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Tecnologia e
Modelo de
Gestão:
o cenário
do futuro
da saúde
EDIÇÃO ESPECIAL DE ANIVERSÁRIO DE 2 ANOS
DA REVISTA SCIENCE, VOCÊ VAI CONHECER OS CONTEÚDOS
exclusivos
COMO A PANDEMIA
ACELEROU O PROCESSO DE
AMADURECIMENTO PARA A
GESTÃO EM SAÚDE?
Editora-chefe
Mara Márcia Machado
Editor-executivo
Dr. Felipe Tolaini
Editor Científico
Fabrício dos Santos Cirino
Conselho Editorial
Amanda Figueiredo Bittencourt
Carlos Eduardo Figueiredo
Luiz Eduardo Bettarello
Nick Guldemond
Peter Lachman
Comitê Científico
Elizabeth Fernandes Reis
Lucianna Reis Novaes
Michel Matos de Barros
Andrea Fernandes Vieira
Edição e revisão
Mariana Leite
Dalila Alves
Fotos
Shutterstock
Carta da editora
05 Artigo Original 1
Boas práticas de gestão em saúde
31 Artigo Original 5
Desafios dos hospitais filantrópicos no Brasil:
pública na perspectiva do modelo uma perspectiva da maturidade de gestão
do terceiro setor
41 Artigo Original 6
09 Artigo Original 2
Tecnologia e modelo de gestão:
Hospital do Amanhã: novo posicionamento
estratégico no sistema de saúde
o cenário de futuro da saúde
49 Artigo Original 7
61
transformação digital e rupturas
em série
Normas de submissão
1
ORIGINAL
pelo terceiro setor foi superior a US$ 1 trilhão, cerca de anuais (cerca de 1% do PIB) em 20102.
8% do produto interno bruto (PIB) do planeta e equi- O município de Manaus, Amazonas, é o principal cen-
valente à oitava maior economia do mundo . 2
tro econômico, político e demográfico da região Norte
A atuação do terceiro setor no Brasil iniciou-se com as do país, com a indústria e o terceiro setor se destacan-
primeiras organizações da sociedade civil, ainda no sé- do na economia local. Desde a implantação da Zona
culo XVI, por meio da participação da Igreja Católica na Franca de Manaus, em 1967, o município experimenta
instalação das Irmandades de Misericórdia, vinculadas um ciclo econômico baseado em seu parque industrial
ridade religiosa, consolidando-se na década de 19903. Por meio da experiência de um modelo de gestão
em saúde como organização social que presta ser-
A prestação de serviços para o Sistema Único de
viços em unidades do SUS em Manaus, a Associação
Saúde (SUS) ganhou força com a Lei n. 8.080/1990
Sustentabilidade, Empreendedorismo e Gestão em
(Lei Orgânica de Saúde)4, que, a partir de determi-
Saúde do Amazonas (SEGEAM), pioneira no terceiro
nantes sociais, passou a dispor da iniciativa privada
setor amazonense, vem desenvolvendo suas ativida-
em caráter complementar, reiterando a saúde como
des em saúde de forma sustentável e com padrões
direito de todos e dever do Estado na execução de
de excelência.
políticas que garantam um acesso universal e iguali-
tário às ações e aos serviços de saúde. Nesse sentido,
as denominadas Organizações Sociais (OSs), após
qualificadas em processo público, habilitam-se a fa-
HISTÓRIA E
zer contratos de gestão com o Estado para gerir e DESENVOLVIMENTO DO
definir as ações, os protocolos e as diretrizes dentro CAPITAL HUMANO DA
de unidades de saúde5, respaldadas pela Lei Federal SEGEAM
n. 9.637, de 15 de maio de 19986, e pela Lei n. 9.790,
Fundada como empresa privada em 2012, a SEGEAM
de 23 de março de 19997.
iniciou suas atividades com um contrato firmado
Takashi Yamauchi, especialista e autoridade na- com o Serviço Social da Indústria (Sesi Saúde), exe-
cional no tema, ao acompanhar o crescimento do cutado por apenas uma enfermeira, que desenvolvia
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planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8080.htm. norte-sera-totalmente-online.
2
ORIGINAL
Tecnologia e modelo
de gestão: o cenário
de futuro da saúde
reducionista, é inteligível. Toda organização existe No que tem sido chamado de tecnologias hard (ou du-
em função de ter objetivos a serem transformados ras), em 1946 entrou em operação o primeiro computa-
em resultados socialmente necessários. Essas orga- dor – o Electronic Numerical Integrator and Computer
nizações podem ser estatais ou privadas, mas estão (ENIAC) –, cujo desenvolvimento foi fundamental para
a serviço de cumprir seus objetivos. Podemos, inclusi- o projeto Manhattan, de criação da bomba atômica.
ve, fazer uma provocação: quem define os objetivos, o Ele foi desativado em 1955, mas a ciência da compu-
que, em última análise, significa a definição política da tação, atualmente conhecida como a área da tecno-
razão de ser dessas organizações? Deve ser o Estado, logia da informação, deslanchou muito rapidamente.
no caso das organizações com finalidade sanitária ou Grandes empresas passaram a desenvolver novas
social, ou seja, a política é definida pelo Estado, e a máquinas desde a década de 1960, configurando ver-
realização das atividades que implicam as entregas re- dadeiros “mastodontes” difíceis de operar. Contudo,
levantes socialmente é atividade das organizações es- esses equipamentos evoluíram e foram ficando mais
tatais ou privadas. Definir a política – ou seja, o “quê” – amigáveis, avançando na tecnologia empregada até
é função do Estado; e o fazer – ou o “como” – é função alcançar a era dos personal computers (PCs), os ta-
das organizações, que podem ser estatais ou privadas, blets, os celulares e tantos outros dispositivos.
mas que estão relacionadas a um bem público. Quem
Paralelamente a esses desenvolvimentos, vieram as
define a política é o Estado, e é este quem verifica e
novas ferramentas de comunicação de máquina, a
regula se as entregas são realizadas.
criação da web nos anos 1990 e toda a revolução que
Aqui também cabe a discussão de se essas organi- ocorreu em todas as áreas da atividade humana. O
zações, quando privadas, podem ser lucrativas ou crescimento geométrico da capacidade de proces-
não devem ter finalidade lucrativa. Creio que em samento de dados permitiu que fosse enfrentado o
uma sociedade capitalista essa discussão não caiba. desafio de decodificação do genoma humano e revo-
Obviamente, as entregas podem ser realizadas por or- lucionou o campo do desenho de novas moléculas.
ganizações com finalidade lucrativa. A questão deve Enfim, o cruzamento entre a genômica, a biotecno-
ser que a regulação deverá operar no sentido de que o logia e a nanotecnologia com a intersecção da tec-
lucro esteja submetido à função pública do produto a nologia da informação está criando um mundo novo,
ser entregue à sociedade, ou seja, novamente o Estado que poderá ser melhor na promoção da diminuição
deve regular a relação entre o lucro e as entregas que da desigualdade.
ele deve garantir para construir bem-estar.
Mas, enquanto no mundo hard os computadores fize-
ram essa revolução, no mundo soft foi operada outra
revolução. O mundo da gestão, a partir da necessida-
UM POUCO DE HISTÓRIA de de reconstruir o mundo destruído pela guerra e
Após a segunda grande guerra, o mundo passou a mu- dos grandes investimentos realizados na Europa e no
dar mais rapidamente. Muita tecnologia foi produzida Japão, teve em Deming e Juran seus grandes ícones
e transformou todos os setores da atividade humana, na construção do conceito de gestão da qualidade. No
e na área da saúde não foi diferente. Mas, apesar de Japão, criaram ferramentas novas para trabalhar com
esse registro ser relevante pelo fato de o incremento a qualidade e, junto com outros pensadores da área da
tecnológico tornar a entrega de saúde uma atividade gestão, como Ishikawa, desenvolveram uma nova for-
mais complexa, quero fazer menção às transforma- ma de produzir que atingiu todas as áreas da atividade
ções no campo da gestão. humana, inclusive a prestação de serviços de saúde.
Paralelamente a esse movimento, Ansoff, entre tantos na medida em que não existiam mais colônias que o
outros, começou a reconstruir a ideia de planejamen- fizessem. Nascia o Estado regulador. A regulação é
to, questionando: para que serve um plano? Sabendo uma nova atividade do Estado, que não mais se in-
que sua utilidade é dirigir a ação, não podendo ser cumbe de fazer, mas que continua tendo que entre-
confortavelmente fixo, o mundo passa a se mover de gar. Assim, ele privatiza as estruturas de produção e
uma nova forma e transforma-se rapidamente, com a regula as entregas por meio da definição das políticas
obrigatoriedade de um plano ser totalmente mutável e da verificação das entregas. Esse modelo está, neste
– segundo a origem conceitual, seria o antiplano! Daí novo século, atingindo até o glorioso National Health
a ideia de ser estratégico. Service (NHS), que está entregando para a gestão pri-
Em meados da década de 1960, tempo dos grandes vada alguns hospitais estatais nos serviços de saúde
visão sobre a teoria do funcionamento das organiza- A questão é que o mundo da gestão mudou, mas o
ções, Bertalanffy desenvolveu a Teoria de Sistemas, Estado não conseguiu mudar para dar respostas efi-
que seria importante para muitas teorias que viriam cientes de maneira adequada. Daí a necessidade de
a ser propostas mais adiante englobando essas novas mudar para enfrentar a equação dos custos crescentes
ideias, como a teoria das contingências e outras mo- oriundos da violenta onda tecnológica e da mudança
das, como a reengenharia e a gestão participativa. do padrão epidemiológico, cada vez mais caracteriza-
Importante registrar que os anos 1950/60 trouxeram do por doenças crônico-degenerativas, somados a um
grandes transformações para o mundo da gestão. cidadão-cliente cada vez mais informado e que quer
A questão da eficiência passou a ocupar um espaço um produto melhor. Importante lembrar que o mundo
muito relevante, e o processamento eletrônico de da- da gestão mudou muito, mas o mundo da informação
dos garantiu a tudo isso uma velocidade com a qual não ficou atrás. Desde McLuhan, com sua aldeia glo-
o mundo não imaginava trabalhar. Tudo passou a ser bal dos anos 1970, até os dias atuais, com as novas
muito mais rápido e com mais qualidade. ferramentas de comunicação eletrônica, os Estados
devem buscar o triple aim – melhorar a experiência
Nesse momento, a administração pública passou a
do cidadão/paciente, melhorar a saúde da população
ser questionada por sua natural demora em mobili-
e reduzir o custo dessa operação.
zar recursos e pelo custo de seus produtos. Trabalhar
com recursos públicos exige publicidade e isonomia
no mundo todo, e esses dois atributos exigem tempo e
burocracia para serem garantidos!
SOLUÇÕES
Os caminhos não são muitos e certamente passam por
O Reino Unido, que havia perdido suas colônias e não
um novo modelo para realizar ações de saúde, que ne-
tinha mais quem pagasse a conta da ineficiência, foi
cessariamente devem incorporar a prevenção primá-
um dos primeiros países a iniciar um processo de reti-
ria por meio de modelos de atenção básica realmente
rada do Estado do fazer, privatizando áreas que histo-
eficazes. Esta é uma tarefa a ser enfrentada pelos mo-
ricamente eram executadas por ele, como o transpor-
delos de atenção tanto estatais quanto privados.
te, a comunicação e o saneamento. A Dama de Ferro,
Margaret Thatcher, operou duramente esse processo, Também é uma lição para ambos os modelos. No
desempregando muitos ingleses e ajustando as con- caso brasileiro, a Atenção Médica Supletiva (AMS)
tas a serem pagas pelos súditos de sua majestade, e o Sistema Único de Saúde (SUS) devem buscar
aumentar a eficiência de seus respectivos sistemas de remuneração pelo trabalho, seja por meio do marco
saúde para que gerem impacto e efetividade, trazendo legal das parcerias público-privadas, mediadas pela
o desenvolvimento de portas de entrada mais efetivas, remuneração do capital. Na administração pública,
geridas por bons protocolos de acesso, com incorpora- existem outras hipóteses a serem analisadas – as em-
ção de ações reais de promoção e proteção da saúde. presas públicas estatais, como é o caso da Empresa
Paralelamente, devem buscar a melhoria da escala- Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH), as fun-
bilidade da oferta de serviços. Aqui entra a questão a dações de apoio, como a Fundação Zerbini, ou as
ser discutida em outro artigo sobre a Nova Economia: fundações estatais de direito privado, com poucas e
a terceirização das áreas fins e a fragilização das rela- recentes experiências em curso.
ções de trabalho, pois, certamente, são soluções que Enfim, existe um claro desafio a ser enfrentado pela
reduzem custos, mas que têm consequências na qua- saúde pública brasileira e este é o desafio da eficiên-
lidade dos serviços ofertados. cia, muito mais complexo na área estatal. Mas a socie-
Mas, de qualquer forma, há uma discussão mais sim- dade tem que entender os desafios e as alternativas
ples no espaço do SUS, que é a da terceirização da em jogo para enfrentar a decisão, que não se resume a
gestão de hospitais e outros serviços assistenciais. dizer que isso é privatização ou financeirização da saú-
Aqui não existe muita dúvida: a saída é construir no- de. Essas alternativas são fruto de uma visão estreita
do problema a ser enfrentado.
vas relações de parceria, sejam as mais simples reali-
zadas pelas organizações sociais (entidades filantró- Substantivo é ter em conta que a saúde é pública, um
picas) e, portanto, com uma relação que não inclui bem da sociedade!
3
ORIGINAL
* Artigo adaptado de: Vides MLPC. Identificação dos fatores que influenciam o médico no
processo de tomada de decisão quando da indicação de um hospital para a internação de
um paciente: proposição de um instrumento e estudo de caso [master's thesis]. São Paulo:
Escola de Administração de Empresas de São Paulo, Fundação Getulio Vargas; 2018. 70 p.
INTRODUÇÃO FUNDAMENTAÇÃO
O presente estudo versou sobre o mercado privado
TEÓRICA
de saúde no Brasil, empregando o Hospital Edmundo O hospital, conforme a Organização Mundial da
Vasconcelos – hospital privado de grande porte do Saúde (OMS), é uma instituição de cuidado em saúde
município de São Paulo – como fonte de informações em que os médicos e outros profissionais compõem
a força de trabalho.
para a realização da pesquisa. Em particular, focou o
relacionamento de prestação de serviços entre o hos- Ao se falar dos fatores condicionantes de uma orga-
pital privado e a sociedade e propôs um instrumento nização hospitalar, avalia-se como de relevada im-
de avaliação da percepção da comunidade médica so- portância o papel do corpo clínico na instituição, haja
vista ser deste profissional a responsabilidade maior
bre os fatores principais relacionados à escolha de um
pelos pacientes4. Nesse ambiente, os médicos estabe-
hospital para a internação do paciente.
lecem uma relação de autonomia, aspecto que esses
O médico é grande responsável pela captação dos trabalhadores do conhecimento vivenciam diaria-
pacientes. Assim, a instituição hospitalar deve pos- mente nas instituições hospitalares, onde seu saber
suir clareza dos diferenciais que geram valor para e sua competência técnica orientam as atividades de
esse profissional. Isso permite empreender ações outros profissionais. Sua atividade pode ser qualifica-
que respondam ao que o médico espera de uma da como uma importante forma de influência e até
instituição de alto desempenho. O papel do médico mesmo de poder em todos os níveis da organização.
Assim, essa condição impõe maior complexidade à re-
no hospital é central, com autonomia e autoridade
lação médico-hospital.
profissional em todos os níveis organizacionais1. Os
médicos possuem poder e influência nas práticas de Diante desse cenário, os hospitais buscam progra-
mar novas práticas de forma que possam aumentar a
saúde, interferindo, portanto, na utilização dos recur-
eficiência e a padronização de processos, bem como
sos de saúde2.
atender às necessidades e expectativas de médicos,
Conforme Barbanti (2000)3, faz-se necessário o uso de pacientes, fontes pagadoras e demais colaboradores
ferramentas que promovam a maior integração entre da instituição na busca por melhores resultados as-
médicos e toda a estrutura hospitalar. Dessa maneira, sistenciais e financeiros. Os programas de acreditação
a oportunidade que se apresenta verte sobre a ques- hospitalar auxiliam o setor na melhoria contínua de
tão de ouvir o médico de maneira estruturada, para seus resultados, na medida em que estimulam a cria-
que se possa entender o que é diferencial competitivo ção de uma infraestrutura voltada para a segurança
no atendimento aos pacientes, a padronização siste-
para esse profissional quando ele avalia uma institui-
mática dos processos, o desenvolvimento do conhe-
ção hospitalar.
cimento explícito por meio da criação de protocolos
É uma relação de mutualidade a interação estabele- clínicos e o acompanhamento de indicadores5.
cida entre o médico e o hospital. Conhecer a opinião
Dessa forma, as políticas implantadas pela instituição
de um dos principais atores do mercado hospitalar hospitalar é que definem o papel do médico e o âmbito
impacta diretamente na tomada de decisão e refle- de sua atuação. Nessa perspectiva, o aprimoramento
te positivamente na sustentabilidade econômica do envolvimento médico nas atividades de desenvol-
da organização.. vimento da saúde deve ser reconhecido.
Ao se pensar que a gestão está pautada na organiza- estudo de caso e, assim, aplicou-se o questionário no
ção dos recursos de forma que objetivos específicos hospital em estudo.
sejam alcançados, faz-se necessário avaliar a influên-
Considerou-se como população-alvo os médicos que
cia dos fatores internos e externos nesta tarefa, que,
compõem o corpo clínico do hospital em referência,
quando realizada em um hospital, tem como cenário
com recorte composto apenas pelos médicos com as
um ambiente único e de alta complexidade. Em razão
especialidades responsáveis pela tomada de decisão
das múltiplas dimensões e necessidades e da diversi-
no momento da indicação pelo processo de interna-
dade de interesses, a gestão de um hospital impõe-se
ção de seus pacientes.
como um grande desafio, “[...] na medida em que deve
colocar todos esses segmentos em funcionamento de
Formas de interpretação e análise
forma simultânea, harmoniosa, eficiente e economi-
dos dados
camente viável”6.
As respostas "Extremamente Importante" sobre a lis-
A estrutura hospitalar integra atividades e processos
ta dos fatores importantes de um hospital para inter-
de informação e negócio, em que a gestão de vários
nação do paciente foram classificadas em quartis, a
saberes está direcionada para a atividade-fim do
saber: 0|---25% (D, sem importância), 25|---50% (C,
hospital, sendo esta pautada no cuidado ao pacien-
baixa importância), 50|---75% (B, média importância)
te. Para tanto, é necessário que esse direcionador
e 75|---|100% (A, alta importância).
seja compreendido por todos os profissionais; que
as necessidades sejam identificadas; que as pesso- A soma de respostas "Bem avaliado"/"Muito bem ava-
as entendam a abrangência e a importância de sua liado" dos médicos que responderam ao instrumento
atuação; que exista uma perfeita inter-relação entre da pesquisa foi classificada em quartis, como se segue:
todos os níveis hierárquicos do hospital; e que as re- 0|---25% (D, avaliação ruim), 25|---50% (C, avaliação
Tabela 1 – Fatores de importância em uma instituição hospitalar no momento da decisão sobre indicação de um hospital ao
paciente
EXTREMAMENTE QUARTIL DE
FATORES
IMPORTANTE IMPORTÂNCIA
Excelência no atendimento ao paciente 76% A
Qualidade dos serviços de apoio (serv. de alimentação, gestão de leitos, eng. clín.,
45% C
manutenção hosp., agendamento de cirurgia)
continua...
Tabela 1 – Continuação...
EXTREMAMENTE QUARTIL DE
FATORES
IMPORTANTE IMPORTÂNCIA
Suporte dos Sistemas de Tecnologia da Informação (prontuário eletrônico, sistema
34% C
de laudos, chamada de pacientes)
Localização 17% D
Fonte: Dados da pesquisa. Legenda: 0|---25% (D, sem importância), 25|---50% (C, baixa importância), 50|---75% (B, média importância) e 75|---|100% (A, alta
importância).
Foram identificados como alta importância (Tabela 1) Pode-se inferir, ao se avaliar a classificação conferida
os fatores “Excelência no atendimento ao paciente”, ao fator “Escolha do paciente” (sem importância),
“Sistema que garanta o exercício médico de forma éti- que a decisão sobre o hospital em que o paciente será
internado é baseada em uma decisão eminentemente
ca” e “Foco na segurança do paciente”. Este resulta-
do médico.
do indica que a relação médico-paciente é pautada no
atendimento com excelência e segurança, bem como Chama a atenção o fato de o item “Suporte dos
de decisão para as instituições hospitalares em bus- Auxiliares (laboratório de análises clínicas e patolo-
ca de melhor posicionamento junto ao corpo clínico: gia, banco de sangue, medicina nuclear)”, “Qualidade,
“Suporte e qualidade do Serviço de Emergência”; quantidade e capacitação da equipe multidisciplinar
“Índice de infecção hospitalar”; “Respeito aos di- (nutrição clínica, farmácia, psicologia, fisioterapia)” e
reitos do médico”; “Informação e respeito ao pa- “Qualidade, capacitação e quantidade de profissionais
ciente”; “Ética institucional”; “Infraestrutura da da assistência de enfermagem” – todos com avaliação
Unidade de Terapia Intensiva”; “Qualidade, capaci- ótima. Destaca-se, ainda, que os fatores “Qualidade,
tação e quantidade de profissionais da assistência quantidade e capacitação da equipe multidisciplinar
de enfermagem”; “Materiais e equipamentos de (nutrição clínica, farmácia, psicologia, fisioterapia)”
qualidade”; “Infraestrutura do Centro Cirúrgico”; e “Qualidade, capacitação e quantidade de profissio-
“Materiais e equipamentos em quantidade sufi-
nais da assistência de enfermagem” representam a
ciente”; “Qualidade do Serviço de Diagnóstico por
melhor avaliação estratificada entre clínicos e cirur-
Imagem”; “Humanização hospitalar”; “Qualidade,
giões e entre internos e externos.
quantidade e capacitação da equipe multidisciplinar
(nutrição clínica, farmácia, psicologia, fisioterapia)”;
“Resolutividade frente às situações inesperadas”;
“Infraestrutura geral da instituição”; “Infraestrutura
CONCLUSÃO
das Unidades de Internação” e “Suporte de Serviços O instrumento proposto mostrou-se eficaz na detec-
Auxiliares (laboratório de análises clínicas e patolo- ção de fatores importantes, segundo os médicos, para
gia, banco de sangue, medicina nuclear)”. a escolha de um hospital na internação de um paciente.
Adicionalmente, esses fatores de importância podem ser
Em relação aos itens ligados aos aspectos de infraes-
avaliados em casos específicos, como o hospital em es-
trutura (centro cirúrgico, materiais e equipamentos
e unidades de internação), observa-se a importância tudo, para o benefício da gestão hospitalar, o aumento
possuem para a prática médica. Nesse cenário, enten- No hospital em estudo, a pesquisa apresenta patama-
de-se que a busca da instituição por maior competiti- res claros e evidentes dos aspectos de relevância para o
vidade pode ser pautada em mudar esses fatores para médico. Pode-se afirmar que os fatores “Excelência no
um patamar mais elevado de diferenciação. atendimento ao paciente”, “Sistema que garanta o exer-
Para os médicos clínicos, em razão da característica cício médico de forma ética” e “Foco na segurança do
da assistência prestada e da constante inter-relação paciente” são os que mais interferem na tomada de de-
multidisciplinar, destaca-se o bom desempenho que cisão pelo médico no momento da indicação ao paciente
foi referenciado aos fatores “Suporte de Serviços de um hospital para internação.
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4
ORIGINAL
Inovação revisitada:
propostas para o setor
de saúde em tempos de
transformação digital e
rupturas em série
Vivemos um novo contexto histórico. Um contexto opcional. Um mundo onde as ações que nos trouxeram
que não segue mais metamorfoses lineares, é frágil até ele não são suficientes para nos levar até o futuro
e instável, exacerba ansiedades e é, muitas vezes, desejado. Um mundo radicalmente interdependente.
incompreensível. O conceito de mundo BANI (Brittle
Inovar é core nas estratégias bem-sucedidas das orga-
– Frágil, Anxious – Ansioso, Nonlinear – Não Linear
nizações modernas. Mas como incorporar a inovação
e Incomprehensible – Incompreensível) traduz esse
no dia a dia das pessoas e colher o melhor que ela pode
novo mundo que é tão difícil de assimilar1.
gerar para o crescimento sustentável em um mundo
O termo surgiu antes da pandemia de covid-19, catali- tão complexo como o descrito? A seguir, apresento a
sadora de enormes transformações. As estruturas for- todos uma aproximação proposta que traz clareza so-
mais do planeta foram derrubadas e tornaram incerto bre os fundamentos necessários a uma cultura de ino-
o que era consolidado. A experiência dessa pandemia vação em um mundo tão incerto. Importante reforçar
está nos exigindo exercícios frequentes de antecipa- que não se trata de uma fórmula pronta ou de um mé-
ção, com ações sempre um passo à frente da próxima todo infalível. Tem a ambição apenas de descrever os
ruptura. fundamentos que, se satisfatoriamente trabalhados,
Outro elemento característico deste fragmento da favorecem o surgimento de um ambiente de inovação
história é o excesso de informações. Hoje, existem da- em contextos de incerteza.
dos e argumentos para tudo, manipuláveis para satis-
fazer qualquer interesse. E surge uma nova barbárie,
geradora de caos e mais incerteza: a chamada igno- FUNDAMENTO 1 – O VALOR
rância hiperinformada. Obnubila, confunde e aumen- É O PROPÓSITO
ta o risco das decisões. Essa incerteza sobre o futuro
O valor está muito bem estabelecido em diferentes
próximo (o próximo minuto) força-nos a conviver com
setores da economia, mas, em saúde, tem diferentes
ampliações das margens de erro em cada ação e eleva
conotações, o que dificulta sua compreensão e utili-
ao extremo os níveis de ansiedade.
zação2. Mas pode ser definido como a diferença entre
Com mudanças constantes e dias incertos, torna-se os benefícios auferidos pelos clientes que compram os
fundamental adaptar-se com rapidez e substituir os produtos e serviços e os custos econômicos para a em-
planejamentos duros por modelagens flexíveis. Não presa que os fabrica e entrega3. De maneira simplifica-
temos mais controle, e as certezas viraram sinônimo da, considera a produção obtida em relação ao custo
de obsolescência. Mas já está claro que conviver com a consumido. É essencial ser acompanhado, embora no
incerteza exige um nível de preparação e investimen- mundo real seja pouquíssimo usado4.
tos em educação e planejamento que nossa sociedade
Sob a perspectiva histórica, vale citar Michael Porter.
não tem.
Ele definiu que o valor é o conjunto alcançado de re-
Para que essa adaptabilidade seja incorporada pelas sultados de saúde do paciente por unidade gasta de
organizações, é importante mapear os direcionado- dinheiro4. Deveria ser o grande objetivo dos sistemas
res de futuros alternativos e analisar seus impactos no de saúde ao redor do mundo, pois é o que une interes-
negócio e na sociedade, em tempo real, à medida que
ses de todos os atores, sem prejuízo para alguém. Isso
são desvendados.
significa dizer que a sustentabilidade econômica do
Enfim, que mundo é esse? Um mundo que não mais setor pode ser obtida simultaneamente às conquistas
aceita que a inovação seja tratada como um saber para todos, sem exceção, nos diferentes aspectos em
que podemos aferi-las, como qualidade, segurança, na comparação deles para promover melhor qualida-
equidade, acesso e eficiência, entre outros. de assistencial, entre muitas outras.
Lutar por avanços na entrega de valor a todos é fun- Trabalhar com foco na entrega de valor representa,
damental para retirarmos o setor da competição de em linhas gerais, articular a inovação com foco na
soma zero, em que os atores lutam por benefícios busca por um cuidado pertinente, que gere resultados
próprios, estimulando o mesmo comportamento dos ótimos para os pacientes em termos de desfechos clí-
demais. E, obviamente, para entregarmos mais saú- nicos, que seja eficiente e que promova experiências
de, como consequência do progresso sustentável. É engajadoras durante a jornada de cada um e de todos.
o valor para o paciente que é o objetivo central, não Vamos falar brevemente sobre esses pilares da entre-
o valor para outros atores . Desta forma, entregar so-
4
ga de valor.
luções em saúde com alto valor para o paciente deve
se tornar o objetivo e a definição de sucesso para cada a) A pertinência
um, reduzindo o fardo hoje causado aos cidadãos e
A pertinência significa “fazer o que é adequado, para
aos governos.
cada paciente, no momento devido”. Ela é entendida
Porém, é necessário exercitar o pensamento sistêmi- como determinante na geração de valor, apesar de ser
co para compreender como gerar o valor e implantar inquestionável a importância da medida dos desfe-
ações que o traduzam. A estratégia de todo o sistema chos e dos custos. Quando uma intervenção em saúde
deve ser reorganizar o cuidado em torno de condições é inadequada, em qualquer contexto, entende-se que
clínicas (ou agrupamentos de condições clínicas), em não é pertinente. Eventos impertinentes anulam a ge-
unidades de prática que promovam a integração de ração de valor.
todos os profissionais, serviços, processos e produtos,
Isso significa dizer que um procedimento realizado
cobrindo a maior fração possível do ciclo do cuidado,
pelo melhor cirurgião, no melhor hospital, com o me-
segundo Porter. Também em sua perspectiva, devem-
lhor desfecho clínico de curto, médio e longo prazos,
-se medir resultados e custos durante a linha do cuida-
mas que de fato não era a melhor opção clínica para
do de cada paciente, mover os modelos remunerató-
o contexto de um paciente torna-se impertinente e
rios baseados em volume de eventos para pagamentos
não entrega valor a todos. Pode até entregar valor a
em bundles, integrar e coordenar o cuidado através
alguns, mas nunca sob a perspectiva completa do que
de múltiplos pontos assistenciais, expandir os serviços
é o valor e nunca para todos.
geograficamente com foco na excelência e desenvol-
ver uma plataforma digital que integre as informações
em torno da visão de indivíduo.
b) O desfecho
Sem a obtenção e análise contínua de resultados clí-
Essa modelagem proposta, entretanto, tem se mos-
nicos, perde-se enormemente o valor de se acompa-
trado bastante desafiadora em seus exercícios de
nhar outras dimensões da qualidade, já que o foco da
implantação prática. Por exemplo, as unidades assis-
entrega de valor deve ser prioritariamente o paciente.
tenciais rotineiramente encontram dificuldades para
Desta forma, alguns princípios devem ser seguidos
a integração de informações, falhas na gestão das
para a gestão do desfecho.
jornadas (como dificuldade em enxergar ciclos mais
amplos do cuidado), predominância dos modelos de Os resultados devem ser medidos sempre com base
remuneração baseados em volumes, indicadores de em condições clínicas, e não por especialidades,
resultados ainda com gestão incipiente e resistência procedimentos ou intervenções/eventos. Isso evita a
fragmentação atual e nos transporta para a visão de com base no objetivo de conter custos não necessa-
indivíduos, em contraposição à tradicional visão de riamente gera valor; ao contrário, pode prejudicar sua
eventos. Ao implantarmos a visão com foco nas pes- entrega e ser devastador para os esforços de reforma
soas, estamos construindo também melhores funda- dos serviços de saúde em todo o mundo.
mentos para a migração de modelos de remuneração,
Usando outros termos, a redução de custos, sem re-
saindo da remuneração por eventos e migrando para lação com os resultados alcançados, é perigosa e
remunerações por pacotes em torno de condições autodestrutiva. Gera resultados de falsa economia e
clínicas. Lembremos que o acompanhamento de re- potencialmente limita os cuidados efetivos. Limitar
sultados deve incluir fatores de risco às condições clí- os tratamentos pode impedir a escolha de interven-
nicas, ampliando a visão da abordagem assistencial ções verdadeiramente eficazes, embora mais caras.
para inteligências preditivas e ações preventivas. Portanto, é importante gerenciar os custos, mas polí-
Seguindo o mesmo raciocínio, os resultados devem ticas de contenção de custos não geram valor a todos
cobrir o ciclo completo do cuidado, por mais desafia- e são muito diferentes dos investimentos em ganhos
dor que isso possa ser, saindo da percepção transacio- de eficiência4.
nal. Portanto, não basta avaliar o resultado imediato Gerar eficiência está diretamente relacionada à ha-
de uma cirurgia, sendo também fundamental avaliar o bilidade de obter resultados com consumo mínimo
tempo até o retorno às atividades plenas de trabalho, possível de recursos e esforços. Está conectada à
as complicações evitáveis no médio/longo prazo e os avaliação contínua de benefícios e custos, ou seja, os
impactos na qualidade de vida do paciente submetido investimentos mobilizados devem produzir os efeitos
a ela. Isso significa dizer que os resultados devem ser desejados. A otimização da eficiência deve ser estraté-
acompanhados na linha do cuidado de cada paciente gia de uso permanente na gestão de serviços de saúde.
– com atenção à multidimensionalidade dos resulta-
dos, focando-se em monitorar o que impacta pacien- d) A experiência
tes e familiares, e não exclusivamente o que impacta
Sob o ponto de vista assistencial, a experiência deve
os prestadores da assistência.
ser construída com base na organização dos proces-
A padronização de resultados que devem ser monito- sos nos serviços. Esse é o fundamento que deve ser
rados é também muito importante, sempre respeitan- trabalhado nas unidades de prática. Uma importante
do a visão em torno de condições clínicas e otimizando tarefa é organizar cada unidade assistencial em torno
comparações, aprendizados e avanços. Diversas orga- de condições clínicas, promovendo a integração de
nizações, como o International Consortium for Health times multiprofissionais e atribuindo a responsabili-
Outcomes Measurement (ICHOM) se especializaram dade sobre o maior ciclo temporal possível da jornada
em construir essas recomendações de maneira estru- de cada paciente.
turada, contribuindo para a comparabilidade necessá-
Os serviços devem ser distribuídos nas unidades de
ria na busca da excelência.
serviço respeitando a lógica do ciclo do cuidado. Por
exemplo, hierarquizar a oferta de serviços capazes de
c) A eficiência
atender às diferentes complexidades das condições
O valor é centralmente baseado nos resultados obti- clínicas, compreender os riscos dos pacientes na hora
dos com uma intervenção em relação aos custos gera- de avaliar quais serviços implantar em cada unidade,
dos para entregá-la. Porém, limitar as ações em saúde conectar essas decisões de portfólio de serviços com
a discussão sobre conveniência aos usuários e seus fa- individual para o reconhecimento do saber coletivo,
miliares, entre outros temas. Nesse contexto, conec- em dinâmicas de cocriação.
tar a telessaúde com os serviços em unidades físicas
Isso está acontecendo porque criar sozinho significa,
é fundamental para a expansão da rede constituída,
sempre, criar sob a perspectiva enviesada do conhe-
integrando diferentes saberes e ampliando a atuação
cimento pessoal. Significa transferir para a criação
dos times assistenciais, para benefício do paciente.
as perspectivas vividas pelo criador, sob sua lógica de
Outros serviços assistenciais mais tradicionais, como
entendimento construída ao longo da vida. A conse-
assistência domiciliar, devem seguir a mesma lógica
quência é que os serviços e produtos gerados nesse
de integração proposta. contexto são potencialmente limitados. Além disso,
Porém, a experiência deve ir além da abordagem do que criar sozinho exclui, muitas vezes, o momento em que
ocorre no momento da prática assistencial no mundo se escuta o outro para entender a demanda real que
físico, abrangendo a geração de novas camadas de in- está em jogo – não a demanda que alguém pode pres-
teligência analítica, comunicação e engajamento por supor existir. Centrar a escuta no outro permite refor-
via digital. Analisar informações que possam predizer çar o arsenal de compreensão, de maneira muito mais
riscos e conectar as pessoas com o melhor cuidado eficiente do que centrar a escuta em si mesmo.
preventivo imediatamente gera uma nova experiência Em suma, é preciso entender estes dois pontos rela-
em saúde, muito mais completa, além de potencial- cionados à importância do outro para que a inovação
mente promover mais entrega de saúde aos pacientes, floresça: (i) a demanda real (a alheia) precisa ser ou-
em termos clínicos. A experiência, como conjunto de vida e respeitada centralmente para que possamos
percepções das pessoas em torno dos eventos e das construir o que expressa o melhor encaminhamento
jornadas de saúde, tem o enorme potencial de migrar possível para sua solução e (ii) a criação coletiva e
o debate para a geração de valor ao longo da vida das colaborativa permite-nos agregar valores da miríade
pessoas (Life Time Value – LTV), não mais se limitando social a nossos desenvolvimentos, o que nos aproxima
à visão transacional. do consumidor e favorece o sucesso das criações.
com os outros, pois juntos conseguimos oferecer vi- diferente da majoritária remuneração por volume de
sões mais exatas do todo). serviços oferecidos no contexto contemporâneo.
É importantíssimo ser protagonista, não devemos Perceber o outro significa abrir o potencial de colabo-
abandonar essa postura. Mas permitir o protagonismo rar com o outro e cocriar. Anita Woolley e Thomas W.
de todos é alavancador do potencial criativo e, conse- Malone estudam a inteligência coletiva, que é gera-
quentemente, da inovação. Dessa forma, entendemos da pela colaboração, e propõem o trabalho em cima
que, a cada ausente nos processos operacionais e es- de vetores que a amplifiquem. A proposta vai além da
tratégicos, estamos criando um universo de presentes óbvia seleção de pessoas mais inteligentes, prepara-
incompletos. das e com mais vivências enriquecedoras, apontando
Obviamente, esse conceito não é uma ode à lentidão também para a seleção de pessoas com maior percep-
ou à burocratização do trabalho. Significa engajar to- ção das emoções alheias, a redução do envolvimento
dos que contribuem para o debate em torno dos temas de pessoas que monopolizem conversas e a inclusão
expostos, e não engajar qualquer um por perto. Esse de mais mulheres. Nesse último aspecto, há sólidas
conceito certamente consome um tempo inicial um evidências de que times com mais mulheres possuem
pouco maior para executar colaborativamente, para maior inteligência coletiva5.
na sequência gastar pouco ou nenhum tempo com o
As equipes precisam trabalhar de forma interdepen-
resgate de lideranças que se sentiram desprestigiadas
dente, com todos colaborando pelo mesmo propósi-
e, durante o processo, desengajaram-se completa-
to, tendo em mente que não há mais estruturas está-
mente. As resistências se dissipam e, ao considerarmos
veis e que a própria composição do time muda com o
o ciclo completo da inovação até seu momento de im-
tempo, como afirma Amy Edmondson. Segundo ela, o
plantação e monitoramento, observamos velocidade
esforço colaborativo entre pessoas de diferentes áre-
maior do que nas vias tradicionais. As metodologias
as aumenta o nível de compromisso e o torna mais
ágeis ajudam a derrubar as barreiras naturais da hie-
fluido, com menos atritos. No entanto, para promover
rarquia e estimulam essa colaboração por habilidades
a colaboração e o compartilhamento da diversidade
complementares. Por fim, há suporte muito maior en-
de ideias entre os profissionais, é preciso que o líder
tre os pares e melhor qualidade do objeto criado, pois
possibilite a criação de um ambiente em que todos sai-
é muito mais apto a responder às demandas de uma
bam que não serão punidos ou humilhados por expor
sociedade diversa e cujas visões precisam ser incluídas
suas ideias, suas perguntas ou até mesmo seus erros.
na origem dos esforços de inovação.
É fundamental promover a segurança psicológica, ha-
A construção do valor deve levar em conta, portanto, bilitando a expressão franca e contributiva, gerando
a perspectiva de quem demanda os processos, servi- confiança e colaboração entre os pares e a liderança6.
ços e produtos do setor. E não deveria, sob justificativa
alguma, ser construída sob a perspectiva de quem é
responsável por sua entrega. Isso significa dizer que o
FUNDAMENTO 3 – A
valor está nos resultados proporcionados a alguém, e
não nas ações executadas em si. Por exemplo, o valor
DIVERSIDADE
está no resultado real de entrega de saúde para um Segundo pesquisa da McKinsey, companhias mais
paciente, não no volume de serviços oferecidos a ele. inclusivas são capazes não apenas de transformar o
Portanto, a remuneração prevista deveria também le- mercado, mas também de promover um ambiente
var em conta o valor em saúde produzido ao paciente, mais rico e convidativo7.
A diversidade traz diferentes experiências, conhe- em comparação com apenas 31% nas que não são
cimentos e percepções, extremamente relevantes comprometidas com a diversidade. Outra descober-
para o desenvolvimento de produtos e serviços que ta interessante é que os funcionários de empresas
traduzam os saberes coletivos. Muitos estudos já de- comprometidas com a diversidade têm probabilida-
monstraram os benefícios dela para os resultados de 36% maior de relatar que desejam permanecer
dos negócios. Em estudo de 2021, com 693 empresas
três anos ou mais na mesma empresa, o que indica
e com mais de 3.900 funcionários entrevistados no
haver maior poder de retenção em relação às empre-
Brasil, na Argentina, no Chile, na Colômbia, no Peru e
sas sem investimento em diversidade7.
no Panamá, observou-se que empresas com políticas
de diversidade e inclusão em termos de gênero têm Além de tudo isso, o poder de atrair novos colabo-
probabilidade 93% maior de apresentar performan- radores mais talentosos, de estabelecer interações
ce financeira superior à de seus pares da indústria. mais saudáveis com seus atuais e futuros clientes,
Quando se considera etnia, as empresas com maior de aumentar o poder de engajamento em suas cone-
diversidade têm 24% maior probabilidade de apre- xões e, por fim, de conquistar mais confiança dos in-
sentar performance financeira superior, enquanto vestidores depende diretamente da capacidade das
em empresas com maior diversidade em termos de empresas de atuarem em valores contemporâneos,
orientação sexual, a probabilidade de apresentar re- como a inclusão.
sultados melhores é 15% superior7.
Mas como atingir esse estado satisfatório? Muitas
Como isso ocorre? O mesmo estudo investigou as en-
ações são determinantes da obtenção da vantagem
grenagens do melhor desempenho financeiro a par-
competitiva de ter times mais diversos e culturas
tir de ações pragmáticas de expansão da diversidade
mais inclusivas, por exemplo7,8:
social e da inclusão de todas as vozes na criação e na
execução. Funcionários de empresas comprometidas • Garantir a representação de talentos diversificados,
com a diversidade têm probabilidade 152% maior de assegurando que os sub-representados tenham
propor novas ideias e 62% maior de ser incentivados acesso às oportunidades que os demais já tiveram.
a colaborar com outras equipes, e são 64% mais pro-
• Comprometer-se abertamente com a diversidade, por
pensos a compartilhar ideias e melhores práticas7.
meio de objetivos específicos de responsabilidade que
E os benefícios não cessam nos já descritos. As em- sejam transparentes e conhecidos por todos, desde o
presas comprometidas com a diversidade têm maior
momento da contratação de novos colaboradores.
probabilidade de ter melhores práticas de inovação.
Isso significa também ter tolerância zero com com-
Os funcionários são 72% mais propensos a relatar que
portamentos discriminatórios e assédio. Da mesma
a organização aprimora consistentemente sua forma
forma, educar todos sobre o impacto negativo das mi-
de fazer as coisas, 77% mais propensos a concordar
croagressões e sobre como lidar com essas situações.
que a organização aplica ideias externas para melho-
rar sua performance e 76% mais propensos a dizer • Ter metas claras para cada parâmetro, designan-
que a organização utiliza o feedback dos clientes . 7
do um patrocinador executivo para cada grupo de
No que se refere à felicidade dos funcionários e à saú- afinidade, alocando fundos, atribuindo responsa-
de organizacional, as evidências também são contun- bilidades na execução da estratégia da empresa e
dentes: 63% dos funcionários de empresas diversas divulgando publicamente o progresso no cumpri-
e inclusivas indicam que estão felizes no trabalho, mento das metas.
• Promover treinamento e educação sobre diversi- no desenho do que desejamos e precisamos ter. A
dade para todos os colaboradores, principalmente visão fragmentada e superespecializada, em contra-
para as lideranças, para que possam capacitar os ponto à visão sistêmica, cada vez mais tem nos afas-
trabalhadores e promover um ambiente aberto ao tado de construções completas e que transformem a
diálogo e atento às questões de diversidade e inclu- sociedade em escala.
são, ao qual todos se sintam pertencentes. Deve-se Charles Bezerra, autor brasileiro, descreveu em sua
fortalecer o conceito de liderança inclusiva, adotan- Teoria da Inovação Holográfica a diferença de criar
do essa competência como essencial, exemplifica- com base na totalidade versus criar com base nos
da pelos líderes, mensurada nas avaliações e apoia- fragmentos9. Ele compara a inovação contemporânea
da por iniciativas de capacitação. a um filme fotográfico: se cortarmos o filme fotográfi-
• Rever as políticas de recursos humanos: é impor- co em múltiplos pequenos pedaços, em cada um deles
tante assegurar que contratações, promoções, observaremos um fragmento do todo; já ao cortarmos
remunerações e benefícios sejam iguais. Investir um filme holográfico em pedaços, observaremos que
também em estratégias de retenção e promoção. cada pedaço contém a imagem do filme completo, ou
Garantir que todos se beneficiem de sponsorship, seja, o todo está contido nos fragmentos. A inovação
em qualquer setor deve ser sempre holográfica, pois
assegurando que tenham acesso aos recursos de
significa que a totalidade (a visão sistêmica) está con-
que precisam para ser bem-sucedidos.
tida em cada ação executada, em contraponto ao mo-
delo de inovação predominante no mundo contem-
porâneo, em que os fragmentos juntos não traduzem
FUNDAMENTO 4 – A VISÃO
necessariamente o todo desejado, pois estão isolados
DO TODO (SISTÊMICA) e desconectados de um plano maior.
Compreender o todo envolvido em cada decisão es-
Para criarmos com visão sistêmica, ou visão holográfi-
tratégica é essencial para que se construa um futuro
ca, precisamos contar com o engajamento de todas as
desejável e se cresça exponencialmente. Em primei-
visões possíveis. Então, fica cada vez mais claro compre-
ro lugar, enxergar que precisamos abandonar a frag- ender o porquê de as empresas que investem na diversi-
mentação institucionalizada e endereçar uma agenda dade e são inclusivas na gestão de seus times possuírem
em que as pessoas estejam no centro das operações. resultados melhores sob diferentes aspectos: estão mais
Passar a enxergar a jornada das pessoas em suas linhas aptas a se adaptarem em um mundo com tantas incer-
de cuidado, ao longo da vida. Tudo conectado a elas, tezas, pois conseguem enxergar a totalidade do todo e
gerando experiências únicas e que as tornem leais a aplicá-la nas partes que criam. Essa totalidade também
seus cuidadores, produtos, marcas e jornadas. se aplica ao contexto temporal: é preciso haver orienta-
Para isso, precisamos enxergar o todo e expressá-lo ção de longo prazo, para que se possa calibrar dinamica-
nas partes que devem ser executadas. Isso é comple- mente a busca pela maximização de resultados no curto
tamente diferente do cenário atual, no qual criamos prazo com a construção do futuro desejável.
as partes na expectativa de que, juntas, entreguem um Além disso, a visão do todo exige cultivar postura de
futuro melhorado. Esse futuro melhor é apenas uma curiosidade e foco constante no aprendizado. Coletivos
das versões previsíveis e pouco ambiciosas que a visão com essas características, estimulados por lideranças
sistêmica pode extinguir. Quanto mais ampla for a vi- que incentivam ações exploratórias e que são mais to-
são do que é a saúde, de fato, mais ambiciosos somos lerantes ao erro, conseguem maior envolvimento nas
ações criativas e maior sucesso em seu desenvolvimen- – visão do todo) abre as portas de um universo de pos-
to. Nesse contexto, vale ressaltar a importância de acei- sibilidades que gerará impactos positivos em você e
tar as falhas e não matar a coragem de transgredir. na sociedade. E nos habilita a um novo coletivo social,
Uma perspectiva da visão sistêmica que vem ganhando mais preparado e adaptável para as seriadas rupturas
muito espaço entre as lideranças de vanguarda e as orga- que estão à nossa espera. Aliás, já começaram a acon-
nizações onde atuam são os critérios ESG de construção tecer: a pandemia de covid-19 as acelerou.
dos modelos de negócios. Em inglês, a sigla ESG se refe- O presente conteúdo não teve como objetivo reforçar a
re a aspectos ambientais, sociais e de governança que ilusão da performance absoluta, a partir da qual orga-
devem reger os negócios para garantir sua sustentabili- nizações e pessoas acreditam que o sucesso pode de-
dade. Se no passado uma empresa deveria estar focada
pender exclusivamente das próprias ações. Sabemos
em seu crescimento e sua lucratividade, hoje seu papel
que isso não existe; o sucesso depende também dos
na sociedade é muito mais amplo. Empresas que procu-
movimentos de competidores e outros atores. Porém,
ram agregar a visão sistêmica no desenho de seu futu-
só o planejamento da estratégia pode trazer respostas
ro desejado conseguem compreender mais facilmente
que nortearão os próximos passos, sempre partindo da
a relevância da sustentabilidade e do impacto positivo
visão de um futuro ambicionado. Sem essa etapa, ino-
que podem gerar na sociedade. Além disso, já existe um
vações se tornam paliativas e incrementais. Da mesma
enorme acúmulo de evidências técnico-científicas cons-
forma, quando não se instala uma cultura de inovação,
tatando que empresas que prestam atenção às questões
as ações inovadoras se tornam apenas eventos.
ambientais e sociais e possuem preocupações de gover-
nança não prejudicam a criação de valor; ao contrário, A transformação digital é um conjunto de rupturas que
uma sólida proposta de ESG se correlaciona fortemente está transformando a forma como lideramos e como
com maior retorno de suas ações, em circunstâncias tan- vivemos, com impactos diretos e peculiares em cada
to de queda como de elevação10. O melhor desempenho setor da economia. A saúde, com sua baixa experiência
de empresas com práticas de ESG também se traduz em em rupturas recentes e seu altíssimo nível de expo-
redução da percepção do risco, em cobrança de juros sição a rupturas no futuro imediato, encontra-se em
mais baixos quando recorrem a empréstimos e em clas- estado de extrema vulnerabilidade13,14. Isso exige ur-
sificações de crédito mais altas .
11,12
gência em ações por parte de todos. Para os líderes,
talvez o ponto essencial seja desapegar-se do poder
e da hierarquia e entender que não estão sós, pois o
COMENTÁRIOS FINAIS mundo pede mais colaboração e compartilhamento
A presença dos quatro fundamentos da inovação pro- de responsabilidades, habilitando o coletivo e, enfim,
postos neste artigo (valor – colaboração – diversidade gerando os valores que desejamos.
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pdf?shouldIndex=false 2016 Nov.
5
ORIGINAL
UnitedHealth Groupa (UHG), em 2012, a partir da aqui- trução de estratégias que possibilitem competir e
sição do Grupo Amil; e aquisição do Grupo Notredame garantir sustentabilidade nesse contexto de grandes
com a promulgação da Lei n. 13.097/2015, o Brasil Segundo o position paper "Indicadores Rede
passou a permitir participação de empresas de capital Hospitalar do Brasil (2019/2020)", publicado
estrangeiro em hospitais, clínicas e laboratórios. pela Confederação das Santas Casas e Hospitais
Em 2018, com o investimento do HIG Capitalc na Rede Filantrópicos do Brasil (CMB), o país possui 1.819
Meridional, nasceu a Kora Saúde. No mesmo período, unidades filantrópicas de saúde, com um total de
houve a abertura de capital da Hapvida, uma rede re- 168.689 leitos, sendo 26.434 de Unidade de Terapia
gional (Norte e Nordeste) que começa a despontar Intensiva (UTI), e em 2020 foi responsável por aten-
como uma das maiores do Brasil – posicionamento der 41,33% dos procedimentos de internação no
este marcado pela fusão com o Grupo Notredame SUS, sendo que realizou 64,82% das internações de
rede de saúde suplementar do Brasil. Ainda em 2021, Apesar da representatividade em termos de número de
a Rede Mater Dei, de Minas Gerais, abriu o capital e unidades, quantidade de leitos e volume de atendimen-
iniciou seu processo de crescimento, formando mais to, o setor filantrópico está muito atrás dos hospitais
uma grande rede brasileira. Para efeito desta pesquisa, privados quando o tema é gestão. Nos aspectos assis-
ainda é possível citar a Athena Saúde, que igualmente tenciais, os hospitais filantrópicos em geral localizam-
vem crescendo por meio de processos de aquisições. -se no mesmo nível de muitas unidades privadas. No
a
Multinacional diversificada de cuidados de saúde e bem-estar, baseada nos Estados Unidos. Figura como oitava maior empresa do mundo em receita
segundo a lista Fortune 500 de 2021.
b
Empresa americana de investimentos privados, especializada em private equity, venture capital, crédito, patrimônio público, investimentos de impacto,
ciências da vida e imóveis. Private equity é um tipo de investimento, feito de forma privada, em que o investidor aporta seu capital diretamente em empresas
com potencial de crescimento nos médio e longo prazos, com o intuito de lucrar com uma futura venda.
c
Empresa de investimentos de capital privado e ativos alternativos com sede em Miami, Flórida, com mais de US$ 50 bilhões em capital próprio sob gestão.
entanto, quando se trata governança e gestão, são evi- afirma que “as ações e serviços públicos de saúde
dentes inúmeros gaps e oportunidades de melhoria, os integram uma rede regionalizada e hierarquizada e
quais refletem a baixa maturidade de suas operações. constituem um sistema único”, que deverá ser finan-
Para efeito deste artigo, será utilizado o conceito de ciado “com recursos do orçamento da seguridade so-
maturidade de gestão descrito por Gordilho (2018)2, cial, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
que versa que maturidade de gestão é ter pessoas Municípios, além de outras fontes” (art. 198, § único).
qualificadas e capacitadas para utilização de tecno- O artigo 199 afirma que “a assistência à saúde é livre
logia, com bons e sólidos processos para execução da à iniciativa privada” e, em seu parágrafo único, com-
estratégia definida, bem como um sistema de gover- pleta que “as instituições privadas poderão participar
nança coeso que possibilite melhor gestão e controle de forma complementar do sistema único de saúde,
da organização. A metodologia utilizada nesta pes- segundo diretrizes deste”.
quisa qualitativa avaliou critérios nas cinco áreas de A partir dessas definições, criou-se no Brasil a estru-
maturidade de gestão: (i) Estratégia Empresarial; (ii) tura de financiamento da saúde que temos até os dias
Governança Corporativa; (iii) Gestão de Pessoas; (iv) atuais, com os hospitais categorizados em três tipos
Gestão de Processos; e (v) Tecnologias de Gestão. com base nas fontes de financiamento: públicos, pri-
O desenvolvimento da maturidade de gestão tornou- vados e filantrópicos. Pode-se afirmar que esse é o iní-
-se fundamental para aumentar a competitividade e cio do processo de “empresarialização” da atividade
garantir a sustentabilidade das instituições de saúde, hospitalar, que passa a precisar ser gerida nos moldes
considerando o rápido processo de transformação do de qualquer outra atividade econômica presente na
setor. Apesar do ambiente conservador dos hospitais, sociedade.
os temas de gestão têm avançado de forma sistemáti-
Ainda hoje, muitos hospitais são geridos por médicos
ca nas referidas organizações.
com um olhar voltado prioritariamente para a assis-
As seções seguintes deste texto apresentam uma tência, e palavras como "otimização", "competição" e
contextualização da evolução do processo gestão "profissionalização" dos processos de gestão são me-
nos hospitais e o resultado de uma pesquisa para ava- ros acenos retóricos, longe de aplicações práticas que
liação do nível de maturidade de gestão, realizada a transformem as organizações em verdadeiras empre-
partir de dados levantados durante as consultorias re- sas de saúde.
alizadas pela empresa GesSaúde , entre 2018 e 2022,
d
Até pouco tempo atrás, situações como rígida estru-
junto a 26 hospitais – 14 filantrópicos e 12 privados
tura hierárquica vertical, áreas internas que não con-
– em diversos estados do Brasil.
versam entre si, existência de feudos, eficiência opera-
cional e produtividade baixas, desperdício em diversas
etapas da cadeia operacional, alto índice de endivida-
A GESTÃO NO MERCADO mento, pouco poder de negociação com operadoras,
DE SAÚDE baixos índices de profissionalização dos processos de
A Constituição Federal de 1988 (CF/88) define que “a gestão e de informatização eram consideradas “nor-
saúde é direito de todos e dever do Estado” (art. 196). mais” pelo setor, ou seja, um padrão dominante em
Mais adiante, no artigo 198, o texto constitucional áreas e níveis de gestão do sistema hospitalar.
d
Empresa de consultoria especializada no fomento da maturidade da gestão em instituições de saúde do Brasil.
Em um cenário de formação de grandes redes com serem empregados e nos resultados desejados, sua
competição nacional, aumento dos ganhos de escala, estrutura funcional de características fortemente hie-
visão de gestão focada em resultados e farto acesso a rarquizadas e verticalizadas vem se mostrando cada
capital, a sobrevivência do setor filantrópico situa-se à vez mais insatisfatória4.
prova. Hospitais são organizações tradicionais, presen-
A principal deficiência refere-se à expectativa de coo-
tes na sociedade ocidental desde a Idade Média, reco-
peração entre os diversos segmentos do hospital, com
nhecidas pelo caráter conservador de sua gestão e que
vistas a atingir os objetivos que determinam a susten-
possuem grande dificuldade de implementar proces-
tabilidade da instituição e sua própria razão de existir,
sos de mudança. Essas características são atribuídas à
ou seja, o melhor atendimento ao doente que procura
própria natureza da atividade e às complexas relações
a unidade, com custos adequados que possibilitem
entre o corpo administrativo (gestão) e o assistencial.
cumprir os compromissos financeiros e garantir a sus-
Mesmo com esse perfil, em função das transforma- tentabilidade financeira da instituição.
ções do setor, as organizações do setor de saúde estão
Diante do modelo implementado, principalmente
sendo forçadas a evoluir em seus modelos e processos
nos hospitais privados e filantrópicos, que vivem da
de gestão, principalmente nas áreas administrativa e
prestação de serviços para os planos privados e para
operacional – instâncias que, durante muito tempo,
o SUS, a viabilização da sustentabilidade financeira
foram relegadas a segundo plano devido ao foco qua-
da operação é um tema que ganha notoriedade e in-
se exclusivo nos aspectos técnicos, assistenciais.
teresse da administração dessas instituições a cada
Estudos na área de Administração apontam que as ano que passa.
mudanças nos hospitais têm se realizado em termos
Nesse sentido, compreende-se que, para atingir seus
de implementação de programas de qualidade, incor-
objetivos, o hospital precisa alocar e estruturar de
poração de tecnologias médicas avançadas, profissio-
maneira racional todos os processos, bem como os
nalização dos recursos humanos, modernização das
setores, de forma a garantir que trabalhem em har-
práticas de gestão, evolução nos processos de gover-
monia, com foco em alcançar a fluidez na trajetória do
nança, definição e acompanhamento das estratégias
paciente em sua jornada de atendimento e no percur-
e maior formalização nos processos operacionais.
so do recurso financeiro. Isso propiciará que o atendi-
A formação do setor filantrópico tem como origem a mento realizado se transforme em uma conta e possa
tradição portuguesa da Santa Casa de Misericórdia, ser cobrado da fonte pagadora, seja ela convênio, seja
que representou, durante os quatro primeiros séculos particular, seja o SUS.
de nossa história após o início da colonização, o único
Para garantir a eficiência da jornada do paciente e do
modelo de hospital que se dispunha a receber os do-
recurso financeiro necessário ao melhor atendimen-
entes, qualquer que fosse sua condição4. Esse mode-
to, o hospital deve buscar evolução da maturidade de
lo, baseado em rígida estrutura vertical, em que cada
seus processos operacionais e de gestão.
unidade, serviço ou departamento tem um conjunto
de deveres e responsabilidades estanque e definido,
funcionou relativamente bem enquanto as rotinas
hospitalares caracterizavam-se por desempenho es-
MATURIDADE DE GESTÃO
tável, em ambientes pouco modificáveis. Contudo, no
NA SAÚDE
atual cenário de contínuas mudanças na demanda do Todas as organizações, em qualquer lugar do mundo,
mercado e da clientela, nos processos disponíveis a estão em busca de modelos que permitam melhor
integração de seus diversos setores e, por consequên- pode ser definida como aquela que “em todo seu
cia, de seus funcionários, por estarem convencidas de pensamento enfatiza processos em oposição a hierar-
que essa é a melhor forma de garantir melhor desem- quias, com especial ênfase nos resultados e na satis-
penho e melhores resultados . 4
fação dos clientes” (p. 21).
de negócios ainda é uma novidade no setor de saúde. texto, está presente na obra “Maturidade de Gestão
Grande parte dos hospitais ainda está na fase de en- Hospitalar e Transformação Digital, os caminhos para
tendimento e aplicação conceitual do gerenciamento o futuro da Saúde”, de Gordilho2, que apresenta o ce-
de setores, o que tem atrasado seu processo de evo- nário de transformação em que o setor de saúde se
lução em termos de maturidade de gestão, impedin- encontrava em 2018.
do-os de alcançar maiores resultados e de aumentar Nesse aspecto, conforme modelo da figura 1, a matu-
sustentabilidade do setor, principalmente, mas não ridade de gestão é construída a partir da evolução har-
exclusivamente, do filantrópico. mônica de cinco dimensões: estratégia empresarial,
De acordo com McCormack, Johnson e Walker (2003)8, governança corporativa, gestão de processos, gestão
uma empresa orientada para processos de negócio de pessoas e tecnologias de gestão.
N Ç A C O R P O R AT
E RNA I VA
G OV
PESSOAS
PROCESSOS TECNOLOGIAS
ES
TR AL
AT
É A RI
GIA
/ PLANO EMP RES
Para avaliar a maturidade de gestão dos hospitais, foi utilizado em projetos executivos de consultoria na
desenvolvido um modelo de cinco níveis (listados e referida área.
descritos nos próximos tópicos, que, de forma matri- O objetivo da avaliação e classificação do nível de ma-
cial, estabelecem critérios para as cinco dimensões do turidade de gestão é proporcionar clareza ao caminho
modelo de maturidade de gestão na saúde: estratégia para promoção da evolução dos processos de gestão
empresarial, governança corporativa, gestão de pro- dentro da organização, de forma a redirecionar o foco
cessos, gestão de pessoas e tecnologias de gestão. do negócio para o resultado e a satisfação do cliente.
NÍVEIS
ÁREAS
1. INICIAL 2. DEFINIDO 3. PADRONIZADO 4. GERENCIADO 5. OTIMIZADO
A Governança
As práticas de
Estrutura de As práticas de Corporativa está
Existem práticas governanças
governança governança incorporada à cultura da
Governança iniciadas de ganham força,
corporativa corporativa organização, trazendo
Corporativa governança são formalizadas
não definida na apresentam democratização,
corporativa. e possuem maior
organização. resultados. transparência e busca
transparência.
pela sua perenidade.
A organização A cultura do
A organização possui plano planejamento e
A organização possui plano estratégico com acompanhamento das
A estratégia não
possui plano estratégico e realiza desdobramento de metas e resultados
está formalizada,
Estratégia estratégico, porém o processo de objetivos e metas estão disseminados em
não existe um
Empresarial não realiza o acompanhamento para todos os níveis toda a organização. O
plano estratégico
acompanhamento sistêmico desse da gestão e realiza orçamento empresarial
formal.
sistemático. plano no nível da o acompanhamento é elaborado e
organização. sistemático do plano acompanhando em todos
em todos os níveis. os níveis da gestão.
O desempenho O desempenho
Informalidade Início da Toda a organização
é baseado em é baseado em
Gestão de na definição das formalização está focada na busca de
competências para resultados para
Pessoas atribuições e de atribuições e resultados e melhoria
alcançar os objetivos alcançar os objetivos
responsabilidades. responsabilidades. contínua
da organização. da organização.
Utilização do PEP
Organização não Possui sistema Realiza a prescrição Prontuário completo, sem papel
Tecnologias possui sistema integrado de eletrônica integrada eletrônico (PEP) com integração
de Gestão integrado de gestão no a solicitação de completo integrado máxima em todos os
gestão. backoffice. exames e backoffice. ao backoffice. departamentos do
hospital.
Fonte: elaboração dos autores
Para cada dimensão, foram criados critérios de avalia- Quadro 2 – Discriminação da quantidade de questões por
dimensão
ção, mensurados por meio de um formulário com 32
questões distribuídas conforme o Quadro 2. DIMENSÃO Nº DE QUESTÕES
A coleta de dados para avaliação do processo de matu- sistema integrado de gestão no backoffice.
ridade de gestão foi realizada nos registros de consul- 3. Padronizado: após implantação do plano de execu-
toria da empresa GesSaúde referentes ao período de ção e acompanhamento da estratégia; as práticas de
2018 a 2022, compreendendo um total de 26 projetos, governança corporativa são formalizadas e dissemi-
sendo 14 hospitais filantrópicos e 12 hospitais priva- nadas na organização; os processos são formalizados
dos. As amostras por quantidade de leitos são apre- em todas as áreas como prática organizacional; a ava-
sentadas no Quadro 3. liação de desempenho dos colaboradores é baseada
em competências focadas nos objetivos da organiza-
ção; e, para além do backoffice, já realiza prescrição
Quadro 3 – Discriminação do universo de pesquisa por
quantidade de leitos médica e de enfermagem integradas.
Quadro 4 – Classificação do nível de maturidade de gestão dos hospitais privados, por dimensão
Estratégia Empresarial 3 7 1 1
Gestão de Processos 3 6 2 1
Gestão de Pessoas 3 9
Tecnologias de Gestão 3 5 4
Quadro 5 – Classificação do nível de maturidade de gestão dos hospitais filantrópicos, por dimensão
Estratégia Empresarial 8 5 1
Gestão de Processos 7 6 1
Gestão de Pessoas 7 4 3
Tecnologias de Gestão 6 5 3
Estratégia Empresarial 11 12 2 1
Gestão de Processos 10 12 3 1
Gestão de Pessoas 10 13 3
Tecnologias de Gestão 9 10 7
Para estabelecer o nível de maturidade de gestão, foi é a base para o planejamento das ações de melhoria e
utilizado o critério de adoção do menor nível, pois este evolução harmônica de todas as dimensões.
Hospitais Filantrópicos 10 4
Percebeu-se, a partir dos resultados obtidos, que o nível proporcionar um caminho objetivo para o desenvolvi-
máximo de maturidade de gestão encontrado na amos- mento de ações no sentido de evoluir nos processos de
tra estudada foi o 2, sendo que a diferença encontrada gestão das organizações, observando melhores resul-
na gestão dos hospitais privados em relação aos hospi- tados organizacionais (financeiros), mercadológicos
tais filantrópicos é significativa, com 75% dos hospitais (de capital) e regulatórios (de legislação).
privados no nível 2, enquanto 71% dos hospitais filan- Os resultados apontam a necessidade de melhoria nos
trópicos encontram-se no nível 1 de maturidade. modelos e práticas de governança, de aumento da ma-
Considerando-se os resultados encontrados, obser- turidade da gestão hospitalar e de uso de tecnologias
va-se que existe uma grande oportunidade de evo- para suporte, considerando demandas de natureza
lução em maturidade de gestão para os hospitais fi- organizacional, mercadológica e regulatória, assim
lantrópicos alcançarem o mesmo nível dos hospitais como sugerem empreendimento de novos estudos,
privados da amostra, e que em ambos os casos há principalmente no que tange a relacionar a maturida-
uma necessidade premente de seguir no caminho da de de gestão com os diversos campos do conhecimen-
evolução dos processos de gestão para se tornarem to que perpassam a área da saúde.
REFERÊNCIAS
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s5JQ/?format=pdf&lang=pt Best Pratices. Boca Raton, FL: CRC Press LLC; 2003.
6
ORIGINAL
Hospital do Amanhã:
novo posicionamento
estratégico no sistema
de saúde
A pandemia de covid-19 trouxe evidência forte sobre a ne- filantrópico cuja missão é cuidar da saúde da co-
cessidade de repensar o sistema de saúde como um todo. munidade regional com respeito aos valores éticos,
Um sistema que, ao longo dos anos, vem sendo repensa- morais e espirituais. É um hospital geral de referên-
do em sua estrutura e organização na busca de resulta- cia macrorregional em inovação e humanização na
dos eficientes e efetivos, com agregação de valor para as assistência médica hospitalar, cuidando da saúde
pessoas associada ao melhor custo. Um sistema focado de uma população de aproximadamente 800 mil
na doença, no momento da agudização, e nas estruturas pessoas, distribuídas em mais de 60 municípios,
de urgência e emergência. Suportado por infraestrutura com 85% dos atendimentos pelo SUS.
insuficiente, defasada tecnologicamente e com mode-
No ano de 1998, havia um vazio assistencial para
los de gestão inadequados – segundo estudos do Banco
a linha do nascimento, sem estrutura para aten-
Mundial, em 2009, uma parcela significativa dos hospi-
dimento de gestantes de alto risco, unidade de
tais brasileiros, públicos e privados, foi reprovada quanto
terapia intensiva (UTI) pediátrica e assistência pré-
ao alto desperdício e ao gasto ruim. Outro fator determi-
-natal. Como consequência, a taxa de mortalidade
nante que corrobora o sistema ineficaz é o financiamento
infantil era alta se comparada com a de países de-
ou subfinanciamento notadamente do Sistema Único de
senvolvidos: 29,2 a cada mil nascidos vivos no ano
Saúde (SUS), cuja organização se caracteriza pela frag-
mentação entre os níveis de atenção à saúde. de 2000.
Os grandes desafios, portanto, são repensar o sistema Frente a essa realidade, a SCMP criou em 1998 o
de saúde dentro da visão de redes assistenciais integra- Programa Materno-Infantil (Promai) com o objetivo
das e com gestão eficaz e, sobretudo, desenvolver um geral de desenvolver ações multidisciplinares inte-
novo modelo de atenção capaz de responder às neces- gradas e articuladas com a rede de atendimento do
sidades da pessoa e da família, considerando todos os SUS, visando à redução da taxa de mortalidade do
determinantes sociais que estão inseridos. Transformar binômio mãe-filho e a proporcionar melhorias na
um modelo que olhe mais para as pessoas e menos para qualidade de vida da mulher e da criança.
as doenças, com foco na qualidade de vida suportada O programa adota modelos de atenção ao par-
por hábitos e estilos de vida saudáveis. E qual será o to e nascimento que favorecem a qualidade dos
papel dos hospitais num futuro disruptivo? serviços, valorizando o parto normal e contribuin-
do para a redução dos riscos decorrentes de cesa-
rianas desnecessárias. Após o nascimento, todos
CASE DO PROGRAMA os recém-nascidos que tiveram passagem pela
MATERNO-INFANTIL unidade de terapia intensiva ou semi-intensiva ne-
(PROMAI) DA SANTA CASA onatal são acompanhados até os 2 anos de idade
DE MISERICÓRDIA DE PASSOS pelo programa.
A Santa Casa de Misericórdia de Passos (SCMP), A Figura 1 apresenta os principais marcos no desen-
em Minas Gerais, é uma instituição de caráter volvimento do Promai.
Figura 1– Linha do tempo do Programa Materno-Infantil (Promai) da Santa Casa de Misericórdia de Passos (SCMP), Minas Gerais
2001 2010
2022
Prática do Inauguração da UTI
2016
Alojamento Infantil e Neonatal Unidade Adm.
Conjunto no Complexo Hospital da Mulher
Banco de
Materno-Infantil e da Criança
Leite
1999 2014
buscam promover a saúde física e mental da crian- • Mãe-canguru: esse método visa a aumentar o vín-
ça, esteja ela internada ou em acompanhamento culo entre mãe e filho, estimular o aleitamento ma-
ambulatorial. terno e promover o desenvolvimento da criança.
• Atendimento fisioterápico: para os recém-nasci- • UTI Cardíaca Infantil: em 2016, foi incluída a cirur-
• Atendimento odontológico: é dispensado às crian- Nesse componente, são desenvolvidas ações que
ças filhas de mães que foram acompanhadas no pré- promovem a saúde da mulher, com atendimento de
-natal do Promai ou àquelas acompanhadas pela planejamento familiar e cuidado integral às gestan-
neonatologia e pediatria, até os 5 anos de idade. tes adolescentes e de alto risco, desde o pré-natal até
a alta segura da mãe e da criança.
• Atendimento em fonoaudiologia: é voltado aos
• Ambulatório Pré-Natal de Alto Risco: proporciona
recém-nascidos de risco e às crianças com sequelas
às gestantes adolescentes e de alto risco um pré-
neurológicas que passaram pela UTI neonatal, até
-natal específico e adequado, com o objetivo de
os 2 anos de idade, avaliando o desenvolvimento da
acompanhar a evolução da gravidez e conseguir
fala, da linguagem e do sistema motor-oral.
uma boa preparação física e mental para o parto e
• Avaliação diagnóstica: acompanhamento da ida- para o cuidado da criança.
de de aquisição das funções neuropsicomotoras de
• Ações socioeducativas: são realizadas, desde 1999,
todos os recém-nascidos, até os 3 anos de idade,
as campanhas de combate ao câncer de mama e
com passagem pela UTI neonatal e pela unidade
de colo uterino. Em 2007, iniciou-se o Programa
intermediária da SCMP, além de orientação familiar
Buscando Vidas em parceria com o Instituto Avon,
para estímulo da aquisição dessas funções para pre-
cujo objetivo principal é contribuir para a imple-
venção de atrasos no desenvolvimento.
mentação da rede de atendimento para detecção
• Brinquedoteca: durante a internação, o hospital precoce do câncer de mama. O projeto abrange 33
busca minimizar os efeitos causados nesse período municípios e tem como uma das metas ampliar o
com um espaço onde as crianças brincam, fazendo acesso de mulheres ao exame de mamografia. São
realizadas ações de conscientização e sensibiliza- Alojamento Conjunto, PPP (pré-parto, parto e pós-
ção sobre a importância da detecção precoce do -parto), Centro Obstétrico, Pediatria, UTI Neonatal e
câncer de mama, além de treinamentos para as Pediátrica e UTI Cardíaca Infantil.
equipes de atenção básica dos municípios e da dis-
Em 2012, foi inaugurada a Casa da Gestante, uma
ponibilização de um único banco de dados para o
casa de apoio anexa ao hospital onde as mães da
monitoramento do projeto, o SISVIDAS.
região permanecem enquanto seus bebês estão na
• Educação dos profissionais nas redes de atenção à UTI Neonatal, ou ainda, durante o pré-natal, quando
saúde, com o objetivo de capacitá-los para o aten- precisam estar próximas ao hospital.
dimento de identificação de risco e encaminhamen-
Em 2016, iniciou-se o Banco de Leite, com o objeti-
to precoce ao pré-natal de alto risco; puericultura;
vo de incentivar, proteger e promover o aleitamento
amamentação e planejamento familiar.
materno, visando à melhoria da qualidade de vida
dos recém-nascidos da UTI Neonatal.
3) Incentivo ao aleitamento materno
e ao alojamento conjunto Várias ações de humanização são desenvolvidas na
linha de cuidado do nascimento, dentre as quais
Desde 1999, é realizado um trabalho de envolvimen-
to das crianças nas campanhas anuais de aleitamen- se destacam:
to materno, por meio da participação de alunos do • Estamos ao seu Lado – ações voltadas para a assis-
1º ao 9º ano do ensino fundamental em concursos tência ao parto humanizado:
de frases e cartazes sobre o tema. Essas campanhas
o Acompanhante à escolha da mãe;
estimulam a discussão, entre as próprias crianças, so-
bre a importância da amamentação. o Método não farmacológico para alívio da dor;
Com mais de 20 anos de atuação, o programa é reco- E, com isso, os atendimentos no Promai crescem, em
nhecido regionalmente por seu compromisso de cui- média, 17% ao ano. O Gráfico 1 apresenta a evolução
dar das pessoas com respeito, qualidade e segurança. dos atendimentos em números absolutos.
4,820
5,000
4,085
4,000
3,254
3,000
2,423
2,176
1,632 1,735
2,000 1,501 1,474
1,038
1,000
0
2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020 2021
Em relação a qualidade da atenção ao parto e nasci- SCMP é regional e atende casos de alto risco, a taxa
mento, uma das estratégias adotadas é a utilização média de cesáreas realizadas via SUS é de 31%. Ainda
da Classificação de Robson, um método que permite assim, esses resultados estão bem abaixo das taxas
avaliar, monitorar e comparar as taxas de cesáreas ao médias de cesárea no SUS do estado de Minas Gerais
longo do tempo. Considerando que a maternidade da e do Brasil, respectivamente, de 45% e 42%.
Gráfico 2 – Taxas de cesáreas realizadas anualmente via SUS em Passos (MG), no estado de
Minas Gerais e no Brasil (2010-2021).
60%
50%
40%
30%
20%
10%
0%
2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020 2021
Passos 27% 28% 25% 27% 28% 31% 32% 32% 34% 37% 37% 34%
Minas Gerais 41% 43% 45% 45% 45% 44% 45% 46% 46% 47% 48% 48%
Brasil 37% 38% 40% 41% 41% 40% 41% 43% 44% 45% 47% 47%
Passos Minas Gerais Brasil
Fonte: TabWin/DataSUS
Como consequência de todas as ações realizadas no para a criação do programa – hoje, essencial para uma
âmbito desses quatro componentes, o impacto na população regional de mais de 30.000 mulheres na
comunidade da região atendida foi a redução da taxa faixa etária de 20 a 39 anos.
de mortalidade infantil, que foi o principal motivador
35.0
29.2
30.0
25.0
20.8
20.0
15.7
14.2 14.3
13.0 12.4 12.8
15.0 12.4 12.1
10.7 11.2
10.2 9.5 9.4
8.4 8.4
10.0 7.1 6.9 6.7 6.2
5.0
0.0
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020
Dado seu constante crescimento, em 2022 o potencializando os resultados com valor agregado, ou
Complexo Materno-Infantil foi transformado em uni- seja, como integrador das ações de saúde de forma
dade administrativa do hospital, hoje denominada colaborativa com a governança.
Hospital da Mulher e da Criança. E o Promai conso- Com o olhar para o futuro, vislumbram-se as "10 me-
lida-se como um programa que promove ações que gatendências em healthcare para a próxima década”a
transformam vidas. apresentadas por Fabricio Campolina, presidente da
Johnson & Johnson MedTech Brasil, em artigo publicado
em fevereiro de 2020. Tendo como base a transformação
CONCLUSÃO digital, em especial a inteligência artificial, são elas:
A experiência do Promai proporciona insights impor- 1. Maior expectativa de vida saudável – expan-
tantes para a revisão do papel do hospital na pro- dir o limite biológico e chegar em idade avançada
moção e nos cuidados de saúde. Em mais de duas com saúde.
a
Campolina F. As 10 megatendências em healthcare para a próxima década. LinkedIn [Internet]. 2020 Jan 31 [Cited 2022 Nov 23]. Available from: https://
www.linkedin.com/pulse/10-megatend%C3%AAncias-em-healthcare-para-pr%C3%B3xima-d%C3%A9cada-campolina/.
3. Hubs sociais e determinantes sociais de saúde se- Fazendo um recorte dessa análise de Campolina, in-
rão alavancas fundamentais para alcançar um sistema serir o hospital atual nesse novo cenário nos impõe
de saúde sustentável. desafios gigantescos em busca de um novo modelo
de assistência, suportado por estruturas físicas e tec-
4. Desaparecimento da fronteira entre os mundos
nológicas adequadas e sustentáveis, para alcançar o
físico e virtual – a tecnologia 5G será cem vezes mais
objetivo maior, que é melhorar a saúde da população,
rápida do que a tecnologia atual e suportará milhões de
em todos os lugares, de todas as idades, promovendo
dispositivos conectados por metro quadrado; a distân-
uma vida longa, com estilo e hábitos de vida saudáveis.
cia física passará a ter pouca relevância, e o mundo vir-
E, para concretizar esse horizonte desafiador, a Santa
tual estará totalmente integrado a nosso mundo real.
Casa de Misericórdia de Passos iniciou em 2009 um pro-
5. A ascensão do consumidor de serviços de saúde, cesso de planejamento de seu futuro, o qual deu ori-
que deixará de ser mero paciente e passará a ser prota- gem ao projeto Cidade da Saúde e do Saber (CSS): uma
gonista das decisões relacionadas a sua saúde. cidade-conceito que incorpora todos os elementos de
6. A era da inovação aberta – viveremos cada vez mais smart city como forma de desenvolver um Ecossistema
em um mundo integrado e de colaboração, em que Integrado de Saúde e Estilo de Vida, onde as pessoas
cada pessoa, física, jurídica ou virtual, colocará seus possam viver a experiência de uma vida urbana conec-
tada e saudável, em todas as suas dimensões (corpo,
ativos a serviço de um propósito comum.
mente, coração e espírito). Seu propósito é gerar saúde
7. O divisor de águas será a medicina ultraperso- para o mundo, transformando a maneira com que as
nalizada, cuja visão inclui mapeamento genético, pessoas olham para a própria saúde ao inserir efetiva-
identificação do tratamento mais efetivo para a mente o cuidado à saúde no cotidiano delas: morar com
pessoa por meio da inteligência artificial, produção saúde, deslocar-se com saúde, alimentar-se com saú-
em casa, com impressoras de 3D, de comprimidos e de, divertir-se com saúde, enfim, viver com saúde.
próteses individualizados.
Dessa forma, a CSS pretende ser um hub de inovação
8. Busca pelo equilíbrio entre transparência e priva- em saúde, uma plataforma para integração digital
cidade – maior transparência reduz o risco de desvios das pessoas à saúde conectada e um living lab para
éticos e facilita o acesso de dados individualizados, o desenvolvimento e experimentação de soluções liga-
que poderá proporcionar diagnósticos mais precoces das a saúde e estilo de vida. Assim, representa o desen-
e tratamentos mais efetivos. Por outro lado, a deman- volvimento e a implantação de um novo modelo de
da da sociedade por privacidade vai gerar um debate atenção à saúde, deslocando-se da característica as-
que poderá pender para extremos e, até o final da dé- sistencial hospitalar para um modelo integrado de ge-
cada, deverá atingir um equilíbrio. ração de saúde, de forma que a SCMP possa olhar mais
para as pessoas e menos para doenças, ter sustentabi-
9. Supremacia da colaboração homem-máquina – o lidade e perenidade de seus propósitos institucionais.
próximo nível da transformação digital na assistência
Por fim, em nossa visão, o Hospital do Amanhã será
médica estará centrado em núcleos inteligentes que
aquele que estiver preparado para essa nova realida-
facilitem essa colaboração.
de, trazendo uma abordagem unificada e integrada,
10. A revolução da cirurgia digital – a combinação em que todas as partes interessadas participam visan-
da transformação digital com a cirurgia robótica dará do a promover mais acesso para as pessoas com mo-
origem à cirurgia duplo dígito durante esta década e delos de assistência inovadores e humanizados e com
deverá se tornar um dos maiores segmentos. melhores custos.
7
ORIGINAL
Leandro Figueira
Graduação em Medicina pela Universidade de Vassouras;
especialização (residência médica) em Anestesiologia pelo
Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo (HSPE);
MBA em Gestão de Organizações Hospitalares e Sistemas de
Saúde pela Fundação Getulio Vargas (FGV); MBA Executivo
em Gestão Estratégica e Econômica de Negócios pela FGV;
diretor de Cuidado Integrado do Hospital Israelita Albert
Einstein; São Paulo/SP.
Por definição, futuro é algo que se segue ao presente Esse olhar centralizado no cuidado ao paciente permi-
ou que está relacionado ao tempo que há de vir. Pois tiu, nos últimos anos, a busca pela máxima eficiência
bem, quando você estiver lendo este texto, todas estas com entrega de valor para aqueles que acessam os
informações já serão parte do passado, pois o momen- sistemas de saúde em qualquer lugar do mundo. Os re-
to da autoria precede o momento de contato do leitor sultados, sempre bastante abrangentes, foram men-
com este conteúdo. E qual é a relação disso com a surados pelo ponto de vista mais amplo do conceito
gestão dos serviços de saúde? A complexidade desse de saúde e também pelo econômico, mostrando cla-
sistema traz a necessidade de interpretações basea- ramente que, ao longo do tempo, o ciclo do cuidado
das em situações passadas, com informações relevan- baseado na experiência do paciente trouxe benefícios
tes e confiáveis, desafiando os gestores a uma tomada
de saúde para aqueles que se engajam nos programas,
de decisão futura e assertiva com base em toda a sua
refletindo em resultados financeiros relevantes para
série histórica.
as instituições que possuem práticas centradas nesses
Albert Einstein, em uma de suas célebres frases, afir- modelos e provando que a longevidade e a sustenta-
mou que é uma “insanidade continuar fazendo sem- bilidade do setor são dependentes da experiência de
pre a mesma coisa e esperar resultados diferentes”. seus usuários ao longo do ciclo de vida.
Em nosso mundo atual, o que se espera dos gestores
Pesquisas apontam que são atributos da satisfação do
em saúde é que, para a busca de melhores resultados,
paciente: o acesso ao serviço, o quantitativo de pes-
não continuem tendo a mesma atitude! Planos de ação
soal, o ambiente, a interação com a equipe de saúde,
são extremamente importantes para que possamos
a competência técnica dos profissionais, a percepção
ter melhorias contínuas em todos os nossos proces-
de segurança com a presença do familiar, os padrões
sos, com delegações claras para as lideranças ou para
quem estiver responsável pelos indicadores-chave. assistenciais presentes nos cuidados e a mudança no
estado de saúde dos pacientes.
Portanto, falar sobre boas práticas de gestão da saú-
de tem gerado oportunidades relevantes aos modelos Partindo desse pressuposto, é possível considerar que
gestores atuais. Um pilar bastante estratégico em que a experiência do paciente pode ser promovida por
se fundamenta a atual gestão em saúde é a discussão ações que:
de centralizar o olhar na experiência do cliente. Por • facilitem o acesso ao serviço de saúde – realizar
parte dos gestores e tomadores de decisão, deve-se melhorias de infraestrutura que melhorem a acessi-
entender a experiência do paciente e, consequente-
bilidade, organizar agendas em horários que sejam
mente, sua satisfação, como um caminho a ser trilha-
mais fáceis de se adaptar às rotinas dos pacientes e
do por ele – pensando que, caso ele não tenha opções
possuir recursos que permitam que todas as etapas
dentro de um sistema de saúde, sua satisfação passa
assistenciais sejam realizadas na mesma instituição
a ser dicotômica, pois, na necessidade do cuidado, o
certamente são ações que facilitam essa percepção
que importa para o paciente é ter a continuidade dele.
pelos pacientes;
A experiência do paciente é um conceito mais amplo,
em que, podendo fazer escolhas dentro de seu fluxo • aumentem a comodidade de pacientes e familia-
em um serviço de saúde, o indivíduo participa de seu res/cuidadores – investimentos em mobiliário, hi-
plano terapêutico como forma a escolher aquilo que giene e ambiente não apenas renovam as áreas do
lhe satisfaz. serviço de saúde, como também fazem com que os
usuários se sintam mais confortáveis, desconcen- Não podemos evoluir na discussão sobre gestão res-
trando sua atenção do sofrimento que a patologia ponsável sem construir um estudo aprofundado de
lhe traz; saúde populacional. Esse tipo de estudo, reconhecido
por sua relevância quanto aos determinantes da saú-
• humanizem o atendimento – envolver o paciente e
de, passa pela identificação e estratificação dos riscos
seus familiares no cuidado, como forma de aumentar
a adesão aos tratamentos e de gerar corresponsabi- da população estudada. A gestão de risco é o nome
lização nas terapias, faz com que os pacientes per- dado a um conjunto de atividades gerenciadas com o
cebam os critérios de qualidade e segurança, assim objetivo de controlar uma organização frente às po-
como melhora seu estado de saúde. tenciais ameaças, seja qual for a área impactada. Uma
boa gestão de risco está associada ao planejamento e
Sendo um dos pontos importantes das boas práticas
ao uso dos recursos humanos e materiais para mitigar
de gestão, o controle efetivo dos custos no sistema de
os riscos ou, ainda, tratá-los. Em geral, os riscos são
saúde está relacionado ao custo-efetividade e à res-
classificados em altos, emergentes ou habituais.
ponsabilidade. Há uma luta incessante na gestão de
serviços de saúde pela maior eficiência operacional, Mapear adequadamente os riscos e extrair dados con-
com o gerenciamento de indicadores de produção e fiáveis do sistema é crucial para o reconhecimento das
faturamento, para que seja fornecido um serviço com necessidades individuais e ampliar sobremaneira os
o maior aproveitamento possível de recursos – o tem- custos coletivos, com exigência de avaliações precisas
po, as pessoas e os materiais –, sempre vislumbrando e aprofundadas. Em outras palavras, as avaliações de
a minimização dos desperdícios no serviço. Todos os risco dos grupos de pacientes que possuam condições
participantes do sistema, sejam os diretamente liga- crônicas ou agudas podem direcionar as políticas po-
dos à assistência, sejam os ligados à administração, pulacionais, racionalizando tratamentos e recursos do
têm sua parcela de responsabilidade, e reconhecer sistema. Muito se discute sobre as formas de obtenção
este fato já é um começo para a disseminação da cul- dos dados e sobre a correta identificação dos casos
tura de utilização responsável dos recursos. Os obje- para uma gestão de saúde organizada; pesquisas re-
tivos estratégicos dependentes da operação precisam centes demonstram que, nos últimos anos, o mape-
ser desdobrados até os profissionais diretamente en- amento e o acompanhamento dos riscos organiza-
volvidos com o paciente, pois eles precisam perceber cionais e das condições da saúde da população foram
o quanto sua atividade executada de forma incorreta fundamentais para o direcionamento de políticas de
ou não planejada impacta o negócio. saúde pública, as quais atendem ao mercado tanto pú-
blico quanto privado, já que estes setores consomem
Cabe a todos o controle desses recursos, fator deci-
cerca de 10% do produto interno bruto (PIB), com po-
sivo para que a distribuição dos recursos disponíveis
tencial incremento nos próximos anos.
seja uniforme, possibilitando uma maior inclusão de
pessoas em um sistema de saúde mutualista que, em A evolução constante das boas práticas de gestão no
qualquer país, seja ele desenvolvido, seja em desenvol- sistema de saúde levou à aplicação de um conheci-
vimento, tem limitações de recursos. Quando falamos mento já difundido, mas pouco estruturado em nosso
em custo-efetividade, estamos discutindo quais são os país. Esse processo passa diretamente pela gestão da
reais benefícios aplicados à saúde de quem utiliza os experiência dos colaboradores, que são os efetivos
recursos disponíveis. Muitas vezes, a distribuição irra- agentes de saúde. Um passo importante demonstra-
cional ou mesmo irresponsável desses recursos pode do no pós-pandemia é que os conceitos de saúde fo-
colocar todo o sistema em risco de falência. ram ampliados para incluir a saúde mental, visto que
muitos dos recursos do setor foram consumidos pelo Outro ponto fundamental para a boa prática de gestão
desconhecimento da dimensão que esse mal causaria é a transparência. Transparência é um termo que hoje
na sociedade como um todo. Muito se diz que uma em- em dia está na pauta da sociedade e, por vezes, tem
presa com gestão eficaz deve obrigatoriamente zelar sido banalizado, visto que, na prática, as informações
pela saúde de seus colaboradores para que eles, go- não se revelam como todos os stakeholders gostariam
zando de uma saúde mais equilibrada, possam trans- de vê-las. A transparência vai desde a apresentação
formar a saúde de seus assistidos, criando um ciclo dos bons e maus resultados, dos aprendizados e das
mais positivo de assistência e assistidos. oportunidades de melhoria até a demonstração clara
da administração de todos os recursos empregados e
Porém, o que vimos durante a pandemia foi um número
disponíveis para o cumprimento do propósito de en-
insuficiente de profissionais em um mercado de traba-
tregar saúde para todos aqueles que necessitam.
lho aquecido e ávido por contratações emergenciais
para suprir a demanda de atendimento. Soma-se a isso Um ponto importante – eu diria que até fundamental
o fato de profissionais, na maioria não percebendo a – para uma boa prática de gestão é a apresentação
valorização de seu trabalho na remuneração, acumu- recorrente de todos os dados e de todas as ações de-
larem dois ou até três vínculos empregatícios, além da correntes do conhecimento hoje disponível nas insti-
carga emocional gerada pelo cenário catastrófico jun- tuições para benefício da sociedade como um todo.
to aos pacientes e pelo medo de transmitir a patologia O exercício e a prática da transparência vão além da
aos familiares. Todos esses aspectos geraram uma so- demonstração dos resultados financeiros e das ações
brecarga nunca vista antes nesta geração de trabalha- das empresas. Eles refletem como uma boa instituição
dores, que acabaram adoecendo por síndromes como cuida de seus pacientes, faz sua gestão populacional,
burnout, pânico e tantas outras doenças psiquiátricas cuida da saúde de seus colaboradores e apresenta cri-
devido ao esgotamento emocional. térios de sustentabilidade e perenidade dos negócios.
8
ORIGINAL
Gestão de saúde:
o impacto em
cada vida
Glória Brunetti
Graduação em Medicina pela Universidade de Santo Amaro;
especialização (residência médica) em Doenças Infecciosas e
Parasitárias pelo Instituto de Infectologia Emílio Ribas; médica
infectologista e paliativista no Instituto de Infectologia Emílio
Ribas; fundadora e presidente executiva do Voluntariado
Emílio Ribas (VER); ; membro da Fundação Poder Jovem e líder
do Comitê Saúde do Grupo Mulheres do Brasil; São Paulo/SP.
Nada é tão valioso quanto o ser humano! Vejo a qualidade como o esforço para ser fazer algo
bem-feito desde a primeira vez. E, a esse esforço,
A saúde desse ser humano é definida pela Organização
agregamos todas as possibilidades do momento em
Mundial da Saúde (OMS) como sendo um pleno
que vivemos.
bem-estar físico, mental e social.
Atualmente, partilhamos muitos modelos de gestão
A saúde pode também ser facilmente entendida
e de assistência, além de tecnologia que avança a
como o equilíbrio entre tudo o que estamos sentin-
largos e velozes passos, possibilitando diagnóstico
do e vivendo, sabendo que pode ser interrompida,
e tratamento de diversas doenças de modo rápido,
desequilibrada a qualquer momento por um problema eficaz e seguro.
físico – como uma dor de cabeça –, um problema emo-
O grande desafio é e será a qualidade do serviço que
cional – como a comunicação de uma má notícia –,
entregamos!
um problema espiritual – como uma perda e luto – ou
mesmo um problema socioeconômico – como perder Na saúde pública brasileira, temos desde 1988 o
o emprego. Nos organizamos como sociedade para Sistema Único de Saúde (SUS), que é o único meio de
acesso à assistência em saúde para mais de 150 mi-
ativamente colaborar na recuperação da saúde das
lhões de brasileiros. Ele deve garantir o acesso a todos
pessoas, de forma que reencontrem esse importante
e a equidade na distribuição das verbas, que devem
equilíbrio e bem-estar.
ser suficientes para as metas estabelecidas. Também
No passado, muitas instituições de saúde eram forte- deve garantir ótima qualidade no atendimento, além
mente ligadas à religião, cuja benemerência acolhia, de focar a integralidade das necessidades de cada pes-
dava alimentação e disponibilizava recursos – que soa. Não, isso não é tarefa fácil.
eram muito poucos, dado que a evolução da ciência A gestão pública deve ser ágil, transparente e justa
na época não dispunha de avanços científicos para em relação aos recursos destinados a ela. Para isso,
diagnóstico e tratamento. além da constante capacitação dos gestores públicos,
Famoso exemplo desse modelo é o Hôtel-Dieu, com é preciso avançarmos muito na digitalização de todo
unidades em vários locais da França, entre as quais se o sistema. Hoje são várias e diferentes as linguagens
do sistema de informática distribuídas pelos diver-
destaca o Hôtel-Dieu de Paris, provavelmente cons-
sos equipamentos de saúde do SUS, o que dificulta
truído a partir do século VII. No Brasil, temos nossas
o perfeito funcionamento de toda a rede. Facilitar a
conhecidas Santas Casas, modelo português trazido
comunicação digital entre usuários, gestores e cola-
para cá a partir de 1540, com a inauguração da Santa
boradores/servidores melhora o acesso dos usuários
Casa de Olinda, em Pernambuco.
e a regulação dos pacientes, e otimiza a compilação, a
Falo de acolhimento, atenção e cuidado em uma mensuração e a análise dos dados, inclusive de custos.
situação de poucos recursos tecnológicos nos sécu- Enfim, melhora o serviço, o atendimento e a satisfação
los passados. E, mesmo não sendo possível avaliar e de todos os envolvidos.
mensurar o serviço prestado naquela época, ao pen- Na saúde suplementar, também são grandes os
sar na entrega e na busca por perfeição no atendi- desafios, pois as operadoras de planos privados de
mento prestado pelos religiosos, leigos, nesses espa- assistência à saúde devem ter ações eficazes e ga-
ços para os enfermos, acredito que pode ter havido, rantir acesso ao usuário/cliente no momento em que
sim, muita “qualidade”. ele mais precisa, tanto para prevenção como para
tratamento, e procurar atingir a satisfação de todos vontade ou recusa daquele cliente de repetir a experi-
os envolvidos – usuários e prestadores de serviços. ência. Vários fatores podem influenciar o cliente e sua
Tudo isso dentro dos recursos, financeiros e estrutu- experiência com um serviço, impactando diretamente
rais, de que dispõem. sua satisfação.
A satisfação do cliente está em destaque quando fa- Destaco o fator tempo, sempre lembrado porque a
lamos de boas práticas na gestão de saúde. Assim, os maioria das pessoas procura o melhor atendimento
conflitos, em relação tanto à qualidade do serviço com o menor tempo de espera. Aprendemos a fazer di-
prestado quanto à remuneração, que muitas vezes versas atividades mais rapidamente – inclusive agora
existem entre as operadoras de saúde e os prestadores usamos frequentemente a entrega de muitos produ-
de serviços (como médicos e outros profissionais de tos e serviços em casa –, mas, mesmo com essa otimi-
saúde, hospitais e laboratórios) vão impactar direta- zação, o tempo continua sendo algo escasso, valioso
mente o cliente e, é claro, a recuperação ou preserva- e sempre em falta na nossa vida. Assim, tempo para
ção de sua saúde. marcar uma consulta ou um exame, tempo para libe-
As relações entre prestadores e operadoras devem ser rar a aprovação de um procedimento (uma cirurgia,
reguladas pela Agência Nacional de Saúde (ANS), ob- por exemplo), tempo que se espera para ser atendido
jetivando garantir o melhor atendimento ao cliente e em um pronto-socorro contribuem muito para a per-
sem custos adicionais. Destaca-se que a finalidade do cepção de um bom atendimento e revelam se a gestão
contrato de plano de saúde é a assistência integral à de saúde ali aplicada foi ou não eficiente.
saúde do cliente, considerando sua percepção quanto O importante, quando falamos das boas práticas apli-
à qualidade do serviço. cadas na gestão de saúde, é ter em mente que estamos
Uma das perguntas mais frequentes que se faz em focando a vida de uma pessoa, que está necessitando
questionários para medir a satisfação do cliente é: de atenção e cuidados e que merece todo nosso com-
“Você recomendaria este serviço/produto para seus prometimento e conhecimento para que se alcancem
amigos?”. A resposta direciona rapidamente para a os melhores resultados.
9
ORIGINAL
Leandro Firme
Graduação em Administração pelo Instituto Municipal
de Ensino de Bebedouro (Imesb); especialização em
Administração Hospitalar pela Universidade de Ribeirão
Preto (Unaerp); MBA em Gestão Financeira e Controladoria
pela Fundação Getulio Vargas (FGV); MBA em Liderança,
Inovação e Gestão pela Pontifícia Universidade Católica do
Rio Grande do Sul (PUCRS); CEO da Unimed Porto Alegre;
Porto Alegre/RS.
O que nós, líderes, tomadores de decisões dos prin- seja beneficiado. Legados são construídos por meio
cipais players deste complexo e ambíguo sistema de da união de esforços e da convergência de pensa-
saúde, temos feito – além de muito falar – para cons- mentos e de atitudes. Nesses momentos, percebe-
truir a saúde do futuro? De que maneira nossas ações mos que juntos somos mais fortes. A confiança entre
podem ser percebidas como valor em todos os senti- os atores deste complexo ecossistema será o ponto
dos e em todas as pontas deste elo da corrente? de partida para a construção da saúde do futuro, a
Peter Drucker estava certo ao dizer que “a melhor ma- chave habilitadora para o novo, despertando iniciati-
neira de prever o futuro é inventá-lo”. Nesse sentido, vas capazes de garantir a perenidade e a sustentabi-
proponho uma mudança de perspectiva. Hoje, nossos lidade dos negócios.
planos de ação são norteados por discussões baseadas
Pensar na saúde do futuro também nos remete a uma
em o que e como fazer, enquanto nosso foco real de-
profunda reflexão acerca da necessária transforma-
veria ser para quem e por que fazer. A saúde do futuro
ção digital dos processos e das técnicas. Mas será
carece de objetividade e confiança nas relações, e essa
que há maturidade em todos os elos desta cadeia
simples inversão poderá nos levar a um plano opera-
cional executivo mais pragmático, mais ágil e asserti- produtiva para uma transformação disruptiva? Ou
vo. A transformação digital, marca de nosso tempo, é deveríamos focar nossas energias em um processo
outro elemento sobre o qual precisamos nos debruçar de otimização digital?
se quisermos reposicionar os negócios de saúde. Em relação a segmentos como financeiro, industrial,
Ao revisitar o período avassalador da pandemia de co- automotivo, aeronáutico e varejista, por exemplo, per-
vid-19 – marcado por uma crise sanitária e econômica, cebemos que o processo de transformação digital do
com efeitos globais nunca antes sentidos na contem- segmento de saúde está atrasado.
poraneidade –, reencontramos aprendizados impor-
Da última década para cá, acompanhamos intensas
tantes, como priorizar o essencial e confiar uns nos
movimentações de fusões e aquisições em nosso se-
outros. Presenciamos uma mobilização incansável de
tor, reformatando parte da rede de acesso à saúde
pessoas e empresas em prol de soluções. O sistema
em estruturas de governança verticais extremamen-
privado de saúde apoiou o sistema público e vice-
te profissionalizadas e integradas. Esses movimentos
-versa; os profissionais de saúde, “heróis aclamados”,
apoiaram-se mutuamente; a indústria da saúde e as no mercado de saúde, de certa forma, têm gerado
de outros segmentos se uniram e dedicaram unidades uma evolução na incorporação de novas tecnologias,
específicas para a produção de insumos e equipamen- com a implantação de hubs de inovação, a democra-
tos básicos para a assistência. Esse episódio demons- tização do acesso à saúde (a exemplo da telemedici-
trou que iniciativas inovadoras, boa vontade, prioriza- na) e uma busca incessante por eficiência e susten-
ção das demandas, aceleração da introdução de novas tabilidade do sistema. No entanto, de nada adianta
tecnologias, atitudes mais prospectivas e menos rea- uma corrida desenfreada na tentativa de recuperar o
tivas e, principalmente, a execução de um plano de tempo perdido sem que as novas regras ou premissas
emergência são um caminho factível. desse jogo insano estejam claras e consensadas en-
A confiança, no entanto, foi o grande diferencial. Em tre todos os players do ecossistema de saúde. Então,
um plano de emergência, somos forçados a confiar por onde começar? O que priorizar? Quais atitudes e
uns nos outros, e cada um exerce seu papel com res- ações que podemos adotar hoje nos permitirão cons-
ponsabilidade e entrega o melhor para que o todo truir esse novo cenário?
A era digital vem empurrando as transformações nas Precisamos criar ambientes de inovação, nos quais as
dinâmicas de governança e gestão em todos os seg- pessoas se sintam seguras e motivadas a participar des-
mentos da economia, principalmente no de saúde, se processo. Isso apoiará a escalada para a saúde do fu-
pressionado a acelerar esse processo desde a pande- turo. Afinal, fazemos para pessoas por meio de pessoas.
mia. Sabemos que o segmento de saúde do Brasil é
Hoje, temos um sistema de saúde caracterizado por
caracterizado pela burocracia exagerada nos proces-
um descompasso importante entre os players. A isso
sos, pelos custos altos e pela famosa procrastinação
se relacionam as mais diversas variáveis, como a re-
na tomada de decisões. Porém, aderir ao movimento
gião de atuação, o acesso a tecnologias, a cultura or-
digital já não é mais uma opção, e sim uma condição
ganizacional, as prioridades de gestão, a maturidade
para permanência no mercado.
dos líderes, os modelos assistenciais implantados, os
Iniciativas como a digitalização dos processos e o uso históricos de saúde desencontrados dos pacientes e,
da inteligência artificial abrem um leque de oportuni- principalmente, o entendimento sobre a importância
dades capazes de reposicionar os negócios em saúde, da construção de um ecossistema integrado, no qual
além de apoiá-los na escolha das jornadas mais efi- o paciente esteja no centro. Por essa razão, faz senti-
cientes e na melhor tomada de decisão. A inteligência do a provocação de, inicialmente, otimizar para, em
artificial, “a nova eletricidade”, vem tomando espaços seguida, transformar. É preciso organizar, preparar – e
e está cada vez mais presente no dia a dia de hospitais, há muito ainda a evoluir.
clínicas, laboratórios e demais serviços de saúde deste
Para avançarmos na construção de um ecossistema
complexo ecossistema. Não há mais tempo para adiar
de saúde do futuro, temos urgência em superar temas
decisões. Ou nós fazemos ou ela fará por nós: de forma
recorrentes, como o envelhecimento da população,
melhor, mais ágil, mais barata e mais assertiva.
o novo perfil do consumidor e a medicina persona-
Líder mundial em pesquisa e aconselhamento para lizada, além da mudança no modelo assistencial
empresas, o Gartner anunciou recentemente as dez pautado pelo valor em saúde e pela eliminação dos
principais tendências tecnológicas que as organiza- desperdícios. Também estão em discussão os custos
ções poderão explorar nos próximos anos e que nos crescentes, a incorporação de tecnologias emergen-
servem de referência. Elas são construídas em torno tes, a melhor eficiência nos processos e nas técnicas
de três ações: otimizar, dimensionar e ser pioneiro. médicas, a gestão de dados orientada a uma jorna-
da mais inteligente e menos onerosa aos sistemas de
O processo de otimização passa principalmente pelo
saúde. Cabe aos tomadores de decisão considerar,
engajamento das pessoas, além de programas robus-
ainda, a predição de eventos e agravos futuros na saú-
tos de inovação e remodelagem nos processos atu-
de populacional e a mudança necessária no modelo
ais alinhados à melhor escolha de investimento em
de remuneração, assim como proporcionar a melhor
tecnologias. Nessa linha do pensamento, é preciso in-
experiência aos pacientes. O enfrentamento dessas
tensificar o investimento em um processo evolutivo e
questões garantirá um ecossistema forte, tecnológi-
educativo das pessoas, do mais alto escalão corporati-
co, sustentável e seguro.
vo – conselhos de administração, gestores, tomadores
de decisão – até as bases operacionais. A transforma- A saúde do futuro que queremos começa agora.
ção começa por um programa de educação estrutu- Devemos nos sentar à mesa e ter conversas difíceis.
rante, que seja capaz de desenvolver nas pessoas um Humildade e transparência são essenciais. É preciso
mindset digital, fortalecendo o aculturamento organi- abandonar velhos e destrutivos hábitos pautados na
zacional ao tema data driver. quantidade. Posicionar o paciente ao centro, qualificar
a coordenação do cuidado e genuinamente expor vul- todos os players do ecossistema para, então, se transfor-
nerabilidades, acabando de vez com as desconfianças mar em um segmento totalmente renovado, mais cola-
que, por décadas, afastaram e dividiram opiniões e ati- borativo, menos burocrático e mais tecnológico.
tudes. É tempo de somar, otimizar, integrar e entregar
Enfim, temos à frente um futuro brilhante a ser cons-
uma saúde de valor, percebida por todos e, principal-
truído. Nosso presente já parte apoiado por recursos
mente, pelo paciente, que é quem de fato a usufrui.
importantes, como inteligência artificial, tecnologias
O “paciente cliente”, assim chamado por anos, já não emergentes, dispositivos individuais de monitora-
está tão paciente assim. Ele é bem-informado, está mento e de autocuidado com a saúde e metaverso.
cada vez mais adaptado às tecnologias e preocupa- Porém, vale destacar que, somente por meio da am-
do com seu bem-estar. Tem exigido do sistema atual pliação em massa do mindset digital e da confiança
de saúde respostas que vão além do tratamento de restabelecida, reproduzidos em atitudes colaborati-
doenças, ditando pautas urgentes que perpassam por vas inovadoras entre fonte pagadora, prestadores de
prevenção, promoção, predição e autocuidado. serviços de saúde, indústria, médicos, profissionais de
Sob pressão constante por novas respostas, o setor de saúde e demais players envolvidos, poderemos dar
saúde deve acelerar ainda mais o processo de otimização mais um passo adiante e entregar de fato a saúde do
e ampliar exponencialmente a consciência digital entre futuro. A saúde que as pessoas desejam.
Sobre a revista
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nal e internacional. Limitado a 15 páginas (incluindo incluindo tabelas. As margens superior, inferior e late-
resumo, tabelas, figuras e referências). ral devem ser de 2,5 cm.
Estudo Teórico: Análise de teorias ou métodos que dos. Não devem ser utilizadas abreviações, siglas ou
apoiem a qualidade e segurança do paciente, que con- localização geográfica da pesquisa. Deve ser claro,
tribuam para o desenvolvimento do conhecimento em exato e atraente.
• Nomes dos autores: Completos e sem abreviaturas, definição da amostra (se aplicável); coleta de dados,
numerados em algarismos árabes, com a filiação ins- análise e tratamento de dados, aspectos éticos.
titucional, localização, estado e país. • Resultados: Apresentação e descrição dos dados
• Instituições: até três hierarquias de filiação institu- obtidos, sem interpretações ou comentários. Pode
cional (Universidade, Faculdade, Departamento). conter tabelas, gráficos e números para permitir uma
melhor compreensão. O texto deve complementar
• Autor correspondente: Declaração de nome, ende-
ou destacar o que é mais relevante, sem repetir da-
reço de e-mail e telefone.
dos fornecidos nas tabelas ou números. O número de
• Resumo: Somente na linguagem do manuscrito participantes faz parte da seção resultados.
com até 1.290 caracteres com espaços. Deve ser
• Discussão: Deve restringir-se aos dados obtidos e re-
estruturado com as seguintes seções: Objetivo,
sultados alcançados, salientando aspectos novos e re-
Método, Resultados e Conclusão, exceto para estu-
levantes observados no estudo e discutindo o acordo
dos teóricos.
e divergências em relação a outras pesquisas publica-
• Descritores: Três a seis descritores que identifiquem das nacionais e internacionais. Deve indicar as limita-
o assunto, seguindo a linguagem dos resumos; sepa- ções do estudo e os avanços no campo de pesquisa.
rados por um ponto e vírgula; e extraídos dos vocabu-
• Conclusão: Deve ser direta, clara e objetiva, respon-
lários DeCS (Descritores em Ciências da Saúde), ela-
dendo às hipóteses ou objetivos, e fundamentada
borados pela BIREME, ou MeSH (Títulos de Sujeitos nos resultados e na discussão. Não cita referências.
Médicos), elaborados pela NLM (Biblioteca Nacional
• Referências: Máximo de 30 (exceto em estudos de
de Medicina).
revisão, dependendo da estratégia de busca e sele-
• Incluir apenas referências estritamente relevantes de dados. Quando não elaboradas pelos autores, to-
ao tema abordado, atualizadas (dos últimos 10 anos) das as ilustrações devem indicar a fonte apropriada.
e de abrangência nacional e internacional. Evitar in-
• Apoio financeiro: Declarar o nome de instituições
cluir um número excessivo de referências na mesma
públicas e privadas que forneceram financiamento,
citação e concentração de citações para o mesmo
assistência técnica ou outra ajuda. Essas informa-
periódico. Os autores são de total responsabilidade
pela exatidão das referências. ções devem ser fornecidas na página do título.
• Figuras: tabelas, gráficos e figuras, no máximo cin- • Siglas: Restritas ao mínimo. Elas devem ser explicadas
co, devem ser obrigatoriamente inseridos no corpo na íntegra na primeira vez em que aparecem no texto.
do texto, sem informações repetidas e com títulos Não usar siglas ou abreviaturas no título ou resumo.