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Os jovens da época do pós-guerra - meados de 1960 - nascidos na Europa

(especialmente Grã Bretanha e França), Estados Unidos, Canadá ou Austrália, foram


chamados de baby boomers porque, depois da Segunda Guerra Mundial, estes países
experimentaram um súbito aumento de natalidade que ficou conhecido como baby
boom. Eles não queriam seguir os valores paternos e eram contra qualquer regra
imposta.
O American way of life (estilo americano de vida) é a expressão aplicada a um
estilo de vida que funcionava como referência para a maioria dos habitantes dos Estados
Unidos da América. Era uma modalidade comportamento dominante desenvolvida a
partir do século XVIII, cuja base é a crença nos direitos à vida, à liberdade e à busca da
felicidade. Relacionado ao American Dream, o American Way of Life, trazia como
objetivos principais de vida emprego e moradia fixos, uma família “tradicional” e a
aquisição de materiais como sinônimo de felicidade.
Os baby boomers queriam mais liberdade para expressar sua identidade através
de comportamentos reprovados pelo americano da época, e eram considerados rebeldes
sem causa. Porem, revolucionaram o cenário com sua música e literatura controversos, a
popularização de diversas drogas e a ideia de sexo livre.
Na literatura, houve o movimento beat, cujo principal representante foi Jack
Kerouac, que retratou no seu livro (On The Road) uma vida na estrada, sem o objetivo
de conquistar casa fixa, emprego bem pago e família. Quem vivia essa vida estava
interessado apenas em curtir o momento.

A Música como Protesto

O Clube dos 27, um grupo de músicos que morreram tragicamente na idade de


27 anos, teve seu número de integrantes elevado durante essa época. Inclusive, dois
deles performaram no Woodstock, festival que marcou o movimento contracultural,
juntando astros como Jimi Hendrix, Janis Joplin, The Who e Grateful Dead e teve um
alcance muito além do que se previa, já que 50 mil ingressos foram vendidos e o
público passou de meio milhão de pessoas.
Alguns dos membros do Clube que faziam parte do movimento contracultural e
morreram em um curto intervalo de tempo são:
Brian Jones: Membro fundador dos Rolling Stones, o guitarrista ajudou a elevar
a banda ao topo do mundo, mas faleceu ao se afogar na piscina de casa em 03/07/69.
Jimi Hendrix dedicou uma música para ele e Jim Morrison escreveu um poema em sua
homenagem.
Jimi Hendrix: Pioneiro em diversas técnicas da guitarra elétrica, o americano
ganhou o mundo ao ir para a Inglaterra, onde conquistou uma legião de fãs com seu
rock psicodélico e agressivo e tornou-se o músico de rock mais bem pago do mundo em
1969. Morreu asfixiado pelo próprio vômito depois de misturar vinho e remédios em
18/09/70.
Janis Joplin: Era tida por muitos como a maior voz feminina do rock, blues e
soul da época, e é reverenciada até hoje apesar de sua curta discografia. Morreu 16 dias
depois de Hendrix numa overdose de heroína.
Jim Morrison: O frontman da banda de blues rock psicodélico The Doors faleceu
na banheira do apartamento onde morava após um ataque cardíaco. A decisão da polícia
de não realizar autópsia acabou gerando controvérsias e versões alternativas para a
história que circulam até hoje.
A alta taxa de morte entre os artistas e hippies em geral se dava devido ao
consumo excessivo de drogas lícitas e da experimentação das ilícitas, práticas comuns
no ambiente musical do período.

As Artes Visuais como Protesto

O cinema, na época da contracultura, passou por mudanças e críticas, dentre elas


o afastamento do ideal de roteiros devidamente estruturados com começo, meio e fim e
características emocionantes, mais tarde vistas com olhos críticos. Alexandre Astruc,
pensador da época, identifica nos filmes de Orson Welles, Jean Renoir e Robert Bresson
uma mudança no cinema francês e expressa bem as modificações do período:

“O cinema está se tornando um meio de expressão, como todas as artes antes


dele (...), está gradualmente se tornando uma linguagem (...) a qual e pela qual um
artista pode expressar seus pensamentos, não importa o quão abstratos (...). Por isso,
eu gostaria de chamar essa nova era do cinema de era da ‘camera-stylo’ (câmera-
caneta). Com isso eu quero dizer que o cinema gradualmente se desprenderá da tirania
do visual, das demandas concretas e imediatas da narrativa, para e tornar uma
construção tão flexível quanto a escrita.”
Os participantes do movimento acreditavam que o relevante era expressar os
pensamentos do diretor, que não tem mais só o trabalho de dirigir uma cena, mas sim de
inventar e reinventar.

André Bazin, crítico de cinema, dá o ponto de partida para as modificações


francesas quando funda a revista de crítica Cahiers du Cinema, na qual é publicado o
artigo de François Truffaut (A certain tendency of the french cinema) que segue a
mesma linha de pensamento de Astruc, apoia elevar a figura do diretor, e anuncia a
criação de uma escola que chamou de Realismo Psicológico.

As características-base dessa nova fase da Sétima Arte foram

1. O abandono dos estúdios em detrimento das gravações em espaços


abertos, com interferências do som cotidiano e da luz natural da vida normal;
2. A troca da continuidade da narrativa pelo abstrato de uma ideia ou
pensamento representado conforme as vontades do artista.

Truffaut apresenta essas características em seu filme Atirem no Pianista, onde


François proporciona períodos longos para momentos irrelevantes e faz o uso da luz
natural mesmo à noite. Um destaque que retrata bem as peculiaridades do pensamento
da época é quando uma prostituta fica nua e não há troca de trilha sonora nem desfoque
na lente, apontando que a mulher nua não precisava ser erotizada.

Este processo todo gerou enorme abalo nos estúdios tradicionais dos Estados
Unidos, já que as narrativas contavam com a presença de elementos como sexo livre,
drogas e rebeldia – todos tabus nos filme Hollywoodianos - e personagens jovens
despreocupados com emprego e moradia fixa e constituição de família, cuja única
obsessão era aproveitar a vida sem apreensões.

Tropicalismo: A Contracultura Brasileira

O tropicalismo é um movimento brasileiro que surgiu na década de 1960 e foi


extremamente inovador, pois valorizava a cultura brasileira e ao mesmo tempo
mesclava elementos internacionais nas suas formas de expressão. Ele causou a ruptura
de diversas convenções comportamentais, políticas, ideológicas e estéticas. Neste
período, o país se encontrava dentro de um regime militar, autoritário e opressor, onde o
governo limitava cada vez mais a voz do povo.

O engate inicial do tropicalismo foi o III Festival de Música Popular Brasileira.


Promovido pela rede Record, o evento trouxe artistas como Gilberto Gil, Gal Costa e
Caetano Veloso, principais representantes do movimento, que fizeram apresentações
muito impactantes pelo teor de suas musicas, cujas letras criticavam e ironizavam
problemas sociais presentes no governo da época e abordavam temas do cotidiano.
Valorizavam a cultura nacional, mas ao mesmo tempo traziam elementos internacionais,
como o uso de guitarras elétricas (influencia de Jimi Hendrix) ao invés do tradicional
violão. Outros participantes emblemáticos do movimento foram Os Mutantes e Jorge
Bem Jor.

A tropicália não tinha como objetivo principal usar a música como arma para o
combate politico, pois acreditava que a inovação estética por si o já era uma forma de
protesto, mas a manifestação musical acabou sendo a ferramenta de maior alcance do
período, inovando ao exibir a junção de vários estilos musicais homogêneos, como o
rock, a bossa nova, o baião, o samba e o bolero.

As artes visuais buscavam - da mesma maneira que as canções - mostrar as


perturbações da sociedade, aplicando a pintura e o teatro, marcado pelas montagens de
O rei da vela, de Oswald de Andrade, e de Roda Viva, de Chico Buarque. Também o
cinema, com destaque para o filme Terra em Transe, de Glauber Rocha, e as artes
plásticas. Este último foi o menos valorizado pelo movimento, no entanto o nome
“tropicalismo” surgiu de uma obra de Hélio Oiticica nomeada dessa maneira e exposta
no Museu de Arte Moderna no Rio de Janeiro em 1967. A nomenclatura depois seria
inspiração para Caetano Veloso na composição de Tropicália.

A tropicália era chamada pelos adversários de “movimento vago e sem


comprometimento político” e muito criticada por supervalorizar a liberdade individual e
por trazer novos elementos à cultura brasileira. Diversos artistas tradicionais
acreditavam fortemente que a interferência da cultura pop-rock americana estragaria a
música brasileira e as artes visuais seriam manchadas com a influência da pop art.

Diante das provocações, censuras e com respaldo do AI- 5, que suspendia as


garantias de liberdade individuais, jornalistas e manifestantes foram presos e cantores
como Gilberto Gil, Chico Buarque e Caetano Veloso foram obrigados a se exilarem na
Europa. Todos esses acontecimentos resultaram no enfraquecimento do tropicalismo
como movimento de protesto, em meados de 1968.

A importância do tropicalismo residiu principalmente em seu caráter inovador


que modernizou as artes e reinventou seus significados, criando novos padrões estéticos,
revolucionando a cultura do país e interferindo diretamente nas gerações posteriores dos
artistas brasileiros.

A Música de Protesto nos Dias de Hoje

Apesar dos movimentos de contracultura terem ocorrido há cerca de 60 anos,


várias ideias permanecem atemporais, como as músicas usadas como forma de protesto,
ferramenta utilizada por vários compositores atuais.

Temos exemplos em obras americanas como Till It Happens To You, da Lady


Gaga, que fala sobre a cultura do estupro e como as pessoas não tratam o assunto com a
seriedade necessária e They Don’t Care About Us, do Michael Jackson. Ele escreveu a
letra enquanto estava no Brasil para denunciar o descaso das autoridades para com a
parte desprivilegiada da população. Inclusive, a gravação do videoclipe (de autoria do
Spike Lee) na Favela Santa Marta foi negociada diretamente com os traficantes do
bairro, e os políticos brasileiros não ficaram nada satisfeitos.

Get Up And Stand, do Bob Marley, é um protesto contra guerras, assim como
BYOB (Bring Your Own Bombs), do System of a Down, escrita em desacordo à guerra
do Iraque (em 2005). A música questiona “Por que os presidentes não lutam na
guerra?(...) Por que eles mandam os pobres?”.

Em Chain, do Usher, o cantor critica o racismo estrutural ainda existente apesar


de o período de escravidão ter acabado há mais de século. All About That Bass, da
Meghan Trainor, fala sobre a luta pelo fim dos preconceitos contra gordos.

No Brasil, também temos músicas atuais que retratam assuntos “delicados”. Um


dos nomes de maior expressão nesse cenário é o Emicida, com Boa Esperança, que
relata os preconceitos que os empregados domésticos sofrem diariamente, Não se
Brinca com Mulher, que denuncia o abuso e a violência contra a mulher com uma letra
bem feminista e Pantera Negra, outra condenação ao racismo.

Vem Pra Rua, de O Rappa foi criada com o objetivo de juntar os brasileiros para
torcer na Copa das Confederações nas ruas, mas acabou se tornando uma música de
protesto quando a população a ouviu e foi lutar por melhores condições de vida nas ruas
(as manifestações sempre tocavam a canção).

Também temos Sr. Presidente, do Projota, que desaprova o sistema brasileiro


em que vivemos, onde pagamos muito ( Paga pra viver, paga pra sonhar/ A gente paga
pra morrer e o filho paga pra enterrar) e não recebemos nada (De um povo que ainda
segue órfão do seu pai da nação/De uma pátria mãe solteira da sua população/Onde o
salário vale menos do que o preço do pão), o desemprego e moradores de rua. Outra,
Portão do Céu, faz menção ao incidente de Mariana, como os governos culpam a
natureza para fugir da responsabilidade e cita Cazuza (compositor da época da
ditadura), falando o quanto ele ficaria decepcionado ao ver que nada mudou.

A Movimentação Conservadora como Contracultura

Conservadorismo é definido pelo dicionário como ideologia original de apego


às raízes históricas herdadas e tradições de uma sociedade. Nas últimas décadas, a
tendência é os jovens aderirem a pensamentos mais “modernos”, revolucionários,
seguindo as ideias de liberdade de expressão e comportamento propostas durante a
contracultura, enquanto os mais velhos são mais propensos a manterem o apego às
antigas convicções.

Porém, sociólogos e observadores mais atentos vêm notando uma onda crescente
de conservadores nas gerações mais novas e até sugestionando que o Conservadorismo
seja a Contracultura do século XXI, por ambos serem movimentos reacionários ao
pensamento corrente da sociedade.

Os baby boomers eram, essencialmente, discordantes dos costumes e princípios


da época. Então, se estes se modificam, é correto afirmar que a oposição a eles também
sofre mudanças, afinal divergências sobre visões de mundo sempre existirão. Nas
últimas décadas, se têm visto um cenário mais progressista tanto no Brasil quanto em
potências globais europeias e Estados Unidos, portanto é natural que a oposição seja a
face “conservadora” da população.

Contudo, para haver um movimento de contracultura, deve existir uma cultura


dominante – nos anos 60, era o American Way Of Life – e não há consenso sobre qual é
a atual ou se sequer existe uma. Enquanto, na teoria, a sociedade é multicultural, onde
todos podem expressar suas crenças e tradições, na prática não é tão simples.

Defensores dos velhos costumes alegam que a cultura preponderante imposta ao


povo nas últimas décadas foi sim subversiva, e que o correto é manter-se ligado às
práticas moralistas já estabelecidas no passado. Argumentam que não se defendeu a
liberdade de expressão, e sim o incentivo ao pensamento sócio democrata, sem dar
espaço às opiniões contrárias. O jornalista Vitor Lacourt analisa o fenômeno em um de
seus textos:

“Quanto mais uma cultura é imposta e oprimir quem discordar dela, mais a
contracultura cresce. É um fenômeno natural diante de um domínio cultural.”

Na contramão dessa afirmação, há o latente racismo estrutural presente no nosso


país e a gritante intolerância à comunidade LGBT, ainda causadores de mortes todos os
anos. Em tese, esses comportamentos não seriam tolerados se as condutas prevalecentes
fossem de fato progressistas.

Em síntese, são duas avaliações divergentes sobre movimentos que não


partilharam da mesma realidade, portanto deve-se manter o cuidado para não
desconsiderar os diferentes ambientes e circunstâncias em que se encontram.

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