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Curso Breve – Empreitadas de Obras Públicas nas Autarquias Locais

AEDREL, 2 de Maio de 2022 (online)

Empreitada de concepção-construção à luz do CCP;


A intervenção dos concorrentes: da apresentação de pedidos de
esclarecimentos e listas de erros e omissões à apresentação da proposta

Miguel Assis Raimundo


Professor Auxiliar da FDUL e Investigador do CIDP
Advogado

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• Recente tratamento doutrinal da figura: Miguel Assis Raimundo, "Empreitada de
concepção-construção no direito dos contratos públicos: função e pressupostos da
definição colaborativa de obras públicas", O Direito, 153.º, (II), 2021, pp. 327-380;
Rafael Ribeiro, "Algumas reflexões em torno do regime aplicável às empreitadas de
conceção-construção no Código dos Contratos Públicos", Revista de Contratos Públicos,
(25), 2021, pp. 95-129.

• Menção ao PEES e ao processo legislativo que veio dar origem à Lei n.º 30/2021, que
alterou o CCP

• A excessiva liberalização dos pressupostos da ECC proposta na versão inicial “matou”


a medida
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• Os diferentes modos de execução de obras públicas. Ideia geral da ECC

• Em especial, a contraposição da empreitada de simples execução e da ECC – vantagens


e desvantagens. Os critérios de análise:

• Erros de projecto, risco e alocação; mais-valia da presença inicial das vertentes


projecto e obra
• Concorrência
• Celeridade?
• Qualidade?
• Gestão de outros actos de controlo? (cf. adiante a questão da AIA)
• Em suma: centragem no tipo de projecto e cuidados particulares na programação
e na definição das peças do procedimento (em especial, critério de adjudicação) 3
• “Toolbox approach”, de natureza pragmática;

• Injustificada qualquer ideia de um desfavor da figura, o que é bem comprovado por (i)
dados do direito europeu, e (ii) paralelo com o direito privado (e com o “direito da
construção” visto em geral), que mostram o crescimento e a utilidade social de
modelos “chave na mão” e, em termos de técnicas de construção, do “early contractor
involvement”

• Sem se ignorar que o sentido normativo do art. 43.º/3 é de molde a exigir uma
fundamentação específica, não vale a pena dramatizar o carácter “excepcional” da ECC

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• Noção: ECC é o contrato no qual a elaboração do
projecto de execução está a cargo do empreiteiro

• não se trata de contrato misto, por expressa previsão


legal – 43.º/11; importante, porque de outro modo,
poderiam ser aplicadas as regras de escolha do
procedimento do art. 32.º

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• Pressupostos materiais (alternativos, 43.º/3):
• Assunção de obrigações de resultado e
• Complexidade técnica;

• Carácter relativo e questionável da figura da “obrigação de resultado”

• O que se pretende dizer é que o empreiteiro tem de garantir um certo desempenho


específico da obra em fase de utilização (o exemplo do desempenho energético; cf.
aliás o DL 50/2021)

• Obrigação de resultado assumida pelo empreiteiro e intervenção de outros terceiros

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• É pela complexidade técnica que habitualmente se chega à
fundamentação;

• Os casos (mormente, do Tribunal de Contas) de verificação ou


não verificação dos pressupostos, e os critérios que daí
podemos retirar.

• O cumprimento do dever de fundamentação

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• Indicações relevantes do direito comparado:
• Direito francês: é permitida “se motivos de ordem técnica, ou a assunção de um compromisso
contratual sobre a melhoria da eficiência energética, ou a construção de um edifício novo que supere
as exigências da regulamentação térmica em vigor, tornarem necessária a associação do empreiteiro
às actividades de projecto da obra”.
• “Os motivos de ordem técnica que justificam o recurso a um contrato de concepção-construção são ligados ao
fim (la destination) ou à organização e características técnicas (la mise en oeuvre technique) da obra. São
abrangidas as obras nas quais a utilização condiciona a concepção, a execução e a organização da obra, assim
como as obras cujas características, tais como dimensões excepcionais ou dificuldades técnicas particulares,
exigem o apelo aos meios e à tecnicidade próprias dos operadores económicos”
• Dos direitos espanhol e italiano saem também indicações relevantes apontando para elementos
como a especificidade técnica, a dimensão, o valor da obra, e certos sectores (transportes, infra-
estruturas como aeroportos, edifícios de natureza cultural) como aqueles nos quais habitualmente se
verificam as características que permitem a ECC

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• A questão do nível de programação da obra em sede de
caderno de encargos na ECC

• O caminho entre o programa preliminar e o projecto de


execução (referência à Portaria n.º 701-H/2008)

• As referências (não totalmente conclusivas) na doutrina mais


recente, e as da doutrina mais antiga e do Tribunal de Contas

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• As razões em abono da defesa da possibilidade de combinação de
ECC com nível (ou níveis) mais avançados de programação:

• Melhor gestão do risco ambiental (referência ao RAIA)


• Melhor definição das características da obra (em especial, a defesa do
interesse público em contexto de mera definição de obrigações de
resultado)
• Maior capacidade de distinguir pontos menos críticos e pontos mais
críticos da obra

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• Esclarecimentos e erros e omissões das peças do procedimento (artigo 50.º)

• A importância da utilização adequada desta fase para o saneamento das peças do


procedimento – boa parte das exclusões e também dos problemas de execução do
contrato vêm de dúvidas que poderiam ter sido esclarecidas nesta fase

• Esta fase pode igualmente ser útil para a entidade adjudicante se aperceber da
eventual necessidade de utilizar o mecanismo do 79º/1, alínea c) ou mesmo alínea d),
do CCP

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• Em caso de utilização do 79º/1, alíneas c) ou d), antes do final do prazo
de entrega de propostas, haverá lugar à aplicação das consequências dos
n.ºs 3 e 4?

• Os dois preceitos são provenientes de uma redacção do 79º que conferia


estas faculdades após a data de entrega de propostas.

• A consequência indemnizatória do 79º/4 não pode verificar-se, pois a


norma exige que não tenha sido excluída a proposta (o que exige que se
esteja numa fase em que o júri já tenha tido acesso a ela).
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• Em 2017 ocorreu a fusão, no mesmo momento procedimental, das fases de
esclarecimentos e resolução de erros e omissões (revogação do 61º)

• Efeito de aceleração do procedimento – também porque deixou de ficar


automaticamente suspenso o prazo com a apresentação da lista de erros e
omissões

• O regime actual coloca, pois, maior pressão temporal sobre os agentes


económicos – combinada com a genérica redução de prazos de propostas e
candidaturas
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• Sequência do regime de esclarecimentos e rectificações: apresentação pelos
concorrentes no primeiro terço, resposta até ao segundo terço

• mas permite-se que o convite ou programa de concurso fixem momento diferente

• O 50º/5 divide a referência aos esclarecimentos, que são prestados pelo órgão
competente para a decisão de contratar ou pelo órgão indicado nas peças, e à
pronúncia sobre erros e omissões, que é objecto de decisão pelo órgão competente
para a decisão de contratar

• A lei não se refere explicitamente, nesta parte, às meras rectificações, que apenas são
mencionadas nos n.ºs 7 a 8
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• Esta circunstância (sobretudo a leitura conjugada dos n.ºs 5 e 7) permite perguntar se
alguém, e quem, pode rectificar as peças a pedido (porque o nº 7 já resolve a
rectificação oficiosa)

• No entanto, obviamente, quem pode o mais pode o menos;

• talvez o legislador tenha entendido que a rectificação das peças se inclui no conceito geral
de resposta a erros e omissões (o que, no entanto, não parece rigoroso)

• No 50º/9 (prevalência) também não se autonomiza o caso da resposta a erros e


omissões, mas por maioria de razão, o regime aí referido terá de valer nesse caso

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• A opção de repartir, no nº 5, a competência entre esclarecimentos e resposta a erros ou
omissões deve associar-se a um aspecto de competência dos órgãos: a redacção do
69º/2 tornou indelegáveis no júri as competências para rectificação das peças e para a
resposta a erros ou omissões

• Origem e justificação da solução

• A questão pode não ser líquida: por vezes pode não ser claro se algo que se responde é uma
rectificação ou um esclarecimento; os interessados podem constituir expectativas (até pelo
50º/9, que no entanto não sana a incompetência) que depois sejam postas em causa

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• Inequívoco (e consagrando uma prática nesse sentido) é que o órgão competente para
a decisão de contratar não está dependente de pedido dos interessados para
introduzir rectificações ou prestar esclarecimentos (50º/7)

• O uso de tal faculdade (sempre, mas em especial após o segundo terço) tem de ser
acompanhado de uma adequada utilização do 64º, com a sua distinção entre duas
categorias essenciais de alterações às peças

• O 50º/2 tem um conceito de erro ou omissão que é aplicável às peças (e não apenas
ao caderno de encargos)

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• O aspecto mais discutido do 50º na versão de 2017 foi, sem dúvida, o da natureza do
dever de apresentar listas de erros e omissões, e o das consequências a que se refere o
50º/4;
• Cf. Miguel Assis Raimundo, "Erros e omissões das peças do procedimento e posição do co-
contratante, ou a vida difícil da boa-fé na contratação pública", Revista de Direito
Administrativo, (4), 2019, pp. 44-54.

• Não ficou bem harmonizada, na versão final do CCP, a redacção do 50º/4 com a do
378º/3 e 4: ela fazia sentido na versão do Anteprojecto de 2016;

• A revisão de 2021 veio corrigir este problema, intervindo nos arts. 50.º e 378.º

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• Aplica-se uma ideia de graus diferentes de evidência:

• Os trabalhos que já fossem detectáveis no prazo (curto) do 50º e não


tenham sido detectados pelo concorrente nesse prazo, são da sua
responsabilidade (em metade do valor);

• Os que sejam só detectáveis aquando da consignação, ficam sujeitos ao


prazo de 60 dias;

• Os que só surgem com a execução ficam sujeitos a um prazo autónomo a


partir da sua detecção (ou dever de detecção)
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• Outros aspectos a ter em conta na apresentação de
proposta em procedimentos tendentes à contratação de
empreitadas:

• Elementos do art. 57.º/2 (não esquecer, porém, o importante


STA 27-01-2022, proc. 0917/21.9BEPRT);

• Forma de indicação dos preços (preços parciais) – 60.º/4.


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Obrigado pela vossa atenção

miguelraimundo@fd.ulisboa.pt

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