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HOMOAFETIVA
SUMÁRIO: . Introdução. 2. União Homoafetiva – Conceito. 2.1. Conflito existente
entre as disposições da Constituição Federal e a União Homoafetiva. 3. O instituto da
União Estável e sua comparação com a União Homoafetiva. 4. Causas do não
reconhecimento da União Homoafetiva. 4.1 A influencia da Igreja Católica na união
entre pessoas do mesmo sexo. 4.2 As características de nossos tribunais. 4.3 Os
tribunais Gaúchos. 5. As mudanças no Direito de Família com o reconhecimento da
União Homoafetiva. 5.1 Conclusão – Da necessidade do reconhecimento da União
Homoafetiva.
1. Introdução
União entre pessoas do mesmo sexo é um tema que apesar de ser uma realidade há
vários anos, na ultima década tomou maiores proporções, por inúmeros motivos, dentre
os quais: o movimento tem se organizado melhor promovendo marchas para reivindicar
seus direitos e as ações judiciais em busca do reconhecimento da União Homoafetiva
tornaram-se uma realidade.
É necessária uma legalização para o referido tema e como, infelizmente, esta não existe,
pretende-se discorrer sobre a necessidade do reconhecimento da União Homoafetiva e
as barreiras que esse tipo de união enfrenta.
A união homoafetiva nada mais é do que a união de duas pessoas do mesmo sexo, que
traz consigo todas características de um relacionamento, ou seja, um convívio público e
duradouro, conceito este que muito se assemelha com o da união estável, se não
vejamos:
Art. 1.723, CC. É reconhecida como entidade familiar à união estável entre o homem e
a mulher, configurada na convivência pública, duradoura e estabelecida com o
objetivo de constituição de família.
Portanto, a União Homoafetiva pode ser caracterizada também como união estável entre
pessoas do mesmo sexo, pois sua única diferença com a União Estável prevista no
artigo supramencionado é a questão dos componentes serem do mesmo sexo.
Como é sabido, não se tem no Brasil uma lei específica para este referido assunto,
embora exista um projeto de lei que tenta regulamentar a união civil entre pessoas do
mesmo sexo.
Art. 1º. As relações pessoais e com terceiros decorrentes de uma união familiar estável
ou de uma união civil homoafetiva se regerão pela presente lei e pelas normas da
legislação civil que com ela não conflitem(1).
Aprovar esse projeto de lei, hoje, não seria de grande utilidade, pois como será
mostrado com maior riqueza de detalhes em momento oportuno, apesar de não
existirem muitas decisões judiciais a favor do tema, as existentes já estão em um
patamar muito mais elevado do que o referido projeto de lei.
(...)
§ 3º: Para efeito de proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e
a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.
(grifo nosso)
Se todos são iguais perante a lei sem qualquer distinção, há de se convir que a união
entre pessoas do mesmo sexo é perfeitamente possível. Ademais, a relação afetiva entre
duas pessoas é um tema de interesse particular, e não público, logo, o Estado deve
proteger e não proibir ou fechar os olhos para tal assunto.
A União Estável não era reconhecida no Código Civil de 1916, pois apenas o casamento
civil era reconhecido como entidade familiar. Havia ao instituto do concubinato, o qual
era caracterizado por uma união com os mesmo traços do casamento só não atendendo a
formalidade do casamento.
O concubinato poderia ser puro, onde as pessoas não tinham nenhum impedimento para
se casar, ou impuro, o qual se dava quando as pessoas tinham impedimentos legais para
a realização do matrimônio, ou seja, quando alguma das partes já fosse casada, ou
estivesse presente qualquer outra peculiaridade que impedisse o casamento civil.
Caso não fosse provada, em juízo, a constituição da sociedade de fato, era concedida à
parceira uma indenização pelos serviços prestados. A concubina era tratada como
empregada doméstica, ou seja, confundia-se a relação de afeto com uma relação de
trabalho.
Um relevante avanço ocorreu com a edição da sumula 380 do STF, pois, pela primeira
vez, foi reconhecido o direito da concubina. A sumula diz que: "Comprovada a
existência da sociedade de fato entre os concubinos, é cabível a sua dissolução judicial,
com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum".
Entretanto, a União Estável, como entidade familiar protegida pelo Estado, apenas foi
reconhecida na Constituição de 1988, através de seu art. 226. Tal dispositivo
constitucional revolucionou o direito de família, uma vez que cria um novo conceito de
família, a qual passa a basear-se em três princípios: Afeto, Solidariedade e Cooperação.
Mais tarde, veio a Lei 8.971 de 1994, a qual exigiu o lapso temporal de no mínimo 5
(cinco) anos de relacionamento afetivo para o reconhecimento da União Estável, ou a
constituição de prole entre os companheiros.Vejamos:
A critica feita pela doutrina a essa norma se refere ao lapso temporal, alega-se ser
inconstitucional a determinação de prazo mínimo de relacionamento, uma vez que o art.
226 não exige tal lapso para a configuração de União Estável e, se a Constituição não
restringiu o direito, não caberia à lei ordinária restringir. Ademais, no parágrafo terceiro
do referido dispositivo constitucional, a Constituição ressalta que a lei deve facilitar a
conversão de tal união em casamento, entendendo-se que lei ordinária não deve criar
empecilhos.
Em seguida, foi editada a Lei 9.278 de 1996, a qual deixou de exigir o lapso temporal
de 5 (cinco) anos e trouxe um conceito de União Estável com os requisitos básicos para
seu reconhecimento. Nesse sentido, ficou mais fácil para magistrado julgar e analisar o
caso concreto, pois, para se reconhecer a União Estável é preciso a concorrência dos
requisitos expressos em lei.
O novo código civil, em seus art. 1.723 e seguintes, mantém o mesmo conceito de
União Estável e seus requisitos, instituindo como regime de bens entre os companheiros
o da comunhão parcial de bens, ou seja, todos os bens que forem adquiridos na
constância do relacionamento estável será divido em partes iguais entre os cônjuges. A
polêmica, nesse caso, dá-se pelo fato do código se omitir a respeito da legislação
anterior, daí surgiu a duvida se ele revogou ou não as leis anteriores.
Com isso, surgiram duas correntes doutrinárias, a primeira dizendo que revogou, pois
regulamentou totalmente a matéria, e a outra dizendo que não, pois o novo Código Civil
e as leis especiais são complementares, por isso não há de se falar em revogação da
legislação anterior.
Ademais, vale ressaltar a Sumula 382 do STJ, a qual afirma que o fato das pessoas não
morarem sob o mesmo teto, não desqualifica o concubinato:
"A vida em comum sob o mesmo teto, more uxorio, não é indispensável à
caracterização do concubinato" (sum. 382 do STJ).
4.1 A influencia da Igreja Católica na União Estável entre pessoas do mesmo sexo.
Teoricamente nosso Estado é laico, ou seja, não sofre influência de nenhuma religião,
cabendo a ele proteger as religiões e não positivar seus princípios. Entretanto, existe
uma grande distância entre o plano teórico e o prático, não que isto necessariamente
represente um problema, só que para questão da união homoafetiva é a confusão entre
direito e moral religiosa é um problema para o seu reconhecimento, pois nossos
legisladores e operadores do direito são, em sua maioria, conservadores e afetados pela
opinião da igreja, o que provoca o atraso do nosso ordenamento em regular o questão
fática da união entre homossexuais.
De acordo com um relatório feito pela ONU, constatou-se que nosso poder Judiciário é
extremamente conservador. Asma Jahangir, representante da ONU, a qual esteve no
Brasil e deixou nosso país dizendo que recebeu queixas da falta de acesso a Justiça(2).
Ela não é a única a se pronunciar neste sentido. Dr. Claudio Baldino Maciel, presidente
da Associação dos Magistrados do Brasil (AMB), foi mais longe ao afirmar que a
postura dos tribunais se assemelha com a do século XVIII: magistrados extremamente
reativos a mudanças e bastante conservadores, o que acaba excluindo o caráter
científico do direito. Ele afirmou ainda que esta postura abalou a credibilidade no Poder
Judiciário e promoveu uma fuga de investimentos(3).
Devido a esta postura, a maioria esmagadora das decisões referentes à União Estável
entre pessoas do mesmo sexo não reconhece esse tipo de união. As decisões são no
sentido de alegar que a matéria ainda não foi normalizada, dizendo os magistrados que
não podem julgar favoráveis à União Homoafetiva com base no art 226 da CF, pois tal
artigo é claro ao dizer que o reconhecimento se dá quando exista união estável entre
homem e mulher.
Ocorre que tais decisões não merecem prosperar, pois ignoram o princípio mais
importante do nosso ordenamento, que é a dignidade da pessoa humana, fundamento do
nosso Estado Democrático de Direito. O princípio da dignidade da pessoa humana
garante que toda pessoa tem direito de realizar os seus atributos inerentes à
personalidade e concretizar os direitos previstos na Constituição. Sendo assim, o não
reconhecimento da União Homoafetiva constitui-se em afronta ao princípio da
dignidade da pessoa humana, na medida em que ofende o princípio da igualdade das
pessoas independente do sexo e, ainda, impede que as pessoas tenham seu
relacionamento afetivo reconhecido pelo ordenamento, o que as coíbe também de ter
acesso à divisão de bens em eventual partilha, aos alimentos, à sucessão e à pensão
previdenciária.
Assim, mesmo não contemplados no art. 1.694 do novo Código Civil – que prevê sua
possibilidade apenas entre parentes, cônjuges ou companheiros – os alimentos são
devidos na união homoafetiva, eis que decorrem, logicamente, de princípios
constitucionais, especialmente do dever de solidariedade social e da afirmação da
dignidade humana, que, repita-se à exaustão, não pode ser vislumbrado como valor
abstrato, desprovido de concretude. Ora, se a relação homoafetiva, como qualquer outro
relacionamento heterossexual, lastrei-se no afeto e na solidariedade, não há motivo para
deixar de reconhecer o direito a alimentos, em favor daquele que necessita de proteção
material.
Deste modo, com espeque nos primordiais e inafastáveis valores constitucionais e tendo
em mira que é objetivo fundamental da República construir uma sociedade solidária,
justa e igualitária, visando a promoção do bem estar de todos, indistintivamente, sem
preconceitos, não se pode negar a possibilidade de alimentos nas uniões homoafetivas,
sempre que um dos parceiros deles necessitar, como forma de manter sua integridade,
tal como sói ocorrer em qualquer outra união familiar(6).
Não é apenas na doutrina que se encontra respaldo para afirmar a necessidade do direito
aos alimentos na União Homoafetiva. A jurisprudência gaúcha recente reconhece ainda
o direito à sucessão:
Infelizmente este tipo de jurisprudência é minoritário, mas mostra que o direito tem
caminhado lentamente para o reconhecimento do direito aos alimentos e à sucessão em
união homoafetiva, o que já é uma vitória visto que a própria união homoafetiva ainda
não foi regulamentada.
É verdade que a omissão da legislação quanto à matéria não é o único fator responsável
pela marginalização dos casais homoafetivos, mas, sem dúvidas, ela serve para reforçar
o preconceito existente. O reconhecimento da União Homoafetiva seria um forte aliado
na luta contra o preconceito.
Finalmente, defende-se que, enquanto não seja regulamentada a união entre pessoas do
mesmo sexo, os aplicadores do direito deveriam utilizar-se do princípio constitucional
da dignidade da pessoa humana e do art. 4° da LICC para, através da aplicação da
analogia, reconhecer a União Homoafetiva, concedendo aos companheiros do mesmo
sexo os mesmo direitos previstos para a União Estável.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
ASSIS, Reinaldo Mendes de. União entre homossexuais: aspectos gerais e patrimoniais.
In: Jus Navigandi, n.52. Disponível em <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?
id=2441>. Acesso em: 11 mar. 2002.
BRANDÃO, Débora Caus. Parcerias homossexuais. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2001.
NOTAS:
3. Baldino, Claudio,
Atuações e qualificações
(1) Bacharelando do 9º período de Direito da Faculdade Politécnica de Uberlândia.
(2) Professora.
E-mails
(1) jpknychala@hotmail.co
Publicado em 11/2002
A Constituição Federal de 1988 veio a sepultar de uma vez essa celeuma, reconhecendo
como entidade familiar, passível de proteção estatal a união estável entre homem e
mulher. (art. 226 art. § 3.º) A matéria foi regulamentada pela Lei n.º 8971, de 29 de
dezembro de 1994 e pela Lei n.º 9278, de 10 de maio de 1996.
Sob esse mesmo prisma, é fundamental também, entender que a diversidade de sexos
não é "conditio sine qua non" para a percepção conceitual da família. O principal fator
de formação familiar é a afetividade. E a própria interpretação histórica nos prova isso.
Vale lembrar-nos do clássico helênico Édipo Rei, onde o protagonista, Édipo, mata seu
próprio pai, Laio, desconhecendo a relação de parentesco; e, em seguida, casa-se com
Jocasta (sua mãe), ignorando também esses laços. Mais ainda; notório era na Roma
Antiga a filiação afetiva evidenciada na escolha do sucessor do imperador pelo próprio
CÆSAR através de uma adoção ficta. Observa-se, no primeiro exemplo, que a
paternidade biológica não define necessariamente a relação familiar. Por outro lado, no
segundo exemplo, o afeto e a confiança, determinavam porém, o direito e poder
sucessórios. A desembargadora do TJ-RS, Maria Berenice Dias sustenta opinião
conceitual semelhante afirmando que:
"A família não se define exclusivamente em razão do vínculo entre um homem e uma
mulher ou da convivência dos ascendentes com seus descendentes. Também pessoas do
mesmo sexo ou de sexos diferentes, ligadas por laços afetivos, sem conotação sexual,
merecem ser reconhecidas como entidades familiares. Assim, a prole ou a capacidade
procriativa não são essenciais para que a convivência de duas pessoas mereça a proteção
legal, descabendo deixar fora do conceito de família as relações homoafetivas. Presentes
os requisitos de vida em comum, coabitação, mútua assistência, é de se concederem os
mesmos direitos e se imporem iguais obrigações a todos os vínculos de afeto que
tenham idênticas características." (Dias; 2001. p. 102)
"Com homem não te deitarás como se fosse mulher: é abominação." (Levítico 18:22)
" Pelo que Deus os abandonou às paixões infames. Porque até as suas mulheres
mudaram o uso natural, no contrário à natureza.
O saudoso mestre Orlando Gomes, em seu magistério, ressalta a forte influência das
religiões cristãs na composição legislativa de proteção à instituição familiar e, por
conseqüência, na instituição do Direito de Família:
"Afinal, é todo o direito de família, que revela, em suas principais regras, a influência
do cristianismo, seja a do direito canônico, seja a do direito protestante, seja ainda, para
a área mais limitada, a do direito canônico da Igreja ortodoxa" (Gomes, 2000. p.41)
O fato é que a Carta Política de 1988 reafirmou como laico o Estado brasileiro,
separado da Igreja Católica desde a Proclamação da República em 1891. Mas a lacuna
legislativa permanece, contrariando o preceito constitucional da dignidade da pessoa
humana, consagrado no art. 1.º, IIIe tem colocado muitas pessoas, que mantêm com
outrem do mesmo sexo uma relação, não só de afetividade, mas também de vida
comum, numa situação de total desamparo, configurando assim, uma veemente
injustiça.
A falta de dispositivo legal sobre a matéria tem tornado cada vez mais importante a
atuação do operador do direito a fim de solucionar, com eqüidade, tais questionamentos.
Dessa forma, é vital o entendimento do "fenômeno social jurídico" em epígrafe. A fria
exegese legal não deve ser confundida pelo jurista como aplicação do Direito. Este deve
ser, primeiramente, entendido como fato social; produto da atuação dos atores sociais
em seu meio. Assim, é imprescindível a inteligência de Pontes de Miranda sobre o
tema:
"Diante das convicções da ciência, que tanto nos mostram e comprovam explicação
extrínseca dos fatos (isto é, dos fatos sociais por fatos sociais, objetivamente), o que se
não pode pretender é reduzir o direito a simples produto do Estado. O direito é produto
dos círculos sociais, é fórmula da coexistência dentro deles. Qualquer círculo, e não só
os políticos, no sentido estrito, tem o direito que lhe corresponde." (Miranda, 1955
p.170)
"Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes
e os princípios gerais de direito."
Ora, claro nos parece que, dentro do corte epistemológico na sociedade brasileira
contemporânea, o fenômeno da união estável homossexual está claramente evidenciado
e aceito. Cabe então, aos magistrados, advogados e doutrinadores, o entendimento desse
fenômeno como parte do meio social para a utilização dos princípios e métodos
adequados à defesa dos interesses dessas pessoas.
A Constituição Federal, consagra, em seu artigo 1.º, inciso III, o princípio da Dignidade
da Pessoa Humana. Esse princípio de direito natural, positivado em nosso ordenamento
jurídico, ressalta a necessidade do respeito ao ser humano, independente da sua posição
social ou dos atributos que possam a ele ser imputados pela sociedade. Sempre é válido
citar o comentário do prof. Manoel Gonçalves Ferreira Filho sobre o tema:
Ora, se o ser humano constitui por si próprio um valor, que deve ser respeitado e
preservado, é fundamental que o qualquer tipo de relacionamento de seres humanos,
desde que lícito, deve ser reconhecido pelo ente estatal, uma vez que os valores
humanos fazem parte de seu próprio substrato emocional e intelectual. Essencial
relembrar o grande Ortega Y Gasset em sua máxima: "Eu sou eu e minhas
circunstâncias; se não as salvo, não me salvo."
Como corolário desse princípio, a nossa Carta Magna também outorga, em seu art. 5.º,
inciso I, a isonomia legal entre homens e mulheres. Isso significa que a lei não pode
instituir tratamento desigual entre pessoas que se encontrem em mesma situação fática
e/ou jurídica. Partindo desse entendimento, indispensável reconhecer a coragem e a
lucidez da oitava câmara cível do egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande
do Sul, ao reconhecer a união homossexual a partir da inteligência do dispositivo
constitucional.
Apesar desse tipo de decisão ser exceção na jurisprudência do país, muitos magistrados
têm interpretado a união homoafetiva como uma sociedade de fato, uma vez que há um
esforço dos companheiros destinados a um fim comum. Dessa forma, têm-se
multiplicado as sentenças fundamentadas na Súmula 380 do Supremo Tribunal Federal,
transcrita a seguir:
Acreditamos muito lúcida essa decisão através da utilização da analogia da Lei 9278/96
e da Súmula 380 do STF. De fato, é indiscutível a existência da sociedade de fato.
Entretanto, a maioria dos tribunais ainda não reconhece à união estável homoafetiva no
tocante à concessão de alimentos, sendo omissa no reconhecimento de outros aspectos
de caráter não-patrimonial. Muitas prestações que são fornecidas pelo(s)
companheiro(s) não são passíveis de apreciação pecuniária. São prestações de caráter
doméstico, afetivo ou emocional que não se incorporam ao patrimônio, mas são
INDISPENSÁVEIS à convivência harmoniosa e pacífica de pessoas que possuem vida
comum e à própria constituição do patrimônio.
Tendo como base esse entendimento, criticamos o acórdão proferido pela Oitava
Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, que negou a prestação de
alimentos a uma mulher por sua ex-companheira com base, unicamente, pela natureza
homossexual do relacionamento.
Data maxima venia, discordamos em absoluto com esse entendimento. Ora, se o mesmo
Tribunal reconheceu competência das Varas de Família o julgamento de questões
relativas às uniões homoafetivas, (entendendo, por conseguinte, essa instituição como
familiar) e mais; se o Tribunal entendeu válida a aplicação analógica da Lei 9278/96
(que regula o regime de bens da união estável heterossexual), torna-se incoerente a não-
aplicação analógica do dispositivo referido para a concessão de alimentos a ex-
companheiros do mesmo sexo.
4. A Instrução Normativa 25/2000 (INSS)
5. Projeto de Lei
"Art. 1º. É assegurado a duas pessoas do mesmo sexo o reconhecimento de sua parceria
civil registrada, visando à proteção dos direitos à propriedade, à sucessão e aos demais
regulados nesta Lei.
Art. 2º. A parceria civil registrada constitui-se mediante escritura pública e respectivo
registro em livro próprio, nos Cartórios de Registro Civil de Pessoas Naturais na forma
que segue.
(...)
§ 2º. Após a lavratura do contrato a parceria civil deve ser registrada em livro
próprio no Registro Civil de Pessoas Naturais.
§ 3º. O estado civil dos contratantes não poderá ser alterado na vigência do
contrato de parceria civil registrada."
Entendemos ser inconstitucional esse projeto de lei. Não pelo registro da parceria civil
da parceria entre pessoas do mesmo sexo, mas pela alteração do seu estado civil.
Compreendemos que esse tipo de registro nada mais é que a desnaturação do instituto
do casamento, uma vez que a lei não apenas reconhece a união estável entre pessoas do
mesmo sexo, como também garante a elas o direito de realizar um tipo de união civil
sem previsão constitucional. Ademais, fica a dúvida de tamanha incoerência: qual seria
o estado civil daqueles que realizassem esse tipo de registro? Segismundo Gontijo
também tece críticas a respeito, afirmando que esse tipo de registro de parceria
ofereceria espaço para simulações de natureza patrimonial.
Ives Gandra Martins também não poupou críticas ao referido projeto. Em sua opinião, o
projeto de lei é inconstitucional, uma vez que fere o § 3.º da Constituição Federal, uma
vez que equipara, segundo o autor, a união homossexual a entidade familiar. Sobre isso,
duramente afirma:
Aqueles que entendem que a união pretendida pela parlamentar é apenas para garantia
patrimonial das pessoas que têm atração sexual contrárias às leis da natureza, com
manifesta distorção do uso de seu aparelho genital, desconhecem que tal garantia
patrimonial lésbicas e pederastas se podem auto-outorgar, através de contratos
inominados de caráter civil, com o que, para tais fins, o direito já lhes oferta uma
segurança adequada.
O projeto, todavia, não pretende apenas a segurança patrimonial entre os que não
têm atração pelo sexo oposto, mas lhes dar ares de entidade familiar, e, nesse aspecto,
a inconstitucionalidade é manifesta, vale dizer, fere o disposto no § 3.º do art. 226."
(Martins, 2000 págs 1021/1022)
Entendemos infeliz a crítica desse grande jurista em dois aspectos. Um deles é que não
existem provas de que a homossexualidade seja algum tipo de disfunção de natureza
psíquica ou biológica. A Organização Mundial de Saúde (OMS) inclusive não entende
mais a homossexualismo como doença. O outro é que, apesar no projeto de lei ser
notoriamente mal feito, em nenhum momento, menciona expressamente como família a
parceria civil registrada entre pessoas do mesmo sexo. Assim sendo, torna-se leviana tal
afirmação.
Há também um esboço de projeto de lei sobre o mesmo tema. O texto redigido em abril
de 2002, pelos juristas e professores Fernando Malheiros Filho (RS); Paulo Lins e Silva
(RJ); Roberto Rodrigues Alves (DF); Segismundo Gontijo (MG) e Sérgio Marques da
Cruz Filho (SP), a pedido da Deputada Laura Carneiro, Presidente da Comissão de
Família e Seguridade Social, da Câmara Federal, como substitutivo de outros projetos
sobre a matéria, em tramitação na Casa. O texto apresenta uma propriedade técnica
muitíssimo superior ao primeiro e, não atribui caráter familiar a uniões homossexuais,
mas apenas de união civil, atribuindo competência às Varas Cíveis para o julgamento de
matérias relativas a estas. Dispõe também sobre a união estável heterossexual, seu
regime de bens e sua conversão e casamento, revogando, expressamente, as leis
referentes à união estável. Equipara a união homoafetiva à união estável em todos os
direitos e obrigações inclusive no que se refere a cobrança judicial de alimentos (art.
8.º). Transcrevemos a seguir trechos do esboço do projeto de lei, para uma análise mais
depurada.
Art. 4º. Salvo estipulação diversa, os bens móveis e imóveis adquiridos onerosamente
por qualquer dos conviventes, na constância da união familiar estável, regem-se pelas
disposições sobre o regime da comunhão parcial de bens estabelecidas na legislação
civil, abrangendo direitos, deveres e responsabilidades.
(...)
Art. 8º. Conforme previsão legal que rege o instituto, o convivente pode pedir ao outro
os alimentos de que necessite, deferindo-os o juiz provisionalmente depois de audiência
prévia de justificação.
(...)
SUBTÍTULO II: DA UNIÃO CIVIL HOMOAFETIVA
Art. 10. Duas pessoas do mesmo sexo poderão constituir união civil nos mesmos
termos, condições, direitos e obrigações desta lei, excetuado o que se refere a filhos
comuns e à conversão em casamento.
Art. 12. Assegurado o segredo de justiça em todos os casos a matéria relativa à união
familiar estável é de competência do juízo da Vara de Família e é do juízo da Vara
Cível a da união civil homoafetiva..
(...)
Art. 15. Ficam revogadas as Leis nºs 8.971, de 29 de dezembro de 1994 e 9.278 de 10
de maio de 1996 e as disposições em contrário às desta lei. (texto disponível em
http://www.gontijo-familia.adv.br)
6. Conclusão
A partir da análise dos argumentos no presente trabalho, é possível concluir que a existe
a necessidade de se reavaliar determinados conceitos em Direito de Família. Mais ainda;
é preciso destituir-nos do moralismo que circunda o meio jurídico e encarar o fato da
existência da união entre pessoas do mesmo sexo e da necessidade desse tipo de união
receber amparo legislativo, e não ficar entregue apenas ao entendimento judicial.
É preciso que o operador do Direito esteja cada vez mais atento às transformações que
ocorrem em nossa sociedade, a fim de que venha ele, efetivamente, ser um instrumento
de transformação social e não apenas um técnico em legislação. É este o único modo de
reduzirmos os abismos que separam o cidadão do Estado a fim de alcançarmos uma
sociedade mais igualitária e justa para todos.
7. Bibliografia
GOMES, Orlando. Direito de Família. Ed. Forense. 12ª Edição. Rio de Janeiro, 2000.
MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado. Volume 7. Editor Borsoi. Rio de
Janeiro. 1955.
Sobre o autor
Publicado em 10/2003
Enéas Castilho Chiarini Júnior
Homossexualismo, como nos ensina Delton Croce, é "a atração erótica por indivíduos
do mesmo sexo", podendo o homossexual praticar atos libidinosos ou apenas exibir
fantasias sexuais com relação à indivíduos do mesmo sexo, apresentando certa
indiferença ou repugnância por indivíduos do sexo oposto. Pode atingir ambos os sexos,
de onde recebe a denominação de masculina, se praticada entre homens, ou feminina, se
praticada entre mulheres.
Conforme Renato Posterli, "É oportuno, agora, ressaltar que homossexualismo deixou
de ser doença. Á décima revisão da Classificação Internacional de Doenças e Problemas
Relacionados à Saúde (CID), da Organização Mundial de Saúde, exclui, depois de
quase vinte anos, o homossexualismo como doença.''... o então presidente do Conselho
Federal de Medicina, psiquiatra Ivan Moura Fé, afirmou que ''muitas vezes, os próprios
pais levam os filhos homossexuais ao médico, porque acreditam que eles são doentes; a
situação deixa os profissionais confusos, já que não é encontrado nenhum sinal que
indica a existência de uma anomalia.''" mais adiante, conclui que "É, comprovadamente,
uma opção de vida."
É tão bem aceito o fato de a homossexualidade ser uma escolha, que Delton Croce
chega a lembrar: "Freud afirma que todo indivíduo, homem ou mulher, tem uma
tendência ponderável, íntima e oculta à homossexualidade. Tal-qualmente, opina
Abrachamsen (Delito y psique, p. 181 usque 183): ‘Não existe, provavelmente,
nenhuma pessoa normal que não possua algumas inclinações homossexuais
inconscientes.’"
Nos países "de primeiro mundo", sobre tudo da Europa Ocidental, a homossexualidade
já é encarada como preferência pessoal de cada indivíduo, sendo, inclusive em alguns
países, permitida, reconhecida e até mesmo protegida a união entre pessoas do mesmo
sexo.
A Constituição Federal no seu artigo 226, § 3º afirma que "para efeito da proteção do
Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade
familiar..."
Os intérpretes costumam entender que através de tal dispositivo constitucional, a lei
protege apenas "a união estável entre o homem e a mulher", não protegendo outras
espécies de união (homem com homem e/ou mulher com mulher).
Se a lei, não exclui, expressamente, a proteção das uniões homoafetivas, então caímos
no que Bobbio chamou de Norma Geral Exclusiva, que é uma das premissas básicas do
pensamento Kelseniano, que afirma que "tudo o que não está explicitamente proibido,
está, implicitamente, permitido", idéia protegida pela Constituição Federal que afirma
que "ninguém está obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de
lei" (artigo 5º, inciso II).
A respeito de tal posicionamento, Fábio Ulhoa Coelho afirma que "...como todas as
normas são reduzidas à estrutura de um imperativo sancionador (dado certo
comportamento, deve ser uma sanção), para o pensamento kelseniano, aquele juiz que
enxerga lacuna no direito está, na verdade, pretendendo aplicar sanção a uma conduta
não-sancionada ou deixar de aplicar sanção a conduta sancionada. Ou seja, ele pretende
inverter o sentido da norma [...] em Kelsen, o julgador só considera que há lacunas no
ordenamento quando não o satisfaz a solução oferecida..."
Apesar disso, os que acreditam haver lacuna no direito brasileiro, devem, uma vez que
pelo princípio da indeclinabilidade, consagrado no artigo 126 do Código de Processo
Civil, o juiz não pode deixar de solucionar o caso concreto alegando lacuna na lei,
recorrer ao artigo 4º da Lei nº 4.657/42 (Lei de Introdução ao Código Civil) que ordena:
"quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e
os princípios gerais de direito", completando em seu artigo 5º que "na aplicação da lei, o
juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum".
Pela analogia, devemos admitir tais uniões através do seguinte raciocínio que possui
duas premissas básicas:
1ª) todo ser humano possui o sagrado direito de constituir uma família (direito este
garantido pelo artigo XVI da Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU, de
1948);
2ª) todo deficiente físico, se desejar, pode recorrer a uma cirurgia plástica reparadora
para minimizar seus déficits físicos.
a) todo deficiente físico (que é membro da espécie humana) pode constituir uma
família;
b) todo hermafrodita, por ser uma espécie de deficiente físico, pode, se assim desejar,
recorrer a uma cirurgia plástica para definição de seu sexo (fenotípico), sendo
imperiosa, neste caso, a permissão para retificação de seu registro de nascimento;
Estas duas últimas premissas nos levam a conclusão de que todo hermafrodita, por ser
uma espécie de deficiente físico, pode constituir uma família, independente de cirurgia
plástica reparadora, com um homem ou uma mulher, sob pena de criar-se uma restrição
de direitos ao hermafrodita que é contrária ao ordenamento jurídico nacional;
Cumprindo ressaltar, porém, que a união do transexual, não deve ser aceita apenas no
caso de cirurgia, uma vez que este não pode ser compelido a se submeter a uma
operação plástica para possuir o direito de se unir com aquele que ama;
Logo, do mesmo modo, o homossexual deve ser livre para unir-se com a pessoa amada,
independente do sexo (genético), sob pena de se autorizar-lhe a união com um indivíduo
do mesmo sexo (genético) que o seu, se este submeter-se a uma cirurgia de
redesignação de sexo, o que é anti-jurídico.
Caso não seja compreendida a analogia proposta, pela observância dos costumes, torna-
se imperiosa a admissão das uniões homossexuais, uma vez que é bastante comum a
união fática de dois homossexuais, sendo inclusive de aceitação popular, uma vez que
no dia 10 de agosto de 2000, no programa de televisão Você Decide, o público, de todo
o país, votou a favor e um "casal" de mulheres que desejavam dar à luz a uma criança,
para constituírem uma família (o placar foi 63.649 votos contra, e 100.547 - 61,2% - a
favor), sendo, ainda que, no dia 17 de janeiro de 2002, no site do portal Terra, até as 16
horas e 45 minutos, obteve-se uma aprovação de 82,78% (10.376 votos) a favor de que
o filho da cantora Cássia Eller permanecesse com a sua ex-companheira, Maria eugênia.
Fatos estes que evidenciam a abertura da sociedade brasileira à união entre
homossexuais.
Celso Ribeiro Bastos afirma que "não sendo possível suprir a lacuna mediante a
utilização dos instrumentos acima citados, deverá lançar mão a autoridade competente
da eqüidade, que é uma apreciação subjetiva, cujo critério reside no senso de justiça. O
Código de Processo Civil de 1939, no seu art. 114, conceituava a eqüidade nos
seguintes termos: ‘Quando autorizado a decidir por eqüidade, o juiz aplicará a norma
que estabeleceria se fosse legislador’."
Caso seja necessária a aplicação da eqüidade, cumpre ressaltar que, atualmente, apesar
de uma nova onda de contaminação pelo vírus da AIDS, sobre tudo nos Estados Unidos
da América (Conforme noticiado pela revista Veja de 14 de fevereiro de 2001), mais
precisamente na cidade de São Francisco, "capital mundial dos homossexuais", a AIDS
não está relacionada com a opção sexual, e sim com a vida sexual, com a
promiscuidade, de maneira que não se pode afirmar que o homossexual está mais, ou
menos, propenso à ser infectado pelo HIV. O que está acontecendo, nestes casos, é que,
atualmente, a AIDS não é mais vista como uma sentença de morte. O preconceito aos
aidéticos está diminuindo. Os médicos estão conseguindo, graças aos recentes avanços
da medicina, prolongar e, principalmente, melhorar a qualidade de vida dos infectados,
o que causa uma diminuição do "medo" que cada indivíduo tem de ser infectado,
fazendo com que este indivíduo venha a diminuir a prevenção, causando desta forma a
contaminação pelo não uso de preservativos.
A verdade é que, aquele que mantém uma vida sexual ativa com vários parceiros, quer
seja ele homossexual ou heterossexual, está dentro do chamado "grupo de risco",
denominação esta que hoje já é combatida por muitos especialistas que dizem não mais
existir este "grupo de risco", e que todos são passíveis de contaminação. Tanto é
verdade esta afirmação que, no dia 6 de setembro de 2000, a revista Istoé trouxe uma
reportagem a respeito do crescente número de casos de donas de casa infectadas pelo
HIV, e que foram contaminadas pelos próprios maridos, sendo que estes casos
representavam cerca de 57% dos casos registrados entre dezembro de 1999 e junho de
2000.
Mas, segundo o mesmo autor, "o aspecto mais chocante da decisão governamental, que
optou pela Constituinte congressual e, ao mesmo tempo, uma das razões mais fortes
para que o Governo tomasse essa decisão, constitui no fato de que a Constituinte
congressual teria a participação, como constituintes, dos senadores eleitos em 1982.
Esses senadores, de direito, não poderiam ser membros natos da Constituinte, pois
ninguém pode ser constituinte sem mandato específico"
Diante desse quadro histórico, é fácil notar que a Assembléia Nacional Constituinte de
1988 não possuía a liberdade necessária para aprovar a Constituição conforme deveria,
sendo influenciada pelo regime militar que na época dava seus "últimos suspiros", o que
explica por que não existe em toda a constituição vigente qualquer norma explícita que
aprove e proteja a união homoafetiva.
Para reforçar tal argumento, cumpre trazer o texto que fora aprovado pela subcomissão
dos Negros, Populações Indígenas e Pessoas Portadoras de Deficiência do Congresso
Constituinte para o que seria o artigo 2º da Constituição Federal, que, ao final fora
substituído sob o argumento de "enxugar" o texto da Constituição. O texto era o
seguinte: "Art. 2º - Todos, homens e mulheres, são iguais perante a lei, que punirá como
crime inafiançável qualquer discriminação atentatória aos direitos humanos e aos aqui
estabelecidos. Parágrafo 1º - Ninguém será prejudicado ou privilegiado em razão de
nascimento, etnia, raça, cor, sexo, trabalho, religião, orientação sexual, convicções
políticas ou filosóficas, ser portador de deficiência de qualquer ordem e qualquer
particularidade ou condição social..." (Maria Berenice Dias)
Aliás, tais argumentos valem também para o Novo Código Civil que entrou em vigor
em 2003, uma vez que seu projeto vem de 1975, ou seja, desde a época da Ditadura
Militar, não tendo sofrido grandes alterações de lá para cá.
Também não convence o argumento de que tais uniões não devem ser liberadas por
serem um mal exemplo para a juventude, posto que os exemplos de heterossexuais são
em número muito maior, seria mais fácil para o jovem que ele seguisse o exemplo da
maioria, ademais, todo mal exemplo caí frente a uma boa educação.
Também não pode ser aceito o argumento de que tais uniões não são capazes de gerar
filhos, uma vez que, atualmente, já é possível que duas mulheres que vivem juntas dar á
luz um filho inseminado artificialmente. Além de que, frente as mais recentes
descobertas acerca da existência, embora raríssimas, de crianças geradas fora do útero
materno (chamada de gravidez ectópica), é possível ter-se uma visão futurística
fantástica segundo a qual seria possível, ao menos em tese, de que um homem possa dar
à luz um filho fertilizado in vitro e inserido, posteriormente, em seu abdômen,
semelhante ao que já se pode ocorrer com as mulheres (lembre-se de que Júlio Verne foi
chamado de louco quando escreveu histórias sobre viagens à lua, assim como Eistein
também foi chamado de louco quando disse que o tempo é relativo, assim como alguns
achavam que Jesus Cristo era louco por dizer que era filho de Deus e rei dos Homens).
Deve-se lembrar ainda que, a respeito do Contrato Social de Rousseau, Beccaria afirma
que "...somente a necessidade obriga os homens a ceder parcela de sua liberdade; disso
advém que cada qual apenas concorda em pôr no depósito comum a menor porção
possível dela, quer dizer, exatamente o que era necessário para empenhar os outros em
mantê-lo na posse do restante."
Darcy Azambuja concorda com Beccaria quando afirma que "...se a vontade geral,
criada pelo contrato, fosse ilimitada, seria criar o despotismo do Estado, ou melhor, das
maiorias, cuja opinião e decisão poderia arbitrariamente violentar os indivíduos..."
O próprio Rousseau alerta que "...o maior bem de todos, que tal deve ser o fim de todo o
sistema de legislação, achá-lo-eis resumido nestes dois objetos principais, a liberdade e
a igualdade..."
Segundo Darcy Azambuja, "...toda a intervenção do estado é nociva ao bem comum; ele
apenas deve dar segurança aos indivíduos e não intervir na vida social senão para
manter a ordem. Liberdade de profissão, liberdade de trabalho, liberdade de comércio,
toda a atividade livre: o estado não deve pretender conhecer melhor do que eles próprios
os direitos dos indivíduos..."
Cumpre ainda assinalar que Direito e religião são duas coisas distintas, tanto é verdade
que o legislador contrariou alguns escritos bíblicos, como por exemplo este trecho que
manda à mulher obedecer ao marido:
Quem, em pleno século XXI seria capaz de afirmar que o homem é superior à mulher, e
que portanto esta deve submeter-se àquele? Hoje em dia já está consagrado no mundo
jurídico o princípio de igualdade entre os sexos.
Mais uma vez o Direito contraria a religião quando autoriza o divórcio, pois, conforme
Marcos 10:7-9: "por isso deixará o homem a seu pai e a sua mãe, e unir-se-á a sua
mulher. E serão os dois uma só carne: e assim já não serão dois, mas uma só carne.
Portanto o que Deus ajuntou não separe o homem."
Desta forma, o Direito contraria a Bíblia Sagrada algumas vezes, posto que, conforme
salientado, Direito e religião são coisas distintas. Se o Direito não obedece aos
mandamentos Bíblicos que ordenam a mulher a submeter-se ao seu marido, e que
impedem o divórcio, porque os juristas se preocupariam com o fato de ser o
homossexualismo contra a vontade de Deus? Se o ordenamento jurídico já contrariou a
Bíblia em nome da igualdade entre os sexos, porque não pode, mais uma vez, contrariá-
la, afirmando a igualdade entre hetero e homossexuais?
Só a Deus cabe julgar, à nós, seres humanos, cabe amar ao próximo como a nós
mesmos, fazendo o bem, sem olhar a quem, conforme a parábola do Bom Samaritano,
narrado em Lucas 10:1-42.
Acrescente-se, ainda, que não cabe ao defensor do direito à união homossexual que
aponte os benefícios da liberdade homossexual, mas ao contrário, cabe àquele que é
contra à união homossexual apontar quais são os males que podem ser causados à
sociedade, no caso de uma legalização do direito de união homossexual, pois in dubio
pro reo, ou, mais acertadamente, in dubio pro libertatis.
Deve-se ressaltar, ainda, que a OITAVA CÂMARA CÍVEL do TRIBUNAL DE
JUSTIÇA DO RS, em julgamento do dia 01/03/00 julgou ser juridicamente possível o
pedido de reconhecimento de união estável entre homossexuais "...ANTE PRINCÍPIOS
FUNDAMENTAIS INSCULPIDOS NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL QUE VEDAM
QUALQUER DISCRIMINAÇÃO, INCLUSIVE QUANTO AO SEXO, SENDO
DESCABIDA DISCRIMINAÇÃO QUANTO A UNIÃO HOMOSSEXUAL [...] UMA
ONDA RENOVADORA SE ESTENDE PELO MUNDO, COM REFLEXOS
ACENTUADOS EM NOSSO PAIS, DESTRUINDO PRECEITOS ARCAICOS,
MODIFICANDO CONCEITOS E IMPONDO A SERENIDADE CIENTÍFICA DA
MODERNIDADE NO TRATO DAS RELAÇÕES HUMANAS, QUE AS POSIÇÕES
DEVEM SER MARCADAS E AMADURECIDAS, PARA QUE OS AVANÇOS NÃO
SOFRAM RETROCESSO E PARA QUE AS INDIVIDUALIDADES E
COLETIVIDADES, POSSAM ANDAR SEGURAS NA TÃO ALMEJADA BUSCA
DA FELICIDADE, DIREITO FUNDAMENTAL DE TODOS..."
Não se pode esquecer, também, que a grande maioria dos atentados terroristas que
acontecem no mundo, inclusive os ocorridos no dia 11 de setembro de 2001, e que
deram origem à guerra entre os EUA e o Afeganistão, são fruto da intolerância, e esta
sim deve ser completa e definitivamente banida de todo o ordenamento jurídico, pois
como já dizia a Declaração dos Direitos Humanos a mais de cinqüenta anos, todo
indivíduo nasce livre e igual em direitos e deveres.
Um Estado só se torna uma grande nação, quando o povo que o compõe, age por amor à
pátria. Só é possível amar, e respeitar um Estado, respeitando e admirando seus
governantes (entendendo-se governantes no sentido mais amplo da palavra, abrangendo
os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário). E, para isso, é necessário que os
governantes sigam os ideais deste povo, sejam ou não, contrários aos seus próprios
ideais particulares. Só assim, quando os governantes de um Estado, ouvem o clamor do
povo, e agem conforme os anseios de seus súditos, mesmo contrariando suas convicções
pessoais (jogando por terra a teoria de Carl Marx), é que conseguirão a admiração e
respeito por parte dos governados, para que possam, juntos, governantes e governados,
formarem, definitivamente, uma grande nação.
Por fim, gostaria de citar meu grande professor Dr. Paulo Duarte Lopes Angélico (Juiz
de Direito titular da 3ª Vara Cível da Comarca de Pouso Alegre/MG), que pergunta de
maneira incisiva:
"Deve existir lei que limite a capacidade de amar? Quem pode afirmar ou firmar este
dogma?" (in Boletim Universitário do 3º Simpósio da Faculdade de Direito do Sul de
Minas - Inovações no Direito Material Civil - "Fatos e Mitos", "União entre
homossexuais")
Referências Bibliográficas
AZAMBUJA, Darcy. Teoria geral do Estado. 36ª ed., São Paulo: Globo, 1997;
BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de direito financeiro e tributário. 7ª ed., São Paulo:
Saraiva, 1999;
BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. 1ª ed., São Paulo: Editora Martin Claret,
2000;
CROCE, Delton. Manual de medicina legal. (trechos) 4ª ed., São Paulo: Saraiva, 1998;
LEITE SAMPAIO, José Adércio. Direito à intimidade e a vida privada: uma visão
da sexualidade, da família, da comunicação e informações pessoais, da vida e da
morte. 1ª ed., Belo Horizonte: Del Rey, 1998;
ULHOA COELHO, Fábio. Roteiro de lógica jurídica. 3ª ed., São Paulo: Max
Limonad, 1997.
Sobre o autor
RESUMO
A união homoafetiva é uma realidade que merece tutela jurídica, não podendo ficar
excluída de nossa legislação. O presente estudo conceitua a homossexualidade, sua
denominação e a ausência de legislação específica no Brasil. Tal abordagem justifica-se,
visto que o tema tem pertinência, atual e possui grande relevância social. Não somente
pela repercussão na esfera jurídica, mas também por afetar vidas, já que pessoas iguais a
todos encontram-se a margem da sociedade por puro preconceito.
O preconceito ainda impõe barreiras para que a união homoafetiva seja equiparada à
união estável e consequentemente os parceiros não se beneficiam dos direitos por ela
garantidos.
INTRODUÇÃO
1 – CAPITULO I: A FAMÍLIA BRASILEIRA
1.1 Evolução histórica da família
1.2 Fontes
1.3 Evolução no Ordenamento Brasileiro
1.4 A Constituição Federal de 1988
1.5 Conceito atual de família
2 – CAPITULO II UNIÃO HOMO-AFETIVA
2.1 primeiro passo para a regularização
2.2 As barreiras existentes
2.3 Sociedade de fato
2.4 União Homoafetiva como entidade familiar
2.5 Repercussão Social
2.6 Análise da União Homoafetiva frente aos Direitos Humanos
3 – CAPITULO III DA UNIÃO ESTÁVEL
3.1 Conceito
3.2 Elementos caracterizadores
3.3 Temporalidade
3.4 Evolução da união Estável
3.5 Divergência em relação a entidade familiar
3.6 cabimento da União estável na relação Homoafetiva
3.7 Dissolução da União Estável
4 – CAPITILO IV PARTILHA DE BENS E SUCESSÃO PATRIMONIAL
4.1 Partilha e bens e Sucessão em geral
4.2 Partilha de bens e Sucessão do convivente
4.3 União Homoafetiva e partilha de bens
4.4 União Homoafetiva e sucessão patrimonial
4.5 Evoluções Jurisprudenciais
CONCLUSÃO
BIBLIOGRAFIA
ANEXO A - Projeto de lei nº. 1.151, de 1995. Da Deputada Marta Suplicy (PT-SP)...48
ANEXO B - Substitutivo da lei 1.151 de 1995 adotado pela comissão. Do Deputado
Roberto Jéferson
ANEXO C – Acórdão, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS
INTRODUÇÃO
O tema em tela, apesar de polemico, está muito evidenciado nos dias atuais e está sendo
de extrema importância sua explanação. Longe de procurar esgotar o assunto a ser
abordado, o presente trabalho discorrerá de maneira a tentar elucidar a evolução das
uniões extramatrimoniais e o preconceito sob a ótica do Direito, com enfoque específico
na união homoafetiva. Esta, por não ser uma união convencional, sofre muitos
preconceitos e barreiras até hoje.
O casamento tradicional vem perdendo cada vez mais o seu valor na atualidade da
sociedade brasileira, e a união sem burocracias vêm cada vez mais ganhando espaço e
predileção nos relacionamentos modernos. Diante disso, faz-se substancialmente,
necessário que o operador do Direito ajuste sua visão e percepção para as relações
homoafetivas e suas questões jurídicas; uma vez que não se pode esquecer que as
relações onde envolvem pessoas do mesmo sexo e que se unem com o intuito de
desenvolverem uma vida familiar, ou seja, de constituir uma família, são regidas pelo
amor, fidelidade, harmonia, respeito e pela construção patrimonial.
A escolha do tema tem por objetivo fazer valer os direitos garantidos a todo indivíduo,
seja ele heterossexual ou homossexual, pois são cidadãos, pagam tributos, votam sem
distinção de sua sexualidade todos contribuindo de igual maneira e fazendo desta forma
valer o princípio da igualdade.
A sociedade precisa deixar a hipocrisia de lado e entender que a união homoafetiva faz
parte da realidade e não tem como fingir que ela não exista.
A união afetiva e sexual entre duas pessoas é um fato natural, chama-las de União
estável, Concubinato ou Homoafetiva é um fato cultural, taxativo, ou seja, uma
valoração moral para diferenciá-las do casamento. A família acompanha a evolução dos
costumes e, por isso, apresenta-se de formas diferentes para atender as necessidades
humanas de cada época.
A sociedade se desenvolve de acordo com o momento histórico que vive, sendo assim,
o direito não cria a realidade, são os fatos e as situações que acabam se tornando tão
evidentes ao ponto do legislador regulamenta-las. A convivência homossexual é uma
realidade que não pode mais ficar à margem da devida tutela jurídica. Precisa ser
reconhecida pelo Estado como entidade familiar.
A família está em constante e incessante transmutação e essas mudanças se fazem
necessárias para que a entidade familiar possa acompanhar a evolução, agregando novos
valores que despontam a cada dia nas diversas sociedades.
1.2. FONTES
Vale ressaltar que no último século houve grandes transformações sociais e a família
brasileira começou a tomar novo molde, alargando o conceito de família, não mais
sendo ele restringido ao casamento. O papel da autonomia da vontade no Direito de
Família é residual, pois os efeitos já estão estabelecidos em lei, exemplo, as pessoas não
são obrigadas a se casarem, mas o fizer, os efeitos do casamento estão estabelecidos em
lei, consequentemente deverão ser cumpridos.
Este princípio foi mantido nos textos constitucionais seguintes, quais sejam de 1937,
1946, 1967, 1969, o casamento era a única forma legítima para se constituir uma
família. Na Constituição de 1988, temos a família contemporânea, famílias mais
igualitárias, supremacia do afeto, o termo família legítima passou a ser somente
didático.
Mas foi a Lei 6515 de 1977 Lei do Divórcio a grande revolucionária ao permitir a
dissolução do casamento quebrando os valores religiosos embutidos até então na família
brasileira.
A Lei 11.441 de 2007 , que dispões sobre Separação e Divorcio realizados em cartório
veio a facilitar ainda mais a dissolução destas uniões, desde que sejam consensuais e
sem filhos menores.
A família continua a ser a base absoluta da sociedade, contando com especial proteção
do Estado. A grande mudança foi a dissociação do casamento como única forma de
constituição de família legítima, pois a relação extra matrimonial estável entre um
homem e uma mulher antes não possuía conceito de família, pois se tratava de uma
união não reconhecida.
Dentro do moldes reais existentes na sociedade, a família atual é mais liberal e mais
justa, contudo, o Código Civil contribui para as divergências doutrinárias e
Jurisprudenciais sobre o tema ao criar um capítulo próprio e específico ao tratamento e
regulamentação da união estável, distinto do casamento.
No que pertine às uniões homoafetivas, verifica-se absoluta ausência de
regulamentação, seja em legislação constitucional como infraconstitucional, pois nem
mesmo o Novo Código Civil foi capaz de acompanhar a necessidade de regramento que
as referidas uniões ensejam.
A sociedade se desenvolve de acordo com o momento histórico que vive sendo assim o
Direito não cria a realidade, são as situações fáticas que se tornam tão evidentes ao
ponto do legislador regulamanta-las. Existe um anseio social muito grande em priorizar
a vontade do indivíduo frente ao moralismo rigoroso das normas, visando à liberdade de
cada um em busca da realização afetiva e da felicidade, sem o risco da exclusão causada
pelo preconceito do moralismo, surgindo assim um novo perfil nas entidades familiares,
que se molda dia a dia.
Não é de agora que as uniões entre pessoas do mesmo sexo se formam em múltiplos
números, e no ordenamento pátrio ainda se encontram à margem da lei, da mesma
forma que já estiveram às uniões estáveis antes do reconhecimento estatal.
Entendendo isso, não haveria porque não legalizar as relações afetivas já existentes, ou
seja, devemos exigir do legislador soluções efetivas para a realidade social, não devendo
esta ser ignorada, pois não há dúvidas que o tratamento diferenciado aos homossexuais
configura evidente discriminação.
Por outro lado a evolução da Ordem Jurídica neste tema sofreu e sofre grandes
obstáculos face as características da nossa sociedade, fortemente influenciada pela
religião católica, a qual impões certos limites, notadamente porque o Direito de Família
é talvez o ramo de Direito mais sensível às influencias dos costumes locais e princípios
religiosos. Isto porque conforme a doutrina Cristã, a homossexualidade representa um
pecado, é vista como um desvio dos padrões éticos de conduta, além de ser considerada
como um comportamento ultrajante nas sociedades que se pautam na moral e bons
costumes.
Está na hora de se ter um ordenamento mais justo e livre de injustiças, pois o que os
homossexuais reivindicam é poder ter acesso aos direitos da parceria legalmente
reconhecida. Além disso, tal aceitação representaria um avanço no reconhecimento
como cidadãos, visto que, o Direito deve acompanhar as transformações ocorridas e, em
favor delas, afastar o preconceito e criar leis em nível de compatibilidade com os reais
interesses da sociedade.
Não há lei expressa que impeça a união estável entre homossexuais, porém o que
impede tais uniões são as disposições na Constituição e do Novo Código Civil que
colocam a união entre homem e mulher equiparada ao casamento e que não pode se dar
entre pessoas do mesmo sexo devido a finalidade primordial do casamento ser a
reprodução. Consequentemente com isso regular a união de homossexuais, sem
capacidade reprodutiva seria inviável. Todavia, outros discordam deste pensamento que
designa como meta a reprodução apenas, desconsiderando o vinculo afetivo e o
companheirismo, visto que nossa legislação permite situações em que os casos de
reprodução não se fazem possível.
(...) não tem exclusividade por fim a procriação; visa também ao estabelecimento de
união afetiva e espiritual entre os cônjuges. Uma vez que essa união pode ser alcançada,
inexistirá motivo para anular o casamento, só porque dele não adveio prole, em razão da
esterilidade de um dos cônjuges. A jurisprudência é pacífica a respeito, tanto para a
mulher como para o homem.
Desta feita, não se apresenta motivos para impedir o casamento, ou união entre
homossexuais exclusivamente pela impossibilidade de procriar. Talvez a maior barreira
depois do inconsciente coletivo de reprovação da sociedade, seja exatamente a barreira
religiosa, imposta principalmente pela igreja, visto que a mesma prega o casamento
como a única forma possível de constituir uma família, com o interesse máximo de
procriação, intitulando as uniões fora deste padrão como atos imorais. Mas o termo é
subjetivo, visto que o conceito de moral é de foro intimo de cada individuo.
Uma das críticas mais comum contra a união homoafetiva é a seguinte: diz que contraria
à natureza, argumentando em de se tratar de desvio sexual ou doença. Desta forma
vivemos então numa falsa democracia, já que está fora da realidade cotidiana, pois
mesmo diante de significativos avanços, ainda não se pode falar em exercício efetivo da
democracia no âmbito das relações familiares.
Com a evolução dos costumes, a mudança de alguns valores sociais, e estando as uniões
homoafetivas cada vez mais presentes em nossa sociedade, visto que é um fato que se
impõe que não pode ser negado. Devem estes então merecer a tutela jurídica necessária
para ser visto como entidade familiar, fazendo jus a todos os direitos inerentes à mesma.
Encontra-se no Rio Grande do Sul a i Desembargadora Maria Berenice Dias, que com
sua sensibilidade, busca e luta para que os homossexuais tenham seus direitos
reconhecidos e resguardados.
No mesmo Estado tem justos julgados reconhecendo a união homossexual como união
estável e, inclusive permitindo que sejam julgados em varas especializadas em Direito
de Família, e não em Varas Cíveis. Infelizmente nem todos vêm desta forma, e com isso
muitas barreiras terão ainda de serem derrubadas para que se tenha uma legislação mais
justa e coerente com a realidade social.
Mesmo que seja admitida a livre disposição de bens no âmbito do Direito Patrimonial
privado por ato inter vivos ou causa mortis, esta, disposição não se confunde com as
liberdades de disposição por doação ou legado, (onde o proprietário ou autor da herança
pode dispor da parte disponível de seus bens), com o pacto de convivência entre pessoas
do mesmo sexo, que, ainda na sociedade brasileira é vista como afronta à moral e bons
costumes.
Entendem ainda, que a relação pública entre pessoas do mesmo sexo configura em tese,
crime de ato obsceno ou atentado público ao pudor, entretanto, admitem que tal assunto
possa vir a ser regrado caso seja aprovado lei específica permitindo o que na visão desta
minoria é incoerente.
Para eles a coabitação ou convivência habitual, pode ocorrer entre duas pessoas mesmo
que entre elas não exista um vinculo sexual. É uma visão meramente societária do
assunto, é uma outra possibilidade de transferencia de patrimônio a quem se quer bem.
Não se pode negar a possibilidade da existência de sociedade de fato entre pessoas do
mesmo sexo, isso porque, esta sociedade pode acontecer mesmo sem coabitação ou
convivência habitual, sendo então dispensável o intuito de constituir família. Ainda que
possa negar que, a união de patrimônios decorra como fruto desta convivência. É
evidente que explorando atividade profissional conjunta, haverá a sociedade de fato, na
medida da colaboração de cada um dos sócios. Porém, da simples convivência entre
pessoas do mesmo sexo, é certo que não resulta em patrimônio comum, isso porque a lei
assim dispôs.
Devemos observar que é direito fundamental do ser humano a igualdade, se a lei não
veda o pacto sobre os efeitos patrimoniais entre pessoas físicas, porque dificultar a livre
disposição patrimonial entre pessoas do mesmo sexo?
Deve se prevalecer a segurança jurídica pretendida pelas partes, com prévia estipulação
de direitos e deveres, um frente ao outro, dando a cada um o que é seu, na medida do
que entendem ser advindo do esforço comum. Por isso entende-se que não havendo
vedação legal à constituição de entidade familiar ao separado de fato, nem à
constituição de sociedade de fato entre pessoas do mesmo sexo, entendemos que estes
possuem direito liquido e certo, amparado por Mandado de Segurança, ao registro, o
que somente irá trazer segurança jurídica à sociedade.
A união homoafetiva não sendo uma sociedade de fato, quando os laços são apenas
afetivos, também não pode dar a ela equiparação ao casamento, visto que este é a união
legalmente constituída entre homem e mulher, com a observância das formalidades
previstas em lei. Assim sendo, embora a Constituição Federal de 1988, em seu artigo
226 parágrafo 3º, define a união estável como a entidade formada entre homem e
mulher, o que a primeira vista exclui a possibilidade de incluir as uniões homoafetivas.
Se analisarmos mais detalhadamente, existirá uma lógica na inclusão da união
homoafetiva na união estável, vez que, acima das leis estão os princípios
constitucionais. E quando o artigo mencionado outorga proteção estatal apenas para as
uniões entre pessoas heterossexuais, contraria o princípio constitucional que prevê o
respeito à dignidade humana, onde proíbe qualquer discriminação em razão de raça,
credo, convicção política e sexo.
Desta feita, incluir a união homo-afetiva nessa categoria é o que parece a decisão mais
acertada e justa, visto que inúmeras decisões judiciais têm reconhecido aos integrantes
de uniões homoafetivas os mesmos direitos de união estável.
O Projeto de Lei n.º.1.151 DE 1995 – Projeto Suplicy, que regula os efeitos jurídicos
das uniões entre pessoas do mesmo sexo, veio de encontro a uma realidade que não é
despercebida pelos operadores do Direito.
È certo que inicialmente é preciso entender que a Constituição Federal veta qualquer
possibilidade desta espécie de relacionamento ser introduzido no Direito de família com
características de entidade familiar, pois embora não proíba, também não ampara a
formação de entidades familiares entre pessoas do mesmo sexo. Percebe-se então, que o
relacionamento entre homossexuais sob o ponto de vista jurídico está submetido ao
regime das sociedades civis, tal como era o regulamento da união estável antes do
advento da Constituição Federal de 1988. Vale dizer que a omissão da lei alimenta a
discriminação, o preconceito e acaba servindo de fundamento para dar legitimidade a
atos de violência praticados pelos homofóbicos contra os homossexuais.
Não se faz possível vislumbrar a possibilidade de uma entidade familiar formada por
homossexuais somente por fruto do preconceito e de atrofia intelectual da sociedade.
Este subdesenvolvimento intelectual, que nos obriga a se contentar com a idéia de uma
sociedade civil para essas relações, como sendo uma idéia perfeita, no momento
impedindo que seres humanos iguais a todos os outros fiquem à margem da lei. Neste
passo se dirigiu o projeto Suplicy ao determinar em seu artigo 3º que O contrato de
união estável será lavrado em Oficio de Notas, sendo livremente pactuado.
Permanecendo assim, a aparência contratual, que dará ensejo ao surgimento da
sociedade civil entre as pessoas do mesmo sexo.
O casamento constitui a família legítima e confere aos seus parceiros direitos e garantias
próprias do ato solene que é o casamento, quais sejam: vinculo de afinidade no
parentesco; formação da sociedade conjugal; nova ordem de vocação sucessória; em
determinados casos a emancipação; disciplina das relações patrimoniais dos cônjuges
através do regime de bens adotado, e impõe aos cônjuges os deveres matrimoniais.
Assim sendo toda forma de união ilegítima esta a margem da legítima.
O projeto Suplicy, visa disciplinar a união civil entre homossexuais, num esboço
contratual de parceria, assegurando a duas pessoas o reconhecimento de sua relação,
versando à proteção de direitos à propriedade, sucessão, previdenciários e fiscal. Desta
forma, legitimando a nova família, que passará a ter registro em livro próprio nos
Cartórios de Registro Civil de Pessoas naturais, conforme dispõe o artigo 2º do projeto
lei n.º.1515 / 1995, fazendo figurar um novo conceito denominado de unido, tomando
feição de contrato público, versando sobre questões patrimoniais, deveres,
impedimentos e obrigações mútuas.
Ignorar e repudiar esse tipo de relacionamento não faz a realidade menos visível; pelo
contrário, gera mais preconceito, discriminação e violência.
Com o decorrer do tempo e com todas as revoluções até aqui travadas, os conceitos e
atitudes mudaram, levando a outros tipos de pensamentos e posicionamentos em relação
as diversas formas de união.
Na atual vida moderna, está sendo estritamente necessário que o operador do Direito
ajuste sua visão e percepção para as relações homoafetivas e suas questões jurídicas;
uma vez que não se pode olvidar que as relações que envolvem pessoas do mesmo sexo
e que se unem com o intuito de desenvolverem uma vida familiar, são regidas pelo
amor, fidelidade, harmonia e pela construção patrimonial.
Mas enquanto a lei não chega, por maiores que sejam os preconceitos, cabe a justiça
assegurar a igualdade e a dignidade humana. A insistência de uma sociedade
conservadora não pode impedir que o judiciário reconheça direitos das uniões
homoafetivas.
Infelizmente, muito ainda há que ser discutido, seja social ou juridicamente, mas o
importante é que já existe uma pré-disposição da sociedade para discutir este tema tão
polêmico para alguns, mas tão natural para outros, até porque não deixa de ser natural.
Hoje, a liberação sexual toma corpo o ganha terreno numa busca frenética para alcançar
respeito e ordem social, e não existirá respeito sem igualdade, sem liberdade.
Na verdade, não são os valores que estão perdidos como pregam alguns doutrinadores,
mas sim o bom senso dos homens é que encontra-se alterado, pois muitos acham que
são perfeitos e se acham no direito de julgar de forma a marginalizar todos àqueles que
vivem de forma diversa dele. Diante disso é que temos tantos ataques violentos dos
homofóbicos aos homossexuais pelo simples fato de serem homossexuais.
Indispensável é reconhecer que os vínculos homoafetivos, são muito mais do que meras
relações homossexuais, são constituídas de afeto, lealdade, respeito. Em verdade,
representam uma categoria social que não pode mais ser discriminada ou marginalizada
pelo preconceito. Deve ser cuidado pelos conceitos científicos do Direito, sob pena de o
Direito falhar como Ciência e, o que é pior, como Justiça.
A sociedade mundial, com o passar dos tempos, sofreu inúmeras transformações que
podem ser atribuídas ao desaparecimento de dogmas anteriormente inabaláveis. A única
forma de união afetiva tradicional era o casamento, que passou a conviver com outros
tipos de união como, por exemplo, a união estável e a união de pessoas do mesmo sexo.
Por que então, todas não usufruem os mesmos direitos? Mesmo diante desses fatos, tais
relacionamentos tidos como "imorais" e "anormais", foram ignorados pelo legislador,
carecendo de respostas jurídicas e legais.
Não se pode falar em liberdade sem pensarmos no direito a intimidade, ou vida privada
mencionados da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, dispondo o
seguinte, que ninguém será sujeito a interferências na sua vida privada, todo homem
tem direito a proteção da lei. Diante disso podemos afirmar que não existe nada mais
privado do que a vida sexual de cada um, ou seja, cabe a cada pessoa viver sua própria
sexualidade. Sendo assim, se o sujeito tem o direito de ser homossexual, também deve
tem o direito de ter sua união regulamentada juridicamente, com todo amparo legal
necessário para que não haja injustiças.
Impedir esse direito é o mesmo que impedir o direito a liberdade e igualdade, ferindo
desta forma princípios constitucionais.
Deve-se entender que a proporcionalidade consiste que, para se impedir um direito, esta
restrição não pode ser descabida, têm que ter motivos fortes e plausíveis, motivos estes
que não se sustentam quando se pensa em união homoafetiva, pois esta seria apenas o
gozo do princípio da liberdade e igualdade inerente a todos.
Passados mais de cinqüenta anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos, que
teve como meta principal consagrar o princípio da igualdade, é de surpreender a
ausência de enfrentamento dos aspectos jurídicos das expressões da afetividade
homossexual no panorama legal, na jurisprudência e mesmo na literatura jurídica. De
forma injustificável, persiste a resistência, ainda marcada por forte traço de
conservadorismo, em respeitar quem simplesmente busca a felicidade fora do modelo
convencional de família.
E isso é de grande importância no combate ao preconceito, pois, este é uma arma que
fere a dignidade humana, direitos são desrespeitados. Buscamos uma ordem jurídica
mais justa, mais humana. São muitas as lacunas, mas devemos tentar encontrar a
solução nos direitos fundamentais elencados na Constituição. Cabe à jurisprudência
interpretações mais modernas. Todavia, o conservadorismo impera e desta forma,
ocorre a marginalizarão do que só deveria ser afeto.
(...) não assegurar garantias nem outorgar direitos às uniões de pessoas do mesmo sexo
infringe o princípio da igualdade escancarando postura discriminatória ao livre
exercício da sexualidade. A omissão acaba por consagrar a violação aos direitos
humanos, pois afronta a liberdade sexual, direito fundamental do ser humano que não
admite restrições de qualquer ordem.
3.1. CONCEITO
A união estável nasce do afeto entre homem e mulher, sem a existência do casamento
civil, porém com a finalidade de entidade familiar. Exercida de forma contínua e
pública, tem que ser duradoura e sólida, jamais podendo ser efêmera.
Esta união tem que prolongar no tempo, isso é um requisito temporal. Por um longo
período na estória foi denominada como concubinato, tal expressão é hoje utilizada
apenas para designar o relacionamento amoroso envolvendo pessoas casadas, infiéis e
adulteras.
Nesta relação deve existir igualdade, com poderes de direção no aspecto sócio-jurídico
para ambos, vinculação afetiva, psicológica e material, de caráter estável e duradouro,
sem o casamento civil. É este tipo de comunhão de vida que irá resultar numa entidade
familiar, que não precisa em nada se assemelhar ao casamento. A união estável não é
definida como estado civil, pois se o companheiro for viúvo, solteiro, etc. permanecerão
neste estado civil.
O Novo Código Civil legitimou as mudanças radicais pela qual a família brasileira
passou desde a vigência do Código Civil de 1916. Um destes temas é o “casamento
ilegítimo”, ou seja, a união de pessoas que já haviam casado anteriormente e eram tidos
como concubinos. Durante longos 86 anos o termo ganhou diversas interpretações, mas
depois do referido Código Civil de 2002, a relação entre companheiros e companheiras
ganhou status de união estável, com direitos e deveres assegurados.
3.3 TEMPORALIDADE
A questão do tempo parece-nos uma lacuna. Quanto tempo seria necessário para
configurar este tipo de união?
A união precisa ser ininterrupta, o período aproximado de dois anos tem que ser
contínuos, pois se houver interrupções o prazo anterior será desconsiderado e começara
contar deste tempo em diante. Mas é necessário analisar a situação de cada caso, para
que se perceba se há a existência de outras características que configuram que há uma
entidade familiar com convivência de igualdade. A Lei 8.971/94 foi a primeira que
disciplinou a união estável, fez referencia em seu artigo 1º ao prazo de cinco anos de
convívio em comum, hoje em dia não é mais assim, conforme citado o prazo mínimo de
convivência é de dois anos.
O homem é uma criatura sociável, portanto a família á a base da sua estrutura religiosa e
psicológica, em termos de convivência. Todavia nas últimas décadas a concepção de
família vem se desatrelando dos dogmas religiosos; as mudanças são radicais e
acompanham a evolução tecnológica atual, pois hoje tudo requer a praticidade na
corrida contra o tempo, e com isso a família sofre mudanças ano a ano. O Direito, como
regulador do convívio social acompanha essas mudanças, porém de forma lenta, face ao
protecionismo e conservadorismo próprios de sua cautela como instituto.
Tais situações existiam e era incontestável, o que fez com que muitos juizes criassem
alternativas para evitar que injustiças fossem cometidas. Uma delas foi aplicar por
analogia, através do Direito Comercial o reconhecimento da sociedade de fato entre
conviventes não casados e, também, a jurisprudência admitiu a meação dos bens
adquiridos em esforço comum.
Aos poucos, as restrições existentes no Código Civil de 1916 passaram a ser aplicadas
apenas no concubinato adulterino, ou seja, o impuro. Aquele em que o homem vivia
com a esposa e ao mesmo tempo com a concubina. Porém, se estivesse separado de fato
da esposa e vivesse com outra pessoa um relacionamento de marido e mulher, tais
restrições não eram aplicadas, e esta passava a ser chamada de companheira.
Concubinato puro ou companheirismo seria a convivência duradoura, como marido e
mulher sem impedimentos decorrentes de outra união.
A nova legislação foi feliz ao dedicar um capítulo em separado para tratar da União
Estável como algo dissociado do casamento, mas com o mesmo valor de uma
instituição familiar convencional. Mas, apesar de ser um marco que tem o seu valor, o
erro cometido pelo legislador pareceu proposital ao deixar para a doutrina e a
jurisprudência o encargo de determinar quais seriam ou não os efeitos da União Estável
em situações do dia a dia.
Cabe salientar que alguns doutrinadores adotam uma posição um tanto quanto
conservadora, no sentido de encarar a União Estável como uma forma indireta de
desagregação da família constituída pelo matrimonio.
A união homo afetiva, apesar de não aceita em nossa legislação pátria, está se
consolidando e conseguindo alguns avanços importantes pata ter seu reconhecimento. O
Novo Código Civil, em seu artigo 1.723 e seguintes, incluiu em sua estrutura o instituto
da União Estável, mas não foi o suficiente para regular a situação dos casais
homossexuais. A legislação ainda permanece conservadora ao reconhecer como União
Estável somente aquela existente entre homem e mulher, desta forma. Fechando os
olhos para uma parcela minoritária, porém, significativa da sociedade brasileira que
compõem uma entidade familiar diferenciada. Os homossexuais estão cada vez mais se
organizando, se associando no intuito de se faça valer seus direitos, não aceitando mais
ser considerados cidadãos de segunda classe.
Preconceitos de ordem moral não podem levar à omissão do Estado, nem tão pouca a
ausência de leis e o conservadorismo do Judiciário servem como justificativa para negar
direitos aos vínculos afetivos que não têm a diferença de sexo como pressuposto. É
certamente discriminatória afastar a possibilidade de reconhecimento das uniões
homossexuais, pois são relacionamentos que surgem de um vinculo afetivo, gerando o
enlaçamento de vidas com desdobramento der caráter pessoal e patrimonial, estando a
reclamar regramento jurídico.
Nada justifica, por exemplo, entregar uma herança a parentes distantes em prejuízo de
quem muitas vezes dedicou uma vida ao companheiro (a) e participou da formação do
patrimônio.
Quando duas pessoas ligadas por um vinculo afetivo manter uma relação duradoura,
pública e contínua, como se casados fossem, formando um centro familiar à semelhança
do casamento, merece identifica-la como geradora de efeitos jurídicos independente do
sexo a que pertencem.
Não é ignorando a realidade, deixando-a de lado da sociedade e fora do Direito, que irá
desaparecer a homossexualidade. Enquanto a lei não acompanha a evolução da
sociedade, as mudanças de mentalidade, a evolução do conceito de moralidade,
ninguém tem o direito de fechar os olhos e assumir uma postura preconceituosa ou
discriminatória. Os aplicadores do Direito não pode ser fonte de injustiças. Não se
devem confundir questões jurídicas com as questões morais e religiosas. É necessário
mudar os valores, abrir espaços para as novas discussões, resolver princípios, dogmas e
preconceitos.
O fato de não existir norma legal que regule alguma situação colocada em julgamento
não significa inexistência de direito à tutela jurídica, ausência de lei não quer dizer
ausência de direito, e nem impede que surtam efeitos. A falta de previsão específica nos
regramentos legislativos não pode servir de motivo para deixar de reconhecer a
existência de direitos.
Na omissão legal o juiz deve se valer da analogia, dos costumes e princípios gerais de
direito para que se faça valer a justiça.
Consagrar os direitos em regras legais, talvez seja a maneira mais eficaz de romperem
tabus e derrubar preconceitos. Mas enquanto a lei não vem, é o Judiciário que deve
suprir a lacuna legislativa, mas não por meio de julgamentos permeados de preconceitos
ou restrições morais de ordem pessoal. A Justiça não é cega e nem surda, precisa ter os
olhos abertos para ver a realidade social e os ouvidos atentos para ouvir o clamor dos
que por ela esperam.
Ora, a família, da segunda metade do século XX, passou por uma transformação, na
qual o afeto, ao invés do vinculo formal, passou a ser o elemento caracterizador da
família. A união homoafetiva é uma realidade e merece proteção do Estado. O § 3º do
Artigo 226 da Constituição Federal, ao exigir a diversidade de sexo, para a configuração
da união estável, está em desconexo com a realidade, ferindo, portanto a dignidade
humana.
“Na União Estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações
patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens”.
O artigo citado informa que, não existindo estipulação em contrato escrito, os bens
móveis e imóveis adquiridos onerosamente, por um ou ambos os companheiros, no
período em que durar a união estável, são considerados frutos do trabalho e da
colaboração comum, pertencendo a ambos, em partes iguais. Assim o caso o casal
compre um imóvel e queira ressaltar o direito de um dos dois maior do que o do outro,
podem mencionar na escritura pública ou no compromisso particular desta aquisição um
percentual diferenciado, ou então, conforme possibilita este artigo, podem fazer um
contrato, programando toda a sua vida econômica e financeira. Aplica-se no que couber
o regime de comunhão parcial de bens.
Existirá união estável quando houver associação homem e mulher, ambos livres e
desimpedidos, com a finalidade de constituir família, convivendo com se casados
fossem por um lapso temporal juridicamente razoável, ininterrupto e não clandestino,
gerando entre eles direitos e deveres de respeito e consideração mútuos; assistência
moral e material recíproco; guarda; sustento e educação dos filhos comuns. Esta mesma
união poderá a qualquer tempo ser desfeita, seja por vontade de ambos os
companheiros, seja pela pré-disposição unilateral quando o outro descumprir seus
deveres da convivência, seja enfim, pelo evento da morte.
Sucessão de forma genérica significa o ato jurídico pelo qual uma pessoa substitui outra
em seus direitos e obrigações, podendo ser tanto em consequencia de uma relação entre
pessoas vivas quanto da morte de alguém. Admitindo o Direito então duas formas de
sucessão: inter vivos e causa mortis.
Não podemos confundir sucessão com herança, primeira é o ato de alguém substituir
outrem nos direitos e obrigações em função da morte, ao passo que herança é o conjunto
de bens, direitos e obrigações que se transmitem, em virtude do felecimento a uma
pessoa ou várias pessoas que sobreviveram ao falecido.
Este ramo do direito tem origem aos mais remotos tempos, sempre ligado à idéia de
comunidade da família. O direito das sucessões é fundamentado no direito de
propriedade, em razão da possibilidade de perpetuar seu patrimonio, o homem se vê
incentivado a conservá-lo e a aumentá-lo. Em nosso ordenamento, as normas
concernentes ao Direito das Sucessões estão estabelecidas no artigo 5º da Constituição
Federal, inicsos XXX e XXXI, nos artigos 1784 a 2027 do Código Civil, Lei n. 10.406,
de 10 de janeiro de 2002.A sucessão é aberta na morte de alguém ou na presunção da
mesma. Surge então o direito hereditário acontecendo a substituição do de cujos pelos
seus sucessores na relações juridicas em que o falecido figurava.
Existem dois tipos de herdeiros, os da sucessão legitima, que são os herdeiros legitimos
também chamado de necessário determinado pela lei na seguinte ordem, em primeiro
lugar os descendentes, ou seja, filhos biologicos e adotados, se forem falecidos serão os
filhos destes; caso não haja herdarão em segundo lugar os ascendentes, na falta dos
mesmos herdam os avós; em terceiro lugar o conjuge sobrevivente e em quarto lugar os
parentes colaterais, quais sejam, irmãos, tios, sobrinhos, primos nesta ordem. Além
destes, temos também os legatários ou testamentários, que são beneficiados por
testamento. A lei faculta qualquer pessoa a dispor de parte de seus bens através de
testamento, cahamada de parte disponível, que no máximo chegará até à metade do que
possui. No caso de não haver herdeiros necessários o testador poderá testar seu
patrimonio em sua integralidade.
A união homoafetiva merece tutela jurídica, visto que, traz em sua essência o afeto entre
dois seres humanos, semelhante a qualquer união, sendo então merecedores da partilha
igualitária em caso de dissolução, desta forma realizando a verdadeira justiça.
Portanto, precisa-se ser visto de outra forma, pois os companheiros possuem direito a
herança em concorrência com filhos, pais ou parentes sucessíveis do falecido até quarto
grau, se existirem. Se esta união homoafetiva for reconhecida como união estável
poderá existir a possibilidade de se falar em herança e consequentemente sucessão,
sendo os companheiros herdeiros um do outro em relação aos bens adquiridos na
constância da união.
Fato este que seria muito justo, visto que, em muitos casos o falecido não tem herdeiros
legítimos e não faz testamento, acabando seus bens a mercê do Estado, ou muitas vezes
a herança fica nas mãos de parentes distantes que o rejeitavam e o excluíam do convívio
familiar.
Tais soluções, cabe repetir, geram descabido beneficiamento dos familiares distantes,
que, normalmente, rejeitavam, rechaçavam e ridicularizavam a orientação sexual do de
cujos. De outro lado, na ausência de parentes, a solução leva a um resultado ainda mais
injusto. A herança é recolhida ao Estado pela declaração de vacância, em detrimento de
quem deveria ser reconhecido como sendo o titular dos direitos hereditários.
Todas as espécies de vínculo afetivo que tenham o afeto e respeito como base são
merecedoras da proteção do Estado. Assim sendo, a Justiça gaúcha definiu a
competência dos juizados especializados da família para apreciar as uniões
homoafetivas, desta forma às inserindo no âmbito do Direito de Família, nota-se que
este foi um grande marco que ensejou grandes e importantes mudanças das orientações
jurisprudenciais Riograndense.
A primeira decisão brasileira que deferiu herança ao parceiro do mesmo sexo também
foi do Rio Grande do sul, como tantas outras.
O caminho está aberto, é necessário que os juizes cumpram a missão de fazer justiça
acima de tudo. É preciso ter sensibilidade para cuidar de assuntos tão delicados como
são as relações homoafetivas, as quais demandas precisam ser julgadas com menos
preconceito e mais humanidade.
CONCLUSÃO
Enquanto não existir nenhuma norma que regule as uniões homoafetivas caberá aos
juizes aplicar a justiça fazendo uso dos costumes, analogia e princípios, cabe ao
operador do direito se adequar aos novos fatos que surgem em a evolução da sociedade.
A união homoafetiva é na maioria das vezes ligada a idéia de promiscuidade,
libertinagem e depravação, sem que tais fatos sejam verdadeiros. Ao contrario, de sua
maioria os companheiros compartilham uma vida de amor, carinho, afeto e respeito de
forma duradoura e fiel. É necessário deixar de lado os falsos moralismos e preconceitos
e proteger as relações homoafetivas, resguardando o Princípio da Dignidade Humana,
que é um direito de todos e não apenas daqueles que seguem este ou aquele
comportamento tido como “normal” ou aceitáveis.
Percebe-se que é cada vez mais comum sentirmos a presença do estado em nossas vidas,
e esta, cada vez mais longe da igreja que traz o caráter sacro de conceito de família.
Desta forma, nos leva a uma liberdade cada vez maior dos costumes, ocorrendo um
redirecionamento no conceito de família.
O preconceito é uma arma que fere a dignidade humana, direitos são desrespeitados.
São muitas as lacunas, mas tenta-se encontrar a solução nos direitos fundamentais
elencados na Constituição Federal. Cabe a jurisprudência interpretações mais modernas,
entretanto, o conservadorismo prevalece e ocorre a marginalização do que deveria ser
amor e respeito.
Não importa a forma de amar, e sim o amor ao próximo, pois as relações entre duas
pessoas baseiam-se em companheirismo, cumplicidade e responsabilidades. Dever ter
seus direitos e obrigações resguardadas, sejam eles morais ou materiais, patrimoniais.
Ainda existe um longo caminho para se percorrer, mas será questão de tempo para a lei
admitir direitos às relações homoafetivas, afinal, a lei não se adianta aos fenômenos
sociais, vem sempre ao encontro deles.
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
DIAS, Maria Berenice Manual de Direito das Famílias, 4. Edição – São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais 2007.
MARIA, Berenice Dias, União Homossexual, O Preconceito & a Justiça, 3ª edição 2006
Editora Livraria do advogado.
RODRIGUES, Silvio. Direito Civil vol. VI Direito de Família, edição 29ª São Paulo
editora Saraiva
VENOSA, Silvio. Direito Civil. Vol. V Direito de Família, edição 1ª 2004 São Paulo,
editora Atlas.
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, vol. 5, edição 19ª 2004. São
Paulo. Editora Saraiva.
MIRABETE, Julio Fabrine. Manual de Direito Penal, São Paulo, edição 2005. Editora
Atlas.
INTRODUÇÃO
A presente pesquisa irá abordar sobre a família homoafetiva. Contudo, para maior apreensão e
entendimento do leitor, iremos primeiramente dispor sobre a sexualidade através Sexologia,
inclusive do Direito.
As questões que iremos focar primeiramente girarão em torno das seguintes indagações: O
que é sexualidade? O que é sexo? Como se exterioriza a sexualidade? O exercício da
sexualidade fora dos padrões culturais (“considerado correto”) gera conseqüências para a
pessoa? O que é a sexualidade para o Direito? Quais são as proteções jurídicas a respeito do
livre exercício da sexualidade?
Tópico próprio de nossa pesquisa abordará a família homoafetiva através de uma ótica
constitucional, onde iremos dispor a norma do artigo. 226 da Constituição, pertinente ao tema
família. Analisaremos, inclusive, os desdobramentos do artigo mencionado, para abordarmos
as questões doutrinárias que fazem um estudo crítico de nossa Constituição.
Pressupõe a pesquisa mostrar que a união homoafetiva sofre preconceitos não só por parte da
sociedade, mas por parte de uma doutrina conservadora que persiste equiparar tais relações
como uma sociedade de fato.
Por fim, mostraremos que a omissão legal do legislador não implica em ausência de proteção
constitucional da família homoafetiva. Esta entidade familiar além de forte apoio jurisprudencial
possui correspondentes legais, tais como: art. 126 do Código de Processo Civil, art. 4º da Lei
de Introdução ao Código Civil do Decreto-lei nº 4.657, art.1º, inciso III da CF, art.5º da CF, e por
fim, o art. 5º e desdobramentos da “Lei Maria da Penha” (Lei nº.: 11.340/06).
A sexualidade é mais abrangente porque não trata de um fator meramente físico, integram
também na sexualidade fatores psicológicos do indivíduo que expressará seus impulsos
sexuais de forma livre, não se restringindo, apenas aos órgãos genitais que possui.
Por ser expressão livre da vontade do individuo há varias formas de exteriorizar a sexualidade,
definindo-se, portanto, por: homossexualidade, heterossexualidade, bissexualidade,
transexualidade.
Maria Berenice Dias, em sua obra “Manual de Direito das Famílias”, assegura juridicamente,
que a sexualidade “integra a própria condição humana. É direito humano fundamental que
acompanha o ser humano desde o seu nascimento, pois decorre de sua própria natureza”
(DIAS, p. 176, 2006). O exercício da sexualidade é um direito natural, que nasce com o
indivíduo e o acompanha por toda a sua vida, compreende também a sua dignidade, portanto,
ninguém “pode se realizar como ser humano, se não tiver assegurado o respeito ao exercício
da sexualidade” (DIAS, p.31, 2008).
Vê-se que pelo desenrolar da pesquisa a sexualidade demonstra-se tema relevante para o
Direito, possuindo assim tutela jurídica. A luta no que tange a livre manifestação da sexualidade
(não-heterossexual) é conquistar o respeito à dignidade humana, igualdade e liberdade.
Veja que lutam os bissexuais, homossexuais e transexuais, por igualdade, justiça, bem-estar,
liberdade, direitos individuais e em certos casos por direitos sociais. Importante lembrar que
todos estes direitos mencionados no Preâmbulo da Constituição são garantidos e elencados
nas disposições dos artigos do texto Constitucional.
Quanto à igualdade e liberdade, podemos observa o art. 5º da Constituição, que expõe que
todos “são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade,
à igualdade (...)” (Art.5º, Caput, CR/1988).
“(...) de nada adianta assegurar respeito à dignidade humana e à liberdade. Pouco vale
afirmar a igualdade de todos perante a lei, (...), que não são admitidos preconceitos ou
qualquer forma de discriminação. Enquanto houver segmentos alvos da exclusão
social, tratamento desigualitário entre homens e mulheres, enquanto a
homossexualidade for vista como crime, castigo ou pecado, não se está vivendo em
um Estado Democrático de Direito” (DIAS, p.30, 2008)
Portanto não podemos ter nenhuma sombra de dúvida, que a sexualidade de um indivíduo não
deve ser alvo de preconceito e inclusive motivo de exclusão de direitos. As normas jurídicas
além de disporem proteção, devem garantir a efetividade de direitos inibindo atos nocivos a
estes. – Garantindo assim, os pilares de um Estado Democrático de Direito. O problema da
discriminação quanto à sexualidade é visível, porém reparável.
O matrimônio era única fonte de união, que se daria entre homem e mulher com especial
objetivo de procriação. Esta instituição possui suas raízes na religião, que fundou os traços da
“normalidade”, manifestada pela heterossexualidade. Este fato fez com que o Direito tutelasse
somente esta união, não prevendo assim, mudanças e avanços morais, como também,
científicos e tecnológicos.
Maria Berenice Dias, aponta os fundamentos da Igreja afirmando que foi através do casamento
que se propagou a “fé cristã: crescei e multiplicai-vos. A infertilidade dos vínculos
homossexuais levou a Igreja a repudiá-los, acabando por serem relegados à margem da
sociedade” (DIAS, p. 174, 2006).
O Direito representado pela figura do legislador (que poderia ter solucionado todo problema)
seguiu os mesmos passos adotados pela religião e das exigências culturais, mesmo com a
existência de relações homoafetivas, que cada dia aumenta no seio da sociedade. O motivo
torna-se óbvio “o legislador, com medo da reprovação de seu eleitorado, prefere não aprovar
leis que concedam direitos às minorias alvo da discriminação” (DIAS, p.174, 2006). – Não há
leis específicas para as uniões homoafetivas no Direito Positivo Brasileiro! ?
Estabelece a Constituição em capitulo próprio sobre a família, a começar pelo artigo. 226 e
desdobramentos. Entende-se pelo caput do artigo mencionado que família é uma instituição
protegida pelo Estado, por ser a base formadora da sociedade. O problema doutrinário
encontra-se nos desdobramentos presente artigo, vejamos:
A maior parte da doutrina entende que é expresso o descaso do Estado ao reconhecer como
união estável somente entre homem e mulher, ainda que “em nada se diferencie a convivência
homossexual da união estável heterossexual” (DIAS, p 43, 2006), fato este, que possa dificultar
a proteção da relação homoafetiva como entidade familiar.
Nota-se atualmente, que a família toma novos aspectos obedecendo tão somente aos
princípios da afetividade, ostensibilidade e estabilidade. Veja que o parágrafo 4º do artigo 226
da Constituição entende não ser necessário à presença de um homem e uma mulher para
poder constituir uma entidade familiar. Esta entidade é denominada “monoparental, que
dispensa a existência do casal (homem e mulher)” (LÔBO, p.68, 2008), basta-se que comprove
os requisitos exigidos no conteúdo do parágrafo.
Outro grupo familiar que podemos encontrar na doutrina são as famílias recompostas ou
famílias reconstituídas. Esta entidade é formada por “um cônjuge ou companheiro e os filhos do
outro, vindos de relacionamento anterior” (LÔBO, p.73, 2008). Sem dúvida há uma figura
familiar diferente da monoparental e da família decorrente do parágrafo 3º do art. 226 da
Constituição. Na família reconstituída surgem relações diferentes, os filhos, por exemplo,
“passam a ter novos irmãos. Os cônjuges, companheiros ou parceiros passam a ter novos
parentes por afinidade” (FARIAS, ROSENVALD; p.62, 2008).
O que queremos comprovar é que o matrimônio, o sexo, ou a capacidade de procriar não são
expressos como elementos fundadores da família, ou seja, que justifique ou não a existência
de um núcleo familiar.
De forma alguma, está expresso na Constituição que é vedado relações homoafetivas, porém,
já é sabido que o legislador não regulamentou tais uniões. Lôbo afirma que apesar da
“ausência de lei que regulamente essas uniões não é impedimento para sua existência, porque
as normas do art.226 são auto-aplicáveis independentemente de regulamentação” (LÔBO,
p.68, 2008). Portanto, leva-nos a crer que esta omissão não significa a ausência de tutela
jurídica.
No mesmo sentido, Farias e Rosenvald na obra Direito das Famílias, afirmam que uma relação
homossexual “poderá produzir efeitos no âmbito do ordenamento jurídico seja no âmbito
patrimonial, seja na esfera pessoal” (FARIAS, ROSENVALD, p.53, 2008).
À luz dos valores constitucionais a família “ganhou uma dimensão mais ampla, espelhando a
busca da realização pessoal de seus membros” (FARIAS, ROSEVALD, p.54, 2008), ou seja, da
dignidade humana (Art.1º, inciso III, CF, 1988). Outros princípios constitucionais também são
levados em consideração, a titulo de exemplo: principio da igualdade (art.5º, CF 1988), que
veda qualquer tipo de discriminação.
Definir dignidade, não é tarefa fácil, pois o termo possui para o Direito natureza principiológica,
podemos fazer, porém, com a contribuição magistral de Gagliano e Pamplona Filho. Para os
autores a dignidade
Logo podemos perceber que o termo é bastante amplo, repercute nas relações patrimoniais e
afetivas do individuo. Tal motivo nos leva a crer que é correto a visão esposada de Farias e
Rosenvald ao afirmarem que as relações homoafetivas produzem efeitos no âmbito jurídico.
Reconhecer esta entidade familiar como sociedade de fato, é levar as uniões homossexuais
para o “âmbito puramente obrigacional, (...) – do qual decorreriam efeitos tão-somente
patrimoniais” (FARIAS; ROSENVALD, p.53, 2008). Esta visão não é correta, pois o parceiro
deveria comprovar efetivamente que houve participação sua quanto à aquisição de bens que
se perfez no tempo de convivência.
Ora, pois, a relação existente é movida por traços eminentemente afetivos, não de sócios.
Logo, é infundado o reconhecimento da união homoafetiva como sociedade de fato.
Todo o trabalho de Maria Berenice Dias gira em torno da equiparação da união homoafetiva
como união estável descrita no parágrafo 3º do art. 226 da Constituição.
Por outro lado, Paulo Lôbo entende não haver “necessidade de equipará-las à união estável,
que é entidade familiar completamente distinta” (LÔBO, p.68, 2008). Quanto a este impasse,
concordamos com Paulo Lôbo.
As uniões homoafetivas não deixam de ter tutela jurídica simplesmente por não estarem
expressas nos desdobramentos do art. 226 do Texto Constitucional, além do mais, conforme
Paulo Lôbo observou, esta entidade familiar é completamente diferente. O problema de ser ou
não equiparada à União Estável deriva do art. 226 da Constituição. - Sua enumeração seria
taxativa ou simplesmente exemplificativa? - O Texto Constitucional estaria sendo
discriminativo?
Farias e Rosenvald, afirmam a “não taxatividade do rol contemplado no art.226 da Lei das Leis,
sob pena de desproteger inúmeros agrupamentos familiares não previstos ali” (FARIAS,
ROSENVALD, p.36, 2008). Logo, a Constituição não discrimina e nem exclui nenhuma outra
entidade familiar existente.
Outra observação importante realizada pelos autores que justifica a não equiparação desta
União a União Estável é que o problema pode ser originário da interpretação dada ao Texto
Constitucional, senão vejamos:
“a exclusão das outras formas de entidades familiares não decorre da lei expressa do
Texto Constitucional, mas de uma interpretação do Texto Magno” (LÔBO, citado por
FARIAS; ROSENVALD, p. 36, 2008)
O Texto Constitucional diz tão-somente aquilo o que queremos compreender. Portanto, o que
devemos compreender é que não há limitação, discriminação, ou exclusão de entidades
familiares não previstas nos desdobramentos do art.226 do Texto Magno.
Até aqui foi demonstrado que há uma omissão do legislador quanto às uniões homoafetivas,
porém, conforme vimos esta omissão não implicará em ausência de tutela jurídica.
Segundo o art. 126 do Código de Processo Civil, “o juiz não se exime de sentenciar ou
despachar alegando lacuna ou obscuridade da lei (...)” (CPC, art.126). O mesmo sentido pode
ser notado na Lei de Introdução ao Código Civil do Decreto-lei nº 4.657, de 4 de Setembro de
1942. Quando a lei for omissa “o juiz decidirá o caso de acordo com analogia, os costumes e
os princípios gerais do direito” (LICC, art.4º). Ressalvando que no caso dos costumes, não
valerá para o Direito “preconceitos de ordem moral” (DIAS, p.179, 2006)
As normas do Art.1º, inciso III, CF, (relata sobre a dignidade da pessoa humana) e a norma do
Art.5º da CF (expõe sobre a Igualdade), são utilizadas como pilares justificadores da família
homoafetiva, mais especificamente da expressão sexual.
Outra disposição normativa do art. 5º da “Lei Maria da Penha” (Lei nº.: 11.340/06), a nosso ver,
deu um grande passo ao reconhecer a união homoafetiva pelo menos, entre mulheres. Senão
vejamos:
“art.5º: Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a
mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão,
sofrimento físico, sexual ou psicológico e de dano moral ou patrimonial:
I – (...)
III – (...)
O parágrafo Único do art.5º da “Lei Marinha da Penha” é de extrema importância, pois ali,
certificamos o reconhecimento da união homoafetiva, ainda que seja entre mulheres.
No âmbito jurisprudencial, podemos afirmar que a Justiça Gaúcha foi pioneira ao tratar da
união homoafetivas. Já no ano de 1999 foi definido “a competência dos juizados especializados
da família de apreciar as uniões homoafetivas” (DIAS, p.181, 2006).
Para finalizarmos nosso trabalho, segue abaixo algumas jurisprudências:
A ausência de lei específica sobre o tema não implica ausência de direito, pois existem
mecanismos para suprir as lacunas legais, aplicando-se aos casos concretos a
analogia, os costumes e os princípios gerais de direito, em consonância com os
preceitos constitucionais (art. 4º da LICC)”. (TJ, Estado do Rio Grande do Sul, AC
70009550070, Des. Luiz Felipe Brasil Santos, DESA. MARIA BERENICE DIAS, 2004)
CONCLUSÃO
Concluímos com a pesquisa que para trabalhar acerca da família homoafetiva é mister
entender o os problemas advindo da manifestação sexual, que pode se dar por quatro
maneiras: homossexualidade, heterossexualidade, bissexualidade, transexualidade.
Vimos que a sexualidade é a manifestação livre do indivíduo que integra não só os fatores
físicos, mais psicológicos. Logo a sexualidade é mais abrangente do que o sexo, que é
compreendido tão-somente pelas características biológicas e fisiológicas do individuo.
O respeito à sexualidade é importante para o indivíduo. Como direito fundamental do ser
humano, torna sua vida digna e feliz. Motivo este, que levou o Direito a buscar princípios que
tutelassem a livre manifestação sexual. Sua proteção é destacada pelo nosso texto
Constitucional em vários pontos, mas apesar da proteção, se a homossexualidade,
bissexualidade e transexualidade forem alvos de preconceito ou discriminação não efetivará a
vontade do nosso Texto Maior.
Concluímos que o a omissão do legislador constitucional ao tratar sobre a família no artigo. 226
e desdobramentos não proíbe as relações homoafetivas, e muito menos significa dizer que a
entidade familiar homoafetiva esta despida de tutela jurídica.
Vimos que não é necessário homem e mulher para se ter uma entidade familiar. O grupo
familiar pode ser monoparental ou composto por famílias recompostas, ou formado por
membros do mesmo sexo – Família Homoafetiva, que surte efeitos sociais e jurídicos, pois
atualmente a família é compreendida tão-somente por valores constitucionais da dignidade,
igualdade, afetividade, ostensibilidade e estabilidade.
A família homoafetiva é uma entidade que deve ser visualizada tal como se apresenta, não há
necessidade de equiparar com a união estável. A família homoafetiva possui proteção
Constitucional, mesmo que esta não esteja expressa nos desdobramentos do art. 226 da
mencionada Lei. A Constituição não é taxativa. Em outras palavras ela não exclui nenhuma
entidade familiar. A família descrita no parágrafo terceiro e quarto do art. 226 são apenas
exemplificativos.
Por fim, vimos que a família homoafetiva, apesar da omissão do legislador, mesmo porque o
parágrafo terceiro e quarto do art.226 da Constituição é apenas exemplificativo, não deixa ter
correspondentes legais e jurisprudências que justifiquem esta união.
A “Lei Maria da Penha” ou Lei nº.: 11.340/06 no art. 5º, e desdobramentos, avançou muito na
definição e no reconhecimento da família homoafetiva, mesmo que somente entre mulheres.
Concluímos que a definição de comunidade familiar no inciso II do referido artigo possui uma
conceituação bastante ampla e moderna de entidade familiar, não ocorrendo problemas de
interpretação ou da necessidade exemplificativa apresentada na Constituição.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Leis
Jurisprudências
STJ, REsp 820475/RJ, Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, Ministro Luis Felipe Salomão,
06/10/2008
TJ, Estado do Rio Grande do Sul, AC 70009550070, Des. Luiz Felipe Brasil Santos, Desa.
Maria Berenice Dias, Porto Alegre, 2004.
TJ, Estado do Rio Grande do Sul, AC 70012836755, Dês. Luiz Felipe Brasil Santos (revisor),
Des. Ricardo Raupp Ruschel, Desa. Maria Berenice Dias, Porto Alegre, 2005.
TSE, Ac. Unân, Rec. Especial Eleitoral 24564/PA, rel. Min. Gilmar Mendes, j. 1.10.04 RJTSE -
Revista de jurisprudência do TSE, Volume 17, Tomo 1, Página 234
Doutrina
DIAS, Maria Berenice, Manual de Direito das Famílias, RT, 3º edição atual e ampliada, São
Paulo, 2006
____, Maria Berenice, Direito à Diferença, Revista Jurídica Areópago da Faculdade Unifaimi,
Ano I (2008), Edição nº 3, disponível em:
http://www.faimi.edu.br/v8/RevistaJuridica/Edicao3/Homoafetividade%20e%20o%20direito
%20à%20diferença%20-%20berenice.pdf
FARIAS, Cristiano Chaves de Farias; ROSELVALD, Nelson, Diretos das Famílias, De acordo
com a Lei nº 11.340/06 – Lei Maria da Penha e com a Lei 11.441/2007 – Lei de Separação,
Divórcio e Inventário Extrajudiciais, Lúmen Júris, Rio de Janeiro, 2004.
GAGLIANO, Paplo Stolze; PAMPLONA, Rodolfo, Novo Curso de Direito Civil, Contratos,
Tomo I, Volume IV, 2º Edição revista e atualizada e reformada, Saraiva, São Paulo 2006.
1.0 - Introdução
Assim é que se pretende verificar como é vista a questão de tais uniões sob
o ponto de vista dos Direitos Humanos, na tentativa de se descobrir se,
perante a legislação vigente no Brasil – notadamente a Constituição Federal
de 1988 –, seria possível considerar-se tais relacionamentos como
juridicamente protegidos, ou se, face as declarações internacionais de
Direitos Humanos – notadamente a Declaração da ONU de 1948 – seria
juridicamente possível negar-se o “direito à união homossexual”.
2.1 - Origem
2.2 - Conceito
A maioria dos autores (Paulo Gustavo Gonet Branco, op. cit.; Alexandre de
Morais, op. cit.; e João Baptista Herkenhoff, Gênese dos Direitos Humanos)
concordam em dizer que a idéia de Direitos Humanos está intimamente
ligada à idéia de dignidade da pessoa humana.
Para João Baptista Herkenhoff: “por direitos humanos ou direitos do homem
são, modernamente, entendidos aqueles direitos fundamentais que o
homem possui pelo fato de ser homem, por sua própria natureza humana,
pela dignidade que a ela é inerente. São direitos que não resultam de uma
concessão da sociedade política. Pelo contrário, são direitos que a
sociedade política tem o dever de consagrar e garantir. Este conceito não é
absolutamente unânime nas diversas culturas. Contudo, no seu núcleo
central, a idéia alcança uma real universalidade no mundo
contemporâneo...” (Gênese dos Direitos Humanos, págs. 30 e 31)
Nesse sentido, o autor lembra, mais adiante, que “Jefferson, nos Estados
Unidos, afirmou, como democrático, que a vontade da maioria fosse a base
do poder. Mas completou que essa vontade da maioria, para ser legítima,
deveria ser razoável. A minoria possui direitos iguais, também protegidos
pela lei, sentenciou Jefferson. Violar esses direitos é agir como opressor.”
(Gênese dos Direitos Humanos, pág. 127).
Outro o valor seria o da “liberdade” seria o suporte dos artigos III, IV, XIII,
XVIII, XIX e XX, onde o autor afirma que ”...a liberdade deve conduzir à
solidariedade entre os seres humanos. Não deve conduzir ao isolamento, à
solidão, à competição, ao esmagamento do fraco pelo forte, ao homem-
lobo-do-homem, à ruptura dos elos. Essa ruptura leva tanto à esquisofrenia
individual quanto à esquisofrenia social. Garantir a liberdade dentro de uma
sociedade solidária é o desafio que se coloca. Liberdade para todos e não
apenas para alguns. Liberdade que sirva aos anseios mais profundos da
pessoa humana. De modo algum a liberdade que seja instrumento para
qualquer espécie de opressão.” (Gênese dos Direitos Humanos, pág. 136).
Assim seriam estes, e os outros cinco (os outros valores seriam: “paz e
solidariedade universal”, “proteção legal dos direitos”, “Justiça”,
“Democracia” e “dignificação do trabalho”) valores, os grandes objetivos a
serem alcançados pela Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU,
em seus trinta artigos.
Assim, ele apresenta vários documentos jurídicos que foram assinados após
a promulgação da referida Declaração da ONU, e que trazem, em relação a
esta mesma Declaração, uma ou outra ampliação da noção de Direitos
Humanos. Seriam os principais documentos: A Carta Africana dos Direitos
Humanos e dos Povos, A Declaração Islâmica Universal dos Direitos do
Homem, a Declaração Universal dos Direitos dos Povos, a Declaração
Americana de Direitos e Deveres do Homem, e a Declaração Solene dos
Povos Indígenas do Mundo.
Concorda com esta tese o jurista Paulo Gustavo Gonet Branco, que, em
determinado momento, chega a afirmar que: “De fato, o catálogo dos
direitos fundamentais vem-se avolumando, conforme as exigências
específicas de cada momento histórico...” (Op. cit., pág. 115)
Existe quem defenda até mesmo uma quarta geração de direitos, a qual
estaria apenas em estágio embrionário.
3.0 - Da homossexualidade
Conforme Luiz Alberto David Araújo (Op cit., pás 36 à 45), com o surgimento
do cristianismo, com o surgimento do ideal da virgindade, inspirado na vida
de Maria, que teria concebido seu filho sem ter mantido relações sexuais
com José, tornando-se um modelo a ser seguido por todas as mulheres do
mundo; o casamento, a sociedade e a sexualidade passam a ter uma
interpretação cristã. A Igreja Católica pregou o sexo como algo mau, o
prazer seria obra do Diabo; o sexo seria admitido unicamente com a
finalidade de procriação, sendo ainda hoje condenado pela Igreja o uso de
preservativos, mesmo durante relações sexuais entre marido e mulher. O
pecado original seria fruto de uma relação sexual. Por isso ele é mau. O
celibato é o modo pelo qual os homens se redimem do pecado original.
Mas pode-se encontrar, por exemplo, em Corintios 6:9 "Não sabeis que os
injustos não herdarão o reino de Deus? Não vos enganeis: nem os devassos,
nem os idólatras, nem os adúlteros, nem os efeminados, nem os
sodomitas". Devendo os termos "efeminados" e "sodomitas" ser entendidos
e identificados com o que hoje se entende por homossexuais. Desta forma,
está claro que os homossexuais não "herdarão o reino de Deus", e por isso,
serem, todas as igrejas, quer sejam a Católica ou outras igrejas Evangélicas,
radicalmente contra a homossexualidade.
Outro exemplo pode ser colhido em Levítico 18:22, onde lê-se: "Com o
homem não te deitarás, como se fosse mulher: É abominação". Este
versículo, mais ainda que o anterior, deixa claro, que a homossexualidade é
contrário à vontade divina.
Só a Deus cabe julgar, à nós, seres humanos, cabe amar ao próximo como a
nós mesmos, fazendo o bem, sem olhar a quem, conforme a parábola do
Bom Samaritano, narrado em Lucas 10:1-42.
Ademais, não se deve misturar Direito e Religião, pois são coisas diferentes.
Bem andou o legislador ao contrariar alguns escritos bíblicos, como por
exemplo este trecho que manda à mulher obedecer ao marido: “Vós,
mulheres, submetei-vos a vossos maridos, como ao Senhor; porque o
marido é a cabeça da mulher, como também Cristo é a cabeça da igreja,
sendo ele próprio o Salvador do corpo. Mas, assim como a igreja está sujeita
a Cristo, assim também as mulheres o sejam em tudo a seus maridos.”
(Efésios 5:22-24).
Quem, em pleno século XXI, seria capaz de afirmar que o homem é superior
à mulher, e que portanto esta deve submeter-se àquele? Hoje em dia já está
consagrado no mundo jurídico o princípio de igualdade entre os sexos.
Deve-se lembrar ainda, que o Direito não está submisso à Religião, tanto é
verdade que o Direito, mais uma vez, contraria os ensinamentos da Bíblia
ao autorizar o divórcio, pois, conforme Marcos 10:7-9: “Por isso deixará o
homem a seu pai e a sua mãe, e unir-se-á a sua mulher. E serão os dois
uma só carne: e assim já não serão dois, mas uma só carne. Portanto o que
Deus ajuntou não separe o homem.”
Ora, o direito à liberdade afirma que toda pessoa humana pode fazer o que
bem lhe aprouver desde que, com suas ações, não prejudique ninguém.
Uma vez comprovado que a união homoafetiva não prejudica ninguém,
trata-se, portanto, de parcela, nitidamente, ligada à liberdade pessoal de
cada indivíduo.
Frente ao que foi exposto sobre intimidade e vida privada está claro que o
indivíduo tem o direito de ser homossexual, pois esta é uma escolha que
apenas a ele diz respeito, faz parte de sua vida mais íntima, e ninguém tem
o direito de dizer como este ou aquele indivíduo deve viver sua privacidade.
Não parece, por outro lado, contraditório o fato de um indivíduo ter direito
de ser homossexual e não poder “exercer” esta homossexualidade através
de união – juridicamente reconhecida – com outro indivíduo homossexual,
contrariando o que afirmou João Baptista Herkenhoff sobre as reais
possibilidades de exercício do direito à liberdade?
E mais, uma vez que não foi tal hipótese expressamente vedada pelo
constituinte, cumpre concluir pela possibilidade jurídica do reconhecimento
deste tipo de união, pois se trata de hipótese restritiva de direito onde não
cabem interpretações extensivas (todos os autores que tratam de
hermenêutica jurídica são unânimes em reconhecer tal impossibilidade).
As possíveis limitações que podem ser feitas aos Direitos Fundamentais não
são ilimitadas, devendo-se na prática, sempre, preservar um mínimo de
direito compatível com o Direito Fundamental o qual se pretende limitar. É a
idéia de “núcleo essencial” de um Direito Fundamental, que, nas palavras
do Ministro Gilmar Ferreira Mendes: “De ressaltar, porém, que, enquanto
princípio expressamente consagrado na Constituição ou enquanto postulado
constitucionalmente imanente, o princípio da proteção do núcleo essencial
destina-se a evitar o esvaziamento do conteúdo do direito fundamental
decorrente de restrições descabidas, desmesuradas ou desproporcionais.”
(Op. cit., pág. 245).
Lembra, ainda, o Ministro que: “... propõe Hesse uma fórmula conciliadora,
que reconhece no princípio da proporcionalidade uma proteção contra as
limitações arbitrárias ou desarrazoadas (teoria relativa), mas também
contra a lesão ao núcleo essencial dos direitos fundamentais. É que,
observa Hesse, a proporcionalidade não há de ser interpretada em sentido
meramente econômico, de adequação da medida limitadora ao fim
perseguido, devendo também cuidar da harmonização dessa finalidade com
o direito afetado pela medida.” (Op. cit., pág. 245).
Com o passar do tempo, ficou claro que esta era uma doença comum,
causada por vírus, e transmitida pelo sangue. Todos estão sujeitos a ela. Os
casos de heterossexuais contaminados cresceram, chegando-se mesmo, a
ponto de poder-se dizer que, atualmente, a maioria dos casos novos
registrados são de heterossexuais. E não se quer dizer com isso que estes
casos são de drogados ou hemofílicos, e sim de heterossexuais casados,
que não usam drogas, nem praticam relações homossexuais.
A verdade é que, aquele que mantém uma vida sexual ativa com vários
parceiros, quer seja ele homossexual ou heterossexual, está dentro do
chamado "grupo de risco", denominação esta, que, hoje já é combatida por
muitos especialistas que dizem não mais existir este "grupo de risco", e que
todos são passíveis de contaminação. Tanto é verdade esta afirmação que,
no dia 6 de setembro de 2000, a revista Istoé trouxe uma reportagem a
respeito do crescente número de casos de donas de casa infectadas pelo
vírus HIV, e que foram contaminadas pelos maridos, sendo que estes casos
representavam cerca de 57% dos casos registrados entre dezembro de
1999 e junho de 2000.
Por outro lado, como já dito anteriormente, porquê se preocupar com o fato
de as uniões homoafetivas serem contra os textos bíblicos, quando é de
conhecimento geral que isto não foi argumento bastante para impedir-se a
legalização do divórcio?
Assim, este também é um fim que não é, de forma alguma, fomentado pelo
não-reconhecimento jurídico das uniões homoafetivas.
Por fim, esta limitação também não é adequada para fomentar o outro fim a
que se destina: a proteção do bom desenvolvimento psicológico e social das
crianças.
Está claro que, por ser uma limitação que não se adequa às finalidades a
que se propõe, e mais, por ser uma medida desnecessária, uma vez que
existem outras medidas menos danosas aos direitos homossexuais que
sejam tão eficientes na busca destes objetivos quanto a limitação analisada,
não é razoável que esta proibição seja acolhida, estando, portanto,
demonstrada a plena incompatibilidade entre a regra da proporcionalidade
e o não-reconhecimento das uniões homoafetivas.
Mas, como dito, por amor à dialética, cumpre perguntar: mesmo que a
limitação analisada fosse necessária, seria proporcional ao dano imposto
aos homossexuais? Seria razoável, no intuito de se alcançar os objetivos
apontados, impedir o legítimo desejo de união entre duas pessoas de
mesmo sexo, as quais pretendem, em última análise, apenas serem felizes?
É claro que, como bem lembra Alexandre de Morais (Op. cit., págs. 56 et.
seq.), o preâmbulo não tem força normativa obrigatória, mas, como este
mesmo jurista bem observou, o preâmbulo constitucional “consiste em uma
certidão de origem e legitimidade do novo texto e uma proclamação de
princípios” (Ibid., pág. 57) além de que: “...o preâmbulo não é juridicamente
irrelevante, uma vez que deve ser observado como elemento de
interpretação e integração dos diversos artigos que lhe seguem.” (Ibid.,
pág. 57).
Por outro lado, como bem assinala Valério de Oliveira Mazzuoli: “Como
INTRODUÇÃO
1 A FAMÍLIA
“...
A família é reconhecida como base da sociedade, recebendo proteção especial
do Estado. O conceito de família é alargado no texto constitucional. A família é a
união estável entre homem e mulher devendo a lei facilitar sua conversão em
casamento. (Pinto Ferreira, Lui. Manual de Direito Constitucional, p. 429).
O fato de outorgar à lei a obrigação de facilitar a conversão da referida união em
casamento, não subtrai da mesma a qualificação de família, merecedora de
proteção do Estado, deixando, entrever, tão-só a preferência de ser regularizada
tal situação de fato que, no entanto, na linguagem já consolidada por Pontes de
Miranda, tornou-se suporte fático suficiente para a sua integração no campo do
Direito de Família, subtraído que foi da gama obrigacional onde havia sido
acomodado pelos juristas.
Pacifico o reconhecimento de todos que atentaram para tal dispositivo
constitucional de que houve o enquadramento do instituto no Direito de Família,
assim Sérgio Gilberto Porto (Palestra proferida no curso de Direito de Família,
promovido pelo Instituto dos Advogados do Brasil, em 14.10.89) e Sérgio
Gischkow Pereira (Algumas questões de família na nova Constituição, Ajuris
45/146), com o conseqüente deslocamento da competência para o julgamento
das ações para as varas especializadas.
...”.
A família patriarcal era a base desse sistema mais amplo e, por suas
características quanto à composição e relacionamento entre seus membros,
estimulava a dependência na autoridade paterna e a solidariedade entre os
parentes.
Por outro lado, podemos ver a predominância nos séculos XVIII e XIX de
famílias com estruturas mais simplificadas e menor número de
componentes. Tal fato, entretanto, parece não ter alterado a intensidade
das relações familiares e a importância da família como unidade social
básica no decorrer desse período.
“A Constituição italiana dedicou três artigos (29 a 31) à família, baseando toda a
regulamentação desta instituição no reconhecimento dos direitos que lhe
pertencem enquanto ‘sociedade natural fundada sobre o matrimônio’ (do qual se
deduz que a família assim tutelada é a legitima, ou seja, monogâmica; que deriva
de um matrimônio regular)”.
“A família é um fato natural. Não a cria o homem, mas a natureza (...) O legislador
não cria a família, como o jardineiro não cria a primavera. Fenômeno natural, ela
antecede necessariamente o casamento, que é um fenômeno legal, e também por
ser um fenômeno natural é que ela excede à moldura em que o legislador a
enquadra. Agora, dizei-me: que é que vedes quando vedes um homem e uma
mulher, reunidos sob o mesmo teto, em torno de um pequenino ser, que é fruto
de seu amor? Vereis uma família. Passou por lá o juiz, com a sua lei, ou o padre,
com o seu sacramento? Que importa isso? O acidente convencional não tem
força para apagar o fato natural. De tudo que acabo de dizer-vos, uma verdade
resulta: soberano não é o legislador, soberana é a vida. Onde a fórmula
legislativa não traduz outra cousa que a convenção dos homens, a vontade do
legislador impera sem contraste. Onde, porém, ela procura regulamentar um
fenômeno natural, ou o legislador se submete às injunções da natureza, ou a
natureza lhe põe em cheque a vontade. A família é um fato natural, o casamento é
uma convenção social. A convenção é estreita para o fato, e este então se produz
fora da convenção. O homem quer obedecer ao legislador, mas não pode
desobedecer à natureza, e por toda a parte ele constitui a família, dentro da lei, se
é possível, fora da lei, se é necessário”23
A ordem pública seria fundada sobre a ordem privada, a ordem social sobre
a ordem doméstica, a grande pátria sobre a pequena. Esta regulamentação
procedia-se segundo certas opções normativas, entre as quais são
salientados o reforço drástico do poder marital, a supremacia absoluta da
família legítima, a condição jurídica submissa da mulher e a criminalização
do adultério feminino. Além disso, a família repousava em uma disciplina
machista do pátrio poder sendo, ainda, reforçada por seu controle público.
Este poder-dever orientava-se para a consecução de fins públicos, daí a
possibilidade da intervenção estatal sempre que não fosse desempenhado
adequadamente.
O Direito não regula os sentimentos dos indivíduos, mas sim as uniões que
agregam afetos a interesses em comum, que ao terem relevância jurídica,
merecem proteção legal, não importando se seus parceiros são hetero ou
homossexuais, deste modo, todos os vínculos que tem o afeto como base
são merecedoras da proteção do Estado.
Com esse passo a evolução dos direitos humanos atinge seu ápice, a sua
plenitude subjetiva e objetiva. São direitos humanos plenos, de todos os
sujeitos contra todos os sujeitos, para proteger tudo o que condiciona a vida
humana, fixados em valores ou bens humanos como patrimônio da
humanidade, segundo padrões de avaliação que garantam a existência com
a dignidade que lhe é própria.
Tendo como ponto de partida a visão paradigmática acerca deste instituto, devemos,
primeiramente, estabelecer que a nossa Carta Constitucional constituiu em Estado
Democrático de Direito a República Federativa do Brasil (Art. 1º CR/88). E, em sendo assim,
toda análise do direito deve ter como pano de fundo justamente este contexto.
Neste sentido, analisaremos a pensão por morte a partir de uma visão paradigmática. Para
tanto, tomaremos como parâmetro três situações, sendo elas: a igualdade entre homens e
mulheres, a manutenção do benefício em caso de novas núpcias e a união homoafetiva. Muito
embora estejam disciplinadas e garantidas pela CR/88, ainda que implicitamente, bem como a
partir de uma interpretação teleológica da mesma, tais situações, na esfera previdenciária,
assumem conotações distorcidas e, na maioria das vezes, sem embasamento jurídico algum.
No que tange ao primeiro caso – igualdade entre homem e mulher para percepção do benefício
-, este talvez, dentre os três, seja o que possui menor grau de complexidade. Talvez, isto se
deva justamente ao fato de que o texto constitucional, de maneira expressa, assegurou esta
igualdade para o recebimento do benefício da pensão por morte (Art. 5º, caput c/c art. 201, V
CR/88). Neste sentido, tendo sido o segurado acometido da contingência morte, os
dependentes deste (art. 16, Lei 8.213/91) farão jus ao referido benefício, independentemente
de serem inválidos ou não.
Passando à situação seguinte, pode-se afirmar categoricamente que, para a grande maioria
das pessoas, existe uma informação equivocada acerca dos fatos em análise.
Corriqueiramente, o que vemos e presenciamos a todo o momento, é uma completa
paralisação das informações no tempo. Ocorre que, a partir da promulgação da Lei 8.213/91,
pôs-se fim à velha história de se perder o benefício em caso de um dos cônjuges virem a
contrair novas núpcias. Hodiernamente, a viúva que contrai novo casamento ou vive em união
estável, não perde o direito à pensão que recebe pelo falecimento de seu ex-marido, exceto se
da nova união derivar alteração econômica para melhor e, conseqüentemente, tornar
desnecessário o pensionamento. Nesta última hipótese, deve ser oportunizado à beneficiária
prévio contraditório a permitir-lhe comprovar que do novo casamento não resultou melhoria na
sua situação econômico-financeira.
Casar-se novamente, portanto, não tira o direito da mulher de receber pensão por morte do
primeiro marido, desde que ela possa provar que a nova união não melhorou sua situação
econômico-financeira, tornando dispensável o pagamento do benefício. 4
Nos termos do art. 619 da Instrução Normativa nº 118, de 14 de abril de 2005, hoje vigente,
que baliza os atos do Instituto Nacional de Seguro Social – INSS -, no tocante ao pagamento
de proventos previdenciários, “é vedada a percepção cumulativa da pensão mensal vitalícia
com qualquer outro benefício de prestação continuada mantido pela Previdência Social,
ressalvada a possibilidade de opção pelo benefício mais vantajoso”. Nestes termos, aquele que
for beneficiário da pensão por morte, caso case-se novamente, manterá o direito de percepção
referente ao mesmo. Entretanto, caso venha a falecer o novo cônjuge, o beneficiário não
poderá cumular tais proventos, podendo optar pelo benefício mais vantajoso.
Por fim, no que se refere à união homoafetiva5, embora esta não esteja expressamente prevista
na Constituição de 1988, implicitamente ela encontra-se assegura pela Carta Constitucional,
inclusive no que se refere ao benefício em comento. Tal assertiva tem como fundamento,
primeiramente, o direito e garantia fundamental da igualdade de todos perante a lei, esculpido
no art. 5º deste mesmo diploma.
Além disso, o art. 226, §3º do mesmo texto, reconhece a união estável como entidade familiar a
ser tutelada pelo Estado. Embora o mesmo diploma faça menção expressão à união entre
homem e mulher, ao tomar por base o já mencionado art. 5º, bem como o fundamento máximo
da CR/88, que é a promoção da dignidade humana, inserida neste dispositivo, implicitamente,
está a entidade familiar homoafetiva. Portanto, ao se estabelecer o direito à pensão por morte
ao cônjuge ou companheiro e dependentes, o inciso V do art. 201 CR/88, consequentemente,
incluiu aí a união homoafetiva.
A união, para ser reconhecida como status de entidade familiar, valorizada e em várias situações
equiparada ao casamento, são exigidos o atendimento de quatro requisitos fundamentais: que a
convivência seja duradoura, seja pública, seja contínua, e finalmente, que a união tenha o objetivo de
constituir família.
Com isso a Lei 9.278/96, conjugou no artigo 1º é reconhecida como entidade familiar a convivência
duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida com objetivo de
constituição de família. O objetivo principal do legislador é prestigiar a família salvaguardando a
entidade familiar.
Do mesmo modo o código Civil, estabelece no artigo 1.723: é reconhecida como entidade familiar a
união estável entre homem e mulher, configurada na convivência pública, continua, e duradoura e
estabelecida como objetivo de constituir família.
A jurisprudência do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, estabelece para efeitos de direitos reais,
como seguro, previdência a possibilidade de serem alcançados como se fossem uma sociedade
familiar.
Assim entendendo que o casamento nada mais é do que um contrato, onde as partes convencionam
um dever de coafetividade, poderia ate se considerar a união homoafetiva, com estável. A razão
disso esta solidificado na própria constituição de 1988, em seu Art. 5º Todos são iguais perante a lei,
sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no
País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos
termos seguintes:I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta
Constituição;
Por outro lado se seguirmos a risca a sistemática da Lei 9.278/96, não encontraríamos amparo a
solidificar todos os requisitos da união estável, aja vista que por razões sistemáticas a própria
sociedade, ainda mantém certos pudores com relação a homoafetividade, razão por qual inexiste
todos os requisitos, (.convivência pública, continua, e duradoura e estabelecida como objetivo de
constituir família).
O primado é exigência da convivência, seja duradoura, ou contínua, tem a finalidade de não deixar
dúvida quanto aos relacionamentos eventuais, de curta duração e que não estão protegidos pela Lei.
A falta de publicidade do relacionamento, por outro lado, conduz a convicção de que se trata de
aventura furtiva, em que ambos sabem não ter consistência e que não pode, por conseqüência,
ensejar uma esperança de compromisso. Subterfúgios indica pelo menos a intenção de um
relacionamento mais sério.
O benefício econômico não se configura apenas quando alguém aufere rendimentos, senão
igualmente quando deixa de fazer despesas que, de outra maneira, teria de efetuar (Apelação Cível
38.956/85). E assim deve ser, porque o esforço comum, que caracteriza a sociedade de fato, pode ser
representado por qualquer forma de contribuição: pecuniária ou através de doação de bens materiais,
ou ainda por meio de prestação de serviços. Este sem dúvida, o sentido que o Código Civil
brasileiro, ao definir o contrato de sociedade, empresta a locução 'combinar esforços ou recursos
para lograr fins comum' (art. 1.363). Como é de primeira evidência, a expressão 'esforços ou
recursos' abrange todas as formas ou modalidades de contribuição para um fim comum. (f. 472)
Pondere-se, neste ponto, que, provada a sociedade de fato, entre os conviventes do mesmo sexo, com
aquisição de bens pelo esforço comum dos sócios, está presente o contrato de sociedade,
reconhecido pelo art. 1.363 do Código Civil, independente de casamento ou de união estável, pois
celebram contrato de sociedade as pessoas que se obrigam, mutuamente, a combinar seus esforços
pessoais e/ou recursos materiais, para a obtenção de fins comuns. Grifei. (FILHO, Manoel
Gonçalves Ferreira. Comentários à Constituição Brasileira de 1988. Ed. Saraiva. 3.ª Edição. São
Paulo. 2000.)
O Egrégio Superior Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul, quando oportunizada a
tecer comentários sobre a matéria, o fez, todavia declinando incisivamente apenas acerca das varas
residuais a competência para analisar o feito.
Conquanto frágil o sistema, legal já vem admitindo certas benéfices, como direito patrimonial para
fins de seguro, e previdência, deixando de lado a questão familiar, conforme se denota pelo acórdão
transcrito abaixo:
Em função disso o nosso Estado de Mato Grosso do Sul, já pronunciou, conforme julgado proferido
pela Quarta Turma Cível, na Apelação Cível N. 2005.017442-7/0000-00 - enfrentada pelo Exmo. Sr.
Des. Elpídio Helvécio Chaves Martins como se demonstra o julgado por nos colecionado:
E função disso, a convivência familiar resguardada pelo código civil, tem como escopo principal a
guardião da família enquanto mantenedora do próprio Estado. A União, quer seja afetiva, Estável, ou
Homoafetiva, quando redobrada de cuidados inseridos pela própria exegese da norma constitucional,
não deve adstringir a preconceitos.
Digo isso porquanto, a vontade do legislador, é sempre proteger a família, se ambos as pessoas
dividem o bem comum, para a sociedade (tanto homem quanto mulher) são sócios. O fato de suas
preferências sexuais não pode ser objeto de recusa ao reconhecimento de direitos, ainda que de
forma precária, é necessário que se resguarde por respeito ao próprio direito que como toda
sociedade esta em constante ebulição.
Portanto, embora, o Estado não regulamentou a união homoafetiva, não podemos eximir que
diversas vezes o relacionamento, angaria patrimônio, bens e, comum construídos pelos
companheiros. Com isso reconhecer ou não a união entre pessoas do mesmo sexo como entidade
familiar, não mitigara as relações familiares, tão pouco, o patrimônio.
Por seu turno a nossa Constituição Federal, consagra, em seu artigo 1.º, o princípio da basilar da
Dignidade da Pessoa Humana positivado em nosso ordenamento jurídico a necessidade do respeito
ao ser humano, independente da sua posição social ou dos atributos que possam ser imputados pela
sociedade. Nesta senda é necessário ressaltar o acalorado manifesto do professor Alexandre de
Morais, em sua renomada obra "O princípio fundamental consagrado pela Constituição Federal da
dignidade da pessoa humana apresenta-se em dupla concepção. Primeiramente, prevê um direito
individual protetivo, seja em relação ao próprio Estado, seja em relação aos demais indivíduos. Em
segundo lugar, estabelece verdadeiro dever de tratamento igualitário dos próprios semelhantes. Este
dever configura-se pela exigência de o indivíduo respeitar a dignidade de seu semelhante tal qual a
Constituição federal exige que lhe respeitem a própria. A concepção dessa noção de dever
fundamental resume-se a três princípios do Direito Romano: honestere vivere (viver honestamente),
alterum non laedere (não prejudicar ninguém) e suum cuique tribuere (dê a cada um o que lhe é
devido) (grifos nossos)". (Moraes, 2002. p. 129)
No mesmo norte foi à aclamada decisão do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Rio Grande do
Sul, no acertado julgamento por nos colecionado:
Rio Grande do Sul - EMBARGOS INFRINGENTES. AÇÃO DE RECONHECIMENTO DE
UNIÃO ESTÁVEL ENTRE HOMOSSEXUAIS. PROCEDÊNCIA. A Constituição Federal traz
como princípio fundamental da República Federativa do Brasil a construção de uma sociedade livre,
justa e solidária (art. 3.º, I) e a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo,
cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (art. 3.º, IV). Como direito e garantia
fundamental, dispõe a CF que todos são iguais perante a Lei, sem distinção de qualquer natureza
(art. 5.º, caput). Consagrando princípios democráticos de direito, ela proíbe qualquer espécie de
discriminação, inclusive quanto a sexo, sendo incabível, pois, discriminação quanto à união
homossexual. Configurada verdadeira união estável entre a autora e a falecida, por vinte anos, deve
ser mantida a sentença de procedência da ação, na esteira do voto vencido. Precedentes. Embargos
infringentes acolhidos, por maioria. (TJRS - EI 70030880603 - 4º G. Cív., Rel. Des. José Ataídes
Siqueira Trindade, j. 14.08.2009).
Comunga desse mesmo entendimento o mestre Manoel Gonçalves Ferreira Filho, "Dignidade da
pessoa humana. Está aqui o reconhecimento de que, para o direito constitucional brasileiro, a pessoa
humana tem uma dignidade própria e constitui um valor em si mesmo, que não pode ser sacrificado
a qualquer interesse coletivo." (Ferreira Filho, 2000. p. 19).
Corolário a esse preceito constitucional, em seu art. 5.º, inciso I, a constituição avocou o princípio da
isonomia legal entre homens e mulheres, o que importa em aceitamos, a lei é defeso instituir
tratamento desigual entre pessoas que se encontrem em mesma situação fática e/ou jurídica, por
simbiose é imperativo da própria segurança jurídica reconhecermos a validade da união
homoafetiva. Partindo desse entendimento, a oitava câmara cível do Egrégio Tribunal de Justiça do
Estado do Rio Grande do Sul, reconheceu a união homossexual a partir do estudo sistemático da
própria constituição esteio máximo de nossa sociedade jurídica.
Minas Gerais - Ação Ordinária. União Homoafetiva. Analogia. União estável protegida pela
Constituição Federal. Princípio da igualdade (não-discriminação) e da dignidade da pessoa humana.
Reconhecimento da relação de dependência de um parceiro em relação ao outro, para todos os fins
de direito. Requisitos preenchidos. Pedido procedente. À união homoafetiva, que preenche os
requisitos da união estável entre casais heterossexuais, deve ser conferido o caráter de entidade
familiar, impondo-se reconhecer os direitos decorrentes desse vínculo, sob pena de ofensa aos
princípios da igualdade e da dignidade da pessoa humana. O art. 226, da Constituição Federal não
pode ser analisado isoladamente, restritivamente, devendo observar-se os princípios constitucionais
da igualdade e da dignidade da pessoa humana. Referido dispositivo, ao declarar a proteção do
Estado à união estável entre o homem e a mulher, não pretendeu excluir dessa proteção a união
homoafetiva, até porque, à época em que entrou em vigor a atual Carta Política, há quase 20 anos,
não teve o legislador essa preocupação, o que cede espaço para a aplicação analógica da norma a
situações atuais, antes não pensadas. A lacuna existente na legislação não pode servir como
obstáculo para o reconhecimento de um direito. (TJMG - AC 21.0024.06.930324-6/001(1), Rel. Des.
Heloisa Combat , j. 22.05.2007).
Rio de Janeiro - Família. União estável. Pessoas do mesmo sexo. Relação homoafetiva. Artigo 3º,
inc. IV, da CF. A Constituição Federal é expressa no sentido de que constitui objetivo fundamental
da República a promoção do bem de todos, tornando defeso qualquer tipo de preconceito ou
discriminação ligada a condições que sejam inerentes à pessoa humana. (TJRJ, AC 2006.001.06195,
Rel. Des. Marco Antonio Ibrahim, j. 04.07.2006).
Posto isso para concluir, ao enfrentar essa celeuma, devemos compreender, o ordenamento jurídico
brasileiro não disciplina expressamente a respeito da relação afetiva estável entre pessoas do mesmo
sexo. Da mesma forma, a lei brasileira não proíbe a relação entre duas pessoas do mesmo sexo.
Logo, está-se diante de lacuna do direito.
In casu, ocorrendo a colmatação da lacuna, cumpre recorrer à analogia, aos costumes e aos
princípios gerais de direito, detrimento ao renomado art. 126 do CPC e art. 4º da LICC. Na busca da
melhor analogia, o instituto jurídico, não é a sociedade de fato. A melhor analogia, no caso, é a com
a união estável. O par homossexual não se une por razões econômicas. Tanto nos companheiros
heterossexuais como no par homossexual se encontra, como dado fundamental da união, uma
relação que se funda no amor, sendo ambas relações de índole emotiva, sentimental e afetiva.
Na aplicação dos princípios gerais do direito a uniões homossexuais se vê protegida, pelo primado
da dignidade da pessoa humana e do direito de cada um exercer com plenitude aquilo que é próprio
de sua condição. Somente dessa forma se cumprirá à risca, o comando constitucional da não
discriminação por sexo. Numa análise perfuctória aos costumes não pode discrepar do projeto de
uma sociedade que se pretende democrática, pluralista e que repudia a intolerância e o preconceito.
Pouco importa se a relação é hétero ou homossexual. Importa que a troca ou o compartilhamento de
afeto, de sentimento, de carinho e de ternura entre duas pessoas humanas são valores sociais
positivos e merecem proteção jurídica.
Dito isso porquanto, o reconhecimento de que a união de pessoas do mesmo sexo geram as mesmas
conseqüências previstas na união estável. Negar esse direito às pessoas por causa da condição e
orientação homossexual é limitar em dignidade a pessoa que são. A união homossexual no caso
concreto. Uma vez presentes os pressupostos constitutivos da união estável (art. 1.723 do CC) e
demonstrada a separação de fato do convivente casado, de rigor o reconhecimento da união estável
homossexual, em face dos princípios constitucionais vigentes, centrados na valorização do ser
humano. Via de conseqüência, as repercussões jurídicas, verificadas na união homossexual, tal como
a partilha dos bens, em face do princípio da isonomia, são as mesmas que decorrem da própria união
heterossexual. (TJRS - AC 70021637145, 8.ª C. Cív., Rel. Des. Rui Portanova, j.13.12.2007).
BIBLIOGRAFIA
DINIZ. Maria Helena, Curso De Direito Civil Brasileiro, livro 5ª, 23ª, São Paulo, Saraiva, 2008
FILHO, Manoel Gonçalves Ferreira. Comentários à Constituição Brasileira de 1988. Ed. Saraiva. 3.ª
Edição. São Paulo. 2000.
Yussef Said Cahali, Dos Alimentos, 3ª Edição, São Paulo Ed. Revista dos Tribunais,1999.
MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional. Ed. Atlas
S.A. São Paulo. 2002.
VENOSA. Silvio de Salvo, Direito de Família, São Paulo Ed. Atlas, 2001. V., 05.
CABREIRA, Heidy de Avila, e Hamilton Elliot Akel, Subsidiariedade da obrigação alimentar dos
avós.
http://www.fieo.br/edifieo/index.php/posgraduacao/article/viewFile/219/292
http://www.tex.pro.br/wwwroot/curso/acoesdedireitomaterial/revisaoexoneracaoerepeticaodealiment
os.htm
http://www.consumidorbrasil.com.br/consumidorbrasil/textos/familia/uniao.htm#Uni%C3%A3
http://www.amaerj.org.br/index2.php?option=com_content&do_pdf=1&id=228
http://blog.redel.com.br/leisetribunais/2007/10/29/stj-alimentos-responsabilidade-dos- -avos-
obrigacao-complementar -e-sucessiva-interpretacao-do-art-1698-do-novo-codigo-civil/
http://www.jurisway.org.br/v2/cursoonline.asp?id_curso=653&pagina=13&id_titulo=8588
http://www.stj.gov.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?livre=uni
%E3o+homoafetiva&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=2
http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3441
Nota
(1)http://www.stj.gov.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?livre=uni
%E3o+homoafetiva&&b=ACOR&p=true&t=&l=10
SUMÁRIO
1. Introdução
Para o foco que se quer dar ao presente estudo, decerto não se faz necessário um
aprofundamento maior do que será aqui apresentado 1, no qual pretendemos demonstrar
o suficiente para expor o quanto a legislação pátria tem apresentado evoluções
importantes, ainda que lentas e de pequena monta.
Portanto, na narrativa que faremos neste capítulo nos limitaremos à breve demonstração
de um parcial histórico das evoluções dos textos de dois importantes Códigos: o Civil e
o Penal – evidentemente, à luz da Constituição Federal. E será através desse panorama
que se pretende pinçar alguns poucos, porém marcantes exemplos acerca das recentes e
progressivas conquistas alcançadas, independentemente de sermos homens ou mulheres,
quando mostrar-se-á suficiente que sejamos juridicamente reconhecidos como aqueles
seres que alcançaram a condição civil de pessoa2 , pois que todos somos iguais perante
a lei, sem distinção de qualquer natureza3.
Iniciemos pelo Código Civil Brasileiro, contudo não o Código vigente, nascido da Lei
nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 e que entrou em vigor em 11 de janeiro de 2003;
mas o Código Civil Brasileiro ainda à época da vigência da Lei nº 3.071, de 1º de
janeiro de 1916; e percebe-se logo no seu art. 2º uma pista de um dos muitos motivos
que o levou a ser modificado, pois que patente o caráter discriminatório do seu teor.
Ocorre que essa é uma concepção que temos hoje, despertada não há muito tempo e que
somente presenciou o fim da vigência do texto discriminatório quando nos
aproximávamos de vermos completadas nove décadas da data em que passou a vigorar.
Contudo, à época em que entrara em vigor, não há dúvida de que se tratava da mais
atual e vanguardista das leis brasileiras, com expressões que atendiam perfeitamente à
cultura patriarcal da época.
Assim, quando lemos na sua redação original que “todo homem é capaz de direitos e
obrigações na ordem civil”, parece-nos óbvia a necessidade de alteração para a forma
atual, a qual consta do art. 1º do novo Código Civil que se limitou a substituir a
expressão homem por pessoa, quando se deixa simplesmente de subtender que por
homem pretendia o legislador referir-se ao ser humano, pelo que passou a lhe conferir
melhor designação genérica: pessoa.
Seguindo a mesma linha preconceituosa de uma sociedade patriarcal – como
naturalmente se esperaria de qualquer sociedade que, ainda com os pudores
remanescentes da cultura Imperial do final do século XIX, buscasse preservar os seus
valores éticos e morais – o revogado parágrafo único do art. 36 do Código Civil de 1916
determinava que “a mulher casada tem por domicílio o do marido”, apesar de ser tão
comum àquela época como o é nos dias atuais, independentemente do imóvel onde
ambos residissem ser adquirido pelo esforço comum ou, ainda, trazido pela mulher para
integrar o seu patrimônio pessoal, mas que seria usufruído por ambos – acaso adotado o
regime convencional de comunhão parcial de bens 4.
E aliás, em se tratando de bens trazidos pela mulher, é interessante fazer-se referência
ao extinto regime dotal, outrora previsto nos arts. 278 a 311 do Código de 1916.
A impressão que se tem é que à proporção que cresce a numeração dos artigos em
comento, aumenta o nível de preconceito neles contido, a exemplo do art. 219, IV 5 e de
todo o Capítulo VI, compreendido pelos arts. 379 a 3956 do Código de 1916 que, não
fugindo à regra, discriminavam a mulher permitindo ao marido que requeresse a
anulação do casamento acaso descobrisse ter sido enganado quanto ao nível de pureza
da sua esposa. Mas, se tudo corresse como o marido esperava – ou seja, se sua esposa
tivesse se guardado para a noite de núpcias – e o casamento prosseguisse, então o
homem sobre ela e os filhos legítimos, legitimados, os legalmente reconhecidos e os
adotivos exerceria todo o pátrio poder, pois que o parágrafo único do art. 380 previa
que “divergindo os progenitores quanto ao exercício do pátrio poder, prevalecerá a
decisão do pai”.
Entendendo suficiente o panorama comparativo apresentado entre os textos vigente e
revogado do Código Civil, busca-se arrematar o objetivo pretendido trazendo à
evidência apenas três artigos do Código Penal Brasileiro, a saber os arts. 215, 216 e 240,
quando os dois primeiros tiveram alteradas suas redações em função da discriminatória
utilização da expressão mulher honesta; enquanto o terceiro foi completamente
revogado, deixando o adultério de ser considerado como crime.
Para melhor comentar o teor discriminatório da expressão mulher honesta, faz-se
necessário que os acima referidos artigos do Código Penal sejam complementados com
um outro artigo do revogado Código de 1916: o art. 1.548. Afinal, para tratar dos atos
tidos como delituosos praticados contra a honra da mulher, o artigo 1.548 do Código de
1916 previa que "a mulher agravada em sua honra tem direito a exigir do ofensor, se
este não puder ou não quiser reparar o mal pelo casamento, um dote correspondente à
sua própria condição e estado: se, virgem e menor, for deflorada; se, mulher honesta,
for violentada, ou aterrada por ameaças; se for seduzida com promessas de casamento;
ou se for raptada”.
Observe-se que o Código esmerou-se em zelo ao acenar com ameaça de estabelecer um
valor correspondente ao dote como indenização, o que, à época, era medida eficaz, pois
que era notório o conhecimento de que se fazia por onde fosse cumprida. E, ainda, que a
expressão mulher honesta, para a realidade dos costumes da época em que eram
vigentes esses preceitos legais, repercutia mais como um predicativo do que o atual tom
discriminatório que passa a assumir.
E, por fim, deixar o adultério de ser crime beneficiou tanto aos homens como as
mulheres. Entretanto, não se pode deixar de observar quanto a prevalência na ineficaz
ameaça de punição ao homem por relacionar-se com outra mulher, mesmo em plena
constância do casamento – em função da sociedade política e juridicamente patriarcal,
fundada em conceitos e tendências machistas.
Ou seja, há de se reconhecer que foram representativas as conquistas que as mudanças
produzidas nos Códigos Civil e Penal7 trouxeram para a sociedade, como um todo.
Assim, se no contexto geral satisfatória foi sua recepção, no que se refere à tutela das
relações convivenciais muitos foram os progressos, particularmente no que se refere à
possibilidade de legitimação das relações outrora ilegítimas.
E há que se reconhecer, ainda, que absolutamente impossível seria prosseguirmos –
como até mesmo o seria iniciar – esse presente estudo, o qual se propõe tratar dos
direitos civis de indivíduos civil, penal e constitucionalmente reconhecidos, protegidos
e respeitados como pessoas, sem que trouxéssemos à luz flashes do suporte que a
Constituição Federal e o Código Penal conferem ao Código Civil, no que se apresentará
a seguir.
Isto posto, “permissa vênia”, requer possam aqui ser apropriada e necessariamente
combinados os dispositivos constitucionais com os civis, de forma a que se obtenha
harmônico resultado interpretativo da norma.
Resultado de muitos séculos da exacerbada proteção que o Estado teve com a instituição
do casamento – sempre orientado pela Igreja – fez com que este fosse elevado ao
“status” de única forma lícita de constituição familiar, chegando-se ao extremo da
sociedade compartilhar os conceitos maliciosos que se procurou imputar ao
concubinato, transformando-o em elemento estranho ao direito, portanto incapaz de
produzir efeitos jurídicos.
Paralelamente a esse denso clima de preconceitos, encontramos o estigma do adúltero –
ou, ainda pior e mais pecaminoso, o da adúltera. Referia-se a conceito tipificado como
delito pelo Código Penal e tutelado conjuntamente pela Igreja e pelo Estado.
Entretanto, acalmadas as tensões resultantes das intensas transformações sociais,
políticas e culturais que a humanidade vivenciou, ao longo de séculos; e tendo sido
aplacadas as perseguições até mesmo inquisitórias às condutas estigmatizadas como
pecaminosas e nocivas à moral e aos bons costumes, encontramo-nos na
contemporaneidade do respeito aos direitos humanos universais, ratificados por uma
Constituição cidadã e um novo Código Civil que conseguiu retificar no texto do seu
antecessor inúmeros marcos preconceituosos – mas não todos.
Nesse ambiente propício às novas conquistas é que os homossexuais saem das sombras
da obscuridade, do anonimato que os pudores e preconceitos os empurravam e passam a
reunir forças para argüir o direito de se fazerem presentes na rotina da sociedade,
passando a conviver lado a lado com cidadãos como eles, capazes inclusive de
estabelecer-se familiarmente.
Com isso, lancemo-nos à análise de um outro tipo de união afetiva que sempre foi
genericamente discriminada pela sociedade: as relações homossexuais, também
denominadas relações homoafetivas ou homoeróticas.
Da mesma forma que não se pode ignorar que se por um lado há um notável
descompasso entre as evoluções que podem ser inquestionavelmente apontadas no
Direito Civil como um todo e, em especial, no que se refere ao Direito de Família; de
outro lado, não se pode negar a existência de algumas outras formas de entidades
familiares – famílias apenas de fato, e não de direito – insistentemente mantidas
marginalizadas à inclusão de seu reconhecimento no ordenamento jurídico,
representadas por famílias formadas por duas pessoas do mesmo sexo.
Ocorre que, inegavelmente, as pessoas que se apresentam em uniões homossexuais
ainda conseguem provocar sensação de afronta à sociedade, apesar de serem uma
realidade social datada de tempos remotos. O que se pensaria como argumento para
tentar justificar essa dificuldade para com o caráter normal que os homossexuais
procuram conferir às suas relações é que, afinal, o comportamento considerado como
sendo normal, ideal e aceito não apenas pela sociedade brasileira, mas em todas as
demais sociedades contemporâneas, são as relações homem-mulher. Há, então, pruridos
conservadoristas ante a presença de um casal formado por homem-homem ou mulher-
mulher e, infelizmente, não se pode censurar aos que ainda não se acostumaram com
essa realidade que se nos vem sendo apresentada, cada vez com maior freqüência.
E, ilustrando o quanto esse sentimento de normalidade dessas relações homem-mulher
é, além de universal, tido como normal, habitual e ideal, pode-se oferecer como
exemplo os registros lançados nas escrituras sagradas, sobre os quais são descarregados
toda a carga de censura social que fica evidenciada nos dois trechos da Bíblia Sagrada
que selecionamos, “in verbis”:
Levítico 19 :
"Com homem não te deitarás, como se fosse mulher, é abominação. Não te deitarás
com um animal, para te contaminares com ele. A mulher não se porá perante um
animal, para juntar-se com ele; é perversão."
======
Romanos 2:
"Dizendo-se sábios, tornaram-se loucos. Pelo que Deus os entregou às concupiscências
de seus corações, à imundícia, para desonrarem seus corpos entre si. Mudaram a
verdade de Deus em mentira, e honraram e serviram a criatura em lugar do Criador,
que é bendito eternamente. Amém. Semelhantemente, também os homens, deixando o
uso natural da mulher, inflamaram-se em sua sensualidade uns para com os outros,
homem com homem, cometendo torpeza, e recebendo em si mesmos a penalidade
devida ao seu erro. E como eles não se importaram de ter conhecimento de Deus, ele os
entregou a um sentimento pervertido, para fazerem coisas inconvenientes.”
Como dito, pode-se perceber que a mútua hostilidade habitual vem progressivamente
cedendo espaço, quando passa a ficar evidente que ora grupos sociais interessados no
assunto lhes acenam com a oferta, ora os homossexuais têm demonstrado receptividade
quanto à aceitação de soluções jurídicas ajustadas às situações de fato.
Assim é que, através da – preconceituosa – distinção conceitual entre concubinato puro
e impuro, foi dado o motivo à edição da Súmula 380 do STF-Supremo Tribunal Federal,
que previu, quando comprovada a existência da sociedade de fato entre os concubinos,
ser cabível a sua dissolução judicial, com a partilha do patrimônio adquirido pelo
esforço comum.
Foram lentas e graduais as conquistas e até mesmo criativos os recursos utilizados para
se chegar ao primeiro e inesquecível estágio para o reconhecimento jurídico, social e
cultural de outras maneiras lícitas e socialmente aceitas de se estabelecer uma célula
familiar.
E, sobre isso, há que se exaltar que foi graças à perseverança e determinação dos
homossexuais – contando com significativas contribuições de pessoas outras que, por
motivos muitas vezes restritos a interesses técnicos e jurídicos, sem compartilhar do
caráter pessoal dos que seriam diretamente beneficiados pela conquista com a qual se
espera contribuir – conseguiu-se pressionar os operadores do Direito para que
encontrassem meios jurídicos lícitos e capazes de enfrentar e transpor o obstáculo do
reconhecimento de suas relações afetivas.
Finalmente, os homossexuais passam a ter alguma forma de reconhecimento legal de
suas relações homoafetivas, conquistado através da sociedade de fato, abaixo ilustrada
por meio de decisão unânime emanada do Tribunal de Justiça do Estado de São
Paulo, na relatoria do Des. Paulo Dimas Mascaretti:
Necessário se faz que seja dado o destaque que o próximo aresto requer, devendo-se de
logo ressaltar que – além do mesmo ser procedente do STJ-Superior Tribunal de
Justiça – a matéria, na espécie, refere-se ao direito previdenciário e não ao de família.
Trata-se de recurso interposto pelo INSS, por meio do qual nos é apresentada
interessante discussão sobre a possibilidade de um companheiro homossexual ter ou não
direito a receber pensão por morte como dependente de um segurado falecido. A
sentença julgou improcedente o pedido, declarando extinto o processo. Contudo, o
Ministério Público Federal – representando o companheiro homossexual do segurado
falecido – apelou da sentença, sob a alegação de que o § 3º do art. 226, da Constituição
Federal, não exclui a união estável entre pessoas do mesmo sexo, pelo que requereu
fosse observado o princípio da igualdade. Apelou, ainda, o autor, e o Tribunal “a quo”
deu provimento às apelações. Entretanto, a Turma negou provimento ao recurso do
INSS, confirmando a concessão do benefício, entendendo preenchidas as exigências
constantes da Lei nº 8.213/91, quando comprovadas a qualidade de segurado do “de
cujus” e de convivência afetiva e duradoura – ao longo de 18 anos – entre o falecido e o
autor. Na ementa, confirmou-se ainda a legitimidade do Ministério Público para intervir
no processo em prol de tratamento igualitário quanto a direitos fundamentais, tudo com
fulcro no art. 127 da Constituição Federal. Eis a ementa:
A despeito das entrelinhas discriminatórias que a própria letra da lei não conseguiu
omitir em seu texto, os casais alcançados pelo reconhecimento da união estável são
gratos pelos direitos assegurados por meio de decisões jurisprudenciais. Contudo, ainda
é um direito que somente assiste aos que ingressarem em juízo e lograrem reiterada a
decisão anteriormente proferida a outros casais, o que os expõem ao risco de as ver ou
não repetidas – estando a inteiro arbítrio dos Desembargadores e Ministros que
compõem nossos Tribunais.
Mas não se pode ignorar quanto à existência de uma certa restrição constante nas duas
normas 9, pois que ambas previsões legais referem-se à “união estável entre o homem e
a mulher”.
Deparamo-nos, então, com o obstáculo que os operadores do direito tiveram que
conviver, até que fosse finalmente encontrada a fórmula para transpô-lo.
Se, por um lado, o texto das normas pode querer apresentar uma conotação restritiva,
por outro lado pode-se facilmente constatar que neles identifica-se a omissão, a lacuna
quanto a previsão que se busca. E, no que se refere à omissão, “quando a lei for omissa,
o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de
direito” 10, pois, ao constatar a “falta de normas jurídicas particulares, o juiz aplicará
as regras de experiência comum subministradas pela observação do que
ordinariamente acontece e ainda as regras de experiência técnica, ressalvado, quanto
a esta, o exame pericial” 11 e, afinal, “o juiz não se exime de sentenciar ou despachar
alegando lacuna ou obscuridade da lei. No julgamento da lide caber-lhe-á aplicar as
normas legais; não as havendo, recorrerá à analogia, aos costumes e aos princípios
gerais de direito” 12.
Ou seja, se no quesito ser permitido a legislação brasileira mostrou-se fechada e
impermeável, ao não apresentar brechas que favorecessem uma interpretação que
interessasse aos casais homossexuais, percebe-se que o mesmo não ocorreria quanto ao
quesito ser possível, uma vez que não se pode menosprezar o princípio de que o que
não está formalmente proibido, subtende-se legalmente permitido.
Esse é o alicerce onde se encontra fincada a base de sustentação utilizada pelos
operadores do Direito que ousaram interpretar a norma positiva de forma a conseguir
identificar que sua lacuna tem, agora, seu espaço preenchido pelas decisões
jurisprudenciais emanadas dos nossos tribunais, resultado do entendimento do óbvio: se
não há a previsão legal, expressa, de proibição na união estável de casais homossexuais
– o que há, ressalte-se, é a previsão de que se admite a “união estável entre o homem e
a mulher” – então não há possibilidade jurídica de proibi-la, pelo que torna-se
legalmente permitida.
Acaso a redação do texto da norma, ao invés da atual forma – “união estável entre o
homem e a mulher” – nos fosse apresentada de maneira diversa, mais hermética, onde a
lacuna fosse previamente preenchida por uma única palavra – “união estável somente
entre o homem e a mulher” – capaz de restringir em absoluto qualquer possibilidade
dos casais homossexuais pleitearem em juízo a argüição de suas pretensões, inexistiria
questionamento quanto à lacuna, pelo que certamente se passaria a direcionar esforços
para a modificação da norma – e não mais pela sua omissão.
Certamente, com esse entendimento, o mais apropriado mostrou-se real: o primeiro dos
julgadores a assim entender somente pode fazê-lo por ter se desprovido de valoração
prévia e preconceitos, tudo isso fundado no princípio constitucional da legalidade,
segundo o qual ”ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão
em virtude de lei” 13 .
7. Conclusão
A legislação brasileira é considerada das mais amplas. Contudo, sua vastidão
necessariamente não quer aqui significar seu nível de amplidão, de abrangência. Afinal,
além da Constituição Federal, do Código Civil e do Código Penal, dispomos de um
número considerável de outros Códigos, como os de Processo Civil, Processo Penal,
Comercial, Eleitoral, Tributário Nacional e outros mais, além de uma relação
inacreditável de Estatutos e Leis Especiais, tomando como exemplo poucas, porém de
relevante importância, como os Estatutos do Idoso, da Criança e do Adolescente, do
Índio, ao que se acrescem Leis, Decretos, Decretos-Leis e Emendas Constitucionais, em
rol quase infinito. E, como se ainda bastante não fosse, além de todo esse elenco de
normas – devidamente inseridas no nosso ordenamento jurídico – as vemos
constantemente atualizadas ou complementadas através de outras fontes do Direito,
representadas pelas Súmulas e jurisprudências, todas inspiradas na doutrina que,
incansavelmente, procura oferecer interpretações das normas que traduzam o foco que
não se pode afastar: os direitos individuais e sociais.
Não obstante, inexiste no país legislação especial que trate das relações homossexuais,
regulando e protegendo seus direitos como casais. O motivo? Imagina-se óbvio o
suficiente até mesmo tendendo ao risco de causar mal estar, em conseqüência da
incômoda realidade de que não se consegue – ainda – tratar desse assunto com a mesma
desenvoltura e naturalidade que se trata na elaboração de textos normativos que
resultariam em Estatuto como o do Índio, da Criança e do Adolescente, do Idoso, talvez
porque um idoso não precise se apresentar como idoso para que se reconheça que ele
tem direitos assegurados pelo seu Estatuto – pois a característica que lhe confere
direitos é visível, externa; o mesmo ocorrendo quanto à criança, o adolescente e o índio.
Mas, seria possível – sem incorrer no risco de vir a ser processado por injúria14 –
dirigir-mo-nos a um homossexual e lhe oferecer os direitos que teria assegurados em um
Estatuto? Soaria estranho ou natural se perguntássemos a um homossexual que não se
nos apresentou como tal, algo que fosse natural apenas aos homossexuais – como, por
exemplo: “qual o nome do seu companheiro, para colocarmos no pedido de pensão do
senhor?”.
Associada aos preconceitos, esse certamente poderia ser um dos motivos que
dificultariam a elaboração de legislação especial que lhes assegurasse direitos
específicos. Pois se tanto para o idoso quanto para a criança e o adolescente, o que os
insere nos Estatutos que os protege é o fator idade; enquanto que para o índio seria o
fator étnico-racial; para o homossexual, qual seria o fator?
Observe-se, então, que além do aspecto jurídico e social, há a questão física, hormonal,
sexual e ainda a preocupação com o lado emocional e psicológico do indivíduo.
A título de exemplo, diríamos que da mesma forma que uma pessoa com obesidade
mórbida – que além dos aspectos físicos, externos, visíveis, que colocariam em risco a
sua vida, os obesos também sofrem de distúrbios e problemas emocionais graves,
relacionados com a sua auto-estima, com a deficiência na sua capacidade de se aceitar
como realmente são e, ainda, pela rejeição da sociedade à sua figura –, tanto quanto um
obeso, um homossexual que se comporta assumindo a sua condição de preferir
sexualmente pessoas do seu mesmo sexo é comumente rejeitada e discriminada pela
sociedade, pelo que advém como conseqüência a automática e inafastável sensação de
mal estar, enquanto que a Lei, que vê a todos como iguais, sem distinções de quaisquer
naturezas15 , existe para assegurar seu bem-estar, em caráter constitucional.
O obeso não pediu para nascer obeso, assim como o homossexual não teve a faculdade
de escolher como gostaria de ter nascido. Poderia até mesmo ao longo de toda a sua
vida não manifestar, não exteriorizar, a sua homossexualidade; mas seria o que se
vulgarmente designa de enrustido. Da mesma forma, o portador de alguma deficiência
física ou necessidade especial não pediu para vir ao mundo com a aparência física
diferente dos demais indivíduos. Mas tanto ao obeso quanto ao portador de qualquer
deficiência física ou necessidade especial são assegurados plenos e legítimos direitos,
constantes dos regimentos legais. À eles é assegurado, constitucionalmente, direitos
sociais e individuais, com a preservação de seu bem-estar.
Então, aos olhos da Constituição da República Federativa do Brasil – ao menos sob os
olhos vendados da figura mítica da justiça – todos somos iguais e não podemos ser
discriminados, sob qualquer alegação ou pretexto.
Enfim, que às importantes conquistas alcançadas pelos homossexuais na luta que
assumiram para o reconhecimento de suas relações homoafetivas como uniões estáveis
sejam acrescidas outras, esperando-se que a hermenêutica jurídica exercitada pelos
estudiosos, acadêmicos, doutrinadores, aplicadores, julgadores e profissionais do
Direito possa continuar a contribuir para que sejam consolidados direitos e garantias
específicos em Lei Especial que lhes assegure, dentre todos os direitos que buscam, o de
constituir dignamente as suas famílias, sem distinções, preconceitos ou tão somente
graças à aplicação alternativa do direito positivado, que conseguiu brilhantemente
identificar a possibilidade de aproveitamento da lacuna identificada na Lei.
Referências
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Paulo: Saraiva, 2006.
BRASIL. Código Civil. Texto da Lei nº 3.071, de 1º de janeiro de 1916. Organizador
Yussef Said Cahali, 5 ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: RT, 2003.
BRASIL. Código Penal. Texto do Decreto-Lei nº 3.914, de 9 de dezembro de 1941.
Vade Mecum Saraiva / obra coletiva de autoria da Editora Saraiva com a colaboração de
Antônio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz dos Santos Windt e Lívia Céspedes.
– São Paulo: Saraiva, 2006.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal,
1988. Vade Mecum Saraiva / obra coletiva de autoria da Editora Saraiva com a
colaboração de Antônio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz dos Santos Windt e
Lívia Céspedes. – São Paulo: Saraiva, 2006.
BRAUNER, Maria Claudia Crespo e SCHIOCCHET, Taysa. O Reconhecimento
Jurídico das Uniões Estáveis Homoafetivas no Direito de Família Brasileiro.
Questões Controvertidas no Direito de Família e das Sucessões – Série Grandes
Temas de Direito Privado – Vol. 3, Coordenação Mário Luiz Delgado e Jones
Figueiredo Alves. – São Paulo: Método, 2005.
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro – Direito de Família. vol. 5,
18. ed. – São Paulo: Saraiva, 2002.
MORAES, Alexandre de. Direito constitucional / Alexandra de Moraes. 13 ed. –São
Paulo: Atlas, 2003.
NEGRÃO, Sônia Regina. Direitos da personalidade. O direito à intimidade sexual.
Jus Navigandi, Teresina, a. 9, n. 704, 9.jun.2005. Disponível em:
<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6829>. Acesso em: 19.mai.2006.
SANTORO, Claudia. A necessidade de regulamentação das uniões estáveis
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SZANIAWSKI, Elimar. Limites e possibilidades do direito de redesignação do
estado sexual: estudo sobre o transexualismo: aspectos médicos e jurídicos. – São
Paulo: Revista dos Tribunais, 1998.
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: parte geral / Sílvio de Salvo Venosa. 2 ed. –
São Paulo: Atlas, 2002 – (Coleção direito civil; v. 1)
1 Ainda mais porque o objetivo desse trabalho estará pautado em demonstrar o que
ainda se busca modificar na legislação ora vigente, e não o que já se modificou ou
revogou.
4 Art. 258 do Código Civil de 1916 e art. 1.640 do Novo Código Civil, de 2002.
6 O Capítulo VI do Código de 1916, através dos arts. 379 a 395 tratavam do “pátrio
poder”.
Inserido em 1/1/2009
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