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O Teatro é isto: você tem que ter a pachorra. É ruim o espetáculo? Uma porcaria? Ou você
avaliou que é bom? Não, não é bom... porém você está lá? Então vai. Não é questão de
paixão romântica, mas uma confirmação permanente de algo que faz viver. Não sei se estou
certo, mas estou falando o que eu sinto.
Para mim, o Teatro é a grande aventura. Nela tomam parte os condutores dos povos, os Júlio
César, os Coriolano, mas existem também os soldadinhos. E é entre esses trabalhadores que
habitam as pequenas salas, esses jardins de catacumbas, que você pode encontrar realmente
as descobertas. Porque Júlio César se formou, está pronto, está feito. É uma imagem acabada.
São tristes os atores que se consideram modelos realizados. O sujeito faz oitenta anos,
continua atuando em espetáculos, tem um técnica interpretativa fantástica (afinal são tantos
anos de trabalho) mas o que sobra dele é a mediocridade humana, a sovinice permanente.
Um diretor francês do passado escreveu a uma jovem atriz: “Você começou agora, está tendo
muito sucesso, seu trabalho é esplêndido, mas e quando seu rosto ficar envelhecido, como é
que você vai fazer Julieta?” Esta pequena aula de duzentos anos atrás continua válida: então
você vai continuar tentando segurar a idéia da Julieta enquanto seu rosto envelhece?
O ator é aquele que atravessa o processo de mudança. Porque o Teatro de hoje não é mais o
Teatro de ontem. De que serve a grande técnica se a atriz ficou ressequida, se a vida sugou
dela tudo de que ela precisava? É um jogo terrível: o Teatro é um fenômeno de crueldade
definitiva, é um estupro permanente. E é preciso se pôr em movimento pela descoberta
permanente, ter a avidez de aprender, de receber para poder devolver. O Teatro também é
isso: dar e devolver, dar e devolver, dar e devolver, até o momento no qual os dois se juntam
para fazer uma coisa só - que é o grande tema da vida.
Depois de um período de morte, de sono, de sonolência, o Teatro no Brasil parece que
despertou. Está manifestando de forma muito mais categórica, mais violenta, mais agressiva,
no bom sentido da palavra, uma presença dramatúrgica muito forte. Em grupos, como no
caso dos seis que se reúnem para esse jornal, isso me parece muito evidente.
Importa não esquecer a pergunta do ponto de partida: o que te interessa dentro da Arte? Para
mim, é a presença do homem. Buscar o ser humano. Têm pessoas cuja falta de humanidade
não interessa mais.
Por último, aliando tradições circenses ingênuas e grotescas à várias modalidades de comédia
pantomima, fescenina, Commedia dell’Arte... e teatro popular, os Parlapatões têm, ao longo
de seus dez anos de existência, andando na contramarcha da história e contaminado inúmeros
indivíduos e grupos na senda do teatro popular e do cômico, redignizando o gênero e seus
antigos artistas. Com seus quase vinte espetáculos, Piolin, Sardanapalo, Funâmbulos,
Pantagruel os Parlapatões, em qualquer espaço, têm alegrado a vida e o teatro. Com relação a
todos os Parlapatões ex e atuais (e especialmente com relação a Hugo Possolo: o Tililingo),
diria um limitado poeta: penso que se houvesse um-céu-no-céu-da-terra, no centro da arena
que lá houvesse vocês seriam permanentemente homenageados. Riso como o provocado por
vocês comove, humaniza e enternece naquilo que cada um tem de melhor.
Quanto ao público, a produção atual tem dificuldades diversas das dos anos 60. Mais sujeita a
uma indústria-da-divulgação-de-modelos-e-obras-normalmente-alienantes (chamada media),
ela se vê determinada por uma conjunção de medo, crise econômica e atropelo da memória.
Hoje, parcela significativa da população que poderia ir ao teatro, está presa e trancada em
suas casas.
Mas... e viva nós! O teatro existe! Enfrenta ‘dragões da maldade’, se apropria de experiências
anteriores, se renova. Retoma um gosto que permaneceu até 1968: o das mobilizações
coletivas. E como se diria na tradição da revista, com relação ao teatro paulista: OBA!