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LÍNGUA E LINGUAGEM

Já sabia ajuntar as sílabas e ler por cima toda coisa, mas


VARIAÇÃO LINGUÍSTICA descrencei a pedir a influência de ir à escola, porque diante dos
escritos que o mestre me passava e das lições marcadas nos
1. (Enem 2017) livros, fiquei sendo uma quarta-feira de marca maior. Alívio bom
era quando chegava em casa.
Pela primeira vez na vida teve pena de haver tantos BERNARDES, C. Rememórias dois. Goiânia: Leal, 1969.

assuntos no mundo que não compreendia e esmoreceu. Mas


O narrador relata suas experiências na primeira escola que
uma mosca fez um ângulo reto no ar, depois outro, além disso,
frequentou e utiliza construções linguísticas próprias de
os seis anos são uma idade de muitas coisas pela primeira vez,
determinada região, constatadas pelo
mais do que uma por dia e, por isso, logo depois, arribou. Os
assuntos que não compreendia eram uma espécie de tontura, A registro de palavras como “estranheza” e “cegava”.
mas o Ilídio era forte. B emprego de regência não padrão em “chegar em casa”.
Se calhar estava a falar de tratar da cabra: nunca esqueças C uso de dupla negação em ‘não entender nadinha”.
de tratar da cabra. O Ilídio não gostava que a mãe o mandasse D emprego de palavras como “descrencei” e “ladineza”.
tratar da cabra. Se estava ocupado a contar uma história a um E uso do substantivo “bichos” para retomar “pessoas”.
guarda-chuva, não queria ser interrompido. Às vezes, a mãe
escolhia os piores momentos para chamá-lo, ele podia estar a 3. (Enem 2017)
contemplar um segredo, por isso, assustava-se e, depois,
Sítio Gerimum
irritava-se. Às vezes, fazia birras no meio da rua. A mãe
envergonhava-se e, mais tarde, em casa, dizia que as pessoas Este é o meu lugar [...]
da vila nunca tinham visto um menino tão velhaco. O Ilídio Meu Gerimum é com g
ficava enxofrado, mas lembrava-se dos homens que lhe Você pode ter estranhado
chamavam reguila, diziam ah, reguila de má raça. Com essa Gerimum em abundância
memória, recuperava o orgulho. Era reguila, não era velhaco. Aqui era plantado
Essa certeza dava-lhe forças para protestar mais, para gritar
E com a letra g
até, se lhe apetecesse.
PEIXOTO, J. L. Livro. São Paulo: Cia. das Letras, 2012. Meu lugar foi registrado
OLIVEIRA, H. D. Língua Portuguesa, n. 88, fev. 2013
No texto, observa-se o uso característico do português de (fragmento).
Portugal, marcadamente diferente do uso do português do
Brasil. O trecho que confirma essa afirmação é: Nos versos de um menino de 12 anos, o emprego da palavra
“Gerimum” grafada com a letra “g” tem por objetivo
A “Pela primeira vez na vida teve pena de haver tantos
assuntos no mundo que não compreendia e A valorizar usos informais caracterizadores da norma nacional.
esmoreceu.”
B “Os assuntos que não compreendia eram uma espécie B confirmar o uso da norma-padrão em contexto da linguagem
poética.
de tontura, mas o Ilídio era forte.”
C “Essa certeza dava-lhe forças para protestar mais, C enfatizar um processo recorrente na transformação da língua
portuguesa.
para gritar até, se lhe apetecesse.”
D registrar a diversidade étnica e linguística presente no território
D “Se calhar estava a falar de tratar da cabra: nunca
brasileiro.
esqueças de tratar a cabra.”
E reafirmar discursivamente a forte relação do falante com seu
E “O Ilídio não gostava que a mãe o mandasse tratar a cabra.”
lugar de origem.
2. (Enem 2017)
4. (Enem 2017)
Entrei numa lida muito dificultosa. Martírio sem fim o de
Naquela manhã de céu limpo e ar leve, devido à chuva
não entender nadinha do que vinha nos livros e do que o
torrencial da noite anterior, saí a caminhar com o sol ainda
mestre Frederico falava. Estranheza colosso me cegava e me
escondido para tomar tenência dos primeiros movimentos da
punha tonto. Acho bem que foi desse tempo o mal que me
vida na roça. Num demorou nem um tiquinho e o cheiro intenso
acompanha até hoje de ser recanteado e meio mocorongo.
do café passado por Dona Linda me invadiu as narinas e fez a
Com os meus, em casa, conversava por trinta, tinha ladineza e
fome se acordar daquela rema letárgica derivada da longa noite
entendimento. Na rua e na escola – nada; era completamente
de sono. Levei as mãos até a água que corria pela bica feita de
afrásico. As pessoas eram bichos do outro mundo que
bambu e o contato gelado foi de arrepiar. Mas fui em frente e
temperavam um palavreado grego de tudo.
levei as mãos em concha até o rosto. Com o impacto, recuei e
me faltou o fôlego por alguns instantes, mas o despertar foi
imediato. Já aceso, entrei na cozinha na buscação de derrubar
a fome e me acercar do aconchego do calor do fogão à lenha.
Foi quando dei reparo da figura esguia e discreta de uma Gravar: quando o ator é de televisão. Filmar: quando ele
senhora acompanhada de um garoto aparentando uns cinco quer deixar claro que não é de televisão.
anos de idade já aboletada na ponta da mesa em proseio
íntimo com a dona da casa. Depois de um vigoroso “Bom dia!”, Grávida: em qualquer ocasião. Gestante: em filas e
de um vaporoso aperto de mãos nas apresentações de praxe, assentos preferenciais.
fiquei sabendo que Dona Flor de Maio levava o filho Adão para Guardar: na gaveta. Salvar: no computador. Salvaguardar:
tratamento das feridas que pipocavam por seu corpo, no Exército.
provocando pequenas pústulas de bordas avermelhadas. Menta: no sorvete, na bala ou no xarope. Hortelã: na horta
ou no suco de abacaxi.
GUIÃO, M. Disponível em: www.revistaecologico.com.br. Acesso em: 10 mar. 2014 (adaptado).
Peça: quando você vai assistir. Espetáculo: quando você
A variedade linguística da narrativa é adequada à descrição
está em cartaz com ele.
dos fatos. Por isso, a escolha de determinadas palavras e
DUVIVIER, G. Folha de S. Paulo, 24 mar. 2014 (adaptado).
expressões usadas no texto está a serviço da
A localização dos eventos de fala no tempo ficcional. O texto trata da diferença de sentido entre vocábulos muito
B composição da verossimilhança do ambiente retratado. próximos. Essa diferença é apresentada considerando-se a(s)
C restrição do papel do narrador à observação das cenas
relatadas. A alternâncias na sonoridade.
D construção mística das personagens femininas pelo autor B adequação às situações de uso.
do texto. C marcação flexível das palavras.
E caracterização das preferências linguísticas da D grafia da norma padrão da língua.
personagem masculina E categorias gramaticais das palavras.

5. (Enem 2017) 7. (Enem 2016)


Zé Araújo começou a cantar num tom triste, dizendo aos Lisboa: aventuras
curiosos que começaram a chegar que uma mulher tinha se
tomei um expresso
ajoelhado aos pés da santa cruz e jurado em nome de Jesus
um grande amor, mas jurou e não cumpriu, fingiu e me cheguei de foguete
enganou, pra mim você mentiu, pra Deus você pecou, o subi num bonde
coração tem razões que a própria razão desconhece, faz desci de um elétrico
promessas e juras, depois esquece.
O caboclo estava triste e inspirado. Depois dessa canção pedi um cafezinho
que arrepiou os cabelos da Neusa, emendou com uma valsa serviram-me uma bica
mais arretada ainda, cheia de palavras difíceis, mas bonita que quis comprar meias
só a gota serena. Era a história de uma boneca encantadora
só vendiam peúgas
vista numa vitrine de cristal sobre o soberbo pedestal. Zé
Araújo fechava os olhos e soltava a voz: fui dar a descarga
Seus cabelos tinham a cor/ Do sol a irradiar/ Fulvos raios disparei um autoclisma
de amor./ Seus olhos eram circúnvagos/ Do romantismo azul
dos lagos/ Mãos liriais, uns braços divinais,/ Um corpo alvo gritei “ó cara!”
sem par/ E os pés muito pequenos./ Enfim eu vi nesta boneca/ responderam-me “ó pá”
Uma perfeita Vênus.
positivamente
CASTRO, N. L. As pelejas de Ojuara: o homem que desafiou o diabo. São Paulo: Arx, 2006.
(Adaptado). as aves que aqui gorjeiam não gorjeiam como lá.
O comentário do narrador do romance “[...] emendou com uma PAES, J. P. A poesia está morta mas juro que não fui eu. São Paulo: Duas Cidades, 1988.

valsa mais arretada ainda, cheia de palavras difíceis, mas


No texto, a diversidade linguística é apresentada pela ótica de
bonita que só a gota serena” relaciona-se ao fato de que essa
um observador que entra em contato com uma comunidade
valsa é representativa de uma variedade linguística
linguística diferente da sua. Esse observador é um
A detentora de grande prestígio social.
B específica da modalidade oral da língua A falante do português brasileiro relatando o seu contato na
C previsível para o contexto social da narrativa. Europa com o português lusitano.
D constituída de construções sintáticas complexas. B imigrante em Lisboa com domínio dos registros formal e
E valorizadora do conteúdo em detrimento da informal do português europeu.
forma. C turista europeu como domínio de duas variedades do
português em visita a Lisboa.
6. (Enem 2016) D português com domínio da variedade coloquial da língua
Nuances falada no Brasil

Euforia: alegria barulhenta. Felicidade: alegria silenciosa.


E poeta brasileiro defensor do uso padrão da língua falada
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em Portugal.
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