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GAMES E CINEMA: QUESTÕES SOBRE ADAPTAÇÃO

MARCEL ALVARO DE AMORIM1, CAIO HENRIQUES SICA LAMAS1, LUCAS PEREIRA VEILLARD1 E MATHEUS DE CARVALHO
BARRETO1
1Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro campus São João de Meriti

1. INTRODUÇÃO A dialogicidade e a intertextualidade (HUTCHEON, 2006; SANDERS, 2006;


FIORIN, 2008) ajudam, então, a transcender os limites do conceito de fidelidade.
O cinema e os games, se encarados de forma dialógica e intertextual, nos
Este trabalho busca analisar uma importante relação entre duas mídias na
remetem a outras formas de arte. Sendo assim, as adaptações devem ser
atual indústria do entretenimento: o diálogo entre os jogos digitais e o cinema, a
encaradas não como cópias, mas como traduções intersemióticas,
partir da compreensão de suas interdiscursividades e intertextualidades (FIORIN,
transmutações, hipertextos, derivados de um texto de partida - ou vários – com
2008; BAKHTIN, 2016).
ou sem origem especificada na intricada rede dialógica de sentidos (BAKHTIN,
Nas últimas décadas, essas facetas da indústria cultural têm procurado
2016).
estreitar o laço entre si, produzindo criações híbridas, que dialogam os dois
formatos. Essas criações vão desde filmes baseados em jogos - que utilizam o
material provindo do mundo dos games para a criação não só de suas 5. DISCUSSÃO E RESULTADOS
narrativas, como também de suas especificidades técnicas e visuais - até games
produzidos a partir do cinema e/ou jogos em formato cinematográfico - que
Middle Earth: Shadow of Mordor é um videogame de 2014, distribuído pela
geralmente ampliam o arco narrativo da história, ampliação que possui papel
Warner Bros. Interactive Entertainment e ambientado no universo ficcional de O
importante no desenvolvimento do jogo e em suas condições de jogabilidade.
Senhor dos Anéis. A trama discorre sobre eventos imediatamente anteriores à
Guerra do Anel, entre os acontecimentos de O Hobbit e SDA, e acompanha a
2. OBJETIVO historia de Talion, um guardião do portão negro que é assassinado junto a sua
família. Essa história secundária se funde à trama dos Anéis de Poder quando
Talion tem seu espírito ligado ao do mestre élfico que forjou esses anéis,
Procuramos, a partir dos pressupostos das Teorias da Adaptação (STAM,
Celebrimbor. A união de ambos se alicerça em uma busca por vingança contra as
2000; HUTCHEON, 2006; SANDERS, 2006), caracterizar e discutir as
forças antagonistas, o exército de Sauron, em uma atmosfera violenta e sombria
especificidades narrativas das mídias mencionadas a partir da análise do game
que fornece o pano de fundo para um bem sucedido videogame de ação e
Middle Earth: Shadow of Mordor, uma ampliação do universo construído na
furtividade.
trilogia O Senhor dos Anéis (SDA), de J. R. R. Tolkien.
A trama dialoga com o universo tolkiano referenciando fatos temporais da
obra do autor, tais como a retomada de Mordor pelas forças do Senhor do Escuro
3. METODOLOGIA e a tentativa de Smeagol de recuperar o Um Anel, que estava anteriormente em
sua posse. O jogo utiliza também parte dos personagens do universo criado por
Tolkien, como o Boca de Sauron, Celebrimbor – este presente também em outra
Para se atingir os objetivos traçados, inicialmente, discutiremos os
obra, O Silmarillion (1977), e protagonista do jogo - e Golum. Ademais, são
pressupostos das Teorias da Adaptação, para, em seguida, caracterizarmos apresentados novos personagens que expandem o universo da Terra Média, como
comparativamente (NITRINI, 2001) a narrativa do game, buscando compreender Bolsa de Ratos, Torre de Sauron e o segundo protagonista, Talion, assim como
os diálogos, interdiscursividades e intertextualidades (SANDERS, 2006; FIORIN, novos arcos narrativos, como a busca por vingança por parte dos dois
2008) construídos nessa mídia em relação estreita com a narrativa da obra protagonistas.
literária e de suas adaptações para o cinema. Dessa forma, o jogo amplia não apenas o universo de SDA, mas também
dialoga com outras obras de Tolkien como as mencionadas O Hobbit e
Silmarillion. O jogo funciona, então, como uma ponte entre eventos e
4. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA personagens dessas obras, acrescentando, suplementando e construindo
dialogicamente (STAM, 2000; BAKHTIN, 2016) o universo tolkiano da Terra
Para Robert Stam (2000), a crítica especializada lida com as adaptações de Média.

uma forma extremamente moralista, usando termos como infidelidade, traição,


REFERÊNCIAS
violação e vulgarização para descrever adaptações que, segundo os críticos, não
alcançam seu objetivo: ser fiel ao texto de partida (STAM, 2000, p. 54). De
acordo com Stam, para superarmos a crítica da fidelidade é necessária a BAKHTIN, M. Os gêneros do discurso. Tradução de Paulo Bezerra. São
Paulo: Editora 34, 2016.
percepção de que quando classificamos uma obra como infiel ao texto original,
expressamos, na verdade, nosso desapontamento ao sentirmos que a adaptação FIORIN, José Luiz. “Interdiscursividade e intertextualidade”. In. BRAIT, Beth.
falha ao captar o que nós, como receptores, consideramos os aspectos (Org.) Bakhtin: outros conceitos-chave. São Paulo: Contexto, 2008.
fundamentais da narrativa, temática e estética da fonte da adaptação.
HUTCHEON, L. A Theory of adaptation. London and New York: Routledge,
O conceito de fidelidade é extremamente problemático e questionável. 2006.
Stam questiona-se até sobre a possibilidade da fidelidade em adaptações já que
NITRINI, S. Literatura Comparada: história, teoria e crítica. 2ª ed. São
mudanças são automatizadas dado o caráter das mídias envolvidas. Uma das Paulo: EDUSP, 2000.
formas consideradas pelos estudioso para abordar a adaptação é a percepção do
texto de chegada como a leitura de uma obra fonte, um texto de partida, leitura SANDERS. J. Adaptation and appropriation. London and New York:
Routledge, 2006.
essa que "é inevitavelmente parcial, pessoal e conjectural". Stam (2000, p. 64)
propõe, então, que entendamos o processo de adaptação como uma forma de STAM, R. Beyond fidelity: the dialogics of adaptation. In: NAREMORE, J.
dialogismo intertextual. (Org.). Film adaptation. New Jersey: Tutgers University, 2000, pp. 54-76.

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