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Universidade Federal de Sergipe

Centro de Educação e Ciências Humanas


Departamento de História

Descolonização da
África e/ou Ásia
A Descolonização de África e a
“reafricanização dos espíritos”

Prof. Me. Wanderlei Menezes


Apresentação da proposta da aula

❑ Priorizar a Descolonização Africana


❑ Histórias Conectadas (Europa – Ásia – África)
❑ Recorte temporal: 1945-1975
❑ Estudar as independências em blocos
❑ Tomar o caso da Guiné e Cabo Verde como ilustrativo.
❑ Ênfase nas produções historiográficas africanas
Perspectivas analíticas
O colonialismo em África e Ásia
(século XV ao XX)
❑ Expansão Marítimo-Comercial Europeia do século XV e XVI –
Dominação litorânea, entrepostos comerciais, mercantilismo e
escravismo.
❑ Imperialismo (século XIX): dominação interiorizada, subjugação política,
capitalismo industrial e financeiro, exploração das riquezas e da força de
trabalho.
❑ Ideologia: Supremacismo branco – Racismo científico – Eugênia –
Darwinismo Social – “Fardo do Homem Branco.
❑ Discurso científico-político: África Selvagem – Antropologia.
❑ Resistências à opressão colonizadora europeia.
“O Mediterrâneo é um lago de civilização; não é segredo
para ninguém que ao norte de suas costas está o velho
universo e ao sul deste um universo ignorado; pode-se dizer
de um lado a civilização, do outro a barbárie.
O momento é de dizer a estas ilustres nações que aqui
estão: uni-vos! Vamos ao Sul! Ele está na nossa frente, esse
bloco de areia e cinzas, este monstro inerte e passivo que,
depois de seis mil anos, é obstáculo à marcha universal.
Deus oferece a África à Europa. [...] Façam estradas, portos,
cidades, cultivem, colonizem, multipliquem-se”.

Trecho de um discurso de Vitor Hugo (1804-


1885), proferido em 18 de maio de 1879.
Os frutos do colonialismo

❑ Violência
❑ Fome e desumanização
❑ exploração do trabalho e das riquezas
naturais
❑ Estatuto do Indígena: colônias
portuguesas e o Apartheid (África
britânica)
❑ Imposição da cultura europeia.
❑ Espaços administrativos artificiais.
As rachaduras no colonialismo

❑ Primeira Guerra Mundial (1914-1918)


❑ Crise Mundial do Capitalismo (1929-1939)
❑ Aumento do êxodo rural – formação dos grandes
núcleos urbanos em África.
❑ Expansionismo das forças nazifascistas – O caso
Etíope – 1935-1936.
❑ A geração de “assimilados” ou “adiantados”
❑ Movimentos de Pan-Africanista
❑ Intelectualidade Negra – Negritude (diáspora)
Descolonização ou lutas de
Independências: discutindo conceitos
❑ A palavra descolonização não existia até a década de 1950. Aparece
primeiramente em francês décolonisation (1952) e em inglês
Decolonization (1955). Em português, apenas na década de 1970.
❑ Os primeiros historiadores a se valer do conceito são os franceses (René
Remond, Jean Chesneaux e Maurice Crouzet) para designar a crítica
dos povos africanos e asiáticos ao colonialismo europeu.
❑ Entre os pensadores africanos e líderes políticos o termo não era usado
(luta pela independência, anti-imperialismo, anti-colonialismo, libertação
nacional).
❑ Conceito histórico que representa um momento e acontecimentos (1945-
1975).
Independências e Descolonização

Descolonização
ou reafirmação

Lutas pelas
Independências

Tomada de
consciência
política

Colonialismo
Imperialismo
Pan-Africanismo e Negritude
❑ Marcus Harvey (1887-1940) – mito do regresso à
“Mãe-África” (afrodescendentes).
❑ William Du Bois (1868-1963) – Defesa da
igualdade das raças, coesão e união dos povos
negros contra os abusos do colonialismo.
❑ 1919 – Primeiro Congresso Pan-Africano (Paris).
❑ Movimento de Negritude (1939) – Jean Price
Mars, Franz Fanon, Aimée Cesaire e Leopold
Senghor.
❑ Mobilização em jornais e revistas europeias
(França e Inglaterra)
❑ Presence Africaine (1947) – filósofo e historiador
Diop
Geração Pan-Africanista

Nkrumah Senghor Nyerere Keniata S. Machel Agostinho Neto

Pequeno círculo Movimento de


intelectualizado Massas
❑ Organização da Unidade Africana
(OUA - 1963-2002)
❑ A OUA teve um importante papel na
história da descolonização de África,
não só como grupo de pressão junto
da comunidade internacional, mas
também fornecendo apoio direto aos
movimentos de libertação, através do
seu Comitê Coordenador da
Libertação da África.
❑ Atualmente é a União Africana (2002-)
Ascensão do nacionalismo africano
❑ Fontes de inspiração ao nacionalismo africano:

▪ Os experimentos europeus do século XIX.


▪ A política das nacionalidades pós-Grande Guerra.
▪ Carta do Atlântico (1940).
▪ ONU no Pós-Segunda Guerra.
“O que o cristianíssimo burguês do século XX não perdoa a Hitler não é o
crime em si, o crime contra o homem, não é a humilhação do homem em
si, é o crime contra o homem branco [...] é ter aplicado à Europa
procedimentos colonialistas que, até então, só se destinavam aos árabes,
cules da Índia e negros da África” (CESAIRE, 1955, p. 35).
Segunda Guerra Mundial e a
Descolonização
❑ Colapso das potências imperialistas (França, Bélgica e
Holanda) com a jugo nazista.
❑ Necessidade de recrutar combates do Ultramar.
❑ O Norte da África como espaço fundamental na Segunda
Guerra.
❑ O desmoronamento dos impérios coloniais asiáticos pelo
Japão Imperial.
❑ Racismo como uma das causas da Segunda Guerra.
❑ Mais de um milhão de soldados africanos combateram na
II Guerra Mundial e ajudaram a libertar a Europa do
fascismo. Mas o reconhecimento foi quase nulo.
A Guerra Fria e a luta dos povos
africanos e asiáticos
❑ Acordos de Brazaville com De Gaule (1944)
❑ 5º Congresso Panafricano de Manchester (out. 1945)
❑ Conferência de Bandung (Abril/1955) – não
alinhamento e terceiro mundismo.
❑ Apoio das Superpotências à causa.
❑ O caminho do socialismo africano.
❑ Organização da Unidade Africana.
África Branca:
as independências no Magreb
❑ Influência do Pan-Arabismo
❑ Egito (1922) – protetorado britânico – Canal de Suez
❑ Líbia (1952) – ex-colônia italiana – tutela de França e
Inglaterra
❑ Derrota humilhante do imperialismo francês na Indochina
❑ Tunísia e Marrocos (1956) temos mobilizações populares
e prisão de líderes nacionalistas – busca-se a negociação.
❑ Argélia (1952-1962) – Guerra entre o governo francês com
os Pieds Noires e as forças nacionalistas da FLN.
❑ Queda da 4ª República e a ascensão de De Gaulle.
❑ Atentados terroristas – 400 mil mortos.
A África Negra Francesa

❑ Em 1947, os malgaxes conquista a independência com luta


armada – “a Independência não se pede, se conquista!”.
❑ Tentativa de controlar os processos por método mais
conciliatório. (Gradualismo)
❑ África Ocidental Francesa (1960) – caso Sekou Turé (Guiné)
❑ África Tropical Francesa (1960) – Gabão, Congo, Camarões.
❑ A regionalização das Independências – Senegal (Senghor).
❑ Territórios sob tutela: Togo, Ruanda, Burundi.
A África Negra Inglesa
❑ Processos impactados pela Independência da Índia (1947) e
Birmânia – processos violentos.
❑ África Ocidental Inglesa (Gana, Nigéria, Serra Leoa e Gâmbia)
❑ África Oriental Inglesa (Quênia, Uganda e Tanganica)
❑ África Centro-Austral (Niassalandia e Rodésias e RAS)
❑ O caso Gana: Nkrumah (África para os africanos) – (1956).
❑ Nigéria: federação com guerra civil
❑ Quênia: tentativa dos Mau Maus (1952) e liderança de
Keniata. Resistência dos colonos brancos.
❑ Rodésia: tentativa de aplicar o Apartheid.
❑ O caso do Apartheid na África do Sul
O caso do Congo Belga
❑ Era propriedade particular do Rei Leopoldo II da
Bélgica. Oficialmente colônia belga em 1908
❑ Colonização violenta e com total desprezo pelos
nativos e exploração extrativista.
❑ Em 1959, começam as manifestações na capital
pela libertação nacional.
❑ A Bélgica aceita a Independência (1960), porém a
faz de modo intempestivo.
❑ Governo: Kasavubu (presidente) e Lumumba
(primeiro-ministro).
❑ Resistência na Katanga (Moises Tsombé) – Patrice Lumumba, entregue aos
Guerra Civil). inimigos para ser assassinado
❑ Assassinato de Patrice Lumumba (1961).
A Descolonização da África Lusófona
❑ Ultracolonialismo português – Ditadura
fascista de Antônio Salazar (1889-1970)
❑ Unidade administrativa no Ultramar:
Províncias Ultramarinas
❑ Regime do Indigenato e Luso-tropicalismo
❑ Guerra do Ultramar (Colonial): 1961-1974
❑ Revolução dos Cravos (abril/1974): queda
do Salazarismo
❑ Portugal aceita conceder as
independências (1975): Cabo Verde
(05.07), São Tomé e Principe (12.07),
Moçambique (25.06), Angola (11.11)
A Descolonização da África Lusófona
❑ Angola: ❑ Moçambique:

▪ Começa a guerra colonial em 1961 ▪ Comando da Frelimo (Eduardo


com massacres na Baixa do Mondlane), assassinado em 1969.
Cassange com a UPA. ▪ Liderança de Samora Machel.
▪ Frentes de atuação: MPLA (Agostinho ▪ Guerra de guerrilha a partir de 1964.
Neto), FNLA (Holder Roberto) e
UNITA (Jonas Savimbi).
▪ Massacres e rivalidades fraticidas dos
movimentos.
▪ Forte presença da PIDE-DGS
Amílcar Cabral (1924-1973)
❑ Natural da Guiné. Filho de pai cabo-verdiano e mãe guineense
❑ É um jovem literato promissor. Estuda Agronomia em Portugal
(1945)
❑ Na “Casa dos Estudantes do Império” conhece outros estudantes
africanos que liderarão os processos de descolonização de seus
países, movimento de negritude e antifascistas.
❑ Volta a Guiné-Bissau (1952) para atuar como adjunto dos Serviços
Agrícolas e Florestais da Guiné. Depara-se com a fome, miséria e
analfabetismo – mazelas do colonialismo.
❑ Em 1955, Cabral participa da Conferência de Bandung e toma
conhecimento da questão afro-asiática.
❑ Foge para Angola, onde ajuda na fundação do MPLA em 1956.
❑ Em 1959 funda o partido clandestino Partido Africano para a
Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC).
PAIGC e a Descolonização da Guiné
❑ Em 1959 promovem a greve de trabalhadores do porto de Pidjiguiti,
fortemente reprimida pelo governo colonial, resultando na morte de 50
manifestantes e no ferimento de outras centenas.
❑ Tenta negociar com as autoridades portugueses à Independência de Guiné e
Cabo Verde sem sucesso.
❑ Articula, em 1960, a criação da Frente Revolucionária Africana para a
Independência Nacional das Colônias Portuguesas.
❑ Inicia a luta armada com apoio da URSS, Cuba e algumas nações africanas,
a exemplo da Guiné Conacri (Sekou Turé) que oferece bases ao PAIGC.
❑ Conquista vitórias militares e diplomáticas expressivas.
❑ Janeiro de 1973: assassinado covardemente em Conacri por um militante do
PAIGC
❑ Setembro de 1973: proclamação da Independência de Guiné-Bissau, que no
ano seguinte seria reconhecida por Portugal.
Características da Luta
Descolonizadora de Cabral e do PAIGC
❑ Luta que visava atender as necessidades do povo.
❑ Unidade na luta e construção nacional.
❑ Luta antirracista.
❑ Luta democrática-popular.
❑ Luta com pautas feministas.
❑ Uso da diplomacia aliada à ordem militar.
❑ Organização familiar (tabancas).
❑ Apoio à educação libertadora.
“Nós não estamos a lutar para tomar
o lugar dos opressores colonialistas,
nem seus postos e nem explorar as
classes trabalhadoras. Nós queremos
a independência de nosso país e ser
um país não é apenas ter um
presidente, hino e bandeira.
É ser livre. É pensar. É querer ter
orgulho de ser africano. Só aquele
que reafricaniza os espíritos é livre e
venceu a opressão colonialista”
(Amílcar Cabral)
A Descolonização Africana:
um olhar toponímico

Costa do Ouro = Gana


Sudão Francês = Mali
Alto Volta = Burkina Faso
Rodésia = Norte (Zâmbia) e Sul (Zimbabué)
Niassalândia = Malaui
Congo Belga = Zaire
Bechuanalândia = Botsuana
Sudeste Africano (alemão) = Namíbia
Lourenço Marques (Moçambique) = Maputo
Leopoldville = Kinshasa
Considerações Finais
❑ A Descolonização e os processos de independências das nações
africanas são uma excelente síntese do século XX: lutas contra o
fascismo, fim dos impérios coloniais, luta contra o racismo,
ressignificação africana etc.
❑ Processo heterogêneo que dura uma geração (25 anos).
❑ As Metrópoles não abriram mão de suas colônias. Estas tiveram um
papel ativo na desconstrução do colonialismo e na afirmação de seus
estados nacionais.
❑ Quase metade dos países atuais foram resultados dos processos de
descolonizações (1945-1989), sendo que boa parte se deu entre 1950 e
1965.
Bibliografia
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