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Em Defesa da Sociedade - Michel Foucault

Aula de 18 de Fevereiro de 1976

1- Desagregação de um discurso histórico preliminar: a louvação de Roma (discurso do


Estado sobre si mesmo; função de manifestar o direito do Estado -XVII/XVIII).

2- Essa “invenção de um discurso histórico” ocorre de duas maneiras: 1) reativação do fato


da invasão: invasão dos germanos nos séculos V-VI como momento da ruptura do direito
público; 2) introdução de um novo sujeito da história: já não é Estado falando de si, mas
uma nova entidade: a nação.

3- Nação: a partir dela vão derivar noções como nacionalidade, raça, classe. Definição
enciclopédica de nação (p. 120).

4- O que é essa nova história, em que ela consiste, como se instaura no século XVIII?
Problema inglês (XVI-XVII) na monarquia inglesa, havia dois sistemas de direitos opostos e
ao mesmo tempo duas nações. Sistema de direito correspondente à nação normanda
(aristocrático e monárquico) e, por outro lado, o direito saxão (direito das liberdades
fundamentais)
Problema da nobreza francesa (XVII-XVIII): lutar em duas frentes: 1) contra a monarquia e
suas usurpações de poder; 2) contra o terceiro estado, que se aproveita da monarquia para
invadir os direitos da nobreza (p. 121).

5- Gália (invasão dos francos): o direito que nela reina não é em absoluto uma soberania
consentida, é um fato de dominação (p. 122). Surge uma nova nobreza: civil, jurídica,
administrativa: prática aguçada, fina e hábil do direito romano e, em segundo lugar, o
conhecimento da língua romana (prática do direito + conhecimento da língua).

6- A liberdade de uma aristocracia guerreira: liberdade do egoísmo, da avidez, de gosto


pela batalha, conquista e rapina. Não se trata da liberdade da tolerância e da igualdade: se
dá pela dominação.

7- Para Boulainvilliers: o início do feudalismo: feudalismo como um sistema histórico-


jurídico que caracteriza a sociedade, as sociedades europeias, desde os séculos VI, VII, VIII
até o século XV aproximadamente.

8- Transformação da monarquia: chefe de guerra e chefe civil (episódio do vaso de


Soissons - p. 126 e p. 128). O monarca absoluto nasce: a forma militar do poder e da
disciplina começa a organizar o direito civil.

9- Aristocracia gaulesa: se refugia na Igreja após a invasão de francos e germânicos. A


Igreja se tornou a aliada natural dos novos monarcas: latim, direito romano, prática
judiciária.

10- Língua dos saberes - sistema da língua-saber: Latim torna-se língua do Estado - língua
de saber e língua jurídica. Retomando consciência de si, inserindo-se de novo na trama do
saber, que a nobreza poderá voltar a ser uma força, colocar-se como sujeito da história.
11- Análises sobre a guerra - narrativa da guerra
“Pois bem, eu acho que se tem, quando se olham as coisas um pouco mais de perto, o
exemplo de uma classe que, na mesma medida em que estava em plena decadência,
despojada de seu poder político e econômico, implantou uma certa racionalidade histórica
de que a burguesia em seguida, e o proletariado depois, se apossarão. Mas eu não direi
que é porque estava em decadência que a aristocracia francesa inventou a história. é
porque ela fazia a guerra que pôde atribuir-se, precisamente, sua guerra como objeto,
sendo a guerra a um só tempo o ponto inicial do discurso, a condição de possibilidade da
emergência de um discurso histórico e o referencial, o objeto para o qual se volta esse
discurso, sendo a guerra, ao mesmo tempo, aquilo a partir de que o discurso fala e aquilo
de que ele fala” (p. 139)

12- 3 generalizações da Guerra em Boulainvilliers

1º - Generalização da guerra com relação ao direito e aos fundamentos do direito:

Guerra é essa espécie de episódio de ruptura que suspende o direito e o subverte. A guerra
é o barqueiro que permite ir de um sistema de direito para outro.

Em nenhuma sociedade, seja qual for, há direitos naturais (p. 131)

“E, aliás, todas as vezes que se veem as diferenças entre aristocracia e povo atenuar-se
numa sociedade ou num Estado, pode-se ter certeza de que o Estado vai entrar em
decadência” (p. 132).
“Logo, em toda parte desigualdades, em toda parte violências que fundamentam
desigualdades, em toda parte guerra ‘ (p. 132).

Liberdade como contrário da igualdade

“A lei igualitária da natureza é fraca em face da lei desigualitária da história” (p. 133).

2º - Generalização da guerra e sua relação à forma da batalha

Armas
“Já não é como resultado da invasão que a guerra deixaria sua marca num corpo social,
mas que, por intermédio das instituições militares, ela acaba tendo efeitos gerais sobre a
ordem civil inteira” (p. 134)
“Já não é esse mecanismo binário simples que marcará com a chancela da guerra o corpo
social inteiro, mas uma guerra considerada além e aquém da batalha, a guerra como
maneira de fazer a guerra, como maneira de preparar e de organizar a guerra. A guerra
entendida como distribuição das armas, natureza das armas, técnicas de combate,
recrutamento, retribuição dos soldados, impostos destinados ao exército, a guerra como
instituição interna e não mais como evento bruto da batalha” (p. 135)

A guerra é uma economia geral das armas, uma economia dos homens armados e dos
desarmados, num dado Estado, e com todas as séries institucionais e econômicas que
derivam daí…. (p. 135).
3º - Generalização da guerra como sistema invasão-revolta

Relação de força: como os fortes se tornam fracos e como os fracos se tornam fortes.

Determinação dos mecanismos internos de inversão (fortes-fracos)

História como cálculo de forças: Quem se tornou forte? Quem se tornou fraco? - novas
oposições, novas clivagens, novas distribuições.

Guerra como uma espécie de estado permanente entre grupos, frentes, unidades táticas, de
certo modo, que se civilizam uns aos outros, se opõem uns aos outros, ou, ao contrário, se
aliam uns aos outros.

Guerra generalizada: vai percorrer tanto todo o corpo social quanto toda a história do corpo
social: mas não, é evidente, como guerra dos indivíduos contra os indivíduos, mas como
guerra de grupos contra grupos.

13- História a partir do próprio fato de guerra: relacionar guerra, religião, política, costumes
e caracteres - princípio de inteligibilidade da sociedade.

“Guerra como matriz de verdade do discurso histórico: “a verdade e o logos não começam
onde cessa a violência. Ao contrário, foi quando a nobreza começou a travar sua guerra
política, a um só tempo contra o terceiro estado e contra a monarquia, foi no interior dessa
guerra e pensando na história como guerra, que algo como o discurso histórico que
conhecemos agora pôde estabelecer-se” (p. 139).

“Mas eu não direi que é porque estava em decadência que a aristocracia francesa inventou
a história. É e porque ela fazia a guerra que pôde atribuir-se, precisamente, sua guerra
como objeto, sendo a guerra a um só tempo o ponto inicial do discurso, a condição de
possibilidade da emergência de um discurso histórico e o referencial, o objeto para o qual
se volta esse discurso, sendo a guerra, ao mesmo tempo, aquilo a partir de que o discurso
fala e aquilo de que ele fala”

Política: a guerra sendo continuada por outros meios.

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