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Macroeconomia II

Licenciatura em Economia

5. OS MOVIMENTOS INTERNACIONAIS DE
CAPITAIS EM MACROECONOMIA

Bibliografia:
Ramos (2020)
Dornbush, Fisher & Startz (2018), cap. 13

Conceição Pereira
FEUC, 2022/23
Macroeconomia II – 2022/23 1
Tendência e Obstáculos à Igualização Internacional das Taxas de Juro
• Liberalização e consequente crescimento dos movimentos de capitais, a partir
dos anos 80 do sec. XX: investidores procuram obter o maior retorno nos
seus investimentos em todo o mundo, pelo que o capital flui para países com
taxas de retorno mais elevadas.

• Se taxa de retorno no país > (<) que no exterior, em ativos similares, ocorre
uma entrada (saída) de capitais em busca de maior remuneração, o que gera
excesso (escassez) de capital, que por sua vez reduz (eleva) a taxa de retorno
no país, alinhando pela que é proporcionada no exterior  tendência à
igualização internacional das taxas de retorno proporcionadas pelos ativos
em que são aplicados os capitais.

• Admitindo apenas ativos que rendem juros (ou cujo retorno está de alguma
forma relacionada com os juros), isto significa que o capital fluirá para países
com taxas de juro mais elevadas. Trata-se de uma tendência à igualização
internacional das taxas de juro.

• Porém, continuam a observar-se diferentes taxas de juro em aplicações


similares, o que resulta da existência de obstáculos à perfeita mobilidade de
capitais.
Macroeconomia II – 2022/23 2
Tendência e Obstáculos à Igualização Internacional das Taxas de Juro
• Obstáculos à igualização internacional das taxas de juro
– existência de diferentes regimes fiscais;
– persistência de alguns obstáculos administrativos à livre circulação de
capitais;
– diferenças de risco nas aplicações (ex. guerras e instabilidade política);
– diferenças de liquidez, mesmo em operações idênticas, das aplicações em
diferentes moedas;
– enviesamentos psicológicos favoráveis às aplicações numas moedas em
detrimento doutras.
• Vamos porém admitir: sistemas fiscais comparáveis, plena liberalização
dos movimentos de capitais, risco e liquidez idênticos, e ausência de
enviesamentos psicológicos significativos.
• Perfeita mobilidade de capitais: cenário eminentemente teórico em que os
capitais se movem livremente, sem qualquer atrito (rapidamente e em
quantidades ilimitadas) nem custo, entre os diferentes países do mundo e
em que se excluem os obstáculos referidos em cima.
Macroeconomia II – 2022/23 3
Equação de paridade das taxas de juro
• Há um obstáculo adicional à igualização internacional das taxas de juro, que
resulta da instabilidade cambial:
• Vamos imaginar um residente na Área euro (AE) que tem que decidir sobre
aplicar 800€ em obrigações nacionais, que oferecem 2% ou norte-americanas
(NA) que oferecem 6%, durante 1 ano.
• Optar pelas obrigações da AE  receber 800×(1+0.02) = 816€ daqui a 1 ano.
• Optar pelas obrigações NA  trocar € por $ agora e $ por € daqui a 1 ano.
Suponhamos que agora 1€ = $1 e daqui a 1 ano 1€ = $1.05 (euro aprecia / dólar
deprecia 5%).
– Agora troca 800€ por 800€×1=$800, que aplica a 6%
– Daqui a 1 ano recebe $800×(1+0.06)=$848, que troca por $848/1.05  807.6€
– Obtém uma taxa de retorno de (807.6€ - 800€) / 800€  1%
– É esta taxa de retorno que é relevante para comparar com a da aplicação em
obrigações nacionais. Ignorar isto potencia más decisões: se o indivíduo deste
exemplo não considerar a perda cambial de 5% e, portanto, optar por
obrigações NA tomará uma má decisão, pois ele teria obtido um retorno maior
na AE (2%) do que com obrigações NA (1%  6% – 5%).
Macroeconomia II – 2022/23 4
Equação de paridade das taxas de juro
• Vamos formalizar o raciocínio de cálculo da taxa de juro em
euros de uma aplicação em dólares e confrontá-la com a taxa de
juro da aplicação em euros.
• Aplicar agora A€ em obrigações nacionais à taxa de juro i 
receber daqui a 1 ano A(1+i)€
• Aplicar agora A€ em obrigações estrangeiras à taxa de juro i*
 receber daqui a 1 ano quanto?
– Agora troca A€ por $A. 0, que aplica à taxa de juro i*

– Daqui a 1 ano recebe $A. 0(1 + i*), que troca por A. 0(1 + i*) / 1 €

• Como no momento do investimento não se conhece a taxa de


câmbio que irá vigorar daqui a 1 ano, o valor a receber daqui a 1
ano deve ser definido em termos esperados: A. 0(1 +i*)/1E €
Macroeconomia II – 2022/23 5
Equação de paridade das taxas de juro
• Então a taxa de juro em euros da aplicação em dólares é:


∗ ∗

• Se definirmos a taxa de depreciação esperada da MN da seguinte


forma:

• A taxa de juro em euros da aplicação em dólares vem:

∗ ∗

∗ ∗

• Por aproximação :

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Equação de paridade das taxas de juro
• Se existir perfeita mobilidade de capitais, a tendência à igualização internacional
das taxas de retorno, i.e. ∗ determinará:

• Esta equação é designada por Equação de Paridade das Taxas de Juro (EPTJ).

 os capitais são atraídos ao país em enorme quantidade.

 os capitais fogem para o exterior em enorme quantidade.
• Portanto, a não observância da EPTJ conduz ao desequilíbrio do mercado
cambial.
• Se admitirmos , a EPTJ escreve-se:
• Tal como a condição de PPC estabelece que bens semelhantes tendem a custar o
mesmo preço em todo o lado, a EPTJ estabelece que, quando há perfeita
mobilidade de capitais, as taxas de retorno de ativos semelhantes não podem
diferir sistematicamente entre países. Mas, ao contrário da PPC, a EPTJ é válida
mesmo no muito curto prazo.
Macroeconomia II – 2022/23 7
Equação de paridade das taxas de juro
• Admite-se que a EPTJ é sempre satisfeita e qualquer desvio é imediatamente
eliminado.
• Como o nosso objeto de estudo é uma pequena economia em relação ao RM
i* é exógena e quando i  i*, é a taxa de juro interna que tem que ajustar para
que a EPTJ se verifique.
• Um cenário de perfeita mobilidade de capital pode ser representado por uma
linha horizontal no diagrama IS/LM, denominada BP=0, desenhada ao nível
da taxa de juro internacional, i*, porque nesse cenário só existe equilíbrio no
mercado cambial quando é verificada a condição i = i*.

• A designação BP=0 resulta de i

tradicionalmente um equilíbrio ex
ante no mercado cambial ser i > i*  Entrada de capitais
equivalente a um equilíbrio na
i = i* BP=0
Balança de Pagamentos (e um
desequilíbrio no mercado cambial i < i*  Saída de capitais
ser assimilado a um desequilíbrio
na BP  AR).
Y
Macroeconomia II – 2022/23 8
Macroeconomia II
Licenciatura em Economia

6. A POLÍTICA MACROECONÓMICA EM
ECONOMIA ABERTA:
O MODELO MUNDELL-FLEMING

Bibliografia:
Burda & Wyplosz (2022), cap. 12
Dornbush, Fisher & Startz (2018), cap. 13
Santos et al. (2016), cap. 8

Conceição Pereira
FEUC, 2022/23
Macroeconomia II – 2022/23 9
Introdução
• Até agora, os nossos modelos de determinação do produto admitiam que as
economias estão ligadas internacionalmente apenas através do comércio de bens
e serviços. Porém, essa ligação também ocorre através dos mercados financeiros.
O conceito de economia aberta pressupõe abertura comercial e financeira.
• Hoje em dia, o grau de integração entre os mercados financeiros é bastante
elevado  perfeita mobilidade de capitais (PMC).
i
• Objetivo: compreender como são determinados o LM ou RT
produto e a taxa de juro num cenário de PMC, E
estudando o modelo Mundell-Fleming - extensão do i* BP=0
modelo IS/LM ou IS/RT à economia aberta sob PMC
(hip.: preços rígidos). Neste modelo a economia só
está em equilíbrio macroeconómico global em E: IS
Y

• Este modelo é adequado para estudar uma pequena economia aberta (a integração
financeira, altera a análise porque i* é exógena para as economias pequenas).
Enquanto, o modelo que já estudámos sem PMC é o adequado para estudar uma
grande economia (ex. EUA). Uma vez que um país grande afeta, mas não é muito
afetado pela taxa de juro/retorno externa, omite-se a curva BP=0.
Macroeconomia II – 2022/23 10
Determinação de Y e i em câmbios fixos
Política Monetária
• Em regime de câmbios fixos o BC fixa a taxa de câmbio.
• De entre os 3 possíveis instrumentos do BC, oferta de moeda, taxa de juro e
taxa de câmbio, só é possível escolher um  se o BC opta por fixar a taxa
de câmbio, deixa de poder controlar os outros, ou seja perde a autonomia da
PM  não pode controlar M (LM perde relevância), nem pode controlar i
(RT perde relevância)  pode omitir-se LM / RT
• BC só pode escolher um ponto sobre a
curva L: enfrenta 2 restrições, L e a taxa i
de juro internacional i*  só pode 1
escolher o ponto A
A
i*
• Se tentar reduzir i / aumentar M para
alcançar o ponto B, o capital flui para o
exterior, porque i < i*  BC compra MN i B
para evitar que desvalorize (vende ME 
2
reservas)  BC retira moeda de L
circulação M/i  retorno ao ponto A
L, M
•  M endógena
Macroeconomia II – 2022/23 11
Determinação de Y e i sob câmbios fixos

Política Monetária
quando BC controla M • PME  LM0LM1
• i  i < i*  saída de
i
LM0 capitais  EOMN/ EPME 
pressão à depreciação da MN.
1 LM1
• BC compra MN em troca de
2
i*
ME (  reservas cambiais)
BP=0 para evitar depreciação da MN
 M  LM1LM0
• A expansão monetária é
revertida (toda a moeda
IS fornecida em mercado aberto
tem que ser retirada em
mercado cambial)  BC não
Y0 Y tem qualquer controlo sobre i
ou M; a PM é ineficaz em
influenciar o produto.
Macroeconomia II – 2022/23 12
Determinação de Y e i em câmbios fixos
Perturbações da procura
• G, T, I, x …  IS0IS1 (A→B): rendimento aumenta e taxa de juro
permanece inalterada (lembrar que com PMC e câmbios fixos, as curvas
LM/RT podem ser omitidas da representação).
• Comparação com situação sem PMC, em
LM ou RT que a BP=0 perde relevância e a LM ou a
i C RT ganham relevância (ponto C):
– Se BC controla M, quando a procura
A B
i* BP=0 aumenta e consequentemente Y,
levando a L1, surge um EPM  i,
pois M não se altera;
IS1 – Se BC adota a RT ele sobe a taxa de
IS0
juro para limitar a subida de Y.

Y0 Y1 Y • i  I: Efeito crowding out, que limita


efeito expansionista.
• PO em câmbio fixos e PMC muito eficaz.
Macroeconomia II – 2022/23 13
Determinação de Y e i sob câmbios fixos

Perturbações da procura quando BC controla M

LM0 • G, T, I, x …  IS0IS1


i
(A→C)
C
LM1
• i  i > i*  entrada de capitais 
A
B EPMN / EOME  pressão à
i* BP=0
apreciação da MN.
• BC vende MN/ compra ME ( 
IS1 reservas cambiais) para evitar
apreciação da MN  M 
IS0
LM0LM1 (C→B)
Y0 YC YB Y

• Com PMC o efeito expansionista de uma PO é maior:

Macroeconomia II – 2022/23 14
Determinação de Y e i em câmbios fixos
Perturbações financeiras internacionais
• i*  BP=0BP=0’
• i*  i < i*  saída de capitais 
i LM0 ou RT0 EOMN / EPME  pressão à
depreciação da MN.
B
i*’
A
BP=0’ • BC compra MN/ vende ME (
i* BP=0 reservas cambiais) para evitar
depreciação da MN  M
• i  I  Y, recessão decorrente da
IS0 interdependência monetária
Y1 Y0 Y internacional, que reflete a perda de
autonomia da PM.
•  grande exposição a perturbações
financeiras internacionais.

Macroeconomia II – 2022/23 15
Determinação de Y e i em câmbios fixos
Política cambial
• A PM pode continuar a ser implementada, mas através da PC (realinhamento
deve ser acompanhado de variação do stock monetário):
•   PEL  IS0IS1 (A→B) (= perturbação da procura)  Y  L1
– Face a L1, se o BC não fornecesse a moeda adicional, a taxa de juro subiria
(A→C)  i > i*  entrada de capitais  pressão à apreciação da MN, que
BC evitaria vendendo MN / comprando ME  M  C→B
– O BC poderá desde logo fornecer moeda em mercado aberto: A→B.

i i
C
C

B A B
i* i* BP=0
A

L’
IS1
L IS0
L,M Y0 Y1 Y
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Determinação de Y e i em câmbios flexíveis
• Em regime de câmbios flexíveis a taxa de câmbio é determinada em mercado
( ajusta-se até que o mercado cambial equilibre).
– BC recupera a autonomia da PM (pode adotar metas monetárias ou a RT)
– BC abdica da taxa de câmbio como instrumento (determinada em mercado)
– Curva IS torna-se endógena (porque a taxa de câmbio é endógena)  pode omitir-se a IS.

Política Monetária
i LM0 ou RT0 LM1 ou RT1
• PME: i / M  RT0RT1 ou
LM0LM1 (A→C) A B
• i  i < i*  saída de capitais  i* BP=0
EOMN / EPME  depreciação da
MN (BC não intervém) C
IS1
•   (Ex-Im)  IS0IS1 (C→B) IS0
Y
• PM muito eficaz. Y0 Y1

• O efeito expansionista da PM é conseguido à custa da deterioração da


BCom e consequente efeito restritivo no RM – efeito beggar thy neighbour
(mendigar / empobrecer o vizinho)
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Determinação de Y e i em câmbios flexíveis

Perturbações da procura quando


BC controla M ou adota a RT
• G, T, I, x …  IS0IS1

i • i  i > i*  entrada de capitais


LM ou RT  EPMN / EOME  apreciação
da MN
1
•   (Ex-Im)  IS1IS0
i* BP=0
• PO é ineficaz porque a apreciação
da MN exerce um efeito crowding
2 out total na PEL (sem PMC este
IS1 efeito seria parcial).
IS0
• O valor do produto permanece
inalterado, mas a composição do
produto altera-se.
Y0 Y
• Produto é isolado de perturbações
tanto da procura interna como
externa.
Macroeconomia II – 2022/23 18
Determinação de Y e i em câmbios flexíveis
Perturbações da procura
quando BC controla i

• G , T, I, x …  IS0IS1


• BC expande M (compra
i LM0 LM1 obrigações em mercado aberto)
para evitar i  LM0LM1
(representação gráfica
i* BP=0 alternativa com LM horizontal
coincidente com BP=0)
IS1
IS0 • A expansão monetária mantém
Y1 Y a taxa de juro inalterada,
Y0
evitando a apreciação da MN.
• A PO só é eficaz se for
acompanhada de uma expansão
monetária.

Macroeconomia II – 2022/23 19
Determinação de Y e i em câmbios flexíveis

Perturbações financeiras internacionais


• i*  BP=0BP=0’
i LM ou RT
• i*  i < i*  saída de capitais
B  EOMN / EPME 
i*’
A
BP=0’ depreciação da MN
BP=0
i*
•   (Ex-Im)  IS0IS1
(A→B)
IS1 • O efeito expansionista desta i*
IS0
é conseguido à custa do efeito
Y0 Y1 Y restritivo no RM – efeito beggar
thy neighbour.

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Determinação de Y e i com e sem PMC
• A transmissão da política monetária:
– Sem PMC: i  Investimento  Y
– Com PMC:
• Câmbios fixos: i  saída de capitais  intervenções do BC para
manter a taxa de câmbio, anulando a eficácia da PM
• Câmbios flexíveis: i  saídas de capital    PEL  Y

• Eficácia da PO:
– Sem PMC: POE  Y ( L  i  I: crowding out do investimento
mitiga Y, se BC controlar M; BC aumenta M, para evitar i se BC
controlar i  maior Y)
– Com PMC:
• Câmbios fixos: i  entrada de capitais  intervenção do BC para
manter a taxa de câmbio aumenta M, reforçando a eficácia da PO
• Câmbios flexíveis: i  entrada de capitais    PEL (crowding
out da PEL)  Y, anulando a eficácia da PO, se BC controlar M; BC
aumenta M para evitar i, o que garante a eficácia da PO se BC
controlar i.
Macroeconomia II – 2022/23 21
Determinação de Y e i com e sem PMC

Trilema de Mundell-Fleming:
• De entre as 3 opções assinaladas nos vértices do triângulo os
países podem apenas escolher duas, ou seja um dos lados do
triângulo.

PMC

A B

Câmbios fixos C PM autónoma

Macroeconomia II – 2022/23 22
Vantagens e Desvantagens Relativas dos Regimes Cambiais
Câmbios fixos Câmbios flexíveis
Efeito no produto
PME Sem efeito Aumento
Perturbações positivas da procura Aumento Sem efeito
(incluindo POE)
Aumento da taxa de juro internacional Diminuição Aumento
Instrumento exógeno da PM Taxa de câmbio Taxa de juro ou
oferta de moeda
Instrumento endógeno da PM Taxa de juro ou Taxa de câmbio
oferta de moeda

• Argumentos a favor dos câmbios fixos/desfavor dos câmbios flexíveis


– Estabilidade cambial - a excessiva instabilidade cambial prejudica o comércio
internacional.
• Argumentos a favor dos câmbios flexíveis/desfavor dos câmbios fixos:
– Em câmbios flexíveis os desequilíbrios no mercado cambial são automaticamente
absorvidos, enquanto em câmbios fixos podem ser persistentes;
– É muito complexo regular o mercado cambial;
– Os regimes de câmbios fixos são vulneráveis a ataques especulativos.
Macroeconomia II – 2022/23 23
Crises da Balança de Pagamentos
(a desenvolver no âmbito da apresentação do tema 8)
• NCF=BCor+BCap<0  BFin<0, i.e., importações líquidas de capitais
persistentes, para financiar essencialmente consumo, empresas
ineficientes e endividadas, guerras ( se resultar de um défice para
financiar o crescimento da economia) podem levar à revisão das
expectativas dos investidores  saídas de capitais (cenário
intensificado em PMC).
– Câmbios flexíveis: grande desvalorização da moeda  inflação (via
importações + caras).
– Câmbios fixos: perda de reservas cambiais e eventual abandono do
regime.

• Exemplos: Portugal (acordos com o FMI de 1978-79 e 1983-85),


Países Asiáticos 1997/98; Argentina 2001 …
• Ver: box cap. 24 Lipsey & Chrystal Balance of Payments crisis e
https://cepr.org/voxeu/blogs-and-reviews/sudden-stops-primer-balance-payments-crises
Macroeconomia II – 2022/23 24
Macroeconomia II
Licenciatura em Economia

7. DESEMPREGO E INFLAÇÃO
Bibliografia:
Lipsey & Chrystal, cap. 23 (13ª ou 14ª edição: p. 570-576 ou 596-601 + case study 5)
Dornbusch, Fischer e Startz, 13ª edição, cap. 8 (p. 179-188) e 6 (p. 122-130)

Conceição Pereira
FEUC, 2022/23
Macroeconomia II – 2022/23 25
Definições e Custos de desemprego
• O desemprego é contra-cíclico, tendendo a subir nas fases desfavoráveis do
ciclo económico e a descer nas fases favoráveis, mas nunca se anulando.
• O desemprego total pode ser desagregado em desemprego cíclico e
desemprego de equilíbrio  taxa de desemprego total (u) = taxa de
desemprego cíclico + taxa de desemprego de equilíbrio (u*).
• Desemprego cíclico (cyclical unemployment): causado por um nível
demasiado baixo da procura agregada, insuficiente para adquirir todo o
produto potencial, que gera um hiato do produto negativo. Verifica-se,
então, quando Y < Y* (u > u*).
• Desemprego de equilíbrio (equilibrium unemployment), também designado
por desemprego natural ou de LP: aquele que persiste quando Y = Y* (u =
u*).
• Apesar da situação ser referida como uma situação de “pleno emprego”,
quando Y = Y* existe desemprego!
• Ver desemprego de equilíbrio como a tendência de LP e desemprego cíclico
como o desvio de CP relativamente a essa tendência (u – u*).

Macroeconomia II – 2022/23 26
Definições e Custos de desemprego

• Componentes do desemprego de equilíbrio:


– Desemprego friccional (frictional): resulta da procura do 1º emprego e da
transição entre empregos (labour turnover).
– Desemprego estrutural (structural): resulta do desajustamento
(mismatch) entre as características da oferta (trabalhadores à procura de
emprego) e da procura de trabalho (as que são desejadas pelos
empregadores), a nível de competências, indústrias, ocupações e
localização geográfica.
• A taxa de desemprego natural ou de equilíbrio (u*) é frequentemente
designada por NAIRU.
– NAIRU significa taxa de desemprego não aceleradora da inflação (Non-
Accelerating-Inflation Rate of Unemployment). Esta designação resulta do facto
da manutenção da taxa de desemprego neste valor garantir uma inflação estável.
Se a taxa de desemprego descer abaixo (subir acima) de u* a inflação acelera
(desacelera) – iremos ver que assim é no ponto 7.4 do programa sobre o dilema
inflação-desemprego.

Macroeconomia II – 2022/23 27
Definições e custos do desemprego
Alguns custos do desemprego
• Custos a nível agregado:
– Perda de produto: hiato negativo é a medida do valor dos bens e
serviços que deixam de ser produzidos.
– Impostos que os desempregados pagariam poderiam ser usados em
benefício de toda a sociedade.
– Despesa pública com subsídio de desemprego deixa de ser usada em
benefício de toda a sociedade.

• Custos a nível individual:


– Perda de rendimento, minorada mas não totalmente compensada pelo
subsídio de desemprego e que ultrapassa o valor atribuído ao tempo de
lazer acrescido, porque a maioria deste lazer é não desejado.
– Custos psicológicos: (ex. sentimento de exclusão que leva à perda de
autoestima).
– Perda de capital humano: falta de atividade deprecia as qualificações
do trabalhador.
Macroeconomia II – 2022/23 28
Causas e Políticas de Redução do Desemprego
Causas do desemprego cíclico
• SL: curva da oferta de trabalho (labour supply) (trabalhadores)
• DL: curva da procura de trabalho (labour demand) (empresas)
• W: salário (wage)
• L: quantidade de trabalho (labour) w

• Quando o hiato do produto é


nulo a curva da procura de SL
trabalho é DLN. Em recessão
desloca-se até DLR.
• Admitindo flexibilidade salarial wN
plena, típica da concorrência
wR
perfeita, o salário e o emprego DLN
caem (variação pró-cíclica).
DLR
• Em recessão o emprego diminui,
mas não há desemprego cíclico.
LR LN L
Macroeconomia II – 2022/23 29
Causas e Políticas de Redução do Desemprego
• Porém, o caso de determinação concorrencial do salário não é realista,
porque
– na realidade observam-se flutuações cíclicas não só no emprego mas
também no desemprego (cíclico) e
– pressupõe uma redução voluntária no emprego, mas na realidade
observa-se desemprego involuntário.
• Desemprego involuntário – o desemprego dos trabalhadores que
gostariam de trabalhar, num emprego para o qual foram preparados,
ao salário em vigor, mas que não conseguem arranjar emprego.
• Para explicar a emergência deste tipo de desemprego não basta a
ocorrência da recessão, é ainda necessário haver rigidez salarial –
situação em que os salários não variam o suficiente para permitir que
a oferta e a procura de trabalho concorrenciais se igualem.
– Sem rigidez salarial não há desemprego involuntário cíclico, como vimos
no gráfico do slide anterior.
– O papel da rigidez salarial é descrito no slide seguinte.

Macroeconomia II – 2022/23 30
Causas e Políticas de Redução do Desemprego
w
• Se, em recessão, a procura de
SL
trabalho diminuir para DLR, mas
o salário permanecer fixo em wN, Desemprego
Involuntário
a oferta de trabalho será LN, mas = LN – LR

a procura será apenas LR. wN

• O emprego é determinado pela


quantidade procurada ao salário DLN

em vigor, wN: LR. A oferta DLR


remanescente para a qual não há
procura (LN – LR) fica LR LN L
involuntariamente desempregada. w
SL
• Na realidade, os salários
wN
tendem a variar um pouco (de wR
forma pró-cíclica), mas não o DLN
Desemp.
suficiente para restabelecer o Involuntário
DLR
equilíbrio  desemp. involunt. L
Macroeconomia II – 2022/23 31
Causas e Políticas de Redução do Desemprego

Algumas causas da rigidez do salário nominal


associada ao desemprego cíclico

• Relações de LP estáveis entre trabalhadores e empregadores que


garantem trabalhadores que conhecem bem a organização, por
contrapartida de salários estáveis; em face de flutuações nas vendas,
os empregadores ajustam, não o salário, mas sim o emprego
(despedindo trabalhadores contratados mais recentemente em caso de
redução de vendas) e aceitam flutuações nos lucros.
• Certos arranjos institucionais propiciam estas relações de LP. Ex:
contratos que fixam os salários a vigorar por um período de vários
anos; benefícios adicionais ao salário de base; aumentos salariais com
o aumento dos anos de serviço; indemnizações por despedimento.
• Empresas evitam cortes salariais, porque estes reduzem a lealdade e
motivação dos seus trabalhadores e, por isso, a sua eficiência e
incentivam alguns trabalhadores a despedirem-se, o que reduz a
produtividade média da empresa e gera custos de contratação e treino
dos novos trabalhadores.
Macroeconomia II – 2022/23 32
Causas e Políticas de Redução do Desemprego

Políticas de redução do desemprego:

• O desemprego cíclico pode ser reduzido através de políticas


monetárias ou orçamentais expansionistas que estimulam a
procura agregada e mitigam a recessão – políticas de
estabilização (PO + PM) expansionistas.
• O desemprego de equilíbrio pode ser reduzido através de
políticas que promovem o ajustamento entre as características
dos trabalhadores e as que são procuradas pelos empregadores –
políticas estruturais. Exemplos: a desenvolver no âmbito da
apresentação do tema 9

Macroeconomia II – 2022/23 33
Causas e Políticas de Redução do Desemprego

Causas e políticas de redução do desemprego estrutural


(a desenvolver no âmbito da apresentação do tema 9)
• Causas endógenas: fatores que alteram a estrutura da procura de
trabalho ao longo do processo de crescimento económico,
– exemplos: declínio da indústria e intensificação dos serviços; aumento da
concorrência internacional; revolução nas tecnologias de informação e
comunicação, robotização, etc.
– Como a adaptação da estrutura da oferta de trabalho a estas mudanças é
lenta, entretanto existe desemprego.

• Causas políticas: políticas que desencorajam mobilidade entre


regiões, indústrias e profissões; políticas que desencorajam a
substituição de mão de obra por máquinas; salário mínimo; sistema de
subsídio de desemprego; poder dos sindicatos.
• Ver: secção sobre desemprego estrutural e case study 5 cap. 23 Lipsey
& Chrystal; Dornbusch, Fischer & Startz (2018) Box 7.4.

Macroeconomia II – 2022/23 34
Custos da Inflação e Deflação
• Hipótese de inflação perfeitamente antecipada: todos os contratos são
ajustados com base na inflação esperada, de modo a que o valor real
do rendimento e da riqueza dos indivíduos não seja afetado (ex.
salários e taxas de juro aumentam para compensar subida dos preços).
Mas, mesmo neste caso existem custos, que são pequenos quando a
taxa de inflação é moderada, mas que podem ser significativos em
hiperinflação:
– Custos associados à detenção de moeda líquida e custos de sola de sapato
= com operações que visam evitar a perda de poder de compra resultante
da detenção de liquidez.
– Custos de menu = dispêndio de recursos com a alteração dos preços
(recálculo e remarcação)

• Hipótese de inflação imperfeitamente antecipada


– redução de eficácia na afetação dos recursos
– efeitos redistributivos

Macroeconomia II – 2022/23 35
Custos da Inflação e Deflação

• Efeitos redistributivos do rendimento e da riqueza:


– perdem os agentes económicos com rendimentos fixos em termos
nominais, ou que não conseguem vê-los aumentar na mesma proporção
do crescimento dos preços;
– perdem os que detêm ativos cujo valor nominal não acompanha a subida
dos preços (ex. numerário, depósitos, obrigações).

• a) Na relação de crédito
– a inflação diminui o valor real da dívida  o credor é prejudicado e o
devedor beneficiado
– Mecanismo de compensação do credor: para evitar esta transferência de
poder de compra, a taxa de juro contratada deve ser mais elevada de
forma a compensar o credor pela perda de poder de compra decorrente da
subida dos preços = acrescenta-se à taxa de juro que remunera a cedência
de fundos a taxa de inflação esperada:

Macroeconomia II – 2022/23 36
Custos da Inflação e Deflação

iN = iR + e  Equação de Fisher
– iN é a taxa de juro nominal = taxa de juro contratada, que incorpora, para além
da remuneração da cedência de fundos (iR), a compensação pela inflação
esperada
– e é a taxa de inflação esperada
– iR é a taxa de juro real = taxa que remunera a cedência de fundos:

Lógica: Se emprestarmos hoje x u.m. à taxa de juro iN, daqui a um ano


recebemos x(1+iN), cujo valor real esperado será .

Então, a taxa de juro real será 1= , que é


aproximadamente igual a se (se e for muito baixa).
Macroeconomia II – 2022/23 37
Custos da Inflação e Deflação
• Custos da deflação (crescimento negativo dos preços):
– Efeitos redistributivos na relação de crédito: deflação aumenta o valor
real da dívida  credor é beneficiado, devedor é prejudicado
– Em deflação não existe mecanismo de compensação do agente perdedor
(devedor), porque o credor não tem interesse em perder dinheiro (ex.
iR=1%, e = -3%  iN = 1% – 3% = -2%)
– para evitar iN<0, os bancos cobram taxas de juro reais elevadas 
redução do recurso ao crédito e do investimento  estagnação
económica
– A deflação faz adiar o consumo (mentalidade dominante em inflação é
“compra já vende mais tarde”, enquanto em deflação é “compra mais
tarde vende já”)  estagnação económica
– A deflação aumenta o custo real do trabalho, que propicia falências,
dada a dificuldade de redução dos salários nominais.

Macroeconomia II – 2022/23 38
Custos da Inflação e Deflação
b) Outros exemplos de efeitos redistributivos fora da relação de crédito:
– entre o Estado e o setor privado:
• Inflação desloca as pessoas para escalões superiores de impostos sobre o
rendimento => deve haver atualização de escalões de acordo com a inflação.
• Inflação aumenta receita com IVA, porque taxas incidem sobre preços de
bens e serviços nominalmente mais elevados; e também tende a aumentar a
carga tributária sobre o rendimento obtido com a poupança.
• Hiperinflação reduz receita com impostos diretos devido a pagamento
desfasado - Efeito Tanzi-Oliveira.
– entre capitalistas e trabalhadores: a inflação não antecipada beneficia os que
recebem lucros em prejuízo dos que recebem salários, porque os salários não
aumentam de forma tão rápida e acentuada como os preços
• Indexação salarial como possível solução: os contratos de trabalho podem
incluir cláusulas que determinam o ajustamento automático do salário em
função da inflação.
• Indexação salarial complica o ajustamento em caso de choques da oferta.
• Ver: https://www.imf.org/en/Publications/fandd/issues/Series/Back-to-Basics/Inflation
https://www.europarl.europa.eu/RegData/etudes/ATAG/2022/733710/EPRS_ATA(2022)733710_EN.pdf
https://www.bancobpi.pt/contentservice/getContent?documentName=PR_UCMS02066607

Macroeconomia II – 2022/23 39
Inflação: episódios históricos e da atualidade
(a desenvolver no âmbito da apresentação do tema 10)
• Episódios históricos de Hiperinflação: Alemanha (1923), Hungria (1946),
América Latina (sobretudo anos 1980), Zimbabwe (2006-09), Venezuela
(2017-22), etc; estão normalmente associados a grandes perturbações políticas
e financiamento monetário de elevados défices públicos.
• Inflação na atualidade: simultaneamente inflação pela procura (com origem no
aumento da procura por bens e serviços) e inflação pelos custos (com origem
no aumento dos custos de produção).
– Procura: recuperação da procura na sequência do alívio das restrições impostas pela
pandemia covid-19 e de apoios concedidos pelo Estado;
– Oferta: persistência de uma oferta de bens de consumo limitada, devido a
estrangulamentos nas cadeias de abastecimento, decorrentes das restrições impostas
durante a pandemia (sobretudo na China), e aumento do preço da energia e dos
alimentos, causado pela depreciação do euro face ao dólar (no caso da AE) e pela
guerra da Rússia na Ucrânia.
• Ver: Burda & Wyplosz, BOX 10.2: Hyperinflation and Central Banks: Historical and Current
Episodes e BOX 5.2: Zimbabwe: The Top of the Inflation Heap; Dornbusch, Fischer & Startz,
secção 19.5; https://jornaleconomico.pt/noticias/inflacao-2022-o-que-e-e-quais-as-suas-consequencias-879137;
https://www.europarl.europa.eu/RegData/etudes/BRIE/2022/729352/EPRS_BRI(2022)729352_EN.pdf;

Macroeconomia II – 2022/23 40
Macroeconomia II
Licenciatura em Economia

7. DESEMPREGO E INFLAÇÃO
(conclusão)

Bibliografia:
Dornbusch, Fischer e Startz, 13ª edição, cap. 8 (p. 179-188) e 6 (p. 122-130)

Conceição Pereira
FEUC, 2022/23
Macroeconomia II – 2022/23 41
Dilema Inflação-Desemprego: a Curva de Phillips
• Num estudo que publicou em 1958 sobre a Grã-Bretanha para o
período 1861-1957, Phillips constatou que existia uma relação estável
e inversa entre a taxa de crescimento dos salários nominais, Ŵ , e a
taxa de desemprego, u:

ˆ Wt  Wt 1
W
Wt 1

u
• Declive negativo: a níveis baixos da taxa de desemprego, típicos das
fases favoráveis do ciclo económico, ocorre um excesso de procura no
mercado de trabalho, que conduz ao crescimento rápido dos salários
nominais; a níveis elevados da taxa de desemprego, típicos das fases
desfavoráveis do ciclo económico, ocorre um excesso de oferta no
mercado de trabalho, conducente a aumentos modestos ou
eventualmente reduções dos salários nominais.
Macroeconomia II – 2022/23 42
Dilema Inflação-Desemprego: a Curva de Phillips
• Com o tempo o termo curva de Phillips passou também a ser usado para
descrever uma relação entre a taxa de inflação e a taxa de desemprego:


u* u

• Na passagem dos salários aos preços admite-se que as variações de


preços serão proporcionais às variações dos custos unitários do trabalho
(CUT).
• CUT: constituem uma aproximação estatística ao custo médio do fator
trabalho por unidade produzida
massa salarial salário  número de trabalhadores
CUT   
produção produção
salário salário
 
produção / número de trabalhadores produtividade

Macroeconomia II – 2022/23 43
Dilema Inflação-Desemprego: a Curva de Phillips
• Lógica da Curva de Phillips:
– u = u* (equilíbrio no mercado de trabalho)  salários nominais crescem
ao mesmo ritmo da produtividade do trabalho  CUT constantes   =
0
– u < u* (excesso de procura no mercado de trabalho)  salários nominais
crescem a um ritmo superior ao da produtividade do trabalho  CUT
crescem   > 0
– u > u* (excesso de oferta no mercado de trabalho)  salários nominais
crescem a um ritmo inferior ao da produtividade do trabalho  CUT
decrescem   < 0

• A Curva de Philips traduz um trade-off entre a taxa de inflação e a


taxa de desemprego (trade-off = relação de troca entre duas coisas,
i.e. em que se opta por uma em detrimento da outra), podendo então
escrever-se do seguinte modo:

Desemprego cíclico
Macroeconomia II – 2022/23 44
Dilema Inflação-Desemprego: a Curva de Phillips
• Reinterpretação da curva de Phillips: a curva foi vista como uma
ementa para as escolhas de política económica, assumindo-se que
optar por uma política de estabilização expansionista gera inflação
mas absorve desemprego, e a opção contrária controla a inflação mas
gera desemprego.
• Esta curva não prevê a
possibilidade de haver estagflação

(combinação de estagnação com
inflação, ou seja a coexistência de
elevado desemprego e elevada B
inflação):
– A: quando há desemprego cíclico u* u
(u > u*) não há inflação ( < 0) A
– B: quando há inflação ( > 0) não
há desemprego cíclico (u < u*)

Macroeconomia II – 2022/23 45
Dilema Inflação-Desemprego: a Curva de Phillips
• Desatualização da Curva de Phillips: a curva de Phillips deixou de se
adequar à realidade a partir de finais da década de 60, quando a
inflação e o desemprego começaram a aumentar a um ritmo acelerado
nas economias desenvolvidas, ou seja quando passou a verificar-se
estagflação.
• Objeção de Friedman-Phelps: a curva de Phillips apresenta uma taxa de
inflação independente das expectativas de inflação; porém, a inflação
efetiva depende das expectativas de inflação, porque os salários são
negociados com base na inflação esperada (ex. se a taxa de inflação
esperada for 5%, os salários terão que aumentar pelo menos 5% para
que os trabalhadores não percam poder de compra).
• Proposta de Milton Friedman e Edmund Phelps: incorporação das
expectativas de inflação na curva de Phillips:

 t   te   ( ut  u*)

Macroeconomia II – 2022/23 46
Dilema Inflação-Desemprego: a Curva de Phillips
• Graficamente: 

e

u* u
• Agora, mesmo quando a economia se encontra em pleno emprego pode haver
inflação, desde que existam expectativas de inflação:
∗ 𝒆 ∗

• Esta curva já admite a possibilidade de existir


estagflação: mesmo quando há desemprego cíclico
(u > u*) pode haver inflação, desde que hajam 
expectativas de inflação (ex. ponto S).
S
• A estagflação acontece quando ocorre uma recessão
ao longo de uma curva de Phillips de CP numa
situação de inflação baseada nas expectativas de u* u
inflação.
Macroeconomia II – 2022/23 47
Dilema Inflação-Desemprego: a Curva de Phillips
• Admita-se expectativas adaptativas, que pressupõem que os agentes
económicos, crendo na continuação das tendências do passado, formam
as suas expectativas para o futuro com base nos valores ocorridos no
passado. Na sua forma mais simples:

• Curva de Phillips com expectativas adaptativas:  t   t 1   ( ut  u*)


• Admita-se u*=7% e =0.4. Partindo de A, suponhamos uma política estabilização
expansionista em t=0, visando descer u para 5%, que desloca a economia para B,
onde a taxa de inflação é 1 = 0 – 0.4(0.05 – 0.07) = 0.008 = 0.8%.
• Como esta política cria inflação, os agentes
 económicos irão rever as suas expectativas
para t=2: e2 = 1 = 0.8%  deslocação da
D curva para cima; então a inflação será: 2 =
3=2.4%
2=1.6% C 0.008 – 0.4(0.05 – 0.07) = 1.6% (C)
1=0.8% B • Nova subida de e, resultante da subida de ,
A conduz a nova deslocação da curva. Em t=3:
0=e0=0
u0 3 = 0.016 – 0.4(0.05 – 0.07) = 2.4% (D)
u* u
(…)
Macroeconomia II – 2022/23 48
Dilema Inflação-Desemprego: a Curva de Phillips
• Enquanto Phillips pressupunha a troca de menos desemprego por mais
inflação, com a incorporação de expectativas, a troca é de menos desemprego
por inflação crescente. Isto traduz o facto de os acréscimos de inflação que é
necessário aceitar não serem estáveis, porque os agentes vão revendo as suas
expectativas ao longo do tempo e portanto a mesma taxa de desemprego vai
sendo compatível com taxas de inflação cada vez maiores. Isto é designado por
princípio aceleracionista. Versão aceleracionista da curva de Phillips:

 t   t 1   ( ut  u*)   t   ( ut  u*)

• Como a inflação irá acelerar (desacelerar) sempre que a taxa de desemprego se


encontrar abaixo (acima) da taxa de desemprego natural, é habitual designar
esta taxa u* por taxa de desemprego não aceleradora da inflação = non-
accelerating inflation rate of unemployment, NAIRU (taxa de desemprego
compatível com inflação estável).

• Inércia inflacionista: a inflação persistirá, porque está incorporada nas


expectativas. Só um choque que inverta as expectativas a pode fazer parar.
Macroeconomia II – 2022/23 49
Dilema Inflação-Desemprego: a Curva de Phillips
• Como as expectativas de inflação vão sendo revistas ao longo do tempo e
consequentemente a curva de Phillips se vai deslocando, sempre que a taxa de
inflação se desvia do valor esperado, então o trade-off entre desemprego e
inflação descoberto por Phillips é apenas válido no CP. Uma política de redução
do desemprego através do estímulo da procura só é eficaz no CP.

• No LP a taxa de inflação é perfeitamente antecipada, porque os agentes


económicos aprendem com a experiência. Então, a curva de Phillips no LP é uma
reta vertical traçada ao nível da taxa de desemprego natural:  = e  u = u*.
 Curva de
Phillips de LP
Curvas de
Phillips de CP

e2 > e1

e1 > e0


u* e0 = 0
u
Macroeconomia II – 2022/23 50
Dilema Inflação-Desemprego: a Curva de Phillips
• Admita-se agora expectativas racionais, que pressupõem que os agentes
económicas utilizam toda a informação relevante ao seu dispor e sabem lidar
com essa informação, de tal forma que em média acertam nas suas
expectativas.
• Curva de Phillips com expectativas racionais:  t   te  ut  u *
• A curva passa a ser vertical mesmo no CP, o que significa que a política
económica de redução do desemprego através do estímulo da procura não é
eficaz nem no CP. Se os agentes económicos formulam as suas expectativas
corretamente, na sequência de uma expansão antecipada da procura, não se
assistirá a uma redução do desemprego. O anúncio da política gera
expectativas de inflação que se refletem nas negociações salariais, fazendo
com que a economia ajuste imediatamente num ponto sobre a curva de
Phillips de LP, a um nível superior de inflação.
• Robert Lucas, responsável pela introdução da hipótese das expectativas
racionais no raciocínio macroeconómico, admite porém que os agentes, ao
serem surpreendidos pela política económica, podem cometer erros de
previsão. Assim, só uma política inesperada poderá ter efeitos reais.
Macroeconomia II – 2022/23 51
Dilema Inflação-Desemprego: a Curva de Phillips
• Incorporação dos choques da oferta (variações no preço das matérias
primas ou na produtividade)  versão moderna da curva de Phillips:

e+

u* u
• De acordo com esta versão da curva, a taxa de inflação depende de 3
forças:

Inflação esperada Desemprego cíclico Choques da oferta


Inflação pela procura Inflação pelos custos
Macroeconomia II – 2022/23 52

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