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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO

CENTRO DE ARTES
DEPARTAMENTO DE TEORIA DA ARTE E MÚSICA

RAYSSA DOS SANTOS SILVA NAKA

Relações intertextuais entre os processos de composição de


canções infantis e o Guia Prático de Villa-Lobos

VITÓRIA – ES
JULHO DE 2022
Rayssa dos Santos Silva Naka

Relações intertextuais entre os processos de composição de


canções infantis e o Guia Prático de Villa-Lobos

VITÓRIA – ES
JULHO DE 2022
RAYSSA DOS SANTOS SILVA NAKA

Relações intertextuais entre os processos de composição de


canções infantis e o Guia Prático de Villa-Lobos

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao


Departamento de Teoria da Arte e Música do
Centro de Artes da Universidade Federal do
Espírito Santo, como requisito parcial para
obtenção do grau de Bacharel em Música.
Orientador: Prof. Dr. Antonio Celso Ribeiro.

Comissão Examinadora

________________________________
Prof. Dr. Antonio Celso Ribeiro
Universidade Federal do Espírito Santo

________________________________
Prof. Dra.Mirna Azevedo Costa
Universidade Federal do Espírito Santo

_________________________________
Prof. Me. Darcy Alcantara Neto
Universidade Federal do Espírito Santo
Agradecimentos

Ao Deus Eterno, Autor, Compositor e Orquestrador da minha vida.

Ao meu orientador prof. Dr. Antonio Celso por compartilhar sua sabedoria com
paciência e dedicação, fundamentais para que este trabalho fosse concluído com
sucesso.

Aos professores Me. Darcy Alcantara Neto e Dra. Mirna Azevedo Costa, membros da
Banca Examinadora, por terem atendido ao convite, dispondo de seu tempo e
conhecimento para análise do trabalho.

Aos meus pais, pela base, ajuda e amor incondicionais.

Ao meu amado esposo pela compreensão, apoio e motivação em todos os


momentos.

Aos meus filhos, responsáveis pela leveza e transformação das trilhas da minha vida.

Aos meus queridos amigos Crysleyson e Plácido pelo suporte técnico não apenas
neste trabalho, mas também pelo incentivo e amizade que ajudaram a amenizar os
momentos difíceis com bom humor ao longo do curso.
Resumo

Esta pesquisa investiga a intertextualidade musical entre peças para crianças,


reunidas no Guia prático para a Educação Artística e Musical – Heitor Villa-Lobos –
1º Caderno, e canções tradicionais infantis de outros países. São abordados os
conceitos de Dialogismo e Intertextualidade de Mikhail Bakhtin e os modelos
intertextuais apresentados pelo musicólogo Joseph Straus: Influência como
Imaturidade, Influência como Generosidade e Influência como Ansiedade. Para
análise foram considerados os seguintes elementos musicais: forma, melodia, ritmo,
textura, tessitura e letra (rima). Como produto, foram compostas cinco canções
destinadas ao público infantil amparadas pelas ferramentas composicionais
discutidas nesta monografia.

Palavras-chave: Composição musical. Intertextualidade. Música Infantil. Villa-Lobos


ABSTRACT

This research investigates the musical intertextuality between children’s songs


compiled in the Practical Guide for Artistic and Musical Education by Heitor Villa-
Lobos – 1st Book (Guia Prático para a Educação Artística e Musical – Heitor Villa-
Lobos – 1º Caderno), and traditional children's songs from other countries. Dialogism
and Intertextuality concepts by Mikhail Bakhtin and intertextual models presented by
the musicologist Joseph Straus are discussed: Influence as Immaturity, Influence as
Generosity and Influence as Anxiety. The following musical elements were
considered for analysis: form, melody, rhythm, texture, range and lyrics. As a final
product, five children's songs were composed, based on the compositional tools
discussed in this paper.

Keywords: Musical composition. Intertextuality. Children’s songs. Villa-Lobos


LISTA DE FIGURAS

Figura 1: BACH, J.C.Violino Sonata in D - dur. Op.16 nº1 ........................................ 19


Figura 2: Mozart, W. Amadeus. Violin Sonata in B-flat major. K ................................ 20
Figura 3: Hommage a J.S.B ...................................................................................... 23
Figura 4: BWV 856, Prelúdio in F .............................................................................. 23
Figura 5: VIVALDI, Antonio. Concerti Grossi - As quatro estações - Primavera ........ 25
Figura 6: RICHTER, Max. Vivaldi - The Four Seasons - Spring 1 ............................. 26
Figura 7: Cai, cai, balão ............................................................................................ 34
Figura 8: A canoa virou .............................................................................................. 36
Figura 9: Fui no Itororó .............................................................................................. 38
Figura 10: A gatinha parda I ...................................................................................... 39
Figura 11: A gatinha parda II...................................................................................... 40
Figura 12: Tessituras - 1º vol. Caderno Villa Lobos .................................................. 43
Figura 13: tabela comparativa canções do 1º Caderno ............................................. 43
Figura 14: Bolo, bolo, bolo......................................................................................... 45
Figura 15: Ya lloviendo está ...................................................................................... 46
Figura 16: Oyfn Pripetshik ......................................................................................... 47
Figura 17: A cantiga de ninar ..................................................................................... 49
Figura 18: Kookaburra ............................................................................................... 51
Figura 19: O pato nada no lago ................................................................................. 52
Figura 20: Shabondoma ............................................................................................ 53
Figura 21: Escalas pentatônicas ............................................................................... 54
Figura 22: Canción para la bañar la luna .................................................................. 55
Figura 23: Pequeña luna ........................................................................................... 56
Figura 24: Escala chinesa ......................................................................................... 57
Figura 25: Baila sola .................................................................................................. 57
Figura 26: Los pollitos dicen ...................................................................................... 58
Figura 27: Os pintinhos ............................................................................................. 59
Figura 28: Bādī: ......................................................................................................... 61
Figura 29: Pule 1,2,3 ................................................................................................. 63
Figura 30: Pi(pocando) .............................................................................................. 64
Figura 31: Flor de cerejeira ....................................................................................... 66
Figura 32: Indiozinho feliz! ........................................................................................ 67
SUMÁRIO
1INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 8
2 Objetivos ........................................................................................................................ 10
2.1 Objetivos gerais........................................................................................................... 10
2.2 Objetivos específicos .................................................................................................. 10
3 Justificativa ..................................................................................................................... 10
4 Metodologia .................................................................................................................... 11
5 Caminhos para a composição musical ........................................................................... 11
6 Dialogismo e Intertextualidade ....................................................................................... 12
6.1 A intertextualidade aplicada à música ......................................................................... 16
7 A intenção do compositor ............................................................................................... 29
8 Processos da Composição Musical ................................................................................ 31
9. Canções ........................................................................................................................ 33
9.1 “Cai, cai, balão” ........................................................................................................... 33
9.2 A canoa virou ............................................................................................................... 36
9.3. Fui no Itororó .............................................................................................................. 37
9.4 A gatinha parda I ........................................................................................................ 39
9.5 A gatinha parda II ........................................................................................................ 40
10 Análise geral das canções do Caderno 1 de Villa-Lobos:............................................. 42
11 Análises de canções de outros países.......................................................................... 43
11.1 Bolo, Bolo, Bolo ......................................................................................................... 44
11.2. Oyfn Pripetshik ......................................................................................................... 47
11.3 A cantiga de ninar ..................................................................................................... 49
11.4 Kookaburra ................................................................................................................ 50
11.5 O pato nada no lago ................................................................................................. 52
11.6 Shabondoma ............................................................................................................. 53
11.7 Canción para bañar la luna ........................................................................................ 54
11.8 Pequeña Luna ........................................................................................................... 56
11.8 “Baila Sola” ................................................................................................................ 57
11.9 Los Pollitos Dicen ...................................................................................................... 58
11.10 Os pintinhos ............................................................................................................. 59
12 Análise das composições autorais ............................................................................... 61
12.1 “Bādī”........................................................................................................................ 61
12.2 Pule 1,2,3! ................................................................................................................. 63
12.3 Pi(pocando) ............................................................................................................... 64
12.4 Flor de Cerejeira ........................................................................................................ 66
12.5 Indiozinho feliz........................................................................................................... 67
13 CONCLUSÃO............................................................................................................... 70
REFERÊNCIAS ................................................................................................................. 71
ANEXOS ........................................................................................................................... 79
1 INTRODUÇÃO

Se fosse ensinar a uma criança a beleza da música não começaria com


partituras, notas e pautas. Ouviríamos juntos as melodias mais gostosas e
lhe contaria sobre os instrumentos que fazem a música. (Rubem Alves1)

A vida nos proporciona a possibilidade de ouvir o início de nossa trilha sonora


antes de termos consciência de quem somos, de como devemos nos relacionar e
construir nossa narrativa no mundo. Antes das palavras, os balbucios; antes da
consciência, o instinto, antes do canto, os ruídos; antes da música, o choro. Assim,
ainda que não compreendamos e nos revelemos ao mundo, vivenciamos sons,
batimentos, ruídos, vibrações que nos trarão memórias afetivas boas ou ruins e que
de alguma forma farão parte da nossa história.
O som em si não é Música, mas a Música é composta por sons2. A música
sempre acompanhou e exerceu influência sobre a mente humana. Kurt Pahlen em
“História Universal da Música” (1963, p.14) escreve que para o homem exprimir os
sentimentos “serve-se de sons e cria a música que o ajuda a exteriorizar o júbilo, a
tristeza, o amor, os instintos belicosos, a crença nos poderes supremos e a vontade
de dançar”. Somos intrinsecamente musicais e compreendemos que, desde a
infância, a música cria oportunidades para o desenvolvimento da criança em vários
aspectos. PAHLEN (1963, p.13) afirma que todas as crianças nascem com
capacidade musical, voz e ouvido.
As experiências dos primeiros anos de vida são fundamentais para a
construção e desenvolvimento do intelecto e das emoções humanas. Sabemos que
a criança relaciona-se com o mundo brincando porque tudo é uma brincadeira para
ela. Com a música não é diferente. Se ela entende a música como uma brincadeira,
o aprendizado torna-se divertido e eficiente. Assim, através do lúdico, ela faz
descobertas, adquire ideias, princípios e conhecimentos, aprimora habilidade motora,

1 Fonte: Wikipedia. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Rubem_Alves. Acesso em 20 de abril


de 2022.
2 O som é uma sensação auditiva que nossos ouvidos são capazes de detectar. Esta sensação é

produzida pelo movimento organizado das moléculas que compõem o ar. Fonte: “Som e Acústica:
ondas sonoras”. Universidade de São Paulo (USP). Disponível em:
https://www.ifsc.usp.br/~donoso/fisica_arquitetura/12_som_acustica_1.pdf. Acesso em: 20 de maio de
2022.
8
se expressa, amplia o vocabulário, aprende a se concentrar, canta, brinca, relaciona-
se consigo e com o outro.
Segundo Gainza 3 (1988, p. 26) a música é um elemento de fundamental
importância, pois movimenta, mobiliza e, por isso, contribui para a transformação e o
desenvolvimento. Em “Estudos de Pedagogia Musical “Gainza 4 observa que a
música e o som, enquanto energia, estimula o movimento interno e externo no
homem, impulsionando-no a ação e promovem nele uma multiplicidade de condutas
de diferente qualidade e grau.
O tema desse trabalho foi inspirado a partir da experiência pessoal de compor
música para os meus filhos: cantigas de ninar, canções para passar um ensinamento
ou apenas para brincar com eles. Com interesse em me aprofundar sobre como
compor músicas infantis, busquei investigar como se dá o processo composicional
das canções voltadas a esse público. A partir disso, busquei como referencial de
análise peças do “1º Caderno – Heitor Villa-Lobos Guia Prático para a Educação
Artística e Musical 1º Volume”, e nove canções de outros países. Para análise e
comparação do material apresentado utilizamos os conceitos de Dialogismo e
Intertextualidade aventados por vários autores, entre eles: Bakhtin, Kristeva, Straus,
Lópes-Cano, Fiorin, etc e em especial o conceito de intertextualidade emprestado à
música por Peter Burkholder. Este trabalho apresenta como produto final cinco
composições destinadas ao público infantil, que dialogam intertextualmente com as
canções analisadas considerando os seguintes elementos musicais: tessitura,
melodia, ritmo, textura, letra e forma.

3 CHIOCHETA, Lucilene Fagundes; REIS, Marcos Adelmo dos. Música na educação infantil.
Disponível em: http://www.uniedu.sed.sc.gov.br/wp-content/uploads/2016/03/TCC-Lucilene-Fagundes-
Chiochetta.pdf Acesso em: 22 de maio de 2022.
4 GAINZA, Violeta Hemsy. Estudos de pedagogia musical. Summus Editora Editorial LTDA: São

Paulo,1982. Disponível em: https://books.google.com.br/books?hl=pt-


BR&lr=&id=kXuIxOBl7IsC&oi=fnd&pg=PA21&dq=gainza+m%C3%BAsica&ots=cxzPsYft-
f&sig=QvKe7-
fTTwMKEkDnHrMiFbU1vnM&redir_esc=y#v=onepage&q=gainza%20m%C3%BAsica&f=false. Acesso
em 20 de maio de 2022.
9
2 Objetivos

2.1 Objetivos gerais

Neste trabalho objetivamos investigar e analisar os elementos básicos


musicais inseridos em algumas canções apresentadas no Guia Prático (Heitor Villa-
Lobos – Guia Prático para a Educação Artística e Musical – 1º volume, 1º Caderno)
e compreender a escolha de determinados elementos presentes na composição
musical para crianças, comparando-as com algumas canções folclóricas
provenientes de determinadas culturas.

2.2 Objetivos específicos

A partir dos procedimentos analisados, propomos compor canções infantis


fazendo uso dos procedimentos composicionais empregados por Villa-Lobos sob o
ponto de vista melódico das obras apresentadas no trabalho.

3 Justificativa

Quando se fala em música para crianças há inúmeras pesquisas que


apresentam a importância e influência desta no âmbito da pedagogia musical e da
musicalização infantil. No entanto, há poucos estudos específicos sobre como
compor para crianças e quais (se há) determinados elementos que devem ser
considerados para sua criação.
Por mais simples que pareça o processo de criação musical para crianças, já
que a própria linguagem infantil é simples, é importante ressaltar que há uma
crescente demanda mercadológica e pedagógica para esse público, uma vez que no
país, desde 2008, foi sancionada a Lei 11.769 que determina a obrigatoriedade do
Ensino de Arte, contemplando as linguagens de Artes Visuais, Teatro, Música e
Dança e Música na educação básica.
Sendo assim, essa pesquisa objetiva analisar e discutir o processo de
composição musical, dialogando com análise de algumas obras do Cancioneiro
infantil popular brasileiro e de outras canções, que serão apresentadas
posteriormente.
10
4 Metodologia

Neste projeto será realizada uma revisão de literatura para analisar algumas
canções folclóricas apresentadas no Guia Prático (Heitor Villa-Lobos – Guia Prático
para a Educação Artística e Musical – 1º volume, 1º Caderno) e compará-las com
canções infantis tradicionais de determinados países. O objetivo da pesquisa será
descritivo com caráter exploratório e abordagem qualitativa. Para abordar o tema da
Intertextualidade serão utilizadas referências conceituais e bibliográficas
apresentadas em teses, artigos e dissertações acadêmicas observando, em especial,
alguns conceitos levantados por Straus e Bakhtin. Serão abordadas ferramentas
gerais de composição que inclui análise intervalar, perfil melódico, fraseologia e
repetição rítmico/melódica. Também analisaremos a classificação de rimas em
versos das canções, pois a rima, sendo um fenômeno universal, é encontrada em
muitas canções deste trabalho, inclusive em peças estrangeiras.

5 Caminhos para a composição musical

O processo de composição musical apresenta variados caminhos, que


podem ser construídos a partir da “inspiração” de ideias momentâneas ou da
escolha de procedimentos formais para tratar essas ideias. De acordo com Aaron
Copland5 (1974, p. 9), na história da música há três tipos de compositor: 1) aquele
que tem “inspiração espontânea”; 2) o construtivo e 3) o tradicionalista. Cada um
deles concebe a música de uma maneira diferenciada.
Franz Schubert seria um exemplo de compositor de inspiração
espontânea, segundo o autor, que destaca que este é o perfil de compositor que
mais fascina a imaginação das pessoas. Para ele, todos os compositores são
inspirados, mas esse tipo é o de inspiração mais fácil. “A música parece jorrar de
cada um deles. Muitas vezes, eles não são capazes de anotar as ideias na rapidez
em que elas lhes ocorrem” (Copland 1974, p. 9).

5COPLAND, Aaron. What to listen for music (Como ouvir (e entender) música). Brasil: Artenova, 1974
p.9.Disponível em:https://www.hugoribeiro.com.br/biblioteca-digital/Copland-
Como_ouvir_entender_musica.pdf. Acesso em 25 de Novembro de 2021.
11
O segundo tipo, o construtivo, seria exemplificado por Beethoven. De
acordo com o autor, neste caso o compositor começa a trabalhar a partir de um tema
já escolhido.

Beethoven não era absolutamente um compositor ao estilo de Schubert, bem-


amado da inspiração; era obrigado a seguir o caminho mais longo, começando
com um tema, transformando-o em uma ideia germinal, e construindo em cima
disso uma obra completa, em um trabalho diário e exigente. Desde os dias de
Beethoven, esse tipo de compositor tem-se revelado o mais comum. (Copland,
1974 p.9)

O terceiro tipo de compositor seria o chamado tradicionalista, como o


caso de Palestrina e Bach, segundo Copland. De acordo com o autor, ambos
nasceram em um período da história da música, em que um determinado estilo
musical estava prestes a atingir o seu maior desenvolvimento. Neste caso a
composição seria voltada a criar música em um estilo já existente e aceito,
procurando fazê-lo de uma maneira que superasse o que se fizera antes:

O tipo de compositor tradicionalista começa com um padrão em vez de começar


com o tema. O ato criador em Palestrina é menos o da concepção temática do que
o do tratamento pessoal de um padrão bem estabelecido. E mesmo Bach, que
concebeu 48 temas variados e inspirados no seu Cravo Bem Temperado, conhecia
por antecipação o molde genérico em que eles deveriam inscrever-se. Não é
preciso dizer que o período que estamos vivendo foge um pouco ao padrão
tradicionalista. Copland (1974, p.9)

6 Dialogismo e Intertextualidade

Quando falamos sobre Dialogismo e Intertextualidade, observamos que estes


não são conceitos que se limitam ao campo da filosofia ou da linguística. Ambos
estão presentes em tudo o que nos cerca. Nossas decisões, conversas, discursos,
valores, crenças etc tudo é realizado a partir das nossas relações de interação com
o outro. Não somos seres isolados interna ou externamente. Neste contexto a língua
é como uma ponte de interação e comunicação entre os sujeitos para expressar
nossa posição no mundo. Seja verbalmente (sons e letras), ou musicalmente (a
forma musical) nossa linguagem produz sentidos, sendo um produto de interação
social, histórico e cultural.

12
Para abordar a intertextualidade é preciso lançar-se ao conceito de
Dialogismo de Mikhail Bakhtin6. Conforme teorizou o filósofo, a orientação dialógica
é naturalmente um fenômeno próprio a todo discurso. Trata-se da orientação natural
de qualquer discurso vivo. Em todos os seus caminhos até o objeto, em todas as
direções, o discurso se encontra com o discurso do outro e não pode deixar de
participar com ele de uma interação viva e tensa7. (Bakhtin, 1988, p.88)

Apenas o Adão mítico que chegou com a primeira palavra num mundo
virgem, ainda não desacreditado, somente este Adão podia realmente evitar
por completo esta mútua orientação dialógica do discurso alheio para o
objeto. Para o discurso humano, concreto e histórico, isso não é possível.
(FiORIN, 2018, p.21)

De acordo com Baktin8 todos os enunciados no processo de comunicação,


independentemente de sua dimensão, são dialógicos. Neles, existe uma
dialogização interna da palavra, que é perpassada sempre pela palavra do outro. É
sempre e também a palavra do outro. Desta forma o enunciador, para constituir um
discurso, leva em conta o discurso do outro, que está presente no seu. Por isso,
todo discurso é ocupado, atravessado pelo discurso alheio. No dialogismo, são as
relações de sentido que se estabelecem entre dois enunciados.
O filósofo foi um dos pioneiros no estudo da intertextualidade, apesar de não
ter utilizado este termo. Em “Marxismo e Filosofia da Linguagem”9, Mikhail Bakhtin,
articula as primeiras reflexões que darão origem à noção de intertextualidade, a
partir de seu estudo sobre o discurso citado. Ele observa que: “[o] discurso citado é
o discurso no discurso, a enunciação na enunciação, mas é, ao mesmo tempo, um
discurso sobre o discurso, uma enunciação sobre a enunciação” 10 (Bakhtin 1997,

6Mikhail Mikhailovich Bakhtin foi um pensador e filósofo, além de teórico de artes e cultura da Europa.
Considerado um dos maiores estudiosos da linguagem humana, suas obras sobre diversos temas
influenciaram uma infinidade de pensadores de diversas áreas como: crítica da religião,
estruturalismo,semiótica e marxismo.Uma das principais obras de Bakhtin é “Marxismo e Filosofia da
Linguagem”. Fonte: https://www.infoescola.com/biografias/mikhail-bakhtin/. Acesso em 10 de janeiro
de 2022.
7apud MAGALHÃES, L, O. José Luiz Fiorin - Introdução ao pensamento de Bakthin. Lócus: Revista

de História. Universidade Federal de Juiz de Fora. Disponível em:


https://pt.scribd.com/document/496540696/Mikhail-Bakunin-Lucilha-de-Oliveira-Magalhaes-
Introducao-Ao-Pensamento-de-Bakhtin. Acesso em 20 de janeiro de 2022.
8 FIORIN, José Luiz. Introdução ao pensamento de Bakhtin. p.20.
9 Apud ALÓS, Anselmo Peres. Texto literário, texto cultural, intertextualidade. Revista Virtual de
Estudos da Linguagem – ReVEL. V. 4, n. 6, Março de 2006, p.1 Disponível em:
<https://www.academia.edu/44112380/TEXTO_LITER%C3%81RIO_TEXTO_CULTURAL_INTERTEX
TUALIDADE> Acesso em 20 de janeiro de 2022.
10 ALÓS, Op., cit. p.2.

13
p.144). Nesse sentido, Bakhtin11, conceitua que todo texto é construído como um
mosaico de citações; todo texto é a absorção e transformação de um outro.
Em seu artigo “Texto literário, texto cultural, intertextualidade”, Anselmo Peres
Alós (2006, p.1) observa que a literatura se produz como constante diálogo entre
textos e culturas, constituindo-se a partir de permanentes processos de retomadas,
empréstimos e trocas. Ele completa que, Mikhail Bakhtin, ao estudar o romance do
século XIX, estabeleceu a noção de dialogismo - diálogo ao mesmo tempo interno e
externo à obra - que estabelece relações com as diferentes vozes internas e com os
diferentes textos sociais (ALÓS, 2006, p.1). De modo semelhante, Carvalho12 (2018,
p.17) afirma que o dialogismo pode ser entendido como um espaço de interação
entre o eu e o tu ou entre o eu e o outro. O termo “outro” diz respeito ao mundo
social no qual cada sujeito está inserido, significando que nenhum sentido se
constrói sozinho, mas comporta sempre a perspectiva de outra voz. Ou seja, tanto o
sujeito como o discurso resultam da interação social estabelecida com diferentes
segmentos em um mesmo ou em diferentes âmbitos sociais.

Os enunciados não são indiferentes entre si nem se bastam cada um a si


mesmos; uns conhecem os outros e se refletem mutuamente uns nos outros.
Esses reflexos mútuos lhes determinam o caráter. Cada enunciado é pleno
de ecos e ressonâncias de outros enunciados com os quais está ligado pela
identidade da esfera de comunicação discursiva. Cada enunciado deve ser
visto antes de tudo como uma resposta aos enunciados precedentes de um
determinado campo (aqui concebemos a palavra “resposta” no sentido mais
amplo): ela os rejeita, confirma, completa, baseia-se neles, subentende-os
como conhecidos, de certo modo os leva em conta. (BAKHTIN 2011, p. 297
apud CARVALHO 2018, p.18)

Bakhtin13 afirma que o autor não é aquele que apenas manipula o texto, mas
quem avalia outros pontos de vista e os incorpora no seu próprio, resultando em
uma relação dialógica: “A aproximação e o diálogo entre textos é, então, como a

11 Apud GIACOMOLLI, DÓRIS HELENA SOARES DA SILVA. Memória e Intertextualidade em


reparação e mãos de cavalo. Millenium, 46-A. Número Especial temático sobre Literatura, [s. l.], p.
260-272, Novembro 2014. Disponível em: https://repositorio.ipv.pt/bitstream/10400.19/2705/1/16.pdf..
Acesso em 20 de abril de 2022.
12 CARVALHO, Ana Paula Lima de. Sobre intertextualidades estritas e amplas. 2018. 136f. - Tese

(Doutorado) - Universidade Federal do Ceará, Programa de Pós-graduação em Linguística, Fortaleza


(CE), 201 . Disponível em: https://repositorio.ufc.br/bitstream/riufc/39589/9/2018_tese_aplcarvalho.pdf.
Acesso em 10 de janeiro de 2022.
13 GIACOMOLLI, DÓRIS HELENA SOARES DA SILVA. Memória e intertextualidade em reparação e

mãos de cavalo. Millenium, 46-A. Número Especial temático sobre Literatura, [s. l.], p. 262, Novembro
2014. Disponível em: https://repositorio.ipv.pt/bitstream/10400.19/2705/1/16.pdf. Acesso em 25 de
novembro de 2021.
14
consciência humana, formada por exterioridades, pontos de vistas de outrem, que se
encontram”. (GIACOMOLLI 2014, p.262). A autora explica que quando se lê um texto
não lemos apenas palavras; mas também “lemos” a sociedade na qual este está
inserindo. Assim sendo, a “linguagem literária transporta uma dualidade de
significado e dialoga com outros textos e com o contexto histórico” (Giacomolli, 2014,
p.262).
Concordando com Kristeva14, Manfrinato e Dudeque (2013), nenhum texto é
gerado do zero: “os textos preexistentes sempre influenciam os novos textos” .
Paralelo a isso, Fiorin15 (1994, p. 30) diz que “a intertextualidade é o processo
de incorporação de um texto em outro, seja para reproduzir o sentido incorporado,
seja para transformá-lo”.
Para Tania Franco Carvalhal16 a intertextualidade, como propriedade descrita,
tornou-se um procedimento imprescindível à investigação das relações entre os
diversos textos:
Tornou-se chave para a leitura e um modo de problematizá-la. Como
sinônimo das relações que um texto mantém com um corpus textual pré ou
coexistente, a intertextualidade passou a orientar a interpretação, que não
pode mais desconhecer os desdobramentos de significados e vai entrelaçá-
los como a própria origem etimológica da palavra esclarece: texere, isto é,
tecer, tramar. Daí “intertexto”, que significa ‘tecer no, misturar tecendo’ e, de
forma figurada, entrelaçar, reunir, combinar (RUPRECHT 17, 1984). O texto
permite a leitura de intertextos, ou seja, do “conjunto de textos que se pode
aproximar daquele que temos sob os olhos, o conjunto de textos que
encontramos na memória de uma dada passagem’, como definiu Riffaterre
(1979)”. (CARVALHAL, 2006, p.128)

Desta forma tal conceito tem contribuído para os estudos de literatura , uma
vez que “modificou as leituras dos modos de apropriação, de absorções e de
transformações textuais, alterou o entendimento da “migração” de elementos
literários, revertendo as tradicionais noções de “fontes” e “influências” (CARVALHAL,
p.129).

14 DUDEQUE, Norton; MANFRINATO Ana Carolina. Intertextualidade em Dança (Miudinho) da


bachianas brasileiras n. 4, de Heitor Villa-Lobos. In: Encontro Internacional de Teoria e Análise
Musical, 3., 2013, 219. São Paulo. Anais.ECA-USP. : Disponível em:
http://www2.eca.usp.br/etam/iiiencontro/files/comm_Manfrinato_Dudeque_p218-228.pdf. Acesso em
10 de dezembro de.2021.
15 MANFRINATO, DUDEQUE. Op. cit.,p.219.
16 CARVALHAL, Tania Franco. Intertextualidade: a migração de um conceito (2006,128). Revista Via

Atlântica nº9 Jun/2006. USP. Disponível em:<


https://www.revistas.usp.br/viaatlantica/article/view/50046/0 . Acesso em: 10. Jan.2021. Acesso em 5
de janeiro de 2022.
17 Apud CARVALHAL, Op. cit.,p.128.

15
Esse processo de “incorporação” de um texto em outro, no nosso caso, será
analisado em canções infantis de diferentes países com línguas, culturas e
geografias distintas: Argentina, Bolívia, Peru, Brasil, Austrália, China e Japão.
Hipotetizamos que a leitura do nosso intertexto (música) poderá permitir a
criação de uma nova canção a partir do “conjunto de textos que se pode aproximar
daquele que temos sob os olhos, o conjunto de textos que encontramos na memória
de uma dada passagem”, segundo a definição de Riffaterre18.

6.1 A intertextualidade aplicada à música

De acordo com o Groves Music Online 19 , a primeira definição do termo


“intertextualidade” pertinente à música foi dado por Peter Burkholder:

Aplicado à música desde os anos 1980, é um termo mais amplo do que um


empréstimo que, normalmente, concentra-se no uso de uma peça tendo um
ou mais elementos tomados de outra. Assim, a intertextualidade abrange a
utilização de um estilo geral ou linguagem, bem como de uma melodia
emprestada. Além disso, enquanto o empréstimo é uma relação mono
direcional em que uma peça toma emprestada de outra, a intertextualidade
engloba relações mútuas, como quando duas peças desenham a mesma
convenção, mas nenhum dos compositores estava ciente da outra peça.
(PUPIA, 2017, p.17)

Para Lúcia Barrenechea20 (2003, 125) discutir a intertextualidade em música


implica abordar um tema teórico-analítico extremamente interessante, mas
relativamente complexo. Barrenechea remete a Charles ROSEN21 (1980, p. 88) que
afirma que só é possível tratar a influência no universo musical como um caso
hipotético, de evidências incertas. Isso acontece principalmente porque, segundo
Rosen, a intertextualidade está relacionada diretamente com a releitura que o
compositor faz de seus antecessores.

18 Apud CARVALHAL, Op. cit.,p.128.


19 PUPIA, Adailton Sergio. Intertextualidade na Bachianas Brasileiras n.2 de Heitor Villa-Lobos, 2017,
p.17. Disponível em:
https://www.academia.edu/38167875/Intertextualidade_na_Bachianas_Brasileiras_N_2_de_Heitor_Vill
a_Lobos. Acesso em 10 de janeiro de 2022.
20 BARBOSA, Lucas de Paula; BARRENECHEA, Lúcia. A intertextualidade musical como fenômeno.

Per Musi. Belo Horizonte, v.8, 2003. p. 125-136. Disponível em:


http://musica.ufmg.br/permusi/permusi/port/numeros/08/num08_cap_10.pdf. Acesso em 10 de janeiro
de 2022.
21 Apud BARRENECHEA, Op. cit., p.125.

16
O compositor, ao estudar as obras de seus antepassados, reage a esses
trabalhos reinterpretando-os, ou seja, ele usa o material compositivo neles
contidos, segundo uma visão própria, o que implica em transformação
desse material, em tratamento individualizado, segundo seu poder criativo,
sua originalidade. Em decorrência desse processo transformador, a
influência se torna um objeto difícil de ser observado. (BARRENECHEA,
2003, 125)

A autora observa que ao estudarmos a intertextualidade em música devemos


nos aproximar das teorias da influência musical, pensando na obra como esse
espaço formal multidimensional, caracterizado pela intersecção de muitos
estilos.(BARRENECHEA, 2003, p.125). Barrenechea (2003, p.126) fala sobre o
modelo da influência musical de Joseph N. Straus calcado na teoria da influência
literária de Harold Bloom22, por meio da qual, segundo Straus, é possível interpretar
o relacionamento entre a música do século XX e a música dos séculos passados.
Neste contexto a autora cita, conforme Straus, que não apenas a música
neoclássica de Stravinsky foi permeada de elementos da música tradicional, mas
também a música progressista de Schoenberg apresentava referências da música
tradicional.

A música de Stravinsky estava ligada a de seus predecessores,


primeiramente, porque ele “...freqüentemente incorporava formas
específicas ou estruturas, ou peças inteiras do passado em suas
composições... Em segundo lugar, ele radicalmente revisou esses
elementos, refazendo-os de acordo com sua própria imagem. (STRAUS,
1990, p.6) apud BARRENECHEA (2003, p.126)

Já a relação da música de Schoenberg com a música tradicional, se dava


primeiramente porque:

ele sentiu a necessidade de medir o colossal alcance musical de seus


predecessores. Ele conheceu, melhor que muitos, quão memoráveis são a
música de Bach, Mozart, Beethoven e Brahms. Essa música estava
constantemente atrás dele, impondo sua qualidade, diante da qual ele
media a si mesmo... Em segundo lugar, o vasto alcance de seus
predecessores dificultou a Schoenberg compor dentro de uma proposta ao

22 O livro “Angústia da Influência” é a obra mais estudada de Harold Bloom. A expressão, cunhada por
ele, já havia aparecido antes de 1973 no livro “The ringers of the tower”. Bloom foi um audaz defensor
da poesia romântica em um período em que o New Criticism imperava em Yale, seu âmbito
profissional, o que promoveu uma série de calorosos confrontos. Bloom foi considerado pertencente a
um grupo de intelectuais que surgia neste período: Os desconstrutores de Yale. Juntamente com
Geoffrey Hartman, Paul de Man e J. Hillis Miller apresentou uma visão ao mesmo tempo anti-
essencialista e antiformalista da literatura. CASTRO, Daniel Fraga de. A complexidade da Angústia da
Influência de Harold Bloom. Disponível em:
https://editora.pucrs.br/anais/XISemanaDeLetras/pdf/danielfraga.pdf. Acesso em 26 de abril de 2022.
17
mesmo tempo atraente e nova... A riqueza e o peso da tradição o forçaram
a seguir o “duro caminho” de mudar e a desenvolver a linguagem musical. 23
(STRAUS, 1990, p.8)

Segundo Barrenechea, Straus discute a relação de um compositor com seus


antecessores por meio de três modelos intertextuais.
No primeiro, o jovem compositor usa frequentemente elementos do estilo ou
estruturas muito parecidas com a de um professor ou com a de outro compositor
mais velho. Este é o modelo de “influência como imaturidade”, (BARRENECHEA
2003, p.127).
Como exemplo da Teoria da Influência como Imaturidade, François-René
Tranchefort 24 (2004) em seu “Guia da Música de Câmara” trata das primeiras
dezesseis sonatas de Mozart, compostas no início de sua carreira como criança
prodígio. São obras classificadas como “sonatas para teclas com acompanhamento
de violino”. Segundo Tranchefort, entre essas obras encontram-se as sonatas K.10,
K.11, K.12, K.13, K.14 e K.1525 publicadas em 1765. Nelas a influência francesa de
Johann Shobert e a de Johann Christian Bach26, que Mozart acabava de encontrar
pela primeira vez, estão presentes de forma considerável (TRANCHEFORT27,2004,
p. 616).
Essas dezesseis Sonatas de infância são todas em dois ou três
andamentos breves (sendo a primeira de todas, K.6, a única sonata em
quatro andamentos de Mozart). O estilo galante italiano, tal como o cultivava
J.C.Bach, domina, e os primeiros andamentos de forma sonata, cujos
segundos temas só raramente são individualizados, comportam
desenvolvimentos extremamente breves. Realizações pasmosas para uma
criança de oito a dez anos, não se elevam, no entanto, acima da média da
época, e um longo caminho as separa das Sonatas da maturidade de
Mozart. (TRANCHEFORT, 2004, p.617)

23 BARRENECHEA, L. Op. cit. p.126.


24 TRANCHEFORT, François-René. Guia da Música de Câmara. 1ª edição: Outubro de 2004: Gradiva:
Lisboa (Portugal).
25 Outros exemplos com peças de Mozart e J.C. Bach:

Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=FT1syg2u0BI&ab_channel=EGMMusicClassic (Mozart


Flute Sonata K 10 - 15)
Fonte:https://www.youtube.com/watch?v=0D-
3f5JtyFc&ab_channel=SOLRACPILINOELIMPROVISADORCUBANO (MOZART: 5 CONTRADANZAS
KV 609nças).
Fonte:https://www.youtube.com/watch?v=3z9FdfNP7ww&ab_channel=harpsichordVal (Johann
Christian Bach 6 Sinfonias Op.18).
Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=Q_h7kJRBr34 (J. C. Bach - Piano Concertos Op. 7).
26 Johann Christian Bach nasceu em 5 de setembro de 1735. O compositor alemão era o filho mais

jovem de Johann Sebastian Bach. Compôs numerosas obras orquestrais e de câmara, além de
várias óperas. Viveu um bom tempo de sua vida na Inglaterra, motivo pelo qual ficou conhecido como
"o Bach Londrino" ou "o Bach Inglês". Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Johann_Christian_Bach .
27 TRANCHEFORT, F. Op. cit., p.616

18
Figura 1: BACH, J.C.Violino Sonata in D - dur. Op.16 nº1

Fonte: IMSLP28

28Fonte: https://imslp.org/wiki/File:JCBachViolinSonatainD-DurOp16No1.pdf . Acesso em 20 de abril


de 2022.
19
Figura 2: Mozart, W. Amadeus. Violin Sonata in B-flat major. K

Fonte: IMSLP.29

As sonatas anexadas são obras para violino e piano/cravo juntos.


Identificamos em ambas as peças o estilo galante com melodias mais simples,
menos polifonia, o uso da relação harmônica tônica e dominante e a distinção entre
melodia solo e acompanhamento. Também observamos o uso de ornamento como
trinado para embelezar a música. Segundo Tranchefort o gênero híbrido da sonata
para cravo ou pianoforte com acompanhamento de um violino foi de uso quase geral
na literatura musical dos anos 1760-1770. Mondoville30 e os seus sucessores tinham
lançado a sua bases e, como uma grande parte de seus contemporâneos, Johann
Christian Bach e, na sua continuação, o jovem Mozart, submeteram-se a ele”.
(Tranchefort, 2004, p. 16). Observa-se que o violino (ou flauta) funcionava mais
como um acompanhamento ou limitava-se a completar sonoridade do teclado –
dando ao conjunto um certo colorido.
O segundo modelo conhecido como “influência como generosidade” foi
desenvolvido principalmente por T. S. Eliot, objetivando demonstrar a natureza da

29 Fonte: https://imslp.org/wiki/File:TN-Mozart_Werke_Breitkopf_Serie_18_KV10.jpg. Acesso em 20 de


abril de 2022.
30 TRANCHEFORT, F. Op. cit., p.612. Jean-Joseph Cassanéa de Mondoville (1711-1772) foi autor de

uma dezena de obras dramáticas e de várias páginas de música sacra e música instrumental.
20
influência na poesia. Neste caso, a intertextualidade é tratada como um processo de
aprimoramento do artista.

Eliot... vê a influência como um processo de enriquecimento do artista nos


seus anos de formação, como também no período de maturidade.
Suscetibilidade à influência, contudo, não é um sinal de incapacidade, mas
de valor, o principal da tradição é assimilado, o melhor do artista. Mesmo
em trabalhos em que o artista parece muito individual, artistas excepcionais
demonstram consciência do passado.(STRAUS, 1990, p.10 apud
BARRENECHEA 2003, p. 127)

Barrenechea explica que no contexto da teoria da influência como


generosidade, escapa a possibilidade de apreciar a tensão, ou seja, o conflito
gerado no compositor “moderno” pelo contato com a música de tradição tonal.

Devido ao peso que os elementos tradicionais exercem, como também, em


decorrência do reconhecido mérito artístico das obras dos antecessores, o
contato do compositor da primeira metade do século passado com o
trabalho de seus predecessores resultou em conflito. Assim, ao olhar para
trás, o compositor do início de século XX teve que buscar um sentido novo
nos elementos tradicionais, tendo que submetê-los a um radical processo
de transformação. (Barrenechea 2003, p. 127)

Destas três teorias apenas a teoria da “influência como ansiedade” possibilita


uma adequada atenção a essa problemática, conforme observa Barrenechea:

Straus resume em quatro componentes principais a teoria da influência


como ansiedade de Harold Bloom: 1. O poema é uma entidade relativa ou
entidades dialéticas, todo poema é uma releitura de algo já dito; 2. A relação
entre os poemas novos e os antecedentes, reflete mais uma história de luta
que de generosidade e quanto mais esse conflito se refletir no interior do
poema, maior será a sua qualidade artística; 3. A luta entre poemas novos e
seus antecedentes se manifesta na forma de uma releitura ou
reinterpretação; 4. A influência como ansiedade é um fenômeno universal,
não está restrito apenas a um período histórico (STRAUS 31, 1990, p. 12).

Em sua tese “Intertextualidade na Sinfonia nº 8 (1950) de Heitor Villa-Lobos”


Adailton Sergio Pupia observa que, de acordo com Straus (1990), a suscetibilidade à
influência é geralmente vista como imaturidade, em que o jovem compositor
frequentemente utiliza elementos do estilo ou da estrutura musical inspirada em seu
professor ou em outro compositor antecessor.

31 BARRENECHEA, L. Op. cit., p.127.


21
Este tipo de influência é considerado uma indicação de fraqueza artística,
de um trabalho secundário (STRAUS, 1990, p. 9). Um exemplo apontado
pelo autor neste tipo de influência é encontrada na Sinfonia n. 1 (1905-
1907), de Igor Stravinsky, sendo diretamente influenciado por Nikolai
Rimsky-Korsakov, professor de Stravinsky na época em que a obra foi
composta. (PUPIA, 2021, p.9)

Na segunda teoria, “Influência como Generosidade”, é assinalada que


a suscetibilidade à influência não é sinal de incapacidade, mas de valor, onde o
principal da tradição é assimilado “mesmo em obras que parecem mais individuais.
Assim, bons artistas irão demonstrar consciência do passado”32 (STRAUS, 1990, p.
10).
Straus (1990) aponta que, para Eliot, as obras do passado têm impacto
decisivo em qualquer trabalho posterior: “na visão de Eliot, a verdadeira criatividade
artística envolve abnegação, uma vontade de abrir e de se subordinar à influência do
passado”.33 (STRAUS, 1990, p. 10)
Nesta teoria são consideradas as homenagens. O material produzido remete
à obra do compositor admirado, trazendo um tipo de releitura da obra homenageada.
Como exemplo podemos citar a admiração recíproca entre os compositores Brahms
e Schumam, e Béla Bartok em sua admiração por J.S.Bach.
A peça Nº 79 do “Mikrokosmos volume III” de Béla Bartók é um exemplo de
“Influência como Generosidade”. A obra se intitula “Hommage a J.S.B.” e faz uma
homenagem ao compositor Johann Sebastian Bach apresentando as técnicas de
contraponto, inversão e espelhamento e utilização dos temperamentos maior/menor.

32 PUPIA 2021, 9. Intertextualidade na Sinfonia n.8 (1950) de Heitor Villa-Lobos. Tese de Doutorado.
Departamento de Música da Universidade Federal do Paraná, 2021, p. 14. Disponível em:
https://www.academia.edu/49800713/Intertextualidade_na_Sinfonia_n_8_1950_de_Heitor_Villa_Lobo
s. Acesso em 29 de março de 2022.
33 PUPIA, A.S, Op. cit.,. p.9 e 10.

22
Figura 3: Hommage a J.S.B

Fonte: Mikrokosmos34

Figura 4: BWV 856, Prelúdio in F

Fonte: IMSLP35

34 BARTÓK, Béla. Mikrokosmos, volume III, nº 79.


35 Fonte: https://imslp.org/wiki/File:BWV0856.pdf. Acesso em 20 de abril de 2022.
23
Em relação à Teoria da Influência como Ansiedade, Straus aponta que essa
teoria é relativamente nova e relevante para entender a música do século XX,
apresentando uma importante interação de elementos contrastantes e conflitantes.36
(STRAUS, 1990, p. 12)
Nesse sentido, Straus apresenta oito estratégias composicionais igualadas às
proporções revisionárias (reformuladas), que serão explicadas adiante: a
motivização, a generalização, a marginalização, a centralização, a compressão, a
fragmentação, a neutralização e a simetrização.
A motivização apresenta o conteúdo motívico da obra anterior de forma mais
intensificado. A generalização ocorre quando um motivo de uma obra anterior é
inserido em um conjunto de notas sem ordem. Na marginalização os elementos
musicais centrais na estrutura de uma obra anterior passam a desempenhar um
papel secundário na nova obra. O oposto disso, na centralização os elementos
musicais secundários em uma obra anterior adquirem papel principal na nova obra.
Na técnica de compressão os elementos que ocorrem diacronicamente em uma
obra anterior são comprimidos em algo sincrônico na nova obra. Na fragmentação,
os elementos que ocorrem juntos em uma obra anterior são separados na nova obra.
Na neutralização os elementos musicais tradicionais têm suas funções costumeiras
canceladas. Já na simetrização as progressões harmônicas e as formas musicais
tradicionalmente direcionais são invertidas ou simetricamente retrógradas. 37

(STRAUS, 1990, p. 17)


Ainda na Influência como Ansiedade o compositor tenta deliberadamente
evitar qualquer referência direta com o passado, apesar de que tudo o que é
composto de novo já recebeu influência do passado. Nesta ansiedade, quanto mais
ele tenta desvencilhar-se e fazer algo original, mais ele se depara com o passado.
A relação reflete uma situação desafiadora, uma vez que o compositor quer
conscientemente romper com o passado, mas para isso acaba fazendo uso dele.
Como exemplo citamos Schoenberg que, apesar de destruir a hierarquia tonal,
continua a fazer uso de formas antigas como Giga, Minueto, Gavota, Valsa etc para
apoiar as “formas novas”38.

36 PUPIA, Adailton Sergio,. Op. cit. p.10.


37 Apud PUPIA, Adailton Sergio, Op. cit. p.11. PUPIA.
38 A influência como ansiedade é um fenômeno universal, não está restrito apenas a um período

histórico (STRAUS, 1990, p. 12) apud BARBOSA; BARRENECHEA (2003,127). Disponível em:
24
Outro exemplo de Influência por Ansiedade é a composição “Reimagining
Vivaldi39” de Max Richter. Ele estrutura a sua obra a partir do ciclo de Concerti
Grossi – “As Quatro Estações” do compositor do período barroco italiano Antonio
Vivaldi, mas quebra uma série de paradigmas ao fazer um releitura através de
desconstrução e reconstrução da obra original), atualizando a música de Vivaldi para
os dias atuais. Observamos ainda que Richter utiliza a estratégia composicional da
fragmentação e collage em sua peça, uma vez que elementos que estavam juntos
na obra original de Vivaldi são separados e “colados” em sua releitura.

Figura 5: VIVALDI, Antonio. Concerti Grossi - As quatro estações - Primavera

Fonte: IMSLP40

http://musica.ufmg.br/permusi/permusi/port/numeros/08/num08_cap_10.pdf. Acesso em 10 de abril


de.2022.
39 Max Richter in Concert: Reimagining Vivaldi.
https://www.youtube.com/watch?v=Ebm69gW9UlI&t=2075s&ab_channel=NPRMusic .
40 Fonte: https://imslp.org/wiki/File:Spring-score-a4.pdf. Acesso em 20 de abril de 2022.

25
Figura 6: RICHTER, Max. Vivaldi - The Four Seasons - Spring 1

Fonte: Nkoda41

Ao compararmos uma peça com a outra, percebemos que nessa


“reimaginação” Richter utiliza elementos contrastantes e conflitantes em relação à
obra original 42 . Aplicaremos o conceito de Montagem do cineasta russo Sergei
Eisenstein para analisar o trabalho de Richter. Segundo PEREIRA43, ao referir-se à
montagem, Eisenstein fala sobre a justaposição. Nesse sentido, sempre que dois
fatos são apresentados simultaneamente – seja na arte ou em nossa vida
cotidiana – estamos acostumados a fazer uma síntese dedutiva destes, uma espécie
de interpretação.

41 Fonte: https://www.nkoda.com/instrument?ref=0e84f3cf-d17a-4496-9688-9491431531a3. Acesso


em 20 de abril de 2022.
42 Max Richter in Concert: Reimagining Vivaldi.
https://www.youtube.com/watch?v=Ebm69gW9UlI&t=2075s&ab_channel=NPRMusic .
43 PEREIRA, Valéria Sabrina. Montagem e Colagem na obra de Walter Kempowski. Revista de Letras,

São Paulo, v.50, n.1, p.185-198, jan./jun. 2010. Disponível em:


https://periodicos.fclar.unesp.br/letras/article/view/3171/2897 . Acesso em 15 de maio de 2022.
Acesso em 15 de maio de 2022.

26
Assim o que importa na montagem não são as características dos elementos
isolados, pois:
[...] através de sua união não parece a simples soma de um plano mais
outro plano – mas o produto. Parece um produto – em vez de uma soma
das partes – porque em toda justaposição deste tipo o resultado é
qualitativamente diferente de cada elemento considerado isoladamente.
EISENSTEIN44, 2002, p.16).

Ilustrando melhor o que seria este produto, Eisenstein cita a união das células:

O plano não é um elemento da montagem. / O plano é uma célula da


montagem. / Exatamente como as células, em sua divisão, formam um
fenômeno de outra ordem, que é o organismo ou embrião, do mesmo modo
no outro lado da transição dialética de um plano há a montagem. / A colisão.
O conflito de duas peças em oposição entre si. [...] Montagem é conflito.
(EISENSTEIN45, 2002, p.43)

A montagem só é válida quando causa conflito entre suas partes de forma


que dele possa irromper algo novo. Este conflito, entretanto, não é causado somente
pela ação do autor, ele depende da interação do espectador no processo de criação.
Na montagem, o espectador precisa criar, trilhar o mesmo caminho que o autor, pois
não recebe a obra pronta e digerida. (PEREIRA, 2010, p.186).
Dialogando com o conceito de Montagem de Eisenstein, no qual há o efeito
de “choque” ou “estranhamento”, observamos que a obra de Max Richter também
apresenta esses efeitos, uma vez que, ao propor uma “reimaginação” da obra de
Vivaldi, aparecem elementos contrastantes e conflitantes em relação à música
original. Assim, utilizando a técnica de Montagem, Richter faz uma intervenção na
peça do compositor italiano. Sua música pode ser classificada como uma montagem,
como ideia de justaposição, pois ele recorta fragmentos e os coloca em outro lugar,
transformando assim, a obra original Por isso, ele a nomeia de “Reimagining Vivaldi”.
Em seu livro Música Dispersa46 (2018) o Rúben López-Cano47 observa que
intertextualidade é a “capacidade cognitiva que nos permite detectar ligações e
semelhanças entre duas ou mais peças”. Para ele, uma obra pode ser revisada,

44 PEREIRA. Op. cit. p.185


45 PEREIRA. Op. cit. p.186.
46 LÓPEZ-CANO, Rúben. Música Dispersa: apropiación, influencias, robos y remix en la era de la

escucha digital. Musikeon Books, Barcelona, 2018. In: PUPIA, Adailton Sergio. “Intertextualidade na
sinfonia nº8 (1950) de Heitor Villa-Lobos”. Tese de Doutorado. Departamento de Música da
Universidade Federal do Paraná, 2021, p. 14. Disponível em:
https://www.academia.edu/49800713/Intertextualidade_na_Sinfonia_n_8_1950_de_Heitor_Villa_Lobo
s. Acesso em 29 de março de 2022.
47Apud PUPIA, Adailton Sergio, Op. cit., p.14.

27
organizada ou reescrita por seu autor ou outro compositor por diversos motivos,
caracterizando a transformação de um original. A alteração pode ser realizada de
forma substitutiva (correção de erros) ou acumulativa (nova versão).
O teórico aborda cinco tipos de intertextualidade: citação, paródia,
transformação de um original, tópica e alusão.
A citação seria o caso mais evidente de intertextualidade, ocorrendo quando
o compositor se refere a outra obra de si mesmo (nesse caso, auto-citação) ou de
outro compositor:
Para que aconteça a citação, a referência intertextual deve ser forte e clara
(na maior parte do tempo, a citação contrasta com o restante da música);
deve ser realizada sobre uma obra reconhecível e específica, embora o seu
nome ou autor seja desconhecido; deve haver intencionalidade,
reconhecida e dosada, pois, do contrário, se incidiria plágio e deve existir
certa literalidade entre a obra original e sua citação, pois a forte
transformação de um original se torna outro caso de intertextualidade.
(LÓPEZ-CANO, 2007, p. 31) apud PUPIA (2021,13 e 14)

A paródia se refere ao uso de um tema ou ideia de uma obra específica como


ponto de partida para a composição de outra obra. O termo pode soar como uma
imitação satírica ou irreverente, mas faz referência ao retrabalho de um material
original.
O tópico (ou tópica) refere-se a uma obra escrita em um determinado estilo,
para um estilo, gênero, ou tipo de música diferente. A referência não é realizada por
uma obra específica e reconhecível como tal, mas por amplas áreas genéricas sem
paternidade autoral específica, sendo um processo intextextual bem interessante.
Já a alusão ocorre quando há vagas menções a estruturas, sistemas ou
procedimentos gerais que uma obra faz em relação ao estilo geral do autor, ao tipo
de música, ou de uma cultura musical. “A alusão não é óbvia e exige que o autor ou
o especialista indique a sua existência”.48 (LÓPEZ-CANO, 2007, p. 36).
Em sua obra “A estética intertextual na música contemporânea:
considerações estilísticas” a musicóloga Ilza Nogueira 49 observa a relação

48 LÓPEZ-CANO, Rúben. Música Dispersa: apropiación, influencias, robos y remix en la era de la


escucha digital. Musikeon Books, Barcelona, 2018 apud PUPIA (2021,14). Acesso em 29 de março de
2022.
49 NOGUEIRA, Ilza. A estética intertextual na música contemporânea: considerações estilísticas.

Brasiliana (v. 13). 2003, p. 2-12. : In: PUPIA, Adailton Sergio. Intertextualidade na bachianas
brasileira n.2 de Heitor Villa-Lobos. Dissertação de Mestrado. Departamento de Artes e Música da
Universidade Federal do Paraná, 2017, p. 16. Disponível em:
https://www.academia.edu/38167875/Intertextualidade_na_Bachianas_Brasileiras_N_2_de_Heitor_Vill
a_Lobos . Acesso em 10 de dezembro de 2021.
28
intertextual em obras de compositores brasileiros contemporâneos. O estudo tem
como objetivo “mostrar e avaliar motivações e propósitos diversos no uso da
apropriação intelectual, tais como a expressão ideológica e o recurso estilístico”
(NOGUEIRA, 2003, p. 2).
Nogueira tem como referencial a teoria de Affonso Romano Sant’Anna 50 ,
apresentada em seu livro Paródia, Paráfrase & Cia, de 2007. Nogueira utiliza as
quatro categorias intertextuais oferecidas por Sant’Anna, correlacionando-as com as
obras analisadas. Estes quatro tipos de intertextos se situam entre o hibridismo e a
fusão estilística, havendo “diversos graus de integração ou desvio de sentido ou
estilo entre um texto e intertextos atuantes, resultantes do propósito da semelhança
ou da diferença” (NOGUEIRA51, 2003, p. 3):

A apropriação é caracterizada como uma técnica de articulação de textos


alheios num contexto variado, como em uma colagem ou montagem.
Desassociado dos seus contextos originais, os textos apropriados estão
sujeitos a uma nova leitura. A paródia inverte o sentido do objeto parodiado,
geralmente concretizando a crítica, a contestação, definida como a
intertextualidade das diferenças. A estilização inova sem subverter, perverter,
ou inverter o sentido. Possibilita a introdução de um tratamento pessoal no
discurso, uma reforma, sem modificação essencial da estrutura. Já a
paráfrase é a reafirmação, em termos diferentes, do mesmo sentido de uma
obra, definida como a intertextualidade das semelhanças. (NOGUEIRA,
2003, p. 3-4)

7 A intenção do compositor

Em seu artigo “The Composer's Intention” Edgar F. Jacques 52 (1891) fala


sobre o processo composicional dos três maiores compositores da tradição clássica
ocidental: Beethoven, Mozart e Haydn. O autor aborda conceitos como a intenção do
compositor e os processos consciente e inconsciente que caracterizam suas obras.

50 SANT’ANNA, Afonso Romano de. Paródia, paráfrase & Cia. São Paulo: Ática, 2007. In: PUPIA,
Adailton Sergio. Intertextualidade na bachianas brasileira n.2 de Heitor Villa-Lobos. Dissertação de
Mestrado. Departamento de Artes e Música da Universidade Federal do Paraná, 2017, p. 16.
Disponível em:
https://www.academia.edu/38167875/Intertextualidade_na_Bachianas_Brasileiras_N_2_de_Heitor_Vill
a_Lobos> . Acesso em 10 de dezembro de 2021.
51 SANT’ANNA, Op. cit., p.16.
52 JACQUES, Edgar F. The Composer's Intention. Fonte: Proceedings of the Musical Association, 18th

Sess. (1891 - 1892), pp. 35-54. Acesso em 10 de janeiro de 2022. p, 36.


29
Ao analisar o caso de Mozart, Jacques descreve trechos de uma carta que o
compositor escreveu para seu amigo Salzburg para falar sobre sua forma de
composição:

Quando eu sou, por assim dizer, completamente eu mesmo, inteiramente


sozinho, e de bom ânimo – digamos, estando sozinho, numa carruagem,
caminhando após uma boa refeição, ou durante a noite quando não consigo
dormir... As ideias assim fluem melhores e abundantemente. De onde e
como elas vêm eu não sei e nem posso forçá-las. As ideias que me
agradam eu as retenho na memória, e estou acostumado a cantarolá-las
para mim mesmo. Se as coisas continuarem desse jeito, logo me ocorre
‘pegar um naco delas e fazer um bom prato’, isso é ajustá-las às regras do
contraponto, às peculiaridades dos instrumentos etc. "Tudo isso incendeia
minha alma, e, desde que eu não seja perturbado, meu assunto se amplia,
se torna metodizado e definido (JACQUES, 1891, p. 36). (Tradução nossa).

Jacques comenta que Mozart, por conta de sua aptidão especial, teria um
cérebro que funcionava mais ou menos automaticamente, uma vez que ele escrevia
o que a sua imaginação ouvia.
Por outro lado, o teórico aponta que haveria outra classe de compositores que
produziria de forma mais “consciente”, como Beethoven, por exemplo.

Os cadernos de desenho de Beethoven, é claro, já ocorreu a vocês como


um caso em questão. Um estudo muito pequeno desses inestimáveis
registros irão convencer os mais céticos de que na composição de cada
uma de suas obras, Beethoven não apenas teve uma forte ", intenção", mas
foi capaz de mantê-la firmemente diante dele enquanto ele buscava os sons
musicais exatos mais adequados para expressá-los. (JACQUES, 1891, p.
40).

De acordo com o Jacques, Mozart era um desenhista mental e Beethoven


material. “O primeiro continuou em seu cérebro o processo que este último elaborou
no papel- “et voila tout”53.
Sobre o processo consciente, ele afirma: "E se essa visão for correta,
devemos aceitar o palavra 'Intenção’ como a melhor disponível, nas circunstâncias,
para ambas as classes de compositores - os conscientes e os inconscientes”
(Jacques, 1891,40). Em uma conversa com Neate, Beethoven teria dito: "sempre
tenho uma imagem em minha mente quando componho e trabalho para isso (1891,
p.41).

53A expressão francesa 'et voilá tout' se traduz literalmente como “e eis tudo” é corresponde
superficialmente à interjeição de surpresa "pá pum" . (Antonio Celso Ribeiro).
30
Para Jacques é evidente que não é impossível que Mozart possa ter
composto sua música sob a influência de sentimentos ou Ideias; na verdade, porém
é possível pensar de outra forma quando ouve-se suas melhores obras. “Mas Mozart
parece ter estar inconsciente disso ou por ter considerado isso como um problema
isso iria cuidar de si mesmo”, afirma Jacques.
Beethoven tinha uma imagem, fazia o rabisco e compunha inspirado naquilo.
Mozart geralmente ouvia a música inteirinha na cabeça dele e escrevia tudo. Sobre
Haydn, considerado o pai da Sinfonia Clássica, Jacques afirma que ele é mais
legitimamente o precursor de Beethoven:

(...). Lemos que, quando estava para compor, ele imaginava um pequeno
romance que poderia lhe fornecer sentimentos e cores musicais; e, ainda,
que quando disposto à ternura e à melancolia, anotava temas para adágios
e andantes, e quando de bom humor, temas para árias e minuetos.
(JACQUES, 1891,p. 41)

8 Processos da Composição Musical

Ao abordar o processo de composição e improvisação na proposta


pedagógica, Koellreutter (1987)54 explica que o processo de composição acontece
em quatro fases: a conscientização da ideia, a concepção formal, a escolha do
repertório dos signos musicais e a sua estruturação.
O primeiro estágio da composição envolve o mundo extramusical (ideias
abstratas) e o material sonoro (qualquer fonte sonora). Na segunda fase, chamada
de concepção formal, há a formulação da ideia geral, tal como um projeto da
composição.
Já na escolha do repertório dos signos musicais é selecionado o material
para ser usado na obra, utilizando-se dos recursos e seus aspectos sonoros,
preparando para o quarto estágio. Para o autor, neste último dão-se as relações
estruturais (repetição, variação, pontos de referência), articulação (contrastes,
tensão e repouso, densidade e rarefação, dissonância e consonância, etc.) e a

54GERALDES. Métodos de pré-iniciação de Piano para crianças em idade pré-escolar, 2017,p.17.


Disponível em: METODOS_DE_PRE_INICIACAO_DE_PIANO_PARA_C.pdf . Universidade Católica
de Santos. Trabalho de Conclusão de Curso, 2011, p.17. Acesso em 02 de dezembro de 2021.
31
forma, dando origem a uma obra que segundo Koellreutter 55 é a ideia realizada e
terá influência no mundo extramusical.
No caso das canções infantis é importante lembrar que há muitos estudos
que abordam a grande influência que a música exerce sobre a criança em sua vida
cotidiana. Pode-se fazer música para criança com o intuito de educar, trabalhar sua
musicalidade, interação, socialização, coordenação motora ampla e fina, expressão
rítmica desenvolvimento corporal, comportamentos etc. Cada compositor trabalha de
acordo com o seu objetivo e particularidades.
Vale lembrar, entretanto, que ao pensar em compor um repertório infantil é
importante considerar alguns elementos, tais como: o ritmo a ser utilizado, a
linguagem simples, melodia curta, tessitura que não ultrapasse muito uma oitava
(para cantar), repetição e rimas para assimilar a letra, figuras de linguagem como
metáforas, além da mensagem da letra estar de acordo com os períodos melódicos
(suspensivo e conclusivo), entre outros.
GAINZA56(1982, p.23) observa que é necessário cuidado para que a música
para crianças esteja dentro do nível de recepção de alturas, intensidade e timbres
considerados adequados para o ouvido infantil:

Quando uma criança bem pequena atua como receptora de sons, reclama –
chorando ou tapandos os ouvidos – se a altura ou intensidade desses sons
ultrapassar o limiar de saturação de seu sistema receptor (Sabe-se que o
som, nos limites extremos de seus parâmetros, irrita – por evocar
sensações limítrofes... A necessidade de permanecer – como regra geral –
dentro do nível ótimo de recepção de alturas, intensidade e timbres,
estende-se ao longe da primeira infância, a tal ponto que consideramos
sumamente nocivo acostumar prematuramente as crianças a aceitarem
situações sonoras de caráter extremo (o volume, o timbre, a intensidade
etc.), como seria o caso de certos exemplos de música contemporânea –
erutida e popular – que deveriam der classificadas de “não indicadas” para
crianças pequenas, anciãos e enfermos, porque tendem a dessensibilizar o
sistema defensivo natural que todo indivíduo tem em seus sentidos e que
lhe adverte sobre situações anormais ou de perigo. (GAINZA,1982,23).

Assim, selecionamos para análise canções brasileiras do Guia Prático para a


Educação Artística e Musical – Heitor Villa-Lobos – 1º Volume –1º Caderno que se

55GERALDES, Op.cit., p.17


56GAINZA, Violeta Hemsy. Estudos de pedagogia musical. Summus Editora Editorial LTDA: São
Paulo,1982. Disponível em: https://books.google.com.br/books?hl=pt-
BR&lr=&id=kXuIxOBl7IsC&oi=fnd&pg=PA21&dq=gainza+m%C3%BAsica&ots=cxzPsYft-
f&sig=QvKe7-
fTTwMKEkDnHrMiFbU1vnM&redir_esc=y#v=onepage&q=gainza%20m%C3%BAsica&f=false. Acesso
em 20 de maio de 2022.
32
encontram dentro das características citadas anteriormente e suas relações
intertextuais com cantigas infantis de vários países e suas influências na
composição de cantigas infantis originais pelo autor dessa monografia. Nesse
contexto, à luz da intertextualidade, analisaremos melodia, textura e ritmo das
canções infantis relacionando-os intertextualmente com os conceitos aventados
nessa monografia sempre que for pertinente.
A partir disso, citando o processo de composição a partir de Koellreutter,
observamos como ocorrem as relações estruturais e de articulação nas cantigas
infantis analisadas neste trabalho.

9. Canções
9.1 “Cai, cai, balão”

Essa peça 57 apresenta repetição melódica e de letra em sua estrutura,


possuindo forma bipartida. A parte “A” da música que se inicia com a frase “Cai, cai,
balão” é repetida textualmente duas vezes apresentando desenho melódico
descendente enquanto a frase da parte “B” “Não cai não” é repetida três vezes, mas
com desenho melódico ascendente. Essa configuração apresenta contrastes na letra
e na melodia, mas dando coerência entre letra e música.

57 BARBOSA, Maria Clara; BARBOZA Sérgio; LAGO, Manoel Aranha Corrêa. Heitor Villa-Lobos
(estudo folclórico musical) Guia prático para a Educação Artística e Musical. 1º Caderno. Funarte: Rio
de Janeiro. 2009, p. 21.
33
Figura 7: Cai, cai, balão

Fonte: Caderno 1- Villa-Lobos58

Do ponto de vista da articulação, na linha melódica principal predominam-se


os intervalos de segunda maior, menor e terça maior. Observamos que as frases “Na
rua do Sabão” e “Cai aqui na minha mão” apresentam o desenho melódico similar
entre si, mas com mudança da letra e sutil variação de perfil melódico na segunda
frase, à guisa de conclusão. Apesar disso, o final das frases possui uma pequena
variação. A frase “Na rua do Sabão” começa no final do segundo tempo (tempo fraco)
do compasso binário com terminação suspensiva. Já a frase “Cai aqui na minha
mão” é ligeiramente mais longa e funciona como conclusão da canção. A forma
dessa música é “A – A1”.
Importante acrescentar que além da repetição e contraste, a melodia é
simples, curta, o compasso binário é simples, há pouca variação de figuras rítmicas
(mínima, semínima, colcheia e semicolcheia) e o andamento é Allegretto59. A canção
começa numa anacruse e é cantada originalmente a duas vozes, mas com texto
único, repetição e sincronia entre as vozes, a textura é monódica e a tessitura da
melodia é de 6ª maior. Não há modulação nessa peça. Na melodia, predominam-se
os desenhos intervalares em graus conjuntos com eventuais saltos de terça e quarta

58 Fonte: BARBOSA, Maria Clara et al. Heitor Villa-Lobos, Guia Prático para a Educação Artística e
Musical – 1º Volume, 1º Caderno.
59 Andamento Moderadamente rápido (112–120 bpm). Fonte: https://mosaicmusicinstruction.com/wp-

content/uploads/2018/07/basic-tempo-markings.pdf
34
que ‘aceleram’ a mudança de registro ou do perfil melódico. Essa peça faz uso de
procedimento simétrico, ocorrendo uma modificação rítmica da melodia e inversão
do seu conteúdo motívico.
Além de proporcionar entretenimento e diversão, esta canção pode ser
usada como instrumento pedagógico-educacional e de sociabilidade para a criança,
uma vez que contribui para o conhecimento e permanência de uma das tradições
brasileiras mais celebradas que são as festas juninas.
Observamos que o desenho intervalar da frase “Cai cai balão” é
descendente, concordando com a ideia de um balão que está caindo. De forma
lúdica, a criança abaixa, gira, levanta etc, acompanha com o corpo tudo o que está
proposto na partitura sem precisar ter conhecimento dela. A criança faz os
movimentos de abaixar, levantar, chachoalhar para o lado, tocar a própria mão etc.
seguindo uma coerência entre texto, melodia e ritmo. Tais movimentos realizados na
brincadeira estimulam a sua orientação espacial. Assim, a criança aprende a
localizar o que está a sua frente ou atrás, acima ou abaixo, perto ou longe de outro
colega desenvolvendo a noção em relação ao seu próprio corpo e interage
socialmente. Outro elemento que observamos na letra dessa canção é a rima,
fundamental para o aprendizado, pois estimula a memória auditiva, que está ligada a
consciência fonológica60.

Os pesquisadores Briant e Bradley (1987) observaram que a sensibilidade


da criança para as rimas e aliterações (repetições de fonemas no início, no
meio ou no fim das palavras) tem relação com o bom desempenho na
leitura. Seus estudos mostram que as estratégias fonológicas empregadas
para ler são extremamente úteis durante a leitura e podem ser
enormemente facilitadas pelos recitativos. (MAFFIOLLETI61)

60 A consciência fonológica pode ser entendida como um conjunto de habilidades que vão desde a
simples percepção global do tamanho da palavra e de semelhanças fonológicas entre as palavras até
a segmentação e manipulação de sílabas e fonemas (Bryant &Bradley, 1985). Scielo. Disponível em:
https://www.scielo.br/j/pee/a/Zs83Yfc4wRLFPgp5ZbQLFBb/?lang=pt#:~:text=A%20consci%C3%AAnc
ia%20fonol%C3%B3gica%20pode%20ser,(Bryant%20%26Bradley%2C%201985). Acesso em 20 de
maio de 2022.
61 MAFFIOLETTI, L. A. . A dimensão lúdica da música na infância. In: XIV Encontro Nacional de

Didática e Prática de Ensino, 2008, Porto Alegre, RS. Trajetórias e processos de ensinar e aprender:
sujeitos, currículos e cultura. Porto Alegre, RS : EDIPUCRS, 2008. Disponível em:
https://www.researchgate.net/profile/Leda-
Maffioletti/publication/322633982_A_DIMENSAO_LUDICA_DA_MUSICA_NA_INFANCIA/links/5f31d2
afa6fdcccc43beed41/A-DIMENSAO-LUDICA-DA-MUSICA-NA-INFANCIA.pdf> Acesso em 23 de maio
de 2022.
35
A rima desta canção é simples, pois apresenta uma sequência de repetição
similar entre os versos.

“Cai cai balão (a)


Na rua do sabão (a)
Não cai não (a)
Cai aqui na minha mão” (a)

9.2 A canoa virou

Figura 8: A canoa virou

Fonte: Caderno 1 Villa-Lobos 162

“A canoa virou, (a)


deixá-la virar, (b)
por causa de Fulana (c)
que não soube remar”. (b)

A canção “ A canoa virou”63 apresenta compasso binário acéfalo e simples


com três figuras rítmicas na melodia (mínima, colcheia e semicolcheia). A tessitura é
de 7ª maior e o andamento é um Alegretto. Melodicamente predomina-se os
desenhos intervalares com segundas maiores e menores. Há também saltos de 3ª

62 BARBOSA, Maria Clara et al. Heitor Villa-Lobos, Guia Prático para a Educação Artística e Musical –
1º Volume, 1º Caderno.
63 Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=3cDsvBPn-mQ&ab_channel=GalinhaPintadinha . Acesso

em 13 de junho de 2022.
36
menor e maior, 4ª justa e aumentada. A forma da peça é bipartida com estrutura “A –
A1” e sua rima alternada (abcb).
. “A canoa virou” não tem constrastes melódicos como na canção anallisada
anteriormente. A primeira frase, o antecendente, é formada pelo motivo; a segunda
frase, o consequente, se baseia fortemente na estrutura do antecedente.
A textura melódica da peça é monódica, mas o arranjo apresentado por Villa-
Lobos é polifônico. Neste caso, a voz superior canta a melodia principal e a voz
inferior, à guisa de acompanhamento, reproduz onomatopeicamente o barulho dos
remos: ‘schxê’ ‘schxê’, criando uma ambientação sonora das águas a partir dessa
figura de linguagem, além de reforçar a ideia de que “fulana não soube remar”.

9.3. Fui no Itororó

A peça dialoga com a canção “A canoa virou”. Uma vez que apresentam
semelhanças entre si podem ser classificadas na Teoria da “Influência como
Generosidade” e ao conceito de citação intertextual. As duas canções possuem
padrão motívico similar, assim como a melodia e o mesmo tipo de ritmo com
pequenas variações e letras/versões diferentes. Relembrando o conceito de López-
Cano64 “a citação é forte e clara e contrasta com o restante da música que acontece
quando o compositor se refere a outra obra de si mesmo (nesse caso, auto-citação)
ou de outro compositor”. Vale ressaltar que a forma da “Fui no Itororó65” tem parte
“B”, diferentemente de “A Canoa virou”, que possui a estrutura “A – A1”, sendo,
portanto, uma canção estrófica. Em relação ao posicionamento dos versos, a rima é
alternada (aabcb). Nessa canção aplica-se a estratégia composicional da
motivização, uma vez que ela repete o conteúdo motívico da obra “A canoa virou” e
acrescenta uma nova parte contrastante.

64Apud PUPIA, Op. cit., p.14.


65Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=zliELbZjBrI&ab_channel=GalinhaPintadinha. Acesso em
13 de junho de 2022.
37
“Fui no Itororó beber água e não achei. (a)
Encontrei bela morena que no Itororó deixei. (a)
Ó Mariazinha, Mariazinha (b)
Entrará na roda (c)
e ficará sozinha.” (b)

Figura 9: Fui no Itororó

Fonte: Pinterest66

66Fonte:https://www.google.com.br/search?q=fui+no+itoror%C3%B3+partitura&tbm=isch&ved=2ahUK
Ewjj4PiUosL4AhXJuZUCHW-kBl8Q2-
cCegQIABAA&oq=fui+no+itoror%C3%B3+partitura&gs_lcp=CgNpbWcQAzoECCMQJzoGCAAQHhAH
OgQIABAYOgQIABAeOgYIABAeEAVQlARY0xVgziVoAHAAeACAAe4BiAGiDZIBBjAuMTAuMZgBAKA
BAaoBC2d3cy13aXotaW1nwAEB&sclient=img&ei=Aa2zYqPcJsnz1sQP78ia-
AU&bih=694&biw=1517#imgrc=-3gaYrPsjPrfDM. Acesso em 10 de abril de 2022.
38
9.4 A gatinha parda I

Figura 10: A gatinha parda I

Fonte: Caderno 1 – Villa-Lobos67

“A minha gatinha parda (a)


Em janeiro me fugiu (b)
Quem achou minha gatinha? (c)
Você sabe? Você sabe, você viu?” (b)

“A gatinha parda I” 68 é um canto orquestrado para duas vozes. Apresenta


compasso quaternário simples e quatro figuras rítmicas na melodia principal
(semibreve, mínima, semínima e colcheia). Sua tessitura é de 7ªM e sua rima é
Alternada (abcb)
Os desenhos intervalares incluem segundas maiores e menores e eventuais
saltos de 3ª menor descendente, 4ª aumentada ascendente e 5ª justa ascendente. O
compasso é tético e o seu andamento é Moderato 69 . A música começa com a
onomatopéia “Miau” que é representada por uma apogiatura da nota Dó (colcheia)
para a nota Si (semibreve). Para enfatizar a primeira pergunta “Quem achou minha

67 Fonte: BARBOSA, Maria Clara et al. op.cit.35.


68 Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=EBH-JAzuVUo&t=1395s&ab_channel=NelsondeCampos.
Acesso em 13 de junho de 2022.
69 Moderadamente (108–120 bpm).

39
gatinha?” o ritmo é escrito com colcheia pontuada e semicolcheia em intervalos de
2ª maior ascendente, sugerindo, provavelmente, o senso de urgência em encontrá-la.
No final da frase “parda” aparecem mínimas com salto de 3ª menor descendente e
são utillizadas notas mais longas possivelmente para descrever com mais atenção
uma característica da gata. Há um salto de 5ª justa para começar a letra de “Em
janeiro me fugiu”. O salto mais longo aqui serve para enfatizar o lamento do dono.
Na parte “Você sabe? Você sabe? Você viu?” As perguntas repetidas em sequência
possuem o mesmo padrão ritmico de colcheias e desenho melódico descendente.
As perguntas em movimento descendente podem sugerir que o dono está
desanimado ou desesperançoso sobre a possibilidade de reencontrar sua gatinha.
Aqui as colcheias sem pontução predominam. A forma desta canção também é
bipartida: “A – A1”.

9.5 A gatinha parda II

Figura 11: A gatinha parda II

Fonte: Caderno 1 – Villa-Lobos70

70 BARBOSA, Maria Clara et al. Op.cit.,p.36


40
Na segunda canção “A gatinha parda II” a letra é repetida, mas com algumas
distinções. Por exemplo: na canção 1, a letra começa contando a história “A minha
gatinha parda....” e “quem achou minha gatinha?” como se o dono estivesse
buscando ajuda para achar sua gatinha com alguma esperança de encontrá-la. São
usadas colcheias e semicolcheias, conforme observamos na mesma. Mas, na
canção II, o miado inicial da gata não aparece. Começa direto na interjeição “Ai!”,
sugerindo não apenas lamento, mas também raiva ou nervoso. Ela começa com
uma semínima pontuada, o que dá a possibilidade de prolongar e enfatizar sua
reclamação “Ai!”. Mais a frente isso é confirmado quando ele diz “Quem roubou
minha gatinha?”. Não pergunta mais “quem achou”, mas “Quem roubou?”. O
desenho rítmico e intervalar de “quem roubou minha gatinha?” não começa com
colcheia pontuada como na canção anterior, mas sim com semínima pontuada. Na
pergunta “você sabe, você sabe?” aparecem colcheias pontuadas que ajudam a
enfatizar o quanto a pessoa ficou indignada ao ter sua gatinha roubada. Neste
mesmo contexto da música “A gatinha parda I” eram apenas colcheias não
pontuadas. Também observamos que no final da pergunta “você viu?” da canção II
há um movimento descendente culminando a última nota com um salto de 4ª justa
ascendente, tornando a frase suspensiva no primeiro ritornello. Comparando esta
parte com a mesma frase na canção I observamos que o desenho é todo
descendente terminando na tônica, mesmo no primeiro ritornello. A letra “Você viu?”
da segunda canção torna-se conclusiva, com desenho melódico descendente
apenas da segunda vez após o ritornello, mas ainda assim ela dá um salto de 8ª
justa no final com a onomatopéia “nhau”, apontando para um possível aparecimento
da gata ao final.
Ainda sobre essas músicas observamos que a melodia possui graus
conjuntos e eventuais saltos de 3ª maior e menor descendentes. Também apresenta
saltos sucessivos de terça como arpejos e os saltos de 4ª justa são ascendentes. Ou
seja, uma faz referência à canção anterior, mas com algumas diferenças. Na peça II
há salto de 8ª justa que não aparece na música I. Da mesma forma, não há saltos de
5ª justa ou 4ª aumentada como na canção I. A melodia muda pouco. A tonalidade da
primeira canção está em Eb e da segunda canção em D. O compasso passa a ser
binário e o andamento mais rápido, passando de Moderato para Alegretto. Nessa
canção a textura entre as duas vozes é polifônica. A segunda voz se encarrega de

41
frisar a fala da gata “Nhan”, diferenciando-se um pouco da primeira que utiliza a
onomatopéia “Miau” para começar e depois “Nan”. As duas canções dialogam entre
si e se complementam. Uma começa a contar a história e a outra dá um possível
desfecho para a situação.
Observamos que essas músicas analisadas têm forma estrófica, que é uma
estrutura de fácil assimilação e entendimento para as crianças. Entre essas duas
canções “A gatinha parda – I” e “A gatinha parda – II” encontramos a estratégia
composicional da motivização, pois o conteúdo motívico da peça 1 é apresentado
novamente na segunda música de forma mais intensificada.

10 Análise geral das canções do Caderno 1 de Villa-Lobos:

O 1º caderno do Guia Prático para a Educação Artística e Musical – Heitor


Villa-Lobos (1º volume)71 apresenta 58 peças escritas para coro “a capela” de 1 a 4
vozes, predominando as peças a 2 vozes; sendo que deste conjunto, 35 foram
aproveitadas por Villa- Lobos na coleção Solfejos 1.
De acordo com a apresentação do caderno do Guia Prático o material possui
peças com texto único e vozes em sincronia, o que significa que mesmo que
possam ser cantadas a três ou quatro vozes, a escrita é homofônica.
Outra característica das peças é que elas possuem, segundo os
organizadores do caderno, superposição de fonemas e/ou textos; Isso significa que
enquanto uma voz está cantando a melodia a outra voz faz o acompanhamento
utilizando onomatopéias como por exemplo, “tum tum tum”, “schxê! schxê! schxê!"
“nan! nan! nan!” etc. ou fragmentos do texto original, observando, às vezes, o
mesmo ritmo:
Nas canções do Guia Prático encontramos melodias com tessitura intervalar
de 5ª, 6ª, 7ª, 8ª, 9ª e 10ª. Observamos que há pouca variação rítmica e que as
figuras mais utilizadas são: mínima, semínima, colcheia e semicolcheia; em algumas
canções também aparecem semibreves. O caderno traz arranjos simples sobre os
seguintes gêneros musicais: polca, modinha, quadrilha e mazurca.
Nas 58 peças analisadas melodicamente do 1º Caderno Villa-Lobos,
predomina-se o intervalo de 8ª justa na maioria das canções, conforme observamos

71BARBOSA, Maria Clara et al. Op.cit.


42
na tabela e no gráfico. Ou seja, 34,49% das músicas apresenta tessitura de 8ª justa
e começa com uma Anacruse. Em segundo lugar, as nonas (maiores e menores),
depois as sétimas, sextas, décimas e quintas. Vale acrescentar que 68,97% das
canções apresenta compasso binário simples. As outras são: ternário (13,79%),
quaternário (8,62%) e binário composto (6,89%).

Figura 12: Tessituras - 1º vol. Caderno Villa Lobos

Fonte: produção do autor

Figura 13: tabela comparativa canções do 1º Caderno

Fonte: produção do autor

11 Análises de canções de outros países

43
Ao falarmos sobre a Intertextualidade nas canções infantis percebemos que o
processo de “incorporação” ou diálogo de um texto/canção em outro dá-se de
diversas maneiras: observamos os motivos, repetições, formas, melodias, ritmo,
variações, letra etc. Vimos que no Caderno Villa Lobos 1 muitas canções são
anônimas e fazem referência às tradições culturais brasileiras. Da mesma forma
canções infantis de outros países também dialogam entre si e se enquadram nos
conceitos de Intertextualidade apresentados neste trabalho.
Neste sentido, vamos citar e analisar os padrões rítmicos, melódicos, textura,
tessitura e texto (quando houver) destas músicas e buscar a intertextualidade entre
elas com as canções do Caderno 1 Villa- Lobos.
Compreendemos que há um padrão nessas canções analisadas.
Predominam-se tessituras que não ultrapassam uma oitava, adequando-se à
extensão vocal da criança; melodias curtas, repetitivas e simples, ou seja, fáceis de
serem assimiladas; e também o uso de Onomatopéias – figura de linguagem
utilizada na formação de uma palavra que traz um som natural a ela associada,
proporcionando os “efeitos” que ajudam na representação do imaginário e
vocabulário infantil. Também encontramos a questão da ludicidade nas peças, letras
com rimas e ausência de modulações melódicas.

11.1 Bolo, Bolo, Bolo

44
Figura 14: Bolo, bolo, bolo

Fonte: transcrição da autora

Transcrição 72fonética
“Ugah73, ugah, ugah (a)
Bmagal narrugah (a)
Nistovevah col haiom (b)
Ad ieshar nimtsah maqom (b)
Leshêvet, lacom (b)
Leshêvet, lacom (b)
Leshêvet velacom (b)

A letra e o ritmo desta canção hebraica mostram que ela é uma brincadeira
musical. A tessitura é de 7ª menor, favorecendo as atividades corporais que a
mesma propõe. Na melodia são apresentados desenhos intervalares de 2ª maior
descendente e ascendente e alguns saltos de 3ª maior e menor ascendente, 4ª justa
descendente, 5ª justa ascendente. O compasso é um binário simples, a melodia é
repetitiva, adequada à proposta de passar um ensinamento específico através da
letra ou de simplesmente contar uma história. Predominam as seguintes figuras

72 Tradução:
Bolo, bolo, bolo
Num círculo circulamos
E andamos o dia inteiro
Até encontrarmos um lugar para
Sentar, levantar.”(3x)
73
Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=PXPNzjUCaJU&ab_channel=Rokdim . Acesso em 13 de
junho de 2022.
45
rítmicas: mínima, semínima e colcheia. A forma dela é um rondó: Aa Bb Coda. Esta
peça faz uso dos procedimentos simétrico e de compressão. O conteúdo motívico é
repetido, porém com modificação e inversão do mesmo, utilizando ainda a
diminuição do padrão rítmico, onde cada nota tem o seu valor reduzido.
A canção “Bolo, Bolo, Bolo” apresenta intertextualidade com a cantiga
espanhola “Ya lloviendo está”. Ambas possuem motivo melódico e rítmico
semelhantes, mas com letras diferentes. Além da questão rítmica com a canção
hebraica “Bolo, Bolo” , “Ya lloviendo está – Já está chovendo” dialoga com canções
do Caderno 1 Villa Lobos pelo uso de onomatopéias como “ping, pang” que
remetem ao som de chuva, ao uso de intervalos com tessitura de 3ª maior e textura
monódica. O desenho intervalar predominante é de 2ª menor descendente. Uma
canção curta, simples e com tessitura adequada para a criança cantar e de estrutura
estrófica “A – A1”. Essa canção apresenta rimas interporladas (aba). Quando
comparamos “Ya lloviendo está” com “Bolo Bolo Bolo” observamos a técnica da
motivização de uma em relação a outra, observando a modificação rítmica por
aumentação em seu padrão rítmico.

“Ya lloviendo está (a)


Clin clin clin clin (b)
Ya lloviendo está.” (a)

Figura 15: Ya lloviendo está

Fonte: Pinterest74

74Fonte:https://www.google.com.br/search?q=ya+lloviendo+esta&tbm=isch&ved=2ahUKEwiBpIGcosL

4AhWUTbgEHasRDGEQ2-
cCegQIABAA&oq=ya+lloviend&gs_lcp=CgNpbWcQARgAMgQIABAeMgQIABAeMgQIABAeMgQIABA
eMgQIABAeMgQIABAeMgQIABAeMgQIABAeMgQIABAeMgQIABAeOgsIABCABBCxAxCDAToICAAQ
sQMQgwE6CAgAEIAEELEDOgUIABCABDoGCAAQHhAFOgYIABAKEBg6BAgAEBM6BggAEB4QCF
D6CFjNNWD9QGgFcAB4AIABiQKIAfcWkgEGMC4xNC4zmAEAoAEBqgELZ3dzLXdpei1pbWfAAQE&
46
11.2. Oyfn Pripetshik

Esta canção iídiche 75 apresenta outras características em comum com


algumas músicas do Caderno de Villa-Lobos:

Figura 16: Oyfn Pripetshik

Fonte: Wikipedia76

Nesta cantiga 77percebemos alguns pontos em comum com as canções do


caderno Villa-Lobos: intervalos de 2ª maior e menor, eventuais saltos de 3ª menor, 4ª
justa descendente e ascendente e uma tessitura de 9ª menor, ainda adequada para
a voz infantil. A música começa com uma frase ascendente suspensiva com graus
conjuntos e saltos de 3ª menor e maior. Em seguida um salto de 4ª justa aponta para
a segunda frase (repetida duas vezes) contrastante que começa descendente com
saltos de 4ª justa, 3ª menor e maior e termina com graus conjuntos. Os saltos
sucessivos de 3ª menor também formam acorde meio diminuto na música. Sua
textura é monódica e possui a Forma A-B-b. A canção apresenta rimas interpoladas.

sclient=img&ei=EK2zYoHcG5Sb4dUPq6OwiAY&bih=694&biw=1517#imgrc=IY3-PUemPtynyM .
Acesso em 15 de junho de 2022.
75 Oyfn Pripetshik uma canção composta por Mark Warshawsky (1848-1907) . A canção é sobre um

rabi ensinando aos seus jovens estudantes o alef-beit (alfabeto hebraico A língua iídiche é derivada
do alto alemão, historicamente falada pelos judeus Ashkenazi. O idioma terá tido origem durante o
século IX na Europa Central, fornecendo à nascente comunidade Ashkenazi um vernáculo de base
alemão fundido com elementos retirados do hebraico e aramaico, bem como - mais tarde - línguas
eslavas e vestígios de línguas românicas. Fonte:
https://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADngua_i%C3%ADdiche .
76 Fonte: https://en.wikipedia.org/wiki/Oyfn_Pripetshik . Acesso em 10 de março de 2022.
77 Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=UUF-jHyEuNg&ab_channel=albertdiner . Acesso em 13

de junho de 2022.
Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Oyfn_Pripetshik .
47
“Oyfn 78pripetchik brent a fayerl, (a)
Un in shtub iz heys, (b)
Un der rebe lernt kleyne kinderlekh, (c)
Dem alef-beys. (b)

Refrão:

Zet zhe kinderlekh, gedenkt zhe, tayere, (a)


Vos ir lernt do; (b)
Zogt zhe nokh a mol un take nokh a mol: (c)
Komets-alef: o! (b)

Lernt, kinder, mit groys kheyshek, (a)


Azoy zog ikh aykh on; (b)
Ver s'vet gikher fun aykh kenen ivre – (c)
Der bakumt a fon. (b)

Lernt, kinder, hot nit moyre, (a)


Yeder onheyb iz shver; (b)
Gliklekh der vos hot gelernt toyre, (a)
Tsi darf der mentsh nokh mer? (b)

Ir vet, kinder, elter vern, (a)


Vet ir aleyn farshteyn, (b)
Vifl in di oysyes lign trern, (a)

78Tradução: No forno à lenha, um fogo queima,


E na casa está quente.
E o rabino está ensinando pequeninas crianças, o alfabeto.

Refrão:
Vejam, crianças, lembrem-se, queridos,
O que vocês aprendem aqui;
Repitam e repitam mais uma vez,
Komets-alef: o!

Aprendam, crianças, com grande entusiasmo.


Então eu ensino vocês;
Aquele entre vocês que aprender a pronunciação hebraica mais rápido -
Ele receberá uma bandeira.
Aprendam crianças, não tenham medo,
Todo começo é difícil;
É sortudo aquele que aprendeu a Torá,
O que mais uma pessoa precisa?
Quando vocês envelhecerem, crianças,
Vocês entenderão por si mesmas,
Quantas lágrimas estão nessas letras,
E quanto lamento.
Quando vocês, crianças, sofrerem no Exílio,
E estiverem exaustas,
Que vocês obtenham força dessas letras,
Olhem para elas!

48
Un vi fil geveyn. (b)

Az ir vet, kinder, dem goles shlepn, (a)


Oysgemutshet zayn, (b)
Zolt ir fun di oysyes koyekh shepn, (a)
Kukt in zey arayn!” (b)

11.3 A cantiga de ninar

Figura 17: A cantiga de ninar

Fonte: Caderno 1 – Villa-Lobos79

“Sai bicho papão de cima do telhado (a)


Deixa este menino dormir sossegado (a)
Mucama muito feia que veio da Bahia (b)
Pega este menino e lava na bacia.” (b)

“A cantiga de ninar” 80 dialoga com “Oyfn Pripetshik”. A primeira frase


(suspensiva) começa com desenho melódico intervalar descendente com saltos de
4ª justa descendente e ascendente, seguidos por saltos de 3ª maior e menor
ascendentes formando um acorde maior. Em seguida, graus conjuntos e um salto de
5ª justa descendente. A segunda frase (conclusiva) apresenta desenho ascendente
com saltos de 3ª maior e graus conjuntos. As frases contrastantes são repetidas
duas vezes. A tessitura é de 8ª justa e no ritmo predominam-se as figuras: mínima,
semínima e colcheia. Forma estrófica “A – A1 – B – B1 e rima emparelhada (aabb).

79
BARBOSA, Maria Clara et al. Op.cit.
80 BARBOSA, Maria Clara et al. Op.cit., p 22.
49
As duas peças apresentam o mesmo material e se apresentam como
cantigas. Ambas apresentam contrastes com frases suspensivas e conclusivas e
repetições. A “Oyfn Pripetshik” é uma canção mais singela e tem como objetivo
apresentar um ensinamento e “A cantiga de ninar” tem como objetivo acalmar (por
meio da melodia) a criança para dormir.

11.4 Kookaburra

A canção australiana81 é um cânone a 3 vozes e apresenta rima emparelhada


(aaca). Essa forma é derivada do “round82” medieval e apresenta tessitura de 8ª
justa. Os desenhos intervalares são de 2ª maior ascendente e descendente, saltos
de 3ª menor e maior descendentes e um salto de 8ª justa. O compasso quaternário
simples e tético. As figuras predonimantes são semibreve, mínima, semínima e
colcheia.
Destacamos que utilizar cânones para o público infantil é uma prática
relevante na educação musical, uma vez que trabalha o foco e a percepção musical,
pois a criança tem que prestar atenção não apenas na sua voz, mas também na
parte do outro grupo que começa o canto.

81 Tradução: kookaburra pousou no pé de eucalipto ele é o feliz rei do galho, ria kooganurra, ria, a sua
vida deve ser muito boa. kookaburra pousou no galho, e come todas as frutinhas que ele vê. Pare,
kookaburra, pare, deixe algumas para mim. kookaburra pousou no galho, e conta todos os macacos
que vê. Pare kookaburra, pare, aquilo não é ele, aquilo sou eu.
82 Entre o tipo de dança mais difundida na Europa Medieval destaca-se a “dança de roda”. Dois

fatores que provavelmente contribuíram para a popularização deste estilo de dança foram a
simplicidade de seus passos, onde tanto homens e mulheres dançam em roda e de mãos dadas,
como a simbologia e o valor mágico do círculo.” Fonte: https://www.aphc.com.br/2017/11/16/oficina-
de-dancas-circulares-medievais-e-
celtas/#:~:text=Entre%20o%20tipo%20de%20dan%C3%A7a,o%20valor%20m%C3%A1gico%20do%
20c%C3%ADrculo . Acesso em 27 de junho de 2022.

50
Figura 18: Kookaburra

Fonte: Musicalion83

“ Kookaburra sits in the old gum tree (a)


Merry merry king of the bush is he (a)
Laugh kookaburra laugh (c)
Kookaburra great your life must be.” (a)

83 Fonte:Muscalion. Kookaburra. Disponível em:


https://www.musicalion.com/es/scores/partituras/329/desconocido-
an%C3%B3nimo/29315/kookaburra. Acesso em 26 de junho de 2022.

51
11.5 O pato nada no lago

Figura 19: O pato nada no lago

Fonte: Canal Carlos Correia – via Youtube84

Assim como “Kookaburra”, “O pato nada no lago”85, do compositor brasileiro


Carlos Correia, também é uma peça canônica voltada ao público infantil. A música
apresenta saltos com intervalos de 3ª maior ascendente e 3ª menor descendente,
saltos de 5ª justa e 4ª justa ascendente. A tessitura é de 9ª menor. O compasso é
binário simples e as figuras rítmicas predominantes são semínima e colcheia.
Outra questão a ser mencionada nessas análises é a inserção de
personagens não humanos. Nesses primeiros anos do desenvolvimento da criança o
assunto “bichinhos” está presente no imaginário e curiosidade infantil. Trazê-los ao
cotidiano de forma lúdica e musical também é importante. Assim, notamos no
Caderno 1 – Villa-Lobos e nessas duas canções a citação de personagens como o
pato, o pássaro, o gato etc que despertam interesse e atenção da criança, facilitando
o processo de aprendizado.

84 Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=soJcUY1QIyo&ab_channel=CarlosCorreia. Acesso em 14


de junho de 2022.
85 Fonte: Op.cit.

52
11.6 Shabondoma

Figura 20: Shabondoma

Fonte: @ReiKurosawaa via Twitter86

Shabondama tonda. (a)


Yanemade tonda (a)
Yanemade tonde (b)
kowarete kieta. (a)
Shabondama kieta (a)
Tobazuni kieta (a)
Umarete suguni, (c)
kowarete kieta (a)
Kaze kaze fukuna! (a)
Shabondama tobaso (d)

A música japonesa Shabondoma87 (bolha de sabão) apresenta tessitura de


11ª justa com três figuras rítmicas: semínima, colcheia e semicolcheia, assim como a
maioria das canções apresentadas anteriormente. Remete a uma brincadeira infantil
que é brincar com bolhinhas de sabão. A canção apresenta rima irregular e seu
desenho melódico intervalar contém 2ª maior e inclui saltos de 4ª justa ascendente,
3ª menor e maior ascendente, 5ª justa ascendente e descendente e 8ª justa. A
textura da música é monódica e sua forma é Binária (AB), apresentando um perfil
que faz alusão às bolhas de sabão que sobem e descem. Essa música dialoga com
a peça “Cai cai, balão”, que faz alusão aos movimentos do balão que está caindo.

86 Fonte:https://twitter.com/reikurosawaa/status/648634211306483717. Acesso em 1 de junho de 2022.


87 Fonte:https://www.youtube.com/watch?v=D_YAssqrJJU&t=44s&ab_channel=LearnJapanesewithJap

anesePod101.com . Acesso em 13 de junho de 2022.


53
11.7 Canción para bañar la luna

Na cantiga “Canción para Bañar la Luna88”, da argentina Maria Elena Walsh, a


tessitura encontrada é de 10ªaum. A variação rítmica se dá em quatro figuras:
Mínima, semínima, colcheia e semicolcheia. O compasso desta canção também é
simples, com alternância entre compassos binário e ternário. O desenho melódico
inclui graus conjuntos ascendente e descendente. A peça inclui saltos de 3ª menor
ascendente e descendente, 4ª justa e 4ª aumentada. A sua melodia tem elementos
da escala pentatônica (Tônica, 2M, 4J, 5J e 6 e ausência de semitons entre um grau
e outro da escala), que é associada a músicas orientais. O padrão motívico dela
remete a um clichê da música chinesa que por sua vez dialoga com o clichê da
música andina. Sua forma é A-a – B-b – codeta e a letra apresenta rimas
emparelhadas (aabb). Esta peça apresenta o procedimento composicional da
compressão, uma vez que repete e intensifica o conteúdo motívico, apresentando
variação com a diminuição do padrão rítmico.

Figura 21: Escalas pentatônicas89

Escala pentatônica menor

Fonte: Descomplicando a Música

88 https://www.youtube.com/watch?v=mNNUTvJwTK0&ab_channel=GuadalupeVicent. Acesso em 10
de maio de 2022.
89 Fonte: https://www.descomplicandoamusica.com/escala-pentatonica/ . Acesso em 20 de maio de

2022.
54
Figura 22: Canción para la bañar la luna

Fonte: transcrição da autora

“Ya la luna baja en camisón (a)


A bañarse en un charquito con jabón (a)
Ya la luna baja en tobogán (b)
Revoleando su sombrilla de azafrán (b)

Quien la pesque con una cañita de bambú (a)


Se la lleva a Siu Kiu (a)
Ya la luna viene en palanquín (b)
A robar un crisantemo del jardín (b)

Ya la luna viene por allí (a)


Su kimono dice no, no y ella sí (a)
Quien la pesque con una cañita de bambú (b)
Se la lleva a Siu Kiu (b)

Ya la luna baja muy feliz (a)


A empolvarse con azúcar la nariz (a)
Ya la luna en puntas de pié (b)
En una tacita china toma té (b)

Quien la pesque con una cañita de bambú (a)


Se la lleva a Siu Kiu (a)
Ya la luna vino y le dio tos (b)
Por comer con dos palitos el arroz (b)

Ya la luna baja desde allá (J) (a)


Y por el charquito-quito nadará (a)
Quien la pesque con una cañita de bambú (b)
Se la lleva a Siu Kiu (D)” (b)

55
11.8 Pequeña Luna

Figura 23: Pequeña luna

Fonte: Ana profe music90

“La pequeña luna na venga, en el cielo (a)


Entre las estrellas brilhantes de luz (b)
Ven linda luna al oeste (c)
Ven linda luna antes que me acueste” (c)

Essa canção tradicional chinesa apresenta desenho intervalar de 2ª maiores,


saltos de 3ª menor e maior ascendentes e descendentes e saltos de 4ª justa. A
tessitura é de 6ª menor e sua forma é binária: A-A B-b. Observamos o uso de
‘alusões’ na letra desta canção, que também apresenta rima irregular (abcc).
Essa música se enquadra no conceito de Teoria da Influência por
Generosidade. Isso porque esta canção de feições andina tem como fonte de
inspiração a música praticada pelos povos ameríndios da cordilheira dos Andes. Ela
também faz alusão a “clichês” que caracterizam a música chinesa91, como ela é
vista no Ocidente. Além disso, entre as duas canções acima vemos um elemento
textual em comum: a lua, que é um símbolo importante nas tradições chinesas. A
canção faz uso de compressão no sexto compasso.

90Fonte: https://anaprofemusic.blogspot.com/2012/04/musica-etnica-partitura-de-cancion.html. Acesso


em 5 de maio de 2022.
91 Fonte: https://ukebuddy.com/escalas-ukulele/G-chinesa-escala. Acesso em 5 de maio de 2022.

56
Figura 24: Escala chinesa

Fonte: produção da autora

Nessas peças citamos o conceito de alusão de Ricardo Zani92 (2003, 128) ao


explicar que a alusão não se faz como uma citação explícita, mas sim, como uma
construção que reproduz a ideia central de algo já discursado e que, como o próprio
termo deixa transparecer, alude a um discurso já conhecido do público.

11.8 “Baila Sola”

Figura 25: Baila sola93

Fonte: Mamalisa94

“Yo la quiero ver bailar, saltar y brincar (a)


Andar por los aires (b)
y mover-se com mucho do naire (b)
Déjen la sola, solita y sola.” (c)

92 Fonte: https://www.mamalisa.com/?t=es&p=464&c=5. Acesso em 10 de janeiro de 2022.

57
A canção boliviana95 apresenta tessitura de 6ª menor e apenas duas figuras
rítimicas: semínima e colcheia. A forma musical dela é estrófica, sendo uma canção
para a criança dançar, pular e brincar. Além de apresentar uma letra que sugere a
dança, a peça lembra o gênero Valsa por causa do compasso binário composto. O
desenho intervalar é de 2ª menor e maior ascendente e descendente com eventuais
saltos de 3ª maior descendente e 5ª justa ascendente, sendo uma música simples,
curta e de fácil assimilação com rima emparelhada.

11.9 Los Pollitos Dicen

Figura 26: Los pollitos dicen

Fonte: Mamalisa

“Os pollitos 96dicen pio pio pio (a)


Cuando tiennen hambre (b)
Cuando tiene frio (a)
La galina busca el maiz y el trigo (a)
Les da la comida y les presta abrigo”. (a)

96Tradução:
Eu quero vê-la dançar
Pular e brincar
Andar pelos ares
E se mover com muita graciosidade
Deixem-na só, sozinha e só.
58
“Os pollitos dicen 97 ” é uma canção peruana que apresenta tessitura de 7ª
menor e padrão rítimico de semínima e colcheia. Observa-se que a frase é iniciada
com salto ascendente de 4ª justa, seguidos por intervalos de 2ª maiores e menores
e saltos de 3ª menor para imitar o “pio” dos pintinhos. Na segunda frase o desenho
melódico contrasta começando descendente em “quando eles têm frio. Ocorre ainda
um salto de 5ª justa ascendente, seguidos por graus conjuntos que caminham até a
conclusão da frase na sua tonalidade. A textura é monódica e sua forma é: A – A1” . A
canção apresenta rimas alternadas e emparelhadas.

11.10 Os pintinhos

Figura 27: Os pintinhos

Fonte: Meu piano é divertido98

“Piu99, piu, fazem os pintinhos. (a)


Piu, piu, todos bem juntinhos.” (a)

A canção “Os pintinhos” dialoga com a música peruana anterior e apresenta


rima simples (aa). Ambas apresentam narrativas semelhantes. Na primeira, o
cuidado da mãe com os filhotes; na segunda, a história sobre como eles ficam

97 Fonte: https://www.mamalisa.com/?t=es&p=4887. Acesso em 10 de janeiro de 2022.


98 BOTELHO, Alice. Meu Piano é divertido, volume 1. Acesso em 1 de maio de 2022.
99 Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=mmX4gDnTLT4&ab_channel=BrunoCamargoPiano.
Acesso em 1 de maio de 2022.
59
juntinhos, talvez porque sentem frio, assim como revela a canção anterior.
Observamos que o autor faz uso da articulação stacatto 100para similar o piado “piu,
piu”. E na música peruana a compositora usa saltos e desenho melódico ascendente
para trazer essa ideia ao imaginário infantil. A tessitura melódica é de uma 4ª justa e
contêm intervalos de 2ª maior e menor e 3ª menor. Sua forma é estrófica.
Ao analisar melódica e ritmicamente canções de variados países notamos
alguns pontos de convergência: Letra curta e/ou repetitiva; presença de rimas;
tessituras em sua maioria de até 8ª justa; fórmulas de compasso simples com
poucas variações rítmicas, sendo mais comuns as figuras de mínimas, semínimas e
colcheias e em menor proporção, semicolcheias e semibreves. É construida a partir
de motivos repetidos, o que facilita a execução e aprendizado das crianças. A tônica
das melodias também são propícias ao universo infantil, estimulando brincadeiras,
atividades físicas e a imaginação.

100 O staccato ou “destacado” também chamado de ponto de diminuição — designa um tipo


de fraseio ou de articulação no qual as notas e os motivos das frases musicais devem ser executadas
com suspensões entre elas, ficando as notas com curta duração.

60
12 Análise das composições autorais
12.1 “Bādī”

Figura 28: Bādī:

Fonte: produção da autora

61
A cantiga “Bādī” conta a história de um passarinho filhote para ilustrar a
relação afetiva entre mãe e filho. Assim como a criança começa a descobrir o mundo
externo, mas volta para o aconchego da mãe diariamente, o passarinho é
dependente da mãe até começar a voar. A música apresenta uma letra relativamente
longa, pois conta o cotidiano do pássaro desde o seu despertar até o descanso
noturno. Contudo, a letra e a melodia são repetitivas e apresentam rimas simples e
emparelhadas que possibilitam que a criança memorize também a letra e que não
apenas a escute como uma canção para dormir. Essa música pode ser utilizada para
estimular a imaginação infantil, apresentando uma narrativa com várias coisas que
acontecem no dia a dia do passarinho (sair, brincar, contemplar a natureza, voltar
para o colo/ninho), além de proporcionar a identificação da própria criança com o
personagem da história cantada.
O desenho melódico começa com graus conjuntos descendentes e saltos de
3ª maior e menor ascendentes. No contraste “Passarinho, o sol tão alto aquece o
coração...”, a música começa com salto de 5ª justa ascendente, seguido por 4ª justa
descendente. Basicamente predominam duas figuras rítmicas: colcheia e
semicolcheia e o compasso é um quaternário simples, sua tessitura é de 7m e a
forma dela é A-b-a. A estrutura da canção é relativamente simétrica e sua rima é
emparelhada (aabb). A música “Bādī” dialoga com “Os pollitos dicen” que também
tem tessitura de 7ª menor e padrão rítmico de semínima e colcheia. Assim como a
canção sobre os pintinhos narra o cuidado da mãe com os filhotes, Badi também
aborda o cuidado e a afetividade entre mãe e filho, principalmente na infância.

“Passarinho, lá no ninho, pequenino a piar. (a)


Passarinho, bem cedinho, logo põe-se a cantar (a)
Passarinho, acorda em seu ninho. (b)
Passarinho, o sol está tão lindo. (b)

Passarinho, lá no ninho, mamãezinha a procurar. (a)


Passarinho, sai do ninho. Com as flores vai brincar. (a)
Passarinho, o sol tão alto aquece o coração! (b)
Passarinho, um pinguinho! Cai a chuva, que emoção! (b)

Passarinho, canta, canta, voa, voa a rodar. (a)


Mas é hora de ir pro ninho, a noitinha vai chegar. (a)
Boa noite, passarinho! Mais um belo sonho vem. (b)
Bom descanso com os anjinhos, passarinho durma bem.” (b)

62
12.2 Pule 1,2,3!

Figura 29: Pule 1,2,3

Fonte: produção da autora

O desenho melódico começa com saltos intervalares de 4ª justa ascendente,


seguido por graus conjuntos e 4ª justa descendente. As figuras pontuadas e o
andamento Allegro (120 BPM) sugerem uma brincadeira, onde a criança deve se
movimentar e pular rapidamente. A letra é curta, repetitiva e apresenta rimas simples
(aa). A música foi pensada para ser utilizada como atividade que estimula o
desenvolvimento da consciência corporal e o equilíbrio da criança. A criança precisa
mudar várias vezes ao se equilibrar em um pé ou pulando com dois pés, colocar
mão na testa, imitar um sapo, etc. São brincadeiras que ajudam a criança a pensar
rápido antes de reagir e aprender a fazer expressões faciais, como por exemplo
“cara de chinês”. Tal canção dialoga com a peça “Cai, cai balão” que também
trabalha com os movimentos de abaixar, levantar, virar para o lado, seguindo uma
coerência entre texto, melodia e ritmo. Movimentos que estimulam a orientação
espacial da criança. Também dialoga com “Bolo bolo” por conta da mesma proposta.

63
“Se você já viu um urso da floresta, (a)
Então pule de um pé só e coloque a mão na testa. (a)

Se você já viu um peixe no rio, (a)


Então pule com dois pés, imitando um sapinho. (a)

Se você ouviu uma vaca mugindo, (a)


Então conte até três, faça cara de chinês.” (a)

12.3 Pi(pocando)

Figura 30: Pi(pocando)

Fonte: produção da autora

Essa canção é pensada como um travalínguas101, jogo verbal muito utilizado


na educação infantil e apresenta rimas emparelhada e alternada.

101
Exercício oral que consiste em articular, com rapidez e sem enganos, frases ou sequências de pala
vras com segmentos difíceis de pronunciar, como, por exemplo três tristes tigres. Fonte:
https://dicionario.priberam.org/traval%C3%ADngua . Acesso em 9 de maio de 2022
64
A ideia é imitar uma pipoqueira, utilizando onomatopéias e trabalhar a
separação das sílabas. A criança é levada a imaginar rapidamente as novas “figuras”
que vão se formando a partir das sílabas que sobram e formam uma nova palavra
ou frase, como por exemplo “Ja NE LA sem o “Nela” fica o “JÁ vou pipocar”. Também
citamos o “pipoca” sem o Pi” fica o “poca” de pocar, considerada uma expressão
típica do povo capixaba. O desenho melódico da parte A apresenta salto de 4ª justa
ascendente, seguido por 3ª menor e maior descendente. Há saltos de 5ª justa
ascendente. Na parte B o desenho melódico começa com salto de 4ª justa, porém
utiliza mais graus conjuntos do que na primeira parte. A sua tessitura é de 7ª menor,
com textura monódica. O ritmo faz uso de semínimas, colcheias e semicolcheias em
andamento Andante Moderato (92 bpm). Um dos objetivos desta brincadeira musical
é ajudar a criança a desenvolver um vocabulário mais amplo e auxiliar no
desenvolvimento da articulação das palavras.

“Pipoca sem o Pi fica o Poca de Pocar (a)


Pocar é estourar a pipoca na panela. (b)
Panela sem o Pá fica o Nela de janela. (b)
Janela sem o Nela fica o Já vou pipocar. (a)

Pipoca, pipoca, pipoca, pipocar, (a)


Imitando uma panela vou agora pipocar (2x).” (a)

65
12.4 Flor de Cerejeira

Figura 31: Flor de cerejeira

Fonte: produção da autora

A peça foi composta tendo como referência a escala pentatônica (presente na


música oriental). Ela remete a dois símbolos tradicionais da cultura asiática: a flor de
cerejeira 102 e o pássaro Tsuru 103 , considerado uma ave sagrada do Japão. A
tessitura desta canção é de 8ª justa e a textura monofônica. A letra é curta, repetitiva
e apresenta rimas irregulares (abac). Sua forma é “A – A1 e dialoga com a peça
tradicional chinesa “Pequeña luna” que também utiliza a escala pentatônica.
Predominantemente, o desenho melódico é construído com graus conjuntos e
pequenos saltos de 3ª menor ascendente e 4ª justa descendente com as figuras
rítmicas: mínima, semínima e colcheias.

Flor de cerejeira, flor de cerejeira (a)


Baila o Tsuru pelo céu azul. (b)
Flor de cerejeira, flor de cerejeira, (a)
Doce primavera, encanto a mais bela. (c)

102 A flor de cerejeira, ou flor de sakura, como é conhecida no Japão, simboliza pureza, brevidade da
vida e felicidade. Fonte: https://www.dicionariodesimbolos.com.br/flor-cerejeira/
103 Na cultura japonesa, além de representar vida longa, o tsuru simboliza fidelidade, paz e poder de

cura
66
12.5 Indiozinho feliz

Figura 32: Indiozinho feliz!

Fonte: produção da autora

A música “Indiozinho feliz!” pode ser cantada com divisão para dois grupos
infantis. Um canta a melodia e o outro fala as expressões “Nariz!, Feliz! Uhula! Um,
dois, três!”. Ela apresenta tessitura de 9ª maior e forma AB e rimas simples e
emparelhadas.
Começa com salto de 3ª menor descendente, graus conjuntos e salto de 8ª
justa na parte que as crianças falam “1,2,3”. No início da parte B é apresentada uma
sequência de graus conjuntos ascendentes, seguida por salto de 6ª maior. A canção
pode ser utilizada na educação infantil com o intuito de conscientizar as crianças
sobre a importância e o respeito pela contribuição dos povos indígenas para com a
sociedade e a preservação ambiental, conceitos abordados de forma mais
direcionada no Dia do Índio (19 de abril). Para acompanhar a canção podem ser
utilizados instrumentos musicais como o pau de chuva, flauta, maracá, tambor etc de
preferência feitos com material reciclado e confeccionados pelas próprias crianças.

“Eu sou um indiozinho feliz (a)


(Nariz!) – Colocar a mão no nariz (a)
Eu cuido da natureza! (b)

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(Beleza!) – fazer sinal de positivo com o dedo polegar (b)
Eu toco o pau de chuva (c)
(Uhula) – Tocar o pau de chuva no ritmo (c)
Vamos contar até 3 (d)
(1,2,3) – Contar rapidamente com os dedos (d)

Vamos juntos, sim, proteger a natureza divina! (a)


Ela nos dá comida e água e sombra e é tão bonita!” (a)

A Influência como Generosidade permeou todas as canções da autora deste


trabalho. Para compor essas peças dialogamos com as músicas infantis
estrangeiras analisadas anteriormente.
A canção de ninar é estabelecida por sua finalidade de fazer a criança
adormecer. Com esse objetivo, muiitas dessas canções são monótonas, com letra e
melodia repetitivas. Grande parte delas trabalha com questões inerentes a todo ser
humano: a fragilidade do nascimento e o desenvolvimento com a experimentação de
sentimentos bons ou ruins. Em muitas dessas canções de ninar são utilizadas
figuras/situações que despertam sentimentos de medo, perda, separações,
despedidas etc, explorando de forma negativa as emoções da criança. Em “Bādī”
utilizamos a repetição e a monotonia, como a maioria das cantigas de ninar, porém
com letra de aconchego e segurança. Para isso utilizamos o personagem
“passarinho” – figura que remete à fragilidade e à doçura. Dialogamos com as peças
“Os pintinhos” e “Os pollitos dicen”, que também abordam o cuidado materno.
A peça “O Indiozinho feliz” dialoga parcialmente com a “Pequena Luña”, que é
uma música oriental. O desenho intervalar inicial é semelhante entre elas e as
figuras rítmicas de colcheias, semínimas e mínimas também. É uma canção simples
que traz elementos clichês sobre esse povo, como o cuidado com a natureza e tocar
o instrumento pau de chuva.
Em “Pi(pocando)” trabalhamos com onomatopéias e separação de sílabas,
estimulando o raciocínio e imaginário infantil. Assim, utilizamos o termo “Pipocando”,
fazendo uma uma alusão à gíria regional do Espírito Santo, do verbo “Pocar” que
pode significar estourar, fazer barulho, arrebentar e fazer sucesso.
Ao compor “Pule 1,2,3” pensamos nas brincadeiras infantis como Amarelinha,
onde predomina-se a movimentação e os pulos com um pé e dois pés. Também
fazemos alusão às brincadeiras infantis de mímica, onde podem ser imitados
animais, expressões, sentimentos etc. Ainda neste processo intertextual dialogamos

68
com a canção “Bolo, bolo, bolo” e “Baila Sola”, cujos temas em comum são as
brincadeiras infantis, a liberdade, a alegria e a brincadeira em círculos. Além disso,
dialogamos com a canção “Cai cai balão” que trabalha a coordenação motora e
orientação espacial da criança.
Flor de Cerejeira foi composta utilizando a escala pentatônica. A música faz
alusão à cultura hipônica, ao citar um símbolo de beleza, renovação e do feminino
no Japão: a flor de cerejeira (Sakura). O pássaro Tsuru, que é citado bailando, faz
parte das lendas desse povo, sendo considerada uma ave sagrada, que traz boa
sorte e longevidade. Além dos nomes que remetem às tradições da região, a rítmica
com valores curtos, a tessitura pequena e a escala pentatônica estabelecem uma
relação intertextual interessante com a cultura japonesa.
Compomos essas canções dialogando com as peças brasileiras e
estrangeiras apresentadas na pesquisa. As relações intertextuais que surgiram entre
as canções são classificadas dentro Teoria da Influência como Generosidade,
estando presente no desenho rítmico, melódico, na forma, tessitura, textura e
também nas letras.

69
13 CONCLUSÃO

A presente pesquisa buscou compreender como ocorrem os processos para a


composição de músicas destinadas ao público infantil, observando-se alguns pontos
em comum entre elas. Na questão textual: letras simples, repetitivas e curtas, rimas
e onomatopéias. Na parte rítmica, compassos simples com pouca diversidade de
figuras musicais, mas com presença de variações motívicas com aumentação ou
diminuição. Na parte melódica, predominantemente, foram utilizados desenhos
intervalares com graus conjuntos e, em alguns momentos, saltos de 3ª, 4ª, 5ª, 6ª e
até 8ª, sendo que a maioria das canções apresentou tessitura de 8ª justa (com
algumas exceções de 9ª e 11ª). Observamos que grande parte das peças foram
compostas utilizando formas estróficas – A – A1 ou A-B. Acreditamos que as formas
estróficas foram empregadas por facilitar a assimilação de letras e melodias
repetitivas para as crianças.
Identificamos que as canções do 1º Caderno Villa-Lobos podem ser
classificadas dentro da Teoria da Influência por Generosidade, pois são músicas
anônimas e que preservam tradições da cultura brasileira. Constatamos que a
intertextualidade musical está presente em peças de diferentes culturas: australiana,
brasileira, chinesa, espanhola, boliviana, japonesa, hebraica, iídiche e peruana,
apresentando um ponto em comum: a repetição rítmica e melódica.
Essas canções são relevantes não apenas para o entretenimento infantil, mas
podem ser utilizadas como ferramentas educacionais, uma vez que são abordados
princípios éticos, valores de cidadania, como o respeito ao outro e a preservação da
natureza. Como produto final compomos cinco peças tendo esse tipo de enfoque em
mente. Almejamos também que as canções possam estimular a ampliação do
vocabulário, o desenvolvimento ritmico e corporal, a conscientização em relação ao
meio ambiente, o conhecimento de outras culturas e a formação de vínculos afetivos
na primeira infância.
Acreditamos que este trabalho irá contribuir significativamente para o
repertório musical infantil brasileiro abrindo novas possibilidades para mães,
professores e educadores trabalharem de forma lúdica, conceitos e valores que
permeiam a vida em sociedade.

70
REFERÊNCIAS

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ANEXOS

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