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UNIÃO ESTÁVEL: ANALOGIA COM O CASAMENTO,

PARA FINS PENAIS

UNIÃO ESTÁVEL: ANALOGIA COM O CASAMENTO, PARA FINS PENAIS


Revista do Instituto dos Advogados de São Paulo | vol. 4 | p. 75 | Jul / 1999
Doutrinas Essenciais Família e Sucessões | vol. 2 | p. 825 | Ago / 2011
DTR\1999\356

Euclides Benedito de Oliveira

Área do Direito: Geral


Sumário:

1.Proteção jurídica à família - 2.União estável como entidade familiar. Conceito e requisitos -
3.Reflexos penais da união estável

1. Proteção jurídica à família

Pelo vetusto regime do Código Civil (LGL\2002\400) (com lineamentos oriundos do último quartel do
século passado e vigência a partir de janeiro de 1917), diferenciava-se a família em legítima e
ilegítima. Legítima era apenas a família formada por meio do casamento. Ilegítima, a resultante de
união informal, de fato, pela convivência de fim amoroso entre homem e mulher, sem as
formalidades do "papel passado". 1

Radical mudança adveio com a Constituição Federal de 1988, dando-se nova conceituação à
entidade familiar, para efeito de proteção do Estado. A família passou a ser vista e aceita de forma
ampla, pela sua origem no direito natural, com naturais reflexos em todo o ordenamento jurídico,
tanto no âmbito civil quanto no penal.

Ao texto da Carta vigente, vislumbra-se o ente familiar por quaisquer das formas de sua instituição,
haja ou não celebração oficial:

a) pelo casamento civil ou religioso com efeitos civis (art. 226, §§ 1.º e 2.º), confirmando a clássica
acepção de "família legítima", ao teor do Código Civil (LGL\2002\400);

b) pela união estável entre o homem e a mulher, também considerada forma legítima de união, ainda
que informal, com direito a igual proteção do Estado, previsto que a lei facilite sua conversão em
casamento (art. 226, § 3.º);

c) pela comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes, formando a chamada
"família monoparental" (art. 226, § 4.º). 2

Em suma, seja a união legalizada pelo casamento ou sedimentada por duradouro tempo de
convivência, ou mesmo passageira, mas vindo a gerar descendência, sempre haverá de
enquadrar-se nos moldes de um núcleo familiar, assim entendido o agrupamento de pessoas
envolvidas por laços de sangue, vínculos afetivos e comunhão de interesses.

A instituição do divórcio, em 1977 (EC 9, de 28.06.1977, Lei 6.515, de 26.12.1977), significou um


grande avanço na regularização de uniões de pessoas que se achavam desquitadas ou separadas
judicialmente. Abriu-lhes a oportunidade para um novo casamento, mas não se preocupou em lhes
resguardar direitos decorrentes da simples união de fato. 3

Completou-se o ciclo evolutivo com a normatização constitucional de 1988 e subseqüente


reformulação legislativa. Como já anotamos, a nova carta reconhece, ao lado da família resultante da
união legal pelo casamento, a família de fato, oriunda de união estável, como forma pura do antigo
concubinato. Estende-lhe proteção, não só com relação aos contraentes, mas também aos filhos e
demais componentes da entidade familiar (arts. 226, § 5.º, e 227, § 6.º). 4

Resulta claro que o ordenamento constitucional consagrou a definição ampla da família, como base
da sociedade, garantindo-lhe proteção especial do Estado, independentemente do modo pelo qual
tenha se originado a união.

Ressalva-se que o reconhecimento do concubinato, sob os contornos de "união estável", como


integrante da "entidade familiar" não significa omissão à figura do casamento. Ao invés, todo o

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sistema familiar continua girando a partir e em torno dessa instituição, tanto que os parágrafos do art.
226 se estendem em disposições sobre o casamento civil (1.º), efeitos do casamento religioso (2.º),
conversão da união estável em casamento (3.º), igualdade de direitos e deveres entre os cônjuges
(5.º) e causas de dissolução do casamento pelo divórcio (6.º).

Mantém-se, pois, o instituto básico do casamento como forma de sacramentar as uniões familiares e
até se destaca pela previsão de que o legislador facilite a transformação em casamento das uniões
estáveis.
2. União estável como entidade familiar. Conceito e requisitos

A garantia constitucional de proteção do Estado não se estende a toda e qualquer espécie de união
extraconjugal, e, muito menos, a hipóteses de vida em comum entre pessoas do mesmo sexo. O
texto do art. 226, § 3.º, é expresso em mencionar a exigência de estabilidade, restrita à união entre
homem e mulher.

O que se entende por "união estável"? A Constituição não diz, relegando a solução para lei que
disponha sobre o modo de conversão da união em casamento.

Convém afastar, desde logo, aquelas situações de simples amasiamento passageiro, especialmente
quando envolvam pessoas casadas. Certamente não teria o legislador pretendido a extensão de
benefícios legais em detrimento da família legalmente constituída, nem tampouco o incentivo à
poligamia.

A união protegida seria aquela da vivência de homem e mulher solteiros, separados judicialmente
(ou mesmo de fato, em excepcionais circunstâncias), divorciados ou viúvos, na situação de
"companheiros", com aparência de casamento ("casamento de fato"), conforme já vinha sendo
reconhecido pela doutrina e pela jurisprudência.

Diversas leis consagram direitos a "companheiros", em especial as leis previdenciárias e fiscais,


pondo como requisitos a condição de não existir impedimento matrimonial e o tempo mínimo de
convivência por cinco anos. Da mesma forma dispõe a Lei de Registros Públicos, ao permitir a
adoção, pela mulher, do patronímico do companheiro (art. 57, § 2.º).

Com a regulamentação dos direitos decorrentes da união estável, clareou-se a sua conceituação. A
Lei 8.971, de 29.12.1994, embora não utilize a expressão "união estável", dá-lhe substância ao
definir como "companheiros" o homem e a mulher que mantenham união comprovada, no estado de
solteiros, separados judicialmente, divorciados ou viúvos, por mais de cinco anos, ou com prole.

A Lei 9.278, de 10.05.1996, alterou esse conceito, omitindo os pressupostos de natureza pessoal e
afastando referências a tempo de convivência e prole: considera entidade familiar (resultante da
união estável), a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e de uma mulher,
estabelecida com objetivo de constituição de família. 5

Convivência pressupõe vida em comum, sem o que não se caracteriza união dos conviventes. A lei
não menciona o dever de coabitação, ou vida em comum no mesmo domicílio, que o Código Civil
(LGL\2002\400) assenta como um dos deveres básicos dos casados (art. 231, II). Abre-se campo à
excepcional configuração de união estável à distância, quando residam, os companheiros, em locais
diversos, desde que, não obstante esse distanciamento físico, subsista a convivência definida na lei.
6

Duradoura é o mesmo que estável, a significar permanência por tempo razoável, que seja suficiente
para caracterizar a convivência intuitu familiae. Merece aplausos a dispensa do prazo mínimo de
cinco anos de vida em comum para que se reconheça a entidade familiar resultante da união estável.
Primeiro, porque a CF (LGL\1988\3), no art. 226, § 3.º, não prevê a condicionante temporal.
Segundo, pela evidência de que a estabilidade da união tem que ser examinada caso a caso, pelas
circunstâncias do modo de convivência e pela família que daí resulte, ainda que não dure muitos
anos e mesmo que não haja filhos dessa união.

A convivência há de ser pública, isto é, de conhecimento do meio social onde vivam os


companheiros, o que afasta configuração de cunho familiar a encontros velados, às escondidas, que
sugerem, pela clandestinidade, segredo de vida em comum incompatível com a constituição de uma

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verdadeira família no meio social. Também refoge ao modelo de união estável, por força da mesma
interpretação, a ligação adulterina de pessoa casada, sem estar separada de fato do seu cônjuge,
uma vez que ordinariamente se procura preservar do conhecimento público o amasiamento em
proteção ao lar conjugal. O mesmo se diga das uniões desleais, isto é, de pessoa que viva em união
estável e, paralelamente, mantenha ligação afetiva com outra pessoa. Essas hipóteses
descaracterizam união estável, não só pelas razões expostas como pela quebra ao dever de
"respeito e consideração mútuos", previsto no art. 2.º da lei. 7

A vida em comum há de ser contínua, sem interrupções que lhe retirem a característica da
permanência. O vai-e-vem de encontros e desencontros denota instabilidade da união, a ser aferida,
caso a caso, na pendência do tempo e das condições em que tenha ocorrido a temporária separação
dos conviventes.

Além dos requisitos de ordem objetiva, a união estável exige o elemento anímico, intencional,
consistente no propósito de formação da família. Depende de uma série de fatores, como a
exteriorização da convivência more uxorio, comportamento social, situação de dependência de um
dos companheiros, colaboração nas empreitadas de interesse comum, existência de filhos dessa
união, etc. 8

A conceituação da união estável se completa com a enumeração dos direitos e deveres dos
conviventes, em igualdade de condições (art. 2.º da Lei 9.278/96). Assim, a união estável pressupõe,
para que seja reconhecida e para que se mantenha, mútuo respeito e consideração das partes,
assistência material e moral recíproca e os cuidados na guarda, sustento e educação dos filhos
comuns.

Não se admite, à luz do texto legal, união adulterina, característica do concubinato de pessoa
casada. Nem união desleal, que se some a outra união de fato. 9

Assegura-se aos conviventes, como forma de proteção jurídica à entidade familiar, direitos
patrimoniais semelhantes aos que se aplicam a pessoas casadas:

a) prestação de alimentos, por força do dever de mútua assistência e, no caso de rescisão da união
estável;

b) meação, por efeito do condomínio nos bens adquiridos a título oneroso durante a convivência,
salvo se havidos por sub-rogação no produto de bens havidos anteriormente ou por estipulação
contrária em contrato escrito;

c) sucessão hereditária, não havendo descendentes ou ascendentes; usufruto sobre um quarto dos
bens, se houver descendentes, ou sobre metade se houver ascendentes; habitação sobre o imóvel
destinado à residência da família.
3. Reflexos penais da união estável

Ante o exposto, tomem-se como premissas necessárias ao exame dos reflexos da união estável na
esfera do direito penal os seguintes pontos:

a) ao lado da família tradicional, formada pelo casamento, situa-se a união estável entre o homem e
a mulher, no mesmo plano de "entidade familiar";

b) aos participantes dessa espécie de união, os companheiros ou conviventes, assegura-se a


mesma proteção jurídica garantida à família.

O quadro apresenta relevo diante das disposições do ordenamento penal que, de um lado, visam
proteger a instituição familiar e, de outro, apenam com maior ou menor severidade os autores de
ação delituosa envolvendo pessoas unidas pelo mesmo laço familiar, com tipificação expressa para
as situações de casamento entre o agente e a vítima.

Na parte geral, ao cuidar da aplicação da pena, o Código prevê como circunstância agravante ter o
agente cometido o crime contra "cônjuge" (art. 61, II, e). Mas essa mesma circunstância de relação
conjugal pode ocasionar extinção da punibilidade, em crimes contra os costumes, quando
sobrevenha casamento do réu com a ofendida (art. 107, inc. VII). Ainda, nessa modalidade de

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crimes, o casamento da vítima com terceiro faz extinguir a punibilidade se a interessada não
requerer o prosseguimento do inquérito policial ou da ação penal em 60 dias a contar da celebração
(art. 107, inc. VIII).

Na parte especial é prevista isenção de pena ao autor de crime contra o patrimônio de cônjuge, na
constância da sociedade conjugal (art. 181, I). E somente se procede mediante representação se o
crime dessa natureza é cometido em prejuízo do cônjuge desquitado ou judicialmente separado (art.
182, I).

Há todo um título dedicado aos "crimes contra a família", com destaque para os arts. 235 a 240,
relativos aos "crimes contra o casamento", como a "bigamia" e o "adultério". No mesmo contexto, o
capítulo dos "crimes contra a assistência familiar" prevê tipificação para o "abandono material" de
cônjuge (art. 244).

Embora "união estável" não seja o mesmo que casamento, tem as similitudes apontadas quanto à
formação de entidade familiar e direitos assegurados aos seus membros. Por isso as indagações:
poderiam os "companheiros" ser equiparados a "casados" para os fins penais? Caberia aplicação
analógica na espécie?

3.1 Impossibilidade de tipificação penal analógica ou por extensão

São questionamentos de inteira pertinência diante da caracterização de união estável como


"entidade familiar". Importa repisar, no entanto, que nem a Constituição, nem as leis especiais
estabeleceram a igualdade entre casamento e união estável. São situações distintas, na sua
substância, e tanto é assim que o legislador previu normas que viessem a facilitar a conversão da
união estável em casamento.

De outro lado, não se pode estabelecer tratamento analógico, na esfera penal, para fins de
enquadramento em prática delitiva.

Tenha-se em mente o princípio da reserva legal que norteia nosso direito positivo (art. 1.º do CP
(LGL\1940\2)). Com efeito, o reconhecimento da figura delituosa exige enquadramento no tipo
constante da lei, sem que possível sua ampliação fora desse padrão específico de conduta humana.
Nessa linha de raciocínio, afirma-se não haver lacunas na lei penal que pudessem ser preenchidas
por outros recursos supletivos na aplicação do direito ao caso concreto.

3.2 Distinção entre normas incriminadoras e não-incriminadoras

Para mais adequada solução, porém, impõe-se distinguir entre as chamadas normas incriminadoras
e normas não-incriminadoras. Aquelas cuidam das condutas puníveis e das penas que lhes são
aplicáveis. A segunda categoria de normas estabelece excludentes da figura delituosa, atenuantes,
causas de diminuição da pena ou mesmo de sua dispensa.

Em face do princípio da legalidade estrita, não podem ser supridas ou suplementadas as normas
penais incriminadoras, ainda que apresentem falhas ou omissões em seus descritivos. As não
incriminadoras, porém, pelo seu caráter benéfico, ensejam a integração da norma por outros
recursos da ciência jurídica, a fim de que se atinja o seu efetivo alcance na casuística judicial.

São critérios de integração da norma jurídica, como prevê o art. 4.º da LICC (LGL\1942\3)
(igualmente aplicável no ramo penal), a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito. Não
se trata de fontes do direito, mas de instrumentos de auto-integração da lei, a fim de suprir suas
eventuais falhas. Inadmissível, conforme já ressaltado, a invocação de tais recursos para redefinir
crimes ou aplicar sanções não constantes expressamente do texto legal. Mas perfeitamente
admissível que sirvam de meio à correta aplicação do direito punitivo em caráter benéfico, quando o
texto frio da lei não seja explícito em relação a uma situação análoga.

Nesse sentido o dominante entendimento doutrinário, como se extrai do abalizado magistério de


Damásio Evangelista de Jesus, 10citando igual opinião de José Frederico Marques, 11a dizer que
"onde o art. 4.º (da LICC (LGL\1942\3)) encontra aplicação plena e cabal é em relação aos casos de
licitude excepcional e de isenção de culpabilidade. As omissões do legislador, nesse terreno,
autorizam o juiz a cobrir as falhas da lei com os processos de integração jurídica".

Através da analogia, o intérprete verifica os pontos de semelhança entre um fato concreto, não

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previsto com clareza na lei, e o fato regulado expressamente. Considera o primeiro análogo ao
segundo, e daí extrai a mesma conclusão para incidência de igual dispositivo legal, porque inspirado
na mesma razão de decidir. 12Consiste a analogia, pois, na aplicação a uma hipótese não prevista
em lei de disposição relativa a um caso semelhante. 13

Pela distinção já feita entre normas incriminadoras e normas não-incriminadoras, claro está que em
direito penal só tem lugar a analogia in bonam partem, quando o sujeito é beneficiado por sua
aplicação, e nunca in malam partem, porque então resultaria prejuízo incompatível com o lembrado
princípio da reserva legal quanto às normas descritivas dos crimes.

Retorna-se, então, ao ponto em debate - a situação de união estável, com possível analogia entre
"companheiro" e "casado", para os fins de integração da norma jurídico-penal.

A conclusão é de que não se pode aplicar a analogia para reconhecimento das figuras delituosas
praticadas por cônjuges, como se dá nos crimes contra o casamento ou contra a assistência familiar.
Assim, não há falar em crimes de bigamia ou de adultério entre companheiros, já que a lei exige a
situação do casamento como elemento caracterizador do tipo. O mesmo se diga com relação ao
abandono material do cônjuge, previsto no art. 244 do Código.

Também incabível a incidência analógica, a companheiro, de circunstância agravante genérica da


pena em crime praticado contra cônjuge (art. 61, II, e, do CP (LGL\1940\2)). 14O mesmo se diga dos
casos de aumento de pena para delitos contra cônjuge, como previsto nos arts. 133, § 2.º, II, 148, §
1.º, I e 226, III, do CP (LGL\1940\2).

3.3 Aplicação da analogia benéfica

Pertinente a aplicação da analogia, porém, nos casos em que a lei penal dá tratamento benéfico à
situação dos casados. A eles poderão equiparar-se, então, os companheiros que se achem na
mesma posição no quadro delituoso. Afinal, o que se pretende favorecer, em tais casos, não é a
figura específica do casamento, mas sim a unidade do grupo que, embora atingida pelo
procedimento delituoso, revela-se de interesse maior que a punição pelo Estado, que viria a agravar
a desagregação dos componentes familiares.

Enquadram-se nesse contexto os seguintes dispositivos do Código Penal (LGL\1940\2), em que a


posição de cônjuge pode ser substituída por companheiro:

# ação de iniciativa privada (queixa, ou prosseguimento de ação penal pública), em caso de morte ou
ausência do ofendido, pelo cônjuge sobrevivente (art. 100, § 4.º);

# extinção da punibilidade pelo casamento do agente com a ofendida, em certos crimes contra os
costumes (art. 107, VII) - aí se incluindo também a união estável entre agente e ofendida;

# necessidade de provocação da vítima para prosseguimento do inquérito policial ou da ação penal,


quando vier a se casar com terceiro, em certos crimes contra os costumes (art. 107, VIII) - valendo
dizer, também, se vier a unir-se estavelmente com terceiro;

# isenção de pena nos crimes contra o patrimônio praticados contra cônjuge (art. 181, I) e, por
extensão, contra companheiro;

# necessidade de representação, nas mesmas circunstâncias, se o crime é praticado contra cônjuge


desquitado ou separado judicialmente (art. 182, I), cabendo acrescentar: ex-divorciado ou
ex-companheiro;

# diminuição de pena, no crime de rapto consensual, se praticado para o fim de casamento (art. 221)
- ou de união estável;

# necessidade de representação para ação penal pública, nos crimes contra a liberdade sexual
cometidos com abuso do pátrio poder, ou da qualidade de padrasto (art. 221, § 1.º, II e § 2.º) - aqui
se situando também o companheiro da mãe do menor ofendido;

# isenção de pena no crime de favorecimento pessoal, quando praticado por cônjuge (art. 348, § 2.º),
beneficiando-se por igual o companheiro.

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Pelas mesmas razões, estendem-se ao companheiro os dispositivos do Código de Processo Penal


(LGL\1941\8) que condicionam atuação do cônjuge da vítima de crime:

# direito de representação no caso de morte ou ausência do ofendido (art. 24, par. ún.);

# direito de oferecer queixa ou prosseguir na ação no caso de morte ou ausência do ofendido (art.
31);

# consentimento do marido para que a mulher casada exerça o direito de queixa, salvo se estiver
dele separada ou quando a queixa for contra ele (art. 35); 15

# preferência do cônjuge, quando comparecer mais de uma pessoa com direito a queixa (art. 36);

# direito de intervir como assistente na ação penal movida pelo Ministério Público, no caso de morte
ou ausência do ofendido (art. 268).

Sob outro aspecto, a permitir enquadramento igualitário aos componentes da entidade familiar,
sejam ou não casados, o Código Penal (LGL\1940\2) estabelece regras especiais de isenção de
pena, por perdão judicial, nos crimes de homicídio culposo (art. 121, § 5.º) ou lesão corporal culposa
(art. 129, § 8.º) se as conseqüências da infração atingirem o próprio agente de forma tão grave que a
sanção penal se torne desnecessária (aí se compreendendo os delitos praticados por cônjuge,
companheiro e filhos da vítima) 16.

3.4 Posição da doutrina e da jurisprudência

Poucas as incursões doutrinárias sobre o tema, assim como incipiente a jurisprudência de nossos
tribunais.

Posiciona-se Jacques Camargo Penteado, na obra A família e a justiça penal, 17formalmente contra
qualquer aplicação analógica entre cônjuge e companheiro para fins de aplicação das normas
penais, tanto as incriminadoras quanto as não-incriminadoras ou favoráveis ao agente. Argumenta
que a família constituída pelo casamento é uma "substância" enquanto a união estável é "mero
acidente", uma perfeita, a outra imperfeita, por isso que não ensejam equiparação, sendo diversos os
seus efeitos jurídicos.

Parece inquestionável a conclusão relacionada às normas incriminadoras, em que descabe a


incidência penal analógica, por expressa vedação legal, atendendo-se ao princípio nullum crimen,
nulla poena sine previa lege.

No que respeita às normas não-incriminadoras, porém, há de prevalecer a regra da analogia in


bonam partem, conforme já analisado, atendendo-se ao mandamento constitucional de proteção da
família, que extrapola dos angustos limites da união civil restrita ao casamento.

A esse propósito, divergem os Tribunais, sem que se possa afirmar dominante o entendimento a
favor ou contra a extensão, aos companheiros, das normas não-incriminadores que favorecem os
casados.

O TJSP, em acórdão da 5.ª Câm. Crim., julgando crime de estupro, negou a extinção de punibilidade
por ocorrência de união de fato entre a ofendida e terceiro. Foi relator o Des. Dirceu de Mello,
deixando assente, na fundamentação do voto condutor: "Na verdade, muito claro o preceito do art.
107, inciso VIII, do Código Penal (LGL\1940\2), ao falar, para os fins que especifica, em casamento
(civil, é claro) celebrado. Está certo que concebida a norma com vistas a resguardar os interesses da
família, hoje, na forma da Constituição, também aquela marcada pela união estável entre homem e
mulher. Mais do que tudo, porém, o que não se pode olvidar, é que liberatório de responsabilidade, e
por crimes muito graves, o citado dispositivo do Código Penal (LGL\1940\2). Donde o aparecer não
como regra, mas exceção, e ter, por conseguinte, que ser exercido nos exatos termos em que o
compôs o legislador". 18

Em recente julgado do TACSP, deu-se pela extinção da punibilidade, nos termos do art. 107, VII, do
CP (LGL\1940\2), em rapto consensual seguido de união estável do agente com a raptada. A
decisão firmou-se na tese de que a constituição de núcleo familiar estável, por força do que dispõe a
Constituição Federal de 1988, equipara-se ao matrimônio legalizado para fins de extinção da

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punibilidade. 19

Na mesma linha de interpretação analógica, decisão firmada pela 4.ª Câmara do mesmo Tribunal de
Alçada, ao reconhecer isenção de pena em caso de furto praticado contra ex-companheira. Após
lembrar o dispositivo constitucional que estende proteção à união estável como entidade familiar,
salientou o relator, Juiz Marco Nahum: "Numa coerência material entre o novo princípio
constitucional e o art. 181, inc. I, do Código Penal (LGL\1940\2), há que se interpretar, agora, o
elemento normativo do tipo 'cônjuge' nos exatos termos especificados na Carta Magna (LGL\1988\3),
ou seja, é o homem que se une estavelmente à mulher, constituindo família, independentemente do
ato de união ter sido praticado pela lei civil. No caso, havia união estável entre a vítima e o apelante.
Viveram maritalmente e tiveram, neste período, um filho. Portanto, sob todos os ângulos de nossa lei
maior, havia, entre apelante e vítima, a constituição de uma entidade familiar e constituíram juntos o
patrimônio do casal". 20

4. Equiparação do companheiro a casado no Anteprojeto da Parte Especial do Código Penal


(LGL\1940\2)

A reforma do Código Penal (LGL\1940\2), iniciada com a Lei 7.209, de 11.07.1984, que reformulou a
Parte Geral, deve prosseguir com mudanças estruturais na tipificação delitiva e na quantificação das
penas. Nesse sentido, Anteprojeto de nova Parte Especial, apresentado pela Comissão presidida por
Luiz Vicente Cernichiaro e composta pelos juristas Ney Moura Teles, Ela Wiecko Volkmer de
Castilho, Licínio Leal Barbosa, Evandro Lins e Silva e Damásio Evangelista de Jesus.

O texto do Anteprojeto, que se acha em fase de apreciação final no Ministério da Justiça,


expressamente acolhe o entendimento de que o tratamento penal dispensado ao cônjuge estende-se
igualmente ao companheiro, na união estável, tendo por referencial a pessoa humana componente
da entidade familiar. A equiparação é prevista não só em casos de favorecimento do agente, mas
também na tipificação de certas figuras delituosas.

Consta da Exposição de Motivos do Anteprojeto, em mais de um capítulo, que se firma o tratamento


igualitário, "atendendo à evolução dos costumes". Mas não seria apenas esse o fundamento, de
reconhecido cunho social. Na verdade, a linha evolutiva da legislação há de seguir o mais alto e
soberano princípio constitucional de abrangente proteção à família, dentro ou fora do casamento.

Confiram-se os dispositivos inovadores, conforme a proposta:

# art. 121, § 7.º: possibilidade de isenção de pena, no homicídio culposo, se a vítima for cônjuge ou
companheiro;

# art. 128, § 8.º, II: isenção de pena, nas mesmas condições, na lesão culposa;

# art. 133, par. ún., II: crime qualificado de abandono de incapaz, se cometido por cônjuge ou
companheiro;

# art. 150, § 1.º: crime qualificado de seqüestro e cárcere privado, se cometido por cônjuge ou
companheiro;

# art. 170: crime de satisfação da lascívia própria (que é introduzido em lugar do crime de sedução),
consistente em "induzir, mediante fraude, ameaça, promessa de benefício, casamento ou união
estável, pessoa maior de quatorze e menor de dezoito anos a satisfazer a lascívia do agente";

# art. 213, I: extinção da punibilidade, nos crimes contra o patrimônio, se praticados em prejuízo de
cônjuge, na constância da sociedade conjugal, ou de companheiro, no caso de união estável;

# art. 214, I: ação penal mediante representação, nos crimes contra o patrimônio, se cometidos em
prejuízo de cônjuge judicialmente separado, divorciado ou ex-companheiro de união estável;

# art. 244: crime de abandono material, para quem deixar, sem justa causa, de prover a subsistência
de cônjuge ou companheiro;

# art. 353, § 2.º: isenção de pena, no crime de favorecimento pessoal, para quem presta o auxílio na
condição de cônjuge ou companheiro.

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Para complementar essa política de isonomia no tratamento penal dos componentes da entidade
familiar, é preciso que a reforma se estenda aos dispositivos da Parte Geral do Código Penal
(LGL\1940\2), relativos às circunstâncias agravantes em crimes praticados contra cônjuge (art. 61,
inc. II, e), ação penal subsidiária (art. 100, § 4.º) e hipóteses de extinção da punibilidade (art. 107,
incs. VII e VIII).

De igual forma, haverão de ser revistos os dispositivos da lei processual penal que atendem à
posição do cônjuge, para que igualmente se contemple o companheiro, na representação em caso
de morte ou ausência do ofendido (art. 24, par. ún.), queixa ou prosseguimento na ação quando
morto ou ausente o ofendido (art. 31), consentimento do marido para que a mulher casada exerça o
direito de queixa (art. 35), preferência do cônjuge, quando comparecer mais de uma pessoa com
direito a queixa (art. 36), e direito de intervir como assistente na ação penal movida pelo Ministério
Público, em caso de morte ou ausência do ofendido (art. 268).

5. Conclusão

Na proteção à família, garantida pela Constituição e por leis especiais, há de se compreender o


tratamento penal igualitário entre cônjuge e companheiro.

Inadmissível a aplicação analógica das normas penais incriminadoras, em face do princípio da


reserva legal. Sob esse aspecto, aguarda-se reforma da legislação, nos termos de propostas
contidas no Anteprojeto da Parte Especial do Código Penal (LGL\1940\2).

Embora subsistam divergências de opiniões na doutrina e na jurisprudência, afigura-se predominante


e de inteira pertinência a tese da extensão ao companheiro das normas penais favoráveis ao réu, na
qualidade de cônjuge. Trata-se de valorar a união estável por decorrência das regras constitucionais
e legais visando à proteção da família, ainda que sem os laços oficiais do casamento civil.

Assim entendida e aplicada a analogia na esfera penal, estar-se-á cumprindo na inteireza o preceito
constitucional de proteção à entidade familiar formada à sombra da união estável, à semelhança do
que se dá com respeito à família oriunda do casamento.

6. Bibliografia

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(1) A esta união informal se denominava, genericamente, "concubinato", a significar vida em comum
entre homem e mulher, com aparência de casamento ( more uxorio), ou formas assemelhadas de
convivência, para fins de relacionamento sexual, com suposta fidelidade das partes.

(2) Caso típico da mãe solteira, quando desconhecido o genitor, ou episódica a união, bastando que
se origine prole dentro do conceito de família natural.

(3) A única referência a essa espécie de união, na Lei do Divórcio, está em seu art. 45: permite a
livre estipulação do regime de bens, sem o impedimento do art. 258, II, do CC, no casamento do
maior de 60 e da maior de 50 anos, se já mantinham comunhão de vida desde antes de 28 de junho
de 1977 (data da EC 9), por 10 anos consecutivos, ou se tinham filhos dessa união.

(4) Na mesma linha de proteção à união estável, a Constituição também distingue o "companheiro"
como possível beneficiário de pensão por morte do segurado (art. 201, V).

(5) Já não se fala em "concubinato", nome tradicional, abrangente de todas as situações de união à
margem do casamento. Num sentido amplo, "união estável" também seria forma de "concubinato";
"companheiros" ou "conviventes" seriam o mesmo que "concubinos". Alguns autores classificam o
concubinato em "puro" e "impuro", para diferenciar as uniões de pessoas legalmente desimpedidas
das ligações de caráter adulterino. Nesses termos, a forma "pura" de concubinato se iguala à vida de
"companheiros", ou "conviventes", em "união estável". Melhor será, no entanto, reservar, com
exclusividade, estes novos termos para a situação específica das pessoas que se enquadrem nos
figurinos das Leis 8.971/94 e 9.278/96. Restaria o "concubinato", assim, para a outra hipótese, de
ligação proibida, envolvendo pessoa casada, ou ainda não separada judicialmente, em união com
terceiro, na posição de adulterinidade que o Código Civil (LGL\2002\400) contempla para invalidação
de certos atos.

(6) Esse o entendimento da Súm. 382 do STF para caracterização do concubinato.

(7) Do que ficou exposto, conclui-se que não é possível a simultaneidade de casamento e união
estável ou de mais de uma união estável. O texto expressamente restringe o reconhecimento da
entidade familiar à união de "um homem e uma mulher", em exclusão de uniões múltiplas,
simultâneas. Poderá não ter sido proposital essa especificação do artigo, e até seria dispensável,
mas, sem dúvida, reforça a interpretação de que a lei somente protege as uniões sinceras e leais,
próprias do sistema monogâmico. E assim há de ser, com efeito, ante a ilicitude da bigamia, para a
hipótese dos casados. Mas cumpre lembrar a possibilidade de casamento putativo, mesmo em casos
de nulidade ou de anulação da segunda união, quando haja boa-fé por parte de um ou de ambos os
cônjuges, com reconhecimento de direitos, nos termos do art. 221 do CC. Da mesma forma, e por
igual razão, pode haver união estável putativa quando o partícipe de segunda união não saiba da
existência de impedimento decorrente da anterior e simultânea união do seu companheiro; para o
companheiro de boa-fé subsistirão os direitos da união que lhe parecia estável, desde que
duradoura, contínua, pública e com propósito de constituição de família, enquanto não reconhecida
ou declarada a nulidade.

(8) Claro está que não se enquadra no modelo de entidade familiar a convivência para outros fins,
como para estudos (república de estudantes), exercício de profissão conjunta (divisão de um imóvel
para residência e escritório) ou simples intuitos econômicos, como a repartição física de bens
utilizados em sistema de cooperação mútua.

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UNIÃO ESTÁVEL: ANALOGIA COM O CASAMENTO,
PARA FINS PENAIS

(9) Importa lembrar, neste passo, que o projeto original da lei previa, como requisitos da convivência,
que não fosse adulterina nem incestuosa. Essas expressões foram afastadas do texto aprovado.
Mas não significa a aceitação de uniões daquela espécie, desde que se atente para os deveres
mútuos dos companheiros, o primeiro deles relativo ao "respeito e consideração" (art. 2.º, inc. I), ou
seja, lealdade, fidelidade entre os parceiros. E, sobre união de caráter incestuoso, basta frisar que
atenta contra o próprio direito natural e os princípios de moral pública, razões que impedem
casamentos nessa circunstância, aplicando-se a mesma regra para apreciação da união estável.
Não obstante, a jurisprudência tem reconhecido direitos decorrentes de uma segunda união desde
que haja separação de fato do casado, por tempo que denote efetiva cessação da vida em comum.
Também se ressalve, ainda mesmo em hipótese de uniões simultâneas, a produção de efeitos ao
convivente de boa-fé, tipificando-se, em tais situações, uma união estável putativa, conforme acima
anotado, com reporte ao que dispõe, sobre casamento, o art. 221 do CC.

(10) Direito penal. 20. ed. Saraiva, 1997, v. 1, p. 23 e 25.

(11) Tratado de direito processual penal. Saraiva, 1980, v. 1, p. 165.

(12) Ubi eadem ratio legis, ibi eadem dispositio.

(13) JESUS, Damásio Evangelista de, op. cit., p. 48.

(14) Ressalvada a incidência da letra f do mesmo artigo, em que a situação de companheiro pode se
enquadrar na agravante de prática do crime, prevalecendo-se, o agente, de "relações domésticas".

(15) A previsão de consentimento do marido afronta o princípio constitucional de igualdade de


direitos dos cônjuges, de modo que não recepcionado pela Carta vigente. Confira-se a lição de
Damásio Evangelista de Jesus: "A mulher casada pode exercer o direito de queixa sem o
consentimento do marido. Cremos que a disposição foi revogada pelos arts. 3.º, IV, 5.º, I, e 226, §
5.º, da CF (LGL\1988\3), que determina a igualdade de direitos a ambos os cônjuges. De modo que
entendemos superada a questão de a mulher casada poder ou não exercer o direito de queixa ou de
representação sem o consentimento do marido. Nesse sentido: TJMG, RCrim. 931, RT 639/334" (
Código de Processo Penal (LGL\1941\8) anotado. 14 ed. Saraiva, 1998, nota ao art. 35).

(16) Ver precedentes em RT 640/321 e 641/344.

(17) São Paulo : RT, 1988, cap. 7: O núcleo familiar de fato e a Justiça Penal - p. 103-117.

(18) RJTJSP (atual JTJ), v. 135/399. Votação por maioria. Declarou voto vencido o Des. Celso
Limongi, prestigiando a decisão de primeiro grau, que dera pela extinção da punibilidade. Lembrou
ensinamento de Celso Delmanto, no sentido de que o art. 107, VIII, do CP (LGL\1940\2), visa "a que
a vítima seja preservada, não tendo sua tranqüilidade conjugal e familiar perturbada pelo crime
sexual que antes sofreu" ( Comentários ao Código Penal (LGL\1940\2), p. 185). E conclui: "Se essa é
a razão de ser dessa causa de extinção de punibilidade, não se pode subtrair da vítima não casada o
mesmo direito atribuído à ofendida que veio a casar-se posteriormente, pois, como visto, a
Constituição da República (LGL\1988\3) estendeu a proteção do Estado à união estável".

(19) Ap. 1.003.851/6, da 6.ª Câm. do TACrimSP, maioria, rel. juiz Ivan Marques, e voto vencedor
declarado pelo juiz Mathias Coltro, publ. na RJTACrim 32: 67/260. No mesmo sentido, ap. no proc.
404.983, TJMT, mandando extinguir a punibilidade em caso de sedução.

(20) Ap. 1.135.911/1, v.u., j. em 02.03.1999.

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