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82 | abril/junho - 2013
Belo Horizonte | p. 1-294 | issn 0100-2589
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro
Revista Brasileira de
Direito processual
RBDPro
Conselho Editorial
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Pareceristas ad hoc
André Del Negri Marcelo Nogueira Roberta Toledo Campos
Carlos Gustavo Rodrigues Del Prá Mônica Cecilio Rodrigues Sérgio Henrique Tiveron Juliano
Dnieper Chagas de Assis Murillo Sapia Gutier Sérgio Luiz de Almeida Ribeiro
R454 Revista Brasileira de Direito Processual : RBDPro. – ano 15, n. 59, (jul./set. 2007)- . – Belo Horizonte:
Fórum, 2007-
Trimestral
ISSN 0100-2589
Publicada do n. 1, jan./mar. 1975 ao n. 14, abr./jun.1978 pela Vitória Artes Gráfica, Uberaba/MG.
Publicada do n. 15, jul./set. 1978 ao n. 58, abr./jun. 1988 pela Editora Forense, Rio de Janeiro/RJ.
Publicação interrompida em 1988 e retomada pela Editora Fórum em 2007.
Av. Afonso Pena, 2770 - 16º andar - Funcionários – CEP 30130-007 Esta revista está indexada em:
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DOUTRINA
Artigos
CONFERÊNCIAS
Juiz contraditor?
Lúcio Delfino, Fernando F. Rossi............................................................................................................................................................. 229
1 Delimitação do estudo............................................................................................................................................. 229
2 O contraditório em seu sentido dinâmico................................................................................................... 230
3 A estruturação do contraditório e a impossibilidade de um juiz contraditor........................ 236
4 Considerações finais................................................................................................................................................... 245
Referências....................................................................................................................................................................... 251
Acerca de la reforma al art. 274 y el ejercicio del derecho de defensa, desde la óptica del
defensor penal
Hernán Federico Soto, María Juliana Ruani.................................................................................................................................. 255
I Introducción ................................................................................................................................................................... 255
II.I Breve estado del arte – La audiencia imputativa..................................................................................... 257
II.II La imputación................................................................................................................................................................. 259
II.III La calidad de imputado........................................................................................................................................... 260
III La audiencia imputativa o de imputación de cargos en el derecho colombiano.............. 262
Notas e comentÁrios
RESENHA
ROQUE, Andre Vasconcelos. Class actions: ações coletivas nos Estados Unidos: o que
podemos aprender com eles?. Salvador: JusPodivm, 2013
Leonardo Carneiro da Cunha..................................................................................................................................................................... 285
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 7-9, abr./jun. 2013
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 7-9, abr./jun. 2013
de Direito Processual Civil de Presidente Prudente, ocorrido em 2013, nos dias 08,
09 e 10 de maio, na cidade de Presidente Prudente, São Paulo.
12 Acerca de la reforma al art. 274 y el ejercicio del derecho de defensa, desde
la óptica del defensor penal. Hernán Federico Soto e María Juliana Ruani tecem
comentários positivos a uma reforma legislativa que valoriza o contraditório e
a regra da congruência no sistema penal argentino. O trabalho retrata a versão
escrita da palestra apresentada pelos processualistas no I Congresso Provincial de
Derecho Procesal Penal, ocorrido na cidade argentina de Rosario, nos dias 08 e 09
de novembro de 2012.
Em “Notas e Comentários” é reproduzido o discurso proferido pela professora
Mariângela Guerreiro Milhoranza, que abriu o I Seminário de Direito Processual de
Canela, RS, evento organizado para homenagear os 30 anos de docência do pres-
tigiadíssimo Professor Doutor Araken de Assis.
Por fim, uma resenha, elaborada pela habilidosa pena do Professor Doutor
Leonardo Carneiro da Cunha, referente à última e instigante obra do professor
André Vasconcelos Roque, é apresentada como sugestão de leitura.
Os Diretores
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 7-9, abr./jun. 2013
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 13-22, abr./jun. 2013
que deu origem ao Código de Processo Civil em vigor, o então Ministro da Justiça,
Dr. Alfredo Buzaid.
Cândido Rangel Dinamarco, um de seus maiores discípulos nas terras sul-
americanas, chega mesmo a falar na formação de uma “escola processual”, formada
da Faculdade de Direito do Largo do São Francisco, em torno dos escritos de Liebman:
1
DINAMARCO. 100 anos de Liebman. In: DINAMARCO. Fundamentos do processo civil moderno, p. 39.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 13-22, abr./jun. 2013
2
Cf. ARMELIN. Legitimidade para agir no direito processual civil brasileiro, p. 48-49.
3
Ibidem, p. 49, grifos nossos.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 13-22, abr./jun. 2013
4
Processo de execução, p. 58.
5
Coisa julgada, condições da ação e a impossibilidade de repropositura da demanda. Revista
Dialética de Direito Processual, p. 55, grifos no original.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 13-22, abr./jun. 2013
6
Revista dos Tribunais, São Paulo, n. 599, p. 141-142, grifos no original.
7
Legitimidade para agir no direito processual civil brasileiro, p. 53.
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4 A legitimação ad causam
A segunda condição da ação ora examinada nada mais é do que a exigência
de coincidência entre as partes na relação jurídica material e as partes na relação
jurídica processual.
Quando se declara o autor carecedor do direito de ação, por ilegitimidade
ativa ou passiva, está-se dizendo, em última análise, que o direito material invocado
não lhe pertence, ou que o autor não possui tal direito em relação àquele que
foi inserido no polo passivo da demanda. Esse julgamento, em essência, em nada
difere de uma decisão de improcedência. Vejamos o seguinte exemplo: numa
demanda em que se pleiteia a cobrança de importância em dinheiro, qual a dife-
rença entre o julgador dizer que “A” é carecedor do direito de ação, por não figurar
no polo ativo da relação creditícia, e dizer que o pedido formulado é improcedente,
pois “A” não é titular do crédito e, portanto, não possui o direito material que estriba
a demanda? A distinção parece-nos ser apenas formal, pois o conteúdo é idêntico:
em ambas as situações o autor não é titular do direito subjetivo alardeado.
Aliás, não são raras as situações em que, alegando o réu, na contestação,
ilegitimidade de parte, o juiz posterga a análise da preliminar para o julgamento
de mérito, sob a alegação de que essas questões se confundem. Nesse sentido, a
prática judiciária não desmente o que vimos sustentando.
Donaldo Armelin afirma que “nos casos de legitimidade direta ou ordinária,
onde essa qualidade tem como arrimo a alegada própria titularidade do direito,
difícil seria separar a legitimidade do próprio mérito, o que torna inevitável sejam
ambas examinadas conjuntamente, quando não se atribui a titularidade do direito
questionado a terceiro”.8
Nas hipóteses de legitimação extraordinária (ou substituição processual),
quando um sujeito comparece em juízo, em nome próprio, defendendo direito
alheio, também deve o magistrado analisar a relação jurídica de direito material.
José Roberto dos Santos Bedaque, ao falar sobre a legitimação extraordinária,
explica:
8
Legitimidade para agir no direito processual civil brasileiro, p. 83.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 13-22, abr./jun. 2013
5 O interesse de agir
O interesse de agir, quando não se confunde com o mérito, mistura-se aos
pressupostos processuais, como procuraremos demonstrar, com base nos ensina-
mentos de Liebman.
Liebman sintetiza o conceito de interesse de agir na seguinte frase: “O inte
resse de agir é, em resumo, a relação de utilidade entre a afirmada lesão de um
direito e o provimento de tutela jurisdicional pedido”.11 Percebe-se, dessas lições,
que o ponto central do conceito está na palavra relação. Toda relação envolve dois
objetos, um de cada lado da relação. No caso do interesse de agir, essa relação se
consubstancia entre “a afirmada lesão”, com o tipo de “tutela jurisdicional”.
Afirma, ainda, esse autor:
9
In: MARCATO. Código de Processo Civil interpretado, nota 4 ao artigo 6º. p. 56.
10
MOURÃO. Coisa julgada.
11
LIEBMAN. Manual de direito processual civil, v. 1, p. 156, grifos no original.
12
Ibid., p. 302, grifos no original.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 13-22, abr./jun. 2013
13
Ibid., p. 155, grifos nossos.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 13-22, abr./jun. 2013
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 13-22, abr./jun. 2013
7 Conclusão
Acreditamos, pois, que a abolição das condições da ação constitui um avanço
processual e, acima de tudo, importa na simplificação do processo, tendo em vista
que este ficaria adstrito apenas às questões processuais e ao mérito. Teríamos,
assim, apenas um binômio de questões, eliminando do processo civil uma fonte de
constantes embaraços formais.
Referências
ARMELIN, Donaldo. Legitimidade para agir no direito processual civil brasileiro. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1979.
MARCATO, Antonio Carlos. Código de Processo Civil interpretado. São Paulo: Atlas, 2004.
DIDIER JR., Fredie. Curso de direito processual civil. 6. ed. Salvador: JusPodivm, 2006. v. 1.
DINAMARCO, Cândido Rangel. 100 anos de Liebman. In: DINAMARCO, Cândido Rangel. Fundamentos
do processo civil moderno. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2010.
LIEBMAN, Enrico Tulio. Manual de direito processual civil. Tradução e notas Cândido Rangel Dinamarco.
2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1985. v. 1.
LIEBMAN, Enrico Tulio. Processo de execução. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 1986.
MOURÃO, Luiz Eduardo Ribeiro. Coisa julgada, condições da ação e a impossibilidade de repropositura
da demanda. Revista Dialética de Direito Processual, n. 17, p. 49-58, ago. 2004.
MOURÃO, Luiz Eduardo Ribeiro. Coisa julgada. Belo Horizonte: Fórum, 2008.
MOURÃO, Luiz Eduardo Ribeiro. Uma análise crítica da teoria das condições da ação. Revista
Brasileira de Direito Processual – RBDPro, Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 13-22, abr./jun. 2013.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 13-22, abr./jun. 2013
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1
CHIOVENDA. Instituições de direito processual civil, v. 1, p. 56.
2
CARNELUTTI. Instituciones del proceso civil, col. I, n. 1, p. 22.
3
Theodoro JÚNIOR. Direito e processo, v. 5, p. 17-18.
4
Theodoro JÚNIOR. Direito e processo, v. 5, p. 19-20.
5
Theodoro JÚNIOR. Direito e processo, v. 5, p. 21.
6
Ibidem, p. 21.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 23-44, abr./jun. 2013
7
GONÇALVES. Técnica processual e teoria do processo, p. 64-65.
8
Dinamarco. A instrumentalidade do processo.
9
CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO. Teoria geral do processo, p. 40-41.
10
CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO. Teoria geral do processo, p. 161.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 23-44, abr./jun. 2013
11
Ibidem, p. 157-158.
12
MARQUES. Manual de direito processual civil, p. 40-41.
13
GONÇALVES. Técnica processual e teoria do processo, p. 68.
14
FAZZALARI. Istituzioni di diritto processuale, p. 81.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 23-44, abr./jun. 2013
15
FAZZALARI. Istituzioni di diritto processuale, p. 82-83.
16
GONÇALVES. Técnica processual e teoria do processo, p. 120-124.
17
GONÇALVES. Técnica processual e teoria do processo, p. 127.
18
FAZZALARI. Istituzioni di diritto processuale, p. 82.
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tenha de ser atual, mas uma participação potencial, convertendo, assim, o direito
em ônus. Tanto é assim que Marcelo Galuppo lembra a possibilidade de o interes-
sado, na produção do provimento, deixar de participar, por vontade própria, da
formação deste ato. Bem como o fato de não se exigir a existência de controvérsia,
sendo possível, por exemplo, que o réu (contrainteressado) concorde com a pre-
tensão do autor. Aliás, o próprio direito brasileiro prevê e estimula essa possibili-
dade, ao tornar obrigatória, na maioria dos processos, a tentativa de conciliação
por parte do juiz. Pode-se mesmo afirmar que a nova sistemática brasileira erige
em primeiro dever do juiz a tentativa de, na qualidade de “mediador”, fazer com
que se restabeleça racionalmente, no âmbito de uma comunidade real de comu-
nicação, o diálogo, ou seja, o discurso entre autor e réu.19
19
GALUPPO. Elementos para uma compreensão metajurídica do processo legislativo.
20
Essa definição foi retirada do livro do prof. Aroldo Plínio Gonçalves, intitulado Técnica processual,
publicado pela editora Aide, em 2000. Na verdade, esse conceito pode ser elaborado a partir dos
estudos de Elio Fazzalari, processualista italiano na Universidade de Roma.
21
LEAL. Teoria processual da decisão jurídica.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 23-44, abr./jun. 2013
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 23-44, abr./jun. 2013
CPC um instrumento produzido pela ditadura militar, no período mais duro, bem
como por adotar um sistema processual da relação jurídica processual, no qual se
estabelece dentro de um critério de subordinação entre os sujeitos processuais,
o contraditório, ao longo do CPC, precise ser revisto e adequado à nova ordem
constitucional brasileira, que já possui mais de 20 anos, e ainda não vem sendo
respeitado em alguns momentos pelo Judiciário.
3 Princípio do contraditório
O princípio do contraditório está recepcionado no art. 5º, inciso LV, da
Constituição da República. Assim, temos a seguinte redação: “aos litigantes, em
processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o
contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”.
Para Liebman, “o princípio do contraditório é a garantia fundamental da
Justiça e regra essencial do processo. Segundo este princípio, todas as partes devem
ser postas em posição de expor ao juiz as suas razões, antes que ele profira a decisão.
As partes devem poder desenvolver suas defesas de maneira plena e sem limita-
ções arbitrárias. Qualquer disposição legal que contraste com essa regra deve ser
considerada inconstitucional e, por isto, inválida”.22
Sobre o assunto, assevera Didier Junior:
22
LIEBMAN apud MARCATO. Preclusões: limitação ao contraditório?. Revista de Processo, p. 111.
23
DIDIER JR. Curso de direito processual civil: teoria geral do processo e processo de conhecimento, p. 45.
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Art. 10. O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base
em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportu-
nidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual tenha
que decidir de ofício.26
24
GONÇALVES. Técnica processual e teoria do processo, p. 120-124.
25
LEBRE DE FREITAS. Introdução ao processo civil: conceito e princípios gerais: à luz do Código revisto,
p. 103.
26
Código de Processo Civil Projetado.
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este vem sendo implementado e discutido pela Corte. Iremos trazer acórdãos que
se coadunam com a Constituição e com a efetiva garantia de participação das
partes, mas também, traremos acórdãos e decisões, inclusive já pacificadas, que
infelizmente não traduzem a efetiva garantia do contraditório no processo.
A primeira decisão paradigmática que pretendemos analisar é justamente a
proferida no HC nº 137.549/RJ, no qual a Relatora foi a Ministra Maria Thereza de
Assis Moura, da Sexta Turma, vejamos:
27
HC nº 137.549/RJ, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 07.02.2013, Sexta Turma do
STJ, DJe, 20 fev. 2013.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 23-44, abr./jun. 2013
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 23-44, abr./jun. 2013
28
MS nº 19.179/DF, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 04.02.2013, Primeira Seção do STJ,
DJe, 14 fev. 2013.
29
Cf. entendimento do STF: Processo. Ato administrativo. Declaração de insubsistência. Audição
da parte interessada. Inobservância. Uma vez constituída situação jurídica a integrar o patri-
mônio do administrado ou do servidor, o desfazimento pressupõe o contraditório. Precedente:
RE 158.543-9/RS, por mim relatado perante a Segunda Turma, com acórdão publicado no DJ de
6-10-1995” (AI nº 587.487-AgR, Rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 31.05.2007, Primeira Turma,
DJE, 29 jun. 2007). No mesmo sentido: RE nº 466.521-AgR, Rel. Min. Dias Toffoli, julgamento em
07.08.2012, Primeira Turma, DJE, 22 ago. 2012.
30
Cf. a jurisprudência, também do Supremo Tribunal Federal, que está coadunado com o entendi-
mento do Superior Tribunal de Justiça no caso acima citado. Assim o STF entende que a ausência
de processo administrativo ou a inobservância aos princípios do contraditório e da ampla defe-
sa tornam nulo o ato de demissão de servidor público, seja ele civil ou militar, estável ou não”
(RE nº 513.585-AgR, Rel. Min. Eros Grau, julgamento em 17.06.2008, Segunda Turma, DJE, 1º ago.
2008). No mesmo sentido: RE nº 594.040-AgR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgamento em
06.04.2010, Primeira Turma, DJE, 23 abr. 2010; RE nº 562.602-AgR, Rel. Min. Ellen Gracie, julgamento
em 24.11.2009, Segunda Turma, DJE, 18 dez. 2009. Vide: AI nº 634.719-ED, Rel. Min. Dias Toffoli,
julgamento em 07.02.2012, Primeira Turma, DJE, 09 mar. 2012; RE nº 289.321, Rel. Min. Marco
Aurélio, julgamento em 02.12.2010, Primeira Turma, DJE, 02 jun. 2011; RE nº 217.579-AgR, Rel.
Min. Cezar Peluso, julgamento em 16.12.2004, Primeira Turma, DJ, 04 mar. 2005.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 23-44, abr./jun. 2013
31
Cf. entendimento do STF não ofende o art. 5º, LV, da Constituição acórdão que mantém o inde-
ferimento de diligência probatória tida por desnecessária. O mencionado dispositivo constitu-
cional também não impede que o julgador aprecie com total liberdade e valorize como bem
entender as alegações e as provas que lhe são submetidas. Precedentes” (AI nº 623.228-AgR, Rel.
Min. Sepúlveda Pertence, julgamento em 14.08.2007, Primeira Turma, DJ, 14 set. 2007). No mes-
mo sentido: AI nº 660.254-AgR, Rel. Min. Dias Toffoli, julgamento em 06.04.2010, Primeira Turma,
DJE, 14 maio 2010; RE nº 531.906-AgR, Rel. Min. Eros Grau, julgamento em 10.06.2009, Segunda
Turma, DJE, 26 jun. 2009; HC nº 90.045, Rel. Min. Joaquim Barbosa, julgamento em 10.02.2009,
Segunda Turma, DJE, 20 mar. 2009; AI nº 687.881-AgR, Rel. Min. Menezes Direito, julgamento em
16.12.2008, Primeira Turma, DJE, 06 mar. 2009; AI nº 723.808-AgR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski,
julgamento em 16.12.2008, Primeira Turma, DJE, 20 fev. 2009; AI nº 603.460-AgR, Rel. Min. Ayres
Britto, julgamento em 29.04.2008, Primeira Turma, DJE, 31 out. 2008. Vide: HC nº 98.865, Rel. Min.
Ricardo Lewandowski, julgamento em 18.05.2010, Primeira Turma, DJE, 04 jun. 2010.
32
AgRg no AREsp nº 238.307/RJ, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 11.12.2012, Quarta
Turma do STJ, DJe, 19 dez. 2012.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 23-44, abr./jun. 2013
33
EDcl no AREsp 76.987/RJ, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, julgado em 06.12.2012, Primeira Turma
do STJ, DJe, 13 dez. 2012.
34
Cf. entendimento do STF “A prova emprestada, especialmente no processo penal condenatório,
tem valor precário, quando produzida sem observância do princípio constitucional do contradi-
tório. Embora admissível, é questionável a sua eficácia jurídica. Inocorre, contudo, cerceamento
de defesa, se, inobstante a existência de prova testemunhal emprestada, não foi ela a única a
fundamentar a sentença de pronúncia” (HC nº 67.707, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em
07.11.1989, Primeira Turma, DJ, 14 ago. 1992). No mesmo sentido: RHC nº 106.398, Rel. Min. Celso
de Mello, julgamento em 04.10.2011, Segunda Turma, DJE, 03 abr. 2012; HC nº 95.186, Rel. Min.
Ricardo Lewandowski, julgamento em 26.05.2009, Primeira Turma, DJE, 12 jun. 2009.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 23-44, abr./jun. 2013
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 23-44, abr./jun. 2013
36
AgRg no RMS nº 34.290/GO, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 05.02.2013, Primeira Turma
do STJ, DJe, 08 fev. 2013.
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AgRg nos EDcl no REsp nº 1104848/RJ, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 05.02.2013, Sexta Turma
37
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38
AgRg no REsp nº 982.984/DF, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 18.09.2012, Quinta Turma
do STJ, DJe, 21 set. 2012.
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5 Conclusão
Assim, neste texto foi possível explicar que processo é um procedimento
garantidor de um espaço discussivo-argumentativo, onde o contraditório é ele-
mento legitimador da decisão.
O Superior Tribunal de Justiça, no que tange à verificação da aplicação do
princípio do contraditório, em muitos casos vem dando interpretação ao mesmo
conforme a Constituição, qual seja, que o mesmo é elemento necessário e garan-
tidor do processo e da decisão judicial ou administrativa.
No entanto, quando confrontamos as decisões do Superior Tribunal de
Justiça sobre o princípio do contraditório é que temos várias decisões que não
explicam o sentido de contraditório, bem como, em bases herméticas, não permi-
tem o leitor ou intérprete entender qual seria o conceito de contraditório tomado
como premissa para dizer que houve ou não respeitabilidade ao mesmo.
Verificamos, em regra, que a maioria das decisões pesquisadas, no que tange
à análise do contraditório no processo jurisdicional ou administrativo, toma como
premissa que o mesmo é meramente um direito formal de ser ouvido. Isso signi-
fica dizer que o Superior Tribunal de Justiça ainda não superou o processo como
relação jurídica, bem como que ainda está deixando de aplicar a normatividade
processual nos termos e paradigmas constitucionais corretos. Se a constituição
defende a cidadania (art. 1º), a democracia (art. 1º) e o contraditório (art. 5º, inc. LV),
e todos esses princípios possuem como elemento central a participação, qual-
quer tipo de conduta ou lei que veda a participação ou limite, como no caso do
40
LEAL. Teoria geral do processo: primeiros estudos, p. 82.
41
MOREIRA. Fundamentação do direito em Habermas, p. 144.
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Abstract: The article examines how the Superior Court applied the principle
of contradiction in their judgments.
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revisto. Coimbra: Coimbra Ed., 1996.
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MARQUES, José Frederico. Manual de direito processual civil. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 1990.
MOREIRA, Luiz. Fundamentação do direito em Habermas. 2. ed. Belo Horizonte: Mandamentos, 2002.
SOARES, Carlos Henrique; BRETAS, Ronaldo de Carvalho Dias. Manual elementar de processo civil.
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Theodoro JÚNIOR, Humberto. Direito e processo. Rio de Janeiro: Aide, 1997. v. 5.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 23-44, abr./jun. 2013
1 Introdução
Este texto, escrito a convite do caríssimo amigo de mais de uma década,
prof. Glauco Gumerato Ramos, para coletânea brasileira organizada pelo prof. José
Renato Nalini em homenagem ao prof. Juan Montero Aroca, possuía no título ori-
ginal1 uma evidente provocação ao opor como contrários perfeitos o Garantismo
Processual e o, assim dito, Direito Processual Social.
1
O título original seria: “Ainda e muito ‘a favor’ do Direito Processual Social ou ‘contra’ o garan-
tismo processual universal”. Melhor será posicionar o Direito Processual Social entre o Ativismo
e o Garantismo, em homenagem à trova quinhentista portuguesa de Francisco Sá de Miranda:
“Pouco por força podemos,/ isso que é, por saber veio,/ todo o mal jaz nos extremos,/ o bem todo
jaz no meio”.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 45-79, abr./jun. 2013
2
MONTERO AROCA (Coord.). Proceso civil e ideología: un prefacio, una sentencia, dos cartas y quince
ensayos. Essa obra reúne trabalhos de Adolfo Alvarado Velloso, Eugenia Ariano Deho, José Carlos
Barbosa Moreira, Franco Cipriani, Ignazio Díez-Picazo, Federico G. Dominguez, Luís Correia de
Mendonça, Girolamo Monteleone, Joan Picó i Junoy, Giovanni Verde e do próprio coordenador,
Juan Montero Aroca.
3
ALVARADO VELLOSO. Garantismo procesal contra actuación judicial de oficio.
4
O artigo se denomina “Direito processual social no Brasil: as primeiras linhas” e a acidentalidade se
deve à pesquisa sobre igualdade e desigualdade processual, por nós desenvolvida, sob a generosa
orientação do prof. Arruda Alvim, para a tese de doutoramento (PUC-SP/2008), que possuía o desafio
inicial de definir uma “área” do Direito Processual Civil que contemplasse as “diferenciações” entre
partes e interesses merecedores de compensações processuais. O desafio original ficou resumido
a esse artigo publicado em 2006, na Revista Latinoamericana de Derecho Social, México, n. 2, e na
Revista de Processo, São Paulo, n. 142.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 45-79, abr./jun. 2013
do prof. Montero Aroca ou de Alvarado Velloso, ideia que somente mais tarde se
afigurou possível, com os debates feitos com o amigo Glauco Gumerato Ramos.
Por isso e só por isso é que este artigo pode ser considerado, em pálida
medida, uma réplica tardia das afirmações feitas pelo meu querido contendor
brasileiro e, em escala ainda menor, aos trabalhos dos professores espanhol e
argentino.
5
ALCALÁ-ZAMORA Y CASTILLO. Liberalismo y autoritarismo en el proceso. In: ALCALÁ-ZAMORA Y
CASTILLO. Estudios de teoría general e historia del proceso, t. II, item n. 22, p. 285, dirá que não há
incompatibilidade alguma entre liberalismo e autoritarismo no processo. Por essa razão nomina-
mos de “aparentemente” inconciliável o binômio.
6
MOREIRA. Neoprivatismo no processo civil. In: MOREIRA. Temas de direito processual: (nona série),
item n. 2, p. 88. O autor cita como exemplos leis que considera insuspeitas de autoritarismo, tais
como a Lei da Ação popular (Lei nº 4.717/1965) e Lei da Ação Civil Pública (Lei nº 7.347/1985),
editadas durante os governos militares (1964-1985). Contudo, ao argumento de Montero Aroca
essas também seriam, provavelmente, leis autoritárias, pois outorgam excessivos poderes aos
juízes, e não democráticas, como imagina Barbosa Moreira.
7
PICÓ I JUNOY. El derecho procesal entre el garantismo y la eficacia: un debate mal planteado. In:
MONTERO AROCA (Coord.). Proceso civil e ideología: un prefacio, una sentencia, dos cartas y quince
ensayos, item n. III.1, p. 117. O presente texto está publicado no Brasil, na Revista de Processo, n. 197,
jun. 2011, em língua italiana.
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[...] Não posso dar por terminada essa crítica sobre as disposições legais
relativas aos filhos ilegítimos, sem antes considerar o lado processual
desta questão. [...] o procedimento civil é prejudicial aos interesses das
classes pobres, na medida em que exclui, ordinariamente, a intervenção
autônoma do juiz. Este defeito geral da administração da justiça civil
influi em nossos casos, pesando duplamente sobre as costas dos pobres.
8
Há um exemplar da edição original alemã na Biblioteca do Supremo Tribunal Federal, em Brasília,
doada pela família de Pontes de Miranda. Há uma edição argentina, da mesma tradução de
Adolfo G. Posada e introdução de Diego Lamas (Buenos Aires: Atalaya, 1947).
9
MENGER. El derecho civil y los pobres, cap. VII, p. 134-135.
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10
MENGER. El derecho civil y los pobres, cap. XXVI, p. 213. Estão aqui presentes, sem dúvida, os ele-
mentos do que hoje conhecemos como de antecipação de tutela dos alimentos ou mesmo dos
alimentos gravídicos.
11
Essa denominação é atribuída por Luiz Machado Guimarães a Eduardo Couture, quando descreve
a autoridade do juiz segundo a fórmula de Franz Klein, no século XIX, e de Giuseppe Chiovenda,
no século XX. Ver: COUTURE. Oralidade e regra moral no processo civil. In: MORATO. Processo oral,
p. 99-110.
12
CHIOVENDA. Le riforme processuali e le correnti del pensiero moderno. In: CHIOVENDA. Saggi di
Diritto Processuale Civile, v. 1, item n. 5, p. 391, em que afirma que o principal problema da justiça
civil é a relação entre iniciativa da parte e iniciativa do juiz, chave das reformas processuais para a
adaptação do processo às necessidades sociais.
13
KELLY. Storia del pensiero giuridico occidentale, cap. VIII, p. 388, esclarece que “a ideia fundamental
dos legisladores franceses era excluir a incerteza e a arbitrariedade na aplicação da lei e com este
fim trataram de reduzir o quanto possível a função interpretativa e de criação do direito pelo juiz,
em quem não se confiava”.
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14
CALAMANDREI. Premissas políticas do projeto do Código de Processo Civil italiano. In: MORATO.
Processo oral, item n. 1, p. 166. Esse trabalho foi apresentado como Parecer ao texto do Projeto
Preliminar de CPC (1937).
15
BÖHN. Processo civile e ideologia nello stato nazisocialista. Rivista Trimestrale de Diritto e Procedura
Civile. Sobre a influência da ideologia nazisocialista no processo civil; sobre a influência de Franz
Klein, item n. 3, p. 640; sobre o uso do judiciário como instrumento político e ideológico, item n. 4,
p. 641-647.
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16
CAMPOS. Exposição de motivos. In: CÓDIGO de Processo Civil, p. 2.
17
CAMPOS. Exposição de motivos. In: CÓDIGO de Processo Civil, p. 5-7.
18
GUIMARÃES. Processo autoritário e regime liberal. In: GUIMARÃES. Estudos de direito processual
civil, p. 128-130. (Artigo foi originalmente publicado na Revista Forense, n. 82, em 1940).
19
Com redação idêntica, esses códigos previam no art. 262 da Lei nº 830, de 07.09.1922 (CPC de
Minas Gerais) e no art. 263 do Dec. nº 28, de 02.12.1930 (CPC da Parahyba) que: “O juiz póde orde-
nar ‘ex officio’ as diligencias que julgar necessarias para se apurar a verdade dos factos allegados,
depois de realizadas as que forem requeridas pelas partes”.
20
“Art. 230. Se, examinados os autos, o juiz entender necessaria, para julgar afinal, alguma diligen-
cia, ainda que lhe não tenha sido requerida nas allegações finaes, a poderá ordenar, marcando
para isso o prazo conveniente”.
21
GUEDES. O princípio da oralidade: procedimento por audiências no direito processual civil brasileiro,
item n. 1.3.3, p. 23-25, nas quais são feitas referências ao processo romano-canônico e a concessão
de poderes instrutórios ao juiz pela Clementia Saepe, ano 1306 d.C., do Papa Clemente V.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 45-79, abr./jun. 2013
Art. 112. O juiz dirigirá o processo por forma que assegure à causa anda-
mento rápido, sem prejuízo da defesa dos interessados.
[...]
Art. 117. A requerimento, ou ex-officio, o juiz poderá, em despacho moti-
vado, ordenar as diligências necessárias à instrução do processo e indeferir
as inúteis em relação a seu objeto, ou requeridas com propósitos manifes-
tamente protelatórios.
De outra parte, com outro espírito, haviam normas inseridas no CPC de 1939
que aparentemente iam em sentido contrário ao propalado autoritarismo, como
o art. 4º:
Art. 4º. O juiz não poderá pronunciar-se sobre o que não constitua objeto
do pedido, nem considerar exceções não propostas para as quais seja por
lei reclamada a iniciativa da parte.
22
Aula proferida na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) (SANTOS. Contra o
processo autoritário. Revista da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, item n. 6, p. 37).
23
Outros dispositivos conferiam poderes instrutórios ao juiz, como o art. 224 (requisição de certi-
dões às repartições públicas); art. 210 (oitiva pelo juiz de testemunha referida).
24
SANTOS. Contra o processo autoritário. Revista da Faculdade de Direito da Universidade de São
Paulo, item n. 7, p. 39.
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25
JARDIM. A publicização do processo civil, parte II, cap. 2º, §7º, p. 87-91 e parte III, cap.1º, §3º, p. 107-109.
26
CAPPELLETTI. Publicización, oralidad, socialización. In: CAPPELLETTI. El processo civil en el derecho
comparado, §9, p. 44-45. O autor associa a publicização do processo à oralidade, também identi-
ficada ao uso dos poderes de direção e de controle pelo juiz.
27
MOREIRA. Neoprivatismo no processo civil. In: MOREIRA. Temas de direito processual: (nona série),
itens n. 2-6, p. 88-95. Em estudo anterior, publicado em 1984, o professor destacava que: “confiar
ao juiz papel mais ativo na direção e na instrução do feito, ao contrário do que parecem recear
alguns, não implica forçosamente instaurar no processo civil o domínio do ‘autoritarismo’ ou do
‘paternalismo’”. [...] “A ampliação dos poderes do órgão judicial não tem como contrapartida ne-
cessária o amesquinhamento do papel das partes, nem a eliminação, ou sequer a redução, das
garantias a que fazem jus e tampouco da responsabilidade a que fazem jus” (MOREIRA. A função
social do processo civil moderno e o papel do juiz e das partes na direção e na instrução do pro-
cesso. In: MOREIRA. Temas de direito processual: (terceira série), item n. 3, p. 54).
28
DINAMARCO. Liebman e a cultura processual brasileira. Revista de Processo, item n. 2, p. 1-2 e item
n. 8, p. 5-6. Versão eletrônica. Essa posição depois seria consagrada em outros autores italianos:
CAPPELLETTI. Publicización, oralidad, socialización. In: CAPPELLETTI. El processo civil en el derecho
comparado, §8º-19, p. 43-79. No mesmo sentido: CABRAL. O processo como superego social: um
estudo sobre os fins sociais da jurisdição. Revista de Processo, item n. 1, p. 345.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 45-79, abr./jun. 2013
que não apenas respeita o livre arbítrio dos cidadãos na tomada de decisões
relativas à sua esfera privada, mas que, no momento em que estes recorrem
ao Estado para a tutela dos seus direitos, este, através dos juízes, controla
vigilantemente se aqueles estão em condições de se autotutelarem e, em
caso negativo, supre moderada e parcimoniosamente as suas insuficiências
para, sem comprometer a sua imparcialidade, assegurar-lhes o acesso efe-
tivo ao gozo dos seus direitos, tendo em vista que as posições de domina-
ção que prevalecem na sociedade precisam ser neutralizadas, sob pena de
entregarem os mais fracos ao jugo incontrastável dos mais fortes, em total
desrespeito às promessas de construção de uma sociedade erigida sob a
égide da dignidade humana e do pleno respeito aos direitos fundamentais.31
29
MARINONI. Novas linhas do processo civil: o acesso à Justiça e os institutos fundamentais do direito
processual, item n. 2.5.8, p. 71-74.
30
GRECO. Publicismo e privatismo no processo civil. Revista de Processo, p. 29 et seq. Versão eletrônica.
31
GRECO. Publicismo e privatismo no processo civil. Revista de Processo, item n. 16, Conclusão.
A proposta de assistência do juiz à parte mais frágil se encontra também em: CALAMANDREI.
Instituciones de derecho procesal civil: según el nuevo Código, §62, p. 342-345; DENTI. Il processo
come strumento di politica sociale. In: DENTI. Processo civile e giustizia sociale, item n. 1, p. 53-55.
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32
MONTERO AROCA. El proceso civil llamado “social” como instrumento de “justicia” autoritária. In:
MONTERO AROCA (Coord.). Proceso civil e ideología: un prefacio, una sentencia, dos cartas y quince
ensayos, item n. 10, p. 164.
33
Revista Brasileira de Direito Processual – RBDPro, p. 83-102.
34
CIPRIANI, Franco. El proceso civil italiano entre revisionistas e negacionistas; CIPRIANI, Franco. El
proceso civil entre viejas ideologías y nuevos eslóganes; MONTELEONE, Girolamo. Principios y
ideologías del proceso civil: impresiones de un ‘revisionista’; MONTELEONE, Girolamo. El actual
debate sobre las ‘orientaciones publicísticas’ del proceso civil, publicados todos em MONTERO
AROCA (Coord.). Proceso civil e ideología: un prefacio, una sentencia, dos cartas y quince ensayos.
35
PISANI. Pubblico e privato nel processo civile. Revista de Processo, itens n. 5-6, p. 295-301.
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Nueva LEC espanhola, em 1999.36 O ativismo processual é, para essa corrente, esse
conjunto todo de fenômenos que vão se conformando a partir do final do século
XIX e início do século XX, sintetizados pela ampliação dos poderes instrutórios
do juiz. De outro lado, o garantismo seria o inverso, caracterizado pela posição
moderada do juiz, com seus poderes limitados na atividade probatória e no impulso
processual, com a revalorização do princípio dispositivo.
Outro é, por certo, o ativismo constitucional, como bem destacou o pró-
prio prof. Glauco Gumerato Ramos em debate no UniCEUB (Centro Universitário
de Brasília) em reunião de nosso Grupo de Pesquisa =ISO Justiça Processual e
Desigualdade.37 Este outro ativismo dos Tribunais Constitucionais vem sendo
definido pela doutrina e pelos próprios tribunais, mas ainda pende de completa
delimitação.38
Em todas essas variações de denominações, o que se nota é uma discussão
entre duas formas aproximadas de ver o processo, que se isolam uma da outra por
motivos político-processuais como: a) a vedação ou autorização ao juiz de decidir
além das alegações das partes; b) vedação ou autorização para o juiz determi-
nar de ofício a realização de provas; c) vedação ou autorização a impulsionar o
processo.
36
MONTERO AROCA. El derecho procesal en el siglo XX, item n. 10-C, p. 71. Essa obra editada em 2000,
no item referido, traça um panorama crítico do processo civil europeu, influenciado por Franz
Klein, que segue a tendência de publicização, com função social, como fenômeno de massas,
com a ampliação dos poderes do juiz e mitigação do princípio dispositivo [PICÓ I JUNOY. El dere-
cho procesal entre el garantismo y la eficacia: un debate mal planteado. In: MONTERO AROCA
(Coord.). Proceso civil e ideología: un prefacio, una sentencia, dos cartas y quince ensayos], consi-
dera como sinônimas as expressões “publicização” e “socialização do processo”, que possui como
virtude a ampliação dos poderes do juiz (item n. I, p. 109-110).
37
Nessa oportunidade o professor afirmou que o ativismo pode ser vislumbrado numa dupla pers-
pectiva: a) aquela praticada pelo STF, sob inspiração da Suprema Corte Americana (Common
Law), na qual o juiz pode criar o direito, sendo assim no Brasil, na qual o juiz interpreta a lei estabe-
lecida pelo Legislador e b) praticado pelas instâncias inferiores, posição criticada pelo professor,
na qual a figura do juiz é excessivamente valorizada e onde se exacerba o seu poder, interferindo
na matéria que deveria ser das partes e influenciando a decisão (Reunião de 14.09.2011 do Grupo
de Pesquisa =ISO Justiça Processual e Desigualdade, UniCEUB, Brasília/DF).
38
Sobre o conceito de ativismo constitucional ver: BRANCO. Em busca de um conceito fugidio: o ati-
vismo judicial. In: FELLET; PAULA; NOVELINO (Org.). As novas faces do ativismo judicial, p. 387-401. A
obra coletiva reúne mais de 20 textos sobre o tema.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 45-79, abr./jun. 2013
Muito se escreveu sobre esse assunto e há variadas posições sobre essa lei
italiana, com o propósito de contornar aquilo que não se lhe pode retirar, ou seja,
o fato de ter sido editada por fascistas em pleno ano de 1940. Seu nascimento
sob o patrocínio de um governo que é hoje execrado por todos (ou quase todos)
permite que se lhe oponham ressalvas.39
Quem se posiciona neste sentido é Franco Cipriani, opinião confirmada por
Juan Montero Aroca, Girolamo Monteleone e Alvarado Veloso, mas que encontra
concordância total ou parcial em outros doutrinadores.40
De outro lado, respeitados doutrinadores já argumentaram que a referida
lei não é exatamente autoritária porque editada por um Estado fascista.
Giovanni Verde sugere que se trata “de ver se há disposições do código que
seguem uma linha de características autoritárias e se estas disposições são de tal
importância que permitem qualificar o código como autoritário”. E acrescenta que
esse código autoritário e fascista tornou possível a formação de uma jurisprudên-
cia respeitosa em relação ao princípio da congruência entre pedido e sentença,
não sendo diferente daquela ideologia liberal pretendida por Montero Aroca.41
Michelle Taruffo, autor de uma das mais consagradas obras sobre a história
do processo civil italiano medieval, moderno e contemporâneo, ao tratar do CPC
de 1940 sintetiza quanto à matriz ideológica do código que: “com toda probabi-
lidade, na verdade, o Relatório Grandi foi considerado como fascista, mas não o
código”. E mais, finaliza dizendo que se se tem em conta tudo o que foi dito, então
é lícito afirmar que — aparte as tentativas de “fascistizar” o código completo em
qualquer parte do Relatório Grandi — isso não pode ser considerado o fruto da
ideologia fascista nem de modo geral, nem nas suas disposições individuais. É
verdade, em substância, que as conexões entre o código e o fascismo são princi-
palmente cronológicas [...]”.42
39
A primeira edição do ano 1941 da Rivista di Diritto Processuale Civile (v. XVIII, Parte I), traz uma série
de artigos que apontam progressos e elogiam o CPC italiano de 1940, tendo como autores, entre
outros: CARNELUTTI, Francesco. Carattere del nuovo Codice di Procedura Civile; REDENTI, Enrico.
L’umanità nel nuovo processo civile; CONFORTI, Leopoldo. Codice rivoluzionario; D’AMELIO,
Mariano. Le tendenze sociali del nuovo Codice di Procedura Civile.
40
RICCI. Il processo civile fra ideologie e quotidianità. Rivista Trimestrale di Diritto e Procedura Civile,
item n. 6, p. 86, concordando parcialmente.
41
VERDE. Las ideologías del proceso en un reciente ensayo. In: MONTERO AROCA (Coord.). Proceso
civil e ideología: un prefacio, una sentencia, dos cartas y quince ensayos, item n. 3, p. 72-74.
42
TARUFFO. La giustizia civile in Italia dal ‘700 a oggi, cap. IV, item n. 4, p. 286. Essa é também a
posição firme de: ALCALÁ-ZAMORA Y CASTILLO. Liberalismo y autoritarismo en el proceso. In:
ALCALÁ-ZAMORA Y CASTILLO. Estudios de teoría general e historia del proceso, t. II, item n. 9, p. 260,
ao afirmar que o código “não tem nada de fascista, se se excetuam algumas tão explosivas como
circunstanciais frases de sua exposição de motivos”.
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Barbosa Moreira, de outra parte, observa que o CPC italiano de 1940 tem
sido alvo de críticas por ser produto do fascismo, embora a melhor razão esteja
com os que divergem dessa posição, citando com exemplo Michele Taruffo, que
afirmava ser a Relazione del Ministro Grandi uma “cláusula de estilo acrescentada
pela exigência política contingente”.43
Mas a fogueira segue acesa, pois recentemente Andrea Proto Pisani a ela
voltou-se para dizer que “a polêmica sobre se o código de 1940 era ou não fascista,
era ou não autoritário seria progressivamente atenuada e os processualistas civis,
recuperada a sua tranquilidade, teriam podido voltar ainda dedicar-se ao estudo
do processo acentuando o componente publicista”.44 De um ponto de vista mais
amplo, Alessandro Somma, com base em extensa bibliografia, relativiza a influên-
cia do fascismo sobre o direito, restringindo-a a aspectos principalmente formais.
E acrescenta “à luz do que aqui se observou não me parece que o Código Civil ita-
liano [1942] — como o recurso formal dos modelos mutuais da história — possa
ser considerado fascista ou antifascista”.45
Entretanto, deve-se destacar o mais detalhado exame que se dispõe sobre
a Relazione Grandi, feito pelo processualista colombiano Jairo Parra Quijano, na
obra Racionalidad e ideología en las pruebas de oficio, na qual assegura, em síntese,
que:
Essa posição se alinha com a postura ideológica adotada na obra, que con-
sidera necessária a concessão de poderes ao juiz como forma de permitir que ele
“conheça a verdade”, essencial para decidir de forma justa.
43
MOREIRA. Neoprivatismo no processo civil. In: MOREIRA. Temas de direito processual: (nona série),
item n. 2, p. 89.
44
PISANI. Pubblico e privato nel processo civile. Revista de Processo, item n. 3, p. 292. O texto corres-
ponde à palestra proferida em Cagliari, em julho de 2011, em homenagem a Franco Cipriani. De
outra parte, considerando relativa e inútil a discussão, ver: RICCI. Il processo civile fra ideologie e
quotidianità. Rivista Trimestrale di Diritto e Procedura Civile, item n. 6, p. 87.
45
SOMMA. Fascismo e diritto. Rivista Trimestrale di Diritto e Procedura Civile, anno LV, n. 3, item n. 8,
p. 628-633 e item n. 10, p. 643.
46
PARRA QUIJANO. Racionalidad e ideología en las pruebas de oficio, cap. X, item “B”, p. 55. Ao fim da
obra há o texto integral da Relazione Grandi, traduzida para o espanhol.
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47
GUIMARÃES. Processo autoritário e regime liberal. In: GUIMARÃES. Estudos de direito processual
civil, p. 131-132.
48
São lembrados pelo próprio Luiz Machado Guimarães, como exemplos de Códigos Estaduais
que previram os poderes instrutórios do juiz, o Código do Processo Civil, Commercial, Penal
e Orphanologico do Estado da Bahia (Lei nº 1.121, de 21.08.1915) e o Código do Processo Civil e
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193949 e o CPC de 1973,50 assim como vem reafirmado no Projeto do Novo CPC.51
Na doutrina se destaca desde alguns anos os trabalhos de João Batista Lopes e
de José Roberto dos Santos Bedaque, sintetizando a posição dominante sobre o
tema,52 mas não pacífica.53 Alexandre Freitas Câmara ao tratar dos Poderes instru-
tórios do juiz e processo civil democrático, após um extenso reexame das posições
políticas dos grupos que se opõem, uns considerando democrático e outros auto-
ritário o processo, assegura a legitimidade democrática do art. 130 do CPC atual,
no qual “impõe-se o reconhecimento de amplos poderes de iniciativa probatória
ao juiz, permitindo-se que este agente estatal cumpra sua missão constitucional:
fazer justiça”.54 Outro exemplo, anterior ao CPC de 1973, é a Lei nº 5.478/1968, Lei
de Alimentos, que prevê, por exemplo, no art. 19 que “o juiz, para instrução da
causa ou na execução da sentença ou do acordo, poderá tomar todas as providên-
cias necessárias para seu esclarecimento ou para o cumprimento do julgado ou
do acordo, inclusive a decretação de prisão do devedor até 60 (sessenta) dias”.55
O Projeto do Novo CPC, depois da apresentação do Anteprojeto (2009), da
tramitação no Senado Federal (PL nº 166/2010), que a esta altura está na Câmara
de Deputados (Projeto de Lei nº 8.046/2010), possui outros tantos exemplos de
Commercial do Estado do São Paulo (Lei nº 2.421, de 14.01.1930). Mas podem-se identificar outros
dois casos além dos citados acima: o Código do Processo Civil do Estado de Minas Gerais (Lei nº 830, de
07.09.1922), e o Código do Processo Civil e Commercial do Estado da Parahyba (Dec. nº 28, de 02.12.1930).
49
Art. 117. A requerimento, ou ex-officio, o juiz poderá, em despacho motivado, ordenar as diligên-
cias necessárias à instrução do processo e indeferir as inúteis em relação a seu objeto, ou reque-
ridas com propósitos manifestamente protelatórios.
50
Art. 130. Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias à
instrução do processo, indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias.
51
Art. 354. Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias
ao julgamento da lide. Parágrafo único. O juiz indeferirá, em decisão fundamentada, as diligências
inúteis ou meramente protelatórias (Anteprojeto, art. 258; PL nº 166/2010 do Senado, art. 354).
52
LOPES. Os poderes do juiz no aprimoramento da prestação jurisdicional. Revista de Processo, p. 24-67;
BEDAQUE. Poderes instrutórios do juiz, especialmente itens 3-3.8, p. 74-157. Ver textos precedentes a
esses que são ilustrativos: no Brasil, NAVES. Impulso, processual e poderes do juiz, itens 18-19, p. 53-57;
na Itália, CAPPELLETTI. Publicización, oralidad, socialización. In: CAPPELLETTI. El processo civil en el
derecho comparado, §13, p. 60-62.
53
CÂMARA. Poderes instrutórios do juiz e processo civil democrático. Revista de Processo, observa
que “a doutrina brasileira não é pacífica a respeito do alcance deste poder do juiz” (item n. 2, p. 2.
Versão eletrônica).
54
CÂMARA. Poderes instrutórios do juiz e processo civil democrático. Revista de Processo, item n. 5,
p. 5-8. Versão eletrônica.
55
Poucos dirão tratar-se de uma lei autoritária, embora tenha sido publicada em plena fase crítica
da Ditadura Militar, em vista da natureza dos direitos em disputa na ação de alimentos e o possí-
vel desequilíbrio entre as partes, a justificar esta e outras tantas diferenciações procedimentais ali
previstas.
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força que também poderiam ser considerados autoritários, tal como o art. 11856
e, especialmente, o inc. III, que autoriza ao juiz: “determinar todas as medidas
indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegu-
rar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto
prestação pecuniária”.
Mas devemos observar que o processo civil brasileiro não vem sendo regu-
lado exclusivamente no CPC, mas também recebe a normatização de inúmeras
leis especiais ou esparsas. Nessas normas especiais, que regulam, por exemplo,
mais da metade dos processos da União e de seus entes, na Justiça Federal, trami-
tam pelo procedimento dos Juizados Especiais Federais (JEF), com uma grande va-
riedade de regras compensatórias. Mas há outros exemplos nos quase 100 (cem)
procedimentos especiais existentes nessas leis esparsas, no CPC de 1973 e até no
CPC 1939, ainda parcialmente vigente.
Isto é uma parte do Direito Processual Social atual. Embora velho nas suas
concepções, ele é novo e variável quanto aos grupos de destinatários, quanto às
matérias e mesmo quanto aos seus fundamentos ideológicos.
É insuficiente hoje tratar-se de Direito Processual Social pensando apenas em
regras compensatórias para os pobres, como pensavam os socialistas do final do
século XIX e até a metade do século XX. As desigualdades encontradas atualmente
nas sociedades se pulverizam em inúmeras formas, como será exposto a seguir
no item 4.2 deste texto. Nele virão listadas as: a) desigualdades sociais (indivi-
duais e de grupos); b) desigualdades econômicas; c) desigualdades educacionais
ou instrucionais gerais; d) desigualdades técnicas-jurídicas e gerais; e) desigual-
dades culturais (étnicas, linguísticas etc.); f ) desigualdades político-institucionais
Art. 118. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe: I – promover
56
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57
ROCHA; GUEDES. Derechos fundamentales y proceso civil en el Brasil: algunas técnicas procesales
compensatorias de desigualdades sociales y la protección judicial de los derechos fundamentales.
Anuario de Derechos Humanos, item n. 5.1; versão portuguesa publicada na Revista Brasileira de
Direito Processual – RBDPro, Belo Horizonte, ano 19, n. 74, item 5.1, p. 119-123, abr./jun. 2011.
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por meio das ações coletivas, que estão cercadas por peculiaridades que
esse sistema possui. Mas tais ações não excluem o processo individual de
consumo, que preserva singularidades, embora seja regido pelas normas
gerais de processo (CPC) e por leis extravagantes. Dentre alguns benefí-
cios processuais está a inversão do ônus da prova.
f ) Beneficiários da previdência e assistência social – Os assistidos pela Pre-
vidência Social têm a seu favor, no plano processual, a Lei dos Juizados
Especiais Federais (Lei n. 10.259/2001), que, combinada com a Lei dos
Juizados Especiais Cíveis e Criminais (Lei n. 9.099/1995), oferece vanta-
gens em relação aos juízos comuns. Esse novo modelo judicial se baseia
na ampliação do acesso à Justiça por meio de um modelo consensual,
econômico e simplificado, oral e concentrado, informal e célere. Carac-
teriza-se também pela ampliação dos poderes do juiz (art. 4º), isonomia
total entre Administração e administrado, com redução de prerrogativas
da Fazenda Pública, possibilidade de transação de Direito Público, fim da
apelação ex officio e recorribilidade somente quanto ao direito material.
Nesses juizados, os pedidos não podem ultrapassar 60 salários mínimos
(17 mil US$) e o pagamento das condenações é feito pelo Tesouro, median-
te requisição e não pelo sistema vinculado ao orçamento do ano seguinte
(precatório).
g) Agricultores e camponeses – Em alguns poucos casos, os camponeses
contam com regras especiais para a aquisição da propriedade. Ela pode
se dar por meio do usucapião especial agrário (Lei n. 6.969/1981), da
ação discriminatória de terras públicas (Lei n. 6.383/1976) e das imissões
possessórias agrárias. São tipicamente agrárias as demandas de cum-
primento, de despejo, de consignação, de rescisão e de indenização em
contratos agrários, de preferência, de divisão, demarcação e extinção de
condomínio agrário, usucapião especial e nunciação de obras rurais, além
da desapropriação para fins de reforma agrária. No processo agrário ado-
tam-se, sem exceção, os princípios constitucionais processuais, tais como
contraditório, ampla defesa, duplo grau, isonomia, publicidade etc.; os
princípios gerais do processo, como princípio dispositivo e da demanda,
lealdade processual e boa-fé, e, também, princípios especiais ou próprios,
dentre os quais podem ser arrolados os princípios da simplificação e da
oralidade, com identidade física e concentração de atos, o princípio da
gratuidade de justiça, o princípio da indisponibilidade das regras e da fixa-
ção da competência segundo o local dos bens litigados.
h) Beneficiários do meio ambiente sadio – Este grupo, titular de direito difu-
sos, que, às vezes, congrega toda a sociedade, tem a seu dispor meios efi-
cientes de atuação, principalmente a ação civil pública (Lei n. 7.347/1985)
e a ação popular (Lei n. 4.717/1965). Estas não são vistas como típicas
ações, mas como técnicas que ensejam procedimentos, métodos de cog-
nição e provimentos diferenciados para a obtenção da tutela do meio
ambiente, para o que se aplica subsidiariamente os dispositivos do Código
de Processo Civil. As regras do “processo civil ambiental” se ampliam cada
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Esses são sujeitos processuais que podem em maior ou menor escala neces-
sitar ou depender da atividade instrutória do juiz, da elasticidade de seus poderes
na busca da prova. São pessoas e as pessoas é que merecem tutela, não apenas
os direitos.58
Atenta à realidade dos nossos dias, tratando de iniciativa probatória do juiz,
a profa. Ada Pellegrini Grinover destaca que: “a visão do Estado social não admite a
posição passiva e conformista do juiz, pautada por princípios especialmente indi
vidualistas. O processo não é um jogo, em que pode vencer o mais poderoso ou o
mais astucioso, mas um instrumento de justiça, pelo qual se pretende encontrar
o verdadeiro titular do direito. A pacificação social almejada pela jurisdição sofre
sério risco quando o juiz permanece inerte, aguardando passivamente a iniciativa
instrutória da parte”.59
58
CABRAL. O processo como superego social: um estudo sobre os fins sociais da jurisdição. Revista
de Processo, item n. 1, p. 347, referindo Cândido R. Dinamarco.
59
GRINOVER. A iniciativa instrutória do juiz no processo penal acusatório. In: GRINOVER. A marcha
do processo, item n. 5, p. 81.
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Além disso, Juan Montero Aroca arrola manifestações que se alinham com o
ativismo, embora não se refiram estritamente à atividade do juiz, tais como o não
reconhecimento pelas partes de ser o juiz um terceiro e a classificação da “luta
processual” das partes como má-fé ou improbidade processual.
O garantismo processual civil — e diga-se “processual civil” porque o garan
tismo processual penal pode e deve ter outro sentido — está posto como o inverso do
ativismo, devendo o juiz se manter alheio à delimitação do objeto do processo e na
definição do âmbito da prova como um espectador, sem interferir nessas atividades.
Com isso, o juiz preserva sua independência e a essencial imparcialidade.
Como dito acima, o garantismo seria caracterizado pela posição moderada
do juiz, com seus poderes limitados na atividade probatória e no impulso proces-
sual, com a revalorização do princípio dispositivo.
O garantismo, na palavra final do artigo do professor Juan Montero Aroca,
é a luta contra a publicização, nome que se dá ao fenômeno do século XX que se
caracteriza pelo favorecimento extremo do coletivismo a ponto de se suprimirem
direitos fundamentais das pessoas.60
60
MONTERO AROCA. El proceso civil llamado “social” como instrumento de “justicia” autoritária. In:
MONTERO AROCA (Coord.). Proceso civil e ideología: un prefacio, una sentencia, dos cartas y quince
ensayos, item n. 10, p. 165.
61
TROCKER. Il processo civile tedesco e quello italiano: loro basi storico-ideologiche. In: TROCKER.
Processo civile e Costituzione: Problemi de diritto tedesco e italiano, item n. 2, p. 8-9, especialmente
a nota 11, na qual destaca a posição de R. Schmidt, Prozessrecht und Staatsrecht. Noutra passa-
gem, o autor denomina o binômio aparentemente inconciliável de “rígido dualismo”.
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62
DIDIER JR. Os três modelos de direito processual: inquisitivo, dispositivo e cooperativo. In: LEITE;
SARLET; CARBONELL (Coord.). Direitos, deveres e garantias fundamentais, item n. 3-4, p. 431-434.
63
MITIDIERO. Colaboração no processo civil: pressupostos sociais, lógicos e éticos, item n. 4, p. 101-103.
64
NUNES; BAHIA. Processo, jurisdição e processualismo constitucional democrático na América
Latina: alguns apontamentos. Revista Brasileira de Estudos Políticos, v. 101, item n. 4, p. 92. Ver tam-
bém: NUNES, Dierle. Processo liberale, sociale e democrático. Disponível em: <http://www.diritto.it>.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 45-79, abr./jun. 2013
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as regras e a extensão dos recursos.65 Aqui o processo pode ser garantista, no sentido
reclamado por Montero Aroca, pois se está diante de partes que, em geral, são
equiparadas, assim como diante de direitos disponíveis.
No grupo do Processo para defesa de interesses individuais privados especiais
(Direito Processual Social) caracteriza-se o Direito Processual Social pela presença
de interesses privados diferenciados, amparados por regras materiais e, também,
protegidos pelas regras processuais especiais. Nestes casos, o juiz amplia seus
poderes tanto para a busca de provas quanto para a concessão de medidas urgen-
tes de ofício.
Por tal razão, essas distinções entre partes e situações jurídicas distintas, não
se pode pretender uma regra universal que imobilize o juiz sempre, em todos os
casos e pelos mesmos meios. Encontrada esta contradição, deve ser feita uma
distinção necessária.
Universalizar o garantismo corresponderia, a essa altura, permitir uma apli-
cação plena do princípio dispositivo e a mitigação do princípio inquisitivo, que não
tem precedente conhecido.66 Devis Echandía, ao tratar do tema sob a ótica da
legislação colombiana, afirma que podem harmonizar-se o critério liberal com as
convicções sociais e, com igual razão, pode ter-se um processo civil também social,
que cumpra a função do interesse público.67
65
GUEDES. Direito processual social no Brasil: as primeiras linhas. Revista Latinoamericana de Derecho
Social, n 2, item IV, p. 67-81; Revista de Processo, n. 142, item n. 4, p. 148-160.
66
Ver: CAPPELLETTI. Iniciativas probatorias del juez y bases prejurídicas de la estructura del proceso.
In: CAPPELLETTI. La oralidad de las pruebas en el proceso civil, p. 111-135.
67
DEVIS ECHANDÍA. Política social en la justicia civil. In: DEVIS ECHANDÍA. Estudios de derecho procesal,
cap. V, item n. 6, p. 213.
68
As desigualdades complexas ou multidimensionais de modo geral estão associadas à pobreza,
que cria desnível ou déficit nos demais campos ou atividades vitais, atrasando a saúde, a edu-
cação, o conhecimento cultural, a comunicação, a instrução técnica etc. Exemplos podem ser
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muitos, mas um é a feminilização da pobreza, que associa a liderança doméstica de lares pobres
àqueles conduzidos por mulheres, fazendo convergir duas condições de trato desigual e mere-
cedoras de compensação: a condição feminina e a pobreza. Mas há muitos outros que podem
associar múltiplas condições de déficit como a baixa instrução escolar, a pobreza, a integração
de minorias indígenas ou de imigrantes, comuns em agricultores latino-americanos, por exem-
plo. O acesso ao crédito, a participação política, a luta processual por direitos são obturadas se
não forem criados pelo Estado mecanismos de equiparação para essas pessoas ou grupos sociais
(GUEDES. Igualdade e desigualdade no processo civil: o processo como técnica compensatória de
desigualdades sociais, item n. 8.4.2).
69
GUEDES. Igualdade e desigualdade no processo civil: o processo como técnica compensatória de
desigualdades sociais, item n. 11.1.1.
70
SEN. Desigualdade reexaminada, cap. 6, p. 147; neste ponto o autor expõe a relação existente
entre os diferentes tipos de desigualdade.
71
ARZATE SALGADO. Elementos conceituais para a construção de uma teoria sociológica da carên-
cia. In: CATTANI; DIAZ (Org.). Desigualdades na América Latina: novas perspectivas analíticas, p. 236.
72
RODRIGUEZ SOLERA. Sete grandes debates sobre a desigualdade social. CATTANI; DÍAZ (Org.).
Desigualdades na América Latina: novas perspectivas analíticas, p. 218.
73
FISS. Grupos y cláusula de igual protección. In: GARGARELLA (Comp.). Derecho y grupos desavan-
tajados, p. 145-146.
74
ARZATE SALGADO. Elementos conceituais para a construção de uma teoria sociológica da carência.
In: CATTANI; DIAZ (Org.). Desigualdades na América Latina: novas perspectivas analíticas, p. 237-239.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 45-79, abr./jun. 2013
KYMLICKA. Multiculturalismo liberal e direitos humanos. In: SARMENTO; IKAWA; PIOVESAN (Coord.).
76
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77
ALCALÁ-ZAMORA Y CASTILLO. Causas y efectos sociales del derecho procesal. In: ALCALÁ-ZAMORA
Y CASTILLO. Estudios de teoría general e historia del proceso, v. 2, n. 5, p. 145.
78
CALAMANDREI. Instituciones de derecho procesal civil: según el nuevo Código, cap. 3º, §62, p. 342.
79
GUEDES. Igualdade e desigualdade no processo civil: o processo como técnica compensatória de
desigualdades sociais.
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GUEDES. Igualdade e desigualdade no processo civil: o processo como técnica compensatória de desi-
80
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 45-79, abr./jun. 2013
81
Órgãos da Justiça Comum dos Estados e do Distrito Federal (DF) criados para a conciliação de maté-
rias de menor complexidade e valor igual ou inferior a 40 salários mínimos (SM), entre particulares.
82
Órgãos da Justiça Comum Federal para a conciliação de matérias de menor complexidade e valor
igual ou inferior a 60 salários mínimos (SM) entre particulares e a União e alguns de seus entes de
administração indireta (autarquias, fundações e empresas públicas).
83
Órgãos da Justiça Comum dos Estados e do DF para a conciliação de matérias de menor comple-
xidade e valor de até 20 ou 60 salários mínimos (SM) a depender do ente federativo, entre parti-
culares e Estado, DF e Municípios ou alguns de seus entes de administração indireta (autarquias,
fundações e empresas públicas).
84
RAMOS. O processo civil gatopardista dos Juizados Especiais. Revista Brasileira de Direito Processual
– RBDPro, p. 37.
85
ALCALÁ-ZAMORA Y CASTILLO. Liberalismo y autoritarismo en el proceso. In: ALCALÁ-ZAMORA Y
CASTILLO. Estudios de teoría general e historia del proceso, t. II, item n. 5, p. 252.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 45-79, abr./jun. 2013
5 Conclusão
Pensar-se em regras universais não faz mais muito sentido no Brasil, hoje,
quando se quer um processo cada vez mais “customizado” ou adequado à tutela
desejada pela parte. As razões podem ser muitas, mas aponto três genéricas.
Há um imenso campo de atuação do Processo Coletivo, no qual as regras e
princípios, tais como o princípio dispositivo e seus dois aspectos, não possuem res-
sonância tão alta, sendo guiado por outros princípios e para proteção de outros
interesses.86
Há uma extensa atuação processual do Estado,87 desconhecido e sem cor-
respondência na maioria dos países europeus continentais ou de tradição anglo-
saxônica, que permitem o reconhecimento de um campo próprio do Direito
Processual Administrativo, como Direito Processual Público, ora com outorga de
poderes mais amplos ao juiz, ora com mitigação de garantias processuais estatais,
ora privilegiando o Estado, ora protegendo o cidadão da excessiva força proces-
sual estatal.88
Não há mais o velho Direito Processual Social dos pobres do século XIX e
do século XX, havendo sim novas e complexas dificuldades que mais exigem do
Estado e de seus agentes, sejam administradores ou juízes.
Reequilibrar partes com regras do processo, quando e se necessário, pode ser
tarefa estatal, seja pela outorga de direitos, seja pela compensação processual,89 se-
jam aos pobres ou desassistidos, negros, beneficiários de seguro social, adolescentes
em condição de risco, indígenas, mulheres, agricultores, desabrigados de catástrofes,
homossexuais e outras minorias, refugiados, detentos, imigrantes, desempregados,
doentes, acidentados, microempresários, sem-terra, deficientes etc.
86
ALMEIDA. Direito processual coletivo brasileiro, cap. 11, p. 560-579, especialmente o princípio da
máxima efetividade do processo coletivo, que corresponde à ampliação dos poderes do juiz (item
11.7.7, p. 576-577), baseado na opinião de Ada Pellegrini Grinover. Também: MACEDO JUNIOR.
Ação civil pública, o direito social e os princípios, YARSHELL; MORAIS (Coord.). Estudos em home-
nagem à Professora Ada Pellegrini Grinover, item n. 2, p. 294-296.
87
Diferentemente de outras repúblicas federativas (México e Argentina) temos apenas uma lei proces-
sual “nacional”, que se aplica a todos os litígios, sejam entre sujeitos privados ou entre estes e o Estado
(União, Estados, Distrito Federal, Municípios e os entes de cada um desses entes federativos), ao lado
de inúmeras leis esparsas que tratam de procedimentos especiais ou de incidentes processuais.
88
SUNDFELD. O direito processual e o direito administrativo. In: SUNDFELD; BUENO (Coord.). Direito
processual público: a Fazenda pública em juízo, p. 15-30, nas quais aponta as razões de conexão
entre o Direito Administrativo e o Direito Processual.
89
COUTURE. Algunas nociones fundamentales sobre derecho procesal del trabajo. In: COUTURE.
Estudios de derecho procesal civil, t. I, item n. 5, p. 275-276, onde descreve a sua ideia de igualdade
por compensação, feita por meio da criação de outras desigualdades.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 45-79, abr./jun. 2013
Mas, além disso, tutelar não mais ou não apenas os direitos desses indivíduos
ou grupos de indivíduos, mas as pessoas e como pessoas, assim reconhecidas pela
técnica processual.
Referências
ALCALÁ-ZAMORA Y CASTILLO, Niceto. Causas y efectos sociales del derecho procesal. In: ALCALÁ-
ZAMORA Y CASTILLO, Niceto. Estudios de teoría general e historia del proceso. Ciudad de México:
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ALCALÁ-ZAMORA Y CASTILLO, Niceto. Liberalismo y autoritarismo en el proceso. In: ALCALÁ-ZAMORA
Y CASTILLO, Niceto. Estudios de teoría general e historia del proceso. Ciudad de México: UNAM, 1974.
ALMEIDA, Gregório Assagra de. Direito processual coletivo brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2003.
ALVARADO VELLOSO, Adolfo. Garantismo procesal contra actuación judicial de oficio. Valencia: Tirant
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BÖHN, Peter. Processo civile e ideologia nello stato nazisocialista. Rivista Trimestrale de Diritto e
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BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Em busca de um conceito fugidio: o ativismo judicial. In: FELLET,
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R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 81-104, abr./jun. 2013
I Introdução
Os homens sempre viveram sob a égide de um ordenamento que os per-
mitisse viver em sociedade, desde que tornaram-se sedentários. Foi esse ordena-
mento natural que, positivado, deu origem aos códigos e às leis.
Entretanto, surgiu no mundo moderno, pós-guerra, uma nova “ciência” cha-
mada Teoria da Argumentação Jurídica que, aos poucos, mostrava ao povo que
não era possível conceber Direito sem moral. Mais do que isso, os expoentes mais
notórios dessa teoria, citados e parafraseados neste texto, comprovam que é jus-
tamente na moral que reside a justificação da vontade do legislador. Isto quer dizer
que não poderíamos considerar Direito uma lei injusta, que não fosse passível de
justificação através da moral.
O modelo processualista cível não poderia admitir, per se, critérios de cor-
reção e validade, principalmente por agir na esfera privada. No entanto, todas
as relações jurídicas passaram por uma referida constitucionalização, tornando
possível a aplicação desses critérios para que houvesse a validação das normas no
sentido de conferir se elas de fato surtiam eficácia social.
1
SÓFOCLES. Antígona. Tradução de Lawrence Flores Pereira. Rio de Janeiro: TopBooks, 2006.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 81-104, abr./jun. 2013
2
Revolução Francesa é o nome dado ao conjunto de acontecimentos que, entre 05 de maio de
1789 e 09 de novembro de 1799, alteraram o quadro político e social da França. Ela começa com
a convocação dos Estados Gerais e a Queda da Bastilha e se encerra com o golpe de estado do 18
de brumário de Napoleão Bonaparte. Em causa estavam o Antigo Regime (Ancien Régime) e os
privilégios do clero e da nobreza. Foi influenciada pelos ideais do Iluminismo e da Independência
Americana (1776). Está entre as maiores revoluções da história da humanidade. A Revolução é
considerada como o acontecimento que deu início à Idade Contemporânea. Aboliu a servidão e
os direitos feudais e proclamou os princípios universais de “Liberdade, Igualdade e Fraternidade”
(Liberté, Egalité, Fraternité), frase de autoria de Jean-Jacques Rousseau. Para a França, abriu-se em
1789 o longo período de convulsões políticas do século XIX, fazendo-a passar por várias repúbli-
cas, uma ditadura, uma monarquia constitucional e dois impérios.
3
A escola da exegese, também conhecida como Escola filológica, em direito, é uma corrente de pen-
samento jurídico que floresceu no início do século XIX, a partir do Código Napoleônico. A escola da
exegese confirma que a interpretação deve ser mecânica, de acordo com a intenção do legislador.
4
REALE, Miguel. Filosofia do direito. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1965.
5
KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. São Paulo: Martins Fontes, 2000. p. 181.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 81-104, abr./jun. 2013
O conflito entre justiça e certeza jurídica pode ser bem resolvido do seguinte
modo: o direito positivo, assegurado pela legislação e pelo poder, tem priori-
dade mesmo quando o seu conteúdo é injusto e não beneficiar as pessoas, a
menos que o conflito entre a lei e a justiça chegue a um grau intolerável em
que a lei, como uma “lei defeituosa”, deva clamar por justiça.
6
RADBRUCH, G. Introducción a la ciencia del derecho, p. 34.
7
La moral del derecho. México: F. Trillas, 1967. p. 123. Original inglês de 1964.
8
Direito e democracia: entre faticidade e validade. Tradução de Flávio Beno Siebeneichler. 2. ed. Rio
de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003a. v. 1.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 81-104, abr./jun. 2013
9
HECK, Luís Afonso (Org.). Direito natural, direito positivo, direito discursivo. Porto Alegre: Livr. do
Advogado, 2010. p. 118.
10
De la vocación de nuestra época para la legislación y la ciencia. Madrid: Aguilar, 1970. p. 64.
11
Um caso difícil é aquele que ocorre quando os fatos e normas relevantes permitem mais de uma
solução (antinomia); dois ou mais princípios colidem; não existe nenhuma norma aplicável (ano-
mia – lacuna), ou mesmo que exista a norma, e seja clara, seja injusta; e, finalmente, um caso é
difícil quando mesmo que exista um precedente judicial, considere-se necessário modificar.
12
Aristóteles chamava topoi ou “lugares comuns” a algumas verdades aceites que orientam os nos-
sos argumentos e as escolhas do dia a dia. Apesar de tudo, tais verdades podiam ser discutidas. Um
exemplo é a ideia de que se deve preferir um bem mais duradouro àquele que é menos duradouro.
13
Segundo Mello, “Discricionariedade é a margem de liberdade que remanesça ao administrador
para eleger, segundo critérios consistentes de razoabiildade, um, dentre pelo menos dois com-
portamentos cabíveis, perante cada caso concreto, a fim de cumprir o dever de adotar a solução
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 81-104, abr./jun. 2013
modo correto, e sem abusos, ele fará uma conexão contingente entre Direito e
moral através da razão prática.
Um Estado puramente coator e totalitário não se importaria com a moral
do seu povo, e é nesse ponto que não haveria interesse da união de Direito e
moral. Um Estado sem fim social, priorizando o Direito patrimonial, é aquele que
quer desagregar a moral do direito. No exemplo do antepenúltimo parágrafo, a
vida sexual privada do casal não poderia ser posta em juízo, mesmo que um dos
cônjuges sofresse abuso constante, o que valeria era a “fama” destes perante a
sociedade. Ficaria, portanto, prejudicado o fim social do Estado (que hodierna-
mente é garantia Constitucional) e a pretensão de correção (validade) que deve
ser incessantemente buscada, a fim da eficácia social mostrada na aceitação das
leis pelos destinatários das normas.
A relação existente entre direito e moral pode definir-se, desde a perspectiva
habermasiana, como um entrelaçamento complementar — uma vez que a moral
é necessária como critério justificador no sentido de dar eficácia social às normas.
Não há resquício de subordinação hierárquica do Direito a respeito da moral, mas
sim uma comum participação na razão prática. Migra, portanto, a moral, ao inte-
rior do Direito, mas sem prender-se no Direito positivo. Dessa maneira, na medida
em que as normas jurídicas — que definem e organizam as regras do jugo coleti-
vo — permitem limitar a insegurança, a anarquia e o recurso à força, o direito se
aproxima de alguma maneira à moral.
Relendo-se a obra de Kant, notamos que a definição do Direito por ele ofe-
recida opera no campo do imperativo categórico e da regra moral, e harmonizava
as liberdades individuais e viabilizava a vida na sociedade civil, enquanto sua falta
privava o homem de sua liberdade. No fim das contas, a teoria do imperativo cate-
górico tentava explicar de um modo convincente para a razão a possibilidade do
dever e do ser sempre extraídos da lei. O Direito, portanto, em seus fundamentos
e em suas premissas normativas, relaciona-se intimamente com a ética, o que
conduz à superação do positivismo. Robert Alexy, pondo em foco essa discus-
são, de mais de dois mil anos, relembra o caso de Alcebíades, que, dirigindo-se
a Péricles, pergunta-lhe se a lei de um tirano que toma o poder usando a força
deve mesmo ser considerada uma lei. Se a lei é injusta ou imoral, ela não é Direito.
Desde o começo da existência do Direito, o gérmen da ideia dos direitos humanos
mais adequada à satisfação da finalidade legal, quando, por força da fluidez das expressões da lei
ou da liberdade conferida no mandamento, dela não se possa extrair objetivamente, uma solu-
ção unívoca para a situação vertente”.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 81-104, abr./jun. 2013
14
Ibid.
15
Desobediência civil é uma forma de protesto a um poder político (seja o Estado ou não), geralmente
visto como opressor pelos desobedientes. É um conceito formulado originalmente por Henry David
Thoreau e aplicado com sucesso por Mahatma Gandhi no processo de independência da Índia e
do Paquistão. É uma das formas de expressão do Direito de Resistência, sendo esta uma espécie de
Direito de Exceção que, embora tenha cunho jurídico, não necessita de leis para garanti-lo, uma vez
que se trata de um meio de garantir outros direitos básicos. Ele tem lugar quando as instituições
públicas não estão cumprindo seu fiel papel e quando não existem outros remédios legais possíveis
que garantam o exercício de direitos naturais, como a vida, a liberdade e a integridade física.
16
A Filosofia do Direito é o campo de investigação filosófica que tem por objeto o Direito. Ela pode
ser definida como o conjunto de respostas à pergunta “o que é o direito?”, ou ainda como o enten-
dimento da natureza e do contexto do empreendimento jurídico.
17
MAcCORMICK, Neil. Coherence in Legal Justification. In: KRAWIETZ, E. et al. (Ed.). Theorie der
Normen: Festgabe für Ota Weinberger Zum 65. Geburtstag. Berlín: Duncker und Humblot, 1984.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 81-104, abr./jun. 2013
O Terceiro Reich Nazista tinha leis próprias, que embora esdrúxulas, eram
plenamente cumpridas pelos soldados e parte da população, aliás, mais do que
cumpridas, eram exaltadas. Na época, plasmava-se que “a vontade do Führer e a
lei são a mesma coisa” e Adolf Hitler declarou-se aos promotores prussianos “juiz
supremo do povo alemão”. Possuía ele, entre outros poderes, o “direito” de revogar
processos criminais e de suspender os direitos civis. Com esses poderes, iniciou a
política de segregação racial.18 O comissário de Justiça e Líder Jurídico do Reich
assim disse aos juristas em 1936:
18
COTRIM, Gilberto. História global Brasil e geral. São Paulo: Saraiva. Volume único.
19
Colour of War (As Cores da Guerra). Documentário com vídeos em cores da Segunda Guerra
Mundial e relatos de soldados e civis. Apresentado na TV Escola. 2009.
20
PEDRO, Antonio; CÁCERES, Florival. História geral. São Paulo: Moderna. (Série Sinopse).
21
ALEXY, Robert. Constitucionalismo discursivo. Porto Alegre: Livr. do Advogado, 2010. p. 32.
22
Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes [...]
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 81-104, abr./jun. 2013
23
GOLDMAN, L. Ciências humanas e filosofia. São Paulo: Ed. Difel, 1968. p. 27-70.
24
HECK, Luís Afonso. Jurisdição constitucional e legislação pertinente no direito comparado. Porto
Alegre: Livr. do Advogado, 2006. p. 124-126.
25
PERELMAN, Chain. Tratado da argumentação: a nova retórica. Tradução de Maria Ermantina de
Almeida Prado Galvão. Revisão da tradução Eduardo Brandão. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes,
2005b. (Justiça e Direito).
26
HABERMAS, Jurgen. Direito e democracia: entre faticidade e validade. 2. ed. Tradução de Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003a. v. 1, p. 138.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 81-104, abr./jun. 2013
Robert Alexy, em seu livro Teoria dos direitos fundamentais, pondera que
regras e princípios são reunidos sob o conceito de norma, eis que ambos pres-
crevem o dever-ser: são eles expressões básicas do dever, da permissão e da proi-
bição. Dessa maneira, entende ele, ser a distinção entre regras e princípios uma
“distinção entre duas espécies de norma”.29
A Constituição e os demais códigos brasileiros começaram a ser vistos como
sistemas abertos30 de princípios e regras, onde as ideias de justiça e de realização
dos direitos fundamentais passam a ser os maiores anseios a serem alcançados —
as regras têm apenas função instrumental, com objetivo de dar segurança jurídica
ao sistema. De outra banda, os princípios, por trazerem normas mais abertas com
essa flexibilidade, oportunizam a realização da justiça ao caso em concreto. Os
27
NAILS, Debra. The People of Plato: a Prosopography of Plato and Other Socratics. [S.l.]: Hackett
Publishing, 2002.
28
CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição. 7. ed. 5. reimpr. Coimbra:
Almedina, 2008. p. 1255.
29
ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Tradução de Ernesto Garzón Valdés. Madrid:
Centro de Estudios Constitucionales, 1993. p. 87.
30
Um conjunto normativo pode ser classificado de duas maneiras: 1. Se o corpo é dotado de ele-
mentos que permitem a flexibilidade e adaptação à riqueza da realidade, são abertos; 2. Se o
sistema fundar-se única e literalmente nas normas, sem admitir interpretações hermenêuticas,
será fechado.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 81-104, abr./jun. 2013
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 81-104, abr./jun. 2013
32
O único problema é que essa mudança institucional não foi acompanhada por um rigor analítico
no julgamento dos casos, para que se possa determinar claramente qual o princípio ou regra foi
utilizado (holding ou ratio decidiendi), diferenciando de considerações feitas pelos julgadores que
não são necessárias para a decisão tomada (ober dicta), isso sem falar na necessidade de expor a
razão que levou à adoção de um juízo racional para que se crie uma exceção à regra geral fixada
por um precedente, tendo em vista uma nova circunstância fática (distinguish).
33
ALEXY, Robert. Direito, razão, discurso: estudos para a filosofia do direito. Tradução de Luís Afonso
Heck. Porto Alegre: Livr. do Advogado, 2010. p. 160.
34
Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios
e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos
ou diretamente, nos termos desta Constituição.
35
Ideia desenvolvida inicialmente em conversa informal com o Procurador da Fazenda Nacional Dr.
Daniel Luis Dalberto, especialista em Direito Público.
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Sendo assim, não há como conceber apenas uma resposta correta para os casos
difíceis ou uma solução correta para a solução da lide. Postula Kelsen:
Dizer que uma sentença judicial é fundada na lei, não significa, na ver-
dade, senão que ela se contém dentro da moldura ou quadro que a lei
representa — não significa que ela é a norma individual, mas apenas que
é uma das normas individuais que podem ser produzidas dentro da mol-
dura da norma geral.36
Pontifica Hart:
O poder discricionário que assim lhe é deixado pela linguagem pode ser
muito amplo; de tal forma que, se ela aplicar a regra, a conclusão constitui
na verdade uma escolha, ainda que não possa ser arbitrária ou irracional.
A pessoa opta por acrescentar a uma série de casos um caso novo, por
causa das semelhanças que podem ser consideradas, quer como juridi-
camente relevantes, quer como suficientemente próximas. No caso das
regras jurídicas, os critérios de relevância e de proximidade da semelhança
dependem de fatores muito complexos, que atravessam o sistema jurídico
ou intenção que possam ser atribuídos à regra.37
36
KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. São Paulo: Martins Fontes, 2000. p. 391.
37
HART, H. L. A. El concepto de derecho. Tradução de Genaro R. Carrió. Buenos Aires: Abeledo-Perrot,
1992. p. 140.
38
POSNER, Richard. Law, Pragmatism and Democracy. Cambridge: Havard University Press, 2004. p. 459.
39
SCHUARTZ, Luís Fernando. Poder Econômico e abuso do poder econômico no direito de defesa
da concorrência brasileiro. Revista de Direito Mercantil, São Paulo, n. 94, p. 130, 1994.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 81-104, abr./jun. 2013
40
MATILDE FERREIRA, D. La buena fe, el principio general en el derecho civil. Madrid: Monte Carlo,
1985. p. 292-293.
41
A boa-fé subjetiva revela-se ora numa dimensão psicológica, ora em uma ética. Na dimensão psi-
cológica há um desconhecimento da situação fática, por ignorância ou por erro de juízo, Fernando
Noronha adverte que [...] ou a pessoa ignora os fatos reais, desde que sem incorrer em erro crasso,
e está de boa-fé, ou não ignora, e está de má-fé. Mesmo quando ela ignore com culpa, continuará
de boa-fé, a menos que se trate de ignorância grosseira, caracterizando culpa grave (O direito dos
contratos e seus princípios fundamentais: autonomia privada, boa-fé, justiça contratual. São Paulo:
Saraiva, 1994. p. 133). Na dimensão ética, a boa-fé do agente revela-se na convicção da prática de
ato legítimo isento de qualquer prejuízo ou dano ao outro; contudo, equivoca-se — sendo seu
erro desculpável —, aí implica-se uma valoração ética da conduta social do agente presumida-
mente de boa-fé, sendo subjacente o agir com cautela e diligência. A verificação da boa-fé, então,
tem por paradigma a cautela e diligência que as pessoas têm no trato de seus negócios.
42
Leciona o prof. Miguel Reale: “[...] a boa-fé objetiva se apresenta como uma exigência de lealdade,
modelo objetivo de conduta, arquétipo social pelo qual impõe o poder-dever de que cada pessoa
ajuste a própria conduta a esse arquétipo, obrando como obraria uma pessoa honesta, proba e leal”
(A boa-fé objetiva. Estado de S. Paulo, 16 ago. 2003. Espaço Aberto, p. A2. Arquivo pessoal de notas).
43
O paradigma da boa-fé objetiva implica: “[...] uma atuação ‘refletida’, pensando no outro, no par-
ceiro contratual, respeitando-o, respeitando seus interesses legítimos, suas expectativas razoáveis,
seus direitos, agindo com lealdade, sem abuso, sem obstrução, sem causar lesão ou desvantagem
excessiva, cooperando para atingir o bom fim das obrigações: o cumprimento contratual e a rea-
lização dos interesses das partes” (LIMA, F. A. P. de; VARELA, J. de M. A. Código Civil anotado. 3. ed.
Coimbra: Coimbra Ed., 1986. v. 2, p. 3).
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BUONA FEDE. In: ROMANO, Santi. Enciclopedia del diritto. Milano: Giuffrè Editore, 1959. t. V, p. 683-684.
44
Cf., dispositivos normativos suprarreferidos, mais, STJ – Resp. nº 276025/SP, JBCC 189/361, DJ, 12 mar.
45
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O professor Menezes Cordeiro leciona que a confiança “exprime a situação em que uma pessoa adere,
46
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47
Artigo 151 do Código Civil de 1916.
48
O adimplemento voluntário de negócio anulável implica em extinção de todas as ações ou exce-
ções que acaso dispusesse o devedor, pois esse opta por seguir certa conduta e não lhe é lícito,
posteriormente, surpreender a outra parte com tal mudança.
49
O exemplo usual é o de demandar por dívida já paga. Assim, determina o Código Civil que aquele
que demanda por dívida já paga fica obrigado a pagar ao devedor o dobro do que houver cobrado
(artigo 940 do Código Civil de 2002). É verdadeiro desdobramento do princípio do dolo agit, pois
pune o credor que propõe demanda contra o devedor por puro espírito de emulação, já que nada
mais tinha a receber.
50
BENATTI, F. A responsabilidade pré-contratual. Trad. A. V. Jardim e Miguel Caeiro. Coimbra: Almedina,
1970. p. 78.
51
Deriva de Tu quoque, Brute, fili mi? Até tu, Bruto, meu filho?, pronunciada por Julio César ao ser
assassinado em 44 a.C. (FERREIRA DA SILVA, C. W. M. Dicionário de expressões latinas. Porto Alegre:
SECOVI/AGADE, 2005. p. 188).
52
Se a parte não executou a sua prestação no contrato sinalagmático, não poderá exigir da outra
parte a contraprestação. Como poderia o inadimplente exigir da outra parte o cumprimento da
contraprestação se não prestou? Não poderá invocar a regra que descumpriu em seu benefício.
53
Francesco Messineo adverte que a justiça contratual determina que o contrato não deve destruir
o equilíbrio existente previamente entre os patrimônios dos contratantes, logo, cada uma das
partes deve receber o eqüipolente daquilo que haja dado (DIRITTO PRIVATO: TEORIA GENERALE.
In: Enciclopedia del diritto. Milano: Giuffrè, 1961. v. IX, p. 805). Jacques Ghestin, portanto, deduz
que, ao permitir a satisfação das necessidades dos contratantes, o contrato não pode afastar-se
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característica de cláusula geral acolhida pelo Código Civil de 2002. Por este motivo,
ao interpretar a lei ou o contrato de acordo com a boa-fé, o intérprete estará sem-
pre na busca da concretização ética das relações jurídicas, aplicando-se a norma
(princípios e regras) ao caso concreto, no sentido que melhor atenda à justiça
naquela determinada hipótese.54
dos ideais de uma justiça comutativa (cf. L’utile et le juste dans les contrats. Archives de Philosophie
du Droit, Paris, n. 26, p. 47, 1981) dado que a incidência do princípio operará na relação contratual
em que uma das partes, por ser mais poderosa, possa impor seu conteúdo à outra, sendo irrele-
vante a natureza profissional ou não de seus partícipes (Op. cit., p. 48).
54
Pode-se afirmar que razões de boa-fé permitiriam que, excepcionalmente, o intérprete afastasse
a aplicação do texto frio da lei, construindo “o direito do caso”, atente-se, contudo, que esta cons-
trução na realidade é revelação do direito que se tira das relações inter-humanas dadas num crono-
topos determinado, já que o direito é um produto cultural que se atualiza permanentemente.
55
SILVA, Ovídio Araújo Baptista da. Comentários ao Código de Processo Civil: arts. 1º a 100. 2. ed. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 105.
56
É conhecido o momento retórico da decisão judicial: a sentença. Sua condição fundante está na
Constituição Federal, e está enucleada na lei processual no que trata da necessidade de indicação
dos motivos de fato e de direito que deram origem à decisão. Aí está, então, fixado o estigma (do
grego stigma, “picadura”, isto é, marca ou sinal no corpo — metaforicamente, a sentença “marca”
o corpo do juiz) do decidere, pois, ao se fazer a “picadura” o juiz analisando o conteúdo dos autos
“opta” (escolhe uma [ou duas, ou ...] entre varias possibilidades) por uma versão de resultado in-
terpretado, portanto, de conteúdo exegético (que, antes de tudo, é “relato”), que sua aculturação,
sua educação (no sentido mais amplo) e seus preconceitos lhe possibilitaram fazer... “fazendo”.
Por isso se lhe exige que “faça explícito” (daí, explicitar) em sua “mediação” (no sentido de inter-
por-se nos fatos contidos no processo) como ocorreram os fatos e desta forma como foi conduzida
à conclusão com a construção do incidere da norma jurídica aplicável ao caso. Em assim não sen-
do, emergem as condições para a manifestação das “nulidades”, excetuando-se as cargas subjeti-
vas, caso em que o decisum por déficit não se lhe adere por iniquidade, por isso mesmo, todas as
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decisões judiciais são aparatadas de requisitos semántico-lingüísticos para elidir eventual déficit.
Isto tudo garante que a “verdade” contida no processo, de “verdade” infunde pouco valor. Com o
que concordamos, em parte, com Carnelutti e em parte, com Jacinto Nelson de Miranda Coutinho
em seu artigo “Glosas ao “verdade, dúvida e certeza”, de Francesco Carnelutti para os operadores
do direito” (In: RUBIO, David Sánchez et al. (Coord.). Anuário ibero-americano de direitos humanos
(2001/2002). Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002. p. 173-197). Não se pode falar de “verdade”, ou
mesmo de um “acordo de verdades”, contudo, rogata venia, não se pode falar de “certeza” como
escolha (como o faz Carnelutti). Todo o mecanismo utilizado no processo (processando...): os tes-
temunhos, interrogatórios, periciais e demais sememas jurídicos que vão induzir a decisão em si
mesma, traz implícita a semente da incerteza, do desparamento de juízos que vão dar lugar a
outros preconceitos detidos na sentencia; daí o “nullus” da verdade processual. Agora bem, se a
captura da “verdade” no processo é impossível, certamente, por conclusão simétrica, a negativa
de “justiça” é consequência. Logo é possível entender “justiça” (não como “poder” ou “instituição”)
mas como uma “câmara de compensação” (a semelhança de uma “clearing house”) onde os direi-
tos e os deveres, as pretensões e as exceções são os títulos (compensáveis). Daí ser importante ter
presente que a “verdade” (“inalcançável”) não pode ser atingida pelo processo; contudo, cuidado!
— isso não faz com que o processo não contenha “verdade”. Ele, o processo, é “verdade” no estrito
sentido de “conformidade das coisas com o conceito que delas forma a mente”. E aí, tem sede a
verossimilitude fática da sentença que formalmente atendeu os preceitos jurídicos e também os
transubjetivos acaso incidentes. Essa especial forma de “verdade” — o verossímil, que é um adje-
tivo que não repugna à verdade, que tem aparência de verdadeiro se mostra inteiro mas, oculta
seus determinantes, sua eficácia está na ilusão que provoca e na virtualidade que estabelece.
Agora, sobre a certeza (que trata Carnelutti), rogata maxima venia, não encontramos a raiz do
substantivo certeza (derivado do latim certu), no “cernere” latino, daí derivou o verbo em castelhano:
cerner (também cernir, mas pouco utilizado), que é, basicamente, separar; em português também
temos o verbo “cernir” e que também, expressa separar, até mesmo o latino cernere significa sepa-
rar (este separar é intencionado ao separar com a peneira a farinha do farelo, ou qualquer outra
matéria reduzida a pó, de sorte que o mais grosso fique sobre a tela, e o sutil caia no lugar desti-
nado para recolhê-lo. Em português temos o instrumento: a “cernideira” que é uma peça de ma-
deira sobre a qual se movem as peneiras da harina, na operação de peneirar). Seu uso transliterado
implica em atalaiar, observar, examinar. O mesmo do “discernir” (do latim discernere): isto é, distin-
guir uma coisa de outra, assinalando a diferença que há entre elas. O que é “separar” também.
Portanto, não podemos concordar que “certeza”, que implica uma significação distinta de “cernir”
ou “discernir”, significando claramente “o conhecimento seguro e claro de alguma coisa”, tenha
algo a ver com o significante: “escolher” (do latim ex e colligere). Certo que em sucessivas transli-
terações se pode agregar sentido denotando alguns significantes: assim, cernere, ao “separar”,
vale dizer, ao considerar isoladamente coisas que estavam juntas ou fundidas, a operação lógica
determina o plus da escolha, mas aí o ato é posterius. Portanto, o substantivo “certeza” emergente
do adjetivo “certo” proveniente do latim “certus” (conhecido como verdadeiro, seguro, indubitá-
vel) implica o significado de forma de assentimento decorrente de conhecimento que pode ser
demonstrado, o que é evidente, sendo, portanto, objetiva e subjetivamente suficiente. A “esco-
lha” está em “posteridade” frente a “certeza” que é prius, portanto, a “certeza” não “escolhe”, quando
muito “colhe”. “Colher” está no mundo dos fatos (asir, no sentido de agarrar, pegar; prender; empu-
nhar); já “escolher” está no mundo da cultura e é resultado de uma “ação intencional” de variante
extensiva, denota nossa participação volitiva num ato de querer um resultado de conteúdo inten-
sivo. O decisum então não deverá ser obtido por uma “certeza” que “escolhe”, ou por uma escolha
(certa) deliberada. Há uma presunção de certeza, mas não “a” certeza. Pois a bem da “verdade” (a
verdade do sujeito que pensa a verdade como coimplicação do “ser” no “deber-ser”, isto é, “ser-
sendo-ser-devido”), por chaves interiores, inconsciente, o resultado eventualmente foi obtido por
manipulações probatórias ou por exercícios aprovantes de matriz meramente virtual, ou por vício
no momento da interpretação do direito a ser aplicado, o que aniquilaria com qualquer certeza,
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alemão Gadamer57 advoga que “na verdade, há muitas formas de se ter certeza.
O modo de certeza proporcionada por uma certificação alcançada por meio da
ou não (?). O resultado pode haver sido obtido por uma clara manifestação idiossincrásica ou
ideológica vinculantes de estados inconscientes produtores de fantasias que intentam juridicida-
de. As contradições das sentenças são o resultado das contradições humanas, estão imersas e
saturadas do humano humanizante. Daí, a “verdade” que contém, nada mais reflete que uma ra-
zão de verossimilitude fática; tão só verossimilitude, vale dizer, probabilidade de certeza, ou com
aparência de verdadeiro. E aqui se estabelece, em nosso sentir, um dos maiores problemas ético-
políticos no âmbito do direito: a indeterminação do erro nas sentenças judiciais, ao par com a
contingência dos órgãos estatais de jurisdição. A indeterminação e a contingência andam de
mãos dadas. Produzem incertezas e estão na base de todas as “teorías dos recursos judiciais”. São
por vezes invisíveis, mas eficazes. Estão implicadas nas contradições que o sistema normativo
social de vinculação compulsória estabelece àqueles neles inseridos. Estão no religioso, no esté-
tico, na moral, no jurídico, no político ou no económico, até mesmo na ciência. Não têm rosto mas
deixam sua “pegada” (ou vestígio) indelével naqueles marcados por elas, geralmente os despos-
suídos de toda sorte. Logo, as razões da propalada neutralidade e da proclamada “verdade” for-
mal (subjacente à “verdade” real) não podem ser tratados senão no contexto das contradições
que uma sentença possa encerrar. Por isso podem estar consteladas no erro e dele irradiar seus
efeitos (sub)vertendo a própria razão de ser da tutela jurídica a que se comprometeu o Estado de
Direito. Contudo, não olvidemos que, parafraseando Pontes de Miranda, se pode entender a sen-
tença como prestação do Estado, em virtude da obrigação assumida na relação jurídica proces-
sual (processo), quando a parte ou as partes vieram ao juízo, isto é, exerceram a pretensão à tutela
jurídica, tal explicação científica da necesitas cognocendi et judicandi satisfaz as exigências práti-
cas e teóricas. A toda evidencia, como discorre o pensamento pontiano, não se podendo saber
quem tem razão antes de proceder, in casu, a situação humana impõe que se fragmentasse o di-
reito material e o direito processual (formal), a que correspondem a pretensão e a ação de direito
material, de um lado, e, de outro, a pretensão de direito público, pré-processual, e a “ação”. O
Estado não rendeu-se à sua infalibilidade no julgar a ponto de fazer passar a coisa julgada mate-
rial como a incidência mesma da lei, nem as suas sentenças, todas, como sentenças justas. Há
concepções idealistas do Estado; ele, contudo, não é idealista, porque ele é fato, simplesmente
fato. O processo é todo encadeado para se chegar a seu fim: a sentença com a eficácia que lhe
agregue a natureza da ação e das circunstancias do processo. Cuidado! Não é o juiz que lhe con-
fere a eficácia segundo queira; é o direito processual, segundo a sua concepção da questão e da
sentença. Pontes de Miranda vai advertir que efeitos anexos e reflexos, que acaso tenham a sen-
tença, também dependem do que se passou; mas não seriam previsíveis pelos que só observas-
sem de dentro do processo e do interior da sentença. São efeitos que não são próprios e necessários
da sentença, posto que ela, dadas certas circunstâncias exteriores, os tenha de produzir. São efei-
tos que se vêm mirando-se do lado de fora para lá da sentença. Quando o juiz entregou a presta-
ção jurisdicional não os via, necessariamente, como poderia (pre-)ver a coisa julgada formal, a
coisa julgada material, a força ou o efeito constitutivo, a força ou efeito condenatório, a força ou
efeito mandamental, a força ou efeito executivo (cf. PONTES DE MIRANDA, F. C. Tratado das ações,
t. I, §33). Esta é uma visão cartesiana e empirista. É uma postura que o processo como instrumen-
to exige, reclama! Mas, não afasta a visão crítica (!), nem impede a desconstrução das decisões
judiciais frente a realidade em que se constitui o direito na sociedade pós-moderna. Daí, a cons-
cientização dos magistrados é importante frente a certo “daltonismo” emergente de (in)determi-
nadas convicções que distanciam, iníqua e falaciosamente o juízo em relação com o verosímil dos
fatos trazidos ao julgamento.
57
GADAMER, Hans-Georg. Verdade e método I. Tradução de Flavio Paulo Meurer. Revisão da tradu-
ção por Enio Paulo Giachini e Márcia Sá Cavalcante Schuback. 5. ed. Rio de Janeiro: Vozes, 2003.
p. 321.
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58
DESCARTES, René. Discurso do método. Tradução de Elza Moreira Marcelina. Brasília: EdUnb; São
Paulo: Ática, 1989. p. 37.
59
GADAMER, Hans-Georg. O problema da consciência histórica. Tradução de Paulo César Duque
Estrada. 2. ed. Rio de Janeiro: Fundação Getulio Vargas, 2003. p. 35.
60
RIBEIRO, Darci Guimarães. O sobreprincípio da boa-fé processual como decorrência do compor-
tamento da parte em juízo. In: ROCHA, Leonel Severo Rocha; STRECK, Lenio Luiz (Org.). Anuário
do Programa de Pós Graduação em Direito da Universidade do Vale do Rio dos Sinos. São Leopoldo,
2003. p. 80.
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IX Conclusão
No campo processual, só a análise dos fatos levaria à verdade. Mas quais
fatos seriam realmente verdadeiros, e não falsos?
A verdade processual nada mais é que a mescla entre a verdade processual,
os fatos e os acontecimentos comprovados, e uma nova verdade filosófica ligada
à linguagem e à argumentação, à narrativa, à subjetividade e ao convencimento
do Magistrado em relação aos fatos. Com as novas teorias retóricas, surge a neces-
sidade de uma norma que obrigasse os litigantes a trazer à lide tanto a verdade
processual quando a verdade real, mesmo que contrapostas. Significava dizer,
mais ainda, que o juiz teria o dever de buscar o esclarecimento dos autos, indo
além do proposto pelas partes.
No entanto, sabe-se que o papel do magistrado não é o mesmo de um pe-
rito que busca provas e confirma sua veracidade. Ao contrário, ele tem o dever
legal de, através da demonstração das partes e das provas por elas apresentadas,
decidir qual é a verdade processual.
O juiz, desde sempre, agia estritamente fundamentado pela legalidade. No
entanto, por muitas vezes, embora o magistrado soubesse da inverdade das pro-
vas apresentadas, ele obrigava-se a julgar estritamente com base nelas. Os autos
dos processos eram eivados de vícios, perdendo-se a verdade nas entrelinhas de
falsos testemunhos, perícias inexperientes e depoimentos falsos. Dessa forma,
a convicção do juiz, baseada estritamente na legitimidade pela legalidade, aca-
bava decidindo pela sentença injusta, mas legal. Com a insurgência da teoria da
argumentação jurídica e do sistema de regras e princípios, a moral começou a ser
abarcada pelo Direito Processual. Isso queria dizer, de modo geral, que o proce-
dimentalismo processual não poderia produzir eficácia jurídica se não agisse de
acordo com a moral da sociedade na qual viviam os destinatários da norma.
O Direito Processual passou por um longo trajeto em que começou, aos
poucos, a aceitar que só era eivada de correção e validade jurídica a verdade real.
E a verdade real só poderia ser provada se o Direito abarcasse a moral, eis que a
“honestidade” é um princípio moral, e não regra positivada.
No entanto, aos poucos, com o receito típico da magistratura pátria, aca-
bou-se por positivar o dever de agir moralmente frente o processo civil. E isso não
foi feito de uma hora para outra, ao contrário, somente depois da emergência
das garantias fundamentais de eficácia mundial o legislador pátrio começou a
indagar-se se códigos puramente patrimonialistas surtiriam efeito numa sociedade
pós-moderna na qual os direitos sociais dos homens passaram a sobrepor-se aos
direitos privados.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 81-104, abr./jun. 2013
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puro respeito à lei não garante a racionalidade da decisão, a uma pois pode ser a
norma irracional sua origem e a duas, porque o efeito que causa é o desequilíbrio
social. Entretanto, quando princípios são positivados na forma de normas, mais
ainda eles têm sua eficácia e segurança jurídica garantidas.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 81-104, abr./jun. 2013
Mauro Simonassi
Mestre em Direito Público, Estado e Cidadania
pela Universidade Gama Filho/RJ. Professor de Direito
Processual Civil na Faculdade de Direito de Ipatinga (FADIPA).
Juiz de Direito da Comarca de Ipatinga/MG.
Resumo: O presente estudo tem por objetivo proceder a uma análise das tu-
telas de urgência e de evidência no sistema no novo Código de Processo Civil
que se encontra em trâmite no Congresso Nacional (Projeto nº 8.046/2010),
fazendo-se um paralelo, em alguns pontos, com o Código de Processo Civil
vigente.
1 Introdução
Não se ignora que, a cada dia, se criem mecanismos legais para agilidade no
julgamento da demanda, a ponto de se inserir a brevidade da duração do processo,
o que implica em celeridade, como garantia fundamental, segundo a regra inscrita
no art. 5º, inciso LXXVIII, da Constituição Federal, introduzido com EC nº 45/2004,
que instituiu a chamada reforma do Judiciário.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 105-125, abr./jun. 2013
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 105-125, abr./jun. 2013
1
Nesse sentido, vide lição de José Roberto dos Santos Bedaque: Tutela cautelar e tutela antecipada:
tutelas sumárias e de urgências: (tentativa de sistematização), p. 32-33.
2
CARNELUTTI. Instituições de processo civil, v. 1, p. 205-206.
3
MARINONI. Tutela cautelar e tutela antecipatória, p. 44.
4
PONTES DE MIRANDA. Tratado das ações, v. 6, p. 360.
5
BEDAQUE. Tutela cautelar e tutela antecipada: tutelas sumárias e de urgências: (tentativa de siste-
matização), p. 296.
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6
Alexandre Câmara, ao se referir à natureza da decisão que concede reintegração ou manutenção limi-
nar, assim arremata: “Trata-se de tutela antecipada” (CÂMARA. Lições de direito processual civil, p. 346).
7
Na Alemanha, a Lei de 27.07.2001, que entrou em vigor em 1º.01.2002, veio para reformar o
Código de Processo Civil Alemão (ZPO) de 1876, que entrara em vigor em 1º.10.1879, conforme
anota José Carlos Barbosa Moreira em comentário breve sobre a reforma processual civil alemã
[Temas de direito processual: (oitava série), p. 199].
8
A Itália também passou por reforma processual na década de 1990, conforme registra José Carlos
Barbosa Moreira [Temas de direito processual: (oitava série), p. 200].
9
Portugal passou por reformas na década de 1990, sendo as duas principais as do DL 329-A/95, de 12
de dezembro, e do DL 180/96, de 25 de setembro. Houve ainda a reforma do DL 183/2000, de 10 de
agosto, e, a última, a reforma dos DL 38/2003, de 08 de março, e DL 199/2003, de 10 de setembro,
principalmente o primeiro, que alteraram substancialmente o processo de execução.
10
MEDINA; ARAÚJO; GAJARDONI. Procedimentos cautelares e especiais: antecipação de tutela, juris-
dição voluntária, ações coletivas e constitucionais, v. 4, p. 32.
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11
CAMBI. Neoconstitucionalismo e neoprocessualismo. In: DIDIER JR. (Org.). Leituras complementa-
res de processo civil, cap. VII, p. 158.
12
MORELLO, Augusto M. Avances procesales, p. 17.
13
CAPPELLETTI; GARTH. Acesso à justiça, p. 12.
14
MOREIRA, José Carlos Barbosa. Por um processo socialmente efetivo. In: MOREIRA. Temas de direito
processual: (oitava série), p. 15-16.
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Como o Código de Processo Civil italiano ainda não foi alterado, e a sua
realidade normativa não prevê uma tutela antecipatória similar a do di-
reito brasileiro, a doutrina italiana insiste em buscar na base da ação cau-
telar inominada (no art. 700) o fundamento para a tutela antecipatória.
(MARINONI, p. 199)16
15
Como se colhe da redação do art. 381.1, que vai adiante: “1. Sempre que alguém mostre fundado
receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável ao seu direito, pode requerer a
providência conservatória ou antecipatória concretamente adequada a assegurar a efectividade
do direito ameaçado” (BRITO; MESQUITA. Código de Processo Civil anotado, p. 372).
16
MARINONI; ARENHART. Manual do processo de conhecimento, p. 199.
17
FAZZALARI. Instituições de direito processual, p. 245.
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entre a medida cautelar e antecipação da tutela, busca no mesmo art. 700 do CPC
Italiano, deficiente nesse sentido, frise-se, a base para a sustentação desta. Eis o
seu pensar nesse caso:
18
FAZZALARI. Instituições de direito processual, p. 244.
19
Eis a redação do §1º do art. 727 da Ley de Enjuiciamento Civil: “El embargo preventivo de bienes,
para asegurar la ejecución de sentenças de condena a la entrega de cantidades de dinero de fru-
tos, rentas e cosas fungibles computables a metálico por aplicación de precios ciertos” (MORENO.
Ley de enjuiciamento civil y otras normas procesales, p. 304).
20
BEDAQUE. Tutela cautelar e tutela antecipada: tutelas sumárias e de urgências: (tentativa de siste-
matização), p. 44.
21
MARINONI. Tutela cautelar e tutela antecipatória, p. 39.
22
Que não sofreu modificação mesmo com advento da Lei nº 25.488, que entrou em vigência no
dia 20 de maio de 2002, publicada oficialmente em 22 de novembro de 2001.
23
Conforme Marinoni (Tutela cautelar e tutela antecipatória, p. 43).
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 105-125, abr./jun. 2013
José Roberto dos Santos Bedaque demonstrou que tanto a tutela anteci-
pada quanto a tutela cautelar são espécies do gênero chamado “tutela de
urgência”, inexistindo, portanto, qualquer importância prática na distin-
ção rigorosa entre as duas, e que a verdadeira importância reside, então,
na “perfeita identificação do fenômeno”, ou seja, na solução da “angus-
tiante questão do tempo no processo.26
24
BEDAQUE. Tutela cautelar e tutela antecipada: tutelas sumárias e de urgências: (tentativa de
sistematização).
25
Mas não técnico-jurídico, porque sabidamente distintas, mormente quanto ao conteúdo.
26
BONICIO. Proporcionalidade e processo: a garantia constitucional da proporcionalidade, a legiti-
mação do processo civil e o controle das decisões judiciais, p. 90.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 105-125, abr./jun. 2013
Isto porque, no juízo da infância e juventude, nos chamados pedidos de providência, previstos nos
27
arts. 98 e 101 da Lei nº 8.069/90, o juiz pode conceder, até mesmo administrativamente, medida
cautelar ou antecipação da tutela de ofício, em favor do interesse do menor, que se sobrepõe, não
de modo absoluto, como erroneamente se pensa, a outros interesses formais.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 105-125, abr./jun. 2013
28
De modo a se avaliar o nexo de pertinência entre o pedido de tutela de urgência e o pedido da
ação principal, como registra Galeno Lacerda (Comentários ao código de processo civil: Lei n. 5.869,
de 11 de janeiro de 1973: v. 3, t. I: arts. 796 a 812, p. 212)
29
Que mesmo assim não perde o caráter de liminar porque concedido no início do procedimento,
como menciona Humberto Theodoro Junior, invocando Adroaldo Furtado Fabrício, quando assim
se expressa: “Liminar, lexicamente, é um adjetivo que atribui a algum substantivo a qualidade de
inicial, preambular, vale dizer ‘é tudo aquilo que se situa no início, na porta, no limiar’” (THEODORO
JÚNIOR. Curso de direito processual civil, v. 2, p. 659).
30
A ideia de conferir estabilidade aos efeitos das tutelas de urgência vem sendo defendida por Ada
Pellegrini Grinover desde 1977, como lembra José dos Santos Bedaque (BEDAQUE. Estabilização
das tutelas de urgência. In: YARSHELL; MORAES (Org.). Estudos em homenagem à professora Ada
Pellegrini Grinover, p. 660).
31
E se concedida e efetivada a medida sem impugnação, haverá extinção do processo, permane-
cendo a estabilização dos efeitos da medida, consoante a regra do art. 281, §2º, do NCPC que,
nesse caso, comportará recurso de apelação e não agravo de instrumento.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 105-125, abr./jun. 2013
FUX. O novo processo civil. In: FUX (Coord.). O novo processo civil brasileiro: direito em expectativa:
32
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mais existirá, contudo não significa, em momento algum, que as tutelas cautelares
desaparecerão, pelo contrário, são mantidas em sua essência e podem ser conce-
didas tanto incidentalmente quanto no início do processo”.33
A linha de direção do NCPC é a racionalização do processo e economia
processual, para atender ao comando constitucional do art. 5º, inciso LXXVIII, da
Constituição Federal de brevidade da prestação jurisdicional, conquanto a norma
constitucional seja de conceito legal indeterminado, o que obriga o juiz a analisar
o caso concreto para dar efetividade à norma, como observam Nelson Nery Junior
e Rosa Maria de Andrade Nery.34
Esse vetor de orientação implica que a questão procedimental deve ser
flexibilizada35 quando se tem em mira o direito material veiculado através do
processo,36 e pleiteado antecipadamente como garantia processual (tutela cau-
telar), ou como antecipação da pretensão inicial (tutela antecipada), evitando-se
que filigranas procedimentais possam macular a tutela do direito, como assevera
Gustavo de Medeiros Melo, que aplaude o tratamento uniforme dado às tutelas
de urgência do NCPC, tanto em seu aspecto substancial quanto procedimental,
quando diz:
33
SAMPAIO JÚNIOR. Tutelas de urgência no anteprojeto do novo CPC. In: DIDIER JR.; MOUTA;
KLIPPEL (Coord.). O projeto do Novo Código de Processo Civil: estudos em homenagem ao Professor
José de Albuquerque Rocha, p. 266.
34
NERY JÚNIOR; NERY. Constituição Federal comentada e legislação constitucional, p. 140.
35
Como acena Dinamarco em suas Instituições: “Uma das características do processo civil moderno é o
repúdio ao formalismo, mediante a flexibilização das formas e interpretação racional das normas que
as exigem, segundo os objetivos a atingir” (DINAMARCO. Instituições de direito processual civil, p. 57).
36
Não como valor absoluto a ponto de ofender garantias constitucionais básicas, como o devido
processo legal e o contraditório inscritos no art. 5º, incisos LIV e LV, da Constituição Federal, como
direitos fundamentais de cuja emanação decorre do estado Democrático de Direito.
37
MELLO. O regime dos provimentos de urgência no projeto de Lei nº 166/10. In: ROSSI et al. O futuro
do processo civil no Brasil: uma análise crítica ao projeto do novo CPC, p. 238).
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 105-125, abr./jun. 2013
Também será recurso de apelação quando o juiz indeferir de plano a petição inicial que instru-
38
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 105-125, abr./jun. 2013
Desse modo, também não se mostra razoável atrelar, de modo rígido, a medi-
da cautelar ao objeto do processo principal, em curso, ou que vier a ser instaurado
quando preparatória a medida, mesmo porque é da essência da medida cautelar
que a providência pleiteada no processo cautelar difira da pretensão posta no pro-
cesso principal, porquanto, a não ser assim, estar-se-ia diante da antecipação da
tutela e não de medida cautelar.
O que se quer dizer é que se a pretensão é de natureza condenatória, ou
mesmo executiva, a providência cautelar poderá ser de arresto, ou mesmo busca e
apreensão, e até mesmo o sequestro, porque, qualquer que seja o nome, a garantia
de tutela do direito material, que é, afinal, o que se busca proteger mediatamente,
estará assegurada.
39
MARINONI; MITIDIERO. O projeto do Código de Processo civil: crítica e propostas, p. 106.
40
FUX. O novo processo civil. In: FUX (Coord.). O novo processo civil brasileiro: direito em expectativa:
(reflexões acerca do projeto do novo Código de Processo Civil), p. 17.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 105-125, abr./jun. 2013
8 A tutela de evidência
As tutelas de urgências e de evidência foram tratadas no Título IX, Capítulo I
do Livro do NCPC, porquanto, tanto uma quanto a outra são mecanismos a operar
contra os males da morosidade do processo, mormente quando nos tempos atuais
o imediatismo se apresenta como valor quase que absoluto.
Especificamente cuidou o NCPC da tutela de evidência no art. 285, elencando
os casos em que será concedida, independentemente da demonstração do risco de
dano na demora da prestação jurisdicional, prescindindo, portanto, desse clássico
requisito, sempre presentes em tutelas de urgência.
Na verdade o legislador dispensou a necessidade de demonstração do pe-
rigo de dano, como se colhe da redação do art. 278 do NCPC, não porque não
seja exigido para o deferimento da tutela de evidência, mas sim porque o legis-
lador entendeu que está presumido o perigo de dano e, portanto, dispensou a
demonstração da existência.
Nessas hipóteses, também não há que se falar em plausibilidade do direito,
mas da sua constatação imediata diante da pretensão posta em juízo, como men-
ciona José Herval Sampaio Júnior ao conceituar a tutela de evidência, quando
assim se expressa:
Desta forma, podemos conceituar tal tutela como aquela que é dada
após se constatar como o próprio nome diz a evidência do direito ale-
gado, ou seja, não há discussão sobre o direito que se quer vê protegido
imediatamente, logo não se fala em plausibilidade, mas em constatação
de plano do direito alegado.41
SAMPAIO JÚNIOR. Tutelas de urgência no anteprojeto do novo CPC. In: DIDIER JR.; MOUTA;
41
KLIPPEL (Coord.). O projeto do Novo Código de Processo Civil: estudos em homenagem ao Professor
José de Albuquerque Rocha, p. 260.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 105-125, abr./jun. 2013
42
Que fala em decisão interlocutória de mérito proferida em cognição exauriente [COSTA. Tutela de
evidência no projeto do novo CPC: uma análise dos seus pressupostos. In: ROSSI et al. (Coord.). O
futuro do processo civil no Brasil: uma análise crítica ao projeto do novo CPC, p. 174].
43
Não parcial, mas integral de mérito, ter-se-ia operado a cisão do mérito e do processo, conforme
se demonstrará adiante.
44
Esse ponto comportará estudo mais aprofundado em outro estudo específico acerca da sentença
e da chamada decisão interlocutória de mérito.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 105-125, abr./jun. 2013
45
Quando assim orienta: “Já tive oportunidade de criticar o entendimento doutrinário amplamente
majoritário, afirmando que os problemas recursais advindos da mudança legislativa motivaram a
doutrina majoritária a uma interpretação equivocada da lei, tudo para evitar se falar em sentença
parcial de mérito, recorrível por apelação” (NEVES. Manual de direito processual civil, p. 493).
46
Em arremate ao pensamento predominante acerca da decisão interlocutória de mérito, pontifica
Daniel Amorim: “Dessa forma, muito provavelmente pacificar-se-á o entendimento de que, não
colocando fim ao processo ou à fase cognitiva, o ato judicial, ainda que tenha como conteúdo
uma das matérias do art. 269 do CPC, será considerado uma decisão interlocutória recorrível por
agravo. Tratar-se-á nesse caso de decisões interlocutórias de mérito” (NEVES. Manual de direito pro-
cessual civil, p. 493).
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 105-125, abr./jun. 2013
Nesses casos, o juiz iria proferir sentença de mérito, com fundamento simpli-
ficado, quanto ao conteúdo cindido, do mesmo modo que ocorre nas sentenças
homologatórias de acordo nas hipóteses do art. 269, inciso III, do atual CPC, deter-
minando o prosseguimento do processo na parte incontroversa, mediante mero
comando formal no corpo dessa sentença, cujo teor principal poderia ser:
Nos termos do art. 285, inciso II do CPC, julgo por sentença com resolução
do mérito (art. 474, inciso I do NCPC), a parte incontroversa da demanda.
Proceda-se ao desmembramento do processo, mediante cópia, da parte
incontroversa, com o prosseguimento da parte controversa nestes mes-
mos autos.
47
Impende o registro novamente de Daniel Amorim, do pavor do operador do direito nesses casos,
quanto ao recurso cabível. Diz ele: “Esse cenário apavora o operador do direito, levando-o inclusive
a rejeitar o atual conceito legal de sentença, para entender tal pronunciamento como decisão
interlocutória e dessa forma recorrível pelo agravo de instrumento” (NEVES. Manual de direito
processual civil, p. 493).
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 105-125, abr./jun. 2013
Penso que o entrave anunciado por Daniel Amorim, de que a apelação carrega
os autos ao tribunal, com prejuízo para o procedimento,48 seria facilmente solucionado
operando-se a cisão do mérito e do processo, como propugnado anteriormente, já
que o processo cindido (com cópia da parte incontroversa) é que prosseguirá em
execução definitiva, enquanto o processo da parte controversa prosseguirá normal-
mente, sem qualquer prejuízo, quanto ao seu andamento.
9 Conclusão
As tutelas de urgência se traduzem em mecanismos necessários à garantia
constitucional de acesso à justiça inscrita no art. 5º, inciso XXXV, da Constituição
Federal, e possibilita que a efetividade do processo se opere num plano de maior
razoabilidade, de modo a minimizar os males da demora na prestação jurisdicio-
nal, hoje tão exigida pela sociedade de massa atual no exercício da pretensão de
seus direitos.
Dada a sua importância para efetividade do processo, as tutelas de urgên-
cias encontram-se reguladas na legislação da Europa, entre outros, no Código de
Processo Civil Italiano, Português, Espanhol e Alemão, não se percebendo lá uma
preocupação acentuada com a distinção entre antecipação de tutela e medida
cautelar.
O novo CPC pretende uma sistematização no tratamento das tutelas de
urgência, pretensão essa já empreendida em sede doutrinária, conferindo um
tratamento diferenciado, situando-as topograficamente na parte geral, o que im-
plica dizer que se aplicam a todo e qualquer procedimento, seja no procedimento
cognitivo, executivo ou mesmo nos procedimentos especiais.
O procedimento nas tutelas de urgência, tanto antecipatória como inciden-
tais, na proposta do novo Código de Processo Civil, tem caráter de mero incidente
processual, e não ação autônoma, verificando-se um fenômeno novo, qual seja,
de aproveitamento do procedimento antecedente a viabilizar a tutela jurisdicio-
nal de cognição ou mesmo execução, transmudando-se a relação processual.
Quando os pressupostos de qualquer medida de urgência são comuns, e
tendo em linha de conta a fungibilidade entre elas, é desnecessária a manutenção
das medidas cautelares nominadas, tal como no atual Código de Processo Civil,
razão porque o novo Código de Processo Civil elimina as medidas cautelares nomi-
nadas, focando mais no seu fundamento e razão de ser, de proteção do direito
material.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 105-125, abr./jun. 2013
Referências
BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Estabilização das tutelas de urgência. In: YARSHELL, Flário Luiz;
MORAES, Maurício Zanoide de (Org.). Estudos em homenagem à professora Ada Pellegrini Grinover.
São Paulo: DPJ, 2005.
BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Tutela cautelar e tutela antecipada: tutelas sumárias e de urgências:
(tentativa de sistematização). 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2003.
BONICIO, Marcelo José Magalhães. Proporcionalidade e processo: a garantia constitucional da
proporcionalidade, a legitimação do processo civil e o controle das decisões judiciais. São Paulo:
Atlas, 2006. (Coleção Atlas de Processo Civil).
BRITO, Wanda Ferraz de; MESQUITA, Duarte Romeira. Código de Processo Civil anotado. 17. ed. Coimbra:
Almedina, 2005.
CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. 15. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Lumen
Juris, 2009.
CAMBI, Eduardo. Neoconstitucionalismo e neoprocessualismo. In: DIDIER JR., Fredie (Org.). Leituras
complementares de processo civil. 6. ed. rev. e atual. Salvador: JusPodivm, 2008. cap. VII.
CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à justiça. Porto Alegre: S.A. Fabris, 1988.
CARNELUTTI, Francesco. Instituições de processo civil. Tradução de Adrián Sotero de Witt Batista.
Campinas: Servanda, 1999. v. 1.
COSTA, Eduardo José da Fonseca. Tutela de evidência no projeto do novo CPC: uma análise dos seus
pressupostos. In: ROSSI, Fernando et al. (Coord.). O futuro do processo civil no Brasil: uma análise crítica
ao projeto do novo CPC. Belo Horizonte: Fórum, 2011.
DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. 5. ed. rev. e atualizada de acordo
com Emenda Constitucional 45. São Paulo: Malheiros, 2005. v. 1.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 105-125, abr./jun. 2013
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 105-125, abr./jun. 2013
Marianna Chaves
Doutoranda em Direito Civil pela Universidade de Coimbra. Mestre
em Ciências Jurídicas pela Universidade de Lisboa. Especialista
em Ciências Jurídicas (Direito de Família, Contrato de Transporte
e Direito Comercial Internacional) pela Universidade de Lisboa.
Pós-Graduada em Filiação, Adoção e Proteção de Menores pela
Universidade de Lisboa. Pós-Graduada em Direito da Bioética e
da Medicina pela Associação Portuguesa da Direito Intelectual
e Universidade de Lisboa. Diretora do Núcleo de Relações
Internacionais do IBDFAM – PB (Instituto Brasileiro de Direito de
Família – Seção Paraíba). Membro da International Society of Family
Law, da American BAR Association e da International BAR Association.
Pesquisadora Assistente do Instituto de Investigación Científica da
Universidade de Lima. Professora do Curso de Pós-Graduação em
Direito Marítimo e Portuário da Universidade Católica de Santos.
Membro do Conselho Editorial da revista Jus Scriptum. Autora da
obra Homoafetividade e direito: proteção constitucional, uniões,
casamento e parentalidade: um panorama luso-brasileiro e de
diversos artigos jurídicos publicados em obras coletivas e revistas
especializadas no Brasil, Portugal, Peru e Argentina. Advogada.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 127-151, abr./jun. 2013
Introdução
Não somente leis especiais — LAB1 e LAV2 — regulam a matéria no Brasil
e em Portugal, respectivamente. Disposições, efeitos e consequências constam
nos Códigos Civis e nos Diplomas Processuais Civis de ambos os países, pelo que
se faz necessário proceder a uma análise interdisciplinar, uma saudável interação
entre o Direito Processual e o Direito Material, ou simplesmente “um diálogo entre
as fontes”.3
E sobre essa influência recíproca que uma matéria pode — e deve — ter
sobre a outra, afirma José Roberto Bedaque que o Direito Processual deve ser
sempre elaborado à luz do direito substancial e em função dele. Acresce ainda o
jurista que a ciência processual deve amoldar-se às necessidades específicas do
seu objeto, ofertando formas de procedimentos e tutela ajustadas às situações de
vantagem garantidas pela norma material.4
Não se pretende, no presente estudo, seguir de modo exaustivo a evolu-
ção da arbitragem. A ideia é apresentar um pano de fundo, necessário ao bom
entendimento do panorama jurídico da arbitragem no momento atual, pois, sem
uma perspectiva evolutiva, ainda que genericamente e minimamente delineada,
jamais qualquer instituto — jurídico ou não — atingirá uma percepção minima-
mente correta.
Vale salientar que a análise do direito estrangeiro constitui uma ferramenta
importante para construção de ideias e para a fundamentação de juízo. É mister
ressaltar que esta análise comparativa entre Brasil e Portugal também serve para
evidenciar as semelhanças e as discrepâncias do tratamento jurídico deferido a
tal matéria, apontando os pontos fortes e fracos de cada ordenamento jurídico.
Assim, o presente estudo tentará, de forma superficial, traçar algumas ideias
e linhas gerais sobre a arbitragem como meio alternativo de resolução de litígios.
No ponto seguinte, abordar-se-á a regulação do instituto no Brasil e em Portugal,
trazendo-se à baila as normas em vigor e alguns comentários sobre normas revo-
gadas. O ponto seguinte ocupa-se do tema propriamente dito, precisamente, da
análise da convenção de arbitragem, da sua divisão, dos conceitos e, mais deti-
damente, dos efeitos e da responsabilidade — especificamente a processual —
oriundos do seu incumprimento.
1
Como denominar-se-á a Lei de Arbitragem Brasileira: Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996.
2
Como denominar-se-á a Lei de Arbitragem Voluntária: Lei nº 31/86, de 29 de agosto.
3
Nas palavras de TARTUCE. Arbitragem: algumas interações entre o direito material e o direito
processual: função social do contrato, ética na arbitragem e abuso processual. Revista Magister de
Direito Civil e Processual Civil, p. 6-7.
4
BEDAQUE. Direito e processo: influência do direito material sobre o processo, p. 22.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 127-151, abr./jun. 2013
5
Cfr. CÂMARA. Das relações entre a arbitragem e o Poder Judiciário. In: CÂMARA. Escritos de direito
processual: segunda série, p. 121.
6
No original: “Il proceso deve dare per quanto è possibile a chi há un diritto quello e próprio quello
ch’egli há diritto di conseguire” (CHIOVENDA. Dell’azione nascente dal contratto preliminare. In:
CHIOVENDA. Saggi di diritto processuale civile, v. 1, p. 110).
7
Neste sentido, consultar CÂMARA. Das relações entre a arbitragem e o Poder Judiciário. In:
CÂMARA. Escritos de direito processual: segunda série, p. 121-122.
8
CARMONA. A arbitragem no processo civil brasileiro, p. 19.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 127-151, abr./jun. 2013
9
Esse é o conceito trazido à baila por CAIVANO. Arbitraje: su eficacia como sistema alternativo de
resolución de conflictos, p. 48. Para José Rogério Cruz e Tucci “infere-se, de logo, que o legislador
atribuiu natureza publicística ao juízo arbitral, consubstanciado em equivalente jurisdicional, por
opção das partes. A despeito de ser instituído por meio de um instrumento negocial de cunho
privado (convenção arbitral), o desenrolar do processo de arbitragem é tão jurisdicional quanto
aquele que tramita perante a justiça estatal” (TUCCI. Arbitragem: garantias constitucionais do
processo e eficácia da sentença arbitral. Revista Magister de Direito Civil e Processual Civil, p. 43).
Note-se, portanto, que existem divergências doutrinárias acerca da natureza — privada ou pública
— do processo de arbitragem.
10
Corrente liderada, em território brasileiro, por CARMONA. Arbitragem e processo, p. 51-53. Outra
não parece ser a posição de GAGLIANO; PAMPLONA FILHO. Novo curso de direito civil, v. 2, p. 258.
No mesmo sentido se manifestam BARACHO. Processo constitucional, p. 75; WAGNER JÚNIOR.
Processo civil: curso completo, p. 11; FREITAS. Execução da sentença arbitral. Revista Síntese Direito
Civil e Processual Civil, p. 60.
11
Tais vantagens também são apontadas por AMARAL. Arbitragem: oportunidades, riscos e desa-
fios. In: LEITE (Coord.). Grandes temas da atualidade, p. 2.
12
Neste sentido, cfr. BASSO. Procedimento Arbitral atual: necessidade de um diálogo de reforma?.
In: LEMES; CARMONA; MARTINS (Coord.). Arbitragem: estudos em homenagem ao Prof. Guido
Fernando da Silva Soares, p. 1-2.
13
Lei nº 556, de 25 de junho de 1850, que ainda encontra-se em vigor, mas teve toda a sua parte
primeira revogada pelo Código Civil de 2002. O que levou ao fenômeno da “civilização” do Direito
Comercial, já que muitas questões antes tratadas pelo Código Comercial agora estão a Cargo do
Código Civil, como, por exemplo, questões de títulos de crédito, de sociedades comerciais, entre
outras.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 127-151, abr./jun. 2013
14
Decreto nº 3.900 de 1867: Art. 9º – “A Cláusula compromissória, sem a nomeação de árbitros, ou
relativa a questões eventuais não vale senão como promessa, e fica dependente para sua perfei-
ção e execução de novo e especial acordo das partes, não só sobre os requisitos do art. 8º, senão
também sobre as declarações do art. 10º”.
15
Arts. 1.037 a 1.048.
16
Arts. 1.031 a 1.046.
17
Arts. 1.072 a 1.102.
18
Cfr. DOLINGER; TIBÚRCIO. Direito internacional privado: arbitragem comercial internacional, p. 20-21.
De igual modo trazem uma bela perspectiva da evolução histórica da arbitragem MORAIS; SPENGLER.
Mediação e arbitragem: alternativas à jurisdição!, p. 168-174; COSTA. Arbitragem. Revista Síntese Direito
Civil e Processual Civil, p. 8-10.
19
Que no decorrer do estudo poderá ser denominada apenas de LAB.
20
Convenção de Nova Iorque sobre Reconhecimento e Execução de Sentenças Arbitrais Estrangeiras,
ratificada por mais de 130 países, o que facilita a execução da sentença arbitral estrangeira, o que
em muitos casos não acontece com a sentença judicial estrangeira (CHAVES. Venda de navios:
panorama luso-brasileiro e internacional. Revista Magister de Direito Empresarial, Concorrencial e
do Consumidor, p. 78).
21
Convenção Interamericana sobre Arbitragem Comercial Internacional.
22
Ementa: “1. Sentença estrangeira: laudo arbitral que dirimiu conflito entre duas sociedades co-
merciais sobre direitos inquestionavelmente disponíveis – a existência e o montante de créditos
a título de comissão por representação comercial de empresa brasileira no exterior: compromisso
firmado pela requerida que, neste processo, presta anuência ao pedido de homologação: ausên-
cia de chancela, na origem, de autoridade judiciária ou órgão público equivalente: homologação
negada pelo Presidente do STF, nos termos da jurisprudência da Corte, então dominante: agravo
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 127-151, abr./jun. 2013
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 127-151, abr./jun. 2013
3 Convenção de arbitragem
O Código de Processo Civil alemão, no §1029, traz a definição de convenção
de arbitragem. O nº 1 determina que a convenção arbitral é o acordo entre as
partes em submeter à decisão de um tribunal arbitral total ou parcialmente os
litígios que entre elas ocorrem ou que venham a surgir futuramente, pertinentes
a uma determinada relação contratual ou extracontratual.25
Manuel Barrocas conceitua a convenção de arbitragem como sendo “o acordo
pelo qual as partes se vinculam a submeter os litígios existentes a um tribunal arbi-
tral. Por esse acto de vontade, as partes determinam que os litígios entre si, emer-
gentes de uma certa relação jurídica, contratual ou extracontratual, que tenham já
surgido ou que venham a surgir no futuro, serão resolvidos por um terceiro através
de uma decisão que formará caso julgado e é susceptível de ser executada”.26
A Convenção de arbitragem é a forma de submeter as contendas à arbi-
tragem, e compreende a cláusula compromissória e o compromisso arbitral,
institutos diversos.27 Nos pontos seguintes analisar-se-ão as duas figuras e seus
respectivos efeitos, de acordo com a lei brasileira e a lei portuguesa.
25
§1029 “Begriffsbestimmung.
(1) Schiedsvereinbarung ist eine Vereinbarung der Parteien, alle oder einzelne Streitigkeiten, die zwischen
ihnen in Bezug auf ein bestimmtes Rechtsverhältnis vertraglicher oder nichtvertraglicher Art entstanden
sind oder künftig entstehen, der Entscheidung durch ein Schiedsgericht zu unterwerfen”.
26
BARROCAS. Manual de arbitragem, p. 143.
27
De acordo com o art. 3º da Lei de Arbitragem brasileira, “as partes interessadas podem submeter
a solução de seus litígios ao juízo arbitral mediante convenção de arbitragem, assim entendida a
cláusula compromissória e o compromisso arbitral”.
28
Consultar SILVA. Arbitragem, mediação e conciliação. In: LEITE (Coord.). Grandes temas da atuali-
dade, v. 7, p. 23.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 127-151, abr./jun. 2013
29
Norma análoga é encontrada no Código de Processo Civil francês: Article 1442: “La clause
compromissoire est la convention par laquelle les parties à un contrat s’engagent à soumettre à
l’arbitrage les litiges qui pourraient naître relativement à ce contrat”.
30
No sistema anterior à Lei nº 9.307/96, dois caracteres primordiais podiam ser destacados em rela-
ção à arbitragem no plano interno: a diferenciação entre cláusula compromissória e compromisso,
e a necessidade de homologação do laudo arbitral por autoridade judiciária. Assim, a cláusula
compromissória existente em contrato, dispondo sobre a submissão de eventuais contendas
à arbitragem não constituía garantia de formação do juízo arbitral. O asseguramento vinha do
compromisso, que obrigava sua realização, reproduzindo a expressão de vontade das partes pela
realização da arbitragem, após o surgimento da lide. Neste sentido, cfr. DOLINGER; TIBÚRCIO.
Direito internacional privado: arbitragem comercial internacional, p. 21-22.
31
Neste sentido, se manifestou Acórdão do STJ português:
“I – A clausula compromissória tem uma eficacia identica a do compromisso arbitral, com a dife-
rença de este versar sobre litigio pendente e aquela sobre litigio futuro.
II – O compromisso arbitral, tal como a clausula compromissória, vincula as partes a sujeição da
decisão do litigio por árbitros.
III – Cabe a ambas partes discutir e fixar, por acordo, o objecto do litígio, no acto de nomeação de
árbitros, resolvendo o juiz, na falta desse acordo” (STJ. Processo nº 074664; Rel. Frederico Baptista;
j. 16.12.1986; BMJ, n. 362, ano 1987, p. 509).
32
“Quando as partes, tendo convencionado uma cláusula compromissória, celebrem após o surgi-
mento do litígio, um outro acordo referente à resolução por arbitragem, a natureza deste acordo
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No Brasil, faz-se necessária uma maior atenção às nuances sobre esta questão,
sendo necessária uma especial atenção à questão da cláusula compromissória “cheia”
e cláusula compromissória “em branco” ou “vazia”.
e a sua relação com a cláusula compromissória devem ser determinados por interpretação. As
partes podem ter pretendido a revogação da cláusula compromissória, substituindo-a por um
compromisso arbitral, ou apenas modificá-la e/ou complementá-la” (BARROCAS. Manual de ar-
bitragem, p. 171).
33
Art. 5º “Reportando-se as partes, na cláusula compromissória, às regras de algum órgão arbitral
institucional ou entidade especializada, a arbitragem será instituída e processada de acordo com
tais regras, podendo, igualmente, as partes estabelecer na própria cláusula, ou em outro docu-
mento, a forma convencionada para a instituição da arbitragem”.
34
DOLINGER; TIBÚRCIO. Direito internacional privado: arbitragem comercial internacional, p. 33. Em
sentido contrário, se manifesta o jurista português Manuel Pereira Barrocas, quando afirma que
segundo a lei do Brasil, “a existência de uma cláusula compromissória não dispensa a celebração
de um compromisso arbitral que, se não for acordado pelas partes, é levado a tribunal judicial
para que o juiz estabeleça os temos do compromisso se as partes, perante ele, não acordarem.
Em suma, sem compromisso arbitral não há arbitragem. Por nós, acreditamos que esta forma
complexa em assegurar execução à cláusula compromissória atrasa a resolução do litígio, reti-
rando à arbitragem uma das suas virtudes: a celeridade” (BARROCAS. Manual de arbitragem, cit.,
p. 171, nota 31). Data maxima venia, não deve prosperar o entendimento do jurista português,
uma vez que, essa situação apenas se aplica às cláusulas compromissórias “em branco”.
35
Em seu voto vista, o então Ministro do STF, Nelson Jobim, apontou por desnecessário o uso do art. 7º
para o caso de cláusulas com remissão às regras de órgão ou entidade e para as cláusulas com
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pacto sobre instituição. Entente por aplicável o mecanismo do art. 7º da Lei nº 9.307/96 apenas
para as denominadas “cláusulas em branco”, que é a cláusula que não contenha “acordo prévio
sobre a forma de instituir a arbitragem (Art. 6º, primeira parte). Nesse caso, a cláusula não se
reporta nem às regras de órgão ou entidade especializada, nem mesmo possui qualquer disci-
plina quanto à questão. Cláusula dessa natureza chamo de ‘cláusula compromissória em branco’,
tudo porque não tem disposição nenhuma quanto à instituição da arbitragem. O que ela contém
é tão-somente o pacto de submeter à arbitragem os conflitos que decorrem da relação contratual,
seja ela, quanto ao objeto, uma cláusula ‘universal’, ‘parcial’ ou ‘singular’. Para esse tipo ‘em branco’
a lei tem norma específica”. Após citar o art. 6º da LAB, o Ministro continua seu voto a afirmar que
“está prevista uma notificação para se ‘dar início à arbitragem’, ou seja, para instituir-se a arbitra-
gem com a assinatura do compromisso arbitral. [...] A lei vai mais longe. Ela disciplina a hipótese
do não comparecimento da parte convocada ou de sua negativa expressa. [...] A lei criou uma
ação judicial com procedimento especial. Está no art. 7º” (STF. Agravo Regimental na Sentença
Estrangeira n. 5.206 – Reino da Espanha. Revista Trimestral de Jurisprudência, p. 949-951).
36
Art. 6º Não havendo acordo prévio sobre a forma de instituir a arbitragem, a parte interessada
manifestará à outra parte sua intenção de dar início à arbitragem, por via postal ou por outro
meio qualquer de comunicação, mediante comprovação de recebimento, convocando-a para,
em dia, hora e local certos, firmar o compromisso arbitral.
Parágrafo único. Não comparecendo a parte convocada ou, comparecendo, recusar-se a firmar
o compromisso arbitral, poderá a outra parte propor a demanda de que trata o art. 7º desta Lei,
perante o órgão do Poder Judiciário a que, originariamente, tocaria o julgamento da causa.
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desta, salvo quando se mostre que ele não teria sido concluído sem a referida
convenção”.37
Pode-se dizer que a presença de tais dispositivos nas legislações regulado-
ras da arbitragem no Brasil e em Portugal traduz o empenho do legislador na con-
servação negocial, restando clara a eficácia interna da função social do contrato
para as partes da avença.38
37
Tal entendimento já se encontra cristalizado na jurisprudência, como se depreende de excerto de
um julgamento do Tribunal da Relação de Lisboa: “A nulidade, substancial ou formal, do contrato
não afecta a cláusula compromissória nele inserta, que subsiste, desde que não se mostre que o
contrato não seria concluído sem a referida cláusula” (RL; j. 27.11.2003; CJ, 2003-V, p. 100).
38
Neste sentido, assevera Flávio Tartuce que “a função social do contrato é associada à tendência
de conservação do contrato ou negócio jurídico, sendo a extinção do contrato o último caminho,
a última medida, a última ratio”. TARTUCE, Flávio. “Arbitragem: algumas interações entre o direito
material e o direito processual – função social do contrato, ética na arbitragem e abuso processual”
(cit., p. 12).
39
Consultar GAGLIANO; PAMPLONA FILHO. Novo curso de direito civil, p. 249.
40
Conforme afirma TARTUCE. Arbitragem: algumas interações entre o direito material e o direito
processual: função social do contrato, ética na arbitragem e abuso processual. Revista Magister de
Direito Civil e Processual Civil, p. 8. O mesmo autor, na página seguinte do mesmo escrito, assevera
que basta uma leitura atenta da Lei de Arbitragem brasileira, para vislumbrar dentro da própria
legislação quantas vezes a mesma faz menção aos verbetes “contrato”, “contratar”, o que leva ao
entendimento de que a própria LAB procurou dar-lhe uma feição contratual. Pertinente alertar
que no presente escrito está em causa o instituto contrato, e não o documento contrato.
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41
No direito anterior, a doutrina e a jurisprudência dividiam-se em três correntes: a que não con-
feria eficácia alguma à cláusula compromissória; a que a via como simples obrigação de fazer,
prevendo que do seu incumprimento caberia pleito por perdas e danos; e a terceira, que defen-
dia a execução específica da cláusula compromissória. Para uma análise mais detalhada das três
correntes doutrinárias e jurisprudenciais, consultar BARBI FILHO. Execução específica da cláusula
arbitral. Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro, p. 32; DOLINGER; TIBÚRCIO.
Direito internacional privado: arbitragem comercial internacional, p. 22-23.
42
Sobre a questão, manifestou-se em erudito voto, a Ministra Ellen Gracie, onde afirmou que “ao
institutir a execução específica da cláusula compromissória, a Lei nº 9.307/96 afastou o obstáculo
que, até então, tornava praticamente inexistente a arbitragem em nosso país. Toda vez que se
quisesse furtar a uma solução célere da controvérsia — ou mesmo, ao simples reconhecimento
de sua responsabilidade pela quebra do contrato — à parte inadimplente bastava recusar-se a
firmar o compromisso arbitral. Ao juízo era vedado substituir-se a esta sua manifestação — ainda
que a controvérsia, perfeitamente delimitada, decorresse exatamente do desenvolvimento natu-
ral do contrato e versasse sobre direitos de natureza disponível. [...] Negar possibilidade a que
a cláusula compromissória tenha plena validade e que enseje execução específica importa em
erigir em privilégio da parte inadimplente o furtar-se à submissão à via expedita de solução da
controvérsia, mecanismo este pelo qual optara livremente, quando da lavratura do contrato ori-
ginal em que inserida essa previsão. É dar ao recalcitrante poder de anular condição que — dada
a natureza dos interesses envolvidos — pode ter sido consideração básica à formação da avença”
(STF. Agravo Regimental na Sentença Estrangeira n. 5.206 – Reino da Espanha. Revista Trimestral
de Jurisprudência, p. 998-999).
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 127-151, abr./jun. 2013
43
Neste sentido se manifesta AMARAL. Arbitragem: oportunidades, riscos e desafios. In: LEITE (Coord.).
Grandes temas da atualidade, p. 4.
44
Art. 7º
§1º O autor indicará, com precisão, o objeto da arbitragem, instruindo o pedido com o documento
que contiver a cláusula compromissória.
§2º Comparecendo as partes à audiência, o juiz tentará, previamente, a conciliação acerca do lití
gio. Não obtendo sucesso, tentará o juiz conduzir as partes à celebração, de comum acordo, do
compromisso arbitral.
§3º Não concordando as partes sobre os termos do compromisso, decidirá o juiz, após ouvir o
réu, sobre seu conteúdo, na própria audiência ou no prazo de dez dias, respeitadas as disposições
da cláusula compromissória e atendendo ao disposto nos arts. 10 e 21, §2º, desta Lei.
§4º Se a cláusula compromissória nada dispuser sobre a nomeação de árbitros, caberá ao juiz,
ouvidas as partes, estatuir a respeito, podendo nomear árbitro único para a solução do litígio.
§5º A ausência do autor, sem justo motivo, à audiência designada para a lavratura do compromisso
arbitral, importará a extinção do processo sem julgamento de mérito.
§6º Não comparecendo o réu à audiência, caberá ao juiz, ouvido o autor, estatuir a respeito do
conteúdo do compromisso, nomeando árbitro único.
§7º A sentença que julgar procedente o pedido valerá como compromisso arbitral.
45
AÇÃO DE COBRANÇA – CLÁUSULA ARBITRAL – AJUIZAMENTO DA AÇÃO NO JUÍZO ESTADUAL
– IMPOSSIBILIDADE – No momento em que as partes convencionam a Arbitragem como forma
única de solução dos seus conflitos, porventura decorrentes do próprio contrato, apenas a juris-
dição privada é que será competente para decidi-los, inexistindo necessidade de observância
dos requisitos do §2º do art. 4º da Lei 9.307/96, quando não se tratar de contrato de adesão e o
aderente concorda com a estipulação (TJMG; AC nº 1.0702.07.378892-0/001; 12ª C. Cív.; Rel. Des.
Domingos Coelho; j. 23.09.2009).
ARBITRAGEM. OBRIGATORIEDADE DA SOLUÇÃO DO LITÍGIO PELA VIA ARBITRAL, QUANDO
EXISTENTE CLÁUSULA PREVIAMENTE AJUSTADA ENTRE AS PARTES NESTE SENTIDO. INTELIGÊNCIA
DOS ARTS. 1º, 3º e 7º DA LEI Nº 9.307/96. PRECEDENTES. Provimento neste ponto. Alegada ofensa
ao art. 535 do CPC. Não ocorrência. Recurso especial parcialmente provido (STJ; REsp nº 791.260;
Proc. 2005/0175166-1; RS; 3ª T.; Rel. Des. Conv. Paulo Furtado; DJE, 1º jul. 2010).
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 127-151, abr./jun. 2013
legal (eficácia positiva). A única exceção a essa regra ocorre quando a cláusula é
inserida em contrato de adesão,46 de acordo com o art. 4º, §2º, da LAB.47
Na situação de resistência à instauração do processo arbitral, a LAB possui
mecanismos eficientes para a sua execução.48 Mas o que acontece no caso de uma
das partes ingressar com uma ação judicial, deixando de levar em conta a existên-
cia de uma cláusula compromissória? Qual a resposta do Judiciário a tal demanda?
O Código de Processo Civil brasileiro, em seu art. 267, VI, estabelece que ex-
tingue-se o processo, sem resolução de mérito, pela convenção de arbitragem.49
Note-se, porém, que para que tal fato ocorra, o réu deve alegar em sua defesa,50
46
AÇÃO CONSIGNATÓRIA CUMULADA COM REVISIONAL DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS. ESCRITURA
PÚBLICA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. AUSÊNCIA DE CARACTERÍSTICAS DE CONTRATO DE
ADESÃO. LEI Nº 9.514/97. ADMISSIBILIDADE DA CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA. LEI DE ARBITRAGEM.
I. Em se tratando de compra e venda de imóvel instrumentalizada por escritura pública, ausentes
as características de contrato de adesão, não há que se falar em revisão contratual ou nulidade
de cláusulas que foram livremente pactuadas entre as partes. II. A Lei nº 9.514/97, expressamente,
admite a cláusula compromissória nos contratos que versem sobre alienação fiduciária de imóvel
e, por não se tratar de contrato de adesão, deve prevalecer a convenção de arbitragem. III. A esco-
lha do juízo arbitral é lícita, e uma vez estipulada a convenção de arbitragem, nos termos da Lei
nº 9.307/96, fica excluída a competência da justiça comum para dirimir as controvérsias oriundas do
contrato, devendo o processo ser extinto sem julgamento de mérito, nos termos do art. 267, VII, do
CPC. Apelos conhecidos, mas prejudicados. Processo extinto sem julgamento de mérito. Sentença
cassada (TJGO; AC 92320-0/188; 1ª C.Cív.; Rel. Des. João Ubaldo Ferreira; DJGO, 16 jan. 2006).
47
Neste sentido, consultar MARTINS. A arbitragem no Brasil. Revista Síntese Direito Civil e Processual
Civil, p. 27.
48
Como já referido anteriormente, só será necessária a utilização do mecanismo de execução cons-
tante do art. 7º da Lei de Arbitragem brasileira no caso de cláusula compromissória “em branco”
ou “vazia”.
49
CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA. RENÚNCIA A JURISDIÇÃO ESTATAL. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM
JULGAMENTO DE MÉRITO. Havendo as partes convencionado a solução de controvérsia acerca do
contrato que pactuaram, conforme previsão do art. 3º e ss. da Lei nº 9.307/96, estabelecendo a
convenção de arbitragem, renunciam à jurisdição estatal, de modo que o processo instaurado
deve ser extinto sem julgamento de mérito, nos termos do art. 267, VI do CPC. II. Honorários advo-
catícios. Fixação. Valor da causa. Critério sem paradigma ou previsão legal. Considerando-se que
o caso trata-se de embargos à execução, para fixação da verba honorária o juiz não está adstrito
ao valor atribuído à causa, haja vista ausência de previsão legal de tal parâmetro. Aplica-se as dis-
posições do art. 20, §4º, do CPC. Apelo conhecido e parcialmente provido (TJGO; AC 83147-2/188;
Proc. 200402054746; Goiânia; 3ª C.Cív.; Rel. Des. João Waldeck Félix de Sousa; DJGO, 22 fev. 2005).
50
Na lição de Humberto Theodoro Júnior, “a contestação, em nosso sistema processual, não é ape-
nas um meio de defesa de ordem material ou substancial. Cabe ao réu usá-la, também, para as
defesas de ordem processual, isto é, para opor ao autor alegações que possam invalidar a relação
processual ou revelar imperfeições formais capazes de prejudicar o julgamento do mérito. Essas
arguições meramente processuais se revestem de caráter judicial, de maneira que seu exame e
solução hão de preceder a apreciação do litígio (mérito)”. Continua o processualista brasileiro por
dizer que “o juízo arbitral, nos casos em que a lei o permite (Lei nº 9.307, de 29.09.96), é modo
de excluir a aptidão da jurisdição para solucionar o litígio. Se as partes ajustaram o compromisso
para julgamento por árbitros, ilegítima será a atitude de propor ação judicial sobre a mesma lide.
A defesa processual que opõe à ação a preexistência de compromisso arbitral é peremptória”
(THEODORO JÚNIOR. Curso de direito processual civil, v. 1, p. 346-347).
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 127-151, abr./jun. 2013
51
Art. 301. Compete-lhe, porém, antes de discutir o mérito, alegar:
[...]
IX – convenção de arbitragem;
52
Art. 301
[...]
§4º Com exceção do compromisso arbitral, o juiz conhecerá de ofício da matéria enumerada neste
artigo.
53
ARBITRAGEM. CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA E COMPROMISSO ARBITRAL. REQUISITOS DA
LEI Nº 9.307/96 NECESSIDADE. CONVENÇÃO DE ARBITRAGEM CONHECIMENTO DE OFÍCIO.
IMPOSSIBILIDADE. EXTINÇÃO DO PROCESSO. Para a estipulação da cláusula compromissória ou
compromisso arbitral devem ser respeitados os requisitos esculpidos no art. 4º e seguintes da
Lei nº 9.302/96, sob pena de ineficácia do instrumento de vinculação. O Código Processual Civil
veda, no art. 301, §4º, o reconhecimento, de ofício, da convenção de arbitragem pelo juiz para
dar ensejo à extinção do feito sem julgamento de mérito, vez que a mesma necessita ser arguida
pelo réu por se tratar de matéria de defesa (TJGO; AC nº 98927-0/188; 4ª C.Cív.; Rel. Des. Almeida
Branco; DJGO, 29 ago. 2006).
54
Processual civil. Recurso especial. Cláusula arbitral. Lei de Arbitragem. Aplicação imediata.
Extinção do processo sem julgamento de mérito. Contrato internacional. Protocolo de Genebra
de 1923.
– Com a alteração do art. 267, VII, do CPC pela Lei de Arbitragem, a pactuação tanto do compro-
misso como da cláusula arbitral passou a ser considerada hipótese de extinção do processo sem
julgamento do mérito. – Impõe-se a extinção do processo sem julgamento do mérito se, quando
invocada a existência de cláusula arbitral, já vigorava a Lei de Arbitragem, ainda que o contrato
tenha sido celebrado em data anterior à sua vigência, pois, as normas processuais têm aplicação
imediata. – Pelo Protocolo de Genebra de 1923, subscrito pelo Brasil, a eleição de compromisso
ou cláusula arbitral imprime às partes contratantes a obrigação de submeter eventuais conflitos
à arbitragem, ficando afastada a solução judicial. – Nos contratos internacionais, devem preva-
lecer os princípios gerais de direito internacional em detrimento da normatização específica de
cada país, o que justifica a análise da cláusula arbitral sob a ótica do Protocolo de Genebra de
1923. Precedentes. Recurso especial parcialmente conhecido e improvido (STJ; 3ª Turma; REsp
nº 712.566 – RJ (2004/0180930-0), Rel. Min. Nancy Adrighi, j. 18.08.2005).
55
Cfr. GAJARDONI. A arbitragem nos tribunais estatais (10 anos de jurisprudência). In: LEITE (Coord.).
Grandes temas da atualidade, p. 190.
56
Também no sentido da aplicabilidade imediata das normas da LAB, já havia se manifestado o
Supremo Tribunal Federal, em mais de uma ocasião:
SENTENÇA ARBITRAL ESTRANGEIRA. PEDIDO DE HOMOLOGAÇÃO. CONTRATO DE AFRETAMENTO.
REQUISITOS PREVISTOS NO REGIMENTO INTERNO DO STF E NA LEI Nº 9.307/96 (LEI DA
ARBITRAGEM). Tendo as normas de natureza processual da Lei nº 9.307/96 eficácia imediata,
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devem ser observados os pressupostos nela previstos para homologação de sentença arbitral es-
trangeira, independentemente da data de início do respectivo processo perante o juízo arbitral.
Pedido que cumpre os requisitos dos arts. 37 a 39 da mencionada lei, bem como os dos arts. 216
e 217 do RI/STF. Homologação deferida (STF. Tribunal Pleno; Sentença Estrangeira Contestada
nº 5.828 – Reino da Noruega; Rel. Min. Ilmar Galvão; j. 06.12.2000).
HOMOLOGAÇÃO DE LAUDO ARBITRAL ESTRANGEIRO. REQUISITOS FORMAIS: COMPROVAÇÃO.
CAUÇÃO: DESNECESSIDADE. INCIDÊNCIA IMEDIATA DA LEI Nº 9.307/96. CONTRATO DE ADESÃO:
INEXISTÊNCIA DE CARACTERÍSTICAS PRÓPRIAS. INAPLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO
CONSUMIDOR. 1. Hipótese em que restaram comprovados os requisitos formais para a homo-
logação (RISTF, artigo 217). 2. O Supremo Tribunal Federal entende desnecessária a caução em
homologação de sentença estrangeira (SE nº 3.407, Rel. Min. Oscar Corrêa, DJ de 07.12.84). 3.
As disposições processuais da Lei nº 9.307/96 têm incidência imediata nos casos pendentes de
julgamento (RE nº 91.839/GO, Rafael Mayer, DJ de 15.05.81). 4. Não é contrato de adesão aquele
em que as cláusulas são modificáveis por acordo das partes. 5. O Código de Proteção e Defesa
do Consumidor, conforme dispõe seu artigo 2º, aplica-se somente a “pessoa física ou jurídica que
adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final”. Pedido de homologação deferido
(STF. Sentença Estrangeira Contestada n. 5.847 – Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do
Norte. Revista Trimestral de Jurisprudência, p. 868-869).
57
CÂMARA. Parecer: arbitragem: interpretação de cláusula compromissória: redução do objeto do
processo estatal. In: CÂMARA. Escritos de direito processual: segunda série, p. 391.
58
Abraçando a tese de que o contrato seria “a relação jurídica subjetiva, nucleada na solidariedade
constitucional, destinada à produção de efeitos jurídicos existenciais e patrimoniais, não só entre
os titulares subjetivos da relação, mas também perante terceiros” (NALIN. Do contrato: conceito
pós-moderno em busca de sua formulação na perspectiva civil-constitucional, p. 253).
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59
Conforme indica SCHREIBER. A proibição de comportamento contraditório: tutela de confiança e
venire contra factum proprium, p. 50.
60
Neste sentido, consultar BARROCAS. Manual de arbitragem, p. 165.
61
Artigo 11º
(Constituição tribunal)
1 – A parte que pretenda instaurar o litígio no tribunal arbitral deve notificar desse facto a parte
contrária.
2 – A notificação é feita por carta registada com aviso de recepção.
3 – A notificação deve indicar a convenção de arbitragem e precisar o objecto do litígio, se ele não
resultar já determinado da convenção.
4 – Se às partes couber designar um ou mais árbitros, a notificação conterá a designação do árbi-
tro ou árbitros pela parte que se propõe instaurar a acção, bem como o convite dirigido à outra
parte para designar o árbitro ou árbitros que lhe cabe indicar.
5 – Se o árbitro único dever ser designado por acordo das duas partes, a notificação conterá a
indicação do árbitro proposto e o convite à outra parte para que o aceite.
6 – Caso pertença a terceiro a designação de um ou mais árbitros e tal designação não haja ainda
sido feita, será o terceiro notificado para a efectuar e a comunicar a ambas as partes.
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62
Como afirma BARROCAS. Manual de arbitragem, p. 226.
63
A excepção dilatória de preterição do tribunal arbitral (art. 494º, nº 1, al. h), do Cód. Proc. Civil)
abarca quer o compromisso arbitral, quer a cláusula compromissória. (RP, Acórdão de 09.05.1995,
Col. Jur. Ano 1995, n. 3, p. 208).
64
Antiga alínea h). Por tal fato, em alguns julgados — mais antigos — citados serão encontradas
referências à alínea h).
65
I – O compromisso arbitral versa sobre litígio presente, ao passo que a cláusula compromissória
versa sobre litígio futuro; mas tanto aquele como esta vinculam as partes à sujeição da decisão do
litígio a árbitros, que, no primeiro caso, são logo nomeados pelas partes; e, no segundo, terão de
o ser por elas quando surgir um litígio abrangido pela cláusula, ou, na falta de escolha, pelas par-
tes, o serão pelo Tribunal. II – Constitui cláusula compromissória e é inteiramente válida aquela
em que as partes estipulam que em caso de sinistro, a avaliação dos bens seguros e dos prejuízos
será feita entre o segurado — mesmo que o seguro produza efeitos a favor de terceiros ou tenha
sido celebrado por conta de outrem — e a seguradora. III – A violação de uma tal cláusula consti-
tui a excepção dilatória de preterição do tribunal arbitral previsto na al. h) do nº 1 do art. 494º do
CPC (RL, Processo nº 0006676, Rel. Pires Salpico, j. 05.04.1990, BMJ, n. 396, ano 1990, p. 423).
66
ARTIGO 493º
(EXCEPÇÕES DILATÓRIAS E PEREMPTÓRIAS – NOÇÃO)
1. As excepções são dilatórias ou peremptórias.
2. As excepções dilatórias obstam a que o tribunal conheça do mérito da causa e dão lugar à
absolvição da instância ou à remessa do processo para outro tribunal.
ARTIGO 494º
(EXCEPÇÕES DILATÓRIAS)
São dilatórias, entre outras, as excepções seguintes:
[...]
j) A preterição do tribunal arbitral necessário ou a violação de convenção de arbitragem.
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67
BARROCAS. Manual de arbitragem, p. 166.
68
Esse é o entendimento de BARROCAS. Manual de arbitragem, p. 166.
69
Coloca-se entre aspas, por tal comportamento — dentro da arbitragem — não estar expressa-
mente tipificado na LAV ou no Diploma Processual Civil.
70
Neste sentido, assevera o especialista em Arbitragem, Manuel Barrocas, que “não é coerente e é,
em suma, contra as regras da boa fé que as partes tenham acordado submeter o seu litígio ou
litígios a arbitragem e, uma vez tal facto tenha ocorrido, adoptem uma atitude tendente a impe-
dir ou a dificultar a constituição do tribunal arbitral ou pratiquem atos hostis à arbitragem e ao
desenvolvimento normal da acção arbitral. Igualmente, não é admissível que, sabendo as partes
como funciona a arbitragem, com as suas vantagens e desvantagens relativamente aos tribunais
judiciais, minimizem ou impeçam a verificação daquelas e fomentem estas últimas, nomeada-
mente não cumprindo decisões ou meras solicitações do tribunal arbitral no sentido de colaborar
com uma correcta produção da prova ou o estabelecimento adequado da verdade dos factos”
(BARROCAS. Manual de arbitragem, p. 227).
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 127-151, abr./jun. 2013
71
BARROCAS. Manual de arbitragem, p. 227.
72
CARMONA. Arbitragem e processo, p. 299.
73
Neste sentido, julgado do Tribunal de Justiça de Minas Gerais: CIVIL – APELAÇÃO – AÇÃO
DECLARATÓRIA – FALTA DE INTERESSE SUPERVENIENTE – OCORRÊNCIA – ARBITRAGEM POSTERIOR
AO AJUIZAMENTO DO FEITO – PRESENÇA DE CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA – EXTINÇÃO DO
FEITO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO – INCISO VII DO ARTIGO 267 DO CPC. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ
– OCORRÊNCIA. Deve ser negado provimento ao recurso contra a sentença que extinguiu o feito
judicial por ausência de interesse processual por terem as partes instituído o procedimento arbi-
tral. Deve ser reduzida a pena de litigância de má-fé quando o montante foi arbitrado acima do
legalmente previsto. Majoram-se os honorários advocatícios quando a fixação ocorreu em valor
irrisório para a causa em discussão (TJMG; 11ª C. Cível; AC nº 1.0283.05.001235-2/002(1); Rel. Des.
Afrânio Vilela, j. 17.12.2008).
74
PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. AÇÃO DE DESPEJO POR FALTA DE PAGAMENTO CUMULADA COM
COBRANÇA E ENCARGOS DA LOCAÇÃO. COMPROMISSO ARBITRAL. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM
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5 Considerações finais
Diante de tudo o que foi exposto no presente estudo, é imperioso ressaltar
algumas questões e cumpre-se retirar algumas conclusões:
1. Para que o mecanismo da arbitragem funcione eficazmente, se faz ne-
cessário o chamado “dialógo das fontes”, uma interação entre o Direito
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Referências
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de Oliveira (Coord.). Grandes temas da atualidade. Rio de Janeiro: Forense, 2007. v. 7 - Mediação,
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BARACHO, José Alfredo de Oliveira. Processo constitucional. Rio de Janeiro: Forense, 1984.
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Econômico e Financeiro, São Paulo, v. 97, p. 29-38, 1995.
BARROCAS, Manuel Pereira. Manual de arbitragem. Coimbra: Almedina, 2010.
BASSO, Maristela. Procedimento arbitral atual: necessidade de um diálogo de reforma?. In: LEMES,
Selma Ferreira; CARMONA, Carlos Alberto; MARTINS, Pedro Batista (Coord.). Arbitragem: estudos em
homenagem ao Prof. Guido Fernando da Silva Soares. São Paulo: Atlas, 2007.
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5. ed. São Paulo: Malheiros, 2009.
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Aires: Ad Hoc, 1992.
CÂMARA, Alexandre Freitas. Das relações entre a arbitragem e o Poder Judiciário. In: CÂMARA,
Alexandre Freitas. Escritos de direito processual: segunda série. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005.
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TUCCI, José Rogério Cruz e. Arbitragem: garantias constitucionais do processo e eficácia da sentença
arbitral. Revista Magister de Direito Civil e Processual Civil, Porto Alegre, v. 26, p. 43-46, set./out. 2008.
WAGNER JÚNIOR, Luiz Guilherme da Costa. Processo civil: curso completo. 2. ed. Belo Horizonte: Del
Rey, 2008.
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1 Introdução
O direito probatório, como sub-ramo do direito processual, está intimamente
condicionado pelas premissas jusfilosóficas prevalecentes em cada momento da
cultura humana.
Como consequência dessa influência filosófico-cultural, tem-se que em cada
modelo probatório (clássico, moderno e contemporâneo — classificação mera-
mente didática) haverá uma diversa determinação do que seja relevante na inda-
gação posta.
Assim, pode-se constatar no chamado modelo clássico de prova a presença
de um caráter seletivo do conhecimento e relativo do fato. Diante da constante
presença do problema do erro, da falibilidade humana, nela é limitado o campo
de indagação, com a renúncia ao conhecimento do fato na sua totalidade.
A concepção moderna de prova, por sua vez, fruto que é do iluminismo, do
racionalismo, busca um alargamento do campo de indagação para melhor conhe
cimento dos fatos (total evidence), procurando conhecer o fato em sua inteireza,
tal qual em uma operação técnica. O conceito moderno de prova, portanto, passa
a ser demonstrativo, firme na crença de que nenhum conhecimento é ao homem
vedado.
Por fim, o modelo contemporâneo de prova decorre da presença constante
dos princípios constitucionais vigentes, conjugando características ora de prova
argumentativa, ora de prova demonstrativa, mostrando-se de um modelo de pola-
ridade assimétrica.
1
GIULIANI. Ordo iudiciarius medioevale (Riflessioni su un modello puro di ordine isonomico). Rivista
di Diritto Processuale, p. 598.
2
OLIVEIRA. A garantia do contraditório. In: OLIVEIRA. Do formalismo no processo civil, 2003, p. 227.
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3
OLIVEIRA. A garantia do contraditório. In: OLIVEIRA. Do formalismo no processo civil, 2003, p. 227.
4
Idem, p. 17.
5
Idem, p. 18 e MITIDIERO. Elementos para uma teoria contemporânea do processo civil brasileiro, p. 16.
6
Para Carlos Alberto Alvaro de Oliveira, a primeira fase da história do direito processual desco-
nheceu a sua autonomia e a intervenção estatal na sua regulação. A segunda fase, por sua vez,
chamada de procedimentalismo pelo preclaro jurista gaúcho, era ainda sincrética, ou seja, não
distinguia o processo do direto material, caracterizando-o como mero adjetivo. Essa fase é inter-
calada por uma transição, chamada de conceitualismo, com a obra de Oskar Bülow, surgindo a
construção dogmática das bases científicas dos institutos processuais. Mais tarde viria a fase do
instrumentalismo, no qual o processo é visto como instrumento da realização do direito material.
Por fim, a quarta fase é a do formalismo-valorativo, na qual o processo, além da técnica, é visto
como fenômeno cultural, produto do homem, e não da natureza (Cf. OLIVEIRA. Do formalismo no
processo civil, 3. ed.).
7
GIULIANI, op. cit., p. 598.
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Esse perene conflito entre retórica e lógica teve como resultado ora a
preponderância de uma, ora a de outra, ao sabor das vicissitudes de cada mo-
mento histórico, cujas implicações se refletem diretamente no processo.
Disso, como ressalta Giuliani,8 embora retórica e lógica não estejam em opo-
sição, mas se complementem na construção do conceito de ordem, com o pre-
domínio de uma ou de outra, formaram-se duas opostas ideias de ordem. Uma,
a que se deu o nome de isonômica, em que prevalecem os princípios da retórica,
e outra, chamada assimétrica, em que predominam os parâmetros estabelecidos
pela lógica.
O conceito de prova, da mesma sorte, está intimamente ligado à ideia de
ordem, pois, nas palavras de Giuliani:
8
GIULIANI. Prova in generale: A) Filosofia del dirito. In: ENCICLOPEDIA del diritto, XXXVII, p. 519.
9
Idem.
10
GIULIANI, Alessandro. Prova in generale: A) Filosofia del dirito. In: ENCICLOPEDIA del diritto, XXXVII,
p. 519.
11
KNIJNIK. Os standards do convencimento judicial: paradigmas para o seu possível controle.
Revista Forense, p. 22.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 153-179, abr./jun. 2013
12
Idem.
13
KNIJNIK. A prova nos juízos cível, penal e tributário, p. 10.
14
TARUFFO. Modelli di prova e di procedimento probatorio. Rivista di Diritto Processuale, p. 420-421.
15
KNIJNIK. A prova nos juízos cível, penal e tributário, p. 11.
16
GIULIANI. Prova in generale: A) Filosofia del dirito. In: ENCICLOPEDIA del diritto, XXXVII, p. 523.
17
Idem.
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partes, não do juiz, sendo deste a função de controlar o juízo das partes, sem,
todavia, substituí-lo pelo seu próprio, em violação ao princípio do contraditório e
em detrimento das alternativas argumentativas que lhe são apresentadas.18
Alessandro Giuliani,19 citando o seguinte trecho da obra Policraticus, de John
of Salisbury, afirma que, no momento introdutório do processo, não apenas as
partes, mas também os causídicos se obrigavam a não lançar mão de manobras
que resultariam em abuso do processo, ressaltando a preocupação com a manu-
tenção da ordem:
18
GIULIANI. Ordo iudiciarius medioevale (Riflessioni su un modello puro di ordine isonomico). Rivista
di Diritto Processuale, p. 610.
19
Idem, p. 610, nota 29.
20
No original: “Ut vero rerum veritas citius illucescat, litigatores ipsos, personas videlicet principales, non
ante ad litem Iudex admittet, quam ei praestito sacramento faciant fidem, quod iustitiae insistent, et
calumniam omnem procul facient, seu et ipsi patroni causarum, quo fidelior possit esse examinatio,
ab ipsa contestatione litis, iuramento arctantur ad veritatem et fidem, iurantes quod cum omni
virtute sua, omnique ope, quod iustum et verum examinaverint, clientibus suis inferre procurabunt,
nihil studii relinquentes prout cuique possibile est; et quod ex industria sua non protahent lites. Nam
eas oportet a iudicibus infra biennium vel triennium terminari” (tradução nossa).
21
GIULIANI. Prova in generale: A) Filosofia del dirito. In: ENCICLOPEDIA del diritto, XXXVII, p. 531.
22
KNIJNIK. Os standards do convencimento judicial: paradigmas para o seu possível controle. Revista
Forense, p. 22.
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Mais do que isso, nas palavras de Carlos Alberto Alvaro de Oliveira, “o contra-
ditório representa o único método e instrumento para a investigação dialética da
verdade provável” no ambiente cultural da ordem isonômica. Valemo-nos, ainda,
das magistrais palavras do jurista gaúcho para explicar o contexto e as idiossin-
crasias dessa ordem:
23
GIULIANI. Ordo iudiciarius medioevale (Riflessioni su un modello puro di ordine isonomico). Rivista
di Diritto Processuale, p. 606.
24
OLIVEIRA. A garantia do contraditório. In: OLIVEIRA. Do formalismo no processo civil, p. 228-229.
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per argumenta iudici faciens fidem (a prova, portanto, é esclarecer [tornar fidedigna]
ao juiz, por meio de argumentos, uma coisa dúbia — tradução nossa).25
Conforme afirma Giuliani,26 clássica é a concepção de prova como argumentum,
tendo sido de Cícero a definição mais madura, segundo a qual, argumentum est ratio
quae rei dubiae faciat fidem (argumento é a razão que esclarece uma coisa dúbia —
tradução nossa).
Essa frase de Cícero foi extraída de sua clássica obra Topica, em cujo contexto
se lê:
[6] Toda ratio disserendi diligente possui duas partes, uma inventiva (de
encontrar) e a outra judicativa (de julgar), sendo Aristóteles, ao que me
parece, o criador de ambas. Os Estóicos, por sua vez, elaboraram-nas. A
judicativa é diligentemente perseguida pela ciência chamada Dialética,
enquanto a arte inventiva, chamada tópica, a qual melhor era ao uso e
certamente anterior pela ordem da natureza, foi totalmente abandonada.
[7] Nós, porém, visto que ambas são dotadas de suma utilidade, e, se pos-
sível, pensamos em pesquisá-las, começando pela primeira. Visto que é
fácil encontrar as coisas escondidas por meio de um locus (lugar) demons-
trado e conhecido, dessa forma, quando desejamos investigar um argu-
mento, devemos conhecer os locos (lugares); assim, elas são chamadas
por Aristóteles, por assim dizer, a sede da qual os argumentos emergem.
[8] Dessarte, pode-se definir o locus como a sede do argumento, o qual, por
sua vez, é a razão que esclarece uma coisa dúbia.27
25
GIULIANI. Prova in generale: A) Filosofia del dirito. In: ENCICLOPEDIA del diritto, XXXVII, p. 530.
26
GIULIANI. Il concetto di prova: contributo alla logica giuridica, p. XI.
27
No original: “[6] Cum omnis ratio diligens disserendi duas habeat partis, unam inveniendi alteram
iudicandi, utriusque princeps, ut mihi quidem videtur, Aristoteles fuit. Stoici autem in altera ela-
boraverunt; iudicandi enim vias diligenter persecuti sunt ea scientia quam dialektikon appellant,
inveniendi artem quae topika dicitur, quae et ad usum potior erat et ordine naturae certe prior,
totam reliquerunt. [7] Nos autem, quoniam in utraque summa utilitas est et utramque, si erit
otium, persequi cogitamus, ab ea quae prior est ordiemur. Ut igitur earum rerum quae abscon-
ditae sunt demonstrato et notato loco facilis inventio est, sic, cum pervestigare argumentum
aliquod volumus, locos nosse debemus; sic enim appellatae ab Aristotele sunt eae quasi sedes, e
quibus argumenta promuntur. [8] Itaque licet definire locum esse argumenti sedem, argumentum
autem rationem quae rei dubiae faciat fidem” (tradução nossa).
28
TARUFFO. Modelli di prova e di procedimento probatorio. Rivista di Diritto Processuale, p. 420.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 153-179, abr./jun. 2013
29
GIULIANI. Il concetto di prova: contributo alla logica giuridica, p. XI.
30
Idem, p. 109.
31
Idem.
32
GIULIANI. Il concetto di prova: contributo alla logica giuridica, p. 231.
33
Idem.
34
Idem, p. 233.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 153-179, abr./jun. 2013
35
GIULIANI. Prova in generale: A) Filosofia del dirito. In: ENCICLOPEDIA del diritto, XXXVII, p. 549.
36
Idem, p. 552.
37
KNIJNIK. O recurso especial e a revisão da questão de fato pelo Superior Tribunal de Justiça, p. 75.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 153-179, abr./jun. 2013
38
OLIVEIRA. A garantia do contraditório. In: OLIVEIRA. Do formalismo no processo civil, 2003, p. 228-229.
39
PICARDI. Processo civile (dir. moderno). In: ENCICLOPEDIA del diritto, XXXVI, p. 111.
40
GIULIANI. Prova in generale: A) Filosofia del dirito. In: ENCICLOPEDIA del diritto, XXXVII, p. 539.
41
Idem, p. 542.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 153-179, abr./jun. 2013
Como afirma Nicola Picardi, até a Idade Moderna, o processo era considerado
fruto da manifestação da razão prática, não tendo regramento legislado:
[...] al mondo dei fatti viene riconosciuta una autonomia completa: quando
si ammette il fatto come qualcosa di esterno, oggettivo, viene meno
quell’aspetto di contrarietà nella ricerca, che nel passato era sembrato
essenziale, sotto l’influsso delle teoria retoriche e dialettiche. Se il giudice
deve porre a base della decisione il fatto confessato, derivano alcune
conseguenze dal punto di vista lógico: a) la questione di fatto è nettamente
separata dalla questione di diritto (che conosce solo il giudice); b) deve
esistere um rapporto di necessita fra il fatto e la conseguenza giuridica.44
42
GIULIANI. Prova in generale: A) Filosofia del dirito. In: ENCICLOPEDIA del diritto, XXXVII, p. 542.
43
PICARDI. Processo civile (dir. moderno). In: ENCICLOPEDIA del diritto, XXXVI, p. 114.
44
GIULIANI. Il concetto di prova: contributo alla logica giuridica, p. 208.
45
ZANETTI JR. O problema da verdade no processo civil: modelos de prova e de procedimento
probatório. In: ZANETTI JR. Introdução ao estudo do processo civil, p. 143.
46
Idem.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 153-179, abr./jun. 2013
A partir dessa época, o direito, como ciência jurídica, passa a ter como ideal
uma ordenação exaustiva, dominado que é por um pensamento sistemático típico
de uma lógica cientificista.
A assimetria da ordem, contudo, veio aos poucos se mostrando, com a intro
dução lenta e gradual da intervenção judicial nas questões fáticas, visto que, nesse
momento, iudex potest in facto supplere.
Exemplos marcantes nos são apresentados por Carlos Alberto Alvaro de
Oliveira, que, em sua obra Do formalismo no processo civil, explicita os caso da
Prússia, em cuja legislação processual de 1793 e 1795 conferiu ao juiz poderes
de se assegurar das verdadeiras condições dos fatos da causa, bem como o da
reforma promovida por Bellot, no Cantão de Genebra, em que ao juiz é dado até
mesmo investigar os fatos ex officio:
47
OLIVEIRA. Do formalismo no processo civil, 2003, p. 37.
48
OLIVEIRA. Do formalismo no processo civil, 2003, p. 47.
49
GIULIANI. Prova in generale: A) Filosofia del dirito. In: ENCICLOPEDIA del diritto, XXXVII, p. 521.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 153-179, abr./jun. 2013
50
MARTINS-COSTA. Culturalismo e experiência no novo Código Civil. In: DIDIER JR.; MAZZEI (Org.).
Reflexos do novo Código Civil no direito processual, p. 24.
51
MARTINS-COSTA. Culturalismo e experiência no novo Código Civil. In: DIDIER JR.; MAZZEI (Org.).
Reflexos do novo Código Civil no direito processual, p. 24.
52
MARTINS-COSTA, op. cit., p. 25, sintetizando magistralmente a filosofia elaborada por Miguel
Reale.
53
Idem, p. 27.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 153-179, abr./jun. 2013
54
Idem.
55
Idem, p. 28 e OLIVEIRA. A garantia do contraditório. In: OLIVEIRA. Do formalismo no processo civil,
2003, p. 227.
56
OLIVEIRA. Teoria e prática da tutela jurisdicional, p. 124.
57
Idem.
58
Idem, p. 125.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 153-179, abr./jun. 2013
real de obter do juiz uma decisão de mérito, adaptada à natureza das situações
subjetivas tuteláveis, de modo a que seja plenamente satisfeita a necessidade de
tutela manifestada na demanda”.59
A segurança, por sua vez, é o fundamento da garantia do cidadão contra o
arbítrio estatal, sendo ela inafastável da própria noção de Estado de Direito.60
No âmbito do direito processual, a finalidade da segurança é assegurar a
concretização de um processo justo, este entendido não meramente como ofe-
recedor de meios processuais mínimos, mas também de resultados qualitativa-
mente diferenciados, “em que todos os institutos e categorias jurídicas são relidos
à luz da Constituição e o próprio processo civil é materialmente informado pelos
direitos fundamentais”.61
De suma importância a ressalva feita por Carlos Alberto Alvaro de Oliveira
de que o valor da segurança jurídica não deve ser confundido com a manutenção
cega e indiscriminada do status quo, devendo ser evitada a confusão entre segu-
rança jurídica e a ideologia da segurança, cujo objetivo é o imobilismo social.62
De notar-se, ainda, que esses dois valores (efetividade e segurança) se encon-
tram em permanente conflito, pois na medida em que maior é a segurança, menor
será a efetividade, e vice-versa.
Por outro lado, consoante bem coloca Humberto Ávila, o princípio é uma nor-
ma que aponta para um estado ideal de coisas a ser promovido sem, no entanto,
indicar os comportamentos cuja adoção irá contribuir para a promoção gradual
desse ideal.63
Contudo, essa ausência de indicação dos comportamentos necessários
não significa que o seu cumprimento não seja obrigatório. Ao contrário, a mera
instituição do princípio, de per se, já impõe a adoção de condutas adequadas e
indispensáveis à sua promoção.64
Dessarte, o dever de adequação da conduta com o princípio é decorrência
lógica da própria positivação dele. Todavia, como já sabido, a Constituição não
protege apenas um fim, mas vários. Deve-se, então, escolher dentre todos os com-
portamentos adequados para a promoção de um fim — um estado ideal de coisas
— aquela conduta que menos restringe os demais fins do Estado Democrático de
Direito.65
59
OLIVEIRA. Teoria e prática da tutela jurisdicional, p. 127.
60
Idem, p. 129.
61
Idem, p. 131.
62
OLIVEIRA. Teoria e prática da tutela jurisdicional, p. 132.
63
ÁVILA. O que é devido processo legal?. Revista de Processo – RePro, p. 51.
64
Idem, p. 52.
65
ÁVILA. O que é devido processo legal?. Revista de Processo – RePro, p. 53.
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66
Idem.
67
OLIVEIRA. O formalismo-valorativo no confronto com o formalismo excessivo. Revista Forense, p. 19.
68
OLIVEIRA. Os direitos fundamentais à efetividade e à segurança em perspectiva dinâmica. Revista
Forense, p. 45.
69
OLIVEIRA. O formalismo-valorativo no confronto com o formalismo excessivo. Revista Forense, p. 19.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 153-179, abr./jun. 2013
70
OLIVEIRA. Teoria e prática da tutela jurisdicional, p. 133.
71
KNIJNIK. A prova nos juízos cível, penal e tributário, p. 10.
72
KNIJNIK. A prova nos juízos cível, penal e tributário, p. 11.
73
Idem, p. 12.
74
OLIVEIRA. Os direitos fundamentais à efetividade e à segurança em perspectiva dinâmica. Revista
Forense, p. 45.
75
OLIVEIRA. O formalismo-valorativo no confronto com o formalismo excessivo. Revista Forense, p. 19.
76
Idem, p. 13.
77
Idem.
78
REICHELT. A prova no processo civil contemporâneo..., p. 95.
79
KNIJNIK. A prova nos juízos cível, penal e tributário, p. 15.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 153-179, abr./jun. 2013
80
REICHELT. A prova no processo civil contemporâneo..., p. 96.
81
REICHELT. A prova no processo civil contemporâneo..., p. 124.
82
REICHELT. A prova no processo civil contemporâneo..., p. 124.
83
KNIJNIK. A prova nos juízos cível, penal e tributário, p. 13.
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7 Conclusão
Em conclusão, tomando emprestadas as palavras de Alessandro Giuliani, o
direito probatório pode ser considerado como um capítulo da história político-
constitucional de uma época, refletindo as suas variações nas relações de harmo-
nia e dissonância principalmente nas relações institucionais entre legislador e juiz
e entre este e o cidadão.84
A concepção clássica de prova predominou durante a ordem isonômica, entre
os séculos XII a XV, fundada no caráter seletivo do conhecimento e relativo do fato.
Diante da constante presença do problema do erro, da falibilidade humana, nela é
limitado o campo de indagação, com a renúncia ao conhecimento do fato na sua
totalidade.
O pensamento probatório desse período é o de uma verdade provável, ob-
tida a partir da ars oponendi et respondendi (diálogo regrado).
O ordus iudiciarius medieval, apontado por Giuliani como um modelo em
que predomina a ordem isonômica, representa um fator de equilíbrio no consti-
tucionalismo medieval, visto que o próprio direito probatório, assim como o di-
reito processual como um todo, sofre influência direta dos valores constitucionais
predominantes em sua época:
Vale, ainda, ressaltar que o conceito clássico de prova subentende uma filo-
sofia político-constitucional de limitação do poder, vedando qualquer interven-
ção externa ao processo.
84
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R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 181-202, abr./jun. 2013
Introdução
Quando se fala em acesso à justiça, é preciso investigar perspectivas que
o proporcionem de maneira maximizada. Isto é, não basta permitir o acesso à
justiça, é necessário que este ocorra de maneira real, com celeridade e eficiência.
E para que a celeridade e a eficiência se mostrem presentes, bons recursos mate-
riais devem estar disponíveis para a prestação de tutela jurisdicional.
Nesta esfera é que surge a questão da informatização do Poder Judiciário, pois
a tecnologia é uma grande aliada do homem na busca de eficiência para a prestação
de serviços públicos ou privados. Por sua vez, a internet e os seus variados recur-
sos têm se mostrado fundamentais no exercício das atividades do Poder Judiciário,
destacando-se o acompanhamento e o cadastramento de processos on-line.
Cumpre verificar que, num contexto de informatização judiciária total, os pro-
cessos em papel seriam extintos e o peticionamento eletrônico ganharia tamanha
amplitude que as visitas aos fóruns e aos tribunais se tornariam desnecessárias.
Seria também possível falar na realização de defesas orais e de audiências por comu-
nicação simultânea, isto é, por videoconferência.1 Tais recursos tornariam o processo
muito mais célere, garantindo o acesso à justiça de maneira ampla e efetiva.
Contudo, a observação da estrutura judiciária atual demonstra que os recur-
sos tecnológicos não têm sido utilizados nas dimensões de suas capacidades reais.
Apesar da utilização da tecnologia, a informatização total do Poder Judiciário ainda
não ocorreu.
Então, surge o objeto do presente artigo, que visa apurar se a falta de infor
matização do Poder Judiciário em larga escala é um dos fatores responsáveis
pela garantia ineficaz do acesso à justiça. Assim, serão analisadas as questões da
contribuição da tecnologia para o direito processual, dos principais obstáculos à
implantação do processo informatizado e do atual contexto fático e jurídico da
informatização judiciária.
Com efeito, pretende-se compreender as perspectivas atuais da informati-
zação do Poder Judiciário, considerando a necessidade de que a mesma ocorra
em larga escala para que o direito fundamental de acesso à justiça, previsto na
Constituição Federal, seja garantido.
1
No processo penal, a realização de audiências por videoconferência foi autorizada pela Lei
nº 11.900/09, que deve ser utilizada em caráter excepcional. O Código de Processo Civil não disci-
plina tal possibilidade. Contudo, o projeto do novo Código de Processo Civil o faz, em seu artigo
151, §3º: “os processos podem ser, total ou parcialmente, eletrônicos, de modo que todos os atos
e os termos do processo sejam produzidos, transmitidos, armazenados e assinados por meio ele-
trônico, na forma da lei [...]” (BRASIL, 2010, p. 83).
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Para se falar em uma real aplicação do Direito moderno, é preciso focar nas
noções de direitos e garantias fundamentais relacionados ao processo judicial,
entre as quais se encontra o acesso à justiça. A formação do conceito de acesso
à justiça possui diversos enfoques, o que se verifica pelo posicionamento de
Cappelletti e Garth, que apontaram três ondas, ou seja, três posicionamentos
básicos para a realização efetiva de tal acesso.
Primeiramente, Cappelletti e Garth (1998, p. 31-32) entendem que surgiu
uma onda de concessão de assistência judiciária para os pobres, partindo da pres-
tação sem interesse de remuneração por parte dos advogados e, ao final do pro-
cesso, levando à criação de um aparato estrutural para a prestação da assistência
pelo Estado.
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os tribunais brasileiros. Com isso, diversos benefícios serão alcançados. Aliás, sobre
os benefícios do processo eletrônico, entende Mendonça (2008, p. 134):
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2
O Conselho Nacional de Justiça, com o sistema Processo Judicial Eletrônico (PJe), um software recen-
temente elaborado, tem buscado a solução para os problemas da incompatibilidade de softwares e
dos gastos com a informatização. Com tal sistema, “o CNJ pretende convergir os esforços dos tribu-
nais brasileiros para a adoção de uma solução única, gratuita para os próprios tribunais e atenta para
requisitos importantes de segurança e de interoperabilidade, racionalizando gastos com elaboração
e aquisição de softwares” (BRASIL, 2011).
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Lei nº 10.259/01 e a Instrução Normativa TST nº 28, sendo que a última instituiu
o Sistema Integrado de Protocolização e Fluxo de Documentos Eletrônicos da
Justiça do Trabalho.
Nos dizeres de Batista (2010, p. 76), esta lei “é recente e vai contribuir muito
para a celeridade processual, pois, ao se protocolizar um processo, perde-se muito
tempo no cartório, os cartorários têm que numerá-lo, encapá-lo, carimbá-lo etc.,
ou seja, é um outro óbice ao acesso à Justiça”. De maneira geral, afirma-se que a
Lei nº 11.419/06 é o principal diploma regulamentador do processo judicial in-
formatizado, trazendo as diretrizes para a atuação dos profissionais que utilizem
o sistema e disciplinando a estrutura que deverá ser implementada pelo Poder
Judiciário em obediência à lei.
Entre outros aspectos, destaca-se a facultatividade para se aderir ao processo
eletrônico, decorrente da redação do artigo 1º: “o uso de meio eletrônico na tra-
mitação de processos judiciais, comunicação de atos e transmissão de peças pro-
cessuais será admitido nos termos desta Lei” (BRASIL, 2009, p. 1286, grifos nossos).
A Lei nº 11.419/06 acerta ao não impor a utilização dos meios eletrônicos, pois
isso seria muito precipitado, apesar de não existirem dúvidas de que, num futuro
próximo, o processo seja totalmente eletrônico.
Mendonça (2008, p. 130-131) considera, ainda, sobre os principais aspectos
da Lei: protocolo eletrônico no momento de envio da mensagem, prorrogação
dos prazos nos casos de falhas do sistema, criação do Diário de Justiça Eletrônico,
desnecessidade de apresentação dos originais da maior parte dos documentos
digitalizados.
Destacam-se, ainda: o prazo estendido até 24 horas do último dia (artigo
3º, parágrafo único), citações e intimações por meio eletrônico (artigos 5º e 6º),
os autos digitais transmitidos pela internet (artigo 8º), a dispensa da intervenção
do cartório na juntada de petições (artigo 10), o envio eletrônico de documentos
(artigo 13) e as diversas alterações no Código de Processo Civil, modernizando-o
(artigo 20) (BRASIL, 2009, p. 1286-1287).
Segundo Giglio (2007, p. 40), referida Lei, por timidez ou por atraso, acabou
apenas ratificando as medidas que já estavam em prática pela Justiça Federal e
por alguns tribunais trabalhistas. Entretanto, Giglio (2007, p. 42) assevera: “em sín-
tese conclusiva, a Lei nº 11.419 é necessária, progressista, ponderadamente ino-
vadora, coerente, apresenta alguns defeitos, mas merece aplausos pelos acertos,
que superam com folga os desacertos”.
Embora pairem diversas controvérsias sobre a Lei nº 11.419/06, como a ADI
proposta pela Ordem dos Advogados do Brasil versando sobre a constitucionalidade
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Considerações finais
Na era da informação, a sociedade passou a evoluir em um ritmo cada vez
mais acelerado, o que tem gerado diversas modificações em seus modos de rela
cionamento e na estrutura de funcionamento de suas instituições. Se, por um
lado, pode se afirmar que a informatização do Poder Judiciário não está ocor-
rendo por um processo natural, por outro lado, é inegável que existe um clamor
no sentido de que a tecnologia deve se aliar a todas as esferas de atuação humana,
aperfeiçoando, inclusive, a oferta de serviços públicos.
Depois das ondas de acesso à justiça, a busca da prestação de tutela juris-
dicional aumentou progressivamente. Entretanto, o Poder Judiciário não aperfei-
çoou sua estrutura de maneira compatível com as novas exigências sociais, o que
gerou uma crise que vem se alastrando há anos e prejudicando o acesso à justiça.
Como foi dito, para o verdadeiro acesso à justiça, não basta disponibilizar
um fórum para que o sujeito de direito busque a tutela jurisdicional: são necessá-
rios mecanismos diversos e toda uma estrutura apta a garantir esse direito funda-
mental do ser humano, previsto na Constituição Federal.
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É nesta seara que desponta a informatização judiciária, que traz recursos aptos
à maximização do acesso à justiça sob o aspecto estrutural. Tais recursos dotam o
processo judicial de uma maior celeridade e eficiência, o que se mostra essencial
diante dos problemas atualmente enfrentados nos juízos e tribunais. Entre esses
recursos, destacam-se a digitalização dos processos, o peticionamento eletrônico e
a realização de atos processuais com a utilização da internet.
Evidente que o Poder Judiciário possui falhas que não serão solucionadas
pela informatização judiciária, como o pequeno contingente de juízes e cartorá-
rios, o aumento desproporcional do número de demandas e a falta de ética pro-
fissional por parte de alguns. Com certeza, tais problemas merecem a atenção
da sociedade e a busca de soluções rápidas e coerentes. Por outro lado, com o
processo judicial eletrônico será economizado o tempo gasto com a formação de
autos convencionais, o que envolve a extinção das inúmeras certidões exaradas e
a diminuição das diligências praticadas por oficiais de justiça.
Tantos aspectos positivos levam a uma situação de alerta com a qual a socie-
dade se depara: a existência insuficiente de informatização, em especial na esfera da
justiça estadual. O contexto atual da informatização judiciária, infelizmente, demons-
tra que o poder público oferece às instituições tecnologias aquém das disponíveis no
mercado e não investe de maneira suficiente na melhoria da estrutura das mesmas.
De outra forma, é inegável que ocorreu uma evolução no processo de
informatização, principalmente a partir da Lei nº 11.419/06, o diploma legal que
colocou em prática o direito de acesso à justiça decorrente da Carta Magna. Tal
perspectiva leva a crer que, em um futuro próximo, o processo eletrônico será
uma realidade em todos os fóruns e tribunais brasileiros.
Abstract: The present article aims to discuss the connection between the
computerization process of the Judiciary and the maximization of the fun-
damental right of justice access. Such, initially weaves comments about the
justice access concept and its connection with the procedural effectiveness
issue as one of its facets. Then, it exposes about how the technology must
be used as an procedural effectiveness ally, before their particularities which
provides a speedier judicial process. After, it analyzes the obstacles that pres
ent themselves to the total computerization judicial. From there it is consid
ered about the legal and factual context of the computerization process, with
analysis of the Constitution, of the Law n. 11.419/06 and of the Law Project
n. 166/10 (new Code of Civil Procedure), as well as through exposure to specific
cases. So, it is intended to determine which perspectives surrounds, actually,
the issue of the computerization process of the Judiciary.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 181-202, abr./jun. 2013
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R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 181-202, abr./jun. 2013
1
Ponencia ganadora del Premio “Humberto Briseño Sierra”, presentada el 19 de octubre de 2012 al
XII Congreso Nacional de Derecho Procesal Garantista, en la ciudad argentina de Azul.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 205-216, abr./jun. 2013
II
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R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 205-216, abr./jun. 2013
confiable para generarla, por lo que — según los dictámenes de la justicia social
y los principios democráticos liberales — puede ser tranquilamente corregido y
humanizado por la regulación social y económica de un Estado que se encamina
a la erradicación de la pobreza); (iii) la “tercera via” (que repele el “caminar con sus
propios pies” de los liberales, rechaza el “cuidado de la cuna a la tumba” de los
socialdemócratas, admite con pragmatismo la economía globalizada por encima
del Estado, acepta las diferencias de clase y las desigualdades económicas y aboga el
bienestar (no sólo a los excluídos) a través de una política de meritocracia (“opor-
tunidad, no caridad”), que sea fraternal, pero haga contrapeso entre los derechos
y las responsabilidades.
De cualquier manera, todas estas corrientes ideológicas de inspiración socia-
lista están permeadas por idealizaciones como la igualdad material, la justicia social,
la preocupación por los pobres, la colaboración, la prevalencia de lo social sobre lo
individual, la solidaridad y la planificación estatal.
Trasplantados al ámbito jurisdiccional, estos valores causan la infusión de un
“socio-sanitarismo procesal” (hasta ahora tan cara a las demandas sobre welfare
rights, es decir, las demandas sobre derechos de trabajo, seguridad y asistencia
social). Aquí, a diferencia de la concepción liberal clásica del proceso civil, no
está sólo preocupado por “componer lides”. El caballo de batalla de la vanguardia
socialista es resolver el conflicto subyacente con justicia social. Por ninguna otra
razón la figura procesal central es el juez (“juez-gnóstico”), que posee los “poderes
iniciáticos” de transponer a la realidad aparente in statu assertionis. A través de la
Big Science — la Sociología —, el juez desvela la realidad “real” en sus más “pro-
fundas contradicciones” por medio de un “análisis microscópico marginal”, que
hace caso omiso de los principios clásicos del derecho probatorio. En definitiva, se
hace “de la vista gorda” ante el adagio “lo que no consta en los autos, no es de este
mundo” [quod non est en actis hoc non est en el mundo] y la fría “verdad formal” da
paso a la efervescente “verdad material”.
En resumen, el juez del “fabianismo procesal” sigue el script hegeliano de la
“reconciliación con la realidad” [Versöhnung mit der Wirklichkeit]. Por lo tanto, el
proceso deja de ser un instrumento a disposición de las partes para llegar a ser
instrumento público del Estado-clínica para implementar ex cathedra una política
de igualación social [publicismo social]. Más: al juez se confieren amplios poderes
extroversos [principio inquisitivo], por medio de los cuales tendrá que alcanzar la
misión soteriológica de equilibrar las fuerzas entre las partes y promover la igual-
dad sustancial entre ellas.
Para un concepto socialista, un buen juez es un Hobin-Hood, ejecutor de las
ideas de los grandes iconos del “romanticismo social”. A favor del “eslabón más débil”
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 205-216, abr./jun. 2013
III
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 205-216, abr./jun. 2013
etc.), afectada por la crisis económica de la década de 1930 y apretada entre las
grandes potencias empresariales emergentes y los trabajadores organizados. Con
esto, florecieron el odio al capitalismo (mercado libre) y al socialismo (planifica-
ción centralizada). Así, surgió el llamado “corporativismo” y la creencia de que las
clases sociales no se pelean entre sí, pero trabajan en armonía para el bien común
mediadas por el Estado. La base de este nuevo modo de producción sería una
comunidad espiritual nacional y orgánicamente unificada bajo la cohesión social
incondicional, expresada en el lema “L’union fait la force” y gobernada por un es-
tado totalitario bajo el dominio personal de un liderazgo fuerte e invencible (Il
Duce, Der Führer).
Para que todo esto fuese posible, era esencial que las ideas iluministas de
la igualdad, la libertad, la fraternidad y el progreso de la Revolución Francesa de
1789 fuesen aniquiladas por valores marciales como el poder, la guerra, el orden,
la autoridad, la obediencia, la lealtad y el heroísmo. El individualismo debe ceder
el paso, por lo tanto, a una nueva concepción del hombre: un héroe, absorbido
por la comunidad y motivado por los sentimientos de deber, honor, abnegación,
gloria y lealtad absoluta al líder supremo y todopoderoso. De esto podemos ver
que el fascismo nunca se molestó con el desarrollo de un sistema racional y cohe-
rente: era simplesmente “un revoltijo de ideas sin sentido” [Hugh Trevor-Roper].
De todas formas, es posible identificar algunos principios básicos: a) anti-
racionalismo (que hace hincapié en la historia, la mística, el pasado común, el
sentimiento, la cultura, el deseo, el impulso, el instinto y los límites de la razón y
del intelecto); b) lucha (que cree en el darwinismo social y la guerra como medio
de selección natural de los hombres más fuertes); c) socialismo (que desarrolla un
colectivismo materialista y un capitalismo que sirve a los intereses del Estado);
d) ultranacionalismo (que cree en la superioridad de una nación sobre las demás
y fomenta el expansionismo e imperialismo); e) liderazgo (que entiende que la
sociedad civil debe estar guiada por una autoridad carismática, libre de cualquier
atadura constitucional); f ) elitismo patriarcal (que rechaza la igualdad, cree en el
gobierno de una minoría “guerrera” masculina dispuesta a sacrificarse por las masas
ignorantes, débiles y inertes, destinadas a la obediencia ciega).
Trasplantada la Weltanschauung al ambiente jurisdiccional, se llega a un
“dirigismo procesal à outrance”. El proceso se convierte en un regnum iudicis, en
que el juez ejerce una monocracia formalista, legalista y policiesco-inquisitorial.
Por otra parte, los litigantes son vistos como enfermos, que se desentonan de la
armonía socio-orgánica y precisan ser sanados espiritualmente con justicia por el
Estado Paternal (y, si es posible, reconciliados, pero jamás en un contexto alter-
nativo privado extrajudicial: “nada fuera del Estado”, como defendía Mussolini).
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 205-216, abr./jun. 2013
Además en este caso el juez ejerce “poderes ilimitados casi místicos” — en sintonía
con el libre recherche scientifique de los franceses y la Freirechtbewegung de los
alemanes — para transponer la “verdad formal” de los autos del proceso y llegar
a la “verdad material”, ignorando el adagio quod non est en actis hoc non est en el
mundo.
Sin embargo, el juez no manipula estos mecanismos de prueba buscando el
“equilibrio social” de los marxistas aventureros, es decir, con el objetivo de reequi-
librar las partes, que son socioeconómicas desiguales: sua iniciativa probatória es
promovida a tout propos para simplemente reafirmar la autoridad incontestable
del Estado. Es la reducción diestro-hegeliana y ad Hitlerum de la “reconciliación
con la realidad” [Versöhnung mit der Wirklichkeit]. Es como si la jurisdicción, de
acuerdo con la dicción de uno de los grandes teólogos del Estado, fuera “el fin
último”, la “finalidad propia, absoluta e inquebrantable”, el “razonable en sí y por sí
mismo”, que tiene “el derecho supremo contra el individual, cuyo supremo deber
se centra en ser un miembro del Estado”. No por otra razón se admite que el juez
arbitrariamente, sin un propósito específico, imponga ex officio adiciones al objeto
litigioso; llene ex officio la ausencia de presupuestos procesales; fije o investigue
hechos no alegados; relaje el procedimiento estándar; invierta la carga de la prueba;
relativice la cosa juzgada sin provocación de las partes (sobre todo en favor del
Estado); conceda medidas de oficio [activismo autoritario publicístico radical].
En consecuencia, para la concepción fascista, tiene más valor el “juez-general”, el
“monista línea dura”, que es la prima donna del espectáculo procesal.
En consecuencia, el proceso deja de ser un instrumento a disposición de
las partes para llegar a ser un instrumento del Estado-juez a servicio de la pacifi-
cación a forceps y, por conseguiente, un instrumento de dominación [publicismo
estatólatra]. Con esto, el énfasis recae en el estudio dogmático de la jurisdicción,
que efectiviza los derechos subjetivos, no transformando subversivamente la rea-
lidad social a favor de los más necesitados, sino alimentando la libido dominandi
del Estado. Después de todo, más importante que la trascendencia de la jurisdictio
y de suas palabras es la inmanencia del poder jurisdiccional de imperium y su acción
concretizadora.
Por otra parte, el proceso civil es un “bien público”, una “propiedad del
Estado” colocado bajo custodía de un patriciado cartorial formado por plenipo-
tenciarios actores judiciales. Si el juez es el Führer, entonces no es sorprendente
que el contradictorio sea entendido como una cooperación espiritual-orgánica
entre las partes, sin que se pierdan en la dialéctica febril y mezquina del abyecto
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homo economicus liberal. Es decir, bajo los auspicios del ideal de la cooperación
judicial monocéntrica, se ve el contradictorio como un “diálogo” exlético asimé-
trico [= intento de comprensión — a menudo forzado — entre materialmente
desiguales], no como un debate dialéctico simétrico [= desacuerdo entre formal-
mente iguales]. Sin embargo, si el proceso es un instrumento público-estatal, no
puede perderse en trucos, insultos e inmoralidades propios de los lobos capitalis-
tas: la mala fe es demonizada in extremis.
Teniendo en cuenta todas estas consideraciones, se puede concluir que,
para una visión fascista, la consigna del derecho procesal debe ser la efectividad: si
el juez no tiene poder para aplicar sus resoluciones, entonces el proceso no es más
que una guarida de “pronunciamientos inofensivos”. Esta consigna fue adoptada,
según los garantistas, por el Código portugués de procedimiento civil de 1939, las
modificaciones introducidas en la ZPO alemán por medio del Decreto de 8 de no-
viembre de 1933, el Code di Procedura Civile italiano de 1940, el Zivilprozessordnung
austriaco de 1895, hecho por Franz Klein (que el garantismo dice ser el opus magnum
del fascismo procesal, el non plus ultra del protagonismo autoritario judicial y el
“organo metodológico” de todos los activistas judiciocratas).
IV
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“anarquía económica” y presentado por los controles reguladores “de arriba hacia
abajo”, que buscan promover la prosperidad, la armonía en la sociedad civil y la
reducción de las desigualdades de los puntos de partida. Por lo tanto, el Estado
mínimo de los liberales radicales (incapaz de corregir las injusticias y desigualda-
des) y el Estado máximo de los socialistas marxistas (pesado, ineficaz y opresivo)
dan paso a un estado fiscal y ágil, a un “liberalismo de Estado”, que — aunque
sigue siendo oponente de nivelaciones y estandarizaciones sociales — ayuda a la
gente a ayudarse a sí misma, interviene por inducción en la economía y promueve
los servicios de bienestar social, como la salud, la seguridad social y la educación.
La libertad negativa de los liberales clásicos da lugar a una libertad positiva, o sea,
a la idea de que la libertad también puede ser amenazada por las desigualdades
sociales y desventajas muy intensas.
El trasplante de los topoi social liberales al ámbito jurisdiccional (como la
individualidad, la libertad positiva, la cooperación, la regulación, la eficiencia) da
lugar al llamado “gerencialismo procesal civil”. Aquí se desconfía del sistema
adversarial paleoliberal del common law, pues su demora en el desenlace proce-
sal es inaceptable para las demandas actuales de celeridad [right delayed is right
denied]. El engaño y la astucia son vehementemente combatidos por el juez (que
se basa en un sistema de represión de la litigación de mala fe construído sobre
la responsabilidad objetiva del improbus litigator). El magistrado se convierte en
un “regulador”, que no espera más soluciones legislativas milagrosas, asume la
responsabilidad [accountability] por la buena gestión de los procesos e interviene
extra legem — a menudo bajo la racionalidad organizacional y através de técnicas
de gestión computacional — para eliminar los obstáculos que causan la “conges-
tión procesal” y para una resolución de los litígios en “tiempo razonable”.
El proceso es manejado como una “micro-empresa gestionada por la
macro-empresa judicial”, que opera bajo la planificación estratégica, la toma de
decisiones a gran escala y se compone de magistrados dotados de inteligencia
organizacional, liderazgo motivacional y capacidad de movilización. En este caso,
el protagonista de la relación procesal no es la persona del juez o las partes, pero
el Poder Judicial y su poderoso staff asesorial, que sufren una fuerte presión ins-
titucional para el desempeño satisfactorio (que se mide — a la luz de las reco
mendaciones del New Public Management de Mark Moore — por indicadores
estadísticos y supervisión del cumplimiento de metas objetivas).
Se instala un vínculo entre el proceso civil [case mamangement] y las políti-
cas públicas judiciales [court mamangement], ambos impregnados de la filosofía
del Just in time. El juez (visto como un proveedor) y las partes (vistas como los
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moderna, ya no más puede existir el laissez faire laissez passer: el Estado interviene
para estimular la vida social. En el procedimiento civil, esto significa que las “téc-
nicas” de los procesalismos socialista y fascista no se utilizan para compensar la
vulnerabilidad de la parte desfavorecida, o para fortalecer el Estado contra la so-
ciedad civil, pero para garantizar “the just, speedy and inexpensive determination of
every action and proceeding” [Federal Rules of Civil Procedure de los EE.UU., Rule 1].
Es decir, estas “técnicas” son releídas de acuerdo a una mentalidad empresarial. En
la Comunidad Europea, este gerencialismo activista fue elevado a la condicción
de directiva a través de la Recomendación R (1984) 5 del Comité de Ministros del
Consejo de Europa, adoptada en 28 de febrero de 1984 (esta directriz fue adoptada,
por ejemplo, en el §4.9 del Dispute Act de 2005).
Frente a todas estas consideraciones, no es difícil concluir que, a los social
liberales, el lema principal de legitimación es la flexibilidad (prater legem o lograda
a través de textos normativos concisos y escritos en conceptos vagos e impreci-
sos, que permiten al juez un razonamiento sobresuntivo). Todo esto se pone de
acuerdo con el “fetiche business” y sus reingenierías corporativas laboratoriales...
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COSTA, Eduardo José da Fonseca. Los criterios de la legitimación jurisdiccional según los
activismos socialista, facista y gerencial. Revista Brasileira de Direito Processual – RBDPro, Belo
Horizonte, ano 21, n. 82, p. 205-216, abr./jun. 2013.
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1
Texto base da palestra proferida no XXIV Congresso do Instituto Panamericano de Direito Processual
(IPDP), em 18 de abril de 2012, no Colégio de Abogados de La Plata, Argentina.
2
Agradeço ao amigo e conterrâneo Hélio Oliveira Massa, advogado e professor, que gentilmente
revisou o texto e lhe propôs mudanças significativas de conteúdo e estilo.
3
En este abril del año 2012, mi solidaridad al pueblo argentino, sus víctimas y veteranos en el marco
de los 30 años de la Guerra de las Malvinas.
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4
Ainda sobre a influência da Inquisição Espanhola no modelo de processo que ainda hoje prati-
camos no ambiente ibero-americano, notadamente quanto ao protagonismo do juiz no cenário
processual, cf. com muito proveito Adolfo Alvarado Velloso (Garantismo procesal versus prueba
judicial oficiosa. Rosario: Editorial Juris, 2006. p. 48-70).
5
Ver a homenagem póstuma que lhe prestou Andrea Proto Pisani em “Ricordando Franco Cipriani”
(Revista de Processo – RePro, v. 187, p. 435, set. 2010).
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naquele país, vale lembrar —, e, claro, do CPC brasileiro de 19396 e de seu sucessor
de 1973,7 o Código Buzaid.
A conformação do modelo arbitrário e autoritário de processo civil incenti-
vou a produção de uma doutrina maciçamente influenciada por esses valores. No
Brasil, tanto na perspectiva do CPC-39, como do atual CPC-73, a matiz publicista
sempre esteve na pauta das especulações da doutrina e da consequente casuís-
tica jurisprudencial.
Contudo, apesar da radical mudança de paradigma ocorrida posterior-
mente à Segunda Grande Guerra, onde — ao menos no mundo ocidental —
criou-se uma ordem constitucional (=Constituições) e internacional (=Pactos
Internacionais) democrática, toda essa influência acabou por projetar luzes no
processo civil e no papel que o juiz deve exercer por seu intermédio. Daí surge a
ideia do devido processo garantida constitucionalmente, com todos os consectá-
rios que esta cláusula constitucional impõe: ampla defesa, contraditório, impar-
cialidade, impartialidade etc.
Mesmo diante de uma nova ordem de coisas, a doutrina tradicional do pro-
cesso civil seguiu a produzir e a difundir as concepções publicistas do final do
século XIX, época em que amadurecia na Europa uma das vertentes do Estado
Contemporâneo: o Estado do Bem-estar Social, ou Welfare State.8
6
Na Exposição de Motivos do CPC-39, Francisco Campos deixa claro qual foi a opção política que
orientou a estruturação daquele código. Uma leitura atenta dessa Exposição de Motivos chamará
— creio eu — a atenção do leitor para os tópicos em que o respectivo discurso foi desenvolvido,
por exemplo: “Decadência do processo tradicional”; “O processo como instrumento de domina-
ção política”; “A concepção duelística e a concepção autoritária do processo; “Sentido popular do
novo sistema”; “A restauração da autoridade e o caráter popular do Estado”; “A função do juiz na
direção do processo”; “Chiovenda e a concepção publicística do processo”. Além de outros, sob
esses tópicos paradigmáticos o Ministro da Justiça do Estado Novo de Getúlio Vargas sustentou a
concepção (ultra)publicista e autoritária que deveria orientar o trato do processo civil de modo a
se buscar os fins do Estado.
7
Quanto ao CPC-73, cf. Alfredo Buzaid: “[...] ainda no derradeiro quartel do século XIX, dois Códigos
— o da Alemanha e o da Áustria — que tiveram grande ascendência sobre os monumentos ju-
rídicos dos tempos atuais. Dado o rigor científico dos seus conceitos e precisão técnica de sua
linguagem, impuseram-se como verdadeiros modelos, a que se seguiram as elaborações legis-
lativas dos Códigos do século XX” (Linhas fundamentais do sistema do Código de Processo Civil
brasileiro. In: BUZAID, Alfredo. Estudos e pareceres de direito processual civil: notas e adaptação ao
Direito Vigente de Ada Pellegrini Grinover e Flávio Luiz Yarshell. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2002. p. 33). Ver, ainda, da pena do mesmo Buzaid “Exposição de Motivos do Código de Processo
Civil”. In: Capítulo II – Do sistema do Código de Processo Civil vigente, nº 3.
8
Sobre a ideia de Estado Contemporâneo e Estado do Bem-estar, ver ESTADO contemporâneo.
In: BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de política. 10. ed.
Brasília: UnB, 1997. v. 1, p. 401-409 e, ESTADO do bem-estar. In: Norberto; MATTEUCCI, Nicola;
PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de política. 10. ed. Brasília: UnB, 1997. v. 1, p. 416-419.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 217-227, abr./jun. 2013
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A experiência nos mostra que é mais comum do que deveria ser essa distorção
na ordem das coisas, onde o mundo “prático” do processo nem sempre coincide com
o mundo “idealizado” na Constituição que, em última análise, representa as próprias
diretrizes que a sociedade constitucionalmente organizada se impôs. A realidade do
Poder Judiciário, lamentavelmente, nos mostra isso de forma bastante visível.
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É verdade que boa parte dos códigos de processo civil dos países latino-
americanos foram legislativamente elaborados na perspectiva (ultra)publicista
que caracteriza o ativismo judicial, que continua a orientar o plano pragmático
do processo jurisdicional. Contudo, o fato é que as Constituições do período pós-
Segunda Guerra têm primado pela elaboração de uma ordem constitucional que
viabiliza a contenção do Poder estatal, inclusive no que diz respeito ao processo
jurisdicional de criação do Direito. A previsão do enunciado prescritivo contido no
inciso LIV do art. 5º da Constituição brasileira é uma demonstração dessa opção
política do poder constituinte originário: “ninguém será privado da liberdade ou
de seus bens sem o devido processo legal”. E ainda que se tenha feito através de
representantes, não nos esqueçamos de que o poder constituinte originário emana
do povo.
Quanto mais o processo civil for pensado-reformulado-operado-concre-
tizado nas diretrizes dogmáticas do garantismo processual, mais se viabilizará o
(re)equilíbrio entre os modelos semântico e pragmático de processo jurisdicional.
Mais se estará aproximando o prescrito na Constituição (=democrática e republi-
cana) com o praticado no processo de criação do Direito pelo Poder Judiciário.
6 Fechamento
O processo civil com viés autoritário e arbitrário do modelo pragmático que
praticamos não gera a solução dos problemas sociais, além de ser antidemocrático,
antirrepublicano e de representar um hipertrofismo do Poder Judiciário contrário
— ao também constitucional — princípio da Separação dos Poderes.
Nós, os processualistas, precisamos abdicar de nossa soberba e aceitar, uma
vez por todas, que nem o processo, nem o juiz, tampouco o Poder Judiciário, podem
viabilizar uma pragmática apartada das prescrições constitucionais. Até porque não
seremos nós, tampouco o será a autoridade judicial, que redimiremos os “males” da
vida em sociedade.
Por certo, há muito que fazer por intermédio do jurídico e do processo de
criação do Direito. Mas que se o faça conforme as diretrizes do modelo semântico
projetado desde a Constituição. A vida na democracia-republicana impõe que o
Poder seja exercido dentro das garantias constitucionais.
Do contrário, continuaremos subservientes ao arbítrio e/ou ao sentimento
coletivo que muitas vezes ignora os limites que nos impusemos através de nossas
Constituições. Daí, o devido processo legal, tal como a própria “justiça”, passará do
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 217-227, abr./jun. 2013
mundo terreno ao etéreo como algo que permanecerá guardado dentro de cada
um de nós como sentimento pessoal irrealizável.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 217-227, abr./jun. 2013
Lúcio Delfino
Advogado. Diretor da Revista Brasileira de Direito Processual –
RBDPro. Doutor em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo. Membro do Instituto Panamericano de Direito Processual.
Membro do Instituto Iberoamericano de Direito Processual. Membro
do Instituto Brasileiro de Direito Processual. Membro da Academia
Brasileira de Direito Processual Civil. Membro do Instituto
dos Advogados Brasileiros. Membro do Instituto dos
Advogados de Minas Gerais.
Fernando F. Rossi
Advogado. Diretor da Revista Brasileira de Direito Processual –
RBDPro. Mestre em Direito. Membro do Instituto Iberoamericano
de Direito Processual. Membro do Instituto Brasileiro de Direito
Processual. Presidente da Primeira Seção do Instituto
dos Advogados de Minas Gerais.
1 Delimitação do estudo
A proposta deste ensaio se limita a: (i) apontar os significados assumidos
pelo contraditório no paradigma do Estado Democrático de Direito; (ii) esclarecer
1
Palestra proferida em 09 de maio de 2013, por Lúcio Delfino, no I Congresso Internacional de
Processo Civil de Presidente Prudente, na cidade de Presidente Prudente, SP, cuja coordenação cien-
tífica coube aos professores Sergio Almeida Ribeiro e Alexandre Freire.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 229-254, abr./jun. 2013
que apesar da renovação vivenciada, tanto as partes como o juiz possuem papéis
bem definidos naquilo que diz respeito a esse direito fundamental; (iii) afastar a
ideia de que o juiz é paritário no diálogo processual com as partes; (iv) refutar a
impressão segundo a qual o contraditório implica deveres não só para o juiz mas
também para as próprias partes; e, por fim, (v) assinalar que a cooperação deve ser
trabalhada em sintonia com o caráter litigioso que distingue o objeto do processo,
em respeito à liberdade das partes e sem desprezar que cada qual delas têm por
alvo desideratos próprios e contrastantes entre si.
2
Essa é, por exemplo, a opinião de Leonardo Greco: “Hoje, o contraditório ganhou uma proteção
humanitária muito grande, sendo, provavelmente, o princípio mais importante do processo. Ele é
um mega-princípio que, na verdade, abrange vários outros e, nos dias atuais, não satisfaz apenas
com uma audiência formal das partes, que é a comunicação às partes dos atos do processo, mas
deve ser efetivamente um instrumento de participação eficaz das partes no processo de forma-
ção intelectual das decisões” (GRECO. Instituições de processo civil, v. 1, p. 540-541).
3
Assim pensa Fazzalari: “[...] o processo é um procedimento do qual participam (são habilitados
a participar) aqueles em cuja esfera jurídica o ato final é destinado a desenvolver efeitos: em
contraditório, e de modo que o autor do ato não possa obliterar as suas atividades” (FAZZALARI.
Instituições de direito processual, p. 118-119). Também segue entendimento similar Hermes Zaneti
Júnior: “Logo, se o processo é specie e o procedimento é genus, se o processo é a espécie de
procedimento adjetivada do contraditório (autiatur et altera pars) e da racionalidade prática pro-
cedimental (com a formação da decisão no iter discursivo), consequentemente não há dúvida de
que o contraditório é o ‘valor-fonte’ do processo (qualquer processo), em particular do processo
judicial. Significa dizer que a estrutura dialética é a ratio distinguendi entre o processo e o proce-
dimento, e que sem contraditório não há processo [...]” (ZANETI JÚNIOR. Processo constitucional:
o modelo constitucional do processo civil brasileiro, p. 194). Em igual sentido, a lição de Aroldo
Plínio Gonçalves: “Pelo critério lógico, as características do procedimento e do processo não devem
ser investigadas em razão de elementos finalísticos, mas devem ser buscadas dentro do próprio
sistema jurídico que os disciplina. E o sistema normativo revela que, antes que distinção, há entre
eles uma relação de inclusão, porque o processo é uma espécie do gênero procedimento, e, se
pode ser dele separado é por uma diferença específica, uma propriedade que possui e que o torna,
então distinto, na mesma escala em que pode haver distinção entre gênero e espécie. A diferença
específica entre o procedimento em geral, que pode ou não se desenvolver como processo, e o
procedimento que é processo, é a presença neste do elemento que o especifica: o contraditório.
O processo é um procedimento, mas não qualquer procedimento; é o procedimento de que par-
ticipam aqueles que são interessados no ato final, de caráter imperativo, por ele preparado, mas
não apenas participam; participam de uma forma especial, em contraditório entre eles, porque
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seus interesses em relação ao ato final são opostos” (GONÇALVES. Técnica processual e teoria do
processo, p. 68). Cite-se ainda a pena de Daniel Mitidiero: “O processo, que é necessariamente um
procedimento em contraditório adequado aos fins do Estado Constitucional, reclama para sua
caracterização a estruturação de um formalismo que proponha um debate leal entre todas as
pessoas que nele tomam parte” (MITIDIERO. Colaboração no processo civil: pressupostos sociais,
lógicos e éticos, p. 134).
4
Sobre a evolução dos significados do princípio do contraditório, consultar os seguintes trabalhos:
DELFINO. O processo democrático e a ilegitimidade de algumas decisões judiciais. In: DELFINO.
Direito processual civil: artigos e pareceres, p. 29-80; GONÇALVES. Técnica processual e teoria do
processo; MADEIRA. Processo de conhecimento & cognição: uma inserção no Estado Democrático
de Direito; MITIDIERO. Colaboração no processo civil: pressupostos sociais, lógicos e éticos; NUNES.
O princípio do contraditório: uma garantia de influência e de não surpresa. In: DIDIER JR.; JORDÃO
(Coord.). Teoria do processo: panorama mundial, p. 151-172; OLIVEIRA. Garantia do contraditório;
PINTO. A causa petendi e o contraditório; THEODORO JÚNIOR; NUNES. Uma dimensão que urge
reconhecer ao contraditório no direito brasileiro: sua aplicação como garantia de influência, de
não surpresa e de aproveitamento da atividade processual. Revista de Processo; ZANETI JÚNIOR.
Processo constitucional: o modelo constitucional do processo civil brasileiro.
5
Não é adequado resolver o problema segundo uma cômoda posição formalista, que atribui legiti-
midade à atividade jurisdicional porque a Constituição prevê a nomeação de juízes mediante con-
curso de provas e títulos (argumento normativo, formal, procedimental). Ainda que tal resposta
não possa ser desprezada, é ela simplista e tangencial, pois negligencia o cerne da questão e, de
tal modo, não colabora o suficiente para seu desenlace. Ou seja, afirmar que a Constituição é que
determina a maneira pela qual os juízes são nomeados não esclarece, na essência, as razões pelas
quais o poder jurisdicional, apesar de emanado do povo, não é exercido por intermédio de repre-
sentantes eleitos (CF, parágrafo único do art. 1º, primeira parte). Tampouco responde como as deci-
sões judiciais, proferidas por juízes não eleitos, detêm autoridade para invalidar atos legislativos e
administrativos oriundos da atuação de representantes democraticamente eleitos pelo povo.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 229-254, abr./jun. 2013
6
GARGARELLA. La justicia frente al gobierno, p. 9. Não escapa de Luiz Guilherme Marinoni esta
questão: “O debate em torno da legitimidade da jurisdição constitucional, ou melhor, a respeito
da legitimidade do controle da constitucionalidade da lei, funda-se basicamente no problema da
legitimidade do juiz para controlar a decisão da maioria parlamentar. Isso porque a lei encontra
respaldo na vontade popular que elegeu o seu elaborador — isto é, na técnica representativa.
Por outro lado, os juízes, como é sabido, não são eleitos pelo povo, embora somente possam ser
investidos no poder jurisdicional através do procedimento traçado na Constituição, que prevê
a necessidade de concurso público para o ingresso na magistratura de 1º grau de jurisdição —
de lado outros critérios e requisitos para o ingresso, por exemplo, no Supremo Tribunal Federal”
(MARINONI. Teoria geral do processo, p. 431).
7
A expressão solipsismo judicial traduz-se num espaço subjetivo o qual se encontra blindado ao
exercício pleno do contraditório, dele se originando decisões judiciais decorrentes do labor soli
tário do juiz, ao arrepio da necessária colaboração das partes. O juiz solipsista é aquele que se basta em
si, egoísta, encapsulado, que atua solitariamente, pois compromissado apenas com a sua própria
subjetividade. Para um aprofundamento acerca dos significados dessa expressão, verificar: DIAS;
FIORATTO. A conexão entre os princípios do contraditório e da fundamentação das decisões na
construção do Estado democrático de direito. Revista Eletrônica de Direito Processual; MADEIRA.
Processo de conhecimento & cognição: uma inserção no Estado Democrático de Direito; STRECK. O
que é isto: decido conforme minha consciência?.
8
Cleber Lúcio de Almeida apresenta visão bastante similar a que ora se defende: “O Estado
Democrático de Direito tem como característica essencial a criação das normas jurídicas gerais
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 229-254, abr./jun. 2013
e abstratas pelos seus destinatários (construção participada da ordem jurídica). Nesse sentido,
estabelece o art. 1º, parágrafo único, da Constituição da República que todo poder emana do
povo. Contudo, no verdadeiro Estado Democrático de Direito, não é suficiente a construção par-
ticipada da ordem jurídica. Nele, o processo judicial, como instrumento de atuação de uma das
funções do Estado, deve estar em sintonia com os princípios adotados constitucionalmente, dos
quais decorre o direito fundamental de participação na tomada de decisões. Por essa razão, tam-
bém a norma jurídica concreta — a norma regente do caso submetido ao Poder Judiciário ou o
direito no caso concreto — deve ser construída com a participação dos destinatários dos seus
efeitos (construção participada da decisão judicial ou do direito no caso concreto). A participação
das partes na formação do direito no caso concreto opera em favor da consolidação do Estado
Democrático de Direito, uma vez que ser senhor do próprio destino é participar não só da cria-
ção, mas também da aplicação das normas jurídicas gerais e abstratas a casos concretos”. Mais à
frente, leciona: “Participar da formação da decisão judicial é, também, participar da compreensão
do significado das normas jurídicas gerais e abstratas (interpretação). Essa participação legitima
a atribuição de significado à norma constante da decisão e a torna mais objetiva, uma vez que
construída a partir de diversos pontos de vista” (ALMEIDA. A legitimação das decisões judiciais no
Estado democrático de direito).
9
DELFINO. O processo democrático e a ilegitimidade de algumas decisões judiciais. In: DELFINO.
Direito processual civil: artigos e pareceres, p. 29-80. Aceitar o contraditório como direito de
influência implica obrigatoriamente rever o conceito de jurisdição para atribuir-lhe novos contor-
nos, afeiçoados ao marco do Estado Democrático de Direito. Nesse rumo, leciona André Cordeiro
Leal, em sua tese de doutoramento: “[...] no Estado Democrático de Direito, em sua visão procedi-
mental, não mais se poderia afirmar a jurisdição como atividade do juiz no desenvolvimento do
poder do Estado em dizer o direito ou em aplicá-lo ao caso concreto, mas, sim, como o resultado
necessário da atividade discursiva dos sujeitos do processo a partir de argumentos internos ao
ordenamento” (LEAL. Instrumentalidade do processo em crise, p. 34).
10
Caso grave de lesão ao contraditório ocorre quando juiz conhece de controvérsia não suscitada
na petição inicial — e, portanto, não impugnada pelo demandado —, decidindo a lide segundo
molde jurídico (enquadramento jurídico) diverso daquele segundo o qual foi proposta. Assim agindo
ulcera também de morte o denominado princípio da congruência, que vincula a decisão judi-
cial à causa de pedir e ao pedido. Sob essa perspectiva, merecem revisão os brocardos da mihi
factum, dabo tibi ius e iura novit curia. Atualmente não há como aceitar que a colaboração das
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 229-254, abr./jun. 2013
partes se restrinja ao material fático; deve igualmente ser observada no que concerne às matérias
jurídicas. A decisão não pode, pois, surpreender as partes, nem fática, nem juridicamente. E mais
uma observação: a vedação de decisões-surpresas naquilo que toca às matérias jurídicas deve ser
trabalhada em atenção ao compromisso que possui o magistrado com a ordem jurídica. Daí se
afirmar, sempre, que o contraditório impõe ao magistrado o dever de aperfeiçoar o contraditório,
algo que deve ser realçado quando o que está em jogo é o debate do enquadramento jurídico
dos fatos. Afinal, o Código de Processo Civil prevê a possibilidade de manejo da ação rescisória
quando a sentença (ou acórdão) violar literal disposição de lei (CPC, art. 485, V). Isso apenas signi-
fica que o juiz não está autorizado a aplicar ao caso concreto solução decorrente de norma legal
que não se ajusta à realidade fática; é que, se assim proceder, seja por qual motivo for, violará o
ordenamento jurídico, maculando sua decisão com vício gravíssimo passível de rescisão.
11
Esclarece Enrico Redenti que as partes têm o legítimo interesse de obter uma decisão e de influen-
ciar, com aporte ou com a oferta de contribuições, tanto temáticas quanto informativas, demons-
trativas, críticas ou polêmicas, a formação de seu conteúdo; o contraste dialético ou dialógico que
deriva do contraditório fornece ao juiz, imparcial e prudente, os elementos necessários e suficien-
tes (do ponto de vista da lei) sobre o tema e sobre o modo de decidir, com resultantes de relativa
justiça (REDENTI. Diritto processuale civile, v. 2, p. 25-26). Nesse mesmo sentido, Daniel Mitidiero:
“[...] exigir-se que o pronunciamento jurisprudencial tenha apoio tão-somente em elementos
sobre os quais as partes tenham tido a oportunidade de se manifestar significa evitar a decisão-
surpresa no processo. Nesse sentido, têm as partes de se pronunciar, previamente à tomada de
decisão, tanto a respeito do que se convencionou chamar questões de fato, questões de direito e
questões mistas, como no que atine à eventual visão jurídica do órgão jurisdicional diversa daquela
aportada por essas ao processo. Fora daí há evidente violação à cooperação e ao diálogo no
processo, com afronta inequívoca ao dever judicial de consulta, e ao contraditório” (MITIDIERO.
Colaboração no processo civil: pressupostos sociais, lógicos e éticos, p. 136-137). Em linha seme-
lhante, Dierle José Coelho Nunes: “Neste Estado democrático os cidadãos não podem mais se
enxergar como sujeitos espectadores e inertes nos assuntos que lhes tragam interesse, e sim
serem participantes ativos e que influenciem no procedimento formativo dos provimentos (atos
administrativos, das leis e das decisões judiciais), e este é o cerne da garantia do contraditório.
Dentro desse enfoque se verifica que há muito a doutrina percebeu que o contraditório não pode
mais ser analisado tão somente como mera garantia formal de bilateralidade da audiência, mas,
sim, como uma possibilidade de influência (Einwirkungsmöglichkeit) sobre o desenvolvimento do
processo e sobre a formação de decisões racionais, com inexistentes ou reduzidas possibilidades
de surpresa. Tal concepção significa que não se pode mais na atualidade, acreditar que o contra-
ditório se circunscreva ao dizer e contradizer formal entre as partes, sem que isso gere uma efe-
tiva ressonância (contribuição) para a fundamentação do provimento, ou seja, afastando a idéia
de que a participação das partes no processo pode ser meramente fictícia e mesmo desnecessá-
ria no plano substancial” [NUNES. O princípio do contraditório: uma garantia de influência e de
não surpresa. In: DIDIER JR.; JORDÃO (Coord.). Teoria do processo: panorama mundial, p. 151-172].
Assim pensa, por igual, o festejado processualista mineiro, Ronaldo Brêtas: “A nosso ver, esse con-
siderado trinômio estrutural do contraditório — informação-reação-diálogo — que se instala na
dinâmica do procedimento acarreta a correlação do princípio do contraditório com o princípio da
fundamentação das decisões jurisdicionais. Por consequência, no Estado Democrático de Direito,
é esta forma de estruturação procedimental que legitima o conteúdo das decisões jurisdicionais
proferidas ao seu final, fruto da comparticipação dos sujeitos do processo (juiz e partes contradi-
toras), gerando a implementação técnica de direitos e garantias fundamentais ostentados pelas
partes” (DIAS. Processo constitucional e Estado Democrático de Direito, p. 104).
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 229-254, abr./jun. 2013
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14
Segundo pontua Ronaldo Brêtas de Carvalho Dias, “deve ser energicamente descartada qualquer
doutrina que sugira aos órgãos estatais (juízes e tribunais) o exercício da função jurisdicional sob cri-
térios outros dissociados da constitucionalidade da jurisdição, ao revés, marcados de forma incons-
titucional e antidemocrática pela arbitrariedade, pela discricionariedade, pelo subjetivismo, pelo
messianismo, pelas individualidades carismáticas ou pela patologia que denominamos complexo
de Magnaud” (DIAS. Responsabilidade do Estado pela função jurisdicional, p. 134).
15
Aqui a referência aos sofistas é feita de maneira elogiosa, em atenção ao legado positivo deixado
por esses grandes mestres do embate discursivo. Bem diferentemente, portanto, da imagem que
lhes era atribuída por Sócrates, Platão e Aristóteles, hoje muito questionada, que os viam como
demagogos e falsos filósofos. Para um maior aprofundamento no tema: GUTHRIE. Os sofistas.
16
MITIDIERO. Colaboração no processo civil: pressupostos sociais, lógicos e éticos, p. 102.
17
OLIVEIRA; MITIDIERO. O direito fundamental ao contraditório e sua centralidade no processo cole-
tivo. In: ASSIS et al. (Coord.). Processo coletivo e outros temas de direito processual, p. 131.
18
Daniel Mitidiero, ao que tudo indica, usa a expressão diálogo processual com o propósito de se
referir exclusivamente ao diálogo travado entre partes e juiz. Não estaria, assim, referindo-se ao
contraditório em si mesmo, isto é, ao debate entre as partes, com a intenção de nele (=contradi-
tório, debate entre as partes) incluir também a participação do juiz. O diálogo processual (=coo-
peração) seria para o mestre gaúcho um modo de distribuir poderes na comunidade de trabalho
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entre “partes ß à juiz” e “juiz ß à partes”, e não entre parte ß à parte ß à juiz ß à parte.
Ainda que tenha sido realmente essa a intenção do ilustre processualista — com a qual se con-
corda em sua plenitude —, crê-se, por razões adiante desenvolvidas, que: (i) não existe paridade
no diálogo processual entre juiz e partes; (ii) o contraditório não implica deveres das partes para
com o juiz.
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É bem verdade que ninguém defende abertamente a possibilidade de um juiz contraditor. Não
obstante, hoje em doutrina é prevalente o entendimento de que se deve incentivar um prota-
gonismo judicial em matéria probatória a fim de tornar mais efetivo e justo o processo, além de
assegurar a igualdade entre as partes. O próprio ordenamento processual, aliás, segue esse rumo
(CPC, art. 130). Para os que assim pensam não haveria aí um risco à imparcialidade do julgador,
desde que se respeitem alguns limites, entre eles o próprio contraditório (MATTOS. Da iniciativa
probatória do juiz no processo civil, p. 103-104; BRAGA. Iniciativa probatória do juiz no processo civil,
p. 81-82; BEDAQUE. Poderes instrutórios do juiz, p. 158-159). Entretanto, há nesse raciocínio uma
armadilha muitas vezes não percebida: é que ao introduzir provas ao processo, o juiz, muito sutilmente,
deixa de lado a sua condição de terceiro (impartialidad) e passa a operar, ainda que inconscien-
temente, como verdadeira parte, ou como auxiliar de uma delas. E assim procedendo, atuando
como deveria laborar a parte beneficiada pela prova, vulnera o contraditório, desequilibra o de-
bate, tudo em prejuízo da contraparte, que agora terá que se voltar também contra o próprio
magistrado. Portanto, a própria legislação brasileira — em artigo de lei concebido anteriormente
à Constituição Federal de 1988 —, e também a doutrina, admite uma espécie de juiz contraditor:
aquele que determina, de ofício, a produção de provas. Sobre o assunto, especificamente acerca da
perda da qualidade de terceiro imparcial do juiz que no processo introduz oficiosamente meios
de prova e da lesão ao contraditório que isso acarreta, adverte Girolamo Monteleone: “Nadie
quiere un juez passivo e inerte, impotente espectador de las astucias de las partes y de suas
defensores, pero sí se quiere evitar que el processo este permanentemente sustraído a la disponi-
bilidade de los titulares de los interesses en juego para ser encomendado a un órgano autoritário
e incontrolado, que produce resultados como los arriba ilustrados. Nadie quiera la injusticia y
la ineficácia de la jurisdicción, pero precisamente, para evitar que ello ocurra, se requiere alejar
diligentemente toda, aunque lejana, confusión de pepeles en el processo; es decir, que el juez y
las partes permanezcan siempre en su sitio. En efecto, como ha perfectamente escrito tambíen
Montero Aroca, atribuir al juez el poder de introducir de oficio médios de prueba en sentido
estricto (no solo simples médios instructorios recognocitivos) significa exatamente atribuirle
también el ropaje y los poderes de la parte. Si no hay duda de que el processo se resuelve en el
contradictorio entre los contendientes y que éstos tienen el derecho y la carga de oferecer al juez
las pruebas de los hechos alegados en sostén de suas demandas, excepciones y defensas con
la finalidade de que éste pueda rectamente decidir, no hay igualmente duda que encomendar
también a él el impulso pobatorio lo ponga en el mismo plano de la parte vulnerando el princi-
pio del contradictorio y el derecho de defensa. La parte, en efecto, actúa y se defende en juicio
frente al adversário, no del juez, por lo que cuando entra en el ruedo, introduciendo a su discre-
ción pruebas sobre hechos deducidos en litis, altera profundamente el contradictorio y perde
su calidad más essencial y genética de terceiro imparcial. De tal modo, no solo se corrompen
irremediablemente la jurisdicción y el processo, sino que se abre el caminho a la arbitrariedade y
a la injusticia” [MONTELEONE. El actual debate sobre las orientaciones publicísticas del processo
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civil. In: MONTERO AROCA (Coord.). Proceso civil y ideologia: un prefacio, una sentencia, dos cartas
y quince ensayos, p. 173-197]. Em termos diversos, porém pontuando sua contrariedade com os
chamados poderes instrutórios do juiz, leciona Pontes de Miranda: “Dar ao juiz o direito de orde-
nar produção de testemunhas que as partes não ofereceram, ou mandar que se exibam docu-
mentos, que se acham em poder da parte, e não foram mencionados pela parte adversa, ou pela
própria parte possuidora, como probatórios de algum fato do processo, ou deliberar que uma
das partes preste depoimento pessoal, é quebrar toda a longa escadaria, que se subiu, através de
cento e cinquenta anos de civilização liberal” (PONTES DE MIRANDA. Comentários ao Código de
Processo Civil, t. II, p. 514). Numa perspectiva diversa, vale aqui a lembrança do primoroso estudo,
elaborado por Dierle Nunes, em que resgata os traços do movimento da socialização processual,
ocorrido no segundo pós-guerra, especialmente nos países do Leste Europeu e sob a inspiração
do sistema processual soviético (URSS). De suas conclusões sobressai uma espécie perigosíssima
de juiz contraditor, que tudo podia e tudo devia fazer àquele tempo em nome dos ideais estatais.
Leciona o mestre mineiro, com apoio na doutrina de Comoglio: “A adoção de poderes oficiosos
do julgador ganhou uma dimensão que nem mesmo Menger imaginara, uma vez que, além do
modelo convencional de ativismo judicial, permitiu-se àquele a não-vinculação às alegações e
provas deduzidas pelas partes, estando autorizado a suscitar de ofício aspectos fáticos e ques-
tões relevantes para a decisão, podendo, inclusive, decidir ultra petita e atribuir formas de tutela
não requeridas que considerasse mais apropriadas ao caso em discussão” (NUNES. Processo juris-
dicional democrático: uma análise crítica das reformas processuais, p. 110-111).
20
Aqui a expressão juiz contraditor é utilizada figurativamente; uma imagem cujo propósito é servir
de expediente para convencer. O ideal, por conseguinte, seria que permanecesse no plano da ima-
ginação. Mas isso não ocorre, infelizmente. O fantasioso, vez ou outra, materializa-se, tornando-se
uma palpável (e incoerente) realidade: o juiz contraditor não é mero personagem de quadrinhos.
Em nota de rodapé anterior já se aludiu ao art. 130 do Código de Processo Civil que, ao atribuir
poderes instrutórios ao juiz, transforma-o num contraditor, em desprestígio a alguns direitos
fundamentais processuais integrantes do devido processo legal (contraditório, juiz natural, igual-
dade). Mas há outros exemplos dessa anomalia. A pretexto de limitar e corrigir contratações de
natureza privada, envolvendo honorários entre advogados e seus clientes, alguns juízes traba-
lhistas do Rio Grande do Sul têm condicionado a homologação de acordos judiciais à renúncia
da cobrança de honorários por parte dos advogados. Há casos em que os juízes fazem inserir,
por sua própria iniciativa, nos termos de conciliação e em decisões judiciais, a “cláusula” de que
os honorários contratuais não serão endevidos (OAB-RS reage contra intromissão de juízes em
honorários. Consultor Jurídico. Disponível em: <www.conjur.com.br>. Acesso em: 24 ago. 2012).
Sem contar os variados desvios ao ordenamento jurídico que daí se infere (problemas relaciona-
dos à competência, à lesão ao direito de ação e ao princípio do juiz natural), o exemplo ilustra a
presença entre nós de juízes que agem como se partes fossem, pequenos déspotas que marcam,
com a sua própria vontade e subjetivismo, acordos cuja característica mais relevante haveria de
ser a liberdade das partes.
21
Entretanto, não se crê acertada a afirmação feita pelos mestres no sentido de que o juiz encontra-se
em posição de paridade com as partes no diálogo processual.
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Mas por que é inconcebível um juiz contraditor? O tema não é de todo novo
e já fora objeto dos estudos de Elio Fazzalari,22 Aroldo Plínio Gonçalves23 e, mais
recentemente, resgatado por Flaviane de Magalhães Barros Pellegrini24 e Kelen
Cristina Fonseca de Sousa.25 A indagação que se coloca é: em seu papel de garan-
tir às partes oportunidades no exercício do contraditório, assegurar o direito delas
de igual participação, oportunizar o debate sobre todas as questões surgidas ao
longo do feito, enfim, essa participação ativa do juiz no iter processual o transforma
também em um contraditor?
A resposta só poderia ser negativa. No debate processual o juiz não se situa
em posição paritária com as partes simplesmente porque não é destinatário dos
atos decisórios. Não é contraditor e sim um estranho no que tange aos interesses
em contenda, não sendo parte interessada naquilo que se discute no processo;
é o autor do provimento, não o seu alvo.26 É terceiro imparcial, não parte parcial.
O contraditório é exercido unicamente pelos contraditores (leia-se partes e seus
advogados), aqueles que se digladiam ao longo do processo, defendem suas razões
fáticas e jurídicas, produzem provas e contraprovas e que são titulares de posi-
ções jurídicas ativas e passivas perante o órgão jurisdicional, envolvidos na causa
por seus próprios, parciais e pessoais interesses.
A expressão juiz contraditor denota então — reafirme-se em outros termos
— um oximoro: aproxima conceitos que não combinam, com significados opos-
tos e que verdadeiramente se repelem; onde se situa um, o outro não se ajus-
ta.27 Afinal, é incoerente pensar naquele que representa o Estado e cuja função
22
FAZZALARI. Instituições de direito processual.
23
GONÇALVES. Técnica processual e teoria do processo.
24
PELLEGRINI. O paradigma do Estado Democrático de Direito e as teorias do processo. Revista
Eletrônica da Faculdade Mineira de Direito.
25
SOUSA. O princípio do contraditório: uma reconstrução sob a ótica do paradigma do Estado Demo
crático de Direito. Não publicada.
26
Nessa linha, o discurso de Fazzalari: FAZZALARI. Instituições de direito processual, p. 121-124.
Aroldo Plínio Gonçalves, por sua vez, adverte que o juiz colabora, enquanto sujeito do processo,
do diálogo que deve resultar a decisão para o caso concreto, mas isso “não o transforma em con-
traditor, ele não participa ‘em contraditório com as partes’, entre ele e as partes não há interesses
em disputa, ele não é ‘interessado’, ou um ‘contra-interessado’ no provimento. O contraditório
se passa entre as partes porque importa no jogo de seus interesses em direções contrárias, em
divergência de pretensões sobre o futuro provimento que o iter procedimental prepara, em opo-
sição. [...] O contraditório realizado entre as partes não exclui que o juiz participe atentamente
do processo, mas, ao contrário, o exige, porquanto, sendo o contraditório um princípio jurídico,
é necessário que o juiz a ele se atenha, adote as providências necessárias para garanti-lo, deter-
mine as medidas adequadas para assegurá-lo, para fazê-lo observar, para observá-lo, ele mesmo”
(GONÇALVES. Técnica processual e teoria do processo, p. 121-123).
27
Alguns exemplos de oximoros: melodia calada, instante eterno, luz escura, visão cega, triste glória,
vida morta, fogo gelado...
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Alvarado Velloso apresenta a distinção entre impartialidad e imparcialidad. Segundo leciona, “la
idea de imparcialidad indica que el tercero que actúa en calidad de autoridad para procesar y
sentenciar el litigio debe ostentar claramente ese carácter: para ello, no ha de estar colocado
en la posición de parte (impartialidad) ya que nadie puede ser actor o acusador y juez al mismo
tiempo; debe carecer de todo interés subjetivo en la solución del litigio (imparcialidad) y debe
poder actuar sin subordinación jerárquica respecto de las dos partes (independencia)” (VELLOSO.
El garantismo procesal, p. 20-21). Também sobre a temática, Gustavo Calvinho: “Retomando el
examen conceptual, juntamente con la independencia de los poderes institucionales y no insti-
tucionales debe buscarse la imparcialidad intrajuicio, lo que significa — desde lo objetivo — que
el órgano que va a juzgar no se encuentre comprometido por sus tareas y funciones ni con las
partes — impartialidad — ni con los intereses de las partes — imparcialidad. De esta forma se
va a lograr entonces el famoso triángulo de virtudes del órgano jurisdiccional que son impartia-
lidad, imparcialidad e independencia. La autoridad impartial es aquella que no se involucra en el
debate rompiendo el equilibrio y sustituyendo o ayudando a los contendientes en sus activida-
des específicas, como pretender, ofrecer prueba y producirla. Este elemento, por consiguiente, se
relaciona con la actividad de procesar y el respeto a los roles de los litigantes y a las reglas prees-
tablecidas de debate. La independencia, en cambio, marca el respeto por la libertad de decisión,
sólo limitada en cuanto a la obediencia al ordenamiento jurídico, sin que se acepten presiones,
órdenes o sometimiento a otros poderes institucionales o no institucionales — como grupos
económicos o medios masivos de comunicación — sean o no sujetos del proceso. Un correcto
sistema de designación y remoción de los jueces y ciertas garantías de intangibilidad de remune-
raciones, permanencia e inamovilidad en sus funciones ayudan en este aspecto” (CALVINHO. La
ineludible vinculación de la imparcialidad del juzgador a un concepto de proceso alineado con
los derechos fundamentales. Revista Brasileira de Direito Processual – RBDPro).
29
Como forma de impor freios à atividade estatal jurisdicional e evitar possíveis arbítrios, instituiu-se,
também como cláusula pétrea, o direito fundamental de proibição do juízo ou tribunal de exceção
(ou, simplesmente, princípio do juiz natural). Representa, destarte, mais uma engrenagem que
compõe o complexo mecanismo de legitimação e controle da atividade jurisdicional e do seu
resultado — legitimação pelo devido processo legal. De uma maneira singela, o princípio traduz a
ideia de que o órgão jurisdicional, devidamente investido no cargo, e as regras de competência,
às quais se encontra vinculado, hão de preexistir aos fatos envolvidos no julgamento, jamais,
então, concebidos a partir deles. Afiançam-se, com isso, as diretrizes da imparcialidade e da inde-
pendência do órgão judiciário, além de robustecer a garantida de igualdade entre as partes. Ao
afirmar que ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente (CRFB,
art. 5º, LIII), o constituinte estabeleceu uma condição prévia para validar a atuação do Estado-juiz.
A atividade jurisdicional, assim, se legitimará não pela presença de qualquer autoridade, mas
apenas pela da autoridade jurisdicional, preconcebida conforme os ditames constitucionais, e
cuja competência já se encontre antecipadamente estabelecida no ordenamento jurídico. Enfim,
a jurisdição se legitima desde que presidida por um juiz constitucional, isto é, aquele que, além
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de prévia e legitimamente investido no poder jurisdicional, é o autorizado, mediante regras de
competência antecipadamente positivadas em abstrato, a atuar em dada circunstância e num
específico caso concreto. Também se constata a mesma intenção do constituinte quando afirma
que não haverá juízo ou tribunal de exceção (CRFB, art. 5º, XXXVII): tal dispositivo reforça a veda-
ção da admissão de órgãos jurisdicionais criados ex post facto, cuja essência se prende à preocu-
pação implícita de assegurar não só a independência e a imparcialidade do juiz, mas também a
própria igualdade das partes no curso do procedimento judicial. Há de se lembrar, sempre, que
num Estado Democrático de Direito, no qual o exercício do poder não se resume a uma atividade
solitária do juiz — já que oriunda da participação de todos os atores processuais (partes e juiz)
—, seria mesmo inconcebível admitir-se a criação de órgão jurisdicional — ou mesmo de regras
de competência — depois de ocorrido o fato a ser julgado, sobretudo pela alta dose de autori-
tarismo que essa circunstância representaria, sabe se lá viciada por quais interesses escusos e
inescrupulosos do Estado ou mesmo de grupos de interesses a ele vinculados.
30
Não se ignora a possibilidade de os direitos fundamentais protegerem eventualmente o próprio
Estado. Afinal, não obstante em sua origem terem por titularidade as pessoas naturais, limitando
a atuação do Estado em prol do indivíduo, com a evolução dos tempos as Constituições asse-
guraram direitos fundamentais também às pessoas jurídicas e, depois, às pessoas estatais. Isso,
entretanto, não autoriza a ilação de que todo e qualquer direito fundamental tem como titulares
pessoas naturais, jurídicas e estatais, uma vez que alguns deles encontram-se restritos a deter-
minadas classes. No que diz respeito ao contraditório, sua titularidade atinge todo aquele que se
encontra na situação de parte, indistintamente, seja indivíduo, pessoa jurídica ou ente estatal.
Nem é necessário dizer que o juiz não se situa no âmbito processual como parte, mas, sim, como
autoridade jurisdicional, representante do Estado, equidistante dos litigantes e sem qualquer inte-
resse pessoal no litígio.
31
Para José Carlos Barbosa Moreira o conteúdo da garantia do contraditório traduz-se em fonte dos
poderes das partes no âmbito do procedimento [MOREIRA apud RICCI. Princípio do contraditó-
rio e questões que o juiz pode propor de ofício. In: FUX; NERY JR.; WAMBIER (Coord.). Processo e
Constituição: estudos em homenagem ao Professor José Carlos Barbosa Moreira, p. 495-499].
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32
Fredie Didier Jr. e Pedro Henrique Pedrosa Nogueira, em sua original obra Teoria dos fatos jurí-
dicos processuais, analisam pormenorizadamente o fato jurídico processual. Elucidam que a nor-
ma, enquanto proposição, prevê hipoteticamente fatos de possível ocorrência no mundo — fatos
ou conjuntos de fatos previstos abstratamente, cuja denominação corrente é “suporte fático”.
Quando aquilo que está previsto na norma se concretiza, dá-se a incidência, e o fato passa a ser
considerado jurídico. É então a partir da ideia de fato jurídico como produto da incidência da nor-
ma sobre seu suporte fático que se separa mundo dos fatos e mundo jurídico — o mundo jurídico
traduz-se no conjunto delimitado pelos fatos que adquiriram, em razão da incidência, relevância
para o direito. Essas as suas palavras: “pela juridicização do fático, o direito adjetiva os fatos para
serem considerados jurídicos e assim tecerem o mundo jurídico”. Dessa premissa, por conse-
guinte, decorre a divisão do mundo jurídico em três planos distintos: existência (entram todos os
fatos jurídicos, sem exceção), validade (restrito aos fatos jurídicos caracterizados pela relevância
da vontade no suporte fático; os atos jurídicos lato sensu); e eficácia (incluem-se os fatos jurídicos
aptos a produzirem seus efeitos típicos) (DIDIER JR.; NOGUEIRA. Teoria dos fatos jurídicos proces-
suais, p. 26-27). No que tange propriamente ao plano da eficácia, Didier e Nogueira pontuam que
as situações jurídicas são um tipo de eficácia jurídica, vale dizer, são categorias eficaciais, que não
obstante pressuporem um fato jurídico, já estavam previstas em abstrato no consequente, ou no
preceito, da norma. E, para os mestres, as situações jurídicas, encaradas lato sensu, “abarcam todo
o tipo de eficácia jurídica, inclusive a relação jurídica, que é a mais importante das categorias
eficaciais”. As relações jurídicas seriam, pois, espécie de situação jurídica, normalmente produzi-
das pelos fatos jurídicos, e que para existirem pressupõem: (i) a vinculação de, pelo menos, dois
sujeitos (princípio da intersubjetividade); (ii) um objeto (princípio da essencialidade do objeto);
(iii) com correspectividade de direitos, deveres e demais categorias coextensivas (pretensão,
obrigação etc.) (princípio da correspectividade de direitos e deveres) (DIDIER JR.; NOGUEIRA.
Teoria dos fatos jurídicos processuais, p. 119-120). Ainda mais precisamente, lecionam: “O traço
característico da relação jurídica está na circunstância de que ela vincula, pelo menos, dois su-
jeitos de direito a respeito de um objeto, tendo como conteúdo mínimo um direito (prestacional
ou potestativo) e a sua correlata situação jurídica passiva (dever ou estado de sujeição), além
de suas respectivas extensões, como as pretensões, ações, obrigações, e situação de acionado”
(DIDIER JR.; NOGUEIRA. Teoria dos fatos jurídicos processuais, p. 128). Segundo se pensa, é esse
o caso do preceito constitucional que dispõe sobre o contraditório: ele estabelece uma relação
jurídica. Reza o art. 5º, LV, da Constituição que “aos litigantes, em processo judicial ou adminis-
trativo [...] são assegurados o contraditório e a ampla defesa [...]”. Ora, o contraditório é previsto
como eficácia jurídica da incidência do suporte fático do aludido enunciado normativo. Basta,
portanto, ser litigante, em processo judicial ou administrativo (incidência do suporte fático), para
que o contraditório seja assegurado (eficácia jurídica). É o contraditório uma situação jurídica
relacional, a envolver, de um lado, o Estado-juiz, a quem cumpre o dever de assegurar aos litigan-
tes o contraditório, e, de outro, os litigantes (demandante e demandado), que detêm o direito de
exercer o contraditório. Em tal perspectiva, não há como vislumbrar paridade entre juiz e partes
no diálogo processual decorrente do contraditório — o diálogo processual que caracteriza o
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contraditório é algo que diz respeito exclusivamente às partes (e seus advogados). Tampouco é
apropriado afirmar que o contraditório implica deveres de conduta (de esclarecimento, consulta,
prevenção e auxílio) também para as partes — os deveres de conduta oriundos do contraditório
são unicamente do juiz para com as partes. Ou em outros termos: o contraditório pode ser enca-
rado como a eficácia jurídica (de cunho relacional) proveniente da incidência do suporte fático
do art. 5º, LV, da Constituição, isto é, uma situação jurídica de perspectiva dupla (relação jurídica
processual), porque engendra deveres para o Estado-juiz (situação jurídica passiva) e direitos para
as partes (situação jurídica ativa).
33
GUSMÃO. Introdução à ciência do direito, p. 69.
34
Afirmar que os princípios constitucionais — em especial o contraditório — detém caráter deon-
tológico não quer significar desprezo ao seu caráter axiológico. Nessa linha, elucida André do Vale
Rufino, em apego aos ensinamentos de Habermas: “Pode-se dizer então que as normas apresen-
tam uma dupla face: por um lado, determinam o que é devido (elemento normativo, diretivo,
imperativo, isto é, deontológico); por outro, contêm um juízo de valor ou critério de valor (de
justificação ou de crítica) sobre o que é devido (elemento valorativo ou axiológico). Os elementos
deontológico e axiológico representam, por assim dizer, as duas faces de uma mesma norma”
(RUFINO. Estrutura das normas de direitos fundamentais: repensando a distinção entre regras, prin-
cípios e valores, p. 160).
35
Equivocam-se aqueles que pensam que o direito fundamental à ampla defesa é algo inerente
apenas àqueles que se encontram no polo passivo da relação jurídica processual. Bem diferen-
temente, trata-se de um direito fundamental conexo ao contraditório, cujos destinatários são
demandante e demandado, voltado a permitir que ambos exercitem amplamente suas posições
jurídicas ao longo do processo, desenvolvam e debatam as suas teses, produzam provas e con-
traprovas etc. Aliás, a literalidade do art. 5º, LV, da Constituição, não deixa dúvidas quanto aos
destinatários da ampla defesa e também do contraditório: “aos litigantes, em processo judicial ou
administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com
os meios e recursos a ela inerentes”.
36
Daniel Mitidiero não nega essa imperatividade decorrente do princípio do contraditório. Em artigo
escrito para responder algumas críticas formuladas por Lenio Streck, esclarece o processualista
quais as consequências do não atendimento aos deveres de colaboração: “[...] inconstitucionali-
dade por afronta ao direito fundamental ao processo justo (art. 5º, LIV, CF/1988), possibilidade de
responsabilização judicial (art. 133, CPC) e, especificamente no caso de dever de auxílio, possi-
bilidade de multa punitiva à parte que, indiretamente, frustra a possibilidade de colaboração do
juiz para com a parte contrária (art. 14, CPC)”. E continua: “O juiz que se omite no cumprimento
de seus deveres de cooperação viola o direito ao processo justo. Os deveres de esclarecimento,
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de diálogo e de prevenção, como se resolvem em deveres que o juiz pode cumprir independen-
temente de qualquer conduta a ser adotada pela parte contrária perante a qual tem o dever de
colaborar, podem gerar responsabilização do juiz por ausência (art. 133, CPC). Já o dever de auxílio,
que muitas vezes depende de determinado comportamento da parte contrária para que o juiz
possa colaborar com a outra, dá lugar à possibilidade de o órgão jurisdicional sancioná-la por
descumprimento de seu dever de obediência ao juízo (art. 14, CPC)” (MITIDIERO. Colaboração no
processo civil como prêt-à-porter?: um convite ao diálogo para Lenio Streck. Revista de Processo,
p. 55-69). Parece claro que a maioria dessas consequências decorrem justamente da normativi-
dade que caracteriza o contraditório, sobretudo de sua face deontológica, que une partes e juiz
numa relação que envolve direitos e deveres. E, frente a esses deveres destinados a concretizar
um direito (fundamental) daqueles que litigam no âmbito judicial, crê-se realmente que não é
adequado defender uma atuação paritária no diálogo processual entre partes e juiz. Eles, partes e
juiz, não atuam nessa engrenagem em igualdade, mas, sim, em posição de subordinação, de sujeição.
37
MOREIRA apud RICCI. Princípio do contraditório e questões que o juiz pode propor de ofício. In:
FUX; NERY JR.; WAMBIER (Coord.). Processo e Constituição: estudos em homenagem ao Professor
José Carlos Barbosa Moreira, p. 495-499.
38
Essas as palavras exatas de Edoardo Ricci quanto ao ponto: “À luz dessas premissas, o problema da defi-
nição do contraditório como garantia fundamental pode ser abordado com clareza. Evidentemente,
tal garantia concerne aos poderes das partes no processo. Mas, por outro lado, diria respeito à sua
cooperação com o juiz, na busca da solução mais justa e, ainda, à cooperação do juiz com as partes
por razão de solidariedade? Acreditamos que não. A busca de decisão mais justa mediante debate
das partes e a solicitação do juiz como cooperação não dizem respeito ao contraditório como garan-
tia, mas à sua utilização em razão de outras finalidades” [RICCI. Princípio do contraditório e questões
que o juiz pode propor de ofício. In: FUX; NERY JR.; WAMBIER (Coord.). Processo e Constituição: estudos
em homenagem ao Professor José Carlos Barbosa Moreira, p. 495-499].
39
Fala-se muito hoje em “princípio” da colaboração (ou da cooperação), tanto na doutrina nacional
como na estrangeira. Crê-se, todavia, acertada a crítica de Lenio Streck no sentido de que não há
propriamente um “princípio” da cooperação”. O que existem, acredita-se, são deveres do magis-
trado para com as partes decorrentes da norma legal que prevê o contraditório. Sobre o embate
doutrinário sobre ser ou não a cooperação um princípio, é válido consultar: STRECK. Verdade e
consenso, p. 485; MITIDIERO. Colaboração no processo civil como prêt-à-porter?: um convite ao
diálogo para Lenio Streck. Revista de Processo.
40
Apesar de o contraditório ser um direito fundamental processual, cujo exercício cabe às par-
tes, decorrem dele deveres dirigidos ao juiz. O juiz não exerce o contraditório, mas está obriga-
do a assegurar o seu exercício pelas partes e também prima pelo seu aprimoramento. É nessa
perspectiva que se pode concluir que a ideia de colaboração do juiz para com as partes advém
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por certo, não significa ampliar os contornos do contraditório para admitir em seu
núcleo conceitual a participação paritária do juiz, mas apenas aceitar que seus
reflexos implicam deveres correlatos ao Estado-juiz necessários à sua adequada
concretização.
4 Considerações finais
De tudo o que foi aqui trabalhado, arremate-se com as seguintes conclusões:
1 Na atualidade não mais se concebe o contraditório mediante feições
meramente formais. Para além do binômio informação-reação, hoje surge como
um direito de influência na construção do provimento jurisdicional, pautado num
viés exegético mais consentâneo aos ideários constitucionais, em especial à con-
cepção de democracia.
2 Esse vigor democrático que se imputa atualmente ao contraditório, de
outro lado, eleva sobremaneira a sua importância de controlar a atividade juris-
dicional e o seu resultado. Afinal, a imperatividade proveniente da norma funda-
mental obriga o juiz a curvar-se diante dela, a respeitar seu conteúdo substancial,
a observá-la em atenção principalmente aos seus novos matizes. Isso somente
quer significar mais segurança jurídica, transparência e previsibilidade, vale dizer,
representa uma garantia no sentido de que se encontra vedada a produção de
decisões judiciais em desatenção à dialética processual, decorrente do labor soli-
tário do julgador (=solipsismo judicial).
3 O juiz tem o dever de assegurar o contraditório e de provocar o seu ama-
durecimento. Isso, contudo, não o torna um contraditor porque não é destinatário
dos atos decisórios. É terceiro imparcial e não parte parcial. Enfim, o contraditório é
um tributo à liberdade das partes no processo — exercitada segundo os limites da
lei, naturalmente —, um coringa que lhes avaliza a autoridade do seu discurso, do
seu labor argumentativo e probatório em prol de seus interesses pessoais, a garan-
tia de que a decisão judicial seguirá um rumo previsível, alheio à surpresa, estranho
a raciocínios solipsistas. É um direito em favor dos litigantes contra o arbítrio estatal
do contraditório, não significando isso, todavia, a legitimação de um juiz contraditor, que atue
no âmbito processual em paridade com as partes. Salvo engano, Dierle Nunes encampa enten
dimento semelhante: “No entanto, na ótica democrática, o contraditório vem reassumir o seu
papel de fomentador e garantidor da comparticipação e do debate, ao ser encarado em perspec-
tiva normativa”. E conclui: “Seria, assim, resgatado o seu papel fundamental no dimensionamento
processual, de forma a assegurar a influência dos argumentos suscitados por todos os sujeitos
processuais e garantir que, nas decisões, não aparecessem fundamentos que não tivessem sido
submetidos ao espaço público processual” (NUNES. Processo jurisdicional democrático: uma análise
crítica das reformas processuais, p. 258).
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 229-254, abr./jun. 2013
41
A expressão comunidade de trabalho denota que o processo é método civilizado destinado a
resolver conflitos de interesses, que se presta, sobretudo, a legitimar (e controlar) a jurisdição e os
seus resultados. Contudo, rotular o processo de comunidade de trabalho ou de método civilizado
de diálogo não significa desconsiderar que em seu bojo o que há é verdadeiramente um litígio
entre dois antagonistas, que buscam a vitória mediante o alcance de objetivos diversos, parciais
e singulares.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 229-254, abr./jun. 2013
7 De forma mais técnica: reza o art. 5º, LV, da Constituição que “aos litigantes,
em processo judicial ou administrativo [...] são assegurados o contraditório e a
ampla defesa [...]”. O contraditório corresponde à eficácia jurídica decorrente da
incidência do suporte fático do aludido enunciado normativo. Basta, portanto,
ser litigante, em processo judicial ou administrativo (incidência do suporte fático),
para que o contraditório seja assegurado (eficácia jurídica). É o contraditório uma
situação jurídica relacional, a envolver: de um lado, o Estado-juiz, a quem cumpre
o dever de assegurar aos litigantes o contraditório; de outro, os litigantes (deman-
dante e demandado), que detêm o direito de exercer o contraditório. Daí é que se
conclui: (i) não há como vislumbrar paridade entre juiz e partes no diálogo proces-
sual decorrente do contraditório — o diálogo processual que caracteriza o con-
traditório é algo que diz respeito exclusivamente às partes (e seus advogados); (ii)
tampouco é apropriado afirmar que o contraditório implica deveres de conduta
(de esclarecimento, consulta, prevenção e auxílio) também para as partes — os
deveres de conduta oriundos do contraditório são unicamente do juiz para com
as partes. Em síntese: o contraditório pode ser encarado como a eficácia jurídica
(de cunho relacional) proveniente da incidência do suporte fático do art. 5º, LV,
da Constituição, isto é, uma situação jurídica de perspectiva dupla (relação jurídica
processual), porque engendra deveres para o Estado-juiz (situação jurídica passiva)
e direitos para as partes (situação jurídica ativa).
8 Não se nega a relevância da colaboração do juiz para com as partes no âm-
bito processual. Muito pelo contrário. Afinal, tal desiderato (colaboração, coope-
ração, comparticipação) sintoniza-se aos anseios democráticos, fomenta soluções
de conflitos mediante transações, além de favorecer decisões mais amoldadas aos
aspectos fáticos e jurídicos desenhados pelo litígio. É sobretudo uma vacina pode-
rosíssima contra as chamadas decisões-surpresa. O problema denunciado aqui se
liga, isso sim, à dinâmica dessa colaboração. Até onde pode avançar o juiz, em seu
diálogo com as partes, alicerçado em seu dever de cooperar? Qual o limite a ser
respeitado por ele a fim de que não se torne também um contraditor? Acredita-se
que as intervenções do juiz devem se pautar pela prudência. Cumpre-lhe influir
nos arrazoados apresentados para indicar ali pontos que se lhe apresentem obs-
curos, ou lhe pareçam equivocados, vale dizer, é sua função provocar o debate
entre os contraditores a fim de sanar dúvidas existentes, forçar a exploração pe-
las partes de aspectos fáticos e jurídicos ainda não adequadamente aclarados
ou amadurecidos (dever de esclarecimento).42 Compete-lhe, por igual, prevenir as
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 229-254, abr./jun. 2013
43
SOUSA. Estudos sobre o novo processo civil, p. 65-66.
44
SOUSA. Estudos sobre o novo processo civil, p. 66-67.
45
SOUSA. Estudos sobre o novo processo civil, p. 67.
46
A expressão comparticipação é muito cara a Dierle Nunes: “O resgate do papel da participação no es-
paço público processual de todos os envolvidos (cidadãos ativos), na perspectiva policêntrica e com-
participativa, permitirá o redimensionamento constitucional da atividade processual e do processo,
de modo a guindá-lo a seu real papel de garantidor de um debate público e dos direitos funda-
mentais, de uma estrutura dialógica de formação de provimentos constitucionalmente adequados”
(NUNES. Processo jurisdicional democrático: uma análise crítica das reformas processuais, p. 260).
47
Um exemplo que bem retrata a filosofia do socialismo processual é aquilo que alguns chamam de
“princípio da parcialidade positiva do juiz”, com adeptos no Brasil, inclusive. Em palestra ganhadora
do Prêmio “Humberto Briseño Sierra”, apresentada em 19 de outubro de 2012, no XII Congresso
Nacional de Direito Processual Garantista, realizado na cidade argentina de Azul, Eduardo José
da Fonseca Costa, com o seu brilho característico, elucidou, em perspectiva crítica, as caracterís-
ticas de um bom juiz segundo um conceito socialista — o chamado “juiz Hobin-Hood”: “Para un
concepto socialista, un buen juez es un Hobin-Hood, ejecutor de las ideas de los grandes iconos
del “romanticismo social”. A favor del “eslabón más débil” de la relación procesal — una iniciativa
conocida como “parcialidad positiva” (?!) — el juez puede hacer más flexible el procedimiento
estándar legal (aunque aquí, por regla general, sea realizado un procedimiento sumario y oral),
invertir la carga de la prueba, relativizar pro misero el rigorismo de la cosa juzgada (lo que explica
la propagación contra legem de la cosa juzgada secundum eventum probationis en Brasil, especial-
mente en las lides sobre seguridad y asistencia social), interferir en la formación del objeto litigioso,
satisfacer las carencias en materia de prueba (esto no insulta a la “imparcialidad”?) y conceder
medidas autosatisfactivas ex officio [activismo autoritario “socioequilibrante”, que los críticos ven
como praxis gauchiste]”. Mais à frente, concluiu o mestre: “[...] el activismo autoritario engagée del
procesualismo socialista predica la “parcialidad positiva” como criterio de legitimidad de la activi-
dad jurisdiccional (que no es más que una degradación de la imparcialidad). Dentro de la trilogía
estructural del proceso, el objetivo socialista de desestructuración es el concepto de jurisdicción
(y el principio constitucional que lo protege — la imparcialidad)” (COSTA. Los critérios de la legiti-
mación jurisdiccional según los activismos socialista, facista y gerencial).
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 229-254, abr./jun. 2013
dúvida, à própria liberdade das partes e aos seus direitos mais elementares.48 Sob
o signo da colaboração, segundo tal ângulo, vivenciaria um regime procedimen-
tal (e não processual) marcado pela indiferença em relação à participação dos
litigantes, tudo legitimado pela busca da verdade.49 Para ser ainda mais claro: o
48
Ao denunciar uma crise de identidade vivenciada pelo processo civil brasileiro, Glauco Gumerato
Ramos, com a inteligência que lhe é característica, apresenta contundente crítica ao protagonis-
mo judiciário: “Mas um fator preponderante continua a lhe marcar o perfil e isso a despeito do
ambiente democrático e republicano estabelecido pela Constituição de 1988: continua sendo um
CPC ‘do juiz’, um CPC autoritário, um CPC viabilizador das mais perversas arbitrariedades. Ou seja:
mudou-se muito, mas nada — ou muito pouco — mudou. Na essência, os matizes metodológicos
do nosso CPC continuam a movimentar uma engrenagem na qual o processo civil se desenvolve
como categoria jurídica a serviço da jurisdição (=Poder), e não como estrutura democrática e repu-
blicana viabilizadora da dialética que caracteriza o devido processo legal (=Garantia). E a prova de
que pouco mudou está no fato de que atualmente tramita na Câmara dos Deputados um antepro-
jeto de novo CPC. Eis aí o ‘processo civil gattopardista’ a que me refiro no título acima. Queremos
mudar novamente, mas pouco será mudado! A atuação do prático diante do Poder Judiciário ‘civil’
nos mostra isso, apesar de a dogmática (doutrina) continuar a nos seduzir com um discurso legi-
timador desse ‘poderoso juiz’ que tudo pode em nome da ‘verdade’, da ‘justiça’ e da concretização
de um ‘processo justo’. O processo civil dos livros (law in books) é romântico; o processo civil da
prática (law in action) é assustador, ao menos na perspectiva dos artífices da postulação (advoca-
cia, MP, defensoria pública). Estes são testemunhas do ultraje que a garantia do devido processo
legal sofre no dia a dia do foro cível — além do penal, é claro! — nas mãos desse ‘juiz redentor’
dos males da sociedade, tão decantado em verso e prosa nas lições da grande maioria dos nossos
processualistas e que tanta influência exerce sobre nossa jurisprudência. Ignoramos que de nossa
Constituição da República transborda um modelo semântico-processual garantista e nos deixa-
mos levar por um arbitrário e equivocado modelo pragmático-processual de viés ativista, onde
avulta a figura de um juiz comprometido com a própria ‘justiça subjetiva’ que melhor lhe ocorrer
diante do caso concreto. Não é incomum que na cena processual nos deparemos com justiceiros
— e não com juízes — agigantados sob o sacrossanto manto da toga” (RAMOS. O processo civil
gattopardista dos Juizados Especiais. Revista Brasileira de Direito Processual – RBDPro, p. 37-42).
49
Sobre o problema da verdade, esclarece Andrea A. Meroi, com amparo em Luigi Ferrajoli: “La
verdad procesal en cuanto a los hechos (quaestio facti) consiste en la confirmación de la aserción a
su respecto y se resuelve mayormente por vía inductiva conforme a los datos probatórios. La idea
según la cual es posible alcanzar y afirmar una verdade objetiva, certa, absoluta es ‘en realidade
una ingenuidade epistemológica que las doctrinas jurídicas ilustradas del juicio como aplicación
mecânica de la ley comparten com el realismo gnosiológico vulgar’ (Luigi Ferrajoli). Y si aune n el
campo de las llamadas ‘ciencias duras’ se afirma hoy que a lo máximo que podemos aspirar es a
una verdade aproximativa, cuánto más cabrá decir respecto de la verdade procesal, condicionada
adicionalmente por sérios limites: a) la verdade procesal de la quaestio facti es apenas probabilís-
tica [...]; b) el conocimiento judicial de esa verdade sobre las aserciones fácticas es ineludiblemen-
te subjetivo [...]; c) el conocimiento judicial de la quaestio facti es un ‘discurso institucionalizado’,
sometido a un ‘método legal de comprobación procesal’, que hace de la verdad sobre los juicios
de hechos una verdade inevitabelemente aproximativa [...]” (MEROI. Resignificación del ‘contra-
dictorio’ en el debido proceso probatório. In: CONTROVERSIA procesal, p. 80-83). Na mesma
vereda, ensina Adolfo Alvarado Velloso que a verdade não é um problema primordial do Direito;
primordial é a sua missão básica e elemental de alcançar e manter a paz dos homens que convi-
vem em um tempo e lugar determinado. Complementa o mestre argentino: “Si la verdade fuere
realmente un problema jurídico primordial y su búsqueda la exclusiva o principal determinante
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de toda y de cualquiera actuación de los jueces, poderían coexistir con él los institutos del sobre-
seimiento, de la absolución por la duda, de cualquier tipo de caducidade (de la instancia, de la
producción de la prueba, etc), de las cargas probatórias, de la congruência procesal como clara
regla de juzgamiento, de la prescripción liberatória, de la cosa jusgada, de la imposibilidad de
decuzir excepciones relacionadas con la causa obligacional en la ejecución de títulos cambiários,
etc., etc? La respuesta negativa es de toda obviedade...?” [VELLOSO. La imparcialidade judicial y
el sistema inquisitivo de juzgamiento. In: MONTERO AROCA (Coord.). Proceso civil y ideologia: un
prefacio, una sentencia, dos cartas y quince ensayos, p. 217-247]. Para situar a crítica em termos
nacionais, pense-se apenas no instituto da revelia, que autoriza o juiz a admitir como verdadeiros
os fatos afirmados pelo demandante em caso de ausência de defesa (CPC, art. 319).
50
A essência litigiosa, atribuível ao fenômeno que se desenvolve processualmente, não escapou à
percepção de Daniel Mitidiero. Tanto assim que, juntamente com Luiz Guilherme Marinoni, criti-
cou o projeto do novo CPC apresentado ao Senado, que, em seu art. 5º, previa que “as partes têm
direito de participar ativamente do processo, cooperando entre si e com o juiz e fornecendo-lhe
subsídios para que profira decisões, realize atos executivos ou determine a prática de medidas de
urgência”. Assinalou, enfim, que é “a própria estrutura adversarial ínsita ao processo contencioso
que repele a ideia de colaboração entre as partes” (MARINONI; MITIDIERO. O projeto do CPC, p. 73).
51
Confira-se, em rota oposta, o que pensa o mestre paulista, Cassio Scarpinella Bueno: “Certo que
as partes, como sujeitos parciais da relação processual, e o juiz, na qualidade de sujeito imparcial,
não têm interesses iguais refletidos no contraditório. Este, o juiz, não pode, por definição, ter
interesse nenhum naquilo que julga, sob pena de ruptura com um dos sustentáculos da juris-
dição, que é a imparcialidade; aquelas, as partes, têm interesses seus deduzidos em juízo, e que
são, por definição, também colidentes. Isso, contudo, não significa que não exista outro tipo de
interesse, que é comum a todos os sujeitos processuais, que é o de resolver a questão pendente de
apreciação pelo Poder Judiciário da melhor forma possível, imunizando-a de ulteriores discussões”
(BUENO, Cassio Scarpinella. Amicus Curiae no processo civil brasileiro: um terceiro enigmático, p. 55).
Inquestionável que partes e juiz, respectivamente sujeitos parciais e imparcial, têm interesses
diversos em juízo. Cada qual das partes busca fazer valer aquilo no que acredita, suas razões de
fato e de direito; o juiz, de sua vez, não alimenta interesse algum no objeto do litígio, pois o que
lhe cabe é resolver o conflito em conformidade com o ordenamento jurídico. Entretanto, crê-se,
com a devida vênia, inexistir esse outro interesse ao qual se refere Cassio Scarpinella, que seria
comum a todos os sujeitos processuais, como se as partes desejassem, de maneira uníssona e
conjunta, realmente resolver “a questão pendente de apreciação pelo Poder Judiciário da melhor
forma possível”. Não há, de regra, um tal espírito filantrópico que contagie as partes no âmbito
processual; o que quer cada uma delas, sem dúvida, é mesmo resolver a questão da melhor forma
possível, desde que isso signifique favorecê-la em prejuízo do adversário — cada parte quer a
sardinha para o seu próprio prato.
52
Essa a linha do pensamento de Juan Monteiro Aroca: “[...] Las ‘reglas del juego’, de cualquier juego,
incluso el del processo, deben ser observadas por los jugadores, naturalmente, pero a estos no
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 229-254, abr./jun. 2013
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se les puede pedir que todos ellos, los de un equipo y los de otro, colaboren en la búsqueda de
cuál es el mejor de ellos, ayudando al árbitro a descobrir a quién debe declarar ganhador, pues
si las cosas fueran así no tendría sentido jugar el partido. El ‘juego’ se basa en que cada equipo
luche por alcanzar la victoria utilizando todas las armas a su alcance, naturalmente respetando
las reglas, y con un árbitro imparcial” (MONTERO AROCA. El processo civil llamado ‘social’ como
instrumento de ‘justicia’ autoritária. In: MONTERO AROCA (Coord.). Proceso civil y ideologia: un pre-
facio, una sentencia, dos cartas y quince ensayos, p. 129-165). Em linha de entendimento idêntica,
Adolfo Alvarado Velloso elucida o risco de se defender a ideia de um processo como método se-
gundo o qual os advogados e partes colaboram solidária e ativamente na busca da verdade e na
formação de uma decisão justa. Elucida que um tal modo de pensar despreza a realidade social
do litígio, que nada mais é que uma guerra. Sem armas, é verdade; mas mesmo assim uma guerra
e não um passeio alegre e despreocupado das partes de mãos dadas e caminhando pelo parque.
E arremata: “Cuando un acreedor presenta al juez su demanda, no lo hace en acto de alocada
aventura sino meditadamente, lleno de incertidumbres, temores, gastos y expectativas, luego
de haber hecho lo imposible para lograr un acuerdo con el deudor. De tal modo, sólo porque no
tiene otro camino para recorrer, elige la última alternativa que le oferece la civilidade: el processo.
Cómo pretender ahora que estos dos antagonistas — que ya se odian por haber hablado y dis-
cutido hasta el cansancio del tema que los aqueja — salgan a buscar como buenos amigos, del
brazo y solidariamente, la verdad de lo acontecido y una decisión justa? Justa para quien? Para el
desesperado y cuasi exámine acreedor o para el deudor impenitente?” (VELLOSO. La imparciali-
dade judicial y el sistema inquisitivo de juzgamiento. In: MONTERO AROCA (Coord.). Proceso civil
y ideologia: un prefacio, una sentencia, dos cartas y quince ensayos, p. 114). Daniel Mitidiero, por
sua vez, é esclarecedor acerca do risco de se banalizar a colaboração: “Estamos de pleno acordo
com a necessidade de controlarmos a utilização indevida e desordenada de normas jurídicas que,
por vezes, ocorre na prática judicial do nosso país. É preciso, contudo, separar o joio do trigo. A
colaboração é um projeto autêntico do processo justo no Estado Constitucional — para usarmos
uma expressão em homenagem a Lenio Streck. Banalizá-la, tratando-a sem maiores cuidados,
constitui empresa no mínimo temerária. Cumpre evitá-la — a bem da necessidade de moldarmos
o processo civil a partir dos fundamentos do Estado Constitucional a fim de torná-lo tão demo-
crático quanto o acesso à moda com o advento do prêt-à-porter” (MITIDIERO. Colaboração no
processo civil como prêt-à-porter?: um convite ao diálogo para Lenio Streck. Revista de Processo).
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DELFINO, Lúcio; ROSSI, Fernando F. Juiz contraditor?. Revista Brasileira de Direito Processual
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R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 229-254, abr./jun. 2013
Es que creo que nuestra historia [...] puede en buena medida ser
interpretada como una oscilación entre pautas de convivencia
de creciente amplitud, tolerancia y zonas de libertad, y formas
opresivas de mantenimiento de lo existente, cuando no directa-
mente regresivas [...].
(Jorge E. Vázquez Rossi)
I Introducción
Con motivo de llevarse a cabo el Primer Congreso Provincial de Derecho Pro
cesal Penal, en la ciudad de Rosario, en el que se tratará el análisis de la Ley 12.734
y leyes complementarias, nos hemos propuesto realizar la presente ponencia con
1
Ponencia presentada al I Congreso Provincial de Derecho Procesal Penal, en Rosario, 8 y 9 de noviem-
bre de 2012. Tercer Panel – tema: “La investigación penal preparatoria y el derecho de defensa”.
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2
Constitución de la Nación Argentina: Artículo 18. Ningún habitante de la Nación puede ser penado
sin juicio previo fundado en ley anterior al hecho del proceso, ni juzgado por comisiones espe-
ciales, o sacado de los jueces designados por la ley antes del hecho de la causa. Nadie puede ser
obligado a declarar contra sí mismo; ni arrestado sino en virtud de orden escrita de autoridad
competente. Es inviolable la defensa en juicio de la persona y de los derechos.
Constitución de la Nación Argentina: Artículo 19. Las acciones privadas de los hombres que de
ningún modo ofendan al orden y a la moral pública, ni perjudiquen a un tercero, están sólo reser-
vadas a Dios, y exentas de la autoridad de los magistrados. Ningún habitante de la Nación será
obligado a hacer lo que no manda la ley, ni privado de lo que ella no prohíbe.
Constitución de la Nación Argentina: Artículo 28. Los principios, garantías y derechos reconoci-
dos en los anteriores artículos, no podrán ser alterados por las leyes que reglamenten su ejercicio.
3
Antes que se convirtiera en ley.
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4
FALKENBERG, Nicolás, La inmediata aplicación de los principios normados en el nuevo esquema pro-
cesal penal santafesino. Disponible en: <http://www.terragnijurista.com.ar/doctrina/esquema_
stafe.htm>. Última entrada 29.10.2012.
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5
Ídem ant.
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II.II La imputación
Imputar proviene del latín imputare, que significa atribuir a otro una culpa,
delito o acción. En este sentido señala el Dr. Seguí que: “Francesco Carnelutti, en
el epígrafe de este capítulo, señala un aspecto importante de la imputación penal,
dado que como él bien dice no puede haber imputado sin imputación. De ello
puede colegirse que si el rol de imputado otorga determinadas garantías consa-
gradas en la Carta Magna, la imputación será violatoria de la Constitución cuando
la incorrección del acto que la contiene impida al justiciable ejercer todos y cada
uno de los derechos que la ley suprema del Estado le otorga”.7
Julio Maier lo hace suyo cuando señala que imputar un hecho significa recri-
minarlo con todas sus circunstancias y elementos, tanto materiales como normati-
vos, físicos o psíquicos.8
A su turno, García Rada, al tratar de explicar el contenido de la imputación,
expresa lo siguiente: “[...] imputar es atribuir a una persona la comisión de un hecho
que la ley penal califica de delito. La imputación está contenida en la denuncia que
presenta el Ministerio Público”.9
Desde el punto de vista funcional, la imputación es el procedimiento por
medio del cual se concreta la función de acusación, y, a partir de ella, materializa
formalmente la acción penal.
Como dice Falkemberg, aspecto esencial es la asignación del carácter adver-
sarial que se materializa aquí con la obligatoriedad de la presencia del defensor,
so pena de nulidad. Aquí mismo, también, la acusación debe suministrar todos los
elementos probatorios e informaciones de que tenga noticia, incluidos los que le
sean favorables al procesado, pero que — adicionalmente — la defensa también
podrá pedir el descubrimiento de elementos probatorios.
6
FALKENBERG, Nicolás, op. cit.
7
SEGUÍ, Ernesto, Imputación, congruencia y nulidad en el proceso penal, Nova Tesis, Bs. As. 2010, p. 15
8
MAIER, Julio, Derecho Procesal Penal argentino, Ed. Hammurabi, Bs. As. 1989, T. I, Volumen B, ps. 336
y sgtes.
9
GARCÍA RADA, Domingo, Manual de derecho Procesal Penal, Sesator, 7ª ed., Lima, 1982, p. 104.
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10
JAUCHEN, Eduardo, Tratado de derecho Procesal Penal, Rubinzal-Culzoni, Santa Fe, 2012, T. I.
11
Extraído de Jauchen, op. cit.
12
Código Procesal de Santa Fe — Ley 12.734: “Artículo 100. Calidad de imputado. Los derechos que
este Código acuerda al imputado, podrá hacerlos valer la persona que fuera detenida o indicada
como autor o partícipe de un hecho delictuoso, en cualquier acto inicial del procedimiento diri-
gido en su contra y en función de la etapa en que se encuentre, hasta la terminación del proceso.
Si estuviera privado de su libertad podrá formular sus instancias ante el funcionario encargado de
la custodia, quien la comunicará inmediatamente al Tribunal interviniente”.
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13
OROÑO, Néstor A., Imputado: ¿A partir de que momento? Derecho al sobreseimiento. Disponible en:
<http://www.pensamientopenal.com.ar/articulos/imputado-partir-que-momento-derecho-al-
sobreseimiento>, Edición 146 – 01.08.12.
14
Derecho que le fue negado durante mucho tiempo, cuando se lo consideraba como objeto de la
persecución penal en el sistema inquisitivo.
15
JAUCHEN, Eduardo, Derechos del imputado, Rubinzal-Culzoni, Santa Fe, 2005, p. 153.
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16
JAUCHEN, Eduardo, Comentarios sobre el Código Procesal Penal de Santa Fe, RCE, p. 116.
17
VANEGAS VILLA, Piedad Lucía, Las audiencias preliminares en el sistema penal acusatorio, Fiscalía
General de la Nación, Escuela de Estudios e Investigaciones Criminalísticas y Ciencias Forenses,
Bogotá, 2007, p. 51 a 55.
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[...] pese a lo positivo que resulta unificar en una misma audiencia la inti-
mación de los hechos y la resolución sobre la eventual cautela personal
(prisión preventiva), la primicia debe ser estudiada con cautela [...]
¿Qué es, entonces, lo que me parece objetable en la innovación legislativa?
En un sistema adversarial creo importante el encuentro o contacto expe-
dito entre los contradictores procesales: el fiscal acompañando general-
mente a la víctima, el eventual querellante y el perseguido penalmente
respaldado por su abogado defensor. En este contexto, el equilibrio de
fuerzas entre los participantes está asegurado y autoriza el desarrollo
normal y civilizado de la reunión; pero si los particulares excedieran o
abusaran de su derecho de audiencia o el fiscal fuera más allá de su legí-
tima autoridad, la controversia o discrepancia habilita para ocurrir ante el
juez de la investigación penal preparatoria, quien de inmediato resolverá
la cuestión (art. 284 del Código Procesal Penal, Ley 12.734).
Con la nueva redacción propugnada ya no hay encuentro directo entre
los protagonistas: el fiscal deberá pedir al juez que convoque a una audien-
cia pese a que no existe motivo de controversia entre las partes; ello con
todas las dilaciones que motiva el implicar a un nuevo órgano en la pro-
gramación del convergente episodio. En la severidad ritual de un acto
presidido por un magistrado imparcial, las partes se encapsularán en sus
roles, asumiendo actuaciones estereotipadas y ese formalismo restará
espontaneidad y sustancia al intercambio de ideas liso y llano entre la
acusación y la defensa.
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20
RÍOS, Ramón Teodoro, op. cit.
21
CORVALÁN, Víctor, en un trabajo extraído de la página del Colegio de Abogados de Rosario, al
tiempo de publicarse en ella el texto de la Ley 12.734.
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23
PRUNOTTO, Mariana y RODRIGO, Fernando, La acción, la pretensión y la demanda en el derecho
procesal penal, La Fe del Hombre en sí mismo o la lucha por la libertad a través del proceso: El Mundo
Procesal rinde Homenaje al Maestro Adolfo Alvarado Velloso:, San Marcos, Perú, 2008, p. 358.
24
Ídem ant.
25
ALVARADO VELLOSO, Adolfo, El garantismo procesal, Revista Jurídica La Ley, 2010, p. 3. Disponible
en: <http://www.academiadederecho.org>. Última entrada 31/10/12.
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Discrepamos con la opinión del Dr. Ríos cuando expresa que la paridad de
fuerzas está asegurada con la presencia del Defensor. Si tomáramos el mismo
argumento supra señalado de la sobrecarga de trabajo de los Jueces, de la misma
manera podemos ponderar tal peso sobre los Defensores Públicos, cuya primera
aproximación al conflicto muy probablemente sea en esta audiencia,26 si que el
principio de objetividad aparezca, prima facie, como suficiente resguardo.
Asimismo, en caso de duda, entendemos que nada mejor que el decisor
para asegurar el mentado equilibrio, reestableciéndolo in situ y en el momento
cuando pueda verse afectado.
Obiter dictum, cabe preguntarse también si el inculpado, en lugar de verse
cohibido ante la investidura del magistrado, puede encontrarse más tranquilo con
su presencia, que dirigirá el debate (de haberlo) contra quién es su contraparte,
pretende contra él y lo acusa — nada menos — que de un delito penal.
Teniendo en consideración lo mencionado precedentemente y a tenor de
las pautas que a continuación se enumerarán estimamos que la “audiencia impu-
tativa” es un Acto de Contradicción (o cuanto menos es posible que se transforme
en tal) y no otra mera comunicación:
- El grado requerido de convencimiento para realizarla, que implica una valo
ración que puede ser puesta en duda por parte del Defensor.
- La posibilidad de la presencia del querellante, que no se debe al principio
objetivo y por tanto es el contrincante por antonomasia del imputado.
- La posibilidad del querellante de sugerir preguntas, hacer observaciones
y dejar su constancia en el acta respectiva.
- La obligación del “descubrimiento de la prueba”, entre las cuales pueden
encontrarse actos irreproductibles (art. 282 nuevo CPP).
- que tiene éste último de aportar su descargo, ejerciendo de pleno su de-
recho a ser oído. (art. 277 nuevo CPP).
- La posibilidad de proponer prueba, cuya admisibilidad puede ser objeto
de controversia.
- La obligación de encontrarse presente el defensor, lo que además de pre-
ponderar el derecho de defensa también posibilita la negociación entre
las partes en perfecto pie de igualdad.
- El pedido y sustanciación de medidas cautelares, con el fin de lograr eco-
nomía procesal, incluidos en la reforma.
- La decisión — política, pero decisión al fin — de incluir al Juez en la im-
putativa, lo que se traduce en que los legisladores consideraron al acto
como de contradicción.
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27
Como parece entenderlo Corvalán en el trabajo citado.
28
Entendida la palabra sentido amplio, claro está.
29
Una imputación es clara cuando el imputado puede comprender cabalmente cual es la acción
que se le atribuye y el resultado que se le recrimina. Para que el justiciable pueda tener esta
comprensión cabal es necesario formularle una imputación suficientemente asertiva, exenta de
ambigüedades, que le impidan saber por qué razón se lo investiga y somete a un proceso penal;
en donde estriba la ilicitud que se reprocha y cuál es el rol protagónico (principal o accesorio) que
se le atribuye.
30
Una imputación es precisa cuando delimita con exactitud tanto los aspectos objetivos como sub-
jetivos de la atribución delictiva.
31
Como modo concreto de exteriorización personal se realiza en un determinado tiempo y lugar y
contiene la impronta de la personalidad del agente. Por ello, no puede imputarse una conducta
sin las circunstancias referenciadas que delimitan el actuar del justiciable. El requisito de que
la imputación sea circunstanciada y específica abarca -asimismo- la descripción y atribución de
las circunstancias preexistentes, concomitantes y sobrevinientes de los demás protagonistas del
hecho penal.
32
Para que la imputación penal sea integral debe contener todos los elementos materiales que
caracterizan al hecho; detallar acabadamente la conducta humana desplegada en sus aspectos
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físicos y síquicos y puntualizar todas las circunstancias normativas que agravan, atenúan o exi-
men de pena.
33
El tema referido a la oportunidad en que debe formularse la imputación del hecho se encuentra
íntimamente relacionado con el tema de la intervención del imputado en el proceso y con el
derecho de defensa en juicio, dado que una imputación tardía impediría:
1. La posibilidad de efectuar un efectivo contradictorio a partir del conocimiento cabal de la con-
ducta recriminada.
2. El contralor de la prueba de cargo por parte del Defensor Penal.
3. El derecho de ofrecer prueba de descargo.
34
Sancinetti dice que “la razón de una imputación está siempre en aquello dominable por el sujeto
a quien se le formula la imputación”. Autor citado, Subjetivismo e imputación objetiva en derecho
penal, Ed. Ad-Hoc, Bs. As., 1997, p. 29.
35
Esta garantía que nace del principio de reserva y del de tipicidad impide que una imputación
sea constitucionalmente válida cuando solo hace mención a determinadas conductas sin referir
puntualmente al tipo penal.
36
VÉLEZ MARICONDE, Alfredo, Derecho Procesal Penal, Lerner, Córdoba 1969, T. II, p. 218.
37
Las garantías son remedios jurisdiccionales por los cuales la persona que está afectada en su
derecho puede exigir la tutela efectiva del mismo. Cuando ello no acontece el proclamado y se-
dicente “derecho” se convierte en una abstracción metafísica desprovista de contenido jurídico y
fiel arquetipo de hipocresía estatal. Ya en 1789 los franceses en su “Declaración de los Derechos del
Hombre y del Ciudadano” señalaron que “Toda sociedad en la cual la garantía de los derechos no
esté asegurada no tiene Constitución.” (art. 16).
38
MAIER, Julio, Derecho Procesal Penal argentino, Ed. Hammurabi, Bs. As. 1989, T. I, Volumen B, p. 319.
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39
Ley 12.734. Art. 8 Inviolabilidad de la defensa. La defensa en juicio deberá comprender para las
partes, entre otros, los siguientes derechos: ser oídas, contar con asesoramiento y representación
técnica, ofrecer prueba, controlar su producción, alegar sobre su mérito e impugnar resoluciones
jurisdiccionales, en los casos y por los medios que este Código autoriza.
40
Corte Constitucional de Colombia, 10.02.09, expediente D-7318, Demanda de inconstituciona-
lidad contra el artículo 371 (parcial) de la Ley 906 de 2004, “por la cual se expide el Código de
Procedimiento Penal”.
41
VÁZQUEZ ROSSI, Jorge, La defensa penal, Ed. Rubinzal-Culzoni, 3ª ed., Santa Fe, 1996, p. 78.
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C.S.J.S.F. in re “Aliendro, José Julio s/ violación y corrupción calificada”, Acuerdo del 29/12/92
42
CLARIÁ OLMEDO, Jorge, Derecho Procesal Penal, Ed. Lerner, Córdoba 1984, T. II, ps. 315/316.
43
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 255-276, abr./jun. 2013
A su turno, tampoco hay que olvidar que el objeto mismo del proceso penal
está constituido por los hechos que el órgano acusador vierte en la imputación,
por lo que no se puede concebir lógicamente un objeto procesal ambiguo, ya
que de lo contrario las partes no estarán contendiendo sobre una misma cosa,
sino por cosas distintas; o sea, el proceso no será convergente. Sigue diciendo el
fallo Aliendro al respecto: “El principio de congruencia es el que exige que haya
correlación entre el hecho contenido en la imputación y respecto del cual se re-
cibe declaración indagatoria, pretendiéndose con la observancia de tal principio
que el pronunciamiento jurisdiccional que se emita y los actos de defensa que se
ejerzan, no versen sobre circunstancias fácticas distintas a las del caso concreto”.44
Lo dicho en los párrafos anteriores de este apartado no tiene otra función
que cimentar el carácter principalísimo de la actuación que la Defensa tiene — o
cuanto menos puede llegar a tener — dentro de la audiencia imputativa.
En efecto, solo la defensa puede hacer patente los errores, inexactitudes o
defectos de la imputación de cargos, sin que sea contrargumento el hecho de que
la actuación sea provisional y que la acusación propiamente dicha se realiza en
un momento posterior, dado que la Defensa puede ejercer su ministerio desde el
mismo comienzo de la investigación penal.
Sabido es que la defensa penal es una actividad procesal que tiene por ob-
jeto hacer efectivo los derechos y garantías del imputado y que eventualmente
pueden ser vulnerados por cualquiera de los sujetos procesales que intervengan
durante todo el proceso, sea investigación, juicio o ejecución penal, sin olvidar
que se trata de uno de los poderes, junto con el de jurisdicción y de acción, para
la válida realización penal.
Dice Vázquez Rossi: “El proceso no constituye al derecho de defensa, sino
que debe regular las oportunidades debidas de manifestación; un procedimiento,
de cualquier género, que se hiciese al margen o en violación de la garantía de
defensa, devendría insalvablemente nulo, carecería de efectos jurídicos válidos
y debería ser jurisdiccionalmente revisado [...]. La reglamentación procesal del
derecho de defensa, al igual que la de otras garantías constitucionales, no puede
hacerse de tal manera que el mismo se trabe o diluya o aparezca como un recono-
cimiento puramente formal, sin verdadera incidencia operativa. Por el contrario,
una regulación procesal imbuida del espíritu constitucional, arbitrará un sistema
íntegramente garantizado en el que de manera armónica actuarán las facultades
de las partes en defensa de sus respectivos intereses”.45
44
Cám. Penal Rosario (S.F.), Sala 3ª, 27.06.07 in re “F., A. P. s/Homicidio agravado por el uso de arma
de fuego”, <zeus.com.ar>, Sección Colección Zeus – Jurisprudencia, documento nº 008192.
45
VÁZQUEZ ROSSI, Jorge, La defensa penal, cit., p. 79
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 255-276, abr./jun. 2013
Además, vale recordar el carácter escriturario del acto, por lo que se avizora
que el legislador quiso darle visos de semi permanencia — o de dificultosa varia-
bilidad — en respeto al principio de congruencia dentro del proceso penal.46 Por
ello el principio de congruencia es un límite a la actividad requirente del actor
penal y a la actividad jurisdiccional del Magistrado.
Dentro del proceso penal si bien el contradictorio sobre la plataforma fác-
tica se realiza en plenitud en el juicio no deja por ello de ser debatido en la etapa
de investigación, aunque en forma más acotada. “No se trata de ser ‘partidarios’ de
los principios acusatorios en el proceso, dispositivo en los recursos y de correlación
o congruencia entre las pretensiones mantenidas por el acusador y el contenido
de la resolución jurisdiccional, nada más que por un puro amor a la simetría o
una teórica inclinación estética al equilibrio de las proporciones. Lo que está en
juego detrás de estas discrepancias es nada menos que el principio de la impar-
cialidad del juzgador, ínsito en el concepto de jurisdicción, implícito ya en nuestra
Constitución Nacional y expresamente incorporado por el Pacto de San José de
Costa Rica (art. 8.1) en la última reforma”.47 El efectivo derecho de contradicción debe
garantizarse desde un comienzo, en forma real y práctica.
Entonces, se puede concluir que dentro de la lógica adversarial aparece
como más adecuado que las objeciones del defensor puedan plantearse ante
el tercero que dirime la verdadera pretensión (resistencia o contrapretensión),
que ante el mismo funcionario que — supuestamente — cometió el yerro y que,
como si fuera poco, en ese acto es su contraparte. Toda colisión, enfrentamiento o
contienda requiere un campo de batalla común donde medir las armas argumen-
tativas y debe ser decidido por el órgano imparcial, por lo que en base a la regla
de la celeridad y concentración nos parece adecuado que se haga en el momento.
Ello conllevará a una real tutela judicial efectiva, entendiéndose ésta cuando
la actividad jurisdiccional concretamente impide la lesión de un derecho ame-
nazado o restablece el pleno ejercicio del conculcado, con suficiente virtualidad
jurídica para que los derechos del justiciable sean efectivamente protegidos, ga-
rantizados y satisfechos.
46
La congruencia — hija preclara de la garantía constitucional de defensa en juicio — es el princi-
pio de raigambre constitucional que ordena que el hecho imputado sea idéntico a todo lo largo
del iter procesal, incluida la sentencia judicial. Como bien señala Ramón T. Ríos, “En el proceso
penal la congruencia exige que el núcleo fáctico sometido al juzgamiento sea esencialmente el
mismo a lo largo de todo el proceso, desde su intimación en la indagatoria, su descripción en el
procesamiento, su formulación en la requisitoria de elevación a juicio y su análisis en la sentencia.”
En Proceso Penal, Principio dispositivo, congruencia y recursos, J.A. 1984, IV, p. 793 y sgtes.
47
Cám. Penal Rosario (S.F.), Sala 2ª, 03.11.03. in re “S., J. A. s/ Homicidio culposo”, <zeus.com.ar>,
Sección Colección Zeus – Jurisprudencia, documento nº 005036.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 255-276, abr./jun. 2013
El Defensor cumple una misión unilateral. Para ser fiel a su posición de guardián
de los derechos e intereses del imputado, sólo puede actuar a favor de éste por
fuerza de una situación jurídica que se inspira también en el interés público. Por
eso el defensor que por cualquier pretexto olvide o perjudique la defensa de su
patrocinado, es tan culpable como el que la sostenga con medios fraudulentos.
Por el contrario, los Fiscales del Ministerio Público de la Acusación serán quienes
dirijan la investigación, además de ser quiénes sustentan la acción penal entre
otras funciones propias, y si bien se rige en un comienzo por el principio de obje-
tividad, ello no quiere decir que dejan de ser partes.
Quimérico resulta concebir un funcionario que no tiene el deber de ser impar-
cial pero que tiene que ser enteramente objetivo, que ante la evidencia de un hecho
criminoso pueda conservar sin mácula la mentada objetividad. Por ello es loable
que el contradictorio se abra desde un primer momento, porque de lo contrario
resultará tardío e ineficaz.
Podemos citar a Vélez Mariconde sobre el particular: “En virtud de un dogma
universal, por lo tanto, el proceso constituye, además de un medio que la sociedad
necesita para hacer valer su derecho o potestad, una garantía individual. Durante
todo el desarrollo de la actividad procesal, el imputado debe tener oportunidad para
expedirse libremente, alegar y probar su inocencia o cualquier circunstancia capaz de
aminorar su responsabilidad. El derecho de defensa es un elemento esencial del
proceso. Toda violación de las normas procesales que aseguran la intervención,
asistencia y representación del imputado, es absolutamente nula sólo por impero
de la Constitución”.48
Además, de lo contrario, se estaría cambiando el funcionario pero no la lógica
del sistema: el Juez de Instrucción ahora sería el Fiscal, siendo posible revisar su
actividad recién en una audiencia posterior, y por tanto se contrarían las reglas del
art. 3 CPP (T.O. Ley 12.734) de concentración, inmediatez, simplificación y celeridad.
Por último, podemos destacar que la tesitura adoptada comulga con mayor
precisión con el art. 8, I. b), de la Convención Americana Sobre Derechos Humanos
Pacto San José de Costa Rica, cuando establece que “Toda persona tiene derecho
a ser oída, con las debidas garantías y dentro de un plazo razonable por un juez
o tribunal competente, independiente e imparcial, establecido con anterioridad
por la ley, en la sustanciación de cualquier acusación penal formulada contra ella
o para la determinación de sus derechos y obligaciones de orden civil, laboral,
fiscal o de cualquier otro carácter”.
48
VÉLEZ MARICONDE, Alfredo, Derecho Procesal Penal, Lerner, Córdoba 1969. T. II, ps. 401/402.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 255-276, abr./jun. 2013
VII Conclusiones
Por lo dicho, pensamos que la audiencia imputativa debe considerarse
como un acto de contradicción y no de comunicación o bilateralización, conforme
se dijo en el apartado V. de este trabajo.
De así considerarse, creemos que la presencia del Juez en la misma hace
a la efectividad del contradictorio, de la regla de la congruencia y la garantía de
la defensa en juicio, dado que — a nuestro criterio — todo acto contradictorio
debe hacerse bajo el resguardo de lo que otras legislaciones denomina “Juez de
Garantías”.
Ello además conjuga mejor con:
- La legislación supranacional contenida en el Pacto de San José de Costa
Rica recién citado;
- La lógica adversarial que impone la controversialidad desde el mismo co-
mienzo del proceso penal;
- La validez misma del acto, al encontrarse reunidos quienes ejercen los
poderes de acción, defensa y jurisdicción;
- La regla de la inmediación, al tomar el Juez contacto con las partes;
- La de concentración y la celeridad, al convertir en inane el art. 284 que
prevé el control del Juez en una audiencia posterior para nuestro tema;
- Para la garantía de la inviolabilidad Defensa en Juicio, que al evitar que
una eventual contienda procesal se realice frente a la contraparte, como
si se tratara de un procedimiento de negociación.
En suma, consideramos positiva la reforma porque la presencia del Juez en
la misma, como supervisor del cumplimiento de los derechos del imputado
VIII Colofón
No podemos finalizar sin dedicar un apartado a los homenajeados en este
Congreso, cuya dedicación en pro del garantismo penal ha abrevado en los más
ínclitos ideales reconocidos por nuestra Constitución; propiciando el cambio de
paradigma que — lamentablemente — aún está en proceso en nuestra provincia.
Por ello, celebramos la fecunda y racional apertura de sus trabajos, que deno-
tan no ya una elección vocacional sino una postura de vida.
Referencias
ALVARADO VELLOSO, Adolfo, El garantismo procesal, Revista Jurídica La Ley, 2010, pág. 3. Disponible
en: <http://www.academiadederecho.org>. Última entrada 31.10.12.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 255-276, abr./jun. 2013
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Processual – RBDPro, Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 255-276, abr./jun. 2013.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 255-276, abr./jun. 2013
Bom dia!
É com imensa alegria que, nesta manhã, estamos aqui reunidos com o intuito
de homenagear o Professor Dr. Araken de Assis.
Desde que ingressei na PUCRS, na qualidade de discente, tive a honra de
conhecer o professor Araken de Assis. Desde então, o professor Araken propiciou
a seus alunos vários ensinamentos de vida.
Por exemplo, foi o professor Araken de Assis quem me ensinou que a humil
dade é o primeiro pré-requisito da sabedoria, pois o homem verdadeiramente
sábio é um homem em construção, em eterna mutação, aprendendo algo novo a
cada dia. Logo, nenhum de nós está pronto ou acabado... É depois de formados,
ao longo da vida profissional, que se dá a maior parte da nossa aquisição e produ-
ção de conhecimento.
Aquisição e produção de conhecimento foi a primeira preocupação dos
ensinamentos do professor Araken para com seus alunos. Mas, além do ensino
técnico de primeira grandeza, o professor Araken também trouxe ensinamentos
de vida e, em especial, ensinamentos para quem quer ser um bom professor.
Nesse sentido, foi o professor Araken de Assis quem ensinou que:
- Primeiro, as aulas devem ser preparadas e estudadas com antecedência;
- Segundo, a pontualidade e a assiduidade são características fundamen-
tais em um grande professor;
- Terceiro, todos os alunos são especiais e todos devem ser chamados pelo
seu primeiro nome, mesmo que a turma seja grande...
Por fim, ensinou que, mesmo quando a vida for dura, cheia de cobranças,
há um ensinamento a ser retirado de cada situação, pois “só se atiram pedras em
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 279-280, abr./jun. 2013
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R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 283-285, abr./jun. 2013
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 283-285, abr./jun. 2013
É obra construída com esmero e qualidade, tendo fortes alicerces, excelentes vigas,
portas, janelas e excepcional acabamento. Não é obra para ser apenas contemplada,
mas para ser habitada, ocupada, utilizada com muita frequência.
ROQUE, Andre Vasconcelos. Class actions: ações coletivas nos Estados Unidos: o que
podemos aprender com eles?. Salvador: JusPodivm, 2013. Resenha de: CUNHA, Leonardo
Carneiro da. Revista Brasileira de Direito Processual – RBDPro, Belo Horizonte, ano 21, n. 82,
p. 283-285, abr./jun. 2013.
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 283-285, abr./jun. 2013
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 287-291, abr./jun. 2013
página página
ASPECTOS semânticos de uma contradição ROQUE, Andre Vasconcelos. Class actions: ações
pragmática. O garantismo processual sob o coletivas nos Estados Unidos: o que podemos
enfoque da filosofia da linguagem aprender com eles?. Salvador: JusPodivm, 2013
- Conferência de: Glauco Gumerato Ramos......... 217 - Resenha de: Leonardo Carneiro da Cunha........ 285
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 287-291, abr./jun. 2013
C DESCUMPRIMENTO
CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA - Ver: Da convenção de arbitragem – Efeitos e
- Ver: Da convenção de arbitragem – Efeitos e responsabilidade pelo descumprimento no
responsabilidade pelo descumprimento no Brasil e em Portugal. Artigo de: Marianna
Brasil e em Portugal. Artigo de: Marianna Chaves........................................................................... 127
Chaves........................................................................... 127
DIREITO
- Ver: Ensaio sobre a argumentação do direito
COLABORAÇÃO
e a boa-fé processual. Artigo de: Mariângela
- Ver: Juiz contraditor?. Conferência de: Guerreiro Milhoranza, Camila Paese Fedrigo........81
Lúcio Delfino, Fernando F. Rossi.......................... 229
DIREITO POSITIVO
COMPROMISSO ARBITRAL - Ver: Ensaio sobre a argumentação do direito
- Ver: Da convenção de arbitragem – Efeitos e e a boa-fé processual. Artigo de: Mariângela
responsabilidade pelo descumprimento no Guerreiro Milhoranza, Camila Paese Fedrigo........81
Brasil e em Portugal. Artigo de: Marianna
Chaves........................................................................... 127 DIREITO PROBATÓRIO
- Ver: Dos Fundamentos axiológicos dos
CONSTITUIÇÃO modelos probatórios (clássico, moderno e
contemporâneo). Artigo de: Eduardo Cunha
- Ver: Aspectos semânticos de uma
da Costa........................................................................ 153
contradição pragmática. O garantismo
processual sob o enfoque da filosofia da DIREITO PROCESSUAL
linguagem. Conferência de: Glauco - Ver: Aspectos semânticos de uma
Gumerato Ramos...................................................... 217 contradição pragmática. O garantismo
processual sob o enfoque da filosofia da
CONTRADITÓRIO linguagem. Conferência de: Glauco
- Ver: Juiz contraditor?. Conferência de: Gumerato Ramos...................................................... 217
Lúcio Delfino, Fernando F. Rossi.......................... 229
- Ver: Princípio do contraditório no Superior DIREITO PROCESSUAL CIVIL
Tribunal de Justiça. Artigo de: Carlos Henrique - Ver: Ensaio sobre a argumentação do direito
e a boa-fé processual. Artigo de: Mariângela
Soares...............................................................................23
Guerreiro Milhoranza, Camila Paese Fedrigo........81
CONVENÇÃO DE ARBITRAGEM DIREITO PROCESSUAL SOCIAL
- Ver: Da convenção de arbitragem – Efeitos e - Ver: Direito Processual Social Atual – Entre o
responsabilidade pelo descumprimento no Ativismo Judicial e o Garantismo Processual.
Brasil e em Portugal. Artigo de: Marianna Artigo de: Jefferson Carús Guedes..........................45
Chaves........................................................................... 127
DIREITOS FUNDAMENTAIS
D - Ver: Ensaio sobre a argumentação do direito
DERECHO DE DEFENSE e a boa-fé processual. Artigo de: Mariângela
- Ver: Acerca de la reforma al art. 274 y el Guerreiro Milhoranza, Camila Paese Fedrigo........81
ejercicio del derecho de defensa, desde la
E
óptica del defensor penal. Conferência de:
EFETIVIDADE PROCESSUAL
Hernán Federico Soto, María Juliana Ruani....... 255
- Ver: Informatização do Poder Judiciário e
acesso à justiça – Perspectivas atuais.
DESCOMPASSO Artigo de: Bruna Pinotti Garcia, Nelson
- Ver: Aspectos semânticos de uma Finotti Silva.................................................................. 181
contradição pragmática. O garantismo
processual sob o enfoque da filosofia da ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO
linguagem. Conferência de: Glauco - Ver: Juiz contraditor?. Conferência de:
Gumerato Ramos...................................................... 217 Lúcio Delfino, Fernando F. Rossi.......................... 229
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 287-291, abr./jun. 2013
página página
F LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ
FILOSOFIA DA LINGUAGEM - Ver: Da convenção de arbitragem – Efeitos e
- Ver: Aspectos semânticos de uma responsabilidade pelo descumprimento no
contradição pragmática. O garantismo Brasil e em Portugal. Artigo de: Marianna
processual sob o enfoque da filosofia da Chaves........................................................................... 127
linguagem. Conferência de: Glauco
Gumerato Ramos...................................................... 217 M
MEDIDAS CAUTELARES
FUNDAMENTOS AXIOLÓGICOS - Ver: Um breve panorama sobre as tutelas de
- Ver: Dos fundamentos axiológicos dos
urgência e de evidência no sistema do novo
modelos probatórios (clássico, moderno e
Código de Processo Civil. Artigo de: Mauro
contemporâneo). Artigo de: Eduardo Cunha
da Costa........................................................................ 153 Simonassi..................................................................... 105
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 287-291, abr./jun. 2013
PRAXE FORENSE S
- Ver: Aspectos semânticos de uma SEMINÁRIO DE DIREITO PROCESSUAL DE CANELA
contradição pragmática. O garantismo - Ver: Homenagem aos 30 anos de docência
processual sob o enfoque da filosofia da do Professor Doutor Araken de Assis. Notas
linguagem. Conferência de: Glauco
e comentários de: Mariângela Guerreiro
Gumerato Ramos...................................................... 217
Milhoranza................................................................... 279
PROCEDIMENTO
- Ver: Princípio do contraditório no Superior SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Tribunal de Justiça. Artigo de: Carlos - Ver: Princípio do contraditório no Superior
Henrique Soares...........................................................23 Tribunal de Justiça. Artigo de: Carlos
- Ver: Um breve panorama sobre as tutelas de Henrique Soares...........................................................23
urgência e de evidência no sistema do novo
Código de Processo Civil. Artigo de: Mauro T
Simonassi..................................................................... 105 TEORIA DA ARGUMENTAÇÃO
- Ver: Ensaio sobre a argumentação do direito
PROCESSO CIVIL
e a boa-fé processual. Artigo de: Mariângela
- Ver: Direito Processual Social Atual – Entre o
Ativismo Judicial e o Garantismo Processual. Guerreiro Milhoranza, Camila Paese Fedrigo.......81
Artigo de: Jefferson Carús Guedes..........................45
TEORIA DAS CONDIÇÕES DA AÇÃO
PROCESSO - Ver: Uma análise crítica da teoria das
- Ver: Princípio do contraditório no Superior condições da ação. Artigo de: Luiz
Tribunal de Justiça. Artigo de: Carlos Eduardo Ribeiro Mourão...........................................13
Henrique Soares...........................................................23
TUTELA DE EVIDÊNCIA
PROFESSOR DOUTOR ARAKEN DE ASSIS
- Ver: Homenagem aos 30 anos de docência - Ver: Um breve panorama sobre as tutelas de
do Professor Doutor Araken de Assis. Notas urgência e de evidência no sistema do novo
e comentários de: Mariângela Guerreiro Código de Processo Civil. Artigo de: Mauro
Milhoranza................................................................... 279 Simonassi..................................................................... 105
R TUTELA DE URGÊNCIA
REFORMA AL ART. 274 - Ver: Um breve panorama sobre as tutelas de
- Ver: Acerca de la reforma al art. 274 y el urgência e de evidência no sistema do novo
ejercicio del derecho de defensa, desde la
Código de Processo Civil. Artigo de: Mauro
óptica del defensor penal. Conferência de:
Simonassi..................................................................... 105
Hernán Federico Soto, María Juliana Ruani....... 255
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 287-291, abr./jun. 2013
R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 293-294, abr./jun. 2013
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R. bras. Dir. Proc. – RBDPro | Belo Horizonte, ano 21, n. 82, p. 293-294, abr./jun. 2013