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RESPONSABILIDADE CIVIL E SUAS CONSEQUÊNCIAS QUANTO AO


ABANDONO AFETIVO

Isabela de Camargo
Trabalho de Conclusão de Curso
Orientadora: Professor (a) Adélia Cristina Peres Torrecillas

RESUMO

O presente trabalho tem como objetivo efetuar a análise dos requisitos e


possibilidades de configuração por responsabilidade civil afetivo pelos progenitores,
assunto polemizado nos tribunais, ou seja, como um todo, vigorante em todas as
camadas da sociedade, atingindo questões éticas, sociais e culturais. Portanto,
dentro dessa análise sob diversos aspectos, da concessão do dano moral aos filhos
rejeitados afetivamente durante o seu desenvolvimento educacional, por um dos
seus pais e por ambos, frente aos deveres familiares. Dessa maneira, será exposto
um sucinto embasamento histórico do conceito de “família” e a mudança constante
no âmbito familiar. Todavia, o trabalho foi baseado em livros e artigos, a fim de que
pudesse trazer uma melhor reflexão acerca das imposições da lei, e dos deveres
dos pais para com seus filhos, bem como com a sociedade e, suas consequências,
uma vez que não são observadas.

Palavras-Chaves: Abandono afetivo, Responsabilização, Indenização.


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Introdução

O presente trabalho possui como objetivo abordar um dos temas mais


polêmicos, não apenas no Direito de Família, mas na área jurídica como um todo,
cuja problemática ganha relevância com o transcorrer dos valores da sociedade, no
sentido de reconhecer o afeto como valor jurídico nas relações familiares, dessa
maneira a responsabilidade civil decorrente do abandono afetivo, envolta a questões
correlacionadas, tais como os elementos da responsabilidade civil com o intuito de
se averiguar a possibilidade de incidência do dano moral.
Portanto, a explanação e a compreensão do tema abordado, foram tratadas
de forma a demonstrar paulatinamente a formação histórica das famílias,
corroborando as transformações nesse modelo, alterada com o decorrer do tempo
progressivamente, e tais mudanças vem alterando o panorama familiar diante a
sociedade, instaurando ao modelo familiar novos conceitos e formações. Todavia,
existe a demonstração das conjecturas para a definição da responsabilidade civil,
como: o dano moral para que ocorra a configuração de responsabilidade civil.
Outrossim, o trabalho diante do tema analisado trouxe as responsabilidades e
consequências dos genitores perante seus filhos, ratificando por meio de artigos do
ordenamento jurídico brasileiro que atestam aos menores os direitos básicos e
fundamentais, como: cuidado, educação, respeito e o direito de desenvolver-se
amparados em seio familiar, e que não basta apenas aos pais o suplemento de
alimentos, sendo a presença física e o cuidado de suma importância para que o
menor cresça com integridade.
Por fim, o estudo teve o propósito de asseverar a importância dos cuidados e
da presença dos genitores no crescimento e desenvolvimento de seus filhos, e o que
o singelo pagamento em quantia a título de alimentos, não minora as necessidades
dos menores. A omissão pelos genitores poderá afetar a evolução dos filhos,
ocasionando danos que poderão ser perpétuos. Desta maneira, serão apontadas as
carências de que seja atribuída aos genitores omissos, uma maior participação, por
meio de indenização, restaurando os danos morais causados aos seus filhos.
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DESENVOLVIMENTO

1- FAMÍLIA

De acordo com Venosa (2012), família é a unidade social mais antiga do ser
humano, considerada por ampla parte da doutrina brasileira, um grupo de pessoas
ligadas não somente por meio do sangue, mas também pelas questões de
afetividade. Contudo, buscando um melhor entendimento em sentido estrito, família
é definida como conjunto familiar sucedida do casamento ou união estável, e, por
conseguinte, pelos genitores advêm os filhos, sendo que estes poderão ser criados
por ambos ou apenas um deles.
Para tanto, Venosa (2012, p. 02) define:

Em conceito restrito família compreende somente o núcleo formado por pais


e filhos que vivem sobre o pátrio poder ou poder familiar. Nesse particular a
Constituição Federal estendeu sua tutela inclusive para a entidade familiar
formada por apenas um dos pais e seus descendentes, a denominada
família monoparental.

Dessa maneira, dentro do contexto familiar e no desenvolvimento do indivíduo


como pessoa passa ser de suma importância, o modelo familiar que a criança
crescerá, pois com essa base se construirá sua família no futuro. Ou seja, é neste
ambiente familiar harmônico, afetivo e protegido que são transmitidos valores éticos
e morais que servirão como base no processo de desenvolvimento para vida adulta.
(VENOSA, 2012).

1.1- Formação da família na história

O termo família segundo Gonçalves (2014), na era do direito romano,


perdurava a figura do homem, que se de dominou pater famílias (pai de família), o
qual exercia absoluto controle sobre sua mulher e seus filhos, podendo ele inclusive,
em relação aos filhos matá-los, vendê-los e ainda impor-lhes a pena que se achasse
cabível, a família era respectivamente também, uma unidade econômica, religiosa,
política e jurisdicional. Uma vez, que o ascendente vivo mais velho era, ao mesmo
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tempo, chefe político, sacerdote e juiz. Pois, ele conduzia, oficiava o culto dos
deuses domésticos e distribuía justiça. Gonçalves (2014, p. 31).
Gonçalves (2014) aponta ainda, as questões canonistas que desde a
antiguidade, achavam que não se poderia existir a dissolução do casamento, pois se
tratava de uma união realizada por Deus, logo sua dissolução só deveria ocorrer
com morte de um dos cônjuges, ou seja, não poderia o homem dissolver algo
realizado por Deus. Cabe notar ainda, que apenas no século IV, na constância do
reinado do Imperador Constantino é que foi tratada uma nova concepção cristã da
família, sendo restringindo os poderes do pater famílias, passando dar uma maior
autonomia para as mulheres e para os filhos. Gonçalves (2014, p. 31).
Segundo explica Nader (2010), o pater é tido como um sacerdote e
magistrado, pois o patrimônio familiar está concentrado em suas mãos, isto é, tudo
deveria passar por ele. Pode-se dizer que o cristianismo teve papel fundamental na
restrição dos poderes conferidos ao pater de forma a dar maior autonomia à mulher
e aos filhos. Nader (2010, p. 12-13) traz:

Quando falecia o pater, seus filhos varões adquiriam personalidade e


passavam a constituir outras famílias, chamadas próprio jure, nas quais
assumiam a condição de pater famílias. O conjunto destas famílias,
compostas por descentes de um ancestral comum, criava a família communi
jure, constituída por ágnatos, ou seja, parentes por linha masculina. O
parentesco materno não produzia efeitos jurídicos. [...] Como as relações de
família se revelaram injustas na fase do patriarcado, por influência do
cristianismo a autoridade do pater foi perdendo substância
progressivamente, até desaparecer a sua superioridade em relação à
esposa. Quanto aos filhos, estes deixaram a condição alieni juris, adquirindo
personalidade jurídica.

Para Nader (2010), a ideia de família foi influenciada pela religião, a exemplo,
do Código Civil de 1916 que não admitia o filho havido fora do casamento e nem as
uniões extraconjugais. Contudo, com a promulgação da Constituição Federal de
1988, a qual trouxe em seu texto como princípio básico a dignidade da pessoa
humana, abrangendo como a entidade familiar as mais variadas formas de
constituição e não mais a singular, formada apenas pelo casamento, e passou
proibir ainda, qualquer tipo de discriminação entre os filhos, dando tratamento
igualitário sejam eles concebidos pelo casamento e/ou não.

1.2- Conceitos gerais acerca da família


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Nos termos do artigo 226 da Constituição Federal de 1988: “A família, base


da sociedade, tem especial proteção do Estado” (BRASIL, 2006).
O Código Civil de 2002 em seu texto seguiu os mesmos ditames da
Constituição Federal de 1988, em relação à proteção ou assistência, alimentos e
união estável. Sendo assim os pais tem igualdade de direito sobre seus filhos
menores, tudo isso em consequência do poder familiar.
Portanto, Gonçalves (2014) aponta que a família contemporânea pode ser
constituída pelos laços sanguíneos ou não, ou pode ser formada pelo vinculo
matrimonial que uniu ambas as vontades das partes. Sendo assim, o vocábulo
família compreende todas as pessoas ligadas por vínculo de sangue, bem como
aquelas unidas pela afinidade ou ainda pela adoção. Assim, podemos compreender
que o Direito de família não está previsto apenas no Código Civil, como também
abrange outras normas como, normas religiosas de condutas aos membros
familiares, bem como regras de cooperação mutua entre eles. Sendo a participação
do Estado de suma importância para que cada indivíduo que constitua a família
tenha uma contribuição para instituição familiar.
É certo que o Código Civil prevê o direito aos alimentos, porém, estes não são
devidos entre pais e filhos, ou seja, também são devidos a todos os parentes em
linha reta, ou aqueles que possuem melhores condições para prestar alimentos.
Assim, para melhor esclarecer. Gonçalves (2014, p. 20).

No tocante aos alimentos, o Código Civil de 2002 traça regras que


abrangem os devidos em razão do parentesco, do casamento e também da
união estável, trazendo, como inovação, a transmissibilidade da obrigação
aos herdeiros [...] A obrigação alimentar alcança todos os parentes na linha
reta. Na linha colateral, porém, limita-se aos irmãos.

Assim, fica claro que a proteção das pessoas e dos filhos subordinados à
autoridade paterna constitui dever decorrente do poder familiar, expressão melhor
utilizada e mais adequada.

2- DO DIREITO FAMILIAR

Para Diniz (2012), o poder familiar é um conjunto de direitos e deveres que


são conferidos aos pais, em igualdade de condições no tocante ao sustento, a
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guarda, e a educação, em relação à figura dos filhos menores de 18 anos, bem


como ainda, dos seus bens. Destarte, não cabe aos pais tão somente dar a vida e
alimentá-los, cabendo a eles também que sejam responsáveis em proporcionar, a
proteção, e o afeto, dos filhos, não afastando o direito de correção, uma vez que não
poderão ser exageradas, nem agressões físicas, para que o menor não seja exposto
à situação de risco. Assim, Diniz (2012, p.519). “Podem ainda usar, moderadamente
seu direito de correção, como sanção do dever educacional, pois o poder familiar
não poderia ser exercido, efetivamente, se os pais não pudessem castigar seus
filhos para corrigi-los”.

2.1- Princípio da afetividade

De acordo com Dias (2009), a edificação familiar ocorre constantemente pela


interação afetiva entre os indivíduos, desta forma a construção de lares se dá por
meio do amor parental. Este princípio atua de forma oculta na legislação vigente por
meio de adjetivos como a proteção e cuidado que indiretamente é designado por
afeto, desse modo o princípio da afetividade é o que rege o direito de família
conforme enfatiza Dias (2009, p.33).

O afeto não é somente um laço que envolve os integrantes de uma família.


Também tem um viés externo, entre as famílias, pondo humanidade em
cada família, compondo, no dizer de Sérgio Resende de Barros, a família
humana universal, cujo lar é a aldeia global, cuja base é o globo terrestre,
mas cuja origem sempre será, como sempre foi, a família.

Ou seja, o afeto deu um novo rumo ao direito de família, mesmo que seja ele
um princípio implícito, uma vez que, as características das famílias contemporâneas,
são tratadas dentro de um formato, cuja afinidade está na estrutura familiar, seja ela
consanguínea ou não.

2.2- Princípio da igualdade familiar

Brasil (2006) de acordo com Constituição Federal é assegurado que todos os


filhos sejam tratados iguais, mesmo que seja concebido fora do matrimônio e/ou
adotados, assim o artigo 227 em seu § 6º estabelece que (Brasil, 2006, p.105).
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Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança,


ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à
saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura,
à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária,
além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação,
exploração, violência, crueldade e opressão.
§ 6º Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção,
terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações
discriminatórias relativas à filiação.

Portanto, pode-se ponderar que única diferença existente entre a prole é a


forma que ela terá o contato com a família, uma vez, que poderá ser concebida na
instituição da união estável, ou mesmo ser adotada por pais vistos como comuns, ou
originárias de famílias homoafetivas, ou ainda, advinda de uma relação
extraconjugal.

2.3- Princípio da convivência em família

Neste contexto é assegurado que todos os indivíduos tenham direito de


desfrutar do lar como ambiente afável, fortalecendo e gerando todos os dias laços
que venham a consolidar o âmbito familiar. Sendo a casa um ambiente privativo que
não deve ser violado.
É direito da prole o convívio com os pais, ainda que eles sejam divorciados,
porém, hoje se busca a ideia de guarda compartilhada, a qual os pais compartilham
a convivência e todas as responsabilidades que envolvam o filho menor, garantindo
assim, o pleno direito da criança e do adolescente.

2.4- A importância dos pais em relação à formação dos filhos

Segundo Zimerman (1999), os filhos demandam de cuidados e muita


prudência por parte dos pais desde o nascimento até sua maioridade, todavia,
dentre essas observações temos a alimentação, higienização, atenção, e o principal
o amor. Contudo, a educação sempre acaba sendo tratada como uma das maiores
responsabilidades dos pais, porém, essa educação pode ser dividida em educação
formal e informal. A educação formal trata-se da cientifica, é o estímulo aos menores
ao estudo, apoio e o fornecimento de meios para a concretização do conhecimento.
Já na educação informal é voltada para o conhecimento hierárquico de princípios,
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valores e o discernimento irão trabalhar ainda questões para diferenciar o que é


certo e o que é errado, como afirma Zimerman (1999, p.104)

Uma família bem estruturada requer algumas condições básicas, como é a


necessidade de que haja uma hierarquia na distribuição de papéis, lugares,
posições e atribuições, com a manutenção de um clima de liberdade e de
respeito recíproco entre os membros.

Outrossim Zimerman (1999), os pais têm grande influência sobre os filhos


sendo uma delas a formação civil, pois a partir de um diálogo restrito tendem os
filhos estabelecerem uma relação limitada e assim uma educação pelo silencio. Já
os pais que com seus filhos têm um relacionamento com diálogos abertos,
conseguem estabelecer uma relação de confiança e liberdade, logo, o filho poderá
encarar a vida adulta com maior preparo para o seu futuro. Nesse sentido, a
educação, o diálogo, a atenção e o amor, auxiliam a criança tanto na vida social
como na escolar, concedendo mecanismos para a prole busque sempre uma melhor
atitude a tomar nas situações que se depararem na vida. E assim, prestando os pais
os devidos cuidados para com seus filhos, não descumprindo as leis, não incorrerão
para serem responsabilizados.

3- DA RESPONSABILIZAÇÃO

De acordo com Gagliano (2013), a responsabilidade civil é um dever jurídico


sucessivo que surge para reparar um dano ocasionado pela violação do dever
jurídico originário, ou seja, é a obrigação pecuniária de reaver um dano causado a
outrem, seja ele por ação ou omissão, por meio da indenização.
Para a ocorrência da responsabilidade civil deve-se a pessoa praticar um ato
ilícito, e a partir dele ocorrer um dano que tenha conectividade entre eles. Assim,
toda pessoa que causar ato ilícito a outrem fica obrigado a repará-lo. Assim, dispõe
o artigo 186, caput, do Código Civil “Aquele que, por ação ou omissão voluntária,
negligencia ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que
exclusivamente moral, comete ato ilícito”.
No entanto, em conformidade com o artigo mencionado, uma vez que,
preenchido esses quatro requisitos: ação ou omissão, ato ilícito, dano e nexo causal,
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estará configurada a responsabilidade civil, imputando ao autor do dano, o dever de


reparação.

3.1- Responsabilidade objetiva e subjetiva


A responsabilidade civil surge quando ocorre o descumprimento de uma
obrigação, ocasionando assim uma consequência jurídica ou patrimonial, que
decorre de lei ou de um contrato. Deste modo, são duas as espécies de
responsabilidade civil, a responsabilidade civil subjetiva e a responsabilidade civil
objetiva.
A responsabilidade civil subjetiva se dá quando estiverem presentes quatro
elementos: o fato, dano, nexo causal e culpa. Aqui, o elemento da culpa é
indispensável para que a pessoa tenha o dever de reparar o dano, é obrigatório
provar para o juiz a existência de um fato que gerou um dano e, que entre o fato e o
dano há a existência de um nexo de causalidade, ou seja, uma conexão entre a
conduta e o resultado, além da prova de que o agente agiu com culpa em sentido
amplo, seja dolo, negligência, imprudência ou imperícia. Nesse sentido, define
Gonçalves (2014, p.52)

“Diz-se, pois, ser “subjetiva” a responsabilidade quando se esteia na ideia


de culpa. A prova da culpa do agente passa a ser pressuposto necessário
do dano indenizável. Nessa concepção, a responsabilidade do causador do
dano semente se configura se agiu com dolo ou culpa”.

A responsabilidade civil objetiva se dá com a necessidade de que a vítima


comprove três elementos como: o fato, o dano e o nexo causal, para que só assim
tenha direito a indenização. É possível notar que esta responsabilidade independe
da culpa. Gonçalves (2014, p.56)

“Na responsabilidade objetiva prescinde-se totalmente da prova da


culpa. Ela é reconhecida, como mencionado, independente de culpa.
Basta, assim que haja relação de causalidade entre a ação e o dano”.

Sendo assim, podemos concluir que ambas as responsabilidades, ou seja,


subjetiva e objetiva, tem o dever de recair sobre o agente causador do dano o direito
de indenização, porém, é importante distinguir qual delas recaíra sobre a pessoa. E
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assim, é insignificante a presença da culpa para o pagamento a título de


indenização.

3.2- Dano moral

Não há que se falar em responsabilidade civil, sem que haja devidamente a


comprovação do prejuízo, ou seja, do dano causado pelo agente. Assim, o dano
trata-se de um elemento importante e indispensável para que decorra o direito de
indenização ou reparação de fato. Para Diniz (2003, p.112) “o dano é como uma
lesão (diminuição ou destruição) que, devido a certo evento, sofre uma pessoa,
contra sua vontade, em qualquer bem ou interesse jurídico, patrimonial ou moral”.
Assim Diniz (2012, p. 93), destaca sobre o tema:
O dano moral direto consiste na lesão a um interesse que visa a satisfação
ou o gozo de um bem jurídico extrapatrimonial contido nos direitos da
personalidade (como a vida, a integridade corporal e psíquica, a liberdade, a
honra, o decoro, a intimidade, os sentimentos afetivos, a própria imagem)
ou nos atributos da pessoa (como o nome, a capacidade, o estado de
família). Abrange, ainda, a lesão à dignidade da pessoa humana (CF/88, art.
1º, III).

Já nas palavras de Filho (2008, p.78)


Nessa linha de princípio, só deve ser reputado como dano moral a dor,
vexame, sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira
intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe
aflições, angústia e desequilíbrio em seu bem-estar. Mero dissabor,
aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da
órbita do dano moral, porquanto, além de fazerem parte da normalidade do
nosso dia-a-dia, no trabalho, no trânsito, entre os amigos e até no ambiente
familiar, tais situações não são intensas e duradouras, a ponto de romper o
equilíbrio psicológico do indivíduo. Se assim não se entender, acabaremos
por banalizar o dano moral, ensejando ações judiciais em busca de
Indenizações pelos mais triviais aborrecimentos.

O dano moral possui duas espécies: o dano moral compensatório e o dano


moral punitivo; os dois são defendidos pela jurisprudência que estipula que em sua
aplicação devem-se ponderar critérios de proporcionalidade e de razoabilidade, além
das condições entre ofensor e ofendido sobre o bem jurídico tutelado e que foi
lesado.
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4- DO ABANDONO

O abandono afetivo configuraria ato ilícito por ser o afeto um princípio,


portanto um dever jurídico imposto ao pai frente os filhos menores. Aquele que deixa
de cumprir tal imposição está descumprindo um preceito legal. E tal violação, aliada
aos demais pressupostos, possibilitaria a condenação do infrator à indenização por
dano moral. Diante disso, Dias (2009, p. 455) apresenta outro posicionamento:
“ainda assim, mesmo que o pai só visite o filho por medo de ser condenado a pagar
uma indenização, isso é melhor do que gerar no filho o sentimento de abandono”.

4.1- Consequências do abandono

Como foi citado nos capítulos anteriores, é evidente a importância que tem a
unidade familiar no desenvolvimento dos filhos até que estes cheguem à vida adulta.
Um indivíduo criado por um ou ambos os genitores que suprem todas as suas
necessidades, convivem de forma harmoniosa em qualquer ambiente. Já aquele
com uma criação diversa, sendo rejeitados por um ou ambos genitores, não
conseguem viver em harmonia em lugar algum, sempre serão revoltados pela
situação a qual foram expostos quando menores. Dessa forma, fica fácil identificar
crianças que crescem sem este “apoio familiar”, ocasionando a eles danos
irreparáveis na maioria das vezes, comprometendo de forma negativa o
comportamento e a sua identidade como indivíduo. É nesse sentido que Dias (2009,
p.21) ressalta:

Dentre os inescusáveis deveres paternos figura o da assistência moral, psíquica e


afetiva, e quando os pais ou apenas um deles deixa de exercitar o verdadeiro e mais
sublime de todos os sentidos da paternidade, respeitante a interação do convívio e
entrosamento entre pai e filho, principalmente quando os pais são separados ou nas
hipóteses de famílias monoparentais, onde um dos ascendentes não assume a
relação fática de genitor, preferindo deixar o filho no mais completo abandono, sem
exercer o direito de visitas, certamente afeta a higidez psicológica do descendente
rejeitado.

Ao longo da vida da criança ou do adolescente os danos dessa ausência


estarão explícitos, podendo ter influências nos estudos, receio de se relacionarem
com outras pessoas, ou até mesmo tornam-se pessoas inibidas, oprimidas e
revoltadas.
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É claro que existem casos que os genitores não possuem a intenção de


deixar de atuar no desenvolvimento dos filhos, no entanto, deixam de cumprir com
suas responsabilidades e necessidades emocionais de forma omissiva e negligente.
Mesmo o simples pagamento da pensão não desobriga o pai a ser presente na vida
do filho, como também o afeto existente dessa relação. Nesse sentido, Madaleno
(2007, p.124) diz:

Foi-se o tempo de os equívocos das relações familiares gravitarem exclusivamente


na autoridade do pai, como se ele estivesse acima do bem e do mal apenas por sua
antiga função provedora, sem perceber que deve prover seus filhos muito mais
carinho do que dinheiro, de bens e de vantagens patrimoniais. Têm os pais o dever
expresso e a responsabilidade de obedecerem às determinações judiciais ordenadas
no interesse do menor, como disto é exemplo o dever de convivência em visitação,
que há muito deixou de ser mera faculdade do genitor não-guardião, causando
irreparáveis prejuízos de ordem moral e psicológica à prole, a irracional omissão dos
pais.

É claro que os pais tendo eles ou não uma relação entre si,
independentemente de com qual a guarda for estabelecida, devem estar de forma
voluntária e constante na vida e rotina dos seus filhos, que requerem cuidados deles
até poderem cuidar de si mesmo. Sobre o assunto, vem o doutrinador Nader (2010,
p.206) expor:

A vida na idade adulta e a formação deste ser, resultam de experiências vividas ao


longo da vida, mormente no ambiente familiar, especialmente na infância e
adolescência(...). Se a criança cresce em um ambiente sadio, benquista por seus
pais, cercada de atenção, desenvolve naturalmente a autoestima, componente
psicológico fundamental ao bom desempenho escolar, ao futuro sucesso profissional
e ao bom relacionamento com as pessoas.

São as consequências desse abandono afetivo dos pais para com os seus
filhos que estes na sua adolescência começam a consumir de forma excessiva
álcool, que é a porta aberta para o consumo de outras drogas, e com isso perante a
sociedade apresentam comportamentos agressivos, tudo isso evidencia ainda mais
os danos que a ausência de estrutura familiar causa aos seus membros. Em razão
desses incidentes devem os pais ser responsabilizados civilmente, a partir da
ausência destes na criação dos filhos, como consequência deixa de prover os
cuidados e proteção destes filhos, que tem tais direitos garantidos pela Constituição
Federal, ferindo tais direitos devem eles responder por tal ato, caracterizando assim
a responsabilidade civil por abandono. Sobre o assunto, ressalta Diniz (2010, p. 33):

A conduta de um genitor ausente, que não cumpre as responsabilidades intrínsecas


ao poder familiar, enquadra-se perfeitamente entre os atos ilícitos, tendo ele
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descumprido seus deveres parentais perante o filho, inerentes ao poder familiar,


esculpidos nos artigos 22 do Estatuto da criança e do adolescente – ECA.

O que é imposto aqui é que os pais cumpram com os seus deveres legais de
cuidado e proteção aos seus filhos e caso eles não cumpram tais obrigações serão
punidos por sanções pecuniárias. Os pais não são obrigados a amarem seus filhos,
o que a lei impõe a eles é o dever de cuidado com a sua prole. Portanto, Nader
(2010, p.14) dispõe que:

O descaso entre pais e filhos é algo que merece punição, é abandono moral grave,
que precisa merecer severa atuação do Poder judiciário, para que se preserve não o
amor ou a obrigação de amar, o que seria impossível, mas a responsabilidade ante o
descumprimento do dever de cuidar, que causa o trauma da rejeição e da indiferença.

Isto posto, para que recaia a responsabilidade civil e o dano seja ressarcido
deve-se analisar o caso concreto, que levará em consideração o estado em que a
criança se encontra, os danos que possam ter ocorridos pela negligência de seus
pais
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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao longo do tempo, houve diversas mudanças ocorridas nas unidades


familiares, uma delas foram os variados modelos constituídos na sociedade
contemporânea, assim um novo conceito de família adentrou a legislação brasileira,
tendo como norte os princípios constitucionais.
As evoluções começaram com a Constituição de 1988, trazendo princípios
constitucionais que colocou o homem e a mulher em pé de igualdade, preconceito
este que anos as mulheres sofriam, pois eram sempre mandadas primeiro pelo pai,
depois maridos e filhos. Outras vieram na vigência do Código Civil de 2002,
revogando o Código Civil de 1916, e com isso substituindo algumas expressões que
eram usadas no código antigo e no atual não mais, a exemplo, a expressão “poder
familiar” no Código Civil de 1916 era conhecido como “pátrio poder”, que com a nova
expressão os deveres e responsabilidade são de ambos os genitores, não apenas
só do pai como era na lei antiga.
A discriminação existente em relação aos filhos havidos fora do casamento foi
extinta pela nova legislação vigente, dando a eles igualdade perante aos demais
irmãos. Essa imposição do dever de cuidar, não vem juntamente com o dever de
amar sua prole, no entanto a falta de cuidado, pela falta de sua presença ativa, traz
danos aos seus filhos. Logo o simples pagamento dos alimentos pelo genitor não o
permite que seja ausente durante a criação do menor, tendo ele que ser presente,
independente da alegação de que pagando já está exercendo seu papel. O afeto
entre a relação de pais e filhos não são estabelecidos no ordenamento jurídico,
porém, é fundamental para o bom desenvolvimento do menor, para que assim
cresçam com uma boa estrutura familiar e em suas vidas adultas passem os
mesmos princípios para as suas famílias que vão constituir.
É preciso destacar aqui que nos casos em que o pedido é a indenização dos
pais pelo abandono afetivo, o que os filhos buscam é que sejam indenizados pela
falta de cuidados, ausência, e constrangimentos que tiveram ao longo de suas vidas
causados por esse abandono, e que tinham tais direitos garantidos por lei e os pais
não cumpriram e, portanto, devem ser penalizados. Todavia, a fim de conceder a
possível indenização por danos morais no caso de abandono afetivo, se faz
necessário preencher alguns requisitos como a presença do dolo/culpa, o dano
efetivamente comprovado principalmente por perícia técnica a fim de constatar sua
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profundidade com o intuito de se averiguar a potencialidade do abalo na dignidade


entre a conduta do agente e o resultado, devendo todos restar comprovados.
Dessa forma, caberá ao filho demonstrar o ônus da prova no decorrer do
processo, pois se trata de responsabilidade civil subjetiva, que deverão provar com
laudo médicos os prováveis danos emocionais deixados pelo abandono dos pais,
devem estar descritos o caso deles, bem como também servira como meio
probatório o histórico escolar de todo seu não desenvolvimento, comprovando assim
que tudo originou da falta de base familiar. Enfim, tendo causalidade entre o dano e
a culpa dos pais, estes serão responsabilizados na esfera civil.
Então por fim, não querendo propiciar afeto ao menor, é melhor que não se
tenha filhos, pois, ter filhos implica em cumprir deveres sendo um deles o dever da
convivência familiar, cuja desobediência gera sanções. Não se pode, pois, compelir
ninguém a amar, a dar afeto ou a conviver, mas pode sim se responsabilizar diante
da existência de pressupostos, pela quebra de deveres familiares, expressos em lei.
Quem tem filhos, portanto, assume o risco de ter que propiciar esses direitos ao
menor, devidamente previstos em lei, já que se constitui em deveres para os pais,
sob pena de responsabilização civil.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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DINIZ, Maria Helena, Curso de Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil, 26ª
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