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Gabriel Brasileiro Nunes Matos Carneiro

Teresópolis 2021

Tema: Os encantos da Cerveja Ácida


SOUR ALES

Antes de qualquer coisa, gostaria de começar o meu trabalho


destacando a necessidade de discutir e conversar sobre cerveja
artesanal com uma linguagem mais simples e facilitadora. Abordo
aqui essa questão por vivenciar e observar situações de exclusão
por parte de alguns estudiosos do mundo da cerveja com
consumidores que ainda não possuem tanto conhecimento. Sei do
potencial incrível de mercado que a bebida tem, e para uma maior
abertura de portas, é importante colocar essa questão em pauta.

Dito isso, venho aqui apresentar o meu trabalho sobre a cerveja


SOUR(azedo, em inglês), categoria que abriga vários estilos. Como
o nome já diz, é uma cerveja ÁCIDA, que pode remeter ao “gosto
azedo” do iogurte, suco de laranja, maracujá, limão, entre outros.

O uso de leveduras selvagens no processo de fermentação, sendo


ele controlada ou espontaneamente é uma característica marcante
no processo das Cervejas Sour. O processo de produção é delicado
e arriscado, o que torna uma bebida difícil de ser produzida. Como
no passado não se tinha um entendimento sobre o processo e a
interferência natural que acontecia no mosto, às pessoas
acreditavam que a bebida adquiria essa característica azeda por
conta de uma transformação milagrosa.

Ao longo dos anos, cervejeiros começaram a compreender que por


conta de microorganimos presentes no ar, o mosto fermentava de
forma espontânea. Apesar da dificuldade para encontrar “o ponto”
da acidez nesse tipo de cerveja, o mercado vem buscando cada vez
mais se aventurar em produzi-las. Diversos tipos e possibilidades
podem ser encontrados nas cervejas Sour. Apesar de ser ácida, a
única característica em comum entre todas essas cervejas é no
processo de produção com o uso de leveduras selvagens. Até a
potência da acidez lática irá mudar de uma para a outra, isso
porque existe a necessidade do mosto entrar em contato com
microrganismos completamente distintos que na maioria das vezes
estão em ambientes diferentes. Em muitas ocasiões são criados
ambientes propícios para que os microrganismos se proliferem.
O mundo das cervejas ácidas é algo muito amplo, das versões mais
clássicas partidas da Europa como a Berliner Weisse, Flanders Red
Ale, Lambic... Até aquelas que tiveram esses estilos como
referência e chegaram a um resultado único e inovador, como as
American Sour, e posteriormente a Catharina Sour.

Dentre tantos estilos que são englobados nessa categoria, decidi


escolher aquele que é visto e consumido com maior frequência na
minha cidade Salvador. Os dois maiores guias de estilo para
concurso o classificam com diferentes nomenclaturas. “Mixed-
Fermatation Sour Beer” (BJCP) ou “American Style Sour Ale”
(Brewers Association). Em minha opinião, existem algumas falhas
nas especificações dos dois guias de estilo, por não se
aprofundarem mais nas características essenciais e deixarem muito
aberta a maneira como o estilo pode ser produzido. A falta de um
“mergulho” maior na descrição de aromas, sabores e falhas faz com
que o cervejeiro iniciante fique perdido com o caminho que deve
seguir quando quer produzir uma cerveja desse estilo para
inscrever num concurso.

Independente da nomenclatura utilizada trata-se de um estilo


bastante versátil, permitindo bastante variações como de diferentes
estilos como base, adição de frutas, e técnicas para atingir a acidez.
Inicialmente desenvolvido por cervejeiros americanos a partir de
experimentos e interpretações modernas das Belgian Sour Ales.

O movimento da cerveja sour começou a ganhar força nos Eua a


partir dos anos 2000, quando o famoso mestre cervejeiro e amante
das cervejas envelhecidas Vinnie Cilurzo assumiu o comando da
cervejaria Russian River, até então mundialmente conhecida pela
sua Double Ipa. Em 2008 suas cervejas ácidas já eram
deslumbradas pelos apreciadores de cerveja, e Vinnie recebeu
prêmios por Inovação na cerveja artesanal. Consequentemente
esse acontecimento abriu os olhos do mercado, e outras cervejarias
começaram a apostar no estilo e inovar nos seus rótulos. Hoje os
Estados Unidos possui uma enorme variedade de sour, e é um
destino espetacular para os amantes do estilo.
A ascensão das American Sour Ales coloca em evidência o caráter
inovador e explorador da escola americana, influenciando nós
brasileiros, que também gostamos de experimentar e colocar a
nossa criatividade em prática. Com isso, no ano de 2015, por volta
de março/abril se inicia um movimento de maior produção de
cerveja ácida no Brasil. A ACERVA catarinense traz para o país um
cervejeiro americano bastante conhecido, Michael Tonsmeire,
escritor do livro “American Sour Beer”. Momento que despertou o
interesse de vários cervejeiros artesanais e micro cervejarias sobre
as cervejas ácidas. A ACASC (Associação das Micro Cervejarias de
Santa Catarina) observando aquele bom momento, percebeu que
cada cervejaria estava dando uma nomenclatura diferente para as
cervejas ácidas produzidas com frutas. Num momento que, cerveja
ácida com frutas não existia necessariamente um estilo onde
pudessem ser catalogadas nos principais guias, consequentemente
sendo catalogadas como “Experimental Beer”. Mas a partir do
momento em que esses produtores passaram a fabricar o estilo de
maneira recorrente, sendo também reproduzida em outras partes do
país com frutas originais do Brasil, entende-se que não se trata
mais de um estilo experimental. A ACASC por fim, decide reunir
alguns produtores desse estilo, e em conjunto denomina-lo
“Catharina Sour”.

O ano de 2018 traz um grande feito para o mercado de cerveja


artesanal brasileiro, pois o estilo Catharina Sour é catalogado no
BJCP (Beer Judge Certification Program) de forma provisória. Isso
permite que ele possa ser julgado mundialmente por concursos
oficiais que seguirem essa normativa. Com isso, a catalogação traz
também uma série de outros benefícios como, a globalização do
estilo, a valorização da cultura, e a popularização nacional,
aumentando o número de vendas.

É um grande passo para a evolução da cerveja artesanal no Brasil,


despertando mais interesse na parte de pesquisas, e quem sabe,
na criação de identidade de uma nova escola cervejeira. Uma vez
que, apesar de começarmos a plantar lúpulos e maltes na nossa
região, o Brasil ainda não pode ser considerado como uma escola,
pois dependemos bastante da importação de insumos estrangeiros
e não possuímos nosso próprio lúpulo, levedura ou até mesmo
malte capaz de abastecer o mercado nacional.

Avaliação Sensorial

Para a etapa de avaliação sensorial fiz a escolha de 3 rótulos


referentes ao estilo.

1- SourSAT P.05 (Cervejaria Satélite)

APARÊNCIA:

- Cor vermelha com feixes amarronzados de alta turbidez. Espuma


clara, levemente rosada, com médio-baixa formação e retenção
curta.

AROMA:

- Frutado destacando framboesa e amora, leves notas de malte,


remetendo miolo de pão. Acidez presente e sem características
aromáticas de lúpulo.

SABOR:

- Acidez lática presente em primeiro plano, frutado de framboesa e


amora e leve dulçor no final.

SENSAÇÃO NA BOCA:

- Corpo leve, alto drinkability com carbonatação médio-alta e final


seco.
2- Vanilha Sour Guava (Cervejaria Mafiosa)

APARÊNCIA:

- Coloração rosada, levemente turva, com espuma branca de baixa


formação e baixa retenção.

AROMA:

- Acidez presente, notas fortes de goiaba com um leve e discreto


hibisco.

SABOR:

- Forte funky acompanhado de goiaba

SENSAÇÃO NA BOCA:

- Corpo médio, carbonatação alta com final seco. Funky muito forte,
tornando-a de baixo drinkability.

3- Sawã (Cervejaria Japas)

APARÊNCIA:

- Rosa com feixes alaranjados, com espuma branca de média


formação e baixa retenção. Turbidez média.

AROMA:

- Acidez em primeiro plano acompanhada de notas significantes de


ameixa. Leve presença de malte e lúpulo, apresentando aromas de
miolo de pão e florais respectivamente.

SABOR:

- Acidez lática presente de maneira harmoniosa com ameixa. Notas


de malte são sutis acompanhadas de um leve amargor do lúpulo
que é perceptível. Final levemente doce.

SENSAÇÃO NA BOCA:

- Corpo médio-baixo, médio-alta carbonatação com o final seco e


elegante.
HARMONIZAÇÃO

A harmonização que eu escolhi sugerir foi um ceviche de salmão e


linguado, preparado com caldo de laranja-lima, pouco caldo de
limão, tomate cereja, cebola roxa picada e pimentão vermelho. Sal
e pimenta do reino a gosto, mas sem exagero.

O estilo de harmonização que ocorre entre o prato e a cerveja é a


harmonização por semelhança, uma vez que os dois apresentam a
acidez como característica principal. Acho uma sugestão muito rica,
pois tanto a cerveja, quanto o prato possuem muitos sabores
apesar do gosto base. Além do ceviche não ser um prato pesado, o
que ajuda a ressaltar todas as características da cerveja, que se
apresenta de forma elegante e interessante para limpar o palato,
convidando a pessoa para uma nova garfada.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS

- Anotações da aula

- Livro “O atlas mundial da cerveja” (Tim Webb e Stephen


Beaumont)

- Apostila do Curso Sommelier de Cervejas (Science of Beer)

- Guia de Estilos de Cervejas BJCP 2018

- Guia de Estilos Brewers Association 2018

- Canal Papo de Cerveja: https://www.youtube.com/watch?


v=uitLYNSJQb8

- Revista BeerArt: https://revistabeerart.com/news/catharina-sour-


reconhecido
- Central Brew: https://centralbrew.com.br/blog/cerveja-sour-o-que-
sao-e-por-que-voce-precisa-conhecer/

- Cerveja Mestra: https://cervejamestra.com.br/2017/04/01/sour-


beer-desvendando-as-cervejas-azedas/

- Trabalho do Sommelier Science of Beer

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