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DIREITO DA FAMÍLIA | JORGE DUARTE PINHEIRO

• O Direito da Família contemporâneo, Jorge Duarte Pinheiro, Gestlegal, 2020


1º NOÇÃO E OBJETO DO DIREITO DA FAMÍLIA
O Direito da Família, identifica-se com o conjunto de normas jurídicas que regulam a instituição
´família`. O código civil não formula uma noção de família, o que demonstra uma dificuldade do
recorte da própria instituição familiar. A doutrina Portuguesa tem defendido uma conceção de
família desde a entrada em vigor do código civil. Nesta corrente, família é entendida como o
grupo de pessoas unidas entre si por qualquer uma das relações jurídicas familiares que se
extraem do artigo 1576º. É família em sentido jurídico, nomeadamente, o grupo constituído por:
✓ Duas pessoas que casaram uma com a outra – Relação matrimonial;
✓ Por pai e filho – Exemplo de relação de parentesco;
✓ Por sogro e genro – Exemplo de relação de afinidade;
✓ Por adotante e adota – Relação de adoção
À família de uma pessoa pertencem o seu conjugue, os seus parentes, afins, adotantes e adotados.
Uma pessoa poderá ter varias famílias: uma família conjugal, uma família parental, uma família
por afinidade e uma família adotiva.
A lei não atribui ao grupo familiar personalidade jurídica nem judiciaria. As denominações ´bem
da família` - Artigo 1671º/2 ou ´interesses da família` - Artigo 1677º/ c)/1, não traduzem o
reconhecimento de um interesse jurídico autónomo de uma entidade coletiva mas sim aos
interesses dos próprios membros da família. Não obstante, não estão em causa interesses
individuais ou exclusivos das pessoas singulares que compõem o grupo. Os termos ´bem` e
´interesses da família` designam os interesses dos membros do grupo familiar enquanto tais, os
interesses comuns às pessoas singulares que integram a família, ou seja é um interesse
comunitário daquele grupo familiar.
A família é constitucionalmente reconhecida - Artigo 67º/1 - como ´elemento fundamental da
sociedade`. Inclusive, a especial dignidade da instituição familiar no ordenamento jurídico é
resultado da constante intervenção do Estado no momento da constituição ou extinção do nexo
de pertença ao grupo familiar.
A importância da relação patrimonial e da relação de parentesco no primeiro grau de linha reta,
designada como relação de filiação, ultrapassa largamente as restantes relações jurídicas
familiares.
O livro de Direito da família no código civil tem sido fruto de inúmeras alterações legislativas.
Não esquecendo nunca, que o atual código civil é de 1967, tendo havido uma revolução também
legislativa após o 25 de abril | A articulação do código civil determina:
✓ Quem pode ou não casar – Artigo 1601º e com quem se pode ou não casar – Artigo 1602º
e 1604º, alíneas c) a f);
✓ Deveres íntimos a que os conjugues estão reciprocamente vinculados, como, por
exemplo, os de fidelidade e coabitação – Artigo 1672º;
✓ Define a titularidade dos bens do casal – Artigos 1717º a 1736º, indica atos patrimoniais
que um conjugue não pode praticar sem o consentimento do outro – Artigos 1678º a
1683º, aponta situações em que um conjugue responde por dividas contraídas
exclusivamente pelo outro – Artigos 1691º, 1693º e 1694º
✓ Estabelece quando é que as partes deixam de estar casadas – Artigos 1773º a 1785º; regula
as consequências do divorcio, seja quanto a apelidos – Artigos 1677º B, quanto à partilha

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de bens – 1790º, quanto à casa de morada da família – 1793º, quanto aos animais de
companhia – 1793º - A, ou quanto à obrigação de alimentos – Artigos 2016º e 2016º A
✓ Diz quem é o pai e a mãe de determinada pessoa – Artigos 1796º a 1873º;
✓ Impõe deveres de mútuos respeito, auxilio e assistência entre pais e filhos, maiores ou
menores – Artigo 1874º
✓ Regula a composição do nome do filho – Artigo 1875º
✓ Indica a quem compete o exercício das responsabilidades parentais, nomeadamente nos
casos de divorcio e de separação de facto – Artigos 1906º e 1909º;
✓ Prevê situações de privação ou limitação do exercício das responsabilidades parentais –
Artigos 1913º a 1920º - A;
✓ Concretiza o conteúdo das responsabilidades parentais e as condições do respetivo
exercício, dispondo, designadamente, sobre aspetos como a educação do menor – Artigos
1885º e 1886º, a permanência deste na casa paterna – Artigos 1887º e 1883º, e a
administração dos bens do filho – Artigos 1888º a 1900º;
✓ Obriga os pais a sustentar o filho maior enquanto ele não houver completado a sua
formação profissional – Artigo 1880º, o que eventualmente abarca a conclusão de um
curso superior;
O objeto do direito da família tem vindo a alargar-se de forma a englobar realidades semelhantes
às relações familiares nominadas, tais como as ditas para-familiares | Exemplo de relações para-
familiares: União de facto; relação entre esposados; relação entre ex-cônjuges; vida em economia
comum; relação entre tutor e tutelado; relação entre uma pessoa e outra que esta a seu cargo ou
cuidado; relação entre uma pessoa e aquela que a cria e sustenta; etc.
Defende Jorge Duarte Pinheiro, que as relações parafamiliares serão aquelas cuja eficácia
jurídica (civil) seja em larga medida idêntica à das relações familiares ou aquelas em que, pelo
menos, se verifique de facto uma vida em comum análoga à que é exigida entre sujeitos de
relações familiares. Posto isto, admite-se que são parafamiliares a relação de tutela e, dentro de
certas condições, a união de facto e a convivência em economia comum.
2.2 O Direito da família na dicotomia Direito Publico VS Direito privado
O regime jurídico da família, união de facto, convivência em economia comum e da proteção de
crianças, jovens e idosos é vasto e heterogéneo. A par das normas do código civil, existem outras
que, nomeadamente, descrevem e punem ´crimes contra a família`, regulam impostos de harmonia
com a situação familiar ou parafamiliar dos contribuintes, atribuem direitos e benefícios aos
trabalhadores e funcionários da administração pública que sejam pais, mães, conjugues, membros
de união de facto ou conviventes em economia comum, e conferem prestações destinadas a
assegurar a proteção social de certas pessoas, tendo em conta a respetiva situação familiar ou
parafamiliar. Assim, e pelo facto de o regime jurídico conter normas de Direito privado, fiscal, da
função publica, segurança social, etc. é adverso à denominação como direito privado.
O nosso estudo é do Direito da família em sentido restrito, que corresponde às normas do livro
IV do código civil e a normas avulsas.
Mas então será ou não Direito privado?
➢ Não: No Direito da família existem várias normas injuntivas; nas enumerações legais, as
situações jurídicas famílias principais são referidas como deveres e não como direitos. O
estado intervém constantemente no momento da constituição e da extinção das relações
jurídicas familiares; consagra-se a figura das responsabilidades parentais, etc.
o Ou seja, existem muitas normas injuntivas sobre constituição, efeitos e extinção
das relações jurídicas familiares, modalidades e causas de divorcio, modos de
filiação, etc. A existência destas normas baseia-se em motivos de interesse

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publico e limitam em muito a autonomia privada que é um dos princípios
fundamentais do Direito privado.
o No direito privado o Direito subjetivo é a situação jurídica que emana liberdade
e autonomia privada. Contudo, a lei alude às principais situações jurídicas
advindas do casamento e da filiação como deveres e não como direito
o A intervenção de entidades estatais (juízes, conservadores do registo civil) são
indispensáveis para efeitos de celebração e invalidação do casamento, divorcio,
constituição ou extinção retroativa do vinculo de filiação, etc. Ademais, as
responsabilidades parentais atribuem a um sujeito (o pai) poderes de autoridade
sobre outro (o filho menor), o que não é compatível com a visão do direito
privado como área que regula situações em que as partes estão em situação de
igualdade.
O processo instrumental do Direito privado (processo civil comum declarativo) corre nos
tribunais sendo encarado como um assunto das partes, em que o principio dispositivo predomina
sobre o principio inquisitório, cabendo a um juiz resolver o litigio à luz de regras materiais
precisas. Contudo, em muitos dos processos aplicáveis ao Direito da família1 aplica-se o principio
inquisitório. As providencias são adotadas segundo critérios de conveniência e oportunidade, e
não de legalidade estrita, sendo reconhecida competência a entidades administrativas, tal como o
conservador civil.
Parece o autor defender que o Direito da família é um ramo de Direito privado, sendo que apenas
se deve atender ao critério da posição dos sujeitos. Os grupos familiares e parafamiliares não são
entes públicos, e os seus membros atuam entre si destituídos de ius imperii. O Direito da família
é assim Direito civil ou Direito privado comum, regendo as suas regras a condição normal das
pessoas.
Há grandes diferenças entre o Direito da família em sentido restrito e o Direito não civil da família.
Demonstrativo dessa desarticulação é entre o direito civil da família e o Direito fiscal da família,
quanto a rendimentos dos conjugues. O Direito fiscal não tem em atenção os regimes de bens
aplicáveis ao casamento por força do código civil. Independentemente do regime de bens em que
se casaram, é permitido aos conjugues optarem pela tributação conjunta ou separada. Ou seja, é
permitida a tributação em separado de cada elemento do casal que contraiu casamento no regime
da comunhão geral de bens e a tributação conjunta daqueles que casaram no regime de separação
de bens.
4. A Demanda do critério de relação jurídica familiar
O artigo 1576º enumera aquilo que qualifica como ´fontes das relações jurídicas familiares`: o
casamento, o parentesco, a afinidade e a adoção. Considera JDP que a enumeração é infeliz pois
o parentesco e afinidade não são fontes ou factos constitutivos das ligações jurídicas familiares,
sendo elas próprias relações jurídicas familiares. A fonte do parentesco é a procriação ou geração,
e a fonte da afinidade é a conjugação do casamento-ato com a procriação.
O casamento e a adoção, podem ser entendidos ou como factos constitutivos (casamento-ato, ato
de adoção) ou como relações jurídicas familiares (casamento-estado ou relação matrimonial,
vinculo de adoção). Ou seja, um elenco correto de fontes das relações jurídicas familiares
abarcaria o casamento enquanto ato, a procriação, o casamento ato conjugado com a procriação e
o ato da adoção.
Dada esta correção concetual é possível identificar relações familiares nominadas: o casamento
enquanto estado ou relação matrimonial, o parentesco, a afinidade e o vinculo da adoção. As

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Página 23 e 24 do manual base

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relações familiares são simples vínculos jurídicos e não verdadeiras relações jurídicas, pois uma
relação jurídica em sentido técnico acarreta situações jurídicas relativas, um direito de uma pessoa
a que corresponde um dever de outra, o que nem sempre acontece nas situações familiares
(exemplo: Não existem direitos e deveres entre parentes do 4º grau da linha colateral)
A doutrina maioritária defende que não há mais relações jurídicas familiares se não aquelas
constantes do artigo 1576º. A questão discute-se, por exemplo, quanto à união de facto. Assim,
alguns autores defendem a taxatividade do enunciado legal , outros consideram que uma relação
jurídica familiar implica deveres familiares ou um estado pessoal (que já foi refutado antes).
MAS, em principio as tipologias legais não são taxativas, acrescendo que a má técnica legislativa
empregue no artigo 1576º não abona a ideia de que o enunciado é fechado.
4.3 Referência genérica ao casamento
O artigo 1577º define o casamento como ´o contrato celebrado entre duas pessoas que pretendem
constituir família mediante uma plena comunhão de vida, nos termos das disposições deste
código`. Esta noção, que tem em vista o casamento-ato, pode ser adaptada ao casamento – estado:
a relação matrimonial consiste no vinculo entre duas pessoas que celebraram um contrato válido
pelo qual se comprometeram a constituir família mediante uma plena comunhão de vida.
O vinculo matrimonial constitui-se através de contrato que tem de ser celebrado perante entidade
com competência funcional para o ato (funcionário do registo civil, pároco ou ministro do culto)
ou funcionário sobre de facto, sob pena de inexistência (artigos 1628º, alínea a) e 1629º) a não ser
que seja um casamento urgente. Mas, para ser juridicamente existente, o casamento urgente carece
de um ato posterior, a homologação pelo funcionário do registo civil, exceto se tiver sido
considerado como católico pelas autoridades eclesiásticas – Artigos 1628º, alínea b), e 1624º/1,
alínea d)
O casamento está sujeito a registo civil obrigatório (artigos 1651º/1). Na falta de disposição legal
em contrario, o vinculo matrimonial não pode ser invocado (artigo 1669º/1).
A relação matrimonial traduz-se na obrigação de plena comunhão de vida, que se concretiza em
deveres recíprocos de respeito, fidelidade, coabitação, cooperação e assistência – Artigo 1672º, e,
de certa forma, num regime diferenciado em matéria de bens e divididas – Artigo 1678º e s.
Com a morte de uma das partes, a outra assume uma posição privilegiada na sucessão legal –
Artigos 2133º/2 e 2157º. A extinção do vinculo matrimonial por outro motivo que não a morte
(como o divorcio ou a invalidade) exige a intervenção de uma entidade estatal (juiz, conservador
do registo civil) ou equiparada (autoridade eclesiástica)
Nos termos do artigo 1586º, a adoção ´é o vinculo que, à semelhança da filiação natural, mas
independentemente dos laços de sangue, se estabelece legalmente entre duas pessoas nos termos
dos artigos 1973 e seguintes`. A constituiçao deste vinculo depende da vontade de uma das partes,
o adotante (artigo 1990º/1 alinea a) e faz-se por sentença judicial (artigo 1973º/1 que tem de ser
proferida num processo próprio (processo de adoção regulado no regime jurídico do processo de
adoção . A adoção é equiparada à filiação biológica e extingue normalmente as relações familiares
entre adotado e família biológica (artigo 1986º)
À semelhança do casamento também a adoção tem de ser registada – Artigo 1º/1, alínea c) do
Código do registo civil, não se podendo à partida invocar vinculo adotivo antes disso – Artigo 2º
CRC.
A extinção do vinculo de adoção só pode acontecer por via judicial – Artigos 1989º, 1990º e 1991º
ou por morte.

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5. O PARENTESCO
Artigo 1578º Parentesco é ´o vinculo que une duas pessoas, em consequência de uma delas
descender da outra ou de ambas procederem de um progenitor comum`.
O parentesco é uma relação de consanguinidade, ou de laços de sangue entre duas pessoas, que
se determina por linhas e graus: ´cada geração forma um grau, e a serie dos graus constitui a
linha de parentesco`- Artigo 1579º:
➢ Quando uma das pessoas descende da outra são parentes na linha reta
➢ Quando nenhuma descende da outra, mas ambas procedem de um progenitor comum, são
parentes na linha colateral – Artigo 1580º/1
Na linha reta há tantos graus quantas as pessoas que formam a linha de parentesco, excluindo
uma deles, excluindo o único progenitor, quando se determina o parentesco entre pai e filho –
Artigo 1581º/1. Na linha colateral há tantos graus quantas as pessoas que formam a linha de
parentesco, não se contado o progenitor comum – Artigo 1581º/2 | EXEMPLO:

BENTO DANIEL
ANTÓNIA Pai de D Filho de B
Mãe de B e C CARLA EDUARDA
Mãe de E Filha de C

 Antónia e Bento ou Antónia e Carla são parentes no 1º grau da linha reta – Pais e filhos;
 Bento e Carla são parentes no 2º grau da linha colateral – Irmãos;
 Carla e Daniel ou Bento e Eduarda são parentes no 3º grau da linha colateral – Tios e
sobrinhos;
 Antónia e Daniel ou Antónia e Eduarda são parentes no 2º grau da linha reta – Avós e
netos;
 Daniel e Eduarda são parentes no 4º grau da linha colateral – Primos direitos;
O parentesco na linha reta pode ser descendente ou ascendente – Artigo 1580º/2: É descendente
quando se parte do ascendente para o que dele procede. É ascendente quando se parte do
descendente para o progenitor | Exemplo: Antónia é ascendente no 1º grau da linha reta de Bento
e este é descendente no 1º grau da linha reta de Antónia.
A lei distingue entre linha paterna e materna – Artigo 1952º/3. Exemplo:
➢ Ana é mãe de Berto, Carla e Dionisio;
➢ Raul é pai de Berto, Carla e Eduardo;
➢ Tânia é mãe de Eduardo
➢ Tomé é Pai de Dionisio
 Dionisio é parente de Berto e Carla no 2º grau da linha colateral materna;
 Eduardo é parente de Berto e Carla no 2º grau da linha colateral paterna;
 Berto é parente de Carla no 2º grau da linha colateral materna e paterna;
Quando duas pessoas são parentes tanto na linha materna como paterna fala-se de duplo
parentesco ou parentesco bilateral; Se além disso são parentes no 2º grau da linha colateral
(irmãos) como acontece com Berto e Carla, fala-se em irmãos germanos ou bilaterais – Artigo
2146º
O parentesco é unilateral se acontece por apenas uma das linhas, paterna ou materna. Os parentes
no 2º grau da linha colateral paterna ou só materna designam-se como unilaterais. Quando este
parentesco unilateral resulta de terem um progenitor masculino comum, fala-se de irmãos
consanguíneos: Exemplo: Eduardo é irmão consanguíneo de Berto e de Carla. Sendo a mãe o

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progenitor comum, diz-se que são irmãos uterinos, como por exemplo Dionisio é irmão uterino
de Berto e de Carla.
5.2 Efeitos de Parentesco
A fonte do parentesco é a procriação, contudo os ´poderes e deveres emergentes da filiação ou
do parentesco só são atendíveis se a filiação se encontrar legalmente estabelecida` - Artigo
1797º/2. A filiação não legalmente estabelecida importa, de forma excecional, nos termos do
artigo 1603º. O estabelecimento da filiação tem eficácia retroativa.
A filiação está sujeita a registo civil obrigatório – Artigo 1º/1, alínea b do CRC, pelo que em regra
a eficácia do parentesco só opera havendo registo da filiação estabelecida – Artigo 2º CRC.
Nos termos do artigo 1582º, salvo disposição legal em contrario, os efeitos do parentesco
produzem-se em qualquer grau da linha reta e até ao sexto grau da linha colateral. O direito de
representação na sucessão legal em beneficio dos descendentes do irmão do autor da sucessão
(2042º; 2133º/1, alínea c) e 2145º) constitui um exemplo em que o parentesco releva na linha
colateral alem do sexto grau.
A relevância jurídica do parentesco varia em razão da linha e do grau. A mais importante espécie
de relação de parentesco é a relação de filiação (maternidade ou paternidade). Os principais efeitos
específicos da relação de filiação são a vinculação reciproca dos respeitos sujeitos aos deveres de
respeito, auxilio e assistência (artigo 1874º) e a sujeição dos filhos às responsabilidades parentais
(ou poder paternal) até à maioridade ou emancipação (1877º)
A segunda espécie de parentesco juridicamente mais relevantes é a que liga outros parentes na
linha reta, mais concretamente Avós e netos; a terceira, aquela que liga os irmãos entre si. Estas
duas relações são protegidas contra o exercício abusivo das responsabilidades parentais (1887º-
A). Depois é a relação entre uma pessoa e descendentes do seu irmão – tio e sobrinhos. A ultima
ligação com algum relevo jurídico é a do parentesco no 4º grau da linha colateral.
Assim, a hierarquia do parentesco será:

Pais e filhos
Avós e Netos
Irmãos
Tios e Sobrinhos
Parentesco no 4º grau da linha colateral - Primos

Entre os efeitos do parentesco que se produzem em vida de ambos os sujeitos da relação, destaca-
se a obrigação de alimentos, que recai sobre o parente, seguindo a ordem do artigo 2009º do CC.
Em matéria do casamento, o parentesco na linha reta e o parentesco no 2º grau da linha colateral
são impedimentos matrimoniais dirimentes – Artigo 1602º, alíneas a) e c), enquanto o parentesco
no terceiro grau da linha colateral é um impedimento impediente – Artigo 1604º, alínea c)
Quanto a estabelecimento da filiação, não se admite averiguação oficiosa da maternidade se,
existindo perfilhação, a pretensa mãe e o perfilhante forem parentes na linha reta ou no segundo
grau da linha colateral – Artigo 1809º, alínea a); e também não se admite a averiguação oficiosa
da paternidade se a mãe e o pretenso pai estiverem unidos por idênticos laços de parentesco –
Artigo 1866º, alínea a). No que toca a meios de suprir o poder paternal, os parentes do menor
estão entre as pessoas que podem ser chamadas pelo tribunal a exercer o cargo de tutor ou de
vogal do conselho de família – Artigos 1931º e 1952º.

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Quanto aos efeitos da extinção do parentesco por morte, destaca-se a sucessão legal hereditária.
Os descendentes, ascendentes, irmãos e seus descendentes e outros parentes na linha colateral até
ao 4º grau integram, respetivamente, a 1ª, 2ª, 3ª e 4ª classe de herdeiros legítimos – Artigo 2133º/1.
Os herdeiros de cada uma das classes sucessíveis têm prioridade sobre os das classes imediatas –
Artigos 2134º
O parentesco tem também relevância no campo da legitimidade para requerer providencias
destinadas a tutelar a memoria do falecido – Artigos 71º/2, 73º, 75º/2, 76º/2 e 79º/2; da atribuição
do direito a indemnização dos danos não patrimoniais causados por morte da vitima – Artigo
496º/2 e 3; e da transmissão por morte do arrendamento para habitação – Artigo 1106º/1, alínea
c), e 2,3 e4, e artigo 57º do NRAU
No campo dos efeitos não civis do parentesco, ressalta a atribuição da nacionalidade portuguesa
originaria com fundamento no parentesco em linha reta descendente no 1º grau e até no 2º grau
5.3 Extinção do vínculo de parentesco
A relação de parentesco extingue-se com a morte de um dos sujeitos ou na sequencia de ação
judicial (impugnação de maternidade ou paternidade)

6. A AFINIDADE
Afinidade: Vínculo que liga cada um dos conjugues ao parente do outro – Artigo 1584º. Assim,
a constituição desta relação jurídica familiar depende da celebração de um casamento e da
existência de uma relação de parentesco entre uma pessoa e um dos conjugues.
A afinidade é determinada pelos mesmos graus e linhas que definem o parentesco – Artigo 1585º.
| Por exemplo: António, filho de Carlos e Diana, casou-se com Berta, mãe de Eduardo, nascido
de uma relação anterior
 Carlos e Diana (sogros) são afins no 1º grau da linha reta de Berta (nora);
 António (padrasto) é afim no 1º grau da linha reta de Eduardo (enteado);
 António tem um irmão , Fernando, que será afim no 2º grau da linha colateral de Berta
(cunhado).
Não há relação de afinidade entre os parentes de um conjugue e os parentes do outro:
designadamente não há nenhuma relação entre os pais de António e os pais de Berta (compadres),
entre filho de Berta e os pais de António, ou até mesmo com um filho de António, nascido de
outra ligação anterior.
6.2 Efeitos e extinção do vínculo de afinidade
As fontes da afinidade são, cumulativamente, o casamento e a procriação, sendo que em regra, a
eficácia da afinidade apenas pode ser invocada se a filiação estiver legalmente estabelecida e se
este facto e o casamento tiverem sido registados.
A relação de afinidade mais importante é a afinidade da linha reta, mais concretamente a que liga
os sogros às noras ou genros e a que liga padrastos a enteados – Mas os seus efeitos são menores
que aqueles que estão associados às principais espécies da relação de parentesco. Na ultima classe
de pessoas obrigadas a elementos de fonte legal, estão o padrasto e a madrasta, que estão
vinculados à prestação de alimentos relativamente a enteados menores que estejam, ou estivessem
no momento da morte do conjugue, a cargo deste – Artigo 2009º/1, alínea f). | A afinidade na
linha reta:
✓ É um dos impedimentos dirimentes ao casamento – Artigo 1602º, alínea d);

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✓ Constitui obstáculo à averiguação oficiosa da maternidade ou paternidade – Artigos
1809º/ alínea a) e 1866º/alínea a);
✓ Por força da Lei nº 137/2015, de 7 de setembro, é suscetível de determinar a atribuição
de responsabilidades parentais sobre o enteado menor – Artigos 1903º, 1904º e 1904º -
A;
O afim na linha reta ou colateral, pode beneficiar de transmissão por morte do arrendamento para
habitação, à luz do artigo 1106º/1, alínea c), 2, 3 e 4 (ou só o enteado, nos termos do artigo 57º
do NRAU); e estar a obrigado a exercer a tutela do menor ou de integrar o conselho da família –
Artigos 1931º/1 e 1952º/1.
A afinidade não é um facto designativo na sucessão hereditária legal, não conferindo legitimidade
para requerer providencias destinadas a tutelar a memoria do falecido, nem fundamenta atribuição
legal do direito a indemnização por danos não patrimoniais causados por morte da vitima.
Por força do artigo 1585º, 2ª parte, a afinidade não cessa pela dissolução do casamento por morte,
ou seja o vinculo subsiste após a extinção da relação conjugal derivada de morte. Em sentido
inverso, o divorcio põe fim à afinidade. Esta solução legal parece ajustada pois mantem a relação
de afinidade nos casos em que normalmente se conservam ´os laços afetivos especiais criados
pela afinidade` (caso da dissolução por morte e atendendo à teleologia da norma, a morte
presumida) . Noutras situações de extinção não retroativa do vinculo matrimonial (divórcio e
dispensa de casamento rato e não consumado) compreende-se a cessação da afinidade.
O vinculo de afinidade extingue-se ex tunc (retroativamente):
✓ Com a anulação e nulidade do casamento, a não ser quem ambos os conjugues estivessem
de boa fé ao celebrar o ato. Neste ultimo caso, o vinculo produzirá efeitos até transito em
julgado da sentença de anulação ou da declaração de nulidade – Artigo 1647º/1.
✓ Extingue-se também nas situações de extinção retroativa do vinculo de filiação do qual
decorre o parentesco de um dos conjugues.
A afinidade extingue-se en nunc (desse momento para a frente):
✓ com a morte de um dos sujeitos da relação e com a adoção do parente do conjugue, salvo
se o adotado for filho do conjugue do adotante – Artigo 1986º. Ao determinar a cessação
do parentesco entre o adotado e o conjugue, a adoção elimina o vinculo de que depende
a relação de afinidade.
7. A HIPÓTESE DE RELAÇÕES JURÍDICAS FAMILIARES INOMINADAS
Haverá outras relações familiares inominadas, como por exemplo, a união de facto a convivência
em economia comum? Quanto a aspetos como o afeto ou à vida em comum, considera o autor
que são aspetos meramente acidentais aquando da fixação do carater de uma ligação. Uma relação
de parentesco entre irmãos, por exemplo, constitui-se e subsiste mesmo que reine a indiferença e
o odio entre aqueles sujeitos.
É por isso necessário identificar um elemento que seja observado em todos os casos de relações
familiares nominadas: O que há em comum entre o casamento, o parentesco, a afinidade e
adoção?: A presença constante de um ato estatal (praticado pelo conservador do registo civil, juiz
ou funcionário de unidade de saúde publica) ou equivalente, que respeita à aquisição ou, no
mínimo, à perda da qualidade familiar. Na falta deste ato, essa relação familiar nominada não se
constitui (casamento e adoção) ou não produz os efeitos essenciais. Na falta de ato estatal, a
relação familiar perdura até à morte das partes. Para extinção por motivos diferentes da morte,
não é suficiente a vontade de um ou de ambos os sujeitos. O próprio divórcio por mutuo

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consentimento tem de ser decretado pelo conservador do registo civil ou pelo juiz – Artigo
1773º/2
Ao mesmo tempo que restringe o papel da vontade extintiva das partes, ao conferir durabilidade
às relações jurídicas familiares, a exigência de um ato estatal, ou equivalente, materializa a
especial dignidade reconhecida pelo Estado à ligação familiar nominada: Estas ligações têm um
status que justifica a intervenção de um entidade que é tida como interprete do interesse coletivo.
7.2 Relações familiares inominadas e relações parafamiliares
Há duas relações familiares inominadas:
➢ Filiação por PMA heteróloga: Emerge do artigo 20º da LPMA (mais o 23º/2, 26º, 27º e
47º) e do artigo 1839º/3
o A presunção de que o marido da mãe é o pai da criança representa um dos modos
de estabelecimento da paternidade e, portanto, de constituição do vínculo de
parentesco – Artigos 1796º/2 e 1826º/1. Esta presunção pode ser ilidida por ação
– Ação de impugnação de paternidade – em que cabe ao autor demonstrar que,
de acordo com as circunstâncias, a paternidade do marido da mãe é
manifestamente improvável – Artigo 1839º/1 e 1. Se não existirem laços de
sangue entre o marido da mãe e a criança, a paternidade deve ser excluída.
o O artigo 1839º/3 prevê que não seja permitida a impugnação de paternidade com
fundamento em inseminação artificial ao conjugue que nela consentiu, sem que
exista distinção se o esperma provenha do marido ou de terceiro. Assim, o
preceito permite que se crie e mantenha um vinculo de filiação entre duas
pessoas, ainda que não exista ligação biológica entre elas: Tendo o marido
consentido que a mulher fosse inseminada com esperma de terceiro, a criança
nascida na sequencia dessa inseminação é tida como filha do marido da mãe
(sendo assim registada).
o Contudo, este vinculo não se reconduz nem ao parentesco nem à adoção. A
criança não é descendente biológico do marido da mãe, no sentido do artigo 1578,
e o consentimento para a inseminação não foi prestado no âmbito de um processo
de adoção. A posição da regência, de qualificar a filiação por PMA heteróloga
como relação jurídica inominada não é pacifica, pois introduz uma modalidade
autónoma de filiação.
➢ Apadrinhamento civil: Regime aprovado pela Lei nº 103/2009, de 11 de setembro
A união de facto e a convivência em economia comum não são relações jurídicas familiares.
Atualmente, constituem-se e extinguem-se livremente, sem que seja necessária a intervenção
estatal (seguindo a mesma lógica de que nas relações familiares nominadas há intervenção do
estado). Basta a vontade de uma das partes. Medidas de proteção das pessoas que vivem em
economia comum ou das uniões de facto não necessitam de registo.
A tutela, por sua vez, está sujeita a registo civil obrigatório – Artigo 1º/1, alínea h) do CRC e o
tribunal pode determinar a constituição ou extinção de uma relação tutelar – Artigos 1927º e
1949º. A tutela é um meio de suprir o poder paternal e traduz-se, habitualmente, numa relação a
termo certo – Artigo 1961º/alínea a), destituída de uma durabilidade que acompanha as relações
familiares nominadas.
Assim, considera o autor que a união de facto, convivência em economia comum e tutela, apenas
podem ser relações parafamiliares (para serem qualificadas como tal, terá de haver a mínima
similitude com as relações familiares nominadas) pois:

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✓ A relação tutelar é semelhante à relação de parentesco no 1º grau em linha reta, pois o
tutor tem os mesmos direitos e obrigações dos pais que exercem o poder paternal – Artigo
1935º/1;
✓ União de facto traduz-se na comunhão do leito, mesa e habitação entre duas pessoas,
comunhão essa a que estão obrigados os membros da união conjugal – Artigos 1577º e
1672º
✓ Convivência em economia comum é a situação de duas ou mais pessoas ´que vivam em
comunhão de mesa e habitação há mais de dois anos e tenham estabelecido uma vivencia
em comum de entreajuda ou partilha de recursos` - Artigo 2º da Lei 6/2001, de 11 de
maio. A esta relação cabe obrigações que são comuns à relação conjugal, tal como o
artigo 1672º que vincula os conjugues aos deveres de coabitação, cooperação e
assistência, e à relação entre pais e filhos menores (deveres de auxilio e assistência,
impostos pelo artigo 1874º)
Não obstante, para que sejam consideradas relações parafamiliares, a união de facto e a
convivência em economia comum têm de preencher determinados requisitos que as tornem mais
próximas das relações jurídicas familiares:
✓ A união de facto e convivência comum têm de durar há mais de dois anos – Artigo 1º/1
da Lei 6/2001, de 11 de Maio e Artigo 1º/2 da Lei 7/2001, de 11 de Maio – Há aqui uma
paralelismo com a durabilidade tendencial das relações jurídicas familiares.
✓ A união de facto só é protegida se não ocorrer um dos casos previstos no Artigo 2º da Lei
7/2001, de 11 de Maio, similares aos que obstam à validade do casamento;
✓ A convivência em economia comum só é protegida se pelos menos um dos seus membros
for uma pessoa maior de idade e desde que não ocorra nenhuma das circunstâncias
mencionadas no artigo 3º da Lei 6º/2001, de 11 de Maio
Não se enquadram no conceito de relações parafamiliares ou familiares:
✓ Relação entre esposados: É uma relação simplesmente preparatória de uma relação
conjugal;
✓ Relação entre ex-cônjuges: Fruto da dissolução do casamento;
✓ Relação entre uma pessoa e aquela que a cria e sustenta, quando não coincidam com uma
situação de convivência em economia comum protegida
Todas estas relações anteriores são inseridas por Guilherme de Oliveira e Francisco Pereira coelho
nas relações parafamiliares.
JDP entende que não assume carater parafamiliar ou familiar a relação entre o credor e o devedor
de alimentos.
8. A OBRIGAÇÃO DE ALIMENTOS ENQUANTO EFEITO DAS RELAÇÕES
FAMILIARES E PARAFAMILIARES
A obrigação de alimentos é um efeito que se pode verificar em todo o tipo de relações familiares
(relação matrimonial, parentesco, afinidade, adoção, filiação por PMA heteróloga e
apadrinhamento civil)
No elenco de pessoas vinculadas à prestação legal de alimentos estão o conjugue, parentes e afins
– Artigo 2009º/1. À adoção aplicam-se as regras do parentesco em matéria de alimentos, por força
do artigo 1986º. À filiação por PMA heteróloga aplica-se analogicamente o regime dos efeitos do
parentesco, dada a semelhança juridicamente relevante que a lei admite existir, implicitamente,
entre a filiação por PMA heteróloga e a filiação biológica – Artigo 1839º/3. No caso de
apadrinhamento civil há que atender ao disposto no artigo 21º da LAC.

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Ademais, o membro sobrevivo de uma união de facto, relação parafamiliar, pode exigir alimentos
nos termos do artigo 2020º. Sobre um tutor recai a mesma obrigação alimentar que caberia aos
pais – Artigo 1935º/1
8.2 Natureza e regime da obrigação de alimentos
A obrigação de alimentos não tem natureza jurídica familiar, isto é, esta obrigação pode vincular
uma pessoa perante outra sem que entre elas exista ou tenha existido qualquer laço familiar: Esta
afirmação pode ser sustentada, entre outras, com as seguintes situações:
✓ O artigo 2009º/1, alínea a) inclui o ex-cônjuge no grupo de devedores de uma eventual
prestação legal de alimentos;
✓ O artigo 2004º/1 parte inicial, admite a constituição por via negocial da obrigação,
independentemente de qualquer nexo orgânico entre as partes;
A relação de alimentos não é uma relação parafamiliar pois não há necessariamente vida em
comum entre o credor e o devedor de alimentos, e a relação não produz efeitos idênticos às
relações familiares. Esta relação de alimentos é muitas vezes designada como relação
acessoriamente familiar, pois está frequentemente ligada a interesses familiares. Mas a relação
de alimentos é apenas um dos efeitos possíveis das relações familiares, apresentado esta
obrigação, uma estrutura patrimonial enquadrada numa relação creditícia que em muitos casos
está funcionalmente ligada a relações familiares.
Os alimentos são prestações que visam prover tudo o que é indispensável ao sustento, habitação
e vestuário de uma pessoa, compreendendo também o que é necessário à instrução e educação do
alimentada no caso de este ser menor – Artigo 2003º. A obrigação de alimentos pode ter como
fonte:
➢ Um negócio Jurídico: Artigos 2014º/1, 2073º e 2273º;
➢ Facto não negocial: Denominada de obrigação legal de alimentos. Surge,
nomeadamente, através de um vinculo familiar – Artigo 2009º/1;
O artigo 2009º/1 estabelece o elenco geral das pessoas vinculadas à prestação legal de alimentos:
_____________________________________________________________________________
Artigo 2009º
Pessoas obrigadas a alimentos
1.Estão vinculados à prestação de alimentos, pela ordem indicada:
a) O conjugue ou o ex-cônjuge;
b) Os descendentes;
c) Os ascendentes;
d) Os irmãos;
e) Os tios, durante a menoridade do alimentando;
f) O padrasto e a madrasta, relativamente a enteados menores que estejam, ou estivessem no
momento da morte do conjugue, a cargo deste.
2.Entre as pessoas designadas nas alíneas b) e c) do numero anterior, a obrigação defere-se
segundo a ordem da sucessão legitima.
3.Se algum dos vinculados não puder prestar os alimentos ou não puder saldar integralmente a
sua responsabilidade, o encargo recai sobre os onerados subsequentes.
_____________________________________________________________________________
Entre os descendentes e os ascendentes, a obrigação defere-se segundo o principio da preferência
de graus de parentesco, sem prejuízo do direito de representação (artigos 2135º e 2138º) nos
termos do artigo 2009º/2 | Exemplo: Se A, que carece de alimentos, tiver um filho e um neto, a
vinculação recai sobre o filho; Se B, que carece de alimentos, tiver um filho, C, e dois netos, E e

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F, que são por sua vez filhos de um filho já falecido, D, a vinculação recai diretamente sobre o
filho C e, por direito de representação, sobre os netos E e F.
No caso do apadrinhamento civil, o elenco geral tem de ser adaptado em função do disposto no
artigo 21º da LAC: Se o afilhado carecer de alimentos, os padrinhos são obrigados a prestá-los,
no caso de os pais do afilhado não terem condições de satisfazer o encargo – Artigo 21º/1 da LAC.
Em sentido inverso, se for o padrinho quem necessita de alimentos e não tem filhos que o possam
satisfazer, a obrigação recai imediatamente sobre o afilhado – Artigo 21º/2 da LAC.
O artigo 2010º regula a situação em que uma pluralidade de pessoas estão obrigadas à prestação
de alimentos, determinando que respondem todas na proporção das suas quotas como herdeiros
legítimos do alimentando – Artigo 2010º/1 que implica a aplicação dos artigos 2136º, 2138º,
2139º, 2140º, 2142º, 2145º 2 2146º. Se alguma das pessoas assim onerada não puder satisfazer a
parte que lhe cabe, o encargo recai sobre as restantes – Artigo 2010º/2 | Exemplo 1: Se G, que
carece de alimentos, tiver três filhos, H, I e J, a cada um deles incumbe a prestação de um terço.
Mas se H não tiver meios económicos suficientes para tal, I e J terão de pagar a totalidade da
prestação | Exemplo 2: B, que tem um filho C, e dois netos E e F, que são, por sua vez, filhos de
um filho já falecido, D, a C incumbe metade da prestação de alimentos e aos netos a outra metade
(um quarto a cada um). Mas se o neto E não tiver meios suficientes, o neto F terá de satisfazer a
quota de E e a sua própria quota.
O artigo 2011º prevê a hipótese de o alimentando ter doado bens que lhe pudessem assegurar
meios de subsistência. Neste caso e na medida em que os bens doados pudessem assegurar a
subsistência do doador, a obrigação alimentar recai, no todo ou em parte, sobre o donatário ou
donatários, segundo a proporção do valor dos bens doados, e não sobre as pessoas designadas nos
artigos anteriores. A obrigação alimentar transmite-se aos herdeiros do donatário.
É visível uma certa conexão entre a regulamentação da obrigação legal de alimentos e a
regulamentação sucessória legal, nomeadamente:
✓ Semelhança entre as classes de pessoas vinculadas à obrigação de alimentos (2009º/1) e
as classes de sucessíveis legítimos (2133º/1);
✓ Remissões expressas para as regras da sucessão legitima (2009º/2 e 2010º/1);
✓ O chamamento dos onerados subsequentes (2009º/3) que lembra o chamamento dos
onerados sucessores (2137º/1)
✓ O impacto das doações no regime dos alimentos (2011º) que não deixa de ter alguma
correspondência no plano da sucessão legitimária
✓ A inclusão, entre os fundamentos da deserdação, da recusa sem justa causa, dos devidos
alimentos ao autor da sucessão ou ao seu conjugue (2166º/1, alínea c);
Com base nesta conexão, já se pretendeu fundar a obrigação de alimentar como contrapartida do
direito de suceder. Contudo demonstrou-se que a obrigação de alimentar não tem fundamento na
sucessão. Até porque é precisamente nas famílias que menos bens têm para transmitir que se
identifica mais sujeitos que carecem de sustento.
A medida dos alimentos é orientada pelo binómio: Necessidade do alimentando VS Possibilidade
do obrigado – Artigo 2004º: Os alimentos destinam-se a fornecer o indispensável à vida de uma
pessoa que não tem bens suficientes nem consegue trabalhar o suficiente para garantir a sua
subsistência. Assim, há dois limites alternativos na fixação dos alimentos: A contribuição dos
alimentos não pode exceder o que é necessário ao credor nem o que é exigível, tendo em conta a
capacidade do devedor.
Na relação conjugal ou entre pais e filhos: A obrigação de alimentos insere-se no dever de
assistência, tendo apenas autonomia quando não haja vida em comum; se existir vida em comum,

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as partes estão vinculadas à obrigação reciproca de contribuir para os encargos da vida familiar –
Artigos 1675º/1, 1676º/1, 1874º e 2015º. Ora, a obrigação de contribuir para os encargos da vida
familiar demarca-se da obrigação de alimentos em sentido restrito não só por implicar
reciprocidade mas também por ter como medida o critério do nível de vida comum do agregado
familiar e não o da necessidade dos sujeitos Na relação entre pais e filhos sujeitos às
responsabilidades parentais, acresce ao dever reciproco de assistência, o dever de sustento –
Artigo 1878º/1 e 1879º. Ainda que vinculem apenas os pais é algo que se distingue novamente da
pura obrigação de alimentos, pois os titulares das responsabilidades parentais têm de proporcionar
aos filhos um nível de vida idêntico ao seu.
No caso de extinção do vinculo matrimonial e de dissolução por morte da união de facto, é preciso
ter em conta as disposições especiais constantes dos artigos 2016º a 2020º
Os alimentos são fixados por acordo ou pelo tribunal.: No caso de tribunal, são em regra, devidos
em forma de pensão ou prestação pecuniária mensal – Artigo 2005º. Os alimentos constituídos
por acordo, são devidos desde a proposição de ação ou, se já estiverem fixados pelo tribunal ou
por acordo, desde o momento em que o devedor se constituiu em mora – Artigo 2006º
A ação de alimentos é uma ação comum, exceto quando se tratar de ação relativa a alimentos
devidos a crianças e a filho maior ou emancipado (1880º). De forma preliminar ou incidente de
uma ação de alimentos, podem ser concedidos alimentos provisórios, que serão fixados segundo
o prudente arbítrio do tribunal. Uma vez prestados, não poderão ser restituídos, ainda que a ação
improceda – Artigo 2007º
O direito legal de alimentos é: Indisponível: O próprio direito não pode ser renunciado ou cedido.
O credor pode somente deixar de pedir os alimentos ou renunciar às prestações vencidas – Artigo
2008º/1; sendo um direito indisponível é também ele imprescritível, pois apenas prescrevem as
pensão alimentícias vencidas (no prazo de 5 anos, de acordo com o artigo 310º alínea f) ;
Impenhorável: A lei afasta a possibilidade da penhora do credito legal de alimentos; e
Insuscetível de se extinguir por compensação: Este direito não pode ser compensado pelo
obrigado com créditos sobre o alimentado – Artigo 2008º/2.
Mas a proteção especifica do credito de alimentos é muito extensa:
✓ O legislador consagrou um processo de execução especial por alimentos – Artigos 933º
e 937º do CPC;
✓ Integrou regras sobre meios de tornar efetiva a prestação de alimentos no processo
especial de alimentos devidos a criança – Artigo 48º do RGPTC
✓ Atribui direitos reais de garantia ao credor de alimentos – Artigo 705º, alínea d) e 737º/1,
alínea c);
✓ Colocou entre os fundamentos da deserdação, a recusa, sem justa causa, dos devidos
alimentos ao autor da sucessão ou ao seu conjugue – Artigo 2166º/1, alínea c);
✓ Incriminou, dentro de certas condições, a violação da obrigação legal de alimentos –
Artigo 250º do CP;
Os alimentos taxados não são imutáveis, ou seja, há sempre a possibilidade de alteração quando
as circunstancias assim o determinem: conforme os casos, a prestação alimentícia pode, então,
aumentar, diminuir ou passar a vincular outras pessoas – Artigo 2012º
São causas gerais de cessação da obrigação alimentar – Artigo 2013º/1:
✓ A morte de um dos sujeitos da relação de alimentos;
✓ A impossibilidade de continuação do cumprimento pelo obrigado;
✓ A falta de necessidade do credor;
✓ Violação grave dos deveres do credor para com o obrigado;

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No caso de morte do obrigado ou de impossibilidade superveniente de cumprimento pelo
obrigado, não se extingue forçosamente o direito de alimentos: o encargo pode recair sobre outras
pessoas que constem no artigo 2009º
Para os casos de obrigação relacionados com o casamento (incluindo divorcio, separação de
pessoas e bens, invalidade e viuvez) e com a união de facto, o artigo 2019º (que para ser aplicado
às uniões de facto, há que ser adaptado por força do artigo 2020º/3) prevê três causas adicionais
de cessação da obrigação:
✓ A celebração de casamento pelo alimentado, após a extinção do casamento anterior ou da
união de facto;
✓ O comportamento moral que torne o alimentado indigno do beneficio alimentar;
✓ O inicio da união de facto;

9. CARACTERISTICAS DO DIREITO DA FAMÍLIA


Permeabilidade à realidade social: O Direito da família é especialmente permeável à
realidade social e às posições ideológicas ( politicas, religiosas, ou conceções laicas ou apolíticas).
Um facto demonstrativo desta permeabilidade é a legislação que vigorou durante o estado novo e
a revolução subsequente ao 25 de abril. A titulo exemplar, no código atual, ao contrario dos seus
antecessores, não se restringe o divorcio em função da modalidade (civil ou católica), consagra-
se o principio da igualdade entre os conjugues e não se discriminam os filhos nascidos fora do
casamento. | Segundo o critério do modo de conexão com os valores, o Direito da família pode
ser:
▪ Monista: Se apenas considerar como correta uma determinada categoria de conceções,
não aceitando quaisquer outras;
▪ Pluralista: Quando admitir a relevância de diferentes ordens de dever ser. A
regulamentação familiar é compatível com uma pratica que se desenrole quer segundo
valores maioritários, quer segundo valores minoritários em aspetos que não colidam com
as conceções da maioria. O Direito da família português, atualmente, é pluralista
▪ Relativista: Quando as normas permitirem comportamento que se orientem por
quaisquer valores. Todas as conceções são válidas, não havendo fundamento para proibir
atitudes que assentem em valores diferentes.

Crescente internacionalização: O Direito da família dos países ocidentais não conhece


fronteiras: Importa soluções externas, sujeita-se a fontes extra-estatais e regula situação
transnacionais mediante normas de outros ordenamentos. Esta tendência de importação de
soluções provenientes de ordenamentos estrangeiros, levou já à formação de um núcleo ocidental
comum de Direito da família, que consagraram o principio da não descriminação entre conjugues
e entre filhos nascidos dentro e fora do casamento.
O cidadão Português ou aquele que se encontre em território nacional não esta necessariamente
subordinado ao direito da família português. Os artigos 49º a 61º do código civil e os regulamentos
da UE podem determinar a aplicação de normas de ordenamentos estrangeiros.

Prevalência da dimensão pessoal sobre a patrimonial: Apesar do peso dos


aspetos patrimoniais, é a vertente pessoal que marca o regime da relação familiar. Do ponto de
vista da lei, a constituição de uma relação conjugal não é um meio de aumentar o património ou
de prover futuras necessidades económicas, mas sim a criar uma comunhão de vida – Artigos
1577º e 1672º. Mesma a relação de parentesco juridicamente mais relevante: filiação, não é vista
como meio de assegurar o sustento de certas pessoas ou de definir a titularidade do património
que pertencera a um dos sujeitos entretanto falecido.

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Assim, pretende-se um espaço de vivencia pessoal comum e, uma progressiva autonomia dos
filhos face aos pais, e um relacionamento pautado por valores imateriais – Artigo 1874º

Recurso a conceitos indeterminados: Este fenómeno é visível nos enunciados dos


deveres conjugais e paternofiliais – Artigos 1672º e 1874º. É uma técnica que dá à lei uma maior
aptidão de resposta aos desafios do caso concreto e uma maior capacidade de resistência no
tempo. Não obstante, por implicar uma tarefa de preenchimento ou valoração, acarreta consigo
uma certo grau de incerteza. Exige-se ao interprete que que reduza o risco de arbitrariedade,
mediante uma valoração apoiada em parâmetros normativos fundamentais.

Abundância de normas injuntivas: Ainda que seja um elemento restritivo da


autonomia privada, não elimina a liberdade individual dos sujeitos da relação familiar. Por um
lado, há normal injuntivas que protegem essa liberdade (tal como o artigo 1672º quando impõe a
cada um dos conjugues o dever de respeitar o outro; ou o artigo 1878º/2 quando obriga os pais ao
reconhecerem aos filhos menores não emancipados autonomia na organização da sua própria
vida). Por outro lado, a lei não regula detalhadamente os aspetos da vida pessoal dos membros da
família, enumerando deveres familiares recorrendo aos conceitos indeterminados.
A proteção da personalidade e o acordo entre as partes constituem dois dos mecanismos mais
importantes.

Oscilação entre institucionalismo e individualismo ético: O Direito da família


regula não só os interesses exclusivos de cada um, bem como os interesses comuns daqueles que
estão unidos por si por laços familiares. Ao lado de referências legais ao ´bem da família` e à
´unidade da vida familiar`, coexistem referencias aos interesses e às exigências da vida
profissional de cada um dos conjugues, bem como ao interesse dos filhos. Também a CRP no
artigo 67º reconhece à família o direito à proteção da sociedade e do Estado, reconhecendo-lhe
também o direito à efetivação de todas as condições que permitam a realização pessoal dos seus
membros.
A família é um conjunto de pessoas, que ainda que formem um grupo, não perderam a sua
individualidade. Impugna-se pelo equilíbrio entre integração e independência.

Lógica de proteção: Há uma grande lógica de proteção que leva a uma grande
intervenção estatal, que se materializa em atividade legislativa que origina e estrutura novas áreas
do Direito da família, como o direito convivencial ou direito tutelar, ou que se reflete no maior
dinamismo judicial e administrativo para defesa das crianças e jovens em perigo. Esta lógica é
visível, desde logo: Na tutela de um cônjugue perante o outro; tutela do ex-cônjuge mais
desfavorecido, com base na regulamentação da casa de morada de família, da compensação por
contribuição excessiva para os encargos da vida familiar, etc.; medidas de proteção das pessoas
que vivem em união de facto e em economia comum;

Grande abertura ao uso da mediação e de outros métodos alternativos de


resolução de conflitos: Revela-se hoje uma grande abertura ao uso de métodos alternativos de
resolução de litígios, nomeadamente, a intervenção judicial de conciliação ou arbitragem e a
mediação. Os artigos 1673º/3 e 1901º/2 e 3 preveem situações em que o juiz é chamado a decidir
sobre assuntos concretos da vida familiar. No 1º caso, o tribunal decidirá sobre a fixação ou
alteração da residência da família, na falta de acordo. Este processo é disciplinado, mais
concretamente, pelo artigo 991º/3 do CPC que admite, que antes da decisão o juiz convoque as
partes e quaisquer familiares para uma audiência onde tentará a conciliação – Assim, o juiz goza
de poderes de arbitragem vinculativa, a que se somam poderes de conciliação de exercício
facultativo. Não são insignificantes os poderes de intervenção conciliatória, manifestando-se, por

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exemplo, no processo de divórcio sem consentimento de um dos conjugues – Artigo 1779º e de
regulação do exercício das responsabilidades parentais – Artigo 37º do RGPTC.
A Mediação: Método extrajudicial de resolução de litígios em que um terceiro, que se
vincula a agir com neutralidade, procura ajudar as partes a chegarem a um acordo relativamente
àquilo que as divide. O artigo 24º do RGPTC confere ao juiz a faculdade de determinar a
intervenção de serviços públicos ou privados de mediação, em qualquer estado dos processos
tutelares cíveis e sempre que o entenda conveniente, designadamente, em processo de regulação
do exercício das responsabilidades parentais. Um despacho do Ministério da justiça criou um
sistema alargado de mediação em matéria familiar. A mediação é elogiada por ser mais célere,
mais barata e por diminuir a conflitualidade, graças à sua estrutura informal e flexível
A mediação tem vindo a ganhar lugar dado o próprio lugar do direito da família que é pluralista,
tolerante, onde reina a liberdade e a responsabilidade individual, privilegiando a definição do
destino pelos próprios interessados.

10. CARACTERÍSTICAS DAS SITUAÇÕES JURÍDICAS


FAMILIARES
Natureza estatutária: As situações jurídicas familiares emergem de um status, isto é, de uma
ligação orgânica entre o individuo e o grupo. As situações jurídicas não cabem a um individuo
em si, mas sim enquanto membro de um grupo a que o estado, através da sua intervenção
reconhece interesse social,
Indisponibilidade: As situações jurídicas familiares são indisponíveis, mais concretamente:
Artigos 1618º, 1699º/1 alínea b) e 1878º/1. A lei prevê para estas situações uma disciplina que os
sujeitos não podem, unilateralmente ou por acordo, alterar. Esta indisponibilidade projeta-se
também na extinção das situações jurídicas familiares, que são intransmissíveis e irrenunciáveis
|Exemplo: o dever de fidelidade extingue-se com a morte de uma das partes, não se transmitindo
por morte; o dever de auxilio mutuo não pode ser cedido a terceiro; os pais não podem abdicar
das responsabilidades parentais, ainda que possam ser privados dessa responsabilidade.
Durabilidade Virtual: As situações jurídicas familiares duram enquanto durar o status
familiar, e a perda deste só acontece com a morte de um dos sujeitos ou com um ato do Estado. |
Exemplo: Enquanto não houver divorcio, os conjugues mantem-se vinculados à generalidade dos
deveres.
Funcionalidade acentuada: As situações jurídicas familiares estão predominantemente ao
serviço de interesses que ultrapassam os interesses exclusivos dos seus titulares. Por exemplo, as
responsabilidades parentais, cujos titulares são os pais, são ordenadas em torno do interesse do
filho menor e têm de ser exercidos (estão obrigados a tal, sob pena de sanção). As outras situações
que, não sendo de exercício obrigatório, são direitos subjetivos não podem ser exercidos com fins
egoístas. Ainda que não esteja obrigado a exercer esses deveres, quando o fizer tem de fazê-lo na
perspetiva do interesse comum dos membros do grupo a que ele pertence
Oponibilidade erga omnes: As situações jurídicas familiares tem de ser respeitadas por
terceiros. |Exemplo: Os deveres conjugais e paternofiliais dirigem-se, primeiro, a conjugues, pais
e filhos, aos quais incumbe o cumprimento. Contudo, são oponíveis a terceiros, que se devem
abster de contribuir para o incumprimento ou para a impossibilidade de cumprimento.
Tipicidade: O carater erga omnes das situações familiares não é compatível com a atipicidade
das mesmas : Os terceiros devem saber com o que contar e com o que não devem interferir. Os
deveres conjugais ou paternofiliais são aqueles que a lei prevê, não sendo permitida a constituição
de outros através de negociação.

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O problema da garantia: Classicamente os direitos familiares pessoais têm uma garantia
mais frágil do que aquela que é dada aos direitos reais e aos direitos de credito: Os direitos
familiares não são passiveis de execução especifica e a sua violação não origina responsabilidade
civil, mas apenas a aplicação de mecanismos de direito da família.
Genericamente pode afirmar-se que os direitos familiares pessoais não comportam execução
especifica. Mas a impossibilidade de sanções reconstitutivas não é uma particularidade do direito
da família: Há deveres familiares patrimoniais, como o de assistência que podem ser alvo de
execução (1676º/4). Mas a regra de não execução explica-se pela infungibilidade do
comportamento devido. Mas os defensores desta fragilidade negam a aplicação da
responsabilidade civil a casos de incumprimento de deveres correspondentes, argumentando-se,
por exemplo, que uma ação de indemnização entre pais e filhos prejudicaria o respetivo
relacionamento.
Contudo, defende JDP que o legislador não excluiu a tutela indemnizatória em lado algum. O
artigo 1792º/1 determina o contrario: ´o cônjuge lesado tem o direito de pedir a reparação dos
danos causados pelo outro cônjuge, nos termos gerais` Defende ainda que não faria sentido
afastar um principio de justiça, como a reparação dos danos, apenas porque o lesado e o lesante
são familiares. Nada justifica, para o autor, que a área familiar seja exceção à aplicação deste
instituto
Assim, parece contrariar a ideia de que a garantia dada às relações familiares é menor do que
aquela que é dada às situações jurídicas comuns afirmando, inclusivamente, que é ainda mais
intensa (pode ser reclamada, por exemplo, a entrega judicial da criança, etc.)
11. O REGIME CONSTITUCIONAL DAS MATÉRIAS QUE SÃO OBJETO DO
DIREITO DA FAMÍLIA
O regime jurídico constitucional da família é formado pelas normas dos artigos 36º, 67º, 68º, 69º,
72º e parte do 26º da CRP. Estes artigos orientam o legislador ordinário e ajudam na interpretação
e preenchimento de conceitos indeterminados.
Os artigos 36º e 26º da CRP consagram princípios constitucionais que são diretamente aplicáveis
e vinculam entidades públicas e privadas, princípios esses que podem ser agrupados em três
categorias:
✓ Princípios atinentes à generalidade das relações familiares: Abarcam o direito de
constituir família e o direito à reserva da intimidade da vida privada e familiar;
✓ Princípios de Direito matrimonial: Direito à celebração do casamento, e competência
da lei para regular os requisitos e os efeitos do casamento e da sua dissolução, por morte
ou divórcio, e o principio da igualdade dos cônjuges;
✓ Princípios de Direito da filiação: Direito à identidade pessoal e genética, a não
descriminação dos filhos nascidos fora do casamento, a atribuição aos pais do direito-
dever de educação e manutenção dos filhos;
As normas dos artigos 67º, 68º, 69º e 72º da CRP são meramente programáticos e fundam
princípios de proteção da família, proteção da maternidade e paternidade, proteção das crianças e
jovens, e de proteção dos idosos.
11.2 Princípios constitucionais aplicáveis à generalidade das matérias que são objeto do
Direito da família, fundados em normas preceptivas.
O artigo 36º/1 da CRP reconhece a todos o direito de constituir família em condições de plena
igualdade. Este direito fundamental compreende qualquer relação familiar: conjugal; de
parentesco; de afinidade; de adoção; de filiação por PMA heteróloga e de apadrinhamento civil.

17
O Direito de procriar confere ao seu titular a liberdade de procriar ou de não procriar. Inclusive,
beneficia de tutela penas (artigo 144º, alínea b) do CP). Não obstante, a liberdade de procriar
sujeita-se a certos limites, tais como: O Direito de procriar é concedido para a formação de um
grupo em que o interesse mais ponderoso é o da criança. Externamente destaca-se a liberdade de
não procriar da outra pessoa que se relaciona com aquela que pretende ter um filho.
O direito de constituir um vinculo jurídico de filiação não adotiva assiste tanto ao pai como ao
filho. Mas é um direito especialmente assegura ao filho menor, pois é o seu interesse que recebe
especial enfoque. A própria constituição foca muito o interesse superior da criança, veja-se:
Artigo 36º/5 CRP; Artigo 36º/6 CRP; Artigo 67º/2 alínea d); Artigo 69º/1 e 2.
Alguma doutrina tem defendido que o direito de constituir família abrange a união de facto:
Argumentam com a distinção feita pelo artigo 36º/1 entre constituir família e contrair casamento,
ou invocando a existência de um conceito constitucional aberto e plural de família.
A constituição não formula uma noção de família, e não pode essa conceção ser substituída por
uma qualquer noção que possa ser dada pelo legislador ordinário, pois isso seria um erro grave
de subversão e desrespeito pela hierarquia das fontes. Contudo, e tende em conta a ótica da
constituição e da sua proteção a este grupo, não parece caber no conceito constitucional de família
a união de facto, seja ela formada por pessoas do mesmo sexo ou de sexo diferente, nem a
convivência em economia comum. Essas relações parafamiliares constituem-se e extinguem-se
sem que seja necessária a intervenção do estado.
Mas estas duas relações não são vazia de fundamento constitucional, apontando-se para o efeito,
que constituem formas de organização de vida que traduzem o direito ao desenvolvimento da
personalidade do artigo 26º/1 da CRP.
O direito à reserva da intimidade da vida privada e familiar, também prevista no artigo 26º/1 da
CRP é uma situação jurídica fundamental relativa à família. Este direito envolve diretamente a
componente familiar, assegurando uma esfera de privacidade ao individuo, no contexto das suas
relações familiares que ele pode opor ao Estado e aos particulares que não sejam sujeito das
mesmas relações. O próprio artigo 26º/2 impõe à lei o dever de estabelecer garantias contra a
obtenção e utilização abusivas de informações familiares.
11.3 Princípios constitucionais de Direito Matrimonial, fundados em normas preceptivas
O artigo 36º/1, 2ª parte concede o direito de celebrar casamento em condições de igualdade. Este
direito é contrario a casamentos forçados e às restrições de casamento fundadas na raça, religião
ou nacionalidade dos nubentes –Artigo 16º/1 da DUDH ( de acordo com o artigo 16º/2 da CRP
que remete para a DUDH)
Atendendo ao artigo 18º/1 da CRP, é nula a cláusula de um contrato de trabalho que atribua à
entidade patronal o poder de despedir um trabalhador que viesse a contrair casamento.
À consagração do direito à liberdade matrimonial, separado do direito de constituir família, alia-
se a atribuição de competência à lei ordinária para regular os requisitos e efeitos do casamento e
da sua dissolução, por morte ou divórcio, independentemente de a forma de celebração ser civil
ou religiosa.
Esta remissão para a lei ordinária, da regulamentação dos requisitos do casamento, qualquer que
seja a forma (artigo 36º/2 CRP) suscita algumas questões dado o conteúdo do artigo 1625º do
CC. Este artigo reserva aos tribunais eclesiásticos que aplicam Direito canónico, competência
para conhecer das causas de nulidade do casamento católico contraído em território nacional.

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 A doutrina maioritária tem defendido a tendência da constitucionalidade, fazendo uma
interpretação restritiva da referencia do artigo 36º/2 da CRP, aos requisitos do casamento,
invocando o elemento histórico: O artigo 1625º reproduz na totalidade o artigo XXV da
concordata de 1940.
o Entretanto, na nova concordata de 2004, o artigo 16º continua a reconhecer a
competência das autoridades eclesiásticas para conhecer das clausulas de
nulidade do casamento católico. Seja como for, a lei não confere eficácia civil às
decisões das autoridades de outras confissões religiosas. Tal como decorre do
artigo 26º/2 CRP o legislador constituinte não se desinteressa por esta matéria
O artigo 36º/3 da CRP confirma a presença de sinais valorativos na regulação do casamento. Os
cônjuges têm direitos e deveres iguais. Foi rejeitado o modelo de união sob direção do marido
que estava consagrado na versão originaria do código.
11.4 Princípios Constitucionais de Direito da Filiação, fundados em normas preceptivas
Em aspetos cruciais como a família, a constituição Portuguesa guia-se pelas convenções comuns
da comunidade. Assim, prevê que os pais têm o direito e o dever de educação dos filhos e que,
em regra, os filhos não podem ser separados dos pais – Artigo 36º/5 e 6 CRP.
Do artigo 36º/4 extrai-se o principio da não descriminação dos filhos nascidos fora do casamento.
Mas esta proibição não é afetada pela existência de diferentes modos de estabelecimento da
paternidade, nos casos de filiação fora do casamento – Artigo 1796º/2: É uma diferenciação
decorrente da própria natureza das coisas. Assim, impede-se também a lei de usar designações
discriminatórias relativas à filiação (norma constitucional essa não acatada no artigo 1703º/2 que
faz referencia a ´descendentes legítimos` - Mas esta é uma questão meramente terminológica.)
O direito – dever de educação e manutenção dos pais é reconhecido pelo artigo 36º/5 da CRP, a
ambos os pais sem distinções.
O artigo 36º/6 enumera o principio de que os filhos não podem ser separados dos pais, exceto
quando não sejam cumpridos os seus deveres fundamentais, e só poderá acontecer mediante
decisão judicial. Deste modo, seria inconstitucional a norma que permitisse retirar uma criança
aos pais por mera decisão administrativa. Tendo em conta este principio mostra-se duvidoso o
preceito do artigo 1907º/1 que admite que um filho menor seja confiado a terceira pessoa por
decisão judicial, independentemente de se terem verificado algumas das circunstâncias previstas
no 1918º
Ainda que o artigo 36º não faça referencia aos filhos nascido através de PMA estes não podem
ser descriminados relativamente aos filhos nascidos na sequencia de ato sexual, por força do
principio geral da igualdade – Artigo 13º/1
No artigo 26º/1 e 3 encontramos o direito à identidade pessoal e genética.
11.5 Princípios de proteção consagrados em normas programáticas
O artigo 67º/1 estampa a ideia da família enquanto elemento fundamental da sociedade que
legitima a intervenção regulamentadora do Estado. O artigo 67º/2 enumera as funções do estado
nesta matéria. O artigo 68º especifica o principio da proteção da família no domínio da
maternidade e paternidade. O artigo 69º reconhece às crianças o direito à sua proteção e ao seu
desenvolvimento, patenteando uma especial preocupação com as crianças desamparadas. Por sua
vez, o artigo 72º confere proteção à terceira idade, neste sentido o Estado deve zelar pelo
cumprimento do dever de assistência ou da obrigação de alimentos, que recai sobre os familiares.

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12. O DIREITO EUROPEU DA FAMÍLIA
A problemática do Direito europeu da família pressupõe três níveis principais:
➢ Uniformização e unificação do Direito Europeu nos Estados Europeus: As
transformações que afetaram a generalidade dos países europeus levaram à formação
quase espontânea de um núcleo comum de Direito da família, pois é visível a
convergência entre os vários estados europeus em certos regimes como o casamento,
divórcio, etc. Mas existem também diferenças substanciais entre os Direitos da família
dos vários estados Europeus (por exemplo, no que toca à relevância civil do casamento
religioso, ao regime matrimonial de bens supletivo e ao casamento entre pessoas do
mesmo sexo)
o Numa tentativa de uniformização do Direito Europeu da família, foi criada em
2001 a comissão de Direito da Família Europeu que elaborou já princípios nas
áreas do divórcio e alimentos entre ex-cônjuges; responsabilidades parentais e
efeitos patrimoniais do casamento.
o A formulação destes princípios não tem carater vinculativo mas procura
persuadir os legisladores nacionais a adotar o mesmo modelo.
➢ Regulamentos com incidência familiar: Os regulamentos comunitários com incidência
familiar já assumem carater vinculativo para todos os estados-membros da União
europeia. Contudo, estes regulamentos limitam-se a facilitar o reconhecimento e
execução num estado, de decisões tomadas noutro estado, a fixar qual o estado com
competência de decisão em assuntos conexos a mais do que um estado membro. |
Destacam-se os seguintes regulamentos:
✓ Regulamento (CE) nº 2201/2003, de 27 de Novembro – Competência,
reconhecimento e execução de decisões em matéria matrimonial e em matéria de
responsabilidade parental.
✓ Regulamento (CE) nº 4/2009 do conselho, de 18 de Dezembro de 2008 –
Competência, lei aplicável, reconhecimento e execução das decisões e
cooperação em matéria de obrigações alimentares
✓ Regulamento (UE) nº 2016/1103 do conselho, de 24 de junho de 2016;
✓ Regulamento (UE) nº 2016/1104 do conselho, de 24 de junho de 2016;
➢ A jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Humanos (TEDH): O TEDH
julga com base na convenção europeia dos Direitos Humanos que contem dois artigos
especialmente relevantes em matéria de Direito da família: Artigo 8º e 12º
o Por diversas vezes o TEDH considerou haver vida familiar entre crianças e
adultos, ainda que não existam laços de sangue ou de reconhecimento de adoção.
Em sentido inverso, não se considerou estar coberta pelo conceito de vida
familiar relação entre tia e sobrinho que não residiam juntos, em virtude daquele
(que queria ser reconhecida como tutora) só o ter visitado uma vez em cinco anos.
o Assim, é patente que o conceito de vida familiar não é idêntica com a noção
Portuguesa de relação jurídica familiar.

20
PARTE I
DIREITO DA FILIAÇÃO
CAPÍTULO I – CONSTITUIÇÃO DO VÍNCULO DE FILIAÇÃO
Filiação:
➢ Sentido estrito: Relação juridicamente estabelecida entre as pessoas que procriaram e
aquelas que foram geradas. | É nesta aceção que o termo é empregue no artigo 1796º e
seguintes.
➢ Sentido amplo: Corresponde tanto à relação jurídica familiar constituída pela procriação
quer à relação que, não tendo origem no fenómeno da procriação, produza efeitos
jurídicos familiares | Exemplo: Filiação constituída por sentença de adoção (os efeitos da
adoção praticamente não se distinguem dos do vinculo de filiação biológica estabelecida).
A lei recorre ao conceito amplo no artigo 60º/1 ao referir-se à filiação adotiva. E esta é a aceção
predominantemente seguida, seguindo a crença de que a eficácia é mais importante do que a
constituição. Nunca esquecendo que as realidades que estão aglutinadas, estão subordinadas ao
mesmo principio: Principio do superior interesse da criança ou do menor.
O Direito da Filiação assenta numa conceção filiocêntrica:
✓ Artigo 1875º/2 – Os conflitos entre os pais sobre o nome da criança são decididos pelo
juiz ´de harmonia com o interesse do filho`.
✓ Artigo 36º/5 CRP – Atribui aos pais não só o direito, mas essencialmente o dever de
educação e manutenção dos filhos;
✓ Artigo 1878º - As responsabilidades parentais são exercidas no ´interesse dos filhos`;
✓ Artigos 1905º e 1906º/7 – Referindo-se aos casos de divórcio, separação de pessoas e
bens, declaração de nulidade ou anulação de casamento, exigem o acordo dos pais e a
decisão do tribunal, sempre tendo em vista o ´interesse do menor`;
✓ Artigo 36º/6 CRP – Admite que os filhos sejam separados dos pais caso estes não
cumpram os seus deveres;
✓ Artigo 67º/2 alínea d) CRP – Cabe ao estado garantir o direito ao planeamento familiar,
de forma a permitir uma maternidade e paternidade conscientes;
✓ Artigo 69º/1 CRP – Reconhece às crianças o direito à proteção da sociedade e do Estado
contra todas as formas de abandono, discriminação e opressão e contra o exercício
abusivo da autoridade na família;
O que significa: Interesse superior do menor/criança/jovem/filho?: É um conceito indeterminado.
É, por exemplo, do interesse da criança o seu ´integral e harmonioso desenvolvimento físico,
intelectual e moral` o que implica a existência de ´um ambiente familiar normal` (expressão
contida no artigo 69º/2 CRP). É hoje aceite que a opinião da criança é de ponderar na
determinação do seu superior interesse pelas autoridade judiciarias, e por isso reconhece-se o seu
direito a ser ouvida – Artigo 5º/1 alínea c) do RGPTC. Nesta lógica de interesse superior,
incentiva-se a biparentalidade, ou seja, é preferível que a criança tenha duas figuras parentais (é
dada, por exemplo, preferência à adoção conjunta em detrimento da adoção singular (ver a titulo
exemplar o requisito da idade do artigo 1979º)

21
14. Modalidades de filiação
Segundo o critério da fonte/origem do vinculo:

Procriação
através de ATO
SEXUAL
BIOLÓGICA
PMA
HOMÓLOGA
FILIAÇÃO ADOTIVA

POR PMA
HETERÓLOGA

➢ Filiação Biológica: É a filiação em sentido estrito. Decorre da procriação, identificando-


se com o parentesco no 1º grau da linha reta, que é uma relação familiar nominada(1578º).
A constituição deste vinculo tem eficácia retroativa, produzindo efeito entre os sujeitos
desde a data do nascimento do filho – Artigo 1797º/2. | A filiação biológica subdivide-se
em:
 Filiação derivada de ato sexual: É a forma mais comum de filiação, sendo por
isso a esta forma que se refere o regime geral Português de constituição e extinção
do vinculo de filiação, constante do artigo 1796º.
 Filiação decorrente de PMA Homóloga: Há produto genético dos
beneficiários, como por exemplo ´o esperma do Homem` que “ beneficiará”
daquela reprodução.
➢ Filiação Adotiva: Aquela que, independentemente dos laços de sangue, se constitui por
sentença proferida no âmbito do processo de adoção – Artigo 1793º/1. A adoção é uma
relação familiar nominada – Artigo 1586º. Não tem caráter retroativo.
➢ Filiação por PMA heteróloga: Constitui-se mediante consentimento da parte que irá
assumir o papel de pai, independentemente dos laços de sangue e em que tenha havido
sentença judicial. É uma relação familiar inominada. O artigo 1839º/3 dá um exemplo de
filiação por PMA heteróloga: não permite a impugnação da paternidade presumida do
marido da mar quando ele consentiu a inseminação artificial, sem que se distinga se o
esperma vem do marido ou de terceiro. Este preceito admite que o consentimento
prestado fora do âmbito de um processo de adoção seja suficiente para criar um vinculo
de filiação entre o marido da mãe a criança, mesmo que não exista vinculo biológico. A
PMA heteróloga tem também carater retroativo.
15. Critério biológico e critério social ou ´afetivo`
A filiação biológica é a principal modalidade de filiação, ao passo que a filiação adotiva e por
PMA heteróloga são modalidades subsidiárias. A constituição de filiação por adoção é dificultada
pela exigência de vários requisitos que contribuem para que a sua expressão estatística seja
diminuta. A filiação por PMA heteróloga é também limitada pois o ato sexual continua a ser a
forma privilegiada e porque no seio da procriação medicamente assistida, razoes éticas e outras,
têm levado à defesa de uma utilização excecional deste processo em relação à PMA heteróloga.

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Assim, a lógica do nosso sistema é muito biologista pelo que o critério geral para a constituição
do vinculo da filiação é o biológico (sendo preferível a PMA homóloga em detrimento da
heteróloga).
A prevalência do critério biológico no estabelecimento da filiação decorre, nomeadamente, da
forma como a lei contrapõe a filiação em sentido estrito à adoção, e do que se prescreve quanto à
forma de estabelecimento da maternidade.
O artigo 1586º distingue a adoção da filiação natural com base nos laços de sangue. O artigo
1796º/1 preceitua que relativamente à mãe, a filiação resulta do facto do nascimento. Importante
é o artigo 1801º que determina que ´nas ações relativas à filiação são admitidos como meio de
prova os exames de sangue e quaisquer outros métodos científicos.
Atualmente as duvidas sobre uma ligação biológica são facilmente desfeitas através de testes de
ADN. Contudo, há uma opinião que tem prevalecido, que rejeita a recolha coercitiva de sangue,
restringindo o alcance do artigo 1801º. Os avanços científicos permitem que o material para
exame não seja necessariamente o ADN, podendo ser saliva, fios de cabelo, fragmentos de pele
ou unhas
O biologismo não é um valor absoluta, enão se confirma a expectativa ou presunção de que os
pais biológicos tem maior aptidão para o exercício das responsabilidades parentais. Em vários
aspetos o legislador afasta-se do principio da verdade biológica, como por exemplo: Ao sujeitar
ações de investigação de maternidade e de paternidade e de impugnação da paternidade a prazos
de caducidade – Artigos 1817º, 1873º e 1842º. Ao excluir a ação de averiguação oficiosa
suscetível de revelar uma ligação incestuosa – Artigo 1809º, alínea a) e 1866º, alínea a); ao exigir
consentimento do filho maior de idade para que a perfilhação produza efeitos – Artigo 1857º.
Há quem defenda a inconstitucionalidade sobre normas legais que sujeitem as ações de filiação a
prazos de caducidade. Neste sentido, muitos são os autores, que ao contrário da posição defendida
pelo tribunal constitucional, defendem a inconstitucionalidade destas normas.

SECÇÃO II – ESTABELECIMENTO DA FILIAÇÃO NO


CASO DE PROCRIAÇÃO ATRAVÉS DE ATO SEXUAL
O regime geral Português de constituição e extinção do vinculo – Artigos 1796º a 1873º - tem em
vista a filiação biológica decorrente da procriação por ato sexual. Esta filiação é de base parental,
heterossexual e não tem origem em técnicas de procriação medicamente assistida.
O artigo 1796º distingue entre estabelecimento da filiação quanto à mãe, do estabelecimento da
filiação quanto ao pai:
✓ O nº1 diz que a filiação materna resulta do facto do nascimento e que se estabelece nos
termos dos artigos 1803º a 1825º, isto é, por declaração de maternidade ou
reconhecimento judicial.
✓ O nº2 dispõe que a paternidade se presume em relação ao marido da mãe e que, nos
casos de filiação fora do casamento, se estabelece por reconhecimento.
Assim, a maternidade jurídica resulta do facto do nascimento, regra que tem em vista a situação
comum em que, a mãe genética e a mãe de gestação são uma e mesma pessoa. O parto tem-se
como um elemento que torna clara a ligação biológica à mãe. Quanto à paternidade, e faltando
um facto notório como o parto, segue-se o sistema da presunção, para os filhos nascidos dentro
do casamento, e o sistema do reconhecimento ou do decreto para os outros.

23
17. ESTABELECIMENTO DA MATERNIDADE
O artigo 1796º/1 determina que a filiação materna se estabelece nos termos dos artigos 1803º a
1825º.
São apenas dois os modos de estabelecimento da maternidade: A declaração de maternidade e
o reconhecimento judicial. A averiguação oficiosa não é um modo de estabelecer a maternidade,
mas uma atividade imposta por lei com o objetivo de levar ao estabelecimento por um dos dois
modos possíveis (declaração de maternidade ou reconhecimento judicial) Ou seja, a averiguação
oficiosa não é um modo de averiguação em sim, mas antes um meio de chegar a essa averiguação.
➢ Declaração de maternidade: É o modo normal de estabelecer a maternidade e consiste
numa indicação da maternidade que tanto pode ser efetuada pela mãe como por terceiro.
O artigo 124º/1 CRC obsta ao registo da declaração de maternidade que contradiga a filiação
resultante de ato de registo anterior.
A indicação da maternidade efetuada pela própria mãe é a declaração de maternidade em sentido
restrito. Contudo, existe um sentido amplo, quando a indicação da maternidade é feita por terceiro
(artigos 1804º/2 e 1805º/1 e 2). Em regra, a declaração de maternidade faz-se por menção desta
no registo de nascimento do filho. Neste caso, a declaração tem a denominação especifica de
´menção da maternidade` - Artigo 1803º
A declaração de maternidade está normalmente conexa com a declaração de nascimento: O
declarante do nascimento deve indicar, quando possível, a mãe do registando – Artigos 112º/1
CRC e 1803º/1 CC.
O nascimento está sujeito a registo obrigatório – Artigo 1º/1, alínea a) CRC. Quando ocorrer em
território Português, deve ser declarado no prazo de 20 dias imediatos, numa conservatória do
registo civil, ou se o nascimento ocorrer em hospital onde seja possível declarar o nascimento, até
ao momento em que haja alta – Artigo 96º/1 CRC. O nascimento deve ainda ser declarado no
hospital para onde a parturiente tenha sido transferida, desde que seja possível declarar o
nascimento até ao momento em que receba alta – Artigo 96º/2 CRC.
Por força do artigo 97º/1 do CRC, a obrigação de declarar o nascimento cabe, sucessivamente, às
seguintes pessoas:
✓ Aos pais ou a outros representantes legais da criança ou a quem por eles seja, para o
efeito, mandatado por escrito particular;
✓ Ao parente capaz mais próximo que tenha conhecimento do nascimento;
✓ Ao diretor ou administrador ou outro funcionário por eles designado da unidade de saúde
onde ocorreu o parto ou no qual foi participado o nascimento;
Se o nascimento tiver ocorrido há mais de um ano, a respetiva declaração só pode ser prestado
por qualquer dos pais, por quem tiver o registando a seu cargo ou pelo próprio interessado se for
maior de 14 anos – Artigo 99º/1 CRC
Se o nascimento declarado tiver ocorrido há menos de 1 ano, a maternidade indiciada (por pessoa
do artigo 97º/1 do CRC, ou por qualquer pessoa que exiba provas da declaração de maternidade
feita pela mãe em escritura, testamento ou termo lavrado em juízo) considera-se estabelecida –
Artigos 1804º/1; 113º/1 do CRC.
Quando o nascimento declarado tiver ocorrido há 1 ano ou mais, a maternidade indicada
considera-se estabelecida se for a mãe a declarante, se estiver presente no ato do registo, se for
nele representada por procurador com poderes especiais ou se for exibida prova da declaração de
maternidade feita pela mãe em escritura, testamento ou termo lavrado em juízo – Artigo 114º/1

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CRC. Não se verificando nenhum desses casos, a pessoa indicada como mãe (por uma das pessoas
com competência para a declaração tardia do nascimento, regulada no artigo 99º/1 CRC será
notificada pessoalmente para, no prazo de 15 dias, vir declarar se confirma em auto a maternidade,
sob a cominação de o filho ser havido como seu (artigos 114º/2 CRC e 1805º/2). Se a pretensão
mãe negar a maternidade ou não puder ser notificada, a menção da maternidade fica sem efeito –
Artigo 1805º/3. Se confirmar a maternidade ou, se tendo sido notificado, nada declarar a
maternidade considera-se estabelecida.
Quando o registo de nascimento é omisso quanto à maternidade, a mãe pode fazer a todo o tempo
a declaração de maternidade e qualquer pessoa com competência para fazer a declaração de
nascimento tem poder para identificar a mãe do registado – Artigo 1806º. Nesta situação, aplica-
se o disposto quanto a nascimentos ocorridos há menos de 1 ano ou há 1 ano ou mais. A declaração
de maternidade não pode ser feita se se tratar de filho nascido ou concebido na constância do
matrimonio e existir perfilhação por pessoa diferente do marido – Artigo 1806º/1, 2ª parte. Neste
caso apenas resta o reconhecimento judicial.
Os artigos 125º a 129º do CRC regulam o registo da declaração de maternidade que não conste
de assento de nascimento. Em regra, o funcionário do registo civil lavra um assento de declaração
de maternidade, que deve observar os requisitos do artigo 126º do CRC. Não obstante, a
declaração de maternidade feita por testamento, escritura pública ou termo em juízo é registada,
por averbamento, ao assento de nascimento do filho – Artigo 129º CRC.
A mãe não perfilha, declara maternidade. A declaração de maternidade efetuada pela mãe não é,
nem pode ser um reconhecimento do filho, é uma simples comunicação de um facto ostensivo
que é o nascimento. Por isso, o artigo 1807º prevê a impugnação da maternidade estabelecida com
base em declaração apenas quando a maternidade indicada não for a verdadeira.
A declaração de maternidade efetuada pela própria mãe não tem um regime legal especifico que
se compare ao da perfilhação. Por isso alguns perguntam se o regime da perfilhação não se aplica
analogicamente à declaração de maternidade:
SIM ! - Podem NÃO – NÃO SE PODEM NÃO É CLARA A POSIÇÃO A
aplicar-se APLICAR TOMAR
- Artigo 1848º/2 - Normas que aludam ao nascituro; - Filho pré-falecido – ARTIGO
- Artigo 1852º - Não se aplicam os artigos 1850º, 1856º;
- Artigo 1858º - 1860º e 1861º sobre capacidade e - Filho maior – Artigo 1857º;
irrevogabilidade vícios na formação da vontade, por - Erro vicio ou coação moral –
da perfilhação; estarem associadas à perfilhação Artigo 1860º;
enquanto declaração de consciência - Investigação judicial pendente –
Artigo 1863º;
A solução é dependente da natureza das normas em causa. O regime da perfilhação pode aplicar-
se à declaração de maternidade nos aspetos em que não esteja marcado pelo convencimento da
filiação e pela vontade de exteriorizar esse convencimento (a perfilhação é um ato livre e
voluntário).
➢ Reconhecimento judicial da maternidade: Ocorre através de uma ação autónoma
(especialmente intentada para o efeito) de investigação de maternidade ou de declaração
de maternidade. O tribunal deve comunicar a qualquer conservatória do registo civil a
decisão que reconhecer a maternidade, para que seja feito o averbamento da filiação
estabelecida – Artigo 78º CRC
Não é admissível o reconhecimento judicial de maternidade contrário ao que conste do registo de
nascimento (artigo 1815º), sendo indispensável a impugnação prévia da maternidade registada. |
A ação de investigação pode ser:

25
✓ Comum/simples – Incide apenas no plano do estabelecimento da maternidade;
▪ À partida a ação comum de investigação de maternidade deve ser intentada pelo
filho contra a pretensa mãe – Artigos 1814º e 1819º. O artigo 1818º estende a
legitimidade ativa ao conjugue aos descendentes do filho, segundo determinadas
regras.
▪ O artigo 1819º/1 regula a legitimidade passiva, prevendo que, se a pretensa mãe
tiver falecido, a ação deve ser proposta contra o conjugue sobrevivo não separado
de pessoas e bens e também, numa situação de litisconsórcio2 necessário ativo –
Artigo 33º CPC, sucessivamente, contra os descendentes, ascendentes ou irmãos;
na falta de todas estas pessoas, a ação tem de ser instaurada contra um curador
especialmente nomeado para se opor à pretensão do investigante. O artigo
1819º/2 consagra uma situação de litisconsórcio voluntário passivo.
▪ O artigo 1820º permite a coligação de vários investigantes em relação à mesma
pretensa mãe;
▪ Na ação de investigação, o autor deve provar que o filho nasceu da pretensa mãe
– Artigo 1816º/1. Contudo, o autor beneficia de duas presunções de maternidade
– Constantes no artigo 1816º/2 – Ambas as presunções estabelecidas são ilidíveis
(refutáveis) mediante contraprova – Artigo 1816º/3.
▪ O artigo 1817º regula os prazos para a proposição da ação de investigação de
maternidade. A regra é enunciada no numero 1:
• 1817º/1 – A ação só pode ser proposta durante a menoridade do
investigante ou nos 10 anos posteriores à sua maioridade ou
emancipação;
• 1817º/2 – Alarga o prazo geral: Se a maternidade não puder ser
estabelecida em consequência da existência de um registo incompatível,
a ação de investigação de maternidade pode ser movida no 3 anos
seguintes à retificação, declaração de nulidade ou cancelamento do
registo inibitório;
• 1817º/3 – Alarga também o prazo legal: A ação pode ainda ser proposta
nos 3 anos posteriores se ocorrer algum dos factos previstos nas várias
alíneas.
▪ É entender de JDP que a propositura da ação de investigação de maternidade fora
dos prazos estabelecidos no artigo 1817º impede a obtenção pelo autor de
benefícios sucessórios com base na filiação pretendida (mas não o próprio
estabelecimento da maternidade).
▪ Resulta do artigo 1821º que o filho menor ou maior acompanhado tem direito a
alimentos provisórios desde a proposição da ação de investigação de
maternidade, contanto que o tribunal considere provável o reconhecimento da
maternidade. No caso da ação ser improcedente, não serão restituídas as
importâncias recebidas pelo filho a titulo de alimentos provisórios – Artigo
2007º/2

2
A pluralidade de partes principais num processo judicial pode traduzir-se num litisconsórcio ou numa
coligação. Em termos gerais, existe litisconsórcio quando (i) havendo um único pedido, este é formulado
por vários autores ou contra vários réus ou (ii) havendo vários pedidos, estes são formulados por todos os
autores ou contra todos os réus. O litisconsórcio diz-se necessário quando seja imposto por lei ou por
vontade das partes, importando considerar o disposto no artigo 33.º do Código de Processo Civil (CPC),
que o regula, e que determina no seu n.º 1 que, diferentemente do que sucede no litisconsórcio voluntário,
se “a lei ou o negócio exigir a intervenção dos vários interessados na relação controvertida, a falta de
qualquer deles é motivo de ilegitimidade”.

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✓ Especial/ Complexa (ou mista) – Destina-se a reconhecer a maternidade de filho nascido
ou concebido na constância do matrimónio da pretensa mãe (artigo 1822º) e tem
repercussões no domínio do estabelecimento da paternidade;
▪ O artigo 1822º contém regras especificas de legitimidade para a ação especial de
investigação de maternidade.
▪ Em caso de falecimento do autor ou dos réus na ação especial de investigação de
maternidade, aplica-se, com as necessárias adaptações o disposto nos artigos
1818º e 1819º - Artigo 1825º
▪ Na ação especial de investigação de maternidade, pode ser impugnada a
presunção de paternidade do marido da mãe (1823º/1). Se existir perfilhação por
pessoa diferente do marido da mãe, a perfilhação só prevalecerá se for afastada a
presunção ´pater is est ` (de paternidade)- Artigo 1823º/2
▪ A ação de declaração de maternidade referida no artigo 1824º, destina-se a suprir
a impossibilidade de a mãe declarar maternidade por se se tratar de filho nascido
ou concebido na constância do matrimonio e existir perfilhação por pessoa
diferente do marido. Deve ser intentada pela mãe tanto contra filho como contra
o marido e, se existir perfilhação, também contra o perfilhante. Em caso de
falecimento do autor da ação ou dos réus na ação, aplica-se o disposto nos artigos
1818º e 1819º - Artigo 1825º
▪ A lei não limita a propositura da ação de declaração de maternidade;

➢ Averiguação oficiosa da maternidade – A averiguação oficiosa da maternidade não é


um modo de estabelecimento de maternidade, mas sim um meio/atividade imposta por
lei com o objetivo de levar a tal estabelecimento por um dos dois tais modos possíveis
(declaração de maternidade ou reconhecimento judicial).
Sempre que a maternidade não esteja mencionada no registo de nascimento, o funcionário deve
remeter ao tribunal a certidão integral do registo acompanhada de copia do auto de declarações,
havendo-as (artigos 115º/1 e 116º CRC). Contudo, a remessa não terá lugar se, existindo
perfilhação, o conservador certificar que o pai e a mãe são parentes ou afins em linha reta ou
parentes no 2º grau da linha colateral – Artigo 115º/2 CRC.
Na sequencia da remessa, será aberto um processo de averiguação oficiosa da maternidade
(1808º/1) no tribunal competente. A instrução do processo, que tem caráter secreto (1812º), cabe
ao MP (artigo 60º/1 do RGPTC).
O MP deve proceder às diligencias necessárias para identificar a pretensa mãe e, havendo
indicação da respetiva identidade deve ouvi-la em declarações que serão reduzidas a escrito –
Artigo 60º RGPTC. Se a pretensa mãe confirmar a maternidade (artigo 1808º/3 CC e 117º CRC),
será lavrado termo e remetida certidão para averbamento ao assento de nascimento do filho. O
processo termina. A maternidade estabeleceu-se por declaração.
Se a pretensa mãe não puder ser ouvida ou se não confirmar a maternidade, acaba a instrução, o
MP decidirá sobre a viabilidade ou não da ação de investigação de maternidade. Existindo provas
seguras que abonem a viabilidade da ação de investigação contra certa mulher, o MP propõe a
ação de investigação. De outro modo será proferida a decisão de inviabilidade, que é notificada
aos interessados – Artigo 62º/3 RGPTC.
Também não será proposta a ação de investigação se durante a instrução se vier a apurar que,
existindo perfilhação, o pai e a pretensa mãe são parentes ou afins em linha reta ou parentes no 2º
grau da linha colateral ( 1809º, alínea a); ou se tiverem decorrido 2 anos sobre a data do
nascimento (1809º, alínea b).

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A decisão de inviabilidade proferida pelo magistrado do MP é suscetível de reapreciação
hierárquica, no prazo de 10 dias – Artigo 63º do RGPTC.
A ação que o MP intenta, na sequencia de decisão de viabilidade, é uma ação oficiosa de
investigação de maternidade, que pode ser comum/simples e especial/complexa (ou mista). A
ação comum: Apenas no plano de estabelecimento da maternidade. Ação especial: Destina-se a
reconhecer a maternidade do filho nascido ou concebido na constância do matrimónio da pretensa
mãe (artigo 1810º) e tem repercussões no domínio do estabelecimento da paternidade.
Nos termos do artigo 1810º, a ação oficiosa especial de investigação de maternidade está sujeita
às regra da ação (não oficiosa) especial de investigação de maternidade, sem prejuízo no disposto
no artigo 1809º, alínea b). Este 1810º ressalva a aplicação do 1809º/ alínea b) e não do 1809º/a
pelo que é admissível (pois afasta-se a aplicação da alínea a) a ação oficiosa especial se, houver
perfilhação, a pretensa mãe e o perfilhante forem parentes ou afins em linha reta ou parentes no
2º grau da linha colateral.
Sendo procedente a ação oficiosa de investigação de maternidade comum ou especial, a
maternidade estabeleceu-se por reconhecimento judicial. O tribunal deverá então comunicar a
qualquer conservatória a decisão, para que seja feito o averbamento da filiação legalmente
estabelecida – Artigo 78º CRC. Em sentido inverso, se a ação oficiosa for improcedente, nada
obsta que seja intentada nova ação de investigação de maternidade, ainda que fundada nos
mesmos factos – Artigo 1813º CC.

18. ESTABELECIMENTO DA PATERNIDADE


Esta é a divisão do CC:
➢ Secção III – Estabelecimento da paternidade
▪ Subsecção I – Presunção da paternidade
▪ Subsecção II – Reconhecimento da Paternidade
▪ Divisão I – Disposições gerais
▪ Divisão II – Perfilhação
▪ Divisão III – Averiguação oficiosa
▪ Divisão IV – Reconhecimento judicial

Dentro do casamento Presunção

Estabelecimento da
Paternidade
Perfilhação

Reconhecimento de
Fora do casamento
paternidade
Reconhecimento
judicial/ Decisão judicial
em ação de investigação

18.2 Distinção entre filiação dentro e fora do casamento


O sistema de estabelecimento da paternidade assenta na distinção entre filhos nascidos dentro e
fora do casamento. Como tal, pergunta-se se essa distinção não é discriminatória, violando assim
o artigo 36º/4 da CRP. O artigo 1826º/1 é um modo mais fácil de estabelecer a paternidade, mas
que se aplica apenas a filhos de mães casadas. O artigo 1871º (inserido na divisão do
reconhecimento judicial) consagra presunções quanto à paternidade de filhos de mães não
casadas, mas essas presunções não são modos de estabelecer a paternidade, sendo apenas
relevantes a nível probatório no âmbito de uma ação de investigação da paternidade, ou seja, no
máximo ajudam o autor a obter uma sentença de reconhecimento da paternidade, sentença essa
que estabelece o vinculo de filiação.

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Alguns autores defendem que esta diferenciação de filhos dentro e fora do casamento não é
aceitável. É uma regra que tem implícita a ideia de que existe uma ligação mais forte do filho com
o marido da mãe do que o homem que vivem com a mãe em união de facto. Ou seja, esta ideia
não ´corresponde ao espirito do tempo, nem obtém adesão de uma maioria politica`.
Apesar de os testes de ADN, serem atualmente muito mais fiáveis, não é desejável, na perspetiva
do interesse da criança, que se introduz um procedimento adicional quanto à filiação de filhos de
mães casadas, fazendo depender o estado de estabelecimento da paternidade de uma vontade de
perfilhar ou do sucesso de uma ação de investigação. A alternativa ao regime atual poderá ser:
estabelecimento da paternidade por presunção confinado ao marido da mãe, ou o alargamento da
presunção constitutiva do vinculo de filiação ao homem que viva em união de facto com a mãe.
Na visão de JDP esta diferenciação não contraria a constituição. Tal como defende Jorge Miranda
e Rui de Medeiros na anotação ao artigo 36º/4 da CRP, a proibição de diferenciação não impede
absolutamente ´a admissibilidade de especificidades materialmente fundadas em relação ao
regime aplicável aos filhos nascidos fora do casamento`, isto é, não impede regras sobre
reconhecimento da paternidade.
Certo é que o fundamento da presunção é a elevada probabilidade de correspondência com a
realidade, e que nesta medida a sua aplicação por analogia à união de facto seria aceitável.
Contudo, a presunção pressupõe o registo do vinculo que une a mãe ao pretenso pai (artigo 1835º
CC) e a certeza sobre o momento da constituição e extinção desse vinculo (artigo 1826º/2). Em
sentido inverso, a união de facto na está sujeita a registo e a informalidade que preside a essa
relação não dá garantias de segurança quanto ao inicio e ao fim da ligação.
18.3 Momento da conceção
O conhecimento do momento da conceção do filho é especialmente relevante para o
estabelecimento da paternidade:
✓ Presume-se que o filho concebido nas constância do matrimónio tem como pai o marido
da mãe – Artigo 1826º/1;
✓ A perfilhação do nascituro só é válida quando posterior à conceção – Artigo 1855º;
✓ Várias presunções de paternidade, têm como referência temporal o período legal de
conceção – Artigo 1871º/1, alínea c), d) e e);
✓ O momento da conceção delimita o âmbito de aplicação das situações de cessação da
presunção de paternidade – Artigos 1828º, 1829º e 1831º/1; Delimita também a ação
oficiosa de investigação da paternidade com base em processo crime – Artigo 1867º
✓ O artigo 1798º contém regras quanto ao momento legal da conceção do filho: Primeiros
120 dias dos 300 anteriores ao nascimento. Assim, o filho beneficia de duas presunções:
▪ Presunção de que a conceção de verificou em qualquer um dos 120 dias dos 300ª
anteriores ao nascimento;
▪ Presunção de que a gestação não foi superior a 300 dias nem inferior a 180 dias;
 As presunções do artigo 1798º são ilidíveis nos termos do artigo 1800º,
que admite ação judicial destinada a fixar a data provável da conceção
dentro do período referido no artigo 1798º ou a provar que o período de
gestação foi inferior a 180 dias ou superior a 300. Esta ação pode ser
proposta por qualquer interessado ou pelo MP; se for julgada procedente
a sentença deve fixar a data provável da conceção.
▪ O prazo de conceção do 1798º é suscetível de ser reduzido se dentro dos 300 dias
anteriores ao nascimento do filho tiver sido interrompida ou completada outra
gravidez. Nesta hipótese de gravidez anterior, não são considerados para a
determinação do momento da conceção os dias que tiverem decorrido até à

29
interrupção da gravidez ou ao parto – Artigo 1799º/1. A prova de interrupção de
outra gravidez, não havendo registo, só pode ser feita em ação especialmente
intentada para esse fim, por qualquer interessado ou pelo MP .

➢ Presunção de paternidade: Estabelece o artigo 1826º/1 que o filho nascido ou


concebido na constância do matrimonio da mãe tem como pai o marido da mãe. A regra
´pater is est`, isto é, a presunção, abrange os casos de conceção e nascimento do filho
durante o casamento, antes do casamento (desde que tenha nascido durante o
matrimonio), e de conceção do filho durante o casamento, mesmo que tenha nascido em
momento posterior. Por força do artigo 1827º, a presunção de paternidade também
abrange os casamentos anulados ou declarados nulos, desde que tenham sido registados.
Como a presunção é delimitada pela duração do casamento, o artigo 1826º/2 determina que o
momento da dissolução do casamento por divórcio ou da sua anulação é o do trânsito em julgado
da respetiva sentença. O casamento católico nulo ou dissolvido por dispenso só se considera
extinto a partir do registo da dissolução pelas autoridades eclesiásticas. Dentro desta lógica, a
dissolução do casamento por divórcio decretado pelo conservador ocorrerá no momento do
respetivo despacho (pois transita em julgado no próprio dia em que é proferido) Conjugando o
artigo 1827º com o 1826º/2 verifica-se que, nos casamento civis anulados, a presunção vigora até
transito em julgado da sentença de anulação, enquanto que nos casamento católicos, a presunção
dura até ao registo civil da sentença da declaração de nulidade.
A delimitação da presunção não tem em conta os avanços na área da PMA | Exemplos: A
existência de processos de reprodução que permitem o nascimento de um filho muito depois da
sua conceção ou de processos que permitem a própria fecundação posterior à morte daquele que
contribuiu com os elementos genéticos. A criopreservação, ou seja, a preservação a baixas
temperaturas, de gametas e embriões, abre o caminha à eventualidade de o nascimento se dar
muito depois da morte dos progenitores.
A paternidade presumida tem de constar obrigatoriamente no registo do nascimento, não sendo
admitidas menções que a contrariem, excetuando o disposto nos artigos 1828º e 1832º - Artigo
1835º/1. No caso de o registo de casamento dos pais apenas ser efetuado depois do registo de
nascimento, e deste não constar a paternidade do marido da mãe, a paternidade será mencionada
oficiosamente – Artigo 1835º/2
A regra pater is est não impõe deveres de coabitação e fidelidade aos conjugues. Para tal basta
ver que se admite a conceção anterior ao casamento. Esta regra tem apenas como base a
probabilidade de correspondência com a realidade. Se a conceção do filho for anterior ao
casamento em não mais de 180 dias, a vontade de casar torna verosímil que o pai tenha sido o
marido da mãe. Esta regra de presunção, é uma presunção legal, e é ilidível por impugnação
judicial – Artigo 1838º
Em certos casos, que não exigem impugnação judicial, a lei afasta a vigência da presunção de
paternidade, ainda que o filho tenha nascido ou tenha sido concebido na constância do matrimonio
da mãe. Estes casos são designados como cessação da presunção de paternidade, e figuram nos
artigos 1828º, 1829º e 1832º:
✓ Artigo 1828º - A presunção cessa relativamente ao filho concebido antes do casamento,
isto é, dentro dos 180 dias posteriores à celebração do casamento, se a mãe ou o marido
declararem no ato de registo do nascimento que o marido não é o pai;
✓ Artigo 1829º/1 – Relativo a filhos concebidos depois de terminada a coabitação.
Estabelece que a presunção de paternidade cessa se o nascimento do filho ocorrer
passados 300 dias depois de finda a coabitação, nos termo do 1829º/2. Este numero 2

30
enumera as situações em que se considera finda a coabitação dos conjugues.3 | A
presunção que cessa por força deste artigo, pode:
▪ Reiniciar-se: A presunção recupera (por força de um direito) os seus efeitos
(para o futuro). O reinicio é estabelecido no artigo 1830º.
▪ Renascer: A presunção é restabelecida através de uma decisão judicial. O
renascimento é estabelecido no artigo 1831º
✓ Artigo 1832º: Determina que a presunção de paternidade cessa se a mulher casada fizer
a declaração de nascimento com a indicação de que o filho não é do marido. Neste caso
admite-se a perfilhação (1832º/3). Esta mesma presunção que cessou pode renascer nos
termos do artigo 1831º/1 – Artigo 1832º/6.
Havendo bigamia ou novo casamento da mãe dentro de 300 dias após a dissolução do primeiro
casamento, surge um conflito de presunções de paternidade: Resolve-se pelo artigo 1834º/1:
Prevalece a presunção de que o pai é o segundo marido. Se for impugnada com sucesso a
paternidade do segundo marido, o artigo 1834º/2 prevê que renasce a presunção relativa ao
anterior marido da mãe.
➢ Perfilhação: Ato pelo qual uma pessoa (do sexo masculino) declara que um ser vivo da
espécie humana é seu filho. Por ser um reconhecimento voluntário da paternidade, a
perfilhação caracteriza-se por ser pessoal, livre, solene e irrevogável. A perfilhação é o
modo mais comum de estabelecer a paternidade dos filhos fora do matrimonio.
▪ Ato pessoal pois tem de ser feita pelo próprio pai ou por intermédio de um
procurador com poderes especiais (artigo 1849º) mas também no sentido de não
ser um ato patrimonial.
▪ Ato livre (que inclusive, é anulável a perfilhação por ação moral – 1860º/1) mas
não é um ato facultativo: o pai biológico tem o dever jurídico de perfilhar, sendo
que se não o fizer, poderá ser obrigado a indemnizar o filho.
▪ Ato solene Apenas pode revestir uma da formas indicadas no artigo 1853º. A
perfilhação que contrarie a paternidade que conste do registo de nascimento será
válida desde que seja feita por testamento, escritura pública ou termo lavrado em
juízo. Contudo, a sua eficácia depende do cancelamento do registo daquela
paternidade – Artigo 1848º/2;
▪ Irrevogável – Artigo 1858º - É irrevogável independentemente da forma que
revestiu. Mesmo a revogação do testamento não afeta a subsistência da
perfilhação quanto esta tenha sido feita através de testamento.
A perfilhação deve obedecer a alguns critérios, caso contrário implica a impugnabilidade,
invalidade ou ineficácia:
✓ A perfilhação tem de corresponder à verdade – Artigo 1859º;
✓ Só têm capacidade para perfilhar os indivíduos com mais de 16 anos se não forem maiores
acompanhados com restrições ao exercício de direitos pessoas nem forem afetados por
perturbação mental notória no momento da perfilhação – Artigo 1850º/1 (não interessa
que a perturbação seja ou não cognoscível mas sim ´certa, inequívoca, não duvidosa (à
semelhança da demência no artigo 1601º, alínea b)
✓ Por ser de carater pessoal, os menores com 16 e 17 anos não necessitam de autorização
dos pais ou tutores para perfilhar – Artigo 1850º/2;

3
O 1829º/2, alínea a) refere-se à primeira conferencia. Este preceito sofreu alterações com o DL nº
272/2001, de 13 de outubro que introduziu alterações na separação e divorcio por mutuo consentimento.
A primeira conferencia deve agora ser entendida como agora a única.

31
o Contudo, os menores de 16 e 17 anos, não emancipados, não podem perfilhar por
testamento – Artigos 1853º e 2189º, alínea a) (ou seja, terão de perfilhar por
forma diferente que conste do artigo 1853º)
Quanto ao consentimento, o perfilhante tem de declarar que quer perfilhar, e esse consentimento
tem de ser puro e simples. As condições, termos e cláusulas que limitem ou modifiquem os efeitos
atribuídos à perfilhação por lei têm-se por não escritos – Artigo 1852º. O consentimento não deve
estar viciado por coação moral ou erro sobre as circunstâncias que tenham contribuído
decisivamente para o convencimento da paternidade – Artigo 1860º/1 e 2.
Os requisitos da perfilhação quanto ao perfilhando são: Ausência de outra paternidade
estabelecida; conceção do perfilhando; existência do perfilhando; assentimento do perfilhando
quando seja maior ou emancipado ou dos descendentes do perfilhando que sejam maiores ou
emancipados
Não é possível a perfilhação em contrario da paternidade que conste do registo de nascimento
enquanto este não for retificado, declarado nulo ou cancelado – Artigo 1848º/1. Contudo, a
perfilhação que contrarie a filiação registada será válida desde que feita por testamento, escritura
pública ou termo lavrado em juízo, ficando apenas a sua eficácia dependente do cancelamento do
registo daquela paternidade – Artigo 1848º/2
É necessário que o perfilhando exista (como pessoa ou ser vivo da espécie humana) ou tenha
existido. O artigo 1854º dispõe que a perfilhação pode ser feita a todo o tempo, antes ou depois
do nascimento do filho ou depois da morte deste. O artigo 1855º acrescenta que a perfilhação
apenas é válida quando posterior à conceção e se o perfilhante indicar a mãe. O artigo 1856º limita
a eficácia da perfilhação posterior à morte do filho: Apenas produz efeitos em favor dos seus
descendentes – Artigo 1856º (o pai que perfilhar filho falecido não beneficia de sucessão)
A perfilhação de filho maior ou emancipado, ou de filho pré-falecido que tenha descendentes
maiores ou emancipados, apenas produz efeitos se aquele ou estes, ou sendo maiores
acompanhados com restrição ao exercício de direitos pessoais, o acompanhante antecipando ação
judicial, derem o seu assentimento – Artigo 1857º/1. A lei não fixa prazo para o assentimento,
podendo ele ser dado antes ou depois da perfilhação, por qualquer uma das três formas: declaração
prestada perante funcionário do registo; documento autentico ou autenticado ou termo lavrado em
juízo no processo em que haja sido feita a perfilhação. Na falta de prazo, compreende-se que o
artigo 1857º/4 confira a qualquer interessado o direito de requerer judicialmente a notificação
pessoal do perfilhando, descendentes ou representantes legais. O silencio vale como assentimento.
Não constitui requisito de perfilhação o registo da maternidade do perfilhando (1851º). Não há
também obstáculos à perfilhação de filhos incestuosos. Quanto a filhos provenientes de adultério,
há que distinguir: Filho adulterino de homem casado é livremente perfilhável por este; filho de
mãe casada só é eficazmente perfilhável depois de ilidida a presunção de paternidade e cancelado
o registo feito com base nela.
A perfilhação não pode ser invocada enquanto não for lavrado o respetivo registo – Artigo 2º do
CRC. Se a perfilhação for feita perante funcionário do registo civil regista-se através de assento
de nascimento ou assento próprio, consoante tenha sido efetuada na altura da declaração de
nascimento ou posteriormente – Artigos 130º/1 e 125º CRC. A perfilhação efetuada por
testamento, escritura pública ou termo lavrado em juízo é averbado ao assento de nascimento do
filho – Artigos 130º/1 e 129º do CRC. A perfilhação feita em unidade de saúde competente é
inscrita no assenta de nascimento.

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A lei estabelece regras especiais para o registo de perfilhação que careça de assentimento – Artigo
1857º/2 alíneas a) 3 e 4; Artigos 130º/2 e 133º CRC e para o registo de perfilhação de nascituro –
Artigo 132º CRC.
O assentimento de perfilhação deve mencionar o assentimento do perfilhado, se for maior ou
emancipado, ou dos seus descendentes, se for pré-defunto. O assentimento dado por declaração
feita perante o conservador do registo civil é reduzido a auto e averbado no assento de nascimento,
e no de perfilhação se houver. O registo da perfilhação é dado como secreto até ser dado o
assentimento necessário e, sem prejuízo do disposto no 1857º/4, só pode ser invocado para
instrução do processo preliminar de casamento ou em ação de nulidade ou anulação do casamento.
No caso de assento de perfilhação que deva considerar-se secreto, lança-se na sequencia do
assento de nascimento do perfilhado cota de referencia com menção do livro, numero e ano do
respetivo assento. Assim que seja dado o assentimento, lavra-se oficiosamente o respetivo
averbamento. No caso de o perfilhado ou descendentes serem chamados a dar assentimento e o
recusarem, o assento de perfilhação é cancelado oficiosamente.
O assento de nascimento de perfilhação de um nascituro, apenas pode ser lavrado posteriormente
à conceção e identificando a mãe, e terá alem dos requisitos gerais, que conter o nome completo,
data de nascimento, estado, naturalidade, residência habitual e filiação da mãe do perfilhado,
época de perfilhação e data provável do parto.
A perfilhação é um ato jurídico não negocial, integrado por uma declaração de consciência (
carater hibrido da perfilhação). É um simples ato jurídico: o estabelecimento da paternidade dá-
se por força de lei, independentemente de ter sido ou não querido pelo perfilhante. Esta natureza
não negocial é confirmada pelo artigo 1852º. Não é, ao contrário do que defendem alguns autores,
uma declaração de ciência.
➢ Reconhecimento judicial da paternidade – Realiza-se através de ação autónoma
(especialmente intentada para o efeito) de investigação da paternidade. O tribunal que
reconhecer a paternidade deve comunicar essa decisão a qualquer conservatória do registo
civil, para que seja feito o averbamento da filiação estabelecida – Artigo 78º CRC.
Esta ação de investigação não pode ser proposta enquanto a maternidade não estiver estabelecida
a menos que exista um pedido conjunto para o reconhecimento da paternidade e da maternidade:
Artigo 1869º. À semelhança da perfilhação, não se admite o reconhecimento judicial de
paternidade em contrário ao que conste do registo de nascimento enquanto este não for retificado,
declarado nulo ou anulado – Artigo 1848º/1.
À partida, a ação de investigação da paternidade deve ser intentada pelo filho contra o pretenso
pai – Artigos 1869º, 1873º e 1819º. É conferida legitimidade à mãe menor para intentar a ação
em representação do filho sem necessidade de autorização dos pais, sendo contudo representada
em juízo por curador especial nomeado pelo tribunal – Artigo 1870º. O artigo 1872º permite a
coligação de investigantes filhos da mesma mãe, em relação ao mesmo pretenso pai. Ao abrigo
do artigo 39º CPC admite-se a figura do litisconsórcio passivo alternativo na ação de investigação
da paternidade: o filho que tiver duvidas fundamentadas sobre a identidade do verdadeiro
progenitor pode formular subsidiariamente o mesmo pedido contra réu diverso do que é
demandado. | Exemplo: Se o filho tiver conhecimento de que a mãe teve relações sexuais com
mais de um homem durante o período legal de conceção, ele não está obrigado a intentar a ação
de investigação apenas contra um deles, pode mover essa ação contra vários réus numa relação
de subsidiariedade.
Nos demais aspetos da matéria de legitimidade aplica-se, com as necessária adaptações, o disposto
nos artigos 1818º e 1819º, que se referem à ação de investigação de maternidade.

33
A prova da procriação pode ser feita alternativamente:
✓ Com base em testes de ADN – Artigo 1801º;
✓ Com base em presunções legais não ilididas pelo réu – Artigo 1871º;
✓ Através da demonstração de que o pretenso pai teve relações sexuais com a mãe durante
o período legal de conceção e que dessas relações resultou o nascimento do investigante
– coabitação causal
A prova direta da procriação enfrenta sérias dificuldades pois existe por vezes uma reação adversa
à realização coerciva de exames de ADN por parte do progenitor. Como tal, as presunções legais
previstas no 1871º/1 são instrumentos valiosos para a obtenção de uma sentença de
reconhecimento da paternidade. Se o investigante fundamentar a sua pretensão em uma das
presunções, não terá de fazer prova direta do facto da procriação. É suficiente a alegação e prova
dos factos que constituem a base da presunção, presumindo-se o vinculo biológico. Se uma das
presunções for invocada, recai no investigado o ónus de a refutar, levantando sérias duvidas sobre
a paternidade que lhe é imputada – Artigo 1871º/2
A paternidade presume-se quando o filho houver sido reputado e tratado como tal pelo pretenso
pai e reputado como filho também pelo público – Artigo 1871º/1, alínea ) – É a posse de estado
de filho – Exige a verificação de todos estes requisitos:
✓ Reputação como filho pelo pretenso pai – nomen.
▪ É a convicção intima por parte do investigado, de que é pai do investigante;
✓ Tratamento como filho pelo pretenso pai – tractatus;
▪ Traduz-se na pratica, por parte do pretenso pai, para com o investigante, dos atos
de assistência que os pais normalmente costumam dispensar aos filhos, incluindo
os cuidados, carinho, amparo, proteção e solicitude próprios de um pai.
✓ Reputação como filho do pretenso pai pelo público – fama;
▪ Convicção por parte das pessoas que conhecem o investigante e o investigado,
de que este é pai daquele.
O artigo 1871º/1 alínea c) define que a paternidade presume-se quando, durante o período legal
da conceção tenha existido comunhão duradoura de vida em condições análogas às dos conjugues
ou concubinato duradouro entre a mãe e o pretenso pai, durante o período legal da conceção. Uma
comunhão de vida em condições análogas às de conjugues significa união de facto que se
distingue do concubinato duradouro pelo seguinte: Na união de facto: Há comunhão sexual e
comunhão de habitação; No concubinato duradouro: Há apenas um relacionamento sexual
estável. Enquanto fundamento da presunção, a união de facto heterossexual tem de ser duradoura
mas não precisa de existir há mais de 2 anos.
O 1871º/1, alínea e) define que se presume também a paternidade quando se prove que o pretenso
pai teve relações sexuais com a mãe durante o período legal de conceção. Esta presunção
introduzida em 1998 aumentou as possibilidades de sucesso na investigação. Com esta alteração
é ao investigado que cabe evitar a procedência da ação, ilidindo a nova presunção mediante a
prova de que a mãe teve relações sexuais com vários homens durante o período legal de conceção.
Se este método levantar sérias duvidas sobre a paternidade do investigado, a ação podera proceder
se o investigante conseguir afastar a paternidade daquele ou daqueles que juntamente com o
pretenso pai tiveram relações sexuais com a mãe do investigante (por exemplo através de exames
de sangue).
Todas as presunções do 1871º/1 são de natureza diversa da presunção legal do 1826º/1: As
primeiras invertem o ónus da prova na ação de investigação da paternidade (é a sentença que
estabelece a paternidade) e são ilidíveis mediante contraprova (1871º/2). A presunção do 1826º
estabelece a paternidade e só é ilidível mediante ação judicial de impugnação.

34
O artigo 1873º estabelece que é aplicável à ação de investigação da paternidade, com as
necessárias adaptações, o disposto nos artigos 1817º que prevê prazos para a proposição da ação
de investigação de maternidade. Assim, em regra, a ação de investigação da paternidade só
poderia ser proposta durante a menoridade do investigante ou nos 10 anos posteriores à sua
maioridade ou emancipação – Artigo 1817º/1.
Não é certa a constitucionalidade de normas que impõem prazos de caducidade para ações de
reconhecimento judicial da maternidade ou paternidade
 TC 413/89, de 31 de maio – Pronunciou-se no sentido da não inconstitucionalidade.
Alguns acórdãos que seguiram esta orientação, sustentavam que o estabelecimento de
prazos para a propositura da ação de investigação não restringe o conteúdo do exercício
do direito fundamental ao conhecimento e reconhecimento da paternidade (que resulta
dos direitos fundamentais à integridade moral e à identidade pessoal – Artigos 25º/1,
26º/1 CRP) sendo uma simples condição de exercício ou que sendo uma restrição ou mero
condicionamento, não se traduz em limite substancial contrário ao principio
constitucional da proporcionalidade. Ao lado do direito do filho ao reconhecimento da
paternidade, haveria outros direitos que também mereciam tutela jurídica tais como o
direito de o progenitor não ver indefinida a situação quanto à paternidade, mas também é
do interesse do próprio que com o passar do tempo vê mais difícil a produção de prova
 O acórdão 23º/2006, de 10 de janeiro do TC ( na senda dos anteriores acórdãos,
principalmente o 486/2004) – Declarou a inconstitucionalidade com força obrigatória
geral, da norma constante do 1817º/1, na redação da lei nº21/98, de 12 de maio que
estabelecia para a caducidade do direito de investigar a paternidade, um prazo de 2 anos
a partir da maioridade do investigante, por violação das disposições conjugadas dos
artigos 26º/2, 36º/1 e 18º/2 CRP.
o Outros acórdãos seguiram esta decisão. A fundamentação no acórdão 486/2004
resulta que a declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral,
assentou no entendimento de que o regime do 1817º/1 ao excluir totalmente a
possibilidade de reconhecimento judicial da paternidade, a partir dos 2 primeiros
anos posteriores à maioridade do investigante, acarretava uma afetação do
conteúdo essencial dos direitos fundamentais à identidade pessoal e a constituir
família, que incluem o direito ao conhecimento da paternidade ou maternidade
porque o prazo de dois anos ´ se esgota normalmente num momento em que, por
natureza, o investigante não é, ainda, naturalmente, uma pessoa experiente e
inteiramente madura` e esse prazo poderia começar a correr e findar sem
oportunidades ou justificações concretas para interposição de ação de
investigação.
 É de frisar que aquilo que é declarado inconstitucional não é a imposição
de prazos, mas sim o prazo de 2 anos.
 Para Jorge Duarte Pinheiro não é razoável a imposição de prazos para a investigação da
paternidade ou maternidade. Os testes de ADN permitem determinar com grande
segurança a maternidade ou paternidade de uma pessoa, muitos anos apos a morte do
hipotético progenitor, o que afasta o risco de incerteza das provas. Quanto aos argumentos
da tutela da segurança jurídica dos herdeiros e do combate da caça as heranças, entende
JDP que estão em causa interesses patrimoniais que não são importantes do que o
interesse do filho no estabelecimento da respetiva filiação.
o Prazos de caducidade são uma restrição desproporcional do direito à identidade
pessoal, mais precisamente do direito à identidade pessoal relativa ou à
historicidade pessoal – Artigo 26º/1 CRP;
o Ademais violam o Direito a constituir família

35
De modo a combater esta ideia da inconstitucionalidade desta norma, e o argumento a favor de
que o fim desta norma é evitar o uso da aço de investigação apenas para alcançar benefícios
sucessórios, a provedor de justiça, em 1999 propôs que se consagra-se a imprescritibilidade para
a propositura de ações de investigação desde que os efeitos pretendidos fossem de natureza
pessoal e não patrimonial. Par JDP este aditamento não seria suficiente. Defende que o melhor
caminho é o da interpretação. Assim, os prazos do 1817º devem ser observados se o investigante
quiser obter benefícios sucessórios do vinculo de filiação. Ou seja, há que restringir a aplicação
do prazo a situações em que a proposição da ação de investigação com efeitos sucessórios. Como
tal, no numero 1 onde se lê ´a ação de investigação de maternidade só pode ser proposta durante
a menoridade do investigante ou nos dez anos posteriores à sua maioridade ou investigação`
deve subentender-se ´para efeitos sucessórios` Desta forma, a propositura da ação fora dos prazos
não obsta ao estabelecimento da filiação, sendo sempre assegurado o exercício do direito à
identidade pessoal e o direito a constituir família. Assim, acabava também por consagrar uma ´
caça à herança paterna` e traduz uma figura do abuso de direito. Entende também que esta
proposta não viola o principio da indivisibilidade ou unidade do estado
Assim, o artigo 1817º, no seu todo aplicável, diretamente à maternidade, e por força do artigo
1873º, à paternidade, é suscetível de uma interpretação conforme à constituição: A proposição de
uma ação de investigação fora dos prazos previstos naquele não impede a obtenção de uma
sentença que estabeleça a filiação, obstando somente à relevância do reconhecimento da posição
de filho na sucessão legal.
Em suma, estes são os principais argumentos apresentados pelos que discutem acerca da
inconstitucionalidade desta norma:
Serão os prazos de caducidade neste campo constitucionais? (principalmente no artigo
1817º)
SIM, são NÃO, são inconstitucionais
- Segurança jurídica; - Esta norma restringe direitos fundamentais como o
- A partir de determinada altura, a direito à identidade pessoal e à constituição de família;
prova é mais difícil e menos - Os interesses patrimoniais (como as heranças) não
rigorosa/fiável; são mais importantes que os interesses do filho;
- O progenitor tem direito a não ficar - São uma restrição desproporcional do Direito à
numa situação de indefinição; identidade pessoal;
- O fim de uma norma deste teor é o - Obsta ao exercício de direito familiares, emergentes
de evitar o uso da ação de da ligação familiar, tal como o direito a alimentos de
investigação apenas para alcançar fonte legal tao cuidadosamente protegidos pelo
benefícios sucessórios; legislador;
O filho menor ou maior acompanhado, tem direito a alimentos provisórios desde a proposição da
ação, contanto que o tribunal considere provável o reconhecimento da paternidade – Artigo 821º
aplica e adaptado do artigo 1873º.
De acordo com o artigo 1884º/1 o pai não unido pelo matrimonio à mãe do filho é obrigado, desde
a data do estabelecimento de paternidade, a prestar-lhe alimentos atinentes ao período de gravidez
e ao primeiro ano de vida do filho, sem prejuízo das indemnizações a que por lei ela tenha direito.
A mãe pode pedir os alimentos na ação de investigação de paternidade e tem direito a alimentos
provisórios se a ação foi proposta antes do termo do período de 1 ano de vida do filho, desde que
o tribunal considere provável o reconhecimento da paternidade – 1884º/2.
Se a ação de investigação for improcedente, não serão restituídos as importâncias recebidas, pelos
filhos ou pela mãe, a titulo de alimentos provisórios – Artigo 2007º/2.

36
➢ Averiguação oficiosa da paternidade - Não é um modo de estabelecer a paternidade
mas antes uma atividade imposta por lei com o objetivo de conduzir a tal estabelecimento
por um dos modos possíveis (perfilhação ou reconhecimento judicial).
Sempre seja lavrado o registo de nascimento de criança apenas com a maternidade estabelecida
ou sempre que seja eliminada a menção de paternidade dele constante, deve o conservador remeter
ao tribunal certidão integral do registo, pata que se possa averiguar oficiosamente a identidade do
pai – Artigo 1864º CC e 121º/1 e 2 CRC. Contudo, a remessa não tem lugar se, conhecido o nome
do pretenso pai, o conservador se certificar que este e a mãe são parentes ou afins em linha reta
ou parentes no 2º grau da linha colateral – Artigo 121º/3 CRC.
Recebida a certidão inicia-se a instrução do processo de averiguação oficiosa da paternidade que
tem carater secreto (1812º e 1868º) e cabe ao MP
O MP deve fazer as diligencias que lhe cabem para identificar o pretenso pai (ouvindo, por
exemplo, a mãe acerca da paternidade que atribui ao filho) e havendo indicação da identidade,
deve ouvi-lo em declarações, que serão reduzidas a escrito – Artigo 60º/1 RGPTC e 1865º/1 e 2.

• Se o pretenso progenitor confirmar a paternidade, será lavrado termo de perfilhação e o


processo termina
• Se não confirmar a paternidade ou não puder ser ouvido: MP procederá às diligencias
necessárias para determinar a viabilidade da ação de investigação da paternidade.
Existindo provas seguras da paternidade, o MP propõe a ação de investigação. De outro
modo, será proferida decisão de inviabilidade, que é notificada aos interessados
• Também não será proposta ação de investigação se durante a instrução se vier a apurar
que a mãe e o pretenso pai são parentes ou afins em linha reta ou parentes no 2º grau da
linha colateral – Artigo 1866º, alínea a); ou se tiverem decorrido dois anos sobre a data
do nascimento – 1866º, alínea b).
Concluindo pela viabilidade, caberá ao Ministério público intentar uma ação oficiosa comum de
investigação da paternidade. Contudo, o nosso regime jurídico conhece outra categoria de ação
oficiosa de investigação de paternidade – investigação com base em processo crime.
Ainda que seja regulada no artigo 1867º a investigação com base em processo crime não é
precedida pelo processo de averiguação oficiosa, nem está dependente de um despacho final de
viabilidade. A esta ação oficiosa com base em processo crime não se aplicam os artigos 1864º e
1865º nem as normas do CRC e do RGPTC.
A investigação com base em processo crime (por exemplo de uma violação) é intentada quando
em processo crime se prove a cópula em termos de constituir fundamento para a investigação de
paternidade e se mostre que a ofendida teve um filho em condições de o período legal da conceção
abranger a época do crime – Artigo 1867ºCC. A ação pode ser intentada mesmo que tenham
decorridos 2 anos sobre a data do nascimento
Sendo a ação oficiosa, comum ou com base em processo crime, procedente, a paternidade
estabeleceu-se por reconhecimento judicial. O tribunal comunicará a decisão a qualquer
conservatória do registo civil, para que seja feito o averbamento da filiação legalmente
estabelecida – Artigo 78º CRC
Sendo a ação improcedente, nada impede que seja intentada nova ação de investigação da
paternidade, ainda que fundada nos mesmo factos – Artigos 1813º e 1868º
Mas fará sentido esta ação oficiosa com base em processo crime? Qual o interesse público na
constituição de um vinculo de filiação entre uma criança e aquele que a violou? Como tal, JDP
considera este artigo um algo chocante.

37
SECÇÃO III – CONSTITUIÇÃO DA ADOÇÃO
_____________________________________________________________________________
Artigo 1586º
Noção de adoção
Adoção é o vinculo que, à semelhança da filiação natural, mas independentemente dos laços de
sangue, se estabelece legalmente entre duas pessoas nos termos dos artigos 1973º e seguintes.
_____________________________________________________________________________
O professor Jorge Duarte pinheiro propõe como definição de adoção: Vinculo constituído por
sentença judicial, proferida no âmbito de um processo especialmente instaurado para o efeito,
que, independentemente dos laços de sangue, cria direitos e deveres paternofiliais entre duas
pessoas.
A regulação da adoção está espalhada por vários diplomas além do código civil:
✓ Constituição – Artigo 36º/7;
✓ RJPA – Regime jurídico do processo de adoção
✓ Lei de proteção de crianças e jovens em perigo;
✓ Convenção sobre os Direitos das crianças;
✓ Convenção europeia em matéria de adoção de crianças;
A ideia de que a filiação adotiva é uma imitação da filiação natural, acaba também por sugerir
que a filiação adotiva é secundária, subsidiária em relação à filiação biológica, pelo que tende a
assumir caráter excecional.
MODALIDADES DE ADOÇÃO

Conjunta/plural

NACIONAL/INTERNA

ADOÇÃO Singular

INTERNACIONAL

A adoção será interna ou internacional, consoante a adoção implique ou não uma mudança da
residência habitual da criança para outro Estado – Artigo 2º/ alínea a e b do RJPA;
Quanto à adoção interna: A adoção conjunta é feita por duas pessoas. A singular é feita por uma
só pessoa. Deteta-se uma preferência pela adoção singular, o que reflete a visão da adoção como
uma imitação da filiação natural.
O artigo 1977º revogado em 2015 distinguia entre adoção plena e adoção restrita, com base no
critérios dos efeitos: Adoção plena: implicava a integração total e exclusiva na família do
adotante, ou seja, o adotado adquiria a situação de filho do adotante, extinguindo-se as relações
ente o adotado e a sua família biológica. A adoção restrita: atribuição do poder paternal ao
adotante, conservando-se no resto a generalidade dos laços entre o adotado e a sua família natural.
REQUISITOS DA ADOÇÃO INTERNA
O vinculo da adoção é constituído por sentença judicial (1973º/1). A sentença que decreta adoção
pressupõe o preenchimento de determinados requisitos quanto ao adotando, adotante, à relação
entre adotante e adotado e quanto a terceiros.

38
➢ Requisitos quanto ao ADOTANDO: São quatro os requisitos quanto ao adotando:
✓ Conveniência: A adoção só ´será decretada quando apresente reais vantagens para o
adotando` - Artigo 1974º/1;
✓ Não subsistência da adoção anterior. Regulado pelo artigo 1975º/1. Este requisito
impede duas ou mais adoções em simultâneo do mesmo adotando, bem como a
adoção sucessiva do mesmo adotando por pessoas que não estejam ligadas entre si
por casamento ou união de facto protegida4, quando não tenha havido extinção da
adoção anterior.
o O 1975º/2 não introduz nenhuma exceção, apenas admite a constituição de
novo vinculo adotivo ou após a extinção do anterior (por morte dos
adotantes) ou com efeito extintivo da adoção prévia (caso o comportamento
dos primeiros adotantes preencha causas da confiança com vista a futura
adoção.
o Uma exceção parece ser a do artigo 5º da Lei nº2/2016, de 29 de Fevereiro,
que, sob a epigrafe ´disposição transitória`, admite, dentro de certos
pressupostos, a adoção de criança já adotada pelo ex-cônjuge ou ex-
companheiro do mesmo sexo.
✓ Requisito da idade máxima – Artigo 1980º/2 – Não se permite a adoção de maiores
(nem de menores emancipados) . Em regra, o adotando deve ter menos de 15 anos à
data do requerimento de adoção. MAS, pode ser adotado quem, à data do
requerimento da adoção, tenha menos de 18 anos e não seja emancipado ´quando,
desde idade não superior a 15 anos, tenha sido confiado aos adotantes ou a um deles
ou quando for filho do cônjugue do adotante`
✓ Requisito do consentimento – Decorre dos artigos 1981º/1, alínea a). Assim, para a
adoção será necessário o consentimento do adotando com mais de 12 anos. Contudo,
o tribunal pode dispensar o consentimento do adotando, se ele estiver privado do uso
das faculdades mentais ou se existir grave dificuldade em ser ouvido – Artigo
1981º/3, alínea a)

➢ Requisitos quanto ao ADOTANTE: A lei prevê quatro requisitos gerais quanto ao


adotante, prevendo depois também requisitos especiais em caso de adoção conjunta.
Assim, quanto a requisitos gerais:
▪ Vontade de adotar: É indispensável essa vontade do adotante – Artigo 1981º/1,
alínea e). A falta de consentimento do adotante é fundamento de extinção
retroativa da adoção – Artigo 1990º/1, alínea a).
▪ Motivos Legítimos: Artigo 1974º/1. Por exemplo, não se funda em motivos
legítimos a decisão de adotar para obter uma diminuição da carga fiscal suportada
pelo adotante ou para evitar o pagamento de imposto sobre futuras transmissões
a titulo gratuito de bens pertencentes ao adotante, a favor do adotando.
▪ Idade mínima: Em regra, é 25 anos, exceto no caso de adoção singular, em que
tende a ser exigível idade não inferior a 30 anos – Artigos 1979º/1 e 2. Se se tratar
de adoção singular de filho do conjugue ou companheiro volta a ser suficiente ter
mais de 25 anos.
▪ Idade Máxima: Em regra a idade máxima é de 60 anos. Só pode adotar quem
não tiver mais de 60 anos à data em que a criança lhe tenha sido confiada,
mediante confiança administrativa ou medida de promoção e proteção da
confiança com vista a futura adoção, salvo se o adotando for filho do conjugue
ou companheiro – Artigos 1979º/3 e 5

4
União de facto protegida: Aquela que dura há mais de 2 anos e não cabe em nenhuma das alíneas do artigo
2º da LUF.

39
No caso de adoção conjunta, há requisitos adicionais:
✓ Os dois candidatos à adoção devem estar ligados por uma união conjugal, ou por
uma união de facto protegida há mais de 4 anos – Artigo 1979º/1 e Artigo 7º da
LUF – Este requisito visa comprovar uma certa estabilidade do relacionamento
entre os candidatos, que é tida como benéfica para o adotando. Assim, por
exemplo, não obsta à adoção o facto de um casal ter casado há 1 ano, depois de
ter vivido em união de facto há 3 – E isso é claro com o artigo 1979º/6.
 O CC não diz em que momento devem estar reunidos os requisitos de
idade mínima e do prazo de duração do casamento ou da união de facto
dos adotantes. Mas decorre do RJPA que esses requisitos deverão estar
cumpridos no momento em que o candidato comunica a sua intenção de
adotar ao organismo de segurança social ou instituição particular
autorizada, pois a candidatura será logo indeferida, se no momento em
que é apresentada não se verificarem os pressupostos definidos por lei –
Artigo 43º/5 RJPA.
O artigo 5º da Lei nº2/2016, de 29 de fevereiro, permite, dentro de certas condições, a adoção
singulares de filho do ex-cônjuge ou ex-companheiro, quando se esteja perante casais
homossexuais que se ´tenham entretanto divorciado ou cuja união de facto tenha entretanto
cessado` e que se encontravam legalmente impedidos de adotar antes da entrada em vigor da nova
lei
➢ Requisitos quanto à RELAÇÃO entre ADOTANDO e ADOTANTE:
▪ Probabilidade do estabelecimento de um vinculo, entre o adotante e o
adotando, semelhante ao da filiação: Resulta do artigo 1974º/1 `(…) seja
razoável supor que entre o adotante e o adotando se estabelecerá um vinculo
semelhante ao da filiação` - Tendo em conta este artigo questiona-se sobre a
possibilidade de adoção de um irmão pelo outro, de um neto por avô;
▪ Necessidade de um período em que o adotando tenha estado previamente ao
cuidado do adotante: Resulta do 1974º/2. Excetuando os filhos do conjugue ou
companheiro do adotante, apenas podem ser adotadas crianças que tenham sido
confiadas ao adotante mediante confiança administrativa ou medida de promoção
e proteção de confiança com vista a futura adoção – 1980º/1.
▪ A confiança administrativa resulta de uma decisão do organismo de
segurança social que proceda à entrega da criança ao candidato a
adotante – 34º/2 RJPA. Essa confiança só pode ser atribuída, depois de
ouvida a criança maior de 12 anos, ou de idade anterior (mas tendo em
conta a maturidade e discernimento) e esta não se opuser à decisão –
36º/1 RJPA. A medida de promoção e proteção de confiança com vista a
futura adoção consiste na colocação da criança ou do jovem sob guarda
do candidato selecionado ou sob a guarda de família de acolhimento ou
de instituição com vista a futura adoção – 38º Lei de proteção.
▪ A medida é decretada pelo tribunal (38º Lei de proteção) ao abrigo do
disposto no artigo 1978º. Na verificação das situações em apreço, o
tribunal deve atender prioritariamente aos direitos e interesses da criança
– Artigo 1978º/2
▪ O artigo 1974º/2 não fixa um período para o adotando estar ao cuidado
do adotante. Esse prazo, inicia-se com a confiança administrativa ou
judicial, e corresponde ao período de pré-adoção e não deve ser superior
a 6 ou, excecionalmente, 9 meses – Artigo 50º/1 e 5 e artigo 52º/2 do
RJPA

40
▪ Diferença máxima de idades: À partida não deve ser superior a 50 anos, mas há
exceções – Artigo 1979º/3, 4 e 5
O artigo 1976º impõe um ultimo requisito quanto à relação entre o adotando e adotante, se entre
eles existir vinculo de tutela ou de administração legal de bens: o tutor ou administrador legal de
bens só pode adotar a criança depois de aprovadas as contas da tutela ou administração de bem e
saldada a sua responsabilidade
➢ Requisitos da ADOÇÃO QUANTO A TERCEIROS: Incluem os requisitos quanto aos
familiares do adotante e quanto aos parentes e ao tutor do adotando:
▪ Quanto a familiares do adotante:
▪ A adoção não deve envolver sacrifício injusto para os outros filhos do
adotante – Artigo 1974º/1.
• O juiz deverá ainda ouvir os filhos do adotante com + 12 anos –
Artigo 1984º, alínea a);
▪ É necessário que o conjugue do adotante não separado de pessoas e bens
dê o seu consentimento para a adoção – Artigo 1981º/1, alínea b);
▪ Quanto aos parentes e ao tutor do adotando:
▪ Exige-se consentimento do tutor e de certos parentes do adotando –
Artigo 1981º/1, alíneas c) e d).
• O consentimento tem de ser prestado perante juiz e pode ser dado
independentemente da instauração do processo de adoção –
Artigo 1982º/1 e 2. O consentimento é irrevogável e não está
sujeito a caducidade – 1983º/1
▪ Necessária a audição de alguns parentes do adotando cujo consentimento
para a adoção não é necessário - Artigo 1984, alínea b)
Sublinha-se a exigência do consentimento para adoção, por parte dos pais do adotando, de acordo
com o artigo 1981º/1, alínea c). O consentimento da mãe para a adoção não pode ser prestado
antes de decorridas 6 semanas após o parte – 1982º/3
Não é verdade que o sistema português faça depender a adoção do consentimento dos pais
biológicos. Há várias situações em que o consentimento não é exigido – 1981º/1 alínea c.
O PROCESSO DE ADOÇÃO INTERNA
Definido no artigo 2º, alínea h do RJPA, é um processo secreto (artigo 4º) e assume também
carater administrativo e judicial. De acordo com o artigo 40º do RJPA este processo é constituído
por três fases:
➢ Fase preparatória: Estudo de caracterização da criança com decisão de adotabilidade e
preparação, avaliação, e seleção dos candidatos a adotantes. O estudo é quanto à criança
que está em situação de adotabilidade
▪ A candidatura a adoção é apresentada junto de qualquer equipa de adoção dos
organismos de segurança social ou instituição particular autorizada – Artigo
43º/1 do RJPA. Não havendo motivo para indeferimento liminar, dá se inicio a
todo um conjunto de procedimentos de preparação, avaliação e seleção que deve
estar concluído no prazo máximo de 6 meses – Artigo 44º/1 RPJA
▪ Estes procedimentos tem como objetivo a emissão de um parecer que examine a
personalidade, saúde, idoneidade para criar e educar a criança, a situação familiar
e económica do candidato a adotante e as razoes determinantes do pedido de
adoção – Artigo 44º/2 e 3 RJPA.
▪ Concluídos os procedimentos, comunica-se a decisão ao candidato.
▪ Rejeição – Admite-se recurso para o tribunal – Artigo 46º RJPA

41
▪Aceitação – O candidato é obrigatoriamente inscrito na lista nacional,
nos termo do artigo 10º RJPA, podendo prosseguir o processo.
➢ Fase de Ajustamento:
▪ Aferição da correspondência entre as necessidades da criança e a capacidade dos
candidatos: Nos termos do artigo 48º do RJPA – Com base no resultado formula-
se uma proposta de adoção, que sendo confirmada pelo conselho nacional para a
Adoção, é apresentada ao candidato
▪ Organização do período de transição – Artigo 49
▪ Acompanhamento e avaliação do período de pré-adoção – Neste período de pré-
adoção, o candidato a adotante fica com a criança a seu cargo com vista a adoção.
Esta medida de promoção e proteção dura até ser decretada a adoção, não
estando, normalmente, sujeita a revisão e impede os pais biológicos de visitarem
a criança ( Artigo 62º-A da Lei de proteção.) Esta medida implica:
▪ Inibição dos pais exercerem responsabilidades parentais – Artigo 1978º
- A;
▪ Suspensão de eventual processo de averiguação oficiosa da maternidade
e paternidade – Artigo 38º/2 RPJA
▪ No período de pré adoção as instituições estão em permanente acompanhamento
da integração da criança e avaliando a viabilidade da relação parental
Por fim, em 30 dias, conclui-se com parecer relativo a concretização do projeto adotivo – Artigo
50º/4 RJPA. A entidade competente notifica o candidato a adotante do teor do relatório. Após a
notificação o candidato pode apresentar requerimento de adoção junto do tribunal competente
com o qual se inicia a fase final, que corresponde com o processo judicial de adoção.
O processo judicial de adoção, decorre nos termos dos artigos 52º a 59º do RJPA e assume
natureza voluntária (artigo 31º RPJA) e tem caráter urgente (32º RJPA)
Junto o relatório feito no período de pré-adoção, feita a audição do adotante e de outras pessoas,
efetuadas as diligencias requeridas ou julgadas convenientes e ouvido o MP, o juiz decidirá sobre
a adoção. Contudo, e ainda que a adoção se estabeleça por sentença, a decisão administrativa é
decisiva, e tem necessariamente, de constar no processo judicial.
O decretamento de adoção, está sujeito a registo civil obrigatório – Artigo 1º/1, alínea C) do CRC,
e é averbada ao assento de nascimento – Artigo 69º/1, alínea d) CRC.
PROIBIÇÃO DE CONSTITUIÇÃO E PROVA DO VÍNCULO DE FILIAÇÃO
BIOLÓGICA
Segundo o artigo 1987º depois de decretada a adoção não é possível estabelecer a filiação natural
do adotando nem fazer a prova dessa filiação fora do processo preliminar de casamento. Contudo,
a prova da filiação biológica daquele que foi adotado é possível na ação de nulidade ou anulação
do casamento, intentada com fundamento num dos impedimentos previstos no artigo 1602º,
alíneas a), c) e d). Assim, o artigo 1987º quando determina a não possibilidade de fazer proba da
filiação natural tem de ser alvo de uma interpretação restritiva.
O artigo 1603º/1 aplica-se na totalidade à filiação biológica daquele que foi adotado. Outra
conclusão seria chocante: Celebrado um casamento entre uma pessoa adotada e o seu pai natural,
a ligação biológica, não detetada no processo preliminar de casamento, não poderia ser invocada
para se conseguir a invalidação da constituição do vinculo matrimonial.
Ainda que esta proibição se mostre coerente com o carater exclusivo e a irrevogabilidade da
adoção, a constitucionalidade deste preceito não é clara. A titulo exemplar, nomeia-se Guilherme
de Oliveira que entende que esta proibição não se justifica inteiramente no principio da proteção

42
da adoção – Artigo 36º/7 CRP, pelo que parece figurar uma restrição desproporcional dos Direitos
fundamentais à identidade pessoal e à constituição da família – Artigo 26º/1; 36º/1 e 18º/2 CRP.
SEGREDO DA IDENTIDADE E ACESSO AO CONHECIMENTO DAS ORIGENS
A identidade do adotante não pode ser revelado aos pais biológicos do adotando, a menos que o
adotante declare expressamente não se opor a essa revelação – Artigo 1985º/1, com concretização
no 69º/5 CRC e 5º e 56º/e do RJPA
Raciocinio semelhante se faz em relação à identidade dos pais biológicos. O artigo 1985º/2
determina que os pais biológicos se podem opor de forma expressa a que a sua identidade seja
revelada aos pais adotivos
A lei 143º/2015º, de 8 de setembro consagrou expressamente o direito do adotando conhecer as
suas origens (artigo 1990º - A) nos termos do artigo 6º do RJPA. Assim, o direito ao conhecimento
das suas origens pode ser exercido de forma pessoal e livre pelo adotado assim que complete 18
anos. Antes disso, apenas só o pode fazer com 16 ou 17 anos, mediante autorização dos pais
adotivos ou do representante legal.
A ADOÇÃO INTERNACIONAL
As duas principais fontes são: Regime jurídico do processo de adoção – Artigo 61º e seguintes; e
a convenção de Haia sobre a proteção das crianças e cooperação em Matéria de adoção
internacional.
A adoção internacional é aquela que implica transferência da residência habitual da criança do
território de um Estado para o território de outro Estado, que é o da residência habitual dos
adotantes.
➢ Adoção internacional de crianças residentes em Portugal: Está subordinada ao
principio da subsidiariedade: A adoção internacional só é permitida quando não se mostre
viável, em tempo útil, a adoção em Portugal – Artigo 82º/1 RJPA; e desde que se
verifiquem cumpridos todos os requisitos do artigo 83º do RJPA.
o A adoção é normalmente decretada no pais de acolhimento – Artigo 88º/1 RJPA.
Assim que obtida a certidão estrangeira que decretou a adoção, a autoridade
central para a adoção internacional fornece a Portugal o averbamento da nova
relação familiar no assento de nascimento da criança – Artigo 82º/2 RJPA.
➢ Adoção internacional de crianças residentes no estrangeiro: Implica a intervenção de
dois Estados, o português e o de residência da criança. As exigências deste processo são
impeditivos à adoção em países onde não existe organização do Estado, que são
justamente onde as crianças mais necessitam. Ademais, o processo de adoção
internacional duplica o numero de entidades que apreciam a pretensão do adotante e que
acompanham o processo de adoção.
o A adoção é decretada em Portugal ou no pais de origem, consoante o que haja
sido acordado entre a autoridade central Portuguesa e a autoridade competente
do pais da residência ou do que resulte do ordenamento desse pais – Artigo 80º/1
RJPA
o As decisões proferidas no estrangeiro tem eficácia em Portugal desde que o
Estado que a proferiu seja contraente da convenção da Haia sobre a proteção das
crianças e a cooperação em matéria de adoção internacional, ou se estiverem
abrangido por acordo que dispense a revisão de sentença estrangeira – ARTIGO
90º/1 RJPA. Nos restantes casos a decisão depende de reconhecimento da
autoridade central Portuguesa – 90º/2

43
SECÇÃO IV – CONSTITUIÇÃO DA FILIAÇÃO, NO CASO DE PROCRIAÇÃO
MEDICAMENTE ASSISTIDA5
A Filiação decorrente de PMA apenas pode constituir-se tendo havido consentimento para a
procriação e para a relação parental. Assim, apenas através do consentimento se pode constituir
filiação decorrente por PMA. A constituição da filiação decorrente de PMA admite também a
biparentalidade de duas mulheres e monoparentalidade feminina. Como tal, a filiação decorrente
de PMA é, em principio, incompatível com averiguação oficiosa da paternidade
A PMA agrupa um conjunto de técnicas destinadas à formação de um embrião humano sem a
intervenção do ato sexual. Nestas técnicas independentes da prática de sexo, devem separar-se os
processos de procriação sexuada dos processos de procriação assexuada:
Procriação sexuada: Pressupõem o recurso a dois componentes genéticos, um de pessoa do
sexo masculino e outro de pessoa de sexo feminino. Concretamente, recorre-se ou a gâmetas ou
células reprodutoras, ao espermatozoide e ao óvulo ou ovócito.
▪ As técnicas são as referidas no artigo 2º/1 da LPMA. As técnicas são divididas consoante
a fecundação opere dentro do organismo materno (in vivo) ou fora do organismo materno
(in vitro).
▪ Atualmente as técnicas utilizadas em Portugal são apenas a: Inseminação intrauterina –
IIU; Fertilizaçao in vitro – FIV; injeção intracitoplasmática de esperma ou
espermatozoides – ICSI;
▪ Ainda se faz outra distinção, consoante a proveniência do material genético:
 PMA homóloga: Quando os espermatozoides e os ovócitos provêm do próprio
casal;
 PMA heteróloga: Quando o espermatozoide ou/e os ovócitos não provêm do
casal, tendo havido recurso a um dador, ou seja, a alguém que é externo ao casal
| Exemplo: Inseminação artificial. | A PMA heteróloga pode ainda:
▪ Total: Quando nenhuma das células reprodutoras provêm de nenhum
dos membros do casal;
▪ Parcial: Quando uma das células reprodutoras provêm de apenas um dos
membros do casal;
Procriação assexuada: Pode ser efetuada recorrendo a apenas um componente genético,
que tanto pode ser proveniente do sexo feminino como masculino.
▪ Dentro destes, a Lei nº32/2006, de 26 de julho (LPMA) proíbe a clonagem reprodutiva
humana – Artigo 7º/1, prevendo no artigo 36º, pena de prisão de 1 a 5 anos para quem
transferir para o útero embrião obtido através desta técnica, salvo quando essa
transferência seja necessária à aplicação das técnicas de PMA sexuada.
Se o beneficiário da PMA for apenas uma pessoa, a procriação será necessariamente heteróloga.
No entanto, poderá também ela ser total ou parcial, consoante se recorra ou não a células
reprodutoras do beneficiário.
LEGISLAÇÃO SOBRE PMA
Ainda que o artigo 67º/2 da CRP, desde a revisão de 1997, fixe como tarefa do Estado,
regulamentar a procriação assistida, em termos que salvaguardasse a dignidade da pessoa humana,

5
A lei da procriação Medicamente assistida foi alterada pela Lei n 72º/2021, que alterou os artigos 22º e
23º, e aditou dois novos artigos: 22 – A e 42 – A.

44
apenas em 2006 foi publicada uma legislação geral sobre PMA. A lei da Procriação Medicamente
assistida – LPMA criou o conselho Nacional de Procriação Medicamente assistida – CNPMA
Mas há princípios fundamentais aplicáveis à LPMA, mas que são sobretudo princípios do Direito
de personalidade e do Direito da família, e que podem ou ser constitucionalizados:
✓ Artigo 67º/2, alínea e) – Ao estado incumbe regulamentar a procriação medicamente
assistida, mas em termos que salvaguardem a dignidade da pessoa humana;
✓ O principio da dignidade da pessoa humana -Principio fundador da nossa ordem jurídica
✓ A pessoa deve ser tratada como pessoa que é, ou seja, deve-lhe ser reconhecida
autonomia, autodeterminação. O ser humano não deve ser coisificado, instrumentalizado
ou comercializado;
✓ À exceção da filiação decorrente de procriação por ato sexual, exige-se uma declaração
de vontade do candidato a progenitor ( caso da PMA, adoção)
✓ Principio da igualdade – Artigo 13º/1 CRP – Obsta à discriminação com base no facto de
nascimento por PMA
✓ Direito à identidade pessoal – Artigo 26º/1 CRP – Garante a identidade genética do ser
humano, nomeadamente na criação, desenvolvimento e utilização de tecnologias e na
experimentação cientifica
MOTIVOS LEGÍTIMOS DE RECURSO À PROCRIAÇÃO MEDICAMENTE
ASSISTIDA
O artigo 4º/1 da LPMA estabelece que as técnicas de PMA são um método subsidiário e não
alternativo. Assim, em regra, a constituição da filiação assenta na prática de ato sexual. Não há
direito a escolher entre procriação mediante ato sexual e a procriação assistida. O recurso à PMA
apenas pode acontecer, por exemplo, em situações de infertilidade. Não obstante, este principio
da subsidiariedade não impede o recurso a técnicas de PMA de forma a evitar o aparecimento e
desenvolvimento de anomalias genéticas (ou para evitar, por exemplo, a transmissão do vírus da
sida). O artigo 4º/2 enumera então as situações em que é possível recorrer a PMA
MAS, o artigo 4º/3 aditado posteriormente vai contra esse principio da subsidiariedade, ao
permitir a todas as mulheres o acesso às técnicas de PMA independentemente do diagnóstico de
infertilidade. Isto é, a mulher pode optar entre a PMA ou por ato sexual. Esse principio da
subsidiariedade releva apenas para o Homem.
A escolha de características do filho: Artigo 14º da convenção para a proteção dos Direitos do
Homem e da Dignidade do ser Humano face às aplicações da biologia e da medicina: Exclui a
utilização de técnicas de PMA para escolher o sexo, salvo para evitar graves doenças hereditárias
ligadas ao sexo (entre essas doenças destaca-se a hemofilia – doença transmissível da mãe para
criança do sexo masculino). Mas esta proibição estende-se a outras características (artigo 7º/2).
BENEFICIÁRIOS DO ACESSO À PROCRIAÇÃO ASSISTIDA
O artigo 6º/1 da LPMA permite a todas as mulheres o acesso à PMA, independentemente do
Estado civil e de viverem ou não em união de facto. Como tal, assiste-se a uma fase em que apenas
as pessoas do sexo masculino estão impedidas de recorrer à PMA. Também esse artigo 6º permite
recorrer a técnicas de PMA os casais de sexo diferente ou casais de mulheres, pelo que apenas os
casais de homens não podem recorrer à PMA.
O Decreto regulamentar nº 6/2016, de 29 de Dezembro, explicita um principio de igualdade de
tratamento entre os vários beneficiários no acesso à PMA (casais de sexo diferente, casais de
mulheres e mulheres sós) no âmbito do serviço nacional de saúde, impondo a aplicação de
critérios idênticos de acesso e proibindo a sujeição a tempos de espera distintos.

45
Para ter acesso à PMA basta ter 18 anos (6º/2 LPMA) e é indiferente o tempo de duração do
relacionamento do casal. O artigo 6º/2 da LPMA impede PMA em beneficio de maior
acompanhado que esteja impedido por sentença de recorrer essas técnicas, mas não estende essa
proibição a indivíduos que não sendo maiores acompanhados, sofram de demência notória. JDP
entende que a PMA também lhes está vedada por analogia com o artigo 1850º/1.
O Decreto regulamentar nº 6/2016, de 29 de dezembro prevê a possibilidade de sujeitar a
avaliação psicológica os candidatos a PMA.
ADMISSIBILIDADE DOS PROCESSOS HETERÓLOGOS
Alguns autores defendem que a PMA heteróloga não deveria ser permitida e que, inclusivamente,
violariam o principio constitucional da proteção da família.
Os processos heterólogos são tidos como subsidiários em relação aos processos homónimos: O
recurso a técnicas heterólogas só deveria ser autorizada quando a procriação por processos
homólogos não fosse possível ou implicasse elevados riscos para a saúde dos beneficiários ou do
nascituro – Esta solução também é a da lei – Artigo 10º/1, 19º/1, 27º e 47º da LPMA.
A admissibilidade de processos heterólogos suscita 2 problemas:
➢ Contrapartida económica da dação de material genético: A LPMA proíbe a compra e
venda de óvulos, sémen, embriões ou de qualquer material biológico decorrente da
aplicação de técnicas de PMA – Artigo 18º LPMA. Os centros de tratamento são também
proibidos de atribuir qualquer valor ao material genético – Artigo 17º/1 LPMA.
➢ Anonimato do doador: Esta é uma questão de querela constitucional. A pessoa nascida
graças à dação tem direito à sua identidade pessoal genética – Artigo 26º/3 CRP, o que
inclui o direito de conhecer a pessoa que lhe transmitiu os genes. Parece consensual que
o anonimato do dador nunca pode ser absoluto. É preciso garantir que a pessoa nascida
mediante o recurso a técnica heteróloga de PMA não venha, futuramente, a casar com a
pessoa que fez a dação ou com descendentes do dador – Há um interesse público
ponderoso que se opõe ao casamento entre pessoas do mesmo sangue. O TC já se
pronunciou pela inconstitucionalidade de normas demasiados restritivas para chegar ao
conhecimento de dados sobre o dador, inclusivamente levou à alteração da LPMA.
Assim, o artigo 15 da LPMA:
▪ 15º/1 – Consagra a regra do sigilo sobre a identidade de qualquer dos
participantes no ato de PMA
▪ 15º/2 – consagra agora uma exceção mais ampla em beneficio de pessoa nascida
na sequencia de PMA: Ela pode, junto dos serviços de saúde, obter as
informações genéticas que lhe digam respeito, bem, como desde que possuam 18
anos, obter junto do conselho nacional de procriação medicamente assistida
informação sobre a identificação civil do dador
▪ 15º/4 – Explicita que identificação civil é o nome completo do dador.
▪ 15º/5 – Exceção: Possibilidade de obtenção de informações sobre a identidade
do dador por razões ponderosas judicialmente reconhecidas.
▪ Outra exceção do género é a do 15º/3: Possibilidade de as pessoas
nascida na sequencia de PMA heteróloga, que possuam idade igual ou
superior a 16 anos, obterem informação ´sobre eventual existência de
impedimento legal a projetado casamento`

46
GESTAÇÃO OU MATERNIDADE DE SUBSTITUIÇÃO
O artigo 8º/1 da LPMA define gestação ou maternidade de substituição como ´qualquer situação
em que a mulher se disponha a suportar uma gravidez por conta de outrem e a entregar a criança
após o parto, renunciando aos poderes e deveres próprios da maternidade`
A maternidade de substituição implica normalmente três fases: negociação, elaboração do acordo
e cumprimento do estipulado. O acordo é normalmente entre a mãe de gestação e a de receção,
podendo intervir os maridos ou companheiros. A participação masculina assenta traduz-se num
consentimento. O marido da mãe de receção consente e assume a paternidade jurídica da futura
criança
Atualmente, a maternidade de substituição opera sobretudo mediante o recurso a técnicas de
PMA. Uma classificação atende ao titular do ovulo:
✓ Quando pertence à mãe de gestação: Maternidade de substituição genética;
✓ Não pertence à mãe de gestação : Maternidade de substituição puramente gestacional;
Outra distinção é entre a substituição intrafamiliar e a extrafamiliar consoante haja ou não uma
ligação familiar entre a mãe de gestação e a mãe de receção.
Nas situações típicas de maternidade de substituição, existe a celebração de um acordo escrito,
pelo qual uma das partes assume perante a outra três obrigações principais: Iniciar e completar
uma gravidez; entregar à mãe de receção a criança resultante da gestação; e reconhecer a mãe de
receção como a mãe jurídica, abstendo-se de reivindicar quaisquer diretos parentais sobre o
menor. É normal que a mãe de receção se obrigue a pagar as despesas com o parto, bem como
aquelas inerentes à aplicação das técnicas de OMA ou que estejam relacionadas com a saúde da
mulher gravida e do nascituro. O acordo também pode incluir o assumir pela mãe de gestação de
certos deveres de comportamento durante a gravidez (como a abstenção do consumo de álcool,
de drogas, da pratica de atividades de risco e de relações sexuais).
Mas que tipo de contrato é este? Segundo JDP o contrato de maternidade de substituição,
assemelha-se a contrato de prestação de serviço atípico definido pelo artigo 1154º do código civil.
Na maternidade de substituição, a mãe de gestação compromete-se a entregar, de facto e de
direito, à mãe de receção, o fruto da sua atividade de gestação. Trata-se de um contrato em que o
serviço prestado consiste numa gestação por contra de outrem. Há repulsa pelo contrato de
gestação a titulo oneroso por atentar contra a dignidade da pessoa humana.
Segundo o artigo 8º da LPMA: A celebração de negocio de gestação de substituição é possível
desde que seja gratuito; e em situações de ´ausência de útero, de lesão ou de doença deste órgão
que impeça de formas absoluta e definitiva a gravidez da mulher ou em situações clinicas que o
justifiquem` - 8º/2
São nulos e criminalmente puníveis os negócios jurídicos de substituição que não respeitem o
enunciado da LPMA – Artigo 8º/12 e 39º da LPMA.
PROCRIAÇÃO MEDICAMENTE ASSISTIDA POST MORTEM
A lei 72º/2021, alterou todo o procedimento de inseminação post mortem. Até esta lei não era
possível após a morte do marido ou do unido de facto, a mulher ser inseminada com sémen do
falecido. Mas atualmente já é possível, desde que exista consentimento.
DESTINO DOS EMBRIÕES EXCEDENTÁRIOS
A fertilização in vitro causa o exceder de embriões – A LPMA ainda que não consagre o numero
máximo de ovócitos a inseminar, consagra o principio geral de que apenas deve ser criado o

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numero considerado necessário para o êxito do processo de fertilização – Artigo 24º/1. O artigo
25º da LPMA regula o destino dos embriões excedentários – os embriões com condições mínimas
de viabilidade devem ser criopreservados com o propósito de serem transferidos para os
beneficiários originários num prazo que é em regra de 3 anos. Depois desse prazo, os embriões
podem ser usados para PMA em favor de outrem, com o consentimento dos beneficiários
originários – 25º/3
Os embriões excluídos de qualquer projeto parental podem ser usados em investigações
cientificas – Artigo 9º ou de serem congelados e eliminados – 25º/2, 6 e 7.
O artigo 22º/3 da LPMA entende ser licita a transferência de embrião para o membro feminino
do casal de beneficiários originários, apos a morte do membro masculino.
FILIAÇÃO NA PMA
A filiação decorrente de PMA, homóloga ou heteróloga, é necessariamente constituída por
consentimento do beneficiário – Artigo 20º/1 a 3 da LPMA. Este consentimento para a
constituição da filiação decorrente de PMA pressupõe uma dupla intenção: Intenção dirigida à
admissão da procriação e uma intenção posterior de constituição do vinculo de filiação.
O artigo 14º da LPMA regula o consentimento para o recurso à PMA – o recurso a estas técnicas
não pode ser feito sem consentimento livre e esclarecido dos beneficiários, prestado
expressamente e por escrito perante um médico responsável – 14º/1, apos informação previa de
todos os benefícios e riscos da utilização de PMA – 14º/2. O consentimento dos beneficiários é
livremente revogável por qualquer uma das partes até inicio dos processos terapêuticos de PMA
-14º/4.
O consentimento para a constituição da filiação decorrente de PMA insere-se num negócio
jurídico que é, subsidariamente, regido pelos princípios subjacentes às regras atinentes ao
consentimento em outros negócios que também são fontes de relações jurídicas familiares, tal
como o casamento – Artigo 1600º e 1645º CC (normas sobre impedimentos dirimentes absolutos,
falta de vontade e vícios) ou em atos não negociais constitutivos da relação de filiação nos quais
a vontade é particularmente valorizada, tal como a perfilhação – Artigo 1860 e 1862º, e a adoção.
No momento de constituição do vinculo, a lei entende que é suficiente a exibição de documento
comprovativo da prestação de consentimento à PMA – Artigo 20º/2 LPMA. Assim, o documento
cria uma presunção ilidível de consentimento para a constituição do vinculo de filiação – 20º/4
LPMA.
➢ A FILIAÇÃO POR PMA HETERÓLOGA:
A filiação entre a criança e o beneficiário que tiver contribuído para a PMA com as respetivas
células reprodutoras enquadra-se numa relação familiar de parentesco – Artigo 1578º.
A filiação entre a criança e o beneficiário que não tiver contribuído para a PMA com as respetivas
células reprodutoras corresponde a uma relação familiar inominada (porque não é reconduzível à
noção de parentesco) que é designada por filiação PMA heteróloga.
Assim, o vinculo de filiação por PMA heteróloga define-se como: Modalidade de filiação que não
é biológica nem adotiva. Demarca-se da filiação biológica, por ser independente dos laços de
sangue. Demarca-se da filiação adotiva, por não se constituir por sentença de adoção, ainda que
pressuponha também a vontade daquele que virá assumir uma posição juridicamente equivalente
à de progenitor.
O artigo 1839º/3 proíbe a impugnação de paternidade com fundamento em inseminação artificial
ao conjugue que tenha consentido. Atribui a paternidade ao marido da mãe que foi sujeita a

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inseminação, mesmo que o esperma seja de terceiro. Entende JDP que a interdição de impugnação
da paternidade estende-se, portanto, a todas as pessoas referidas no artigo 1839º/1, incluindo o
filho nascido de PMA e ao próprio Ministério público – 1841º/1
O artigo 20º da LPMA consagrou a figura geral da filiação por PMA heteróloga. Mas este artigo
20º não distingue processos homólogos e heterólogos.
O artigo 23º/2 do especifica a filiação por PMA heteróloga que ainda que respeite à inseminação
post mortem, se aplica com as devidas adaptações à fertilização in vitro com recurso a sémen ou
ovócitos de quem veio a falecer (26º LPMA)
De acordo com o 23º/2, se após a morte do marido ou homem com quem vivia em união de facto,
a mulher for inseminada com sémen do falecido, a criança que vier a nascer nao é tida como filha
do falecido quando, à data da inseminação, a mulher esteja casada ou viva há pelo menos 2 anos
em união de facto com homem, que nos termos do artigo 14º da LPMA, tenha dado o seu
consentimento a tal ato.
FILIAÇÃO DECORRENTE DE PMA ILÍCITA
Ainda que uma criança nasça mediante uso de técnica de PMA há que determinar a respetiva
filiação, ainda que não tenha sido conforme ao direito.
Havendo inseminação post mortem consentida pelo marido masculino do casal que faleceu, em
violação do disposto no artigo 22º/1 da LPMA, a criança que vier a nascer é havida como filha
do falecido – Ou seja, ainda que tenha sido ilícito, prevalece o consentimento.
Se houver maternidade de substituição no nosso ordenamento a filiação será constituída em
relação aos beneficiários aos beneficiários. O interesse da criança é preponderante e por isso o
que melhor acautela o seu desejo é a constituição do vinculo em relação a alguém que a desejou.

CAPÍTULO II – EFEITOS DA FILIAÇÃO


À partida, a filiação não produz efeitos enquanto não for legalmente constituída e registada. A
Filiação tem de se encontrar legalmente estabelecida tal como decorre do artigo 1797º/1. |
Exemplo: O mero nascimento de uma criança não desencadeia só por si, os efeitos da filiação.
Para existirem efeitos da filiação, não basta a constituição do vinculo, sendo também preciso o
registo: A declaração de maternidade, a perfilhação, a sentença de reconhecimento da
maternidade/paternidade e a sentença de adoção, transitadas em julgado, a paternidade presumida
têm de ser registadas. Qualquer uma das três modalidades de filiação só podem ser invocadas
depois de registada: Artigo 1º/1, alínea b) e c) e 2º do CRC.
MOMENTO DA PRODUÇÃO DOS EFEITOS DA FILIAÇÃO
A filiação legalmente estabelecida produz efeitos desde o momento do nascimento do filho –
Artigo 1797º/2 (aplica-se analogicamente à filiação por PMA). A adoção constitui-se por sentença
1973º/1, pelo que os seus efeitos produzem-se a partir do transito em julgado da decisão judicial.
PRINCIPIO DA NÃO DISTINÇÃO QUANTO AOS EFEITOS DA FILIAÇÃO
É proibida a discriminação dos filhos nascidos fora do casamento – Artigo 36º/4 CRP e dos filho
nascidos por recurso a técnicas de PMA – Artigos 3º e 15º/5 da LPMA, em cumprimento do
principio da igualdade – Artigo 13º/1 CRP.
Os efeitos produzidos pela filiação biológica (1874º e ss.) estendem-se às demais modalidades (o
adotado é equiparado a filho biológico – 1986º/1

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❖ DEVERES PATERNOFILIAIS
A relação de filiação implica deveres que não se confundem com as responsabilidade parentais.
Pais e filhos devem-se mutuamente respeito, auxilio e assistência – Artigo 1874º/1.
Os deveres paternofiliais perduram ao longo de toda a relação de filiação, ou seja, não cessam
com a maioridade ou emancipação do filho
➢ Dever de respeito: Obriga cada sujeito da relação de filiação a não violar os direitos
individuais do outro. Compreende-se aqui tanto direitos de personalidade como
patrimoniais.
➢ Dever de auxilio: Obrigações de ajuda e proteção tanto quanto à pessoa como ao
património dos pais e filhos. São obrigações com especial relevo nos momentos de
crescimento, doença e velhice.
➢ Dever de Assistência: Dever estruturalmente patrimonial que impõe prestações
suscetíveis de avaliação pecuniária. Cabe neste dever, por exemplo, a obrigação de prestar
alimentos e de contribuir para os encargos da vida familiar – Artigo 1874º/2
▪ A obrigação de assistência é absorvida pelo dever de contribuir para os encargos
da vida familiar durante vida em comum, apenas adquirindo autonomia no caso
de não haver comunhão de habitação entre os pais e os filhos – Nesta situação
vigoram as regras gerais, o que significa que tanto podem estar vinculados os
pais como os filhos – Artigos 2003º, 2004º, 2009º/1, alínea b) e c). | A lei
consagra um processo especial para os alimentos devidos a criança: 45º a 48º do
RGPTC. | A violação da obrigação legal de alimentos é criminalmente punível –
250º CP;
▪ No âmbito da obrigação alimentar inclui-se o dever parental de pagamento das
despesas com o sustento, segurança, saúde e educação do filho maior ou
emancipado que não tenha completado a sua formação profissional – Artigo
1880º - O artigo 1905º/2 acrescenta ao 1880º que a obrigação de sustento se
mantém até que o filho complete 25 anos de idade
▪ Esta obrigação depende também das possibilidades individuais de cada sujeito.
O incumprimento ou impossibilidade de cumprimento dos deveres paternofiliais de respeito,
auxilio e assistência pode ser suprido com a aplicação de medidas de proteção de crianças, jovens
e idosos.
Vinculação cumulativa de deveres paternofiliais e deveres conjugais: O artigo 2009º/1 sugere
uma posição hierarquicamente superior dos deveres conjugais, não obstante é sempre preferível
assegurar a satisfação de deveres paternofiliais e dos deveres conjugais (colisão de direitos 335º).
Os deveres conjugais integram o cumprimento dos deveres paternais quanto a filhos comuns do
casal que residam com os pais
❖ OUTROS EFEITOS GERAIS DA FILIAÇÃO

Nome do filho: A constituição do nome é regulado pelo código do registo civil – Artigos 102º
e ss. O nome está sujeito ao principio da imodificabilidade: Uma vez inscrito no assento de
nascimento só pode ser alterado mediante autorização do conservados dos registos centrais
(104º/1 CRC). Mas há exceções a este principio, ou seja, situações em que a modificação não
depende de autorização: Estabelecimento da constituição de adoção e revisão de sentença de
adoção (104º/2 CRC) e outra situação é a que resulta do exercício dos direitos previstos no artigo
1876º
▪ Aos irmãos não pode ser dado o mesmo nome próprio, salvo se um deles for falecido –
Artigo 103º/1, alínea d) CRC;

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▪ Na falta de estabelecimento da filiação, ao registando não deixará de ser atribuído
apelidos, competindo a sua escolha ao declarante do nascimento ou ao conservador –
Artigo 103º/1, alínea f) CRC
▪ Se a filiação estiver constituída quanto a ambos os pais, a decisão do nome cabe a ambos,
independentemente da titularidade das responsabilidades parentais.
▪ Na falta de acordo entre os pais, o tribunal fixará o nome, de harmonia com o interesse
do filho – A decisão judicial sobre o nome é proferida no âmbito de uma providencia
tutelar cível – segue a forma de ação tutelar comum – Artigo 3º, alínea j) e 67º RGPTC.
▪ No caso da maternidade ou paternidade serem estabelecidas posteriormente ao registo de
nascimento, o nome do filho poderá ser alterado, para integrar apelidos da mãe e do pai
ou só um deles – Artigo 1875º/3.
▪ Adoção de nome: Nos termos do artigo 1876º/1 quando a paternidade não se encontre
estabelecida, pode atribuir-se à criança apelidos do marido da mãe se esta e o marido
declararem, perante funcionário do registo civil, ser essa a sua vontade. A finalidade desta
figura é integrar o filho de pai desconhecido no novo lar formado pela mãe e marido. O
mesmo acontecerá em sentido inverso, isto é, quando não houver maternidade
estabelecida – Seguindo o 1876º/2, nos 2 anos posteriores à maioridade ou emancipação
o filho pode requerer que sejam eliminados do seu nome os apelidos do marido da mãe
ou da mulher do pai
▪ Alterações do nome na adoção: A constituição da adoção acarreta alterações do nome
do adotado – 1988º - perde os apelidos de origem e é composto um novo nome com
apelidos dos adotantes, nos termos do 1875º. A alteração do nome na adoção conjunta e
na adoção singular do filho do conjugue implica consenso. À partida, o adotado conserva
o nome próprio (apenas excecionalmente, a pedido do adotante, o tribunal pode alterar o
nome próprio)

Nacionalidade do filho: Nos termos do artigo 1º/1 da Lei da Nacionalidade a atribuição da


nacionalidade portuguesa ao filho está dependente da nacionalidade (portuguesa) de um dos
progenitores e pelo local de nascimento (em Portugal). | Beneficiam de nacionalidade portuguesa
originária:
✓ Filhos de mãe portuguesa ou de pai português nascidos em território nacional;
✓ Filhos de mãe portuguesa ou de pai português nascidos no estrangeiro, se o progenitor
português aí se encontrar ao serviço do Estado Português, se tiverem o seu nascimento
inscrito no registo civil português ou se declararem que querem ser portugueses;
✓ Filhos de estrangeiros nascidos em território português, se um dos progenitores também
aqui tiver nascido e aqui tiver residência;
✓ Nasceram em território português, se não possuírem outra nacionalidade
De acordo com o artigo 5º da Lei da Nacionalidade, o adotado por nacional português adquire
nacionalidade portuguesa.
Entrada e permanência no território português;6

❖ RESPONSABILIDADES PARENTAIS
As responsabilidades parentais consistem no conjunto de situações jurídicas que, normalmente,
emergem do vinculo de filiação e incumbem aos pais com vista à proteção e promoção do
desenvolvimento integral do filho menor não emancipado – Artigo 1877º e 1878º. É mais do que

6 Lei nº37/2006, de 9 de Agosto – Fixa as condições do exercício do direito livre de livre circulação e residência no
território português por pais e filhos de cidadãos na união europeia. Quanto a outras pessoas: Lei nº23/2007, de 4 de
julho.

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um meio de suprimento das incapacidades dos menores| Algumas características das
responsabilidades parentais:
Caráter estatutário: As responsabilidades parentais constituem uma situação jurídica que se
funda na ligação paternofilial, num grupo com importância reconhecida pela constituição – Artigo
68º/2 CRP;
Indisponibilidade: Resulta do artigo 1699º/1, alínea b) O pai não pode dispor das
responsabilidades parentais pois o interesse que lhe está subjacente não lhe pertence mas sim ao
filho menor. Alem de indisponíveis são também intransmissíveis (competem única e
exclusivamente aos pais – 1878º/1) Manifesta-se também no 1882º
Funcionalidade acentuada: As responsabilidade parentais são ordenadas em torno do
interesse do filho – Artigo 1878º - o que revela que este é um instituto destinado a proteger e
promover o crescimento saudável da criança. O pai que omita, culposamente, o cumprimento de
deveres parentais pode ser sancionado com a inibição do exercício destas responsabilidades –
Artigo 1915º/1. É também daqui que advém a possibilidade de o Estado poder intrometer-se na
relação de pais e filhos – sempre que se revele necessário para garantir o interesse da criança.
Eficácia perante terceiros: As responsabilidades parentais produzem efeitos erga omnes. O
poder de representação é geral, e a inobservância dos deveres de guarda e educação torna os pais
responsáveis pelos danos que os filhos causarem a terceiros – Artigo 491º
Tipicidade: Os artigos 1699º/1, alínea b) e 1882 mostram que não é permitida a criação de
situações jurídicas novas nem a eliminação daquelas que a lei indica.
É obrigatório o registo das decisões em matéria de exercício das responsabilidades parentais sobre
regulação, alteração, cessação, inibição, suspensão e providencia limitativas – Artigo 1920º - B;
Artigo 1º/1, alíneas f), h) do CRC. Esse registo é feito por averbamento ao assento de nascimento
do filho – Artigo 69º/1, alíneas e) e f) do CRC. Na falta de registo obrigatório, as decisões não
podem ser invocadas contra terceiros de boa-fé – Artigo 1920º - C.
CONTEÚDO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS
Compete aos pais deveres de guarda e educação, dever de prover ao sustento, poder de
representação e poder de administração dos bens do filho menor – Artigo 1878º/1. Os filhos
devem obediência aos pais – 1878º/2 – Há uma posição de subordinação, ainda assim, e tendo em
conta a maturidade dos filhos, os pais devem ter em atenção a sua opinião em assuntos familiares
Poder – dever de guarda: Os pais velam pela segurança e saúde dos filhos. Implica que o
filho viva com os pais no mesmo lar. Os filhos menores não podem ser separados dos pais exceto
através de decisão judicial – 36º/6 CRP – não podem abandonar a casa paterna ou aquela que os
pais lhe destinaram nem dele ser retirados – 1887º/1. O 1887º/2 prevê a possibilidade de reclamar
o filho no caso deste abandonar a casa – Entrega judicial de criança.
▪ O poder de vigilância abarca as ações do filho e a regulação das suas relações – Por
exemplo, um pai pode impedir o relacionamento do filho com pessoas associadas a
drogas. Mas esse impedimento tem de ser justificado. Mas por exemplo essa privação não
pode acontecer em relação aos irmãos ou avós – 1887º - A
▪ Os pais podem ainda decidir no que respeita aos cuidados de saúde – Cabe-lhes autorizar
intervenções ou tratamentos médicos. Mas há exceções a este necessidade de autorização
( ação estatal de politicas de saúde pública, urgências, estado de perigo, casos em que a
criança tem discernimento para decidir por si). Mas sendo superior interesse da criança a
recusa dos pais pode ser superada por via judicial

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Poder – dever de dirigir a educação: Prepara o filho para uma vida enquanto ser autónomo.
O 1885: Os pais devem promover, de acordo com as suas possibilidades, o desenvolvimento
físico, intelectual e moral dos filhos, bem como uma adequada instrução geral e profissional. O
artigo 1886º reconhece aos pais de menores de 16 anos, liberdade para decidir sobre a matéria.
▪ Quanto à existência de um poder de correção – Tradicionalmente apontam-se como licitas
as medidas de correção como repreensões, privação de um divertimento e castigos
corporais moderados. O artigo 152º - A/1, alínea a) do CP pune com pena de prisão quem,
sendo cuidador ou educador de pessoa menor lhe inflija, maus tratos físicos ou psíquicos,
incluindo castigos corporais.
Dever de prover ao sustento: Compreende a habitação, vestuário, alimentação e todas as
prestações que se desdobram em responsabilidades parentas (prestações com saúde, segurança,
etc). Os pais estão obrigados a proporcionar aos filhos um nível de vida idêntico ao seu.
▪ 1879º Os pais estão desobrigados destes deveres se os filhos estiverem capazes de se
sustentar
Poder – dever de representação: Poder de representação geral dos filhos menores – 1878º/1.
Havendo conflito de interesses entre pais e filhos, os filhos menores podem ser representados por
curador nomeado pelo tribunal – 1881º/2. Decorre do 1878º que este dever compreende todos os
direitos e o cumprimento de todas as obrigações menos os puramente pessoais, os quais o filho
menor pode praticar pessoal e livremente. | EX.: A perfilhação e o casamento são atos puramente
pessoais (16 anos). O artigo 127º/1 enumera atos que o menor tem de praticar sozinho, isto é,
pessoal e livremente. Os pais não administram os bens do 1888º/1
▪ 1888º/1, alínea d) – Administrados pelo próprio filho;
▪ 1888º/1, alínea a) a c) – Administrados por terceiros, em representação do filho menor.
Poder-dever de administração dos bens: Os pais têm de administrar os bens dos filhos
menores menos o mencionados no 1888º/1. Este poder de administração cessa com a
emancipação. Mas há ainda um conjunto de atos patrimoniais que os pais não podem praticar sem
autorização do MP – 1889º e 1892º (alienar ou onerar bens, salvo tratando-se de alienação onerosa
de coisas suscetíveis de perda ou deterioração, contrair empréstimos ou negociar transação). A
aceitação ou não de liberalidades em representação do filho é regulada pelos artigos 1889º/1,
alínea j) e l), e 1890º.
▪ Os atos indevidamente praticados pelos pais são anuláveis – 1893º, mas podem ser
confirmados pela entidade a quem competia.
▪ Os pais devem administrar os bens do filho com o mesmo cuidado com que administram
os seus – 1897º. Não estão ainda obrigados a prestar contas ou caução da sua
administração – 1898º e 1899º. Podem utilizar os rendimentos dos bens do filho dentro
de certos limites, para fazer face a necessidades da vida familiar – 1896º/1. Devem
entregar os bens que a este pertencem, assim que atinja a maioridade.
Dever de obediência e autonomia da criança: Os filhos menores devem obediência aos pais
( 1878º/2, 1ª parte) mas os pais também devem, de acordo com a maturidade dos filhos,
reconhecer-lhes autonomia na organização da sua própria vida (1878º/2, 2ª parte). As
responsabilidades parentais são um modo de proteção do filho, no seu crescimento, separação e
individualização.

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EXERCICIO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS
O sistema de exercício das responsabilidades parentais, criado pela Lei nº 61/2008, de 31 de
outubro:
➢ Exercício em comum dessas responsabilidades, salvo exceções: Este principio vigora,
de acordo com o artigo 1901º, 1906º/1, 1911º e 1912º - Ambos decidem em acordo sobre
todas as questões da vida do filho. O exercício das responsabilidades parentais caberá a
um dos pais:
▪ Se um deles morrer – 1903º e 1904º;
▪ Quando a filiação não estiver constituída quanto ao outro pai – 1910º;
▪ Quando os pais não vivam juntos e o exercício em comum seja tido como
contrário ao interesse do filho – 1906º/2, 1911º/2 e 1912º/1;
▪ Quando existir incapacidade acidental provocada por álcool ou drogas
No caso de exercício em comum, faltando acordo dos pais, qualquer um deles pode recorrer ao
tribunal que tentará a conciliação – 44º do RGPTC. No caso de não ser possível, o tribunal ouvirá
o filho antes de decidir, a menos que algumas circunstancias o desaconselhem. Se um dos pais
praticar ato, presume-se que age de acordo com outro, a menos que a lei exija consentimento de
ambos os pais ou se trate de ato de particular importância – 1902º e 1911º/1 Um terceiro deverá
recusar intervir num ato pratica apenas por um dos pais quando se presuma acordo.
Atos praticados por apenas um dos pais sem acordo do outro são anuláveis por analogia do 1893º.
A invalidade não é oponível a terceiro que ignore desculpavelmente a falta (1902º/1) ou a
necessidade de acordo.
➢ Exercício em comum mitigado das responsabilidades parentais quando os pais não
vivam juntos: No caso de os pais não viverem juntos, estarem divorciados ou separados,
haverá exercício conjunto mitigado das responsabilidades parentais – Artigo 1906º/1 e 3,
1911º/2 e 1912º/1 – Ou seja, ambos decidem em matérias de particular importância.
Quanto a atos da vida corrente do filho, o exercício das responsabilidades parentais cabe
ao progenitor que com ele reside habitualmente.
Se ambos os pais exerciam as responsabilidades parentais, e existiu divórcio, separação,
declaração de nulidade ou anulação do casamento, separação de facto dos conjugues ou cessão da
união de facto introduz-se modificações no regime do exercício das responsabilidades parentais
– Artigos 1905º, 1906, 1909º/1 e 1911º/2. Passa-se de um exercício comum para um mitigado:
As responsabilidades parentais em questão de particular importância para o filho são de ambos
ao pais, as relativas à vida corrente são exercidas apenas por um deles – 1906º/1 e 3.
Mas o que significa ´questões de particular importância ?`
Para JDP são questões relacionadas com a educação religiosa de filho com menos de 16 anos;
tratamento médicos ou intervenções cirúrgicas de alguma gravidade; atos patrimoniais que
careçam de autorização do ministério púbico e situações de representação do menor em juízo
(16º/2 e 3 e 18º do CPC).
A professora Rita Lobo xavier acrescenta as deslocações para o estrangeiro, a escolha de
estabelecimento de ensino e atividades extracurriculares, bem como a prática de desportos
radicais.
Outra questão prende-se com o determinar do progenitor com que o filho residirá
habitualmente

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Nesta escolha, o tribunal deve ter em atenção o interesse da criança, considerado nomeadamente,
o ´eventual acordo dos pais e a disponibilidade manifestada por cada um deles para promover
relações habituais do filho com o outro ` - 1906º/5
O pai que não resida habitualmente (pai não guardião ou não residente) com o filho pode
relacionar-se livremente com ele, sempre que ambos o desejem. Na concretização do convívio
entre estes dois prevalece o interesse do filho – 1906º/7. Enquanto o filho se encontrar com este
progenitor, é a este que pertence o exercício das responsabilidades parentais relativo a atos da
vida corrente do filho que pode exercê-las por si ou por delegação – 1906º/3 e 4. Mas este
progenitor não deve contrariar as orientações educativas mais relevantes definidas pelo progenitor
com o qual a criança reside habitualmente – 1906º/3, 2ª parte. O progenitor que não exerce as
responsabilidades parentais quanto a atos correntes tem o direito de ser informado sobre o modo
como elas são exercidas, principalmente quanto à educação e condições de vida da criança –
1906º/6
Aquele a quem cabe a guarda física da criança está vinculado ao dever de prover o sustento, o
outro está obrigado a prestar alimentos ao filho – 1905º
Entende JDP que a lei deveria ter atentado mais a uma repartição paritária do tempo de exercício
entre cada um dos progenitores, de forma a assegurar o principio da igualdade dos progenitores,
e até mesmo para dar a criança tempo com ambos. A letra do 1906º/1 e 3 favorece a pratica da
residência única.
Nas situações de rutura da vida em comum, o exercício das responsabilidades parentais tem de
ser regulado por acordo dos pais ou decisão do tribunal:
✓ Acordo é apresentado pelos pais na conservatória do registo civil, no âmbito de divórcio
por mutuo consentimento (1775º/1, alínea b e 1776º-A) ou de processo de regulação das
responsabilidades parentais por mutuo acordo (274º - A a C do CRC). Este acordo carece
de aprovação pelo MP ou homologação do tribunal que será recusada se não estiver
assegurado o interesse da criança - 1776º - A/2, 1778º - A
✓ Se não existir acordos, há o processo previsto nos artigos 34º a 63º do RGPTC – Inclui
uma conferencia de pais onde o juiz procura um acordo. Na ausência de acordo, o juiz
decide provisoriamente sobre a regulação das responsabilidades parentais, remetendo as
partes para mediação técnica especializada (38º RGPT). Se a falta de acordo persistir
haverá discussão e julgamento, sendo proferida uma sentença de regulamento do
exercício das responsabilidades parentais – 39º/7, 40º/1 do RGPTC.
A violação do regime de visitas pode gerar incumprimento da regulação do exercício das
responsabilidades parentais e até configurar crime de subtração de menor – 249º CP
Mas a sentença ou acordo de regulação do exercício das responsabilidades parentais não é
imutável, podendo esse acordo ser modificado por mutuo consentimento dos pais. Qualquer um
dos dois pode pedir alteração da regulação.
➢ Possibilidade de exercício das responsabilidades parentais por terceiro: Nos termos dos
artigos. 1903 e 1904/2, quando existirem impedimentos de exercício das
responsabilidades parentais por ambos os pais, este exercício, caberá por decisão judicial,
preferencialmente ao cônjuge ou Unido de facto de qualquer dos pais e depois alguém da
família, de qualquer dos pais.
▪ No apadrinhamento civil também existe este exercício – Artigo 7º/1 da LAC –
Atribui aos padrinhos o exercício destas responsabilidades;

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Em caso de filiação estabelecida apenas quanto a um dos pais, as responsabilidades podem ser
atribuídas por decisão judicial, ao conjugue ou unido de facto do único progenitor jurídico
exercendo-a a assim em conjunto – 1904º - A/1
No caso de haver confiança a terceira pessoa, cabem a esta os poderes e deveres relativos à criança
que forem indispensáveis ao adequado desempenho das suas funções, competindo ao tribunal
decidir em que termos são exercidas pelos pais as responsabilidades parentais – 1907º/2 e 3.
INIBIÇÃO E LIMITAÇÕES AO EXERCÍCIO DAS RESPONSABILIDADES
PARENTAIS
O titular de responsabilidades parentais pode ser privado do seu exercício – inibição – ou ver esse
exercício restringido por medidas judiciais – limitações em sentido amplo.
➢ Inibição do exercício das responsabilidades parentais
A inibição do exercício das responsabilidades parentais pode resultar diretamente de lei ou de
decisão judicial. A decisão que decrete a inibição pode ser fundamentada na condenação por
prática de crime a que a lei atribui o efeito de inibição ou outra situação – A inibição por lei ou
decretada pelo tribunal com fundamento em crime chama-se: inibição de pleno direito – 1913º.
As outros situações de inibição (aquelas sem base em crime) denominam-se inibição judicial
A inibição pode também ser total ou parcial consoante abarque a generalidade das situações ou
apenas a representação e administração dos bens do filho – 1915º/2
A inibição do exercício das responsabilidades parentais não implicam que o pai possa deixar de
alimentar o filho – 1917º
 Inibição de pleno direito: São inibidos de pleno direitos do exercício das
responsabilidades parentais: os condenados definitivamente por crimes a que a lei atribui
o efeito de inibição, quando o tribunal decidir pela inibição, menores, e maiores
acompanhados (quando a sentença assim o declare) etc.
Estão parcialmente inibidos das responsabilidades parentais, os menores não emancipados
(1913º/2). Inibição de pleno direito quanto aos demais é total, salvo determinação judicia.
Distinta quanto ao maior acompanhado inibido.
Esta inibição de pleno direito cessa conforme a causa que a origina (cessação da pena de inibição,
maioridade, cessação de maior acompanhado, etc.)
 Inibição judicial: A inibição também poderá ser total ou parcial consoante o
critério do tribunal. A inibição pode referir-se a todos os filhos ou apenas alguns
(1915º/2). Regra geral, os efeitos dessa inibição estendem-se a todos os que nascerem
depois de aquela ter sido decretada (1915º/3)
A inibição pode ser requerida pelo ministério, ou qualquer parente ou pessoa a cuja guarda esteja
confiada com fundamento em causas subjetivas ou objetivas – 1915º/1.
▪ Causas subjetivas: infração culposa dos deveres do pai para com os filhos;
▪ Causas objetivas: Inexperiência, doença, ausência ou outra razão que demonstre não
estar em condições de cumprir os seus deveres para com os filhos
Os artigos 52º a 57º do RGPTC regulam o processo de inibição do exercício das responsabilidades
parentais. Como medida preliminar o tribunal pode ordenar a suspensão do exercício das
responsabilidades parentais e o acolhimento da criança. Esta inibição decretada pelo tribunal
cessam quando cessarem as causas que a originaram – 1916º/1.

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➢ Limitação ao exercício das responsabilidades parentais
Este tipo de medidas são tomadas quando exista perigo para a pessoa (1918º/1) ou património do
filho (1920º/1). Mas não há regras destas, apenas no código civil, sendo a Lei de proteção a
principal fonte de limitações. A revogação ou alteração destas medidas pode ser pedida a todo mo
tempo pelo tribunal, a requerimento do Ministério público ou qualquer dos pais – 1920º - A
Assim, e quando a segurança, saúde e formação de uma criança estejam em perigo, pode o
tribunal, a requerimento do MP ou de qualquer parente do menor decretar medidas adequadas, tal
como confiar a criança a terceira pessoa – 1918º
No caso de a criança ser confiada a terceira pessoa ou a estabelecimento de educação e de
assistência, será estabelecido um regime de visitas aos pais, a menos que, excecionalmente, o
interesse do filho o desaconselhe – 1919º/2. Os pais mantem o exercício das responsabilidades
parentais em tudo o que não se incompatível com as medidas - 1919º/1
Quanto ao património: Quando a má administração coloca em perigo o património do filho, pode
o tribunal decretar as providencias necessárias – 1920º/1. | EX:. Prestação de contas e informação
sobre a administração e estado do património do filho
MEIOS DE SUPRIMENTO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS
A lei reserva o termo ´meio de suprir o poder paternal` apenas para a tutela e a administração de
bens – 1921º e seguintes.
➢ Tutela
O artigo 1921º/1 enumera os casos em que uma criança está sujeita a tutela. A instauração de
tutela é promovida oficiosamente através de ação tutelar comum – Artigo 67º do RGPTC.
Normalmente, os menores estão sujeitos a tutela até à maioridade ou emancipação
A tutela é exercida por um tutor e pelo conselho de família – 1924º/1. O cargo de tutor e de
conselho da família são obrigatórios – 1926º. O tutor será designado pelos pais ou pelo tribunal –
1927º, sendo que essa designação deve ser feita em testamento ou documento autentico ou
autenticado (interessando apenas no caso de eles falecerem ou ficarem incapazes – 1928º/1 e 3).
Mas essa designação tem de ser confirmada pelo tribunal (1931º/1)
Não havendo ninguém com condições para exercer a tutela, as funções de tutor serão
desempenhadas pelo diretos do estabelecimento de educação e assistência onde esteja a criança –
1962º/2 – Neste caso não existirá conselho de família
O cargo de tutor é remunerado (1942º/1) e ele tem o direito a ser reembolsado pelas despesas que
legalmente haja feito (1946º/1).
O conteúdo do poder do tutor decorre dos artigos 1935º a 1947º. O tutor tem, à partida, os mesmo
direitos e deveres dos pais e é obrigado a exercer o poder tutelar com a diligencia de um bom pai
de família (1935º/2). A restrição que lhes é imposta mais relevante será a fiscalização por parte
do conselho de família e do protutor – Artigos 1954º e 1955º/1; a prática de certos atos (1937º e
1939º) e um conjunto de atos para os quais depende de autorização do MP (1938º, 1940º e 1941º
➢ Administração de bens
A administração de bens institui-se quando: Os titulares das responsabilidades parentais tenham
sido apenas excluídos, inibidos ou excluídos da administração de todos os bens do incapaz ou de
alguns deles; ou quando a entidade competente para designar o tutor, designe atribua a outro a
administração dos bens do incapaz.

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A administração pode coexistir com o poder paternal ou a tutela, sendo que a sua instauração é
também ela oficiosa, através de ação tutelar comum – 67º RGPTC
A administração dos bens é exercida por um ou mais administradores, e no caso de tutela também
pelo conselho de família.
No caso de doação ou deixa testamentária em beneficio de criança é licita a designação de
administrador quanto aos bens compreendidos na liberalidade – 1968º
O administrador deve garantir aos pais ou tutor, através dos rendimentos dos bens, as importâncias
necessárias aos alimentos da criança – 1971º/3. Divergências entre administrador e pais ou tutor
são decididas em tribunal – 1971º/4.

EXTINÇÃO DO VINCULO DE FILIAÇÃO


A extinção do vinculo de filiação pode ser ou não retroativa:
▪ Filiação por ato sexual: O vinculo é retroativamente destruído por impugnação da
maternidade, invalidade e caducidade da declaração de maternidade, impugnação da
paternidade, impugnação, invalidade e caducidade da perfilhação.
▪ Filiação adotiva: Extinção retroativa através de revisão da sentença;
▪ Filiação por PMA: Retroativa fundada na ausência ou invalidade do consentimento
Em caso de extinção retroativa tudo se passa como se a filiação nunca se estivesse estabelecido,
menos quanto aos alimentos de fontes legal que não são restituídos (2007º/2 aplicável por maioria
de razão aos alimentos definitivos)
Na extinção não retroativa, o mais comum é a morte, mas há mais exemplos como a extinção
da filiação prévia decorrente de adoção.
EXTINÇÃO RETROATIVA DO VÍNCULO DA FILIAÇÃO DECORRENTE DE ATO
SEXUAL
➢ Impugnação da maternidade
A maternidade estabelecida por reconhecimento judicial não é impugnável, mas a estabelecida
por declaração pode a todo o tempo ser impugnada em juízo se não for a verdadeira – 1807º.
Têm legitimidade para impugnar a maternidade a própria pessoa declarada como mãe, a pessoa
registada como filho, ou qualquer outra pessoa com interesses moral ou patrimonial na ação e o
Ministério público.
Admite-se uma ação autónoma de invalidação da declaração de maternidade – Aplicam-se
analogicamente as disposições do negócio jurídico, devidamente justificado – A declaração de
maternidade pode ser anulada a requerimento do declarante por coação moral ou erro que leve ao
estabelecimento de uma maternidade falsa – Enquanto ato jurídico a declaração tem de ser livre.
➢ Extinção retroativa da paternidade estabelecida
A paternidade presumida e registada apenas pode ser destruída através de ação de impugnação –
1838º - ou por impugnação da presunção de paternidade em ação de investigação de maternidade.
A impugnação da paternidade do filho concebido no matrimónio é o modo normal de impugnação
da paternidade presumida – O autor deve provar que de acordo com as circunstâncias a
paternidade do marido da mãe é altamente improvável – 1839º/2 (não coabitação entre os
conjugues no momento da conceção, impotência do marido para gerar, etc.) Tem legitimidade
para requerer a ação as pessoas do artigo 1839º/1. Se o filho menor não emancipado, será
representado, na ação, por um curador especial 1846º/3 aplicável por analogia.

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▪ No caso de morte ou ausência do marido, da mãe ou do filho – Legitimidade regulada
pelos artigos 1844º/1 e 1845º
Não é clara a conformidade das soluções estabelecidas com a consagração constitucional do
direito à identidade pessoal e ao desenvolvimento da personalidade – Artigo 26º/1 CRP
Artigo 1842º fixa prazos para a ação de impugnação da paternidade. No caso de morte ou ausência
do marido da mãe, da mãe ou do filho, há ainda que atender aos prazos do artigo 1844º/2 e 1845º
JDP: Estranha que a lei negue legitimidade direta a quem se declarar pai do filho para impugnar
a paternidade do marido da mãe – Como a constituição de um vinculo de filiação pressupõe o
afastamento prévio de outro, veda-se ao verdadeiro pai de criança nascida de relação
extramatrimonial o estabelecimento da sua paternidade, se não requerer ao MP que intente ação
de impugnação no prazo de 60 dias a contar da data em que a paternidade do marido da mãe
conste do registo
Em sentido inverso, havendo perfilhação, pode um terceiro impugnar pois enquadrar-se-á na
qualidade de ´outra pessoa que tenha interesse moral ou patrimonial` (1859º)
JDP não entende esta diferenciação entre filhos e relações. Mas acórdãos recentes do Tribunal
constitucional tem-se pronunciado pela constitucionalidade destas normas dos artigos 1838º,
1839º/1 e 1841º
O artigo 1840º ocupa-se da impugnação da paternidade de filho concebido antes do casamento –
o autor deve provar apenas que o filho nasceu dentro dos 180 dias posteriores à celebração do
casamento. É o reu quem tem de provar as exceções das alíneas do artigo 1840º/1
Impugnação antecipada: A paternidade pode ser impugnada pelo marido da pretensa mãe ainda
antes de ser registada a maternidade, no prazo de 6 meses a contar da dará em que ele soube do
nascimento – 1843º/1 – Serve para aqueles casos em que o marido da pretensa mãe pretende
demonstrar que a sua paternidade é altamente improvável | EX.: O marido, possivelmente
separado de facto da mulher, suspeita ou sabe que esta deu à luz um filho, mas não encontra
qualquer registo de nascimento que a indique como mãe | A impugnação antecipada evita que o
marido tenha de esperar por um registo, o que pode demorar muito tempo, tornando mais difícil
a prova.
Impugnação, invalidade e caducidade da perfilhação: Artigo 1859º.
▪ A perfilhação será nula se não observar a forma correspondente – Artigo 220º e 295º - ou
se for anterior à conceção – Artigo 1855º, 295º e 295º
▪ A perfilhação é anulável por erro vicio, coação moral ou incapacidade do perfilhante.
 Artigo 1860º - Anulação por erro ou coação. Só é relevante o erro sobre as
circunstâncias que tenham contribuído decisivamente para o convencionamento
da paternidade. A coação há que ser analisada nos termos gerais – Artigos 255º
e 256º do CC. Em regra, a ação de anulação caduca no prazo de 1 ano a contar
do momento em que o perfilhante teve conhecimento de que estava em erro ou
em que cessou a coação.
▪ A perfilhação é ainda anulável por incapacidade do perfilhante quando este tiver – 16
anos, for maior acompanhado com restrições ao exercício de direitos pessoais ou estiver
afetado por perturbação mental notória no momento do acto – 1850º/1ª a contrario; A
anulação com base neste vicio, tem de ser requerida pelo perfilhante, pelos seus pais, tutor
ou acompanhante se assim resultar de medidas de acompanhamento decretadas numa
ação indicada dentro do prazo – Artigo 1861º

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Se o perfilhante falecer sem ter intentado a ação de anulação (com fundamento em erro, coação
ou incapacidade) ou no decurso do processo, têm legitimidade para intentar no ano seguinte à sua
morte os descendentes ou ascendentes do perfilhante e todos os que mostrem ter sido prejudicados
nos seus direitos sucessórios por efeito da perfilhação – 1862º
EXTINÇÃO RETROATIVA DA FILIAÇÃO ADOTIVA
A adoção pode ser extinta retroativamente por revisão da sentença de adoção – Artigos 1990º e
1991º. A eficácia da revisão da sentença não se resume à eliminação dos laços entre adotado e
adotante. São restaurados os laços entre adotado e família anterior como se nunca tivessem sido
extintos.
A revisão de sentença é diferente do recurso extraordinário de revisão. Pode ser interposto um
recurso extraordinário de revisão da sentença de adoção nos termos dos artigos 696º do CPC.
Os fundamentos para uma revisão de sentença de adoção são taxativamente indicados no artigo
1990º/1. Dado o regime do artigo 1990º o processo de revisão é muito restrito e por isso difícil de
acontecer. O artigo 1991º regula a legitimidade e prazos para pedir a revisão da sentença de
adoção. Neste processo, o adotado, sendo criança, é representado pelo MP – Artigo 57º/1 RJPA
EXTINÇÃO RETROATIVA DA FILIAÇÃO DECORRENTE DE PMA
Sendo constituída por consentimento, a filiação decorrente de PMA extingue-se por impugnação
de parentalidade, se for provado que não existiu consentimento válido ou que a criança não nasceu
da inseminação para que o consentimento foi prestado – Artigo 20º/4 da LPMA – A parentalidade
de criança nascida por PMA a que recorreu mulher casada ou em união de facto é impugnável
pela pessoa que não tiver consentido no recurso à técnica de PMA pelo seu conjugue ou
companheiro.
▪ É nulo o consentimento não expresso e que não esteja sob forma escrita, perante o médico
responsável – Artigo 14º/1 da LPMA e 220º CC – Aplicam-se ao consentimento as regras
dos negócios jurídicos – E por isso também será nula a declaração de consentimento para
o recurso a PMA, quando faltar a intenção dirigida à admissão da procriação ou intenção
de constituição do vinculo de filiação – Aplica-se analogicamente o artigo 1635º e
1990º/1, alínea a)
▪ É anulável o consentimento prestado por pessoa com menos de 18 anos – Artigo 6º/2 da
LPMA – O consentimento pode ser anulada por incapacidade acidental (1635º, alínea a)
analogicamente)
▪ É anulável o consentimento viciado por erro desculpável e essencial sobre as qualidades
essenciais do filho ou por coação moral, no caso de ser grave o mal com que o declarante
foi ilicitamente ameaçado e justificado o receio da consumação desse mal – Artigos
1636º, 1638º, 1990º/1, alínea c) e d) e 2. – Haverá erro sobre as qualidades da criança se
o consentimento é prestado na suposição que ela terá características semelhantes às dos
beneficiários da PMA quando as mesmas serão diferentes
O regime de anulação do consentimento para a filiação por PMA é mais fechado do que o regime
de anulação da perfilhação. Não poderia ser para menos: A perfilhação é posterior à conceção. O
consentimento na PMA é anterior à conceção podendo ter sido motivação da conceção de uma
criança que deve ver estabelecida quanto a si a filiação.
EXTINÇÃO NÃO RETROATIVA DO VÍNCULO DA FILIAÇÃO EM CASO DE MORTE
Com a morte do pai ou do filho extingue-se o vinculo jurídico de filiação, cessando daí por diante
a generalidade dos efeitos da filiação.

60
O filho conserva o nome que lhe foi dado. Com a morte de um sujeito da relação de filiação, o
outro adquire ainda certos direitos e prerrogativas, que são:
Direito de suceder como herdeiro legitimo e legitimário do de cuiús – Artigos 2133º/1, 2157º
e 1986º/1
▪ O filho é chamado à sucessão do pai na primeira classe de sucessíveis, em eventual
concurso com o conjugue do de cuiús não separado de pessoas e bens;
▪ O pai é chamado à sucessão do filho, na falta de descendentes do falecido, em eventual
concurso com o conjugue do de cuiús – Em caso de concurso, aos pais pertencerão metade
do que legalmente cabe àquele na herança – 2143º/1 e 2157º
Direito à transmissão por morte do arredamento para habitação – Depende dos requisitos do
1106º. Ainda que da letra da lei não se retire esta conclusão, inclui-se aqui a adotação, que é
equiparada ao parentesco, nos termos do artigo 1986º
Direito à indemnização por danos patrimoniais com a morte da vitima e legitimidade para
requerer providencias preventivas ou atenuantes da ofensa à memoria do falecido – Artigo
496º/2 e 3 – Sendo a vitima o pai, cabe ao filho em concurso com o conjugue do de cuiús não
separado de pessoas e bens ou com o companheiro do falecido. Sendo a vitima o filho, a
indemnização cabe ao pai, na falta de descendentes. A legitimidade para requerer providencias
preventivas ou atenuantes da ofensa à memoria do falecido – Artigos 71º/1, 73º, 75º/2, 76º/2,
79º/1
OUTROS CASOS DE NÃO RETROATIVIDADE
A perfilhação, declaração de maternidade, consentimento para PMA (após a conceção) e adoção,
são irrevogáveis. Por conseguinte, além da morte, o único caso de extinção ex nunc da filiação
está associado à adoção – A sentença de adoção extingue a filiação anterior e estabelece a nova.

DIREITO TUTELAR
CAPÍTULO I – PROTEÇÃO DE CRIANÇAS E JOVENS EM PERIGO
A PROTEÇÃO DAS CRIANÇAS
A proteção especial de que a criança deve ser alvo não deve ser sinonimo de diminuição – O
Direito civil deve tratar as crianças como qualquer outro cidadão. A criança detém a generalidade
dos direitos característicos do Direito privado, exceto aqueles que pressupõem o exercício pessoal
com maturidade associada a certa idade.
A incapacidade geral de exercício afeta justamente a criança (122º e 123º CC): A criança é
reconhecida como titular da generalidade dos direitos, mas está, geralmente, impedida de os
exercer pessoalmente. Salvo os casos de emancipação, é aos 18 anos que o individuo ´adquire
plena capacidade de exercício, ficando habilitado a reger a sua pessoa e a dispor dos seus bens`-
Artigo 130º e 133º. Os direitos das crianças, são normalmente exercidos pelos seus pais, que ao
abrigo das responsabilidades parentais se encontram legitimados para os representar – Artigo 124º
e 1878º/1. 7 - ´Ao alcance da criança está a generalidade dos direitos, mas não o direito de
exercer pessoalmente a generalidade dos direitos de que é titular`

7JDP defende ser urgente a formulação de um novo estatuto da criança, pois esta tem de ser encarada como uma pessoa
que apenas excecionalmente não pode exercer alguns dos seus direitos que lhe cabem (devido à ausência de
maturidade), ao invés de ser tratada como alguém que não pode exercer nenhum dos direitos de que é titular (como
sendo alguém completamente afastado da vida jurídica).

61
O artigo 69º CRP consagra o principio da proteção da infância, às quais se reconhece o direito à
proteção da sociedade e do Estado. Fora do Estado, destaca-se a convenção sobre os Direitos da
criança
➢ Proteção civil das crianças
O código civil contem normas sobre proteção civil dos menores:
✓ Normas atinentes às responsabilidades parentais – Ao serviço do interesse do filho;
✓ Normas relativas à inibição do exercício das responsabilidades parentais;
✓ Normas limitativas ao exercício das responsabilidades parentais;
✓ Normas respeitantes aos meios de suprimento das responsabilidades parentais;
✓ Normas que regulam a adoção – visa realizar o superior interesse da criança;

A lei de proteção de crianças e jovens em perigo


A lei a proteção de crianças e jovens afasta se do modelo que via no ser humano com menos de
18 anos, um objeto de proteção. A criança é agora encarada como uma verdadeira pessoa, um
sujeito cujos direitos devem ser respeitados.
A lei de proteção de crianças e jovens admite a proteção do jovem adulto – Artigo 5º, alínea a) e
não exclui a aplicação de medidas pelas comissões de proteção de crianças e jovens em perigo
que são entidades não judiciais.
Esta lei de proteção está vocacionada para a defesa da pessoa da criança, o código civil está
especialmente direcionado para a proteção patrimonial (1920º e 1921º/2 CC). Não obstante, a lei
de proteção não anula a proteção do código civil da esfera predominantemente pessoal dos filhos
menores em perigo – O artigo 1918º é fundamental na proteção cível, diferentemente das medidas
de promoção e proteção promovidas pela lei de proteção.
A lei tutelar educativa prevê a aplicação de medidas educativas a crianças menores de 16 anos
que tenham praticado factos que são qualificados como crime. A lei de proteção visa promover
e assegurar os direitos individuais das crianças e jovens que se encontrem em perigo.
Articulação entre lei de proteção de crianças e jovens em perigo, lei tutelar educativa e regime
geral de processo tutelar cível.
➢ Lei tutelar educativa: Regula situações de crianças entre os 12 e os 16 anos – Art. 1º;
➢ Lei da proteção: Crianças com menos de 12 anos – Todas as crianças com menos de 12
anos podem ser acolhidas numa instituição, ainda que uns tenham praticado crimes e
outros não.
Não há uma separação total entre a intervenção tutelar da proteção da intervenção tutelar
educativa.
A INTERVENÇÃO PARA PROTEÇÃO DA CRIANÇA E DO JOVEM EM PERIGO
O pressuposto da intervenção é fixado pelo artigo 3º/1 da Lei de proteção: A intervenção é
legitima quando os pais, representante legal ou quem tenha a guarda de facto ponham em perigo
a segurança, saúde, formação, educação ou desenvolvimento da criança ou jovem, ou quando esse
perigo resulte de ação ou omissão de terceiros ou da própria criança ou jovem a aqueles que não
se oponham de modo adequado a remove-lo – ou seja, a criança tem de estar numa situação de
perigo imputável aos pais, representante legal ou a quem tenha a sua guarda de facto.
A situação de risco será imputável a estes, quando tenha sido criada por eles ou quando estes não
tenham agido de forma adequada a remover o perigo que foi criado por terceiros ou pela própria
criança.

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O artigo 3º/2 da Lei de proteção contem uma enumeração exemplificativa de situações de perigo:
✓ 3º/2 – Abandono – A criança ou jovem está entregue à sua sorte, totalmente desamparada
e os pais, representante legal ou guardião de facto não manifestam qualquer interesse pelo
seu destino;
✓ 3º/2, alínea b) – Maus tratos – podem ser físicos ou psicológicos |EX.: Ofensas
corporais, humilhações, ameaças, etc.
✓ 3º/2, alínea c) – insuficiência de cuidados parentais/negligencia – Situação em que a
criança ou jovem não recebe os cuidados ou afeição adequados à sua idade e situação
pessoal |EX.: Falta de higiene, alimentação deficiente, ausência de atenção, etc.
A intervenção tutelar de proteção está submetida a princípios que são consagrados no artigo 4º da
Lei de proteção: O primeiro principio é mais uma vez o interesse superior da criança e do jovem
– Mas este interesse está subordinado aos princípios da necessidade e proporcionalidade
A intervenção é desencadeada pela tomada de conhecimento das situações de crianças e jovens
em perigo. Os artigos 64º e seguintes da Lei de proteção regulam a comunicação de situações de
criança e jovens em perigo – as situações de perigo devem ser comunicadas às comissões de
proteção (por autoridades policiais e judiciárias), que por sua vez efetuam as comunicações ao
Ministério público nos casos previstos nos artigos 68º e 69º da Lei de proteção.
Qualquer pessoa que tenha conhecimento de situações de perigo deve comunica-las às entidades
competentes em matéria de infância – comissões de proteção de crianças e jovens ou às
autoridades judiciarias (66º/1 da Lei de proteção). A comunicação é mesmo obrigatória nos casos
de risco de vida, integridade física ou psíquica ou da liberdade de criança ou jovem – 66º/2 lei de
proteção)
O artigo 6º da lei de proteção dispõe que a intervenção tutelar cabe às entidades com competência
em matéria de infância e juventude, comissões de proteção de crianças e jovens e tribunais.
Também o Ministério Público tem papel de grande relevância – Artigo 72º/1 da Lei de proteção.
A intervenção de entidades com competência em matéria de infância e juventude (como as
escolas) é efetuada consensualmente com os pais, representantes legais ou com quem tenha a
guarda de facto da criança ou jovem – Artigo 7º da Lei de proteção. Estas entidades não podem
aplicar medidas que sejam exclusivas das comissões de proteção de crianças e jovens e aos
tribunais – Artigo 38º da lei de proteção.
Os artigos 12º e seguintes da lei de proteção regulam a natureza, competência, composição e
funcionamento das comissões de proteção de crianças e jovens – Estas comissões podem aplicar
todas as medidas de promoção e proteção, exceto a medida de confiança a pessoa selecionada
para adoção, família de acolhimento ou instituição com vista à adoção, que está reservada para os
tribunais (38º Lei de proteção)
Principio da subsidiariedade – Artigo 4º, alínea k) da Lei de proteção – Apenas em ultima
instância se admite a intervenção judicial. Assim, as comissões de proteção tem posição de
entidades privilegiadas no sistema de proteção das crianças e jovens em perigo.
Mas dado o carater não judicial das comissões, a sua autoridade tem de ser aceite pelos
interessados sendo exigido o consentimento expresso dos pais, do representante legal ou da pessoa
que tenha a guarda de facto da criança – Artigo 9º da Lei de proteção – e a não oposição da criança
ou jovem com idade igual ou superior a 12 anos ou da criança com menos de 12 anos que
compreenda o sentido da intervenção – Artigo 10º.
A intervenção do MP é disciplinada pelos artigos 72º e seguintes da lei de proteção. Este mesmo
artigo 72º confere competência ao MP para fiscalizar a atividade das comissões de proteção para

63
propor ações ou usar de quaisquer meios judiciais necessários à proteção das crianças e jovens
em perigo.
Apenas os tribunais podem aplicar a medida de confiança a pessoa selecionada para adoção, a
família de acolhimento ou instituição com vista à adoção – 38º da Lei de proteção.
MEDIDAS DE PROMOÇÃO DOS DIREITOS E DE PROTEÇÃO DAS CRIANÇAS E
DOS JOVENS EM PERIGO
Detetada uma situação de perigo, a intervenção pode concretizar-se na aplicação de alguma das
medidas do artigo 35º/1 da lei de proteção. Este elenco é taxativo, a menos que exista ´perigo
atual ou iminente para a vida ou de grave comprometimento da integridade física da criança ou
do jovem `:
➢ Apoio junto dos pais: Artigo 39º da lei de proteção. A palavra pais abrange os pais,
representante legal ou pessoa que tenha a guarda de facto da criança ou jovem pelo que
esta medida também pode ser aplicada junto do representante legal ou da pessoa que tenha
a guarda de facto;
➢ Apoio junto de outro familiar: Artigo 40º da lei de proteção.
➢ Confiança a pessoa idónea: Artigo 43º da lei de proteção;
➢ Apoio para a autonomia da vida: Artigo 45º da lei de proteção;
➢ Acolhimento familiar: Artigo 46º da lei de proteção. Esta confiança apenas pode ser
atribuída a pessoas que não tenham qualquer relação de parentesco com a criança ou
jovem e que não sejam candidatos à adoção
➢ Acolhimento residencial: Artigo 49º e ss. da lei de proteção;
➢ Confiança a pessoa selecionada para a adoção, a família de acolhimento ou a
instituição com vista à adoção: Artigo 38º - A da lei de proteção.
▪ Esta medida tem como efeito a inibição dos pais do exercício das
responsabilidades parentais ( 1978º - A), levando ainda à designação de um
curador provisório até ser decretada a adoção ou instituída outra medida (Artigo
62º/3 da lei de proteção)
A preparação deste diploma revela o caráter excecional da intervenção para a proteção, pois esta
implica restrições a direitos fundamentais dos pais – como ao direito à educação e manutenção
dos filhos – mas também aos direitos fundamentais dos filhos – liberdade e autodeterminação
pessoal. Também por isso é que a lei de proteção submete a intervenção para a proteção aos
princípios da necessidade e proporcionalidade que estão associados às restrições de direitos
fundamentais (artigo 18º/2 CRP)
O artigo 35º/2 da Lei de proteção distingue ainda:
➢ Medidas de promoção e proteção a executar em meio natural de vida: Apoio junto dos
pais; apoio junto de outro familiar; confiança a pessoa idónea; apoio para a autonomia de
vida; confiança a pessoa selecionada para a adoção;
No âmbito deste tipo de medidas são prestados apoios psicopedagógicos, sociais e económicos:
▪ Apoio psicopedagógico: Consiste na intervenção de natureza psicológica e pedagógica
que tenha em conta as diferentes etapas de desenvolvimento da criança ou do jovem e o
respetivo contexto familiar e que visa, nomeadamente, promover o desenvolvimento1
integral da criança ou do jovem – Artigo 11º do DL nº 12/2008, de 17 de janeiro
▪ Apoio social: Envolve recursos comunitários, tendo em vista contribuir para o
desenvolvimento integral da criança ou jovem e para a satisfação das necessidades sociais
do agregados – Artigo 12º do DL nº 12º/2008, de 17 de janeiro;

64
▪ Apoio económico: Atribuição de prestação pecuniária ao agregado familiar com quem a
criança ou jovem reside, tendo como fundamento a necessidade de garantir os cuidados
adequados ao desenvolvimento integral da criança ou jovem – Artigo 13º do DL nº
12/2008, de 17 de janeiro

➢ Medidas de promoção e proteção a executar em regime de colocação: acolhimento


familiar; acolhimento residencial; confiança a família de acolhimento ou a instituição
com vista à adoção;
Do artigo 36º sobressai outra distinção:
➢ Medidas decorrentes de negociação: Acordo de promoção e proteção em que existe o
consentimento dos pais, do representante legal ou da pessoa com a guarda de facto da
criança ou jovem e o consentimento da criança ou jovem com mais de 12 anos.
A noção de acordo de promoção e proteção é dada pelo artigo 5º alínea f) da lei de proteção e
regulado no artigo 55º e seguintes da mesma lei
As medidas aplicadas pelas comissões, são necessariamente negociadas. As aplicadas pelos
tribunais podem ou não ser negociadas (podem ser impostas).
Princípios a ter em conta na aplicação de medidas: Princípios da necessidade, proporcionalidade
e prevalência da família

O principio da prevalência da família oferece preferência às medidas que integrem a criança ou
jovem na sua família ou que promovam a sua adoção ou outra forma de integração familiar estável
– Artigo 4º, alínea g) da lei de proteção.
Os outros princípios privilegiam as medidas que afetem o menos possível a vida da criança ou do
jovem e da sua família.

Execução, duração, revisão e cessação das medidas de promoção e proteção


Quanto à execução – Artigo 59º da lei de proteção
Duração – Artigo 60º e ss. da lei de proteção
Revisão das medidas – Artigo 62º da lei de proteção
Cessação – Artigo 63º da lei de proteção
As disposições quanto ao processo de promoção e proteção instaurados nas comissões são
previstas nos artigos 77º a 90º da lei de proteção. O processo é regulado especialmente nos artigos
93º a 99º da lei de proteção.

APADRINHAMENTO CIVIL
O artigo 2º da LAC define apadrinhamento civil. Esta é uma relação que pressupõe duas partes:
O afilhado, criança ou jovem e o padrinho ou padrinhos, pessoa singular ou membros de uma
família. Os terceiros serão os pais do afilhado.

O apadrinhamento civil constitui-se por decisão judicial ou compromisso de apadrinhamento


homologado pelo tribunal – Artigo 13º - A formação do apadrinhamento está dependente de
vários requisitos:

65
▪ Quanto ao afilhado: Artigo 5º LAC
▪ Quanto aos padrinhos – Artigo 4º LAC (e 12º)
▪ Quanto a terceiros – Artigo 14º/1 alínea b) e ss. exige o consentimento destas pessoas
enumeradas.

O apadrinhamento civil visa, essencialmente, criança que esteja a beneficiar de medida de


acolhimento residencial ou outra medida de proteção ou que esteja em perigo confirmado por
processo judicial

O processo pode ser constituído oficiosamente pelo tribunal ou poder ser da iniciativa das
pessoas e entidades do artigo 10º da LAC

EFEITOS DO APADRINHAMENTO CIVIL

O principal efeito é a atribuição de responsabilidades parentais aos padrinhos – Artigo 7º da LAC


– Por força deste mesmo artigo, e no exercício dessas responsabilidades, os padrinhos estão
sujeitos às limitações previstas no compromisso de apadrinhamento civil, na decisão judicial que
constituiu o apadrinhamento e a algumas das restrições que recaem sobre o tutor na
administração do património do menor.

Inicialmente a relação de apadrinhamento é acompanhada por uma entidade, processo esse


regulado no artigo 20º da LAC

O apadrinhamento origina ainda a obrigação de alimentos e um impedimento matrimonial –


Artigos 21º e 22º, respetivamente.

O apadrinhamento civil não extingue a relação entre afilhado e pais. Ainda que estes não
exerçam as responsabilidades parentais, beneficiam, em regra, dos direitos designados no artigo
8º da LAC.

A relação entre padrinhos e pais pautam-se pelos princípios consignados no artigo 9º da LAC.

EXTINÇÃO DO APADRINHAMENTO CIVIL

De acordo com o 24º o apadrinhamento civil é permanente que apenas se extingue se revogado.
Não obstante, o apadrinhamento civil extingue-se com a morte dos padrinhos ou do afilhado,
sendo que nenhum é sucessível legal do outro.

A revogação extingue o apadrinhamento civil e é feita por decisão do tribunal nos termos do
artigo 25º/2 da LAC. Esta revogação está sujeita a registo obrigatório – 1º/1, alínea i) do CRC
que é efetuado imediata e oficiosamente pelo tribunal que a decidiu – Artigo 28º/1 LAC.

No caso de revogação contrária à vontade dos padrinhos e sem culpa destes, são lhes
reconhecidos direitos – Artigo 26º LAC.

O casamento entre sujeitos ligados pelo vinculo de apadrinhamento civil extingue este vinculo
– Há incompatibilidade entre a relação de apadrinhamento e a relação conjugal, prevalecendo
a ultima: o casamento é válido, ainda que tenha sido contraído sem dispensa do impedimento
de apadrinhamento – Artigo 22º/1 da LAC e 1631º, alínea a) CC.

NATUREZA JURÍDICA DO APADRINHAMENTO CIVIL

O apadrinhamento civil será menos que a adoção: Não confere direitos sucessórios legais, ao
contrário do que sucede com o vinculo de adoção, e o padrinho enfrenta mais restrições do que
os pais e os adotantes quanto à administração do património da criança (artigo 7º LAC)

66
Mas será mais em relação à tutela: O apadrinhamento impede a instauração da tutela e poe fim
à relação tutelar já existente. Não se extingue pelo facto de o afilhado atingir a maioridade (a
tutela, em principio, cessa com a maioridade do pupilo)

Assim: A intervenção do Estado na constituição e revogação do vinculo, a duração e a finalidade


da integração familiar permite considerar o apadrinhamento civil uma nova relação familiar
inominada

PROTEÇÃO DOS IDOSOS


Os idosos são alvo de proteção constitucional: Artigos 67º/2, 72º/1 e 72º/2 CRP.
Ao contrário daquilo acontece com os jovens, os idosos não têm uma lei para sua proteção ainda
que possam estar sujeitos às mesmas condições de perigo que os jovens.
JDP não compreende a falta de um modelo de defesa dos idosos, que seja densificado no direito
civil
O professor Jorge Duarte pinheiro entende que se podem estender aos idosos as normas
reguladoras dos deveres paternofiliais e da obrigação de alimentos: Os deveres de respeito, auxilio
e assistência do artigo 1874º que devem ser garantidos pelos filhos de forma a proteger os pais
que são idosos – Assim, uma pessoa pode estar vinculada a deveres perante três categorias
familiares: Conjugue, filhos e pais.
Do mesmo modo, um idoso que necessite de alimentos pode exigi-los aos filhos e demais
descendentes nos termos do artigo 2009º/1 alínea b) – Esta obrigação de prestar alimentos decorre
também do dever paternofilial de assistência, quando pais e filhos não vivam em comum (1874º/2)
Não obstante, no caso dos filhos ou descendentes não prestarem alimentos, não é comum os idosos
exigirem judicialmente essa prestação
Acolhimento familiar de pessoas idosas
O DL nº 391/91, de 10 de Outubro regula o acolhimento familiar de pessoas idosas ou com
deficiência. Este acolhimento é prestado necessariamente a titulo oneroso – Artigo 1º/3 desse
mesmo DL

DIREITO MATRIMONIAL
CAP. I – CONSTITUIÇÃO DO VÍNCULO
_____________________________________________________________________________
Artigo 1577º
Noção de casamento
Casamento é o contrato celebrado entre duas pessoas que pretendem constituir família mediante
uma plena comunhão de vida, nos termos das disposições do código civil
_____________________________________________________________________________
O casamento tem como características: Contratualidade; assunção do compromisso reciproco de
plena comunhão de vida; pessoalidade e solenidade.
É ou não o casamento um contrato ?
▪ Alguns negam carater contratual ao casamento, qualificando-o como um ato jurídico em
sentido estrito: Não há liberdade de estipulação das partes.
▪ JDP parece considerar o casamento como um contrato: A intervenção do conservador do
registo civil é similar à do notário aquando da celebração de um contrato de compra e

67
venda. Ainda que existam efeitos do casamento que são imperativos, as partes gozam de
alguma autonomia: Podem decidir quando e com quem querem casas, podem estipular
acerca do modo como exercerão os deveres conjugais legalmente impostos, mediante
acordo. A relevância da simulação enquanto vicio (1635º, alínea d) confirma a natureza
negocial do mesmo: A validade do casamento é suscetível de ser prejudicada caso os
nubentes não queiram submeter-se aos efeitos essenciais do ato que praticaram.
 Os efeitos pessoais do casamento (como os do 1672º) não afastam o caráter
contratual do casamento, pois o contrato não é uma figura exclusivamente
patrimonial.
 O casamento tem de ser celebrado em conformidade com as disposições do
código civil – É um contrato pessoal e solene. É pessoal porque para se realizar
é indispensável a presença dos nubentes (ou do procurador do outro – este
procurador tem poderes ilimitados – 1616º, alínea a) e 1620º). É também solene
porque se sujeita a forma especial – 1615º
O casamento implica o assumir de um compromisso reciproco: Compromisso de plena comunhão
de vida – Esta plena comunhão de vida traduz-se em deveres específicos – Artigo 1672º - Deveres
de respeito, fidelidade, coabitação, cooperação e assistência.

MODALIDADES DO CASAMENTO:
Alem do casamento sob forma civil, há ainda o casamento católico: A lei reconhece valor e
eficácia a este casamento 8 Reconhece-se eficácia a esta modalidade de casamento quanto a
aspetos que não sejam meramente formais. | Assim, e nos termos do 1626º CC:
▪ As decisões de autoridades eclesiásticas quanto à nulidade do casamento e à dispensa
pontifícia do casamento rato e não consumado podem produzir efeitos civis.
▪ Aplicam o direito canónico aos requisitos de validade do matrimónio católico – Matéria
de forma como da possibilidade legal, heterossexualidade, capacidade e consenso dos
contraentes
Quanto aos outros casamente religiosos não católicos – Não há norma semelhante, e ainda que se
reconheça efeitos civis a esses (artigo 19º/1 da Liberdade religiosa) eles estão submetidos ao
regime do casamento civil, exceto alguns aspetos de forma)
Atualmente, em Portugal, o Estado admite eficácia do direito da igreja ou comunidade religiosa
em aspetos que não são meramente formais – o casamento civil e o religioso são duas formas ou
modalidades diferentes. Atualmente o casamento civil é facultativo para todos os membros da
igreja ou comunidades religiosas no país. Assim, o casamento civil e o casamento católico são
dois institutos diferentes. Não obstante, o casamento religioso não católico carece de autonomia
enquanto modalidade, integrando-se no casamento civil que tem assim duas formas: a civil e a
religiosa. As partes podem escolher entre:
➢ Casamento civil celebrado por forma civil – perante conservador do registo civil;
➢ Casamento civil celebrado por forma religiosa – perante ministro de culto de uma
igreja ou comunidade religiosa radicada em Portugal;
➢ Casamento católico – celebrado perante pároco;
Os sistemas matrimoniais existentes são:
➢ Sistema de casamento religioso obrigatório: O Estado apenas reconhece eficácia civil
aos casamentos celebrados por forma religiosa;

8
Cânones 1055 e seguintes do código de direito canónico. E concordata entre a República portuguesa e a
santa sé, de 2004.

68
➢ Sistema de casamento civil obrigatório: Casamento religioso não produz efeitos,
apenas tem relevância jurídica o casamento civil, celebrado segundo a forma consagrada
na lei
➢ Sistema de casamento civil facultativo: Tanto surte efeito o casamento civil como o
casamento celebrado por forma religiosa – os nubentes podem escolher entre a forma
laica e a forma religiosa
 1ª variante: O Estado apenas reconhece um regime particular ao casamento
religioso nos aspetos formais – Em tudo o resto se aplica a lei civil;
 2ª variante: O Estado admite a eficácia do direito da igreja ou comunidade
religiosa em aspetos que não são meramente formais
➢ Sistema de casamento civil subsidiário: O Estado reconhece o casamento religioso,
apenas admitindo o casamento laico para os casos em que é considerado legitimo pelo
direito da igreja ou da comunidade religiosa.
Atualmente, em Portugal vigora o sistema de casamento civil facultativo de 2ª variante: o
casamento religioso não católico carece de autonomia enquanto modalidade, integrando-se no
casamento civil, que comporta, assim, duas formas: a civil e a religiosa. As partes podem escolher
entre o casamento civil celebrado por forma civil (perante conservador do registo civil),
casamento civil celebrado por forma religiosa (perante ministro do culto de uma igreja ou
comunidade religiosa radicada em Portugal) e o casamento católico (celebrado perante pároco)
PROMESSA DE CASAMENTO
Promessa de casamento = esponsais ou desposórios
A promessa de casamento é o contrato pelo qual duas pessoas se comprometem a contrair
matrimónio – Artigo 1591º - A este contrato, na falta de disposições especificas (1591º a 1595º)
aplica-se o regime geral do contrato promessa (do livro de obrigações) e, em seguida, as regras
gerais dos negócios jurídicos.
▪ Aplica-se, por exemplo, o 410º/1 – À luz deste, a capacidade exigida para a promessa de
casamento é a mesmo requerida para a celebração do casamento
▪ Quanto ao consentimento – Aplicam-se as regras gerais dos negócios jurídicos, pois as
regras especiais do casamento em matéria de falta ou vícios de vontade destinam-se a
garantir a estabilidade de um matrimonio que já foi celebrado.
▪ Ao contrario do casamento, a promessa pode ser submetida a condição ou termo (ex.: à
condição de obter determinada colocação profissional)
▪ O objeto da promessa deve ser legalmente possível – Artigo 280º/1
▪ A validade da promessa não depende de forma especial – Artigo 219º, não se impondo
forma expressa – Artigo 217º
São exemplos de celebração de contrato promessa de casamento: O pedido de casamento aceite;
A oferta de anel de noivado a um do namorados, que o recebe e coloca no dedo; a declaração para
casamento proferida no processo preliminar (artigos 135º a 137º do CRC); a outorga de convenção
antenupcial na qualidade de nubente (artigo 1698º)
Efeitos
As partes ficam vinculadas a casar uma com a outra – Mas não é possível obter execução
especifica da promessa – Artigo 1591º e 830º. Em caso de incumprimento apenas se confere o
direito às indemnizações previstas no artigo 1594º
▪ A obrigação de indemnizar restringe-se às despesas feitas e às obrigações contraídas na
previsão de casamento – Só é indemnizável uma parte dos danos patrimoniais

69
emergentes, o que consubstancia uma limitação à extensão da obrigação geral de
indemnizar
 A indemnização é fixada segundo arbítrio do juiz – Artigo 1594º/3 – Mais um
desvio ao regime geral da responsabilidade civil – Ainda que exista dolo do
agente, o montante a indemnizar poderá ser inferior ao valor das despesas feitas
e das obrigações contraídas na previsão do casamento.
 A ação de indemnização caduca no prazo de 1 ano a partir da data de rompimento
da promessa – Artigo 1595º
Em caso de rompimento os contraentes são obrigados a restituir os donativo que lhes foram feitos
em virtude da promessa e expectativa do casamento segundo os termos dos preceitos para a
nulidade ou anulabilidade do negócio jurídico – Artigo 1592º/1 o numero 2 explica aquilo que
envolve a obrigação de devolução. No caso de extinção deste contrato por morte de um dos
promitentes cabe aquele que está vivo optar entre conservar os donativos do falecido ou exigir
aqueles que lhe tenha feito – Artigo 1593/1- derivado ao cariz intimo de alguns donativos, o
promitente sobrevivo pode reter a correspondência e os retratos pessoais do falecido e exigir a
restituição das cartas e retratos pessoais que lhe tenha oferecido – 1593º/2.
REQUISITOS DO CASAMENTO
As principais quatro revoluções do direito matrimonial foram:
➢ A consagração da possibilidade de casamento civil – pelo código civil de 1867º;
➢ Admissão do divórcio na legislação republicana de 1910;
➢ Consagração do principio da igualdade entre marido e mulher – fruto da CRP de 1976º e
da reforma do CC de 1977º;
➢ Permissão do casamento civil entre 2 pessoas do mesmo sexo – Lei nº 9/2010, de 31 de
maio;
---------- CAPACIDADE
Têm capacidade para contrair casamento todos aqueles em que não se verifique algum dos
impedimento – Artigo 1600º
As proibições de casar, isto é, os impedimento, são típicos: Apenas impedem de casar, aqueles
que estão previsto na lei, e o momento da observação desses impedimento é o momento da
cerimonia do casamento- existindo, o casamento não deve ser celebrado – A não observância das
regras sobre impedimentos pode acarretar:
▪ A anulabilidade do ato – 1631º, alínea a)
▪ Aplicação de sanções especiais com caráter patrimonial – Artigos 1649º e 1650º, 22º/3
LAC
▪ Sujeição a responsabilidade civil, penal e disciplinar do funcionário do registo civil –
Artigos 294º e 297º alíneas b) e c) do CRC;
Classificação dos impedimentos:
➢ Nominados: Designados como impedimentos pela própria lei – Artigos 1601º, 1602º e
1604º CC e 22º/1 LAC
➢ Inominados: Restantes. Vinculo de adoção e de filiação por PMA heteróloga, bem como
o matrimonio religioso anterior não dissolvido, quando as mesmas partes pretendam
voltar a casar entre si mediante outra forma de casamento – 1589º/2

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A classificação mais importante é:
➢ Impedimentos dirimentes Se se verificarem o casamento é anulável – 1631º, alínea a) |
Podem ser:
▪ Absolutos: obstam à celebração de um casamento por uma pessoa com qualquer
outra. Aquela pessoa em especifico não pode casar seja com quem for
▪ Relativos: Aqueles que obstam à realização de um casamento entre certas
pessoas – Aquelas duas pessoas não podem casar entre si, mas podem casar com
qualquer outra pessoa.
➢ Impedimentos impedientes
Há ainda impedimentos suscetíveis de dispensa e outros insuscetíveis:
➢ Impedimentos dispensáveis: Não obstam ao casamento no caso de existir autorização
de uma autoridade. Apenas são dispensáveis alguns impedimentos impedientes – Artigo
1609º/1 e seguintes
➢ Impedimentos indispensáveis; Não permitem a celebração do casamento
independentemente de qualquer pedido de autorização. São indispensáveis, todos os
impedimentos dirimentes.
IMPEDIMENTOS DIRIMENTES
O casamento celebrado verificando-se algum impedimento dirimente, é anulável (1631º, alínea
a). A anulação tem de ser decretada pelo tribunal – 1632º.
Segundo o 1639º têm legitimidade para intentar a ação:
▪ Conjugues
▪ Parentes em linha reta ou até ao 4º grau na linha colateral
▪ Herdeiros e adotantes dos conjugues
▪ Ministério público – Esta legitimidade do MP revela que a consagração deste
impedimentos é a proteção de interesses públicos e não de interesses particulares
À partida a ação de anulação fundada em impedimentos dirimentes deve ser instaurada até 6
meses depois da dissolução do casamento – Artigo 1643º/1 alínea c). O Ministério público só
pode propor a ação até à dissolução do casamento - 1643º/2
Admite-se a convalidação do casamento contraído com impedimentos dirimentes absolutos mas
não com impedimentos dirimentes relativos – Artigos 1633º/1, alínea a), b) e c)
Os impedimentos dirimentes absolutos são enumerados no artigo 1601º
_____________________________________________________________________________
Artigo 1601º
Impedimentos dirimentes absolutos
São impedimentos dirimentes, obstando ao casamento da pessoa a quem respeitam com qualquer
outra:
a) A idade inferir a dezasseis anos;
b) A demência notória, mesmo durante os intervalos lúcidos, e a decisão de
acompanhamento, quando a sentença respetiva assim o determine;
c) O casamento anterior não dissolvido, católico ou civil, ainda que o respetivo assento não
tenha sido lavrado no registo do estado civil.
_____________________________________________________________________________
❖ casamento celebrado com falta de idade nupcial - contraído por um dos nubentes
sem 16 anos, aplicam-se as regras especiais quanto a legitimidade e prazo para a anulação

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– Além das pessoas mencionadas no 1639º/1 pode intentar ou prosseguir a ação o tutor
do menor – 1639º/2 :´
▪ Até 6 meses após ter atingido a maioridade, se instaurada pelo próprio;
▪ Até 3 anos depois da celebração do casamento, quando proposta por outro, mas nunca
depois de ter sido atingido a maioridade
Considera-se a anulabilidade sanada se, antes de transitar em julgado a sentença de anulação, o
casamento de menor não núbil for confirmado por este, perante funcionário do registo civil e duas
testemunhas, depois de atingida a maioridade – 1633º/1, alínea a)
❖ impedimento dirimente absoluto por demência de maior acompanhado (quando a
sentença o determine) – Por demência entende-se qualquer anomalia psíquica que torne
uma pessoa incapaz de reger convenientemente a sua pessoa ou património. Para que
possa obstar ao casamento, a demência tem de ser notória e habitual. Assim, é notória a
demência certa, inequívoca e não duvidosa.
Entende JDP que o requisito de notoriedade não se refere ao conhecimento ou cognoscibilidade
da anomalia mental – Assim, a demência notória impede o casamento mesmo que tenha sido
celebrado num intervalo lúcido, e só releva aquela demência notória que é habitual pois o
tratamento da demência acidental, ou não permanente, cabe no âmbito do consentimento
matrimonial (1635º, alínea a)
❖ Impedimento dirimente absoluto por casamento anterior não dissolvido
Pretende-se evitar a bigamia (punida criminalmente – artigo 247º CP). Assim o casamento não
pode acontecer enquanto não existir dissolução do anterior.
O impedimento cessará com a dissolução do casamento anterior, que pode ocorrer por morte ou
divórcio. Ainda que a declaração de morte presumida não dissolva o casamento (115º), o 116º
não consagra um casamento sob bigamia pois o novo casamento leva à dissolução do anterior
Este impedimento não existe se o primeiro casamento for juridicamente inexistente (1630º/1) ou
se tiver sido declarado nulo ou anulado por sentença transitada em julgado antes da celebração do
novo.
No intentar da ação: 1639º/1 e 2 e ver disposição especial: 1643º/3. O 2º casamento convalida-se
com a declaração de nulidade ou anulação do primeiro – 1633º/1, alínea c)
Os impedimentos dirimentes relativos são enumerados no artigo 1602º:
_____________________________________________________________________________
Artigo 1602º
Impedimentos dirimentes relativos
São também dirimentes, obstando ao casamento entre si das pessoas a quem respeitam, os
impedimentos seguintes:
a) O parentesco na linha recta;
b) A relação anterior de responsabilidades parentais;
c) O parentesco no segundo grau da linha colateral;
d) A afinidade na linha recta;
e) A condenação anterior de um dos nubentes, como autor ou cúmplice, por homicídio
doloso, ainda que não consumado, contra o cônjuge do outro.
_____________________________________________________________________________
Ainda que a adoção extinga normalmente as relações familiares entre o adotado e ascendentes e
colaterais naturais, mantêm-se os impedimentos de parentesco e afinidade derivados da ligação
biológica (artigo 1986º/1 parte final. Por força do 1986º/1 primeira parte, o adotado adquire a

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situação de filho do adotante e é tido como seu descendente – Há assim impedimento dirimente
quanto ao casamento do adotado e descendentes com o adotante e seus ascendentes – Artigo 1602º
alínea a), c) e d) – Havendo adoção, o adotado e descendentes têm de respeitar os impedimentos
de parentesco e afinidade tanto à família biológica como da adotiva.
Também a filiação por PMA heteróloga é um impedimento inominado por aplicação analógica
do regime dos efeitos da filiação biológica – Assim, há impedimento dirimente ao casamento
entre sujeitos da relação de filiação por PMA heteróloga entre:
▪ Qualquer destes dois sujeitos e os descendentes ou ascendentes do outro – 1602, alínea
a);
▪ Do filho por PMA heteróloga com os filhos biológicos do seu pai – 1602, alínea c);
▪ Do filho por PMA heteróloga com aquele que foi conjugue do filho – 1602º alínea d);
▪ De acordo com o artigo 15 da LPMA não é permitido o casamento entre filho por PMA
heteróloga e dador
Impedimentos dirimentes relativos ao parentesco, afinidade, filiação por PMA heteróloga e
adoção asseguram a proibição de incesto ou pratica de atos sexuais entre familiares próximos
O artigo 1603º/1 revela que os impedimentos de parentesco e afinidade contam como tal ainda
que a filiação não esteja estabelecida – É uma exceção ao principio da atendibilidade apenas da
filiação legalmente constituída – Artigo 1797º/1 – O parentesco que venha a ser reconhecido
neste processo preliminar de casamento, ou na ação de declaração de nulidade ou anulação do
casamento, não produz efeitos fora deste âmbito – não vale como prova para ação de investigação
de maternidade ou paternidade: Desvio ao principio da indivisibilidade do estado – uma pessoa
pode ser considerada filha de outrem no que toca à celebração do casamento e já não ser
considerada como tal para outros aspetos (deveres paternofiliais, sucessão legal, etc.).
Este artigo 1603º/1 aplica-se na totalidade à filiação biológica do adotado. JDP defende que o
artigo 1987º deve ser alvo de uma interpretação restritiva para os casos de adoção, na parte em
que determina que não é possível fazer prova da filiação natural, fora do processo preliminar de
casamento: É admissível a prova da filiação biológica do adotado na ação de declaração de
nulidade ou anulação do casamento fundada num dos impedimentos previstos nas alíneas a), c) e
d) do artigo 1602 – se assim não fosse e tendo celebrado o casamento (por exemplo entre um
adotado e o seu pai natural, a ligação biológica não detetada no decorrer do processo preliminar
de casamento, não poderia ser invocada para se conseguir a invalidação da constituição do vinculo
matrimonial).
1602º, alínea b) – Relação anterior de responsabilidades parentais (como o exercício por terceiros,
nos termos do 1903º, 1904º e 1904º - A)
O impedimento da alínea e) – condenação de um dos nubentes por homicídio doloso contra o
cônjugue do outro – Existe quando um nubente tenha sido condenado, como autor ou cúmplice
por homicídio ou tentativa de homicídio ainda que esse crime não tenha sido cometido com a
intenção de permitir o casamento do agente com o conjugue da vitima Este impedimento apenas
produz efeitos quando já tenha transitado em julgado a sentença de condenação por homicídio –
A condenação anterior por sentença que ainda não transitou em julgado desencadeia um
impedimento meramente impediente que consta no artigo 1604º, alínea f)

Este impedimento, no entendimento de JDP, não se funda numa tentativa de punição daquele que
foi condenado pelo homicídio ou tentativa (pois esse impedimento, aparentemente perpétuo,
suscitaria duvidas de constitucionalidade em relação ao artigo 30º/1 e 2 CRP). Este impedimento

73
funda-se antes na censurabilidade social e ética de um casamento celebrado por alguém com o
assassino do seu conjugue
IMPEDIMENTOS IMPEDIENTES
Ainda que obstem ao casamento, não o tornam anulável se ele se celebrar – Aquilo que, no
máximo poderá acontecer, é que uma das partes sofrerá uma sanção de caráter patrimonial –
Artigos 1649º e 1650º CC e 22º/3 da LAC.
O artigo 1604º enumera os impedimentos impedientes:
_____________________________________________________________________________
Artigo 1604º
Impedimentos impedientes
São impedimentos impedientes, além de outros designados em leis especiais:
a) A falta de autorização dos pais ou do tutor para o casamento do nubente menor, quando
não suprida pelo conservador do registo civil;
b) (Revogada);
c) O parentesco no terceiro grau da linha colateral;
d) O vínculo de tutela, acompanhamento de maior ou administração legal de bens;
e) (Revogada);
f) A pronúncia do nubente pelo crime de homicídio doloso, ainda que não consumado,
contra o cônjuge do outro, enquanto não houver despronúncia ou absolvição por decisão
passada em julgado.
_____________________________________________________________________________

A estes há que acrescentar os contidos em lei especial: Vínculo de apadrinhamento civil – Artigo
22º/1 LAC e um outro que está contido no artigo 1589º/2 que é o impedimento do casamento civil
de duas pessoas unidas entre si por matrimonio católico anterior não dissolvido

O impedimento da falta de autorização é absoluto todos os outros são relativos

❖ Falta de autorização dos pais ou tutor – alínea a) – Refere-se a menores com 16


ou 17 anos ( menos de 16 anos é impedimento dirimente).

A autorização cabe aos pais que exerçam as responsabilidades parentais ou ao tutor (1612º/1) e
deve ser concedida antes da celebração do casamento ou na própria cerimonia. A pedido do
menor, o conservador pode suprir essa autorização se existirem razoes ponderosas que justifiquem
a celebração do casamento (1612º/2)

O menor que case sem a devida autorização, não fica completamente emancipado (133º) – Nos
termos do 1649º os bens que ele leve para o casal ou que depois adquira por titulo gratuito são
administrados pelos pais, tutor ou administrado legal até que atinja a maioridade e não respondem,
em nenhum caso, pelas dividas contraídas por um ou ambos os conjugues durante o período de
menoridade – Não obstante, dos rendimentos desses bens serão retirados ao menor os alimentos
necessários ao seu Estado.

❖ Alínea b) agora revogada: Impedimento do prazo internupcial

Impedia o casamento daquele com matrimonio anterior dissolvido, declarado nulo ou anulado,
enquanto não tivessem decorrido 180 ou 300 dias conforme se tratasse de homem ou mulher –
Aquele que não respeitasse este prazo perdia todos os bens que tivesse recebido por doação ou
testamento do seu primeiro conjugue

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JDP parabeniza a revogação deste artigo pois era uma restrição ao direito fundamental de contrair
casamento, restrição esse que não cumpria os requisitos do artigo 18º/2 CRP

❖ Parentesco no 3º grau da linha colateral, vinculo de tutela, acompanhamento de


maior ou administração de bens e vinculo de apadrinhamento civil

São os únicos suscetíveis de dispensa – Se essa dispensa existir, o casamento passa a ser licito e
não existe a aplicação de qualquer sanção. Não havendo dispensa podem existir sanções para um
dos conjugues – sanção de indisponibilidade relativa – Artigo 1650º/2 (tratando-se de um caso de
apadrinhamento civil – Artigos 22º/3 LAC)

O parentesco no 3º grau da linha colateral obsta ao casamento entre tios e sobrinhos – Proibição
aplica-se ao casamento entre um adotado e descendentes com tios e sobrinhos biológicos. Este
mesmo impedimento apenas existirá quando existir estabelecimento legal do parentesco.
Seguindo o artigo 1986º/1 o impedimento do parentesco do 3º grau da linha colateral, pensado
para a família biológica, é alargado à família adotiva

A infração para o casamento celebrado indevidamente será assim a prevista no artigo 1650º/2 –
A sanção não será aplicada no caso de adoção, se se tratar de parentesco natural não detetado no
processo preliminar de casamento (1987º)

O vinculo de tutela, acompanhamento de maior ou administração legal de bens obsta ao


casamento entre o incapaz e as pessoas elencadas no artigo 1608º - A violação desta proibição de
casar é sancionada com a indisponibilidade relativa do artigo 1650º/2

CONSENTIMENTO

O contrato de casamento exige o mutuo consentimento das partes que tem de ser exteriorizado no
próprio ato – Principio da atualidade do consentimento matrimonial consagrado no artigo 1617º

Artigo 1619º: Principio do carater pessoal do consentimento, do qual resulta a necessidade da


vontade de contrariar matrimonio ser manifestada pelos próprios nubentes. A representação
apenas será licita quando admitido o instituto do casamento por procuração. O casamento em que
tenha faltado a declaração de vontade de um ou ambos os nubentes ou procurador é juridicamente
inexistente nos termos do artigo 1628º, alínea c)

O consentimento deve ser puro e simples – Artigo 1618º - A vontade importa aceitação de todos
os efeitos legais do matrimónio, exceto daqueles que podem ser objeto de convenção antenupcial
(1698º) – As estipulações dos nubentes que pretendam modificar os efeitos injuntivos do
casamento ou submete-los a condição ou termo, são irrelevantes, considerando-se que o
casamento é válido como se tivesse sido puro e simples o consentimento prestado.

À declaração prestada deve estar subjacente a vontade de contrair matrimonio – Tem de existir
uma vontade negocial e uma coincidência entre a vontade e a declaração – A vontade deve ser
livre e esclarecida

Casamento por procuração

É uma exceção ao principio do carater pessoal do consentimento – É licita a representação por


procurador de um, e apenas um, dos nubentes na celebração do casamento – Artigos 1619º e
1620º/1 – Se ambos se fizerem representar por procurador, o casamento é inexistente nos termos
do artigo 1628º, alínea c)

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A procuração tem de ser outorgada por documento autenticado, instrumento público ou
documento escrito e assinado pelo representado, com reconhecimento presencial de assinaturas –
Artigo 43º/2 do CRC. A inobservância de forma determina a nulidade da procuração – Artigo
220º que não chega a atribuir qualquer poder de representação.

A procuração deve conter poderes especiais para o ato, a designação expressa do outro nubente e
a indicação da modalidade do casamento – Artigo 1620º/2 – A procuração que não tenha esses
poderes especiais ou a designação expressa do outro nubente é nula, sendo inexistente o
casamento que venha a ser celebrado ao abrigo da mesma – Artigo 1628, alínea d). Se não for
indicada a modalidade de casamento existirá uma mera irregularidade que não prejudica a
validade da procuração nem do casamento.

Mas esta tipo de casamento não será uma exceção assim tao grande ao principio da pessoalidade
pois a intervenção do próprio nubente é suficientemente garantida na passagem da procuração.
Mas apesar da margem decisória do constituinte que limita o papel do procurador, este é um
verdadeiro representante e não um mero núncio – A imposição legal da presença física do
procurador, em substituição do nubente permite pressupor que ele tem a liberdade de não concluir
o matrimonio em condições extremas ( se o casamento for inválido ou se se produzirem ou
descobrirem circunstâncias que, provavelmente, levariam o constituinte a desistir da pretensão
matrimonial)

A procuração extingue-se por revogação ou caducidade - 1621º. É inexistente o casamento


contraído por intermedio de procurador, depois da revogação ou caducidade da procuração –
Artigo 1618º, alínea d)

A revogação pode acontecer a qualquer altura até ao momento da celebração do casamento e põe
termo aos efeitos da procuração no preciso momento em que é realizada, não estando a sua
eficácia dependente do conhecimento da revogação por parte do procurador. Mas, o constituinte
é responsável pelo prejuízo que causar se, por culpa sua, não fizer a revogação a tempo de evitar
a celebração do casamento

A procuração caduca ainda com a morte do constituinte ou do procurador ou acompanhamento


de qualquer deles, quando a sentença que o haja decretado assim determine.

FALTA DE VONTADE NEGOCIAL E DIVERGÊNCIAS ENTRE A VONTADE E A


DECLARAÇÃO

O casamento é anulável por falta de vontade negocial sempre que falte consciência do ato ou
quando a declaração de casar tenha sido extorquida por coação física – Artigo 1635º

Qualquer causa de falta de consciência do ato é relevante para a possibilidade de anular o


casamento, designadamente a incapacidade acidental (prevista no 1635º, al a) e o erro na
declaração que não recaia sobre aspetos físicos do outro contraente. O casamento também será
anulável por erro acerca da identidade física do outro contraente (1635º, al b)

No caso da simulação, para que esta seja fundamento de anulação, é necessário que não exista
qualquer vontade de assumir obrigação de plena comunhão de vida, isto é, que as partes recusem
a totalidade dos efeitos essenciais do casamento – ou seja, a simulação terá de ser total | EX.: Se
os nubentes declararem casar, tendo previamente combinado que não estarão vinculados ao dever
de fidelidade, o casamento é válido: estar-se-á perante uma simulação parcial a que se aplica o
1618º e não o 1635º d) --- A anulação por simulação pode ser requerida pelos próprios conjugues
ou qualquer pessoa prejudicada pelo casamento (1640º/1)

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Nos restantes casos do artigo 1635º a ação apenas pode ser proposta pelo conjugue cuja vontade
faltou ou não coincidiu com a declaração: se ele falecer na pendencia da causa, podem prosseguir
na ação os seus parentes, afins na linha reta, herdeiros ou adotantes – 1640º/2

A ação de anulação por uma destas causas apenas pode ser proposta dentro dos 3 anos posteriores
à celebração do casamento ou, se o casamento era desconhecido do requerente o prazo é de 6
meses depois de ele ter conhecimento do mesmo – Artigo 1644º

ERRO VICIO E COAÇÃO MORAL

Casamento celebrado com a vontade viciada por erro é anulável nos termos do artigo 1636º: Mas
apenas é relevante o erro que recai sobre qualidades essenciais da pessoa do outro conjugue, tem
de ser desculpável e essencial (é indiferente se o erro vicio é simples ou qualificado por dolo)

▪ Qualidade essencial: Qualidade de uma pessoa que, em abstrato, seja idónea para
determinar o consentimento matrimonial | EX.: A impotência;
▪ Desculpabilidade: Não pode ser um erro grosseiro, em que não teria caído uma pessoa
normal, nas circunstâncias daquele caso concreto;
▪ Objetivamente essencial: Apenas importa a qualidade que, a ser conhecida, legitimaria
a não celebração do casamento, à luz da consciência social dominante;
▪ Essencialidade subjetiva: É indispensável a prova de que a parte que está em erro não
teria celebrado o erro se tivesse uma representação correta da realidade;

Até 2010 o erro tinha de ser próprio: Era próprio o erro que não recaia sobre condições de validade
ou existência do casamento (ex.: se um dos conjugues supunha erradamente que o outro já tinha
idade nupcial, o casamento seria anulável por impedimento dirimente e não por erro)

▪ JDP não concordava e defendia que o erro apenas seria improprio quando recaísse sobre
uma qualidade que fosse fundamento de inexistência do casamento, ou seja, se o nubente
supunha que se casava com alguém do sexo oposto – O casamento seria inexistente por
aplicação do 1628º, al e) – com a revogação deste artigo desapareceu para JDP a única
hipótese em que o erro seria impróprio
 Assim, se o erro recair sobre uma circunstancia correspondente a um
impedimento dirimente caberá à vitima optar pelo regime do erro ou pelo regime
do impedimento dirimente – ou seja, todos os erros são próprios pelo que não há
interesse em incluir esta característica como requisito de causa de anulação.

Casamento sob coação moral é anulável desde que seja grave o mal de que o nubente é
ilicitamente ameaçado e justificado o receio da sua consumação – Artigo 1638º/1 – Os requisitos
da coação moral no casamento, são idênticos aos requisitos do regime geral da coação moral. O
artigo 1638º/2 equipara a exploração de situação de necessidade (negócios usurários da parte
geral) à coação moral.

A anulação fundada em erro ou coação apenas pode ser pedida pelo conjugue cuja vontade foi
viciada: se ele falecer na pendencia da causa, podem prosseguir na ação os seus parentes, afins na
linha reta, herdeiros ou adotantes – Artigo 1641º. A ação caduca se não for instaurada dentro dos
6 meses posteriores à cessação do estado de erro ou coação (1645º)

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FORMALIDADES DO CASAMENTO CIVIL

A celebração do casamento civil celebrado por forma civil está sujeita a formalidades
estabelecidas na lei. Distinguem-se:

➢ Formalidades preliminares – Antecedem a cerimónia;

As formalidades preliminares do casamento civil sob forma civil comum (não urgente) integram
o processo preliminar de casamento – Regulado nos artigos 134 a 145º do CRC e artigos 1610º a
1614º do CC. O casamento celebrado sem precedência do processo preliminar de casamento é
válido mas é celebrado sob o regime imperativo da separação de bens – Artigo 1720º/1, alínea a)

 O processo preliminar de casamento destina-se à verificação da inexistência de


impedimentos – Artigo 1610º, e é organizado por qualquer conservatória do registo civil
– Artigo 134º CRC e inicia-se com a declaração para casamento

Declaração para casamento – feita pelos nubentes, pessoalmente ou através de procurador, em


conservatória do registo civil – Os nubentes comunicam a intenção de contrair matrimónio e
requerem a instauração do processo de casamento (135º CRC). É ao conservador quem compete
verificar a identidade e capacidade matrimonial dos nubentes, efetuando todas as diligencias
necessárias

O processo preliminar será alterado se, até à celebração do casamento, se se conhecer algum
impedimento: o processo será suspenso até que o impedimento cesse, seja dispensado ou julgado
improcedente por decisão judicial (artigos 142º CRC e 1611º/3 cc). Qualquer pessoa pode
declarar, até ao momento da celebração do casamento, a existência de impedimentos, sendo essa
declaração obrigatória para o MP e funcionários do registo civil assim que tenham conhecimento
desse mesmo impedimento – Artigo 142º/1 CRC e 1611º CC

➢ Formalidades de celebração

Se lavrado despacho final a autorizar o casamento, este deve ser celebrado nos 6 meses posteriores
– Artigo 1614º As formalidades do casamento civil estão previstas nos artigos 153º a 155 do CRC
e 1615º e 1616º CC.

É obrigatória a presença de duas testemunhas sempre que a identidade de qualquer dos nubentes
ou procurador não possa ser confirmada por uma das formas previstas no artigo 154º/3 CRC – O
casamento celebrado sem a presença das testemunhas quando seja obrigatório, é anulável nos
termos do artigo 1631º, al c) – Essa ação de anulação apenas pode ser proposta pelo MP (1642º)
e dentro do ano posterior à celebração do casamento (1646º) – será convalidado se, antes do
transito em julgado da sentença de anulação, o conservador reconhecer que a falta de testemunhas
deve-se a circunstâncias atendíveis – Artigo 1633º/1, alínea d)

A celebração do casamento é pública e consiste numa cerimonia cujas formalidades são reguladas
no artigo 155º do CRC

➢ Formalidades subsequentes – São o registo;

As formalidades posteriores ao casamento traduzem-se no registo civil. O artigo 1651º enumera


quais os casamentos sujeitos a registo

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O registo civil consiste no assento que é lavrado por inscrição ou transcrição (1652º)e em suporte
informático (14º CRC):

▪ Assento lavrado por inscrição: Registo direto do ato de casamento | Assentos de


casamento civil não urgente celebrado por forma civil em território português ou
realizado no estrangeiro perante agente diplomático ou consular português – Artigo 52º,
al e) CRC
▪ Assento lavrado por transcrição: Registo que tem por base o assento da cerimonia feito
por uma entidade que não desempenha funções de registo civil | Todos os que não são
celebrados por inscrição – Artigos 53º/1, alíneas b), c), d) e e) do CRC;

Efetuado o registo, os efeitos civis do casamento retroagem à data da celebração do ato – Artigo
1670º/1 – Este principio da retroatividade não afeta os direitos de terceiros que sejam compatíveis
com os direitos e deveres de natureza pessoal dos conjugues e dos filhos.

O casamento cujo registo é obrigatório não pode ser invocado enquanto não for lavrado o
respetivo assento (salvo exceções: 1601º, al. c) 1653º/1

O registo não condiciona a existência ou a validade do casamento, mas sim a sua prova: À partida,
os únicos meios de prova legalmente admissíveis do ato são o acesso à base de dados do registo
civil e a certidão extraída do assento – Artigo 211º/1 CRC

FORMALIDADES DO CASAMENTO CIVIL CELEBRADO POR FORMA RELIGIOSA

O casamento civil sob forma religiosa observa as formalidades da própria religião e as


formalidades civis – As formalidades não podem ser preteridas em detrimento das religiosas.

É o artigo 19º da Lei da liberdade religiosa – Lei nº 16/2001, de 22 de junho que contem as
formalidades civis a observar nos casamentos civis por forma religiosa comum, celebrado em
Portugal perante ministro do culto de uma igreja ou comunidade religiosa radicada no pais | Lei
da liberdade religiosa – Artigo 19º:
_____________________________________________________________________________
Artigo 19º
Casamento por forma religiosa
1 - São reconhecidos efeitos civis ao casamento celebrado por forma religiosa perante o ministro
do culto de uma igreja ou comunidade religiosa radicada no País. O ministro do culto deverá ter
a nacionalidade portuguesa ou, sendo estrangeiro, não nacional de Estado membro da União
Europeia, ter autorização de residência temporária ou permanente em Portugal.
2 - Aqueles que pretendam contrair casamento por forma religiosa deverão declará-lo,
pessoalmente ou por intermédio de procurador, no requerimento de instauração do respectivo
processo de publicações na conservatória do registo civil competente, indicando o ministro do
culto credenciado para o acto. A declaração para casamento pode ainda ser prestada pelo ministro
do culto, mediante requerimento por si assinado.
3 - Autorizada a realização do casamento, o conservador passa o certificado para casamento, nos
termos dos artigos 146.º e 147.º do Código do Registo Civil, com as necessárias adaptações. O
certificado não é passado sem que o conservador se tenha assegurado de que os nubentes têm
conhecimento dos artigos 1577.º, 1600.º, 1671.º e 1672.º do Código Civil. O certificado deve
conter menção deste facto, bem como do nome e da credenciação do ministro do culto. O
certificado é remetido oficiosamente ao ministro do culto, a quem são igualmente comunicados
os impedimentos de conhecimento superveniente.
4 - É indispensável para a celebração do casamento a presença:
a) Dos contraentes, ou de um deles e do procurador do outro;

79
b) Do ministro do culto, devidamente credenciado;
c) De duas testemunhas.
5 - Logo após a celebração do casamento, o ministro do culto lavra assento em duplicado no livro
de registo da igreja ou da comunidade religiosa e envia à conservatória competente, dentro do
prazo de três dias, o duplicado do assento, a fim de ser transcrito no livro de assentos de
casamento.
6 - O conservador deve efectuar a transcrição do duplicado dentro do prazo de dois dias e
comunicá-la ao ministro do culto até ao termo do dia imediato àquele em que foi feita
_____________________________________________________________________________

É sempre obrigatória a presença das duas testemunhas – A violação desta regra (19º/4) são as
mesmas que são previstas para o casamento civil sob forma civil – Em caso de ausência do
ministro de culto devidamente credenciado – Artigos 1628º, alínea a) e 1629º

O casamento civil por forma religiosa está subordinado ao regime do código civil para o
casamento civil

CASAMENTO URGENTE

O casamento urgente sob forma civil: A celebração é permitida independentemente do processo


preliminar de casamento e sem intervenção do funcionário do registo civil – 1622º/1. É também
reconhecida eficácia civil ao casamento católico urgente, que é aquele que pode celebrar-se
independentemente do processo preliminar de casamento e de passagem do certificado para
casamento – Artigo 1599/1

Ainda que o 1590º apenas se refira diretamente ao casamento urgente sob forma civil ou católico,
é admissível o casamento civil urgente sob forma religiosa, nas mesmas condições em que é
permitido o casamento católico – Para identificar que tipo de casamento é, é necessário identificar
a presença de alguma das entidades do respetivo tipo (ministro do culto, conservador, padre) –
Na ausência desta figura é preciso interpretar a intenção dos nubentes – 1590º, 2ª parte

Os requisitos de fundo do casamento urgente são (1622º/1):

✓ Fundado receio da morte próxima de algum dos nubentes; ou


✓ Iminência de parto;

As formalidades do casamento civil urgente tem como principais especialidades:

▪ Desnecessidade da precedência do processo preliminar de casamento;


▪ Dispensa-se a presença do conservador ou ministro do culto e é obrigatória a presença
de 4 testemunhas
▪ Há uma fase de formalidades subsequentes à celebração: Fase da homologação que é
anterior à fase do registo;

As formalidades do casamento são as prescritas pelo artigo 156º do CRC

O casamento civil urgente não homologado é juridicamente inexistente – Artigo 1628º, al. b)

O casamento urgente considerado como católico pelas autoridades eclesiásticas e, como tal,
transcrito é inexistente enquanto casamento civil – Mas produz todos os efeitos próprios de um
casamento católico

80
CASAMENTO DE PORTUGUESES NO ESTRANGEIRO E DE ESTRANGEIROS EM
PORTUGAL

Este processo é regulado pelo código do registo civil – Artigo 161º e seguintes. O artigo 51º/4 do
código civil admite a produção de efeitos civis em território português de um casamento celebrado
no território de um Estado que não reconheça efeitos a esse ato | EX.: Casamento católico entre
portugueses celebrado em França

O casamento entre um Português e um estrangeiro celebrado em Portugal apenas pode realizar-


se pelas formas e segundo as formalidades admitidas na lei Portuguesa para o casamento de
portugueses no pais

O casamento de dois estrangeiros em Portugal pode ser celebrado segundo a forma prescrita na
lei nacional de qualquer dos contraentes perante os respetivos agentes diplomáticos ou consulares
desde que igual competência seja reconhecida por essa mesma lei aos agentes diplomáticos e
consulares portugueses – Artigo 51º/1 CC e 165º do CRC.

CASAMENTO CATÓLICO

O casamento católico é definido pelo código de direito canónico como ´ato de vontade pelo qual
o homem e a mulher, por pacto irrevogável, se entregam e recebem mutuamente, a fim de
constituírem o matrimónio` - Cânone 1057

A lei portuguesa atribui relevância civil ao regime do direito canónico do casamento católico em
matérias que não digam respeito à forma

As decisões definitivas do clero relativas à nulidade do casamento católico e à dispensa do


casamento rato e não consumado podem produzir efeitos civis, após revisão e confirmação das
mesmas decisões, nos termos do direito português pelo competente tribunal do Estado Português
– Artigo 1626º/1

 O casamento católico apenas pode ser tido com inválido se violar o Direito
canónico – Se esse casamento infringir regras civis sobre requisitos do casamento ele já
não será anulável

O casamento católico apenas poderá ser nulo na sequencia da decisão de uma autoridade
eclesiástica – Em sentido inverso, a categoria da nulidade não se aplica ao casamento civil cujo
desvalor é apenas a inexistência ou a anulabilidade – Retira-se do capítulo do CC atinente à
invalidade do casamento em que se refere a nulidade a propósito do casamento católico (1625º) e
a inexistência e a anulabilidade a propósito do casamento civil (1627º)

Há divergências de fundo entre os dois ordenamento (civil e católico).O casamento católico:

▪ Apenas pode ser celebrado entre um Homem e uma mulher – cânone 1057/2;
▪ A idade de 14 anos para a mulher (cada conferencia episcopal pode estabelecer idade
diferente – em PT a idade mínima é 16 anos) e o casamento civil anterior não dissolvido
não constituem impedimentos;
▪ Anomalia psíquica permanente não é impedimento ainda que possa afetar o
consentimento – cânone 1095
▪ A impotência (1084), disparidade de culto (1086º), ordens sacras (1087) e o voto de
castidade (1088) configuram impedimentos
▪ Casamento contraído sob condição é inválido – cânone 1102/1;

81
▪ Admite-se a representação dos 2 nubentes por procurador cânones 1104 e 1105;´
▪ Simulação ou reserva mental implica a invalidade do casamento – cânone 1101/2
▪ Erro vicio simples torna inválido o matrimonio apenas quando se verificam as condições
do cânone 1097/2
▪ É invalido o casamento contraído por vitima de erro qualificado por dolo consoante o
cânone 1098;
▪ Coação moral acarreta a invalidade do matrimonio nos termos do cânone 1103;

Ou seja, certos impedimentos de direito civil não o são no direito canónico. O artigo 1596º
estabelece, contudo, que o casamento católico apenas pode ser celebrado por quem tiver a
capacidade matrimonial exigida na lei civil – A verificaçao do cumprimento dos impedimentos
de direito civil nos casamento católicos é assegurada mediante instrumentos gerais como:

✓ A cominação de sanções criminais para o ministro da igreja católica – Artigos 296º/1,


alíneas a) e b) do CRC;
✓ Sanções civis patrimoniais para um dos nubentes – Artigo 22º LAC e 1649º e 1650º CC.
✓ Recusa de transcrição – Permite ao Estado garantir o cumprimento dos impedimentos,
pois o casamento católico comum com um impedimento dirimente civil não será
transcrito, nos termos do artigo 1974º/1, alínea d) CRC

----- Formalidades civis do casamento católico

As formalidades civis tratadas pela lei civil são as do momento prévio e posterior à celebração do
matrimonio. As formalidades do ato matrimonial são reguladas pelo direito canónico nos cânones
1108 a 1120

A generalidade dos casamentos católicos estão sujeitos a processo preliminar de casamento


organizado nas conservatórias do registo civil – Artigo 1597º/1 (excetuam-se os casamentos
católicos urgentes)

Casamentos católicos não precedidos de processo preliminar de casamento consideram-se


contraídos sob o regime imperativo da separação de bens – Artigo 1720º/1, alínea a)

Problema doutrinário: Natureza jurídica da transcrição do casamento católico

▪ Para JDP o facto da morte de um ou ambos os conjugues não impedir a transcrição afasta
a qualificação deste ato como condição de existência ou validade do ato matrimonial em face
do ordenamento estatal
o Para JDP este ato é igual a qualquer outro ato de registo do casamento –
Formalidade ad probationem – o casamento católico não transcrito produz um
efeito civil que não se reconduz ao domínio da prova: enquanto não for
dissolvido, o casamento católico não transcrito impede a celebração de
casamento civil subsequente – Artigo 1601º, alínea c)

Nem todos os casamentos católicos celebrados em Portugal são registados por transcrição – O
registo de casamento católico contraído por pessoas já casadas por casamento civil não dissolvido
faz-se por averbamento ao assento do casamento civil – Artigo 179 CRC e 1589º/1 CC

CAP. II – EFEITOS DO CASAMENTO

Todos os casamentos, sejam eles civis, católicos ou religioso regem-se, quanto aos efeitos civis,
pelas normas legais – Artigo 36º/2 CRP e 1588º

82
Os efeitos legais do casamento consistem na aquisição do status ou estado de casado e na sujeição
aos regimes inerentes – A palavra estado ou status pode ser usada em duas aceções:

• Sentido próprio: Como qualidade de que resulta um regime – O estado de casado é a


ligação que se estabelece entre duas pessoas que casaram uma com a outra e de onde
resulta a qualidade de conjugue – sujeito de uma relação conjugal ou membro daquele
grupo que é a família conjugal
• Sentido improprio - Um regime associado a certa qualidade – casamento enquanto estado
– identifica-se com os efeitos do ato

Enquanto qualidade, o estado de casado tem características mais gerais como:

✓ Indisponibilidade;
✓ Durabilidade virtual;
✓ Oponibilidade erga omnes;
✓ Exclusividade – Não se pode estar casado com duas pessoas ao mesmo tempo – principio
da monogamia

O casamento é um instituto dotado de grande relevância social, o que justifica todo o interesse e
intervenção do Estado nesse campo. Através das suas regras o estado passa uma imagem ideal
daquilo que deve ser esta ligação entre duas pessoas. Aquilo que mais importa no casamento
enquanto estado é a dimensão pessoal e não a patrimonial, pois é a primeira que justifica a
existência e proteção do casamento - Uma relação conjugal não é concebida enquanto unidade de
bens mas sim como uma comunhão entre duas pessoas

Decorre dos artigos 1618º, 1698º e 1699º - As normas jurídicas sobre efeitos do casamento são
injuntivas

➢ Principio da igualdade dos cônjuges – Artigo 1671º

_____________________________________________________________________________
Artigo 1671º
Igualdade dos cônjuges

1.O casamento baseia-se na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges.

2. A direção da família pertence a ambos os cônjuges, que devem acordar sobre a orientação da
vida em comum tendo em conta o bem da família e os interesses de um e outro.

_____________________________________________________________________________

Este principio proíbe a discriminação em razão do sexo, sendo um principio chave do casamento
ocidental moderno – Hoje continua a ser necessário afirmar este principio, fruto de um contexto
de pluralismo religioso, em que, por vezes, se sente a tentação de tolerar, senão legitimar, as
convicções e práticas fundamentalistas, cristas ou islâmicas, que assentem na subordinação da
mulher ao marido.

O principio da igualdade influi na qualificação e concretização dos deveres conjugais – os


cônjuges estão reciprocamente vinculados a situações jurídicas em igual numero e com igual
conteúdo | EX.: O dever de assistência não dita a necessária afetação exclusiva da mulher às
tarefas do lar e a plena isenção do marido quanto ao trabalho domestico

 O 1671º/2 determina a atribuição aos membros do casal da direção conjunta da


família: Principio da igualdade no governo da família

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Para assegurar esta igualdade no governo a lei impõe aos cônjuges a obrigação de tentarem chegar
a acordo sobre a orientação da vida em comum – É uma obrigação de meios inscrita no dever de
cooperação conjugal. A recusa persistente de um em chegar a consenso pode preencher os
pressupostos do divórcio sem o consentimento do outro | Há casos em que a falta de acordo sobre
um assunto que cabe a ambos, tal como a fixação/alteração da residência de família, leva a que a
decisão incumba ao tribunal – Artigo 1673º/3

Os acordos sobre a orientação da vida comum têm como objeto os assuntos com especial
relevância familiar tais como a fixação da residência, a determinação do numero de filhos e do
momento de os ter, o modo de cumprimento dos deveres conjugais e de exercício das
responsabilidades parentais – Não são incluídos neste acordo direitos de personalidades ainda que
o respetivo titular esteja adstrito a agir com consideração pelos interesses da sua família.

Problema: Natureza dos acordos sobre a orientação da vida em comum – são ou não verdadeiros
negócios jurídicos, que vinculam os cônjuges a cumprir as obrigações convencionadas?

 JDP: Sim ! – sendo o consenso sequencia do principio da igualdade dos cônjuges,


a negação de carater vinculativo aos acordos é incompatível com a natureza inderrogável
do principio – Mas os parâmetros avaliativos destes acordos são diferentes daqueles que
são aplicáveis aos negócios jurídicos, pois submetem-se a um regime de
modificação/extinção diferentes do regime geral: Não têm de ser acatados por um cônjuge
sempre que determinem um sacrifício irrazoável dos seus interesses individuais ou que
não prossigam o bem da família

Tutela da personalidade no casamento e ideia do núcleo intangível da comunhão conjugal

O casamento não elimina a individualidade de cada cônjuge, e a própria disciplina matrimonial


contempla a proteção de personalidade:

▪ Indica os interesses individuais dos cônjuges como fator a ponderar na celebração de


acordo sobre a orientação da vida em comum – 1671º/2
▪ Consagra o direito à liberdade de atividade profissional ou outra – 1677º D;
▪ Dever conjugal de respeito 1672º - Reconhece-se a vigência da generalidade das situações
jurídicas inerentes à dignidade da pessoa humana (direito à integridade física, à honra, à
privacidade, à liberdade de religião e de culto, etc.) no seio da família

Mas a tutela da personalidade não legitima o afastamento de efeitos jurídicos essenciais do


casamento (como o dever de coabitação) ainda que em nome da liberdade – É necessário um
equilíbrio entre direitos de personalidade e efeitos do casamento, o que apenas se conseguirá com
o auxilio da ideia de núcleo intangível da comunhão conjugal – Há direitos que não podem ser
derrogados, e são esses que integram o núcleo intangível, todos os outros pertencem aos direitos
individuais

DEVERES DOS CÔNJUGES


_____________________________________________________________________________

Artigo 1672º
Deveres dos cônjuges
Os cônjuges estão reciprocamente vinculados pelos deveres de respeito, fidelidade, coabitação,
cooperação e assistência
_____________________________________________________________________________

Estes são deveres recíprocos dos cônjuges e integram o núcleo intangível da comunhão conjugal:
São inderrogáveis. A sua importância é também salientada pelo facto de o conservador os referir
durante as formalidades da celebração do casamento – A violação destes deveres permite,

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segundo certos pressupostos, a obtenção imediata do divorcio por um dos cônjuges sem a
dependência de um prazo de separação de facto

➢ Dever de respeito

Consiste em não lesar a honra, sendo por isso ilícitos os comportamentos de um dos cônjuges que
atinja a integridade moral do outro |EX.: Proferir insultos verbais; gestos obscenos; não
cumprimentar.

Num sentido mais vasto este dever surge como uma tutela geral da personalidade física e moral,
assegurada pelo artigo 70º/1 CRP – Há uma nova afirmação da subsistência, no essencial, dos
direitos de personalidade, durante o matrimonio. Este dever geral de respeito ultrapassa a esfera
pessoal, salvaguardando também os direitos patrimoniais individuais de cada cônjuge

Defende JDP que alem da sua área mais típica, que é a honra, o dever de respeito imporá
obrigações que não sejam impostas pelos restantes deveres nominados

Do mesmo modo, realça-se que não é licito, ao cônjuge, agir sistematicamente como se estivesse
sozinho – Em várias situações, o estado de casado exige a um cônjuge que seja prudente no
exercício dos seus direitos gerais

➢ Dever de fidelidade

Identificação com um dever duplo de abstenção:

▪ Dever de fidelidade física: Impede o adultério, isto é, pratica de atos sexuais com
terceiros;
▪ Dever de fidelidade moral: impede qualquer ligação amorosa (não física) de um cônjuge
com terceiro;

A imposição desta exclusividade repercute-se nos direitos de liberdade e privacidade pois não
permite reconhecer a faculdade de escolha do parceiro sexual e a relevância do adultério – Numa
ação de divórcio sem consentimento do outro cônjuge (1781º, al d) abre-se a porta a uma prova
que recai sobre aspetos íntimos da vida do alegado infrator

 Mas, em que se funda a proibição de adultério? – Não é uma forma de evitar uma
conceção extramatrimonial (e assim garantir a correspondência entre a presunção de
paternidade e a paternidade biológica) pois este dever vincula todos os cônjuges e não
apenas os casais heterossexuais A obrigação de exclusividade sexual decorre da imagem
legal do casamento enquanto comunhão tendencialmente plena de vida (1577º) e
monogâmica (1601º, alínea c). É assim entendida como uma ligação absorvente e
monopolizadora que não se coaduna com a pratica de atos sexuais extramatrimoniais

Para JDP o dever de fidelidade resume-se à proibição do adultério. O tal dever de fidelidade moral
está diretamente associado ao dever de não injuriar o cônjuge, que se insere no domínio mais
restrito do dever de respeito – A infidelidade moral foi importada de frança, que pretendia superar
a falta de consagração legal de um dever conjugal nominado de respeito.

O adultério compreende ainda todos os atos sexuais realizados com outra pessoa que não o
cônjuge: cópula vaginal, coito anal, cópula vulvar, sexo oral, masturbação, etc.

➢ Dever de coabitação

Na perspetiva comum e clássica, o dever de coabitação impõe a comunhão de leito, mesa e


habitação

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▪ Comunhão de leito – Não tem em vista a mera partilha de cama, englobando a prática
de atos sexuais;

Muitos excluem a obrigação de comunhão sexual pois ela não resulta claramente da letra da lei
ou por esta ser incompatível com a liberdade sexual

JDP defende que a comunhão sexual está abarcada pela expressão coabitação. Ainda que não
tenha sido expressamente referida pelo legislador, a inclusão deste conceito neste artigo é
suportada por outros preceitos legais tais como: requisitos de validade do casamento que assentam
no aspeto sexual, tal como é a proibição do incesto (1602º al. a) c) e d) mas também no artigo
1829º que regula a presunção de paternidade dos filhos. Quanto ao argumento de ser restritivo da
liberdade: Em primeiro lugar, não é permitido o emprego da força, pública ou privada. Em
segundo, a liberdade não é toda restringida: Os cônjuges gozam de alguma liberdade sexual, pois
podem, pelo menos, decidir quando e como terão relações sexuais

A obrigação de comunhão sexual apenas será violada após recusa sistemática, injustificada e
prolongada

▪ Comunhão de mesa – Não é apenas a ideia de refeições tomadas em conjunto, mas


também a comunhão de vida económica;
▪ Comunhão de habitação – Em visões tradicionais impõe a convivência dos cônjuges a
tempo inteiro ou, pelo menos, habitualmente na casa de morada de família – Esta ideia
de convivência está também subjacente no artigo 1673º que impõe a adoção de uma
residência da família para que a vida quotidiana do casal ai se desenrole;

Esta comunhão de habitação mostra-se, atualmente, pouco viável. Hoje há a necessidade de maior
mobilidade das pessoas por motivos profissionais (imaginem-se dois funcionários públicos que
são colocados em extremos oposto do país) – Aliás, os motivos profissionais podem estar entre
os motivos justificadores de uma não adoção da residência de família

➢ Dever de cooperação
_____________________________________________________________________________

Artigo 1674º
Dever de cooperação
O dever de cooperação importa para os cônjuges a obrigação de socorro e auxilio mútuos e a de
assumirem em conjunto as responsabilidades inerentes à vida da família que fundaram
_____________________________________________________________________________

Este artigo decompõe o dever de cooperação em duas obrigações:

▪ Obrigação de socorro e auxilio mútuos – Equivale ao dever de cooperação na vida do


outro cônjuge. Ainda que socorro e auxilio sejam quase sinónimos:
 Socorro – salienta uma ajuda que procura superar situações anormais e graves,
de crise ou emergência do outro cônjuge
 Auxilio – salienta uma colaboração que vise os problemas do dia a dia;

Ainda que os cônjuges se devam apoiar na doença ou na recuperação, a nenhum deles pode ser
exigido um comportamento heroico ou próprio de um mártir, o que explica que uma alteração
grave das faculdades mentais do outro cônjuge que dure há mais de 1 ano possa constituir
fundamento de um pedido de divórcio litigioso (1781º, al. b)

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▪ Obrigação de os cônjuges assumirem em conjunto as responsabilidades inerentes à
vida da família que fundaram

Implica a cooperação no sustento, guarda e educação dos filhos, bem como o apoio a outros
familiares (por exemplo, os pais) que estejam a cargo de um ou de outro cônjuge – O artigo
1676º/1 prevê de forma expressa a possibilidade do cumprimento do dever de contribuir para os
encargos da vida familiar através do trabalho despendido na manutenção e educação dos filhos.

 Esta similitude entre a obrigação de assumir em conjunto as responsabilidades e


o dever autónomo do 1676º motiva algumas criticas à opção legal de autonomização do
dever de cooperação perante o dever de assistência.

O 1675º/3 retira, dentro de certas condições, o caráter de reciprocidade às obrigações inscritas no


dever de assistência mas não excetua nunca as obrigações que se enquadram no dever de
cooperação.

O 1676º/1 não contem uma obrigação de manutenção e educação dos filhos, mas indica apenas
uma forma, entre outras, de satisfação do dever de contribuir para os encargos da vida familiar.

A obrigação de assunção em conjunto das responsabilidades familiares não se cinge à cooperação


na atividade relativa aos filhos e outros familiares de um ou ambos os cônjuges – Está ligado, de
forma estreita, ao principio da igualdade entre os cônjuges, impondo o respeito da regra de co
direção da família e de decisão bilateral em matéria de orientação da vida em comum

A obrigação de assunção em conjunto das responsabilidades familiares vincula também os


cônjuges a trabalharem para a prosperidade comum, a criarem riqueza para os dois, dando
expressão a um dever de cooperação patrimonial

➢ Dever de assistência – Artigo 1675º

É um dever estruturalmente patrimonial, que envolve prestações suscetíveis de avaliação


pecuniária – Nele vigoram:

▪ Obrigação de prestar alimentos


▪ Obrigação de contribuir para os encargos da vida familiar

A obrigação de alimentos é absorvida pela obrigação de contribuir para os encargos da vida


familiar em situações conjugais normais. Apenas será autónomo numa situação de rutura (sem
extinção do vinculo matrimonial) – A obrigação de contribuir para os encargos da vida familiar
vincula o cônjuge perante o outro e perante os familiares a cargo dos cônjuges. O credor da
obrigação conjugal de prestar alimentos apenas vincula o cônjuge

Havendo rutura da vida em comum, a obrigação de contribuir para os encargos da vida familiar
converte-se numa obrigação de alimentos que vincula um cônjuge perante o outro e, se necessário,
noutra obrigação de alimentos autónoma, que incumbirá a cada um dos cônjuges relativamente
aos familiares a seu próprio cargo (como os filhos)

Mas a obrigação de contribuir para os encargos de vida familiar pressupõe, logicamente, a


existência de vida familiar – Esta obrigação extingue-se, portanto, em todas as hipóteses em que
falta a vida em comum, nomeadamente, por existir separação de facto

Aquilo que separa a obrigação de alimentos e o dever de contribuir para os encargos é apenas a
ausência de economia comum – A contribuição para os encargos da vida familiar não se adequa
a um vinculo matrimonial que já não reflete comunhão de vida.

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O legislador entendeu que a obrigação alimentar na separação de facto não pode estar dependente
de razoes puramente económicas (necessidade de uma parte e capacidade da outra, com
ponderação do anterior nível económico e social) – No artigo 1675º a culpa ou imputabilidade
dos cônjuges surge como condição da obrigação alimentar – Se a separação de facto não for
imputável não for imputável a qualquer dos cônjuges ou se for imputável a ambos, qualquer um
deles pode exigir alimentos ao outro. Se a separação de facto for imputável a um dos cônjuges,
ou a ambos, a obrigação de alimentar apenas cabe ao único ou principal culpado.

 Apenas excecionalmente, por razões de equidade (fatores de duração do


casamento e do contributo das partes para a economia do casal) o cônjuge inocente ou
menos culpado pode ser obrigado a prestar alimentos ao outro

A regra do 1675º/3 é estranha num sistema que aboliu a culpa enquanto pressuposto de obtenção
do divórcio – Ainda que a nova lei não imponha que se averigue da culpa na rutura da vida em
comum para determinar a dissolução do casamento ou para concessão de alimentos entre ex-
cônjuges, o juiz é forçado a formular tal juízo na constância do matrimonio no quadro da
obrigação alimentar.

A obrigação de contribuir para os encargos da vida familiar destina-se ocorrer a necessidades dos
membros do agregado familiar de base conjugal que vivam em economia comum – As
necessidades podem ser dos cônjuges, filhos e até outros parentes ou afins associados à mesma
economia doméstica. Apenas relevam as necessidades que se coadunam com a condição
económica e social de determinado núcleo familiar em concreto

O 1976º/1 conecta os encargos com a vida familiar e o lar ou a manutenção da educação dos filhos
| EX.: Despesas com a vida na residência familiar como a renda, gás, água e telefone, compra de
mobiliário, eletrodomésticos, etc.; Despesas com a alimentação, vestuário, higiene, saúde e
escolaridade dos filhos

 Mas a referencia legal não é taxativa – JDP entende que também devem ser
integrados encargos como as despesas dos cônjuges com o seu vestuário, alimentação,
higiene, aparência física e saúde bem como possíveis necessidades de lazer, recreio físico
e espiritual, realização e afirmação pessoal de cada um dos membros da família.

O único tipo de despesas fora deste dever conjugal são aqueles que colidem com a ideia de vida
em comum, que materializem a violação de outros deveres conjugais |EX.: Compra de um objeto
caro destinado à decoração do lar quando aquele que adquiriu sabia que esse objeto atinge a
sensibilidade estética do outro; despesas de alojamento num hotel com vista à prática de adultério.

Ainda que o dever de assistência vincule reciprocamente ambos os cônjuges, estes não estão
obrigados a realizar uma prestação idêntica – Tendo em conta o principio da igualdade, a lei
impõe uma contribuição proporcional ajustada às possibilidades de cada um – Assim, a fixação
do montante da contribuição que é exigível implica, a par da identificação e avaliação de todos
os encargos com a vida familiar, uma operação de avaliação da capacidade contributiva de cada
cônjuge

As formas de contribuição para ocorrer aos encargos da vida familiar foram repartidos legalmente
em duas categorias:
▪ Afetação de recursos – Proventos ou ganhos do trabalho, pensões, dividendos, juros,
rendas, etc.
▪ Trabalho despendido no lar ou na manutenção e educação dos filhos – Pretende
reconhecer valor económico ao trabalho doméstico com os filhos

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Existe uma grande autonomia das partes no que toca à fixação do modo de cumprimento do dever
em apreço – A lei não define encargos da vida familiar, não os hierarquiza, não indica o montante
que deve ser afetado a cada uma das necessidades familiares nem impõe esta ou aquela forma de
contribuição aos cônjuges.
Na ausência de acordo vigora a regra da contribuição proporcional, assistida da garantia
estabelecida pelo artigo 1976º/4 – Há a faculdade a um cônjuge de obter judicialmente o
cumprimento do dever de contribuição que incumbe ao outro (há assim a possibilidade de
execução especifica para os deveres conjugais – ainda que apenas seja tutelado aquele cônjuge
credor na medida em que o faltoso seja credor de um crédito de rendimentos ou proventos sobre
um terceiro identificável [ex.: o cônjuge faltoso é trabalhador por conta de outrem: pode o tribunal
notificar a entidade patronal para entregar diretamente ao outro a parte do vencimento necessário
à satisfação da divida de contribuição para os encargos])
O 1976º/2 visa valorizar a relevância do trabalho do lar, protegendo o cônjuge que se dedicou em
grande parte ao trabalho doméstico, e que por isso não exerceu nenhuma atividade remunerada
nem progrediu na carreira.
CARACTERÍSTICAS DOS DEVERES CONJUGAIS E DAS SITUAÇÕES JURIDICAS
ATIVAS CORRESPONDENTES

É nítido que não é correto afirmar que os deveres dos cônjuges são efeitos meramente pessoais:
dever de respeito obriga um cônjuge a não violar direitos patrimoniais; dever de cooperação pode
acarretar colaboração na atividade profissional do outro; dever de assistência reflete-se em
prestações de cariz patrimonial.

Aos deveres que os cônjuges estão vinculados, correspondem, no lado ativo, a direitos subjetivos:
São permissões – o seu titular é livre de as exercer | EX.: Ele não está obrigado a exigir que o seu
cônjuge lhe seja fiel. No caso de violação de um dever conjugal, o cônjuge afetado não tem de
pedir o divórcio nem de requerer a reparação dos danos causados pela infração – o cônjuge titular
pode optar entre o exercício ou o não exercício

As características dos deveres conjugais são:

✓ Carater estatutário – Ligam-se ao estado de casado e subsistem, à partida, enquanto não


operar uma alteração do estado civil (mesmo que exista incumprimento ou rutura)
✓ Durabilidade virtual – cessam quando o estado civil muda, isto é, quando se passa a ser
separado de pessoas e bens, viúvo ou divorciado;
✓ Caráter erga omnes – Os terceiros não podem contribuir para o incumprimento ou
impossibilidade de incumprimento dos deveres conjugais;
✓ Típicos – Não há deveres conjugais alem dos previstos na lei;
✓ Indisponíveis – Não se pode afastar os deveres conjugais, são imperativos. Mas é
possível definir a forma, por exemplo, de contribuição para os encargos da vida familiar;
✓ Tutela especifica – À tutela comum junta-se uma tutela especificamente familiar
▪ Violação do dever de coabitação – separação de facto imputável a uma
das partes é sancionada com a suspensão do dever de assistência a cargo
do outro, mas o único ou principal culpado permanece vinculado ao
dever de assistência perante o inocente – 1675º/3
▪ Violação do dever de contribuir para os encargos da vida familiar – A lei
admite uma ação destinada a exigir o seu cumprimento – 1676º/4
▪ Esta tutela também opera contra 3º - Aquele que contribuir para o
incumprimento do dever de fidelidade, mediante prática de relações

89
sexuais com o cônjuge de outrem, é afetado pela invalidades das doações
que tenham sido feitas pelo cônjuge adultero – 2196º
✓ Tutela comum – A infração por um cônjuge de direitos individuais, patrimoniais ou
pessoais do outro, que se inscreve numa violação do dever de respeito, é suscetível de
determinar responsabilidade civil e criminal nos termos gerais – A violação de deveres
conjugais (como os de fidelidade e coabitação) pode acarretar responsabilidade civil nos
termos gerais – decorre do próprio 792º

A violação de um dever conjugal, para JDP pode preencher os pressupostos da obrigação de


indemnizar: ilicitude, culpa, dano e nexo de causalidade entre o facto ilícito e o dano.

Também um terceiro que contribua para o incumprimento ou impossibilidade de incumprimento


dos deveres conjugais pode ter que indemnizar | EX.: O terceiro cúmplice de adultério; o médico
que lese a capacidade sexual de um cônjuge

EFEITOS DO CASAMENTO NO DOMÍNIO DO NOME, DA FILIAÇÃO, DA


NACIONALIDADE, DA ENTRADA E PERMANÊNCIA NO TERRITÓRIO
PORTUGUÊS

Quanto ao apelido: 1677º - É atribuída a faculdade (não o dever) de alteração do nome em virtude
do casamento. JDP parece entender que apenas um dos cônjuges pode exercer esta faculdade ao
contrário da doutrina maioritária

A faculdade de alterar o nome é uma exceção ao principio da imutabilidade do nome fixado no


assento de nascimento consignado no artigo 104º/1 CRC

 Esta exceção pode basear-se em vários motivos: A comunhão de apelidos tende


a criar e reforçar o sentimento de pertença ao grupo familiar;

JDP não entende ser possível uma interpretação literal do artigo 1677º no sentido de este artigo
permitir que um ou os dois cônjuges alterem os seus nomes sem que exista um elemento comum
em ambos os nomes | Ex.: Ana Ribeiro muda o nome para Ana Ribeiro silva e António Silva
muda para António silva ribeiro, ou então, que Ana mude para Ana silva ribeiro sem que o marido
mude o seu nome – JDP não concorda com isto, defendendo que tem de existir um elemento
comum aos nomes, nem que seja uma coincidência quanto à ordem ou disposição do apelido ou
apelidos. Para este (e porque a técnica da intercalação modificaria profundamente os nomes das
pessoas) a faculdade do 1677º apenas pode ser exercida por um dos cônjuges que adita aos seus
próprios apelidos apelidos do outro até ao máximo de dois

Quanto à filiação na constância do matrimónio: o casamento civil não cria um dever conjugal
de procriação conjunta, ainda que nos termos do 1577º o casamento vise a constituição de família:
a ligação entre os cônjuges é ela própria uma relação familiar. Ou seja, não há uma obrigação de
procriação.

Quanto à nacionalidade e permanência no território Português: A nacionalidade portuguesa


não se adquire nem se perde pelo mero facto da celebração do casamento – A lei da nacionalidade
prevê que um estrangeiro casado há mais de 3 anos possa adquirir nacionalidade portuguesa
mediante declaração feita na constância do matrimonio. Do mesmo modo, um Português não o

90
deixa de ser pelo facto de se casar com um estrangeiro ( a menos que, sendo também nacional de
outro Estado, declare que não quer ser Português)

A entrada e permanência de estrangeiro casado são reguladas pela Lei nº 37/2006, de 9 de agosto
que estabelece um regime favorável ao cônjuge de cidadão da união em matéria de entrada e saída
do território nacional, direito de residência ou proteção contra o afastamento do território
Português.

EFEITOS PREDOMINANTEMENTE PATRIMONIAIS DO CASAMENTO

O único modo pelo qual é permitido às partes fazerem estipulações sobre regimes de bens é a
convenção antenupcial – O artigo 1717º determina que na falta de convenção em contrário o
casamento se considera celebrado sob o regime de bens supletivo que é a comunhão de adquiridos.
As estipulações sobre regime de bens feitas fora da convenção antenupcial consideram-se,
portanto, não escritas

 Não é certa definição de regime de bens como: ´o acordo dos nubentes sobre o regime
de bens que vai vigorar no seu casamento` - As convenções antenupciais não tem de
conter, necessariamente, cláusulas sobre o regime de bens
 Também não é correto afirmar que é o acordo através do qual se regulam as relações
patrimoniais que se irão estabelecer no futuro casamento – Não é permitido alterar, por
convenção antenupcial, regras legais sobre administração e disposição de bens do casal
nem sobre dividas dos cônjuges

JDP: A convenção antenupcial é um negócio celebrado em vista da futura realização de um


casamento, com a necessária intervenção de, pelo menos, um dos nubentes, na qualidade de parte
– A convenção não é forçosamente um acordo entre nubentes e nem sequer tem de ser um
contrato: pode incluir apenas uma doação para casamento feita por terceiro a um dos esposados
(1754º) ou uma disposição testamentária feita por um esposado (1704º). A convenção é celebrada
antes do casamento e é acessória em relação ao mesmo – O artigo 1716º condiciona a eficácia da
convenção à realização de um casamento válido, o que salienta a acessoriedade da convenção em
relação ao casamento

Retirando as estipulações por morte e as doações para casamento, é escassa a relevância do


conteúdo da convenção antenupcial em aspetos conexos com o casamento e que não incidam
sobre a matéria da titularidade dos bens do casal

Conteúdo

Quanto ao regime de bens: Principio da liberdade de estipulação – Artigo 1698º - os nubentes


podem fixar livremente o regime de bens do seu casamento, quer escolhendo um dos regimes
típicos, quer adotando um regime atípico

 Mas há restrições à liberdade de estipulação:


• Não pode ser convencionada a comunicabilidade dos bens do 1733º - Artigo
1699º/1 al. d);
• Não pode ser convencionada a comunicabilidade dos bens objeto de doação entre
casados – Artigo 1764º/2;

91
• Não é admissível a escolha do regime da comunhão geral nem a estipulação da
comunicabilidade dos bens referidos no artigo 1722º/1 nos casamentos celebrados por
quem tem filhos – Artigo 1699º/2;
• Não é permitida a fixação, total ou parcial, do regime de bens por simples
remissão genérica para lei estrangeira, para um preceito revogado, ou para usos e
costumes locais – Artigo 1718º
• Casamento urgente ou celebrado por quem tenha completado 60 nos de idade
considera-se sempre contraído no regime imperativo da separação de bens – Artigo
1720º/1
• Não é permitido modificar as regras sobre administração dos bens do casal –
Artigo 1699º/1 al c) – Por identidade de razão não é admissível a alteração das regras
sobre disposição (e também o regime das dividas não pode ser alterado, apesar do silencio
da lei quanto a esse aspeto)

Por força do artigo 1699º/1 alínea d), o artigo 1733º/1 é um regra injuntiva que se aplica a todo e
qualquer regime de bens e não apenas ao regime típico da comunhão geral

O 1699º/2 deve ser alvo de uma interpretação restritiva – A proibição aí contida apenas será
aplicável nos casos em que existam filhos de um dos nubentes com terceiro – No caso de os
nubentes apenas terem descendentes comuns, será permitida a escolha do regime da comunhão
geral e a estipulação da comunicabilidade dos bens referidos no artigo 1722º/1

 Este 1699º/2 é um mecanismo de tutela dos sucessíveis legitimários em vida do


de cuiús – Mais concretamente, dos filhos que, a par de cônjuge fazem parte dos
sucessíveis legitimários prioritários nos termos dos artigos 2157º e 2133º/1 a)

A convenção antenupcial pode ter como objeto aspetos que não respeitem ao regime de bens, e
relacionados ou não com o futuro casamento: É admissível inserir na convenção antenupcial,
quaisquer atos ou negócios que possam constar de escritura pública, desde que pelo menos um
dos nubentes seja autor, parte ou beneficiário do mesmo – Esses atos ou negócios tanto podem
ser patrimoniais (como a compra e venda, arrendamento) como extrapatrimoniais (como a
perfilhação, declaração de maternidade)

 Cláusulas que não tenham em vista o futuro casamento não estão subordinadas
ao principio da imutabilidade do 1714º/1 nem a ouras regras especificas da convenção
antenupcial. Mas, tais regras aplicam-se plenamente às cláusulas conexas com o
casamento, salvo previsão contrária

Nas convenções não respeitantes ao regime de bens, mas conexos com o matrimónio sobressaem
as estipulações por morte e as doações para casamento – Mesmo com a proibição dos pactos
sucessórios (1699º/1 al a) e 2028/2) e ao abrigo do artigo 1700º/1 a convenção pode incluir a
instituição de herdeiro ou a nomeação de legatário, desde que seja feita por qualquer dos
esposados ou em favor de qualquer um deles, bem como a renuncia reciproca dos esposados à
condição de herdeiro legitimário

 Não são consideradas licitas outras estipulações por morte

Doações para casamento: Doações feitas a um dos esposados, ou a ambos, em vista do seu
casamento (1753º/1). Apenas podem ser realizadas na convenção nupcial (1756º/1)

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Mas há mais aspetos que podem ser regulados pelas convenções antenupciais:

✓ Estipulações de que a partilha se fará segundo regras diferentes das do regime de bens
adotado – Artigo 1719º;
✓ Regulamentar o consenso em assuntos importantes da vida matrimonial, como o local de
residência da família ou a forma de contribuição para os encargos da vida familiar – Mas
esta autorregulamentação está subordinada a regras próprias dos acordos sobre a
orientação da vida em comum;

É válida a convenção antenupcial sob condição ou termo – Artigo 1713º/1 – Admite-se a


estipulação da vigência sucessiva de regimes de bens para um mesmo casamento | EX.: Os
esposados podem convencionar que o regime de bens adotado é o da separação, nos primeiros 5
anos de casamento; o regime de adquiridos nos 5 anos subsequentes e o regime da comunhão
geral, a partir do 10º ano de casamento

 Não modifica o principio da imutabilidade das convenções: As mudanças não


resultam de um acordo posterior ao casamento, mas de cláusulas acessórias constantes da
própria convenção.

O 1713º/2 afasta a retroação dos efeitos do preenchimento da condição à data da conclusão do


negócio em relação a terceiros

JDP aconselha a que, de modo a minimizar a incerteza associada à condição, seja inseria uma
cláusula que contemple a obrigatoriedade do registo civil do preenchimento da condição.

CAPACIDADE PARA CELEBRAR CONVENÇÕES ANTENUPCIAIS

O artigo 1708º regula apenas a capacidade para intervir em convenções antenupciais na qualidade
de esposado ou nubente – Têm capacidade para celebrar convenções antenupciais aqueles que
têm a capacidade para contrair casamento – Não há coincidência entre a capacidade matrimonial
e a capacidade genérica de exercício pois é reconhecida capacidade de gozo para realizar
convenções antenupciais a indivíduos desprovidos de capacidade genérica de exercício (menores
com 16 e 17 anos) e nega-se a capacidade de gozo para celebrar as mesmas convenções a
indivíduos dotados de capacidade genérica de exercício (ex.: aqueles que padeçam de demência
notória)

 A celebração da convenção antenupcial sem capacidade de gozo para tal, é nula


nos termos gerais

Mas os menores carecem de autorização dos respetivos representantes (1708º/2) e os maiores


acompanhados com capacidade matrimonial devem apresentar o acordo expresso do
acompanhante (1708º/3) – A falta de autorização leva a que a convenção seja anulável – Artigo
1709º. A convenção convalida-se se o casamento for celebrado depois de cessar a incapacidade.

Em caso de capacidade de exercício, o regime da anulabilidade da convenção antenupcial


demarca-se do regime geral da anulabilidade em 3 aspetos:

▪ Os representantes ou acompanhante do incapaz tem legitimidade para invalidar a


convenção, independentemente de estarem ou não no circulo de pessoas em cujo interesse
a lei estabelece a anulabilidade;

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▪ O prazo de 1 ano é contado a partir da data do casamento e não a partir do momento em
que cessa a incapacidade (o 1º prazo pode acabar antes do 2º);
▪ A anulabilidade é sanável mediante a celebração do casamento depois de finda a
incapacidade e não apenas mediante confirmação;

FORMA E REGISTO DA CONVENÇÃO - Artigo 1710º e 1711º

_____________________________________________________________________________

Artigo 1710º
Forma da convenções antenupciais
As convenções antenupciais são válidas se forem celebradas por declaração prestada perante
funcionário do registo civil ou por escritura pública

_____________________________________________________________________________

As convenções antenupciais são válidas se celebradas por declaração perante funcionário do


registo civil ou escritura pública – Acordos de revogação ou modificação da convenção
antenupcial (feitos antes do casamento) estão subordinados também a estes requisitos (1712º/2)

O registo é condição de eficácia legal da convenção perante terceiros: As convenções apenas


produzem efeitos em relação a terceiros depois de efetuado o registo – 1711º/1 – Em regra, o
registo não tem efeito retroativo perante terceiros (191º/1 CRC) – MAS, o 191º/2 CRC quanto ao
casamento católico define que os efeitos do registo da convenção lavrado simultaneamente com
a transcrição do casamento retroagem, perante terceiros, à data da celebração do casamento, desde
que este tenha sido transcrito dentro dos 7 dias imediatos (o mesmo se aplicará ao casamento civil
sob forma religiosa)

Independentemente do registo, a convenção é oponível entre as partes (1711º/1 a contrario) – são


tidas como partes, os cônjuges, e outorgantes que não sejam esposados, e os herdeiros de uns e
outros

REVOGAÇÃO E MODIFICAÇÃO DA CONVENÇÃO

 Antes da celebração do casamento – Principio geral da modificação ou extinção


por mutuo consentimento dos contraentes – 1712º/1

A falta de intervenção de alguma das pessoas que outorgaram a primeira convenção ( sem ser os
cônjuges – JDP) não implica a irrelevância total da convenção revogadora ou modificadora –
Aquele que outorgou a primeira mas não a segunda, tem apenas o direito de resolver as cláusulas
da nova convenção que lhe digam respeito – 1712º/3

 Depois da celebração do casamento – Principio da imutabilidade – Artigo 1714º/1


Funda-se na tentativa de evitar que um cônjuge, por causa do domínio psicológico ou afetivo do
outro, aceite alterações que o prejudiquem do ponto de vista patrimonial. - Há também a ideia de
que, após o casamento se torna difícil um exercício autentico da autonomia privada na elação
entre os cônjuges Mas a lei estabelece exceções a este principio no artigo 1715º

94
INVALIDADE E CADUCIDADE DA CONVENÇÃO

À convenção antenupcial aplicam-se as regras gerais sobre invalidade dos negócios jurídicos, com
ressalva do artigo 1709º que estabelece um regime especial para a incapacidade de exercício.

Cláusulas que não respeitem o 1699º ou outros preceitos legais injuntivos são nulas nos termos
do 294º

 MAS, entre as cláusulas nulas importa destacar aquelas pelas quais os nubentes
´pretendam modificar os efeitos do casamento, ou submetê-lo a condição, a termo ou
preexistência de algum facto` que se têm por não escritas – Artigo 1618º/2 – As clausulas
não escritas não determinam a invalidade de toda a convenção e são insuscetíveis de
conversão – é um desvio ao regime geral do 292º e um afastamento total do 293º

De acordo com o 1716º a convenção antenupcial caduca se o casamento não for celebrado dentro
de 1 ano ou se, tendo-o sido, vier a ser declarado nulo ou anulado – Estes dois casos de caducidade
demonstram o caráter acessório da convenção antenupcial relativamente ao casamento

Graças ao principio da boa fé, a não celebração do casamento dentro de 1 ano ou a declaração de
nulidade ou anulação do casamento não implicam necessariamente a ineficácia da convenção –
Ao excetuar o disposto em matéria de casamento putativo, o 1716º reconhece expressamente um
limite ao funcionamento da regra tradicional de que o que é acessório segue o regime do principal
em caso de invalidade do casamento – se ambos os cônjuges tiverem contraído de boa fé o
casamento anulado ou declarado nulo, a convenção é plenamente eficaz até transito em julgado
da sentença de anulação ou até ao registo nos termos do artigo 1647º

DOAÇÕES PARA CASAMENTO

_____________________________________________________________________________
CAPÍTULO X
Doações para casamento e entre casados
SECÇÃO I
Doações para casamento

Artigo 1753º
Noção e normas aplicáveis
1.Doação para casamento é a doação feita a um dos esposados, ou a ambos, em vista do seu
casamento.
2. Às doações para casamento são aplicáveis as disposições da presente secção e, subsidariamente,
as dos artigos 940º a 979º.
_____________________________________________________________________________

Traduz-se numa doação em sentido técnico (940º) mas não se confunde com as prendas para
casamento ou donativos (estes últimos inserem-se nos artigos 1592º e 1593º). A causa jurídica da
doação é o casamento, pelo que depende dele (1760º)

Seguindo o artigo 1754º existem dois tipos de doações para casamento:

▪ Doações entre esposados – Feitas por um dos esposados ou pelos dois reciprocamente;
▪ Doações de terceiro – Feitas por um terceiro a um ou ambos os esposados;

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Quanto ao momento da eficácia, as doações para casamento podem ser:

▪ Inter vivos – O efeito de transmissão da propriedade da coisa ou da titularidade de outro


direito produz-se em vida do doador;
▪ Mortis causa – Os efeitos produzem-se com a morte do doador;

Salvo estipulação em contrário, as doações para casamento relevam como doações inter vivos e
produzem efeitos a partir da celebração do casamento.

O regime especifico das doações para casamento é regulado pelos artigo 1753º a 1760º - As
doações para casamento mortis causa estão subordinadas ainda ao que se dispõe nos artigos 1701º
a 1703º - tal como define o 1753º/2 | O regime especial das doações para casamento consagra dois
desvios ao regime geral:

✓ Admitem-se as doações por morte ( em regra proibidas pelo 946º/1);


✓ Ao abrigo do 975º al a) – A doação para casamento não é revogável por ingratidão do
donatário;
✓ O 1757º é uma norma supletiva que prevê a incomunicabilidade dos bens objeto de
doação entre esposados, em qualquer que seja o regime de bens – A qualidade (própria
ou comum) dos bens doados por terceiros será, naturalmente, a que resultar da aplicação
das regras do regime de bens que vigorar para o casamento

Doações para casamento apenas podem ser feitas em convenção antenupcial – 1756º/1, celebrada
quer por escritura pública quer por declaração prestada perante funcionário do registo civil –
Artigo 1710º - A inobservância desta forma leva à consequência do 1756º/2 que é a nulidade
quanto às doações por morte. Em caso de inobservância nas doações entre vivos ela não é inválida:
apenas não se aplicam as regras especiais desta secção mas aplicam-se antes ao regime geral das
doações para casamento.

Por se integrarem nas convenções antenupciais, as doações para casamento são reguladas,
subsidariamente, as normas das convenções (que prevalecem sobre as normas gerais das doações).
Assim: A capacidade do esposado para fazer doações para casamento – Artigos 1708º e 1709º;
essas doações apenas produzem efeitos em relação a terceiros depois de registadas as respetivas
convenções – 1711º/1; antes da celebração do casamento, todas as doações para casamento são
revogáveis nos termos do 1712º

Após a celebração do casamento, o regime da revogação das doações é diverso:

▪ Doação feita por terceiro: segue o regime geral da revogação por mutuo consentimento –
Artigo 406º/1;
▪ É vedado ao autor de doações mortis causa prejudicar o donatário por atos gratuitos de
disposição (1701º/1)
▪ Doações mortis causa de bem determinado – Não havendo consenso para a revogação, é
possível conseguir conversão do objeto da doação, com a autorização do donatário, nos
termos do artigo 1701º/1 e 2
▪ Doações entre esposados (mortis causa e inter vivos) – irrevogáveis por força do 1758º;

A lei estabelece ainda casos especiais de caducidade no artigo 1760º

 A lei nº 61/2008, de 31 de outubro aboliu a declaração do cônjuge culpado no


divórcio e modificou o artigo 1791º/1 – Elimina-se a necessidade de apurar culpado no

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divórcio – Há assim uma incompatibilidade entre o que consta no artigo 1760/1 b) e 2
com a mais recente alteração do artigo 1791º pelo que se tem entendido que existiu uma
revogação tácita desses preceitos do 1760 pelo novo preceito do 1791º

O artigo 1703º/1 prevê uma causa de caducidade que se aplica exclusivamente às doações para
casamento mortis causa: morte do donatário antes do doador Contudo, se a doação for feita por
terceiro e ao doador sobreviverem descendentes do donatário, nascidos do casamento, afasta-se a
caducidade, determinando que estes serão chamados a suceder nessa doação – único exemplo de
direito de representação na sucessão contratual

EFEITOS DO CASAMENTO NO CAMPO ATIVO PATRIMONIAL

Regime de bens:

▪ sentido amplo: complexo de normas relativas aos efeitos do casamento que se


produzam, no plano patrimonial, durante a subsistência do vinculo matrimonial e não
estejam estritamente ligados à disciplina dos deveres dos cônjuges | Distingue-se ainda:
▪ Regime patrimonial primário/efeitos gerais patrimoniais - regras
sobre administração e disposição dos bens do casal, bem como regras
sobre responsabilidade por dividas – injuntivas
▪ Regime patrimonial secundário/efeitos especiais patrimoniais –
regras sobre titularidade de bens – supletivas

Esta divisão é superficial pois sendo certo que o regime primário é tendencialmente injuntivo, há
também regras injuntivas no âmbito do regime patrimonial secundário (tal como o 1720º)

▪ Sentido restrito: conjunto de regras cuja aplicação define a titularidade sobre os


bens do casal – são as regras que permitem saber se um bem pertence ao património
comum, próprio ou ao património do outro – É a aceção adotada em DT família

Os regimes de bens podem ser agrupados segundo duas grandes classificações:

➢ Regimes típicos – enquadram-se num dos tipos previstos na lei. São os regulados
nos artigos 1721º a 1736º:
▪ Comunhão de adquiridos – Regra: são bens comuns o produto do
trabalho do cônjuges e os bens adquiridos por eles na constância do
matrimónio a titulo oneroso – Artigos 1724º e 1722º/1. Todos os outros
bens tendem a ser próprios.
▪ Comunhão geral – Regra: São bens comuns todos os que a lei não
considera incomunicáveis – Artigo 1732º. Assim, tendem a ser comuns
bens que os cônjuges tinham ao tempo da celebração do casamento e
aqueles que eles venham a adquirir posteriormente a titulo gratuito
▪ Separação de bens – Não há bens comuns – todos os bens são próprios
de um ou outro cônjuge. O 1735º afirma que cada um dos esposados
conserva o domínio de todos os seus bens presentes e futuros. Podem
haver bens que pertençam em compropriedade a ambos os cônjuges –
Não são bens comuns, mas antes um bem que numa parte é próprio de
um deles e que noutra parte é próprio do outro – Neste sentido, por
exemplo, se os nubentes convencionarem que um imóvel comprado por
um deles antes do casamento pertencerá em compropriedade a ambos, a
estipulação será compatível com o regime da comunhão de adquiridos

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mas também com o regime da separação, mas não com o regime da
comunhão geral
➢ Regimes atípicos – todos os outros

Outra contraposição:

➢ Regimes convencionais – Aqueles que podem ser fixados pelas partes. A estipulação de
um regime tem de ser feita na convenção antenupcial e, em principio, pode consistir quer
na escolha de um regime típico quer na fixação de um regime atípico
➢ Regimes supletivos – Vigoram na falta de estipulação válida e eficaz das partes. Artigo
1717º - regime supletivo: comunhão de adquiridos (mas para os casamentos celebrados
até 31 de maio de 1967 o regime supletivo é o da comunhão geral)
➢ Regimes imperativos – vigoram num casamento mesmo contra a vontade das partes –
1720/1:
o Casamento urgente – regime de separação de bens;
o Casamento por quem tenha completado 60 anos de idade – regime de separação
de bens;
 Além disso:
 É nula a doação entre casados – 1762º ainda que seja válida a doação entre
esposados (aqueles que, ainda que o pretendam, ainda não casaram)
 A posição sucessória do cônjuge sobrevivo não é afetada pelo facto de ter
contraído casamento sob o regime imperativo da separação de bens – Os artigos
2133º e 2317º apenas afastam o cônjuge separado de pessoas e bens

A imposição legal da separação de bens é entendida como um instrumento dissuasor do casamento


por interesse económico – Este fim que se pretende alcançar não justificaria uma regulamentação
menos favorável para o cônjuge sobrevivo em matéria de sucessão ? – Não há limitações aos
direitos de sucessão ao cônjuge sobrevivo nestas condições, pelo que aquilo que não herda ou não
comunga em vida, poderá beneficiar aquando da morte.

Outra critica: A sujeição ao regime imperativo do casamento celebrado por quem tenha
completado 60 anos funda-se na suspeita de interesse económico da outra parte, e funda-se no
pressuposto de que uma pessoa com 60 ou mais ou anos terá pouco tempo e qualidade de vida –
Este pressuposto não é adequado à realidade portuguesa e é de difícil harmonização com o
principio da igualdade do artigo 13º CRP

Comunhão conjugal de bens

Compropriedade Comunhão conjugal


- Tem na base uma - os sujeitos da comunhão conjugal são titulares de um único
pluralidade de direitos da direito sobre o chamado bem comum
mesma espécie que - Não é correto afirmar que a comunhão conjugal seria uma
recaem sobre o mesmo comunhão sem quotas – cada cônjuge tem necessariamente uma
bem; quota na comunhão que é designada de meação nos bens comuns
- A contitularidade - Aquilo que acontece é que um cônjuge não pode dispor válida e
termina com a divisão da eficazmente da sua meação nos bens comuns, enquanto não cessar
coisa comum, que pode a própria comunhão patrimonial
ser exigida, a todo o - 1730º/2 permite doações por conta da meação e não doações da
tempo, por qualquer dos própria meação

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consortes, a não ser que - Não é suficiente uma manifestação de vontade das partes para
exista uma cláusula de pôr fim à contitularidade;
indivisão (1412º) - As quotas são idênticas: 50 -50: os sujeitos participam por
- Os direitos dos consortes metade no património comum, sendo nula qualquer estipulação
podem ser diferentes em contrário (1730º/1);
(1403º/1) - Regras sobre administração e disposição dos bens em
- Regras sobre contitularidade: Artigos 1678º a 1687º;
administração e - A comunhão conjugal destina-se, preferencialmente, à
disposição dos bens em satisfação de dividas que responsabilizem ambos os cônjuges
contitularidade: Artigos (1695º/1)
1406º, 1407º, 1408º/1 e 2

Mas há regras sobre comunhão conjugal que pela ratio se aplicam à compropriedade entre
cônjuges: Artigo 1699º/1 al. d) – pretende assegurar a um cônjuge a titularidade exclusiva de
certos bens

A constituição de compropriedade depende de um contrato oneroso ou gratuito: se um bem


pertencente apenas a um dos cônjuges passar, sem qualquer contrapartida do outro, a pertencer
em compropriedade tende a aplicar-se as regras da doação

---------- COMUNHÃO DE ADQUIRIDOS ----------

É o regime convencional ou supletivo desde que não se esteja perante uma situação de regime
imperativo da separação de bens – será convencional quando adotado em convenção antenupcial
e supletivo na falta de convenção ou no caso de caducidade invalidade ou ineficácia da convenção

1724º central – quanto à alínea a) – Alguns defendem que continuam a ter natureza de comum,
os bens adquiridos em substituição de salários, tal como as reformas, etc. – O próprio 1699º/1 d)
define como incomunicáveis esses bens: pensões e complementes de reforma que são direitos
estritamente pessoais e excetuados da comunhão pelo próprio 1733º/1 al. c)

Quanto à alínea b) – Em regra, são comuns os bens adquiridos, onerosamente, pelos cônjuges na
constância do património (o 1722º/1 b) excetua da comunhão os bens que os cônjuges adquiram
depois do casamento por sucessão ou doação – contudo, os bens havidos por meio de doação ou
deixa testamentaria de terceiro entram na comunhão desde que não integrem a legitima, se o autor
tiver determinado a sua comunicabilidade (1729º).

Serão bens próprios:

✓ Salvo estipulação em contrário, os bens doados por um esposado ao outro não se


comunicam (1757º);
✓ Os bens doados por um cônjuge ao outro – 1764º/2;
✓ Bens que cada um dos cônjuges tenha ao tempo da celebração do casamento – 1722º/1,
alínea a);
✓ Bens adquiridos na constância do matrimonio anterior, por virtude de direito próprio
anterior – 1722º/1 al c);
✓ Bens sub-rogados no lugar de bens próprios – 1723º;
✓ Bens adquiridos maioritariamente com dinheiro/bens próprios de um dos cônjuges –
1726º/1;

99
✓ Parte adquirida em bens indivisos pelo cônjuge que dele for comproprietário fora da
comunhão – 1727º;
✓ Bens adquiridos por virtude de titularidade de bens próprios, que não possam considerar-
se como frutos destes – 1728º/1;
✓ Bens do 1733º/1;

Na duvida sobre a natureza dos bens moveis, presumem-se comuns por força do 1725

O artigo 1722º/2 é meramente exemplificativo de bens que se consideram adquiridos na


constância do matrimónio em virtude de direito próprio anterior, sem prejuízo da compensação
que poderá ser devida ao património comum – A compensação é sempre devida quando a
aquisição de bens qualificados como próprios não tenha sido efetuada inteiramente à custa do
património próprio do adquirente

No elenco do 1722º/2 poderia fazer ainda parte: bens adquiridos depois do casamento por causa
de negócios aleatórios celebrados antes dele (como o dinheiro de um boletim do Euromilhões
registado antes do casamento); os bens adquiridos por força da condição ou termo verificada
durante o casamento, que foi inserida num contrato celebrado anteriormente.

E os bens adquiridos depois do casamento, em cumprimento de contrato promessa anterior ? –


Alguma jurisprudência defende que apenas seria próprio se esse contrato tivesse eficácia real –
JDP não encontra nenhuma base para tal distinção (alias, o 1722º/1 c) – ressalva o direito de
preferência sem distinguir consoante a eficácia real, pelo que não se aplicará também ao contra
promessa) – o contrato promessa anterior caberá nesta previsão independentemente de o contrato
ser ou não dotado de eficácia real.

Artigo 1723º - É particularmente polémica a consequência da falta de menção documental da


natureza própria dos meios empregues na aquisição de outros bens (exigência do 1723º, alínea d):

▪ Alguma doutrina sustenta que os bens adquiridos com dinheiro ou valores próprios
seriam comuns nos termos do 1724º cabendo ou não ao cônjuge adquirente um crédito
de compensação sobre o património comum
▪ Outra setor doutrinário defende que esses bens são próprios na relação entre os cônjuges
ou quando a atribuição desse caráter não afete interesses de terceiros – JDP concorda
mais com esta – A exigência do documento pretende proteger terceiros. Ademais, admitir
que um bem adquirido com dinheiro ou valores próprios seja considerado como comum
apenas por ter faltado a menção da proveniência desse dinheiro é admitir uma
transferência a titulo gratuito, de um património próprio para um património comum que
nem sequer é suscetível de ser entendida como uma doação válida – a simples ausência
de menção não pode ser tida como uma doação, e ainda que se pretendesse que fosse,
isso não seria possível pois os bens objeto de doação entre cônjuges não se comunicam
 Assim, e no plano estrito da relação entre cônjuges: Não há motivo para se afastar a
natural aplicação do principio da sub – rogação real, independentemente da menção.
 Quanto aos interesses dos terceiros – São estes interesses que justificam a exigência
de menção – visa-se proteger o terceiro que beneficia de um crédito, hipotecário ou
não, garantido pelo património comum do casal ou pela meação do cônjuge que não
era titular do dinheiro ou dos valores aplicados na aquisição e que confiou
legitimamente na natureza comum do bem adquirido, devido à regra geral aplicável
aos bens adquiridos pelos cônjuges na constância do matrimónio (1724º, al b)

100
 Tudo ponderado, é de concluir que, se não for afetado o interesse de terceiros, o bem
adquirido será próprio. Se colocar em causa a posição de terceiros, sem que nenhum
deles tenha intervindo na escritura de retificação, o bem adquirido será comum
restando ao cônjuge o direito a ser compensado.

Artigo 1726º não resolve as situações em que um bem é adquirido com 50 % de bens comuns e
50 % de bens próprios – esse bem será comum por força do 1724º alínea b) e o cônjuge que
contribuiu com bens próprios será beneficiado com um crédito de compensação sobre o
património comum nos termos gerais

---------- COMUNHÃO GERAL DE ADQUIRIDOS ----------

Vigora como regime supletivo, relativamente aos casamentos celebrados até 31 de maio de 1967
– As normas deste regime estão previstas nos artigos 1722º a 1731º e são idênticas para o regime
convencional e para o regime supletivo

O património comum é constituído por todos os bens dos cônjuges que não sejam excetuados por
lei (1732º) – Não é correto afirmar que a comunhão geral de adquiridos implica a inexistência de
bens próprios | Não integram o património comum:

✓ Bens do 1733º/1;
✓ Bens doados por um cônjuge ao outro – 1764º/2;
✓ Bens doados por um esposado ao outro, salvo estipulação convencional em contrário –
Artigo 1757º;

São bens comuns:

✓ Os frutos dos bens incomunicáveis e as benfeitorias realizadas nesses mesmos


bens – Artigo 1733º/2 – Aquilo que é incomunicável é o bem em si, e não os proventos
que dele advêm;

---------- SEPARAÇÃO DE BENS ----------

Além de regime convencional, vigora enquanto regime imperativo nos casos do artigo 1720º. Os
artigos 1735º e 1736º aplicam-se tanto ao regime imperativo quer ao regime convencional da
separação de bens.

As diferenças de regulação prende-se no campo da doação entre casados: elas são válidas no
regime de separação de bens se esse regime foi adotado pelas partes, mas serão inválidas se esse
regime for imposto por lei – Artigo 1762º

Não há bens comuns – os bens pertencem a um cônjuge, em propriedade exclusiva, ou a ambos,


em compropriedade. É necessário por isso ter em atenção o regime da compropriedade – Artigo
1403º e ss.

O 1735º - os cônjuges podem dispor livremente dos seus bens próprios. Apenas em remotas
hipóteses a prática de atos de disposição de bens próprios pelo respetivo titular carece do
consentimento do outro cônjuge, nomeadamente: Artigo 1682º/3, al a), 1682º - A/2 e 1682º - B

Assim, nem no regime de separação existe uma total independência patrimonial.

101
O regime da separação de bens não impede que um cônjuge suceda a outra na qualidade de
herdeiro legitimo e legitimário – Mas a lei 48º/2018, de 14 de Agosto admite que uma estipulação
em convenção antenupcial, daqueles que se vão casar no regime convencional ou imperativo da
separação de bens, renunciem reciprocamente à futura condição de herdeiro legitimário

---------- REGIMES ATÍPICOS ----------

São aqueles que se demarcam, em algum aspeto, de um dos regimes previstos no CC |EX.: Um
dos nubentes diz que todos os bens serão próprios, com exceção de um bem presente, que será
comum – Não se trata do regime típico da separação de bens, que é incompatível com a previsão
de um bem comum (não importa aquilo que as partes dizem que é, mas aquilo que realmente é)

Os regimes atípicos têm de ser fixados em convenção antenupcial e estão submetidas às restrições
comuns do principio da liberdade de estipulação em matéria de regime de bens | EX.: O artigo
1699º/1 d) não impede a adoção de um regime atípico de comunhão em que sejam próprios os
frutos dos bens incomunicáveis (o nº2 não reveste carater imperativo)

Se na fixação de um regime atípico (sem que a convenção resolva, diretamente ou por remissão
para um regime típico) o problema da titularidade de todos os bens do casal há que: 1º Aplicar as
regras gerais sobre interpretação do negócio jurídico e; 2º aplicar as regras da comunhão de
adquiridos naquilo em que a convenção for omissa | EX.: É celebrado um regime atípico em que
se estipula que o imóvel X levado para o casamento é comum, a natureza dos demais bens é
apurada com base nos artigos 1722º e s. – será comum o produto do trabalho dos cônjuges – artigo
1724º alínea a)

A ratio dos artigos 1682º - A/1 e 1683º/2 ajuda a concluir sobre a disciplina que cabe aos atos de
disposição nos regimes atípicos: No caso de alienação ou oneração de imóvel, o consentimento
conjugal só é dispensado se estiver em causa um imóvel próprio cujos frutos sejam igualmente
bens próprios; no caso de repudio, o consentimento comum deixa de ser exigido se, por força do
regime matrimonial adotado, tanto os bens adquiridos por via sucessório como os respetivos
frutos forem tidos como bens próprios.

Quanto às dividas: Normas que aludam especificamente a um regime típico de bens são
analogicamente aplicáveis aos regimes atípicos em que predomine a componente do regime típico
que é referido | EX.: Se as partes convencionaram que haveria um bem comum e apenas um, a
responsabilidade dos cônjuges por dividas comunicáveis será parciária, por analogia com o
disposto no artigo 1695º/2.

MODIFICAÇÃO SUPERVENIENTE DO REGIME DE BENS

O 1714º/1 consagra o principio da imutabilidade do regime de bens pois determina que após a
celebração do casamento, não é permitida a revogação ou modificação da convenção antenupcial
nem a alteração do regime de bens legalmente fixado, a não ser nos casos previstos na lei | As
exceções são escassas: são as do 1715º - este principio visa a proteção de um cônjuge perante
outro.

Como tal, JDP defende que teria sido razoável permitir a modificação por consenso, sempre que
se verificasse judicialmente, não haver risco de prejuízo patrimonial para qualquer um deles – ou
seja, seria preferível um sistema de modificabilidade em que o acordo estivesse sujeito a

102
homologação judicial (que garantiria que não existiria esquemas que prejudicasse um dos
cônjuges ou até mesmo um terceiro, por exemplo, em matéria de dividas e de bens que respondem
às mesmas)

Mas não se devem considerar abrangido por este principio da imutabilidade os negócios que
afetam a qualificação de bens concretos, como comuns, próprios ou outro – esses negócios serão
válidos na falta de disposição contrária (como é o 1714º/2)

Simples separação judicial de pessoas e bens: separação superveniente de bens que se traduz
numa modificação da relação matrimonial, apresentando caráter necessariamente litigioso: A
separação apenas pode ser decretada em ação intentada por um dos cônjuges contra o outro –
Artigo 1768º

Esta ação, fundamentada através do 1767º, destina-se a proteger os bens comuns ou bens próprios
do cônjuge que a propõe – A legitimidade para interpor esta ação é regulada no artigo 1769º.

Os efeitos são os estatuídos pelo artigo 1770º - A estes há que acrescentar a exclusão do 1678º/2
alínea e) e f) ( mas não a g)

A simples separação judicial é irrevogável

O artigo 1715º/1 al d) alude a outros casos de separação superveniente de bens, além da simples
separação judicial de pessoas e bens, que são:

✓ Ausência na fase de curadoria definitiva – Artigo 108º;


✓ Ausência na fase de morte presumida – Artigo 115º;
✓ Separação de meação decretada no âmbito de uma execução – Artigo 740º CPC
– ocorre quando a execução tenha sido movida contra um só cônjuge, isto é, na situação
de divida incomunicável. É ainda necessário que hajam sido penhorados bens comuns do
casal por conta da divida incomunicável e que o outro cônjuge tenha requerido a
separação;

ADMINISTRAÇÃO DOS BENS DO CASAL

O artigo 1678º fixa os poderes de administração dos bens do casal que cabem a cada um dos
cônjuges - Mas para determinar a legitimidade de cada um dos cônjuges no que toca à prática de
atos de administração que constituam simultaneamente atos de disposição, é necessário consultar
os artigos 1682º a 1683º

Este 1678º regula inteiramente os atos de administração que não se enquadram na categoria de
atos de disposição.

As regras sobre administração são imperativas ( pelo 1699º/1 c) pelo que alguma doutrina defende
que o artigo 1678º tem também carater imperativo, ainda que a alínea g) permita que uma das
partes (mediante mandato) se afaste da regra geral de administração de bens próprios - Assim,
este 1678º/2 g) permite que os cônjuges estipulem através de mandato revogável uma qualquer
regra de administração, ainda que diversa do restante artigo.

 Assim, é preferível falar de uma supletividade condicionada à celebração de um


mandato livremente revogável – Aquilo que o legislador quis proibir com o 1699º/1 c)

103
foi apenas uma alteração irrevogável das regras da administração previstas no artigo
1678º

Regra geral de administração dos bens comuns – 1678º/3 – cada um dos cônjuges tem
legitimidade para a pratica de atos de administração ordinária, mas os restantes atos apenas podem
ser praticados com o consentimento de ambos | Assim, há que distinguir entre gestão ordinária e
extraordinária:

▪ Ordinária: corresponde à gestão normal – Atos que, não alterando a substancia da coisa,
se destinam à sua frutificação ou conservação | EX.: Pintura de uma casa de que os
cônjuges são proprietários e pretendem arrendar
▪ Extraordinária: todos os outros

Aquilo que importa é a normalidade ou não da gestão, critério que tem de ter em conta: a
frequência da realização do ato, condições económicas do casal, grau de repercussão na esfera
jurídica dos cônjuges. No caso de atos de administração ordinária incompatíveis, prevalecerá o
ato praticado em primeiro lugar, porque o respetivo agente dispunha dos poderes necessários para
o praticar

Nos casos de administração extraordinária por um cônjuge sem o consentimento do outro, o ato
apenas será válido se o cônjuge obteve autorização judicial – 1684º/3 ou se o outro não se opôs,
sabendo daquele ato

Exceções à regra geral de administração dos bens comuns (regra do 1678º/3)

✓ Administração ordinária de uma participação social em sociedade comercial que


constitua bem comum cabe apenas ao cônjuge que celebrou o contrato de sociedade ou,
no caso de aquisição posterior ao contrato, àquele por quem a participação tenha vindo
ao casal – Resulta do artigo 8º do CSC – O outro cônjuge não será impedido de exercer
a administração, nos termos da lei civil, quando este estiver impossibilitado, por qualquer
causa, de a exercer;
✓ Também as 4 primeiras alíneas do artigo 1678º/2 conferem poderes exclusivos de
administração, quer ordinária como extraordinária a um dos cônjuges
o A alínea a) do 1678º ainda que referindo-se aos proventos do trabalho que sejam
comuns por força do regime de bens que vigora no casamento, não exonera o
cônjuge que os recebe do cumprimento do dever conjugal de assistência – Ele é
livre de aplicar os seus rendimentos do trabalho como entender mas só depois de
ter realizado a contribuição para os encargos da vida familiar ou a prestação de
alimentos a que possa estar vinculado

As restantes alíneas deste artigo preveem exceções tanto à regra geral sobre administração dos
bens próprios como à regra geral sobre administração dos bens comuns

▪ A alínea e) do 1678º/2 exprime a relevância profissional no direito matrimonial -cada um


dos cônjuges tem a administração dos bens móveis (mas não imóveis), sejam eles comuns
ou próprios, que utiliza como instrumento de trabalho – Assim pretende-se assegurar ao
cônjuge o livre uso dos seus instrumentos de trabalho
 Mas estes não é um valor absoluto: o inicio da utilização exclusiva por um
cônjuge de um bem movel que não lhe pertence carece de autorização do outro cônjuge

104
que é o titular – Essa utilização e administração exclusiva tem de resultar da celebração
de um acordo sobre orientação da vida em comum
▪ Alínea f) – Só se verificará quando estejam cumulativamente preenchidos dois
pressupostos: Impossibilidade de exercício da administração dos bens pelo outro cônjuge
e falta de procuração bastante para a administração desses bens
 Impedimento do exercício: Deve ter caráter permanente ou durável que
justifique a transferência de poderes – Esta disposição não se aplicará quando a
impossibilidade for meramente temporária/eventual (caso em que se aplicará o 1649º/2)
| A lei especifica duas causas de impossibilidade não meramente temporárias do exercício
de administração:
• Ausência em lugar remoto – Não presença por estar em sitio longínquo que
torne inviável ou absurdamente dispendiosa e imprática a administração a tal
distancia e que não permita, portanto, esperar pelo regresso do ausente
• Ausência em lugar não sabido – Ausência em sentido técnico, similar ao do
artigo 89º/1 – Conjugação da curadoria provisória com o 1678º - Para JDP a
instauração da curadoria provisória afasta as regras especificas da administração
dos bens do casal, pois a curadoria confere maior proteção ao ausente casado pois
os poderes individuais de administração são mais restritos (94º) e o curador
provisório está obrigado a prestar contar (95º/1)
• Tendo sido decretado o acompanhamento do cônjuge impossibilitado de exercer
a administração, deixa de se aplicar o 1678º/ e prevalece o regime que oferece
maiores garantias de proteção do interesse do incapaz que é o regime do maior
acompanhado
 Falta de procuração: procuração bastante será aquela que torna dispensável a
transferência (total ou parcial) de poderes de gestão para o outro cônjuge – os poderes de
procurador não podem ser menores do aqueles que cabem a um cônjuge administrador

Após a simples separação judicial de bens ao inaplicáveis as alíneas e) e f) do 1678º/2

A violação do 1604, alínea a) origina uma exceção ao principio da administração intraconjugal


dos bens do casal – se o menor casar sem autorização dos pais ou tutor a administração dos bens
que ele tiver ao tempo da celebração do casamento ou dos bens que venha depois a adquirir a
titulo gratuito incumbe, até à maioridade, aos seus representantes legais (1649º) – Até à
maioridade esses bens não podem ser administrador por nenhum dos cônjuges pelo que antes dos
18 anos, e quanto a esses bens, não será invocável o artigo 1678º

REGIME DO EXERCÍCIO DA ADMINISTRAÇÃO CONJUGAL

O artigo 1681º estabelece um regime especial de exercício da administração conjugal que cobre
4 situações:

✓ Administração ao abrigo do disposto no 1678º/2 al. a) a f);


✓ Administração fundada em mandato – Artigo 1678º/2 al. g);
✓ Administração fundada em aparência de mandato;
✓ Entrada na administração de bens comuns ou bens próprios do outro cônjuge sem poderes
e com oposição expressa desse outro cônjuge

105
Mas é possível extrair outras soluções:

✓ Administração ao abrigo do disposto no 1678º/1 e 3;


✓ Gestão dos bens próprios sem poderes, havendo oposição expressa do outro cônjuge
administrador;
✓ Prática de atos de administração sem poderes, não havendo conhecimento do cônjuge
administrador;

1681º/1 – A dispensa de apresentar contar e a sujeição à responsabilidade civil apenas quanto aos
danos resultantes de atos dolosos (retira os negligentes) de gestão é justificado com a paz familiar
– São alguns que criticam esta imunidade relativa por identificar denegação de tutela com
ausência de conflitualidade. JDP critica também a jurisprudência que considera não estarem
abrangidos por estes atos, as omissões intencionais – ignora o facto de serem mais frequentes atos
de negação deliberada e intencional do que atos de administração intencionalmente ruinosos e
também não tem em conta atitudes de abstenção tomadas pelo cônjuge administrador com o
intuito de prejudicar o outro

1681º/2 Ao remeter para as regras do mandato, está a submeter o cônjuge administrador ao regime
geral da responsabilidade civil obrigacional – Artigos 798º e 799º - Esse cônjuge pode ser
obrigado a indemnizar o outro pela prática de atos (ou omissões) meramente culposos (dada a
discrepância com o nº1, defende JDP ser necessário abolir a imunidade desse mesmo nº1)

 O mandato conjugal é livremente revogável – Mas esta revogabilidade não advém


das regras do mandato mas da proibição de estipulações que modifiquem de modo
irreversível as regras sobre administração dos bens do casal – Fazer depender a revogação
do mandato do acordo do mandatário ou terceiro poderia ser uma perda definitiva dos
poderes de administração que a lei reconhece originariamente ao cônjuge mandante

Atendendo ao dever de cooperação o mandato presume-se gratuito

1681º/2, 1ª parte – Administração por um cônjuge sem poderes legais ou contratuais para tal, mas
com o conhecimento e sem oposição expressa do outro cônjuge, está subordinada ao regime da
administração conjugal fundada em contrato de mandato – Não é um mandato tácito pois ela tem
lugar apesar do silencio ou até da oposição tácita do outro -É sim uma manifestação especifica da
tutela da confiança de 3º na legitimidade do cônjuge que praticar atos de gestão, confiança que é
protegida em virtude de não haver oposição expressa, cognoscível do outro cônjuge e do facto de
o homem comum presumir que a ação de um cônjuge se baseia num acordo realizado entre ambos
os membros do casal - À partida a legitimidade do mandatário aparente está confinada ao
perímetro da administração ordinária, salvo prova de que o conhecimento e a falta de oposição
expressa do outro cônjuge também compreendem o inicio de atividade extraordinária

É ilegítima a atuação de um cônjuge cuja gestão não lhe caiba, e em que existe oposição direta do
outro cônjuge – responde o 1681º/3 2ª parte – o cônjuge administrador é como possuidor de má
fé e tem de indemnizar o outro cônjuge pela perda ou deterioração dos bens administrados ainda
que não tenha agido com culpa (1269º a contrario) e pelo valor dos frutos que deixou de obter por
culpa sua e que um proprietário diligente teria obtido

JDP considera que o cônjuge administrador ao abrigo do 1678º/1 e 3 não está isento de
responsabilidade civil:

106
✓ A administração de bens próprios com base na regra do 1678º/1 não está isento
de responsabilidade civil, e é suscetível de causar danos ao outro se colidir com o dever
de assistência a que o cônjuge administrador está vinculado em qualquer dos regimes, ou
se implicar uma frutificação inferior àquela que um proprietário diligente poderia ter
obtido Mas terá de existir dolo (por identidade de razão com as alíneas anteriores)

O artigo 1687º trata apenas de atos de disposição e não de atos de administração – Mas, aos
simples atos de administração praticados sem legitimidade para o efeito é analogicamente
aplicável a disciplina estabelecido pelo 1687º: Todos serão anuláveis com exceção daqueles que
respeitem a bens próprios do outro cônjuge, que serão nulos nos termos do 1687º/4

Providências administrativas

O que pode fazer o cônjuge que não tem a administração dos bens ? Pode:

• Tomar medidas de caráter administrativo relativamente aos bens, enquanto gestor de


negócios nos termos do 464º e ss.;
• Atuar nos termos do 1679º - É uma manifestação particular da figura de gestão de
negócios no campo das relações patrimoniais dos cônjuges | EX.: Situação em que, se
revelando urgente a reparação do telhado de uma casa para evitar a entrada de chuva, o
cônjuge a quem incumbia a administração do imóvel se ausentou por 2 dias

Ao contrário do que acontece no 1678º, no artigo 1679º a impossibilidade em questão é


temporária, eventual ou transitória – E as providências apenas podem ser tomadas se do atrasar
destas medidas resultarem prejuízos

Assim, o 1679º destina-se a evitar que o dono do negócio sofra prejuízos – diferente da figura
geral da gestão de negócios (esta permite ao gestor qualquer atuação no interesse do dono do
negócio – designadamente uma atuação que vise a obtenção de vantagens)

Contas bancárias singulares


_____________________________________________________________________________
Artigo 1680º
Depósitos bancários

Qualquer que seja o regime de bens, pode cada um dos cônjuges fazer depósitos bancários em seu
nome exclusivo e movimentá-los livremente.
_____________________________________________________________________________

Este preceito reconhece a cada um dos cônjuges um direito de liberdade contratual especifica – o
casamento não retira ao cônjuge o direito de ser parte num contrato de conta bancária, e tentar
facilitar o comércio bancário, dispensando o banco do ónus de averiguar se a constituição e a
movimentação da conta se ajustam às regras patrimoniais daquele casamento em concreto.

Mas este 1680º é uma regra de administração e não de titularidade dos bens | EX.: Se for
depositado dinheiro comum (que seja, por exemplo, correspondente ao produto do trabalho no
regime da comunhão de adquiridos) o depósito não constitui a natureza de bem próprio

107
A proteção efetiva dos direitos patrimoniais de um cônjuge depende de uma informação completa
acerca da situação dos bens do casal e dos atos que a estes respeitem – cada um dos cônjuges está
vinculado, nos termo gerais do artigo 573º e 575º a informar o outro acerca da existência da conta
singular, saldo e movimentos e a apresentar os respetivos documentos – A prestação de
informação por parte do banco seria mais fiável, mas o artigo 78º do RGICSF 9 sujeita as
instituições bancárias a um dever de sigilo sobre factos ou elementos que digam respeito à sua
relação com os clientes – esse sigilo abarca nomes de clientes, contas de depósito e movimentos
e outras operações – o artigo 79º que apresenta exceções é restrito.

Nega-se muitas vezes a informação ao cônjuge do titular, fundamentando que a informação só


pode ser prestada mediante autorização do cliente (que seria aquele em nome da qual está a conta)
ou quando exista uma disposição que limite esse dever de segredo (afirma-se que muitas vezes a
instituição pode presumir que a conta apenas é comum quando aberta em nome de ambos os
cônjuges e apenas aí incluiria os dois no circulo da confidência)

 A jurisprudência não tem concordado com este entendimento: Alguns defendem


que o sigilo é irrelevante quando possa funcionar como instrumento de fraude à lei. O
entendimento com o qual JDP parece mais concordar é o de que o cônjuge do titular
nominal da conta, casado em regime de comunhão, é um cliente para efeitos de dispensa
do sigilo bancário e por isso o banco tem de prestar informações ao cônjuge do titular
nominal da conta singular

DISPOSIÇÃO DOS BENS DO CASAL

➢ Poderes de disposição em vida sobre a generalidade dos bens móveis – Artigo


1682º - regula qualquer ato de alienação ou oneração sobre a generalidade dos bens
móveis. O conceito de oneração aqui inscrito é amplo: inclui todas as situações que levem
a uma limitação das faculdades associadas à titularidade de um direito preexistente (ex.:
a locação e o comodato de bens)

Aos bens que constituam o estabelecimento comercial (que é regulado pelo 1682º - A) aplica-se
na mesma o 1682º se essa disposição não afetar a aptidão de funcionamento desse
estabelecimento.

O 1682º/1 e 2 estabelece uma regra geral: A legitimidade para dispor tende a coincidir com a
legitimidade para administrar . O 1682º/2 não refere o 1678º/2 g) pois os poderes de disposição
que cabem ao cônjuge mandatário são os que constam do mandato . O artigo 1682º/3 contém
exceções ao principio da coincidência do âmbito dos poderes de disposição com os de
administração

O 1682º/3 a) referencia os ´móveis utilizados conjuntamente por ambos os cônjuges na vida do


lar`: Alguma doutrina defende que esses bens ´pertençam ao quadro normal da vida familiar` o
que acontecerá, por exemplo, com o automóvel habitualmente usado pela família nas deslocações
e passeios JDP defende que esse preceito destina-se a evitar que as condições
materiais de vida no lar conjugal sejam alterados por ato unilateral de um dos conjugues, pelo que
caberão nesse preceito os bens móveis que desempenhem algum papel na habitação familiar. Esse

9
Regime geral das instituições de crédito e sociedades financeiras

108
bem tem de se encontrar na casa de morada de família e tem de estar ao serviço de, pelo menos,
um dos membros do agregado familiar que aí residem

Um cônjuge pode dispor gratuitamente, de móveis comuns que administrem, nos termos do
1678º/2 al. a) a f) sem o consentimento do outro, a não ser que os móveis tenham a utilização
prevista no 1682º/3 a) – Ainda que válido, o ato de disposição traduz um empobrecimento do
património comum que se produz mesmo sem acordo do outro cônjuge – por essa razão, será
abatida metade do valor dos bens alienados ou diminuição do valor dos bens onerados na meação
do cônjuge disponente, a menos que se trate de doação remuneratória ou donativo conforme os
usos sociais (1682º/4)

➢ Poderes de disposição em vida sobre a generalidade dos bens imóveis e sobre o


estabelecimento comercial – Artigo 1682º - A – Regula atos de disposição em vida de
imóveis e de estabelecimento comercial, independentemente das regras sobre
administração e sem distinção entre bens próprios ou comuns

Para dispor do estabelecimento comercial e de todos os imóveis, exceto a casa de morada de


família, exige-se o consentimento de ambos os cônjuges a não ser que entre eles vigore regime da
separação de bens – Esta exigência prende-se com a natureza dos frutos de bens próprios: são
bens comuns – 1724º, al. b), 1728º/1 a contrario e 1733º/2. Pretende também evitar a perda ou
limitação da fonte de benefícios presumivelmente apreciáveis que, existindo, ingressam no
património comum

A simples promessa de disposição não carece de consentimento. Apenas se poderá questionar em


relação à validade desse mesmo contrato que tenha eficácia real

Não se sujeitam a este regime os atos de disposição de bens que não são património próprio nem
comum dos cônjuges | EX.: Alienação realizada pelo cônjuge titular de uma sociedade comercial
de construção e venda de imóveis

➢ Poderes de disposição sobre a casa de morada de família – Artigo 1682º -A/2 –


A disposição desta, carece do consentimento de ambos os cônjuges

Se o imóvel que é a casa de morada de família pertencer a terceiro, que o arrendou a um dos
cônjuges, a disposição da posição de arrendatário da casa de morada de família depende do
consentimento conjugal nos termos do 1682º-B

Assim, é essencial fixar determinado imóvel como sendo casa de morada de família, qualificação
essa que resulta de acordo, expresso ou tácito dos cônjuges ou de decisão judicial (1673º) –
Apenas um bem pode ser considerado casa de morada de família. A mesma não existe em caso
de separação de pessoas e bens, pois os conjugues deixam de estar vinculados ao dever de
coabitação (1795º-A)

➢ Poderes de disposição em vida quanto ao direito de aceitar ou rejeitar


aquisições a titulo gratuito – 1683º - Um cônjuge não carece de consentimento para
aceitar doações, heranças e legados

Em regimes de comunhão o consentimento do cônjuge sucessor que pretenda repudiar uma


herança é indispensável (1683º/2) ainda que os bens nunca viessem a integrar o património
comum – Mais uma vez tem se em atenção a natureza comum dos frutos dos bens próprios nos
109
regimes de comunhão. A mesma exigência já não é feita para a rejeição de uma proposta de
doação.

CONSENTIMENTO CONJUGAL

O consentimento importa enquanto condição de validade e enquanto condição de


responsabilização de um cônjuge. O consentimento apenas terá relevância legal se for
especialmente conferido para cada ato, através da forma exigida para a procuração

➢ Poderes de disposição por morte – 1685º reconhece aos cônjuges o direito de


dispor livremente para depois da morte, dos seus bens próprios e da sua meação no
património comum

No tocante ao património comum, esta liberdade limita-se, normalmente, à metade ideal que cabe
a cada cônjuge.

EFEITOS DO CASAMENTO NO CAMPO DO PASSIVO PATRIMONIAL

Qualquer um dos conjugues tem legitimidade para contrair dividas sem o consentimento do outro
– Artigo 1690º/1

Ainda que o principio geral das obrigações nos diga que só responde pela divida quem as contraiu,
no regime patrimonial do casamento, por força da cláusula geral de plena comunhão de vida, e
ainda que vigore o regime da separação de bens, a lei prevê situações em que uma divida contraída
por um cônjuge responsabiliza também o outro – são as dividas comunicáveis (as que apenas
responsabilizam o cônjuge que a contrai diz-se incomunicável ou própria)

A determinação da responsabilidade dos cônjuges pelas dividas é condicionada pelo momento em


que essa mesma divida foi contraída

O artigo 1691º enumera dividas comunicáveis

▪ B) Aplica-se se reunidas duas condições: A divida foi contraída para ocorrer a


encargos da vida familiar e esses encargos são normais. A normalidade é aferida pelo
critério do valor (a divida tem de ser pequena, comparativamente ao padrão da vida do
casal)
▪ C) Depende da verificação de dois pressupostos: Divida contraída na constância
do matrimónio e contraída pelo cônjuge administrador (nos limites do seu poder) e que
tenha sido contraída em proveito comum do casal~.
▪ Uma divida é contraída em proveito comum do casal quando: o cônjuge
pretendia obter um beneficio conjunto para o casal (material ou
imaterial), mas esse beneficio tem de ser provável, de acordo com as
regras da experiencia, no momento em que ela é contraída
▪ D) A maioria da doutrina defende que este regime apenas é aplicável às dividas
comerciais integradas no exercício habitual do comércio do cônjuge comerciante

O artigo 1692º enumera dividas incomunicáveis

As dividas que oneram aquisições a titulo gratuito (doações, heranças ou legados) são da exclusiva
responsabilidade do conjugue aceitante, a não ser que, por força do regime de bens adotado

110
(comunhão geral ou regime atípico) os bens adquiridos ingressem no património comum, situação
em que a divida será da responsabilidade de ambos – Artigo 1693º

 Para efeitos deste artigo, são dividas que oneram aquisições a titulo gratuito
aquelas que estão em ligação estreita com os bens adquiridos a titulo gratuito |EX.:
Dividas do de cuiús, que constituem encargos da herança e dividas resultantes de um
encargo modal inserido numa doação ou legado

E se existir concurso aparente de normas? | EX.: A e B casam em regime de separação de bens.


Na constância do matrimónio, A contraiu uma divida para financiar a realização de obras num
imóvel que lhe pertence, mas que constitui a casa de morada de família, tendo a divida sido
garantida por uma hipoteca sobre o imóvel a cuja beneficiação se destina a quantia mutuada – Ao
aplicar-se o 1691º/1 al. c) a divida será comunicável, aplicando-se o 1694º/2 ela será
incomunicável – Neste caso aplicar-se-ia o 1694º/2 O 1693º e 1694º são especiais
em relação ao 1691º e 1692º

➢ Bens que respondem por dividas comunicáveis – Artigo 1695º - Respondem os


bens comuns, e faltando comuns, respondem solidariamente os bens próprios de qualquer
um deles – o património próprio de cada um responde pela parte da divida que lhe cabe
(normalmente 50%)
➢ Bens que respondem por dividas incomunicáveis – Artigo 1696º - responde o
património próprio do cônjuge devedor e, subsidariamente, a sua meação nos bens
comuns

O regime de dividas é indisponível – Não são validas estipulações contrárias ao disposto nestes
dois artigos

A casa de morada de família não está a salvo de ser penhorada para satisfação de dividas dos
cônjuges, a menos que essas dividas sejam fiscais ou à segurança social

Compensações devidas pelo pagamento das dividas do casal

Compensação – meio de prestação de contas da transferência de valores entre os patrimónios do


casal, isto é, entre o património comum e os próprios – A compensação é assim um crédito de um
património comum perante o património próprio de um dos cônjuges, ou de um património
próprio de um perante o património comum ou próprio de outro

É o artigo 1697º que regula o fenómeno da compensação

Se não vigorar o regime da separação de bens, a compensação só pode ser exigida no momento
da partilha – Ainda que a lei não o diga expressamente, a compensação deve ser atualizada com
base no índice de preços – Esta lacuna é integrada por aplicação analógica do 2029º/3

PARTILHA DE BENS COMUNS DO CASAL

Partilha – Ato pelo qual se poe termo à indivisão de património. Na comunhão conjugal visa a
atribuição definitiva aos cônjuges dos bens comuns, através do preenchimento das respetivas
meações. Assim, na comunhão conjugal, a partilha está sujeita a dois pressupostos:

111
▪ Existência de bens comuns (não há partilha no regime de separação de bens, pois não
há património comum)
▪ Cessação das relações patrimoniais entre os cônjuges ou separação superveniente
de bens – a cessação abrange a dissolução do casamento, declaração de nulidade ou
anulação do casamento e a separação de pessoas e bens. Não havendo cessação das
relações patrimoniais entre os cônjuges, pode ocorrer partilha nos casos de separação
superveniente de bens

É admissível, ainda na constância do matrimonio, a celebração de um contrato promessa de


partilha dos bens comuns ou de um contrato de partilha? – Ainda que o artigo 1689º apenas aluda
à partilha no momento da cessação das relações, a doutrina tem entendido que as partilhas e os
contratos promessa de partilha antes da cessão dessas relações, são válidas.

 Mas apenas porque esse acordo estaria subordinada a uma condição suspensiva
da procedência de um divórcio. Esses atos não violariam o principio da imutabilidade
pois, antes do transito em julgado da sentença de divórcio, os bens comuns do casal
continuariam a ser comuns

JDP não concorda com esta visão pois: O artigo 1714º destina-se a proteger o cônjuge de um
eventual ascendente psicológico decorrente da comunhão de vida entre ambos, pelo que o
principio da imutabilidade não impediria apenas a partilha do património comum durante o
casamento, como impediria também qualquer acordo relativo a essa partilha, realizado entre os
cônjuges numa altura em que vivem em comum.

▪ Mas já não estaria vedada a possibilidade de celebrar uma partilha sob condição
suspensiva ou um contrato promessa, desde que essa celebração seja posterior à rutura da
vida em comum (nomeadamente na pendencia de uma ação de divórcio)

A partilha pode fazer-se fora ou inserido no processo de inventário, consoante exista ou não
acordo dos cônjuges:

Partilha extrainventário – De património comum de bens moveis não está sujeita a forma
especial (219º). A partilha de bens comuns que sejam imóveis pode ser feita através de escritura
pública ou documento particular autenticado

O acordo de partilha alcançado pelos cônjuges no âmbito do divorcio ou separação de pessoas e


bens, por mutuo consentimento produz efeitos depois de homologado pela decisão que decreta o
divorcio ou a separação – Artigos 272º-A/5, 5 e 8 CRC

A partilha desdobra-se ainda em três operações:

➢ Cálculo do valor do património comum – Implica a determinação do valor do ativo e


a dedução do passivo – O primeiro passo é determinar os bens comuns (todos os direitos
integrados no património comum + direitos de credito correspondentes às compensações
devidas pelos cônjuges ao património comum – essas compensações compreendem:
compensações devido ao pagamento de dividas incomunicáveis + compensações pela
aquisição de bens próprios à custa do património comum e todas as outras que configurem
uma transferência injustificada de valores)

112
Depois de somado o total dos bens comuns, há que abater o passivo comum:

1. são relacionadas e deduzidas as dividas do património comum perante terceiros;


2. Consideram-se as dividas do património comum perante os cônjuges, em que se incluem
as dividas entre conjugues e as dividas do património comum ao património próprio de
um dos cônjuges;

As dividas de um cônjuge perante o outro podem ser – 1689º/3:

▪ Dividas de indemnização;
▪ Dividas de compensação por contribuição indevida para os encargos da vida
familiar nos termos do 1676º/3
▪ Dividas de compensação pelo pagamento de dividas comunicáveis nos termos do
1697º/1;
▪ Dividas por disposição de bens comuns a titulo gratuito – 1682º/4

Dividas entre cônjuges por disposição de bens comuns a titulo gratuito não entram no passivo
comum. Para evitar fraude cometida pelos cônjuges em relação aos interesses de terceiro, as
dividas de património comum perante cônjuges são liquidadas em ultimo lugar

➢ Calculo do valor das meações – Depois de apurado o valor do património comum, acha-
se o valor da respetiva metade, que é igualmente o valor de cada uma das meações do
cônjuge. Se existiu disposição de bens comuns a titulo gratuito, nos termos do 1682º/4,
metade do valor dos bens doados é abatido à meação do cônjuge disponente e somado à
meação do outro cônjuge (é tido como valor dos bens doados, aquele que eles tiverem à
data da verificação do facto que originar a partilha – que será a data da cessação das
relações patrimoniais entre os cônjuges ou separação superveniente de bens)
➢ Preenchimento das meações – Depois de se achar o montante das meações, procede-se
ao preenchimento das mesmas – No preenchimento é atendível o acordo dos cônjuges
que podem: designar bens do património comum que hão de compor as respetivas
meações; indicar bens comuns que sejam objeto de sorteio entre eles; decidir na venda
total ou parcial dos bens comuns e na distribuição do produto da alienação entre eles. Se
não existir acordo procede-se à abertura de licitação entre eles
o O 1731º prevê, quanto a instrumentos de trabalho que tenham entrado no
património comum por força do regime de bens, uma atribuição preferencial na
partilha dos bens do casal
o Não há impedimentos à estipulação de atribuições preferenciais na partilha do
património, desde que seja feito por convenção antenupcial;
o Se o montante dos bens comuns atribuídos a um dos cônjuges for superior ao da
respetiva meação, assiste ao outro o direito de lhe exigir o pagamento de tornas
no valor que corresponda ao excesso

Ao longo de todas as operações tem de ser assegurado o respeito pela regra imperativa da
participação por metade no ativo e no passivo da comunhão – Artigo 1730º/1

Para saber quais os bens comuns há que atender ao regime que vigorou no casamento: Mas a
partilha pode ser feita segundo um regime diferente daquele que vigorou durante o casamento –
expressamente previsto pelos artigos 1719º e 1790º - Assim, a regra de que a partilha se fará de
acordo com o regime de bens que vigorou no casamento é supletiva

113
o 1719º/2 pretende salvaguardar os direitos de terceiro na liquidação do passivo – Há que garantir
a tutela da confiança de terceiros que contratam com os cônjuges.

A restrição do 1790º impõe que a partilha se faça segundo o regime da comunhão de adquiridos
ainda que se estipule na convenção que o regime vigente é o da comunhão geral e que, havendo
divórcio, a partilha se fará segundo esse regime

CONTRATOS ENTRE CONJUGÊS

➢ Doações entre casados regem-se pelos artigos 1761º a 1766º e, subsidariamente


pelas regras próprias da doação (940º a 979º)

As doações entre conjugues só não serão válidas se vigorar imperativamente o regime da


separação de bens – Artigo 1762º - Mas apenas se for imperativo, no caso de ser convencional já
pode existir

As doações entre casados são sempre revogáveis por mutuo consentimento – 1765º/1 – A
transferência patrimonial, a titulo gratuito, é reversível

 A faculdade de revogação unilateral, não se transmite aos herdeiros do doador


(1765º/2), é irrenunciável e pode ser exercida a todo o tempo pelo autor da liberalidade

Não sendo doações, mas antes donativos (como prendas de aniversário) não se aplica o regime da
livre revogação

Ao contrário das doações para casamento, as doações entre casados são suscetíveis de revogação
por ingratidão do donatário, nos termos dos artigos 970º e s. (aplicáveis por força do 1761º)

O artigo 1766º prevê três hipóteses de caducidade da doação entre casados

A doação de bens móveis apenas contará como doação se feita por documento escrito. A doação
de imoveis realiza-se por escritura pública ou documento particular autenticado, nos termos gerais
(o artigo 1761º remete para regras da doação – 947º)

À partida, para que a doação produza efeitos, o donatário tem de sobreviver ao doador. Se o
donatário falecer antes do doador, a doação não caduca quando o autor confirmá-la nos 3 meses
subsequentes à morte do beneficiário, altura em que esse bem integrará a herança do donatário

Se o casamento vier a ser declarado nulo ou anulado, a doação entre casados não caduca se ambos
estiverem de boa fé ou se o donatário for o único cônjuge de boa fé – Artigo 1766º/1, al. b)

➢ Compra e venda – o artigo 1714º/2 proíbe a compra e venda entre cônjuges, exceto
quando estejam separados de pessoas e bens. A doutrina abre ainda a possibilidade de ser
válida a compra e venda entre casados que não estejam separados de pessoas e bens
quando se trate de uma venda executiva (em que prevalece o maior preço oferecido, pelo
que não há razão para proibir)
o Motivo desta proibição: Evitar que os cônjuges façam um ao outro, sob aparência
de venda, verdadeiras doações que não estariam sujeitas ao regime da livre
revogabilidade das doações entre casados, por força das dificuldades inerentes à
prova da simulação

114
➢ Sociedade – 1714º/2 proíbe a celebração de contratos de sociedade entre os cônjuges,
exceto se estiverem separados de pessoas e bens. Mas o 1714º/3 considera licita a
participação dos dois cônjuges na mesma sociedade de capitais. Ademais, o 8º/1 do CSC
prevê: ´É permitida a constituição de sociedades entre cônjuges bem como a participação
destes em sociedades, desde que só um deles assuma a responsabilidade ilimitada` - esta
disposição refere-se diretamente às sociedades comerciais mas também é aplicável às
sociedades civis sob forma comercial
o Não é admissível a constituição pelos cônjuges em sociedades civis sob forma
civil. Mas, admite-se, a constituição e participação entre cônjuges na mesma
sociedade desde que esta seja uma sociedade por quotas, anónima ou comandita
(na qual nenhum deles seja sócio comanditado – isto é, nenhum deles ou apenas
um deles pode assumir responsabilidade ilimitada)
➢ Contratos onerosos não mencionados no 1714º/2 – Em regra, são validos todos os
contratos entre cônjuges não proibidos por este artigo.
➢ Contas coletivas – o artigo 1680º é analogicamente aplicável às contas coletivas:
os cônjuges podem livremente constituir contas coletivas de que ambos sejam titulares e
podem movimentá-las de acordo com as regras bancárias

EFEITOS DO CASAMENTO EM SITUAÇÕES DE RUTURA DA VIDA EM


COMUM

SEPARAÇÃO DE FACTO

Utilizando a definição dada pelo 1782º, separação de facto será quando não existe comunhão de
vida entre os cônjuges e há da parte de ambos, ou de um deles, o propósito de não a restabelecer
– um casal pode viver separado de facto durante anos sem que venha a ser decretado o divórcio
ou a separação de pessoas e bens. Aliás, dois cônjuges podem viver em separação de facto até à
morte de um deles | A separação de facto verifica-se quando se preencham dois elementos:

▪ Elemento objetivo: Falta de vida em comum dos cônjuges (ausência de coabitação)


▪ Elemento subjetivo: propósito de não restabelecer a vida em comum – Há a vontade
interior de não retomar a coabitação;

Não haverá separação de facto na falta de um destes 2 elementos |EX.: Não é separação de facto
o caso dos cônjuges que não vivam em comum porque um deles foi colocado, para exercer
funções públicas, numa localidade distante da casa de morada de família

 Em sentido inverso, pode existir separação de facto, mesmo que vivam os dois na
mesma casa – Basta que não convivam um com o outro e que não pretendam restabelecer
a vida em comum – basta não haver comunhão de leito, que não comam juntas, etc.

A separação de facto constitui fundamento do divórcio por rutura da vida em comum, nos termos
do artigo 1781º, alínea a)

A ausência de vida em comum inerente à separação de facto, leva à conversão da obrigação de


contribuir para os encargos da vida familiar em obrigação de prestar alimentos – Mas depois há
que ver as regras do 1675º/3

115
Na área da filiação, cessa a presunção de paternidade do marido da mãe se o nascimento do filho
ocorrer passados 300 dias depois da data que a sentença fixe como a da cessação da coabitação –
Artigo 1829º/1 e 2

As regras de exercício das responsabilidades parentais previstas para o divórcio, separação de


pessoas e bens e invalidade do casamento são aplicáveis aos cônjuges separados de facto – Artigo
1909º/1

A ausência de vida em comum inerente à separação de facto obsta à aplicação do artigo 1691º/1
b)

Cônjuges separados de factos continuam vinculados ao deveres dos cônjuges, exceto o dever de
assistência (no caso previsto no 1675º/3) | EX.: O dever de coabitação não cessa por não estar a
ser cumprido

Regras sobre administração, disposição e dividas (exceto o 1691º/1 b) e regime de bens continuam
a ser aplicados – a eventual existência de duas residências separadas, não significa que o imóvel
onde antes ambos residiam tenha perdido a qualidade de casa de morada de família pois essa
qualificação depende de acordo dos cônjuges, ou decisão judicial ou separação de pessoas e bens.

O cônjuge sobrevivo separado de facto continua a ter a qualidade de sucessível legal do de cuiús
– 2133º e 2157º - Esta solução mostra-se pouco aceitável, nos casos em que a separação de facto
dure há mais de 1 ano

SEPARAÇÃO DE PESSOAS E BENS

Instituto que modifica o vinculo matrimonial, extinguindo as relações patrimoniais e o dever de


coabitação entre cônjuges – Aplica-se à separação de pessoas e bens, a generalidade do regime
do divórcio

A separação de pessoas e bens pode ser por mutuo consentimento ou sem o mesmo – 1773º. As
causas da separação de pessoas e bens sem o consentimento de um dos cônjuges são as mesmas
do divórcio sem o consentimento de um dos cônjuges

Perante uma crise matrimonial, os cônjuges tanto podem requerer a separação de pessoas e bens
como o divórcio: podem requerer o divórcio sem que tenha havido prévia separação de pessoas e
bens – o 1795º/2 até revela preferência pelo divórcio no lugar da separação de pessoas e bens: se
um cônjuge requerer o divorcio, e o outro a separação de pessoas e bens, a sentença deve decretar
o divórcio se ambos os pedidos procederem.

A separação de pessoas e bens afeta dois deveres conjugais:

▪ Dever de coabitação: Extingue-se – deixa de existir casa de morada de família


▪ Dever de assistência: Ou se extingue ou assume a configuração de obrigação de
alimentos a cargo de um dos cônjuges

Os restantes deveres (respeito, fidelidade e cooperação) subsistem – Não obstante, o


incumprimento destes deveres, incluindo o de infidelidade, tem pouca relevância

116
Quanto ao nome: o cônjuge que acrescentou ao seu nome apelidos do outro, conserva-os (1677º-
B/1) podendo ser privado judicialmente do seu uso unicamente quando esse uso ´lese gravemente
os interesses morais do outro cônjuge ou da sua família`- 1677º-c

Quanto à filiação: cessa a presunção de maternidade, se o nascimento do filho ocorrer depois de


300 dias dos acontecimentos estatuídos no 1829º/1 e 2 al. a)

Quanto aos bens: A separação de pessoas e bens produz os efeitos que produziria a dissolução do
casamento (1795º-A, 2ª parte) – cessam para o futuro as relações patrimoniais entre os
cônjuges(extingue-se a comunhão conjugal de bens, deixam de se aplicar as regras de
administração e disposição dos bens do casal, bem como as regras sobre dividas dos cônjuges e
passam a ser permitidos os contratos de compra e venda e sociedade entre cônjuges sem qualquer
restrição)

Aquele que está separado de pessoas e bens não tem o direito de suceder como herdeiro legal do
seu cônjuge – 2133/3 e 2157º, nem tem direito a indemnização por danos não patrimoniais, no
caso de morte do consorte – 496º/2

Aplica-se, em geral, o regime dos efeitos patrimoniais do divórcio por força do artigo 1794º

A separação de pessoas e bens termina pela reconciliação dos cônjuges ou pela dissolução do
casamento: Artigo 1795º-B – Os cônjuges podem a todo o tempo restabelecer a vida em comum
e o exercício pleno dos direitos e deveres conjugais – 1795º-C/1

 Havendo reconciliação, volta a vigorar o regime inicialmente fixado para o


casamento – o 1715º não permite que passe a vigorar o regime de bens que as partes agora
pretendem escolher. A reconciliação determina ainda o reinicio da presunção de
paternidade.
• A reconciliação é da exclusiva competência da conservatória do registo civil e
tem por base um acordo declarado pelos cônjuges – os efeitos produzem-se a partir da
homologação pelo conservador

A separação de pessoas e bens pode terminar pela dissolução do casamento: pela morte ou
divórcio – A separação de pessoas e bens pode ser reconvertida em divórcio a todo o tempo nos
termos do 1795ºD/2

Será a conversão a única forma de obter o divórcio, apos a separação de pessoas e bens?

▪ Doutrina: Após a separação de pessoas e bens, qualquer um dos cônjuges podem intentar
a todo o tempo uma ação de divórcio autónoma, nos termos gerais | Argumentos:
 É preciso sancionar, mediante declaração de culpa, um cônjuge que se comporte
de modo censurável para com o outro, durante a separação de pessoas e bens;
 Não é correto admitir a permanência de um matrimónio até se atingir o período
legal para efeitos de conversão, quando um cônjuge assumiu tais comportamentos (ex.:
violência)
▪ JDP: A lei revela um espirito genericamente adverso à intervenção judicial, ao diminuir
para metade o prazo exigido para conversão unilateral e aboliu a declaração de culpa no
divórcio

117
 Ao optar pela separação de pessoas e bens os cônjuges assumem um risco: o de
manter formalmente o vinculo matrimonial até altura em que se possa converter a
separação em divórcio
 Comportamentos violentos ou outros que ocorram neste período são tao graves
como aqueles que, eventualmente, foram praticados a constância do matrimónio ou após
o divórcio e que são sancionáveis nos termos gerais
 Assim, a conversão é a única forma de obter o divórcio após a separação de
pessoas e bens

CAP. III EXTINÇÃO DO VÍNCULO MATRIMONIAL

A extinção do vinculo matrimonial pode ser:

➢ Retroativa: Invalidade do casamento;


➢ Não retroativa: Dissolução (por morte e por divórcio);

INVALIDADE DO CASAMENTO

Os desvalores do casamento civil celebrado por forma civil ou religiosa são dois – Artigo 1627º:

➢ Inexistência: As suas causas são as consagradas no 1628º que é taxativo – A inexistência


no casamento é invocável a todo o tempo por qualquer pessoa, independentemente de
declaração do tribunal (1630º/2) – Sendo inexistente, não há qualquer produção de
efeitos, nem os putativos.
➢ Anulabilidade: O artigo 1631º enumera as causas de anulabilidade, que são também
taxativas: impedimentos dirimentes, falta ou vicio da vontade, e ausência de testemunhas.
o Só pode ser anulado no decorrer de uma ação especialmente intentada para o
efeito (1632º) antes disso a anulabilidade não é invocável para nenhum efeito
judicial ou extrajudicial.
o A anulação leva à cessação dos efeitos do casamento, com caráter retroativo –
tudo se passa, em principio, como se o casamento não tivesse sido celebrado
➢ Nulidade: Exclusivo do casamento católico. A declaração de nulidade cabe aos tribunais
eclesiásticos que aplicam o direito canónico.
o De acordo com a concordata – Artigo 16º/1 e com o 1626º CC -As decisões das
autoridades eclesiásticas que declarem a nulidade do casamento produzem
efeitos civis, a requerimento de qualquer das partes, após revisão e confirmação,
nos termos do direito português, pelo tribunal competente
▪ No processo de revisão: o tribunal português verifica se a decisão é
autentica, e se respeitam os princípios do contraditório e da igualdade e
se o seu resultado não colide com os princípios da ordem pública
internacional do Estado Português – Artigo 16º/2 da concordata. Os
efeitos da nulidade do casamento católico são semelhantes aos da
anulação do casamento civil
o O reconhecimento de efeitos civis às sentenças de nulidade do casamento católico
dos tribunais eclesiásticos pode originar uma contradição com os efeitos da
sentença de divórcio decretada pelo tribunal estatal | EX.: Um casamento católico
dissolvido por divórcio pode vir a ser declarado nulo – o regime dos efeitos
patrimoniais do divórcio não são = aos da nulidade

118
CASAMENTO PUTATIVO

Casamento putativo – casamento anulado ou declarado nulo que produz efeitos, como se fosse
válido, normalmente, até ao transito em julgado da sentença de anulação ou até ao averbamento
no registo civil da decisão de nulidade – Artigo 1647º/1 e 3 – O casamento putativo não se aplica
a casamentos inexistentes | Os requisitos gerais do casamento putativo são 3:

1. Existência de casamento – 1630º/1 a);


2. Anulação do casamento civil ou declaração de nulidade do casamento católico – 1630º/1
b);
3. Casamento contraído de boa fé pelos menos por um dos cônjuges – 1630º/1 c);
▪ Nos termos do 1648º/1 está de boa fé: o cônjuge que contraiu casamento na
ignorância desculpável do vicio que causou a nulidade ou anulabilidade, ou cuja
declaração de vontade tenha sido extorquida por coação moral ou física – A boa fé dos
cônjuges presume-se e o seu conhecimento pertence aos tribunais do Estado Português

O regime geral está nos artigos 1647º e 1648º e depende do facto de apenas estar 1 ou ambos de
boa fé:

➢ Ambos estão de boa fé: 1647º/1 e 3;


➢ Apenas um está de boa fé: 1647º/2 e 3;
o O cônjuge de boa fé pode invocar perante aquele que está de má fé, todos os
efeitos do casamento, e pode invocar esses mesmo efeitos perante terceiros, desde
que sejam mero reflexo das relações havidas entre os cônjuges, que será o caso,
por exemplo, de direitos sucessórios do cônjuge sobrevivo

Ainda que o artigo 1647º/2 apenas se refira a benefícios, entende-se que aquele que invocar os
efeitos favoráveis para si fica sujeito também aos desfavoráveis - estatuto do cônjuge que contrai
um casamento inválido não pode ser mais vantajoso do aquele que contrai um casamento válido.

Casos especiais de eficácia putativa:

➢ Presunção de paternidade – O 1827º não exclui a presunção de que o pai é o marido da


mãe, no caso de anulação ou declaração de nulidade, Mais, estabelecida ou constituída a
paternidade do marido da mãe, as regras aplicáveis às responsabilidades parentais são as
mesmas previstas para o caso de divórcio
➢ Alimentos – Tendo sido declarado nulo ou anulado, o 2017º determina que o cônjuge de
boa fé conserva o direito de alimentos após o transito em julgado da respetiva decisão.
➢ Nacionalidade – Artigo 3º/2 da Lei da Nacionalidade determina que a declaração de
nulidade ou anulação do casamento não prejudica a nacionalidade adquirida pelo cônjuge
de boa fé

DISSOLUÇÃO POR MORTE

A morte de um dos cônjuges leva à cessação da generalidade dos efeitos pessoais e patrimoniais
do casamento – Mas subsistem relações de afinidade que ligam o cônjuge sobrevivo aos parentes
do outro (1585º), e conservam-se também os apelidos que se tenham acrescentado | O viúvo pode
perder o nome do falecido em 2 situações:

119
✓ Segundas núpcias, se não declarar até ao novo casamento que pretende conservar
tais apelidos – Artigo 1677º-A, 2ª parte;
✓ Privação judicial do uso do nome, a pedido dos descendentes, ascendentes e
irmão do falecido quando esse uso lese gravemente os interesses morais da família do
defunto;

Mas com a morte do cônjuge, cabem ao outro os seguintes direitos:

▪ Direito de suceder como herdeiro legitimário do de cuiús, se não estiver separado de


pessoas e bens – Artigos 2133º/1 al. a) e b) e 3 e 2157º - e se não tiver havido renuncia à
condição de herdeiro legitimário, nos termos do artigo 1700º/1 al. c) e 3;
▪ Direito de suceder apenas como herdeiro legitimo, se tiver havido renuncia, implica
direitos semelhantes aos que cabem ao companheiro sobrevivo sobre a casa de morada
de família e recheio desta – Artigos 1707º-A/3;
▪ Direito a ser alimentado pelos rendimentos dos bens deixados pelo falecido – Art 2018º;
▪ Direito à transmissão por morte da posição de arrendatário habitacional que pertencia ao
de cuiús, se, no momento da morte, o cônjuge sobrevivo residia nesse local,
independentemente de estar ou não separado de pessoas e bens ou de facto – Artigos
1106º/1 a);
▪ Atribuição preferencial, na partilha, do direito de habitação da casa de morada de família
e do direito de uso do respetivo recheio – Artigos 2103º-A a 2103º-C;
▪ Direito a indemnização por danos não patrimoniais sofridos com a morte da vitima, se
não estiver separado de pessoas e bens – Artigo 496º/2;
▪ Legitimidade para requerer providencias preventivas ou atenuantes da ofensa à memoria
do cônjuge falecido – Artigos 71º/2, 73º, 75º/2, 76º/2 e 79º/1;
▪ Exercício exclusivo das responsabilidades parentais sobre os filhos menores do casal –
Artigo 1904º/1;
▪ Eventual exercício das responsabilidades parentais sobre os filhos menores do cônjuge
falecido – Artigo 1904º/2;

DIVÓRCIO

Causa de dissolução do casamento decretada pelo tribunal ou pelo conservador do registo civil, a
requerimento de um ou de ambos os cônjuges. | São duas as principais modalidades de divórcio:

➢ Divórcio por mutuo consentimento: Requerido na conservatória do registo civil


por ambos os cônjuges, de comum acordo, ou no tribunal se o pedido de divorcio não for
acompanhado de todos os acordos exigidos nos termos do 1775º/1 por remissão do
1773º/2 | O divórcio por mutuo consentimento pode ser:
o Por mutuo consentimento quanto à dissolução do casamento e quanto a matérias
complementares;
o Litigioso apenas quanto a matérias complementares;

Assim, o divórcio por mutuo consentimento pressupõe que ambos os cônjuges estão de acordo
quanto à dissolução do casamento, e o requerimento pode ser apresentado a todo o tempo, sem
necessidade de período mínimo de duração do casamento | No inicio do processo de divorcio, a
conservatória ou o tribunal devem informar os cônjuges sobre a existência e objetivos da
mediação familiar

120
O divorcio por mutuo consentimento pode ser instaurado na conservatória do registo civil,
mediante requerimento e acompanhado pelos documentos exigidos pelo 1775º/1

 Se os acordos apresentados acautelarem os interesses de ambos e dos filhos, o


conservador homologa os acordos e decreta o divórcio. Em caso contrário: convida os
cônjuges a alterarem os acordos – se estes os modificarem de forma a salvaguardar esses
interesses, pode homologá-los. Em caso de não alteração recusa homologação e remete
para o tribunal

As decisões do conservador tem os mesmos efeitos das sentenças judiciais, e da decisão do


conservador cabe recurso para o tribunal da relação – 274º/1 CRC

O processo é depois enviado ao MP para que este se pronuncie sore o acordo (dentro de 30 dias)
– Se o MP considerar que aquele acordo acautela devidamente os interesses dos menores ou se o
acordo tiver sido alterado pelos cônjuges nos termos indicados pelo MP, será marcada conferencia
e o conservador não pode recusar a homologação. Se, em sentido inverso, o MP propuser
alterações e estas não forem acatadas, o processo é remetido ao tribunal.

O divórcio será requerido no tribunal, se os cônjuges não entregarem algum dos acordos previstos
no 1775º/1 – Neste caso, a tramitação é regulada especificamente pelo artigo 1778º-A

O processo de divorcio por mutuo consentimento pode correr no tribunal, ainda que tenha sido
requerido na conservatória, ou até mesmo no caso de ter sido instaurado como divórcio sem
consentimento de um dos cônjuges – Basta ver que: o processo de divorcio por mutuo
consentimento requerido na conservatória é remetido para o tribunal nos casos em que as partes
insistam a apresentar acordos que não acautelam devidamente os interesses de ambos os cônjuges
e filhos menores – Artigos 1776º-A e 1778ç; E mesmo o divorcio litigioso pode converter-se por
mutuo consentimento, nos termos do 1779 – que prosseguirá no tribunal.

➢ Divórcio litigioso (sem consentimento de um dos cônjuges): Requerido no


tribunal por um dos cônjuges contra o outro, com fundamento em determinada causa
(1773º/3)
o Se existir acordo dos cônjuges, o divorcio sem consentimento pode ser
convertido em divórcio por mutuo consentimento (1774º/2)

O divórcio sem consentimento de um dos cônjuges implica o preenchimento de uma das situações
enumeradas no artigo 1781º - A cláusula do 1781º d) é aberta – pode aí incluir-se violações graves
de deveres conjugais (como violência doméstica – contra o dever de respeito) e até se admite que
uma mudança de sexo feita por um dos cônjuges n constância do matrimonio poderia ser um
motivo

O 1785º regula a legitimidade: Qualquer um dos cônjuges, a não ser que o fundamento seja
alteração das faculdades mentais ou ausência do cônjuge, situação em que a legitimidade passa a
ser apenas do outro cônjuge.

O consenso entre as partes é sempre favorecido – ao receber o requerimento de divorcio, o tribunal


informa o cônjuge que pretende dissolver o casamento, sobre a existência e objetivos dos serviços
de mediação familiar – 1774º

121
No processo de divórcio, há uma tentativa de conciliação dos cônjuges (1779º/1 CC e 931º/1
CPC) – se essa tentativa não resultar, o juiz tentará obter acordo para o divórcio por mutuo
consentimento (1779º/2 CC e 931º/2 CPC) – Na falta de acordo o juiz procurará obter um acordo
quanto a alimentos e regulação das responsabilidades parentais e utilização da casa de morada de
família –

Uma outra classificação distingue o divorcio entre judicial ou administrativo, conforme seja
decretado pelo tribunal ou pela conservatória: o divorcio por mutuo consentimento é
tendencialmente administrativo. O divorcio litigioso é necessariamente judicial: apenas pode ser
requerido no e decretado pelo tribunal

À luz do 36º/2 CRP é admissível a dissolução por divorcio de qualquer casamento | O direito ao
divorcio é um direito potestativo: consiste no poder de produzir determinado efeito jurídico que
é a extinção da relação matrimonial – tem caráter pessoal pois pertence aos cônjuges enquanto
tais – principio da intransmissibilidade e do exercício pessoal do direito ao divorcio

 Exceções:
▪ Possibilidade de a ação de divórcio ser continuada, pelos herdeiros do autor
para efeitos patrimoniais, se o cônjuge autor falecer na pendencia da causa –
1785º/3
▪ Requerimento do divorcio por mutuo consentimento pode ser assinado por
procuradores dos cônjuges – 1775º/1;
▪ Quando o cônjuge que pode pedir o divórcio for maior acompanhado, a ação
pode ser intentada pelo acompanhante que tenha poderes de representação,
obtida autorização judicial – 1785º/2;
▪ Na tentativa de reconciliação em processo de divorcio sem consentimento do
outro cônjuge, admite-se a representação das partes por mandatários
especiais, quando elas estejam ausentes do continente ou da ilha onde correr
o processo – 931º/1 CPC

O direito ao divórcio é irrenunciável

Apreciação das causas de divórcio litigioso

Um sistema de divórcio litigioso pode seguir o modelo de:

➢ Divórcio sanção – pressupõe um ato ilícito e culposo de um cônjuge e pretende


sancionar esse ato – Só pode ser requerido pelo cônjuge inocente;
➢ Divórcio constatação da rutura do casamento – Exige um estado de vida
intolerável e pretende pôr fim a essa situação – Qualquer um dos cônjuges pode pedir o
divórcio;
➢ Divórcio remédio – pressupõe um estado de vida conjugal intolerável, mas essa
situação é causa, com ou sem culpa, por um dos cônjuges, e o divórcio visa permitir ao
outro cônjuge que se liberte do casamento – o divórcio apenas pode ser requerido pelo
cônjuge afetado pela crise matrimonial que não causou;

O sistema Português é misto: ente o modelo de divórcio constatação da rutura e de divórcio


remédio – Artigo 1785º/1- com a alteração do cc pela Lei nº61/2008 de 31 de outubro cai o
divórcio enquanto sanção (O que não passou a ilibar os cônjuges de responsabilidade pelo facto

122
de contribuírem para a dissolução do casamento – esse ilícito deve ser sancionado no plano da
responsabilidade civil)

EFEITOS DO DIVÓRCIO

O divorcio determina a cessação da generalidade dos efeitos pessoais e patrimoniais do casamento


– 1688º que opera para o futuro

▪ Efeitos predominantemente pessoais – produzem-se a partir do transito em julgado da


sentença ou do despacho do conservador que decretar o divórcio – 1789º/1 e 1776º/3;
▪ Efeitos predominantemente patrimoniais – A cessação desses efeitos produz-se, por
retroação, à data da apresentação do requerimento d divórcio – 1789º/1 2ª parte

Se a separação de facto entre os cônjuges for dada como provada no processo judicial, qualquer
um deles pode requerer que os efeitos do divórcio (patrimoniais ou pessoais) produzam efeito,
por retroação, à data que a sentença fixe como sendo a do inicio daquela separação – 1789º/2.
Nada parece obstar à retroação, se esta for requerida por ambos, no processo por mutuo
consentimento, com alegação da separação de facto e indicação da data da cessação da coabitação.

Não obstante, os efeitos patrimoniais do divórcio apenas podem ser opostos a terceiros, a partir
da data do registo do divórcio – 1789º/3 e 1776º/3

Principio: Equiparação do divórcio à dissolução por morte – 1788º - Mas há exceções, pois o
divórcio produz os seguintes efeitos específicos:

✓ Extingue a afinidade existente entre cada um dos cônjuges e os parentes do outro – 1785º
a contrario;
✓ O ex-cônjuge não pode conservar os apelidos do outro, salvo consentimento deste ou
autorização do tribunal – 1677º-B;
✓ Nenhum dos cônjuges pode na partilha familiar receber mais do que aquilo que receberia
se o casamento tivesse sido celebrado segundo o regime da comunhão de adquiridos –
1790º;
✓ Cada cônjuge perde todos os benefícios recebidos ou que haja de receber do outro cônjuge
ou de terceiro, em vista do casamento, ou em consideração do estado de casado – 1791º
✓ O ex-cônjuge perde o direito de suceder como herdeiro legal do outro – 2133º/3 e 2157º;

Há também uma disciplina diferente noutras matérias em caso de divórcio:

➢ Quanto aos alimentos: Nos termos do 2016º/2 qualquer um dos cônjuges tem
direito a alimentos (desde que deles precise) independentemente do tipo de divórcio –
Este direito pode ser negado por razões manifestas de equidade

Na fixação do montante dos alimentos o tribunal deve ter em atenção os fatores descritos no artigo
2016º - A

Se o cônjuge que recebe alimentos contrair novo casamento ou iniciar união de facto, o seu direito
a alimentos cessa por força do artigo 2019º

123
O 2016º-A consagra que o credor de alimentos não tem o direito de exigir a manutenção do padrão
de vida que tinha antes, e ainda que não seja claro, a medida dos alimentos deve ser aquela que
garanta um nível de vida razoável

➢ Animais de companhia: 1793º - A


➢ Destino da casa de morada de família: É importante distinguir as situações em
que a casa pertence a ambos (como bem comum ou compropriedade), a apenas um ou em
que está arrendada

Cônjuges que vivam em casa que pertence a apenas um deles ou a ambos o direito de nela habitar
poderá vir a ser atribuído, em exclusivo, àquele que não era proprietário do imóvel através da
formação de uma relação de arrendamento – Esta relação pode ser constituída por acordo ou
sentença

Na falta de acordo entre os cônjuges divorciados quanto ao destino da casa que pertence a um
deles ou a ambos em contitularidade, aplica-se o disposto no 1793º

 O tribunal pode dar de arrendamento a um dos cônjuges, considerando as


necessidades de cada um deles e o interesse dos filhos do casal – Não existirá, nesse caso,
um contrato de arrendamento mas antes um criação forçada por sentença de uma relação
de arrendamento para habitação – o conteúdo (como o preço e a responsabilidade pelos
encargos do condomínio) será definido por sentença (é prática usual que o valor da renda
que venha a ser fixado fique aquém do valor de mercado

Resulta do 1793º/2 que o arrendamento forçado pode ser resolvido pelo tribunal, a requerimento
do senhorio (ex-cônjuge) quando circunstâncias supervenientes o justifiquem |EX.: Aumento
substancial do nível de vida do arrendatário, degradação acentuada da condição económica do
senhorio, filhos que atingiram a maioridade e deixaram de viver na casa arrendada

Mas esta solução é delicada pois admite expropriar do uso de um bem que lhe pertence, em
beneficio de outro particular com fundamento na proteção da família – É verdade que a família
tem tutela constitucional. Os casos mais difíceis de justificar serão aqueles em que há divórcio
mas não há descendentes – que interesse de família existirá aí? Ainda para mais há uma quebra
de qualquer ligação.

E se a casa de morada de família estiver arrendada a um dos cônjuges ? – A matéria é regulada


pelo artigo 1105º - Pode haver a transmissão ou concentração a favor de um deles (transmissão
se o direito que pertencia a apenas um deles passa para o outro; concentração se o arrendamento
habitacional era comum e passa a ser exclusivo de um deles)

 Na falta de acordo, o 1105º/2 confere ao tribunal o poder para decidir quanto ao


destino da casa de morada de família – Há que ter em atenção a necessidade de cada um
dos cônjuges, os interesses dos filhos e outros fatores relevantes – nos termos do 1105º/3
o acordo homologado pelo juiz, ou pelo conservador do registo civil, ou a decisão judicial
sobre a titularidade do direito de arrendatário são notificados oficiosamente ao senhorio.

Se se tratar de um divórcio por mutuo consentimento administrativo: O destino da casa de morada


de família é definido por acordo das partes que carece de homologação pelo conservador do
registo civil

124
A constituição e extinção do arrendamento a favor do ex cônjuge apresenta natureza quase
alimentar: Essa relação, a determinação do valor da renda e a repartição de responsabilidades
pelos encargos de fruição das partes comuns, orientam-se principalmente pelo critério da
necessidade da casa e da situação patrimonial dos interessados – sendo a necessidade da casa o
critério principal e no caso de a renda ser inferior ao valor da renda de mercado poderá associar-
se a uma espécie de prestação alimentar a cargo do transmitente

▪ Assim, poderá cogitar-se, a hipótese de aplicar os artigos 2012º, 2014º e 2019º - Assim
haveria que adaptar estas regras ao arrendamento
▪ Poderia também aplicar-se o 1793º/2, diretamente ou por analogia, arredamento forçado

OUTROS CASOS DE DISSOLUÇÃO DO CASAMENTO, ALÉM DA MORTE E DO


DIVÓRCIO

➢ Celebração de novo casamento, após a declaração da morte presumida: A declaração


de morte presumida em si, não dissolve o casamento (115º). Não obstante, após a
declaração de morte presumida, o cônjuge do ausente, casado civil ou catolicamente, pode
contrair novo casamento (116º, 1ª parte) – A declaração de morte presumida torna o
casamento do ausente dissolúvel – no momento em que o cônjuge do ausente contrai novo
casamento, dissolve-se o anterior | Se:
o Ausente regressar ou existir noticias de que era vivo quando se celebrou o novo
casamento: O 1º casamento é tido dissolvido por divórcio à dará da declaração
de morte presumida – 116º, 2ª parte
o Ausente não regressa: o 1º casamento é dissolvido por morte à data da celebração
de morte presumida;
o Prova-se que o ausente morreu antes da celebração do 2º casamento: o 1º
dissolve-se à dará do óbito;
➢ Mudança de sexo: A mudança de sexo na constância do matrimónio perdeu autonomia
enquanto causa de dissolução10 – Mas esse facto é suscetível de ser invocado por um dos
cônjuges como fundamento do divórcio, independentemente de o casamento ter sido
contraído entre pessoas do mesmo sexo ou de sexo oposto, desde que estejam preenchidos
os pressupostos do 1781º, al d)
➢ Dispensa do casamento rato e não consumado: causa particular de dissolução do
casamento católico, que é regulado nos cânones 1142 e 1697 a 1706 CDC – a dispensa
de casamento rato e não consumado é reconhecida no artigo 1624º CC e 16º da concordata
de 2004 ( este reconhecimento levanta duvidas quanto à constitucionalidade)
o Casamento rato: Validamente celebrado – cânone 1061/1
o Casamento não consumado: não existiu cópula – 1061/1 – Apenas depois de
consumado é que o casamento católico é indissolúvel

10
O artigo 70º/1, al i) do CRC prevê que ao assento de casamento seja especialmente averbada ´a mudança
de sexo de qualquer dos cônjuges e a correspondente mudança de nome próprio, desde que haja
consentimento do outro conjuge`

125
PARTE IV – DIREITO CONVIVENCIAL

CAP. I - UNIÃO DE FACTO

A união de faco identifica-se com a convivência de duas pessoas em condições análogas às dos
cônjuges ou com uma coabitação (de leito, mesa e habitação)

 A definição de união de facto do 1º/2 da LUF não é a mais adequada pois refere
o prazo de dois anos que é irrelevante para caracterizar determinar relação como união
de facto – O prazo de 2 anos apenas releva para que aquela união de facto seja protegida.

Distingue-se do casamento no plano da constituição, efeitos e extinção: A união de facto forma-


se assim que os sujeitos vivam em coabitação, não sendo necessária qualquer cerimónia. Não há
deveres que vinculem reciprocamente os membros dessa união de facto, nem há regras próprias
em matéria de administração e disposição de bens e dividas. Essa ligação dissolve-se pela mera
vontade de uma das partes, sem ser necessária intervenção estatal ou qualquer formalismo.

União de facto VS Concubinato duradouro VS Convivência em economia


comum
Há comunhão de Não comunhão de mesa e Situação das pessoas que
leito, mesa e habitação. Apenas há um vivem em comunhão de
habitação; relacionamento sexual mesa e habitação, mas em
estável que falta a comunhão sexual

UNIÃO DE FACTO PROTEGIDA

Só goza das medidas de proteção previstas na LUF a união de facto protegida, que é aquela que
preenche, cumulativamente, dois requisitos:

➢ Duração superior a 2 anos;


➢ Inexistência de impedimentos estabelecidos no artigo 2º da LUF;

O prazo de 2 anos tem ou não de decorrer consecutivamente ? O prazo tem de voltar a ser contado
desde o inicio, em caso de reconciliação

Se em certa data deixou de haver comunhão de habitação porque um deles revelou a intenção de
não a restabelecer, a ligação extingue-se por vontade de uma das suas partes ao abrigo do artigo
8º/1 b) LUF

 A reconciliação não renova a união de facto, origina uma nova união com os
mesmos membros da anterior

E se as partes deixarem de coabitar, sem que exista intenção de por fim à comunhão de habitação?
– o prazo suspende-se |EX.: Forma-se uma união de facto. 1 ano depois, por motivos
profissionais, um dos membros tem de passar a residir noutra localidade distante da residência
comum do casal – A falta de coabitação não representa uma rutura e por isso, assim que as partes
retomem a vida em comum, volta a correr o prazo que é condição da união de facto protegida e o
ano anterior à situação de afastamento involuntário será incluído ( não recomeça do 0 o prazo)

126
Do artigo 2º há a salientar: A exigência de idade, que é superior à idade nupcial, e o facto de não
obstar à união de facto protegida a relação anterior de responsabilidades parentais (que é um
impedimento matrimonial dirimente) – ou seja, beneficia de proteção jurídica, por exemplo, a
união de facto integrada por um filho do ex companheiro do outro membro, ainda que este tenha
exercido responsabilidades parentais sobre o novo companheiro

A LUF nada diz sobre a vigência simultânea de 2 (ou mais) uniões de facto – uma pessoa pode
querer ter duas uniões de facto simultâneas e viver realmente como membro de duas uniões de
facto com companheiros diferentes, que ignoram a situação real e supõem que as ausências, mais
ou menos prolongadas, do parceiro se justificam por motivos meramente profissionais

 Não é crível que o legislador tenha abdicado do principio da monogamia – Aliás,


há dois elementos que revelam isso mesmo:
• O legislador teve de regular a união de facto tendo em conta a semelhança social
da ligação com a união matrimonial, que está sujeita a monogamia;
• Expressão: ´condições análogas ao dos cônjuges` - pressupõe uma vivencia
intima exclusiva entre duas pessoas;

Mas não seria justo negar, ao companheiro de boa fé, a proteção civil da união de facto, e por isso
nas situações de 2 ou mais uniões de facto integradas por um mesmo membro, os companheiros
de boa fé devem solicitar a proteção – O mesmo se deveria aplicar quando está em causa pessoa
de boa fé unida de facto a um companheiro casado e não separado de pessoas e bens

Independentemente disso, e por falta de controlo estatal, é possível que os membros obtenham
plena proteção, mesmo que não tenha sido respeitado o principio da monogamia.

Quanto ao prazo e dos impedimentos:

▪ O impedimento de idade importa na data do reconhecimento da união de facto (na altura


em que se invoca a eficácia da união de facto protegida – nessa altura tem de ter 18 anos)
pelo que o prazo poderá começar a partir da altura em que o membro da união de facto
complete 16 anos (idade nupcial);
▪ Quanto à demência/acompanhamento – interessa o momento do inicio da união de facto:
os 2 anos não começam a correr se a demência ou situação de acompanhamento se
verificarem na data do inicio da coabitação – o prazo não se interrompe nem suspende,
se a demência ou situação de acompanhamento forem posteriores ao começo da
convivência análoga à dos cônjuges (só não pode haver demência/acompanhamento no
inicio da coabitação, depois disso não releva)
▪ Quanto aos impedimentos do 2º al. c) e d) – Enquanto subsistirem não permitem a
contagem do prazo indispensável para que se possa falar de uma união de facto protegida
▪ Impedimento da alínea e) – da condenação – apenas importa se a sentença condenatória
tiver transitado em julgado antes de terem decorrido 2 anos após o inicio da coabitação;

À pessoa que pretenda beneficiar do regime da união de facto protegida cabe provar de que vive
ou viveu em união de facto há mais de 2 anos – Na falta de disposição legal ou regulamentar em
contrário, a prova faz-se nos termos gerais – Artigo 2º-A/1 LUF:

✓ Por vezes, é feita mediante declaração emitida pela junta de residência do


interessado – Através dessa declaração comprova-se que ele viveu ou vivia com o outro

127
em união de facto durante determinado período de tempo – Neste caso, exige-se a junção
àquele documento de ´declaração de ambos os membros da união, só compromisso de
honra, de que vivem em união de facto há mais de dois anos, e de certidões de cópia
integral do registo de nascimento de cada um deles` (2º-A/2 LUF) – Nos termos do 2º-
A/5 falsas declarações são penalmente puníveis;

Qualquer interessado em afastar a aplicação do regime da união de facto protegida pode


demonstrar que o facto não é verdadeiro, porque a união não existiu ou porque não teve lugar no
período mencionado na declaração – A prova de que a união infringe um dos impedimentos ou
viola o principio da monogamia compete àquele contra quem é invocada a eficácia da união de
facto protegida (por força do 342º/2)

Os impedimentos à união de facto protegida que constam no artigo 2º al. d) apenas importam se
se fundarem em filiação legalmente estabelecida.

EFEITOS DA UNIÃO DE FACTO

O artigo 1º/3 da Lei da economia comum dispõe que a coabitação em união de facto não é facto
impeditivo das medidas de proteção das pessoas que vivam em união de facto – No mesmo
sentido, o artigo 3º/2 LUF estabelece que nenhuma das suas normas prejudica a aplicação de
qualquer outra disposição legal ou regulamentar tendente à proteção de uniões de facto ou
situações de economia comum Assim, os membros de união de facto não protegidas
podem invocar o regime da convivência em economia comum protegida, se preencherem esses
requisitos (mas os membros das uniões de facto protegidas tem igual poder – ainda que o regime
da união de facto seja mais favorável do que o da convivência em economia comum, ainda que
possa haver um interesse atendível na invocação da proteção em economia comum)

O artigo 1871º/1 al. c) institui uma presunção de paternidade do filho concebido na constância da
união de facto, mas no âmbito de uma ação de investigação

Podem beneficiar de técnicas de PMA os membros de união de facto compostas por mulheres ou
pessoas de sexo diferente – Artigo 6º/1 da LPMA – A filiação da criança nascida no decorrer
deste processo será fixada relativamente a ambos os membros do casal – As responsabilidades
parentais serão plenamente exercidas por ambos – Artigo 1911º/111

Em caso de dissolução da união de facto pela morte de um deles, as responsabilidades parentais


caberão, em regra, ao companheiro sobrevivo (1911º e 1904º). É ainda possível o exercício
conjunto das responsabilidades parentais pelo único progenitor da criança e pelo seu companheiro
(1904º-A) – Em caso de impedimento ou morte do único progenitor da criança, o exercício das
responsabilidades parentais poderá caber ao companheiro (por decisão judicial nos termos do
1903º e 1904º)

Em caso de dissolução por rutura da união de facto em que vigorasse o exercício conjunto das
responsabilidades parentais – Aplica-se, no essencial, as regras sobre responsabilidades parentais
no caso de divorcio (1911º/2, 1905º, 1906º e 1904º-A/5)

11
A alteração efetuada pela Lei nº 61/2008, de 31 de Outubro, prescindiu da declaração do casal perante
funcionário do registo civil no sentido do exercício conjunto, que era antes exigido pelo 1911º/3

128
Disposições legais sobre efeitos do casamento não se aplicam em bloco à união de facto

▪ O direito de não casar impede que se trate uma pessoa que não casou como se estivesse
casada;
▪ O caráter informal da união de facto não é suficiente para desencadear todas as
consequências de um casamento;
▪ Não fica, contudo, excluída a possibilidade de aplicação analógica à união de facto de
algumas normas próprias do casamento;

A lei não impõe aos membros da união de facto deveres análogos aos que vinculam os cônjuges
(do 1672º) – Ainda que os membros de união de facto estejam naturalmente vinculados ao dever
geral de respeito (a fidelidade, coabitação, cooperação e assistência são, quando muito, deveres
morais ou éticos dos membros da união de facto)

Nada impede que surja entre os membros da união de facto uma obrigação de alimentos – Pode
haver entre os companheiros uma obrigação natural de alimentos, subordinada às normas do 402º
a 404º, ou até mesmo uma obrigação de alimentos judicialmente exigível, desde que as partes
tenham celebrado validamente um negócio jurídico com esse objetivo (2014º/1)

As prestações patrimoniais espontâneas efetuadas por qualquer uma das partes para satisfação das
necessidades da vida em comum presumem-se feitas em cumprimento de uma obrigação natural
de alimentos, pelo que, em regra, o autor da prestação não pode exigir ao companheiro do que
prestou – 403º.

Em caso de morte ou lesão corporal daquele que prestava alimentos ao companheiro, no


cumprimento de uma obrigação natural ou judicialmente exigível, o beneficiário tem direito a
indemnização, nos termos do 495º/3

A lei não estabelece, para a união de facto, regras semelhantes às do casamento em matéria de
regime de bens, administração, disposição e dividas, pelo que tais regras não são, em principio
aplicáveis à união de facto – Mas, é analogicamente aplicável à união de facto o 1691º/1 b) –
comunicam as dividas contraídas para ocorrer aos encargos da vida familiar (esta norma visa a
tutela de terceiros – para um terceiro que desconhece a ausência de matrimónio, a união de facto
não se distingue da união conjugal, pelo que estando em causa dividas de pequenos montantes,
não é exigível que se apure a aparência se a união conjugal corresponde ou não à realidade)

Contratos de coabitação: Contratos mediante os quais as partes estipulam para a união de facto,
já constituída ou a constituir, uma regra semelhante ao que vigora para o casamento:

▪ Se tiver por objeto deveres conjugais específicos (como a fidelidade) – Será inválido nesta
parte pelos mesmos motivos que levam à recusa da aplicação em bloco dos efeitos legais
do casamento à união de facto;
▪ Como decorre do 2014º/1, será possível constituir através de negócio, uma obrigação de
alimentos, que não se confunde com essa obrigação legal que advém do dever de
assistência (é meramente convencional);
▪ Cláusulas de administração e disposição de bens próprios que imponham a necessidade
de consentimento do outro membro da união de facto, serão inválidas por afetarem
interesses de terceiros;

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▪ Cláusulas sobre dividas: são válidas se ampliarem a proteção que cabe, nos termos gerais,
aos credor, e desde que não sejam usurárias para um dos membros da união de facto;
▪ Cláusulas que regulamentem direitos associados à cessação da união de facto – são
válidas desde que não contrariem medidas legais de proteção da união de facto que sejam
imperativas, e se não limitarem significativamente a liberdade na rutura e não violarem a
proibição de pactos sucessórios;

EFEITOS ESPECIFICOS DA UNIÃO DE FACTO PROTEGIDA

Os efeitos são os previstos no artigo 3º da LUF. Retirando a alínea a), todos os efeitos dai
decorrentes são não civis (dizem respeito a: função pública, trabalho, fiscal, segurança social, etc)
– A eficácia civil da união de facto protegida é escassa

Lei da nacionalidade: pode adquirir a nacionalidade portuguesa mediante declaração o estrangeiro


que viva em união de facto há mais de 3 anos com nacional português, após reconhecimento
judicial dessa relação – Artigo 3º/3

O artigo 7º da LUF reconhece aos unidos de facto protegidos (independentemente do sexo) o


direito de adoção conjunta, em condições semelhantes às previstas no 1979º: + de 25 anos e
duração da ligação superior a 4 anos; ou, no caso do adotando ser filho do companheiro, idade
mínima de 25 anos, bastando que a união de facto dure há mais de 2 anos

CESSAÇÃO DA UNIÃO DE FACTO

O artigo 8º/1 prevê as causas de cessação da união de facto: Há que acrescentar uma quarta causa
que é a reconciliação de um membro da união de facto casado, separado de pessoas e bens, com
o respetivo cônjuge – A reconciliação põe fim à separação de pessoas e bens, e implica o
restabelecimento da vida em comum entre os cônjuges e de todas as situações jurídicas conjugais
(1795º-C/1) o que é incompatível com a subsistência da união de facto protegida

Para a dissolução por rutura, basta a manifestação de vontade de um dos seus membros – Não é
necessária qualquer intervenção estatal. A declaração referida pelo 8º/2 não é condição da
cessação da união de facto, mas sim da efetivação dos direitos que são legalmente conferidos a
um companheiro no caso de rutura de uma união protegida.

O artigo 2º-A/3 e 4 regulam a prova da dissolução de casamento

LIQUIDAÇÃO DE INTERESSES PATRIMONIAIS

Para alguma doutrina, finda a união de facto cada um deles tem direito a participar na liquidação
do património adquirido pelo esforço comum, pelo que deve ser feita de acordo com os princípios
das sociedade de facto quando os respetivos pressupostos se verifiquem

Mas a decisão mais acertada parece ser: a ausência da comunhão de vida em que se traduz a união
de facto, opõe-se ao uso da construção da sociedade de facto, pelo que o conflito assentará no
instituto do enriquecimento sem causa (é este mecanismo que mulher tutela, por exemplo, o unido
de facto que entregou dinheiro seu para que o outro interviesse como adquirente no contra de
compra e venda)

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A coabitação cria confusão quanto à titularidade dos bens moveis não sujeitos a registo (como o
recheio da casa) – Não sendo possível demonstrar a propriedade exclusiva de um deles, presume-
se (natural ou judicialmente) que esses bens estão em compropriedade pelo que qualquer um deles
poderá requerer a divisão da coisa comum nos termos dos artigos 1412º e 1413º

EFEITOS ESPECIFICOS DA UNIÃO DE FACTO PROTEGIDA

EFEITOS DA CESSAÇÃO POR MORTE

➢ Direito a alimentos: o membro sobrevivo da união de facto protegida que careça de


alimentos pode exigir alimentos da herança do companheiro falecido (2020º/1).
▪ Este direito perde-se se não for exercido dentro dos 2 anos posteriores à data da
morte do autor da sucessão – 2020º/2, e cessa também se o alimentado contrair casamento
ou iniciar nova união de facto;
➢ Direito a outras prestações: Artigo 3º/1 al. e), f) e g) estabelecem outras prestações – o
artigo 6º regula o regime de acesso a estas prestações: Elas são-lhes devidas,
independentemente de necessidade, e apenas haverá ação judicial se a entidade
responsável pelo pagamento das prestações por morte entender que existem fundadas
dúvidas sobre a existência da união de facto (6º/2) – se essa ação for intentada, o
sobrevivo apenas terá que demonstrar que vivia em união de facto há mais de 2 anos
➢ Direitos sobre a casa de morada de família pertencente ao falecido: o membro
sobrevivo goza de direito real de habitação, pelo prazo de 5 anos, sobre a casa de morada
de família, e tem um direito de preferência na sua venda (durante o tempo em que habitar
nela) – Artigo 5º/1 e 9 LUF
▪ Se a união de facto começou há mais de 5 anos antes da morte, o direito de
habitação é conferido por tempo igual ao da duração da união – 5º/2 LUF
▪ Apenas em casos excecionais, pode o tribunal prorrogar o prazo, nos termos do
artigo 5º/4 LUF
▪ O direito de habitação não será conferido ao membro sobrevivo se este tiver casa
própria no concelho ou nos concelhos limítrofes (no caso de viver em lisboa ou Porto) –
5º/6 LUF – esse mesmo direito caduca se o interessado não habitar a casa por mais de 1
ano, salvo se essa falta for devida a causa maior
▪ Esgotado o prazo, o membro sobrevivo tem o direito de permanecer no imóvel
na qualidade de arrendatário, nas condições gerais de mercado – 5º/7
➢ Direito de uso do recheio da casa de morada de família pertencente ao companheiro
falecido: É conferido ao sobrevivo o direito de uso do recheio da casa de morada de
família pertencente ao falecido, nos termos do artigo 5º/1 e 2 da LUF
▪ O direito de uso caduca, e o respetivo prazo pode ser prorrogado, nos mesmos
termos que o direito de habitação sobre a casa de morada de família – 5º/4 e 5 LUF
➢ Direito ao arrendamento para habitação da casa antes arrendada ao companheiro
falecido: A lei faz depender a transmissão em beneficio de companheiro ou conveniente
em economia comum do preenchimento cumulativo dos seguintes requisitos: Duração da
relação há mais de 1 ano e tempo de residência do sobrevivo no locado superior a um ano
( o requisito da duração [que é inferior ao geral, para a transmissão por morte] é o único
que é diferente, isto é, todos os outros tem de ser preenchidos tal como prescreve o artigo
2º da LUF)

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▪ Transmissão por morte nos contratos celebrados antes do NRAU são regulados
pelos artigos 57º, 26º/2 e 28º desse mesmo regime – para estes já se exigirá uma duração
mínima de 2 anos da relação;
▪ O arrendamento decorrente de transmissão está, em regra, limitado por natureza,
ao período de duração do direito real de habitação que existia se o falecido fosse
proprietário do imóvel onde se encontrava instalada a casa de morada de família mesmo
que o falecido fosse titular de um direito de arrendamento de duração indeterminada.
➢ A lei 23/2010, de 30 de Agosto, alterou o artigo 496º e atribuiu ao sobrevivo o direito a
ser indemnizado, em concurso com os filhos ou outros descendentes dos falecidos –
496º/2 e 3

EFEITOS DA CESSAÇÃO POR RUTURA OU CASAMENTO DE UM DOS MEMBROS


DA UNIÃO DE FACTO

A união de facto também pode extinguir-se com o casamento de um dos membros – Artigo 8º/1,
c) LUF

A dissolução por rutura apenas terá de ser judicialmente declarada quando se pretendam fazer
valer direitos que dependam dessa declaração que deve ser proferida na ação em que os direitos
reclamados são exercidos, ou em ação que siga o regime processual das ações de estado – Artigo
8º/2 e 3 LUF

Os principais efeitos prendem-se com o destino da casa de morada de família: se viverem em casa
pertencente a um deles, ou em compropriedade a ambos, o direito de nela habitar poderá vir a ser
atribuído àquele que não era proprietário do imóvel ou que era somente um dos comproprietários,
mediante a constituição de uma relação de arrendamento (essa relação pode ser constituída por
acordo ou sentença)

 Faltando acordo entre eles quanto ao destino da casa de morada de família que
pertença a um deles ou a ambos em compropriedade – Artigo 4º LUF – Aplica-se o 1793º
com as necessárias adaptações

Após a separação, se o casal residia em casa arrendada a um dos membros, aqueles que não é
arrendatário ou não é o único pode vir a adquirir o direito exclusivo de habitar nessa casa, graças
ao mecanismo de transmissão inter vivos do direito de arrendamento – transmissão da posição de
arrendatário faz-se por acordo ou sentença – o artigo 4º da LUF prevê que em caso de separação,
é aplicável o disposto no 1105º. Por força do 1105º/3 a transmissão do arrendamento por acordo
do casal tem de ser homologado pelo juiz e deve ser notificada oficiosamente pelo senhorio

▪ De acordo com o 8º/3 LUF o membro que precise de intentar uma ação para fazer valer
os direitos que lhe são conferidos pelo artigo 4º pode ter de cumular o pedido de
transmissão de direito de arrendamento para o não arrendatário ou de constituição do
direito de arrendamento com o da declaração judicial de dissolução da união de facto por
separação, sendo aquele pedido dependência deste.

Há efeitos do divorcio que são semelhantes aos da rutura da união de facto (ex.: quanto à casa de
morada de família ou exercício das responsabilidades parentais).

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No caso de rutura, o ex-companheiro que careça de alimentos não tem direito a obtê-los do outro,
ao contrário daquilo que acontece no divórcio (e na dissolução da união de facto pela morte)

CAP. IV – CONVIVÊNCIA EM ECONOMIA COMUM

É uma comunhão de mesa e habitação entre duas ou mais pessoas – Artigo 2º da LEC | Pode ser:

➢ Convivência em economia comum protegida: Aquela que goza das medidas de


proteção previstas na LEC. São necessários, cumulativamente, os seguintes requisitos:
▪ Duração superior a 2 anos –
▪ Vivencia com entreajuda ou partilha de recursos –
▪ Existência mínima de um membro maior de idade
▪ Convivência não relacionada com a prossecução de finalidades transitória
▪ Integração livre de todos os membros no grupo
➢ Convivência em economia comum não protegida;

EFEITOS ESPECIFICOS

O artigo 4º/1 LEC estende à convivência em economia comum protegida os benefícios do regime
não civil do casamento.

Os efeitos civis resumem-se essencialmente à tutela da casa de morada comum – Artigo 4º al. d)
e e) da LEC: Em caso de morte da pessoa proprietária da casa de morada comum, as pessoas que
com ela tenham vivido em economia comum têm direito real de habitação, pelo prazo de 5 anos,
sobre aquela casa, e direito de preferência na sua venda, também pelo mesmo prazo – Artigo 5º/1
da LEC. – Esta transmissão não ocorrerá quando ocorrer uma das situações previstas no artigo
5º/2 e 3

Em caso de morte do membro da convivência em economia comum que era arrendatário da casa
de morada comum, um dos membros sobrevivos pode beneficiar da transmissão por morte do
arrendamento para habitação nos termos do artigo 1106º - A posição de arrendatário transmite-se
para a pessoa que com ele vivesse em economia comum há mais de um ano e residisse nesse local
também há mais de 1 ano – se sobreviveram vários a prioridade será dada prioritariamente:
Parente do arrendatário, parentes mais próximo, parente mais velho, afim, afim mais próximo,
afim mais velho, ou àquele que for mais velho

Em comparação com a união de facto: As pensões de sobrevivência e subsídios não ocorrem nas
economias comuns, nem os direitos de exigir alimentos à herança ou de usar o recheio da casa de
morada.

Há aspetos que aproximam a união de facto da convivência em economia comum:

✓ Tal como a convivência em economia comum, a união de faco pressupõe


´comunhão de mesa e habitação`;
✓ Exige-se um prazo de 2 anos para que ambas beneficiem de proteção;
✓ Tanto a LEC como a LUF pressupõem que não há incompatibilidade entre os
regimes das duas figuras;
✓ Ambas pressupõem a existência de uma comunhão entre os seus membros, mas
não obrigam a vida em comum;

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Existe casamento mesmo que não vivam em comum, mas não é possível união de facto sem
coabitação efetiva.

A união de facto e a convivência em economia comum não são relações jurídicas familiares – A
constituição ou extinção de uma relação jurídica familiar por facto diferente da morte implica um
ato de uma autoridade estatal (conservador ou juiz) ou de autoridade equivalente (funcionário de
facto, padre, etc.)

São relações parafamiliares (desde que protegidas) pois são similares às relações familiares:

▪ Ambas traduzem-se numa comunhão de vida análoga àquela que é exigida entre os
sujeitos das relações familiares.
 Na união de facto há comunhão de leito, mesa e habitação a que estão vinculados
os membros da união, que só podem ser dois;
 Na convivência em economia comum – há comunhão de mesa e habitação entre
duas ou mais pessoas - vivencia de entreajuda ou partilha de recursos

A união de facto e a convivência em economia comum protegidas são relações emergentes de


atos jurídicos em sentido estrito, mais precisamente de atos reais ou materiais – Na sua
constituição e desenvolvimento, os respetivos membros assumem comportamentos voluntários,
que é suficiente para que se produzam os efeitos legais de proteção – esses comportamentos não
têm de ter conteúdo comunicativo, nem finalidade declarativa

UNIÃO SEM COMUNHÃO DE HABITAÇÃO

As partes decidem residir habitualmente em sítios diferentes, sem abdicar de outros elementos
como a comunhão sexual, fidelidade e entreajuda – Há o propósito bilateral de vida a dois, mas
as partes não residem nem pretendem residir no mesmo local |EX.: Experiencia posterior ao
divórcio, sendo adotado por um divorciado e um terceiro que pode evitar atos impulsivos de
substituição do cônjuge por outrem, que têm consequências na relação entre os adultos envolvidos
e filhos de pais divorciados – Esta deveria ser uma figura mais bem ponderada pelo legislador.

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