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Curso Básico de

Gerenciamento da
Segurança
Operacional

Módulo - 2

Fundamentos da
Segurança Operacional
CONTEÚDO DO MÓDULO
01 Introdução
02 A resposta do setor aéreo aos perigos
03 A Organização e a Segurança Operacional
04 A evolução da Segurança Operacional
05 Modelos Organizacionais
06 O dilema da Gestão de Segurança
07 Cultura positiva de Segurança Operacional
08 Gerenciamento da Segurança Operacional
09 Resumo
10 Referências Bibliográficas
Introdução
VAMOS AGORA DAR CONTINUIDADE NO CURSO, INICIANDO NOSSOS
ESTUDOS NO MÓDULO 2 – FUNDAMENTOS DA SEGURANÇA
OPERACIONAL, QUE TEM COMO PRINCIPAL OBJETIVO DEMONSTRAR
COMO FUNCIONA O GERENCIAMENTO DA SEGURANÇA OPERACIONAL
EM UMA ORGANIZAÇÃO DE AVIAÇÃO.

O transporte aéreo constitui-se em um Essa capacidade de resposta tem exigido


dos segmentos mais dinâmicos da dos Estados cada vez mais empenho em
economia global, uma vez que se desenvolver regulação estratégica e de
caracterizou como uma indústria inovadora infraestrutura capazes de orientar e
que tem a capacidade de direcionar o garantir a expansão sustentável da
progresso econômico e social de um país e indústria de aviação, com base no
também pela possibilidade de conectar equilíbrio entre o gerenciamento financeiro
pessoas, lugares e as mais diversas e o gerenciamento da segurança. Como
culturas. Mesmo em tempos de crise, tal consequência, a melhoria da segurança
indústria tem apresentado números operacional e o avanço da modernização
expressivos e com forte tendência de da navegação aérea tendem a depender
crescimento no que se refere à sua essencialmente de profundo e estruturado
contribuição com os produtos internos planejamento. Mas o que vem a ser
brutos, à quantidade de empregos gerados segurança operacional? O que significa
e ao total de passageiros e de carga paga gerenciamento da segurança? É possível
transportados anualmente em escala eliminar todos os perigos da atividade
global. Entretanto, a evolução significativa aérea? Essas e outras perguntas serão
das atividades de transporte aéreo no respondidas no decorrer deste módulo
cenário nacional e internacional trouxe que abordará ainda sobre a evolução do
consigo a necessidade de que as nações, pensamento sobre segurança, como
bem como a indústria aeronáutica, acontece as diversas interações do
respondessem de forma proativa aos indivíduo em seu ambiente de trabalho, o
atuais perigos à segurança operacional que é uma cultura positiva de segurança
provenientes desse crescimento. operacional, dentre outros.
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A Organização
e a Segurança
Operacional

SEGURANÇA OPERACIONAL: UM CONCEITO


EM CONSTANTE EVOLUÇÃO

As atividades humanas ou sistemas construídos


pelo homem dificilmente serão garantidos como
completamente livres de erros operacionais e suas
consequências. Portanto, a segurança é um
recurso dinâmico do sistema, em que os riscos de
segurança devem ser continuamente mitigados. É
importante ter em mente que a aceitabilidade do
desempenho da segurança é comumente
influenciada por normas e cultura nacionais e
internacionais. Assim, para manter o desempenho
da segurança em um nível aceitável, um sistema
Na aviação, o conceito de segurança operacional
tão aberto e dinâmico deverá ser gerenciado
pode ter diversas conotações, dependendo da
continuamente para assegurar o equilíbrio entre a
perspectiva de quem avalia essa questão. Na
produção e a proteção da atividade
visão dos passageiros, por exemplo, o conceito de
desenvolvida.
segurança operacional pode significar fazer uma
viagem sem acidentes ou incidentes sérios. Para
A seguir, a evolução do entendimento sobre
outros, no entanto, pode significar a ausência do
segurança operacional no contexto da aviação.
histórico de acidentes; já para os gestores das
organizações, segurança operacional pode ser um
cenário alcançado pelo cumprimento de regras e
dos regulamentos vigentes. Todas essas
concepções possuem um denominador comum: o
controle absoluto de todos os fatores envolvidos
na aviação que, de uma maneira ou de outra,
podem contribuir para que um evento indesejável
aconteça (acidente ou incidente grave). Segundo
a Organização de Aviação Civil Internacional
(OACI), no contexto da aviação, segurança
operacional é "o estado no qual os riscos
associados às atividades da aviação, assim como
às atividades relacionadas ou de suporte direto às
operações de aeronaves, são reduzidos e
controlados a um nível aceitável". Independente
do conceito adotado, reduzir os acidentes aéreos
continua sendo o objetivo final, ainda que hoje
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saibamos que o sistema de aviação não pode


estar completamente livre de perigos e riscos
associados.
A Evolução da
Segurança
Operacional
Em termos práticos podemos dividir a evolução da aviação em quatro épocas

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distintas. A primeira delas, chamada de Era Técnica, teve início dos anos 1900 e
prosseguiu até o final dos anos 1960. Nesse época, a aviação surgiu como uma
forma de transporte de massa, em que as deficiências identificadas foram
inicialmente relacionados a fatores técnicos e falhas tecnológicas. O foco das
Anos atividades de segurança operacional era, portanto, orientado para a investigação e
aprimoramento de fatores técnicos. A partir da década de 1950, os avanços
1900 tecnológicos levaram a uma redução gradual na frequência dos acidentes aéreos,
com isso, os processos de segurança foram ampliados para abranger a
conformidade com a regulação e a fiscalização.

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A era dos Fatores Humanos, seguiu do início dos anos 1970 até meados da década
de 1990. No início da década de 1970, a frequência de acidentes aéreos foi
significativamente reduzida graças aos avanços tecnológicos e melhorias na
segurança operacional. A aviação tornou-se um meio de transporte mais seguro e o
foco das atividades de segurança foi estendido para incluir questões de fator
Anos humano, como a interface homem-máquina. Isso produziu uma busca por
informações de segurança além do que havia sido gerado com os primeiros
1970 a
processos de investigação de acidentes. No entanto, apesar dos investimentos de
1990 recursos na mitigação de erros, o desempenho humano continuou a ser citado
como fator contribuinte recorrente nos acidentes. A aplicação da ciência dos
fatores humanos tendia a focar na pessoa, sem considerar plenamente o contexto
operacional e organizacional. No início da década de 1990 foi então reconhecido
pela primeira vez que as pessoas operavam em um ambiente complexo, que incluía
vários fatores que tinham o potencial de afetar o comportamento humano.

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A era dos Fatores Organizacionais teve início em meados da década de 1990 e
segue até os dias atuais. Durante a era de fatores organizacionais, a segurança
operacional passou a ser vista sob uma perspectiva sistêmica, incluindo a
organização como um todo, além de fatores humanos e técnicos. Como resultado,
foi introduzida a noção de “acidente organizacional”, que considerou o impacto da
Meados cultura e das políticas institucionais sobre a eficácia dos controles dos riscos de
segurança. Além disso, os esforços tradicionais de coleta e análise de dados, que se
de 1990 limitavam ao uso de dados recolhidos por meio da investigação de acidentes e
até o final incidentes graves, foram complementados por uma nova abordagem proativa para
a segurança operacional. Essa nova abordagem estava baseada na coleta e análise
do Século rotineira de dados por meio de metodologias proativas e reativas, a fim de
20 monitorar riscos de segurança operacional conhecidos, detectando eventuais
problemas emergentes. Essas melhorias formularam a lógica de avançar para uma
abordagem de gestão para a segurança operacional.

4 A partir do início do século XXI (Era do Sistema Total), as organizações e as


Entidades evoluíram para um nível mais elevado no que tange à maturidade em
termos de segurança operacional. Iniciou-se o período em que estas começaram a
implementar o Programa de Segurança Operacional do Estado (SSP) e o Sistema de
Início do Gerenciamento da Segurança Operacional (SMS) a fim de colher os benefícios
Século 21 advindos desse sistema.
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até os dias
atuais
Modelos
Organizacionais

O MODELO DO QUEIJO SUÍÇO


Após falarmos sobre o conceito de Segurança Falhas ativas são ações realizadas ou não, como
Operacional, vamos agora estudar um pouco erros e violações, que têm efeito adverso
sobre os acidentes aéreos, mais propriamente, o imediato. Já as condições latentes são aquelas
porquê deles ocorrerem segundo alguns modelos que existem no sistema de aviação muito antes
existentes. O modelo do "Queijo Suíço", de um resultado prejudicial. As consequências
desenvolvido pelo professor James Reason, ilustra das condições latentes podem permanecer
que os acidentes na aviação ao ocorrerem, ocultas por muito tempo, por isso, muitas vezes
envolvem falhas sucessivas de várias barreiras do não são percebidas como prejudiciais, mas se
sistema. Essas falhas podem ser geradas por tornarão aparentes após a interposição das
muitos fatores, como problemas em equipamento defesas do sistema. Geralmente, essas condições
ou erros operacionais. O modelo ainda sustenta são geradas por pessoas muito distantes no
que sistemas complexos, como o da aviação, são tempo e no espaço do evento prejudicial. As
muito bem protegidos com camadas de defesas, condições latentes podem incluir situações
por isso, falhas em um único ponto raramente geradas pela falta de uma cultura positiva de
trazem consequências a esses sistemas. Assim, a segurança operacional, projeto deficiente de
ineficiência das defesas de segurança poderiam equipamentos ou procedimentos, objetivos
ser uma consequência tardia de decisões institucionais conflitantes, sistemas institucionais
tomadas nos níveis mais altos do sistema, ou decisões de gestão incompletas, dentre
permanecendo latentes até que seus efeitos ou outros. A perspectiva de antecedentes dos
potencial danoso sejam ativados sob acidentes organizacionais visa identificar e
circunstâncias operacionais específicas. Em tais mitigar as condições latentes em nível sistêmico
circunstâncias, falhas humanas ou ativas de nível e não por meio de esforços localizados para
operacional agem para romper as defesas minimizar falhas ativas, o que veremos no tópico
naturais de segurança operacional. O modelo de a seguir. Abaixo, uma ilustração do modelo do
Reason propõe que todos os acidentes incluem "Queijo Suíço" no contexto de uma organização
uma combinação de falhas ativas e condições de aviação.
latentes.
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FONTE: HTTPS://WWW.RESEARCHGATE.NET/FIGURE/FIGURA-4-TEORIA-DO-QUEIJO-SUICO-DE-JAMES-REASON-
FONTE-REASON-1997-ADAPTADO_FIG4_281840243
CAUSALIDADE DOS ACIDENTES
Como dito anteriormente, os acidentes na aviação normalmente envolvem falhas de
múltiplas defesas em diferentes áreas (equipamentos, infraestrutura, erros operacionais
etc.). Em sistemas complexos como esse, falhas isoladas dificilmente causam problemas
significativos, por isso, algumas delas podem permanecer despercebidas (condições
latentes) até que um conjunto de condições faça com que se tornem aparentes (falhas
ativas). É o que propõe o professor James Reason no modelo chamado de “Acidente
Organizacional”, o qual considera que os acidentes são fruto de uma combinação de
condições latentes e de falhas ativas. De acordo com o conceito de Acidente
Organizacional de Reason, as falhas ativas são produtos de ações individuais ou de equipe
que, usualmente, envolvem erros ou violações cometidos pelos trabalhadores na linha de
frente da organização. Esses fatores, ao combinarem-se com fatores ambientais ou outros
eventos desencadeadores, encontram ou criam caminhos através das defesas
implementadas pela organização para impedir a ocorrência de acidentes. Vejamos essa
representação na figura abaixo:

O modelo de Reason representa a operação do sistema de aviação civil sob condições de


perigo. Nesse modelo, o acidente é resultante de sucessivas violações de múltiplas defesas
por meio da combinação de condições latentes (aspectos organizacionais) e falhas ativas
(desempenho humano). Assim, fatores isolados não resultariam em um acidente, já que as
defesas do sistema atuariam de maneira a evitar a trajetória das condições latentes até o
desfecho em possível catástrofe. O modelo representa as camadas representativas da
organização (englobando decisões gerenciais e processos organizacionais), do local de
trabalho (englobando as condições de trabalho), das pessoas (englobando erros e
violações) e as camadas de defesas. Os orifícios nas camadas representam as falhas em
partes distintas do sistema. Caso esses orifícios venham a se alinhar, fica estabelecido um
caminho que leva a um comprometimento da segurança operacional e a um eventual
acidente ou incidente. No próximo tópico estudaremos um pouco mais sobre o Acidente
Organizacional, considerando o diagrama de blocos no contexto de uma organização de
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aviação.
O ACIDENTE ORGANIZACIONAL
O modelo de Reason pode ser ainda usado Essas condições podem incluir falta de
como um guia de análise do ambiente estabilidade, baixa qualificação e
operacional, permitindo examinar o experiência, excesso de jornada, falta de
comportamento dos indivíduos envolvidos credibilidade da gestão, problemas
em determinada ocorrência. Nesse caso, ergonômicos, dentre outros. Sob a
podemos aplicá-lo durante a vigilância perspectiva do acidente organizacional, os
continuada das operações, numa auditoria esforços de segurança operacional devem
interna ou mesmo na investigação de ser direcionados para monitorar os
eventos internos de segurança operacional. processos organizacionais e identificar
Em cada caso, o modelo deve considerar condições latentes, para então reforçar as
quais defesas da organização são eficazes, defesas do sistema. Ao mesmo tempo, esse
quais foram violadas e em que o sistema monitoramento permitirá melhorar as
poderia se beneficiar ao se implantar condições do local de trabalho para conter
defesas adicionais. Uma outra perspectiva as falhas ativas, intervindo diretamente na
do acidente organizacional pode ser vista a prevenção de possíveis incidentes graves
partir do diagrama de blocos abaixo. ou acidentes. Vale mencionar que o
modelo pode apresentar imperfeições,
principalmente, quando houver um
tratamento superficial dos problemas
sistêmicos. Se ao ser utilizado, a
organização considerar apenas as falhas
mais evidentes, dificilmente será possível
alcançar a causa raiz dos problemas, ou
seja, condições latentes importantes
poderão continuar despercebidas até que
FONTE: SMM (OACI 2013 - 3ª EDIÇÃO).
um evento catastrófico as evidencie na
operação. Vejamos abaixo uma
Os processos organizacionais são aqueles representação desse esquema.
em que a organização possui controle direto
em grau razoável, tais como, a formulação de
políticas, planejamento, comunicação e
supervisão. Quando existem deficiências
nos processos organizacionais, tais como
falta de supervisão, comunicação
inadequada, recursos insuficientes etc., cria-
se a possibilidade do surgimento de outros
problemas relacionados a condições do
local de trabalho e a erros operacionais, da
mesma forma que possibilitam o surgimento
de novas condições latentes. Por
consequência, consideramos como FONTE: SAFETY MANAGEMENT SYSTEM - SMS (OACI - 2007).

condições do local de trabalho todos os


fatores negativos que influenciam A seguir, abordaremos o modelo SHELL
diretamente o desempenho e a eficiência esclarecendo como ele pode ajudar a
dos trabalhadores em sua rotina diária, ilustrar o erro humano no contexto
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favorecendo assim o surgimento de falhas organizacional.


ativas.
O MODELO SHELL
Diversos modelos já foram propostos para Assim, é necessário conhecer como se dão as
auxiliar na avaliação dos fatores humanos no conexões entre o Liveware e os demais blocos
desempenho da segurança operacional. do diagrama SHELL e que afetam o desempenho
Enquanto James T. Reason propôs em 1990 o humano para compreender a relação existente
modelo da Trajetória das Condições Latentes entre as pessoas e o contexto operacional,
para explicar a dinâmica organizacional dos visando evitar a ocorrência desses erros. O erro
acidentes, Edwards (1972) e Hawkings (1984) humano é considerado o fator que contribui para
desenvolveram e aperfeiçoaram o Modelo SHELL, a maioria dos incidentes na aviação, por isso,
voltado para explicar as relações dos indivíduos podemos dizer que mesmo pessoas
com a complexidade de componentes presentes competentes cometem erros. Tais falhas devem
no contexto operacional do segmento ser entendidas como um componente normal em
aeronáutico. O nome do modelo é um acrônimo qualquer sistema no qual os seres humanos
formado pelas iniciais dos componentes do estejam presentes e interajam com outros
sistema da aviação: Software: representando elementos. Erros são o resultado de ações que
procedimentos, treinamentos, suporte, etc.; falham e não geram os resultados esperados. Eles
Hardware: representando máquinas e são categorizados de acordo com os processos
equipamentos; Environment: representando as cognitivos envolvidos em relação ao objetivo da
diversas circunstâncias operacionais em que os ação e de acordo com o fato de estarem
outros componentes do sistema devem relacionados ao planejamento ou à execução da
funcionar; Liveware (centro): representando o atividade.
indivíduo no local de trabalho; e Liveware:
representando outras pessoas. Com o auxílio do
modelo SHELL, é possível entender melhor como
os diversos componentes do ambiente de
aviação podem afetar o desempenho operacional
dos indivíduos no ambiente de trabalho. Vejamos
na ilustração abaixo.

FONTE: SMM (OACI 2009 - 2ª EDIÇÃO).

Vale destacar que para o gerenciamento da


segurança operacional ser realizado de forma
eficaz (tema a ser estudado mais a frente) é
FONTE: MODELO SHELL - ADAPTADO DE CAA (2002).
preciso diferenciar um erro de uma violação. Em
No centro do diagrama está o indivíduo que essência, a diferença entre erros e violações está
realiza suas atividades interagindo com na intenção (OACI, 2013). Enquanto erros
diferentes elementos presentes na aviação, operacionais são involuntários, as violações são
representado pelo bloco Liveware. O indivíduo atos deliberados e devem ter tratamento
é o componente mais crítico do sistema, ao diferenciado dentro da organização para não
mesmo tempo em que é o mais flexível. Porém, comprometer o desempenho da segurança
nem sempre as interações realizadas são operacional.
perfeitas, resultando em dificuldades de
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adaptação. Essas tensões no ambiente de


trabalho, que são representadas no modelo
por um encaixe com falhas nas interfaces
entre os blocos, favorecem o erro humano.
A TEORIA DA DERIVA PRÁTICA
A Teoria da Deriva Prática de Scott A. Snook é Como a deriva é uma consequência da prática
usada para entender como o desempenho de diária, é chamada de "deriva prática". O termo
qualquer sistema "se afasta" da sua proposta "Deriva" é usado neste contexto como um desvio
original. Tarefas, procedimentos e equipamentos gradual de um curso pretendido.
geralmente são inicialmente projetados e
planejados em um ambiente teórico, sob Snook afirma que a deriva prática é inevitável em
condições ideais, com uma suposição implícita qualquer sistema, não importando o quanto
de que quase tudo pode ser previsto e cuidadoso e bem pensado tenha sido seu
controlado, e onde tudo funciona como projeto. Algumas das razões para a ocorrência da
esperado. Isso geralmente é baseado em três Deriva Prática são:
suposições fundamentais de que:
Tecnologia que nem sempre opera como
A tecnologia necessária para atingir as metas previsto;
de produção do sistema está disponível; Procedimentos que não [podem ser
O pessoal é treinado, competente e motivado executados conforme planejado;
para operar adequadamente a tecnologia Regulamentos que não estão atentos às
como pretendido; e limitações contextuais;
Políticas e procedimentos ditarão o sistema e Introdução de mudanças sutis em sistemas
o comportamento humano. após sua concepção, sem a correspondente
reavaliação de seu impacto; e
Essas suposições estão subjacentes à linha de Adição de novos componentes ao sistema
base (ou ideal) de desempenho do sistema, que sem uma avaliação de segurança apropriada
pode ser apresentado graficamente como uma dos perigos que estes podem apresentar:
linha reta desde o início do desenvolvimento interações entre sistemas, dentre outros.
operacional.
Na realidade, as pessoas geralmente fazem o
sistema funcionar diariamente apesar de suas
deficiências, aplicando adaptações locais (ou
soluções alternativas) e estratégias pessoais.
Essas soluções alternativas podem desviar da
proteção e dos controles e defesas de
gerenciamento de riscos existentes.

Ações tais como realização de auditorias,


monitoramento de Indicadores de desempenho
de segurança e vistorias, podem ajudar a expor
FONTE: CONCEITO DA DERIVA PRÁTICA DE SCOTT A. SNOOK, PROFESSOR atividades que estão "praticamente à deriva".
ASSOCIADO DA HARVARD BUSINESS SCHOOL, É UM DOS PRINCIPAIS
ESPECIALISTAS EM DESENVOLVIMENTO DE LIDERANÇA. POSSUI MBA (ALTA
Logo, analisar as informações para descobrir
DISTINÇÃO) DA HARVARD BUSINESS SCHOOL, E PH.D. DA UNIVERSIDADE DE porque a deriva está acontecendo, ajuda a
HARVARD EM COMPORTAMENTO ORGANIZACIONAL. ENTRE SEUS LIVROS,
ESTÃO FRIENDLY FIRE E PRACTICAL INTELLIGENCE IN EVERYDAY LIFE. atenuar os riscos de segurança. Ao mesmo
tempo, quanto mais próximo do início da
Uma vez implantado operacionalmente, o sistema implantação operacional for identificado o desvio
deve ter o desempenho ideal conforme prático, mais fácil será para organização intervir.
projetado, seguindo o desempenho da linha de
base (linha laranja) na maioria das vezes. Na A seguir, vamos falaremos sobre Cultura de
realidade, o desempenho operacional muitas Segurança, buscando esclarecer porque ela é
vezes difere do pressuposto desempenho da tão importante para a segurança das operações
linha de base como consequência das operações no ambiente da aviação.
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reais em um ambiente complexo, em constante


mudança (linha vermelha).
O DILEMA DA GESTÃO DE SEGURANÇA

Em qualquer organização envolvida na prestação A figura abaixo ilustra a alocação de recursos e


de serviços, os riscos de produção /lucratividade os limites do espaço de segurança de uma
e segurança estão vinculados. Uma organização organização
deve manter a lucratividade para permanecer no
negócio, equilibrando os recursos empregados
na produção, bem como os aplicados na
implementação do controle dos riscos
envolvidos com a operação aérea.
A implementação de controles de risco tem um
preço - dinheiro, tempo, recursos - e o foco
desses controles é melhorar o desempenho da
segurança e não o da produção. No entanto,
alguns investimentos em segurança também
podem melhorar a produção, reduzindo
acidentes e incidentes e, portanto, seus custos
associados.
A alocação de recursos excessivos à segurança
(controles de risco) pode resultar na atividade da
O espaço de segurança é uma metáfora para a
empresa se tornar não lucrativa, portanto
zona em que uma organização equilibra a
comprometendo a viabilidade da organização.
desejada produção/lucratividade, mantendo a
Por outro lado, a alocação excessiva de recursos
necessária segurança por meio de controles de
para produção pode ter um impacto negativo na
risco. Por exemplo, um fornecedor de serviço
segurança do produto ou serviço e, finalmente,
pode querer investir em novos equipamentos. Os
levar a um acidente.
novos equipamentos podem fornecer
As organizações precisam monitorar e gerenciar
simultaneamente a necessária melhoria da
continuamente seu espaço de segurança, à
eficiência, bem como incrementar a
medida que os riscos e influências externas
confiabilidade e o desempenho da segurança.
mudam com o tempo.
Essa tomada de decisão envolve uma avaliação
A necessidade de equilibrar lucratividade e
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tanto dos benefícios para a organização quanto


segurança tornou-se uma premissa importante
dos custos envolvidos.
na perspectiva dos provedores de serviço.
Cultura Positiva
de Segurança
Operacional
O termo "cultura" significa cultivar, e vem do latim colere.
Genericamente, "cultura" é todo aquele complexo que inclui
o conhecimento, a arte, as crenças, a lei, a moral, os
costumes e os comportamentos que membros de distintos
grupos sociais compartilham entre si. Há três tipos de
cultura: a cultura nacional, que envolve o sistema de valores
de cada nação individualmente; a cultura organizacional ou
corporativa, que diferencia os valores e os comportamentos
de organizações específicas, tais como empresas estatais,
órgãos de governo e organizações privadas; e a cultura
profissional, que diferencia os valores e os comportamentos
de grupos profissionais específicos, como pilotos,
controladores, mecânicos, pessoal de aeródromos etc., no
caso da aviação. Como as organizações são essencialmente
grupos de pessoas, elas não estão imunes a considerações
culturais. Assim, podemos entender a cultura de segurança
como uma consequência natural da existência de seres
humanos no sistema de aviação. Segundo o Safety
Management Manual (OACI), uma cultura positiva de
segurança operacional é o padrão de comportamento das
pessoas em relação à segurança operacional e aos riscos
associados aos perigos identificados na operação, quando
ninguém os está observando. Esse tipo de cultura de
segurança engloba as percepções e crenças mais comuns
dos membros de uma organização de aviação em relação à CULTURA POSITIVA DE
segurança dos usuários do sistema, no entanto, para ser
saudável, dependerá de um alto grau de confiança e
SEGURANÇA OPERACIONAL
respeito entre o pessoal operacional e a equipe de gestão.
A cultura de segurança é a expressão de
Tal cultura irá afetar praticamente todos os tipos de
interações interpessoais dentro de uma organização ou como a segurança é percebida,
mesmo fora dela. Ela se apresenta quando indivíduos e valorizada e priorizada pelos funcionários
grupos: estão conscientes dos riscos e conhecem os e pela alta direção da organização.
perigos encontrados pela organização em suas atividades;
estão continuamente se comportando para preservar e
aumentar a segurança; são capazes de acessar os recursos
requeridos para realizar operações seguras; são dispostas e
capazes de se adaptarem quando encontram problemas de
CURIOSIDADE!!!
segurança; estão dispostos a comunicar problemas de
segurança; e avaliam de maneira consistente os
VOCÊ SABIA QUE, NA FORÇA AÉREA BRASILEIRA,
comportamentos relacionados à segurança em toda a
O MCA 63-19 VERSA SOBRE A CULTURA DE
organização. Vale lembrar que a forma como são
SEGURANÇA OPERACIONAL A SER ADOTADA NO
incorporados valores essenciais pela cultura organizacional
SISTEMA DE CONTROLE DO ESPAÇO AÉREO
afeta diretamente o desempenho da segurança operacional,
BRASILEIRO (SISCEAB)?
podendo ser uma influência positiva ou negativa. Podemos
perceber uma influência negativa quando se acredita que
A MCA 63-19 TEM A FINALIDADE DE
segurança não é tão importante, ou quando não existe uma
PADRONIZAR OS PROCEDIMENTOS REQUERIDOS
preocupação com os perigos associados à operação. O
PARA O DESENVOLVIMENTO DA CULTURA DE
Gerenciamento da Segurança Operacional dependerá
SEGURANÇA OPERACIONAL NAS
essencialmente da mudança de cultura de uma organização.
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ORGANIZAÇÕES E ENTIDADES PROVEDORAS DE


Sem uma cultura positiva de segurança, será quase
SERVIÇOS DE NAVEGAÇÃO AÉREA (PSNA).
impossivel realizar um bom gerenciamento da segurança
operacional, nosso próximo tópico de estudo.
Gerenciamento da
Segurança Operacional
Para alcançar os objetivos de produção, a Os perigos em matéria de segurança são
administração de qualquer organização de aviação consequências das atividades relacionadas com a
precisa gerenciar diferentes processos empresariais. entrega dos produtos e/ou prestação de serviços.
Assim, podemos dizer que o gerenciamento da Assim, uma análise dos recursos e dos objetivos da
segurança operacional é uma função tão essencial organização permite uma distribuição equilibrada e
quanto o gerenciamento financeiro, de recursos realista dos recursos disponíveis entre os objetivos
humanos, etc. Como não existe organização de de proteção e os objetivos de produção, conforme
aviação que tenha sido criada somente para as necessidades da organização.
fornecer segurança operacional, o resultado será um
dilema gerencial potencial. Nesse contexto, quando a
organização deseja aumentar a sua produção, ou
seja, prestar mais serviços ou transportar mais
pessoas ou cargas, há um aumento dos riscos
envolvidos. Sob essa óptica, surge um dilema em que
os objetivos de produção e os de proteção
competem entre si pelos recursos da organização.
Ao privilegiar a alocação de recursos para os
objetivos de produção em detrimento dos objetivos
da proteção, mais próxima estará a organização de
vivenciar a ocorrência de uma catástrofe.
FONTE: SMS COURSE (OACI-2007).

Quando enfim os objetivos de produção e os de


proteção se mostram saudáveis no sentido de não
levar a organização à falência ou à catástrofe, com
fronteiras bem delimitadas pelo gerenciamento
financeiro e pelo gerenciamento da segurança
operacional, dizemos que foi alcançado o espaço de
segurança operacional.

FONTE: SMS COURSE (OACI-2007).

Por outro lado, quando se privilegia os objetivos de


proteção em detrimento dos objetivos de produção,
a organização vai se aproximar da condição de
falência, como vemos na figura abaixo.

FONTE: ADAPTADO DO DOC. 9859 (OACI-2013).

Como as interações humanas não são perfeitas, as


falhas irão ocorrer. Por isso, para tentar amenizar os
impactos negativos na operação, precisaremos
gerenciar os diferentes elementos no ambiente
organizacional. Nesse contexto, o gerenciamento da
segurança operacional será entendido como a
aplicação de um conjunto de processos e medidas
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que visarão a prevenção de acidentes, de lesões às


pessoas e de outras consequências negativas
FONTE: SMS COURSE (OACI-2007). quando da entrega de um produto ou serviço.
Gerenciamento da
Segurança Operacional
8 princípios norteadores
O gerenciamento da segurança operacional 6. Integração do treinamento de segurança
engloba oito princípios fundamentais: operacional. Raramente os treinamentos para o
1. Compromisso da alta direção no pessoal operacional incluem o tema da segurança
gerenciamento da segurança operacional. Tal operacional, tendo em vista a concepção
comprometimento facilitará a alocação de equivocada de que o pessoal operacional já é
recursos para as atividades que envolvem a especialista no assunto. Essa integração favorece
segurança. a difusão do conhecimento.
2. Relato efetivo de segurança operacional. As 7. Implementação efetiva de procedimentos
informações obtidas por meio dos relatos irão operacionais padronizados. Por meio de
permitir a identificação de perigos e o checklists, briefings e da padronização, o pessoal
gerenciamento dos riscos associados. operacional poderá desempenhar suas atividades
3. Monitoramento permanente de dados. Por com maior controle e eficácia.
meio da coleta, análise e compartilhamento de 8. Melhoria contínua do nível geral da segurança
dados de segurança operacional das operações operacional. O gerenciamento da segurança
normais, a organização será capaz de extrair operacional não é um esforço que dá resultados
informações úteis, para divulgação junto ao consistentes de forma imediata, eles serão
pessoal operacional. colhidos a longo prazo por meio da melhoria
4. Investigação dos eventos que afetam a gradual do sistema.
segurança operacional. Permite que a organização
identifique deficiências sistêmicas, priorizando as O resultado de adotar esses oito princípios será
causas dos problemas ao invés da busca por a formação de uma cultura organizacional que
culpados pelas falhas. favoreça práticas seguras, incentive a
5. Compartilhamento de lições aprendidas e de comunicação sobre segurança efetiva e
melhores práticas de segurança operacional. Por gerencie ativamente a segurança com a mesma
meio do intercâmbio ativo de informações, a atenção com que trata a gestão financeira.
organização poderá melhorar a cultura de
segurança.

Podemos dizer que o


gerenciamento da segurança
DESIGN DE UI/UX operacional pode ser visto
também como um negócio
Assim como a maioria das publicações principal da organização que
impressas, o segredo para criar um desenvolve atividades de
livreto impactante está na curadoria. A aviação. Dessa forma, estaria
consistência da marca é importante relacionado em linhas gerais
com os objetivos de proteção,
para as empresas, mas um bom design
já que sua essência busca
também se aplica a livretos pessoais ou melhorar a segurança. Por ser
de eventos. Certifique-se de ter uma função organizacional,
informações claras e precisas em cada esse gerenciamento proativo
deverá assegurar que todos os
página. Escolha fotos, fontes e imagens
riscos associados à operação
atraentes. Escolha cores que combinem sejam conhecidos, avaliados e
com seu estilo. Você precisa se mitigados de maneira
comunicar bem com seu público, então, satisfatória, auxliliando os
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tenha-o sempre em mente ao criar gestores no cumprimento de


suas responsabilidades em
relação à segurança.
Resumo
Neste módulo, falamos de alguns dos principais Por fim, ao discorrer sobre o tema
fundamentos envolvidos no contexto da Gerenciamento da Segurança Operacional,
segurança operacional da aviação. Estudamos a explicamos o dilema gerencial e afirmamos que
evolução do pensamento sobre segurança, esse gerenciamento engloba um conjunto de
abordamos os modelos organizacionais como o ações, métodos e procedimentos a serem
"Queijo Suíço", o "Modelo SHELL" e a "Deriva adotados, no âmbito de uma organização de
Prática". Exploramos aspectos de uma Cultura aviação, para a prevenção de acidentes aéreos,
Positiva de Segurança Operacional, introduzimos visando à melhoria contínua de toda a operação.
o tema do Gerenciamento da Segurança
Operacional e finalizamos, listando os principais No próximo módulo do nosso curso falaremos
elementos norteadores desse gerencimento. Ao sobre o Programa de Segurança Operacional
comentarmos sobre o conceito mais atual de (PSO) de Estado e sobre os Programas de
segurança operacional, explicamos como ele foi Segurança Operacional Específicos das
sendo aprimorado ao longo dos anos. Ao Autoridades de Aviação Brasileiras.
explorarmos o modelo do Queijo Suíço, do prof.
James Reason, procuramos esclarecer a lógica
dos acidentes aéreos, que ao ocorrerem
envolvem violações sucessivas de várias Chegamos ao fim deste Módulo. Vamos agora fixar o
barreiras implementadas na operação. Ao que aprendemos sobre os Fundamentos da Segurança
abordarmos o conceito de Causalidade dos Operacional. Para tanto, retorne à página inicial do
Acidentes, demonstramos como o diagrama de curso e realize a Avaliação de Aprendizagem,
blocos que caracteriza o Acidente respondendo corretamente às questões.
Organizacional pode ser aplicado como um guia
de análise do ambiente operacional de uma
organização de aviação. Quando citamos o
Modelo SHELL, o conceito de Deriva Prática e o
termo Cultura Positiva de Segurança
Operacional, além de explicarmos sobre os tipos
de cultura existentes, procuramos deixar claro
como o desempenho das pessoas nas
atividades da aviação podem interferir na
segurança operacional devido às diversas
interações dos indivíduos e ao comportamento
por eles adotado em sua rotina.

DESIGN DE UI/UX
Assim como a maioria das publicações
impressas, o segredo para criar um
livreto impactante está na curadoria. A
consistência da marca é importante
para as empresas, mas um bom design
também se aplica a livretos pessoais ou
de eventos. Certifique-se de ter
informações claras e precisas em cada
página. Escolha fotos, fontes e imagens
atraentes. Escolha cores que combinem
com seu estilo. Você precisa se
comunicar bem com seu público, então,
tenha-o sempre em mente ao criar
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Referências Bibliográficas
BRASIL. ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil. Organização de Aviação Civil Internacional (OACI).
Disponível em: https://www2.anac.gov.br/anacpedia/por_ing/tr3627.htm - Acessado em 14/11/2021 às
20:30.

BRASIL. ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil). Segurança Operacional. Disponível em:
https://www.gov.br/anac/pt-br/assuntos/seguranca-operacional/sgso/sgso - Acessado em 14/11/2021
às 20:00.

BRASIL. Ministério da Defesa. Comando da Aeronáutica. DECEA (Departamento de Controle do Espaço


Aéreo). Cultura de Segurança Operacional – MCA 63-19. Rio de Janeiro: DECEA, 2017. Disponível online
em: https://publicacoes.decea.gov.br/?i=publicacao&id=4519

OACI (International Civil Aviation Organization). Safety Management Manual (SMM): Doc. 9859 AN/474.
3ª ed. Montreal: OACI, 2013.

OACI (International Civil Aviation Organization). Safety Management Manual (SMM): Doc. 9859 AN/474.
4ª ed. Montreal: OACI, 2018.

OACI (International Civil Aviation Organization). Safety Management System Course. Montreal: OACI,
2007.

SKYBRARY. OACI SHELL Model. Disponível online em:


https://www.skybrary.aero/index.php/OACI_SHELL_Model

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CURSO BÁSICO DE GERENCIAMENTO DA SEGURANÇA OPERACIONAL

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