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BASES FISIOLÓGICAS E FARMACOLÓGICAS DA

NUTRIÇÃO

1
Sumário
NOSSA HISTÓRIA .................................................................................. 3

INTRODUÇÃO ......................................................................................... 4

ABSORÇÃO E METABOLISMO DOS FÁRMACOS/NUTRIENTES ........ 6

FASE BIOFARMACÊUTICA .................................................................... 6

FASE FARMACOCINÉTICA .................................................................... 7

FASE FARMACODINÂMICA ................................................................... 8

INTERAÇÃO FÁRMACO-NUTRIENTE ................................................... 8

PROCESSO ABSORTIVO ..................................................................... 10

MODIFICAÇÃO DO PH DO CONTEÚDO GASTRINTESTINAL ........... 11

VELOCIDADE DO ESVAZIAMENTO GÁSTRICO ................................. 12

COMPETIÇÃO PELOS SÍTIOS DE ABSORÇÃO .................................. 13

FLUXO SANGUÍNEO ESPLÂNCNICO (FSE) ....................................... 13

INTERFERÊNCIA DO ESTADO NUTRICIONAL NA


BIODISPONIBILIDADE DOS FÁRMACOS ...................................................... 14

INTERFERÊNCIA DO FÁRMACO NO ESTADO NUTRICIONAL ......... 15

O PACIENTE IDOSO............................................................................. 16

CONFORMAÇÃO E QUÍMICA DOS FÁRMACOS E DOS RECEPTORES


......................................................................................................................... 19

NÍVEIS DE ESTRUTURA DAS PROTEÍNAS ........................................ 21

INTERAÇÕES ....................................................................................... 21

IMPACTO DA LIGAÇÃO DO FÁRMACO SOBRE O RECEPTOR ........ 24

EFEITOS DAS MEMBRANAS SOBRE AS INTERAÇÕES FÁRMACO–


RECEPTOR ..................................................................................................... 26

DETERMINANTES MOLECULARES E CELULARES DA SELETIVIDADE


DOS FÁRMACOS ............................................................................................ 28

PRINCIPAIS TIPOS DE RECEPTORES DE FÁRMACOS .................... 29

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CANAIS IÔNICOS TRANSMEMBRANA ................................................ 31

RECEPTOR NICOTÍNICO DE ACETILCOLINA REGULADO POR


LIGANTE .......................................................................................................... 33

RECEPTORES TRANSMEMBRANA ACOPLADOS À PROTEÍNA G ... 34

RECEPTORES TRANSMEMBRANA COM DOMÍNIOS CITOSÓLICOS


ENZIMÁTICOS ................................................................................................. 36

RECEPTORES COM TIROSINOCINASES ........................................... 37

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................... 39

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NOSSA HISTÓRIA

A nossa história inicia com a realização do sonho de um grupo de


empresários, em atender à crescente demanda de alunos para cursos de
Graduação e Pós-Graduação. Com isso foi criado a nossa instituição, como
entidade oferecendo serviços educacionais em nível superior.

A instituição tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de


conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a
participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua
formação contínua. Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais,
científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o
saber através do ensino, de publicação ou outras normas de comunicação.

A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma


confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base
profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições
modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica,
excelência no atendimento e valor do serviço oferecido.

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INTRODUÇÃO
O alimento, independentemente da cultura do indivíduo e da época vivida,
é um fator essencial e indispensável à manutenção e à ordem da saúde. Sua
importância está associada à sua capacidade de fornecer ao corpo humano
nutrientes necessários ao seu sustento.
Para o equilíbrio harmônico desta tarefa é fundamental a sua ingestão em
quantidade e qualidade adequadas, de modo que funções específicas como a
plástica, a reguladora e a energética sejam satisfeitas, mantendo assim a
integridade estrutural e funcional do organismo.
No entanto, esta integridade pode ser alterada, em casos de falta de um
ou mais nutrientes, com consequente deficiência no estado nutricional e
necessidade de suplementação (regime dietoterápico).
Por outro lado, os nutrientes são também capazes de interagir com
fármacos, sendo um problema de grande relevância na prática clínica, devido às
alterações na relação risco/benefício do uso do medicamento.
Estas interações são facilitadas, pois os medicamentos, na sua maioria,
são administrados por via oral.
Os nutrientes podem modificar os efeitos dos fármacos por interferirem
em processos farmacocinéticos, como absorção, distribuição, biotransformação
e excreção (Oliveira, 1991; Yamreudeewong et al., 1995), acarretando prejuízo
terapêutico.
A absorção dos nutrientes e de alguns fármacos ocorre por mecanismos
semelhantes e frequentemente competitivos e, portanto, apresentam como
principal sítio de interação o trato gastrintestinal.
Desde a década de 80, a Joint Commission on Accreditation of
Hospitals vem incentivando profissionais, como farmacêuticos e nutricionistas, a
monitorar as interações fármaco-nutriente que ocorrem com pacientes
internados, bem como orientá-los a este respeito quando eles deixam o hospital
(Murray & Healy, 1991; Lasswell & Loreck, 1992).
Portanto, na equipe de saúde, estes profissionais desempenham um
papel importante na identificação destas interações, bem como na educação de
pacientes em programas de aconselhamento (Thomas, 1995).

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Entretanto, nos Estados Unidos, em uma ampla pesquisa, constatou-se
não haver, na maioria dos hospitais, um programa de consulta formal (Wix et al.,
1992).
Um maior conhecimento em relação a este processo conduz a um controle
mais efetivo da administração do medicamento e da ingestão de alimentos,
favorecendo, assim, a adoção de terapias mais eficazes. Portanto, o presente
artigo tem como objetivo apresentar os diversos aspectos envolvidos na
interação fármaco-nutriente.

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ABSORÇÃO E METABOLISMO DOS FÁRMACOS/NUTRIENTES
A maioria dos fármacos administrados oralmente é absorvida por difusão
passiva, enquanto os nutrientes são absorvidos, preferencialmente, por
mecanismo de transporte ativo.
Quando se administra um fármaco por via oral, sua absorção pelo tubo
gastrintestinal e, consequentemente, sua concentração sanguínea, são
dependentes de vários fatores (Tabela 1) (Roe, 1984a).

O trajeto dos fármacos no organismo pode ser representado através de


três fases: biofarmacêutica, farmacocinética e farmacodinâmica (Figura 1).

FASE BIOFARMACÊUTICA
Compreende todos os processos que ocorrem com o medicamento a
partir da sua administração, incluindo as etapas de liberação e dissolução do
princípio ativo. Esta fase deixa o fármaco disponível para a absorção.
Entretanto, sua natureza química, estado físico, tamanho e superfície da
partícula, quantidade e tipo dos excipientes utilizados, processo farmacêutico
empregado e formulação são fatores os quais podem influir na biodisponibilidade
do princípio ativo, fazendo variar o tempo de absorção e a quantidade absorvida.

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FASE FARMACOCINÉTICA
Esta fase inclui os processos nos quais o organismo interfere sobre o
fármaco.
A farmacocinética é o estudo dos processos de absorção, distribuição,
biotransformação e excreção.
O metabolismo ocorre em dois tipos de reações básicas, referidas como
reações fase I e fase II (Figura 1).
A primeira inclui reações bioquímicas, como oxidação, redução e
hidrólise, as quais conduzem a modificações nas moléculas dos fármacos.
A segunda corresponde àquelas que conjugam os grupos funcionais dos
fármacos a moléculas endógenas.
Estas reações são catalisadas por enzimas ou sistemas enzimáticos,
sendo o fígado o principal local de metabolismo de compostos ativos, em função
de seu amplo sistema microssomal.
Outros órgãos e tecidos, como pulmões, rins, mucosa intestinal, pele e
plasma sanguíneo, também podem participar deste processo (Silva, 1994).
O sistema de catálise do metabolismo oxidativo, dependente do citocromo
P450, atua sobre uma ampla gama de substâncias endógenas, bem como sobre
substâncias químicas estranhas, tais como fármacos, poluentes ambientais e
carcinógenos.
Modificações na atividade desse sistema pode alterar a resposta
metabólica frente a estas substâncias (Anderson et al., 1982; Anderson, 1988).
Há similaridades na absorção, mas as distribuições metabólicas do
fármaco e do nutriente são diferentes (Figura 2).
Os nutrientes entram no processo metabólico normal da célula também
na forma de substrato para reações bioenergéticas, produzindo energia para
contrabalançar a entropia ou na forma de cofator para as reações anabólicas e
catabólicas.
Os fármacos, por sua vez, geralmente participam de reações que resultam
na modificação química, na atividade farmacológica e na sua excreção (Hayes
& Borzelleca, 1985).

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FASE FARMACODINÂMICA
Fase responsável pelo estudo das interações moleculares que regulam o
reconhecimento molecular de um fármaco pelo receptor (Barreiro & Fraga,
2001).
O resultado desta interação produz o efeito terapêutico, cuja resposta é
variável e depende de diversos fatores individuais, além dos farmacocinéticos
(Silva, 1994).
O conceito de biodisponibilidade, no sentido restrito, é o termo empregado
para descrever a fração da dose administrada de um produto farmacêutico capaz
de alcançar a circulação sistêmica e exercer ação terapêutica.
Este parâmetro expressa a extensão e a velocidade das fases
biofarmacêutica e farmacocinética da substância ativa (Reynolds, 1993).

INTERAÇÃO FÁRMACO-NUTRIENTE
As interações entre nutrientes e fármacos podem alterar a disponibilidade,
a ação ou a toxicidade de uma destas substâncias ou de ambas.
Elas podem ser físico-químicas, fisiológicas e patofisiológicas (Roe, 1985;
Roe, 1993). Interações físico-químicas são caracterizadas por complexações
entre componentes alimentares e os fármacos.
As fisiológicas incluem as modificações induzidas por medicamentos no
apetite, digestão, esvaziamento gástrico, biotransformação e clearance renal. As
patofisiológicas ocorrem quando os fármacos prejudicam a absorção e/ou
inibição do processo metabólico de nutrientes (Toothaker & Welling, 1980;
Thomas, 1995).
O consumo de alimentos com medica-mentos pode ter efeito marcante
sobre a velocidade e extensão de sua absorção.
A administração de medicamentos com as refeições, segundo aqueles
que a recomendam, se faz por três razões fundamentais: possibilidade de
aumento da sua absorção; redução do efeito irritante de alguns fármacos sobre
a mucosa gastrintestinal; e uso como auxiliar no cumprimento da terapia,

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associando sua ingestão com uma atividade relativamente fixa, como as
principais refeições (Gai, 1992; Kirk, 1995).
Entretanto, estes motivos são insuficientes para justificar este
procedimento de forma generalizada, pois a ingestão de alimentos poderá afetar
a biodisponibilidade do fármaco através de interações físico-químicas ou
químicas (Gai, 1992; Roe, 1994; Thomas, 1995).
Sendo afetada a biodisponibilidade, por modificação dos processos
farmacocinéticos, ocorrerá alteração da farmacodinâmica e da terapêutica
(Thomas, 1995).
Assim, é de fundamental importância conhecer as substâncias ativas cuja
velocidade de absorção e/ou quantidade são alteradas, bem como aquelas que
não são afetadas pela presença de nutrientes (Toothaker & Welling, 1980).
Estudos aprofundados com humanos sobre estes mecanismos têm sido
realizados, com a finalidade de demonstrar mais precisamente os efeitos dos
nutrientes sobre a biodisponibilidade dos fármacos (Radulovic et al., 1995;
Lavelle et al., 1996).
Analgésicos e anti-inflamatórios, por exemplo, são com frequência
administrados com alimentos.
O objetivo é diminuir as irritações da mucosa gástrica provocadas,
principalmente, pela administração destes medicamentos por tempo prolongado.
De acordo com a maioria das pesquisas realizadas, os nutrientes
diminuem a velocidade de absorção dos fármacos, provavelmente por
retardarem o esvaziamento gástrico (Souich et al., 1992).
O retardo na absorção de certos fármacos, quando ingeridos com
alimentos, nem sempre indica redução da quantidade absorvida.
Mas, provavelmente, poderá ser necessário um período maior para se
alcançar sua concentração sanguínea máxima, interferindo na latência do efeito.
Entretanto, substâncias que se complexam com nutrientes estão frequentemente
indisponíveis para absorção (Gai, 1992).
O sistema renal constitui uma das principais vias de excreção de
fármacos, sendo importante no processo de interação.
O pH urinário sofre variações conforme a natureza ácida ou alcalina dos
alimentos ou de seus metabólitos.

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Assim, dietas ricas em vegetais, leite e derivados elevam o pH urinário,
acarretando um aumento na reabsorção de fármacos básicos, como, por
exemplo, as anfetaminas. No entanto, com fármacos de caráter ácido, como
barbitúricos, verifica-se elevação da excreção.
Por outro lado, ovos, carnes e pães acidificam a urina, tendo como
consequência o aumento da excreção renal de anfetaminas e outros fármacos
básicos (Trovato et al., 1991; Basile, 1994).
A natureza das diferentes interações pode apresentar os seguintes
caminhos (Truswell, 1975):
• alguns nutrientes podem influenciar no processo de absorção de
fármacos;
• alguns nutrientes podem alterar o processo de biotransformação de
algumas substâncias;
• alterações na excreção de fármacos podem ocorrer por influência de
nutrientes;
• fármacos podem afetar o estado nutricional;
• o estado nutricional pode interferir sobre o metabolismo de certos
fármacos, diminuindo ou anulando seu potencial terapêutico ou aumentando seu
efeito tóxico.

PROCESSO ABSORTIVO
A influência dos nutrientes sobre a absorção dos fármacos depende do
tipo de alimento, da formulação farmacêutica, do intervalo de tempo entre a
refeição e sua administração e do volume de líquido com o qual ele é ingerido.
(Welling, 1977; Welling,1984; Williams et al., 1993; Fleisher et al., 1999).
O trato gastrintestinal representa o principal sítio de interação fármaco-
nutriente, uma vez que o processo de absorção de ambos ocorre por
mecanismos semelhantes e podem ser competitivos.
A maioria das interações clinicamente significativas ocorrem no processo
de absorção (Toothaker & Welling, 1980), segundo os estudos até hoje
realizados.

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A ingestão de alimentos é capaz de desencadear no trato digestivo a
liberação de secreção que, por ação qualitativa e quantitativa dos sucos
digestivos, age hidrolisando e degradando ligações químicas específicas,
através da ação do ácido clorídrico e de enzimas específicas (Guyton, 1992).
Portanto, substâncias sensíveis a pH baixo podem ser alteradas ou até
inativadas pelo ácido gástrico quando ingeridas com alimentos (Toothaker &
Welling, 1980), como, por exemplo no caso da inativação da penicilina e da
eritromicina (Welling, 1978; Welling, 1984).
Paralelamente, o nutriente pode influenciar na biodisponibilidade do
fármaco através da modificação do pH do conteúdo gastrintestinal,
esvaziamento gástrico, aumento do trânsito intestinal, competição por sítios de
absorção, fluxo sanguíneo esplâncnico e ligação direta do fármaco com
componentes dos alimentos (Welling, 1984; Souich et al., 1992).

MODIFICAÇÃO DO PH DO CONTEÚDO GASTRINTESTINAL


Após a ingestão de alimentos ou líquidos o pH de 1,5 do estômago se
eleva para aproximadamente 3,0.
Esta modificação pode afetar a desintegração das cápsulas, drágeas ou
comprimidos e conseqüentemente a absorção do princípio ativo.
O aumento do pH gástrico em função dos alimentos ou líquidos pode
reduzir a dissolução de comprimidos de eritromicina ou de tetraciclina (Welling &
Tse, 1982; Trovato, 1991).
Por outro lado, medicamentos como a fenitoína ou o dicumarol
desintegram-se mais facilmente com a alcalinização do pH gástrico (Welling,
1984).
O pH também interfere na estabilidade, assim como na ionização dos
fármacos, promovendo uma alteração na velocidade e extensão de absorção
(Harrison et al., 1992).

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VELOCIDADE DO ESVAZIAMENTO GÁSTRICO
A presença de alimentos no estômago contribui para o retardo do
esvaziamento gástrico, devido aos sinais de retroalimentação duodenal,
incluindo principalmente o reflexo enterogástrico e a retroalimentação hormonal.
Portanto, a velocidade do esvaziamento do estômago é limitada pela
quantidade de quimo que o intestino delgado pode processar (Guyton, 1992).
Refeições sólidas, ácidas, gordurosas, quentes, hipertônicas e volumes
líquidos acima de 300 mL tendem a induzir um acentuado retardo do
esvaziamento gástrico, enquanto refeições hiperprotéicas têm efeito menor
neste processo (Welling, 1984; Guyton, 1992).
Assim, a composição da dieta influencia o tempo de permanência dos
fármacos no trato digestivo e, consequentemente, aumenta ou diminui a
absorção dos mesmos.
O esvaziamento gástrico lento pode aumentar a absorção dos fármacos
que se utilizam de mecanismos saturantes, isto é, há um prolongamento do
tempo de contato do princípio ativo com a superfície de absorção, (Welling, 1984;
Gai, 1992), facilitando-a difusão através da membrana celular.
Aumento da atividade peristáltica do intestino
A atividade peristáltica do intestino delgado é provocada, em parte, pela
entrada de quimo no duodeno e pelo fluxo gastroentérico.
Este reflexo eleva o grau geral de excitabilidade do intestino delgado e
também aumenta a motilidade e secreção (Guyton, 1992).
O aumento moderado da motilidade tanto pode favorecer a dissolução do
medicamento, facilitando o contato das substâncias ativas com a superfície de
absorção e otimizando, assim, a velocidade do processo (Toothaker & Welling,
1980), quanto pode diminuir a sua biodisponibilidade, em função da elevação da
velocidade do trânsito intestinal.
Secreções de ácidos, enzimas e sais biliares aumentam na presença de
alimentos.
Os ácidos e sais biliares, pelas suas propriedades tensoativas, auxiliam a
solubilização e favorecem a absorção de fármacos lipossolúveis (Toothaker &
Welling, 1980; Basile, 1994).

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Os sais biliares também podem formar complexos não absorvíveis com
substâncias como a colestiramina (Toothaker & Welling, 1980; Roe, 1985). De
forma geral, as secreções podem ampliar a disponibilidade do fármaco,
dependendo da sua natureza, ácida ou básica, da lipofilicidade ou da formulação
do medicamento (Welling, 1984).
É o caso, por exemplo, da griseofulvina, que tem sua absorção aumentada
quando ingerida com dietas hiperlipídicas (Kirk, 1995).

COMPETIÇÃO PELOS SÍTIOS DE ABSORÇÃO


A presença de nutrientes pode constituir uma competição pelos sítios de
absorção, cuja conseqüência dependerá de qual componente apresentar maior
afinidade com este sítio.
A levodopa (L-dopa), usada no tratamento da doença de Parkinson, tem
ação terapêutica inibida por dieta hiperprotéica; entretanto, uma dieta
hipoprotéica potencializa e estabiliza este efeito (Duvoisin & Sage, 1996).
Esta alteração deve-se ao fato de os aminoácidos competirem com a
levodopa tanto na absorção intestinal, quanto na penetração no cérebro (Welling,
1977).

FLUXO SANGUÍNEO ESPLÂNCNICO (FSE)


A circulação esplâncnica é constituída pelo suprimento sanguíneo do trato
gastrintestinal, baço e pâncreas.
A ingestão de alimentos aumenta o fluxo sanguíneo esplâncnico, e o grau
de modificação depende do tipo e da quantidade da refeição ingerida.
Dietas hiperprotéicas e hiperlipídicas elevam o FSE, o qual é maior para
as grandes refeições do que para as pequenas.
O aumento do FSE pós-prandial tem sido implicado na diminuição do
efeito de primeira passagem, levando, portanto, à ampliação da disponibilidade
sistêmica de um número de fármacos, incluindo alguns bloqueadores beta-
adrenérgicos (Welling, 1989).

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Ligação direta do fármaco com componentes dos alimentos
(complexação)
A interação fármaco-nutriente pode ocorrer por mecanismo de
complexação, resultando na diminuição da sua disponibilidade.
Os íons di e trivalentes (Ca2+, Mg2+, Fe2+ e Fe3+), presentes no leite e
em outros alimentos, são capazes de formar quelatos não absorvíveis com as
tetraciclinas, ocasionando a excreção fecal dos minerais, bem como do fármaco
(Welling, 1977; Welling, 1984).

INTERFERÊNCIA DO ESTADO NUTRICIONAL NA


BIODISPONIBILIDADE DOS FÁRMACOS
As deficiências nutricionais resultam de quantidades de nutrientes
essenciais ingeridas inadequadamente, o que acarreta precariedade do estado
nutricional.
Este, por sua vez, pode afetar a ação do fármaco, por alterar a absorção,
a distribuição, a biotransformação e a excreção, influenciando, portanto, a
resposta terapêutica (Krishnaswamy et al., 1981; Hoyumpa & Schenker, 1982).
Provavelmente, o fator mais importante do regime alimentar no
metabolismo de compostos ativos é a quantidade de proteína na dieta.
Um regime alimentar com elevado teor de proteína e baixo teor de
carboidrato aumenta a velocidade do metabolismo do fármaco, enquanto dieta
com baixo teor de proteína e alto teor de carboidrato favorece o efeito oposto
(Roe, 1978; Roe, 1984b).
A proteína e outros nutrientes podem influenciar a atividade enzimática do
citocromo P450 microssomal hepático no homem.
Desta forma, a meia-vida plasmática de vários fármacos pode ser alterada
em função dos nutrientes oferecidos pela dieta, aumentando ou reduzindo a
atuação deste importante sistema enzimático (Anderson et al., 1982; Roe,
1984b; Basile, 1994).
Micronutrientes (zinco, magnésio, ácido ascórbico e riboflavina)
apresentam papel de grande relevância na metabolização hepática de fármacos
(Insogna et al., 1980; Hoyumpa & Schenker, 1982), como é o caso do zinco,

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essencial para enzimas específicas associadas às fases I e II no processo de
biotransformação.

INTERFERÊNCIA DO FÁRMACO NO ESTADO NUTRICIONAL


Os fármacos podem modificar o metabolismo de nutrientes. Estas
interações normalmente resultam em alteração do estado nutricional (Trovato et
al., 1991), sendo imprescindível o controle do uso de substâncias produtoras de
efeitos prejudiciais à nutrição, como, por exemplo, o metotrexato e a ciclosporina,
que danificam a mucosa intestinal, diminuindo a absorção de cálcio (Roe,
1984a).
No tratamento de doenças crônicas, o uso prolongado de medicamentos
pode provocar a perda de nutrientes. Nestes casos, a suplementação dietética é
necessária para restabelecer as condições nutricionais normais do paciente.
A alteração causada pelas substâncias ativas na absorção de nutrientes
pode ser primária ou secundária. A má absorção primária induzida por
medicamentos é uma consequência dos efeitos diretos dos agentes
farmacológicos sobre a mucosa ou sobre o processo intraluminal (Tabela 2).
A má absorção secundária é causada pelo pobre estado fisiológico ou,
ainda, pela interferência do fármaco sobre o metabolismo de um nutriente que,
por sua deficiência, poderá ocasionar a má absorção de outros (Roe, 1984a;
Trovato et al., 1991).
Substâncias como antiácidos, laxativos e antibióticos (Tabela 2) podem
causar a perda de nutrientes.
O uso prolongado de laxativos estimulantes como bisacodil induz o
aumento da velocidade do trânsito intestinal e consequentemente reduz a
absorção de glicose, proteína, sódio, potássio e algumas vitaminas, enquanto o
uso excessivo daqueles que contêm fenolftaleína diminui a absorção de
vitaminas C e D (Roe, 1978; Roe, 1984b).
Grandes doses de óleo mineral interferem na absorção de vitaminas
lipossolúveis (A, D, E, K), b-caroteno, cálcio e fosfatos, devido à barreira física
e/ou diminuição do tempo de trânsito intestinal (Clark et al., 1987; Trovato et al.,
1991).

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O metabolismo da vitamina D, cálcio e fosfatos está inter-relacionado, ou
seja, a deficiência de uma destas substâncias poderá conduzir a anormalidades
metabólicas, caracterizando má absorção secundária (Yamreudeewong et al.,
1995).
O uso excessivo de óleo mineral pode provocar raquitismo em crianças e
osteomalacia em adultos, por deficiência de cálcio (Roe, 1978; Insogna et al.,
1980).
Aumento na excreção de minerais ocorre com o uso prolongado ou com
a ingestão de altas doses de diuréticos.
A furosemida, diurético de alça, acarreta perda de potássio, magnésio,
zinco e cálcio (Roe, 1984b).

O PACIENTE IDOSO
A ingestão de nutrientes como proteínas, lipídeos, minerais e vitaminas
em quantidade e qualidade adequadas é importante para a manutenção do
estado nutricional.
No idoso, o requerimento nutricional é diferenciado, em virtude,
principalmente, da diminuição do metabolismo basal, aliada na maioria das
vezes ao sedentarismo.
Modificações fisiológicas, como as descritas no Quadro 1, não sendo
adequadamente avaliadas, podem afetar o estado nutricional do idoso (Varma,
1994).
Portanto, para a preservação da integridade estrutural e funcional de seu
organismo, é preciso monitorar suas necessidades e condições nutricionais, o
que pode ser feito através de alimentação, de medidas antropométricas, de
exames bioquímicos, da avaliação clínica e da análise de fatores
socioeconômicos e ambientais, como, por exemplo, a instabilidade emocional, a
proximidade da família e dos amigos e o abuso de álcool ou de medicamentos
(Munro et al., 1987).

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Os problemas nutricionais e as reações medicamentosas, no idoso,
advêm das alterações próprias do processo de senescência e de fatores diversos
(Quadro 2) (Roe, 1985).
A probabilidade de prescrição medicamentosa para o idoso é maior,
quando comparada com outras faixas etárias, em virtude do tratamento de
doenças crônicas e/ou agudas intercorrentes (Varma, 1994; Schumann, 1999).
Ele pode vir a ingerir de 3 a 10 medicamentos/dia, elevando o risco de
indução da deficiência nutricional (Varma, 1994).
Comumente o idoso tem como prática a automedicação, para alívio dos
sintomas relacionados à doença ou a outro problema qualquer de saúde,
vinculados ou não com a idade.
Os medicamentos de venda livre ingeridos por ele com frequência são os
laxativos, os anti-histamínicos, as vitaminas, os minerais, os analgésicos e os
antiácidos, os quais, quando consumidos de forma abusiva, causam efeitos
adversos sobre o apetite e o estado nutricional (Roe, 1994; Schumann, 1999).
Na Espanha, de acordo com dados do Encontro Nacional de Saúde, 23%
da população adulta e 21% da população infantil fazem uso da automedicação
(Gil Esparza, 1997).

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Segundo Teresi & Morgan (1994) no ano 2010 metade do total dos
medicamentos que a população dos Estados Unidos consumirá não
será prescrita diretamente pelo médico.
Os medicamentos utilizados pelo idoso podem ser mais ou menos
absorvidos, dependendo das condições de consumo, ou seja, se associados ou
não às refeições, bem como do seu estado nutricional (Roe, 1984a; Chen et al.,
1985).
Por outro lado, as deficiências nutricionais podem ocorrer por indução
medicamentosa, sendo as mais frequentes as depleções de vitaminas e de
minerais (Flodim, 1990; Murray & Healy, 1991).
Medicamentos podem causar um estado nutricional insatisfatório em
pacientes idosos por diferentes mecanismos.
Em contrapartida, a condição nutricional inadequada pode alterar a ação
do fármaco.
A digoxina, importante agente terapêutico no tratamento da insuficiência
cardíaca congestiva, possui propriedade anorexígena, além de causar náuseas
e vômitos.
O uso concomitante com diurético facilita a perda não somente de sódio,
mas também de potássio, magnésio e cálcio.
Em mulheres na menopausa a perda de cálcio aumenta o risco de
osteoporose (Roe, 1993).
A Figura 3 ilustra fatores que levam à desnutrição suas consequências,
as quais acarretam modificações na ação, efeito e utilização do medicamento
(Basile, 1988).
A idade exerce uma grande influência no processo farmacocinético do
fármaco e, portanto, o idoso representa uma população de grande risco quanto
à interação fármaco-nutriente.
Por que determinado fármaco afeta a função cardíaca, enquanto outro
altera o equilíbrio da água e dos íons nos rins? Por que o ciprofloxacino mata
efetivamente as bactérias, porém raramente prejudica o paciente?
Essas perguntas podem ser respondidas se examinarmos, em primeiro
lugar, a interação entre determinado fármaco e seu alvo molecular específico e,
em seguida, considerarmos o papel dessa ação dentro de um contexto fisiológico
mais amplo.

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Este capítulo enfoca os detalhes moleculares das interações fármaco–
receptor, enfatizando a variedade de receptores existentes e seus mecanismos
moleculares.
Essa discussão fornece uma base conceitual para a ação dos numerosos
fármacos e classes de fármacos considerados neste livro.
Embora os fármacos possam, teoricamente, ligar-se a quase qualquer tipo
de alvo tridimensional, a maioria dos fármacos produz seus efeitos desejados
(terapêuticos) através de uma interação seletiva com moléculas-alvo, que
desempenham importantes papéis na função fisiológica e fisiopatológica.
Em muitos casos, a seletividade da ligação do fármaco a determinados
receptores também estabelece os efeitos indesejáveis (adversos) de um
fármaco.
Em geral, os fármacos são moléculas que interagem com componentes
moleculares específicos de um organismo, produzindo alterações bioquímicas e
fisiológicas dentro desse organismo.
Os receptores de fármacos são macromoléculas que, através de sua
ligação a determinado fármaco, medeiam essas alterações bioquímicas e
fisiológicas.

CONFORMAÇÃO E QUÍMICA DOS FÁRMACOS E DOS


RECEPTORES
Por que o imatinibe atua especificamente sobre a tirosinocinase do
receptor BCR-Abl, e não sobre outras moléculas?
A resposta a essa pergunta e a compreensão da razão pela qual
determinado fármaco liga-se a um receptor específico podem ser encontradas
na estrutura e nas propriedades químicas das duas moléculas.
A presente seção irá discutir os determinantes básicos da estrutura dos
receptores e química da ligação fármaco–receptor.
A discussão aqui prioriza principalmente as interações dos fármacos, que
são pequenas moléculas orgânicas, com receptores-alvo, que consistem
principalmente em macromoléculas (especialmente proteínas); entretanto,

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muitos desses princípios também se aplicam às interações de produtos
terapêuticos à base de proteína com seus alvos moleculares.
Como muitos dos receptores de fármacos humanos e microbianos
consistem em proteínas, é conveniente proceder a uma revisão dos quatro
principais níveis de estrutura das proteínas.
Em seu nível mais básico, as proteínas consistem em longas cadeias de
aminoácidos, cujas sequências são determinadas pelas sequências do DNA que
codificam as proteínas. A sequência de aminoácidos de uma proteína é
conhecida como estrutura primária.
Após a síntese de uma longa cadeia de aminoácidos sobre um ribossomo,
muitos dos aminoácidos começam a interagir com aminoácidos adjacentes na
cadeia polipeptídica.
Essas interações resultam na estrutura secundária da proteína, formando
conformações bem definidas, como hélice, lâminas pregueadas e barril.
Em consequência de sua forma altamente organizada, essas estruturas
com frequência se acondicionam firmemente entre si, definindo ainda mais a
forma global da proteína.
A estrutura terciária resulta da interação dos aminoácidos mais distais
entre si ao longo de uma cadeia simples de aminoácidos. Essas interações
incluem a formação de ligações iônicas e a ligação covalente de átomos de
enxofre para formar pontes de dissulfeto intramoleculares. Por fim, os
polipeptídios podem sofrer oligomerização, formando estruturas mais
complexas.
A conformação que resulta da interação de polipeptídios separados é
denominada estrutura quaternária.
As diferentes porções que compõem a estrutura de uma proteína
geralmente apresentam afinidades distintas pela água, e essa característica
possui um efeito adicional sobre a forma da proteína.
Como tanto o meio extracelular quanto o intracelular são compostos
primariamente de água, os segmentos proteicos hidrofóbicos estão
frequentemente recolhidos no interior da proteína ou protegidos da água pela
sua inserção em membranas de dupla camada lipídica.

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NÍVEIS DE ESTRUTURA DAS PROTEÍNAS
A estrutura de uma proteína pode ser dividida em quatro níveis de
complexidade, conhecidos como estrutura primária, secundária, terciária e
quaternária.
A estrutura primária é determinada pela sequência de aminoácidos que
compõem a cadeia polipeptídica.
A estrutura secundária é determinada pela interação de átomos de
hidrogênio de carga positiva com átomos de oxigênio de carga negativa em
carbonos da mesma cadeia polipeptídica.
Essas interações resultam em diversos padrões secundários
característicos de conformação da proteína, incluindo a hélice e a lâmina
pregueada.
A estrutura terciária é determinada por interações de aminoácidos que
estão relativamente distantes no arcabouço da proteína. Essas interações, que
incluem ligações iônicas e ligações de dissulfeto covalentes (entre outras),
conferem às proteínas a sua estrutura tridimensional característica.
A estrutura quaternária é determinada pelas interações de ligação entre
duas ou mais subunidades proteicas independentes.

INTERAÇÕES
Fármaco–Receptor hidrofílicos frequentemente localizam-se na superfície
externa da proteína. Uma vez concluído todo esse processo de torção e
dobramento, cada proteína assume uma forma peculiar que determina a sua
função, a sua localização no corpo, a sua relação com as membranas celulares
e as interações de ligação com fármacos e outras moléculas.
O sítio de ligação refere-se ao local onde o fármaco liga-se ao receptor.
Cada sítio de ligação de fármacos possui características químicas singulares,
que são determinadas pelas propriedades específicas dos aminoácidos que
compõem o sítio de ligação.
A estrutura tridimensional, a forma e a reatividade do sítio, bem como a
estrutura inerente, a forma e a reatividade do fármaco, determinam a orientação

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do fármaco em relação ao receptor e estabelecem a intensidade de ligação entre
essas moléculas.
A ligação fármaco–receptor resulta de múltiplas interações químicas entre
as duas moléculas, algumas das quais são bastante fracas (como as forças de
van der Waals), enquanto outras são extremamente fortes (como a ligação
covalente).
A soma total dessas interações proporciona a especificidade da interação
fármaco–receptor global.
A favorabilidade de uma interação fármaco–receptor é designada como
afinidade do fármaco pelo seu sítio de ligação no receptor.
A química do ambiente local onde ocorrem essas interações — como
hidrofobicidade, hidrofilicidade e pKa dos aminoácidos próximo ao sítio de
ligação — também pode afetar a afinidade da interação fármaco–receptor
As forças de van der Waals, que resultam da polaridade induzida em uma
molécula em consequência da mudança de densidade de seus elétrons,
proporcionam uma força fraca de atração para os fármacos e seus receptores.
Essa polaridade induzida constitui um componente ubíquo de todas as
interações moleculares.
A ligação de hidrogênio, mediada pela interação entre átomos de
polarização positiva (como o hidrogênio fixado ao nitrogênio ou oxigênio) e
átomos de polarização negativa (como o oxigênio, o nitrogênio ou o enxofre),
resulta em ligações de força significativa.
As ligações de hidrogênio produzem lâminas pregueadas e hélices em
sua estrutura.
As interações iônicas, que ocorrem entre átomos de cargas opostas, são
mais fortes do que as ligações de hidrogênio, porém menos intensas do que as
ligações covalentes.
A ligação covalente resulta do compartilhamento de um par de elétrons
entre dois átomos em diferentes moléculas.
As interações covalentes são tão fortes que, na maioria dos casos, são
essencialmente irreversíveis.
Conforme assinalado anteriormente, o ambiente onde ocorre a interação
entre fármacos e receptores também afeta a favorabilidade da ligação.

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O efeito hidrofóbico refere-se ao mecanismo pelo qual as propriedades
singulares do solvente universal, a água, intensifica a interação de uma molécula
hidrofóbica com um sítio de ligação hidrofóbico.
A ligação fármaco–receptor raramente é produzida por um único tipo de
interação; na verdade, é uma combinação dessas interações de ligação que
proporciona ao fármaco e a seu receptor as forças necessárias para formar um
complexo fármaco–receptor estável.
Em geral, a maioria das interações fármaco–receptor é constituída por
múltiplas forças fracas: uma interação fármaco–receptor típica pode consistir em
10 ou mais interações de van der Waals e em algumas ligações de hidrogênio;
as interações iônicas e a ligação covalente são muito menos comuns.
Por exemplo, o imatinibe estabelece numerosas interações de van der
Waals e ligações de hidrogênio com o sítio de ligação do ATP na BCR-Abl
tirosinocinase.
A soma total dessas forças cria uma forte interação (alta afinidade) entre
esse fármaco e seu receptor.
Apesar de serem relativamente raras, as interações covalentes entre um
fármaco e seu receptor representam um caso especial.
Com frequência, a formação de uma ligação covalente é essencialmente
irreversível, e nesses casos o fármaco e o receptor formam um complexo inativo.
Para readquirir a sua atividade, a célula precisa sintetizar uma nova
molécula de receptor para substituir a proteína inativada; por outro lado, a
molécula do fármaco que também faz parte do complexo inativo não está
disponível para inibir outras moléculas do receptor.
Os fármacos que modificam seus receptores-alvo (frequentemente
enzimas) através desse mecanismo são algumas vezes denominados substratos
suicidas.
A estrutura molecular de um fármaco é que determina as propriedades
físicas e químicas que contribuem para sua ligação específica ao receptor.
Os fatores importantes incluem a hidrofobicidade, o estado de ionização
(pKa), a conformação e a estereoquímica da molécula do fármaco. Todos esses
fatores combinam-se para estabelecer a complementaridade do fármaco com o
sítio de ligação.

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As bolsas de ligação dos receptores são altamente específicas, e
pequenas alterações no fármaco podem ter um acentuado efeito sobre a
afinidade da interação fármaco–receptor.
Por exemplo, a estereoquímica do fármaco possui grande impacto sobre
a força da interação de ligação.
A varfarina é sintetizada e administrada como mistura racê mica (uma
mistura contendo 50% da molécula dextrógira e 50% da molécula levógira);
todavia, o enantiômero S é quatro vezes mais potente do que o enantiômero R,
em virtude de uma interação mais forte da forma S com o seu sítio de ligação na
vitamina K epóxido redutase.
A estereoquímica também pode afetar a toxicidade nos casos em que um
enantiômero de um fármaco produz o efeito terapêutico desejado, enquanto o
outro enantiômero exerce um efeito tóxico indesejável, talvez em virtude de uma
interação com um segundo receptor ou de seu metabolismo a uma espécie
tóxica.
Embora seja algumas vezes difícil a síntese e purificação em larga escala
de enantiômeros individuais por laboratórios farmacêuticos, alguns dos fármacos
atualmente comercializados são produzidos como enantiômeros individuais nos
casos em que um dos enantiômeros possui maior eficácia e/ou menor toxicidade
do que a sua imagem especular.

IMPACTO DA LIGAÇÃO DO FÁRMACO SOBRE O RECEPTOR


De que maneira a ligação do fármaco produz uma alteração bioquímica
e/ou fisiológica no organismo?
No caso dos receptores com atividade enzimática, o sítio de ligação do
fármaco é frequentemente o sítio ativo onde uma transformação enzimática é
catalisada.
Por conseguinte, a atividade catalítica da enzima é inibida por fármacos
que impedem a ligação do substrato ao sítio ou que o modificam de modo
covalente.

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Nos casos em que o sítio de ligação não é o sítio ativo da enzima, os
fármacos podem produzir uma mudança ao impedir a ligação de ligantes
endógenos às bolsas de ligação de seus receptores.
Entretanto, em numerosas interações fármaco–receptor, a ligação de um
fármaco a seu receptor resulta em uma mudança na conformação do receptor.
A alteração da forma do receptor pode afetar sua função, aumentando,
inclusive, a afinidade do fármaco pelo receptor.
Essa interação é frequentemente designada como adaptação induzida,
visto que a conformação do receptor é modificada de modo a melhorar a
qualidade da interação de ligação. O princípio de adaptação induzida sugere que
a ligação fármaco–receptor pode ter profundos efeitos sobre a conformação do
receptor.
Ao induzir alterações na conformação do receptor, muitos fármacos não
apenas melhoram a qualidade da interação de ligação, como também alteram a
ação do receptor.
A mudança de forma induzida pelo fármaco é algumas vezes idêntica
àquela produzida pela ligação de um ligante endógeno. Por exemplo, todos os
análogos da insulina administrados de forma exógena estimulam o receptor de
insulina na mesma intensidade, apesar de suas sequências de aminoácidos
serem ligeiramente diferentes.
Em outros casos, a ligação do fármaco altera a forma do receptor,
tornando-o mais ou menos funcional do que o normal. Por exemplo, a ligação do
imatinibe à BCR-Abl tirosinocinase faz com que a proteína assuma uma
conformação enzimaticamente inativa, inibindo, assim, a atividade cinase do
receptor.
Outra maneira de descrever o princípio de adaptação induzida é
considerar o fato de que muitos receptores ocorrem em múltiplos estados de
conformação — por exemplo, estado inativo (ou fechado), ativo (ou aberto) e
dessensibilizado (ou inativado) — e o fato de que a ligação de um fármaco ao
receptor estabiliza uma ou mais dessas conformações.

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EFEITOS DAS MEMBRANAS SOBRE AS INTERAÇÕES
FÁRMACO–RECEPTOR
A estrutura do receptor determina não apenas as suas afinidades de
ligação para fármacos e ligantes endógenos, mas também a localização da
proteína em relação aos limites celulares, como a membrana plasmática.
As proteínas que possuem grandes domínios hidrofóbicos são capazes
de residir na membrana plasmática, em virtude do elevado conteúdo de Base
estrutural da inibição enzimática específica: interação do imatinibe com a BCR-
Abl. porção cinase da BCR-Abl tirosinocinase é mostrada em formato de fita
(cinza).
Um análogo do imatinibe, um inibidor específico da BCR-Abl
tirosinocinase, é mostrado na forma de modelo espacial (azul).
Diagrama detalhado das interações intermoleculares entre o fármaco (na
cor azul) e os resíduos de aminoácidos da proteína BCR-Abl.
As ligações de hidrogênio estão indicadas por linhas tracejadas, enquanto
as interações de van der Waals (indicadas por halos ao redor do nome do
aminoácido e sua posição na sequência da proteína) são mostradas para nove
aminoácidos com cadeias laterais hidrofóbicas.
A interação do fármaco (azul) com a proteína BCR-Abl (cinza) inibe a
fosforilação de uma alça de ativação crítica (formato em fita de cor azul intensa),
impedindo, assim, a atividade catalítica. Interações lipídios da membrana.
Muitos receptores transmembrana apresentam domínios lipofílicos que
estão assentados na membrana e domínios hidrofílicos que residem nos
espaços intracelular e extracelular.
Outros receptores de fármacos, incluindo diversos reguladores da
transcrição (também denominados fatores de transcrição), só possuem domínios
hidrofílicos e podem residir no citoplasma, no núcleo ou em ambos.
Assim como a estrutura do receptor determina a sua localização em
relação à membrana plasmática, a estrutura de um fármaco afeta a sua
capacidade de ter acesso ao receptor.
Por exemplo, os fármacos que são altamente hidrossolúveis têm, com
frequência, menos capacidade de atravessar a membrana plasmática e ligar-se
a moléculas-alvo situadas no citoplasma.

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Em contrapartida, certos fármacos hidrofílicos que são capazes de
atravessar canais transmembrana ou de utilizar outros mecanismos de
transporte podem ter rápido acesso a receptores citoplasmáticos.
Os fármacos que são altamente lipofílicos, como muitos hormônios
esteroides, são capazes de atravessar o ambiente lipídico hidrofóbico da
membrana plasmática sem canais ou transportadores especiais, tendo
consequentemente acesso a alvos intracelulares.
A capacidade dos fármacos de alterar a forma dos receptores faz com que
a ligação de um fármaco a seu receptor sobre a superfície celular possa afetar
funções no interior das células.
Muitos receptores proteicos na superfície celular possuem domínios
extracelulares que estão ligados a moléculas efetoras intracelulares através de
domínios do receptor que se estendem pela membrana plasmática.
Em alguns casos, a mudança na forma do domínio extracelular pode
alterar a conformação dos domínios do receptor que atravessam a membrana
e/ou que são intracelulares, resultando em alteração na função do receptor.
Em outros casos, os fármacos podem estabelecer ligações cruzadas entre
os domínios extracelulares de duas moléculas receptoras, formando um
complexo receptor dimérico que ativa moléculas efetoras no interior da célula.
Todos esses fatores — estrutura do fármaco e do receptor, forças
químicas que influenciam a interação fármaco–receptor, solubilidade do fármaco
na água e na membrana plasmática e função do receptor no seu ambiente celular
— conferem especificidade significativa às interações entre fármacos e seus
receptores-alvo.
Este livro apresenta numerosos exemplos de fármacos que podem ter
acesso e ligar-se a receptores de modo a induzir uma mudança de sua
conformação, produzindo consequentemente um efeito bioquímico ou fisiológico.
Esse princípio sugere que, uma vez adquirido o conhecimento da
estrutura de um receptor, pode-se, teoricamente, projetar um fármaco capaz de
interromper a atividade deste receptor.
Com efeito, existem, no momento atual, muitas pesquisas em andamento,
que têm por objetivo aumentar a eficácia e reduzir a toxicidade dos fármacos
através de uma alteração da sua estrutura, de modo que possam ligar-se de
modo mais seletivo a seus alvos.

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Esse processo, conhecido como planejamento racional de fármacos,
propiciou o desenvolvimento de inibidores da protease que afetaram
profundamente a evolução da doença pelo HIV, bem como de agentes
antineoplásicos, como o imatinibe.

DETERMINANTES MOLECULARES E CELULARES DA


SELETIVIDADE DOS FÁRMACOS
Um fármaco ideal é aquele capaz de interagir apenas com um alvo
molecular que produza o efeito terapêutico desejado, mas não com alvos
moleculares capazes de provocar efeitos adversos indesejáveis.
Embora esse fármaco ideal ainda não tenha sido descoberto (isto é, todos
os fármacos de uso clínico atual têm o potencial de produzir efeitos adversos,
bem como efeitos terapêuticos), os farmacologistas podem tirar proveito de
diversos determinantes da seletividade dos fármacos numa tentativa de atingir
essa meta.
A seletividade quanto à ação de um fármaco pode ser obtida através de
pelo menos duas categorias de mecanismos:
(1) a especificidade de subtipos de receptores quanto ao tipo celular e
(2) a especificidade do acoplamento receptor–efetor quanto ao tipo
celular.
Embora numerosos receptores potenciais de fármacos estejam
amplamente distribuídos entre diversos tipos de células, alguns receptores são
mais limitados na sua distribuição.
A administração sistêmica de fármacos que interagem com esses
receptores localizados pode resultar em efeito terapêutico altamente seletivo.
Por exemplo, os fármacos cujos alvos consistem em processos
universais, como a síntese de DNA, tendem a causar efeitos colaterais tóxicos
significativos; este é o caso de numerosos agentes quimioterápicos atualmente
disponíveis para o tratamento do câncer.
Outros fármacos cujos alvos consistem em processos que se restringem
a determinado tipo de célula, como a produção de ácido no estômago, podem
ter menos efeitos adversos.

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O imatinibe é um fármaco extremamente seletivo, visto que a proteína
BCR-Abl não é expressa nas células normais (não-cancerosas).
Em geral, quanto mais restrita a distribuição celular do receptor-alvo de
determinado fármaco, maior a probabilidade de o fármaco ser seletivo.
De forma semelhante, embora muitos tipos diferentes de células possam
expressar o mesmo alvo molecular para determinado fármaco, o efeito desse
fármaco pode diferir-nos vários tipos celulares, devido a mecanismos diferenciais
de acoplamento receptor–efetor ou a exigências diferenciais do alvo do fármaco
nos vários tipos de células.
Por exemplo, embora os canais de cálcio regulados por voltagem sejam
universalmente expressos no coração, as células marca-passo cardíacas são
relativamente mais sensíveis aos efeitos dos agentes bloqueadores dos canais
de cálcio do que as células musculares ventriculares cardíacas.
Esse efeito diferencial é atribuível ao fato de que a propagação do
potencial de ação depende principalmente da ação dos canais de cálcio nas
células marca-passo cardíacas, enquanto os canais de sódio são mais
importantes que os de cálcio nos potenciais de ação das células musculares
ventriculares. Em geral, quanto maior a diferença nos mecanismos de
acoplamento receptor–efetor entre os vários tipos de células que expressam
determinado alvo molecular para um fármaco, mais seletivo tende a ser o
fármaco.

PRINCIPAIS TIPOS DE RECEPTORES DE FÁRMACOS


Tendo em vista a grande diversidade de moléculas de fármacos, seria,
aparentemente, muito provável que as interações entre fármacos e seus alvos
moleculares fossem igualmente diversas. Isso é apenas parte da verdade.
Com efeito, a maioria das interações fármaco–receptor atualmente
elucidadas podem ser classificadas, em sua maioria, em seis grandes grupos.
Esses grupos compreendem as interações entre fármacos e
(1) canais iônicos transmembrana,
(2) receptores transmembrana acoplados a proteínas G intracelulares,
(3) receptores transmembrana com domínios citosólicos enzimáticos,

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(4) receptores intracelulares, incluindo enzimas, reguladores da
transcrição e proteínas estruturais,
(5) enzimas extracelulares e
(6) receptores de superfície celular.
O fato de saber se determinado fármaco ativa ou inibe o seu alvo e com
que intensidade ele o faz fornece valiosas informações sobre a interação.
Embora a farmacodinâmica (o estudo dos efeitos dos fármacos sobre o
corpo humano) seja considerada de modo detalhado no próximo capítulo, é
conveniente citar de modo sucinto as principais relações farmacodinâmicas entre
fármacos e seus alvos antes de examinar os mecanismos moleculares das
interações fármaco–receptor.
Os agonistas são moléculas que, através de sua ligação a seus alvos,
produzem uma alteração na atividade desses alvos.
Os agonistas integrais ligam-se a seus alvos e os ativam até o grau
máximo possível. Por exemplo, a acetilcolina liga-se ao receptor nicotínico de
acetilcolina e induz uma alteração de conformação no canal iônico associado ao
receptor, de um estado não-condutor para um estado totalmente condutor.
Os agonistas parciais produzem uma resposta submáxima através de sua
ligação a seus alvos.
Os agonistas inversos causam inativação de alvos constitutivamente
ativos. Os antagonistas inibem a capacidade de ativação (ou inativação) de seus
alvos por agonistas fisiológicos ou farmacológicos.
Os fármacos que bloqueiam diretamente o sítio de ligação de um agonista
fisiológico são denominados antagonistas competitivos.
Os fármacos que se ligam a outros sítios na molécula do alvo e que,
portanto, impedem a alteração de conformação necessária para a ativação (ou
inativação) do receptor podem ser antagonistas não-competitivos.
Como o mecanismo de cada interação fármaco–receptor é delineado nas
várias seções que se seguem, convêm considerar, em nível estrutural, como
podem ser produzidos esses diferentes efeitos farmacodinâmicos.

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CANAIS IÔNICOS TRANSMEMBRANA
A passagem de íons e de outras moléculas hidrofílicas através da
membrana plasmática é necessária para numerosas funções celulares. Esses
processos são regulados por canais transmembrana especializados.
As funções dos canais iônicos são diversas, incluindo funções
fundamentais na neurotransmissão, na condução cardíaca, na contração
muscular e na secreção. Por conseguinte, os fármacos cuja ação é direcionada
para os canais iônicos podem exercer impacto significativo sobre as principais
funções orgânicas.
São utilizados três mecanismos principais na regulação da atividade dos
canais iônicos transmembrana. Em alguns canais, a condutância é controlada
pela ligação do ligante ao canal. Em outros canais, essa condutância é regulada
por mudanças de voltagem através da membrana plasmática.
As interações fármaco–receptor podem ser divididas, em sua maioria, em
quatro grupos.
A. O fármaco pode ligar-se a canais iônicos que se estendem pela
membrana plasmática, produzindo uma alteração na condutância do canal.
B. Os receptores hepta-helicoidais que se estendem através da
membrana plasmática estão acoplados funcionalmente a proteínas G
intracelulares. Os fármacos podem influenciar as ações desses receptores
através de sua ligação à superfície extracelular ou à região transmembrana do
receptor.
C. O fármaco pode ligar-se ao domínio extracelular de um receptor
transmembrana e causar uma alteração de sinalização no interior da célula, por
meio da ativação ou inibição de um domínio intracelular enzimático (boxe
retangular) da molécula do receptor.
D. Os fármacos podem sofrer difusão através da membrana plasmática e
ligar-se a receptores citoplasmáticos ou nucleares.
Trata-se frequentemente da via utilizada pelos fármacos lipofílicos (por
exemplo, fármacos que se ligam a receptores de hormônios esteróides).
Alternativamente, os fármacos podem inibir enzimas no espaço extracelular, sem
a necessidade de atravessar a membrana plasmática (não mostrado).

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A maioria dos canais iônicos compartilha uma certa semelhança
estrutural, independentemente de sua seletividade para íons, magnitude de
condutância ou mecanismos de ativação (regulação) ou inativação.
Os canais iônicos tendem a ser macromoléculas semelhantes a tubos,
constituídas por certo número de subunidades proteicas que atravessam a
membrana plasmática.
O domínio de ligação do ligante pode ser extracelular, localizado dentro
do canal, ou intracelular, enquanto o domínio que interage com outros receptores
ou moduladores é, com mais frequência, intracelular.
A estrutura do receptor nicotínico de acetilcolina (ACh) foi estabelecida
até uma resolução de Å, fornecendo um exemplo da estrutura de um importante
canal iônico regulado por ligante.
Duas das subunidades foram designadas como; cada uma contém um
único sítio de ligação extracelular para a ACh.
No estado livre (sem ligante) do receptor, o canal encontra-se ocluído por
cadeias laterais de aminoácidos e, dessa maneira, não permite a passagem de
íons.
A ligação de duas moléculas de acetilcolina ao receptor induz uma
alteração de sua conformação, que abre o canal e permite a condutância de íons.
Embora o receptor nicotínico de ACh pareça assumir apenas dois
estados, isto é, aberto ou fechado, muitos canais iônicos são capazes de assumir
outros estados. Assim, por exemplo, alguns canais iônicos podem tornar-se
refratários ou inativados.
Nesse estado, a permeabilidade do canal não pode ser alterada durante
um certo período de tempo, conhecido como período refratário do canal. O canal
de sódio regulado por voltagem sofre um ciclo de ativação, abertura do canal,
fechamento do canal e inativação do canal.
Durante o período de inativação (refratário), o canal não pode ser
reativado durante alguns milissegundos, mesmo se o potencial de membrana
retornar para uma voltagem que normalmente estimula a abertura do canal.

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RECEPTOR NICOTÍNICO DE ACETILCOLINA REGULADO POR
LIGANTE
A. O receptor de acetilcolina (ACh) da membrana plasmática é composto
de cinco subunidades — duas subunidades , uma subunidade , uma subunidade
e uma subunidade .
B. A subunidade foi removida para mostrar a estrutura esquemática
interna do receptor, demonstrando que ele forma um canal transmembrana.
Na ausência de ACh, a comporta do receptor está fechada, e os cátions
(mais especificamente íons sódio [Na+]) são incapazes de atravessar o canal.
C. Quando a ACh liga-se a ambas as subunidades , o canal abrese, e o
sódio pode seguir ao longo de seu gradiente de concentração para dentro da
célula.
Um estados diferentes do mesmo canal iônico. Essa ligação dependente
do estado é importante no mecanismo de ação de alguns anestésicos locais e
agentes antiarrítmicos, respectivamente.
Os anestésicos locais e os benzodiazepínicos constituem duas classes
importantes de fármacos que atuam através de alteração na condutância dos
canais iônicos.
Os anestésicos locais bloqueiam a condutância dos íons sódio através
dos canais de sódio regulados por voltagem nos neurônios que transmitem a
informação da dor da periferia para o sistema nervoso central, impedindo, assim,
a propagação do potencial de ação e, consequentemente, a percepção de dor
(nocicepção).
Os benzodiazepínicos também atuam sobre o sistema nervoso, porém
através de um mecanismo diferente.
Esses fármacos inibem a neurotransmissão no sistema nervoso central
ao potencializar a capacidade do transmissor ácido gama-aminobutírico (GABA)
de aumentar a condutância de íons cloreto através das membranas neuronais,
fazendo com que o potencial de membrana se afaste ainda mais de seu limiar
para ativação.

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RECEPTORES TRANSMEMBRANA ACOPLADOS À PROTEÍNA
G
Os receptores acoplados à proteína G representam a classe mais
abundante de receptores no corpo humano.
Esses receptores, que estão expostos na superfície extracelular da
membrana celular, atravessam a membrana e possuem regiões intracelulares
que ativam uma classe singular de moléculas de sinalização, denominadas
proteínas G.
(As proteínas G são assim designadas em virtude de sua ligação aos
nucleotídios de guanina, GTP e GDP.)
Os mecanismos de sinalização acoplados à proteína G estão envolvidos
em numerosos processos importantes, incluindo visão, olfação e
neurotransmissão.
Uma das principais funções das proteínas G consiste em ativar a
produção de segundos mensageiros, isto é, moléculas de sinalização que
transmitem o sinal fornecido pelo primeiro mensageiro — habitualmente um
ligante endógeno ou um fármaco exógeno — a efetores citoplasmáticos.
A via mais comum associada às proteínas G consiste na ativação de
ciclases, como a adenilil ciclase, que catalisa a produção do segundo
mensageiro, o 3ʼ,5ʼ-monofosfato de adenosina cíclico (cAMP), e a guanilil
ciclase, que catalisa a produção do 3ʼ,5ʼ-monofosfato de guanosina cíclico
(cGMP). As proteínas G podem ativar a enzima fosfolipase C (PLC), que, entre
outras funções, desempenha um papel essencial no processo de regu lação da
concentração de cálcio intracelular.
Após ativação por uma proteína G, a PLC cliva o fosfolipídio de
membrana, o fosfatidilinositol-4,5-difosfato (PIP2), produzindo os segundos
mensageiros diacilglicerol (DAG) e inositol-1,4,5-trifosfato (IP3). O IP3 deflagra
a liberação de Ca2+ das reservas intracelulares, aumentando acentuadamente
a concentração citosólica de Ca2+ e ativando eventos moleculares e celulares
distais.
O DAG ativa a proteinocinase C, que, a seguir, medeia outros eventos
moleculares e celulares, incluindo contração do músculo liso e transporte iônico
transmembrana. Todos esses eventos são dinamicamente regulados, de modo

34
que as diferentes etapas nas vias envolvidas são ativadas e inativadas com
cinéticas características.
Na atualidade, já foi identificado um grande número de isoformas da
proteína G, exibindo, cada uma delas, efeitos singulares sobre seus alvos.
Algumas dessas proteínas G incluem a proteína G estimuladora (Gs), a proteína
G inibitória (Gi ), Gq, Go e G12/13.
As proteínas G têm a propriedade de interagir com vários tipos diferentes
de moléculas efetoras. O subtipo de proteína G que é ativado frequentemente
determina o efetor a ser ativado pela proteína G.
Duas das subunidades mais comuns de G são a Gs e a Gq, que estimulam
a adenilil ciclase e a fosfolipase C, respectivamente.
Quando estimulada pela Gs, a adenilil ciclase converte o ATP em AMP
cíclico (cAMP).
A seguir, o cAMP ativa a proteinocinase A (PKA), que fosforila diversas
proteínas citosólicas específicas.
Quando estimulada pela Gq, a fosfolipase C (PLC) cliva o fosfolipídio de
membrana fosfatidilinositol-difosfato (PIP2) em diacilglicerol (DAG) e inositol-
trifosfato (IP3).
O DAG difunde-se na membrana para ativar a proteinocinase C (PKC),
que, a seguir, fosforila proteínas celulares específicas.
O IP3 estimula a liberação de Ca2+ do retículo endoplasmático para o
citosol. A liberação de cálcio também estimula eventos de fosforilação de
proteínas, que levam a alterações na ativação de proteínas.
Apesar de não estarem ilustradas aqui, as subunidades das proteínas G
também podem afetar determinadas cascatas de transdução de sinais celulares.
Algumas das quais podem acoplar-se de diferentes maneiras ao mesmo receptor
em tipos celulares distintos, é provavelmente importante na seletividade
potencial de fármacos futuros.
As subunidades das proteínas G também podem atuar como moléculas
de segundos mensageiros, embora suas ações não estejam totalmente
caracterizadas.
O grupo dos receptores-adrenérgicos constitui uma importante classe
dentro da família dos receptores acoplados à proteína G. Entre esses receptores,
os que foram mais extensamente estudados foram designados como 1, 2 e 3.

35
Cada um desses receptores é estimulado pela ligação de catecolaminas
endógenas, como a epinefrina e a norepinefrina, ao domínio extracelular do
receptor.
A ligação da epinefrina induz uma alteração na conformação do receptor,
ativando proteínas G associadas ao domínio citoplasmático do receptor.
A forma ativada da proteína G (isto é, ligada ao GTP) ativa a adenilil
ciclase, resultando em aumento dos níveis intracelulares de cAMP e em efeitos
celulares distais.

RECEPTORES TRANSMEMBRANA COM DOMÍNIOS


CITOSÓLICOS ENZIMÁTICOS
A terceira classe importante de alvos celulares para fármacos consiste em
receptores transmembrana que transduzem uma interação de ligação com
ligantes extracelulares numa ação intracelular através da ativação de um
domínio enzimático ligado.
Esses receptores desempenham diversos papéis num conjunto diverso
de processos fisiológicos, incluindo metabolismo, crescimento e diferenciação
celulares.
Os receptores que possuem um domínio enzimático intracelular podem
ser divididos em cinco classes principais, com base no seu mecanismo
citoplasmático de ação. Todos esses receptores consistem em proteínas que
atravessam uma única vez a membrana, ao contrário do modelo que atravessa
sete vezes a membrana encontrado nos receptores acoplados à proteína G.
Muitos receptores com domínios citosólicos enzimáticos formam dímeros
ou complexos de múltiplas subunidades para a transdução de seus sinais. Muitos
dos receptores com domínios citosólicos enzimáticos modificam proteínas pela
adição ou remoção de grupos de fosfato de resíduos de aminoácidos
específicos.
A grande carga negativa dos grupos de fosfato pode alterar drasticamente
a estrutura tridimensional de uma proteína e, consequentemente, modificar a
atividade dessa proteína.

36
Além disso, a fosforilação é um processo facilmente reversível,
permitindo, desse modo, que esse mecanismo de sinalização possa atuar
especificamente no tempo e no espaço.

RECEPTORES COM TIROSINOCINASES


O maior grupo de receptores transmembrana com domínios citosólicos
enzimáticos é a família dos receptores com tirosinocinase. Esses receptores
transduzem sinais de numerosos hormônios e fatores de crescimento através da
fosforilação de resíduos de tirosina na cauda citoplasmática do receptor. Isso
leva ao recrutamento e à fosforilação subsequente da tirosina de diversas
moléculas sinalizadoras citosólicas.
O receptor de insulina é um receptor com tirosinocinase bem
caracterizado. Esse receptor é constituído por duas subunidades extracelulares,
que estão ligadas de forma covalente a duas subunidades que atravessam a
membrana.
Principais tipos de receptores transmembrana com domínios citosólicos
enzimáticos. Existem cinco categorias principais de receptores transmembrana
com domínios citosólicos enzimáticos.
A. O maior grupo é constituído pelos receptores com tirosinocinases. Após
ativação induzida pelo ligante, esses receptores sofrem dimerização e
transfosforilam resíduos de tirosina no receptor e, com freqüência, em proteínas
citosólicas alvo. O receptor de insulina e a proteína BCR-Abl fornecem exemplos
de receptores com tirosinocinases.
B. Alguns receptores podem atuar como tirosinofosfatases. Esses
receptores desfosforilam resíduos de tirosina em outros receptores
transmembrana ou em proteínas citosólicas. Muitas células do sistema imune
possuem receptores com tirosinofosfatases.
C. Alguns receptores associados a tirosinocinase carecem de um domínio
enzimático definitivo, porém a ligação do ligante ao receptor desencadeia a
ativação de proteinocinases associadas ao receptor (denominadas
tirosinocinases não-receptoras) que, em seguida, fosforilam resíduos de tirosina
em certas proteínas citosólicas.

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D. Os receptores com serina/treoninocinases fosforilam resíduos de
serina e de treonina em determinadas proteínas-alvo citosólicas. Os membros
da superfamília de receptores do TGF- pertencem a essa categoria.
E. Os receptores com guanilil ciclase contêm um domínio citosólico que
catalisa a formação do cGMP a partir do GTP. O receptor do peptídio natriurético
tipo B é um dos receptores de guanilil ciclase que foi bem caracterizado.
Ao final da década de 90, verifica-se uma vasta literatura demonstrando
como os constituintes dos alimentos podem influenciar a biodisponibilidade de
fármacos e vice-versa.
Entretanto, depara-se com a falta de informações de ordem prática, em
programas hospitalares, os quais ajudariam muito a equipe de saúde e,
principalmente, os usuários de medicamentos de uso contínuo, portadores de
doenças crônicas degenerativas, idosos e aqueles com estado nutricional
insatisfatório.
Muitos dos efeitos adversos observados ao longo da vida de um indivíduo
não são documentados ou, então, são simplesmente entendidos como
consequências do medicamento, não se considerando o processo de interação
fármaco-nutriente.
No Brasil, não existe um programa de educação e acompanhamento do
paciente em hospitais, universitários e não universitários, envolvendo este
assunto.
Nos países de Primeiro Mundo, a exemplo dos Estados Unidos, são
poucos os hospitais que possuem programa de educação e acompanhamento,
com o objetivo de determinar a extensão destes processos, os quais ocorrem no
dia-a-dia. Programas de monitorização ajudariam a detectar e prevenir
problemas potencialmente sérios de interação fármaco-nutriente.
Em síntese, Basile (1994) comenta com muita propriedade: "O
conhecimento prévio das características do paciente (necessidades,
idade, funções fisiológicas, estado nutricional, hábitos de alimentação),
da doença (crônica, aguda ou ambas) e do medicamento (eficácia,
margem de segurança, posologia, modo e tempo de utilização)
constitui conduta ética que, com certeza, cerceia os riscos advindos
das interações entre fármacos e alimentos".

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