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I. INTRODUÇÃO
crime” que são (...) As narrativas cotidianas, comentários, conversas e até mesmo brincadeiras e
piadas que têm o crime como tema. [No geral, essas narrativas], contrapõem-se ao medo e à
experiência de ser uma vítima do crime e, ao mesmo tempo, fazem o medo proliferar. A fala do crime
promove uma reorganização simbólica de um universo que foi perturbado tanto pelo crescimento do
crime quanto por uma série de processos que vêm afetando profundamente a sociedade brasileira
nas últimas décadas.
distanciamento entre as classes. É com essa perspectiva de análise que se justifica a
pertinência e relevância do estudo aqui proposto.
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Documento elaborado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) e Fórum Brasileiro de
Segurança Pública (FBSP) a partir de dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM),
órgão do Ministério da Saúde.
Estes poucos dados aqui expostos fornecem elementos indicativos acerca da
forte presença do fenômeno da violência no estado do Maranhão, particularmente da sua
acentuação na capital do estado, expressando a dinâmica de um cenário que é reflexo das
“fraturas entre uma sociedade profundamente desigual e um Estado que tem se mostrado
incapaz de lidar com as questões decorrentes dessa problemática” (NUNES, 2014, p.55).
Além disso, é importante evidenciar o fato que, no contexto mais recente, existe
uma crise de natureza sistêmica cuja consequência provoca a redefinição das bases
econômicas e ideopolíticas que dão sustentação ao atual modo de regulação capitalista.
Neste cenário, acentuam-se em todo o mundo, inclusive no Brasil, “o acúmulo
social e espacial da privação econômica, de desfiliação social e desonra cultural, com a
deterioração da classe trabalhadora” (Wacquant, 2005, p. 22), ao mesmo tempo em que se
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Caldeira, 2000; 1997; Wacquant, 2005; Carlos, 2013, Baierl, 2004.
vivencia nos países capitalistas centrais a erosão do Estado Social. Ademais, no Brasil, a
crise desse padrão regulatório também provocou alterações nos modos de intervenção do
Estado, expondo mais fortemente as sequelas da questão social advindas da extrema
pobreza, aliadas também às diferentes formas históricas de “exclusão”, como aquelas de
base cultural, racial e de gênero.
A conjugação destes vários fatores faz reacender,
[...] a concepção moralista e moralizadora que hoje organiza as formas pelas quais
são enunciadas as ameaças representadas pelas manifestas e crescentes
distâncias sociais e culturais entre os deserdados e os vencedores do mercado, ao
responsabilizar os pobres e excluídos pela sua pobreza e exclusão, reintroduz no
discurso público a ótica estigmatizadora que demonizou as camadas populares no
século XIX. O recalcado pânico social das “classes perigosas” retorna ao imaginário
coletivo (...) e participa da condenação do subproletariado urbano. Condenando-o à
desqualificação, à invisibilidade e à inutilidade sociais, transforma-o de fração pobre
do salariat em segmento marginal da sociedade. Condenando-o a exclusão da
divisão social do trabalho e a viver em uma economia da pobreza, não raro alimenta-
o com as práticas do capitalismo predatório das drogas e do roubo. Condenando-o
ao cárcere de um ambiente social e cultural que incentiva e valoriza a prática da
violência como o único recurso simbólico, produz, especialmente para os jovens, a
ilusão do reconhecimento social (Ribeiro, 2001, p.14).
IV. CONCLUSÃO
9 Vilas
- a favela maranhense (Diniz, 2007), no geral, estes espaços são constituídos através de
processos ilegais de ocupação.
dados coletados na pesquisa que deu substrato a este trabalho, pois 100% dos
respondentes entrevistados disseram que optaram por morar nessa modalidade de
residência por questão de segurança. Ainda que 35% tenham destacado como motivação a
busca de mais qualidade de vida, e 17% tenham alegado a praticidade 10 deste tipo de
moradia.
Caldeira (2000), também diz que o anseio por segurança no urbano se coloca
em evidência nas últimas décadas, haja vista que a apreensão da violência e a
disseminação do medo permeiam as relações da sociabilidade citadina. Isto fica
demonstrado na resposta de um entrevistado: “vim morar aqui devido ao alto índice de
violência como roubo em residências soltas; em condomínio fechado tenho segurança,
posso viajar sem preocupações”.
Nesse contexto, em que a preocupação com a segurança e proteção se
sobressaem, vê-se que fatores como qualidade de vida e praticidade aparecem como
motivações secundárias, porém não menos importantes, visto que são estratégias de
fetichização do espaço urbano enquanto mercadoria. Carlos (2013, p. 106) afirma que:
O espaço urbano tornado mercadoria faz com que seu acesso seja
determinado pelo mercado imobiliário; deste primeiro acesso, redefinem-se
outros – por exemplo, a bens e serviços urbanos, à centralidade – uma vez
que os usos (tanto produtivos quanto improdutivos), submetidos ao valor de
troca se articulam a partir do lugar da moradia.
Os dados também mostraram que 42% dos entrevistados já haviam residido em
outros condomínios enquanto 58% estavam vivenciando esta experiência pela primeira vez,
ou seja, nunca haviam morado nesse tipo de empreendimento. A análise desse dado
demonstra que a procura por essa forma de moradia, enquanto alternativa de segurança e
defesa pessoal de caráter privado, expressa a inoperância do Estado como garantidor de
segurança pública, e, ao mesmo tempo expõe que tal ausência estatal acaba por se mostrar
favorável ao mercado imobiliário e à indústria privada de segurança.
Pode-se dizer, portanto, que essa concepção de segurança reforça o
individualismo e minimiza a compreensão do direito coletivo à segurança, pois, de acordo
com Baierl (2004, p.63), essa postura faz com que os cidadãos tenham resistência a
entender que as possibilidades de enfrentamento e interrupção do ciclo da violência se
encontram na esfera pública.
Os depoimentos a seguir denotam bem essa concepção de segurança
associada a liberdade individual, que destacamos anteriormente:
(...) saber que eu não preciso me preocupar com a minha família e com os meus
pertences, e poder transitar sem medo pelo ambiente;
(...) não ter preocupação com a entrada e saída se pessoas estranhas, poder ficar
com as janelas e portas abertas sem a preocupação de fechá-las em determinado
horário”;
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Refere-se à oferta de serviços, tais como: salões de festas, academia, quadras esportivas, etc.
(...) andar e viver livremente sem preocupação de estranhos adentarem à casa”;
“poder viajar tranquilamente”;
REFERÊNCIAS