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DIREITO DA FAMÍLIA E DOS MENORES: Teóricas

Prof. Francisco Manuel de Brito Pereira Coelho

+ Curso de Direito da Família, Francisco Pereira Coelho e Guilherme de Oliveira

+ Estabelecimento da Filiação, Guilherme de Oliveira

Aula dia 20 de setembro de 2018

Bibliografia:

1ª parte:

Curso de Direito da Família, vol I, Francisco Pereira Coelho e Guilherme de Oliveira, 5ª ed.

www.centrodedireitodafamilia.org - publicações - online

2ª parte:

www.guilhermedeoliveira.pt - direito da família - estabelecimento da filiação

Aula dia 27 de setembro de 2018

INTRODUÇÃO

A. NOÇÃO JURÍDICA DE FAMÍLIA

1. NOÇÃO GERAL
O CC não define família. O CC enumera apenas as fontes das relações jurídicas familiares
(artigo 1576º CC) - a família é definida analiticamente.

A noção jurídica de família contém-se, então, implicitamente, no art. 1576º CC que, sem
pouco rigor, considera “fontes das relações jurídicas familiares” o casamento (relações entre
cônjuges), o parentesco (entre parentes), a afinidade (entre afins) e a adoção (entre adotante e adotado
ou entre um deles e os parentes do outro). Família são, assim, as relações que resultarem destas 4
fontes.

2. AS “FONTES” DE RELAÇÕES JURÍDICAS FAMILIARES

a) CASAMENTO: 1577º CC (noção)

Casamento é o contrato (negócio jurídico bilateral, composto por duas declarações de vontade,
em que as partes pretendem a produção de certos efeitos práticos e querem que esses efeitos sejam
tutelados pelo direito) celebrado entre duas pessoas (a lei 9/2010 introduziu o casamentos entre pessoas
do mesmo sexo) que pretendem constituir família mediante uma plena comunhão de vida (falamos
numa comunhão de leito, mesa e de habitação - tripla comunhão) e em condições de exclusividade/
unidade.

b) PARENTESCO: 1578º CC (noção)

É o vínculo que une duas pessoas, em consequência de:

1. Uma delas descender (direta ou indiretamente) da outra: o parentesco é em linha reta ou


direta (pais e filhos, avos e netos - 1580º).

2. Ou de ambas procederem de progenitor comum: o parentesco é linha colateral ou


transversal (irmãos, primos, seja qual for o grau de primo, tios - 1580º).

Deve ter-se em conta o limite à relevância jurídica do parentesco posto no artigo 1582º
CC: Salvo disposição da lei em contrário, os efeitos do parentesco produzem-se em qualquer grau na linha
recta e até ao sexto grau na colateral.

Filipa Ribeiro Gonçalves 1


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Como se calcula o grau de parentesco? 1581ºCC


1581º/1: Na linha reta (ou direta) há tantos graus quantas as pessoas que formam a linha
de parentesco, excluindo o progenitor. Exemplo: a relação entre pai A e filho B é de 1º grau; a relação
entre A pai e C neto é de 2º grau.

1581º/2: Na linha colateral (ou transversal) os graus contam-se pela mesma forma,
subindo por um dos ramos e descendo pelo outro, mas sem contar o progenitor comum. Exemplo:
a relação de parentesco entre dois irmãos é de 2º grau; a relação de parentesco entre tio e sobrinho é de 3º
grau; a relação de parentesco entre primos direitos é de 4º grau.

A forma de parentesco que mais interessa/ocupa ao direito é a relação entre pais e filhos,
enquanto os filhos forem menores.

Relativamente aos efeitos do parentesco, há efeitos que a lei associa a vários formas de
parentesco, como o efeito sucessório (2133º CC) e a obrigação de alimentos (2003º e ss. CC) e
há um efeito exclusivo da relação de parentesco entre pais e filhos: os pais, enquanto os filhos
forem menores, têm um conjunto de poderes-deveres em relação aos filhos que são as
responsabilidades parentais.

c) AFINIDADE: 1584º CC (noção)


É o vínculo que liga cada um dos cônjuges aos parentes do outro. A afinidade é apenas a
relação entre um dos cônjuges e os parentes dos outros, não é, portanto, entre os parentes de A
e parentes de B, afinidade não gere afinidade. Exemplo: A e B são casados, a relação entre A e os
parentes de B é uma relação de afinidade. Se B já tinha um filho (F) A é padrasto de F é também uma
relação de afinidade.

Pouco importância tem para o direito, são poucos os efeitos associados à afinidade.

Também se fala, em relação à afinidade, de linhas retas e de linhas colaterais, bem como
de graus. Como se calcula? O artigo 1585º CC diz que a afinidade determina-se pelos mesmos
graus e linhas que definem o parentesco, ou seja, a forma de contagem é igual ao regime do
parentesco. A linha e o grau de afinidade é o mesmo da relação de parentesco que lhe está
subjacente. Exemplo: B tem irmão I que é cunhado de A, é uma relação em linha colateral em 2º grau,
então a afinidade subjacente é a mesma; B tem um filho F, A é padrasto de F, a relação entre A e F é em
linha reta e é de 1º grau, portanto a relação de afinidade é a mesma.

O casamento dissolve-se por morte ou por divórcio? Artigo 1585º/2ªparte: a afinidade


(…) não cessa pela dissolução do casamento por morte. O que significa que se se dissolver por
divórcio a relação de afinidade cessa também. Exemplo: A é casado com B e o casamento dissolve-
se, B tem o pai P que enquanto eram casados era sogro de A. P era sogro de A, havia relação de afinidade,
mas o casamento dissolveu-se, dissolvido o casamento mantém-se a relação de afinidade? Como A e B
divorciam-se, A deixa de ser afim de P.

d) ADOÇÃO: 1586º CC (noção)


É o vínculo que, à semelhança da filiação natural (biológica), mas independentemente dos
laços do sangue, se estabelece legalmente entre duas pessoas.

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Hoje serve interesses, sobretudo, do adotado e não já do adotante.

Formas de adoção (até à lei 143/2015 de 8 de setembro):

• Adoção plena: aquela em que o filho adotado se torna plenamente filho do


adotante e ao mesmo tempo cortam-se todos os laços que este tivesse com os
seus pais biológicos;

• Adoção restrita: aquela em que o filho que era adotado não era plenamente filho
dos pais adotivos e ao mesmo tempo não se rompiam as relações com os pais
biológicos.

Face ao recurso quase exclusivo da adoção plena, a lei decidiu acabar com a adoção
restrita. A partir da lei 143/2015, passou a existir apenas a adoção plena, que se chama hoje
apenas de adoção, pois já não faz sentido chamar-lhe de adoção plena porque já não existe uma
outra. As adoções restritas que já existiam antes da entrada em vigor da lei, mantiveram-se.

Faz-se uma segunda distinção, tendo em conta quem faz a adoção:

• Temos a adoção conjunta quando é um casal em sentido amplo que adota (quer
estejam casadas ou então que vivam em união de facto);

• Ou uma adoção singular quando a adoção é feita por uma só pessoa, casada ou
não casada.

Até há pouco tempo só os casais ou uniões de facto de pessoas de sexo diferente é que
poderiam adotar, mas isso mudou com lei 2/2016 de 29 de fevereiro, onde se abriu a
possibilidade de um casal composto por pessoas do mesmo sexo poder adotar.

3. CONCLUSÕES

1ª conclusão: A lei, no artigo 1576º CC, diz que são fontes de relações jurídicas
familiares: o casamento, o parentesco, a afinidade e a adoção. Parece que está implícita uma
taxatividade, um aparente princípio da taxatividade. Era assim que se entendia, mas hoje o
sistema jurídico já admite outras formas de relações familiares diferentes das previstas, como, p.
e., a união de facto (não são casados, mas vivem como se o fossem), podem existir outras.

2ª conclusão: A família não é uma pessoa jurídica, não é uma pessoa coletiva e, por isso,
não tem personalidade jurídica. Quando se utliza a expressão “interesse da família” deve ser vista
como o somatório dos interesses individuais dos membros da família.

3ª conclusão: A noção de família sociologicamente é menor que a noção jurídica. Na


realidade social, é cada vez mais a familiar nuclear/célula familiar, ou seja, são os pais e os filhos
menores.

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Aula dia 28 de setembro de 2018

B. UNIÃO DE FACTO

— O que é a união de facto? (noção)

A lei dá a noção de união de facto, no artigo 1º/2 da lei 7/2001, de 11 de maio, nos
termos do qual a união de facto é a situação jurídica de duas pessoas que, independentemente
do sexo, vivam em condições análogas às dos cônjuges, mas não são cônjuges.

O que é viver em condições análogas às dos cônjuges? É viver em comunhão de leito, de


mesa e de habitação e em condições de unidade ou exclusividade, mas não são casadas.

Duas pessoas que vivam em concubinato pressupõe apenas a comunhão de leito, o que
significa que têm um relacionamento sexual mais ao menos prolongado. É diferente da ideia de
união de facto, pois no concubinato não há comunhão de mesa, nem de habitação.

— História legislativa

Na nossa história legislativa temos duas leis sobre a união de facto. A primeira lei a regular
a união de facto foi a lei 135/99, de 28 de agosto, que teve uma duração curta de apenas dois
anos. Em 2001, apareceu uma nova lei, que revogou a anterior, que é quase totalmente
coincidente com a primeira, a lei 7/2001, de 11 de maio, que é a lei que hoje regula a união de
facto. O propósito desta segunda lei era apenas um, era de consagrar a proteção jurídica de
uniões de facto constituídas por pessoas do mesmo sexo, pois a lei 1999 concedia proteção
jurídica exclusivamente às uniões de facto constituídas por pessoas de sexo diferente.

Não obstante, a lei 7/2001 foi alterada. Houve uma grande revisão, através da lei 23/2010,
de 30 de agosto. Houve outras alterações, mas a mais significativa foi a de 2010.

Formalmente, a lei que hoje regula a união de facto é a lei 7/2001, mas que foi alterada
pela lei 23/2010.

— O que a Constituição nos diz sobre a união de facto?

A CRP não fala na união de facto nem dispõe diretamente sobre ela.

O artigo 36º da CRP estabelece vários princípios relativos à matéria da família (é o


principal artigo da CRP relativo à família). Logo no nº 1 diz que todos têm direito de:

1. Constituir família e de

2. Contrair casamento, em condições de plena igualdade.


Por haver dois direitos diferentes, houve certos autores (como Gomes Canotilho e Vital
Moreira) que entenderam que o legislador teve o cuidado de distinguir dois direitos porque o 1º
direito - direito de constituir família - terá sido considerado a pensar na união de facto, no direito
de desenvolver uma união de facto.

Há outro entendimento segundo o qual aquele direito está relacionado com o direito de ter
filhos/de procriar e de uma vez ter tido filhos de estabelecer os seguintes nexos/as
correspondentes relações (paternidade, maternidade e filiação). É este o sentido que antes de
haver a CRP já era dado à mesma expressão utilizada em textos de direito internacional.

Posto isto, a expressão “constituir família” não tem a ver com a união de facto. Não é aí
que a CRP protege a união de facto. Haverá outro sítio na CRP onde se proteja? Haverá, mas não
de forma expressa, mas sim de forma indireta. Há um grande direito fundamental que é o direito
que está no artigo 26º, o direito ao livre desenvolvimento da personalidade: cada um é como é e

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tem a sua personalidade própria e cada um a manifesta como quiser. É dentro este amplo direito
que cabe o direito que as pessoas têm de se quiserem viverem em união de facto. Assim, o
reconhecimento constitucional não resulta diretamente do artigo 36º, porque o entendimento não
é esse, mas o que resulta do artigo 26º.

— Como a lei regula a união de facto? (regime da união de facto)

Como se constitui? Já que é apenas um facto e, portanto, se situa apenas no domínio dos
factos, a união de facto existe/constitui-se quando esse facto passa a existir; quando o facto da
união de facto passa a existir, ou seja, quando duas pessoas passam a viver em condições
análogas dos cônjuges, quando vivem em comunhão de leito, mesa e habitação e em condições
de unidade ou exclusividade, todavia não são casadas. Só aí está constituída a união de facto.

Como se prova que as pessoas vivem ou que viveram em união de facto? Se houvesse
casamento, como é um contrato, haveria a prova por força do registo do casamento. Aqui não
há, pois não há registo público de uniões de facto. Como não existe esse elemento formal, como
se prova? Artigo 2º-A da lei 7/2001. Este artigo debruça-se sobre a prova da união de facto.
Este artigo começa por dizer, no seu nº 1, que a união de facto prova-se por qualquer meio
legalmente admissível, qualquer um dos meios de prova previstos na lei substantiva e processual
(p. ex.: testemunhas). Trata-se da consagração do princípio de admissibilidade de qualquer meio
de prova. Antes de 2010, discutia-se se as juntas de freguesia podiam passar um certificado/
atestado comprovando que as pessoas vivem ou que viveram em união de facto. A partir de
2010, no artigo 2º-A, passou a reconhecer-se explicitamente estes atestados sob compromisso
de honra passados pela juntas de freguesia.

Quais as condições de eficácia da união de facto? Condições de reconhecimento jurídico


O direito só verificadas certas condições/requisitos é que protege a união de facto.

• 1ª condição (que pode ser vista como requisito de existência da união de facto): Duração
de pelo menos 2 anos. Tal consta do próprio conceito de união de facto (artigo 1º/2 da
lei 7/2001). Se quiseres ser rigorosos é um elemento/requisito de proteção jurídica.
Compreende-se que exija um mínimo de duração, exige-se uma continuidade da
união de facto. Uma vez cumpridos 2 anos a união de facto passa a ser protegida
retroativamente.

• 2ª condição: Antes de 2001, as uniões de facto eram compostas por pessoas de


sexo diferente, a partir desse ano passaram a poder ser compostos por pessoas do
mesmo sexo. Todavia, mesmo depois da lei de 2001, muita gente entendia que a
proteção e os direitos que eram dados às uniões de facto constituídas por pessoas
do mesmo sexo eram exclusivamente os da lei 7/2001, e não já tendo em conta as
diferentes leis que eram aplicadas a pessoas de sexo diferente que constituíam
uniões de facto. Isto significa que, de acordo com tal entendimento, os direitos
concebidos pela lei 7/2001 aplicar-se-iam a todas as uniões de facto e os outros
estabelecidos por outras leis só a uniões de facto heterossexuais. Após 2010, o
artigo 3º/3 veio acabar com qualquer duvida e estabeleceu que qualquer disposição
em vigor tendente à atribuição de direitos ou benefícios fundados na união de facto é
aplicável independentemente do sexo dos seus membros. Isto significa que todos os
direitos que são reconhecidos às uniões de factos compostos por pessoas de sexo
diferente são igualmente reconhecidos para uniões de pessoas do mesmo sexo.

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Assim, no direito atual, não se impõe um requisito de heterossexualidade porque a


união de facto entre pessoas do mesmo sexo está equiparada à união de facto entre
pessoas de sexo diferente, gozando de igual proteção jurídica. Até à entrada em
vigor da lei 2/2016, de 29 de fevereiro, só os unidos de facto de sexo diferente
podiam adotar e recorrer a técnicas de procriação medicamente assistidas. Com
aquela lei, os unidos de facto do mesmo sexo passam a poder adotar, mas continua-
lhes vedado o recurso a técnicas de procriação medicamente assistidas. Todavia,
com a lei 25/2016, de 22 de agosto, que veio alterar a redação do artigo 6º da lei
32/2006, de 26 de julho (a lei da procuração medicamente assistida), permitiu-se o
recurso, por casais de mulheres unidas de facto, a técnicas de procriação
medicamente assistida.

Aula dia 11 de outubro de 2018

• 3ª condição: No artigo 2º da lei da união de facto (lei 7/2001, de 11 de maio),


enumeram-se uma série de requisitos de capacidade da união de facto. No sentido
de tal como duas pessoas podem ser impedidas de casar (1601º e 1602º CC), pois
necessitam de capacidade para tal, assim também se estabelece requisitos do
mesmo tipo para que a união de facto seja reconhecida pela lei. As incapacidade
para casar/matrimoniais coincidem basicamente com o quadro de incapacidades da
união de facto. No entanto, há duas diferenças: 1 - Uma diferença real: no artigo 2º/c
da lei da união de facto diz que o casamento não dissolvido é impeditivo da união de
facto, salvo se tiver sido decretada a separação de pessoas e bens. Duas pessoas
casadas podem recorrer a um mecanismo em que elas se separam e separem
igualmente os bens, o que não significa a cessação da relação matrimonial, elas
continuam formalmente casados, mas ficam separados de pessoas (cessa a
habitação) e bens. Como continuam casadas não podem casar com outra pessoa, há
um impedimento matrimonial, mas já podem desenvolver uma união de facto
juridicamente protegida. 2 - Uma diferença aparente: no artigo 2º/a da lei da união de
facto diz que só as uniões de facto de pessoas com 18 ou mais anos à data do
reconhecimento da união de facto é que são protegidas (no entanto, a união de facto
pode ter começado já com pelo menos 16 anos; nestes casos a união de facto
começou a desenvolver-se/constituir-se de certa forma e foi reconhecida pelo direito
logo a partir dos 18 anos). No caso do casamento, este já pode ser celebrado aos
16.

Os efeitos da união de facto:

- Efeitos que se produzem na vigência da união de facto:

- Efeitos pessoais: A união de facto não é um contrato gerador de


obrigações, como acontece no casamento. A união de facto é apenas um facto, não se está
obrigado a nada. Os deveres pessoais dos cônjuges (artigo 1672º CC) são deveres jurídicos,
obrigações recíprocas dos cônjuges, da relação matrimonial. Apesar de na união de facto não
resultarem obrigações, os membros da união de facto não estão vinculados por quaisquer
deveres pessoais, há certos efeitos do casamento que se aplicam à união de facto, mas que são
efeitos indiretos: Tal como duas pessoas casadas podem adotar, assim duas pessoas em união

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de facto podem realizar uma adoção conjunta, nos mesmos termos (artigo 7º lei 7/2001); para
além disto, a lei diz que as responsabilidades parentais são exercidas nos mesmos termos
(artigo 1911º CC).

- Efeitos patrimoniais: Para o casamento a lei estabelece um vasto conjunto


de efeitos patrimoniais. Este conjunto de efeitos patrimoniais que se estabelece para o
casamento não vale, em regra, para a união de facto, porque no casamento temos um contrato e
a união de facto é apenas um facto. O que vale, então, para a união de facto? Valem as regras
gerais do direito (obrigacional e real), não há aqui um regime específico. Para este efeitos são
dois estranhos que vivem um com o outro - este é o princípio geral.

Se os conviventes em união de facto quiserem realizar um contrato para


regular os aspetos patrimoniais da relação, normalmente quando a iniciam, podem fazê-lo. Não
há nenhuma norma que o preveja, mas não há razões para entender que este tipo de contrato
seja proibido, devendo, por isso, considerar-se o contrato como admitido/lícito - costuma dar-se
o nome a este contrato de contrato de coabitação.

Apesar de globalmente o regime do casamento não se aplicar à união de


facto, pode acontecer que certas normas possam ser analogicamente aplicadas. Exemplos de
normas com efeitos patrimoniais do casamento que se devem aplicar à união de facto: Artigo
1691º CC que diz quais são as dívidas de responsabilidade de ambos os cônjuges. Algumas
dívidas, apesar de serem contraídas apenas por um dos cônjuges, são pagas pelos dois. Temos
o exemplo do artigo 1691º/1/b CC que se refere às dívidas para ocorrer aos encargos normais da
vida familiar. A justificação encontra-se no facto de a dívida ter sido contraída para os dois, para
ambos os cônjuges. Pergunta-se se isto pode aplicar-se à união de facto. Há uma exata analogia
entre a situação de casamento e a união de facto. Na união de facto existe também uma vida em
comum e existem encargos assumidos relacionadas com a vida em comum. Assim, as situações,
os factos e os interesses em jogo são os mesmos, não havendo, por isso, razões para se tratar,
neste caso, de forma diferente o casamento e a união de facto, pois as situações são análogas.
Sendo aqui irrelevante haver ou não contrato, pois interessa apenas os factos - esta é a posição
do Dr. Francisco Manuel de Brito Pereira Coelho. Outro exemplo de normas patrimoniais que se
aplicam ao casamento e que podem ser analogicamente aplicadas à união de facto é o caso da
pensão de viuvez ou de sobrevivência. Se duas pessoas casadas divorciarem-se e uma delas
receber periodicamente a pensão de alimentos, quando essa pessoa que recebe a pensão passar
a viver com outra pessoa em união de facto, a consequência disso é a perda de direito a
alimentos do ex-cônjuge. Tal acontece igualmente, se em vez de ter iniciado uma união de facto,
tivesse contraído novamente casamento. No caso de união de facto, quando uma das pessoas
morre, a outra pode ter direito a receber uma pensão de viuvez ou pensão de sobrevivência, que
tem a ver com o facto do companheiro que morreu ter descontado durante muito tempo para a
segurança social. Se a pessoa que ficou viúva a certa altura iniciar uma união de facto com outra
pessoa, isso faz com que deixe de ter direito à pensão? Se casa-se deixava de a receber, mas se
fosse união de facto? Para este efeito, o desenvolvimento de uma relação de união de facto é
equiparada ao casamento e leva à perda do direito de receber alimentos (artigo 2019º CC),
acontecendo o mesmo à pensão de viuvez, que está no diploma DL 133/2012.

- Efeitos após a cessação/termo da união de facto: De acordo com o princípio geral, o


regime que está estabelecido para a dissolução do casamento, em regra, não vale para união de
facto. O que vale? As regras gerais do direito (direito real e direito obrigacional). Todavia, se
houver o contrato de coabitaçao e se ele tiver cláusulas relativas àquilo que se vai fazer no caso
de dissolução, então aplicam-se essas regras.

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A lei estabelece alguns efeitos à extinção da união de facto. Mas, em primeiro lugar,
como se extingue a união de facto? Tal como o casamento, extingue-se por morte ou por rutura
(artigo 8º lei 7/2001).

A extinção por rutura, já que se fala de factos, dá-se quando esse facto que é a união
facto deixar de existir, quando cessar esse facto. Uma vez cessando a união de facto, que efeitos
a lei associa à rutura? Nos mesmos termos reservados para o divórcio: No artigo 1793º CC diz
que havendo divórcio, qualquer um dos cônjuges pode pedir ao tribunal (dirigindo um
requerimento ao juiz) a casa de morada da família, quer seja casa comum quer própria do outro,
considerando as necessidades da casa de cada um dos cônjuges e os interesses dos filhos do
casal, sendo a casa entregue a título de arrendamento. Se se chegar a acordo não e necessário
requerimento. Não havendo acordo é que há tal possibilidade do pedido do artigo 1793º CC. Este
direito de permanência da casa de morada de família existe na rutura da união de facto (artigo
4º/4 da lei da união de facto), mandando a lei aplicar à união de facto o disposto no artigo
1793º CC. Prevê-se igualmente a hipótese de se viver em casa arrendada. Se são casados e
habitarem em casa arrendada, se se divorciarem a lei estabelece um regime mais ao menos
equivalente: artigo 1105º CC. Não se chegando a acordo, o artigo diz que cabe ao tribunal
decidir em função das necessidades de cada um, dos interesses do filho e outros fatores
relevantes em nome de quem permanece o arrendamento + 4º da lei união de facto.

No caso de extinção por morte na união de facto temos como efeitos principais:

1. Enquanto no casamento se um dos cônjuges falecer o cônjuge sobrevivo é o maior


dos herdeiros, é o mais qualificado, na união de facto o convivente sobrevivo não é
herdeiro. A lei, todavia, atende a certas necessidades específicas do união de
facto, pois o sobrevivo viveu anos com aquele que faleceu. A proteção que dá não
é pela via sucessória, mas por outras vias: se o unido de facto tiver necessidade
de alimentos a lei diz, no artigo 2020º do CC, que este tem o direto de exigir
alimentos da herança do falecido.

2. Relativamente à casa de morada da família, se a casa fosse da propriedade do


unido de facto que morreu, a casa não iria para o outro porque este não é herdeiro.
Todavia, a lei atende ao interesse do sobrevivo em manter a casa do unido de
facto que faleceu: artigo 5º da lei da união de facto. No nº 1 diz-nos que o
sobrevivo pode permanecer na casa, pelo prazo de 5 anos, como titular de um
direito real (limitado ou menor) de habitação e de um direito de uso de recheio. A
lei acrescenta no nº 2 que nos casos em que a união de facto ter começado há
mais de 5 anos antes da morte, então o sobrevivo tem direito a permanecer por
tempo igual ao da duração da união de facto na casa. Será mais de 5 anos se mais
tempo tiver durado a união de facto. No nº 4 diz-se que, excecionalmente, por
motivos de equidade, o tribunal pode prorrogar os prazos previstos pelo legislador.
No nº 7 diz que esgotado o prazo o sobrevivo tem ainda o direito de permanecer
no imóvel na qualidade de arrendatário. O nº 9, por sua vez, acrescenta que o
membro sobrevivo tem direito de preferência em caso de alienação/venda do
imóvel, durante o tempo que o habitar a qualquer título. Se vivessem em casa
arrendada e o titular do direito a arrendamento morrer, o artigo 1106º/1/b CC
determina que se transmite ao unido de facto.

3. No caso de indemnização em caso de lesão de que proveio a morte. No caso de


lesão de que proveio a morte de um dos membros da união de facto, o sobrevivo
pode exigir ao autor da lesão (p. e., assassinato, morte por acidente) uma indemnização

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dos prejuízos/danos sofridos (artigo 496º CC). Esta indemnização pode ser tanto
pelos danos sofridos pelo próprio morto, pela morte (privação da vida), como
danos sofridos por certas pessoas, os conviventes para vítima. Até 2010, o artigo
466º do CC, entre as pessoas com direito a indemnização não fazia referência ao
unido de facto. Só em 2010 é que o artigo 496º passou a incluir sua referência
expressa (nº 3).

4. O regime de atribuição de pensões ou subsídios por morte. Tem a ver com os


direitos resultantes do regime da segurança social. Quando um dos cônjuges
morre, o viúvo tem direito a receber certas prestações da segurança social, cujo
nome mais correto é pensão de sobrevivência, há outros, mas esta é a mais
importante. Esta pensão de sobrevivência existe também em relação ao unido de
facto sobrevivo - artigo 3º/e da lei da união de facto. O unido de facto sobrevivo
tem automaticamente direito a esta pensão de sobrevivência, quer dizer que, mal
se dê o falecimento do unido de facto, o sobrevivo tem direito a essa pensão, sem
ter necessidade de intentar uma ação e sem ter necessidade de provar que precisa
dela para sobreviver. Antes de 2010, não era assim, se quisesse a pensão tinha de
intentar uma ação judicial e se quisesse a tinha de provar que precisava do
montante para a sua sobrevivência - direito a alimentos.

Aula dia 12 de outubro de 2018

C. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO DIREITO DA FAMÍLIA

O artigo que mais nos interessa é o artigo 36º CRP, pois é sobretudo aqui que se
encontram os princípios constitucionais do Direito da Família:

Nº 1: Todos têm o direito de constituir família e de contrair casamento em condições de


plena igualdade. Consagra dois direitos fundamentais: 1 - direito de contrair casamento; 2 -
direito de constituir família.

Sobre o DIREITO DE CELEBRAR CASAMENTO, todos podem casar, a não ser que
hajam razões/impedimentos objetivos que justificam o impedimento. Isto significa que, por
impedimentos/razões objetivas, podem haver pessoas que estejam impedidas de celebrar
casamento. Se não houver tais razões objetivas, então, há direito de celebrar casamento.

O reconhecimento deste direito significa que a CRP quer garantir a instituição do


casamento? Estará aqui contida uma garantia constitucional? Até certo ponto, sim. Se a lei
reconhece a todos o direito é lógico que tem de haver uma instituição que é o casamento; está
reconhecida implicitamente a garantia constitucional da instituição do casamento. A lei quer
garantir que exista o casamento, se não não fazia sentido reconhecer esse direito a todos.

E que casamento é que a CRP está a garantir? Com que caraterísticas? Quais as
caraterísticas mínimas ou o núcleo essencial mínimo? Em primeiro lugar, temos a caraterística da
contratualidade (o casamento é composto por declarações de vontades livres e já não é um ato imposto
pelo Estado) que é uma caraterística aceite. Outra caraterística é a da monogamia/exclusividade (é
um contrato apenas a dois). Outra é a da exogamia (duas pessoas só podem casar com alguém que não
é da sua família próxima). Existem caraterísticas que hoje estão ultrapassadas e, por isso, já não
constituem caraterísticas do casamento: é o caso da caraterística da heterossexualidade (desde

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2010). Ainda hoje se fala na tendencial perpetuidade como caraterística do casamento (o


casamento não se pode dissolver-se como se dissolvem em geral os contratos; não basta uma declaração
dirigida de um ou outro não baseada em qualquer fundamento para se dissolver o casamento). A posição
do Dr. Francisco Manuel de Brito Pereira Coelho é de que, apesar do atual regime não permitir
que se cesse o casamento sem base em fundamento, mais tarde ou mais cedo tal terminará. Por
tal razão, não se deve considerar esta caraterística essencial para o casamento.

Assim, o casamento é um contrato, um ato resultante de declarações voluntárias, é um


ato a dois e, de acordo com os padrões culturas, é um ato realizado entre duas pessoas fora da
família próxima. Um casamento nestes termos é o que está, de alguma forma, garantido pela
CRP.

Sobre o DIREITO DE CONSTITUIR FAMÍLIA, a melhor interpretação da expressão


“constituir família” é a interpretação que sempre foi dada: é o direito de procriar, de ter filhos, e de
estabelecer com eles as correspondentes relações de filiação - remissão para página 4 e 5.

Nº 2: A lei (ordinária) regula os requisitos e os efeitos do casamento e da sua dissolução,


por morte ou divórcio, independentemente da forma de celebração (seja um casamento pela
forma civil, seja pela forma religiosa) - PRINCÍPIO DE ATRIBUIÇÃO DE COMPETÊNCIA
EXCLUSIVA À LEI CIVIL PARA A REGULAÇÃO DOS CASAMENTOS, SEJAM CIVIS OU
RELIGIOSOS. Deste princípio resulta que, em qualquer dos casos, é a lei civil que cabe regular
os requisitos e efeitos do casamento e a sua dissolução. No entanto, as coisas não são bem
assim.

Em relação ao casamento civil este é regulado exclusivamente pela lei civil, pois não fazia
sentido ser regulado por outros ordenamentos quaisquer. Todavia, em relação a uma espécie
particular do casamento religioso, de uma particular religião - a católica -, as coisas não são
assim. O artigo 1625º CC diz que o conhecimento das causas respeitantes à nulidade do
casamento católico e à dispensa do casamento rato e não consumado é reservado aos tribunais e
às repartições eclesiásticas competentes. Há, aparentemente, uma contradição deste artigo com
o 36º/2 da CRP. O que nos vem dizer o artigo 1625º CC é que há certas matérias do casamento
católico (de nulidade e dispensa do casamento rato e não consumado) que não são reservadas aos
tribunais civis, mas sim aos tribunais e às repartições eclesiásticas. O casamento rato é o
casamento que foi ratificado, foi feito pelo padre, mas não foi consumado sexualmente, sendo,
por tal razão, uma causa de dissolução do casamento, devido à importância dada pela igreja à
procriação após o casamento. Afinal, há certas matérias que afinal são apreciadas não pelos
tribunais civis, mas pelas repartições eclesiásticas que irão julgar aplicando o direito canónico e
não o direito civil. Isto parece contra o que está na CRP, esta diz que a lei civil é que tem
competência para regular os casamentos e o CC dá competência ao direito canónico. Para
chegar à conclusão se a norma é constitucional ou inconstitucional, temos de interpretar as duas
normas, a superior (constitucional) e inferior (ordinária), pois, em primeiro lugar, temos de saber o
seu exato sentido e só depois desta tarefa interpretativa é que podemos fazer a apreciação de
constitucionalidade ou inconstitucionalidade. O que se tem entendido sobre o artigo do 1625º
CC? Antes de mais, temos de ter em conta o sentido que o legislador atribui ao artigo 36º/2 CRP
na altura em que o fez. Quando foi aprovada a CRP, o constituinte tinha consciência que o artigo
1625º CC existia e quis mantê-lo. Tendo em conta a simultaneidade histórica entre a norma da
CRP e da norma do CC e a manutenção do artigo 1625º CC, tem-se entendido que tem de se
fazer uma interpretação restritiva.

Filipa Ribeiro Gonçalves 10


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Deste número resulta, implicitamente, um outro princípio que é o PRINCÍPIO DA


ADMISSIBILIDADE DO DIVÓRCIO PARA QUALQUER FORMA DE CASAMENTO. Este
princípio teve a sua importância na CRP de 76, pois no regime anterior as pessoas casadas
catolicamente não podiam divorciar-se mesmo à face do Estado e os divórcios eram apenas para
os casamento civis.

Nº 3: Os cônjuges têm iguais direitos e deveres quanto à capacidade civil e política e à


manutenção e educação dos filhos - PRINCÍPIO DA IGUALDADE DOS CÔNJUGES. Trata-se de
uma aplicação do princípio geral do artigo 13º CRP e 1671º CC. Antes do 25 de abril, não era
assim. A regra era de que havia uma hierarquia interna na relação matrimonial: o marido era o
chefe de família e a mulher estava numa posição de inferioridade.

Nº 4: Os filhos nascidos fora do casamento não podem, por esse motivo, ser objeto de
qualquer discriminação e a lei ou as repartições oficiais não podem usar designações
discriminatórias relativas à filiação - PRINCÍPIO DA PROIBIÇÃO DE DISCRIMINAÇÃO ENTRE
OS FILHOS NASCIDOS DO CASAMENTO E FORA DO CASAMENTO. Traduz-se em dois
níveis:

- Ao nível material, os filhos, sejam nascidos do casamento ou fora, devem ser


tratados juridicamente da mesma forma. Não era assim antes do 25 de abril em que havia
tratamento desigual, p. e., para efeitos sucessórios - proibição da discriminação em sentido
material;

- No plano formal, não se permite o uso de designações discriminatórias como as


de filho ilegítimo, natural, bastardo ou outras que não se limitem a mencionar o puro facto do
nascimento fora do casamento dos progenitores, devendo utilizar-se designações neutras -
proibição da discriminação em sentido formal.

Aula dia 18 de outubro de 2018

Nº 5: Os pais têm o direito e o dever de educação e manutenção dos filhos - ATRIBUIÇÃO


AOS PAIS DO PODER-DEVRES DE EDUCAÇÃO DOS FILHOS. É um poder-dever (deveres que
são atribuídos a certas pessoas que se têm de exercer de determinada forma), que os pais têm em
relação aos filhos, quem manda nas relações são os pais, embora o poder-dever lhes seja
reconhecido no interesse dos filhos - responsabilidades parentais. É primeiramente um poder em
relação aos filhos (1878º/1 CC), mas também em relação ao Estado (67º/2/c CRP).

Nº 6: Os filhos não podem ser separados dos pais, salvo quando estes não cumpram os
seus deveres fundamentais para com eles e sempre mediante decisão judicial - PRINCÍPIO DA
INSEPARABILIDADE DOS FILHOS DOS SEUS PROGENITORES. Pode ocorrer que os filhos
sejam separados dos pais, por decisão judicial, sempre que se verifique o condicionalismo
previsto no artigo 1915º/1 CC; do mesmo modo o artigo 1918º CC.

Nº 7: A adoção é regulada e protegida nos termos da lei, a qual deve estabelecer formas
céleres para a respetiva tramitação - PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO DA ADOÇÃO. A adoção, como
instituição/instituto, é garantida pela CRP, que assegura a sua existência e a sua estrutura

Filipa Ribeiro Gonçalves 11


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fundamental, não podendo o legislador ordinário suprimi-la nem desfigurá-la ou descaraterizá-la


essencialmente. O regime da adoção constará de lei ordinária. A CRP faz esta referência para
garantir que exista e seja protegida a instituição da adoção (ideia presente pelo menos
implicitamente). Por fim, o processo de adoção tem caráter urgente.

Além do 36º, há outras normas da CRP que não têm a mesma importância, são normas
mais programáticas: Artigos 67º e ss. CRP.

• Artigo 68º: ao Estado incumbem obrigações de promover certas atividades e medidas


para a proteção da família;

• Artigo 68º: proteção da maternidade e paternidade;

• Artigo 69º: proteção da infância.

D. CARATERÍSTICAS GERAIS DO DIREITO DA FAMÍLIA (DIREITO OBJETIVO) E DOS DIREITO DA


FAMÍLIA (DIREITOS SUBJETIVOS FAMILIARES)

CARATERÍSTICAS GERAIS DO DIREITO SUBJETIVO DA FAMÍLIA:


1. PREDOMÍNIO DE NORMAS IMPERATIVAS: Acentuado predomínio de normas imperativas e,
como tais, inderrogáveis pela vontade dos particulares, contrariamente a outros ramos do
direito, como é o caso do direito das obrigações cujas normas revestem, na sua maioria,
caráter supletivo ou dispositivo. Todavia, há cada vez menos normas imperativas no direito da
família. Assiste-se a uma retirada do direito, deixando a família para a vontade dos sujeitos,
sobretudo em matéria do casamento. Cada vez mais o casamento é aquilo que os cônjuges
quiserem. Mesmo a norma do artigo 1672º CC que impõe de forma aparentemente imperativa
os deveres conjugais é cada vez menos sendo visto como imperativa.

2. INSTITUCIONALISMO: O direito da família é um direito institucional. É que o direito família,


em grande parte, vem regular certas realidades que já existiam e para as quais já existiam
regras próprias antes mesmo de aparecer o direito a regulá-las. Isto significa que o direito
apenas reproduz as regras que já se tinhas gerado e desenvolvido espontaneamente. É o
caso do casamento. Todavia, não é sempre assim, ou seja, há áreas em que a lei não se limita
a ser institucional. Muitas vezes o direito quer alterar/inovar as coisas, p. e., a seguir à
revolução do 25 de abril houve uma grande reforma e normas foram introduzidas que não
correspondiam à realidade do casamento, como é o caso da igualdade dos cônjuges.

3. COEXISTÊNCIA DO DIREITO ESTADUAL E DO DIREITO CANÓNICO: No direito da família


coexistem dois direitos/ordenamentos jurídicos: direito civil e o direito religioso/canónico -
remissão para a página 10 e 11.

4. PERMEABILIDADE: O direito da família é permeável às transformações (políticas, sociais,


religiosas, económicas), o primeiro ramo do direito civil a ser afetado pelas transformações é
o direito da família. É assim no tempo, mas esta permeabilidade verifica-se também no
espaço, tanto assim que o direito da família é um direito nacional, ligado às realidades de
cada país. Apesar de ser um direito nacional, vai se assistir cada vez mais ao aparecimento
de um certo corpo de regras transnacionais - um direito familiar transnacional. Além do corpo
mínimo que consta na CDH, há uma Comissão Europeia do Direito da Família que dos seus
trabalhos resultou um texto que destina a influenciar os legisladores de cada pais.

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5. LIGAÇÃO A OUTRAS CIÊNCIAS HUMANAS: O direito da família é um direito ligado


estreitamente a muitas outras ciências humanas, é um direito que tem carga interdisciplinar.

6. AFETAÇÃO DE CERTAS QUESTÕES DE DIREITO DA FAMÍLIA A TRIBUNAS DE


COMPETÊNCIA ESPECIALIZADA - TRIBUNAIS DE FAMÍLIA E MENORES. Há bastantes
matérias do direito da família que não são apreciadas pelos tribunais, mas por tribunais de
competência especializada. Anteriormente, tínhamos o tribunais de família e menores, mas já
não é assim. Em vez de haver este tribunal, com Passos Coelho, passou a haver um grandes
tribunais e dentro destes secções de competência de família e menores. Todavia, agora com
António Costa há, afinal, juízos de competência especializada.

CARATERÍSTICAS DOS DIREITOS SUBJETIVOS FAMILIARES - DIREITOS DE CARÁTER


PESSOAL:
1. OS DIREITOS FAMILIARES COMO PODERES FUNCIONAIS: Muitos dos deveres familiares
são, até certo ponto, indisponíveis, não podem ser afastados por estipulação em contrário.
No caso do casamento justifica-se pela presença do interesse público subjacente (não
obstante ser cada mais disponível, ou seja, aquilo que as partes quiseres), noutros campos
do direito da família seria pelo interesse de terceiro.

2. FRAGILIDADE DA GARANTIA: A garantia da relação jurídica é o conjunto de meios coercivos


que o Estado tem à disposição do titular do direito no caso do direito ser violado. Dizia-se
que o direito da família tinha uma garantia mais frágil, não tinha uma garantia comum e o
exemplo que se dava (no passado) era dos deveres conjugais. No caso do cônjuge não ser
fiel ou sair de casa violar o dever do cohabitaçao qual seria a garantia do outro para fazer
valer o seu direito? Pode o cônjuge ofendido pedir uma indemnização? Entendia-se que não,
com base em razões como facto de o casamento funcionar como uma espécie de santuário
em que o Estado não poderia entrar e assim não poderia haver uma indemnização pelo danos
provocados pela violação de direitos familiares. Se é este o fundamento, então deixa de
existir se os cônjuges já estão a divorciar-se. Neste caso, já não há conflito que se agrave e o
casamento deixa de ser um santuário, não havendo razões para que não haja indemnização.
Não havia razões para mesmo durante o casamento não se poder intentar uma ação contra o
outro, mas o normal, nestes casos, é que se divorciem. Quando na vigência do casamento se
pede indemnização o normal é que peça simultaneamente o divórcio. Esta ideia de fragilidade
da garantia está em crise e hoje temos o artigo 1792º/1 no CC, que foi introduzido em 2008,
que diz que o cônjuge lesado tem o direito de pedir a reparação dos danos causados pelo
outro cônjuge, todavia o artigo está integrado na secção do divórcio, por isso parece que o
pedido de indemnização seja pedido com o divórcio.

3. CARÁTER DURADOURO: Os direitos ou relações familiares são duradouros e geram


verdadeiros estados de pessoas: estado de casado, estado de filho, estado de pai, etc. Porque
assim é, existe nas relações familiares uma grande necessidade de certeza e segurança o que
explica que sejam objeto de registo civil obrigatório, que serve para pôr de forma pública os
tais estados da família.

4. TIPICIDADE DOS DIREITOS FAMILIARES: os direitos da família tendiam a ser vistos como
típicos, eram apenas formas típicas, isto é, os que estavam previstos na lei. Esta ideia em
crise.

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DIREITO MATRIMONIAL

1. Introdução

2. O casamento enquanto contrato (requisitos)

3. O casamento enquanto estado (efeitos)

4. Dissolução do casamento

1. INTRODUÇÃO

— Conceito de casamento: artigo 1577º CC.

— Função do casamento: Não se faz referência a outra finalidade do casamento que não seja
esta: a comunhão de vida. Significa que as pessoas querem instituir uma vida plena.

— Caraterísticas gerais (comuns, em princípio, ao casamento civil e católico) do casamento


como ato:

1. O casamento como ato por que se interessam o Estados e as religiões.

Como se regulam estes interesses do Estado e das religiões? Os interesses em jogo -


Estado:

• Interesse em que as pessoas possam seguir livremente o seu culto religioso e


celebrar o casamento ao encontro do ritual da sua religião - interesse da
preservação da liberdade religiosa;

• Enquanto Estado laico, interesse em tratar as religiões da mesma forma - interesse


de preservação da igualdade das religiões;

• Interesse de evitar, tanto quanto possível, que as pessoas que querem casar sejam
forçadas a realizar dois casamentos para ver o seu estatuto de casado reconhecido
pelo Estado.

• Interesse de que, tanto quanto possível, os efeitos dos casamentos civis e religiosos
sejam os mesmos.

Há vários sistemas matrimoniais possíveis, isto é, formas diferentes de articulação da


regulação do Estado e das religiões relativamente ao casamento:

- Sistemas que já não existem na nossa família jurídica:

• Sistema de casamento religioso obrigatório: O Estado reconhece unicamente os


casamentos religiosos, não admitindo, consequentemente, os casamentos civis.

- Sistemas que existem hoje:

• Sistema do casamento civil obrigatório: O Estado só reconhece os casamentos


civis, aos casamentos religiosos não é reconhecida qualquer eficácia. As pessoas
têm liberdade para casarem religiosamente, mas o Estado não atribuirá a esse
casamento quaisquer efeitos jurídicos, forçando, assim, os nubentes a casar
religiosa e também civilmente - dupla celebração.

• Sistema de casamento civil facultativo (vigora entre nós): O Estado reconhece o


casamento religioso e não obriga a realizar um segundo casamento civil. As
pessoas podem escolher se querem casar civil ou religiosamente, sendo, em

Filipa Ribeiro Gonçalves 14


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qualquer um dos casos, o casamento igualmente reconhecido. Há duas


modalidades:

- Casamento civil celebrado sob forma religiosa: Os casamentos religiosos,


apesar de serem realizados sob a forma religiosa, estão sujeitos ao regime
do direito civil. A única coisa religiosa no casamento é apenas a sua forma,
porque em todo o resto do regime (requisitos e efeitos) vale exclusivamente
o direito civil. Assim, o casamento é um instituto único, regido por uma só
lei, a lei civil, salvo no que respeita à forma de celebração. É o que se passa
entre nós em relação a outras religiões que não a católico.

- O casamento é regulado tanto pelo CC como pelo código de direito


canónico. O código de direito canónico regula outros aspetos do regime do
casamento católico para além da sua forma. Neste casos temos dois
institutos diferentes: o casamento civil e o casamento católico. É o que se
passa entre nós em relação ao casamento católico.

Como o nosso DC tem evoluído?

1. No Código Civil de 1867 o sistema matrimonial era o sistema de casamento civil


facultativo, na sua segunda modalidade

2. Com o clericalismo da 1ª República suprimiu-se o casamento civil facultativo e institui-


se o casamento civil obrigatório.

3. Em 7 de maio de 1940, foi assinada uma Convenção Internacional com a Santa Sé, no
Vaticano (Concordata entre a Santa Sé e a República Portuguesa) que admitiu o regresso do
sistema de casamento civil facultativo, na sua segunda modalidade. Na Concordata estabeleceu-
se que o regime da dissolução de casamento católico era o do código de direito canónico, que
estabelecia que não havia dissolução do casamento com o divórcio.

4. Com o CC de 1966 manteve o regime da Concordata, mas, aos poucos, tornou-se


objeto de contestação generalizada em largos setores da opinião pública, a questão da
indissolubilidade por divórcio dos casamentos católicos, contestação que com a queda da
ditadura veio a reforçar-se. Todavia, antes do 25 de abril, as vozes de contestação não tiveram
sucesso.

5. A 15 de fevereiro de 1975, foi assinada, no Vaticano, uma revisão da Concordata de


1940, o Protocolo Adicional à Concordata, e tornou-se os casamentos católicos suscetíveis de
dissolução com o divórcio. Passou a aplicar-se ao casamento católico o regime civil do
casamento em relação à dissolução, mas em outros aspetos o casamento católico continuou a
aplicar-se o código de direito católico.

6. A CRP de 1976 não alterou anda.

7. Em 2001, foi aprovada a Lei nº 16/2001, de 22 de junho conhecida como a Lei da


Liberdade Religiosa. Até 2001, o único casamento religioso que era reconhecido era o católico,
não havia mais casamentos religiosos. Por haver desigualdade de tratamento por parte do
Estado às restantes religiões, estas formaram um movimento reivindicativo e consequentemente
foi aprovada tal lei. Esta lei tem implicações não apenas na matéria do casamento, mas este
aspeto que nos interessa. Com esta lei passaram a ser reconhecidos também os casamentos
celebrados de acordo com outras religiões que não a católica. Mas são todas as religiões? Quais
as religiões reconhecidas para este efeito? As únicas religiões reconhecidas para este efeito são
as religiões consideradas como radicadas em Portugal (têm de ter raízes em Portugal). Como
assim radicada em Portugal? O grupo religioso que quer ser considerado radicado dirige o
requerimento ao Ministério da Justiça, mas este só pode ser apresentado passados que sejam

Filipa Ribeiro Gonçalves 15


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pelo menos 30 anos de presença social organizada em Portugal ou 60 anos fora - requisito
temporal. Uma vez apresentado o requerimento o Ministério da Justiça, tendo em conta a história
e o número de crentes, o MP considera a religião radicada ou não. Se considerar radicada a
mesma é inscrita num registo de pessoas coletivas religiosas, que é um registo das religiões.

8. A alteração mais recente é a nova Concordata entre a República Portuguesa e a Santa


Sé, assinada no Vaticano, a 18 de maio de 2004 e que veio substituir a velha Concordata (de
1940). O que há de diferente em face da velha? Duas coisas (que nos interessam): 1. Enquanto na
velha o Estado português obrigava-se perante a Santa Sé a reservar aos tribunais e repartições
eclesiásticas o conhecimento e julgamento de certas matérias relativas ao direito canónico, ou
seja, representava para o Estado português o cumprimento de uma obrigação, depois de 2004 tal
está no Código porque o Estado português assim o quer e já não porque é obrigado a tal, a
anterior obrigação desapareceu; 2. Antes da nova Concordata, quando havia uma sentença
proferida pelos tribunais eclesiásticos esta era automaticamente recebida na ordem jurídica civil e
produzia igualmente efeitos automáticos. Havia, até 2004, um processo de receção automática
das sentenças, mas deixou de ser assim. As sentenças para terem efeitos na ordem jurídica civil
portuguesa teriam de passar por um processo prévio de revisão e confirmação, através de
requerimento por parte dos interessados no sentido da sentença ser revista e confirmada. É algo
meramente formal, que atende a 4 requisitos: sentença autêntica; provém de tribunal
competente; respeito pelos princípios processuais; e não ofensa dos princípios de ordem pública
internacional. Só assim é confirmada a sentença e passa a produzir efeitos.

Aula dia 19 de outubro de 2018

Caraterização do sistema atual (onde se encaixa o nosso sistema atual?)

Para quem não tem religião, vale o sistema civil obrigatório, aqui não se levanta qualquer
dúvida. O problema só se coloca para as pessoas que têm religião:

- Para aqueles que têm uma religião não radicada em Portugal vale o sistema do
casamento civil obrigatório.

- Para aqueles que professam uma religião radicada em Portugal que não a
católica vale o sistema do casamento civil facultativo na primeira modalidade (casamento civil
celebrado sob a forma religiosa).

- Em relação aos católicos vale o sistema de casamento civil facultativo na


segunda modalidade.

O casamento católico é regulado pelo CC e pelo direito canónico. Quais as áreas


competentes do direito civil e do direito canónico?

Que normas se aplicam ao casamento católico?

NOTA:

Quanto aos requisitos do casamento:

- Requisitos de fundo (definem-se por contraposição aos de forma; é tudo o que não é a forma):

- Requisitos de consentimento (relativos à declaração de vontade);

- Requisitos de capacidade.

- Requisitos de forma.

Temos ainda os efeitos do casamento e a sua dissolução.

Filipa Ribeiro Gonçalves 16


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Relativamente aos requisitos de fundo:

— Requisitos de consentimento: rege-se exclusivamente o direito canónico (pelo


código do direito canónico - 1625º CC).

— Requisitos de capacidade: aplicam-se simultaneamente a lei civil e a canónica.


Para duas pessoas poderem casar catolicamente têm de ter a capacidade exigida pela lei
canónica, bem como têm de respeitar os requisitos de capacidade da lei civil (1596º CC). Mas
como é que isto é controlado? Pelos tribunais civis ou pelos tribunais eclesiásticos? Há um
processo preliminar de casamento que se destina a ver se há ou não capacidade das partes para
se casarem, e nesse processo, que seria enviado pelo conservador do registo civil ao pároco que
celebraria o casamento, o conservador do registo civil tem de passar um certificado a declarar
que os nubentes podem contrair casamento (1598º/1 CC). Se o conservador considerar a
incapacidade dos contraentes, o que proíbe o casamento, o pároco não o pode celebrar, sob
pena de incorrer em crime de desobediência qualificada. E se o casamento for celebrado mesmo
assim? Quem julga este caso de incapacidade? De acordo com o 1625º CC diz-se que a
competência pertenceria aos tribunais eclesiásticos. Todavia, eles não podem apreciar tal
situação, pois eles apenas aplicam, por força do 1625º, o direito canónico e não o direito civil. Os
tribunais civis também não podem apreciar, por força do 1625º, que atribui a competência aos
tribunais eclesiásticos. Isto significa que a situação não pode ser apreciada nem pelos tribunais
civis, nem pelos tribunais eclesiásticos, não podendo assim este casamento vir a ser anulado,
nem declarado nulo. Apesar de ser um casamento de incapazes e da incapacidade conduzir à
invalidade do casamento, ele não pode ser invalidado e, por isso, permanece válido. Perante
estes casos, a lei estabeleceu um truque que vai conduzir a um resultado equivalente ao da
invalidade: os casamentos católicos para terem efeitos civis não basta realizarem-se, é preciso
serem registados e enquanto não o forem e se não o forem é como se não existissem; neste caso
pode ser recusado legitimamente o registo do casamento por parte conservador e como o
casamento não é registado ele, apesar de celebrado e válido, não terá eficácia civil.

Relativamente aos requisitos de forma: relativamente à forma propriamente dita, ou seja, ao


ritual/cerimónia, rege-se apenas pelo direito canónico. Todavia, há ainda formalidades anteriores
à celebração, ou seja, processos preliminares do casamento, onde se aplicam tanto o direito
canónico como o direito civil e formalidades posteriores, como é o registo, onde se aplicam
igualmente normas de direito canónico e de direito civil.

Quanto aos efeitos do casamento: aplica-se exclusivamente o direito civil (artigo 1588º CC).

Quanto à dissolução do casamento: em regra, aplicam-se as normas do CC, mas há um


ponto específico em que se aplica o código de direito canónico, que é o caso da dispensa do
casamento rato e não consumado - artigo 1625º.

Quanto às causas de nulidade do casamento e ao regime processual das respetivas


ações só o direito eclesiástico é competente - artigo 1625º CC. Mas é ao direito civil que
pertence, uma vez declarada a nulidade do casamento católico pelo tribunal eclesiástico, regular
os efeitos da nulidade (aplicar-se-á aqui os artigos 1647º-1648º CC).

Quanto à promessa de casamento aplicam-se os artigos 1591º e ss. CC.

Filipa Ribeiro Gonçalves 17


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Foram levantadas, entre nós, dúvidas sobre a constitucionalidade do nosso sistema


matrimonial, no entanto já estão ultrapassadas.

Houve quem dissesse que todo o nosso sistema matrimonial seria inconstitucional, que
inclusivamente a simples admissão de duas formas diferentes de celebrar casamento seria
inconstitucional. A realidade é que tal admissibilidade é constitucional porque está admitida
expressamente na CRP, no seu artigo 36º/2 (A lei regula os requisitos e os efeitos do casamento e da
sua dissolução, por morte ou divórcio, independentemente da forma de celebração), onde admite, na
parte final do preceito, várias formas.

Aula dia 25 de outubro de 2018

Temos ainda a questão do princípio do Estado laico (laicidade do Estado - artigo 41º/4
CRP). Há quem diga que o nosso sistema, na medida em que reconhece/atribui efeitos jurídicos
civis a casamentos religiosos, seria um Estado com religião. É um argumento sem sentido, pois
não é pelo facto de reconhecer os casamentos religiosos que passa a ter religião. Até porque,
hoje, o Estado reconhece várias religiões, qual seria, então, a religião do Estado? Não há
inconstitucionalidade.

Bem como a questão do princípio é da liberdade religiosa (artigo 41º CRP). Há religiões
cujos casamentos não são reconhecidos, é o caso das religiões não radicadas em Portugal. As
pessoas que professam estas religiões seriam menos livres em termos religiosos. Isto não parece
ter sentido. A liberdade religiosa significa a liberdade de ter uma religião, de praticar o culto dela
e de celebrar casamento segundo os seus ritos e que as pessoas que não professem qualquer
credo não sejam obrigadas a celebrar casamento religioso; não significa ter o direito do
reconhecimento do casamento pelo Estado.

Ainda a igualdade de tratamento das religiões. Não há, entre nós, igualdade de tratamento
das religiões. Há desigualdade de tratamento entre as religiões radicadas e não radicadas em
Portugal, pois os casamentos das religiões radicadas em Portugal são dotados de efeitos civis e
os casamentos das religiões não radicadas em Portugal não são dotados de efeitos civis. Para
além de que o casamento católico é tratado de uma forma e o casamento de outras religiões
reconhecidas é tratado de outra forma. Decerto que as religiões e seitas são todas iguais no
sentido de que deve ser permitido livremente o culto de qualquer delas (salvo eventuais restrições
que a ordem pública possa impor), mas, como é óbvio, não têm todas o mesmo grau de
organização nem na mesma relevância social. Assim e por força do princípio da igualdade, não
se deve obrigar Estado a tratar como igual o que é diferente. Mas será que há uma violação do
tratamento igual das religiões? As religiões não são todas iguais e, por isso, devem ser tratadas
de forma diferente. Seja como for, o nosso regime atual do casamento, com 3 tipos de
casamento, foi aceite por todos. Quando se elaborou a lei da liberdade religiosa os membros de
todas as religiões participaram e a aceitaram, mesmo sendo desigual.

2. O casamento como negócio jurídico


O casamento tem caráter negocial; é um negócio jurídico, ou seja, é um ato em que os
sujeitos (nubentes) que casam declaram a sua vontade, sob tutela do direito, e visam a produção
de certos efeitos práticos.

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3. O casamento como contrato

Dentro dos negócios jurídicos é um contrato (artigo 1577º CC), isto é, um negócio jurídico
bilateral, em que há duas declarações de vontade que convergem para a produção de um
resultado comum.

Importa apreciar a doutrina que nega a contratualidade do matrimónio. Uma orientação


mais extrema que vê na declaração do funcionário do registo civil o elemento verdadeiramente
constitutivo do casamento, sendo o consentimento das partes um simples pressuposto dessa
declaração. Há, porém, orientações mais moderadas. Segundo uma delas, o casamento seria um
negócio plurilateral, com três partes: os cônjuges e o conservador do registo civil, colocando a
declaração do funcionário ao lado das declarações dos nubentes. Há ainda uma doutrina que
concebe o casamento como um complexo de atos, como um conjunto integrado por um negócio
bilateral e por um poder estadual, passando o casamento em parte a ser de direito privado e em
outra parte a ser de direito público.

4. O casamento e diversidade de sexo

O casamento pode ser realizado por pessoas de sexo diferente ou do mesmo sexo.

Nota sobre a progressiva aceitação do casamento por pessoas do mesmo sexo:

1º. Não era aceite;

2º. Não se aceitou, mas reconheceu-se efeitos jurídicos à união de facto entre pessoas do
mesmo sexo (em Portugal);

3º. Admitiu-se um contrato com os mesmo efeitos do casamento, mas que não se
chamava casamento (Alemanha, Áustria, Suíça, em Portugal já não). Havia uma união civil registada
ou contrato de parceria registada. O legislador não lhe chamou casamento, pois era um
expressão reservada aos velhos casamentos entre pessoas de sexo diferente.

4º. Aceitação do próprio casamento (entre nós, em 2010).

Questões de constitucionalidade que se levantaram, quer quando era proibido, quer hoje
em que é permitido. Antes, quando era proibido o casamento por pessoas do mesmo sexo, o
problema de constitucionalidade era de saber se o regime seria contrário ao princípio da
igualdade ou da proibição da discriminação em função da orientação sexual, o que representaria
uma discriminação entre uns e outros. Agora, em que o casamento por pessoas do mesmo sexo
é permitido, suscita-se o problema de saber se a CRP (artigo 36º/1) ao consagrar ao direito ao
casamento, ao garantir essa instituição que é o casamento, não estaria a querer garantir o
casamento com a caraterística da heterossexualidade. A CRP não impõe um certo modelo de
casamento? O casamento heterossexual? O TC decidiu no sentido em que a CRP não se
pronuncia sobre o assunto, a única coisa que exige é que haja casamento, que duas pessoas
queiram entrar numa comunhão de vida. Agora se o legislador quiser acrescentar mais
caraterísticas tem a liberdade para o fazer. A CRP impõe apenas o mínimo e dá liberdade ao
legislador ordinário para definir outras caraterísticas do casamento, podendo o casamento
cumprir outras funções desde que justificáveis. Posto isto, não era inconstitucional nem o
sistema anterior nem o atual.

5. O casamento como negócio pessoal


Enquanto negócio familiar, é um negócio pessoal, ou seja, é um negócio que não se
destina a constituir, modificar ou extinguir relações de caráter patrimonial, mas a influir no estado
das pessoas, familiar ou de outra ordem. É um negócio pessoal porque:

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1º Tem efeitos pessoais. Resultam efeitos patrimoniais, mas não são esses que
caraterizam a índole do casamento.

2º Em principio, só pode ser realizado pessoalmente, mas pode vir a ser realizado
mediante procurar.

6. O casamento como negócio solene


É daqueles negócios em que a vontade dos contraentes não pode manifestar-se ou
exprimir-se de qualquer modo, mas só através de certa forma, determinada por lei. Para o
casamento a forma requerida para a sua validade consiste an cerimónia da celebração do ato.
Relativamente às formalidades do casamento católico são regidas pelo direito canónico, já o
casamento civil tem de ser celebrado perante o funcionário do registo civil.

— Caraterísticas do casamento como estado:


1. Unidade ou exclusividade

É um contrato a dois. Uma pessoa não pode estar casada ao mesmo tempo com duas ou
mais pessoas. Nem a poliandria nem a poligamia são, pois, admitidas. Ver artigos 1601º/c CC e
247º Cód. Penal (neste, a bigamia como crime).

2. Vocação de perpetuidade?

O casamento seria de vocação de perpetuidade ou perpetuidade tendencial. Ele não é


perpétuo, essa ideia já não existe na sua pureza, por isso se diz tendencial. Fala-se de tendencial
perpetuidade pois:

1º: O casamento não pode cessar ainda por simples denúncia não fundada de uma das
partes. Para um dos cônjuges se divorciar tem de provar um facto. O casamento só cessa com
fundamento no sentido do divórcio com prova em factos;

2º: Ao contrário dos negócios patrimoniais comuns em que se pode apor uma condição
ou termo (possibilidade de delimitar temporalmente a relação), ficando condicionados, assim, a
um eventual evento futuro e incerto, no casamento não, não se pode apor uma condição ou um
termo.

2. CONTRATO DE PROMESSA DE CASAMENTO

Está previsto nos artigos 1591º a 1595º CC.

O contrato promessa é o contrato nos termos do qual as partes se obrigam a


posteriormente celebrar o contrato prometido, no caso o casamento; as partes comprometem-se
a casar (artigo 1591º CC).

Embora o artigo 830º CC admita, em geral, a execução específica das obrigações


derivadas dos contratos-promessa, a natureza da obrigação assumida - natureza pessoal que
reveste a obrigação de casar - excluiria, desde logo, neste caso, a possibilidade de execução
específica. Isto significa que da promessa de casamento não pode resultar uma obrigação de
casar cujo cumprimento é exigível judicialmente, ou seja, a promessa de casamento não dá
direito a exigir a celebração do casamento. Posto isto, este contrato não é suscetível de
execução específica.

De acordo com o regime geral, se uma das partes não cumprir a obrigação tem de
indemnizar a contraparte, em princípio, pelos os danos que causou, sejam danos patrimoniais ou
não patrimoniais. No âmbito da promessa de casamento, o contraente que não cumpra a

Filipa Ribeiro Gonçalves 20


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promessa não responde pela totalidade dos prejuízos causados: ele responde só por certas
despesas, sem que as partes possam estipular cláusula penal de montante superior - menor
extensão do dever de indemnizar. Neste sentido, a parte fiel só pode reclamar as indemnizações
previstas no artigo 1594º CC, ou seja, os danos indemnizáveis são apenas as despesas feitas e
as obrigações contraídas na previsão do casamento, ficando de fora, pois, os lucros cessantes,
os restantes danos emergentes e os danos não patrimoniais. Posto isto, não são indemnizáveis
danos não patrimoniais nem outros danos patrimoniais. Até porque se assim não fosse, se não
houvesse um dever de indemnizar de menor extensão e se a promessa de casamento fosse
plenamente eficaz (como os outros contratos-promessa), o consentimento para o matrimónio
seria menos livre. Para não ter de indemnizar a totalidade dos prejuízos causados, para não ter
de pagar uma indemnização porventura muito avultada, o contraente que estivesse na disposição
de romper a promessa poderia preferir talvez casar e é isso que a lei não deseja. A lei tem
especial empenho para que o consentimento dos nubentes seja livre, tanto quanto possível, até
ao momento da celebração do casamento.

A indemnização pode ser pedida (artigo 1594º/1 CC) pelo esposado inocente, pelos pais
deste ou por terceiros que tenham agido em nome dos pais e pode ser pedida pelo nubente
culpado, que rompeu a promessa sem justo motivo ou que, por culpa sua, deu lugar a que o
outro se retratasse.

A indemnização é fixada pelo árbitro do tribunal (artigo 1594º/3 CC) e a responsabilidade


em que incorra o nubente que se retrate ou dê justo motivo à retratação do outro, embora
circunscrita nos limites do artigo 1594º CC, não deverá ter-se como responsabilidade
extracontratual ou pré-contratual, mas como responsabilidade contratual.

Em todo o caso, esta obrigação de indemnizar do artigo 1594º só existe se um dos


contraentes romper a promessa sem justo motivo. Justo motivo é um conceito indeterminado,
que pertencia à jurisprudência determinar na sua aplicação aos casos concretos. Não havendo
jurisprudência sobre a matéria, poderá dizer-se, de um modo geral, que há justo motivo quanto,
segundo as conceções que dominam a esfera social dos nubentes, a continuação do noivado e a
celebração do casamento não podem razoavelmente ser exigidas a um ou ambos os esposados.
Há de se tratar de causas anteriores à própria retratação, mas que poderão ser posteriores ou
anteriores à promessa de casamento. Neste último caso, porém, não deve tratar-se, ao menos
em regra, de circunstâncias que já fossem conhecidas do nubente que se retratou. A prova do
justo motivo pertence ao réu (devedor); é a solução mais razoável e que decorre da aplicação das
regras gerais (artigo 799º/1 CC).

Existe ainda a obrigação de restituir os donativos feitos em virtude da promessa de


casamento e na expectativa do casamento (artigo 1592º e 1593º CC), tanto no caso de
retratação como no de incapacidade, e tanto em relação aos donativos recebidos do outro
esposado como os recebidos de terceiro. O dever de restituir também abrange as cartas ou
retratos pessoais do outro esposado (artigo 1592º/2 CC), mas não as coisas que hajam sido
consumidas antes da retratação ou da verificação da incapacidade.

O artigo 1593º estabelece, porém, um regime particular para o caso de casamento não
celebrado em razão da morte de algum dos promitentes. O esposado sobrevivo tem, neste caso,
uma opção: de harmonia com as regras gerais, pode exigir aos herdeiros do outro esposado os
donativos que tenha feito restituindo os que recebeu; mas podem também conservar os
donativos do falecido, perdendo, neste caso, o direito de exigir os que por sua parte lhe tenha
feito. Isto quanto à generalidade dos donativos, pois quanto à correspondência e aos retratos

Filipa Ribeiro Gonçalves 21


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pessoais do falecido o sobrevivo pode reter o que tenha recebido e exigir a restituição do que
tenha dado, ficando, pois, com tudo.

Tanto no caso do rompimento da promessa ou da morte do promitente, o direito de exigir


a restituição dos donativos ou a indemnização, caduca no prazo de 1 ano (artigo 1595º CC).

3. CASAMENTO CIVIL COMO ATO (requisitos e invalidades)

Duas notas introdutórias:

1ª: Não vale aqui a regra geral do negócio jurídico do artigo 294º CC: Os negócios
jurídicos celebrados contra disposição legal de carácter imperativo são nulos, salvo nos casos em
que outra solução resulte da lei. Vale antes a disposição específica do artigo 1627º CC: É válido o
casamento civil relativamente ao qual não se verifique alguma das causas de inexistência jurídica,
ou de anulabilidade, especificadas na lei. Ou seja, a invalidade tem de estar definida
expressamente em lei, é preciso que haja uma norma específica que diga que há invalidade.

2ª: No casamento civil, as únicas sanções invalidatórias previstas são, para poucos casos,
a inexistência e, para a generalidade dos casos, a anulabilidade, não existe a consequência
nulidade. A eventual referência aos casamentos nulos refere-se ao casamento católico e não civil.

Índice:

Quanto aos requisitos do casamento:

- Requisitos de fundo (definem-se por contraposição aos de forma; é tudo o que não é a forma):

- Requisitos de consentimento (relativos à declaração de vontade);

- Requisitos de capacidade.

- Requisitos de forma.

Temos ainda as invalidades do casamento quando não observados os requisitos.

REQUISITOS:

• Requisitos de FUNDO:

- De CONSENTIMENTO (declarações dos sujeitos): Sem a vontade de casar da parte de


ambos os nubentes e sem que esta tenha sido manifestada, nos termos da lei, não pode
haver casamento válido (princípio da vontade). As questões respeitantes ao
consentimento estão reguladas nos artigos 1617º e ss. O artigo 1617º CC enuncia o
princípio da atualidade do mútuo consentimento. O consentimento tem de ser:

1. Pessoal: O consentimento há de ser expresso pelos próprios nubentes,


pessoalmente, no ato da celebração; a vontade é estritamente pessoal - artigo
1619º CC. O casamento é um negócio pessoal. A lei admite, porém, o chamado
casamento por procuração (artigo 1620º CC), o qual constitui, de alguma forma,
uma exceção ao princípio geral. A procuração (caráter formal) deve ser outorgada
por documento assinado pelo representante, com reconhecimento presencial da
assinatura, por documento autenticado ou por instrumento público. Só um dos
nubentes pode fazer-se representar por procurador e há de tratar-se de

Filipa Ribeiro Gonçalves 22


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procuração em que se confiram poderes especiais para o ato, se individualize a


pessoa do outro nubente e se indique a modalidade do casamento (caráter
substancial). Do artigo 1628º/d CC resulta que o casamento por procuração é
inexistente quando celebrado depois de terem cessado os efeitos da procuração,
quando esta não tenha sido outorgada por quem nela figura como constituinte ou
quando seja nula por falta de concessão de poderes especiais para o ato ou de
designação expressa do outro contraente; a falta de indicação da modalidade do
casamento (artigo 1620º/2 CC) não parece determinar a nulidade da procuração e
a inexistência do casamento que venha a ser celebrado. E, em face ao artigo
1621º/1 e 2 CC, cessam todos os efeitos da procuração pela revogação dela
(constitui um desvio à regra do artigo 224º CC), pela morte do constituinte ou do
procurador ou pela interdição ou inabilitação de qualquer deles em consequência
de anomalia psíquica.

2. Puro e simples: Não se pode apor ao casamento cláusulas condicionais, ou seja,


uma condição ou um termo. O casamento não pode ficar na dependência de um
acontecimento futuro, incerto (condição) ou mesmo certo (termo) (artigo 1618º/2
CC). O casamento é um contrato incondicional e inatrasável. E se o casamento for
celebrado com condição? As cláusulas consideram-se não inscritas e o
casamento vale, isto para a proteção da dignidade do casamento - artigo 1618º/2
CC.

3. Perfeito: As duas declarações de vontade que integram o consentimento devem


ser concordes uma com a outra e em cada uma dessas declarações de vontade
deve haver concordância entre a vontade e a declaração. Uma concordância que
a lei presume, pois, nos termos do artigo 1634º CC. Não pode verificar-se, assim,
uma divergência entre a declaração e a vontade. Todavia nem sempre assim
acontece. Por vezes, consciente ou inconscientemente, pode ocorrer que a
vontade manifestada ou declarada seja diferente da vontade efetiva ou real. Então
o consentimento é imperfeito. E o problema que se põe é o de saber se o
declarante ficará vinculado, e em que termos, à declaração que prestou sem
embargo de ser outra a sua vontade.

Nota: Em sede de casamento, o interesse de proteção da confiança do


declaratório não faz sentido, mas existe um interesse em proteger a estabilidade
ou dignidade do casamento.

O regime das divergências entre a vontade e a declaração do regime geral é


diferente do regime do casamento - artigo 1635º CC que se refere às únicas
divergências entre vontade e declaração, que têm como sanção a anulabilidade
por falta de vontade:

• Declarações não sérias (1635º/a): Só podendo a incognoscibilidade, pelo


declaratário, da não seriedade da declaração fundamentar uma obrigação
de indemnizar os prejuízos sofridos (245º/2 CC).

• Coação absoluta ou física (1635º/c): Constitui o desvio à regra do artigo


246º CC.

• Casamento simulado (1635º/d): O casamento é simulado quando os


nubentes apenas pretendem seguir o fim visado (p. e., a adquirição de
nacionalidade, a obtenção de autorização de residência ou de trabalho) e recusam a
comunhão de vida que constitui a essência do casamento: a declaração

Filipa Ribeiro Gonçalves 23


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que prestam perante o conservador do registo civil de que querem casar


um com o outro não corresponde à sua vontade real. A anulação pode ser
requerida pelos próprios cônjuges e por quaisquer pessoas prejudicadas
com o casamento (artigo 1640º/1 CC), dentro dos 3 anos subsequentes
ou, se o casamento era ignorado do requerente, nos 6 meses seguintes à
data em que dele teve conhecimento (artigo 1644º CC).

• Erro na declaração (1635º/b): Hipóteses de erro na declaração: casos em


que falta ao declarante a própria vontade da ação; casos em que lhe falta
a vontade da ação como declaração; casos de simples desvio na vontade
negocial. Nos dois primeiros casos, o casamento é anulável (artigo 1635º/
a, que constitui um desvio da regra do 246º CC). No último caso, o sujeito
executa voluntariamente o comportamento declarativo e tem vontade de
realizar um negócio jurídico, mas não o negócio jurídico de conteúdo
correspondente ao significado exterior da declaração. Como o casamento
é um negócio de conteúdo fixo, são dificilmente concebíveis estes casos
de erro na declaração. Em qualquer um dos casos, a anulação só pode ser
requerida pelo cônjuge cuja vontade faltou (artigo 1640º/2 CC), dentro dos
3 anos subsequentes à celebração do casamento ou, se este era ignorado
do requerente, nos 6 meses seguintes à data em que dele teve
conhecimento (artigo 1644º CC); mas pode ser continuada pelos seus
parentes, afinas na linha reta, adotantes ou herdeiros se o autor falecer na
pendência da causa.

4. Livre: O consentimento deve ser livre, o que a lei presume também no artigo
1634º CC. E, para que o consentimento seja verdadeiramente livre, é preciso que
a vontade dos nubentes, em primeiro lugar, tenha sido esclarecida, ou seja,
formada com exato conhecimento das coisas, e, em segundo lugar, se tenha
formado com liberdade exterior, isto é, sem a pressão de violências ou ameaças.
Com o primeiro aspeto relaciona-se a doutrina do erro e com o segundo a da
coação. Isto significa que não podem verificar-se vícios da vontade, ou seja,
coação e erro; a vontade não pode ser viciada.

Na verdade, em face do princípio do artigo 1627º CC, só são relevantes em


matéria de casamento os vícios da vontade previstos especialmente na lei,
justamente o erro-vício (artigo 1636º) e a coação moral (artigo 1638º), e não os
restantes. Não assumem significado, pois, quanto ao casamento, nem o dolo (este
não está previsto porque não releva autonomamente, releva sim enquanto erro, em que não
deixa de ser um erro e erro provocado pela contraparte ou terceiro), nem, em geral, o
estado de necessidade. Outra consequência do artigo 1627º é a de que o erro e a
coação só são relevantes, em matéria de casamento, nos apertados termos e
condições dos artigos 1636º e segs. Quer isto dizer que os requisitos especiais
que aí se põem para a relevância do erro e da coação excluem aquelas outras
exigências feitas no Código Civil para a relevância do erro e da coação nos
negócios jurídicos em geral: como lei especial, as primeiras normas substituem e,
nessa medida, afastam a aplicação das últimas. Havendo, contudo, ainda
condições ou pressupostos gerais que a lei ou a doutrina exigem para a relevância
do erro e da coação como motivos de anulação do negócio jurídico, decerto que
tais pressupostos ou condições ainda se aplicam ao casamento.

Filipa Ribeiro Gonçalves 24


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• Erro: Releva nos termos do artigo 1636º CC (aos quais acrescem, porém, as
condições gerais) e depende dos seguintes pressupostos:

- Recaia sobre qualidade essencial da pessoa do outro cônjuge:


De todas as possíveis modalidades que o erro pode revestir só
releva uma delas: o erro sobre a pessoa do outro contraente. O
erro deve recair sobre a pessoa com quem se realiza o
casamento, sobre as suas qualidades, mas não sobre quaisquer
qualidades, mas sobre uma qualidade essencial dessa pessoa.

Trata-se de um conceito indeterminado, que pertence à


jurisprudência aplicar e que só se determina através dessa
aplicação. Poderá dizer-se que são essenciais as qualidades
particularmente significativas, que, em abstrato, sejam idóneas
para determinar o consentimento (estado civil ou religioso do outro
cônjuge, nacionalidade, prática de crime infamante, vida e costumes
desonrosos, impotência, deformidades físicas graves, doenças
incuráveis e que sejam hereditárias ou contagiosas).

- Próprio: Não há de recair sobre qualquer requisito legal de


existência ou de validade do casamento. Assim, se um dos
cônjuges supunha erradamente que o outro já atingira a idade
nupcial, ou que o outro era divorciado quando ainda era casado, o
erro será impróprio. O casamento será anulável, não propriamente
por erro, mas sim, e independentemente do erro, por falta do
requisito legal a que o erro diz respeito.

- Desculpável: Exigência que resulta expressamente do artigo


1636º CC. O erro indesculpável ou grosseiro, em que não teria
caído uma pessoa normal perante as circunstâncias do caso, não
pode pois ser invocado como motivo de invalidade do casamento.
- A circunstância sobre a qual o erro versou tenha sido
determinante da vontade de contrair casamento, tanto subjetiva
como objetivamente: Se o erro não existisse e o sujeito tivesse
um conhecimento exato dessa circunstância, não teria querido
celebrar o casamento. Mas não basta que o erro tenha sido
determinante subjetivamente, como na generalidade dos negócios
jurídicos (artigos 247º e 251º), não basta que a circunstância sobre
que recaiu o erro tenha sido essencial para o nubente na
determinação da sua vontade de contrair casamento; há de
acrescer uma essencialidade objetiva (artigo 1636º), ou seja, há de
ser legítimo, razoável, em face das circunstâncias do caso e à luz
da consciência social dominante, que na determinação da
vontade de casar tenha sido decisiva a circunstância sobre que
versou o erro.

• Coação: Revela nos termos do artigo 1638º CC. Enquanto vício da


vontade, reconduz-se ao receio ou temor ocasionado no declarante pela
cominação de um mal, dirigido à sua própria pessoa, honra ou fazenda ou
de um terceiro. O receio da consumação ulterior do mal cominado é que
constitui propriamente a coação como vício da vontade. O mal que se

Filipa Ribeiro Gonçalves 25


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receia há de ter sido cominado precisamente com intenção de extorquir o


consentimento do declarante para o negócio de que se trata (artigo 255º/1)
— o negócio que se diz celebrado sob coação.

Condições gerais de relevância da coação (também se exigem para o


casamento). Há que distinguir conforme a coação é exercida pelo outro
contraente ou proveniente de terceiro. No que se refere à coação exercida
pelo outro contraente:

- A coação deve ser essencial ou determinante da vontade: Não


há de ser puramente incidental. É preciso que o negócio nunca
tivesse sido concluído se não fora o temor ou receio do mal
cominado.

- Há de haver intenção de extorquir a declaração.

- A cominação deve ser injusta, ilícita: O mal ameaçado pode


corresponder ao exercício de um direito do cominante e, todavia,
a cominação ser injusta; será injusta se o cominante quiser obter
uma vantagem anormal, desproporcionada ou sem qualquer
relação com o seu direito.

Tratando-se de coação proveniente de terceiro, exige ainda a lei mais dois


requisitos:

- Seja grave o mal cominado.

- Justificado o receio da sua consumação.

Pelo que respeita ao casamento, não se distingue entre as hipóteses de a


coação provir do outro contraente ou de terceiro. Nos termos do artigo
1638º/1 CC, é anulável o casamento celebrado sob coação moral,
contanto que seja grave o mal com que o nubente é ilicitamente
ameaçado e justificado o receio da sua consumação. Formulam-se aqui
duas exigências que apenas são postas, relativamente à generalidade dos
negócios jurídicos, quando a coação seja proveniente de terceiro (artigo
256º/2ª parte CC): a exigência da gravidade do mal cominado e a do
receio justificado da consumação desse mal, a qual implica, obviamente,
as exigências da iminência do mal e da gravidade da própria ameaça. A
coação é relevante mesmo que a ameaça vise interesses patrimoniais, e,
quando se dirija a terceiro, qualquer que seja a relação, familiar ou outra,
entre esse terceiro e o declarante coagido. Basta que a cominação do mal
a causar ao terceiro, dada aquela relação, tenha determinado — como se
lhe fosse dirigida — a vontade do declarante.

Do artigo 1638º/2 CC resulta que é equiparada à ameaça ilícita o facto de


alguém extorquir ao nubente a declaração de vontade mediante a
promessa de o libertar de um mal.

Anulabilidade por erro ou coação; seu regime

Quando o consentimento for prestado por erro ou coação e se verifiquem as


respetivas condições de relevância o casamento é anulável (artigo 1631º/b).

A ação de anulação só pode ser intentada pelo cônjuge enganado ou coato,


dentro dos seis meses subsequentes à cessação do vício (artigo 1645º), ou
seja, subsequentes à data em que o cônjuge teve conhecimento da

Filipa Ribeiro Gonçalves 26


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circunstância sobre que versou o erro ou em que cessou a coação; mas


podem prosseguir nela os seus parentes, afins na linha reta, herdeiros ou
adotantes se o autor falecer na pendência da causa (artigo 1641º). Além
disso, a anulabilidade é sanável mediante confirmação, nos termos gerais do
artigo 288º. A confirmação pode ser expressa ou tácita, como nos negócios
jurídicos em geral (artigo 288º/3).

Aula dia 26 de outubro de 2018

- De CAPACIDADE: Os impedimentos matrimoniais dizem-se as circunstâncias que, de


qualquer modo, impedem a celebração do casamento, as circunstâncias verificadas as
quais o casamento não pode celebrar-se, sob pena de anulabilidade do ato ou de
sanções de outra natureza. Os impedimentos não são propriamente incapacidades, mas
as circunstâncias onde elas se originam; são causas das incapacidades. Tais
incapacidades são os efeitos que os impedimentos matrimoniais produzem ainda antes
de o casamento se celebrar; depois da celebração, os impedimentos determinam a
anulabilidade do casamento ou outras sanções.

Classificações dos impedimentos matrimoniais (artigos 1601º, 1602º e 1604º CC):

- Impedimentos dirimentes vs. impedimentos impedientes: 1ºs. O casamento que for


contraído não obstante a existência de impedimento é anulável (1631º/a) e podem
ser impedimentos absolutos ou relativos; 2ºs. Impedem igualmente a realização do
casamento, mas se o casamento se realizar ele continua válido. Nestes casos,
aplicam-se outras sanções.

- Impedimentos absolutos vs. impedimentos relativos: 1ºs. São verdadeiras


incapacidades, filiam-se numa qualidade da pessoa e impedem-na de casar seja
com quem for; 2ºs. São ilegitimidades, que se fundam numa relação da pessoa de
que se trata com outra(s) e que só lhe proíbem o casamento com essa(s) pessoa(s).

- Impedimentos dispensáveis vs. impedimentos não dispensáveis: 1ºs. Admitem


dispensa; 2ºs. Não admitem dispensa. Dispensa diz-se o ato pelo qual uma
autoridade, atendendo às circunstâncias do caso concreto, autoriza o casamento
nesse caso não obstante a existência de determinado impedimento. Consideram-
se dispensáveis os impedimentos referidos no artigo 1609º/1 CC, a dispensa, de
acordo com o nº 2, compete ao conservador do registo civil, que concederá
quando haja motivos sérios que justifiquem a celebração do casamento e nos
casos de algum dos nubentes ser menor o conservador ouvirá, sempre que
possível os pais ou o tutor, à luz do nº 3.

- Impedimentos de direito civil vs. impedimentos de direito canónico: Os


impedimentos dirimentes e impedientes do casamento civil são também
impedimentos ao casamento católico (artigo 1596º CC).

Filipa Ribeiro Gonçalves 27


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IMPEDIMENTOS DIRIMENTES ABSOLUTOS (artigo 1601º CC):

- FALTA DE IDADE NUPCIAL (1601º/a): O casamento é anulável se algum dos


nubentes ainda não tinha atingido, ao concluir o matrimónio, a idade nupcial, ou
seja, a idade mínima que incidia suficiente maturidade física e psíquica e que a lei
exige para que se possa celebrar casamento válido. Segundo o artigo 1601º/a CC,
é impedimento dirimente absoluto a idade inferior a 16 anos seja qual for o sexo do
nubente.

No que se refere à legitimidade para a ação de anulação e respetivos prazos regem


os artigos 1639º e 1643º CC.

Têm legitimidade para propor a ação ou prosseguir nela: os cônjuges ou qualquer


outro parente deles na linha reta ou até ao 4º grau na linha colateral, bem como os
herdeiros e adotantes dos cônjuges e o Ministério Público - artigo 1639º/1 CC;
bem como o tutor do menor - artigo 1639º/2 CC.

Quanto aos prazos: se a ação for proposta pelo próprio menor este tem até 6
meses depois de atingir a maioridade; se for proposta por outras pessoas estas
têm até 3 anos depois da celebração do casamento, mas nunca depois da
maioridade - artigo 1643º/1/a CC.

A anulabilidade considera-se sanada, convalidando-se o casamento desde a data


da celebração, se, antes de ter transitado em julgado a sentença de anulação, o
menor confirmar o casamento perante o funcionário do registo civil e duas
testemunhas, depois de atingir a maioridade - artigo 1633º/1/a CC.

- DEMÊNCIA (1601º/b): Nos termos do artigo 1601º/b CC, são impedimentos


dirimentes absolutos a demência notória, mesmo durante os intervalos lúcidos, e a
interdição ou inabilitação por anomalia psíquica.

O conceito jurídico de demência não coincide com o psiquiátrico: demência, para


o direito civil, é o mesmo que anomalia mental ou psíquica. Trata-se de qualquer
anomalia, quer se projete no domínio da inteligência quer no da vontade, que
impeça o indivíduo de reger convenientemente a sua pessoa e os seus bens.

A lei não visa aqui, como na generalidade dos negócios jurídicos, a proteção do
interesse particular do próprio cônjuge psiquicamente anormal; os interesses que
se querem proteger com o impedimento de demência são interesses públicos.
Pretende-se evitar que as doenças se transmitam para os filhos e defender sob
este aspeto a própria sociedade (razão de saúde pública); por outro lado (razão de
ordem social), quer a lei evitar que se constituam famílias que não sejam, no corpo
social, células sãs e úteis, como decerto não o seriam as famílias em que algum
dos cônjuges fosse portador de anomalia psíquica.

Filipa Ribeiro Gonçalves 28


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O impedimento tanto abrange a demência de direito (reconhecida em sentença de


interdição ou inabilitação por anomalia psíquica), como a simples demência de
facto.
O impedimento de interdição ou inabilitação por anomalia psíquica só existe desde
a data do trânsito em julgado da respetiva sentença, mas a sentença que decrete a
interdição ou inabilitação deve fixar, sempre que possível, a data do começo da
incapacidade, nos termos do artigo 901º/1 CPC; presumindo-se que a
incapacidade já existia desde essa data. Assim, o casamento que tenha sido
celebrado posteriormente à data que a sentença tenha fixado como a do começo
da incapacidade poderá ser anulado, com fundamento no artigo 1601º/b CC, sem
que o requerente tenha de fazer prova da anomalia psíquica invocada.

Não assim no caso de demência de facto, em que importará fazer prova, não
apenas da demência, mas também da data em que ela se manifestou. Como
decorre das regras gerais, a demência só releva se já existia à data da celebração
do casamento; a demência posterior não é impedimento nem pode fundar uma
ação de anulação, mas só uma ação de divórcio ou separação judicial de pessoas
e bens, nos termos do artigo 1781º/b CC. Note-se que, tratando-se de demência
de facto, requer ainda a lei a notoriedade da demência.

O Código dá uma noção de facto notório no artigo 257º/2. Se o autor da


declaração, por qualquer causa acidental, não era capaz de entender o sentido da
declaração ou não tinha o livre exercício da vontade, a declaração pode ser
anulada se o facto era notório ou conhecido do declaratário, considerando-se o
facto notório quando uma pessoa de normal diligência o teria podido notar. Não
cremos porém que a demência, como impedimento matrimonial, tenha de ser
notória no sentido do artigo 257º/2, dada a diferente função que a exigência da
notoriedade desempenha nas duas hipóteses. No caso de incapacidade acidental
essa exigência é posta para defender os interesses do declaratário e os interesses
gerais da contratação: a lei permite a anulação do negócio no interesse do
incapaz, mas entende que só é razoável permiti-la se o declaratário sabia ou devia
saber, por o facto ser notório, da incapacidade da outra parte. Ora não acontece
assim no casamento, em que não se trata de ponderar os interesses das duas
partes e achar um ponto de equilíbrio entre eles: a lei não visa aqui proteger o
interesse de uma das partes, mas proteger interesses públicos. O que importa à lei
é que a demência exista, que ela seja certa, inequívoca, não duvidosa, sendo este
o sentido que tendemos a dar à notoriedade exigida no artigo 1601º/b CC.

A questão dos intervalos lúcidos está hoje expressamente resolvida na lei (artigo
1601º/b CC), no sentido de que a demência constitui impedimento à celebração do
casamento mesmo durante esses intervalos. Relativamente à generalidade dos
negócios jurídicos, a lei rejeita igualmente a doutrina dos intervalos lúcidos quando
tenha sido decretada a interdição ou inabilitação, não admitindo a prova de que o
ato do interdito ou inabilitado foi praticado em intervalo de lucidez (artigos 148º e
156º).

Note-se que é este um dos pontos de divergência entre o direito civil e o direito
canónico, que não conhece o impedimento de demência e integra o caso na
matéria do consentimento, considerando válido, em conformidade, o casamento

Filipa Ribeiro Gonçalves 29


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celebrado em intervalo lúcido desde que o facto se prove. A razão da divergência


estará em que o direito canónico não é tão sensível como o direito civil às aludidas
razões de ordem eugénica e social, privilegiando neste aspeto o valor da liberdade
matrimonial se o nubente tinha o livre exercício da vontade no momento da prática
do ato.

Por último, há a referir que o artigo 1601º/b, haja ou não sentença de interdição ou
inabilitação, concebe a demência como um estado permanente ou habitual, não se
abrangendo no preceito, portanto, os casos de demência acidental, por qualquer
causa, das faculdades mentais do nubente.

No caso de demência, só pode propor a ação de anulação o cônjuge cuja vontade


faltou (artigo 1640º/2). E o casamento será válido (artigo 1627º) se a alteração das
faculdades mentais não retirava ao nubente a consciência do ato. Salvo tratando-
se de casamento urgente, as hipóteses de incapacidade acidental são todavia
dificilmente verificáveis. A ação de anulação com fundamento em impedimento de
demência, interdição ou inabilitação por anomalia psíquica pode ser proposta ou
continuada por qualquer dos cônjuges ou pelos seus parentes na linha reta ou até
ao 4º grau da linha colateral, herdeiros e adotantes dos cônjuges ou pelo Ministério
Público (artigo 1639º/1), assim como pelo tutor ou curador do interdito ou
inabilitado (artigo 1639º/2).

No que se refere aos prazos de propositura da ação, distingue a lei duas hipóteses:
sendo a ação proposta pelo próprio demente, deve este intentá-la até seis meses
depois de lhe ter sido levantada a interdição ou inabilitação ou de a demência ter
cessado; se a ação for proposta por outras pessoas, deverá sê-lo dentro dos três
anos subsequentes à celebração do casamento, mas nunca depois do
levantamento da incapacidade ou da cessação da demência (artigo 1643º/1/a).

A lei admite, porém, a convalidação do casamento se, antes de transitar em


julgado a sentença de anulação, o casamento for confirmado pelo demente,
perante o funcionário do registo civil e duas testemunhas, depois de lhe ter sido
levantada a interdição ou inabilitação ou, tratando-se de demência notória, depois
de ter feito verificar judicialmente o seu estado de sanidade mental (artigo 1633º/1/
b).

- VÍNCULO MATRIMONIAL ANTERIOR NÃO DISSOLVIDO (1601º/c): Nos termos do


artigo 1601º/c, constitui impedimento dirimente absoluto o casamento anterior não
dissolvido, católico ou civil, ainda que o respetivo assento não tenha sido lavrado
no registo do estado civil. Assim, quem for casado não pode pois contrair
matrimónio sem que se ache dissolvido, declarado nulo ou anulado o seu
casamento anterior. É indiferente a causa da dissolução: o casamento anterior pode
ter-se dissolvido por morte, divórcio ou, tratando-se de casamento católico,
dispensa do casamento rato e não consumado.

A lei visou com este impedimento evitar a bigamia, assegurando proteção, no


plano civil, ao bem da unidade matrimonial.

Filipa Ribeiro Gonçalves 30


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No que se refere à morte presumida deve ter-se em conta o preceituado nos


artigos 115º-116º. A morte presumida não dissolve o casamento (artigo 115º),
dado que a respetiva declaração pode ser requerida por qualquer dos interessados
a que se refere o artigo 100º (artigo 114º/1). Decorrido um ano sobre a data das
últimas notícias, o cônjuge do ausente pode, todavia, pedir o divórcio com o
fundamento no artigo 1781º/c. Se não usar desta faculdade, e embora decorram
os prazos fixados no artigo 114º/1, o casamento manter-se-á. Mas a declaração de
morte presumida torna-o dissolúvel, podendo o cônjuge do ausente contrair novo
casamento e dissolvendo-se o primeiro pela celebração do segundo.

Não regressando o ausente, o primeiro casamento considerar-se-á dissolvido por


morte; se o ausente regressar ou houver notícia de que era vivo quando foram
celebradas as novas núpcias, considera-se o primeiro matrimónio dissolvido por
divórcio à data da declaração de morte presumida (artigo 116º).

A ação de anulação com fundamento em impedimento de vínculo pode ser


intentada pelos cônjuges ou por qualquer parente deles na linha reta ou até ao 4º
grau da linha colateral, pelos herdeiros e adotantes dos cônjuges e pelo Ministério
Público (artigo 1639º/1), e bem assim pelo 1º cônjuge do bígamo (artigo 1639º/2),
até seis meses depois da dissolução do casamento (artigo 1643º/1/c). Mas não
poderá ser instaurada nem prosseguir estando pendente ação de declaração de
nulidade ou anulação do 1º casamento do bígamo (artigo 1643º/3), convalidando-
se o 2º casamento se o 1º vier efetivamente a ser declarado nulo ou anulado
(artigo 1633º/1/c).

IMPEDIMENTOS DIRIMENTES RELATIVOS (artigo 1602º CC)

- PARENTESCO (artigo 1602º/a e c) e AFINIDADE (1602º/d): São impedimentos


dirimentes relativos o parentesco na linha reta (artigo 1602º/a) e no segundo grau da
linha colateral (artigo 1602º/c), assim como a afinidade na linha reta (artigo 1602º/d).
Devendo ter-se em conta que o impedimento de parentesco também compreende,
no caso de adoção, quer a relação entre adotante e adotado e as relações entre os
descendentes do adotado e o adotante ou entre os ascendentes do adotante e o
adotado (al. a), quer as relações entre o adotado e os outros filhos do adotante, se
os houver (al. c), dado o princípio expresso no artigo 1986º.

As razões dos impedimentos são para o parentesco o interesse proteger o valor da


proibição do incesto, com todas as razões de ordem ética, eugénica e social; no
que se refere aos impedimentos de afinidade e adoção são decisivas razões de
moral familiar, além do respeito devido às convenções sociais, que censurariam
fortemente casamentos celebrados entre as pessoas que aqueles impedimentos
abrangem.

Note-se que os impedimentos de parentesco e afinidade valem mesmo que a


maternidade ou paternidade não se encontre estabelecida (artigo 1603º).

Filipa Ribeiro Gonçalves 31


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O casamento celebrado com impedimento de parentesco na linha reta ou no 2º


grau da linha colateral, ou de afinidade na linha reta, é anulável (artigo 1631º/a)
podendo a ação de anulação ser intentada pelos cônjuges ou por quaisquer
parentes deles na linha reta ou até ao 4º grau da linha colateral, pelos herdeiros e
adotantes dos cônjuges ou pelo Ministério Público (artigo 1639º/1), até seis meses
depois da dissolução do casamento (artigo 1643º/1/c).

- A RELAÇÃO ANTERIOR DE RESPONSABILIDADES PARENTAIS (1602º/b + 1903º


a 1904º-A). Isto é, o cônjuge de um pai ou mãe, ou unido de facto com estes que
tenha assumido responsabilidades parentais relativamente ao filho desse pai ou
mãe, fica impedido de casar com esse filho.

Continua a fundamentar impedimento mesmo depois de o filho atingir a maioridade


e de se extinguirem, portanto, as responsabilidades parentais.

O casamento celebrado com impedimento de relação anterior de


responsabilidades parentais é anulável (artigo 1631º/a) podendo a ação de
anulação ser intentada pelos cônjuges ou por quaisquer parentes deles na linha
reta ou até ao 4º grau da linha colateral, pelos herdeiros e adotantes dos cônjuges
ou pelo Ministério Público (artigo 1639º/1), até seis meses depois da dissolução do
casamento (artigo 1643º/1/c).

Aula dia 02 de novembro de 2018

- CONDENAÇÃO POR HOMICÍDIO (1602º/e): Constitui impedimento dirimente


relativo a “condenação anterior de um dos nubentes, como autor ou cúmplice, por
homicídio doloso, ainda que não consumado, contra o cônjuge do outro”. Trata-se
de uma sanção imposta, pois a lei suspeita que o homicídio tenha sido cometido
com intenção de permitir o casamento do agente com o cônjuge da vítima. Note-
se, porém, que a lei só exige que o homicídio seja doloso, mesmo no caso de
tentativa; não requer que tenha sido praticado com uma intenção específica de
posterior casamento com o cônjuge da vítima. Portanto, a condenação por
homicídio negligente não constitui impedimento.

Este impedimento de condenação por homicídio só existe a partir da data do


trânsito em julgado do respetivo acórdão condenatório; como se frustraria, porém,
o objetivo da lei se a sentença demorasse tempo suficiente para os interessados
contraírem casamento, admitiu-se um impedimento impediente de pronúncia por
homicídio, nos termos do artigo 1604º/f.

A ação de anulação com fundamento em impedimento de condenação por


homicídio pode ser intentada pelos cônjuges ou por qualquer parente deles na
linha reta ou até ao 4º grau da linha colateral, pelos herdeiros e adotantes dos
cônjuges e pelo Ministério Público (artigo 1639º/1), nos três anos subsequentes à
celebração do casamento (artigo 1643º/1/b).

Filipa Ribeiro Gonçalves 32


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IMPEDIMENTOS IMPEDIENTES

- FALTA DE AUTORIZAÇÃO DOS PAIS OU DO TUTOR PARA O CASAMENTO DE


MENORES (1604º/a): Constitui impedimento impediente a falta de autorização dos
pais ou do tutor para o casamento do nubente menor, quando não suprida pelo
conservador do registo civil.

O impedimento refere-se apenas aos menores de 18 anos, mas maiores de 16; os


menores de 16 anos estão feridos de incapacidade de gozo em relação ao
casamento, constituindo a falta de idade núbil impedimento dirimente e não
simplesmente impediente.

A autorização deve ser concedida pelos progenitores que exerçam as


responsabilidades parentais, ou pelo tutor, antes da celebração do casamento ou
no próprio ato da celebração. Trata-se de um dos casos, ressalvados no artigo
1902º/1, em que a lei exige o consentimento de ambos os progenitores; é claro,
porém, que se só um deles exercer as responsabilidades parentais, só àquele
cumpre conceder autorização para o casamento do filho.

O menor pode pedir o suprimento da autorização para casamento que lhe seja
negada pelos pais (ou por um dos pais). O pedido de suprimento é formulado em
petição dirigida ao conservador do registo civil; autuada a petição com os
documentos que lhe respeitem, o conservador faz citar os pais ou o tutor para
responderem e, concluída a instrução, decide sobre o pedido, suprindo a
autorização dos pais ou do tutor se verificar que o menor tem suficiente
maturidade física e psíquica e há razões ponderosas que justifiquem a celebração
do casamento; a decisão, que é da exclusiva competência do conservador, deve
ser notificada aos interessados e dela cabe recurso para o juiz da comarca.

Se o menor contrair casamento sem autorização dos pais ou do tutor ou o


respetivo suprimento, não fica plenamente emancipado (artigo 132º CC). Nos
termos do artigo 1649º, que o artigo 133º tem o cuidado de ressalvar, continua a
ser considerado menor quanto à administração dos bens que tenha levado para o
casal ou que lhe advenham por título gratuito até à maioridade, bens cuja
administração não é confiada ao outro cônjuge, como o seria segundo as regras
gerais (artigo 1678º/2/f), e que se mantêm até à maioridade sob administração dos
pais, do tutor ou do administrador legal. Mas dos rendimentos desses bens, que
não respondem em caso algum, pelas dívidas contraídas pelos cônjuges ou por
qualquer deles durante a menoridade, serão arbitrados ao menor os alimentos
necessários ao seu estado.

- PRAZO INTERNUPCIAL (1604º/b): Nos termos do artigo 1605º/1, o impedimento


do prazo internupcial obsta ao casamento daquele cujo matrimónio anterior foi
dissolvido, declarado nulo ou anulado, enquanto não decorrerem sobre a
dissolução, declaração de nulidade ou anulação, cento e oitenta ou trezentos dias,
conforme se trate de homem ou mulher.

Filipa Ribeiro Gonçalves 33


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As razões do prazo internupcial são duas:

1. Respeito das convenções sociais;

2. O maior prazo internupcial para a mulher pretende evitar as dúvidas que


poderiam suscitar-se sobre a paternidade do filho nascido depois do 2º
casamento. Na verdade, se um 2º casamento imediato fosse possível o filho
que nascesse dentro dos 300 dias subsequentes à dissolução, declaração
de nulidade ou anulação do 1º casamento seria havido como filho do 1º e do
2º marido (artigo 1826º/1) - filho do 1º marido por ter sido concebido durante o 1º
casamento e filho do 2º marido por ter nascido na constância do 2º matrimónio da
mãe. E se o filho nascesse decorridos mais de 180 dias sobre a celebração
do 2º casamento as duas presunções valeriam com a mesma força. A lei
prevê a possibilidade de semelhante conflito de presunções de paternidade,
definindo um critério para a respetiva solução (artigo 1834º), mas há
interesse em evitar que o conflito surja e a exigência de um prazo
internupcial serve esse interesse. Pretende-se, assim, evitar, por
compreensíveis escrúpulos de ordem moral, que a mulher contraísse
segundas núpcias estando grávida do 1º marido.

O prazo internupcial é, em regra, (1605º/1) de:

• 180 dias para o marido;

• 300 dias para a mulher (se grávida).

NOTA: Apesar da utilização da expressão “declaração judicial” esta já não é judicial. Esta
competência que era dos juizes deixou de o ser em consequência do DL nº 272/2001. Este
DL teve como propósito transferir certas competências dos tribunais para outras entidades
e um desses casos foi esta competência para declarar esta não gravidez da mulher que
passou a ser da competência das Conservatórias do Registo Civil.

Porém, há três exceções:

• Artigo 1605º/2/1ª parte: Permite à mulher contrair novas núpcias decorridos


180 dias sobre a data da dissolução, declaração de nulidade ou anulação do
casamento anterior se fizer prova de que não está grávida ou tiver tido algum
filho depois daquela data.

• Artigo 1605º/2/2ª parte: Se os cônjuges estavam separados judicialmente de


pessoas e bens e o casamento se dissolveu por morte do marido, pode a
mulher celebrar 2º casamento decorridos 180 dias sobre a data em que
transitou em julgado a sentença de separação se fizer prova de que não está
grávida ou tiver tido algum filho depois dessa data. Aqui há de se deduzir dos
180 dias o tempo decorrido entre a data da separação e a do falecimento do
marido.

• Há casos em que o 2º casamento se pode celebrar imediatamente após a


dissolução, declaração de nulidade ou anulação do 1º, não havendo, pois,
prazo internupcial. São os casos em que a coabitação entre os cônjuges já
tinha cessado quando o casamento se dissolveu como acontece:

- Tendo-se dissolvido o casamento por morte e os cônjuges já estavam


separados de pessoas e bens e os prazos do artigo 1605º/1 já tinham

Filipa Ribeiro Gonçalves 34


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decorrido desde a data em que a separação fora decretada por


sentença transitada em julgado (1605º/5);

- Se, tendo-se dissolvido o casamento por divórcio, a sentença fixou a


data em que cessou a coabitação dos cônjuges e os prazos do artigo
1605º/1 já haviam decorrido desde essa data (artigo 1605º/4/1ª parte);

- Ou ainda se houve divórcio por conversão e os prazos do artigo 1605º/


1, já tinham decorrido (artigo 1795º-D) desde a data em que transitou
em julgado a sentença que decretou a separação (artigo 1605º/4/2ª
parte).

A partir de que data se conta o prazo internupcial? Artigo 1605º/3. Cumpre


distinguir entre os vários modos de extinção da relação matrimonial previstos no
artigo 1605º:

• Dissolução:

- Por morte: o prazo conta-se a partir da data do óbito;

- Por divórcio:

√ Sem consentimento de um dos cônjuges: há que distinguir


conforme a:

I. A sentença tenha fixado a data em que cessou a


coabitação dos cônjuges: não há prazo internupcial,
desde que os prazos do artigo 1605º/1 já tenham
decorrido desde a data que a sentença fixou como a da
cessação da coabitação;

II. A sentença não tenha fixado a data em que cessou a


coabitação dos cônjuges: o prazo internupcial corre a
partir da data do trânsito em julgado da sentença de
divórcio.

√ Por mútuo consentimento: a prática seguida nas conservatórias


parece ser a de contar o prazo internupcial a partir da data da
conferência, conforme a orientação do despacho ministerial.

• Anulação do casamento: o prazo conta-se a partir do trânsito em julgado da


respetiva sentença (artigo 1605º/3).

• Para o casamento católico:

- Dissolução do casamento católico por dispensa do casamento rato e


não consumado: o prazo conta-se a partir do registo da decisão
proferida pelas autoridades eclesiásticas (artigo 1605º/3);

- Declaração de nulidade do casamento católico: o prazo internupcial


corre, igualmente, desde a data do registo da sentença do tribunal
eclesiástico competente.

Note-se que aquele que contrair novo casamento sem respeitar o prazo
internupcial perde todos os bens que tenha recebido por doação ou testamento do
seu primeiro cônjuge (artigo 1650º/1).

Filipa Ribeiro Gonçalves 35


DIREITO DA FAMÍLIA E DOS MENORES: Teóricas

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Aula dia 08 de novembro de 2018

Houve um entendimento de todos os partidos de acabar com o prazo internupcial.


O PAN propôs a eliminação do prazo internupcial; o BE propôs um prazo de 180
quer para o homem e para a mulher; o PS propôs um prazo para ambos de 30
dias. Todavia o processo foi “esquecido” e nunca mais se falou no assunto.

O prazo internupcial é discutível em 2 postos:

1. Não será uma distinção inadmissível perante a liberdade de casar?


Haverá hoje razões que justifiquem a restrição à liberdade de casar, porventura
inconstitucional?;

2. Esta desigualdade entre homem e mulher que assenta na razão da


gravidez da mulher tinha mais peso quando havia o risco de haver duas
paternidades presumidas simultâneas e permanecer sempre a dúvida de quem
seria o pai, embora haja uma artigo para esta questão 1834º em que a lei diz que
havendo a colisão de presunções vence a 2º. Esta dúvida tinha senrido dantes em
que era difícil de apurar a paternidade, hoje não há razões para permanecer essa
dúvida, pois há formas fáceis para saber a paternidade a partir do ADN.

- PARENTESCO NO 3º GRAU DA LINHA COLATERAL (artigo 1604º/c): Não podem


casar os tios com as sobrinhas, nem as tias com os sobrinhos.

O impedimento é todavia dispensável (artigo 1609º/1/a), competindo a dispensa


ao conservador do registo civil, quando haja motivos sérios que justifiquem a
celebração do casamento. (nº 2).

- RELAÇÃO DE TUTELA, CURATELA E ADMINISTRAÇÃO LEGAL DE BENS (artigo


1604º/d): É ainda impedimento impediente o vínculo de tutela, curatela ou
administração legal de bens enquanto não tiver decorrido um ano sobre o termo da
incapacidade e não estiverem aprovadas as respetivas contas, se houver lugar a
elas. O artigo 1608º demarca a extensão do impedimento, que atinge, não só o
tutor, curador ou administrador, mas também os seus parentes ou afins na linha
recta, irmãos, cunhados e sobrinhos.

As razões do impedimento:

1. Quer a lei evitar que o tutor, curador ou administrador se exima, através do


casamento, ao cumprimento da obrigação de prestar contas - por isso exige
que as contas tenham sido prestadas e aprovadas;

2. A a lei receia que seja menos livre o consentimento do incapaz para o


casamento, dado o ascendente que o tutor, curador ou administrador ainda
mantenha sobre ele — por isso exige que tenha corrido um ano completo
sobre a data da cessação da tutela, curatela ou administração legal de bens,
pensando que só então aquele ascendente cessará.

O impedimento é dispensável desde que estejam aprovadas as contas (artigo


1609º/1/b).

Filipa Ribeiro Gonçalves 36


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- VÍNCULO DE ADOÇÃO RESTRITA: O artigo 1604º/e foi revogado e estabelecia que a


adoção restrita era impedimento impediente, obstando ao casamento do adotante ou seus
parentes na linha reta com o adotado ou seus descendentes; do adotado com o que foi
cônjuge do adotante; do adotante com o que foi cônjuge do adotado; dos filhos adotivos da
mesma pessoa, entre si. Tratava-se de impedimento suscetível de dispensa e cuja sanção
era a do artigo 1650º/2. A adoção restrita já não existe, mas continua a valer para as
adoções restritas feitas antes da lei de 2015 que veio eliminar essas mesmas adoções.

Mas foi introduzido no sistema um mecanismo parecido coma adoção restrita, que é o
apadrinhamento civil. Há certas pessoas que não são investidas no papel de pais adotivos,
mas de padrinhos civis. O apadrinhamento civil é uma quase adoção e em muitos pontos é
praticamente idêntico à adoção restrita. Consequentemente, para não haver dois
mecanismos iguais, manteve-se apenas o apadrinhamento civil (com a lei 103/2009). Em
consequência da relação entre padrinho ciivil e afilhado civil há também um impedimento
impediente que é dispensável e com consequências do mesmo tipo. Este impedimento e
as suas sanções estão previstos na artigo 22º/1 da lei do apadrinhamento civil.

- PRONÚNCIA POR HOMICÍDIO (artigo 1604º/f): No caso de existir condenação de


um dos nubentes por homicídio doloso ou tentativa havia um impedimento
dirimente relativo - artigo 1602º/e. No caso de ainda não haver condenação, mas
apenas despacho de pronúncia existe este impedimento impediente.

Celebrando-se o casamento, apesar da verificação de qualquer impedimentos


impedientes, que consequências(sanções) produzem? Artigo 1650º CC:

- Nº 1: Perda todos os bens que tenha recebido por doação ou por testamento
do 1º cônjuge/consorte - consequência punitiva;

- Nº 2: No caso de parentesco e relação entre tutor/curador/administrador,


ficam incapazes para receber do seu cônjuge/consorte qualquer benefício por
doação ou testamento.

• Requisitos de FORMA:

- A forma comum do casamento: O casamento é um negócio formal ou solene, para cuja


celebração é necessário um ritual, uma cerimónia. Razões dessa forma:

• Além das razões gerais que justificam a existência de forma;

• Há razões específicas: a ideia de vincar a importância, seriedade do ato que


estão a realizar;

• Há ainda uma razão histórica: o ritual do casamento civil foi construído à margem
do casamento católico.

Existem formalidades:

I. Anteriores/preliminares ao casamento: Correspondem a um encadeamento de


atos, a um processo antes do casamento - o processo preliminar do
casamento, para o qual qualquer conservatória do registo civil tem

Filipa Ribeiro Gonçalves 37


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competência e que que tem por propósito apurar a existência de impedimentos


matrimoniais:

1. Declaração: quem pretenda contrair casamento deve declará-lo,


pessoalmente ou por intermédio de procurador (aqui ambos os nubentes
podem fazer-se representar por procurador, isso só não pode acontecer no momento
da celebração), numa conservatória do registo civil e requerer a
instauração do processo do casamento;

2. É imediata e oficiosamente consultada a base de dados do registo


civil, sendo integrados na base de dados documentos que se mostrem
necessários;

3. A publicidade do processo preliminar do casamento era,


anteriormente, assegurada através da afixação de editais. A nova
legislação suprimiu essa formalidade. Hoje o processo preliminar é
público e qualquer pessoa pode dirigir-se à conservatória e ter acesso
aos dados do casamento;

4. Compete ao conservador verificar a identidade, a capacidade


matrimonial dos nubentes e a existência ou inexistência de
impedimentos ao casamento;

5. Feitas todas as diligências, deve o conservador, no prazo de um dia a


contar da última diligência, proferir o despacho a autorizar os nubentes
a celebrar o casamento ou a mandar arquivar o processo.

6. Se o despacho for desfavorável, é notificado aos nubentes, que dele


podem recorrer nos 8 dias seguintes à data da notificação.

II. Do próprio casamento (celebração propriamente dita): Se o despacho final for


favorável, o casamento deverá celebrar-se (artigo 1614º). Qualquer
conservador do registo civil é competente para a celebração do casamento e,
em princípio, não é obrigatória a presença de testemunhas.

III. Posteriores ao casamento (registo): O casamento é um dos factos que


constituem objeto do registo civil.

- Princípios gerias do registo civil (comuns a qualquer registo civil):

1. A prova resultante do registo civil é a única prova admitida dos


factos resultantes do registo. O facto da celebração do
casamento inscrito no registo só pode ser provado mediante a
prova do registo, não há outro meio de prova.

2. O registo faz prova plena dos factos nele contidos. Significa que
uma vez inscrito o facto no registo civil só pode afastar-se essa
prova, através de prova do facto contrário que só pode ser feita
mediante ação judicial.

- Princípios especiais quanto ao registo do casamento: Como se faz o


registo do casamento? De duas formas:

√ Inscrição: Sendo o casamento civil, o conservador inscreve os


dados sobre a realização do casamento nos seus livros de registo

Filipa Ribeiro Gonçalves 38


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civil e o registo é imediatamente feito após a celebração/


proclamação do casamento.

√ Transcrição: Nos casos de casamento católico, dos outros


casamentos religiosos e do casamento civil sob a forma religiosa.
O conservador copia/reproduz o documento que lhe foi feito
chegar por outra pessoa.

- Efeitos do registo civil: Em relação ao casamento civil, o registo é


apenas um meio de prova, a sua única função é uma função probatória;
em relação ao casamento católico e aos restantes casamentos
religiosos, para além da função probatória, tem ainda uma função para
a produção de efeitos. Um casamento católico só produz efeitos civis
(só tem eficácia civil) a partir do momento em que é registado. O
conservador pode recusar a transmissão do casamento, nos casos, p.
e., em que o casamento foi celebrado com impedimento estabelecido
no CC.

Como pode ocorrer o intervalo de tempo entre o momento em o


casamento é celebrado e o momento em que o registo é feito? Artigo
1670º/1 - efetuado o registo, e ainda que venha a perder-se, os efeitos
civis do casamento retrotraem-se à data da sua celebração. O registo
tem efeitos retroativos, tudo se passa como se o registo tivesse sido
feito no momento da celebração do casamento. Todavia, há exceções:
segundo o nº 2, ficam ressalvados os terceiros que tenham entretanto
tenham adquirido direitos. Se ocorreu um facto de aquisição de direitos
por terceiros, a lei protege os terceiros desde que esses direitos sejam
compatíveis com os direitos e deveres de natureza pessoal dos
cônjuges e dos filhos. Isto só não acontece no caso em que a
transcrição feita dentro dos 7 dias subsequentes à celebração, aqui a
retroatividade é plena, mesmo em relação a terceiros.

Posto isto, a regra é da retroatividade, com a exceção dos direitos


adquiridos por terceiros e com exceção à exceção de a transcrição se
ter feito a tempo, regressando aqui a retroatividade.

- Formas especiais do casamento:

A. Casamento urgente (artigo 1622º e ss.): Em que circunstâncias pode ser


celebrado este casamento?

- Fundamentos/condições: artigo 1622º/1: quando haja fundado receio de


morte próxima de algum dos nubentes ou eminência de parto.

- Diferenças relativamente à forma comum de casamento:

1. Celebra-se sem precedência do processo preliminar;

2. Celebra-se sem intervenção de um funcionário do registo civil;

3. As formalidades preliminares reduzem-se a uma proclamação oral ou


escrita de que se vai celebrar o casamento, seja pelo funcionário do
registo civil ou por qualquer das pessoas presentes;

Filipa Ribeiro Gonçalves 39


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4. À celebração do casamento exige-se uma declaração expressa do


consentimento de cada um dos nubentes perante 4 testemunhas,
duas das quais não podem ser parentes sucessíveis dos nubentes;

5. Relativamente ao registo, deve redigir-se uma ata do casamento por


documento escrito assinado por todos os intervenientes (nubentes e
testemunhas) - forma simplificada;

6. As exigências de controlo tem de ser respeitadas - o processo próprio


para averiguar a existência de impedimentos;

7. O casamento fica sujeito a homologação do conservador civil:

8. As causas justificativas da não homologação são as referidas no artigo


1624º;

9. O casamento urgente não homologado é juridicamente inexistente


(artigo 1628º/b);

10. O casamento urgente homologado passa a ser igual aos outros e,


nestes casos, considera-se celebrado imperativamente sobre o regime
de separação de bens (artigo 1720º/1/a CC).

B. Casamento civil sob a forma religiosa: São os casamentos celebrados de acordo


com rituais de outras religiões que não a católica.

- O que há de diferente quanto à forma comum do casamento?

1. Tem de correr o processo preliminar, mas o conservador não se limita


a apurar a existência de impedimentos, ele tem de ver se se trata de
uma religião radicada em Portugal (através do registo das pessoas
coletivas religiosas), tem de confirmar a qualidade do ministro do culto
da religião enquanto tal, tem de dizer aos nubentes que o seu
casamento é um casamento civil, que produz efeitos civis e tem de
confirmar que estes estão a par dos artigos 1577º, 1600º, 1671º e
1672º do CC.

2. Quanto à celebração do casamento, o ritual é religioso e, por isso, o


Estado não intervém;

3. Quanto as formalidades posteriores de registo, tem de haver registo


que é feito por transcrição.

Aula dia 09 de novembro de 2018

INVALIDADES: Consequências que se produzem quando o casamento é celebrado e se verificam


impedimentos, ou seja, quando se verifica a falta de requisitos.

Há diferenças entre o regime geral do negócio jurídico e o regime das invalidades do


casamento:

1ª. O regime geral do negócio jurídico jurídico não reconhece expressamente a figura da
inexistência (apesar de haver quem entenda que expressões como “o negócio não produz efeitos” é a
inexistência), mas já está reconhecida expressamente para o casamento.

2ª. No regime geral do negócio jurídico há anulabilidade e nulidade, relativamente à


matéria do casamento civil há apenas a anulabilidade.

Filipa Ribeiro Gonçalves 40


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• INEXISTÊNCIA DO CASAMENTO:

- As causas de inexistência, que é a consequência mais gravosa, são só os casos do


artigo 1628º.

- Qual o regime do casamento inexistente? Artigo 1630º/1 e 2:


• É inexistente por força da própria lei (ipso iure);
• Não produz qualquer efeito, nem sequer os efeitos que chegou a produzir enquanto
a inexistência não foi descoberta;

• Pode ser invocada por qualquer pessoa (mesmo não interessadas);

• Pode ser invocada a todo o tempo (não há prazo), independentemente de


declaração judicial.

• ANULABILIDADE DO CASAMENTO:

Em todos os outros casos em que há omissão de requisitos, a consequência é a


anulabilidade, desde que esteja explicitamente na lei. O artigo 1631º CC faz uma enumeração
breve das causa de anulabilidade.

As anulabilidades não são todas iguais, os regimes de invocação da anulabilidade, as


pessoas que as podem invocar e os prazos são diferente consoante as causas da anulabilidade.
Como são muitas e podem ser muitos diferentes, há uma tentativa de distinção das
anulabilidades, consoante os interesses em vista dos quais a anulabilidade é estatuída (3 grupos
de anulabilidades):

1. Situações em que a anulabilidade é estabelecida não apenas no interesse


dos cônjuges e das suas famílias, mas também no interesse público ou
em função de um interesse social geral. São os casos de casamento
contraído com impedimento dirimente. Elas podem ser invocadas pelos
cônjuges, por familiares seus, mas também pelo representante do
interesse público que é o Ministério Público (artigo 1639º CC), podem
fazê-lo por está em causa um conjunto de interesses amplos.

2. Há uma anulabilidade que é estabelecida apenas no interesse público.


Essa anulabilidade é apenas uma, que é o vício formal do artigo 1631º/c e
artigo 1642º estabelece que a ação de anulação com este fundamento só
pode ser proposta por esse representante do interesse público que é o
Ministério Público.

3. Anulabilidade estabelecida apenas no interesse particular de um dos


cônjuges. São as anulabilidades resultantes de vícios da vontade, da
divergência entre a vontade e a declaração. Só o nubente cuja vontade
esteja viciada pode invocar a anulabilidade - artigos 1640º e 1641º.
Exceção: No caso particular da divergência entre a vontade e declaração
que é a simulação, para além dos próprios simuladores, podem invocar a
simulação também terceiros, mas só os terceiros que com a simulação os
simuladores procuraram prejudicar/enganar, pois estão interesses seus
em causa - artigo 1640º/1.

• CASAMENTO PUTATIVO: A seguir ao regime das anulabilidades, há um capítulo sobre o


instituto do casamento putativo.

- Noção e razão de ser: Declarado nulo ou anulado o casamento, os efeitos que este
produziu até à data da declaração de nulidade ou anulação podem manter-se quando

Filipa Ribeiro Gonçalves 41


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certos pressupostos se verifiquem - artigos 1647º e 1648º CC. No regime geral do


negócio jurídico, quando há declaração de nulidade ou anulação, essa declaração de
nulidade ou anulação tem, por regra, efeitos retroativos - artigo 289º CC -, ou seja, todo o
tempo entre a realização do negócio e a sua invalidação é apagado (com as devidas
exceções, mas a retroatividade é a regra). No casamento não é assim, a regra é a inversa. O
casamento não tem, em regra, efeitos retroativos, os efeitos que produziu até ser anulado
mantém-se - são efeitos putativos -, pois parte-se do princípio que as pessoas
pensavam que o casamento era válido. A realidade é que no plano dos factos o
casamento produziu efeitos e não é razoável que esses factos sejam destruídos
retroativamente.

- Pressupostos: A produção de efeitos putativos depende de 3 pressupostos:

1. É necessária a existência do casamento - o casamento inexistente não tem efeitos


putativos;

2. É preciso que o casamento tenha sido declarado nulo ou anulado;

3. Ambos os cônjuges ou apenas um deles tem de estar de boa fé (artigo 1648º).

Nota: Quando fala vício causador da nulidade ou anulabilidade, quando a lei faz referência à
nulidade está a pensar no casamento católico, pois esse é que é declarado nulo.

- Efeitos:

1. Princípio geral: mantêm-se para o futuro, até à data do trânsito em julgado


da sentença de anulação do casamento civil (artigo 1647º/1) ou até à do
averbamento da sentença do tribunal eclesiástico que declarou a nulidade
do casamento católico (artigo 1647º/3), os efeitos do casamento já
produzidos, mas não se produzem novos efeitos. Deste modo, a declaração
de nulidade e a anulação só operam ex nunc (e não ex tunc, como nos
negócios jurídicos em geral).

2. Efeitos em relação aos cônjuges: Há que distinguir três situações possíveis:

• Se os cônjuges estavam ambos de boa fé, o casamento produz todos


os efeitos entre eles até à data da declaração de nulidade ou da
anulação (artigo 1647º/1).

• Se só um dos cônjuges estava de boa fé, o casamento inválido


produz os efeitos que forem favoráveis, concretamente, ao cônjuge
de boa fé (artigo 1647º/2); só esse cônjuge pode arrogar-se dos
benefícios do estado matrimonial.

• Se ambos os cônjuges estavam de má fé, o casamento não tem


eficácia putativa, mas antes retroativa.

3. Efeitos em relação aos filhos: Há um efeito que se mantém mesmo que


ambos os nubentes esteja de má fé que é a presunção de paternidade -
artigo 1827º/1.

4. Efeitos em relação a terceiros: Há que distinguir as mesmas três hipóteses.

• Se ambos os cônjuges estavam de boa fé, o casamento inválido


produz todos os seus efeitos, também em relação a terceiros, até ao
trânsito em julgado da sentença de anulação do casamento civil ou
ao averbamento da decisão do tribunal eclesiástico que declarou a
nulidade do casamento (artigos 1647º/1 e 3).

Filipa Ribeiro Gonçalves 42


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• Se só um dos cônjuges estava de boa fé, o artigo 1647º/2, faz ainda


uma distinção:

- Tratando-se de relações que, estabelecendo-se entre os


próprios cônjuges, vão afetar terceiros nos seus interesses, os
respetivos efeitos, “mero reflexo, relativamente a terceiros, das
relações havidas entre os cônjuges” (artigo 1647º/2),
produzem-se ou não — em relação aos cônjuges e,
reflexamente, em relação a terceiros — conforme forem
favoráveis ou desfavoráveis ao cônjuge de boa fé.

- Tratando-se de relações que se estabeleçam diretamente entre


cada um dos cônjuges e terceiros, mas que estejam
dependentes do estado pessoal de casado, não estando estas
relações abrangidas no artigo 1647º/2, pois não se trata aqui,
relativamente a terceiros, de “mero reflexo das relações havidas
entre os cônjuges”, o princípio a aplicar deve ser o da
invalidade, pelo que o casamento não produz neste caso
quaisquer efeitos.

• Se ambos os cônjuges estavam de má fé, o casamento não produz


efeitos em relação a eles e, por conseguinte, também não os produz
em relação a terceiros.

Aula dia 15 de novembro de 2018

4. CASAMENTO CIVIL COMO ESTADO (efeitos)

Divide-se em duas áreas: efeitos pessoais e efeitos patrimoniais (objeto da cadeira de


DPFS).

EFEITOS PESSOAIS: O casamento constitui a família, impõe aos cônjuges um conjunto


de deveres e tem efeitos sobre o seu nome e nacionalidade.

I. PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS: artigos 1671º e ss. CC.

O artigo 1671º enuncia os dois princípios fundamentais por que se rege a matéria dos
efeitos pessoais do casamento:

• Princípio da igualdade dos direitos e deveres dos cônjuges (nº 1): artigo 36º CRP:

• Em concordância com ele, o princípio da direção conjunta da família (nº 2): É um


corolário do princípio da igualdade dos cônjuges. Se os cônjuges são iguais, a
direção da família deve pertencer aos dois e não exclusivamente a um deles. Trata-
se de um preceito imperativo.

A lei impõe aos cônjuges o dever de acordar sobre a orientação da vida em comum
tendo em conta o bem da família e os interesses um do outro. Assim, sempre que
haja de tomar decisões para a vida comum as decisões devem ser tomadas por
acordo - subprincípio de exigência do acordo dos cônjuges. Esta exigência de
acordo só existe para aquilo que tem a ver com a vida comum e já não com a vida

Filipa Ribeiro Gonçalves 43


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privada de cada um, onde já não vale a exigência de acordo. Caberá, assim, p. e.,
no âmbito do subprincípio de exigência de acordo a repartição dos recursos,
escolha da residência da família, o planeamento familiar, a repartição de funções
ou tarefas, mas já não caberá, por estar em causa a vida privada, a maneira como
se veste, a religião, os amigos, o partido político, etc.

A escolha de profissão é importante e está especificada na lei que lhe dedica um


artigo próprio - artigo 1677ºD. Até 1977, o marido podia opor-se a que a mulher
exercesse determinados trabalhos. Por haver esse regime anterior é que houve
necessidade deste artigo. Deve, em todo o caso, harmonizar-se este artigo com o
dever de os cônjuges acordarem sobre a orientação da vida em comum. O
exercício por um dos cônjuges, sem o acordo do outro, de uma profissão pouco
decorosa ou de uma atividade muito perigosa, p. e., podem configurar, nas
circunstâncias do caso e tendo em conta a personalidade e a suscetibilidade do
outro cônjuge, uma violação grave dos deveres de cooperação ou de respeito. Em
princípio, cada um dos cônjuges é livre de exercer a profissão ou atividade que
quiser, mas quando se proponha a exercer certa profissão ou atividade não deve
esquecer-se de que não é só. A liberdade deve cumular-se com as obrigações/
deveres dos cônjuges.

Há exigência de acordo para os aspetos comuns. E se os cônjuges não chegarem


a acordo? Deverá o tribunal intervir? Em regra, o tribunal não deve poder intervir,
os cônjuges devem chegar naturalmente a acordo. Todavia, a lei admite que o
desacordo seja resolvido pelo tribunal, nas seguintes situações:

- Em matéria de residência, quando haja desacordo sobre a fixação ou


alteração da residência da família (1673º/3);

- Em relação ao nome próprio ou apelidos dos filhos (1875º/2);

- Em relação a problemas de responsabilidades parentais (1901º/2).

II. DEVERES DOS CÔNJUGES:

O artigo 1672º CC é o artigo que enumera os deveres recíprocos dos cônjuges: dever de
respeito, fidelidade, coabitação, cooperação e assistência.

Anotações iniciais gerais:

1ª: A enumeração do artigo 1672º entende-se que não é uma enumeração taxativa. A lei
não diz que os deveres são só estes, por isso entende-se que serão todos aqueles que resultem
de propósito/objeto de instituição da comunhão de vida (apesar de ser muito difícil encontrar
deveres que não caibam destes deveres do artigo 1672º).

2ª: Estes deveres são imperativos, o que significa que se impõe a ambos os cônjuges e
que não podem ser afastados por convenção. Mas a lei oferece a possibilidade de ambos os
cônjuges cumprirem-nos de modo diverso, de acordo com os interesses e conveniências. Estes
deveres podem, portanto, ser executados de forma flexível. Isto significa que o conteúdo dos
deveres conjugais depende do modo como os cônjuges conformar a sua relação; os cônjuges

Filipa Ribeiro Gonçalves 44


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podem decidir como aplicam os deveres conjugais, tudo depende da capacidade de tolerância
de cada um deles e da sua personalidade.

3ª: A lei fala em deveres conjugais, mas serão estes verdadeiros deveres jurídicos? Para
um dever jurídico ser um dever jurídico, aquando do seu incumprimento, tem de se verificar
consequências indemnizatórias ou resolutórias para o infrator. Só é um dever jurídico se tiver de
ser adotado sob pena de se produzirem determinadas consequências. Isto não acontece no
casamento, em que não há consequências resolutórias: a violação de deveres conjugais, a partir
de 2008, deixou de ser fundamento do divórcio; nem há consequências indemnizatórias: pela sua
violação não resultará uma indemnização. Posto isto, parece difícil continuar a falar de deveres e,
por isso, o Drº Francisco M. B. Pereira Coelho utiliza a expressão de “comportamento que
corresponde a uma plena comunhão de vida e que se espera que os cônjuges adotem”. Assim,
os deveres conjugais não são propriamente deveres jurídicos porque não lhes estão associados
consequências jurídicas em caso do seu incumprimento (nem indemnizatórias, nem resolutórias).

A. Dever de respeito: São violações do dever de respeito atos ou comportamentos que não
constituam violações diretas de qualquer um dos outros deveres. É um dever ao mesmo
tempo negativo e positivo. Enquanto dever negativo (de non facere) é um dever que incumbe
a cada um dos cônjuges de não ofender a integridade física e moral do outro, de não violar os
direitos de personalidade do outro cônjuge e é um dever de cada um deles não reconduzir a
vida de forma indigna, desonrosa e que o faça desmerecer no conceito público. Antes de
2008, os tribunais e a doutrina distinguiam entre injúrias (agressão) diretas e indiretas.
Enquanto dever positivo é um dever de respeitar a personalidade do outro cônjuge.

B. Dever de fidelidade: É um puro dever negativo. Obrigação de cada um dos cônjuges a não
ter relações consumadas com pessoa que não seja o seu cônjuge. O adultério, para além
deste elemento objetivo da prática de relações sexuais consumadas, abrange um elemento
subjetivo que é a intenção ou a consciência de violar o dever de fidelidade. Assim, não haverá
violação do dever de fidelidade se o cônjuge que teve relações sexuais com terceira pessoa
só o fez, p. e., por erro ou coação. Constitui ainda violação do dever de fidelidade a tentativa
de adultério e a conduta licenciosa ou desregrada de um dos cônjuges nas suas relações
com terceiros, a ligação sentimental e a correspondência amorosa que mantém com ele, etc.

C. Dever de coabitação: Corresponde à tripla comunhão: leito, mesa e habitação.

a) Comunhão de leito: Há uma limitação lícita do direito à liberdade sexual, no duplo


sentido de que a pessoa casada fica obrigada a ter relações sexuais só com o seu
cônjuge e a não ter essas relações com terceiros.

b) Comunhão de mesa: É a comunhão da vida em economia comum.

c) Comunhão de habitação: A lei tem uma norma sobre a residência da família (1673º
CC), onde estabelece que (e de acordo com o princípio da igualdade dos cônjuges) são os
cônjuges que devem escolher de comum acordo a residência da família, devendo
atender nomeadamente às exigências da vida profissional, ao interesse dos filhos e à
salvaguarda da unidade da vida familiar. Posto isto, ambos os cônjuges têm a
obrigação de viver na residência da família, salvo motivos ponderosos em contrário
(1673º/2), p. e., razões de trabalho. Mas parece que a lei considerou tal situação, em
que um dos cônjuges não vive na residência da família, como uma situação

Filipa Ribeiro Gonçalves 45


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excecional e transitória, pois o normal é que vivam um com o outro. Quando tal não
suceda, quando não vivam um com o outro e não haja razões de caráter excecional e
transitório que o justifiquem, então estaremos já perante uma rutura, uma separação
de facto.

D. Dever de cooperação: Definido no artigo 1674º CC

E. Dever de assistência: Do artigo 1675º/1 CC, retira-se que o dever de assistência


compreende dois subdeveres:

1. Dever de prestar alimentos: É um dever que cabe dentro da obrigação de contribuir


para os encargos da vida familiar, pois, enquanto que vivem juntos, o dever de prestar
alimentos toma a forma de de dever de contribuição para os respetivos encargos. Este
dever só assume autonomia se os cônjuges estão separados de facto, pois aí já não
existe vida familiar e não tem sentido falar em obrigação de contribuir para os
respetivos encargos. Os nº 2 e 3 do artigo 1675º referem-se a esta situação de
separação de facto. Este artigo assenta no apuramento do cônjuge culpado ou principal
culpado na separação ou na verificação da equivalência das respetivas culpas, fazendo
persistir a relevância da culpa. Assim, se ambos tiverem culpa são obrigados a prestar
alimentos, mas se apenas um deles tiver culpa então só é esse o obrigado. Há 2
problemas:

1º: A lei estabelece o critério da maior culpa como o critério de imposição a


ambos os cônjuges ou só a um deles a obrigação de prestar alimentos. Este
critério valia também para após o divórcio. Em 2008, deixou de valer para o
divórcio e, consequentemente, hoje, a obrigação de alimentos após o divórcio
não é estabelecida em função da culpa. Entende-se que deve ser assim em
relação à obrigação de alimentos de simples separação de facto. Se em 2008 se
quis eliminar a relevância da culpa para efeitos de alimentos pós-divórcio, deve
considerar-se eliminada essa relevância também em matéria de alimentos em
caso de separação.

2º: Nos casos de separação de facto em que existe a obrigação de alimentos


(que não se estabelece em função da culpa), coloca-se a questão de saber qual o
montante dessa obrigação. Até à reforma de 2008, para efeitos de alimentos
subsequentes ao divórcio, havia uma orientação jurisprudencial de que o
montante dos alimentos deveria corresponder aos padrões de vida que
consubstanciavam na vida em casamento. Após 2008, passou a ser outro o
regime dos alimentos pós-divórcio de acordo com o artigo 2016º-A/3. Posto isto,
o cônjuge não tem, hoje, o direito a exigir o padrão de vida que consubstanciou
no casamento. Assim, se aquele entendimento foi afastado para o divórcio, deve
afastar-se igualmente para a separação de facto.

2. Dever de contribuir para aos encargos da vida familiar: O artigo 1676º CC diz-nos que
este dever incumbe ambos os cônjuges nos mesmos termos. Todavia, não há aqui um
princípio de igualdade absoluta, tudo depende das possibilidades de cada um dos
cônjuges - principio da proporcionalidade da prestações dos cônjuges para suportar os
encargos. A lei diz ainda que como pode ser cumprida esta obrigação: seja através da
afetação dos seus recursos (rendimentos e proventos), seja através do trabalho
despendido no lar ou na manutenção e educação dos filhos. Nos casos em que um dos

Filipa Ribeiro Gonçalves 46


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cônjuges contribui de forma consideravelmente superior para os encargos, que


consequências pode resultar? Em regra, a lei não valorou as diferenças de
contribuições, porque considera que as contribuições se vão equilibrando naturalmente.
Só apenas no caso extremo do artigo 1676º/2 é que a lei considerou a diferença de
valores. Que caso é esse? É o caso de contribuição superior em consequência da
renúncia de forma excessiva à satisfação dos seus interesses pessoais - vida
profissional - em favor da vida em comum - sacrificou-se pela família/casal - permitindo,
assim, que o outro cônjuge satisfizesse os seus interesses. Só nesta hipótese em que
há prejuízos patrimoniais importantes, é que a lei estabelece que o cônjuge que se
sacrificou tem o direito de exigir do outro corresponde compensação - crédito
compensatório:

1º: Quando o crédito compensatório pode ser exigido? Artigo 1676º/3: no


momento da partilha dos bens do casal. Para o Drº Francisco M. B. Pereira Coelho,
o que a lei quis dizer é que o crédito compensatório só pode ser exigido no
momento do divórcio: o fundamento principal é este que no casamento há sempre
um “investimento" (os cônjuges “investem” no casamento); e a esse investimento
corresponde sempre, como em qualquer projecto empresarial, uma expectativa de
“retorno”, a médio prazo; enquanto o casamento dura, dir-se-á que esse
investimento vai obtendo retorno (vai sendo amortizado): um dos cônjuges, por
hipótese, não estudou, não trabalhou (este o seu investimento), mas o curso
normal do casamento permite-lhe ir recebendo a compensação ou o retorno
normal desse sacrifício (o outro cônjuge ficou mais liberto para progredir
profissionalmente e assim trazer mais dinheiro para a vida do casal); mas, se e
quando o casamento termina, frustra-se essa expectativa de retorno, e frustra-se
de forma definitiva e radical: o cônjuge sacrificado, desprovido que está, p. ex., de
habilitações profissionais ou títulos académicos, fica desarmado, se calhar para o
resto da vida. Ora, se é assim, parece que não deve ser propriamente na partilha
que se deve proceder às operações de compensação do artigo 1676º: enquanto o
casamento continua, continua o aproveitamento recíproco das utilidades e dos
investimentos de ambos os cônjuges; é sim no momento do divórcio que deve ter
lugar a nossa compensação.

Posto isto, a consequência da compensação é um efeito do divórcio e,


consequentemente, deveria estar no capítulo dos efeitos do divórcio.

2º: Como se determina o montante do crédito? Ninguém sabe bem, seja por que
razão for, este mecanismo tem sido ignorado pelos tribunais.

III. NOME: Relativamente ao nome dos cônjuges - artigo 1677º a 1677º-C e ss.

1º Artigo 1677º/1: Em consequência do casamento, cada um dos


cônjuges conserva os seus próprios apelidos, mas pode acrescentar-
lhes apelidos do outro até ao máximo de dois.

2º Artigo 1677º-A: No caso do casamento se dissolver por morte, o


cônjuge viúvo que tenha acrescentado o nome, mantém-no e mesmo
que case novamente pode mantê-lo se o declarar até à celebração do
2º casamento.

Filipa Ribeiro Gonçalves 47


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3º Artigo 1677º-B: No caso de divórcio, os ex-cônjuges podem manter o


nome do outro, se ex cônjuge der consentimento ou o tribunal o
autorizar (a partir do DL 272/2001 a competência passou para os
conservadores do registo civil).

4º Artigo 1677º-C: No caso de divórcio ou morte, o cônjuge que conserve


apelidos do outro pode ser privado pelo tribunal de o usar quando esse
uso lese gravemente os interesses morais do outro cônjuge ou da sua
família. Este processo de privação de uso do nome já não é iniciado no
tribunal, mas sim nas conservatórias, só em caso extremo é que se
chega à fase judicial.

5. MODIFICAÇÃO DA RELAÇÃO MATRIMONIAL - SEPARAÇÃO DE PESSOAS E BENS

No mecanismo de separação de pessoas e bens ainda não existe divórcio - Artigos 1794º
e ss. CC.

Introdução: Antes, quando o divórcio não era permitido para os casamentos católicos a
única possibilidade que tinham era separar de pessoas e bens, que era um mecanismo
duradouro, considerado como o divórcio dos católicos. Hoje não é assim, dado que o divórcio já
é possível também para os casamentos católicos e, por isso, este mecanismo perdeu interesse
prático.

A expressão “separação judicial de pessoas e bens” está errada, pois já não é uma
separação necessariamente judicial, ela pode operar através das conservatórias do registo civil.

Quais as formas possíveis de separação de pessoas e bens? Vale o princípio geral do


artigo 1794º CC que remete para o regime do divórcio. Assim, são modalidades da separação de
pessoas e bens:

1. Mútuo consentimento;

2. Litigiosa ou sem consentimento de um dos cônjuges.

Quais as causas que podem fundamentar a separação? As mesmas que podem


fundamentar um pedido de divórcio - artigo 1794º CC.

Relativamente ao processo de separação: Vale também a remissão para o divórcio -


artigo 1794º CC.

A diferença está em relação aos efeitos (1795º-A):

- Pessoais: A separação não dissolve o casamento, as pessoas continuam casados


e, por isso, não podem contrair novo matrimónio, mantém-se, assim, o dever de
fidelidade, bem como o dever de respeito (no seu lado negativo e já não será exigível o
positivo) e cooperação; extingue apenas os deveres de coabitação e assistência,
mas em relação à assistência permanece o direito a alimentos (e já não o dever de
contribuir para os encargos da vida familiar).

- Patrimoniais: Implica uma separação de bens, ou seja, faz-se a partilha dos bens
comuns e, consequentemente, deixam de ser herdeiros um do outro.

Filipa Ribeiro Gonçalves 48


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Como pode terminar a situação de separação? De duas formas (artigo 1695º-B):

1. Artigo 1795º-C: Reconciliação - os cônjuges reconciliam-se (este artigo faz


referência à intervenção do juiz, mas já não é assim). Os cônjuges podem a todo o
tempo restabelecer a vida em comum e o exercício pleno dos direitos e deveres
conjugais.

2. Artigo 1795º-D: Conversão em divórcio. Como funciona a conversão? A lei diz


que se os dois cônjuges quiserem converter a sua separação em divórcio podem
faze-lo a todo o tempo; no caso de ser apenas um a querer o divórcio pode faze-
lo sem precisar de fundamento específico, passado que seja 1 ano da separação
de pessoas e bens.

Aula dia 16 de novembro de 2018

6. EXTINÇÃO DA RELAÇÃO MATRIMONIAL - DIVÓRCIO


Modos como a relação pode extinguir-se:

√ Dissolução

√ Invalidação: declaração de nulidade ou


anulação

São causas da dissolução do casamento:

√ Morte de um ou ambos os cônjuges

√ Divórcio

INTRODUÇÃO AO DIVÓRCIO: Quais as principais questões relacionadas com o divórcio?

- Admissibilidade do divórcio (questão que era colocada anteriormente): Antes do 25 de


abril, não era admitido o divórcio para os casamentos católicos. Esta questão está
hoje resolvida e até a CRP já o admite (artigo 36º).

- Fundamentos do divórcio: Para o divórcio (litigioso) ser possível basta fundar-se


numa qualquer causa objectiva que demonstre abertura objetiva do divórcio.

- Deverá exigir-se tanto? Não deverá admitir-se o divórcio sem fundamento? É


preciso uma causa para pedir o divórcio? Hoje, em Portugal, exige-se um facto de
fundamento, enquanto noutros países pode-se pedir o divórcio sem ter de se
provar qualquer facto.

- Efeitos do divórcio: Há certas matérias com muito debate, como é o caso da


matéria da prestação de alimentos e da matéria do modo de exercício das
responsabilidades parentais.

REGIME DO DIVÓRCIO

NOÇÃO: Entende-se por divórcio a dissolução do casamento decretada pelo tribunal ou


pelo conservador do registo civil, a requerimento de um dos cônjuges ou dos dois, nos termos
autorizados na lei.

Filipa Ribeiro Gonçalves 49


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CARATERÍSTICAS: O direito ao divórcio é um direito:

1. Potestativo: Traduz-se no poder de produzir determinado efeito jurídico - a


dissolução do vínculo matrimonial. E é o um direito potestativo extintivo, pois o
efeito jurídico que se destina a produzir não consiste na constituição ou
modificação, mas na extinção da relação jurídica.

2. Pessoal: É um direito relativo ao estado das pessoas que a lei atribui aos cônjuges
ou a um deles. Por um lado, significa que é um direito intransmissível quer inter
vivos quer mortis causa (há, porém, de ter em conta o artigo 1785º/3 CC). Por
outro lado, significa ainda que não é admitida aqui, em princípio, a representação
voluntária (a representação legal é, porém, admitida no artigo 1785º/1).

3. Irrenunciável: A lei quer que o cônjuge a quem pertença este direito tenha sempre
a faculdade de decidir, com inteira liberdade e em face às circunstâncias atuais,
sobre a oportunidade do divórcio; a lei quer defender os cônjuges contra a sua
precipitação que poderia levá-los a renunciar, a exercer ou a exercer livremente o
seu direito ao divórcio. O direito ao divórcio é insuscetível quer de renúncia
antecipada (não pode renuncia-se de antemão, antes do casamento) quer de renúncia
superveniente (depois do casamento). É ainda insuscetível quer de renúncia
genérica (renúncia a pedir o divórcio em geral e por qualquer dos fundamentos da lei)
quer de renúncia específica (pedir o divórcio com um determinado ou determinados
fundamentos). Por último, é insuscetível quer de renúncia total quer de renúncia
parcial.

MODALIDADES: O divórcio pode revestir duas modalidades:

1. Divórcio por mútuo consentimento: resulta de acordo entre os cônjuges;

2. Divórcio sem consentimento de um dos cônjuges (já não é designado divórcio


litigioso, apesar de haver artigos em que aparece esta expressão, ela está revogada): não
há acordo entre os cônjuges e, por isso, que resulta de um pedido judicial
deduzido de um dos cônjuges contra o outro.

A. Divórcio por mútuo consentimento

Noção: Não é pedido por um dos cônjuges contra o outro, mas é pedido pelos dois, de
comum acordo, e os cônjuges não têm de revelar a causa ou causas por que querem o divórcio;
os cônjuges podem divorciar-se sem terem de fundamentar o seu requerimento conjunto do
divórcio na verificação de certa causa, é um divórcio sem causa (enquanto o litigioso já tem causa).
Todavia, a realidade é que materialmente haverá sempre uma causa, mas isso não interessa para
o direito e, por isso, do ponto de vista jurídico, não é preciso indicar causa - artigos 1775º a
1778º-A CC.

Pressupostos: São 2 os pressupostos, mas são pressupostos que já não existem. Assim,
quais eram esse dois pressupostos?

1. Houve um pressuposto temporal: Com a reforma de 1977, os cônjuges só podiam


divorciar-se desde que tivessem casados há pelo menos 3 anos. Tratava-se de
defender os cônjuges contra a sua leviandade ou precipitação, que poderia levá-
los a pedir o divórcio irrefletidamente, sob o impulso dos primeiros

Filipa Ribeiro Gonçalves 50


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desentendimentos ou dificuldades que lhes surgissem na vida matrimonial. Esse


argumento não tem sentido, pois o que importa é as pessoas queriam divorciar-
se. Em todo o caso, estes prazos acabaram em 98 (com a lei 47/98, de 10 de
agosto).

2. Depois da lei 47/98, de 10 de agosto, era preciso não apenas que os cônjuges
estivessem de acordo quanto ao divórcio, mas também quanto a outras matérias -
eram os acordos complementares ao divórcio. Quais eram essas outras matérias?

• 1º: Se um dos cônjuges precisasse de alimentos após o divórcio, tinham de


estar de acordo sobre o montante e o modo de exercício do direito de
alimentos;

• 2º: Quanto ao destino da casa da morada de família;

• 3º Sobre o modo como passariam a exercer as suas responsabilidades


parentais em relação aos filhos menores.

Se não conseguissem chegar a acordo sobre estas 3 matérias, se falta-se um


destes 3 acordos complementares, era o suficiente para não poderem divorciar-se
por mútuo consentimento, ou seja, era o suficiente para o requerimento ser
indeferido.

Hoje, e a partir da lei 61/2008, a lei não admite obstáculos, basta que queiram
divorciar-se para o fazerem - o resultado esta garantido. O acordo dos cônjuges
para a dissolução do casamento é o único pressuposto que subsiste para o
divórcio por mútuo consentimento.

Como funcionam os processos do divórcio por mútuo consentimento?

- DIVÓRCIO ADMINISTRATIVO: O processo corre nas conservatórias do registo civil e o


processo será administrativo - artigos 1775º e ss. CC, há também normas do Cód.
Registo Civil. Como as coisas funcionam?

1. Os cônjuges dirigem-se a qualquer conservatória do registo civil e


apresentam o requerimento no sentido do divórcio, requerimento esse que
deve ser assinado pelos dois. O requerimento tem de ser acompanhado por
certos acordos complementares, tem de estar de acordo sobre certas
matérias complementares, se não estiverem de acordo tem de haver
intervenção do tribunal. As matérias são:

- Filhos (1775º/1/b);

- Alimentos (1775º/1/c);

- Casa (1775º/1/d).

- Além destes 3 acordos, em 2017 (com a Lei


8/2017, de 3 de março) acrescentou-se que se
houver animal de companhia tem de haver
acordo sobre o destino do animal (1775º/1/f).

A alínea a) do nº 1 do artigo 1775º, exige que se apresente uma relação


especificada dos bens comuns, ou seja, uma lista dos bens comuns. Esta
lista não é propriamente um acordo de vontades, é um acordo quanto a
factos. Seja como for, mesmo considerando-se acordo, os tribunais ignoram
esta exigência, eles tendem a aceitar que cada um dos cônjuges apresente a
lista dos bens comuns.

Filipa Ribeiro Gonçalves 51


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A lei estabelece que a pedido dos cônjuges que seja o próprio conservador
ou funcionário do registo civil a redigir os acordos, mas a vontade é dos
cônjuges, apenas a escrita é do conservador.

2. O conservador tem a obrigação de informação aos cônjuges da existência


de serviços de mediação familiar cujo objetivo são os que resultam do
nome, são apenas mediar, e não influenciar. Se os cônjuges recorreram a
estes serviços o processo suspende-se, e aí:

- Se os cônjuges, ou algum deles, desistirem do pedido, o processo


acaba e o conservador fará consignar em ata a desistência e
homologá-la-á;

- Se os cônjuges mantiverem o propósito de se divorciarem, o


processo continua.

Até 2008, a entidade que recebia o requerimento é que deveria tentar


reconciliar os cônjuges, mas agora isto está proibido e foi substituído por
esta nova exigência de informação da existência dos serviços de mediação
familiar.

3. O conservador convoca os cônjuges para uma conferência/reunião (artigo


1776º), em que o conservador confirma identidade os cônjuges e o
requerimento do divórcio e vai apreciar os acordos, se estes estão bem
feitos, no sentido de que não desprotegem os interesses de qualquer um
dos cônjuges ou dos filhos. Se isso acontecer, o conservador convida os
cônjuges a alterá-los:

- Se os cônjuges não alterarem os acordos, o conservador recusa a


sua homologação, não decreta o divórcio e remete o processo para o
tribunal competente (artigo 1778º CC);

- Se alterarem os acordos devidamente o conservador homologa os


acordos e decreta o divórcio, procedendo-se ao respetivo registo.

4. Isto acontece a todos os acordos menos a um que é apreciado pelo


Ministério Público que é o acordo relativo aos filhos (artigo 1776º-A), acordo
que o conservador deve enviar para o MP.

Aula dia 22 de novembro de 2018

- DIVÓRCIO JUDICIAL: O processo corre nos tribunais e o processo será judicial.

Em que casos é que tem lugar o processo judicial do divórcio por mútuo
consentimento? São 3 e apenas 3 os casos:

1. Se os acordos complementares não tiverem sido considerados razoáveis e


por isso não homologados pela entidade competente para os apreciar
(conservador ou MP). Então, o processo é remetido para o tribunal -
remessa do processo administrativo (artigo 1778º CC);

2. Se, logo à partida, os cônjuges não tiverem apresentado os acordos


complementares, pelo menos 1 dos 4 que a lei exige. Este processo começa
logo a correr no tribunal (artigo 1778º-A CC);

3. Se houver inicialmente um processo de divórcio sem consentimento de um


dos cônjuges, nessa ação de divórcio litigioso há uma tentativa por parte do

Filipa Ribeiro Gonçalves 52


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juiz de conciliação, mas não sendo possível a reconciliação dos cônjuges, o


o juiz vai tentar que acordem em divorciar-se por mútuo consentimento
(artigo 1779º CC).

Como corre o procedimento judicial? Artigo 1778º-A CC e 994º e ss. CPC.

1. Os cônjuges apresentam o requerimento subscrito por ambos;

2. O juiz deve informar sobre a existência e os objetivos dos serviços de


mediação familiar. Se os cônjuges recorrerem aos serviços o processo
suspendem-se, se não o processo continua normalmente (artigo 1774º CC);

3. Há uma conferencia única entre o juiz e os cônjuges. Nesta conferência o


juiz vai apreciar os acordos que já existem, em relação aquelas que não
existem o juiz vai tentar convencer os cônjuges a chegarem a acordo em
relação a eles (artigo 1778º-A/6 CC). Se na sequência desta tarefa:

- Chegarem a acordo e se os acordos forem razoáveis o juiz


homologa-os;

- Se não chegarem a acordo ou se os acordos não forem razoáveis,


como as matérias complementares têm de ficar definidas, é o juiz
que as define, ou seja, que fixa essas matérias (artigo 1778º-A/3
CC);

4. O divórcio é decretado. Ele é sempre decretado, mesmo que não haja


acordo dos cônjuges, pois fica a ser o juiz estabelecer o regime dos acordos
complementares.

B. Divórcio sem consentimento de um dos cônjuges


Noção: Aqui não há mútuo consentimento, só um dos cônjuges é que se pretende


divorciar e, por isso, a forma processual de o fazer é uma ação judicial de divórcio intentada por
um dos cônjuges contra o outro. Este pedido divórcio tem uma causa (causa de pedir), ou seja,
um facto que serve de fundamento para o divórcio e uma vez provada essa causa é que o pedido
tem sucesso.

Ideias gerais: Conceções de divórcio litigioso dos últimos tempos (espírito do divórcio):

1. Divórcio-sanção: O único fundamento para o divórcio era a violação culposa de deveres


conjugais. O divórcio era como uma sanção ao cônjuge infrator. Todavia, na realidade, o divórcio
nunca era uma sanção, até porque normalmente era o cônjuge infrator que queria o divórcio.

2. Divórcio-remédio: O divórcio pressupõe apenas uma situação de crise do matrimónio,


um estado de vida conjugal intolerável e quer ser o remédio para um tal estado ou situação.
Concebe-se não só situações em que a crise do matrimónio provém da culpa de algum dos
cônjuges, mas também de situações em que a vida conjugal se tenha tornado intolerável por
causas puramente objetivas. O divórcio não quer castigar o culpado (não quer valer como uma
sanção), mas apenas remediar ou prover àquela situação de crise objetivamente considerada, ou
seja, quer ser um remédio de que beneficiaria o cônjuge que vítima de uma situação intolerável.

É o caso quando um dos cônjuges adoece mentalmente de forma grave e em consequência dessa
doença o outro cônjuge (o cônjuge são) pode pedir o divórcio ou, então, se um dos cônjuges desaparece o
cônjuge presente pode intentar uma ação de divorcio litigioso.

Filipa Ribeiro Gonçalves 53


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3. Divórcio-constatação da rutura: O que importa é a existência de uma situação de rutura


do casamento, objetivamente considerada e que o divórcio deve pura e simplesmente constatar.
O que causa o divórcio é a própria rutura em si (separação de facto), a sua confirmação.

O nosso sistema português é um divórcio-rutura, com marcas do divórcio-remédio.

Quais as causas de divórcio previstas entre nós?

Sendo o divórcio sem consentimento de um dos cônjuges um divórcio com causa, um


dos cônjuges só o pode pedir quando alegue e prove uma circunstância que seja fundamento
para o divórcio. São causas para o divórcio justamente as circunstâncias verificadas as quais a lei
permite a um ou a ambos os cônjuges pedir o divórcio.

A causa do divórcio não se confunde com a causa de pedir na ação de divórcio. A 1ª é


uma categoria abstrata e a 2ª é o facto concreto que se invoca.

As causas do divórcio sem consentimento de um dos cônjuges podem classificar-se a


partir de diferentes critérios:

(a) Causas determinadas e indeterminadas:

- A causa é determinada se a lei individualiza e especifica com precisão o facto


que pode fundamentar o pedido de divórcio - artigo 1781º/a), b) e c);

- A causa é indeterminada se esse facto não está concretamente especificado,


mas cabe numa cláusula geral, a que a lei recorreu para definir as causas do
divórcio - artigo 1781º/d).

(b) Causas perentórias ou absolutas e causas facultativas ou relativas:

- Nas causas perentórias ou absolutas, o juiz, apurados os factos que as


integram, tem de decretar o divórcio sem qualquer apreciação sobre a
gravidade desses factos, ou seja, sem qualquer averiguação sobre se eles
determinaram, no caso concreto, um estado de vida conjugal intolerável.
Decerto que o divórcio só é autorizado porque se entende que esse estado
exista; mas a lei admite uma presunção iuris et de iure de que há um estado
de vida matrimonial intolerável onde quer que estejam verificados aqueles
factos, que reconheceu como causas perentórias de divórcio - artigo 1781º/a)
e c) (o tribunal deve decretar o divórcio logo que se faça prova dos respetivos
factos).

- Nas causas facultativas ou relativas, o juiz tem de averiguar ainda, uma vez
apurados os factos que as integram, a gravidade da causa e o grau de
comprometimento da vida em comum resultante dessa gravidade, ou seja,
tem de averiguar se os factos turvaram a harmonia conjugal de forma grave
em termos de passar a ser impossível ou intolerável a vida em comum -
artigo 1781º/b) e d) (as causas concretas que forem alegadas pela via da alínea b) e
d) só justificarão a sentença de divórcio se o tribunal se convencer de que elas são
suficientes para mostrar a rutura definitiva do casamento).

(c) Causas subjetivas e objetivas:

- As causas subjetivas são culposas e já não existem desde a reforma de 2008.

- As causas objetivas não são culposas. Qualquer dos cônjuges, ou os dois,


podem ter sido responsáveis pela verificação dos factos alegados como
causa da rutura definitiva do casamento; mas essa “culpa” não releva para

Filipa Ribeiro Gonçalves 54


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nenhum efeito, pois o que interessa é a demonstração da rutura definitiva do


casamento - várias alíneas do artigo 1781º.

(d) Causas unilaterais ou bilaterais:

- As causas são unilaterais se poderem ser invocadas só por um dos cônjuges


- artigo 1781º/b) e c) -> artigos 1785º/1.

- As causas são bilaterais se poderem ser invocadas pelos dois cônjuges -


artigo 1781º/a) e d) -> artigos 1785º/1.

De acordo com o artigo 1781º CC, são 4 as causas do divórcio. Contudo, existe uma
causa indeterminada e geral (alínea d)) e as restantes são causas determinadas meramente
exemplificativas (alíneas a), b) e c)):

1) Artigo 1781º/d: Rutura definitiva da vida em comum. A lei quis que, para ser
possível o divórcio, que tenha de haver uma rutura definitiva, não basta um
começo de rutura. Quando se dá a rutura definitiva? Costuma-se dizer que é
quando, perante aquele determinado quadro de circunstâncias, já não há
retorno possível, em todo o caso cabe ao tribunal a competência para
reconhecer quando é que certos factos (não previstos na lei), mostram rutura
definitiva do casamento. Para preencher este conceito temos a ajuda da lei que
nos dá exemplos de situações que, para ela, são situações de rutura definitiva
do casamento: são as causas das alíneas a), b) e c). Todavia, a rutura do
casamento não é relevante apenas quando se provam as estas causas
determinadas pela lei, mas também noutras situações que não são
especificadamente previstas.

2) Artigo 1781º/a: A separação de facto por um ano consecutivo. A separação


de facto é quando os cônjuges estão separados, mas já não coabitam um com
o outro. Para haver separação de facto é preciso, de acordo com o artigo
1782º, 2 elementos:

• Elemento objetivo (o corpus da separação do facto): a ausência de


coabitação, de comunhão de vida; mas não basta, é ainda preciso …

• Elemento subjetivo (o animus da separação de facto): haja da parte de


ambos ou de um dos cônjuges o propósito de não restabelecer a
comunhão de vida.

Qual o tempo de separação de facto que a lei exige para ser possível o divórcio
com esse fundamento? 1 ano. A lei diz ainda, no artigo 1781º-A, que a
separação de facto tem de ser por um ano consecutivo (não admite
interrupção).

3) Artigo 1781º/b: A alteração das faculdades mentais do outro cônjuge,


quando dure há mais de um ano e, pela sua gravidade, compromete a
possibilidade da vida em comum. A lei não se basta com a alteração das
faculdades mentais, a lei exige que essa alteração dure um ano e que seja
grave e que pela sua gravidade comprometa a possibilidade da vida em
comum. Isto porque, a alteração das faculdades mentais, quando seja grave,
destrói à partida, ao contrário do que acontece quando se trata de outras
doenças, a plena comunhão de vida que é a essência do casamento (artigo
1577º), uma comunhão de vida, não apenas física, mas também intelectual e

Filipa Ribeiro Gonçalves 55


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afetiva. A continuação de uma vida em comum tão gravemente limitada


representaria para o outro cônjuge um sacrifício inexigível e não parece que o
direito deva impor-lhe sacrifício tão pesado; se ele quiser, assumi-lo-á.

O artigo 1792º/2 CC diz que o cônjuge que pediu o divórcio com fundamento
nesta alínea deve reparar os danos não patrimoniais causados ao outro cônjuge
pela dissolução do casamento. O cônjuge pode divorciar-se, mas deve
indemnizar o outro pelos danos não patrimoniais (resultantes do próprio
divórcio). Isto normalmente não acontece, pois costuma-se recorrer à separação
de facto onde não se tem de indemnizar.

4) Artigo 1781º/c: A ausência, sem que do outro cônjuge haja notícias, por tem
não inferior a um ano. Pode assim o cônjuge do ausente, decorridos um ano
sobre a data das últimas notícias, pedir o divórcio com fundamento na própria
ausência.

A ausência não é já uma separação de facto? Na ausência verifica-se o


elemento objetivo, mas já não o elemento subjetivo que pode ou não se
verificar.

Posto isto,

- 1781º/a: causa determinada, perentória ou absoluta, objetiva e bilateral (artigo


1785º/1);

- 1781º/b: causa determinada, facultativa ou relativa, objetiva e unilateral;

- 1781º/c: causa determinada, perentória ou absoluta, objetiva e unilateral;

- 1781º/d: causa indeterminada, geral, facultativa ou relativa, objetiva e bilateral.

Processo: É sempre judicial. Está tratado nos artigos 931º e 932º CPC:

1. Apresentação da petição inicial (pois, neste caso, há autor e réu), em que


o autor formula o pedido e indica a causa de pedir, ou seja, o facto ou os
factos essenciais e concretos que lhe servem de fundamento;

2. Obrigação por parte do juiz de informar os cônjuges da existência e os


objetivos dos serviços de mediação familiar - artigo 1774º CC.

3. Há uma tentativa de conciliação pelo juiz - artigo 1779º CC. O juiz tenta
reconciliar os cônjuges no sentido de que continuem o casamento e, não
sendo possível, tenta ao menos obter o acordo para o divórcio por mútuo
consentimento.

4. Continuando o processo, o juiz pode tentar que os cônjuges chegam a


acordo sobre as matérias complementares. Em todos o caso, não
conseguindo os acordos, o juiz pode, por iniciativa própria ou a
requerimento de alguma das partes, fixar regimes provisórios quando aos
acordos que só valem na pendência do processo.

5. Pode haver lugar a contestação;

6. No termo o juiz decide do divórcio. Ele vai valorar a causa do pedido de


divórcio, vai verificar se os factos estão provados e estando provados se
podem servir de fundamento ao divórcio. Sendo positivo, o juiz decide o
divórcio e a sentença do divórcio não está condicionada pela pré-fixação
das matérias complementares. Essas matérias complementares podem

Filipa Ribeiro Gonçalves 56


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ser decididas em apenso ao processo do divórcio, mas, muitas vezes,


são decididas depois. A sentença limita-se a decretar o divórcio e já não
a declaração de culpa, como anteriormente. A única coisa que pode ser
acrescentada, se tiver sido feita prova disso e se houver requerimento por
parte dos cônjuges é que a cessação da coabitação se tenha dado num
determinado momento anterior.

EFEITOS: Artigos 1788º e ss. CC.

O princípio geral é de que o divórcio dissolve o casamento e tem os mesmo efeitos da


dissolução por morte, salvo as exceções consagradas na lei. Assim, o divórcio extingue a relação
matrimonial e faz cessar, para o futuro, os efeitos, mantendo-se, porém, os efeitos já produzidos.
A sentença constitutiva só opera ex nunc e não ex tunc.

A partir de que data se produzem os efeitos? Podem considerar-se divorciados a partir, de


acordo com o artigo 1789º/1, do trânsito em julgado da respetiva da sentença de divórcio ou da
data em que o despacho do conservador do registo civil se tornou definitivo (equipara-se o
despacho do conservador à sentença do divórcio - artigo 1776º/3 CC). Contudo, os efeitos
retroagem à data da proposição da ação ou do requerimento do divórcio quanto às relações
patrimoniais entre os cônjuges (princípio da retroatividade - artigo 1789º/1/2ª parte). Assim, a
exceção só vale no âmbito das relações patrimoniais, ficando de fora as relações pessoais (só
estão divorciados quando o processo termina). A lei permite que os efeitos patrimoniais possam
retroagir a um momento anterior: até ao momento em que os cônjuges deixaram de coabitar. Se
a coabitação entre os cônjuges tiver cessado antes da propositura da ação e a falta de
coabitação estiver provada no processo, pode qualquer dos cônjuges requerer que a sentença
fixe a data em que a coabitação cessou, retrotraindo-se os efeitos patrimoniais do divórcio a essa
data. A prova de que a coabitação cessou em determinada data faz-se, em regra, quando o
pedido de divórcio sem consentimento de um dos cônjuges se funda em separação de facto dos
cônjuges (artigo 1781º/a).

Estando em causa interesses de terceiros os efeitos patrimoniais do divórcio só lhes


podem ser opostos a partir da data do registo da sentença - artigo 1789º/3 CC.

• TERMO DA COMUNHÃO E PARTILHA: Com a dissolução do casamento cessam


as relações patrimoniais entre os cônjuges (artigo 1688º CC) e pode proceder-se à
partilha dos bens do casal.

As regras sobre a partilha: Temos de saber quais os bens próprios e os bens


comuns. Em principio, faz-se de acordo com o regime de bens estipulado (recebendo
cada um dos cônjuges os seus bens próprios e a sua meação no património comum - artigo
1689º):

- Se for um regime de comunhão geral de bens existe um património


comum do casal e, em consequência do divórcio, faz-se a partilha desse
património comum (tudo é comum e, por isso, tudo é para partilhar).

- Se for um regime de separação de bens então não há partilha, pois não há


bens comuns;

- Se for um regime de comum de adquiridos: só se partilha o património


comum - artigo 1689º CC:

Filipa Ribeiro Gonçalves 57


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• É próprio:

- O que cada um dos cônjuges levou para o casamento


(o que tinha antes de casar);

- O que cada um dos cônjuges recebeu no casamento a


título gratuito (herança, doação) que pertence ao
cônjuge que recebeu.

• São comuns os bens adquiridos a título oneroso.

Exceção à regra que a partilha se faz de acordo com o regime de bens: artigo 1790º
CC (isto se forem casados segundo o regime de comunhão geral): Em caso de
divórcio, nenhum dos cônjuges pode na partilha receber mais do que receberia se o
casamento tivesse sido celebrado segundo o regime da comunhão de adquiridos.
Esta regra do 1790º só existia para o cônjuge culpado ou mais culpado, o inocente
ou menos culpado poderia receber mais do que receberia. Hoje, vale para ambos os
cônjuges.

Nesta opção tomada terá pesado decisivamente o facto de o regime da comunhão


geral favorecer a celebração de casamentos cujo móbil fosse o interesse económico
e conduzir a soluções de flagrante injustiça, mal se entendendo que o casamento,
em si mesmo, fosse um meio de adquirir - propósito de evitar que o divórcio se
torne num negócio.

E havendo património comum ainda não partilhado de pessoas que já não estão
casadas? Qual o estatuto do património do casal? Parece que este património
comum deve ter um tratamento mais ao menos parecido àquele que tem a herança
indivisa. Enquanto estão casados nenhum dos cônjuges pode dispor da sua quota
do património e não pode pedir a partilha do património comum - isto em relação ao
património conjugal. Na herança indivisa os herdeiros podem pedir a partilha e
qualquer um deles pode dispor da sua quota. Se os cônjuges já estiverem
divorciados, mas ainda não houver partilha, ele deve ter o tratamento da herança
indivisa, ou seja, os cônjuges podem pedir a partilha e podem dispor da sua quota.

• TERMO DAS ILEGITIMIDADES CONJUGAIS (um dos cônjuges não podem realizar
um ato sem a autorização do outro cônjuge). As ilegitimidades conjugais cessam
com o trânsito em julgado da sentença do divórcio.

Aula dia 29 de novembro de 2018

• DESTINO DA CASA DA MORADA DA FAMÍLIA: Os cônjuges devem acordar sobre


o destino da casa de família (artigo 1775º/1/d CC), se não chegarem a acordo:

— Se viverem em casa própria comum ou de um dos cônjuges - artigo 1793º


CC. O tribunal pode dar de arrendamento a qualquer um dos cônjuges, a seu
pedido, a casa de morada da família (trata-se de uma expropriação sem
indemnização). Na decisão sobre a constituição do direito ao arrendamento
da morada da casa de família, o juiz deve considerar as necessidades de
cada um dos cônjuges e o interesse dos filhos do casal. Há arrendamento
constituído por decisão judicial, que fica sujeito às regras gerais do
arrendamento, mas sendo um arrendamento especial (é instituído por

Filipa Ribeiro Gonçalves 58


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decisão judicial em função interesses de um dos cônjuges) o arrendamento


passa a ser gerido pelo tribunal, que define as condições do arrendamento e
pode fazê-lo cessar (nos termos do artigo 1793º/2);

— Se viverem em casa arrendada - artigo 1105º CC. Os cônjuges podem


acordar na:

- Transmissão do arrendamento: Quando o arrendamento tiver sido


feito por um dos cônjuges eles podem acordar em que o arrendamento se
transmita ao cônjuge não arrendatário, o que é imposto ao senhorio. A regra
geral é que havendo cessão da posição contratual - da posição de
arrendatário - esta tem de ser consentida pela outra parte - pelo senhorio.
Neste caso, temos uma situação excecional;

- Concentração do arrendamento: Quando o arrendamento tiver sido


feito pelos dois cônjuges (direito contitulado) estes podem acordar em que o
arrendamento se concentre em um deles, só ficando esse a ser arrendatário.

O tribunal intervém na falta de acordo e decidirá tendo em conta o mesmo quadro


de interesses do artigo 1793º CC (dos cônjuges e dos filhos). Para além do mais, o
direito ao arrendamento da casa da morada de família deve ser atribuído ao
cônjuges que mais precise dela.

• PERDA DA QUALIDADE DE SUCESSOR: Após o divórcio, cessam os direitos


sucessórios que até ao divórcio os cônjuges tinham em caso de morte um em
relação ao outro. Existe tanto quando a sucessão legal (que resulta da lei - artigo
2133º CC) como à sucessão testamentária (artigo 2317º CC).

• PERDA DE BENEFÍCIOS: Cada cônjuges perde todos os benefícios recebidos ou


que haja de receber do outro cônjuge ou de terceiro, em vista do casamento ou em
consideração do estado de casado (artigo 1791º CC). Parte-se da ideia de que o
casamento não deve ser um meio de adquirir património. Não se aplica aos
donativos conformes aos usos sociais (artigo 940º/2 CC), que correspondem a
práticas sociais generalizadas e não implicam, em regra, disposições de valor
considerável.

• OBRIGAÇÃO DE PRESTAÇÃO ALIMENTOS: Artigos 2016º e 2016º-A.

a) Generalidades: O artigo 2016º/1 CC diz que cada cônjuges deve tratar da


sua própria subsistência após o divórcio. Isto significa que enquanto a
pessoa for tentando arranjar meios subsistência, enquanto razoavelmente os
seus esforços não poderem ser sucedidos, terá direito a esta prestação,
mas apenas, e repetindo, enquanto for cumprindo a obrigação de tratar da
sua própria subsistência. Em regra, a prestação é temporária, mas pode
haver casos em que a pessoa não consiga arranjar meios de subsistência, p.
ex., por causa da idade avançada, aí a prestação já será definitiva.

b) Quem tem direito a alimentos: Antes de 2008, funcionava em função da


culpa, ou seja, era o cônjuge culpado ou mais culpado que tinha de prestar
alimentos ao outro cônjuge. Depois de 2008, deixou de estar presente o
critério da culpa, podendo qualquer um dos cônjuges ter direito a alimentos

Filipa Ribeiro Gonçalves 59


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- artigo 2016º/2 CC. Além do mais, a lei tem, no artigo 2016º/3 CC, a
cláusula da equidade: o direito a alimentos pode ser negado.

c) Medida da obrigação: Normalmente o montante dos alimentos corresponde


ao mínimo necessário para a sobrevivência da pessoa (sustento,
alimentação e vestuário) - artigo 2003º CC. Em regra e de acordo com o
regime geral de alimentos, o montante é definido em função deste mínimo
de sobrevivência. Contudo, no caso de divórcio as coisas são diferentes. No
artigo 2016º-A CC vemos que na fixação do montante o tribunal deve tomar
em conta uma série de circunstâncias, não apenas ao mínimo necessário de
sobrevivência, nem ao mesmo padrão de vida que beneficiavam enquanto
casados, será um intermédio que corresponderá a uma vida decente.

d) Critérios para a fixação do montante: A prestação de alimentos existe no


caso do alimentado ter necessidade de alimentos e na possibilidade de o
alimentante os prestar, sem por em risco a sua próprio sobrevivência.

e) Modo de prestar os alimentos: Em regra, será uma prestação pecuniária


periódica mensal - artigo 2005º CC. Mas podem haver outras formas de
alimentos:

- Acordo das partes; ou

- Decisão judicial baseada em razões especiais.

Poderá ser fixado inicialmente um montante total da prestação que é paga de


uma só vez (clean break) - a ideia é de cortar de uma vez as relações
económicas entre os divorciados. O montante é calculado com base em
elementos tradicionais, tendo em conta o tempo previsível em que a
necessidade do credor se verificará.

f) Alteração dos alimentos fixados: Pode haver circunstâncias posteriores que


justifiquem uma alteração - artigo 2012º CC.

g) Indisponibilidade e impenhorabilidade do direito: Em geral, a pessoa não


pode dispor do direito de alimentos (não pode transmitir, ceder ou
renunciar), nem o direito de alimentos pode ser penhorável, bem como está
proibida a compensação da dívida de alimentos com um crédito que o
devedor de alimentos tenha sobre a contraparte, até porque o montante
dos alimentos corresponderá apenas ao mínimo para a sobrevivência -
artigo 2008º CC. No caso do divórcio, podendo o montante dos alimentos
exceder o mínimo de sobrevivência, parece que nesse excesso já poderão
ser objeto de disposição e penhora.

h) Garantia do cumprimento da obrigação:

- O direito vigente confere ao credor de alimentos o direito de constituir


hipoteca legal (artigo 705º/d CC);

- O tribunal pode determinar uma hipoteca judicial (artigo 710º CC);

- O credor pode requerer o arresto de bens do devedor (artigo 619º CC);

- O tribunal pode impor prestação de caução quando tiver razões para


duvidar do cumprimento pontual (artigo 624º CC).

i) Cessação da obrigação de alimentar: Além das razões gerais do artigo


2013º CC, há razões específicas que constam do artigo 2019º CC.

j) Preferências entre credores: Artigo 2016º-A/2 CC.

Filipa Ribeiro Gonçalves 60


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• OBRIGAÇÃO DE INDEMNIZAR: Possibilidade do cônjuge lesado pedir a reparação


dos danos (não patrimoniais) causados pelo outro cônjuges no casamento - artigo
1792º CC. Isto significa que pode haver lugar a responsabilidade civil, nos termos
gerais.

Mas estes danos aqui referidos são quaisquer danos (resultantes da violação de
quaisquer deveres) ou são apenas os danos que resultam da violação de direitos que
as pessoas já tinham antes do casamento e independente do casamento (que
resultem da violação de deveres gerais de respeito, de ofensas a direitos de personalidade
e a direitos fundamentais - direitos absolutos) ou também da violação de deveres
especificamente conjugais (direitos relativos)? Para o Dr. Francisco M. B. Pereira
Coelho, apenas por violação de deveres gerais de respeito, de direitos de
personalidade e de direitos fundamentais.

Filipa Ribeiro Gonçalves 61


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DIREITO DA FILIAÇÃO

1. Introdução

2. Estabelecimento da relação jurídica da filiação

3. Efeitos da filiação

1. INTRODUÇÃO: PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS

— Princípios já falados - CRP (página 11 e 12):

- Direito a constituir família - artigo 36º/1.

- Princípio da proibição de discriminação dos filhos nascidos do casamento e fora


do casamento - artigo 36º/4;

- Princípio da atribuição aos pais dos poder-dever de educação dos filhos - artigo
36º/5.

- Princípio da inseparabilidade dos filhos dos seus progenitores - artigo 36º/6.

- Proteção da adoção - artigo 36º/7;

- Proteção da família - artigo 68º;

- Proteção da paternidade e maternidade - artigo 68;

- Proteção da infância - artigo 69º.

— Outros princípios ainda não falados:

- CRP:

• Direito à identidade pessoal - artigo 26º. Trata-se de um direito de


personalidade que consiste, por um lado, no direito a ter um nome, de
não ser privado dele, de o defender e de impedir que outrem o utilize;
por outro lado, consiste num direito à historicidade pessoal, significando
isto o direito ao conhecimento da identidade dos progenitores que, por
sua vez, garante um direito à localização familiar, de tal modo que casa
indivíduo possa identificar os seus parentes, a sua origem geográfica e
social.

• Direito ao livre desenvolvimento da personalidade - artigo 26º. Consiste


no direito à liberdade de desenvolvimento da sua personalidade, mas é
antes de mais um direito ao desenvolvimento da personalidade.

- Outros que resultam da lei:

• Princípio da taxatividade dos meios estabelecidos na lei para o


estabelecimento da filiação: Significa que os vínculos da filiação se
estabelecem apenas através dos modos previstos imperativamente na
lei, não valendo aqui o princípio da autonomia da vontade.

• Princípio da primazia da verdade biológica: O sistema de


estabelecimento da filiação pretende que os vínculos biológicos tenham
uma tradução jurídica fiel, isto é, pretende que a mãe juridicamente
reconhecida e o pai juridicamente reconhecido sejam realmente os
progenitores, os pais biológicos do filho. Assim, a filiação jurídica
corresponde, em regra, à filiação biológica. Há, em todo o caso, o
reconhecimento da filiação afetiva, mais importante do que serem

Filipa Ribeiro Gonçalves 62


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reconhecidos os pais biológicos como pais jurídicos, são os pais


jurídicos afetivos.

• Princípio da atenção ao superior interesse do filho/criança.

2. ESTABELECIMENTO DA FILIAÇÃO

Notas introdutórias:

I. Pode ter interesse, para certos efeitos, saber quando se deu a concessão de uma
criança. A uma norma geral do artigo 1798º CC que diz quando se deu a concessão -
período legal de concessão: corresponde aos primeiros cento e vinte dias dos trezentos
que antecederam o nascimento do filho (salvas as exceções dos artigos seguintes).
Assim, tendo em conta a data do nascimento, recua-se 300 dias (10 meses) e a
concessão ter-se-á dado nos primeiros 120 dias (4 meses) - presunção que admite
prova em contrário. É uma presunção em dois sentidos (artigo 1800º CC):

1. Que a concessão se deu naqueles 120 dias (4 meses) - podendo provar-se


o contrário;

2. Que a concessão se deu em qualquer dia daqueles 120 dias (4 meses) -


podendo provar-se que se tenha dado num período mais restrito.

Em todo o caso, pode-se provar que houve uma gestação anormalmente longa (mais de
300 dias), bem como uma gestação anormalmente curta (menos de 180 dias).

máx. 300 dias mín. 180 dias 0 dias

120 dias 180 dias

Conceção Nascimento

II. Há dois grandes sistemas:

1. Sistemas de filiação: Para se estabelecer juridicamente a filiação basta a


prova da filiação biológica, que uma vez provada constitui automaticamente
o vínculo jurídico de filiação.

2. Sistemas de reconhecimento: Para se estabelecer juridicamente a filiação


não basta a prova da filiação biológica, é preciso ainda que o progenitor
reconheça que é pai ou mãe, seja um reconhecimento voluntário ou judicial
(podendo a lei na ação judicial limitar ou excluir a possibilidade de ação judicial).

O nosso sistema atual:

—Em relação à maternidade, é um sistema de filiação;

—Em relação à paternidade, há uma exigência de reconhecimento, mas aos


poucos parece que o sistema também caminha para um sistema de filiação.

Filipa Ribeiro Gonçalves 63


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Formas de estabelecimento da filiação:

I. ESTABELECIMENTO DA MATERNIDADE: Há 3 formas:

1. Estabelecimento por indicação no registo civil (artigos 1803º a 1805º CC):


Identificação da mãe no registo de nascimento. A pessoa que fizer a declaração de nascimento
deve indicar ou identificar a mãe, e esta indicação é suficiente para que o conservador faça
menção do nome da mãe no assento de nascimento (artigo 1803º). Posto isto, basta esta
identificação para automaticamente estar estabelecida juridicamente a maternidade.

A lei distingue aqui duas hipóteses:

- Se o nascimento tiver ocorrido à menos de 1 ano: A maternidade mencionada


considera-se estabelecida, restando notifica a mãe deste facto, se não tiver
sido ela ou o marido a fazer a declaração - artigo 1804º CC.

- Se o nascimento tiver ocorrido há 1 ano ou mais: Artigo 1805º CC

• Se for a mãe a declarante ou ela esteja presente no ato ou, então, estiver
representada por procurador especial a maternidade é automaticamente
estabelecida.

• Se for outra pessoa, o legislador evita um estabelecimento automático,


preferindo que a pessoa indicada como mãe seja notificada para ter a
oportunidade de se opor ou para confirmar a maternidade. O seu
silêncio valerá como concordância e se a mulher indicada como mãe
negar a maternidade, ou se ela não poder ter sido notificada, a menção
da maternidade não chega a ser convertida em estabelecimento da
maternidade, essa menção fica sem efeito.

2. Estabelecimento por declaração no registo civil: A maternidade é estabelecida em


momento posterior àquele em que foi feito o registo de nascimento; o registo de nascimento já
existe, mas é omisso quanto à maternidade. O meio técnico para desencadear o estabelecimento
da maternidade é (artigo 1806º CC):

A maternidade será mencionada no


— A declaração de maternidade feita r e g i s t o , fi c a n d o a m a t e r n i d a d e
pela própria mãe (nº 1); ou
estabelecida.

— A indicação/identificação da mãe No último caso, se o nascimento já tiver


ocorrido à 1 ano ou mais aplica-se o
feita por terceiro (nº 2).

regime do artigo 1805º CC.

O artigo 1806º/1/parte final fala dos casos em que a mãe está casada quando o filho
nasceu e de já ter havido perfilhação por pessoa diferente do seu marido. Se a mãe era casada
quando o filho nasceu, então funciona a presunção de paternidade do artigo 1826º CC: presume-
se que o filho nascido ou concebido na constância do matrimónio da mãe tem como pai o marido
da mãe. Mas se na altura da declaração de maternidade a criança já tinha pai (um terceiro,
pessoa diferente do marido da mãe), então estaríamos perante casos em que há dois pais:
haveria um pai resultante da presunção de paternidade e outro pai resultante da perfilhação que
tinha havido. Querendo a lei evitar estes casos, a lei exige que se a mãe quiser assumir a sua
maternidade tem de o fazer através de uma ação judicial de investigação, que é uma ação
intentada pela mãe contra si mesma - artigo 1824º CC.

Filipa Ribeiro Gonçalves 64


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Em relação à capacidade para a perfilhação (artigo 1850º CC): a lei exige que as
pessoas tenham pelo menos 16 anos. Para o Drº Francisco M. B. P. Coelho, basta a capacidade
natural para entender a maternidade, para uma uma jovem ser capaz de assumir a maternidade.

Em relação à forma (artigo 1853º CC): o modo normal de fazer a declaração de


maternidade é a declaração feita perante o funcionário do registo civil (que conduz a uma inscrição
por meio de assento), mas a declaração pode ser feita por testamento, escritura pública ou termo
lavrado em juízo (leva a um averbamento).

Pode acontecer que a maternidade estabelecida não corresponde à verdade


biológica, ou seja, a mãe que se identificou como mãe efetivamente não o é. Nestas hipóteses há
possibilidade de impugnação da maternidade registada - artigo 1807º CC.

— Legitimidade ativa:

• Pessoa declarada como mãe: que erroneamente se


assumiu como mãe;

• Pelo registado;

• Por quem tiver interesse moral ou patrimonial na


procedência da ação;

• Ministério Público: manifesta o interesse do Estado


no estabelecimento da filiação biológica.

— Legitimidade passiva: A lei não define quem tem legitimidade passiva,


mas podemos concluir:

• Pessoa declarada como mãe;

• Filho;

• Pai.

— Prazo: Não há prazo (a todo o tempo). O direito de impugnar não


caduca.

Aula dia 30 de dezembro de 2018

3. Reconhecimento judicial: Tem por base uma ação judicial que é ação de
investigação da maternidade.

Entre a declaração da maternidade e o reconhecimento judicial, o CC fala da averiguação


oficiosa de maternidade (artigo 1808º e ss. CC). Esta não é mais uma forma de estabelecimento
da maternidade.

Sempre que haja um registo de nascimento e não seja indicada a maternidade abre-se um
processo (de iniciativa oficiosa, pois parte de entidades públicas) pelo funcionário do registo civil
que procedeu ao registo da criança. Ele vai enviar ao tribunal uma certidão do registo a fim de
que o tribunal proceda à identificação da maternidade.

A que resultados pode resultar este processo?

- Se o tribunal não chegar ao resultado, o processo é arquivado;

- Se o tribunal conseguir ter uma ideia segura ou muito provável da identidade da


mãe, ele chama essa pessoa que pensa que é a mãe para ela confirmar:

Filipa Ribeiro Gonçalves 65


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• Se ela confirmar estabelece-se a maternidade através da declaração da


maternidade feita por termo lavrado em juízo;

• Se ela não confirmar, mas se o tribunal mesmo assim, apesar da não


confirmação, continuar convencido que ela é a mãe, o processo é enviado
para o agente o Ministério Público que vai intentar a corresponde ação de
investigação da maternidade, com base nos indícios do processo oficioso.
Se no âmbito desta ação for reconhecida a maternidade então o modo de
reconhecimento será o reconhecimento judicial, feita no âmbito da ação
judicial da maternidade. No artigo 1808º CC descreve-se esta averiguação
e no artigo 1809º CC estabelece as situações em que não tem lugar esta
ação oficiosa:

- No caso de se concluir que o filho é incestuoso;

- No caso de terem decorridos 2 anos desde a data do nascimento.

O reconhecimento judicial está previsto nos artigos 1814º e ss. CC.

— Legitimidade ativa: Quem pode propor a ação?

- Filho: será intentada em nome próprio (se já tiver capacidade judiciária) ou


representado pelo Ministério Público, contra alguém que ele pensa que é a
sua mãe - artigo 1814º CC.

- Marido da pretensa mãe: durante a menoridade do filho - artigo 1822º/2 CC;

- A própria mãe: propõe a ação contra si mesma, na hipótese em que era


casada e já havia perfilhação por pessoa diferente do seu marido - artigo
1824º CC;

- Agente do Ministério Público: no termo de uma averiguação oficiosa - artigo


1808º CC.

— Prossecução e transmissão da ação: Artigo 1818º CC.

— Legitimidade passiva: Artigo 1819º CC.

- Contra a pretensa mãe;

- Se a pretensa mão tiver falecido, contra o cônjuge sobrevivo não separado


judicialmente de pessoas e bens e também contra os descendentes,
ascendentes ou irmãos;

- Na falta destas pessoas, será nomeado curador especial.

— Prova da maternidade: O autor tem de mostrar que o filho nasceu da pretensa mãe
(artigo 1816º CC); tem de provar o vínculo biológico da maternidade.

Como se prova a filiação biológica? Com provas científico-laboratoriais, com base


no ADN. No CC permanece uma ajuda para a ação de investigação estabelecendo
presunções de maternidade, porque anteriormente a prova era mais difícil. Posto isto,
presume-se a maternidade em 2 hipóteses (artigo 1816º/2 CC):

1. Alínea a): Quando o filho houver sido reputado e tratado como tal pela
pretensa mãe e reputado como filho também pelo público. Há 3 elementos
descritos nesta alínea:

Filipa Ribeiro Gonçalves 66


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- Nomen: a mãe tenha tratado o filho como filho (dar A este conjunto de
elementos dá-se
o nome de filho);
habitualmente o
- Tractatus: a mãe o trate materialmente como filho;
nome de posse de
- Fama: seja reputado como filho pelo público.
estado de filho.
2. Alínea b): Quando exista carta ou escrito no qual a mãe tenha declarado
inequivocamente a sua maternidade.

Estas presunções podem ser afastadas/ilididas mediante a existência de dúvidas


sérias sobre a maternidade. Não é preciso provar-se o contrário, basta que se crie no
espírito do juiz duvidas sérias sobre a maternidade (artigo 1816º/3 CC).

— Prazos para a propositura da ação de investigação: Artigo 1817º CC.

1) Em Portugal, há prazos;

2) Que prazos?

- Durante a menoridade do investigante - nº 1;

- 10 anos após a sua maioridade (ou seja, até aos 28 anos) - nº 1;

- 3 anos após uma das ocorrências de algum dos factos do nº 3.

3) Esta questão dos prazos vem sendo discutida quanto à sua


constitucionalidade. O prazo inicial era de 2 anos (ou seja, até aos 20 anos)
e este prazo foi declarado inconstitucional pelo Tribunal Constitucional pelo
Acórdão 23 de 2006. Este veio declarar inconstitucional o prazo curto de 2
anos porque iria contra um direito fundamental que é o direito à identidade
pessoal, seria incompatível com este direito que inclui o direito ao
conhecimento das origens. Este acórdão apenas declarou inconstitucional
aquele prazo de 2 anos e mais nada disse, não se opondo a que o prazo
fosse outro. Na sequência da Lei 14/2009 (lei que fixou a redação atual) o
prazo passou a ser de 10 anos após a maioridade. Discute-se se mesmo
este prazo será inconstitucional. Se existe esse direito fundamental e se é
importante porque há prazo?

A. Havia a razão do envelhecimento das provas. Hoje já não tem


sentido, pois as provas são feitas pelo confronto de ADN e não há
risco de envelhecimento destas provas.

B. Se não houvesse prazos o pretenso pai estaria a todo o tempo


numa situação de insegurança. Para assegurar a segurança aos
pais, a lei estabelecia prazos, assim pelo menos a partir de certa
altura não haveria ação de investigação. Na realidade, se o pretenso
pai está inseguro se calhar será mesmo o pai e sendo-o tem o
dever de reconhecer a sua paternidade.

C. Pretendia-se evitar a caça tardia à fortuna. Para evitar que a ação


seja intentada pelo filho já velho quando o pais mais velhos são,
com intenções meramente patrimoniais. Hoje, não é
necessariamente assim, porque os pais não necessitam de ter mais
dinheiro que os filhos. Pode deixar-se que o filho proponha a ação
para reconhecimento, podendo este vir a ser reconhecido, mas a
sentença não ter efeitos patrimoniais. Assim, é reconhecida a
qualidade de pai/mãe, mas sem os efeitos patrimoniais.

Filipa Ribeiro Gonçalves 67


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Foi sobretudo com base nestas razões, mas principalmente na B e na C, que


o Tribunal Constitucional (já em relação à formulação atual) se pronunciou no
Acórdão 401 de 2011 no sentido da não inconstitucionalidade.

Aula dia 06 de dezembro de 2018

II. ESTABELECIMENTO DA PATERNIDADE: Há 3 formas:

1. Presunção (legal) de paternidade do marido da mãe (presunção pater is est quem


nuptias demonstrant): Presume-se que a o marido da mãe é o pai das crianças que foram
concebidas ou nascerem na constância do casamento. Basta a verificação de um destes factos
para funcionar a presunção de paternidade - artigo 1826º CC (presume-se que o filho nascido ou
concebido na constância do matrimónio da mãe tem como pai o marido).

Fundamento e natureza da presunção: Constitui uma evidência pacífica que, dos


nascimentos de mãe casada, a esmagadora maioria implica biologicamente a coautoria do
marido. O legislador resolverá a questão de saber quem é o pai (facto desconhecido), partindo de
circunstâncias conhecidas (os nascimentos de mãe casada) recorrendo aos princípios de
normalidade patentes (juízo de probabilidade). As razões ou a base desta presunção está ligada
com o facto de duas pessoas coabitarem uma com a outra e em condições de exclusividade.

Esta presunção, apesar de existirem analogicamente as mesmas razões, não é


extensível à união de facto. A lei não estabeleceu a presunção para a união de facto e como há o
princípio de taxatividade dos modos de estabelecimento da filiação, então a presunção de
paternidade é só para o marido da mãe.

Trata-se de uma presunção iuris tantum, ou seja, ilidível, ou afastável mediante prova
em contrário do facto presumido - no caso, pode provar-se que o marido da mãe não é o pai.
Esta refutação da presunção é feita através da ação judicial de impugnação da paternidade.

Âmbito de aplicação da presunção:

A presunção funciona relativamente:

— Ao filho concebido antes do casamento e nascido durante o matrimónio (nasc. 2);

— Ao filho concebido e nascido durante o casamento (nasc. 3);

— Ao filho concebido durante o casamento e nascido depois da sua dissolução


(nasc. 4).

Não funciona relativamente:

— Ao filho concebido e nascido antes da celebração do casamento (nasc. 1);

— Ao filho concebido e nascido depois da dissolução do casamento (nasc.5).

Celebração do Dissolução do
casamento casamento

Nasc. 1 Nasc. 2 Nasc. 3 Nasc. 4 Nasc. 5


Filipa Ribeiro Gonçalves 68
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A paternidade do marido, que resulta do funcionamento da presunção, é a paternidade


verdadeira enquanto não for provado o contrário. Assim, os serviços do registo estão obrigados
a fazer a respetiva menção.

Casos de cessação ou de não funcionamento da presunção de paternidade: Há


casos em que apesar da verificação dos pressupostos da presunção, ou seja, apesar do filho
nascer ou ser concebido na constância do casamento, a presunção de paternidade não funciona
- são aquilo que se designa os casos de cessação ou de não funcionamento da presunção de
paternidade. Quais os casos de não funcionamento da presunção da paternidade (expressão
preferida pelo Dr. Francisco M. B. Pereira Coelho)?

I. Artigo 1828º: Hipótese de o filho ter nascido dentro dos 180 dias (6 meses)
posteriores à celebração do casamento (o que significa que o filho foi
concebido antes o casamento), basta a declaração da mãe ou do marido da
mãe no ato do registo de nascimento de que o marido não é o pai para não
funcionar a presunção de paternidade.

II. Artigo 1829º: Hipótese em que apesar de o filho nascer e ter sido concebido
durante o casamento, na altura em que foi concebido os pais já não
coabitavam um com o outro (tinha cessado a coabitação), mas continuavam
casados. Mais concretamente, quando o filho tiver nascido 300 dias depois
da data em que os cônjuges deixaram de coabitar. A lei não considera
relevantes para estes efeitos qualquer cessação da coabitação, são só as
situações do 1829º/2.

III. Artigo 1832º: Hipótese em que a mulher casada faz a declaração, no registo
de nascimento, com a indicação de que o filho não é do marido. Para que
serve, então, o artigo 1828º? O 1828º ainda tem utilidade porque se for um
filho concebido antes do casamento não é só a mãe que pode fazer cessar a
presunção, é também o marido dela e se se tratar de filhos concebidos
antes do casamento não é possível renascer a presunção da paternidade.

Casos de reinício da presunção de paternidade: Artigo 1830º.

Casos de renascimento da presunção de paternidade: Artigo 1831º:

— Apesar de se verificar a hipótese do 1829º (ausência da coabitação), pode provar-


se que após a citação os cônjuges mantiveram relações um com o outro;

— Pode provar-se que existia posse de estado do marido relativamente ao filho;

— (Não se tratando de filhos concebidos antes do casamento, se mãe fizer a


declaração e se provar que tiverem relações no tempo de conceção).

Não há possibilidade de renascimento da presunção de paternidade: Artigo 1828º: se


se tratar de filho concebido antes do casamento, quando a mãe ou o marido dela declaram que
não é o pai, cessa definitivamente a presunção de paternidade.

Filipa Ribeiro Gonçalves 69


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Funcionando a presunção, ela pode ser afastada mediante prova de facto contrário
através da ação de impugnação da paternidade. Esta ação está prevista nos artigos 1838º e ss.

— Legitimidade ativa: As pessoas indicadas no artigo 1839º/1. São as pessoas


que estão dentro da relação:

- Mãe;

- Filho

- Pai presumido (legitimidade direta);

- Aquele que afirma ser o pai, mediante


requerimento ao MP e a ação será intentada
pelo MP (artigo 1841º).

— Prazos: Artigo 1842º. Há prazos, mas serão eles inconstitucionais? O TC


decidiu pela não inconstitucionalidade da existência de prazos.

— Prova: Nesta ação destinada a ilidir uma presunção teria de ser provado, em
princípio, o facto contrário ao facto presumido, teria de ser provado que o
marido da mãe não é o pai. Todavia, não é bem isso que a lei diz no artigo
1839º/2. A lei não exige a prova estrita, apenas exige que a paternidade do
marido da mãe seja manifestamente improvável. Há um caso em que nem
sequer é preciso provar nada, basta a impugnação de pessoa com
legitimidade: é a hipótese do artigo 1840º em que a mãe ou o marido dela
impugna a paternidade de filhos nascidos antes do casamento.

2. Perfilhação: Ato voluntário de reconhecimento da paternidade biológica pelo pai. É


o pai que que se apresenta como progenitor de um filho que ainda não tem paternidade
estabelecida. Esta manifestação passa a constar do registo civil e a paternidade considera-se
estabelecida, com efeito retroativo até à data do nascimento do filho.

Natureza jurídica do ato de perfilhação: Não é um negócio jurídico (são atos que visam
a produção de certos efeitos que as pessoas querem e que o direito tutela). É um simples ato jurídico
(ato jurídico em sentido estrito: o declarante não causa, mas desencadeia os efeitos jurídicos que
se produzem por força da lei). O ato consiste numa declaração de vontade ou numa declaração
de ciência? O perfilhante diz que quer assumir o estatuto jurídico e pai ou diz que sabe que é
o pai biológico? A perfilhação deve ser entendida com uma declaração de ciência - o perfilhante
declara que sabe que é o progenitor - e a lei faz desencadear os efeitos jurídicos que constituem
o estatuto da paternidade.

Caraterísticas da perfilhação:

• Ato jurídico unilateral: O ato jurídico da perfilhação é feito pelo pai. Há apenas
um caso em que a lei exige o assentimento do próprio perfilhado: quando ele
é maior - artigo 1857º (direito de rejeição do pai);

• Ato pessoal (artigo 1849º): Pode ser entendido no sentido de que:

- Tem natureza e efeitos pessoais;

- Em princípio, tem de ser feita pessoalmente, mas a lei diz que pode ser
feita por procurador com poderes especiais.

Filipa Ribeiro Gonçalves 70


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• Ato livre (artigo 1849º): Pode ser entendido no sentido de que:

- A perfilhação para ser válida tem de brotar de uma vontade livre ou


esclarecida, sob pena de invalidade da perfilhação;

- O perfilhante pode perfilhar, sem ter de pedir o consentimento ou


anuência a outrem;

- O perfilhante perfilha se quiser, não é obrigado. É, todavia, discutida


esta liberdade. Guilherme de Oliveira entende que, no estado atual do
regime da perfilhação, a perfilhação não deve ser encarada como um
ato livre, mas deveria antes de haver um dever jurídico (obrigação) de
perfilhar - princípio primazia da liberdade biológica. Há uma razão para
esta consideração de o ato não dever ser livre: se existe a ação de
reconhecimento judicial, se o filho pode intentar a ação contra o
pretenso pai, se tem esse direito é porque o pai tem um dever.
Francisco M. B. Pereira Coelho diz que na medida em que seja possível
a ação de reconhecimento da paternidade, então temos de reconhecer
que há um dever jurídico por parte do pai de ser pai. Nos casos em que
o direito caducou, parece que caducando o direito do filho de obter a
ação de investigação, então caduca a obrigação de perfilhar.

• Ato puro e simples (artigo 1852º): Não pode comportar cláusulas que limitem
ou modifiquem os efeitos que a lei atribuiu, seja cláusulas típicas como o
termo e a condição, sejam cláusulas atípicas.

• Ato irrevogável (artigo 1858º): Uma vez feita a perfilhação, o pai não pode
voltar a trás. A perfilhação é definida de forma definitiva. Mesmo no caso do
testamento revogado em que conste a perfilhação isso não afeta a
perfilhação.

Outras condições para a perfilhação:

— Capacidade (artigo 1850º): Indivíduos com mais de 16 anos se não forem


maiores acompanhados com restrições ao exercício de direitos pessoais de
acordo com a sentença. O artigo 147º CC mantém a capacidade para atos
pessoais como este, ou seja, em regra, mantém capacidade para perfilhação,
a não ser que a sentença decrete o contrário.

— Forma: Artigo 1853º - São 4:

- Declaração prestada perante funcionário do registo civil;

- Testamento;

- Escritura pública;

- Termo lavrado em juízo.

— Tempo: Artigo 1854º.

Anulação da perfilhação: por vício da vontade - erro ou coação moral (artigo 1860º)
ou por incapacidade (artigo 1861º).

Filipa Ribeiro Gonçalves 71


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Impugnação da perfilhação (artigo 1859º): A perfilhação pode ser impugnada, se não


corresponder à verdade (se houver desconformidade entre a verdade biológica e a verdade
jurídica): casos de perfilhação conscientemente falsas. Esta ação de impugnação da perfilhação
tem um regime de arguição diferente da presunção da paternidade:

— Legitimidade ativa (nº 2):

- Perfilhante;

- Perfilhado;

- Toda a gente que tenha interesse moral ou patrimonial na


procedência da ação;

- MP.

— Prazo (nº 2): Não há prazos. A ação pode ser intentada a todo o tempo, isto
é, a ação é imprescritível.

— Prova: Tem de se provar que o perfilhante não é o pai, que a perfilhação não
corresponde à verdade e o autor pode usar qualquer meio de para convencer
o tribunal de que o perfilhante não é o pai biológico.

A lei alivia o encargo probatório se a ação for proposta pela mãe ou pelo
filho. A mãe e o filho têm a possibilidade de impugnarem a relação
estabelecida sem prova da não-paternidade, mas depois, se o perfilhante
demonstrar que é verosímil que tenha coabitado com a mãe do perfilhado, a
mãe o filho têm de fazer prova - inverte-se o ónus da prova (nº 3).

A lei abre um divisão para falar da averiguação oficiosa da paternidade (artigos


1864º e ss.). Quando seja efetuado o registo do nascimento e não ficar estabelecida a
paternidade abre-se o processo de averiguação oficiosa - igual à maternidade (página 65 e 66).
Quando há confirmação é por perfilhação e já não por declaração.

3. Reconhecimento judicial (artigos 1869º e ss.): É a chamada ação de investigação


da paternidade. O pedido que o autor faz ao tribunal é que declare a paternidade jurídica do réu,
relativamente ao filho, estabelecendo por decisão judicial a filiação que não foi estabelecida por
perfilhação. A causa de pedir é o vínculo biológico da progenitora que, pretensamente, liga o réu
ao filho. A lei em muitas coisas remete para a maternidade - artigo 1873º.

— Legitimidade ativa:

- Filho (artigo 1869º + 1973º -> 1818º);

- MP, na hipótese de averiguação oficiosa.

— Legitimidade passiva: o pretenso pai (1973º -> 1819º).

— Meios de prova: O filho tem de fazer prova do facto constitutivo do seu


direito, tem de fazer prova da paternidade.

Filipa Ribeiro Gonçalves 72


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- 1º meio de prova (prova direta): confronto de ADN, provas científico-


laboratoriais. Com o teste de paternidade fica provada de forma direta
própria paternidade. A probabilidade necessária é na casa dos 99,96%,
nos 99,8% já não é suficiente. No caso do pai se recusar o material
para o confronto de ADN, o que se faz? Há um princípio segundo o
qual as pessoas não podem ser forçadas fisicamente a fornecer meios
seus para permitir o confronto de ADN - artigo 417º CPC. Se se
recusarem incorrem em ato ilícito, por recusa de colaboração para a
descoberta da verdade e são condenados em multa.

Aula dia 07 de novembro de 2018

- 2º meio de prova (prova indireta): Se o pai se recusar a colaborar e


pagar a coima, tornando, por isso, (culposamente) impossível a prova
ao filho, há outra possibilidade: é de funcionar uma inversão do ónus da
prova (artigo 344º/2 CC).

Fica provada a
O filho tem de provar que:

paternidade.
a. Na altura em que foi concebido que a sua Dantes chama-
mãe manteve relações sexuais com o se a coabitação
pretenso pai;
causal, mas a
b. A sua mãe só teve relações sexuais com expressão caiu
em desuso.
ele (em exclusividade).

Se, por seu turno, esta prova não for possível fazer, então a lei vem em
auxílio do investigante e estabelece várias presunções do vínculo
biológico: enumeradas no artigo 1871º/1 CC que tem 5 alíneas, que
correspondem a 5 grupos de presunções. Estas presunções que só
funcionam no âmbito de uma ação de investigação/reconhecimento da
paternidade e são presunções diferentes da presunção de paternidade.

As duas primeiras alíneas (alíneas a) e b)) são as mesmas presunções


da ação de maternidade. Nestes dois casos há um reconhecimento
implícito da paternidade pelo pretenso pai.

• Alínea a) - posse de estado: Posse de estado de filho (nomen,


tractatus e fama).

• Alínea b) - escrito do pai: O pai deixou algum escrito em que o


dissesse inequivocamente.

• Alínea c) - convivência: A convivência entre o réu e a mãe do filho


durante o período legal de conceção. A convivência relevante
pode assumir duas formas:

1. União de facto;

2. Concubinato duradouro (é apenas comunhão de leito e já não de


mesa e habitação).

Havendo união ou concubinato há relações e há base para


presumir que são mantidas em exclusividade. Assim, provada a
convivência e as relações sexuais entre a mãe e o pretenso pai
podem presumir-se que foram mantidas em exclusivo.

Filipa Ribeiro Gonçalves 73


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• Alínea d) - sedução da mãe: Situações em que o pretenso pai


seduziu a mãe, mas em condições de aproveitamento. Houve um
certo convencimento de manter a mãe a manter relações com ele
utilizando uma certa vantagem. Assim, faz-se a prova de
existência de relações sexuais e prova-se um quadro de
circunstâncias a partir das quais se presume que são em
exclusividade.

• Alínea e) - relações sexuais: Quando se prove que houve relações


sexuais com o pretenso pai. Parece que ficam desprovidas de
utilidade as alíneas c) e d) e nada na lei nos diz que as presunções
dessas alíneas são mais fortes, por isso entende-se que são
tratadas na mesma forma. Esta alínea foi acrescentada mais tarde
por um razão prática, pois era difícil fazer prova da paternidade do
pretenso pai. Se o pretenso pai não for o pai é fácil defender-se a
partir de testes de paternidade.

Estas presunções são ilidíveis/afastáveis bastando que se crie no


espírito do juiz dúvidas sérias sobre a presumida paternidade (prova
bastante - pode ser afastada facilmente) - artigo 1871º/2.

— Prazos: Igual à maternidade (artigo 1873º -> 1817º).

3. EFEITOS

Princípios gerais:

— Artigo 1874º: No nº 1 abre com a proclamação de que pais e filhos devem-se


mutuamente respeito, auxílio e assistência - existe um dever mútuo/recíproco. Nº 2 acrescente o
dever de assistência compreende a obrigação de prestar alimentos e a obrigação de contribui
durante a vida em comum de contribuir, de acordo com os recursos próprios, para os encargos da
vida familiar. Estes deveres têm uma especial direção: dos pais em relação aos filhos; são
deveres mais intensos durante a menoridade do filho e têm um especial conteúdo que
corresponde ao conteúdo das responsabilidades parentais (artigo 1878º CC)

— Artigo 1875º e 1876º: Tem a ver com o nome do filho e como é que ele é composto. O
nome do filho e os apelidos são escolhidos pelos pais. Não havendo acordo quanto ao nome a
atribuir, temos uma das situações excecionais onde a lei permite que seja o juiz a tomar a
decisão e ele vai movimentar-se dentro do âmbito de sugestões que chegaram dos pais.

— Artigo 1876º: Na hipótese em que a mãe é casada com alguém que não é o pai da
criança (padrasto) e a criança não tem paternidade estabelecida, podem ser atribuídos ao filho
menor apelidos do marido da mãe, se a mãe e o marido da mãe assim o entenderem. Todavia, no
nº 2, a lei diz que nos dois anos posteriores à maioridade ou emancipação o filho pode este
requerer que sejam eliminados do seu nome os apelidos do padrasto.

Responsabilidades parentais:

Quando o filho é menor, os pais têm um conjunto complexo de poderes-deveres que têm
de exercer e exercer pela forma mais aconselhada pelo interesse do filho. Antes da reforma de
2008, a expressão utilizada era poder paternal, hoje utiliza-se a expressão responsabilidades
parentais.

Filipa Ribeiro Gonçalves 74


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Qual a duração das responsabilidades parentais? De acordo com o artigo 1877º, elas
duram até à maioridade do filho ou emancipação. Mas não é bem assim. A lei tanto permite que
as responsabilidades parentais possam:

1. Durar para lá da maioridade: Veja-se o artigo 1880º CC. São os casos em que o
filho quando atingiu a maioridade ainda não tinha completado a sua formação
profissional. Nestes casos há apenas a obrigação de os pais suportarem as
despesas com os encargos para o sustento, segurança, saúde e educação, tudo o
resto cessou com os 18 anos. Mas mesmo esta obrigação não é eterna, ela
apenas é exigível na medida em que seja razoável exigir aos pais o cumprimento
desta obrigação e apenas pelo tempo normalmente requerido para que a
formação profissional se complete (será por volta dos 25 anos).

2. Cessar antes da maioridade: Nos casos em que o filho já tem dinheiro (p. ex.,
devido a herança ou trabalho), os pais ficam dispensados de pagar as despesas.

Aula dia 13 de novembro de 2018

Como são exercidas as responsabilidades? Não é uma relação entre iguais, é entre
desiguais. Quem manda na relação são os pais, mas as responsabilidades existem no interesse
do filho. Do artigo 1878º/2 CC resulta que os filhos devem obediência aos pais. Logo a seguir,
diz-se que os pais, porém, de acordo com a maturidade dos filhos, devem ter em conta a opinião
dos filhos nas assuntos familiares importantes e reconhecer-lhes autonomia na organização da
própria vida.

Quais as finalidades das responsabilidades parentais? São duas de sinal oposto:

1. Proteção;

2. Os pais devem preparar o filho para a independência;

Estas finalidades acompanham a vida do menor invertendo-se: quando nasce só preciso


de ser protegido, mas à medida que vai crescendo é menos necessária a proteção e está mais
presente a outra que é a função de preparação para a independência.

Qual o conteúdo das responsabilidades parentais? Que responsabilidades os pais têm?


Está sintetizado no artigo 1878º/1:

• Responsabilidades que têm a ver com a pessoa do filho - responsabilidades do tipo


pessoal:

- Velar pela segurança e saúde;

- Prover ao sustento;

- Dirigir a educação: O artigo 1885º diz em que consiste a responsabilidade de


educação do filho. E os pais podem educar religiosamente o filho? Posições:

1. Os pais não deveriam impor a religião ao filho, ele devem decidir


quando tenham maturidade;

2. Os pais podem impor a religião ao filho.

A lei diz, no artigo 1886º, que pertence aos pais decidir sobre a religião dos
filhos menores de 16 anos - idade em que os filhos se tornam maiores para
efeitos religiosos.

Filipa Ribeiro Gonçalves 75


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• Responsabilidades que têm a ver com os bens do filho - responsabilidades do tipo


patrimonial:

- Representá-los (artigo 1881º): Os menores não têm capacidade de exercício


de direitos e, consequentemente, os pais têm competência de representação.
Mas não os representam em tudo, há atos em que os pais não têm
competência representativa. Assim, excetuamos da competência de
representação:

1. Os atos puramente pessoais - casamento, perfilhação;

2. Aqueles que o menor tem o direito de praticar pessoal e livremente


- artigo 127º:

- Bens que adquire com o seu trabalho;

- Atos praticados no exercício do trabalho que desempenha;

- Atos próprios da vida corrente que estejam ao alcance da


sua capacidade e que impliquem despesas de pequena
importância;

3. Atos respeitantes a bens cuja administração não pertencem aos


pais - artigo 1888º.

Em tudo o resto os pais têm competência representativa, mas o facto de


terem esta competência não quer dizer que podem fazer tudo. No artigo
1889º, a lei sujeita uma série de atos à necessidade de autorização ao MP.

- Administrar os seus bens: Compete aos pais administrarem um património


alheio que é o património do filho - artigos 1895º e ss. CC.

Antes de 1977, eram os pais que ficavam com o usufruto legal dos bens do
filho. Em substituição temos o artigo 1896º que diz que os pais podem
utilizar os rendimentos dos bens dos filhos para satisfazerem as despesas
com a saúde, segurança e educação do filho, além disso os pais podem
utilizar ainda, dentro de justos limites, com outras necessidades da vida
familiar, necessidades dos filhos, mas também deles.

Em relação a esta administração, pergunta-se qual o padrão de diligência


que os pais devem adotar no exercício desta administração? Para efeitos
de responsabilidade civil, estabelece-se o critério do homem médio (artigo
487º/2). Mas é este o padrão para este efeito? A lei satisfaz-se com o artigo
1897º: a diligência que têm com o seu próprio património.

Regime geral da administração Regime da administração neste caso

O administrador, como garantia da A lei não estabelece a obrigação de


boa administração, presta caução inicial - artigo 1898º -, nem
inicialmente uma caução e, no fim estabelece a prestação contas no
da administração, o administrador termo da administração - artigo
deve prestar contas da sua 1899º.
administração.

Filipa Ribeiro Gonçalves 76


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Havendo dois progenitores, as responsabilidades parentais são exercidas por eles em


condições de igualdade. Neste caso, em que há dois titulares, como articulam as suas
competências? Quem toma as decisões incluídas no âmbito das responsabilidades parentais?
Há vários hipóteses:

I. Os pais estarem casados (artigo 1901º e 1902º): Se assim for, o exercício das
responsabilidades parentais pertence a ambos os pais (1901º/1), que as exercem
de comum acordo (1901º/2). Havendo de tomar uma decisão relativa ao filho tem
que haver acordo entre os pais. Se não houver acordo e tratando-se de questão
de particular importante, há possibilidade de recurso ao tribunal e o tribunal
decidirá. De acordo com o artigo 1902º, se um dos pais praticar um ato que
integre o exercício das responsabilidades parentais, presume-se que haja acordo
com o outro. Só não existe a presunção de acordo e, por isso, se exige o acordo
efetivo de ambos os cônjuges, nas situações a seguir previstas:

1. Nos casos em que a lei exige expressamente o acordo dos progenitores;

2. Em relação a atos de particular importância para o filho.

Aula de 14 de dezembro de 2018

II. Os pais estarem divorciados: Há 3 problemas fundamentais:

1. Quem paga as despesas? Ambos. Há de definir o montante dos


alimentos/encargos que o ex-cônjuge que não reside com o menor tem
de pagar. Este problema é resolvido mediante:

- Se houver acordo, por acordo;

- Se não houver acordo, por decisão judicial.

2. Com quem é que o filho fica? Enquanto os pais são casados com os
dois. No divórcio, esta questão é resolvida mediante:

- Se houver acordo, por acordo;

- Se não houver acordo, por decisão judicial.

A lei diz pouco. Há vagas sugestões deixadas na lei no CC e em outros


diplomas legais. Essas indicações dizem normalmente de que o menor
ficará a viver com um dos progenitores e de que o outro progenitor tem
direito de visita do filho. O artigo 1906º/5 fala da visita e da residência do
filho com um dos progenitores. Mas o artigo 1906º/7 parece abrir a porta
a soluções de outro tipo. Embora o CC normalmente fale que o menor irá
viver com um dos pais e o outro tem direito de visita, abre a porta a outras
soluções, pois diz que o menor deve manter relação de proximidade com
os dois progenitores. O diploma da organização tutelar de menores
disciplinava isto com minúcia, mas foi revogado por um outro diploma
aprovado pela Lei 141/2015 que é o regime geral do processo tutela cível.
Neste regime geral prevê-se novas soluções possíveis como a
possibilidade de viver com ambos os progenitores em condições de
igualdade. Mas em que termos? A residência ou guarda alternada não
está desenvolvida por lei.

Filipa Ribeiro Gonçalves 77


DIREITO DA FAMÍLIA E DOS MENORES: Teóricas

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3. Quem toma as decisões relativas ao menor? As decisões relativas ao


filho são tomadas da seguinte forma (o artigo 1906º estabelece 3
categorias de questões):

— Primeiro grupo de questões (artigo 1906º/1 e 2 -> 1901º): As


questões de particular importância para o filho (p. ex., uma
intervenção cirúrgica do menor; a alteração da residência para o
estrangeiro). Estas questões devem ser decididas por acordo dos
progenitores e são exercidas nos termos que vigoravam na
constância do casamento, ou seja, se faltar acordo podem
recorrer ao tribunal. Salvo…

- Os casos de urgência manifesta;

- Os casos em que a exigência de acordo for contrária aos


interesses do menor.

… onde se pode prescindir a exigência de acordo

— Segundo grupo de questões (artigo 1906º/3): As questões


relativas aos atos da vida corrente. O exercício das
responsabilidades parentais, nestes casos, cabe ao progenitor
com quem o menor resida habitualmente ou ao progenitor com
que ele se encontre provisoriamente.

— Terceiro grupo de questões (artigo 1906º/3): O progenitor com


que o filho se encontra temporariamente ao exercer as
responsabilidades parentais não deve contrariar as orientações
educativas mais relevantes tal como definidas pelo progenitor
com que o menor reside habitualmente.

III. Outras situações possíveis:

• Quando há separação de facto (artigo 1909º): Se os progenitores estão


casados, mas não vivem um com o outro, aplicam-se as regras aplicáveis
ao divórcio;

• Quando há união de facto (artigo 1911º): Se os progenitores estão em união


de facto, aplicam-se as mesmas regras que seriam aplicáveis se
estivessem casados;

• Quando os progenitores não estão nem estiveram casados, não vivem nem
viverem em união de facto, simplesmente tiveram um filho (artigo 1912º): a
lei neste caso manda aplicar as mesmas regras que valem para o divórcio.

Em 2015, através da lei 137/2015, foram acrescentados no sistema hipóteses de


alargamento do exercício das responsabilidades parentais a pessoas que não os progenitores,
para além das soluções já tradicionalmente reconhecidas (p. ex., adoção, tutor). Isto só há nas
hipóteses dos artigos:

• Artigo 1903º: Hipóteses em que um dos progenitores está impedido de


exercer as responsabilidades parentais por ausência, incapacidade ou outro
impedimento decretado pelo tribunal;

• Artigo 1904º: Hipóteses de morte de um dos cônjuges;

• Artigo 1904º-A: Hipóteses em que um dos progenitores exerce as


responsabilidades com o seu companheiro, mas esta possibilidade de

Filipa Ribeiro Gonçalves 78


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exercício conjunto só é possível no caso de não estar estabelecida a


maternidade ou paternidade.

A lei fala ainda em inibição das responsabilidades parentais quando o progenitor que
exerce as responsabilidades parentais é afastado dessas responsabilidades. São duas situações:

• Artigo 1913º (inibição do pleno direito - é um inibição automática);

• Artigo 1915º (inibição por decisão judicial - não é uma inibição automática).

A inibição pode ser levantada quando cessem as mesmas razões que levaram à inibição -
artigo 1914º.

Fala-se ainda em limitação do exercício das responsabilidades parentais. Há limitações


de natureza/ordem:

• Pessoal: artigos 1918º e 1919º.

• Patrimonial: artigo 1920º.

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