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Catarina Serra | A91478

2022/2023

Direito da família e sucessões


Aulas teóricas
21.09.2022
O direito da família está contemplado no livro IV do CC.
O art.1576º CC diz-nos quais são fontes das relações jurídicas familiares, sendo
estas o casamento, o parentesco, a afinidade e a adoção. No entanto, surge a questão de saber se
só existirão estas fontes de relações jurídicas familiares ou existirão mais para além das
contempladas neste artigo. Ora, o art.36º CRP, menciona no seu nº1 que “todos têm o direito
de constituir família e de contrair casamento em condições de plena igualdade”, abrindo porta
para a existência de outras relações familiares. Isto significa que vamos estudar estas relações
familiares, sendo que vamos dar maior destaque ao casamento.

Casamento
Art.1576º CC (noção de casamento) - “O casamento é o contrato celebrado entre duas
pessoas que pretendem constituir família mediante uma plena comunhão de vida, nos termos
das disposições deste código”. Ora, nem sempre foi esta a noção de casamento, existindo
gradualmente diferenças.
É completamente irrelevante saber se os cônjuges pretendem ou não ter filhos, ao
contrário do católico que sim.
Vamos ver que no nosso ordenamento jurídico temos o casamento civil, o casamento
católico e o casamento civil sobre a forma religiosa. No caso do casamento católico e do
civil, estes são 2 sistemas diferentes regidos por normas diferentes. O católico para além disso
tem normas próprias do direito canónico. Existe o civil sobre a forma religiosa, que não tem
regras próprias, mas uma diferente forma de realização.
Em relação ainda ao casamento católico, este é regulado pela lei civil, o que significa
que o direito canónico apenas terá competência para se pronunciar pela validade (art.1621ºCC).
Relativamente à validade esta é exclusiva dos tribunais eclesiásticos. O casamento católico só
pode ser declarado nulo. Se falarmos em anulação estamos a falar de casamento civil. O
casamento rato é um casamento não consumado.

Parentesco
Art.1578º CC (noção de parentesco) - “parentesco é o vínculo que une duas pessoas,
em consequência de uma delas descender da outra ou de ambas procederem de um progenitor
comum”. Ou seja, o parentesco é uma relação de sangue, é um vínculo que se estabelece entre 2
pessoas. Desta forma, temos de distinguir 2 linhas de parentesco: parentesco em linha reta
(descendem uns dos outros) e parentesco em linha colateral (descendem de um progenitor
comum). Podemos ter ainda a distinção entre a linha materna (pessoas que têm a mesma mãe) e
linha paterna (pessoas que têm o mesmo pai).
Art.1579º CC (elementos do parentesco): “O parentesco determina-se pelas gerações
que vinculam os parentes um ao outro: cada geração forma um grau, e a série dos graus
constitui a linha de parentesco”.
Segundo o art.1580º podemos ter parentes em linha reta quando um dos parentes
descende um do outro, e parentes em linha colateral quando ambos procedem de um progenitor
comum.
Art.1581º CC (truque: fazer o esquema- contar os traços)

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Art.1582ºCC (limites do parentesco). Do ponto de vista jurídico, os efeitos do


parentesco produzem-se em qualquer grau da linha reta e até ao 6º grau da linha colateral. No
entanto, podem existir exceções. Há um caso em que o parentesco produz efeitos além do 6º
grau em linha colateral, isto é, no direito sucessório quando existe direito de representação.
Impedimentos impedientes (o casamento é válido, mas não é legal) e impedimentos
dirimentes (o casamento é anulado).

Afinidade
Art.1584ºCC (noção de afinidade): vínculo que liga cada um dos cônjuges aos parentes
do outro cônjuge. Determinam-se pelos mesmos graus e linhas. Mesmo quando há a morte dos
cônjuges a afinidade mantém-se, mas termina quando há divórcio. A afinidade tem sempre por
base o casamento. “A afinidade não gera afinidade”. Art.1585º

Adoção
Art.1586ºCC (noção de adoção): “A adoção é o vínculo que, à semelhança da filiação
natural, mas independentemente dos laços do sangue, se estabelece legalmente entre duas
pessoas nos termos dos art.1973º e seguintes”. A adoção não é um vínculo biológico, tendo na
sua base uma realidade afetiva e sociológica. O principal efeito é que o adotado constitui o
efeito jurídico de filho, rompendo os laços com a família biológica, visando sempre o superior
interesse/proteção da criança.

A realidade social vai evoluindo e agora existem outras relações que foram surgindo e
que podem ser classificadas ou não como relações familiares, como por exemplo, a união de
facto. Esta é uma relação entre 2 pessoas semelhante à dos cônjuges, mas que não está sujeita
ao vínculo jurídico do casamento. O reconhecimento da união de facto como relação familiar
resulta do art.36º CRP. A união de facto pode ser abrangida pelo art.26º CRP. Esta não tem os
mesmos efeitos do casamento. Isto não impede que o legislador possa atribuir alguns efeitos à
união de facto que são semelhantes aos atribuídos ao casamento (ex. proteção de casa de
morada de família em casa de morte, atribuição de alguns benefícios em caso de morte, etc.).
Lei 7/2001- contém a união de facto.

28.09.2022
União de facto

Em relação à união de facto, são inúmeras as razões que levam as pessoas a querer ou
optar por viver em união de facto. Quando se constitui união de facto? Quais os seus efeitos?

Lei nº7/2001, de 11 de maio Proteção das uniões de facto

 Art.1º/nº2: “A união de facto é a situação jurídica de duas pessoas que,


independentemente do sexo, vivam em condições análogas às dos conjuges há mais de
dois anos”. Trata-se de uma relação entre 2 pessoa, que vivam em comunhão de lei,
mesa e habitação, não estando unidos por vínculo formal do casamento, pressupondo
também a exclusividade, sendo que esta relação tem de durar pelo menos à 2 anos.
Assim, concluímos que à luz deste artigo, é preciso que haja uma vivência semelhante à
do casamento.

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Como se prova a união de facto? A união de facto não tem um formalismo de criação,
nem está sujeita a registo. Assim, segundo o art.2º-A menciona que, na falta de disposição legal
ou regulamentar que exija prova documental específica, a prova da união de facto pode fazer-se
através de qualquer meio legal admissível, mas normalmente é feita por declaração emitida
pela Junta de Freguesia competente da residência dos unidos de facto, eventualmente
comprovada por testemunhas. Não podemos esquecer que se isto for mostrado está provada a
união de facto, mas para isso é preciso que não exista qualquer impedimento previsto no art.2º.
Estas exceções são muito semelhantes com alguns dos impedimentos do casamento. Assim,
impede a união de facto: (a) idade inferior a 18 anos à data do reconhecimento da união de
facto; (b) demência notória; (c) casamento não dissolvido; (d) parentesco na linha reta ou no 2º
grau da linha colateral ou afinidade na linha reta; (e) condenação anterior de uma das pessoas
com autor ou cúmlice por homicídio doloso ainda que não consumado contra o cônjuge. Se se
verificar uma destas exceções, a união de facto não pode ser invocada.

Que efeito são atribuídos à união de facto?

Podemos fazer aqui um paralelismo com o casamento, mas há alguns efeitos


considerados pessoais da união de facto (art.7º): a matéria da aquisição de nacionalidade, lei de
proteção de crianças e jovens em perigo.

Os efeitos patrimoniais da união de facto. É verdade que os coviventes podem fazer


contratos de coabitação, sujeitas a regras gerais dos contratos e estipulam relações patrimoniais
entre eles, no entanto, isto não ocorre, normalmente, em Portugal. Quando isso não acontece,
que ocorre na maioria dos casos, aplicamos as regras gerais. Isto pode gerar, no fim da união de
facto, alguma injustiça e empobrecimento de uma das parte em relação à outra. Há, na
jurisprudência, alguns acordãos que tentam diminuir essas diferenças entre as partes. A forma
que a jurisprudência tem encontrado é através do enriquecimento sem causa, no entanto, têm de
estar preenchidos determinados requisitos legais.

 Art.3º.

Estas prestações e proteções da alínea (e), (f) e (g) têm algumas concretizações no art.6º,
porque havia uma discussão na doutrina sobre o unido de facto preenchendo os requisitos poder
vir a ser alimentado pelos bens da herança era discutido se, havendo bens suficientes na herança
que acautelassem esta prestação de alimentos, ele teria direito. O que a lei vem dizer é que o
membro sobrevivo da união de facto benificia dos direitos, independentemente de haver
necessidade da prestação de alimentos.

Relativamente à casa de morada de família em caso de ruptura, esta é identica ao que


está previsto para o casamento. O art.4º regula a proteção da casa de morada da família em caso
de rutura. Este artigo remete para o art.1105º e 1793º CC. Estas 2 normas estão previstas para o
casamento.

 O art.1105º CC prevê o caso de a casa de morada de família ser arrendada. Aqui o


tribunal vai ver qual o unido de facto que mais necessidade tem da casa, ou seja, vai ver
se à alternativas de residir noutro local, se tem trabalho, os filhos e quem vai ficar com
os filhos, etc. Assim, esse convivente pode não ser o titular da casa de morada de
família e, por isso, é que tem de pagar uma renda para poder viver lá. Se a casa for
arrendada aplicamos o art.1105º, que nos diz que pode dar-se a transmissão do
arrendamento ou a concentração para esse unido de facto, e acrescenta que isso opera

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independentemente de houver consentimento do senhorio. Sendo que aqui também


opera o critério de maior necessidade.
 Por outro lado, temos o art.1793º CC, onde a casa de morada de família é comum ou
própria de um dos conjuges, sendo que pode o tribunal dar de arrendamento a
qualquer um dos conjuges, a seu pedido, considerando as necessidades de cada um dos
conjuges e o interesse dos filhos do casal.

Para a proteção da casa de morada de família em caso de morte, temos o art.5º, que
menciona que em caso de morte não há a produção de efeitos sucessórios, sendo que os
herdeiros serão os descendentes ou acendentes. No entanto, em caso de morte do membro da
união de facto proprietário da casa de morada da família e do respetivo recheio, o membro
sobrevivo pode permanecer na casa, pelo prazo de 5 anos, como titular de um direito real de
habitação e de um direito de uso do recheio. No entanto, o nº2 vem corrigir o prazo de 5 anos,
para os casos em que a união de facto tenha começado há mais de 5 anos antes da morte e,
assim, os direitos de uso e habitação são conferidos por tempo igual ao da duração da união, ou
seja, se A e B estiveram juntos durante 10 anos em união de facto, quando A morrer, o B tem o
direito real de habitar na casa e de usar o seu recheio durante 10 anos. Temos aqui um legado
legal imperativo, sendo que o autor da sucessão não pode excluir este legado. No entanto, estes
direitos caducam se o interessado não habitar a casa por mais de 1 ano, salvo se a falta de
habitação for devida a motivo de força maior (nº5). NOTA: O direito real de habitação não é
conferido ao membro sobrevivo se este tiver casa própria na área do respetivo concelho da
freguesia da casa de morada da família (nº6). Ora, esgotado o prazo em que o membro
sobrevivo beneficiou do direito de habitação, este pode ter o direito de permanecer no imóvel,
mas na qualidade de arrendatário e tem o direito de permanecer no local até à celebração do
respetivo contrato (nº7). Em caso de alienação do imóvel, o membro sobrevivo tem direito de
preferência, durante o tempo em que o habitar a qualquer título, ou a título do direito real ou a
título de arrendatário (nº9). Se a casa de morada de família for arrendada a lei também protege o
membro sobrevivo da união de facto remetendo para o art.1106º CC (nº10). Este artigo do CC
só fala em transmissão, mas pode acontecer a transmissão ou concentração.

Considerações importantes

Princípios constitucionais do direito da família

Temos na nossa CRP algumas normas que se referem ao direito da familia. O principal
é o art.36º CRP, enquadrado no regime das DLG´s, e depois temos outras normas que são
mais de ordem programática. O art.36º tem o reconhecimento de 2 direitos: o direito de
constituir família e o direito de contrair casamento. Alguns autores viam aqui enquadrado o
reconhecimento das novas formas de família como a união de facto. Outros autores, vêm dizer
que este direito não abrange outras formas de família para além das do art.1576ºCC. Para estes
últimos, o reconhecimento da possibilidade de viver em união de facto pode sim ser enquadrado
no nº26º CRP.

A nossa lei diz-nos que o casamento pode ser civil ou católico (art.1587º CC), sendo
que estes são 2 diferentes formas de celebração do casamento e 2 institutos jurídicos diferentes.
Quem casa catolicamente está sujeito a normas de direito canónica para além das leis civis.

 Art.1625º CC: " O conhecimento das causas respeitantes à nulidade do casamento


católico e à dispensa do casamento rato e não consumado é reservado aos tribunais e

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repartições eclesiásticas competentes".


 Olhando para este artigo poderíamos dizer que este é inconstitucional, por violar o
art.36º/nº2 CRP.
 O art.36º/nº2 CRP: “A lei (civil) regula os requisitos e os efeitos do casamento e da
sua dissolução, por morte ou por divórcio, independentemente da forma de celebração”.

Mas o art.1625º diz que isso é reservado aos tribunais e às repartições eclesiasticas
competentes. Ora, este artigo não é inconstitucional, mas temos de perceber a articulação entre
ambas as normas.

Voltando para o art.36º CRP:

- Do seu nº2 resulta a admissibilidade do divórcio para todos os casamentos.


- Do seu nº3 resulta o princípio da igualdade dos conjuges, visto que os conjuges têm
iguais direitos e deveres quanto à capacidade civil e política e à manutenção e educação
dos filhos.
- Do seu nº4 resulta o princípio da não discriminação dos filhos nascidos fora do
casamento.
- Do seu nº5 resulta o poder dever dos pais em relação à educação dos filhos.
- Do seu nº6 resulta a não separação dos filhos e dos pais, salvo quando os pais não
cumpram os seus deveres fundamentais e sempre mediante decisão judicial.
- Do seu nº7 resulta a possibilidade da adoção.

O art.67º a 70º- proteção da família, paternidade, infantilidade e juventude.

Aspetos sociológicos do direito da família

Assistimos a uma mudança da grande família para a pequena família. A par disso,
assistimos, à perda das funções da família que tinha, a função política do direito romano. Perdeu
a função económica e fundamentalmente, perdeu a função de educação, que passou a ser da
responsabilidade do Estado. A evolução da relação conjugal tambem mostra uma passagem para
o casamento puro que só importa para os conjuges. Ou seja, dantes o casamento era da
responsabilidade de toda a família. A partir do sec. XIX surge a ideia do casamento romântico,
sendo que as funções dos conjuges estavam muito bem definidas. Isto começa a mudar na dec
de 60 e 70 do sec. XX, com a ajuda das grande guerras, sendo que temos aqui uma mudança
para uma relação paritária. Cada um dos conjuges quer a realição pessoal na relação e exige
mais do outro, o que leva cada vez mais a divórcios. O casamento passou para uma relação
pura. Surgem então as famílias recombinadas que também são uma realidade de hoje em dia.

Principais características do direito objetivo da família

 As normas do direito da família são imperativas, ou seja, não encontramos aqui normas
coletivas. Onde existe maior flexibilidade é no domínio do casamento, mas mesmo
assim temos normas imperativas. Não temos aqui grande margem de manobra.
 As normas que regulam as relações familiares caracterizam-se pelo seu
institucionalismo, o que não quer dizer que pontualmente o legislador não tenha aqui
um carácter pedagógico.
 O direito da família é muito permiável às alterações sociais, económicas e políticas.
 As suas normas têm muita ligação a outras ciências humanas.

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 Há uma afetação de tribunais especializados para tratar destas matérias de direito da


família, nomeadamente, os juízos de família e menores.
 Existe uma fragilidade da garantia.

12.10.2022

Casamento como um ato constitutivo da relação matrimonial


O primeiro aspeto que temos de estudar tem a ver com a unidade do direito
matrimonial, o casamento é católico ou civil como vimos (art. 1587º/1 do CC). Isto significa
que temos duas formas diferentes de celebração do casamento ou dois institutos diferentes? São
dois institutos jurídicos diferentes regidos por normas próprias, um regido pela lei civil e
outro pelo dto canónico. O que não quer dizer que ao dto canónico não apliquemos também
normas da lei civil. Independentemente disso há algumas características que se aplicam a ambos
e vamos começar por aí.
Casamento civil (art. 1577º CC) é o contrato celebrado entre duas pessoas
independentemente do sexo que é celebrado nos termos das disposições da lei e visa o
estabelecimento de uma plena comunhão de vida entre os cônjuges. A plena comunhão de vida
não é descrita, mas conseguimos chegar a um conceito através de outras normas do CC como
aquela em que os cônjuges estão reciprocamente vinculados pelos deveres conjugais de respeito,
fidelidade, coabitação, cooperação e assistência (art. 1672º CC), comunhão de vida que é
exclusiva (não podem celebrar outra em simultâneo – art. 1601º c) CC) e tendencialmente
indissolúvel – art. 1773º CC (apesar de ter havida uma simplificação progressiva do regime do
divórcio que permite uma dissolução relativamente fácil do vínculo, mas existem regras para
este).
Não é muito diferente da noção de casamento do código de direito canónico (cânones
1057º e 1055º) o que origina o matrimónio é o consentimento das duas pessoas e o
consentimento matrimonial é o ato da vontade pelo qual o homem e a mulher, por pacto
irrevogável, se entregam e recebem mutuamente a fim de constituírem o matrimónio e o cânone
1055º acrescenta que “o pacto matrimonial, pelo qual o homem e a mulher constituem entre si a
comunhão intima de toda a vida, ordenada por sua índole natural ao bem dos cônjuges e à
procriação e educação da prole, entre os batizados foi elevado por Cristo Nosso Senhor à
dignidade de Sacramento”. O contrato aqui é assumido como um mandamento. Contrato entre
duas pessoas em que se visa a comunhão de vida que assenta no consentimento e que deve estar
de acordo com as regras do dto canónico tendo como principais fins o bem dos cônjuges e a
procriação e educação da prole.
A principal diferença entre estas noções é que o dto canónico apresenta fins
matrimoniais que não existem no dto civil e isto explica que se os cônjuges ao contraírem
casamento católico não quiserem estes fins (um ou mais do que um) o casamento pode ser
considerado nulo. Conduz-nos à relevância que o dto canónico dá à consumação do casamento,
não é que afete a validade do mesmo, ou seja, que seja necessária para a perfeição do ato, mas
sim a sua indissolubilidade, tornando-o um ato mais estável pois só depois de consumado o
casamento goza de indissolubilidade, não apenas intrínseca, mas também extrínseca. O
casamento não consumado pode ser dissolvido perante o dto canónico e é a única causa de
dissolução do casamento para este direito. Tirando isto o conceito revela-se o mesmo.
Este contrato definido nestes moldes apresenta uma série de características:
1º - Ato pelo qual se interessa o Estado e a Igreja. Inicialmente quem regulava o
casamento era a igreja (como ainda hoje acontece com o batizado), por se tratar de um

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sacramento e aí reivindicava para si a competência exclusiva. A partir do seculo XVI começam


a surgir tendências no sentido de separar o contrato do sacramento (igreja regula o sacramento e
o estado pode regular o contrato que é civil), esta ideia significa que o Estado só reconhecia
efeitos civis ao casamento civil. O facto de termos um ato regulado pela igreja e pelo estado
leva-nos a falar dos sistemas matrimoniais.
Quatro sistemas matrimoniais: sistema do casamento civil obrigatório; sistema de
casamento religioso obrigatório; sistema de casamento civil subsidiário e sistema de casamento
civil facultativo (que tem 2 modalidades).
1- Casamento civil obrigatório - Só tem efeitos jurídicos o casamento civil, celebrado
segundo as suas leis e regulado por elas, portanto, se as pessoas quiserem que o seu
casamento tenha efeitos jurídicos (poderem invocá-lo para os mais variados efeitos) tem
de casar civilmente, o que não significa que o estado proíba o casamento católico,
apenas não lhe atribui efeitos jurídicos. O direito matrimonial do Estado é obrigatório
para todos os cidadãos, independentemente da religião que professem. Oferece a
vantagem de sujeitar todos os cidadãos de um determinado Estado à mesma lei
matrimonial o que é principalmente vantajoso em Estados em que haja muita divisão
religiosa, mas tem o problema de que força a dupla celebração de casamento em relação
aos nubentes que professem qualquer confissão religiosa (tem de casar civilmente e
depois de acordo com a sua religião).
2- Casamento religioso obrigatório – Sistema em que não se admite o casamento civil,
vigorou durante muito tempo e até final do seculo XX na Grécia. Neste caso o estado
submete-se completamente à igreja e reconhece apenas os casamentos celebrados de
acordo com essa religião (no caso era a igreja ortodoxa grega) independentemente da
religião e nacionalidade dos nubentes. Isto acontece em estados em que a maior parte
das pessoas professa a mesma religião (residual). O principal problema é não é muito
compatível com a liberdade religiosa.
3- Casamento civil subsidiário - Tal como o nome indica o casamento civil é subsidiário,
ou seja, o Estado subordina-se inteiramente á Igreja e por isso, em princípio, o
casamento católico é o único que o Estado reconhece, e o casamento civil apenas se
admite subsidiariamente, ou seja, para os casos em que é considerado legitimo pelo
próprio direito canónico. Assim, deve observar-se a forma canónica se ao menos uma
das partes contraentes tiver sido batizada ou recebida na Igreja Católica e dela não tiver
saído por um ato formal (Cânone 1117º Código de Direito Canónico), o Estado apenas
admite que celebrem casamento civil os que não tenham recebido batismo válido
segundo a Igreja Católica ou, embora batizados, tenham posteriormente apostado.
Também tem o problema da liberdade religiosa uma vez que o Estado obriga os
cidadãos à prática de um ato religioso mesmo que os nubentes, apesar de batizados,
professem outra religião ou até nenhuma.
4- Casamento civil facultativo – Os nubentes podem escolher livremente entre o
casamento civil ou o casamento católico ou celebrado segundo os ritos de outra religião
e o estado reconhece a ambos os efeitos civis, o que não leva à dupla celebração. Vários
países seguem este sistema, no entanto, ele abrange duas modalidades:
a. Na primeira modalidade o casamento civil e religioso são apenas duas formas
diferentes de celebração do matrimónio, mas ambas reguladas pela lei civil
(mesmo regime) e com os mesmos efeitos legais. Não compromete a unidade
do dto matrimonial. O casamento continua a ser um instituto único, regido por
uma só lei (lei do Estado), salvo no que respeita à sua forma de celebração. A
lei permite que as atribuições do funcionário do registo civil sejam
desempenhadas pelo respetivo ministro do culto. Em confronto com o sistema
de casamento civil obrigatório oferece a vantagem de evitar aos nubentes uma

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dupla celebração e conserva a vantagem de haver um único direito matrimonial,


válido para todos os nacionais do país.
b. Na segunda modalidade fica comprometida a unidade do dto matrimonial
porque não são apenas duas diferentes formas de casamento são dois institutos
jurídicos diferentes. O Estado não reconhece apenas a forma de celebração
religiosa, reconhece a própria legislação (e até jurisdição) eclesiástica sobre o
casamento, como que renunciando à sua soberania nessa medida. Esta
modalidade poupa aos nubentes uma dupla celebração do matrimónio, mas
agora à custa da unidade do direito matrimonial, que é sacrificada.
O ordenamento jurídico português… evolução histórica
Código de Seabra (1867) era confuso e contraditório. Os arts. 1057º e 1072º pareciam
admitir o casamento civil subsidiário só que não havia controlo prévio da religião dos nubentes
(art. 1081º), nem a religião afetava a validade do casamento, este não podia ser anulado por
motivo da sua religião (art. 1090º). Então na verdade o Código consagrava o casamento civil
facultativo na sua segunda modalidade (dois institutos diferentes).
Podia acontecer que duas pessoas casassem pela igreja legitimamente, mas este não ser
legitimo pela lei civil, como se controlava isto? Ora, o sistema deste código tinha alguns
inconvenientes que resultavam de o casamento civil e o casamento católico serem admitidos
como dois institutos diferentes, sendo diferente o seu regime quanto à capacidade,
consentimento, vícios, nulidade do ato, forma, prova, etc. Todavia, o Código atenuou alguns
destes inconvenientes, primeiro para aproximar os dois sistemas de impedimentos, aplicou
também ao casamento católico os impedimentos impedientes do casamento civil – trata-se de
um processo preliminar de casamento (art. 1058º CC), responsabilizando o ministro da Igreja
que celebrasse casamento não obstante a existência destes impedimentos (art. 1071º CC). Em
segundo lugar com o objetivo de unificar o registo dos casamentos, ordenou aos párocos que
enviassem ao respetivo oficial do registo civil a ata do assento paroquial a fim desta ser
registada (art. 2476º CC), todos os casamentos têm de ser registados sob pena de
inatendibilidade (art. 1699º CC). Aqui o registo não é meramente uma questão de
oponibilidade a terceiros, mas sim de inatendibilidade entre os cônjuges, se o casamento não for
registado ninguém o pode invocar.
Este sistema vigorou até à I República (1910), o decreto nº1 de 25 de dezembro de 1910
no seu art. 2º e 3º considerava o casamento como contrato “puramente civil”. Também as causas
de nulidade ou anulação do casamento competiriam exclusivamente ao foro civil (art. 65º).
Tínhamos então um sistema de casamento civil obrigatório. Para evitar que os nubentes se
limitassem à cerimónia religiosa, o art. 312º CRegCivil de 1911 estabelecia a precedência
obrigatória do casamento civil sobre qualquer casamento religioso. Este sistema vigorou durante
trinta anos no dto português.
A concordata de entre a Santa Sé e a República Portuguesa de 1940 veio admitir de
novo o sistema de casamento civil facultativo na sua segunda modalidade, mas em versão
diferente. Estas diferenças traduzem-se em transigências que foram feitas quer pelo Estado quer
pela Igreja: o Estado reconhece efeitos civis aos casamentos católicos em certos termos, a não
permitir aos seus tribunais aplicar o divórcio aos casamentos católicos e a reservar ao foro
eclesiástico a apreciação da validade ou nulidade dos mesmos casamentos. Da parte da Igreja
vamos ter o Estado a aplicar o seu sistema de impedimentos ao casamento católico, a regular o
processo preliminar e o registo e a permitir aos seus tribunais decretar a separação de pessoas e
bens relativamente aos casamentos católicos.

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A indissolubilidade por divórcio dos casamentos católicos tornou-se objeto de


contestação generalizada na opinião pública. Devido a esta contestação surgiram negociações
com a Santa Sé que levaram à assinatura, em 1975, do Protocolo Adicional à Concordata que
salienta o dever de os cônjuges que celebram casamento católico de não pedirem o divórcio,
trata-se de um dever de consciência que lhes incumbe perante a Igreja e não perante o Estado.
Com esta alteração estavam criadas as condições para se modificar neste ponto o direito interno,
assim, surge o Decreto-lei 261/75 de 27 de maio que no art. 1º revogou o art. 1790º CC, que
não permitia aos tribunais civis decretar o divórcio nos casamentos católicos. Assim,
continuamos a ter a segunda modalidade do sistema de casamento civil facultativo, mas quanto
ao aspeto fundamental da sua dissolução por divórcio, o casamento civil ou católico passa a ser
regido unicamente pela lei do Estado.
De referir a Lei da Liberdade Religiosa (Lei nº 16/2001 de 22 de maio), depois desta,
para os católicos, continuamos a ter a segunda modalidade do sistema de casamento civil
facultativo. No entanto, passaram a existir casamentos civis celebrados por forma religiosa (para
quem professa determinada religião que não seja a católica), perante ministro do culto de igreja
ou comunidade religiosa radicada no país (art. 19º), que constituem apenas outra forma de
celebração do casamento (não um instituto diferente), sujeito em questão de forma às mesmas
disposições pelas quais se regem os casamentos civis celebrados perante o conservador do
registo civil. Ou seja, para estas situações temos a primeira modalidade do sistema de
casamento civil facultativo.
A concordata de 2004 introduziu uma alteração significativa não vinculando mais o
Estado a reservar aos tribunais eclesiásticos o conhecimento das causas relativas à nulidade do
casamento católico. Por outro lado, as decisões das autoridades eclesiásticas relativas à nulidade
do casamento e à dispensa pontifícia do casamento rato e não consumado, deixaram de ser
recebidas no direito português de forma automática, só produzindo efeitos civis a requerimento
de qualquer das partes e após revisão e confirmação pelo tribunal da Relação competente,
quando estejam preenchidas as condições enumeradas no art. 16º.
Caraterização do sistema atual
Para os católicos temos o sistema de casamento civil facultativo na segunda
modalidade e para os que pertencem a igrejas ou comunidades religiosas que se considerem ou
venham a considerar radicadas no país temos o sistema de casamento civil facultativo na
primeira modalidade. Note-se que os católicos podem optar indiferentemente pelo casamento
católico ou pelo civil (art. 1587º CC). Trata-se de duas modalidades de casamento igualmente
admitidas e igualmente válidas. Para os que pertençam a outras igrejas ou comunidades
religiosas, não “radicadas no País”, é um sistema de casamento civil obrigatório, pois a lei não
dá qualquer valor à respetiva cerimónia religiosa.
A CRP no seu art. 36º/2 atribui competência à lei civil para regular os requisitos e os
efeitos do casamento e da sua dissolução, por morte ou divórcio, independentemente da forma
de celebração. Esta ideia de exclusividade da lei civil sugere a ideia de que a CRP tenha querido
derrogar os arts. XXV da Concordata e 1625º do CC, no entanto, esta intenção não
transparece dos debates parlamentares, continuando a entender-se que na prática o
conhecimento das causas respeitantes à nulidade do casamento católico e à dispensa do
casamento rato e não consumado é reservado aos tribunais e repartições eclesiásticas
competentes.
Se se entender que o art. 1625º é conforme à Constituição e não foi derrogado pela
Concordata de 2004, o direito português consagrará a segunda modalidade do sistema de
casamento civil facultativo, uma vez que ao foro eclesiástico compete julgar, segundo as normas

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do dto canónico, da validade ou nulidade do casamento católico. O Estado dá, pois, efeitos civis
ao casamento católico como tal e reconhece ou recebe não só as normas do dto canónico que
regem o ato matrimonial, como inclusivamente a aplicação que dessas normas seja feita pelos
órgãos jurisdicionais da própria Igreja.
Por outro lado, Gomes Canotilho, Vital Moreira e Marques Santos entendem que o
casamento canónico instituído pela Concordata de 1940 e reafirmado pela concordata de 2004
para que não seja considerado inconstitucional apenas pode existir como forma diferente de
celebração do casamento, admitindo a legislação concordatária, a segunda modalidade do
sistema de casamento civil facultativo (dois institutos diferentes) e até porventura a primeira
modalidade do sistema de casamento civil facultativo (duas formas de celebração) como
inconstitucionais. Esta não é a opinião dos autores do livro.
O dto português tentou ainda evitar os inconvenientes que resultam do sistema aplicado
(segunda modalidade do sistema de casamento civil facultativo) em alguns pontos
fundamentais:
a) Aproximar os sistemas de impedimentos (art. 1596º CC) exige-se a capacidade civil
para a celebração do casamento católico, aplicando a este casamento todo o sistema de
impedimentos do casamento civil. Para dar valor prático, proíbe a lei ao pároco, sob
pena de graves sanções (art. 296º a) nº1 do CRegCivil) a celebração do casamento
católico sem que lhe seja presente certificado, passado pelo conservador do registo
civil, a declarar que os nubentes podem contrair casamento (art. 1598º/1 do CC e 146º e
151º CRegCivil). Ainda assim como é óbvio o casamento católico está sujeito e até
antes de mais nada aos impedimentos do dto canónico (nem todos os casamentos que se
podem celebrar civilmente também se podem celebrar catolicamente).
b) Para unificar o registo do casamento, o CRegCivil impôs ao pároco, sob cominação das
sanções previstas no art 296º c) nº1, a obrigação de enviar à conservatória do registo
civil competente o duplicado do assento paroquial, a fim de ser transcrito no livro de
casamentos (art. 1655º/1 CC e 169º CRegCivil).
c) Quanto à questão do casamento o Decreto-lei nº 261/75 de 27 de maio desaparece a
situação anterior que dizia que os tribunais civis só podiam decretar o divórcio nos
casamentos civis ou nos casamentos católicos anteriores a 1 de agosto de 1940,
podendo agora o casamento civil e o casamento católico ser dissolvidos por divórcio,
nos tribunais civis, com os mesmos fundamentos e nos mesmos termos.
Por que normas – de direito civil ou canónico – se rege o casamento católico em cada um
dos seus aspetos?
a) Promessa de casamento – artigos 1591º ss. do CC aplica-se quer à promessa do
casamento católico, quer à do casamento civil.
b) Requisitos de fundo do casamento católico temos de distinguir os problemas relativos
ao consentimento onde se aplica o direito canónico uma vez que se trata de requisitos de
validade (art. 1625º CC). Já quanto à capacidade como vimos aos impedimentos
matrimoniais aplicam-se as duas ordens jurídicas, o casamento católico está sujeito
primeiramente aos impedimentos do dto canónico e também ao sistema de
impedimentos do dto civil (art. 1596º CC).
c) Forma – em geral é regulada pelo dto civil e pelo dto canónico. Assim quanto às
formalidades preliminares há ao mesmo tempo formalidade canónicas e civis a cumprir
(ex. processo preliminar que corre na conservatória do registo civil).
d) Causas de nulidade – apenas são competentes o dto e foro eclesiástico (art. 1625º CC).
Mas é ao dto civil que pertence, uma vez declarada a nulidade do casamento pelo

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tribunal eclesiástico, regular os efeitos da nulidade e eventual aplicação ao caso do


instituto do casamento putativo (art. 1647º-1648º CC).
e) Efeitos do casamento – tanto pessoais como patrimoniais é o dto civil que se aplica.
f) Separação de pessoas e bens – disposições da lei civil são igualmente aplicáveis ao
casamento católico.
g) Dissolução do casamento – aplicam-se ambas as ordens jurídicas (a dissolução por
morte ou divórcio competem exclusivamente à lei civil (art. 36º/2 da CRP), mas o
casamento católico admite ainda uma causa de dissolução própria dele, a dispensa do
casamento rato e não consumado.
Os carateres do casamento como ato: Casamento como negócio jurídico; casamento como
contrato; casamento como negócio pessoal; casamento como negócio solene.
Casamento como negócio jurídico
O negócio jurídico é uma declaração de vontade dirigida a certos efeitos e que a ordem
jurídica tutela em si mesma e na sua direção determinada, atribuindo-lhe efeitos jurídicos em
geral correspondentes aos fins que os declarantes têm em vista. O negócio jurídico é o
instrumento por excelência da autonomia da vontade privada. O casamento é um dos negócios
familiares, apesar da margem de autonomia das partes ser muito limitada neste domínio. Os
efeitos pessoais do casamento, em particular os direitos e deveres dos cônjuges, são fixados
imperativamente na lei, sem que as partes possam introduzir desvios ou derrogações no
respetivo regime (art. 1699º/1 b) e 1618º/2 do CC). A liberdade dos nubentes não é só porém a
de casarem ou não, também têm a liberdade de escolher a pessoa com quem o fazem, a
liberdade de escolherem entre casamento civil e casamento católico, a liberdade de casarem
pessoalmente ou por procuração, etc. Por outro lado, embora os cônjuges não possam alterar os
deveres do art. 1672º, a lei permite-lhes decidir sobre o modo de cumprimento de alguns desses
deveres, assim os cônjuges devem acordar sobre a orientação da vida em comum (art. 1671º/2
do CC), escolhem de comum acordo a residência da família (art. 1673º do CC) e a forma como
cada um cumpre o dever de contribuir para os encargos da vida familiar (art. 1676º do CC).
Casamento como contrato
Tanto o casamento católico como o civil. Quanto ao católico não há qualquer dúvida
sendo os contraentes os nubentes e o pároco uma testemunha pública que, em nome da igreja,
recebe o consentimento deles. No que se refere ao casamento civil sabemos que no nosso direito
o conceito de contrato não é de aplicação restrita aos negócios patrimoniais e o art. 1577º do CC
define o casamento como “contrato” não podendo subestimar-se o valor desta indicação. A
contratualidade do casamento civil tem sido, todavia, contestada havendo quem considere que
ele não é um ato de direito privado, mas também, ou exclusivamente um ato administrativo.
Casamento como negócio pessoal
O casamento é um negócio familiar e sabe-se que os negócios familiares são negócios
pessoais dos mais típicos e característicos. Dizem-se pessoais os negócios que não se destinam a
constituir, modificar ou extinguir relações de carácter patrimonial, mas a influir no estado das
pessoas, familiar ou de outra ordem. O casamento como negócio pessoal, ostenta as
caraterísticas gerais dos negócios pessoais: são regidos por normas imperativas; só podem ser
concluídos/celebrados pessoalmente, o que leva a que não seja possível a representação no
casamento; entre outras.
Contrato como negócio solene

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A vontade dos contraentes não se pode manifestar de qualquer modo, de acordo com o
princípio geral da liberdade de forma, mas só através de certa forma, determinada pela lei.
Contudo, diferentemente da forma formal exigida para outros negócios/declarações de vontade
(documento escrito), a forma requerida para a validade do casamento consiste na “cerimónia de
celebração do ato”. As formalidades do casamento católico são regidas pelo direito canónico e
as formalidades do casamento civil estão previstas no art.115º CRCivil, sendo que este deve ser
celebrado perante o funcionário do registo civil.
Carateres do casamento como estado matrimonial
Unidade ou exclusividade - não é possível alguém contrair casamento com outra
pessoa sem dissolver o casamento anterior, ou seja, uma pessoa não pode estar casada ao
mesmo tempo com duas ou mais pessoas (1601º c) do CC). A bigamia é crime previsto e punido
nos termos do art.247º CP. Não é permitida a poligamia simultânea, no entanto, não existe nada
contra a poligamia sucessiva (segundas núpcias), essa é livremente admitida pelo direito civil e
pelo direito canónico (a morte dissolve o vínculo matrimonial).
Tendencial indissolubilidade - a doutrina tradicional falava em perpetuidade do
casamento para exprimir a ideia de que este só se dissolve quando algum dos cônjuges falecer.
Contudo, ao longo do tempo a tendência foi sempre no sentido de o divórcio ser facilitado. Face
à legislação atual faz sentido falar de perpetuidade do casamento em relação ao casamento
católico, mas quanto ao casamento civil faz mais sentido falar de dissolubilidade condicionada
no sentido em que não possam ser apostos ao casamento condição ou termo resolutivos, ou seja,
há um elenco de causas do divórcio e não se pode estipular outras para além das previstas no art.
1781º do CC.
Promessa de casamento
É um instituto com pouca aplicação prática e está regulado no art.º 1591ºCC - “O
contrato pelo qual, a título de esponsais, desposórios ou qualquer outro, duas pessoas se
comprometem a contrair matrimónio não dá direito a exigir a celebração do casamento, nem a
reclamar, na falta de cumprimento, outras indemnizações que não sejam as previstas no artigo
1594.º, mesmo quando resultantes de cláusula penal.”
Uma questão que se coloca é saber porque é que o legislador estabeleceu um regime
próprio para a promessa de casamento, quando há um regime geral para o contrato promessa?
Qual a particularidade da promessa de casamento? Ora, em termos gerais, na eventualidade de
não cumprimento do contrato promessa, há possibilidade de indemnização por todos os danos
causados. No entanto, na promessa de casamento, o contraente que não cumpre a promessa de
casamento não responde pela totalidade dos prejuízos causados, nos termos gerais do direito dos
contratos ou pela cláusula penal convencionada, mas responde apenas por certas despesas
(despesas feitas e obrigações contraídas na previsão do casamento), sem que as partes possam
estipular cláusula penal de montante superior – art.º 1594º do CC.
É de notar ainda que mesmo que a promessa de casamento fosse plenamente eficaz,
nunca dela resultaria uma obrigação de casar cujo cumprimento fosse judicialmente exigível.
Isto significa que embora o art.830º do CC admita, em geral, a execução específica das
obrigações derivadas dos contratos promessa, a natureza da obrigação assumida (natureza
pessoal – obrigação de casar) excluiria desde logo a possibilidade de recurso à execução
especifica. Concluímos que a especialidade do regime promessa de casamento está na menor
extensão do dever de indemnizar que deriva do não cumprimento dessas obrigações.
Se nos questionarmos sobe o porquê de a lei não querer que se vá muito longe no dever
de indemnizar resultante da violação da promessa de casamento a resposta é que o

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consentimento para o casamento seria menos livre. Pensemos que talvez para não ter de
indemnizar a totalidade dos prejuízos causados, para não ter de pagar uma indemnização
porventura muito avultada, o contraente que estivesse na disposição de romper a promessa
preferiria casar. Então em matéria de casamento a lei tem especial empenho em que o
consentimento dos nubentes seja livre, tanto quanto possível, até ao momento da celebração do
casamento (art. 1591º CC).
Sendo a promessa de casamento um verdadeiro negócio jurídico, dela resultarão, em
princípio os mesmos efeitos que derivam de qualquer promessa de contratar, resultando dela, se
for válida, duas obrigações de casar igualmente válidas. A garantia destas obrigações é, no
entanto, como já vimos mais frágil do que a garantia que a lei dá às obrigações que resultam de
outros contratos-promessa sendo que está excluída a execução em forma específica e o dever de
indemnizar que resulta do não cumprimento destas obrigações é circunscrito a certas obrigações
e despesas. Vamos agora tratar exatamente deste dever de indemnizar.
Quanto aos sujeitos da obrigação de indemnizar o art. 1594º/1 do CC não levanta
dúvidas, a indemnização pode ser pedida pelo esposado inocente, pelos pais deste ou por
terceiros que tenham agido em nome dos pais. E pode ser pedida ao nubente culpado que
rompeu a promessa sem justo motivo ou que por sua culpa deu lugar a que o outro a rompesse.
O art. 1594º/2 estabelece ainda a hipótese de haver obrigação de indemnização caso o
casamento não se realize por motivo de incapacidade de algum dos contraentes, se ele ou os
seus representantes houverem procedido com dolo. “Justo motivo” é um conceito indeterminado
que pertenceria à jurisprudência determinar a sua aplicação nos casos concretos, no entanto,
poderá dizer-se que há justo motivo quando, segundo as conceções que dominam na esfera
social dos nubentes, a continuação do noivado e a celebração do casamento não podem
razoavelmente ser exigidas a um ou ambos os esposados. Estas causas podem ser anteriores ou
posteriores à promessa de casamento, mas sendo anteriores, em regra, não devem ser
conhecidas do nubente que se retratou. A prova do justo motivo cabe ao réu (devedor) segundo
decorre das regras gerais (art. 799º/1 do CC).
Quanto ao objeto da obrigação de indemnizar suscitam-se alguns problemas. Sabemos
que o dever de indemnizar não se estende à totalidade dos prejuízos causados sendo restrito às
despesas feitas e às obrigações contraídas na previsão do casamento (art. 1594º/1 do CC)
ficando assim de fora os lucros cessantes, os restantes danos emergentes que não se reconduzam
a despesas feitas ou obrigações contraídas e os danos patrimoniais. A indemnização é fixada
segundo o prudente arbítrio do tribunal (art. 1594º/3 do CC) devendo atender-se no seu cálculo
“não só à medida em que as despesas e obrigações se mostrem razoáveis, perante as
circunstâncias do caso e a condição dos contraentes, mas também às vantagens que,
independentemente do casamento, umas e outras possam ainda proporcionar” – isto já acontecia
no regime geral da responsabilidade civil e significa que uma despesa que não se mostre
“razoável” não será consequência adequada do rompimento da promessa e que se as despesas
ainda proporcionarem vantagens ao nubente inocente o dano sofrido por ele será menor.
Para além da indemnização, outro efeito que a lei prevê sempre são as restituições dos
donativos feitos em virtude da promessa e na expectativa do casamento (art. 1592º e 1593º do
CC). Estas estão previstas em dois artigos distintos: art.1592º (casos gerais em que a promessa
de casamento não foi cumprida); 1593º (restituições em caso de morte).
Art.1592º CC - a lei diz que os donativos que os promitentes tenham feito um ao outro
ou recebido de um terceiro em virtude da promessa devem ser sempre restituídos. Há sempre
lugar a restituição dos donativos (restituição mútua), se a promessa não se cumprir, seja em caso
de retratação ou de incapacidade, tanto ao esposado culpado como ao inocente e tanto em
relação a donativos recebidos do outro esposado como aos recebidos de terceiro. Se a restituição

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em espécie não for possível, será o valor do mesmo restituído. Art. 1592º/2 do CC – “A
obrigação de restituir abrange as cartas e retratos pessoais do outro contraente, mas não as
coisas que hajam sido consumidas antes da retratação ou da verificação da incapacidade”.
Art.1593º CC - O promitente sobrevivo tem uma opção: de harmonia com as regras
gerais, pode exigir aos herdeiros do outro esposado os donativos que tenha feito, restituindo os
que recebeu; mas pode também conservar os donativos do falecido, perdendo, neste caso, o
direito de exigir os donativos que por sua parte foram feitos. No entanto, “O mesmo promitente
pode reter a correspondência e os retratos pessoais do falecido e exigir a restituição dos que este
haja recebido da sua parte”, ficando com tudo e isto devido ao caráter pessoal dos “donativos”
em questão sendo que a lei considera que as cartas e retratos constituem património moral.
O fundamento e os termos da obrigação de restituir os donativos decorrem do
preceituado no art. 1592º do CC. Verdadeiramente, o fundamento da obrigação de restituir
reside na ineficácia dos donativos (por não se ter verificado a condição a que eles se
subordinavam – casamento), mas a lei equipara a ineficácia, sob este aspeto, à nulidade ou
anulabilidade, obrigando os nubentes a restituir os donativos segundo os termos da
nulidade/anulabilidade do negócio jurídico. O art. 1592º do CC remete assim para o disposto no
art. 289º do CC segundo o qual a obrigação de restituir derivada da declaração de nulidade ou
da anulação do negócio jurídico se funde no princípio do enriquecimento sem causa e se meça
por este enriquecimento. Assim, mesmo não sendo este princípio o fundamento da obrigação,
ele explica alguns aspetos de tal obrigação de restituir. Por exemplo, se o nubente que recebeu
os donativos os alienar gratuitamente, e não puder tornar-se efetiva contra o alienante a
restituição do seu valor, fica o adquirente obrigado a restituir, mas só na medida do seu
enriquecimento (art. 289º/2 do CC). É ainda este princípio que explica que a obrigação de
restituir não abranja as coisas que hajam sido consumidas antes da retratação ou da verificação
da incapacidade (art. 1592º/2 do CC).
Por último, sobre o prazo de caducidade o art. 1595º do CC marca o prazo de um ano a
contar da data do rompimento da promessa ou da morte do promitente, para a ação destinada a
exigir a restituição dos donativos ou as indemnizações previstas no art. 1594º do CC.

19.10.2022

O casamento

O consentimento para efeitos de celebração de casamento

Sem vontade de casar da parte de ambos os cônjuges e sem que esta vontade seja
manifestada, não pode haver casamento nenhum. É o consentimento que constitui a relação
matrimonial. O casamento é um contrato verbal, mas solene, inclusivamente a lei vai ao ponto
de nos dizer que palavras é que os cônjuges têm de pronunciar (art.155º/nº1 (a) e (e) CRegCiv).
Seria excessivo que se considerasse o casamento inválido quando proferidas palavras diferentes,
mas com o mesmo sentido.
O consentimento para casamento tem de obedecer a determinados requisitos. Umas são
gerais à generalidade dos negócios jurídicos e outras são especiais, relativas a este negócio.

Características do consentimento: o casamento deve ser pessoal, puro e simples, perfeito e


livre. Para além disto, deve ser atual.

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1. Pessoal- O casamento deve ser expresso de forma pessoal no ato da celebração do


casamento (art.1619º).
No entanto, existe um desvio a esta característica, pois existe a possibilidade de celebração
do casamento através de procuração (art.1620º, 1621º CC e 43º e 44º CRegCiv). O facto de
um dos nubentes se poder fazer representar que não se está a respeitar o princípio da atualidade,
porque a vontade é declarada pelo procurador no momento da celebração.
O casamento por procuração tem 1 exigência formal e 2 de índole material. A exigência
de carácter formal é a que resulta do art.43º/nº2 CRegCiv, ou seja, (1) para ser válida tem de ser
assinada pelo nubente e tem de conter o reconhecimento presencial da assinatura ou. As
exigências de caris material são: (2) só um dos nubentes se pode fazer representar por um
procurador (art.1620º/nº1 CC e art.44º/nº1 CRegCiv; (3) da procuração deve resultar deveres
especiais para o ato, individualizar a pessoa do outro nubente e indicar a modalidade de
casamento.
Caso a procuração desrespeito uma das exigências e o casamento é realizado na mesa este
é considerado juridicamente inexistente (art.1628º (d) CC).
Na procuração para casamento o legislador diz que a procuração cessa os seus efeitos
apenas com a simples revogação, não necessita de a revogação chegar ao conhecimento do seu
destinatário, que é o procurador (desvio à regra do art.224º CC).
Tema problemático relativo à representação: qualificação do procurador. Há quem defende
que é um representante da vontade, isto implica que ao celebrar o negócio, se algo ocorrer ele
pode recusar-se a celebrar. Há quem defenda que é um mero núncio/ representante na
declaração, não tendo liberdade de, em última instância, não celebrar o negócio. A doutrina
maioritária vai no sentido de dizer que o procurador ad núpcias é um representante na
vontade, ainda que com poderes muito escassos.

2. Puro e simples (art.1618º CC), ou seja, a vontade de contrair casamento importa a


aceitação de todos os efeitos legais associados à celebração do casamento. No nº2 temos
a ideia de que não é possível haver condição ou termo ao casamento. A própria
dignidade do casamento assim o impõe. Se na condição nupcial puser um termo, o
casamento é válido e essas cláusulas têm-se por não escritas, ou seja, assumem-se como
não escritas (art.1618º/nº2).

3. Perfeito, ou seja, não só as declarações de vontade têm de ser concordantes uma com a
outra, mas deve haver uma concordância entre declaração e vontade. Não podem existir
faltas de vontade.
legislador presume que há concordância entre declaração e vontade (art.1634º CC), ele
presume que não há falta de vontade, ou seja, há uma concordância entre declaração e vontade.
Se na eventualidade de um casamento é celebrado com falta de vontade subjacente a uma das
declarações, ele vai ser considerado anulável.
Em matéria de invalidades do casamento vigora o princípio da tipicidade (art.1627º CC).
Para efeitos de invalidade só valem as causa de invalidade previstas na lei para causas de
invalidade do casamento. Pode haver mil e uma causa de invalidade do negócio jurídico, mas
para o casamento só valem as que estão previstas na lei como invalidades do casamento. Estão
previstas no art. 1635º CC: reserva mental, declarações não sérias, erro na declaração,
simulação. Nestas situações o casamento é anulável por falta de vontade.
- Reserva mental (art.244ºCC): ela só vai relevar em matéria de invalidade quando for
conhecida do declaratário e nesse caso vai ser equiparada à simulação.

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- Declarações não sérias


- Simulação:
Para se anular um casamento simulado é necessário recorrer a um tribunal judicial tendo
de existir um fundamento, tem de haver legitimidade e tem de estar dentro do prazo. Quanto
à simulação o fundamento é a falta de vontade (art.1635º (d)); relativamente à legitimidade
temos de olhar para o art.1640º/nº1 CC; no que toca ao prazo temos de olhar para o
art.1644º CC.
Art.243º CC- a simulação não pode ser oposta a terceiros de boa-fé.
Na opinião dos autores do manual da disciplina só a simulação absoluta é que releva
para efeitos de invalidade, ou seja, quando os nubentes não queriam celebrar negócio
nenhum, mas acabam por fazê-lo.
- Erro na declaração (Art.1635º (a)). Casos de sonambulismo, embriaguez, erro sobre a
identidade da outra pessoa, incapacidade acidental, etc. Só tem legitimidade a pessoa a
quem faltou a vontade.

4. Livre. O legislador também presume que o consentimento é livre (art.1624º CC). Dupla
presunção, porque presume que o consentimento é perfeito e livre. Quando falamos em
liberdade do consentimento estamos no âmbito dos vícios da vontade- erro e coação.
Ele é verdadeiramente livre quando: (1) a vontade se formou com exato esclarecimento,
ou seja, tenha sido esclarecida- quando isto não é cumprido falamos em erro; (2) a
vontade tenha sido formada com liberdade exterior (livre de pressões e ameaças) - aqui
falamos em coação.
Aqui só vamos falar do erro e da coação por força do princípio da tipicidade. Para além do
dito anterior, eles valem nos exatos termos na matéria do casamento.

Erro
Em matéria do casamento só vale o erro sobre qualidades essenciais da pessoa do
cônjuge.
 Pressupostos: o erro é irrelevante a não ser que estejam preenchidos 4 pressuposto: (1)
tem de incidir sobre qualidades essenciais; (2) tem de ser próprio; (3) tem de ser
desculpável; (4) a circunstância sobre que incidiu o erro tem de ser determinante da
vontade de contrair casamento, tanto subjetiva como objetivamente. Art.1636º CC.
1. São as particularidades significativas, ou seja, que em abstrato sejam idóneas a
determinar o consentimento. Exemplo: prática de um crime difamante, doenças
contagiosas e hereditárias, nacionalidade, religião, etc.
2. O erro é próprio se não recair sobre qualquer requisito legal de validade ou
existência do casamento. Exemplo: Imaginemos que eu me vou casar com B e na
altura não sei, mas descobri depois que ele só tem 15 anos. Já vimos que se trata de
um impedimento à celebração do casamento. Eu estava em erro, mas como ele
insidia sobre a idade, ele incide sobre um requisito de validade. É mais fácil anular
um casamento por a pessoa não poder casar por não ter idade do que estar a
preencher os requisitos todos do erro. Isto resulta do princípio geral do concurso de
normas.
3. O erro indesculpável ou grosseiro, no qual não caísse uma pessoa normal, em
condições normais, não é relevante.
4. Se o erro não existisse, ele não teria querido casar. Esta essencialidade tem de
assumir 2 vertentes, uma subjetiva (na pessoa da pessoa que estava em erro) e outra

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objetiva (atenta a consciência social dominante e olhando objetivamente para


aquelas que são as circunstâncias do caso teria de ser possível supor que qualquer
pessoa não teria querido casar se soubesse daquela circunstância).

Coação

Art.1638ºCC. Para efeitos de celebração do casamento só é relevante se estiverem


preenchidos 5 pressupostos:

1. Essencial ou determinante da vontade. O negócio nunca teria sido celebrado se não


houvesse coação;
2. Intenção de extorquir uma declaração;
3. Haver uma cominação injusta ou ilícita, sem o qual, se não houvesse coação não seria
possível;
4. Tem de ser grave
5. Tem de ser justificado o receio da sua consumação

Em suma, se o consentimento não for livre, a sua consequência, é que o casamento é


anulável. Legitimidade (art.1641ºCC). Prazo (art.1645ºCC).

26.10.2022
Capacidade matrimonial

Regra: todos têm capacidade para casar, salvo quando a lei vier dizer o contrário
(art.1600º CC).

Vamos encontrar aqui diferenças relativamente à capacidade em geral, para celebração


dos outros negócios jurídicos, sendo que essa tem a ver com o nº de incapacidades e com a
qualificação dessas incapacidades. O legislador quer promover e estimular a celebração do
casamento. Vamos encontrar aqui neste regime, algo que se assume diferente- próprio regime da
incapacidade. O regime de anulabilidade do casamento é muito mais grave do que os negócios
jurídicos em geral. Há outra especificidade que já conhecemos- alguém faz um determinado
negócio não tendo capacidade, a lei limita-se a. No caso do casamento, o legislador não só o
sanciona, como também no caso de o casamento ser anulado, o legislador protege os efeitos
desse casamento anulado- regime do casamento putativo- ou seja, permite que os efeitos se
produzem. Outra particularidade, evita que o casamento seja celebrado por pessoa sem
capacidade, por via de um processo prévio para aferir a capacidade.

Conceito de impedimento patrimonial. Eles são as circunstâncias onde se filiam as


incapacidades ou outras proibições legais de contrair casamento. Mas se a pessoa casar na
mesma? O casamento é passível de anulabilidade ou outras sanções menos severas. Nem
sempre a existência de um impedimento conduz há anulabilidade do casamento, pode sim levar
a outras sanções.

Que impedimentos temos? Quais as que se conduzem à anulabilidade? Quais são as


sanções mais leves?

 Impedimentos dirimentes- caso o casamento se realize, mesmo com o


impedimento, o casamento é anulável.

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 Impedimentos impedientes- caso o casamento se realize, mesmo com o


impedimento, o casamento é válido, não é anulável. Conduz às sanções de
caracter patrimonial, nomeadamente o nubente não pode administrar
determinados bens.

Qualquer um deles impedem a celebração do casamento.

 Impedimentos absolutos- são verdadeiras incapacidades, ou seja, impedem que


a pessoa case com qualquer pessoa;
 Impedimentos relativos- temos aqui muito mais ilegitimidades do que
incapacidades. Não impedem que a pessoa case com qualquer pessoa, ela
impede que a pessoa case com outra pessoa concreta.

 Impedimentos dispensáveis (art.1609º CC) - admitem dispensa. A dispensa é


um ato de uma entidade administrativa, permite que não obstante a existência
destes impedimentos, o casamento possa celebrar-se. Todos os outros, não
admitem dispensa.

 Impedimentos de direito civil


 Impedimentos de direito católico

Art.1601º- Impedimentos dirimentes absolutos

Se o casamento for celebrado, mesmo com estes impedimentos, o casamento é anulável


(art.1631º/nº1 (a)). Compreendem os casos que que a pessoa é impedida de casar com qualquer
pessoa.

a. Idade inferior a 16 anos.

Legitimidade (art.1639º/nº1 e 2 CC) - o leque de pessoas é muito ampla, incluindo o MP


(ao contrário, dos negócios em geral).

Prazo (art.1643º (a) CC).

Art.1633º CC- que se não só a este caso, mas também se aplica a outros impedimentos.
É possível que o casamento de menor veja a sua anulabilidade sanada, caso se verifique o que
está neste artigo.

b. Demência notória. Tanto pode consistir numa demência de direito (pode


consistir uma medida de acompanhamento) ou demência de facto (vai ser
preciso provar a demência, mas a partir do momento em que esta se manifesta,
pois se ela se verificar depois do casamento, ela não interessa). Esta demência
de facto implica a existência de uma anomalia na pessoa que impede a pessoa
de se reger a si mesma ou aos seus bens. Que seja notória quer dizer que seja
evidente, ou seja, uma pessoa olha para a outra e consegue perceber que há
anomalia. No casamento está em causa interesses sociais e morais. Isto é um
impedimento, pois o legislador pretende evitar que estes problemas se
transmitam aos seus descendentes e, consequentemente, à sociedade. É mais
fácil provar quando há medida de acompanhamento.

Legitimidade (art.1639º CC).

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Prazo (art.1643º CC).

Art.1633º CC.

c. Casamento anterior não dissolvido, católico ou civil, ainda que o respetivo


assento não tenha sido lavrado no registo civil. Isto quer dizer que o casamento
anterior, à partido, é válido. Art.1632º CC. No entanto, pode existir um
casamento anulável anterior, mas enquanto não existir a sentença de anulação
ele é válido, e obsta à celebração do casamento. Se o 1º casamento é anulado, o
2º casamento convalida-se (art.1633º (c) CC), e não pode ser anulado. A este
artigo acresce o art.1643º/nº3 CC (prazo). Este artigo (art.1601º/nº1 (c) CC)
trata-se de uma exceção ao princípio da inatendibilidade dos factos não
registados (o casamento é um facto sujeito a registo, se ele não for registado, é
inatendível).

Legitimidade (art.1639º CC)

Prazo (art. 1643º/nº1 (c) CC). O prazo é até 6 meses após a dissolução do casamento.
Qual casamento? Do 2º casamento, pois é aquele que quero anular com base neste
impedimento. Caso passe o prazo, o 2º casamento convalida-se, ou seja, passa a válido.

Art.1602º CC- impedimentos dirimentes relativos

Legitimidade (art. 1639º CC)

Prazo (art.1643º (b) CC.

Art.1604º- Impedimentos impedientes.

São aqueles que impedem a celebração do casamento. Caso, mesmo assim o casamento seja
celebrado, o casamento é válido, mas vai ter sanções mais leves que a anulabilidade. Aqui os
impedimentos absolutos e relativos estão todos misturados no artigo. Não geram a
anulabilidade, mas gerem outras sanções: art.1649º e 1650º CC.

 Art.1649º CC (sem haver autorização dos pais ou sem o respetivo suprimento).


 Art.1650º CC- nos restantes impedimentos impedientes, a existência deste
impedimento, gera a incapacidade para receber do seu consorte doações patrimoniais.

02.11.2022

Formalidades do casamento (requisitos de forma)

Permite que as partes pensem bem no que estão a fazer, as cláusulas que estão a aceitar
e serve para prova. Tendo também desvantagens, ou seja, é mais demorado, inclui mais
despesas.

O formalismo que é exigido para o casamento serve essencialmente para provar a


existência desse mesmo casamento. A forma exigida para o casamento é a cerimónia do

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casamento civil, que é copia do casamento católico. Depois, serve para incutir nos cônjuges a
seriedade do ato.

3 tipos de formalidades:

Vamos falar das formalidades anteriores à celebração do casamento, das formalidades


da própria celebração do casamento, das posteriores (registo).

 Formalidades preliminares ao casamento

A nossa lei exige que haja uma capacidade negocial por parte dos nubentes, tendo os
cônjuges de dar início a um processo preliminar do casamento (art.134º CRegCivil). Havendo
sanções se celebrarem um casamento, sem este processo preliminar, tendo este de ser sempre
realizado. O art.135º CRegCivil- no processo preliminar podem ambos os cônjuges estar
representados por procurados, contrariamente ao que acontece na própria celebração do
casamento, em que só um dos nubentes pode estar representado. A declaração deve conter os
elementos que aparecem no art.136º/nº2 CRegCivil e devem conter os elementos contidos no
art.137º CRegCivil (ter atenção o nº1, nº4). Depois do processo ser instruído com todos estes
elementos, é necessário publicitá-lo, ou seja, obter uma cópia (art.140º CRegCivil- publicidade
do processo). Este processo serve para aferir a capacidade matrimonial dos nubentes, sendo que
no final deste, o conservador, tem de aferir desta legitimidade, tendo de realizar algumas
diligências (art.143º CRegCivil- diligências a efetuar pelo conservador). Se o casamento for
sobre a forma civil, o próprio conservador, assegura que haja conhecimento sobre estas normas
(no casamento católico, deve o conservador acautelar o conhecimento destas normas).
Posteriormente a estas diligencias, é necessário ser proferido um despacho final (art.144º
CRegCivil), sendo que se uns dos nubentes tiverem manifestado a sua vontade de casar
civilmente sobre a forma religiosa ou pretendem casar catolicamente, o conservador tem,
necessariamente, de enviar um certificado para casamento, sendo que ser ele, o pároco não pode
celebrar o casamento (art.146º e 147º CRegCivil). Com o despacho final encerra-se esta fase
preliminar (esta é a situação normal).

No entanto, podem surgir aqui alguns incidentes:

 Necessidade de obtida uma dispensa de um impedimento (art.1609º CC). Se assim


for, é preciso obedecer ao processo de dispensa de impedimentos (art.253º e 254º
CRegCivil);
 Os nubentes tenham demonstrado a sua vontade de casar civilmente sobre a forma
católica ou catolicamente, sendo necessário o certificado (art.146º e 147º CRegCivil)
 Ser detetado um impedimento, que é o incidente mais importante e relevante (art.142º
CRegCivil e 1611º CC). Processo de impedimento de casamento (art.245º a 252º
CRegCivil).

 Formalidades da própria celebração do casamento

Art.145º CRegCivil (prazo para a celebração)

Art.153º CRegCivil (dia, hora e local)

Art.154º CRegCivil (intervenientes)- o casamento tem de ser celebrado com a presença de,
pelo menos, 2 testemunhas, sob pena de o casamento ser considerado anulável, nos termos do

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Art.1631º (c) CC (“é anulável o casamento celebrado sem a presença de testemunhas, quando
exigida por lei, que é o caso”).

Art.155º CRegCivil (solenidade). Diz-se aqui tudo o que o conservador tem de dizer para
celebrar o casamento. Se faltar esta declaração do conservador, o casamento existe, pois é a
declaração dos nubentes que faz o casamento.

 Formalidades do registo do casamento

Art.1º e 2º CRegCivil (conjunto de atos sujeitos a registo). Se alguns destes atos não forem
registados, eles são inatendíveis, ou seja, eles até podem ser válidos, mas não podem ser
invocados (exceção das convenções antinupciais). Art.1669º CC. Continua a ser um
impedimento matrimonial o presente no art.1601º (C), mesmo não tendo sido registado.

Art.3º CRegCivil (valor probatório do registo)

Art.50º CRegCivil (assentos e averbamentos)

Art.190º CRegCivil- não há um registo por assento, ele faz-se por menção no assento do
casamento (exceção).

Os assentos podem ser por inscrição (a entidade faz o registo do casamento que presenciou)
ou por transcrição (é feito por entidade que não foi a que a presenciou). Art.52º e 53º
CRegCivil.

Os averbamentos são atualizações. Os assentos são inalteráveis, ou seja, não posso estar a
mudar (art.62º CRegCivil).

Olhando para o registo de casamento, especificamente. No caso, em particular, do


casamento, o casamento não registado é inatendível, podendo este ser registado a todo o tempo
e temos aqui a retroatividade do registo (efeitos ex tunc). Pode acontecer que entre o momento
da celebração do casamento e o efetivo registo, pode haver aqui direitos adquiridos por
terceiros.

 Art.1670º CC (efeito retroativo do registo). A lei salvaguarda aqui o registo feito por
transcrição (feito com base no documento que enviem ao conservador, pois ele não
esteve presente, e corre algum lapso temporal) estabelecendo 7 dias para ocorrer o
registo. Os efeitos são retroativos, mas ficam ressalvados os direitos de terceiro que
sejam compatíveis com direitos e deveres de natureza pessoal dos cônjuges ou filhos.
Exemplo: no decurso do casamento, há atos que os cônjuges não podem celebrar
sozinhos e precisam do consentimento do outro, imaginemos que antes do registo, um
dos cônjuges estabelece um contrato que necessitava de consentimento para celebrar o
negócio, o outro cônjuge vem dizer que o negócio não é válido, mas este terceiro com
quem foi celebrado o negócio fica aqui protegido, pois existe um direito patrimonial do
terceiro que é compatível com o direito pessoal do cônjuge.

Pequenos desvios

 Casamentos urgentes: são celebrados sem processo preliminar ou sem funcionário do


registo civil (art.1622º CC e art.156º ss CRegCivil).
Pressupostos: Isto pode ocorrer (1) quando haja fundado receio de morte próxima de
um dos nubentes; (2) iminência de parto. A lei exige que umas destas circunstâncias
estejam preenchidas, mas não é preciso provar expressamente isso, ou seja, baste que

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os nubentes tenham a convicção de que vá acontecer uma destas circunstâncias. Ele só


não será amolgado, quando os nubentes estejam de má-fé. Art.1590º CC.
Formalidades: Art.156º CRegCivil
Depois da celebração do casamento é necessário realizar-se o processo liminar de
casamento e também a homologação do conservador. Há casos em que o casamento
não é homologado, por recusa do conservador (art.160º CRegCivil). Se ele não for
homologado, ele é inexistente (art.1628º (b) CC).
 Casamentos celebrados no estrangeiro, entre 2 portugueses ou 1 português com um 1
estrangeiro (art.161º a 163º CRegCivil). Art.51º/nº4 CC.
 Casamento de estrangeiros em Portugal (art.165º e 166º CRegCivil, art.51º/nº1
CC)

09.11.2022
INVALIDADE DO CASAMENTO

® Inexistência de casamento

Os casamentos inexistentes são os previstos no art.1628º: casamentos celebrados perante


quem não tinha competência funcional para o ato (al.a e b) ou que falte a declaração de vontade
dos nubentes ou de um deles (al.c e d).

Regime da inexistência

O casamento inexistente não produz efeitos- nem mesmo putativos-, e que a


inexistência do casamento pode ser invocada a todo o tempo, por qualquer interessado,
independentemente de declaração judicial (art.1630º). Assim, ao contrário do que acontece
com a anulabilidade do casamento (art.1632º), a inexistência pode ser reconhecida por sentença
em ação que não seja especialmente intentada para esse fim, pode ser invocada por via de
exceção e declarada oficiosamente pelo Tribunal. Se, porém, o casamento estiver registado e a
inexistência do casamento não resultar do próprio contexto do registo, o registo do casamento
não é inexistente (art.85º/nº1 (a) CRegCivil) e pode tornar-se necessária uma ação para ilidir a
prova resultante do registo (art.3º), ação que, não podendo ser de justificação administrativa,
pois o registo não é inexistente nem nulo (art.241º/nº1), terá de ser uma ação de processo
ordinário (art.233º/nº3 e 546º/nº2 CRegCivil), em que se peça a declaração de inexistência do
casamento e, acessoriamente, o cancelamento do registo (art.91º/nº1 (b) CRegCivil).

® Anulabilidade do casamento

Os casos de anulabilidade do casamento são exclusivamente os do art.1631º. São anuláveis:

a. Os casamentos contraídos com impedimento dirimente (falta de idade nupcial,


demência notória, interdição ou inabilitação por anomalia psíquica, casamento
anterior não dissolvido, parentesco na linha reta, parentesco no 2º grau da linha
colateral, afinidade na linha reta e condenação por homicídio);
b. Os casamentos celebrados com falta de vontade por parte de um ou de ambos os
nubentes (incapacidade acidental ou outra causa que determine a falta de

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consciência do ato, erro acerca da identidade física do outro contraente, coação


física e simulação);
c. Os casamentos em que tenha havido vicio da vontade juridicamente relevante (erro-
vício e coação moral);
d. Os casamentos celebrados sem a presença das testemunhas exigidas por lei .

Regime da anulabilidade

A anulabilidade não opera ipso iure (pela própria lei), não sendo invocável para
qualquer efeito, judicial ou extrajudicial, enquanto não for reconhecida por sentença em ação
especialmente intentada para esse fim (art.1632º). Sendo que a ação de anulação só pode ser
proposta por certas pessoas (art.1639º a 1642º) e dentro de certos prazos (art.1643º a 1646º),
considerando-se sanada a anulabilidade e válido o casamento em determinadas hipóteses.

Não há só um, mas vários regimes de anulabilidade. Pode dizer-se que há na lei 3
regimes diferentes de anulabilidade, consoante os interesses em vista dos quais a anulabilidade é
estatuída.

1. Há casos em que a lei prescreve a anulabilidade do casamento no interesse dos


cônjuges e das suas famílias e também no interesse público. São os casos de
CASAMENTO CONTRAÍDO COM IMPEDIMENTO DIRIMENTE.
 Legitimidade (muito ampla): a lei dá legitimidade, de modo geral, aos
cônjuges e aos seus parentes na linha reta ou até ao 4º grau da linha colateral,
herdeiros e adotantes e o MP.

Há, todavia, dentro desta ampla esfera de casos, ainda uma distinção a fazer:

a. Impedimentos dirimentes temporários - a lei admite que a anulabilidade seja


sanada e marca um curto prazo, em princípio, para a propositura da ação, ou não
permite que a anulação seja requerida depois de o motivo da anulabilidade ter
cessado. É o caso de casamento contraído com os impedimentos de falta de idade
nupcial, demência notória, interdição ou inabilitação por anomalia psíquica e
casamento anterior não dissolvido.
b. Impedimentos dirimentes permanentes – a lei não permite que a anulabilidade
seja sanada e esta pode ser arguida em prazo mais longo. São os casos de
casamento contraído com os impedimentos de parentesco ou afinidade na linha reta,
parentesco nº2 grau da linha colateral e condenação por homicídio.
2. A anulabilidade pode ser estatuída só no interesse público. É o caso do CASAMENTO
CELEBRADO SEM A PRESENÇA DE TESTEMUNHAS.
 Legitimidade: MP.
3. A anulabilidade é estatuída no interesse particular de um dos cônjuges. Ocorre nos
casos de INCAPACIDADE ACIDENTAL ou de outra causa que determina a FALTA
DE CONSCIÊNCIA DO ATO, ERRO SOBRE A IDENTIDADE FÍSICA do outro
cônjuge, COAÇÃO FÍSICA, ERRO-VÍCIO e COAÇÃO MORAL.
 Legitimidade: cônjuge enganado, coato ou cuja vontade faltou.
 Prazo: muito curto.

® Casamento putativo

Está regulado no art.1647º e 1648º. Em face do princípio da irretroatividade da


declaração de nulidade ou anulação (art.289º) ao casamento declarado nulo ou anulado não se

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deveriam atribuir quaisquer efeitos. Tudo seriam consequências desvantajosas, para os


cônjuges, para os filhos e até para terceiros. Suponhamos que um contrato em que um dos
cônjuges tivesse intervindo como administrador de bens comuns ou próprios do outro uma vez
declarado nulo ou anulado o casamento, tal intervenção passaria a ser irregular, o contrato não
produziria efeitos e os direitos do terceiro ficariam injustamente prejudicados. O instituto do
casamento putativo visa evitar estes inconvenientes. Em face de uma união conjugal que
interessa à sociedade fazer cessar, basta que ela cesse, não sendo necessário apagar os efeitos
jurídicos que produziu no passado, sendo certo que não podem apagar-se os efeitos que de
facto ela já produziu.

Pressupostos:

A produção de efeitos putativos depende de 3 pressupostos:

a. É necessária a existência do casamento. Se o casamento é inexistente, por se verificar


alguma das situações do art.1628º, não tem efeitos putativos (art.1630º/nº1);
b. É preciso que o casamento tenha sido declarado nulo ou anulado (art.1647º/nº1 e 3).
A invalidade do casamento não opera ipso iure (art.1632º) e, enquanto não for
reconhecida por sentença em ação especialmente intentada para esse fim, o casamento
não produz todos os seus efeitos;
c. É necessária a boa-fé dos cônjuges ou de algum deles. Esta boa-fé é necessária para
que o casamento produza efeitos em relação aos cônjuges ou que os efeitos favoráveis
ao cônjuge de boa-fé, e, reflexamente, produza efeitos em relação a terceiros. A eficácia
putativa em relação aos filhos não depende da boa-fé dos cônjuges, pois essa produz-se
ainda que ambos tenham contraído casamento de má-fé.
A lei presume a boa-fé dos cônjuges (art.1648º/nº3), a qual consiste, em princípio, na
ignorância desculpável do vício causador da nulidade ou anulabilidade
(art.1648º/nº1). A lei alarga mais um pouco este conceito, considerando igualmente de
boa-fé o cônjuge cujo consentimento tenha sido extorquido por coação. A boa-fé dos
cônjuges deve existir no momento da celebração do casamento (art.1647º), que dá
efeitos putativos ao casamento contraído de boa-fé. Pertencendo ao direito civil, uma
vez declarada a nulidade do casamento católico por Tribunal eclesiástico, regular
os efeitos da nulidade e a eventual aplicação do instituto do casamento putativo
(art.81º), é da exclusiva competência dos Tribunais do Estado o conhecimento
judicial da boa-fé (art.1648º/nº2).

Efeitos:

 Princípio geral

Os efeitos do casamento já produzidos mantêm-se para o futuro, até à data do trânsito


em julgado da sentença de anulação do casamento civil (art.1647º/nº1) ou até à do averbamento
da sentença do Tribunal Eclesiástico que declaro a nulidade do casamento católico
(art.1647º/nº3), mas não se produzem novos efeitos. Deste modo, a declaração de nulidade e a
anulação só operam ex nunc.

 Efeitos em relação aos cônjuges

Caso os cônjuges estavam ambos de boa-fé, o casamento produz todos os feitos entre
eles até à data da declaração de nulidade ou anulação (art.1647º/nº1). Exemplo: Se A,

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casado com B, faleceu, sendo B herdeiro de A, e depois o casamento entre A e B é declarado


nulo ou anulado, o efeito sucessório produzido mantém-se.

Caso só um dos cônjuges estava de boa-fé, o casamento inválido produz (em relação a
ambos os cônjuges) os efeitos que forem favoráveis, concretamente, ao cônjuge de boa-fé
(art.1647º/nº2). Exemplo: Se A, casado com B, faleceu, e B foi herdeiro de A, o efeito
sucessório mantém-se se B era o cônjuge de boa-fé; a convenção antinupcial terá efeitos se o
regime estipulado beneficiar o cônjuge de boa-fé (art.1716º).

Caso ambos os cônjuges estavam de má-fé, o casamento não tem eficácia putativa em
relação a eles.

 Efeitos em relação a terceiros

Caso ambos os cônjuges estavam de boa-fé, o casamento inválido produz todos os seus
efeitos, também em relação a terceiros, até ao transito em julgado da sentença de anulação do
casamento civil ou do averbamento da decisão do Tribunal eclesiástico que declarou a nulidade
do casamento (art.1647º/nº1 e 3).

Caso só um dos cônjuges estava de boa-fé, o art.1647º/nº2 faz ainda uma distinção.
Tratando-se de relações que, estabelecendo-se entre os próprios cônjuges, vão afetar terceiros
nos seus interesses, os respetivos efeitos produzem-se ou não conforme forem favoráveis ou
desfavoráveis ao cônjuge de boa-fé. Tratando-se de relações que se estabeleçam diretamente
entre cada um dos cônjuges e terceiros, mas que estejam dependentes do estado pessoal do
casado a solução é diversa. Aqui não se justificaria que fosse aqui decisiva a distinção entre boa
e má-fé, só se produzindo os efeitos favoráveis àquele. O terceiro não merece mais ou menos
proteção porque esteja de boa ou má-fé o cônjuge com quem contratou. Não se tratando aqui de
relações abrangidas pelo art.1647º/nº2 o princípio a aplicar deve ser o da invalidade, pelo que
o casamento não produz aqui quaisquer efeitos.

Caso ambos os cônjuges estejam de má-fé, o casamento não produz efeitos em relação a
estes e, por conseguinte, também não os produz em relação a terceiros.

CASAMENTO CATÓLICO

Consentimento

Segundo o cânone 1057º o que origina o matrimónio é o consentimento legitimamente


manifestado, um consentimento que “não pode ser suprido por qualquer poder humano”.

O cânone 1095º considera incapazes de contrair matrimónio por não poderem prestar
consentimento válido todos o que se encontrem em qualquer das 3 situações aí previstas:

 Os que carecem de suficiente uso da razão (nº1), o qual se presume a partir dos 7 anos
(cânone 97º)  Abrangem-se aqui tanto as doenças mentais que revestem carácter
permanente (exemplo: esquizofrenia), como, segundo alguns autores, as perturbações
mentais transitórias (exemplo: alcoólicos);
 Os que sofrem de grave defeito de discrição do juízo acerca dos direitos e deveres
essenciais do matrimónio, que se devem dar e receber mutuamente (nº2) 
Abrangem-se aqui as perturbações que retiram ao sujeito a capacidade crítica, ou seja, a

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capacidade para ponderar concretamente, na prática, o casamento que vai celebrar e as


obrigações inerentes ao mesmo;
 Os que por causas de natureza psíquica, não podem assumir as obrigações
essenciais do matrimónio (nº3)  Abrangem-se aqui as anomalias psíquicas ou
psicossexuais que não permitem assumir as “obrigações essenciais” do casamento, quer
o débito conjugal, quer da relação interpessoal que constitui objeto do consentimento
matrimonial.

Embora o direito canónico continue a integrar as anomalias psíquicas na matéria do


consentimento, não vendo nelas, como no direito civil, um impedimento matrimonial, a
consideração específica das “incapacidades” previstas no cânone 1095º constitui uma
significante mudança.

À semelhança do que acontece no direito civil, o direito canónico exige igualmente que o
consentimento para o casamento seja atual, pessoal, puro e simples, perfeito e livre.

Nos termos do cânone 1104º, é necessário que os contraentes se encontrem


simultaneamente presentes, por si mesmos ou por procurador, para contraírem validamente
matrimónio, devendo expressar o seu consentimento por palavras ou, se não puderem falar, por
sinais equivalentes. Os requisitos necessários para se celebrar validamente casamento por
procuração estão expressos no cânone 1105º, sendo que o direito canónico permite que
ambos os nubentes se façam representar na celebração do casamento.

O casamento contraído sob condição de um facto futuro não é válido (cânone 1102º/nº1),
mas o nº3 permite que se contraia casamento sob condição de um facto passado ou presente com
autorização escrita do Ordinário do lugar, sendo o casamento válido ou não conforme exista ou
não o objeto da condição (nº2).

Os casos de divergência entre a vontade e a declaração estão previstos no cânone 1101º o


qual no nº1 enuncia uma presunção de conformidade entre o consentimento interno da
vontade e as palavras ou sinais empregados. A divergência é, todavia, relevante e o
casamento inválido “se uma ou ambas as partes, por ato positivo da vontade, excluírem o
próprio matrimónio ou algum elemento essencial do matrimónio ou alguma propriedade
essencial” (nº2), bastando que uma das partes tenha tal vontade. Ao contrário do direito civil,
dá-se relevância à simulação parcial, permitindo que o casamento seja declarado nulo se uma ou
ambas as partes excluírem algumas das suas propriedades essenciais.

Nos cânones 1096º e ss referem-se aos vícios do consentimento.

No que respeita ao ERRO (cânone 1096ºss), o ERRO SOBRE A NATUREZA DO


CONTRATO revela, nos termos do cânone 1096º que “para haver consentimento matrimonial é
necessário que os cônjuges pelo menos não ignorem que o casamento é uma união permanente
entre um homem e uma mulher ordenada à procriação de filhos mediante alguma cooperação
sexual”. O casamento é inválido se qualquer dos cônjuges ignorava a natureza do
casamento, embora tal ignorância não se presuma depois da puberdade. O ERRO ACERCA
DA PESSOA torna inválido o matrimónio (cânone 1097º/nº1). O ERRO ACERCA DA
QUALIDADE DA PESSOA não o torna inválido, a não ser que direta e principalmente se
pretenda essa qualidade e não a pessoa (nº2). O ERRO SOBRE A UNIDADE, a
INDISSOLUBILIDADE ou a DIGNIDADE SACRAMENTAL DO CASAMENTO não vicia
necessariamente o consentimento matrimonial (cânone 1099º), assim como não exclui

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necessariamente este consentimento a certeza ou a opinião acerca da nulidade do matrimónio


(cânone 1100º).

Relativamente ao DOLO, este é fundamento de nulidade do casamento se estiver


preenchido o condicionalismo do cânone 1098º. Nestes termos, quem contrai matrimónio
enganado por dolo, perpetrado para obter o consentimento, acerca de uma qualidade da outra
parte que, por sua natureza, possa perturbar gravemente a comunhão de vida conjugal, contrai-o
invalidamente.

O cânone 1103º considera inválido o casamento celebrado por violência ou medo grave
incutido por uma causa externa, ainda que não dirigido a extorquir o consentimento, para se
libertar do qual alguém se veja obrigado a contrair matrimónio.

Capacidade

Antes de mais o casamento católico requer capacidade de direito canónico, não


podendo celebrar-se validamente se existir algum dos impedimentos dirimentes (cânones
1073º ss) e não houver dispensa do impedimento. Os impedimentos de direito canónico
podem ser de direito divino ou de direito eclesiástico (só os segundos sujeitos a dispensa),
dirimentes ou impedientes, absolutos ou relativos, perpétuos ou temporários, públicos ou
ocultos.

® Impedimentos dirimentes: falta de idade nupcial; impotência; vínculo matrimonial


anterior; disparidade de culto; ordens sacras; voto público perpétuo de castidade
emitido num instituto religioso; rapto; crime; consanguinidade; afinidade; honestidade
pública; parentesco legal (adoção).

Além de exigir a capacidade de direito canónico, o casamento católico requer ainda


capacidade de direito civil (art.1596º). Os impedimentos de direito civil (dirimentes e
impedientes) também são impedimentos ao casamento católico, o qual só pode ser celebrado
se for presente ao pároco um certificado passado pelo conservador e em que este declara
que não há, ou que não conhece, impedimentos civis à declaração de casamento católico
(art.1598º).

Mas se se celebrar casamento católico sem observância deste preceito e houver


impedimentos de direito civil? O casamento católico não pode ser anulado no foro civil
(art.1625º); o casamento não deveria ter-se celebrado se havia impedimentos civis, mas, se se
celebrou, os Tribunais civis não podem pronunciar-se sobre a sua validade ou invalidade.
Assim, o problema que se impõe ao Estado é apenas o de saber se deverá ou não permitir a
transcrição do casamento. Procurando-se conciliar os dois interesses da melhor forma, a lei
autoriza ou não a transcrição consoante a espécie de impedimento de que se trate. Desta
forma, só vão relevar os impedimentos dirimentes, que têm na sua base interesses públicos
fundamentais. Tudo isto quanto aos casamentos comuns.

Se o CASAMENTO CATÓLICO FOR URGENTE, então pode celebrar-se legalmente


mesmo sem processo preliminar e passagem do certificado e, por isso, a solução da lei é
diferente. Só nos casos de: falta de idade nupcial, interdição ou inabilitação por anomalia
psíquica e de casamento anterior não dissolvido, desde que o impedimento ainda persista, é que
o conservador pode recusar a transcrição do casamento católico urgente (art.174º/nº1 (d) e
(e) CRegCivil).

Formalidades preliminares e celebração do casamento

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1. O processo preliminar do casamento católico ocorre na conservatória do registo


civil. A declaração para casamento também pode ser prestada, sob a forma de
requerimento por si assinado, pelo pároco competente para a organização do processo
canónico, perante o qual se presume que os nubentes já manifestaram a sua vontade de
casar (art.135º/nº2 CRegCivil). O casamento católico não pode ser celebrado sem que
seja emitido certificado exigido pelo respetivo pároco passado pelo conservador e
em que este declare que os nubentes podem contrair casamento (art.146º e 151º). O
conservador deve passar certificado dentro do prazo de 1 dia a contar da data do
despacho final ou daquela em que os nubentes manifestaram a intenção de contrair
casamento católico (art.146º/nº1 e 2). O pároco que oficiar o casamento sem lhe ser
presente o certificado incorre em pena de desobediência qualificada (art.348º/nº2 CP) -
art.296º/nº1 (a) CRegCivil.
2. Quanto há celebração de casamento católico não há formalidades civis.

Registo do casamento: a transcrição

Logo após a celebração do casamento católico deve ser lavrado em duplicado o


respetivo assento paroquial, no livro de registo ou em arquivo eletrónico da paróquia (art.167º
CRegCivil). O assento e o duplicado devem ser assinados pelos cônjuges, pelas testemunhas e
pelo sacerdote que os tiver lavrado (art.168º/nº1).

O pároco deve enviar o duplicado do assento a qualquer conservatória do registo


civil nos 3 dias seguintes a fim de ser transcrito (art.169º/nº1 CRegCivil). Os efeitos da
transcrição só retroagem ao momento da celebração do casamento, mesmo em relação a
terceiros, se a transcrição for feita nos 7 dias imediatos à celebração (art.1670º/nº2 CC e
188º/nº2 CRegCivil). A obrigação de remessa do duplicado só não existe nos casos previstos no
art.170º (a) e (b) CRegCivil. Se o Ministro da Igreja, sem motivo grave e atendível, deixar de
enviar o duplicado do assento ou o enviar fora do prazo estabelecido, incorre em
responsabilidade penal- pena de desobediência qualificada (art.348º/nº2 CP, art.296º/nº1 (c)
CRegCivil).

O conservador deve fazer a transcrição do duplicado ou da certidão de assento


paroquial dentro do prazo de 1 dia, contado nos termos do art.172º/nº2 CRegCivil, e
comunicá-lo ao pároco até ao termo do dia imediato àquele em que foi feita (art.172º/nº1
CRegCivil). Na falta de remessa do duplicado ou da certidão de assento pelo pároco, a
transcrição pode ser feita a todo o tempo, em face de qualquer desses documentos, a
requerimento de algum interessado ou do MP (art.172º/nº3 CRegCivil). A transcrição pode ser
recusada nos casos previstos no art.174º/nº1. A transcrição recusada com base em
impedimento dirimente deve ser efetuada oficiosamente, ou por iniciativa de qualquer
interessado ou do MP, logo que cesse o impedimento que deu causa à recusa (art.175º
CRegCivil). No entanto, nem todos os impedimentos à celebração do casamento são
impedimentos à transcrição. E no caso dos casamentos urgentes temos de atender ao
art.174º/nº1 (e) CRegCivil.

O casamento católico já existe, mesmo antes da transcrição, na ordem jurídica civil,


que inclusivamente lhe atribui determinados efeitos (art.1601º (c)), mas só pode ser invocado
ou atendido e, portanto, só produzirá a plenitude dos seus efeitos (“efeitos de casamento”)
quando a transcrição se efetuar.

2 Casos particulares em que a lei introduziu desvios significativos:

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a. O casamento católico ter sido celebrado independentemente do processo preliminar


e sem que tenha sido passado o certificado de capacidade matrimonial dos nubentes.
Pode ocorrer nos casos de casamentos in articulo mortis, na iminência de parto
ou cuja celebração imediata seja expressamente autorizada pelo ordinário
próprio por grave motivo de ordem moral (art.1599º/nº1 CC) ou quando o
pároco celebra o casamento contra o disposto no art.151º/nº1 CRegCivil
embora incorrendo nas sanções do art.296º/nº1 (a) CRegCivil. Em todas estas
situações, a transcrição só pode fazer-se depois de correr o processo preliminar
de casamento (preliminar em relação à transcrição) (art.134ºss e art.173º
CRegCivil). Não é aqui necessária para a instauração do processo a declaração dos
nubentes, a qual é substituída pelo duplicado ou pela certidão do assento canónico
(art.173º/nº1).
b. Cônjuges que já estão ligados por casamento civil celebram casamento católico .
Não há aqui lugar a transcrição, mas ao simples averbamento do casamento
católico ao assento do casamento civil (art.53º/nº3 e 70º/nº1 (a) CRegCivil). O
averbamento é feito em face de duplicado ou certidão de assento paroquial, enviada
pelo pároco ou a requerimento dos interessados, independentemente do processo
preliminar de casamento (art.1589º/nº1 CC e 179º CRegCivil), e deve ser lançado
imediatamente (art.73º/nº4 CRegCivil). O casamento civil não é absorvido pelo
casamento católico, subsistindo, apesar da declaração de nulidade ou da dissolução
por dispensa deste.

Casamentos urgentes e “de consciência”

Casamentos católicos urgentes

O casamento católico urgente pode ser celebrado sem que seja exibido o certificado do
art.151º/nº1 CRegCivil perante o respetivo pároco nos casos de casamento in articulo mortis, na
iminência de parto ou cuja imediata celebração seja expressamente autorizada pelo ordinário
próprio por motivo de ordem moral (art.1599º CC e 151º/nº2 CRegCivil). Estes casamentos
urgentes podem ser celebrados independentemente de processo preliminar. No entanto, a
dispensa de processo preliminar não altera as exigências da lei civil quanto à capacidade
matrimonial dos nubentes.

Celebrado o casamento urgente, o pároco lavra, nos termos gerais, o assento paroquial,
de que deve enviar duplicado à conservatória. A transcrição, porém, não tem agora de ser feita
no prazo do art.172º/nº1, salvo se já tiver corrido o processo preliminar. Se não for esse o caso,
é preciso que corra primeiro o processo preliminar (que não foi realizado anteriormente à
cerimónia do casamento urgente, mas não é dispensado) substituindo-se a declaração dos
nubentes pelo duplicado ou pela certidão do assento canónico (art.173º). Só depois é que se faz
a transcrição, nos 2 dias seguintes ao despacho final do conservador (art.172º/nº2). Deve a
transcrição ser recusada nos casos previstos no art.174º/nº1 (e) CRegCivil.

Os casamentos católicos celebrados sem precedência do processo preliminar


consideram-se celebrados no regime da separação de bens (art.1720º/nº1 (a) CC).

Casamentos “de consciência” ou secretos

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É o caso das pessoas que viviam em união de facto, mas se supunha que eram casadas,
assim permite-se o seu casamento secreto para se evitar o escândalo que poderia resultar da
celebração pública do ato (art.170º (a) e 296º/nº2 CRegCivil).

Nulidade do casamento e nulidade da transcrição

A concordata de 2004 não contém preceito idêntico ao art.15º da concordata anterior e,


por isso, o Estado Português não está vinculado a reservar aos tribunais eclesiásticos a
apreciação e avaliação da validade ou nulidade dos casamentos católicos. Porém, o art.1625º
CC manteve-se em vigor, pelo que, se o preceito não for ou enquanto não for alterado, a
nulidade dos casamentos católicos só pode ser declarada pelos tribunais eclesiásticos.

Segundo o art.16º da Concordata de 2004, as decisões das autoridades eclesiásticas


relativas à nulidade do casamento católico, verificadas pelo órgão eclesiástico de controlo
superior, produzem efeitos civis, a requerimento de qualquer das partes, após a REVISÃO e
CONFIRMAÇÃO, nos termos do direito português, pelo competente Tribunal do Estado.
Caso contrário, o casamento católico, declarado nulo no foro eclesiástico, continua a ser válido
e plenamente eficaz na ordem civil, obstando à celebração de novo casamento por qualquer dos
cônjuges. Assim, é necessária a revisão e confirmação pelo Tribunal da Relação, que deve
verificar se estão preenchidas as condições enumeradas nas várias alíneas do art.980º
CRegCivil.

Ac. Tribunal da Relação de Évora (processo 1144/08-3): Revisão de sentença de


Tribunal Eclesiástico (meio processual). Decisão: “De resto, a invalidade do casamento é
expressamente admitida pela ordem jurídica nacional. Por todo o exposto, acorda-se, revista a
sentença do Tribunal Interdiocesano de …, que decretou a nulidade do castamente católico
celebrado entre a requerente e o requerido, em confirmá-la na ordem jurídica portuguesa para
produzir todos os seus efeitos”.

O direito canónico admite, porém, a CONVALIDAÇÃO do casamento católico,


segundo a qual o casamento inválido se torna válido e pode revestir 2 formas: convalidação
simples ou convalidação sanatio in radice (cânone 1156º a 1165º). A convalidação simples é a
forma ordinária de convalidação de casamento católico, consistindo numa renovação do
casamento, através de uma nova prestação do consentimento (cânone 1157º), o qual só tem
efeitos ex nunc, desde o momento da própria convalidação (art.170º (b) e 177º/nº2, 3 e 4
CRegCivil). Esta convalidação supõe que os cônjuges podem agora contrair matrimónio válido,
por ter cessado a causa da invalidade (um impedimento dirimente de carácter temporário).
Quando, logo após a celebração, se verifique a necessidade de convalidar o ato por esta forma, o
pároco não é obrigado a remeter à conservatória o duplicado do respetivo assento, basta-lhe
remeter o duplicado do assento paroquial da nova celebração. Se o casamento convalidado já
estava transcrito, o pároco deve enviar a qualquer conservatória do registo civil, no prazo de 5
dias, o duplicado do novo assento, a fim de ser transcrito, cancelando-se o 1º assento, mas sem
prejuízo dos direitos de terceiro. A sanatio in radice é uma forma extraordinária de
convalidação, é a que implica verdadeiramente uma ratificação do casamento inválido. É
dispensada a renovação do consentimento, aproveitando-se o consentimento prestado para o
consentimento inválido. É preciso estarem preenchidos 3 requisitos: (1) é preciso que se trate de
nulidade procedente de impedimento de direito eclesiástico ou de falta de forma; (2) que tenha
havido consentimento “naturalmente suficiente” para fazer surgir o casamento e que este se
mantenha por ambos os cônjuges; (3) tem de haver uma causa grave a justificar a sanatio.
Respeitados estes requisitos, esta poderá ser concedida pela Sé Apostólica ou pelo Bispo da

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diocese (cânone 1165º). A sanatio in radice do casamento católico nulo, mas transcrito, é
averbada ao respetivo assento, mediante comunicação do pároco (art.70º/nº1 (d) e 177º/nº1
CRegCivil).

Quanto à valida ou nulidade da transcrição, já os Tribunais civis podem pronunciar-


se. Nos termos do art.87º (d) CRegCivil, o registo é nulo quando, tratando-se da transcrição
de casamento católico, tenha sido lavrado com infração do art.174º/nº1 (d) e (e).

16.11.2022
OS EFEITOS DO CASAMENTO

 Efeitos pessoais

O casamento constitui a família, impõe aos cônjuges um conjunto de deveres e tem


efeitos sobre o seu nome e nacionalidade.

A matéria está regulada nos art.1671º a 1689º CC, sendo que estas disposições gerais não
regulam apenas os efeitos pessoais do casamento, mas também o regime ou estatuto
matrimonial “primário”, ou seja, os efeitos patrimoniais do casamento independentes do regime
de bens: administração de bens dos cônjuges, poderes dos cônjuges sobre os bens que integram
as várias massas patrimoniais, partilha do casal.

Princípios fundamentais: igualdade dos cônjuges e direção conjunta da família

O art.1671º enuncia dos 2 princípios fundamentais por que se rege a matéria dos
efeitos pessoais do casamento: o princípio da igualdade dos direitos e deveres dos cônjuges
(nº1) e, em correlação, o da direção conjunta da família (nº2).

No que se refere ao princípio da igualdade dos cônjuges é um dos princípios


constitucionais do direito da família. O art.36º/nº3 CRP estabelece que “os cônjuges têm
iguais direitos e deveres quanto à capacidade civil e política e à manutenção e educação dos
filhos”, usando uma formulação redutora, mas esta não obsta a que o princípio se aplique a
outros aspetos não compreendidos na letra da disposição (responsabilidade por dívidas,
administração dos bens dos filhos). O art.36º/nº3 CRP é um corolário do princípio geral do
art.13º/nº2 CRP que proíbe qualquer discriminação em razão do sexo. O homem e a mulher
são iguais perante a lei (art.13º/nº2) e não deixam de o ser pelo facto de serem casados um com
o outro. A igualdade dos cônjuges está inscrita na Declaração Universal dos Direitos do
Homem (art.16º) e na Convenção Europeu dos Direitos do Homem (art.12º). Claro que num
sistema de igualdade surgem dificuldades provocadas pelo eventual desacordo dos cônjuges,
mas estes devem resolver eles próprios os seus diferendos. E a coesão da família nunca poderá
assentar na autoridade de um dos cônjuges sobre o outro, mas só no seu acordo. As únicas
desigualdades que naturalmente subsistem são as que se fundam na natureza biológica da
mulher.

O princípio da direção conjunta da família (art.1671º/nº2) é um corolário do da


igualdade dos cônjuges. Se os cônjuges são iguais, a direção da família deve pertencer aos
dois e não exclusivamente a um deles. Este princípio trata-se de um conceito imperativo. A
direção da família pertence a ambos os cônjuges, pelo seria nulo o contrato em que estes
acordassem em que essa direção ficasse a pertencer a um deles. A lei impõe aos cônjuges o

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dever de “acordar sobre a orientação da vida em comum tendo em conta o bem da família
e os interesses de um e outro”. Trata-se de um dever pessoal dos cônjuges, a acrescer aos 5
deveres referidos no art.1672º. Claro que os cônjuges podem não chegar a um acordo sobre
certo ato ou assunto da vida conjugal comum, mas devem ter disponibilidade para procurarem
um acordo. Violaria este dever o cônjuge que quisesse decidir por si em assuntos da vida
matrimonial, recusando deliberadamente qualquer disposição para chegar a acordo com o outro.
O objeto do acordo deve versar sobre a orientação da vida em comum e só sobre ela e o poder
de executar a orientação acordada pertence a qualquer dos cônjuges. Note-se que a lei apenas
obriga os cônjuges a acordar sobre a orientação da vida em comum, nomeadamente, a repartição
dos recursos e o decurso da vida, a residência de família, o planeamento familiar, a repartição de
funções, etc. Mas fica fora da vida pessoal, a vida privada do marido e da mulher. Pode
assim cada um dos cônjuges, sem ter de ouvir o outro, vestir-se ou pentear-se como quiser,
escolher os seus amigos, professar a sua religião, etc. O casamento não limita os direitos de
personalidade dos cônjuges, salvo o direito à liberdade sexual, pois cada um está obrigado em
face do outro ao “débito conjugal”, assim como a não ter relações sexuais com terceiros. Neste
quadro também se integra o art.1677ºD, segundo o qual cada um dos cônjuges pode exercer
qualquer profissão ou atividade sem o consentimento do outro. Pode também cada um dos
cônjuges exercer a atividade que quiser. O termo abrange qualquer espécie de atividade:
económica, cívica, política, cultural, social, religiosa, desportiva, etc.

Sendo estes os princípios, é de notar que eles têm de se conciliar com o dever de os
cônjuges acordarem sobre a orientação da vida em comum, tendo em conta o bem da
família e os interesses de um ou outro (art.1671º/nº2). O exercício por um dos cônjuges, sem o
acordo do outro, de profissão pouco decorosa ou de atividade muito perigosa, assim como a
assunção de compromissos que impliquem proselitismo excessivo ou grande empenhamento e
disponibilidade de tempo, podem configurar, nas circunstâncias do caso e tendo em conta a
personalidade e a suscetibilidade do outro cônjuge, uma violação grave dos deveres de
cooperação ou de respeito, e contribuir decisivamente para a rutura da vida conjugal.
Cada um dos cônjuges é livre, em princípio, de exercer a profissão ou atividade que quiser, mas
quando se proponha exercer certa profissão ou atividade não deve esquecer de que não é só.

A igualdade tem o seu preço, pois os cônjuges podem estar em desacordo sobre a
orientação da vida familiar e, não cabendo a decisão a qualquer deles, há que saber como se
resolve o diferendo. É necessário saber se o juiz deve intervir e em que termos. Em princípio, o
nosso direito recusa a intervenção judicial. No âmbito das relações pessoais entre os cônjuges
apenas em 3 casos é que a lei permite que o conflito entre os cônjuges seja decidido pelo
Tribunal: nos casos de desacordo sobre a fixação ou alteração da residência de família
(art.1673º/nº3); sobre o nome próprio ou os apelidos dos filhos (art.1875º/nº2) e sobre
questões de particular importância relativas ao exercício das responsabilidades parentais
(art.1901º/nº2). São casos em que é especialmente necessária ou urgente a solução do conflito.
À parte estes casos, o desacordo deve ser resolvido dentro da família, pelos próprios cônjuges.
O direito recusa-se a intervir e faz apelo ao sentido de responsabilidade dos cônjuges e à sua
capacidade de autorregulamentação da família.

Deveres dos cônjuges

Nos termos do art.1672ºCC, os cônjuges estão reciprocamente vinculados pelos


deveres de respeito, fidelidade, coabitação, cooperação e assistência. Trata-se de deveres
recíprocos, como o exige o princípio da igualdade dos cônjuges. A violação destes deveres não

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é causa de divórcio, a violação não vale por si mesma. Sabendo que o cumprimento dos deveres
referidos corresponde ao que se espera de uma “plena comunhão de vida”, a verificação de
incumprimentos importantes dos deveres conjugais (art.1781º (a) a (c)) faz acreditar, segundo a
lei, que o vínculo matrimonial se rompeu. Segundo a al.d, a prova de quaisquer factos que
constituem violações graves no quadro dos deveres conjugais, com uma intensidade ou uma
repetição grave, pode convencer o Tribunal de que o projeto de vida em comum está
definitivamente terminado. É a rutura que justifica a dissolução formal do casamento. A rutura
definitiva do vínculo deve apresentar-se como objetiva, a justificar plenamente o regime de
legitimidade ativa previsto no art.1785º/nº1: qualquer dos cônjuges pode pedir o divórcio.

Pode haver deveres conjugais explícitos na enumeração do art.1672º, mas também


implícitos (ex. o dever de sinceridade cabe no dever de respeito).

® Dever de respeito:
Só são violações do dever de respeito atos ou comportamentos que não constituam
violações diretas de qualquer dos outros deveres mencionados no art.1672º. O dever de
respeito é um dever ao mesmo tempo negativo e positivo. Como dever negativo ele é o
dever que incumbe a cada um dos cônjuges de não ofender a integridade física ou
moral do outro, compreendendo-se na “integridade moral” todos os bens ou valores da
personalidade cuja violação constituía “injúria”: a honra, a consideração social, o amor
próprio, a sensibilidade e ainda a suscetibilidade pessoal. Em segundo logo, é ainda o
dever de cada um dos cônjuges não se conduzir na vida de forma indigna, desonrosa e
que o faça desmerecer no conceito público, estando aqui em causa as “injúrias
indiretas”. Embora não dirigidas ao outro cônjuge, a relevância destas injurias funda-se
na ideia de que o casal é uma “unidade moral”, de tal forma que a honra, a dignidade e
a reputação de um dos cônjuges são ao mesmo tempo a dignidade, a honra e a
reputação do outro. Se um dos cônjuges se embriagar ou se drogar com frequência, ou
cometer crime infamante, está a violar o seu dever de respeito ao outro cônjuge.
® Dever de fidelidade
Trata-se de um puro dever negativo. O dever de fidelidade obriga cada um dos
cônjuges a não ter relações sexuais consumadas (cópula e ainda o coito anal e oral)
com outra pessoa que não seja o seu cônjuge. O adultério supõe ainda um elemento
subjetivo, a intenção ou, pelo menos, a consciência de violar o dever de fidelidade.
Assim, não haverá violação deste dever se o cônjuge que teve relações com terceiro só
o fez, por exemplo, por erro ou sob coação. Por outro lado, também a tentativa de
adultério constitui violações deste dever. E independentemente da prática de relações
sexuais, consumadas ou tentadas, são ainda violações a conduta licenciosa ou
desregrada de um dos cônjuges nas suas relações com terceiro, a ligação
sentimental e a correspondência amorosa que mantém com ele, etc.
® Dever de coabitação
“Coabitar” não quer dizer apenas habitar conjuntamente, na mesma casa, ou viver em
economia comum, mas viver em comunhão de leito, mesa e habitação.
a. Comunhão de leito: o casamento obriga os cônjuges ao “débito conjugal”, sendo
que o casamento implica uma limitação lícita do direito à liberdade sexual, no
duplo sentido de que a pessoa casada fica obrigada a ter relações sexuais com o
seu cônjuge e a não ter essas relações com terceiros. A recusa constitui violação
do dever de coabitação, se não for justificada por impotência, doença de um ou
outro dos cônjuges, etc.

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b. Comunhão de mesa: os cônjuges viverem em economia comum.


c. Comunhão de habitação: de acordo com o princípio da igualdade dos cônjuges,
são estes que devem escolher de comum acordo (expresso ou tácito) a residência
de família, ou seja, a terra e o local onde vão viver, devendo, nos termos da lei,
atender às exigências da sua vida profissional, ao interesse dos filhos e à
salvaguarda da unidade da vida familiar (art.1673º/nº1). Escolhida a residência da
família, ambos os cônjuges têm obrigação de viver aí, salvo motivos
ponderosos em contrário (art.1673º/nº2) - ex. exigências profissionais. Não
haverá separação de facto dos cônjuges, para o efeito do art.1781º (a), se ambos
tiverem o propósito de restabelecer a comunhão de vida quando isso for possível
(art.1782º/nº1). O acordo sobre a residência não pode ser revogado
unilateralmente por qualquer dos cônjuges, pois esta requer igualmente acordo
dos dois (art.1673º/nº3). Não havendo acordo, a lei permite, excecionalmente,
que qualquer dos cônjuges requeira a intervenção judicial para solução do
diferendo (art.991º CPC). O cônjuge que pretenda a fixação judicial da residência
da família ou a respetiva alteração deve oferecer com a petição inicial e prova de
factos que justifiquem a fixação da residência em certo lugar ou a alteração da
residência. Sendo que o outro cônjuge é citado para se pronunciar, oferecendo
igualmente as provas que entender. Por fim, o juiz decide tendo em conta os
critérios do art.1673º/nº1.
® Dever de cooperação: importa para os cônjuges a obrigação de socorro e auxílio
mútuos e a de assumirem em conjunto as responsabilidades inerentes à vida da
família que fundaram (art.1674º). Assim, a lei obriga os cônjuges a ampararem-se
mutuamente nas horas boas e más, na felicidade como na provação. E obriga-os a
assumirem em conjunto as responsabilidades inerentes à vida em família.
® Dever de assistência: compreende a obrigação de prestação de alimentos e a de
contribuição para os encargos da vida familiar.
a. Obrigação de prestação de alimentos: a primeira destas obrigações só tem
autonomia em face da segunda quando os cônjuges vivem separados, de direito
ou só de facto. Se vivem juntos, o “dever de prestação de alimentos” toma a
forma de “dever de contribuição para os encargos da vida familiar”. No caso
de separação de pessoas e bens, judicial ou administrativa, e de simples separação
de facto, não existe “vida familiar” e não tem sentido falar na obrigação de
contribuir para os respetivos encargos, mas a lei, em certas condições, obriga cada
um dos cônjuges a prestar alimentos ao outro. O dever de alimentos no caso de
separação de pessoas e bens está regulado no art.2016º. O regime da obrigação de
alimentos no caso de separação de facto dos cônjuges está previsto no art.1675º.
Relativamente ao facto de saber a quem incumbe a obrigação de prestação de
alimentos, o art.1675º assenta no apuramento do cônjuge culpado ou principal
culpado na separação, ou na verificação da equivalência das respetivas culpas,
fazendo assim persistir no direito português a relevância da culpa. A obrigação de
direitos entre os cônjuges está sujeita ao princípio geral do art.2004º.
b. Obrigação de contribuir para os encargos da vida familiar:
nos termos do art.1676º o dever de contribuição para os encargos da vida familiar
incumbe a ambos os cônjuges nos mesmos termos e pode ser cumprido por
qualquer deles de 2 formas: pela afetação dos seus recursos (rendimentos e
proventos) e através do trabalho despendido no lar ou na manutenção e

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educação dos filhos. A violação grave ou reiterada do dever de contribuir para os


encargos da vida familiar é um sinal de rutura do casamento para efeitos do
art.1781º (d).

Nome e nacionalidade

Nome

Os efeitos do casamento quanto aos apelidos dos cônjuges estão regulados no art.1677º
a 1677ºC.

A regra fundamental é a do art.1677º, segundo a qual cada um dos cônjuges


conserva os seus próprios apelidos, mas pode acrescentar-lhes apelidos do outro, até ao
máximo de 2. O casamento não faz perder os apelidos de qualquer dos cônjuges e nenhum
deles tem obrigação de juntar apelidos do outro cônjuge aos seus, podendo inclusive renunciar
em qualquer momento aos apelidos adotados (art.104º/nº2 (d) CRegCivil).

A faculdade de cada um dos cônjuges acrescentar os apelidos do outro costuma ser


exercida na ocasião do casamento, mas a lei permite que o seja mais tarde. A pretensão deve ser
formulada em requerimento dirigido ao funcionário da conservatória detentora do assento
de nascimento do cônjuge, ao qual é averbada a alteração dos apelidos (art.69º/nº1 (m)).

Exemplo: Maria Alves casa com João Monteiro. Os cônjuges podem: (1) manter os seus
apelidos sem qualquer alteração decorrente do casamento; (2) pode a mulher acrescentar ao
seu o apelido Monteiro; (3) pode o homem acrescentar o apelido Alves; (4) pode a mulher
juntar ao seu o apelido do marido e este intercalar no seu nome o apelido dela, ficando a ser
Alves Monteiro o nome do casal; (5) pode o marido acrescentar ao seu o apelido da mulher e
esta intercalar no seu nome o do marido, ficando os cônjuges a chamar-se os 2 Monteiro Alves;
(6) cada um dos cônjuges pode acrescentar ao seu o apelido do outro, ficando a ser Maria
Alves Monteiro e João Monteiro Alves.

O cônjuge que tenha adotado apelidos do outro conserva-os em caso de viuvez e


mesmo depois de segundas núpcias, se o declarar até à celebração do novo casamento
(art.1677ºA), não podendo neste caso acrescentar apelidos do segundo cônjuge
(art.1677º/nº2). Se contrair segundas núpcias e não fizer a referida declaração até à data em que
as contrair, o viúvo/a perde os apelidos do primeiro cônjuge, que tenha adotado (art.1677ºA, 2ª
parte, a contrário) podendo então acrescentar apelidos do segundo cônjuge aos seus
(art.1677º/nº1).

O caso de separação de pessoas e bens está previsto no art.1677ºB/nº1, segundo o


qual, decretada a separação, e tal como no caso de viuvez, cada um dos cônjuges conserva os
apelidos do outro que porventura tenha adotado. Nada o impede, porém, de renunciar aos
apelidos do outro cônjuge (art.104º/nº2 (d) CRegCivil).

Regime diferente ocorre no caso de divórcio, em que, em princípio, cada um dos


cônjuges perde os apelidos do outro que tenha adotado. Nos termos do art.1677ºB/nº1,
2ªparte pode, todavia, conservá-los se o ex-cônjuge der o seu consentimento, por algum dos
modos no nº2, ou for autorizado a usá-los tendo em atenção os motivos invocados. Se
conservar os apelidos do ex-cônjuge e passar a segundas núpcias, não pode acrescentar-lhes
apelidos do novo cônjuge (art.1677º/nº2).

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O pedido de autorização de uso dos apelidos do ex-cônjuge pode ser deduzido no


processo de divórcio, mas também o pode ser, em processo próprio, mesmo depois de o
divórcio ter sido decretado (art.1677ºB/nº3). Se for deduzido conjuntamente com o de divórcio
(art.470º/nº1 CPC), o pedido de autorização de uso dos apelidos do ex-cônjuge é processado
como incidente da ação, valendo a mesma solução se o pedido for formulado na pendencia da
ação de divorcio. Em qualquer dos casos, a autorização é concedida pelo Tribunal (art.5º/nº2
Decreto-lei nº272/2001, de 13 outubro). Só quando o pedido é deduzido em processo
próprio, depois de o divorcio ter sido decretado é que segue os termos do “procedimento
tendente á formação de acordo das partes” (art.5º a 10º Decreto-lei nº272/2001, de 13 de
outubro) e que pode ser instaurado em qualquer conservatória do registo civil (art.6º/nº1).

O pedido, com a indicação dos motivos que o justifiquem, é deduzido em requerimento


ao conservador do registo civil e o requerido é citado para contestar, querendo, no prazo de 15
dias. Não havendo oposição e devendo considerar-se confessados os factos invocados pelo
requerente, o conservador declara a procedência do pedido; se o requerido deduzir
oposição marca tentativa de conciliação a realizar no prazo de 15 dias. Se a tentativa de
conciliação não resultar, as partes são notificadas para alegarem e requererem a produção de
novos meios de prova, nos 8 dias seguintes, e o processo é enviado ao Tribunal.

Falecido um dos cônjuges ou decretada a separação de pessoas e bens ou o


divorcio, o cônjuge que conserve apelidos do outro pode ser privado do direito de os usar
quando esse uso lese gravemente os interesses morais do outro cônjuge ou da sua família
(art.1677ºC/nº1). O pedido de privação do uso do nome pode ser deduzido, no caso de
divorcio ou separação de pessoas e bens, litigiosos ou por mútuo consentimento, pelo outro
cônjuge ou ex-cônjuge e, no caso de viuvez, pelos descendentes, ascendentes ou irmãos do
cônjuge falecido (art.1677ºC/nº2).

Nacionalidade

Art.3º e 8º da Lei da Nacionalidade e art.14º do respetivo Regulamento. Assim, o


estrangeiro casado há mais de 3 anos com nacional português pode adquirir a nacionalidade
portuguesa mediante declaração feita na constância do casamento (art.3º/nº1 da Lei da
Nacionalidade). Nos termos do nº2 a declaração de nulidade ou a anulação do casamento não
prejudica a nacionalidade adquirida pelo cônjuge que o tenha contraído de boa-fé. Nos termos
do art.8º, o português que case com nacional de outro estado não perde por esse facto a
nacionalidade portuguesa, salvo se, tendo adquirido pelo casamento a nacionalidade do seu
cônjuge, declarar que não quer ser português. As mencionadas declarações devem ser
registadas na Conservatória dos Registos Centrais (art.16º e 18º) e averbadas ao assento de
nascimento do interessado (art.19º). A mulher que tenha perdido a nacionalidade portuguesa por
efeito do casamento poderá readquiri-la mediante declaração (art.30º).

23.11.2022
 Efeitos patrimoniais

Efeitos patrimoniais do casamento independentes do regime de bens

 Administração dos bens dos cônjuges

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Os bens do casal são “bens comuns”, supondo um regime específico para a sua
administração, porque não há regras gerais de direito civil sobre o assunto. Por outro lado,
mesmo quando os bens pertencem a um ou a outro cônjuge, as circunstâncias de grande
proximidade em que eles vivem - “a comunhão de vida” - recomendam que um dos cônjuges
tenha poderes de administração sobre os bens do outro, ou tenha poderes exclusivos sobre bens
que são dos dois.

As regras sobre administração dos bens do casal são imperativas (art.1699º/nº1 (c)). Esta
imperatividade não exclui que um cônjuge ceda ao outro todos ou em parte dos seus poderes
sobre bens próprios ou bens comuns, desde que o faça por mandato, que é livremente revogável
(art.1678º/nº2 (g) e 1170º/nº1).

O art.1678º enuncia as regras gerais de administração dos bens do casal, importando


distinguir entre a administração de bens próprios e de bens comuns.

i. Quanto aos BENS PRÓPRIOS cada cônjuge administra os seus próprios bens
(art.1678º/nº1). No entanto, existem algumas exceções a esta regra nos termos do
nº2, sendo que um dos cônjuges pode administrar bens do outro:
a. Quando se trate de móveis que, embora pertencentes ao outro cônjuge, são
exclusivamente utilizados como instrumento de trabalho pelo cônjuge
administrador (al. e);
b. No caso de ausência ou impedimento do outro cônjuge (al. f);
c. Quando o outro lhe confira, por mandato revogável, poderes de administração
(al. g).
ii. Quanto aos BENS COMUNS temos a regra de administração conjunta
(art.1678º/nº3, 2ª parte): ambos os cônjuges são administradores do património
comum. Constitui exceção a este princípio a concessão de poderes de
administração ordinária a qualquer dos cônjuges (art.1678º/nº3, 1ª parte).
Constituem também desvios àquela regra os casos dos bens que, embora comuns,
devem ser administrados por um dos cônjuges, quer porque têm uma ligação
privilegiada com esse cônjuge, quer porque o outro esteja ausente ou impedido de
os administrar ou tenha conferido àquele, por mandato revogável, poderes de
administração. Assim, e embora se trate de bens comuns, o nº2 do art.1678º
atribui a cada um dos cônjuges a administração exclusiva:
a. Dos proventos que receba pelo seu trabalho (al. a), embora os bens sejam
comuns por força do regime que vigora no casamento (art.1724º (a) e 1734º);
b. Dos seus direitos de autor (al. b), tratando-se de direitos patrimoniais de autor,
pois os direitos pessoais de autor são incomunicáveis, como “direitos
estritamente pessoais” e administrados pelo titular (art.1733º/nº1 (c));
c. Dos bens comuns que levou para o casal ou adquiriu depois do casamento a
título gratuito e dos sub-rogados em lugar deles (al. c);
d. Dos bens que tenham sido doados ou deixados a ambos os cônjuges com
exclusão da administração do outro cônjuge, salvo se se tratar de bens doados
ou deixados por conta da legitimidade desse outro cônjuge (al. d);
e. Dos bens moveis comuns por ele exclusivamente utilizados como instrumentos
de trabalho (al. e);
f. De todos os bens do casal, se o outro cônjuge se encontrar ausente ou impedido
de administrar (al. f). O texto da lei refere-se apenas aos bens próprios do outro

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cônjuge, mas deve permitir-se igualmente, por maioria de razão, a


administração exclusiva dos bens comuns;
g. De todos os bens do casal ou de parte deles, se o outro cônjuge lhe conferir, por
mandato revogável, esse poder (al. g). Esta alínea trata só dos bens próprios do
outro cônjuge, mas deve admitir-se, por maioria de razão, que um cônjuge
confira ao outro, por mandato revogável, os seus poderes de administração
sobre bens comuns.

 Especialidades da administração dos bens do casal: poderes do cônjuge administrador.


Responsabilidade pela administração

Os poderes do cônjuge administrador vão além da mera administração (art.1682º/nº2),


abrangendo poderes de disposição dos moveis comuns ou próprios do cônjuge administrador.

No que toca à responsabilidade pelo exercício da administração a lei distingue vários


tipos de situações que merecem tratamentos específicos.

Nos casos em que o cônjuge tem o poder, por força da lei, de administrar bens que não
são seus- art.1678º/nº2 (a) a (f)- o administrador não é obrigado a prestar contas da sua
administração e só responde pelos atos intencionalmente praticados em prejuízo do casal ou do
outro cônjuge (art.1681º/nº1). Nos outros casos, o administrador de bens comuns ou bens
próprios do outro cônjuge é obrigado a prestar constas da administração, por aplicação das
regras do mandato (art.1681º/nº2 e 3 e art.1161 (d)). No entanto, o administrador só é
obrigado a prestar contas e a entregar o saldo dos últimos 5 anos.

Por outro lado, o administrador responde pelos atos e pelas omissões nos termos em que o
mandatário responde. E responde mesmo como um possuidor de má-fé, no caso da parte final
do art.1681º/nº3, ou seja, responde pela perda da coisa mesmo que tenha agido sem culpa
(art.1269º), deve restituir os frutos que não colheu, mas que um proprietário diligente poderia
ter obtido (art.1271º) e perde, em qualquer caso, as benfeitorias voluptuárias que tenha feito
(art.1275º/nº2).

No caso de se pedir responsabilidades a um cônjuge administrador, vai ser necessário


decidir se o crédito de indemnização é próprio ou comum. Se o dano indemnizado for um dano
num bem próprio, o crédito será incomunicável por força da lei (art.1733º/nº1 (d)).

 Poderes do cônjuge não administrador

O cônjuge que não tem a administração dos bens não está inibido de tomar providencias a
ela respeitantes, se o outro se encontrar, por qualquer causa, impossibilitado de o fazer, e do
retardamento das providencias poderem resultar prejuízos (art.1679º). Visam-se aqui apenas os
casos de impossibilidades temporárias, ficando o cônjuge não administrador com poderes de
administração, mas só para o efeito de poder requerer as providencias necessárias.

Ilegitimidades conjugais

 Ilegitimidades conjugais nos regimes de comunhão

Cada um dos cônjuges NÃO PODE, SEM O CONSENTIMENTO do outro:

(a) alienar bens imoveis, próprios ou comuns (art.1682ºA/nº1 (a));

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(b) onerar bens imoveis, próprios ou comuns, através da constituição de direitos reais de
gozo ou de garantia, e ainda dar de arrendamento esses bens ou constituir sobre eles outros
direitos pessoais de gozo (art.1682ºA/nº1 (a));

(c) alienar o estabelecimento comercial, próprio ou comum (art.1682ºA/nº1 (b));

(d) onerar ou locar o estabelecimento comercial próprio ou comum (art.1682ºA/nº1 (b));

(e) alienar a casa de morada de família (art.1682ºA/nº2);

(f) onerar a casa de morada de família através da constituição de direitos reais de gozo ou
de garantia, e ainda dá-la de arrendamento ou constituir sobre ela outros direitos pessoais de
gozo (art.1682ºA/nº2);

(g) dispor do direito ao arrendamento da casa de morada de família (art.1682ºB);

(h) alienar os móveis, próprios ou comuns, utilizados conjuntamente pelos cônjuges na


vida do lar (art.1682º/nº3 (a). Valerá aqui o conceito de recheio da casa definido pelo
art.2103ºC, ou seja, a lei quer aqui proteger a integridade do recheio, isto é, do conjunto de
todos os bens moveis que se encontrem afetados à fruição normal da habitação, moveis cuja
falta se faria sentir por tornarem a habitação diferente do que costuma ser.

(i) alienar os moveis, próprios ou comuns, utilizados conjuntamente pelos cônjuges como
instrumento comum de trabalho (art.1682º/nº3 (a)).

(j) alienar os seus bens moveis e móveis comuns, se não for ele a administrá-los
(art.1682º/nº2 e 3 (b));

(k) repudiar heranças ou legados (art.1683º/nº2). Salvo as exceções, a herança ou legado


constituem um benefício. O repúdio por um dos cônjuges significaria uma perda
patrimonial equivalente a qualquer outra perda económica. E ambos os cônjuges são
interessados, quer o bem se integre no património comum (art.1732º), quer se integre no
património do cônjuge chamado (1722º/nº1 (b)). Neste caso, o cônjuge do chamado
participará em metade dos frutos dos bens (art.1728º/nº1 e 1733º/nº2).

 Ilegitimidades conjugais no regime da separação

Aqui, as ilegitimidades conjugais têm muita menor amplitude, pois são aqui restritas à
prática dos atos mencionados nas anteriores alíneas e, f, g, h, i, j. Sendo que a prática dos
restantes atos é permitida a qualquer dos cônjuges.

CONSENTIMENTO CONJUGAL

O consentimento conjugal para a prática dos atos que dele legalmente carecem deve ser
especial para cada um desses atos (art.1684º/nº1). A lei pretende que o cônjuge que dá o
consentimento pondere e reflita sobre a oportunidade de cada ato. O que não obsta a que o
consentimento possa ser expresso ou tácito.

O consentimento está sujeito à forma exigida para a procuração (art.1684º/nº2), ou


seja, à forma exigida para o respetivo negócio (art.262º/nº2). Assim, o consentimento para a
constituição de direitos reais sobre imóveis deveria ser prestado por escritura pública.

A autorização do cônjuge pode ser revogada quando o ato para que foi concedida não
estiver começado, mas se tiver tido começo a execução, o cônjuge só a poderá revogar

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reparando qualquer prejuízo de terceiro resultante da revogação. Relativamente à forma da


revogação a lei é omissa, mas aplicamos o estabelecido para a forma do consentimento
(art.1684º/nº2 e 117º CNot).

O efeito da autorização é o de validar os atos que o outro cônjuge praticar, no caso


de este não ter legitimidade para eles. Quando o outro cônjuge já tinha legitimidade para
praticar o ato p efeito aqui é o de responsabilizar o cônjuge que a concede.

O art.1684º/nº3 prevê a possibilidade de suprimento do consentimento, quando um


cônjuge não tem legitimidade para praticar sozinho, validamente, um ato jurídico que lhe pareça
necessário ou conveniente. O suprimento é admitido não só no caso de impossibilidade como
também no caso de injusta recusa. O art.1000º e 1001º CPC regulam o processo especial de
suprimento do consentimento, sendo da competência para o suprimento quando a causa de pedir
é a incapacidade ou a ausência da pessoa do MP. Cabe ao autor não só a prova da recusa ou da
impossibilidade, mas também a da vantagem ou da necessidade da realização do ato.

Relativamente às SANÇÕES a aplicar o art.1687º|nº1 estabelece que, os atos


praticados contra o disposto nos nº 1 e 3 do artigo 1682º, nos artigos 1682º-A e 1682º-B e no nº
2 do artigo 1683º são ANULÁVEIS. Quanto ao regime de anulabilidade, nos termos do
art.1687º a anulação pode ser pedida pelo cônjuge que não deu o seu consentimento ou seus
herdeiros, nos 6 meses subsequentes à data em que o requerente teve conhecimento do ato,
mas nunca depois de decorridos 3 anos sobre a sua celebração. A anulabilidade é sanável
mediante confirmação nos termos gerais (art.288º), podendo ser expressa ou tácita. O nº3 do
art.1687º procura assegurar proteção ao adquirente de boa-fé nos casos de anulabilidade, mas
apenas relativamente aos bens moveis não sujeitos a registo, ou seja, moveis de baixo valor e
sujeitos a transações mais frequentes. O nº4 estabelece que “À alienação ou oneração de bens
próprios do outro cônjuge, feita sem legitimidade, são aplicáveis as regras relativas à alienação
de coisa alheia”, ou seja, o regime da NULIDADE.

Poderes dos cônjuges relativamente aos bens que integram as várias massas patrimoniais

® Poderes de disposição inter vivos


 Quanto a BENS IMÓVEIS:
 Regime da comunhão: cada um dos cônjuges não pode dispor dos seus
bens próprios nem dos bens comuns sem o consentimento do outro
(art.1682ºA/nº1 (a)), sob pena de anulabilidade do ato (art.1687º/nº1).
Também não pode dispor dos bens do outro, sendo nula a disposição
que faça desses bens (art.1687º/nº4 e 892º).
 Regime da separação: cada um dos cônjuges pode dispor livremente
dos seus bens próprios (art.1682ºA/nº1 (a), mas não pode dispor dos
bens do outro sob pena de nulidade (art.892º e 1687º/nº4).

 Quanto a BENS MÓVEIS:


 Regime da comunhão: cada um dos cônjuges pode dispor livremente
dos seus próprios bens e dos bens comuns se os administrar, salvo nos
casos referidos no art.1682º/nº3 (a) (moveis próprios ou comuns
utilizados conjuntamente pelos cônjuges na vida do lar ou como
instrumento comum do trabalho). A alienação que um dos cônjuges

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faça dos seus bens próprios ou dos moveis comuns que não administre
ou que se refere o artigo anterior é anulável, nos termos do
art.1687º/nº1. Não pode também cada um dos cônjuges dispor dos bens
do outro, quer esteja quer não esteja na administração desses bens, sob
pena, respetivamente, de anulabilidade (art.1682º/nº3 (b) e 1687º/nº1)
ou de nulidade do ato (art.892º e 1687º/nº4), a não ser que, estando na
administração dos bens, o respetivo ato de disposição seja “ato de
administração ordinária” (art.1682º/nº3 (b)).
 Regime da separação: cada um dos cônjuges pode dispor livremente
dos seus bens próprios se os administrar, salvo nos casos referidos na
alínea a do art.1682º/nº3. Mas não pode dispor dos bens do outro, sob
pena de nulidade do ato (art.892º e 1687º/nº4).
® Poderes de disposição mortis causa: Cada um dos cônjuges só pode dispor, para depois
da morte, dos seus bens próprios e na sua meação dos bens comuns (art.1685º). As
disposições são feitas durante a vida dos cônjuges, mas, por definição, só pretendem
produzir os seus efeitos depois da morte do disponente e a morte tem a consequência de
dissolver o matrimónio. Assim, não se justifica a imposição de restrições aos poderes
normais de cada cônjuge proprietário, nos interesses da suspensão económica do outro
cônjuge e da família.

30.11.2022
O regime da responsabilidade por dívidas: a) A legitimidade para contrair dívidas; b) A
responsabilidade pessoal; c) A
responsabilidade patrimonial (bens comuns ou próprios); d) As compensações devidas (art.
1697.º).
- Termo das relações patrimoniais. A partilha (arts. 1688.º e 1689.º): operações da partilha.

FPC-GO, pp. 476-528

06.12.2022
- Os regimes de bens.
- As convenções antenupciais: a) A liberdade de convenção; os seus limites. aa) As limitações à
liberdade de celebração;
bb) As limitações à liberdade da fixação do conteúdo: b) O conteúdo possível das convenções; o
seu regime; as doações
para casamento; c) O princípio da imutabilidade.
- O princípio da imutabilidade: os argumentos a favor e contra o princípio; âmbito do princípio.
- Contratos entre cônjuges.

FPC-GO, pp. 528-594

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