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ETIMOLOGIA E APLICAÇÃO DO CONCEITO PHRONESIS

NA LÍNGUA ITALIANA
Sergio Cricca Viana1

RESUMO
A presença de conceitos e suas interpretações em uma obra literária deve, não apenas, ser
tratado como uma questão de explicar a melhor escolha, para além disso, vale-se de
compreender seus impactos, etimologias e sobretudo contextos de suas aplicações, de tal
modo que para maior entendimento sobre um verbete, principalmente os mais capitais para
uma pesquisa, a busca por um comparações, discussões e resoluções são necessárias para
situar o pesquisador e o leitor sobre o efetivo interesse de uso do conceito, seja em uma
pesquisa literária ou a produção de um ensaio. O conceito de Phronesis na língua italiana
passa por uma construção que não apenas deve ser desenvolvida, explicada e interpretada mas
também esclarecida perante aos outros verbetes que possam, de qualquer modo, conflitar-se.

Palavras-chave: Phronesis; etimologia; Aristóteles; Saggezza; Prudência; língua italiana.

Introdução
A produção deste artigo é produto do primeiro capítulo da dissertação em
desenvolvimento sobre a perspectiva de Francesco Guicciardini (1483 - 1540) aos eventos
políticos desencadeados em sua época, a partir de três expectativas diversas, analisadas por
três fases de sua vida, realizando uma pesquisa através das obras literárias de cada fase (Storie
Fiorentine, Dialogo del reggimento di Firenze e Storie d’Italia), compreendendo seu estilo de
escrita, mensagens explícitas e implícitas, a biografia do autor referente a cada uma de suas
fases, além de suas ideológicas, expectativas, frustrações e críticas, em conflito com a sua
vida profissional nos mais altos cargos políticos e envolvido nas principais decisões pré e
durante a decadência do governo republicano em Florença no século XVI, caindo perante a
ascensão do Absolutismo e a concentração de poder no regime de Ducato, este submisso às
forças estrangeiras espanholas e francesas. Esta pesquisa está em desenvolvimento no
Departamento de Letras Modernas FFLCH (USP), referente a linha de pesquisa de Literatura
e Cultura Italianas.
Os estudos sobre filologia desenvolvidos na disciplina com o prof. Dr. Antônio Lindo

1
Endereço para acessar este CV: http://lattes.cnpq.br/8206088225039249
foram de suma importância para a compreensão do percurso dos conceitos clássicos até as
diversas épocas e contextos, e através da visão filológica que o conceito de Phronesis será
tratado no primeiro capítulo da dissertação, dado que entre as análises que serão realizadas na
dissertação, a ótica da etimologia e interpretações de conceitos, em especial Accidenti e
Prudenzia (versões guicciardiniane de Fortuna e Phronesis), são fundamentais, por serem
termômetros das obra do autor em relação às suas perspectivas em cada uma das três fases.
Vale dizer que foi preferido o verbete Phronesis ao invés de Prudência, pois deste modo a
referência ao conceito filosófico de Aristóteles (384 a.C. - 322 a.C.) e seus desdobramentos
são mais claros, dado que Prudência, nos dias atuais, têm desvios em sua aplicação.
Este artigo busca comunicar as inquietações entre as várias aplicações de Prudência,
não apenas na língua italiana como também em português, como resultado de um confronto
de bibliografias que, durante a pesquisa para compor a dissertação, tiveram entraves nas
interpretações entre alguns verbetes, logo, busca-se destrinchar e esclarecer como interpretar
o conceito Phronesis nestas duas línguas.

Etimologia de Phronesis e suas potências traduções


Dentre os adventos filosóficos gregos, que são até os dias atuais algumas das bases da
sociedade ocidental, a Phronesis é considerado um dos eixos elementares para o
funcionamento cívico, moral e ético da sociedade, seja como um elemento aplicável ou
refutável, este conceito passou por diversas interpretações e alterações contextuais. Segundo o
WordSense Dictionary, a escrita original de Phronesis é φρόνησις, como a junção de “From
φρονέω ("to think") + -σις; the former from φρήν ("mind")”2, que é original do grego antigo.
A sua adaptação para Prudentia a partir de Cícero (106 a.C. - 43 a.C.), não buscava traduzir
as obras, mas trazer seus valores de modo retórico, método diferente dos padrões atuais,
porém, ele conseguiu manter não apenas a grafia da palavra do grego para o latim, mas
também o seu contexto, desta vez, situado no contexto dos debates cívicos e políticos
inerentes a Roma Antiga.
A grafia em Prudentia foi mantida na recuperação dos clássicos pelos escolásticos, às
vezes retornando a escrita em Phronesis, o resgate do conceito era para comprovar os dogmas

2
WordSense Dictionary, acesso em 08/12/2022,
https://www.wordsense.eu/%CF%86%CF%81%CF%8C%CE%BD%CE%B7%CF%83%CE%B9%CF
%82/ : Do φρονέω ("pensar") + -σις; do antigo φρήν ("mente") (tradução nossa).
católicos e suas filosofias a partir de outros autores, além de ser uma resposta frente a corrida
intelectual contra o Islã, ambientada pelo contexto da busca da verdade religiosa, cruzadas e
consolidação do catolicismo como a verdade absoluta, que para tal os estudos sobre a
metafísica aristotélica foram considerados como não apenas a comprovação “intelectual” do
sagrado católico, mas também de uma formalização acadêmico dos valores e elementos
católicos, tendo como sujeito defensor desta prática São Tomás de Aquino (1225 - 1274) e
seus estudos sobre as virtudes, que passam pela compreensão de: Prudência como a sabedoria
prática da qual se deve pensar nos atos e suas consequências; Temperança como a habilidade
de auto-moderação e auto-restrição; Fortaleza como a habilidade de enfrentamento, ação sem
covardia; e Justiça como a manutenção do justo e comportamento razoável.
Os humanistas renascentistas quem retomaram a Phronesis como um produto da ética
e prática política, e Florença como uma das pioneiras no Estado republicano, desde o século
XII e seus lapsos republicanistas através da oligarquia, passando pelas transformações sociais
e elevação das classes burguesas e assalariadas chamadas Arti Fiorentini (Arti Maggiori e Arti
Minori), desde as revoltas com Tumulto dei Ciompi (1378), até a formação de Corporazioni
mais sólidas e plurais, que cooperaram para a formação do períodos mais republicano vivido
até então, entre 1434 e 1494 (Repubblica di Iure), intensificata entre 1494 e 1512 (Repubblica
a tutti gli effetti), e tendo com início da decadência e falecimento deste regime em 1532,
sendo neste contexto fiorentino que o conceito Phronesis se encontra escrito como Prudenzia,
de acordo com a língua florentina da época.
Atualmente, o conceito de Phronesis, na língua italiana, não se mantém na mesma raiz
gráfica, pois a palavra que melhor se enquadra é Saggezza, que sua descrição se enquadra
dentro do valor conceitual dos verbetes anteriores. No que se refere a língua portuguesa, não
foi encontrada uma palavra que se referisse exclusivamente como relativa ao conceito de
Phronesis, ainda que haja o verbete Prudência, que tem a grafia similar a Phronesis, esse não
porta em seu uso atual o mesmo conceito, e com isso, a tradução para a língua portuguesa fica
relativa ao tradutor e o contexto aplicado.
A dissertação desenvolvida no departamento de Letras em italiano seguirá um corpo
de referências bibliográficas quase completamente em italiano, mas também foram analisados
textos em português, e neles o uso do conceito Phronesis foi traduzido para Prudência, ainda
que este encontre certas aplicações atuais que escapam da interpretação aristotélica, dado que
atualmente seu uso mais comum é como sinônimo de cautela e paciência. Vale também dizer
que, dentro da sociedade utilitarista do século XXI a palavra Prudência pode também ser
usada com intuito de insultar um indivíduo por ser lento nas decisões, medroso ou inseguro.
Durante as aulas com o Prof. Dr. Luiz Antônio Lindo na disciplina de Tradução e
Filologia: a Transmissão de Textos Filosóficos e Científicos à Idade Média, FFLCH - USP
(2021), foi reforçado que o fato da língua portuguesa não ter desenvolvido uma nova palavra
para descrever o uso desvirtuado do conceito Phronesis, unificando esta e o conceito
aristotélico a mesma palavra (Prudência), não é suficiente para afirmar que a palavra
Prudência deva passar por uma reformulação, apenas significa que ainda não teve uma análise
mais crítica sobre este conceito e a diferença em relação às suas aplicações na língua
portuguesa, sendo ainda perceptível através do contexto a qual dos tipos de Prudência que
uma frase possa se referir.
Na língua italiana, por sua vez, desde seus primórdios fiorentini, notando-se desde a
língua de Dante (1265- 1321), que o conceito de Phronesis era debatido, e por causa desta
presença constante do conceito que se migrou para dois caminhos diferentes, separando a
interpretação filosófica do uso utilitarista e moderno de “prudência”, por sua vez: saggezza e
prudenza.
Os livros atuais que traduzem as obras humanistas italianas, principalmente de
Florença (a sua vez escrita como Prudenzia) preferem seguir pela escolha da palavra
Saggezza, mesmo que esta tenha uma ortografia diferente do conceito que ela provém:
saggézza s. f. [der. di saggio1]. – L’essere saggio; capacità di seguire la ragione nel
comportamento e nei giudizî, moderazione nei desiderî, equilibrio e prudenza nel
distinguere il bene e il male, nel valutare le situazioni e nel decidere, nel parlare e
nell’agire, come dote che deriva dall’esperienza, dalla meditazione sulle cose, e che
riguarda soprattutto il comportamento morale e in genere l’attività pratica: una
persona di grande s.; parlare, agire con s., con molta s.; dare prova di s.; parole piene
di s.; la s. delle persone anziane, dei contadini; la s. condensata nei proverbî; con
partic. riferimento al modo di operare: la s. di un consiglio, di una decisione, di un
provvedimento legislativo. Nel linguaggio medico, denti della s., lo stesso che denti
del giudizio (v. dente). (TRECCANI, 2021)3
Os escritores modernos preferem aplicar o uso de Prudenza como o verbete relativo
aos valores da sociedade moderna, desenvolvendo a partir desta palavra o valor de agir com

3
Acesso em 06/12/21. https://www.treccani.it/vocabolario/saggezza/: saggézza s. f. [der. di saggio]. – O ser
sábio; capacidade de seguir a razão no comportamento e nas análises, moderação dos desejos, equilíbrio e
prudência no distinguir o bem e o mal, no avaliar as situações e no decidir, no falar e no agir, como um talento
que deriva da experiência, da meditação sobre as coisas, e que abrange sobretudo o comportamento moral e por
vezes a atividade prática: uma pessoa de grande sabedoria; falar, agir com sabedoria; com muita s.; dar prova de
s.; falar cheio de s.; a s. das pessoas anciãs, dos camponeses; a s. condensata nos provérbios; com partic.
referência ao modo de operar: a s. de um conselho, de uma decisão, de uma medida jurídica. Na linguagem
médica, dentes da sabedoria, o mesmo que os dentes do juízo (v. dente). (tradução nossa).
cautela, paciência, ausência de pressa e, às vezes, a partir de uma visão utilitária,
exageradamente cauteloso e medroso:
La PRUDENZA è l’atteggiamento cauto di chi, per carattere, è portato a prevedere e
a valutare con molta attenzione le possibili conseguenze delle proprie azioni e si
comporta in modo da evitare di correre rischi inutili e di procurare danni a sé o ad
altre persone (avere p.; in determinate circostanze è necessario agire con p., bisogna
usare p.; il timore induce alla p.; consigliare la p.; guidate con p.!; p., ti
raccomando!; la p. non è mai troppa; sono oggetti pericolosi che vanno maneggiati
con estrema p.; per p., preferì non dire altro; per p., ha preso l’abitudine di chiudere
sempre la porta a chiave). 2. Nella teologia cattolica, la prudenza è una delle quattro
virtù cardinali (insieme a giustizia, fortezza e temperanza): per la precisione, quella
che aiuta l’uomo a distinguere il bene dal male, così da guidarlo verso ciò che è
giusto. (TRECCANI, 2021)4
Com isso, o agir com inteligência, dominar a experiência e ser capaz de compreender
o presente a partir dos elementos históricos e das habilidades sociais e políticas, se diz “agire
con saggezza”, agora, quando se age com calma, paciência e espera, se diz “agire con
prudenza”.

Phronesis, Saggezza e Sapienza, segundo Aristoteles


Na língua italiana moderna, mas também historicamente, há o conflito entre dois
verbetes para melhor representar a Phronesis: Sapienza e Saggezza, cabendo a cada uma a
interpretação distinta do “saber”, dado que em Sapienza o “saber” refere-se aos
conhecimentos técnicos, saber científico e voltado sobretudo as disciplinas básicas de ensino.
Ao invés disso, a Saggezza é aplicada na língua italiana como um saber prático, aprendido a
partir das experiências sociais, assim como também representa a habilidade de compreender o
passado, para mapear o presente e antever o futuro.
O debate entre estes verbetes ocorre desde o início da formação deste conceito, dado
que a sua interpretação até Platão (428 a.C - 347 a.C.) era de que o conhecimento era o
resultado de elementos não claramente distintos, às vezes iguais. A Phronesis (em italiano
“saggezza”, em português “prudência”) e a sophia (em italiano “sapienza”, em português
“sabedoria”) eram dois elementos que compunham a habilidade intelectual do homem, seja na

4
Acesso em 06/12/2021 https://www.treccani.it/vocabolario/prudenza/: A PRUDÊNCIA è a relação cauteloso de
quem, por natureza, é levado a prever e a avaliar com muita atenção às possíveis consequências das próprias
ações e se comporta em modo de evitar de correr riscos inúteis e de procurar danos a si mesmo e a outras pessoas
(ter prudência.; em determinadas circunstâncias é necessário agir com p., precisa usar a p.; o temor induz à p.;
conciliar a p.; guiar a p.; dirija com p.!; p., estou te avisando!; a p. e nunca exagerada; são objetos perigosos que
vão manipular com extrema p.; por p., preferes não falar; por p., pegou o hábito de fechar sempre a porta com a
chave. 2. Na teologia católica, a prudência é uma das quatro virtudes cardeais (junta da justiça, fortaleza e
temperança): pela precisão, aquele que ajuda o homem a distinguir o bem do mal, assim o guiará até aquilo que é
certo. (tradução nossa)
compreensão do mundo (mundo físico) quanto na moral, ética e espírito (metafísico).
Nos dias atuais, ainda é possível encontrar interpretações equivocadas destes dois
conceitos, e para esclarecer a diferença conceitual entre eles, a Treccani5 (principal
enciclopédia italiana, assim como arquivista histórico e parceiro para publicações dos estudos
da língua realizados pela Accademia della Crusca) considera Sapienza:
Possesso di profonda scienza e dottrina. Il termine (dal lat. sapientia, der. di sapiens
-entis «sapiente, saggio») traduce il greco σοφία, vocabolo che nel pensiero
filosofico presocratico e ancora in Platone viene impiegato per indicare quella
concezione della s. che è insieme abilità tecnica, conoscenza razionale ed equilibrata
prudenza nel distinguere bene e male, lecito e illecito, utile e dannoso. In
quest’ultima accezione esso è utilizzato come equivalente di φρόνησις, «saggezza»
(➔ Phronesis), che, espressione anch’essa di perfezione spirituale, riguarda più
specificamente il comportamento pratico e l’agire morale. La distinzione nel
concetto e nell’uso dei due vocaboli si pone con chiarezza in Aristotele che
nell’Etica Nicomachea (➔) (TRECCANI, 2021)6
Deste modo, Sapienza é potencialmente confundível com Saggezza, devido a
interpretação que se debatia entre a real diferença entre Sophia e Phronesis, que a partir da
separação destes dois conceitos por Aristóteles, estas habilidades foram destinadas para
setores diferentes do saber, ainda que cada qual têm efeitos sobre a outra.
Platão tinha a percepção de que Phronesis e Sophia não eram a mesma coisa, pela
lógica existente a sua época de que tudo tinha seu perfeito contrário, logo, uma coisa como a
“falta de sabedoria” não poderia ela, sendo coisa única, ser composta de dois contrários para
si, sendo elas a Phronesis e a Sophia. Esta indagação não foi concluída por Platão, mesmo que
tenha sabido que não eram a mesma coisa, ele não pôde responder o que Phronesis e a Sophia
eram, separadamentes:
Allora, Protagora, quale delle due ipotesi dobbiamo abbandonare? Quella in base
alla quale ogni cosa ha un solo contrario o quella in base alla quale la sapienza è
diversa dalla saggezza, che entrambe sono parti della virtù e che, oltre ad essere
diverse, sono anche dissimili in se stesse e nelle loro proprietà, come le parti del
volto? Quale delle due ipotesi dobbiamo abbandonare? Infatti i due ragionamenti
non vanno d'accordo: non "cantano insieme" e non sono in armonia fra loro. Come
potrebbero accordarsi se per ogni cosa deve esistere un solo contrario, e non di più, e
invece la stoltezza, che è una cosa sola, sembra avere come contrari la sapienza e la
saggezza? (PLATONE, 2010, p. 190)7.

5
Acesso em 06/12/2021. https://www.treccani.it/
6
Acesso em 06/12/2021 https://www.treccani.it/enciclopedia/sapienza_%28Dizionario-di-filosofia%29/: Posse
de profunda ciência e doutrina. O termo (do lat. sapientia, der. di sapiens -entis «sapiente, saggio»), traduzido do
grego σοφία, vocabolo que no pensamento filosófico presocratico e anida em Platão vem usado para indicar
aquela concepção de “sapienza” que é o conjuto de habilidade técnica, conhecimento racional e equilibrada
prudência no distinguir o bem e o mal, licito e ilicito, util e danoso. Nesta última acepção, ele é utilizado como
equivalente de φρόνησις, «saggezza» (Phronesis), que espressa também esta a perfeição espiritual, diz respeito
mais especificamente ao comportamento prático e o agir moral. A distinção no conceito e no uso dos dois
vocábulos se põem com clareza em Aristóteles no Etica Nicomachea (tradução nossa).
7
PLATONE, Protagora, a cura di M. L. Chiesara, BUR, Milano 2010: Então, Protagora, qual das duas hipóteses
devemos abandonar? Aquela em base que cada coisa tem apenas um contrário ou aquela em base que a sapienza
Aristóteles, discípulo de Platão e preceptor de Alexandre Magno (356 a.C - 323 a. C.),
foi um filósofo grego do século V a.C. cujo trabalho se estende por todas as áreas da filosofia
e ciência conhecidas no mundo grego, sendo ainda o autor do primeiro sistema abrangente de
filosofia ocidental. Dentre os seus interesses, como Física e Metafísica, outro campo
desbravado é a ética e moral, notados em especial na obra Ética a Nicômaco, considerado um
marco importante no estudo e desenvolvimento da ética como disciplina filosófica. Baseada
em seu pai, Nicômaco, a obra traz uma abordagem prática das virtudes como o caminho para
o pleno desenvolvimento humano, do ponto de vista ético, defendendo que o objetivo é ser
bom, não apenas saber o que é bom. Ainda, segundo Aristóteles, um caráter virtuoso nos
aproxima da felicidade.
Dentre os principais temas de Aristóteles, considere: as inovações no âmbito da Física
e Metafísica, Ética e confronto contra os sofistas. Porém, a Phronesis aparece como um
resultado de uma crítica aos seus mestres, não apenas para definir melhor o conceito, mas o
trazendo para uma análise do Particular, e não apenas do Universo.
Até a chegada de Aristóteles, os grandes filósofos como Platão e Sócrates (470
a.C.-399 a.C.) sempre haviam falado da Phronesis como um conceito equivalente à sabedoria,
melhor dizendo, para eles, a Phronesis não era nada mais do que o reflexo da sabedoria.
Entretanto, Aristóteles incluiu um novo aspecto a esta linha de pensamento. Segundo sua
explicação, a Phronesis é uma manifestação do conhecimento, assim como a própria virtude
de uma das partes da alma racional.
Apesar disso, Aristóteles não se refere à Phronesis apenas como uma ciência ou arte,
mas explica em sua obra Ética a Nicômaco que ela é compreendida como uma representação
do correto, do lógico e do real, assim como diferenciando o bem e o mau (diferente da
interpretação de São Tomás de Aquino de “diferenciar o bem do mau).
Portanto, a Phronesis está focada nos assuntos humanos como também na reflexão dos
aspectos que possibilitam uma deliberação. Desta forma, Aristóteles indica a diferença entre o
indivíduo prudente e os demais por causa da capacidade de deliberação que leva a discernir a
melhor opção para o momento, com isso, este conceito era o elemento capital para a Ética e

(sabedoria) é diversa da saggezza (prudência), que ambas são partes da virtude e que, além de serem diversas,
são também dissimilar entre si e nas propriedades delas, como as partes da face? Qual das duas hipóteses
devemos abandonar? Efetivamente os dois raciocínios não concordam: não “cantam juntas” e não estão em
harmonia entre eles. Como poderiam concordar entre si se para cada coisa deve existir um só contrário, e não a
mais, e ao invés de estultícia, que é uma coisa só, parece ter como contrários a sapienza e a saggezza? (tradução
nossa).
Moral humana, a considerando com a base para outras virtudes.
Baseando nesta perspectiva aristotélica, é possível notar a diferença na interpretação
entre Phronesis e Sophia a partir de um exercício reflexivo sobre as interpretações de casa
uma de suas respectivas tradução e suas devidas aplicações atuais: uma pessoa que age com a
Sophia é sapiente, e aquela que age com Phronesis é saggia. Assim como que o ato de agir
com a Sophia é sapienza e o ato de agir com a Phronesis é saggezza.
Portanto, não é aceitável a generalização destes contextos como uma única coisa, pois
assim como atualmente cada qual tem um valor distinto, os clássicos também às
diferenciavam, pois segundo Aristóteles em A Ética de Nicômaco, Phronesis e Sophia são
ambas parte virtù intelectuais; Sapienza como “Scienza e intelletto delle cose più elevate per
natura” (ARISTOTELE, 2012, p. 1141)8; Saggezza como:
“Riguarda le cose umane e quelle su cui è possibile deliberare, infatti diciamo che
l’attività tipica del saggio è soprattutto questa, il ben deliberare (…) chi delibera
bene, in generale, è colui che tende al miglior bene pratico per l’uomo sulla base del
ragionamento calcolante. La saggezza non riguarda solo gli universali, ma deve
conoscere anche i casi particolari, infatti è pratica, e la prassi riguarda i casi
particolari” (ARISTOTELE, 2012, p. 1141)9.
A diferença presente entre estes dois conceitos aristotélicos revelam a distinção das
virtudes intelectuais como esferas do saber distintas, que podem ser presentes individualmente
em uma pessoa, sem a obrigatoriedade de coexistirem, desenvolvendo características,
habilidades, métodos e aplicações destes saberes que não passam pelo mesmo processo de
aprendizagem, e por tal conclusão a partir de Aristóteles que Saggezza e Sapienza são
qualidades buscadas por caminhos diferentes e através de mecanismos variados.

Considerações finais
A escolha de realizar este artigo baseado na língua italiana, realizando algumas
comparações com a língua portuguesa, foi necessária para decifrar como os conceitos de
Prudenza, Saggezza e Sapienza (também considerando a forma fiorentina de Prudenzia) eram
aplicados nas fontes da dissertação em desenvolvimento (os três livros de Guicciardini), mas
para além, compreender as suas etimologia e questões filológicas e filosóficas, dado a

8
Ciência e intelecto das coisas mais elevadas por natureza (tradução nossa).
9
Refere-se às coisas humanas e aquelas sobre as quais é possível deliberar, de fato dizemos que a
atividade típica do “sábio” (não é uma tradução em português que diferencia assim como se faz em
italiano entre Sapiente e Saggio) e sobretudo esta, o bem deliberar (...) quem delibera bem, em geral,
e aquele que tende ao maior bem prático para para o homem sobre base de raciocínio calculante. A
Prudência não refere-se apenas aos universais, mas deve conhecer também os casos particulares,
de fato é prático, e a praxia refere-se aos casos particulares. (tradução nossa).
pluralidade destes conceitos na língua italiana.
Conclui-se que o conceito de Saggezza é efetivamente o mais próximo de Prudenzia,
este que é uma aplicação guicciardiniana direta e consciente de Phronesis, e mesmo que
Saggezza não siga a grafia original, a sua interpretação conceitual é fiel. Porém, vale dizer que
algumas obras de Guicciardini traduzidas do fiorentino para o italiano moderno mantém o
verbete Prudenzia, como uma provável proposta de não afastar a aplicação aristotélica de
Guicciardini, mantendo ao mesmo tempo as grafias semelhantes, e para as traduções que
aceitam a aplicação de Saggezza, é sugerido que seja realizada uma explicação filológica para
situar o leitor/pesquisador sobre as diferenças destes conceitos, dado que as distinções
gráficas pode interferir na compreensão e pesquisa, assim como a aplicação
descontextualizada igualmente possibilita uma interpretação desajustada.
Das obras em português, não foram encontrados os livros de Guicciardini usados na
dissertação em desenvolvimento, e sobre o referencial bibliográfico, os autores brasileiros
realizam o devido exercício etimológico para situar o leitor/pesquisador, não apenas
facilitando a interpretação como também justificando as escolhas do verbetes para melhor
explicar o conceito Prudenzia, que por fim, acabam escolhendo manter os verbetes originais,
ou seja, Phronesis para referir se ao conceito aristotélico e Prudenzia para a perspectiva
guicciardiniana, tal como é encontrado nas pesquisas de Felipe Teixeira:
Deve-se notar, contudo, que o entendimento guicciardiniano de prudenzia não pode
ser inteiramente englobado pelo modelo aristotélico: para o escritor florentino, a
prudenzia constitui o principal alicerce de uma forma de análise das coisas da
política fundada na capacidade de antecipação, necessária ou provável, dos efeitos
das ações humanas. (TEIXEIRA, 2007, p. 344).

Referências bibliográficas
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di Maria Silvia Vaccarezza: Milano, 2014.
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ml, acesso em: 09 set. 2021.
_______. Storia d'Italia. a cura di Silvana Seidel Menchi; saggio introduttivo di Felix
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_______. I Ricordi. a cura di Roberto Palmarocchi. In: Scrittori d'Italia. Laterza Editore:
Bari, 1933. Liber Liber: disponível em
https://www.liberliber.it/mediateca/libri/g/guicciardini/ricordi/pdf/ricord_p.pdf, acesso em: 09
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PLATONE, Protagora, a cura di M. L. Chiesara, BUR, Milano 2010.
_______. O Melhor Governo Possível: Francesco Guicciardini e o Método Prudencial de
Análise da Política. In: Revista de Ciências Sociais, Rio de Janeiro, vol. 50, cap. 2, 2007, p.
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