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Multiparentalidade

1. Introdução

O presente artigo tem como objetivo principal conceituar e compreender a


incidência da multiparentalidade na sociedade e ordenamento jurídico brasileiro.
Inicialmente busca - se demonstrar a evolução do conceito de família, que no
passado era compreendido como apenas aquele composto pelo pai, a mãe e filhos,
modelo este considerado tradicional e patriarcal, onde o pai provinha com o sustento
da família e exercia único e exclusivamente o poder sobre a esposa e filhos. Esta
concepção de família sofreu uma mudança significativa no início do século XX,
quando a mulher necessitou sair dos cuidados apenas com o lar e ajudar nas
despesas com trabalhos externos, exercendo uma função que antes era atribuída
apenas para os homens.
Essa evolução no conceito de família ganhou uma ênfase maior com o
advento da Constituição Federal de 1988, em que colocou homens e mulher no
mesmo nível de igualdade, possibilitando que aquele modelo tradicional de família
não fosse o único existente em nossa sociedade. Com o artigo 226 da CF/88 foi
possível demonstrar a igualdade e a importância tanto do homem quanto da mulher
na entidade familiar e a viabilidade em se constituir família sem necessariamente ser
pelo casamento, abrindo um leque de possibilidades de existências de novos
núcleos familiares, como por exemplo, a monoparental, mosaico, poliafetiva, a
multiparentalidade que é objeto de nosso estudo, entre outros.
Ademais, trataremos do nosso tema central, a multiparentalidade, que é
concomitância do parentesco biológico e afetivo, ou seja, é a possibilidade em se ter
mais de dois pais no registro de nascimento de uma pessoa. E quando discutimos
esta temática nos surge vários questionamentos quanto a sucessão, pensão, guarda
e visitas, mas de forma mais simplificada, quando reconhecida a multiparentalidade,
aqueles pais e filhos afetivos passam ater direitos e deveres como se biológicos
fossem. Entretanto, o único ponto que ainda traz uma controvérsia jurisprudencial e
doutrinaria é quando a sucessão, pois se tem o receio de fraude na busca de tal
direito.
Este tema ainda não possui lei específica que o define, mas possui princípios
que o valorize e enfatize sua existência. Como o princípio da dignidade da pessoa
humana ao qual lhe é atribuída uma importância significativa, pois é o princípio
norteador de todos os ramos do direito por enaltecer o valor do ser humano em
todas as suas relações sociais, principalmente quando envolve questões
importantes como o respeito. Outro princípio é o da afetividade, que tem como
diretriz demonstrar o significado de afeto nas relações interpessoais, que na
multiprentalidade ganha um significado ainda mais valioso, pois é através do afeto
que este modelo de família surge e se sustenta. Por fim, mas não menos importante
temos o princípio do pluralismo familiar, que basicamente norteia a possibilidade de
existir essas vastas entidades familiares que hoje fazem parte de nossa realidade.
Em síntese, quando tratamos da multiparentalidade nos fundamos muito em
jurisprudências, visto que existe pelo menos um caso julgado em cada estado no
território brasileiro. E isso somente foi possível após a repercussão geral 622 do STF
que julgou um recurso extraordinário que discutia tal demanda. Ensejando ainda a
discussão e curiosidade da mídia nacional quanto a esses casos tão incomum, mas
que já é uma realidade em nossa sociedade e merece toda atenção e respeito.

2. Conceito de Família

Inicialmente é importante lembrar que a estrutura e o conceito de família eram


padronizados pela figura do pai, da mãe e de filhos e, conforme Gonçalves (2012)
essa configuração é denominada "pequena família". Na Roma antiga até a história
recente o poder familiar era todo do pátrio poder, onde o pai era a única fonte de
sustento da família, exercendo poder exclusivo sobre os filhos e a esposa, tal
hierarquia prevaleceu até a legislação civil anterior. Porém com a revolução
industrial, final do século XIX e início do XX, a mulher teve a necessidade de deixar
os cuidados exclusivos com a família e começar a ajudar no sustento econômico do
lar. Assim, com o advento da Constituição Federal de 1988 e conforme dispões o
artigo 226, §5, homens e mulheres passaram a ter igualdade entre ambos.
No Código Civil de 1916, a visão de direito de família era voltada para o
homem, na figura do patriarca que provinha o sustento e possuía o poder sobre a
mulher e os filhos. Maria Berenice Dias explica de forma clara a concepção de
família no Código Civil de 1916:

O antigo Código Civil, que datava de 1916, regulava a família do início do


século passado. Em sua versão original, trazia estreita e discriminatória
visão da família, limitando-a ao casamento. Impedia sua dissolução, fazia
distinções entre seus membros e trazia qualificações discriminatórias às
pessoas unidas sem casamento e aos filhos havidos dessas relações.

Todavia, o atual Código Civil de 2002, atendendo à isonomia constitucional


entre homem e mulher na família, passando a prevê em seu artigo 1630 que
enquanto menores os filhos estão sujeitos ao poder familiar e ainda no artigo 1634
do mesmo código, diz que a ambos os pais compete o exercício do poder familiar.
Desta forma foi desmistificando o conceito tradicional e matrimonializado de família e
de poder familiar, já que isso foi necessário em decorrência da evolução social,
surgindo assim novos conceitos e arranjos familiares, que agora abrange relações
que vão além da consanguínea, identificando o afeto como elemento valioso para
formação desses novos arranjos. Conforme ensina a ilustre doutrinadora Maria
Berenice Dias:

O afeto, elemento identificador das entidades familiares, passou a servir de


parâmetro para a definição dos vínculos parentais. Se de um lado existe a
verdade biológica, de outro lado há uma verdade que não mais pode ser
desprezada: a filiação socioafetiva, que decorre da estabilidade dos laços
familiares. (Dias, 2016, p. 682)

Um desses novos arranjos que abrange as relações de família é a


multiparentalidade, que será objeto do nosso estudo, por força do qual um indivíduo
passa ter mais de um pai e mais de uma mãe, podendo esse vínculo familiar surgir
de uma relação biológica e socioafetiva.
Mas apesar de toda essa evolução ainda não se tem legislação especifica
que trate desse tema, motivo pelo qual a doutrina e a jurisprudência vêm sinalizando
sobre a importância da busca por esse direito, afinal na Constituição Federal de
1988, garante-se proteção aos direitos fundamentais nos quais o princípio da
afetividade e da dignidade da pessoa humana são assegurados.

3. Espécies de família e sua proteção constitucional


Entende - se por família, aquela composta por indivíduos que compartilham
um grau de parentesco, Maria Berenice Dias lembra que todos ocupa uma função
nessa entidade, sem necessariamente possuírem um laço biológico e que a
sociedade se organiza em torno da família. Neste passo lesiona a ilustre
doutrinadora:

A família-instituição foi substituída pela família-instrumento, ou seja, ela


existe e contribui tanto para o desenvolvimento da personalidade de seus
integrantes como para o crescimento e formação da própria sociedade,
justificando, com isso, a sua proteção pelo Estado. (Dias, 2016, p. 233)

Sendo ainda lembrado pela Constituição Federal de 1988, como a base da


sociedade. Neste sentido a família vai além da relação entre pessoas, ela é
necessária para a estabilidade da sociedade.
Ademais, a entidade familiar origina-se de várias formas e recebem toda
proteção constitucional, o artigo 226 da Constituição garante essa proteção, em seu
rol exemplificativo é elencado algumas espécies de família, mas as que não foram
mencionadas neste artigo também possui a mesma proteção das mencionadas.
Vejamos alguns exemplos:
3.1. Casamento: Ao longo do tempo alguns filósofos e doutrinadores
entendia o casamento como um direito divino, como o intuito apenas de perpetuação
da espécie e era visto apenas como um contrato. Entretanto, com a evolução social
e as mudanças nos costumes, a percepção desse instituto mudou e começou a ser
visto como aquele em que duas pessoas em comum acordo se unem em matrimonio
e que suas condições são definidas pelo Código Civil.
A dissolução do casamento valido se dá pelo divorcio ou pela morte de um
dos cônjuges. No artigo 1571 do Código Civil é elencado todas as possibilidades de
término da sociedade conjugal, ao passo que somente a separação judicial, impede
que os cônjuges contraiam no matrimonio.
3.2. União Estável: Anteriormente denominada de concubinato, ou união
livre, onde duas pessoas compartilham a vida em comum, como se casamentos
fossem. Por muito tempo a doutrina entendia que os concubino não possuía diretos
ao fim da relação, como acontece no casamento, e que poderia ser rompido a
qualquer tempo, haja visto que não possui os ritos e formalidades do casamento.
Com o passar do tempo a denominação concubinato recebeu outro
significado, que se trata da relação eventual entre pessoas impedidas de se casar. E
aquela definição, ao qual duas pessoas compartilham a vida em comum, semelhante
ao casamento, é entendido como União Estável. Esta união passa a ter uma maior
proteção no instante em que o Código Civil de 2002 lesiona sobre os direitos e
garantias antes não reconhecidos, desta forma, quando ao fim da relação ambos os
companheiros no momento da partilha dos bens seguem o que determina o regime
da comunhão parcial e ainda reconhece tais companheiros como meeiros sobre os
bens adquiridos na constância da união. Por fim, a união estável pode ser convertida
em casamento, quando os companheiros o requererem ao juiz e fizer o registro civil,
conforme demonstra o artigo 1726 do CC.
3.3. Natural: Constituída pelos pais e seus descendentes, é entendida como
família biológica. A doutrina denomina ainda com extensa e ampliada, onde essas
duas nomenclaturas se ferem a parentes próximos que o menor possua um vínculo
de afetividade. O exemplo mais clássico, é quando o corre a destituição do poder
familiar dos pais, busca-se por parentes que possa cuidar dessa criança ou
adolescente, é neste momento que também surge a figura da família substituta para
amparar esse menor. Como na família substitua, a família natural recebe uma
proteção especial do ECA, pois tutela os direitos da criança e do adolescente.
3.4. Monoparental: É aquela constituída de um dos pais e seus filhos, onde
única e exclusivamente o poder familiar é exercido por este genitor.
A doutrina lembra que quando ocorro o rompimento do vínculo entre os
genitores e os filhos passam a viver com apenas um deles, não é considerada a
monoparentalidade, pois a responsabilidade do poder familiar é de ambos, podendo
a guarda ser compartilhada. Assim, família monoparental não reconhece a
existência do outro genitor, as vezes pela morte ou por este não reconhecer a
filiação.
3.5. Anaparental: É composta por pessoas que possuem um vínculo de
parentesco consanguíneo ou apenas afetivo e que não tenha necessariamente
natureza amorosa ou sexual, mas sim que desfrute de uma convivência prolongada
e que compartilhe um enriquecimento patrimonial. Como por exemplo, amigos que
passam a morar juntos, possuem somente o vínculo afetivo e sem nenhuma
conotação amorosa, que partilham uma convivência diária e que busque meios para
sobrevivência de todos no lar.
3.6. Poliafetiva: Também conhecida como poliamor, conceito totalmente
distinto da monogamia ao qual o relacionamento se restringe a apenas duas
pessoas. Esta é constituída por várias pessoas em que todas se relacionam, neste
caso foge da ideia de se amar apenas uma pessoa e começa a ser visto como a
possibilidade de amar várias pessoas ao mesmo tempo, de forma verdadeira, tendo
uma convivência harmoniosa e pacífica. E todos agregam para o bem-estar da
entidade familiar.
3.7. Mosaico: Possui diversas definições pela doutrina, como, pluriparental,
composta, mas todas essas denominações têm o mesmo significado, que é aquela
composta por um casal que traz de outras relações seus filhos e que podem possuir
filhos em comum. Esse modelo de família decorre a partir do surgimento do divórcio,
em que relações extintas e pessoas começam a buscas outros relacionamentos e
assim constituir novas famílias, desta forma, então que surge as figuras do padrasto
e madrasta.
Vejamos, que pouco se fala dessa entidade familiar, mas esta é a mais como
em nossa sociedade, haja visto que depois da lei do divórcio ( LEI Nº 6.515/77),
muitas relações foram dissolvidas ao passo que muitas também surgiram através
dessa dissolução, dando origem a novas famílias.
3.8. Substituta: Esta entidade familiar recebe atenção especial do ECA, pois
envolve a proteção da criança e do adolescente. Em casos específicos o menor é
acolhido pela família substituta quando não puder permanecer nos cuidados de sua
família natural. Maria Berenice Dias (2016) lembra que família substituta não possui
uma definição específica, mas habitualmente são famílias que estão no cadastro de
adoção.
Esse acolhimento pelas famílias substitutas ocorre quando o menor não pode
permanecer sobre os poderes da família natural. Durante o período que estão com
as famílias substituta se buscam meios para que ele volte para o seio da família
natural, meios para que essa reinserção seja benéfica para a criança ou
adolescente, porém nem sempre isso ocorre, então em tal caso o menor é
cadastrado para adoção para que encontre uma família que lhe dê amor, respeito e
dignidade.

4. Multiparentalidade
4.1 Conceito de Multiparentalidade

Multiparentalidade é a coexistência de vínculo biológico e afetivo. Neste


sentido segundo Christiano Cassettari (2015), para que a multiparentalidade esteja
constituída é necessário a presença de filiação com mais de duas pessoas no
registro de nascimento.
Maria Berenice Dias preleciona sobre esse tema:

Para o reconhecimento da filiação pluriparental, basta flagrar a presença do


vínculo de filiação com mais de duas pessoas. A pluriparentalidade é
reconhecida sob o prisma da visão do filho, que passa a ter dois ou mais
novos vínculos familiares. Coexistindo vínculos parentais afetivos e
biológicos, mais do que apenas um direito, é uma obrigação constitucional
reconhecê-los, na medida em que preserva direitos fundamentais de todos
os envolvidos, sobretudo o direito à afetividade. (Dias, 2016, p. 682)

Assim, a multiparentalidade é a possibilidade de uma pessoa ter dois pais


e/ou duas mães na certidão de nascimento. E para que o reconhecimento da
parentalidade afetiva conste no registro de nascimento é preciso seguir normas
instituída pelo Provimento n° 63 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que em seu
artigo 10 e parágrafos descreve como ocorrera esse registro:

Art. 10. O reconhecimento voluntário da paternidade ou da maternidade


socioafetiva de pessoa de qualquer idade será autorizado perante os oficiais
de registro civil das pessoas naturais.
§ 1º O reconhecimento voluntário da paternidade ou maternidade será
irrevogável, somente podendo ser desconstituído pela via judicial, nas
hipóteses de vício de vontade, fraude ou simulação.
§ 2º Poderão requerer o reconhecimento da paternidade ou maternidade
socioafetiva de filho os maiores de dezoito anos de idade,
independentemente do estado civil.
§ 3º Não poderão reconhecer a paternidade ou maternidade socioafetiva os
irmãos entre si nem os ascendentes.
§ 4º O pretenso pai ou mãe será pelo menos dezesseis anos mais velho
que o filho a ser reconhecido.

Mas se analisarmos essa questão no contesto social a multiparentalidade já


faz parte da nossa realidade, ao passo que muitas relações estão sendo extintas,
outras vem surgindo, e essas novas relações trazem com sigo frutos de relações
passadas que dão origem a novos arranjos familiares, assim, o afeto que era
partilhada apenas com cônjuges ou companheiros são passados para sua prole,
desta forma cultivando um amor e cuidado com esses como se seu filho fosse,
surgindo assim um parentesco por afinidade que necessariamente não exclui o
consanguíneo, pelo contrário amplia os laços familiares e multiplicam os vínculos
parentas. Valendo-se do pensamento do nobre doutrinador Christiano Cassettari:
"Essa hipótese é viável em várias oportunidades, tais como nos casos em que for
possível somar a parentalidade biológica e a socioafetiva, sem que uma exclua a
outra.''(Cassettari, 2015, p. 169).
Porém é importante lembrar que não é preciso ser apenas laço afetivo e
biológico, pode em muitos casos existir apenas o afetivo, como é lembrado por
Maria Berenice Dias nos casos de adoção unilateral.
É inegável que quando tratamos do tema da multiparentalidade surgem várias
dúvidas e indagações quanto aos direitos e deveres de todos envolvidos nessa
relação. Neste sentido o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) determina em
seu artigo 22, parágrafo único que:

Art. 22. Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos
filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de
cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais.

Parágrafo único. A mãe e o pai, ou os responsáveis, têm direitos iguais e


deveres e responsabilidades compartilhados no cuidado e na educação da
criança, devendo ser resguardado o direito de transmissão familiar de suas
crenças e culturas, assegurados os direitos da criança estabelecidos nesta
Lei.
E ainda o parágrafo 6° do artigo 227 da Constituição Federal tratara da
igualdade entre os filhos:

art. 227, § 6º Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por


adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer
designações discriminatórias relativas à filiação.

Assim, quando se declara a parentalidade afetiva as questões envolvendo


sucessão, obrigação alimentar, guarda e direito de visitas será tratado como se
fossem um parentesco biológico.

Sucessão: A partilha será igual para todos os filhos sem fazer nenhuma
descriminação quanto aos biológicos e afetivos, portanto, declarada o parentesco
afetivo esses também serão considerados herdeiros legítimos para fins legais,
sempre respeitando a ordem de preferência e vocação hereditária que é
determinada do artigo 1829 a 1847 do Código Civil.
Porém, o entendimento sobre a sucessão ainda traz divergência doutrinaria,
pois, uma parte da doutrina tem dificuldade de aceitar o reconhecimento da filiação
afetiva, principalmente quando o pedido de reconhecimento é após a morte do
suposto pai/mãe e estes não se manifestaram anteriormente sobre o desejo de
reconhecimento desta filiação. E tal entendimento doutrinário vem refletindo na
jurisprudência, assim vejamos:

APELAÇÃO CÍVEL. ADOÇÃO PÓSTUMA. AUSÊNCIA DE PROVA DA


VONTADE INEQUÍVOCA DE ADOÇÃO DO AUTOR POR PARTE DO
CASAL FALECIDO. PAIS BIOLÓGICOS QUE CONCEDERAM A GUARDA
DO AUTOR PARA TERCEIROS.1) O instituto da guarda, cujo feixe de
obrigações contempla o dever de vigilância, amparo, cuidado, assistência
material e moral, preservando, no entanto, os laços sanguíneos originais,
não se confunde com o da adoção, que, segundo o art. 41 do ECA, atribui a
condição de filho ao adotado, com idênticos direitos e deveres, inclusive
sucessórios, desligando-o de qualquer vínculo com pais e parentes
naturais.2) Não restou comprovada a inequívoca vontade dos falecidos de
adotar o apelante, em que pese existam elementos elucidativos do auxílio
afetivo e material que ambos prestaram-lhe, o que tem respaldo no bom
desempenho da guarda com o qual se comprometeram. APELAÇÃO
DESPROVIDA. (Apelação Cível Nº 70051863967, Oitava Câmara Cível,
Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ricardo Moreira Lins Pastl, Julgado em
28/02/2013)

Por fim, é preciso analisar caso a caso para que seja possível reconhecer a
filiação afetiva e o direito a sucessão. E se reconhecido o filho é herdeiro de seus
pais, sendo biológicos ou afetivos, e estes de seus filhos.

Pensão: A obrigação alimentar será prestada de forma igual para filhos


biológicos e afetivos, conforme artigo 1696 do Código Civil: "O direito à prestação de
alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes,
recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros''.
Portanto, pais biológicos ou afetivos estão obrigados a prestar alimentos para
seus filhos, em consonância com o artigo 1694, § 1° também do Código Civil:

Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos


outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com
a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua
educação.
§ 1o Os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do
reclamante e dos recursos da pessoa obrigada.

Por fim, a fixação de alimentos nos casos multiparentalidade será aplicado


igual aos casos de bipaternidade, pois, o único objetivo é suprir a necessidade
daquele que o recebe.

Guarda: Reconhecida a multiparentalidade a guarda será aplicada de forma


a garantir o que for melhor para o menor, respeitando o princípio do melhor interesse
da criança e do adolescente. Conforme determina o artigo 4° do Estatuto da Criança
e do Adolescente (ECA):

Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do


poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos
referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer,
à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à
convivência familiar e comunitária.

Em suma, é possível pleitear a guarda quando existe vínculo afetivo, pois o


intuito é garantir o que melhor atender as necessidades do menor e assim fornecer
meios para que ele possa se desenvolver de forma plena.

Visitas: Após a fixação da guarda para um dos pais e se não aplicado o


artigo 1616 que diz:
Art. 1.616. A sentença que julgar procedente a ação de investigação
produzirá os mesmos efeitos do reconhecimento; mas poderá ordenar que o
filho se crie e eduque fora da companhia dos pais ou daquele que lhe
contestou essa qualidade.

O direito de visita pode ser exercido pelo outro, como determina o artigo
1589 do Código Civil:
Art. 1.589.O pai ou a mãe, em cuja guarda não estejam os filhos, poderá
visitá-los e tê-los em sua companhia, segundo o que acordar com o outro
cônjuge, ou for fixado pelo juiz, bem como fiscalizar sua manutenção e
educação.

Em síntese o direito a visita busca estreitar os laços de afetos entre pais e


filhos e preservar o melhor interesse do menor.

4.2 Princípios
Além dos conceitos doutrinários, a multiparentalidade se sustenta em
princípios constitucionais, que assegura a melhor aplicação do direito e desejos das
partes envolvidas. Ao tratar dos princípios Maria Berenice Dias diz que: "Os
princípios constitucionais representam o fio condutor da hermenêutica jurídica,
dirigindo o trabalho do intérprete em consonância com os valores e interesses por
eles abrigados." (Dias, 2016, p. 71)
Assim, os princípios que melhor se aplica nesse contexto é o da dignidade da
pessoa humana, o da afetividade e o do pluralismo familiar, pois são princípios que
respeitam e garantes direito quando trata da mutiparentalidade. Assim vejamos
como esses princípios são de suma importância:
4.2.1. Princípio da Dignidade da Pessoa Humana: É um princípio muito
aplicado no Direito como um todo, é tratado pela doutrina como sendo um princípio
mais universal. Esse princípio tem a função primordial de garantir o respeito à
dignidade humana, e ainda que toda violação a esta dignidade seja reparada, sendo
dada ao Estado esta obrigação de preserva – lo.
No Direito de Família tal princípio tem o intuito de valorizar e garantir o
respeito pelas diversas entidades familiares e ainda promover o desenvolvimento de
forma plena dos indivíduos que ocupam essas entidades. Ademias, reconhecem de
forma igualitária todos os membros que compõe o núcleo familiar, para que estes
possam desenvolver o respeito, o amor e a afetividade entre si.
Para multiparentalidade a dignidade da pessoa humana serve como base
para o reconhecimento desse modelo familiar, pois a partir do respeito a este
princípio é possível reconhecer a existência de vários vínculos. Deste modo, quando
o judiciário reconhece a existência de mais de duas relações parentais, está de certo
modo respeitando e valorizando a dignidade daquele que está sendo privilegiado
pela coexistência desses vários vínculos.

4.2.2. Princípio da Afetividade: O Estado busca de várias formas proteger


este princípio, mesmo que não fale de forma explicita sobre afeto, ele elenca na
constituição direitos para que este seja respeitado. O princípio da afetividade está
profundamente ligado ao Direito de Família, como lesiona Maria Berenice Dias:
"pode ser utilizado no direito das famílias, como forma de expor a ideia de afeição
entre duas pessoas para formar uma nova sociedade: a família''. (Dias, 2016, p. 84).
No Direito de Família está presente basicamente em todas as relações, como por
exemplo, na união estável, no casamento quando duas pessoas resolvem se unir
em decorrência do afeto mútuo que sentem um pelo outro. Na adoção, quando
alguém resolve transmitir todo o seu afeto para uma criança que até aquele
momento desconheci tal sentimento. Ou seja, entre pessoas que não possuem laço
sanguíneo nenhum, mas se amam e protegem unicamente pelo afeto que sentem.
Este princípio está profundamente ligado a multiparentalidade, pois quando o
Estado e as próprias pessoas envolvidas na relação reconhecem a existência da
multiplicidade de filiação, basicamente confirmam e respeitam a afetividade que
existe entre eles. Nesse passo, a afetividade é unicamente a razão pela qual se
busca reconhecer a multiparentalidade.

4.2.3. Princípio do pluralismo familiar: É por meio desse princípio que o


Estado se reconhece a possibilidade da existência de vários arranjos familiares. Ou
seja, é não mais se limitar em dizer que o casamento é a única base da sociedade,
mas sim que todas aquelas entidades familiares que antes não era reconhecida
passa agora a possuir extrema importância para o desenvolvimento da sociedade.
Um desses novos arranjos que é protegido pelo pluralismo familiar é a
multiparentalidade, que surgiu basicamente do afeto e contribui para o
desenvolvimento pleno da sociedade.

4.3 Jurisprudências
Ao tratamos da multiparentalidade nosso estudo se baseia basicamente nas
doutrinas e nas jurisprudências, ao passo que tal realidade não está expressa em
nosso ordenamento jurídico.
Deste modo, quando buscamos descobrir a amplitude da multiparentalidade
nos tribunais, percebemos que em todos os estados no território brasileiro tem ao
menos um caso julgado reconhecendo a multiplicidade de parentesco. É evidente
que tais decisões não foram tomadas de forma instantânea, foi necessário muito
tempo para que os tribunais se adaptassem a nova realidade, pois quando era
discutido o reconhecimento de um parentesco afetivo onde já existia um biológico a
única opção adotada era a exclusão de um deles, por exemplo, quando um filho
desejava reconhecer seu padrasto como pai afetivo os tribunais determinava que
fosse escolhido apenas um, trazendo deste modo uma questão conflitante para o
filho que não deseja excluir a figura do pai biológico e substituir pelo afetivo, mas sim
somar as duas paternidades. Por estas razões, o STF na repercussão geral 622
deliberou sobre a possibilidade de se somar a filiação afetiva e biológica, ou seja,
não era necessário a prevalência de uma sobre a outra, mas sim a coexistência de
ambas. Ficando assim a decisão:

O Tribunal, por maioria e nos termos do voto do Relator, apreciando o tema


622 da repercussão geral, negou provimento ao recurso extraordinário,
vencidos, em parte, os Ministros Edson Fachin e Teori Zavascki. O Tribunal
deliberou fixar a tese na próxima assentada. Ausente, justificadamente, o
Ministro Roberto Barroso, participando do encontro de juízes de Supremas
Cortes, denominado Global Constitutionalism Seminar, na Universidade de
Yale, nos Estados Unidos. Falaram: pelo recorrente a Dra. Deborah de
Oliveira Figueiredo; pelo amicus curiae Instituto Brasileiro de Direito de
Família - IBDFAM, o Dr. Ricardo Lucas Calderón, e, pelo Ministério Público
Federal, o Dr. Rodrigo Janot Monteiro de Barros. Presidiu o julgamento a
Ministra Cármen Lúcia. Plenário, 21.09.2016. Decisão: O Tribunal, por
maioria e nos termos do voto do Relator, fixou tese nos seguintes termos:
“A paternidade socioafetiva, declarada ou não em registro público, não
impede o reconhecimento do vínculo de filiação concomitante baseado
na origem biológica, com os efeitos jurídicos próprios”, vencidos, em
parte, os Ministros Dias Toffoli e Marco Aurélio. Ausente, justificadamente, o
Ministro Roberto Barroso, participando do encontro de juízes de Supremas
Cortes, denominado Global Constitutionalism Seminar, na Universidade de
Yale, nos Estados Unidos. Presidiu o julgamento a Ministra Cármen Lúcia.
Plenário, 22.09.2016. (RE 898060 / SC – Santa Catarina, Recurso
Extraordinário, Relator(a): Min. Luiz Fux, Julgamento: 21/09/2016, Órgão
Julgador: Tribunal Pleno, grifo nosso)

A decisão do STF foi tomada após a análise do Recurso Extraordinário


898060, assegurando a possibilidade de duas paternidades de acordo com o caso
concreto.
Como já foi dito a multiparentalidade está evidente em todos os tribunais do
país e cada caso traz um efeito, tanto para a evolução do direito quanto para as
pessoas envolvidas, nos mostrando o valor do afeto e principalmente que as
relações de afetivas podem coexistir de forma harmoniosa com a biológica.
Para melhor sedimentar o que até agora foi descrito, declinaremos
jurisprudências que atine ao assunto:

APELAÇÃO CÍVEL. JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA. RECONHECIMENTO DE


PATERNIDADE SOCIOAFETIVA. POSSE DO ESTADO DE FILHO.
POSSIBILIDADE DE COEXISTÊNCIA COM A PATERNIDADE BIOLÓGICA.
INTERPRETAÇÃO DO ART. 227, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL,
C/C O ART. 1.593, DO CÓDIGO CIVIL VIGENTE. MANUTENÇÃO DOS
VÍNCULOS AFETIVO E BIOLÓGICO. DIREITO PERSONALÍSSIMO.
PRESERVAÇÃO DA ANCESTRALIDADE. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA
PESSOA HUMANA. RECURSO PROVIDO. I O arcabouço normativo pátrio,
de índole constitucional, não admite qualquer discriminação entre as
espécies de parentesco e filiação, tampouco veda a coexistência de
relações de idêntica natureza, a exemplo da paternidade, por não
estabelecer graus de hierarquia entre elas. Inteligência do art. 227, § 6º, da
Constituição Federal, c/c o art. 1.593, do Código Civil. II Nessa linha de
intelecção, é forçoso reconhecer o estado de filiação, de natureza afetiva,
entre indivíduos que se reconheçam como pai e filha, fato comprovado pela
longa, profícua e pública convivência entre eles (fls. 33/59), sem que isso
represente, de forma automática, a extinção da paternidade biológica,
notadamente quando, como na espécie, a vontade dos requerentes é
uniforme, e direciona-se ao reconhecimento da dupla paternidade. III Exigir,
para tanto, que haja efetiva e simultânea convivência do filho com ambos os
pais, representa indevida intervenção do Estado na vida privada, porquanto
a relevância da relação pessoal, seja ela biológica ou afetiva, não pode ser
mensurada, apenas, pelo tempo de convívio entre os envolvidos, mas,
essencialmente, pelo legítimo interesse que estes demonstrem na
manutenção dos vínculos estabelecidos, por consanguinidade ou
afetividade. IV In casu, é certo que o pai biológico da primeira recorrente
veio a falecer no ano de 2011 e, conquanto não tivesse mantido relação
próxima com sua filha, preservou nela o desejo de tê-lo como pai, ainda que
em sua memória afetiva, elemento mais do que suficiente para a
manutenção do vínculo consanguíneo, indispensável à preservação da
ancestralidade e da dignidade da pessoa humana. V Por fim, não se
tratando, na origem, de lide de adoção, ou de ação negatória de
paternidade, mostra-se ilícita a extinção, de ofício, do vínculo biológico
mantido entre a autora e seu falecido pai, por desbordar, tal decisão, dos
limites objetivos da demanda (arts. 128 e 460, do CPC). Reforma da
sentença que autoriza, entretanto, a superação do vício apontado, nos
termos do artigo 249, § 2º, do CPC. VI Recurso provido. (TJ-BA - APL:
05134634620148050001, Relator: Dinalva Gomes Laranjeira Pimentel,
Segunda Câmara Cível, Data de Publicação: 02/09/2015)

DIREITO CIVIL - FAMÍLIA - RECONHECIMENTO DE FILIAÇÃO


SOCIOAFETIVA POST MORTEM - IMPROCEDÊNCIA EM PRIMEIRO
GRAU - RECURSO DO REQUERENTE - PROVAS DOCUMENTAL E
TESTEMUNHAL DA SOCIOAFETIVIDADE - ESTADO DE FILIAÇÃO
COMPROVADO - DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA - SENTENÇA
REFORMADA - RECURSO PROVIDO A posse do estado de filiação,
consubstanciada em relação afetiva e pública como pais e filho, autoriza o
reconhecimento de filiação socioafetiva, amparada na lei civil (art. 1.593 do
CC) e no princípio constitucional da dignidade da pessoa humana (art. 1º,
III, da CF/88). (TJ-SC - AC: 03013751220148240039 Lages 0301375-
12.2014.8.24.0039, Relator: Monteiro Rocha, Sexta Câmara de Direito Civil,
Data de Julgamento: 05/12/2017)

AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. DIREITO DE FAMÍLIA.


PATERNIDADE SOCIOAFETIVA E BIOLÓGICA. COEXISTÊNCIA.
POSSIBILIDADE. REGISTRO CIVIL. AVERBAÇÃO.1. A paternidade
socioafetiva, declarada ou não em registro público, não impede o
reconhecimento do vínculo de filiação concomitante baseado na origem
biológica, com todas as suas consequências patrimoniais e
extrapatrimoniais.2. Agravo interno não provido. (STJ: Agravo Interno no
REsp 1622330, RS 2013/0004282-2, Orgão Julgador-TERCEIRA TURMA,
Relator: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Julgamento: 12 de 12
de 2017, Publicação: 02/02/2018)
Casos de multiparentalidade vem se repetindo e ganhando notoriedade não
só no âmbito jurídico, mas também na mídia nacional. Um desses casos aconteceu
em Santa Maria região central do Rio Grande do Sul, em que uma criança passara a
ter em seu registro o nome de duas mães e um pai, segundo reportagem do G1, as
duas mães eram casadas e mantinham um relacionamento a quatro anos, possuía
uma amizade com o homem que era pai biológico da criança. Segundo relatos
dados ao portal do G1 a advogada da família disse que a gravides foi decidida entre
os três após uma concepção natural e todos as etapas, desde o enxoval até o parto,
foi feito em comum acordo entre as partes, deste modo, então antes do bebê nascer
eles buscaram o judiciário para que fosse possível reconhecer a possibilidade em se
ter duas mães no registro de nascimento. Em entrevista para o G1 o juiz Rafael
Pagnon Cunha, quem proferiu a decisão (2014, apud Cunha, 2014) disse que:

Pai e mãe é uma função acima de tudo, é um exercício de uma função,


exercício funções e de cuidados. Não importa quem o faz, mas quanto mais
gente estiver cuidando dessa criança, eu tenho certeza de que a
possibilidade de felicidade dela é bastante grande.

Em Maceió foi registrado o primeiro caso de multiparentalidade, segundo


informações do portal Alagoas 25 Horas, uma adolescente de 12 anos desejou
reconhecer seu padrasto como pai afetivo. Eles conviviam desde os três anos de
idade da jovem, os levando a buscar o judiciário para reconhecer esse vínculo.

A ação foi proposta e 2016 após a adolescente, a mãe e os pais expressarem


o desejo da paternidade afetiva e no ano de 2018 a juíza da 28° vara civil de Maceió,
Maria de Fatima Pirauá, reconheceu o pedido, dando a adolescente o direito de ter
dois pais e uma mãe em seu registro de nascimento, permitindo a inclusão do
sobrenome do padrasto ao seu. Na decisão se manteve a guarda para a mãe e o pai
afetivo e assegurando o direito de visita ao pai biológico. Em entrevista a magistrada
(2018 apud Pirauá 2018) afirmou que:

Devemos aplicar os princípios da dignidade humana, da liberdade, do


respeito à diferença, do pluralismo familiar, da proibição ao retrocesso social
e da proteção integral dos menores. Todos esses princípios possuem
fundamento constitucional e justificam a ampliação do conceito de entidade
familiar, que deve ser definida pelo amor e pela afetividade, e não apenas
pelos laços de sangue.

Na sentença a juíza valorizou o pluralismo familiar e principalmente a


transformação social de casos semelhantes traz.
Outro caso relevante aconteceu recentemente na vara única da comarca de
Teodoro no interior de São Paulo, em que o Portal Prudentino noticiou a decisão da
juíza Patrícia Érica Luna da Silva reconhecendo a existência de paternidade afetiva
e biológica de uma criança. A decisão foi dada após a mãe da menor entrar com
uma ação para reconhecer a paternidade biológica de sua filha. Segundo a
reportagem, a mãe tinha um relacionamento de mais de 10 anos com o pai afetivo e
no período da relação manteve um caso extraconjugal como o pai biológico. Tendo
dúvida quanto a paternidade buscou judicialmente descobrir a verdadeira, assim
provado que o homem como quem teve um breve relacionamento era o pai biológico
de sua filha, ela desejou que retirasse o nome do pai afetivo e substituísse pelo
biológico, porém a juíza em sua decisão determinou que se mantivesse ambos os
vínculos.

Em entrevista para o Portal Prudentino a juíza diz o porquê de sua decisão


(2018, apud Silva, 2018):

O artigo 226, parágrafo 4º, da Constituição Federal, abre a possibilidade de


constituição de novas formas de organização familiar, dentre elas o
reconhecimento judicial da multiparentalidade, que veio trazer respaldo legal
a situações fáticas existentes, em respeito ao princípio da dignidade
humana”. “Portanto, diante da realidade que se apresenta, de forma a
privilegiar a dignidade, a igualdade e a identidade, vê-se que o
reconhecimento da dupla paternidade é de rigor.

Do exposto, o reconhecimento da concomitância de filiação afetiva e biológica


vai além de privilegiar o filho em se ter múltipla parentalidade, valoriza a relação de
amor e respeito que a convivência e o tempo solidificaram entre as partes.

5. Considerações Finais

A multiparentalidade surge quando se reconhece os princípios da dignidade


humana, da afetividade e do pluralismo familiar, pois com o reconhecimento destes
é possível identificar a coexistências de vínculos parentais. Valorizando o amor e
afeto que existe em relações não consanguíneas, ao passo que essa em muitos
casos não exerça de forma efetiva seus deveres.

Quando esse tema é discutido vemos que ainda traz muitas divergências,
uma vez que uma parcela da sociedade enxerga como uma desvalorização da
família e perpetuação destorcidos da relação pais e filhos, entretanto, outra parte
desta mesma sociedade consegue visualizar a possibilidade em ampliar o amor e
cuidados daquele que é privilegiado com a existência da múltipla filiação. Assim,
quando se questiona se é aceitável a subsistência da multiparentalidade, não se
pretende indagar se isso vai afetar de forma negativa os laços biológicos, mas que
essa nova espécie de família viabiliza o desenvolvimento social pleno daquele filho
que tem um amor e afeto por aquele não compartilha vínculo consanguíneo.

Ademais, quando a jurisprudência admite essas decisões reenterradas,


basicamente está confirmando que aquele costume é relevante para sociedade e
precisa ser sedimento para melhor atender os interesses daqueles que buscam o
reconhecimento dessa realidade.

Portanto, o reconhecimento da multiparentalidade enseja na confirmação de


que nossa sociedade está evoluindo e as relações familiares também está
acompanhando esta evolução, fazendo com que o nosso ordenamento jurídico se
adeque a esta nova realidade e permita que essas relações advindas do afeto e do
amor recebam total proteção como originadas do laço de sanguíneo. Por fim, sendo
um tanto redundante, é confirmar que o afeto exerce a mesma importância de outas
relações e que precisa ser valorizado e enaltecido.
Referência

Abreu, Karina Azevedo Simões. Multiparentalidade: Conceito e consequência


jurídica de seu reconhecimento. Disponível em
<https://karinasabreu.jusbrasil.com.br/artigos/151288139/multiparentalidade-
conceito-e-consequencias-juridicas-de-seu-reconhecimento> Acesso em: 28 de
abril de 2018.

Alagoas 24 Horas. Após pedido da defensoria pública, justiça reconhece que


adolescente tem dois pais. Disponível em:
<http://www.alagoas24horas.com.br/1147836/apos-pedido-da-defensoria-publica-
justica-reconhece-que-adolescente-tem-dois-pais/> Acesso em: 7 de maio de
2018.

Brasil. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil:


promulgada em 5 de outubro de 1988. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2014.

Brasil. Código Civil (2002). Código Civil Brasileiro. 4. ed. São Paulo: Saraiva,
2014.

Cassettari, Christiano. Multiparentalidade e Parentalidade socioafetiva:


Efeitos jurídicos. 2. ed. São Paulo: Editora Atlas, 2015.
Conselho Nacional de Justiça. Provimento n° 63. Disponível em
<http://www.cnj.jus.br/busca-atos-adm?documento=3380> Acesso em: 5 de maio
de 2018.

Dias, Maria Berenice. Manual de direito das Familias. 11. ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2016.

Brasil. ECA (1990). Estatuto da Criança e do Adolescente. 4. ed. São Paulo:


Saraiva, 2014

Gonçalves, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Direito de Família. 9. ed.


São Paulo: Saraiva, 2012. V. 6

G1, Rio Grande do Sul. Após decisão da justiça, bebê é registrada com duas
mães e um pai. Disponível em
<http://g1.globo.com/rs/rio-grande-do-sul/noticia/2014/09/apos-decisao-da-
justica-bebe-sera-registrada-com-duas-maes-e-um-pai.html> Acesso em: 7 de
maio de 2018

Portal Prudentino. Justiça reconhece caso de multiparentalidade na região.


Disponível em <http://portalprudentino.com.br/noticia/noticias.php?
id=49452&titulo=justi%E7a-reconhece-caso-de-multiparentalidade-na-regi%E3o>
Acesso em: 7 de maio 2018

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