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Direito da Família Matilde Diogo Alves

DIREITO DA FAMÍLIA
2022/2023
Matilde Diogo Alves
Relações Jurídico-Familiares
As fontes das relações jurídico-familiares encontram-se previstas no artigo 1576.º,
segundo o qual são fontes das relações jurídico-familiares o casamento, o parentesco, a
afinidade e a adoção. Uma crítica a esta conceção é que é certo que o casamento e a
adoção são atos jurídicos e, por isso, efetivas fontes de relações jurídico-familiares, mas
o parentesco e a afinidade são verdadeiras e efetivas relações jurídico-familiares efetivas.
A noção de fonte de relações jurídico-familiares prende-se com ser algo que gera deveres
e obrigações. Ainda que o casamento e a adoção sejam constituídas por contrato e
sentença judicial, respetivamente, e criem direitos e obrigações, o parentesco e a afinidade
são verdadeiras relações e não fonte de relações.
O que está na base do parentesco é uma relação de consanguinidade – verdadeira relação
jurídico-familiar, não uma fonte. O mesmo sucede com a afinidade, relação que tem na
base o casamento e o parentesco – relação entre cônjuge e os parentes do outro cônjuge.
Assim, só o casamento e a adoção são verdadeiras fontes.
O casamento dá origem a uma relação jurídica matrimonial, que consiste na relação que
liga duas pessoas que pretendem ter uma plena comunhão de vida entre si, de forma
perpétua, ao abrigo do artigo 1577.º. Distingue-se das demais relações jurídicas, já que
estas ligam várias pessoas em simultâneo.
O parentesco é uma relação jurídico-familiar estabelecida através de laços de sangue,
seja porque descendem uma da outra, seja porque descendem de um progenitor comum
(1578.º). O parentesco determina-se pelas gerações que vinculam os parentes um ao
outro: cada geração forma um grau e a série de graus constitui a linha de parentesco –
artigo 1579.º do Código Civil:

• Parentes em linha reta: Casos de pessoas que sejam descendentes uma da outra.
A linha reta pode ser descendente ou ascendente, em função da posição em que
nos colocamos para contar (1580.º/2);

• Parentes em linha colateral: Quando os parentes não são descendentes, mas têm
um progenitor comum.

Na linha reta há tantos graus quantas pessoas que formam a linha de parentesco, excluindo
o progenitor – artigo 1581.º. Na linha colateral, os graus contam-se pela mesma forma,
subindo por um dos ramos e descendo por outro, mas sem contar o progenitor comum.

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Os efeitos do parentesco produzem-se em qualquer grau na linha reta até ao sexo grau da
linha colateral – artigo 1582.º, limites do parentesco. Nota: Excetua-se o direito de
representação no âmbito sucessório (2042.º).
Efeitos do Parentesco:

• Efeitos sucessórios: Os parentes podem ser sucessores uns dos outros, seja na
sucessão legítima, seja na sucessão legitimária – herdeiros obrigatórios, que não
podem ser afastados pelo autor da sucessão. A respeito da sucessão legítima, as
primeiras três classes de sucessíveis na ordem correspondem aos descendentes,
ascendentes, irmãos e seus descendentes e outros colaterais até ao 4.º grau;
• Direito a Alimentos (art. 2009.º): Encontramos relações de parentesco nas alíneas
b) a e), tratando-se este de um direito economicamente relevante no quadro da
família familiar. O direito a alimentos é um direito que um sujeito recebe por dele
carecer para substituir e porque o obrigado a prestar tem condições económicas
para o prestar (alimentos = habitação, comida, vestuário, educação, etc.) e implica
a necessidade do beneficiário e a capacidade económica do obrigado;
• Impedimentos Matrimoniais: De acordo com o artigo 1600.º, estão impedidos
parentes em linha reta e parentes em segundo grau da linha colateral (irmãos).

A afinidade é o vínculo que liga cada um dos cônjuges aos parentes do outro, de acordo
com o artigo 1584.º do Código Civil. A fonte da afinidade é, assim, o casamento.
A relação de afinidade não cessa com a dissolução do casamento por mote (art. 1585.º),
mas cessa com o divórcio: nas palavras do professor Guilherme de Oliveira, a cessação
justifica-se, pois, “na generalidade dos casos, as relações de afinidade deixam de ter
relevância social, mal se justificando, por isso, que mantenham a sua relevância jurídica”.
O cômputo dos graus, em sede de afinidade, faz-se da mesma forma que no parentesco.
Efeitos da Afinidade:

• Direito a Alimentos (art. 2009.º, n1, alínea f)): O padrasto/madrasta estão


vinculados a prestar alimentos aos enteados menores caso estejam a seu cargo na
morte do cônjuge;
• Impedimentos Matrimoniais (art. 1602.º, alínea a)): A afinidade em linha reta
consiste num impedimento dirimente relativo.

A adoção tem uma relação em tudo semelhante à filiação natural, sem que se verifiquem
laços de sangue entre adotado e adotante, estendendo-se, de seguida, aos demais membros
da família. Será o parentesco uma consequência da adoção?
De acordo com a professora Madalena, o parentesco não é apenas um vínculo biológico,
mas um vínculo que une a descendência. A lei não refere a consanguinidade como
requisito e, por isso, a professora entende que de tal não se tratará. Pela interpretação do

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artigo 1578.º e 1986.º, defende que a adoção forma parentesco: tem como fonte a sentença
judicial que decreta a adoção, mas não deixa de ser parentesco. Para além disso, como
seria admissível argumentar no sentido de existir um impedimento matrimonial para
pessoas que crescem como irmãos se não se estabelecesse o parentesco?
A professora Rossana Martinho Cruz considera que o casamento não se confunde com a
afinidade ou a adoção. Entende que a adoção também é fonte de relação jurídico-familiar
e, por isso, apesar da equiparação que existe entre a filiação por parentesco e por adoção,
sem genética, defende que não existe parentesco.

É discutida a precisão deste artigo, nomeadamente, se este elenco de relações familiares


é taxativo ou enunciativo. Atualmente, entende-se que não deve ser inteiramente taxativo,
podendo incluir outras realidades no leque das relações familiares, entre as quais a união
de facto (doutrina diverge), o apadrinhamento civil (que visa substituir aqueles em que
em primeira linha seriam os responsáveis pelo exercício das responsabilidades parentes)
a paternidade não biológica em caso de procriação medicamente assistida ou a economia
comum.

Estabelecimento da Maternidade e da Paternidade


A filiação estabelece-se em função do princípio da verdade biológica. Assim, o legislador
tem como pretensão que haja uma transposição da verdade que resulta da biologia ou da
genética. Assim, mãe é quem gera e dá à luz (ainda que existam certos desvios derivados
das formas de procriação medicamente assistida) e pai presume-se o marido da mãe, caso
a mulher seja casa. Esta presunção pater is est está prevista no art. 1826.º/1. Hoje em dia,
no domínio das formas de procriação medicamente existida – daqui para a frente, PMA –
o pai é pai não apenas por ser casado com a mãe, mas única e exclusivamente caso tenha
consentido no recurso a essa técnica. Assim, esta é uma relação de parentesco não legal,
decorrente da vontade.
Quanto às PMA, em 2016, o legislador veio consagrar a possibilidade de uma mulher
solteira, independentemente de qualquer problema de infertilidade, recorrer a sémen de
um dador para procriar e gerar uma vida. Este é um sinal contraditório do legislador, que
há anos tem vindo a tentar aniquilar as famílias monoparentais, compostas por mães
solteiras, por as associar ao desequilíbrio.

Como acima tratado, a paternidade, no casamento, presume-se. E se a criança nascer no


contexto de uma união de facto, como é estabelecida a paternidade? Por perfilhação. No
casamento, o marido é obrigado a ter as responsabilidades parentais, mas, fora do
casamento, na ausência de ato voluntário, em princípio, não é assim.

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Conceções de Família
Antes, vigorava um conceito alargado de família. Hoje em dia, vigora um conceito de
família nuclear, que se mantém muito depois da maioridade. A evolução tem dado origem
ao conceito da família mosaico ou reconstituída (“os meus, os teus e os nossos”).
As famílias monoparentais podem sê-lo ab initio ou por superveniência do facto: no caso
da viuvez, p.e., uma família inicialmente nuclear passa a ser monoparental por força da
morte de uma das figuras parentais e no caso das PMA, p.e., existe uma família
monoparental ab initio.
A família está centrada no fator da intimidade, sendo visto como um centro de interesses
regulado. Fruto das Revoluções Liberais da segunda metade do século XX, o Código
Civil sofreu uma reforma muito importante, a de 1977. No plano do Direito da Família,
isto institui uma grande revolução. Os principais fatores revolucionários foram a
igualdade entre o marido e a mulher e o princípio da direção conjunta da família.
Nota: Proibição da bigamia porque se considera que o casamento é a partilha de mesa,
leito e habitação entre duas pessoas, não entre mais. Não significa isto que casamentos
polígamos admitidos ao abrigo de outras leis não possam ser reconhecidos em Portugal,
para alguns efeitos.

Normas Constitucionais de Direito da Família


O Direito Constitucional tutela o direito da família no domínio dos direitos fundamentais,
consagrando os seguintes direitos fundamentais:

• Direito a celebrar casamento (artigo 36.º, número 1, 2.ª parte da Constituição da


República Portuguesa): todas as pessoas têm o direito de contrair casamento em
condições de plena igualdade.
o Este direito não preclude a existência de impedimentos ao matrimónio
estabelecidos pelo legislador ordinário, objetivamente justificáveis por
interesses superiores, atendendo, em regra, a princípios éticos emergentes
dos bons costumes ou a razões de interesse público e, em concreto, de
saúde pública, como acontece no artigo 1602.º. Estes impedimentos
aplicam-se aos casamentos civis e católicos;
o O casamento pode ser o casamento civil, canónico ou civil sob forma
religiosa, exigindo-se capacidade matrimonial;
o Este preceito proíbe, por exemplo, impedimentos destinados a proibir
casamentos entre raças diferentes ou que imponham pré-requisitos
médicos a poderem casar e até que impeçam pessoas do mesmo sexo de
casar, casamentos outrora proibidos em vários ordenamentos;
o Sendo o direito a celebrar o casamento uma garantia institucional, o
legislador tem o dever de proteger e regular positivamente, mas a figura
não pode ser aniquilada ou suprimida, nem podem ser instituídos
demasiados obstáculos à sua válida celebração;

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o Até 1975, o casamento católico seria para toda a vida, não sendo o divórcio
admitido. Fruto da evolução operária de 25 de abril, surgiu um decreto, e
1975, onde se veio a abolir esta proibição.

• Direito a constituir família, que encontra consagração ainda em vários diplomas


internacionais, como o art. 16.º/1 da DUDH, o art. 12.º da CEDH e o artigo 9.º da
CDFUE.
Guilherme de Oliveira e Pereira Coelho entendem que estes são dois direitos diferentes –
constituir família e contrair casamento – porque, ao lado do casamento, existe a família,
p.e., por parentesco, entre outras.

• Competência da lei civil, prevista no artigo 36.º, número 2, da Constituição da


República da Portuguesa: o legislador pretende subtrair do Direito Canónico a
regulação da matéria dos requisitos e dissolução do casamento:
o À competência dos tribunais eclesiásticos está, nos termos da lei civil,
reservada às causas respeitantes à nulidade do casamento católico e à
dispensa do casamento rato e não consumado (1625.º), em linha com o
estabelecido na Concordata de 2004 (nota: esta Concordata não exclui o
divórcio no casamento católico, mas indica que este deverá ser evitado);
o Porém, tem-se entendido que, à luz deste preceito constitucional, esta
situação poderá ser, a qualquer momento, alterada, no sentido de atribuir
competência aos tribunais civis para dirimir estas situações;
o A grande diferença entre o casamento civil e o casamento católico é que o
casamento civil só pode ser anulado pelas causas taxativamente previstas
e o casamento católico pode ser declarado nulo, competindo aos tribunais
eclesiásticos esta declaração de nulidade.

• Direito à Identidade Pessoal (artigo 26.º, número 1, da Constituição): Este


direito consiste, por um lado, num direito a todo o sujeito ter um nome e de o
defender; e, por outro lado, no direito à historicidade pessoal, materializado no
direito ao conhecimento da identidade dos seus progenitores “que, por sua vez,
garante um direito à localização familiar”. O direito à identidade pessoal tem
permitido a introdução de algumas alterações na legislação familiar,
nomeadamente em matéria de PMA, com o fim da imposição do anonimato dos
doares, por força do direito à historicidade pessoal;

• Direto ao Livre Desenvolvimento da Personalidade (artigo 26.º da Constituição


da República Portuguesa): Este direito fundamenta uma tutela geral de
personalidade e consagra uma “liberdade geral de ação”, uma liberdade de
“comportamento” no sentido de uma autonomia e autodeterminação individuais,
“assegurando a cada cidadão a liberdade de traçar o seu plano de vida”:
o Este direito permitiu a conversão de um casamento em união de facto,
através da figura do divórcio por mútuo consentimento. Segundo esta

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decisão, se dois sujeitos têm a liberdade de converter uma união de facto


em casamento, a situação inversa deverá ser legitimada;
o O conceito de família não está legalmente definido, até porque a família
surge como uma célula base da sociedade, anterior ao direito. Assim, é um
conceito aberto e plural, sujeito à evolução da sociedade, sendo isto
essencial para garantir o livre desenvolvimento da personalidade, como
acontece, p.e., no caso da adoção conjunta de pessoas do mesmo sexo;

o Direito dos cônjuges a um regime igualitário (art. 36.o, n.o 3 CRP): os cônjuges
tem iguais direitos e deveres quanto à capacidade civil e política e à manutenção
e educação dos filhos.
• cada um dos cônjuges desenvolve a vida fora da família + ambos
contribuem para os encargos – não é uma lógica de igualdade estrita no
que diz respeito à contribuição financeira
• Decorrência logica do princípio da igualdade (art. 13.o CRP).
• “manutenção e educação dos filhos” – no que diz respeito ao exercício
das responsabilidades parenteais incumbem a ambos da mesma forma na
constância do casamento. exigem comum acordo por ambos – acordo este
que se presume. NAS QUESTÕES DE PARRICULAR IMPORTÂNCIA
O CONSENTIMENTO NÃO SE PREUSME (p.e. saúde – sujeição a
transfusão de sangue + viagens para o estrangeiro + educação)
• a igualdade dos pais na manutenção dos filhos é visível na ação de
impugnação da paternidade presumida (1839/1) – pode haver impugnação
pelo marido, pela mãe ou pelo filho!

o Direito dos filhos a um regime igualitário (art. 36.o, n.o 4 CRP): os filhos
nascidos fora do casamento não podem, por esse motivo, ser objeto de qualquer
discriminação.
• O artigo 123.o CRC veio permitir, posteriormente à entrada em vigor da
Constituição, a eliminação das certidões de registo de todas os elementos
discriminatórios
• O tratamento igualitário tem igualmente implicações do ponto de vista
sucessório.

o Direito de pedir o divórcio (art. 36.o, n.o 2 CRP in fine): este direito é
reconhecido independentemente da natureza do casamento (civil ou católico);

o Direito-dever dos pais a educarem os filhos (art. 36.o, n.o 5 CRP);


• a criança tem o direito de ser ouvida? sim, tendo em atenção a sua
personalidade – 1874º/1 e 1872º
• o estado tem o dever de colaborar com os pais na educação dos filhos –
norma programática.

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o Direito de inseparabilidade dos filhos junto dos pais (art. 36.o, n.o 6 CRP): os
filhos não podem ser separados dos pais, salvo quando estes não cumpram os seus
deveres fundamentais para com eles e sempre mediante decisão judicial
• o lugar natural e próprio das crianças é com os seus pais e só em situações
excecionais e graves podem ser afastadas dos seus pais (quando
ponham as crianças em perigo e valores fundamentais como o livre
desenvolvimento, integridade física e moral + saúde)
• podem gerar inibições de exercício de responsabilidades parentais
• no limite – processo de adoção ou apadrinhamento civil

o Proteção da adoção (art. 36.o, n.o 7 CRP);

O artigo 36.o CRP deverá ser conjugado com o artigo 67.o CRP, que consagra a proteção
da família enquanto grupo de pessoas pelo legislador; com o artigo 68.o CRP, que
consagra a proteção da paternidade; e com o artigo 69.o CRP, consagrando a proteção das
crianças da sociedade e do Estado, com vista ao seu desenvolvimento integral. o artigo
67º e seguintes não gozam da mesma força jurídica.

o Artigo 69º – proteção da infância


• como se protege? como se protege? ao sinalizar situações que
comprometem + criação de instituições que acolham (CPCJ + SS)

O CONCEITO CONSTITUCIONAL DE FAMÍLIA ASSENTA ENTÃO EM 4 PILARES


o a família é uma realidade prévia ao direito e é um conceito relativamente aberto
o a geração e a educação dos filhos é um elemento fundamental da família
constitucionalmente protegida sendo a maternidade e a paternidade valores sociais
eminentes.
• existe uma equivalência entre a maternidade e paternidade dentro e fora
do casamento e existe uma solidariedade intergeracional
o a consagração da família, casamento e adoção como garantias institucionais
(dever de proteção e abstenção de aniquilamento do seu núcleo essencial)
o intervenção subsidiária do estado ainda que ele seja chamado a complementar a
função social que o pai e a mãe devem ter

Professora considera que estes deveres podem ser reduzidos a 3 porque não concorda que
a família tenha de ter filhos, sobretudo a família assente no casamento.

D OUTRINA
o Rita Lobo Xavier: “a família entrou na CRP para que a CRP entrasse na família”

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• a família entrou na CRP por força da introdução dos artigos mencionados,


sendo que a CRP reconhece a família como elemento fundamental da
sociedade
• tutela a família impondo o dever de a proteger e impondo uma intervenção
subsidiária do estado (em termos em que não pode dirigir as famílias ou
imiscuir-se demais na forma como os pais educam os filhos – 1878º - mas
pode e deve auxiliar
▪ a tutela constitucional tem dois polos: assegurar autonomia dos
seus membros, mas também tutelar a sua vertente de garantia
institucional
• a CRP entrou na família através da vinculatividade direta destas normas
constitucionais (são DLG)

NOTAS:
o o fator do desejo de perpetuar cadeia de DNA própria deve ser tida em conta no
que diz respeito ao direito da família – é diferente adotar e reproduzir (mesmo que
PMA)
o refere-se numa lei “dignidade humana” e não “dignidade da pessoa humana” para
acautelar os nascituros

CARACTERES DO DIREITO DA FAMÍLIA

o predomínio das normas imperativas, ao contrário do direito das obrigações, p.e.


deveres dos cônjuges + regras da administração de bens;
• o legislador intervém apenas em domínios que entende ser do interesse
público; pelo que a sua intervenção, se ditada por interesses de ordem geral,
deverá ser essencialmente constituída por estas normas
• A presença de normas supletivas está sobretudo confinada às relações
familiares patrimoniais (ex. o legislador, na ausência de escolha prévia
do regime de bens, prevê o regime da comunhão de adquiridos)
o institucionalização da família – existe um núcleo fundamental de conceitos de
família que não podem ser desvirtuados;
• sendo a família um conceito aberto e plural – inexistência de uma definição
legal de família – surge a tendência de recurso a clausulas gerais p.e.
interesse superior da criança ou os deveres conjugais
• ainda assim, muitas das vezes o legislador atua com um intuito pedagógico
• ainda que haja institucionalismo, há permeabilidade às alterações sociais e
muitas vezes o legislador sente necessidade de introduzir modificações na
sociedade

o coexistência do direito estadual com o direito canónico;

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• Do ponto de vista institucional o direito da família é também


particularmente caracterizado pela coexistência entre direito estadual
(direito civil) e direito canónico - veja-se os casos da Concordata ou da
competência dos tribunais eclesiásticos - bem como pela atribuição de um
conjunto de competências exclusivas aos tribunais de família e menores
(ex. ações de divórcio e separação judicial de pessoas e bens sem
consentimento de um dos cônjuges).
o fragilidade da garantia dos direitos pessoais
• tendo-se eliminado a figura do divórcio por violação dos deveres conjugais,
bem como a relevância da culpa noutros domínios p.e. partilha de bens após
o divórcio), não há uma garantia específica
• eventualmente pode haver responsabilidade civil por violação de direitos
fundmanetais de um cônjuge pelo outro

o atribuição de competência especializada a tribunais de família e menores


para conhecer tudo aquilo que diga respeito às família e crianças (lei 62/2013
– LOSJ);
o Competência apara regular providencia entre cônjuges ou quanto a filhos menores
o questões relativas ao reconhecimento da união de facto.

RELAÇÃO MATRIMONIAL
Constituição da Relação Matrimonial
Conceito e Caracteres Gerais do Casamento
O Código Civil consagra uma definição de casamento, o que constitui uma inovação face
aos outros sistemas, onde não surge definido o casamento. De acordo com o artigo 1577.º,
o casamento é o contrato celebrado entre duas pessoas que pretendem constituir família
mediante uma plena comunhão de vida, nos termos das disposições do Código Civil.
A plena comunhão de vida concretiza-se nos deveres conjugais, quando praticados em
igualdade. A plena comunhão de vida já não se entende como procriação, já não se
tratando este de um fim essencial, nem sequer entrando na definição de casamento civil.
Ainda assim, quando são tratadas questões como a proteção da família e da casa de
morada da família, surgem referidos, desde logo, o valor e os direitos dos “filhos” – assim,
a família com filhos é o paradigma. No casamento canónico, ainda que não seja um
requisito, é dada maior relevância ao intuito de procriação.
Assim, este conceito é entendido como um interesse fundamental de vinculação dos
cônjuges a um conjunto de deveres emergentes da exclusividade e da tendencial
perpetuidade do casamento. Surgem, assim, deveres pessoais aos quais estão as pessoas
vinculares: respeito, fidelidade, cooperação, coabitação e assistência, de acordo com o
artigo 1672.º do Código Civil.

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Assim,

• “tendencial perpetuidade”: A tendencial perpetuidade do casamento não obsta


ao possível exercício do direito ao divórcio pelos cônjuges (36.º/2);
A violação dos deveres supramencionados por um dos cônjuges tem, atualmente, uma
tutela muito mais fraca, com a retirada do instituto do negócio por culpa da lei civil; ainda
assim, em situações extremas, o cônjuge lesado pode lançar mão do instituto da
responsabilidade civil para ser indemnizado, nos termos gerais, pelos danos sofridos em
consequência da violação destes deveres.

• “exclusividade”: Verifica-se o estabelecimento de um impedimento dirimente


absoluto à celebração de um novo casamento quando o casamento anterior,
católico ou civil, não esteja dissolvido (art. 1601.º, c)).
O mesmo é reiterado com a proibição da união de facto com uma pessoa perante a
subsistência de um casamento, na Lei da União de Facto. No entanto, isto pode vir a
acontecer, devido à morosidade inerente ao processo de divórcio quando não há
casamento.

O contrato de casamento é um negócio pessoal que diz respeito às pessoas dos cônjuges,
apesar de ser admitido o casamento por procuração. É também um negócio solene, por
existir todo um formalismo que se observa para garantir que as pessoas estão convictas
quanto à sua vontade. Não é livremente dissolúvel, tendo de existir uma causa para que
haja uma dissolução do contrato:

• Pode ser uma dissolução por mútuo consentimento – ou intervenção da autoridade


pública – ou por iniciativa de um deles com fundamento numa causa fundada na
lei:
• No ordenamento jurídico português, não existe um divórcio “a pedido”, tendo
sempre que existir uma causa.
É dos artigos 1672.º e ss. que se retiram os deveres de respeito, fidelidade, coabitação,
cooperação e assistência.
Não pode uma pessoa estar casada com mais do que uma pessoa, não sendo admitidas no
Direito Civil ou Canónico a poligamia ou a poliandria simultâneas, podendo ser
sucessivas.
Não podem ser apostas condições ou termos ao casamento. Não pode assim, p.e., ser
determinado que o casamento será válido durante 5 anos e depois será avaliada a
possibilidade de renovação, ou as partes decidir que serão casadas enquanto forem felizes.
Assim, verifica-se numerus clausus de causas de divórcio.

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O Direito Canónico concede uma definição de casamento no cânone número 1057,


número 2, do Código Internacional Canónico, “ato da vontade pelo qual o homem e a
mulher, por pacto irrevogável, se entregam e recebem mutuamente a fim de constituírem
o matrimónio”. Assim, os sujeitos, no Direito Civil, são “duas pessoas”, o casamento é
tendencialmente perpétuo, suscetível de cessar através do divórcio e o casamento envolve
uma “plena comunhão de vida”.

Regime Matrimonial Português


O sistema matrimonial português consagra três modalidades de casamento:
1. Casamento Católico (artigos 1587.º e 1588.º), que se distingue do casamento
civil do ponto de vista formal e substancial:
o Forma: A celebração do casamento canónico implica um conjunto de
formalidades canónicas e formalidades civis;
o Substância: Além do facto de o Estado Português conferir direitos civis, o
legislador reconhece e acolhe as normas de direito canónico que regem o
ato matrimonial, bem como a sua aplicação pelos tribunais eclesiásticos,
competentes para averiguar da nulidade de um casamento católico.
2. Casamento Civil sob a Forma Religiosa: ao abrigo da Lei da Liberdade
Religiosa, o Estado Português reconhece a celebração de determinados
casamentos de acordo com o Código de uma determinada religião, regendo-se, no
restante, pela lei Civil (artigo ???). Estes casamentos são celebrados perante o
Ministro do Culto da Igreja/comunidade religiosa;
3. Casamento Civil (artigo 1587.º), celebrado segundo a Lei Civil, na Conservatória
do Registo Civil.

Qual a natureza dos deveres familiares e conjugais?


Parte da doutrina considera que, nas relações horizontais e verticais, os direitos da família
são poderes funcionais, não direitos subjetivos (direitos subjetivos são exercidos se,
como, quando e no interesse do titular e poderes funcionais estão subordinados a outros
interesses do seu titular, o se, quando e como sendo determinados pelo interesse de outra
pessoa). São intransmissíveis e irrenunciáveis, tendo de ser aquela pessoa a realizar a
tarefa, p.e., mesmo quando alguém dá um dos seus filhos para adoção, está em causa um
ato de exercício das responsabilidades parentais, na medida em que terá sempre a
obrigação de zelar pela sua saúde e segurança, podendo dar-se o caso de essa ser a melhor
alternativa para a criança.
O exercício destes direitos é legal e judicialmente controlado, através de padrões
objetivos.
Nas relações verticais, surgem entre pais e filhos, defendendo a doutrina a plena
aplicabilidade do conceito de deveres funcionais. Nas relações horizontais, entre

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cônjuges. Será que podemos dizer que exerço o meu dever de fidelidade e o meu direito
de exigir fidelidade no interesse de outrem? A professora Rosa Matias entende que estão
em causa direitos subjetivos que estão subordinados à comunhão de vida existente entre
duas pessoas casadas.

Os direitos familiares pessoais apresentam a característica de fragilidade da garantia.


Por regra, a violação de um dever acarreta uma sanção, como acontece, p.e., com os
direitos de crédito. Não há, no entanto, no âmbito do Direito da Família, uma sanção
organizada para o não cumprimento dos deveres correspondentes aos direitos.
No âmbito das relações verticais, a Constituição da República Portuguesa estabelece a
possibilidade de sancionar, através da separação dos filhos e dos pais, limitando e inibindo
as responsabilidades parentais.
Em relações horizontais, não encontramos esta sanção. Antes de 2008, quando o divórcio
radicava na culpa – só a violação culposa de dever conjugal era fundamento para divórcio
– havia quem entendesse o divórcio como a sanção, até porque poderia haver lugar a uma
indemnização pelos danos causados pelo divórcio (que deixou de existir).
A maioria da doutrina entende que só pode haver lugar a indemnização entre cônjuges
pela violação de direitos absolutos, como direitos de personalidade – como, p.e., quando
um cônjuge bate no outro. Mesmo neste caso, a indemnização nasce do facto de serem
direitos absolutos, não do facto de serem cônjuges. Assim, não há responsabilidade
contratual, só extracontratual. Esta questão tem gerado muita discussão na doutrina. A
professora Rosa considera que tem de haver uma qualificação do ilícito nos casos em que
a violação de deveres absolutos é feita no âmbito do casamento, em virtude da relação de
proximidade existencial entre as partes, em virtude da plena comunhão de vida.
Nota: Quando se verifica uma violação de deveres de contribuir para os encargos da vida
familiar, o outro cônjuge pode falar com a entidade empregadora ou com o tribunal para
que lhe reserve uma parte do salário do outro cônjuge.
Os direitos familiares são direitos duradouros, convertendo-se em estado de pessoa –
estado de filho, de mãe, de pai, de casado ou divorciado. Isto devido ao facto de ser
necessária a certeza e segurança jurídica, pelo facto de tratarmos relações entre pessoas.
Estes direitos têm impacto na pessoa, gerando impedimentos matrimoniais, como
parentesco e afinidade e nos regimes de administração de bens.
Verifica-se a obrigatoriedade de registo de direitos familiares, porque existem outros
efeitos que decorrem das relações jurídico-familiares, como a maioria dos factos –
nascimento, paternidade, maternidade, etc.
Os direitos familiares representam numerus clausus. Assim, seria inválido o contrato feito
por quaisquer pessoas que assumam para com a outra os direitos e deveres típicos da
filiação, casamento, adoção, etc. Será inválido, assim, um contrato através do qual uma
pessoa pretenda ficar na situação de filha, irmã, sobrinha, etc., é nulo. A única forma de

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gerar direitos e deveres familiares é através dos específicos negócios ou atos familiares –
casamento, adoção, perfilhação, declaração de maternidade, etc. O objetivo é evitar que
haja interesses patrimoniais implicados.
Os direitos familiares são relativos, ou seja, só produzem efeitos entre as partes, não sendo
oponíveis erga omnes. Pese embora o facto de haver quem considera o contrário (João
Duarte Pinheiro), ao defender que o dever de fidelidade é um dever absoluto, podendo
ser oponível erga omnes.

Natureza dos Deveres Conjugais – Aspetos Práticos


Os deveres conjugais são imperativos – artigos 1672.º e 1699.º/n1/b)
Ainda que haja quem defende a sua baixa juricidade, está em causa a impossibilidade de
sindicância da sua juridicidade em tribunal, sendo o divórcio a única via de resolução
possível. Mesmo que se admitisse a sindicabilidade em tribunal, no caso de serem ambos
os cônjuges que, por acordo, pretendem afastar um determinado dever matrimonial, não
há sindicabilidade. Ainda assim, a jurisprudência tem decidido pela sindicabilidade dos
deveres matrimoniais, podendo o cônjuge lesado pedir indemnização pelos danos
causados – seja por responsabilidade civil obrigacional ou por responsabilidade civil
extraobrigacional, porque pode estar em causa a violação do dever geral de respeito, que
é um dever absoluto.
Não são passiveis de ser alterados – artigos 1672.º, 1699.º/n1/b) e 1692.º
Se os cônjuges quiserem alterar um dos deveres matrimoniais através de convenção
antinupcial, esta cláusula será nula e ter-se-á por não escrita (1618.º/2), por se tratar de
uma violação de uma norma imperativa, atendendo a que o Estado intervém por estarem
em causa interesses públicos.
Nota: O dever de fidelidade é um dever que é imposto de forma imperativa porque resulta
de um dos traços identificadores do casamento – a exclusividade. É certo que a referência
aos “sexos diferentes” foi eliminada do artigo, mas a referência à exclusividade, quando
se refere uma comunhão plena de vida “entre duas pessoas”, não foi.

Será que os deveres matrimoniais não estarão a restringir em termos inadmissíveis o


direito a constituir família – um direito constitucional – tendo em conta que há quem nele
não se reveja? A professora Madalena entende que não, porque o direito a contrair
casamento e o direito a constituir família são distintos. As realidades são distintas, o que
desde logo se evidencia no artigo 36.º – é possível constituir família através do casamento,
mas também através de outras vias.

O artigo 67.º da Constituição estabelece a família como um valor iminente, estabelecendo,


até, uma garantia constitucional. No entanto, o mesmo não é feito em relação ao

13
Direito da Família Matilde Diogo Alves

casamento. Estabelecendo o artigo 36.º uma garantia institucional, o casamento não


poderá ser descaracterizado. No artigo 36.º, temos direitos de quatro ordens: direito a
constituir família e matrimónio, igualdade e direitos dos cônjuges, direitos dos pais
relativamente aos filhos e direitos dos filhos.
No casamento existe liberdade de celebração, mas não existe liberdade de estipulação. O
art. 36.º/1 afirma que todos podem, nos termos da lei, contrair casamento, deixando ao
legislador ordinário a noção de casamento. Este direito contempla a liberdade positiva de
casar e a liberdade negativa de casar: está salvaguardada a autodeterminação sexual no
casamento, mesmo existindo um dever de fidelidade, não se verificando, por isso, uma
restrição ilegítima, tendo em conta que, quando alguém decide contrair casamento, aceita
todos os seus efeitos (1618.º/2).
Assim, são caracteres da noção de casamento:

• Celebração de um contrato;
• Entre pessoas de sexo diferente;
• Que pretendem constituir família;
• Mediante uma plena comunhão de vida.
Para quem considera que o casamento tem como fim a procriação, não contemplar a
distinção de sexos seria uma descaracterização do instituto. De acordo com a professora
Madalena, a distinção de sexos não é um elemento essencial porque, nesse caso, pessoas
que tivessem problemas de infertilidade, que quisessem recorrer à técnicas de PMA ou
que tivesse atingido a meno ou a andropausa, não poderiam casar.
Pelo facto de esta discussão quanto às características essenciais do casamento ter existido
e nunca se ter colocado em causa o dever de fidelidade, conclui-se que a exclusividade é
uma característica fundamental.

Outra garantia constitucional é a tutela de cada um dos indivíduos da família.


Diz o artigo 67.º que a família é um elemento fundamental da sociedade, encontrando-se
prevista, assim, uma garantia institucional: oneração do Estado para a tutela da família.
Assim, o Estado tem de criar condições para a efetiva realização de cada um dos cônjuges
(dimensão subjetiva individual). Assim, aquele concreto membro da família não se apaga
do seu seio, dizendo-nos o art. 67.º que as pessoas no amago da família continuam a ter
de ver respeitado o seu direito ao livre desenvolvimento da personalidade.

Princípios do Direito da Família


1. Princípio da Igualdade dos Cônjuges

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

Este é um princípio constitucional, em matéria de efeitos pessoais e patrimoniais – artigo


1671.º, número 1. No número 2, está previsto no princípio da direção conjunta da vida
familiar, que enuncia que ambos os cônjuges têm os mesmos direitos e deveres (em
relação de igualdade). Já não há poder político e ambos têm a direção, em conjunto, da
vida familiar.
2. Princípio da Intervenção Mínima do Estado na Família
O Estado só pode intervir na medida do necessário. Por regra, o Estado dá corpo àquilo
que rege a maior parte das famílias (direitos de respeito, fidelidade, amor entre os
cônjuges e entre pais e filhos) – concretizando as normas. Intervém reconhecendo o
direito institucional, mesmo que pretenda, por vezes, intervir com um papel pedagógico,
p.e., ao retirar a culpa do âmbito do divórcio. Da mesma forma, pedagogicamente, admitiu
o casamento entre pessoas do mesmo sexo – “pedagógico” por estar a consagrar uma
questão pacífica na sociedade.
Nota: A intervenção nem sempre é mínima porque, por mais que por vezes se limite a
concretizar aquilo que se entende por família, ocorrem, também, intervenções
pedagógicas.

Realidades parafamiliares são relações que, mesmo não sendo identificadas como
familiares ou equivalentes, são similares, como, p.e., o apadrinhamento civil.

Conceito de casamento
o Casamento civil
o Casamento católico
o Casamento civil sob forma religiosa
o o casamento é um contrato pelo que exige capacidade
• enquanto estado
▪ plena comunhão de vida vai ter determinados efeitos
▪ comunhão de vida exclusiva (não se admite a poligamia) e que não
é livremente dissolúvel
• enquanto ato – acordo visto como contrato entre duas pessoas feito de
acrodo com a lei (determinações da lei) e dirigido ao estabelecimento de
uma plena comunhão de vida
▪ contrato dirigido ao estabenecido dirigido à pelna comunhão de
vida
o o que se entende por “plena comunhão de vida”
• hoje afasta-se a interpretação desta expressão no sentida da procriação
(ainda que se refira em muitas normas a proteção dos filhos, interpretando-
se antes como um interesse fundamental de vinculação dos cônjuges a um

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

conjunto de deveres emergentes da exclusividade e tendencial


perpetuidade)
• só conseguimos densificar quando olhamos para o 1672º (deveres dos
cônjuges) – em que os cônjuges reciprocamente se vinculam
• exclusividade (de relações sexuais)
▪ implica impedimentos matrimonias – não pode casar quem já seja
casado – impedimento dirimente absoluto
• não é livremente dissolúvel – tendência de fragilização
▪ morte e divórcio
▪ as causas que se admite para o divórcio são taxativamente previstas
na lei – 1781º (ausência sem notícias + rutura definitiva da vida em
comum + ver artigo)
▪ taxatividade de causas
▪ a rutura da vida em comum é hoje mais fácil de invocar
• coabitação (partilha de recursos)
• cooperação (auxílio mútuo)
• assistência
• respeito
• fidelidade
• obrigação de alimentos quando não há coabitação

Casamento Civil
o pode suceder que durante a vida do casamento haja um facto que leve ao divórcio
(dissolução da vida em comum)
• ab initio, pode haver vícios como invalidade, anulação ou declaração de
nulidade
• mais tarde, pode dar-se por divórcio ou morte
• a dissolução sucede por facto durante a pendencia do casamento enquanto
as primeiras dizem respeito à génese do ato (o próprio ato)
o requisitos: consentimento e capacidade

Casamento civil sob forma religiosa


o os requisitos, consentimento e capacidade são regulados pela lei civil
o ao abrigo da Lei da Liberdade Religiosa o Estado português reconhece a
celebração de determinados casamentos de acordo com o código de uma
determinada religião, regendo-se no restante pela lei civil (art. 19.o)
o veio trazer de novo a possibilidade de crentes de outras religiões poderem casar
segundo os ritos da sua religião e o estado reconhecer essa forma de celebração
– casamento civil sob forma religiosa!
o Apenas se encontram abrangidas as Igrejas ou comunidades religiosas “radicadas
no país”, cuja qualificação é atestada pelo Ministro da Justiça e uma vez ouvida a
Comissão para a Liberdade Religiosa.

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

• A atestação só pode ser requerida após mais 30 anos de implantação a nível


nacional ou mais de 60 anos a nível internacional, o que constitui garantia
de duração

o Forma: celebrados perante o ministro do culto da Igreja/comunidade religiosa.


• a forma difere – não é a religião católica, implicado uma celebração e ritual
distinto

Casamento católico – 1587º e 1588º


o noção: o casamento é um ato da vontade pelo qual o homem e a mulher (sexo
diferente), por pacto irrevogável (não se admite dissolução) se entregam e
recebem mutuamente a fim de contraírem matrimónio
• no casamento católico, sendo o casamento o contrato, um casamento e um
pacto irrevogável, ainda que se admita o divórcio civil, para a igreja
continuam os esposos a estar casados
o Forma: a celebração do casamento católico implica um conjunto de formalidades
canónicas e de formalidades civis;
o Substância: além de o Estado português conferir-lhe direitos civis, o legislador
reconhece/acolhe as normas de direito canónico que regem o ato matrimonial bem
como a sua aplicação pelos tribunais eclesiásticos - competentes para averiguar
da nulidade de um casamento católico.
o a extinção do casamento dá-se por invalidação ou dissolução
• a igreja entende que o casamento é um sacramento e um contrato –
características indissociáveis - (admitem-se problemas de erro, coação e
capacidade e nesse caso poderá haver invalidação do casamento)
• causa adicional face ao casamento civil: dispensa do casamento rato e não
consumado – se o casamento não é consumado, há uma fragilidade quanto
ao consentimento e há uma possibilidade de dispensa (a autoridade
eclesiástica pode dispensar)
▪ aqui está em causa a fragilidade do consentimento pela não
consumação do casamento (é uma causa adicional de invalidação
no casamento católico)
o NOTA: para o direito católico, esposos são o marido e mulher que já casaram.
para o direito civil, esposos são nubentes, que depois de casar se vão tornar
cônjuges
o requisitos
• consumação – considera-se que há casamento quando há consentimento,
mas a consumação dá uma certa estabilidade, ou a não consumação
fragiliza a estabilidade do casamento
▪ só depois da consumação é que goza de indissolubilidade
• unidade e exclusividade
• indissolubilidade
• procriação e educação dos filhos
• estes são deveres que se exprimem em direitos e deveres dos cônjuges

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Direito da Família Matilde Diogo Alves


se os nubentes mostrarem querer excluir alguns destes deveres, os
canonistas consideram que está em causa um casamento
desfigurado ou descaracterizado e por isso se trata de uma
simulação. tratando-se de uma simulação, pode ser declarado nulo
▪ se forem ambos a querer afastar, simulação na mesma
▪ quanto a este tema, se no direito civil os nubentes quiserem um
regime diferente, fazem uma reserva ao contrato e está tudo bem
o o casamento católico também tem efeitos pessoais, mas para a igreja católica são
efeitos meres civiles e por isso são regulados pela lei do estado
• a igreja só quer regular a questão da génese do contrato de casamento
(capacidade e consentimento), deixando a regulamentação dos efeitos à lei
civil

O ESTADO VEIO MAIS TARDE INTERESSAR -SE PELO CASAMENTO


o a relação do casamento com a religião é muito anterior à ligação do direito civil
com o casamento
o mais tarde dá-se então uma luta entre a igreja e o estado pela competência do
casamento
• culminou com a secularização
o a questão agora é a de saber como articular as competências – existem vários
sistemas matrimonias
• sistema do casamento religioso obrigatório
▪ não admite o casamento civil (as pessoas só se podem casar
catolicamente)
▪ sistema que vigorou na Grécia
• sistema de casamento civil obrigatório
▪ em frança existiu este casamento civil obrigatório
▪ para que o casamento produza efeitos perante o estado tem de ser
civil
▪ é a lei civil que regula os requisitos de capacidade e consentimento
+ os efeitos
▪ vantagens: todas as pessoas que são nacionais de um determinado
país estão submetidas ao mesmo regime matrimonial – não existem
vários que coexistam
▪ desvantagens: implica que aqueles que querem casar, mas
professam determinada religião, têm de celebrar duplo casamento
(civil e na igreja da qual são crentes)
• sistema de casamento civil facultativo
▪ esposos ou nubentes podem escolher livremente o casamento civil
ou católico, atribuindo o Estado efeitos civis ao casamento
▪ este sistema tem duas modalidades
• primeira modalidade
o sob forma religiosa: o estado entende que os seus
nacionais possam celebrar casamento consoante a

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

sua religião, seja católico, islâmico, judaico etc –


tendo os mesmos efeitos que o casamento civil
(mesmos efeitos)
o vantagem: evita que tenha de haver dupla
celebração + respeita a liberdade religiosa
• segunda modalidade
o vale apenas para os crentes da igreja católica
o neste caso o Estado admite como válido e eficaz o
casamento católico tal e qual como é regulado pela
igreja católica (nos requisitos quanto ao
consentimento)
o então reconhece-se não só a forma de celebração
religiosa, mas a própria legislação canónica e a
própria jurisdição
o vantagens (quanto aos católicos): não terão de
celebrar dois casamentos
o desvantagens: sacrifício da unidade do sistema
matrimonial porque há duas jurisdições que se
pronunciam sobre isto
▪ ao abrigo da antiga concordata, todas as
pessoas que sejam batizadas são obrigadas
ao casamento católico e os outros podem
escolher (podem escolher também os que
tenham renegado a sua crença)
o neste caso não se respeitam as várias religiões e
várias crenças porque só se admite a religião
católica e tal é contrário à CRP

SISTEMA DE CASAMENTO EM PORTUGAL


o Até ao período da República: código de Seabra tinha um sistema contraditório
porque parecia que já se admitia o casamento civil para os não católicos, MAS
seria um sistema subsidiário
o Até à celebração da primeira concordata entre a Santa Sé e o Estado
português: mais tarde considerou-se o casamento como um contrato puramente
civil, não se admitindo o católico nem sob a forma religiosa (modelo de casamento
civil obrigatório)
• através da concordata admitiu-se o sistema facultativo na segunda
modalidade, MAS aqueles que tinham recebido o batismo deviam casar
catolicamente
• não se poderiam divorciar nos tribunais civis – concessão do estado à
igreja
o com a revolução de 1974 houve um movimento contra os presos da concordata
(aqueles que tinham sido batizados – que só se poderiam casar pela Igreja)

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

•celebração de nova concordata, que veio dizer que os casados


catolicamente têm o dever de não pedir o divórcio nos tribunais civis (mas
mero dever de consciência perante a igreja, e não perante o estado)
• como é que os casados catolicamente viviam sem se poder divorciar?
separação de pessoas e bens (que não se podia converter em divórcio) – é
uma modalidade de modificação da relação contratual
• parece dizer-se que o artigo 1625º não estava conforme à CRP na medida
em que os requisitos da capacidade e consentimento seriam definidos pelo
direito canónico e as questões relevantes que se viessem a colocar quanto
aos casamentos católicos seriam apreciados pelos tribunais eclesiásticos
• parecia que a CRP queria derrubar a concordata, mas este artigo
permaneceu intocado mesmo com a lei da liberdade religiosa. esta lei veio
ressalvar a concordata e por isso manteve a relação que existia entre a lei
civil e a lei católica
• concordata de 2004 introduziu várias alterações, entre as quais
▪ a concordata já não vincula o estado a proibir o divórcio dos
casados catolicamente
▪ também não obriga a atribuir a exclusividade da competência de
julgar as causas do casamento católico aos tribunais eclesiásticos
• as decisões das autoridades eclesiásticas sobre a dispensa do casamento
rato e não consumado já não são automáticas, estando sujeitas a revisão e
confirmação pelo tribunal da relação
o então como é o nosso sistema atualmente?
• sistema de casamento civil facultativo na segunda modalidade para os
católicos
▪ desvantagem de haver dois institutos diferentes, mas vantagem de
evitar a dupla celebração à custa da quebra da unidade do sistema
matrimonial
▪ o estado português procurou uniformizar e aproximar o mais
possível as razões de impedimentos matrimoniais (questões da
capacidade) p.e. quem quer casar catolicamente tem de ter
capacidade para casar civilmente + todo o sistema de
impedimentos se aplica
• para que isto seja assim, impõe-se ao pároco que celebra o
casamento que peça um certificado passado pelo
conservador do registo civil a declarar que há capacidade
para contrair casamento. se o pároco não respeitar, são-lhe
aplicáveis sanções
• o certificado de capacidade matrimonial tem validade de 6
meses
• no fim do casamento católico o pároco tem de enviar o
assento de casamento à conservatória

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

• o casamento civil facultativo veio admitir o divórcio para


os casados catolicamente
• há então uma dualidade de regimes que acaba quanto à
dissolução
▪ apesar desta tentativa de aproximação, continua a haver
casamentos que se podem celebrar civilmente mas não
catolicamente
• para os que não sejam católicos, mas sejam de outra religião radicada no
país, sistema de casamento civil facultativo na primeira modalidade
(o estado não reconhece o direito de regulação quanto às causas de
nulidade, MAS conhece-se a forma da celebração de casamento)
▪ quanto ao fundo da questão, são os tribunais portugueses que
regem como se fosse um casamento civil
▪ ver o que é uma religião radicada: registo nacional de pessoas
coletivas + há uma comissão para averiguar se as religiões têm ou
não presença em Portugal e se têm ou não têm um rito organizado
de casamento
▪ encontrar a questão do 1625º junto das características do direito da
família!
• para os que não estejam em nenhuma religião ou religião não radicada
– sistema de casamento civil obrigatório por não se dar qualquer
relevância à cerimónia

Requisitos de fundo do Casamento – Incapacidade e Consentimento


A lei regula as causas de falta de capacidade e falta de consentimento.
INCAPACIDADE
A lei tipifica as causas de capacidade e de falta de consentimento.
No âmbito da capacidade, é necessário atentar no art. 1600.º, que determina que haverá
capacidade nupcial sempre que não se verifique um impedimento. Logo, a capacidade
depende da existência ou inexistência de um impedimento. Cabe ao conservador do
Registo Civil aferir se as partes podem ou não casar à luz dos impedimentos vigentes.
Logo, há um princípio de tipicidade relativamente aos impedimentos matrimoniais, mas
esta não se cinge somente ao c. civil, até porque podemos encontrar impedimentos
previstos em legislação avulsa (Lei do Apadrinhamento Civil, art. 22.º, por exemplo).
Quando se refere aos impedimentos previstos na lei, temos de ler com cautela o que se
entende por lei – não apenas Código Civil, mas diplomas avulsos.
Que impedimentos temos no nosso c. civil? A doutrina categoriza os impedimentos em
diferentes distinções:

21
Direito da Família Matilde Diogo Alves

1. Impedimentos Dirimentes dos Impedimentos Impedientes


Tanto um como outro obstam à celebração do casamento. Porém, se, ainda assim, o
casamento vier a ser celebrado, os impedimentos dirimentes – mais gravosos – dão
origem à nulidade do casamento – 1631.º, alínea a). No caso de impedimentos
impedientes, darão origem a sanção em termos pecuniários – 1649.º, 1650.º e 22.º do
Apadrinhamento Civil.
No âmbito dos impedimentos dirimentes, o legislador distinguiu os absolutos dos
relativos. No âmbito dos impedientes, não.
2. Impedimentos Absolutos e impedimentos Relativos
A diferença prende-se com o facto de ser verdadeiramente uma incapacidade – uma
característica da pessoa que impede a celebração do casamento – ou a existência de um
fator relacional que impeça a celebração daquele casamento.
Legislador foi claro ao distinguir impedimentos absolutos de impedimentos relativos nos
artigos 1601.º e 1602.º.
Nos impedimentos impedientes temos de distinguir entre absolutos e relativos.
1604.º é independentemente da pessoa do outro cônjuge, impedimento impediente
absoluto. O mesmo não se verifica na alínea c), que diz que é impedimento impediente o
parentesco no terceiro grau da linha colateral.
No âmbito dos impedimentos dirimentes, não há lugar à dispensa, Conservador não pode
intervir dispensando este impedimento, quer por razoes morais – prevenção da bigamia e
a prevenção do incesto – quer por razões de doença.
Os impedimentos dispensáveis surgem apenas no âmbito dos impedimentos impedientes,
1609.º, temos de compatibilizar isto com o facto de no âmbito do impedimento por
inexistência de autorização dos pais ser possível o suprimento dessa autorização por parte
do Conservador.
3. Dispensáveis e Não Dispensáveis
A dispensa corresponde ao ato pelo qual uma autoridade, atendendo às circunstâncias do
caso concreto, autoriza o casamento, não obstante a existência de determinado
impedimento. O processo de dispensa vem previstos nos artigos 253.º e 254.º do Código
de Processo Civil.
No âmbito de impedimentos dirimentes, há lugar à dispensa – não podendo o legislador
intervir, dispensando o impedimento, p.e., por razoes eugénicas, médicas de procriação
ou de índole moral, como a proibição da bigamia ou do incesto.
Os impedimentos suscetíveis de dispensa estão previstos no artigo 1609.º.

Impedimentos dirimentes de natureza absoluta – artigo 1601.º

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

• Idade inferior a 16 anos. Quer por capacidade e consciência da declaração, quer


porque aos 16 anos não há este propósito procreativo subjacente à ideia de
casamento, que a idade núbil se teria de estabelecer a partir dos 16 anos. No
entanto, esta ideia da idade núbil aos 16 anos nem sempre se verificou. As
anteriores redações deste artigo e em anterior legislação havia diferenciação entre
homem e mulher: homem podia casar numa determinada idade, mulher podia
casar numa idade inferior. À luz do p. de igualdade e a ideia de vir lesar a
igualdade ao nível de uma igualdade posterior – entendeu-se que prever uma idade
inferior para as mulheres casarem ia prejudicar os estudos destas mulheres, o que
ia perpetuar um certo desnível ao nível educacional, que ia proporcionar ainda
mais desigualdade. A partir dos 16 anos, teremos um outro tipo de impedimento
impediente, antes disso teremos um impedimento dirimente. Quer isto dizer que
os casamentos celebrados com idade inferior a 16 anos, serão casamentos
anuláveis à luz do 1631.º, alínea a). É um impedimento absoluto porque agente
não poderá casar com aquela pessoa ou outra;
Podem intentar ou prosseguir na ação de anulação os cônjuges ou qualquer parente deles
na linha reta ou até ao quarto grau da linha colateral, os herdeiros e adotantes dos
cônjuges, o Ministério Público e o tutor do menor – art. 1639.º.
Se a ação for proposta pelo menor, o prazo é de seis meses após este atingir a maioridade;
se a ação for proposta por outras pessoas, o prazo é de três anos contados desde a
celebração do casamento, mas nunca depois da maioridade – art. 1643.º, número 1, alínea
a).
A anulabilidade considera-se sanada e o casamento convalidado desde a data da sua
celebração se, antes do trânsito em julgado da sentença da anulação, o menor confirmar
o casamento perante o funcionário do Registo Civil e duas testemunhas após atingir a
maioridade – convalidação, art. 1633.º, número 1, alínea a).

• Demência notória e decisão de acompanhamento. Estão impedidos de casar


todos aqueles relativamente aos quais se verifique uma demência notória.
Demência = Falta ou alteração das características físicas e psicológicas de uma
pessoa. não há coerência sobre demência notória no foro clínico e no foro
legislativo. Esta redação não pretendia tutelar o demente, tanto assim é que se
passou a prever que, mesmo durante os intervalos lúcidos, aquela pessoa não
podia casar. Este na génese desta alínea b) o facto de se querer pretender evitar a
disseminação de doenças do foro psicológico através da procriação. É isso que
justifica que um demente, mesmo em intervalo lúcido, possa ver-se impedido de
casar, apesar de, naquele momento, ter plena consciência do ato que está a
praticar. Além disso, prevê casos em que a decisão do acompanhamento preveja
este impedimento matrimonial: poderá haver situações em que a necessidade de
acompanhamento daquele maior que não necessita de um impedimento
matrimonial, porque até tem capacidade para compreender e consegue reger a sua
própria pessoa de tal forma que está capaz de casar. A sentença que vai decretar

23
Direito da Família Matilde Diogo Alves

o acompanhamento de maior é que vai determinar quais são as limitações daquele


maior. Os casos que aqui se preveem são os casos de demência contínua, não são
os casos de demência acidental, quando a própria pessoa se coloca numa situação
tal que está incapaz de compreender o significado da sua declaração. Tem de
haver, de facto, uma alteração não meramente acidental psíquica da pessoa. se for
meramente acidente, já não é impedimento dirimente, trataremos ao nível do
consentimento;
Podem intentar ou prosseguir na ação de anulação os cônjuges ou qualquer parente deles
na linha reta ou até ao quarto grau da linha colateral, os herdeiros e adotantes dos
cônjuges, o Ministério Público e o acompanhante com poderes para o efeito.
Se a ação for proposta pelo demente/acompanhado, o prazo é de seis meses após a
cessação da incapacidade natural ou da revisão do acompanhamento; se a ação for
proposta por outras pessoas, o prazo é de três anos contados desde a celebração do
casamento, mas nunca depois da maioridade ou da cessação da incapacidade natural –
artigo 1643.º, número 1, alínea a).
A anulabilidade considera-se sanada e o casamento convalidado desde a data da sua
celebração se, antes do transido em julgado da sentença de anulação, o
demente/acompanhado fazer verificar judicialmente a cessação das causas de
impedimento – convalidação, artigo 1633.º, número 1, alínea b).

• Casamento anterior não desenvolvido. A génese deste artigo prende-se com a


ideia de que o casamento é celebrado somente entre duas pessoas. o nosso
legislador pretendeu tutelar esta exclusividade que é característica fundamental
do casamento, que não só previu um impedimento dirimente – casamento anterior
não dissolvido – como também previu uma tutela penal para estas situações em
que se fere a exclusividade do casamento, consagrando e prevendo especialmente
o crime de bigamia. Norma do 1601.º não pode deixar de ser compatibilizada com,
por um lado, o 1577.º e, por outro, com a norma que prevê o crime de bigamia.
Há uma tentativa de tutelar a unidade do casamento.
Questiona-se o que sucede quando há morte presumida, ausência qualificada de tal forma
e há tanto tempo que é possível pedir a declaração de morte presumida (ausência
qualificada de 10 anos). A morte presumida não dissolve o casamento (115.º), logo,
continua a existir um casamento anterior não dissolvido. As duas causas de dissolução do
casamento são a morte e o divórcio.
Porém, compatibilizando as normas do 114.º do c. civil com o 1601.º, alínea c),
determinamos que é possível haver novas núpcias sem esta dissolução. Artigo 116.º, se
ausentar regressar ou haver notícia, considera-se primeiro matrimónio dissolvido por
divórcio. Não anula o casamento, mas não obsta à celebração de novas núpcias. Vai-se
presumir que o casamento se dissolveu, mas, se o ausente regressar, é declarado o divórcio
(116.º do c. civil).

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

Podem intentar ou prosseguir da ação de anulação os cônjuges ou qualquer parentes deles


na linha reta ou até ao quarto grau da linha colateral, os herdeiros e adotantes dos
cônjuges, o Ministério Público e o primeiro cônjuge do bígamo (art. 1639.º).
O prazo para a ação é até seis meses após a dissolução do casamento, à luz do artigo
1643.º, número 1, alínea c). Sem prejuízo do prazo, esta ação não pode ser instaurada nem
prosseguir enquanto estiver pendente a ação de declaração de nulidade ou anulação do
primeiro casamento do bígamo.
Dá-se convalidação do segundo casamento em caso de declaração de nulidade ou de
anulação do primeiro casamento – artigo 1633.º, número 1, alínea c).

Impedimentos dirimentes de natureza relativa – Artigo 1602.º

• Alínea a): Parentes em linha reta. Ideia é proteger, razoes de ordem ética e
eugénica, e proibir o incesto. Evitar situações em que há parentes de proximidade
sanguínea tal que, em sede geracional, poderão provocar deformações congénitas
nas crianças. Por este motivo, veio-se prever como impedimento o parentesco na
linha reta e no segundo grau da linha colateral – pais quanto aos filhos, avós
quanto aos netos, etc. Apenas estes estão alicerçados em razões de ordem
eugénica, porque na afinidade já não há proximidade sanguínea, nem há relação
anterior de responsabilidades parentais.
De acordo com o artigo 1603.º, 1986.º e 1987.º, é possível fazer prova da maternidade e
paternidade ainda que esta não esteja estabelecida – é possível provar que A e B são
irmãos apesar de não terem um registo das mesmas pessoas como progenitor, p.e. A tem
no registo mãe incógnita e B pai incógnito. Aí, é possível provar que são irmãos – parentes
do segundo grau da linha colateral –, sem que se estabeleça obrigatoriamente a filiação.
A prova pode fazer-se no processo preliminar de casamento ou se o casamento já se tiver
celebrado, em ação de declaração de nulidade ou de anulação do casamento.
Podem intentar ou prosseguir na ação de anulação os cônjuges ou qualquer parente deles
na linha reta ou até ao quarto grau da linha colateral, os herdeiros adotantes dos cônjuges
e o Ministério Público – art. 1639.º, número 1. O prazo é seis meses após a dissolução do
casamento – artigo 1643.º, número 1, alínea c).

• Alínea c): Parentesco no segundo grau da linha colateral, relação de irmãos,


por ser de extrema proximidade;

• Alínea d): Afinidade em linha reta – sogros com nora e genro e


madrasta/padrasto com enteado. A ratio destes preceitos são razoes de ordem
moral, por se entender que são relações de tal forma próximas que o legislador
entende que deve evitar-se permitir e valorizar um casamento nestas
circunstâncias. Relativamente às concretas alíneas do 1602.º, se duas pessoas se
divorciarem cessa esta existência de afinidade e cessa o impedimento previsto na
alínea d);

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

• Alínea b): Relação anterior de responsabilidades parentais com pessoa


distinta dos pais. Sabemos que as relações de responsabilidades parentais se
estabelecem relativamente aos pais. O que se pretendeu? Pretendeu-se abarcar
situações em que alguém exercitava e era titular das responsabilidades parentais
num determinado momento, apesar de não ser pai ou mãe daquela criança. O
legislador quis que mesmo nas situações em que há um divorcio, a anterior relação
de responsabilidades parentais obstasse que aquela pessoa viesse a casar com a
criança relativamente à qual exerceu responsabilidades parentais. O que se
pretende titular é a titularidade, não o exercício – se a titularidade estiver nos pais
e o exercício no padrinho, já não cabe na alínea b). Esta só se aplica às situações
em que há titularidade das responsabilidades parentais. Razões de ordem moral,
por se tratar de relações de tal forma próximas, que se deve tentar evitar um
casamento nestas circunstâncias. Esta relação assemelha-se em tudo a uma relação
entre um progenitor e um filho e, por isso, o legislador quis criar este
impedimento.

• Alínea e): Situações em que há condenação – decorreu toda a fase de julgamento


com posterior decisão do tribunal de condenação, como autor ou cúmplice de
homicídio doloso. Não se inclui homicídio por negligência. Alicerçou esta alínea
a presunção de que esta tentativa de homicídio ou homicídio teve como propósito
poder casar com aquela pessoa que ficou viúva. Apesar de ser este o propósito,
não é necessário que o homicídio tenha tido dolo específico de garantir a
possibilidade, pode ser qualquer tipo de dolo.

Consequências:
O conservador do Registo Civil vai obstar, não autorizando o casamento e arquivando o
processo preliminar por falta de capacidade.
Se o conservador não detetar estes impedimentos, a consequência é a anulabilidade do
casamento – o casamento é inválido por padecer de anulabilidade (1627.º), estando o
procedimento previsto no artigo 1632.º.
Qual o fundamento para que seja aplicada a anulabilidade e não a nulidade? O
fundamento é a garantia da estabilidade do casamento – casamento será estável até haver
prova.
Quem tem legitimidade para anular? De acordo com o artigo 1639.º, têm legitimidade
para intentar a ação os cônjuges ou qualquer parente deles, na linha reta ou até ao 4.º grau
da linha colateral (irmãos, tios e primos), além do Ministério Público. Assim, exige-se a
ação de declaração, mas admite-se que o Ministério Público requeira.

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

Há ainda outras pessoas que podem intentar a ação – legitimidade ativa – no que respeita
à ação de anulação: acompanhante, tutor e o primeiro cônjuge do infrator em caso de
bigamia (fazer remissão).
Os prazos para tal estão previstos no artigo 1633.º.
Os artigos relevantes são os artigos 1632.º, 1639.º e 1643.º.

Impedimentos Impedientes – 1604.º

• Falta de autorização dos pais para o nubente menor (1604.º/a)).


A autorização tem de ser dada pelos progenitores que exerçam as responsabilidades
parentais ou o tutor antes da celebração do casamento ou no próprio ato da celebração. O
menor terá sempre de ter mais de 16 anos, podendo a autorização ser dada no âmbito da
celebração ou do processo preliminar.
O menor pode pedir a dispensa desta autorização ao conservador do Registo Civil, sendo
que qualquer conservatória é competente para avaliar.
Artigos relevantes são o 1612.º, o 255.º e o 150.º.
Caso a autorização não seja prestada ou suprida pelo conservador do Registo Civil, cabe
a este interpelar para o efeito as pessoas que o devem prestar (155.º, número 1, alínea b)
do Código do Registo Civil), que o poderão conceder no ato do próprio casamento, de
acordo com o art. 150.º, número 3, 181.º, alínea d) do CRC.
Quando a autorização seja negada pelos pais ou por um deles, são seguidos os termos dos
artigos 255.º a 257.º do Código Civil.

O casamento sem autorização tem como sanção a emancipação restrita do menor, de


acordo com os artigos 132.º e 1649.º do Código Civil:

• O nubente continua a ser considerado menor quanto à administração dos bens que
tenha levado para o casal ou que lhe advenham gratuitamente até à maioridade;
• A administração destes bens caberá aos pais, tutor ou administrador legal, não ao
outro cônjuge, como seria nos termos gerais (art. 1678.º, n1, alínea f)):
o Os rendimentos desses bens não respondem pelas dívidas contraídas pelos
cônjuges ou por qualquer um deles durante a menoridade;
o Dos rendimentos destes bens serão arbitrados ao menor os alimentos
necessários ao seu estado.

• Parentesco no 3.º grau da linha colateral (tios e sobrinhos)

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

Este impedimento pode ser dispensado, à luz do artigo 1609.º, número 1, alínea a). A
consequência disto é que o tio/tia não poderá receber qualquer benefício por doação ou
testamento do seu consorte, de acordo com o art. 1650.º, número 2.

• Tutela, acompanhamento de maior ou administração legal de bens. O


fundamento deste impedimento é (1) evitar que o tutor, acompanhante ou
administrador se exima, através do casamento, ao cumprimento da obrigação de
prestar contas e (2) receio de uma menor liberdade de consentimento do incapaz
para o casamento, fruto do ascendente que o tutor, acompanhante ou
administrador ainda mantenham sobre ele. Este impedimento e extensível aos
familiares do tutor, administrador ou acompanhante. Assim, tem de haver uma
prestação de contas, antes de acompanhante e acompanhado se tornarem cônjuges,
objetivo de não haver um aproveitamento financeiro (tutela financeira).
Um casamento nestas condições apenas pode ocorrer se tiver decorrido 1 ano sobre a
cessação da incapacidade – art. 1608.º. Este prazo temporal visa tutelar a liberdade do
que foi alvo da tutela por curadoria ou administração legal de bens, evitando que haja
coação.
Este é um impedimento dispensável pelo conservador (art. 1609.º, número 1, alínea b)),
em processo de dispensa de impedimentos (253.º a 254.º). A sanção disto é que nenhum
daqueles sujeitos abrangidos pelo impedimento poderá receber qualquer benefício por
doação ou testamento do seu consorte – art. 1650.º, número 1.

• Pronuncia do nubente pela prática de crime de homicídio doloso


A condenação constitui, assim, um impedimento dirimente. Se estivesse a correr este
processo, não tendo havido ainda condenação e, por isso, impedimento dirimente, as
pessoas poderiam casar. Tendo o juiz da instrução proferido um despacho de pronuncia,
surge o impedimento.

Consequências:
À partida, as consequências serão as mesmas dos impedimentos dirimentes. O
conservador deverá obstar à celebração do casamento por parte dos nubentes por entender
que estes não têm capacidade – arquivo do processo por falta de capacidade matrimonial.
O casamento não será anulável, mas alvo de uma sanção pecuniária – 1649.º e 1650.º.
Os pais continuarão a administrar os bens do menor autorizado até à sua maioridade. Tem-
se entendido que isto abarca, também, situações mais gravosas de alienação e oneração
dos mesmos, por maioria de razão.

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

O artigo 1649.º terá de ser compatibilizado com o artigo 133.º que diz que haverá
emancipação pelo casamento mesmos nos casos em que se casa sem autorização e sem
suprimento – regime de emancipação restrita.
Nota: Uma vez emitida a declaração de capacidade, o prazo para casar é de seis meses.
Sempre que os nubentes forem casar catolicamente ou sob forma religiosa, o conservador
vai emitir um certificado que pretende atestar que a pessoa tem capacidade e as pessoas
casam tendo em conta a existência ou inexistência de capacidade.

CONSENTIMENTO
O contrato de casamento pressupõe que haja uma vontade de cada um dos seus
contraentes, pelo que os nubentes terão de declarar pretender aquele casamento, sendo
que essa declaração de vontade, sempre que exista, presume-se validamente efetuada, à
luz do artigo 1624.º.
O casamento é um contrato solene pelas exigências de forma exigidas, mas, também, pelo
facto de estarmos perante um contrato verbal – os cônjuges terão de enunciar
determinadas palavras. Só se admite a manifestação de vontade por outra via no caso de
pessoas surdas, mudas ou surdas-mudas ou pessoas que não conheçam a língua.

Delimitação positiva do conhecimento – caracteres que o consentimento deverá ter, para


ser válido e eficaz (artigo 1634.º do Código Civil):
A delimitação positiva é ditada pelos artigos 1617.º a 1621.º.

• Ato pessoal (1619.º e 1620.º): Não pode haver substituição da vontade, salvo por
procuração. Cabe aos nubentes a decisão de contrair matrimónio; significa isto
que, p.e., no exercício das responsabilidades parentais, não pode o pai substituir a
vontade do filho.
o Pode haver casamento por procuração (1621.º), situação em que apenas
um dos nubentes se faz representar por procuração, sendo necessário, de
acordo com o artigo 44.º/1 do Código do Registo Civil que um deles esteja
presente;
o A procuração deve, de acordo com o art. 1620.º/2, conter a menção
especial de se dar poderes para celebração do matrimónio e a designação
expressa do outro nubente, além da referência de que casamento, com
quem e sob que modalidades;
o Surge uma grande discussão: será o procurador um núncio ou um
procurador? Limita-se a declarar ou tem poderes de decisão? Conclui-se
que é um procurador com diminutos poderes e atua de forma mais próxima
a um núncio.
• Ato atual, prestado no momento do matrimónio, aferido no momento da
cerimónia;

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

• O consentimento tem de ser puro, simples ou não condicionado, ao abrigo do


artigo 1618.º, número 2;
• O consentimento tem de ser consciente de todos os deveres, sendo que o
consentimento os abarca a todos;
• Tem de ser perfeito, ou seja, tem de ser prestado de forma livre e esclarecida, sem
erro e sem coação. O legislador presume que houve vontade e que esta foi livre e
esclarecida, presumindo, assim, a perfeição do casamento;
Mas o que sucede quando não há um destes? É imposta uma ação de anulação do
consentimento, nos seguintes casos:

• Reserva mental, p.e., não é relevante, por não estar tipificada;


• Simulação de casamento – situação de divergência entre a vontade e a declaração;
A simulação de casamento consiste num acordo firmado pelos outorgantes do casamento
no sentido de não se sujeitaram às obrigações e não exercitarem os direitos que decorrem
da celebração do casamento – circunstância de os nubentes apenas pretenderem
prosseguir o fim visado para o casamento e recusarem a plena comunhão de vida.
A simulação no casamento relevante para este efeito será sempre uma simulação absoluta.
Consequentemente, admite-se a validade do casamento civil contraído ao abrigo de uma
simulação relativa (caso em que o negócio é efetivamente querido pelas partes).
O casamento simulado pode ser contraído com finalidades diversas, designadamente para
a aquisição de nacionalidade estrangeira ou de autorização de residência, aquisição de
uma situação vantajosa decorrente do estado de cônjuge ou, ainda, para contorno de
disposições legais.
A consequência jurídica é a anulabilidade, de acordo com o artigo 1635.º, alínea d). Têm
legitimidade para requerer a anulabilidade os cônjuges e quaisquer pessoas prejudicadas
com o casamento – 1640.º/1. Os prazos são três anos desde a celebração ou, caso o
requerente desconhecesse dele, 6 meses contados do momento do conhecimento, de
acordo com o art. 1644.º. Os cônjuges não têm acesso à prova testemunhal (394.º/2) e a
prova por presunção (351.º). A restrição da prova testemunhal não abrange terceiros
(394.º/3). A anulação do casamento simulado é inoponível a terceiros de boa-fé, de acordo
com o artigo 243.º do Código Civil.

• Ausência de vontade de ação ou de consciência da declaração; casos:


o Falta de consciência do ato que praticava, p.e. sonambulismo, demência
notória, incapacidade do menor, etc.;
o Incapacidade acidental temporária ou falta de consciência por qualquer
outra causa: pessoa não tem vontade porque não a consegue controlar, p.e.,
efeito de estupefacientes, sonambulismo, embriaguez ou casos de
menoridade em que criança não tem noção do que diz;
o Erro sobre a identidade física do outro contraente, caso em que o agente
quer casar com A, mas acaba por casar com B. O artigo 1635.º, alínea a),

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

pretende acautelar as situações em que a pessoa declara pretender casar,


mas pretendia casar com outra pessoa;
o Situações em que a vontade foi extorquida por coação física, quando a
pessoa perde o domínio de si próprio. Nota: Uma ameaça, ainda que física,
não tem de ser coação física;
o Casamento simulado: circunstância de duas pessoas casarem, pretendendo
um objetivo distinto daquele que é o objetivo do casamento (plena
comunhão de vida), como suceder no direito a arrendamento.
Salvo nos casos de simulação, a ação de anulabilidade só pode ser proposta pelo cônjuge
cuja vontade faltou, ele somente – artigo 1640.º. Como supramencionado, a consequência
jurídica é a anulabilidade (1635.º, alínea a)) e a legitimidade para tal pertence ao cônjuge
(1640.º/2). Caso o cônjuge faleça na pendência da causa, podem prosseguir na ação os
seus parentes, afins na linha reta, herdeiros ou adotantes. O prazo é de três anos desde a
sua celebração ou, caso o requerente desconhecesse dele, 6 meses contados do momento
do conhecimento, de acordo com o artigo 1644.º.

• Erro
Deverá recair sobre a pessoa com quem se realiza o casamento e versar sobre uma
qualidade essencial da pessoa: qualidades naturais (físicas, morais ou intelectuais) ou
jurídicas (identidade física do cônjuge ou estado civil).
Pressuposto de erro em relação ao casamento:
1. Erro deverá cair sobre as qualidades essenciais do cônjuge;
O que são qualidades essenciais? São qualidades não transitórias e acessórias e que, em
abstrato, sejam idóneas a determinar a decisão de casar, p.e., doenças infeciosas ou
transmissíveis, deformidades físicas graves, impotência, falta de um dos membros, facto
de já ter sido declarado sobre crime infamante, profissão desonrosa ou qualidades
jurídicas como o facto da pessoa já ser casada. Será irrelevante o erro sobre parentes do
cônjuge, como, p.e., o pai ser um assassino em série.
2. O erro deverá ser próprio, segundo RM, GOM e PC
O erro não deverá incidir sobre qualquer requisito legal de existência ou validade do
casamento, como, p.e., um impedimento dirimente à celebração porque, nesse caso, a
consequência será a anulabilidade e o casamento deverá ser anulado com base nisso. A
professora Madalena entende que tal não está previsto na lei, não fazendo sentido, por
isso, que não se possa recorrer a este regime, que é diferente da anulabilidade (p.e., A é
menor de 16 anos e se B soubesse, nunca teria casado com A).
3. O erro será desculpável (desculpabilidade)
Exige isto que não se trate de um erro grosseiro – erro de que uma pessoa normal se
aperceberia. Assim, é válido o erro sobre a impotência.
4. Essencialidade objetiva e subjetiva do erro

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

A circunstância sobre a qual recai o erro deve ter sido essencial para o nubente em causa
– e razoavelmente justificável em face nas circunstâncias do caso – essencialidade
objetiva – e à luz da consciência social dominante – essencialidade subjetiva.

• Coação (art. 1638.º) – divergência entre a vontade declarada e a vontade hipotética


É anulável o casamento celebrado sob coação moral, contando que seja mal o grave com
que o nubente é ilicitamente ameaçado e justificado o receio da sua consumação. Assim,
são requisitos da coação moral:
1. Ameaça ilícita – quer a ameaça, quer o uso da mesma;
2. Ameaça essencial – em razão da ameaça, o agente decidiu casar, sem a ameaça
não teria casado;
3. Ameaça intencional – é preciso que se queira tirar da ameaça a declaração de
casamento e nenhuma outra;
4. Ameaça grave;
5. Que haja uma certa certeza de que a ameaça se irá concretizar, quer porque o outro
já começou a praticar certos atos tendentes à preparação da ameaça, quer porque
existe um passado de concretizar as ameaças que realiza;
6. O artigo 1632.º/2 equipara à ameaça a promessa de libertação do mal p.e. “se
casares comigo, pago-te todas as tuas dívidas”.
A coação é relevante mesmo que a ameaça vise interesses patrimoniais e quando se dirija
a terceiro, qualquer que seja a relação, familiar ou outra, com esse terceiro.
Consequência jurídica: Anulabilidade do casamento (1631.º, alínea b))

• Legitimidade e prazo: A ação só pode ser intentada pelo cônjuge coato dentro dos
6 meses subsequentes à cessação do vício – art. 1645.º. Podem prosseguir na ação
os seus parentes, afins em linha reta, herdeiros ou adotantes, se o autor falecer na
pendência da causa – art. 1641.º;
• Sanável mediante confirmação, expressa ou tácita – art. 288.º;
• Convalidação objetiva com a caducidade do direito previsto no art. 1645.º.

O casamento enquanto estado


O casamento enquanto estado – estar casado – é definido em função dos efeitos que vai
operar. O professor Pereira Coelho diz que uma pessoa casa e, juridicamente, torna-se
noutra pessoa – a sua condição, quanto aos seus bens e enquanto pessoa, é outra.
O casamento constitui a família, impõe aos cônjuges um conjunto de deveres e tem efeitos
sobre o seu nome e nacionalidade. Tem efeitos pessoais, em relação à pessoa dos cônjuges
e em relação aos filhos (presunção de paternidade do marido da mãe – art. 1826.º – e
responsabilidades parentais) e patrimoniais, em relação aos bens dos cônjuges.

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

O artigo 1671.º enuncia os dois princípios fundamentais por que se rege a matéria dos
efeitos pessoais do casamento:

• Princípio da Igualdade dos Direitos e Deveres dos Cônjuges;


• Princípio da Direção Conjunta da Família.

Formalidades do Casamento – Processo


As vantagens do processo formal de casamento são que protege as partes da sua
leviandade ou precipitação, exige uma clara e completa expressa da vontade e facilita a
prova, ao contrário do que acontece com a união de facto. No entanto, é demorado,
incómodo, acarreta despesas e pode ser injusto por não ficar válido o negócio que as
partes concluíram, mas a que deixaram de conceder forma legal.
Forma do Casamento: O casamento não consiste somente num documento escrito a que
sejam reduzidas as declarações dos nubentes, mas numa cerimónia, com o objetivo de
evidenciar a importância e a seriedade do ato para os nubentes.
Tipos de Formalidades:
1. Formalidades preliminares;
2. Formalidades da celebração propriamente dita;
3. Registo de casamento.

1. Formalidades Preliminares
A declaração tem de ter os elementos essenciais para identificação dos nubentes e ato do
casamento. Quem pretenda contrair casamento deve declará-lo pessoalmente ou por
intermédio de procurador numa conservatória de registo civil e requerer a instauração do
processo de casamento. O processo preliminar de casamento é público – a publicidade é
assegurada pelo direito à obtenção de cópia da declaração de casamento.
O funcionário do registo civil vai verificar a identidade e capacidade matrimonial dos
nubentes, podendo colher informação junto de autoridades, exigir prova testemunhar e
documental complementar e convocar os nubentes ou os seus representantes legais
quando tal se demonstrar necessário. Depois disto, profere um despacho a autorizar os
nubentes a celebrar o casamento ou a mandar arquivar o processo.
Incidentes que podem ocorrer:

• Se na declaração negocial ou posteriormente os nubentes manifestarem a intenção


de que o casamento seja católico ou que querem celebrar sob a forma religiosa,
está em causa um ambiente diferente e o conservador deve passar um certificado
em que declare que os nubentes podem celebrar casamento – que têm capacidade,
de acordo com a lei civil;

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

• Pode haver processo de dispensa dos impedimentos que autorizem, podendo ser
pedido em qualquer conservatória, mediante alegação dos motivos;
• Podem ser denunciados impedimentos, p.e., pelos pais ou familiares. Nesse caso,
a declaração faz com que o conservador suspenda o processo preliminar e, se o
impedimento for dispensado, prossegue o casamento; se não, este não poderá ser
celebrado.

2. Fase de Celebração
Se o parecer for favorável, o casamento deve celebrar-se dentro dos 6 meses seguintes.
Na celebração do casamento, devem estar os nubentes – podendo um deles estar
representado –, o conservador e duas testemunhas quando a identidade de um dos
nubentes ou do conservado não possa ser confirmada.
O casamento celebrado sem a presença de testemunhas, quando exigida, é anulável –
artigo 1631.º, alínea c) do Código Civil –, mas a ação de anulação só pode ser proposta
pelo Ministério Público (1642.º), dentro do ano posterior à celebração do casamento
(1646.º).
Em caso de cerimónia pública, o conservador tem de identificar os nubentes. Se o
casamento for de um menor de idade, deve-se averiguar se os pais prestam ou não
autorização. Para além disso, são interpeladas as pessoas presentes para declarem se
conhecem algum impedimento à realização do casamento (alínea c). não sendo declarado
impedimento, depois de referir os direitos e deveres dos cônjuges previstos no art. 1672.º,
pergunta a cada um dos nubentes se aceita o outro por consorte.

3. Fase de Registo
Para uma questão de prova, o registo civil é obrigatório. Esta é a única prova legalmente
admitida – sem registo de casamento, a lei não deixa que se prove o casamento de outro
modo, já que o registo faz prova plena de todos os factos aí enunciados.
O registo pode ser lavrado por meio de assento, averbamento, inscrição ou transcrição. O
casamento, enquanto não for registado, não pode ser invocado. O registo do casamento,
como qualquer outro, também pode ser declarado inexistente ou nulo, designadamente
por falsidade, podendo, também, ser cancelado.
Os efeitos do registo não se produzem só ex nunc, mas ex tunc, desde a celebração do ato.

Casamento Urgente – Artigo 1622.º


Existem situações em que o casamento pode celebrar-se independentemente de processo
preliminar e sem intervenção do funcionário do registo civil – circunstâncias em que não

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

é possível averiguar da existência de impedimentos matrimoniais ou aferir se há


consentimento livre e esclarecido.
Este casamento deve ser qualificado como católico ou civil segundo a intenção das partes,
manifestada expressamente ou deduzida das formalidades adotadas, crenças dos nubentes
ou outros.
A lei exige forma registo e, por isso, não admite a celebração de casamento sem mais,
somente no caso de iminência de parto ou risco de morte próxima de um dos nubentes.
Assim, este tipo de casamentos não passam pelo crivo do processo preliminar – não é
feita a deliberação sobre impedimentos e não se verifica se o consentimento é livre e
esclarecido. As formalidades preliminares reduzem-se à proclamação a que se refere a
alínea a) do artigo x ??? – proclamação oral ou escrita, feita à porta da casa onde se
encontrem os nubentes, pelo funcionário do registo civil ou, na sua falta, por qualquer das
pessoas presentes, de que vai celebrar-se o casamento. Assim, basta que seja proclamada
a celebração do casamento, tendo de estar presentes quatro testemunhas, duas das quais
não podem ser parentes sucessíveis.
Registo: Deve ser redigida uma ata do casamento por documento escrito e sem
formalidades especiais, assinado por todos os intervenientes que saibam e possam fazê-
lo – art. 1622.º, número 2.
O casamento urgente fica sujeito a homologação do conservador que, no despacho final,
deve fixar expressamente todos os elementos que devam constar o assento (1623.º). As
razões pelas quais um casamento urgente não deve ser homologado estão previstas no
artigo 1623.º, número 2.
Para efeito, as pessoas casadas por casamento urgente ficam com regime de separação de
bens, de acordo com o artigo 1720.º, número 1, alínea a).
É juridicamente inexistente o casamento que seja celebrado perante quem não tem
competência, salvo se for um casamento urgente homologado pelo conservador. Se for
urgente, mas não homologado, é inexistente.

Invalidade do Casamento – Inexistência, Nulidade e Anulabilidade


A inexistência não surge expressamente prevista na parte geral – só no âmbito do
casamento – e a nulidade é um regime tão forte que parece “duplicar-se”.
Na nulidade, a lei pode conceder efeitos, como facto jurídico, mas a inexistência não – o
negócio não produz efeitos a que é dirigido segundo a vontade das partes, mas a lei
reconhece a sua existência como facto jurídico, a que liga determinados efeitos.

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

Não há casamentos nulos, só anuláveis, em nome da estabilidade do negócio jurídico no


Direito Civil; todas as referências à nulidade do casamento dizem apenas respeito ao
casamento católico.
A. Inexistência do Casamento – artigos 1628.º a 1630.º
O instituo da inexistência do casamento surgiu de uma necessidade prática, por não
parecer razoável declarar nulo um negócio jurídico que nunca existiu.
O regime da anulabilidade, no passado, não se mostrava adequado a casamentos
portadores de vícios mais graves, na altura – como casamentos entre pessoas do mesmo
sexo, em que faltasse a declaração de vontade dos nubentes ou de algum deles, etc. A
anulabilidade não se mostrava suficiente porque não pode ser declarada oficiosamente
pelo tribunal e tem regras de legitimidade e prazo. Além disso, os casamentos anuláveis
produzem efeitos putativos (arts. 1647.º a 1648.º), o que não parece adequado.
Assim, são declarados inexistentes:

• Casamentos celebrados perante quem não tinha competência funcional para o ato;
• Casamentos urgentes não homologados;
• Casamentos celebrados em que falte a declaração de vontade dos nubentes ou de
um deles;
• Vícios da procuração.
Nota: Não é inexistente nem anulável o casamento celebrado perante funcionário de
facto, mas tem como consequência a nulidade do respetivo registo – art. 1629.º + 369.º/2.
Não cabe aqui o ato celebrado por um simples particular que não exerça publicamente a
função de oficial público.
A inexistência não produz efeitos, nem mesmo putativos. Pode ser invocada a todo o
tempo e por qualquer interessado, independentemente da declaração judicial – artigo
1630.º. Atenção que o registo não será inexistente, podendo ser necessária uma ação para
ilidir a prova resultante do registo.
B. Anulabilidade do Casamento – artigos 1631.º e 1632.º
De acordo com o artigo 1627.º, sempre que a lei não estabeleça anulabilidade ou
inexistência, o casamento será válido. São anuláveis:

• Os casamentos contraídos com impedimento dirimente;


• Os casamentos celebrados com falta de vontade por um ou ambos os nubentes;
• Casamentos em que tenha havido vício da vontade juridicamente relevante;
• Casamentos celebrados sem a presença de testemunhas exigidas por lei.
A anulabilidade terá de ser reconhecida por sentença em ação especialmente intentada
para esse fim, de acordo com o art. 1632.º. Só pode ser proposta por certas pessoas (arts.
1639.º a 1642.º), dentro de certos prazos (arts. 1843.º a 1646.º) e prevê a possibilidade de
sanação, de acordo com o art 1633.º.

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

Casamento Putativo
Declarado nulo ou anulado o casamento, os efeitos que este produziu até à data da
declaração de nulidade ou de anulação podem manter-se quando se verifiquem certos
pressupostos; é o que se chama casamento putativo – artigo 1647.º. Assim, um casamento
putativo é um casamento que os cônjuges julgavam ter contraído validamente.
No ordenamento jurídico português, vai-se transcender este âmbito porque a presunção
pater ist est vai operar, na medida em que os filhos de casamento nulo ou anulado, mesmo
no caso de má-fé dos seus progenitores (1827.º) se presumem filhos do marido da mãe
(1826.º, número 1).
Em virtude do princípio da retroatividade da declaração de nulidade ou anulação – artigo
289.º –, a um casamento declarado nulo ou anulado não se deveriam atribuir nenhuns
efeitos. Neste caso, o casamento seria visto como união de facto e os efeitos sucessórios
os respetivos; os filhos nascidos do casamento ter-se-iam como nascidos fora dele, pelo
que não lhes aplicaria a presunção de paternidade do art. 1826.º/1; e as convenções
antinupciais, assim como as doações si nuptiae sequantur feitas pelos conjugues ou
terceiros, caducariam. Tudo isto seriam consequências desvantajosas para os filhos, para
os cônjuges e para terceiros.
Assim, em face da união conjugal que interessa à sociedade fazer cessar, basta que ela
cesse, não sendo necessário apagar os efeitos jurídicos que produziu.

Mas qual a natureza jurídica do casamento putativo? Tratar-se-á de uma ficção do


casamento? Uma instituição autónoma? Será o artigo 1647.º uma exceção à regra do
artigo 289.º?
PL defende que os efeitos putativos têm a sua fonte numa situação de facto resultante da
errónea convicção da legalidade do vínculo. Por isso, quando a lei diz que o casamento
nulo ou anulável produz os seus efeitos jurídicos, produz a ideia de que os efeitos que se
produzem são os mesmos, a lei determina os efeitos do instituto por um processo indireto.
Assim, a lei atribui, pelo casamento putativo, eficácia a uma materialidade, tornando-a
produtora de consequências jurídicas. Então, o casamento putativo é o facto material que
se revela pela aparência de um casamento, a que lei atribui efeitos análogos ao de esse
ato.
Pressupostos do casamento putativo:
1. Existência de casamento; se o casamento é inexistente porque se verificar alguma
das situações do artigo 1628.º, não há efeitos putativos (1630.º/1);
2. Anulação ou declaração de nulidade (1647.º/1 e 3); até que seja declarada a
anulação (1632.º), o casamento produz todos os seus efeitos;

37
Direito da Família Matilde Diogo Alves

3. Boa-fé dos cônjuges ou de algum deles; esta boa-fé é necessária para que o
casamento produza efeitos em relação aos cônjuges ou efeitos favoráveis ao
cônjuge de boa-fé e, reflexamente, em relação a terceiros. A eficácia putativa em
relação aos filhos não depende da boa-fé dos cônjuges (1827.º).
A boa-fé presume-se, de acordo com o artigo 1648.º, número 3 – consiste na ignorância
desculpável do vício causador da nulidade ou anulabilidade da parte do cônjuge cujo
consentimento tenha sido extorquido por coação, devendo existir no momento da
celebração do casamento.
Nota: Uma vez declarada a nulidade do casamento católico por um tribunal eclesiástico,
regular os efeitos da nulidade e eventual aplicação do instituto do casamento putativo é
da exclusiva competência dos tribunais do estado o conhecimento judicial da boa-fé
(1648.º, número 2).
Efeitos do casamento putativo
Mantêm-se para o futuro, até à data do trânsito em julgado da sentença de anulação do
conhecimento civil – art. 1647.º, número 1 – ou até à do averbamento da sentença do
tribunal eclesiástico que declarou a nulidade do casamento católico – artigo 1647.º,
número 3 – os efeitos do casamento já produzidos, mas não se produzem novos efeitos, à
semelhança do que acontece em caso de divórcio.
De acordo com o artigo 2017.º, aplica-se mesmo que a necessidade de alimentos surja
depois da declaração de nulidade ou anulação do casamento.

• Se os cônjuges estavam ambos de boa-fé,


o O casamento produz todos os efeitos entre eles até à data da declaração de
nulidade ou da anulação (art. 1647.º/1);
o Mantêm-se, p.e., os efeitos sucessórios;
o As alienações efetuadas pela mulher sem outorga do marido putativo
continuam a ser anuláveis mesmo depois da declaração de nulidade ou
anulação do casamento, p.e.;
o A vende a casa sem consentimento. Estando ambos de boa-fé, vigora
plenamente o art. 1647.º/1, pelo que os efeitos se produzem até ao trânsito
em julgado da sentença de anulação; ainda não tendo isto sucedido,
aplicam-se as regras relativas à administração de bens do casal e alienação
da casa de morada de família carece de consentimento, independentemente
da titularidade. Apesar de já ter sido intentada a ação, o casamento é
apenas anulável, ainda não anulado.
• Se só estava um bom de boa-fé;
o O casamento inválido produz os efeitos que sejam favoráveis
concretamente ao cônjuge de boa-fé (art. 1647.º/2);
o Se A, casado com B, falece, e B foi herdeiro de A, o efeito sucessório
mantém-se se B estava de boa-fé;
o A convenção antinupcial terá efeitos se o regime estipulado beneficiar o
cônjuge de boa-fé, de acordo com o art. 1716.º;
38
Direito da Família Matilde Diogo Alves

• Se ambos estavam de má fé, o casamento não tem eficácia putativa entre eles.
• Em relação aos filhos, mesmo que estes tenham contraído o casamento de má-fé,
a presunção pater is est aplica-se aos filhos nascidos do casamento, nos termos do
artigo 1827.º;
• Em relação a terceiros;
o Proteção lateral e reflexa
▪ Se ambos os cônjuges estavam de boa-fé, o casamento inválido
produz todos os seus efeitos, também em relação a terceiros, até ao
trânsito em julgado da sentença de anulação (1647.º/ 1 e 3);
▪ Se só um estava de boa-fé,
• Tratando-se de relações que, estabelecendo-se entre os
próprios cônjuges, vão afetar terceiros nos seus interesses,
p.e., alienação de imóveis feita por um dos cônjuges sem o
consentimento do outro – os efeitos produzem-se ou não,
conforme sejam favoráveis ao cônjuge de boa-fé;
• Se se tratar de relações que se estabelecem diretamente
entre cada um dos cônjuges e terceiros que estejam
dependentes do estado pessoal de casado, como no caso de
uma relação de afinidade e uma doação para casamento
feita por terceiro a um dos esposados, o terceiro não merece
maior ou menor proteção consoante esteja de boa ou má-fé
o cônjuge com quem contratou e o casamento não produz
qualquer efeito.

Se ambos os cônjuges estavam de má-fé, o casamento não produz efeitos em relação a


eles e, por isso, também não produz em relação a terceiros.

Nota:
Fragilidade da Garantia
Antigamente, vigorava a tese da fragilidade da garantia que, hoje em dia, continua a ser
defendida por muitos autores, mas não por Rita Lobo Xavier ou RM. Atualmente, diz-se
que se pode recorrer a responsabilidade civil extraobrigacional sempre que a violação
determinasse a violação de um dever absoluto (dever de respeito). Os novos autores vêm
chamar o artigo 1792.º para defender a possibilidade de uma ação por violação de um
dever absoluto.
Nota: A doutrina tradicional defende a fragilidade da garantia porque a “responsabilidade
nos termos gerais” é entendida como responsabilidade civil extraobrigacional.
A previsão de uma obrigação de indemnizar assente nos princípios gerais da
responsabilidade civil por violação de deveres conjugais era tradicionalmente afastada no
nosso ordenamento jurídico, prevalecendo a teoria da fragilidade da garantia. Os deveres

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

familiares pessoais (arts. 1672.º e ss.) não estariam sujeitos à tutela mais consistente dos
deveres jurídicos, que é a possibilidade de o credor exigir do devedor o seu cumprimento
e/ou obter deste uma indemnização – tratar-se-ia de deveres e de relações de caráter tão
íntimo e tão privado que seria impossível forçar, externamente, a sua observância. Assim,
a única possibilidade que assistia ao lesado era a dissolução do vínculo – tutela jurídica
exclusivamente familiar. Depois, a Lei n.º 61/2008 entrou em vigor e deu nova redação
ao art. 1792.º.
O cônjuge lesado pode optar por responsabilidade civil obrigacional/contratual ou
responsabilidade civil extraobrigacional. Por um lado, sempre que se verifica a violação
de um dever absoluto, tem de haver responsabilidade extraobrigacional. Estamos perante
deveres conjugais e, por isso, faz todo o sentido que se possa pedir responsabilidade
contratual, porque o casamento é um contrato. A professora Madalena defende que o
artigo 1792.º estabelece que é possível que haja responsabilidade civil extraobrigacional
ou responsabilidade civil contratual.
Entende-se que o direito a ser ressarcido pelos danos causados só pode ser efetivado uma
vez dissolvido o casamento.

Casamento civil sob forma religiosa

o A Lei da Liberdade Religiosa (Lei n.o 16/2001, de 22 de junho) reconheceu efeitos


civis aos casamentos celebrados por forma religiosa perante ministro do culto de
igreja ou comunidade religiosa radicada no País
o a determinadas religiões admitiu-se a celebração pela FORMA da religião
• A qualidade do ministro do culto que presidirá à celebração do casamento
e a sua credenciação para a prática do ato devem ser oficiosamente
comprovadas pelo conservador, através de comunicação com a igreja ou
comunidade religiosa, sem prejuízo da apresentação pelos nubentes dos
respetivos documentos (art. 137.o, n.o 6);
• a conservatória deve comprovar, junto do registo de pessoas coletivas
religiosas, a radicação da igreja ou comunidade religiosa no País e a
competência dos órgãos para a emissão daqueles documentos
• é ao conservador que compete passar ou não o certificado de casamento
o na igreja católica há alguma competência quando à regulação, mas aqui não
o perante o ministro do culto, e não na conservatória
• a declaração de casamento vai ser enviada pelo ministro do culto à
conservatória. o conservador vai fazer o processo preliminar. a
conservatória tem de averiguar se a religião é ou não radicada e se tem ou
não competência para emitir documentos e praticar atos
• depois autoriza o casamento dos nubentes. a celebração dá-se segundo a
lei da liberdade religiosa
• o assento de casamento é lavrado em duplicado

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

• O ministro do culto que tiver oficiado no casamento deve enviar no prazo


de três dias a uma conservatória do registo civil o duplicado do assento a
fim de ser transcrito + ministro do culto deve ser informado

Dever de Assistência e de Cooperação


O dever de cooperação é um dever pessoal, o de assistência, de natureza patrimonial, não
querendo isto dizer que, no âmbito do dever de cooperação, não se insiram deveres de
natureza patrimonial, no caso de, p.e., uma pessoa estar doente e o cônjuge ir à farmácia
comprar medicamentos.
O artigo 1675.º refere quais os deveres compreendidos no dever de assistência, referindo,
desde logo, deveres de cariz patrimonial e contribuição para “os encargos”. Pelo
contrário, o dever de cooperação fala de “responsabilidades”.
O dever de assistência é um dever excecional que se mantém, no entendimento da
professora Rita Lobo Xavier, na separação de facto.
Será que a expressão “imputável a cada um dos cônjuges”, prevista no artigo 1675.º,
número 2, ainda está em vigor, atendendo a que já não há divórcio por culpa? A prof. Rita
Lobo Xavier entende que não.
Está ao alcance dos cônjuges requerer esta contribuição para os encargos da vida familiar,
cativando, até, parte do salário.
O dever de contribuição incumbe a ambos os cônjuges, de acordo com o artigo 1676.º,
tendo de se verificar uma harmonia com as possibilidades, já que não se pode esperar uma
contribuição simétrica se há assimetria de possibilidades. Pode ser cumprido, por
exemplo, por trabalho despedido no lar – assimetria na retribuição, mas simetria no
âmbito de trabalho doméstico ou educação e manutenção dos filhos.
Os efeitos do divórcio estão previstos a partir do artigo 1773.º e ss. e está previsto um
direito a indemnização. Assim, não existe a possibilidade de pedir indemnização no
âmbito do casamento, por não se pretender esta ligitiosidade.
Deverá a violação destes deveres dar lugar a indemnização?
Segundo a doutrina mais tradicional, entendia-se que nem haveria direito a indemnização
por responsabilidade civil extraobrigacional, sendo a única sanção, assim, a possibilidade
de recorrer ao divórcio. Entendiam que, por ser um regime próprio especial, as sanções
aplicáveis seriam apenas as expressamente previstas.
A abolição do divórcio-sanção é um argumento neste sentido: se o legislador o aboliu,
então não faz sentido dizer-se que pode haver indemnização; com a abolição, pretendeu
remover qualquer caráter sancionatório.

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

• MPA não concorda, devido à existência do artigo 1672.º, mas enuncia que, de
facto, o caráter sancionatório desapareceu;
• Francisco Pinto Coelho defende que só haverá responsabilidade se paralelamente
houver violação de um direito de personalidade do cônjuge – assim, remete para
responsabilidade civil extraobrigacional quando há violação de um direito
absoluto;
• GO defende, também, a responsabilidade civil extraobrigacional, perante a
ausência de menção expressa da lei;
• Cristina Dias enuncia que a eliminação da violação culposa dos deveres conjugais
com fundamento no divórcio não afeta a juricidade dos deveres conjugais. Assim,
a professora concorda com a ideia de que se poderá recorrer à via contratual e
conclui que, apesar da controvérsia doutrinal e da possibilidade de interpretação
restritiva, se pode recorrer às regras de responsabilidade civil contratual
independentemente da violação de outros deveres absolutos.
Verifica-se uma época de alargamento da ideia e cada vez mais autores consideram que
pode haver responsabilidade contratual.

Direito ao Nome – Artigo 1677.º do Código Civil


Com o casamento, são conservados os nomes, podendo ser acrescentados outros. Não se
pode acrescentar nomes se se conserva nomes do anterior cônjuge, mas pode ser mantido
o nome que, entretanto, se tornou seu. Os nomes conservam-se em casos de viuvez se tal
for declarado, mesmo depois de segundas núpcias – porque também aqui o nome se torna
seu.
É possível que a pessoa se oponha, sendo que, nesse caso, é o tribunal que dita se há ou
não direito a manter o nome; se há ou não fundamento para tal, p.e., se o nome de casada
se tornou o nome profissional.
O documento em que o ex-cônjuge autoriza o outro a manter o seu nome pode ser
autêntico – quando é exarado pelos notários – ou particular autenticado, quando é exarado
pelas partes em que quem está a reconhecer o documento vai autentificá-lo.
Falecido um ou decretada a separação legal de bens, pode ser privado ao uso do nome,
quando esse uso lese gravemente os interesses.
Cláusula inserida na convenção antinupcial dita que, em caso de divórcio, o cônjuge não
pode, em qualquer caso, manter o apelido. Quid iuris? De acordo com os artigos 1671.º
e ss. e x ???, não se pode, por convenção antinupcial altear os deveres conjugais e, de
acordo com o art. x ???, consideram-se não escritas as cláusulas pelas quais os nubentes
pretendam alterar os deveres do casamento. Assim, uma cláusula destas será nula,
considerada como não escrita, reduzida e a convenção antinupcial vai subsistir.

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

Dever de Assistência e Obrigação de Alimentos


A obrigação de alimentos corresponde a uma situação excecional e a uma obrigação
jurídica, em termos estruturais (de acordo com o art. 397.º, é um vínculo jurídico através
do qual uma pessoa fica adstrita para com outra à realização de uma prestação pecuniária).
Assim, esta está funcionalmente ligada ao vínculo familiar em torno do qual gravita,
apesar de ser uma obrigação em sentido técnico.
Porque é que se encontra uma obrigação jurídica no Direito da Família? Porque é não
autónoma, no sentido em que existe em virtude de um vínculo familiar – a obrigação
surge em função do vínculo familiar ou parafamiliar, gravitando em torno dele.
Diferentemente do que acontece com o dever de respeito e de auxílio, que são deveres
sempre relativos a um dever de cuidado, não sendo suscetíveis de coação, a obrigação
alimentar, em termos estruturais, impõe uma prestação pecuniária e é suscetível de
execução coativa, muito embora seja um direito familiar (patrimonial, não pessoal).
O fundamento desta obrigação é o respeito pela dignidade da pessoa humana e o conteúdo
do direito à vida, que impõem obrigações estaduais e familiares.
Os deveres de solidariedade obrigam a uma assistência àquele que, por si, não tem
condições suficientes para assegurar um mínimo de existência condigna – uma pessoa
que é carecida de meios económicos suficientes para se assegurar uma vida condigna.
O Estado tem de prestar certas prestações para evitar que, por falta de condições
económicas, uma pessoa não disponha de condições para garantir um mínimo de
existência. A família é uma instituição e unidade única, necessária ao desenvolvimento
humano harmonioso. Atendendo a isto, o legislador constitucional vem prever a família
e, em termos civilistas, impõem-se direitos e deveres que advêm do papel fulcral que o
Estado reconhece e promove à família – um exemplo disto é a obrigação de alimentos.
Elenco de pessoas vinculadas à obrigação de alimentos
A obrigação legal de alimentos é um efeito suscetível de se verificar em todo o tipo de
relações familiares (os professores Pereira Coelho e Guilherme de Oliveira referem o
matrimónio, a afinidade, a adoção, o parentesco, o apadrinhamento civil e a união de
facto). Então, para além de pessoas atendendo ao seu vínculo familiar, temos pessoas
obrigadas em relação ao seu vínculo de relação parafamiliar – entre ex-cônjuges ou entre
tutor e tutelado.
O artigo 2009.º, que refere o elenco de pessoas obrigadas a alimentos, tem de ser
conjugado com:

• A adoção – artigo 1986.º/1;


• À filiação por consentimento não adotivo – aplicação analógica do parentesco;
• Apadrinhamento civil – artigo 21.º da Lei de Apadrinhamento Civil, em que os
padrinhos são considerados parentes em primeiro grau para alimentos;
• União de facto – artigo 2020.º;

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

• Tutor e tutelado – artigo 1935.º/1.


Apesar da obrigação de alimentos ter previsão no livro de d. da Família, esta obrigação
não tem uma natureza jurídica necessariamente familiar, já que uma obrigação de
alimentos pode vincular uma pessoa em relação a outras sem que entre elas exista um
vínculo familiar ou parafamiliar, já que isto se admite por via negocial. assim, temos de
distinguir:
1. Obrigação Legal de Alimentos – resulta da lei, em virtude de um vínculo familiar
ou parafamiliar;
2. Obrigação Convencional de Alimentos (2014.º) – que não tem a sua fonte numa
relação familiar ou parafamiliar, mas num negócio jurídico, podendo resultar de
contrato ou testamento; aplica-se, mutatis mutandis, o regime geral do art. 2003.º
e ss. relativo à obrigação legal de alimentos.
Nos termos do artigo 2009.º, número 2, entre os descendentes e os ascendentes, a
obrigação vai-se deferir segundo o princípio da preferência de grau de parentesco. Isto
dá-se sem prejuízo do direito de representação (arts. 2135.º e 2138.º). P.e., A carece de
alimentos, tem um filho e um neto; a vinculação vai recair sobre o seu filho – grau mais
próximo prefere ao mais afastado. Se o neto faleceu, a obrigação vai recair sobre outro
filho e sobre os netos, em representação do seu pai.
Se algum dos vinculados não puder prestar parcial ou integralmente, o encargo recai sobre
os onerados subsequentes.
Nos termos do artigo 21.º da Lei de Apadrinhamento Civil, se o afilhado carecer de
alimentos, os padrinhos são obrigados a prestá-los, sendo que, na falta de pais em
condições para satisfazer o encargo, serão os padrinhos a garanti-lo. Além disso, se é o
padrinho que carece de alimentos e não tem filhos que possam satisfazer, o encargo recai
sobre os afilhados.
Noção de Alimentos
Nos termos do artigo 2003.º, são prestações (obrigações em sentido técnico) que visam
provir a tudo o que é indispensável ao sustento, como habitação e vestuário,
compreendendo, também, a instrução e educação do alimentado, no caso de este ser
menor. Estes são conceitos indeterminados que caberá ao tribunal, casuisticamente,
determinar – tem de assegurar tudo o que é necessário para assegurar um mínimo de vida
condiga.
A medida dos alimentos assenta numa lógica de binómio, limitado pela necessidade do
alimentado e a possibilidade do obrigado. De acordo com o art. 2004.º, os alimentos serão
proporcionados aos meios daquele que houver de prestá-los e à necessidade daquele que
houver de recebê-los. Assim, na fixação dos alimentos atender-se-á à possibilidade de o
alimentado prover à sua subsistência, não se devendo ignorar as próprias necessidades do
devedor e outras obrigações de alimentos que este tenha.
Nota: Há preferência do filho face ao ex-cônjuge.

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

Para que surja a obrigação, tem sempre de ser verificado o binómio. Para se averiguar a
necessidade, atende-se à insuficiência de meios para a vida condigna. Nunca poderá ser
ultrapassado este equilíbrio entre a vantagem e o sacrifício.
A obrigação de alimentos vai, por regra, beneficiar os grupos sociais com menores
capacidades económicas.
De acordo com o artigo 2005.º, os alimentos devem ser fixados em prestações pecuniárias
mensais (2005.º/1), salvo se houver acordo ou disposição legal em contrário, ou se
ocorrem motivos que justifiquem medidas de exceção. De acordo com o número 2, se,
porém, o obrigado aos alimentos mostrar que não os pode prestar como pensão, mas tão-
só em sua casa e companhia, assim poderão ser decretados.
De acordo com o artigo 2006.º, os alimentos constituídos por facto não negocial são
devidos desde a propositura da ação ou desde o momento em que o devedor se constitui
em mora. Nos termos do artigo 2007.º, como prelimitar ou incidente, podem ser
concedidos alimentos provisórios que serão fixados segundo o arbítrio do tribunal.
Pluralidade de Vinculados – Artigo 2010.º
Sendo várias as pessoas vinculadas à prestação de alimentos, respondem todas na
proporção das suas quotas como herdeiros legítimos do alimentando. Se alguma das
pessoas assim oneradas não puder satisfazer a parte que lhe cabe, o encargo recai sobre
as restantes.
Exemplo: H tem três filhos e a cada um destes filhos incumbe a prestação de 1/3.
Imaginando que um dos filhos não tem meios económicos suficientes para satisfazer a
sua parte. Sendo a ponderação do binómio possibilidade e necessidade obrigatória, esse
obrigado não é onerado pela prestação de alimentos. Assim, os outros filhos terão de a
suportar, metade cada um.
Cada um dos deveres só responde na medida das suas possibilidades e, se todos tiverem
possibilidade, o máximo que cada um deve prestar não pode ultrapassar a sua quota como
herdeiro legítimo. Assim, não é uma obrigação solidária (512.º).
Também não é um regime de responsabilidade parciária porque cada um dos
deveres corre o risco de ter de pagar uma quota-parte superior àquela que lhe
compete como herdeiro legitimário.
Será que os alimentos são ónus da sucessão legal? Tratar-se-á a obrigação de alimentos
de uma contrapartida do direito a suceder? O prof. Guilherme de Oliveira defende que
não, já que, se é nas famílias que menos bens têm que encontramos acrescidos de sustento,
então tal não faria sentido. Cada instituto tem as suas regras e fundamentos: desde logo,
há diferença entre os sucessíveis e os obrigados a alimentos, como o ex-cônjuge, a
madrasta e o padrasto.
A obrigação de alimentos tem caráter indisponível, de acordo com o artigo 2008.º, sendo,
assim, irrenunciável, impenhorável e não sujeito a compensação ou outra forma de
disposição do crédito como doação ou cessão. Não pode ser renunciado ou cedido porque

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

visa satisfazer necessidades, não estando em causa um mero interesse da parte, mas um
verdadeiro propósito público. Tem, assim, uma função assistencial.
Diz o professor Antunes Varela que temos de aplicar o artigo 738.º na sua totalidade e,
neste caso, estamos perante uma norma especial que diz que, se o crédito alimentar for
referente à subsistência ???
No âmbito do regime geral, o crédito é, na sua globalidade, impenhorável, de acordo com
o artigo 738.º, número 1 (é mesmo este o artigo?)
No âmbito do divórcio, quando existe a obrigação entre ex-cônjuges, se entendermos que
a medida dos alimentos entre ex-cônjuges pode ser um pouco mais folgada do que o
“indispensável” – art. 2003.º – para garantir um mínimo de existência condigna, então
certas restrições e proteções mencionadas talvez só mereçam aplicar-se à parte do crédito
que for estritamente indispensável a sobrevivência do credor e o excedente será
penhorável (artigo???).
Admitem-se renúncias tácitas à obrigação de alimentos, mas não futuras. Havendo
renúncia tácita, conclui-se que não há necessidade e, por isso também, não há obrigação.
no entanto, a admissão de renúncia tácita é discutível.
Se, depois de fixados os alimentos pelo tribunal ou por acordo dos interessados, as
circunstâncias determinantes da sua fixação se modificarem, podem os alimentos taxados
ser reduzidos ou aumentados, conforme os casos, ou podem outras pessoas ser obrigadas
a prestá-los – artigo 2012.º. É permitida a inserção de cláusula de atualização no acordo?
O Supremo Tribunal de Justiça determinou que não, porque o valor poderia acabar por
ser elevado acima das possibilidades do devedor. Guilherme Oliveira afirma que os
resultados injustos podem ser corrigidos por nova aplicação da cláusula entre as partes ou
em relação ao tribunal e que, por isso, isto não faz sentido.
O artigo 2013.º trata a cessação da obrigação alimentar:

• Pela morte do obrigado ou do alimentado, por se tratar de uma obrigação intuit


personae, por se fundar na proporcionalidade do binómio e numa obrigação não
autónoma, que existe e não é transmissível:
• Quando aquele que os presta não possa continuar a prestá-los ou aquele que os
recebe deixa de precisar deles;
• Quando o credor viole gravemente os seus deveres para com o obrigado.
Dita o número 2 que a morte do obrigado ou a impossibilidade de este continuar a prestar
alimentos não priva o alimentado de exercer o seu direito em relação a outros, igual ou
sucessivamente onerados.
Garantias do Cumprimento da Obrigação

• Artigo 705.º, alínea d) – Hipoteca legal: Garantia que confere ao credor o direito
de ser pago pelo valor da coisas imóveis ou equiparadas com preferência sobre os
demais credores que não tenham privilégio especial ou registo prévio;

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

• Artigo 710.º – Hipoteca judicial, determinada pelo tribunal que constitua a


obrigação de alimentos;
• Artigo 619.º – Arresto de bens do devedor, se este for um meio adequado para
evitar a perda da garantia;
• Artigo 624.º – Prestação de caução, admitindo-se que o tribunal a imponha quando
tiver razões para duvidar do cumprimento pontual.
Meios de Reação perante o Incumprimento

• Artigo 933.º do Código do Processo Civil, processo de execução especial por


alimentos: o credor pode requerer a adjudicação de certas quantias que o
executado esteja x??? ou a consignação de rendimentos de bens que pertençam
ao devedor;
• O artigo 250.º do Código Penal prevê o crime da violação da obrigação de
alimentos: quem se atrasar mais de 2 meses e para quem incumprir reiteradamente
e quem não cumprir podendo fazê-lo, colocando em risco a subsistência. O
devedor, cumprindo tardiamente, poderá dispensar a pena ou declarar extinta a
pena ainda não cumprida.

Obrigação alimentar entre cônjuges separados de facto


O artigo 1675.º prevê o dever de assistência: a obrigação de prestar alimentos e de
contribuir para os encargos da vida familiar.
Na constância do matrimónio, a obrigação de alimentos não se autonomiza, estando
incluída no dever de contribuir para os encargos da vida familiar (absorvida). A obrigação
só se autonomiza perante a rutura da vida comum. Sempre que haja um caso de obrigações
pecuniárias no âmbito do matrimónio, estará em causa o dever de assistência na vertente
de prestação de alimentos – esta é a posição largamente adotada pela doutrina e
jurisprudência.
No caso de a separação de pessoas e bens, judicial ou administrativa, e de simples
separação de facto, não existe “vida familiar”, não tendo, assim, sentido falar na obrigação
de contribuir para os respetivos encargos, mas a lei, em certas condições, obriga cada um
dos cônjuges a prestar alimentos ao outro.
Rita Lobo Xavier considera que o número 3 não está em vigor e, por isso, não há
autonomização da obrigação da obrigação de alimentos face à obrigação de contribuir
para os encargos da vida comum, porque a separação de facto é meramente modificativa
do casamento. Esta é uma doutrina duvidosa, por estar previsto na lei e, por isso, a
separação impossibilita os tribunais de fazer coisa diferente.

A separação de facto está prevista no artigo 1675.º do Código Civil e consiste numa
modificação da relação jurídica matrimonial, que se verifica mediante dois requisitos:

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

1. Falta de vida em comum dos cônjuges – requisito objetivo;


2. Propósito de não retomar a vida em comum (coabitação), de ambos os cônjuges
ou de apenas um deles – requisito subjetivo.
Verifica-se uma divergência doutrinária sobre se a separação de facto leva à conversão da
obrigação de contribuir para os encargos da vida familiar em obrigação de alimentos.
Se a separação não for imputável a nenhum deles, qualquer pode exigir o dever de
assistência; se for imputável a ambos, a obrigação incumbe ao único ou excecional
culpado. Por motivos de equidade e atendendo à contribuição daquele cônjuge para a
economia do casal durante o casamento, pode o cônjuge não ou menos culpado ser
obrigado a pagar alimentos.
No entanto, hoje em dia, já não há divórcio por culpa. Assim, o regime da separação de
facto devia ter sido adaptado às mudanças que se deram no âmbito do divórcio e da
separação legal – a circunstância de não ter sido feito por um lapso manifesto que exige
correção. Na verdade, quanto a saber a quem incumbe a obrigação de prestação de
alimentos, o art. 1675.º assenta no apuramento do cônjuge culpado ou principal culpado
na separação, ou na verificação da equivalência das respetivas culpas, fazendo assim
persistir no direito português a relevância da culpa – não no divórcio, mas na própria
separação de facto – contra as intenções básicas mais importantes da alteração legislativa
de 2008.
É muito difícil que os tribunais venham a determinar um afastamento da norma do art.
1675.º, número 3, em virtude do princípio da separação de poderes. Então, mesmo que
pareça ter existido um lapso, é muito difícil que os tribunais venham afastar isto, já que,
enquanto a alteração legislativa não se der, não há nada a fazer.
Os ilícitos que podem fundamentar uma obrigação de indemnizar, portanto, não resultam
da mera violação de deveres especificamente conjugais; resultam da violação de deveres
gerais de respeito, de ofensas a direitos de personalidade e direitos fundamentais. Assim,
p.e., um adultério não tem de ser fundamento para uma indemnização, mas sê-lo-á,
provavelmente, de for acompanhado de publicidade ou de qualquer forma de crueldade
moral – foi esta a ideia que presidiu às alterações.
Nos termos do artigo 2004.º, o montante de alimentos depende do binómio, mas a dúvida
consiste em saber como vão ser determinadas as necessidades:
Existindo um credor de alimentos, atendemos às suas necessidades com base no que é o
seu sustento, habitação e vestuário, na medida em que é necessário para assegurar uma
existência condigna (2003.º) ou será que vai ter de contribuir para garantir a manutenção
do estilo de vida que existia durante o matrimónio, na medida das possibilidades do
devedor?
A generalidade da doutrina e jurisprudência atual (Pereira Coelho e Guilherme Oliveira)
vêm considerar que o cônjuge separado de facto pode aspirar a uma situação razoável
acima do limiar de sobrevivência – critério intermédio que não se reduz ao ponto de ser
o mínimo necessário para a existência condigna, mas não é tão exigente para garantir a

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

vida conjugal normal. Justifica-se por manutenção da comunhão de vida em que viveram
e deve atender-se aos custos acrescidos a que o outro cônjuge também terá de ter por viver
sozinho, p.e.
Nota: Poderá o tribunal, excecionalmente e por motivos de equidade, negar os alimentos.

Entre cônjuges separados de pessoas e bens


A separação entre cônjuges e bens vem modificar o regime, extinguindo o dever de
coabitação e assistência, sem prejuízo do direito de alimentos – 1795.ºA.
A separação pode ser judicial ou administrativa, aplicando-se este artigo a ambas. Se
houver separação administrativa de pessoas e bens por mútuo consentimento, não é
rigoroso que se diga que se refira “separação judicial de pessoas e bens”; é certo que o
artigo refere isto, mas é o artigo que existe e que se aplica analogicamente à separação
administrativa.
Os artigos 2016.º e 2016.º-A vêm antecipar o regime aplicável à obrigação alimentar em
caso de divórcio.
O artigo 1676.º, número 4, considera a hipótese de um dos cônjuges contribuir com menos
do que devia. Neste caso, o outro cônjuge pode exigir ao faltoso o que for devido; se este
é trabalhador por conta de outrem e contribui para os encargos da vida do lar com o
produto do seu trabalho, aquele pode exigir que lhe seja diretamente entregue a
importância a que tem direito.

Divórcio
O divórcio vem extinguir a relação matrimonial, mas a relação entre os ex-cônjuges
continua a ter relevância jurídica. Assim que se dá o divórcio, extingue-se a relação
matrimonial e os direitos e deveres associados, mas exceciona a obrigação de alimentos
entre ex-cônjuges como corolário e eficácia póstuma do dever de assistência.
De acordo com o artigo 2016.º, cada cônjuge deve provar à sua subsistência depois do
divórcio, sendo este um princípio geral de autorresponsabilidade. Exceções a este
princípio atendem a uma questão de justiça e ao reconhecimento que o legislador vem
fazer da solidariedade conjugal e a sua eficácia póstuma.
Qualquer um dos cônjuges tem direito a alimentos, independentemente do tipo de
divórcio, mas, por razões manifestas de equidade, o direito a alimentos pode ser negado,
mesmo que se verifique o binómio necessidade/possibilidade – perante esta situação,
vamos averiguar quais as pessoas obrigadas a alimentos.
Se havia uma obrigação convencional, mas o obrigado, por razões de equidade, não deve
prestar, se a outra pessoa não estiver numa situação de necessidade, não há obrigação. Por
regra, as obrigações entre ex-cônjuges são convencionais, por não existir um necessitado.

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

Isto é aplicável, também, ao caso de ter sido decretada a separação judicial de pessoas e
bens, à qual se pode chegar através de acordo ou não.
De acordo com o art. 2016.º - A, o alimentado não tem o direito de exigir a manutenção
do padrão de vida de que beneficiou na constância do matrimónio – critério intermédio.
Critérios para a Fixação do Montante
Os critérios para a fixação do montante são, primeiramente, a necessidade e a
possibilidade, sendo irrelevante que o casal tenha vivido muito acima deste limiar – artigo
2003.º, número 1.
Enuncia o artigo 2016.º-A, número 1, que, na fixação do montante dos alimentos, deve o
tribunal tomar em conta todas as circunstâncias que incluam sobre as necessidades do
cônjuge que recebe os alimentos e as possibilidades do que os presta; como
supramencionado, podem estes ser recusados por manifestas razões de equidade.
Menciona o artigo a “colaboração prestada à economia do casal” – E quando há excesso
manifesto de uma contribuição sobre a outra? Segundo o texto do art. 1676.º, número 2,
haverá excesso manifesto quando “um cônjuge renunciou de forma excessiva à satisfação
dos seus interesses em favor da vida em comum, designadamente à sua vida profissional,
com prejuízos patrimoniais importantes”. Haverá um crédito de compensação quando um
cônjuge excedeu manifestamente o seu investimento na vida em comum, quando
desinvestiu na sua vida pessoal em favor do casamento, mais do que seria exigível – caso
do cônjuge que não acabou os estudos, não fez cursos de formação profissional,
abandonou o emprego, etc.
Se contribuiu com muito mais do que as suas possibilidades, excedeu o seu dever de
assistência e, por isso, deverá ser-lhe aplicado o regime do enriquecimento sem causa,
tendo este direito a um valor que compense esse prejuízo e favoreça o padrão de vida que
poderia ter tido.

Modo de prestar os alimentos


Por regra, os alimentos serão prestados em prestações pecuniárias mensais – art. 2005.º,
número 1 – ou em espécie, mantendo o credor em sua casa e companhia.
Os professores Guilherme Oliveira e Pereira Coelho admitem outros meios de cumprir: é
admissível que os alimentos sejam prestados através da constituição de um direito de
usufruto ou contrato de renda vitalícia com terceiro, admitindo-se, ainda, o pagamento da
prestação pecuniária em capital de uma só vez (una tantu), visando isto o corte de vez das
relações entre cônjuges. Mas será esta uma forma legítima de previsão alimentar?
A doutrina aceita este método, com base na liberdade convencional – art. 2014.º. Se a
obrigação for convencional, é perfeitamente possível, após o tribunal ter formado ideia
clara acerca do montante devido.

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

No entanto, isto afasta a alterabilidade da obrigação alimentar, o que parece contrário ao


binómio necessidade/possibilidade.
Assim, a doutrina admite esta possibilidade, mas, atendendo à indisponibilidade e
irrenunciabilidade do direito de alimentos, isto não é possível na sua forma pura; ou seja,
é admitido, mas não vem determinar que, no futuro, se um cônjuge que estiver em total
situação de vulnerabilidade económica não nasça uma nova obrigação de alimentos,
atendendo à situação de extrema necessidade de um e de possibilidade do outro.
Atendendo a esta indisponibilidade, nunca poderá ser inviabilizada a constituição de uma
nova obrigação, diferente da obrigação de alimentos.
A simples menção do princípio geral que enforma a chamada jurisdição voluntária – o
princípio de que as decisões podem ser alteradas com base em circunstâncias
supervenientes – art. 988.º, número 1, do C. de P. Civil – bastaria para sustentar a
modificabilidade dos regimes de obrigação de alimentos concretamente estabelecidos.
Tratando-se de uma dívida de valor, os alimentos devem poder ser, também, alterados
com base na alteração do valor da moeda.
Nota: O direito francês e italiano determinam que a sentença tenha uma cláusula de
atualização automática, sendo que só é preciso recorrer a tribunal quando essa produza
um resultado injusto por desconsiderar as possibilidades do devedor e as necessidades do
credor. O Supremo Tribunal de Justiça decidiu que não deveriam existir estas cláusulas,
porque poderiam levar a um aumento acima das possibilidades, devendo ser admitidas
apenas por acordo. Guilherme Oliveira percebe a preocupação, mas considera que poderia
existir economia de esforços que justificasse.
Modo de estabelecimento dos alimentos
1. Alimentos Provisórios
• Podem constar de divórcio por mútuo consentimento homologado pelo
conservador – art. 1776.º, número 1;
• Podem ser requisitados pelo juiz, por sua iniciativa, em qualquer fase do
processo de divórcio sem consentimento – art. 931.º do C. de Processo
Civil;
• Também podem ser requeridos como providência cautelar especificada,
depois da sentença do divórcio, quando a necessidade surja de
circunstâncias posteriores e o requerente promova a ação principal para
obter alimentos definitivos;
• Assim, o pedido pode preceder o pedido de alimentos definitivos – artigo
399.º e seguintes do Código de Processo Civil.
2. Alimentos Definitivos
• Acordo entre ex-cônjuges, não sendo mais que um negócio jurídico entre
eles – artigo 2014.º do C. Civil;
• Acordo estipulado pelo juiz em processo de divórcio sem consentimento
– artigo 931.º;

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

• Decisão do tribunal em processo acessório de divórcio sem consentimento


ou em processo comum autónomo, quando a necessidade de alimentos
surgiu posteriormente à dissolução do casamento.

Causas de cessação da obrigação alimentar


O artigo 2019.º enuncia as razões pelas quais, entre cônjuges e ex-cônjuges cessa o direito
a alimentos: se o alimentado contrair novo casamento – mesmo que se comprovasse que
o novo cônjuge é muito pobre, não releva a análise das possibilidades económicas no
novo cônjuge –, iniciar união de facto ou comportamento moral do credor que o torna
indigno do benefício.
Em relação ao caso da união de facto, mesmo que não haja dever assistencial, é certo que
faz parte da definição da união de facto a partilha de recursos entre os seus membros e a
omissão desta referência implicaria um desfavor ao casamento – isto é contrário às
pretensões do legislador, que quer promover não a união de facto, mas o casamento.
Nota: Uma questão que pode suscitar dúvidas é a de saber se, ao avaliar as possibilidades
do devedor, o tribunal deve incluir os bens que não deem rendimento, de tal modo que o
titular possa sentir a necessidade de os alienar, para cumprir a obrigação à custa do capital
ou para adquirir novos bens que produzam rendimentos. O prof. Antunes Varela chamava
à atenção para o problema e entende que a solução foi entregue ao prudente arbítrio do
julgador.
O comportamento moral obedece a um critério de razoabilidade que deve ser preenchido
casuisticamente em função de comportamentos contrários à ética e à moral. De acordo
com o professor Antunes Varela, há causa de cessação quando o comportamento seja de
tal ordem que torne inexigível ao devedor a continuação do encargo em função de um
critério objetivo de razoabilidade.
O artigo 2013.º prevê três causas especiais de cessação da obrigação:

• Morte do obrigado ou do alimentado, não se justificando a transmissão de uma


obrigação pessoal que nasce por virtude de um vínculo de casamento;
• Quando aquele que os presta não possa continuar a prestá-los ou aquele que os
recebe deixe de precisar deles;
Qualquer situação de não verificação do binómio irá determinar uma cessação da
obrigação. Este artigo deve ser conjugado com o art. 2016.º - A , número 2, onde se prevê
um conflito entre obrigações de alimentos e um direito de preferência, devendo sempre
atender-se às outras obrigações alimentares que existem.

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

• Quando o credor viole gravemente os seus deveres para com o obrigado – aqui,
não fará sentido falar de deveres conjugais, porque estes já cessaram. De acordo
com o número 2, a morte do obrigado ou a impossibilidade de este continuar a
prestar alimentos não priva o alimentado de exercer o seu direito em relação a
outros, igual ou sucessivamente onerados.

REGIMES DE ADMINISTRAÇÃO DE BENS


O regime de bens é o conjunto de regras que define a administração de bens do casal,
falamos sempre de propriedade – exclusiva ou de comunhão. As cláusulas de convenção
antenupcial que afrontem a lei são nulas e têm-se por não escritas. A invalidade da própria
convenção implica a aplicação do regime supletivo, no caso de todas as cláusulas serem
nulas – o legislador receava que se plasmasse, na prática, o regime anterior de conferir a
administração de todos os bens ao marido.
Nota: Pode haver cedência de direitos de administração através de mandato, que é
livremente revogável – artigo 1678.º, número 2, alínea g) e 1170.º, número 1.

Há tantos regimes de administração de bens quantos as partes consigam idealizar. Pode


escolher-se um regime típico ou atípico – de acordo com o art. 1698.º, existe liberdade de
estipulação quanto ao regime de bens escolhido pelas partes.
Caso as partes não escolham, não celebrando uma convenção antinupcial, necessária para
escolher um regime de bens, o regime de bem supletivo é a comunhão de adquiridos, à
luz do artigo 1717.º do Código Civil. Sempre que nada se diga, é a este regime que se
recorre.
Bens Próprios
Nada obsta a que os dois cônjuges administrem um bem próprio de qualquer deles, desde
que o dono tenha concedido poderes de administração ao seu cônjuge, por mandato – se
é permitido ceder a totalidade dos poderes de administração, também é lícito ceder partes
deles, instaurando uma coadministração sobre um bem próprio.
Um dos cônjuges pode administrar bens do outro: quando se trate de moveis que, embora
pertencentes ao outro cônjuge, são exclusivamente utilizados como instrumento de
trabalho pelo cônjuge administrador (alínea e)); no caso de ausência ou impedimento do
outro cônjuge (alínea f)); quando o outro lhe confira, por mandato revogável, poderes de
administração (alínea g)) – artigo 1678.º.
Bens Comuns
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Direito da Família Matilde Diogo Alves

Verifica-se a concessão de poderes de administração ordinária a qualquer dos cônjuges –


artigo 1678.º, número 3, primeira parte. Se o bem é comum e a administração cabe a
ambos, qualquer cláusula que exclua a legitimidade de um deles para a administração será
nula, nos termos do artigo 1618.º, número 2.
Este regime pode levar a que cônjuges desavindos vendam a mesma coisa a pessoas
diferentes – nestes casos, verifica-se a prevalência do primeiro ato e propicia que os
terceiros exijam a participação de ambos os cônjuges.
Há bens que, apesar de comuns, devem ser administrados por um dos cônjuges, de acordo
com o artigo 1678.º, número 2:

• Proventos do trabalho;
• Direitos de autor (patrimoniais porque os outros são, desde logo, incomunicáveis);
• Bens comuns que levou para o casal ou adquiriu depois do casamento a título
gratuito e dos sub-rogados em lugar deles (alínea c), p.e., um automóvel e o ato
de o levar à inspeção; parece razoável incluir os rendimentos destes bens com base
em maioria de razão quando é referido, no art. 1696.º/2/a), que manda responder
os rendimentos ao lado dos bens levados para o casal ou posteriormente
adquiridos a título gratuito, por dívidas da exclusiva responsabilidade do seu
titular;
• Bens doados ou deixados a ambos com exclusão da administração do outro; isto
é diferente de uma cláusula de incomunicabilidade: aqui, o bem até pode ser
comum, mas a única pessoa com poderes de administração será a pessoa cuja
administração não foi excluída;
• Bens móveis comuns por ele exclusivamente utilizados como instrumento de
trabalho: nestes casos, pode tomar sozinho decisões que podem ser de
administração extraordinária ou disposição, p.e., A compra um computador antes
da celebração do casamento e, depois deste, o computador é usado exclusivamente
por B – os poderes de administração são de B.
Nota: Um cônjuge não pode fazer de um bem comum um bem próprio da atividade, tal
requer acordo.

• Todos os bens do casal se o outro cônjuge se encontra ausente ou impedido de


administrar (bens próprios e comuns, por maioria de razão); e só se tal poder não
tiver sido conferido a um terceiro;
E se se disser na convenção antinupcial que a única pessoa com poderes de administração
é um dos cônjuges, quid iuris? Recorrer aos artigos 1698.º e 1699.º e concluir que esta
cláusula derroga a norma do artigo x ??? e, por isso, não será de admitir. Na verdade,
deviam ser ambos disjuntamente ou conjuntamente, consoante o ato fosse de
administração ordinária ou extraordinária. Uma cláusula assim ter-se-á por não escrita
nos termos do artigo 1689.º, número 2.

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

• Todos os bens do casal ou parte deles se o outro cônjuge conferir, por mandato
revogável esse poder; norma trata só bens próprios, mas, por maioria de razão,
devem ser incluídos os bens comuns.
Não se admite a cedência por convenção, somente por mandato. Pode o mandato ser
oneroso? Por regra, pode, mas o art. 1714.º, número 2, proíbe a compra e venda entre
cônjuges e, por interpretação analógica, todos os negócios jurídicos onerosos entre
cônjuge.
Os poderes do cônjuge administrador vão para além da mera administração, como
demonstrado pelo art. 1682.º, número 2, abrangendo poderes de disposição dos móveis
comuns ou próprios do cônjuge administrador.
No que toca à responsabilidade pelo exercício da administração (????):
Quando o cônjuge tem o poder, por força da lei, de administrar bens que não são seus, o
administrador não é obrigado a prestar contas da sua administração e só responde pelos
atos intencionalmente praticados em prejuízo do casal ou do outro cônjuge, assim, com
dolo, à luz do artigo 1681.º, número 1, com o objetivo de evitar litigiosidade. No entanto,
quando se tratar de administração por mandato, não é preciso que haja dolo.
De um modo geral, pode dizer-se que o administrador de bens comuns ou de bens próprios
do outro cônjuge é obrigado a prestar contas da sua administração, por aplicação das
regras do mandato – artigo 1681.º, números 2 e 3, e artigo 1161.º, alínea d). A única
diferença que a lei estabeleceu resulta da parte final do número 2 do art. 1681.º: o
administrador só é obrigado a prestar contas e a entregar o saldo dos últimos cinco anos,
por não ter contabilidade organizada.
Assim, responde pelos atos e omissões nos termos em que um mandatário responde:

• Responde como possuidor de má-fé pela deterioração da coisa perdida, mesmo


que tenha agido sem culpa (1269.º);
• Deve restituir os frutos que não colheu, mas que o proprietário diligente poderia
ter colhido;
• Perda de benfeitorias voluptuárias.
Ver esta questão no livro
Quando a administração seja ruinosa a ponto de o cônjuge não administrador correr o
risco de perder o que é seu, dá-lhe ainda a lei a faculdade de requerer a simples separação
judicial dos bens, nos termos dos artigos 1767.º.
Não pode um cônjuge nomear um terceiro como administrador nos casos em que o outro
cônjuge deixa de ter interesse na administração do estabelecimento próprio ou comum,
nem pode assumir diretamente.
Admissibilidade do mandato

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

• Os professores Guilherme Oliveira e Pereira Coelho, defendem que a


imperatividade do regime não exclui que o cônjuge ceda ao outro a administração
sobre bens próprios ou comuns desde que por mandato, que é revogável. O que o
legislador quis proibir foi a vinculação do cedente até à revogação por mútuo
consenso, impossível por imutabilidade ou falta de colaboração.
Assim, o artigo 1681.º, número 3, trata os casos em que os bens são próprios do outro
cônjuge e não existe mandato.
Se existir conhecimento e não existir oposição expressa, basta a prestação de contas e a
entrega do saldo no período de três anos – condição diferente do que aquela prevista
quando se fala de um outro qualquer terceiro.
Se houver oposição expressa, o cônjuge administrador responde como possuidor de má-
fé – artigos 1269.º, 1271.º e 1275.º: responde pela perda ou deterioração da coisa, tem de
restituir os frutos e responder pelo valor dos que não recebeu por não ter sido diligente e
perde as benfeitorias voluptuárias.
Conceito de “Ato de Administração Ordinária”
O professor Manuel de Andrade entende que são atos de administração ordinária os que
correspondem a uma gestão patrimonial limitada e prudente, em que não são permitidas
operações arrojadas ou perigosas que podem ocasionar graves prejuízos para o património
administrado.
Os professores Antunes Varela e Pires Lima, apelam ao conceito de benfeitoria do art.
216.º e consideram que os atos de administração ordinária são os que se traduzem na
conservação do bem (benfeitorias necessárias), como prover a conservação dos bens ou
promover a sua frutificação normal, como, p.e., pintar uma casa ou fazer a apanha de
azeitonas.
O acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 2007 enuncia a noção de Manuel de
Andrade: a remodelação de uma casa será extraordinária porque será uma melhoria ou
alteração não necessária do estado da casa, no entendimento de Antunes Varela, e uma
gestão não prudente e limitada, porque exige um sacrifício patrimonial avultado, no
entendimento do professor Manuel Andrade.
Como é prestado o consentimento?
O consentimento deverá, primeiramente e ao abrigo do art. 1684.º, ser individualizado. O
que sucede se não houver consentimento e, mesmo assim, o apartamento ser remodelado?
O artigo 1687.º não prevê sanção para os casos de ausência de consentimento para os atos
extraordinários de um bem comum. Há quem entenda que não se pode interpretar de
forma extensiva uma norma excecional, devendo aplicar-se a nulidade; mas, surge uma
grande crítica a isto: a nulidade é muito grave no casamento e nem a venda da casa de
morada de família leva a tal sanção.
Assim, entende a doutrina maioritária e a professora Rosa que deve ser aplicado o regime
da anulabilidade, como manda o art. 1687.º, número 1.

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

O Tribunal da Relação de Guimarães e MPA entendem que não há anulabilidade nem


nulidade, o que quer dizer que o ato será ineficaz quanto ao cônjuge que não consentiu –
sanção é ineficácia.
Poderes do Cônjuge Não Administrador
De acordo com o artigo 1679.º, o cônjuge que não tem administração dos bens não está
inibido de tomar providências a ela respeitantes, se o outro se encontrar, por qualquer
causa, impossibilitado de o fazer e do retardamento das providências puderem resultar
prejuízos – visam-se aqui os casos de impedimento ou impossibilidade temporária,
ficando o cônjuge não administrador com poderes de administração, mas só para efeito
de poer requerer as providências a que se refere o artigo.

Ilegitimidades Conjugais
Cada um dos cônjuges não pode, sem o consentimento do outro:
1. Alienar bens imóveis, próprios ou comuns – art. 1682.º/1/a)
Tem sido entendido que o contrato-promessa de alienação não carece de consentimento
de ambos os cônjuges – o contrato-promessa celebrado por um só cônjuge só o vincula a
ele e por isso o cônjuge jamais estará obrigado a ressarcir danos.
2. Oneração de bens imoveis, próprios ou comuns, através da constituição de direitos
reais de gozo ou de garantia, e ainda de dar arrendamento a esses bens ou
constituir sobre eles outros direitos pessoais de gozo – art. 1682.º-A/1/a)
Isto pode significar perda de valor do bem por restrição das faculdades do direito e a
constituição de direitos reais de garantia pode culminar com a perda do bem. Além disso,
o exercício dos direitos do arrendatário também provoca a privação das faculdades do
proprietário e direitos pessoais de gozo. O prof. Antunes Varela considera que a
estabilidade do arrendamento faz com que se justifique a sua presença na norma.
Pode haver hipoteca judicial sobre um bem próprio para garantia de pagamento de uma
dívida desse cônjuge. Também pode haver hipoteca judicial sobre bem comum, mas deve
recair sobre um dos bens comuns que respondam pela dívida ao mesmo tempo que os
bens próprios.
3. Alienar o estabelecimento comercial, próprio ou comum – art. 1682.º-A/1/b)
A circunstância de se tratar de um bem móvel podia integrá-lo no grupo de bens alienáveis
pelo cônjuge administrador, sem o consentimento do outro. Mas a sua importância é de
tal avulto que pareceu razoável exigir-se, para a sua alienação, o consentimento dos dois
cônjuges, quer o bem seja comum, quer seja próprio de algum deles.
4. Onerar ou locar o estabelecimento comercial próprio ou comum – art. 1682.º-
A/1/b)

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

Pelas mesmas razões, mas fazer nota de que não se proíbe a constituição de outros direitos
pessoais sobre o estabelecimento.
5. Alienar a casa de morada de família – art. 1682.º-A/2
O fundamento disto é a defesa da estabilidade da habitação familiar no interesse dos
cônjuges e, eventualmente, dos filhos, no decurso da vida conjugal. Segundo as regras
comuns, sendo os cônjuges casados no regime de separação, o cônjuge proprietário da
casa de morada de família podia livremente vendê-la, doá-la, etc., sem o consentimento
do outro cônjuge e com prejuízo do interesse deste e, eventualmente, dos filhos.
Restringe-se isto à residência principal da família ou, também, à habitação secundária? A
defesa do quadro de vida da família contra a decisão unilateral de um dos cônjuges levará
a estender o regime à residência secundária que o agregado utilize regularmente.
Por outro lado, a natureza de restrição do direito comum e das faculdades normais do
proprietário que este este regime significa, pode levar a reduzi-lo ao mínimo, isto é, a
aplicá-lo apenas à residência principal da família.
Deverá entender-se que a “casa de morada de família” manterá esta qualificação se for e
enquanto for “residência de família”, fixada nos termos do art. 1673.º. Só o deixará de ser
se os cônjuges acordarem, expressa ou tacitamente, na alteração da sua residência ou se
o tribunal fixar uma nova residência a requerimento de algum. Também deixará de existir
casa de morada da família, manifestamente, se os cônjuges resolverem separar-se e
abandonarem um e outro a casa onde moravam. Também é óbvio o desaparecimento da
casa de família na hipótese de separação de pessoas e bens.
Se houver separação de facto, se um dos cônjuges reside na casa, o direito de habitação
continua a ser seu.
6. Onerar a casa de família através da constituição de direitos reais de gozo ou de
garantia e ainda a dar de arrendamento ou constituir sobre ela outros direitos
pessoais de gozo;
A casa de família não está protegida contra penhora e grande influência do direito
constitucional à habitação – art. 65.º da Constituição.
7. Dispor do direito ao arrendamento da casa de morada de família – artigo 1682.º-
B
Assim, não é livre o ato individual de resolução ou denúncia, de revogação por mútuo
consentimento, de cessação da posição de arrendatário, de subarrendamento ou
empréstimo.
8. Alienar os móveis, próprios ou comuns, utilizados conjuntamente pelos cônjuges
na vida do lar – artigo 1682.º, número 3, alínea a)
Tanto a utilização indispensável como a útil ou supérflua é proibida. O conceito de recheio
da casa está previsto no art. 2103.º e pretende proteger a integridade do recheio.

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

Nota: A menção à utilização conjunta por ambos os cônjuges não pretendeu, certamente,
excluir os bens móveis utilizados exclusivamente pelos filhos ou por outros familiares
que os cônjuges tenham a seu cargo – camas, mesas de estudo, etc. Não tem de estar em
causa, também, uma utilização estritamente conjunta. Importa somente que esses bens
pertençam ao quadro normal da vida familiar.
9. Alienar os móveis, próprios ou comuns, utilizados conjuntamente pelos cônjuges
como instrumento comum de trabalho – artigo 1682.º, número 3, alínea a)
No entendimento dos profs. Antunes Varela e Pires de Lima, deixa de existir razão para
aplicação desta norma quando os bens se inutilizarem e deixarem de ser aptos para o fim
ao qual se destinavam.
10. Alienar os seus bens móveis e os bens imóveis comuns, se não for ele a
administrá-los – art. 1682.º, números 2 e 3, alínea b)

11. Repudiar heranças ou legados


O repúdio por um dos cônjuges significaria uma perda de património equivalente a
qualquer outra perda económica. Ambos os cônjuges estão, também, interessados, quer o
bem integre o património comum (1732.º), quer se integra no património do cônjuge
chamado (art. 1722.º, número 1, alínea b)). Neste caso, o cônjuge do chamado participará
em metade dos frutos dos bens – art. 1728.º, n1 e 1733.º, n2.
Qualquer um dos cônjuges pode, também, aceitar doações, heranças ou legados, sem o
consentimento do outro – art. 1683.º, número 1. A aceitação, no nosso ordenamento
jurídico, não faz correr perigo, já que os encargos são limitados à força da liberalidade.

Consentimento Conjugal – Continuação


Como supramencionado, deve ser um consentimento especial para cada um dos atos,
exigindo uma ponderação e reflexão em relação a cada um, exclusivamente – art. 1684.º,
número 1 – e podendo ser tácito ou expresso.
Requer a forma exigida para a procuração, ou seja, a forma exigida para o respetivo
negócio ou ato jurídico – art. 1684.º, número 2 – a forma exigida para o consentimento
para compra a venda de imóveis deve ser escritura particular. São exigidas as mesmas
formalidades para a revogação.
A autorização do cônjuge pode ser revogada enquanto o ato para que foi concedida não
tiver começado; se este já tiver tido começo de execução, o cônjuge só poderá revogar
reparando qualquer prejuízo de terceiro que resulte da revogação.
O efeito da autorização é a validação dos atos que o outro cônjuge praticar, no caso de
este não ter legitimidade para estes. Quando o outro cônjuge já tinha legitimidade para
praticar o ato, o efeito da autorização é o de responsabilizar o cônjuge que a concede.

59
Direito da Família Matilde Diogo Alves

O suprimento do consentimento não serve quando o cônjuge que pretenda atuar possa
praticar validamente o ato que esteja em causa, embora com efeitos jurídicos diferentes
dos que o ato teria se fosse praticado por ambos. Também não atende aos cônjuges que
queiram praticar atos que não lhes dizem respeito, como alienar um bem do outro cônjuge.
É admitido no caso de impossibilidade ou injusta recusa, cabendo ao autor não só a prova
da recusa ou da impossibilidade, mas também a da vantagem ou da necessidade da
realização do ato.
Os atos feridos de anulabilidade levam à anulabilidade: como anuláveis, deverão
considerar-se igualmente as alienações de móveis comuns feitas ao cônjuge não
administrador, mas nunca depois de decorridos 3 anos desde a celebração do negócio. É
admitida a confirmação nos termos gerais.
Em casos de atos ilegítimos sobre móveis não sujeitos a registo, vigora uma tutela
semelhante à que protege o adquirente de boa-fé em caso de ato nulo. Diz Antunes Varela
que, aqui, se sacrificam os interesses do cônjuge alienante em face dos interesses do
adquirente.

Regimes de Administração de Bens – Continuação


Os bens levados para o casamento presumem-se bens próprios do cônjuge. Assim, são
bens próprios aqueles que cada um tenha no momento da celebração do casamento – art.
1722.º. Estes bens não vão integrar a comunhão de bens – regime supletivo. Se houver
doação antes do casamento, o bem também é próprio, pela alínea a).
Também são próprios os bem que advierem por doação ou sucessão durante o casamento,
por não resultarem de esforço conjunto – alínea b).
Dita a alínea c) que são bens próprios os adquiridos durante o casamento por virtude de
direito próprio anterior, p.e., usucapião, bens comprados antes do casamento com reserva
de propriedade, bens adquiridos face a direito de preferência constituído antes do
casamento, situações de contrato-promessa com eficácia real, etc.
Caso do direito de preferência:
Mesmo que haja direito de preferência, se esse não foi o meio através do qual se adquiriu
a coisa, então isto em nada é relevante, pelo quem dependendo do regime de bens, este
será, à partida, um bem comum, por ter sido adquirido por bens comuns. Não é isto, no
entanto, que consta do artigo, segundo o qual sempre que houvesse direito de preferência,
o bem seria próprio.
O Supremo Tribunal de Justiça determinou que, sempre que intervenham ambos os
cônjuges e haja intervenção do património de ambos, devem considerar-se bens comuns,
fazendo-se uma interpretação restritiva.

60
Direito da Família Matilde Diogo Alves

Caso de contrato promessa com eficácia real:


De acordo com os profs. Guilherme Oliveira e Pereira Coelho, este só seve para os efeitos
do art. 1722.º sempre que tenha eficácia real, porque a eficácia real confere um direito a
executar o contrato e, por isso, este é adquirido, em virtude dessa tutela real. Quando a
eficácia é meramente obrigacional, não estando o art. pensado para direitos de crédito,
não poderá o bem tornar-se num bem próprio.
Caso de cláusula de reserva de propriedade:
O bem será próprio mesmo que adquirido com bens comuns, mas há direito a
compensação, nos termos da ideia de esforço comum.

São bens próprios o produto do trabalho – salário, rendimentos e vencimentos – e bens


adquiridos pelo cônjuge durante a constância do matrimónio que não sejam executados
por lei. Os prémios que não sejam fortuna ou azar, sendo produto do trabalho de um dos
cônjuges, é bem comum.

O artigo 1723.º prevê o caso de sub-rogação de bens que vêm ocupar o lugar dos bens
próprios que são também bens próprios, seja por troca direta, p.e., um T2 trocado por
outro T2, seja por aplicação do preço dos bens alienados (al. c)).
Neste artigo, surge enunciado que conservam a qualidade de bens próprios os adquiridos
com valores próprios desde que a proveniência esteja devidamente comprovada no
documento de aquisição com intervenção de ambos os cônjuges. O Supremo Tribunal de
Justiça veio pronunciar-se sobre o primeiro pressuposto, tendo dito que, sempre que
estejam em causa interesses apenas do cônjuge, é possível fazer prova da titularidade e,
desta forma, fazer ingressar o bem na esfera da titularidade do cônjuge e não da
comunhão, mesmo que tal não conste no título de aquisição, isto porque a rácio do
preceito seria a tutela dos interesses de terceiros. Antunes Varela, Pires Lima, Rita Lobo
Xavier e Cristina Dias consideram a interpretação literal.
Exemplo: A adquiriu, por doação, um imóvel. Vendeu esse imóvel e comprou um novo
imóvel. Este bem é próprio ou comum?
Se o adquiriu por doação durante o casamento, é, à luz do art. 1722.º, alínea b), um bem
próprio. Antes do casamento, também – alínea a). Importa determinar se, depois do
investimento, o bem é próprio – só se fizer constar a proveniência do dinheiro no
documento de aquisição e com intervenção de ambos os cônjuges – art. 1723.º, alínea c).
O Supremo Tribunal de Justiça diz que é possível provar a proveniência do dinheiro se
aquela decisão respeitar única e exclusivamente aos cônjuges e não tiver efeitos em
relação a terceiros. Nas relações entre cônjuges, é possível provar que a titularidade do
dinheiro é um bem próprio, diferente do que estabelece a alínea, que determinaria isto
como um bem comum.

61
Direito da Família Matilde Diogo Alves

De acordo com o artigo 1726.º, serão bens próprios os que sejam adquiridos em parte com
valores próprios e em parte com valores comuns, desde que o valor dos bens próprios seja
superior. O bem adquire a natureza da maior prestação.
Dita o artigo 1727.º que são também bens próprios os bens indivisos adquiridos, em parte,
por um dos cônjuges, quando já detinha outra parte. Mesmo adquirida na constância do
matrimónio, considerar-se-á bem próprio do cônjuge adquirente a parte adquirida, como
acontece, p.e., com a herança indivisa.
São, de acordo com o art. 1728.º, também, bens próprios, os adquiridos por virtude da
titularidade de bens próprios e que não possam considerar-se frutos destes – porquanto,
os frutos serão bens comuns.
São bens próprios os bens incomunicáveis no âmbito da comunhão geral, ao abrigo do
artigo 1733.º. Embora não esteja previsto na comunhão de adquiridos, entende-se de
forma unanime que isto se aplica na comunhão de adquiridos. Os argumentos para defesa
de tal são dois:

• Maioria de razão: Se o art. 1733.º torna incomunicáveis na comunhão geral, tal


terá de se verificar também, necessariamente, na comunhão de adquiridos, que,
tendencialmente, comunica “menos” que a outra. Havendo uma proibição de
comunhão no âmbito da comunhão geral, tendo presente que a comunhão de
adquiridos partilha menos do que a comunhão geral, faz sentido que aquilo que
não se partilha no âmbito da comunhão geral também não se partilha na comunhão
de adquiridos:
• Artigo 1699.º, que determina que não pode ser objeto de convenção antenupcial a
comunicação – o legislador proíbe a comunhão dos bens do art. 1733.º.
Os bens incomunicáveis estão previstos no artigo 1733.º.
Excluem-se, também, da comunhão, os bens doados pelos cônjuges um ao outro e pelos
esposados um ao outro – artigos 1764.º/2 e 1757.º.
O produto do trabalho dos cônjuges é comum (alínea a)) e uma casa adquirida pelos
cônjuges é um bem comum.

COMUNHÃO GERAL
Dita a comunhão geral de que são comuns os bens presentes e futuros dos cônjuges que
não forem excetuados por lei – comunicabilidade. Assim, serão bens comuns todos os que
não forem excluídos por lei. Isto exige escolha, através de convenção antenupcial. Serão,
assim, comuns todos os bens dos cônjuges, salvo aqueles que, pela sua natureza, o
legislador conferiu o estatuto de bens incomunicáveis.
Para fazer valer a sua vontade em comunhão geral, os cônjuges terão de optar, em
convenção antenupcial, pelo regime da comunhão geral de bens.
62
Direito da Família Matilde Diogo Alves

Nota: Esta comunhão está vedada a quem já tenha filhos de relações anteriores, ao abrigo
do artigo 1699.º/2 – ideia é de proteger a legítima expectativa de filhos que nasceram de
relações anteriores, sendo proibida a comunicabilidade do art. 1722.º. Surge a discussão:
e se os filhos forem de ambos os cônjuges? A alínea está claramente pensada para filhos
de casamentos anteriores, tendo-se vindo a excluir a aplicação da alínea quando os filhos
sejam de ambos os cônjuges nubentes.
Sendo os bens incomunicáveis, a comunhão está vedada e a cláusula através da qual se
escolha comunhão geral é nula. Todos os casamentos que ocorreram até 31 de maio de
1967 foram celebrados ao abrigo da comunhão geral de bens, já que esse era o regime
supletivo, só depois passando a ser a comunhão de adquiridos.
São aplicadas a este regime as regras da comunhão de adquiridos que não o contrariem,
como, p.e., as normas sobre sub-rogação e aquisição com bens próprios e bens comuns.
Quais os bens comuns?

• Todos os que não sejam excetuados por lei;


• Normas respeitantes aos bens indivisos;
• Regra da metade do artigo 1730.º;
• O produto de trabalho dos cônjuges – art. 1732.º a contrario – e sempre seria
porque o produto de trabalho dos cônjuges também é partilhado no âmbito da
comunhão de adquiridos.

Quais os bens excetuados por lei? De acordo com o artigo 1733.º,

• Bens doados o deixados por conta da legítima com cláusula de


incomunicabilidade – quando o doador declara que não pretende que o bem
integre a comunhão, independentemente do regime –, tendo isto como
fundamento o respeito pela liberdade do testador/doador;
• Bens doados ou dedicados com cláusula de reversão ou cláusula fideicomissária;
estas cláusulas destinam-se a evitar que, em virtude da morte do beneficiário,
apenas metade da doação pudesse reverter para o doador ou fideicomissário,
enquanto a outra metade pertenceria a pessoa distinta;
• O usufruto, o uso ou a habitação e demais direitos estritamente pessoais, como é
o caso dos direitos morais de autor, por contraposição aos direitos patrimoniais de
autor, e dos direitos intuitu personae; p.e., em comunhão geral, o dinheiro que
fosse recebido pela publicação de um livre seria comum, mas as decisões seriam
direitos próprios;
• Indemnização por factos verificados contra a pessoa;
Importa salientar, aqui, a discussão existente relativamente às situações em que a
indemnização surge como meio de reparação de uma incapacidade de auferir salário ou
de uma perda salarial, caso em que se deverá ponderar a comunhão de tais montantes,

63
Direito da Família Matilde Diogo Alves

dado que se destinam a substituir o salário que deixou de ser auferido. Na comunhão
geral, o salário é um bem comum.
Nota: O artigo 1722.º não é aplicável na comunhão geral de bens porque, em sede de
comunhão geral, querem-se incluir mais coisas.

REGIME DA SEPARAÇÃO DE BENS


A regra geral associada à separação de bens é que cada um dos cônjuges conserva o
domínio e a fruição de todos os bens presentes e futuros, por inexistência de comunhão.
Há casos em que é obrigatória a separação de bens – artigo 1720.º, como o caso de
inexistência de processo preliminar como, p.e., quando é um casamento urgente, ou idade
superior a 60 anos, por se entender que, a partir dessa idade, as pessoas não são capazes
de determinar qual regime de administração de bens querem.
Compropriedade no âmbito da separação de bens
Pode haver compropriedade, apesar de haver separação de bens. Se os cônjuges
comprarem algo em compropriedade, há compropriedade, mas não comunhão. Assim,
ainda que não haja comunhão, tal não significa que os cônjuges não possam adquirir bens
conjuntamente, ao abrigo do regime geral de compropriedade – art. 1403.º. A lei presume
a compropriedade dos bens móveis, quando haja dúvidas quanto à sua titularidade,
conforme resulta do art. 1736.º do Código Civil.
O bem próprio de cada um dos cônjuges é a sua quota na compropriedade.
É difícil de provar quem comprou coisas como toalhas de mesa, p.e., por isso, a lei
presume que tal foi comprado em compropriedade – art. 1736.º, número 2. No entanto,
esta presunção só “vale” para bens móveis.

CASAMENTO CATÓLICO
o a dispensa do casamento rato e não consumado no direito canónico
• casamento entre batizados e entre parte batizada e não batizada: podem ser
dissolvidos pelo Romano Pontífice por justa causa, a pedido de ambas as
partes ou de só uma delas, mesmo contra a vontade da outra
• é indiferente a causa da não consumação (impotência, pacto contra bonum
prlis)
• a consunção presume-se até prova em contrário se, celebrado o
casamento, os cônjuges tiverem coabitado
• têm sido invocadas como justas causas de dispensa a impotência
superveniente ou uma doença que não consinta cópula ou a aversão entre
cônjuges ou a circunstância de um dos cônjuges ter contraído casamento
civil com outra pessoa

64
Direito da Família Matilde Diogo Alves

o a não consumação do matrimónio e a justa causa são assim as duas condições


requeridas para ser concedida a dispensa
• o processo de dispensa está previsto nos cânones
o a dispensa no direito português
• é o artigo 1625º que não foi revogado pela CRP nem pela nova concordata
que permitem isto mesmo – produção de efeitos civis
• envio ao tribunal da relação para revisão e conformação, devendo verificar
o preenchimento das condições – não se trata de um juízo contencioso,
sendo muito fácil!
o produz os mesmos efeitos que a dissolução do casamento – efeitos civis ex nunc
e não ex tunc
• não é equiparável à nulidade porque resolve um vínculo validamente
constituído e que produziu os seus efeitos até ao momento da dispensa
• deve este casamento ter-se por dissolvido por uma causa não imputável a
nenhum dos cônjuges
• STJ disse que a dispensa corresponde à anulação, para efeitos civis e por
isso o artigo que se aplica quanto á obrigação de alimentos é o 2017
▪ GO não concorda, defendendo a aplicação do artigo 2016/1/c) por
analogia

RESPONSABILIDADE POR DÍVIDAS


Como é averiguada a responsabilidade por dívidas?
1. Definir a titularidade:
• Há convenção antenupcial? É válida?
• É bem próprio ou comum?
• Embora a titularidade seja da vontade dos cônjuges, a professora MPA
defende que a titularidade deve ser aferida em primeiro lugar;
2. Regras de administração de bens:
• Artigo 1678.º;
• Se for um bem próprio, regra do artigo 1678.º (cada cônjuge tem a
administração dos seus bens próprios) e exceção do número 2, que prevê
casos em que um bem próprio pode ser administrado por ambos;
• Se for um bem comum:
o Se for ato de administração ordinária, a regra é a prevista no artigo
1678.º, número 3 – cada um tem legitimidade para a prática de atos
sem consentimento;
o Se for um ato de administração extraordinária, dita a segunda parte
do art. 1668.º, número 3, que carece de consentimento;

65
Direito da Família Matilde Diogo Alves

o Diferença entre ato de administração ordinária e ato de


administração extraordinária:
▪ Antunes Varela recorre ao regime das benfeitorias e
entende que só as necessárias são atos de administração
ordinária;
▪ Manuel de Andrade fala em largos voos, critério
pecuniário, do valor avultado, aferido casuisticamente
quanto a cada família;
o Exceções no artigo 1678.º, número 2;
3. Atos de alienação ou de disposição?
• Artigos 1682.º (bens móveis) e 1682.º-A (bens imóveis)
o Quanto a bens imóveis, há que distinguir se estamos no regime de
separação de bens ou de comunhão:
▪ Regime de separação: art. 1682.º-A, número 2;
▪ Na comunhão: artigos 1682-A, números 1 e 2.

Responsabilidade por Dívidas


A responsabilidade por dívidas nada tem que ver com os regimes de bens:

• Dita o artigo 1690.º que todos têm legitimidade para contrair dívidas sem
consentimento;
• É a dívida comunicável? Artigos 1691.º e 1692.º;
o Mesmo em regime de separação de bens, se ambos os cônjuges
derem consentimento ou a dívida for em proveito do casal;
o A norma do artigo 1691.º, alínea d), é a única regra que depende
do regime de administração, distinguindo em face do regime de
casamento.
• Quais os bens que respondem? Artigos 1695.º e 1696.º;
• Se tiverem respondido bens que não deviam responder, há lugar a compensações?
Artigo 1697.º.

As normas de responsabilidade por dívidas não podem ser afastadas pelos cônjuges. Não
se poderá, por convenção antenupcial, alterar as regras das dívidas. Tem-se entendido que
as regras sobre alienação ou oneração, bem como sobre responsabilidade por dívidas, não
podem ser alteradas pelos cônjuges, em virtude do art. 1699.º, alínea c), embora este não
o exprima expressamente.
Não se podem alterar estas normas porque não estão em causa apenas interesses das
partes, mas também dos credores.

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

Por força do artigo 1714.º, vigora o princípio da imutabilidade da convenção antenupcial.


O artigo 1690.º/1, prevê o princípio da liberdade de contração de dívida.
Para determinação da responsabilidade, olhamos à data da contração, à luz do artigo
1692.º, e assim se estabelece se a dívida é comunicável ou incomunicável.
São incomunicáveis as dívidas do artigo 1691.º. Notas:

• Sobre a alínea b), não é relevante se houve consentimento ou não e importa


densificar, à luz daquela família, se aquele é um encargo normal ou não, p.e., um
empréstimo para pôr o filho numa escola privada pode não ser um encargo normal,
mas prestações automóveis, ou relativas a eletrodomésticos ou rendas da casa ou
internamentos, sim;
• Sobre a alínea c), o proveito comum não se presume, como enuncia o artigo
1691.º, número 3;
• Sobre a alínea d), se os cônjuges estiverem em regime de comunhão, mas não
separação, há presunção de que o proveito do casal é comum. Para além disso,
nos regimes de comunhão, se o cônjuge for comerciante, presume-se que a dívida
é no exercício do comércio (art. 15.º do Código Comercial), estando o outro
cônjuge obrigado a demonstrar que aquela dívida não foi em proveito comum do
casal, mas em proveito próprio.
São incomunicáveis as dívidas previstas no artigo 1692.º.
Que bens respondem pelas dívidas?

• Se a dívida for comunicável (art. 1695.º): os bens comuns e, só perante a


insuficiência, os bens próprios;
o Se bens diferentes dos previstos no art. 1695.º responderem, há lugar a um
crédito compensatório, ao abrigo do art. 1697.º.
• Se a dívida for de facto incomunicável (artigo 1696.º).

Artigo 1697.º
Se por dívidas da responsabilidade de ambos responderem bens de um, este torna-se
credor o outro. O crédito só é exigível no momento da partilha, ou seja, após o divórcio,
a não ser que vigore o regime da separação de bens. Se um bem comum do casal responder
por uma dívida incomunicável, a respetiva importância é elevada a crédito do património
comum no momento da partilha.
DIVÓRCIO
As únicas duas causas de dissolução do casamento são o divórcio e a morte – a separação
de pessoas e bens não dissolve o casamento, apenas o altera.
O divórcio está previsto nos artigos 1773.º e ss. e consiste num direito potestativo, por
não se traduzir no poder de exigir qualquer prestação ou comportamento de outrem, mas

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

de produzir determinado efeito jurídico: a dissolução do vínculo matrimonial. No entanto,


carece de ser integrado por ato de autoridade pública judicial ou administrativa.

• o direito ao divórcio é um direito pessoal


▪ relativo ao estado de certas pessoas
▪ intransmissibilidade do direito (inter-vivos ou mortis causa)
▪ NOTA: não se pode intentar uma ação de divórcio pelo cônjuge
falecido, mas pode continuar-se no seu empreendimento:
• interesse de evitar que o cônjuge sobrevivo concorra à
herança do autor de uma ação de divórcio que morra na
pendência da causa; os seus herdeiros poderão continuar a
ação que venha a decretar o divórcio;
▪ Só́ no caso de estarem ausentes do continente ou da ilha onde corre
o processo o autor e o réu podem fazer-se representar por
mandatário com poderes especiais na tentativa de conciliação em
processo de divórcio litigioso
• 1785/2 admite representação
• o direito ao divórcio é um direito irrenunciável;
▪ porque a lei quer que o cônjuge a quem pertença esse direito tenha,
sempre, a faculdade de decidir, com inteira liberdade e em face das
circunstâncias atuais, sobre a oportunidade do divórcio
▪ proteção contra precipitação
▪ admite-se, contudo, a desistência aquando de uma ação de divórcio
▪ não se admite a renúncia genérica, nem específica (quanto a um
fundamento)
▪ não se admite renúncia total nem parcial p.e. certas condições ou
com certos encargos
• discussão quanto a se o divórcio deveria ou não ser admitido – acabou
por se considerar que seria um mal menor, comparado com o mal maior
que seria os cônjuges não se divorciarem, mas viverem toda a vida
separados
• introduzido em 1910 pela lei do divórcio, que admite o divórcio litigioso
e por mútuo consentimento, sendo que os fundamentos admitidos já
eram muito semelhantes aos que se admitem hoje
▪ mas p.e. para a separação de facto, exigia-se o prazo de 10 anos
▪ esta legislação esteve em vigor até à concordata da Santa Sé, em
1940 – os casamentos católicos celebrados depois de 1 de agosto
de 1940 deixaram de se poder dissolver pelo divórcio (os cônjuges
renunciavam à faculdade civil de requererem o divórcio)
▪ consagrou o sistema de divórcio sanção, removendo as causas de
divórcio objetivas da lei do divórcio + suprimiu a possibilidade de
pedir diretamente o divórcio por mútuo consentimento, que teria

68
Direito da Família Matilde Diogo Alves

de passar pela antecâmara da separação judicial de pessoas e bens


+ permitiu ao juiz ir contra o pedido e decretar a separação mesmo
que tivesse sido pedido o divórcio
• por mútuo consentimento
▪ sem indicação da causa – divórcio por causa não revelada –
tendência de desdramatização do divórcio
▪ a lei permite às partes, em qualquer altura do processo de divórcio
sem consentimento de um dos cônjuges, convolar para o divórcio
por mútuo consentimento, e obriga o juiz a procurar o acordo dos
cônjuges para o divórcio por mútuo consentimento no caso de a
tentativa de conciliação em processo de divórcio sem
consentimento de um dos cônjuges não resultar
▪ a lei anterior exigia prazo mínimo de duração do casamento (2
anos) + que os cônjuges tivessem completado 25 anos, mas isto
não faz sentido – se têm idade para casar têm idade para divorciar,
visto que o ato de divórcio não exige mais responsabilidade
• o tempo mínimo de casamento também foi suprido
• sem consentimento do outro cônjuge
▪ assenta por regra numa violação culposa dos deveres conjugais e
rutura objetiva do matrimónio
• nunca se admite um “divórcio a pedido” – sem fundamento
expressamente previsto na lei
• diferente porque a tramitação é distinta consoante estejamos num ou
noutro.
• por mútuo consentimento – por ambos os cônjuges, de comum acordo,
▪ administrativo ou judicial
▪ na conservatória do registo civil (este é o serviço competente –
retirado dos tribunais)
▪ excecionalmente pode ser tramitado nos tribunais quando falte um
dos acordos aos quais os cônjuges têm de chegar – art. 1775/1.º -
p.e. destino da casa de morada de família ou certidão de sentença
judicial que tiver regulado o exercício das responsabilidades
parentais ou acordo sobre a prestação de alimentos ao cônjuge que
deles careça ou acordo sobre o destino dos animais de companhia
ou certidão de escritura da convenção antenupcial, se celebrada
• NOTA: é sempre necessário mencionar que não há animais
de companhia se os não houver
• e a lei condicionava o decretamento do divórcio a prévio
acordo dos cônjuges sobre o montante dos alimentos
devidos e à homologação desse acordo. O juiz ou o
conservador do registo civil homologaria o acordo sobre o
montante dos alimentos se este fosse razoável, tendo em
conta todas as circunstâncias atendíveis

69
Direito da Família Matilde Diogo Alves

• Havendo filhos menores, deviam os cônjuges entender-se


igualmente sobre a guarda dos filhos e o exercício do poder
paternal. A lei permitia-lhes várias possibilidades e os
cônjuges deviam escolher uma delas – acordo sujeito a
homologação devendo a homologação ser recusada se a
vontade dos pais não fosse genuína e autêntica ou o acordo
não correspondesse ao interesse do menor
• destino e utilização da casa de morada de família
o falar em “destino” da casa e o n.o 3 na sua
“utilização” provisória no período da pendência do
processo, não podia tirar-se qualquer argumento a
favor da inalterabilidade dos acordos sobre o
destino da casa de morada da família, questão que
trataremos adiante
▪ todos estes acordos são hoje necessários, MAS não verdadeiros
pressupostos
• enquanto no regime anterior a falta de algum dos acordos
ou a não homologação de algum deles conduzia
necessariamente ao indeferimento do pedido de divórcio,
na Lei n.o 61/2008 estas circunstâncias justificam somente
que o processo corra no tribunal, para que seja o juiz a
definir o regime que os cônjuges não conseguiram
estabelecer entre si.
▪ a conservatória não será responsável se não chegarem a acordo
quanto ao que se prevê nos artigos 1775º + 1778º;
▪ 1778º: também há remissão para tribunal quando o acordo não
acautele suficientemente os interesses do menor (sobre as
responsabilidades parentais. a conservatória solicita a alteração aos
pais, para que seja favorável, mas se os pais não alterarem então
vai para o tribunal)
• ver 1778A/3.º – o juiz só pode decretar o divórcio se
estiverem determinadas todas as consequências relativas às
questões do 1775º: alimentos, filhos menores e casa de
morada de família + animais de companhia, se os houver
• juiz terá de fixar isto como se se tratasse de um divórcio
sem consentimento. o problema é que aí não é o juiz que
tem de fixar
• esta modalidade do nº3 não funciona (divórcio por mútuo
consentimento judia) – difícil porque as pessoas querem o
divórcio na hora (que tem de ser na conservatória, mas aí é
preciso acordos). mais vale divórcio sem consentimento,
em que não se pergunta

70
Direito da Família Matilde Diogo Alves

▪ 3ª hipótese: quando no âmbito do processo chegam a acordo


quanto ao mútuo consentimento – ainda que o processo se tenha
iniciado como um processo de divórcio sem consentimento,
haverá tramitação por divórcio com consentimento mesmo que
cheguem a acordo quanto a isso
▪ instaurado pelos cônjuges ou seus procuradores (é comum que os
advogados não intervenham porque os cônjuges se dirigem à
conservatória, mas sempre que seja em tribunal pode haver
representação por procuração)
▪ é a lei 272/2001 que atribui competência à conservatória – se a
ação for intentada no tribunal, este não será competente
• sem consentimento do outro cônjuge
▪ uma ação, um contra o outro, com causa (1781º)
▪ pode conceber-se como sanção (pressuporia ato ou procedimento
culposo – haveria suprimento das causas objetivas de divórcio),
remédio (situação de crise do matrimónio – estado de vida
conjugal intolerável) ou como simples constatação da rutura do
casamento (pode ser quer o cônjuge inocente, quer o outro a pedir,
enquanto no divórcio remédio só pode ser o inocente, ainda que
não haja imputabilidade do outro)
• extinguiu-se o divórcio por culpa (sendo que segundo o
professor Pereira Coelho, isto nunca foi uma sanção)
porque haveria muitas outras sanções e o cônjuge culpado
poderia precisamente ser aquele que mais desejava esta
sanção
• Perante este quadro, pode dizer-se que o direito
português, depois de 2008, consagra um sistema de
divórcio-constatação da rutura do casamento, em que a
causa do divórcio é a própria rutura em si,
independentemente das razões que a tenham
determinado.
▪ O nosso ordenamento jurídico não admite o divórcio sem motivo
expressamente previsto na lei. Quais são as situações em que há
fundamento?

Situações em que há fundamento (artigo 1781º) – bilaterais vs. unilaterais:

• separação de facto por um ano consecutivo;


o situação em que A e B não coabitam juntamente e
não estão em partilha de mesa, leito e habitação há
em si de 1 ano (elemento objetivo)

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

o não se basta com isto – exige-se que não haja


intencionalidade de restabelecer a coabitação e
união (elemento subjetivo)
• alteração de faculdades mentais do outro cônjuge quando
dura há mais de um ano e, pela sua gravidade, comprometa
a possibilidade de vida em comum;
o há uma agravante temporal
o é necessário que a agravação comprometa a vida
em comum p.e. depressão não leva a alteração das
faculdades mentais que pela sua gravidade
comprometa a possibilidade de vida em comum
• a ausência, sem que do ausente haja notícias, por tempo não
inferior a um ano;
• quaisquer outros factos que, independentemente da culpa
dos cônjuges, mostrem a rutura definitiva do casamento,
p.e., doença infeciosa, violência doméstica física ou verbal,
bigamia, adultério, cumprimento de pena de prisão,
tentativa de homicídio familiar, abuso de álcool,
negligência grosseira relativamente ao outro cônjuge
o nenhum dos factos acima referidos releva se deles
não resultar a rutura definitiva da vida comum,
isto é, se tais factos não se demostrarem capazes de
convencer o tribunal de que os laços matrimoniais
se romperam definitivamente
• NOTA: pode ser o próprio a requerer!
▪ p.e. provar que já está a viver com outra pessoa, com a qual já tem
um filho – não é preciso estar separado dois anos (artigo 1785º)
▪ MAS tem sempre de invocar uma causa e é sempre uma ação (há
direito ao contraditório)

Efeitos do Divórcio:

• 1789º - dissolução do casamento, tal e qual como se da morte se tratasse


– efeitos ex nunc
▪ os efeitos produzem-se a partir do transito em julgado da respetiva
sentença, mas retroagem-se à data da propositura da ação quanto
às relações patrimoniais entre os cônjuges
• p.e. o cônjuge que se emancipou pelo casamento não volta
a ser menor
• Assim, p. ex., se um dos cônjuges contrai segundo
casamento entre a data da propositura da ação e a data em
que transitou em julgado a sentença de divórcio, não deixa
o casamento de ser anulável por impedimento de vínculo
matrimonial anterior não dissolvido (arts. 1601.o, al. c), e

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

1631.o, al. a)). Mas se, sendo os cônjuges casados no


regime da comunhão geral, um deles recebe uma herança
na pendência da ação de divórcio, os bens deixados não se
comunicam ao outro cônjuge, pois o cônjuge herdeiro,
graças ao princípio de retroatividade do art. 1789.o, n.o 1,
2.a parte, e se o divórcio vier a ser decretado, é havido
como divorciado, para este efeito, a partir da data da
propositura da ação
o o ex-cônjuge que detenha a administração dos bens
comuns do casal está obrigado a prestar contas ao
outro ex-cônjuge desde a data em que foi instaurada
a ação de divórcio. Servirá de exemplo, também, o
caso em que um cônjuge aliena um imóvel próprio
sem legitimidade (cfr. o art. 1682.o-A). A venda
seria inválida, mas a retroatividade vem afastar as
regras do matrimónio, sem retirar ao outro cônjuge
o direito de arguir a invalidade
o NOTA: aos terceiros, os efeitos do divórcio só
podem ser opostos a partir da data do registo da
sentença
▪ nº2: pode-se requerer que os efeitos do divórcio venham retroagir
à data da separação de facto desde que se faça prova dessa
separação, durante o processo
▪ os efeitos patrimoniais do divórcio só podem ser opostos a
terceiros a partir da data do registo da sentença
▪ cessam todos os deveres conjugais – só permanece um dever
geral de respeito
• 1790º – Partilha
▪ pode fazer-se em termos diferentes dos estabelecidos na convenção
antenupcial
• à partida faz-se de acordo com o regime de bens estipulado
(bens próprios + meação) mas 1790º
▪ vai-se dar a partilha do património do casal (faz-se na própria
conservatória ou no tribunal quando há dúvidas quanto à
titularidade)
▪ regra importante: não se poderá ver o casamento ou o divórcio
como um meio de enriquecimento patrimonial e, nesse sentido, em
caso de divórcio nenhum dos cônjuges pode na partilha receber
mais do que receberia se o casamento tivesse sido celebrado
segundo o regime da comunhão de adquiridos
▪ o património tem de ser partilhado de forma que não se partilhe
mais do que se partilharia em regime da comunhão de adquiridos
▪ Se houve uma casa herdada e os cônjuges estavam em comunhão
geral, p.e., ainda assim, no momento da partilha não se vai

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

contabilizar aquilo que seria comum na comunhão de adquiridos.


Isto parece atentar contra a ideia de imutabilidade;
▪ não deve receber “quantitativamente” – quer dizer que até se pode
partilhar a casa, desde que se subtraia o valor!!!!
▪ um deles pode ser encabeçado, tendo de devolver sob forma de
tornas
▪ se doação é a favor da comunhão, não há retirada do valor da
partilha
▪ conclusão: não implica a substituição do regime da comunhão
geral pela comunhão de adquiridos – não importam os bens, só o
seu valor.
• Artigo 1791º – Benefícios que os cônjuges tenham recebido ou hajam a
receber
▪ “Cada cônjuge perde todos os benefícios recebidos ou que haja de
receber do outro cônjuge ou de terceiro, em vista do casamento ou
em consideração do estado de casado, quer a estipulação seja
anterior quer posterior à celebração do casamento”; benefícios =
liberalidades
▪ Tudo retorna à esfera do titular inicial do bem porque há ideia de
que o casamento não é um meio de enriquecimento patrimonial e
por isso todos os benefícios são perdidos:
• isto não abrange tudo o que sejam doações conforme os
usos especiais – práticas sociais generalizadas que não
implicam, em regram, disposições de valor considerável
p.e. anel de noivado – está no âmbito dos bens que são
dados em razão de usos sociais e por isso não estão
abrangidos nestas doações
• tudo o que sejam benefício, doações ou deixas
testamentárias perdem-se (lógica de não enriquecimento
patrimonial)
• tudo o que são feitas doações feitas por terceiros em nome
do estado de casados ou pelo outro cônjuge são também
devolvidos + doações entre esposados p.e. se o outro
cônjuge fez um seguro de vida ou constituiu uma renda
vitalícia a favor do outro
• se são donativos conforme os usos sociais, não são
abrangidos (Guilherme de Oliveira) p.e. alianças são
donativos conforme os usos sociais e por isso não devem
ser retiradas aos cônjuges
• perda dos direitos sucessórios – na sucessão legítima,
legitimária e testamentária
• Artigo 1793º – Casa de morada de família

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

▪ No divórcio por mútuo consentimento, os cônjuges devem acordar


sobre o destino da casa de morada de família
▪ Quando a casa é bem comum do casal – atribuição da casa: pode o
tribunal dar de arrendamento a qualquer dos cônjuges, a seu
pedido, a casa de morada de família, quer esta seja comum quer
própri do outro, considerando, nomeadamente, as necessidades de
cada um dos cônjuges e o interesse dos filhos do casal
• Senhorio pode pedir a resolução, que vai ser ponderada
pelo tribunal – senhorio deve alegar a provar circunstâncias
que justifiquem p.e. a situação económica da mulher
melhorou
• Ao tribunal cabe definir as condições do contrato, ouvidos
os cônjuges, como diz o art. 1793.o, n.o 1; onde o contrato
for omisso, valem as regras gerais do arrendamento para
habitação. Condições que o tribunal deverá definir são
sobretudo as relativas à duração do contrato e ao montante
da renda.
o GO: quanto à fixação da renda, não deve o tribunal
ser indiferente às necessidades dos cônjuges,
limitando-se a ponderar o valor de mercado
• dar-se o arrendamento a um dos cônjuges tem sido
ponderado aquando da fixação da medida de alimentos
o Fixado o valor da renda, o cônjuge ou ex-cônjuge a
favor do qual foi constituído o direito ao
arrendamento pagará esse valor ao outro se a casa
pertencia exclusivamente a este; se a casa era bem
comum do casal ou pertencia em compropriedade a
ambos, pagará ao outro cônjuge ou ex-cônjuge
metade dessa importância.
▪ quando a própria casa é arrendada
• a transmissão do arrendamento por efeito do divórcio
(1105º) – se estiver em nome de ambos pode haver
concentração num só., se estiver em nome do cônjuge que
não fica com a casa, dá-se transmissão. o senhorio nunca
vai poder opor-se a nada disto. só vai ser notificado
oficiosamente;
• na falta de acordo, cabe ao tribunal decidir – deve ser
atribuído ao cônjuge que mais precise dela (não no intuito
de castigar o culpado nem atendendo a quem ficou em casa
– proteger o cônjuge que mais ficaria prejudicado pelo
divórcio ou separação quanto à estabilidade. rendimentos +
encargos
• Obrigação de alimentos

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

▪ é possível que seja estabelecida em virtude do divórcio uma


obrigação de alimentos
• em face das necessidades de quem haja de receber a pensão
de alimentos e de quem haja de prestar (art. 2016.º-A) –
não há necessidade de manutenção dos padrões de vida
levados pelo casal
o pode haver acordo (2014º) OU acordo entre os
cônjuges estimulado pelo juiz, em processo de
divórcio litigioso
• poderiam ser estabelecidos alimentos provisórios
(providência cautelar) – ideia de que enquanto não for
fixada a medida quantitativamente, podem-se fixar
provisórios
o no divórcio por mútuo consentimento, a lei manda
que os cônjuges acordem sobre eles e que o juiz
homologue
o sem consentimento, podem ser requeridos em
qualquer altura
o podem também ser requeridos como providência
cautelar depois da sentença de divórcio quando a
necessidade surja de circunstâncias posteriores e o
requerente promova a ação principal para obter
alimentos definitivos
▪ quem tem direito?
• qualquer um deles (tendo já sida abandonada a relevância
da culpa)
• pode o tribunal negar excecionalmente, por motivos de
equidade p.e. se um cônjuge desprezou oportunidades de
emprego + praticou todos os factos que violaram direitos
fundamentais do outro e que contribuíram para a rutura do
casamento
▪ no âmbito do divórcio por mútuo consentimento, a medida dos
alimentos pode resultar de acordo. quando divórcio sem
consentimento, pelo tribunal
▪ medida da obrigação: critério intermédio e posição razoável
acima do limiar de sobrevivência, mas não é necessário manter
o padrão de vida! – critério de solidariedade pós conjugal,
ainda que haja obrigação de autossuficiência
▪ há de ponderar as possibilidades do devedor e necessidade do
credor – 2004º - outras obrigações e necessidade de prover à sua
subsistência (2004º, 2016.º/1 e 2016.º - A)
▪ atualização de alimentos - processo de jurisdição voluntária
▪ pode renunciar-se às prestações vencidas
▪ garantias de cumprimento
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Direito da Família Matilde Diogo Alves

• Direito de indemnização (artigo 1792º)


▪ pode haver lugar a responsabilidade civil, nos termos gerais. Ou
seja: é verosímil que certos factos praticados por um cônjuge
constituam ilícitos civis, violações dos direitos de personalidade
do outro cônjuge, dignos de tutela do Direito.
▪ GO: violação de um dever geral de respeito enquanto dever
absoluto é o que fundamenta a indemnização
▪ p.e. adultério não será fonte de indemnização, mas se for
acompanhado de crueldade moral ou publicidade, sim.

Crises Matrimoniais

Englobam uma modificação da relação matrimonial: separação de facto, separação


judicial de pessoas e de bens, separação de pessoas e de bens

Separação de facto

o Causa objetiva
• elemento objetivo: falta de coabitação
• subjetivo: propósito de não o voltar a restabelecer
▪ NOTA: os cônjuges podem ter residências separadas, mas manter
uma autêntica comunhão de vida p.e. emigrantes ou prisão
▪ é preciso que isto se verifique desde que a separação de facto teve
início e não apenas quando se propõe a ação.
o prazo de 1 ano consecutivo
• quando esta lei foi alterada, abrangeu as próprias relações já constituídas
porque dispôs diretamente sobre o conteúdo de uma relação jurídica,
abstraindo do facto que lhe deu origem
• não se admite interrupção – se tentam novamente estabelecer a relação
matrimonial e voltam a separar-se, o prazo corre de novo
o a separação de facto é uma causa bilateral e pode ser invocada por qualquer um
dos cônjuges – mesmo pelo culpado
• não tem de haver acordo ou conformação com o pedido
o afastamento um do outro, em termos fáticos p.e. sair de casa ou nem isso. prova
que pode ser difícil se nenhum deles sai de casa. p.e. o cônjuge que permaneceu
em casa serve para provar necessidade e por isso terá uma vantagem aquando da
partilha. aquele que saiu de casa vai ter mais dificuldade em provar que tem de
necessidade
• a maior parte das legislações admite como causa, embora o prazo varie
o não há nenhuma norma no código que refira a separação de facto, mas há
relevância porque decorrido determinado prazo, a esperança de reconciliação

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

torna-se remota e a lei acha socialmente mais vantajosa a situação dos cônjuges
divorciados do que a dos cônjuges separados de facto.
• como causa de divórcio – 1781º a) e 1782º que refere que há separação
de facto quando não existe comunhão de vida entre os cônjuges
(elemento objetivo) e não há o propósito de a restabelecer p.e. se alguém
está preso ou a cumprir uma missão militar não há separação de facto
porque têm o propósito de vir a restabelecer a comunhão de vida!
• 1789/2 – se a separação for provada no divórcio qualquer um deles pode
exigir que os efeitos retroajam!
• artigo 1909º – regulação das responsabilidades parentais. no contexto da
separação de facto, podem ser reguladas as responsabilidades parentais
dos filhos do casal
• 1675º - dever de assistência
▪ obrigação de alimentos e contribuir para os encargos da vida
familiar
▪ no divórcio há autonomização
• o dever de assistência mantém-se durante a separação de facto, MAS
sob que forma? autonomiza-se ou está dentro da obrigação de contribuir
para os encargos?
o cabe ao que pede o divórcio a prova dos elementos objetivo e subjetivo

A professora Rita Lobo Xavier defende que o terceiro número do art. 1675.º desapareceu
porque tal decorre das alterações de 2008, como a lei do divórcio veio acabar com a ideia
de que se tem de averiguar a culpa e que, durante a separação de facto, continua a haver
dever de contribuir para os encargos da vida familiar, por haver apenas modificação.

ALTERAÇÃO DAS FACULDADES MENTAIS


o Pelo menos 1 ano
o A alteração das faculdades mentais do outro cônjuge que dure há mais de um ano,
quando, pela sua gravidade, comprometa a possibilidade da vida em comum, é
pois causa de divórcio sem consentimento de um dos cônjuges.
• pode ser pedido mesmo sem hospitalização e por isso mesmo sem
separação de facto
o requisitos
• alteração das faculdades mentais
• grave e há mais de 1 ano
• é necessário que comprometa a possibilidade de vida em comum

AUSÊNCIA SEM NOTÍCIAS OU QUALQUER OUTRO FACTO QUE MOSTRE A RUTURA DO


CASAMENTO

o não se devem aqui abranger factos banais e esporádicos

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Direito da Família Matilde Diogo Alves

o factos objetivos capazes de convencer o tribunal de que os laços matrimoniais se


romperam, e se romperam definitivamente
o Estamos a pensar em factos que mostrem objetivamente, e repetidamente, o
desinteresse total, a falta radical de cooperação e de comprometimento na “vida
da família que fundaram” (art. 1674.o), a negligência grosseira a que se vota um
cônjuge ou os filhos comuns.

o Nestas condições, seria previsível que um cônjuge pudesse obter imediatamente


a dissolução do casamento, sem necessidade de viver em separação de facto, desde
que provasse atos de violência doméstica graves, ou tentativas de crimes
relativamente a familiares próximos, capazes de convencer um tribunal que não
era previsível, nem exigível, o restabelecimento de uma vida em comum própria
do casamento.

Separação judicial de pessoas e bens


o processo contencioso
o causa puramente patrimonial – a crise que há entre os cônjuges é puramente
patrimonial
o 1795.º - A – extingue alguns deveres conjugais, mas não extingue o vínculo
conjugal
o motivos: os cônjuges não têm a certeza de que querem divórcio
• 1795.ºA – produz os mesmos bens que produziria a dissolução do
casamento
• 1795.ºC – a separação pode terminar pela reconciliação
• 1795.ºD - ou pela conversão da separação em divórcio (passado 1 ano)
• por força do artigo 1794.º é aplicável à separação o disposto quanto ao
divórcio (tudo o que diga respeito ao procedimento daqui é aplicável ao
divórcio)
• pode ser administrativa ou judicial
o qual é a importância?
• uma das modalidades é o casamento católico ou concordatário, que resulta
da conjugação de direito estadual civil e de direito canónico
• o divórcio pode acontecer no casamento católico, MAS isto só é
reconhecido a nível civil – o divórcio decretado em Portugal não dissolve
o casamento católico, só tendo efeitos civis
• admite-se isto porque o casamento pode ser indissolúvel, mas pode tornar-
se intolerável
• NO CASAMNETO CATÓLICO PODE PEDIR-SE A SEPARAÇÃO
JUDICIAL DE PESSOAS E BENS, que vai produzir os mesmos efeitos
(1795.ºA)
o o estado português não garante que a pessoa não fique divorciada

o o divórcio tem de ser decretado por uma autoridade pública!!!


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Direito da Família Matilde Diogo Alves

• sentença judicial ou decisão do conservador


• os cônjuges não estão divorciados enquanto não sair a sentença do
divórcio

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