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Em defesa do santo

O estabelecimento de marcos é prática comum que preenche a história de toda a humanidade.


Levantados pela vontade dos homens ou a serviço dos deuses, símbolos de vitória ou de
sacralidade, esses monumentos marcam além dos feitos e anseios humanos, os limites de seu
poder. O Gênesis bíblico nos conta que o Criador colocou no meio do Jardim do Éden, duas
árvores cujos frutos são os dois maiores bens que o homem pode ter: a vida e o conhecimento.
Da árvore da vida, Deus permitia que se consumisse o fruto enquanto da árvore do
conhecimento do bem e do mal, não era reservado ao homem seu desfrute. Após a
desobediência do primeiro casal e sua imediata expulsão, nasce a primeira geração pós-Éden
e, ali mesmo, se fazem presentes o fruto da desobediência, o fratricídio. A dor na primeira
família, causada por tamanha barbaridade, só é vencida com o nascimento de um novo filho,
diante do qual Eva exclama “Deus me concedeu outra descendência no lugar de Abel, que Caim
matou”1. A esperança recém-nascida recebe o nome de Seth, e diz a Escritura Sagrada que
Seth teve um filho e lhe colocou o nome de Enos (Enosh) “(...)então os homens começaram a
invocar o nome do Senhor (Shem of Hashem)”. Foi justamente nessa geração que o historiador
Flávio Josefo informa terem sido construídos dois pilares -- ou colunas – com o objetivo de que
neles fossem gravados os ensinamentos entregues pelo próprio Adão, a saber, o mito da criação
do mundo, e de sua futura destruição. Diz o historiador judeu -- e cidadão romano -- que os
construtores desses marcos ergueram um de tijolos e outro de pedra, sendo esse última possível
de ser avistado enquanto Josefo ainda vivia, no séc. I d.C. 2

Se para a civilização hebraica, o conhecimento revelado por Deus a Adão precisava ser mantido
e, para tamanha missão nada mais permanente e informativo que um pilar de pedra gravado
em baixo relevo, para a sociedade brasileira não se fez menos lógico erigir em lugar alto um
símbolo instrutivo de nossa fé, olhando não apenas para o lugar de onde nós viemos, mas
também o rumo que devemos focar no horizonte. Se o passado brasileiro remonta à cultura
ibérica, especialmente portuguesa, nosso futuro só poderá ser salvo do fracasso se
conformando às instruções de nossos pais. De Adão, os hebreus receberam o conhecimento
revelado pelo próprio YHWH; dos portugueses, os brasileiros receberam o conhecimento
entregue pela Santa Igreja, e em memória da catequese da Descoberta e visando ao
fundamento da fé pátria brasileira, no dia 12 de outubro de 1931 foi inaugurado no Rio de
Janeiro, o monumento do Cristo Redentor.

O conhecimento do divino
Estudar a história do homem é estudar a história da religião, se dedicar a entender sua relação
com aquilo que lhe é superior é também buscar entender aquilo que lhe é interno, afinal a vida
humana é parte da vida divina. Essa noção de divindade do homem é reconhecida já nas
sociedades primitivas (mesopotâmios, egípcios), sendo inclusive a força motriz que levou essas
nações à procura da origem das forças elementares, expressas em um politeísmo que
reconhecia (ou entregava) a personalidades sobrenaturais o domínio de um dos elementos ou
forças da natureza. An, o deus-céu e Ninhursag, a mãe-terra, eram ao mesmo tempo as
representações mesopotâmicas para os dois firmamentos, base de todo mito criacionista por ser
a própria estrutura que permite a vida humana sobre a Terra. Representavam também o próprio
ser humano, homem e mulher. Essa estrutura pré-teológica segue um modelo de simbolismo
importantíssimo no estudo das relações humanas com a religião – e que cito aqui unicamente
por ser de utilidade mais à frente na explanação que é tema desta aula. É unânime nas religiões
várias a compreensão da natureza como ente material, mas também imaterial, ou seja, prático,

1
Gn 4:25
2
Para saber mais sobre os pilares de Seth, assistir a Aula 25 de Teologia, na Escola de Conservadorismo.

1
mas também teórico, terreal e celestial. Assim, cada elemento natural (montanha, vale, árvore,
animal, chuva) tem sua consequência imediata física assim como sua referência pedagógica
celeste. Nesse universo de símbolos, a terra é sempre relacionada à mulher e o homem ao céu,
em uma referência direta do ser que detém a potência geradora ao mesmo tempo em que carece
da semeadura. No gênesis judaico (bíblico), a terra virgem foi criada carente de semeadura, que
à primeira vez foi realizada pelo próprio Espírito de Deus que inseminou o solo à semelhança do
que faria quatro mil anos depois com a virgem Maria3. Após a criação do Éden e o direcionamento
do homem para lá habitar, a Terra passa a ser fertilizada pelo Céu “[...]porque ainda o Senhor
Deus não tinha feito chover sobre a terra, e não havia homem para lavrar a terra”. O firmamento
de baixo e o firmamento de cima são separados pela mão do Criador, e sua reunião ocasiona
episódios de criação constantes ad aeternum. Da mesma forma, o homem-céu é criado e de si
mesmo é separado. Diz o Gênesis que, após ser deitado sobre a terra, Deus incompleta Adão,
para que posteriormente o homem a cada nova reunião carnal com a mulher repita o ciclo criador
da vida.

Entender a origem do cosmos no qual vivemos é entender a organização criadora na qual


estamos inseridos e da qual fazemos parte como deuses (Sl 82:6; Jo 10:34), ou seja, entes
dotados de poder criativo. Essa compreensão não é fruto da escolástica e muito menos nos foi
entregue pela teologia moderna, antes foi compreendida no estudo teológico mais primitivo, a
observação da natureza. E é por ser essa a origem intelectual da existência não apenas humana,
mas cósmica em que o ser humano está, que unicamente após seis mil anos de história, após o
advento da ciência moderna, foi possível regressar a níveis inimagináveis de desconhecimento
da existência de todas as coisas, nascendo no mundo moderno o conceito de ateísmo. Note
bem, é preciso responder aqui uma pergunta vital: “o que é o ateísmo?”.

Ateísmo:
Doutrina de quem não crê na existência de qualquer divindade. (Houaiss)

Doutrina ou atitude de espírito que nega categoricamente a existência de Deus,


asseverando a inconsistência de qualquer saber ou sentimento direta ou indiretamente
religioso, seja aquele calcado na fé ou revelação. (Oxford)

O ateísmo não tem relação alguma com o cristianismo! Veja que essa compreensão do próprio
significado do termo é desconhecida do público, que não obstante discute o tema diariamente
na internet (ainda que discuta no nível precário tão habitual ao ambiente virtual). O advento do
surgimento de pessoas que não apenas negam a existência de uma doutrina teológica (no
sentido de estudo do theos), mas negam mesmo a origem transcendente do ascendente, é cosa
nostra, pensamento de uma máfia do nosso século cujo ação bandida é de ordem intelectual.
Olhar para a coisa criada e não enxergar o que está por trás, ou que a precede, é obtusidade
tamanha que sequer a sociedade inca, que sacrificava crianças para aplacar a ira dos deuses
vulcânicos, ousava! Não apenas as sociedades mais primitivas reconheciam a verdadeira origem
das espécies como a sociedade greco-romana com seu panteão de deuses dedicava um altar
para cada força natural (Ceres, Agricultura; Cupido, Paixão; Fauna, Fertilidade; Minerva,
Sabedoria; etc.).

O apóstolo Paulo, quando em passagem por Atenas, nos retrata um episódio histórico dos mais
importantes à matéria aqui abordada:

3
“Estas são as origens dos céus e da terra, quando foram criados; no dia em que o Senhor Deus fez a terra e os céus.
Toda planta do campo ainda não estava na terra, e toda erva do campo ainda não brotava; porque ainda o Senhor
Deus não tinha feito chover sobre a terra, e não havia homem para lavrar a terra.” Gn 2:4, 5 (ARC) A semeadura do
Espírito na Terra em comparação com a semeadura do Espírito em Maria é matéria de suprema grandeza, uma vez
que para o nascimento de Cristo, Deus encontrou em Maria um receptor humano passível de realização do plano
redentor, mas não permitiu a um homem a tarefa da inseminação.

2
Enquanto Paulo esperava por seus companheiros em Atenas, ficou profundamente
indignado ao perceber que a cidade tinha ídolos por toda parte. E sobre esse tema
dissertava na sinagoga entre os judeus e os gentios obedientes a Deus, bem como na
praça principal, diariamente, a todos aqueles que ali estivessem. Então, alguns
filósofos epicureus e estóicos começaram a argumentar com ele. Alguns indagavam:
“O que deseja comunicar esse tagarela?” Outros comentavam: “Parece ser um
anunciador de deuses estranhos”, pois Paulo lhes pregava as Boas Novas de Jesus e
a ressurreição. Por essa razão, o levaram a uma reunião no Areópago, onde lhe
questionaram: “Podes revelar-nos que nova doutrina é essa, sobre a qual dissertas?
Pois estás nos apresentando pensamentos estranhos, e desejamos compreender o
significado de tais ideias”. Porquanto os cidadãos de Atenas, assim como todos os
estrangeiros que ali viviam não se preocupavam com outro assunto senão falar e
procurar saber as últimas novidades.

Sendo assim, Paulo levantou-se no meio da reunião do Areópago e discursou: “Caros


atenienses! Percebo que sob todos os aspectos sois muitíssimo religiosos, pois,
caminhando pela cidade, observei cautelosamente seus objetos de adoração e
encontrei até um altar com a seguinte inscrição: AO DEUS DESCONHECIDO. Ora,
pois é exatamente este a quem cultuais em vossa ignorância, que eu passo a vos
apresentar. O Deus que criou o Universo e tudo o que nele existe é o Senhor dos céus
e da terra, e não habita em santuários produzidos por mãos humanas.

O que temos aqui é o menor dos apóstolos enfrentando internamente uma luta intelectual ao
passear pelo império romano e, chegando a Atenas, centro do florescimento intelectual grego,
encontrar uma cidade imersa na discussão religiosa e, ao mesmo tempo, ignorante quanto ao
Evangelho de Cristo. Que fique bem claro ao leitor, combater o ateísmo nessa situação seria
tarefa desnecessária (burra, até!) uma vez que a cosmovisão helênica era construída sobre o
divino. A falta identificada pelo apóstolo foi não com relação ao ateísmo, mas sim ao
acristianismo! A sociedade helênica não havia recebido a notícia de que o Filho de Deus
encarnou na Judéia, e que sua vida teve como objetivo conceder ao homem o seu maior sonho,
o prêmio que levou a humanidade desde suas primeiras sociedades ao serviço sacerdotal: a
redenção.

Veja que o texto do livro de Atos dos Apóstolos (citado acima) diz “[...]pois Paulo lhes pregava
as Boas Novas de Jesus e a ressurreição”. A doutrina ateísta4 tem como consequência não
apenas nos levar de volta há dois mil anos atrás, mas retroceder a própria cosmovisão humana
religiosa (não cristã, mas religiosa!) a tempos imemoriais, antes da compreensão que permeia
todos os milênios de história humana sobre a terra, perpassando pela renascença italiana, a
filosofia grega e até mesmo os primeiros saberes coletados ainda à luz do fogo nas cavernas.

A Boa Nova de Jesus


E qual nosso objetivo aqui hoje? Confesso que até aqui não fiz mais do que assentar as bases
sobre as quais a discussão deve discorrer, e isso é mister quando necessitamos discutir o que
está acontecendo hoje no Brasil: a tentativa de destruição daquele altar dedicado AO DEUS
DESCONHECIDO.

4
Para os que rejeitam a ideia de uma “doutrina ateísta”, não há exercício mais urgente do que pesquisar sobre a
ligação do cientificismo moderno com a criação de um sistema religioso, onde a crença na origem de tudo quanto há
está baseada em um complexo sistema de estudos produzidos e reproduzidos em laboratório, seguindo posteriormente
para a publicação acadêmica, onde passa a figurar como “escritos sagrados” em forma de artigos científicos, os quais
chegam na atual Era do Judiciário a servir de base até mesmo para processos legais que já levam aos tribunais
aqueles que neguem a fé científica. Não deveria surpreender ninguém o fato de que o grupo que começou clamando
pela liberdade de negar a fé, tenha se tornado exatamente o grupo que produz material técnico que leva para a prisão
os que se negam a crer em suas verdades, agora chamados “negacionistas”.

3
Foi publicado no Jornal O Dia5, matéria intitulada “Alerj apresenta projeto de lei para desapropriar
o Cristo Redentor por interesse religioso”, onde o periódico informa ao público que há uma “briga
entre a Arquidiocese do Rio e o Instituto Chico Mendes (ICMBio), que disputam o acesso ao
Cristo Redentor”. Intermediando “a briga”, um deputado estadual do Progressistas, Dionísio Lins
– que é líder do partido na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) --, apresentou um projeto de lei
que autoriza o poder executivo a desapropriar o terreno onde fica localizado o Cristo Redentor,
sob alegação de “interesse religioso”. Ora, qual interesse religioso pode querer tomar o terreno
onde fica o símbolo religioso que expressa a fé do povo brasileiro?

Para entender o que se passa, mais uma vez preciso (sou obrigado!) fazer um exercício de
retomada do conhecimento abandonado. Estamos falando -- perdão pela repetição, mas o
absurdo é tal que é preciso esclarecer nossas mentes plenamente antes de discutirmos a notícia
– de uma iniciativa do Poder Legislativo estadual do Rio de Janeiro em se tornar proprietária do
terreno onde fica a imagem do Cristo Redentor, e o interesse é religioso! E o que nos conta a
História do Brasil sobre o Cristo Redentor?

Caso o aluno tenha interesse em pesquisar o tema, ficará surpreso ao encontrar não informação,
mas um hiato na história recente de nosso país. A obra de planejamento e construção do Cristo
Redentor simplesmente não é documentada com propriedade! (vou evitar aqui o excesso dos
acentos de exclamação, o tema já é por si escandaloso não sendo necessário escandalizar a
gramática textual). Imagine um cidadão norte-americano tendo dificuldades em encontrar
registros históricos e documentais sobre o planejamento e construção da Estátua da Liberdade,
e isso desconsiderando que o Cristo Redentor não é apenas o maior cartão postal do País, mas
a expressão material da fé do povo mais proeminente da América Latina. Não obstante a
dificuldade aqui denunciada, percorri esse caminho que é carregado de lendas e desinformação
e trago ao caro aluno um breve resumo (com as notas de rodapé com referências para aqueles
que quiserem ir mais à fundo como eu fui, e além).

A origem do Cristo Redentor retoma ao sonho de um cristão que buscava estabelecer no Brasil
– e tinha de ser no Brasil! – um símbolo que anunciasse por si só o Evangelho. O que hoje é a
imagem não apenas do Rio de Janeiro, mas do Brasil no cenário internacional, o Cristo Redentor
foi trazido à imaginação pelo padre Pierre Marie Boss (1836-1934 - chamado Pedro Maria Boss,
no Brasil), missionário francês que desembarcou no Rio de Janeiro em fevereiro de 1859, aos
vinte e cinco anos de idade, para assumir a capelania do Colégio da Imaculada Conceição,
criado por solicitação do Imperador D. Pedro II às Filhas da Caridade de São Vicente de Paulo.
Boss morreu sem ver seu sonho ser materializado em concreto armado, mas foi o veículo de
Deus para trazer à existência as ideias que germinariam em um projeto ousado, concluído
décadas após sua morte. Ainda em 1859, a construção foi sugerida pela primeira vez pelo
próprio padre Pedro Maria Boss, à princesa Isabel. A princesa, no entanto, rejeitou o projeto, e
o fez sabiamente pois anos mais tarde, quando veio a assinar a Lei Áurea e abolir a escravatura
no Brasil, o projeto retornou à pauta com uma modificação soprada aos ouvidos de Isabel pelo
próprio diabo: os abolicionistas queriam erguer uma estátua da redentora dos escravos no alto
do Corcovado.

É então que a Princesa Imperial emite a ordem definitiva que entra nos ouvidos dos tentadores
e fere de morte a ideia idólatra:

5
Jornal O Dia, matéria do dia 15/9/2021 intitulada “Alerj apresenta projeto de lei para desapropriar o Cristo Redentor
por interesse religioso” - https://odia.ig.com.br/rio-de-janeiro/2021/09/6235234-alerj-apresenta-projeto-de-lei-para-
desapropriar-o-cristo-redentor-por-interesse-religioso.html (Acessado pela última vez em 21/9/2021).

4
“Manda Sua Alteza a Princesa Imperial Regente em Nome de Sua Magestade o
Imperador agradecer a oferta da Commição Organizadora constituída da Sociedade
Brazileira de Beneficência de Paris, da Cia. Estrada de Ferro do Cosme Velho ao
Corcovado e do Jornal O Paiz, para erguer huma estátua em sua honra pela extinção
da escravidão no Brasil, e faz mudar a dita homenagem e o projecto, pelo officio de 22
de julho do corrente anno, por huma estátua do Sagrado Coração de Nosso Senhor
Jezus Christo, verdadeiro redentor dos homens, que se fará erguer no alto do morro
do Corcovado’.6

Estava vencida não apenas a tentativa vil de entronar a criatura no alto do Corcovado, como
lançadas as bases de louvor ao Criador com o verdadeiro Redentor, de braços abertos acima
da então Capital Federal.

Porém, com o fim do Império e a chegada da República, o plano só veio a ser discutido de fato
décadas depois, quando em 1921 se reuniu a primeira assembleia destinada a discutir o projeto
local para a edificação do Cristo, a ser construído na ocasião do primeiro centenário da
independência do Brasil, em 1922. A obra obviamente não se concluiu no centenário da
Independência, mas estava lançada a pedra fundamental no coração da comunidade católica,
que a pedido do cardeal Dom Sebastião Leme se organizou e, em setembro de 1923, lançou
uma campanha nacional para arrecadação de fundos para as obras, acontecia então a “Semana
do Monumento”. A sociedade brasileira em geral se mobilizou vendendo rifas e realizando festas
de arrecadação; grupos de escoteiros bateram de porta em porta coletando ofertas e até as
tribos dos Bororós, do estado do Mato Grosso, se envolveram na realização do sonho imperial7.

Tão especial trecho de nossa história é celebrado no belo texto de autoria do próprio padre
Pierre Marie Boss, registrado em prefácio da obra “Imitação de Cristo”, em edição traduzida por
ele do francês8:

“O Corcovado!…
Lá se ergue o gigante de pedra, alcantilado, altaneiro e triste,
como interrogando o horizonte imenso – Quando virá?
Há tantos séculos espero! Sim, aqui está o Pedestal único no mundo.
Quando vem a estátua, como eu, colossal imagem de Quem me fez?”
(...) Acorda depressa, levanta naquele cume sublime a imagem de Jesus Salvador.
-- Lá vai o meu humilde brado.
Deus lhe proporcione eco por todo o Brasil. (...)Nem todos por causas diversas lerão o
Livro;
ao passo que em todas as línguas e linguagens, a imagem
dirá ao grande e ao pequeno, ao sábio e ao analfabeto, a todos:
Ego sua via, veritas, et vita.
Eu sou o caminho, a verdade e a vida.
Venite ad me omnes.
Vinde todos a mim.

6
PRINCESA ISABEL, DECRETO IMPERIAL. Memorial Visconde de Mauá, p. 67-68.
7
http://arqrio.org/formacao/detalhes/1469/85-anos-do-cristo-redentor.
8
BOSS, P.M., Prefácio à Imitação de Cristo. In: LIMA, M., Cristo Redentor do Corcovado. Mensagem religiosa e
história.

5
O que se pede de nós
Com a matéria jornalística citada nesse texto, vemos uma ação pérfida vinda dos setores mais
progressistas da sociedade brasileira, com o único objetivo de desqualificar a memória imperial
e popular do Brasil, haja vista ter sido o Cristo Redentor construído não apenas sob édito real
mas sobre as orações e esmolas de milhares de brasileiros que, movidos pela Paixão de Cristo
na “Semana do Monumento”, se colocaram de corpo e alma (para ser literal nas palavras) no
projeto da fé cristã na Capital do Brasil. Falar de Cristo não é falar de um theos global, essa é a
matéria objeto da religião a ser estudada pelos historiadores das religiões, intelectuais
debruçados sobre o homo religiosus em busca da compreensão da relação Criador-criatura9. O
que se faz aqui é de cunho doutrinário, ou seja, tem a ver com a profissão de fé de um grupo
específico de cidadãos que, no Brasil, se organizaram e laboraram para expressar um conjunto
de ideias fundamentais de um sistema religioso em específico, e esse sistema é o Cristianismo.
Falar do Cristo Redentor é falar de um monumento de propriedade imaterial dos cristãos, não
podendo ser reabertas suas cláusulas de origem, inserindo nas mesmas, competências sociais
ainda que debaixo de vocações supostamente humanitárias vindas de organismos
internacionais.

Agora é hora de os incomodados se retirarem de seus pontos de repouso, e o objetivo da aula


que aqui caminha para o final é justamente esse, depositar no assento da cristandade
adormecida salientes alfinetes a espetar os santos assentos que repousam em berço esplêndido
Brasil afora. Cada cristão brasileiro tem, hoje, a obrigação de defender a memória Imperial do
Brasil, o intento de milhares de pais, mães e filhos cristãos de todo o Brasil que [se] doaram para
o projeto de elevar o Redentor acima de todo nome no Brasil e, mais uma vez, marcar território
anunciando um tempo de resgate do sonho da Princesa Regente de declarar o Sagrado Coração
de Nosso Senhor Jezus Christo diante dos olhos de toda a nação. Ou será que o perigo que
corremos ainda não está claro?

Falar do Cristo é falar daquele que foi além da compreensão do divino, e como dito por São João
“estava no princípio com Deus”. O cristianismo não é uma expressão de fé, é o exercício de
obediência a um corpo doutrinário que, assim como Paulo em Atenas, prega “as Boas Novas de
Jesus e a ressurreição”. Ora, a maior importância religiosa não está na compreensão da origem
divina na coisa criada, essa até mesmo os homens nas cavernas já possuíam, a discussão de
entrada à vida eterna ao lado do Pai está na doutrina de que Jesus, o Nazareno, nasceu de
nascimento virginal, viveu sem mácula e morreu na cruz como sacrifício vivo, imolado para a
remissão dos pecados de todo aquele que n’Ele crer e for batizado10, e crendo, no último dia o
cristão ressuscitará para viver eternamente com seu Salvador (cf. I Co 15).

Declarar o Cristo Redentor como espaço unicamente turístico é profanar o espaço consagrado
e a memória de nossos pais; abrir o Cristo Redentor a toda sorte de culto religioso é permitir que
entre no Brasil a ação destruidora dos espaços físicos destinados ao culto cristão. Será que o
avanço da militância progressista no Ocidente contra os símbolos culturais, religiosos e históricos
de diferentes civilizações ainda não é o bastante para se compreender o mal desejado pelos
“abolicionistas” de nosso século? Não desejam a abolição de algo que não aquilo que entendem
como mal, declaram em alta voz que o cristianismo é a pré-história religiosa, e que o “cristianismo
bom” é o pluricristianismo, qual seja, o cristianismo desprovido de doutrina, apenas um grande
grupo de pessoas “do bem”.

Estamos com o bicentenário da Independência à porta. Em 1922, em comemoração ao primeiro


centenário da Independência, foi anunciado o projeto de construção do Cristo Redentor; em 12

9
Sobre esse tema de suma importância, ver O sagrado e o profano. A essência das religiões, de Micea Eliade. Editora
WMF Martins Fontes. São Paulo, 2018.
10
Mc 16:16.

6
de outubro de 1931, foi inaugurado. Em 2022, chegaremos ao bicentenário, o que renderemos
em memória de nossos pais, ofereceremos à geração atual de cristãos e entregaremos às futuras
gerações? É hora de nos reorganizarmos e irmos novamente de porta em porta, como as
centenas de crianças que recolheram ofertas para a realização do sonho no Corcovado. É hora
de ouvirmos o clamor da Igreja por uma restauração do espaço de culto a Jesus Cristo, em um
tempo em que até mesmo medidas de saúde pública absolutamente sem sentido tem interferido
na liturgia da Santa Igreja. Onde estão as lideranças cristãs no Parlamento? Onde estão as
lideranças cristãs no Corpo de Cristo? Cadê as associações e organizações evangelísticas
desse país? Estariam dormindo, como Baal no sacrifício de Elias? Se estiverem, aqui estamos
nós gritando para que acordem, pois é chegada a hora.

Ferrnando Melo
Brasília, 21 de setembro de 2021.

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