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Resumen de ponencia

A AUTO-ORGANIZAÇÃO DE MULHERES NO MST E A


CONSTRUÇÃO DO FEMINISMO CAMPONÊS POPULAR NA
AMÉRICA LATINA

*Maísa Maria Baptista Prates Do Amaral


*Renata Couto Moreira

Esse artigo tem como objetivo discutir sobre o lugar da trabalhadora no rural brasileiro, as opressões e relações

sociais de poder a que estão submetidas, e o papel da auto-organização das mulheres do MST na construção

coletiva de um feminismo camponês popular. Para isso, partimos da compreensão da situação da mulher no meio

rural, determinada tanto pelo machismo e pelo patriarcado expressos nas relações de gênero e na divisão sexual

do trabalho estabelecida, como também pelo papel desempenhado pelo grande latifúndio e do agronegócio na

determinação da vida das trabalhadoras rurais. O artigo tem como ferramentas de análise do método materialista-

histórico-dialético as categorias da teoria marxista da dependência, da superexploração, e da renda da terra. A

articulação entre estas três categorias dentro do recorte de gênero pretendido coloca em evidência a trabalhadora

rural, em sua identidade de mulher, camponesa, e de classe trabalhadora em si, e para si, que se põe em luta por

mudanças sociais no Brasil, e na América Latina. Tendo como referência um grupo de intelectuais como André

Gunder Frank, Vânia Bambirra, Theotonio dos Santos, Rui Mauro Marini, Heleieth Saffioti e Florestan

Fernandes, que problematizaram a ideia de que internamente nos países dependentes, articulada às transferências

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de valores ao exterior e à garantia dos lucros e rendas das classes dominantes, internas e externas, a necessidade

de gerar ainda maiores excedentes, aparece combinada com o uso de tecnologias avançadas com formas

“arcaicas” de relações sociais de produção, pautadas na superexploração dos trabalhadores em geral, e das

trabalhadoras rurais em especial. Trazem, portanto, contribuições importantes para a formulação da teoria da

dependência e para a compreensão do lugar da trabalhadora rural no processo de desenvolvimento capitalista no

Brasil. Encerraremos o debate com um estudo sobre a auto-organização das camponesas nos coletivos de gênero

do Movimento do Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST como práxis organizativa de construção do feminismo

camponês popular. As relações de gênero entendidas na perspectiva de Faria e Nobre (2003), como relações de

poder, evidenciam que seu exercício apresenta-se bastante desfavorável às mulheres, tanto dentro do

assentamento, como da organização, das associações e cooperativas. O próprio Setor de Gênero, criado no

Encontro Nacional do MST em 2000, é fruto das históricas reivindicações por maior participação das militantes

nas instâncias políticas e na construção de novas relações sociais e de poder entre sexos dentro do próprio

Movimento e na sociedade como um todo. Com base em estudos clássicos, o setor abre a defesa sobre a

importância da participação das mulheres em todas as instâncias de decisão e organização, nas associações,

cooperativas e movimentos sociais. Assim, são vários os exemplos de lutas e vários os estudos realizados pelas

mulheres do MST auto-organizadas que nos levam a refletir sobre a construção do feminismo popular camponês

e a sua importância para a superação das relações de produção e reprodução impostas pelo atual modelo de

produção no campo. Nesse contexto, as mulheres aparecem no MST como protagonistas tanto nos processos de

luta pela terra e resistência no campo, como na produção de alimentos e reprodução de práticas agroecológicas,

na construção do modelo de agricultura camponesa em busca de vida digna no campo. No enfrentamento ao

pauperismo é que estas mulheres se colocam em luta, em um primeiro momento pela conquista da terra, e depois

para viver nela com sua família. Por que entendemos a reforma agrária em um sentido mais amplo, pois a luta

não para quando se conquista o chão, é preciso também viabilizar a condição de produção e reprodução da vida

nos assentamentos. Pensar essa condição é importante para a compreensão de qual camponesa estamos falando,

assentada da reforma agrária, que se põe em movimento e se auto-organiza em coletivos para a superação das

dificuldades econômicas e sociais. Não é uma camponesa em geral que este estudo pretendeu pôr em foco. É

particularmente aquela que se pôs em movimento na luta pela terra como militante do MST antes mesmo de ser,

e depois enquanto, feminista. O papel do MST na formação da consciência de classe dessas trabalhadoras rurais

não pode ser subestimado, pois como militantes orientam suas ações pela própria organização produtiva e

política de coletivos de mulheres proposta nos documentos e cartilhas de orientação do movimento. A auto-

organização das mulheres aparece desde as primeiras cartilhas do Setor de Gênero no MST. Do programa à

práxis, porém, encontram se imensos obstáculos e contradições que somente uma análise da realidade objetiva

concreta desses coletivos de auto-organização pode desvendar. O MST atua nessa perspectiva como instrumento

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de potencialização dos coletivos de mulheres nos assentamentos e acampamentos como importante forma de

luta, resistência e produção (CAMPOS,2005). A auto-organização das mulheres é fomentada pelas militantes nos

assentamentos na busca coletiva pela superação dos problemas econômicos e sociais. A discriminação de gênero

também se reproduz nas relações entre mulheres e homens no campo, no assentamento e no próprio movimento

social. Porém, como discutem Pinassi e Mafort (2012), nem todos entendem a luta das mulheres do MST nessa

dimensão mais ampla, sendo o Setor de Gênero, apesar de prever a participação também de homens desde sua

criação, um setor que ainda incomoda ao desvelar e lutar contra as práticas machistas e opressoras e propor

novas relações sociais para além dos laços patriarcais fortemente reproduzidos na sociedade em geral, e

sobretudo nos assentamentos de reforma agrária e movimentos camponeses.

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Vitória, outubro de 2011.

......................

* Do Amaral
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICA SOCIAL DA UFES - PPGPS. SERRA, Brasil

* Moreira
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICA SOCIAL DA UFES - PPGPS. SERRA, Brasil

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