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A Família na Sociedade Atual: História, Legislação e Composição

Rivando José Conceição dos Santos*

Resumo
O presente artigo aborda a questão da família na sociedade atual, para tanto perpassa
por sua história, sua legislação e composição. Por conseguinte, através de um olhar
na legislação brasileira transcorre pelo direito da família, buscando refletir sobre as
transformações sociais e culturais ocorridas decorrer dos anos no âmbito das relações
familiares, para tanto volta-se a atenção para o florescimento da pluralidade referente
aos variados tipos de famílias. Desse modo, gerando um êxodo da construção do
único modelo de família admitido socialmente, diante disto deixando de ser,
exclusivamente, constituída entre duas pessoas de sexo diferentes. Para melhor
compreensão desse fenômeno busca-se discorrer sobre a história da instituição
família no decorrer dos tempos, perpassando pelas mudanças sociais no decorrer dos
séculos até chegar no atual modelo aceitável na sociedade hodierna em que se
percebe vários tipos de família através de arranjos existentes na hodiernidade, nesse
sentido o texto faz menção do ordenamento jurídico brasileiro em que se tem
positivado a efetivação da família através de relações monogâmicas excluindo dessa
relação o possível casamento entre pessoas da mesma família. Assim a atual
legislação traz proteção tanto ao casamento como para a família monoparental, além
de fazer referência à implementação da união estável no novo Código Civil de 2002.
Portanto hodiernamente a afetividade tem se desenhado como um laço tão intenso
quanto o laço sanguíneo, assim dando origem a novos modelos de família para
atender os novos anseios sociais. Sendo assim o nosso ordenamento jurídico
vislumbrou possibilidades de novas constituições familiares.

Palavras-chave: Família. Ordenamento Jurídico. Pluralidade. Hodiernamente.

1. Introdução

Este artigo aborda questões pertinentes a família na sociedade atual e, tem por
objetivo analisar sua história, sua legislação e composição no decorrer dos séculos
de forma resumida, tendo em vista a necessidade de se reportar à história para
entender as construções de valores positivadas na hodiernidade.
Portanto, nesse trabalho se investiga o instituto família sob a visão pautada na
perspectiva histórica da evolução familiar e legislativa através de um olhar panorâmico
que se estende desde a antiguidade até a contemporaneidade. Para tanto, se debruça

Artigo apresentado ao professor Sergio Santos Correia como requisito avaliativo parcial do
componente Direito Civil – Família do Curso de Direito da Faculdade Pitágoras em Alagoinhas-Ba, 2022
E-mail: rivanjsantos@hotmail.com
sobre as mudanças ocorridas na constituição da família e suas principais
características.
Ainda sobre essa questão esse artigo busca provocar reflexão sobre os
impactos sociais advindo do processo do modernismo para o pós-modernismo, haja
vista possuírem características completamente opostas, pois enquanto a primeira
pauta suas percepções no racionalismo, na ciência e valores burgueses esse último
aflora características como: espontaneidade, ausência de valores e regras,
individualismo, imprecisão, pluralidade entre outros aspectos.
Aliado a esse aspecto, busca-se também perpassar pelas mudanças no
ordenamento jurídico no decorrer dos anos, com o olhar sobre os diferentes conceitos
apresentados para a constituição familiar, portanto atentando para o corte na cultura
predominantemente patriarcal com abertura de novas possibilidade no quesito família.
Por conseguinte, cabe pontuar que a relevância desse tema está pautada sobre
a mudança cultural do pós-modernismo que fragmentou a percepção da instituição
família, tendo em vista que era tida como uma instituição solida e permanente, contudo
nesse novo olhar se admitiu a volatilidade e pluralidade de modelos de famílias
desorganizando todos os conceitos preestabelecidos.
Portanto a elaboração desse artigo fundamenta-se em pesquisa bibliográfica,
tendo como base leitura de livros, artigos publicados, legislações do ordenamento
jurídico brasileiro, entre outros documentos científicos que abordam questões da
história, construções legislações e impactos da instituição família na sociedade.

2. Perspectiva histórica da evolução familiar e legislativa

No que tange a questão da história da família sabe-se que tal aspecto está
ligado de forma diretamente proporcional ao surgimento da civilização, tendo em vista
a necessidade natural do ser humano estabelecer relações sociais impulsionado por
instintos naturais visando a perpetuação da espécie.
Por conseguinte, percebe-se que “A História descreve que a família surge,
inicialmente, como uma relação espontânea e natural, para, posteriormente, o
grupamento converter-se em família monogâmica dentro de uma distinta área envolta
pelas relações privadas”. ((NASCIMENTO, 2014, p.1871)

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Desse modo, em se tratando de historicidade percebe-se que o assunto família
é complexo e extenso, portanto por questões de didática será feito nesse trabalho um
recorte, pontuando as principais características dessa instituição, para tanto buscar-
se-á discorrer sobre parte da trajetória da família brasileira com foco no fato de sua
origem ter sido sistematizada pelo direito romano e pelo direito canônico.
No entanto, sabe-se que:

Durante toda a história as relações entre seres humanos na sociedade são


desiguais, a partir do momento que o homem começou a produzir os seus
alimentos entre 8.000 a 4.000 anos atrás o período neolítico que começou a
divisão dos papéis entre o homem e a mulher, na sociedade agrícolas já havia
a divisão sexual do trabalho tendo como uma das características o fato da
mulher gerar o filho e amamentá-lo, desenvolvendo a questão do cuidar como
sendo papel da mulher. (PEREIRA, et al., 2019, p.03)

Nesse sentido percebe-se que antigamente a constituição familiar obedecia um


modelo exclusivamente patriarcal, para regular isso, o direito romano buscou
normatizar esse contexto através dos princípios morais existentes na sociedade
vigente, assim buscando estruturar o instituto família devido à ausência de preceitos
jurídicos que regulasse as condutas nesse âmbito.

Nesse contexto a palavra família, no Direito Romano, era indistintamente


aplicada tanto às coisas, como às pessoas. O patrimônio compreendia o
conjunto de coisas ou bens da família e as pessoas agregadas. Além do pai,
a família era composta pelos filhos, pela mulher e os escravos. Todos eram
submissos à autoridade do chefe da família. Significava que as pessoas e
cosias sob o poder de um mesmo pater famílias a este pertenciam.
(NASCIMENTO, 2014, p.1871)

No entanto, com o fortalecimento político da igreja católica, foi avocado para si


a missão de disciplinar a questão da formação da família, para tanto apontou o
casamento na igreja como único requisito legal para constituição de uma família,
portanto o vínculo conjugal passou a ser regido pelo direito canônico, tendo em vista
que:

O Direito Canônico tem como realização a justiça divina e no campo do


matrimônio não seria diferente. O matrimônio é uma conduta social da igreja,
mediante um sistema de normas obrigatórias e coativas as quais geram
direitos e deveres. Aqui ressalta que não se trata de um sistema perfeito, mas
sim, perfectível; na sua tentativa. (CAIXETA, 2020, p.18)

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Sendo assim, cabe enfatizar que no período do império o direito canônico era
tido como o único instituto responsável e capaz de regular questões sobre a instituição
familiar, tendo em vista que somente era admitido a construção da familia mediante o
casamento com a profissão da fé católica.
Nessa perspectiva cabe lembrar que:

Na Idade Antiga, o Código de Hamurabi regulava o sistema familiar, sob a lei


patriarcal, exigindo a monogamia, embora admitisse o concubinato mesmo
que os direitos da concubina não fossem os mesmos da esposa. O
casamento legítimo somente era válido, se realizado por um contrato. Admitia
o divórcio, pois ao marido era permitido repudiar a mulher nos casos do não
cumprimento de seus deveres de esposa e dona-de-casa. (NASCIMENTO,
2014, p.1873)

No entanto, tendo em vista que a maioria populacional que viviam no Brasil era
adepto da fé católica não houve problemas significativos com a implementação do
direito canônico, entretanto por ser detentora do monopólio das leis do casamento,
pela obediência as regras advindas do Concilio de Trento que ocorrera em 1563 e das
Constituições do arcebispo da Bahia impediam as demais pessoas que não
comungasse da mesma fé de contraírem matrimônio.
Todavia, diante do crescimento populacional advinda da mestiçagem, portanto
pessoas que comungavam com religiões diversas do catolicismo, o estado resolveu
intervir nessa situação, avocando para si tal responsabilidade e, consequentemente
autorizando a liberdade do matrimônio, assim tornando possível o chamado
casamento misto, ou seja, de pessoas pertencentes as religiões tidas como
dissidentes.
Portanto, percebe-se que:

A evolução histórica mostra que, por muito tempo, a sociedade formatou a


família como uma comunidade presa a regramentos que lhe foram impostos.
Uma obediência cega impedia qualquer questionamento. No Brasil, o sistema
jurídico, moldado no Código Civil, de 1916, vigente por quase um século,
estabeleceu normas às quais as pessoas não mais respeitavam, diante da
realidade social, que alcançou diretamente o núcleo familiar. (NASCIMENTO,
2014, p.1870)

À vista disso, pode-se afirmar que pôr o Estado avocar para si responsabilidade
de legislar sobre o direito da família houve o florescimento de três categorias de
casamentos, ou seja, o casamento católico, o casamento misto que eram aqueles
entre católico e não católicos e o casamento entre os chamados de adeptos de seitas
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dissidentes. Desse modo, entende-se que a instituição família no Brasil foi constituída,
na sua formação, pela mestiçagem entre raças e culturas, superando a resistência da
igreja católica que se posicionava de forma contraria a esse fenômeno social.
Contudo, sem ceder inteiramente a influência da igreja, o Estado passou a
legislar essa questão, ainda que tenha sido perceptível a preservação de alguns
pressupostos religiosos na positivação das leis, pois:

No Brasil, o Código Civil é a principal lei que rege a instituição familiar.


Contém normas referentes ao matrimônio, ao parentesco, aos filhos, à
herança etc. Leis ordinárias visam acompanhar a evolução social. Assim, a
Lei nº 3.071, de 1916 foi o primeiro Código Civil, inspirado no Direito Romano,
no Direito Canônico e no Código Civil Napoleônico. O Código trazia
características da família patriarcal regida pelo casamento monogâmico.
(NASCIMENTO, 2014, p.1874)

Com essa avocação estatal, no decorrer dos anos ocorreram transformações


significativas na legislação que rege o direito da família, nesse aspecto pode-se
afirmar que tal direito sofreu mutações expressivas, principalmente, com a
promulgação da Constituição Federal de 1988 que sucedeu na metade do século XX
e, portanto, a partir de então originou-se diversas leis com fulcro na adaptação dos
novos organismos familiares.
Por conseguinte, tal alteração nas legislações demudou significativamente a
forma de olhar jurídica sobre esse aspecto, tendo em vista a inserção no ordenamento
jurídico dos temas: união estável, adoção com a modernização da questão
investigativa sobre filiação, a guarda dos filhos e o direito a visitas visando amenizar
a questão litigiosa de resolução dos conflitos no âmbito familiar.

3. Constituição da família e suas principais características.

O modelo de família como se conhece na hodiernidade teve seu florescimento


no período pós revolução francesa, ou seja, a partir do século XIX, tendo em vista o
grande processo de renovação cultural que se iniciou, nesse interim foi desenvolvido
a valorização do convívio harmonioso entre os membros familiar pelo aguçamento dos
sentimentos afetivos, pois:

A nova visão da família com a Constituição Federal e o Código Civil de 2002


não é mais de família institucional, mas sim de família instrumental. A família
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passou a ser meio e não fim, é o meio pelo qual as pessoas desenvolvem a
sua personalidade na busca da realização pessoal. Essa realização pessoal
é a felicidade, que também é um direito fundamental. (LIMA, 2016, p.02)

Nesse aspecto pode-se afirmar que a família hodierna é marcada pela


diversidade, levando em consideração que passou ser vista como um instituto
constituído por elementos probatórios além dos laços consanguíneo, assim abrindo
possibilidades de filiação por afetividade através da convivência como pode ser visto
na questão da filiação socioafetiva.
Pois cabe lembrar que:

No Código Civil de 1916 toda família era casamentaria, matrimonializada, de


modo que para ter família era preciso casar. Quem não casava não tinha
família. Não existia no Código Civil de 1916 nenhuma família fora do
casamento. No Código Civil de 2002 a família deixou de ser casamentaria e
passou a ser múltipla, plural. Passou a existir mais de uma forma de
constituição de família: união estável, família monoparental (comunidade de
ascendentes e descendentes. (LIMA, 2016, p.02)

A família é indubitavelmente uma instituição histórica, tendo em vista a


percepção de que esse instituto tenha sido a primeira partícula social a florescer no
sentido organizacional, embora se saiba que tal fato ocorreu sob a égide do
patriarcado. Portanto, diante disso é possível a justificativa de que competia, tão
somente, ao homem a possibilidade de romper o casamento.
Nesse sentido, tal ato era possibilitado no caso de a mulher ser estéril, logo não
podendo promover descendentes, o que nesse período, era tido como fato gravoso,
além disso também era oportunizado ao homem romper com os laços matrimoniais
caso a mulher cometesse adultério.
No entanto, cabe pontuar que nesse período era reputado ao marido, dentre
outras questões a responsabilidade de prover o sustento da família, porém:

Todos esses direitos são agora exercidos pelo casal em sistema de cogestão,
devendo as divergências ser solucionadas pelo juiz (CC art. 1.567, parágrafo
único). O dever de prover à manutenção da família deixou de ser apenas um
encargo do marido, incumbido também à mulher, de acordo com as
possibilidades de cada qual (art. 1.568). (GONÇALVES, [2003? ]. p.18)

Outra característica desse período no quesito família era a ausência de afeição


nos casamentos, tendo em vista que as escolhas dos nubentes cabiam aos patriarcas,

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que tratava essa questão com objetivos específicos de aumentar a sensação de
poder, de preservação da honra e por interesses econômicos.
Portanto, pode-se afirmar que o tópico que hoje é valorizado no âmbito familiar,
como por exemplo, a felicidade dos integrantes no ambiente doméstico, nesse
período, era tida como elementos secundários, sendo assim somente importando o
fortalecimento dos elementos primários que, nesse caso, era a questão econômica.
Desse modo, conclui-se que: (...) as identidades não são livremente escolhidas,
mas sim inscritas em relações discursivas de poder específicas nas quais são
construídas, ressaltando a importância do poder na construção social. (Santos, 2014,
p. 31)
Destarte, nesse contexto, a família era regida pelo direito canônico que
conduzia o matrimônio pelo viés de uma conjuntura espiritual, portanto detentor de
características permanentes e indissociáveis, logo abominava-se todo tipo de
aforismo voltado para a dissociação de tal instituição.
No entanto, é perceptível, na Constituição Federal de 1988, a retirada da
imposição do casamento para o reconhecimento da constituição familiar, dessa forma
possibilitando outras maneiras de união entre pessoas com essa finalidade, havendo
uma quebra de paradigmas no conceito família.
Portanto:

A quebra do modelo único familiar constituído pelo casamento foi seguido de


outras mudanças paradigmáticas, no tocante à filiação, planejamento familiar
e assistência aos membros mais vulneráveis da família, por meio das demais
prescrições dos parágrafos do artigo 226 e dos artigos 227 a 230 da
Constituição Federal. (SOUSA; WAQUIM, 2015, p. 77)

Todavia, com florescimento dessas novas concepções tendeu-se a


aceitabilidade de novos modelos de família através dos modernos olhares sobre essa
questão, assim fugindo do modelo único de sacramento matrimonial que era posto
pela igreja e com isso originando a família moderna, portanto florescendo o elo afetivo
na constituição familiar.

4. Impactos sociais advindo do processo do modernismo para o pós-


modernismo

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No que se refere a família no pós-modernismo pode-se afirmar que difere de
forma significativa dos padrões das famílias do modernismo, tendo em vista a
mudança de percepções da sociedade a esse respeito, tendo para isso as
modificações das legislações para acompanhar os anseios sociais como pode ser
visto na contemporaneidade.
Pois:

Assim verifica-se que a modernidade, chamada por Bauman de modernidade


sólida foi caracterizada pela existência da ordem, estabilidade, regras e
autoritarismo que permearam as instituições públicas e privadas, além de
fazer parte da vida social dos indivíduos, fatores esses, que de certo modo
favorecia os institutos religiosos da igreja cristã, tendo em vista, sua
predisposição em dispositivos já previamente prefixados como eternos.
Nessa perspectiva verifica-se a rigidez e inflexibilidades dos comportamentos
sociais pela fixação das certezas preestabelecidas, sem possibilidades de
avanços pela mudança de ordem, tendo em vista, sua imutabilidade prefixada
e aceita por toda sociedade. (SANTOS, 2022, p. 39)

De tal modo, que pela valorização da pluralidade na hodiernidade, pode ser


visto variadas formas de modelos de família no contexto atual, portanto podendo ser
perceptível como característica desse presente período a inexistência de um único
modelo de família, fator que era predominante Brasil império pelo regimento do Direito
Canônico.
Portanto, nesse sentido pode-se afirmar que a travessia da modernidade para
a pós modernidade ou modernidade liquida conforme preceitua Bauman geraram
impactos sociais significativos, tendo em vista a percepção de que a modernidade, de
certo modo, contrasta com o período atual, haja vista possuírem características
divergentes.
Nesse aspecto sabe-se que a modernidade possuía suas características
pautada na solidez das coisas, unicidade e autenticidade das instituições e da verdade
única, enquanto a pós modernidade possui como características a liquidez, fragilidade
e imitação das coisas, além de preceituar a existência de pluralidade de verdades.
Diante do exposto, pode-se afirmar que:

(...) a pós modernidade chamada de modernidade liquida por Bauman


debruça suas bases nas incertezas das coisas, através de garantias
ambíguas, pela ocorrência da volatilidade e imprevisibilidade das coisas,
fatores esses que se acredita fazer parte da sociedade a partir da segunda
metade do século XX até o tempo hodierno. (SANTOS, 2022, p. 39)

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Assim, na questão da estrutura familiar percebe-se o surgimento e crescimento
de famílias monoparentais, ou seja, formadas por, tão somente, pais ou tão somente
mães, causando uma desestruturação da família tradicional, portanto pode-se afirmar
que esse novo arquétipo familiar se deve as possíveis separações de casais ou por
divórcios ou até mesmo em que os pais se se mantiveram solteiros, portanto nunca
teve a participação do outro “parceiro”.
Por conseguinte, a efemeridade tornou-se característica forte na modernidade
liquida:

Logo, percebe-se que tal pensamento social afetou significativamente todas


as sociedades, tendo em vista, que derreteu até mesmo as relações mais
profundas como as das famílias até então existentes, haja vista, que na
contemporaneidade, nem mesmo os casamentos são feitos para duração
eternas. (SANTOS, 2022, p.41)

Além dessas questões, como características da pós-modernidade, ainda


decorrente desse fenômeno também é possível encontrar pessoas, independente do
sexo, que optaram por terem filhos sem constituírem compromisso com o seu parceiro,
embora haja estudo que pontua a existência de dificuldades no desempenho duplo
sujeito responsável por uma família monoparental.
Outra questão digna de se pontuar sobre os impactos sociais no âmbito da
família com o advento da modernidade liquida é a crescente reconstrução familiar por
meio de recasamentos que tem ocorrido por diversos fatores, entre os quais pode-se
mencionar a questão econômica.
Além disso, cabe mencionar como fator preponderante na alterações de
padrões sociais o fenômeno da revolução industrial que impactou significativamente
toda a sociedade humana, tendo em vista o surgimento de variações de paradigmas,
assim aflorando uma grande mobilidade social, afora isso, estimulou-se o nascimento
da visão aceitável sobre a liberação sexual em que os sujeitos começaram a buscar
a felicidade, deixando assim, em segundo plano, o casamento, que era tido
anteriormente como um instituto sólido, portanto ganhando uma roupagem nova,
como sendo frágil e instável.

Destarte a única certeza que permanece é a convicção que tudo pode mudar
a qualquer momento, assim nada tem sentido definitivo. Portanto nesse novo
contexto há a pregação que a vida tem que ser levada com mais liberdade
com menos dogmas de amarrações sociais, pela permissividade de que tudo
deve ser experimentado sem julgamentos. (SANTOS, 2022, p. 40)
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Entretanto não há como furtar de falar sobre os possíveis conflitos existentes
pela ampliação familiar em que se tem os filhos originados do casal e os filhos
decorrentes de casamentos anteriores, fato que tem causado confusão na questão
dos direitos e deveres de cada integrante dessa família, portanto se não houver um
empenho de ambos os sujeitos envolvidos pela busca da produção de novos
significados com princípios respeitosos, o novo matrimônio tende a dissolver
novamente.
Ulterior característica desse período no quesito família é o surgimento de casais
que optaram por não formalizar o matrimônio e vivem de forma consensual sem
problemas significativos por viverem dessa forma, além desse tipo há também aqueles
que decidiram de forma consensual estar juntos, porém vivendo separados, ou seja,
cada um na sua casa, tendo como pressuposto para esse modo de vida a preservação
da união.
Existem também na hodiernidade a família constituída, tão somente, pelo casal
tendo em vista a opção de não terem filhos por focar na ascensão profissional e na
independência financeira, assim buscando a realização da satisfação pessoal. Ainda
há de se registrar a existência da família unipessoal constituída, tão somente, por um
indivíduo, pois esse tipo de família justifica o modo de viver pela busca da fuga de
situações conflituosas advindas da vida em família.
“Em outras palavras, para se constituir uma família, não é necessário que haja
um casamento, o que basta é existir um vínculo afetivo entre os indivíduos, sejam de
sexos diferentes ou não. ” (TEIXEIRA; AFONSO; SILVA, 2017, p.06)
Nesse sentido, verifica-se que o Código Civil de 2002, “dá sinais inequívocos
de estar na senda do humanismo, sendo vontade do legislador abolir a discriminação
contra a mulher, calcada na ideologia do patriarcado, responsável pelo duplo padrão
de educação dos sexos. ” (MOUSNIER, 2002, p. 259)
Nesse contexto cabe também falar da família formada por homossexuais em
que possui a configuração de dois homens ou duas mulheres, nesse caso, são
famílias formadas por casais gays ou lésbicas que optaram por esse modo de vida
tendendo a buscar no mesmo sexo maior compreensão e satisfação pessoal, porém
há de se pontuar que esse grupo tem sofrido aversão social até mesmo dentro das
respectivas famílias por assumirem uma relação estável homoafetivo.

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No entanto, cabe sinalizar que:

No Brasil, esse direito só foi reconhecido como legítimo a partir da Resolução


nº 175, de 14 de maio de 2013, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Entretanto, para que essa conquista fosse assegurada juridicamente, houve
um longo processo de debate em diversos segmentos, como por exemplo,
nas instâncias social e política. Com o casamento no civil assegurado para
os homossexuais, estes podem estabelecer vínculo conjugal e constituir uma
família. E, em circunstâncias de manifestação do desejo de ter filhos, basta
um dos adultos – ou ambos – assumir a parentalidade, o que configura uma
situação homoparental. (TEIXEIRA; AFONSO; SILVA, 2017, p.02)

Além disso, verifica-se como obstáculo desse tipo de família, o fato de não
poderem, por questões biológicas, originar descendentes consanguíneo, haja vista o
fato da impossibilidade de gerar filhos por questões alheias à vontade do casal, tendo
em vista que por questões anatômicas tal privilégio, tão somente, é oportunizado a
casais que tem relações heterossexuais, portanto como refúgio tem-se buscado suprir
essa necessidade afetiva por meio de adoção.

5. Organização sistemática da família no ordenamento jurídico brasileiro

5.1 Princípios do ordenamento jurídico antes da Constituição Federal de 1988

No quesito da modernização jurídica é preciso pontuar que há um marco nesse


sentido que pode ser traduzido como antes e depois da Constituição Federal de 1988,
porquanto antes vigorava o patriarcalismo assim não abarcando a questão da tutela
jurisdicional, portanto não se tinha como integrante de uma família os descendentes
que não fosse originário da tenacidade do casamento.
Portanto, como família autêntica somente era tida aquela que era constituída
através da inserção do matrimônio, portanto como amparo a legalização desse direito
consuetudinário pode-se mencionar como primeiro marco histórico, nesse sentido, a
construção do diploma legal que foi efetivado em 1º de janeiro de 1916 com a
promulgação da Lei 3.071, Código Civil, tendo como autor do projeto Clóvis Beviláqua
com as impressões moldadas a visão da época. Portanto:

Com a instituição no Brasil do casamento civil, a soberania do direito canônico


em matéria de casamento acaba sendo colocada em segundo plano. Porém,

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mesmo afastada, continuou de forma indireta a exercer grande domínio nas
normativas civis do Brasil, por desvelar novamente várias normas do direito
canônico. Sob a influência da religiosidade da Igreja Católica Apostólica
Romana, as primeiras legislações civis do Brasil mantiveram a princípio a
indissolubilidade do casamento. Posteriormente, com o surgimento de
mudanças culturais da sociedade, foram produzidas novas ideias na
legislação civil, como por exemplo o desquite, que estabelecia a cessação do
conjugal vínculo. (LEÃO, 2019, p. 159)

Diante disso, fica evidenciado o porquê, em um tempo não muito distante “(...)
culturalmente se apregoava que a mulher obrigatoriamente teria que acompanhar o
marido, pois se porventura recusasse seria uma desonra para a família dela, além de
ser considerado falta grave por se caracterizar tal comportamento como deslealdade
ao esposo. (SANTOS, 2020, p.32)
Esse diploma legal trouxe o entendimento de que o indivíduo como um sujeito
de direito era pautando no patrimonialismo, portanto o que de fato importava era
possuir bens materiais, desse modo pode-se afirmar que tal código foi feito com
direcionamento para abarcar os interesses dos grandes proprietários imobiliários.
Ainda, nesse sentido, cabe dizer que era perceptível, na sociedade, a
influência patriarcal em todos os aspectos sociais, portanto para legitimar tal situação
o diploma legal regia positivado, isso no artigo 233, que o marido era o exclusivo chefe
de uma sociedade conjugal.

Vejamos:

Art. 233 - O marido é o chefe da sociedade conjugal.


Compete-lhe:
I - A representação legal da família.
II - A administração dos bens comuns e dos particulares da mulher, que ao
marido competir administrar em virtude do regime matrimonial adaptado, ou
do pacto antenupcial (CCB/1916, art. 178, § 9º, nº I, c, CCB/1916, art. 274,
CCB/1916, art. 289, nº I, e 311).
III - O direito de fixar e mudar o domicílio da família (CCB/1916, art. 46 e
CCB/1916, art. 233, nº IV).
IV - O direito de autorizar a profissão da mulher e a sua residência fora do
tecto conjugal (CCB/1916, art. 231, nº II, CCB/1916, art. 242, nº VII,
CCB/1916, art. 243, CCB/1916, art. 244 e CCB/1916, art. 245, nº II, e
CCB/1916, art. 247, nº III).
V - Prover à manutenção da família, guardada a disposição do CCB/1916,
art. 277. ]

Por conseguinte, a mulher era tida detentora, tão somente, da função de


colaboradora das obrigações familiares, como pode ser visto fazendo uma rápida
leitura do artigo 240 do Código Civil de 1916:
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Art. 240. A mulher, com o casamento, assume a condição de companheira,
consorte e colaboradora do marido nos encargos de família, cumprindo-lhe
velar pela direção material e moral desta. (Redação dada pela Lei nº 6.515,
de 26.12.1977)
Parágrafo único. A mulher poderá acrescer aos seus os apelidos do marido.
(Parágrafo acrescentado pela Lei nº 6.515, de 26.12.1977)

Entretanto, ainda que se tenha avançado juridicamente nesse sentido, porém


pode-se afirmar que:

Mesmo com os avanços do século XXI e direitos adquiridos após muitas lutas,
as mulheres conquistaram a possibilidade de vivenciar também a vida
profissional. Porém, o patriarcado ainda tem muita influência na sociedade e,
ainda destina às mulheres “papéis” vinculados ao ambiente privado como os
afazeres domésticos e os cuidados com a educação dos filhos. (PEREIRA, et
al., 2019, p.01)

Já no quesito da filiação o diploma em questão fazia distinção de forma


significativa entre filhos legitimo e ilegítimo, naturais e adotivos positivando tal situação
no registro de nascimento. Nesse sentido, também deixava evidenciado que a questão
da guarda acoplava-se ao litígio da culpabilidade da separação do casal, sendo assim
não se atrelava ao bem-estar da criança, portanto nesse caso sendo conferida ao
consorte não responsabilizado pelo desquite, pois:

O Direito antigo era essencialmente severo e conservador quanto à


necessidade da preservação do núcleo familiar, prevalecendo os interesses
da instituição do matrimônio em detrimento dos filhos, colocando estes numa
situação marginalizada, se nascidos fora do casamento; a única filiação que
a lei tomava conhecimento real era a ocorrida no seio do casamento. Puniam-
se os frutos dos relacionamentos havidos por pessoas não ligadas pelo
matrimônio, por adúlteros (na época era considerado crime) ou em relações
incestuosas. Em decorrência da visão sacralizada da família e da
necessidade de sua preservação, puniam-se aqueles que culpa alguma
tinham de terem sido gerados fora das normas legais e dos princípios morais
vigentes na época. (LUCCHESE, 2013, p. 232)

Em meados de 1949 foi positivada a Lei 883, que passou a conceder direitos a
filhos ilegítimos que outrora não era conferido, pois passou a reconhecer a esses
através do reconhecimento real de filiação atribuindo direitos a alimentos provisionais,
tramitação em segredo de justiça e herança, sendo assim reconhecida a isonomia de
direitos, não importando a natureza da filiação.
Desse modo a partir de então não foi mais mencionado no registro civil a
questão da natureza da filiação, consequentemente derrubando a postura

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preconceituosa que até então predominava na sociedade da época. Pois nesse
sentido:
A Carta Constitucional de 1988, em seu art. 227, §6º, fincou a absoluta
igualdade entre todos os filhos, não mais sendo admitida a retrógrada
distinção entre filiação legítima ou ilegítima. Hoje, todos são apenas filhos,
uns havidos fora do casamento, outros em sua constância, uns biológicos,
outros não biológicos, mas todos com iguais direitos e qualificações.
(CASTELO, 2011, p. 40)

No entanto, os avanços na legislação continuaram modernizando


paulatinamente, sendo assim, em 27 de agosto de 1962, foi publicada a Lei nº 4.121,
que tratava sobre a condição jurídica da mulher casada, batizada de Estatuto da
Mulher Casada. Fator que revogou múltiplos dispositivos do Código Civil de 1916.
Assim dentre outros direitos modificados, a mulher passou a ter o direito de
praticar o poder familiar, não importando se porventura formasse um novo casamento,
entretanto tal dispositivo manteve-se restrito a tal atividade, tendo em vista a
preservação do artigo 380 do diploma que regia a prioridade masculina no caso de
existir desacordo entre os genitores, no que se reportava ao efetividade do pátrio
poder, portanto preponderava a deliberação do genitor, contudo ressalvava o direito
da genitora recorrer ao judiciário para o real deslinde do litigio.
No entanto, nesse momento já se percebe uma mobilidade na posição da
mulher, representando uma conquista de direitos no ambiente familiar, pela
possibilidade jurídica em poder interferir na administração do lar.
Nessa perspectiva sobre as mutações culturais no âmbito familiar,
especialmente por atribuir maior isonomia a posição feminina no seio familiar tem-se
a mudança das legislação brasileira, pois no ano de 1977, sob o olhar da Constituição
de 1967, a sexta constituição brasileira e a quinta da república, foi editada a emenda
constitucional 09 que disciplinava a possibilidade do divórcio, posterior a separação
judicial e nesse mesmo sentido o advento da Lei 6.515 que regulava a matéria
propiciando a ação direito de divórcio com a ressalva de que já tenha um espaço
temporal de cinco anos de separação de fato.
Isso, com início anterior a 28 de junho de 1977 conforme o artigo 40 – “No caso
de separação de fato, com início anterior a 28 de junho de 1977, e desde que
completados 5 (cinco) anos, poderá ser promovida ação de divórcio, na qual se
deverão provar o decurso do tempo da separação e a sua causa. ”

14
Além disso, essa lei facultou a mulher o direito de usar o nome da família do
cônjuge que outrora era obrigado pelo casamento. Outra mudança legislativa
significativa na questão familiar foi a alteração do regime de casamento com a
introdução do Regime Parcial de Bens, em que preceitua o termino dos vínculos com
o divórcio.
Mais tarde houve a aprovação da Lei 6.697/79, com a finalidade de normatizar
a questão da assistência, proteção e vigilância aos menores, recebendo assim o nome
de Código de Menores. Portanto cabe afirmar que tal lei foi criada com o desígnio de
ajustar a situação de menores encontrados nas ruas desprovidos de lar, que nesse
período eram tidos como simplesmente irregulares.
Entretanto pode-se dizer que tal lei por atrelar a questão de segurança pública
não se ateve de forma total a proteção dos menores de idade em situação de risco,
sendo assim, pode-se afirmar:

Conforme exposto, desde a constituição de 1934 todas as Constituições


brasileiras dedicaram um capítulo à família, muito embora bastante tímidos.
Deste modo, somente com a Carta de 1988 podemos dizer que realmente
ocorreu a constitucionalização do direito civil e do direito de família.
(CASTELO, 2011, p. 53)

Enfim, foi nessa carta magna que o Brasil teve o rompimento de forma evidente
com o desrespeito a dignidade humana, tendo em vista a positivação de uma
constituição voltada para o respeito ao respeito dos direitos humanos, assim buscando
atender os novos anseios sociais.

5.2 O novo florescimento jurídico da família

Do ponto de vista hodierno no que se reporta ao direito da família pode-se


afirmar que com o advento da promulgação da Constituição Federal de 1988, o
entendimento jurídico foi completamente transmutado dos moldes tradicional
conservador, pois a constituição da instituição família, no que se tinha como
referencial aceito socialmente, passou a ser apenas mais um tipo de possibilidade de
agrupamento de pessoas, pela importância que fora atribuída ao princípio da
igualdade e afetividade como podo ser percebido no artigo 226:

15
Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.
§ 1º O casamento é civil e gratuito a celebração.
§ 2º O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei.
§ 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre
o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua
conversão em casamento.
§ 4º Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por
qualquer dos pais e seus descendentes.
§ 5º Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos
igualmente pelo homem e pela mulher.
§ 6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio. (Redação da EC
66/2010)
§ 7º Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da
paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal,
competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o
exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de
instituições oficiais ou privadas.
§ 8º O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos
que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de
suas relações. (CF 1988)

Pois, nesse ordenamento jurídico houve a positivação manifestada dos


princípios fundamentais do sujeito detentor de direitos, isso:

Depois de mais de duas décadas de Regime Militar, o Brasil passou por um


profundo processo de (re) democratização, no qual a preocupação com os
ideais humanos serviu como resposta ao período de totalitarismo que marcou
os anos precedentes. Esse anseio pelo humanismo foi catalisado pelo
Constituinte originário que estabeleceu como fundamento da República, logo
no artigo 1º, inciso III da Constituição Federal de 1988, a dignidade da pessoa
humana. (PAZ, 2009, p. 16)

Dessa forma, com essa carta magna, pôde ser visto positivações de novas
bases jurídicas reguladoras da sociedade, dando origem ao florescimento de
princípios constitucionais que passaram a enfatizar a importância de se respeitar
valores sociais como: a dignidade humana, a liberdade e a igualdade. Diante dessa
nova percepção social e corroborada pelo direito positivado dar-se-á maior proteção
as famílias pelo processo de integração social para proteger tanto a criança quanto
ao adolescente e ao idoso.
Assim, a sociedade continuou avançando na questão da mudança de
percepção em relação as relações sociais, principalmente, a respeito do que se tem
hodiernamente como visão de família. Nesse sentido em 20 de novembro de 1989
feita a Conversão da Organização das Nações Unidas em Nova Iorque que tratou em
assembleia geral da questão do direito da criança e do adolescente sendo ratificada
pelo Brasil por meio do decreto 99.710/99.

16
Assim, ver-se, com base nesse novo olhar em 1990 foi criado o Estatuto da
Criança e do Adolescente (ECA) com a Lei 8.069, uma guinada na percepção do
reconhecimento da necessidade de se perceber os direitos desses sujeitos em
desenvolvimento.
Diante disso, a questão sobre o reconhecimento, no que se reporta ao estado
de filiação, tornou-se um direito personalíssimo, indisponível e imprescritível, portanto
podendo, se for o caso, ser perpetrado em face dos pais ou herdeiros, observando tão
somente, o protocolo referente ao quesito chamado segredo de justiça.
Logo, é sabido que os direitos conquistados e a ocorrência de mudanças de
percepções não ocorrem de forma simples, pois é necessária diligência de toda a
sociedade para que, posteriormente, possa haver a positivação de tais anseios
sociais.
Uma vez que:

Com o advento da Carta Magna/1988, mais especificamente por intermédio


do § 6º, artigo 227, as filiações foram equiparadas, ou seja, não há mais o
que se falar em distinções em virtude do seu tipo, cortando-se assim as raízes
da discriminação entre as filiações, existentes por mais de meio século em
nosso ordenamento jurídico. (SILVA, 2019, p. 16)

Ainda cabe notar que a criação da lei 8.560 de 29 de dezembro de 1992 trouxe
uma inovação acerca das questões familiares, tendo em vista a regulação da
investigação sobre a paternidade em filhos fora do casamento. Pois outorgou
legitimidade ao ministério público, dando-lhe possibilidade de poder ingressar com tal
ação. Nesse aspecto:

Sua principal função foi à proteção ao direito do menor de ter sua paternidade
reconhecida ou declarada, protegendo-o de discriminação, de acordo com a
Constituição Federal, quanto origem/natureza de sua filiação (legítima ou
ilegítima), e a menção sobre o estado civil dos genitores nos termos de
nascimento, bem como nas certidões fornecidas pelo Registrador Civil. Ou
seja, a partir desta norma ficou vedada qualquer referência aos dados
mencionados nos artigos, que possam discriminar o registrado, como, por
exemplo, o estado civil dos pais. Assim como nos ensina o artigo 6º da
mesma lei. (SILVA, 2019, p. 17)

Portanto, cabe dizer que essa lei com suas anuências possibilitou a criança ter
as acomodações mais pertinentes pela possível possibilidade de responsabilizar,
tanto a mãe quanto o pai, no fornecimento do atendimento das necessidades da
criança. “Portanto, no plano teórico, a corrente majoritária parece inclinar-se no
17
sentido de que o princípio da dignidade da pessoa humana ocupa posição hierárquica
superior em relação aos demais princípios e valores constitucionais” (PAZ, 2009, p.
20)
Ainda cabe pontuar o que se tem de mais recente nessa questão no
ordenamento jurídico brasileiro, assim nesse sentido se tem o Novo Código Civil
através da lei 10.406 que entrou em vigor no dia 11 de janeiro de 2002, buscando
atender as novas demandas sociais, tendo em vista as constantes transformações
sociais. Entretanto embora esse código seja novo, pela morosidade em se aprovar a
ponto de passar décadas esse diploma deixou de contemplar os hodiernos anseios
sociais. Portanto não contemplou a união estável e nem o casamento entre pessoas
do mesmo sexo.

Diante disso, da inexistência de regulamentação expressa da união


homoafetiva, muitos magistrados brasileiros já entenderam, no passado, ser
juridicamente impossível o reconhecimento dessa relação afetiva. Entretanto,
tal posição foi superada pelos Tribunais Superiores, sob o argumento de que
“a possibilidade jurídica do pedido não é simplesmente a previsão, in
abstracto, no ordenamento jurídico, da pretensão formulada pela parte.
Portanto, não deve ser conceituada, como se tem feito, com vistas à
existência de uma previsão no ordenamento jurídico, que torne o pedido
viável em tese, mas, isto sim, com vistas à inexistência, no ordenamento
jurídico, de previsão que o torne inviável”. Em outras palavras, aquilo que não
é expressamente proibido tem-se por permitido. (Fischer, 2016, p. 01)

Assim, percebe-se que ainda que não haja uma lei garantindo a devida
assistência nesse sentido aos homossexuais, contudo através de um olhar no tempo
pretérito pode-se compreender a questão do suporte judicial no âmbito familiar a essa
parcela da sociedade. Pois o Supremo Tribunal Federal (STF) no mês de maio de
2011 deu origem a jurisprudência permitindo a união jurídica entre pessoas do mesmo
sexo, alterando o entendimento do código civil que preceitua família como sendo
formada por um homem e uma mulher.
Nesse sentido, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) publicou no dia 14 de
maio de 2013 uma resolução de número 175 que proibiu os cartórios de recusares
realizar casamentos homoafetivos. Entretanto, apesar desses progressos nos
entendimentos das autoridades, ainda não há o que se falar em garantia em lei, mas
sim em justiça.
Contudo, visando a mitigação de discriminações e preconceitos,
principalmente, no quesito da não aceitabilidade do casamento homoafetivo, o STF

18
no mês de junho de 2019 formulou uma decisão no sentido de enquadrar a questão
tanto da homofobia, quanto da transfobia em crime de racismo, buscando, de certo
modo, compelir o congresso a legislar sobre o tema.

10. Considerações Finais

Enfim, diante das reflexões feitas nesse presente trabalho, pode-se afirmar que
a instituição família faz parte de um elo social muito antigo, ou seja, a base
indispensável para a constituição de uma sociedade, para tanto pontua-se um tempo
em que a família era tida como uma constituição formada, tão somente, pela
consagração do casamento, portanto provocando uma segregação social.
Nesse trabalho foi tratado a questão das normas jurisdicionais no tratamento
das demandas do contexto familiar, tendo em vista as várias transformações jurídicas
que essa instituição sofreu pela positivação de legislações constitucionais e
infraconstitucionais no decorrer dos séculos.
Dessa forma perpassou pelo direito canônico, pelo direito romano, por
constituições e leis especificas até chegar ao contexto atual, tendo início a essa
normatização hodierna com a promulgação da constituição de 1988 que tratou tal
assunto de forma meticulosa. Inclusive abarcando a questão da filiação e
fundamentando tal requisito no princípio da dignidade humana frustrando a
discriminação relativa ao direito de filiação.
Por todo o exposto percebe-se a importância da intervenção do direito
positivado com bases no respeito aos direitos pessoais do indivíduo pela advento de
uma constituição cidadã que permitiu um entendimento sobre a possibilidade de
diversos tipos de família, tendo em vista o princípio da dignidade humana e o direito a
felicidade.

11. Referências

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