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Dura realidade. A moldura do quadro atual de Angola não é pintada em tons suaves.
Bem pelo contrário. É marcada por conflitos, pobreza, sofrimento e devastação. E
não é de agora. Isso vem de longa data.
O país africano foi colônia portuguesa do início do século XVI até 1975. Nesse
período, sofreu muito com a escravidão e com a exploração. Depois de quatro
séculos atrelada a Portugal, Angola iniciou um movimento de descolonização que
durou 13 anos e culminou com sua independência.
No entanto, depois da independência, as coisas ficaram ainda piores. Estourou uma
guerra civil que durou quase 30 anos, causou mais de 500 mil mortes e devastou o
país. A independência de Angola não significou o início da paz, mas do inferno.
Já deu para perceber que Angola não é um dos destino mais comuns na bagagem
dos viajantes. Luanda é uma cidade feia, sem atrativos, extremamente perigosa e
não está aberta ao turismo. No entanto, a vida tem me levado a trilhar lugares fora
da caixa e adoro novas experiências. Aproveito todas as situações para conhecer
pessoas, aprender com elas, quebrar paradigmas, ver a vida por outros ângulos,
rever conceitos.
SOBRE AS CRIANÇAS
A realidade é muito cruel com as crianças angolanas nascidas em famílias que não
tem boas condições financeiras, o que infelizmente representa a esmagadora
maioria. Dois terços da população vive em favelas miseráveis sem água potável, luz
elétrica ou saneamento básico, no centro e arredores de Luanda. Basta andar por
qualquer canto da cidade para ver essa triste realidade. O índice de mortalidade
infantil é enorme. Um estudo do Fundo das Nações Unidas feito em meados de
2015 aponta que de cada seis crianças, uma morre antes de completar cinco anos
de idade, principalmente devido a desnutrição, malária e disenteria. Isso é chocante.
Reflete simplesmente a mais alta taxa de mortalidade infantil do mundo.
Aliás, entrar e sair de Angola é outra questão delicada. Apesar do país ser uma
"democracia", as coisas na prática funcionam bem mais pelo lado da "ditadura". O
presidente José Eduardo dos Santos comanda soberano o país há 35 anos e
histórias de corrupção são frequentemente noticiadas.
A CHEGADA EM LUANDA
Turismo ainda não é uma realidade. A infra-estrutura turística é zero devido a tanta
guerra. Quem vai a Angola costuma ter algum vínculo de trabalho. E para falar bem
a verdade, estrangeiros brancos não parecem ser muito bem-vindos. Os angolanos
não lidam muito bem com as questões raciais. Tem reação negativa com as
pessoas de fora. O que parece é que os ressentimentos recentes da guerra civil e
as antigas mazelas da colonização portuguesa permeiam as relações humanas.
Essa frase que ouvi no hotel traduz bem o que estou tentando dizer: “Imagina dois
brancos andando sozinhos por aí. Todo cuidado é pouco. Assaltos a mão armada
contra estrangeiros são comuns. Sair à noite, nem pensar. Apenas de carro e
acompanhados por um angolano.” Por via das dúvidas, é de bom tom ser prudente.
Para começo de conversa, taxis quase não há. Vi apenas três em uma semana.
Além disso, é necessária uma reserva prévia com 24 horas de antecedência e os
preços são exorbitantes, baseados na “cara” do freguês. O taxímetro é mero enfeite.
Do aeroporto para o centro, que é muito perto, não leva mais do que 10 ou 15
minutos se não tiver trânsito, o valor pode chegar a 200 dólares. Isso mesmo. Um
abuso total. Boa opção é contratar um carro com motorista para o dia todo por
menos de 100 dólares. Vai resolver dois problemas ao mesmo tempo: você estará
sempre acompanhado por uma pessoa de confiança que conhece a cidade e não
vai se sentir explorado.
Durante o dia até dá para caminhar por perto do hotel. Mesmo assim, a sensação
de insegurança é grande, especialmente se você se afastar das ruas principais.
DIRIGIR PODE?
Nas estradas é pior ainda. Não há acostamento, crateras gigantescas são uma
constante e guardas rodoviários fazem questão de parar os motoristas para pedir
propina. Num trajeto de pouco mais de 100 quilômetros fomos parados duas vezes.
BOAS LEMBRANÇAS
Essas histórias garantem as boas lembranças da vida e fazem uma viagem valer a
pena. Pedi a ela que me contasse sobre o “Pensador”. Quando seu pai era jovem e
a guerra estava tirando o sossego das pessoas, ele resolveu esculpir uma figura
masculina que consternada, pensativa, sentada com as mãos na cabeça rogava
para aquilo tudo terminar. Assim, ele criou essa imagem que virou um ícone no
artesanato angolano.
No dia seguinte fui ao Mercado de Benfica e fiquei encantada com o trabalho feito
em madeira pelos artesãos. É uma visita que vale a pena em Luanda.
OUTROS LUGARES A VISITAR EM LUANDA
Luanda não é propriamente uma cidade bonita e não tem muito para se ver. É
formada por uma parte no continente e uma ilha, a Ilha do Cabo, repleta de praias e
restaurantes voltados para o Oceano Atlântico. Recentemente, Luanda ganhou uma
nova avenida à beira-mar chamada de Marginal.
Comecei dando uma circulada geral pelo centro da cidade, de carro. Os prédios
mais modernos e bem conservados são os do governo. Eles costumam ser pintados
em tons de rosa e têm arquitetura colonial. Nem pense em fotografar esses prédios.
Eles são vigiados constantemente por guardas armados e quem é visto
fotografando corre o risco de ser preso. Isso não é piada. No ano passado, um
engenheiro brasileiro que veio ao país a trabalho foi preso por esse motivo. Do
carro, apontei para o Palácio do Presidente e o motorista apavorado disse que eu
não podia fazer nenhuma menção ao prédio, nem com as mãos nem com o olhar. E
dizem que o regime político do país é a democracia. Depois visitei o Mausoléu de
Agostinho Neto, o primeiro presidente do país. Ele é adorado por muita gente, mas
há controvérsias sobre a construção do mausoléu. Afinal, trata-se de um país em
que tanta gente passa fome. O Memorial fica na Praia do Bispo. Tem uma torre de
120 metros de altura cercada por jardins. Dizem que a obra foi um presente russo e
os traços realmente lembram um foguete. A seguir fui até o Museu da História
Militar que fica na ex-Fortaleza de São Miguel, no alto da colina e tem um visual
interessante da cidade. O museu em si não oferece grandes atrativos além de
paredes cobertas por azulejos portugueses.
Aproveite que está nessa região para conhecer o Mercado de Benfica e o Museu
Nacional da Escravatura.
Dali pegue um barco e vá até a Ilha do Mussulo. É onde muitas pessoas tem casa
de praia para passar os fins de semana e as férias. É o melhor lugar de Lunda para
tomar sol e curtir uma praia. Mas, não espere luxo nem praias limpas. É tudo muito
simples no país.
Se quiser ir mais longe, indico o trajeto Luanda – Cabo Ledo. No caminho, pare no
Miradouro da Lua para ver as falésias coloridas. Em seguida vem a Barra do
Kwanza um rio povoado de crocodilos. Logo, aparece o Parque Nacional de
Kissama. Com sorte, talvez você consiga encontrar alguns animais. Eu vi apenas
macacos. E então, Cabo Ledo. Repleto de praias muito selvagens, algumas
procuradas pelos surfistas. O resort com melhor infra-estrutura da região se chama
Carpe Dien. Pé na areia, caro e bem simples. Indico um bate-e-volta.
O Embondeiro ou Baobá é um símbolo de Angola. São árvores muito emblemáticas
que vivem até seis mil anos. Produzem um fruto chamado mukua que serve para
fazer sucos, doces e sorvetes. Parece um isopor com gosto ácido. Bem exótico.
CURIOSIDADE
Casas populares vem sendo feitas para acomodar os angolanos e ao passar por
elas, o tamanho me surpreendeu. São casas de 4 ou 5 quartos. Enormes. Perguntei
para um amigo angolano o motivo de casas tão grandes. Ele explicou que a
poligamia era uma prática comum no país e que na mesma casa costuma viver um
homem com duas ou três mulheres e muitos filhos. Em períodos de guerra, muitos
homens morrem e as mulheres ficam sozinhas precisando de proteção, portanto,
esse é um fato comum.
INDICAÇÃO DE HOTEL
La Vigia. Restaurante muito simples. Tem peixe fresco assado na brasa. A lula, que
eles chamam de choco, também é deliciosa.
LÍNGUA NACIONAL
MOEDA
FUSO HORÁRIO
DOCUMENTOS NECESSÁRIOS
COMO CHEGAR
Há vôos regulares da TAAG do Brasil para Luanda e da TAP de Lisboa para
Luanda.
Cachoeiras de Kalandula. São 5 horas de carro por estradas bem ruins. Os hotéis
na região são fracos e muito caros e é preciso levar alimentos.
Praias de Benguela, ao sul de Luanda. Dá para ir de avião. Dizem que tem boa
infra-estrutura.
Parque Nacional de Iona na divisa com a Namíbia, ao sul de Luanda. Não tem
hotéis. É preciso acampar.
https://www.viajarpelomundo.com/2015/12/a-vida-em-angola.html