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O dos Castelos
A Europa é perspetivada pelo poeta como figura feminina cujo rosto é, indubitavelmente, Portugal – “O
rosto com que fita é Portugal.
Porém, esta figura feminina “jaz”, melhor dizendo, está deitada sobre os cotovelos, numa atitude de
hipotético adormecimento, ou de espera, vivendo das memó rias de um passado, cujas raízes culturais estã o
associadas à Grécia, Itá lia e Inglaterra.
Desta atitude passiva, expectante, apenas o rosto parece estar animado de vida, porque fita, olha
fixamente o Ocidente – o mar, onde a Europa se lançou através de Portugal, na grandiosidade das descobertas
com a qual traçou o seu pró prio futuro. Neste sentido, só Portugal parece estar pronto a despertar e o seu
olhar é, simultaneamente, “esfíngico e fatal”, ou seja, enigmá tico e marcado pelo destino.
Assim, o poeta refere-se, sem dú vida, ao papel de Portugal como líder inegá vel de uma nova Europa,
cujo futuro recuperará a gló ria do passado. A missã o de Portugal está , desde logo, assinalada pela sua
localizaçã o geográ fica estratégica: conquistar o que está para ocidente, o mar, criando um novo império que
dará continuidade à supremacia do restante império europeu.
O título do poema é uma alusã o ao territó rio português, protegido por os sete castelos que, uma vez
conquistados aos mouros, definiriam a geografia de Portugal.
Tal como neste poema de Mensagem, a estrofe 20 do canto III d’ Os Lusíadas referencia Portugal como
a cabeça da Europa – “quá si cume da cabeça de Europa toda” – atribuindo-lhe uma missã o predestinada. N’ Os
Lusíadas, essa predestinaçã o é ditada pelo “Céu” que quis que Portugal vencesse na luta contra os mouros.
Quer num texto, quer noutro, é percetível um forte sentimento patrió tico, uma vez que o papel de
Portugal face à Europa é enfatizado.
No texto camoniano, tal sentimento expressa-se tanto pela forma como o poeta vê Portugal como líder
da Europa (“cabeça”), como na expressã o do amor do narrador, Vasco da Gama, pela “ditosa pá tria”, onde
espera vir a morrer depois de cumprida a sua missã o.
Já Pessoa valoriza o papel de Portugal junto da civilizaçã o ocidental, ao colocá -lo como resto que fita
“O ocidente, futuro do passado”. É um sentimento muito patrió tico aquele que leva Pessoa a antever a
construçã o de um império muito para alem do material e é também esse sentimento o que o leva a apontar
Portugal como cabeça e Itá lia e Inglaterra como cotovelos.
Os Campos
O das Quinas
Só o que passa!
E Filho o ungiu.
O poeta faz uma série de afirmaçõ es paradoxais – “Os deuses vendem quando dã o” -, ou baseadas em
jogos de palavras – “Baste a quem basta o que lhe basta” – com um ú nico objetivo: mostrar que para se
atingir a grandeza, para se conquistar a gló ria é indispensá vel estar disposto a sofrer – “Compra-se a gló ria
com a desgraça”.
Qual será , pois, o destino do Homem, mais particularmente o do Homem português? O mesmo de
Cristo: tal como Ele, os portugueses só ascenderã o a um plano superior, transcendendo-se, superando as
limitaçõ es da pró pria vida, por natureza efémera – “A vida é breve, a alma é vasta”.
Estã o, entã o, traçadas as potencialidades da alma portuguesa, uma alma que se afirma “vasta”, grande
– será esta grandeza de alma que presidirá todos os heró is de Mensagem.
Se se descodificar o titulo do poema, “as quinas” correspondem à s cinco chagas de Cristo, símbolo do
sofrimento e morte redentores da humanidade. Por conseguinte, as quinas sã o, desde logo, a expressã o de
que só o sacrifício conduz à redençã o e à gló ria, projetando a missã o de Portugal para um plano de
espiritualidade.
Os Castelos
Ulisses
Vivo e desnudo.
E nos criou.
Assim a lenda se escorre
De nada, morre.
Ulisses sistematização
Canto VIII:
- Armada estacionada em Calecut
- Narrador: Paulo da Gama
- Narratá rio: Catual de Calecut
4 (…)
Vês outro, que do Tejo a terra pisa,
Depois de ter tã o longo mar arado,
Onde muros perpétuos edifica,
E templo a Palas, que em memó ria fica?
Os Castelos
D. Afonso Henriques
D. Afonso Henriques é apelidado pelo poeta de “Pai”. Ele é, simultaneamente, “Pai” e “cavaleiro” – Pai,
porque fundador da nacionalidade e, por isso, pai dos portugueses; cavaleiro, porque, com a “espada”,
defendeu e conquistou o territó rio português, mas também se assumiu como defensor da fé. Entã o, o poeta
pede-lhe que, nos dias de hoje, ele sirva de exemplo aos portugueses e que a sua força inspire a uma açã o que
vença os “novos infiéis”, ou seja, todos aqueles que se opõ em à missã o espiritual e providencial de Portugal
que, para o poeta, é uma certeza inabalá vel.
Espada:
Confere luminosidade (tudo à sua volta se torna claro);
Defesa dos valores (morais, religiosos, nacionais);
Símbolo de cavalaria uniã o mística entre o cavaleiro e a espada;
Valor profético;
Símbolo:
- Da Guerra Santa da guerra interior;
- Do verbo, da palavra;
- Da conquista do conhecimento;
- Da libertaçã o dos desejos;
- Da espiritualidade;
- Da vontade divina;
N’Os Lusíadas, como nã o podia deixar de ser, é dado um destaque enorme a D. Afonso Henriques,
figura que preenche as estrofes 28 a 84 do canto III. Ele é o fundador da naçã o, o escolhido por deus que
legitima o seu poder ao aparecer-lhe na batalha de Ourique. De resto, a lenda de Ourique, muito alimentada
desde o século XVI, serviu para conferir uma dimensã o sagrada ao nascimento de Portugal. Na Mensagem,
curiosamente, o poema dedicado a D. Afonso Henriques nã o refere a lenda, mas ela está lá , implícita, através
da espada/bênçã o.
Os Castelos
D. Dinis
D. Dinis sistematização
Pessoa evoca a figura histó rica de D. Dinis, monarca português da 1ª dinastia, filho de Afonso III. A sua
prioridade enquanto rei foi administrar e organizar o Reino português e nã o guerrear, tendo assinado a paz
com Castela em 1297. Foram-lhes atribuídos os cognomes “O Lavrador” e “O Trovador”, tanto pelo impulso
que deu ao desenvolvimento da agricultura, como pelo apreço manifestado pelo culto da arte de fazer poesia
e pela elevaçã o do português como língua oficial.
Os dois primeiros versos do poema remetem, de imediato, para essa dupla faceta – D. Dinis “escreve
um seu Cantar de Amigo” e é “plantador de naus a haver”, sendo estas construídas com o produto dos pinhais
por ele mandados semear. D. Dinis representa, pois, aquele para quem a poesia terá , entre outros, como
objetivo cantar o império português e aquele que lançará a semente de futuros impérios.
Nos restantes versos, destaca-se toa uma serie de vocá bulos que exprimem sons, vozes, rumores,
como se de uma profecia se tratasse (“marulho obscuro”; “fala dos pinhais”; “o rumor dos pinhais”). Todos
eles profetizam a grande epopeia marítima portuguesa dos séculos XV e XVI.
D. Dinis é, entã o, o profeta que sabe intuir, de forma sibilina (enigmá tica), o grande império das
descobertas. Assim, o que se preconiza é o sonho fundador que permita a construçã o de um tempo futuro.
D. Dinis intertextualidade
D. Dinis nã o poderia deixar de figurar na Mensagem, obra que se ocupa sobretudo dos mitos e à qual
da Histó ria, interessa precisamente a matéria mítica. Nesse sentido, D. Dinis figura como um mito da
iniciaçã o, o antecipador da grande empresa de descoberta do mar desconhecido, aquele que soube escutar a
voz do mar. Já n’Os Lusíadas, epopeia que se ocupa da matéria histó rica elaborada como caminho para a
construçã o do império, da gló ria e do heroísmo, D. Dinis merece pouco mais de duas breves estrofes, pois ele
nã o é um rei guerreiro e os seus feitos nã o sã o feitos de armas.
As Quinas
Qual a Sorte a nã o dá .
Este é o primeiro dos quatro poemas dedicados a D. Sebastiã o. Caracterizando-se como um “louco”
porque “quis grandeza”, D. Sebastiã o admite com orgulho essa loucura, símbolo do inspirado, de todo aquele
que está para além do comum da sociedade e transmite a ideia de que nem a morte a extinguiu ou poderá
extinguir. O “ser que houve” morreu nos areais de Alcá cer Quibir; o “ser que há ”, esse nã o é perecível, porque
o sonho também nã o o é.
Indo mais além neste discurso de “elogio da loucura”, D. Sebastiã o incita aqueles que o ouvem a
herdarem a sua loucura. Trata-se de uma espécie de apelo à continuidade do seu sonho de grandeza.
Num remate de natureza tanto reflexiva como desafiadores, o poeta interroga-se sobre o que distingue
o Homem dos restantes animais – é o sonho que permite que o Homem seja “mais que (...) cadá ver adiado”. É
o sonho que eleva o Homem e o faz ultrapassar a pró pria morte. D. Sebastiã o surge, entã o, como uma espécie
de messias que traz a boa nova da salvaçã o.
O Infante
Infante D. Henrique – grande impulsionador dos descobrimentos. Tendo defendido uma politica expansionista voltada para a
descoberta, foi o responsá vel pela escola de Sagres e levou a cabo a realizaçã o de uma série de descobertas que englobam os
arquipélagos dos Açores e da Madeira e a costa ocidental africana até pró ximo do equador.
O Infante – sistematização
No poema que abre a segunda parte de Mensagem, Pessoa recupera a figura do infante D. Henrique,
um heró i, um dos eleitos por Deus que foi protagonista da vontade divina – “Deus quer” – e que cumpriu a
missã o para a qual foi designado – “a obra nasce”. é entã o reforçada, neste poema, a ideia do heró i mítico,
aquele que Deus manipula quase como um títere, o que obedece à s suas ordens e cumpre os seus desígnios.
Essa obra foi grandiosa: a descoberta da Terra na sua totalidade e verdadeira forma, através da posse
do mar – “E viu-se a Terra inteira, de repente,/Surgir, redonda, do azul profundo”.
Porém, o poeta antecipa o desfecho desventurado da saga marítima dos portugueses – povo que deu o
mundo ao mundo, conquistando o mar, mas cujo império se foi progressivamente dissolvendo – “E o Império
se desfez”.
O poema encerra, entã o, um tom desencantado – “Senhor, falta cumprir-se Portugal!” –, mas no qual se
pretende a certeza de que é possível recuperar a grandeza perdida e construir um Portugal novo, fazendo
alusã o ao mito do Quinto Império.
O Mostrengo
O Mostrengo – sistematização
Este poema simboliza a interminá vel e difícil tarefa da conquista do mai, o poeta narra o encontro –
aquando da primeira passagem do cabo das Tormentas em 1488 – entre a figura horrenda do Mostrengo e o
homem do leme, representante de todos os protagonistas da aventura marítima, os navegadores portugueses.
Numa relaçã o clara de inferioridade física com o monstro marinho, o homem do leme nã o se deixa
intimidar, e lança-lhe o seu desafio: dar cumprimento à vontade inflexível de D. Joã o II.
Ao dominar o Mostrengo, o homem do leme protagoniza a vitó ria dos navegadores portugueses sobre
todos os obstá culos que o mar oferecia: os medos e os inú meros perigos.
Poema cuja extensã o parece querer simbolizar o longo e difícil processo de conquista do mar:
O cará ter narrativo do poema;
O dialogo a três vozes: sujeito poético, Mostrengo e homem do leme;
A simbologia do Mostrengo: todos os perigos, medos e obstá culos;
A dimensã o simbó lica do homem do leme: anó nimo que dá voz ao sentir e à ousadia de um povo;
Poema eco da tradiçã o lendá ria: o desafio do homem face aos limites da sua condiçã o humana;
A insistência no numero três e sua simbologia.
O Mostengo:
Revela atitudes intimidató rias, ameaçadoras, amedrontadoras;
É informe (nã o tem uma forma concreta);
Está carregado de conotaçã o negativa;
É pouco definido, pouco descrito (nã o tem identidade);
Simboliza os perigos do mar, os obstá culos, as adversidades e os medos.
O Mostrengo – intertextualidade
(…)
(…)
43 Sabe que quantas naus esta viagem
Que tu fazes, fizerem de atrevidas,
Inimiga terã o esta paragem,
Com ventos e tormentas desmedidas!
E da primeira armada que passagem
Fizer por estas ondas insofridas,
Eu farei de improviso tal castigo,
Que seja mor o dano que o perigo!
(…)
A afirmação do herói – a coragem do heró i afirma-se pelo enfrentar do medo, por ousar conhecê-lo, decifrá -
lo; assim, o uso da palavra, por parte de Vasco da Gama, interrompendo as palavras ameaçadoras da
monstruosa figura, a pergunta sobre a sua identidade (“Quem és tu?”) sã o o momento simbó lico de afirmaçã o
da grandeza do homem.
O desfazer do mito – tendo sobre os humanos a vantagem de conhecer para amem do presente, o que
mostra ao profetizar desgraças futuras, o gigante, no final, retira-se com um “medonho choro”, depois de ter
contado a sua histó ria. Fora, afinal, vencido no amor e na guerra, iludido e aprisionado; assim, ao tornar-se
conhecido, desvanece-se o seu cará ter ameaçador.
Simbologia do episódio – o Gigante Adamastor representa o maior de todos os obstá culos na realizaçã o de
qualquer viagem, seja qual for a sua natureza – o medo do desconhecido. Como vencer os limites paralisantes,
por vezes, que a prudência impõ e? Como preparar o confronto com nã o se sabe o quê? Com que armas se luta
com o que se desconhece? Perante o desconhecido, os navegadores enfrentaram o terror, desvendaram os
seus mistérios e o desconhecido deixou de o ser. Portanto, o episó dio simboliza a vitó ria sobre o medo que os
perigos ignorados da natureza provocavam – em “O Mostrengo”, encontramos naturalmente a mesma
intençã o simbó lica.
Mar português
Sã o lá grimas de Portugal!
Se a alma nã o é pequena.
O poeta dirige-se ao mar, um mar responsá vel pelo sofrimento das mã es, dos filhos, das noivas, de
todos aqueles que ousaram cruzar as suas á guas com o intuito de o dominarem – “para que fosses nosso, ó
mar!”.
Terá valido a pena tanto sofrimento? “Tudo vale a pena/Quando a alma nã o é pequena” – é mais uma
maneira de o poeta afirmar a importâ ncia da vontade da alma humana, vontade sempre insaciá vel.
Se, na primeira estrofe, o mar é sinonimo de dor, já na segunda, aparece associado à conquista do
absoluto. De facto, o mar encerra “perigo” e “abismo”, mas também espelha o “céu”, ou seja, oferece
recompensas ao permitir o acesso a um prémio superior, seja ele a verdade, a heroicidade, a imortalidade, a
gló ria...
As “lá grimas de Portugal” que tornaram salgado o “mar” de Mensagem sã o as lá grimas choradas n’ Os
Lusíadas pelas mulheres que, na praia, se despediram dos marinheiros que partiram na grande aventura de
Vasco da Gama, nas Despedidas em Belém.
Este episó dio é um momento particularmente lírico da narrativa, pondo a tó nica nos sentimentos do
que ficavam, que antecipadamente choravam a perda dos que partiam, bem como nos destes, que tiveram que
enfrentar esse primeiro obstá culo – a dor que infligiam aos seres amados, as saudades que eles pró prios já
começavam a sentir. Antes dos heró is, em particular Vasco da Gama, vêm as mais frá geis – “mã es, esposas,
irmã s”, “velhos e os mininos”, os mesmos cujas lá grimas darã o sal ao mar do poema de Mensagem.
Assim, nestas estancias d’ Os Lusíadas, há um ambiente de dor e de pessimismo provocado pela
antecipaçã o dos perigos que aqueles que partem vã o enfrentar. No poema “Mar Português”, esta consciência
do perigo, que também provoca dor e sofrimento, é eivada de otimismo, por a dor é encarada como um meio
necessá rio para alcançar o sonho, é uma fase do caminho para atingir o absoluto.
Prece
Prece – sistematização
Trata-se do ultimo poema da segunda parte de Mensagem, Mar Português, onde sã o exaltados os
acontecimentos e o heró is das descobertas marítimas portuguesas, constituindo, também, um prenuncio da
linha temá tica estruturadora da ultima parte de Mensagem – o Encoberto.
O poema é, sem duvida, um apelo a uma entidade divina e superior – “Senhor” – em quem o sujeito
poético deposita a esperança de um futuro redentor. Se, na primeira quadra domina um sentimento de
desencanto e a disforia se torna notó ria, no resto do poema sucede a certeza de que nem tudo é irremediá vel
e de que é possível restaurar a grandeza perdida, ou, pelo menos, conquistar uma outra grandeza – o poeta
acredita que é possível recuperar o passado grandioso e avançar para um futuro promissor e positivo. Assim,
para ele, a esperança ainda sobrevive, a chama da vida ainda nã o está completamente extinta, ela apenas
dorme debaixo do “frio morto em cinzas”.
O que é preciso, entã o? Basta que a “mã o do vento” a erga, basta apenas um golpe de vontade e, uma
vez levantado “o sopro, a aragem”, o esforço ganhará forma e, de novo, haverá a certeza de conquistar a
“Distâ ncia”. Esta distâ ncia nã o tem necessariamente que ser a do mar, mas será , sobretudo, “nossa”, ou seja,
será a condiçã o redentora do desencanto do povo português. O tom das duas quadras é, pois, a de um choro
apelo à açã o, numa antevisã o de um novo império, o Quinto Império – um império nã o mais material porque
eterno.
Prece – intertextualidade
Neste poema, o sujeito lírico lamenta o presente de cinzas em que a pá tria está mergulhada (depois de
ter vencido tanta “tormenta” e ter tido tanta “vontade” e exprime o desejo de ressurgimento impulsionado
pela vontade de novos embates com o desconhecido, na perseguiçã o da verdade que só é possível alcançar
seguindo a chama vital do sonho. Do mesmo modo, no final de Os Lusíadas, o poeta, que cantou a vontade
indomá vel dos guerreiros e nautas do passado, exprime a amargura de saber que, no presente, a pá tria “está
metida/No gosto da cobiça e da rudeza/Duma austera, apagada e vil tristeza.”, por isso, apela a D. Sebastiã o,
para que o rei impulsione o ressurgimento da luta, enfrentando “perigos incó gnitos do mundo”.
D. Sebastião
'Sperai! Cai no areal e na hora adversa
D. Sebastião – sistematização
Este poema, que abre a terceira parte de Mensagem, utilizando um discurso na primeira pessoa,
inicia-se com um apelo do rei aos portugueses, a quem o monarca transmite a esperança de um futuro
promissor. Para o rei, a “hora adversa” do presente nã o é mais do que o “intervalo” necessá rio para o inicio da
realizaçã o de um grande sonho universal e eterno – “é o que eu me sonhei que eterno dura” – que
ultrapassará a precariedade do momento em que o D. Sebastiã o histó rico, aquele que desaparecer na batalha
de Alcá cer Quibir, caiu no areal.
A derrota, em Alcá cer Quibir, assim, apresentada como “um mal necessá rio” para se ultrapassar a
dimensã o material e efémera do império português – “o areal e a morte e a desventura” – e se começar a
construir uma outra grandeza possuidora de uma dimensã o espiritual e eterna, o Quinto Império, inspirado
na figura do rei – “É esse que regressarei”. O rei assume-se como uma espécie de messias, um enviado de
Deus – “Que Deus concede aos seus”; “Se com Deus me guardei?” –, um salvados que conduzirá o seu povo à
gló ria eterna.
O Quinto Império
Triste de quem vive em casa,
Contente com o seu lar,
Sem que um sonho, no erguer de asa
Faça até mais rubra a brasa
Da lareira a abandonar!
Fernando Pessoa, in Mensagem
Neste poema, pessoa assume, de forma clara e explicita, o que se já vinha anunciando ao longo de
Mensagem, o futuro redentor de Portugal está indissociavelmente ligado à construçã o de um império de
características espirituais e eternas, o Quinto Império.
As primeiras três estrofes constituem uma reflexã o sobre a condiçã o humana. Partindo de afirmaçõ es
provocató rias e controversas – “Triste de quem vive em casa/Contente com o seu lar” ; “Triste de quem é
feliz!” –, pretende-se mostrar que a felicidade torna o Homem acomodado, transformando-o num ser sem
sonhos, que apenas “Vive porque a vida dura” e que nada mais faz durante a sua existência do que esperar a
morte – “Ter por vida a sepultura”. A conclusã o deste momento reflexivo é a de que ser homem passa pelo
descontentamento que leva à realizaçã o de grandes obras.
Nas duas ultimas estrofes, o poeta desvenda a “chave do poema”: o desencanto do presente (“erma
noite”) será ponto de partida para uma nova era designada como “dia claro”. Esta nova era distancia-se das
gló rias materiais – “Quem vem viver a verdade/Que morreu D. Sebastiã o?” – e apresenta-se como a
continuadora das matrizes espirituais que moldaram a identidade europeia ao longo dos séculos – Grécia (a
origem da civilizaçã o Ocidental), Roma (a potência que expandiu os fundamentos greco-latinos), Cristandade
(a dimensã o espiritual e humanista europeia), Europa (influencia europeia no resto do mundo, operada apó s
a renascença). Estes “quatro Tempos” tiveram o seu ciclo de vida, mas o Quinto Império, império da língua e
cultura portuguesas, nã o só conduzirá Portugal a uma nova gló ria, como será eterna e universal.
Relaçã o do advento do Quinto Império com as profecias de Jú piter no Consílio dos Deuses:
Camõ es foi o épico que imortalizou o império português, ao vê-lo atingir o seu apogeu com os
Descobrimentos. Pessoa é o cantor épico-lírico que canta o impero “à beira má goa”, procurando despertar os
espíritos para a necessidade do seu ressurgimento. Se nas duas primeiras partes da Mensagem é possível uma
aproximaçã o a Os Lusíadas, na terceira parte, Pessoa sente-se investido no cargo de anunciador do Quinto
Império, que nã o precisa de ser material, mas civilizacional.
(Terceiro)
Só te sentir e te pensar
Meus dias vá cuos enche e doura.
Mas quando quererá s voltar?
Quando é o Rei? Quando é a Hora?
Terceiro – sistematização
Este é o ú nico poema de Mensagem que nã o apresenta titulo, sendo, por esse facto, considerado como
aquele em que o discurso se identifica com o pró prio Pessoa.
O poema estrutura-se em torno do desencanto e da má goa do poeta que sente os seus “dias vá cuos”, o
vazio que subjaz à ruína do império, e que anseia pela chegada de um messias, de um salvador, que possa
restituir a Portugal a grandeza perdida – “Quando virá s, Ó Encoberto,/Sonho das eras português”.
O predomínio das interrogaçõ es revela essa dor do presente e a â nsia da chegada da “Nova Terra” e
dos “Novos Céus”. Atende-se, ainda, na identificaçã o realizada pelo sujeito poético entre o sonho e a entidade
divina inspiradora – “Quando, meu Sonho e meu Senhor?” – que o torna uma das forças impulsionadoras da
vontade humana.
Terceiro – intertextualidade
(...)
O final da Mensagem aproxima-se e o poeta exprime a sua tristeza e vazio pela pá tria à “beira-má goa”.
Quer anunciar a vinda do futuro, “ser mais do que o sopro incerto/De um grande anseio que Deus fez”, mas
tem já “os olhos quentes de á gua”. Como Camõ es no final de Os Lusíadas, quando desalentado escreve “Nã o
mais, Musa, nã o mais, que a Lira tenho/Destemperada e a voz enrouquecida” e mais à frente, diz a D.
Sebastiã o “Para servir-vos, braço à s armas feito:/Para cantar-vos, mente à s Musas dada”.
Nevoeiro
Nem rei nem lei, nem paz nem guerra,
É a Hora!
Valete, Fratres
Nevoeiro – sistematização
O poema final de Mensagem apresenta uma caracterizaçã o negativa de Portugal, país marcado pela
falta de identidade, de entusiasmo, de objetivos e de valores morais.
Portugal é um pais fragmentado, mergulhado na incerteza, vivendo à sobra de um passado glorioso
que morreu – “Como que o fogo-fá ctuo encerra”. No entanto, o nevoeiro que envolve Portugal traz em si o
gérman da mudança, indicia um outro tempo anunciado pela exclamaçã o final – “É a Hora!” – e pela saudaçã o
latina – “Valete fratres”. É o tempo do Quinto Império, que dará à língua e cultura portuguesas uma dimensã o
eterna e universal.
Nevoeiro – intertextualidade
Neste poema, como em Prece, o sujeito lírico lamenta o presente de indefiniçã o e crise em que a pá tria
está mergulhada e exorta à mudança que equivale ao erguer do sonho do combate com o desconhecido, na
perseguiçã o da verdade. Do mesmo modo, no final de Os Lusíadas, o poeta exprime a amargura de saber a
pá tria “metida/No gosto da cobiça e na rudeza/Duma austera, apagada e vil tristeza”, para depois fazer um
apelo a D. Sebastiã o, no sentido de impulsionar o ressurgimento da luta.
Assim, o retrato de Portugal que Camõ es faz na sua obra aproxima-se do retrato feito em Nevoeiro – é
o “Portugal a entristecer/Brilho sem luz e sem arder”, de Pessoa. A desilusã o é, porém, maior: falta-lhe o grito
de esperança que encontramos no poema pessoano.
Os símbolos
As Ilhas Afortunadas
Sã o ilhas afortunadas,
Os Símbolos
O Desejado
À Eucaristia Nova.
Mestre da Paz, ergue teu glá dio ungido,
Os Símbolos
O Encoberto
A Rosa do Encoberto.
Fernando Pessoa, in Mensagem
Ao longo do poema, assiste-se a uma progressã o ideoló gica e temporal na construçã o das perguntas:
símbolo fecundo símbolo divino símbolo final : três símbolos
aurora ansiosa dia já visto sol já desperto : três momentos do dia
Horizonte
Horizonte – sistematização
Horizonte – intertextualidade
51 Cortando vã o as naus a larga via
Do mar ingente para a pá tria amada,
(…)
Quando juntas, com sú bita alegria,
Houveram vista da ilha namorada,
(…)
O Canto IX dos Lusíadas, conta do regresso dos Portuguesas da Índia, onde pelo caminho encontram a
«Ilha dos Amores». A Ilha aparece como uma recompensa, mas também como símbolo de o povo Português
de ter tornado, pelos seus feitos, igual aos deuses que agora os homenageiam de modo tã o inesperado. A
comparaçã o possível entre este Canto IX e o poema “Horizonte” é a oposiçã o quase total entre o que Camõ es
considera a “Recompensa” e Pessoa considera a “Verdade”. Camõ es idealiza uma recompensa para os
sentidos, um festim material, enquanto Pessoa quer algo mais alto e frio – a verdade do conhecimento oculto.
Os Tempos
Tormenta
Os Tempos
Antemanhã
Os Tempos
Noite
“A ú ltima nau” aparece como uma espécie de lead-in, de introduçã o à Terceira Parte de Mensagem, que
ainda nã o se iniciou. É este um período intermédio de poesia, palavras de anoitecer, saindo da luz (a vida) do
que é conhecido em que fomos ainda guiados pelos sentidos, para entrarmos na escuridã o completa da noite
(a morte), onde apenas os símbolos nos vã o guiar.
A certeza de Pessoa acha aqui nobre conclusã o. “Nã o sei a hora, mas sei que há a hora”. De maneira
perentó ria o poeta nã o deixa dú vidas ao leitor – o regresso de D. Sebastiã o será uma realidade. Mas num
futuro incerto.
Deus, chame-lhe a alma (…) / Mistério”. “Mistério” é afinal uma palavra que pode tomar diferentes
“A que ilha indescoberta / Aportou? Voltará da sorte incerta / Que teve?”significados. A
– Pessoa invoca aqui, como o fez por exemplo no seu drama está tico Ocerteza é uma
Marinheiro, a mesma ilha misteriosa, na qual é possível aquilo que agora é certeza
impossível. É a mesma ilha longínqua que Jacinto do Prado Coelho identifica nainterior,
Mensagem, dizendo-nos – lembrando Castro Meireles – que Pessoa desenha firmada numa
também “a histó ria trá gico-marítima de si pró prio”. convicçã o de
“iniciado”.
Viriato
E é já o ir a haver o dia
Viriato – intertextualidade
22 Desta o pastor nasceu, que no seu nome
Se vê que de homem forte os feitos teve;
Cuja fama ninguém virá que dome,
Pois a grande de Roma nã o se atreve.
Esta, o velho que os filhos pró prios come
Por decreto do Céu, ligeiro e leve,
Veio a fazer no mundo tanta parte,
Criando-a Reino ilustre; e foi desta arte:
Luís de Camõ es, Os Lusíadas, Canto III
As Quinas
Os Colombos
Ocidente
Da mã o que desvendou.
Da mã o que o conduziu.
Os tempos
Calma
MENSAGEM
Período de elaboraçã o: 1913 a 1934
Data de publicaçã o: 1/12/1934
Intencionalidade comunicativa:
. Regenerar o orgulho dos portugueses;
. Contar o passado histó rico de Portugal de uma forma simbó lica e emblemá tica, transformando-o num mito,
a partir do qual seja possível reinventar o futuro;
. Anunciar um novo Império civilizacional, uma supernaçã o mítica.
44 poemas divididos em 3 partes
1ª parte – Brasã o: Nascimento do Império – Evocaçã o dos heró is histó ricos e míticos fundadores de Portugal;
2ª parte – Mar Português: Vida do Império – simboliza a essência da vocaçã o de Portugal para o mar e para o
sonho; sã o retratados os impulsionadores da expansã o portuguesa; conceçã o messiâ nica da Histó ria (“Deus
quer, o Homem sonha e a obra nasce”)
3ª parte – O Encoberto: Morte e Ressurreiçã o do Império – constata-se o estado moribundo do Império
Português e anuncia-se a regeneraçã o do ardor patrió tico; à morte sucederá um tempo de prosperidade
espiritual (o Quinto Império)
Mito Sebastianista
D. Sebastiã o, o décimo sexto rei de Portugal, conhecido pela sua sede de grandes feitos heroicos, morreu em
combate na batalha de Alcá cer Quibir, onde lutou corajosamente em busca de expansã o territorial. Como D.
Sebastiã o nã o tinha herdeiros, o seu desaparecimento provocou uma crise diná stica, que originou a
aclamaçã o de Filipe II de Espanha como rei de Portugal. A notícia da morte do rei português, mal aceite pelos
populares, deu azo ao nascimento do mito sebastianista que simboliza a crença no regresso daquele que
salvará a pá tria e lhe restituirá a sua gló ria.
Mensagem e Lusíadas
Síntese
Os Lusíadas e a Mensagem cantam, em perspetivas diferentes, a grandeza de Portugal e o sentimento português.
Nas duas primeiras partes da Mensagem é possível um diálogo com Os Lusíadas; em O Encoberto, Pessoa situa-se no
momento em que o Império Português parece desmoronar-se por completo e, assume, então, o cargo de anunciador de
um novo ciclo que se anuncia, o Quinto Império, que não precisa de ser material, mas civilizacional.
Os Lusíadas são uma narrativa épica, que faz uma leitura mítica da História de Portugal. Em estilo elevado, canta uma
ação heroica passada e analisa os acontecimentos futuros, cuja visão os deuses são capazes de antecipar.
Fernando Pessoa, no poema épico – lírico, canta, de forma fragmentária e numa atitude introspetiva, o império
territorial, mas retrata o Portugal que “falta cumprir-se”, que se encontra em declínio a necessitar de uma nova força
anímica.
Camões procura perpetuar a memória de todos os heróis que construíram o Império Português; Fernando Pessoa
descobre a predestinação desses heróis, para encontrar um novo heroísmo que exige grandeza de alma e capacidade
de sonhar, quando o mesmo Império se mostra moribundo.
Os nautas, incluindo Vasco da Gama, são símbolo do heroísmo lusíada, do seu espírito de aventura e da capacidade
de vivência cosmopolita.
Em Lusíadas, Camões consegui fazer a síntese entre o mundo pagão e o mundo cristão; na Mensagem, Pessoa procura a
harmonia entre o mundo pagão, o mundo cristão e o mundo esotérico.
Fernando Pessoa, na Mensagem, procura anunciar um novo império civilizacional. O “intenso sofrimento patriótico”
leva-o a antever um império que se encontra para além do material.
Mensagem
Lusíadas
Mitificação do herói
Os lusíadas mostram a história do povo que teve a ousadia da aventura marítima e a intenção em exaltar os heróis que
contribuíram a alargaram o Império;
Os navegantes, com destaque para Vasco da Gama, ultrapassam a individualidade do herói coletivo (povo), e são
símbolos do heroísmo lusíada, do seu espírito de aventura e da capacidade de vivência cosmopolita;
Exprime a passagem do desconhecido para o conhecido, da realidade do Velho Continente e dos seus mitos
indefinidos para novas realidades de um mundo a descobrir.
Ao contrário dos épicos anteriores, Camões escolheu um herói coletivo, procurando que a sua epopeia anunciasse a
história de todo um povo, afirmando que os navegantes, que chegaram à Índia, e todos os heróis lusíadas merecem a
mitificação;
Nega a existência de deuses, dizendo que estes são criação do homem para tentar justificar o que lhe parece difícil de
explicar.
Mensagem é a única obra completa publicada em vida de Fernando Pessoa. Contém 44 poemas. Os seus poemas,
apesar de compostos em momentos diversos, têm como fio condutor da sua unidade a visão mítica da Pátria.
1. A Estrutura Tripartida
Os 44 poemas que constituem a Mensagem encontra-se agrupados em três partes que correspondem às etapas da
evolução do Império Português – nascimento, realização e morte.
O poema comça com a expressão latina Benedictus Dominus Deus noster qui deditnobis signum (Bendito o Senhor
Nosso Deus que nos deu o sinal).
Cada uma das partes do Poema inicia-se também com uma expressão latina: na primeira surge Bellum sine bello
(Guerra sem guerra). Na segunda parte, ocorre Possessio maris (Posse do mar). N1.1a terceira parte há uma Pax in excelsis
(Paz nos céus), que marcará o Quinto Império. O poema termina com a expressão Valete, Frates (felicidades irmãos).
1.1. Brasão
Esta primeira parte corresponde ao nascimento do Império Português. Portugal na Europa e em relação ao Mundo,
procurando atestar a sua grandiosidade e o valor simbólico do seu papel na civilização ocidental
1.3. O Encoberto
A terceira parte corresponde a desintegração, começa por manifestar a esperança e o “sonho português”, pois o
atual Império encontra-se moribundo. Mostra a fé de que a morte contenha em si o gérmen da ressurreição.
2. Discurso da Mensagem
Em Brasão, “Os Campo”, “Os Castelos”, “As Quinas”, “A Coroa” e “O Timbre”, são marcas de afirmação do passado,
de mágoa do presente e de antevisão do que há de vir. Em Mar Português, há um presente de glórias, que já não existe,
mas que faz parte da mémoria e alma portuguesa, capaz de fazer renascer uma nova luz, de permitir o advento do Quinto
Império. O Encoberto, depois de manifestar a crença num regresso messiânico, considera que, após a tempestade atual, a
chama há de voltar e a luz permitirá o caminho certo. Por isso que acredita que “É a Hora” de traçar novos rumos e
caminhar na construção de um Portugal novo.
1. ª Parte
1. O dos Castelos
»Personificação da Europa
»“Futuro do passado” designa uma alma que permanece.
2. Ulisses
» Lenda da criação da cidade de Lisboa por Ulisses
» “O mito é o nada que é tudo”: apesar de fictício, legitima e explica a realidade
» O mito está num plano superior à realidade, dada a sua intemporalidade
3. D. Afonso Henriques
» D. Afonso Henriques equiparado a Deus, tendo como missão o combate aos Infiéis
» Vocabulário de dimensão sagrada: “vigília”, “infiéis”, “bênção”
» Referência ao aparecimento de Deus a D. Afonso Henriques na Batalha de Ourique
4. D. Dinis
» Mitificação de D. Dinis pela sua capacidade visionária (plantou os pinhais que viriam a ser úteis nos
Descobrimentos); construtor do futuro
» O Presente é “noite”, “silêncio” e “Terra”, enquanto que o futuro é os pinhais, com som similar ao do mar, daí a
“terra ansiando pelo mar”
5. D. Sebastião, rei de Portugal
» A “loucura” ou “sonho” é a capacidade de desejar e ter iniciativa, para ultrapassar o estado de “cadáver adiado que
procria” (simplesmente vive esperando a morte)
» Convite a que outros busquem a grandeza para construir algo importante (“Minha loucura, outros que me a
tomem”)
» Para ser grande, Portugal deve ter loucura e desejar grandeza, para poder “renascer o país”.
» Enquanto figura histórica, D. Sebastião morreu em Alcácer-Quibir (“ficou meu ser que houve”) mas persiste
enquanto lenda e exemplo de “loucura” (“não o que há”)
» Apesar do fracasso, a batalha de Alcácer-Quibir é importante para motivar e recuperar Portugal do estado de
“morte psicológica”
2. ª Parte
1. O Infante
» “Deus quer, o Homem sonha, a obra nasce”: descrição do processo de criação
» Porque Deus quis unir a Terra, “criou” o Infante D. Henrique para que este impulsionasse a obra dos
Descobrimentos
» Mitificação do infante, criado e predestinado por Deus
» Depois de criado o Império material (“Cumpriu-se o mar”), “o Império se desfez”, faltando “cumprir-se Portugal”,
sob a forma de um Quinto Império espiritual
2. Horizonte
» O horizonte (“longe”, “linha severa”, “abstrata linha”) simboliza os limites
» Descrição das tormentas da viagem (passado), da chegada (presente) e reflexão (projeção futura)
» A esperança e a vontade são impulsionadoras da busca
» O sucesso permite atingir o Conhecimento como recompensa
3. Ascensão de Vasco da Gama
» Capacidade de interferência de Vasco da Gama no plano mitológico das guerras entre deuses e gigantes
» Ascensão de Vasco da Gama e dos Portugueses, porque devido aos seus feitos “se vão da lei da morte libertando”,
perante pasmo quer no plano mitológico (deuses e gigantes) quer no plano terreno (pastor)
4. O Mostrengo
» Existência permanente do desconhecido
» O homem do leme treme com medo do perigo, mas enfrenta-o (herói épico)
» Imposição progressiva do homem do leme ao mostrengo
5. Mar Português
» Lamentação do “preço” dos descobrimentos e reflexão sobre a sua utilidade
» O mar (“sal”, “lágrimas”) é de origem portuguesa – mitificação de Portugal
» “Tudo vale a pena/Se a alma não é pequena”: o preço da busca é recompensado, neste caso tornando-se português
o mar.
» É no mar (desconhecido) que se espelha o céu
» Cumprir o sonho é ultrapassar a dor
6. Prece
» Poema de transição da 2.ª para a 3.ª parte da obra
» Descrição negativa do presente e consequente saudade do passado
» “O frio morto em cinzas a ocultou:/A mão do vento pode erguê-la ainda.”: Debaixo das cinzas ainda resta alguma
esperança
» Demonstração do desejo de novas conquistas
» Independentemente da conquista, interessa “que seja nossa” para recuperar a identidade e glória passadas.
» O Passado é representado pela grandeza nacional (Descobrimentos) e o Presente pela saudade do passado, daí a
necessidade de recuperar o fulgor e o tom de esperança implícito no poema
3. ª Parte
1. O Quinto Império
» “Triste de quem é feliz!”: Felicidade de quem não sonha, não passando de “cadáver adiado que procria”
» Quem sonha está permanentemente descontente, e por isso tem objetivos
» Depois de quatro Impérios, um novo nascerá, começado por D. Sebastião
» D. Sebastião morreu, mas a mitificação permanente permite que o sonho persista e que possa ser prosseguido –
“minha loucura, outros que me a tomem”
2. Screvo meu livro à beira-mágoa
» Descontente face à situação do mundo, o poeta vive na ânsia do sonho e da vinda do “Encoberto” para o despertar
» O vocativo varia, assegurando apenas a vinda de um messias, independentemente da sua identidade
» O sujeito poético apela à vinda do destinatário para “acordar” o povo
3. Nevoeiro
» Metáfora do Portugal presente, na indefinição, obscuridade e incerteza
» O país vê-se perante uma crise de identidade e valores
» Ao contrário da nação, o sujeito poético está inquieto, chorando a saudade do passado
» É chegada a hora de preparar o futuro, despertar o reino e cumprir a missão já que ao nevoeiro sucede um novo
dia.
I Os Campos:
Primeiro / O dos Castelos
Segundo / O das Quinas
Os Castelos:
Primeiro / Ulisses
Segundo / Viriato
Terceiro / O Conde D. Henriques Quarto / D. Tareja
Quinto / D. Afonso Henriques Sexto / D. Dinis
Sétimo (I) / D. João o Primeiro Sétimo (II) / D. Filipa de Lencastre
Primeira / D. Duarte, Rei de Portugal Segunda / D. Fernando, Infante de Portugal Terceira / D. Pedro, Regente d
Brasão
Nun’ Á lvares Pereira
Bellum sine
PRIMEIRA As Quinas:
PARTE
Benedictus Dominus Deus noster qui dedit nobis
A Coroa:
V O Timbre:
A Cabeça do Grifo / O Infante D. Henriques
Uma Asa do Grifo/ D. Joã o Segundo
A outra Asa do Grifo / Afonso Alburquerque
O Infante
Horizonte
Mensagem
Padrã o
signum
O Mostrengo
Epitáfio de Bartolomeu Dias
Os Colombos
Ocidente
Fernão de Magalhã es
Portuguê s
Mar Português
PARTE
Mar
A Ú ltima Nau
Prece
I Os Símbolos:
Primeiro / D. Sebastião
Segundo / O Quinto Império Terceiro / O Desejado
Quarto / As Ilhas Afortunadas
Quinto / O Encoberto
II Os Avisos:
O Encoberto
Primeiro / O Bandarra
TERCEIRA
PARTE
Pax in
III Os Tempos:
Primeiro / Noite
Segundo / Tormenta
Terceiro / Calma
Quarto / Antemanhã
Quinto / Nevoeiro
5. Sebastianismo
Fernando Pessoa, na Mensagem cria o herói, o Encoberto que se apresenta como D. Sebastião. Da história ao
mito: a inspiração providencial da figura de D.Sebasteão. D. Sebastião é representado pelo “Encoberto” que está
associado a uma dimensão messiânica de um salvador da pátria. A mitologia nacional indica o Sebastianismo como a
crença na regeneração futura de Portugal e de ideologia impulsionadora do Quinto Império.
6. Exaltação patriótica
O nacionalismo está presente por Portugal ser o tema central. O passado de inspiração, o presente de frustação
e o futuro de concretização. O sentido providencial e messiânico de Portugal está presente na eleição do povo para a
instituição do Quinto Império.
7. Simbologia
Ilhas Afortunadas- Em Mensagem, Fernando Pessoa fala das Ilhas Afortunadas como mito e símbolo, é o
espaço onde se inventa a ideia de salvaçã o, é lá que está o Desejado, o salvador, aquele ou aquilo que virá
salvar a pátria, fazê-la renascer, construindo o Quinto Império.
Mar- Na Mensagem, o mar é "Elemento de ligação entre o passado e certeza adivinhada do futuro, o mar é o
símbolo do ser-se português". O mar surge associado ao desvendar do desconhecido, à demanda de um novo
mundo, de um novo tempo. É o espaço que concilia o perigo, a dor e a possibilidade de ultrapassar' o abismo e o
medo, é uniã o, revelaçã o e descoberta. O mar espelha o céu, o divino, é o caminho, é o espaço de concretizaçã o
do sonho/da loucura.
O mar é símbolo dinâ mico da vida, por isso, o mar foi o caminho para a construçã o do império físico, o mar
será o caminho de busca dessa Índia por haver, como se pode ler no Dicioná rio de Símbolos de Jean Chevalier e Alain
Gheerbrant, "Tudo sai do mar e tudo aí volta: lugar do nascimento, da transformação e do renascimento.”
No mar está o Mostrengo, símbolo do desconhecido, do medo, do fantástico, do misterioso que urge combater e
destruir. Para lá do Mostrengo, estava o novo mundo. Vencer o Mostrengo, comparável ao Adamastor de Os Lusíadas, é
vencer os medos e as inseguranças.
Terra- A terra simboliza a funçã o materna, pois é ela que dá a vida, é, portanto, a fonte do ser e a sua
protecçã o. Na Mensagem podemos associar à s figuras femininas D. Tareja e D. Filipa de Lencastre. Ambas
simbolizam a concepçã o de seres excepcionais, que marcarã o o destino da pá tria. A primeira representa o início
da La dinastia de Portugal: "Ó mãe de reis e avó de impérios, / Vela por nós!," a segunda, dá origem à Ínclita
Geraçã o: “ Que enigma havia em teu seio / Que só génios concebia?".
Espada-Símbolo militar, da virtude e da bravura. Representando a força, possui uma dupla simbologia: a
destruiçã o, mas também o combate à injustiça, à maldade, à ignorâ ncia, ganhando, entã o, uma dimensã o
positiva. Na Mensagem, e seguindo de novo as palavras de Artur Veríssimo, na obra já citada, é "o símbolo da
Guerra Santa, da guerra interior, do Verbo, da palavra, da conquista do conhecimento, da libertação dos desejos,
do poder, da espiritualidade, da vontade divina, da justiça.". Este autor associa ainda a espada ao cavaleiro, à
defesa do Bem. Entre o cavaleiro e a sua espada cria-se uma ligaçã o intrínseca, "mística", pois ela será a sua
"companheira de vida ou de morte". Esta interpretaçã o é perceptível no poema Nun' Álvares Pereira: a espada
confere ao heró i uma dimensã o guerreira, mas é também luz que o guia, que permite desvendar e conhecer.
Loucura-A loucura é vista como a força motriz que conduz o homem à genialidade, à heroicidade. É um traço
distintivo da grandeza, é a energia criativa, é aquilo que impulsiona à açã o. Sem o sonho, sem a utopia, sem a
loucura, o homem toma-se incapaz de agir, é ela que o impulsiona na sua inquietaçã o, na busca da
distâ ncia, da "febre de Além".
Nau- Simboliza a viagem, a descoberta de novos mundos, novas culturas, que permitirã o o
alargamento do conhecimento. Numa travessia difícil, a nau representa a segurança.
Noite, Tormenta, Calma, Antemanhã, Nevoeiro- Estes sã o os títulos dos cinco poemas que constituem a
terceira secçã o, denominada Os Tempos, da terceira parte da obra e podem ser lidos como um todo.
A noite é o tempo do sono, da morte, da suspensão das energias e um momento de letargia. Representa o
estado do país que perdeu o Poder e o Renome.
A tormenta, na Bíblia representa a intervençã o de Deus, nomeadamente a Sua có lera e pressupõ e uma ideia
de agitaçã o, que trará , no futuro, uma mudança: "Mas súbito, onde o vento ruge, / O relâmpago, farol de Deus, um
hausto / Brilha, e o mar 'scuro 'struge." A tormenta simboliza as aspiraçõ es do homem desejoso de uma vida menos
banal.
Antemanhã/manhã simboliza o tempo em que a luz ainda está pura, em que não há corrupção. É sempre o
início de qualquer coisa, um tempo de descoberta, de recomeço, de esperança, de possibilidade, de redenção, de
revelação. Antemanhã é a passagem das trevas para a claridade.
O épico fala dos heró is que construíram e alargaram o Império Português, para que a sua memó ria
nã o seja esquecida, enquanto Pessoa escolhe aquelas figuras histó ricas predestinadas a essa
construçã o imperial mas, através delas procura simbolizar a essência do ser português que
acredita no sonho e se mostra capaz da utopia para a realizaçã o de grandes feitos.
Nos Lusíadas há a viagem à India, na Mensagem temos a avaliaçã o do esforço, considerando que a
gló ria advém da grandeza da alma humana, apesar das vidas perdidas e de toda a espécie de
sacrifícios dos nautas mas também das mã es, filhos e noivas.
Camões procurou em Os Lusíadas cantar os feitos gloriosos dos portugueses que deram início ao grande império
que se estendeu pelos diversos continentes. Pessoa, em Mensagem, cantou o fim do Império territorial, procurando
incentivar o aparecimento de um império de língua, de cultura e de valores.
As Dificuldades- “O Mostrengo” da Mensagem ou o “Adamastor” de Os Lusíadas aproximam-se na sua mais profunda
imagem comunicativa. Ambos exprimem os perigos da aventura marítima para exaltar o espirito dos nautas e do povo
português.
Sintese:
Semelhanças
Poemas sobre Portugal.
Concepçã o da Histó ria Portuguesa enquanto demanda mística.
D. Sebastiã o, ser eleito, enviado por Deus ao mundo, para difundir a Fé de Cristo.
Os heró is concretizam a vontade divina.
Conceito abstracto de Pá tria.
Apresentaçã o dos heró is da Histó ria de forma fragmentá ria.
Exaltaçã o épica da acçã o humana no domínio dos mares.
Superaçã o dos limites humanos pêlos heró is portugueses.
Superioridade dos navegadores lusos sobre os nautas da Antiguidade.
Gló ria marcada pelo sofrimento e lá grimas.
Sacrifício voluntá rio em nome de uma causa patrió tica.
Estrutura rigorosamente arquitectada.
Evocaçã o do passado (memó ria) para projectar, idealizar o futuro (apelo, incentivo).
Diferenças
Os elementos estruturantes das obras (forma e conteúdo) são marcados pela diferença de quatro séculos que separam os
autores
Os Lusíadas
OS LUSÍADAS
Período de publicaçã o: 1545-1570
Data de Publicaçã o: 1572
Fontes literá rias: “Odisseia” de Homero e “Eneida” de Virgílio
Género narrativo: epopeia pois trata-se de uma narrativa, estruturada em verso,
que narra os feitos grandiosos de um heró i com interesse para toda a
Humanidade
Proposiçã o: poeta propõ e-se a exaltar os feitos dos portugueses;
Invocaçã o: poeta pede ajuda à s ninfas;
Dedicató ria: poeta dedica a sua obra a D. Sebastiã o;
Narraçã o: poeta relata a descoberta do caminho marítimo para a Índia pelos
navegadores portugueses liderados por Vasco da Gama
Estrutura externa
. 10 cantos; Oitavas; Versos decassilá bicos; Esquema ritmá tico: ABABABCC
. 4 Planos: do poeta; da viagem; da mitologia; da histó ria de Portugal
Mitificaçã o do heró i
A mitificaçã o do heró i é constante na epopeia lusa.
Logo na Proposiçã o, Camõ es sobrepõ e o português ao homem comum,
pelos seus feitos mais grandiosos “Do que prometia a força humana”, que
superam os antigos. Também os Deuses reconhecem a magnificência dos heró is
nacionais, no episó dio do Consílio dos Deuses, onde Baco teme ser esquecido em
detrimento deles.
Contudo, é o no episó dio da Ilha dos Amores que a mitificaçã o do heró i
atinge o seu apogeu, uma vez que a uniã o dos lusitanos com as ninfas os eleva à
categoria de semideuses e que Vasco da Gama tem o privilégio de conhecer a
“Má quina do Mundo”.
Assim, ao longo d’Os Lusíadas, o povo luso vai-se da libertando da “lei da
morte”.
Reflexõ es do Poeta
A epopeia camoniana contém algumas reflexõ es por parte do seu autor.
Logo no Canto I, o pensamento do poeta recai sobre a fragilidade do
“bicho da terra tã o pequeno” que é o homem. Mais adiante, é criticado o desprezo
deste pela poesia, que nã o é mais do que um reflexo da sua rudeza. Camõ es
sente-se desvalorizado, apesar de ter sempre “numa mã o a pena e noutra a
lança”, pois vive num país materialista que está imerso numa “vil tristeza” e no
gosta da cobiça. Ao longo da obra, nã o faltam ainda conselhos que visam por
termo à corrupçã o que tem lugar em Portugal.
Assim, Camõ es lamenta o estado decadente da pá tria, mas mostra orgulho
nesta e espera uma mudança.