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Daniel Alvarenga Fernandes1, Anny Caroline Porto Chagas2, Amélia Ribeiro de Jesus3, Alex Vianey
Callado França4, Frederico Santana de Lima5, Ângela Maria da Silva6, Atilano Salvador Godinho7,
Karine Garcez Schuster Franco8
Resumo Objetivo: Avaliar aspectos ultrassonográficos associados à morbidade em pacientes com formas clínicas crônicas de
esquistossomose mansônica, utilizando-se protocolo proposto pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Materiais
e Métodos: Foram avaliadas duas populações distintas: a) área endêmica e b) institucional terciária, com histopato-
lógico confirmando fibrose. Critérios de inclusão: diagnóstico confirmado por parasitológico de fezes para Schistosoma
mansoni (método Kato-Katz). Critérios de exclusão: sorologia positiva para HIV, HTLV-1, VHB ou VHC. Foi utilizado pro-
tocolo ultrassonográfico de Niamey, proposto pela OMS. Resultados: Avaliando-se isoladamente as medidas dos es-
paços periportais, estas se mostraram sem alterações em 21% dos indivíduos com doença avançada da instituição
terciária. Utilizando-se todos os parâmetros do protocolo, 100% dos indivíduos da instituição terciária, com forma grave
da doença, apresentaram fibrose periportal avançada. Em pacientes hepatoesplênicos da área endêmica não se iden-
tificou fibrose à ultrassonografia. Conclusão: O protocolo ultrassonográfico proposto pela OMS detecta fibrose peri-
portal avançada nos pacientes com forma grave da doença, com maior sensibilidade do que a medida do espaço pe-
riportal isoladamente. A complexidade de identificação das fases iniciais da fibrose periportal, em áreas endêmicas,
pela ultrassonografia, pode suscitar o campo da complementação diagnóstica e a continuidade do aprimoramento
dos protocolos ultrassonográficos nestas áreas.
Unitermos: Esquistossomose mansônica; Morbidade; Fibrose periportal; Ultrassonografia.
Abstract Objective: To evaluate sonographic features associated with morbidity in patients with chronic clinical presentations of
schistosomiasis mansoni, according to the protocol proposed by the World Health Organization (WHO). Materials and
Methods: Two distinctive populations were evaluated: a) patients from an endemic area, and b) patients from a tertiary
institution, with histopathologically confirmed periportal fibrosis. Inclusion criteria: diagnosis confirmed by parasitological
stool examination for Schistosoma mansoni (Kato-Katz method). Exclusion criteria: positive serology for HIV, HTLV-1,
HBV or HCV. The Niamey protocol on ultrasonography proposed by the WHO was utilized. Results: As the measures of
periportal spaces were isolatedly evaluated, no alteration was observed in 21% of the tertiary institution patients with
advanced disease. As all parameters of the Niamey protocol were considered, 100% of patients from the tertiary
institution, with severe disease, presented advanced periportal fibrosis. In hepatosplenic patients from endemic areas,
fibrosis was not identified at ultrasonography. Conclusion: The sonographic protocol proposed by the WHO can detect
advanced periportal fibrosis in patients with severe form of disease with higher sensitivity than the isolated measurement
of periportal space. The complexity involved in the sonographic identification of early stages of periportal fibrosis in
endemic areas may give rise to the field of diagnostic supplementation and to a continued improvement of sonographic
protocols in these areas.
Keywords: Schistosomiasis mansoni; Morbidity; Periportal fibrosis; Ultrasonography.
Fernandes DA, Chagas ACP, Jesus AR, França AVC, Lima FS, Silva AM, Godinho AS, Franco KGS. Aspectos ultrassonográficos asso-
ciados à morbidade de formas clínicas crônicas de esquistossomose mansônica, utilizando-se protocolo proposto pela Organização
Mundial da Saúde. Radiol Bras. 2013 Jan/Fev;46(1):1–6.
* Trabalho realizado no Hospital Universitário da Universidade 3. Pós-doutora, Professora Adjunta do Departamento de Me- 5. Médico Gastroenterologista, Mestrando da Universidade
Federal de Sergipe (HU/UFS), Aracaju, SE, Brasil. dicina da Universidade Federal de Sergipe (UFS), Membro do Federal de Sergipe (UFS), Aracaju, SE, Brasil.
1. Médico Radiologista, Especializando no Hospital das Clíni- Instituto de Investigação em Imunologia (III) e dos Institutos 6. Doutora, Professora Associada do Departamento de Medi-
cas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Campi- Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCT)/CNPq, Aracaju, SE, cina da Universidade Federal de Sergipe (UFS), Aracaju, SE,
nas, SP, Brasil. Brasil. Brasil.
2. Médica do Departamento de Medicina, Membro do Grupo 4. Livre-docente, Professor Adjunto, Coordenador do Serviço 7. Médico Radiologista, Membro Titular do Colégio Brasileiro
de Pesquisas em Esquistossomose do Hospital Universitário da de Hepatologia da Universidade Federal de Sergipe (UFS), Ara- de Radiologia e Diagnóstico por Imagem (CBR), Coordenador da
Universidade Federal de Sergipe (HU/UFS), Aracaju, SE, Brasil. caju, SE, Brasil. Residência Médica em Radiologia e Diagnóstico por Imagem
bém analisada a presença de hipertensão Nos casos positivos para esquistosso- tointestinal (HI) e 9/69 (13,0%) da forma
portal (escore PH), que é dada pela análise mose os pacientes foram tratados com dose hepatoesplênica (HE). Todos pacientes do
de indicadores de sua existência, como me- única de praziquantel (40 mg/kg) após rea- HU apresentavam a forma hepatoesplênica.
dida do diâmetro da veia porta, presença de lização dos exames. Outros parasitos intes- A Figura 1 mostra alguns padrões de
ascite e presença de circulação colateral. tinais foram tratados com as drogas corres- imagens nos pacientes estudados, quando
Esses escores (IP, PT e PH) são interpreta- pondentes. analisados o aspecto qualitativo do parên-
dos por meio de uma tabela que classifica quima hepático, o IP escore, segundo pro-
a fibrose periportal como: possível, prová- tocolo do Niamey Working Group, 2000(9).
RESULTADOS
vel, presente, presente avançada e presente A Figura 2 mostra imagem ultrassono-
avançada com hipertensão portal(9). Foi A US foi realizada em 89 indivíduos, 69 gráfica do PT escore, o qual resulta da me-
realizada avaliação pelo modo B e estudo destes procedentes da área endêmica, com dida de dois ou três ramos portais de se-
com mapeamento Doppler colorido. idade entre 18 e 72 anos, média ± desvio- gunda ordem, isto é, o primeiro ramo seg-
As análises dos dados foram realizadas padrão (DP) de 49 ± 14,2 anos, sendo 32/ mentar a deixar o ramo direito ou o ramo
utilizando-se o programa de estatística 69 (46,4%) do sexo masculino, e 20 pacien- esquerdo da veia porta principal.
GraphPad Prism. Foram feitas análises de tes provenientes do Hospital Universitário A Figura 3 mostra imagem ultrassono-
correlação linear entre medidas obtidas no (HU) com idade entre 23 e 76 anos, média gráfica do PH escore de um dos pacientes
exame ultrassonográfico, como tamanho do ± DP de 53 ± 16,9 anos, sendo 8/20 (40,0%) do grupo hepatoesplênico (HE-HU), que é
baço, do lobo hepático direito, espaço peri- do sexo masculino. dado pela análise de indicadores de hiper-
portal e diâmetro da veia porta mediante Quanto às formas clínicas dos pacien- tensão portal, como medida do diâmetro da
cálculo do coeficiente de correlação de tes da área endêmica, classificadas pelo veia porta, presença de ascite e presença de
Spearman. Um valor de p < 0,05 foi consi- exame físico, 42/69 (60,9%) eram da forma circulação colateral. Observa-se que a vi-
derado como estatisticamente significativo. intestinal (I), 18/69 (26,1%) da forma hepa- sualização e caracterização morfológica da
A B
Fibrose por US
I 0 42 42
HI 3 15 18
HE 0 9 9
HE-HU 20 0 20
Total 23 66 89
Tabela 2 Correlações entre os parâmetros ultrassonográficos realizados nos indivíduos com formas crônicas de esquistossomose mansônica: hepatoesplênica
de instituição terciária (HE-HU) e portadores de formas clínicas crônicas da área endêmica.
Todos os indivíduos provenientes da por meio desta medida, utilizada como prin- com o tamanho do lobo direito do fígado
instituição de atendimento terciário (HE- cipal parâmetro de classificação de fibrose nos pacientes da área endêmica (Tabela 2).
HU) apresentavam forma grave da doença em protocolo ultrassonográfico anterior ao Sabe-se da assimetria dos lobos hepáticos
e 100% deles apresentavam fibrose hepá- do Niamey Working Group (Abdel-Wahab observada pela US em pacientes esquistos-
tica avançada característica da esquistosso- et al.(7)). Em instituição terciária, Domin- somóticos crônicos com a forma hepatoes-
mose à US, utilizando o método de Nia- gues et al.(21), também utilizando medidas plênica, com aumento do lobo esquerdo e
mey. Alguns autores sugerem que esses in- dos espaços periportais, demonstraram que redução do lobo direito, observada em até
divíduos compõem um grupo clássico de todos os indivíduos pertencentes à forma 81% dos casos(27), a qual pode estar rela-
hepatoesplênicos e correspondem àqueles hepatoesplênica possuíam algum grau de cionada ao maior fluxo sanguíneo para o
que chegam aos hospitais de referência por fibrose à US. Todavia, apesar de sua larga lobo esquerdo(28), além de achados de es-
conta de varizes sangrantes(15). utilização, alguns autores consideram que plenomegalia, espessamento periportal e
Em pacientes hepatoesplênicos prove- esta análise puramente quantitativa do es- perivesicular, aumento de calibre das veias
nientes da área endêmica não se identificou pessamento periportal, como utilizada em porta, esplênica e mesentérica superior, e
fibrose à US. Foi referida na literatura a di- protocolo ultrassonográfico anterior ao do a identificação de circulação venosa cola-
ficuldade de identificar as fases iniciais da Niamey Working Group (Abdel-Wahab et teral(29–31). Abdel-Wahab et al.(7) afirmaram
fibrose periportal, em áreas endêmicas, al.(7)), para avaliação de pacientes esquistos- que a esplenomegalia, os calibres das veias
pela US(16). Cogita-se ainda que a causa da somóticos crônicos, possui baixa reprodu- porta e esplênica, a presença de circulação
esplenomegalia dos indivíduos com pouca tibilidade(18,22,23). King et al.(24), utilizando colateral e o número e tamanho das vari-
ou nenhuma fibrose à US poderia ser uma o protocolo de Niamey em 3.954 pessoas zes esofágicas vistas na endoscopia tam-
reação hiperplásica à esquistossomose que no Egito e no Quênia, concluíram igual- bém estão relacionados com a intensidade
evoluiria, com o decorrer do tempo, para a mente que a associação dos padrões de da fibrose periportal(5). De Jesus et al.(l4),
forma grave de doença ou mesmo poderia imagem, mais do que a espessura isolada- em indivíduos de outra área endêmica de
ser causada por outras doenças não inves- mente dos espaços periportais, parecera re- esquistossomose, também encontraram
tigadas no estudo, aspectos estes corrobo- presentar maneira mais eficiente na classi- correlações diretas significativas entre in-
rados por outros estudos(15,17). Soma-se, ficação da morbidade e risco de sangra- tensidade da fibrose periportal e o tamanho
também, o fato de a avaliação do espessa- mento digestivo da doença. do baço e calibres das veias porta e esplê-
mento periportal ser de complexa realiza- Quanto à parcela de indivíduos não he- nica, além de correlação entre o diâmetro
ção(18). Estudos indicam a ressonância patoesplênicos com fibrose à US, foi ob- das veias porta e esplênica e o tamanho do
magnética como método de maior acurácia servado apenas em pacientes com forma baço.
na visualização do espessamento peripor- hepatointestinal, na qual pode haver graus A baixa detecção de fibrose periportal
tal nas fases precoces da doença, que pode de fibrose, como foi observado em estudos no presente estudo nos indivíduos hepato-
ser caracterizado pelo realce após a injeção anteriores(25,26). Outro estudo sugere ainda esplênicos da área endêmica pode ainda,
do contraste paramagnético(19,20). que o espessamento periportal estritamente dentre outros já citados, indicar que estes
Avaliando-se isoladamente as medidas central à US, sem sinais de hipertensão tenham menores graus de lesão hepática
dos espaços periportais, inclusas como um portal, pode resultar de um depósito de te- esquistossomótica devido a diferenças ge-
dos parâmetros do protocolo do Niamey cido adiposo ao redor da veia porta(18). néticas ou regionais, aspectos a serem ana-
Working Group, observa-se que o PT es- Neste caso, a US necessita ser complemen- lisados. Alternativamente, estes dados po-
core se mostrou sem alteração em todos os tada pela ressonância magnética(22). dem refletir uma baixa capacidade de de-
pacientes com a forma hepatoesplênica da Foram obtidas correlações diretas e es- tecção de fibrose periportal nos estágios
área endêmica e em 21% dos indivíduos tatisticamente significativas entre: o diâme- iniciais pela US. Estes dados reforçam a
com doença avançada (HE-HU). Em outra tro da veia porta com o tamanho do baço e utilização da classificação de Niamey ado-
área endêmica, De Jesus et al.(14) detecta- com a medida do lobo direito do fígado nos tada pela OMS para detecção de fibrose em
ram diferentes graus de fibrose em indiví- pacientes do HE-HU; o diâmetro da veia fases mais avançadas de esquistossomose
duos esquistossomóticos hepatoesplênicos porta com a medida do espaço periportal e e alertam para a complexidade de detectar
lesões em estágios iniciais pela US, estimu- 6. Doehring-Schwerdtfeger E, Mohamed-Ali G, 19. Lambertucci JR, Andrade LM, Pinto-Silva RA.
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