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Guerra as drogas: uma empreitada fracassada

Rivando José Conceição dos Santos*

Resumo
Este artigo é um fruto de resultados adquiridos através de uma reflexão sobre o
proibicionismo das substâncias conhecidas na contemporaneidade como drogas
ilícitas sob a guarida da preocupação com a saúde pública, além de refletir sobre os
impactos sociais dessa política incriminadora no país. Por conseguinte busca verificar
os motivos que impulsionam o consumo de tais substancias, ainda que esteja diante
de uma política repressiva às drogas, perpetuando, desse modo, o aumento
progressivo de forma avassaladora, tanto a venda, como o uso dos entorpecentes
ilícitos. Portanto, é possível perceber, até de maneira empírica, que a política
conhecida como “Guerra às drogas”, que teve seu marco inicial na convenção de
Xangai, foi um fracasso, pois é visível que após décadas de proibição o problema não
foi extirpado das sociedades como se pensava, mas é perceptível o seu efeito
contrário, através do comércio dessas substâncias proibidas que persiste de forma
crescente, provocando uma imensa sensação de insegurança social pelo
aparecimento dos chamados traficantes de drogas, incidindo, assim, em diversos
outros tipos de crimes. Não obstante é verdade que, devido a tal fracasso, já se
busque um olhar diferenciado sobre o assunto que pode ser visto com a nova lei de
drogas 11.343 de 2006, que despenalizou o usuário, porém deixou uma grande
lacuna, já que o uso permaneceu criminalizado, contudo os indivíduos passaram a ser
enquadrado por tráfico com cada vez menos quantidade de drogas. Assim, são
vislumbradas possibilidades de alternativas diversas de encarceramento através de
mudanças na legislação brasileira.

Palavras-chave: Drogas. Código Penal. Encarceramento. Proibicionismo.

1. Introdução
A política existente do proibicionismo de entorpecentes em nossa sociedade
tem se mostrado cada vez mais ineficaz em seu propósito, já que é visível o
crescimento desenfreado do uso e da venda das drogas, desafiando desse modo a
política incriminadora estatal. No entanto, acreditava-se que pela repressão seria
possível desestimular a venda e consequentemente o consumo dos produtos
proibidos, contudo com o passar do tempo se percebeu que tal finalidade não foi
alcançada, deixando escapar a percepção, de forma clara, que o código penal não
deveria se intervir nesses assuntos, já que sua aplicabilidade não trouxe resultados
palpáveis, além de gerar outras problemáticas ainda mais gravosas como o aumento
da violência e por conseguinte gerando o encarceramento das massas. Portanto:
* Trabalho de Conclusão de Curso de Pós-Graduação em Direito Penal e Direito Processual Penal,
Universidade Estácio de Sá, Alagoinhas-Ba, 2020.2.
E-mail: rivanjsantos@hotmail.com
Falar sobre drogas: é um tema que precisa ser sistematizado. Droga é uma
palavra criada pela proibição. Na realidade, o que existe são tóxicos. Tóxicos:
alguns deles são proibidos e justamente esses que são proibidos se chamam
drogas. Temos tóxicos de uso comum. O tóxico que causa mais mortes no
mundo é o álcool; não só pelo uso, abuso ou dependência, mas também
porque é o tóxico mais criminógeno. Os outros tóxicos proibidos realmente
causam mortes, mas não tanto pelo uso, pelo abuso ou pela dependência,
mas pela proibição. (ZAFFARONI, 2013, p.115)

Desse modo, pode-se afirmar que a política proibicionista das drogas produziu
um efeito inverso ao seu desígnio, já que a opressão não pôde evitar o crescimento
da oferta e consequentemente o consumo também aumentou em grande escala, pois
é sabido que o acesso aos tóxicos proibidos não é difícil na sociedade contemporânea,
logo que é manifesto a possibilidade de comprar em uma simples esquina de uma
cidade, embora no Brasil haja uma lei muito rigorosa acerca do tráfico e porte de
drogas, positivado em nosso ordenamento jurídico como a Lei de Tóxico 11.343/06
que versa da seguinte:
Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir,
vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo,
guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda
que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação
legal ou regulamentar: Pena – reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e
pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa. § 1º
Nas mesmas penas incorre quem: I – importa, exporta, remete, produz,
fabrica, adquire, vende, expõe à venda, oferece, fornece, tem em depósito,
transporta, traz consigo ou guarda, ainda que gratuitamente, sem autorização
ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, matéria-prima,
insumo ou produto químico destinado à preparação de drogas; II – semeia,
cultiva ou faz a colheita, sem autorização ou em desacordo com
determinação legal ou regulamentar, de plantas que se constituam em
matéria-prima para a preparação de drogas; III – utiliza local ou bem de
qualquer natureza de que tem a propriedade, posse, administração, guarda
ou vigilância, ou consente que outrem dele se utilize, ainda que
gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou
regulamentar, para o tráfico ilícito de drogas. § 2º Induzir, instigar ou auxiliar
alguém ao uso indevido de droga: Pena – detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos,
e multa de 100 (cem) a 300 (trezentos) dias-multa. § 3º Oferecer droga,
eventualmente e sem objetivo de lucro, a pessoa de seu relacionamento, para
juntos a consumirem: Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 1 (um) ano, e
pagamento de 700 (setecentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa, sem
prejuízo das penas previstas no art. 28. (SILVA, 2016, p. 71).

Destarte, diante da observância dessa lei de drogas vigente em nosso país este
artigo busca expositivar a política proibicionista de tóxicos através de um olhar crítico
a luz dos princípios constitucionais e do efeito real dessa política incriminadora, com
foco nas implicações decorrente da intervenção estatal na individualidade da
sociedade e como se dá o enfrentamento da desobediência da lei 11.343/06. Desse
modo, abordando possíveis benefícios e destacando os malefícios desse
enfrentamento estatal com um olhar no discurso moralizante justificador de suas
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ações. “Porém, as soluções para a questão estão muito mais além do limitado campo
jurídico, tão caro aos legisladores e juristas, em especial pela tendência de estes se
isolarem tanto das ciências sociais, como da realidade social que os cerca.”
(RODRIGUES, 2006, p.19).
Por conseguinte para a realização dessa pesquisa foram utilizadas fontes
bibliográficas com um olhar nas possíveis soluções das causas do aumento crescente
da violência com o viés anexado ao tráfico de drogas e assim através do método
dedutivo pela análise dos diversos aspectos atinentes a política incriminatória das
drogas como forma de fundamentar provável solução, tendo em vista o olhar dessas
ocorrências pela reprodução semelhante em outros países. Assim, verifica-se que,
embora o Direito Penal tenha o propósito inicial de dirimir os conflitos sociais, as
complexidades das situações cotidianas impedem uma análise mais profunda e
crítica, sob pena de, ao invés de reduzir, aumentar os danos.

2. A Lei de drogas 11.343/06


Há quem afirme que o Brasil tem de certa forma avançado sistematicamente
com um novo olhar na política das drogas ilícitas pelo o advento da nova lei de drogas
que foi sancionada em 23 de agosto de 2006, que incide no desencarceramento do
usuário de drogas ilícitas, entretanto é possível também proferir que há um outro olhar
sobre esta lei, que a enxerga de forma crítica, percebendo-a como um anacronismo
feito para parecer uma forma de progresso, já que tanto o uso quanto a venda continua
por esta norma criminalizada, assim sendo, tão somente, despenalizou ou
“desencarcerou” o usuário, portanto é visto por Taffarello (2009, p.17) que
“Demonizado é o consumo de drogas, e igualmente demonizados são a própria droga
e o seu consumidor, bem como seu negociador”. Dessa forma, se questiona o
benefício desta nova lei, já que o usuário, além de se encontrar em estado de
fragilidade social, continua sendo interpelado pelas forças de segurança estatais e
conduzido até uma delegacia de polícia civil para que possa ser feito o Termo
Circunstanciado de Ocorrência (TCO), estigmatizando o indivíduo ainda mais, ou
seja, a política proibicionista de criminalização do sujeito continuou, já que este
atualmente tornou-se o único dispositivo de intervenção do estado com esses sujeitos
que estão em situação de risco social. Diante desse panorama, cumpre-se questionar
não apenas a função jurídica da lei de Drogas, mas sobretudo o seu papel social, na

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medida em que a política de proibição não tem se mostrado eficaz e, ainda assim,
socialmente o usuário – mesmo desencarcerado – carrega um pesado estigma.
Sabe-se, portanto que a redação do artigo 28 caput provocou discursões
doutrinárias a respeito do que o legislador realmente queria dizer, o que deixou um
juízo duvidoso, assim houve entendimentos diversos pelos juristas em que pairou a
dubiedade sobre a criminalização e descriminalização do uso das drogas, pois alguns
juristas afirmava que tinha ocorrido o “abolitio criminis”, portanto restou ao Supremo
Tribunal Federal (STF) resolver o dilema diante dos entendimentos desencontrados,
sendo batido o martelo pela suprema corte que a nova lei de drogas trouxe apenas a
despenalização e não a descriminalização e assim o encarceramento tinha sido
substituído por penas educativas e/ ou penas restritivas de direito.

No campo do controle social insere-se a forma mais drástica de controle


formal, exercido pelo sistema penal, que aqui se denominou controle penal.
O controle penal sobre a droga atua por meio da proibição do consumo e da
venda de determinadas substâncias, e seu discurso punitivo fundamentado
no conceito de “nocividade” de determinadas substâncias, e impõe um
comportamento individual à coletividade, moldado sobre o ideal de
abstinência como virtude a ser seguida. (RODRIGUES, 2006, p.21).

Diante desse contexto sabe-se o quanto se tornou imprescindível a discursão


sobre a política proibitiva das droga, logo pode-se afirmar que é um fato indissociável
da sociedade contemporânea, isso devido ao crescimento do comercio de tóxicos
ilícitos, portanto tornou-se inadiável discursões a respeito das vulnerabilidades que
estes indivíduos ficam e consequentemente toda a sociedade pela violência que
advém dessa distorção jurídica. Já que é percebido a ausência de resultados positivos
por colocar as forças de segurança a efetuar uma verdadeira caçada aos usuários de
drogas deixando-os ainda mais em situação de vulnerabilidade social, demonstrando,
dessa forma um modo de fuga da real missão estatal que constitucionalmente deveria
tratar de diminuir as diferenças sociais pelo respeito ao princípio da dignidade humana
que se encontra positivado na Constituição Federal de 1988.
Portanto “drogas” trata-se do resultado das normas basilares internacionais
proibitivas de criminalização que foram perpetradas por volta do século XX, dessa
forma pode-se afirmar que a sociedade conviveu por milênios de forma harmoniosa
com tóxicos sem a intervenção do direito penal e nem por isso a espécie humana
entrou em desordem total. Portanto, “O sistema brasileiro proibicionista está

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alicerçado por ideologias de diversos campos, que se complementam na formulação
do discurso que legitima a repressão.” (SOLOVIEV, 2012, p.26).
Sendo assim diante da situação de violência urbana pela política proibicionista
das drogas que é vivenciado atualmente pelos brasileiros é possível afirmar que essa
política incriminadora teve um assustador fracasso no seu objetivo das substâncias
que foram catalogadas como proibidas. Portanto, é inegável o fracasso, embora
recentemente tenha-se buscado amenizar a situação com o advento da nova lei de
drogas de nº 11.343/06 em substituição a antiga lei 6.368/76, visando o
desencarcerando dos usuários.
Essa estratégia reduz o alcance do direito penal e se baseia nas
considerações críticas já clássicas sobre o fracasso da prisão, sua inutilidade,
e da necessidade de se adotarem medidas mais humanitárias com relação
ao usuário. Do ponto de vista pragmático, justifica-se por razões econômicas,
como a desnecessidade de encarceramento do usuário, o alto custo de
manutenção da prisão, e a importância de se concentrarem os esforços e
aumentar a repressão ao grande tráfico. (RODRIGUES, 2006, p. 33).

Enfim o olhar sobre o usuário teve como marco mostrar que a conduta de portar
drogas ou usar não traz prejuízo a saúde pública, mas tão somente a saúde do utente
e como em nosso ordenamento jurídico a autolesão não é objeto de punição, portanto
a criminalização do usuário torna-se inconstitucional, sem falar no preceito majoritário
de que o direito penal deve interver minimamente na vida social.

3. O Proibicionismo Norte-americano
Dessa forma, é coerente pontuar que o Estados Unidos em certo momento
histórico fez, além das que ainda hoje são consideradas drogas ilícitas, uma
experiência proibitiva chamada de “Lei Seca”, fato esse que ocorreu no período entre
os anos 1920 e 1933, em que efetuou uma alteração na lei do país através de uma
emenda constitucional criminalizando o álcool. Portanto, “O trânsito que levou o
mercado de drogas da legalidade à ilegalidade foi relativamente rápido e violento,
como exemplifica o movimento que vai das Guerras do Ópio, no século XIX, à Lei
Seca, de 1919” (LABATE et al, 2008, p.91).
Contudo se percebeu que tal medida legislativa foi um desastre, pois apesar da
intervenção do direito penal na vontade individual dos cidadãos norte-americanos,
através de medidas punitivas, ainda assim ficou evidenciado que não houve a
interrupção nem das vendas e nem consequentemente do consumo das bebidas
alcoólicas, além de fomentar a corrupção alcançando até mesmo os agentes estatais
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que deram um jeito de lucrar com tal medida proibicionista. Portanto é possível afirmar
que:
O resultado imediato dessa proibição é bastante conhecido e comentado: o
efeito automático da Lei Seca não foi a supressão do álcool e dos hábitos a
ele associados, mas a criação de um mercado ilícito de negociantes dispostos
a oferecê-lo a uma clientela que permanecia inalterada. Inalterada em gostos,
mas agora diferente, pois ilegal, criminosa. Produziu-se um campo de
ilegalidades novo e pujante; inventou-se um crime e novos criminosos; e o
álcool, talvez para angústia dos proibicionistas mais dedicados, não deixou
de ser consumido. (LABATE e et al, 2008, p.96).

Também pode-se afirmar que nesse período o Estado perdeu o controle da


qualidade das bebidas afetando de forma decisiva a saúde, bem como a segurança
da população com o surgimento de facções de traficantes do álcool.
Sendo assim, ficou visível a ineficácia da lei seca, pois quem ganhou com a
medida proibicionista foi, tão somente, os chamados de traficantes, ou seja, a
clandestinidade, já que se estima sobre esse período como a temporada que mais se
consumiu bebida alcoólica naquele país, ainda que nesse tempo a qualidade das
bebidas alcoólicas tenham caído, o que acarretou novas reflexões sobre a capacidade
estatal, que por mais desenvolvido que um pais seja, ainda assim não será capaz de
criar um aparelho que consiga, de forma eficaz, garantir a cobertura de toda a
sociedade. Portanto, as medidas proibicionista terminam por fazer efeito oposto ao
que se propõem. Enfim é possível dizer que houve o reconhecimento por parte das
autoridades do descontrole estatal pelo aumento do consumo do álcool tendo em vista
a repressão, assim sendo foi revogada a emenda constitucional. Portanto pode-se
afirmar que esse país:
Os Estados Unidos tiveram a experiência da proibição do álcool, que não foi
uma lei, foi uma reforma da Constituição que tiveram que fazer. A proibição
do álcool trouxe para eles grandes problemas. Um dos maiores foi a criação
de uma mistura de criminalidade violenta com criminalidade inteligente, que
eram as máfias criadas na luta daqueles anos doidos. (ZAFFARONI, 2013,
p.116).

Portanto, acredita-se que a insistência desse país, bem como as outras nações
sobre o proibicionismo das demais drogas trata-se mais de um discurso de falso
moralismo, de cunho religioso e racistas do que uma preocupação real com a saúde
social usando de forma irracional a demonização do diferente. “Deste modo,
identificamos que as raízes da criminalização da maconha no Brasil estão
indiscutivelmente ligadas à diáspora africana.” (BARRO e PERES, 2011, p. 06).
Sendo assim é preciso pensar o mundo antes da proibição das drogas para que haja
um melhor entendimento desse contexto, pois:
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A utilização de plantas psicoativas e alucinógenas pelos nativos em cultos
indígenas e pagãos era comum nos primórdios da colonização, tanto nas
Américas como na Europa. Afirmam antropólogos que “a questão do uso de
drogas pode ser considerado universal, uma vez que são pouquíssimas as
culturas que não se utilizam de alucinógenos”, aos quais se atribui um papel
importante em experiências religiosas. Na região brasileira do Acre, plantas
psicoativas compõem rituais indígenas, como é o caso do uso do cipó
ayahuasca na confecção de um chá alucinógeno que até hoje ainda é
utilizado pela comunidade do Santo Daime (RODRIGUES, 2006, p. 26 e 27).

Portanto, já é pacificado que a guerra as drogas trata-se de uma batalha


invencível, pois com o passar dos tempos a única coisa que se conseguiu foi o
fortalecimento e crescimento de um poder paralelo ao Estado, poder esse que não
tem a mínima preocupação com a saúde social, da mesma forma como aconteceu
nos Estados Unidos com o advento da lei seca que incidia sobre a proibição de
bebidas alcoólicas, em que foi visto até mesmo o surgimento de bebidas alcoólicas
com maior teor de lesividade a saúde humana, assim como atualmente se verifica na
sociedade atual com a sustentação da medida proibicionista das drogas.
Ainda assim é possível afirmar, diante do contexto hodierno, que há uma
insistência obstinada do Estado no endurecimento cada vez mais da legislação
proibicionista em relação as drogas, através de um discurso punitivo, com vista a
extinguir a proliferação dos tóxicos ilícitos, como única forma possível para combater
o crescimento desgovernado do mal-estar social provocado pelo tráfico de drogas,
contudo se percebe que o Estado nem mesmo consegue diferenciar o uso recreativo
dos usuários ditos problemáticos, pois o que se sabe é que:
(...) a tolerância ou intolerância em relação ao consumo das diferentes drogas
evoluiu, ao longo da história, mais a partir de convenções sociais arbitrárias
– resultantes de fatores econômicos, históricos e culturais – do que de seus
reais danos para a saúde. Na maioria dos países, álcool e tabaco, por
exemplo, são consideradas drogas legais, apesar de seus efeitos
potencialmente negativos para a saúde e do ônus que seu consumo impõe
sobre o sistema de saúde pública. No caso do álcool, soma-se ainda o
potencial de causar acidentes de trânsito e contribuir para a violência
doméstica e urbana. (SILVA, 2013, p. 52)

No entanto é compreensível o comportamento de grande parte da sociedade


atual em relação a inaceitabilidade da liberação das drogas, principalmente, para os
nascidos no período de grande proibicionismo desses entorpecentes, que brotou na
convenção de Xangai no século XX. Contudo Silva, (2013, p.3 43) afirma que:
O relatório do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime de 2008
reconhece que a aplicação das convenções internacionais sobre drogas
ilícitas produziu várias consequências negativas adversas e inesperadas,
entre as quais a criação de um mercado paralelo controlado pelo crime,
drenagem de recursos governamentais em detrimento de investimentos em
saúde pública (que foi a razão de ser precípua da política proibicionista),
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estigmatização e marginalização social dos dependentes. Os próprios
organismos especializados da ONU reconhecem que se passou do objetivo
inicial de eliminação das drogas – hoje considerada irrealista – para uma
política de contenção dos níveis de produção e comercialização e da
violência.

No entanto, diariamente é noticiado nos diversos meios de comunicações


selvagerias, apontando como os culpados pelo crescimento dessa violência urbana
os usuários das drogas ilícitas por alimentar o tráfico de drogas e consequentemente
contribuído para grande parte dos Crimes Violentos Letais Intencionais (CVLI), já que
é sabido a existência de alguma relação, desses fatos, com esse comércio
clandestino, o que justifica a fomentação da criação de medidas repressiva cada vez
mais rigorosas em relação ao tráfico de drogas, superlotando, dessa forma, os
presídios causando assim uma espécie de terrorismo social. Além disso, é essencial
evidenciar as fragilidades do sistema penitenciário para o qual são mandados os
condenados pela Lei de Drogas. Sabe-se que o Brasil, salvo poucas exceções, não
possui prédios com logísticas capazes de reintegrar os detentos a sociedade, de modo
que mandar um indivíduo para a prisão, em suma, trata-se de uma condenação
perene, já que efeitos gravosos, decorrente do encarceramento, podem perdurarem
na vida do sujeito até mesmo depois do cumprimento da pena.

4. A Inconstitucionalidade da Criminalização do Porte de Drogas para Uso


Pessoal (art. 28 da Lei 11.343/2006)
Há discussões sobre a constitucionalidade ou inconstitucionalidades da
criminalização das drogas pela intervenção do direito penal, já que é sabido o uso de
substâncias psicotrópicas desde os primórdios pela espécie humana por diversos
motivos; seja ele religiosos, medicinais ou recreativos, portanto a ciência desses fatos
histórico tem o poder de incitar a discursão sobre a legitimidade do Estado em intervir
no pessoal do indivíduo, estabelecendo um padrão de comportamento através da
moral adverso do que já era estabelecido pelas comunidades soando como um
desrespeito a diversidade e ao pluralismo cultural, afetando os direitos e garantias
estabelecidas pela constituição de 1988 que legitima o direito a intimidade.
Na Itália, surgiu nos anos noventa o Movimento Antiproibicionista que vem
desde então fazendo lobby sistemático junto a governos e à Comissão de
Entorpecentes da ONU. Surgem mobilizações em prol da modificação das
convenções internacionais, em particular em relação à exclusão da cannabis
como droga ilícita (ou seja, de sua descriminalização). O Global Cannabis
Commission Report apresenta diversas propostas nesse sentido, acopladas
a sugestões de políticas públicas de controle e informação sobre os efeitos
da droga; argumenta que os efeitos negativos da cannabis para a saúde são
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menores do que os de substâncias legais como o álcool ou o tabaco. (SILVA,
2013, p. 341).

Para tanto é perceptível a ofensa da lei de drogas em seu artigo 28 aos


princípios fundamentais da constituição federal de 1988, portanto é possível dizer que
tal artigo ofende ao princípio da dignidade humana, que está positivado no artigo 1º,
inciso III, da Constituição Federal de 1988, que assegura limitação estatal e assim
garante a liberdade de escolha do indivíduo, portanto pode-se afirmar que esse artigo
da lei de drogas ofende esse princípio pela criminalização do uso de certos produtos
tóxicos, já que tal substância pode fazer parte da cultura de uma comunidade, pois a
dignidade humana é manifestada na responsabilidade do indivíduo pela própria vida
o que deve ser respeitado pelas demais pessoas, portanto cada indivíduo tem o direito
de viver como quiser sem ter sua intimidade invadida.
Também observa-se a ofensa ao princípio da igualdade, nesse caso, o
problema fica evidente quando se foca o olhar para as drogas licitas, ou seja, drogas
não proibidas, na busca de uma resposta satisfatória sobre como é feita essa distinção
a respeito do que pode e o que não pode, já que há uma percepção social que o
tabaco é mais nocivo para a saúde do que, por exemplo, a Cannabis sativa,
popularmente conhecida como maconha, essa última taxada de como droga ilícita,
enquanto a primeira apesar de comprovação sobre sua lesividade a saúde continua
no rol de drogas licitas, pois “Segundo estimativas da OMS, porém o tabaco é
responsável por aproximadamente 5 milhões de mortes anuais em todo o mundo, o
que representa cerca de 8,8% das mortes registradas todos os anos no planeta.”
(TAFFARELLO, 2009, p. 28).
Ainda é possível também falar de uma outra droga licita, o álcool, que apesar,
de evidenciar grandes lesividades a saúde dos usuários, também causa vários
malefícios sociais, pois além de criar mais dependência do que a droga ilícita
conhecida como maconha ainda é responsável por grande partes das mortes
decorrente de acidentes de carros, o que desperta questionamentos diversos, sobre
a escolha do proibicionismo dos produtos, logo:
Estima, ainda que algo entre 20% e 30% das incidências globais de câncer
no esôfago, câncer no fígado, cirrose hepática, convulsões epiléticas,
acidentes de trânsito e homicídios estejam relacionados com altos níveis de
consumo de bebidas alcoólicas. Anualmente, cerca de 1,8 milhões de
pessoas morrem em virtude de problemas decorrentes do consumo de álcool,
número correspondente a 3,2% de total de mortes em todo o planeta.
(TAFFARELLO, 2009, p. 21).

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Portanto, essa política proibicionista das drogas, transgride também o princípio
da intimidade e a vida privada dos indivíduos que está positivado no artigo 5º inciso X
da constituição federal vigente, que preceitua ser invioláveis a intimidade, a vida
privada, a honra e a imagem das pessoas, inclusive assegurando direito a indenização
pelo dano material ou moral no caso de violação, entretanto aos indivíduos, no Brasil,
percebe-se a violação desse direito à vida privada na incriminação do indivíduo por
usar certos tipos de drogas, já que em nosso ordenamento jurídico a auto lesão não
é para ser punível.
Ainda pode-se dizer que essa política proibicionista ofende também o princípio
da liberdade, embora despenalize o uso, criminaliza o usuário, pela intervenção do
direito penal sobre o indivíduo que porta, ainda que seja para uso recreativo, já que
cabe ao direito penal o princípio da intervenção mínima, ou seja, o direito penal
somente poderá intervir no caso de extrema necessidades (ultima ratio), para proteção
de bens jurídicos afetados ou na iminência de sê-los. Entretanto é verdade que o
fenômeno do aumento da criminalidade está anexada ao tráfico de drogas, contudo
isso não é, tão somente, um privilégio do Brasil, mas tal fenômeno pode ser visto em
todos os países que adotam uma política proibicionista de drogas, portanto, o
resultado amenos desses conflitos é o encarceramento de uma população
desfavorecidas. “E, uma vez atrás das grades, são ainda submetidos às condições de
detenção mais duras e sofrem as violências mais graves. Penalizar a miséria significa
aqui "tornar invisível" o problema negro e assentar a dominação racial dando-lhe um
aval de Estado.” (WACQUANT, 1999, p. 06).
Além disso a violência decorrente do tráfico de drogas pode fazer parte da
realidade social de um Estado de várias outras formas como é visto em diversos meios
de comunicações, arrazoando sobre conflitos existentes entre os traficantes, por
pontos de drogas, geralmente indivíduos periféricos, indivíduos que fazem assaltos
para pagar dívidas de drogas, causando muitas vezes a morte de suas vítimas, além
das situações conflitantes com a polícia, que não poucas as vezes tem resultados
mortes, seja dos envolvidos com o tráfico de drogas, seja dos agentes de segurança
ou até mesmo de pessoas alheias a esses conflitos o que se dá o nome de “bala
perdida”, assim se percebe a nocividade dessa política proibicionista de drogas cujas
implicações são inúmeras mortes.

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5. Proibicionismo: Uma política que Combate a Violência com a Violência
Assim ficou evidenciado que a política proibicionista das drogas tem cunho
religioso, econômicos e sociais, atribuindo qualidades morais aos produtos para
caracterizar o sistema proibitivo ou permissivo. É verdade que o proibicionismo das
drogas teve como marco inicial a guerra do ópio em virtude dos conflitos decorrente
do comércio mundial entre alguns países como a China e a coroa Britânica tendo o
debate acontecido na conferência de Xangai com o Estados Unidos se posicionando
contra a venda dessa substância, com a representação de 13 países, assim ficando
restrito o comércio desses produtos, diante da pressão internacional, a venda passou
a fazer parte do comércio, tão somente, para fins medicinais. Portanto Labate et al
(2008, p. 93) afirma dizendo:
Ainda que o encontro de 1909 não tenha sido impositivo, ficando apenas no
campo das recomendações genéricas à necessidade de reduzir o mercado
de opiáceos, o texto final trazia a marca da experiência estadunidense nas
Filipinas e que seria uma das características centrais do início do
proibicionismo: a defesa do uso legal sob estrito controle para uso médico, e
a ilegalidade para qualquer outra forma de uso (recreativos, hedonistas, etc.).

É verdade que algumas drogas que hoje são consideradas licitas em algum
tempo também já foram consideradas ilícitas como por exemplo o álcool no Estados
unidos com a implementação da política Lei Seca, que foi um fracasso, conforme
vimos anteriormente. E tratando das drogas hoje consideradas ilícitas, há diversas
discursões sobre o assunto preceituando que é preciso legalizar, no entanto,
diferentes do que muitas pessoas acham legalizar não é liberar, tampouco estimular,
pois pode-se dizer que liberado já está, já que é possível ter acesso a esses produtos
tóxicos facilmente em múltiplos locais, até mesmo é possível adquirir por um sistema
delivery via telefone qualquer dessas drogas que são consideradas proibidas pela
nossa legislação, pois é sabido que o acesso não está restrito as comunidades pobres,
sendo assim o que precisa é tirar da mão do traficante esse comércio ilegal que é
liderado por pessoas sem a mínima preocupação social, portanto ver-se a
necessidade de colocar sob a gerência estatal, já que é inegável o avanço comercial
nesse sentido, pois há mais de 10 anos a Organização das Nações Unidas (ONU) já
afirmava que a estimativa da comercialização das drogas ilícita permeava a média de
400 bilhões de dólares anuais.
Assim, fazendo uma pequena análise vemos que estamos falando de produtos
sem as devidas precauções sanitárias, como por exemplo, no caso da cocaína em

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que muitas vezes são misturadas com outras substâncias ainda mais nocivas à saúde
como: talco, cimento, pó de mármore entre outros, para os usuários inalarem, dessa
forma é possível afirmar que a política proibitiva trata-se de um desserviço estatal.
Entretanto o que é visto se refere ao Estado usando o sistema penal para tentar
controlar a disseminação das substâncias proibidas que são qualificadas como ilícita,
usando o discurso de proteção social em que afirma o “cuidado” com a saúde pública
através da imposição punitiva. Assim, além de ineficaz, a política de drogas adotada
pelo Estado também é nociva a saúde que diz proteger. Já que as drogas
desenvolvidas ilegalmente não passam por controles de regras sanitárias e, portanto,
ocasionam graves problemas a seus usuários.
Devido a política proibicionista pela criminalização de alguns tipos de drogas, o
Estado através das forças policiais impetra violência pela violação dos direitos
humanos que pode ser visto no encarceramento das massas humanas em presídios
e cadeias públicas sem a mínimas condições de habitação, muito menos apresenta
alguma eficiência na missão de reintegrar socialmente os detentos, incitando desse
modo rebeliões onde quase sempre terminam com mortes, assim pode-se afirmar que
é vista uma “necessidade” do Estado em querer controlar, de certa forma, os
indivíduos indesejáveis pela percepção falsa de risco social, provocando uma
verdadeira guerra civil com o pano de fundo voltado em promover segurança pública,
portanto nesse sentido as forças de segurança são arremessadas pelo sistema para
tentar interver no controle de tráfico de drogas, dessa forma provocando inúmeras
mortes, tanto dos considerados pelo sistema como os fora da lei, quantos dos agentes
de segurança, portanto percebe-se o Estado “combatendo” a violência com violência.
Entretanto por essa causa esses indivíduos que passaram a ser considerados
fora da lei, para se firmar socialmente busca na sua maioria unir o tráfico de drogas
com o tráfico de armas tornando assim um sistema muito mais letal, que leva os
pesquisadores do assunto a afirmar que essa união torna-se o maior mercado
criminoso do mundo, desse modo expondo toda a sociedade a um risco potencializado
desnecessariamente.
Sendo assim, quando em posse de conhecimentos de tamanhos malefícios
sociais causada por essa política proibicionista, torna-se ainda mais difícil a
compreensão de tal permanência, já que “O direito à vida é a premissa dos direitos
proclamados pelo constituinte; não faria sentido declarar qualquer outro se, antes, não

12
fosse assegurado o próprio direito de estar vivo para usufruí-lo.” (MENDES, 2009,
p.393).
Nesse sentido, percebe-se que a extensão do poder punitivo do estado na
busca do controle social não tem surtido o efeito desejado por mais que se busque
capacitar o braço repressor estatal, seja pelo aparelhamento das policias, ou seja,
pelo endurecimento das leis, o que causa ainda mais exclusão social.
Ainda sobre a política proibitiva das drogas é possível afirmar a necessidade,
urgentemente de se fazer alguma coisa diferente da intervenção armada por parte do
Estado para que assim possa ter reflexos concretos na sociedade, diversa do
crescente aumento da violência pela intervenção estatal, portanto como se ver hoje,
até mesmo as crianças são copitadas pelos traficantes e inseridas nesse violento
sistema sem escrúpulos sociais. Dessa forma no Brasil a violência pelo comercio de
drogas ilícitas fica cada vez mais descontrolada, portanto:
Em breve, provavelmente, a Suprema Corte julgará a inconstitucionalidade
da criminalização do consumo e do porte para uso próprio, pois, por todas as
razões apresentadas, trata-se de grave violação às garantias republicanas
dos Direitos Humanos de Primeira Geração. (BARRO e PERES, 2011, p.19).

Ainda é possível afirmar que proporcionalmente a Europa Ocidental consome


mais drogas do que os países aqui da América latina, contudo apresenta menor índice
de violência correlacionais.
A despeito disso acredita-se ainda que a escolha da estigmatização do produto
para torna-lo ilícito tem base empírica sem fundamentação médica sobre os malefícios
a saúde pública, além de ficar percebido que a lei que trata sobre tóxicos é ancorada
na Agencia Nacional de Saúde (ANVISA) que descrimina as substâncias
consideradas drogas ilícitas. Logo fica perceptível que se trata de uma norma em
branco, já que precisa de uma regulamentação, ou seja, a definição do objeto em
apreço, para tanto a portaria SVS/MS 344/1998, elenca uma lista como todas as
substancias capazes de causar dependência, sendo esta atualizada periodicamente
e por ser uma norma penal em branca tem causado algumas controversas a respeito
da sua legalidade. Contudo, vale ressaltar que o país que comandou o proibicionismo
das drogas no século XX, Estados Unidos, já tem flexibilizado nesse sentido, como
por exemplo, a maioria dos seus estados, já legalizaram a maconha, tanto para o uso
medicinal, como para o uso recreativo, além da adesão de outros países a essa nova
política descriminalizadora como Uruguai e Canadá que também já possuem um olhar
mais respeitoso sobre a cultura do consumo dessa erva, dessa forma é possível
13
pontuar que os estados que adotaram essa nova perspectiva política como por
exemplo, o estado da Califórnia, tem-se observado uma redução drástica nos ilícitos
envolvendo o tráfico de drogas.

6. Breve Histórico sobre Norma Penal em Branco versus Princípio da Legalidade


Sendo assim vale dizer que temos dois tipos de normas penais em branco;
norma penal em branco homogênea e norma penal em branco heterogênea, portanto,
verifica-se possíveis afrontas dessas normas ao princípio constitucionais. Já que o
princípio da legalidade é taxativo em expor que não há crime, incluindo, dessa forma,
as contravenções penais, sem lei anterior que a defina e nem pena sem prévia
cominação legal, assim percebe-se que esse conceito engloba tanto o princípio da
legalidade como também o princípio da reserva legal, além de fazer referência ao
princípio da anterioridade. Portanto pode-se afirmar: “A consequência desse princípio
é que a sociedade tem uma segurança jurídica maior, de uma aplicação isonômica do
direito, uma vez que não haverá argumentos ilógicos com base, por exemplo, no
direito natural, sem que esteja positivado.” (MELO, 2017, p. 17).
Dessa forma, quando se refere a normas penais em branco, faz-se referência
as normas incompletas e sendo assim, precisa de complementação para que possa
ser entendida e aplicada. A respeito das normas em penais em branco Melo, (2017,
p. 29) diz que “(...) conclui-se que a norma penal em branco heterogênea nada mais
é do que uma norma em que não reúne todos os seus elementos, ou seja, tem os
elementos fundamentais do tipo, porém precisa de um complemento para que surtam
seus efeitos.”
A constituição Federal de 1988, dita sobre o princípio da legalidade, como
pode ser visto no artigo 5 inciso ll visando, dessa forma, proporcionar ao cidadão
segurança jurídica, pois assim, ninguém fica obrigado a fazer alguma coisa ou deixar
de fazer algo, senão em virtude de lei, garantindo a todos uma vida digna, dessa
forma, protegendo as pessoas individualmente contra possíveis ações abusivas do
Estado, já que esse princípio transmite garantia ao cidadão através do respeito à lei.
Assim como foi visto as normas penais em branco são entendidas como
aquelas que precisam de complemento, podendo ser divididas em normas penais em
branco homogêneas e normas penais em branco heterogêneas. Desse modo, pode-
se dizer que as normas penais em branco homogêneas são, portanto, aquelas que os

14
complementos sucede da mesma fonte legislativa e de mesma hierarquia. Já as
normas penais em branco heterogêneas, por outro lado, podem ser entendidas como
aquelas que os complementos advém de fontes diferentes, ante a heterogeneidade
legislativa.
No entanto é sabido a existência de duas correntes que versam sobre essas
normas e que uma das duas correntes existentes taxa, nomeadamente, a norma
penal em branco heterogênea, que é aquela que tem complemento de uma fonte
diferente da lei, apregoando, desse modo, que esse tipo de completude opera como
uma ofensa ao princípio da legalidade, haja vista, que esse tipo de conteúdo da
norma penal poderá ser alterado sem a apreciação da sociedade, através dos seus
representantes. Já a lei, propriamente dita, para que possa haver uma alteração é
preciso que as duas Casas do Congresso aprecie e aprove e assim, seja manifesta
a vontade do povo, além de ser submetido, ainda, ao crivo do poder executivo que
pratica o sistema de freios e contrapesos.
Entretanto, a corrente a majoritária, atina que as normas penais em branco,
seja ela homogênea ou heterogênea, não causa afronta ao princípio da legalidade,
afirmando que não há o que se falar sobre ofensas as normas constitucionais,
assegurando que não se pode fazer referência de violação de nenhum princípios,
muito menos ao princípio da taxatividade ou anteriorioridade, haja visto que
enquanto a norma não é complementada, não produz efeito algum, dessa forma
essa corrente majoritária noticia que não há o que se falar de inconstitucionalidade
diante das normas penais em branco.
Assim somente é possível falar das normas penais em branco homogêneas
quando o complemento da lei é oriundo da mesma fonte que legislou a norma em
branco, como no caso concreto, o fato sobre contrair matrimonio, pois ainda que se
saiba da existência de impedimento, como fator que pode causar nulidade segundo
consta no código penal, no artigo 237, contudo as causas desses impedimentos são
elencadas no artigo 1521 do código civil. Dessa forma, percebe-se que o
complemento de um código está em outro código, ou seja, mesma fonte. Já as
normas penais em branco heterogêneas diferencia da homogênea pelo fato do
complemento não ser da mesma fonte, como é possível perceber ao estudar a lei de
drogas, que tem sua proibição na lei penal, mas a discriminação do que seja drogas
vem do complemento, através da norma elaborada pelo ministério da saúde com sua

15
Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). No entanto, para firmar a
segurança jurídica vale lembrar que “A norma do tipo penal incriminadora, não
retroagirá, salvo se for para beneficiar o réu. Essa é a ideia contida no art. 2º, e seu
parágrafo único do Código Penal.” (MELO, 2017, p. 50).
Sendo assim, pelos argumentos trazidos no decorrer do presente texto, resta
claro que as normas penais em branco, embora exista uma corrente contrária, no que
se refere a legalidade da norma em branco heterogênea, desconsiderando, dessa
forma, sua legitimidade, afirmando, que fere bruscamente princípios constitucionais,
contudo, fica perceptível pela corrente majoritária que não há inconstitucionalidade
das normas penais em branco, seja ela classificada como homogênea ou
heterogêneas, já que é preservada o princípio da anterioridade, sendo assim ninguém
é punido por alguma coisa se não estiver positivado.

7. Repensando sobre o Encarceramento por Drogas


Destarte, há uma percepção que a política proibicionista das drogas tem
provocado um crescente aumento da violência nos estados, assim, por mais que se
aumente o efetivo de agentes de segurança pública ou se invista na criação de
estabelecimento prisionais, ainda assim, percebe-se que, tão somente, essa atitude
não é suficiente para resolver a problemática da selvageria urbana, mas no máximo
como resultado se consegue, tão somente, superlotar as unidades prisionais. Dessa
forma, cabe pontuar esses impactos sociais como fator negativo na questão de
segurança pública, já que transmite uma visão destorcida sobre as forças estatais,
fazendo parecer que as autoridades estão relegando a segundo plano a tutela de
bens jurídicos inalienáveis, como a vida, tendo como ponto observável a essa
perspectiva a quantidade de delegacias de repressão ao tráfico de drogas em
comparação ao número de Delegacias de Homicídios e Proteção a Pessoas (DHPP),
deixando transparecer, dessa forma que o foco principal seja traficantes e nos
usuários de drogas, qualificando como os grandes inimigo da sociedade, acirrando
ainda mais a violência, gerando assim mortes dos dois lados, ou seja, dos agentes
estatais e dos marginalizados. Portanto:
A criminalização implica ações policiais de difícil êxito contra um negócio
altamente lucrativo. O primeiro fator que dificulta a repressão a essas
atividades é a lei de mercado da oferta e da demanda. Sempre que um
distribuidor é retirado do mercado as oportunidades dos que permanecem e
daqueles que pretendem entrar no negócio são 76 elevadas. Desse modo, a

16
retirada de um traficante do mercado o torna até mais atrativo. Em grande
medida, a repressão não desestimula o tráfico. O segundo fator consiste na
impossibilidade de controlar as fontes de fornecimento. (MORAIS, 2005, p.
75,76).

No entanto, é correto afirmar que houve uma mudança na lei de drogas, talvez,
com o intuito de provocar um desencarceramento através de uma nova regra sobre o
proibicionismo das drogas com a lei 11.343/06 contudo:
Percebeu-se, no entanto, a partir de sua entrada em vigor, aumento
considerável no número de pessoas condenadas por tráfico de drogas. As
alterações legislativas trazidas pela nova lei podem, assim, estar contribuindo
para o aumento da população carcerária nos presídios o que, via de regra,
acaba por impedir uma gestão adequada das unidades prisionais brasileiras.
(RICAS, 2018, p.04).

Decerto o sistema prisional não suporta as constantes demandas ocasionadas


pelas prisões, assim levando em consideração as políticas públicas existentes, o
encarceramento tem demonstrado sua deficiência em reduzir a violência, bem como
sua ineficácia na ressocialização do apenado, desse modo, causando uma sensação,
na população, de total insegurança social.
Contudo, ainda que diferencie para o apenado três tipos de regime para
cumprimento da pena, com as seguintes classificações como: o regime fechado em
que o apenado cumpre em estabelecimento prisional, sendo que na sua maioria essas
unidades, mantém os presos em condições insalubres, devido a superlotação, o que
dificulta a ressocialização do indivíduo, o regime semiaberto, embora pela lei tende a
ser mais humanizado, pois o cumprimento da pena deve ocorrer em colônias agrícolas
ou estabelecimento similar, permitindo desse modo, aperfeiçoamento do condenado
através de possíveis cursos e o regime aberto, onde o detido deverá cumprir a pena
em casa de albergado ou estabelecimento para tal fim. Porém é certo que
independente do regime de cumprimento de pena o indivíduo sai dali estigmatizado
como pouquíssimas oportunidades de inserir-se novamente no mercado de trabalho.
Conceber historicamente o sistema penal não significa, portanto, considerar
que o atual paradigma teórico e prático acerca da pretensão punitiva do
Estado represente o topo hierárquico e a perfeição de um sistema dogmático,
criminológico e penalista que se pretende impor, tampouco que seja a forma
mais acabada e a que trará melhores resultados à atual realidade social
observada. (SALGADO; ASSUNÇÃO; CARDOSO, 2018, p. 340).

Sendo assim é possível afirmar que, com o passar dos tempos foi-se dando
ênfase valorativa as estratégias proibicionista das drogas, com a construção de
paradigmas sobre os malefícios sociais que a legalidade de tais produtos poderiam
acarretar para as comunidades, dessa forma, essa teoria que hoje já encontra
17
dificuldades em se manter, afirma que os entorpecentes poderiam provocar um
desequilíbrio social, cuja solução, somente é possível pela radicalidade da
incriminação das drogas para que, assim haja um possível controle estatal.

8. O Caminho Percorrido pelo Proibicionismo no Brasil


É sabido que a questão das drogas não é um evento novo, pois a historiografia
afirma que no Brasil ela vem desde o período da sua colonização. Diante disso
percebe-se que houve uma graduação da política proibicionista intervendo na vida
privada do indivíduo, embora se saiba que “Não há, efetivamente, qualquer base
cientifica a permitir que se satanize ou que se santifique este ou aquele psicoativo, ou
mesmo que determine a proibição absoluta de seu uso, (...).” (TAFFARELLO, 2009,
p. 30). Contudo é sabido que tivemos o código criminal, a lei das Ordenações
Filipinas, que vigorou de 1603 até 1830, ficando conhecida pelo rastro de crueldade
em seu sistema punitivo fazendo, além de fazer referência a política proibitiva das
drogas, no entanto foi em 1830 que foi promulgado o primeiro código penal do Brasil,
embora não expressasse, de forma clara, a questão do proibicionismo das drogas,
mas em seu decreto 828 com data de 29 do mês de setembro isso no ano de 1851,
já pontuava que devia se executar de forma regular a venda dos medicamentos, para
tanto no artigo 51 regulava sobre as substancias chamadas de venenosas que
deveriam serem vendidas, isso se dava pela existência de uma tabela constando os
possíveis medicamentos, referindo-se afinal sobre tudo que devia ser comercializado
e já advertindo que o contraventor seria penalizado, assim tudo que fosse fabricado e
vendido deveria ser comunicado as autoridades sanitárias, para que tais substâncias
fossem devidamente catalogada, dessa forma, descrevendo possíveis punições para
quem desobedecesse.
Posteriormente tivemos o código penal no ano de 1890 que ficou datado como
11/11 do mesmo ano em que no artigo 159 positivava a criminalização da venda ou
da ministração de substancias que tinha sido convencionadas como venenosas e que
não passasse pelas formalidades dos regulamentos sanitários existentes. No entanto,
em 1914 quando tínhamos como presidente Wenceslau Braz, tivemos o decreto de
número 2.861 no dia 08 de julho de 1914, em que o pais aderiu à Conferência
Internacional do Ópio em que o viciado, agora, passaria a ser tratado como doente
não mais como um criminoso. Assim no ano de 1932 a dependência química passou

18
a ser considerada uma doença que exigia um relatório obrigatório para controle estatal
sendo instituído, portanto o decreto 20.930 determinava revisões periódicas sobre as
substancias toxicas, já que a sociedade estava em continua mudança e avanços.
Por conseguinte nesse mesmo ano a dependência química passou a fazer
parte da lista de doenças de controle obrigatório e para isso fora criado a Comissão
Nacional de Fiscalização de Entorpecentes pele decreto 780, em abril de 1936 que se
mantinha subordinada ao Ministério de Relações Exteriores tendo também como
objetivo positivado no seu artigo terceiro ação fiscalizadora, além da repressão do
tráfico e uso ilícito das drogas. Porém no ano de 1938 foi aprovado um novo decreto
de número 891 da lei sobre a fiscalização dos entorpecentes que tinha como finalidade
no seu bojo, além de punir os atos de plantar e cultivar as substâncias que eram
consideradas pelo Estado como ilícita, também obrigava o internamento de pessoas
dependentes químicas de forma compulsória. Entretanto era admitida a venda de
algumas substâncias consideradas ilícitas mediante receitas médicas em locais como
farmácia para que o Estado sustentasse o controle.
No ano de 1940 novamente tivemos o Código Penal Brasileiro legislando sobre
o tema drogas que tratou como crimes contra a saúde pública. Para tanto o artigo 281
em seu texto redacional criminalizava os produtos, inclusive discriminado penas de
reclusão para qualquer tipo de manipulação de substância entorpecente não
regulamentada pelo Estado. Contudo, como já foi mencionado, tal política
incriminatória não surtiu o efeito desejado, mas teve implicações inversa.
Portanto, cabe pontuar que apesar do fracasso de tal política incriminatória, o
Brasil buscou ainda mais combater tais atos, ingressando na política internacional de
combate as drogas, para isso no ano de 1964 apregoou a Convenção Única sobre
Entorpecentes através do decreto 54.216 no dia 27 do mês de agosto, sendo assinada
tal convenção internacional em 30 de março de 1961 na cidade de Nova York.
Ainda cabe dizer que em 10 de fevereiro de 1967, o Brasil tendo como
presidente Castelo Branco que também permanecia inclinado na política
incriminadora das drogas, assim através do decreto 159 no seu artigo primeiro
positivava que era proibido qualquer tipo de manipulação de substâncias, ainda que
não fosse considerada entorpecente, mas que de alguma forma fosse capaz de
provocar dependência, seja ela física ou psíquica. Mas, foi tão somente, no ano de

19
1976 é que a lei 6368/76 revoga o artigo 281 do código penal passando assim tal
assunto a ser tratada por uma legislação especial.
Todavia no ano de 1988 com a promulgação da nossa Constituição Federal
vigente as drogas passaram a serem consideradas como algo extremamente nocivo
a sociedade. Sendo assim, a nova constituição brasileira no seu artigo 5ª no inciso
XLlll que se refere aos direitos e garantias fundamentais recepcionou o discurso de
guerra as drogas, já que em seu texto trouxe o crime de tráfico ilícito de entorpecentes
e drogas afins, equiparando tal prática a crimes hediondos, ainda que esses atos não
estejam positivado na lei 8.072/90 de crimes hediondos, além disso tornou
inafiançável e insuscetível de graça e anistia.
No entanto foi a nova lei de drogas 11.343/06 que trouxe em seu texto no
parágrafo único do artigo primeiro a definição do que é considerado drogas, definindo-
a como substância que tem o poder de causar dependências e que são especificados
nas listas periodicamente atualizadas pelo Poder Executivo da União, além dessa
definição temos também o conceito efetuado pela Organização Mundial de Saúde
(OMS) em 1981, que define como substâncias que não são produzidas por o
constituição viva, e que tem por sua característica capacidade de produzir alterações
no funcionamento do organismo humano, além de descrever drogas psicotrópicas
como substâncias capazes de alterar comportamentos humanos por agir no sistema
nervoso central com possiblidade de causar dependência química.

9. Análise dos resultados


Sendo assim temos como resultados desta pesquisa sobre o proibicionismo
das drogas, que trata-se de um assunto amplamente discutido, levando em
consideração que nos últimos anos esse assunto tem ocupado lugar de destaque na
sociedade pós modernismo, já que é possível ver discursões a respeito desse tema
nas redes sociais, tanto na falada, quanto na escrita, enfatizando a propagação da
violência, difundindo a culpabilidade ao tráfico de drogas, além do empobrecimento
social. Dessa forma, foi percebido que a política proibicionista as drogas trata-se de
fazer com que o código penal se ocupe com a vida privada dos indivíduos, impondo
limitações ao uso de substâncias com o aval da Organização Mundial de Saúde (OMS)
que mesmo sem nenhum resultado cientifico justificável para tal atitude, criminalizou

20
produtos estigmatizados, afirmando ser proibidos por serem capazes de causar dano
a saúde pública.
Apesar de termos como resultados dessa pesquisa o fato de que as drogas são
milenar e que estes produtos já foram utilizado no decorrer do tempo de forma
recreativa por vários povos, por fazer parte de várias culturas e assim desde os
primórdios foram usados sem a necessidade de nenhuma política proibicionista. Logo:
A necessidade da repressão às drogas nasce com as contradições do
processo de abolição da escravatura no Brasil, em 1888. Com a perda da
ferramenta da escravidão há de se criar outras para que se possa controlar a
cultura negra que agora luta para fazer parte do tecido social existente.
(LUNARDON, 2015, p. 04).

No entanto, foi a parti do século XX que pôde ser visto o início da adoção de
uma politica proibicionista, a princípio, por uma questão política comercial que
começou entre a China e a Índia e que teve seu marco na convenção de Xangai.
Somente a parti de então foi possível falar em proibições de entorpecentes nos países
ocidentais, principiando a política proibicionista que já se revelou extremamente
prejudicial a humanidade, que de forma gradual começando pelo ópio até alcançar
vários produtos tóxicos, assim para tais proibição foi se levado em consideração
algumas questões como, por exemplo, cunho racista, principalmente, no caso da
maconha produto que era usado por negros escravos trazido pelos portugueses
agredindo assim a individualidade das pessoas. Portanto para Lunardon, (2015), a
política incriminadora das drogas foi instituída como forma de dominação dos ex-
escravos com a criação de uma delegacia no Rio de Janeiro, em 1934, que tinha como
objetivo além de tratar dos crimes das drogas ilícitas, incluía também como missão
reprimir as rodas de samba, a dança da capoeira e os ritos de umbanda.
Com efeito, o aumento rápido e contínuo da distância entre brancos e negros
não resulta de uma súbita divergência em sua propensão a cometer crimes e
delitos. Ele mostra acima de tudo o caráter fundamentalmente discriminatório
das práticas policiais e judiciais implementadas no âmbito da política "lei e
ordem" das duas últimas décadas. A prova: os negros representam 13% dos
consumidores de droga (o que corresponde a seu peso demográfico) e, no
entanto, um terço das pessoas detidas e três quartos das pessoas
encarceradas por infração à legislação sobre drogas. Ora a "guerra à droga"
lançada estrepitosamente por Ronald Reagan, e ampliada desde então por
seus sucessores, é, com o abandono do ideal da reabilitação e a
multiplicação dos dispositivos ultra-repressivos (generalização do regime das
penas fixas e irredutíveis, elevação do limite de execução das sentenças
pronunciadas, perpetuidade automática no terceiro crime, punições mais
rigorosas para os atentados à ordem pública), uma das causas mais
importantes da explosão da população carcerária. (WACQUAN, 1999, p.62)

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Além do mais, há relatos de que a Europa em suas expedições descobriu vários
tipos de plantas que interferiam no sistema central humano, como: o haxixe, ópio e o
tabaco, passando a comercializar tais especiaria internacionalmente por altos preços,
servindo desse modo como ancora impulsionadora das suas expedições, ainda há de
se dizer que as comunidades indígenas usava esses e outras plantas alucinógenas
como itens sagrados. Para tanto, “Estima-se que as folhas de coca sejam utilizadas
há mais de 4.500 anos por índios da América.” (MORAIS, 2005 p.70)
No entanto, é sabido que foram os portugueses que colonizaram o Brasil e
assim recaiu sobre a responsabilidade dos jesuítas, que eram padres católicos, a
missão de catequizar os índios que aqui habitavam, portanto estes religiosos
passaram a impor sua crença, buscando abolir entre outras coisas as plantas que
eram consideradas sagradas para a cultura local e abominação para os religiosos. Por
conseguinte diante dessas informações é possível começar a entender o nascimento
da política incriminadora das drogas no Brasil, tendo como encabeçador da política
proibicionista o protestantismo norte americano.
Entretanto é válido pontuar que até a idade média não havia lei proibitiva sobre
a questão da drogas, pois o que existia em matéria restritiva era preceitos morais
instituídos pela igreja cristã. Portanto, no século XVl o consumo de entorpecentes na
Europa era comum pelas comunidades, além de exercer uma grande influência na
economia daquele continente, portanto “Não há, efetivamente, qualquer base
cientifica a permitir que se satanize ou que se santifique este ou aquele psicoativo, ou
mesmo que determine a proibição absoluta de seu uso, (...).” (TAFFARELLO, 2009,
p. 30).
Dessa forma o que hoje é chamado de drogas ilícitas já foi motivo de orgulho
na economia internacional. Contudo ficou notório que foi o ópio a droga mais
comercializada no mundo antigo, principalmente, pelos países orientais como a Índia
e a China. Ainda há também indicativos que na pré história a agricultura da cannabis
sativa popularmente conhecida como maconha era usada até mesmo como tempero,
tendo também fortes indícios de que a tradição de usar a maconha em forma de
cigarro deu-se pelos primeiros escravos que chegaram aqui no Brasil e daí
pulverizando por várias parte do mundo.

10. Considerações Finais

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Enfim, tendo em vista as reflexões feitas nesse presente trabalho, foi
ressaltados possíveis alternativas para dirimir conflitos sociais provocados pela
política proibicionista das drogas, entretanto não há a pretensão de esgotar o tema,
dessa forma tratando apenas de uma reflexão sobre a política proibicionista das
drogas e seus desdobramentos sociais, portanto nesse artigo busco contribuir para
melhor compreensão da marginalização dos indivíduos motivados por um comércio
de substâncias toxicas que foram taxadas de ilegais, dando assim início a uma
verdadeira guerra civil.
Assim, partindo de uma ótica humanista fica evidente que a criminalização das
drogas não é solução para nenhuma sociedade civilizada, já que é possível perceber
sua ineficácia em várias sociedades que implementaram tal princípio proibitivo, sendo
assim este artigo vislumbra alternativas do combate as drogas fora do direito penal, já
que dentro deste, somente fizera surgir novos tipos de crimes como; torturas, mortes
e até mesmo corrupção dos próprios agentes públicos.
Portanto, é possível afirmar que a política existente de combate as drogas
ofende o princípio da igualdade, já que existe também as drogas que são chamadas
de licitas ou seja drogas permitidas, além de ofender o princípio da racionalidade já
que é perceptível, ao longo dos anos, que tal política causou mais malefícios do que
benefícios se é que se pode afirmar sobre algum tipo de benefício e, portanto além
disso passou a produzir cadáveres até mesmo dos agentes de segurança públicas
que foram incumbidos da missão de erradicação das drogas pela legislação vigente.
Assim é possível afirmar que com essa política de combate as drogas toda a
sociedade está perdendo, portanto somente uma pequena parcela está ganhando,
que são os grandes traficantes internacionais de drogas, já que as forças de
segurança não consegue alcança-los, por tamanha complexidade que esse comércio
ilegal ganhou, além disso existe a possibilidade de que esses grandes traficantes
estejam sob o manto empresarial, assim, tão somente os pequenos “comerciantes”
das drogas, os varejistas, são presos causando um superencaceramento da classe
pobre e um enorme rastro de mortes, seja pelos concorrentes desse comércio ilegal,
seja pela intervenção estatal armada.
Além disso, fere também o princípio da intimidade a vida privada, fato que fica
evidenciado quando o Estado através do seu braço armado, que são as forças de
segurança, pega um indivíduo usando algum tipo de entorpecente considerado ilícito

23
e conduz até a delegacia para ali ser feito o Termo Circunstanciado de Ocorrência
(TCO), já que não há lesão a terceiros, portanto em respeito a princípio da lesividade
tal individuo jamais poderia ser interpelado por uma guarnição da força estatal e de
forma constrangedora ser conduzido a uma delegacia de polícia civil, já que este
indivíduo pertence a uma classe de risco social, sendo assim precisaria de intervenção
sanitária e não de intervenção da secretaria de segurança pública.
Vale ressaltar que os gastos com a política simbólica de repressão a droga leva
uma boa fatia do orçamento do país sem apresentar nenhum resultado positivo
concreto, assim se percebe o volume de dinheiro que poderia ser relocado para os
verdadeiros crimes, ou seja, para os delitos violentos com concreta violação dos bens
jurídicos tutelados, já que no Brasil menos de 10% dos Crimes Violentos Letais
Intencionais (CVLI) são solucionados.
Portanto, aqui ficou evidenciado que Estado precisa controlar o tráfico de
drogas, mas não é com uma política proibitiva incriminadora que irá consegui, além
de ser possível afirmar que o sistema incriminador tornou-se uma fábrica de injustiça
social, já que é percebido que os reais comandantes do tráfico de drogas jamais são
presos, logo é sabido que estes em hipótese alguma andará com alguma coisa ilícita,
assim, tão somente, os varejistas, que são pequenos “comerciantes” ilegais serão os
sujeitos que sempre ocuparão as cadeias públicas, além de ser percebido que sua
grande maioria são pessoas pobres, negras e moradores das periferias das cidades.
Além de ficar constatado que as drogas como maconha, cocaína e crack apesar
de serem proibidas circula livremente na sociedade, já que em qualquer esquina é
possível adquiri esses produtos, assim pode-se afirmar que está acessível a todos,
portanto na prática as drogas estão liberadas, restando ao país, tão somente, legaliza-
la para poder ter realmente o controle da situação, tanto econômica, quanto sanitária
e assim tirar essa gente da clandestinidade, voltando-se para uma real política de
desencarceramento.
Portanto ficou demonstrado nesse trabalho que o sistema proibitivo das drogas
na verdade possui um discurso moralizante para se justificar a prisão, principalmente,
dos jovens negros e pobres em situação de risco social sob o pretexto de tráfico de
drogas com alegação de lesividade a saúde pública, contudo é sabido o quanto pode
serem letais as drogas que são consideradas licitas como o álcool e o tabaco,
superando até mesmo os risco a saúde que causam as drogas ilícitas como a cocaína

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e a maconha. Portanto diante do exposto e da realidade vivida no sistema de
segurança pública é fundamental que se busque implementar uma política social mais
humanitária através de programas de inclusão sociais, assim minimizando ao máximo
as possibilidades de haver necessidade de usar o sistema punitivo estatal, ou seja,
para que o direito penal seja realmente o último recurso a ser usado pela necessidade
de se manter a ordem pública e assim os indivíduos possam viver harmonicamente.
Entretanto, no Brasil a situação da descriminalização das droga enfrenta diversas
resistências, principalmente, a barreira da religiosidade, já que a bancada religiosa no
Congresso Nacional é forte e atua no sentido contrário a legalização, tendo como
principal base preceitos morais.

11. Referências

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