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A importância

do estudo
sobre os
sonhos na
pandemia
Autor:Bruno LuizTavares Oliveira
Orientadora: Clarice Caldeira Leite
Instituição: Colégio Murialdo PortoAlegre
PortoAlegre, 2020.

Imagem 1: “O sonho”, de Frida Kahlo.


Imagem 2: “Swan e Minotauro, Starcatcher”, de Duy Huynh.
“Não há longa noite que não encontre o dia.”
William Shakespeare

“É doente de sonho. Todos nós somos


doentes de sonho, por isso estamos aqui.”
Charles Bukowski
Sumário
1. Introdução
1.1 Hipótese
2. Referencial teórico – psicanálise, filosofia e neurociência
3. Metodologia
4. Resultados e discussões
5. Conclusão
6. Referências
1. Introdução
A partir do tema Efeito emocional relativo ao isolamento social, o
presente estudo tem como objetivo geral refletir acerca da importância dos
estudos sobre os sonhos relacionados ao impacto das medidas sanitárias de
distanciamento social e confinamento no cotidiano das pessoas para
protegerem-se da Covid-19.
Desde Freud, sabemos da importância dos sonhos como forma de
elaboração e autoconhecimento da subjetividade, tanto individual quanto
coletiva. Os sonhos nos auxiliam, entre outras funções, a aliviar o peso da
realidade trágica e catastrófica. Neste ano mundialmente atípico,
intencionamos auxiliar na divulgação de pesquisas que se preocupam em
criar mecanismos de ajuda, sobretudo, virtuais.
Através de pesquisas feitas por cientistas neste período peculiar, como a
“Sonhos em tempos de pandemia”, cujo "o estudo teve como objetivo a
criação de um campo possível de endereçamento das angústias e do
sofrimento vivido pelos trabalhadores da saúde e da educação (...),
distinguindo o isolamento físico do social e tornando possível compartilhar
com outros as vivências subjetivas deste período traumático em que cada
um precisa enfrentar novos desafios e se reinventar. [...]”, encontramos
subsídios para fundamentar a importância social, cultural, psicológica,
filosófica e neurocientífica dos relatos oníricos ocorridos em tempos
pandêmicos no Brasil. Com o que os brasileiros andam sonhando? Imagem 3: “Leaving Wonderland”, de
Christian Schloe.
1.1 Hipótese
“Quando Sigmund Freud escreveu o livro que é reconhecido como marco
fundador da psicanálise “A Interpretação dos Sonhos”, em 1900, um dos
objetivos foi retirar os sonhos do mundo da fantasia, do sem sentido ou das
artes adivinhatórias. A hipótese de Freud era que o sonho é a realização de
um desejo, e que diz respeito exatamente ao que vivemos no dia a dia de
nossas vidas, mas que não podemos vivenciar (grifo nosso). O sonho é a
parte que Freud chamou de economia psíquica, pois busca uma elaboração
psíquica do que angustia, do que produz reações afetivas, mas não se apresenta
ao sonhador como uma produção de sentido para a vida. Ainda que reconheça a
vida nos sonhos que Freud chamou “restos do dia”. (GURSKI, 2020).

A hipótese da pesquisa é a de que o ato de narrar sonhos “[...] pode


promover condições de construir uma trama discursiva numa perspectiva que
coloque em relevo um saber do sujeito do inconsciente. Uma aposta de que o
compartilhamento dos sonhos pode contribuir para o pensamento e a
reflexão sobre o mal-estar deste tempo surpreendente que vivemos – tanto
global, em função da Covid, quanto localmente, com o descaso e o
desgoverno na política brasileira em meio à pandemia (grifo nosso)”
Imagem 4: Livro “A interpretação dos
(ROSA; BROIDE; ALENCAR, 2020).
sonhos”, de Sigmund Freud.
2. Referencial teórico – psicanálise, filosofia e neurociência
1. “O gesto de dar ouvidos ao coletiva – dimensão que, em tempos violentas de modos de vida, como
sonhador, acolhendo a sua de distanciamento, oferece um laço guerras ou transformações sociais e
intimidade, configura-se ato que que acolhe e recolhe a palavra como pessoais repentinas, que acionam o
convoca a fala. Na contramão do transmissão, testemunho desse processo de elaboração
descaso e da indiferença tempo. [...]” (op. cit.). caracterizado como traumático. Há
governamental fizemos a aposta de ainda um terceiro tipo de sonho,
que, ao ofertar a escuta aos sonhos próprio dos tempos de crise social,
e às suas associações, as questões 3. “O método proposto de leitura do que interroga o absurdo e o obsceno
do viver ganhariam espaço e se material consistiu em nos deixar de modo que o litoral entre ficção
revelariam nos sonhos como interpelar pelos sonhos e pelo saber ou realidade, sonho ou vigília,
produções, fotografia, obra de arte. neles contidos quanto à política torna-se fluído. [...]” (op. cit.).
Coube a eles, os sonhadores, libidinal presente nos laços sociais
oferecerem seu saber inconsciente vividos no atual momento.
– aquele que não se sabe – para Com Freud, as cenas dos sonhos nos 5. “Edson de Sousa utiliza a expressão
uma pesquisa, para a ciência, a permitiram recolher, a partir da “atravessar desertos” como
universidade, a saúde e a posição singular do sujeito, a sua metáfora para enfrentar o
educação, tão desprezadas pelo articulação coletiva, o seu totalitarismo reinante que nos
desinvestimento político maciço. diagnóstico e a prospecção das inunda de paralisia e conformismo,
[...]” (ROSA; BROIDE; crises em andamento. Nessa anestesiando o que temos de mais
ALENCAR, 2020). proposta, em vez de interpretar o precioso, nosso direito à revolta,
sonhador e a realidade, invertemos: nossa potência de desejar, nosso
os sonhos endereçados se compromisso para com a nossa
2. “A pesquisa torna-se, então, uma apresentam como intérpretes dos imaginação.” (op. cit.).
convocação aos nossos laços sociais, da cultura e da política
contemporâneos para contarem a de nosso tempo. [...]” (op. cit.).
história do seu tempo, compondo
um ato de dupla inflexão, clínico e
político. Há uma dimensão de 4. “Outro aspecto relevante foi certa
reconhecimento da palavra e do perda do limiar entre sonho e
sujeito ao transformar a dor e o realidade – um fenômeno presente
sofrimento vividos em pertença em situações de interrupções
2. Referencial teórico – psicanálise, filosofia e neurociência
6. “No atual contexto histórico surreal quanto à pandemia.” neurocientista Natália Mota, para a
brasileiro, em que o anonimato e a (IANNINI, 2020) revista Viva Bem.” (op. cit.).
mentira ocupam a cena política,
sonhar é um ato revolucionário.
8. “O neurocientista Sidarta Ribeiro, 10. “Como pesquisadores e sujeitos da
Revolucionário porque subverte o
um dos mais respeitados em sua história, nosso compromisso é
campo do não querer saber, do não
área no Brasil, professor e vice- sermos contemporâneos. Para o
se responsabilizar pelo dito. Ao
diretor do Instituto do Cérebro da filósofo Agamben, o
sonharem por todos nós,
Universidade Federal do Rio contemporâneo é aquele que
os sonhantes/sonha-dores oferecem
Grande do Norte (UFRN), afirma percebe o escuro do seu tempo
uma profusão de imagens que
existir uma forte teoria que como algo que lhe concerne, e que
revelam e afirmam que ainda há
originalmente todos os sonhos eram não cessa de interpelá-lo. É aquele
sonhos para nos despertar para a
pesadelos. Segundo o especialista, que recebe em pleno rosto o facho
vida.” (op. cit.).
desde os tempos das cavernas os de trevas que provém do seu tempo.
sonhos serviam para avisar dos [...]” (ROSA; BROIDE;
7. “– O bom do sonho é que a mente perigos iminentes. [...]” CARTA ALENCAR, 2020).
trabalha sem censura. Os nossos CAPITAL (2020).
medos, os desejos e as fantasias se
projetam numa tela como se fosse
9. “Ao viver este trauma coletivo, com
cinema [...]” “[...]nos sonhos o
as mudanças bruscas na rotina
aparelho psíquico se abre para
imposto pelo novo coronavírus, os
elaborar o que não compreendemos,
sonhos refletem o esforço psíquico
e por isso parecem conferir algum
para se adaptar a uma nova
sentido à realidade, mesmo uma tão
realidade, explicou a psiquiatra e
3. Metodologia
Esta pesquisa é de natureza bibliográfica, divulgando estudos
exploratórios sobre os sonhos na pandemia que ainda estão em
continuidade, sendo realizados no ano de 2020. Caso seja do
interesse do leitor deste trabalho participar desses estudos
(parceria entre as universidades USP, UFRJ, UFRGS e UFRN),
disponibilizamos aqui o link do Instagram @sonhosconfinados
(https://www.instagram.com/sonhosconfinados/) e o link do termo
de consentimento livre e esclarecido presente no formulário
(https://docs.google.com/forms/d/e/1FAIpQLSda_C_f7qIDD4dBN
DiYRt7AkLs7eRRR_Pu_Epb4jsJI2w8V4Q/viewform), de acordo
com a metodologia dos especialistas das universidades envolvidas
na pesquisa. É preciso ter 18 anos ou mais para participar.

Imagem 5: Ilustração “It’s in Dreams That


Americans Are Making Sense of Trump”, de
Stephen Marche
4. Resultados e discussões
Os estudos iniciais apontaram:

- Começaram a surgir temas inesperados, como a especificidade da escuta on-line (na pandemia, muitas consultas
psicológicas se deram através da internet).

- Os participantes da pesquisa relatam que ao escrever e ou contar os sonhos já começam a perceber algo que não haviam
pensado antes. Dizem também experimentar um certo alívio quando percebem algum sentido nos relatos.

- A maioria dos sonhos relatados são ruins, inclusive aqueles considerados pesadelos, e raramente palavras positivas e que
passam sensações de leveza estão presentes.

- Nos primeiros 369 sonhos, coletados entre abril e maio, as palavras que mais aparecem são casa (354), mãe (124) e
amigo(a)s (120). Depois vem namorado, carro, cidade, pai, etc. Quarentena aparece 29 vezes, pandemia 21, matar 19,
morte 11. Em junho, as palavras mais frequentes continuam sendo casa, mãe e amigo(a)s, mas relativamente a abril e
maio, elas são menos representativas. A frequência de "pandemia" dobra, de "quarentena" diminui quase pela metade. Ou
seja, antes as pessoas se preocupavam mais com a quarentena, agora mais com a pandemia. Resultado esperado, claro.
Mas o dado mais impressionante é o aumento significativo, no último mês, das palavras morte e matar. Em geral, alguém
ou algo "tentando me matar" (o número dessas ocorrências quase dobra). Esse aumento é concomitante ao aumento da
frequência da presença de vocabulário de termos dos noticiários políticos (como fascismo) e de figuras políticas no relato
dos sonhos, como o próprio Bolsonaro (aumento de mais ou menos um terço).
5. Conclusão
Através deste trabalho, aprendemos a relevância dos estudos sobre os sonhos para a
elaboração e a adaptação dos indivíduos expostos a traumas coletivos ciência, sociedade,
principalmente em tempos de pandemia devido ao coronavírus. Os sonhos nos alertam de
perigos eminentes, transpassando as limitações da consciência, ou seja, são como cinemas sem
censura que expressam desejos, medos e fantasias. Como seres contemporâneos, não
cessamos de interpelar as catástrofes do nosso tempo. Portanto, os sonhos são revolucionários
e, o ato de sonhar e relatá-los provê potência coletiva e traz alívio, possibilitando que saiamos
de uma anestesia vinda de um totalitarismo e que tenhamos o direito à liberdade de expressão
e o compromisso com os nossos desejos e imaginação. Compartilhar uma pesquisa que possa
trazer alento dentro de uma possibilidade digital (Instagram @sonhosconfinados) para
progredir em várias áreas do conhecimento é opimo.
6. Referências
Sites
BASTOS, A. (2020). Coronavírus: pesquisadores estudam como a pandemia afeta os sonhos dos brasileiros. Disponível em:
<https://www.nsctotal.com.br/noticias/coronavirus-pesquisadores-estudam-como-a-pandemia-afeta-os-sonhos-dos-brasileiros>. Acesso em:
20/11/20.

ROSA; BROIDE; ALENCAR (2020). Os sonhos e o despertar para a travessia de desertos. Disponível em:
<https://revistacult.uol.com.br/home/pandemia-sonhos-atravessar-desertos/>. Acesso em: 20/11/20.

CARTA CAPITAL (2020). Covid Dreams: como a pandemia tem influenciado os nossos sonhos. Disponível em:
<https://www.cartacapital.com.br%2Fsociedade%2Fcovid-dreams-como-a-pandemia-tem-influenciado-os-nossos-sonhos%2F&usg=>. Acesso
em: 20/11/20.

DIAS, M. (2020). Conheça a pesquisa sobre sonhos na pandemia realizada pela UFMG. Disponível em:
<https://www.revistaencontro.com.br/canal/revista/2020/07/conheca-a-pesquisa-sobre-sonhos-na-pandemia-realizada-pela-ufmg.html>. Acesso
em: 20/11/2020.

VERZTMAN; ROMÃO-DIAS (2020). Catástrofe, luto e esperança: o trabalho psicanalítico na pandemia de COVID-19. Disponível em:
<https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1415-47142020000200269>. Acesso em: 20/11/20.

CHENIAUX, E. (2020). Os sonhos: integrando as visões psicanalítica e neurocientífica. Disponível em:


<https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-81082006000200009>. Acesso em: 20/11/20.

“Sonhos confinados – uma pesquisa sobre a vida onírica no contexto de uma pandemia
Imagens
Imagem 1: “O sonho”, de Frida Kahlo. Disponível em: <https://www.todamateria.com.br/obras-frida-kahlo/>. Acesso em: 20/11/20.

Imagem 2: “Swan e Minotauro, Starcatcher”, de Duy Huynh. Disponível em: <https://weheartit.com/entry/12646728>. Acesso em: 20/11/20.

Imagem 3: “Leaving Wonderland”, de Christian Schloe. Disponível em: <https://www.actitudfem.com/tecnologia/viral/internet/ilustracion-


surrealista-christian-schloe#imagen-2>. Acesso em: 20/11/20.

Imagem 4: Livro “A interpretação dos sonhos”, de Sigmund Freud. Disponível em: <https://www.amazon.com.br/Interpretação-Dos-
Sonhos-Sigmund-Freud/dp/8525427837>. Acesso em: 20/11/2020.

Imagem 5: Ilustração “It’s in Dreams That Americans Are Making Sense of Trump”, de Stephen Marche. Disponível em:
<https://www.newyorker.com/culture/cultural-comment/its-in-dreams-that-americans-are-making-sense-of-trump>. Acesso em: 20/11/20.

Imagem 6: Pintura surrealista de Michel Cheval. Disponível em:


<https://www.google.com/url?sa=i&url=https%3A%2F%2Fbr.pinterest.com%2Fpin%2F483222235011961818%2F%3Famp_client_id%3DC
LIENT_ID(_)%26mweb_unauth_id%3D%7B%7Bdefault.session%7D%7D%26amp_url%3Dhttps%253A%252F%252Fbr.pinterest.com>.
Acesso em: 20/11/20.

Imagem 7: Reprodução da web/ Autor desconhecido. Disponível em: <https://www.instagram.com/sonhosconfinados/>. Acesso em: 20/11/20
Muito obrigado!
Agradeço à professora de Química da nossa escola,
Clarice, pela oportunidade de refletir sobre os efeitos
emocionais relativos ao isolamento social. Já que o tema
específico foi a importância do estudo dos sonhos, quero
deixar registrada uma singela descoberta durante a
elaboração da pesquisa, a saber o sonho “revelador” de
Kekulé, químico do séc. XIX que descobriu a fórmula
estrutural da molécula de Benzeno. Link aqui:
<https://profes.com.br/Prof.Quimica/blog/o-sonho-de-
kekule-um-sonho-historico> .Acesso em: 20/11/20.
Bruno Luiz Tavares Oliveira, turma 201.
Imagem 7: Reprodução da web/ Autor desconhecido. Imagem 6: Pinturasurrealista deMichelCheval.

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