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Escola de Sociologia e Políticas Públicas

Departamento de História

ESTRATÉGIAS DE DESENVOLVIMENTO DE PÚBLICOS NA


MÚSICA CLÁSSICA: ANÁLISE DO CASO DE ESTUDO
CONTRA CONCERTS

DAVID SILVA, Nº 104392

EMPREENDEDORISMO CULTURAL

DOCENTE: CATERINA FOÀ

Mestrado em Estudos e Gestão da Cultura

Janeiro, 2021
Índice

Sumário............................................................................................................................. 3

1. Enquadramento Teórico ................................................................................................ 3

2. Caso de Estudo: Contra Concerts................................................................................... 5

2.1. Contextualização do projeto ............................................................................................... 5

2.2. Caracterização do Público Atual ........................................................................................ 7

2.3. Caracterização do Público-Alvo para 2022 ......................................................................... 8

2.4. Estratégias de Desenvolvimento de Públicos....................................................................... 8

2.4.1. Manutenção do Público Atual .......................................................................................... 8

2.4.2. Captação de Público-Alvo .............................................................................................. 10

3. Conclusão .....................................................................................................................12

Bibliografia ......................................................................................................................13
Sumário
O presente trabalho tem como objetivo encontrar e descrever possíveis estratégias para o
desenvolvimento de públicos no setor da música clássica, nomeadamente no nicho da música
de câmara. O trabalho é introduzido através de um enquadramento teórico onde serão
esclarecidos conceitos relacionados com o desenvolvimento de públicos no setor cultural e onde
será justificada a importância da diversificação e rejuvenescimento dos públicos associados à
música clássica, tendo em conta o seu contexto atual. Será também feita uma pequena
contextualização do setor musical australiano, onde o caso de estudo está inserido. De seguida,
é apresentado o projeto Contra Concerts através da sua breve contextualização, da apresentação
do seu business model canvas e da caracterização do seu público atual e público-alvo para a
temporada de 2022. Posteriormente, serão apresentadas nove possíveis estratégias para a
manutenção do público existente e para a captação e diversificação de novos públicos.
Finalmente, conclui-se que apesar de muitas das estratégias propostas terem um baixo custo
financeiro, o maior entrave à sua concretização apoia-se na falta de recursos humanos das
organizações culturais. Igualmente, reforça-se a ideia de que qualquer processo de
desenvolvimento de públicos tem que ser pensado a longo prazo e que só desta forma é que é
possível alterar os hábitos dos consumidores de música clássica.

Palavras-chave: Desenvolvimento de Públicos, Práticas Culturais, Música Clássica, Público-


Alvo, Estratégias de Diversificação de Públicos

1. Enquadramento Teórico

O conceito associado ao desenvolvimento de públicos em práticas culturais começou a tornar-


se relevante na década de 1980, quando a taxa de participação em atividades artísticas começou
a estagnar nalguns países desenvolvidos (Barlow & Shibli, 2007). Sendo um conceito bastante
amplo e complexo, existe uma abrangência considerável de definições utilizadas e mesmo quem
o considere como um umbrella term cobrindo todos os aspetos financeiros, artísticos, sociais e
educacionais utilizados pelas instituições quando se dirigem ao seu público de novas formas
(Lindelof, 2015, p. 202). Uma das definições mais inclusiva e utilizada atualmente é a de
Kawashima (2000, p.4), referindo-se ao desenvolvimento de audiências como uma ampliação
desta em termos quantitativos, qualitativos e sempre que haja um enriquecimento da
experiência dos consumidores. Esta abordagem pode dividir-se em quatro grandes categorias:
1) inclusão cultural, 2) extended marketing, 3) educação do público e 4) cultivo do gosto. As

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duas últimas categorias têm com alvo o público já existente a 1) tem um propósito social e a 2)
extended marketing, pretende despertar o interesse latente de potenciais audiências e persuadi-
los a tornarem-se consumidores, ao mesmo tempo que são minimizados os fatores que os
afastam (Kawashima, 2000, p. 9). No entanto, esta última visão que liga o marketing ao
desenvolvimento de audiências encontra alguma oposição na literatura, pois alguns autores
consideram que o desenvolvimento de públicos deve ser concretizado através da construção de
relações fortes e a longo prazo com cada membro do público e não através de estratégias de
marketing (Rentschler et al., 2002). Existem então dois pontos de vista distintos no que se refere
ao desenvolvimento de públicos, o primeiro considera que potenciais audiências devem ser
atraídas através de educação, marketing ou inovação. Por outro lado, uma outra visão considera
que os valores estéticos prevalecem como mais importantes e o público é simplesmente o meio
que permite a sobrevivência das instituições culturais (Ruiz, 2020, p. 17).

A questão do desenvolvimento de públicos no setor da música clássica tem vindo a tornar-se


cada vez mais importante, graças ao facto de se evidenciar alguma quebra nos níveis de
participação, percecionada através da redução de bilhetes vendidos, maior dificuldade em obter
financiamento, aumento das despesas e aos novos gostos das audiências (Beeching, 2012). Esta
falta de procura também é devida, em parte, ao envelhecimento do público (Kolb, 2001) e à
falta de participação de grupos etários mais jovens (DiMaggio & Mukhtar, 2004). O
afastamento do público das salas de concerto está potencialmente ligado a vários fatores, dos
quais se destacam neste trabalho: o enfraquecimento da educação artística, o desenvolvimento
tecnológico, a diminuição da quantidade de tempo livre e a falta de interesse (Bedell, 2012,
p.1). Esta dificuldade de captação de novos públicos, nomeadamente um público mais jovem,
tem estado na ordem do dia para várias instituições musicais, levando ao desenvolvimento de
cinco grandes áreas de inovação, destinadas à captação deste público para concertos de música
clássica: 1) experiência do concerto, envolvendo mudanças na programação e setting do local;
2) conteúdo educacional antes e durante os concertos; 3) mudanças nos preços dos bilhetes; 4)
utilização de redes sociais; 5) desenvolvimento geral de audiências (Mitchell, 2019).

No caso particular australiano, os números apresentados pelo Australian Bureau of Statistics


(ABS, 2015) evidenciam que a faixa etária mais representada em concertos de música clássica
é a dos 65-74 anos, com 14% de participação e que este género musical representa somente
4,1% em termos de lucros e 5,7% da participação no conjunto total da indústria musical
australiana (Live Performance Australia, 2019). Apesar destes números desanimadores é

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necessário compreender que eles refletem essencialmente as observações registadas no setor
orquestral (Keen & Williams, 2009), pois no campo da música de câmara o registo de dados é
demasiado inconsistente para ser caracterizado (Sandow, 2010). No entanto, este nicho da
música clássica pode ser particularmente importante no desenvolvimento de públicos, dado o
seu caráter intimista (Goldsworthy, 2015, p. 49). Adicionalmente, o facto de vários músicos de
câmara privilegiarem atualmente salas de concerto alternativas devido à maior independência,
pressão reduzida e rápido planeamento (Robinson, 2013) também facilita a captação de novas
audiências com um perfil demográfico mais jovem (Haferkorn, 2018).

Em conclusão, o desenvolvimento de públicos no setor da música clássica é uma preocupação


real e que está a provocar mudanças e adaptações por parte de muitas entidades culturais de
países desenvolvidos, em particular grandes instituições como orquestras sinfónicas e casas de
ópera. No caso da música de câmara, graças a características relacionadas com o baixo custo
de investimento, menos questões logísticas e humanas e maior flexibilidade, torna-a num caso
de estudo ideal para testar algumas das estratégias de desenvolvimento de audiências.

2. Caso de Estudo: Contra Concerts


2.1. Contextualização do projeto

Contra Concerts é um projeto criado em 2021, baseado em Brisbane, Austrália e com curadoria
e direção artística do flautista Jonathan Henderson. A sua área de intervenção artística foca-se
na criação, desenvolvimento e produção de uma temporada de concertos de música de câmara
clássica, apresentados ao longo do ano em Brisbane e na sua cidade vizinha, Toowoomba. Para
cada concerto são convidados diversos músicos nacionais que, no final de uma residência
artística de cinco dias, apresentam o repertório preparado em ambas as cidades. Na sua
temporada de lançamento em 2021, foram apresentados três programas entre Abril e Junho em
cada cidade, num total de seis concertos e uma audiência conjunta de 522 pessoas. Este projeto
foi apresentado em parceria com o ensemble de música clássica australiano, Southern Cross
Soloists (SXS) e parcialmente financiado pelos programas Australian Council for the Arts e
Arts Queensland. Para a sua segunda temporada em 2022, serão apresentados novamente três
programas entre Agosto e Outubro. Uma novidade em curso é o aumento do número de
concertos por programa através de pequenas tournés regionais no estado de Queensland. Tendo
em conta este avanço, considera-se crucial reajustar o Business Model utilizado e analisar as
estratégias de manutenção e diversificação de públicos.

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Figura 1 - Business Model Canvas - Temporada 2022 Contra Concerts
Fonte: OSTERWALDER & PIGNEUR (2010, p. 44)
2.2. Caracterização do Público Atual
O público presente na primeira edição de Contra Concerts pode ser caracterizado através de
três fontes distintas: análise dos diferentes tipos de bilhetes comprados através da plataforma
online EventBrite, análise de fotos tiradas durante os concertos e observação direta não
estruturada. Através da plataforma de compra de bilhetes online é possível retirar as seguintes
conclusões em relação à percentagem das diversas tipologias de bilhetes vendidos: crianças
(2,1%), estudantes (6,7%), adultos (37,7%), sénior (28,1%), subscrições 3 concertos (25,4%).
Apesar destas informações não serem precisas em termos da idade exata do público,
principalmente no que se refere à percentagem de pessoas que compraram uma subscrição para
3 concertos, revelam quais são algumas das características do público que assistiu a estes
concertos em termos da sua faixa etária. Em relação à análise das fotografias, apresentam-se
três exemplos na figura 1 onde é possível verificar que a grande maioria das pessoas têm uma
idade avançada. O último meio de observação foi feito principalmente através dos convívios
sociais entre artistas e público depois dos concertos e na receção do público à entrada dos locais
de concerto. Este, apesar de ter sido uma recolha de informação informal, foi também o mais
rico e que permitiu um leque de dados mais alargado. Compreendeu-se que uma parte
considerável do público está reformado ou em situação de pré-reforma, pertence a um meio
socioeconómico privilegiado e é frequentador assíduo de atividades culturais, em particular de
concertos de música clássica, quer por estar ligado ao setor da cultura, por ter estudado música
no passado, por pertencer a grupos de música amadores ou por ter filhos ou netos que estudam
música atualmente. Todos estes dados confirmam a caracterização do público associado à
fruição de concertos de música clássica já descrito anteriormente e reforçam a necessidade de
estratégias de desenvolvimento de novos públicos para a temporada de 2022.

Figura 2- Exemplos Fotográficos de três concertos da temporada Contra Concerts 2021


Fonte: https://www.instagram.com/contraconcerts/

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2.3. Caracterização do Público-Alvo para 2022
Tal como já foi apresentado no Business Model Canvas, o projeto Contra Concerts pretende
desenvolver o seu público para a temporada de 2022, através da manutenção do seu público de
2021, constituído essencialmente por pessoas séniores ou acima da faixa etária dos 45 anos, e
da diversificação de novos públicos, principalmente através da captação de famílias, estudantes
de música e habitantes locais. A captação de famílias é o grande foco da nova temporada, não
só por ser vantajosa do ponto de vista económico pela compra de vários bilhetes, mas porque
permite igualmente uma subida na percentagem de crianças e jovens nos concertos. Os
estudantes de música contribuem igualmente para a descida da média de idades do público e
para a divulgação, aceitação e credibilização do projeto no setor artístico. Num futuro próximo,
podem também ser uma importante fonte de divulgação de possíveis programas dedicados a
jovens artistas. A integração do público local foi também considerada importante, não só pela
facilidade em termos de acessos, mas também porque podem contribuir para possíveis parcerias
com os negócios locais e por serem um público diversificado em termos de idade, género,
profissões e interesses. Porém, devido ao facto estarem associados a um determinado espaço
geográfico, como ainda não foram escolhidas as salas de concerto para a temporada de 2022,
nenhuma das estratégias incidirá sobre este segmento de público específico.

2.4. Estratégias de Desenvolvimento de Públicos


2.4.1. Manutenção do Público Atual
Oferta de descontos específicos – Lançamento de uma campanha de email marketing para toda
a base de dados de endereços eletrónicos com um desconto imediato de 20% na compra de
subscrições para a temporada de 2022. As subscrições para a temporada de 2021 já incluíam
um desconto de 20% em relação aos preços dos bilhetes individuais, por isso, talvez seja
necessário um ajuste no preço inicial das mesmas. A base de dados de Contra Concerts inclui
todos os compradores de bilhetes da temporada de 2021, assinantes da newsletter e outros
contactos recolhidos durante os concertos. Esta estratégia foi inspirada numa semelhante
executada pela San Antonio Symphony Orchestra, nos Estados Unidos (Bedell, 2012, p. 49).
Tem como vantagens a entrada de algum capital financeiro rapidamente e garantir a adesão aos
3 concertos, contribuindo assim para a fixação de um público fiel ao projeto. No entanto,
reflete-se em menos lucro por cada venda e pode dar a falsa sensação de “casa cheia”, dado que
não é obrigatório que as pessoas venham a todos os concertos.

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Eventos Sociais Privados – Organizar um ou mais eventos de socialização com os principais
patronos do projeto, incluindo: parceiros, músicos, staff e os membros do público mais
investidos no projeto, nomeadamente aqueles que compraram a subscrição para os 3 concertos
em 2021. Este evento poderia ser uma refeição ou um típico barbecue australiano e poderia
contar com pequenos discursos, momentos musicais e a apresentação da temporada antes de ser
lançada ao público. Teria como objetivos: criar uma relação mais familiar com os principais
stakeholders do projeto, promover doações de particulares ou de empresas, oferecer descontos
e ofertas especiais a quem estivesse presente e formar uma comunidade associada ao projeto.
Idealmente até poderia ser organizada por um dos membros do público, não só facilitando todo
a organização logística e financeira, mas também contribuindo para a introdução do projeto a
potenciais pessoas que estivessem presentes na sua casa. Esta ideia já é executada de uma
maneira semelhante pelo parceiro do projeto Southern Cross Soloists.

Doações Individuais – Lançamento de uma campanha de pedido de doações aos subscritores


mais apegados ao projeto. Dada a cultura de mecenato muito presente no setor cultural
australiano, este pode ser um meio para conseguir um financiamento privado, diminuindo a
dependência de subsídios públicos, ao mesmo tempo que estabelece uma relação mais íntima
com certos membros da comunidade Contra Concerts. Uma das contrapartidas possíveis para
os doadores é um formato de cocriação em que estes pudessem escolher um compositor que
gostassem que fosse tocado na próxima temporada, um intérprete a convidar ou o local de
apresentação do concerto. Este tipo de doações tem sempre a limitação de não ser uma fonte de
rendimento estável ou até de haver um aproveitamento e pressão por parte dos doadores de
começarem a tomar decisões para as quais não foram consultados. Porém, a simplicidade e os
benefícios financeiros tornam-na essencial para qualquer entidade cultural australiana.

Voluntariado – Para os subscritores que queiram ter uma maior participação no projeto, mas
que prefiram não se envolver financeiramente, a possibilidade de fazerem parte de uma equipa
de voluntariado pode ser muito benéfica. Para o projeto tem a vantagem de permitir menos
gastos com certas despesas, tais como: pessoal para frente de sala, produção (transporte de
cadeiras, estantes, instrumentos e músicos, catering, etc..) e para os voluntários transmite uma
sensação de gratificação pela ajuda prestada. Como desvantagem, este tipo de iniciativa tem a
necessidade de exigir alguma formação da parte dos voluntários e levanta questões éticas
associadas ao facto de estar a ser utilizado trabalho não pago para funções para as quais existem
profissionais que precisam dele.

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2.4.2. Captação de Público-Alvo
Maior Segmentação nos tipos de Bilhete – Criação de um bilhete de família flexível. Este
bilhete facilitaria a compra de bilhetes por parte de famílias que queiram introduzir a música
clássica aos seus filhos ou netos e seria flexível para incluir: pais/mães solteiros, avós e um
número ilimitado de crianças/jovens mesmo que não sejam filhos, por exemplo, amigos ou
primos. O objetivo deste bilhete seria trazer grupos maiores de potenciais interessados aos
concertos e diminuir a idade média da audiência. Outra possibilidade seria eliminar o bilhete
de estudante e torná-lo num bilhete, por exemplo, de -30 anos, alargando assim o espectro de
pessoas afetadas. Esta nova tipologia poderia cobrir jovens em início de carreira que ainda não
possuem uma grande disponibilidade financeira, mas que gostam de participar em atividades
culturais. O único problema de ambos os bilhetes é a redução do lucro da bilheteira, mas tendo
em conta os números tão baixos apresentados em 2021, dificilmente estes segmentos se irão
tornar na maioria da audiência de um ano para o outro. Adicionalmente, poder-se-ia criar um
bilhete de última hora a um preço fixo mais baixo, destinado a todos os que decidissem só no
dia ir ao concerto, mas ficando sempre dependente do número de lugares vazios. Os bilhetes
para menores de 30 anos foram uma iniciativa da Fundação Calouste Gulbenkian para os seus
concertos, o bilhete de família foi desenvolvido pela Kids in Museums (2010) e os bilhetes de
última hora são uma prática comum em várias salas de concertos da Europa central.

Parcerias Institucionais – Na presente temporada, as parcerias que poderiam contribuir para


uma maior captação do público-alvo seriam: universidades e escolas de música. Estas
envolveriam, do lado das instituições a divulgação nas suas redes internas e externas do projeto
e, do lado de Contra Concerts, a oferta de bilhetes grátis ou a preços reduzidos, que teriam que
ser confirmados até uma data a definir, antes de cada concerto. Estas parcerias seriam
vantajosas para o projeto, pois contribuiriam para a divulgação e aceitação do mesmo no meio
cultural, ao mesmo tempo que aumentariam o número de jovens nos concertos. As parcerias
com as universidades poderiam até incluir instituições que não tivessem faculdades de música.
A únicas desvantagens destas iniciativas são: a diminuição das receitas de bilheteira e a
dificuldade de estabelecimento de contacto e tempo necessário para o desenvolvimento da
parceria com cada instituição individualmente. Outras possíveis entidades parceiras poderiam
ser: grupos de música clássica amadores (orquestras, coros ou ensembles), associações
artísticas e revistas ou lojas de música. Neste momento, não estão a ser consideradas parcerias
com empresas, pois o tempo de procura, contacto, desenvolvimento da parceria e

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estabelecimento de todas as contrapartidas iria consumir demasiado tempo necessário para a
concretização da componente artística.

Propostas Multidisciplinares – Uma possibilidade para a atração de um público mais diverso


seria mudar o conceito atual dos concertos apresentados e torna-lo num espetáculo que
incluísse, não só música clássica, mas também outras artes, através de: parcerias com artistas
visuais para criarem um cenário evocativo da música que está a ser tocada, criação de um
espetáculo que envolva música e dança ou música e teatro ou até mesmo associar a música
clássica a géneros que não pertencem normalmente a esta esfera artística, tais como: street
dancing, grafiti, rap, música indígena ou outros géneros. Este tipo de iniciativa foi utilizado
pela Ópera de Paris na produção de 2019 de Les Indes Galantes de Rameau ao colocar na última
cena da ópera um coro e solistas a cantar ao lado de dançarinos de breakdance. Teria como
vantagem o potencial de trazer novos públicos interessados em espetáculos artísticos mais
inovadores, mas também tem a desvantagem de poder dissuadir o público atual de voltar a
comprar bilhetes. Uma outra hipótese seria fazer concertos especiais para famílias ou crianças,
porém, ainda não foram encontradas formas de conciliar a qualidade artística do projeto com
este tipo de formato mais informal e direcionado a um segmento específico.

Masterclasses – Esta iniciativa insere-se na diversificação da proposta de valor e consistiria na


organização de pequenas masterclasses de interpretação musical/instrumental com os músicos
de cada programa. Aos participantes da masterclasse seria incluído no preço inicial a entrada
no concerto e aos assistentes passivos seria dado um desconto para a sua aquisição. Esta
iniciativa contribuiria para uma maior exposição do projeto e dos seus músicos associados na
esfera musical e poderia contribuir, não só para a vinda de um público mais jovem aos
concertos, mas também para que se desse o efeito inverso dos bilhetes de família, ou seja, que
fossem os jovens estudantes de música que trouxessem os pais aos concertos. A desvantagem
desta iniciativa é o tempo necessário para a organização e divulgação deste novo produto.

Mudança de Setting – Um dos fatores dissuasores da vinda de públicos mais diversificados aos
concertos de música clássica é a formalidade associada e a sensação de que é necessário ter
algum conhecimento prévio para se assistir a um concerto deste género (Small, 1998). Uma
forma de combater esta resistência é tentar tornar o ambiente mais informal e convidativo a
novas pessoas potencialmente desconhecedoras do mundo da música clássica. Uma das
soluções poderá ser apresentar concertos comentados em que um apresentador introduz o

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concerto e vai fazendo a mediação este o público e as obras apresentadas ao longo deste. Este
formato pretende criar uma relação mais interativa com o público, deixar os novos visitantes
mais descontraídos e, no geral, contribuir para um ambiente mais informal. Em complemento
desta iniciativa, já foi estabelecido na temporada de 2021 um pequeno catering depois de cada
concerto, para que o público e os artistas possam socializar entre eles.

3. Conclusão
Este trabalho focou-se na definição do conceito de desenvolvimento de públicos no setor da
música clássica e aplicou-o ao caso particular do projeto de música de câmara Contra Concerts.
As nove estratégias apresentadas foram inicialmente divididas em dois grupos: manutenção do
público atual e captação do público-alvo. Destas nove estratégias, podemos identificar quatro
que têm como objetivo formar uma relação mais íntima e familiar com o consumidor: doações,
voluntariado, eventos sociais e mudança de setting; duas que propõem ou uma alteração do
produto artístico inicial ou um alargamento do mesmo: propostas multidisciplinares e
masterclasses; e três relacionadas com o marketing do projeto: oferta de descontos específicos,
mais tipologias de bilhetes e parcerias com instituições. Qualquer uma destas estratégias
apresentadas já foi utilizada com sucesso por outras entidades culturais e, apesar de não
representarem nenhuma inovação no setor artístico, podem ser fundamentais no
desenvolvimento de um projeto recém-criado. O maior desafio à concretização de qualquer um
destes processos será sempre o tempo necessário para o seu planeamento, execução e controlo,
dado a falta de recursos humanos. Uma das grandes vantagens destas nove estratégias, com a
exceção dos projetos multidisciplinares e masterclasses, é o baixo ou nulo investimento
financeiro, o que ajuda à sua concretização. Tal como explicitado no corpo de texto, as parcerias
empresariais não foram contempladas nas estratégias de captação de público-alvo, devido ao
investimento necessário para as estabelecer e porque, apesar de serem benéficas para o projeto,
iriam trazer mais público com as mesmas características do público atual. Em conclusão, e
baseando-me tanto na revisão da literatura especifica como na observação empírica, é
necessário compreender que a implementação de qualquer estratégia de desenvolvimento de
públicos no setor da música clássica é um processo lento e que demora, por vezes, anos até ser
possível a observação de mudanças significativas. Por isso, é fulcral um planeamento a longo
prazo, motivação para um contínuo controlo e adaptação das estratégias e sobretudo coragem
para continuar a tentar manter viva uma tradição que dado o seu valor artístico merece ser
apoiada e posta à disposição e fruição do número mais alargado de pessoas possível.

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