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Imperialismo [SELEÇÃO DE TEXTOS] Prof.

Demian Melo

Texto 1
O caráter mundial do capitalismo: “Pela exploração do mercado mundial, a burguesia
imprime um caráter cosmopolita è produção e ao consumo em todos os países. Para grande
pesar dos reacionários, ela retirou a base nacional da indústria. As indústrias nacionais
tradicionais foram, e ainda são, a cada dia destruídas. São substituídas por novas indústrias, cuja
introdução se tornou essencial para todas as noções civilizadas. Essas indústrias não utilizam
mais matérias-primas locais, mas matérias-primas provenientes das regiões mais distantes, e
seus produtos não se destinam apenas ao mercado nacional, mas também a todos os cantos da
Terra. Ao invés das necessidades antigas, satisfeitas por produtos do próprio país, temos novas
demandas supridas por produtos dos países mais distantes, de climas os mais diversos. No lugar
1 da tradicional auto-suficiência e do isolamento das nações surge uma circulação universal, uma
interdependência geral entre os países. E isso tanto na produção material quanto na intelectual.
Os produtos intelectuais das nações passam a ser de domínio geral. A estreiteza e o isolamento
nacionais tornam-se cada vez mais impossíveis, e das muitas literaturas nacionais e locais nasce
uma literatura mundial.” Karl Marx e Friedrich Engels, Manifesto do Partido Comunista, 1848

Texto 2
“O imperialismo é a expressão política do processo de acumulação do capital, em sua
competição pelo domínio de áreas do globo ainda não conquistadas pelo capital.
Geograficamente essas áreas abrangem, mesmo hoje, vastas regiões da Terra. Em comparação
com a massa enorme de capital já acumulado nos velhos países capitalistas, do capital que luta
por encontrar novos mercados para seu mais-produto e possibilidades de capitalização para sua
mais-valia, e em função da rapidez com que hoje se transformam as culturas pré-capitalistas em
capitalistas, ou, em outras palavras, em comparação com o alto grau de desenvolvimento
alcançado pelas forças produtivas do capital, esse campo que lhe resta para a expansão parece
mínimo. É isso que determina forma de atuação do capital internacional no cenário mundial.
Dado o grande desenvolvimento e a concorrência cada vez mais violenta entre os países
capitalistas na conquista das regiões não-capitalistas, o imperialismo tanto aumenta em
violência e energia seu comportamento agressivo em relação ao mundo não-capitalista, como
agrava as contradições entre os países capitalistas concorrentes.” Rosa Luxemburgo, A
acumulação de capital (1913)

Texto 3
Nova fase do capitalismo: “(...) Assim, as fases principais da história dos monopólios podem
resumir-se do seguinte modo: 1) Anos 1860-1880: ponto culminante do desenvolvimento da
livre concorrência. Os monopólios não são mais do que germes quase imperceptíveis. 2) Após a
crise de 1873, período de grande desenvolvimento dos cartéis; no entanto, eles são ainda apenas
a exceção. Apresentam ainda falta de estabilidade. Têm um caráter passageiro. 3) Auge de fins
do século XIX e crise de 1900-1903: os cartéis passam a ser uma das bases de toda a vida
econômica. O capitalismo transformou-se em imperialismo.” Imperialismo, fase superior do
capitalismo (1916)
Territorialismo: “(...) o traço característico do período que nos ocupa é a partilha definitiva do
planeta, definitiva não no sentido de ser impossível reparti-lo de novo – pelo contrário, novas
partilhas são possíveis e inevitáveis –, mas no sentido de que a política colonial dos países
colonialistas já completou a conquista de todas as terras não ocupadas que havia no nosso
planeta. Pela primeira vez o mundo encontra-se já repartido, de tal modo que, daqui por diante,
só se poderão efetuar novas partilhas, ou seja, a passagem de territórios de um “proprietário”
para outro, e não a passagem de um território sem proprietário para um “dono”.” (Idem)

Texto 4
“Usarei o termo ‘imperialismo’ para designar a prática, a teoria e as atitudes de um centro
metropolitano dominante governando um território distante; o ‘colonialismo’, quase sempre
uma conseqüência do imperialismo, é a implantação de colônias em territórios distantes.” (...)
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“Em nossa época, o colonialismo direto se extinguiu em boa medida; o imperialismo, como
veremos, sobrevive onde sempre existiu, numa espécie de esfera cultural geral, bem como em
determinadas práticas políticas, ideológicas, econômicas e sociais.” Edward Said, Cultura e
Imperialismo (1993)
(...)
“O que pretendo examinar é a maneira pela qual os processos imperialistas ocorreram além do
plano das leis econômicas e das decisões políticas, e – por predisposição, pela autoridade de
formações culturais identificáveis, pela consolidação contínua na educação, literatura, artes
visuais e musicais – manifestaram-se em outro nível de grande importância, o da cultura
nacional, que tendemos a apresentar como algo asséptico, um campo de monumentos
2 intelectuais imutáveis, livres de filiações mundanas.” (Idem)
(...)
“A primazia dos impérios britânico e francês não obscurece de forma alguma a
expansão moderna realmente notável da Espanha, Portugal, Holanda, Bélgica, Alemanha, Itália
e, de outra maneira, da Rússia e dos Estados Unidos. A Rússia, porém, adquiriu seus territórios
imperiais quase exclusivamente por contiguidade. Ao contrário da Inglaterra ou da França, que
saltavam para outros continentes a milhares de quilômetros de suas fronteiras, a Rússia ia
engolindo qualquer terra ou povo que estivesse perto de seus limites, os quais, com isso,
continuavam avançando cada vez mais para o sul e o leste. Mas, nos casos inglês e francês, a
simples distância de territórios atraentes exigia a arregimentação de vastos interesses; e este é o
foco que adoto aqui, em parte porque estou interessado em examinar o conjunto de formas
culturais e estruturas de sentimentos assim produzidas, em parte porque o domínio ultramarino é
o mundo onde cresci e nele ainda permaneço. A condição de superpotência da Rússia e dos
Estados Unidos, usufruída por quase meio século, deriva de histórias muito diferentes e de
trajetórias imperiais diversas. Existem muitas variedades de dominação e reação, mas o tema
deste livro é a “ocidental”, junto com a resistência por ela gerada.
Na expansão dos grandes impérios ocidentais, o lucro e a perspectiva de mais lucro
foram, evidentemente, de enorme importância, como provam amplamente os atrativos das
especiarias, açúcar, escravos, borracha, algodão, ópio, estanho, ouro e prata ao longo dos
séculos. Também havia a inércia, o investimento em negócios já existentes, a tradição e o
mercado ou forças institucionais que mantinham os empreendimentos em atividade. Mas, para o
imperialismo e o colonialismo, não é só isso. Havia um comprometimento por causa do lucro, e
que ia além dele, um comprometimento na circulação e recirculação constantes, o qual, por um
lado, permitia que pessoas decentes aceitassem a ideia de que territórios distantes e respectivos
povos deviam ser subjugados e, por outro, revigorava as energias metropolitanas, de maneira
que essas pessoas decentes pudessem pensar no imperium como um dever planejado, quase
metafísico, de governar povos subordinados, inferiores ou menos avançados. Não podemos
esquecer que era mínima a resistência doméstica a esses impérios, ainda que muitas vezes
fossem fundados e mantidos em condições adversas e até desvantajosas. Além das imensas
dificuldades enfrentadas pelos colonizadores, havia ainda a disparidade física, tremendamente
arriscada, entre um pequeno número de europeus a uma enorme distância do lar e o número
muito maior de autóctones em seu território natal. Na Índia, por exemplo, na década de 1930,
“meros 4 mil funcionários públicos ingleses, assistidos por 60 mil soldados e 90 mil civis (em
sua maioria, homens de negócios e membros do clero) tinham se imposto a um país de 300
milhões de habitantes”. Mal conseguimos fazer ideia da força de vontade, da autoconfiança e até
da arrogância necessárias para manter tal estado de coisas, mas, como veremos nos textos de A
passage to India [Passagem para a Índia] e Kim, essas atitudes têm uma importância pelo menos
equivalente à da mera quantidade de membros do serviço público ou das forças armadas, ou aos
milhões de libras que a Inglaterra extraía da Índia.” (Idem).

Texto 5
“Formas antigas de imperialismo dependeram diretamente de conquistas e dominação colonial.
O capitalismo ampliou o alcance da dominação para muito além da capacidade de controle
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político direto ou da ocupação colonial, simplesmente impondo e manipulando as operações de


um mercado capitalista. Assim como as classes capitalistas não precisam do comando político
direto sobre os trabalhadores sem propriedade, os impérios capitalistas podem se valer de
pressões econômicas para explorar sociedades subordinadas. Mas, assim como os trabalhadores
tiveram de se tornar dependentes do capital e ser mantidos nessa dependência, também as
economia subordinadas devem se tornar e ser mantidas vulneráveis à manipulação econômica
do capital e pelo mercado capitalista – um processo que pode ser violento.” Ellen Wood, O
império do capital (2003)

3 Texto 6
O Fardo do Homem Branco (1899) A história dos comuns.
Rudyard Kipling As portas que não deves entrar
As estradas que não deves passar
Tomai o fardo do Homem Branco - Vá, construa-as com a sua vida
Envia teus melhores filhos E marque-as com a sua morte.
Vão, condenem seus filhos ao exílio
Para servirem aos seus cativos; Tomai o fardo do homem branco -
Para esperar, com arreios E colha sua antiga recompensa -
Com agitadores e selváticos A culpa de que farias melhor
Seus cativos, servos obstinados, O ódio daqueles que você guarda
Metade demônio, metade criança. O grito dos reféns que você ouve
(Ah, devagar!) em direção à luz:
Tomai o fardo do Homem Branco - "Porque nos trouxeste da servidão
Continua pacientemente Nossa amada noite no Egito?"
Encubra-se o terror ameaçador
E veja o espetáculo do orgulho; Tomai o fardo do homem branco -
Pela fala suave e simples Vós, não tenteis impedir -
Explicando centenas de vezes Não clamem alto pela Liberdade
Procura outro lucro Para esconderem sua fadiga
E outro ganho do trabalho. Porque tudo que desejem ou sussurrem,
Porque serão levados ou farão,
Tomai o fardo do Homem Branco - Os povos silenciosos e calados
As guerras selvagens pela paz - Seu Deus e tu, medirão.
Encha a boca dos Famintos,
E proclama, das doenças, o cessar; Tomai o fardo do Homem Branco!
E quando seu objetivo estiver perto Acabaram-se seus dias de criança
(O fim que todos procuram) O louro suave e ofertado
Olha a indolência e loucura pagã O louvor fácil e glorioso
Levando sua esperança ao chão. Venha agora, procura sua virilidade
Através de todos os anos ingratos,
Tomai o fardo do Homem Branco - Frios, afiados com a sabedoria amada
Sem a mão-de-ferro dos reis, O julgamento de sua nobreza.
Mas, sim, servir e limpar -

Texto 7
“Nosso método de investigação é simples: propomo-nos a analisar o nascimento e a vida do
imperialismo por meio de exemplos históricos que considero típicos. Um traço comum surge
em cada caso, fazendo com que o problema sociológico do imperialismo seja um único, em
todas as épocas, embora com diferenças substanciais entre os casos individuais. Dai o plural
‘imperialismos’ no título.” Joseph Alois Schumpeter, Sociologia dos Imperialismos (1919)

Imperialismo como atavismo social “O imperialismo tem, portanto, um caráter atávico.


Enquadra-se num grande grupo de características que sobrevivem de eras remotas, e que
desempenham um papel importante em toda situação social concreta. Em outras palavras, é um
elemento que provém de condições vivas, não do presente, mas do passado (...). É um atavismo
da estrutura social, dos hábitos individuais psicológicos, de reação emocional. Como as
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necessidades vitais que o criaram desapareceram para sempre há muito, também ele deve
desaparecer gradualmente, muito embora qualquer ação bélica, por menos imperialista que seja
o seu caráter, volte a revivê-lo. O imperialismo tende a desaparecer como elemento estrutural
porque a estrutura que o colocou em destaque está em declínio, dando lugar, no curso da
evolução social, a outras estruturas onde não há lugar para ele, e que eliminam os fatores do
poderio que eram o seu fundamento. Tende a desaparecer como elemento de reação emocional
habitual, devido à racionalização progressiva da vida e do espírito, processo no qual as antigas
necessidades funcionais são absorvidas por novas tarefas, no decurso das quais as antigas
energias militares são modificadas funcionalmente. (...) Nossos exemplos mais recentes de
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imperialismo inegável e claro são as monarquias absolutistas do século XVIII. E são, sem
dúvidas, “mais civilizados” do que os seus predecessores.” (Idem).

Texto 8
O imperialismo e suas interpretações
Harry Magdoff

Analistas sérios de ambos os lados da controvérsia reconhecem que estão envolvidos no


caso grande número de fatores: os principais expoentes do imperialismo econômico admitem
que estiveram também em jogo influências políticas, militares e ideológicas; analogamente,
numerosos autores que questionam a tese do imperialismo econômico concordam em que os
interesses econômicos desempenharam um papel significativo no particular. O problema,
contudo, é o de atribuir prioridade às causas.
Imperialismo econômico. O pai da interpretação econômica do novo imperialismo foi o
economista liberal britânico John Atkinson Hobson. Em seu fecundo trabalho Imperialism: A
Study (publicado em 1902), mencionou ele o papel que tais forças como o patriotismo, a
filantropia e o espírito de aventura na promoção da causa imperialista. Conforme o interpretava,
contudo, a questão crítica era saber por que a energia desses elementos ativos assumira a forma
especial de expansão imperialista. Hobson identificou a causa nos interesses financeiros da
classe capitalista como “o acelerador do motor imperial”. A política imperialista teria que ser
considerada como irracional se encarada do ponto de vista da nação como um todo: os
benefícios econômicos obtidos eram muito menores do que os custos de guerra e armamentos,
enquanto reformas sociais necessárias eram postas de lado na excitação da aventura imperial.
Mas era de fato racional aos olhos de uma minoria de grupos de interesses financeiros. E o
motivo disso, na opinião de Hobson, era a saturação persistente do capital na indústria. A
pressão de capital carece de oportunidade de investimento derivava em parte da má distribuição
da renda: o baixo poder aquisitivo de massa bloqueia a absorção de bens e de capitais pelo país.
Além disso, o modo de agir das maiores firmas, especialmente as que operam em trustes e
conglomerados, fomenta restrições à produção, procurando evitar os riscos e o desperdício da
superprodução. Em virtude disso, as grandes firmas têm poucas oportunidades de investir na
expansão da produção interna. O resultado da má distribuição da renda e do comportamento
monopolista é a necessidade de abrir novos mercados e criar novas oportunidades de
investimento em países estrangeiros.
O estudo de Hobson, porém, abrangeu um espectro mais amplo do que a análise do que
ele chamou de sua raiz econômica. Examinou também os aspectos associados ao novo
imperialismo, tais como as transformações políticas, as atitudes raciais e o nacionalismo. O
livro em seu todo causou forte impressão e influenciou profundamente pensadores marxistas,
que estavam se tornando muito interessados na luta contra o imperialismo. O mais influente dos
estudos marxistas foi o pequeno volume escrito por Lenin em 1916, intitulado Imperialismo:
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fase superior do capitalismo. A despeito de numerosas semelhanças, no fundo há uma grande


diferença entre os contextos de análises de Hobson e Lenin e também entre suas respectivas
conclusões. Enquanto Hobson pensava que o novo imperialismo servia aos interesses de certos
grupos capitalistas, acreditava também que poderia ser eliminado por reformas sociais, ao
mesmo tempo sustentando que persistiria o sistema capitalista. Isso exigiria que se restringissem
os lucros das classes cujos interesses estavam estreitamente vinculados ao imperialismo, e uma
distribuição mais equitativa da renda, de modo que os consumidores pudessem adquirir toda a
produção da nação. Lenin, por outro lado, julgava que o imperialismo estava tão profundamente
integrado na estrutura e no funcionamento normal do capitalismo avançado que acreditava que
somente sua derrubada revolucionária, com sua substituição pelo socialismo, libertaria o
5 mundo.
Lênin, note-se, colocou as questões do imperialismo em um contexto mais amplo do
que os simples interesses de um setor particular da classe capitalista. Segundo ele, o próprio
capitalismo mudara em fins do século XIX; além disso, uma vez que isso ocorrera mais ou
menos na mesma época em algumas das principais nações capitalistas, o fato explicaria por que
se iniciara a nova fase do desenvolvimento capitalista justamente nessa época. Essa nova fase,
acreditava Lenin, envolvia mudanças não só políticas e sociais, mas também econômicas; mas
sua essência econômica era a substituição do capitalismo competitivo pelo capitalismo
monopolista, ou uma fase mais avançada na qual o capital financeiro, ou uma aliança entre
grandes firmas industriais e bancárias, dominaria a vida econômica e política da sociedade. A
competição continuaria, mas entre um número relativamente menor de gigantes, que poderiam
controlar grandes setores da economia nacional e internacional. Eram esse capitalismo
monopolista e a resultante rivalidade gerada entre nações capitalistas monopolistas que
fomentavam o imperialismo; por seu lado, os processos do imperialismo estimulariam o
desenvolvimento ulterior do capital monopolista e sua influência sobre toda a sociedade.
A diferença entre o paradigma mais complexo de Lenin e o do Hobson destaca-se
claramente no tratamento que deram à exportação do capital. Da mesma forma que Hobson,
Lenin sustentava que a crescente importância das exportações de capital era um aspecto-chave
do imperialismo, embora atribuísse tal fenômeno a muito mais do que a mera superabundância
de recursos. Considerava também que a aceleração da migração do capital tinha origem no
desejo de obter controle exclusivo das fontes de matérias-primas e enrijecer o domínio sobre
mercados estrangeiros. Ele, portanto, mudou a ênfase do problema geral do capital excedente,
inerente ao capitalismo em todas as suas fases, para os imperativos do controle de matérias-
primas e mercados na fase monopolista. Com essa perspectiva, Lenin ampliou também o
conceito de imperialismo. Uma vez que o impulso era para dividir o mundo entre grupos de
interesse monopolista, a rivalidade conseqüente se estenderia à luta por mercados nas principais
nações capitalistas, bem como nos países capitalistas menos avançados e nos países coloniais.
Essa rivalidade seria intensificada devido ao desenvolvimento desigual de diferentes nações
capitalistas: os retardatários tentariam agressivamente conquistar uma fatia dos mercados e das
colônias controladas por aqueles que lá chegaram antes e que, naturalmente, opunham-se a uma
redivisão. Outras forças – políticas, militares, ideológicas – entrariam em jogo na formulação
dos delineamentos da política imperialista, muito embora Lenin insistisse m que essas
influências germinavam apenas no canteiro do capitalismo monopolista.
Imperialismo não-econômico. Talvez a teoria alternativa mais sistemática do
imperialismo tenha sido aquela proposta por Joseph Alois Schumpeter, um dos economistas
mais conhecidos da primeira metade do século XX. Seu ensaio Zur Soziologie des
Imperialismus (A Sociologia do Imperialismo) foi publicada incialmente na Alemanha, em
1919, sob a forma de dois artigos. [...]
Um estudo de impérios, começando com os primeiros dias da história escrita, levou
Schumpeter a concluir que o imperialismo apresenta três características genéricas: 1) Na sua
raiz há uma tendência persistente para a guerra e a conquista, amiúde dando origem a uma

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expansão irracional, destituída de qualquer objetivo militar válido. 2) Essa ânsia não é inata ao
homem. Evoluiu de experiências traumáticas quando povos e classes foram transformados em
guerreiros a fim de evitar a extinção; a mentalidade e os interesses de classes guerreiras
sobrevivem, contudo, e influenciam os fatos, mesmo depois de desaparecida a necessidade vital
de guerras e conquistas. 3) A tendência para a guerra e a conquista é mantida e condicionada
pelos interesses internos das classes dominantes, amiúde sob a liderança dos indivíduos que têm
mais a ganhar econômica e socialmente com as guerras. Não fossem estes fatores, acreditava
Schumpeter, o imperialismo teria sido varrido para a lata do lixo da história à medida que
amadurecia a sociedade capitalista, porquanto o capitalismo na sua forma mais pura é antitético
ao imperialismo e floresce melhor no clima de paz e livre comércio. Não obstante a natureza
6 pacífica inata ao capitalismo, contudo, emergem grupos de interesses que se beneficiam com
conquistas agressivas no exterior. Sob o capitalismo monopolista, a fusão de grandes bancos e
cartéis cria um poderoso e influente grupo social que pressiona em busca de controle exclusivo
de colônias e protetorados, tendo em vista obter lucros mais altos.
Apesar de semelhança entre a discussão de Schumpeter do monopólio e a de Lenin e
outros marxistas, uma diferença crucial se mantém de pé. O capitalismo monopolista no marco
de referências de Lenin constitui um afloramento natural de estágio prévio do capitalismo
competitivo. Mas, segundo Schumpeter, trata-se de um enxerto artificial no capitalismo
competitivo como natural, tornado possível pelo efeito catalítico do resíduo herdado da
precedente sociedade feudal. Argumentou Schumpeter que o capitalismo monopolista só pode
crescer e prosperar sob a proteção de altas barreiras alfandegárias; sem esse escudo haveria
ainda indústria em grande escala, mas não cartéis ou outros tipos de organização monopolista.
Uma vez que as barreiras tarifárias são erguidas por decisão política, é o Estado e não um
processo econômico natural que promove o monopólio. Por conseguinte, será na natureza do
Estado – e, em especial, naqueles aspectos que combinam a herança do Estado autocrático
anterior, a velha máquina de guerra, e os interesses e idéias feudais, juntamente com interesses
capitalistas – que iremos descobrir a causa do imperialismo. A forma particular do imperialismo
nos tempos modernos seria afetada pelo capitalismo e este em si modificado pela experiência
imperialista. Segundo a análise de Schumpeter, contudo, o imperialismo nem era produto
necessário nem inevitável do capitalismo.

Fonte: MAGDOFF, Harry. Imperialismo: da era colonial ao presente. Rio de Janeiro: Zahar,
1979, p.38-41.

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