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Introdução

Esta cadeira relaciona-se com a cadeira de Teoria Geral do Negócio Jurídico, uma vez que uma
das figuras primordiais do Direito da Família é o contrato de casamento (matéria da formação do
negócio, da forma negocial e patologias do negócio jurídico- erro, simulação, etc).

Novidades e figuras relevantes no Direito da Família:

o Figura da união de facto

o Casamento entre pessoas do mesmo sexo (antes era considerado inexistência jurídica)

o Recurso às técnicas de procriação medicamente assistida

o Maternidade de substituição (recurso a uma terceira que vai funcionar como


‘’hospedeira’’ da criança; barriga de aluguer)- Esta figura coloca questões de ordem
moral e de ordem ética. A possibilidade de esta terceira vir a renunciar, à partigoida,
antes de a criança nascer, os seus direitos como mãe, viola o artigo 288º do CC. Temos
uma renúncia antecipada ao exercício de um direito, considerada, em regra, nula. Por
otro lado, temos uma proibição de o filho descobrir a sua identidade biológica e origem
genética, sendo uma violação do direito de autodeterminação e identidade pessoal. Este
diploma põe em causa uma série de postulados basilares do nosso Direito. No entanto,
são lei, e, como tal, vigentes (o que não significa que não possam ser questionados).

o Acções de investigação de paternidade: sempre que alguém entende ser filho de alguém
que não o periflhou, e, a partigoir do momento em que tem informações suficientes para
o efeito, pretende intentar uma acção que visa obter uma sentença que delcare que
aquele senhor é o seu Pai. Este meio está previsto nos artigos 1871º e ss. Esta figura traz
o problema da admissibilidade do prazo de caducidade. Estas acções só podem ser
intentadas dentro de um período temporal, fim do qual caduca o direito de acção. Este
problema tem sido objecto de alterações legislativas com o efeito de alargar o prazo de
caducidade. Temos uma colisão entre 2 direitos com a mesma natureza, são ambos
direitos de personalidade e são ambos direitos fundamentais: por um lado, o direito à
autodeterminação do filho que pretende exercer o seu poder jurídico a ser tratado e ser
reconhecido como filho de certa pessoa e, por outro, o direito à autodeterminação do
pretendo pai que pretende continuar sem ser tratado como pai daquela criança, porque
evidentemente não o é.
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O Objecto e as Características do Direito da Família

Esta disciplina vai ter como núcleo estruturante a família, ou seja, esta realidade social que é
relevante para o Direito. O primeiro problema resulta do facto de não haver uma noção de família. Não
temos uma noção de família no Código Civil de que nos possamos socorrer.

O que Código Civil apenas faz, de forma “errada”, no artigo 1576º, é elencar as fontes das
relações jurídico-familiares. O problema desta norma é pode levar ao erro de confundir o conceito de
família com o conceito de fonte de relações jurídico-familiares.
São realidades que têm de estar separadas. A única coisa que este artigo vem fazer, de forma
incompleta e desactualizada, é enumerar algumas fontes de relações jurídico-familiares.

Como foi estudado em TGNJ, o facto jurídico é dado como referência ao critério da fonte. Temos
os factos naturais, os factos voluntários, factos voluntários simples (actos jurídicos) e o negócio jurídico.

Portanto, aqui temos a fonte. Temos aqui o facto juridicamente relavante que permite constituir
vínculos intersubjectivos familiares.

Conceito de Família

O conceito de família é um conceito polissémico.

1) Conceito circunscrito/em sentido estrito - Família conjugal (que resulta do


casamento, constituída pelos cônjuges e pelos eventuais filhos)

2) Microfamília ou família nuclear - É, para muitos autores, aquele que está subjacente
ao artigo 36º da CRP. Constituído por Pai, Mãe e filhos. O que significa que podemos ter
um conceito de família em sentido horizontal (Pai e Mãe) e vertical (filhos) fora do
casamento. O que releva nesta acepção é tão-somente os laços de filiação criados entre
duas pessoas e os seus filhos.

3) Conceito em sentido amplo - Conceito alargado, que vem renovar outros indivíduos
ligados aos membros da família nuclear por laços de parentesco. Vamos encontrar aqui
os avós, os tios, os primos, os sobrinhos, os cunhados, os sogros, no fundo, todos os
membros da família que, normalmente, vivem em células familiares distintas, mas que
se reúnem periodicamente.

4) Conceito de família em sentido afectivo - Este conceito vai renovar os laços e vínculos
entre indivíduos que não estão unidos por relações de consanguinidade. Família afectiva
são aqueles que se relacionam entre si como tal mas não estão unidos por laços de
consanguinidade. Exemplo: padrasto e madrasta e filhos do marido ou da mulher;
vizinhos que acompanham diariamente a vida de algum dos membros da família,
funcionários domésticos (cuidadores), etc.
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5) Família como instituição - A instituição é muito difícil de definir. Existe uma instituição
jurídica quando se consegue individualizar um conjunto de normas e princípios
estruturantes que dêem uma identidade própria àquela realidade social.

o Existe um princípio de protecção e de intangibilidade das instituições


jurídicas.

o Não podem ser eliminadas, não podem ser comprimidas no seu âmbito de
acção.

o Existe um poder/dever do Estado de as proteger e de as tutelar.

o Esta acepção de família como instituição é a que está consagrado no artigo


67º do texto da CRP. Este artigo releva a família como célula básica da
sociedade, como realidade pré-existente ao Estado, designadamente ao
Estado-Legislador. Ideia segundo a qual a família é anterior ao Estado, é
independente de valorações políticas ou partigoidárias, tem de ser relevada
como uma realidade em si mesmo, objectiva e, sendo uma realidade
institucional, a única coisa que se admite é uma actualização do conteúdo
desta célula básica da sociedade, conferindo maiores direitos, maiores
faculdades, e nunca reduzindo os direitos, faculdades ou as liberdades
concedidas. Portanto, admitem-se alterações por aditamento e nunca por
supressão.

o Este artigo 67º foi uma norma central na discussão sobre o casamento
homossexual, pois dizia-se que, ao admitir o casamento entre pessoas do
mesmo sexo se estava a descaracterizar a instituição da família, que tinha
traços próprios, designadamente a existência de uma relação heterossexual.
Este foi um argumento normativo nesse debate. Seria uma “machadada” no
conceito de família. A resposta foi no sentido de chamar a atenção de que em
nada se descaracterizava a família, porque precisamente o que estava a fazer
era expandir o perímetro/o conceito de família a indivíduos ligados
afectivamente, de modo a que pudessem ser captados autonomamente como
família, assente no casamento.

Assim, temos uma primeira conclusão: Não existe um conceito universal de família no Direito
Português. Não existe sequer um conceito harmonizado no Direito Europeu. Aliás, os temas familiares e
acessórios são dificilmente objecto de harmonizações legislativas no plano europeu porque são
marcadamente ideológicos. Temos países com diferentes opções ideológicas em matéria de família,
mais ou menos conservadores. Costuma ser matéria deixada à soberania dos Estados.

Algumas normas desde já importantes:

Artigo 1887º-A do CC (Convívio com irmãos e ascendetes)


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 Esta norma foi introduzida em 1995. Tem sido reiteradamente invocada. Existe o fenómeno
da alienação parental. Sempre que existe uma ruptura entre o casal, muitas vezes
intrumentaliza-se a criança em favor dos interesses.

 Esta norma vem conferir um direito subjectivo, permitindo que sempre que haja uma
privação injustificada do convívio, haja lugar ao direito de acção.

Artigo 68º da CRP

 Se a família é o núcleo da sociedade, e se o artigo 67º proclama um equilíbrio entre a


vida profissional e a vida pessoal, incumbe ao Estado garantir condições políticas sérias
de apoio à parentalidade (maternidade e paternidade)

 É necessário que o Estado intervenha, mesmo nas relações jurídico-privadas, de forma a que
os Pais possam “exercer a sua insubstituível acção em relação aos filhos”.

 O Estado não se pode limitar a garantir equipamentos sociais. É necessário que os Pais
possam estar com os filhos.

Artigos 69º a 72º CRP : regulação dos limites etários na vida de um membro da família

 Infância, juventude e terceira idade

 Estas normas são corolários do artigo 67º da CRP

Artigo72º CRP (Tutela da terceira idade)

 Tema do problema da intervenção do Estado nas relações estritamente privadas entre os


membros da família

 Saber até que ponto é legítimo o Estado não se imiscuir nesta relação e permitir
passivamente o isolamento e abandono dos idosos

 Cada vez mais se promove uma política intervencionista no domínio da terceira idade,
fiscalizando os agregados familiares, sancionando os membros da família pelas políticas que
adoptem.

 Numa visão clássica do direito da família, o estado não podia intervir nas relações privadas.
No entanto, superou-se a ideia de que as relações familiares são estritamente privadas. Não
o são sempre que estejam em causa valores gerais e direitos fundamentais dos membros da
família.

O que estivemos a tratar até agora é da família na sua dimensão institucional. Mas esta
dimensão convive com a dimensão subjectiva individual. Isto significa que cada membro da família
tem de ser relevado autonomamente como tal, com direitos e obrigações próprios. Esta sua dimensão
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individual permite concretamente que haja uma reacção sempre que estejam postos em causa direitos
subjectivos dos membros da família. Exemplo: Se um Pai ou uma Mãe maltratam o filho menor à sua
guarda, existe o poder-dever de terceiros denunciarem a situação ou do próprio que esteja a ser objecto
de abusos. O Estado intervém nesta medida. Existe uma dimensão individual que nos permite ser
titulares de direitos subjectivos a exercer, na relação não só com o Estado mas nas relações com os
demais membros da família.

Em suma:

1) Conceito equívoco de família (convoca diferentes acepções)

2) Não existe uma noção legal de família a que se possa recorrer

3) As fontes das relações familiares em nada se confundem com o conceito de família

4) O Direito Constitucional parece dar primazia, no artigo 37º, à chamada família


nuclear/micro-família

5) O artigo 67º da CRP releva a família na sua dimensão institucional (família como
instituição)

6) Quer o artigo 36º, quer concretamente o artigo 26º, permitem reconhecer e


afirmar a dimensão individual ou subjectiva de família, garantindo aos membros da
família direitos a exercer na relação entre si ou entre terceiros.

7) É importante relevar, ao lado do conceito jurídico restrito de família, também


vínculos não estritamente jurídicos, como os vínculos afectivos. Hoje em dia, têm
verdadeira autonomia jurídica os laços não consanguíneos entre pessoas,
permitindo relevar o conceito de família afectiva.

Força Expansiva do Direito da Família

Hoje em dia, não podemos ter uma visão redutora, nem do conceito de família, nem do ramo de
direito que se ocupa da família, que se identifique com a visão clássica. Actualmente, estudar Direito da
Família tem de ser muito mais do que estudar as relações de parentesco, de afinidade, de adopção.
Existe um conjunto de realidades centrais que abriram o perímetro do direito da família como a união
de facto.

A união de facto tem sido uma figura bastante recorrente nos dias de hoje. O casamento, neste
sentido, está em declínio. O intérprete não pode fechar os olhos a esta realidade cada vez mais relevante
e que continua a ser discriminada no plano normativo. Exemplo: Duas pessoas que vivam em união de
facto, com comunhão de tecto, cama e mesa, há mais de 3 anos, se uma delas falecer, mesmo que com
filhos nascidos, o membro sobrevivo é tratado de forma absolutamente desiquilibrada em relação ao
cônjuge sobrevivo, se por exemplo o unido de facto morre, tinha um automóvel e contas bancárias, o
sobrevivo não tem direito a nada, ainda que tenham, durante 12 anos, todos os dias, partilhado
despesas e responsabilidades. No plano normativo, as únicas coisas que se prevêem são: a transmissão
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do arrendamento por morte, a possibilidade de o cônjuge sobrevivo permanecer na casa durante um


determinado período de tempo, e eventuais pensões da segurança social em certos casos. Não há
direitos sucessórios. O unido de facto não é sucessível legitimário.

Outra realidade importante é a chamada convivência em economia comum (ex: estudantes


que partilham apartamento). Dependendo dos contornos em questão, não pressupõe comunhão de
leito, mas implica uma partilha de meios.1

Outra figura é o apadrinhamento civil. Trata-se de uma relação jurídica objecto de norma
própria desde 2009. Vai-se conferir juridicidade aos laços afectivos entre dois indivíduos, que vão ser
qualificados como de padrinho e afilhado (não de baptismo). É uma relação jurídica que permite a
alguém, que não seja concretamente ligado por laços de sague, apadrinhar uma criança e acompanhá-la,
ajudando na sua educação, no seu sustento, até à sua idade adulta. É uma nova relação jurídica com
relevância familiar.

Outros vínculos juridicamente relevantes:

 Relação entre aqueles que estão prometidos um ao outro para casamento -


Promessa de casamento

 Relação entre ex-cônjugues (mesmo que não haja filhos) - Há um conjunto de


direitos subjectivos que se podem constituir e que continuam a subsistir,
designadamente o direito a alimentos, no termo do casamento. Se houver filhos,
continua a haver responsabilidades parentais e obrigação de alimentos.

 Relação entre tutor e tutelado

 Relação entre a pessoa que sustenta e a pessoa criada e sustentada por outrem

 Dissociação entre aqueles que são os titulares de responsabilidades parentais e


aquele que cuida efectivamente e sustenta, seja uma criança, seja uma pessoa idosa.

 Relação com pessoa a cargo de outrem (não é objecto de normas especiais)

Definição de Direito da Família

É um ramo de direito privado, aplica-se predominantemente às relações estabelecidas entre


particulares. É um ramo de direito civil comum, pois filia-se no direito civil, tendo autonomia
conceptual dentro deste, como um dos seus ramos.

1 Compras do supermercado, gás, electricidade...


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Tem por objeto primordial o estudo da realidade da família. Mas o que é que é a família em
termos jurídicos?

Há várias realidades que permitem qualificar a essência de uma família. São realidades que são
objeto do direito da família, visto que qualificam a essência de uma família:

1)Relação de parentesco – Dentro desta acepção, família é a ligação entre duas ou mais
pessoas unidas por laços sanguíneos.

2)Adoção – é uma modalidade de filiação, isto é, é uma fonte de relações que se estabelecem
verticalmente entre alguém que tem qualificativo de pai, e outrem que vai ser tratado como seu
filho. Portanto, a diferença é ter fonte na lei. É uma modalidade de filiação jurídico-legal, visto
ser alheia a laços sanguíneos, contrapõem-se à filiação biológica. Não pode haver discriminação
entre filhos naturais ou adoptivos.2

3)Casamento – O contrato de casamento, é a união de duas pessoas para constituir família, é a


fonte desta relação jurídica.

Portanto, o direito da família vai regular relações entre indivíduos unidos por laços sanguíneos
(relação de parentesco) ou laços criados por efeitos da celebração do contrato (casamento) ou ainda
laços criados por força da lei (adoção).

4)Relações estabelecidas com terceiros relativamente aos quais não exista, nem um
vínculo jurídico-legal, nem um vínculo consanguíneo

5)União de facto – Temos a união de duas pessoas para constituir família, mas sem qualquer
assente contratual. Temos uma comunhão em 3 planos:

a) Comunhão de teto (residência comum),

b) Mesa (dever de cooperação, assistência mutua),

c) Cama (não basta ser uma relação afetiva, estamos a falar de uma comunhão de leito)

6)Convivência em Economia comum –É diferente de união de facto. A convivência em


economia comum é uma forma de comunhão, próxima da união de facto porque também não é
contratualizada, mas difere desta, pois não existe uma comunhão plena. Desde logo, no plano
do leito, não existe comunhão de leito. Exemplo: Pode suceder entre 2 amigos que decidem
compartigoilhar despesas num espaço , vivendo sobre o mesmo teto.

7)Afinidade – 1584º CC é definido como o vínculo que liga cada um dos cônjuges aos parentes
do outro. Esta afinidade é uma fonte de relações jurídico familiares.

Mais sistematizadamente, o Direito da Família é um ramo de direito privado, um ramo de


direito civil, que tem o assento normativo no livro IV do CC (1576º a 2023º) e tem como objeto o
estudo da família. Tal como já vimos, a família é um conceito jurídico que não é objecto de uma única

2 Artigo 36º da Constituição.


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definição legal, como tal, nós não temos legitimidade para circunscrever o direito da família a apenas
uma aceção de família.
Deve ser aliás considerado inconstitucional circunscrever o direito da família ao âmbito
tradicional (anterior às reformas), pois hoje o direito da família não estuda apenas a família conjugal (a
que resulta do casamento) ou apenas a nuclear (a que se estabelece verticalmente entre os pais e os
filhos.).

Também não é hoje concebível que o direito da família se circunscreva hoje em dia a laços de
consanguinidade, isso vale apenas para os vínculos de parentesco, artigo 1578º. Hoje em dia, as
realidades mais relevantes em termos quantitativos são as que realidades que resultam por força da lei
(adoção, união de facto, convivência em economia comum, apadrinhamento civil).

Nesta matéria o nosso Código Civil está desatualizado, como tal, para estudar bem o direito
da família não nos podemos circunscrever ao Código Civil. Foi uma opção do legislador não integrar no
Código Civil essas realidades da união de facto, convivência em economia comum, apadrinhamento civil.
Mesmo o regime jurídico da adoção consta de uma lei ordinária.

Para estudar o conceito de família juridicamente relevante devemos inspirar-nos no texto


constitucional, onde temos fundamentalmente 5 aceções de família que já vimos supra.

As divisões do Direito da Família

Programa Adoptado

Este ano lectivo, na regência da Professora Ana Filipa Morais Antunes, no nosso curso de Direito
da Família da Universidade Católica vamos dividir o nosso estudo em quatro grandes capítulos:

1) Introdução – pretende-se dar noções gerais sobre o conceito, objecto e princípios deste ramo.

2) Estudo das vinculações intersubjectivas - isto é, das relações que se estabelecem no direito da
família, e não são apenas as relações elencadas no 1576º CC. A professora Ana Filipa trata aliás
da união de facto e convivência em economia comum como verdadeira e própria relação
familiar, e não como relação parafamiliar

3) Casamento

4) Filiação – vai ser tratado lado a lado, a filiação biológica e a jurídico legal, portanto, o estudo da
adoção é remetido para o final do nosso programa.
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Livro Quatro do Código Civil

O Livro IV do Código Civil tem o nome de “Direito da Família”. É este livro que será o foco
principal do nosso estudo. A organização deste é feita da seguinte forma:

1)Relações familiares , 1576º a 1586º - que se fundamentam no critério da fonte das relações
jurídico-familiares, e o legislador elenca apenas 4. O 1576º elenca uma lista de fontes de
relações jurídico familiar, que é uma lista tipificada, mas esta tipificação não é taxativa, pelo
contrário é uma tipicidade enunciativa.

2)Casamento, artigos 1587 a 1795º-D Vai ser tratado de forma bicéfala, temos aspectos
relativos ao casamento católico e o civil. 3

3)Filiação, artigo 1796º a 1972º

4)Adopção , artigo 1973º a 2002º-D

5)Obrigação de alimentos, 2003º a 2023º

Deixar nota que o Código foi alvo de uma alteração legislativa em 1977, pois a CRP determinou
uma alteração no paradigma do direito da família em 3 planos:

1) No plano da filiação biológica e jurídico legal, pois a CRP vem ela própria interessar-se
pelo tema da adopção

2) No plano do casamento, que se caracterizava por um paradigma desequilibrado, ou seja,


havia uma repartigoição de tarefas entre o marido e a mulher que tinha de ser respeitada. Ao
marido incumbia o sustento da família, administrar os bens da família. À mulher incumbia o
governo doméstico, a mulher não podia abrir contas bancarias, não podia realizar atos de
despesa que não fossem autorizados pelo marido. Houve alteração deste paradigma devido ao
artigo 36º3 da CRP.

Para além da reforma de 77 ocorreram ainda 3 alterações:

1º - Alteração da noção de casamento em 2001 com abertura às uniões homossexuais

2º - Em matéria de divórcio, veio-se afastar o divorcio sanção assente na violação culposa dos
deveres conjugais. Antigamente esta era a única forma, de não havendo acordo, uma pessoa se
divorciar.

3º - Em matéria de adopção. Durante muito tempo existiram duas modalidades de adoção:

a) a restrita – o adotando nunca era considerado membro, com pleno direito, da família
onde era recebido. Portanto, não perdia o vínculo com a família de origem.

3 Hoje em dia é regulado por um regime jurídico especial


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b)plena – criança adotada passa a integrar de pleno a família que o recebia.

Hoje em dia não existe esta distinção, toda e qualquer adoção é plena.

Projeção do Direito da Família com outros ramos do direito

1º - Direito civil – Há normas relevantes nos outros ramos do direito civil:

1)na teoria geral do direito civil, e vamos ver a influência da teoria geral na formação
do casamento. Em matéria de vícios e patologias negociais (1631º e seguintes)

2)Direito das obrigações - vamos buscar a este a matéria da responsabilidade por


dívidas.

3)Direitos Reais – Aqui interessam as formas de aquisição e transmissão do direito de


propriedade em vida, porque por efeitos do casamento, os cônjuges vão adquirir um
conjunto de bens e é preciso perceber qual é o título de aquisição, para também depois
falarmos da administração dos bens do casal.

4)Sucessões – Aqui importante é percebermos o conceito de herdeiros e perceber que o


direito das sucessões está inspirado ainda pela ideia de manutenção do património
adquirido em vida na família, a ideia é que haja uma devolução sucessória
primordialmente para os membros da família.

2º - Direito Constitucional – vai relevar no plano dos Direitos e liberdades fundamentais –


DLG(24º e ss) + 67 a 72º que tratam da família, paternidade e maternidade etc... + 63º + 64º
esta norma que impõe ao estado uma politica fiscal que seja orientada para a família

3º Direito Penal – Relevam aqui crimes conjugais, crimes relativamente aos filhos, crimes que
sejam praticados contra uma criança menor (prostituição de menores, violação etc..). Coação de
casamento, todas essas normas são relevantes aqui.

4º - Direito comercial – Sempre que um cônjuge seja comerciante, isto é, pratique atos de
comércio, seja a titulo individual, seja no corpo de uma empresa, existem implicações em
matéria de responsabilidade por dividas. Artigo 13º + 230º do Codigo Comercial vão ser
relevantes.

5º - Direito das Sociedades Comerciais – Artigo 8º vem esclarecer os termos da constituição


de sociedades comerciais entre cônjuges. Também será importante para suportar certas teses
que iremos ver infra.

6º - Direito do trabalho – interessa-se pelos apoios à parentalidade.


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7º - Direito Fiscal – há um modelo diferenciado para a tributação dos cônjuges e também para
os membros da união de facto.4

8º - Direito Processual Civil – sempre que um cônjuge seja devedor, e não pague
atempadamente as suas dívidas, tendo sido condenado por sentença transitada em julgado, ele
pode ser executado. Para além disso, pode ser executado o seu cônjuge.

9º - Direito registal – Vai ser importante o Código do Registo civil, em matéria do nascimento
de crianças, filiação, contrato do casamento, alteração do nome depois do casamento, divorcio,
partigoilhas etc. Tudo isso é regulado aqui.

10 º -Direito da Providência social – artigo 63º da CRP.

Notas Distintivas do Direito da Família

Temos 11 notas distintivas:

1º - Dimensão institucional – Releva a circunstância de a família ser uma garantia


institucional. A família é uma realidade social, pré existente ao estado e que titula situações
jurídicas ativas (direitos) exercitáveis na relação com o estado. A família deve ser objecto de
proteção normativa.

2º - Dimensão individual ou subjectiva – O indivíduo, os seus interesses e necessidades, têm


de ser respeitados e conciliados com a existência da família. É por esta razão que conseguimos
perceber que pela circunstância de um pai e de uma mãe serem trabalhadores, portanto terem
uma vida profissional ativa, isto não pode significar que tenham um horário que leve a que não
vejam os filhos. Porque aí, está a ser posta em causa os interesses dos filhos relativamente aos
pais e o próprio interesse dos pais em querer estar com os filhos.

3º - Imperatividade das normas jurídicas – O direito da família é um dos ramos do direito


civil, que se caracteriza por um predomínio de normas injuntivas, ou seja, não podem ser
afastadas por vontade das partigoes. Isto significa, que aquela tipicidade de relações jurídico-
familiares, ainda que enunciativa do 1576º, não pode ser desrespeitada, isto é, as relações
jurídico-familiares existem, e quem quiser aderir a essas, vai aderir com um conteúdo
fundamentalmente vinculado. Claro que esta imperatividade não prejudica que haja liberdade
contratual em alguma medida, vai haver, vai é estar muito mais reduzida do que em Direito das
Obrigações por exemplo.

4º - Tipicidade – O direito da família caracteriza-se por um princípio de tipicidade, existem


figuras com conteúdo vinculado que tem de ser respeitado pelas partigoes. Esta tipicidade é
sinónima de uma descrição legal, que na generalidade dos casos é acompanhada de um nome
legal. Essas figuras existem com um nome dado pelo legislador.

4 Ver o “splitting” estudado a Fiscal em sede de IRS no semestre passado por exemplo.
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5º - Significativa restrição da autonomia contratual – A liberdade contratual é inexistente no


que diz respeito à esfera pessoal, mas existe com algumas limitações na esfera patrimonial.
Exemplo: Possibilidade dos cônjuges optarem por uma convenção antenupcial5. Mas mesmo na
convenção antenupcial existe um principio de liberdade, mas com fortes restrições 1699º +
1714º + 1715º são 3 normas que são excecionais ao principio da liberdade. Portanto,
também aqui existem normas imperativas.

Quanto ao casamento, existe liberdade de celebração, mas não existe liberdade de


estipulação no estatuto pessoal, apenas no estatuto patrimonial através da convenção
antenupcial. Portanto os cônjuges podem:

i. Casar e não celebrar a convenção antenupcial e nessa medida nem


sequer vão decidir as relações patrimoniais porque se aplica o regime
supletivo, comunhão de adquiridos, artigo 1717º e seguintes.

ii. Se não quiserem o regime da comunhão de adquiridos fazem uma


convenção antenupcial.

6º - Eficácia absoluta dos estados familiares pessoais – Quando estamos a relevar o conceito
de eficácia, é uma eficácia no sentido de que qualquer destes estados familiares é
suscetível de ser oponível erga omnes. É a ideia de absolutidade destes estados familiares.

A circunstancia de ser casado, ser pai, ser unido de facto etc.. é uma qualidade que pode ser
invocada e tem de ser respeitada por qualquer pessoa, independentemente de se configurar
uma relação jurídica entre si. Isto, não prejudica em nada, que exista uma relatividade das
situações jurídicas.

Ou seja, se a mulher falta ao respeito ao marido, viola um dever de fidelidade, por exemplo, a
violação deste dever gera uma responsabilidade obrigacional.

Portanto, a circunstancia de ser cônjuge é um estado familiar absoluto, mas no campo


intersubjectivo as situações são relativas, portanto dão origem a pretensões
indemnizatórias no campo obrigacional.

7º - O direito da família é um ramo de direito onde proliferam conceito indeterminados –


Os conceitos indeterminados são uma técnica legislativa que visa a atualização do direito.
Vemos o mesmo tipo de técnica em cadeiras como Direito do Trabalho que estudámos este
semestre.

Exemplos:

1577º - “plena comunhão de vida” – a doutrina e jurisprudência tem dito que esta plena
comunhão é a dos 3 pilares.

1878º nº2 – “Assunto familiar importante”

5 1698º e seguintes
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1901º nº2 – “Questões de partigoicular importância”

1974º nº1 – “Superior interesse da criança”

8º - O direito da família é um ramo de direito que não é estático, é dinâmico. São as


alterações que ocorrem no ceio da sociedade civil que justificam as alterações legislativas.

9º - A interferência do Estado nas relações familiares privadas, esta intervenção do estado


legítima que se autonomize uma nota que é a hétero regulamentação do direito da família.
Ninguém defende hoje em dia que o direito da família é um direito estritamente de
relações privadas e de auto regulamentação, pelo contrário, o Estado intervém, seja para
premiar ou sancionar comportamentos familiares.

10º - Coexistência entre o direito civil e o direito canónico, temos duas ordens normativas
no direito da família a conviverem uma com a outra. O direito civil que regula o casamento civil,
mas que também reconhece os efeitos do casamento católico, que por sua vez é regulado pelo
direito canónico.

11º - No plano da jurisdição, dos tribunais competentes, o direito da família também tem uma
jurisdição especializada, que são os Tribunais da Família e de Menores.

A Relação entre Direito da Família e Direitos Familiares

Os “estados de família” e as situações jurídicas familiares – elenco e


caracterização

O estado civil é uma das modalidades possíveis da relevância do estado pessoal, sendo que
aqui conseguimos captar os sujeitos da categoria de casados, solteiros, divorciados ou viúvos.

Conceito de estado de família: Um estado é em primeiro lugar uma posição jurídica que
assenta na relação entre de um determinado sujeito e um determinado bem jurídico. Ou seja,
“estado” é um conceito relacional, sendo que quando se apela ao conceito de bem jurídico não se apela
ao conceito de coisa, já que este pode ser, quer uma coisa, quer uma prestação, sendo esse segundo
termo que releva no domínio do Direito da Família.
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É a prestação que caracteriza este vínculo obrigacional. 6 Assim sendo, o que vamos privilegiar
no âmbito do direito da família são estados familiares, ou seja, a posição em que cada sujeito que
merece a qualificação de membro da família tem relativamente a certos bens jurídicos
familiares.
Esta posição jurídica, relativa ao conceito de estado, é depois qualificado por 4 notas essências:

1º Complexa: Implica um acervo de situações jurídicas, quer ativas, quer passivas, de


distinta natureza. Ou seja, no estado de casado vamos encontrar os direitos de exigir a
fidelidade, o respeito, a cooperação entre outros. Que são direitos subjetivos em sentido
estrito, e onde vamos encontrar as obrigações correspetivas, as de respeitar, cooperar,
ser fiel, etc. – Binómio Direito Subjectivo/Obrigação.

Vamos também encontrar direitos potestativos, como por exemplo o de propor uma
ação de anulação do casamento, de responsabilidade civil, de propor uma ação de
divórcio…

Uma das obrigações mais relevantes no domínio da relação matrimonial é a obrigação


de alimentos, que é regulada em sede de regime comum nos artigos 2013º e
seguintes do CC. Esta é mais um exemplo de uma obrigação em sentido técnico, e de
uma obrigação jurídica passiva que está integrada neste estado familiar.

A ideia é de que o estado familiar é a situação jurídica complexa que não se reduz nem à
titularidade apenas de direitos subjetivos ou à adstrição apenas de situações passivas.
Vamos encontrar uma pluralidade de ambas estas situações neste domínio.

2º Pessoal: Significa que estas situações jurídicas são insuscetíveis de uma avaliação
pecuniária. Ou seja, estamos num conceito de não patrimonialidade. Qualquer um destes
direitos, obrigações/deveres jurídicos, não pode ser convertido numa expressão
numérica, ainda que possa dar origem a uma ação de responsabilidade civil 7.

3º Duradoura: Os estados familiares, tipicamente, não são posições instantâneas que se


constituem e extinguem no mesmo espaço de tempo ou num espaço de tempo não
assinalável. A ideia é de que estas posições jurídicas se prolongam durante um período
de tempo sem um termo relevante definido.

4º São dotadas de eficácia absoluta no que diz respeito ao dever genérico de


respeitar: Todas estas posições jurídicas (de sermos filhos, Pais, casados) devem ser
respeitadas por todos, independentemente de qualquer nexo relacional concreto.
Oponibilidade erga omnes.

Assim sendo, podemos considerar que o estado familiar é uma qualidade fundamental
das pessoas que estejam vinculadas a uma relação familiar ou com relevância familiar.

6 Ver artigo 397º do CC face ao conteúdo de uma prestação.


7 Como é expressão o constante do artigo 496º onde se podem indemnizar danos não patrimoniais
16

Direitos Familiares

O conceito de estado familiar distingue-se de Direitos Familiares: O estado é esta posição


jurídica complexa sendo que dentro dela vamos encontrar imensas situações jurídicas entre as quais as
situações ativas, sendo que as mais importantes são os direitos familiares. Ou seja, este segundo
conceito integra o conteúdo do primeiro

Os direitos familiares são situações jurídicas ativas tituladas por um indivíduo que seja partigoe
de uma relação jurídica familiar ou com relevância familiar, sendo que estes tanto podem ser:

1º, Direitos pessoais – Caraterizam-se por 7 notas essenciais:

1º Não patrimonialidade

2º Indisponibilidade: Trata-se de uma indisponibilidade qualificada que se traduz em


3 caraterísticas essenciais:

1º Inaliabilidade: Estes direitos não podem ser transmitidos nem inter vivos
nem mortis causa; Indisponibilidade por razões de interesse geral.

2º Irrenunciabilidade: Não é possível renunciar à titularidade destes direitos


familiares pessoais. É possível verificarem-se situações de não exercício, mas
nunca pode haver uma renúncia á titularidade destes direitos;

3º Imprescritíveis: Estes direitos não se extinguem pelo decurso do tempo, tal


como resulta da letra expressa do artigo 298º nº1 à contrário do CC

Estes são ainda direitos de exercício vinculado, o que se trata de um corolário da


nota da irrenunciabilidade. Tal como não podemos abdicar da titularidade
destes direitos, eles devem ser exercidos nos termos e para os efeitos definidos
na lei, porque estamos perante uma matéria que se caracteriza pelo Princípio da
Tipicidade, de conteúdo vinculado e obrigatório.

Podemos considerar que existe a este respeito uma reminiscência de uma figura
denominada de poder funcional, onde encontramos as figuras dos
poderes/deveres que implicam para o seu titular a necessidade de atuação
tendo em vista a satisfação de interesse de outrem/altruístas. Exemplo: No
domínio das responsabilidades parentais existe um conjunto de situações
jurídicas que se caraterizam como sendo verdadeiros poderes funcionais.

Todas as diretrizes enunciadas nos artigos 1874º e seguintes, não se tratam de


situações jurídicas que os Pais possam decidir a seu belo prazer. Elas são
diferidas em razão da circunstância das crianças até aos 18 anos
precisarem de ser cuidadas por alguém. Existe aqui uma dissociação entre a
titularidade e o interesse que é satisfeito.
17

3º Por outro lado, estamos perante direitos de caracter duradouro8: Assim, os


direitos familiares pessoais são direitos estáveis, que se destinam a prolongar durante
toda a vigência da relação jurídica patrimonial.

4º Estes direitos são ainda relativos no que diz respeito ao plano da eficácia, ou
seja, a sua violação gera consequência que têm de ser executadas no plano da relação
com o sujeito que é contrapartigoe dessa relação. Existe aqui uma eficácia relativa.

5º Tratam-se ainda de direitos típicos, que estão escritos na Lei e que lhes associa um
determinado nomen Iuris. São por isso direitos típicos e nominados

2º Direitos patrimoniais: São os que são suscetíveis de uma avaliação pecuniária e onde
encontramos 2 grandes situações relevantes:

1º Obrigação de alimentos, artigos 2013º e seguintes.

2º Obrigação de indemnizar

Estas obrigações de natureza patrimonial são também elas relativas na medida em que só
podem ser atuadas e exigidas relativamente à parte que é devedora das mesmas.

As implicações em matéria de direitos da personalidade e de direitos


fundamentais

Temos diferentes estados familiares, que se tratam das qualidades fundamentais de um sujeito
perante um determinado bem que tem as características supra expostas, e entre estes direitos
familiares há quem questione se podemos admitir uma coincidência entre os conceitos de direitos
familiares pessoais e de personalidade.

Os direitos de personalidade são situações jurídicas ativas que se constituem sobre bens
jurídicos eminentemente pessoais, são relativos à personalidade, seja ela física ou moral. Têm um
regime jurídico próprio constante dos artigos 70º a 81º do CC.
Alguma Jurisprudência, sempre que estão em causa ações em que se alega a violação de um
direito familiar, entende que o regime jurídico dos direitos de personalidade não tem aplicação nestes
casos concretos, porque se deve observar exclusivamente as posições do Direito Familiar. Assim, só nos
casos em que o legislador vem admitir uma tutela é que ela deve ser concedida, e que se tratam dos
casos expressamente previstos no Livro IV.
Esta não é, contudo, a única visão suscetível de ser defendida nesta matéria não sendo a
que a Professora Ana Filipa defende. A Professora acha que existe a necessidade de dissociar o
conceito de direitos familiares do conceito de direitos de personalidade porque não são
conceitos simétricos. Por essa razão, isto significa que no caso concreto, se eu tiver a violação de um

8Vimos há pouco esta nota quanto ao conceito de estado. Faz sentido que se os direitos familiares fazem parte do
conceito de Estado Familiar então estes segundos sejam duradouros sendo os primeiro duradouros.
18

direito familiar, têm de ser reconhecidos diferentes meios de tutela jurídica, antes de mais aqueles
que são garantidos pelo direito da familiar, mas para além do mais, aqueles que são garantidos
pelo regime comum dos direitos de personalidade.

Por exemplo, temos os artigos 1671º, 1672º e 1674º. António todos os dias, quando regressa
do trabalho senta-se no sofá pega numa cerveja mete os pés em cima da mesa e não fala com a mulher,
não trata dos filhos menores porque vem cansado do emprego. Quid Iuris?
Pelo artigo 1674º: Podia estar aqui em casa o dever de cooperação, já que numa família cada
um tem uma quota-partigoe de responsabilidade, e não se pode assumir que é a mulher que tem de
fazer todas as tarefas domésticas.
Podia-se ainda individualizar a violação de outros deveres, tais como: União de mesa: Se ele não
se sentar à mesa com a família; Igualdade, Dever de respeito: O direito fundamental ou princípio que
inspira esta dever de respeito é o direito ao bom nome que é uma componente da personalidade
que se trata da integridade moral – artigo 25º da CRP: Tutela a integridade física ou moral, que é
replicada no artigo 26º e que tem consagração no artigo 70º do Código Civil.
Se este dever de respeitar outrem existe na sociedade em geral, existe de modo qualificado no
âmbito de uma sociedade conjugal, e por isso, os cônjuges devem reciprocamente respeito. Por isso,
neste caso, o cônjuge estaria a violar um dos pilares essências que é o de respeitar, que implica
cumprimentar, saber como correu o dia e preocupar-se com a família.
Ou seja, não seria necessário termos o artigo 1672º e referidos do Livro IV porque já
existe o artigo 25º da CRP e o 70º do CC que permitem chegar á mesma solução, mas se o
Legislador achou que se devia clarificar que neste contrato especial (o de casamento) existe um dever
de respeito que se for violado gera responsabilidade obrigacional. Sendo que se fundamentarmos
essa violação no artigo 25º da CRP e 70º do Código já estaremos perante um caso de resp.
extraobrigacional9.

Assim, na mesma ação devo peticionar uma indemnização com um fundamento10, e


posso, nos termos gerais, alegar a violação de um direito de personalidade que é
simultaneamente, neste caso, um direito fundamental.
Por isso, teria neste caso 3 pilares de tutela, e esta é uma realidade que por vezes é esquecida
pelos tribunais de forma errada já que estamos parente categorias conceptuais distintas que devem
desencadear uma tutela especial. Nos caso da violação de um direito fundamental11, no plano
constitucional, permite arguir a violação e exigir os meios correspondentes quer de entidades privadas
quer publicas e, por força do artigo 17º o regime dos DLG´s, que é excepcional, são aplicáveis a outros
direitos de natureza análoga que são por exemplo direitos de personalidade, sendo que há quem
entenda que estes são direitos materialmente constitucionais mas formalmente civis. Ou seja, que o
regime destes direitos fundamentais é susceptível de ser aplicado aos direitos de personalidade.
Assim, não podemos estranhar a existência de diversos meios de tutela que parece levar
ao mesmo resultado, ou seja, a uma indemnização, mas que o fazem por caminhos diversos.

Não podemos por isso reduzir à unidade estas 3 categorias concetuais (direitos familiares,
de personalidade e fundamentais), porque:

9 Diferença prática e conceptual


10 Violação de um direito familiar que resulta do contrato de casamento e que gera responsabilidade obrigacional
onde temos presunção de culpa e determinado regime prescricional
11 Que vinculam todo o tipo de entidades de acordo com o artigo 18º da CRP
19

1º Existem direitos familiares que não são direitos de personalidade, desde logo os direitos
patrimoniais. Se falarmos da obrigação de alimentos, este não é um direito de personalidade,
assim como o direito de assistência (de contribuir para as despesas da família) também não o é.

2º Existem direitos familiares que se fundam na decorrência lógica de um direito


fundamental. Ex: Direito de respeito (ver o supra exposto)

3º Existem direitos familiares que não têm a natureza de um direito fundamental. Ex:
Obrigação de alimentos ou de indemnizar, onde podem ser uma consequência da violação de um
direito fundamental mas não um direito fundamental individual.

4º Existem direitos familiares que têm a natureza de direitos fundamentais ou que são
uma sua explicitação. Exemplo: Direito de decidir se caso ou não; Direito de decidir se quero ou
não constituir família por via da descendência; Direito de decidir se quero procriar ou se quero
adotar; Direito de decidir se vive em união de facto. Todos estes direitos estão previstos no
artigo 36º da CRP e têm relevância familiar

Conclusão: Sempre que tivermos situações de concurso de pretensões entre a violação de


direitos familiares, de personalidade ou fundamentais, devemos desencadear os meios de tutela
respeito e não adotar uma teoria de absorção como por vezes adota a jurisprudência.

Se quiser sintetizar as notas distintivas e comuns entre estes vários tipos de direitos:

1º Notas distintivas: Não se pode considerar que os direitos familiares tenham sempre
uma natureza absoluta. Vemos que estes são tipicamente relativos, enquanto os direitos de
personalidade são absolutos. Além disso, os direitos de personalidade são necessariamente de
natureza pessoal, sendo que os familiares tanto podem ser de natureza pessoal (a maioria) ou
patrimonial.

2º Notas comuns: Indisponibilidade e imprescritibilidade: é comum aos direitos da


personalidade e familiares;

Elenco de Direitos familiares que têm relevância no plano dos direitos de personalidade e
fundamentais:

1º - Direito à identidade pessoal: Artigo 26º da CRP – É um direito relevante e que


fundamenta o direito ao nome e a que eu possa ser conhecido por esse nome. Este direito em
sede de direito da família tem uma tripla relevância, porque sempre que alguém casa tem a
possibilidade de aditar ao seu nome o nome de casado, o que implica uma alteração do nome, e
correspetivamente, sempre que alguém se divorcie ou que haja o termo do casamento por
efeitos da morte, também pode haver alteração para efeitos ou nome que havia sido aditado.
Esta matéria consta nos artigos 1677º a 1677-C do CC. A 3ª relevância neste direito ao nome
prende-se com o nome dos filhos, sendo que sempre que o casal tenha filhos, eles terão um
nome que é composto por nomes próprio e apelidos normalmente dos progenitores.

Mas para além do direito ao nome, outros direitos mais relevantes existem e que ainda são
concretizações do direito á identidade pessoal, por exemplo, o direito a casar. Esta ideia de que
20

os sujeitos podem decidir livremente se querem e com quem querem casar, é uma decorrência
do direito à identidade pessoal, ou seja, faz partigoe da minha pessoa e da minha formação como
pessoa, eu decidir se quero passar o resto da minha vida com alguém ao meu lado que eu tenho
de respeitar, ser fiel, etc ou não… Tal como é o direito a constituir família que não pode ser
imposto.

Este plano dos direitos familiares que são simultaneamente direitos de personalidade e
fundamentais, é essencial para que consigamos perceber aquela dimensão individual e subjetiva
do direito da família, porque aqui estamos a estudar o indivíduo naquilo que lhe diz respeito e
nas suas situações jurídicas.

Outro corolário deste direito à identidade pessoal, é o direito a ser perfilhado. Ou seja, uma
criança quando nasce tem o direito a ser registado como sendo filho de alguém. Filho da Mãe e
depois pode ser filho de um outro progenitor, que ou se presume por ser o marido (presunção
de paternidade) ou se não houver casamento, é necessário que haja uma declaração voluntaria
no sentido de reconhecer aquela criança como filho. Este direito é muito importante porque rem
implicações com um outro direito fundamental, o de conhecer as minhas origens genéticas.

Nos casos em que existe uma criança filha de Pais incógnitos, reconhece-se à criança a
legitimidade ativa de vir intentar uma ação no sentido de ser esclarecida a sua identidade
genética através de exames de ADN concretamente. Isto importa porque nos casos de crianças
que sejam oriundas de técnicas de PMA não se admite tal pretensão, e por essa razão, hoje em
dia já exista uma orientação no sentido de considerar que as Leis sobre PMA´s é
inconstitucional, porque se limita este direito da criança.

2º - Direito ao livre desenvolvimento da personalidade – Artigo 26º da CRP – É o chamado


direito à autodeterminação, onde encontramos algumas das situações que já vimos quanto ao
direito à identidade pessoa, porque é difícil de estabelecer fronteiras entre ambos. Assim, quer o
direito a casar com uma pessoa do mesmo sexo ou de sexo diferente (artigo 36º nº1 da CRP) é
um direito de autodeterminação, quer o direito a não casar e por isso a viver em união de
facto são ambos direitos de autodeterminação. Assim como o direito a viver em economia
comum, ou seja, deve ser decidido por cada individuo se quer passar a viver com outras pessoas
num espirito de união de despesas e responsabilidade.

Outro exemplo de um direito de autodeterminação é o de orientar a vida comum em condições


de plena igualdade – Artigo 36º nº3 da CRP e 1672º do CC. Isto significa que no casamento,
orientação da vida comum deve ser também decidida de comum acordo. Assim como:

Direito a ter filhos biológicos ou não – Artigo 36º da CRP e 67º e 68º da CRP

Direito ao planeamento familiar – Artigo 67º da CRP

Direito á realização pessoal de um individuo membro do agregado familiar –


artigo 67º nº1 da CRP. Ou seja, pela circunstância de viver em família não podemos
eliminar enquanto pessoa. Exemplo:Se preciso de fazer ginástica, tenho de poder
continuar a fazê-lo! Nem tudo aquilo que se ganha é para a família ou para os filhos
21

Direito fundamental à reserva da vida privada familiar – Artigo 26 da CRP e 80º do


CC. Assim, o direito à reserva da vida privada, é da vida privada do indíviduo mas
também da sua família, sendo que para este efeito a família é constituída pela família
nuclear e não alargada (Avos, Tios e primos).

Quadro normativo do Direito da Família

Está desenvolvido em diferentes normas que estão dispersas por diferentes diplomas.

Artigos 24º e seguintes, 36º e 67 a 73º da CRP;

Livro IV – Artigos 1576º a 2023º do CC

Código Regista Civil- Importante para a matéria do casamento;

Regime jurídico da adoção – alarga as normas previstas no código civil sobre adoção;

Lei da Liberdade Religiosa;

Lei da proteção das uniões de facto;

Lei da proteção das pessoas que vivem em economia comum;

Lei sobre as técnicas de PMA e de maternidade de substituição.

Já se tentou no Direito Europeu fazer um ensaio sobre a unificação do Direito da Família, mas
sem grande sucesso. Isto porque temos no próprio espaço europeu diferentes soluções face ao
casamento entre pessoas do mesmo sexo, quanto ao enquadramento da união de facto e também no
respeitante ás técnicas de PMA, onde não é possível chegar a um ponto de concórdia entre os diferentes
estados membros. Assim, o projeto de CC europeu em sede de direito da família é ainda longínquo. Esta
dificuldade é depois acentuada por problemas essenciais:

O problema das chamadas famílias migrantes, que é um fenómeno que representa o reverso da
medalha da globalização. Cada vez mais, em razão de diferentes incidentes políticos ou miliares, se
assiste a um fenómeno de deslocalização em bloco de famílias inteiras que atravessam continentes. Isso
coloca problemas jurídicos relevantes, porque é necessário depois saber até que ponto é que o direito
interno dos países de acolhimento dessas famílias se vai poder aplicar, concretamente o direito da
família, porque existem assimetrias muito relevantes do ponto de vista cultural e da relação conjugal e
com os filhos. O problema que se coloca é se se deve continuar a aplicar o direito da nacionalidade, ou o
do país de acolhimento (de matriz ocidental).

A Professora Ana Filipa salienta que existe a este respeito um princípio segundo o qual em
matéria de estado pessoal, se aplica o direito da nacionalidade, que é replicado pela generalidade
dos Estados civilizados. Assim, se um Português decidir emigrar para um país de religião distinta
daquela que é maioritariamente assumida em Portugal, e com tradições distintas, não pode pura e
simplesmente arrogar-se do direito de ser aplicado o direito local. Exemplo: do casamento
22

poligâmico: Em Portugal é proibido, sendo que até existe um crime de bigamia previsto no CP sempre
que alguém case duas vezes. Não se admite a possibilidade de alguém estar casado com mais de uma
pessoa… Se olharmos para o artigo 1577º do CC vemos que um dos pilares que ainda carateriza a
noção de casamento é a ideia de que o casamento é o contrato celebrado entre duas pessoas. Por isso, se
é entre 2 pessoas o casamento poligâmico não pode aqui ser considerado.

Quando uma destas familiares migrantes se vem situar em Portugal mas casou de acordo com o
distrito local validamente com mais de um marido ou mulher? Como se trata da relação com os filhos no
seio desses casamentos? Se um Português imigra para Marrocos ele pode aí casar com 3 mulheres? Se
voltar para Portugal é considerado casado ou não? Se não se reconhecer ca o contrato de casado
celebrado, isso significa que eles podem voltar a casar em Portugal?
Estes problemas não são respondidos, sendo que a Doutrina tem procurado uma resposta que
tem de se centrar entre nós, em princípios jurídicos porque não existe uma norma que diga
expressamente qual a solução a dar a este caso.

Podemos a este respeito recorrer ao Princípio da Ordem Pública, que tem sido invocado tanto
para travar o reconhecimento do casamento celebrado lá fora em termos não admissíveis perante o
direito interno, como para travar a possibilidade de no nosso ordenamento interno, celebrar um
casamento que seria válido de acordo com o direito da nacionalidade, mas que não é valido de acordo
com o direito do local.

Actuais Desafios do Direito da Família

Este Princípio da Ordem Pública encontra-se positivado no artigo 22º do CC. Isto significa que
ainda que os diferentes estados reclamem a aplicação do direito da nacionalidade (da origem das
pessoas), este direito vai ser ineficaz na ordem jurídica portuguesa sempre que haja uma violação de
princípio de ordem pública. Trata-se neste caso de ordem pública na acessão internacional. No
caso dos artigos 281º, 271º está em causa a ordem pública interna.12

Assim esta ordem pública remete para os traços identitários do Estado enquanto tal, de um
dado Estado como Nação e que em caso algum podem ser postergados. Assim, considera-se ainda que
pode até ser contrário à dignidade da pessoa humana admitir um casamento que pode ser
celebrado com mais do que 2 pessoas.

Pode-se refutar a possibilidade de haver um contrato de casamento entre uma pessoa e um


animal porque sendo o casamento um contrato celebrado entre duas pessoas, isso implica que ambas
tenham personalidade jurídica e que sejam sujeitos. Enquanto que os animais ainda não são
verdadeiros sujeitos de direito isso seria logo um obstáculo formal e literal a tal admissibilidade. Um
argumento material seria o de considerar tal pretensão como contrário à ordem pública de igual forma,
porque se considera atentatório a um princípio estruturante do Estado Português e de uma nação

12 Não confundir.
23

civilizada, admitir a celebração de um contrato pessoal de relevância social não entre duas pessoas, mas
entre uma pessoa e animal.

Estas questões não é puramente teórica e tem uma grande relevância na proteção que deve ser
dada a famílias migrantes.O problema tem de ser contextualizado à luz de duas grandes coordenadas:

1) Por um lado, pode-se invocar um direito à identidade corporal, um direito que se filia num
direito fundamental, também de personalidade, que é o direito à identidade pessoal.
Legitima-se por isso a faculdade de alguém, querendo e podendo faze-lo à luz da lei do
estado de origem, celebrar casamento com mais do que uma pessoa. Se por ventura, no
contexto de migração se vier a basear num país de matriz distinta, pode vir invocar o
reconhecimento do casamento validamente constituído à luz do direito do estado de
origem.13

2) Mas se assim é, temos de ter uma segunda coordenada que conflitua com esta.
É o problema de que, à luz do direito interno português, repugna, à luz daquilo que é o
direito constituído, a união entre 3 ou mais pessoas ou com animais, qualificando isto como
casamento14. Põe-se em causa o respeito pela garantia institucional do casamento.15

Como resolver este potencial conflito? O que se tem vindo a defender na doutrina,
concretamente pelos autores que se colocam mais no Direito Internacional Privado, cadeira que vamos
ter no próximo ano lectivo, é de enfatizar a necessidade de distinguir dois planos:

a. Direito ao reconhecimento desta celebração, validamente celebrada, em Portugal

b. Direito à celebração em Portugal, da união nestas condições.

Quanto ao primeiro plano, os autores entendem é que pode admitir-se o reconhecimento em


Portugal o casamento celebrado ao arrepio dos princípios estruturais do direito português. Isto é
importante porque uma das proibições que faz parte do tecido normativo português, é a proibição da
bigamia. Esta não só é censurada do ponto de vista moral como é mesmo tipificada como crime no
Código Penal16. Para além desta relevância criminal, o próprio CC vai proclamar como impedimento
dirimente absoluto o vínculo anterior não dissolvido, seja ele católico ou civil.17
Em geral, nunca se pode admitir o casamente de alguém que ainda esteja casado com outra
pessoa, que não tinha sido dissolvido por morte do cônjuge ou por divorcio. Isto é um dos efeitos
pessoais que pode levar ao reconhecimento da eficácia destas uniões atípicas à luz do direito interno
português, para evitar que ocorra a bigamia.

13 Lei pessoal
14 Tendo presente o que está no artigo 1577 do CC, que é uma figura com traços identitários próprios: união
entre 2 pessoas. Este elemento subjectivo ancora o casamento e não pode ser ignorado, há aqui uma circunscrição
do ponto de vista subjetivo.
15 Quando se fala em garantia institucional está em causa um principio objectivo de tutela que o Estado ou a

sociedade tem de respeitar


16 Artigo 247º CP, presente no titulo IV “crimes contra a vida em sociedade” e no capitulo I “Crimes contra

família”
17 Obstáculo intransponível à celebração do casamento. Artigo 1601, al c) CC
24

Quanto ao segundo plano, não se pode vir para Portugal celebrar este tipo de casameto. Aqui a
resposta já vai ser categórica. Isto não é possível visto que o Direito interno não contempla esta
hipótese. É neste plano que relevam outras normas:

Artigo 14º a 65º CC (normas de Direito Internacional Privado). Aqui temos de ter presente, em
especial duas normas:

Artigo 25º – esclarece o que é a chamada lei pessoal e diz que é aquela que se aplica a
atos que se integrem no estado pessoal. Todos os atos com relevância eminentemente
pessoal são regidos pela lei pessoal.

Artigo 31º – esclarece que a lei pessoal é a da nacionalidade do individuo.

Daqui retira-se:

1. Se um português pretender celebrar casamento no estrangeiro, a lei aplicável quanto


aos requisitos para celebrar o casamento, é a lei portuguesa e não a lei estrangeira.

2. De igual forma, se um estrangeiro pretender celebrar o casamento em Portugal a lei


aplicável é também a lei pessoal (a estrangeira).

Portanto, se assim for, um estrangeiro que quer vir para Portugal devia poder celebrar o
casamento poligâmico. Mas não pode devido à exceção de ordem publica internacional18.

Assim:

1. Não pode um português celebrar um casamento poligâmico no estrangeiro.

2. Não pode um estrangeiro celebrar um casamento poligâmico em Portugal, ainda que o


estado de origem o admita, devido ao princípio da ordem publica internacional.

Concluindo este subcapítulo dos desafios atuais do Direito da Família:

1. É difícil admitir, num tempo próximo, uma harmonização europeia a nível de direito da
família porque ainda há muitas diferenças no plano das relações familiares. Exemplos:

i. Não há uma tendência líquida em todos os estados membros quanto ao


casamento entre pessoas do mesmo sexo.

ii. Também é problemática a adoção por casais homossexuais. Temos


ainda autores portugueses que consideram a lei portuguesa que permite
a adoção por casais do mesmo sexo inconstitucional.

iii. Problemas das técnicas de PMA e barrigas de aluguer - também há hoje


em dia um pedido de inconstitucionalidade desta lei, em razão das

18Paralisa-se a aplicação de lei estrangeira porque a admissibilidade de casamento poligâmico repugna a


princípios estruturais do direito português. Vamos restringir a aplicação do artigo 31º com o artigo 22º.
25

restrições que se colocam aos filhos resultantes destas técnicas de não


poderem conhecer os seus ascendentes.

2. Tratamento jurídico das famílias migrantes, nomeadamente o casamento poligâmico

3. Difícil adopção de um conceito único de família, quer no plano interno, quer no plano
europeu.19

As Directrizes Fundamentais do Direito da Família

As directrizes fundamentais deste ramo do direito que agora estudamos são os grandes
princípios, os princípios estruturantes, que têm também carácter normativo, valem como verdadeiras
normas jurídicas20. Vamos então verificar estes princípios ao quadro normativo positivado21:

1. Princípio da Família como instituição fundamental - Trata a dimensão institucional da


família. Entender que a família é uma célula social básica e, sendo uma célula social básica, é
uma realidade pré-existente ao Estado. Não é o estado que cria a família nem as relações
familiares. O que o Estado tem de fazer é declarar, reconhecer, a existência da família. Por essa
razão, a família é também ela uma garantia institucional. Sempre que a família, como célula
básica, titular de direitos subjectivos, seja atacada, desencadeiam-se os meios de tutela da
família, artigo 67 CRP. Recordar aqui que concepção de família que é relevada é como
instituição fundamental é a família nuclear, artigo 36º,que é aquela que se constitui e se
caracteriza pela existência de pais e de filhos. Há depois, uma linha tradicional de tutela da
família conjugal (36º nº5 CRP), aquela que se constitui pelo casamento. Contudo, hoje em dia,
não se pode circunscrever a tutela da família à família conjugal, mas também relevam as famílias
formadas à margem do casamento.

2. Princípio do reconhecimento do Direito de todos a constituírem família em condições de


plena igualdade, artigo 36º nº1 CRP - Legitima a conclusão que pode haver família mesmo
fora do casamento, ao contrario do que defendia o professor Antunes Varela. Foi esta a norma
que foi utilizada para a abertura do casamento às pessoas do mesmo sexo.

3. Princípio do reconhecimento do direito de todos a contraírem casamento em condições


de plena igualdade - Não é igual ao anterior, aqui é um princípio privativo do casamento. O
artigo 36 é uma norma dicéfala: a) Todos têm direito a constituir família, b) Todos têm direito a
contrair casamento.

19 Ver “Conceito de Família” nas páginas anteriores.


20 A professora Ana Filipa Antunes entende, na linha do professor António Cortês, que se devem estudar os
princípios no plano normativo.
21 Não esquecer a diferença no entanto entre Princípios e Regras: Um princípio é uma norma ao lado da regras. “As

regras aplicam-se o os princípios valem”. Um princípio é uma norma que reclama aplicação na maior medida
possível. Já a regra é um comando incondicionado de “tudo ou nada”
26

4. Princípio do casamento como garantia institucional: O casamento não é um mero contrato,


um simples acordo de vontades, é um ato de conteúdo vinculado (os efeitos pessoais não podem
ser modificados e os efeitos patrimoniais só em casos pontuais). O que significa que só é
casamento aquilo que o legislador. Este é o argumento usado pelas vozes contrárias à abertura
do casamento às pessoas do mesmo sexo, consideram que houve um ataque à instituição que é o
casamento.

5. Princípio da não discriminação entre filhos, artigo 36º nº4 CR: Proibição de distinção entre
filhos nascidos no casamento ou fora dele.

6. Princípio da proteção normativa da adoção, 36º nº7 CRP e artigo 1973º e seguintes do CC.
Não pode haver distinção entre filhos naturais e filhos jurídico-legais. Foi por isso que a
distinção entre adoção plena e adoção estrita foi revogada.

7. Princípio da igualdade dos cônjuges, 36º nº3 da CRP e artigo 1671º nº1 do Código - É
importante perceber que este princípio funciona, quer no plano de relações horizontais entre os
cônjuges entre si, quer no plano das relações verticais, dos cônjuges em relação aos filhos. Não
tem de havr pelouros na família, não há a obrigação de um ter de se ocupar dos filhos e fique em
casa e o outro que vai trabalhar, claro, há a liberdade se organizarem como entenderem.

8. Princípio da direção conjunta da família, artigo 1671º nº2 -Têm de se colocar em acordo em
todas as decisões estratégicas da vida familiar. Artigo 1673 CC, não pode haver imposição de
ideias de um ao outro.

9. Princípio da maternidade e paternidade como valores sociais eminentes, artigo 68º nº2
CRP -Há hoje em dia um entendimento de que não se deve falar de maternidade ou paternidade,
mas de parentalidade.

10. Princípio da igualdade dos progenitores na relação com os filhos, artigo 36º nº3

11. Princípio do reconhecimento do direito-dever dos pais quanto à educação, manutenção e


segurança dos filhos, artigos 36º nº5 e 68º nº1 da CRP - Ideia de que há uma dissociação
entre a legitimidade e o interesse, os pais têm legitimidade para atuar mas o interesse é dos
filhos.

12. Princípio do reconhecimento e da tutela à convivência com a família, nuclear ou alargada,


artigo 36º nº6 CRP - Proclama a ideia que os filhos não podem ser separados dos pais, a não ser
que exista uma situação patológica prevista na lei, da qual resulte a inibição das
responsabilidades parentais.Na família alargada já vamos alargar aos avós22, aos tios. Artigo
1887º – A do CC que legitima o direito dos avós e dos meios irmãos a conviverem com os netos
e com os meios irmãos.

22Artigo 72º da CRP que deixa a ideia que os idosos devem ser integrados na família e que não devem ser
abandonados – dever de solidariedade intergeracional.
27

13. Princípio da intangibilidade da célula familiar constituída por pais e filhos - A ideia de que
os filhos não podem ser separados dos pais tem a ver com isto, há um respeito institucional pela
ligação que se estabelece nestes dois planos. Ver artigo 1887 CC, abandono do lar, e artigo
1915º e seguintes: inibição das responsabilidades parentais, acontece quando por alguma
razão forte e ponderosa os pais não podem ter a tutela dos filhos.

14. Princípio do carácter essencialmente laico do casamento, artigo 36º nº2 da CRP - A lei civil
tem a prerrogativa de regular requisitos e efeitos do casamento e da sua dissolução, quer seja
civil ou católico. Aqui temos as base normativas:

a. Artigo 41º nº4 CRP – separação do estado em relação a igreja

b. Artigo 1587º nº2 CC – a lei civil reconhece valor e eficácia ao casamento católico nos
termos das disposições do CC

c. Artigo 1588º CC – o casamento católico rege-se pelas normas comuns do CC.

É a lei civil que regula requisitos de celebração, a forma de celebração, os efeitos e o modo de
extinção do casamento.

15. Princípio da cessação voluntaria do vinculo matrimonial, 36º nº2 CRP e 1733º CC - Parte
da ideia de que hoje em dia, a ninguém está vedado o acesso ao divórcio, independentemente do
tipo de casamento. É voluntária porque basta uma declaração de vontade nesse sentido, mesmo
que o cônjuge não esteja de acordo. Esta é uma conquista de 2008, caiu o paradigma do
divorcio-sanção.

16. Princípio do divorcio independentemente de culpa de um dos conjunges, artigo 1779º a


1787º CC, É uma decorrência do principio anterior. Hoje em dia o CC ainda admite duas
modalidades de divórcio: divorcio por mútuo acordo e divorcio litigioso.

17. Princípio da solidariedade intergeracional, artigo 36º nº5 CRP - Os pais têm o dever de
manutenção dos filhos, há um dever de manutenção que funciona numa logica vertical
descendente mas também em relação aos idosos numa logica vertical ascendente (artigo 72º nº
1 CRP).

Artigo 1874º CC – dever de assistência mutua aos filhos

Artigo 1878º CC– dever de prover ao sustento dos filhos

Artigo 1879º CC - dever de assegurar as despesas com o sustento, segurança, saúde e


educação dos filhos menores

Artigo1880º CC - vem impor aos pais o pagamento de certas despesas com filhos
maiores de idade.
28

18. Princípio da subsidiariedade da intervenção do Estado, o direito da família caracteriza-se


desde sempre numa logica de mínima intervenção do Estado, são os cônjuges que têm de decidir
como organizar a vida familiar. Bases normativas para este princípio são o artigo 36º nº5 a
contrario da CRP, o artigo 67º nº1 CRP, artigo 68º nº1 CRP, artigo 69º CRP, artigo 70º nº 1
CRP. O estado só intervém se os pais precisarem de ajuda me termos assistenciais do Estado.

19. Princípio de cooperação do estado com as famílias, deve criar condições propícias para a
manutenção das famílias - Não é contraditório com o anterior. O estado deve criar condições
logísticas a criação de lares para não onerar as famílias. Artigos: 67º nº2, 70º nº2 e nº3 da
CRP. O que resulta daqui é que qualquer relação entre o estado e a família não é uma relação
substitutiva, independentemente de vontade, tem de haver uma razão legal, objetiva. Caso
contrario é uma ingerência abusiva.
29

Relações jurídicas familiares e com relevância familiar no


Direito da Família:

Introdução

Nesta parte do nosso caderno e seguindo o programa de Direito da Família deste semestre
vamos estudar esta parte base em 3 planos que vamos distribuir por 3 capítulos:

a. Relações jurídicas familiares de acordo com o código civil

b. Relações familiares previstas em lei especial

c. Outras relações com relevância familiar

As relações jurídicas familiares de acordo com o código civil, artigo 1576º são: 1) Casamento,
2) Parentesco, 3) Afinidade, 4) Adoção.
O artigo 1576º não nos dá uma definição de família, nem sequer um elenco acabado de relações
jurídicas familiares. O que o artigo faz, ou pretende fazer, é enumerar as fontes23 de relações
jurídico-familiares. As quatro fontes de relações jurídico familiares elencadas são não taxativas, ou
seja, são meramente enunciativas. Isto não prejudica, contudo, a circunstância de haver outras relações
familiares previstas em legislação extravagante.

A definição de relação familiar é a seguinte: relação familiar é toda aquela que tenha por
objecto a família e seja regulada por lei em sentido formal.

Para a professora Ana Filipa Antunes esta é a definição que deve ser usada para saber o que é
uma relação familiar. Tanto vale o código civil como outro qualquer diploma, desde que haja uma
intervenção do legislador por lei.
O artigo 1576º é uma norma criticável para a professora Ana Filipa porque induz a ideia
que são só aquelas as relações familiares quando isso é um equívoco, uma vez que este não define
relação familiar e não define fonte em termos taxativos, isto é a posição da Professora Ana Filipa
Morais Antunes que considera a união de facto por exemplo uma verdadeira relação familiar. A

23Os elementos da relação jurídica são: sujeito, objeto, facto e garantia. Destes elementos a fonte é o facto.
O CC no direito da família, quando fala em fonte, o que está a dizer é que os factos juridicamente relevantes são 4:
o casamento, parentesco, afinidade e adoção. O facto é entendido como o evento social gerador de efeitos
jurídicos.
30

professora Ana Filipa defende depois que ainda que sejam meramente enunciativas, não deixa de
estar em causa um numerus clausus. Havendo uma tipicidade, temos de respeitar o regime jurídico
associado a cada uma destas fontes de relações familiares, que são de conteúdo vinculado.

Guilherme Oliveira em face do artigo 1576º diz poder entender ‑se que, além das que foram
mencionadas, não haja outras relações familiares que como tais devam ser consideradas para a
generalidade dos efeitos no direito português. Sendo relações familiares as referidas naquele preceito
legal, pode dizer ‑se que a família abrange todas as pessoas ligadas por essas relações. À família de uma
pessoa pertencem, pois, não só o seu cônjuge como ainda os seus parentes, afins, adotantes e adotados:
este conceito assim tão lato é que corresponde à noção jurídica de família.

Além disto, avançar ainda que estão em causa relações eminentemente pessoais (insuscetíveis
de avaliação pecuniária). Mas isto não poe em causa que as relações familiares legitimem e dêem
origem a relações secundarias patrimoniais. Exemplo: responsabilidade civil, responsabilidade por
dividas do conjunge, dever de assistência pelos cônjuges, dever de assistência relativamente aos filhos,
obrigação de alimentos.

Elenco e caracterização das previstas no Código Civil

Casamento

O casamento, tal como a família é um conceito polissémico, não há uma noção única. É antes de
mais uma instituição fundamental, tem de ser protegido pelo Estado e não pode ser subtraído, mas
pode ser alargado.
Pode ser usado “casamento” como contrato: o casamento é um contrato pessoal, bilateral,
sinalagmático, causal e de conteúdo vinculado no que diz respeito aos efeitos pessoais e em grande
parte quanto aos efeitos patrimoniais.
O casamento baseado na convivência e na ligação afetiva: a ideia de que o que interessa é a
relação amorosa entre as pessoas a affectio.

Em termos técnicos, o casamento no artigo 1577º é definido por referência à figura do


contrato. O elemento essencial do contrato de casamento, à luz do artigo 1577 é a “plena comunhão
de vida”. Esta expressão técnica é muito importante.

A plena comunhão de vida é uma comunhão em 3 planos (teto, mesa e cama), é uma
comunhão integral e que, para além de ser plena, tem de ser observada nos termos das
disposições deste código. É este o elemento que nos vai permitir dizer que a união de facto é diferente
do casamento, porque à união de facto não se aplicam as disposições do CC.
31

Iremos tratar melhor do casamento mais adiante.

Parentesco

Diverso é o cenário relativo ao parentesco. Aqui já não estamos a privilegiar a vontade das
partes. Aqui, a fonte da relação jurídica / o facto jurídico genético é um facto natural ( vínculo da
sanguinidade/ os laços sanguíneos unem estas pessoas).24

Sempre que precisamos de identificar linhas de parentesco temos de ter presente que o
parentesco se pode constituir em termos verticais em sentindo ascendente ou descendente ou
pode funcionar em termos colaterais ( irmãos, primos, tios, sobrinhos).
De acordo com o artigo 1580º, quanto às linhas de parentesco:

1) a linha diz-se reta quando um dos parentes descende do outro;


2) Diz-se colateral quando nenhum dos parentes descende do outro, mas ambos
procedem de um progenitor comum ( exemplo – os irmãos não descendem um do
outro, mas têm como elemento comum 2 ou 1 progenitor comum; tendo os 2 chamar-
se-ão “ irmãos germanos”, tendo 1 em comum chamar-se “irmãos uterinos”).

De acordo com o artigo 1581: “na linha reta, há tantos graus quanto as pessoas que formam a
linha do parentesco, excluindo o progenitor.” Sempre que estamos a fazer um cômputo de grau em linha
reta, vamos contar sempre os graus relativamente ao ascendente e vamos excluir a pessoa de
referência. Assim, não existem parentescos de 1º grau em linha reta; nem necessariamente de 2º
lugar.

De acordo com o artigo 1581 nº2: “os graus contam-se da mesma forma, subindo por um dos
ramos e descendo pelo outro, mas sem contar o progenitor”. Quando se fala de parentesco em linha reta,
não existe limite de grau. Diferentemente, na ilha colateral, existe um limite para a relevância
jurídica do parentesco: até ao 6º grau da linha colateral. Isto significa que a partir. Do 6º grau não
se relevam os efeitos jurídicos do parentesco, sejam eles efeitos jurídicos no plano familiar,
sucessório ou institucional.

Sempre que temos um parentesco em linha colateral, este parentesco oferece 2 grandes
categorias:

1. Parentesco na linha colateral bilateral - parentes na linha colateral que procedem ambos
de progenitores comuns, em termos bilaterais porque procedem do mesmo pai e da mesma
mãe. Ex: pai e mãe casados que tiveram ambos 2 filhos. Aqueles filhos são provenientes do
mesmo pai e mãe. Chamam-se “irmãos germanos”.

24Esta relação de sangue não se confunde com a filiação. A filiação é uma espécie possível das relações de
parentesco. Não esgota o conceito de parentesco. Na filiação é pais/ filhos ( estabelece-se em termos verticais e
ascendentes). Ora, o parentesco tanto funciona em termos verticais e ascendentes como colaterais.
32

2. Parentesco unilateral - filhos que descendem apenas do mesmo pai ou da mesma mãe.
Neste caso de unilateralidade do parentesco, se o progenitor comum é a mãe ( 2 meios
irmãos filhos da mesma mãe), eles chamam-se “irmãos uterinos”. Se, pelo contrario,
descendem do mesmo pai, chamam-se “ irmãos consaguíneos“.

Quando fazemos o cômputo de grau, aquilo que vai relevar é as várias gerações. Aquilo que
vamos ver na árvore de família é as diferentes gerações. Cada geração funciona como um grau de
parentesco. Aqui, vamos relevar a maior proximidade ou afastamento relativamente à pessoa de
referência. Só podemos qualificar os graus que unem, cada grau equivale a uma geração. Logo, vamos
contar o nº de gerações que vão mediar os parentes.

Se o parentesco é uma relação jurídica familiar, significa que vai produzir diferentes efeitos
jurídicos que são desencadeados em 4 planos:

1. Plano do direito comum – o parentesco é relevante, desde logo, em matéria de ofensa aos
direitos de personalidade. Se recordarmos o regime previsto no artigo 71º, sabemos que o
legislador reconhece legitimidade ativa aos parentes para poderem reagir a uma ofensa ilícita a
entes queridos falecidos. Este é o 1º exemplo da relevância jurídica do parentesco.

2. Direito da família – o parentesco vai relevar em vários cenários:

a. Filiação- vinculo de materialidade/ paternalidade (nas modernas tendências designado


de Parentalidade25). É essencial a ligação sanguínea para o estabelecimento da filiação
biológica, no CC ainda está plasmado o principio essencial da verdade biológica (releva-
se como Mãe a que deu à luz; e como Pai aquele que, presumivelmente, o é porque
presume-se que se manteve relações sexuais no período legal relevante em termos de
concepção. Estes princípios estão no artigo 1871º c) e 1826 no caso de haver
casamento, o filho nascido da mãe presume-se filho do marido da mulher. Relativamente
ao estabelecimento da maternidade (artigo 1796º – a filiação resulta do facto do
nascimento). O primeiro grande efeito é, assim a filiação por um lado, para se
estabelecer e, em segundo lugar, para se exercerem as responsabilidades parentais (
1874º e seguintes.)

b. O parentesco também releva para se imporem responsabilidade familiares


quanto a menores de idade- admitindo que os pais morreram ou estão impedidos de
exercer o poder paternal. Quem vai cuidar da criança? Para estes casos está pensada a
Tutela Paternal (artigo 1931º nº1 e artigo 1952º). Existe mesmo uma obrigação legal
de integrar o órgão conselho da família sempre que os pais não existam ou estejam
impedidos.

c. Em termos de aferir impedimentos matrimoniais- a circunstância de laços


sanguíneos é relevante a ligação para obstar à formação do casamento, isto resulta do:

25 Viva ao Bloco de Esquerda.


33

i. Artigo 1602º a) — impedimentos dirimentes relativos, obstam ao casamento


entre si o parentesco na linha reta e no 2º grau da linha colateral.

ii. 1604º c) – impedimentos impedientes – tios / sobrinhos

iii. 1609º nº1 a) – pode ser pedida a dispensa do impedimento no caso do


parentesco do 3º grau da linha colateral ( remissão para o 1604º c) )- os tios e
sobrinhos podem casar se, previamente, tiverem solicitado a dispensa do
impedimento.

iv. Artigo 1631º a) - O parentesco também releva para a invalidade do casamento,


impedimento dirimente.26

d. Legitimidade para arguir a anulabilidade do casamento, artigo 287º - a


anulabilidade está reservada para a pessoa em cujo interesse a lei estabelece o direito de
arguir a anulabilidade. No regime do casamento, vamos encontrar anulabilidades
atípicas: para além da pessoa que a lei quer proteger, vai se alagar a legitimidade ativa a
outros parentes :

i. Artigo 1639º -Portanto, se tivermos um impedimento dirimente, caso os


cônjuges nada façam, os parentes têm esta legitimidade para arguir a invalidade.

ii. Artigo1640º nº2 – nos restantes casos de falta de vontade, podem prosseguir
na ação os parentes na linha reta;

iii. Artigo 1641º- se o casamento for anulado por vicio de vontade , podem
prosseguir na ação os parentes em linha reta.

e. Artigo 1887º a) – os avós têm direito ao convívio com os netos, os irmãos entre eles
igualmente.

f. Introduz uma restrição à averiguação oficiosa da maternidade ou paternidade. -


artigo 1809º a) e 1866º a) . Normalmente, a grande relevância jurídica do vínculo do
parentesco estabelece-se na linha reta sem dependência de grau e na linha colateral até
ao 2º grau, ainda que o parentesco, em geral, possa relevar até ao 6º.

g. Obrigação de alimentos – é uma relação jurídica patrimonial, artigo 2000º e seguintes.


A norma especial do artigo 2009º b), c) , d) e e) estabelece a relevância dos:
ascendentes, descendentes, irmãos, tios. Qualquer uma destas pessoas avós/ netos,
pais/ filhos... irmãos / tios podem ter um direito a alimentos.

3. Direito das Sucessões – no direito das sucessões ainda há uma grande marca da família
nuclear. Mas, sucessão legítima, o legislador contempla a família alargada, podemos ter como

26Os impedimentos dirimentes conduzem à invalidade do casamento; já os impedimentos impedientes não


conduzem à invalidade do casamento.
34

herdeiros legítimos outros parentes que não o cônjuge e os descendentes. Artigos 2132º e
2133º. Já na sucessão legitimária, artigo 2167º ascendentes e descendentes.

Artigo 2034º – pode haver uma incapacidade por indignidade no caso de ser praticado um
atentado contra descendente ou ascendente do autor da sucessão.

Por ultimo, 2042º- pode haver representação na sucessão legal. Esta é representação cabe aos
descendentes do filho do autor da sucessão em benefícios dos descendentes do irmão do
falecido.

4. Direito das Obrigações

i. Artigo 1496º nº 2 – consagra o direito à indemnização dos danos não


patrimoniais por morte de um familiar, filhos ou outros descendentes ou ,na falta
destes, os pais e outros ascendentes e os sobrinhos ou irmãos que os
representem. Todos estes parentes são susceptíveis de virem a exercer uma
pretensão indemnizatória no caso de morte ou dano grave.

ii. O vínculo do parentesco estabelece restrições no que respeita à liberdade


negocial. Restrições: para a celebração de certos atos, por exemplo para a CV, o
facto de ser filho de/ neto de determina o valor jurídico negativo da CV ( Artigo
877). 27

Afinidade

É uma relação jurídica que pressupõe uma referência a outras duas relações jurídicas familiares:
o casamento e o parentesco. Resulta da conjugação dos efeitos do casamento e do parentesco. O
conceito de afinidade está esclarecido no 1584º. É relevante que não existe afinidade entre os membros
de uma união de facto. A afinidade estabelece-se entre o cônjuge relativamente aos parênteses do outro.
Ora, “cônjuge” só é aquele que casou. Por isso, na união de facto não há afinidade.
A afinidade também comporta linha e graus, aqui, de acordo com o artigo 1585º, releva-se
exactamente os mesmos princípios que vimos quanto ao parentesco ( pode haver afinidade em linha
reta ou linha colateral, conta-se da mesma forma). Ou seja, exemplos: uma relação sogro/genro/nora –
tenho uma relação de afinidade na linha reta; relação cunhados/sobrinhos ou tios- linha colateral;
cônjuge do pai da mãe com o avo e a avó- linha reta .

Além da importância social. Quem casa deve estabelecer relações familiares com a família de
origem do seu cônjuge. Não são estranhos uns aos outros, são afins.
Por efeitos da afinidade, constitui-se uma relação jurídica por pessoas que não estão ligadas por
laços de sangue nem por nenhum contrato. Na afinidade, é o legislador que determina que, a partir do
casamento, o cônjuge passa a ter uma relação familiar com os familiares do cônjuge. Esta relação

27 Artigo Jorge Duarte pinheiro – Avós e Netos; foi destacado pela professora para o estudo desta matéria.
35

familiar produz efeitos, nomeadamente, no plano da obrigação de alimentos, artigo 2009º nº1 f),
impõem-se uma obrigação é devedor de alimentos o padrasto/ madrasta quanto a enteados menores
que estejam ou estivessem no momento da morte a cargo deste.
Condiciona a constituição de novas relações jurídicas famílias, temos um impedimento
dirimente relativo. A afinidade em linha reta é um obstáculo ao casamento, artigo 1602º c) . Não é
possível casar com o sogro, pois existe um obstáculo à validade desse casamento.

Outro efeito jurídico da afinidade é a legitimidade ativa alargada aos afins para prosseguirem
em ações de anulação de casamento. Portanto, não apenas os parentes, mas também os afins podem
prosseguir uma ação de anulação do casamento. Artigos 1640º nº2 e 1641º.

Há ainda a obrigação de exercer a tutela ou de integrar o conselho de família, vimos que isto
aconteceria relativamente aos parentes, mas também pode suceder quanto aos afins e estes vão ter as
mesmas obrigações legais no caso de ser necessário constituir tutela para cuidar de um menor, artigo
1931º e 1952º.

Da afinidade resultam ainda restrições à averiguação oficiosa da maternidade e paternidade –


1809º/A e 1866º.

A afinidade não termina pela dissolução do casamento por morte artigo 1585º, esta norma
(controversa) foi alterada em 2008 e suscita a seguinte questão: se não termina por morte, quando e
que termina? Quando é que deixamos de ter afins? Com o divórcio. Esta foi uma solução que não estava
plasmada antes de 2008 e que tem sido muito criticada e compreende-se a crítica: no fundo, o
legislador, hoje em dia, parte do princípio de que quando as pessoas morrem a afinidade continua,
diferentemente, se as pessoas continuarem vivas, podendo manter relações com os afins, já não o
podem fazer ao abrigo da afinidade porque elas cessam automaticamente por efeito do divorcio. Esta
ideia pode produzir efeitos perniciosos: imaginemos os cônjuges que se divorciam e que já tinham
filhos de anterior casamento, ora, os enteados deixam de ser afins relativamente à pessoa que se
divorcia. Assim, deixam também de ter sobrinhos... o Legislador , no ver da professora Ana Filipa, mal,
está a assumir uma ideia de afastamento da família do cônjuge que em termos sociais não é aquilo que
se verifica: se alguém se divorciar não vai deixar de considerar o sobrinho como tal, por exemplo. Por
estas razoes, esta decisão tomada pelo legislador em 2008 tem sido muito criticada.

Não há afinidade entre os parentes de cada um dos cônjuges. Ou seja, não há comadres nem
compadres. A afinidade não chega a esse nível. Não há relações entre os pais de um e os pais de outro
dos cônjuges.

Adopção

Artigo1586º dá uma noção de adopção e remete para os artigo 1973º a 2002º -D. O que o
Legislador, fez foi depois de regular o casamento (que é o modelo de relações familiares), avançou para
a filiação (artigos 1796 e seguintes.) e a adopção surge no artigo 1973º, surge depois da filiação
biológica. Isto dentro da lógica que o legislador já deixa antever no artigo 1585º e que se consubstancia
36

na ideia de que a adopção é um vínculo à semelhança da filiação, Logo, é tratada depois da filiação
para se conseguir já perceber quais os aspectos do regime que também se pode aplicar em sede de
adopção, é uma questão de sistematização do Código que a nosso ver foi bem construída neste caso.

O adoptado é tratado, para todos os efeitos, como filho biológico. Logo, aplica-se exatamente o
mesmo regime em direitos dos filhos obrigações e responsabilidades dos pais. No fundo, só por
uma razão de fonte da filiação é que hoje em dia ainda se autonomizam as duas modalidades de filiação.
Não pode, de acordo com o artigo 36º nº7 da CRP, haver qualquer discriminação entre filhos adoptivos
e filhos biológicos.

O artigo 1977º foi revogado e, para além disso, com a Lei 2/2016 de 29 de Fevereiro -
reconhece o direito de adopção por casais homossexuais. Portanto, em 2010, alargou-se o
casamento a pessoas do mesmo sexo e, 6 anos depois, reconheceu-se o direito de adopção por casais do
mesmo sexo. Foi como que um segundo pilar em termos de relações jurídico familiares que ficou por
tratar na lei 31 de Maio de 2010.

Com a eliminação da distinção entre adopção restrita e adopção plena temos agora de ter
presente o artigo 1986º porque este vem esclarecer que a adopção produz os mesmos efeitos da
filiação. Ou seja, em matéria de impedimentos matrimoniais, vão ser aplicáveis seja a criança adoptada
ou não. Assim, tal como não posso casar com o filho biológico, também não posso casar com o filho
adoptivo. Neste ultimo caso, embora não haja questões da consanguinidade, mas em termos de moral e
ordem pública repugna que uma Mãe possa casar com o filho.

As relações jurídicas com relevância familiar previstas em lei especial

Para Ana Filipa, regente do programa que seguimos nas aulas e respectivamente neste caderno,
ou as relações são familiares e têm relevância para o direito da família ou simplesmente não são.
Portanto, “relações parafamiliares” são reações que apela a algo paranormal e, por essa razão, Ana
Filipa recusa-as e considera que, em termos técnicos, ou temos razões para estarmos perante uma
relação familiar ou não temos.
Então, qual é o critério, para a doutrina de Ana Filipa, que usamos para saber se estamos
perante uma relação jurídico-familiar ou não?

São relações jurídicas-familiares as que, evidentemente, cuidem de um vínculo familiar/ em que


esteja implicada a família em qualquer uma das suas acepções e que esteja regulada em lei formal.
Assim, vamos integrar no nosso programa, além da união de facto, a convivência e economia comum e
apadrinhamento civil porque são relações jurídicas que, além de constarem de lei formal, se
caracterizam por 3 notas:

1. Estas relações caracterizam-se pela nota da estabilidade. Não são episódicas/ instantâneas.
37

2. Sendo relações estáveis, são duradouras; ou seja, estas relações têm de se constituir e
manter-se durante um dado período de tempo mínimo para que possam ser tratadas como
relações familiares. Por exemplo, a união de facto e a convivência e economia comum exige
um requisito temporal: 2 anos e 1 dia. Artigo 279º CC e Artigo 1º da União de Facto.

3. Sem termo pré-estabelecido: devo constituir estas relações sem um fim à vista, para que
mereçam o qualificativo de relações jurídico-familiares.

União de Facto

A união de facto era a chamada união concubinária ou união matrimonial de facto como diz
Antunes Varela. Aliás, o qualificativo “união de facto” hoje é muito curioso porque a união de facto
nasceu, assim, era, de facto, uma relação de facto. Isto é, uma relação à margem do direito. Porquê?
Porque ela acontecia mas o legislador fechava os olhos e não a regulava. Logo, aí, justificava-se o
qualificativo “união de facto”. Hoje em dia não é assim, a união de facto não é uma situação meramente
fáctica porque 1) está regulada na lei e 2) tem efeitos jurídicos. Portanto, é por questão histórica que
chamamos como chamamos. Com efeito, nós agora já temos constrangimentos legais, concretamente:

1. Em termos subjetivos, pois só é união de facto a união estabelecida entre 2 pessoas.

2. Além disso, temos um requisito temporal, só é união de facto a estabelecida há mais


de 2 anos.

3. Só é união de fato a união de pessoas em vivência em condições análogas à dos


cônjuges.

Hoje em dia ainda há pontos não assentes na União de Facto, daí o reforço da ideia de que a
União de Facto como relação familiar tenha sido apresentada supra como “doutrina da Professora Ana
Filipa” dado que o tema não é inteiramente consensual no que toca por exemplo à qualificação desta
relação como familiar.
As grandes questões em aberto hoje na União de Facto ou as questões fracturantes são:

1. Saber se a União de Facto é uma verdadeira relação jurídica familiar. Há quem ache que é
parafamiliar, outros como a Professora Ana Filipa Antunes dizem que é familiar. Assim:

a. Rita lobo Xavier (UCP Porto) – entende que a UF não é uma verdadeira relação jurídica
familiar. Alinha na ideia de que estamos perante uma relação parafamiliar.

b. Pereira coelho e Guilherme de Oliveira – Relação jurídica parafamiliar.

c. Capelo (Coimbra) – Relação Jurídica parafamiliar.


38

d. Diogo Leite de campos – também contesta a qualificação da UF como familiar, afirmando


que é parafamiliar.

e. Pamplona Corte real – está próximo de todas as supostas conquistas do Direito da


família; considera que é relação jurídica familiar.

f. Cristina Andrade Dias ( Minho) e Francisco Brito Pereira Coelho ( Coimbra) – ambos a
favor da qualificação como relação jurídica familiar.

2. O regime jurídico é muito lacunoso. Temos poucos artigos: 3 deles tratam de questões de
direito transitório. Logo, temos um regime sucinto. Então, a questão que se coloca é: pode
entender-se que há uma equivalência funcional da união de facto para o casamento? Havendo
essa equivalência funcional, devem aplicar-se as normas de direito matrimonial à união de
facto? Por exemplo, as pessoas vivem em UF e compram carro/ apartamento/ rendas. Todas
estas despesas são despesas que, no direito matrimonial chamamos de despesas “para a
economia comum” que integram o dever de assistência, artigo 1575º. Faz sentido aplicar a
mesma norma à UF? Pode um membro da UF vir exigir ao outro o ressarcimento das despesas
online? Todo o investimento que é feito na casa/automóveis quando acaba a UF, em termos de
património, como é que isto se faz? A resposta a estes exemplos não está na lei.

A lei é omissa em matéria de dever de assistência, em matéria de qualificação do património


constituído em UF , em matéria de responsabilidade por dividas e em matéria de qualificação do
membro da UF sobrevivo como herdeiro ( o membro da UF sobrevivo não é herdeiro, nem
legítimo; a única forma de o proteger é através do testamento).

Com estas insuficiências de regime:

1. Parte da doutrina tem ensaiado a aplicação analógica das normas do casamento -


Dessa aplicação resultava que: os bens adquiridos na constância da UF, em caso de
cessação, deviam ser considerados bens objeto de partilha; assim se o membro da
UF investiu mais, podia exigir do outro um crédito de compensação).

2. Noutra linha, há autores que recusam a aplicação analógica -Desde logo porque
o Princípio Da igualdade reclama uma solução distinta. Porque a UF é uma relação
jurídica familiar distinta ou parafamiliar, juridicamente, deve ser tratada
distintamente. Logo, a não aplicação analógica não viola o Princípio Da igualdade.
Pelo contrário, a aplicação analógica é que violaria. Se não se regula é porque é
irrelevante Os autores baseiam-se em vários argumentos:

2.1 Se percorrermos as diferentes normas do regime matrimonial e


confrontarmos com a união de facto, chegamos à conclusão que não existe
um estatuto pessoal dos membros da união de facto (deveres jurídicos). Os
membros da união de facto até podem replicar o regime do casamento, mas
não são obrigados a tal. Não havendo esta vinculação jurídica, não podemos
pretender retirar a titularidade de direitos fundados em normas que
também não impõem deveres.
39

2.2 Em segundo lugar, não há regime de bens, o que significa que, na vigência
da união de facto se perspetivam as seguintes hipóteses: ou fazem o
chamado contrato de coabitação, que rege os termos essenciais da relação,
e se for violado gera responsabilidade obrigacional, ou não o fazem, e ficam
com as regras do CC.

3. Soluções intermédias28:

3.1 Regime comum do CC – a UF é juridicamente relevante apenas nos termos


previsto na lei 7/2001. Logo, tudo o que não está previsto não se pode
dizer que seja irrelevante. Mas vai ser tratado de acordo com as regras
comuns do CC. Exemplo: se os membros da UF adquirem um apartamento
e se só 1 o compra, esse apartamento é considerado bem próprio porque o
adquiriu por efeitos do Contrato de CV. Exemplo 2: se eles fazem despesas,
em matéria de responsabilidade por dívidas, o regime regra é o da
conjunção29. Logo, com base nas regras gerais do CC, vamos autonomizar
cada negócio daquela UF. No limite, não havendo institutos do direito civil,
recorre-se ao enriquecimento sem causa . Esta é a opinião da professora
Ana Filipa Antunes

3.2 Aplicação analógica do regime das sociedades de facto - Artigos 981º e


seguintes que se aplicam sempre que uma sociedade seja invalidamente
constituída vai ser tratada como sociedade irregular/ sociedade de facto,
por isso até há aqui uma crítica dado que o casamento é um sociedade
legalmente constituída e por isso não irregular. Ora, existe um regime
especial para a dissolução das sociedade de facto e alguma doutrina e
jurisprudência vem aplicar esse regime às UF dizendo que: a família é uma
sociedade, portanto, as regras de repartição do património previstas neste
regime especial aplicam-se às UF. Assim em matéria de dissolução, o
mesmo é, divórcio, artigo 1007º e seguintes. Ana Filipa considera que esta
tese não faz sentido porque a sociedade é um contrato celebrado com
intuito lucrativo, logo, não tem nada a ver com a UF onde não há
supostamente ninguém que se junto a outro com interesses económicos. No
entanto tem sido aplicado pela Jurisprudência.

3.3 Admitir os Contratos – celebrados entre os membros da UF. Ao abrigo da


autonomia privada, as pessoas que vivem em UF podem, querendo, definir
os direitos e obrigações de cada um no contrato. Por isso, se o contrato for
violado, funcionam as regras de responsabilidade Obrigacional.

3. Lacuna/Ausência de regulamentação relevante da união de facto e dos direitos dos


unidos de facto em caso de morte. A Lei 7/2001 concede algumas medidas de protecção, mas
são medidas muito cirúrgicas, que titulam o direito a prestações sociais por morte, titula a

28 É nesta linha que vai a doutrina de Ana Filipa Morais Antunes


29 Ver matéria de Cumprimento e Não Cumprimento das Obrigações
40

transmissão do arrendamento por morte, mas, verdadeiramente, em nenhum ponto desta lei se
reconhece o unido de facto sobrevivo como herdeiro. Há uma discriminação objectiva entre o
unido de facto sobrevivo e o conjugue sobrevivo. O unido de facto não é herdeiro legitimário
nem é herdeiro legítimo (artigo 2131º e 2132º e ss do CC). Significa que o unido de facto não é
herdeiro legal, não é reconhecido pela lei em sede de sucessão. Qual o campo de ser susceptível
de ser prosseguido enquanto sucessível da união de facto? Testamento: 2179º e seguints.
Apenas se for feito testamento é que é possível contemplar o unido de facto. O testamento só é
admissível na quota disponível, sendo que o testamento vai substituir a sucessão legítima. Em
nada prejudica a sucessão legitimária. Continua a haver um problema, o da eventual carência no
tratamento do unido de facto.

Nota: Naturalmente, se a união de facto é juridicamente tutelada ao fim de 2 anos, podemos ter
uma situação de união de facto que dura há 2 anos, e aí não choca não reconhecer o unido de
facto como sucessível legal, mas também pode haver situações de união de facto que
perduraram duraram 22 anos, 25 anos, e quando um deles morre, o outro não é sucessível, e
neste caso já parece muito injusto e chocante. É uma diferenciação que causa algumas
turbulências.

A união de facto, na realidade, é objecto de protecção normativa no campo das sucessões apenas
por via do artigo 2020º, norma que devemos adicionar à Lei 7/2001. Mas mesmo neste domínio,
da obrigação de alimentos, vem-se reconhecer o direito de exigir alimentos ao unido de facto
sobrevivo, relativamente à herança. É um direito que se exerce relativamente à herança.

Conclusão da Professora Ana Filipa: Na nossa disciplina rejeitamos a aplicabilidade analógica


do regime matrimonial, o que não significa um ‘’aplauso’’ pelo regime vigente. Há um diagnóstico
claramente insuficiente e a necessidade de intervenção. Mas aquilo que se defende é que qualquer
intervenção necessária tem que ser feita pelo legislador ordinário e não pela doutrina ou
jurisprudência, através de “esquemas diabólicos” de aplicação de normas que não têm identidade
funcional. Em concreto, não são aplicáveis os artigos 1676º/2, 1691º, b), 1724º, 1725º, 1726º,
1730º e 1736º/2.
A aplicabilidade do artigo 1691º, b) é sustentada por outra doutrina (Professores Guilherme
de Oliveira, Francisco Brito Pereira Coelho, Jorge Duarte Pinheiro).
Quanto ao artigo 1724º, é norma que está inserida em regime de comunhão de adquiridos. Em
comunhão de adquiridos, o produto do trabalho é bem comum. Também não se aplica o artigo 1725º,
que cuida da presunção de comunicabilidade. Não se presume a comunicabilidade de bens porque na
união de facto não há património comum. Ora, se não se aplicam as normas pela comunhão de
adquiridos, uma vez que não há um património comum, também não se aplicam as regras da separação
de bens, uma vez que há uma diversidade funcional quanto ao regime do casamento. Portanto, o artigo
1736º nº2 deve ser inaplicável. Esta é uma norma que autores como o Professor Francisco Brito Pereira
Coelho aplicam, porque resolve o problema da titularidade dos bens (regime de bens adquiridos em
regime de separação de bens podem considerar-se adquiridos em regime de compropriedade), pelo que
daria jeito aplicar esta norma. Mas a Professora Ana Filipa considera que não se aplica. Assim:

1) A união de facto é uma verdadeira e própria relação familiar


2) A relação familiar que se constitui- a união de facto- não se confunde com uma eventual
relação de filiação no decurso da união de facto.
41

3) Existe uma diversidade estrutural e material entre união de facto e relação matrimonial.
4) Logo, não são aplicadas as regras sobre estatuto pessoal para o casamento.
5) O regime que deve ser aplicado é o regime comum do Código Civil. Os bens vão ser
considerados próprios de um, próprios de outro, ou adquiridos em compropriedade, em
função do modo de aquisição do direito de propriedade.
6) É de rejeitar a aplicação do enriquecimento sem causa, pois: a) para além de ser uma figura
subsidiária b) não há uma ausência de causa justificativa para a situação patrimonial e c)
havendo uma obrigação natural, não há repetição do indevido.
7) Qualquer eventual compensação por encargos desproporcionados, por dívidas contraídas,
só pode ser exercitada num caso: se tiver sido celebrado um contrato de coabitação. Apenas
neste caso, por força deste contrato, é que pode ser exigido um crédito de compensação.

Cabe agora verificar quais os elementos constitutivos da verdadeira e própria união de


facto? Temos elementos ditos subjectivos e ditos objectivos:

Elementos subjectivos:

i. A união de facto pressupõe um vínculo entre 2 pessoas, uma com a outra/ relação
que se estabelece entre 2 pessoas

ii. Princípio da irrelevância do sexo para efeitos de união de facto: Estas 2 pessoas
podem ter o mesmo sexo ou sexo diferente

Elementos objectivos:

i. Este vínculo tem de se caracterizar por uma nota de estabilidade. Esta estabilidade
foi esclarecida pelo legislador em termos temporais. Só existe união de facto quando
2 pessoas mantenham uma relação entre si há mais de 2 anos

ii. Exige-se que esta relação seja uma relação que se caracterize por condições de uma
vivência em termos análogos aos dos cônjuges no contrato de casamento. É preciso
que o vínculo seja caracterizado por notas idênticas, análogas, às do contrato de
casamento.

iii. Plena comunhão de vida em 3 planos: tecto, mesa e leito

Há no entanto que ter presente as três noções distintas: casamento, união de facto e
concubinato não são a mesma coisa. Quanto às duas primeiras figuras já vimos o que são e em que
termos podem acontecer sendo que iremos desenvolver o casamento adiante no caderno. Quanto ao
concubinato, era usado antigamente para referir a união de facto mas hoje o concubinato duradouro
só aparece no artigo 1871º, c) O “ou” na lei (artigo 1871º, c) exprime alternativa. Ou há união de facto,
ou existe uma coisa diversa, que é este tal concubinato.

O concubinato caracteriza-se por uma comunhão de leito, mas não comunhão de mesa e
comunhão de tecto. Duas pessoas mantêm relações sexuais, mas não vivem juntas.
42

Para além dos elementos referidos, subjectivos e objectivos, existe um requisito controverso de
natureza finalística, seguido por alguns autores, que é a ausência de uma intenção de estabelecer um
vínculo contratual entre ambos (entre os unidos de facto). É um requisito que se diria implícito.

Lei da União de Facto, Lei 7/2001

Artigo 1º: Delimitação do objecto do diploma: Este diploma trata das medidas de protecção
da união de facto

 Nº1: Delimitação positiva: A união de facto é a situação jurídica de duas pessoas que,
independentemente do sexo, vivam em condição análoga à dos cônjuges, há mais de 2 anos.

Artigo 2º: Delimitação negativa do conceito de união de facto. Casos que obstaculizam a
qualificação jurídica como união de facto. Estas situações são situações relevadas no contexto do
casamento. Ou seja, as mesmas hipóteses que obstaculizam a qualificação de um vínculo como união de
facto são obstáculos à celebração do casamento (remissão para artigo 1601º e artigo 1602º, e), b) e c) e
d) do CC). O legislador não autoriza nem a celebração do contrato de casamento nestas hipóteses, mas
também não autoriza a qualificação como união de facto.

Admitindo que nada disto está verificado, ou seja, não tendo nenhum obstáculo à qualificação
como união de facto, o escopo do diploma é a atribuição de direitos medidas de proteção (direitos
subjetivos que o legislador garante aos unidos de facto). Estes direitos funcionam, fundamentalmente,
nas seguintes hipóteses:

a) Casa de morada de família: É objecto de protecção constitucional no artigo 34º da CRP


(inviolabilidade do domicílio) e também objeto de proteção legal em sede de domicílio (artigo
82º do CC). É reconhecido quer em caso de morte, quer em caso de ruptura da união de facto. O
artigo 4º concede o direito à casa de morada de família em caso de ruptura. A ruptura é
sinónimo de cessação voluntária por um dos membros ou ambos. Aplica-se o artigo 1793º
do CC. É um dos casos em que o legislador regula, de forma expressa, a aplicabilidade
deste e do artigo 1105º do CC (arrendamento). Um dos membros da união de facto pode
continuar a viver na casa, passando a ser tratado como arrendatário. No caso de já ser, continua
a sê-lo em condições especiais previstas na lei. Em caso de morte, rege o artigo 5º da Lei
7/2001. O legislador reconhece a titularidade, pelo prazo de 5 anos, de um direito real de
habituação e de um direito de uso ou de recheio. Isto significa que o unido de facto sobrevivo
pode permanecer na casa apenas durante 5 anos. Esta é a regra. Excecionalmente, pode haver
prorrogação deste tempo nos termos previstos no nº2. A lei reconhece ainda o direito de
preferência na alienação do imóvel (artigo 9º).

b) Direitos quanto à titularidade de prestações por morte (direito da segurança social): direito
de exigir uma prestação por morte (pensão)- artigo 6º. Esta norma foi alterada em 2010. Há
muita jurisprudência que vem esclarecer que este artigo se aplica independentemente de a
43

pessoa em causa ser beneficiária da segurança social, da ADSE, de regimes complementares.


Aplica-se em termos universais, independentemente do regime beneficiado.

c) Prestações sociais em caso de morte em vida: ser beneficiário da ADSE, ter direito a pensões,
direito a ter um regime fiscal diferenciado…

d) Direitos laborais: circunstância dos membros da união de facto terem a possibilidade de exigir
à entidade patronal férias, folgas ou outras pausas que permitam juntar a família. Estes direitos
estão reconhecidos no artigo 3º/d /c da Lei da união de facto.

e) Direito a adoptar: nas mesmas condições das pessoas casadas. Artigo 7º.

f) Artigo 6º/1, da Lei 32/2006, 26 de Julho: lei que cuida das técnicas das PMA. Os membros de
união de facto também podem recorrer às técnicas de PMA.

g) Direito à indemnização em caso de morte de um membro da união de facto- indemnização


por danos não patrimoniais em caso de morte (artigo 496º nº3).

h) Artigo 2020º: direito a exigir alimentos da herança do falecido

O que não se viu em lado nenhum?

 O direito a exigir uma indemnização pelo facto de haver violação de deveres dos
membros da união de facto

 Nenhum direito de crédito no caso de um dos membros ter investido mais do que o
outro

A cessação da união de facto é regulada no artigo 8º e pode ter 3 causas:

1) Morte de um dos membros (facto jurídico em sentido estrito)

2) Ruptura (vontade)

3) Por efeitos da celebração do contrato de casamento por um dos membros

A Lei da União de Facto não regula em termos especificados a relação com os filhos, quem se
considera Pai ou Mãe da criança, porque o CC o faz. Em matéria de relações verticais descendentes é
aplicável o CC nas suas normas comuns ou especiais (artigo 1796º nº1, artigo 1871º, c)- presunção de
paternidade, e perfilhação-artigo 1849º e seguintes). Quanto às responsabilidades parentais, rege o
artigo 1911º do CC. Este artigo tem dupla importância: o nº1 vai reger no caso de vigência da união de
facto; se as pessoas já não vivem juntas (porque uma morreu ou porque se decidiram separar), o nº2
manda aplicar o artigo 1905º a 1908º CC.
44

Jurisprudência Vigente em Matéria de União de Facto

Podemos desde logo dizer que há 4 pontos essenciais na jurisprudência vigente acerca de
Uniões de Facto:

1) Podemos assumir em primeiro lugar, o princípio ou tendência maioritária, de recusa da


equiparação ao regime matrimonial, isto é, a recusa da aplicação do regime matrimonial
à união de facto.

2) Não se aplicando o regime matrimonial a jurisprudência recorre ao regime comum do


Código Civil. Assim este é o regime para resolver questões levantadas na Lei n.º 7/2001, de
11 de Maio.

3) Orientação favorável à aplicabilidade do instituto do enriquecimento sem causa


previsto nos artigos 473º a 482º, a jurisprudência quando confrontada com problemas
como a resolução de casos de contribuição desequilibrada durante a vigência da união de
facto, ou da realização de despesas familiares durante a vigência da união de facto tende a
aplicar este regime.

4) Verifica-se ainda uma orientação favorável à aplicabilidade do regime da constituição e


dissolução das sociedades de facto, com sede legal nos artigos 1007º e seguintes

Acórdãos:

1) Acórdão de 24 de Outubro de 2017 STJ: Vem enunciar o princípio supra referido da não
equiparação jurídica da união de facto ao casamento. Se não há equiparação então não
se ofende o princípio da igualdade ao não aplicar as regras matrimoniais especiais. A forma
de resolver este problema é então apelar à figura das obrigações naturais, artigos 402º a
404º. Enuncia-se ainda uma outra diretriz importante, de acordo com o STJ não existe um
direito à restituição da contribuição para a vida comum, não há um direito de crédito sobre
aquele que tenha feito uma contribuição desequilibrada em prol da vida comum dos unidos
de facto. Qualquer potencial restituição a ser concedida teria de ser trabalhada nos quadros
do regime do enriquecimento sem causa. Faz-se no acórdão ainda uma alusão à tese da
liquidação e dissolução das sociedades de facto que tem por apoio legal os artigos 1007º,
1008º e seguintes, concretamente o 1007º f) e depois os artigos 1010 º e seguintes. De
acordo com esta tesa haveria aqui a possibilidade de aplicarmos o regime destes artigos
partindo do pressuposto que tínhamos uma sociedade “para-conjugal” que poderia ser
dissolvida por vontade das partes, sendo dissolvida haveria depois uma liquidação do
património dessa sociedade através do recurso a estas regras. Ana Filipa Morais Antunes
não subscreve esta tese das sociedades.

2) Acórdão de 24 de Março de 2017 STJ30: O que vem especificamente tratado neste acórdão
é o problema da titularidade de contas bancarias no contexto da união de facto, saber
o que acontece sempre que haja conta aberta em nome dos dois como é que se pode

30Este acórdão é também relevante para uma matéria que estudaremos adiante no contexto do casamento: a
responsabilidade por dívidas
45

juridicamente proceder ao levantamento das quantias ou eventual divisão das quantias da


conta. Este é um tema importante porque na lei da união de facto como já vimos não há
norma em matéria de administração de bens, o que significa que qualquer membro da união
de facto31 pode abrir uma conta bancária em seu nome ou abrir contas solidárias32. Ao ser
solidária, uma conta pode ser movimentada por qualquer um dos seus titulares. A
circunstância de alguém ter legitimidade para ter contas solidarias não implica que o
dinheiro depositado nessa conta seja dinheiro comum, ou que seja susceptível depois de ser
dividido. Assim, na união de facto não existe nenhuma presunção e comunhão do dinheiro
na conta solidária. É isto que o acórdão explica, a circunstância de dois membros de uma
união de facto abrirem uma conta em que ambos são titulares não implica depois um
raciocínio no sentido de que cada um deles tem direito a quinhoar do dinheiro da
conta. Isto vai também no sentido do regime regra das obrigações no direito civil português,
o regime da conjunção, como indicado pelo 513º, este preceito indica que não haja
solidariedade em matéria de obrigações pelo simples facto de ter existido/existir uma união
facto. Era preciso que houvesse um contrato ou um preceito legal no sentido de derrogar o
artigo 513º.

3) Acórdão de 15 de Novembro de 2017 STJ: Trata da solidariedade e das contas


bancárias da união de facto, trata também da diferença entre ser proprietário do
património depositado numa conta e ser titular dessa conta.

4) Acórdão de 21 de setembro de 2017: Sobre uma união de facto mas o problema é no


âmbito dos direitos reais por tocar mais num problema de compropriedade e inversão do
título da posse. Este acórdão não tem por isso tanta importância.

5) Acórdão de 28 de Novembro de 2017 STJ: Trata de um problema de sucessão de leis no


tempo, em específico sobre a transmissão do direito de arrendamento sobre a casa da
morada de família por efeitos da morte. Como sabemos já, um dos direitos que é
especialmente garantido pela lei da união de facto é a possibilidade de o membro da união
de facto poder permanecer na casa de morada de família fosse esta titulada pelo falecido,
por ele próprio ou arrendada. Houve uma alteração na redacção da lei do arrendamento e o
acórdão trata de direito transitório.

6) Acórdão de 11 de maio de 2017 STJ: Este acórdão é uniformizador de jurisprudência e é


importante porque vem uniformizar jurisprudência numa questão fragmentada, a de saber
se o membro sobrevivo da união de facto tinha direito a pensão de sobrevivência33
independentemente do sistema para o qual era beneficiário.

7) Acórdão de 14 de julho de 2016 STJ : Acórdão muito importante pois vem proclamar a
não inconstitucionalidade da equiparação jurídica entre união de facto e o casamento.
Acórdão muito relevante para se ler e perceberem os argumentos da constitucionalidade. “O
respetivo âmbito foi alargado pelo artigo 1º, nº2 da Lei nº 7/2001, de 11.05 - que revogou a
Lei nº 135/99, de 28.08 -, do qual decorre que, no respeito pelo direito ao desenvolvimento da
personalidade, na vertente do direito à auto-afirmação e, dentro deste, do direito à
autodeterminação sexual (artigo 26º, nº1, da CRP), as uniões de facto passaram a abranger

31 Bem como qualquer pessoa em qualquer estado civil….


32 Em nome próprio e de outra pessoa.
33 Pensão social especialmente prevista na lei da união de facto.
46

também os casos de vivência em condições análogas às dos cônjuges de pessoas do mesmo


sexo.” e “A diferenciação do tratamento legal das pessoas casadas e das que vivem em união de
facto não viola o princípio constitucional da igualdade (artigo 13º da CRP), porquanto não
radica numa discriminação arbitrária e destituída de fundamento razoável, antes encontra a
sua razão de ser na diferente situação que resulta do casamento e da união de facto, não tendo
os membros da união de facto os mesmos deveres das pessoas casadas. Assim, os membros da
união de facto não estão, legalmente, vinculados aos deveres de respeito, fidelidade,
coabitação, cooperação e assistência previstos, para os casados, nos artigos 1672º a 1676º do
CC, não têm um regime de bens a observar e respeitar e podem vender livremente os seus bens,
além de, livremente, contratar entre si e com terceiros.”

8) Acórdão de 3 de novembro de 2016: vem enunciar a inexistência de dever jurídico de


contribuir para os encargos da vida familiar e de um correlativo dever de restituição,
portanto, entende que não existe um dever assistência nos termos do artigos 1676º e como
tal também não existe um dever de restituição. “A contribuição monetária de um dos
membros da união de facto, para a construção de uma casa e a aquisição de um veículo
automóvel, não se enquadra no âmbito da satisfação dos encargos da vida familiar. Com a
dissolução da união de facto extingue-se a causa jurídica da contribuição monetária, deixando
de ter justificação a privação da contribuição monetária prestada. A restituição opera,
nomeadamente, por efeito do instituto do enriquecimento sem causa.”

9) Acórdão de 3 de maio de 2016: Menos relevante no nosso estudo porque no fundo vai
sentenciar a mesma ideia que foi decidida pelo Acórdão de 11 de maio de 2017 STJ, por
isso mais vale a pena ler o de 2017.

10) Acórdão de 30 de março de 2016: Também não é muito relevante, trata do homicídio
qualificado. O tribunal vem tentar subsumir ao tipo legal do artigo 132º do Código Penal o
atentado contra a vida praticado entre unidos de facto.

11) Acórdão de 9 de julho de 2014: neste caso, tendo cessado a união de facto, o membro da
união de facto que quer exercer os direitos reconhecidos pela lei, tem de provar a existência
de uma união de facto. Segundo o artigo 2º-A da lei da união de facto temos estabelecida a
forma como se demonstra a existência de uma união de facto, que não sendo um contrato
nem um negócio jurídico nem sequer tem que ter qualquer revestimento exterior (forma),
prova-se a união por todos os meios probatórios legalmente admissíveis. No fundo isto é
uma remissão para Código Civil, artigos 341º e seguintes, e são meios: a prova
testemunhal, o documento de facto, etc... No caso do acórdão colocava-se a questão da
existência de uma união de facto entre duas pessoas, e um dos obstáculos foi saber como se
provava se existia comunhão de leito.

12) Acórdão 11 de abril de 2013: Duas pessoas em união de facto, e uma delas diz que vai
abandonar a casa a menos que a outra lhe venda uma propriedade por um preço simbólico.
Aqui o que temos é uma coacção moral.

13) Acórdão de 22 de maio de 2013: Relevante pois vai aplicar o artigo 2º lei da união de
facto, concretamente a alínea c) que recorta negativamente os elementos da união de facto,
47

14) Acórdão de 6 de julho de 2011: Acórdão muito importante porque trata do problema da
dissolução da união de facto e vem enunciar o princípio da inexistência de um direito a uma
compensação de vida a um unido de facto pela contribuição que fez com o trabalho
doméstico, e vem ainda rejeitar o direito a indemnização por danos não patrimoniais em
caso de rotura. Isto como veremos é importante porque no contexto do casamento quando
há lugar a divorcio o legislador prevê no artigo 1792º a reparação de danos não
patrimoniais, já se tentou defender esta norma na união de facto, e o acórdão vem afastar
esta aplicação, o que vai no sentido do que já vimos da não equiparação

15) Acórdão de 31 de maio de 2011: que nós diz como contar o prazo para a prescrição do
direito a restituição com fundamento em enriquecimento sem causa: 3 anos a contar desde
da cessação da união de facto.

16) Acórdão de 23 de novembro de 2011: relevante para o artigo 3 e) e 6º nº1 da lei da


união de facto, este acórdão cuida do direito especial previsto na lei à prestação social
independentemente da necessidade de alimento.

17) Acórdão de 4 de março de 2008: importante no tocante às responsabilidades parentais


das uniões de facto. Todos os outros acórdãos não tocam neste ponto da união. Há filhos e a
união chega ao seu termo, o que acontece? Este acórdão vai analisar fundamentalmente os
artigos 1905º e seguintes de Código Civil.

18) Acórdão de 19 de maio de 2005: vem proclamar o mesmo princípio da não


inconstitucionalidade da não equiparação entre o casamento e a união de facto.

A jurisprudência supra mencionada foi toda do STJ, vamos agora ver alguns acórdão de
tribunais de relação:

1) Tribunal de Lisboa- 14 de novembro de 2013: Tutela a casa de morada de família. Neste


caso a casa era de luxo e o prolema é que se coloca é se cessada a união de facto o membro
que pretende continuar a habitar na casa tem o direito a continuar na casa de luxo, ou se
cessando a união tem de nivelar o seu estilo de vida porque deixam de ser duas pessoas a
suportar os custos da casa.

2) Tribunal de Lisboa 18 de janeiro de 2011: vem afirmar categoricamente que não há


património comum na união de facto e rejeita aplicabilidade analógica de normas sobre a
comunhão de adquiridos, para além do mais vem rejeitar a compensação pelos encargos
para a vida em comum, não há exigibilidade jurídica para tal, depois, entra pela tese da
liquidação das sociedades civis que se apoioda nos artigos 1007 e seguintss do CC

3) Tribunal do Porto 28 de setembro de 2009: usa também a tese da liquidação das


sociedades, de forma errada no ver de Ana Filipa Morais Antunes. Não temos um direito de
48

Convivência em Economia Comum

A convivência em economia comum é uma relação juridicamente relevante para o direito da


família que é objecto de regulamentação na Lei 6/2001. Está em causa nesta figura uma convivência
familiar em espírito de solidariedade e entreajuda, as pessoas que se relacionem neste contexto estão
inspiradas num padrão de vivência, entreajuda e solidariedade.
Em termos de elementos a convivência em economia comum não se confunde com a união de
facto na medida em que há uma comunhão de teto e de mesa, mas não de leito. Esta convivência
implica que haja esforço para que o agregado se reúna na altura das refeições, mas não para partilha do
leito, está sujeita ao requisito objetivo, há uma nota de estabilidade que exige que a convivência
dure há pelo menos 2 anos. A convivência em economia comum pode operar entre pessoas do mesmo
ou sexo diferente. Uma diferença é que a convivência em economia comum pode ser entre familiares,
já unidos por vínculo de parentesco, ou pode verificar-se fora de relações familiares (exemplo: tia que
vive com a sobrinha ou dois amigos).

No que diz respeito às modalidades da convivência em economia comum podemos ter duas
classificações relevantes:

a) Protegida: é a que preenche os elementos do conceito e que portanto é apta a produzir


efeitos jurídicos, daí que seja chamada “protegida”, dado que os beneficiários vão poder
exercer os direitos previstos pelos artigos 4º, 5º e 6º da lei convivência em economia
comum. 34

b) Não protegida: não preenche os elementos do conceito e não produz os efeitos jurídicos ou
consta das excepções do artigo 3º da lei referida.

Quanto à noção releva o artigo 2º da lei 6/2001, a noção é “a situação de pessoas que vivam em
comunhão de mesa e habitação há mais de dois anos e tenham estabelecido uma vivência comum de entre
ajuda ou partilha de recursos.” Note-se que não se limita o número de pessoas como acontece no
casamento e na união de facto, podem ser mais do que duas pessoas a viver em económica comum,
temos ainda a irrelevância do sexo também. Isto tudo como elementos subjectivos, como elementos
objetivos tem de haver comunhão de mesa e habitação e vivência de entreajuda e partilha de recursos
comuns, há ainda como elemento objectivo a nota de estabilidade: é preciso que a relação dure há mais
de 2 anos.

O artigo 3º vem fazer delimitação negativa como o que acontece num preceito da lei da união
de facto por nós já visto, introduzindo excepções, isto é, elementos impeditivos da aplicação desta lei
6/2001. São eles: Existência entre as pessoas de vinculo contratual, relação de hospedagem ou sub-
locação, etc… Uma pessoa que viva num quarto arrendado a uma família não vive em convivência em
economia comum, cai numa das alíneas do artigo 3º. Este 3º artigo levanta algumas questões na sua
alínea c), nomeadamente para a definição de o que poderá ser uma finalidade transitória. Uma
finalidade transitória é uma finalidade que tem um termo pré-estabelecido, que esteja associada à

34 Lei 6/2001
49

natureza da atividade que está a ser desenvolvida pelas partes ou a outra circunstancia estabelecida,
sempre que estejamos perante uma convivência entre varias pessoas mas com finalidades transitórias
não estamos perante uma convivência em economia comum protegida. (exemplo: alguém que vai
trabalhar para um país durante 1 ano, não irá viver em economia comum com os colegas de trabalho
para efeitos desta lei.) Por último, situações de coacção ou situações com relevância criminal como é
exemplo das pessoas sequestradas que vivem em cativo não se considerará em economia comum.

Quanto aos direitos que esta lei confere releva agora olhar aos artigos 4º e 6º. Por um lado esta
lei confere proteção da casa de morada de família em caso de morte, artigos 4º e 5º. Depois temos a
transmissão de arrendamento por efeitos da morte no artigo 6º e o regime de ferias, faltas e feriados
para trabalhadores com vinculo a função publica, e regime fiscal35 comum também, artigos 4ºa) b )e c).

Esta relação é distinta da união de facto por faltarem os pilares da convivência que já
referimos supra, e quanto à natureza jurídica há autores que enquadram a convivência em economia
comum naquilo que chamam de direito convivencial ou relações para-familiares. No entanto esta
não é a posição que adoptamos neste curso, para Ana Filipa Morais Antunes esta é uma relação
verdadeiramente familiar, e portanto justifica-se o alargamento do catálogo que é meramente
enunciativo do 1576º porque no fundo estão preenchidos os elementos por nós reclamados para a
respectiva classificação de uma relação familiar: 1) figura prevista e regulada por uma lei especial; 2)
relação caracterizada pela nota de estabilidade; 3) uma relação com carácter duradouro; 4) sem tempo
pré-estabelecido.
Esta relação pode constituir-se no seio e com base noutra relação familiar já existente, exemplo
do parentesco, ou à margem de relação familiares já existentes.
Por último esta relação, não fundamenta relações de tipo familiares secundárias, na união de
facto o artigo 2020º reconhece ao membro sobrevivo o direito a herança, na convivência comum isto
não acontece. Os únicos direito que ficam garantidos em caso de morte são os previstos no
Regime de Arrendamento Urbano e os artigos 1106º e seguintes.

Apadrinhamento Civil

O apadrinhamento civil é a terceira das relações jurídicas familiares que vamos estudar neste
ponto da matéria.
É objeto de um diploma especial, a lei 103/2009 de 11 de Setembro. O que se quer com este
vínculo familiar é dar relevância à família afectiva, não vamos relevar vínculos de parentesco já
existentes nem a comunhão de tecto e de habitação, mas sim a possibilidade de alguém estabelecer
uma relação juridicamente relevante em termos familiares com outrem que é menor de idade
atuando com funções simétricas as que são concedidas aos titulares das responsabilidades
parentais. O padrinho, em termos civis, é o sujeito que vai intermediar a relação existente com as
responsabilidades parentais, não se substitui e que pretende coadjuvar e apoiar a criança e exercer
muitos dos direito e obrigações atribuídos aos responsáveis parentais.

35 Em legislação fiscal que não temos de saber aqui.


50

O conceito da relação está definido no artigo 2º da lei e é “ uma relação jurídica,


tendencialmente de carácter permanente, entre uma criança ou jovem e uma pessoa singular ou uma
família que exerça os poderes e deveres próprios dos pais e que com ele estabeleçam vínculos afectivos que
permitam o seu bem-estar e desenvolvimento, constituída por homologação ou decisão judicial e sujeita a
registo civil.” Assim este é um vínculo jurídico-legal que se estabelece com a necessidade de
intermediação de um processo onde intervém o tribunal e outros órgãos com competência.
Esta figura não pretende substituir as responsabilidades parentais, quem tem o vinculo de
apadrinhamento civil tem simultaneamente um vinculo com os pais, e se os pais não existirem, o
apadrinhamento civil não substitui as responsabilidades parentais primárias, porque o que acontece
nessas condições é a necessidade de estabelecer uma tutela legal.

Por outro lado há ainda um princípio de exclusividade, cada padrinho só pode ter um vínculo
de apadrinhamento civil, há proibição de constituir outro vínculo quanto ao mesmo afilhado, isto consta
do artigo 6º da lei do apadrinhamento civil.

Quanto à delimitação subjectiva, os sujeitos elegíveis para este vínculo resultam do artigo 3º:
crianças e jovens (os menores de 18 anos) que residam e Portugal, estes jovens, não podem ser
quaisquer jovens, artigo 5, têm que ser crianças institucionalizadas, a beneficiar de uma medida de
protecção ou que esteja em situação de perigo. A lógica é que estão em causa crianças ou jovens com
perfil de desprotecção familiar e social, e este vinculo pretende nivelar a carência que estes menores
tenham.

Quanto a delimitação objectiva, o artigo5º nº1 1ª parte diz-nos que o pressuposto é que o
apadrinhamento tenha reais vantagens para o menor, por isso o padrinho tem que ser uma pessoa com
perfil sem margem para duvidas quanto a protecção, segurança e manutenção da criança.
Nunca se pode aplicar se não estiverem preenchidos os pressupostos de confiança relevante
para a adoção, só pode ser padrinho aquele que passe por todos os testes legais para adotar crianças. O
que se compreende dado o objectivo supra referido. Esta ideia resulta do artigo 5º nº1 2ª parte.

Quem pode apadrinhar são todos os maiores de 25 anos previamente habilitados para o efeito,
artigo 4º e artigo 12º. Quem pode ser padrinho são antes de mais os familiares, além dos familiares as
pessoas idóneas, como resulta da cláusula geral do artigo 11º nº5, e uma família de acolhimento ou um
tutor.

Quanto a direitos e devers releva o artigo 7º. O conteúdo da relação jurídica do


apadrinhamento civil é simétrico ao do exercício das responsabilidades parentais, 1874º a 1920º c). Os
direitos dos pais biológicos não são postos em causa como resulta do artigo 8º. Os pais têm direito a
saber quem são os padrinhos, a identidade dos padrinhos, a morada dos padrinhos etc…

Quanto aos princípios orientadores da relação entre pais e padrinhos temos o artigo 9º que nos
dá um princípio de mútuo respeito na relação entre pais e padrinhos e preservação da vida privada.

O apadrinhamento civil tem interligação com outras relações familiares, nos casos previstos na
lei quanto ao parentesco, os parentes podem candidatar-se a ser padrinhos. Isto resulta de varias
normas da lei de apadrinhamento civil artigos 8º,9º,10º, 11º, 12º. Mas também há relação com
união de facto, artigo 14º nº1 b), exige-se consentimento da pessoa que viva com o
51

padrinho/madrinha em união de facto. Se o padrinho ou madrinha quiser ter um afilhado em termos


civis e tiver unido de facto tem de pedir consentimento. Esta pessoa em união vai ter também de passar
por um conjunto de crivos legais para verificar se é susceptível de tomar conta de uma criança.

Para Ana Filipa estamos perante uma relação familiar porque estamos perante um vínculo
previsto em lei que é tendencialmente duradouro, sem termo pré-estabelecido (isto a descontar com o
termo legal que se dá quando a criança se torna maior de idade e o apadrinhamento se extingue.)
Esta relação por outro lado gera direitos e obrigações no plano familiar:

1) no artigo 21º há uma obrigação de alimentos entre padrinho e afilhado36.

2) Depois temos os impedimentos impedientes matrimoniais: artigo 22º,37 o


apadrinhamento é um impedimento impediente à celebração de casamento entre padrinhos
e afilhados. Isto é, não prejudica a validade do casamento mas determina aplicação de
sanções de natureza distinta.

3) Equipara-se ao padrinho e afilhado ao estatuto de pais e filhos nos termos do artigo 23º
nº1, assim em matérias de faltas feriados, férias, para que o padrinho possa estar com o
afilhado tem direito a socorrer-se da sua qualidade de padrinho.38

4) Equiparação ao estatuto dos titulares das responsabilidades parentais, artigo 23º nº2 , isto
é relevante em matéria fiscal, o padrinho pode incluir na declaração de rendimento o seu
afilhado, pode também ter estatuto de dador de sangue.

5) O afilhado é equiparado a filho para efeitos de proteção dos encargos familiares, normas
dos artigos 1675º e 1676º, permitem ser aplicadas na mesma relação com o afilhado,
artigo 23 nº3, e para este efeito o agregado familiar do padrinho.

6) O apadrinhamento é um vínculo permanente, artigo 25º.

As dúvidas de o apadrinhamento hoje em dia ser, ou não, uma relação familiar, hoje não fazem
sentido para Ana Filipa Morais Antunes. A lei 2 de 2016 de 29 de Fevereiro vem dizer que há pré-
classificação do apadrinhamento civil como relação familiar: “a presente lei elimina as discriminações no
acesso à adopção ao apadrinhamento civil e demais relações familiares.” Por isso pelo menos desde
de 2016 é uma relação familiar.

Quanto a jurisprudência:

1) Acórdão STJ 25.Novembro.2004: acórdão importante porque no fundo vai


enunciar a noção de convivência em económica comum, de acordo com uma
doutrina que é invariavelmente citada na jurisprudência do STJ quanto à
densificação do conceito. “O conceito de "economia comum" pressupõe uma
comunhão de vida, com base num lar em sentido familiar, moral, e social, uma

36 Remissão nos artigos 2013º do CC e seguintes para este artigo.


37 Remissão para artigos 1601º CC e seguintes.
38 Remissão para artigos 1874º e seguintes do CC.
52

convivência conjunta com especial "affectio" ou ligação entre as pessoas coenvolvidas”


– há aqui uma noção e identificação desta noção que pressupõe não apenas a
presença simultânea de duas ou mais pessoas debaixo do mesmo teto, mas requer-
se também que haja aquela filosofia e prática de entreajuda. Portanto não basta para
que haja uma situação de convivência em economia comum que duas ou mais
pessoas estejam debaixo do mesmo teto, é necessário também que concretamente
estejam disponíveis para organizar a economia doméstica comum.

Portanto como o STJ refere esta “convivência não impõe a permanência no sentido
físico (em absoluto), antes admitindo eventuais ausências, sem intenção de deixar a
habitação, com sujeição a uma economia doméstica comum com a quebra dos laços
estabelecidos, verificando-se, assim, apenas uma única economia doméstica,
contribuindo todos ou só alguns para os gastos comuns”.

Neste acórdão o problema específico que se discute é a transmissão do direito ao


arrendamento ao abrigo da Lei nº 6/2001.

2) Acórdão STJ 05.Julho.2007: acórdão interessante porque no fundo vai relevar uma
presunção de convivência em economia comum numa relação entre tia e sobrinha. E
mais uma vez coloca-se o problema especial da transmissão do direito ao
arrendamento por morte. A tia morre e a sobrinha vem alegar que conviveu com a
tia na mesma casa por mais de 5 anos e portanto vem requerer a proteção especial
prevista na Lei nº 6/2001.

3) Acórdão STJ 13.Novembro.2007: aqui temos o mesmo tema que é transmissão do


arrendamento por morte. O acórdão vem rejeitar a qualificação como verdadeira e
própria convivência em economia comum, há mais de 20 anos, apesar de se ter
alegado, sendo matéria de facto “O ré mora no 1° andar com CC, desde há vários anos,
aí dormindo, estudando, tomando refeições, trabalhando, recebendo amigos e
correspondência, sendo o único a fazê-lo nesse período de tempo. E aí tem domiciliada
a sua conta bancária. E é aí que se encontra recenseado para efeitos eleitorais.” Mas,
sem prejuízo de toda esta factualidade, o STJ foi extraordinariamente exigente, e
considerou que não se provou o elemento finalístico da convivência em economia
comum: para além de haver uma comunhão de teto e para além de haver uma
comunhão de mesa, que aqui tinha ficado alegada e demonstrada, é necessário que
haja uma filosofia de entreajuda, uma única economia doméstica, em que algum ou
ambos contribuem para isso. Como não foi feita a prova deste elemento recusou-se a
proteção garantida pela Lei nº 6/2001.

4) Acórdão TRL 05.Dezembro.2013: estava em causa uma relação entre avó e neto,
neto este que conviveu com a avó debaixo do mesmo teto durante longos anos e a
seguir veio requerer a transmissão do arrendamento por morte. Mais uma vez o
Tribunal da Relação veio rejeitar a qualificação como verdadeira e própria
convivência em economia comum, porque entendeu que não foram demonstrados os
elementos do conceito: a entreajuda ou a partilha de recursos.

Na prática, quando as questões chegam aos tribunais, não basta única e exclusivamente fazer a
demonstração dos dois pilares requeridos pela comunhão devida. É necessário que se demonstre um
elemento da convivência e da entreajuda familiar.
53

Outras relações com implicações no Direito da Família

O acantonamento deste outro conjunto de relações é feito por uma razão desde logo, concetual
mas também pragmática. Se estas relações vão estar a ser estudas numa seção distinta do programa é
porque no entendimento da disciplina não são verdadeiras e próprias relações familiares. O que não
prejudica a circunstância de terem implicações jus-familiares.
Estas relações são vínculos intersubjetivos39 relevantes no plano do direito de família. Não
titulam elas próprias relações familiares, mas tem implicações mediatas no direito de família. E que tipo
de implicações é que se vão verificar? Em diferentes planos:

1) Estas relações jurídicas podem estar na génese, podem funcionar como motor constitutivo
de verdadeiras e próprias relações familiares. Ex: relação entre esposados ou esposais (estas
pessoas são aquelas que têm a intenção de celebrar um contrato de casamento entre si) – há
uma relação génese quanto ao casamento, pode-se ter origem naquela relação entre
esposados.

2) A segunda hipótese de relevância é surgirem no contexto do desenvolvimento de uma


relação familiar. Exemplo: se estamos a considerar a relação entre pessoa que cria e aquela
que é criada, esta relação pode verificar-se designadamente no contexto de um vínculo de
parentesco – já existe um vínculo, há laços sanguíneos entre a criança e aquele familiar, mas
estes laços vão ter relevância jus-familiar porque dão origem a uma nova relação com
implicações familiares, a pessoa que cuida e a pessoa que é cuidada. Portanto podem surgir
no desenvolvimento de uma relação familiar, seja parentesco, seja afinidade (ex: madrasta
assume uma função de cuidador), ou no contexto da união de facto40

3) Estas relações ainda podem relevar no contexto de uma fase de extinção ou cessação de
relações jurídicas familiares: tomemos como exemplo a relação entre ex-cônjuges. Os
cônjuges são aqueles que estão unidos pelo vínculo de matrimónio e que decidindo
divorciar-se passam a ser ex-cônjuges, mas nem por isso deixam de ter uma relação com
implicações no direito da família. Isto vai-se verificar havendo filhos por um lado (em
sentido vertical descendente), mas vai-se verificar também em sentido horizontal, ou seja,
na relação entre si, no plano da obrigação de alimentos.

4) Estas relações com implicações jus-familiares podem também constituir-se para suprir
insuficiências de verdadeiras e próprias relações familiares. Uma hipótese será se os
titulares das responsabilidades parentais unidos pelo vínculo do parentesco estão por algum
motivo inibidos de exercer as responsabilidades parentais41, constitui-se muitas das vezes
uma relação entre a pessoa que cuida e a pessoa que vai criar também, em 2º grau, em modo
de limitar e de suprir as insuficiências das relações familiares. Pode acontecer quer com o
parentesco, quer também no âmbito da tutela – ex: foi constituída uma relação de tutela,
mas ainda assim ela é insuficiente, criando-se paralelamente esta relação da pessoa que cria
e cuida.

39 Conceito de relação jurídica


40 Muitas das vezes a pessoa que vive em união de facto com outrem, o seu consentimento é convocado para a
tomada de decisões estratégicas no que dizem respeito crianças
41 Morreram, desapareceram, etc.
54

Relação entre esposais ou esposados

Esta relação tem três grandes planos de relevância familiar. O primeiro dos planos verifica-se
na chamada promessa de casamento42: figura que vem normativamente regulada nos artigos 1591º
a 1595º. O que se trata aqui é de um contrato-promessa, mas que tem por objeto a decisão de celebrar
um contrato definitivo que se chama casamento. A promessa de casamento é regulada
exclusivamente pela lei civil, é esta a competente na matéria, ainda que o Código do Direito
Canônico preveja no cânone 1062º uma disposição na matéria. Mas a lei civil é a competente para
esta matéria e portanto estas normas vão-se aplicar quer os nubentes celebrem casamento civil, quer
venham a celebrar um casamento católico.

Qual a grande nota distintiva deste regime quanto ao que já aprendemos sobre o contrato-
promessa? É a chamada incoercibilidade do vínculo. Enquanto que, em regra, o contrato-promessa
sendo incumprido pode dar origem e tutelar a execução específica, artigo 830º, não há execução
específica da promessa de casamento, o que significa que não é possível obrigar juridicamente
alguém a casar com ele, mesmo que haja uma promessa, que é válida, se a pessoa mudar de opção,
não pode ser constrangida pelo tribunal a vir emitir a declaração negocial que falta.
Ou seja, temos aqui presente o princípio da incoercibilidade do vínculo – esta é a nota que
resulta do artigo 1591º. Esta norma tem uma epígrafe relativamente enganosa, “ineficácia da
promessa” – mas não há nenhum problema de desvalor jurídico da promessa de casamento: é um
contrato, que pode ser perfeitamente ser celebrado ao abrigo da autonomia privada. Esta nota da
incoercibilidade do vínculo sempre resulta do artigo 830º. Neste artigo enuncia-se o princípio da
execução específica, a não ser “que a isso se oponha a natureza da obrigação assumida”, a promessa
de casamento é claramente um dos casos de obrigação intuito personae, obrigação infungível,
em que se entende ser violadora do princípio da liberdade exigir.

Se é verdade que há também um desvio quanto ao princípio da responsabilidade obrigacional


que se aplica nos termos dos artigos 798º e seguintes, nem por isso se pode dizer que aquele que
violar a promessa de casamento não é suscetível de ser sancionado, porque existem sanções previstas
também na lei. Pode o incumprimento da promessa fundamentar uma pretensão indemnizatória,
artigo 1594º, mas de âmbito limitado. Ou seja, só se indemnizam certas despesas e obrigações. Em
que casos é que pode haver lugar a esta indemnização? Artigo 1594º nº1:

a) No caso rutura de promessa sem justo motivo. O que é o justo motivo43? O critério que aqui
adotamos é um critério de índole objetiva: entende-se que há justo motivo quando por
razões objetiva, e portanto não relativas à pessoa de um dos nubentes, seja inexigível o
cumprimento da promessa, é uma nota de inexigibilidade, averiguada em termos objetivos,
que não depende de sujeito para sujeito.

b) Admite-se também a indemnização em caso de culpa de um dos esposados que leva a que o
outro retrate: um dos nubentes porta-se mal, sendo chamado o nubente culpado e o outro,
inocente, tem o direito a retratar-se44. É o inocente que não quer celebrar o contrato de
casamento, porque designadamente perdeu a confiança na outra pessoa em razão de uma
atitude que ele tenha adotado.

42 Esta promessa de casamento algumas das noções que já adquirimos em Direito das Obrigações.
43 Sinónimo de justa causa
44 Significa arrepender-se
55

Nestes casos então (nestas duas hipóteses típicas) pode haver lugar a indemnização
relativamente (beneficiários da indemnização):

a) Ao esposado inocente;

b) Aos pais do esposado inocente – este fizeram um investimento (ex: arrendaram o espaço
onde ia decorrer a cerimónia);

c) A terceiros que tenham atuado em nome dos pais, os chamados, auxiliares do


cumprimento.

Artigo 1594º/2: pode haver lugar a indemnização se o casamento não for celebrado “por
motivos de incapacidade de alguns dos contraente, desde que este ou algum dos seus representantes
tenham agido com dolo”. Neste caso o critério já é subjetivo porque está diretamente ancorada à pessoa
dos contraentes. Exemplo: vamos imaginar que um dos nubentes têm uma perturbação psiquiátrica
grave, uma esquizofrenia que foi ocultada do nubente inocente. Esta perturbação vem a ser descoberta
antes do casamento. Este é um dos casos que pode titular também esta rutura e o direito a
indemnização nos termos do artigo 1594º/2.
O que é que se indemniza? Qual o âmbito da obrigação de indemnizar? O âmbito da obrigação de
indemnizar é tipicamente o chamado interesse contratual negativo, que se dirige a reembolsar
tipicamente os montantes que foram pagos na expetativa de que o casamento seria celebrado e que
seria celebrado validamente. O que é que entra aqui então?

 Despesas: tudo o que foram despesas causadas e motivadas pela celebração do casamento

 Obrigações contraídas (ex: contratou um DJ na expetativa casamento)

 Vantagens que uma e outras pessoas possam proporcionar45 (ex: pais de um vão doar certos
bens a outro. Estas doações vão caducar na eventualidade da rutura da promessa de casamento
se verificar).

O que é que não se indemniza?

 Outros danos emergentes que não estejam tipificados na lei

 Lucros cessantes

 Danos não patrimoniais46

Regime da restituição dos donativos: podem ser as vantagens previstas no artigo 1594º/3.
Temos um regime especial para a restituição dos donativos previsto no artigo 1592º. Este regime
especial determina, no seu nº 1, que “no caso de o casamento deixar de celebrar-se por incapacidade ou
retractação de algum dos promitentes, cada um deles é obrigado a restituir os donativos que o outro ou
terceiro47 lhe tenha feito em virtude da promessa e na expectativa do casamento, segundo os termos

45 Como veremos depois, existe a possibilidade de serem feitas doações na expetativa de ser celebrado o
casamento.
46 Recordar o artigo 496º
47 Tipicamente os pais ou os familiares
56

prescritos para a nulidade ou anulabilidade do negócio jurídico48.” Há aqui um dever de restituição in


natura, há uma sanção reconstitutiva. Significa que tudo aquilo que tiver sido prestado deve ser
devolvido, para que os contraentes sejam investidos na sua situação originária, nos termos e para os
efeitos do artigo 289º.

Artigo 1592º/2: “a obrigação de restituir abrange as cartas e retratos pessoais do outro


contraente, mas não as coisas que hajam sido consumidas antes da retractação ou da verificação da
incapacidade.” Ex: cartas de amor, fotografias. Mesmo que não existisse esta norma, de onde é que já
resultaria o dever hipotético de restituição desses elementos? Se não tivéssemos norma especial como
temos no artigo 1592º/2, o dever hipotético de restituição poderia resultar dos direitos de
personalidade – artigos 75º a 78º: regem para as chamadas cartas missivas, que hoje em dia têm que
ser interpretadas de uma forma ampla, abrangendo e-mails, SMS, outros documentos. Mesmo com base
nesse regime jurídico sempre haveria a obrigação de restituir.

Esta obrigação de restituir funciona também mesmo na eventualidade de morte, artigo 1593º.
E mais uma vez não precisávamos deste artigo, porque também o artigo 71º sempre permitiria chegar
à mesma conclusão49.

Artigo 1595º: estabelece o prazo de caducidade. Estas ações, seja para peticionar uma
indemnização seja para exigir a restituição, estão sujeitas a um limite temporal, ou seja, não
podem ser exercidas sem dependência do prazo. “(…) prazo de um ano, contado da data do
rompimento da promessa ou da morte do promitente.” Isto trata-se de um verdadeiro prazo de
caducidade.

O segundo efeito da relação entre esposados são as doações para casamento50: nos termos
do artigo 1753º/1 é “doação para casamento é a doação feita a um dos esposados, ou a ambos, em vista
do seu casamento.” – ou seja, na expetativa do seu casamento, sendo que esta expetativa não é uma
expetativa jurídica, mas sim a mera expetativa.
O artigo 1753º/2 manda aplicar, em termos subsidiários, o regime comum da doação, artigos
940º a 979º. Só há uma verdadeira doação nos casos que não caiam no artigo 940º/251, pode-se
fazer um donativo conforme aos usos sociais que não tem a natureza de doação. A primeira coisa que
temos que fazer numa hipótese prática é qualificar se aquela prestação é ou não é um verdadeiro ato
liberatório, ou seja, se é praticado com animus donandi, artigo 940º. Se o ato não for praticado com
animus donandi a conclusão é que não se aplica este regime das doações, porque não há uma verdadeira
doação. As doações feitas a esposados são feitas na convenção antenupcial52, artigo 1756º.

O último efeito da relação entre esposados é a presunção de paternidade: é um efeito nas


relações verticais descendentes. Presume-se que o Pai da criança é aquele nos teros do artigo 1871º
nº1, d), 2ª parte53: a paternidade presume-se.

48 Remissão para o artigo 289º


49 Mas há uma relação entre norma especial (artigo 1593º) e norma comum (artigo 71º).
50 Remissão da promessa de casamento para os artigos 1753º a 1760º
51 Ver matéria de FDCDP
52 Contrato acessório, que é facultativo e que pode ser feito para escolher o regime de bens
53 Remissão da promessa de casamento para o artigo 1871º/1, d)
57

Relação entre ex-cônjuges

Estamos já a funcionar num plano que se segue à cessação do casamento. Há 5 grandes efeitos
na relação entre os ex-cônjuges:

1) Efeito patrimonial: há uma obrigação de alimentos. Esta está titulada nas seguintes normas: artigo
2009º/1, a) e 2016º/2 – é o regime essencial. Temos ainda outras duas normas: artigo 2016º-A/2
e 3, que vão esclarecer alguns aspetos do funcionamento da execução desta obrigação de alimentos.
Artigo 2016º-A/3: “o cônjuge credor54 não tem o direito de exigir a manutenção do padrão de vida
de que beneficiou na constância do matrimónio.” – interesse para fazer uma eventual analogia com o
regime da união de facto. Neste artigo está a ideia de que findo o casamento, finda a relação familiar,
cada um vai à sua vida a não pode ter o direito de exigir a manutenção do estilo de vida antigo.

2) Direito ao nome: esta é uma matéria que se cruza com os direitos de personalidade. Quando as
pessoas casam existe uma faculdade jurídica de aditar os apelidos do cônjuge55. Findo o casamento,
apesar de cessar aquela relação familiar, nem por isso não continua a haver um direito a manter o
apelido, por razões que dizem respeito à vida em sociedade. Exemplo: alguém casa com uma pessoa
e adiciona o apelido desta ao seu nome, passando a ser conhecido na sociedade por aquele apelido,
mesmo no círculo profissional, ora se acabar o casamento faz sentido aquela pessoa que sempre foi
conhecida por ele deixe de o ser e volte ao seu nome originário? Devido a este equilíbrio de
interesses é que o legislador no artigo 1677º B vem regular os termos em que é possível requerer
a privação do uso do nome ou requerer a manutenção do apelido, artigo 1677º, C. O princípio é que
no caso de divórcio não há nenhuma proibição quanto à utilização do nome que tenha sido adotado,
mas reconhece-se ao ex-cônjuge que se sinta afetado pela continuação de utilização do seu nome a
possibilidade de requerer judicialmente a privação judicial da utilização do nome pelo seu ex-
cônjuge.

3) Obrigação de alimentos replica-se na relação com os filhos: Havendo filhos, nascidos do


casamento, o artigo 1905º vem regular os termos da obrigação de alimentos. É possível manter
uma pensão de alimentos não apenas durante a menoridade, mas depois da maioridade até que o
filho complete 25 anos – para que isto aconteça é necessário que haja relação instrumental com, por
exemplo, a frequência de um curso, que justifique que os pais continuem a suportar essas despesas
de formação profissional. Se tal não for o caso ou se o filho desiste do curso ou claramente percebe-
se pela sua postura que nunca o vai concluir, os pais podem demonstrar e alegar em tribunal que
não há razão para continuarem a suportar aquele filho.

4) Exercício de responsabilidades parentais relativamente aos filhos menores: os cônjuges


divorciam-se, mas não deixam por isso de ser pais e não deixam por isso de continuar a ter os
mesmos direitos ou as mesmas obrigações que tinham enquanto casados, artigo 1906º56. É
necessário fazer uma distinção, em virtude deste artigo, entre duas grandes expressões, que são
também conceitos indeterminados.

54 Estamos a falar de ex-cônjuges


55 Ainda que tradicionalmente se continue a verificar que seja a mulher a aditar o nome do marido, não há
nenhuma regra nesse sentido. Qualquer um dos cônjuges pode aditar o nome do outro, e pode aditar um, pode
aditar o último, pode aditar o do meio, etc. Não existe nenhuma regra estrita nesta matéria.
56 Artigo muito importante
58

 Atos de particular importância: não são definidos pelo legislador, mas tipicamente a
regra é que quando um ato seja de particular importância ele exige o concurso de
vontade de ambos os pais, não pode ser apenas um a tomar essa decisão. Depois resta
saber o que é um ato de particular importância: em termos exemplificativos temos tudo
o que diga respeito à cláusula relativa à segurança, à saúde, à educação do filho.

 Atos da vida corrente: contrapõe-se às questões de particular importância. Os


chamados atos de vida corrente são as questões rotineiras, podem ser decididas pelo
cônjuge que tem a guarda da criança em termos primordiais ou então pelo ex-cônjuge
que excecionalmente esteja com o filho (ex: durante o fim-de-semana em que o filho vai
para a casa do pai), podendo fazê-lo sem consultar o outro progenitor.

5) Pensões sociais: estão previstas em lei especial, da segurança social. A chamada pensão de
sobrevivência: falecido um ex-cônjuge, por homenagem à ideia de que houve uma vida em comum
enquadrada no casamento, atribui-se uma prestação pecuniária ao ex-cônjuge em caso de morte.

A relação entre tutor e tutelado

Tutela: meio subsidiário relativamente às responsabilidades parentais. A tutela só se constitui


no caso de insuficiência das responsabilidades parentais, de acordo com o artigo 1921º.
Exemplo: pais morreram, pais estão inibidos, pais estão impedidos de facto, pais despareceram há mais
de 6 meses, pais incógnitos. Nestes casos deve constituir-se a tutela durante a menoridade da criança,
porque a tutela só funciona no mesmo âmbito temporal das responsabilidades parentais.

Quem é que pode ser tutor? Pode ser um familiar, ou seja, alguém que já tenha uma relação
de parentesco, tia, avó, primo. Ou então pode ser um estranho, caso de tutor designado pelo tribunal,
artigo 1931º. Se não houver uma designação pelo conselho de família é o tribunal que oficiosamente
deve indicar uma pessoa para exercer o cargo de tutor. Portanto entre esta panóplia de hipóteses
podemos ter parentes, afins, pessoas que tenham especial afeto pelo menor (ex: pode uma vizinha, que
não tem laços de sanguinidade, mas que sempre se habituou a ver a criança, ser elegível para exercer o
cargo de tutor). Estamos a falar de um processo necessariamente judicial, porque estão em causa
menores. Havendo declaração dos pais quanto a quem querem que seja tutor, vai ser relevada essa
declarada, e admitindo que a pessoa em causa está disponível para o efeito, é preciso ver se ela
consegue cumprir todos os requisitos para ser elegível como tutor, não basta a declaração dos pais
como meio a relevar.

A relação de tutoria vai ter um conteúdo simétrico ao das responsabilidades parentais,


porque no fundo serve para suprir as responsabilidades parentais. O que significa que os artigos
1935º e seguintes devem ser lidos para ficarmos com a ideia do que faz um tutor. Normas
essenciais:

1) Artigo 1935º: tem os mesmos direitos e as mesmas obrigações dos pais.

2) Artigo 1937º: atos vedados ao tutor, ou seja, que ele não pode praticar mesmo sendo tutor
59

3) Artigo 1838º: atos dependentes de autorização do tribunal57

A relação de tutela é ainda relevante porque é fundamento de impedimentos matrimonias.


Portanto quem for tutor do menor não pode validamente celebrar contrato de casamento: artigo
1604º, d)58. É claro que este impedimento é um impedimento meramente impediente, ou seja, não
obsta à validade do casamento e pode ser dispensado, artigos 1608º e 1609º.

Terceira grande relevância da tutela: é relevante em sede de adoção. O tutor só pode adotar a
criança verificados certos constrangimentos, artigo 1976º. Aquilo que se quer aqui é passar de uma
relação que é subsidiária quanto às responsabilidades parentais, para uma relação verdadeiramente
substitutiva, que será a adoção. A tutela para além de ter este condicionamento temporal, ainda é
condicionada pelo artigo 1978º nº4: se um terceiro quiser adotar uma criança, em princípio não o pode
fazer porque a prioridade será concedida ao tutor.
Ainda nestas implicações da tutela em sede de adoção: exige-se o consentimento. De quem? Do
tutor. Portanto se um terceiro, ainda assim, pretender adotar a criança, nos casos em que o tribunal
entenda que pode ser, é preciso que o tutor dê o seu consentimento, artigo 1981º/1, d).

O 4º e último efeito da tutela com implicações no direito da família: quem pode ser designado
padrinho no contexto da lei do apadrinhamento civil é também o tutor, artigo 11º/5 do regime
jurídico do apadrinhamento civil.

Relação entre pessoa cuidadora e pessoa a cargo de outrem

Pode verificar-se em 3 grandes situações:

1- Num contexto de família alargada, quando os avós, tios-avos entram ao serviço, a


prestar cuidados a menores de idade.

2 – No contexto da família afetiva, em que existem pessoas que prestaram serviços à


família ou vizinhos que diariamente asseguram a assistência de uma criança etc...

3 – Cuidados domiciliários, estes têm o seu foco de atenção privilegiado na chamada


terceira idade, portanto, nas pessoas que em razão da idade avançada ou de alguma
contingência física precisam de uma assistência.

57 Os pais também têm um conjunto de atos que não podem praticar. Ex: não podem vender a propriedade dos
filhos. Sendo por isso necessária a intervenção do tribunal.
58 Remissão dupla: do artigo 1604º, d) para o artigos 1921º e ss (tutela); e do artigo 1921º para o artigo 1604º, d)
60

Neste tipo de vinculo temos 5 grandes efeitos:

1º - 1931/1º - Possibilidade destas pessoas cuidadores podem ser designadas como


tutores, para ser tutor é necessário que se esteja em relação com alguém que seja menor
de idade, neste caso não se aplica aos cuidados domiciliários.

2º - Podem ser adotadas crianças e, nos termos do 1974º nº2 determina-se que o
adotando deverá ter estado ao cuidado do adotante durante certo prazo.

3º - A pessoa que cuida, deve prestar o seu consentimento em sede de adoção por
terceiros – 1981/1 d)

4º - Obrigação de alimentos – há uma obrigação de alimentos do padrasto e madrasta,


relativamente a enteados menores que estejam ou estivessem no momento da morte do
cônjuge a cargo deste.

5º - Pensões sociais – previstas em lei especial, e aqui podemos ter 3 grandes situações:
Pensão de sobrevivência, pensão por preço de sangue, por serviços excecionais ao
cuidado do país

Relação entre a pessoa que cria e/ou sustenta e pessoa criada e/ou sustentada
por outrem
Aqui está em causa a pessoa que cria, ou seja, pode se cumular à relação anterior. Isto é, nós
podemos ter a mesma situação de facto ao coberto da relação da pessoa cuidadora e da pessoa que cria.
Está aqui em causa uma pessoa que assegura cuidados permanentes, designadamente, a menor de idade
ou a alguém que esteja sujeito a responsabilidades parentais em termos formais. Aqui temos apenas 1
efeito jurídico: A pensão social, a pensão de preço de sangue prevista em lei especial.
61

Casamento

Conceito

Artigo 1577º: este artigo foi objeto de uma importantíssima alteração legislativa que veio
eliminar a relevância do sexo. Existem duas grandes modalidades de casamento:

1) Casamento civil

2) Casamento celebrado sob forma religiosa

Aqui a terminologia não vai ser simétrica à que encontramos em alguns dos manuais.
Concretamente não é correto equiparar, como sinónimos, casamento católico a casamento sob forma
religiosa. O casamento católico é uma espécie de casamento sob forma religiosa, isto porque não existe
nenhuma exclusividade no que diz respeito às comunidades religiosas quanto à celebração do
casamento segundo um rito católico. Outras religiões podem de igual forma celebrar casamento. Ou
seja, temos o casamento civil e o casamento sob forma religiosa, e dentro deste encontramos o
casamento católico59.

O artigo 1577º dá uma noção de casamento. Não existe uma noção universal de casamento. O
CC adota esta noção, mas não vamos encontrar noções congéneres e simétricas mesmo nos nossos
vizinhos europeus, e muito menos fora da Europa, e muito concretamente no âmbito das sociedades
orientais e não ocidentalizadas. Ou seja, não existe aqui nenhuma possibilidade de dar uma noção
universal de casamento.
Por outro lado o casamento pode ser relvado num plano da conceção de diferentes perspetivas.
Temos 6 grandes perspetivas de conceito de casamento:

1) Instituição jurídica: ideia de casamento como garantia institucional60. O que é que isto
significa? Que temos um instituto dotado de traços identitários que têm que ser respeitado
pelo legislador e pela sociedade.

2) Compromisso jurídico de conteúdo vinculado e típico: o casamento é um compromisso


jurídico, o que significa que foi acolhido pelo legislador que lhe dotou um regime imperativo,
tendencialmente, e que não admite modificações, a não ser nos casos excecionais que são
admitidos

3) Contrato: perspetiva do casamento como acordo de vontades. Sendo um contrato requer que
seja aceite por essas duas pessoas de forma esclarecida e de forma livre, portanto sem erro e
sem coação

59 Será este que, por razões de tradição e de maior expressão, vamos desenvolver aqui de forma mais detalhada.
60 Vimos isto quanto à família, e no que toca ao casamento serve a mesma ideia
62

4) Compromisso privado: ideia que hoje em dia ganha algum folgo, mas é no fundo a ideia de
que o casamento é um compromisso privado que deve estar subtraída a ingerência do Estado.
Ou seja, a ideia segundo a qual o casamento é o tal papel ou um acordo que deve ser definido
em última análise por aqueles que o outorgam e sem as grandes ingerências do Estado. Não é
esta a perspetiva no nosso direito vigente, mas há quem avogue que o caminho deve ser esse

5) União baseada na convivência e na affectio maritalis: isto é a conceção romana de


casamento, a conceção histórica, a ideia de que há uma relação amorosa acima de mais entre
os cônjuges. Também não é esta a perspetiva hoje em dia que vingou na nossa lei

6) Estado:61 estado de casado é uma posição juridicamente atendível. E portanto é outra forma
de olharmos para o casamento, é olharmos para os direitos e obrigações que são reconhecidos
a cada um dos membros do casamento

Traços Identitários

1) Contrato: o casamento é um contrato especial, é um acordo de vontades. E é um contrato que


releva, artigo 232º, o contrato não se considera concluído enquanto as partes não houverem
acordado sobre todos os pontos sobre os quais dotaram essenciais o consenso. É fundamental a
ideia de esclarecimento quando alguém celebra o casamento. É por isso que, seja ele o
casamento civil ou casamento sob forma religiosa, tem que, ou o conservador ou o ministro de
culto que está a assegurar a cerimónia, assegurar-se que antes do consentimento os nubentes
têm plena consciência e aceitam os efeitos do casamento

2) Entre duas pessoas: o casamento há luz do direito civil vigente só pode ser celebrado entre
dois sujeitos e não entre mais. Isto exclui naturalmente o casamento poligâmico e exclui
também a possibilidade de celebrar casamento com um animal. Em termos de corolários temos
duas ideias:

 Casamento pressupõe exclusividade: relação exclusiva entre aquelas duas


pessoas, que estão vinculadas a deveres conjugais que se exercem naquele estrito
fecho relacional

 Pressupõe-se uma vivência íntima dessas duas pessoas: se essas duas pessoas
são apenas elas que fazem o casamento é entre elas que devem ser partilhada toda
a cumplicidade e toda a intimidade de um e outro

3) Contrato que visa a constituição da família: é a ideia do casamento na génese de uma relação
familiar. E portanto este contrato vai permitir a constituição desta relação familiar.

4) Mediante uma plena comunhão de vida: os 3 pilares, esta é a plena comunhão de vida. Para
ser plena62 tem que funcionar nos 3 planos: Leito, Mesa, Teto.

61 Quando vimos a relação entre estado pessoal e direitos familiares falamos nisto. Estado = casado.
62 Sinónimo de absoluta
63

5) Nos termos das disposições deste Código: ou seja, isto significa que temos um modelo legal:

 Injuntivo: não pode ser postergado por vontade das partes, artigo 1651º/2)63

 Tipicidade de deveres conjugais, artigos 1672º e seguintes

 Restrição à autonomia negocial

 Exigência de exclusividade

6) Estabilidade do vínculo: isto é um traço que é implícito, o legislador não o enuncia


expressamente. Mas é um requisito implícito. Portanto a ideia de que alguém quando casa não
está a pensar divorciar-se, a ideia de relação tendencialmente duradoura, que pode ter fim por
divórcio ou por morte nos casos previstos na lei

Estes 6 traços identitários valem para a regulação do casamento civil. No casamento católico
vamos encontrar desde logo duas especialidades:

1) Celebrado entre duas pessoas de sexo diferente: no direito canónico não se admite o
casamento entre pessoas do mesmo sexo

2) Vocação de perpetuidade: o casamento celebrado à luz do direito canónico é uma união


tendencialmente perpétua, cânone 1141º e ss. Já não estamos a falar de uma união
tendencialmente duradoura, é uma união para a vida e que portanto deve ter como causa de
cessação tipicamente a morte. É claro que esta ideia foi mitigada com a Concordata celebrada
em 2004 e que hoje em dia há a possibilidade, também constitucionalmente deferida, de haver
divórcio com efeitos jurídico-civis no casamento católico. Hoje em dia não se pode admitir a
insusceptibilidade de duas pessoas que tenha celebrado casamento católico não se poderem
divorciar

Modalidades de casamento

Artigo 1587º: modalidades de casamento. O casamento pode ser:

1) Casamento católico

2) Casamento civil

Esta é uma norma que é suscetível e é merecedora de críticas na medida em que é redutor
considerar que temos o casamento civil e o casamento católico. Verdadeiramente o que temos é o
casamento civil e o casamento celebrado sob forma religiosa, seja qual for a religião professada.
Artigo 1587º nº2: esta norma vem concretizar o que já resulta do artigo 36º/2 CRP64.
Portanto o CC aqui está a fazer uma remissão para a existência de uma regulamentação paralela, do

63 Não são admitidos a registo quaisquer casamentos que contrariem os princípios de ordem pública internacional
do Estado português
64 Remissão do artigo 1587º/2 para o artigo 36º/2 CRP
64

casamento católico, que, sem prejuízo do exposto ser paralela, é admitida pelo direito e tem efeitos
jurídico-civis, artigo 36º/2 CRP. Há aqui um princípio de reserva de lei em matéria de regulamentação
de todas as formas de casamento. Portanto do artigo 36º/2 CRP vão resultar 4 grandes ideias:

1) Princípio de reserva de lei

2) As modalidades de casamento previstas no artigo 1587º nº2 são meramente


exemplificativas: como a CRP denuncia “independentemente da forma de celebração”, ou seja,
seja ela qual for

3) Legislador adotou um sistema de casamento civil facultativo: isto significa que não existe um
sistema de casamento civil obrigatório, nem um sistema de casamento religioso obrigatório
nem subsidiário. Portanto temos um princípio de casamento civil facultativo. O que é que isto
significa? O Estado vai atribuir efeitos civis ao casamento civil ou ao casamento
celebrado sob forma religiosa. Esta é uma ideia que pode ser ancorada, para além do 36º/2
CRP, na Lei da liberdade religiosa65, artigo 19º/1: “São reconhecidos efeitos civis ao casamento
celebrado por forma religiosa perante o ministro de culto de uma igreja ou comunidade
religiosa radicada no País. (…) ”.66 A Lei da liberdade religiosa também enuncia o mesmo
princípio segundo o qual pertence à lei civil e apenas à lei civil fazer a regulamentação desta
matéria. Na lei da liberdade religiosa temos esta expressão que é ministro de culto, este é
definido pelo artigo 15º desta lei. E as comunidades religiosas vêm definidas no artigo 37º
da Lei da liberdade religiosa.

4) Admissibilidade de formas de celebração de casamento religioso: seja ele católico, seja


ele não católico. Aliás há um princípio de proibição de discriminação entre diferentes
confissões, que resulta da Lei da liberdade religiosa.

Há uma questão relativa com a eventual constitucionalidade ou inconstitucionalidade do artigo


36º/2 CRP.

1) Professor Gomes Canotilho e professor Vital Moreia: tem entendido que não se pode admitir a
existência de diferentes modalidades de casamento para além do civil. Ou seja, só admitem uma
modalidade de casamento, que é casamento civil. E dizem que o resto não são verdadeiras
modalidades. Entendem que é inconstitucional o regime que reserva aos tribunais eclesiásticos a
competência para decidir das causas de invalidade do casamento católico, como resulta do artigo
1625º: “O conhecimento das causas respeitantes à nulidade do casamento católico e à dispensa
do casamento rato e não consumado é reservado aos tribunais e repartições eclesiásticas
competentes” – portanto estes professores tem advogado a inconstitucionalidade deste preceito.

2) Professor Pereira Coelho e professor Guilherme de Oliveira: contrariam a tese sustentada pelos
dois anteriores autores. Entendem que não é inconstitucional, porque aqui a ideia é admitir que o
casamento católico é uma modalidade especial que comporta portanto a admissibilidade de um
regime singular, em determinadas medidas. Um dos traços do regime do casamento católico diz
respeito ao facto de o valor jurídico negativo, ou seja, a sanção da ineficácia jurídica quando o
casamento católico tem uma falha ou patologia, é a nulidade. Enquanto que no casamento civil é a
anulabilidade, por regra. Esta é logo uma razão de diferença que justifica que possa existir um

65Lei nº 16/2001, de 22 Junho


66Remissão do artigo 36º/2 CRP para o artigo 1587º/2 CC e para o artigo 19º da Lei da liberdade religiosa (e
remissões recíprocas)
65

regime paralelo entre o casamento católico e o casamento civil. Não se pode de forma líquida
sustentar a inconstitucionalidade do artigo 1625º.

Casamento católico

Esta figura releva e pressupõe uma relação imediata entre o Estado e a religião. Sendo certo que
no direito vigente o Estado é laico, artigo 41º/4 CRP, o que significa que não advoga nenhuma religião
oficial e pelo contrário admite uma separação do Estado de qualquer comunidade religiosa.

Este princípio da separação do Estado das comunidades religiosas é depois reiterado pelo artigo
3º da Lei da liberdade religiosa67. A separação entre o Estado e a religião não faz com que não haja um
dever de cooperação entre o Estado e as comunidades religiosas e entre elas a Igreja Católica. Este
dever de cooperação é enunciado pelo artigo 5º da Lei da liberdade religiosa. É ao abrigo desta
cooperação que se admite a possibilidade de serem celebrados acordos entre o Estado e certas
comunidades religiosas.

Um desses acordos foi precisamente a Concordata que foi outorgada em 2004 entre o
Estado e a Igreja Católica. A Lei da liberdade religiosa, nos termos do artigo 45º, admite a celebração
de acordo – portanto o Estado pode ir celebrando acordos parcelares com as diferentes religiões de
modo a relacionarem-se de modo cordial e com respeito mútuo. Quadro normativo relevante para a
regulamentação do casamento católico:

1) CRP: aqui vamos relevar o artigo 36º/2, artigo 41º/4 e o artigo 288º, c)68. Esta última norma
cuida dos limites materiais à revisão constitucional: um dos limites à revisão constitucional
é precisamente a separação entre o Estado e a Igreja, nunca pode ser postergado pela
revisão constitucional.

2) Concordata de 2004: tem um valor infraconstitucional, mas é supralegal, ou seja, prevalece


sobre as disposições da lei ordinária. Os artigos relevantes são os artigos 13º a 16º.

3) Lei da liberdade religiosa: para além do artigo 3º e do artigo 5º, a norma mais importante
é o artigo 19º, sobre a celebração de casamentos sob a forma religiosa

4) Código do Registo Civil: série de disposições importantes para a celebração do casamento,


artigos 146º e ss

O casamento católico é um instituto próprio, particular e com traços identitários distintos do


casamento civil. Este instituto tem como um dos traços fundamentais a sanção da nulidade como
desvalor jurídico, também se diferenciando do casamento civil neste aspeto.
Para além do mais tem uma outra fisionomia tão particular que justifica que a própria Igreja
Católica tenha elaborado um códex: conjunto de articulado destinado a regular, entre outras questões,
também o casamento católico – Código do Direito Canónico de 1983 (CDC)69. Quais as normas

67 Remissão do artigo 41º/4 CRP para o artigo 3º da Lei da liberdade religiosa (e vice-versa)
68 Norma estudada em IED e Direito Constitucional
69 Em anexo ao CDC encontramos a Concordata de 2004.
66

relevantes? São dois livros. O CDC é como o CC, está construído e sistematizado em diferentes livros. O
livro mais relevante é o livro IV, que cuida do matrimónio, nomeadamente a noção de matrimónio,
as características deste, os impedimentos, as causas de invalidade – ou seja, tudo aquilo que está
no CC, mas é um regime paralelo. O livro IV começa nos cânones70 1055º e seguintes. E depois, para
além deste livro IV, existe o livro VII, que é um livro estritamente processual, em que não nos interessa
tudo: interessa-nos a parte III (alguns processos especiais), cânones 1671º a 1707º (causas para
declarar nulidade, causas para os cônjuges se separarem, o processo, etc.)

Direito Canónico

Cânone 1055 - Vem definir o casamento católico este cânone permite já perceber alguns traços
identitários do conceito, nomeadamente:

1º - Casamento é perspetivado como um sacramento

2º - É um pacto, ou seja, é um acordo de vontades. Aqui estamos numa linha idêntica à que
resulta do artigo 1577º

3º - É um vinculo entre um homem e uma mulher, distinto do artigo 1577º que hoje em dia
proclama o principio da irrelevância do sexo

4º - Trata-se de uma comunhão íntima, isto está na linha do que vem no 1577º, é uma comunhão
plena, ou seja, implica uma comunhão de teto, mesa e leito.

5º - Mas, esta comunhão intima é de toda a vida, também aqui é distinto do 1577º, há aqui uma
ideia de perpetuidade ao contrário do que sucede na lei civil

6º - Há uma ordenação para procriar, ideia segundo a qual o casamento católico tem
como finalidade a procriação e educação da prole, ou seja, dos filhos que se constituam por
efeitos do casamento. Também aqui não se está em sintonia com o CC, com a leitura que pode
ser feita hoje em dia, na medida em que não é essencial a procriação para que se possa admitir a
celebração do casamento como válida e eficaz. Enquanto no casamento católico continua a
haver a ideia de que quem casa deve constituir naturalmente família, através da procriação
biológica.

Cânone 1056 – Vem tratar dos caracteres do casamento católico: 1º - Unidade; 2º -


Indissolubilidade - esta ideia hoje em dia não constitui direito vigente, à luz do artigo 36º da CRP
toda e qualquer modalidade de casamento pode cessar por efeito do divórcio, independentemente da
forma de celebração. Isto é, não se pode advogar a ideia de indissolubilidade do vinculo à luz da lei civil,
mas não é assim para o direito canónico.

70 O mesmo que um “artigo”


67

No que diz respeito à tramitação, são exigidos certos requisitos que depois vão ser replicados
no CC, entre esses requisitos encontramos 2 grandes realidades:

1º - Consentimento – Cânone 1057 – Sendo o casamento um acordo de vontades, exige-se que


ambos os nubentes estejam de acordo quanto à celebração do casamento, isto é, queiram casar.

2º - Capacidade – Cânone 1058

Cânone 1061 – O casamento validamente celebrado tem de ser celebrado entre batizados, e
se não for consumado, ou seja, não houver relações sexuais, diz se rato e não consumado. Se
houverem relações sexuais o casamento diz-se rato e consumado. Se os cônjuges coabitarem, presume-
se a consumação.

Estes cânones, têm de ser completados com os cânones 1073 e seguintes, porque nós
inicialmente temos a chamada delimitação positiva da capacidade – pode celebrar casamento todos
os que não sejam inábeis, isto é, quem não seja incapaz e depois os 1073 e seguintes vão recortar pela
negativa o requisito da capacidade, portanto, admitindo que a pessoa não sofre de nenhuma
incapacidade, há, contudo, situações concretas que impedem a celebrar valida do casamento – são
os impedimentos matrimoniais.

Cânone 1073 – Vem dizer aquilo que resulta pela negativa do cânone 1058

Cânone 1075 – Quem é que tem competência para declarar e estabelecer outros impedimentos
entre batizados?

Apenas a autoridade suprema da igreja, portanto, compete exclusivamente à autoridade


suprema da igreja declarar autenticamente quando é que o direito divino proíbe ou dirime o
matrimónio.

Cânone 1078 a 1082 – vêm cuidar da chamada dispensa. Já tínhamos visto na lei civil que
relativamente aos impedimentos impedientes é possível pedir dispensa, aqui no quadro do direito
canónico, vem se permitir a dispensa quanto aos impedimentos dirimentes.

1078 paragrafo 3 – Em razão de vinculo de parentesco, nunca de concede dispensa.

Cânone 1083 e seguintes – Vêm cuidar dos impedimentos matrimoniais em especial

Cânone 1083 – vem estabelecer um impedimento matrimonial em razão da idade. No direito


civil a idade para a celebração de casamento começa para os maiores de 16 anos, tendo estes de ter
autorização – 1612º CC. Já no direito canónico, as mulheres com 14 anos completos podem celebrar
casamento e os homens apenas com 16 completos.

Cânone 1084 - vem estabelecer um impedimento matrimonial em razão da impotência para


realizar o ato conjugal. Se o matrimónio visa a procriação, se há uma situação de impotência não é
possível de procriar. Paragrafo 2 + Paragrafo 3 – neste ultimo temos a distinção entre impotência e
esterilidade, essa não proíbe nem anula o matrimónio.
68

Cânone 1085 – nº1– “Atenta invalidamente contrair matrimónio quem se encontrar ligado pelo
vínculo de um matrimónio anterior, ainda que não consumado(ou seja, rato)” nº2 – “Ainda que o
matrimónio anterior tenha sido nulo ou dissolvido por qual- quer causa, não é permitido contrair outro
antes de constar legitimamente e com certeza da nulidade ou dissolução do primeiro”

Cânone 1086 – nº1 – A ideia segundo a qual, que já é enunciada nos primeiros canones, o
batismo é um sacramento essencial para a celebração valida de um casamento entre duas pessoas
que pretendem celebrar um casamento católico.

Cânone 1087 + 1088 – são impedimentos por razões religiosas

Cânone 1089 – Tem vindo a ser advogado por teorias não jurídicas, parece que há um síndrome
depois do rapto, que faz com que se crie uma ligação emocional com o raptor. Dai se determinar a
invalidade do casamento celebrado nestes termos.

Cânone 1090 – Temos aqui situações de homicídio qualificado, alguém é casado com outrem,
isto que é um impedimento para contrair um novo casamento, como tal, recorrem à morte do cônjuge.

Cânone 1091 1. Na linha reta de consanguinidade é inválido o matrimónio entre todos os


ascendentes e descendentes, tanto legítimos como naturais. 2. Na linha colateral é inválido o
matrimónio até ao quarto grau, inclusive. 3. O impedimento de consanguinidade não se multiplica.4.
Nunca se permita o matrimónio, enquanto subsistir alguma dúvida sobre se as partes são
consanguíneas em algum grau da linha reta ou em segundo grau da linha colateral.

Cân. 1092 — A afinidade em linha reta dirime o matrimónio em qualquer grau.

Cân. 1093 — O impedimento de pública honestidade origina-se no matrimónio inválido após a


instauração da vida comum ou de concubinato notório ou público; e dirime as núpcias no primeiro grau
da linha reta entre o homem e as consanguíneas da mulher, e vice-versa.

Cân. 1094 — Não podem contrair matrimónio válido os que se encontram vinculados por
parentesco legal originado na adoção, em linha reta ou no segundo grau da linha colateral.

Com isto, fica visto o regime da capacidade e dos impedimentos familiares para o casamento
católico, faltando ver o tema do consentimento.

É iniciado pela positiva no can.1057, sendo depois é objeto de concretização nos can.1095 e
ss pela negativa.

Can.1095 - São incapazes71 de contrair matrimónio

1.° os que carecem do uso suficiente da razão;

2.° os que sofrem de defeito grave de discrição do juízo acerca dos direitos e deveres essenciais
do matrimónio, que se devem dar e receber mutuamente

71Não tem nada a ver com a incapacidade que falamos agora, são incapazes no sentido que o casamento não se
pode considerar valido e perfeito
69

3º os que por causas de natureza psíquica não podem assumir as obrigações essenciais do
matrimónio.

O Codigo do Direito canónico, vem relevar em sede de consentimento, situações que


materialmente podem ser qualificadas como verdadeira incapacidade jurídica.

Can.1096º - 1º - Para que possa haver consentimento matrimonial é necessário que os


contraentes pelo menos não ignorem que o matrimónio é um consórcio permanente entre um homem e
uma mulher, ordenado à procriação de filhos, mediante alguma cooperação sexual. Portanto, é
fundamental para que se possa considerar este contrato validamente celebrado, que os nubentes
tenham consciência das propriedades do matrimónio e do sentido e da importância do acto à luz
da igreja católica. Tal ignorância depois da puberdade não se presume

Can.1097 – são casos de vícios na formação da vontade – Erro sobre a pessoa

1º - O erro acerca da pessoa torna inválido o matrimónio

2º - O erro acerca da qualidade da pessoa, ainda que dê causa ao contrato, não torna invalido o
matrimonio, a não ser que directa e principalmente se pretenda esta qualidade.

Can.1098 – Quem contrai matrimónio enganado por dolo, perpetrado para obter o
consentimento, acerca de uma qualidade da outra parte, que, por sua natureza, possa perturbar
gravemente o consórcio da vida conjugal, contrai-o invalidamente

Can.1099 – Outra hipótese de erro, mas não sobre a pessoa, sobre as características do
matrimónio, será um erro sobre o conteúdo, sobre o objeto negocial.

Can.1101 – Vai explicar como é que se presta o consentimento. O consentimento presume-se


conforme com as palavras ou sinais empregados ao celebrar o matrimónio.

Can.1102 - Não se pode contrair validamente matrimonio sob condição de um facto futuro –
Portanto, o matrimonio é insuscetível de lhe ser posta uma condição.

Can.1103 – É invalido o matrimonio celebrado por violência ou por medo grave, incutido por
uma causa externa, ainda que não dirigido para extorquir o consentimento, para se libertar do qual
alguém se veja obrigado a contrair matrimonio.

Can.1104 – Vem enunciar um princípio que nós podemos considerar que é o princípio da
pessoalidade do consentimento. O consentimento sendo uma peça essencial para a celebração do
contrato de casamento, tem de ser prestado pelos contraentes que se encontrem
simultaneamente presentes, por si mesmos ou por procurador. Ou seja, admite-se a celebração de
casamento por procuração, ainda que não possa entender que há um verdadeiro procurado, aquilo que
há é um núncio.
Os nubentes expressem por palavras o consentimento matrimonial; mas se não puderem falar,
por sinais equivalentes – esta é a mesma ideia que já tínhamos visto no can.1101.

Can.1105 – Vai regular de forma particular o casamento por meio de procurador.


70

De tudo isto que já visto resulta o quê? O casamento católico pode ser celebrado em
condições válidas, não havendo interferências de vícios na formação de vontade, que afetam:

- quer o esclarecimento(erro) sobre a pessoa ou sobre o objeto

- uma vontade não livre, coação legal

- Este consentimento pode ser celebrado por declarações expressas ou tácitas (217º CC) e tem
de ser pessoal, apesar disto não prejudicar a interferência de um procurador.

Em relação ao casamento rato ou consumado, o can.1142 – vem admitir a possibilidade de ser


dispensada este impedimento. “O matrimónio não consumado entre batizados ou entre uma parte
batizada e outra não batizada pode ser dissolvido pelo Romano Pontífice por justa causa, a pedido de
ambas as partes ou só de uma, mesmo contra a vontade da outra” – É uma causa de dissolução do
casamento, a circunstância de não ter havido consumação.

Can.1108 e seguintes – vão explicitar o processo quanto à forma de celebração de matrimonio.


Can.1024 e ss- Regem os matrimónios mistos, aqueles que são celebrados entre 2 pessoas
batizadas, uma batizada na igreja católica e outra pertencente a uma igreja diferente.

Quanto aos efeitos do matrimonio – 1134 a 1140

Can.1134º - Do matrimonio válido origina-se entre os cônjuges um vínculo de sua natureza


perpétuo e exclusivo + can.1055; no matrimonio cristão, além disso, são os cônjuges robustecidos e
como que consagrados por um sacramento peculiar para os deveres e dignidade do seu estado –
paragrafo 2 can.1056º

Can.1135 – Ambos os cônjuges têm iguais deveres e direitos no concernente ao consórcio da


vida conjugal.

Can.1137 – Este cânone hoje em dia, à luz do artigo36º da CRP não se pode considerar
válido, mas não esquecer que estamos a falar de uma regulamentação da igreja católica, não é uma lei
ordinária. Só a própria designação de filhos ilegítimos é em si uma discriminação que não se pode
admitir hoje em dia.

Can.1139 – Os filhos que nasceram antes do casamento, nasceram em pecado, podem ser
legítimos se os pais entretanto celebrarem casamento.

Separação dos cônjuges – can.1141 e ss

Can.1141 – aqui remissão para o artigo36/2 da CRp que vem admitira possibilidade de divórcio
quanto a todas as modalidades de casamento, independentemente da sua forma de celebração. Para a
igreja católica o casamento é indissolúvel .

A lei civil regula os efeitos do casamento católico, os efeitos civis, como resulta da diretiva do
artigo36/2 da CRP e do artigo1587 nº2 do CC. A lei civil reconhece valor e eficácia ao casamento
católico.
71

Artigo 1588 – Determina que o casamento católico rege-se, quanto aos efeitos civil, pelas
normas comuns deste código, salvo disposição em contrário

Artigo 1590 – Esta norma temos de articular com a possibilidade do casamento urgente de
acordo com o regime do código do direito canónico.

Pressupostos da celebração do casamento

Já tínhamos visto que o sistema no casamento civil não é imposto, é facultativo, tal como não é
imposto a celebração do casamento católico. Há um direito de opção quanto à forma de casamento que
vai ser celebrada, mas há um aspeto comum, seja ele casamento católico ou celebrado ao abrigo de
outra religião ou casamento civil, há um ponto comum: O casamento é um negócio que produz efeitos
jurídico-civis regulados pela lei civil.

Artigo 1596º - Diz-se aqui que o casamento católico só pode ser celebrado por quem tiver a
capacidade matrimonial exigida na lei civil. Exige-se isto independentemente da regulamentação
particular constante do código do direito canónico. As regras essenciais que se vão aplicar são as
constantes do CC, em particular do 1600 e seguintes

Artigo1597º - Processo preliminar de casamento, isto é obrigatório em qualquer


modalidade de casamento que seja celebrado, e é neste processo que vamos averiguar a capacidade
matrimonial. A capacidade dos nubentes para contrair casamento é comprovada por este meio. Se os
nubentes têm intenções de celebrar casamento católico, têm de iniciar o processo junto da igreja da sua
zona de residência, e nesse é o padre que vai emitir uma declaração para a conservatória para dizer que
está aberto o processo. Nos termos deste processo preliminar de casamento é emitido um certificado,
este atesta a existência de capacidade matrimonial.

Artigo1599º - Os chamados casamentos urgentes, já vimos que em certas circunstancias


excecionais previstas na lei, portanto não admitem interpretação extensiva, é possível celebrar o
casamento sem observância da tramitação comum.

O que é que significa sem observância da tramitação comum? Com dispensa do processo
preliminar – as duas principais razões é a iminência da morte e a iminência de parto. Em termos de
tramitação, se alguém quiser celebrar casamento católico, aquilo que tem de fazer é:

1º - Preencher o duplo requisito de capacidade e consentimento

2º - Tem que desencadear o processo preliminar do casamento, que se destina a averiguar a


existência de algum impedimento matrimonial. Este processo segue nas conservatórias de
registo civil, mesmo nos casos de casamento católico.

3º - Termina com a emissão do certificado – 1598º

4º - Terminada essa fase, há lugar à celebração do casamento.


72

5º - Registo

Isto na verdade são 3 fases – 1º processo; 2º- celebração; 3º - registo – estas 3º fases são
reguladas no direito canónico nos termos que vimos, e no CC, mas também no código do registo civil.
Esse código é o diploma que cuida das formalidades e da forma de cumprir das formalidades que são
exigidas para estes efeitos. Que normas é que temos de conhecer? Quanto ao processo preliminar de
casamento – artigo 134º a 145º do Código do Registo Civil

136º - Quem é casado tem de fazer uma declaração no sentido de que quer celebrar casamento.
Esta norma vem reger a forma e conteúdo da declaração.

140º - Publicidade do processo – o processo preliminar do casamento é publico, na parte que


respeita em relação a certos elementos.

145º - Iniciado o processo para a celebração do casamento, o casamento depois tem de ser
celebrado em determinado prazo, sob pena de caducar todo este processo preliminar. O prazo é
de 6 meses.

Em relação ao consentimento existem normas especiais do código do registo civil que temos de
adicionar à regulação do casamento do menor no 1612º.

Celebração do casamento católico – 151º + 152º

151º - É necessário certificado, excetuando os casamentos articulo mortis, isto já está previsto
no 1599º

152º - Casamento católico celebrado no estrangeiro entre nubentes portugueses ou português e


estrangeiro.

Registo do casamento católico – 167º e seguintes – tem de haver um assento paroquial onde
depois vai ser averbado o registo para efeitos de publicidade do ato de matrimonio. Há um conjunto de
elementos que são absolutamente imperativos e tem de constar deste assento, como:

1- Dados de identificação

2- Existência de consentimento dos pais ou representantes no caso de serem menores (149º e


150º)

3- Declaração prestada pelos nubentes que realizam o casamento de livre vontade

4- Apelidos adoptados por qualquer uma das partes


73

Natureza Jurídica do Casamento Católico

O casamento católico quanto à natureza jurídica pode ser visto de uma dupla perspectiva: 1)
como um sacramento à luz da igreja católica; 2) como um negócio jurídico à luz do direito civil,
um pacto, que tem como traços identitários a circunstância da diversidade dos sexos, a circunstância de
ser celebrado intuito persona (pessoal), e o traço de uma grande solenidade: o casamento católico
implica uma cerimónia com figurino tal que se afasta do casamento civil enquanto figura no que toca à
solenidade, e daí a importância do ato para a igreja católica que tem que se observada, é um conjunto de
ritos e momentos expressos.

Casamento Civil

Já natureza Jurídica do Casamento Civil: só é visto como um negócio jurídico e é um contrato


bilateral, e é intuito persona, e não é solene, só tem de ser levado a registo e não tem de ser um contrato
por escrito. Por outro lado é um contrato de conteúdo vinculado muito limitado no que toca à liberdade
de estipulação dos nubentes.

Quais são os requisitos de perfeição do casamento civil?

1 – Capacidade: regulada nos 1600 a 1609 do Código Civil e expressa-se em três grandes
directrizes: a) maturidade (diferente da idade) b) consciência da vinculação c) ausência de
impedimentos

2- Consentimento: 1617 a 1621º + 1631º a 1645º. Aqui há quatro grandes exigências: a)


consentimento tem de ser atual, b) pessoal (e por isso presencial) , c)puro e simples, d)
consentimento tem de ser perfeito: i) esclarecido, ii) espontâneo iii)livre

A constituição da relação jurídica matrimonial civil

Vamos ter Tramitação comuns: as diferentes fases processuais que se aplicam ao casamento
civil e Tramitações especais: as que vamos estudar dizem respeito a 4 situações. As tramitações
especiais são aquelas em que, por diferentes razões, há desvios à tramitação regra.

Antes de iniciarmos o estudo das tramitações, importa recordar que o casamento civil está
envolto numa exigência de solenidade. Esta lógica de solenidade justifica que quer o Artigo 1615º CC
quer o Artigo 155º CRC contenham exigências muito importantes em matéria de forma. Estas exigências
são aquilo a que chamamos de formalidades ad substantiam, ou seja, formalidades que são exigidas
para a plena validade e perfeição deste negocio juridico. Não podemos esquecer que aquilo que vamos
agora analisar é o processo constitutivo de um contrato. Portanto, a nota preliminar é um negócio
envolto em solenidade. Por outro lado, temos uma nota importante de Publicidade, pois este negócio
jurídico está sujeito a publicidade nos termos do Artigo 1615º.
74

Que tramitação especial é a ressalvada pelo Artigo 1615 b) / qual é o diploma a que
temos de atender para saber qual é a forma de celebração dos casamentos sob forma religiosa?
Lei da Liberdade religiosa artigo 19º.

A ideia de solenidade leva a que não se pode admitir como casamento civil qualquer
cerimónia ou qualquer representação cénica. Em razão da importância social do casamento e dos traços
identitários que são pressupostos pelo Artigo 1577º, não se pode admitir que toda e qualquer
cerimonia, ainda que acompanhada de grande floreados e artifícios possa ser qualificada (para efeitos
do CC) como casamento. Isto é um aspeto muito importante porque, em Portugal, não funcionamos com
um registo de simplicidade/facilitismo como se vê nos filmes. Esta solenidade (toda a documentação,
etc.) não pode ser postergada.

O casamento civil é uma cerimónia que está sujeita a que seja pública e testemunhada (na
maioria dos casos, por 2 testemunhas; em certos casos, são precisas 2 testemunhas)! Além disso, não é
qualquer pessoa que pode celebrar um casamento (tem de ser alguém com competência para tal), não
basta parecer que tem competência. A pessoa terá de ser um funcionário do registo civil, um agente
diplomático ou consular ou um ministro de culto – são as 3 grandes hipóteses dadas pela lei civil.

Tramitação do Casamento

Tramitação Comum

A tramitação está prevista nos artigos: 1610 a 1670 CC. Estes são complementados pelos
artigos 43, 44, 52, 53 e 134 a 191 do CRC.
A tramitação comum do casamento civil apresenta 3 fases:

1. Processo preliminar de publicações – Artigos 1610 – 1614 + 134 a 135 CRC

 De acordo com o artigo 1610, este processo serve para verificar unicamente
avaliar o preenchimento do requisito da capacidade matrimonial. Pela negativa
significa que, no processo preliminar, nós vamos averiguar a existência de
impedimentos. Caso haja impedimentos, não há capacidade.

 Todas as matérias de averiguação da capacidade matrimonial, no caso de estarem


em questão relações plurilocalizadas (em interferem diversos ordenamentos
jurídicos), são reguladas nos termos do artigo 49 CC. Este artigo 49 CC vai dar enfase
à chamada “lei pessoal”. Qual é a “lei pessoal”?! Consta do artigo 30 CC que a lei
pessoal é a da nacionalidade do individuo. Assim, sempre que alguém casar com um
75

estrangeiro ou casar no estrangeiro e houver necessidade de determinar a


aplicabilidade da lei portuguesa, vamos ao artigo 49.

 Este processo é publico (não é secreto). Por isso existe o direito de solicitar cópia/
certidão relativa aos elementos dos nubentes (nomes, estado civil...). nos termos do
artigo 140º CRC, temos regulado todos os direitos que são garantidos no contexto
deste processo preliminar.

 Artigo 1611 – É possível haver a chamada “Declaração de Impedimento”; este


processo funciona oficiosamente, ou seja, não há a interferência do tribunal nem do
juiz, mas há a interferência do Conservador do registo civil. Ora, o conservador do
registo civil deve, ex officio/ por iniciativa própria, fazer uma investigação acerca de
eventuais impedimentos. Mas, obviamente, isto não prejudica que, nos termos do
artigo 1611º, alguém que tenha interesse e informações as partilhe e dê
conhecimento ao conservador. No fundo, nada impede que alguém que saiba de um
impedimento o vá comunicar.

 É no contexto deste processo que deve ser concedida a autorização para casamento
de menores de idade (ou seja, menores de 18 anos e maiores de 16 anos – artigo
1612 CC + art- 149 e 150 CRC).

 Artigo 1614 CC +Artigo 145 CRC - há um prazo para a celebração do casamento, ou


seja, uma vez autorizada a celebração do casamento, há um prazo de 6 meses para
a sua celebração.

2. Celebração – Artigos 1615 a 1622 CC e Artigos 153 a 155, 155 a 160 e 161 a 166 CRC

 A cerimónia é pública! Logo, devem haver testemunhas que devem atestar que
aquele ato teve lugar (artigo 1615). Além da publicidade, há a nota da solenidade.
Logo, de acordo com o artigo 1615, para que o casamento possa ser celebrado,
tem de se observar uma dada forma.

 A forma prevista consta, fundamentalmente, do artigo 155 CRC:

o O conservador anuncia que se vai celebrar o casamento;


o Lê os elementos relativos à identificação dos nubentes;
o Se os nubentes forem menores, atesta da existência de autorização;
o Interpela as pessoas para declarar se na audiência se conhece algo que obste
à realização do casamento.
o Não sendo declarado nenhum impedimento, o conservador pergunta a cada
um dos nubentes se aceita o outro como seu consorte.
o A resposta à questão do ponto anterior é formal: cada um dos nubentes
responde pela fórmula descrita no artigo 155.
76

o Prestado o consentimento, o conservador, em voz alta, ao abrigo da ideia de


publicidade, vai declarar, de modo audível, que em nome da lei da republica
portuguesa declara X e Y como marido e mulher.

 Artigo 1616+ Artigo 154 CRC – elenca quem são as pessoas que devem intervir:
o nubentes; seja presencialmente, seja por intermédio de um procurador
(Artigo 1620 e 1621 CC)

o conservador do registo civil ou, no caso de casamento sob forma religiosa, o


ministro de culto

o Necessidade de testemunhas:

 casamento sob forma religiosa – 2 testemunhas - Art- 19/4/c LLR

 quando a identidade de qualquer dos nubentes não seja


verificada/ quando não seja possível atestar que aquela pessoa é,
de facto, quem diz ser – 2 testemunhas - artigo 154/3 CRC

 casamento urgente – 4 testemunhas (sendo que 2 não podem ser


familiares).

 Princípio da Atualidade – o consentimento (a vontade/ o “sim” / a consciência de


vinculação jurídica) tem de ser dito no próprio ato da celebração – Artigo 1617º.
Por isso, não interessa que se tenha prometido a celebração do casamento se depois
não há uma renovação dessa vontade no próprio ato. Esta ideia é reforçada no
Artigo 155º nº1 e) CRC.

 Exigibilidade da aceitação dos efeitos do casamento – artigo 1618 – esta ideia


segundo a qual casamento é um ato de conteúdo vinculado e deve ser observado, por
todos os nubentes, sem que se admita quase liberdade de estipulação. Significa
aceitação de todos os efeitos pessoais (deveres, por exemplo) e efeitos patrimoniais
(regime de bens, responsabilidade por dividas). Esta ideia é reforçada pela LLR na
medida em que, mesmo no casamento sob forma religiosa é fundamental que
haja esta consciência de vinculação jurídica – Artigo 19º nº 3. Esta consciência
de vinculação jurídica também é replicada pelo artigo 143º nº 4 CRC. 72

 Princípio da irrelevância das cláusulas acessórias – artigo 1618 - a condição, o


termo... consideram-se como cláusulas não escritas. Assim, há aqui um princípio
de redução legal. A redução é quando amputamos o negócio suprimindo as cláusulas
viciadas. Neste caso, isto funciona independentemente do artigo 289/3 CC, quer
a condição (Artigo 270 e segs), quer o termo (artigo 278 e 279).

 Carácter pessoal do mútuo consentimento – há aqui um principio de


infugibilidade da pessoa do nubente. Ou seja, não pode ser outra pessoa a dizer que

72 Daí que o casamento seja um ato negocial (“eu quero os efeitos” associados a este ato”).
77

aceita casar, tem de ser o próprio nubente pois é dele que é exigida a manifestação
de vontade. A vontade de contrair casamento é estritamente pessoal. O casamento é
um negócio intuito personae.

 Declaração de vontade – artigo 1634º – a declaração de vontade, no ato da


celebração, constitui presunção de que os nubentes quiseram contrair matrimónio e
de que a sua vontade não está viciada por erro ou coação. Ou seja, além de se exigir a
manifestação de vontade, exigem-se todos os requisitos relevantes da vontade
negocial: livre, esclarecida, espontânea e lícita. Porque é que isto é importante?
Porque se faltar vontade não for livre ou esclarecida, o casamento pode ser
juridicamente inexistente nos termos do Artigo 1628/ c ) CC. Também no artigo
1618º se diz que, se faltar a vontade, pode haver um caso de inexistência jurídica do
casamento. Esta exigência de vontade (artigo 1618º) também é replicada no artigo
155/1/e) + 181/f CRC. Mas, atenção, este principia em nada prejudica a
circunstância de o casamento poder ser celebrado por um procurador. Mesmo que
seja celebrado por procurador, o casamento continua a ser celebrado a título
pessoal. A diferença é que a vontade é manifestada / são reproduzidas as
palavras mecanicamente por alguém que não o nubente (artigos 1620 a 1621).
73

3. Registo - artigo 1651 a 1660 CC + Artigo 1601/ c) CC+ 1, 2, 3, 53, 55 e 180 a 188 CRC

 Uma vez celebrado o casamento, ele tem de ser levado ao registo. A função do
registo é dar a conhecer a terceiros a celebração deste negócio para que os efeitos
associados ao casamento possam valer relativamente a terceiros. Além disso,
permite que os nubentes possam valer-se do seu Estado de casados. De facto, é
essencial a possibilidade de se demonstrar a existência do casamento.

 Artigo 1651 CC – principio da obrigatoriedade do registo relativamente a


uma série de casamentos:

o Todos os casamentos celebrados em Portugal (seja forma civil, seja


religiosa)
o Casamentos de portugueses celebrados no estrangeiro
o Casamentos de estrangeiros que, depois de o celebrarem, adquiram
nacionalidade portuguesa.

 Artigo 1651/2– além dos casos elencados acima, são admitidos a registo
quaisquer outros casamentos que não contrariem os princípios fundamentais da
ordem pública do estado português (remissão para o Artigo 22 CC – exemplo,
temos os casamentos poligâmicos, vem se requerer o registo desse casamento e
depois é que se coloca a questão de se são admitidos ou não).

73 Ana Filipa considera que o legislador anda mal ao falar em procuração, mas sim da interferência de um Núncio.
78

 Artigo 1652º – em que é que consiste o registo do casamento? Consiste no


chamado “assento” - este é o ato do registo. O Assento comporta 2 modalidades:

a. Registo por inscrição – Art- 52 CRC: Casamento civil não urgente


celebrado em Portugal ou no estrangeiro – art 180 a 181 CRC

b. Registo por transcrição- Artigo 53 CRC - casamento católico


celebrado em Portugal ou no estrangeiro E casamento civil urgente

 Artigo 1653º – o registo serve para provar o casamento; para provar o casamento
releva a chamada prova da “posse do estado de casado”. O estado de casado é
relevante para que os casados possam invocar direitos (entre si ou relativamente a
terceiros) que provem do ato do matrimonio. Como é que se prova este estado de
casado? O nº2 vem esclarecer: ou as pessoas vivem como casadas ou são
reputadas como casadas dentro do circulo das suas relações familiares.

 Artigo 1601/c) – esta norma está deslocada das normas registais, mas devemos
fazer uma remissão para ela. Porquê? Porque um dos impedimentos dirimentes
absolutos prende-se com o papel estruturante da inscrição da extinção do
matrimónio. Com efeito “a inscrição no registo, quer do ato do matrimónio, quer do
ato da extinção do matrimonio é estruturante e pode impedir a celebração de um
novo matrimónio.”

 Menções devem constar do registo:

o Artigo 181 CRC – a indicação de que o casamento foi celebrado com ou


sem convenção antenupcial

o Uma declaração dos nubentes de que realizam o casamento por sua livre
vontade.

o Apelidos adotados

 Efeitos do registo – artigos 1669 e 1670:

o Enquanto não for registado não pode ser invocado; há uma ideia de
inoponibilidade do casamento até ao Registo.

o O princípio da retroactividade ao momento da celebração –assim que for


inscrito no registo, considera-se celebrado desde o momento da celebração.
79

Tramitação Especial

É admitida em três casos: casamento urgente, casamento de português no estrangeiro,


casamento de estrangeiros em Portugal.

Casamento urgente – artigo 1622 a 1624 CC + Artigos 156 a 160 CRC + 182 a 183 CRC+
1590 a 1599 do CC para o casamento católico. Este casamento segue uma tramitação especial porque
há um desvio ao processo de tramitação comum. Este desvio é duplo porque:
1. Por um lado, não há processo preliminar de publicações
2. Por outro, não vai haver intervenção do funcionário do registo civil. Assim, temos 2
extravagâncias relativamente ao regime comum.

Artigo 159 CRC – no casamento urgente, o processo preliminar de publicação não é preliminar.
Este processo vai ser realizado depois da celebração do casamento. Em que situações é possível
celebrar “casamento urgente”?

São situações tipificadas na lei – somente nestes casos se admite a celebração de “casamento
urgente”. Que casos são esses?

1. Fundado receio de morte próxima de algum dos nubentes;

2. Eminência de parto

Qualquer uma destas 2 situações fácticas tem de ser alegada, mas não tem de ser provada de
forma cabal. A prova resume-se a testemunhas, no fundo. O legislador confia na veracidade das
declarações prestadas pelo nubente. Porém, o casamento civil pode, depois, não ser
homologado. Ou seja, pode depois não vir a ser aceite / não vir a produzir efeitos jurídicos. Um
dos casos de recusa de alegação – Artigo - 1624 / b) – se houver indícios sérios de serem falsos os
requisitos alegados. Assim, há sempre a possibilidade de, a posteriori/ depois de celebrado o
casamento, vir recusar-se a atribuição de efeitos jurídicos a esse casamento por serem falsas as
alegações (exemplo: “ não havia um parte eminente” Ou “ o outro nubente estava apenas indisposto e ,
portanto, não havia fundado receio de morte”. ).
Uma vez alegada uma das situações acima referidas, quais são os pressupostos de
admissibilidade do casamento?

1. Tem de haver proclamação oral ou escrita de que se vai celebrar o casamento – esta
proclamação visa preencher a ideia de publicidade. Para que não seja uma cerimónia
absolutamente secreta, é preciso que alguém vá dizer “vai-se celebrar um casamento nesta
residência às X horas à porta da casa dos nubentes”. Esta proclamação vai ser feita pelos
funcionários do registo civil, nos casos em que ele exista. Ou pode ser feita por um qualquer
familiar ou amigo. Artigo 156 A – CRC.

2. Declaração expressa de celebração do casamento – esta declaração tem de ser feita perante
4 testemunhas; 2 das testemunhas não podem ser parentes sucessíveis, por isso, temos de
atender às regras do Artigo 2031º e seguintes para ver quem são os sucessíveis dos nubentes.
80

3. Tem de ser redigida a chamada “ata do casamento”, por documento escrito e sem formalidades
especiais e assinada por todos os intervenientes – redige-se a escrito a cerimónia; é um
documento particular e, portanto, não precisa de ser autenticado ou outorgado pelo notário –
Artigo 156 CRC.

Para que este casamento civil urgente seja considerado válido e perfeito (apto a produzir
efeitos) tem de ser homologado. A homologação funciona, assim, como um ato de legitimação
superveniente. No fundo, como não houve processo preliminar de publicações/ não houve interferência
do funcionário do registo civil, então, depois de celebrado, vamos sanar eventuais vícios através desta
homologação. Esta vem regulada, pela negativa, no artigo 1624º, causas de recusa da
homologação.74

Se não houver homologação a qualificação jurídica é o valor jurídico mais gravoso: o


casamento considera-se juridicamente inexistente, artigo 1628º b) CC.

A celebração do casamento civil urgente tem implicações em sede de regimes de bens. Ou seja,
quem casa assim não tem a mesma liberdade de quem casa em situações ditas “normais”, artigo
1720/1/a – considera-se sempre contraído em regime de separação de bens o casamento
celebrado sem precedência do processo preliminar.
Porquê? Porque o legislador receia que este casamento, celebrado em condições “anormais”,
possa ser motivo de ascendente de um dos nubentes relativamente ao outro. Por isso, não há mistura de
património.

Porque é que o legislador admite a celebração de um casamento urgente? Na balança entre as


vantagens da sua admissão, as desvantagens e a ideia segundo a qual o casamento é o laço jurídico de
maior importância social, o legislador opta pela ideia de que “ se as pessoas querem casar, mesmo com
receio de estar a morrer ou porque querem que criança nasça filhas de pais casados, deve-se conceder
a possibilidade de celebrar o casamento desta forma atípica.

O casamento urgente não é privativo do casamento civil. Nos termos do artigo 1590 CC
admite-se a possibilidade de o casamento católico ser celebrado de forma urgente.

Casamento de portugueses no estrangeiro – Artigo 50, 51, 161 a 164 CRC e 1651/1(b) CC.
Artigo 1651º nº1 b), este casamento tem de ser levado ao registo.
Qual forma que deve ser observada no caso dos portugueses casarem no estrangeiro? A forma
preceituada no casamento português ou a forma preceituada no casamento local? Vamos atender ao
artigo 50º CC, a forma do casamento é regulada pela lei do Estado em que este é celebrado. Ou seja, a
lei local rege em matéria de forma a celebração do casamento. Esta é a norma comum.
Mas nós temos uma norma especial, o artigo 51º nº2, diz-nos que se os portugueses
celebrarem casamento no estrangeiro é necessário o processo preliminar de publicações, este
processo deve ser organizado pelas conservatórias do registo civil competentes em razão da
nacionalidade, além disso, diz que este casamento pode ser celebrado por agente diplomático ou

74 Fazer remissão para o artigo 160 CRC.


81

consular ou pelo ministro do culto. Mas, esta norma de conflitos não vive isoladamente e, no CRC, temos
uma norma mais detalhada para estas situações: artigo 161º a 163º CRC. No fundo, em termos
práticos, nestes artigos, é conferido uma opção aos nubentes: o optam pela forma do local da
celebração ou optam pela forma do local da nacionalidade. Podem seguir uma lei ou outra. Se
optarem pela forma do local da nacionalidade, eles estão vinculados a observar a tramitação
prevista no CRC (artigo 154 e 155).

Artigo 163 /3 CRC- esta norma, que é um aditamento ao artigo 49 CC, resulta de uma
necessidade de compromissos que foram feitos em termos internacionais. Como se admite que um
português possa optar pela lei do local da residência (artigo 31 /2 CC).

Independentemente da necessidade de esclarecimento da lei competente para averiguar a


capacidade/ independentemente da lei que regula a forma, aquele ato que foi celebrado no estrangeiro
é um verdadeiro casamento? Isto é uma questão prévia que se coloca à luz do Artigo 1577º. Portanto,
não é qualquer ato que vai ser reconhecido em Portugal como “casamento”. Portanto, para que
ele possa ser “transcrito”: Para que esse ato possa ser “casamento” em Portugal, tem de preencher
os requisitos do artigo 1577º. Designadamente, não pode ser um casamento poligâmico artigo 1641º
nº2 CC. Só pode valer como casamento, no caso de se ter optado pela forma preceituada no direito
português, o casamento que preencha as exigências prescritas no CRC.

Casamento de Estrangeiro em Portugal - Artigo 51º CC, 175 a 176º CRC + artigo 1651 /1
/c) e 1651/2 CC. É obrigatório o registo de casamentos de estrangeiros quando adquiram a
nacionalidade portuguesa. Não se pode proceder ao registo de casamentos de estrangeiros que
ofendam os princípio de ordem pública nacional.

Artigo 51/1 CC – se os estrangeiros quiserem casar em Portugal: Ou organizam o processo


preliminar ao abrigo da lei da nacionalidade no país deles ou vêm para Portugal e estão sujeitos às
regras portuguesas.

Artigo 175 e 176 CRC - ainda que sejam estrangeiros, para que possam casar em Portugal, é
preciso um certificado de que não existem impedimentos, não é suposto que os conservadores
portugueses tenham de conhecer os impedimentos existentes na lei do local.

Artigo 52º CRC – neste caso, o registo é para a inscrição.

Tramites no Casamento sob forma religiosa

Artigo 19º LLR é a norma que nos responda a esta matéria de saber qual o procedimento
aplicável a casamentos celebrados sob forma religiosa (seja católico ou não).

O Código de direito canónico estabelece essencialmente a matéria substantiva. O que nós agora
queremos saber é a forma que segue.
82

O Artigo 19º da Lei da Liberdade Religiosa enúncia o princípio do reconhecimento dos efeitos
civis ao casamento celebrado sob forma religiosa – o conceito de “igreja ou comunidade religiosa” é
definido no Artigo 37 LLR: Não é qualquer seita que é uma igreja.

Artigo 19º nº2 - Assim, tem de haver processo preliminar. Seja casamento hindu seja católico, o
processo preliminar segue na conservatória do registo civil da área de residência.

Artigo 19º nº3 – é necessário certificado que diga que não há impedimentos.

Artigo 19º nº4 – formalidades ad substantiam: presença dos contraentes (próprios ou


procurador), ministro do culto (artigo 137/6 CRC) e 2 testemunhas.

Artigo 1651/ a) – têm de ser levados ao registo; inscrito no livro da igreja e no livro do registo
civil.

Artigo 1628/ a) - se o casamento não for celebrado por ministro de culto credenciado para o
efeito, este será um caso de inexistência jurídica do casamento.

No casamento católico, nós vamos ter 2 planos fundamentais:

1. por um lado, as causas de invalidade civil – artigos 1628, 1631.

2. causas de invalidade ao abrigo do direito canónico; aqui há competência exclusiva


dos tribunais eclesiásticos para julgar essas causas- artigo 1625 CC e os cânones 1671
a 1691.

No casamento católico, o valor juridico negativo regra é a nulidade. Esta dicotomia “casamento
católico (nulidade) e civil (anulabilidade) “tem uma razão histórica: o nosso direito matrimonial resulta
do anteprojeto do professor Gomes da Silva e é inspirado no direito francês de então. Aí vigorava o
princípio segundo o qual: sempre que o legislador não estabelecesse de forma especificada que o ato
era nulo, não se podia reservar essa sanção mais gravosa. Logo, por essa razão, o casamento civil ficou
com a anulabilidade. Era o princípio da nulidade expressa. Ora, hoje em dia, na Europa, o principio
vigente na teoria geral é o princípio oposto: princípio da nulidade eventual. Mas este principio não se
estendeu ao direito matrimonial.

Capacidade Matrimonial

Capacidade matrimonial é uma especificação de outro conceito técnico que é a capacidade


negocial, que deriva da capacidade de gozo e de exercício. Quando falamos de capacidade
matrimonial, estamos no fundo a falar de capacidade jurídica. A não verificação de capacidade gera a
invalidade do casamento75.

75Normalmente a incapacidade de exercício gera anulabilidade e a incapacidade de gozo gera tipicamente


nulidade
83

Quadro normativo relevante Artigo 1600º e 1601º, 1631º a), 1639º, 1643º, 1649º e 1650º

Artigo 1600º - Principio geral – “Têm capacidade para contrair casamento todos aqueles em
quem se não verifique algum dos impedimentos matrimoniais previstos na lei.” O legislador faz um
enunciado pela negativa. Considera-se que é capaz aquele que não é incapaz, sendo que incapaz é
quando exista algum impedimento matrimonial. Há 3 grandes categorias de impedimento:

1)Impedimentos impedientes

2)Impedimentos dirimentes:

1)absolutos

2)relativos.

3)Impedimentos dispensáveis e não dispensáveis

Impedimentos dirimentes absolutos

Artigo1601º - Os impedimentos absolutos são aqueles que vão impedir, ou seja, obstaculizar a
celebração do casamento da pessoa a quem respeitam com qualquer outra. Vai afetar a possível e
eventual relação de casamento com qualquer sujeito, em razão daquele obstáculo jurídico.
Temos:

1º - Idade inferior a 16 anos – aquele que case com 14 ou 15 anos está afetado por uma
incapacidade jurídica (incapacidade de gozo). A incapacidade de gozo gera tipicamente
nulidade (artigo294 CC), a não ser nos casos em que outra solução resulte da lei. Este artigo
1601º é uma disposição legal de caracter imperativo, mas o casamento não vai ser nulo porque
temos uma disposição legal especial.

Artigo 1631, al.a) do CC – vai gerar anulabilidade76, o que significa que alguém que case com
idade inferior a 16 poderia, no limite, continuar casado (deve-se à tal importância social do
casamento).

2º - A demência notória, mesmo durante os intervalos lúcidos, e a interdição ou


inabilitação por anomalia psíquica - Remissão aqui para a interdição (artigo 138 e 151) e
inabilitação (152- 156 CC). Estas hipóteses de interdição e inabilitação não são exaustivas.

Quando se fala em “demência notória” o legislador visa abranger também os casos em que
alguém que não tenha sido declarado interdito ou inabilitado por sentença, possa também ser

76Porque o legislador atendendo à importância social do casamento entende que deve determinado um desvalor
jurídico menos grave que a nulidade.
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impedido de celebrar casamento. Tem de ser é demência notória (facilmente cognoscível pelo
homem medio). Ex. doenças degenerativas como o Alzheimer.

“mesmo durante os intervalos lúcidos”- permite abranger as situações em que alguém não está
permanentemente afetado por uma causa que determina a incapacidade.

3º - O casamento anterior não dissolvido, católico ou civil, ainda que o respetivo assento
não tenha sido lavrado no registo do estado civil - Aqui o que se pretende evitar é a bigamia
(247 C. Penal). Não se pode admitir a celebração do casamento por aquele que ainda está
casado, cujo vinculo ainda não se dissolveu.

Impedimentos dirimentes relativos

Artigo1602º - São também dirimentes, obstando ao casamento entre si das pessoas a quem
respeitam, os impedimentos seguintes:

a) O parentesco na linha reta

b) O parentesco no segundo grau da linha colateral;

c) A afinidade na linha reta;

d) A condenação anterior de um dos nubentes, como autor ou cúmplice, por homicídio doloso,
ainda que não consumado, contra o cônjuge do outro.

Isto está previsto no CDC, no cânone 1091.Geram invalidade (anulabilidade) – artigo 1631
al.a)

Impedimentos impedientes

Artigo 1604º. Não interferem com a validade do casamento, não invalidam o casamento. O que
acontece é a aplicação de outro tipo de sanções (não de eficácia jurídica) ou de efeitos desfavoráveis.

1) A Falta de autorização não suprida pelo conservador – artigoº 1612, 1649 CC e artigoº
149 e 150 CRC. Artigo1612º - explica em que termos é concedida a autorização dos pais, ou em
que termos pode ser essa autorização suprida pelo conservado.

Artigo1649º - explica a consequência desfavorável da circunstância de se ter celebrado


casamento sem autorização dos pais, ou sem essa autorização ter sido suprida pelo
85

conservador. Este artigo apesar de estar inserido numa secção sobre sanções especiais, o
casamento não vai ser invalido, vai ser somente irregular. A irregularidade traduz-se:

1º - Menor de idade não se emancipa de forma plena com o casamento, nos termos
do artigo 132, não passa a ser tratado como maior (artigo 133, 2ª parte CC). É um caso
de emancipação restrita.

2º - O menor não passa a ser considerado capaz de exercício, pelo contrário, os


bens que leve para o casamento, ou que lhe sejam dados a título gratuito, são
geridos pelos pais, isto para evitar o perigo de “ascendente” por parte do outro
nubente, por isso os pais continuam a gerir o património do menor.

A autorização dos pais do artigoº 1612 é uma manifestação do instituto jurídico da


assistência, e não da representação. Isto é um daqueles casos em que os pais, ainda
que sejam representantes legais, naquele ato concreto agem como assistentes. A
sua vontade junta-se à do menor, pelo princípio da pessoalidade do consentimento - há
um concurso de vontades. O menor tem de consentir, mas os seus pais também têm de
consentir.

2)Prazo internupcial (artigo 1605º)- Este prazo tem como objectivo evitar a celebração de
casamento, concretamente pela mulher que tenha sido casada anteriormente, durante um
determinado prazo legal. Isto é assim porque a mulher pode estar gravida de um anterior
casamento e por causa da presunção de paternidade. Se se permitir que a mulher se case
imediatamente com outra pessoa pode haver uma perversão da presunção, uma vez que a
paternidade se presume pertencer ao homem que é casado com a mulher ao tempo do
nascimento. Têm que decorrer 180 dias relativamente aos homens e 300 dias
relativamente às mulheres. Porque é que os homens não podem casar no dia a seguir? Por
razões apenas morais. Aquele que sai do matrimónio deve fazer o “período de nojo”77.
Professora Ana Filipa Morais Antunes - considera que esta discriminação tem um
fundamento material razoável.

Segundo o artigoº 1605/2, é lícito que a mulher case novamente, passados 180 dias se:

1)obtiver declaração judicial de que não está grávida

2) tiver tido algum filho depois da dissolução do casamento anterior

3)Os cônjuges estavam separados judicialmente de pessoas e bens, e o casamento se


dissolver por morte do marido – entende-se que se havia separação de pessoas e bens,
não havia comunhão de leito, pelo que se presume que não houve relações sexuais e que
a mulher não está grávida do de cujus.

Não esquecer de articular a matéria do prazo internupcial com a matéria da presunção


de paternidade (artigoº 1826 e artigo 1834) e ainda com o artigo 1798 (período de
conceção legal).

77 Deve passar um tempo para se abstrair, para esquecer a antiga mulher.


86

Este impedimento do prazo internupcial não se vai aplicar (para além do já visto nº2) nos
casos do nº4 e 5 do artigoº 1605.

3)Parentesco no terceiro grau da linha colateral -Este impedimento pode ser objeto de
dispensa (artigo 1609/1, al.a)).

4)Vínculo de tutela, curatela, ou administração legal de bens

Tutela - artigos 1921º e artigo 1927ºa 1966º

Curatela - é o regime que se aplica no caso de haver um inabilitado (artigoº 153 e ss)

Administração legal de bens - arts.º 1922º e arts. 1967º a 1972º. De acordo com o artigoº
1608º há um alargamento deste impedimento relativamente aos parentes, afins na linha reta,
irmãos, cunhados ou sobrinhos.

5)A pronúncia do nubente pelo crime de homicídio doloso, ainda que não consumado,
contra o cônjuge do outro, enquanto não houver despronúncia ou absolvição por decisão
passada em julgado -O legislador aqui vai relevar o homicídio consumado ou não
consumado, em que já houve sentença de condenação; ou a imputação de um crime de
homicídio que esteja em fase de instrução, apesar do princípio da presunção de inocência.

O que é que temos que acrescentar ao artigo?

6)O impedimento em razão de um vínculo de apadrinhamento civil, que segundo o


artigo22º Regime Geral do Apadrinhamento Civil também deve ser adicionado a estes
impedimentos que podem ser dispensados.

O professor Jorge Duarte Pinheiro tem defendido a tese no sentido em que o matrimónio
católico anterior não dissolvido é um impedimento que devia ser aqui também ser aditado, obstaria à
celebração de um novo casamento civil. Professora Ana Filipa não concorda com esta tese porque,
como já foi visto, o artigoº 1601/c), veda (como impedimento dirimente absoluto) o casamento
anterior não dissolvido, seja católico ou civil, pelo que não há necessidade de o acrescentar ao artigoº
1604. Alguns destes impedimentos impedientes do artigoº 1604 podem ser objeto de dispensa, nos
termos do artigoº 1609. O processo de dispensa compete ao conservador do registo civil.

Quais são as consequências jurídicas da observância de impedimentos impedientes?

1º - Quanto ao casamento celebrado por menor de 18 anos e maior de 16, já foi visto.
87

2º - Artigo 1650º - sanciona a violação do prazo internupcial (através da perda de todos os


bens que tenha recebido por doação ou testamento do seu primeiro conjunge).

3º - A violação das restantes alíneas c), d) e e)78 do 1604, importa, porque determina a
incapacidade para receber do consorte qualquer benefício por doação ou testamento.

Portanto, este artigo determina por um lado, a perda dos bens e depois que não pode haver
cedência de bens, é uma questão de ilegitimidade.

Consentimento

Delimitação positiva
Artigos 1617º a 1621º, no que diz respeito à delimitação positiva. O consentimento é um ato de
vontade. Sendo o casamento um negócio jurídico pressupõe o encontro de duas vontades. Esta vontade,
de acordo com princípios gerais do direito dos contratos, tem que se pautar sempre pelos requisitos de
relevância da vontade negocial:

i. Esclarecida (isenta de erro);

ii. Livre (isenta de coação, isenta do vício do medo);

iii. Madura (tem que ser prestada por um sujeito com maturidade suficiente). Isto releva,
por um lado, para a idade núbil, e também para o regime da incapacidade acidental ou
para outro tipo de incapacidades.

iv. Lícita (o consentimento não pode contrariar nem a Lei nem o Direito).

O regime do consentimento (em geral) está no artigoº 340 do Código Civil, e aqui diz-se logo
que o consentimento não pode contrariar os bons costumes e a ordem pública. Esta norma vai aplicar-
se a todo e qualquer consentimento. Então, em Direito da Família vamos exigir, quanto ao
consentimento, que ele seja:

i. Atual - 1617º - Prestado no momento da celebração do casamento

ii. Pessoal (1619º) - prestado presencialmente ou por intermédio de procurador

iii. Exista a consciência de vinculação jurídica (resulta do artigoº 1618).

iv. Puro e simples - O consentimento tem ainda que ser puro, segundo o artigoº
1618/2, isto é, não condicionado, não dependente da verificação de condições
ou outras cláusulas acessórias.

v. Perfeito - Este requisito a prof. AFMA costuma utilizar para agregar tudo o que
foi referido (tem de ser esclarecido, livre, maduro e lícito)

78 Tem de se fazer aqui uma interpretação corretiva porque hoje em dia tem de ser desconsiderada a al. e) porque foi revogada.
88

vi. Completo - Esta exigência vai beber ao artigoº 155/1, al. e) do CRC. Os nubentes
têm que proferir um conjunto de palavras, que são aquelas que estão escritas na
lei. Não basta dizer que sim.

Tudo isto significa que para o consentimento seja validamente prestado não pode haver
interferências dos vícios da vontade, ou das divergências entre a vontade e a declaração.

Delimitação negativa

Artigoº 1631, al b), arts. 1634 a 1638, 1640 a 1641, 1644 a 1645. A delimitação negativa do
consentimento significa consentimento viciado. Este vício pode ter origem em duas situações típicas:

- falta de vontade

- vícios na formação da vontade

Quais são as questões que se colocam? Será que se pode entender que à luz do direito
vigente, as causas de invalidade do direito civil são taxativas? É que se olharmos para o artigo
1627, que é o ponto de partida da nossa análise, enuncia-se um princípio geral em matéria de
validade do casamento, dizendo que o casamento é válido desde que não existam causas de
inexistência jurídica (artigoº 1628) ou de invalidade (artigoº 1631) especificadas na lei.

Então, quer isto dizer que o que não estiver nesses artigos não gera nada e o casamento
será ainda assim valido? Professora Ana Filipa Morais Antunes – Não. Entende que
verdadeiramente, quando se fala de causas de invalidade do casamento, o que o legislador devia estar
aqui a enunciar, de forma técnica, era o regime em matéria de ineficácia do casamento porque
quando trabalhamos as situações de eficácia jurídica, trabalhamos com os conceitos de inexistência, de
invalidade, irregularidade, e ineficácia em sentido estrito. Este é um quadro completo.

Aquilo que resulta do artigo 1627, aparentemente, é um princípio de tipicidade e reserva de


lei. Tem de ser o legislador ordinário a vir prever a relevância das causas de invalidade.
Mas, já vimos, no artigo 1649 e 1650, que temos a previsão não de invalidade, mas de uma
irregularidade. Esta já é uma prova que o regime do artigo 1627º não pode ser lido de forma rigorosa e
literal, porque isso significaria a irrelevância do artigoº 1649º e 1650º.

Relativamente ao artigoº 1631, as causas são taxativas? O legislador no artigoº 1631 parece
ter alguma falta de rigor técnico. Nomeadamente: Na al. b), o que significa falta de vontade?
Quando estudamos Teoria Geral, vemos que as situações típicas de falta de vontade são os artigo
240º e seguintes - simulação, reserva mental, falta de consciência da declaração, coação física,
89

declaração não séria e erro na declaração. Os casos de vício da formação de vontade são o erro, o
medo e a usura.79

Aparentemente há uma sobreposição de hipóteses, porque o artigo 1634º vai relevar a


vontade viciada por erro e coação, mas simultaneamente o artigo 1635º releva a falta de vontade. O
que é então a falta de vontade do artigo1635?

a) Esta alínea significa que é anulável por falta de vontade quando não existe a consciência do
ato que se pratica, independentemente da causa.

b) Está um caso típico, nunca é tratado como um caso de falta de vontade. Nos casos de erro
existe vontade só que a vontade está viciada.

c) Sobre os casos de coação física temos de ir ver ao artigoº 246 do CC, quanto ao regime geral

d) Temos a simulação, que está no artigoº 240º

Quais são os problemas do artigo 1635? Não se fala de reserva mental, não se sabe se a falta de
consciência do ato é igual a falta de consciência da declaração, porque as terminologias não são
idênticas e equiparam-se, no mesmo artigo, situações de falta de vontade com situações de vício da
vontade. Portanto, sistematicamente:

Na al. a), a ausência de consciência do ato pode ser valorada como:

a. Falta de consciência da declaração (artigoº 246) - Que é um caso de falta de


vontade. Há vontade de ação, mas não de declaração;

b. Coação física (artigoº 246) - não há vontade de ação nem de declaração, o agente é
impelido por uma força exterior.

c. Declarações não sérias (artigoº 245) - que podem ser um caso de falta de
consciência do ato;

d. Incapacidade acidental – que é expressamente relevante no artigoº 1635/a). Resta


saber se é relevante per si, ou se para ser relevante temos de ir procurar os requisitos
do artigoº 257.

O artigoº 1635/a) tem a virtualidade de permitir atender a qualquer causa, mesmo sem
ter que se desencadear a aplicação do regime comum. Esta alínea é apta a fundamentar esta ausência de
consciência do ato, isto é, a inexistência de um livre exercício da vontade. Portanto, qualquer destas
situações referidas que pode gerar a ausência de livre exercício da vontade cairá na a). Para o
legislador de direito matrimonial, é, por isso, indiferente qual é a categoria do vício, o ponto é alegar
e demonstrar que não havia consciência do ato, seja essa causa típica ou atípica.

No 1635/b), refere-se a um erro vício (artigo 251), ou a um erro obstáculo (artigo 247 e
ss)? Ex. A supunha que estava a casar com B, mas na verdade estava a casar com C. Isto é um caso de
251 ou um caso de 247? A maioria dos autores acha que é um caso de erro obstáculo, que se resumem
às situações em que a vontade não é real ou não é cognoscível. Pelo contrario, Ana Filipa Morais

79A incapacidade acidental pode ser tratada como vício da formação da vontade ou como vício do conteúdo,
depende da doutrina.
90

Antunes acha que isto não faz sentido e entende que é um caso de assimetria entre a vontade
conjectural e a vontade real e, portanto, o regime deve ser o do artigoº 251, que permite abranger
todas as circunstâncias físicas ou psicológicas que possam dizer respeito à pessoa do nubente. Se
considerarmos o regime dos artigos 247º e seguintes, dificilmente chegaremos a um valor jurídico
negativo.

Quanto à coação física, do artigoº 1635/c) - A coação física não tem regime particular, de
acordo com o artigoº 246, a sanção é que não se produz efeitos, o que traz um problema a resolver
porque na teoria geral quando não se produz qualquer efeito, isto é, sinonimo de inexistência ou de
nulidade. No direito matrimonial, desencadeará, segundo o regime geral deste ramo, a anulabilidade.

Quanto à simulação, do artigoº 1635/d): Pressupõe (artigoº 240 a 243): Acordo simulatório,
intenção de enganar terceiros e divergência entre a vontade real e a vontade declarada. O problema é
que o regime da simulação pressupõe algumas regras particulares, nomeadamente que os nubentes
possam alegar a simulação. Mas se o fizerem, têm restrições probatórias (artigos 242 e 393).Não
esquecer também da regra do artigo 243, de acordo com a qual a simulação é inoponível a terceiros de
boa fé.
O legislador, quando fala em simulação, no artigo 1635, pensa em algumas situações que têm
sido ilustradas pela doutrina. Exemplo: A e B casam entre si porque B quer obter nacionalidade
portuguesa. Entende-se que aqui há simulação, haverá uma divergência entre a vontade real e a vontade
declarada. Contudo, para que haja simulação, temos que ter uma divergência entre a vontade real e a
declarada, mas a professora Ana Filipa entende que isto não acontece, porque as pessoas querem
efetivamente casar, porque se não casarem não têm nacionalidade. Não há qualquer divergência entre
a vontade real e a declarada. O NJ que estão a celebrar é pretendido por eles. O que difere é que eles
não casam porque querem a plena comunhão de vida, mas para concretizar um efeito ulterior - a
aquisição de nacionalidade. Neste caso, não temos verdadeira e própria simulação. Alguma
doutrina do direito internacional privado vem então dizer que isto não é simulação, é um caso de
fraude à lei. Porque o que os sujeitos estão a fazer é, por via de um negócio jurídico que está previsto
na lei e a que se associa um conjunto de efeitos típicos, estão a querer apenas um dos efeitos e não
querem os outros. Então, o Direito Internacional Privado, aplica o artigoº 21 do Código Civil.
A professora Ana Filipa Antunes, contudo acha que isto não é um caso de fraude à lei - O
que temos aqui é um caso de contrariedade à lei, do artigoº 294. Entende que não é fraude à lei
porque entende que é necessário que se tenha que celebrar, pelo menos, dois NJs em cadeia, para
que exista fraude à lei. A fraude à lei existe quando se celebram dois NJs encadeados temporalmente,
que são lícitos (nenhum deles viola a lei), mas que pela sua conjugação se permite chegar a um efeito
que a celebração isolada de cada um dele não permitiria. Em termos práticos, a conclusão é a mesma,
porque sendo fraude à lei ou sendo contrariedade à lei o NJ é inválido. Qual é a forma de invalidade
(nulidade ou anulabilidade)?
Ana Filipa diz que todas as causas de invalidade do casamento que não venham no artigo 1631º,
mas sejam relevantes à luz do direito comum, tem que se permitir desencadear o valor negativo do
direito comum. Porque a lógica é que só se aplica o valor jurídico negativo especial do direito do
matrimónio quando o legislador o diz expressamente. Quando o legislador não o diz, há duas hipóteses:
ou é irrelevante ou aplica-se o valor jurídico negativo comum de teoria geral. Assim sendo,
conseguimos individualizar no direito civil português casos de casamento civil nulo, quando ele
viola normas imperativas e não exista um valor jurídico negativo especial previsto na lei.
91

O legislador não fala de reserva mental, mas sim de simulação. O que é que isto significa?
Nos termos do artigoº 244, a reserva mental só é relevante nos casos em que é conhecida do
declaratário, situação em que a lei manda aplicar o regime da simulação. Então, transposto este
princípio para o Direito Matrimonial, vamos chegar à conclusão que onde se lê no artigo 1635
“simulação”, vai-se dar relevância jurídica também à reserva mental, se conhecida do
declaratário. Se a reserva não for conhecida do declaratário é irrelevante.
Esta posição é concretamente defendida pelo professor Guilherme de Oliveira, Pereira Coelho e
Jorge Duarte Pinheiro, e aceite também pela professora Ana Filipa Morais Antunes.

Em síntese:

O artigoº 1627, quando enuncia o princípio da taxatividade, verdadeiramente o que está a


enunciar é um princípio de tipicidade e reserva de lei. O que significa que nós temos de obedecer
imperativamente ao regime de direito matrimonial especial que consta dos artigos, mas também temos
de relevar o regime comum previsto na lei, para tudo aquilo que o legislador matrimonial não
tenha previsto. Assim, conseguimos um alargamento das causas de invalidade do casamento, desde
que previstas na lei.
As causas do artigoº 1635 têm que ser objeto de uma interpretação cuidada, porque lidas de
forma literal suscitam as maiores duvidas:

1º - al. a) vai funcionar como uma cláusula aberta, quando se diz “falta de consciência” este é um
conceito não técnico, o que permite agregar uma multiplicidade de situações.

2º - Na b), fala-se do erro. A dúvida é: erro obstáculo ou vício? Maioria da doutrina diz que é
erro obstáculo, mas AFMA diz que é erro vício. O que vai ter implicações importantes porque os
requisitos de relevância são distintos.

3º - Na c), sobre a coação física, não vamos buscar o valor jurídico negativo da teoria, que seria a
nulidade, mas sim os requisitos.

4º - Na d), quanto à simulação, vamos também utilizar os requisitos do regime geral, mas não o
valor jurídico negativo comum.

Vício na formação da Vontade

Concretamente o legislador do direito da família vai considerar duas hipóteses como vício da
formação da vontade:

1) O erro de vício, previsto no 1636º

2) Coação Moral, prevista no 1638º


92

Assim, comparativamente à Teoria Geral do Negócio Jurídico, ficam de fora como “vício na
formação da vontade” a usura e a chamada incapacidade acidental80, contudo a incapacidade
acidental em direito da família é valorada como falta de vontade como resulta do artigo 1635º a).
Relativamente ao erro de vício, como se verá, não está abrangido toda e qualquer hipótese de
erro, apenas está abrangido o erro sobre a pessoa do declaratário: o nubente. Isto resulta do já
mencionado 1636º. Ficam excluídos os erros sobre o objectos, sobre os motivos e sobre a base negocial.
Ao abrigo deste tema, e do 1636º podemos ainda ponderar se o erro previsto é um erro simples
ou se é um erro qualificado por dolo81, aquilo que parece razoável entender, e o que a doutrina tem
geralmente apontado, é que tanto estaria aqui a situação de erro simples como a de erro qualificado
por dolo.

Esta matéria vem prevista nos artigos 1631º b), que é a norma habilitante de causa de
anulabilidade, e que depois se conjuga com os artigos 1636º e 1638º.

Temos então as duas hipóteses típicas. O erro do 1636º é como já dissemos o mesmo que se
encontra no 251º. Isto pode acontecer porque desconhecimento de certas características físicas e
psicológicas do declaratário ou por desconhecimento de características jurídicas da pessoa do
declaratário. O legislador propositadamente não vai expressar as características que se consideram
“sobre a pessoa”, exactamente para deixar todo um conjunto de características que a pessoa suposta
tinha se possam referir à pessoa serem considerados erro. Claro que isto não quer dizer que todas as
não quer dizer que toda e qualquer característica vá ser considerar juridicamente relevante para
este efeito, interessa por isso relembrar a distinção entre pressupostos e requisitos de relevância: o
erro sobre a pessoa só vai suceder quando alguém desconheça uma característica sobre a pessoa do
declaratário, mas esse erro só é relevante se olharmos para o 1636º que consagra um regime especial
quanto ao 251º, não vamos aplicar o duplo requisito de relevância que resultaria do 251º 82.
Vamos então usar os requisitos do 1636º, o requisito que vemos desde logo é o da
essencialidade, e a essencialidade aqui vai ser tanto objectiva como subjectiva, a objectiva serão as
qualidades que não são indiferentes para o “homem médio”, características que não são em abstracto
indiferentes, que não passariam o crivo da normalidade social, já as subjectivas são aquelas que no caso
concreto se aplicam às partes do casamento: por exemplo um monárquico que jamais casaria com uma
republicana. Depois temos, além da essencialidade, o requisito da desculpabilidade, a
desculpabilidade tem a ver com a exigência de alguns padrões de diligência, a desculpabilidade significa
por outras palavras que não é exigível que o nubente enganado/em erro pudesse conhecer com
realidade certa característica: exemplo eu casei com B porque achei que ele tinha olhos azuis. Temos
ainda o requisito da causalidade, que se encontra na parte final do artigo e que é o requisito comum a
todos os erros. Este último requisito significa que o casamento foi celebrado com erro, e se uma das
partes conhecesse a verdade e não houvesse não teria celebrado o casamento.
Assim, resumindo temos:

1) Essencialidade na dupla perspectiva subjectiva e objectiva.

(a partir de aqui temos os requisitos de relevância (a partir do 2)

2) Desculpabilidade que está relacionado com o padrão de inexigibilidade de conhecimento

80 Em TGN a incapacidade acidental é estudada ou como vício de conteúdo ou como vício de formação da vontade.
81 Ver matéria de TGN.
82 Essencialidade (requisito comum) + requisito relativo ao declaratário (247º).
93

3) Causalidade

4) Requisito da propriedade que é um requisito controverso e hipotético, diz que o erro só é


próprio se for a única causa de invalidade do negócio no caso concreto.83 Alguma doutrina, como
a dos professores Pereira Coelho e Guilherme de Oliveira exigem este requisito da propriedade
como requisito de relevância. Antunes Varela por exemplo já não exige este requisito. No nosso
curso não exigimos este requisito pois não resulta da lei nem do regime comum, não há
argumentos normativos hoje para defender este requisito.

Quanto à coacção moral, segunda categoria de erro de vício na formação da vontade em sede
de casamento, vem prevista no 1636º e os elementos do conceito não estão esclarecidos, logo
aplicamos o artigo 255º do Código Civil. Para que haja coacção moral temos então de verificar uma 1)
ameaça moral, 2) que seja ilícita84 e 3) intencionalidade85 da ameaça. Nestes casos o negócio está
viciado porque a vontade não se forma livremente por haver o medo resultante de uma ameaça.
Ainda que os três requisitos estejam mencionados temos posteriormente de verificar se a
coacção moral é relevante. Para isso temos de regressar ao 1638º pois esta norma consagra um
regime especial de coacção moral para o direito da família. Assim, é preciso que:

1) Gravidade do mal – não é qualquer ameaçazinha que vai ser considerada.

2) Justificação do receio – o receio que a ameaça se venha a efectivar tem de ser justificado.

Temos aqui uma assimetria com o regime comum (255º) no que diz respeito aos requisitos
para considerar relevante a coacção moral: primeiro temos de saber se a coacção moral provém do
declaratário ou de terceiro, quando provém do declaratário o requisito de relevância é a dupla
causalidade86.
Não é isto que acontece no direito da família, o regime é mais exigente sendo idêntico ao
regime comum quando a coacção provém de terceiros, isto vê-se comparando o 256º segunda
parte com o 1638º. Assim o regime no direito da família é sempre o usado no regime comum seja a
coacção causada pelo declaratário ou por terceiro. Estes requisitos da coacção têm todos de ser
interpretados de forma objectiva para Ana Filipa.

Quanto ao nº2 do 1638º temos um alargamento do tipo da coacção moral, uma equipação à
ameaça com a promessa de libertação de um mal já em curso. O Professor Jorge Duarte Pinheiro vê
neste artigo um reptício da usura, e que o que há aqui é uma forma de usura, mas para Ana Filipa Morais
Antunes não é isso que está aqui dado que a usura é mais complexa e característica do que o que resulta
do nº2 do 1638º. Para a Professora Ana Filipa o que poderia estar aqui é um estado de necessidade
que em regra é juridicamente irrelevante para efeitos de anular o negócio, e o estado de
necessidade é só um dos elementos da noção de usura

83 Ou seja se houvesse um impedimento dirimente (os impedimentos impedientes não são exemplo pois não
geram invalidade, é preciso que seja uma causa de invalidade.) já não recorríamos ao erro. Este é um requisito
negativo portanto. Se tivermos outra causa de invalidade do negócio temos um erro impróprio.
84 Não temos ilicitude apenas quando há um meio ilícito de ameaçar. Podemos ter ilicitude sempre que há uma

situação jurídica (licíta) que seja usada de forma abusiva. Até pode haver um direito (crédito ou propriedade) mas
têm de ser exercidos nos termos da lei. Precisamos por isso de ir sempre ao 334º.
85 A ameaça têm de se dirigir a extorquir uma declaração negocial. No caso do casamento é um “sim”.
86 A ameaça do mal é causa do medo e o medo é causa do negócio.
94

Falta de Vontade

Aqui temos quatro casos possíveis. São eles, artigo 1635º:

a) Falta de Consciência do ato – alínea residual, tanto se acolhe como fundamento de


falta de consciência a incapacidade acidente como qualquer outra causa. Assim,
aqui segundo a Professor Ana Filipa podemos abrir as portas à anulabilidade por
coacção física, falta de consciência de declaração87 etc… Assim podemos abrir portas
a todas as situações em que o nubente não tinha consciência do que estava a
celebrar.

b) Erro acerca da identidade física – Coloca-se a questão de saber que tipo de erro
está aqui em causa, se é um erro de vício ou se é um erro obstáculo88, o legislador
não esclarece isto. Em termos práticos, se pensarmos em situações hipotéticas ou
concretas podemos classifica-las tanta como erro de vício como obstáculo: A quer
casar com B e declara a sua vontade de o fazer, contudo, quem ele pensava que era B
era na realidade C, neste exemplo, em termos conceptuais podemos tratar a hipótese
tanto como erro de declaração como erro de vício porque no fundo tudo depende da
demonstração, na sede de prova, quanto ao tipo de erro. No fundo é uma
questão de onde colocar o assento tónico da questão.89 O que a doutrina tem vindo a
dizer no entanto é que a alínea b do 1635º tem de ser autonomizada do 1636º,
aliás faz sentido que assim o seja, caso contrário teríamos duas normas a dizer o
mesmo, ou seja que está pensada tendencialmente para os casos de erro na
declaração.

c) Declaração de Vontade Extorquida por coacção física - Quanto a este ponto


dizer que como o legislador não vai regular de modo especifico a coacção física
temos de ir buscar esse conceito ao 246º.90 Ana Filipa Morais Antunes acha que
mesmo que esta alínea c não existisse se podia aplicar o regime do 246º pela alínea
residual, a a).

d) Simulação – Aqui vamos recorrer aos artigos 240º e seguintes. Como já


estudamos em Teoria Geral do Negócio Jurídico a simulação é caracterizada por três
elementos: 1) divergência entre a vontade e a declaração91; 2) um acordo
simulatório; 3) intenção de enganar terceiros. Tipicamente para haver simulação os
dois nubentes têm de estar de acordo em fazer uma simulação, porque se assim não
for vamos ter uma situação de reserva mental92 e não de simulação. A relevância
prática disto é que se estivermos perante um caso de reserva mental não vamos
poder aplicar a d) do 1635º e o legislador não prevê nas outras alíneas a reserva
mental, cabe por isso saber se é de se dar relevância à reserva mental ou não, dado
que as causas de anulabilidade são típicas. O que se pode defender é a aplicação

87 246º. Matéria de TGN.


88 O chamado erro na declaração.
89 Isto é como nas situações de TGN em que se dizia que A queria comprar um prédio com o número 20 e depois

afinal não é esse o prédio, isto tanto podia ser erro de vício como erro de declaração.
90 Aplicamos o regime geral dado que o legislador não especificou nenhuma norma especial.
91 Entra a vontade real e a vontade declarada
92 Ver matéria de TGN e artigo 244º
95

da aliena a do 1635º. Também poderíamos dar relevância por via de interpretação


extensiva / analogia, mas a nosso ver isso é mais rebuscado. A própria existência de
casos de reserva mental no casamento é rebuscada: se uma pessoa quiser casar com
outra para obter apenas um dos efeitos desse contrato não estamos perante um
simulação pois não há acordo e porque a vontade declarada é a vontade real, a
pessoa quer casar, mas quer porque que quer apenas um dos efeitos do
casamento.93 O casamento não é um menu do qual se escolhem apenas alguns
“pratos”. Têm de se aceitar todos os efeitos do contrato de casamento, todos os
direitos e todos os deveres. Um contrato celebrado assim94 é no entender de Ana
Filipa um contrato celebrado com uma causa ilícita, rejeitando por isso a figura da
fraude à lei admitida por outros autores.

Então se alguém casar para obter apenas um dos efeitos do casamento qual é o vício que há? Das
três uma:

1) Não há vício, pois não consta do 1631º nem do 1628º

2) Tese que defende que o casamento é válido mas irregular. O artigo 1627º consagra o
princípio da tipicidade das causa de invalidade do casamento, sendo ela a inexistência, ou a
anulabilidade, ficando por isso de fora a nulidade. Mas como este artigo cuida da validade
deixa de fora as situações que não são sobre validade, sendo elas a irregularidade a
ineficácia em sentido estrito95.

3) Uma terceira tese, que será para a Professor Ana Filipa Antunes eventualmente ilegal apesar
de a defender, é defender que o 1627º cuida apenas das causa de invalidade e consagra o
princípio da tipicidade que têm de ser lido como um princípio de reserva de lei, pois se diz
“especificadas na lei”. Ou seja, que tudo o que o legislador classificar como regime
matrimonial é um regime especial quanto ao regime comum, sendo observado
imperativamente. Mas isto não prejudica que não possam haver outras situações
geradores de outos valores jurídicos negativos que estejam previstos no regime
comum, e por isso pelo artigo 294º diríamos que a tudo o que fosse contrário a um
regime imperativo seria nulo. Esta tese é provavelmente ilegal por uma razão: para que
haja casamento, 1577º têm de estar respeitados os traços identitários que o caracterizam,
sendo um deles a plena comunhão de vida nos termos do Código Civil, e portanto se isto
for assim não temos contrato de casamento em primeiro lugar, logo não se vai poder
passar para a discussão da nulidade.

Há uma outra questão que temos aqui a tratar em sede de delimitação negativa da vontade, o
artigo 1628º c) que é muitas vezes difícil de recortar conceptualmente. Aqui temos situações em que
não há sequer declaração da vontade, temos uma falta de declaração de vontade, aqui não temos

93 Beneficiar de um regime de bens, de um regime sucessório mais favorável, beneficiar de nacionalidade


portuguesa etc…
94 Em que alguém casa para obter apenas certos efeitos do casamento.
95 Ineficácia jurídica lato sensu engloba a invalidade, a ineficácia e a irregularidade.
96

por isso sequer um consentimento nos termos necessários. Não havendo consentimento não há
sequer casamento, temos o desvalor da inexistência jurídica.96

Casamento Por Procuração

No nosso programa da disciplina o que se segue é o casamento por procuração. Antes de


tratarmos do regime jurídico dos valores negativos do casamento, decidimos colocar o casamento por
procuração na ordem do estudo porque é uma matéria muito ligada ao requisito do consentimento.

O consentimento pode ser professado por procuração. O casamento por procuração está
previsto nos artigos 1620º a 1621º, apenas dois artigos que têm depois de ser conjugados com mais
algumas normas: 1628º c), 44º do Código do Registo Civil, no casamento católico temos ainda o
Cânone 1105. Este regime jurídico têm de ser ligado com o regime comum da representação
voluntária. Sempre que falamos de procurador já sabemos que é um representante voluntário. Já
estudamos casos de representação legal noutras cadeiras. Neste casos temos uma representação
voluntária, que se funda na vontade das partes, e concretamente na procuração97. O representante
voluntário vai apenas exteriorizar a vontade do representado não acrescentando nada, por isso não nos
esqueçamos dos três elementos já por nós estudados, do conceito de representação: 1) atuação em
nome de outrem, 2)por conta de outrem e 3) no interesse de outrem.

Modalidades

Quanto às modalidades de procuração no contrato de casamento, temos o artigo 1620º nº2 e


43º nº 1 e 44º do Código do Registo civil, temos que perceber que no fundo, em geral, a procuração
pode ser outorgada com poderes gerais e poderes especiais. Para efeitos de casamento a procuração
que releva é a que têm poderes especiais, porque aquilo que interessa é a razão da natureza do ato que
é um ato estritamente pessoal e de importância social muito relevante é que se especifique a concessão
dos poderes especiais para aquele negócio, portanto nunca ninguém pode casar com uma procuração
que dê “poderes gerais para celebrar negócios jurídicos”, é preciso ser expresso que há o poder de
realizar o contrato de casamento e com quem e especificar a identidade do contraente.
Os mencionados artigos do Código do Registo Civil são artigos que tratam das menções
referiada no nº2 do 1620º e a sua não verificação pode determinar a inexistência do casamento, 1628º
d).

96 Há autores que nos dizem que esta alínea c se aplica a casos em que A pensa que se está a casar com B, mas na
realidade está a casar com C. A justificação apresentada pelos mesmos é que como não há declaração de vontade
de C não há consentimento logo não há casamento.
97 Negócio Jurídico regulado no artigo 262º.
97

Forma

A forma da procuração, prevista no 43º nº2 do CRC e afasta-se do regime comum do 262º nº2,
não vamos aplicar essa norma comum e vamos aplicar esta norma especial.
Assim, a procuração pode ser celebrada em regime comum por:

1) Por documento assinado pelo representado com reconhecimento presencial de assinatura

2) Documento Autenticado

3) Instrumento Público.

Depois temos o regime especial do 43º nº2 do CRC: que vêm prever que no caso de a
procuração ter sido passada a advogado ou a solicitador jurídico é suficiente um documento assinado
pelo representado, deixando por isso de ser necessário o reconhecimento presencial. Isto é assim
porque se confia que a pessoa do solicitador ou do advogado confirma por si a identidade da pessoa.

Pois se a procuração desrespeitar a forma temos então um negócio jurídico nulo como indica o
220º do Código Civil. Mas sendo a procuração nula, isto não significa que o contrato de casamento
celebrado seja também nulo, assim temos fundamentalmente dois grandes cenários:

a) Procuração Nula por falta de poderes especiais – que gera inexistência jurídica do
casamento, 1628º d)

b) Procuração Nula por não indicar a modalidade de casamento – que não gera
inexistência. Pode gerar irregularidade segundo a tese do professor Jorge Duarte Pinheiro,
ou a nulidade segundo outras teses.

Cessação da Procuração

São quatro as causa de cessão de uma procuração para casamento:

1) A revogação – direito potestativo unilateral, 1621º nº2 e 43º nº2 do CRC e pode ter lugar
a todo o tempo.

2) Facto Jurídico Natural – Pela morte quer do representado quer do representante.

3) Interdição – A interdição quer do procurador quer do representante. Desde que transitada


em julgado.

4) A Inabilitação – Inabilitação com fundamento na anomalia psíquica. Desde que transitada


em julgado
98

Os valores jurídicos negativos do casamento viciado, regime jurídico

Sendo uma matéria que tem uma importância muito relevante porque determina a invalidade e
a ineficácia em ser titular do casamento, o direito matrimonial não abdicou de tutelar de forma
particular. Isto significa que o regime jurídico em termo de legitimidade, de prazo, e de efeitos, é um
regime especial, não se aplicando em bloco, de forma imediata, o previsto nos artigos 285º a 294º do
Código Civil, que é o regime comum em matéria de legalidades.
Vimos quais são as modalidades do valor jurídico do casamento. Temos, fundamentalmente,
quatro grupos de inexistência jurídica e depois temos quatro grupos de hipóteses de anulabilidade
que são os mais relevantes, seja com fundamento em impedimento dirimente (alínea a) do artigo
1631º), seja com fundamento numa situação de falta de vontade, seja com fundamento numa situação
de vícios na formação da vontade ou de ausência de testemunhas. Depois temos três casos de
irregularidade que estão previstos respetivamente no 1649º e 1650º, e por último temos o caso
particular com eficácia simples que resulta da não inscrição no registo e cujo regime está plasmado no
1669º e 1670º do código civil.

Notas de Atipicidade

Ora, o regime jurídico pauta-se por notas de atipicidade, o que vai implicar a necessidade de
adequação de muitos dos conceitos do regime comum que já foram apreendidos de Teoria Geral. Isto
vê-se logo no plano dos fundamentos normativos.

 Como vimos, se quisermos anular o casamento com fundamento em erro vício, o âmbito de
aplicação do erro é muito mais restrito do que o que resulta do regime comum. Isto é um
primeiro traço da atipicidade do regime. Portanto, nem todas as hipóteses são juridicamente
contraídas, e mesmo a hipótese de erro sobre a pessoa do declaratário (1636º) também está
prevista em termos mais fechados. Só relevam as qualidades essenciais do outro cônjuge e os
requisitos de relevância jurídica que são distintos dos que concretamente vêm exigir a
responsabilidade ao contrário do que sucede no regime comum.

 Quanto à coação moral, ainda no plano dos fundamentos normativos, a coação moral é
fundamento de anulabilidade do casamento, mas os requisitos de relevância jurídica da coação
moral não se confinam à essencialidade e concretamente à dupla causalidade. Portanto, não se
exige apenas que o medo provenha da ameaça e que tenha sido o medo que tenha determinado
a celebração do negócio. Os requisitos de relevância são dois especiais: a gravidade penal e a
justificação do receio da sua consumação, que só existem no regime comum quanto à coação de
terceiro. Aqui vê-se mais uma vez a atipicidade do regime do direito matrimonial. Para um caso
de coação do declaratário vai exigir os mesmos requisitos de relevância que no caso comum de
coação de terceiro.

 E depois no plano das consequências jurídicas a atipicidade do regime é muito manifesto, vai
se ver casos de legitimidade ativa alargada. Esta matéria convoca aquele conceito de teoria de
invalidade mista, ou de invalidade atípica.
99

Quem pode arguir a anulabilidade? No regime típico, os casos de anulabilidade, nos termos
do 287º, só podem ser arguidos por quem? Pela pessoa em cujo interesse a lei a estabelece. Este é o
princípio geral da anulabilidade. Ou seja, só pode arguir a anulabilidade do negócio aquele que a lei quis
proteger, aquele cujo interesse é tutelado pelo direito, concretamente o que está em erro, o que foi
enganado, o que foi coagido, o incapaz.
No direito matrimonial, este é um dos traços que não se observa, porque para além de este
sujeito poder arguir a anulabilidade, existem muitos outros interessados que vão ser admitidos a arguir
a anulabilidade do negócio. Portanto, esta é uma anulabilidade que no plano da legitimidade ativa
se aproxima da nulidade, por isso é que é atípica.

Quanto ao prazo para invocar: No regime comum, qual o prazo para arguir a anulabilidade? E
esta resposta é sempre depende. Se o negócio não está cumprido, aí não há prazo, e se o negócio está
cumprido é um ano desde a celebração do vício. No regime do direito matrimonial esta distinção
também não vai ser observada, portanto nunca se aplica a regra do 287º/2. Há sempre prazo para
anular o casamento no direito matrimonial, independentemente do contrato ter sido cumprido
ou não.

Há um regime especial de convalidação. Já sabemos que uma das diferenças entre


anulabilidade e nulidade traduz-se precisamente no facto de, em regra, a anulabilidade poder ser
sanada. Pode ser sanada porque circunstâncias? Pelo decurso do prazo, ou seja, caducidade do direito
potestativo, pela confirmação (artigo 282º).
No direito matrimonial, há uma norma especial- o artigo 1633º- que vai revelar várias
hipóteses que podem conduzir à convalidação do casamento, portanto é esta norma que deve ser
observada e não o 288º nem o 287º do CC.

Ao contrário do regime comum previsto no 289º, a anulação do casamento não tem eficácia
retroativa, o que significa que a eficácia é meramente para o futuro e, portanto, não se vai apagar todo
e qualquer efeito já produzido pelo casamento. Isto é facilmente compreensível em razão do trato de
natureza pessoal e que vai gerar efeitos muito relevantes não só no ponto de pessoal como patrimonial,
ou seja, pode haver outras pessoas prejudicadas pela destruição radical dos efeitos, concretamente
credores que confiavam na celebração do casamento e que de um momento para o outro ficam sem essa
garantia patrimonial. Por essa razão, esta é a regra que está plasmada no artigo 1670º do código civil.

Regime da Anulabilidade

Quanto ao regime da anulabilidade do casamento, existem quatro ideias essenciais:

1) É necessária uma ação de anulação. Isto é uma ideia de regime comum. Se o negócio é
anulável, significa que vai produzir efeitos até ser destruído, e como é que ele é destruído?
Através de uma sentença constitutiva. Portanto, ao contrário da nulidade, em que a ação é
uma ação de simples apreciação, nos casos de anulabilidade do negócio precisamos sempre
100

de uma ação constitutiva, porque é com base naquela sentença que nós vamos ter
autorização para destruir todos ou alguns dos efeitos do negócio jurídico. Esta é a ideia que
resulta do 1632º do CC. ‘’A anulabilidade do casamento tem de ser invocada em ação
especialmente intentada para esse efeito”, a dita ação constitutiva.

2) A legitimidade ativa é atípica, porque há mais sujeitos que a podem arguir e é variável em
função do tipo de vício. Portanto, o direito matrimonial aqui é particularmente complexo.
Não se vai dizer que para qualquer caso de anulabilidade tem legitimidade A, B ou C.
Depende do fundamento, para os impedimentos dirimentes tem legitimidade determinadas
pessoas, para os casos de falta de vontade outros, para os casos de vícios de vontade outros,
e para os casos de falta de testemunha outros ainda. Todas as situações são distintas.
Porquê? Porque têm na sua base interesses distintos, ou estritamente particulares, ou
interesses gerais e de ordem pública.

 Para os impedimentos dirimentes temos a norma do 1639º. Já sabemos que os


impedimentos dirimentes, que funcionam sobre o conceito de capacidade jurídica
negativa, geram a anulabilidade do casamento. E quem é que tem legitimidade
ativa? Ora bem, para além dos cônjuges que seria o que resultaria do 287º,
também nos termos do número 1: “qualquer parente na linha recta, qualquer
parente até ao quarto grau da linha colateral, herdeiros no seu conceito geral, os
adotantes e o ministério público” , e o número 2 do artigo 1639º vem ainda fazer
um alargamento em casos particulares: “no caso de casamento de menores, no caso
de casamento de menor de idade, também tem legitimidade um tutor, no caso de
interdição ou de anomalia psíquica o curador, e no caso de bigamia também o
cônjuge do infrator”.

Qual é a razão de ser deste círculo absolutamente alargado de sujeitos? Interesses gerais que
estão na base da construção do conceito de impedimentos dirimentes e os interesses da família.
A família é uma instituição jurídica, é a célula básica, pelo que qualquer pessoa em geral da
família, parente em linha recta, em linha colateral, herdeiros, deve poder ter uma palavra a
dizer, quanto à invalidação deste casamento por impedimentos dirimentes.

 Nos casos de falta de vontade (casos de divergência entre a vontade e a


declaração, ou seja, há uma vontade declarada que não corresponde à vontade
real)- artigo 1640º- o interesse em causa já não é um interesse geral, nem de
ordem pública, é um interesse particular do cônjuge, pelo que o ciclo de pessoas
com legitimidade também vai ser distinto em função dos fundamentos de
anulabilidade, em razão de falta de vontade.

A simulação está prevista no número 1: podem arguir os cônjuges mas também qualquer
pessoa prejudicada com o casamento, qualquer pessoa prejudicada com o casamento é
tipicamente um terceiro, pode ser um credor, pode ser alguém que não esteja relacionado
familiarmente com aquelas duas pessoas. Esta é, mais uma vez, uma nota distintiva contra o
regime que nós conhecemos do 242º, que não se aplica.

Depois, para os restantes casos de falta de vontade, rege o número 2, que vai distinguir três
funções essenciais: falta de consciência do ato, que é a famosa alínea a) do artigo 1635º, cláusula
residual, o erro sobre a identidade física do outro cônjuge e coação física. Quem é que tem
legitimidade? O cônjuge cuja vontade falhou (1ª parte do nº2), mas o legislador vem aqui dizer
101

que, apesar de ser apenas o cônjuge com legitimidade ativa, podem prosseguir na ação que tem
de ser intentada por este cônjuge outras pessoas. Possibilidade de entrarem outros sujeitos a
contestar a validade do casamento. Quem é que são estes sujeitos? Parentes, sem distinção de
linha recta ou colateral, ou seja, parentes em geral, afins na linha recta, herdeiros e adotantes.
Nestes casos, então, estes sujeitos podem ter legitimidade. Se morrer o cônjuge que intentou
originariamente a ação, ou seja, se o cônjuge inicia a ação e entretanto falece, para que a ação
não seja arquivada por nulidade superveniente há uma substituição do cônjuge por estas
pessoas (casos de substituição processual).

 Vícios da vontade (art. 1641º). Quais é que são os interesses que estão aqui em
causa? São interesses particulares do cônjuge que foi aqui afetado, seja por erro,
seja por coação moral. O artigo 1641º vai restringir a legitimidade ativa a este
titular do interesse protegido. Na 1ª parte, releva o cônjuge que foi vítima de erro
ou de coação, ele é apenas o sujeito com legitimidade ativa para intentar esta
ação. No nº 2, vai repudiar a ideia que vimos há pouco em caso de morte, podem
prosseguir na ação os parentes, os afins da linha recta, adotantes, herdeiros.

 Falta de testemunhas (artigo 1642º). Neste caso, quanto ao requisito da exigência


de testemunhas, temos de lembrar o artigo 1616º, diz ‘’certas testemunhas
quando exigidas por lei’’. Quando é que se exige por lei? Exige-se, por exemplo, no
19º/4 da Lei da Liberdade Religiosa, nos casos do 45º/2 do Código do Registo
Civil, quando não é possível comprovar a identidade das partes, no 154º/2 do
Código do Registo Civil. Ora bem, isto são interesses públicos, portanto, é o Estado
que tem interesse em garantir a intervenção de testemunhas, e por essa razão a
legitimidade vai ser conferida única e exclusivamente a um sujeito que é o
Ministério Público, que tem a função de garantir a legalidade dos atos. Isto quanto
ao quadro da legitimidade, legitimidade ativa e variável.

3) Qual é o prazo para vir arguir a anulabilidade do casamento? Mais uma vez, temos um
prazo atípico e especial relativamente ao regime comum, e que mais uma vez varia em
função da causa de anulabilidade. Artigos relevantes: 1643º, 1644º, 1645º e 1646º.

 Impedimentos dirimentes: vêm previstos no 1643º e são quatro os casos


fundamentais (menoridade, interdição, inabilitação por anomalia psíquica ou
demência notória). Portanto, são aqueles casos do 1601º alínea b) do CC.

Se a ação for intentada pelo incapaz: prazo de 6 meses depois de ter sido atingida
a maioridade, ter sido levantada a inabilitação ou interdição ou de a demência ter
cessado.

Se for intentada por outra pessoa temos um prazo mais alargado de 3 anos
subsequentes, 6 meses quando for o próprio incapaz, o demente ou inabilitado ou
interdito, mas nunca depois do prazo limite. Isto faz lembrar o que acontecia na
menoridade, também existia um prazo para o menor vir arguir mas nunca depois
de certo limite, estes limites são atingida a maioridade, levantada a incapacidade
e cessação da demência. Isto compreende-se porque se cessa a situação de
incapacidade, não faz sentido que terceiros possam agir em nome deste. No caso
102

de condenação por homicídio contra o cônjuge de um dos nubentes, 3 anos a


contar da celebração do casamento, nos demais casos até 6 meses depois de
dissolução do casamento. O número 3 depois vai relevar a hipótese de anulação
do casamento fundada no impedimento de vínculo anterior não dissolvido, 1601º
alínea c), nestes casos só pode ser instaurada ou prosseguir se não estiver
pendente a ação de declaração de nulidade ou a anulação do primeiro casamento
do bígamo, e se a ação for intentada pelo Ministério Público só se reconhece o
direito de ação até à dissolução do casamento, nos termos do nº2. Explicar ainda
que em todas as situações, no caso de ser ultrapassado o prazo, o direito caduca,
portanto é um caso de caducidade, e como consequência de convalidação do
casamento por decurso do prazo.

4) Casos de falta de vontade (artigo 1644º): em termos do prazo, no nº1 são 3 anos
subsequentes à celebração do casamento. Há, contudo, um desvio: este prazo não é de 3
anos se o casamento era ignorado pelo requerente, pois nestes caso temos 6 meses
seguintes ao momento da celebração do casamento.

5) Vícios da vontade (1645º): 6 meses subsequentes à celebração do vício. O prazo é muito


mais reduzido do que no regime comum, estamos a falar da amputação por metade do
prazo, normalmente é um ano para a cessação do vício.

6) Falta de testemunhas (1646º): prazo de 1 ano subsequente à celebração do casamento. O


legislador, como a exigência de testemunhas se justifica pelo interesse público e os vícios na
formação da vontade por interesse particulares, consagra o prazo duplicado relativamente à
exigência de testemunhas, e considera mais grave porque é um interesse público. Releva
ainda dizer que termos do artigo 1633º/2, não se aplica a regra do 287º/2, portanto aquela
ideia que se o negócio não tiver cumprido não há prazo, ausência de prazo para arguir a
anulabilidade.

7) Regime especial de convalidação (artigo 1633º): temos 5 hipóteses essenciais:

 1º) Casamento de menor sem idade núbil, ou seja antes dos 16 anos: é o caso previsto no
1633º/1/a) que gera a anulabilidade do casamento, porque é um impedimento
dirimente absoluto, 1601º/a).

 2º) Casamento por interdito ou inabilitado por anomalia psíquica: 1633º/1/b) e


1601º/b) também é um impedimento dirimente absoluto, também se aplica ao caso de
casamento por pessoa afetada por demência notória.

 3º) Casamento de indivíduo já vinculado por anterior casamento não dissolvido:


1633º/1/a) casa com o 1601º/c), também é um impedimento dirimente absoluto.

 4º) Casamento celebrado com falta do número de testemunhas legalmente exigido:


1633º/1/d), que casa com o 154º e 45º/2 do Código do Registo Civil, e o 19º/4 da Lei da
Liberdade Religiosa.
103

 No fundo, neste artigo 1633º, nestas quatro hipóteses é possível sanar a anulabilidade
do casamento.

Regime jurídico da inexistência jurídica

É controverso se a inexistência jurídica é um valor jurídico negativo autónomo. Porquê? Porque


o legislador, na parte comum, não indica nenhumas normas especiais. Os autores que vêm admitir a
existência da inexistência jurídica (entre os quais o professor Carvalho Fernandes, o Professor Oliveira
Ascensão, Professor Mota Pinto e em sentido contrário o professor Menezes Cordeiro) socorrem-se de
alguns argumentos normativos. Os argumentos normativos na parte comum são o 245º e o 246º,
quando se diz que «carecem de qualquer efeito». Para estes autores, isto é igual a inexistência jurídica.

Outro argumento é o do direito matrimonial, sendo que no 1630º há uma norma que vem
esclarecer o regime da inexistência jurídica que em teoria ajuda, porque no fundo é com base nesta
mesma norma que se consegue incitar quais é que são os traços identitários deste regime. O que é que é
a inexistência jurídica? É uma sanção mais gravosa. Isto significa que ela está reservada para casos em
que não existe sequer aparência de validade do casamento, são casos em que em rigor faltam os traços
identitários da figura.

O problema é que o 1628º consagra uma tipicidade de casos de inexistência jurídica, que não
comporta o alargamento com a aplicação analógica, por isso são apenas estes os casos de
inexistência jurídica, deixando de fora os outros de situações patológicas de casamento, que geram o
problema de saber se vão ser consideradas regulares ou se podem ser consideradas nulas com base na
teoria explicada. Não existe sequer uma aparência de matrimónio. Quanto ao 1628º é importante não
esquecer que foi objeto de uma alteração muito relevante em 2010 que determinou a derrogação da
alínea e), que falava de casamento celebrado entre duas pessoas do mesmo sexo. Hoje em dia
fundamentalmente são apenas os casos previstos o casamento celebrado entre quem não tem
competência funcional para o ato.

Esta é uma matéria que se relaciona com o processo de tramitação do casamento. Sabe-se
que o casamento é um negócio acompanhado de uma solenidade particular, que determina logo para a
celebração que esta tenha de ser presenciada e concretizada por alguém com competência particular,
seja a funcionária do registo civil, ou o ministro de culto religioso. Isto resulta do artigo 1616º e resulta
também do artigo 154º do Código do Registo Civil. Sempre que assim não suceda é inexistente.

1) Aplicação do 1629º: vem tratar de um caso muito particular que é os chamados


funcionários de facto. Nesta hipótese, o legislador é sensível e vai afastar a sanção da
inexistência jurídica. O pressuposto comum para a alínea a) do 1628º traduz-se nisto
efetivamente: quem celebrou o casamento não tinha competência para o ato. Contudo,
o traço distintivo é que aquela pessoa que celebrou o casamento, sendo incompetente,
agia publicamente como se tivesse competência, e era reconhecida publicamente
como tendo competência, portanto era desculpável, porque não havia razões para os
104

nubentes desconfiarem da falta de competência da pessoa que celebrou o casamento.


É isto que resulta do 1629º, não se considera juridicamente inexistente se exercia
publicamente as funções e se ambos os nubentes desconheciam a falta daquela competência.

2) A alínea b) trata dos casos de casamento urgente não homologado. O casamento urgente
nos termos previstos nos artigos 1622º a 1624º do Código Civil e 156º a 160º do Código do
Registo Civil carateriza-se por um desvio quanto à tramitação comum quando não há
processo preliminar, e por outro lado não se exige a intervenção do funcionário do registo
civil ou o ministro do culto religioso, mas não se exige porque depois é preciso um ato de
homologação, é um ato de legitimação superveniente, sendo que, quando falhar, o
casamento é juridicamente inexistente.

3) Casamento com falta de declaração de vontade: esta é uma situação distinta da que se
encontra no artigo 1631º/b) porque está depois no 1635º. Não é um caso de falta de
vontade, é um caso de falta de declaração de vontade, é um caso mais grave. Entende-se que
não existe uma divergência entre a vontade e a declaração, por e simplesmente não houve
vontade, ou porque a pessoa estava numa situação de tal ordem que não lhe era possível
reconhecer a suscetibilidade de vinculação jurídica, tratando-se, portanto, de inexistência
jurídica.

4) Alínea d): casamento contraído por intermédio de procurador: em que situações? Nos
casos de vício da procuração, ou porque já não há poderes (caso de representação sem
poderes), ou porque a procuração foi outorgada sem que houvesse legitimidade para o
efeito (agiu como falso procurador), ou nos casos de invalidade da procuração, (aqueles
erros formais, porque não se deram poderes especiais, porque não se identificou a
identidade do outro contraente). Nestas situações o que é que acontece? Artigo 1630º: não
se produz qualquer efeito; circunstância de termos um valor jurídico mais grave do que a
nulidade, que se traduz na inexistência jurídica, não se produzindo qualquer efeito.
Qualquer efeito direto e imediato ou qualquer efeito colateral não se produz, e por essa
razão não há aplicabilidade da norma do 243º ou do 291º porque são normas que protegem
terceiros de boa fé e que determinam a inoponibilidade. Isto nunca se aplica no caso de
inexistência jurídica, não se vai sequer admitir que este casamento, é um chamado
casamento putativo (artigo 1647º e 1648º). Não é possível admitir por usucapião, nem é
possível haver uma conversão do negócio (artigo 293º). Estes são os traços distintivos para
o regime da nulidade. Quem é que tem legitimidade? O legislador esclarece que «qualquer
pessoa» (ver a diferença para o regime da nulidade em que o conceito é qualquer
interessado). O conceito de interesse não se confunde com de ser qualquer pessoa. Portanto,
qualquer pessoa independentemente de ter um interesse juridicamente atendível. O
interessado é apenas aquele que se encontra numa situação jurídica, suscetível de ser
afetado pela manutenção ou pela extinção do negócio jurídico.

Sem dependência de prazo: este é um traço igual da nulidade.

Sem necessidade de declaração judicial que declare a ineficácia jurídica em sentido


lato: isto é um traço um bocadinho controverso porque se costuma dizer que uma das ideias
é que na inexistência jurídica nem é preciso recorrer ao tribunal. Isto é assim se não for
contestado pela contraparte, se não é necessário uma sentença que venha certificar que o
ato é juridicamente lícito.
105

Regime da irregularidade

Consta dos artigos 1649º a 1650º. Este valor jurídico negativo é uma consequência da
verificação dos chamados impedimentos impedientes que não tenham sido dispensados, portanto,
relativamente aos quais não tenha havido aplicação do 1601º. Nestes casos, então, o casamento é valido,
mas produzem-se consequências desfavoráveis para o cônjuge que casou com inobservância destes
impedimentos. Por outro lado, esta ideia de irregularidade tem sido aproveitada como uma sanção
residual, conforme a doutrina, entendendo-se que tudo aquilo que não seja inexistente juridicamente, e
que não gere a anulabilidade, então gera a irregularidade como sanção residual, é a interpretação do
1627º a contrario. Que casos são estes?

1) Artigo 1649º (casamento de menor mas com idade núbil que não tenha sido autorizado
pelos pais ou relativamente ao qual não tenha havido suprimento da autorização). Isto
significa conjugar o 1612º do CC com o regime particular que está previsto no Código do
Registo Civil, que é o chamado processo especial para o consentimento de casamento de
menor de idade (artigo 255º a 257º) do CRC.

Fundamentalmente traduz-se num processo relativamente singelo.

Aquele que queira requerer o suprimento da necessidade de autorização dos pais vai ter que
alegar e demonstrar que tem suficiente maturidade física e psíquica e que há razões
ponderosas para justificar a celebração do casamento (artigo 257º). Estes são os
argumentos que vão ser ponderados. Já sabemos que se não houver autorização nem
suprimento desta e o casamento for celebrado aplica-se a sanção especial do artigo 1649º,
ou seja, é um caso de emancipação restrita (artigo 133º do CC) e, portanto, esta
emancipação restrita determina que o menor, como não se emancipa totalmente, não vai ser
considerado como pleno, capaz de exercício quanto à administração de bens. E que
administração de bens? Os que leve para o casamento, ou os que advenham a título gratuito.
Há uma questão controversa que é a de saber se o artigo 1649º pode ser alargado por
interpretação extensiva e abranger não só os atos de administração mas também os atos de
disposição, com base na ideia de se o legislador proíbe o menos também deve proibir o mais,
porque os atos de disposição são, por exemplo, os atos de doação, liberalidade a título
gratuito, são os atos que implicam a transferência de um bem com a natureza de elemento
estável no património. Em sentido contrário temos outros autores que vêm admitir o
alargamento desta norma com base no princípio referido, e é nesta posição que também se
encontra a Professora. Não faz sentido vedar apenas atos de administração e abrir a porta
aos atos dispositivos, o que implica que sejam celebrados validamente por aquele que casou
de forma irregular. O 1649º também consagra um problema de separação de patrimónios,
no seu nº2. Isto é um caso de autonomia patrimonial, resta saber se é perfeita se é
imperfeita.

2) Artigo 1650º: os casos aqui previstos são dois. Tinha sido dito que a irregularidade
corresponde a três situações essenciais:

 1: Casamento de menores irregular, quanto ao desrespeito pelo prazo


internupcial (se alguém casa com desrespeito pelo prazo internupcial, a sanção
106

vem plasmada no artigo 1650º/1), sendo uma ideia imposta pelo princípio da
justiça. Se se resolve casar com desrespeito pelo prazo internupcial, então não faz
sentido que possa manter os benefícios patrimoniais daquele casamento
relativamente ao qual já se libertou.

Desta forma não pode continuar a beneficiar patrimonialmente desse casamento.


O prazo internupcial está no artigo 1605º (deve ser feita uma remissão).

 2: Desrespeito por impedimentos impedientes previstos no 1604º/c). O


chamado parentesco de terceiro grau da linha colateral, portanto tio-sobrinho por
exemplo, e na alínea d) vínculo de tutela, curatela ou administração legal de bens.
Nestes casos, se for celebrado o casamento com desrespeito pelos limites
temporais que aqui estão previstos, proscreve-se uma incapacidade com o saber
do consorte, portanto do novo cônjuge, qualquer benefício por relação, por
testamento. É a mesma lógica penalizadora, são sanções punitivas. O Professor
Jorge Duarte Pinheiro entende, por exemplo, que o caso de procuração outorgada
sem indicação da modalidade de casamento, que é uma das exigências, gera
irregularidade, e portanto vai aplicar analogicamente este regime. Estas normas
são normas excepcionais e, portanto, nós estamos a aplicar o regime do 1650º a
uma situação matrimonial distinta e a Professora tem muitas dúvidas que haja
analogia, mas esta é a tese do professor Jorge Duarte Pinheiro.

Regime jurídico da ineficácia simples

Consta da seguinte sequência de artigos: Artigo 1651º: proclama a necessidade de inscrição no


registo de certos casamentos. Artigos 1669º a 1670º (efeitos do registo): A ideia essencial que resulta
do 1669º é a seguinte: o casamento que devesse ser registado e não o foi 1651º (conjugar com o artigo
1º/d) do código do registo civil, e os artigos 51º e seguintes deste código). Qual é a consequência?
Significa que não pode ser invocado, seja pelos cônjuges ou seus herdeiros, seja por terceiros, até ser
lavrado o correspondente assento. Isto significa o quê? É um caso de inoponibilidade, o casamento é
válido mas não vai poder ser atendido para efeitos de produção de consequência de direito, nem na
relação horizontal, entre os cônjuges, nem relativamente a terceiros.
Depois temos o artigo 1670º (proclama o princípio da retroatividade do registo): uma vez
lavrado o correspondente assento, seja por inscrição, seja por transcrição, os efeitos civis do casamento
retrotraem-se à data da sua celebração. Portanto, ainda que o registo só ocorra 6 meses depois, as
pessoas consideram-se casadas desde o momento da sua celebração. Depois temos o desvio do nº2, a
que deve ser feita uma remissão para o 53º do Código do Registo Civil (ideia de que a retroatividade do
registo não é absoluta, porque em casos particulares de direitos de terceiros há um desvio). Isto em
matéria de valores jurídicos negativos do casamento.

Casamento putativo: É uma situação teórica, faz parte do Código Civil e tem implicações
práticas relevantes. A sede legal do casamento putativo encontra-se no artigo 1647º e 1648º. São duas
107

normas que se relacionam precisamente com o regime jurídico dos valores negativos do casamento e
com os efeitos do casamento nulo ou anulável. Este regime do casamento putativo vai implicar a
atendibilidade do conceito de boa fé. Vimos que o negócio produz efeitos até ser anulado, portanto até
ao reconhecimento judicial da anulabilidade, o mesmo é dizer até a anulação do casamento. É preciso
uma acção, 1632º, e só com a sentença que é constitutiva é que se destroem os efeitos. Os efeitos do
regime deste casamento putativo, nós temos um desvio ao princípio da destruição retroativa dos efeitos
produzidos pelo casamento. Há aqui uma ideia de validade provisória de certos efeitos que se
encontram num casamento inválido. O legislador foi sensível à ideia de que, ainda que o casamento
seja inválido e ainda que ele venha a ser anulado, certos efeitos já produzidos não devem ser
destruídos. Neste ponto é importante lembrar, apesar de não ter nada a ver, que quando vimos os
efeitos atenuados da ordem pública, vimos que a ordem pública determina a nulidade do casamento,
mas certos efeitos podem vir a considerar-se produzidos, aqui é a mesma ideia.

Que efeitos são estes que se mantêm? São efeitos de facto já produzidos, portanto desde o
passado, o que significa que o regime do casamento putativo não interfere com os efeitos a produzir, só
aqueles que se produziram e consolidaram na ordem jurídica, principalmente se estes efeitos
produzidos são consequentes à celebração de um casamento na ignorância da sua invalidade. Não são
todos os efeitos, são apenas os efeitos de facto, os efeitos já produzidos, efeitos já produzidos em razão
da ignorância da invalidade do casamento. Até quando é que estes efeitos se vão manter na ordem
jurídica? Não é para sempre, é até ao trâmite em julgado da sentença que vá declarar nulo o casamento
católico ou anulado o casamento civil. Exemplos de efeitos:

 Aquisição da nacionalidade (alguém casa com outro e pela lei da nacionalidade tem
direito a adquirir a sua nacionalidade)

 Filiação, a filiação que foi reconhecida por efeitos da celebração do casamento;


Aditamento de apelido do cônjuge;

 Administração de bens, alguém enquanto casado celebrou atos de administração ou de


disposição para os quais tinha legitimidade, e contraiu dívidas para com terceiros;

 Efeitos sucessórios;

 Doação;

 Emancipação.

São tudo efeitos que se dizem efeitos legais, porque são efeitos que estão definidos pelo direito e
que se produzem em razão da celebração do casamento. Isto tudo visto até agora significa que o
casamento inválido, mesmo putativo, não admite a produção de novos efeitos, só vai funcionar para
admitir durante um período de tempo limitado os efeitos que se produziram no passado.

Qual é o conceito de casamento putativo? São dois os elementos do conceito mais um (dois
necessários e um eventual). Tem de se ter celebrado um casamento que não pode ser juridicamente
inexistente (nenhuma das situações do 1628º), pois se houver algum fundamento para a inexistência
108

jurídica nem vale a pena aplicar o regime do 1647º. O casamento, não sendo inexistente juridicamente,
é inválido, e esta invalidade já foi decretada no caso da anulabilidade ou declarada no caso da nulidade.

Qual é o elemento eventual? R: A interferência da boa fé de um ou de ambos os cônjuges. Este é


o elemento satélite que pode ou não coincidir numa hipótese como estas, o que é a boa fé? É definido
pelo legislador no art. 1648º, em que temos o conceito de boa fé subjetiva ética, ignorância desculpável.
Por outro lado, o nº3 do 1648º vai consagrar uma presunção de existência de boa fé. Esta presunção é
naturalmente uma presunção ilidível, nos termos do regime comum do artigo 350º no nº2 (a não ser
que o legislador diga o contrário, as presunções são sempre suscetíveis de ser afastadas por prova em
contrário). A boa fé dos cônjuges presume-se, portanto.

Em que é que se traduz o seu regime jurídico? Está no 1647º e traduz-se no seguinte:

 Ideia subsistência dos efeitos ex nunc. Os efeitos já produzidos no passado (até ao


tramite em julgado da sentença) mantêm-se para o futuro, ideia fundamental que resulta
do regime do casamento putativo, são efeitos produzidos no passado, efeitos de facto
que resultam da lei e produzidos até ao tramite em julgado da sentença.

 No primeiro plano- o chamado plano das relações horizontais ou o chamado plano


horizontal, relação entre os cônjuges (relações internas) há uma interferência da boa ou
da má fé. O casamento civil anulado contraído de boa fé entre os cônjuges produz os
seus efeitos em relação a estes e a terceiros até ao tramite em julgado da sentença.

 No segundo plano de relações- no plano da eficácia lateral- são as relações externas, isto
é, dos cônjuges com terceiros, também aqui a boa ou má fé são relevantes. Nº1 e 2:
depende da existência de boa fé a possibilidade de opor a terceiros os efeitos adquiridos
por força do casamento invalido.

 Terceiro plano- plano das relações verticais- a relação entre os cônjuges e os filhos:
como esta relação não vem prevista no 1647º, tem de ser adicionada a este regime a
norma do 1827º e neste plano é irrelevante a boa ou a má fé dos cônjuges porque se
entende que não pode haver prejuízo para os filhos da ausência de torpeza da parte dos
pais. O nº2 do 1827º aplica-se ao casamento católico.

 Nos termos do 1647º/3, o casamento católico declarado nulo pelos tribunais ou


instituições eclesiásticas produz os seus efeitos nos termos dos números anteriores
até ao momento da decisão. Portanto, o legislador, nos processos de declaração de
nulidade nos casamentos católicos, segue a tramitação prevista no Código de Direito
Canónico e são da competência dos tribunais eclesiásticos nos termos do 1625º e,
por essa razão, o legislador diz que nestes casos produz os seus efeitos até ao
averbamento da decisão.

 O artigo 1648º/2 vem esclarecer quem tem competência para averiguar e aferir da boa
ou má fé dos cônjuges, e esta é uma norma no fundo processual, é da exclusiva
competência dos tribunais do Estado o conhecimento da boa ou má fé dos cônjuges,
mais uma vez deve ser feito um contraponto com o artigo 1625º que é uma norma que
vem reservar aos tribunais eclesiásticos o poder das causas respeitantes à nulidade.
109

 Neste 1647º/2, quando se determina que se apenas um dos cônjuges tiver contraído de
boa fé só esse pode arrogar-se do benefício do estado matrimonial e opô-los a terceiros,
esta é uma norma um pouco complicada de interpretar, porque diz que, desde que,
relativamente a estes, se trate de mero reflexo das relações havidas entre os cônjuges e é
nesta última frase que surge a complicação, esta é uma expressão que carece de
concretização. O que é que o legislador quer aqui dizer? Que se apenas um dos cônjuges
estiver de boa fé só ele é que se pode prevalecer dos efeitos já produzidos, mas mesmo
assim não são de todos os efeitos, são apenas dos efeitos que sejam meros reflexos das
relações havidas entre os cônjuges. Isto é igual a dizer que não se pode prevalecer dos
efeitos diretamente estabelecidos com fundamento na lei. Por exemplo, a afinidade é um
efeito diretamente estabelecido por lei, este não pode ser oposto a terceiros porque
resulta da lei.

 Quais é que são os efeitos que estão em causa? São aqueles que são puramente
indiretos, puramente colaterais nas relações com os cônjuges, nunca os que resultam
diretamente da celebração do casamento. Aqui vai interferir as relações, os negócios
celebrados entre eles, desde que não estejam regulados na lei de forma imperativa, são
estes os casos.

 Quanto à aquisição da nacionalidade, deve ser acrescentada aqui também, porque é


um dos efeitos possíveis. Vem prevista na Lei 37/81 de 3 de outubro que já foi
alterada, sendo a última alteração em 2015. O artigo 3º trata da aquisição da
nacionalidade em caso de casamento ou união de facto. A parte que interessa, ou seja a
norma a adicionar, é o 3º/2: “A declaração de nulidade ou anulação do casamento não
prejudica a nacionalidade adquirida pelo cônjuge que o contraiu de boa-fé.” Este artigo
3º/2 vai alargar aquilo que já resultaria do 1647º ao caso da aquisição da nacionalidade.
Desde que esteja de boa fé, o cônjuge não perde a nacionalidade portuguesa adquirida
com base em casamento invalido. Este é o efeito particular que é ressalvado pela norma.

Estudo da dinâmica do casamento

Vamos partir para o estudo da relação matrimonial, admitindo que não houve vícios nem
patologias. Esta relação matrimonial, a sua execução, vai ser estudada em dois planos essenciais:

I. O plano das relações pessoais

II. O plano das relações patrimoniais

Vamos começar pelo primeiro plano, pelos chamados vínculos jurídico-pessoais. Nesta
matéria, é importante analisar os direitos e as vinculações que têm natureza não patrimonial,
insuscetível de avaliação pecuniária. Vamos recordar matéria dada anteriormente, relembrar o que é o
110

sentido da plena comunhão de vida nos três planos, explicitar o princípio da igualdade dos cônjuges
e depois os deveres conjugais que também já falámos sobre eles e que agora vão ser dados de forma
mais profunda. Qual é a sede normativa da matéria? Constituição (CRP): artigo 36º e o artigo 77º,
Código Civil: artigos 1588º, os artigos 1671º a 1677º/g), o artigo 1680º, o artigo 1682º-A/2,
1682º-B, 1688º, artigos 1874º a 1876º (que tratam precisamente da relação com os filhos, das
responsabilidades parentais) e os artigos 1877º a 1920º-C.

Princípio geral em matéria de vínculos jurídico-pessoais: Competência da lei civil para


regular os efeitos do casamento.Independentemente da modalidade de casamento, é a lei civil que
esclarece quais são os efeitos que se produzem.

Plena comunhão de vida (1577º): comunhão nos três planos-comunhão de tecto, de leito e de
mesa. Esta ideia de comunhão plena de vida tem ligação com os deveres conjugais porque vamos ver
que vão titular o dever de coabitação, comunhão de leito, e no que diz respeito à comunhão de mesa vão
titular o dever de cooperação e o dever de assistência. Há aqui uma interligação muito forte.

Quanto ao postulado da igualdade dos cônjuges: esta matéria teve um influxo histórico muito
importante, pois ao exercerem as chamadas funções naturais dentro da família, ao desaparecer a figura
do chefe de família, consagrou-se o princípio da direção conjunta dos assuntos familiares. Este
princípio da direção conjunta da família, que se encontra no artigo 1671º/2, tem implicações
variadíssimas, desde logo no que diz respeito à relação entre os cônjuges no chamado plano das
relações horizontais. Os cônjuges têm que tomar as decisões de comum acordo, não há decisões com
base no poder de veto, no poder especial, pois ambos têm o mesmo poder de voto e ambos têm o
mesmo poder de falar e influenciar circunstâncias da vida familiar, e isto resulta do 36º/3 da CRP, do
artigo 1671º, e do 1672º do Código Civil.

Orientação da vida em comum (art.1671º/2): traduz-se em onde fixar a residência da


família, se ambos vão trabalhar ou se um fica em casa, se vão ter filhos e quantos filhos é que vão ter, se
os filhos vão ter uma educação religiosa ou não, se os filhos vão frequentar a escola pública ou o sistema
privado. No fundo, as várias decisões que podem ser tomadas e dizem respeito à família, seja nuclear,
seja alargada. Não esquecer que o casamento católico também proclama a mesma diretriz (cânone
1135º), sendo que proclama a mesma ideia que os cônjuges têm iguais direitos e deveres quanto ao
consórcio de vida conjugal. Também no casamento civil sobre forma religiosa, o artigo 19º/3 vem
chamar a atenção para a necessidade de os cônjuges estarem alertados para estes princípios de
direção conjunta de família e de plena igualdade.

Principio da igualdade

1)Relações inter-conjugais (no plano horizontal)- Coordenadas essenciais:

1º - Existe uma igualdade de direitos e deveres de cada um dos cônjuges que resulta do
36.º/3 CRP e 1671.º/1 CC

2º- Existe um principio de direção conjunta da família - 1671.º/2. Significa que todas as
decisões que dizem respeito à família que se constitui por efeito do casamento (família conjugal e
111

eventual família alargada por via da descendência) têm de ser tomadas de comum acordo. Não existem
pelouros nem qualquer divisão artificial imposta pelo Estado ou pela sociedade. É claro que divisões
podem surgir no seio da família desde que tenham sido concertadas também no plano da família.

3º - Existe uma tipologia de direitos e deveres conjugais – consta dos arts. 1672.º a 1676.º CC
– a sua violação pode gerar responsabilidade obrigacional (nos termos dos 798.º ss). É um aspeto
determinante e que se prende com o ponto da eventual articulação (ou sobreposição) dos deveres
conjugais com os direitos de personalidade. Ambos podem gerar consequências indemnizatórias, mas
com títulos e fundamentos distintos.

4º - Prevê-se normativamente o direito a aditar ao nome originário apelidos do cônjuge


(1677.º/1 CC). Este direito permite também invocar ou reconhecer a faculdade de conservar esse
apelido aditado em caso de morte do cônjuge (1677.º-A) e em caso de divorcio/separação judicial de
pessoas e bens, observados determinados limites (1677.º-B).

5º - Este principio da igualdade dos cônjuges tem uma projeção também nas relações
patrimoniais – suscetíveis de avaliação pecuniária - 1678.º a 1688.º. Na sistematização do CC temos os
efeitos tipicamente pessoais e depois temos os efeitos patrimoniais, o que significa que o principio da
igualdade não se consome, única e exclusivamente, na existência de direitos e deveres simétricos, na
existência de dirigir a sua família de comum acordo, mas também na circunstancia de os bens titulados
por um deverem ser administrados por esse; ou quando haja bens comuns esses devem ser
administrados em comum acordo.

Art. 1680.º - a possibilidade de se abrirem contas bancarias sem autorização do outro cônjuge.

1677.º-D – a possibilidade de se exercer uma profissão sem autorização do outro cônjuge.

Estas normas são todas conquistas da reforma de 77 porque até aí a mulher não podia exercer
uma profissão sem o marido, nem exercer as funções de administradora. São uma concretização do
princípio da igualdade.

Também o 1682.ºA – relativamente à casa de morada de família, sobre a qual só pode haver
alienação em caso de haver consentimento de ambos os cônjuges. Deixa de haver o paradigma de que o
homem pode tomar decisões no que toca a alteração do centro da família sem concurso de vontade da
mulher. E o mesmo sobre estabelecimentos comerciais.

Todos estas implicações do principio da igualdade constituem um dos efeitos jurídico-civis do


casamento e, por essa razão, a competência da lei civil é soberana. É o que resulta do 36.º/2 CRP e
1587.º CC e também do cân. 1135 que determina que ambos os cônjuges têm iguais direitos e deveres
no consórcio da vida conjugal e no 19.º/3 da Lei da Liberdade Religiosa. Estes preceitos têm a
preocupação de enfatizar a ideia de que o princípio da igualdade deve ser respeitado
independentemente da modalidade de casamento.

2)Plano vertical (relações com os eventuais descendentes que se venham a constituir) - 36.º/3, 5
e 6 CRP + 1874.º a 1906.º CC. Coordenadas:

1º - Reconhecem-se direitos e deveres simétricos relativamente aos pais e aos filhos – pais
e filhos devem-se mutuamente respeito, assistência e cooperação. Não há aqui nenhum monopólio – a
112

ideia de que só os pais é que devem respeitar os filhos ou vice-versa é errada. Esta foi outra das
alterações que ocorreu em 77, até lá vivíamos um paradigma da relação com os filhos muito autoritária,
baseada na ideia segundo a qual o pai (que era aquele que trabalhava) tinha um poder de ingerência
fundamental na vida dos filhos, podendo mesmo limitar as decisões estruturantes das suas vidas (ex: se
podia ou não casar, estudar, ou escolher uma religião). Todas estas opções, hoje em dia, são
juridicamente reconhecidas aos filhos, que resultam do 36.º/3 e 5 CRP e dos arts. 1874.º e segs.

A CRP diz que os pais têm o direito e dever à “manutenção dos filhos” – o que significa cuidar
deles no que diz respeito à dimensão patrimonial. Este dever à manutenção dos filhos é o dever de
assistência. O dever de assistência é bicéfalo:

1)Obrigação de alimentos – está pensada para as situações de rutura, ou seja, em caso de


dissolução do casamento. Um dos filhos que fica à guarda de um progenitor tem direito à pensão de
alimentos pelo outro progenitor.

2)Dever de contribuir para os encargos normais da vida familiar – está pensado para as
situações de normalidade familiar – tudo o que diga respeito a financiar e custear despesas
relativamente à saúde, educação, alimentação, vestuário do filho. Este dever de assistência não se cinge
à relação com os filhos menores ou não emancipados (1879.º), o legislador admite também em relação
a filhos maiores ou filhos emancipados pelo casamento que possa continuar a existir um dever de
assistência em casos especiais (1880.º). São estes os casos em que o filho está a tirar um curso de
valorização profissional e ainda não seja autónomo, mas há um limite para isto, não pode ser ad
eternum.

3)Existe uma igualdade de poderes e faculdades de cada progenitor. Na relação com os


filhos qualquer um dos pais tem os mesmos direitos e as mesmas faculdades em relação aos filhos,
contrariamente ao que acontecia no passado. Isto traduz-se em vários domínios:

- Na escolha do nome do filho, esta pertence aos dois pais. O nome do filho tem de ser escolhido
de comum acordo – 1875º + 1876º + art. 103.º/2 al. e) CRC

- Este principio replica-se também em matéria de educação – 1885.º; de religião – 1886.º; e no


que diz respeito a decisões em matéria de alimentação.

4)Conteúdo das responsabilidades parentais (1885.º a 1887.º-A )- As responsabilidades


parentais estão criadas para prover, durante a menoridade/não emancipação do menor; dentro do
quadro de substituição de vontades. Assim, qualquer poder que seja reconhecido é considerado um
“poder altruísta”, é o chamado poder-dever ou poder funcional. Existe uma dissociação entre o titular
do poder e o titular do interesse.

Ainda que sejam os progenitores aqueles que sejam titulares do poder para atuar, o interesse é
do menor. Assim, os pais devem agir segundo esse interesse do filho – ex: 1896.º (aplicação dos
rendimentos dos bens dos filhos) + 1888.º e 1889.º.

Estas responsabilidades relevam quer no plano pessoal quer no patrimonial - 1888.º a 1900.º.
Estas responsabilidades parentais são irrenunciáveis, dentro da lógica de que estão a ser deferidas em
nome e no interesse de alguém que tem de ser protegido. Por esta razão não se admite que um pai
113

possa, em determinado momento, dizer que não quer mais ser titular de responsabilidades parentais –
1882.º.

- Só é possível cessar estas responsabilidades no caso de morte dos progenitores,


no caso de ausência qualificada ou de interdição.

5)O princípio da igualdade projeta-se também na relação com os filhos no que diz respeito aos
regimes de exercício das responsabilidades parentais. Há diversos regimes de exercício em função
da titularidade das responsabilidades parentais. Varia consoante:

- As responsabilidades parentais estejam diferidas a ambos ou a apenas um e;

- Consoante os progenitores estejam casados entre si, vivam em união de facto ou vivam
noutra situação jurídica (1911.º) ou em caso de morte de um deles ou de impedimento. Todo o regime
normativo vai partir disto. De uma distinção primária (se pertence a um ou ambos) e uma secundária
(os diferentes regimes de união dos progenitores) - 1901.º a 1912.º

Outros artigos:

 1887.º CC - proíbe o abandono do lar – os menores têm de ser cuidados e mantidos pelos pais,
devendo viver na casa de morada de família. Esta norma casa com a norma constitucional que
veda a separação dos filhos em relação aos pais, a menos que haja decisão judicial nesse sentido.

 1887.º/A – convívio com irmãos e ascendentes. Justifica-se em nome da tutela da família


alargada. Tudo isto dentro da ideia de que, à luz do princípio da igualdade, os filhos devem poder
conviver com outros irmãos, sejam filhos do pai ou da mãe e conviver com os avós paternos e
maternos.

Deveres conjugais: 1672.º a 1676.º

1672º - consagra a tipologia de deveres conjugais. Temos um catálogo imperativo que não pode
ser alterado pela autonomia privada. Há uma imperatividade destes deveres conjugais (1577.º +
1618.º/2).

Considera-se que são não escritas as cláusulas pelas quais os nubentes pretendam modificar os
efeitos do casamento. Ex: não se pode estabelecer que o dever de fidelidade não é um dever
imperativo naquele casamento. Esta imperatividade tanto funciona no contexto do casamento
civil como no contexto do casamento celebrado por forma religiosa, quer no contexto do
casamento católico – cân. 1135.º.

Estes deveres vão ter uma tripla projeção:


114

1)Eles funcionam na génese do casamento – só existe casamento (1577.º) se


for celebrada uma união que se caracterize na plena comunhão de vida nos
termos do CC. Concretamente no respeito pelos deveres conjugais;

2)Funcionam na execução do casamento – podendo legitimar ações de


responsabilidade civil no caso de desrespeito;

3)Funcionam, em certas condições, em caso de rutura da sociedade


conjugal - Em sede de dissolução do casamento. Há uma eficácia póstuma dos
deveres conjugais.

1)Dever de respeito – este dever não é objeto de uma consagração normativa individualizada, o
legislador não trata deste direito numa norma particular. Porquê?

1º - Porque ou se entende que o dever de respeito consta de outras coordenadas


normativas que o direito matrimonial só tem de importar

2º - Ou porque e se entende que este dever tem um conteúdo “residual” – seria


preenchido na medida em que não fosse possível convocar outro dos deveres conjugais,
num caso concreto.

Ana Filipa não compreende esta última tese, não reconhece nem compreende a razão de ser
desta tese porque acha que está em causa um dever primário. Quando se fala de dever de respeito
estamos a aludir à personalidade moral do outro cônjuge, o que significa que estamos a convocar as
noções de inviolabilidade da honra e do bom-nome do outro cônjuge (25.º, 26.º CRP + 70.º/1 CC).

Este dever implica a proibição de qualquer ato ou omissão que seja suscetível de atentar contra
o bom-nome, a reputação ou a honra do outro cônjuge. As condutas aqui são imensas, não sendo
possível um catalogo taxativo. Tanto falta ao respeito aquele que ofende com comportamentos verbais
(chamar nomes) como aquele que o agride fisicamente, porque em ultima analise o respeito está
presente aqui.

Falta também ao respeito aquele cônjuge que mantem uma relação paralela à do casamento
porque está a atentar contra a honra do outro cônjuge – adultério. O adultério não está tipicamente
previsto na lei como crime, não deixando de ser moralmente condenável. Já está previsto no CP como
crime contra a honra quer a difamação quer a injuria que serão agravadas sempre que forem praticadas
contra um cônjuge (180.º, 181.º e 184.º CP). Assim, há aqui um dever de respeito pela individualidade
do outro cônjuge. E não atentar contra as opções pessoais dele, não absolutizar a personalidade de um
em detrimento da do outro. É fácil ver as inúmeras concretizações deste dever na jurisprudência:

1º - Ac. STJ de 12 de Fev. de 2008 – cuida do dever de respeito e de coabitação. Factos: uma
mulher casada é vista reiteradamente em público a passear de braço dado com o seu primo, e a
conversar dentro do carro com o primo até altas horas da madrugada, e a sair de casa dele de manhã, de
mão dada com ele – todas estas situações foram consideradas violadoras do dever de respeito que é
devido ao outro cônjuge. Isso porque o respeito tem de ser tanto dentro de casa como em público (tem
um sentido duplo).
115

2º - Ac. STJ de 16 de Nov. de 2010 – proclama a natureza residual do dever de respeito.


Assume que este dever só se pode usar quando não se encontra a violação de outros deveres conjugais.
Neste caso havia 2 pessoas casadas com 2 filhos e a mulher inscreve-se num ginásio e tem preferência
pelas horas do ginásio no final do dia e começa a chegar a casa às 10/11h da noite. Quando a família vai
de férias para o Algarve a cônjuge mulher convida uma companheira de aulas de ginásio, que era órfã.
Segundo os factos dados como provados, a rapariga era na realidade a sua namorada que conviveu com
a família durante aquela semana de férias. Até que o marido intenta uma ação de divórcio e alega a
violação do dever de respeito.

2) Dever de fidelidade – 1672.º - é próximo do dever de respeito, mas o legislador decide autonomiza-
lo. Em rigor não era preciso ser consagrado porque resulta do dever de respeito. Este dever implica
uma lealdade, quer no plano afetivo, quer no plano sexual. Isto permite-nos perceber que este dever não
se cinge à traição consumada fisicamente.

Pode haver violação deste dever ainda que não haja coito, se for mantida uma relação paralela
porque esta ideia de lealdade projeta-se no plano moral.

Este dever consubstancia uma limitação ao direito à liberdade – a eu poder legitimamente


relacionar-me e conviver com as pessoas que bem entenda, no plano afetivo e sexual. Implica a
compressão deste direito fundamental e, relativamente ao qual não funciona o 81.º CC – que trata das
restrições negociais aos direitos de personalidade. Não é possível abdicar do dever de fidelidade no
casamento. Este dever tem concretizações normativas que desencadeiam a eficácia em sentido lato – ex:
2196.º; 953.º - não se pode beneficiar o companheiro adúltero.

Este dever pode ter implicações também no dever de coabitação. Este dever de coabitação
implica não só uma comunhão de teto, mas também de leito – o débito sexual. Se eu tiver um amante
posso estar menos disponível ou com menos interesse para ter relações sexuais com o meu marido e,
nessa medida, entrar na violação de outro dever conjugal. Assim, a mesma situação prática pode gerar a
violação de vários deveres conjugais. A circunstância de eu ter uma relação paralela gera a violação do
dever de fidelidade, do dever de respeito e pode ainda gerar a violação do dever de coabitação. 98

3) Dever de coabitação – também não é objeto de uma concretização normativa especial no plano da
lei. Implica a comunhão de teto, o que implica a adoção da mesma casa de morada de família, os
cônjuges devem residir na mesma casa, a menos que haja um motivo de força maior - 1673.º

Implica uma comunhão de cama ou de leito. A comunhão de leito não é puramente literal –
não respeitam este dever porque se deitam todos os dias juntos, não basta isso, tem de haver relações
sexuais. Até podem não dormir todos os dias na mesma cama. Este dever restringe também a liberdade
– dizer que há uma pessoa que tem muito amor para dar e não gostaria de se cingir a uma só mulher,
não é possível. Fazendo a opção pelo casamento gera-se uma restrição na minha liberdade sexual99.

98 Ac. STJ de 12/03/1996 – ideia de que a violação do dever de fidelidade não se consuma apenas com o adultério.

99Ac. STJ de 08/09/2009 – violação do dever de coabitação pela impossibilidade de cumprir o débito conjugal. Isto porque
houve um acidente de viação que fez com que um dos cônjuges ficasse com uma paralisia dos membros inferiores e, nessa
116

4º) Dever de cooperação - 1674.º CC. Importa para os cônjuges um dever de auxilio e socorro mútuos
e de assumir em conjunto as responsabilidades inerentes à vida da família que fundaram. A expressão
“obrigação de socorro e auxilio mútuo” tem de ser dividida em duas ideias:

a. Obrigação de socorro – funciona nos casos de urgência. Há um internamento hospitalar,


uma situação de calamidade... implica que haja uma particular solidariedade nessa matéria.

b. Obrigação de auxílio mútuo – funciona em situações de normalidade. Ex: a mulher ficou


com o carro empanado; o homem ficou sem saldo no telemóvel... todas as situações. Há uma
ideia de solidariedade entre os cônjuges. Este dever de cooperação está ligado à ideia de que
qualquer problema tem de ser antecipado em condições de normalidade para que os cônjuges,
em conjunto, possam cuidar dessa matéria.

Esta solidariedade não se cinge ao cônjuge, estende-se à família. Assim, podemos convocar aqui
os filhos, os ascendentes, as pessoas ligadas por um vinculo de parentesco... este dever de cooperação
implica a necessidade de serem realizadas prestações que podem ser, muitas das vezes, patrimoniais,
mas também prestações pessoais (ex: ouvir o outro, estar disponível para). Tudo isto está envolvido no
dever de cooperação – ser e estar disponível.

5) Dever de assistência –art. 1675.º e 1676.º - Estes artigos cuidam do mesmo dever conjugal. O que
está em causa é um dever com expressão patrimonial de conteúdo pecuniário. Traduz-se sempre na
entrega de uma prestação pecuniária e é um dever bicéfalo porque se traduz ou:

1)na obrigação de prestar alimentos (remissão do 1675.º para o 1795.º/A e 2009.º/1


al. a) e 2016.º a 2018.º) ou;

2)no dever de contribuir para os encargos normais da vida familiar – 1676.º - que
funciona em cenários familiares de normalidade (ex: pagamento da renda da casa, da
água, do gás, da educação dos filhos... – 1879.º e 1880.º).

Durante a separação de facto o dever de assistência mantem-se, a não ser que esta separação
seja imputável a um dos cônjuges (ex: um dos cônjuges decide abandonar o lar). Nos casos em que um
dos cônjuges abandone a morada de família rege o 1675.º/3.

Este dever de contribuir para os encargos normais trata de todos os encargos fixos, mas
também de despesas que possam surgir relativamente aos filhos maiores ou menores. Pode ter um
âmbito mais lato do que o que é exigido em conexão com o lar e manutenção dos filhos – podemos ter
aqui outras despesas familiares e podemos ter despesas pessoais de um dos cônjuges (Ex: um dos
cônjuges decide inscrever-se numa atividade desportiva e tem de comprar um equipamento – é uma
despesa familiar, porque não vai sair fora daquela referência).

medida, ficou impossibilitado de consumar a relação sexual. O cônjuge ofendido veio intentar esta ação alegando a violação do
dever de coabitação e do dever de cooperação e assistência.
117

Não são apenas despesas familiares aquelas que digam respeito a mais do que uma pessoa. É
claro que funciona aqui um principio de razoabilidade e proporcionalidade em sentido estrito – se o
orçamento é pouco não faz sentido um dos cônjuges gastar aquilo que não tem, em coisas particulares,
sacrificando as despesas normais, não tem cabimento. Este princípio da proporcionalidade é uma
exigência da justiça comutativa, que funciona nas relações horizontais.

Ambos devem contribuir em igual medida para o casamento, ainda que esta contribuição possa
ser feita através de contribuição pecuniária ou em espécie – ex: um dos cônjuges resolve, por decisão do
casal, não trabalhar e ficar em casa com os filhos – esta contribuição é relevada pelo 1676.º.

Ele contribui diariamente, ainda que não seja em termos pecuniários. Há aqui uma geometria
variável, não é um dever aritmético, obedece e aceita diferentes modelos familiares. É precisamente por
isto que se pode gerar um desequilíbrio e uma violação da justiça comutativa.

Se há um que contribui em maior medida que o outro pode-se desencadear o recurso ao


processo que está previsto no 1676.º/2 – pode-se exigir a correspondente compensação.

Pode-se gerar uma situação em que um dos cônjuges é credor do outro. Esta situação é geradora
de desconforto e por isso, só é possível exigir o direito de crédito no momento da partilha dos bens do
casal – no nº3. Só no momento da dissolução do casamento é que este crédito vai ser atendido –
remissão para o 992.º CPC. É aqui que se regula o processo especial de exigibilidade de crédito.

Como é que este processo funciona? O cônjuge que se acha credor dá conhecimento ao
tribunal da fonte dos rendimentos do outro cônjuge e o tribunal vai autonomizar um cativo daquele
montante que é automaticamente diferido a favor do cônjuge credor.
Este dever de contribuir para os encargos normais não é um dever autónomo, porque é uma
espécie do dever de assistência, o que é enunciado no 1675.º/1 - É um dever de geometria variável que
releva diferentes formas de prestação, não apenas pecuniária mas também em espécie (1676.º/1).

A matéria dos deveres conjugais é de importância extrema porque tem implicações no que diz
respeito aos efeitos pessoais do casamento, mas também no que diz respeito ao divorcio e à
possibilidade de recorrer ao divórcio sem a vontade do outro cônjuge. Não é objeto de uma
regulamentação muito fechada do legislador, abundando conceitos amplos que têm de ser tratados pela
jurisprudência.

Casa de morada de família


Vem regulada no 1673.º + 1793 e 1795.º/A e o 82.º CC (trata do domicilio) e 990.º CPC
(processo de atribuição da casa de morada de família). Funciona em 3 planos:

1)Na relação entre os cônjuges (relação horizontal) – porque é ali que a família conjugal tem
o seu centro de vida habitual: é ali que os cônjuges recebem correspondência, que são citados; é
normalmente junto daquela zona que têm a sua vida profissional ativa e, por isso, há uma
importância estruturante da casa de morada de família no que diz respeito à sua vida ativa. A
casa de morada de família é um conceito técnico de direito da família, mas que significa, em
rigor, domicilio geral voluntário, que é o conceito comum do 82.º CC.
118

O domicilio geral voluntário é aquele em que se tem a residência habitual, que é a ideia da casa
de morada de família. Assim, deve ser escolhida de comum acordo entre os cônjuges (1673.º e
1682.º/A nº 2.º). Admite-se também (nº2) que possa, um dos cônjuges, ter outra residência, que
não a da casa de morada de família, isto acontece essencialmente em situações profissionais.
(Ex: um dos cônjuges está a desenvolver um projeto profissional no algarve).

Esta casa não deve ser definida com base num critério exclusivamente formal, tem de haver
também uma ligação material – se os cônjuges adotam a casa de morada de família, mas não
dormem lá e não fazem lá a sua vida habitual podemos por em causa a realidade daquela casa de
morada de família. Podemos questionar que seja outra que não a que foi declarada pelos
cônjuges. Isto acontece por razões menos legítimas, por razoes fiscais ou relacionadas com
empréstimos.

O 1682.º/B exige sempre o consentimento de ambos os cônjuges no que diz respeito ao


arrendamento. Há uma importância estruturante no que diz respeito à identificação da família
conjugal - 1775.º/1 d) + 1793.º + 990.º CRC

2)Tem também uma grande importância na relação com os filhos (relações verticais) –
havendo filhos deve-se escolher uma casa mais adequada (ex: perto da escola) – 1793.º +
1787.º. Deve ser escolhida de acordo com os interesses dos filhos.

3)Tem também uma projeção social muito importante – não é um conceito vazio, é ali que
se encontra o paradeiro das pessoas e onde convive a família alargada – 1887.º/A.

1795.º/A – cuida da hipótese de separação judicial de pessoas e bens que extingue o dever de
coabitação e estabelece a necessidade de aquisição de nova casa.

A importância da casa de morada de família projeta-se também em situações de rutura de


casamento. Havendo rutura, uma das decisões que tem de ser tomada é a quem será deferida a
casa de morada de família. O 1793.º CC vem admitir que possa ser dado o arrendamento a
qualquer dos cônjuges, considerando as necessidades de cada um. Normalmente é dado ao
progenitor que tenha ficado com a guarda dos filhos. O 1795.º/A cuida das situações de
separação que extingue o dever de coabitação, o que vai determinar a necessidade de aquisição
de uma nova casa.

Direito ao Nome

Manifestação do direito fundamental à identidade pessoal (Art. 26º C.R.P.), que é também um
direito de personalidade, e tem um regime especial previsto no Art. 72º e 73 em matéria de tutela do
nome civil. O nome que vamos estudar é o nome civil.
119

Nome civil: Direito a ter um nome por efeito do nascimento e Direito a modificá-lo por
efeito do casamento ou dissolução do mesmo - Art. 1677º a 1677º C C.C. + CRC 69/n + p, 103º-104º,
167º/h, 187º/g, 278º, 279º, 1, remeter no CC para CRC.
Estas normas especiais do direito da família foram alteradas na revisão de 77- vem-se prever a
possibilidade de os cônjuges conservarem os seus próprios apelidos, mas poder acrescentar apelidos do
outro até ao máximo de 2, esta é a faculdade essencial do 1677º.

1677/2 – Não se prevê essa faculdade, no caso de segundas núpcias, se já tiverem sido adotados
apelidos do 1º casamento para evitar uma total transfiguração do nome originário

Na dissolução do casamento Este direito mantém-se mesmo em caso de separação judicial de


pessoas e bens, de divórcio, bem como no caso de morte - Artigo 1677º B C.C.
1677-C - A isto exceptua-se o cenário em que o outro cônjuge se opõe à manutenção do
aditamento dos apelidos e para isso tem que propor uma ação judicial.

Quem pode colocar a ação:

- Separação de pessoas e bens ou divórcio: Cônjuge ou ex-cônjuge

- Viuvez: Descendentes, ascendentes, irmãos do falecido

É necessário que lese gravemente os interesses morais do outro cônjuge ou da família para que
a ação proceda. Pode ainda aplicar-se o regime do 71/2 direito ao bom nome da pessoa falecida. O
processo de aditamento de apelidos não se prevê no cc, este admite e remete para o CRC

Art 69 alinea n)- alteração do nome

Alínea p)- conservação do apelido

Art. 103º CRC - Composição do nome, aplicabilidade na filiação. Escolher o nome dos filhos, o
nome completo deve ter 6 vocábulos no máximo sendo que dois desses se reservam aos nomes
próprios. Há depois um conjunto de regras. Podem os nomes dos filhos ter ordens distintas nos irmãos

Art. 104º CRC - modificação do nome nos casos em que haja razão ponderosa que justifica que
um filho queira ver o sue nome alterado por um apelido que não constava do seu nome originário ou
mesmo um outro nome próprio. Ex.: Casos de foro criminal em que o nome civil foi dado a um dos pais e o
pai abusa sexualmente do filho ou filha e tal justifica a alteração do nome.

Emancipação do cônjuge menor de idade com mais de 16 anos


1)O menor de idade passa a ser considerado como maior relativamente ao exercício (Art. 132º
C.C.) – emancipação plena

2)Pode no entanto surgir um caso de emancipação restrita quando não há autorização dos
pais ou suprimento da autorização para a celebração do casamento (Art. 133º C.C.) - 104, 1604, 1612,
1649)- admissibilidade da figura do casamento irregular
120

Efeitos Sucessórios

A família constituída por efeito do casamento é depois também tutelada por ocasião da morte.
De acordo com o regime do direito das sucessões principais beneficiários e protegidos por ocasião da
morte são os membros do agregado familiar.

Ideia segundo a qual a propriedade adquirida em vida se deve transmitir por efeitos da morte
em primeira linha para a família.

Art. 62º/1 C.R.P - Não é posto em causa porque o de cujus pode dispor acerca da quota
disponível - titula o direito a propriedade privada e o direito a transmissão em vida e por ocasião da
morte. Isto não é posto em causa pois há uma quota disponível.

Art. 2132º C.C. e 2157 - Os sucessíveis legitimários, encarregues da quota indisponível, são em
tipicamente a família nuclear.

Cônjuge sobrevivo; Descendentes, Demais família ligada por vinculo de parentesco que pode
ser mais largada na sucessão legitima e menos na legitimaria, pois a legitima é a que se aplica no caso de
n ser feito testamento, é legal, mas supletiva

Art. 2166º C.C - Deserdação: Exclui um herdeiro legitimários privando-a da legitima e são
situações verdadeiramente patológicas e que se encontram tipificadas na lei. Apenas nestas hipóteses
elencadas podem os legitimários ser excluídos. Uma das lacunas do direito da família é a falta do unido
de facto sobrevivo

Nacionalidade
Um dos efeitos laterais previstos na lei por ocasião da celebração de um casamento é a
possibilidade de um estrangeiro vir a adquirir a nacionalidade portuguesa (Art. 3º Lei da Nacionalidade
concretizado pelo Art. 14º do Regulamento da Nacionalidade)

Casamento putativo - Pelo Art. 1647º e 1648º CC certos efeitos de um casamento invalidado
mantêm-se e um desses é a aquisição da nacionalidade (Art. 3º/ 2 Lei da Nacionalidade,
concretização do regime comum do Art. 1647º e 1648º C.C.). Importa a boa fé subjetiva ética do
Art. 1647º C.C., apenas relativamente ao cônjuge que esteja de boa fé. Esta possibilidade de
nacionalidade pelo casamento deve ser cruzada com a celebração do casamento de foram
ilícita ou latamente fraudulenta:

1)Há autores que entendem que nestes casos em que se casa apensa para obter a
nacionalidade se celebra um casamento simulado. No entanto, para que assim fosse teria
que haver uma conlcuio entre as partes, como tal, a Prof. AF não concorda que possa ser
invalidade por simulação dado não haver divergência entre a vontade real e a declarada.

2)Uma segunda via é considerar a reserva mental mas, para além de não ser expressa ao
Art. 1635º C.C. (tem de se adicionar a alínea d por interpretação extensiva, a reserva
mental só é relevante se for conhecida do declaratário o que aqui não acontece porque
não há acordo.
121

3)Sobra a fraude à lei, tese proclamada pela doutrina do DIP com base no Art. 21º C.C.-
os casamentos celebrados que convocam a aplicação de diferentes OJ’s

4)Contrariedade à lei: Segundo Prof.AF, para que exista uma fraude à lei tenho que ter
uma operação fraudulenta o que pressupõe pelo menos dois ou mais Njs encadeados
entre si, se não há, não há uma operação, não há fraude à lei. Sobra apenas a
contrariedade à lei que nos permite dizer que estes casamentos celebrados de forma
transfigurada, sem intenção de cumprir o 1577, o 1618, é um casamento celebrado de
forma contraria a lei

Problema prático: O legislador não antecipa esta situação, não vem no Art. 1628º,
1631º nem 1635º C.C. ou leio onde diz simulação e outro caso de ilicitude e aqui o
casamento é anulável ou entendo que não é um caso de anulabilidade ou inexistência
porque não está tipificado, mas pode ser um caso de nulidade Ex: artigo 294 CC- que
entraria com base no 1627 onde leríamos sem prejuízo do regime comum.

Independentemente da qualificação jurídica dada ao caso, o importante é que o contrato de


casamento sendo um contrato típico não é suscitável de oferecer a escolha a uma das partes
relativamente aos efeitos que ele pretende aceitar –Aceita em bloco ou não aceita nada.
Não se pode permitir um invólucro formal de ser casada, mas na realidade não seguir os
postulados do casamento, não haver comunhão de teto, mesa e leito nem cumprir os deveres conjugais.

Portanto esta assimetria entre a norma e a substância do casamento tem que ser desvalorada
pelo ordenamento jurídico sob pena de se permitir um ato social de relevância máxima celebrado em
termos artificiais.

Para AF seria um casamento com causa viciada, significando que a causa (a função do negocio)
não esta na liberdade das partes. No que diz respeito aos negócios típicos, a causa está prevista na lei, e
no casamento é a plena comunhão de vida nos termos do CC.
A causa não se confunde com os fins que estão previstos no 252 (erro sobre os motivos),
281(ilicitude do fim), pois os motivos são representações subjetivas, é o para quê do negocio, são
motivos que não são suscitáveis de ser controlados no trafego jurídico e que como tal tendem a ser
irrelevantes.

O vício em causa é o elemento síntese do negocio, se falta algum elemento o edifico vai ruir e é
este o problema. A causa depois não se prevê no C.C. já esteve nos anteprojetos, mas depois saiu e,
portanto, não temos uma norma especial que diga o que acontece quando a causa tem um vício. Não
havendo regra que nos diga o que acontece quando a causa tem um vício – aplicamos o 294º.

Funciona como norma residual que permite justificar que um negocio celebrado com violação
de normas imperativas tenha um valor jurídico negativo. Quando não há norma especial é sempre o 294
que se aplica. Terminamos assim os efeitos jurídico pessoais
122

Efeitos Jurídico-Patrimoniais

Estatuto jurídico-patrimonial - O principio vetor é o da liberdade (1678 a 1766), o principio da


autonomia privada e que se conjuga com o principio da tutela da propriedade privada que se consagra
na Constituição.

Artigo 1678º a 1766º C.C - legislador tem uma posição de maior abertura relativamente as
opções assumidas pelos contraentes, do que nos efeitos pessoais porque a propriedade deve ser
livremente conformada pelos agentes, isto não quer dizer que não existam normas imperativas que
limitam a autonomia privada, o principio não é absoluto

Exemplos de normas imperativas

- Art. 1717º C.C. Imutabilidade do regimes de bens das convenções antenupciais

- Art. 1699º C.C; Art. 1730- regra da metade

- Art. 1720- imperatividade de regimes de bens

Em que matérias não existe liberdade? Regimes que correspondem a um estatuto legal, em
que não se admite alteração por vontade das partes, regimes em bloco:

- Administração de bens: Art. 1678º - 1682º C.C.

- Alienação de bens: Art. 1682º A a 1682º B e 1685º C.C.

- Responsabilidades por dividas 1690º - 1697º C.C.

Não existe um regime comum agregador de todas as matérias de regime patrimonial, sendo
necessário ter em conta algumas regras do regime comum, noções de copropriedade, compra e venda,
doação, etc.

Noções gerais

Património conjugal - Cada sujeito é em regra titular de um só património e esse funciona


como o espelho para a responsabilidade patrimonial (601), todos os bens titulados pelo sujeito são em
regra susceptíveis de ser executados.
Há hipóteses de separação patrimonial (ressalvadas pelo 601) em que o mesmo sujeito é titular
de mais que um património. O conceito de património separado, que se caracteriza com um regime
especial de responsabilidade por dividas, não se confunde com o património coletivo. A natureza
jurídica do património conjugal é de património coletivo e não separado, temos uma massa patrimonial
detida por mais que uma pessoa. Esta ideia tem certos corolários:

1)Há um direito de ambos os titulares ao conjunto patrimonial e, portanto, o direito é


exercitável apenas em relação ao conjunto.
123

2)Existe um direito, em caso de dissolução do património, à quota de liquidação, não tenho o


direito de vender o património, de o alienar por qualquer via, sou titular de uma quota ideal.

Neste campo o conceito de património coletivo aproxima-se da compropriedade, mas distingue-


se porque aqui como segundo elemento do conceito temos uma afetação finalista que significa que o
património coletivo se constitui e se mantém enquanto for justificado pela existência de casamento. Ora
isto tem como corolário essencial um regime especial de responsabilidade por dividas.

O património conjugal responde em primeira linha pelas dividas do casal e só secundariamente


responde o património pessoal para solver dividas constituídas por ocasião e com base no património
conjugal.

Património conjugal apenas de verifica na comunhão geral e de adquiridos, na separação


de bens só há bens próprios, não existe comunhão e, portanto, não existe património comum.

Massas patrimoniais: conjuntos de bens pertencentes a uma pessoa em certo momento e


variáveis em dinheiro. Bens comuns e bens próprios integram o património conjugal, mas
autonomizam-se em massas separadas. Cada titular é proprietário de bens próprios em seu nome, mas
também de bens comuns.

Atos de Administração e de Disposição: Importa o conceito de função económica-social para


a distinção destes tipos de ato:

1)Ato de disposição - elementos estáveis - são titulados pelo sujeito e destinam a manter-se
no património, é esta a função do bem, casa. Sendo estável qualquer saída é um ato de
disposição.

2)Atos de Administração- Elementos instáveis: A função económico-social é sair do


património- comerciante e mercadoria. Os atos que permitem a beneficiação (benfeitoria-216),
conservação ou manutenção da coisa serão atos de administração, segundo Manuel de Andrade,
atos de gestão que podem ser de:

1)Administração Ordinária- gestão rotineira

2)Administração Extraordinária -atos que normalmente não seriam praticados, que


obrigam a despesas maiores, mas que são impostos por uma necessidade imperiosa.

Particularmente exigíveis em termos monetários, mas sem o qual o bem não se conserva.

Ex: prédio em ruínas


124

Regime de Bens

Conjunto de regras que definem a titularidade sobre os bens do casal. (Art. 1717º - 1752º C.C.).
Releva a autonomia negocial em certa medida, porque existe um princípio de liberdade de escolha dos
bens que se plasma no Art. 1698º C.C. Quando uma pessoa decide casar não lhe é imposto por regra um
regime de bens, em regra.

É na Convenção antenupcial, que tem a natureza de contrato acessório relativamente ao


casamento, que se define o regime de bens. Esta liberdade não é, como resulta do 1698 parte final,
ilimitada porque existem desvios:

- Art. 1699º

- Art. 1720 C.C.- remissão- Casamentos celebrados por pessoas com mais de 60 anos

Estes “limites da lei” não são apenas os limites do direito matrimonial, temos que aplicar o Art.
280º 281º 294º C.C. - nunca se pode numa convenção antenupcial violar bons costumes, ordem publica
ou a lei.

Existe no fundo uma trilogia no regime de bens, que nos leva a distinguir três grandes regimes:

- Comunhão geral

- Comunhão de adquiridos

- Separação de bens

Comunhão Geral de Bens

Art, 1732º a 1734º e deve ser conjugado com o Art. 1699º/2 1ª parte porque existe uma
limitação ao principio a liberdade plasmado nesta ultima norma que proíbe a celebração em regime de
comunhão geral por quem tenha filhos ainda que maiores ou emancipados. A comunhão geral funciona
em três planos essenciais:

- Titularidade dos bens - Quem casa em comunhão geral de bens é titular em conjunto com o seu
cônjuge de todos os bens

- Posse dos bens - a posse é conjunta, não existem situações atomísticas em que um pode
praticar atos sem o outro.

- Administração dos bens - a administração tem que se feita em conjunto


125

Art. 1732º Âmbito do património conjugal - delimita o âmbito da comunhão geral- Integram
o património conjugal todos os bens presentes e futuros dos cônjuges, adquiridos a qualquer título.
Levados para o casamento ou posteriormente adquiridos por qualquer titulo, mas comporta exceções:

Art. 1733º - Norma imperativa que exceptua da comunhão um conjunto de bens assinaláveis.
Art. 1733º/1 c) parte final:

-Demais direitos estritamente pessoais, conceito indeterminado que vem ser concretizado pela
doutrina no sentido de se aplicarem em matéria de:

- Direito morais de autor.

- Direitos de crédito que sejam constituídos intuito personae a favor de um dos cônjuges:
A trabalha numa empresa e em casa. A empresa atribui um premio de produtividade, estes
podem e devem ser considerados estritamente pessoais e, portanto, integram-se nesta alínea,
pertencem a um mérito do cônjuge relativamente ao qual o cônjuge não tem vontade

- Direitos garantidos em virtude da idade ou condição física: Subvenções.

Art. 1733º f) Objetos de uso pessoal e exclusivo com importância intima para a pessoa do
cônjuge, e exclusivo - há um elenco exemplificativo. O que importa aqui são as peças infungíveis que
não podem ser substituídas por outras sem prejuízo para o titular. Ex: Joias – integram esta alínea e não
a g) que se refere a bens de baixo valor económico. Nunca se integra nesta alínea, tal como aclarado pela
jurisprudência, roupa de cama, de mesa, de casa de banho, estes são objetos domésticos e não pessoais
e exclusivos, não se incluem também outros objetos de utilização conjunta pela família, bem como
objetos de trabalho com finalidade profissional. Numa palavra a alínea e refere-se a bens infungíveis
que tenha uma ligação intima à pessoa do cônjuge ou um valor sentimental muito assinalável, este é o
acento tónico

Art. 1733º g) C.C - Objetos não valiosos, mas com ligação afetiva muito forte- critério
pecuniário, vai-se titular o valor afetivo ou sentimental

Remissões Importantes:

1) Art. 1757º- Doações entre esposados e Art. 1764º/2 -Doações entre casados - e
consagram a incomunicabilidade dos bens, o que significa alargamento do Art. 1733º C.C.
Este artigo 1733 ainda que presente em sede de comunhão geral vai ser aplicado igualmente
a comunhão de adquiridos, logo é uma norma com grande aplicabilidade prática

2) Art. 1734º C.C. Norma remissiva - vem aplicar à comunhão geral os Art. 1723º a
1725º- que consagram a presunção de comunicabilidade dos bens móveis ; e 1727 a 1731

Em suma, o regime da comunhão geral consta verdadeiramente de 2 artigos, um primeiro que


define o âmbito e um segundo que o delimita negativamente, este âmbito é depois alargado pelo regime
das doações e vai ser adaptado por força destes 2 conjuntos de normas que vamos importar da
comunhão de adquiridos, mas é um regime singelo, pois na verdade há comunhão na titularidade, posse
e administração
126

Comunhão de Adquiridos

Agora vamos estudar o regime mais relevante (comunhão de adquiridos), desde logo porque é o
regime supletivo, é o que será praticado relativamente a todos aqueles que casaram depois de maio de
1967, deixando de se aplicar o regime da comunhão geral como supletivo, e também porque é o mais
complexo do ponto de vista do numero de artigos que lhe são dedicados. No regime da comunhão de
adquiridos, vamos ter de ponderar:

Art. 1721 a 1731 + 1717 + 1733100+1699/2, 2ª parte

Princípios essenciais:

- Nesta matéria o que vamos encontrar é um património comum (património conjugal), e depois
dois patrimónios próprios (titulados por cada um dos cônjuges).

- O património conjugal, que tem natureza de património coletivo só vai ser suscetível de ser
repartido no momento da partilha.

- Na norma do art. 1699/2, 2ª parte é outra norma que tem de ser acrescentada uma remissão,
tendo presente que nestes casos existe uma proibição de estabelecer a comunicabilidade dos
bens qualificados como próprios, nos termos do art. 1722.

Quais são os bens próprios? Constam do art. 1722. Este não é o único na comunhão de
adquiridos que qualifica bens como sendo bens próprios. Temos de adicionar:

- art. 1723

- art. 1726 a 1729

- Art. 1722:

Temos três grupos de casos aqui enumerados:


O primeiro refere-se aos bens que já eram titulados por cada um dos cônjuges antes do
casamento. Portanto o que está aqui é um princípio de razoabilidade, de justiça, se os bens já eram
próprios antes do casamento, não faz sentido que, uma vez celebrado o casamento, eles venham a
integrar a comunhão conjugal.
O segundo refere-se aos bens adquiridos depois do casamento (estamos na fase de execução do
casamento) mas que advenham ou por sucessão ou por doação. Nestes dois casos, e apenas nestes dois
casos, os bens vão ser qualificáveis como próprios. A razão de ser disto, relativamente às sucessões, é
que há uma ideia de transmissão do património desejavelmente dentro da família, o que se significa que
se o bem foi transmitido por efeito da morte eles devem-se manter daquele cônjuge, dentro da ideia de
destinação finalística dos bens.

100Norma que se aplica também ao regime da comunhão de adquiridos por força de um argumento de maioria de
razão
127

De igual forma no que diz respeito às doações. As doações são liberalidades (art. 940/1) que não
correspondem a atos praticados em termos sociais ou por exigências morais, são atos praticados com
animus donandi, e também se compreende que, correspondendo a doação a um sacrifício unilateral no
património de alguém, não haverá razão para que o cônjuge possa beneficiar também do bem que foi
entregue por doação. (Fazer uma remissão nesta alínea b) para o art. 1729, porque como veremos há
um regime particular em certos adquiridos que cuida especificamente dos bens doados ou deixados a
favor da comunhão.)

Na al. c) fala dos bens adquiridos também depois do casamento, mas por virtude de direito
próprio anterior. Esta é uma expressão técnica e que tem um sentido que é concretizado pelo número
subsequente. O número subsequente vem, com base numa técnica puramente exemplificativa, tentar
colorir alguns casos em que se entende que há uma aquisição fundada em direito próprio anterior, ou
seja, pode haver outros casos para alem dos elencados.

O que se pretende tutelar no 1722/1, al.c) são as aquisições após o casamento, mas que a sua
fonte, isto é, o título constitutivo, é um facto ocorrido antes do casamento – há um hiato temporal entre o
momento da fonte e o momento da efetiva aquisição, que já se verifica depois do casamento.

Casos exemplificativos que temos aqui:

a) situações de partilha de patrimónios ilíquidos - Ou seja, nos tínhamos uma situação de


património ilíquido antes do casamento que se vem a resolver já na qualidade de casado.
Nesta eventualidade, aqueles direitos que se venham a adquirir continuam a ser qualificados
como direitos ou bens próprios.

b) aquisição fundada em usucapião (arts. 1287 e ss.) - Para que alguém possa adquirir com
base em usucapião tem de se individualizar uma situação possessória e esta posse tem de se
ter iniciado antes do casamento.

c) bens adquiridos com reserva de propriedade - O art. 409 do CC que cuida da clausula de
reserva de propriedade é uma exceção ao princípio da eficácia real dos contratos
translativos do domínio. Ou seja, normalmente, os contratos reais (isto é, com eficácia
translativa de domínio) determinam uma transmissão do direito de propriedade
imediatamente por força do contrato e só assim não sucederá nos casos previstos na lei e
quando haja clausula de reserva de propriedade.

d) bens adquiridos no exercício de direito de preferência que se funde em situação


anterior ao casamento - Esta é uma expressão omni-compreensiva, ou seja, tanto se
admite a relevância e direitos de preferência legais como de direitos de preferências
convencionais. Exemplos de direitos de preferência legais:

- direito de preferência legal ocorre no contexto de compropriedade (art.1404 ss.) e


depois no 1410 temos a ação de preferência.

- Também existe de preferência legal no arrendatário sempre que o senhorio pretenda


vender o bem locado

- Direito de preferência do Estado, através da Camara Municipal de Lisboa,


relativamente a certos imoveis situados na circunscrição territorial de Lisboa.
128

- Ou situações de direitos de preferência convencionais (concretamente alicerçado no


pacto de preferência – art. 414 e ss.) e nesta eventualidade também podemos ter a
qualificação como bem próprio do bem que seja adquirido por essa via.

-Outro exemplo é aquele que diga respeito à aquisição de uma prestação em virtude do
contrato aleatório celebrado antes do casamento. Há uns anos houve um caso destes em
Portugal, um casal de namorados que comprou a meias um bilhete de lotaria, o bilhete
foi sorteado e depois o casal zangou-se porque não sabia como dividir o premio. No
regime o casamento, uma situação como esta seria acautelada por esta alínea, a ideia
segundo a qual, se um dos namorados tivesse adquirido este bilhete antes de casar que
seria premiado depois do casamento, ele conservaria o direito ao premio como direito
próprio.

Nota muito importante: Não se pode aplicar o art. 1722/1, al. c) a situações de aquisição
de direitos com base em contratos-promessa anteriores. Nesse caso é inaplicável o art. 1722. E
isto porque quando se fala em direito de preferência é uma situação totalmente distinta de contrato
promessa. Nestes casos de contrato promessa com eficácia meramente obrigacional nunca se pode
aplicar o 1722 e considerar que seria um bem próprio.

Art. 1723: Bens sub-rogados no lugar de bens próprios. Na sub-rogação alguém ou alguma
coisa ocupa o lugar de outra ou de outrem. Por esta razão, os casos do art. 1723 são casos de
qualificação de bens como próprios – o bem originário deixa de existir e é substituído por outro, que se
entende que o vem substituir. Abrangem-se quer casos de sub-rogação direta (alíneas a e b) quer de
sub-rogação indireta (alínea c):

a) Bens sub-rogados no lugar de bens próprios de um dos cônjuges por meio de troca direta -
Isto não corresponde a um contrato tipificado na lei de forma expressa, mas aplica-se a mesma
regulamentação que o contrato de compra e venda por força da remissão do art. 939. Isto é o
chamado princípio da sub-rogação real – o bem novo vai adquirir e tomar o lugar do bem antigo.
Exige-se uma conexão objetiva entre a perda de um direito e a aquisição de outro direito, tem de
haver um nexo incindível. Ex: pode suceder configurar-se um crédito fundado na
responsabilidade civil por danos ocorridos em bens próprios. Ex 2: dação em cumprimento –
podemos ter fundamento para aplicar o regime da sub-rogação para a qualificação como bens
próprios.

b) preço dos bens próprios alienados - Se o bem era meu e o vendo não faria sentido que o
produto da venda fosse integrar património conjugal.

c) bens adquiridos ou benfeitorias feitas com dinheiro ou valores próprios de um dos


cônjuges, desde que a proveniência do dinheiro ou valores seja devidamente mencionada
no documento de aquisição, ou em documento equivalente, com a intervenção de ambos
os cônjuges - Esta alínea, que tem dado azo a algumas controvérsias, tanto no plano doutrinário
como no plano jurisprudencial, fundamentalmente vai fazer depender a qualificação como bem
próprio da observância de uma formalidade, que é uma formalidade essencial.
129

Se os cônjuges casados em comunhão de adquiridos não especificarem que aquela aquisição está
a ser feita com valores próprios, então é presumido que o bem é comum (esta é a consequência
jurídica), daí que se exija a intervenção de ambos, a assinatura de ambos, atestando que os valores são
próprios.
Este é o chamado regime normal, existe uma declaração contemporânea, relativamente ao título
da aquisição e que convoca a intervenção de ambos os cônjuges. Se não houver esta intervenção, a
consequência jurídica é que o bem vai ser qualificado como bem comum (art. 1724, al. b), pode,
contudo, suceder em situações patológicas que um dos cônjuges, de forma censurável, contrária à boa
fé, se queira furtar a intervir neste ato para que o bem seja qualificado como comum e não como
próprio.

Nesta eventualidade, o que a doutrina tem vindo a admitir é aplicar analogicamente o


regime previsto para o suprimento da autorização de ambos os cônjuges – art. 1684/3.

Portanto, se um deles se recusa, sem um fundamento objetivo, a participar, deve ser possível o
suprimento da necessidade de intervenção do cônjuge – haver apenas um documento unilateral.

Valores próprios:

a. na comunhão de adquiridos nunca podem ser considerados valores próprios o


resultado de aforros de poupança. É comum nos casais organizados que se
procure cativar determinados valores como poupança e esta poupança nunca
pode ser qualificada como um bem próprio porque resulta de um esforço
exercido quanto a um bem que é necessariamente comum – trabalho dos
cônjuges.

b. Também nunca é considerado valores próprios as rendas de imoveis – se


algum cônjuge tem um imóvel arrendado, essas consideram-se que aproveitam
ao casal.

Sem prejuízo disto, o conceito de valor próprio é um conceito a definir no caso concreto e
admite-se qualquer tipo de prova (nos termos gerais de Direito – art. 362 e ss).

Este art. 1723 tem de ser relacionado com o art. 1726, que é uma norma que, numa leitura
muito rápida, até se poderia dizer que é a mesma coisa. O que está em causa no art.1726 é um
regime de aquisição com base em direitos, bens ou valores com natureza distinta (em parte bens
próprios e em parte bens comuns).

Se no caso se coloca a questão de saber se o bem vai ser qualificado como próprio ou comum, e
como não podemos ter um bem em parte próprio e em parte comum, em homenagem ao principio da
unidade da natureza jurídica do bem, há um principio que se designa por p. da absorção – o bem vai ser
qualificado como bem próprio ou bem comum, em função da natureza proeminente da participação101.

101Ex: se se comparticipou 70% com bens próprios e 30% com bens comuns, o bem qualifica-se como bem
próprio.
Se for 50-50, deve presumir-se que o bem é comum - esta é a regra na comunhão de adquiridos, nos termos do art.
1724.
130

Para além deste regime do art. 1732 é também de classificar com bens próprios no regime da
comunhão de adquiridos, por força de um argumento de maioria de razão, aqueles que resultam
elencados no regime da comunhão geral – art. 1733. A ideia é a de que: se no regime da comunhão geral,
em que não há patrimónios próprios, aqueles bens são imperativamente incomunicáveis, então, no
regime da comunhão de adquiridos, que se admite que possam existir bens próprios, também se deve
entender que eles são incomunicáveis. São aqueles casos já analisados, como por ex. os bens de uso
pessoal e exclusivo, com uma ligação pessoal (recordações de família, joias, vestuário).

Art. 1727: Aquisiçao de bens indivisos já pertencentes em parte a um dos conjuges. Esta norma
está particularmente pensada para os regimes de compropriedade (art. 1403 e ss.) Temos então um
cônjuge que era comproprietário de um qualquer bem antes do casamento. Nesta eventualidade, de
acordo com este artigo, a parte adquirida em bens indivisos pelo cônjuge que deles for comproprietário
reverte igualmente para o seu património próprio, o que significa que, por efeitos do regime da
compropriedade e se ele vir uma expansão do seu direito de propriedade, esta expansão continua a
qualificar-se como um bem próprio. Recorde-se que nesta matéria, a Dr.ª Elsa Vaz de Sequeira explica
esta ideia segunda a qual sempre que exista a aquisição da quota de um comproprietário por outro,
aquilo que ocorre é verdadeiramente a expansão do direito. Não há a criação de um novo direito mas ao
somente um alargamento do perímetro objetivo.

Do 1727 resulta então o princípio da reversão a favor de património próprio do cônjuge


que já era coproprietário. Este regime não prejudica nos termos do nº2, a eventualidade de haver
lugar a uma compensação devida ao património comum. Isto porque nesta hipótese o comproprietário
vai adquirir a segunda quota e se para isso vai utilizar bens comuns, então depois terá de dar retorno ao
património comum. Estes créditos são sempre exercitáveis no momento da partilha (art.1689/3)

Art. 1728: Bens adquiridos por virtude da titularidade de bens próprios. Este art. tem de
ser separado também do 1722, aqui fala-se em bens adquiridos por virtude da titularidade de bens
próprios, já não se fala de direito próprio como se fala no 1722/1, al.c) e 1722/2.
A diferença é que no regime do 1722 há uma expectativa de aquisição e é durante esse período
de pendência que se pode consolidar a situação jurídica ativa ou não. Neste caso do 1728 o direito é um
direito que se adquire posteriormente ao casamento, portanto, não vem de nenhuma situação jurídica
ativa com natureza de expectativa, como sucede no 1722.
Neste regime há 3 ideias:

1. Qualificação destes bens como bens próprios;

2. Possibilidade de haver uma compensação devida ao património comum102;

3. O legislador ilustra exemplificativamente o conceito de bem próprio.

Vai para o efeito referir quatro casos: 3 deles de direitos reais e 1 outro de direito das
sociedades comerciais.

a. Acessões: Regime já estudado em Direitos reais, presente nos arts. 1325 e ss. –
acessão natural, acessão mobiliaria, acessão imobiliária. Todas essas formas de
aquisição de direito de propriedade são aqui relevadas.

102 Na mesma logica do art. 1727, e que se exerce nos termos do 1689/3
131

b. Situação relativa aos materiais resultantes da demolição ou destruição de


bens

c. Uma A parte do tesouro adquirida pelo cônjuge na qualidade de proprietário.


Convoca o art. 1324

d. 1ª parte Prémios de amortização de títulos de crédito ou de outros valores


mobiliários próprios de um dos cônjuges. Explicando esta alínea: Amortização
significa extinção: Isto significa que alguém é titular de bens com a natureza de
títulos de crédito (ex. cheques, letras, livranças, ações, etc.) ou de valores
mobiliários. Este conceito de valores mobiliários é mais recente, com a
modernização do direito comercial e do direito financeiro avançou-se para o
conceito de valores mobiliários e estes estão sempre ancorados a uma sociedade
comercial (que pode ser fechada – não está cotada em bolsa -, ou aberta – aquelas
que são regulamentadas pela CMVM e, portanto, têm os seus títulos cotados em
bolsa). Sempre que um cônjuge seja acionista de uma sociedade e resolva vender a
sua participação social, com isso amortizando, ele vai receber um premio. Esse
premio é o seu valor de saída de uma sociedade. E é este o valor que vai continuar a
ser considerado como bem próprio.

d. 2ª parte - bem como os títulos ou valores adquiridos por virtude de um direito


de subscrição aqueles inerente: Sendo alguém já acionista de uma sociedade, em
determinadas situações de aumento de capital pode configurar-se a hipótese de nós
alargarmos a nossa participação social, comprando novos títulos de forma
preferencial – porque temos um direito de preferência. Neste caso em que alguém
adquire novos títulos com base num direito de preferência continuam a ser bens
próprios.

Artigo 1729º - bens doados ou deixados em favor da comunhão: Este artigo tem uma técnica
legislativa um pouco obtusa. Diz-se que os bens havidos por um dos cônjuges por meio de doação ou deixa
testamentaria de terceiro entram na comunhão, se o doador ou testador assim o tiver determinado.
Portanto é difícil à primeira vista identificar a norma neste artigo. Os bens deixados são bens comuns ou
são bens próprios?
A regra é que são bens próprios. Só serão bens comuns se o doador ou testador assim o tiver
determinado. N º2 – vem fazer a delimitação negativa de âmbito objetivo: Nunca entram neste regime
as doações ou deixas testamentarias que integrem a legitima do donatário (remissão para o art. 2156 e
ss. - não é possível em vida instrumentalizar o âmbito da legitima).

Bens comuns: São os bens integrados na comunhão. Constam do art. 1724 + 1729 (se tiver
havido especificação nesse sentido) + 1733/2 e 1736

art. 1724: Al. a): Bens que resultam do produto do trabalho dos cônjuges. Isto tem de ser
interpretado:
132

1) O conceito de produto do trabalho que aqui está é toda e qualquer remuneração,


contraprestação. Abrangem-se as situações alicerçadas em contratos individuais de
trabalho, mas também as alicerçadas em contratos de prestação de serviços.

2) Tanto entra o trabalho intelectual como entra o trabalho material. Todas as diferentes
formas de prestação de uma atividade são relevadas para efeitos do art. 1724.

3) Seja o trabalho regular ou puramente esporádico.

Outras situações que são reconduzidas à al. a):

Prestações atribuídas em razão da produtividade: Muitas das empresas ou


escritórios de advogados, com alguma periodicidade, atribuem prémios, que são uma
valoração pelo especial desempenho, pelas especiais horas faturadas, pela especial
relação com o cliente, etc. Estes prémios de produtividade, que vão incrementar o
orçamento familiar, são qualificados como bens comuns e, portanto, não entram no art.
1733 al.c) como prestações intuito personae.

Gratificações que não tenham sido recebidas em resultado de um contrato


aleatório: Alguém que exerce uma atividade e, por alguma razão, recebe a título pessoal
uma gratificação, seja um empregado de mesa, empregado de restauração com outras
funções, funcionária de um salão de estética, entre outras.

Todas estas gratificações se consideram uma forma de retribuição pelo trabalho


desenvolvido.

Tudo o que sejam prestações atribuídas em substituição do salário:

a. Subsídios de parentalidade - sempre que o trabalhador (pai ou mãe) tem


direito a receber uma prestação social de parentalidade

b. prestações auferidas em razão de uma baixa

c. pensões de reforma

d. subsídio de desemprego

E os direitos de autor? Imagine-se que um dos cônjuges tem muitos best sellers. Isto é bem
próprio ou um bem comum? O legislador não esclarece. (esclarecido mais à frente). Al. b): Os bens
adquiridos pelos cônjuges na constância do matrimónio, que não sejam excetuados por lei.
Esta alínea b) funciona como uma válvula residual, é o princípio da comunhão de
adquiridos – tudo o que seja adquirido na constância do casamento deve ser qualificado como bem
comum.

Concretizando esta ideia, entra aqui:

1. Aquisições a título oneroso – tudo o que seja aquisição a titulo oneroso, salvo o
regime particular da sub-rogação, dos prémios, da amortização, vai ser qualificado
como um bem comum.
133

2. Aquisições a título gratuito (art. 1729) – podem ser qualificados como bens
comuns se tiver havido essa menção

3. Tudo aquilo que resulta a contrario do 1722

Para além destas duas alíneas do 1724, temos de conjugar o art. 1733/2. Esta norma prevista
para a comunhão geral aplica-se por maioria de razão para a comunhão de adquiridos. Recordar para
isso o conceito de benfeitoria, no art. 212 e as diferentes categorias de benfeitorias103.

Também podemos ter a contrário do regime de bens próprios, qualificados como bens comuns,
os bens sub-rogados no lugar de bens comuns. Temos uma norma que trata do contrario - dos bens sub-
rogados no lugar de bens próprios - e, por isso, a contrario, os bens sub-rogados no lugar de bens
comuns têm de conservar a sua natureza de bens comuns.

O art. 1725 consagra uma presunção de comunicabilidade e esta é uma presunção restrita aos
bens móveis. É uma presunção ilidível, ou seja, posso fazer prova que é um bem sub-rogado, de que foi
adquirido com bens próprios e afastar a presunção de comunicabilidade.

Art. 1726 - bens adquiridos em parte com dinheiro ou bens próprios e noutra parte com
dinheiro ou bens comuns:

Esta é uma daquelas normas que tanto pode ser utilizada para qualificar um bem como próprio,
como para qualificar um bem como comum.

Neste caso, aquele bem é um fruto da conjugação de um esforço titulado por bens próprios e
bens comuns. Não se pode dizer necessariamente que é um bem próprio ou comum, tem de se atender
ao caso concreto, depende da quantidade de aportações que foram feitas. Há este princípio da unidade
da coisa - e que por isso vai ter a natureza jurídica da aportação de maior valor - e prevê-se também
aqui a ideia da compensação entre patrimónios. Como neste caso o bem tanto pode ser considerado
comum como próprio, a compensação é bilateral, isto é, tanto pode haver uma compensação de
património próprio no património comum, como ao contrário.

Art. 1730 - Regra da metade: Este é um artigo extraordinariamente relevante no Direito da


Família e é um dos exemplos de regras imperativa em absoluto. Esta regra da metade, também
designada regra da meação, determina o seguinte:

a) os cônjuges participam por metade no ativo e no passivo da comunhão

Esta participação por metade no ativo e no passivo não titula o direito a uma participação, isto é,
a uma titularidade de 50% dos bens. Já vimos que património conjugal não se compatibiliza com esta
ideia. Aquilo que dá direito é a 50% do valor do património conjugal. E o valor do património so se sabe
no momento da partilha (art. 1689), so na fase em que se cessam as relações patrimoniais entre os
cônjuges é que eu vou fazer o inventário dos bens, e dar-lhe um valor.

103Necessárias: aquelas que se impõem para a conservação da própria coisa.


Úteis: que, não sendo imprescindíveis para a conservação, lhe aumentam o valor.
Voluptuarias: que não sendo necessárias para a conservação nem se qualifiquem como benfeitorias uteis, servem,
contudo, para recreio daquele que as realiza.
134

Isto significa que a regra da metade verdadeiramente só é exercitada no final do casamento. Não
é possível andar a praticar atos por conta da meação a que se terá eventualmente direito (ex: durante o
casamento, não se posso dizer “vou vender o automóvel, porque tenho 50% do mesmo, para pagar
dividas que tenho no cartão de credito”).

A segunda parte desta primeira alínea “sendo nula qualquer estipulação em sentido diverso” é
muito importante porque este art.1730 é uma norma muito aliciante para se fazer esquemas de fraude
de lei, ou seja, tentar-se, através de esquemas jurídicos distintos, conseguir um efeito que o legislador
pretende evitar. Ex.: Em vida, um dos cônjuges acorda com o outro, fazem um contrato em que renuncia
à sua meação ou que dispõe que 70% da meação fica a favor de C. Tudo isto é nulo com base neste art.
1730/2.

b) A regra da metade não impede que cada um dos cônjuges faça em favor de terceiro doações ou
deixas por conta da sua meação nos bens comuns, nos termos permitidos por lei.

Esta é outra norma que mal lida pode dar origem a situações de fraude à lei porque se pode pôr
um terceiro como testa de ferro quando na realidade o que se pretende é alterar o valor da meação do
outro conjugação. Por outro lado, quando se diz “fazer deixas por conta da meação” significa que não se
pode dizer que a casa do Algarve fica para A, por ex. porque nos só podemos saber aquilo a que cada um
terá direito no momento da partilha, não há legados em vida.

Art. 1731 – Bens que têm a natureza de instrumentos de trabalho:

A professora fez uma chamada de atenção, quando foi analisado o art. 1733 para o facto de que o
que esse artigo dispunha nunca podia ser aplicado no caso de haver instrumentos de trabalho porque
temos aqui uma norma especial no art. 1731, que se vai aplicar também à comunhão geral.

Nós temos determinados bens que são essenciais para o desempenho da atividade profissional
de um dos cônjuges (ex: uma impressora, um automóvel, um computador) e estes bens que entrem para
o património comum (concretamente porque foram adquiridos já quando casados) não são qualificados
como bens próprios do cônjuge que os utiliza para o trabalho, mas atribui-se a esse cônjuge a chamada
prioridade relativamente a ser investido na sua titularidade depois da partilha.

Ou seja, durante a vigência, eles continuam a ser considerados bens comuns, ainda que só
utilizados por um dos cônjuges. Cessando o casamento, o cônjuge tem direito a ser encabeçado
prioritariamente naquele bem porque precisa dele para exercer a sua atividade profissional.

Isto é um regime próximo do art. 2103 – A104 (a ratio subjacente é a mesma).

Direitos de autor: Trata-se de um conceito polissémico, ou seja, tem diferentes acessões em


função da modalidade de direito de autor que está a ser considerada. Na gíria comum é sinonimo de
uma prestação pecuniária. Diz-se que alguém recebeu direitos de autor quando alguém recebe dinheiro
pelo facto de ter feito uma obra intelectual.

104Estas atribuições preferenciais do 2103 vêm prever a atribuição da casa de morada de família e do
chamado direito ao recheio da casa.
135

O direito de autor é o que se chama à retribuição pela paternidade da obra. Faz sentido
que alguém veja a sua invenção remunerada e pode vê-la remunerada de duas formas essenciais:

- Vende a patente, abdica da obra e deixa de ser seu titular;

- Haver uma remuneração periódica. É isto que normalmente acontece quando alguém
escreve um livro, periodicamente há lugar ao pagamento de uma percentagem sobre o
valor das vendas.

Esta é uma acessão de direito de autor – o chamado direito patrimonial de autor. Depois há o
direito moral de autor, que tem a ver com a paternidade da obra. É um direito, por natureza,
exclusivo.

Esta dicotomia entre direito moral e direito patrimonial está presente no art. 9 do CDADC105 e
determina o seguinte:

1. O direito de autor abrange direitos de carácter patrimonial e direitos de natureza pessoal,


denominados direitos morais.

2. No exercício dos direitos de carácter patrimonial o autor tem o direito exclusivo de dispor da sua
obra e de fruí-la e utilizá-la, ou autorizar a sua fruição ou utilização por terceiro, total ou
parcialmente.

Quais são as dúvidas que aqui se colocam?

- A primeira já foi colocada em momento anterior e prende-se com saber se isto ainda poderá
ser considerado um produto do trabalho.

Quanto ao direito moral de autor é claro que não, é um direito imaterial e, por isso, não tem
nada que ver com a contraprestação de natureza pecuniária que está associada ao produto do
trabalho.

Mas quanto ao direito patrimonial de autor já há mais duvidas.

Será que isto cabe na alínea b) do 1724 se não couber na al.a)? E ainda temos o 1725 que
determina que na dúvida se deve presumir que são comunicáveis.

Art. 1678/2, al. b) – apelo ao elemento sistemático da interpretação.

Neste art., em sede de administração de bens, diz-se expressamente que cada um dos cônjuges
tem ainda a administração dos seus direitos de autor.

O que se retira daqui é que este número 2 é um número autónomo relativamente ao número 1, e
o numero 1 cuida da administração de bens próprios. Se o legislador então refere os direitos de

105 Código do Direito de autor e dos direitos conexos


136

autor no número 2, que está fora dos bens próprios, parece que se pode retirar daqui a ideia
que são bens comuns.

Segundo argumento normativo: art. 1696/2, al.b)

Neste caso, estamos em sede de esclarecimento que bens respondem pelas dividas não
comunicáveis – de responsabilidade exclusiva de um dos cônjuges. E o legislador refere “os produtos do
trabalho e os direitos de autor do cônjuge devedor”.

Este “e” será que quer dizer que têm ambos a mesma natureza106 ou o contrário?

Esta dúvida está latente na doutrina e na pág. 629 do manual dos professores Guilherme de
Oliveira e Pereira Coelho, estes autores dizem que talvez este direito deva considerar-se também como
bem próprio porque há uma ligação pessoal e íntima com o direito moral de autor. Mas ao mesmo
tempo, existe uma coisa que é o direito aos benefícios económicos potenciais da obra.

Posição assumida pela profª Ana Filipa: Não se pode convocar o art. 1733/1, al. c) quando se
refere a direitos de uso pessoal e exclusivo. Não é este o caso dos direitos de autor. Qualquer
esclarecimento sobre a matéria, para ser rigoroso, implica que se separe entre direito moral de autor e
direito patrimonial de autor. Se estivermos a falar de direito moral de autor, como resulta do art. 9º
ele é um direito exclusivo. Se é um direito exclusivo tem de ser qualificado como um bem próprio, é o
direito à paternidade da obra.
Se estivermos a falar de direito patrimonial de autor, enquanto benefício efetivo que está
associado à exploração da obra, todos os elementos normativos que acima se elencaram parecem
conduzir a uma conclusão – a sua qualificação como bem comum. Isto resulta, portanto, quer do
percurso pelo elemento sistemático da interpretação, quer pelo próprio princípio regra no regime da
comunhão de adquiridos.
Assim, qualquer benefício patrimonial efetivo que seja colhido pelo autor de uma obra, vai
aumentar o património conjugal. Mas a fundamentação normativa não é a alínea a) mas sim a alínea b),
no sentido em que é outro direito adquirido na vigência do casamento. Não se consegue individualizar
aqui, mesmo num sentido muito lato, que seja um produto do trabalho. Em síntese, temos de:

- Distinguir as várias polissemias do direito de autor;

- Conhecer o regime normativo especial do art. 9/1 e 9/2 do CDADC

- Distinguir o direito à paternidade da obra como bem próprio e distingui-lo do direito à


exploração da obra.

Este direito à exploração da obra também é um direito exclusivo e o que isto significa é que só o
autor da obra pode decidir se deixa o seu livro dentro de uma gaveta e nunca o vai publicar ou se vai
pulicar online ou se o vai publicar fisicamente. Isto é o que se chama a titularidade quanto às opções
que o autor tem quanto à sua obra e aqui, a administração é so do autor da obra, é exclusiva do autor da
obra. Isto no plano da administração.

No plano da fruição, quando já não estamos a trabalhar com benefícios eventuais e hipotéticos.
Eu sou livre de decidir que nunca vou publicar a obra que escrevi mas se eu decidir que vou

106 E ler-se-ia “produto do trabalho, que é bem comum, e outros bens comuns, como dtos de autor”
137

publicar, o rendimento que eu obter já passa a ser um bem comum, porque já há aqui um
benefício efetivo (que se distingue do beneficio eventual).

Regime da separação de bens

Artigos 1735 a 1737 + 1720. É, no fundo, o reverso da medalha da comunhão geral. Na


comunhão geral vimos que só existiam bens comuns, na separação de bens não existem bens comuns,
só existem dois patrimónios próprios, titulados por cada um dos cônjuges, não há património coletivo.
Por essa razão há uma separação absoluta no que diz respeito à titularidade dos bens (cada um dos
bens é titulado por cada um dos cônjuges) e há um regime de administração quase de separação
absoluta (que depois vai ter alguns desvios).

Desvios:

o Art. 1682-A, nº2 - no número 1 do mesmo artigo, o legislador faz uma ressalva mas
relativamente à casa de morada de família107, ainda que sejam casados em separação de
bens, exige-se sempre o consentimento de ambos os cônjuge para preservar a existência da
casa de morada de família.

o Art. 1682 -B – vale para os casos em que a casa de morada é titulada, não ao abrigo do dto de
propriedade, mas ao abrigo de um direito fundado em contrato de arrendamento. Também
aqui carece sempre do consentimento de ambos.

o Art. 1682/3 - neste caso, o legislador vai expor que carece sempre do consentimento de
ambos a alienação ou oneração de bens móveis:

 utilizados conjuntamente por ambos os cônjuges na vida do lar

 utilizados como instrumento de trabalho

Esta ideia prende-se com o conceito de “impenhorabilidade de bens”, que determina que há
certos bens que são sempre subtraídos à garantia patrimonial dos credores em razão da sua
importância (fogão, frigorifico, micro-ondas, cama...). Tem a ver com a dignidade da pessoa humana.

 Pertencentes exclusivamente ao cônjuge que não os administra.

Aqui temos uma dissociação entre titularidade e a administração. Os bens são de um cônjuge,
mas este não os administra, e então neste caso também é necessário consentimento de ambos.

Qual é aqui o valor jurídico negativo de um ato praticado sem consentimento, quando exigido
por lei? O vício é a Ilegitimidade. Isto está no art. 1687, que esclarece que os atos são anuláveis pelo
cônjuge que não deu o seu consentimento.

107 Temos aqui uma das manifestações normativas da importância da casa de morada de família.
138

O art. 1736 vem estabelecer 2 ideias muito importantes, que são convocadas por alguma
doutrina que entende que as lacunas em sede de união de facto podem eventualmente ser supridas com
a aplicação analógica desta norma.

No nº1 diz que se admitem cláusulas de presunção sobre a propriedade dos moveis. Portanto,
em regra, todos os bens são próprios, mas é possível que se venha esclarecer que certos bens são
comuns e para isso tem de se fazer na convenção antenupcial.

Estas cláusulas vão ter eficácia externa, ou seja, vinculam não apenas as partes, mas também os
terceiros. Tem, portanto, uma eficácia absoluta.

O nº2, estabelece-se uma presunção de compropriedade quanto aos bens moveis. Quando
houver duvidas sobre a propriedade exclusiva de um dos cônjuges, deve-se presumir que eles são
detidos em compropriedade (art. 1403 e ss.)

Conclusão da matéria do regime de bens


O regime da comunhão de adquiridos é o regime supletivo (art. 1717). Antigamente o supletivo
era o regime da comunhão geral. Regime imperativo: nestes casos, o legislador não admite a liberdade
quanto à escolha do regime de bens (desvio ao princípio do art. 1698). São os casos previstos no art.
1720 CC (casos em que tem de ser sempre separação de bens) e devemos fazer uma remissão também
para o art. 1699/2. Aqui, estabelece-se a proibição de estipulação do regime de comunhão geral no caso
de casamento celebrado por quem tenha filhos, ainda que maiores ou emancipados.

Convenção antenupcial

A convenção antenupcial está regulada normativamente nos artigos 1698º a 1716º CC (regime
substantivo). Este regime, que é o regime comum, é depois complementado pelo CRC (regime registal):

1) Art. 1º/1, e): obrigatoriedade de inscrição no registo da convenção antenupcial.

2) Art. 181º, e): assento do casamento. Na inscrição no registo já sabemos que uma das menções
que o assento deve conter é necessariamente a declaração se houve ou não uma convenção
antenupcial. Portanto é uma dos elementos obrigatórios.

3) Arts.189º a 191º: cuidam especificamente das convenções antenupciais e da alteração do


regime de bens.

Conceito de convenção antenupcial: ato de natureza negocial, o que significa que temos um
contrato. É um contrato celebrado entre aqueles que pretendem celebrar contrato de casamento e que
tem por finalidade definir o regime de bens. Esta é a causa da convenção antenupcial. A função da
convenção antenupcial é então definir qual seja o regime de bens. Por essa razão este contrato é um
139

contrato puramente eventual, não é obrigatório que seja celebrado, porque na eventualidade de não ser
feita convenção antenupcial aplica-se o regime supletivamente previsto no art. 1717º, que é o regime
da comunhão de adquiridos108.

É por outro lado naquilo que se tem vindo a defender, concretamente linha de ensinamento do
prof. Guilherme de Oliveira e Pereira Coelho, um contrato acessório. É um contrato acessório na medida
em que não tem verdadeira autonomia, só consegue ser efetivado se for efetivamente celebrado o
contrato de casamento. Caso contrário vamos estar a definir um regime de bens que por natureza nunca
vai ser praticado, porque pressupõe a celebração do contrato de casamento. Portanto há um nexo
instrumental entre este contrato, que é independente juridicamente, do contrato de casamento.

Princípio geral da “liberdade de convenção”

O art. 1698º enuncia o princípio geral, que em matéria de convenção antenupcial é o princípio
da liberdade. Temos aqui então uma das manifestações da autonomia privada, da liberdade contratual,
que está art. 405º. Admite-se que os esposados celebrem entre si uma convenção antenupcial. Há
liberdade de celebração e existe liberdade de estipulação, em alguma medida, portanto dentro do
catálogo oferecido pelo legislador. Este art. 1698º determina então não só a liberdade de convenção,
admitindo a escolha de um dos regimes previstos no CC, e a estipulação relativamente ao que aprouver
aos cônjuges. A formulação normativa do art. 1698º é muito próxima do art. 405º.Portanto é
mesma lógica que está no art. 1698º: há liberdade de celebração, há liberdade de estipulação. Esta
liberdade de celebração tem que se traduzir no fundo na escolha de um dos regimes previstos no CC,
ainda que esses regimes depois possam ser regimes impuros, pela circunstância de se poderem
adicionar ou apor cláusulas que em alguma medida os desconfigurem, naquilo que seja admissível.
Dentro dos limites da lei: já resultava do princípio geral do art. 405º e resulta desta restrição especial
em matéria de direito matrimonial. Quais são os limites da lei? Antes de mais são os limites fixados no
regime comum, mas temos para além destas normas comuns normas especialmente de direito
matrimonial:

1) Art. 1699º: um dos limites fixados pelo legislador. Este artigo determina que não pode ser
objeto de regulamentação na convenção antenupcial em 4 grandes situações. Estas 4 hipóteses
que estão subtraídas de regulamentação na convenção antenupcial, ou seja, em que não há
liberdade de estipulação, correspondem ao chamado estatuto legal – ideia segundo a qual no
âmbito do casamento certas matérias são imperativamente dispostas e como tal não há
possibilidade de serem afastadas por decisão das partes.

a. Art. 1699º/1, a): regulamentação da sucessão hereditária dos cônjuges e dos terceiros:
matéria definida em termos imperativos pelo legislador, a sucessão legitimária e
legítima (nas situações em que não tenha havido testamento). Mas diz ainda o art.
1699º/1, a) “salvo o disposto nos artigos seguintes”109, isto porque há normas também
especiais do direito da família que veem prever atenuações à proibição, concretamente

108 Se no exame disser apenas “A e B casados um com o outro”, não se diz nada sobre convenção antenupcial,
temos de fazer uma remissão para o art. 1717º e aplicar o regime da comunhão de adquiridos.
109 Fazer remissão para os arts. 1700º a 1707º.
140

nos arts. 1700º a 1707º. Há aqui um regime particular com eficácia sucessória:
estipulações que os esposados podem fazer e que vão ter eficácia sucessória.

b. Art. 1699º/1, b): alteração dos direitos ou deveres quer paternais quer conjugais: os
direitos e deveres conjugais constam dos arts. 1672º e ss (são simétricos e imperativos)
e relativamente aos filhos temos a matéria das responsabilidades parentais nos arts.
1877º a 1920º-C, toda essa matéria é uma matéria que não pode ser afastada.

c. Art. 1699º/1, c): alteração do regime de administração dos bens do casal: é uma das
matérias que integra o estatuto legal. Está nos arts. 1678º a 1687º.

d. Art. 1699º/1, d): estipulação da comunicabilidade dos bens enumerados no art. 1733º.
Que bens são estes? São aqueles bens incomunicáveis no regime da comunhão geral e
que se aplica por maioria de razão ao regime da comunhão de adquiridos. Todos estes
bens em hipótese alguma podem vir a ser qualificados como bens comunicáveis.

e. Art. 1699º/2, 1ª parte: proíbe-se a escolha do regime da comunhão geral no caso de


ser celebrado casamento por quem já tenha filhos maiores ou emancipados. Limite
especificamente matrimonial. Não há liberdade de escolha.

f. Art. 1699º/2, 2ª parte: proíbe-se a estipulação da comunicabilidade dos bens


elencados no art. 1722º/1, que são bens próprios no regime da comunhão de
adquiridos. Portanto não é possível subverter o regime da comunhão de adquiridos
nestes termos.

g. Art. 1714º: a imutabilidade das convenções antenupciais e do regime de bens


resultante da lei. Este artigo é mitigado, é um princípio que depois é excetuado em
alguma medida pelo art. 1715º. Portanto quando nos perguntarem se existe um
princípio de proibição absoluta de alteração do regime de bens a resposta é não, porque
é possível introduzir alterações nos termos previstos no art. 1715º. É evidente que as
alterações são cirúrgicas e são elas próprias definidas pelo legislador. Só nestes casos é
que pode então haver a chamada mitigação do regime de bens.

Quanto aos regimes particulares previstos nos arts. 1700º a 1707º. Matéria materialmente
de direito das sucessões. Este regime prevê fundamentalmente 6 hipóteses em que se autoriza a
liberdade de estipulação em matéria e com relevância sucessória. Há disposições por morte lícitas,
princípio do art. 1700º.
Regula-se os chamados pactos sucessórios nos arts. 1701º a 1703º. Os pactos sucessórios
porque são um pacto são um acordo, havendo por isso um princípio característico que é o princípio da
irrevogabilidade unilateral, ou seja, se houver um pacto sucessório nunca se pode admitir que um dos
cônjuges o revogue unilateralmente (art. 1701º). Para além disso os pactos sucessórios podem caducar
(art. 1703º). Art. 1704º: disposições de esposados a favor de terceiro, com caráter testamentário (neste
caso as pessoas ainda não casaram, portanto continuamos a tratar dos esposados) – situações jurídicas
tituladas e que têm fonte na convenção antenupcial celebrada entre estes dois esposados; podem então
fazer disposições a favor de terceiros (revivescência do contrato a favor de terceiro, mas com relevância
exclusivamente sucessória e em sede de testamento). Temos ainda as disposições por morte a favor de
terceiro, que já não é no campo da sucessão testamentária, mas sim no campo da sucessão contratual,
art. 1705º. O princípio da correspetividade das disposições por morte a favor de terceiro, art. 1706º.
Por fim no art. 1707º temos a substituição fideicomissária.
141

Requisitos

1) Requisitos substanciais: são substanciais porque são os exigidos para a plena validade no
que diz respeito à configuração do ato. Sendo um contrato, e é um contrato acessório ao
casamento, os requisitos que são exigidos são os mesmos requisitos do contrato de
casamento:

 Capacidade (art. 1708º): é recortada pela negativa, o que legislador faz é


não enunciar um princípio de capacidade apenas, mas esclarecer também
casos de eventuais incapacidades. “Têm capacidade para celebrar convenções
antenupciais aqueles que têm capacidade para contrair casamento”: remissão
para os arts. 1601º e ss, há aqui um princípio de simetria.

“Aos menores, bem como aos interditos ou inabilitados, só é permitido celebrar


convenções antenupciais com autorização dos respectivos representantes
legais”: regime distinto do que se observa relativamente ao casamento.
Sabemos que os interditos por anomalia psíquica ou os inabilitados não têm
capacidade matrimonial, é um impedimento dirimente absoluto, mas já
podem celebrar convenções antenupciais se houver autorização dos seus
representantes legais. É um aspeto diferenciador. O art. 1600º, que recorta
nestes termos a capacidade matrimonial, depois tem que ser conjugado com
o art. 1708º/2 e com o art. 1709º, porque são estes dois artigos que vão
explicar o que é que acontece no caso de não ter havido autorização ou de
não estarmos perante a situação particular prevista no 1708º/2. A sanção
jurídica é anulabilidade: é anulável a convenção antenupcial por falta de
autorização. Esta anulabilidade é uma anulabilidade que no plano da
legitimidade ativa vai ser circunscrita, porque só pode ser invocada pelo
incapaz ou seus herdeiros ou por aqueles a quem competir concedê-la,
dentro do prazo de um ano a contar da celebração do casamento. O que é que
isto significa? Significa que esta anulabilidade que aqui está prescrita é uma
anulabilidade atípica, porque se distingue do regime do art. 287º. No regime
do art. 287º/1 vemos que só pode invocar a anulabilidade a pessoa em cujo
interesse a lei vai reconhecer o direito potestativo de anulação. Aqui vamos
ter um círculo distinto, é um caso de anulabilidade atípica em razão dos
interesses reconhecidos.

 Consentimento: este requisito não é enunciado autonomamente no CC, mas


em rigor não seria necessário porque sabemos que todos os negócios
jurídicos, sendo um acordo de vontades, implicam a manifestação de uma
vontade que se caracteriza por certos requisitos: a vontade tem que ser
esclarecida, livre e lícita. Verificados estes pressupostos podemos dizer que
houve consentimento e portanto que não há nem uma falta nem um vício na
formação da vontade. Delimitação negativa de consentimento: o
consentimento não é lícito, esclarecido ou livre se concorrer uma causa de
anulabilidade por fundamento em vício na formação da vontade ou por falta
142

da vontade. O consentimento é um requisito implícito e tem que ser


necessariamente um consentimento bilateral, porque é um acordo.

2) Requisitos formais (art. 1710º): a convenção antenupcial pode ser feita mediante
declaração prestada perante o funcionário do registo civil ou então por escritura pública, é
alternativa que é reconhecida em matéria de forma. Se esta forma não for observada, temos
um negócio jurídico que é afetado por um vício de forma e portanto não vale enquanto
convenção antenupcial, não tem vinculatividade jurídica.

Publicidade. Função do registo

A convenção antenupcial para além de um negócio bilateral, é um negócio formal. É ainda


necessário que a convenção antenupcial seja inscrita no registo (art. 1711º). Qual é a razão de ser que
leva à inscrição no registo? Por uma razão de publicidade e publicitação concretamente junto de
terceiros daquele regime de bens que está a ser acordado pelos cônjuges.

Toda esta matéria do art. 1711º depois ganha da complementaridade com o regime do CRC. O
art. 1711º/2 releva ainda porque vem fazer um recorte negativo do conceito de terceiros, dizendo o
seguinte: “Os herdeiros dos cônjuges e dos demais outorgantes da escritura não são considerados
terceiros”.

Invalidade

Regime da invalidade da convenção antenupcial. A convenção antenupcial pode ser inválida


fundamentalmente quer com base no regime comum, porque se verifica a inobservância de um dos
limites da lei (contrariedade à lei, contrariedade aos bons costumes, contrariedade à ordem pública),
mas também por inobservância das disposições especificamente matrimoniais. A inobservância das
disposições matrimonias pode ocorrer em que circunstâncias?

1) Pela inobservância dos limites previstos no art. 1689º, em que não pode haver lugar a liberdade
de estipulação.

2) Pela inobservância dos requisitos substanciais: capacidade matrimonial e consentimento.

Estes dois casos geram uma ineficácia em sentido lato. O valor jurídico negativo desta
inobservância de requisitos é a não oponibilidade desta convenção antenupcial a terceiros. Temos
aqui verdadeiramente uma situação de ineficácia relativamente a terceiros desta convenção
antenupcial, que é no fundo ineficaz por não observância dos requisitos prescritos na lei.
143

Aposição de cláusulas acessórias

No plano do conteúdo: como em qualquer negócio jurídico, admitem-se cláusulas acessórias


típicas, há um princípio, que é o princípio da liberdade, quanto à aposição de cláusulas acessórias
típicas, art. 1713º/1.

Esta aposição de cláusulas acessórias típicas implica uma remissão para o regime da condição,
arts. 270º a 277, e do termo 278º a 279º. Pode haver condição, sendo um dos aspetos distintivos
relativamente ao contrato de casamento. O art. 1618º/2 vem considerar como não escrita as condições
que sejam apostas ao contrato de casamento – é outro dos elementos diferenciadores.

Apesar de ser possível apor cláusulas acessórias típicas, nos termos do art. 1713º/2 o
preenchimento da condição não tem efeito retroativo. Há um desvio ao regime regra da condição
plasmado no arts. 270º a 277º. Portanto a não retroatividade dos efeitos da verificação da condição.

Modificação

A convenção antenupcial sendo celebrada e observando-se os limites previstos na lei, quer no


plano substancial, quer no plano formal, pode ser modificada. Portanto existe um princípio de respeito
pela vontade das partes. Ainda que seja celebrada uma convenção antenupcial com um determinado
conteúdo, as partes podem mudar de opinião. E se mudarem de opinião, essa nova opinião tem que ser
plasmada num novo acordo. Esta modificação tem então um sentido de renovação da convenção
antenupcial – substitui-se a anterior por uma nova convenção antenupcial.
É claro que há um limite temporal, porque se o art. 1714º estabelece o princípio da
imutabilidade das convenções antenupciais, não faria sentido que estas depois pudessem ser alteradas
a qualquer momento. O limite temporal está fixado no art. 1712º/1: até à celebração do casamento.
Portanto até ser celebrado o casamento pode-se revogar a convenção antenupcial, substituindo-a por
uma nova.

O limite subjetivo, compreensivelmente exigido, é que quem outorga no novo acordo tem que
ser precisamente aqueles que acordaram no acordo originário ou então os respetivos herdeiros, tal
resulta do art. 1712º/1. Se for inobservado este limite subjetivo a consequência está plasmada no art.
1712º/3: há um direito de resolução.

Requisito de forma relativamente à renovação da convenção antenupcial: há um princípio da


equiparação, ou seja, observa-se as mesmas exigências de forma que tinham que ser verificadas quanto
à celebração da convenção antenupcial. O novo acordo está sujeito aos requisitos de forma e à
publicidade dos artigos antecedentes.

Apesar de haver um requisito de forma, e portanto sendo a convenção antenupcial um negócio


formal, a inobservância do requisito de forma não cai no art. 220º, portanto não se aplica aqui o regime
comum. A ideia aqui não é invalidade da convenção antenupcial, mas sim inoponibilidade da convenção
144

antenupcial a terceiros, portanto há não vinculatividade da convenção antenupcial, por uma razão mais
uma vez da importância do casamento.

Cessação

O acordo nasce nos termos em que vimos, com os requisitos substanciais, com observância da
forma necessária, pode ser modificada, mas também pode cessar. A cessão sempre seria admissível ao
abrigo do art. 406º, princípio geral de direito das obrigações. São duas as causas de cessação da
convenção antenupcial:

1) Revogação: há o chamado distrate110. Revogação por ato da vontade, art. 1712º/1, e vai-se aplicar o
regime comum do direito das obrigações – há um princípio de livre revogabilidade.

2) Caducidade (art. 1716º): são duas as causas de caducidade

 Não celebração casamento no prazo de 1 ano

 Invalidação do casamento, ou seja, se o casamento for declarado nulo ou anulado. Esta


hipótese de invalidação do casamento, nos termos do art. 1716º, ressalva expressamente o
regime do casamento putativo, portanto este pode ser um dos casos em que, ainda que
havendo invalidade dos casamentos, alguns efeitos sejam preservado, remissão para os arts.
1647º e ss.

Em síntese o que é a convenção antenupcial? Qual é a natureza jurídica da convenção


antenupcial? É um contrato, ou seja, é um negócio jurídico de natureza bilateral e no caso concreto,
formal.

Sempre que o legislador condiciona a observância da forma à outorga da escritura pública é um


mecanismo sempre um pouco dissuasor para as partes, por causa dos custos implicados. Fazer uma
escritura pública ainda custa muito dinheiro. E portanto é sempre bom haver uma alternativa,
declaração prestada no conservatório do registo civil normalmente é a via que se opta.

Restrições à liberdade contratual

Imutabilidade do regime de bens e das convenções antenupciais

Art. 1714º: trata do princípio da imutabilidade. Esta imutabilidade é uma imutabilidade bicéfala,
ou seja, é uma imutabilidade:

1) Das convenções antenupciais: só podem ser modificadas até à celebração do casamento

2) Dos regimes de bens

110 Termo próprio do Direito do trabalho.


145

Art. 1714º/1: “Fora dos casos previstos na lei, não é permitido alterar, depois da celebração do
casamento, nem as convenções antenupciais nem os regimes de bens legalmente fixados.” Qual a razão de
ser deste constrangimento? A razão de ser que continua a ser defendida, concretamente pelo prof.
Guilherme de Oliveira e pelo prof. Pereira Coelho, é a proteção de terceiros. Portanto os terceiros são
aqueles sujeitos que não tendo intervenção no ato de celebração do casamento, podem vir a ser
prejudicados por uma súbita ou superveniente alteração do regime de bens, porque estavam a contar
com a aplicação de certo regime legal e se fosse permitido aos cônjuges alterar esse regime legal isso
defraudaria as expetativas daqueles credores.
Esta é a grande ideia e não tanto a ideia que já foi defendida num tempo anterior da proteção de
um cônjuge relativamente a outro. Entendia-se que a imutabilidade estava associada à desconfiança do
ascendente de um cônjuge relativamente ao outro, principalmente nos casos em que o casamento fosse
celebrado por alguém de idade mais avançada relativamente a outro, poderia haver o perigo de
ascendente e com a modificação do regime de bens ter estipulações mais favoráveis. Mas esta razão
tradicional, associada à prevenção de um eventual enriquecimento de um cônjuge relativamente ao
outro, não é hoje em dia, de acordo com a doutrina atual, fundamento para a ainda proibição do
princípio da imutabilidade.

É claro que no plano do direito a constituir este princípio é controverso ainda hoje, porque se
nasceu historicamente desta ideia que um dos cônjuges era mais vulnerável e podia ser abusado pelo
outro cônjuge, se isso hoje em dia já não é o paradigma na realidade podemos fazer outras perguntas.
Em que medida é que é justificativo que alguém, havendo um fundamento objetivo, que teria que ser
densificado pelo legislador, não possa modificar o seu regime de bens?

Situações mais flagrantes: cônjuges casam um com o outro em regime de comunhão de


adquiridos, ambos trabalham como funcionários administrativos, entretanto ficam sem trabalho e nessa
medida lançam-se numa atividade comercial. Ao lançar-se numa atividade comercial, um deles ou
ambos, ficam permeáveis a um regime de responsabilidade por dívidas absolutamente penalizador, a
família e os bens que tenham. Portanto esta seria uma das razões que podia levar a que, ainda que em
termos excecionais, se admitisse uma alteração do regime de bens. Mas não é, o legislador não é
sensível a esta temática, continua a manter o princípio da imutabilidade.

O princípio da imutabilidade tem sido criticado pela doutrina mais moderna, que diz que
não faz sentido, porque aqui estamos no âmbito patrimonial em que o princípio regra deve ser o
princípio da liberdade, liberdade com responsabilidade, com respeito pelos limites da lei. E essa devia
ser a opção assumida pelo art. 1714º, que se coordenaria também mais com o próprio postulado da
igualdade dos cônjuges, com o respeito pela propriedade privada. Deveria pertencer aos cônjuges, até
por uma exigência constitucional, art. 61º, poderem cautelar as formas de transmissão da sua
propriedade e portanto evitar que eles durante a sua vida em mercê de dívidas contraídas pudessem
pura e simplesmente ficar subtraídos de qualquer bem, a não ser aqueles necessários à sua
subsistência.
146

Limitações em matéria de atribuições patrimoniais entre cônjuges

Este princípio da imutabilidade em todo o caso é concretizado pelo art. 1714º e depois tem
certas limitações.

Art. 1714º/2: “Consideram-se abrangidos pelas proibições do número anterior (proibição de


alterar na vigência do casamento convenções antenupciais ou regimes de bens) os contratos de compra
e venda e sociedade entre os cônjuges, excepto quando estes se encontrem separados judicialmente de
pessoas e bens.” Esta norma é coerente. Há um princípio de proibição de dois grandes negócios onerosos
celebrados entre os cônjuges:

1) Contratos de compra e venda

2) Contratos de sociedade

Mas este princípio não se aplica se o regime de bens tutelado for o regime da separação de bens,
porque aí não há património conjugal. Logo os terceiros sabem que quando contratam com aqueles
cônjuges que eles só vão encontrar bens integrados no património próprio. É esta a razão de ser para
esta ressalva, em coerência com aquele que é o fundamento do princípio da imutabilidade.

Quando se fala de compra e venda entre os cônjuges não vamos ter um regime particular.
Portanto o que é que é a compra e venda? Aquilo que já sabemos dos arts. 874º e ss. Considera-se uma
compra e venda entre os cônjuges aquela que seja celebrada entre cônjuges, ou seja, pessoas
casadas uma com a outra e que continuem casadas uma com a outra – daqui resulta que não se aplica a
proibição aos ex-cônjuges, nem se aplica àqueles que ainda sejam esposados, fora do âmbito de
aplicação do artigo. Eles têm que ser casados um com o outro e por outro lado tem que ser uma
verdadeira venda estipulada entre os cônjuges, ou seja, não se aplica111 aos casos de venda
executiva.
A venda executiva decretada no âmbito de um processo executivo está subtraída desta
proibição, porque aí é o próprio tribunal que está a determinar a penhora e a subsequente venda.
Também não se aplica ao caso de dação em cumprimento, art. 837º, que é uma outra forma de tutela da
garantia patrimonial, mas não se considera como verdadeira venda.

O legislador só fala de compra e venda, mas no art. 939º temos uma norma que determina a
aplicação do regime da compra e venda a todos os contratos que tenham uma natureza ou uma função
análoga. Tal levanta a discussão quanto à eventual aplicação também desta proibição a outros contratos
que sejam análogos, tipicamente os chamados contrato de escambo ou contrato de troca. Portanto
aqueles contratos que possam determinar a transferência da titularidade sobre o bem de forma
onerosa. Um outro exemplo é o trespasse. Aquilo que acontece no trespasse é alguém vender o
estabelecimento comercial – o trespasse é uma espécie de venda, mas que não tem por objeto única e
exclusivamente um bem imóvel ou um bem imóvel, como sucede na compra e venda. Tem sim por
objeto o chamado estabelecimento comercial. O estabelecimento comercial é uma universalidade de
direito, que implica uma agregação de diferentes elementos (elementos físicos, pessoas, trabalhadores,
as máquinas, sítio onde funciona aquele estabelecimento). E o estabelecimento comercial é aquilo que
existe como substrato de uma empresa, portanto quando alguém diz que é empresário tem um
estabelecimento comercial e este não é o espaço físico, é no fundo toda aquela universalidade. Nestes

111 Isto tem sido aclarado pela jurisprudência.


147

casos entende-se que deve haver uma aplicação direta desta proibição normativa. Não é uma aplicação
analógica, mas sim uma aplicação direta por força do art. 939º.

Então e será que faz sentido aplicar esta proibição a um arrendamento de longa duração? É que
no arrendamento não há transferência da titularidade. Mas pode ser próximo disso se estivermos a falar
de um arrendamento durante muitos anos. Aqui já seria uma questão de uma eventual aplicação
analógica.

Qual a razão de ser desta proibição? O legislador por um lado quer proteger os terceiros.

1) Por outro lado entende que há um risco sério de haver uma fraude à lei praticada
pelos cônjuges:

 Que possa contornar o princípio da livre revogabilidade das doações entre os


cônjuges. Este é um princípio que está plasmado no art. 1765º. Fazer uma
compra e venda mascarada, sendo na realidade uma doação, pode-se estar a
contornar este regime, e existir a hipótese de simulação.

 Contornar a proibição de doações entre cônjuges no regime imperativo da


separação de bens, isto resulta do art. 1762º, aplicando-se também o art.
1720º.

2) O segundo perigo atendido pelo legislador é o perigo da simulação relativa: celebrar


verdadeiras compras e vendas, mascaradas de doação. Haveria aqui uma simulação
relativa, objetiva, de conteúdo.

3) Em terceiro há no fundo uma ofensa ao princípio da proibição de confusão de


massas patrimoniais. No regime da comunhão geral e no regime da comunhão de
adquiridos, em que há património comum geral, os cônjuges não têm direito a certos
bens, e portanto têm direito a metade do valor do património conjugal, valor que só
se apura em sede de partilha. Por esta razão se se permitisse que durante a vida que
através destes negócios onerosos viesse a ocorrer transmissões sucessivas, haveria
um risco de confusão das massas patrimoniais.

Em matéria de compra e venda entre cônjuges:

1) Ac. STJ 14/11/2006: acórdão interessante porque por um lado faz um discurso pelo
princípio imutabilidade, ainda que no caso concreto o casamento tenha sido
celebrado em regime separação de bens, e portanto vai-se determinar que a
proibição não se aplica por esta razão, ainda que se explica qual a razão de ser da
proibição.

2) Ac. STJ 09/12/2008: entende, na mesma linha, que estando em causa o regime de
separação de bens não se vai aplicar esta proibição.

Outra das proibições que consta do CC é a proibição de constituição de sociedades. Esta ideia,
enunciada pelo art. 1714º/2 tem que ser complementada pelo art. 1714º/3, pelo art. 8º CSC e pelos arts.
980º a 1021º CC. A razão de ser desta proibição é mais uma vez o respeito pela intangibilidade da
comunhão conjugal, portanto que não haja qualquer confusão de esferas, passar bens próprios para
bens comuns e assim sucessivamente. Para além da tutela da garantia patrimonial dos credores.
148

Esta proibição aplica-se em matéria de sociedades civis, sociedades previstas no CC nos arts.
980º a 1021º. Relativamente às sociedades comerciais temos que atender ao art. 1714º/3, que
determina que “É lícita, contudo, a participação dos dois cônjuges na mesma sociedade de capitais (…)”. O
conceito de sociedade comercial vem permitir distinguir dois grandes tipos de sociedades:

1) Sociedades de pessoas:

 Sociedades em comandita

 Sociedades em nome coletivo

2) Sociedades de capitias

 Sociedades por quotas

 Sociedades anónimas (necessariamente tem que ser constituídas pelo menos por 5
sócios)

Esta distinção não é uma distinção puramente teórica, porque tem uma grande aplicação prática
em matéria regime de responsabilidade por dívidas. No regime de sociedades de pessoas tipicamente o
regime de responsabilidade é mais gravoso. No regime de sociedades de capitais a responsabilidade
está ancorada à participação social e portanto é limitada nessa medida.

O legislador está admitir, em derrogação do princípio geral de proibição de constituição de


sociedades, que se possam constituir sociedades comerciais, desde que estas tenham natureza de
sociedades de capitais, precisamente porque não têm um regime de responsabilidade por dívidas que
seja tão gravoso.

Qual é então a razão de ser deste regime especial? Este regime especial é ditado pelo valor da
tutela do comércio. O comércio e celeridade das transações do comércio entende-se que é incompatível
com esta proibição tradicional, faz por isso sentido haver um regime de favor.

Este regime vem permitir em atenuação e em desvio ao princípio da proibição da constituição


de sociedades que se constituam sociedades comerciais, mas esta constituição só é admitida nos
quadros das sociedades de capitais e por outro lado o art. 8º CSC, em concretização desta ideia, vem
dizer que só é válida a constituição de sociedades entre os dois cônjuges se só um deles assumir a
responsabilidade ilimitada nas sociedades de pessoas, para evitar que todo o património conjugal possa
ser absorvido pelo exercício de uma atividade comercial.

Quando se fala de sociedades comerciais, que estão previstas no CSC, temos sempre uma
empresa comercial. A sociedade comercial é um tipo de empresa comercial. E as empresas comerciais
são definidas e elencadas no art. 230º Código Comercial, que é o Código de Veiga Beirão de 1880, que já
só se encontram algumas disposições em vigor.

Jurisprudência em matéria de sociedades:

1) Ac. STJ 18/02/2003: determina que art. 1714º/2 deve ser interpretado “no sentido de
que a noção de sociedade de capitais abrange as sociedades por quotas, quer a sociedade
tenha sido constituída ab initio por ambos os cônjuges, quer posteriormente a eles tenha
sido reduzida.” Este é um dos problemas que se coloca já estritamente societário. As
sociedades têm que ser constituídas com determinado número mínimo de sócios e esse
149

número de sócios era já inicialmente apenas restrito aos cônjuges colocava-se o


problema de saber se eles podiam ou não integrar na sociedade por quotas.

2) AUJ 1/10/1996: mesma questão. “As sociedades por quotas que, (…), ficaram reduzidas a
dois únicos sócios, marido e mulher, não separados judicialmente de pessoas e bens, não
são, em consequência dessa redução, nulas.”

Este tipo negocial não é referido no art. 1714º, mas é um dos negócios onerosos que tem vindo a
ser posto em causa os termos da sua admissibilidade pela doutrina: contrato-promessa de partilha.
O contrato-promessa é um negócio jurídico com autonomia, mas que é preliminar
relativamente àquele que seja o negócio definitivo. Isto no contexto do casamento significaria então o
seguinte: a partilha verifica-se nos termos e nos casos previstos no art. 1689º, mas pergunta-se se os
cônjuges podem na vigência do casamento vir celebrar um contrato-promessa em que decidam os
termos da partilha. Ex: têm uma farmácia, uma casa no Algarve e dois automóveis, e vão decidir
fundamentalmente como é que vão fazer esta distribuição no momento em que se decidam divorciar.
A primeira ideia que temos que ter presente é que não temos nenhuma norma no direito
matrimonial sobre isto, nem a dizer que pode, nem a dizer que não pode, há um silêncio legal que leva a
que a questão seja discutida.
A favor da admissibilidade do contrato-promessa observados determinados limites têm-
se orientado os profs. Guilherme de Oliveira e Pereira Coelho. Já o prof. Jorge Duarte Pinheiro
tem uma posição mais cautelosa favorável à invalidade como princípio.
Quais os argumentos que se utilizam?
A favor da validade usa-se o princípio da autonomia e o princípio da liberdade. Porque que é
que os cônjuges não hão-de ser admitidos a regular provisoriamente os termos da partilha, se aqueles
termos só vão ser considerados eficazes no momento em que ocorrer a partilha, e ai funcionado as
regras legais? Faz-se um inventário, faz-se a avaliação e depois a distribuição seria preferencialmente
no sentido que tinha sido acordado pelos cônjuges. Forma de os deixar ouvir até antes do momento em
que as relações entre eles normalmente azedam, que é no momento em que se advinha o fim do
casamento. Portanto seria um momento de maior esclarecimento pelos cônjuges. Mais desejável que as
pessoas em vida decidam como vão distribuir os bens. Princípio da liberdade e por outro lado não
existe o risco do ascendente. Hoje em dia as relações conjugais funcionam de acordo com o princípio da
igualdade, portanto porque é que não se há-de oferecer aos cônjuges a possibilidade de fazer essa
regulamentação? É claro que esta regulamentação não é imune ao funcionamento do regime comum.
Portanto se se vier a provar que aquele contrato-promessa estava viciado por coação moral ou por
usura ou por qualquer outro fundamento, então deverá ter o valor jurídico correspondente, mas
presumir à partida que isto vai acontecer é errado. Também não se põe em causa nem os interesses dos
cônjuges, nem os interesses de terceiros, porque estamos a falar desde logo de uma eficácia meramente
obrigacional desta convenção e que vai ser diferida par ao momento da efetiva partilha. Em que casos é
que se entende que o contrato-promessa deve ser considerado inválido a título excecional?

1) Ocorreu um vício de acordo com o regime comum.

2) Se encobrir uma verdadeira doação entre cônjuges que tenha por objeto bens
comuns. Portanto se o contrato-promessa na realidade o que está a fazer em termos
simulados é uma doação de bens comuns, sendo nula nos termos do art. 1774º/1.
150

3) Se ocorrer uma divisão manifestamente desigual em ofensa à regra da metade (art.


1730º). Ex: no momento da partilha o cônjuge marido tem direito a 2/3 dos bens
que existirem e a mulher tem direito a 1/3.

Portanto dependerá da configuração concreta do contrato-promessa. E o juízo mais cauteloso é


dizer que não há um princípio de invalidade, mas isto não prejudica que cada contrato-promessa passe
pelo escrutínio concreto da respetiva validade.

Jurisprudência sobre contrato-promessa de partilha:

1) Ac. STJ 05/03/2013: tese da nulidade do contrato-promessa por violação do 1730º/1.


“É nulo, por violação do n.º1 do artigo 1730.º do Código Civil, o contrato-promessa de
partilha subsequente a divórcio em que se estipulou que o bem comum será adjudicado à
ex-cônjuge, tendo o ex-marido já recebido “o valor de tornas que lhe é devido”, sem se
precisar o valor destas e daquele.” Havendo uma total ausência de critérios, entende-se
que isto é um cheque em branco que permite uma distribuição desigual, em ofensa à
regra da metade.

2) Ac. STJ 15/12/2011: tese da nulidade. “Está ferida de invalidade a estipulação


contratual que os cônjuges subscrevam em desrespeito pela regra da metade do seu
património comum no casamento. Porque é profanada a regra da metade consagrada no
art.º 1730º, n.º1, do C. Civil, é nulo o contrato-promessa de partilha negociado entre ambos
os cônjuges no qual, na divisão acordada, se atribui a um dos cônjuges prestações
“manifestamente desproporcionais”.” Neste caso os cônjuges tinham um prédio e um
automóvel antiquíssimo e na distribuição o prédio ficava para um e o outro ficava com o
automóvel do século passado. E portanto entendeu-se que havia aqui uma distribuição
manifestamente desproporcionada das prestações.

3) Ac. STJ 22/02/2007: tese da validade como princípio. “O contrato promessa de partilha
de bens, celebrado pelos cônjuges, no decurso da acção de divórcio, subordinado à
condição suspensiva do decretamento do divórcio, é válido. No entanto, o mesmo estará
ferido de nulidade se violar a “regra da metade”, por atribuir a um dos cônjuges quotas de
bens manifestamente desproporcionais relativamente ao outro.” Ideia de que é preciso de
ver no caso concreto.

4) Ac. STJ 21/12/2005: “É válido o contrato-promessa de partilha de bens comuns do casal,


subordinado à condição suspensiva do, entre os promitentes, decretamento do divórcio.”

Esta análise que fizemos tem por base o art. 1714º e no fundo a interpretação do quadro do art.
1714º, de onde resulta a proibição de celebração de pelo menos dois negócios onerosos entre os
cônjuges, que é a compra e venda e o contrato de sociedade civil e certos contratos de sociedades
comerciais (sociedades de pessoas com responsabilidade ilimitada de ambos), mas suscita-se também
esta última questão que implica uma conjugação do art. 1714º com o art. 1730º. Como não temos norma
especial sobre o contrato-promessa, a admitir-se qualquer sindicância, ela funciona fundamentalmente
nos quadros da violação da regra da metade.
151

Negócios entre os cônjuges

 Matéria das restrições à liberdade de estipulação e celebração

 Na vigência do casamento, nem todos os negócios onerosos são admissíveis – vimos 2: contrato
de compra e venda e contrato de sociedade.

 A compra e venda abrange a compra e venda, de acordo com o regime comum plasmado no CC, e
tem de ser celebrada entre os casados, e não entre esposados, e não se abrangem figuras como a
dação em cumprimento que são expressamente excetuadas pelo artigo 1714º/3.

 Contratos de sociedades: ter em conta não apenas as normas do CC, mas também o Código das
Sociedades Comerciais, nomeadamente o 8º do CSC, que vem de alguma forma temperar aquilo
que resultaria da proibição em matéria de constituição de sociedades entre os cônjuges. Essa
proibição contemplada no 1714º/2 é exceptuada pela norma do 1714º/3. Esta ideia de
constituição de sociedades entre os cônjuges abrange a constituição ad origem ou a entrada
superveniente, através de um fenómeno de tradição de quota ou de transmissão de ações. Ora,
este art. 8º do CSC vem determinar que é licita a intervenção dos cônjuges desde que apenas um
deles assuma uma responsabilidade limitada. Isto significa, em termos práticas, a
admissibilidade de constituição de sociedades de capitais, mas, relativamente às sociedades em
comandita, existem restrições porque só um deles pode ter uma responsabilidade limitada.

 Admissibilidade do contrato promessa de partilha: matéria que pode ser dada aqui ou no
momento da partilha nos termos do 1689º.

Doações entre casados

 Negócios gratuitos que podem ter lugar no decurso da constância matrimonial

 Sede legal: 1761º a 1766º do CC

 Quando falamos em doações em direito matrimonial, temos de distinguir as doações entre


casados e as doações entre esposados ou as chamadas doações para casamento (1753º a 1760º).
O critério distintivo não é estrutural, mas apenas temporal e subjetivo. A doação que ocorre
entre casados implica a celebração do casamento, a doação entre esposados é anterior a esta
celebração (entre dois sujeitos sem este status social).

 É muito importante começarmos por ver se há uma verdadeira e própria doação. O próprio art.
1761º/1 vem remeter para o regime comum da doação. Antes de mais, recordar a noção de
doação 940º/1: a doação é ocontrato, negócio bilateral, por via do qual uma pessoa, com espírito
de liberalidade (animus donandi) e à custa do seu próprio património (há um empobrecimento
consciente/intencional), decide dispor gratuitamente de uma coisa ou direito ou assume uma
obrigação, em benefício do outro contraente.
152

 Delimitação negativa (o que não é doação): consta do 940º/2: elencam-se três atos:

 Renúncia a direitos

 Repúdio da herança ou do legado

 Donativos conformes aos usos sociais: não há uma definição, é um conceito que tem de ser
precisado e concretizado à luz de cada relação ou vínculo subjetivamente relevante.

Tipicamente, os presentes que se costumam dar por ocasião do aniversário do casamento não
são verdadeiras doações, são donativos conforme aos usos sociais.

Também, por ocasião e em vista a celebração do casamento em razão de valores familiares e de


tradição – usar os brincos que toda a gente da família usou – temos um donativo e não verdadeira
doação.

 Esta é a parte cirúrgica da norma que temos de ponderar, é por aqui que começa qualquer
hipótese prática. Se não temos uma verdadeira doação, todo o restante regime fica
prejudicado.

 Todo o regime da doação entre casados é um regime especial, que não prejudica a aplicação do
regime comum. Temos 7 ideias-chave:

1) É válida a doação de bens próprios (princípio que resulta do 1764º/1).

2) Isto significa que é invalida a doação de bens comuns. Isto resulta a contrario da
primeira ideia. Estes 2 princípios não são absolutos: o próprio legislador estabelece um
desvio ao princípio geral da doação de bens próprios no 1762º. A doação de bens
próprios nunca será valida nos casos de casamento celebrado segundo o regime da
separação de bens imperativamente determinados. Portanto, nos casos do 1720º, que
agrupa dois grandes núcleos de hipóteses: casamento celebrado por quem tenha mais de
60 anos e casamento celebrado sem processo preliminar, o casamento tem de ser
celebrado imperativamente de acordo com a separação de bens.

Ratio destes dois princípios (validade de bens próprios e invalidade de bens comuns):

o Tutelar um cônjuge relativamente ao outro (perigo de ascendente). Se se admitisse


a doação de bens comuns, podia-se determinar que saíssem da esfera de bens
comuns e ingressassem na massa patrimonial de bens próprios de um dos cônjuges
muito mais bens e em desequilíbrio e desrespeito pela lógica do princípio da
meação.

o Tutela dos credores e dos terceiros em geral: poderia determinar uma confusão
patrimonial, porque os credores sabem que estão a contratar com 2 casados num
determinado regime de bens e confiam na aplicação desse mesmo regime. E,
portanto, se da execução se transferir artificialmente bens, pode-se defraudar as
expectativas destes credores.
153

3) É proibida a doação recíproca no mesmo ato (princípio do 1763º/2): comparar com


a proibição de testamento de mão comum )2181º). A lógica da proibição é exactamente a
mesma. O legislador não quer que duas pessoas estejam no mesmo acto a efetuar
atribuições patrimoniais recíprocas, pois isto determinaria que para se revogar aquela
atribuição, teriam os dois de estar de acordo. Ora, para evitar estes litígios o legislador
determinou este princípio, procurando tutelar a vontade livre e esclarecida. Desvio a este
princípio: 1763º/3 (reservas de usufruto e rendas vitalícias).

4) Princípio da incomunicabilidade dos bens doados (em qualquer regime de bens): só


se podem doar bens próprios, e doando-se, não se podem nunca converter em bens
comuns (art. 1764º/2). As razões são as mesmas.

5) Princípio da livre revogabilidade pelo doador (art. 1765º/1, 1ª parte): aspeto muito
importante e constitui uma especialidade relativamente ao regime comum das doações.

Livre revogabilidade - sem que haja a necessidade de elencar um fundamento particular,


normalmente previsto na lei ou no contrato.

Este princípio constitui um desvio ao regime comum. Nos artigos 970º e ss prevê-se um caso
particular de doações, que é a chamada revogação por ingratidão do donatário. Se continuarmos a
percorrer o regime comum, encontramos o art. 975º, que dispõe que não há revogação por ingratidão
nas doações para casamento, nem nas doações remuneratórias (art. 941º). As doações remuneratórias
são atribuições patrimoniais gratuitas que se fazem como recompensa de serviços prestados, que
podem ter sido prestados entre cônjuges ou no âmbito de relações com relevância familiar, ou no
âmbito da relação de cuidador.

Crítica: se se admite a chamada doação remuneratória e se no regime geral não pode ser
revogada sequer em caso de ingratidão, isto implica que no âmbito do casamento a doação pode ser
livremente revogável (‘’revoguei porque sim’’) ao passo que no regime geral não pode acontecer. Pode
levar a injustiças.

6) Inadmissibilidade do direito de revogar mortis causa (em benefício dos herdeiros


do doador): Se o doador em vida pode livremente revogar, se ele morrer os seus
herdeiros não têm esta possibilidade, pois este não se transmite, apesar do princípio da
universalidade das transmissões (art. 1765º/2).

7) Irrenunciabilidade do direito de revogar a doação (art. 1765º/1 2ª parte): Mesmos


fundamentos. Se em vida um cônjuge viesse declarar que renunciava ao direito de
revogar doações entre casados, poder-se-ia atacar aquele ato jurídico, mas para evitar
este tipo de litígio o legislador desconfia e proíbe esta possibilidade.
154

Mais notas essenciais do regime

a) Objeto da doação entre casados:

a. Bens próprios (art. 1764º)

b. Bens presentes: fica afastada a possibilidade de se doarem bens futuros (art.


211º). Ratio: tutela do património comum, intangibilidade da garantia
patrimonial.

b) Forma: art. 1763º- norma especial, que vai desviar o que resultaria da aplicação do regime
comum (art. 947º).

i. Doação de coisa móvel: Ora, a doação de coisa móvel era um negócio real quoad
constitutione (negócios que exigem a tradição/entrega da coisa para a perfeição
do negócio). Aqui, no regime da doação entre casados, o que se determina no
1763º/1 é que se estiver em causa um bem móvel, mesmo que acompanhada da
tradição, tem de ser reduzida a escrito, ou seja, temos um agravamento das
exigências de forma relativamente ao regime comum. Ratio: proteção de
terceiros. Se não houvesse documento escrito, seria difícil provar perante
terceiros o que ocorreu.

ii. Doação de coisa imóvel: Quanto à doação de coisas imoveis, não há regime
particular, pelo que se observa o regime do 947º (exigência de escritura pública
ou documento particular autenticado).

c) Caducidade: (Art. 1766º): existem várias causas de caducidade das doações entre casados.

a. Causa natural (alínea a): morte: facto jurídico em stricto sensu que determina a
caducidade se o donatário (beneficiário) morrer antes do doador. Desvio: no caso
de ocorrer confirmação da doação no prazo de 3 meses subsequentes à morte
daquele. Havendo confirmação, há uma legitimação superveniente, pelo que não há
caducidade da doação.

b. Causas jurídicas (alíneas b) e c):

i. Invalidade do casamento: alínea b): por anulação ou declaração de nulidade.


Atenção: o legislador ressalva o regime do casamento putativo, o que
significa que isto obriga a considerar a boa ou má fé dos cônjuges. Se ambos
estiverem de boa fé, não há fundamento para que haja caducidade da
doação. Se houver má fé apenas do doador também não há fundamento para
que haja caducidade.

ii. Divórcio: alínea c)-1ª parte

iii. Separação jurídica de pessoas e bens: alínea c)- 2ª parte.

Este artigo, na alínea c), refere «por culpa do donatário, se este for considerado único ou
principal culpado». Está é ainda uma reminiscência do regime anterior, que apela à ideia de culpa na
relação matrimonial, que hoje em dia foi superada, com a alteração do paradigma em matéria de
155

divórcio e de separação jurídica de pessoas e bens. Por essa razão, na linha do entender de Jorge Duarte
Pinheiro, deve entender-se que esta parte da norma deve ser objecto de uma interpretação ab-rogante.
Hoje em dia é ilegal fazer depender o regime da existência de culpa de um ou de ambos os cônjuges.
Esta norma deve ser tomada como não escrita.

Art. 1791º: benefícios que os cônjuges poderiam obter (antigamente dependia da culpa, hoje em
dia é neutral).

Uma interpretação sistemática à luz do 1791º conduz à necessidade de deixar cair esta
necessidade de culpa.

Doações entre esposados

 Conceito= Doação feita a um ou ambos em vista do seu casamento. Só existe doação entre
esposados se houver uma afetação finalística do bem. O bem é entregue o bem porque se
acredita que se vai celebrar o casamento.

 Art. 1753º: remete para o regime comum (verificar se se trata de uma verdadeira e própria
doação)

 Modalidades:

 Doação feita por um esposado em benefício do outro

 Doação feita por ambos os esposados reciprocamente

 Doação feita por um terceiro a um dos esposados

 Doação feita por um terceiro a ambos os esposados

 Eficácia: A doação para casamento só adquire eficácia com a celebração do casamento (art.
1755º/1). Há um diferimento dos efeitos jurídicos, é uma condição legal. Se o casamento não
foi celebrado é como se nunca tivesse sido feita a celebração. Este princípio da eficácia é
formulado em termos supletivos “salvo estipulação em contrário”, ou seja, reconhece-se às
partes a possibilidade de conformar um modo diferente de regime.

 Existem 1 caso particular com diferentes vertentes:

o 1755º/2: casos com efeitos sucessórios: nos casos em que a doação deva produzir
efeitos por morte do doador, esta doação entre esposados vale como pacto
sucessório, sendo tratada nessa sede, ou seja, há uma espécie de transfiguração do
regime (aplicação dos artigos 1701º a 1703º). Passa de um contrato inter vivos para
mortis causa.

 Forma: art. 1756º: As doações entre esposados têm de ser feitas na convenção antenupcial. O
que parte da doutrina tem vindo a chamar à atenção é de que este regime é demasiado severo
156

e limitativo para aqueles esposados que não querem celebrar uma convenção antenupcial e,
portanto, devia haver uma alternativa. E qual alternativa? Professores Pereira Coelho e
Guilherme de Oliveira: esta doação pode ser estipulada em escritura pública ou por um
documento com a mesma força probatória (em vez da convenção antenupcial).

 Consequência jurídica para a inobservância da forma: se for uma doação em vida, o


regime especial é inaplicável (art. 947º): vício de forma: nulidade (não produção de efeitos).
Se for uma doação por morte: nulidade.

 Ideia essencial desenvolvida em 3 coordenadas:

 Princípio da incomunicabilidade dos bens doados: princípio comum (1757º): princípio


estabelecido de modo diverso, em termos supletivos, pois ressalva-se a estipulação em
contrário (aspecto comum com as doações entre casados)

 Princípio da irrevogabilidade das doações entre casados (art.1758º): aspeto distintivo


das doações entre casados (em que vigora o princípio da livre revogabilidade)

 Admissibilidade da redução por inoficiosidade (art.1759º): artigos 2168º a 2178º.


Instituto pensado para tutelar a legítima (quota de bens indisponível por lei).

 Caducidade: 1760º CC + 1703º

Que situações?

 1760º:

1) Pelo decurso do tempo: Não celebração do casamento num prazo de um ano. Aqui
releva-se o tempo e no regime das doações para casados releva-se a morte

2) Invalidade do casamento,

3) Divórcio

4) Separação judicial de pessoas e bens.

 1703º

1) Pode caducar se o donatário morrer antes do doador.

2) No caso de doação entre terceiro a esposado consagra-se que não caduca a doação se o
donatário morrer anteriormente ao doador. Este artigo vai relevar a morte do
donatário e a morte em condições diferentes consoante seja uma doação entre
esposados e uma doação entre terceiros a esposados.

 Regime particular (1760º/2): norma complexa, tem uma previsão composta por 2 elementos
+ 1 e depois uma estatuição. «Se a doação tiver sido feita por terceiro a ambos os esposados
ou os bens doados tiverem entrado na comunhão, e um dos cônjuges for declarado único ou
principal culpado no divórcio ou separação, a caducidade atinge apenas a parte dele.» Esta
norma, mais uma vez, deve ser objeto da mesma interpretação corretiva. Trata-se de outro
exemplo em que o legislador, nas reminiscências do direito antigo, faz interferir a ideia de
culpa.
157

 Jurisprudência: Acórdão STJ 19/09/17 e Acórdão STJ 26/09/17.

Regime da administração de bens

1. Sede legal: Artigos 1678º a 1697º

2. Qual o regime da administração de bens comuns

3. Qual o regime da administração de bens próprios

4. Relevância da distinção entre atos de administração ordinária e atos de administração


extraordinária

5. Tipologia de atos

6. Antigamente: Até à reforma de 1977, o regime de administração estava concentrado


fundamentalmente num dos cônjuges (masculino).

7. Actualmente: No regime legal vigente, em razão do princípio da igualdade entre os conjugues,


temos um regime de administração de bens completamente distinto. Esse regime vai beber à
titularidade de bens.

8. Será distinto o regime da administração em função da titularidade dos bens (daí a distinção
entre bens comuns e bens próprios).

Regime de administração de bens comuns

 1678º/2 c) e e) + número 3 + 1681º/1, 2 e 3

 Princípio geral: Princípio da administração conjunta= os cônjuges devem administrar estes bens
os dois, há aqui em princípio de concurso de vontade. Esta mesma ideia está presente no
art.1678º/3 2ª parte.

 Desvio: todos os casos em que se venha prever a administração exclusiva dos cônjuges. Como regra,
o legislador quer uma administração dialogada, em conjunto.

 Estes casos de administração conjunta estão previstos na lei e há outros que colocam dúvidas
interpretativas por não estarem previstos. Por exemplo, quando se vem dizer que cada um dos
cônjuges tem a administração dos seus bens próprios, será que em determinadas situações, por
identidade de razão, não se deve admitir também que têm a administração dos bens comuns
158

Regime de administração dos bens próprios

 1678º/1 e 2 e), f) e g) + 1681º/1, 2 e 3.

 Princípio geral: cada um dos conjugues administra os seus bens próprios (art. 1678º/1).

 Excepções/ Desvios: plasmados no art. 1678º/2 (vem legitimar-se a interferência de um dos


conjugues, que não é titular, na administração dos bens).

 Regimes especiais: vai revelar o concurso da vontade dos cônjuges, que se traduz na chamada
exigibilidade do consentimento. Significa pôr os cônjuges de acordo para a prática do ato, ou seja,
reminiscência do princípio da administração conjunta (ambos devem estar de acordo quanto à
prática daquele acto).

o Regime da alienação, oneração e arrendamento da casa de morada de família ( 1682º-A/2 e


1682º-B).

o Atos com relevância sucessória (1683º a 1685º).

o Constituição e movimentação de depósitos bancários (1680º).

 Este regime que tem de ser adequado relativamente à distinção de atos de administração e de atos
de disposição. O legislador não vai seguir os quadros clássicos. Falamos de administração,
alienação e oneração. Com base nestes 3 quadros é que temos de ver, caso a caso, se se trata de um
acto de disposição ou de um verdadeiro acto de administração.

 Acto de alienação: é tipicamente um acto de disposição

 Acto de oneração: é tipicamente um acto de administração. Em que é que se traduz um acto de


oneração? Tipicamente, na constituição de um direito real de garantia, mas também pode ser um
direito real menor.

Administração ordinária e extraordinária

 Sede normativa: Art. 1678º/3:

«Fora dos casos previstos no número anterior, cada um dos cônjuges tem legitimidade para a
prática de actos de administração ordinária relativamente aos bens comuns do casal; os restantes actos de
administração só podem ser praticados com o consentimento de ambos os cônjuges.»

Esta é uma norma que se aplica relativamente à administração de bens comuns, é para aí que
está pensada. Quanto à administração de bens comuns em que tipicamente ambos têm de administrar,
pode um deles administrar sozinho? Sim, se for um ato de administração ordinária.

 O que é um acto de administração ordinária?


159

Não é definido, mas de acordo com a tradição (Professor Manuel de Andrade) são os atos de
gestão corrente, associados a pouco risco de intervenção.

O que significa que seriam atos de administração extraordinária todos os que não fossem atos
de administração ordinária. Já dizia Manuel de Andrade que estamos a trabalhar com atos que implicam
‘’largos voos’’, decisões arriscadas.

 Antunes Varela e Pires de Lima: têm procurado definir esta distinção, com apelo ao conceito
de benfeitoria (art. 216º).

Para estes Professores…

 Atos de administração ordinária: aqueles que se traduzam na conservação dos bens (ex:
pintar a parede de casa, arranjar o muro que caiu).

 Atos de administração extraordinária: aqueles que se traduzam na realização de


benfeitorias ou de melhoramentos na coisa ou na chamada frutificação anormal (porque
os atos de administração ordinária também se destinam à frutificação normal).

 Questão: O conceito de benfeitorias está relacionado com a realização de despesas. Olhando


para definição legal, temos três modalidades: necessárias, úteis e voluptuárias. Na
terminologia de AV e PL, as necessárias seriam as que se destinam a conservar a coisa (atos
de administração ordinária).

«São benfeitorias necessárias as que têm por fim evitar a perda, destruição ou deterioração da coisa;
úteis as que, não sendo indispensáveis para a sua conservação, lhe aumentam, todavia, o valor;
voluptuárias as que, não sendo indispensáveis para a sua conservação nem lhe aumentando o valor,
servem apenas para recreio do benfeitorizante.»

Por esta razão, é difícil conseguir convocar o critério de benfeitoria para definir atos de
administração ordinária e extraordinária nos termos em que o fazem AV e PL.

Ou dizemos que são as benfeitorias úteis e tudo o resto podem ser benfeitorias das outras
categorias ou dizemos que aqui se integram os actos de conservação e os actos de benfeitorias parece
ser um contrassenso.

1679º: (Providências administrativas): «O cônjuge que não tem a administração dos bens não
está inibido de tomar providências a ela respeitantes, se o outro se encontrar, por qualquer causa,
impossibilitado de o fazer, e do retardamento das providências puderem resultar prejuízos.»

Art. 1679º: artigo muito importante porque nos permite dar um salto para outro conjunto de
situações. Na constância do casamento, se o muro cai os cônjuges sentam-se e procedem à reparação.
Ou seja, procedem à solução em conjunto. Mas em determinadas situações patológicas, em que os
cônjuges estão em desentendimento, se quiserem fazer uma providência em que necessitam do
consentimento do outro cônjuge, resultaria a impossibilidade de atuação do outro cônjuge que não seja
o cônjuge administrador ou que precise da autorização, levaria a um impasse. Mesmo noutras situações,
160

em que está a chover em casa e um dos cônjuges precisar de actuar mas o outro não atende o telemóvel,
se não pudesse fazer nada sem o consentimento do outro, levaria a situações injustas.

Por essa razão, aproveita-se o art. 1679º + 1678º/3 para, nesta cadeira, se chegar ao seguinte
conceito de atos de administração ordinária: aqueles que se traduzem na realização de benfeitorias
necessárias, mas também aqueles que se venham a figurar indispensáveis para a conservação da coisa,
requerendo uma intervenção urgente.

Portanto, ampliamos o conceito de administração ordinária também para aqueles actos que, em
situações normais, seriam actos de administração extraordinária mas que, em razão de urgência, são
actos de administração ordinária, dispensando a autorização do outro cônjuge, mas desde que seja,
objectivamente, uma intervenção imperiosa e urgente, que não se compadeça com a mora.

Nestas situações, Ana Filipa admite ampliar o conceito para tutela do cônjuge que não é
administrador sozinho, mas que precisa da autorização do outro cônjuge.

Esta ideia do art. 1679º vai beber à lógica da ideia das providências cautelar (Processo Civil). As
providências cautelares são um tipo de instrumento especial, são acessórias a uma ação e caracterizam-
se pela nota de urgência.

Ex: Tenho uma ação a correr mas se entender que, em razão do perigo da demora, possam vir a
surgir danos irreparáveis para o meu direito, posso lançar mão deste instrumento.

Ideia de necessidade numa situação de urgência imperiosa de atuação e um impedimento do


outro cônjuge, que tanto pode valer no caso em que o cônjuge está em coma, desparecido, ou ausente,
mas também quando o cônjuge não quer colaborar com o outro cônjuge intencionalmente.

Portanto:

1) Actos de administração ordinária: um dos cônjuges pode atuar sozinho.

2) Actos de administração extraordinária: têm de estar de acordo (administração conjunta).

Isto é também relevante para o regime de responsabilidade por dívidas (art. 1691º/1 c):
matéria das dívidas comunicáveis (em que ambos vão responder). Se um dos cônjugues actuar fora dos
limites legais, nunca pode responsabilizar o outro cônjuge. Com base nesta interpretação, consegue-se
dar assento de legitimidade à atuação do outro cônjuge, pode-se responsabilizar o cônjuge que não
tenha dado consentimento.
161

Consentimento

 O outro cônjuge não é convocado para a constituição e movimentação de depósitos bancários (art.
1680º). Este artigo foi alterado em 1977. Ainda que haja liberdade de movimentar, não significa que
o produto do depósito seja um bem próprio, pelo contrário, será bem comum.

 Em que casos se exige o consentimento?

o 1682º/3 a): alienação em vida de bens móveis

o Alienação de móveis comuns cuja utilização caiba aos dois (1682º/1)

o Bens afetos à fruição normal da habitação (tanto faz que aqueles bens sejam usados
por um, por ambos ou por outra pessoa da família, o que interessa é que estejam
ligados funcionalmente à casa de morada de família, onde a família está sediada;
ideia presente no 737º/3 CPC).

 Conceito de «recheio da casa» (art. 2103º c) CC) = bens comuns que para a alienação ou oneração
precisam da autorização de ambos os cônjuges.

Qual o valor jurídico negativo para a prática de atos por um dos cônjuges sem o
consentimento do outro cônjuge, quando ele era necessário?

 No regime comum, não temos nenhuma norma que indique a consequência jurídica em caso de
ilegitimidade, e no direito matrimonial também não temos uma norma especial geral (que se
aplique a todas as hipóteses). Daí a dúvida.

 Temos o art. 1687º que prevê a anulabilidade para a prática de certos atos, mas não de todos.

 1687º/4: relativamente à alienação de bens próprios, o legislador remete para a venda de bens
alheios (art. 892º e ss).

 Fundamentalmente, o que resulta é que é nula a atuação que tenha por objeto bens
próprios feita sem legitimidade. Quanto aos bens previstos nestes artigos, temos
anulabilidade.

 Problema: E o que é que acontece nos casos do 1678º/3, em que está em causa a administração
de bens comuns, mas que o legislador se esqueceu de referir no 1687º? Portanto, se forem
praticados actos de administração extraordinária, sem o consentimento do outro cônjuge, o que
acontece? Não temos solução. A doutrina tem defendido soluções distintas.

 Antunes Varela e Pires de Lima e Cristina Dias: Tese da nulidade. Nestes casos, que o
legislador não previu especialmente, aplica-se o regime da venda de bens alheios (892º
e ss), sendo o acto nulo.

 Jorge Duarte Pinheiro: Aplicação analogicamente do 1687º/1 (anulabilidade).


162

 Ana Filipa: Rejeita a tese da nulidade e a tese da anulabilidade. Estamos perante uma
norma excecional e sancionatória, pelo que não pode ser objeto de aplicação analógica e,
sendo uma norma materialmente excepcional, também não se pode ler de forma
ampliada as palavras do legislador. A Professora defende que o ato em causa, não tem
interferência na validade do acto. O acto é válido. É imposto por razões de tutela de
terceiros. Não seria correcto um cônjuge praticar um ato com terceiro e a seguir
destruir-se retroativamente (art. 289º) por ser inválido.

Ideia: não há interferência na validade, mas vai determinar consequências ao nível da


responsabilidade matrimonial. O cônjuge que não deu autorização para aquele ato vai ser titular de um
direito de crédito, exigido no momento da partilha relativamente ao cônjuge que actuou. De igual forma,
haverá lugar à responsabilidade civil nos termos comuns.

Fica a dúvida se faz sentido convocar a figura da ineficácia em sentido estrito. Por essa via, o
cônjuge que não deu a sua autorização não ficaria vinculado no geral por aquele ato, ou seja, não pode
ser convocado para efeitos de responsabilidade por dívidas. O terceiro é protegido, mas o cônjuge que
não deu o consentimento/ a sua autorização pode-se defender para impedir a comunicabilidade das
dívidas relativamente àquele ato.

O consentimento do cônjuge, de acordo com o artigo 1684º pode ser suprido, pode ser
dispensado. Este processo de suprimento é um processo de suprimento de carácter judicial e portanto
está previsto no Código de Processo Civil nos artigo 1000º e 1001 e é por essa razão um processo
moroso e que implica e custos. Por essa razão é que sempre que o cônjuge não dê o seu consentimento
como resulta do artigo 1684º e este seja legalmente exigido é que pode haver necessidade de recurso à
providência prevista no artigo 1679º.
O consentimento é necessário e no que diz respeito à modalidade tem de ser sempre especial,
isto é, que se contrapõe ao consentimento genérico, nunca se pode admitir que o cônjuge autorize de
forma indistinta qualquer ato praticado por o outro, isto seria chamado consentimento genérico. Há
aqui um consentimento especial, isto é, para cada ato que seja praticado pelo cônjuge o que resulta da
letra, 1684º nº1.
Como qualquer ato com relevância negocial, podemos ter aqui, para efeitos de declaração
negocial o consentimento tácito ou expresso. Mas é sempre um ato formal, como resulta do nº2 do
1684º, a forma do consentimento é a que seria exigida para a procuração, 262º nº2.112

1679º, é uma norma que funciona em situações patológicas, de crise, quando não seja
possível obter o consentimento necessário. Então nestes casos os pressupostos são: o cônjuge tem de
estar impossibilitado de prestar o consentimento ou de recusar o consentimento com uma causa
justificativa. Esta impossibilidade é subjetiva, respeita à própria pessoa do conjugue, e pode ser
transitória ou definitiva, mas no fundo verifica-se um facto dificilmente ultrapassado com o decurso do
tempo, e estes são pressupostos habilitantes. Aquilo que se exige ainda é que se não houver a prática do
ato requerido, possam surgir prejuízos, é a tal ideia que se inspira nas chamadas providências
cautelares que habilita a prática de atos que requeriam o sentimento consentimento mas que vai
adminitr os mesmos momentariamente sob pena de haver prejuízos para o bem.
Em que casos típicos é que se aplica o 1679? Sempre que estiverem em causa as chamadas

Artigo 116º do Código do Notariado que resolve esta questão, será por escritura pública ou as outras
112

duas modalidades previstas neste código.


163

benfeitorias necessárias.
Este artigo 1679ºdeve ser relacionado com o 1678 nº2-F: mesmo que os bens sejam do outro
cônjuge, se esse cônjuge, titular dos bens, tiver impossibilitado de praticar atos de administração, então
o outro cônjuge pode praticar atos de administração sobre eles. É uma simetria de fundamento jurídico,
nestes casos do 1678º os bens são próprios mas admite-se a intervenção de outro cônjuge. No 1679º
não se exige que o bem seja próprio, pode ser próprio ou comum, o que interessa é que se exige o
consentimento, portanto são normas distintas mas que partilham do mesmo fundamento. São normas
ainda que, na Universidade Católica nesta disciplina, se assumiu quanto ao valor jurídico negativo do
1678º nº3 que são normas ponderadas, o legislador no 1687º não esclarece qual é o valor jurídico
negativo de um ato de administração extraordinário que carecia de consentimento de outro cônjuge e
estamos neste caso a lidar com bens comuns, então a sanção aplicada podem ser:

1) Tese da Aplicação analógica do 1687º nº1 – tese perfilhada pelo Professor Jorge Duarte
Pinheiro e pela Professora Rute Teixeira Pinto. Nestes casos entende-se que aquilo que há
fazer é ler outra hipótese para além das 4 hipóteses oferecidas neste nº1 do 1678, dizer que
para além das 4 hipóteses oferecidas também 1683º

2) Professor Antunes Varela: não, não se deve aplicar a anulabilidade, pois deve aplicar-se
aquele que é o valor jurídico negativo previsto para a venda de bens alheios: artigo 892º a
904º, e a sançã será a nulidade em vez de anulabilidade.

3) Nesta universidade rejeita-se a aplicação das duas teses supra-referidas. Rejeita-se a tese
da anulabilidade por dois fundamentos essenciais:

a. Não é admitida à luz dos princípios da interpretação e aplicação das normas a


aplicação analógica de normas materialmente excepcionais como é o caso.

b. Também não é razoável defender-se, que o valor jurídico negativo para um ato de
administração extraordinária sobre bens comuns seja exactamente o mesmo que se
aplica, por exemplo, quanto à alienação ou oneração da casa de morada de família,
artigo 1687º. Implica dar uma sanção demasiado gravosa.

A tese da nulidade é rejeitada porque a nulidade não é o valor jurídico negativo regra no
direito matrimonial e portanto qualquer interferência da nulidade aqui tem de ser devidamente
justificada. Além disso a nulidade prevista no artigo 892º é uma nulidade associada à saída definitiva
de um bem da esfera jurídica de alguém, ora, nos atos de administração extraordinária o que está em
causa não é a saída do bem, mas sim muitas vezes um ato para melhorar o bem ou manter o mesmo. A
nulidade parece também não ter fundamento comparativamente à sanção para a alienação da casa de
família que é a anulabilidade.

A posição defendida por Ana Filipa é então: o ato padece de ilegitimidade, mas a ilegitimidade
deve ser sancionada com ineficácia em sentido estrito e isto significa que:

a. Os credores podem continuar a prevalecer-se daquele ato porque ele é válido.

b. Mas o cônjuge que não deu o seu consentimento pode arguir a inoponibilidade do
ato.
164

Isto tem repercussões em termos de responsabilidade patrimonial: se ele não deu


consentimento e o consentimento era requerido, ele sempre será titular de um direito de crédito a
exigir relativamente à outra pessoa do cônjuge. Consequências no campo da responsabilidade
patrimonial: 1689º nº3 do Código Civil.

Alienação de Bens Imóveis, 1682º-A e 1682º-B

Estes dois artigos são artigos que estabelecem casos particulares no que diz respeito à
administração de bens. São subtraídos ao regime simples que resultaria do 1678º, não basta qualificar
estes bens como comuns ou próprios. Pelo contrário, nestes casos o legislador achou que devia
estabelecer um regime particular e quanto à casa da morada de família esta vai ser protegida uma vez
que qualquer ato de alienação ou oneração vai estar dependente do consentimento do outro cônjuge,
independentemente do regime de bens, 1682º-A nº2.
O 1682º-B vale também para proteger a casa de morada de família, mas nestes casos não é
titulavel como bem, mas ao abrigo do direito de arrendamento, e não propriedade, exige-se aqui
também o consentimento do outro cônjuge relativamente a atos que determinem ou a cessação,
resolução, transmissão do arrendamento constituído sobre a casa de morada de família.113

Para além da casa de morada de família temos o estabelecimento comercial também


protegido normativamente no artigo 1682º-A nº1 b). Este estabelecimento comercial convoca o
conceito de universalidade de direito que está previsto na parte geral, que está previsto no artigo 206º
do código civil, é portanto uma agregação de diferentes elementos materiais e imateriais e humanos que
faz com que uma dada actividade com relevância empresarial possa ser desenvolvida. Também aqui se
exigie o consentimento de ambos os cônjuges para a alienação e oneração, porque se entende que o
estabelecimento é o substrato do rendimento pelos cônjuges.

Quanto aos demais bens imóveis que não sejam qualificados nem como casa de morada de
família nem como estabelecimento comercial, releva o artigo 1682º-A/1 a): é indiferente ser bens
próprios ou comuns, carece do consentimento de ambos os cônjuges a menos que vigore o regime
da separação bens.

Por último temos, o artigo 1685º, as disposições depois da morte, o princípio geral é o da
admissibilidade das disposições consideradas lícitas, feitas em vida mas para valerem apenas com efeito
da morte dos cônjuges, diferimento a produção de efeitos. São válidas se forem:

a) Feitas tendo por objecto bens próprios

b) Ou então a meação do património comum.

113Bem suscetível de penhora, situações mais gravosas em processo civil, quando as famílias em razão de dívidas
contraídas vêm ver-se em processos que implicam a execução da casa de morada de familia. De forma automática,
a penhora-se a casa de morada de família, o que implica que a familia fique sem casa. Só são considerados bens
impenhoráveis certos bens do recheio, mas não a própria casa 735º CRC.
165

Artigo 1683º, de forma conexa, estabelece a desnecessidade do consentimento para aceitar


doações 945º, assim como para a aceitação de heranças, 2050º a 2051º, ou legados. Esta razão de ser
é que o legislador parte do princípio que estes bens vão reverter e vão valorizar a esfera da comunhão
conjugal. Para tal não é necessário consentimento do outro cônjuge.114

1683º nº2: exige-se o consentimento para o repúdio da herança e do legado. Fundamento


material, é o contrário do supra, o legislador presume que se pode introduzir uma razão de
desvalorização patrimonial, e por isso deve ser tomada por ambos os cônjuges. Mas se casamento for
segundo o regime da separação de bens, já não é necessário convocar o consentimento do outro
cônjuge.

Última nota, a administração de bens sempre que esta seja ruinosa, sempre que o cônjuge
administrador introduza prejuízos na comunhão conjugal, é possível ao cônjuge inocente ou lesado
requerer a simples separação judicial de bens. O regime da administração de bens vai interligar-se com
a modificação da relação matrimonial, porque em situações patrológicas de administração é possível
então pedir separação de bens. Fundamento: 1767º, é um dos casos em que se pode introduzir uma
modificação da relação conjugal, é um direito potestativo de natureza modificativa. Os cônjuges
continuam casados, mas vão proceder a uma separação de bens.

Sistematização de Resolução de Hipóteses Práticas sobre o Estatuto Patrimonial

1) Titularidade de Bens – saber se os bens são próprios ou comuns. Isto implica conhecer o
regime de bens, saber se houve convenção ante nupcial.

2) Regime de Administração de Bens – assenta na distinção entre bens próprios 1678º nº1,
bens comuns 1678º nº3, mas depois há o conjunto de casos particulares, 1682º, -A, -B, que
acabámos de ver supra.

3) Responsabilidade por Dívidas – vamos ver agora.

Responsabilidade Por Dívidas

Compreendida nos artigos 1690º a 1697º do Código Civil. Este é um dos núcleos de matéria
que se costuma enquadrar no regime primário patrimomial dos cônjuges, porque é um regime
imperativo, não pode ser objeto de disposição pelas partes, e porque é um regime que se aplica
independentemente do regime de bens, é um regime unitário, claro que vai introduzir especialidades,
mas aplica-se em todos os casos, sejam os cônjuges casados em separação de bens ou comunhão.
O artigo 1690º tem uma dupla importância com base nas suas normas:

114Lembrar 2071º a responsabilidade edo herdeiro contem-se dentro do limite das forças da herança, não há a
possibilidade de se poderem executar bens do cônjuge herdeiro.
166

1) 1690º nº1: vai especificar o que já resultaria do 1671º, se os cônjuges são iguais no que diz
respeito a direitos e deveres, qualquer um deles pode contrair dívida sem consentimento
do outro, isto resultaria também do princípio da direção conjunta, e em terceiro lugar do
principio da capacidade jurídica que se entende plena, porque se eles casaram entende-se que
não sofrem de uma incapacidade que o impeça de dispor sobre si e sobre os seus bens e por essa
razão devem poder praticar os atos jurídicos em vida que são do alcance de qualquer outra
pessoa capaz.

2) 1690º nº2: Norma relevante, vai explicar qual é o momento temporal relevante para apurar a
responsabilidade por dívidas. A responsabilidade por dívidas apura-se em função do facto que
lhe deu origem, esta expressão, “facto que lhe deu origem” é intencionalmente abrangente.
Podem ser factos de natureza distinta, por exemplo a celebração de um contrato é o momento
temporalmente relevante. Se um cônjuge celebra um contrato de crédito ou consumo, esse é o
momento de constituição da da dívida. Se o cônjuge tem um acidente de viação e em resultado
disso lhe vai ser imputada uma responsabilidade, o momento relevante é o momento danoso.

Modalidade de Dívidas

As dívidas podem ser comunicáveis ou incomunicáveis. As primeiras são aquelas que


responsabilizam os dois cônjuges, as segundas são as que responsabilizam apenas um deles. Esta
distinção vai depois ser ponderada num segundo momento que é a questão de que uma vez apurada a
modalidade sabe-se quais são os bens que vão responder, dentro dos princípios do 601º, havendo um
destes casos aquilo que se faz é accionar os bens do devedor e não o próprio devedor, e portanto temos
de conjugar o 1691º com o 1695º que esclarece que bens é que são convocáveis.

As dívidas comunicáveis vêm previstas no artigo 1691º que consagra 5 casos de dívidas
comunicáveis.
A relevância da constituição do casamento e da relação matrimonial, o facto de os factos já
estarem casados, é relevada e não relevada sucessivamente no 1691º. Ela é irrelevada nas alíneas a) e
b), e já é relevada, exige que já tenha havido casamento, nas alíneas c) e d). Já alínea e) é um caso
particular que tem que ver com as dívidas que oneram doações, heranças e legados. Assim, nas alíneas
a) e b), podemos ter dívidas que responsabilizam ambos os cônjuges que podem ter sido contraídas
antes de eles terem casado. Nas c) e d) só podem ser contraídas quando estiver casados. Assim, se é dito
que alguém contraiu uma dívida antes de casar já sabemos que a dívida ou cai na a) ou na b) ou então
vai para o 1692º.
Olhando agora para os 5 casos previstos no 1691:

a) Situação típica que ocorre na vigência do casamento e mesmo antes do casamento, se


alguém vai casar, é norma que precise de organizar a vida em comum e precie de
comprar ou arrendar uma casa, electrodomésticos, etc… isto tudo na perspectiva de
organização da vida em casados. Por esta razão é que o 1691º a) responsabiliza ambos
os cônjuges porque todos os atos originadores de despesas autorizados por ambos
167

devem ser responsabilizados por ambos. É relativamente fácil nos contratos formais em
que se exige uma redução a escrito, porque aí é fácil de se provar que houve um
consentimento de ambos os cônjuges. Já nos contratos consensuais é mais difícil provar
o consentimento.

b) Situação mais complexa que a da a). Esta b) pode confluir com a alínea a), quando tal
acontece a recomendação da professora Ana Filipa é reccorer logo à a), pois é uma alínea
“certa”. A alínea b) é mais complexa porque implica precisar o conceito de “encargo
normal da vida familiar” que já conhecemos do 1676º, são as despesas que têm por
finalidade um ato que vai reverter a favor do casal ou dos filhos do casal, ou da casa de
morada de família, tudo o que respeite ao agregado familiar, despesas como o
empréstimo da casa, de luz, gás, água, telecomunicações, escola dos filhos, natação,
ginásio etc… O legislador chamam-lhe “encargos normais” porque vai implicar a
atendibilidade de um duplo critério: “encargos normais” implica que se pondere o valor
da despesa, para evitar que um casal que receba 2000 euros faça despesas mensais de
3000, isso nunca será considerado um encargo normal da vida familiar, os encargos
normais têm de ser despesas de montante adequado em função do padrão normal
daquela família. O segundo critério é o critério finalístico: só e considerado um
encargo normal da vida familiar aquele que tenha por causa uma despesa familiar, que
pode dizer respeito ao outro cônjuge, ao casal, aos filhos do casal, ou a outros membros
da família.

c) Esta alínea é a mais complicada deste artigo, porque tem diferentes elementos da
previsão normativa que requerem interpretação. O primeiro elemento é que só se
consideram despesas comunicáveis se forem contraídas na “constância do
matrimónio”, o segundo elemento é o “cônjuge administrador”, se o cônjuge
administra bens próprios é o cônjuge administrador, se administra bens comuns no
âmbito de administração ordinária também é o cônjuge administrador, agora, se está a
administrar bens comuns no âmbito da administração extraordinária sozinho,
então está fora da alínea c).115 Terceiro elemento: em “proveito comum do casal”, o
legislador não se refere à familia. Elemento indiciário de que a consideração base é a
família nuclear, constituída pelo cônjuge e os filhos. Já o agregado familiar mais amplo
dificilmente vai cair nesta aliena. Proveito comum do casal é um conceito jurídico e
não fáctico, tem vindo a ser muito discutido na jurisprudência. O que interessa é a
finalidade que foi representada no mommento que originou a despesa. O que interessa é
a representação subjectiva dada à despesa e não o resultado concreto. Exemplo: vou
investir na aquisição de um pacote de férias de família, e estou a pesar beneficiar a
minha família, é em proveito comum de todos. Se em concreto, por várias vicissitudes,
foi um horror de férias e ninguém descanso e tirou proveito, isto já não interessa, não se
põe em causa que a despesa tenha sido em proveito comum, não interessa o resultado
concreto da despesa mas sim a representação dada à mesma. Além disto tanto se
abrangem os benefícios materiais como relevam os benefícios imateriais. Terceiro:
o proveito comum não se presume, não podemos nunca admitir, de acordo com o
1691ºnº3, que há proveito comum, é preciso alegar e demonstrar factos que conduzam
à consideração daquele comportamento como em proveito comum. Só há presunção de

Daí que a concepção, mais ampla ou menos ampla, de ato de administração ordinária tenha repercussões no
115

1691º nº1 c).


168

proveito comum quando haja normal legal nesse sentido. “Nos limites dos poderes de
administração”: esta ideia resulta da necessidade de ser pelo cônjuge administrador, se
ele extravasou o autorizado por lei estamos fora do 1691 c). Certa doutrina como o
professor Guilherme Oliveira, Pereira Coelho, Jose Duarte Pinheiro que consideram que
ainda é uma actuação nos limites dos poderes de administração aquela que seja feita ao
abrigo do 1679º, Ana Filipa concorda mas há autores que discordam como é o caso de
Cristina Dias. No termos do nº2 do regime da comunhão geral de bens são ainda
comunicáveis as dívidas contraídas antes do casamento por qualquer dos cônjuges em
proveito comum do casal, a esta ideia da aliena c). 116

d) Dívidas contraídas no exercício da atividade comercial. Esta alínea requer a


conjugação e interpretação sistemática com os 13º e 15º do Código Comercial e com o
artigo 230º Código Comercial. Na alínea d), aquilo que o legislador faz é presumir o
proveito comum, há uma excepção ao que resulta do 1691º nº3, entende-se que estas
despesas revertem em proveito comum do casal, esta presunção é ilidível de acordo
com o 350º nº2. A professora Ana Filipa considera esta presunção uma inversão
probatória extraordinária, pois vai fazer com que a única coisa que o cônjuge
comerciante tenha de alegar é a alínea d) do 1691º demonstrado ser comerciante e que
realizou esta despesa na sua atividade comercial , e o cônjuge não comerciante vai ter de
provar que a despesa não foi em proveito comum, prova negativa, a posição mais
favorável é do cônjuge não comerciante. Há aqui uma vassalagem do direito civil ao
direito comercial e aos seus valores, o direito comercial é um direito por natureza célere,
que não pode estar sujeito a entraves como alegar e demonstrar o que é o proveito
comum. Se há um cônjuge comerciante, o legislador parte do princípio que todas as
despesas que realiza é em prole da atividade comercial e que reverte para a família
mediatamente. 117 118 Comerciante: artigo 13º código comercial. 13º/1: comerciantes
que são empresários em nome indivudal, que não tenham uma sociedade comercial
constituída. 13º/2: sob a forma jurídica de sociedade, as sociedades comerciais. 15º:
presunção de natureza comercial da divida. O qye ºe comerciante contrai dividas, que se
presumem contraídas no exercidio do comer´cio, e as dfividas contraídas no exercício do
comercio presumem-se contraídas em proveito comum. 230º Código comercial: é aqui
que o legislador escelrace quem são empresas comerciais, que são as sociedades
comerciais.

116 Por exemplo: antes de casado A fez despesas num jantar para anunciar à família o noivado.
117 Se estiver em causa separação de bens não se aplica este principio. Esta alías é uma das críticas que Ana Filipa
aponta ao 1714º, o legislador continua a não autorizar a modificação do regime de bens quando um dos cônjuges
que não era comerciante começa a ser comerciante.
118 Definição de comerciante: artigo 13º código comercial, são comerciantes as pessoas que tendo capacidade

de praticar atos de comércio fazem destes sua profissão, são os chamados comerciantes empresários em nome
individual, que não tenham uma sociedade comercial constituída. 13º/2: são ainda comerciantes os que atuem
sob a forma jurídica de sociedade, as sociedades comerciais. O artigo 15º vai estabelecer uma presunção de
natureza comercial da dívida, aquele que é comerciante contrai dívidas, que se presumem contraídas no exercício
do comércio, e as dívidas contraídas no exercício do comércio presumem-se contraídas em proveito comum. 230º
Código comercial: é aqui que o legislador esclarece quem são empresas comerciais, que são hoje em dia as
sociedades comerciais.
169

e) 1693º nº2: justifica-se em razão da remissão do 1691º e), dívidas que onerem doações,
heranças ou legados, em regra não são comunicáveis, mas podem ser se por força do
regime de bens adotados ingressarem no património comum, para isto é ver
concretamente o artigo 1729º que se aplica directamente à comunhão de adquiridos e
por remissão do 1734º ao regime da comunhão geral.

Há ainda o caso das dívidas que onerem bens certos e determinados, artigo 1694º. Neste caso o
legislador determina que estas dívidas que onerem bens comuns são sempre comunicáveis, quer se
tenham vendido antes ou depois da comunicação dos bens. Exemplos: casa de morada de família em
que se vão pagar impostos, e os impostos são um exemplo de despesas que oneram este bem.

As dívidas incomunicáveis estão no artigo 1692º que consagra 3 casos de dívidas


incomunicáveis:

a) São sempre da responsabilidade exclusiva de um dos cônjuges as dívidas contraídas sem o


consentimento do outro cônjuge, a contrário, aquilo que resulta do 1691º a), ressalvadas
claro as hipóteses previstas nas alíneas b) e c) do nº1 do 1691. 119

b) Neste caso faz sentido que a responsabilidade seja exclusiva de um dos cônjuges, porque
emerge de um facto jurídico muitas das vezes ilícito que deve ser imputável exclusivamente
à pessoa desse cônjuge. Uma responsabilidade criminal pode determinar pagamento de uma
pena de multa, é isto que está aqui em causa. Entram aqui também todos os atos que
impliquem restituição ao abrigo do 1689º, em regra a respobsabilidade é exclusiva nestas
hipóteses, mas o legislador mais uma vez ressalva o 1691º. Exemplo: contrato de crédito
para compra de um automóvel para a família, e no contexto desse contrato foram
incumpridas certas prestações, se por isso houver lugar a processo executivo por exemplo,
pode o cônjuge vir alegar que a dívida seja comunicável e não exclusiva.

c) 1694º nº2 e 1693º nº1, há um alargamento do caso de dividas incomunicáveis


relativamente às dívidas que onerem as doações, heranças ou legados ou as dívidas que
onerem bens próprios de um dos cônjuges, 1694º.

Bens que Respondem pela Dívidas

Se a dívida for comunicável 1695º, que estabelece um princípio de coerência, vem dizer que se
a dívida é comunicável os bens a responder são os bens comuns 1695º nº1 1ª parte. O nº1 segunda
parte, estabelece uma segunda ideia, para além dos bens comuns, subsidiariamente, em caso de
insuficiência dos bens comuns, respondem solidariamente os bens próprios de qualquer um dos
cônjuges em regime de solidariedade, 511º. Desvio a este regime de solidariedade é o número 2: não se

119Só descemos ao 1692º se não conseguirmos subsumir a despesa nas alíneas do artigo anterior. Para resolver
hipóteses práticas só vamos ao 1692º depois do 1691º.
170

aplica o regime de solidariedade, se o casal for casado em regime de separação de bens, caso em que se
aplicar o regime da conjunção e não da solidariedade 513º.

Se a responsabilidade for exclusiva de um dos cônjuges aplica-se o 1696º. Os bens que


respondem são os próprios, nº 1 1ª parte, assim como, os bens elencados no nº 2 a), b) e c). Estes
funcionam ao mesmo tempo.
No caso de insuficiência de bens próprios ou dos bens elencados nas alíneas a), b) e c) do nº2,
vai funcionar subsidiariamente a meação do património comum.

Regime das Compensações Por Dívidas

Está no 1697º. No decurso da sociedade matrimonial, particularmente no regime da comunhão


geral ou de adquiridos por vezes, há necessidade de se reconhecer um direito de crédito a favor de um
dos cônjuges relativamente ao outro, funcionando num sistema de compensações.
O 1697º tem que partir da seguinte distinção: no nº1 estão em causa as hipóteses de
responsabilidade comunicável, de ambos os cônjuges. Se tiverem respondido bens de só um dos
cônjuges, bens próprios, o outro cônjuge torna-se credor pelo montante que haja satisfeito para além
daquilo que lhe competi satisfazer, há uma relação creditícia.
Este direito de crédito é exigido, apenas em sede de partilha dos bens do casal, 2ª parte do nº1
do 1697º. Isto é assim para evitar as situações de mau estar durante a vigência da sociedade
matrimonial, ainda que se constitua o direito de crédito há então este diferimento quanto ao
momento em que este é exigível. 120. Este diferimento só não ocorre se o casamento tiver sido
celebrado em separação de bens, porque aí no fundo os bens já são sempre próprios.

Para o nº2 do 1697º, as dívidas que incomunicáveis funcionam o princípio deste artigo. Pode
constituir-se um direito de crédito quem deveria responder eram os bens próprios, mas responderam
os bens comuns, então o cônjuge passa a ser titular de um direito de crédito a favor do património
comum, pois este diminui em razão do esforço patrimonial, isto significa que aquele cônjuge que era
responsável pela dívida vai ter de retornar ao património comum um montante que teve que
excepcionalmente fazer face à dívida incomunicável. O momento da exigência deste direito é mais uma
vez feito apenas quando à partilha.

Processo Executivo

Sempre que haja um incumprimento voluntário de uma obrigação. Tenta-se fazer a execução
coerciva, feita pelo tribunal através de penhora de bens do devedor, 601º, sempre que seja casado pode
ter implicações na esfera jurídica do outro cônjuge que não era devedor
Como base nos artigos 740º, 741º, 742º e 787º CPC. Por exemplo em razão de uma dívida de

120 Partilha está no 1689º


171

um dos cônjuges é penhorado um bem comum, pode ser até a casa de morada de família, o 740º vem
determinar que o cônjuge do executado é citado, chamado ao processo, para dizer se aceita aquela
penhora ou se se opõe à penhora e requer a separação de bens, considerando que não há razão para ver
a meação dos seus bens operada.

Segunda ideia: o 741º vem prever o incidente de comunicabilidade suscitado pelo exequente,
credor, que lançou bem do processo executivo. Se o exequente apenas lançar mão sobre um dos
cônjuges, mas entender que a dívida deve responsabilizar os dois, então pode dize lo em processo e aí o
cônjuge “inocente” executado é tutelado pois pode pedir a separação de bens.

742º, o cônjuge que está a ser executado vem na própria ação alegar e demonstrar que não deve
ser apenas ele o executado, ele próprio vem chamar o cônjuge para a execução, dizendo que a divida é
comunicável, alegando o proveito comum. O cônjuge é citado para vir declarar o que entende em
matéria de ação.

787º: o cônjuge do executado pode nos termos gerais vir opor-se à penhora, que é a
possibilidade de apresentar uma contestação daquela ação executiva, vem alegar meios de defesa que
justifiquem que aquela penhora seja considerada improcedente.

O processo civil é sensível à circunstâncias de os cônjuges estarem casados um com o outro e


por essa razão terem interferências no regime de bens. O cônjuge executado tem sempre legitimidade
no processo para vir a dar meios de prova, ou declarar que aquela divida incomunciavel não o é ou
separação de bens.

Jurisprudência

STJ 10/01/80: encargos da vida familiar, falando ainda do governo domestico.

STJ 12/01/06: despesa contraída com base em proveito comum, que é uma matéria de direito
que implica a apresentação de factos que o possam provar como tal.

STJ 10/12/15: proveito comum pode ter na sua base um beneficio material pi imaterial e
qualifica-se como insuficiente. Entendeu-se que não era comunicável, por não ser suficiente para
qualificar a divida como proveito comum.

TRL 18/07/09: proveito comum.

TRL 28/11/11: aquisição de um veículo com base num empréstimo. Diz que não interessa estar
a discutir o proveito comum porque 1691º a), ambos outorgaram o contrato.

12/03/15 STJ: aplicação do 1698º.

STJ 24/02/15: aplica o 1697º regime de compensações entre os cônjuges.


172

A modificação da relação jurídica matrimonial civil

Vamos falar da modificação de relação jurídica matrimonial, e em seguida da extinção da relação


jurídica matrimonial.

Modificar significa introduzir alterações no conteúdo da relação jurídica matrimonial, que se


mantém no sentido de não ser extinta, de não cessar.

Pelo contrário, as chamadas causas de extinção vão implicar o termo do matrimónio. Vamos
partir deste cenário com consequências distintas, mas que em rigor partilha de um pressuposto comum.
Quer em cenários de modificação de casamento, quer em cenários de extinção do casamento, estamos
perante fenómenos patológicos na vida matrimonial, ou seja, a ideia de crise que se pode fundamentar
em razões puramente matrimonias, e nesses casos vamos estudar a simples separação judicial de bens,
ou pode mesmo nos casos mais gravosos afetar não apenas o estatuto matrimonial, mas também o
estatuto só dos cônjuges, e nesses casos, vamos só referir a separação judicial de pessoas e bens, ou
então já o divórcio.

A modificação da relação jurídica matrimonial é objeto de diferentes normas do CC: consta dos
arts. 1767º a 1772º para a chamada simples separação judicial de bens. Devemos fazer uma remissão
destes artigos para os arts. 1794º a 1795º-D, separação judicial de pessoas e bens, ou seja, é tratada
depois do divórcio. E para além disto, temos normas do CRC: arts. 271º a 274º. E temos ainda normas
do CPC: arts. 994º a 999º.

Isto significa que há um facto que determina uma mutação do conteúdo da relação jurídica
matrimonial. Este facto pode determinar dois grandes tipos de modificação da relação jurídico-
matrimonial:

1) Simples separação de bens

2) Separação judicial de pessoas e bens – casos mais graves.

Esta matéria justifica-se que seja estudada a propósito do art. 1688º121. É aqui que se explica
quais é que são as fontes de cessação das relações jurídicas matrimonias ou das relações jurídicas
pessoais. Dai que tenhamos de convocar o artigo a propósito da modificação da relação jurídica
matrimonial. Na simples separação judicial de bens a cessação que ocorre é ao nível das relações
matrimoniais, mas ela não é referida no art. 1688º, portanto ela tem que ser adicionada ao elenco das
causas de cessação da relação jurídica matrimonial, que são tipologicamente previstas.

O que é que se prevê?

1) Dissolução do casamento: o casamento pode dissolver-se por morte ou por divórcio

2) Declaração de nulidade ou anulação: de grosso modo, os casos de invalidade

121É uma norma que já foi antecipada, por exemplo, na matéria do crédito por contribuição desequilibrada com os
encargos da vida familiar em sede de partilha.
173

3) Sem prejuízo de haver separação judicial de pessoas e de bens, é aplicável o art.


1795º-A.

Portanto a este art.1688º vamos adicionar o art. 1770º e depois o art.1795º-A. No fundo,
também as causas de modificação determinam uma cessação de relações jurídicas matrimoniais e
pessoais ou apenas relações jurídicas matrimonias.

Simples separação de bens

É uma matéria que está fortemente relacionada com o ponto que estudámos, a chamada
administração de bens122, na medida em que o fundamento para a simples separação judicial de bens,
nos termos do art. 1767º, é precisamente de que qualquer dos cônjuges pode requerer a simples
separação judicial de bens quando estiver em perigo o que é seu, pela má administração do outro
cônjuge. Portanto a simples separação judicial de bens está implicitamente relacionada com o fenómeno
da administração ruinosa. A administração ruinosa tem que enfrentar aquilo que é do cônjuge que se
sente prejudicado. E o que é que é do cônjuge que se sente prejudicado? Podemos ter duas realidades
em termos teóricos:

1) Por um lado, os seus bens próprios. O art. 1678º/2 é uma norma que determina o
alargamento da administração de bens quanto a bens que podem ser do outro cônjuge, em
determinadas situações. Estes são casos que podem dar origem a um fenómeno de
administração ruinosa.

2) Mas em todos os fenómenos em que exista comunhão conjugal o que é que pode estar
afetado? A mediação dos bens comuns (art. 1730º): princípio da mediação.

São estas duas as realidades que podem estar a ser afetados por um ato de administração
ruinosa. Contudo o art.1772º ressalva a possibilidade existirem outros fundamentos previstos na lei
que sejam habilitantes da simples separação de bens. Qual é que é um desses fundamentos? O CPC
prevê a possibilidade de o cônjuge do executado poder requerer a simples separação de bens, arts. 740º
e ss – este será um dos fundamentos normativos, que entra no art. 1772º, em que se admite também a
divisão de bens e a partilha imediata para proteger o outro lado.

Traços essenciais para percebermos o regime: a separação judicial de bens, o nome já


denuncia, implica uma ação que é tramitada no tribunal, daí o termo judicial. Esta ação que é tramitada
em tribunal vem esclarecida no art. 1768º, “caráter litigioso da separação”.

Portanto quem é que tem legitimidade ativa? Resulta do art. 1769º. O cônjuge que se sinta
lesado pela má administração praticada pelo outro cônjuge. A tramitação de processo comum, ainda
não demos.

122 Fazer uma remissão para os arts. 1678º e 1687º.


174

Efeitos jurídicos: os efeitos jurídicos da separação de bens não se projetam no estatuto pessoal,
portanto os cônjuges continuam vinculados aos mesmos deveres conjugais, continuam a observar o
princípio da igualdade, o princípio da direção conjunta da família, mas existe uma alteração em sede
patrimonial. O que se sucede nesta alteração? O eventual regime de bens que vigorava vai-se
transportar no regime de separação de bens. Portanto este é um dos casos em que por admissibilidade
legal se admite uma modificação de regime de bens, na vigência da sociedade matrimonial, através
desta ação que é decidida pelo tribunal.

Ao existir uma separação de bens aquilo que se exige é que haja uma partilha imediata do
eventual património comum. Esta partilha vai seguir os termos previstos no art. 1689º.

Para além de haver esta grande diferença, ou seja, o regime de bens passa a ser o regime de
separação, termina qualquer possibilidade de interferência na administração dos bens do outro
cônjuge, portanto o regime de administração passa a ser também o regime que vigora em sede de
separação de bens. Cada um dos cônjuges administra os seus bens, portanto não existe possibilidade de
interferência.

Ao abrigo do art. 1771º, a separação judicial de bens é irrevogável, o que significa que não é um
estado transitório. Não se pode lançar mão deste instrumento e dizer que se arrependeram e querem
voltar à situação originária – isto não é possível para evitar fraude a credores, fraude à lei, e fraude às
normas de ordem pública, que descrevem o princípio da imputabilidade do regime de bens.

Separação judicial de pessoas e bens

Segunda modalidade de modificação jurídica matrimonial. Costuma dizer-se que esta figura é a
antecâmara do divórcio, é uma expressão da escola de Coimbra, o prof. Guilherme de Oliveira e o prof.
Pereira Coelho, e que já indicia que quem recorre a este instrumento está numa fase de crise
acentuada da relação matrimonial. E este é precisamente um instrumento com este figurino. Em vez
de os cônjuges lançarem mão imediatamente a ação de divórcio, em temos intermédios optam pela
separação judicial de pessoas e bens. O que é que isto significa? Significa que vai haver alterações do
estatuto pessoal, concretamente dos deveres conjugais, e que deixa de haver património conjugal,
também existe uma separação de bens. Mas nesta fase é possível o arrependimento, e é preciso a
reversibilidade desta ação intentada.

Esta antecâmara do divórcio está prevista normativamente nos arts. 1794º e 1795º-D, que
remetem em grande medida para o regime do divórcio que está previsto dos arts. 1773º a 1793º. Em
que é que se traduz esta interferência do regime de divórcio?

Fundamento: quem é que pode requerer a separação judicial de pessoas e bens? E com que
fundamentos? São dois os fundamentos:

 Mútuo acordo: os dois cônjuges sentam-se e decidem que aquela é a via pela qual vão
optar.
175

 Nas situações de crise acentuada existe uma separação judicial de pessoas e bens sem
consentimento do outro cônjuge.

Isto significa então que as duas modalidades de separação judicial de pessoas e bens são as
mesmas duas modalidades que vamos estudar em sede de divórcio: mútuo acordo e o sem
consentimento.

Significa também que a separação decretada por mútuo acordo é uma separação que é
tramitada administrativamente, ou seja, sem necessidade de interferência do tribunal. É decidida e
tramitada nas conservatórias do registo civil. Processo simplificado, sem complexidade e está regulado
nos arts. 271º a 274º CRC + 931º a 938º CPC.

No caso de ser uma separação judicial decretada sem o consentimento do outro cônjuge então
este já tem um carácter necessariamente judicial, o que imprime a ideia de litígio subjacente a este
mecanismo. Esta separação judicial de pessoas e bens litigiosa está então regulada nos arts. 931º a 982º
CPC.

As modalidades que falámos levam a eliminar os fundamentos. Ou seja, tanto pode requerer
separação judicial os cônjuges que decidam por simples ato da vontade, ou então aqueles que entendam
haver um fundamento, alicerçado com base no art. 1781º. A norma do art. 1781º é também uma norma
central para que se possa requerer a separação judicial de pessoais e bens sem o consentimento do
outro cônjuge – todos esses fundamentos vão valer também nesta cédula.

A separação judicial de pessoas e de bens tanto colhe relativamente ao casamento civil como
relativamente ao casamento católico, ainda que no casamento católico esta matéria esteja
especialmente prevista nos cânones 1692 a 1696, “das causas de separação dos cônjuge”.

Efeitos. Quais são as consequências desta modificação jurídica da relação matrimonial?

1) Não se dissolve o vínculo, senão era uma causa extintiva. Mas no campo pessoal,
ocorre uma extinção de dois deveres conjugais, dois deveres que são conjugados,
que caem e perdem a sua eficácia.

 Dever de coabitação: se os cônjuges se separação de pessoas, significam


que deixam de ter uma plena comunhão de vida, no sentido em que já
não vou fazer refeições juntos, habitar na mesma casa e não vão dormir
juntos.

 Dever de assistência (1675º): é um dever bicéfalo, ou seja, abrange o


dever de prestar alimentos e o dever de contribuir para os encargos
normais da vida familiar. A modalidade do dever de assistência que é
posta em causa é o dever de contribuir para os encargos normais da vida
familiar, ou seja, art. 1676º. Isto porque? Porque pode haver obrigação
de alimentos relativamente a cônjuges que estejam separados
judicialmente de pessoas e bens. Esta possibilidade está normativamente
176

prevista no art. 2016º. É possível haver prestação de alimentos mesmo


em sede de separação judicial de pessoas e bens.

Isto dito, significa que os demais deveres conjugais se mantém inalterados, entre os quais, dever
de respeito, dever de fidelidade, dever de cooperação. Todos estes deveres têm e continuar a ser
respeitados, visto que o casamento não terminou.

2) Havendo separação judicial de pessoas e de bens é possível continuar a usar os


apelidos que foram “adotados” com o casamento. Esta é uma das possibilidades que
vem previsto no art. 1677º-B/1, ainda que se admita a possibilidade de ser intentada
uma ação para privação de direito de uso dos apelidos, art. 1677º-C.

Paradigma é o seguinte: se nada for feito, nada é alterado em termos dos nomes. Mas se o
cônjuge recorrer a esta conduta do art. 1677º-C, ai já poderá vir a ser alterado.

3) No campo patrimonial, existe uma equiparação à dissolução do casamento. Não


existe verdadeira dissolução, mas existe uma equiparação. Esta determina o que?

 Que se realize a partilha, art. 1689º

 Deixa de vigorar a proibição da celebração de compra e venda ou de contrato


de sociedade prevista do art. 1714º/2. Ou seja, aquela proibição que
estudámos, havendo separação judicial de pessoas e bens, deixa de ser
conservada.

4) Ao contrário da simples separação judicial de bens, não implica necessariamente o


recurso a uma ação judicial. Isso só acontece no caso de ela ter lugar sem
consentimento do outro cônjuge, caso contrário será tramitada.

5) Por último, o art. 1795º-D é uma norma que vem já prever a possibilidade de se
converter a separação judicial de pessoas bens em divórcio. Esta conversão segue a
tramitação prevista no art. 993º CPC. Esta é a ideia clara da antecâmara: se
efetivamente não há expectativa de conciliação, em vez de se lançar mão de uma
ação de divórcio, aproveita-se tudo aquilo que já ocorreu em sede de separação
judicial de pessoas e bens, para converter o figurino daquela ação, numa verdadeira
e qualquer ação de divórcio, com os mesmos efeitos e com extinção de todos os
deveres conjugais.

A separação judicial de pessoas e bens, nos ermos do art. 1795º-B pode determinar duas
eventualidades:

1) Reconciliação: cônjuges afinal conciliam-se. É possível que durante a separação judicial


se apaixonem de novo, e nessa eventualidade desistem da ação e o casamento mantém-
se sem qualquer das alterações que tinha sido introduzida.

2) Dissolução: manifestada a intenção de divórcio por parte dos cônjuges.


177

Separação de facto

Esta matéria de modificação não fica completa sem se fazer um apontamento a uma figura que
se chama separação de facto.

A separação de facto é uma figura sem autonomia no plano da modificação da relação jurídica
matrimonial, até porque já vimos as duas causas de modificação, mas é uma figura que tem
interferência em três planos na relação matrimonial. Em sede de deveres e direitos conjugais: quando
falámos do dever de assistência, mais concretamente, os deveres de contribuir para os encargos da vida
familiar (art. 1676º), vimos que este dever se mantém mesmo no caso de haver separação de facto dos
cônjuges. Essa separação de facto não tem nada haver com a separação judicial de pessoas e bens nem
com a separação judicial de bens – é uma figura à parte.

Então o que é que significa a separação de facto? A separação de facto é definida pelo legislador no
art. 1782º,123 o conceito não é para ser inventado, ele está estabelecido. Separação de facto: quando não
existe comunhão de vida entre os cônjuges e há por parte de ambos ou de um deles o propósito de não a
estabelecer. Este conceito de separação de facto baseia-se em dois elementos:

1) Elemento objetivo: inexistência de comunhão de vida entre os cônjuges. Não existe


comunhão de mesa, leito nem teto.

2) Elemento subjetivo: não basta o elemento objetivo. É necessário que haja a intenção,
propósito de não restabelecer a comunhão de vida. É a tal ideia de irreversibilidade.

O conceito de separação de facto tem de ser distinguido das generalidades de modificações da


relação jurídica matrimonial, ainda que ela possa, em si mesmo, ser um fundamento jurídico para a
separação judicial de pessoas e bens. Vimos que na separação judicial de pessoas e bens sem
consentimento os fundamentos são os mesmos admitidos para o chamado divórcio sem consentimento
e se consultarmos o art. 1781º, vemos que numa das alíneas se dá relevância à separação de facto, art.
1781º, a). Portanto este conceito, que um conceito é juridicamente relevante, vai ter implicações em
sede de deveres conjugais: o dever de contribuir para os encargos da vida familiar mantém-se em
princípio, a menos que a separação de facto seja censurável.

Segundo é um fundamento jurídico para a separação judicial de pessoas e bens, art. 1781º, a), e
é um fundamento jurídico para o divórcio, art. 1781º, a).

123 Fazer remissão do art. 1676º para o art. 1782º.


178

Extinção da relação jurídica matrimonial civil

Vamos avançar para a rutura de casamento. Causas de extinção da relação jurídica matrimonial.
A rutura pode alicerçar-se em 3 situações típicas:

1) Morte

2) Divórcio

3) Invalidade do casamento

Morte

A morte seja de um ou de ambos os cônjuges – ex: acidente de viação. A morte alicerça-se num
facto jurídico natural ou um facto jurídico em sentido estrito, um resultado. E que morte é esta? O
Direito da Família não introduz especialidades, o conceito de morte juridicamente relevante é o
conceito de morte que está no art. 68º.
Como é que nós conseguimos determinar que houve morte juridicamente relevante? Quando existe uma
irreversibilidade do tronco cerebral, significa que é a chamada morte cerebral – essa é a relevante.
Existe depois legislação especial. No nosso Direito da Família não vai haver especialidades.

Com a morte o que é que sucede em termos de estatuto pessoal? A pessoa que era casada sofre
uma mudança no seu estado civil, passa de casada a viúvo.

Para além do mais, existe também possibilidade de se introduzirem alterações em sede de


direito ao nome. Ocorrendo a morte de um dos cônjuges o art. 1677º-A consagra um princípio da
manutenção em benefício da utilização dos apelidos do cônjuge falecido. Mas existe a possibilidade ao
abrigo do art. 1677º-C ser lançada mão da ação judicial para privação do direito ao nome. Nestes casos
o cônjuge faleceu, portanto não vai ser ele a lançar mão da ação, mas sim os ascendentes e descendentes
ou os seus irmãos, art. 1677º-C/2, 2ªparte.

Os efeitos da morte mudam o estado civil, os apelidos podem continuar a ser utilizados, com a
ressalva do regime do art. 1677º. E ainda a há um outro conjunto de efeitos.

Por ocasião da morte de um dos cônjuges transmite-se o direito ao arrendamento – faculdade


garantida pelo art. 1106º/1, a).

Para além deste efeito existem direitos sucessórios: por ocasião da morte de um dos cônjuges
vai-se abrir pelo menos a sucessão legitimária, ou possivelmente também a sucessão legítima – cônjuge
chamado dentro da classe dos herdeiros.

Outro dos efeitos: art. 2018º, que trata do chamado apanágio do cônjuge sobrevivo. Esta figura
mais não significa do que um direito a alimentos: é um direito a alimento, mas que se chama assim
porque? Porque a pessoa que seria o devedor de alimentos morreu. Portanto quem é que vai ser o
devedor? A herança. É uma obrigação de alimentos que se vai constituir no limite das forças da herança
e de que é credor o cônjuge sobrevivo.
179

Ultimo dos efeitos: art. 1585º, ou seja, afinidade. A afinidade cessa ou não cessa com a morte?
Não cessa. A afinidade não cessa com a morte do outro cônjuge.

Todas estas normas que estamos aqui a citar, são normas relativas aos efeitos do casamento
jurídico que se dissolve por efeito da morte.

Depois há uma norma que também deve ser ponderada que é o art. 1619º/1. Esta é uma norma
que em sede de efeitos patrimoniais vem reconhecer uma faculdade, que é a seguinte: se morrer um dos
cônjuges o outro cônjuge sobrevivo pode requerer a partilha no caso de haver descendentes, de acordo
com o regime da comunhão geral de bens. Portanto vem se prever aqui uma faculdade que é a
possibilidade de ser requerida esta partilha segundo o regime da comunhão geral de bens. É claro que
nesta faculdade, precisamente porque não é um dos efeitos específicos da dissolução do casamento por
morte, implica uma convenção prévia nesse sentido, para que não se pudesse inventar a vontade do
cônjuge que já não está vivo e que não se pode defender, requer-se que tenha havida uma convenção
que autorize a possibilidade de se lançar mão deste regime da partilha segundo a comunhão geral de
bens..

O cônjuge sobrevivo não tem direito a uma espécie de pensão por morte/sobrevivência? Ao
abrigo das leis da segurança social, ou consoante o local de trabalho do cônjuge falecido, existe a
transmissão da pensão por efeitos da morte, tem direito a uma pensão por morte.

Invalidade do casamento

O casamento vai terminar tendo por base um evento originário ou contemporâneo de


celebração do casamento. O casamento nasce desde o momento inicial, viciado, e portanto todos os
efeitos que supostamente se produziriam vão ser terminados, sem prejuízo do regime em sede de
casamento putativo, art. 1647º e 1648º.

Havendo invalidade do casamento o estado civil da pessoa passa a ser solteiro – diferença
relativamente à morte. Havendo invalidade do casamento podem ainda assim haver lugar a obrigação
de alimentos, prevista no art. 2017º – é mais um dos exemplos de efeitos relativamente ao cônjuge que
esteja de boa-fé, se pode manter a titularidade de direito a alimentos pelo cônjuge de boa-fé124.

Divórcio

Alicerça-se num facto jurídico voluntário, o que significa que quem se divorcia exerce um
direito. Qual é a natureza jurídica desse direito? Direito potestativo, isto é, é um direito subjetivo que
tem a natureza de direito potestativo. Porque? Porque introduz uma alteração, a extinção de forma
unilateral na esfera jurídica da outra parte.
Divórcio é uma das causas extintivas na relação jurídica matrimonial. Em termos históricos nem sempre

124 Fazer remissão do plano da invalidade de casamento para art. 2017º.


180

se reconheceu o divórcio. Particularmente numa sociedade portuguesa, puramente católica, durante


uma determinada fase veio-se admitir apenas o divórcio relativamente aos casamentos civis,
suprimindo-se a faculdade de requerer divórcio quanto aos casamentos direitos católicos. Isto sucedeu-
se assim na vigência da chamada Concordata de 1940. Mas este paradigma mudou com a entrada em
vigor da CRP, que em 1976 proclamou o art. 36º/2: o direito ao divórcio existe para todos os
casamentos, independentemente da sua forma de celebração. O que significa que a partir de 1976
esclareceu-se que também os casamentos celebrados de forma religiosa, entre os quais o casamento
católico, podiam ser dissolvidos por divórcio. E afirmou-se mais: quem tem que regular os requisitos e
os efeitos do divórcio é a lei civil – é esta que tem a competência na matéria.

Na Concordata de 2004, em vigor, recordar o art.15º que vem determinar o seguinte:


“Celebrando o casamento canónico, os cônjuges assumem por esse mesmo facto, perante a Igreja, a
obrigação de se aterem às normas canónicas que o regulam e, em particular, de respeitarem as suas
propriedades essenciais.” Se tivéssemos apenas este art. 15º/1, daqui já resultaria, que com base na
leitura dos cânones do Código do Direito Canónico, entre os quais, o cânone 1055 e 1056, o casamento é
um vínculo tendencialmente perpétuo, e portanto, indissolúvel por vontade dos próprios.

O 15º/2 da Concordata: “A Santa Sé, reafirmando a doutrina da Igreja Católica sobre a


indissolubilidade do vínculo matrimonial, recorda aos cônjuges que contraírem o matrimónios canónico o
grave dever que lhes incumbe de se não valerem da faculdade civil de requerer o divórcio.” Como é que
isto se coaduna com o art.36º/2? Não existe aqui nenhum problema de inconstitucionalidade. Aquilo
que resulta deste art. 15º/2 é um reconhecimento de uma obrigação moral por parte dos cônjuges que
contraem o casamento católico de não se divorciarem, mas não há uma obrigação jurídica, porque essa
obrigação jurídica é contrária ao princípio constitucional do art. 36º/2.

O divórcio, em Portugal, sofreu uma grande mutação no seu regime jurídico em 2008. Até então
vivíamos numa conceção de divórcio que a doutrina e a jurisprudência apelidou de divórcio sanção. O
divórcio sanção estava arreigado a uma ideia de violação culposa dos deveres conjugais, portanto no
fundo só era possível lançar mão do divórcio, que se chamava então litigioso125, se tivesse ocorrido uma
violação dos deveres conjugais e essa violação tinha que ser imputável, ou seja, tinha de ser censurável,
culposa.

Este paradigma foi afastado em 2008, e avançou-se para, hoje em dia, a chamada consagração
do divórcio rutura. O divórcio rutura ou o divórcio de constatação da rutura da vida conjugal,
prescindiu da referência dicotómica de cônjuge inocente e cônjuge culpado. A culpa deixa de relevar
com título habilitante para o divórcio. Isto não significa contudo que a culpa seja irrelevante, porque é
desde logo relevada para que? Em sede de responsabilidade civil: a pessoa pode e precisa de alegar e
demonstrar a suposta culpa, se efetivamente quiser pedir uma indemnização ao cônjuge. Mas para
efeitos de direito ao divórcio o legislador, hoje em dia, não quer saber se um dos cônjuges contribuiu
com mais ou menos, com culpa ou sem culpa, para a rutura da vida conjugal. Portanto partimos, hoje em
dia, para um paradigma de divórcio rutura ancorado em factos objetivamente comprovados. Esses
factos são os que estão elencados no art. 1781º e designadamente, sendo daqui que resulta o nome de
divórcio contestação de rutura, do art. 1781º, d), quando se vem admitir que o divórcio possa ser
requerido com base em “Quaisquer outros factos que, independentemente da culpa dos cônjuges, mostrem
a rutura definitiva do casamento”.

125 Que é o hoje o divórcio sem consentimento do outro cônjuge.


181

Mostrem a rutura definitiva do casamento: ideia de impossibilidade, ideia de inexigibilidade de


manutenção do vínculo se um dos cônjuges não quer manter o casamento. Portanto é uma conceção
puramente objetivada do divórcio. É claro que esta conceção e a mudança de paradigma se foi aplaudida
por algum setor da doutrina, precisamente pela eliminação daquele juízo persecutório do cônjuge
culpado, tem também vindo a ser criticada por outro setor da doutrina que entende que com esta
alteração de regime descredibilizou-se a instituição do casamento, porque aquela propriedade essencial
do casamento como sendo uma comunhão plena de vida, estável e portanto sem um termo pré-
estabelecido, acaba por entrar em falência se um dos cônjuges pode, em qualquer momento, determinar
que quer por termo ao casamento – têm por isso havido críticas não só na doutrina, mas também na
jurisprudência.

Modalidades de divórcio

1) Divórcio por mútuo consentimento: é o chamado divórcio administrativo, portanto é


instaurado na conservatória do registo civil e o processo é o consagrado no arts. 271º a 274º
CRC. Este divórcio por mútuo consentimento vem previsto em termos gerais no art. 1773º e
depois no art. 1775º/1, 1ª parte.

Este art.1775º foi alterado pela Lei nº 3/2017, de 3 de Março, o que significa que todos aqueles
que tenham um CC anterior a essa data têm que o atualizar – essa Lei nº 8/2017, de 3 de Março, é a lei
que vem consagrar o chamado estatuto jurídico dos animais, e portanto alterou o CC, CPC e alterou o CP.
O art. 1775º foi alterado uma vez que passou a prever uma alínea f), que no CC anterior não aparece.

Este divórcio pode ser requerido independentemente do motivo. O nome diz tudo: se os
cônjuges estão de acordo quanto a porem termo à relação judicia matrimonial, não precisam de
esclarecer nem justificar a razão que os levou a tomar aquela decisão – é absolutamente indiferente. É o
princípio do respeito pela vontade dos cônjuges, que é o mesmo princípio do art. 406º: se os cônjuges
celebram contrato eles devem por comum acordo poderem destratar-se, ou seja, pôr termo ao
casamento.

O que é que se exige? Para este divórcio por mútuo consentimento seja homologado pelo
tribunal é necessário que haja 4 acordos essenciais entre os cônjuges. Estes acordos resultam do
art. 1775º:

 Havendo filhos menores os cônjuges tem de estar de acordo relativamente aos


exercícios das responsabilidades parentais, concretamente, decidirem o regime de
guarda e de direitos de representação.

 Estar de acordo relativamente à obrigação de alimentos: a obrigação de alimentos pode


ser decretada ao abrigo do art. 2016º. Tem que ser convencionalmente estipulada
também por este acordo.

 Casa de morada de família, isto é, sobre o seu o destino, concretamente decidir se a vão
vender e se vão dividir o produto da venda; se um dos cônjuges vai ficar a viver em casa;
ou se a vão arrendar. Decidir o destino da casa de morada de família.
182

 Destino dos animais de companhia: introdução da Lei nº 8/2017, de 3 Março. Não é


possível existir um divórcio de mútuo consentimento se não existir este último acordo,
por exemplo. Prof. AF critica este ultimo acordo até há exaustão, mas necessariamente
tem de existir este acordo.

Neste divórcio de mútuo acordo não é necessário advogado, o que significa que se eles se
entenderem e tiverem um diálogo só precisam de preencher os formulários que estão disponíveis na
conservatória, e depois o que se exige é um ato de homologação. É este ato homologação que lhe vai dar
eficácia, que vai dar força jurídica a todos aqueles acordos parcelados. Este ato de homologação pode
ser feito quer pelo próprio conservador do registo civil ou pelo tribunal. O tribunal tem sempre
possibilidade de homologar estes acordos, mas não é necessário.

Este divórcio por mútuo consentimento pode ser requerido a todo o tempo. Esta foi outra das
críticas ao regime, dizendo-se que no fundo com esta mudança de paradigma é possível casar-se hoje,
dia 8 de Maio, e amanhã divorciar-se – não há um período em que se tenha de estar casado, um mínimo,
por essa via diz-se que isto pode ser aliciante para aqueles casamentos ditos patológicos, seja
dissimulado, seja fraude à lei, seja contrário à lei, por essa via de permitir casar e descasar.

2) Divórcio independentemente do consentimento do outro cônjuge126: este é o mais complexo,


porque não há diálogo, não há acordo e o divórcio não pode ser tramitado
administrativamente. O divórcio sem consentimento vem previsto normativamente no art.
1773º e depois aplica-se os arts. 1779º a 1785º e ainda os arts. 971º e 972º CPC.

Este é um divórcio tramitado em tribunal e em que é necessário a intervenção de advogados – é


um dos casos de patrocínio judicial obrigatório. Exige-se necessariamente um acompanhamento por
advogado.

Em que é que se caracteriza este processo? Antes de mais qualquer juiz tem de começar por
tentar promover conciliação dos cônjuges, é o que se chama tentativa de reconciliação – ato que, mesmo
em processo civil comum também existe esta fase no processo, a ideia de por as partes em acordo e
desistirem do processo. Só quando a tentativa de reconciliação é frustrada é que se avança no processo
civil. Esta tentativa de reconciliação é expressamente enunciada no art. 1779º/1 e no art. 981º CPC.

Para além da tentativa de reconciliação se se frustrar, o juiz vai ainda ter de promover uma
segunda coisa: tentar que os cônjuges, que não se querem reconciliar e se querem divorciar, então que
se divorciem por mútuo acordo. Vai tentar que eles cheguem a acordo naqueles acordos parcelares,
para que se possa tramitar administrativamente o divórcio. E por essa via o tribunal vai tentar que eles
cheguem a acordo quantos as responsabilidades parentais, quanto à casa de morada de família, quanto
à obrigação de alimentos e quanto ao animal de companhia. Só se esta via também ficar frustrada é que
o processo então vai tramitar judicialmente.

Quem é que tem legitimidade ativa? Qualquer dos cônjuges: 1785º, principio da igualdade, o que
significa que qualquer um deles pode lançar mão de um dos fundamentos elencados no art. 1781º. Não
esquecer que o art. 1781º é composto por 3 alíneas particulares, e uma alínea residual, que é a alínea b)
– esta alínea residual é uma alínea que ganha corpo, designadamente, quando ocorra violação dos
deveres conjugais, mas não é apenas nesses casos. Ou seja, não é uma alínea que esteja pensada para

126Antigo divórcio litigioso – hoje em dia não é referido no texto da lei, ainda que continue a ser referido em
alguma jurisprudência.
183

repristinar o regime anterior – violação culposa de deveres conjugais. Mas designadamente se houver
violação de deveres conjugais ela entra nesta alínea.

Portanto qualquer um dos cônjuges pode lançar mão do divórcio e só alguns cônjuges é que se
podem divorciar com o fundamento previsto na alínea b) e na alínea c).

Art. 1781º, b), um dos fundamentos para o divórcio é: “A alteração das faculdades mentais do
outro cônjuge, quando dure há mais de um ano e, pela sua gravidade, comprometa a possibilidade de vida
em comum”, isto é, quando acontecem distúrbios de personalidade. Esses distúrbios podem ser de tal
forma significativos que o outro cônjuge não queria continuar a relação jurídica matrimonial. Então
naturalmente nestes casos o único cônjuge que tem legitimidade é o cônjuge que se sente afetado pela
alteração das faculdades mentais – há uma restrição no que diz respeito à legitimidade ativa.

Relativamente à alínea c): se há uma situação de ausência, só o cônjuge que não está ausente é
que lançar mão da faculdade de se divorciar com base nesta alínea.

O art. 1781º é um artigo que elenca exemplificativamente causas e fundamentos objetivos de


divórcio e que tem de ser sempre utilizado pelos cônjuges. Se houver divórcio sem consentimento é
necessário que haja uma causa de pedir. A causa de pedir é o fundamento do divórcio.

Art. 1781º:

 Art. 1781º, a): “a separação de facto por um ano consecutivo”: esta separação de facto é definida
no art. 1782º, com base num elemento objetivo e outro subjetivo, e aqui exige-se também um
elemento temporal, porque não basta uma separação de facto, é necessário que ela ocorra por
um ano consecutivo. Ou seja, para que esta norma possa ser aplicada não pode ter havido
interrupções neste período da separação de facto. Consecutivo significa sem interrupção.
Portanto se há um cônjuge que se desloca em trabalho para Moçambique e lá fica durante 3
anos, mas ao longo desse período vem regressando a casa, isso não releva para a separação de
facto como ano consecutivo. É preciso contar sem qualquer interrupção.

 Art. 1781º, b): “alteração das faculdades mentais do outro cônjuge, quando dure há mais de um
ano e, pela sua gravidade, comprometa a possibilidade de vida em comum”. Este é um
fundamento que se socorre, verdadeiramente, de 3 elementos:

a) Elemento objetivo qualificado: porque a alteração das faculdades mentais tem de ser uma
alteração significativa, portanto é um elemento objetivo qualificado.

b) Elemento temporal: há mais de um ano.

c) Elemento finalístico: este elemento finalístico é aquele que determina que seja um
obstáculo há vida em comum.

Ou seja, não só houve uma alteração das faculdades mentais grave, como ela ocorre há mais de
um ano, como a pessoa não consegue viver com a alteração dessas faculdades mentais da pessoa. Todos
estes elementos tem de ser alegados e demonstrados.

Em Direito da Família, estamos a falar de direitos das pessoas, toda esta demonstração dos
elementos da norma é fulcral – se a pessoa não faz a prova de um dos elementos a ação cai, porque a
exceção é adoção do direito das pessoas.
184

 Art. 1781º, c): “a ausência, sem que do ausente haja notícias, por tempo não inferior a um ano”.

a) Elementos objetivos:

i. Situação ausência

ii. Sem notícias

b) Elemento temporal: há mais de um ano.

É necessário recordar aqui o regime da ausência127. Para o Direito da Família de forma muito
particular interessam 3 normas deste bloco, mais especiais: arts. 108º, 115º e 116º. O que é que se
cuida aqui?

a) Art. 108º: está estabelecido em sede de curadoria definitiva, que é a segunda fase da
ausência, quando esta já ocorre há mais de 2 anos ou há 5 anos, consoante haja
representante legal ou não. Traça uma situação de ausente casado: o cônjuge não separado
judicialmente de pessoas e bens pode requerer inventário e partilha e exigir os alimentos a
que tiver direito.

b) Art. 115º: efeitos da morte presumida – terceira fase da ausência. Neste caso, diz se que “a
declaração de morte presumida produz os mesmos efeitos que a morte, mas não dissolve o
casamento, sem prejuízo do disposto no artigo seguinte.”

c) Art. 116º: trata do novo casamento celebrado pelo cônjuge do ausente – “O cônjuge do
ausente casado civilmente pode contrair novo casamento; neste caso, se o ausente regressar,
ou houver notícia de que era vivo quando foram celebradas as novas núpcias, considera-se o
primeiro matrimónio dissolvido por divórcio à data da declaração de morte presumida.”

 Art. 1781º, d): “Quaisquer outros factos que, independentemente da culpa dos cônjuges, mostrem a
rutura definitiva do casamento”. Cláusula residual.

a) É uma cláusula aberta, o que significa que podem estar aqui em causa diferentes factos
com variadas configurações.

b) Apesar de ser uma cláusula aberta, em razão da alteração do regime jurídico do divórcio
tem de ser feita uma interpretação exigente dos factos que se pretende subsumir à alínea
d). Esta alínea não se basta com o “já não gosto de ti”, exige que essa mudança de
sentimento seja de tal forma importante que inviabilize de forma irreversível a
possibilidade de comunhão de vida. E é isto que tem que ser alegado e demonstrado nos
termos desta alínea. Não se pode entender que com base nesta alínea se pode acabar o
casamento sem mais. Os tribunais continuam a fazer uma interpretação restritiva e
exigente dos factos aqui subsumíveis.

O direito ao divórcio é um direito potestativo e é um direito pessoalíssimo, ou seja, só vai ser


reconhecido àquele sujeito que tenha a qualidade de cônjuge. Portanto e em concreto ele é
intransmissível por morte, art. 1785º/3: “O direito ao divórcio não se transmite por morte, mas a ação
pode ser continuada pelos herdeiros do autor para efeitos patrimoniais, se o autor falecer na pendência da
causa; para os mesmos efeitos, pode a ação prosseguir contra os herdeiros do réu”.

127 Remissão para os arts. 89º a 121º, regime comum da ausência, que aqui se vai aplicar em bloco.
185

Aquilo que vimos até agora em matéria de divórcio foi:

1) Regime jurídico do divórcio, onde é que ele está previsto (sede normativa)

2) Modalidades do divórcio

3) Agora vamos ver efeitos jurídicos do divórcio (arts. 1788º a 1793º-A; arts. 1677º-B + 1677º-C; arts.
2003º e ss, de forma especial, art. 2016º; e ainda arts.1905º a 1906º);

Efeitos jurídicos do divórcio

O princípio geral vem consagrado no art. 1788º. “O divórcio dissolve o casamento e tem
juridicamente os mesmos efeitos da dissolução por morte, salvas as exceções consagradas na lei.” O
divórcio dissolve o vínculo conjugal, o que significa que este princípio deve ser casado com o que já
sabemos ocorrendo com base no art. 1688º, o divórcio é uma das causas de cessação das relações
jurídicas pessoais e patrimoniais.

O divórcio tem uma eficácia para o futuro, o princípio geral é este: divorciados os cônjuges,
qualquer dos efeitos vai-se aplicar a partir do momento em que transite em julgado a decisão em
matéria de divórcio.

Quando trabalhamos os efeitos jurídicos vamos replicar uma distinção que é a distinção dos efeitos
jurídicos:

1) No plano das relações horizontais, ou seja, entre os cônjuges

2) No plano das relações verticais descendentes, ou seja, em relação aos filhos

E dentro desta dicotomia ainda vamos fazer uma subdistinção:

1) Estatuto pessoal

2) Estatuto patrimonial

Relações horizontais no que diz respeito ao estatuto pessoal três grandes efeitos:

1) Cessação dos deveres conjugais (art. 1672º): todos os deveres se extinguem, com um
caso particular como exceção. E o caso particular é o relativo à obrigação de alimentos,
ou seja, ainda que haja divórcio, dissolução da relação matrimonial, pode haver uma
eficácia póstuma deste direito de dever conjugal de assistência, porque no fundo um dos
cônjuges pode ficar vinculado a prestar alimentos ao outro, após o divórcio.

2) Pode haver implicações em sede de direito ao nome (art. 1677º-B e art. 1677º-C).

3) Extinção de um impedimento matrimonial à celebração de um novo matrimónio.


Sabemos que o art. 1601º, c) proíbe a celebração de outro casamento por aquele que já
186

seja casado, logo ocorrendo o divórcio abre-se a possibilidade de ser celebrado um outro
casamento, com respeito pelo chamado prazo internupcial, art. 1605º.

Relativamente às relações horizontais no que diz respeito ao estatuto patrimonial vamos ter 6
principais efeitos:

1) Cessa a relação patrimonial entre os cônjuges, cessa o estatuto patrimonial. O que é que isto
significa? Significa várias coisas.

o Determina o regime de bens: deixa de se aplicar aquelas regras particulares em matéria


de regime de bens, em matéria de legitimidades conjugais, em matéria de limitações de
negócios jurídicos, responsabilidade por dívidas, tudo isto cai.

Ocorre a partilha. A partilha está prevista no art. 1689º. Este artigo é muito importante e esclarece
em que temos é que ocorre esta partilha. “Cessando as relações patrimoniais entre os cônjuges, estes ou
os seus herdeiros recebem os seus bens próprios e a sua meação no património comum, conferindo cada
um deles o que dever a este património”. Em que é que se traduz a partilha?

 Inventário dos bens próprios: tem de ser feita uma relação de bens próprios. A relação de bens
próprios é um inventário, um inventário é uma listagem, vai-se descobrir quais são os meios que
são titulados exclusivamente por cada um dos cônjuges. Faz-se uma listagem, para depois se
fazer uma avaliação desses bens.

 Liquidação do património comum, havendo património comum, nos regimes de comunhão geral
ou de comunhão de adquiridos. O que é que significa liquidação do património comum?

a) A chamada liquidação das dívidas contraídas junto de terceiros. Ex: tenho um património
conjugal e um património coletivo, e quero liquidá-lo – o que significa que antes de mais
tenho que ver que dívidas tenho perante terceiros e tenho de pagá-las.

b) Dívidas que são exigíveis na relação inter-conjugal. E que tipo de dívidas é que podem existir
entre cônjuges?

i. Art. 1676º/2 e 3: crédito por contribuição desproporcionada quantos aos encargos da


vida familiar.

ii. Art. 1697º: sempre que exista a possibilidade de haver compensações no caso de ter
havido lugar ao pagamento de dívidas que não eram comunicáveis com bens próprios.

c) Depois de serem pagas as dívidas entre os cônjuges faz-se a chamada partilha em sentido
estrito. A partilha em sentido amplo implica este conjunto de operações aritméticas,
primeiro a listagem de bens próprios. A partilha em sentido estrito é dividir pelos cônjuges
o que sobrar – nos regimes de comunhão cada um dos cônjuges têm presumivelmente 50%.

Esta partilha do art. 1689º pressupõe que haja uma comunhão conjugal, para que se possa fazer
a divisão entre bens próprios e bens comuns. Nos casos de regime de separação de bens cada um dos
cônjuges só tem bens próprios e portanto havendo divórcio cada um levanta os seus bens próprios.

A partilha coloca dois problemas jurídicos:


187

 Problema de saber se há lugar à atualização do valor dos créditos eventualmente devidos


entre os cônjuges. Os créditos só são exigíveis no momento da partilha, art. 1689º/3. O valor
a pagar é o valor originário, no momento da constituição do crédito, ou é o valor no
momento do divórcio, da partilha, com atualização? O art. 550º consagra o princípio
nominalista: só há lugar à atualização nas obrigações pecuniárias quando exista disposição
legal. No nosso caso não temos disposição legal que o permite, nem que o proíba. Por essa
razão a doutrina tem entendido de forma maioritária que não há lugar à atualização do valor
do crédito. É claro que esta tomada de posição é criticada desde logo no plano da justiça
cooperativa. Portanto isto seria um dos casos de necessidade de revisão ou mesmo uma
perspetiva de interpretação corretiva – problema de lacuna a resolver dentro do quadro
sistemático.

 Um dos negócios entre os cônjuges que é controverso é admissibilidade do contrato-


promessa de partilha. A regra é que a partilha só se faz com a cessação das relações pessoais
e patrimoniais, ainda que se admita a celebração de um contrato-promessa de partilha
antecipado, como condição suspensiva. Só é eficaz no caso de ocorrer uma efetiva partilha
dos bens.

Art. 1790º: norma especial e aplicável à partilha em caso de divórcio128. Em caso de divórcio a
partilha opera segundo o regime da comunhão de adquiridos.

2) Perda de benefício (art. 1791º). O art. 1791º é uma norma que nos recorda o regime das
doações feitas entre esposados ou das doações entre casados129. O que se pretende é que se
houver divórcio que nenhum dos cônjuges fique o titulado num benefício que no fundo só tinha
recebido em razão da condição de casado. Lembrar a distinção de verdadeira doação
relativamente ao conceito do art. 940º/2, donativo conforme aos usos sociais. Tudo o que seja
presentes socialmente admissíveis entra também para a restituição do 1791º ainda que não
entrem para o regime da doação entre esposados ou para o regime da doação entre casados. O
art. 1791º tem um âmbito de aplicação mais amplo do que o próprio regime da doação.

3) Obrigação de indemnizar, prevista no art. 1792º. Esta norma esclarece que em sede de divórcio
um dos cônjuges pode ser indemnizado pelo outro. O art. 1792º/1 é uma remissão para os
quadros da responsabilidade delitual ou aquiliana, nos termos gerais da responsabilidade civil.
Tal significa que pressupõe a violação de um direito subjetivo absoluto. É este o espírito do art.
1792º/1. Em nada prejudica a possibilidade de havendo fundamento, concretamente por ter
sido violado um dever conjugal, lançar mão de uma ação de responsabilidade civil obrigacional
com fundamento na violação de direitos de crédito.

O art. 1792º é uma norma especial, apenas para os quadros da responsabilidade delitual. O art.
1792º/2 é uma norma especialíssima porque vem determinar que o cônjuge que pediu o divórcio com
fundamento na alínea b), ou seja, com fundamento na alteração das faculdades mentais do outro
cônjuge, deve reparar os danos não patrimoniais causados ao outro cônjuge pela dissolução do
casamento. O divórcio foi decretado porque se entende que um dos cônjuges está numa situação de
alteração das faculdades mentais e esse cônjuge ao sentir-se lesado na sua própria integridade é credor
de uma indemnização por danos não patrimoniais. Em rigor este art. 1792º/2 não seria necessário,
porque temos o art. 496º.

128 Remissão do art. 1689º para o art. 1790º.


129 Remissão do regime das doações entre esposados e das doações entre casados para o art. 1791º-
188

4) Obrigação de alimentos: vem sistematicamente tratada nos arts. 2003º e ss. Artigos com mais
relevância: art. 2016º, art. 2016º-A, art. 2019º, art. 2009º/1, a) e art. 2003º. A obrigação de
alimentos sendo uma das modalidades do dever de assistência, aqui está ter uma eficácia
póstuma, porque o casamento terminou, mas o legislador entende que, por uma razão de justiça,
que é devido a um dos cônjuges uma compensação patrimonial. Esta obrigação de alimentos
têm então necessariamente um conteúdo pecuniário – a obrigação de alimentos visa custear
despesas, visa contribuir para o pagamento de despesas do cônjuge que se divorciou. O conceito
de alimentos vem previsto no art. 2003º. O art. 2003º/2 determina um alargamento em caso de
haver uma convivência com o menor. Todas estas ideias têm fundamento material para além de
no princípio da justiça comutativa, no princípio da iminente dignidade da pessoa humana –
quando alguém se divorcia, vai passar a fazer uma vida sozinho, para a qual não estará
habilitado por várias circunstâncias, o orçamento passa a ser outro, é razoável que, pelo menos
durante um determinado período de temporal, ele seja auxiliado pelo cônjuge que esteja em
melhores condições.

Esta obrigação de alimentos, que é uma prestação que se funda em razões de justiça, não visa a
manutenção de status quo, não visa a manutenção de padrões de vida. O que significa que a partir do
momento em que alguém se divorcia, a vida, o orçamento e as necessidades são diferentes. Art. 2016º
(princípio primordial) + art. 2016º-A/3 – a obrigação de alimentos é necessariamente adequada ao
novo padrão de vida do divorciado.

Este fundamento primário da obrigação de alimento acaba por entrar muitas vezes em tensão
com outros princípios e valores, concretamente com a ideia de dever de responsabilidade individual e a
própria desrazoabilidade de haver uma solidariedade pós-divórcio. Há autores que são muito críticos
quanto a este regime, precisamente porque a partir do momento em que há uma cessação das relações
patrimoniais, não deveria haver já qualquer tipo de apadrinhamento, como sucede através desta
obrigação de alimento.

De acordo com o art. 2016º qualquer um dos cônjuges pode requerer o direito a alimento, o que
significa, que com a mudança de paradigma do regime do divórcio130 qualquer um dos cônjuges têm
esta faculdade.

Todo este regime é aplicável também à separação judicial de pessoas e bens. Em que caso é que
pode haver lugar à cessação da obrigação de alimentos? Art. 2019º.

 Cônjuge celebra novo casamento – deixa de haver o fundamento material de exigência de


solidariedade póstuma ao casamento.

 Não celebra casamento, mas inicia uma união de facto.

 Indignidade por razões morais: expressão intencionalmente ambígua e portanto aquilo que se
pretende aqui é trazer para o mundo do Direito algumas considerações éticas. Entender que
alguém não pode ser credor da obrigação de alimento porque o seu comportamento tem que
ser considerado como indigno, isto é, contrário à ética e à moral.

A obrigação de alimentos, sendo uma verdadeira e própria obrigação jurídica, pode ser
incumbida. Lança-se mão do processo especial executivo.

130 Já não há cônjuge inocente, não há cônjuge culpado.


189

Se alguém violar a obrigação de alimentos vai praticar também um ilícito com relevância
criminal – art. 250º CP, crime de violação da obrigação de alimentos, isto em razão da obrigação socia
desta obrigação.

Todo este regime da obrigação de alimentos em sede de divórcio ou de separação judicial é uma
obrigação de alimentos ex lege, ou seja, que é imposta por lei. O que não prejudica a possibilidade de, em
condições normais, seja na vigência do casamento ou seja independentemente de uma relação
matrimonial, de se fazer um acordo de obrigação de alimentos: estipulação convencional. Mas não é
disso que cuida em sede de divórcio e de separação judicial de pessoas e bens. A estipulação
convencional está no art. 2014º, que admite em geral que isto seja convencionado.

5) Direito ao arrendamento da casa de morada de família. Importância social da casa de morada de


família. É definida, ou pelo menos é relevada, no art. 1673º. Seja a casa de morada de família um
bem próprio, seja a casa de morada de família um bem comum, é possível vir requerer o
arrendamento da casa de morada de família. O que está em causa é uma destinação de um uso e
não da titularidade. Portanto a casa de morada de família continua a ser titulada como bem
próprio ou como bem comum. Em que caso é que pode haver lugar a esta destinação do uso?
Necessidade do próprio cônjuge, interesses dos filhos, proximidade da escola ou do local de
trabalho – todos estes índices, que são meramente exemplificativo, são relevados para que se
posso decidir ou atribuir a casa de morada de família. Toda esta matéria resulta do art. 1105º,
em sede de locação e arrendamento onde se prevê esta eventualidade.

6) Perda de direitos sucessórios. Por morte se configura um conjunto de direitos sucessórios


assinaláveis. Nos termos do art. 2133º/3 em sede de sucessão legítima e legitimária, com base
num argumento a maiori, e art. 2317º, d), deve-se entender que o ex-cônjuge já não vai ser
considerado como herdeiro da legítima ou da legitimária. Qualquer disposição testamentária a
favor do cônjuge deve considerar-se como tendo caducado.

Na Lei nº 8/2017, de 3 de Março introduziu um conjunto de inovações. Art. 1793º-A,


relativamente aos animais de companhia. A prof. AF está na dúvida se este efeito entra no estatuto
pessoal ou patrimonial das relações horizontais. Um dos efeitos do divórcio é no fundo este previsto no
art. 1793º-A: decidir com quem fica o animal. Os animais de companhia de acordo com o novo art. 201º-
B são seres vivos dotados de sensibilidade. O regime que se aplica aos animais dotados de especial
sensibilidade em termos subsidiários é o regime das coisas. Um dos problemas pode ser definir o que é
um animal de companhia.

Relativamente às relações verticais descendentes:

1) continuam a ser tituladas por quem já era titular. Aquilo que é necessário fazer em sede de
divórcio é tão-somente promover à regulamentação das responsabilidades parentais:
regime de guarda conjunta, guarda partilhada, regime misto. Ideia que resulta do art.
1906º.131

131Já aplicamos esta norma quando resolvemos hipóteses sobre a união de facto – art. 1906º também aplicável em
sede de união de facto.
190

2) As responsabilidades parentais mantêm-se no plano pessoal (necessidade de educação,


assistência, plano espiritual), mas também no plano patrimonial. Relativamente ao plano
patrimonial temos várias normas especiais que vêm esclarecer esta ideia – art. 1878º/1, art.
1879º, art. 1880º e art. 1905º, este último é uma norma especialmente aplicada também em
sede de divórcio ou separação judicial de pessoas e bens relativamente à matéria da
obrigação de alimento. Neste regime geral da obrigação de alimento justifica-se citar o art.
2009º/1, c), que é categórico ao enunciar que estão obrigados a alimentos os ascendentes,
concretamente relativamente aos filhos132.

3) Direito-dever dos filhos continuarem a habitar a casa de morada de família ou aquela que os
pais lhes destinarem, art. 1887º.

4) Direito do filho menor relacionar-se com os ascendentes e com os irmãos, art. 1887º-A.
Muitas das vezes em situações de divórcio ocorrem os fenómenos de alienação parental,
principalmente se houver um regime de guarda não partilhada, aquele progenitor que fica
com os filhos acaba por promover uma espécie de terrorismo psicológico em que contra o
interesse do filho diz que o ex-cônjuge, pai ou mãe, é uma pessoa a evitar, assim como todas
as pessoas relacionadas com ele.

O divórcio ainda no plano pessoal tem um outro efeito essencial, que tem a ver com a afinidade,
art. 1585º. Havendo divórcio a afinidade cessa ou não cessa? Cessa. A afinidade cessa por efeito do
divórcio. Esta norma tem sido, por razões que se compreendem, muito criticada porque parte de um
paradigma que ocorrendo a dissolução do casamento por vontade de um ou de ambos os cônjuges todas
as pessoas que eram tratadas como familiares deixem do ser ao abrigo da afinidade, ou seja, deixa de
haver sobrinhos, tios com base na afinidade. É o legislador a dizer mais do que o que devia.

Data da produção dos efeitos do divórcio

Questão relativamente cristalina, porque resulta da letra da lei, art. 1789º. O divórcio produz os
seus efeitos com o trânsito em jugado da respetiva sentença.

O que é trânsito em julgado? Significa que a sentença se cristaliza – já não é admissível recurso
ordinário. Foram ultrapassados os prazos para interposição de recurso.

Este princípio é compatível, ainda que em termos excecionais, com a eficácia retroativa. Todos
os efeitos produzidos pelo divórcio produzem-se para o futuro, mas excecionalmente o legislador vai no
art. 1789º/1, 2ª parte estabelecer um desvio desse princípio da eficácia para o futuro. E em que casos é
que isto ocorre? Apenas na relação entre os cônjuges, ou seja, relações horizontais, e apenas no estatuto
patrimonial. Nesta eventualidade, relações entre os cônjuges e plano patrimonial, o legislador vai
prever que se, designadamente, uma herança foi recebida por um dos cônjuges na pendência do
processo de divórcio, por razões de justiça, ela não se deve transmitir ao outro cônjuge por força do
regime de bens. Isto porque ainda que o divórcio ainda não tenha sido decretado seria manifestamente
injusto que ele pudesse vir a beneficiar de uma situação e de um benefício que ocorre na pendência do
divórcio. Toda esta linha sempre seria compatível com o princípio do art. 1791º, aí os cônjuges já

132 Remissão do art. 2009º/1, c) para os arts. 1878º/1, 1879º, 1880º e 1905º.
191

tinham recebido o benefício. O que significa que se tinham a possibilidade de receber na pendência do
divórcio, o mesmo princípio deveria ser aplicável, isto é, a não aquisição de uma vantagem patrimonial
na pendência do divórcio.

Por outro lado prevê-se aqui que relativamente a terceiros, eficácia externa, nos termos do art.
1789º/3 que “os efeitos patrimoniais do divórcio só podem ser opostos a terceiros a partir da data do
registo da sentença”. Porque? Por uma razão de ser de publicidade. Sem que haja registo o terceiro não
tem conhecimento das alterações que ocorreram em termos patrimoniais.

Existe um caso particular do divórcio fundamentado com base na separação de facto. art.
1789º/2: “Se a separação de facto entre os cônjuges estiver provada no processo, qualquer deles pode
requerer que os efeitos do divórcio retroajam à data, que a sentença fixará, em que a separação tenha
começado”.

Temos fundamentalmente o seguinte princípio: os efeitos do divórcio só se produzem para o


futuro. Casos particulares:

1) Art. 1789º/1, 2ª parte – por uma razão de justiça nas relações entre cônjuges

2) Art. 1789º/2 – os casos em que o divórcio tenha por fundamento a separação de facto.
Entende-se que, mais uma vez, por razões de justiça não faria sentido que todos aqueles
efeitos do divórcio só se começassem a produzir após o trânsito em julgado, se cessou a
comunhão plena entre os cônjuges há muito mais tempo.

Mediação familiar: novo fenómeno da moda. Aquilo que se pretende com base nesta figura é
consagrar um instrumento de resolução alternativa de litígio. Resolução alternativa ao que? Aos
tribunais. Através da intervenção de um terceiro, que vai funcionar como um árbitro imparcial, aquilo
que se quer é tentar aproximar os cônjuges que estejam em litígio, seja nas suas relações interconjugais,
seja na relação com os filhos.

Uma das inovações também de 2008 foi introduzir a norma do art. 1774º. A importância desta
figura leva a que seja a segunda norma depois de se dizer quais é que são as modalidades do divórcio.
Esta é uma norma relativamente programática. Admite-se a figura da mediação familiar, mas para que
ela seja efetiva é necessária que o Estado organize gabinetes de mediação familiar, e concretamente que
preveja que o custo do recurso à mediação familiar seja compatível com os orçamentos familiares da
generalidade das famílias. E ainda que concretamente alargue os casos por sistema judiciário também à
figura da mediação familiar. Como este passo ainda não foi dado, a prof. AF é relativamente cética
quanto à efetividade da mediação familiar, porque de facto são casos muito pontuais aqueles em que
tem havido recurso já à mediação familiar, seja porque ela é inexistente em certas circunscrições
territoriais, seja porque os custos são muito elevados e as famílias não têm possibilidades. Toda esta
matéria é objeto de regulamentação normativa especial.
192

Divórcio por mútuo consentimento

É divórcio administrativo, é tramitado administrativamente, nas conservatórias do registo civil,


porque parte do pressuposto que os cônjuges estão de acordo quanto à alteração das suas relações
jurídicas matrimoniais ou quanto à extinção da sua relação jurídica matrimonial. É isto que resulta do
1773º/2 1ª parte.

1773º/2 1ª parte – Divorcio por mutuo consentimento pode ser requerido por ambos os
cônjuges de comum acordo, na conservatória do registo civil - Esta eventualidade não prejudica depois
que em certas circunstancias possa o divorcio por mutuo consentimento deixar de ser tramitado
administrativamente e passar a ser tramitado necessariamente em termos judiciais – é isso que cuida o
1773º/2 2ª parte.

Como é que casamos as duas hipóteses?

Nós temos no divorcio por mutuo consentimento, a possibilidade:

1)De tramitação administrativa – nas conservatórias do registo civil - 1773º/2


1ª parte exige-se que os cônjuges cheguem aos 4 acordos requeridos pelo
1775º. Se isto suceder, o que o conservador do registo civil vai fazer é a
homologação dos acordos.

2)De forma judicial - 1773º/2 2ª parte – Acontece nos casos previstos no 1778º
e 1778º-A, estes casos giram em torno dos acordos do 1775º. Tipicamente
acontece:

Os cônjuges podem chegar a acordo quanto a duas matérias do 1775º, mas não relativamente às
demais matérias. O conservador deixa de ter competência para tramitar o divorcio, que passa a ser
tramitado pelo tribunal, por se entender que o juiz tem mais aptidão para supervisionar.

- Não chegam a acordo

- Chegam a acordo, mas entende-se que os acordos não são equilibrados, não devem ser
objeto de homolgação. Nessa eventualidade, o processo não termina, é transmutado
para um processo judicial - 1778º + 1778-Aº

Homologação: pressuposto essencial deste divórcio por mútuo consentimento – A

1776º-A/4: Há acordo, o MP pode fazer sugestões de alterações em funções dos menores, o


tribunal vai tramitar. Tenta mesmo assim obter um mutuo consentimento, apesar de ser tramitado
judicialmente.

Em síntese, o divórcio por mútuo consentimento não é necessariamente tramitado


administrativa é a regra, mas será judicial no caso de:

1)Crise relativamente à obteção de alguns acordos

2)Se os acordos não acautelaram suficiente os interesses que estão a ser tutelados.
193

Filiação

Volta a ganhar aqui uma expressão essencial a matéria dos direitos fundamentais e de
personalidade. Notas essenciais em relação a isto:

Uma das alterações que ocorreu foi a eliminação tendencial do conceito de poder
parental, que foi substituído pela ideia de responsabilidade parental - Isto não é uma opção vazia
de um sentido ético ou axiológico. Pretendeu-se superar o paradigma do autoritarismo na relação entre
pais e filhos. Durante muitos anos havia a ideia de que os pais tinham a potestas. Tal foi eliminado com a
reforma de 77 com a entrada em vigor da constituição em 76 e com as reformas mais recentes no Livro
IV.

Com a abertura do direito de família a novos modelos de família, nomeadamente famílias do


mesmo sexo, entendeu-se que a ideia de poder paternal era descabida neste âmbito.

Responsabilidade: sinónimo de que as situações jurídicas que encontramos na relação entre


pais e filhos (relações horizontais), se caracterizam por um poder dever. Esta ideia de responsabilidade
significa que os pais não atuam quando querem ou como querem, atuam nos casos previstos na lei para
realizar o interesse. Há uma responsabilidade social que é simultaneamente uma
responsabilidade jurídica.

Estas ideias têm apoio normativo no texto da constituição:

- artigo 36º/5 - é categórico ao enunciar que os pais têm o direito e o dever de educação
e alimentação dos filhos.

- art.35/6 - lança a ideia segundo a qual os filhos não podem ser separados dos pais a
não ser que os pais violem de forma grave os seus deveres parentais.

No CC: 1878º/1 – estabelece que competem, no interesse dos filhos, zelar pela segurança e
saúde destes, prover ao seu sustento, dirigir a educação, representa los, e administrar os seus bens. Nº2
- filhos devem obediência aos pais. a relação entre pais e filhos não é uma mera relação entre amigos, há
alguma disciplina dirigida pelos pais e filhos.

Mas, nº2 2ª parte – “os pais de acordo com a maturidade dos filhos, devem ter em conta a sua
opinião nos assuntos familiares importantes e reconhecer lhes autonomia na organização da própria
vida” – vem enfatizar que o filho não é um objeto, é um sujeito, titular de direitos, vinculado a deveres e
que por razões de idade, está envolvido numa relação de rep.legal.

Princípio do interesse superior da criança - expressão literalmente utilizada em sede de


adoção. A adoção é uma das modalidades de filiação, e é marcada por esta matriz essencial, qualquer
processo de adoção deve ser orientado pelo “interesse superior da criança”.
194

Esta é uma expressão indeterminada, como tal, tem sido a jurisprudência a fazer um trabalho
essencial da concretização do que é isto de interesse superior da criança - 1974º/1 1979º/4 e 3º-A
regime jurídico da adoção.

1906º/1: “questões de particular importância” devem ser sempre decididas à luz do interesse
superior da criança

Tratar de problemas jurídicos da filiação implica assumir os cuidados que têm que se ter com a
criança – a ideia da funcionalização da atuação dos pais, ao serviço e interesse da criança.

A criança tem de ser assistida, cuidada, mantida, tudo ideias que resultam desde logo da lei
fundamental 36º/3.

1º - Repúdio da violência (corolário) - ideia de que as relações familiares entre pais e filhos
são uma esfera privada longe da intervenção do legislador ou fiscalização do juiz, é superada
hoje em dia, qualquer maltrato sofrido por uma criança é objeto de um processo que pode
resultar numa inibição do exercício das responsabilidades parentais 1913º e ss CC.

- Este repudio da violência tem o seu paralelo na preocupação com a intervenção do estado, da
segurança social, no que diz respeito a crianças e jovens em perigo, e crianças e jovens
institucionalizadas, categorias a que se dedica um conjunto normativo relevante.

2º - Isto que falamos em relação às crianças institucionalizadas, onde há um dever de


tutela, de vigilância do estado, também se passa no que diz respeito aos - cuidados a ter com
a terceira idade - todos os idosos que estejam em lares de acolhimento e noutras instituições,
colocam a necessidade de intervenção do Estado na fiscalização destas situações, incumbência
do Estado. Princípio da intervenção ex oficio: intervenção do Estado sempre que a família
falhe ou seja insuficiente.

3º - Igualdade no exercio das responsabilidades parentais - para alem de haver uma


igualdade entre os cônjuges, há uma igualdade que se traduz na direção conjunta da família e na
titularidade dos mesmos direitos e adstrição aos mesmos deveres face aos filhos - 36/3 CRP +
1671º/2 CC.

4º - Coresponsabilização das famílias, dos titulares das responsabilidades parentais e do


estado e sociedade em geral - todas as questões que se relacionam com crianças não sendo
tanto questões puramente privadas, obrigam a perceber quem atuou mal no processo, podem
ter sido os pais, outro familiar, terceiros não familiares - o que releva as outras relações com
relevância familiar. Todos esses planos são relevantes, desde logo porque podem falhar.

Se falharem estes planos, coloca-se o problema de saber quem responde pelos danos causados à
criança.
195

5º - Sensibilização para a necessidade que é proclamada todos os anos entre um maior


equilíbrio entre a vida profissional e pessoal - há instrumentos normativos que tentam fazer
este equilíbrio.

Licenças de parentalidade: é atribuída quer à mãe quer ao pai. São períodos pagos pela
segurança social e em que se permite que o trabalhador ou trabalhadora não vá trabalhar.
Licenças de amamentação: Para as mães que amamentam ainda as crianças têm a
possibilidade de ter uma redução do horário do trabalho sem qualquer penalização no seu rendimento.
Regime da função pública + Código do trabalho

Ana Filipa: Sem qualquer penalização, direta e explicita, porque indiretamente, por trabalhar
menos tempo vai ter menos menos produtividade vai ter uma avaliação menos positiva e vai ganhar
menos em termos de prémios.

Licença de assistência aos filhos: Em caso de doença dos filhos, de consultas rotineiras, os
trabalhadores têm direito a faltar com justificação para acompanhar os filhos menores.

Jornada contínua: tendo uma jornada continua, entram a uma determinada hora, têm apenas
uma pausa ligeira e conseguem sair as 16h da tarde para poderem ir buscar os filhos à escola.

Modalidades de filiação

1)Filiação biológica: Filiação biológica bicéfala, filiação assente em laços sanguíneos. Pode ser:

- Filiação natural: Estes sistemas de filiação natural funcionam com base em presunções, saber
quem é a mãe ou quem é o pai, que podem ser afastadas.

- Ou com recurso a técnicas de PMA – Aqui surgem muitas questões complexas. No recurso de
técnicas de PMA, podemos ter PMA:

1)Simples

2)Com recurso a maternidade de substituição – Aqui saber quem é a mae passa a ser uma
questão controversa. Será a mãe a hospedeira ou quem recebe e cria a integra na família?

Coloca-se ainda nestas técnicas de recurso às PMA – a questão de saber quem é o pai?
Tipicamente vai se recorrer nestas técnicas ao banco dos dadores de sémen, as mulheres são
inseminadas com material genético de um estranho cuja identidade não é conhecida, não pode ser
conhecida e vai gerar-se um filho criado por aquela mulher, sozinha, ou por o marido daquela mulher.
196

Todas estas questões implicam com direitos fundamentais e direitos de personalidade – todas
estas situações de recurso às técnicas de PMA, pressupõem uma renuncia daquele que é o dador de
sémen e daquela que vai ser a mãe de substituição ao exercício da responsabilidade parental, ao direito
de ser pai ou mãe.

Prof.Ana Filipa: Esta renúncia é controversa, coloca problemas de legalidade. Há uma renuncia
antecipada ao exercício de direitos.

Antes de iniciarem a PMA o dador de sémen ou a mãe de substituição assinam um formulário ou


um contrato e renunciam. Mas, principalmente no caso da mulher, depois de passar pela gestação, pode
mudar de opinião - mas já renunciou, entende-se que houve uma limitação voluntária ao direito de
personalidade 81º, mas que não é revogável. Estas dúvidas levaram a que esta lei, esteja a ser objeto
de um pedido de fiscalização da constitucionalidade.

A criança gerada com recursos a PMA não tem o direito a conhecer o verdadeiro pai ou mãe
biológicos, o que é um direito fundamental - O direito à identidade pessoal implica isto. Entende-se
que os genes condicionam em alguma medida a personalidade da pessoa, para além da convivência e da
educação, porque os genes e a bilogia podem ter relevância em matéria de doenças hereditárias, porque
pode haver incrementos patrimoniais

26º CRP: direito à autodeterminação, sou uma pessoa diferente se conhecer as minha origens.

Ainda nos PMAS – coloca-se ainda o problema dos Embriões sedentários – a utilização das
técnicas de PMA determina, na generalidade dos casos, que sejam produzidos vários embriões, com
base no material utilizado. Para garantir a probabilidade de sucesso, tem que se salvaguardar a
possibilidade de haver outros embriões para o caso daquele não chegue ao final da gestação. Há aqui
um problema do destino dos embriões sedentários.

Qual é a tutela que deve ser dada em termos pré-natais, ainda não temos uma pessoa
jurídica 66º, mas já teremos uma pessoa humana para algumas conceções, é legitima a
destruição dos embriões sedentários? Bem, mas aqueles embriões resultaram do recurso ao nosso
material genético, temos o poder de decidir destrui-los. É legitimo? Não são resolvidas pela lei de forma
cabal.

2)Filiação adotiva: filiação jurídico-legal, há um processo necessariamente judicial que tem de ser
tramitado para que seja constituída uma relação jurídica familiar.

Na filiação não estamos a autonomizar uma relação familiar, mas a filiação gera parentesco, a
filiação é uma modalidade de parentesco em linha reta descendente.
197

Filiação – relações horizontais - 1796º a 1972º.

Esta matéria está dividida por 3 capítulos essenciais:

1)Estabelecimento da filiação 1796º a 1873º.

2)Efeitos da filiação 1874º a 1972º.

3)Adoção, tratada normativamente à parte, 1586º, 1973º a 1991º.

Estabelecimento da filiação

Depende do estabelecimento da filiação a circunstância de se estabelecerem relações de


parentesco e o próprio status familiar, ser filho de. Importância social, para alem de jurídica.

Isto tem ligação com os direitos à identidade pessoal, autodeterminação, ... direitos
fundamentais e direitos de personalidade 70º/1.

Esta matéria continua a estar marcada pela prevalência dos vínculos biológicos - o 1801º
em matéria de ações de investigação da maternidade vem admitir que com meios de prova admissíveis
se façam testes de sangue e outros testes, como ao ADN.

Discutiu-se se esta restrição ao direito fundamental (direito à integridade física), é admissível?


O legislador veio estabelecer – 1801º - que sempre que haja duvidas em matéria de paternidade que
não pode haver recusa destes meios de prova quando esteja em causa o estabelecimento da
paternidade.

Quanto à Mãe 1796º/1 – A filiação resulta do facto do nascimento – é aquela que dá à luz. O
estabelecimento da filiação assenta nesta presunção, mas pode suceder nos casos em que a mãe
abandoa a criança, não se saiba quem deu à luz a criança.

Aí tem de se lançar mão da investigação da maternidade - 1803º a 1825º. Nos casos normais, a
mãe declara no registo de nascimento de que é mãe daquela criança – é a chamada declaração da
maternidade 1803º a 1807º - voluntariamente a mãe declara que aquela criança é seu filho. Nos casos
em que não o faz voluntariamente é necessário recorrer-se à investigação, oficiosamente - 1808º a
1825º.

Nestas duas eventualidades, nós estamos perante vicissitudes, a mão não declarou que era a
mãe daquela criança – precisamos de proceder à averiguação de quem é a mãe da criaça.

1814 ao 1825º - Reconhecimento judicial da maternidade: coloca problemas relativamente


ao 1817º. Nestes casos do 1814º ao 1825º é o filho que vai intentar a ação para que se descubra quem é
a sua mãe.
198

1817º/1 - prazo de caducidade para a ação instaurada pelo filho e que tem em vista o
esclarecimento da maternidade – Pode ser proposta durante a menoridade ou nos dez anos
posteriores à sua maioridade ou emancipação.

Tem-se discutido muito quanto à constitucionalidade deste prazo de caducidade, à luz dos
direitos fundamentais. É duvidoso que faça sentido estabelecer este prazo quanto à investigação da
maternidade.

O TC pronunciou-se pela inconstitucionalidade deste preceito, com o alargamento do prazo


para 10 anos, a jurisprudência passou a ser uniforme – quer o TC ou o STJ, no sentido de que há uma
colisão de dois direitos fundamentais:

- da mãe de não ser reconhecida enquanto mãe

- filho de conhecer quem é a sua mãe

Que está resolvida pelo estabelecimento deste prazo de 10 anos – Estes prazos são explicitados
e pensados porque se desconfia da seriedade e dos verdadeiros motivos que levam os filhos a intentar
esta ação ao fim de determinado período de tempo. O legislador receia que possa ter motivos com uma
finalidade de ser eleito como herdeiro daquela pessoa.

O prazo de 10 anos pode ser alargado no caso de verificar alguma das circunstâncias do
1817º/3, por exemplo a alíena b) - Em casos execcionais e por se conhecerem factos supervenientes
que pode ser alargado o prazo de 10 anos.

Quanto ao Pai - 1826º a 1875º - aquilo que temos de fazer é distinguir em função do regime e
da relação familiar que une o pretenso pai à mãe da criança. Podemos ter:

Filiação estabelecida na constancia do matrimónio - se o pai estava casado com a mãe temos
uma presunão de paternidade estabelecida no 1896º/2, a favor do marido da mãe. Esta solução é
replicada no 1826º/1 e no 1846º que faz referência ao presumido pai. Mesmo que tenha havido
casamento putativo, nos termos do 1827º a anulação do casamento não prejudica nunca a presunção de
paternidade mesmo que o casamento tenha sido contraído de má fé, um dos exemplos em que se vem
ressalvar este efeito.
Para saber se a presunção deve funcionar, há aqui outras normas importantes:

1798º: período de conceção. É importante nomeadamente nos casos de dupla


presunção, em que haja duvidas quem é o pai da criança – 1834º - vem dizer que o pai é
o segundo marido.

sta filiação funciona com base numa presunção, que é ilidível, pode a própria mãe fazer
prova de que aquele não é o pai da criança ou pode o próprio pai presumido fazer prova
de que não é o pai da criança – admite-se uma ação de impugnação da paternidade -
1839º a 1846º e pode ser intentada ou pelo marido da mãe, ou pela mãe ou ainda
pelo filho.
199

Filiação estabelecida fora do casamento - Pode acontecer o seguinte:

1º - 1796º/2 2ª parte - a filiação ocorre pelo reconhecimento: que é uma declaração de


vontade à semelhança do que se exige quanto à mãe, no reconhecimento o pai vem declarar e assume a
paternidade daquela criança, implica um ato de vontade. Este reconhecimento da paternidade é
regulado normativamente nos 1847º a 1873º.

Quando se releva o reconhecimento da paternidade, esse reconhecimento pode ser:

1) Reconhecimento em sentido estrito, tem a natureza de perfilhação, que é um acto de


manifestação de vontade do pai que vem chamar à sua esfera jurídica os direitos e obrigações para com
aquela criança – 1849º a 1863º.

2) Se o pai não perfilha, tem se lugar a uma decisão judicial, que pode ser instaurada a pedido do
MP oficiosamente, ou pode ser instaurada a pedido do filho – 1869º a 1873º.

O regime do estabelecimento da paternidade aqui funciona em termos de espelho com o da


maternidade, a logica é a mesma – Há uma presunção, em todo o caso exige-se uma declaração de
maternidade quanto à mãe, exige-se um acto de perfilhação quanto ao pai. Se não houver essa
declaração ou perfilhação, é necessário estabelecer judicialmente a filiação.

Ação instaurada pelo filho - 1869º a 1873º - Não se estabelece um prazo de caducidade para
a propositura desta ação, mas o art.1873º é uma norma remissiva que determina que se aplique o
1817º - O mesmo prazo de caducidade que está previsto para a ação de investigação da maternidade, é
igual ao da ação de investigação da paternidade. Suscitam-se igualmente as mesmas dúvidas que
falamos.

Nestes casos de filiação estabelecida fora do casamento, nós podemos ter um caso de UF ou de
um filho que tenha nascido de forma episódica que implicou relações sexuais.

Nesse caso temos a norma do 1871º/1 c) – “presume-se a paternidade quando durante o


período legal de conceção, tenha existido UF ou concubinato duradouro entre mãe e pretenso pai” -
convoca o 1778º, período legal da conceção

Filiação jurídico legal – Adoção

1586º - é uma relação juridica familiar. É objeto de desenvolvimento normativo no art.1973 e ss


e pelo regime jurídico da adoção – Lei 143/2015, 8 de setembro + 36/7 CRP Ideias essenciais:

Adoção é uma modalidade de filiação, apesar de ser tratada separadamente da filiação, hoje
não há fundamento jurídico para o tratamento diferenciado, aliás é vedado pela própria lei.

1974/1: “ entre o adoptante e o adotpado vai se estabelecer um vinculo semelhante ao da


filiação.” – O que devemos retirar daqui é que não existe qualquer diferenciação juridica entre os filhos
adotivos e filhos biológicos. “Vinculo semelhante” deve-se apenas ao facto da fonte ser distinta.
200

Adção estrita vs adoção plena – anteriormente havia esta distinção, que tinha subjacente a
ideia de que na adoção estrita não havia uma equiparação juridica do filho adotado relativamente aos
demais filhos, porque não havia uma integração plena na vida adotiva. Só se conseguia essa integridade
familiar na adoção plena. Esta distinção terminou – Hoje em dia toda e qualquer adoção é uma adoção
plena.

Isto resulta do art.1986º - “pela a adoção o adotado adquire a situação de filho do adotante e
integra-se com os seus descendentes na família deste, extinguindo-se as relações familiares entre o
adotado e os seus ascendentes e colaterais naturais, sem prejuízo do disposto quanto a impedimentos
matrimoniais dnos arts.1602º a 1604º”

Os impedimentos matrimoniais vão se aplicar a todos os elementos da família adotiva, pois há


uma equiparação juridica – Quais são as modalidades de adoção então hoje admitidas? O regime
jurídico da adoção – art.61º a 90º -, faz referencia a uma distinção apenas:

1)Adoção nacional – quando a criança adotada e o candidato a adotante, têm residência em


Portugal.

2)Adoção internacional – implica a transferência de uma criança do seu país de residência


habitual para o país de residência habitual dos adotantes.

Coordenadas essenciais – temos 7:

1º - Principio do superior interesse da criança – 1964/1 + 1979/4 + Art.3º a) do regime


jurídico da adoção

2º -Principio da equiparação jurídica dos filhos adotivos aos filhos naturais – 1986º.

3º - Principio da exigibilidade do consentimento para a adoção – sendo uma relação


juridica que se estabelece a nível judicial, implica o consentimento de vários sujeitos envolvidos
– 1981º + 1982º + 1983º

- Adotando maior de 12 anos

- Cônjuge adoptante não separado judicialmente de pessoas e bens

- Os pais biológicos do adotando, isto no pressuposto que esta adoção não está a ter
lugar naqueles casos em que a criança já está a ser alvo de medidas de
institucionalização. Este consentimento é exigido mesmo que eles sejam menores (os
pais) e mesmo que eles não exerçam responsabilidades parentais.

Relativamente à mãe o legislador estabeleceu que esta só pode consentir decorridas 6


semanas após o parto.

- Ascendente, do colateral até ao 3º grau ou do tutor, quando tenha falecido os pais do


adotando, tenha este a seu cargo a criança.

- Os adotantes
201

Este quadro de vários consentimentos é objeto de 2 desvios – no nº2 e nº3: Nº2 – são
situações em que se muda o sujeito que originariamente tinha dado o consentimento por
outro.Nº3 – casos em que o tribunal dispensa a necessidade de consentimento por
razões ponderosas.

4º - Principio da irreversibilidade do consentimento – 1983º - O consentimento uma vez


prestado não pode ser retratado e não está sujeito a caducidade. Isto é controverso pois temos
uma limitação de direitos de personalidade. O legislador, quando estabelece estas normas (
dizendo que o consentimento é irrevogável), está a limitar o regime geral em matéria de direitos
de personalidade ( art. 81) Daí que se possa questionar a sua licitude. Vemos agora aqui a ideia
de que “nem tudo o que é legal é legitimo”, nem tudo o que está escrito na lei significa que seja
válido do ponto de vista jurídico. 133

5º coordenada: Princípio da audição obrigatório. É um princípio de democraticamente. Se ,


por um lado, se exige o consentimento de vários sujeitos envolvidos(pais biológicos, adoptante,
cônjuge do adoptante) também há a possibilidade de ouvir a criança, saber o que ela pensa/acha
sobre ser adoptada.

Este principio consta do Art.1984º e aplica-se quanto a crianças que tenham idade superior a 12
anos, os 12 anos são limite etário que o legislador releva para efeitos desta audição. Considera
que aos 12 anos já tem maturidade suficiente para uma escolha sensata. Abaixo deste limite,
dificilmente serão ouvidas.

No caso de serem adoptados filhos do cônjuge falecido, devem ser ouvidos os ascendentes ou,
na sua falta, os irmãos maiores.

6º coordenada: Sigilo quanto a identidade do adoptante e quanto à identidade dos pais


naturais, consta do art.1985. Mais uma vez temos um aspeto controverso: por um lado,
compreende-se o secretíssimo deste processo (, danos que possam ocorrer em resultado de
confrontação dos visados no processo) por outro lado é controverso porque não se pode relevar
aos pais naturais do adoptado a identidade da família adoptante. Por isso, isto significa assumir
uma separação total da família. Depois vamos voltar a este tema, mas fora do contexto na
adoção, em PMA’S.

7º coordenada: O artigo 1990ºA foi aditado pela reforma de 2015 e consta também do art.8º do
regime jurídico da adoção. Consagra-se. O direito da pessoa adoptada ao conhecimento das
suas origens. Como conciliar estes parâmetros? Por um lado, há sigilo na identidade dos pais
adotivos e biológicos e por outro lado o direito da pessoa adoptada a conhecer as suas origens
(foi aditado em razão do art.26º da CRP – autodeterminação e dto à identidade genética). Este

133Vamos voltar a esta questão em matéria de PMA ( em que se volta a enunciar o princípio da
irrenunciabilidade do consentimento).
202

direito, além de ser fundamental, é de personalidade: direito inerente à pessoa de conhecer a


origem genética. Isto é importante em matéria de rastreio de doenças, impedimentos
matrimoniais também, se não conheço os meus ascendentes biológicos, posso contrair
casamento com o meu pai/mãe/irmão porque não há estabelecimento da filiação. Este é direito
foi enxertado agora ( e muito bem, na opinião de AF), mas que é dificilmente compatibilizavel
com o regime anterior.

Tramitação do processo de adopção

É processo judicial, só há adoção quando há sentença que transita em julgado. Vem esclarecido
no art.1973º/1. Este é um dos traços distintivos entre esta modalidade de filiação e a natural – a natural
dá origem ao parentesco e baseia-se em laços sanguíneos; a adoção estabelece-se por decisão judicial.

Por outro lado, neste processo detalhadamente descrito no Regime Jurídico da Adoção, há
intervenção de sujeitos que não são atuantes no mundo jurídico apenas ou seja, alem do julgador e do
MP, temos a intervenção de técnicos da SS, Psicólogos - implica a constituição de equipas
multidisciplinares, para se fazer exame psicológico dos candidatos a pais adoptantes. ( Art. 9º regime
jurídico da adopção).

O regime jurídico é um processo moroso e complexo e, por isso, há listas nacionais para adoção
(art.10º do regime jurídico da adoção) que implicam a insusceptibilidade de se prevalecer sistema de
cunhas. Não é possível que alguém, de forma legitima, passe à frente de outro candidato. O que significa
que aqueles casos de filmes de uma família ver uma criança de quem gosta muito e a quer adotar sem
mais, em Portugal não funciona nestes termos; é possível é um processo de apadrinhamento civil ou de
confiança pessoal de menor ( provisoriamente) / à guarda de dada família.

As candidaturas estão no art.43º do regime jurídico da adoção ( ler artigo). Além desta
formalidade, depois, nos termos do art.50º do RJ, existe acompanhamento do processo de candidatura
antes da conclusão. Portanto, antes da adoção em termos definitivos da criança, o chamado período de
pré-adoção. E depois há ainda período no art.60 – período de pós adoção.

Se quisermos, em termos temporais há três períodos:

1- Preliminar- instrui-se o pedido de adoção com intervenção da equipa multidisciplinar, ,


nos termos do art.9º

2- Pré-adoção- uma vez aceite a candidatura, art.50º

3- Pós-adoção- art.60º
203

Legitimidade para Adoptar

Pode adotar quem consta do art.1979º do CC. Esta norma beneficiou de alargamento que foi
introduzido em virtude do casamento

1. podem adotar casais de sexo idêntico ou diferente.

Houve uma polémica e discussão quanto à constitucionalidade de se considerar admissível o


casamento entre pessoas do mesmo sexo, mas não se admitir a adopção:

 Sendo que parte da doutrina dizia que é um caso de inconstitucionalidade subsequente-


se o casamento pode ser celebrado por pessoas do mesmo sexo e se é uma forma de
constituição de família, então, a adopção, que é uma das formas de constituição de
família, então, também tem de ser admitido a adopção por casais do mesmo sexo.

 Do lado contrário, havia uma parte mais conservadora da doutrina que distinguia o
direito à autodeterminação pessoal (casar com quem quero) e do outro lado, a
possibilidade de entregar uma criança a uma família em que há unidade de sexo e, por
isso, falta de referência de um dos sexos.

2. Admite-se que sejam casados (art.1979º/1) há um dado tempo (requisitos temporais).

3. que vivam em união de facto (art.7º da lei da união de facto, lei 7/2001 que determina a
aplicabilidade do art.1979º, equiparação ao regime jurídico do casamento).

4. Além disto, também podem ser solteiros; neste caso há um condicionamento subjetivo  só se
admite nos termos do art.1979º/2, por quem tenha mais de 30 anos sendo solteiro.

Por último, no que respeita à legitimidade ativa para adopção, há ainda limites etários
particulares. Estes respeitam ao facto de o legislador pretender evitar uma desproporção significativa
entre idade do pai adotivo e da criança adotada. Ou seja, para evitar que haja adoção por quem já devia
ser ilegível como avô, mas não como pai. No nº3 do art.1979º diz-se que não pode ser candidato a
adotante quem tenha mais de 60 anos. No entanto, há o desvio do nº5: só se admite que ainda possa ser
adotante se a criança a adotar for filha do cônjuge do adotante, neste caso admite-se para preservar a
unidade da família, possa ser pai adotivo.

Nos termos do art.1979º/4 ainda dentro da lógica de evitar desproporcionalidade manifesta,


proíbe-se a existência de diferenças de idade superior a 50 anos; aqui também há desvio um desvio:
exceção prevista na II parte do art.1979º  no fundo, pode a diferença de idades ser superior quando, a
título excecional, por motivos ponderosos e havendo interesse superior do adotante que o justifique.
Ex: crianças irmãs de outras crianças já adotadas. Por essa razão, para se agregar toda a família, admite-
se que os limites etários não sejam tao imperativos.
204

Legitimidade para ser adoptado

Pode ser adotado, em regra, art.1980º/2 e nº2/d do RJ. Adoção menores de 15 anos. Funciona
primordialmente dentro deste período etário. Comporta desvio: é possível adoptar maiores de 18 anos,
1980/3.

Efeitos da Adoção

Art.1986º - princípio da equiparação jurídica aos filhos biológicos e princípio da integração


plena na família adoptiva. Este princípio é suscetível de um desvio/ atenuação (Art. 1986/3).

O princípio é, de facto, o da equiparação jurídica dos filhos adotados aos biológicos e uma
integração plena na família adoptiva com a rotura dos laços da família biológica, mas em termos
excecionais pode haver manutenção dos laços com a família biológica nestes casos do nº3 do art.1986.

Este princípio do nº3 foi introduzido em 2015 (é mais uma das boas extravagâncias do regime,
mas difícil de compatibilizar, por exemplo, com o princípio do sigilo). De facto, aqui temos possibilidade
de contacto com a família biológica. Alteraram-se certos aspetos sem se atenuarem outros aspetos,
houve alteração descuidada.

Este art.1986/3 é norma simétrica a outra que já conhecemos, o art.1987- A. Já falámos que o
legislador pretende favorecer o contacto entre irmãos, ascendentes e descendentes. É dentro do mesmo
espírito que, hoje em dia, se explica no RJ da adopção esta norma especial.

Art. 1988 - Outra ideia importante consta do art.1988º  a adopção passa também, dentro do
espírito de integração na nova família, pelas alterações no nome da criança adotada.

Como é que se constitui este regime? O nome é elemento de identificação pessoal. Assim, se uma
criança é adotada, de acordo com o princípio da equiparação aos filhos biológicos, os filhos biológicos
não podiam ter um apelido e os adotivos outro. Haveria um ausência de harmonização.

Por isso, o legislador estabelece que:

em regra, deve-se manter o nome próprio da criança (nº2 do art.1988º), é particularmente


importante nos casos em que a criança já responde a um nome próprio, em matéria de identidade
pessoal. Mas, perde os apelidos que constavam do nome civil, os apelidos relativos à família biológica.
Estritamente para favorecer a integração no ambiente adotivo.

O novo nome vai ser composta nos termos do art.1975º, ou seja, os pais adotivos devem, de
comum acordo, decidir ordem dos apelidos dentro do regime geral.

Sem prejuízo destes traços do regime, há a faculdade de modificação do nome próprio da


criança a requerimento do adotante quando se entenda e se alegue que essa modificação salvaguarda o
interesse da criança (dto à identidade pessoal / integração na família -alegando interesses ponderosos).
Ex.: aquele nome próprio é dado pela tradição da família biológica e traz-lhe lembranças negativas
205

(passado de violência); ou todos os filhos da família adotante começam com Maria, e aquela criança não.
Nestes casos excecionais, centrado no interesse da criança, é possível alterar o nome da criança.

Acórdãos

 16.3.2017 STJ  esclarece-se de forma clara o conceito de interesse superior da criança quanto
ao processo de adoção. A criança tinha 5 meses quando foi posta fora de causa pelo avo
biológico juntamento com a mãe; a mãe estava sinalizada por não se mostrar capaz de
demonstrar estabilidade, não proporcionar horários e tinha défices cognitivos (tinha algumas
dificuldades de gerir a própria pessoa o que se traduzia na capacidade de gerir a vida de uma
criança). Por isso, o STJ entendeu que era imposto pelo interesse superior da criança uma
medida tendente a adoção, retirando-a da mãe. Todos estes processos são muito difíceis,
sobretudo, quando não há consentimento para adoção. Porquê? Porque é o MP e o juiz a decidir
retirar a criança da mãe. E é difícil porque é uma medida em contraposição com o princípio de
que os filhos não podem ser separados dos pais, só em casos excecionais.

PMA’s

Lei 32/2016 de 26 de julho. Tem sido sucessivamente alterada - a última ocorreu na lei
25/2016 de 22 de agosto, que veio regulamentar a gestação de substituição. Desde 2016, tínhamos a
regulação da procriação medicamente assistida (técnicas oferecidas aos casais que não possam, por
razoes físicas, gerar uma criança). De forma a permitir o dto à constituição de família.

Este regime é importante porque vem estabelecer uma nova forma de estabelecimento da
filiação. Através das técnicas de PMA’s, vamos gerar um vínculo de parentesco/ criamos um vínculo de
parentesco (ainda que apenas unilateralmente) consanguíneos, biológicos.

A diferença é que há intermediação de técnicas laboratoriais/ científicas que vêm suprir alguma
limitação/deficiência de um ou ambos os pais.

Este regime juridico também tem implicação em matéria de exercício de responsabilidades


parentais; além disso, coloca vários problemas:

1. Primeiro problema jurídico: renúncia à titularidade de responsabilidade parentais pelos


pais biológicos. Os sujeitos do sexo masculino que sejam dadores de esperma têm de assinar
documento em que assumem dever de sigilo/ confidencialidade absoluta e renúncia a
qualquer exercício das responsabilidades parentais. O mesmo quanto à maternidade de
substituição ( aquela que aceite ser mãe de substituição vai renunciar ao exercício e à
titularidade de responsabilidades parentais).

2. Segundo problema jurídico: admissibilidade das limitações estabelecidas quanto ao direito a


conhecer o descendente. Eu renuncio a ser pai/mãe e estou proibida de contactar com o
descendente que venha a ser formado com base no meu material genético.
206

3. Terceiro problema jurídico: controversa admissibilidade das limitações de sentido contrário


- do descendente de conhecer o ascendente biológico. Além do direito à autoderminação,
pode haver implicações em doenças hereditárias, rastreios, etc. com estes entraves
legislativos, esses dtos ficam postos em causa. ( 26/1 + 26/3 CRP).

Quais as técnicas de PMA autorizadas? As técnicas autorizadas são taxativamente enunciadas,


segundo um princípio de tipicidade no art.2º da lei. Tais técnicas são depois aplicáveis à maternidade de
substituição. Exemplos de técnicas: a inseminação artificial, Inseminação in vitro, transferência de
embriões, gametas ou zigotos, diagnostico genético pré-implantação. Podemos ter uma cumulação: mãe
que gerou criança através de uma destas técnicas.

Coordenadas/ Diretrizes gerais:

1- Subsidiariedade de recurso a PMA’s. Só é admitida como método de procriação em casos


limites, nos termos do art.4º/1. Há ainda outro problema jurídico aqui: discriminação dos
homens quanto às mulheres, pois admite-se que os homens só recorram em dados casos (ex:
infertilidade), mas as mulheres podem recorrer em qualquer caso.

2- Tipicidade das causas habilitantes do recurso a PMA’s (art.4º/2 e alargamento do nº3). São
3 situações. É de notar que existe princípio de gratuitidade de entrega e disponibilização de
material genético próprio. Isto vale concretamente para doação de espermatozoides, gâmetas,
oócitos ou embriões (Art. 10) e o nº18 esclarece que é proibida a CV de óvulos, sémen ou outro
material biológico. Pura gratuitidade e altruísmo.

3- Exigência de consentimento qualificado (art.14º/1 da lei). Compreende-se uma vez que a


ingerência em material genético é uma restrição a direitos fundamentais e de personalidade.
Não posso ser compelido a doar material genético a menos que o consinta. O art. 14 exige o
consentimento qualificado  tem que ser livre (sem coação) esclarecido (informado sobre a
recolha do material), expresso (não vale as modalidades de consentimento tácito) e por escrito
(por razões de prova e segurança).

4- O consentimento caracteriza-se pela possibilidade de revogação, mas apenas até ao início


dos processos terapêuticos de pma (art.14º/4 e 5). assim, alguém doa o material genético (
consente) e pode arrepender-se e vir a comprometer a utilização do material, mas apenas até ao
inicio do procedimento. Se for na pendencia do procedimento já não pode revogar.

5- Princípio da confidencialidade (art.15º/1). É confidencialidade a dois níveis:

a. tem que haver sigilo quanto a recurso a técnicas de PMA’s/ funcionam exigências
relativas à reserva de intimidade de vida privada (Art. 80 CC e Art. 26 CRP). Ninguém
pode revelar que alguém está a ser objeto de tratamento com estas técnicas.
207

b. a confidencialidade quanto à identidade dos sujeitos; não pode explicitar-se quem são os
sujeitos que estão a ser visados por estas técnicas de pma’s.

6- Direito da pessoa nascida com recurso a PMA’S a obter informações de natureza genética
(art.15º/2). Esta lei de 2016 vem introduzir este princípio que, em 2015, já encontrávamos na
adopção. O L está cada vez mais sensível à ideia de que a confidencialidade funciona, mas se a
própria pessoa fruto destas técnicas pretender exercer o direito a saber as origens genéticas
pode faze-lo, apesar de haver estes limites.

Que limites são esses: o dto a conhecer as informações de natureza genética não é um dto a
conhecer a identidade do dador. Portanto, posso conhecer a minha propensão para ser um doente com
alzheimer. Mas não tenho o dto a conhecer o meu ascendente biológico. É a forma que o L encontrou de
compatibilizar essas 2 coordenadas.Agora há uma exceção à limitação: quais os 2 desvios à limitação?

a. É um princípio não absoluto e pode-se relevar o conhecimento do dador para saber


se existe impedimento legal à celebração do casamento.

b. É possível ainda conhecer identidade do dador, se o próprio expressamente o


permitir. É uma teia de normas difíceis de articular na prática. O dador renuncia,
mas se expressamente permitir, já se pode relevar a identidade.

c. Há ainda outra possibilidade: razões ponderosas conhecidas por sentença judicial.


Assim, toda a confidencialidade do processo vem a ser comprometida pela
necessidade do recurso a uma sentença judicial, mesmo não tendo o dador
expressamente autorizado. O tribunal decide autorizando ou não a libertação da
identidade do dador, mesmo contra a vontade do dador

7- Proibição de discriminação entre filhos nascidos com ou sem recurso a PMA’S (art.3º/2)
- já temos isto quanto a filhos adoptivos e não adoptivos.

8- Proibição de publicitação do recurso a PMA’s no assento de nascimento (art.15º/5)-


Nunca se pode referir no assento de nascimento que “nasceu às x horas uma criança gerada com
técnicas de PMA’S”.

Notas

Os beneficiários dos PMA’s, com base no art.4 e 6 - a chamada delimitação subjetiva:

1. casais de sexo diferente, casados ou em união de facto


208

2. Casais de mulheres que podem ser casadas ou a viver em condições análogas à dos
cônjuges. Assim, discrimina-se os casais homossexuais compostos apenas feitos por
Homens (nestes casos é preciso diagnostico de infertilidade).

3. Além destes casais de mulheres, admite-se por todas as mulheres independentemente


do estado civil e orientação sexual.

Tramitação do Estabelecimento de Filiação

Relevam três normas o art.10/2, Art. 20 e Art. 23.

 art.10º/2 estabelece-se o princípio de que os dadores não podem ser havidos


progenitores de quem vem a nascer.

 art.20º  determina que, ainda que tenha sido apenas a mulher a recorrer a esta
técnica, se ela for casada ou viver em união de facto e houver consentimento do marido, ele é
havido também como pai da criança.

O nº2 regula casos em que não há prestação de consentimento, mas depois substitui-se isso por
ato com validade idêntica. No caso do nº3 só houve consentimento da beneficiária, o que significa que é
só filho dela, filiação a favor de mãe e paternidade desconhecida.

No nº4, permite-se meio de reação em dois casos essenciais: a. quando houve consentimento do
marido, mas ele pensa que a criança nasce da relação com terceiro e não das técnicas de PMA ou b. nem
houve consentimento e ele pretende contornar o efeito que resulta do 20/1.

Art.23º  implica explicar o que resulta do art.22º (inseminação post mortem), ou seja, a
mulher, sabendo que o marido estava com doença terminal, vem a congelar o material genético do
marido para poder ser mãe de criança nascida daquele homem. É proibido nos termos do art.22º.
Contudo, como resulta do art.23º, se, pese embora a proibição, nascer uma criança, estabelece-se
filiação e estabelece-se que a criança que vier a nascer é filha do falecido.

O dador de material genético não pode nunca ser pai da criança  art.21º. E não lhe cabem
quaisquer poderes/deveres em relação à criança (renúncia antecipada quanto à titularidade de
responsabilidades parentais).
209

Maternidade de Subsitituição

O conceito está no art. 1. Há um contrato celebrado entre os pais da criança e a mãe de


substituição; contrato de natureza gratuita

A maternidade de substituição consta apenas do art.8º e foi introduzida em 2016 depois de debate
extenso na comunidade jurídica, que ainda não está fechado.

1. Discute-se, desde logo, o problema da sua admissibilidade. Se não houvesse o art.8º, poder-se-ia
entender que o recurso a maternidade de substituição seria ilícito. Porquê? Porque só existe a
possibilidade de alguém restringir dtos de personalidade (como o dto ao próprio corpo/ dto á
integridade física dentro dos limites da lei e respeitando a ordem pública). Ora, nestes casos em
que há recurso a um 3º para gerar criança, não é clara a compatibilização com os imperativos de
ordem pública.

Não basta o consentimento  a norma do art.340º (consentimento no direito civil) vem


estabelecer parâmetros (não se pode dizer que qualquer ato é válido porque é consentido).

2. Além deste problema geral de admissibilidade, há outros problemas. Por exemplo, o recurso à
maternidade de substituição dá aso, de forma camuflada, à atribuição de prestação pecuniárias
por parte dos pais da criança.

Os futuros pais da criança querem que a mãe de substituição esteja bem alimentada,
bem nutrida, descansada, confortável. Por isso, vão sendo realizadas prestações
pecuniárias a favor daquela pessoa que comprometem o caráter gratuito. Chegamos a
um ponto em que é difícil dissociar o que é que ainda é contrato e o que é que está fora
do contrato.

3. Pode ainda questionar-se o problema de saber quem é a verdadeira mãe: a que vai gerar ou que
vai criar (mãe afetiva)? O dto não consegue dar uma resposta cabal a esta matéria, ainda que se
estabeleça um princípio. O princípio que a mãe é quem vai receber a criança; porque a mãe de
substituição vai renunciar ao exercício das responsabilidades parentais. Foi a forma do
legislador resolver o problema. A questão é se o legislador pode estabelecer isto.

4. Por último, problema da admissibilidade de renúncia a conhecer os ascendentes bem como toda
a família alargada biológica.

Jurisprudência

 TC 225/2018 proc. 95/17: Tribunal Constitucional declara inconstitucionalidade com força


obrigatória geral de normas contidas no art.8º desta lei  o nº4, 10º e 11º. Por violação do
princípio da determinabilidade das leis, por violação do princípio da reserva de lei parlamentar.
210

 Ainda declara inconstitucionalidade do nº5 do art.14º da lei na parte em que não admite
“revogação do consentimento da gestante de substituição até à entrega da criança ao
beneficiário” por violação do seu direito ao desenvolvimento da personalidade, interpretado de
acordo com o princípio da dignidade humana, e do dto de se constituir família, em consequência
de uma restrição excessiva dos mesmos (art. 18/2 e 26 CRP).

 Declara ainda a inconstitucionalidade do nº12 do art.8º por violação do direito à identidade


pessoal da criança ( art. 26/1).

 Declara inconstitucionalidade do nº1 na parte em que impõe sigilo absoluto relativamente às


pessoas nascidas em consequência do PMA.

Então, a maternidade de substituição sofreu nos últimos tempos uma machadada significativa: O
TC veio alertar para desproporcionalidade do regime tal como consagrado. Por um lado,
desproporcionalidade porque só se admite em casos-limite (o que se entende que pode ser atentatório do
próprio dto de constituir família por quem não tenha outra via). AF diz que essa pessoa tem a solução da
adopção.
O outro problema é o da irrevogabilidade do consentimento a partir do momento em que se
inicia a técnica/ a partir do momento em que é implantado o embrião já não é possível a revogação do
consentimento. Entende-se que isto é uma violência para a própria mulher que vai carregar a criança. A
par disso, haveria o problema dos pais: esperam pela criança e depois a gestante já não queria entregar
a criança. Há um problema de colisão de dtos. O TC entendeu (e AF concorda) que nesta colisão de
direitos o que releva de forma mais determinante é o dto da mulher que dispôs do próprio corpo e,
portanto, deve poder arrepender-se da decisão de renunciar à maternidade. Sem prejuízo do recurso à
indemnização. Há violação de contrato e gera responsabilidade pré-contratual ou obrigacional.

Temos de saber:

1. o conceito (art.8º/1)

2. a quem se aplica/ âmbito subjetivo de aplicação

3. quem pode recorrer/ âmbito subjetivo de aplicação (art.8º/6); neste artigo também se esclarece
uma coordenada importante: não é possível haver maternidade de substituição quando haja
subordinação económica. Ex.: empregada doméstica, aliciam a senhora para que ela tenha
criança. Sempre que exista relação prévia, subordinação económica ou jurídica, não é valido
qualquer contrato de maternidade de substituição. O legislador presume que não á liberdade/
ausência de consentimento.

4. Diretrizes essenciais que vamos falar a seguir.


211

Diretrizes Essenciais

1- Excecionalidade vem no art.8º/2 e foi censurada pelo TC

2- Gratuitidade  art.8º/2 e 8º/5

3- Há processo que tem de ser tramitado com recurso a Comissão Nacional Procriação Medicamente
Assistida e auditado pela Ordem dos médicos, não é processo apenas técnico. Art. 8/4.

4- Proibição de discriminação de filhos nascidos (art.15º/4 e 36º/1 da CRP) com recurso a PMA’S ou
sem recurso a esta figura.

5- Natureza contratual do vínculo resulta do art.8º/1 (gestante de substituição) e art.8º/1


(negócio de maternidade de substituição) e do art. 8º/10 que diz que é um contrato
solene/formal (tem de ser reduzido a escrito).

6- Confidencialidade do processo (art.15º/1)  identidade dos sujeitos envolvidos e do próprio ato


da PMA.

7- Obrigação de manter sigilo (art. 26/1 CRP, art.80º do CC e art.15º da lei). Toda esta obrigação de
manter a reserva está associada à lógica de que sempre que trabalhamos com dados clínicos,
trabalhamos com dados sensíveis, nos termos do art.7º da lei de proteção de dados; não pode
ser tratado sem que haja consentimento ( regulamento que irá entrou em vigor em Maio)

8- Nulidade como valor jurídico negativo  havendo violação das coordenadas impostas pelo
legislador, o contrato é nulo  art.8º/12 da lei das PMA’S

9- Relevância jurídico-criminal, além de ser nulo, qualquer violação dos termos esclarecidos pelo
legislador, pode gerar responsabilidade criminal - nos termos do art.34º e 44º. Por exemplo, se
celebram contrato oneroso, gera responsabilidade criminal.

10- Art.8/7  os pais são quem recorre a estas técnicas.

EFEITOS DA FILIAÇÃO

Até agora vimos quais as modalidades de filiação: biológica bicéfala (com ou sem recurso a PMA’S)
associado à verdade biológica, e a jurídico-legal. Vamos agora ver os efeitos da filiação (isto já foi
estudado em Civil). Está nos art.1874º-1972º CC.

Coordenadas gerais:

 Art.1874º  tem importância dupla: por um lado, esclarece que os pais têm um poder-dever
quanto aos filhos.
212

 Art.1875º e 1876º  dizem respeito à composição do nome do filho; já vimos quem decide,
em que termos é que pode haver lugar ao aditamento de apelidos, se só do pai ou se só da mãe.
Remeter para a matéria do Estado pessoal.

 Art.1877º  respeita às responsabilidades parentais. Esta matéria vai do art.1877º a 1920º/c.

o A primeira ideia é que houve mudança intencional do conceito: hoje fala-se em


“responsabilidades parentais” e já não em “poder paternal”. Esta epigrafe foi alterada em
2008, na reforma que entendeu que era mais adequado fazer cair a ideia de potestas. O
poder paternal antigo é cada vez mais um dever de atuação / poder funcional/ uma
responsabilidade que se assume perante a criança / família e estado.

o Vigência /Durante quanto tempo duram? O art.1877º esclarece que duram até à
maioridade ou até à emancipação. Então, até 18 anos/ até lá os filhos estão sujeitos a
responsabilidades parentais, embora não implique que se celebrarem casamento com
16 anos não haja emancipação plena (132 e 133 CC).

Esta ideia de que é apenas até à maioridade comporta o desvio assinalável do art.1880º. Ou seja, pode,
sem prejuízo do filho se tornar maior, continuar a beneficiar do pagamento de despesas pelos os pais.
Ex.: frequenta curso ou formação profissional. Não é linear a ideia de que, com a maioridade, termina
qualquer dever de assistência.

o Conteúdo das responsabilidades parentais  1878 a 1884º. É instituto de natureza


complexa; como tal, não pode ser conduzido a uma só situação jurídica ativa ou só uma
passiva. Temos uma pluralidade de situações jurídicas ativas e passivas (dtos
potestativos, verdadeiros deveres jurídicos, obrigações jurídicas como a de alimentos)
que têm de ser vistas caso a caso.
213

o As diretrizes gerais deste instituto jurídico:

 Art.1872º, irrenunciabilidade- os pais não podem renunciar ao exercício das


responsabilidades parentais. Ex: abandonar criança, não pode renunciar.

 A representação é instituto regra e funciona como técnica de substituição da vontade


do menor; o não prejudica que haja intervenção de outros institutos, por exemplo, a
assistência (para a celebração do casamento do menor).

 Direitos e deveres compreendidos neste instituto jurídico; os dtos e deveres aqui


compreendidos implicam distinção nos dois planos: estatuto pessoal e patrimonial.

 No pessoal temos os 1885º-1887ºA conjugado com 1604º A e 1612º


para a autorização do casamento celebrado pelo menor.

 Quanto ao estatuto patrimonial, temos regulamentação mais complexa


art.1888º a 1900º do CC. Aqui exige-se aos pais que garantam o sustento,
manutenção dos filhos, custeiem as despesas e encargos associados. Isto
implica, por outro lado, a administração de bens dos filhos – é um tema
complexo porque, ainda que tenhamos um instituto de substituição de
vontades, os pais não estão habilitados a praticar todo e qualquer ato de
administração. Exige-se em certos atos a autorização judicial e, noutros,
os pais estão mesmo proibidos de os praticar. Artigos relevantes:
Art.1888º (exclusão de administração, os pais não têm administração
destes bens) e art.1889º (administração dependente de autorização do
tribunal). Havendo desrespeito por isto, há norma que estabelece valor
jurídico negativo - temos o art.1893º estabelece como regra a
anulabilidade. Tudo isto deve ser articulado com o art.36º da CRP.

[POR FORMATAR DAQUI PARA BAIXO FICOU POR FORMATAR]]]]]]

COMO SE EXERCEM AS RESPONSABILIDADES PARENTAIS?

Sabemos durante quanto tempo vigoram, qual a natureza jurídica (complexo) , o regime jurídico
complexo, em que se traduz o seu conteúdo e agora como se exerce.
214

Está nos arts.1901º a 1912º do CC. Estes artigos foram objeto de alteração pela lei 24/2017 de 24 de
maio. Esta alteração foi para enxertar no CC um artigo relativo à regulação urgente de
Responsabilidades parentais em caso de violência doméstica:

 art. 1906- A Regulação das responsabilidades parentais no âmbito de crimes de violência


doméstica e de outras formas de violência em contexto familiar; Para efeitos do n.º 2 do artigo
anterior, considera-se que o exercício em comum das responsabilidades parentais pode ser
julgado contrário aos interesses do filho se:

a) For decretada medida de coação ou aplicada pena acessória de proibição de contacto entre
progenitores, ou

b) Estiverem em grave risco os direitos e a segurança de vítimas de violência doméstica e de outras


formas de violência em contexto familiar, como maus tratos ou abuso sexual de crianças.

A diretriz essencial/princípio vetor é o respeito pelo superior interesse da criança. É transversal a


qualquer modalidade de filiação porque o exercício das RP é unitário. Intencionalmente, o legislador
deixa a densificação deste conceito à doutrina e jurisprudência.

Temos de distinguir:

1. se a filiação foi estabelecida a favor de ambos os progenitores ou só a favor de um dos


progenitores. Depois, dentro disto, temos de distinguir se foi estabelecida a favor de ambos os
progenitores e eles:

a. estão casados

b. não estão casados nem vivem em união de facto

c. estão divorciados/separados judicialmente de pessoas e bens

d. vivem em união de facto

e. houve morte, de um

f. houve morte de ambos.

Na constância do matrimónio, responde o art.1901º do CC  as responsabilidades parentais são


exercidas por ambos os pais.

Implica distinguir/ implica perceber se o ato compreendido nas responsabilidades parentais é do


dia-dia ou questão de particular importância porque é diferente a resposta consoante esteja em
causa um ato do dia a dia ou ato de particular importância. No casamento vimos algo semelhante.
Portanto, aqui, se for ato de gestão corrente, qualquer um deles pode pratica-lo independentemente do
consentimento, porque se presume que há entendimento/ que estão de comum acordo/ não é preciso
estar sempre a perguntar se o pode inscrever na natação/ levar à pediatra. Agora, quanto aos atos de
215

particular importância, não definidos na lei, há um juízo casuístico e temos de ver concretamente se o
ato pode subsumir-se ao quotidiano da família ou, pelo contrário, se deve ser tratado à parte e exigir
concurso da vontade. Esta distinção está no art.1901º/2. Depois no art.1902º temos os atos praticados
por um dos pais.

Basicamente, 0s casos em que se exige expressamente o consentimento de ambos os progenitores é em


sede de certas matérias de administração de bens ou atos de particular importância.

Ex1: temos casal em que um dos membros vive aleado da realidade virtual (não sabe o que é o
Facebook) e o outro membro é elemento muito ativo nas redes sociais e mete fotos dos filhos.

Quanto a esta questão: é uma de particular importância ou pode-se entender que a mãe, sendo
também titular de RP, pode partilhar com as suas amigas as conquistas dos seus pequenos rebentos?134
Temos que pensar que questões como estas ( ainda que socialmente aceites) são ilícitas - ao abrigo do
art.79º e a jurisprudência tem sancionado estas mesmas práticas porque o direito a imagem é
fundamental e está sujeito a consentimento. Só posso ver a minha imagem captada se tiver dado o
consentimento. Em suma, a posição da cadeira é que estas são questões de particular importância.

Se assim é, no quadro geral, então quanto a menores, o titular do direito à imagem é o menor, e quem
administra são os pais. Basta que haja dissenso para que o ato seja considerado ineficaz, inválido. Sendo
ato de particular importância, tem de haver comum acordo. O que se tem acentuado ( e AF concorda) é
que o direito a imagem é direito pessoalíssimo, é um daqueles casos em que a representação legal está
limitada. Como a criança ainda não administra a sua própria imagem, os pais não têm o direito de usar a
imagem dos filhos para as finalidades que entendam eles próprios como legítima porque sendo direito
pessoalíssimo é insuscetível de representação legal.

Acórdão:

 TR. Évora: 25.6.2015, o tribunal chama a atenção para algo muito importante  os pais não são
donos da imagem dos filhos, os pais têm um dever de resguarde, a utilização da imagem e
lançamento em redes sociais determina que uma imagem uma vez publicada passe a ser bem
publico. Portanto pode ser objeto de tratamento indevido/ ilícito. Ainda que possa haver vários
filtros, está comprovado que uma pessoa possa entrar na rede e publicar tais fotos numa rede
de pedofilia. Os smartphones têm a possibilidade de localizar geograficamente a fotografia e por
essa via permitir dar dados a terceiros.

Quanto aos atos da vida corrente o princípio é outro  aí já qualquer um dos progenitores pode
praticar. O nº3 esclarece que o progenitor com quem reside o menor habitualmente ou com quem se
encontre temporariamente também tem possibilidade de tomar decisão, isto quanto aos casos de
filiação na constância do matrimónio.

Se houve dissolução do matrimónio por morte, funciona o art.1904º, há princípio de concentração


das responsabilidades parentais, são concentrados no cônjuge sobrevivo.

Se se dissolveu por divorcio ou separação judicial de bens, aplica-se o art.1906º do cc, convoca-se a
distinção do art.1901º.

134 Em sede de oral não dizer “faz todo o sentido” usar antes “parece que o legislador quis dizer”
216

Em caso de separação de facto, temos o art.1909º, e união de facto art.1911º. Depois há ainda outras
situações de não coabitação, art.1912º, casos em que houve relação episódica, nasceu criança, e é
possível saber como se exercem as responsabilidades parentais.

Regime dos alimentos devidos a menores:

A obrigação de alimentos é modalidade do dever de contribuir para encargos da vida familiar e funciona
em cargos patológicos/ de rutura. Consta do art.1905º do CC. Temos de compatibilizar com o regime
geral dos alimentos (art.2003º e ss.) A obrigação de alimentos é vínculo que se gera entre o progenitor e
o filho, independentemente do eventual estabelecido vínculo entre os cônjuges ou ex-cônjuge. O vínculo
é sempre autónomo.

Inibições no exercício das responsabilidades parentais:

O que vimos até agora é em casos de normalidade. Agora, há casos excecionais, verdadeiramente
patológicos, em que o legislador decide que aquela criança não pode ficar à guarda dos seus pais/
inibição do exercício do poder paternal - previstos nos arts.1913º-1920º/a, e 1877º/1 do CC. Portanto,
temos situações em que por força da lei os pais ficam impossibilitados de exercer as responsabilidades
parentais, são casos tipificados/ fechados.

Nos casos do art.1915º temos situações em que ocorreu facto suficientemente grave (violador das
responsabilidades parentais) que determina que o Ministério Público, qualquer parente ( ainda
que não seja titular das responsabilidades parentais) ou qualquer outro, venha pedir inibição das
responsabilidades parentais. Depois, ou se abre a adoção, ou fase de admissão para candidatura de
adoção. Nesta ação destinada à decretação da inibição das responsabilidades parentais, caracteriza-se
por 3 elementos:

1. há juízo de censura/ de culpa da atuação dos pais

2. a existência de grave prejuízo para os filhos

3. alegação e demonstração que aqueles pais não têm condições para cumprir deveres que por lei
devem exercer.

Quando se extinguem?

1- Maioridade

2- Emancipação

3- Morte
217

Teórica de Dto da Família Dia 16 de maio de 18

Terminamos ontem a matéria da filiação, que nem sempre integra os programas de dto da família.

Algumas notas:

- Esta matéria so foi dada com menos aulas praticas porque não há muito tempo, mas tem de ser
aprofundada em casa, com o nível de aprofundamento que foi dado em aula, tal como as restantes
matérias. Vai provavelmente sair no exame.

- Temos de ter os códigos atualizados para trabalhar com rigor nessa matéria

(alterado pela Lei 24/2017 e Lei 5/2017, de 2 de março)

Acórdãos sobre a matéria da filiação:

- alteração da residência do menor determinada unilateralmente:

a. Ac. do STJ de 26 de janeiro de 2017:


veio aplicar o regulamento de Bruxelas (Reg. 2201/2003), que foi aprovado para esclarecer os
conceitos de residência permanente do menor e os chamados dtos de visita.

Neste acórdão aprecia-se uma questão processual, de saber qual é o tribunal competente num caso
em que há uma menor que nasceu no Luxemburgo, residiu 8 anos com a mãe la e, ainda que tenha
havido alteração de residência motivada por uma decisão familiar unilateral, entende-se que o tribunal
competente continua a ser o tribunal do Luxemburgo porque era ali que a criança tinha a sua residência
permanente e habitual.

Isto é muito importante porque há muitas vezes a pretensão por parte dos cônjuges de alterar a
residência permanente do filho. Ou seja, vivia no Luxemburgo, depois decide mudar-se para Portugal e
entende que aqui passa a ter a sua residência permanente e fa-lo com base numa argumentação ate
factual: diz “eu neste momento tenho casa própria em Portugal, para alem disso liquidei os impostos
relativos a este imóvel e já inscrevi os meus filhos aqui. Tenho trabalho numa empresa em Portugal”. E
todos estes factos relevantes demonstraram que a alteração não é so formal, mas também material
porque acompanhada de uma transfiguração de tudo o que diz respeito aos aspetos da vida do
progenitor e da criança.

Mas se isto é valido em abstrato (uma pessoa mudar de vida), sempre que a filiação estiver
estabelecida a favor de ambos os progenitores, isso implica uma consequência muito relevante: se a
criança não é filha de pai incógnito ou mãe desconhecida, o efeito jurídico primário de estabelecimento
218

de filiação é a titularidade de responsabilidades parentais a favor dos dois, ainda que a menor
tenha a sua residência habitual junto de um progenitor e outro tenha apenas dtos de visita.

Para alem disto temos o problema do exercício das responsabilidades parentais. Nesta matéria,
com base daquilo que resulta do art. 1901 e 1906 do CC temos uma distinção essencial entre aquilo que
são considerados atos de particular importância e atos da vida corrente, com base nestas premissas.

Os atos de vida corrente podem ser praticados pelo progenitor que tenha a guarda da criança, sem
que haja necessidade de um consentimento do outro.

Já relativamente aos atos de particular importância o legislador vai exigir uma vontade do outro
progenitor tambem porque à luz da CRP (art.36/5 e 6) reconhece-se a ambos os pais o dto e o dever de
educar a criança e de manter a criança.

Temos então nesta matéria de responsabilidades parentais de traçar sempre primeiro esta linha
entre o que é um ato de vida corrente e o que é um ato de particular importância.

O legislador normalmente não define.

Um critério pragmático é considerar que a generalidade do quotidiano são atos da vida corrente. O
que significa que os atos de particular importância podem ser definidos por exclusão de partes, serão
todos aqueles que digam respeito aos núcleos essenciais da vida do menor: segurança e saúde, sustento,
educação. Estes pilares135 serão considerados atos de particular importância.

Quando existe uma criança, a criança é soberana no sentido em que todas as normas dizem que as
responsabilidades parentais são sempre exercidas no interesse da criança.

O que significa que, ainda eu seja muito bom para um pai a mudança de residência, o que se impõe
verificar é seda perspetiva da criança, aquela mudança é de facto vantajosa ou não, porque do confronto
entre estes dois termos da equação, pode resultar a opção entre a criança seguir com o pai que quer
mudar de país ou permanecer naquele que é a sua residência e passar a viver com o outro progenitor.

Não é líquido entender-se que a circunstância daquele progenitor que tem a guarda, alterar a sua
vida profissional seja legitimo para que o filho mude a sua vida.

b. Esta distinção foi aclarada também pelo ac. do T. Relaçao de Lisboa (TRL) de 2 de maio de 2017:
Aqui vem explicar o regime, explicar o que acontece quando o ato é da vida corrente, relativamente
às de particular importância, exige o concurso da vontade e depois o próprio tribunal faz escolhas
interessantes: realça a ideia de que existem zonas cinzentas entre as distinções, o que implica que em
determinado caso um ato possa ser considerado de vida corrente e outro de particular importância e
vêm demonstrar a titulo exemplificativo.

Atos de particular importância: intervenções cirúrgicas das quais podem resultar riscos
acrescidos para a saúde do menor, a pratica de atividades desportivas radicais, as saídas de menor para
estrangeiro sem ser em viagem de turismo, a matricula no colégio privado ou a mudança de colégio
privado, a mudança de residência do menor para local distinto do progenitor a quem foi confiado.

135 Art.1878
219

Atos de vida corrente: decisões relativas à disciplina, ao tipo de alimentação, atividade e ocupação
de tempos livres, decisões quanto aos contactos sociais, o ato de ir buscar e levar o filho a escola, de
acompanhar os trabalhos escolares, a decisão quanto à higiene diária, ao vestuário, ao calçado, a
imposição de regras, decisões sobre idas ao teatro, cinema, saídas à noite, consultas medicas de rotina.

c. Ac. de 16 de novembro de 2017 do STJ:


Esclarece os termos de conciliação entre dtos de visita e residência habitual. Por ex. não é
adequado se o pai vive em Itália e a mãe em Portugal estabelecer uma guarda partilhada

Outro tema que falamos foi dos prazos do dto de investigação da paternidade e maternidade:

Isto tem sido objeto de uma flutuação jurisprudencial.

Numa primeira fase, antes da recente alteração normativa que veio fazer um alargamento do prazo
para aa propositura de ação ate aos 10 anos, entendia-se que era inconstitucional limitar o dto de ação,
limitar o dto à identidade pessoal, o dto a conhecer a origem genética era inconstitucional.

Contudo, nos tempos mais recentes já se desenha uma corrente jurisprudencial no sentido de se
admitir como mais razoável e aceitável, e, portanto, não inconstitucional estabelecer prazos mais
alargados.

Nestes casos nós não temos textualmente nem explicitamente um prazo de caducidade para intentar
a ação de investigação da paternidade, contudo isto é relevado com base na remissão para o regime de
ação de investigação da maternidade - nos termos do art. 1873 que rege quanto à ação de paternidade
intentada pelo filho, em que o legislador remete para o art. 1817. (não esquecer numa hipótese pratica
de explicitar esta técnica legislativa)

a. acórdão de 31 de janeiro de 2017 do STJ:


vem, ao contrário daquela que é a corrente mais estável, considerar inconstitucional o prazo
limitativo do dto de ação. Mesmo o prazo alargado de 10 anos entende que não é adequado. Se
recordarmos o regime dos dtos de personalidade, um dos prazos que se costuma apontar é a sua
imprescritibilidade, ou seja, dtos de personalidade mesmo que não exercidos, não prescrevem.
Se estamos a trabalhar num contexto em que há um prazo de caducidade do dto para propor uma
ação que determina quem é o pai, pode legitimamente considerar-se que é inconstitucional estabelecer-
se uma limitação temporal.

O que se diz é que, em casos como estes, há um conflito de dtos: por um lado há os dtos do pretenso
filho, que são os dtos à identidade pessoal, a autodeterminação e a conhecer as origens genéticas e por
outro lado o dto do pretenso pai a não ser incomodado na ação, tendo em vista o estabelecimento da
220

filiação e que pode ter implicações porque nestas ações há recurso a testes de ADN. Umas das maneiras
do pretenso pai se vir escusar a realizar esses testes é alegar o dto à integridade física.

Nestas matérias vamos ter invocada a norma do art. 335 (colisão de dtos) mas vamos ter aqui
invocada uma colisão de dtos da mesma natureza e espécie e portanto não há um principio de
prevalência, o que implica que hoje em dia o que se faz é relevar o principio da proporcionalidade, da
concordância pratica.

Depois desta interpretação chegamos ou a uma jurisprudência que considera que não é
inconstitucional porque a restrição que se faz aos dtos de personalidade é adequada e não é arbitrária
ou a outra jurisprudência, que mesmo assim é maioritária, entender-se que é inconstitucional porque
não se trata de aferir da adequação ou não adequação, não deve haver limitação temporal no que diz
respeito a dtos pessoalíssimos como estes.

O efeito da caducidade nestas ações significa que, se aquele for efetivamente o pai, nunca se vai
conseguir comprovar judicialmente que ele é pai porque se perdeu o dto à ação.

Sobre esta matéria também vai ser publicado em breve outro acórdão do TC, no próximo mês
provavelmente, cujo relator será o Conselheiro Gonçalo Almeida Ribeiro.

- Acórdão sobre a publicação das imagens dos filhos no facebook há o conflito entre o dto à imagem e
à intimidade da vida privada do filho e que não se entende que possa ser exercido livremente pelos pais,
de acordo com aquilo que é o interesse presumido dos filhos.

Acórdãos sobre o divórcio:

Temos de saber sempre:

1 – Qual a modalidade de divorcio que deve ser relevada?

a. Por muto consentimento


b. Sem consentimento do cônjuge

2- Sabemos também que a tramitação de cada uma das modalidades é distinta:

- o divorcio sem mutuo consentimento é necessariamente tramitado judicialmente

3- No caso do divorcio sem mútuo consentimento, temos de saber qual o fundamento jurídico
para o divorcio:
221

Importante aqui atentar que a al. d) não é uma janela aberta para o divórcio. Pelo contrário, se
formos ver a jurisprudência do STJ, continua a ser também aqui muito exigente, temos de ter factos
suficientemente graves, suficientemente significativos, que revelem a rutura definitiva do casamento.

E estes são conceitos jurídicos que, portanto, precisam de ser decompostos com base em factos.
A melhor forma para ver se houve ou não rutura definitiva do casamento é recordar quais os traços
significativos do casamento, o que cristaliza e diferencia o casamento em relação a outras relações
jurídicas familiares:

- Comunhão plena de vida

- Cumprimento dos deveres conjugais

Mas é uma alínea extremamente exigente, na duvida não se concede o dto ao divorcio se o tribunal não
ficar convencido da irreversibilidade daquela rutura.

4- Planos dos efeitos:

I. Temos de saber qual é o momento da produção dos efeitos.


O princípio geral é que os efeitos do divorcio se projetam para o futuro, sem prejuízo de
haver duas exceções que são normativamente definidas:
- no campo das relações patrimónios entres os cônjuges, se na pendencia do divorcio
algum deles adquirir ou estiver na perspetiva de adquirir um bem
- ou no caso de ocorrer separação de facto.

II. Qual o campo/estatuto afetado pelo divorcio.


O que implica sempre distinguir estatuto pessoal/ estatuto patrimonial e implica tambem
dividir as diferentes relações que podem ser afetadas: temos relações horizontais (entre os
conjunges), verticais (com os filhos), ou outras relações jurídicas familiares (afinidade).
Lembrar também que a matéria dos efeitos do divorcio não está sistematicamente acabada
no CC, os artigos precisam de ser complementados com a obrigação de alimentos por
exemplo (consagrada em dois planos – 1905 quanto aos filhos e 2013 e ss. na relação entre
os cônjuges)

a. ac. de 6 de dezembro de 2001 do STJ


fala sobre os efeitos do divorcio e desvios.

b. Ac. 10 de outubro de 2006 do STJ


relativamente ao divorcio antigamente dito litigioso (proferido ainda antes da alteração
legislativa de 2008). Vem aclarar quando ocorre violação dos deveres conjugais, o que continua
relevante.

c. Ac. de 11 de novembro de 2011 do STJ


222

sobre o art. 1792 CC que vem considerar que podem ser danos morais consequentes da
dissolução do casamento a desconsideração social para o divorciado, a dor sofrida pela
frustração do projeto de vida comum. Também interessante porque o STJ depois vem fazer uma
espécie de censura ou critica social ao regime atual.

d. ac. de 16 de março de 2011 STJ


Sobre o art. 2016 das obrigações de alimentos. Temos aqui uma obrigação de alimentos
estudada em dois planos – quando os cônjuges ainda estão casados mas vivem em separação de
facto (e já vimos que a separação de facto é juridicamente relevante porque pode ser
fundamento do divorcio – não é fundamento por si so de uma modificação da relação
matrimonial mas pode ter implicações no que diz respeito ao cumprimento do dever de
assistência); e depois quando o divorcio já foi decretado.

e. ac. de 9 de fevereiro de 2012 STJ


O STJ faz uma explicação inicial sobre o que é o divorcio e depois deixa a sua marca sobre o novo
regime, dizendo “ A família transforma-se num espaço privado, de exercício da liberdade própria de
cada um dos seus membros, na prossecução da sua felicidade pessoal, livremente, entendida e obtida,
deixando o casamento de assumir, progressivamente, um carácter institucional, maxime, sacramental,
sobretudo na componente da afirmação jurídico-estadual da sua perpetuidade e indissolubilidade, para
passar a constituir uma simples associação de duas pessoas, que buscam, através dela, uma e outra, a
sua felicidade e realização pessoal, e em que a dissolução jurídica do vínculo matrimonial se verifica
quando, independentemente da culpa de qualquer dos cônjuges, se haja já dissolvido de facto, por se
haver perdido, definitivamente, e sem esperança de retorno, a possibilidade de vida em comum.”

f. ac. de 26 de novembro de 2014 STJ


Sobre o problema dos efeitos do divorcio, no que diz respeito a eventual responsabilidade civil
por danos causados pelo cônjuge administrador. Este problema é relevado em sede de partilha,
em termos de créditos.

g. ac. de 3 de março de 2016 do STJ


Obrigação de alimentos entre os ex-cônjuges (agora já não sobre a separação de facto), a ideia
de que neste novo modelo a obrigação de alimentos entre ex-cônjuges cinge-se ao indispensável
para o sustento, vestuário, habitação do outro cônjuge de forma a assegurar a existência
condigna da pessoa (sempre aqui referido o principio da dignidade da pessoa humana), sem ter
como finalidade de proporcionar um nível de vida equiparado ou sequer aproximável do que
havia na vigência da relação patrimonial. Não se verificara o dever de solidariedade conjugal se
for chocante onerar o outro com obrigação correspondente.

h. Ac. de 3 de março de 2016 STJ


223

Sobre o efeito do divorcio que é a eventual restituição de benefícios que os cônjuges tenham
recebido. O que ocorreu foi uma doação para casamento e que se deve considerar caduca,
ocorrendo o divorcio aplicando o art. 1791/1 do CC.
Também é importante porque o legislador ainda deixou neste art. 1760 uma reminiscência do
paradigma do divorcio sanção e da existência de culpa. O tribunal. Vem dizer que apesar da
referência à culpa, ela deve-se considerar sem relevo pratico para condicionar o regime.

Exame:

- 1 hipótese pratica de quid juris

- II grupo é um comentário critico, aderir ou rejeitar e fundamentar

- ou poderá ser uma opção inovadora de distinção e definição de pares de conceitos.

A professora avisou que a preparação do exame passa por ler a jurisprudência e aulas teóricas, vai ser
um exame “clean”, sem surpresas, sem nada de notas de rodapé, que vai incidir no que foi dado com
maior incidência nas aulas.
224

Indíce

Introdução ........................................................................................................................................................................................... 2
O Objecto e as Características do Direito da Família .................................................................................................... 3
Conceito de Família ................................................................................................................................................................ 3
Força Expansiva do Direito da Família .......................................................................................................................... 6
Definição de Direito da Família.............................................................................................................................................. 7
As divisões do Direito da Família .......................................................................................................................................... 9
Programa Adoptado............................................................................................................................................................... 9
Livro Quatro do Código Civil ........................................................................................................................................... 10
Projeção do Direito da Família com outros ramos do direito ........................................................................... 11
Notas Distintivas do Direito da Família ...................................................................................................................... 12
225

A Relação entre Direito da Família e Direitos Familiares ........................................................................................ 14


Os “estados de família” e as situações jurídicas familiares – elenco e caracterização ............................ 14
Direitos Familiares .............................................................................................................................................................. 16
As implicações em matéria de direitos da personalidade e de direitos fundamentais........................... 17
Quadro normativo do Direito da Família ................................................................................................................... 21
Actuais Desafios do Direito da Família ....................................................................................................................... 22
As Directrizes Fundamentais do Direito da Família................................................................................................... 25
Relações jurídicas familiares e com relevância familiar no Direito da Família: .................................................. 29
Introdução ................................................................................................................................................................................... 29
Elenco e caracterização das previstas no Código Civil .............................................................................................. 30
Casamento .............................................................................................................................................................................. 30
Parentesco .............................................................................................................................................................................. 31
Afinidade ................................................................................................................................................................................. 34
Adopção ................................................................................................................................................................................... 35
As relações jurídicas com relevância familiar previstas em lei especial ........................................................... 36
União de Facto ....................................................................................................................................................................... 37
Lei da União de Facto, Lei 7/2001 ................................................................................................................................ 42
Jurisprudência Vigente em Matéria de União de Facto ........................................................................................ 44
Convivência em Economia Comum .............................................................................................................................. 48
Apadrinhamento Civil ........................................................................................................................................................ 49
Outras relações com implicações no Direito da Família........................................................................................... 53
Relação entre esposais ou esposados .......................................................................................................................... 54
Relação entre ex-cônjuges................................................................................................................................................ 57
A relação entre tutor e tutelado ..................................................................................................................................... 58
Relação entre pessoa cuidadora e pessoa a cargo de outrem ........................................................................... 59
Relação entre a pessoa que cria e/ou sustenta e pessoa criada e/ou sustentada por outrem ............ 60
Casamento ........................................................................................................................................................................................ 61
Conceito ........................................................................................................................................................................................ 61
Traços Identitários .............................................................................................................................................................. 62
Modalidades de casamento.............................................................................................................................................. 63
Casamento católico .................................................................................................................................................................. 65
Direito Canónico................................................................................................................................................................... 66
Pressupostos da celebração do casamento ............................................................................................................... 71
Natureza Jurídica do Casamento Católico.................................................................................................................. 73
Casamento Civil ......................................................................................................................................................................... 73
226

A constituição da relação jurídica matrimonial civil ............................................................................................. 73


Tramitação do Casamento .................................................................................................................................................... 74
Tramitação Comum............................................................................................................................................................. 74
Tramitação Especial............................................................................................................................................................ 79
Tramites no Casamento sob forma religiosa ............................................................................................................ 81
Capacidade Matrimonial ........................................................................................................................................................ 82
Impedimentos dirimentes absolutos ........................................................................................................................... 83
Impedimentos dirimentes relativos............................................................................................................................. 84
Impedimentos impedientes ............................................................................................................................................. 84
Consentimento........................................................................................................................................................................... 87
Delimitação positiva ........................................................................................................................................................... 87
Delimitação negativa .......................................................................................................................................................... 88
Vício na formação da Vontade ........................................................................................................................................ 91
Falta de Vontade................................................................................................................................................................... 94
Casamento Por Procuração .................................................................................................................................................. 96
Modalidades ........................................................................................................................................................................... 96
Forma........................................................................................................................................................................................ 97
Cessação da Procuração .................................................................................................................................................... 97
Os valores jurídicos negativos do casamento viciado, regime jurídico .............................................................. 98
Notas de Atipicidade........................................................................................................................................................... 98
Regime da Anulabilidade .................................................................................................................................................. 99
Regime jurídico da inexistência jurídica .................................................................................................................. 103
Regime da irregularidade ............................................................................................................................................... 105
Regime jurídico da ineficácia simples ....................................................................................................................... 106
Estudo da dinâmica do casamento .................................................................................................................................. 109
Principio da igualdade ..................................................................................................................................................... 110
Deveres conjugais: 1672.º a 1676.º............................................................................................................................ 113
Casa de morada de família ............................................................................................................................................. 117
Direito ao Nome.................................................................................................................................................................. 118
Emancipação do cônjuge menor de idade com mais de 16 anos ................................................................... 119
Efeitos Sucessórios ............................................................................................................................................................ 120
Nacionalidade ...................................................................................................................................................................... 120
Efeitos Jurídico-Patrimoniais ............................................................................................................................................ 122
Noções gerais....................................................................................................................................................................... 122
Regime de Bens ....................................................................................................................................................................... 124
227

Comunhão Geral de Bens ................................................................................................................................................ 124


Comunhão de Adquiridos ............................................................................................................................................... 126
Regime da separação de bens ....................................................................................................................................... 137
Conclusão da matéria do regime de bens ................................................................................................................ 138
Convenção antenupcial ........................................................................................................................................................ 138
Princípio geral da “liberdade de convenção” ......................................................................................................... 139
Requisitos.............................................................................................................................................................................. 141
Publicidade. Função do registo .................................................................................................................................... 142
Invalidade ............................................................................................................................................................................. 142
Aposição de cláusulas acessórias ................................................................................................................................ 143
Modificação .......................................................................................................................................................................... 143
Cessação................................................................................................................................................................................. 144
Restrições à liberdade contratual .................................................................................................................................... 144
Imutabilidade do regime de bens e das convenções antenupciais................................................................ 144
Limitações em matéria de atribuições patrimoniais entre cônjuges ........................................................... 146
Negócios entre os cônjuges............................................................................................................................................ 151
Doações entre casados..................................................................................................................................................... 151
Mais notas essenciais do regime.................................................................................................................................. 154
Doações entre esposados ............................................................................................................................................... 155
Regime da administração de bens ................................................................................................................................... 157
Regime de administração de bens comuns ............................................................................................................. 157
Regime de administração dos bens próprios ......................................................................................................... 158
Administração ordinária e extraordinária .............................................................................................................. 158
Consentimento .................................................................................................................................................................... 161
Alienação de Bens Imóveis, 1682º-A e 1682º-B ................................................................................................... 164
Sistematização de Resolução de Hipóteses Práticas sobre o Estatuto Patrimonial ............................... 165
Responsabilidade Por Dívidas ........................................................................................................................................... 165
Modalidade de Dívidas .................................................................................................................................................... 166
Bens que Respondem pela Dívidas ............................................................................................................................. 169
Regime das Compensações Por Dívidas ................................................................................................................... 170
Processo Executivo ........................................................................................................................................................... 170
Jurisprudência ..................................................................................................................................................................... 171
A modificação da relação jurídica matrimonial civil ................................................................................................ 172
Simples separação de bens ............................................................................................................................................ 173
Separação judicial de pessoas e bens ........................................................................................................................ 174
228

Separação de facto ............................................................................................................................................................. 177


Extinção da relação jurídica matrimonial civil ........................................................................................................... 178
Morte ....................................................................................................................................................................................... 178
Invalidade do casamento ................................................................................................................................................ 179
Divórcio.................................................................................................................................................................................. 179
Modalidades de divórcio................................................................................................................................................. 181
Efeitos jurídicos do divórcio ......................................................................................................................................... 185
Data da produção dos efeitos do divórcio ............................................................................................................... 190
Divórcio por mútuo consentimento ........................................................................................................................... 192
Filiação ............................................................................................................................................................................................. 193
Modalidades de filiação........................................................................................................................................................ 195
Filiação – relações horizontais - 1796º a 1972º. ....................................................................................................... 197
Estabelecimento da filiação ........................................................................................................................................... 197
Filiação jurídico legal – Adoção.................................................................................................................................... 199
Tramitação do processo de adopção ......................................................................................................................... 202
Legitimidade para Adoptar ............................................................................................................................................ 203
Legitimidade para ser adoptado.................................................................................................................................. 204
Efeitos da Adoção............................................................................................................................................................... 204
PMA’s ........................................................................................................................................................................................... 205
Coordenadas/ Diretrizes gerais: ................................................................................................................................. 206
Notas ....................................................................................................................................................................................... 207
Tramitação do Estabelecimento de Filiação ........................................................................................................... 208
Maternidade de Subsitituição ............................................................................................................................................ 209
Jurisprudência ..................................................................................................................................................................... 209
Diretrizes Essenciais ........................................................................................................................................................ 211
Teórica de Dto da Família Dia 16 de maio de 18 ....................................................................................................... 217
Indíce ................................................................................................................................................................................................ 224

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