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MITOS LITERÁRIOS

Prof. Dr. Johnni Langer (UFPB/NEVE)


Indicações bibliográficas sobre
teoria do mito
Indicações bibliográficas sobre
Mito e Literatura
Algumas discussões teóricas sobre
Mitos literários
• Teoria do mito (Luis Martínez-Palero)
• O termo mito pode ser abordado segundo algumas peculiaridades, que levam em
conta as suas características e permitem abordagens distintas, podendo ser:
• teológico: referente à genealogia dos deuses;
• cosmogônico: pertinente à criação e ordenamento do universo;
• antropogônico e antropológico: situando a criação do homem e a constituição de
sua ordem social;
• soteriológico: concernente aos mistérios, ritos iniciatórios, catábase/anábase e
liminaridade;
• cultural: alusivos às conquistas ligadas ao desenvolvimento humano ou de uma
comunidade;
• etiológico: tocante à origem das coisas e de seus nomes, bem como das tradições;
• naturalista: atinente aos fenômenos próprios da natureza; moral: respeitante à
luta eterna entre forças opostas, usualmente entre ‘ordem e caos’, por exemplo;
• escatológico: respectivo ao futuro e, principalmente, fim do homem e do universo.
• MITO LITERÁRIO (Colete Astier):

• Coincidências entre mito e literatura: ambos são narrativas


• Diferenças: o mito põe em cenas grandes acontecimentos; se define
por sua maneira de se expressar. Ao contrário da narração
romanesca que tem múltiplos recursos (verossimilhança,
contingência, lógica,) a narrativa mitológica vai direto ao fato.
• -A narrativa literária, por oposição ao mito, admite o desvio e aceita
contemporizações.
• O mito pode transparecer ou estar difusamente relatado na
narração literária
• MITOS LITERÁRIOS (André Dabezies)
• Mito é qualquer imagem capaz de expressar um elemento ou conflito da psicologia
primitiva. Mito é um relato simbólico que passa a ter valor fascinante para uma
comunidade humana
• O mito não é um assunto pessoal de alguém, mas de um grupo, de uma coletividade.
Na criação literária, o mito intervém na relação do escritor com sua época e seu
público: um escritor exprime sua experiência ou suas convicções através das imagens
simbólicas que repercutem um mito já ambientado e ou são reconhecidos pelo
público como exprimindo uma imagem fascinante.
• Um mito tampouco é identificável com um texto. O texto literário não é em si um
mito: ele retoma e reedita imagens míticas, ele próprio pode adquirir valor e fascínio
mítico em certas circunstâncias, pra determinado público durante certo tempo.
• Assim, um simples “tema” literário começa a ter valor mítico quando passa a
expressar a constelação mental em que se reconhece um grupo social (como Tristão,
no século XII, por uma pequena camada amante da literatura cortesã) e torna a ser,
quando deixa de fascinar o público, um simples tema ao qual só se volta por hábito
ou tradição literária (Tristão nos séculos XV ou XVI).
• A vitalidade e a atualidade de um mito se medem pela sua receptividade e pelas
variações desta receptividade.
• MITOS LITERÁRIOS (Luis Martínez-Falero)
• Mito como explicação de fenômenos naturais, ligado aos rituais; explicação
da natureza humana; de natureza oral.
• Mitos culturais: relacionado a crenças e ritos; Mitos literários: relacionado ao
imaginário.
• Nexo entre mito etno-histórico e mito literário: narratividade
• A narratividade supõe que um mito de natureza religiosa ao perder a sua
vinculação ao ritual passe a ser meramente uma história ficcional.
• Processo de moralização do mito:
• - Desmitificação não intencional – processo histórico
• - Desmitificação intencional - racionalismo
Um exercício de análise: comparando a
poesia éddica com a poesia escáldica
(mito X mito literário):
“Tecemos e tecemos a trama das lanças,
Onde homens em prontidão
Avançam os estandartes;
não deixemos
O soberano perecer;
As valkyrias escolhem
Os caídos em campo de batalha”
(Darraðarljóð, tradução de Yuri Venancio, Dicionário de Mitologia Nórdica, São Paulo: Hedra, 2015)

“A Góndul y a Skógul
El Tyr de gautas
Mandó a que rey escogieran;
Que a algunos llevasen
De Yngvi nacido
A vivir com Odin al Valhalla”
(Hákonarmál, séc. X, Éyvind Roba-Escalda, tradução de Luis Lerate, Poesía antiguo-nórdica. Madrid:
Alianza Editorial, 1993).
• Referências:

ASTIER, Colette. Interferências e coincidências das narrações literárias e


mitológicas. In: BRUNEL, Pierre (Org.). Dicionário de mitos literários. Brasília:
UNB, 1997, pp. 491-497.

DABEZIES, André. Mitos primitivos e mitos literários. In: BRUNEL, Pierre (Org.).
Dicionário de mitos literários. Brasília: UNB, 1997, pp. 730-736.

MARTINEZ-FALERO, Luis. Literatura y mito: desmitificación, intertextualidad,


reescritura. Revista Signa, n. 22, 2013. Disponível em:
http://revistas.uned.es/index.php/signa/article/view/6363
Universidade Federal da Paraíba
LITERATURA MEDIEVAL
Centro de Educação
Programa de Pós-Graduação em Ciências das
Religiões
Profa. Dra. Luciana de Campos
• A “literatura” medieval, ou como Zink denomina, “literatura(s):
remetem a uma aptidão para a escrita e o entendimento do que os
textos escritos transmitem, uma oposição entre o clérigo e o leigo, o
letrado e o iletrado.
• Completamente diferente do que hoje entendemos por “literatura”.
• Mas mesmo na Idade Média existe, ainda segundo Zink, uma “consciência” da
atividade literária; de quem é autor, quem é o público e de como se dá a
composição e a recepção das obras.
• E há ainda a “prática social” da poesia em muitas sociedades desde a Antiguidade
que a Idade Média mantém, como, por exemplo a dos aedos gregos, dos bardos
celtas e dos escaldos nórdicos.
• A figura do menestrel é portando imprescindível na divulgação dessa literatura.
Divulgação, não composição.
• É no século XIII que a sua maneira de observar e interpretar o mundo
que começa a se esboçar uma ideia de literatura.
• João Bodel, fins do século XII afirma: “ Os contos da Bretanha são tão
ilusórios e agradáveis”.
• Começa portanto a se esboçar o conceito de Literatura como
entretenimento em oposição a História.
• Literatura Medieval: herdeira e continuadora da tradição literária da
Antiguidade.
• Muitas “obras” medievais tem como personagens heróis da
Antiguidade Clássica como Alexandre, Ulisses, Enéias.
• É com a transmissão em línguas vernáculas que os heróis de outras
nacionalidades começam a interagir e protagonizar diversos contos e
poemas.
• As línguas célticas e germânicas que existiam independentemente do latim,
tiveram manifestações literárias precoces (séculos VII-VIII), cujo vestígio escrito
está subordinado à implantação da cultura latina nas regiões onde ela eram
faladas.
• Canções de gesta e romances franceses são adaptados em alemão do fim do
século XII ao do XV e coexistem com os poemas baseados em lendas heroicas
germânicas. Por volta de 1220, o rei Haakon, da Noruega, manda traduzir
sistematicamente em prosa “norrena”, as obras épicas e romanescas francesas:
essas “sagas de cavaleiros” usurparão o lugar das sagas autóctones.
• (ZINK, 2002)
• Tradição oral:
• “Ler” um texto medieval e compreender as suas implicações e
sutilezas de preservação de um texto que foi concebido para ser
ouvido e com a sua preservação passou a ser “lido”.
• Decodificação social, religiosa e literária na Europa medieval dessa
“literatura”.
• (MITCHEL, 2001)
• Prosa livre e prosa escrita: implica em um debate que vai muito além
da literatura e cultura literária e também não é só sobre a matéria
que compõe a “obra”. É preciso analisa-lo como um produto
específico da cultura literária escrita mas que ao ser divulgado é
influenciado e, muitas vezes modificado pela oralidade.
• (MITCHEL,2001)
• LITERATURA MEDIEVAL
• A “literatura” medieval foi obra da voz e não da letra.
(Zumthor)
• As múltiplas oralidades: quem compunha, para quem
compunha, quem ouvia, como ouvia e onde ouvia
• “Improvisação”(Crosby, 1936)
• Perry-Lord: definidora de toda a poesia oral
• Tradição oral: se situa na duração
• Transmissão oral: no presente da performance
• Necessidade de se interpretar a oralidade (performance de quem
narra e receptividade de quem ouve)
• Trabalhos recentes nessa área/ Especialistas dedicados ao estudo da
performance.
• Três tipos de oralidade segundo Zumthor:
• 1-) Primária e imediata: não tem nenhum contato com a escrita ( - Eu conto./-
Nós escutamos/ -Era uma vez./- Como nos tempos antigos)
• 2-) Oralidade mista: a influência do texto escrito permanece externa, parcial e
atrasada
• 3-) Oralidade segunda: quando ela se compõe na base escrita em um meio onde
a voz já não é a protagonista
• Performance:
• Cada texto que é transmitido a um público obedece às
seguintes condições:
• a produção
• a comunicação
• a recepção
• a conservação
• e a repetição
• Quando um poeta ou seu intérprete canta ou recita (seja o texto
improvisado ou memorizado), sua voz, por si só lhe confere
autoridade.
• A ação da voz lhe confere autoridade.
• A tradição valoriza o texto e seu autor mas, o que importa é a ação da
voz.
• (ZUMTHOR, 1993).
• Este que fez Eric e Enide, os Mandamentos de Ovídio e A arte de amar em romance-
mito, que escreveu A mordida no ombro, O rei Marc e Isolda a Loura, A metamorfose do
cardeal, da andorinha e do rouxinol, começa aqui novo romance, de um jovem que vivia
na Grécia, da casa do rei Artur. Antes que eu dele vos fale, ouvireis a vida de seu pai, sua
origem e linhagem. Tanto ele foi bravo e de alta coragem que, para obter honra e
renome, viajou da Grécia para a Inglaterra, que então se chamava Bretanha.
• Esta história que quero contar, podeis encontra-la escrita em um dos livros da biblioteca
de monsenhor Saint-Pierre em Beauvais. Ele atesta sua veracidade, e por isso devemos
lhe dar crédito. Pelas obras que temos, conhecemos a vida e os feitos dos antigos no
mundo que outrora existiram. Ensinam nossos livros que a Grécia teve grande renome
em cavalaria, tanto quanto em ciência. Depois veio a cavalaria para Roma, e com ela
grande som de saber que agora passou para a França. Permita Deus que elas aqui
fiquem guardadas; que a permanência neste lugar lhes apraza e que jamais saia da
França a glória que aqui se deteve! Deus as tinha apenas emprestado àqueles gregos e
romanos; deles já não mais se fala, pois sua viva brasa está extinta.


• (TROYES, Chrétien de. Romances da Távola Redonda. São Paulo: Martins Fontes, 1991,
p.77)

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