Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
R E V I S TA DE FILOLOGIA CLÁSSICA
N O VA S É R I E
VOLUME XLVII
M M X I X
EVPHROSYNE
R E V I S TA D E F I L O L O G I A C L Á S S I C A
*
CENTRO DE ESTUDOS CLÁSSICOS
FA C U L D A D E D E L E T R A S D E L I S B O A
PT - 1600-214 LISBOA
PORTUGAL
e-mail: euphrosyne.ceclassicos@letras.ulisboa.pt
sítio electrónico: http://www.tmp.letras.ulisboa.pt/cec-publicacoes/cec-euphrosyne
Directora
Maria Cristina de Castro-Maia de Sousa Pimentel
Comissão de Redacção
Abel do Nascimento Pena, Ana Maria Sánchez Tarrío, Arnaldo Monteiro do Espírito Santo, Bernardo Mota, José Pedro Silva Santos
Serra, Manuel José de Sousa Barbosa, Paulo Farmhouse Alberto, Rodrigo Furtado, Vanda Maria Coutinho Garrido Anastácio
Conselho Científico
Aires Augusto do Nascimento (U. Lisboa), Carlo Santini (U. Perugia), Carmen Codoñer Merino (U. Salamanca), Emilio Suárez
de la Torre (U. Pompeu Fabra), Joël Thomas (U. Perpignan), José Manuel Díaz de Bustamante (U. Santiago de Compostela),
Manuel Alexandre Júnior (U. Lisboa), Marc Mayer y Olivé (U. Barcelona), Paolo Fedeli (U. Bari), Thomas Earle (U. Oxford)
Referenciada em
L’Année Philologique | Arts and Humanities Citation Index | ANVUR | Bibliographie inter-
nationale de l’Humanisme et de la Renaissance | CSA Linguistics and Language Behavior
Abstracts | Dialnet | EBSCO | ERIH Plus | Latindex | Medioevo Latino | SCOPUS
CENTRO DE ESTUDOS CLÁSSICOS
FACULDADE DE LETRAS DE LISBOA
EVPHROSYNE
R E V I S TA D E F I L O L O G I A C L Á S S I C A
MMXIX
Frederico Lourenço,
Nova Gramática do Latim
(Lisboa, Quetzal, 2019, 505 pp. ISBN 978-989-722-566-6)
Ricardo Nobre
Centro de Estudos Clássicos da
Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa
rnobre@letras.ulisboa.pt
2 O livro de que actualmente dispomos com esse título foi sujeito a transformações que
o adequaram ao ensino do latim nos nossos dias. De “livro único”, o Compêndio de Gramática
Latina tornou-se um livro único no panorama editorial ao introduzir nas suas páginas, em
contínuas edições, informações que o harmonizaram com os programas oficiais da disciplina.
Demonstram-no o acrescento de notas sobre etimologia ou da lista de verbos frequentes, a
actualização da terminologia gramatical e a reescrita de exemplos feitas ao longo do tempo,
em sucessivas transformações que lhe garantiram a longevidade que legitimamente conhece.
3 Apesar de se apresentar como um “guia de iniciação ao Latim” e não uma gramática
de latim para o ensino secundário Novo Método de Latim (1.ª ed. do manual para o 10.º ano,
1993; a edição de acordo com os programas actualmente em vigor, de 2001, em parceria com
Ana Rita Borregana, data de 2004, reimpr. 2008). M. A. Almendra, falecida em 2005, foi autora
dos manuais Publius et Terentia (10.º ano, 1999; 11.º ano, 2000), depois de ter sido co-autora,
com José Nunes de Figueiredo, dos métodos Initia Latina (publicado entre 1967 e 1993) e
Initium (1991-1998).
FREDERICO LOURENÇO, NOVA GRAMÁTICA DO LATIM 419
5 As citações não são fiéis à norma ortográfica da NGL, redigida segundo o Acordo Orto-
zida” (p. 74) e “A maior autoridade sobre a gramática latina” (p. 163). Em momento algum se
problematiza a decisão de recorrer a uma obra que, repleta de qualidades, se encontra cienti-
ficamente ultrapassada em muitos aspectos (não por acaso, a sintaxe de Pinkster pretende ser
a sua actualização). Igualmente questionável é a afirmação, a propósito da grafia original de
hic: “Há bastante incerteza sobre o assunto” (p. 222), remetendo para esta gramática. Não se
compreende, portanto, qual a relevância, numa gramática escolar com a profundidade desta,
de tal tipo de informação.
7 O A. confessa sem rebuço: “Um pensamento que certamente já terá ocorrido a quem
está a ler este livro é que a terminologia gramatical usada é ‘conservadora’. A razão para isso é
que não é útil aplicar ao ensino e à aprendizagem do latim o último grito (seja ele qual for) no
campo da terminologia gramatical: em primeiro lugar, porque o que conta hoje como último
grito será certamente substituído por outra coisa qualquer daqui a uns anos; em segundo lugar,
porque as grandes obras de consulta para o estudo do latim e do grego, as quais, mais cedo
ou mais tarde, todos os helenistas e latinistas têm de consultar […] usam a terminologia tradi-
cional. […] É a opção mais sensata” (pp. 224-225). Ao aceitar esta apreciação, estaríamos a
impedir o avanço científico da linguística ou a afastá-lo e a excluí-lo do ensino, o que não pode
ser admitido.
8 Na bibliografia, aparecem citadas as obras The Regional Diversification of Latin 200 BC-
-AD 600 (Cambridge, Cambridge University Press, 2007) e An Anthology of Informal Latin, 200
BC-AD 900 (Cambridge, Cambridge University Press, 2016), eventualmente usadas na recolha
de exemplos. Em falta, encontra-se, pela importância que a NGL atribui à questão da norma e
desvio, Social Variation and the Latin Language (Cambridge, Cambridge University Press, 2013).
9 Ph. Baldi, P. Cuzzolin (edd.), New Perspectives on Historical Latin Syntax. Vol. 1: Syntax
of the Sentence; vol. 2: Constituent Syntax: Adverbial Phrases, Adverbs, Mood, Tense; vol. 3:
420 RICARDO NOBRE
101112
Press, 2014.
16 D. Panhuis, Latin Grammar, Ann Arbor, The University of Michigan Press, 2009.
17 Ch. Touratier, Syntaxe latine, Louvain-la-Neuve, Peeters, 1994.
18 V. Väänänen, Introduction au latin vulgaire, Paris, Klincksieck, 2006.
19 Esta obra é mencionada, p. 271, para confirmar o uso de um conjuntivo, dali colhendo
Miguéis (Lisboa, Estampa, 1982): “o problema é essencialmente económico, mas tudo depende
da fórmula política. Se não for dentro da geringonça parlamentar, há que ir buscá-la fora dela”
(p. 287; cf. p. 397).
FREDERICO LOURENÇO, NOVA GRAMÁTICA DO LATIM 421
22 Noutros momentos, a gramática veicula coloquialismos inusitados numa obra desta
natureza: “frase latina escrita às três pancadas” (p. 66); “mas ‘no terreno’, quando estamos a
ler um texto latino” (p. 89; cf. p. 279), “foi algo que nunca lhes passou pela cabeça” (p. 92),
“grafias bem estrambólicas” (p. 99), “ocasionou uma verdadeira festa de formas morfológicas
alternativas” (p. 121), “Para sossegar quem acabou de se surpreender com este panorama”
(p. 137), “forma ‘unissexo’” (p. 143, para falar em comum de dois), “encontramos formas
desconcertantes” (p. 220), “À morfologia […] ‘chega-se lá’ por intuição” (p. 253), “pôr tão cedo
quanto possível ‘as mãos na massa’ no que toca à leitura em latim” (p. 273), “Quem leu até
aqui este capítulo e pensou ‘como é que eu vou meter isto tudo na cabeça?’ pode consolar-se”
(p. 319), etc.
23 Infelizmente, sobre a ordem das palavras em latim a NGL nada tem a dizer. Por isso
também não é de estranhar a ausência de J. Marouzeau (L’ordre des mots en latin. 4 vols., Paris,
Les Belles Lettres, 1922-1953), de Panhuis ou de Danckaert (obras citadas) na bibliografia.
422 RICARDO NOBRE
plemento (directo, indirecto, oblíquo) – ou seja, se for uma oração subordinada substantiva –
numa outra oração (subordinante), ela não pode ser eliminada sem prejuízo da gramatica-
lidade da frase.
27 É por isso que as orações mais típicas que desempenham funções de modificador
frase. Ainda assim, nem todas as orações adverbiais podem ser eliminadas sem prejuízo da
gramaticalidade da oração subordinante: é o que acontece com orações subordinadas que se
anunciam na subordinante por meio de correlativos – orações subordinadas comparativas e
consecutivas (e que não são adverbiais típicas: Ch. Touratier, Grammaire latine: introduction
linguistique à la langue latine, Paris, Éditions Sedes, 2008, pp. 220-227, considera as orações
comparativas e consecutivas como expansão do grupo adjectival porque têm a função sintáctica
de complemento do adjectivo) – e nas estruturas condicionais mais complexas em que a apódose
e a prótase funcionam com regras específicas.
28 Cf. A. Cart, P. Grimal, J. Lamaison, R. Noiville, Grammaire Latine, Paris, Nathan,
1998, p. 145; Ch. Touratier, Syntaxe latine, pp. 655-659; Ch. Touratier, Grammaire latine,
pp. 227-228, B. L. Gildersleeve, G. Lodge, Latin Grammar, Wauconda, Bolchazy-Carducci Pub-
lishers, 2003, pp. 426-428; e L. Sausy, Grammaire latine complete, Paris, Eyrolles, 2015, p. 261.
29 O A. compromete-se a fazer um “o tratamento da sintaxe […] pragmático e sintético,
2003, p. 265.
32 A. Cart, P. Grimal, J. Lamaison, R. Noiville, op. cit.
33 J. Gaillard, J. Cousteix, Grammaire du latin, Paris, Nathan, 1992.
34 R. M. Griffin, Cambridge Latin Grammar, Cambridge, Cambridge University Press, 2008.
35 Ph. Guisard, Ch. Laizé, Grammaire nouvelle de la langue latine, Paris, Bréal, 2001.
36 J. Morwood, A Latin Grammar, Oxford, Oxford University Press, 1999.
37 T. Janson (A Natural History of Latin, Oxford, Oxford University Press, 2004), J.-F. R.
Mondon (Intensive Basic Latin: A Grammar and Workbook, London, Routledge, 2015) e
J. Morwood (op. cit.) são outros exemplos recentes desta prática. No caso de Lourenço, é
um estranho critério quando noutros pontos a gramática não tem escrúpulo em mostrar-se
redundante (por ex., nas dezasseis páginas sobre o calendário).
FREDERICO LOURENÇO, NOVA GRAMÁTICA DO LATIM 425
38 Quando as palavras que funcionam como pronomes têm função de adjectivo (acom-
dos nomes.
40 No capítulo (secção de sintaxe) sobre “preposições” (p. 281), o A. afirma que “Em
grego e alemão, as preposições podem reger um (ou mais) de três casos: acusativo, dativo
e genitivo”: esta informação não é relevante, sobretudo porque a conclusão será: em latim,
“as preposições regem somente dois [casos]: acusativo e ablativo” (p. 281). Assim, causa ou
gratia com genitivo não são interpretadas como preposições, mas como posposições (!) apenas
porque não se colocam antes do nome a que se referem (felizmente não se mudou o nome à
preposição usada no meio do sintagma, como em summa cum laude).
426 RICARDO NOBRE
41 Sobre os verbos depoentes (pp. 210-213) parece faltar informação essencial na prepa-
ração do leitor: em momento nenhum se diz que são verbos com sintaxe de voz activa (“sentido
activo”, p. 210, pode não ser suficiente), com um sujeito que “pratica” a acção e um comple-
mento directo quando são verbos transitivos (e não agente da passiva ou sujeito no qual recai a
acção, como sucede nas construções passivas).
42 Noutros momentos, há observações que parecem extemporâneas, como a informação
de que “No século V d. C., um bispo cristão chamado Agrécio compôs um tratado intitulado
De Orthographia. Não deixa de ser sintomático que, no tocante a esta questão, ele tenha dado
a explicação errada ao afirmar que é no conjuntivo perfeito que o -i- é breve” (p. 152). Talvez
sejam também desnecessárias notas como esta, a propósito da forma “dêictico”: “Nunca é de
mais [sic] sublinhar que ‘deítico’, como se lê habitualmente, ostenta uma acentuação errada, já
que o -ei- é um ditongo. As alternativas certas são: ou a grafia etimológica ‘dêictico’; ou então
‘díctico’; ou ainda, para quem não pronuncia o ‘c’, ‘dítico’” (p. 221, nota); ou ainda a nota da
p. 253 onde se lê: “Claro que a intuição não constitui, só por si, um fundamento sólido na abor-
dagem à morfologia do latim. Basta pensar na seguinte tradução ‘intuitiva’, com que me ri às
gargalhadas há muitos anos, do primeiro verso da Eneida: ‘A arma, o varão e o cano que o meu
primo trouxe de Tróia’”.
FREDERICO LOURENÇO, NOVA GRAMÁTICA DO LATIM 427
43 Existem muitas situações em que se recorre ao grego para explicar algum aspecto da
morfologia latina (por ex., pp. 92, 145, 179), o que é um erro metodológico, embora reconheça
que poderá suscitar a curiosidade do leitor quanto ao grego (se bem que, sem conhecimento
do alfabeto, de nada lhe serve). É pouco crível que esta quantidade de informação sobre uma
língua que o leitor desconhece e que não está a aprender ajude a perceber o latim que está
a estudar.
44 Trata-se de uma gralha, pois a desinência pessoal de amas é -s.
428 RICARDO NOBRE
ou, de acordo com outras teorias, radical ama + desinência -m. Não que-
rendo entrar nessa discussão, opto por manter a terminologia tão simples
quanto possível” (p. 159, em nota45) – mas a simplicidade não pode produzir
ambiguidade e incerteza.
Noutro lugar, verifica-se a confusão entre palavras formadas por com-
posição e por derivação: respondeo não é composto de spondeo (p. 178), mas
seu derivado. Os verbos “compostos de sum” (p. 194)46 ou “compostos de eo”
(p. 199) são na realidade igualmente derivados. São derivadas todas as pala-
vras que se formam com acrescento de prefixo e de sufixos, e compostas as
palavras formadas por mais do que um radical (tanto na gramática tradi-
cional como na linguística contemporânea). Nesse aspecto, a NGL, no capí-
tulo sobre substantivos compostos, ao subcategorizar “Substantivos com-
postos em que ambas as partes constituintes declinam” e nomes “em que só
uma das partes constituintes declina”, mostra que composição é diferente
de derivação.
No que respeita à classe dos pronomes, a terminologia desta gramá-
tica é a mesma do período criticado na introdução: “pronome interrogativo
de função adjectival” (pp. 227, 228) em vez de “determinante interrogativo”
era como se dizia no ensino do Estado Novo, tal como “adjectivos prono-
minais”. Como não identifica os quantificadores com a classe correcta, o
A. apresenta-os deste modo: “Trata-se de um grupo de vocábulos que apre-
sentam a excentricidade de misturar, no singular, a 2.ª e a 3.ª declinações”,
“excentricidade […] partilhada com os numerais” (p. 236), ou seja, repita-se,
a classe de quantificadores.
Nos pronomes pessoais, não é claro o objectivo com que se comparam
as formas do sânscrito, do grego, do latim, do alemão e do inglês. Se a gramá-
tica serve o propósito de explicar a língua latina, mesmo que recorra a
algumas informações etimológicas, fazer disso um quadro, que é introdu-
zido por uma formulação como “a reconstrução teórica […] esbarra contra
a multiplicidade de formas” (p. 214) parece apenas excessivo.
Não é explicado o conceito de pronome reflexo (pp. 218, 265), noção
que um professor de Latim sabe como é difícil para os alunos compreen-
derem. O mesmo se diga a respeito do pronome relativo, cujo conceito não é
esclarecido. Seria ainda de repensar a enunciação da regra de concordância
segundo a qual “O pronome relativo concorda com o antecedente em género
e número, mas surge no caso exigido pela função sintáctica desempenhada
na oração” (p. 340), reformulando-a para a sua justificação: o pronome rela-
tivo toma o género, número e caso da palavra que substitui, se ela estivesse
expressa.
Só depois dos pronomes surge o capítulo dos adjectivos (pp. 231-242),
no qual não se diz como se enunciam, mesmo que essa informação tenha
45 Na p. 342, “oração relativa de caracterização” (uma oração relativa com função sintác-
tica típica de adjectivos) merece uma nota de rodapé onde se lê: “Na terminologia anglo-saxó-
nica, ‘relative clause of characteristic’”.
46 Os derivados de sum não surgem completamente enunciados e por isso o leitor não é
sido dada com pormenor a propósito dos nomes e dos verbos (criando entro-
pia com enunciações semelhantes, em particular com a dos particípios e dos
pronomes possessivos). Dos graus dos adjectivos apenas são mencionados o
comparativo e o superlativo de superioridade (não se faz menção de que
existem outros). Em página e meia, surgem informações sobre o superlativo
de superioridade dos adjectivos da 1.ª classe terminados em -er e a indi-
cação de que facilis, difficilis, gracilis, humilis, similis e dissimilis têm dois
ll nesse grau (sem dizer porquê47). Desafortunadamente, nada se diz sobre
o superlativo relativo de inferioridade, o comparativo de inferioridade e
igualdade; falta a distinção entre superlativo absoluto e superlativo relativo.
No capítulo sobre advérbios, fala-se de “advérbios formados a partir
de adjectivos” (p. 243) sem se esclarecer que são advérbios de modo. Depois
da formação de advérbios a partir de adjectivos, o A., que deu abundantes
informações etimológicas a propósito dos nomes, não explica a origem de
advérbios como diu, iam, semper (p. 244). Teria ainda valido a pena distin-
guir os advérbios de negação (p. 246) porque não exibem todos o mesmo
comportamento (na p. 272 mistura-se o advérbio de negação non com a con-
junção ne). No fim, fala-se de “advérbios oxítonos” (pp. 248-249), fundindo
categorias semânticas (“advérbios de limitação”, “advérbios de causa”, etc.)
com aspectos fonéticos; esta lista desses advérbios não tem tradução e não
se menciona que são advérbios de lugar (tratados em mais parte nenhuma
do livro).
“Da língua saem as maledicências, as injúrias, as blasfémias, as men-
tiras, os perjúrios […]. Por outra parte, tem a língua soberanas excelên-
cias, é intérprete do coração, oráculo dos pensamentos, chave da memória,
parteira dos conceitos, vivo prelo das palavras, freio da prudência e leme
da razão”48: a dimensão expressiva das línguas é infinita e as páginas da
NGL de Lourenço são disso testemunho, pois diversas vezes o A. afirma
que a finalidade da aprendizagem do latim é ler textos nessa língua, sobre-
tudo a sua literatura, mas também documentos de outros registos, de onde
resulta a amplitude de exemplos provindos de textos literários, de Énio a
Santo Agostinho49, a que junta, tal como Pimentel, Espírito Santo e Beato50,
Wheelock51 e English e Irby52, alguns exemplos epigráficos e graffiti, no con-
texto das quais se debatem questões de norma e erro (mais correctamente,
‘porquê’ das coisas, porque não me parece motivante pôr diante de discentes uma língua cheia
de complexidades gramaticais sem dar a ver a sua razão” (p. 11).
48 J. P. Silvestre, op. cit., p. 46.
49 Existe um exemplo de Descartes (p. 261) e a antologia de textos inclui o epitáfio de
Gregório V; no entanto, a NGL não explora as alterações do sistema linguístico além de Agostinho,
sendo por isso desadequada para a leitura de textos medievais, renascentistas e modernos.
50 M. C. C.-M. S. Pimentel, A. do Espírito Santo, J. Beato, Sic Incipitur: Curso Elementar
2018.
430 RICARDO NOBRE
53 Seria de questionar a pertinência da inclusão deste tipo de texto, por vezes desviante
da norma, como modelar e representativo das regras da gramática que o estudante necessita
conhecer para ler sem constrangimentos em latim. No entanto, o leitor fica desde cedo com
consciência de que a língua, tal como os romanos escreviam, não tinha o aspecto que se encontra
cristalizado nos livros, tratando-se antes de uma língua sujeita a variações como qualquer
outra. Além disso, é há muito reconhecido o valor didáctico das inscrições como textos de sen-
tido completo, existindo até um método construído com esses textos (M. Hartnett, By Roman
Hands, Indianapolis, Focus, 2012).
54 Mencione-se apenas que o exemplo quo usque tandem, Catilina, abutere patientia
nostra? (p. 211) não traduz tandem (numa obra didáctica a tradução deve ser o mais literal
possível); os exemplos erit ille mihi semper deus (p. 216) e vetus oppidum et nobile (p. 231) não
estão traduzidos.
55 Optando por reduzir os exemplos a expressões mínimas do fenómeno que se pretende
ilustrar, em inícios dos anos 60 do século XX, no sistema de ensino francês, todas as regras
gramaticais passaram a ser representadas por exemplos típicos que sintetizavam as constru-
ções sintácticas. A gramática de H. Petitmangin, revista em 1963 por P. Coussin, é um exemplo
desse fenómeno, parcialmente importado para Portugal por Almendra e Figueiredo.
56 No entanto, nem sempre é apresentado o significado adequado ao contexto do exemplo
(e as frases das pp. 264-265 não têm vocabulário, que regressa a partir da p. 266).
57 Outros são retirados das obras de J. N. Adams, creditadas na bibliografia.
58 Na métrica, a NGL evidencia-se como a melhor síntese em manuais deste tipo
(só A. Traina, G. B. Perini, Propedeutica al Latino Universitario, 6.ª ed., Bologna, Pàtron, 2016,
pp. 251-287 têm uma exposição mais completa). Na bibliografia, sobre métrica e cláusulas
métricas, é de realçar o tratado de Nougaret, citado pela primeira edição de 1948 (em vez da
4.ª edição em vida do autor, em 1986, com correcções).
FREDERICO LOURENÇO, NOVA GRAMÁTICA DO LATIM 431
ring in the Actual Writings of over 200 Latin Authors, California, Sophron, 2013.
62 C. T. Lewis, An Elementary Latin Dictionary, Oxford, Oxford University Press, s/d,
pp. 936-952.
432 RICARDO NOBRE
termos ao longo da obra não coincide com os desta lista. Definir parens,
parentis como “parente” (p. 91) parece, por sua vez, desajustado, pois, como
a própria gramática regista na página 455, o sentido é de “progenitor(a)”.
Cornu é traduzido por “chifre” nas páginas 122, 123 e 124 mas por “corno”
na página 439.
Foram já apontadas algumas ausências bibliográficas da NGL; no
entanto, não fora o adjectivo “nova” no título e a promessa de uma “gramá-
tica actualizada”, talvez se dispensasse um comentário demorado às três
páginas de referências bibliográficas63. Em primeiro lugar, é evidente que
a bibliografia desmente as críticas que a gramática faz aos materiais de
que dispomos para a aprendizagem do latim em Portugal: se se condenam
os métodos do tempo de Salazar (compreende-se que se critiquem alguns
textos propostos para leitura ou mesmo a natureza doutrinária de alguns
exemplos, mas de resto é uma observação que excede a dimensão linguís-
tica, pelo que não é este o espaço para a debater), a principal bibliografia da
NGL foi produzida entre o final do século XIX e meados do seguinte.
Estão ausentes as obras recentes que se anunciam como actualizações
dos estudos canónicos (sendo de lamentar, por exemplo, o uso de Buck,
mencionado na p. 149, em vez de Sihler ou de Baldi; Pinkster, que actualiza
Kühner, é, como se viu, subaproveitado). Na página 273, o A. admite que o
estudo da sintaxe latina, “idealmente, deveria ser alicerçado na leitura de
A New Latin Syntax, de E. C. Woodcock”. No entanto, a proposta da NGL
para a sintaxe não segue este modelo, optando pelo de Morwood, de que
por vezes se aproxima textualmente. Também ausente está, como se viu, a
Syntaxe Latine de Ernout e Thomas.
Apesar da importância dada não só à aquisição de vocabulário como
à leitura de textos não canónicos, o único dicionário da bibliografia é o
Oxford Latin Dictionary; Ernout e Meillet não são nomeados como autores
do Dictionnaire étymologique de la langue latine (mencionado nas abrevia-
turas, mas ausente da bibliografia). Sabe-se que todos os dicionários de
latim-português (sobretudo o de Torrinha e o de Gomes Ferreira) têm
problemas metodológicos e limitações, mas quem está a aprender (ou a
recordar) latim poderá não estar disponível para o uso de obras lexicográ-
ficas estrangeiras. Assim, uma nota sobre dicionários seria bem-vinda, tal
como a referenciação dos dicionários de Gaffiot64 e de Conte, Pianezzola
e Ranucci65.
“Tem a língua suas horas; em umas deve calar e deve falar em outras,
mas nunca tem hora para dizer tudo”66: assim também as gramáticas. Esta,
63 As gramáticas latinas em Portugal são parcas em bibliografia, que se resume sobre-
tudo a obras similares, ou seja gramáticas de carácter geral, muitas vezes francesas. Borregana
tem uma página de referências, e o Compêndio de Almendra e Figueiredo deixou de mostrar
bibliografia na edição de 1978.
64 F. Gaffiot, Le Grand Gaffiot: Dictionaire Latin-Français, rev. coord. P. Flobert, Paris,
Hachette, 2000.
65 G. B. Conte, E. Pianezzola, G. Ranucci, Dizionario della Lingua Latina, Florença, Le
Monnier, 2004.
66 J. P. Silvestre, op. cit., p. 47.
FREDERICO LOURENÇO, NOVA GRAMÁTICA DO LATIM 433
apesar das suas 505 páginas, não diz tudo sobre a língua latina, nem este
texto regista todas as objecções metodológicas, científicas e pedagógicas que
a leitura da NGL levanta, nem é esse o seu propósito. Nesse sentido, reco-
nheço que uma leitura alternativa deste livro, enquanto obra de divulgação,
testemunho devoto de um amor à língua, esforço para que o Latim reen-
contre o seu lugar na nossa vida (qualidades que ninguém poderá negar ao
trabalho de Frederico Lourenço) conduziria a conclusões muito diferentes
das que a análise linguística permitiu.
I
COMMENTATIONES
Más allá de las formas del amor: γάμος y ἔρως en Suplicantes de Esquilo – María
del Pilar Fernández Deagustini............................................................................. 31
There’s something fishy about Philaenis: Martial 9.62 and related epigrams – Daniel
López-Cañete Quiles. .............................................................................................. 69
Le parole del pianto nella poesia di Venanzio Fortunato – Francesca D’Angelo. ....... 119
Le fonti del sesto libro del De rerum naturis: le fondamenta dell’opera di Rabano
Mauro – Camilla Bertoletti................................................................................... 161
La medida del pie romano: nota de crítica textual sobre un problema filológico-mate-
mático de la Repetitio Sexta de Mensuris de Nebrija – José María Maestre
Maestre.................................................................................................................... 191
De muscipulis et caveis. The cage and the mousetrap as pictorical and literary
motifs in neo-latin emblem books – Carlos Pérez González. ............................. 221
II
STVDIA BREVIORA
The Adjectives ὅσιος and ἀνόσιος referring to Divinities in Euripides – Ana C. Vicente
Sánchez..................................................................................................................... 273
Ov. Met. 8.647: una proposta esegetica – Alessia Maria Scalera.................................. 279
Atticism in Plutarch: a μίμησις τῶν ἀρχαίων or diglossia? – José Vela Tejada. ............. 295
552 RERVM INDEX
Marco Aurelio, vida y pensamiento en una tragedia actual – María Luisa Harto
Trujillo..................................................................................................................... 309
Las Vitae XII Caesarum de Suetonio en los florilegios latinos – María José Muñoz
Jiménez...................................................................................................................... 325
Nuevos datos sobre la versificación latina de Benito Arias Montano: el libro quinto
de los Hymni et secula – Antonio Dávila Pérez..................................................... 353
The Syria Trojan Women from therapeutic theatre to a cry for action – Sandra
Pereira Vinagre....................................................................................................... 403
III
DISPVTATIO NES
Juan Gil (ed.), Chronica Hispana saeculi VIII-IX – Rodrigo Furtado........................... 435
IV
VARIA NOSCENDA
V
LIBRI RECENSITI
Martha Krieter-Spiro, Homer’s Iliad: The Basel Commentary. Book XIV, translated
by Benjamin W. Millis and Sara Strack, edited by S. Douglas Olson. – Claude
RERVM INDEX 553
Rhiannon Ash (ed.), Tacitus: Annals Book XV – Maria Cristina Pimentel. .................. 487
Juan Antonio López Férez, Galeno. Preparación y constitución de textos críticos, entre-
ga y publicación de obras propias o ajenas – Inmaculada Rodríguez-Moreno..... 489
Juan A. Estévez Sola (ed.), Chronica Hispana saeculi XII. Pars III. Historia Silensis
– Rodrigo Furtado................................................................................................... 493
E. Pérez Rodríguez (ed.), Las palabras del paisaje y el paisaje en las palabras de la
Edad Media. Estudios de lexicografía latina medieval hispana – P. F. Alberto..... 495
Aldus Manutius, Humanism and the Latin Classics. Edited and Translated by John
N. Grant – Maria Luísa Resende. ........................................................................... 497
Antonio Dávila Pérez, Benito Arias Montano. Apología de la Biblia Regia – Juan
Carlos Jiménez del Castillo................................................................................... 497
Antonia Sarri, Material Aspects of Letter Writing in the Graeco-Roman World. 500 BC
- AD 300 – Maria Cristina Pimentel....................................................................... 505
Simon Critchley, Tragedy, the Greeks and Us – Sofia Frade ......................................... 507
554 RERVM INDEX
Esther Eidinow, Envy, Poison, and Death: Women on Trial in Classical Athens –
Nereida Villagra. .................................................................................................... 512
David Quint, Virgil’s Double Cross. Design and meaning in the Aeneid – Luís Manuel
Gaspar Cerqueira..................................................................................................... 515
F. Bessone, M. Fucecchi (edd.), The Literary Genres in the Flavian Age. Canons,
Transformations, Receptions – Ana Lóio. ................................................................ 519
Esteban Calderón Barca, Sabino Perea Yébenes (edd.), Estudios sobre el vocabu-
lario religioso griego – Rui Miguel Duarte.............................................................. 522
Dag Nikolaus Hasse, Amos Bertolacci (edd.), The Arabic, Hebrew and Latin Recep-
tion of Avicenna’s Physics and Cosmology – André Baptista................................. 523
Federica Ciccolella, Luigi Silvano (edd.), Teachers, Students, and Schools of Greek
in the Renaissance – Maria Luísa Resende............................................................. 524
Matteo Salvadore, The African Prester John and the Birth of Ethiopian-European
Relations, 1402-1555 – Maria Luísa Resende......................................................... 525
Raúl López López, Eduardo Álvarez de Palacio (edd.), Humanistas españoles. Arte,
Ciência y Literatura – Manuel José de Sousa Barbosa.......................................... 526
Sandra Rodríguez Piedrabuena, Gréta Kádas, Sata Macías Otero, Kevin Zilver-
berg (edd.), Approaches to Greek and Latin Language, Literature and History –
Catarina Gaspar........................................................................................................ 529
Adam J. Goldwyn, Byzantine Ecocriticism: Women, Nature, and Power in the Medi-
eval Greek Romance – Rui Carlos Fonseca............................................................ 532
Donna Zuckerberg, Not All Dead White Men, Classics and Misogyny in the Digital
Age – Sofia Frade..................................................................................................... 537
RERVM INDEX 555
Andrés Pociña Pérez, Aurora López, Carlos Morais, Maria de Fátima Silva,
Patrick J. Finglass (edd.), Portraits of Medea in Portugal During the 20th and
21st Centuries – Ricardo Duarte.............................................................................. 538
c) Instrumenta
Daniela Urbanová, Latin Curse Tablets of the Roman Empire – Catarina Gaspar......... 544
1. Euphrosyne — Revista de Filologia Clássica, the peer journal of the Centre for Classical Studies, publishes papers
on classical philology and its disciplines (including classical reception and tradition).
2. Papers can be sent to euphrosyne.ceclassicos@letras.ulisboa.pt or to the Centre for Classical Studies’ post mail.
3. Papers submitted: must be original; cannot be yield to other entity; must be sent in their definite version; have to be
presented according to these guidelines; will not be returned to the author. Papers will be submitted to peer reviews.
4. Papers will be accepted until 31st of January in the year of the publication; an acceptance notification will be sent to
the author until 31st of July.
5. Originals must always be submitted in double electronic format (Word/.doc(x) and PDF).
6. Papers must have: a) title (short and clear); b) author’s name and surname; c) author’s academic or scientific insti-
tution; d) author’s email; e) abstract (10 lines) in English; f) three key-words in English.
7. Recommended size is 10 pages and never more than 20 A4 pages (font size 12, double spaced).
8. Notes: endnotes, with sequential numeration. When published, these will be converted to footnotes.
9. References:
a) Remissions to pages within the paper are not allowed.
b) Note references:
Books: J. de Romilly, La crainte et l’angoisse dans le théâtre d’Eschyle, Paris, Les Belles Letres, 1959, pp. 120-130;
2nd reference: J. de Romilly, op. cit., p. 78.
Journals: R. S. Caldwell, “The Misogyny of Eteocles”, Arethusa, 6, 1973, 193-231 (vol., year, pp.). 2nd reference:
R. S. Caldwell, loc. cit.
Multi-author volumes: G. Cavallo, “La circolazione dei testi greci nell’Europa dell’Alto Medioevo” in J. Hamesse
(ed.), Rencontres de cultures dans la Philosophie Médiévale — Traductions et traducteurs de l’Antiquité tardive
au XIVe siècle, Paris, Les Belles Letres, 1971, pp. 47-64.
c) Abbreviations: to Latin authors will be followed ThLL conventions; Liddel-Scott-Jones will be used to Greek
authors; Année Philologique to abbreviate journal titles; common abbreviations: p. / pp.; ed. / edd.; cf.; s.u.; supra;
op. cit.; loc. cit.; uid.; a.C. / d.C. (roman).
d) Quotations: Must be marked by quotes “…” (but not in Greek); italic is used to highlight words or short sentences;
quotations in Latin or Greek must be brief.
10. Images must have quality (preferably in TIF format, minimum resolution 200 p.p.), provided in electronic format,
with the precise indication of where they must be placed in the text, and who is their author. The author is
responsible for obtaining any copyrights needed.
11. The author will not be provided with more than one set for review, which has to be returned within a week period.
Originals cannot be modified.
12. Authors will receive a physical copy of the volume and the electronic version of their paper.