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▪ Direito PROCESSUAL PENAL ▪ Caderno de Wantuil Luiz Cândido Holz ▪ Página 27 ▪

CONTEÚDO: INQUÉRITO POLICIAL. Conceito de MATERIAL


inquérito policial. Finalidades da investigação criminal. DE APOIO

04
Elementos informativos x provas. Presidência do
inquérito policial (Lei 12.830/13). Poder requisitório da
autoridade policial. Cláusula de reserva de jurisdição.

INQUÉRITO POLICIAL

CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA DO IP4

▪ CONCEITO: Inquérito policial é o procedimento administrativo inquisitório e


preparatório, presidido pela autoridade de polícia judiciária (delegado de
polícia, civil ou federal), consistente em um conjunto de diligências efetivadas
pela polícia investigativa, realizadas para apuração dos fatos (materialidade e
autoria da infração penal), a fim de oferecer elementos de informação para
que o titular da ação penal possa ingressar em juízo (justa causa).
▪ Inquérito policial é presidido por Delegado de Polícia (Lei 12.830/13, art.
2º, §1º).
▪ Serve para apurar suposta infração penal. O objetivo é apurar, é
esclarecer fatos antes de iniciar uma ação penal.
▪ Inquérito não produz prova, apenas indica as fontes das provas a serem
produzidas judicialmente. Se o Estado iniciasse a ação penal com suas
provas produzidas o Estado já estaria tendente a condenar.
▪ Forma a justa causa para ação penal, evitando ações penais arbitrárias,
temerárias.
▪ Justa Causa: (Art. 2º, §1º, Lei 12.830/13) suporte mínimo, composto pelo
somatório de indícios suficientes de autoria e demonstração material do
crime.

▪ NATUREZA JURÍDICA: Não é processo judicial nem processo administrativo, é


mero procedimento administrativo preliminar, pois do inquérito policial não
resulta diretamente a aplicação de sanção.
▪ A persecução criminal é dividida em duas fases distintas: a investigação
preliminar e a processual.

▪ VÍCIOS DO IP CONTAMINAM O ULTERIOR PROCESSO?


▪ Regra: Sendo mero procedimento administrativo preliminar, eventuais
vícios constantes do IP não contaminam o processo a que der origem.
– EX.: Perícia feita por um só perito não oficial. Depois pode ser feita

4 Fonte: Renato Brasileiro de Lima (Manual de Processo Penal, 2016). Atualização: Lei 13.964/19.
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nova perícia.
▪ Exceção 1: Provas ilícitas produzidas na investigação preliminar podem
contaminar o processo judicial, por derivação (art. 157, §1º, CPP).
▪ Exceção 2: Art. 7º, XXI, Lei 8.906/94 (redação dada pela Lei 13.245/16):
▪ XXI - assistir a seus clientes investigados durante a apuração de
infrações, sob pena de nulidade absoluta do respectivo interrogatório
ou depoimento e, subsequentemente, de todos os elementos
investigatórios e probatórios dele decorrentes ou derivados, direta ou
indiretamente, podendo, inclusive, no curso da respectiva apuração.

▪ FINALIDADES DO IP: O objetivo central do inquérito é a formação da “opinio


delicti”, a opinião acerca do delito, para fins de instauração, ou não, da futura
ação penal, tanto para o Ministério Público, no caso das ações penais
públicas, como para o querelante, nas ações penais privadas. O inquérito
policial tem dupla função, o que afasta a leiga ideia de mecanismo
unidirecional.

▪ Função preservadora:
▪ É a função principal.
▪ A existência prévia de um inquérito inibe a instauração de um
processo penal infundado, temerário, resguardando a liberdade do
inocente e evitando custos desnecessários para o Estado.
▪ Exposição de motivos do CPP destaca que o inquérito policial
traduz uma salvaguarda contra apressados e errôneos juízos,
formados antes que seja possível uma precisa visão de conjunto
dos fatos, nas suas circunstâncias objetivas e subjetivas.

▪ Função preparatória:
▪ É a função secundária, que nem sempre ocorre (já que algumas
investigações conduzem a elementos exclusivamente em favor da
defesa).
▪ Fornecer elementos de informação para que o titular da ação penal
possa ingressar em juízo com a ação penal, além de acautelar meios
de prova que poderiam desaparecer com o decurso do tempo.
▪ Identificar e acautelar as fontes de prova (pessoas e coisas
exteriores ao processo que guardem informações que lhe sejam
úteis).
▪ Colhe elementos de informação quanto a autoria e
materialidade do fato delituoso (justa causa para a ação penal).
▪ As informações obtidas por meio das investigações servem para a
preparação da ação penal e também para fundamentar eventuais
medidas cautelares.
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ELEMENTOS INFORMATIVOS x PROVAS5

Art. 155, CPP. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova
produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão
exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação,
ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas.

ELEMENTOS INFORMATIVOS PROVA

▪ São produzidos na fase investigatória ▪ Em regra, é produzida na fase


(qualquer procedimento judicial.
investigatório). ▪ Exceções: provas cautelares,
antecipadas e não repetíveis.
Podem ser produzidas na fase
investigatória ou na fase judicial.

▪ Não é obrigatória a observância do ▪ O contraditório e a ampla defesa


contraditório e da ampla defesa. são de observância obrigatórios.
▪ A participação de advogado de
defesa na investigação preliminar
(Lei 13.245/16 → Lei 8.906/94, art. 7º,
XXI) não altera a natureza de
elementos informativos, tendo em
vista a redação do art. 155 do CPP
(“contraditório judicial”). Há
doutrina em sentido contrário.

▪ São produzidos sem a presença do ▪ Deve ser produzida na presença do


juiz, salvo quando houver juiz.
necessidade de intervenção do ▪ Princípio da identidade física do
Poder Judiciário (nas hipóteses de juiz (Art. 399 §2º CPP).
cláusula de reserva de jurisdição). ▪ Pode ser uma presença direta /
▪ O juiz não deve determinar física ou uma presença remota (por
medidas investigatórias preliminares videoconferência).
sem que exista provocação. ▪ O CPC/15 excluiu a previsão
▪ Exemplos de necessária de identidade física no juiz, não
intervenção judicial: Interceptação obstante, o princípio apenas
telefônica; busca domiciliar; prisão desapareceu do processo civil,
temporária. posto que o processo penal
possui previsão expressa.

▪ Finalidades:
▪ Fundamento para decretação de
medidas cautelares;

5 Fonte: Renato Brasileiro de Lima (Manual de Processo Penal, 2016).


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▪ Subsídios para formação da


convicção do titular da ação
penal (Ministério Público ou
Ofendido): “opinio delicti”.

STJ (HC 232.960, em 2015)

O reconhecimento fotográfico feito na fase de inquérito, mas não


ratificado nem corroborado por outras provas em juízo, não é válido para
condenar o réu, evitando erro judiciário. No caso, o reconhecimento foi
feito por fotografia, sem observância das regras do art. 226 do Código de
Processo Penal (CPP), e não foi repetido em juízo ou referendado por
outras provas judiciais. Em juízo, a vítima apenas confirmou o boletim de
ocorrência e que havia feito reconhecimento na polícia. Daí a razão de
considerar-se a prova inidônea para a condenação em segundo grau.

▪ Os elementos informativos podem ser utilizados na sentença


condenatória?
▪ Elementos informativos podem ser utilizados para a condenação, desde
que em caráter complementar à prova (mero “obiter dicta”).
▪ “Ratio decidendi”: é a regra de direito e o fundamento probatório
que foi posta como razão da decisão.
▪ “Obiter dicta” (ou, no singular, “obiter dictum”): são as afirmações e
argumentações que, embora possam ser úteis para a compreensão
da decisão, não constituem parte de seu fundamento jurídico.
▪ Elementos informativos isoladamente considerados não podem
fundamentar uma sentença condenatória. Porém, não devem ser
desprezados, podendo se somar à prova produzida em juízo para formar a
convicção do magistrado. Mesmo antes da redação de 2008 já era o
entendimento do STF.
▪ Observe que o art. 155 do CPP deve ser interpretado em consonância
com o art. 386 do CPP, do que deriva que os elementos de informação
não servem, por si sós, para fundamentar uma condenação, mas podem
ser utilizados para fundamentar uma absolvição, o que é consentâneo
com o princípio favor rei.

▪ Autos do IP:
▪ (Art. 12, CPP).
▪ Os autos da investigação preliminar são juntados aos autos do processo
penal, de modo que os elementos informativos sejam aproveitados de
modo subsidiário aos elementos produzidos em contraditório. Na reforma
de 2008 chegou-se a cogitar da não juntada dos autos do inquérito aos
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autos do processo penal, o que foi rejeitado.

▪ Gestão da prova:
▪ Na investigação preliminar, o magistrado não deve ter iniciativa
probatória, sob pena de ofender o sistema acusatório. Na fase judicial,
prevalece que o magistrado pode ter iniciativa probatória, desde que o
faça de maneira subsidiária / complementar às partes, a exemplo do que
indica o art. 212, CPP.

▪ Exceções em que elementos produzidos na fase preliminar


constituirão elementos de prova (art. 155, caput, parte final, CPP):

PROVAS ▪ São aquelas em que há risco de desaparecimento do


CAUTELARES objeto da prova em razão do decurso do tempo, razão
pela qual devem ser colhidas de imediato. Podem ser
produzidas tanto na fase investigatória como na fase
judicial. Em regra, dependem de prévia autorização
judicial, sendo que o contraditório será diferido
(postergado, adiado ou “sobre a prova” – extrínseco à
produção da prova, “inaudita altera pars”).
– EX.: Interceptação telefônica, dados de e-mail,
busca e apreensão domiciliar (dependem de
autorização judicial).
– EX.: ação controlada no crime organizado, dados
pretéritos de ERBs (requisição por autoridade do
delegado de polícia).

PROVAS NÃO ▪ É aquela que uma vez produzida não tem como ser
REPETÍVEIS novamente coletada em razão do desaparecimento,
(IRREPETÍVEIS) destruição ou perecimento da fonte probatória. Podem
ser produzidas tanto na fase investigatória como na fase
judicial. De regra, não dependem de prévia autorização
judicial, sendo que o contraditório será diferido
(postergado, adiado ou “sobre a prova” – extrínseco à
produção da prova).
– EX.: Exame de corpo de delito de lesão corporal,
exame de conjunção carnal, eficiência de arma de
fogo, falsificação documental, constatação de droga
(requisição por autoridade do delegado de polícia).
– EX.: Perícia de RX sobre o suspeito (depende de
autorização judicial).

PROVAS ▪ São aquelas produzidas com a observância do


ANTECIPADAS contraditório real (“para a prova” – intrínseco à
produção da prova) em momento processual distinto
daquele legalmente previsto, ou até mesmo antes do
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início do processo, em virtude de situação de urgência


e relevância. Podem ser produzidas tanto na fase
investigatória como na fase judicial. Dependem de
autorização judicial.
– EX.: Depoimento especial de criança ou
adolescente (art. 8º, Lei 13.431/17).
– EX.: Depoimento “ad perpetuam rei memoriam”
(art. 225, CPP).
– EX.: Depoimentos de policiais militares testemunhas
do fato em razão da aplicação do art. 366, CPP.
▪ Aplica-se analogicamente o procedimento dos arts.
381 a 383, CPC.

▪ Há autores que entendem ser expressões sinônimas.

▪ Depoimento à autoridade policial pode ter valor de prova?


▪ Depoimento tomado pelo Delegado de Polícia não tem valor probatório,
de modo que deverá ser repetido pela autoridade judiciária em
contraditório judicial.
▪ Em caso de urgência face ao concreto risco de desaparecimento da
prova, o Delegado de Polícia poderá representar ao magistrado pela
realização de produção antecipada de prova.
– EX.: (Art. 225, CPP) Se a testemunha estiver em situação de risco de
morte (enfermidade, por exemplo) é interessante que o delegado de
polícia represente ao magistrado pela produção antecipada da
prova, de modo a obter valor probatório. Nessa situação, o
magistrado (na presença de promotor e advogado) é que tomará o
depoimento da testemunha.
– EX.: Em Brasília, estão utilizando o art. 225 do CPP para tomar o
depoimento de vulneráveis em casos de crime contra a dignidade
sexual, evitando que o vulnerável seja novamente exposto às
memórias do crime sexual quando da fase processual.

▪ Crítica à ideia de informatividade do IP (Henrique Hoffmann)6:


▪ Com a frase reducionista “o inquérito policial é um procedimento
meramente informativo”, é passada a errada mensagem de que o valor
probatório do inquérito policial é insignificante e apenas relativo, e que
esse instrumento investigativo não produz provas (mas unicamente
elementos informativos).
▪ Não se discute que o valor probatório de um elemento de convicção
colhido pelo Estado depende da incidência dos princípios do
contraditório e da ampla defesa. Todavia, são esses elementos
(contraditório e ampla defesa) que conferem a natureza de prova ao
elemento colhido, e não o fato de ter sido produzido na etapa policial ou

6 Henrique Hoffmann Monteiro de Castro: https://www.conjur.com.br/2016-nov-29/academia-


policia-mera-informatividade-inquerito-policial-mito. Publicado em 2016.
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judicial. Assim, nada impede que o conhecimento alcançado na fase


policial seja considerado tecnicamente prova e sirva como base exclusiva
da condenação.
▪ Embora mitigados, o contraditório e a ampla defesa estão presentes do
inquérito policial (Súmula Vinculante 14, art. 14 do CPP e Art. 7º, XIV e XXI,
Lei 8.906/94).
▪ A atuação defensiva meramente facultativa realmente não tem o
condão de conferir valor probatório ao elemento colhido, que será
informativo. Isso não significa que o elemento informativo seja inútil: pode
tranquilamente subsidiar a decretação de medidas cautelares e o
recebimento da denúncia (ex: declaração da vítima, depoimento da
testemunha e interrogatório do suspeito), bem como servir de
fundamentação condenatória desde que conjugado com outras provas.
▪ Em relação as medidas cautelares probatórias, haverá o contraditório e
ampla defesa diferidos (durante o processo penal), dando valor
probatório aos elementos colhidos na etapa policial.
▪ A diferença entre a instrução processual e a instrução preliminar policial
não está na maior ou menor qualidade técnica do procedimento policial
em relação ao procedimento judicial, mas tão somente em relação ao
contraditório e ampla defesa, mitigados no inquérito policial em razão da
necessidade de efetividade, para que o Estado (investigação) possa se
reerguer face à situação de desnível provocada pelo próprio criminoso.
▪ “Ao praticar o delito, o criminoso toma certas precauções para
subtrair-se à ação da Justiça, colocando a vítima e o Estado em
posição de desvantagem. Para estabelecer a igualdade, tendo em
vista esse desnível provocado pelo próprio criminoso, é preciso que o
Estado tenha alguma primazia no início da persecução penal a fim
de que possam ser colhidos os vestígios do crime e os indícios de
autoria. Nada mais correto. Afinal, fossem as diligências precedidas
de prévio aviso ao investigado e os atos investigativos acessíveis a
qualquer tempo, seriam inviáveis a localização de fontes de prova e
a colheita dos elementos probatórios sem sobressaltos, impedindo a
regular atuação do aparato policial”7.
▪ Observando-se atentamente o acervo probatório na maior parte dos
processos criminais, a maior parte das provas são compostas de
elementos colhidos durante o inquérito policial, consistentes em provas
cautelares e provas não repetíveis. Além disso, os elementos informativos
do inquérito policial podem somar-se à prova produzida em contraditório.
▪ Grosso modo, apenas as oitivas feitas em sede policial não contam
com contraditório postergado, sendo repetidas em juízo e portanto
qualificadas como elementos de informação. Praticamente todos os
demais elementos, informações extraídas de pessoas e coisas
mediante diligências policiais (antecedidas ou não de ordem
judicial), são provas. Até porque a maior parte dos delitos deixa
vestígios, sendo indispensável colheita da prova pericial (art. 159 do
CPP).

7 Henrique Hoffmann Monteiro de Castro: https://www.conjur.com.br/2016-nov-01/academia-


policia-sim-contraditorio-ampla-defesa-inquerito-policial. Publicado em 2016.
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▪ A prova cautelar ou irrepetível não é produzida na fase judicial, mas na


etapa investigativa. É a polícia judiciária que adota a técnica
investigativa, providenciando análise da coisa ou pessoa e extraindo a
informação. Fica para o Judiciário apenas a tarefa de abrir o necessário
espaço para a manifestação da defesa. Mas a colheita da prova ocorreu
no inquérito policial, sob presidência do delegado de polícia.
▪ É perceptível por mera observação empírica, a qualquer operador na
seara do Direito Penal, que o inquérito policial é o mais importante
instrumento de colheita de provas de infrações penais, não apenas para
subsidiar o recebimento da denúncia para embasar o próprio decreto
condenatório.
▪ Essa crítica tem por objetivo demonstrar a necessidade de eficiência da
atividade investigativa policial, exigindo, inclusive, estrutura adequada,
como também alertar à defesa sobre a importância de sua atuação na
fase policial.

PRESIDÊNCIA DO INQUÉRITO POLICIAL8

Lei 12.830/13:
Art. 2º As funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais
exercidas pelo delegado de polícia são de natureza jurídica, essenciais e
exclusivas de Estado.
▪ Outro procedimento: exemplo é o TCO (art. 69 e art. 77, §1º, Lei
9.099/95).
§ 1º Ao delegado de polícia, na qualidade de autoridade policial, cabe a
condução da investigação criminal por meio de inquérito policial ou outro
procedimento previsto em lei, que tem como objetivo a apuração das
circunstâncias, da materialidade e da autoria das infrações penais.
§ 2º Durante a investigação criminal, cabe ao delegado de polícia a
requisição de perícia, informações, documentos e dados que interessem à
apuração dos fatos.
▪ Deve-se respeitar as cláusulas de reserva de jurisdição e demais
situações em que se exige poderes judiciais.
§ 3º (VETADO)
§ 4º O inquérito policial ou outro procedimento previsto em lei em curso
somente poderá ser avocado ou redistribuído por superior hierárquico,
mediante despacho fundamentado, por motivo de interesse público ou nas
hipóteses de inobservância dos procedimentos previstos em regulamento da
corporação que prejudique a eficácia da investigação.
▪ A fundamentação é vinculada a motivos de interesse público ou
inobservância de procedimentos com risco à eficácia das investigações.
▪ PRINCÍPIO DO DELEGADO NATURAL: Garantia de independência e

8 Fonte: Renato Brasileiro de Lima (Carreiras Jurídicas, 2016).


▪ Direito PROCESSUAL PENAL ▪ Caderno de Wantuil Luiz Cândido Holz ▪ Página 35 ▪

autonomia dos responsáveis pelas investigações. Assim, são vedadas


alterações pontuais nas distribuições de “notitia criminis” e remoções
imotivadas de autoridades policiais das investigações que conduzem,
somente podendo ocorrer tal remoção por ato devidamente
fundamentado. O respeito ao princípio do delegado natural visa eliminar
da fase investigativa qualquer tipo de ingerência política que possa existir
e ameaçar a autonomia do delegado na presidência do inquérito
policial.
▪ Nestor Távora defende o princípio do delegado natural.
▪ Os tribunais superiores não reconhecem referido princípio (STJ. 5ª
Turma. HC 145.040/RJ, J.: 13/08/2013).
§ 5º A remoção do delegado de polícia dar-se-á somente por ato
fundamentado.
▪ Delegado não possui inamovibilidade.
▪ Há quem use a expressão “inamovibilidade relativa”.
(...)

▪ Segundo Henrique Hoffmann: A polícia judiciária é a instituição


constitucionalmente vocacionada a presidir investigações criminais no
Brasil (art. 144, §1º e §4º, CF). Cuida-se de instituição sem compromisso com
a acusação ou a defesa, e exatamente por isso o ordenamento jurídico
outorgou a condução da instrução preliminar ao delegado de polícia
(art. 2º, §1º, Lei 12.830/13).
▪ Ao presidir o inquérito policial, a autoridade policial deve agir com
isenção e independência, garantindo os direitos fundamentais de todos os
envolvidos e tendo como norte unicamente a busca da verdade (função
preservadora).9

PODER REQUISITÓRIO DO DELEGADO10

CPP, Art. 6º
III - colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas
circunstâncias;
▪ É chamado de Poder Geral de Polícia (Henrique Hoffmann).

▪ PODER GERAL DE POLÍCIA: autorização legal conferida à autoridade

9 Henrique Hoffmann Monteiro de Castro: https://www.conjur.com.br/2015-dez-01/inquerito-policial-


indispensavel-persecucao-penal. Publicado em 2015.
10 Henrique Hoffmann Monteiro de Castro: https://www.conjur.com.br/2016-fev-02/academia-
policia-poder-requisitorio-delegado-essencial-busca-verdade#:~:text=O%20poder%20requisit
%C3%B3rio%20do%20delegado%20de%20pol%C3%ADcia%2C%20que%20abrange%20informa
%C3%A7%C3%B5es,de%20responsabiliza%C3%A7%C3%A3o%20criminal%5B11%5D. Publicado em
2016.
▪ Direito PROCESSUAL PENAL ▪ Caderno de Wantuil Luiz Cândido Holz ▪ Página 36 ▪

policial para colher todas as provas que servirem para o esclarecimento


do fato e suas circunstâncias (art. 6º, III, CPP).
▪ Decorrem da cláusula geral do poder geral de polícia:
(a) Poder requisitório.
– EX.: requisição de perícias e informações (art. 2º, §2º, Lei
12.830/13).
– EX.: requisição de dados e documentos.
– EX.: Os dados cadastrais (nome, endereço dentre outros)
podem ser requisitados diretamente pelo Delegado às
operadoras em duas situações: 1) Art. 15, Lei 12.850/13; 2) art. 17-
B, Lei de Lavagem de Capitais.
(b) Poder de condução coercitiva.

▪ PODER REQUISITÓRIO: é o acesso direto (independentemente de autorização


judicial) a certas informações em prol do interesse da coletividade de
esclarecer a verdade na investigação criminal.
▪ Deriva do poder geral de polícia, inerente à privatividade de presidir
inquérito policial, visando municiar a autoridade policial dos meios
necessários para coletar provas de forma célere e eficaz.
▪ Sendo o Delegado autoridade a quem cabe, com isenção e
imparcialidade, adotar todas as providências a fim de esclarecer a
verdade, sem qualquer compromisso com a acusação ou a defesa (art.
2º, §1º, Lei 12.830/13), o legislador conferiu à autoridade de polícia
judiciária uma série de instrumentos para possibilitar que cumpra de modo
satisfatório seu mister, o que decorre diretamente do art. 6º, III, CPP.
▪ Cumpre dever de garantia do direito à segurança pública, sem olvidar
dos direitos fundamentais. Ademais, o acesso a essas informações por
vezes evita a adoção de providências mais severas, tais como a
interceptação telefônica e a busca e apreensão domiciliar,
eventualmente atingindo terceiros não envolvidos e movimentando
inutilmente a máquina judiciária.
▪ A Lei Geral de Proteção de Dados não se aplica em relação à
segurança pública e atividades de investigação penal (art. 4º, III, “d”, Lei
13.709/18).

Dados Objetivos Dados Sensíveis


▪ São dados mais “distantes” do ▪ Dizem mais de perto sobre a
núcleo mais sensível, como é o caso pessoa, com aspectos da vida
de informações sobre nome, íntima (dados sobre a orientação
filiação, endereço, CPF etc. sexual, religiosa, a opção política,
vida familiar, entre outros).

▪ Ainda que se considere que as ▪ Por atingir o núcleo essencial do


informações estão conectadas de direito à privacidade e intimidade
alguma forma à privacidade, a (art. 5º, X, CF), depende de prévia
▪ Direito PROCESSUAL PENAL ▪ Caderno de Wantuil Luiz Cândido Holz ▪ Página 37 ▪

mitigação desse segredo não atinge autorização judicial.


o núcleo essencial do direito, e
simultaneamente garante que o
interesse público exteriorizado na
investigação criminal seja
observado de maneira célere e
eficaz.

▪ Há poder requisitório do Delegado. ▪ Requer prévia autorização judicial.

▪ O grau de sigilo é intermediário ou ▪ O grau de sigilo é elevado.


nenhum.

▪ Exemplos de Poder Requisitório: diligências investigativas


determinadas de ofício pelo delegado. É o acesso a informações que
não atingem a privacidade e intimidade (gostos, afeições, ideias,
vicissitudes) do investigado.
– EX.: apreensão de objetos (art. 6º, II, CPP).
– EX.: requisição de perícias (art. 6º, VII, CPP).
– EX.: ação controlada no crime organizado (art. 8º, §1º, Lei
12.850/13).
– EX.: acesso a dados meramente cadastrais, informações
objetivas que não revelam traços sensíveis das pessoas
(preferências, afeições, ideias e vicissitudes), quando
devidamente justificado (se extrai do poder geral de polícia, art.
6º, III, CPP, e art. 2º, §2º, Lei 12.830/13).
▪ Recusar tipifica contravenção penal (art. 68, LCP).
– EX.: poder específico de requisição de dados cadastrais (art.
13-A, CPP) (art. 15, Lei 12.850/13) (art. 17-B, Lei 9.613/98).
– EX.: Acesso a dados cadastrais junto ao SERPRO (STJ, EDcl no
RMS 25.375, 2008).
– EX.: Acesso ao IP, para identificação de computador e
endereço de instalação (STJ, HC 83.338, 2009).
– EX.: Requerer à operadora de telefonia móvel responsável pela
Estação Rádio-Base o registro dos telefones que utilizaram o
serviço na localidade, em dia e hora (STJ, HC 247.331, 2014).

▪ Cláusulas de reserva de jurisdição: Situações em que o acesso à


informação atinge o núcleo essencial do direito de privacidade ou
intimidade.

▪ Prazo de atendimento: como não há previsão legal específica para o


atendimento à ordem, pode-se utilizar por analogia o lapso temporal de
10 dias preconizado para a requisição em ação civil pública (artigo 8º,
parágrafo único da Lei 7.347/85).
▪ Direito PROCESSUAL PENAL ▪ Caderno de Wantuil Luiz Cândido Holz ▪ Página 38 ▪

▪ Desatendimento à ordem do Delegado: sujeita o recalcitrante à


responsabilização pessoal pelo crime de:
▪ Desobediência (art. 330 do CP ou art. 21 da Lei 12.850/13).
▪ Prevaricação (art. 319 do CP).

CLÁUSULA DE RESERVA DE JURISDIÇÃO

▪ CONCEITO: a necessidade de prévio pronunciamento judicial quando for


necessária a adoção de medidas que possam irradiar efeitos sobre as
garantias individuais.
▪ Informações que evidenciam aspectos personalíssimos dos cidadãos
devem, em regra, ficar fora do alcance do Estado e de particulares (art.
5º, X, CF).
– EX.: Extrato de cartão de crédito.

▪ MODALIDADES:

(a) Cláusula de reserva de jurisdição ABSOLUTA: o controle judicial é


prévio à diligência.
– EX.: Invasão domiciliar (art. 5º, XI, CF).
– EX.: Interceptação da comunicação de dados e das
comunicações telefônicas (art. 5º, XII).
– EX.: Prisão preventiva e temporária (art. 5º, LXI, CF).
– EX.: Afastamento de sigilo de processos judiciais (STF, Pleno, MS
27.483, 2008).
– EX.: Acesso ao Banco Nacional Multibiométrico e de Impressões
Digitais (Art. 7º-C, §11, Lei 12.037/09).
– EX.: No caso de tráfico de pessoas, requisitar, mediante autorização
judicial, às empresas prestadoras de serviço de telecomunicações
e/ou telemática que disponibilizem imediatamente os meios técnicos
adequados – como sinais, informações e outros – que permitam a
localização da vítima ou dos suspeitos do delito em curso. (art. 13-B,
CPP)

(b) Cláusula de reserva de jurisdição RELATIVA: o controle judicial é


posterior à diligência. A autoridade de investigação possui poderes para
produzir o elemento de informação.
– EX.: Apreensão de objetos. Oitiva do ofendido. Interrogatório.
Reconhecimento de pessoas e coisas. Requisições periciais.
Identificação criminal. Colheita de provas (art. 6º CPP).
– EX.: Reprodução simulada dos fatos (art. 7º, CPP).
▪ Direito PROCESSUAL PENAL ▪ Caderno de Wantuil Luiz Cândido Holz ▪ Página 39 ▪

– EX.: Em alguns crimes, requisitar, de quaisquer órgãos do poder


público ou de empresas da iniciativa privada, dados e informações
cadastrais da vítima ou de suspeitos (art. 13-A, CPP).
– EX.: Acesso ao Banco Nacional de Perfis Balísticos (art. 34-A, Lei
10.826/03).

▪ COMPARTILHAMENTO DE DADOS BANCÁRIOS11: Art. 5º, LC 105/01.

▪ Compartilhamento de dados bancários com o Fisco: (art. 6º, LC 105/01)


Embora seja considerado sigiloso com cláusula de reserva de jurisdição, o
STF entende ser constitucional o compartilhamento de dados bancários
direto com o fisco se houver processo administrativo tributário instaurado e
prévia notificação do contribuinte (STF, Plenário. ADI 2390/DF, ADI 2386/DF,
ADI 2397/DF e ADI 2859/DF, RE 601314/SP, 2016)
▪ STF entendeu que esse repasse das informações dos bancos para o
Fisco não pode ser chamado de “quebra de sigilo bancário” e sim de
“transferência de sigilo”. Isso porque as informações são passadas
para o Fisco (ex: Receita Federal) em caráter sigiloso e permanecem
de forma sigilosa na Administração Tributária. Logo, é uma tramitação
sigilosa entre os bancos e o Fisco e, por não ser acessível a terceiros,
não pode ser considerado violação (quebra) do sigilo.
▪ A LC 105/2001 é um instrumento para fiscalizar o dever fundamental
do contribuinte de pagar tributos. O dever fundamental de pagar
tributos está alicerçado na ideia de solidariedade social.
▪ Há compromissos internacionais assumidos pelo Brasil para
combater ilícitos como a lavagem de dinheiro e evasão de divisas e
para coibir práticas de organizações criminosas.
▪ As Receitas estadual e municipal (Secretarias de Fazenda estadual e
municipal) também poderão requisitar dos bancos, sem autorização
judicial, informações sobre movimentações bancárias sem que isso
configure quebra do sigilo bancário. Contudo, precisarão, antes,
editar um ato normativo que regulamente e traga, com detalhes,
todas as regras operacionais para aplicação do dispositivo legal. A
Receita Federal já possui regulamento (Decreto 3.724/2001).

▪ Compartilhamento de dados bancários com o Ministério Público: STF


pacificou que é legítimo que a Receita Federal compartilhe o
procedimento fiscalizatório que ela realizou para apuração do débito
tributário com os órgãos de persecução penal para fins criminais (Polícia
Federal, Ministério Público etc.), não sendo necessário, para isso, prévia
autorização judicial. (STF. Plenário. RE 1055941/SP, 2019 - repercussão geral
– Tema 990)
▪ Natureza de prova emprestada

11 Fonte: Site Dizer o Direito (2019).


▪ Direito PROCESSUAL PENAL ▪ Caderno de Wantuil Luiz Cândido Holz ▪ Página 40 ▪

▪ Estágios de compartilhamento de dados bancários: De um mar de


informações e de cruzamento de dados, no primeiro estágio, há um funil
estreito para o segundo estágio, que é o acesso amplo e sistêmico. E
mesmo desse, poucos casos irão à Polícia e ao Ministério Público, porque,
muitos casos são de informações errôneas ou omissão não dolosa que o
contribuinte corrige imediatamente.
▪ 1º Estágio: É a possibilidade de acesso às operações bancárias
limitado aos dados genéricos e cadastrais dos correntistas, vedada a
inclusão de qualquer elemento que permita identificar a origem ou
natureza dos gastos efetuados. É um acesso amplo ou sistêmico. Se,
desses dados genéricos, surgirem informações indicativas da prática
de um ilícito tributário, passa-se ao segundo estágio. (art. 5º, LC
105/01)
▪ 2º Estágio: Há um acesso incidental. Aqui, a Receita, após instaurar
um procedimento específico, poderá requisitar as informações e os
documentos necessários, realizar fiscalização e auditoria para a
apuração dos fatos. Conforme já explicado, é preciso haver a
instauração de procedimento administrativo fiscal por ordem de
superior hierárquico e com prévia intimação do contribuinte. Se não o
instaurar, a Receita não poderá quebrar o sigilo. Para evitar-se
abusos, há normas que disciplinam com rigor o procedimento.
Percentualmente, o número de procedimentos que chegam ao
segundo estágio é muito pequeno. (art. 5º, §4º, e art. 6º, LC 105/01)
▪ Encaminhamento da “Representação Fiscal Para Fins Penais (RFFP)”
ao Ministério Público (art. 83, Lei 9.430/96).

▪ RELATÓRIO DE INTELIGÊNCIA FINANCEIRA DO COAF12: Art. 11, §3º, Lei 9.613/98.

▪ Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF): é um grande


banco de dados que recebe informações dos bancos, das seguradoras,
dos cartórios de registro de imóveis, de joalherias. Em seguida, cruza dados
e produz relatórios que poderão ser encaminhados à Receita Federal e
aos órgãos de persecução penal em caso de indícios de ilícitos tributários
ou de infrações penais.

▪ Compartilhamento do relatório de inteligência financeira: No recurso


extraordinário examinado pelo STF (RE 1055941/SP) discutia-se uma
condenação criminal que utilizou como prova o procedimento
fiscalizatório que a Receita Federal encaminhou ao MPF. Apesar disso, o
STF decidiu que o julgamento e a definição da tese deveriam abranger
não apenas os procedimentos compartilhados pela Receita Federal, mas
também os relatórios encaminhados pela UIF (antigo COAF).
▪ O STF, neste mesmo julgamento, aproveitou o debate do tema e
fixou a tese de que também é constitucional o compartilhamento dos

12 Fonte: Site Dizer o Direito (2019).


▪ Direito PROCESSUAL PENAL ▪ Caderno de Wantuil Luiz Cândido Holz ▪ Página 41 ▪

relatórios de inteligência financeira da UIF com os órgãos de


persecução penal para fins criminais, sem a obrigatoriedade de
prévia autorização judicial. (STF. Plenário. RE 1055941/SP, 2019 -
repercussão geral – Tema 990).

▪ Natureza jurídica do relatório de inteligência financeira: peça de


informação.
▪ Não é possível afirmar taxativamente que os relatórios de
inteligência seriam somente meio de obtenção de prova, porque,
nas informações e dados, pode haver prova documental que foi
enviada ao COAF e que, deverá ser livremente valorada pelo
magistrado.

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