Você está na página 1de 39

UNIVERSIDADE VEIGA DE ALMEIDA - UVA

CURSO DE PSICOLOGIA

A EFICÁCIA DA TERAPIA COGNITIVO COMPORTAMENTAL EM


CRIANÇAS QUE SOFRERAM VIOLÊNCIA SEXUAL INFANTIL

DANIELA BARCELLOS FARIAS

Rio de Janeiro

2015
Daniela Barcellos Farias

A EFICÁCIA DA TERAPIA COGNITIVO COMPORTAMENTAL EM


CRIANÇAS QUE SOFRERAM VIOLÊNCIA SEXUAL INFANTIL

Monografia apresentada ao curso de psicologia da


Universidade Veiga de Almeida, como requisito
parcial à obtenção do título de bacharel em
psicologia.

Orientador(a): Prof. Juliana Lopes Fernandes

RIO DE JANEIRO

2015
DANIELA BARCELLOS FARIAS

A EFICÁCIA DA TERAPIA COGNITIVO COMPORTAMENTAL EM


CRIANÇAS QUE SOFRERAM VIOLÊNCIA SEXUAL INFANTIL

Monografia apresentada ao curso de psicologia da


Universidade Veiga de Almeida, como requisito
parcial para obtenção do título de bacharel em
psicologia.

Rio de Janeiro, 08 de Junho de 2015.

BANCA EXAMINADORA

______________________________________________________________

PROFESSORA MESTRE JULIANA LOPES FERNANDES

______________________________________________________________

PROFESSOR MESTRE LINCOLN NUNES POUBEL

______________________________________________________________

PROFESSORA DOUTORA RENATA ALVES


AGRADECIMENTOS

À Deus por conceber saúde e capacidade para a realização deste sonho.

Aos meus pais que estiveram comigo desde o início desta trajetória, mesmo sem
entender a minha escolha, estiveram presentes me apoiando, acreditando em mim e não
deixando desistir. Obrigada por tudo, eu amo vocês.

Ao meu esposo, amigo, companheiro de todas as horas, com você eu aprendi que
quando acreditamos em nossos sonhos podemos além de alcançá-los, superá-los, ter você em
minha vida foi um presente de Deus que recebi, obrigada por acreditar em mim, no meu
sonho, e sempre me apoiar, eu te amo.

Aos meus irmãos Sandra e Maicon que serviram de exemplo para iniciar esta
caminhada e mesmo longe significam muito em minha vida, amo vocês.

À minha pequena Lavínia que me inspira em minha prática profissional, e a minha


filha Pandora, mesmo que em muitas vezes não pude oferecer atenção, sempre retribuiu todo
o carinho e amor. Amo vocês!

Aos mestres, em especial a minha orientadora, Juliana Lopes Fernandes, pelo


empenho e entusiasmo com que realiza a prática clínica e ministra suas aulas, e por estar
disponível quando precisei.

Às amigas que tive a oportunidade de conhecer durante o curso, companheiras de


todos os momentos, Ivile Reis, Larissa Vieira e Georgiane, tenho certeza que este é só o início
de nossa jornada!

À amiga de todas as horas e de todas as distâncias Mayara que com suas palavras de
apoio desde o início da escolha do curso esteve presente em minha vida, uma amizade que
perpassa a marca dos sete anos será para a vida toda, obrigada por tudo.

À minha terapeuta Fernanda Peixoto, com sua experiência faz-me, avaliar as situações
de uma forma mais adaptativa, bem como, acreditar em mim mesma, agradeço seu empenho e
dedicação, a cada dia me torno mais flexível, você é o meu exemplo.
RESUMO
A violência sexual infantil é considerada como um problema de saúde pública, tal qual,
mostra-se a relevância de aprimorarmos as técnicas para a intervenção com as vítimas e seus
familiares. Desta forma, este trabalho monográfico teve como intenção realizar uma revisão
de literatura sobre a Eficácia da Terapia Cognitivo Comportamental em crianças que sofreram
violência sexual infantil. Para tanto, foram utilizados como embasamento teórico livros,
textos científicos e artigos da internet dos principais autores referentes ao tema. Nele foram
descritos o panorama da violência sexual infantil, dados estatísticos, a história da terapia
cognitivo comportamental, as principais técnicas utilizadas para estes casos, exemplificando a
diferença entre abordagens diretivas e não diretivas. Contudo foi possível afirmar que a TCC
propicia a eficácia no tratamento em vítimas de abuso sexual infantil, bem como mostrou-se a
importância de mais estudos frente ao tema, comparando com outras abordagens, para que
possamos aprimorar a intervenção, a inclusão de familiares no processo de intervenção e a
criação de protocolos específicos para o abuso sexual infantil. Neste contexto, também foi
destacado a importância dos profissionais da área buscarem melhor capacitação para atuar
nestes casos.

Palavras chave: Violência Sexual Infantil; Terapia Cognitivo Comportamental; Psicoterapia;


Crianças.
ABSTRACT
The Child sexual abuse was considered a public health problem that shows need for improve
techniques for assisting victims and their families. Thus, this monograph was intended to
conduct a literature review on the effectiveness of Cognitive Behavioral Therapy (CBT) in
children who have experienced child sexual violence. To finish, they were used as theoretical
background books, scientific texts and articles from internet lead author on the topic. In it
were described the landscape of child sexual violence, statistics, history of cognitive
behavioral therapy, the main techniques used for these cases, illustrating the difference
between policy and non-directive approaches. However, it was possible to say that CBT
provides efficacy in treating victims of child sexual abuse, and showed the importance of
further studies outside the theme, compared with other approaches, so that we can improve
the intervention, the inclusion of family members in the intervention process and the creation
of specific protocols for child molestation. In this context, also highlighted the importance of
professionals seeking better training area to act in these cases.

Keywords: Child Sexual Violence; Psychotherapy; Children.


SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 08-09

1. PANORAMA DA VIOLÊNCIA SEXUAL INFANTIL 10-11

1.1 DEFINIÇÃO DE ABUSO SEXUAL INFANTIL 11-12


1.2 A INCIDÊNCIA DO ABUSO SEXUAL INFANTIL 12-14
1.3 ABUSO SEXUAL INTRAFAMILIAR E EXTRAFAMILIAR INFANTIL 14-15
1.4 O IMPACTO DO ABUSO SEXUAL INFANTIL 16-17

2. TERAPIA COGNITIVO COMPORTAMENTAL 18-20

2.1 MODELOS COGNITIVO 20-22


2.2 CONCEITUALIZAÇÃO COGNITIVA 22-24

3. A TERAPIA COGNITIVO COMPORTAMENTAL NO QUADRO DE ABUSO


SEXUAL INFANTIL 25-28

3.1.TÉCNICAS UTILIZADAS EM CASOS DE ABUSO SEXUAL INFANTIL 28-34

CONCLUSÃO 35-36

REFERÊNCIAS 37-39
8

INTRODUÇÃO

A violência sexual infantil é um problema de saúde pública que atinge crianças e


adolescentes em diferentes famílias, contextos sociais e culturais.

Quando falamos em maus tratos infantil, a violência sexual infantil está em segundo
lugar, atrás apenas de negligência e abandono. Considerando tal afirmação, podemos imaginar
a quantidade de vítimas que sofrem com a violência sexual infantil, causando danos de curto a
longo prazo, tanto no seu desenvolvimento cognitivo, emocional e comportamental.

A construção deste trabalho possibilitou aprofundar o conhecimento, através da


revisão bibliográfica, um assunto que, frente as estatísticas, apresenta-se de grande relevância
de estudo. Primeiro porquê pouco fala-se sobre o tratamento frente as vítimas e familiares que
vivenciaram o abuso sexual infantil. Segundo pela quantidade de casos expostos nos meios de
comunicação atuais, com grande reincidência de violência sexual infantil e mesmo com tal
relevância, percebe-se um estranhamento da sociedade em abordar tal temática a nível de
prevenção, pois o assunto é visto pela sociedade como uma brutalidade que nada justifica e
que gera sentimento de tristeza em qualquer indivíduo que acaba realizando a empatia frente a
este assunto.

Esse trabalho tem como objetivo mostrar a eficácia da terapia cognitivo


Comportamental (TCC) em crianças que sofreram a violência sexual infantil, enfatizando a
aplicabilidade da TCC quando comparada com outras abordagens não diretivas, frente a este
tipo de violência.Com o intuito de descrever as técnicas que possibilitam melhor intervenção
frente as vítimas.

No capítulo 1, descreve-se o panorama da violência sexual que são acometidos


crianças e adolescentes, a tentativa de sua definição, bem como a incidência de casos a nível
estatístico, os tipos de violência sexual tanto no contexto intrafamiliar e extrafamiliar e o
impacto do abuso sexual infantil na criança e nos familiares.

No capítulo 2, relata-se o contexto histórico da terapia cognitivo comportamental,


desde os primórdios, os questionamentos das abordagens da época até o surgimento da TCC.
Descreve-se ainda, o modelo cognitivo desenvolvido por Aaron Beck até a conceitualização
cognitiva.
9

No capítulo 3, após embasamento ao que refere-se a abordagem e a violência sexual


infantil, são descritas a importância da terapia nestes casos, bem como as técnicas utilizadas
para este tipo violência, A TCC como uma abordagem diretiva, com objetivos e estratégias,
que nestes casos focalizam diretamente ao trauma e os sintomas que nele desencadeiam,
possibilita melhor enfrentamento frente ao trauma vivenciado, reestruturação cognitiva,
consequentemente viabilizando o bem estar nestes indivíduos e uma visão mais adaptativa
frente tal problemática.
10

1 PANORAMA DA VIOLÊNCIA SEXUAL INFANTIL

O crescimento expressivo da violência e suas diferentes formas de manifestação é um


agravante crítico para a sociedade brasileira. Sabemos que a desigualdade econômica, social e
cultural e a propagação das drogas e o desemprego são fatores que colaboram para esta
realidade. Contudo apesar de contribuírem para o acréscimo da violência por si sós não
explicam tal fenômeno (ARAUJO, 2002).

A violência sexual infantil é descrita em relatos históricos, porém o reconhecimento


como um problema de saúde pública é recente, bem como a compreensão quanto aos danos
que pode comprometer o desenvolvimento das vítimas, tanto cognitivamente, emocional e
social (LUCÂNICA ET AL., 2009).

O abuso sexual, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS) é


caracterizado com um dos maiores problemas de saúde pública (ALMEIDA, 2012).

A quantidade de casos de abuso sexual bem como a exploração sexual de crianças


aumenta significativamente a cada dia, mas ainda é um fator surpresa em nossa sociedade,
existe uma dificuldade na aceitação, inclusive um bloqueio em aceitar que o abuso sexual
infantil ocorra por aqueles que deveriam propiciar cuidado e proteção (AMAZARRAY e
KOLLER, 1998).

Não apenas para os que praticam o ato, mas também para aqueles que se omitem, a
constituição federal, o código penal e o estatuto da criança e do adolescente (ECA) propõe
sobre a proteção da criança e adolescente contra qualquer forma de violência e determinam
penalidades (CORDEIRO, 2006).

Segundo Art. 227 da constituição federal:

"É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e


ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à
educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à
liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda
forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão
(REDAÇÃO DADA PELA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 65 DE 2010).

Antes da constituição federal de 1988 a criança não era considerada um sujeito de


direito, somente a partir de 1988 em conformidade com a convenção das Nações Unidades
frente aos direitos da criança que se instaurou uma nova época na defesa dos direitos das
11

crianças e adolescentes que ainda não atingiram os dezoito anos de idade (AZAMBUJA,
2006).

O ECA por sua vez contribui para a proteção das crianças e adolescentes, conforme
Lei nº 8.069, de 13/07/1990, artigo nº 5:

"E Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência,


discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei
qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais.” (ECA,
ARTIGO Nº 5, 1990).

Neste contexto com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) o abuso sexual


infantil começou a ser combatido, porém, sabemos que a violência sexual em crianças e
adolescentes acomete significativamente todas idades, religiões, etnias, culturas, níveis sociais
e econômicos desde a antiguidade (REZENDE, 2011).

O silêncio existente neste tipo de violência além de perdoar o perpetrador reforça o seu
poder perante a vítima, esta por sua vez sente-se impotente. Logo denunciar é uma tarefa
essencial para não corroborar com tal agressividade (AMAZARRAY e KOLLER, 1998).

Visto que falar sobre o abuso sexual infantil com a criança é um tabu, os pais ou
cuidadores possuem grande dificuldade em abordar este assunto com seus filhos. Se para
adultos é uma tarefa difícil falar, imaginem o quão difícil é para a criança, porém, o não falar
não afasta o abuso sexual infantil de nossa realidade, pelo contrário colabora com a
necessidade de silêncio que o abusador tem e precisa para não ser descoberto (SANDERSON,
2008).

Diante deste cenário, faz-se necessário aprofundar o entendimento frente ao abuso


sexual infantil, bem como o impacto nas vítimas, visando a construção de formas de
atendimentos mais eficientes e mais preparadas para lidar com esta demanda (SANT’ANNA e
BAIMA, 2008).

1.1 Definição de abuso sexual infantil

O abuso sexual infantil ocorre em todas as culturas e classes sociais, logo, existem
diferentes definições para o termo abuso, pois sofrem influência dessas variações. Oliveira e
12

Santos (2006) declaram uma certa dificuldade em caracterizar abuso sexual infantil em
determinados contextos sociais, a cerca de existirem diferenças culturais que são convergentes
ao tema, impossibilitando a definição precisa.

Portanto o conceito de abuso sexual está longe de ser preciso, mas pode ser definido
como:

Todo ato ou jogo sexual, sendo relações heterossexuais ou homossexuais, entre um


ou mais adultos e uma criança menor de 18 anos, com a finalidade de estimular
sexualmente a criança ou utiliza-la para obter uma estimulação sexual. (AZEVEDO
e GUERRA, 2000, p.42).

Almeida (2012) afirma que o abuso sexual infantil é o contato físico entre o abusador
e a criança, mencionando como exploração sexual a desigualdade de poder entre abusado
menor de idade e o abusador.

Considera-se o abuso sexual infantil qualquer contato com uma criança ou adolescente
em que o perpetrador tenha idade ou estágio psicossocial mais avançado que a vítima. O
abusador utiliza várias formas de atuação para conseguir realizar o abuso, à vista disto,
existem diferentes formas que são consideradas como parte de um abuso, são elas: ameaças,
força física, carícias, sexo oral, relações de penetração e ainda relações que não há contato
como, voyeurismo, assédio, pornografia e exploração sexual (CAMINHA ET AL., 2011).

O abuso sexual infantil é conduzido pelas vias da sedução, intimidação ou poder,


porém, a grande maioria dos abusos não é utilizado a força física, desta forma, não deixa
marcas visíveis o que torna ainda mais difícil comprovar ou até mesmo descobrir o abuso para
ajudar a vítima (ARAUJO, 2002).

1.2 A incidência do abuso sexual infantil

Não existem números reais sobre o abuso sexual infantil, pois a grande parte deles não
é descoberto. Há estudos que indicam que apenas 10% dos casos são relatados pelas vítimas
ou denunciados ao sistema judiciário criminal, assim sendo torna-se tão difícil uma estatística
fidedigna desta problemática, contudo o autor afirma que um em cada seis meninos e uma em
cada quatro meninas sofram algum tipo de abuso sexual na infância. (SANDERSON, 2008).
13

Caminha et al., (2011) afirma que nunca saberemos os números reais de abuso sexual
infantil, já que, os números nunca serão precisos, pois sabemos que a grande maioria das
notificações de abuso sexual não são relatadas, mesmo assim, enfatiza-se a importância de
mais estudos sobre o a violência sexual infantil, devido aos danos psicológicos na vítima.

A revelação é um momento crítico podendo por si só representar um trauma para a


vítima, por esse motivo a importância da denúncia aos órgãos de proteção para que seja
possível propiciar um acompanhamento adequado e acolhedor as vítimas por profissionais de
saúde (HABIGZANG ET AL., 2008).

Segundo a Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância e


Adolescência (ABRAPIA, 2002) estudos realizados no Estados Unidos (EUA) indicam que a
cada quatro segundos uma criança é abusada sexualmente, os números descrevem que em
90% dos casos a criança é abusada por pessoas que confia ou algum conhecido da família,
neste contexto afirma-se que um abusador ao longo de sua trajetória de vida abuse em média
de 260 crianças ou adolescentes.

No Brasil esta realidade não se difere dos números informados pelo estudo do EUA.
De acordo com o Portal Brasil (2012) foi realizada uma pesquisa pelo sistema de Vigilância
de Violências e Acidentes (Viva) em 2011, afirmando que abuso sexual infantil é o segundo
maior tipo de violência praticado entre crianças de 0 a 9 anos de idade, representando 35%
das notificações recebidas, ficando atrás apenas de negligência e o abandono que
representaram na pesquisa 36% de casos. E quando aumentamos a faixa etária da pesquisa de
crianças e adolescentes de 10 a 14 anos de idade temos 10,5% de casos registrados, em
segundo lugar na pesquisa. O número de notificações recebido pelo Viva para realização da
pesquisa foi de 14.625 casos que variam entre violência sexual, doméstica, física e outros
tipos de agressões realizadas em crianças e adolescentes.

A associação Brasileira de Crianças Abusadas e Negligenciadas revelou que recebe


4,5 milhões de casos por ano de crianças que sofreram abuso sexual e negligência
(CAMINHA ET AL., 2011).

Resultados de pesquisas estão sendo mencionados com o intuito de investigar o índice


e prevalecimento da violência sexual infantil, em conjunto com uma análise dos indicadores
sociais e psicológicos associados a este tipo de violência. Os estudos indicam que a grande
maioria dos casos de abusos sexuais infantis acontecem na própria residência da vítima e
14

grande parte sendo o pai biológico e o padrasto como principal abusador, neste contexto,
sabemos que trata-se de um abuso sexual incestuoso, uma vez que trata-se do pai ou padrasto
da vítima. Existe uma predominância nos casos de abuso sexual incestuoso ser em vítimas do
sexo feminino. O autor enfatiza a precocidade em relação ao início do abuso que ocorre
geralmente entre os 5 e os 8 anos de idade. Contudo, sabemos que quando revelado o abuso
sexual infantil pela vítima ele ocorre geralmente após um ano do início do abuso sexual e a
mãe sempre é um referencial para a criança relatar sobre da violência que sofreu
(HABIGZANG ET AL., 2006p).

Segundo Sanderson (2005) existem cinco tipos de relações incestuosas no abuso


sexual infantil intrafamiliar também conceituado como incesto que são elas: pai-filha, irmão-
irmã, mãe-filha, pai-filho, mãe-filho.

1.3 Abuso Sexual Intrafamiliar e Extrafamiliar Infantil

As crianças e adolescentes são considerados indivíduos que estão em


desenvolvimento, desta forma necessitam de cuidados especiais, onde seja garantido sua
proteção para que ocorra seu crescimento intrapessoal e interpessoal, pois sabemos que a
infância e adolescência são etapas muito importantes para o desenvolvimento físico,
cognitivo, social e emocional de cada ser humano. Sendo assim a garantia dos direitos
fundamentais das crianças e dos adolescentes é de responsabilidade de toda sociedade e do
poder público (HABIGZANG, 2006).

Para formação do indivíduo a família tem seu papel importante como uma instituição
social primordial para o desenvolvimento de cada ser humano, cabendo aos pais proteção,
cuidado no desenvolvimento físico e emocional de seus filhos e garantir segurança.

Quando o abuso ocorre dentro do contexto familiar por aqueles que deveriam cuidar e
zelar seus filhos, estabelece uma confusão de papéis, pois no abuso sexual os atos se misturam
entre sedução e carinho, mascarando o abuso, desta forma a criança oscila em denunciar e
calar-se, pois trata-se, das pessoas as quais a criança confia e deveriam lhe garantir cuidado e
proteção (ARAUJO, 2002).
15

Pesquisas apontam que 50% dos abusos sexuais infantis são realizados por membros
da família (AMAZARRAY e KOLLER, 1998). Desta forma é utilizado o conceito de abuso
sexual intrafamiliar ou também chamado de incesto.

Segundo Habigzang (2006) considera-se também relações incestuosas quando um


adulto e uma criança que não tenha o laço de sanguidade mas possua o papel de responsável
deste menor (tutor, cuidador, membro da família ou familiar à criança) e mantenha relação
sexual, incluindo assim madrastas, padrastos, meios-irmãos, avós e companheiros que
residam junto com o pai ou mãe caso ele assuma o cuidado deste menor.

Sabemos que os pais têm a responsabilidade de cuidar do desenvolvimento físico e


emocional dos seus filhos, quando ocorre o abuso sexual infantil intrafamiliar os pais ou
responsáveis utilizam-se deste poder de cuidado para exercer poder de dominação e
exploração, beneficiando-se a sua satisfação de desejos e necessidades pessoais sobre a
criança ou adolescente (ARAUJO 2012).

Segundo Habigzang (2006) a vítima não entende que a interação é abusiva e por esse
motivo não revela para outras pessoas, mas à medida que o abuso se torna mais evidente, a
criança percebe que está sendo abusada e o perpetrador começa a utilizar artifícios de
barganhas e ameaças para que a criança continue em segredo, mantendo-se assim em torno de
pelo menos um ano. Neste contexto a criança sente-se desamparada, acreditando nas
intimidações do abusador, então surgem as crenças de que é culpada pelo abuso, sentindo
medo da punição caso seja revelada para à família e vergonha por toda violência que vive.
Diante deste cenário a vítima adapta-se a violência sexual existente, afim de manter as
relações familiares.

A violência sexual extrafamiliar caracteriza-se por toda violência sexual que envolvam
pessoas que não sejam da família e também não sejam responsáveis pela criança, assim como,
amigos cuidadores, professores, mãe de amigos, conhecidos, vizinhos, amigo do pai ou da
família, pessoas totalmente desconhecidas e outros (BRAUN, 2002).

Oliveira e Santos (2006) afirmam que existe uma menor frequência no abuso
extrafamiliar quando comparado ao intrafamiliar, mesmo que exista essa diferença o abuso
sexual extrafamiliar ocorre em níveis bastante elevados. Oriundos de adultos que cuidam das
crianças e acabam sendo seus principais perpetradores são os casos de abusos extrafamiliar
relatados em escolas, creches e lares grupais.
16

1.4 O impacto do Abuso Sexual Infantil

Os impactos da violência sexual infantil podem ser diversos e graves. Neste contexto
as vítimas podem ter sequelas emocionais e físicas. Resultados de sequelas emocionais como,
depressão, ansiedade, sentimento de culpa, transtorno de estresse pós-traumático (TEPT) e o
medo são observadas em muitas literaturas sobre o tema. Já as sequelas físicas podemos
descrever como o trauma físico, doenças sexualmente transmissíveis, gravidez e aborto
(BORGES e DELL1AGLIO, 2008).

O abuso sexual infantil pode acarretar em transtornos psicológicos alimentares,


hiperatividade e déficit de atenção, enurese, encoprese, transtornos dissociativos, de humor e
ansiedade, o que implica no desenvolvimento de crianças e adolescentes (HABIGZANG ET
AL., 2006).

A intensidade do relacionamento próximo com o perpetrador, a duração dos abusos,


atividade sexual com penetração e a violência física nos indicam que existem uma maior
probabilidade de um trauma para essa criança ou adolescente vítima do abuso sexual
(SANDERSON, 2008).

Segundo Habigzang (2006) as vítimas de abuso sexual podem apresentar problemas


cognitivos, comportamentais e emocionais. Tais como problemas na cognição, são eles:
crenças distorcidas sobre sim mesmo, percebe-se que o abusado tem culpa pela violência
sexual, desconfiança exagerada, inferioridade, entre outros. Já as alterações de
comportamento, ressalta-se: abuso de álcool e drogas, fugas de casa, isolamento do meio
social, agressividade, tentativas de auto mutilação e suicídio. E as alterações emocionais
destaca-se como: vergonha, raiva, irritabilidade, medo, culpa, ansiedade e tristeza.
17

Figura 1 Alterações Cognitivas e Emocionais apresentadas por Crianças e


adolescentes vítimas de abuso sexual (RABIGZANG, 2010).

A literatura aponta que a grande maioria das vítimas experiência os sentimentos de


culpa, pois, distorcem sua realidade, culpam-se a si mesmas por algo que alguma pessoa
esteja realizando com elas, na qual não existem nenhuma possibilidade de poder nem
controle, distorcendo também a realidade do que é certo e errado, o que a faz se sentirem bem
ou mal. A criança que esteja em desenvolvimento cognitivo inicial, onde não pensa de forma
abstrata, acreditará também que algo ruim está acontecendo com ela por ser alguém má, uma
vez que crenças são reforçadas em livros e filmes infantis recorrente a esta afirmação errônea,
só acontecem coisas más para quem é mal (SANDERSON, 2008).

Segundo Amazarray e Koller (1998) as consequências e os sintomas do abuso sexual


infantil não podem ser generalizadas em todas suas vítimas, uma vez que dependem da
singularidade e vivência de cada criança ou adolescente. A vítima que tenha sofrido o abuso
sexual deve ser considerada uma criança em situação de risco, mesmo que não apresente
sintomas, não significa afirmar que não sofra ou não venha sofrer com sua vivência
traumática em algum momento de sua vida, assim sendo, suas consequências talvez só se
manifestem a posteriori, em decorrência a uma crise evolutiva, situacional a um estresse.
18

2 TERAPIA COGNITIVO COMPORTAMENTAL

As teorias psicanalíticas na década de 60 dominavam a psicologia clínica e a


psiquiatria. Na visão psicanalista a psicopatologia da depressão era referida à raiva introjetada
do objeto perdido, e suas emoções negativas eram referentes as vivências traumáticas reais. O
Behaviorismo e o Humanismo junto com a Psicanálise eram as três abordagens que
dominavam o campo da psicoterapia da época (DOBSON E SCHERRER, 2014; PEREIRA e
RANGÉ, 2011).

Dessa insatisfação, juntamente a revolução cognitiva, surge em 1970 um movimento


de questionamento científico referente a eficácia da psicanálise para o tratamento dos
transtornos mentais (PEREIRA E RANGÉ, 2011).

Enquanto o behaviorismo adotava o modelo de estímulo- resposta nas terapias


comportamentais, causando grande insatisfação por considerar apenas o comportamento para
o tratamento psicológico.

O surgimento das terapias cognitivos comportamentais surgem, nesta mesma época


representando como a “quarta” força na psicoterapia que surgiu a partir da terapia
comportamental tradicional.

O behaviorismo naquela época, defendia a ideia de que um modelo não-mediacional


fosse suficiente para explicar todos os comportamentos humanos e foi criticado também pelas
deficiências em lidar com os comportamentos humanos complexos (DOBSON E
SCHERRER, 2004).

Segundo Dobson e Scherrer (2004), Bandura desafiava a explicação comportamental


tradicional, com o desenvolvimento da teoria da aprendizagem social, com o conceito de
aprendizagem vicária, além do conceito de auto eficácia que incluía a cognição nos processos
de aprendizagem, dando força ao modelo mediacional.

O desenvolvimento de uma Psicologia Cognitiva, ocorreu com o crescente número de


pesquisas cientificas e laboratoriais que incluíam o modelo mediacional, investigando-o e
aplicando aos processos clínicos (DOBSON E SCHERRER, 2004). Bem como o interesse de
terapeutas estudiosos que se identificaram como Cognitivos, são eles: Ellis, Cautella, Beck,
Mahoney e Meichenbaum.
19

A Terapia Racional Emotiva Comportamental (TREC) foi desenvolvida por Albert


Ellis, um psicanalista de formação, sendo a primeira terapia cognitivo comportamental,
enfatizava a visão em que a base dos transtornos psicológicos advém das construções
cognitivas, que são os pensamentos negativos e irracionais, o terapeuta busca interagir
diretamente nessas crenças consideradas irracionais (PEREIRA e RANGÉ, 2011).

A TREC sustenta que a mudança duradoura envolve a reestruturação filosófica das


crenças irracionais. As contribuições de Albert Ellis foram importantes que ele foi agraciado
pela Amercian Psychological Association com o prêmio de Outstanding Life Achievement
(DOBSON E SCHERRER, 2004).

Segundo Pereira e Rangé (2011) além da Terapia Racional Emotiva, surgiram também
outras importantes teorias comportamentais que contribuíram no processo cognitivo, são elas:
Modificação Cognitiva do Comportamento desenvolvida pelo Mahoney (1974), a de
D’Zurilla e Goldfried (1971) com o Treino em Solução de Problemas e o Treino de
Inoculação ao Estresse criada pelo Meichenbaum (1973). Todas essas teorias contribuíram
significativamente para o fortalecimento da terapia cognitiva.

Aaron Beck, também psicanalista de formação, estava disposto a validar


empiricamente o modelo psicanalítico da depressão, como sendo uma raiva retro fletida.
Utilizou os sonhos como objeto de estudo para validar essa ideia, na investigação do conteúdo
de sonhos de pacientes deprimidos e não deprimidos, e não encontrou diferença entre os dois
grupos, em conteúdos hostis ou agressivos (PEREIRA e RANGÉ, 2011).

Esta pesquisa mostrou-se ineficaz, pois, os assuntos dos sonhos de pacientes


deprimidos eram coesos com os assuntos em vigília, onde constatou que os sonhos
significariam um reflexo dos pensamentos do indivíduo (KNAPP e BECK, 2008).

Beck a partir de então, realizou uma pesquisa sistemática com observações clínicas,
concluindo que os sintomas de depressão poderiam ser explicados cognitivamente, ou seja,
interpretações tendenciosas das situações, com representações negativas de si mesmo, do
mundo pessoal e do futuro (KNAPP e BECK, 2008). Beck utilizou este estudo em sua prática
clínica, mostrando aos seus pacientes suas distorções cognitivas e como influenciava no
estado depressivo deles. Desta forma obteve uma melhora de humor e comportamento de seus
pacientes (PEREIRA e RANGÉ, 2011).
20

A partir deste marco, Beck se diferencia da psicanálise com a abordagem cognitiva,


seu foco de tratamento passa a ser em problemas no aqui-e-agora, bem como avaliando as
experiências psicológicas acessíveis ao invés de inconsciente como a psicanálise (KNAPP e
BECK, 2008).

A terapia cognitivo comportamental (TCC), desenvolvida por Beck baseia-se na


interpretação do pensamento que o indivíduo faz frente a uma situação, isto por sua vez,
influência a forma como a pessoa sente-se emocionalmente, e como se comporta (BECK J.,
2013).

2.1 Modelo cognitivo

A terapia cognitivo comportamental fundamenta-se no modelo cognitivo, onde


supõem que somos influenciados pelas percepções que temos dos eventos, que intervém nos
pensamentos, emoções e comportamentos, a partir da avaliação de um determinado
evento/situação, pois, não é o evento em si que gera pensamentos e comportamentos. A forma
que uma pessoa sente é determinada pela interpretação que realiza da situação (BECK J.,
2013). Um indivíduo pode ter reações adversas a uma situação semelhante em diferentes
momentos de sua vida, pois, a forma como a pessoa interpreta influência no modo como se
sente e se comporta em sua vida (PEREIRA e RANGÉ, 2011).

Segundo Pereira e Rangé (2011) pessoas que estejam com sofrimento psicológico
sofrem alteração da percepção em relação a si, o ambiente e suas expectativas para o futuro,
pois, estes indivíduos são afetados pelas distorções de conteúdo de pensamento, ou também
chamadas distorções cognitivas, desta forma, agem no seu dia-a-dia distorcendo todas as
informações que recebem, e as distorções acabam parecendo para um indivíduo uma forma
normal de perceber o mundo, interpretá-lo e se comportar.

Para que seja considerada uma terapia cognitivo comportamental é necessário derivar
do modelo cognitivo, compartilhando alguns pressupostos básicos: Qualquer atividade
cognitiva influência o comportamento, a atividade cognitiva pode ser monitorada e alterada e
as mudanças na cognição definem mudanças no comportamento (PEREIRA e RANGÉ,
2011).
21

A terapia cognitiva criada por Beck trabalha com três níveis de cognição, nas quais
todos os indivíduos possuem, porém, este conceito mencionado em epígrafe remete-se a
cognições no contexto de disfuncionais, pois, causam mal estar no indivíduo, sendo assim, é
identificado e trabalhado os pensamentos automáticos, crenças intermediárias e crenças
nucleares (centrais) (KNAPP e BECK, 2008). Para que possamos modificar o pensamento e
consequentemente o comportamento, faz-se necessário a mudança das interpretações
distorcidas, essa transformação ocorre a partir da reestruturação cognitiva, onde o indivíduo
consegue perceber que existem outras formas de ver a mesma situação na qual distorce
(PEREIRA e RANGÉ, 2011).

O nível de cognição mais superficial na terapia cognitiva são os pensamentos


automáticos, são mais fáceis dos pacientes identificarem. Surgem na nossa mente de uma
forma espontânea, em formato de imagens ou pensamentos, são telegráficos, representativos e
que surgem sem questionamento quando a validade ou utilidade, acompanham uma grande
carga de emoção negativa frente as situações do cotidiano (PEREIRA e RANGÉ, 2011).

Segundo Greenberger e Padesky (2008) um dos objetivos da terapia cognitiva é tornar


os pensamentos automáticos conscientes para o paciente, pois, no dia a dia são inúmeros
pensamentos automáticos que surgem, todavia, não existe consciência deles. Quando o
indivíduo passa a identificar seus pensamentos inicia-se o primeiro passo em direção a
mudança.

Já as crenças intermediárias, descritas também como pressupostos subjacentes,


consideradas como segundo nível de cognição, são regras criadas pelo indivíduo conseguir
conviver com ideias que ele tem sobre si mesmo, sendo elas negativas e desadaptativas que
tem a seu respeito (PEREIRA e RANGÉ, 2011).

Segundo Pereira e Rangé (2011) as crenças intermediárias funcionam como um


mecanismo de proteção em que o indivíduo utiliza para conseguir lidar e se proteger da
ativação das crenças nucleares, pois essas crenças são carregadas de forte emoção negativa
diante das situações, no qual o paciente evita entrar em contato.

A origem das crenças nucleares ou também chamadas de crenças centrais são as


experiências infantis de cada indivíduo, consideradas o terceiro nível e mais profundo das
cognições (PEREIRA e RANGÉ, 2011). No decorrer do desenvolvimento infantil, as crianças
desenvolvem ideias sobre si mesmas, das pessoas e do mundo, mas as crenças desenvolvidas
22

por uma criança nem sempre são verdadeiras, pois, por ser ainda uma criança e não possuir
habilidade mental para avaliar e flexibilizar sua avaliação perante uma situação, essas crenças
se tornam fixas a partir de experiências de vida que convenceu que essas crenças fossem
verdadeiras (GREENBERGER, PADESKY, 1999; PEREIRA e RANGÉ, 2011).

As crenças nucleares são rígidas, inflexíveis e de difícil acesso ou modificação, pois, o


indivíduo não questiona sua veracidade. Contudo o último objetivo da terapia cognitiva é a
modificação das crenças nucleares disfuncionais (KNAPP e BECK, 2008).

Segundo Beck, J (2013) na terapia cognitivo comportamental o paciente aprende junto


com o terapeuta a identificar e avaliar seus pensamentos automáticos modificando os
pensamentos desadaptativos e que causam dor emocional ao paciente, a partir de então o foco
da terapia passa a ser, as crenças que existem por trás dos pensamentos, bem como, os
pressupostos subjacentes (crenças intermediárias) que predispõem aos problemas, ajudando-o
a planejar formas mais eficazes em lidar com situações futuras modificando sua visão de
percepção em relação aos eventos.

2.2 Conceitualização Cognitiva

A conceitualização cognitiva é uma formulação do caso, considerada a principal


habilidade clínica que o terapeuta cognitivo comportamental precisa dominar para realizar o
planejamento dos atendimentos tornando-o mais eficaz (KNAPP, 2007).

O terapeuta precisa conhecer os pensamentos que geram os comportamentos e


emoções desadaptativas do paciente, bem como, as regras subjacentes possibilitando a escolha
das técnicas mais adequadas ao caso. Não havendo o entendimento da cognição do paciente, o
tratamento se tornará apenas aplicação de um conjunto de técnicas, perdendo o foco da
terapia, a estruturação (PEREIRA e RANGÉ, 2011).

A conceitualização cognitiva serve como uma direção para o terapeuta compreender


como o paciente estrutura-se, interage e se protege ao longo de sua vida com suas crenças
negativas desadaptativas. E também auxilia o terapeuta na escolha das intervenções
terapêuticas e tarefas a serem realizadas (KNAPP, 2007).
23

Para um bom entendimento do funcionamento cognitivo do paciente alguns aspectos


são fundamentais para elaborar uma conceitualização cognitiva, são eles:

1.O diagnóstico clínico;


2.Os problemas atuais e os fatores estressores precipitantes que contribuíram
para seus problemas psicológicos ou interferiram em sua habilidade para
resolvê-los;
3.As aprendizagens e experiências antigas que contribuem para seus problemas
atuais;
4.As predisposições genéticas e familiares;
5.Seus pensamentos automáticos;
6.Suas crenças subjacentes (incluindo atitudes, expectativas, regras e
pressupostos);
7.Suas crenças nucleares;
8.Os mecanismos cognitivos, afetivos e comportamentais que ele desenvolveu
para enfrentar suas crenças disfuncionais;
9.Como ele percebe a si mesmo, os outros e o mundo. (KNAPP, 2007, p.27).

São avaliados os aspectos mencionados a partir do primeiro contato com o paciente, o


terapeuta sempre trabalhará com hipóteses que serão verificadas a partir das situações e
pensamentos repetitivos do dia a dia de cada paciente (PEREIRA e RANGÉ, 2011).

A conceitualização cognitiva deve ser específica e individual de acordo com cada


transtorno psicológico de cada paciente, desta forma o tratamento da terapia cognitivo
comportamental irá basear-se na conceitualização cognitiva do paciente associado com o
modelo cognitivo da psicopatologia apresentada (NEUFELD e CAVENAGE, 2010).

Segundo Neufeld e Cavenage (2010) o processo de conceitualização cognitiva deve


ser partilhada com o paciente, de uma forma, que faça sentido para o indivíduo, além de
investigar se tais dados possuem coerência com o que é sentido e interpretado pelo paciente.
Quando ocorre a compreensão da conceitualização cognitiva por parte do paciente
conseguimos a melhor aderência ao tratamento, reforçando o trabalho produtivo da relação
terapêutica, e melhor percepção dos problemas que possam surgir ao decorrer do tratamento.

Segundo Knapp (2004) é importante relatar que a conceitualização cognitiva é uma


hipótese, que ao decorrer do processo terapêutico pode ser alterado ou redefinido, sempre com
o objetivo de um melhor resultado e bem estar do paciente.

Dentro deste contexto foi desenvolvido por Judith Beck (1995) o diagrama de
conceitualização cognitiva (conforme figura 1) que demonstra resumidamente a
conceitualização cognitiva (KNAPP, 2004).
24

Figura 2 Diagrama de conceitualização cognitiva (KNAPP, 2004).


25

3 A TERAPIA COGNITIVO COMPORTAMENTAL NO QUADRO DE ABUSO


SEXUAL INFANTIL

A violência sexual infantil atinge uma quantidade significativa de crianças e


adolescentes todos os dias em diversificadas sociedades e contextos sociais, conforme já
descrito no capítulo 1.

Diante deste cenário, existe a atuação do psicólogo em suas diferentes abordagens


teóricas, faz-se necessário esclarecer que o mais importante do que a escolha da abordagem
teórica para o atendimento de uma vítima de abuso sexual é propiciar um ambiente acolhedor
e seguro, com o propósito de estabelecer o vínculo terapêutico em que a criança sinta-se
acolhida e comece a participar verbalmente (LUCÂNIA ET AL., 2009).

A literatura atual aponta que a psicoterapia é extremamente necessária ao tratamento


das vítimas de abuso sexual infantil, em muitos casos a terapia é mais importante do que o
tratamento medicamentoso, considerando-se as consequências do abuso. Desta forma as
intervenções precoces após a decorrência da violência sexual infantil podem diminuir os
sintomas do abuso, minimizando os riscos a longo prazo para a criança e para a sociedade
como um todo (ALMEIDA, 2012).

Crianças abusadas sexualmente têm o risco aumentado para 21% para depressão e
suicídio, 20% ao desenvolvimento do transtorno de estresse pós-traumático (TEPT), 14% para
comportamento sexual promíscuo, 10% para déficits no rendimento escolar e 8% para o ciclo
de violência (BORGES e DELL’AGLIO, 2008).

Dentre os prejuízos psicológicos em vítimas de abuso sexual infantil alguns estudos


constataram que o TEPT é a psicopatologia mais associada ao abuso sexual.

O TEPT é desenvolvido como resposta a um estresse, com grande significado


emocional que se torna traumático desencadeando uma cascata de eventos psicológicos e
neurobiológicos relacionados. A vítima que sofre do TEPT perde o controle físico e
psicológico da situação, com níveis de ansiedade elevados e alterações das cognições, afetos e
comportamentos (KNAPP e CAMINHA, 2003). Após o indivíduo ser exposto a um evento
traumático grave, sintomas de revivência através de flashbacks começam a ocorrer, como se o
evento estivesse ocorrendo novamente, grande parte das vítimas passam a evitar situações ou
conversas relacionadas ao evento estressor e ainda podem encontrar dificuldade em lembrar
26

de aspectos importantes do evento que desencadeou o TEPT. Neste contexto o indivíduo


perde a motivação em atividades cotidianas que antes do evento realizava normalmente como:
dificuldades para dormir, perda de apetite, conversar com amigos. Também surgem alguns
outros sintomas como surtos de raiva, assustar-se de forma exagerada e dificuldades de
concentração (MARGIS, 2003).

As consequências do abuso podem permanecer ao longo da vida, e até agravar-se.


Neste contexto, foi realizado um estudo, com jovens de 19 anos que estavam em espera para
realizarem exames preventivos, foi verificado que 5,9% das jovens avaliadas tiveram histórico
de abuso sexual na infância, dentre estes históricos de abuso foi verificado que elas também
apresentavam problemas com álcool, tabagismo, depressão, estresse, problemas familiares
e/ou profissionais (AMAZARRAY e KOLLER).

Já em outro estudo realizado com mulheres percebeu que 67% de mulheres que
tiveram histórico de abuso na infância desenvolveram quadros de: transtorno de estresse pós-
traumático (TEPT), problemas na regulação das emoções e no funcionamento interpessoal. E
um terceiro estudo realizado com 40 meninas com idade entre 9 a 16 anos, afim de verificar o
efeito do abuso sexual (no decorrer da vida) sem o tratamento adequado, foi possível observar
que os sintomas psicológicos não diminuíram com a passagem do tempo, essas meninas
estavam em uma lista de espera para atendimento, variando entre um mês à seis meses que o
abuso havia acontecido, contudo percebe-se a grande relevância da intervenção psicoterápica
nestes casos (HABIGZANG e KOLLER, 2011).

Segundo Sant’Anna e Baima (2008) uma quantidade significativa de vítimas procura a


psicoterapia após a idade adulta, porém, quando buscam pela ajuda possuem uma resistência
em abordar a situação do abuso, por vergonha e sentimento de culpa, o que implicará um
tempo maior no vínculo e confiança ao terapeuta para que possa relatar o seu trauma.

Foram realizados estudos por diversos autores na literatura internacional, referente a


eficácia no tratamento de crianças e adolescentes abusados sexualmente, em diferentes
abordagens teóricas e concluíram que a TCC é mais eficaz no tratamento de crianças abusadas
sexualmente, principalmente nas crianças sintomáticas. Já em outro estudo realizado com uma
análise metanalítica afim de investigar a eficácia do tratamento para vítimas de abuso,
comparando no formato individual ou em grupo, concluíram que o tratamento da TCC
individual é mais eficaz para diminuir sintomas de angústia e TCC em grupo mais eficaz para
o resgate da autoestima (PASSARELA, MENDES e MARI, 2009).
27

Lucânia et al. (2009) enfatiza que a terapia cognitivo comportamental (TCC) tem
demonstrado melhor resultado quando comparada a outras abordagens não focais no
tratamento da violência sexual infantil. Cabe ressaltar a importância do papel do
psicoterapeuta em propiciar suporte à vítima, e enfatiza a ineficácia das abordagens não
diretivas, pois o silêncio dessas abordagens, nestes casos, podem ocasionar comportamentos
de evitação replicando o silêncio que já existe neste contexto de abuso, não corroborando para
um acolhimento adequado e de extrema importância ALMEIDA (2012).

A TCC trabalha com alvos específicos, através de estratégias e plano de ação com
início, meio e fim, promovendo ações preventivas, possibilitando a diminuição da incidência
de futuras revitimizações das vítimas e seus familiares, além de sua forma de atuação a TCC
possui evidências científicas de que efetivamente proporciona resultados positivos tanto nos
atendimentos individuais ou em grupo (REZENDE, 2011).

Além das estratégias citadas a TCC destaca-se como uma intervenção eficaz, por
garantir mudanças a curto e médio prazo, onde as sessões são estruturadas, com meta e
conhecimento do tratamento realizado, possibilitando ao paciente melhor aderência e
confiança ao tratamento, bem como o desenvolvimento de habilidades em que os pacientes
poderão utilizar em outras situações da vida, dando lhes esperança de uma mudança visível e
atingível (ALMEIDA, 2012).

Almeida (2012) enfatiza a importância na intervenção sobre encorajar as vítimas para


que possam expressar seus sentimentos frente a violência que sofreram, com o propósito de
descrever suas crenças que movem para pensamentos negativos em relação a si mesma, sobre
os outros e sobre mundo. A grupoterapia auxilia no processo da vítima identificar que existem
outros indivíduos na mesma situação em que se encontra, minimizando o sentimento de
isolação nesse contato e fazendo-os perceber sobre a importância de psico-educar sobre tal
assunto, com intuito de prevenir possíveis incidências de abuso.

A criatividade do terapeuta torna-se muito importante, propiciando a sessão mais


acolhedora e auxiliando no vínculo terapêutico, desta forma o uso de jogos e marionetes,
histórias e entre outros, auxiliará o terapeuta e a vítima para o desenvolvimento da terapia
(TRICOLLI, 2009).

Dentro da literatura frente ao abuso sexual infantil o TEPT destaca-se tanto pelo
número de indivíduos que desenvolveram a psicopatologia após acometimento deste tipo de
28

violência, bem como as técnicas utilizadas para seu manejo serem oriundas a técnicas
cognitivos comportamentais (HABIGZANG, 2006).

3.1 Técnicas utilizadas em casos de Abuso Sexual Infantil

Para obter sucesso em qualquer tratamento alguns aspectos são primordiais: uma
avaliação diagnóstica minuciosa, uma relação terapêutica sólida e empática, independente da
abordagem teórica (PEREIRA e RANGÉ, 2011).

São diversas as técnicas existentes no modelo de terapia cognitivo comportamental,


mas é importante ressaltar que a TCC não é apenas um conjunto de técnicas, pois baseia-se no
modelo cognitivo, este desenvolvido por Aaron Beck, e sem o conhecimento do
funcionamento de cada indivíduo dentro do modelo cognitivo a mera aplicação de técnicas
não será eficaz (KNAPP, 2007; BERNARD e RANGÉ, 2011).

Dentro da abordagem cognitivo comportamental uma das técnicas utilizadas com os


pacientes é a psico-educação referente ao modelo cognitivo (BERNARD e RANGÉ, 2011) e
neste caso também se faz a psico-educação sobre a violência sexual infantil, sendo o primeiro
passo após o acolhimento para a intervenção terapêutica.

Contudo a psico-educação no modelo cognitivo conduzirá o paciente para reconhecer


seus pensamentos, sentimentos e comportamentos, que venha ter quando relembrar da
violência vivida que expos sua integridade pessoal (TRICOLI, 2009).

As distorções cognitivas das vítimas frente a violência vivenciada são


desencadeadoras e mantenedoras de sintomas psicopatológicos (HABIGZANG ET AL.,
2006).

Tendo visto que a vítima de abuso sexual apresenta severas distorções cognitivas o
terapeuta estabelece uma relação que propicie mudanças de comportamento mais adaptativas
e flexíveis a partir da reestruturação cognitiva (HABIGZANG, 2006).

Nos casos de abuso sexual pela literatura revisada, constata-se que não são todas as
vítimas que desenvolvem TEPT, porém, muitas vezes apresentam sintomas associativos a esta
29

psicopatologia, desta forma, são utilizadas inicialmente as técnicas com exposição gradual,
dessensibilização sistemática, inoculação de estresse, treino de relaxamento, interrupção e
substituição de pensamentos perturbadores por outros que recuperem o controle das emoções
(LUCÂNIA ET AL., 2009; HABIGZANG e KOLLER, 2009; HABIGZANG ET AL., 2006).

A Dessensibilização Sistemática é um conjunto de técnicas de exposição à vivência


traumática, o terapeuta dentro da sessão auxiliará o paciente para uma exposição imaginária,
antes disso realizará técnicas de relaxamento, para que o paciente diminua a ansiedade,
quando então estará pronto a fazer a exposição imaginária, trabalhando situações temidas pelo
paciente, de forma gradual, primeiro as mais fáceis de enfrentar até as mais difíceis. A
repetição da exposição à lembrança traumática em um ambiente controlado, possibilita ao
paciente a habituação ao medo e consequentemente a modificação do esquema disfuncional
de esquiva perante as lembranças do abuso (KNAPP e CAMINHA, 2003; GUIMARÃES,
2011).

O treino de relaxamento, caracterizado como um exercício de relaxamento completo,


inicia-se pela cabeça, seguindo as principais partes do corpo, tencionar e relaxar cada uma das
partes até os pés.

A respiração diafragmática, também é ensinada para o paciente, afim de que, nos


momentos de lembrança as memórias traumáticas, ele possa realizar a respiração e com isso
reduzir a ansiedade. A respiração consiste em associar a barriga a um balão com um canudo
ligando o nariz e o umbigo, quando se inspira o ar pelo nariz, o balão que neste caso é a
barriga, vai se encher e o ar vai ser liberado pela boca enquanto o balão esvazia, resultando na
diminuição da ansiedade (TRICOLI, 2009).

A técnica de inoculação de estresse fundamenta-se em treinar o paciente vivenciando a


situação de estresse antecipadamente, para prepará-lo frente a situação real temida,
desenvolvendo recursos pessoais de enfrentamento (GUIMARÃES, 2011)

Foi desenvolvido um projeto de pesquisa por Habigzang (2006) afim de comprovar a


eficácia da grupoterapia cognitivo comportamental em meninas vítimas de abuso, neste
estudo o treino de inoculação de estresse foi utilizado no intuito de ativar a memória ao
trauma e detalhar lembranças intrusivas possibilitando às participantes uma sensação de
controle da intensidade das emoções associadas.
30

A interrupção e substituição de pensamentos perturbadores por outros mais


adaptativos que busque ao controle das emoções, inicia-se através dessensibilização
sistemática e inoculação de estresse, a partir de então inicia-se o processo de reestruturação de
cognições distorcidas (HABIGZANG e KOLLER, 2009).

Afim de ensinar a tríade cognitiva a criança, identificando seus pensamentos,


sentimentos e comportamentos frente ao trauma, o terapeuta coloca o desenho de um corpo
humano e mencionará sentimentos não descritos pelo paciente, em seguida, solicita que o
paciente escolha uma cor e pinte as partes do corpo que represente aquele sentimento para a
criança, após este processo, pode ser solicitado um pensamento para aquele sentimento, sendo
este exemplo de uma forma lúdica de mostrar o processo cognitivo para a criança.

Outra forma de reconhecer os sentimentos das crianças é por meio da criação de


cartões com as emoções, esses podem ser criados junto com o paciente, sempre solicitando
que a criança atribua a intensidade daquela emoção sentida entre 0 a 10, na sequência solicitar
o pensamento frente aquela emoção.

Após realizar em diversas sessões a identificação dos pensamentos, sentimentos e


comportamentos, o terapeuta ensinará a criança a realizar o seu registro de pensamento
disfuncional (RDPD), com o objetivo de que o paciente realize durante a semana,
identificando quais são as distorções presentes no dia a dia da criança. O RDPD infantil
poderá ser adaptado de acordo com o que a criança consiga entender e assim, realizar a tarefa
proposta (TRICOLI, 2009).

Na reestruturação são utilizadas estratégias cognitivas e comportamentais para lidar


com lembranças intrusivas do abuso, elaborando explicações mais adaptativas.

Em virtude disso é ensinado a criança para quando surgir lembranças referente ao


abuso, a criar estratégias para que consiga não ficar pensando sobre o que ocorreu e também
consiga reestruturar as imagens que possam surgir. Na TCC criamos estratégias de manejo
frente essas lembranças, um exemplo é o botão de emergência que foi criado no estudo da
Habigzang (2006). Cada menina escreveu atrás de um cartão amarelo estratégias, como:
brincar, assistir TV, respirar fundo, conversar com amigos, cantar e/ou dançar quando
surgissem as lembranças do abuso, todas levaram o cartão para casa, afim de, quando
experienciassem as lembranças poderiam recorrer ao cartão com suas estratégias descritas.
31

Para a reestruturação também pode ser realizado o ensaio cognitivo, mediação meta
cognitiva e substituição de imagem, como exemplificado o botão de emergência (CAMINHA
ET AL.,2011; RABIGZANG,2006).

No projeto de pesquisa de Habigzang (2006) foi realizado a técnica jogo da memória,


onde as meninas aprenderam a substituir lembranças negativas por outras positivas, o
terapeuta conduziu esta técnica explicando que a memória é como uma caixa com diversas
gavetas que está na cabeça, e que cada gaveta representa uma situação vivenciada. Foi
solicitado que as meninas fechassem os olhos e imaginassem a caixa de memória e depois
escolhessem uma situação positiva que estivesse dentro de alguma gaveta, atentando-se aos
detalhes e desenhando o que imaginaram, após essa instrução foi solicitado novamente para
fecharem os olhos e abrissem uma gaveta com pior lembrança do abuso, pensando nos
detalhes e após isso desenhassem o que imaginaram. De antemão, o terapeuta explicou que é
possível substituir as lembranças ruins pelas lembranças boas, então solicitou que fechassem
os olhos novamente e pensassem na lembrança ruim e imaginassem a modificação pela
lembrança boa, este processo foi realizado diversas vezes até que todas as participantes
conseguissem realizar a substituição. As lembranças geram medo e com essa técnica foi
possível reduzir este medo, neste caso foi realizada uma estratégia cognitiva para
reestruturação da lembrança traumática.

O Brainstorming é uma técnica utilizada na profusão de ideias exploradas pela criança,


para resolver o problema frente a um sintoma vivenciado pela vítima. A estimulação e
mediação metacognitiva (duas colunas: uma de prós e outra de contras) é uma técnica
complementar ao Brainstorming, afim de verificar o nível da validade dos pensamentos
através de evidências prós e contras, propostas de pensamentos através de outras duas colunas
de vantagens e desvantagens bem como o comportamento manifestado pela criança em cada
opção (CAMINHA ET L., 2011)

A prevenção de recaída é uma técnica utilizada na TCC principalmente em casos de


usuários dependentes de álcool e drogas, transtorno obsessivo compulsivo, entre outros, com
a finalidade de prevenção e limitar a ocorrência de episódios. Esta técnica é a combinação de
treinamento de habilidades comportamentais e intervenções cognitivas (OLIVEIRA, FREIRE
e LARANJEIRA, 2011).

A TCC trabalha preparando o paciente para possíveis problemas, ensinando estratégias


para identificar situações de risco e formas para lidar frente a estas situações (KNAPP, 2004).
32

Nos casos de violência sexual infantil o objetivo da prevenção de recaída é construir o


fortalecimento de medidas de autoproteção e retomar as técnicas aprendidas no processo
psicoterápico para lidar com sintomas, pensamentos, emoções e comportamentos decorrentes
do abuso sexual, preparando o paciente e seus responsáveis para a alta, e transferindo a
responsabilidade do tratamento (TRICOLI, 2011; HABIGZANG, 2006).

O role play é uma técnica utilizada com grande eficácia como um teatro da história do
trauma, das melhoras (antes e depois), afim de, apresentar as novas estratégias desenvolvidas
após o tratamento (CAMINHA ET AL., 2011).

As técnicas de intervenção descritas anteriormente referem-se as formas de


tratamentos utilizados atualmente, a partir da literatura pesquisada frente ao abuso. A
literatura indica intervenções individuais, grupais e familiares (HABIGZANG, 2010).

Segundo Habigzang e Koller (2011) as pesquisas indicam que a grupoterapia tem


obtido resultados mais positivos. A psicoterapia em grupo possibilita a troca de experiência,
bem como encontros sem julgamentos, a vítima encontra maior facilidade de tratar seus
medos e sanar suas dúvidas. Contudo a grupoterapia torna-se mais eficaz, pois, atinge
principalmente os sintomas de depressão, ansiedade e associados ao TEPT, sintomas estes que
estão presentes em quase todos os casos de violência sexual infantil.

No que tange a literatura internacional foi realizado um estudo de revisão bibliográfica


por Lobo et al.(2014) referente a eficácia da TCC focada no trauma (TCC-FT), considerando
este um tratamento de primeira linha para vítimas de eventos traumáticos, foi desenvolvida
especialmente para vítimas de abuso sexual infantil, porém, devido sua grande eficácia foi
adaptada para diversos traumas.

Destina-se para vítimas entre 3 a 17 anos de idade que manifestem sintomas


relacionados ao trauma, TEPT, depressão e problemas comportamentais.

A TCC-FT tem como foco a inclusão de pais e/ou cuidadores em todo processo
psicoterápico, inicia-se sessões separadas entre pais e vítimas, seguindo por sessões conjuntas,
para reforçar e fortalecer a comunicação, construir confiança entre a vítima e seus cuidadores,
bem como fortalecer a psico-educação aprendida separadamente. A terapia foca-se em
estratégias cognitivos comportamentais, familiares e humanistas, focado em estratégias de
coping, vivência do trauma através da fala e técnicas de regulação emocional. Considerado
33

um tratamento focal e flexível e de curto prazo com 12 à 16 sessões de até 90 minutos (LOBO
ET AL., 2014).

Segundo Lobo et al. (2014) A figura abaixo representa os componentes centrais da


TCC-FT (adaptado por Cohen, Mannarino & Deblingler).

Figura 2 Componentes da TCC-FT Lobo et al., 2014)


34

Na TCC-FT focaliza-se na intervenção entre a vítima e seus pais e/ou cuidadores não
abusivos, possibilitando uma melhora do evento traumático na criança e na família (LOBO
ET AL., 2014). Neste contexto no estudo de Habigzang (2006) corroborou com esta
afirmação, enfatizando a necessidade de inclusão da família no processo terapêutico em
paralelo, pois, o grupo familiar possuí influência significativa para a criança, dando-lhe o
apoio afetivo e protetivo. Quando este apoio não acontece a família pode sofrer com impacto
das reações emocionais e comportamentais, e assim desenvolver sintomas psicopatológicos
nas vítimas.

Assim demonstra-se que a família exerce um papel importante no processo de


intervenção das vítimas, pois os familiares também experimentam sentimentos negativos,
como culpa após o abuso sexual, portanto, o esclarecimento dos sentimentos experimentados,
bem como, os comportamentos apresentados pelas vítimas de violência, auxilia no processo
de tratamento, com o intuito de proporcionar apoio à vítima fora do âmbito terapêutico
(PASSARELA, MENDES e MARI, 2009).

Por fim, outro fator de extrema importância na intervenção com as vítimas que
sofreram a violência sexual infantil é a disponibilidade de uma equipe multidisciplinar
capacitada adequadamente, para conduzir intervenções corretas nos casos de abuso, pois a
falta de preparo dos profissionais pode acarretar em danos psicológicos secundários à criança
(AMAZARRAY e KOLLER, 1998; HABIGZANG, 2010).
35

CONCLUSÃO

Tendo visto que o tema apresentado é considerado um tabu em nossa sociedade,


poucos são os estudos científicos sobre essa temática, uma vez que, é cabível entender que
existe pouca motivação para realização de estudos frente ao tema.

Este trabalho corroborou para tal expectativa frente as motivações descritas


anteriormente, todavia, foram encontrados obstáculos no que refere-se a pesquisa
bibliográfica.

Em relação aos dados estatísticos frente ao abuso sexual infantil, a literatura apontou
que os números apresentados não são reais, visto que, apenas 10% de casos são denunciados e
levados ao tribunal, contudo, o que demonstra a falta de informação a nível de prevenção, nas
escolas, nas comunidades, nos meios de comunicação e serviços públicos de atendimento a
criança e ao adolescente.

Quanto à eficácia da Terapia Cognitivo Comportamental (TCC) em crianças que


sofreram a violência sexual infantil, foi possível observar que por se tratar de uma abordagem
diretiva, possui objetivos e estratégias para o manejo, enfretamento e a busca da superação do
trauma, os estudos apontaram para redução dos sintomas em sua grande maioria, em
contrapartida as abordagens não diretivas mostraram-se menos eficazes, pois reforçam o
silêncio do abuso sexual, e o ambiente não foi propício para a vítima falar a respeito da
violência que sofreu, bem como, ajudá-la a manejar seu trauma, com estratégias mais
adaptativas promovendo resiliência, tratando-se de futuro.

Contudo faz-se necessário mais estudos que demonstrem a eficácia da TCC quando
comparada com outras abordagens.

Existe um vácuo na literatura em relação ao tratamento das crianças que vivenciaram a


violência sexual infantil a longo prazo, desta forma, demostra-se a importância de mais
estudos referentes ao tratamento, bem como, estudos que contemplem pacientes do sexo
masculino, pacientes com a mesma faixa etária, com os mesmos sintomas e estudos que
demonstrem os ganhos da psicoterapia avaliando as melhoras ou não alcançadas com a
passagem do tempo.
36

Outro ponto observado é a inclusão em todo processo psicoterápico dos familiares da


vítima, pois, observou-se que estudos em que houve a inclusão da família ocorreu um suporte
mais favorável para a vítima, assim como, melhor superação frente a violência vivida.

As técnicas da TCC utilizadas para o tratamento das vítimas foram empregadas tanto
no contexto de psicoterapia individual e grupal, demostrando uma melhor eficácia na forma
grupal, em sua grande maioria. Em alguns casos mesmo com a intervenção grupal faz-se
necessário uma intervenção individual em situações em que os sintomas de culpa, medo do
posicionamento da família entre outros estejam mais sintomáticos.

Muitas técnicas utilizadas nestes casos são oriundas de tratamento de Transtorno de


Estresse pós-traumático, devido a, muitas vítimas apresentarem este quadro, haja vista, faz-se
necessário estudos com outros tipos de técnicas ou protocolos especificamente focados para o
quadro de violência sexual infantil.

Outro ponto observado foi o despreparo dos profissionais nos locais de atendimento a
essas vítimas, foi apontado em alguns estudos, descrevendo a falta de capacitação e de uma
equipe multidisciplinar que conheça as consequências do abuso sexual e esteja preparado para
o acolhimento e questionamento correto frente as vítimas que se apresentem relatando o seu
caso.

Em virtude disso, questiona-se o que é aprendido nos cursos de graduação e o que


realmente é utilizado na prática, pois no período da graduação poucos estudantes de
psicologia tiveram contato com estágios referente a esse tipo de violência, reforçando a ideia
de que alguns profissionais não apresentam o embasamento necessário para trabalhar com as
questões relacionadas ao abuso sexual infantil, em razão disso, faz-se necessário a busca pela
capacitação dos psicólogos que atuem com este tipo de violência, bem como sempre buscar
atualização frente ao tema e capacidade interpessoal para o trabalho multidisciplinar.
37

REFERÊNCIAS

ABRAPIA – Associação Brasileira Multiprofissional da Proteção à Infância e Adolescência.


Abuso sexual: Mitos e Realidades. Editora Autores & Agentes & Associados, Petrópolis. P.
1-58, 3º ed., 2002. Disponível em:
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/Abuso_Sexual_mitos_realidade.pdf. Acesso em:
02/06/2015.

ALMEIDA, Vanessa Maria. Tratamento psicoterápico para vítimas de abuso sexual


infantil: evidências da literatura internacional. Rev. Med. Minas Gerais, 2012.

AMAZARRAY, Mayte Raya; KOLLER, Silvia Helena. Alguns aspectos observados no


desenvolvimento de crianças vítimas de abuso sexual. Revista de Psicologia Reflexão e
Crítica, 1998.

ARAUJO, Maria de Fátima. Violência e abuso sexual na família. Psicol. estud. vol. 7 no.2
Maringá jul./dez 2002.

AZAMBUJA, Maria Regina. Violência sexual intrafamiliar: é possível proteger a


criança? Rev. Virtual Textos & Contextos, n. 5, nov. 2006.

AZEVEDO, Maria Amélia; GUERRA, Viviane Nogueira de Azevedo, (Org.). Crianças


vitimizadas: a síndrome do pequeno poder. 2 ed. São Paulo: Iglu, 2000.

BECK, Judith. Terapia cognitiva: teoria e prática.2 ed. Porto Alegre: Artmed, 2013.

BORGES, Jeane, DELL’AGLIO, Débora. Relações entre abuso sexual na infância,


transtorno de estresse pós-traumático (TEPT) e prejuízos cognitivos. Psicol. estud. vol.13
no.2 Maringá Apr./June 2008.

CORDEIRO, Flávia de Araújo. Aprendendo a Prevenir. Cartilha de abuso sexual.


Promotoria de Justiça de Defesa da Infância e da Juventude, Brasília. P. 1-17, Set, 2006.
Disponível emwww.dhnet.org.br/dados/cartilhas/dht/cartilha_abuso_sexual_ca.pdf. Acesso
em: 28 Mai. 2015.

Diário Oficial da União. Constituição da República Federativa do Brasil (1988). Capítulo


VII, artigo 227, Redação dada Pela Emenda Constitucional n 65, 2010. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm#adctAcesso em:
02/06/2015.

Diário Oficial da União. Estatuto da Criança e do Adolescente (1990). Lei Federal nº 8.069,
Brasília, de 13 de julho de 1990. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/l8069.htm. Acesso em: 02/06/2015.

GREENBERGER, Dennis, PADESKY, Christiane. A mente vencendo o humor. Porto


Alegre: Artmed, 1999.

HABIGZANG, Luíza Fernanda et. al. Avaliação Psicológica em Casos de Abuso Sexual na
Infância e Adolescência. Revista de Psicologia Reflexão e Crítica, 2008.
38

HABIGZANG, Luíza Fernanda et. al. Entrevista clínica com crianças e adolescentes
vítimas de abuso sexual. Estudos de Psicologia, 2008.

HABIGZANG, Luíza Fernanda. Avaliação de Impacto e processo de um modelo de


grupoterapia cognitivo-comportamental para meninas. Tese de Doutorado, Instituto de
Psicologia, UFRGS, 2010.

HABIGZANG, Luíza Fernanda. Avaliação e Intervenção Psicológica para meninas


Vítimas de Abuso Sexual Intrafamiliar. Dissertação de Mestrado, Instituto de Psicologia,
UFRGS, 2006.

KNAPP, Paulo e CAMINHA, Renato Maiato. Terapia cognitiva do transtorno de estresse


pós-traumático. Rev. Bras. Psiquiatr., 25 (supl.1), 2003.

KNAPP, Paulo. Terapia cognitivo-comportamental na prática psiquiátrica. Porto


Alegr9e: Artmed, 2004.

KNAPP, Paulo; BECK, Aaron T. Fundamentos, modelos conceituais,


aplicações e pesquisa da terapia cognitiva. Rev. Bras. Psiquiatr., 2008.

LOBO, Beatriz Oliveira Meneguelo et al. Terapia Cognitivo-Comportamental focada no


trauma para crianças e adolescentes vítimas de eventos traumáticos. Rev. Bras. De
Psicoterapia, 2014.

LUCÂNIA, Eliane Regina. Intervenção cognitivo-comportamental em violência sexual:


estudo de caso. Psicol. estud. vol. 14 n.4 Maringá out./dez 2009.

MARGIS, Regina. Comorbidade no transtorno de estresse pós traumático: regra ou


exceção? Rev. Bras. Psiquiatria, 2003.

NEUFELD, Carmem Beatriz; CAVENAGE, Carla Cristina. Conceitualização cognitiva de


caso: Uma proposta de sistematização a partir da prática clínica e da formação de
terapeutas cognitivo-comportamentais. Rev. Bras. Terap. Cognitivas, vol. 6, n 2, 2010.

OLIVEIRA, Liana Hoher de; SANTOS, Cláudia Simone dos. As diferentes manifestações
do transtorno de estresse pós traumático (TEPT) em crianças vítimas de abuso sexual.
Rev. SBPH vol. 9 n.1 Rio de Janeiro jun. 2006.

PASSARELA, Cristiane et. al. Revisão sistemática para estudar a eficácia de terapia
cognitivo-comportamental para crianças e adolescentes abusadas sexualmente com
transtorno de estresse pós-traumático. Rev. Bras. Psiquiatria. 2009.

PETERSEN, Circe, WAINER, Ricardo. Terapias cognitivos-comportamentais para


crianças e adolescentes. Porto Alegre: Artmed, 2011.

PORTAL BRASIL. Abuso sexual é o 2º tipo de violência mais comum contra crianças,
mostra pesquisa. Portal Brasil. 2002. Disponível em:
http://www.brasil.gov.br/saude/2012/05/abuso-sexual-e-o-segundo-maior-tipo-de-violencia-
contra-criancas-mostra-pesquisa. Acesso em: 02/06/2015.
39

RANGÉ, Bernard (Org). Psicoterapias Cognitivo- Comportamentais: um diálogo com a


psiquiatria. 2 ed. Porto Alegre: Artmed, 2011.

REZENDE, Sabrina. Terapia Cognitivo-Comportamental e políticas públicas


direcionadas a crianças e adolescentes vítimas de abuso: Limites e possibilidades.
Monografia Curso de Especialização em Psicologia Cognitivo-comportamental, UFRGS,
2011.

SANDERSON, Christiane. Abuso Sexual em Crianças. São Paulo: M. Brooks do Brasil


Editora Ltda., 2005.

SANT’ANNA, Paulo Afrânio, BAIMA, Ana Paula. Indicadores Clínicos em Psicoterapia


com Mulheres Vítimas de Abuso Sexual. Psicologia Ciência e Profissão, 2008, 28 (4), 728-
741.

Você também pode gostar