Você está na página 1de 4

Direitos da amante antes do Código Civil de 2002

Antes do advento do Código Civil de 2002, a amante encontrava-se confinada ao


limbo jurídico. Até a Constituição de 1988, havia apenas dois formatos de família no
Brasil, sendo a primeira a família amparada pela Constituição e, a segunda, o
concubinato, o qual era dividido em puro e impuro. O primeiro referia-se às pessoas
solteiras e desimpedidas para contrair casamento, enquanto o segundo tratava da relação
eventual de pessoas impedidas de casar.

O que antes era concubinato impuro, hoje é conhecido simplesmente por


concubinato. Trata-se do vínculo jurídico entre um homem e uma mulher impedidos de
casar e constituir união estável, justamente porque um deles já é efetivamente casado,
está em união estável ou apresenta qualquer dos impedimentos do casamento (art. 1521
do Código Civil de 2002).

Se faz notável o peso moral e o juízo de valores adotado à época. Parte disso
pode ser atribuída, também, ao valor juridicamente tutelado de fidelidade, que já estava
erigido como dever legal no Código Civil de 1916.

Art. 231. São deveres de ambos os cônjuges:

I - fidelidade recíproca;

II - vida em comum, no domicílio conjugal (arts. 233, IV, e 234);

III - mútua assistência;

IV - sustento, guarda e educação dos filhos.

A partir disso não simplesmente se conclui que a monogamia é traço


característico do nosso sistema, como também um padrão valorativo absoluto, sob o
qual pesava e, apesar dos avanços, ainda pesa enorme julgamento por parte do
ordenamento jurídico.

O concubinato não é fenômeno recente, de modo que a História registra que, já


em Roma, no Período Imperial, a convivência livre entre pessoas não ligadas pelo
vínculo do casamento era comum, inobstante reprimida e censurada pela legislação
vigente. De mesma forma se sucedeu também na Idade Média.
As uniões concubinárias, apesar de sempre se terem manifestado de maneira
acentuada, especialmente no Brasil, possuem histórico de rechaço. Tamanha é a aversão
à prática que, no Código Civil de 1916, não se mencionou ou se deu definição sobre.

Desde a edição do Código Civil de 1916, a legislação nunca tratou


especificamente do concubinato. Em meados do século XX, a partir de 1988, é que
começam a aparecer os direitos e garantias para tais relações. Ainda assim, a
jurisprudência sempre assumiu uma postura enrijecida, limitando-se a atribuir efeitos
obrigacionais às uniões concubinárias impuras (adulterinas), aplicando a Súmula nº 380
do Supremo Tribunal Federal (STF).

Nas primeiras decisões, estávamos diante de decisões por Serviços Sexuais


Prestados. Mais tarde, modificou-se essa nomenclatura para Serviços Domésticos
Prestados. Opção que, apesar de menos degradante, reitera o olhar machista e patriarcal
do legislador sobre as mulheres.

Aduzia-se que a mulher casada por mais de 30 anos escolheria ser indenizada,
por ser prostituta em serviços sexuais prestados ou seria indenizada como doméstica.
Sobre isso, não há mais que se falar, visto que esta visão arcaica e ultrajante foi abolida
pela Constituição de 1988.

Há que se falar, então, em sociedade de fato. Ou seja, houve contribuição


conjugal, contribuição para aquisição do patrimônio, possibilitando assim o recebimento
de patrimônio proporcional à sua contribuição.

Assim, passados estes longos anos de sombra, sem a devida proteção, evolui-se
para a Presunção do Esforço Comum, tornando mais leve a carga dos cônjuges, até que
em 1988 A Constituição Federal transforma o concubinato puro em união estável, e
passa a garantir ao companheiro direitos semelhantes a pessoas casadas.

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do


Estado.

§ 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união


estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a
lei facilitar sua conversão em casamento.

As Leis n° 8.971/94 e nº 9.278/96 conferiram alguns direitos de índole familiar


aos integrantes dos vínculos concubinários puros entitulados "uniões estáveis", ditos
"conviventes" ou "companheiros", tais como alimentos, disposições a respeito da
partilha dos bens adquiridos durante a união, usufruto, direito real de habitação e alguns
aspectos sucessórios.

Na opinião de Paulo Lôbo:

“Após a Constituição, as Leis ns. 8.971/94 e 9.278/96 intentaram,


com disposições pouco harmônicas entre si, estabelecer um estatuto
mínimo da união estável, notadamente quanto a seus requisitos (uma
exigindo prazo mínimo, outra não), o dever de alimentos, a sucessão
dos bens adquiridos pelos companheiros da união estável em
casamento e a competência do juízo da Vara de Família para decidir
essas matérias.”

Ainda que até então o concubinato e a união estável fossem tratados de modo
indiferenciado pela doutrina e pela jurisprudência, O Código Civil de 2002,
demonstrando a necessidade de uma diferenciação elucidativa entre os institutos,
disciplinou e conferiu tratamento específico à união estável, e, pela primeira vez no
âmbito legislativo, fez a distinção terminológica com o concubinato, explicitando a
definição deste como sendo "as relações não eventuais entre pessoas impedidas de
casar".

Por assim, temos, de forma simplificada, que o instituto concubinato puro


equivale à atual união estável, enquanto o instituto concubinato impuro é mero
concubinato.

Apesar de inovadora, a distinção terminológica apresentada pelo atual Código


Civil não retira as concubinas do limbo ao qual foram presas. Isto pois a amante, a qual
se insere no instituto concubinato (antigo concubinato impuro), permanece inexistente,
vez que a legislação atual não se posiciona em relação à concessão de quaisquer de seus
direitos, restringindo-se meramente à definir o instituto jurídico que as contempla.
BIBLIOGRAFIA

https://jus.com.br/artigos/68042/os-direitos-sucessorios-da-concubina-a-luz-da-
jurisprudencia-brasileira

https://lfg.jusbrasil.com.br/noticias/64492/direitos-da-o-amante-na-teoria-e-na-pratica-dos-
tribunais-prof-pablo-stolze-gagliano

http://globoreporter.globo.com/Globoreporter/0,19125,VGC0-2703-16395-4-265921,00.html

http://www.egov.ufsc.br/portal/conteudo/o-concubinato-adulterino-sob-o-prisma-do-c
%C3%B3digo-civil-de-2002

https://direitofamiliar.com.br/concubinao-amante-afinal-o-que-e-concubinato/

https://semanaacademica.org.br/system/files/artigos/evolucao_sucessao_companheiro_0.pdf

https://news.gallup.com/poll/162689/record-high-say-gay-lesbian-relations-morally.aspx

LÔBO, Paulo. Direito civil: famílias. São Paulo: Saraiva, 2008.

Você também pode gostar