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Caracterização Físico-Química riginal A


Amostras de Mel
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Caracterização Físico-Química de Amostras de Mel

Physicochemical Characterization of Honey Samples

Jairo da Silva Diasa; Aline Cristina de Camargob; Cláudia Smaniotto Barinc*; Ricardo Machado Ellensohnd

Resumo
Este trabalho teve como objetivo avaliar a qualidade de amostras de mel. Seis amostras de mel foram analisadas das quais três eram
industrializadas (A1, A2 e A3), adquiridas no comércio local, e três adquiridas de vendedores ambulantes (A4, A5 e A6). Os parâmetros
avaliados foram: umidade, açúcares redutores, sacarose, cinzas, pH, acidez livre (meq kg-1), lactônica (meq kg-1) e total (meq kg-1), °Brix,
sólido insolúvel em água, reações de Fiehe, Lugol e Lund. Os resultados das análises indicaram que as amostras industrializadas apresentaram
resultados concordantes com os padrões e qualidade preconizados pela Legislação, enquanto que as amostras obtidas de ambulantes
apresentaram indicativo de adulteração do produto.
Palavras-chave: Mel. Análise físico-química. Controle de qualidade
Abstract
The objective of this work was to evaluate the quality of honey samples. Six honey samples were analyzed: three were industrialized (A1, A2
and A3), acquired in a local market, and three from peddlers (A4, A5 and A6). The analyzed parameters were: humidity, reducing sugars,
sucrose, ashes, pH, free (meq kg -1), lactonic (meq kg -1) and total acidity (meq kg -1), °Brix, water-insoluble solid, and Fiehe, Lugol and Lund
reactions. The results showed that A1, A2 and A3 samples were in accordance with the quality patterns established by the legislation, whereas
A4, A5 and A6 samples presented product adulteration.
Key-words: Honey. Physicochemical analysis. Quality control.

a
Discente - Química Industrial - Universidade Norte do Paraná não controladas pelo homem, como: clima, solo, floração,
(UNOPAR). E-mail: jairo.dias@unopqr.br presença de insetos sugadores e outros fatores (BASTOS,
b
Discente - Química Industrial - Universidade Norte do Paraná
(UNOPAR). E-mail: aline_cristina_camargo@hotmail.com
1994; CAMPOS et al., 2003).
c
Doutora - Química - Universidade de São Paulo (USP), Docente da Muitos autores têm avaliado a qualidade do mel
Universidade Norte do Paraná (UNOPAR). E-mail: claudia.barin@unopar.br comercializado no Brasil (ARAÚJO; SILVA; SOUSA,
d
Doutor em Química Orgânica - Universidade de São Paulo (USP).
Docente - Universidade Norte do Paraná (UNOPAR), E-mail:
2006; LEAL; SILVA; JESUS, 2001; RODRIGUES et. al.
ricardo.ellensohn@unopar.br 2005; SODRÉ et.al., 2007). Em muitos destes estudos, tem-
* Endereço para correspondência: Gilberto Fieli, 375, Jardim Esperança, se verificado que um número considerável de amostras não
Londrina – PR. CEP. 86046-660. atende as especificações das normas brasileiras (BRASIL,
2000) e internacionais (CODEX ALIMENTARIUS, 2001).
1 Introdução As análises físico-químicas indicadas pela legislação
brasi­leira para o controle de qualidade do mel puro são:
O mel, produto natural elaborado por abelhas a partir do umidade, hidroximetilfurfural (HMF), açúcares redutores,
néctar das flores, é coletado e transformado por elas por meio de sacarose aparente, cinzas, acidez livre, sólidos insolúveis em
dois processos básicos: um físico, evaporação da água e outro água e atividade diastásica (BRASIL, 2000).
químico, adição de enzimas. Ele é um dos produtos da colméia O teor de umidade é o principal fator determinante da
mais usados, tanto in natura quanto em diversas formas viscosidade e fluidez do mel, além de ser indicativo importante
industrializadas (KOMATSU; MARCHINI; MORETI, 2002). da tendência à fermentação, não podendo ultrapassar valores
O mel é considerado um dos alimentos mais puros da acima de 20% (BRASIL, 2000; CODEX ALIMENTARIUS,
natureza, apreciado por seu sabor característico e considerável 2001), devido à facilidade de desenvolvimento de certos
valor nutritivo, seu preço é relativamente alto, o que incentiva microrganismos responsáveis pela fermentação (BERA;
muitas vezes a sua adulteração (ARAÚJO; SILVA; SOUSA, MURADIAN, 2007).
2006). O teste de Fiehe é uma análise qualitativa diretamente ligada
Diversos parâmetros físico-químicos e microbiológicos à cor vermelha presente na reação do hidroximetilfurfural
vêm sendo utilizados na caracterização do mel. Trata-se de (HMF) com a resorcina. A cor vermelha persistente indica
um alimento complexo do ponto de vista biológico e analítico, positividade ou presença elevada de HMF, possivelmente
pois sua composição depende de uma série de variáveis mais de 200 mg/kg (LEAL; SILVA; JESUS, 2001). O HMF

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é utilizado como indicador de qualidade, uma vez que tem 2 Material e Método
origem na degradação de enzimas presentes nos méis e indica a
Todas as análises foram realizadas no laboratório de
adulteração do mel por adição de açucar comercial, estocagem
química da UNOPAR - Universidade Norte do Paraná. As
inadequada ou superaquecimento (RODRIGUES, et al., 2005)
O mel é naturalmente ácido, podendo seu pH variar de amostras foram adquiridas em diferentes pontos de venda
3,3 a 4,6 (BRASIL, 2000). Segundo Leal; Silva e Jesus no comércio local de Londrina e região. Os experimentos
(2001), valores alterados de pH podem indicar fermentação foram conduzidos com 6 amostras de méis em 3 repetições,
ou adulteração do mel. Embora o pH não seja indicado, das quais três eram industrializadas (A1, A2 e A3) e três
atualmente, como análise obrigatória no controle de qualidade foram adquiridas de vendedores ambulantes (A4, A5 e A6).
dos méis brasileiros, mostra-se útil como variável auxiliar Os resultados obtidos foram comparados com os padrões de
para avaliação da qualidade. qualidade da legislação brasileira.
A origem da acidez do mel pode estar associada à variação
Os parâmetros analisados foram: açúcares redutores (AR);
dos ácidos orgânicos causada pelas diferentes fontes de
açúcares totais (AT); açúcares não redutores em sacarose;
néctar, pela ação da enzima glicose-oxidase que origina o
ácido glucônico ou ainda, pela ação das bactérias durante a umidade; acidez livre; acidez titulável; acidez total; pH;
maturação do mel. Pela Legislação Vigente (BRASIL, 2000), cinzas; sólidos insolúveis em água, teste de Lugol; teste de
o mel não deve ultrapassar o valor de 40 miliequivalentes Fiehe e reação de Lund.
de acidez/ kg de mel enquanto que, de acordo com Codex Os procedimentos analíticos foram realizados de acordo
Alimentarius a acidez máxima é de 50 meq. kg . -1
com a metodologia proposta pelo Instituto Adolfo Lutz
O teste de Lund permite identificação de méis adulterados (2005), exceto a determinação de açúcares totais (%), de
por adição de xaropes e a detecção de méis artificiais. Este teste açúcares redutores (%) e de sacarose (%) que foi realizada
fundamenta-se na precipitação de substâncias albuminóides
por meio do método de Lane-Eynon, que se baseia na redução
naturais do mel pelo ácido tânico.
de cobre, do reagente de Fehling, pelos grupos redutores dos
O teste de Lugol é um indicador de adulteração, pois
açúcares presentes no mel.
quando há adição de amido há uma reação que apresenta
mudança na coloração, o amido oclui o iodo formando um 3 Resultados e Discussão
complexo vermelho-violeta indicando adulteração no mel.
Com base nos dados supracitados, este trabalho tem como A tabela 1 apresenta os valores médios obtidos nas
objetivo avaliar as características físico-quimicas de amostras análises físico-químicas para as 6 amostras de méis adquiridas
de mel comercializadas em Londrina (PR) e região. no comércio formal e informal de Londrina e região.

Tabela 1: Parâmetros Físico-químicos para méis comercializados em Londrina–PR e região

Parâmetro\Amostra A1 A2 A3 A4 A5 A6 Padrão

Açúcar total (AT) % 78,13 79,36 77,40 84,18 77,16 76,90 ----

Açúcares redutores (AR) % 72,67 76,22 72,67 74,40 74,40 69,40 Mín. 65*; **

Sacarose % 5,46 3,14 4,73 9,78 2,76 7,48 Máx.6*; 5**

Umidade % 16,43 14,54 13,48 12,20 19,00 17,60 Máx. 20 *; **

Cinzas % 0,06 0,04 0,02 0,02 0,13 0,19 Máx. 0,60*

pH 3,88 4,06 4,01 3,20 3,60 3,88 3,30 - 4,60*

Acidez livre (meq kg )-1


30,01 14,73 14,73 34,96 47,79 34,20 ----

Acidez lactônica (meq kg-1) 4,84 2,91 1,93 1,94 4,83 2,43 -----

Acidez total (meq kg-1) 34,85 17,69 16,66 36,63 52,57 36,60 Máx. 50 meq.Kg-1 *; **
Máx. 0,1*; **
Sólido insolúvel em água % 0,04 0,09 0,06 0,25 0,32 0,28

Reação de Lund (ml) 2 2 4 0 5 0

Reação de Fiehe (cor) - - - + - + -

Reação do Lugol (cor) - - - + - + -


* Especificações da Norma Brasileira (BRASIL, 2000).
** Especificações da Norma Internacional (CODEX ALIMENTARIUS, 2002).

20 DIAS, J. S. et al. / UNOPAR Cient. Exatas Tecnol., Londrina, v. 8, n. 1, p. 19-22, Nov. 2009.
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Os resultados mostram que o conteúdo de açúcares precipitado forma um depósito de 0,6 a 3,0 ml, no entanto
redutores obtido para as amostras analisadas variou de 69,40% para as amostras A4 e A6 a reação não ocorre, sendo um
a 76,22%. As normas nacionais estabelecem mínimo de 65% e indicativo de superaquecimento do mel ou de adulteração
o Codex Alimentarius de 60,0%, sendo que o resultado médio por adição de xarope ou açúcar invertido. Para as amostras
obtido encontra-se dentro dos parâmetros exigidos nacional e A3, A5 valores acima do permitido na legislação foram
internacionamente para o mel. observados. Valores excessivos podem igualmente serem
Os resultados obtidos para açúcares totais variaram de indicativos de adulteração.
76,90 a 84,18%, entretanto não existe um valor estabelecido Para a reação de Lugol, as amostras A4 e A6 apresentaram
para açúcares totais pelos padrões de qualidade brasileiro e resultado positivo apresentando coloração marrom-
europeu. avermelhada. Este resultado é indicativo de adulteração do
A porcentagem de sacarose variou de 2,76 a 9,78%. As produto com amido e dextrinas.
normas nacionais estabelecem um máximo de 6,0% e o Codex Os resultados obtidos na tabela 1, para valor de sólido
Alimentarius de 5,0% estando, portanto as amostras A4 e A6 insolúvel variaram de 0,04 a 0,32% estando, portanto as
fora das especificações de qualidade para as normas nacionais amostras A4, A5 e A6 fora das especificações de qualidade
e as amostras A1, A4 e A6 não conformes para o Codex exigida pela legislação brasileira (máximo de 0,1%). Estes
Alimentarius. resultados podem estar associados à não decantação e/ou
Há uma grande variação na distribuição da sacarose filtração no final do processo de retirada do mel.
nas amostras de mel nos diversos trabalhos encontrados
4 Conclusões
na literatura. Os resultados podem ser um indicativo de
adulteração do mel, conforme sugerido por Sodré et.al. (2007). Os resultados obtidos mostram que apenas as amostras
Para o parâmetro umidade, todas as amostras estão em industrializadas A1, A2 e A3 apresentaram valores dentro dos
conformidade com os padrões estabelecidos (BRASIL, 2000), previstos, enquadrando-se nas especificações da Legislação
apresentando resultados inferiores a 20%. Brasileira e internacionais para qualidade de mel, para todos
O pH dos méis estudados está em conformidade com a os parâmetros analisados, enquanto que as amostras obtidas
legislação, variando de 3,60 a 4, 06, exceto para a amostra A4 de vendedores ambulantes (A4, A5 e A6) apresentaram
que apresentou um valor de pH de 3,20. Este valor pode ser resultados não conformes para a qualidade do mel.
indicativo de processos fermentativos ou de adulteração do Agradecimento
produto, colaborando com o resultado apresentado no teste de
Fiehe, para a referida amostra. Os autores agradecem aos técnicos do laboratório da
De acordo com os dados apresentados na tabela 1, para UNOPAR: Cibele Cardoso, Lilian Rodrigues e Márcia
o índice de acidez apenas a amostra A5 não se enquadra nas Fornasieri Domingos pela colaboração no desenvolvimento
normas de qualidade para o mercado consumidor que de do trabalho.
acordo com a Legislação Vigente (BRASIL, 2000), não deve Referências
ultrapassar o valor de 40 miliequivalentes de acidez/kg de mel
ARAÚJO, D.R.; SILVA, R.H.D.; SOUZA, G.S. Avaliação da
enquanto que, de acordo com Codex Alimentarius a acidez qualidade físico-química do mel comercializado na cidade de
máxima é de 50 meq. kg-1. Crato, CE. Revista de Biologia e Ciências da Terra, Campina
Os teores de cinzas variaram de 0,02% a 0,19%, o que Grande, v.6, n.1, p. 51- 55, set. 2006.
atende ao valor de referência estabelecido na legislação BASTOS, D.H.M. Açúcares do mel: aspectos analíticos. Revista
de Farmácia e Biologia, v.12, n.1, p.151-157, 1994.
brasileira vigente, de no máximo 0,6%. Os maiores teores de
cinzas foram encontrados para as amostras A5 e A6. De acordo BATISTA, C. A natureza é o meio. In: ALMANAQUE Rural
Apicultura. São Paulo: Escala, p. 64-65, 2004.
com Venturini, Sarcinelli e Silva (2007), o teor de cinzas é
influenciado pela origem botânica da flor, expressando a BRASIL, Ministério da Agricultura, Pecuária e Abas­tecimento,
Instrução Normativa 11, de 20 de outubro de 2000, Regulamento
riqueza do mel em minerais, entretanto, o teor de cinzas muito técnico de identidade e qua­lidade do mel. Disponível em: http://
alto indica que o mel sofreu adulterações. www. agricultura.gov.br/das/dipoa/anexo_ intrnorm11. htm.
Os resultados indicam a presença de HMF acima dos Acesso em: 20 abr. 2007.
valores permitidos, para as amostras A4 e A6, sendo um BERA, A.; MURADIAN, L.B.A. Propriedades físico-químicas
indicativo de superaquecimento do mel ou de adulteração por de amostras comerciais de mel com própolis do estado de São
Paulo, Ciência e Tecnologia de Alimentos, Campinas, v.27, n.1,
adição de glicose ou açúcar invertido. p.49-52, 2007.
Na reação de Lund o resultado variou entre 0 e 5 ml
CAMPOS, G. et al. Classificação do mel em floral ou mel de
indicando a presença de substâncias estranhas no mel, melato, Ciência e Tecnologia de Alimentos, Campinas, v.23, n.1,
na presença de substâncias albuminóides, componentes p.1-5, 2003.
normais no mel e que são precipitados pelo ácido tânico CODEX ALIMENTARIUS. Revised codex standard for
adicionado na amostra. De acordo com a legislação este honey. Rev. 2 [2001]. 24th Session of the Codex Alimentarius

DIAS, J. S. et al. / UNOPAR Cient. Exatas Tecnol., Londrina, v. 8, n. 1, p. 19-22, Nov. 2009. 21
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22 DIAS, J. S. et al. / UNOPAR Cient. Exatas Tecnol., Londrina, v. 8, n. 1, p. 19-22, Nov. 2009.

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