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Princípios

Constitucionais
do Processo
Penal

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Princípios Constitucionais do DPP
• Processo penal brasileiro está impregnado de dispositivos
inquisitórios;
• É necessário que o CPP passe por uma filtragem constitucional, para
que se adeque ao desenho acusatório e democrático previsto na CF;
• Necessidade de se estabelecer um inafastável sistema de garantias
mínimas AOS INDIVÍDUOS;
• Pensar o processo penal como proteção do indivíduo contra o
arbítrio/abuso do poder do Estado;
• O processo penal é FORMA e forma é GARANTIA contra abusos ou
arbítrios do Estado.
Jurisdicionalidade
• «Nulla poena, nulla culpa sine iudicio»;
• Assunto tratado na aula anterior, junto dos princípios da jurisdição;
• A jurisdição implica na existência de um juiz natural, imparcial e
comprometido com o sistema acusatório previsto na CF;
• A jurisdição também representa a exclusividade do poder jurisdicional, direito
ao juiz natural, independência da magistratura e exclusiva submissão à lei;
• O juiz assume uma posição muito clara no Estado Democrático de Direito, e a
legitimidade de sua atuação não é política, mas constitucional,
consubstanciada na função de proteção dos direitos fundamentais de todos e
de cada um, ainda que para isso tenha que adotar uma posição contrária à
opinião da maioria.
• A Jurisdicionalidade
independência é de extrema importância, pois para termos um juiz natural,
imparcial e que verdadeiramente desempenhe sua função (de garantidor) no
processo penal deve estar acima de quaisquer espécies de pressão ou
manipulação política;
• O juiz não está obrigado a decidir conforme queira a maioria ou tampouco
deve ceder a pressões políticas;
• Não tem por que ser um sujeito representativo, posto que nenhum interesse
ou vontade que não seja a tutela dos direitos subjetivos lesados deve
condicionar seu juízo, nem sequer o interesse da maioria, ou, inclusive, a
totalidade dos lesados.
Jurisdicionalidade
• A independência não significa uma liberdade plena (arbitrária), pois a decisão está
limitada pela prova produzida no processo, com plena observância das garantias
fundamentais (entre elas a vedação da prova ilícita) e devidamente. Não significa
possibilidade de decisionismo;
• Mas, como a lei e – mais especificamente – o processo penal é o limite para o
poder desmesurado do Estado, então a lei e o processo devem sempre proteger o
mais fraco, aquele que pode ser esmagado ou dominado pelo poder estatal;
• Cumpre ao juiz buscar a máxima eficácia dessa proteção ao mais fraco;
• No crime, a vítima é a parte fraca e, por isso, recebe a tutela penal. Contudo, no
processo penal, a parte mais fraca passa a ser o acusado, que, frente ao poder de
acusar do Estado, sofre a violência institucionalizada do processo e,
posteriormente, da pena.
Princípio da Imparcialidade
• Princípio supremo do processo penal;
• Corresponde à posição de terceiro que o Estado ocupa no processo, por meio do juiz, atuando
como órgão supraordenado às partes ativa e passiva;
• Jacinto Coutinho: não significa que o juiz está acima das partes, mas que está para além dos
interesses delas;
• GOLDSCHMIDT: a imparcialidade do juiz é o resultado da parcialidade das partes;
• A imparcialidade é ferida de morte quando se atribuem poderes instrutórios (ou investigatórios)
ao juiz, pois a gestão ou iniciativa probatória é característica essencial do princípio inquisitivo;
• Aury Lopes Jr.: os arts. 156, 127, 242, 209, 385 do CPP e tantos outros que permitem que o juiz
atue de ofício na busca de provas e adoção de medidas cautelares estão tacitamente revogados
pelo art. 3º-A do CPP (eficácia suspensa pelo STF);
• Imparcialidade subjetiva: convicção pessoal do juiz concreto, que conhece de um determinado
assunto e a sua falta de “pré-juízos”. Imparcialidade objetiva: se tal juiz se encontra em uma
situação dotada de garantias suficientes para afastar qualquer dúvida razoável acerca de sua
imparcialidade.
Princípio da Imparcialidade
• Teoria da dissonância cognitiva de SCHÜNEMANN.
• Dificuldade da imparcialidade: o juiz precisa lidar com duas “opiniões” antagônicas, incompatíveis
(teses de acusação e defesa), bem como com a “sua opinião” sobre o caso penal, que sempre
encontrará antagonismo frente a uma das outras duas (acusação ou defesa);
• Agravamento da dificuldade: o juiz constrói uma imagem mental dos fatos a partir dos autos do
inquérito e da denúncia para recebê-la. É inafastável o pré-julgamento (agravado quando ele
decide anteriormente sobre prisão preventiva, medidas cautelares etc.);
• Nesse caso: tendencialmente o juiz se apegará à imagem já construída, de modo que tentará
confirmá-la na audiência, isto é, tendencialmente deverá superestimar as informações consoantes
(da acusação) e menosprezar as informações dissonantes (da defesa);
• Gera o efeito inércia (autoconfirmação de informações consideradas corretas – da acusação) e a
busca seletiva de informações.
Princípio da Imparcialidade
• Quanto maior for o nível de conhecimento/envolvimento do juiz com
a investigação preliminar e o próprio recebimento da acusação,
menor é o interesse dele pela defesa e mais provável é a frequência
com que haverá uma condenação;
• Inversão do princípio in dubio pro reo para o “in dubio pro hell”;
• Importância dos dispositivos processuais aprovados com a Lei
Anticrime, notadamente os artigos 3º-B a 3º-F: juiz das garantias,
proibição da produção de provas de ofício, exclusão física do IP na AP.
Princípio da Imparcialidade
• Para entender o atraso do Brasil: o Tribunal Europeu de Direitos
Humanos (TEDH), especialmente nos casos Piersack, em 01/10/1982,
e De Cubber, em 26/10/1984, consagrou o entendimento de que o
juiz com poderes investigatórios é incompatível com a função de
julgador. Ou seja, se o juiz lançou mão de seu poder investigatório na
fase pré-processual, não poderá, na fase processual, ser o julgador. É
uma violação do direito ao juiz imparcial consagrado no art. 6.1 do
Convênio para a Proteção dos Direitos Humanos e das Liberdades
Fundamentais, de 1950. Segundo o TEDH, a contaminação resultante
dos “pré-juízos” conduzem à falta de imparcialidade subjetiva ou
objetiva.
Princípio Acusatório
• Visto na aula em que tratamos dos sistemas processuais penais;
• O princípio acusatório está desenhado na CF, na redação de vários
artigos: titularidade exclusiva da ação penal pública por parte do
Ministério Público (art. 129, I); contraditório e ampla defesa (art. 5º,
LV); devido processo legal (art. 5º, LIV); presunção de inocência (art.
5º, LVII); exigência de publicidade e fundamentação das decisões
judiciais (art. 93, IX);
• Como o CPP foi fundado sob bases inquisitórias, deve ser filtrado à luz
da CF.
Princípio Acusatório
• Avanço na inserção com a Lei Anticrime do art. 3º-A no CPP, bem como dos arts.
3º-B a 3º-F (suspensos em razão da decisão monocrática do Ministro Fux);
• O art. 3º-A consagra o princípio acusatório: o processo penal terá estrutura
acusatória, vedadas a iniciativa do juiz na fase de investigação e a substituição da
atuação probatória do órgão de acusação;
• 1º) veda a atuação do juiz na fase de investigação, o que é um acerto, proibindo,
portanto, que o juiz atue de ofício para decretar prisões cautelares, medidas
cautelares reais, busca e apreensão, quebra de sigilo bancário, etc;
• 2º) veda – na fase processual – a substituição pelo juiz da atuação probatória do
órgão acusador;
• Fixação do que é de extrema importância: separação do órgão acusador e do
órgão julgador e gestão/produção da prova nas mãos das partes, mais
especificamente na mão do MP – que é a parte que possui a carga probatória –,
mantendo-se o juiz inerte e equidistante.
Princípio da Presunção de Inocência
• Princípio fundante do modelo processual penal que queira ser respeitador da
dignidade e dos direitos essenciais da pessoa humana;
• Nem sempre foi assim: na inquisição a dúvida gerada pela insuficiência de provas
equivalia a uma semiprova, que comportava um juízo de semicondenação a uma
pena leve. Era na verdade uma presunção de culpabilidade;
• Depois disso, a presunção de inocência foi consagrado na Declaração dos Direitos
do Homem de 1789 (Revolução Francesa);
• Década de 1930: voltou a ser atacada pelo pelo totalitarismo e pelo fascismo, a
ponto de Vicenzo Manzini chamá-la de “estranho e absurdo extraído do
empirismo francês” (aqui fazendo críticas à democracia francesa);
• Vicenzo Manzini foi o idealizador do Codice Rocco (inspiração do CPPB).
Princípio da Presunção de Inocência
• No Brasil, o princípio está consagrado no Art. 5º, LVII – ninguém será
considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal
condenatória;
• Na Convenção Americana de Direitos Humanos: Art. 8. (...) 2. Toda
pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência
enquanto não se comprove legalmente sua culpa;
• Muito importante sublinhar que a presunção constitucional de
inocência tem um marco claramente demarcado: até o trânsito em
julgado.
Princípio da Presunção de Inocência
• Irradia em 03 dimensões:
• É norma de tratamento: exige que o réu seja tratado como inocente e
atua em duas dimensões: interna ao processo e exterior a ele. Interna -
imposição – ao juiz – de tratar o acusado efetivamente como inocente
até que sobrevenha eventual sentença penal condenatória transitada em
julgado. Externa - exige uma proteção contra a publicidade abusiva e a
estigmatização (precoce) do réu. Proibição da abusiva exploração
midiática em torno do fato criminoso e do próprio processo judicial;
• É norma probatória: exige que o material probatório necessário para
afastá-la seja produzido pelo órgão acusador de modo lícito e tenha
conteúdo para incriminar.
Princípio da Presunção de Inocência
• É norma de julgamento: norma para o juízo, diretamente relacionada
à definição e observância do “standard probatório”, atuando no nível
de exigência de suficiência probatória para um decreto condenatório.
Difere-se da norma probatória na medida em que atua na perspectiva
subjetiva, ao passo que as regras probatórias têm natureza objetiva;
• E o “princípio in dubio pro societate”?
Princípio do Contraditório e da Ampla Defesa
• São direitos constitucionalmente assegurados no art. 5º, LV, da CF: Aos
litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em
geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e
recursos a ela inerentes;
• É imprescindível para a própria existência da estrutura dialética do
processo;
• método de confrontação da prova e comprovação da verdade,
fundando-se sobre o conflito, disciplinado e ritualizado, entre partes
contrapostas: a acusação (expressão do interesse punitivo do Estado) e
a defesa (expressão do interesse do acusado [e da sociedade] em ficar
livre de acusações infundadas;
Princípio do Contraditório e da Ampla Defesa
• O juiz deve dar “ouvida” a ambas as partes, sob pena de parcialidade, na
medida em que conheceu apenas metade do que deveria ter conhecido;
• O contraditório é observado quando se criam as condições ideais de fala e
oitiva da outra parte, ainda que ela não queira utilizar-se de tal faculdade;
• Para Ada Pellegrini Grinover há uma diferença entre o contraditório e a
defesa no plano teórico, apesar de estarem intimamente ligados: a defesa é
que garante o contraditório, mas também por este se manifesta e é
garantida;
• Para Fazzalari: o contraditório é primeiro o direito à informação
(conhecimento) e, depois, é a efetiva e igualitária participação das partes. É
a igualdade de armas, de oportunidades.
Direito de Defesa
• Defesa Técnica:
• Pressupõe a assistência de uma pessoa com conhecimentos teóricos do Direito,
um profissional, que será um advogado particular ou um defensor público;
• A defesa técnica decorre de uma exigência de equilíbrio entre as partes e também
de uma acertada presunção de hipossuficiência do sujeito passivo, de que ele não
tem conhecimentos necessários e suficientes para resistir à pretensão estatal, em
igualdade de condições técnicas com o acusador;
• A defesa técnica é uma exigência da sociedade: interesse da coletividade de uma
verificação negativa no caso do delito não constituir uma fonte de
responsabilidade penal;
• Por isso que se o acusado não constitui defensor no processo, haverá a nomeação
de um. A defesa técnica é indisponível.
Direito de Defesa
• O Estado deve organizar-se de modo a instituir um sistema de “Serviço
Público de Defesa”, tão bem estruturado como o Ministério Público, com a
função de promover a defesa de pessoas pobres e sem condições de
constituir um defensor. Assim como o Estado organiza um serviço de
acusação, tem esse dever de criar um serviço público de defesa, porque a
tutela da inocência do imputado não é só um interesse individual, mas social;
• Art. 261 do CPP: nenhum acusado, ainda que ausente ou foragido, será
processado ou julgado sem defensor;
• Art. 5º, LXXIV, da CF: o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita
aos que comprovarem insuficiência de recursos;
• Defensoria Pública (prevista no art. 134 da CF).
Direito de Defesa
• Defesa pessoal positiva: o sujeito atua pessoalmente, defendendo a si mesmo
como indivíduo singular;
• A defesa pessoal ou autodefesa manifesta-se de várias formas, mas encontra no
interrogatório policial e judicial seu momento de maior relevância;
• O interrogatório é o momento em que o sujeito passivo tem a oportunidade de
atuar de forma efetiva – comissão –, expressando os motivos e as justificativas ou
negativas de autoria ou de materialidade do fato que se lhe imputa;
• O interrogatório deve ser um ato espontâneo, livre de pressões ou torturas (físicas
ou mentais).
• A autodefesa pode ser renunciada pelo sujeito passivo, mas é indispensável para o
juiz, de modo que o órgão jurisdicional sempre deve conceder a oportunidade
para que aquela seja exercida;
Direito de Defesa
• A autodefesa positiva, portanto, deve ser compreendida como o
direito disponível do sujeito passivo de praticar atos, declarar,
constituir defensor, submeter-se a intervenções corporais, participar
de acareações, reconhecimentos etc. Em suma, praticar atos dirigidos
a resistir ao poder de investigar do Estado, fazendo valer seu direito
de liberdade;
Direito de Defesa
• Defesa Pessoal Negativa: notadamente expressa por meio do direito ao silêncio;
• Na medida em que o acusado pode atuar na sua defesa pessoal, pode também
abrir mão dela, mantendo-se inerte;
• O direito ao silêncio está expressamente previsto no art. 5º, LXIII, da CF: o preso
será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado (...).
Direito aplicado tanto aos presos quanto àqueles em liberdade;
• O direito de silêncio é apenas uma manifestação de uma garantia muito maior,
insculpida no princípio nemo tenetur se detegere, segundo o qual o sujeito
passivo não pode sofrer nenhum prejuízo jurídico por omitir-se de colaborar em
uma atividade probatória da acusação ou por exercer seu direito de silêncio
quando do interrogatório.
Direito de Defesa
• É dever da autoridade policial ou judicial que realiza o interrogatório:
advertir o sujeito passivo de que não está obrigado a responder às
perguntas que lhe forem feitas;
• O interrogatório deve ser tratado como um verdadeiro ato de defesa,
em que se dá oportunidade ao imputado para que exerça sua defesa
pessoal. Para isso, deve ser considerado como um direito e não
como dever, assegurando-se o direito de silêncio e de não fazer prova
contra si mesmo, sem que dessa inércia resulte para o sujeito passivo
qualquer prejuízo jurídico.
Princípios
Constitucionais
do Processo
Penal
Continuação…

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Direito de ser julgado em um prazo razoável
• Na vida contemporânea, o tempo rege a vida pessoal, profissional e o próprio direito;
• No Direito Penal, o tempo é fundante da sua estrutura: tanto cria como mata o direito (pela
prescrição);
• Relação que pode ser sintetizada da seguinte forma: a pena é tempo e o tempo é pena;
• Pune-se através da quantidade de tempo (castigo) e permite-se que o tempo substitua a pena
(tempo do perdão e da prescrição);
• Os muros da prisão não marcam apenas a ruptura no espaço, mas também uma ruptura do
tempo. O tempo, mais que o espaço, é o verdadeiro significante da pena.
Tempo
• Hoje, e penas
a concepção processuais
de poder passa pelo tempo: o verdadeiro detentor do
poder é aquele que está em condições de impor aos demais o seu ritmo, a sua
dinâmica, a sua própria temporalidade;
• O Estado-Penitência (WACQUANT) tomou, ao longo da história, o corpo e a
vida, os bens e a dignidade do homem. Agora, apossa-se do tempo;
• Para RUSCHE e KIRCHHEIMER todo modelo econômico encontra uma forma
de punição adequada. No capitalismo, modelo no qual o tempo de vida dos
trabalhadores é bem de troca (por um salário), a forma de punição
encontrada foi justamente a supressão do tempo de vida em liberdade.
Tempo e penas processuais
• Quando a duração de um processo penal supera o limite da duração
razoável, novamente o Estado se apossa ilegalmente do tempo do
indivíduo, de forma dolorosa e irreversível;
• Esse apossamento ilegal ocorre ainda que não exista uma prisão
cautelar, pois o processo em si mesmo é uma pena;
• Problema: equilíbrio entre um processo muito rápido e que atropela o
direito de defesa e as garantias do acusado e um processo muito
demorado, que se arrasta, equiparando-se a uma negativa de tutela
da justiça.
Tempo e penas processuais
• Ter em mente que a dilação indevida do processo gera ônus para o acusado
preso e para o acusado solto. Para o preso, é evidente, pois está dentro do
cárcere, sofrendo todos os problemas a ele inerentes;
• Para o solto, há o estigma de responder a um processo penal e a angústia
de não ver o problema solucionado;
• A submissão ao processo penal autoriza a ingerência estatal sobre toda
uma série de direitos fundamentais, para além da liberdade de locomoção,
pois autoriza restrições sobre a livre disposição de bens, a privacidade das
comunicações, a inviolabilidade do domicílio e a própria dignidade do réu;
• O caráter punitivo do processo está ligado ao tempo de submissão ao
constrangimento estatal, e não apenas à restrição da liberdade.
Tempo e penas processuais
• O processo penal encerra em si uma pena (a pena de sentar no banco
dos réus) que, mesmo possuindo natureza diversa da prisão cautelar,
inegavelmente cobra seu preço (proporcional à duração do processo).
Em ambas as situações (com prisão cautelar ou sem ela), a dilação
indevida deve ser reconhecida, ainda que os critérios utilizados para
aferi-la sejam diferentes, na medida em que, havendo prisão cautelar,
a urgência se impõe a partir da noção de tempo subjetivo.
Tempo e penas processuais
• A primeira garantia que é fulminada com um processo que sofre dilações
indevidas é a da jurisdicionalidade: o processo se transforma em pena prévia à
sentença;
• Depois, é fulminada a presunção de inocência: sepultamento da credibilidade
em torno da versão do acusado;
• Depois, fulminado o direito de defesa e o contraditório: dificuldades para o
exercício eficaz da resistência processual. Implica um sobrecusto financeiro
para o acusado com os honorários advocatícios e outras despesas processuais.
Também pode ocorrer o empobrecimento do acusado gerado pela
estigmatização social.
Tempo e penas processuais
• Beccaria lá no séc. XVIII já afirmava que o processo deve ser conduzido
sem indevidas protelações.
• Quanto mais rápida for a aplicação da pena e mais perto estiver do
delito, mais justa e útil ela será. Mais justa porque poupará o acusado
do cruel tormento da incerteza e porque a perda da liberdade (em sede
de medida cautelar) já é uma pena.
• E o processo, enquanto pena sem sentença, deve limitar-se pela estrita
medida que a necessidade o exigir, pois, segundo o autor, um cidadão
detido só deve ficar na prisão o tempo necessário para a instrução do
processo; e os mais antigos detidos têm o direito de ser julgados em
primeiro lugar.
E o Direito Penal Brasileiro?
• O art. 5º, LXXVIII, da CF, diz: a todos, no âmbito judicial e administrativo, são
assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a
celeridade de sua tramitação;
• Norma internalizada a partir de documentos internacionais de direitos
humanos, notadamente o art. 10 da DUDH de 1948 e os arts. 7.5 e 8.1 da
CADH;
• Mas e o prazo? A CF não adotou prazo específico. Pelo contrário, adotou a
“doutrina do não prazo”. O que isso significa, que apesar do CPP fazer
referência a alguns prazos, como nos arts. 400 (audiência proc. ordinário),
412 (1ª fase do júri), 531 (audiência proc. sumário) etc., não há qualquer
sanção com o seu descumprimento. Se não há qualquer sanção, esses prazos
são ineficazes.
Critérios para aferir o prazo do processo
• Nessa perspectiva do não-prazo, os tribunais regionais de direitos
humanos, especialmente o TEDH e CIDH, adotam a teoria dos 03
critérios, analisando sempre o caso concreto: a) a complexidade do caso;
b) atividade processual do acusado; c) conduta das autoridades
judiciárias (polícia, MP e Poder Judiciário);
• Esses três elementos devem passar pelo filtro da “razoabilidade”, para
afirmar-se se houve uma dilação indevida ou não;
• Problema da “dilação indevida”. Tem-se entendido que é a mera
inatividade, dolosa, negligente ou fortuita do órgão;
• Não é justificação para a dilação: a sobrecarga de trabalho do Poder
Judiciário.
Introduções positivas da Lei Anticrime
• Determinou que o juiz da instrução, em até 10 dias após o
recebimento dos autos do juiz das garantias, reexamine as medidas
cautelares (dispositivo suspenso pela decisão do Ministro Fux);
• Consagrou o dever de revisar periodicamente a prisão preventiva, a
cada 90 dias (art. 316, § único), mediante decisão fundamentada, de
ofício, sob pena de tornar a prisão ilegal (exemplo importante de
prazo com sanção).
Condenação do Brasil pela CIDH
• Caso Ximenes Lopes (1999): injustificada demora na prestação da tutela penal (e cível);
• Primeira sentença condenatória por violação do disposto no art. 8.1 da Convenção e
também consagrado no art. 5º, LXXVIII, da CF;
• o Brasil foi condenado a pagar: a) 125 mil dólares a título de compensação financeira à
família; b) mais 10 mil dólares a título de ressarcimento das despesas processuais; c)
pagamento dos valores no prazo máximo de 1 ano a contar da data da intimação da
sentença;
• Nesses casos: reconhecida a (de)mora jurisdicional, deve-se aplicar uma “solução”, que
poderá ser: a) compensatória cível (fixação de uma indenização); b) compensatória penal
(atenuação da pena, perdão judicial etc.); c) processual (a melhor solução seria a
extinção do feito, mas não há previsão legal no CPP); d) sancionatória (punição
administrativa do servidor público responsável pela dilação indevida).
Outros princípios
• Vedação das provas ilícitas: art. 5º, inciso LVI, da CF - são inadmissíveis, no
processo, as provas obtidas por meios ilícitos (para acusar/condenar);
• Princípio da igualdade das partes: desdobramento do princípio da
isonomia (art. 5º, caput, CF). Mitigação pelo princípio da presunção de
inocência;
• Princípio da publicidade: art. 5º, inciso LX, da CF – a lei só poderá restringir
a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o
interesse social o exigirem. Art. 792 do CPP: as audiências, sessões e os
atos processuais serão, em regra, públicos e se realizarão nas sedes dos
juízos e tribunais. Exceções: art. 201, § 6º e art. 792, § 1º, ambos do CPP.
Outros princípios
• Princípio do livre convencimento motivado – persuasão racional: art. 155 do CPP: o juiz
formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial,
não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos
colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas;
• O valor de cada prova é atribuído pelo julgador, no momento do julgamento;
• Princípio da motivação dos atos judiciais: art. 93, IX, da CF: todos os julgamentos dos
órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena
de nulidade (...). Serve para o controle da eficácia do contraditório, bem como de que
existe prova suficiente para derrubar a presunção de inocência. Controle da racionalidade
da decisão judicial;
• Princípio do duplo grau de jurisdição: a regra é que decisões possam ser questionadas
perante autoridades judiciárias hierarquicamente superiores e de preferência em órgão
colegiado;
Outros princípios
• Princípio da vedação do bis in idem: art. 8º, nº 4, da CADH, recepcionado
pelo art. 5º, § 2º, da CF (Decreto 678/1992): o acusado absolvido por
sentença passada em julgado não poderá se submetido a novo processo
pelos mesmos fatos. Não é bis in idem o mesmo fato ser apurado por
diversos ramos do direito: esfera cível, penal e administrativa são
independentes (cabem críticas);
• Princípio da oficialidade e obrigatoriedade. Exceção: princípio da
oportunidade;
• Princípio da identidade física do juiz: art. 399, §2º, do CPP: o juiz que presidiu
a instrução deverá proferir a sentença. O juiz que realiza contato direto com
as partes e com a prova produzida é o que tem melhores condições de julgar
o fato imputado.

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