Você está na página 1de 30

A CONSTELAÇÃO SISTÊMICA FAMILIAR COMO MECANISMO DE

SOLUÇÃO CONSENSUAL DE CONFLITOS

Patrícia Menezes1
Darléa Carine Palma Mattiello2

RESUMO:
Esta pesquisa tem como objetivo central, avaliar a inserção das Constelações Sistêmicas
Familiares em processos judiciais. Desenvolvido através de pesquisa bibliográfica e
documental, em uma abordagem mista, quantitativa e qualitativa, com enfoque explicativo, o
estudo buscou abordar a efetividade do uso das Constelações Sistêmicas Familiares como
mecanismo de solução consensual de conflitos. O uso do método psicoterapêutico está em
consonância com uma das metas principais do Novo Código de Processo Civil de 2015, que é
incentivar a prática dos métodos de solução consensual de conflitos, bem como está em
conformidade com a Resolução 125/2010 do CNJ que estimula práticas que proporcionam
tratamento adequado aos conflitos de interesse do Poder Judiciário. As Constelações
Sistêmicas Familiares têm contribuído para o aumento no número de acordos em processos
judiciais, visto que, ao tomarem conhecimento sobre as causas que originam comportamentos
inadequados, as partes se mostram dispostas a chegar a uma solução consensual. A
contribuição deste estudo, é propor uma reflexão aos operadores do Direito, sobre a introdução
de novas formas de solução consensual, tal como a Constelação Sistêmica Familiar que se
mostra altamente efetiva na pacificação de conflitos.

Palavras chave: Solução Consensual de Conflitos. Constelação Sistêmica Familiar. Processos


Judiciais.

THE FAMILY SYSTEMIC CONSTELLATION AS A MECHANISM OF


CONSENSUAL SOLUTION OF CONFLICTS
ABSTRACT:
This research has as its central objective, to evaluate the insertion of Family Systemic
Constellations in judicial processes. Developed through bibliographical and documentary
research, in a mixed, quantitative and qualitative approach, with an explanatory focus, the study
sought to address the effectiveness of the use of Family Systemic Constellations as a
mechanism for the consensual solution of conflicts. The use of the psychotherapeutic method is
in line with one of the main goals of the New Code of Civil Procedure of 2015, which is to
encourage the practice of methods of consensual resolution of conflicts, as well as in
compliance with CNJ Resolution 125/2010, which stimulates practices that provide adequate
treatment to conflicts of interest of the Judiciary. The Systemic Family Constellations have
contributed to the increase in the number of agreements in legal proceedings, since, when they
become aware of the causes that cause inappropriate behavior, the parties are prepared to
arrive at a consensual solution. The contribution of this study is to propose a reflection to the
operators of the Law on the introduction of new forms of consensual solution, such as the
Systemic Constellation Familiar that is highly effective in the pacification of conflicts.

Keywords: Consensus Solution of Conflicts. Systemic Family Constellation. Court lawsuits.

1 Pós-graduanda em Direito Público e Privado: Material e Processual pela Universidade do


Oeste de Santa Catarina. Assessora Jurídica no Tribunal de Justiça de Santa Catarina.
Residente Judicial na Escola Superior da Magistratura do Estado de Santa Catarina.
2 Mestre em Direito pela Universidade do Oeste de Santa Catarina. Especialista em Direito

Constitucional pela Universidade do Oeste de Santa Catarina. Professora no Curso de Direito e


Pesquisadora Docente da Universidade do Oeste de Santa Catarina na linha de pesquisa em
Políticas Públicas de Efetivação dos Direitos Fundamentais Sociais. Advogada.
1 INTRODUÇÃO
Alguns fatores, consistentes na morosidade, o alto custo processual e a
necessidade de um método adequado para cada conflito, fizeram com que a
jurisdição deixasse de ser a única forma de resolução de conflitos. Os métodos
consensuais apresentam diversas vantagens às partes, e em razão disso a
utilização desses mecanismos tem sido incentivada pelo legislador.
A Constelação Sistêmica Familiar, que é um método psicoterapêutico
desenvolvido por Bert Hellinger, apresentou-se em casos judiciais como uma
forma consensual de resolução de conflitos. Em virtude disso, esta pesquisa
buscou analisar qual a efetividade da utilização desse método como
mecanismo de solução consensual de conflitos.
A pesquisa tem como objetivo central, avaliar a inserção das
Constelações Sistêmicas Familiares em processos judiciais. Para tanto, se faz
necessário examinar e descrever os meios consensuais de conflitos, conhecer
o método sistêmico e apontar sua aplicação no campo do Direito e identificar
os resultados obtidos.
A abordagem sobre a utilização das Constelações Sistêmicas Familiares
justifica-se em razão de que, uma vez reconhecida sua efetividade, será
possível incrementá-la nas práticas judiciais, ampliando os meios para chegar a
uma solução consensual de conflitos verdadeira.
Partindo-se da premissa que o método psicoterapêutico atinge o objetivo
de findar os conflitos interpessoais, a relevância social é facilmente visualizada.
Isso porque, tanto o Poder Judiciário quanto os jurisdicionados obterão
vantagens, aquele reduzirá o acumulo de processos e alcançará sua missão de
pacificação social, esse, por sua vez, poderá conquistar uma solução eficaz e
duradoura.
Esta pesquisa se caracteriza como teórica explicativa, em uma
abordagem mista, quantitativa e qualitativa, realizada mediante exploração de
fontes bibliográficas e obras relacionadas ao assunto proposto.
Quanto a estrutura, este trabalho é dividido em três seções, quais sejam:
os estímulos da solução consensual de conflitos pelo Novo Código de
Processo Civil, a mediação e a conciliação como espécies de solução
consensual, os Centros Judiciários de Solução de Conflitos; a origem das
Constelações Sistêmicas Familiares, o procedimento no qual se desenvolve, as
Leis Naturais descobertas por Bert Hellinger; O uso das Constelações
Sistêmicas Familiares nos Tribunais de Justiça brasileiros, bem como os seus
resultados.

2 SOLUÇÃO CONSENSUAL DE CONFLITOS


A palavra “conflito” pode ser definida como um “desacordo agudo ou um
antagonismo de interesses, ideias, valores ou posturas, em que existe
resistência recíproca por parte dos envolvidos” (ZANETI JR. e CABRAL, 2018,
p. 258).
Na medida em que a sociedade se desenvolve e as relações sociais se
formam, os conflitos entre os indivíduos se estabelecem com maior
assiduidade. O crescente número de desavenças entre os integrantes de uma
sociedade, está ligado a fatores tais como: o adensamento populacional, a
consequente insuficiência dos bens materiais e imateriais dispostos a satisfazer
as necessidades pessoais, a escassez de recursos, a concentração de
riquezas divididas de forma desigual, entre outras causas que geram o
sentimento de insatisfação das pessoas (CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO,
2015).
Assim, explicam os autores que quando nasce um conflito gerado por
uma das causas de insatisfação, o direito impõe que os sujeitos chamem o
Estado-juiz. A atividade através da qual os juízes estatais examinam as
pretensões e solucionam os conflitos é chamada de jurisdição. Na
conceituação de Neves (2018, p. 59) “a jurisdição pode ser entendida como a
atuação estatal visando à aplicação do direito objetivo ao caso concreto,
resolvendo-se com definitividade uma situação de crise jurídica e gerando com
tal solução a pacificação social”.
Entretanto, o processo estatal é capaz de pacificar apenas a parte do
conflito que foi judicializada e não o conflito social que originou a controvérsia.
Dessa forma, mesmo depois que o Estado impõe a solução, a parte vencida
não satisfeita tende a voltar a litigar, uma vez que a pacificação não foi
totalmente efetiva. Essa e outras dificuldades, como por exemplo, a
morosidade, o alto custo processual, a necessidade de uma solução adequada
para cada crise jurídica, conduziu os processualistas modernos a excogitar
novos meios para a solução dos conflitos (CINTRA; GRINOVER;
DINAMARCO, 2015).
Os procedimentos não jurisdicionais de solução de conflitos, são
denominados pela doutrina de meios alternativos, equivalentes jurisdicionais ou
meios adequados de solução. Cintra, Grinover e Dinamarco (2015, p. 48),
utilizam o a expressão meios alternativos (alternative dispute resolution - ADR,
ou meios alternativos de solução de conflitos - MASC), e esclarecem que não
se tratam de alternativas ao processo estatal, mas sim de outras vias que
subsistem ao lado deste e que dependendo do tipo do conflito podem ser mais
adequadas.
Didier Jr. (2017, p. 185), ensina que atualmente o termo melhor utilizado
é “meios adequados de solução de conflitos”, porquanto este engloba todos os
meios, jurisdicionais ou não, estatais ou não. Segundo o autor, a designação
“meios alternativos de solução de conflitos” (alternative dispute resolution) é
equivocada porque exclui a jurisdição estatal comum e parte da premissa de
que ela é prioritária.
A lição de Zaneti Jr. e Cabral (2018, p. 69), caminha no sentido de que a
expressão melhor empregada é “métodos adequados de resolução de
conflitos”.
Vasconcellos (2018, p.58), define ainda, que a tendência é designar os
métodos como “Meios/Métodos de Resolução Adequada de Disputas (RAD)”.
Elucida-se que independente da denominação, todos os meios judiciais ou
extrajudiciais de acesso a justiça, hoje compõe o sistema multiportas, que inclui
as práticas restaurativas e outros métodos facilitadores, os quais podem ser
livremente adequados pelos litigantes, que escolhem, conforme suas
necessidades pessoais e materiais, o meio que se mostre mais apropriado e
efetivo.
Esta pesquisa adere a posição de que a expressão mais apropriada, é,
sem dúvidas, “meios adequados de solução de conflitos”. No entanto, se vale
da expressão “meios de solução consensual de conflitos”, haja vista que são
abordados apenas os métodos de autocomposição. Sem deixar, em alguns
momentos, de citar o vocábulo “alternativos”, pois é assim estudada em grande
parte das doutrinas. Adiante, serão abordados alguns aspectos trazidos pelo
Novo Código de Processo Civil, no que se refere aos estímulos a solução
consensual de conflitos.

2.1 A SOLUÇÃO CONSENSUAL DE CONFLITOS E O NOVO CPC/2015


Alguns meios de solução consensual de conflitos já eram incentivados e
praticados no ordenamento jurídico. A conciliação já vinha sendo fomentada no
Poder Judiciário, como por exemplo no âmbito dos Juizados Especiais, os
quais trouxeram a audiência de conciliação no procedimento como etapa
obrigatória. A mediação, por sua vez, era aplicada em setores específicos,
como no Direito de Família, no entanto, sem grandes formalidades (ZANETI
JR. e CABRAL, 2018, p. 7).
No dia 18 de março de 2016, entrou em vigor o Novo Código de
Processo Civil, que foi estruturado no sentido de estimular o Direito Brasileiro
para a solução consensual de conflitos. O prestígio que o novo direito
processual civil brasileiro dá a autocomposição é visualizado logo no primeiro
capítulo intitulado “Normas Fundamentais do Processo Civil”.
No art. 3º do NCPC/2015, é possível perceber a valorização das formas
alternativas de solução de conflitos. Consta no § 2.º, que o Estado promoverá,
sempre que possível, a solução consensual dos conflitos, enquanto o § 3.º
prevê que a conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual
de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores
públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo
judicial.
Na opinião de Neves (2018, p. 68), as inovações do referido Codex a
respeito das formas consensuais de solução de conflitos não se limitaram às
disposições principiológicas. Isso porque, existe uma seção inteira de um
capítulo3 regulamentando a atividade dos conciliadores e dos mediadores
judiciais, que até mesmo faz uma distinção entre os institutos da mediação e
conciliação. Nas palavras do autor, “o diploma processual é inovador e sai da
abstração do ‘conciliar é legal’ para a criação de uma estrutura e de um
procedimento que realmente possa incrementar a conciliação e a mediação
como forma de solução de conflito”.

3 Capítulo III – Dos Auxiliares da Justiça – Seção V – Dos Conciliadores e mediadores judiciais
(arts.165 a 175).
Impende esclarecer, que o acesso ao judiciário não foi afastado pela
novatio legis, pelo contrário, o princípio da inafastabilidade da jurisdição está
expresso no caput do artigo 3º o qual estabelece que “não se excluirá da
apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito”. Contudo, o novo Código
preconiza que isso é compatível com a utilização da solução consensual dos
conflitos, que deverão ser estimulados por todos os profissionais do Direito,
inclusive durante o curso do processo4 (CAMARA, 2017, p.18).
Em complemento, Theodoro Júnior (2018, p. 107) esclarece que
concomitantemente, o legislador assegura o amplo acesso à justiça e
recomenda as vantagens da solução consensual. Portanto, “não se trata de
desacreditar a Justiça estatal, mas de combater o excesso de litigiosidade que
domina a sociedade contemporânea, que crê na jurisdição como a única via
pacificadora de conflitos”, o que por consequência resulta em um número
exorbitante de processos, ultrapassando a capacidade de vasão do serviço
judiciário.
A cultura do litígio, também é mencionada por Donizetti (2017, p. 133). O
Estado possui o poder-dever de dizer e realizar o direito, solucionado os
conflitos de interesses na busca da paz social, função que é chamada de
jurisdição. Entretanto, no sistema almejado pelo legislador denominado
multiportas, a jurisdição deveria ser alternativa a ultima ratio, buscada apenas
quando esgotadas as formas consensuais existentes, “ocorre que a nossa
cultura prioriza o processo jurisdicional, no qual as partes são tratadas e se
tratam como adversários, cabendo ao juiz dirigir o processo com firmeza e
imparcialidade”.
O autor Câmara (2017, p. 18), avalia que as soluções consensuais em
alguns casos parecem mais adequadas do que a imposição jurisdicional de
uma decisão, mesmo que ela atenda ao contraditório e com a participação dos
interessados. A solução consensual é mais adequada, especialmente nos
conflitos de família, tendo em vista que os vínculos intersubjetivos existentes
entre os sujeitos, permanecerão ainda que definida a solução da causa.

4Art. 3º, § 3º, do CPC. A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de
conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do
Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial.
Nessa mesma linha de entendimento, Neves (2018, p. 62) compreende
a indiscutível relevância das formas consensuais de solução de conflitos em
determinadas situações, sobretudo no Direito de Família e de Vizinhança.
Pontua que a pacificação social poder ser melhor obtida por uma solução
derivada da vontade das partes, do que pela imposição de uma decisão
judicial. Afirma também, que se grande parte dos conflitos puderem ser
resolvidos fora da jurisdição, consequentemente haverá menor número de
processos e com isso o Judiciário atuará de forma mais célere e adequada.
Segundo Didier Jr., o Poder Legislativo tem reiteradamente incentivado a
solução consensual através da edição de várias leis nesse sentido. A chegada
do CPC/2015 reforça essa tendência, o que pode ser facilmente visualizado na
estrutura do Código. A mediação e a conciliação estão reguladas em capítulo
inteiro (arts. 165 a 175), o procedimento é realizado de modo a colocar a
tentativa de autocomposição como ato anterior ao oferecimento da defesa pelo
réu (arts. 334 e 695), permite a homologação judicial de acordo extrajudicial de
qualquer natureza (art. 515 e art. 725), possibilita que, no acordo judicial, seja
incluída matéria estranha ao objeto litigioso do processo (art. 515) permite
acordos processuais atípicos (DIDIER, JR., p. 306).
Vê-se, desse modo, a evidente primazia aos mecanismos de
autocomposição, principalmente nas ações de família, nas quais as tentativas
de resolução de conflitos são imprescindíveis. As diretrizes voltadas ao
consenso estão explicitadas no arts. 694, 696 e 697:
Art. 694. Nas ações de família, todos os esforços serão
empreendidos para a solução consensual da controvérsia, devendo o
juiz dispor do auxílio de profissionais de outras áreas de
conhecimento para a mediação e conciliação. Parágrafo único. A
requerimento das partes, o juiz pode determinar a suspensão do
processo enquanto os litigantes se submetem a mediação
extrajudicial ou a atendimento multidisciplinar. Art. 695. Recebida a
petição inicial e, se for o caso, tomadas as providências referentes à
tutela provisória, o juiz ordenará a citação do réu para comparecer à
audiência de mediação e conciliação, observado o disposto no art.
694. Art. 696. A audiência de mediação e conciliação poderá dividir-
se em tantas sessões quantas sejam necessárias para viabilizar a
solução consensual, sem prejuízo de providências jurisdicionais para
evitar o perecimento do direito. Art. 697. Não realizado o acordo,
passarão a incidir, a partir de então, as normas do procedimento
comum, observado o art. 335 (BRASIL, 2015).

Explica Tartuce, (2018, p. 358), que a referida previsão é salutar, visto


que é necessário disponibilizar elementos para que os integrantes da família
possam sustentar tal instituição por si própria, sem delegar a solução de suas
crises a terceiros. Pondera que o “empreendimento de esforços” deve se
verificar sem imposição/pressão para que as partes aceitem participar das
sessões consensuais.

2.1.1 Meios de Solução Consensual de Conflitos: Conciliação e Mediação


As espécies mais comuns de equivalentes jurisdicionais ou de formas
adequadas de solução de conflitos são: autotutela, negociação, conciliação,
mediação e arbitragem. O enfoque desta pesquisa é analisar os métodos
consensuais de conciliação e mediação.
“Conciliação provém do verbo latino conciliare, que é reunir, compor e
ajustar os ânimos divergentes. Inicialmente, diz-se que a Conciliação se
diferencia da mediação, porque esta é mais ritualística, demorada, enquanto a
conciliação é rápida, ágil e informal”. Na conciliação, o conciliador expõe as
propostas de soluções, ou seja, intervém de forma direta para a realização do
acordo, enquanto o mediador apenas busca o empoderamento das partes
(Zaniel Jr. E Cabral, 2017, p. 654).
A mediação e Conciliação são as formas de solução de conflito nas
quais um terceiro intermedia um processo negocial, atuando como auxiliar das
partes que desejavam chegar à autocomposição. Entretanto, o terceiro não tem
função de resolver o problema, como ocorre na arbitragem, mas sim está no
papel de catalisador da solução do conflito. São, portanto, exemplos de
autocomposição com a participação de um terceiro (DIDIER, JR., 2017, p. 308).

2.1.2 Conciliação
A conciliação pode ser conceituada como um processo de
autocomposição em que as partes são auxiliadas por uma terceira pessoa sem
relações pretéritas, neutra e sem qualquer interesse na causa, para que
possam, por meio de técnicas apropriadas, ajudar aos interessados chegarem
a uma solução ou acordo.
Segundo Neves (2018, p. 63), a conciliação está fundada no sacrifício
integral ou em parte do interesse das partes envolvidas no conflito, por meio da
vontade unilateral ou bilateral dos litigantes. A autocomposição está dividida
em espécies, quais sejam, a transação, a submissão e a renúncia. Na primeira,
existe um sacrifício recíproco dos interesses, sendo que cada sujeito abre mão
parcialmente de sua pretensão para que se atinja a solução do conflito. Oposto
disso, é o que acontece na renúncia e na submissão, nas quais a solução
decorre de ato da parte que dispõe do exercício de um direito que seria
legítimo.
Vasconcellos (2018, p. 63) leciona que a conciliação é focada no acordo,
e é mais adequada para resolver relações eventuais, nas quais predomina o
objetivo de equacionar interesses materiais e jurídicos. É tradicionalmente
utilizada junto ao Poder Judiciário nas relações de consumo, podendo ser
também usada em conflitos corporativos, com a particularidade de que o
conciliador exerce pequena ascendência jurídica, visto que toma iniciativa e
expõe sugestões para a conciliação.

2.1.3 Mediação
A mediação pode ser conceituada como a negociação facilitada por um
terceiro, a quem se denomina mediador, o qual se habilita a compreender as
posições das partes e a encontrar soluções que satisfaçam os seus interesses
e necessidades.
Na definição da Lei n. 13.140/2015 (art. 1º, parágrafo único), “considera-
se mediação a atividade técnica exercida por terceiro imparcial sem poder
decisório, que, escolhido ou aceito pelas partes, as auxilia e estimula a
identificar ou desenvolver soluções consensuais para a controvérsia.
Segundo Tartuce (2018, p. 203), a mediação consiste no método
consensual de abordagem de controvérsias “em que alguém imparcial atua
para facilitar a comunicação entre os envolvidos e propiciar que eles possam, a
partir da percepção ampliada dos meandros da situação controvertida,
protagonizar saídas produtivas para os impasses que os envolvem”.
Explica a supramencionada autora, que na mediação alguém isento e
devidamente capacitado passa a contribuir, através de diálogo com as partes,
de modo que elas mesmas possam assumir posturas de protagonistas na
abordagem da controvérsia. Assim, a vantagem da mediação sobre os outros
meios, é oportunizar que as relações perdurem ao longo do tempo, pois a
proposta é apresentar a solução, para que uma vez finalizada a controvérsia,
os envolvidos sejam permitidos a cogitar perspectivas futuras na relação
(TARTUCE, 2018, p. 205).
No mesmo sentido, Vasconcellos (2018, p. 60) esclarece que na
mediação não há adversariedade porque as partes desempenham papel de
corresponsáveis na solução da disputa, todavia, contam com o apoio do
mediador, que, por sua vez, não é responsável por decidir quem está certo ou
errado, limitando-se sua função em auxiliar.
Nos conflitos entre pessoas que mantém relações permanentes ou
continuadas, as mediações trazem melhores resultados. Isso porque o
propósito não é apenas a obtenção do acordo, mas sim a capacitação do
mediandos a fim de identificar as expectativas, os reais interesses e
necessidades, para que haja a transformação do conflito ou restauração da
relação, e só assim constituir o acordo. Assim, em termos de pacificação social
a mediação se destaca em relação a conciliação, uma vez que não está
concentrada apenas no conflito em si, mas também nas causas que o
originaram.
Em que pese as posições contrárias da doutrina a respeito das
diferenças dos métodos apresentados, mediação e conciliação, a parte que
reconhece que há distinção entre eles, indicam como principal diferencial a
atuação do mediador e do conciliador, que, como já dito, enquanto esse opina
na solução do conflito, exercendo função relevantemente ativa na negociação,
aquele que atua como mediador, apenas induz às partes a descobrirem os
porquês de suas controvérsias, para que então, cheguem, por si sós, a solução
consensual.
Aliás, no art. 165, §§ 2º e 3º do NCPC, discrimina mediação e
conciliação, indicando a atuação do conciliador e mediador:
§ 2o O conciliador, que atuará preferencialmente nos casos em que
não houver vínculo anterior entre as partes, poderá sugerir soluções
para o litígio, sendo vedada a utilização de qualquer tipo de
constrangimento ou intimidação para que as partes conciliem.

§ 3o O mediador, que atuará preferencialmente nos casos em que


houver vínculo anterior entre as partes, auxiliará aos interessados a
compreender as questões e os interesses em conflito, de modo que
eles possam, pelo restabelecimento da comunicação, identificar, por
si próprios, soluções consensuais que gerem benefícios mútuos
(BRASIL, 2015).

Ainda, conforme exposto no Manual de Mediação Judicial do CNJ,


alguns tribunais brasileiros, têm organizado treinamentos, workshops, aulas,
grupos de apoio, oficinas, entre outras práticas para auxiliar o jurisdicionado a
solucionar seus conflitos. Dentre esses treinamentos, estão: a) oficinas de
parentalidade, que buscar durante o divórcio a melhor compreensão da
situação por pais e filhos, evitando assim, que o conflito maior se instale b)
oficinas de comunicação conciliatória, que buscam transmitir aos participantes
a comunicação não violenta, para que possam melhor interagir.
Existem ainda, oficinas de abordagem e auxílio a dependentes químicos,
de resolução de conflitos familiares, oficinas de prevenção da violência familiar,
círculos restaurativos e outros. Contudo, são práticas que não se amoldam na
definição de processos autocompositivos como a mediação e conciliação,
sendo, portanto, chamadas de práticas autocompositivas inominadas.

2.1.2 Centros Judiciários de Solução Consensual de Conflitos e Cidadania


O notório incentivo a solução consensual de conflitos pelo Novo CPC,
também pode ser verificado no art. 165, caput, que dispõe: “Os tribunais criarão
centros judiciários de solução de conflito, responsáveis pela realização de
sessões e audiências de conciliação e mediação e pelo desenvolvimento de
programas destinados a auxiliar, orientar e estimular a autocomposição”
(BRASIL, 2015).
Antes mesmo do NCPC, a política de criação e incentivo dos CEJUSC’s
já era objeto de programa editado pelo Conselho Nacional de Justiça
(Resolução 125/CNJ de 29.11.2010). Em atenção a referida resolução, a nova
legislação processual determina que cada tribunal, crie Centros Judiciários de
Solução Consensual de Conflitos responsáveis pela realização de sessões e
audiências de conciliação e mediação e pelos demais programas destinados a
auxiliar, orientar e estimular a autocomposição (THEODORO JR., 2018, p.
488).
De acordo com o artigo 10 da Resolução do CNJ n. 125/2010, os
Centros de Solução de Conflitos devem, necessariamente, abranger o setor
pré-processual, setor processual e setor de cidadania. Em sua estrutura, deve
haver um juiz coordenador e um adjunto a quem cabe a administração dos três
setores e supervisão dos serviços de conciliadores e mediadores. Em
observância ao art. 9º da mesma Resolução haverá também, ao menos um
servidor com dedicação exclusiva, devidamente capacitado em métodos
consensuais de solução de conflitos, para triagem e encaminhamento
adequado de casos (BRASIL, 2010).
As audiências ocorrerão sem a presença do juiz, no entanto, quando o
acordo for obtido, os autos serão encaminhados ao magistrado para fins de
homologação (art. 28, parágrafo único da Lei n. 13.140/2015). Não criados o
Centros, a audiência de mediação ou de conciliação será processada em juízo,
com a participação do conciliador ou mediador. Caso não haja, centros e
ausentes mediador e conciliador, a tentativa da solução do conflito poderá ser
promovida pelo juiz (THEODORO, JR., 2018, p. 488).
A realização da mediação ou da conciliação no próprio juízo, deve ser
medida de caráter excepcional. Isso porque, conforme exposto por Neves
(2018, p. 67), o juiz nem sempre é a pessoa mais indicada para o exercício de
tal função, a uma porque pode ser desprovido da técnica necessária, a duas
porque pode se tornar suspeito de prejulgamento, ao adotar uma posição mais
ativa. Por isso, com a criação de tais órgãos, formados por pessoas
capacitadas e sem competência para julgar, esses problemas inexistirão.
Após verificar o progresso dos meios consensuais de conflitos no
ordenamento jurídico, sobretudo, o avanço e incentivo fornecido pelo Novo
Código de Processo Civil que regulamenta a mediação e a conciliação em seus
dispositivos, bem como, estimula expressamente a busca pela solução
consensual das partes, na próxima seção, se buscará compreender o
fenômeno das Constelações Sistêmicas Familiares.

2.2 A CONSTELAÇÃO SISTÊMICA FAMILIAR


A Constelação Sistêmica é reconhecida como uma ferramenta ou
método que possibilita um entendimento sistêmico dos acontecimentos que
regem a vida humana em suas relações pessoais e profissionais. Procura
desvendar o que há por traz dos comportamentos anormais dos indivíduos, que
resultam nos conflitos. Ao esclarecer a provável causa, a constelação busca
colocar em ordem o sistema em desequilíbrio e assim pacificar e restaurar as
relações.
As Constelações Familiares podem ser conceituadas como o método
desenvolvido por Bert Hellinger, no qual se cria “esculturas vias”, reconstruindo
a árvore genealógica de um determinado indivíduo, o que permite localizar e
remover bloqueios do fluxo amoroso de qualquer geração ou membro da
família (OLDONI, LIPPMANN e GIRARDI, 2017, p.19).
De início, para melhor compreender o método das Constelações
Familiares é necessário conhecer a história do “criador”, Bert Hellinger.

2.2.1 A Origem
Anton “Sutibert” Hellinger, nasceu em 18 de dezembro de 1925, na
Alemanha, foi sacerdote e missionário junto dos Zulus na África do Sul,
educador, psicanalista, terapeuta corporal, terapeuta em dinâmica de grupos e
terapeuta familiar. As constelações familiares, suas observações acerca dos
emaranhamentos sistêmicos e a forma de os solucionar, tocaram a vida de
centenas de pessoas.
A principal influência de seu trabalho, foram os seus pais e a sua própria
infância. Em razão das inúmeras ausências de Hellinger nas reuniões da
“Juventude Hitleriana” e à sua participação numa organização ilegal de jovens
católicos, fez com que fosse considerado como “suspeito de ser inimigo
potencial do povo”. Assim, aos 17 anos de idade tornou-se um soldado,
experimentando situações de calamidade, da derrota e da vida num campo de
prisioneiros na guerra da Bélgica.
O segundo fator influenciador, foi, sem dúvidas, o sacerdócio. Aos 20
anos de idade, ingressou em uma ordem religiosa católica em que iniciou um
processo de purificação da mente, corpo e espírito, especialmente a
meditação. Já na África do Sul, atuou como missionário junto ao Povo Zulu, por
16 anos, experiência que gerou efeitos significativos em seu trabalho. O
entrechoque de cultura, mudou sua consciência acerca de muitos valores
culturais. A participação de Hellinger em treinamentos inter-racial, ecumênico e
em dinâmicas de grupo, conduzidas por clérigos anglicanos, foi extremamente
importante para a construção de seu método. Através disso, percebeu uma
maneira de trabalhar com grupos que valorizava o diálogo, a fenomenologia e a
experiência humana individual.
Do mesmo modo, a psicanálise e a psicoterapia foram grandes
influências que se seguiram. Diversas escolas terapêuticas trouxeram
contribuições na sua forma de trabalhar, além da orientação
fenomenológica/dialógica da dinâmica de grupos aprendida dos anglicanos, à
compreensão da necessidade fundamental dos seres humanos de se
alinharem com as forças da natureza, que aprendeu com os Zulus na África do
Sul, à psicanálise que aprendeu em Viena e ao trabalho corporal aprendido na
América. Aprendeu ferramentas específicas advindas de variáveis fontes, mas
a força dominante no seu trabalho está altamente relacionada a sua apurada
competência para escutar a autoridade da própria alma5.
Em seu trabalho como missionário na África do Sul, junto aos Zulus,
conheceu novas formas de relacionamento interpessoal, pois as relações
tribais eram baseadas no diálogo, no respeito recíproco da dignidade e do
papel de autoridade de cada uma.

2.2.2 O Método
A Constelação Familiar tem por base a terapia sistêmica, que trata sobre
as relações ocultas que vinculam uma pessoa à própria família. Na terapia
familiar sistêmica, se busca constatar se no sistema familiar existe alguém que
esteja emaranhado nos destinos dos integrantes anteriores dessa família.
Quando a pessoa descobre os emaranhamentos, pode se libertar deles com
mais facilidade (HELLINGER e HÖVEL, 2007, p. 11).
Explica Hellinger (2002, p. 13), que falar em emaranhamento significa
dizer que o membro da família, de forma inconsciente, passa a viver o destino
de um parente que viveu antes dele. No exemplo do autor, se uma criança foi
entregue para a adoção em uma geração anterior, um familiar posterior se
comporta como se fosse o adotado. Sente-se como se tivesse sido “excluído”
do núcleo familiar, ou seja, repete um destino que lhe é desconhecido.
Isso porque, existe uma consciência que influencia os membros de uma
família. Assim se qualquer um dos integrantes do sistema familiar foi tratado
injustamente, existirá uma necessidade de compensação. Significando que a
injustiça que foi praticada em gerações anteriores será repetida e sofrida por
alguém da família até que a ordem seja reestabelecida (HELLINGER e HÖVEL,
2007, p. 15).
Na visão adotada por Hellinger, cada indivíduo faz parte de um sistema,
compreendido como um grupo de pessoas interligadas por um destino comum

5
HELLINGER SCIENCIE, Biographical Sketch. Disponível em:
<https://www.hellinger.com/en/home/bert-hellinger/biographical-sketch/> Acesso em
20.11.2018.
e relações recíprocas, no qual cada integrante daquele sistema exerce
influência sobre os outros membros. Dessa maneira, o indivíduo não deve ser
visto de forma individual, mas sim como alguém que é guiado pelas forças do
seu próprio sistema, forças que, por sua vez, não são aparentes (OLDONI,
LIPPMANN e GIRARDI, 2017, p. 28).
Nota-se, então, que a principal característica das constelações familiares
é reconhecer que todos estão ligados ao destino da própria família, e cada
sistema familiar conecta-se por uma consciência coletiva.

2.2.3 O Procedimento
O método da constelação, segue algumas etapas, que podem variar
conforme a necessidade visualizada pelo terapeuta, no entanto, na maioria das
vezes ela ocorre da seguinte forma. O terapeuta solicita ao constelado, que
indique as pessoas que são significativas em suas relações, que têm
participação na questão tratada. Então, para representar os personagens, o
cliente escolhe os participantes do grupo terapêutico e os posiciona no
ambiente, de acordo com as relações que possui (SCHNEIDER, 2007, p. 15)
A escolha da posição deve ser feita a partir de seu sentimento, sem
pretensões, ou seja, sem imaginar as situações que já vivenciou. Tudo deve
ser feito pelo impulso, por uma atitude amorosa. No início do trabalho, o
facilitador (terapeuta) questiona o constelado a respeito de informações sobre
sua história familiar, mas os representantes não devem saber de antemão
quem estão representando, pois pode não se tornar convincente para o cliente
(SCHNEIDER, 2007, p.15).
No transcorrer das constelações os representantes acabam se guiando
mais pelo que sentem do que pelo que sabem. Hellinger e Hövel (2007, p. 12),
esclarecem bem “O que é curioso nas constelações é que as pessoas
escolhidas para representar os membros da família se sentem como as
pessoas reais, tão logo se encontrem na constelação”. Agem por puro instinto,
chegando a sentir sintomas dos representados.
Depois de posicionados os representantes, o constelado se senta, e
após um momento de concentração, o terapeuta solicita que os representantes
exponham seus sentimentos, percepções e sintomas corporais. Assim, o
conhecimento que a alma do cliente tem sobre sua família e sobre as forças
que nela existem torna-se visível para o próprio cliente, ao terapeuta e para os
representantes (SCHNEIDER, 2007, p.16).
A constelação encontra a paz quando os membros da família ali se
reencontram com respeito e amor, os anteriormente excluídos são restaurados
e cada um pode assumir o lugar que lhe pertence. O cliente, muitas vezes é
introduzido para sentir o sistema reconciliado ou reordenado.
Através da constelação permite-se ao cliente a visualização de seu
trauma familiar e os emaranhamentos nele existentes, ao passo que pode
compreender sentimentos e atitudes inconscientes por si praticadas e também
pelos membros do seu grupo familiar. Resultando no entendimento do seu
próprio agir, bem como se torna mais empático em relação aos outros
integrantes. Só assim, poderá encontrar soluções para seus dilemas familiares
ou ainda, compreender situações que não poderão ser modificadas, mas
aprender a conviver com elas.
As constelações, portanto, normalmente seguem as seguintes etapas:
1) A definição do problema O terapeuta pergunta ao cliente qual é o problema, ou seja,
ele quer saber o que o leva a uma constelação familiar. Ele
não está interessado na história “habitual”, em
interpretações, julgamentos e explicações que a
acompanham.
2) A escolha dos O cliente escolhe os participantes para o representar os
representantes membros selecionados da família e para representá-la.
Normalmente, no início de uma constelação, o terapeuta se
prende a um número mínimo.
3) Montagem da constelação O terapeuta pede ao cliente que monte a constelação, ou
seja, que disponha os representantes no espaço e que lhes
transmita uma orientação que evidencie as relações que uns
mantêm com os outros.
4) O processo de solução O terapeuta pode tanto interrogar os representantes sobre o
que está acontecendo com eles, como simplesmente deixá-
los fazer os “movimentos da alma”.
5) A solução A solução de uma constelação dá aos seus membros a
sensação de livrar-se de um peso. Traz paz e satisfação ao
campo de energia familiar.
6) O ritual de encerramento Existem inúmeras maneiras de deixar seu papel de
representante, uma sugestão é o cliente aproximar-se de
cada representante, pegar-lhe a mão e agradecer-lhe por ter
representado seu familiar.
Fonte: Oldoni, Lippmann e Girardi, 2017.
A prática da Constelação Sistêmica Familiar realizada em grupos, visa
descobrir os emaranhamentos possivelmente existentes no grupo familiar do
cliente que buscou a terapia, para que então, através da representação feita
por pessoas desconhecidas, possa encontrar a cura e a restauração do
equilíbrio. Não se trata de “teatro”, uma vez que as pessoas participantes do
grupo são impulsionadas por seus sentimentos, não há nada ensaiado.
As possíveis causas de uma desordem num sistema familiar estão
relacionadas a acontecimentos de vida que envolvem abortos, adoções
complicadas, filhos não reconhecidos, pessoas que foram esquecidas na
família, novas uniões afetivas construídas após o desfecho de um
relacionamento mal resolvido, homicídios, violência física, verbal ou sexual e
lutos não vivenciados (CORNELIUS, 2017, p.50 apud TEDESCO, 2017).
As complicações resultantes desses desequilíbrios, estão aptas a
manifestar nos membros daquela família, sintomas como depressão, insucesso
profissional, dificuldades de constituir relacionamentos, doenças, vícios,
dificuldade financeira, fatores que impedem o encontro com a paz e a
felicidade. A cura desses sintomas pode ser encontrada, quando as causas
tornam se visíveis (CORNELIUS, 2017, p. 51 apud TEDESCO, 2017).

2.2.4 As Ordens do Amor


Bert Hellinger trouxe à tona três ordens ou leis naturais, as quais devem
ser respeitadas para que o sistema não se torne desarmônico. São por ele
denominadas Ordens do Amor, sendo elas: pertencimento, equilíbrio e ordem.
Segundo Hellinger, as necessidades essenciais de nossos
relacionamentos atuam umas sobre as outras. A primeira é a necessidade de
pertencer, isto é, de vinculação, a segunda consubstancia-se na necessidade
de preservar o equilíbrio entre o dar e o receber, e a última, é a necessidade de
segurança proporcionada pela convenção e previsibilidade sociais, isto é, a
necessidade de ordem. Essas necessidades, exercem grande força e influem
demasiadamente em nossas relações, dessa maneira, os relacionamentos são
bem-sucedidos quando conseguimos atender essas necessidades e equilibrá-
las, mas passam a ser problemáticos e destrutivos quando não conseguimos
(HELLINGER; WEBER; BEAUMONT, 2008, p. 16).
A Lei do Pertencimento está ligada a necessidade que o ser humano
tem de se sentir parte de um grupo. Em todos os ciclos a que está inserido,
família, trabalho, amizade, o indivíduo busca de forma consciente ou
inconsciente, ser aceito pelos demais membros. A partir da vontade de
pertencer, tomamos atitudes para que não sejamos excluídos do grupo,
independente de qual seja a condição para essa pertinência.
Desde a infância, as crianças se adaptam aos grupos em que nascem,
elas sentem sua ligação com a família sob a forma de amor, sem se importar
se essa família a alimenta a ou negligencia, pois, para elas os hábitos
familiares são bons. É uma necessidade de sobrevivência, a consciência reage
a tudo que limita ou coloque em risco os nossos vínculos. A consciência liga-
nos uns aos outros, mas também pode nos levar a excluir aqueles que são
diferentes e consequentemente proíbe a participação delas em nosso sistema
(HELLINGER; WEBER; BEAUMONT, 2008, p. 20).
A alma não aceita exclusões, assim quando um membro é excluído do
grupo, outro integrante da família toma seu lugar, e inconscientemente, repete
seu padrão. Frequentemente os filhos abortados (aborto provocado ou
espontâneo), são excluídos do sistema, pois os pais acabam agido como se
eles nunca tivessem existido, considerando apenas o segundo filho. Os
homossexuais, os criminosos, e inclusive parceiros anteriores dos pais, são
também excluídos, entretanto, haja vista que cederam lugar aos que vieram,
eles também pertencem ao sistema e precisam ser rememorados, para evitar
que sejam representados (SCHNEIDER, 2007, p. 30).
Entretanto, quando desrespeitada, a ordem pode ser reestabelecida,
O reequilíbrio de um sistema violador da Lei do Pertencimento se dá
pelo respeito e reconhecimento interior (e não pela razão) do
pertencimento daquele membro antes excluído, momento em que a
paz volta a se estabelecer para todos. Doravante, o membro que
carregava o fardo da repetição finalmente pode encontrar seu lugar,
passando também a se sentir pertencido, livrando-se daquelas
amarras que inconscientemente o impediam de alcançar a plena
felicidade (CORNELIUS, 2017, p.56).

A segunda, é a Lei da Precedência, na qual aqueles que chegaram


antes, cronologicamente, prevalecem sobre os que chegaram depois. Nessa os
mais velhos são hierarquicamente superiores aos mais novos. Define-se,
portanto, que aquele que entra primeiro em um sistema, tem a prevalência e
exerce direitos sobre os que entraram depois, pois dentro de um sistema existe
uma hierarquia, uma ordem a ser respeitada e cada um tem o seu lugar
(OLDONI, LIPPMANN e GIRARDI, 2017, p. 38).
Segundo (Hellinger e Hövel, 2007, p.79), os pais têm precedência em
relação aos filhos, assim como o relacionamento íntimo existente entre eles
como casal, tem precedência com relação à paternidade. Significa que, os pais
precisam exigir dos filhos e não o contrário. Quando os pais não fazem valer
sua superioridade, se igualando a eles, através de “camaradagem”, os efeitos
tendem a ser negativos sobre os filhos, pois sentem-se inseguros.
A Lei da Precedência é desrespeitada, quando os filhos não honram os
pais e começam a impor regras na convivência. Ou ainda, quando os
descendentes assumem o papel de patriarcais, querendo “ajudar” seus
antecedentes. Por isso, não se está falando de não prestar auxílio aos
ascendentes, mas substituir a expressar ajudar por servir. Muitas vezes,
notadamente nos tempos modernos, os filhos tentam ensinar aos pais,
corrigindo suas atitudes, incidindo na evidente desordem.
Ainda que munidos de boas intenções, os filhos não devem tentar
carregar as consequências das culpas por atitudes dos pais, tomar suas
obrigações ou expiações que por eles devem ser vividas. Ao se colocarem
como superiores, mesmo que estejam agindo por amor, não impedem os
efeitos negativos dentro do sistema, ou diretamente a eles mesmos, como
dificuldades nos relacionamentos, de saúde ou financeiras. Por isso, no
decorrer das Constelações, deve ser averiguar se alguém ocupa o papel que
não lhe cabe, para então restabelecer o equilíbrio de modo a tranquilizar o
sistema (HELLINGER, 2002, p. 25).
A Lei do Equilíbrio trata-se do equilíbrio entre Dar e o Receber e está a
serviço da troca nas relações. É preciso cultivar esse equilíbrio nos
relacionamentos, de modo a encontrar a harmonia.
Em um relacionamento íntimo, por exemplo, deve-se expor aos
parceiros do que se precisa, mas sem que haja abuso. Em bons
relacionamentos, ambos são carentes, dando força a seus vínculos. No
entanto, há pessoas que atingem a plenitude e deixam de ser “carentes”, de
sorte que os outros dela podem receber, mas como elas não precisam receber,
há um relacionamento anormal. É preciso que haja uma troca total, ou seja,
quando o doador recebe, o recebedor dá. HELLINGER; WEBER; BEAUMONT,
2008, p. 199).
Conforme pensam os autores, em certos relacionamentos não há como
superar o desequilíbrio entre doador e recebedor, como ocorre entre pais e
filhos ou entre professores e alunos. Enquanto pais e professores são muito
mais doadores, filhos e alunos são praticamente apenas recebedores. Porém,
esse equilíbrio é encontrado quando filhos e alunos passam a próxima geração
o que ganharam da anterior (HELLINGER; WEBER; BEAUMONT, 2008, p. 20).
O sentimento entre pais e filhos atende a uma hierarquia, a qual exige
que eles permaneçam como parceiros desiguais: os pais dão os filhos
recebem. Tudo flui melhor quando cada qual assume seu devido lugar:
Os filhos, inconscientemente, aspiram igualar os pais no sofrimento.
Seu vínculo amoroso é tão forte que os cega e eles não conseguem
resistir à tentação de zelar pelos pais assumindo-lhes a dor. Embora
façam isso por amor e acreditem que estão praticando o bem,
passam a comportar-se como pais de seus pais e dramatizam os
medos destes prejudicando a si mesmos. Este amor cego protege os
vínculos com os pais, mas, atuando como pais e tentando dar-lhes ao
invés de receber deles, invertem o fluxo do dar e receber e,
inadvertidamente, perpetuam o sofrimento (HELLINGER; WEBER;
BEAUMONT, 2008, p. 67).

Algumas coisas, os pais não devem dar aos seus filhos, a saber, dívidas,
obrigações, encargos de ocasião, injustiças sofridas e todos os privilégios
obtidos através de mérito pessoal. Isso porque, são coisas que os pais
obtiveram por meio de esforços e circunstâncias pessoais, por isso, não devem
ser transmitidas às gerações seguintes. Incumbe aos pais o dever de proteger
seus filhos de efeitos negativos, como cabe aos filhos permitir que os pais
sigam seus destinos. Do contrário, se os pais transferem aos filhos coisas
prejudiciais ou os filhos o tomam, o amor é ferido (HELLINGER; WEBER;
BEAUMONT, 2008, p. 70).
A necessidade de pertinência, o equilíbrio entre dar e o receber e
convenção social trabalham juntos para preservar grupos a que pertencemos.
Toda alma quer compensar aquilo que lhe é ofertado. Sentir-se em débito ou
credor são instintos naturais da alma, é assim que os vínculos constroem. Por
isso, na visão de Hellinger, os relacionamentos somente serão bem-sucedidos
se houver equilíbrio nessas três necessidades. Depois de abordadas as
Constelações Sistêmicas e suas nuances, é chegada a hora de analisar o uso
do método terapêutico no campo do Direito.

2.3 A PRÁTICA DAS CONSTELAÇÕES SISTÊMICAS FAMILIARES NO


PODER JUDICIÁRIO
Alguns elementos negativos presentes na forma tradicional de resolver
conflitos, como a morosidade, a sobrecarga do judiciário, a onerosidade, a falta
de solução adequada e efetiva, bem como aqueles fatores já expostos na
primeira seção desta pesquisa, impulsionaram o legislador a fomentar novas
formas de solucionar os impasses existentes na sociedade. Como também
visto alhures, recentemente os meios consensuais, mediação e conciliação,
ganharam força no ordenamento jurídico e passaram integrar o Código de
Processo Civil, bem como da Lei da Mediação.
Ainda há outros métodos que são reconhecidos e desenvolvidos pelos
operadores do Direito, sem que sejam regulamentados. Esse é o caso da
utilização das Constelações Sistêmicas Familiares, que apesar de não
possuírem previsão legislativa, seu uso está em conformidade com a
Resolução 125/2010 do CNJ que estimula práticas que proporcionam
tratamento adequado aos conflitos de interesse do Poder Judiciário.

2.3.1 O Início
A relação entre as práticas das Constelações Sistêmicas Familiares e o
Direito Brasileiro, começou em meados de 2012, quando o Juiz de Direito Sami
Storch adotou o método em sua atuação jurisdicional.
No ano de 2006, quando ingressava na magistratura, Sami também
estudava a técnica das constelações. A visão sistêmica adquirida com a
formação em constelações, auxiliou o juiz na melhor compreensão nos conflitos
trazidos ao Poder Judiciário, bem como contribuiu para que adotasse a melhor
solução em cada caso. Sami considera que o conhecimento sobre as ordens
do amor descobertas por Hellinger, são capazes de tornar mais compreensível
a dinâmica dos conflitos possibilitando a solução mais eficaz para as partes do
litígio (STORCH, 2015).
A aplicação da visão sistêmica foi se desenvolvendo aos poucos na
prática judicante de Sami. Primeiro, elas se deram nas audiências relacionadas
ao Direito de Família, depois foram introduzidas meditações e os exercícios de
constelações com representantes, até que alcançou outras áreas do direito
como a criminal e a de infância e juventude.
Inicialmente foram usadas as frases sistêmicas, que surtiram efeitos
positivos. Em seu exemplo, conta que em uma audiência de divórcio, que inclui
pedidos de alimentos e disputa de guarda dos filhos ao notar a elevada
animosidade entre as partes envolvidas, Sami Storch não permite que falem
muito, para não amplificar o conflito. A conversa é iniciada e o juiz relembra os
conflitantes da história de amor que os trouxe até a sala de audiências, faz com
que rememorem os momentos bons e olhem para a família que construíram.
Logo o casal se emociona. (STORCH, 2015).
Na sequência, as partes são alertadas da dor da separação e percebem
que na verdade, o sentimento de raiva e mágoa está escondendo a dor que
sentem pela falência do relacionamento que possuíam. Registra o autor,
“nesse ponto, é comum que ambos estejam chorando. Já não se lembram
da raiva e da vontade de vingança, pois entraram em contato com o sentimento
primário da dor. Essa dor precisa ser vista e vivenciada, para que possa dar
lugar à paz” (STORCH, 2015).
Finalmente, Sami Storch critica o comportamento dos pais em relação
aos seus filhos, ao fazer comentários depreciativos um sobre o outro. Convida-
os então, a pensar como seus filhos se sentem ao ouvir frases ao estilo “Seu
pai não presta” ou “Sua mãe não te educa”, e imaginar que consequências
internas poderão vir com o desrespeito entre os pais.
Explica, portanto, a importância de não colocar o filho no conflito
existente entre o casal, sugerindo que eles se idealizem dizendo frases como:
“eu e seu pai/sua mãe temos problemas, mas isso não tem nada a ver com
você; nós somos adultos e nós resolvemos”; “fique fora disso; você é só nosso
filho”; “eu gostei muito do seu pai/sua mãe, e você nasceu de um momento de
amor que tivemos”; “eu e seu pai/sua mãe estaremos sempre juntos em você”;
“quando eu olho para você, vejo seu pai/sua mãe”. Diante disso, na maioria das
vezes, as partes diminuem suas resistências e conseguem chegar a um acordo
profícuo (STORCH, 2015).
Posteriormente ao uso da mentalização das frases e das constelações
com bonecos, foi instituído pelo Tribunal de Justiça da Bahia um projeto de
palestras vivenciais com o tema “Separação de casais, filhos e o vínculo que
nunca se desfaz”. Assim na Comarca de Castro Alves/BA, entre 2012 e 2013,
foram realizados seis eventos dentro do projeto. O evento se inicia com uma
palestra, abordando assuntos sobre vínculos sistêmicos familiares, as causas
das crises nos relacionamentos e a solução para lidar com isso. Depois de
meditarem, são convidadas a vivenciar o método das constelações familiares,
constelando sua própria história (STORCH, 2015).
A aplicação da técnica auxiliar na efetivação de conciliações verdadeiras
entre as partes, pois os participantes absorvem os assuntos tratados com
maior respeito e consideração em relação a outra parte envolvida. Realizado o
acordo, basta o juiz homologá-lo para que produza os efeitos de uma sentença,
evitando, assim, a longa instrução processual, que é nociva aos laços
familiares e podem agravar os rancores e prejudicar ainda mais a relação. Sem
contar que, uma solução imposta, está sujeita a não ser cumprida e deixar
ambos insatisfeitos (STORCH, 2015).

2.3.2. Os Resultados
O Juiz de Direito Sami Storch, realizou uma pequena pesquisa na
Comarca onde atua, na qual pessoas que participaram das vivências de
constelações responderam a um questionário, obtendo os seguintes
resultados:

59% afirmaram que a vivência ajudou ou facilitou a obtenção do acordo para conciliação
durante a audiência. Para 27%, ajudou consideravelmente. Para 20,9%, ajudou muito;
77% disseram que a vivência ajudou a melhorar as conversas entre os pais quanto à guarda,
visitas, dinheiro e outras decisões em relação ao filho das partes. Para 41%, a ajuda foi
considerável; para outros 15,5%, ajudou muito;
71% disseram ter havido melhora no relacionamento com o pai/mãe de seu (s) filho (s) após a
vivência. Melhorou consideravelmente para 26,8% e muito para 12,2%;
94,5% relataram melhora no seu relacionamento com o filho. Melhorou muito para 48,8%, e
consideravelmente para outras 30,4%. Somente 4 pessoas (4,8%) não notaram tal melhora;
76,8% notaram melhora no relacionamento do pai/mãe de seu (ua) filho (a) com ele(a). Essa
melhora foi considerável em 41,5% dos casos e muita para 9,8% dos casos;
55% das pessoas afirmaram que desde a vivência de constelações familiares se sentiram
mais calmas para tratar do assunto; 45% disseram que diminuíram as mágoas;
33% disseram que ficou mais fácil o diálogo com a outra pessoa; 36% disseram que passaram
a respeitar mais a outra pessoa e compreender suas dificuldades; e 24% disseram que a outra
pessoa envolvida passou a lhe respeitar mais.
Fonte: Sami Storch, 2018.

O Conselho Nacional de Justiça divulga que em pelo menos 11 estados


(Goiás, São Paulo, Rondônia, Bahia, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Pará,
Paraná, Rio Grande do Sul, Alagoas e Amapá e o Distrito Federal) a
Constelação Sistêmica é utilizada em casos judiciais.
Entre agosto de 2016 e julho de 2017, a Vara Cível, Família, Órfãos e
Sucessões do Núcleo Bandeirante realizou sete sessões de constelação
familiar, no “Projeto Constelar e Conciliar” do TJDFT. Foram convidadas as
partes e advogados, defensores públicos e promotores de justiça de 67
processos em tramitação na serventia, envolvendo ações de divórcio, guarda,
busca e apreensão de menores e alimentos. Ao fim das audiências, verificou-
se que 61% dos acordos foram exitosos. Nos casos em que ambas as partes
se fizeram presentes na constelação, a média de acordos chegou a 76% (CNJ,
2017).
O objetivo do uso do método das constelações no Judiciário, é
esclarecer para as partes o que há por trás do conflito que impulsionou o
processo judicial. A sessão é realizada sob o comando de um profissional
habilitado, terapeuta especializado em constelações sistêmicas. Em algumas
comarcas a técnica é aplicada antes das tentativas de conciliação, nos
CEJUSC’S. Importante dizer que apesar da denominação, as Constelações
Sistêmicas Familiares não se limitam a casos judicias que envolvem o Direito
de Família. O método é usado também no Direito Penal em casos de violência
doméstica e envolvendo adolescentes infratores.
Na Comarca de Parobé/RS a constelação é empregada desde 2016,
auxiliando casais na superação de divergências que resultaram em atos de
violência. A juíza Lizandra dos Passos e as psicólogas Candice Schmidt e
Cristiane Pan Nys formaram grupos de homens e mulheres nos quais as
vítimas são separadas dos agressores em sessões de terapia feitas em
separado. Com isso, homens e mulheres passaram a ver seus conflitos da
perspectiva de um terceiro, ajudando-os a identificar padrões de
comportamento que levam à agressão, bem como o histórico de violência
doméstica observado na própria família (CNJ, 2018).
Quando o agressor assumia a posição de telespectador, passava a
visualizar a dor de uma vítima com outros olhos, se solidarizando, e
enxergando seu papel de algoz. Durante as constelações, os participantes
descobrem em seu sistema familiar, o emaranhado que define seu
comportamento agressivo. Segundo a juíza Lizandra dos Passos, diversas
vezes a mulher agredida não denunciava e ao mesmo tempo havia mulheres
com comportamento de agressoras. Na Comarca de Parobé, desde que a
técnica é usada, houve redução de 94% na reincidência das agressões entre
casais. Segundo Lizandra dos Passos, “trata-se de uma mudança de cultura
que busca reconciliar os universos feminino e masculino” (CNJ, 2018).
Em novembro de 2017, o Tribunal de Justiça do Amapá, realizou a
Oficina de Constelação Familiar para detentos da Penitenciária da região. A
técnica foi utilizada com 20 mulheres e 15 homens. Os convidados para
participar do referido projeto estavam na faixa etária de 18 a 20 anos de idade,
apresentavam antecedentes criminais desde a adolescência, mas no sistema
prisional eram novatos. Segundo a desembargadora Sueli Pini, presidente do
Núcleo Permanecente de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos,
depois que os reclusos realizaram a constelação, manifestaram melhores
comportamentos, como por exemplo, voltando a estudar na escola da
penitenciária, reconhecendo a paternidade de crianças e outros aspectos (CNJ,
2018).
Na Unidade de Internação de Santa Maria no Distrito Federal, com o
objetivo de auxiliar os jovens a entender as razões que os influenciaram a
transgredir a lei e também fazer com que o círculo vicioso que os levam a
reincidir no crime se interrompa, também se filiou às práticas das conciliações
familiares. Em uma sessão, o adolescente Luiz foi constelado. Em uma
representação intuitiva, o adolescente assistiu aos voluntários, servidores e
outros infratores encenando sua vida. Durante o processo, Luiz percebeu que a
experiência com o crime é consequência de vários desajustes, traumas vividos
seus pais na infância deles, revelando um conflito transgeracional. A
consteladora então incentivou que o adolescente constelado, entendesse que
não poderia viver o problema dos pais, e que não precisava assumir ou
reproduzir esses conflitos (CNJ, 2018).
Espalhados pelos Brasil, os efeitos positivos das Constelações têm sido
visualizados também no estado de Santa Catarina.

2.3.3 A Constelação Sistêmica Familiar em Santa Catarina


A aplicação das técnicas da Constelação Sistêmica Familiar no estado
de Santa Catarina é ainda bastante tímida. No entanto, alguns juízes já incluem
a prática em sua atividade jurisdicional com a finalidade de obter um melhor
resultado nos acordos.
O psicólogo e constelador Paulo Pimont, possui formação em Direito
Sistêmica pela Hellinger Schule e é professor convidado da Academia Judicial
do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, foi um dos pioneiros a sugerir o uso
das constelações para área do Direito no Sul do Brasil. Alguns juízes da
Academia Judicial realizaram treinamentos e reconheceram benefícios trazidos
pelo método aos seus trabalhos, para suas equipes e para os jurisdicionados.
Em Florianópolis, a Juíza de Direito Vania Petermann, lidera um projeto
chamado “Conversas em Família”, que é conduzido por Paulo Pimont e
servidores do judiciário. Nele são abordados, a prática da Comunicação não-
violenta e a Constelação Sistêmica. A oficina tem por objetivo proporcionar
uma reflexão sobre o processo e conflito nele existente, construindo-se, dessa
maneira, um caminho para que as partes encontrem a melhor solução. Na
Capital, aproximadamente 240 pessoas com processos judiciais em andamento
participaram da constelação, no entanto, não há uma estatística que comprove
a eficácia da técnica terapêutica no judiciário catarinense.
Na cidade de Balneário Camboriú, a Juíza de Direito Karina Muller
Queiroz, instituiu oficinas que ocorrem quinzenalmente, nas quais as partes
são convidadas para uma palestra e alguns casos são olhados pela ótica da
Constelação Sistêmica. Em março de 2018, na Comarca de Balneário
Camboriú foi realizado o primeiro encontro denominado “Um novo olhar sobre
as dinâmicas familiares”, parte integrante do Projeto “Justiça Sistêmica:
vínculos de amor”. O projeto é coordenado pela juíza Karina Muller Queiroz, e
busca trazer esclarecimentos sobre as dinâmicas familiares cotidianas e
reflexões acerca das relações. Em cada palestra, são abordados temas
diversos sobre as relações familiares, em alguns, são demonstradas algumas
didáticas sistêmicas e quando possível, realizam-se as constelações familiares
(TJSC, 2018).
Na Comarca de Gaspar, a Juíza de Direito da Vara da Família, Infância,
Juventude, Idoso e Órfãos e Sucessões, em audiência de ação de modificação
de guarda, entre outros pontos decididos, encaminhou as crianças para
tratamento psicológico semanal pela Assistência Social do Município onde
residem, bem como orientou que as partes participassem de sessões
de constelação familiar a se realizarem no fórum da comarca (Agravo de
Instrumento n. 4014728-24.2018.8.24.0900).
Na Comarca de Blumenau, a Juíza de Direito Simone Faria Locks, titular
da Vara da Infância e Juventude de Blumenau, também acredita na efetividade
da abordagem sistêmica nos atos infracionais. Em suas audiências, embora
não sejam desenvolvidas as sessões de constelações, ela aplica alguns
métodos sistêmicos com as testemunhas, adolescentes e famílias,
impulsionando a prática do diálogo e do amor.
A Advogada Eunice Schlieck, atuante em Santa Catarina, adota em seus
atendimentos a postura sistêmica, incentivando a conscientização de seus
clientes sobre suas responsabilidades nas demandas que apresenta. De forma
discreta, aplica as Leis Sistêmicas desenvolvidas por Bert Hellinger. Explica
Eunice Schlieck que “queremos trazer um novo olhar para o Direito, onde os
processos sejam focados no essencial com a devida responsabilização das
próprias partes nas escolhas, de forma que os envolvidos se sintam bem com a
solução tomada, para facilitar que ela seja respeitada”.
Como visto, a prática das constelações sistêmicas está sendo
frequentemente utilizada no Poder Judiciário, na busca do êxito da conciliação
entre as partes. O uso das constelações não se limita as sessões, visto que,
nem sempre se faz possível, mas também pode ser desenvolvida através de
palestras, frases, conselhos e uma visão sistêmica em geral.
Desse modo, a aplicação das constelações sistêmicas familiares durante
os processos judiciais tem surtido efeitos positivos, no entanto, não chega a ser
considerado um método de solução consensual, como a mediação e a
conciliação, mas sim, atua na forma de cooperação desses meios, à exemplo
das chamadas práticas autocompositivas inominadas.

3 CONCLUSÃO
A pesquisa teve como objetivo central, avaliar a inserção das
Constelações Sistêmicas Familiares em processos judiciais. Para tanto, se fez
necessário examinar e descrever os meios consensuais de conflitos, conhecer
o método sistêmico e apontar sua aplicação no campo do Direito e identificar
os resultados obtidos. O objetivo principal foi satisfatoriamente respondido,
visto que a utilização das Constelações Sistêmicas Familiares é cada vez mais
crescente no ordenamento pátrio.
Constatou-se que o uso do método psicoterapêutico está em
consonância com uma das metas principais do Novo Código de Processo
Civil/2015, que é incentivar a prática dos métodos de solução consensual de
conflitos pelos operadores do Direito, bem como está em conformidade com a
Resolução do CNJ 125/2010 que estimula práticas que proporcionam
tratamento adequado aos conflitos de interesse do Poder Judiciário.
O método psicoterapêutico desenvolvido por Bert Hellinger é regido por
três Leis Naturais: pertencimento, equilíbrio e ordem, as quais, uma vez
desrespeitadas pelos indivíduos culminam em indesejáveis consequências,
gerando, dessa forma, conflitos que se repetem em gerações. Através das
Constelações é possível que a pessoa que passa por um conflito, descubra o
que está velado em seu comportamento, para que possa curá-lo e alcançar a
felicidade e a paz.
Com amparo jurídico e anuência de juízes e advogados, a Constelação
Sistêmica Familiar é inserida, na maioria das vezes, em casos judicias que
exigem maior sensibilidade dado às suas peculiaridades, como é o caso do
Direito de Família. A visão sistêmica de Hellinger é aplicada por juízes com o
auxílio de profissionais capacitados, através de sessões de constelações
familiares, oficinas, palestras e antes da audiência de mediação ou tentativa de
conciliação.
Desse modo, verifica-se que a aplicação das Constelações Sistêmicas
Familiares e métodos afins, gerou efeitos positivos na resolução de conflitos,
pois, percebeu-se um aumento significativo de acordos entre as partes. É que,
após tomarem consciência de seus emaranhamentos, as pessoas puderam
olhar para o seu conflito de forma diversa, se dispondo a resolvê-los de forma
mais pacífica.
Portanto, a prática das Constelações Sistêmicas Familiares, apesar de
não ser considerada um meio de solução de conflitos, inspira a resolução
consensual no decorrer do processo, precipuamente durante as audiências de
mediação e conciliação.
REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei n.º 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil.


Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-
2018/2015/Lei/L13105.htm> Acesso em: 20 de outubro de 2018.

______Lei n.º 13.140, de 26 de junho de 2015. Lei da Mediação. Disponível


em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/Lei/L13140.htm>
Acesso em: 20 outubro de 2018.
______Resolução nº 125, de 29 de novembro de 2010. Dispõe sobre a
Política Judiciária Nacional de tratamento adequado dos conflitos de
interesses no âmbito do Poder Judiciário e dá outras providências. 29
nov. 2010. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/busca-atos-
adm?documento=2579>. Acesso em: 05 de novembro de 2018.

_____ Azevedo, André Gomma de (Org.). Manual de Mediação Judicial. 6ª


Edição (Brasília/DF:CNJ), 2016.

CÂMARA, Alexandre Freitas. O novo processo civil brasileiro. 3. ed. São


Paulo: Atlas, 2017.

CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO,


Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. 31. ed. São Paulo: Malheiros,
2015.

CORNELIUS, Júlia Padova. A Aplicação das Constelações Sistêmicas na


Resolução de Conflitos Judiciais e Extrajudiciais, 2017. Trabalho de
Conclusão de Curso – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis.

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Constelação familiar: solução para


violência doméstica no Rio Grande do Sul. Disponível em:
<http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/86789-constelacao-familiar-solucao-para-
violencia-domestica-no-rio-grande-do-sul> Acesso em 21 de novembro de
2018.

______Constelação Familiar no cárcere: semente para uma justiça


melhor. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/86571-constelacao-
familiar-no-carcere-semente-para-uma-justica-melhor-constelacao-familiar-no-
carcere-semente-para-uma-justica-melhor> Acesso em 21 de novembro de
2018.
DIDIER JR., FREDIE. Curso de direito processual civil: introdução ao
direito processual civil, parte geral e processo de conhecimento. 19. ed.
Salvador: Ed. Jus Podivm, 2017.

DONIZETTI, Elpídio. Curso didático de direito processual civil. 20. ed. rev.,
atual. e ampl. São Paulo: Atlas, 2017.

HELLINGER, Bert. Ordens do Amor. Editora Cultrix, São Paulo, 2002.

HELLINGER, Bert; WEBER, Gunthard; BEAUMONT, Hunter. A simetria oculta


do amor. Editora Cultrix, São Paulo, 2008.

HELLINGER, Bert; TEN HÖVEL, Gabriele. Constelações familiares: o


reconhecimento das ordens do amor. Editora Cultrix, São Paulo, 2006.

INSTITUTO IPÊ ROXO. A Prática da Constelação Sistêmica no Judiciário


e Direito. Disponível em: <https://iperoxo.com/2018/08/21/a-pratica-da-
constelacao-sistemica-no-judiciario-e-direito/>. Acesso em 27 de novembro de
2018.
INSTITUTO INNOVARE. Atendimento Sistêmico: O Direito sob um novo
olhar. Disponível em: <https://premioinnovare.com.br/praticas/5404>. Acesso
em 28 de novembro de 2018.
NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. 10
ed. Salvador: JusPodivm, 2018.

OAB/SC. Visão sistêmica busca maior humanização da advocacia.


Disponível em: <http://www.oab-sc.org.br/noticias/visao-sistemica-busca-maior-
humanizacao-advocacia/14211>. Acesso em 05 de dezembro de 2018.
OLDONI, Fabiano; LIPPMANN, Márcia Sarubbi; GIRARDI, Maria Fernanda
Gugelmin. Direito Sistêmico: Aplicação das Leis Sistêmicas de Bert
Hellinger ao Direito de Família e ao Direito Penal. Joinville: Manuscritos,
2017.
SCHNEIDER, Jakob Robert. A prática das Constelações Familiares. Patos
de Minas: Atman, 2007.

STORCH, Sami. Direito Sistêmico: primeiras experiências com


constelações no judiciário. In Filosofia, Pensamento e Prática das
Constelações Sistêmicas. 4. ed. São Paulo: Conexão Sistêmica, 2015.
STORCH, Sami. Direito Sistêmico é uma luz no campo dos meios
adequados de solução de conflitos. Disponível em:
<https://www.conjur.com.br/2018-jun-20/sami-storch-direito-sistemico-euma-
luz-solucao-conflitos>. Acesso em 30 de nov. de 2018.
TARTUCE, Fernanda. Mediação nos Conflitos Civis. 4. ed. Rio de Janeiro:
Forense; São Paulo: Método, 2018.

THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 59. ed.


Rio de Janeiro: Forense, 2018.

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA CATARINA. Sala de Imprensa.


Disponível em: <https://portal.tjsc.jus.br/web/sala-de-imprensa/-/magistrada-de-
camboriu-incentiva-pratica-da-justica-sistemica-atraves-de-palestras>. Acesso
em 4 de dezembro de 2018.

VASCONCELOS, Carlos Eduardo de. Mediação de conflitos e práticas


restaurativas. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2018.

ZANETI JR., Hermes; CABRAL, Trícia Navarro Xavier. Justiça Multiportas:


mediação, conciliação, arbitragem e outros meios de solução adequada
para conflitos. Salvador: Juspodivm, 2016.

Você também pode gostar