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RESUMO
O presente estudo tem por objetivo demonstrar o impacto do modelo punitivista atual brasileiro no que
diz respeito às drogas, eminentemente fundamentado no proibicionismo e os seus erros e acertos e a
possibilidade de que venha a ser aperfeiçoado, desde que adotado novo paradigma de prevenção e
punição, que não mais se mostrem meramente estigmatizantes e seletivos. Aponta-se, como forma de
redução dessas características o modelo adotado por Portugal, que se mostra apegado à tutela da
dignidade humana e satisfativa da questão.
Palavras-chave: Direito Penal. Guerra às Drogas. Lei de Drogas. Cárcere. Estigmatização social.
ABSTRACT
The present study aims to demonstrate the impact of the current Brazilian punitive model with regard
to drugs, eminently based on prohibitionism and its mistakes and successes, and the possibility that it
will be improved, provided that a new prevention and punishment paradigm is adopted, that they no
longer prove to be merely stigmatizing and selective. As a form of reduction, it is pointed out the
characteristics of the model adopted by Portugal, which shows itself attached to the protection of
human dignity and satisfaction of the issue.
Keywords: Criminal Law. War on Drugs. Drug Law. Prison. Social stigmatization.
1 INTRODUÇÃO
12 Ibid.
13 Ibid.
220 ISSN 2675-0104 – v.6, n.1, dez. 2021
D’Plácido, 2019.
16 BRASIL. Lei n. 11.343, de 23 de agosto de 2006. Institui o Sistema Nacional de Políticas
Públicas sobre Drogas - Sisnad; prescreve medidas para prevenção do uso indevido, atenção
e reinserção social de usuários e dependentes de drogas; estabelece normas para repressão
à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas; define crimes e dá outras
providências. Brasília, DF: Presidência da República, 2006. Disponível em:
Revista de Iniciação Científica e Extensão da Faculdade de Direito de Franca 221
característica da Lei Antitóxicos para o sistema penal, bem como seu viés
de seletividade penal.
Os crimes relacionados ao tráfico de drogas são a maior
incidência que leva pessoas às prisões, com 28% da população carcerária
total. Roubos e furtos somados chegam a 37%. Homicídios representam
11% dos crimes que causam a prisão25.
Segundo dados disponibilizados pelo Senado Federal, o perfil das
pessoas presas no Brasil é de 67% da etnia negra, 31% dentro da faixa
etária dos 18 aos 24 anos, 25% dos 25 aos 29 anos e 53% com formação
fundamental incompleta26.
Além disso, um estudo realizado no Distrito Federal, no Rio
Grande do Sul, na Paraíba, no Tocantins, em Santa Catarina e em São
Paulo, demonstra que os jovens e negros são a maioria nas audiências de
custódia das localidades analisadas. E possivelmente, os jovens negros
recebem tratamento judicial mais severo, posto que 49,4% dos brancos
detidos permanecem presos e 41% recebem liberdade provisória com
medida cautelar. Já no que se refere à população negra, tais percentuais
alcançam 55,5% e apenas a 35,2% é conferida a liberdade provisória27.
Quanto ao encarceramento feminino tem-se que o tráfico de
drogas é o principal tipo de infração cometido pelas mulheres. Posto que,
segundo os dados do INFOPEN do ano de 2017, os crimes relacionados ao
tráfico de drogas correspondem a quase 60% das incidências penais pelas
quais as mulheres são privadas de liberdade28.
Desse modo, de maneira clara, a atual política criminal de drogas
através da seletividade penal, da quantidade de condutas que criminaliza,
da ausência de necessária comprovação do elemento subjetivo específico
25 BRASIL. Infopen. Há 726.712 pessoas presas no Brasil. Brasília, DF: 08 dez. 2017.
Disponível em: https://www.justica.gov.br/news/ha-726-712-pessoas-presas-no-brasil.
Acesso em: 16 set. 2021.
26 Id. Senado Federal. Perfil das pessoas presas no Brasil. Em discussão, ano 7, n. 29, set.
o número de mulheres presas por tráfico. Agência Brasil, [s.l.], 24 jun. 2018. Disponível
em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2018-06/lei-de-drogas-tem-
impulsionado-encarceramento-no-brasil. Acesso em: 16 set. 2021.
28 BRASIL. Ministério da Justiça e Segurança Pública. Relatório temático sobre mulheres
29 BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (8ª Câmara de Direito Criminal).
Apelação n. 1501074-79.2020.8.26.0530. Apelante: Antônio Marcos da Silva. Apelado:
Ministério Público Estadual de São Paulo. Relatora: Desembargadora Ely Amioka, 02 fev.
2021. Disponível em:
https://esaj.tjsp.jus.br/cjsg/getArquivo.do?cdAcordao=14323098&cdForo=0. Acesso em:
16 set. 2021.
30 Id. Superior Tribunal de Justiça. Habeas corpus n. 662186 SP (2021/0123728-5).
Por meio de seu voto, o Ministro destaca que chama sua atenção
a condenação por tráfico de um indivíduo que trazia consigo quantidade
tão ínfima de drogas. De mais a mais, aponta que a diferenciação entre as
figuras de usuário e traficante é problemática na legislação e pela
concepção expansiva conferida pela lei vigente por vezes acaba-se por
incluir nas condenações de tráfico, ocasiões de consumo compartilhado e
aquisições para consumo próprio.
Além disso, afirma que embora o Tribunal a quo paute a
condenação nas circunstâncias da prisão (decorrente de denúncia anônima)
e na quantidade de drogas apreendidas, aliadas à tentativa de fuga do réu
ao avistar os policiais, a quantidade de droga apreendida é pequena e não
é possível identificar que ele estivesse efetivamente realizando a mercancia
de entorpecentes, haja vista que inclusive estava sozinho no local da
abordagem.
Para além do exposto, a conduta que lhe foi imputada pelo
Parquet foi a de trazer consigo, figura também tipificada pelo art. 28 da
Lei de Drogas, e não há elementos probatórios seguros que demonstrem
seu dolo de narcotraficância; o que se tem é apenas uma intuição acerca de
eventual traficância, não sendo suficiente à sua condenação a existência de
ponto de comércio de drogas no local. Com isso, evidenciado o equívoco,
posto que a conclusão sobre sua conduta decorre de avaliação subjetiva não
amparada em substrato probatório, impõe-se a desclassificação da conduta
para o delito descrito no art. 28, caput, da Lei de Drogas.
Portanto, demonstra-se na prática que a subjetividade muito
encarcera, o faz a penas longas e com prova única, em total desrespeito às
orientações constitucionais vigentes que sustentam o Estado Democrático
de Direito.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
https://www.dependencias.pt/ficheiros/noticias/1316006620dependencias_abril2009.pdf.
Acesso em: 16 set. 2021.
41 Ibid.
42 PORTUGAL descriminalizou uso de drogas em 2001; entenda a política. G1, São Paulo,
REFERÊNCIAS
BRASIL. Infopen. Há 726.712 pessoas presas no Brasil. Brasília, DF: 08 dez. 2017. Disponível em:
https://www.justica.gov.br/news/ha-726-712-pessoas-presas-no-brasil. Acesso em: 16 set. 2021.
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sobre Drogas - Sisnad; prescreve medidas para prevenção do uso indevido, atenção e reinserção
social de usuários e dependentes de drogas; estabelece normas para repressão à produção não
autorizada e ao tráfico ilícito de drogas; define crimes e dá outras providências. Brasília, DF:
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Estadual de São Paulo. Relatora: Desembargadora Ely Amioka, 02 fev. 2021. Disponível em:
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BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (1ª Câmara de Direito Criminal). Apelação n.
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