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Orestes Piermatei Filho

Equações Diferenciais II

Instituto de Ciências Exatas – UFJF


Departamento de Matemática
Apresentação

Para falar sobre os objetos de estudo deste texto é interessante falar, antes, sobre funções. A
primeira definição de função foi apresentada em 1718 pelo matemático suíço Johann Bernoulli.
Nos anos seguintes novas definições surgiram e o conceito de função evoluiu até a definição
apresentada por N. Bourbaki em 1939 (veja a referência [12]), que é transcrita aqui:

D EFINIÇÃO [Bourbaki]: Sejam E e F dois conjuntos, distintos ou não. Uma relação entre
uma variável x de E e uma variável y de F é dita relação funcional em y, se, qualquer que
seja x ∈ E, existe um elemento y de F, e apenas um, que está na relação considerada com
x. Dá-se o nome de função à operação que assim associa a todo elemento x ∈ E o elemento
y ∈ F que está na relação dada com x; diz-se que y é o valor da função para o elemento x
e que a função é determinada pela relação funcional considerada. Duas relações funcionais
equivalentes determinam a mesma função.

Os passos seguintes consiste em exemplificar certas funções com o objetivo de esclarecer a


definição de função dada acima. Em seguida comenta-se sobre os objetos de estudo presentes
neste texto.
Considere uma função f : R → R cuja relação funcional é dada por

x3 + x2 + x + 1
f (x) = ·
x2 + 1
O leitor é convidado a imaginar como seria o gráfico da função f . Feito isso, considere agora
a função g : R → R com relação funcional definida por g(x) = x + 1. Note que o gráfico de g é
fácil de ser descrito: trata-se de uma reta crescente passando pelos pontos (−1, 0) e (0, 1). Mas
seriam as funções f e g iguais? Para que a resposta seja afirmativa é preciso partir da relação
funcional que define f e chegar na relação funcional de g e depois partir da relação funcional
que define g e chegar na relação funcional de f , pois é isso que significa dizer que as relações
funcionais são equivalentes. Assume-se a relação funcional de f :

x3 + x2 + x + 1 (x3 + x) + (x2 + 1)
f (x) = =
x2 + 1 x2 + 1

i
ii Apresentação

x(x2 + 1) + (x2 + 1) (x + 1)(x2 + 1)


= =
x2 + 1 x2 + 1
= x + 1 = g(x),
pois o termo x2 + 1, no denominador, não se anula para qualquer x ∈ R. Portanto, mostrou-se
que f ⇒ g.
Agora parte-se de g. Como x2 + 1 é diferente de zero para todo x real, então é possível
multiplicar e dividir a função g por este termo. Tem-se:
x2 + 1
g(x) = x + 1 = (x + 1) · 2
x +1
(x + 1)(x2 + 1) x3 + x + x2 + 1
= =
x2 + 1 x2 + 1
3 2
x +x +x+1
= = f (x).
x2 + 1
Mostrou-se, portanto, que g ⇒ f . Como f ⇒ g e g ⇒ f , então as relações funcionais de f e
g são equivalentes. Assim, segundo a definição dada por Bourbaki, conclui-se que as funções
f e g são iguais. Uma consequência imediata disso é que o gráfico da f é o mesmo da função
g, isto é, o gráfico de f é a mesma reta do gráfico de g. O leitor deve ter percebido que não é
natural imaginar que a função f , através da relação funcional que a define, tenha como gráfico
uma reta.
O leitor deve estar se perguntando se é possível escrever a função g(x) = x + 1 de outras
maneiras. A resposta é sim: basta multiplicar e dividir a relação funcional de g por qualquer
função que não se anule. Por exemplo, multiplicar e dividir soma de monômios de grau par e
constantes positivas, ou multiplicar e dividir por exponenciais, etc. Há uma infinidade de possi-
bilidades. A consequência disso é que uma mesma função tem uma infinidade de ser escrita.
Outro caso menos evidente é quando se considera as funções f , g : R → R definidas por
(
x, se x ≥ 0, √
f (x) = |x| = e g(x) = x2 .
−x, se x < 0,

Como o leitor sabe, essas duas funções são iguais. Para mostrar isso é necessário pensar em
modo que leva as duas sentenças da função modular na única setença da função g(x) e vice-
versa. Antes de dar continuidade aos cálculos recordar-se-á dois conceitos básicos: raiz n-ésima
e potência de expoente racional.

Sejam a ≥ 0 e n ∈ N. É possível demonstrar que sempre existe um único b ≥ 0 tal que bn = a.



O número b é chamado de raiz n-ésima de a e que é representado por b = n a.

Sejam a > 0 e p/q ∈ Q, onde p ∈ Z e q ∈ N. Define-se a potência de base a e expoente p/q



por a p/q = q a p. Para a = 0 e p/q > 0, define-se 0 p/q = 0.

Dando continuidade, demonstrar-se-á que f ⇒ g, analisando-se cada sentença por vez. Para
x ≥ 0, tem-se
Apresentação iii

1  12 √
x = x 2· 2 = x2 = x2 .
Para x < 0: como x é negativo, então existe y > 0 tal que x = −y (ou y = −x). Assim,
1 p q √
1
−x = y = y 2· 2 = y2 2 = y2 = (−x)2 = x2 .

O leitor deve observar que a validade dos cálculos acima está assegurada pela não negativi-
dade das bases usadas. Tais cálculos mostram que√as duas setenças da função modular f (x) = |x|
são levadas na única sentença da função g(x) = x2 .
Agora mostra-se que g ⇒ f . Para x ≥ 0, tem-se que
√  21 1
x2 = x2 = x 2· 2 = x.

Para x < 0: como x é negativo, então existe y > 0 tal que x = −y (ou y = −x). Assim,
√ 1  1 1 1
x2 = x2 2 = (−y)2 2 = y2 2 = y 2· 2 = y = −x.

Novamente deve ser observado que as bases usadas nos cálculos acima
√ são sempre não nega-
tivas. Mostrou-se, portanto, que a única sentença da função f (x) = x2 é levada nas duas sen-
tenças da função g(x) = |x|. Logo, mostrou-se√g ⇒ f . Como f ⇒ g e g ⇒ f , então, pela definição
de igualdade de função, conclui-se que |x| = x2 .

Essas diferentes maneiras de escrever uma mesma função é chamada de representação: uma
mesma função tem diferentes maneira de ser representada e este é o motivo sobre o que foi
apresentado até este ponto. E o que se ganha em representar uma função de modos distintos?
Ganha-se mais informações sobre a natureza desta função. Por exemplo, considere a função
f : R → R definida pela relação funcional f (x) = x. Com esta representação o que se consegue
falar sobre a função f é que o seu gráfico é uma reta crescente passando pela origem. Mas
também é possível representar f nas duas formas abaixo:
 2 0 Z x t
x
g(x) = =x e h(x) = dt = t = x.
2 0 0

Através da representação pela g é possível concluir que a função f (x) = x pode ser olhada
como a função que informa a variação da inclinação da reta tangente ao gráfico da função
x2/2 e na representação h a função f (x) = x pode ser interpretada como uma das primitivas da

função constante e igual a 1. Em suma, encontrar maneiras diferentes de representar uma mesma
função permite que novos “olhares” se lancem sobre esta função, de modo que aparecem novas
compreensões à cerca dessa função.
A Análise Matemática, em sua essência, é uma teoria de funções onde um dos maiores in-
teresses é a busca por modos distintos de representar e de produzir funções. Estudo de de-
senvolvimento em séries de potências, sequências e séries de funções, etc. são maneiras pro-
duzir funções que são assim representadas. Como exemplo, mostrar-se-á o motivo de uma se-
quência de funções convergente pontualmente representar uma função de fato. A definição é a
iv Apresentação

seguinte: Seja X ⊂ R. Diz-se que a sequência de funções fn : X → R converge pontualmente


para f : X → R quando, dados ε > 0 e x ∈ X, existe n0 ∈ N (dependendo de ε e x) tal que
| fn (x) − f (x)| < ε para todo n > n0 . Neste caso, escreve-se lim fn (x) = f (x).
n→∞
Para demonstrar que f (x) de fato é uma função, inicialmente fixa-se um x0 ∈ X. Como,
por hipótese, cada uma das fn são funções, então o conjunto { f1 (x0 ), f2 (x0 ), . . ., fn(x0 ), . . .} é
formado por números reais. Como se tem | fn (x0 ) − f (x0 )| < ε para todo n > n0 , em virtude
da convergência pontual, este n0 depende agora apenas ε . Isto significa que { fn (x0 )} é uma
sequência numérica convergente, cujo limite é o número real y0 = f (x0 ). Isto mostra que existe
um y0 associado ao número x0 .
O que resta saber é se este número real é único; caso não seja, não será função. Mas isto é
sempre verdade, uma vez que o limite de uma sequência de números é sempre único (ou seja,
empregou-se o teorema de unicidade para sequências numéricas). Como o x0 é arbitrário e como
a convergência pontual é em todo o domínio X, então para cada x ∈ X fixado existe um único
y = f (x) em relação funcional com ele. Portanto, isso mostra que f é de fato uma função.
Na verdade obteve-se mais: uma função f (x) foi “produzida” a partir de uma sequência de
funções fn (x), de modo que f (x) é representada como um limite das funções da sequência
quando n tende para infinito. Além disso, pode-se dizer que uma função foi “construída" a
partir de outras funções.
Claro, a convergência pontual é uma maneira de produzir novas funções, mas ela também
serve como um novo modo de representar funções. Por exemplo, considere-se a sequência de
funções fn : [0, 1] → R com relações funcionais dadas por fn (x) = xn , n ∈ N. Essa sequência
converge pontualmente para a função f : [0, 1] → cuja relação funcional é dada por f (x) = 0
para 0 ≤ x < 1 e f (1) = 1. Com isso, tem-se que essa mesma f pode ser assim representada:
f (x) = lim xn .
n→∞
Para a convergência uniforme, por exemplo, não é necessário demonstrar que o limite é uma
função, pois basta usar o teorema que diz o seguinte: se uma sequência de funções converge
uniformemente, então ela converge pontualmente. Para séries de funções a ideia é a mesma,
basta escrever a série como sequência de somas parciais e olhar para a sequência assim formada.
O primeiro exemplo mostrou que uma função pode ser representada de diversas maneiras,
onde uma das ideias é multiplicar e dividir uma dada função por outra que não se anula (outros
métodos podem ser usados para representar a mesma função de maneira diferente). No segundo
exemplo foi visto que uma função pode ser representada através de limites de sequências de
funções e que é possível produzir uma função a partir de outra funções. No que vem a seguir, a
ideia consiste em analisar casos em que é possível produzir uma função a partir de outra(s).
Neste texto o leitor verá três novos modos de representar ou de produzir funções. O primeiro
caso é através de transformada de Laplace, o segundo é através da série de Fourier e o terceiro
caso é através da transformada de Fourier. As funções que podem ser representadas através
destes três modos permitem novas compreensões sobre a natureza de cada uma delas, como
o leitor notará ao longo do estudo de cada caso. Mas não basta apenas encontrar maneiras de
representar ou de produzir funções, é necessário que tais novas representações ou construções
Apresentação v

sejam úteis na resolução de problemas concretos. No caso da transformada de Laplace, será


visto que a mesma é uma poderosa ferramenta para resolver EDO (Equações Diferenciais Or-
dinárias) com condições iniciais dadas. A série de Fourier é uma ferramenta muito importante e
que permite resolver certas EDP (Equações Diferenciais Parciais). A transformada de Fourier é
outra ferramente poderosa para resolver EDP, principalmente em domínios ilimitados. As apli-
cações da transformada de Laplace serão feitas no mesmo capítulo. Já as aplicações da série e
da transformada de Fourier serão feitas em um capítulo adicional. Em resumo, este texto apre-
senta ferramentas que permitem representar ou produzir certas funções em outras e que são
muito úteis para resolução de problemas práticos.
Ao longo dos apêndices e adendos o leitor encontrará novas ferramentas, como as funções
gama e beta. Existem várias outras, mas que não serão abordas neste texto. Elas fazem parte do
chamado grupo de funções especiais, como, por exemplo, as funções de Bessel, os polinômios
de Legendre e os polinômios de Laguerre. Mas não apenas estas, existem muitos outros casos.
O capítulo 1, sobre a transformada de Laplace, foi pensado da seguinte maneira: apresentar
a definição da transformada de Laplace e apresentar alguns exemplos em alguns casos sim-
ples. Estes exemplos foram concebidos para fazerem parte de uma tabela de transformadas
elementares de Laplace. Em seguida avança-se e apresenta propriedades básicas e mais gerais
desta transformada, onde os exemplos dados mostram aplicações dessas propriedades e que
também farão parte da tabela. A cada nova seção a ideia consiste em apresentar resultados que
aplicados resultará sempre em novas fórmulas que comporão uma tabela que se encontra no final
do capítulo. A ideia, para emprego prático, consiste em manipular algebricamente as transfor-
madas que não são imediatas ou elementares em um conjunto de transformadas elementares de
tal sorte que as fórmulas da tabela possam ser aplicadas diretamente. Também são resolvidos
vários exemplos de problemas envolvendo EDO com condições iniciais dadas.
O capítulo 2, sobre a série de Fourier, foi pensado para ser estudo voltado às aplicações,
sem a necessidade de adentrar em questões mais avançadas da Análise. Decidiu-se não demon-
strar o teorema de Fourier sobre a convergência pontual da série de Fourier. Por outro lado,
procurou-se dar ênfase e destaques a certos pontos relacionado a este teorema, bem como aos
coeficentes de Fourier. Uma das hipótese do teorema é que a função dada seja periódica de
período T = 2L. Para justificar essa hipótese foi elaborada uma seção sobre funções periódicas
que contém os resultados necessários. Outra hipótese do teorema de Fourier é que a função
dada seja seccionalmente diferenciável. Para justificar essa outra hipótese foi criada uma seção
nomeada de velocidade da convergência e que contém os argumentos necessários. Uma dúvida
comum entre os estudantes consiste em saber o motivo de fazer uma integração com limites −L
e L. Realmente não é algo natural. Duas seções envolvendo os coeficientes de Fourier e a sime-
tria de funções contêm os argumentos para tal justificativa: sem as condições de ortogonalidade
das funções cossenos e senos os coeficientes não teriam representações simples. Decidiu-se,
também, apresentar resultados sobre diferenciação e integração de séries de Fourier, bem como
a forma complexa e a identidade de Parseval. No fundo, entre outras coisas, essa identidade diz
quando uma série trigonométrica é ou não uma série de Fourier.
vi Apresentação

Quanto ao capítulo 3, poder-se-ia escolher um entre os seguintes caminhos: (1) apenas uma
apresentação da transformada de Fourier e a resolução de alguns cálculos. O problema é que as
integrais mais interessantes possuem algum tipo de singularidade, que exigiria conhecimento da
teoria de polos e resíduos, bem como o cálculo de integrais com essas ferramentas. O ponto de
partida, neste texto, é que os estudantes não tenham conhecimento prévio em Variáveis Com-
plexas, de modo que essa abordagem foi desconsiderada. (2) Fazer um estudo da transformada
de Fourier em espaços de Schwartz e com isso ganhar mais informações sobre a verdadeira
natureza desta transformada. A experiência dessa abordagem com estudantes no nível esperado
para este texto não deu bons resultados; exige maior maturidade matemática que o estudante
típico, para o público alvo esperado, em geral não tem. Então essa abordagem também foi de-
sconsiderada. (3) A terceira possibilidade, que foi a escolhida, consiste em dar um tratamento
às transformadas de Fourier de forma semelhante ao que foi feito para as transformadas de
Laplace: apresentar a definição e resultados que permitam resolver exemplos que serão levados
para uma tabela contendo transformadas elementares de Fourier. A justificativa para esta es-
colha, em virtude do público alvo esperado, se deve a dois motivos: (a) é possível apresentar as
propriedades mais conhecidas e que são satisfeitas pela transformada de Fourier e (b) ser dese-
jável que este primeiro contato com este assunto leve em consideração os aspectos operacionais
desta ferramenta (ou seja, cálculo de transformadas a partir da tabela construída).
Finaliza-se esta apresentação tecendo alguns comentários sobre o último capítulo, aplicações
às Equações Diferenciais Parciais (EDP). O objetivo deste texto não é o de ser um curso em
Equações Diferenciais Parciais, mas sim usar a Análise Clássica de Fourier em suas aplicações
naturais, as EDP. Inicia-se apresentando alguns conceitos básicos, mostrando a enorme dificul-
dade em definir uma EDP e a solução para a mesma. Em seguida apresenta-se a ordem de uma
EDP, os tipos de equações desta natureza, bem como as maneiras de classificar as EDP.
Apesar de Fourier ter usado a série que recebe o seu nome para resolver problemas do calor,
a verdade é que essa não é a melhor ferramente para a equação do calor. Como ficará claro
ao longo do texto, o teorema de Fourier exige que uma função representada por uma série de
Fourier tenha que ser periódica. Não é natural esperar que a propagação do calor se dê de forma
periódica. A transformada de Fourier resolve essa questão e funciona muito bem com a equação
do calor, ou seja, é mais natural. Por outro lado, a série de Fourier tem “a cara” da equação de
onda, é natural e intuitivo, uma vez que é possível fazer interpretações físicas nos elementos
que aparecem na série de Fourier e que são coerentes com a propação de onda. Apresenta-
se também a fórmula de d’Alembert e sua interpretação geométrica da propagação de onda.
Encerra-se o capítulo com a equação de Laplace, onde se faz estudos apenas sobre retângulos,
discos e regiões circulares. Espera-se que o leitor consiga perceber a diferença da natureza das
soluções obtidas em regiões com distintas geometrias dos domínios.
Os apêndices aos capítulos têm dois objetivos: deixar o texto autossuficiente e complementar
a parte teórica no corpo de cada capítulo, incorporando assuntos que extrapolam um primeiro
estudo. Os apêndices são para estudo complementar. Os adendos têm como objetivo apontar
alguns caminhos que seguem após um primeiro curso. O primeiro apresenta a demonstração do
teorema de Fourier em sua forma clássica. O segundo estuda as séries de Fourier generalizadas,
Apresentação vii

introduzindo um processo de algebrização na Análise Clássica de Fourier, que é um “v-zero”


para a Análise Harmônica. O terceiro adendo também é uma espécie de “v-zero”: um estudo in-
trodutório de Equações Elípticas no caso mais geral. Os adendos também são complementares,
seus estudos podem ficar para um segundo momento.

Orestes Piermatei Filho


Juiz de Fora – MG
Fevereiro de 2023
Conteúdo

1 Transformada de Laplace . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1
1.1 Motivação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1
1.2 Uma classe de funções . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4
1.3 Definição da transformada de Laplace . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5
1.4 Sobre a existência da inversa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22
1.5 Propriedades básicas da transformada de Laplace . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37
1.6 Transformadas de funções descontínuas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53
1.7 Transformadas de Laplace da derivada e da integral . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 60
1.8 Derivada e integral da transformada de Laplace . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69
1.9 Problemas de valores iniciais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 76
1.10 Produto de transformadas e convolução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 92
1.11 Funções impulso . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 104
1.12 Exercícios propostos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 118
Apêndice 1: regras de Leibniz . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 127
Apêndice 2: funções gama e beta . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 132
Apêndice 3: interpretações físicas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 149
Apêndice 4: núcleos de Dirac . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 159

2 Séries de Fourier . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 173


2.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 173
2.2 Funções periódicas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 173
2.3 Coeficientes de Fourier . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 199
2.4 Série de Fourier . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 208
2.5 Simetria de funções . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 228
2.6 Séries de Fourier de funções pares e ímpares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 245
2.7 Diferenciação de séries de Fourier . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 256
2.8 Integração de séries de Fourier . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 262
2.9 Velocidade da convergência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 272
2.10 Forma complexa da série de Fourier . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 279
2.11 Identidade de Parseval . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 290

ix
x Conteúdo

2.12 Exercícios propostos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 302


Apêndice: interpretações físicas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 313

3 Transformada de Fourier . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 321


3.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 321
3.2 Interpretação física . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 327
3.3 Propriedades básicas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 331
3.4 Propriedades mais gerais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 345
3.5 Derivadas, integrais e transformada de Fourier . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 363
3.6 Produto de transformadas e convolução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 377
3.7 Teorema de Plancherel . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 384
3.8 Exercícios propostos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 390
Apêndice: a integral de Dirichlet . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 396

4 Aplicações às EDP . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 417


4.1 Problemas de valores de contorno . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 417
4.2 Conceitos básicos para EDP . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 425
4.3 Tipos de equações de segunda ordem . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 430
4.4 Equação do calor . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 433
4.5 Equação da onda . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 449
4.6 O método de d’Alembert . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 465
4.7 Equação de Laplace . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 488
4.8 Exercícios propostos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 525
Apêndice 1: derivadas superiores de funções compostas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 532
Apêndice 2: o laplaciano em outras coordenadas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 543
Apêndice 3: condução do calor em uma barra . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 564
Apêndice 4: vibrações em uma corda elástica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 567
Apêndice 5: classificação de equações de segunda ordem . . . . . . . . . . . . . . . . . . 573

A Funções representadas por integrais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 579


A.1 Primeiro caso . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 579
A.2 Segundo caso . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 612
A.3 Terceiro caso . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 651

B O teorema de Fourier . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 663


B.1 O espaço L1 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 663
B.2 O teorema de Riemann-Lebesgue . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 677
B.3 Convergência pontual da série de Fourier . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 684

C Série de Fourier generalizada . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 701


C.1 Espaço com produto interno . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 701
C.2 A desigualdade de Bessel . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 714
Conteúdo xi

C.3 Conjunto completo e identidade de Parseval . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 717


C.4 O espaço l 2 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 719
C.5 O espaço L2 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 729
C.6 Generalizando a série de Fourier . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 739
C.7 Convergência em média quadrática . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 749
C.8 Propriedade da unicidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 759
C.9 Condições suficientes para completude . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 766
C.10 Integração e diferenciação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 772
C.11 Convergência uniforme da série de Fourier . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 777

D Equação de Laplace: estudo mais geral . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 795


D.1 Revisão dos teorema de Green e Gauss . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 795
D.2 Identidades de Green . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 806
D.3 A área da esfera Sn−1 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 811
D.4 Solução fundamental . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 819
D.5 Terceira identidade de Green . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 829
D.6 Função de Green . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 849
D.7 Fórmula e teorema de Poisson . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 864
D.8 Funções harmônicas, propriedades da média e do máximo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 871
D.9 Problema de Dirichlet e o teorema de Harnack . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 880
D.10 Problema de Dirichlet e fórmula de Poisson para o círculo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 883

Bibliografia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 893

Índice Remissivo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 899


Capítulo 1
Transformada de Laplace

1.1 Motivação

Todos os resultados desta seção serão obtidos de maneira formal, de maneira similar ao que
era feito pelos matemáticos do século XVIII. O objetivo é dar um entendimento sobre o surgi-
mento da transformada de Laplace, que é definida a partir de uma integral, com a ideia que
uma integral generaliza o conceito de certa série de funções. Em linhas gerais, o que será feito
aqui é dar um entendimento informal de que séries são somas discretas e integrais são somas
contínuas.
Começa-se com as séries numéricas, que “darão origem” às integrais ordinárias. Algumas
definições são necessárias:

D EFINIÇÃO : Uma sequência de números reais é uma função a : N → R definida no conjunto


dos números naturais e assumindo valores no conjuntos dos reais. O valor a(n), para todo n ∈ N,
é historicamente representado por an, ou seja, an = a(n). A imagem da sequência é denotada
por {an} = a(N) = {a1 , a2, . . ., an, . . .}.

D EFINIÇÃO : Diz-se que a sequência {an } converge para um número a ∈ R, que será denotado
por a = lim an , quando, para todo real ε > 0, existe um n0 ∈ N tal que
n→∞

|an − a| < ε , para todo n > n0 .

Quando a sequência não é convergente diz-se que ela é divergente.

Para definir a convergência de uma série numérica, a ideia é considerar uma sequência {an }
e a partir dela formar outra sequência, dita somas parciais, que são somas do tipo

s1 = a1, s2 = a1 + a2, . . ., sn = a1 + a2 + · · · + an .

D EFINIÇÃO : Diz-se que a série numérica ∑ an é convergente se existir o limite
n=1

s = lim sn = lim (a1 + a2 + · · · + an) .


n→∞ n→∞

1
2 1 Transformada de Laplace

Além disso, o limite s é chamado de soma da série, que também se escreve na forma

s= ∑ an = a1 + a2 + · · ·an + · · ·
n=1

Caso a sequência das somas parciais não seja convergente, diz-se que a série numérica ∑ an
n=1
é divergente.

Para passar para uma integral, a ideia é substituir o domínio N da sequência de somas parciais
por um intervalo real, que pode ser limitado ou ilimitado, e fazer uma soma contínua neste
intervalo, ou seja, somar os valores de todos os f (x) para a < x < b, onde a e b podem ser
b
finitos ou infinitos. A notação ∑ f (x) não é indicada para representar a soma contínua. A
x=a
Z b
notação que se consagrou é s(x) dx. Assim sendo, é possível interpretar a integral ordinária
a
como uma soma contínua de f (x) quando x varia no intervalo de a até b.
O procedimento para sequências e séries de funções é similar ao que foi feito até aqui. Inicia-
se recordando a definição de sequência de funções e depois séries de funções.

D EFINIÇÃO : Seja I ⊂ R um intervalo. Uma sequência de funções fn : I → R é uma corres-


pondência que associa a cada natural n ∈ N uma função fn definida no intervalo I e tomando
valores em R.

Seguindo a mesma ideia anterior, o que se faz é identificar fn (x) = f (x, n), ou seja, observar
que que cada elemento fn (x) da sequência de funções é uma função, fn : I × N → R, de duas
variáveis, x e n, tomando valores em R.

D EFINIÇÃO : Seja I ⊂ R. Diz-se que a sequência de funções fn : I → R converge pontual-


mente quando, para cada x ∈ I fixado, a sequência de números { f1 (x), f2 (x), . . . , fn(x), . . .} con-
verge para o número f (x). Assim, fixado x ∈ I, escreve-se lim fn (x) = f (x).
n→∞

Existem outras noções de convergência, como a convergência uniforme, mas a convergência


pontual já é o bastante para o que se pretende fazer aqui.

Para definiir a convergência de uma série de funções, a ideia é considerar uma sequência de
funções { fn (x)} e a partir dela formar outra sequência de funções, ditas somas parciais, que são
somas do tipo

s1 (x) = f1 (x), s2 (x) = f1 (x) + f2 (x), . . ., sn (x) = f1 (x) + f2 (x) + · · · + fn (x).



D EFINIÇÃO : Diz-se que a série de funções ∑ fn (x) é convergente se existir o limite pontual
n=1

s(x) = lim sn (x) = lim [ f1 (x), f2 (x), . . ., fn(x)] .


n→∞ n→∞
1.1 Motivação 3

Além disso, o limite pontual s(x) é chamado de soma da série de funções, que também se
escreve na forma

s(x) = ∑ fn (x) = f1 (x) + f2 (x) + · · · + fn (x) + · · ·
n=1

Caso a sequência de somas parciais não seja pontualmente convergente, diz-se que a série de

funções ∑ fn (x) é divergente.
n=1

Como observado anteriormente, o que se faz é identificar fn (x) = f (x, n), onde fn : I × N → R
é uma função com duas variáveis, uma contínua, x, e outra discreta, n, com valores em R. Caso
a variável discreta n ∈ N seja substituída por outra variável, mas agora contínua, y ∈ J, onde
J ⊂ R é outro intervalo, então o que se obtém é uma função fy (x) = f (x, y), onde fy : I × J → R.
Assim, fixado x ∈ I, é possível realizar uma soma contínua na variável y ∈ J, que resultará em
b
uma integral que define uma dada função. Novamente, a notação ∑ fy (x) não é adequada para
x=a
representar a soma contínua. Nesse caso, a melhor notação é escrever
Z b Z b
fy (x) dy = f (x, y) dy,
a a

onde a e b podem ser finitos ou infinito. Sob hipóteses convenientes, é possível demonstrar
que a integral no último membro acima define uma função F(x). O leitor interessado poderá
consultar os estudos apresentados no Adendo A.
As séries de potência,

∑ an (x − x0 )n = a0 + a1(x − x0 ) + · · · + an(x − x0 )n + · · · ,
n=0

podem ser tratadas como casos particulares das séries de funções. Fazendo x0 = 0 na série de
potência acima, obtém-se

∑ an xn = a0 + a1 x + a2 x2 + · · · + an xn + · · ·
n=0

Usando as ideias anteriores de passar de uma soma discreta para uma integral a partir da série
de potências acima, com x ∈ I ⊂ R, olha-se para an = a(n) e troca-se n ∈ N por t ∈ J ⊂ R,

escrevendo at = a(t), onde t ∈ J agora é variável contínua. Mais uma vez, a notação ∑ at xt
t=0
não é adequada para representar uma soma contínua. A notação mais adequada é escrever
Z ∞ Z ∞
at x t dt = a(t) x t dt
0 0

para representar a soma contínua na variável t ∈ [0, ∞).


4 1 Transformada de Laplace

A integral no segundo membro acima foi muito usada no século XVIII para resolver certos
problemas envolvendo equações diferenciais ordinárias. Ora na forma descrita, ora fazendo-se
uma mudança na variável x.
A transformada de Laplace pode ser obtida fazendo-se uma mudança de variáveis, em particu-
lar, escrevendo x = e −s. Assim,
Z ∞ Z ∞ t Z ∞
a(t) x t dt = a(t) e −s dt = a(t) e −st dt,
0 0 0

que é a tranformada de Laplace para a função a(t). A notação usada neste texto será
Z ∞
L[ f (t)] = e −st f (t) dt,
0

onde F(s) = L[ f (t)] será a função transformada de Laplace da função dada f (t).

1.2 Uma classe de funções

Pretende-se, neste texto, estudar uma transformação linear particular dada através de um
operador integral, denotado por L, conhecido como a transformada de Laplace.1 Para isso,
deve introduzir o conceito de funções seccionalmente contínuas, que é necessário quando for
descrito o domíno do operador L.

Será denotado por f (t + 0) e f (t − 0) os limites laterais, respectivamente, à direita e à es-


querda do ponto a, isto é,

f (t + 0) = lim f (t) e f (t − 0) = lim f (t).


t→0+ t→0−

D EFINIÇÃO : Seja I ⊂ R um intervalo, podendo ser limitado ou ilimitado. Diz-se que


f : I → R é uma função seccionalmente contínua quando ela tiver um número finito de des-
continuidades (todas de primeira espécie) em qualquer intervalo limitado.
Em outras palavras: dados a < b, existem a ≤ a1 < a2 < · · · < an ≤ b tais que f é contínua
em cada intervalo aberto (ai , ai+1 ), com i = 1, 2, . . ., n − 1, e existem os limites laterais

f (ai + 0) = lim f (t) e f (ai − 0) = lim f (t).


t→a+
i x→a−
i

Observa-se que, em particular, toda função contínua é seccionalmente contínua.

Exemplo 2.1: A função f : R \ {0} → R definida por f (t) = 1/t não é seccionalmente con-
tínua. De fato, a descontinuidade de f em t = 0 é de segunda espécie, pois não existem os
limites laterais lim f (t) e lim f (t).
t→0− t→0+

1 Pierre-Simon Laplace (1749 – 1827) foi um matemático francês.


1.3 Definição da transformada de Laplace 5

Exemplo 2.2: Seja f : R → R uma função definida por




 1, se t ≥ 1,


1 1 1
f (t) = , se ≤t < , n ∈ N,

 n n+1 n

 0, se t ≤ 0.

Esta função não é seccionalmente contínua. Apesar de todas as descontinuidades serem de


primeira espécie, no intervalo (0, 1) há um número infinito de tais descontinuidade.

O objetivo de usar as funções seccionalmente contínuas é o fato de que elas são integráveis
(no sentido de Riemann) em intervalos limitados. De fato, se f é seccionalmente contínua em
[a, b], com descontinuidade nos pontos a1 , a2 . . ., an e, possivelmente, também em a e b (os
extremos do intervalo [a, b]), então a integral
Z b
f (t) dt
a

está bem definida e é calculada por


Z b Z a −δ Z a2 −δ Z b−δ 
1
f (t) dt = lim f (t) dt + f (t) dt + · · · + f (t) dt ,
a δ →0+ a+δ a1 +δ an +δ

onde a notação δ → 0+ significa que δ tende a zero somente por valores positivos. É possível
demonstrar que este limite sempre existe.
Esclarece-se a escolha da variável independente t ao invés da usual x: na maioria dos proble-
mas de valor inicial, a variável independente pode ser interpretada como tempo. Além disso,
no caso da transformada de Laplace, normalmente os valores negativos são excluídos, assim
como para o tempo, de modo que a atenção, nestes casos, reduzem-se a observar o semi-eixo
não negativo [0, ∞).

1.3 Definição da transformada de Laplace

Seja f : [0, ∞) → R uma função integrável. Considere a integral abaixo:


Z ∞
e −st f (t) dt.
0

Diz-se que a expressão acima é a transformada de Laplace para a função f , e se escreve,


6 1 Transformada de Laplace

Z ∞
(3.1) L[ f (t)] = F(s) = e −st f (t) dt,
0

desde que a integral acima convirja para algum valor de s.

Relembre-se que uma integral como a do tipo acima é de natureza imprópria (pois, nesse
caso, o domínio de integração é ilimitado) e é calculada de acordo com a regra
Z ∞ Z T
e −st f (t) dt = lim e −st f (t) dt.
0 T →∞ 0

Diz-se que tal integral é convergente, relativamente, a um valor particular de s se, e somente
se, este limite acima existe.

Observa-se que a afirmação acima não é uma definição, ao menos em sentido estrito do
termo. Uma definição será apresentada oportunamente. Também deve ser notado que aparece
uma expressão contendo a variável s no primeiro membro da igualdade acima. Assim, é preciso
saber quando esta expressão em termos de s representa, de fato, uma função desta variável.
Nas aplicações práticas, normalmente é possível calcular diretamente a transformada de
Laplace de funções f pela definição. Contudo, isto não afasta a necessidade de determinar uma
classe de funções que assegura a existência da transformada de Laplace. Isso se deve ao fato de
querer considerar L como um operador linear definido em um espaço vetorial conveniente.
Ao examinar a integral que aparece em (3.1), é razoável pensar em funções f que devem ser
escolhidas de tal modo que a integral
Z T
(3.2) e −st f (t) dt
0

exista para todo T > 0.


Pode-se chegar a tal termo impondo-se que f seja uma função seccionalmente contínua, que
terá, no máximo, um número finito de descontinuidade (de primeira espécie) em todo intervalo
da forma [0, T ], com T > 0. Isso é verdade porque o integrando em (3.2) também terá um
número finito de descontinuidade de primeira espécie em [0, T ].
Por outro lado, cabe notar que apenas a hipótese de f ser seccionalmente contínua é insufi-
ciente para garantir a existência da integral em (3.2), pois esta também deverá convergir quando
T → ∞ para, pelo menos, um valor de s.
Uma maneira de assegurar a convergência da integral é pôr uma condição de que f (t) seja
majorada (ou dominada) por alguma função exponencial, exigindo assim que e −st f (t) tenda
rapidamente para zero quando t cresce.

D EFINIÇÃO : Diz-se que uma função f é admissível (ou de ordem exponencial) em [0, ∞) se
existirem constantes k ∈ R e M > 0 tais que

−kt
(3.3) e f (t) < M ou | f (t)| ≤ M e kt ,
1.3 Definição da transformada de Laplace 7

para todo t > 0.2

Intuitivamente, funções de ordem exponencial não podem “crescer” em valor absoluto mais
rapidamente do que a função M e kt quando t cresce. Na prática, entretanto, isso não é uma
restrição, pois M e k podem ser tão grande quanto se queira.
Os exemplos a seguir mostrarão várias funções que aparecem na prática e que são admis-
síveis.

Exemplo 3.1: A função f : [0, ∞) → R definida por f (t) = 1 é admissível.


De fato, basta tomar k > 0 e M ≥ 1 em (3.3) para ver que

| f (t)| = 1 ≤ M · e kt .

Exemplo 3.2: As funções f , g, u, v : [0, ∞) → R dadas por

f (t) = t n , g(t) = e k t u(t) = sen (kt), e v(t) = cos(kt)

são admissíveis.

S OLUÇÃO : Para valores grandes de t, sabe-se que t n < e t . Isto implica na existência de uma
constante M ≥ 1, tal que para k = 1 vale

| f (t)| = | t n| < e t ≤ M e t .

Para g, basta tomar M ≥ 1 para concluir que | g(t)| = | e k t | = e k t ≤ M e k t .


Para as funções u e v, basta observar que | sen (kt)| ≤ 1 e | cos(kt)| ≤ 1, de modo que tomando
k > 0 e M > 1, encontra-se
|u(t)| = | sen (kt)| ≤ 1 < M e kt ,

|v(t)| = | cos(kt)| ≤ 1 < M e kt .

Exemplo 3.3: As funções f , g : [0, ∞) → R definidas por

f (t) = t n · e k t · sen (bt) e g(t) = t n · e k t · cos(b t)

são admissíveis.

S OLUÇÃO : Seja k > 0. Então,

2 Esta desigualdade só precisa ser satisfeita nos pontos do semi-eixo não negativo, isto é, onde f está definida.
8 1 Transformada de Laplace

n kt
t · e · cos(bt) |t n | e kt |cos(bt)| t n · e kt tn
= ≤ = ·
e 2kt e 2kt e 2kt e kt
Agora será mostrado que
tn
lim
= 0, k > 0.
t→∞ e kt
A demonstração dessa parte é um pouco técnica. Num primeiro momento, o leitor poderá
omitir seu estudo. Seja h : R → R uma função dada por h(t) = e kt , com k > 0. Sabe-se que
h é diferenciável e que h0 (t) = k e kt . Fixado t > 0, pelo teorema do valor médio aplicado ao
intervalo [0, t], segue-se que existe t0 ∈ (0, t) tal que

h(t) = h(0) + h0 (t0 )(t − 0),

de modo que
e kt = 1 + k e kt0 · t.
Além disso, tem-se que e t0 > 1 para t0 > 0, de modo que k e kt0 > k.Logo,

e kt = 1 + k e kt0 · t > 1 + kt, para todos k, t > 0.

Fazendo a mudança t 7→ kt/(n+1) na desigualdade e kt > 1 + kt, segue-se que

kt/(n+1) kt kt ,
e > 1+ > para todos k, t > 0.
n+1 n+1
Agora eleva-se ambos os membros da última desigualdade obtida à potência n + 1.. Assim,
h in+1  kt n+1 kn+1 · t n+1
kt/(n+1) kt
e > ⇒ e > ·
n+1 (n + 1)n + 1
Fazendo
1 kn+1 ,
=
C (n + 1)n+1
obtém-se
t n+1
kt e kt t tn C
e > ⇒ n
> ⇒ kt
< ·
C t C e t
Segue-se imediatamente da última desigualdade acima que
tn
lim = 0, k > 0.3
t→∞ e kt

Além disso, em particular, a expressão t n/e kt é menor ou igual a 1. Então, t n · e kt · cos(bt) ≤
e 2kt para valores de t suficientemente grandes. Logo, existe uma constante M > 0 tal que

t n · e kt · cos(bt) ≤ Me 2kt para todo t > 0.
Se k ≤ 0, então e kt ≤ 1 e | cos(bt)| ≤ 1, de modo que

3
Observa-se que é possível aplicar a regra de l’Hospital ao quociente t n/e kt , derivando n vezes o numerador e denomi-
nador para se chegar a mesma conclusão.
1.3 Definição da transformada de Laplace 9


n kt n kt
t · e · cos(bt) = |t | · e · |cos(bt)| ≤ | t n| = t n .
Além disso, a desigualdade t n < et para valores grandes de t implica na existência de uma

constante M > 0 tal que t n · e kt · cos(bt) ≤ Me t para todo t > 0.
De maneira análoga mostra-se que f (t) também é admissível.

2
Exemplo 3.4: A função f : [0, ∞) → R definida por f (t) = e t não é admissível.

S OLUÇÃO : Primeiro recorda-se a definição: uma função é admissível em [0, ∞) se existirem


constantes k ∈ R e M > 0 tais que

−kt
e · f (t) < M ou | f (t)| ≤ M e kt ,

para todo t > 0. A primeira desigualdade acima afirma que a função dada dividida pela exponen-
cial e kt deve resultar em uma função limitada. Este exemplo será resolvido mostrando-se que
2
a função e t /e kt tende para ∞ quando t → ∞, de modo que não é limitada e, consequentemente,
2
que f (t) = e t não é admissível.
De fato,
2
e −kt · f (t) = e −kt · e t = e t(t−k).
A expressão no segundo membro acima não tem limite quando t → ∞, de modo que a do
primeiro membro também não tem limite; ou seja,
h i
lim e −kt · f (t) = lim e t(t−k) = ∞
t→∞ t→∞

para todo k.
2
Isso mostra que e t /e kt não é limitada. Consequentemente, f não é admissível.

Proposição 3.1 (existência): Seja f : [0, ∞) → R uma função seccionalmente contínua e ad-
missível. Então, existe um número real k tal que
Z ∞
e −st f (t) dt
0

converge para todos os valores de s > k.


D EMONSTRAÇÃO : Usar-se-á o seguinte teorema na demonstração desta proposição: “Sejam
f e g funções integráveis no intervalo [a, b],Zonde a é fixo e b > a é arbitrário
Z tais que | f (t)| ≤
∞ ∞
g(t) para todo t > a. Então existe a integral f (t) dt se existir a integral g(t) dt.” 4
a a

4
O leitor poderá observar que este teorema é o equivalente ao teste da comparação para séries infinitas, porém aplicado
à integrais impróprias.
10 1 Transformada de Laplace

Por hipótese, f é uma função admissível. Logo, existem constantes M > 0 e k tais que
| f (t)| ≤ M e k t para todo t > 0. Além disso, seja {t1, t2, . . ., tn} o conjunto de pontos onde f (t)
é descontínua no intervalo [0, T ]. Assim,
Z T Z T
−st


e f (t) dt ≤
e −st | f (t)| dt
0 0
Z t1 Z t2 Z tn
−st −st
= e | f (t)| dt + e | f (t)| dt + · · · + e −st | f (t)| dt +
0 t1 tn−1
Z T
+ e −st | f (t)| dt
tn
Z t1 n Z ti+1 Z T
−st −st
= e | f (t)| dt + ∑ e | f (t)| dt + e −st | f (t)| dt
0 i=1 ti tn
Z t1 n Z ti+1 Z T
kt kt
≤ e −st
· M · e dt + ∑ e −st
· M · e dt + e −st · M · e kt dt
0 i=1 ti tn
Z t1  Z
n ti+1
 Z T
−(s−k)t −(s−k)t
=M e dt + ∑ M e dt + M e −(s−k)t dt
0 i=1 ti tn
t1 ti+1 " #
n
M −(s−k)t M −(s−k)t
=− ·e +∑ − ·e −
s−k 0 i=1 s−k ti
T
M
−(s−k)t
− ·e
s−k tn
   
M −(s−k)t1 0 −(s−k)t2 −(s−k)t1
=− e −e + e −e +···
s−k
   
−(s−k)tn −(s−k)tn−1 −(s−k)T −(s−k)tn
···+ e −e + e −e

M h i
=− −1 + e −(s−k)T
s−k
M h i
= 1 − e −(s−k)T .
s−k
Para s < k, o limite da exponencial acima, quando T → ∞, não existe, pois o expoente fica
positivo.
Para s > k, tem-se que s − k > 0, de modo que o expoente fica negativo (visto que T > 0
sempre). Assim, existe o limite da exponencial para T → ∞ e este vale zero. Portanto,
Z ∞ h i

e −st
f (t) dt ≤ M · lim 1 − e −(s−k) T
0 s − k T →∞
 
M 1 M ,
= · lim 1 − (s−k)T =
s − k T →∞ e s−k
1.3 Definição da transformada de Laplace 11

para todo s > k.


Portanto, para funções admissíveis e integral imprópria absolutamente convergente, en-
controu-se a seguinte estimativa:
M ,
| F(s)| ≤ para s > k,
s−k
mostrando que a transformada de Laplace existe.

Observa-se que segue da proposição 3.1 que o domínio de definição da transformada de


Laplace de uma função seccionalmente contínua e admissível sempre inclui um intervalo ilimi-
tado superiormente da forma (k, ∞). Na verdade, se s0 é o ínfimo do conjunto de números reais
k tais que F(s) = L[ f (t)] existe para todo s > k, pode-se demonstrar que L[ f (t)] não converge
para qualquer s < s0 .5 Assim, com a possível exceção do próprio ponto s0 , o domínio de L[ f (t)]
é o intervalo aberto (s0 , ∞). Por esta razão, s0 é conhecido como a abscissa de convergência da
2
função f . Note-se, também, que para certas funções, como e −t ou 0, s0 pode ser −∞.

D EFINIÇÃO : Seja f [0, ∞) → R uma função seccionalmente contínua e admissível. Então


define-se a transformada de Laplace, F(s), para a função f , por
Z ∞
F(s) = L[ f (t)] = e −st f (t) dt.
0

Observação 3.1: Anteriormente foi dito que a variável t pode ser intepretada como tempo.
A nova variável s também tem uma interpretação: frequência. Com esta linguagem, pode-se
pensar que o operador L tem como domínio o espaço dos tempos e tem como contradomínio o
espaço das frequências, onde F(s) = L[ f (t)] é interpretada como amplitude do sinal f (t).

O próximo resultado mostra que a função transformada de Laplace tende para zero no infinito.

Proposição 3.2: Seja f : [0, ∞) → R uma função seccionalmente contínua e admissível. Se


F(s) = L[ f (t)], então
lim F(s) = 0.
s→∞
D EMONSTRAÇÃO : Como f é seccionalmente contínua e admissível, a proposição 3.1 mostrou
que existe um número real k > 0 tal que
Z
∞ −st M ,
|F(s)| = e f (t) dt ≤ s > k.
0 s−k

5
Diz-se que b é uma cota inferior de um conjunto não vazio S de números reais se, e somente se, b ≤ s para todo s ∈ S.
Diz-se que B é um ínfimo de S se, e somente se, B é uma cota inferior de S e B ≥ b para toda cota inferior b ∈ S. Uma
das mais importantes propriedades do sistema de números reais é que todo conjunto não vazio S de números reais tem
um único ínfimo B (desde que se suponha que B assume o valor −∞ quando S não tiver cota inferior finita).
12 1 Transformada de Laplace

Tomando limite para s → ∞, obtém-se o resultado desejado, isto é,

lim F(s) = 0.
s→∞

Nos exemplos a seguir, bem como nos exemplos das próximas seções, o leitor poderá veri-
ficar a validade da afirmação da proposição 3.2, bastando para isso tomar s → ∞ nas funções
transformadas de Laplace obtidas.

Exemplo 3.5: Seja f : [0, ∞) → R uma função dada por f (t) = k, onde k é uma constante.
Então a sua transformada de Laplace é dada por
k,
(3.4) F(s) = L[ f (t)] = para s > 0.
s
S OLUÇÃO : A figura 3.1 mostra o gráfico de f (t) com k = 2.

Figura 3.1: Gráfico de f (t) com k = 2.

Seguindo a ideia do exemplo 3.1, mostra-se facilmente que a função f (t) = k é uma função
admissível. Então pode-se usar a definição de transformada de Laplace para obter
Z ∞ Z ∞
F(s) = e −st f (t) dt = e −st · k dt
0 0
Z T
= k · lim e −st dt
T →∞ 0
 T 
k −st
=− lim e
s T →∞ 0
1.3 Definição da transformada de Laplace 13

k 
= − · lim e −s T − 1
s T →∞
k 
= · lim 1 − e −s T
s T →∞
k,
= para s > 0,
s
pois facilmente se vê que
lim e −s T = 0 para s > 0,
T →∞
observando que T > 0.

Figura 3.2: Gráfico de F(s) com k = 2.

Exemplo 3.6: Seja f : [0, ∞) → R uma função dada por f (t) = e k t , onde k é uma constante.
Então sua transformada de Laplace é dada por
1 ,
(3.5) F(s) = para s > k.
s−k
S OLUÇÃO : Pelo exemplo 3.2, f (t) = e k t é uma função admissível. Assim, usando a definição,
obtém-se Z ∞ Z ∞
F(s) = e −st
f (t) dt = e −st ek t dt
0 0
Z T  T 
−(s−k)t 1 −(s−k)t
= lim e dt = − lim e
T →∞ 0 s − k T →∞ 0

1 h i
=− · lim e −(s−k)T − 1
s − k T →∞
14 1 Transformada de Laplace

1 h i
= · lim 1 − e −(s−k)T
s − k T →∞
 
1 −(s−k)T
= 1 − lim e
s−k T →∞

1 ,
= para s > k.
s−k

Figura 3.3: Gráfico de f (t) com k = 1.

O leitor verificará facilmente que, para s > k, s − k > 0, de modo −(s − k)T < 0 e assim

lim e −(s−k)T = 0.
T →∞

Caso seja s < k, então −(s − k)T > 0, de forma que

lim e −(s−k)T = +∞.


T →∞

E se s = k, a função F(s) = 1/(s−k) não estará definida (pois surgirá um zero no denominador).
O exemplo 3.6 mostra que a função transformada de Laplace é mais simples do que a função
original. De fato, a função F(s) = 1/(s−k), que é racional, é mais simples do que a função f (t) =
e k t , que é transcendental.
1.3 Definição da transformada de Laplace 15

Figura 3.4: Gráfico de F(s), com k = 1, do exemplo 3.6.

Exemplo 3.7 (função de Heaviside): Seja uc : [0, ∞) → R uma função definida por
(
0, se 0 ≤ t < c,
u c(t) =
1, se t ≥ c.

Então sua transformada de Laplace é dada por

e −cs ,
(3.6) L [uc (t)] = para s > 0.
s
S OLUÇÃO : O gráfico da função de Heaviside, com c = 2, é exibido na figura 3.5.

Figura 3.5: Gráfico de uc(t) com c = 2.


16 1 Transformada de Laplace

Para verificar que u c(t) é uma função admissível, basta tomar M ≥ 1 e k > 0 para concluir
que
| u c(t)| ≤ 1 ≤ M e kt .
Agora aplica-se a definição de transformada de Laplace diretamente na função uc(t) para
encontrar Z ∞
L [uc (t)] = e −st u c(t) dt
0
Z c Z ∞
−st
= e u c(t) dt + e −st u c (t) dt
0 c
Z c Z ∞
= e −st · 0 dt + e −st · 1 dt
0 c
Z ∞ Z T
= e −st dt = lim e −st dt
c T →∞ c
 T 
1 −st
=− lim e
s T →∞ c

1 
= − · lim e −s T − e −cs
s T →∞
1 
= · lim e −cs − e −s T
s T →∞
e −cs ,
= (para s > 0),
s
pois
lim e −s T = 0.
T →∞

Figura 3.6: Gráfico de F(s) com c = 2.


1.3 Definição da transformada de Laplace 17

O exemplo 3.7 que a função transformada de Laplace é, em geral, mais regular do que a
própria função. Nesse exemplo, a função transformada e −sc/s é contínua (pois a convergência se
dá para s > 0), enquanto que a função original u c(t) é descontínua no ponto x = c.

Exemplo 3.8: Mostre que a transformada de Laplace para a função f : [0 ∞) → R, definida


por f (t) = sen (wt), é dada por
w ,
(3.7) L[ sen(wt)] = s > 0.
s2 + w2
S OLUÇÃO : O gráfico da função f (t) = sen (wt), com w = 1, encontra-se na figura 3.7 a
seguir.

Figura 3.7: Gráfico de f (t) = sen (wt) com w = 1.

Usa-se a definição de transformada de Laplace para escrever


Z ∞ Z ∞
−st
L[ f (t)] = e f (t) dt = e −st sen (wt) dt
0 0
Z T
(3.8) = lim e −st sen (wt) dt.
T →∞ 0

A integral em (3.8) deve ser calculada através de duas integrações por partes. Para a primeira,
usa-se o seguinte
( 
u=e , −st  du = −s · e −st ,

dv = sen (wt),  v = − 1 · cos(wt),
w
e para a segunda integração por partes o seguinte
( 
u=e −st
,  du = −s · e −st ,

dv = cos(wt),  v = 1 · sen (wt),
w
18 1 Transformada de Laplace

Assim,
Z T T Z
−st 1 −st
s T −st
e sen (wt) dt = − e cos(wt) − e cos(wt) dt
0 w 0 w 0
T
1 −st
=− e cos(wt) −
w 0
" T Z T
#
s 1 −st s
− e sen (wt) + e −st sen (wt) dt
w w 0 w 0
T T
1 −st
s −st
=− e cos(wt) − 2 e sen (wt) −
w 0 w 0
Z T
s2
− 2 e −st sen (wt) dt,
w 0

isto é,
Z T Z T T T
−st s2 −st 1 −st
s −st
e sen (wt) dt + 2 e sen (wt) dt = − e cos(wt) − 2 e sen (wt) ,
0 w 0 w 0 w 0

ou ainda,
 Z T T
s2 T
−st 1 −st
s −st
1+ 2 e sen (wt) dt = − e cos(wt) − 2 e sen (wt) ,
w 0 w 0 w 0

que pode ser melhorada para


 2 Z T T T
s + w2 −st 1 −st
s −st
2
e sen (wt) dt = − e cos(wt) − 2 e sen (wt) ,
w 0 w 0 w 0

que, por fim, resulta em


Z T T
−st w −st

e sen (wt) dt = − 2 e cos(wt) −
0 s + w2
0
T
s −st

− 2 e sen (wt)
s + w2
0
w  −sT 0

=− 2 e cos(wT ) − e cos 0 −
s + w2
s  −sT 0

− 2 e sen (wT ) − e sen 0
s + w2
w −sT w
=− 2 · e · cos(wT ) + −
s + w2 s2 + w2
s
(3.9) − 2 2
· e −sT · sen (wT ).
s +w
Substituindo (3.9) em (3.8), obtém-se
1.3 Definição da transformada de Laplace 19

Z T
L[ f (t)] = lim e −st sen (wt) dt
T →∞ 0

w w
= lim − · e −sT · cos(wT ) + −
T →∞ s2 + w2 s2 + w2

s −sT
− 2 ·e · sen (wT )
s + w2
 
w  −sT  w
=− 2 · lim e · cos(wT ) + lim 2 −
s + w2 T →∞ T →∞ s + w2

s  −sT 
− 2 · lim e · sen (wT )
s + w2 T →∞
w ,
= 2
s + w2
pois, nos limites acima, as funções seno e cosseno são limitadas e lim e −sT = 0. Isso mostra o
T →∞
que foi afirmado.

Figura 3.8: Gráfico de F(s) com w = 1.

Exemplo 3.9: Mostre que a transformada de Laplace para a função f : [0 ∞) → R, definida


por f (t) = cos(wt), é dada por
s ,
(3.10) L[cos(wt)] = s > 0.
s2 + w2
S OLUÇÃO : Usa-se a definição de transformada de Laplace para escrever

Z ∞ Z ∞
L[ f (t)] = e −st f (t) dt = e −st cos(wt) dt
0 0
Z T
(3.11) = lim e −st cos(wt) dt.
T →∞ 0
20 1 Transformada de Laplace

Figura 3.9: Gráfico de f (t) = cos(wt) com w = 1.

A integral em (3.8) deve ser calculada através de duas integrações por partes. Para a primeira,
usa-se o seguinte
( 
u = e −st ,  du = −s · e −st ,

dv = cos(wt),  v = 1 · sen (wt),
w
e para a segunda integração por partes o seguinte
( 
u= e −st ,  du = −s · e −st ,

dv = sen (wt),  v = − 1 · cos(wt),
w
Assim,
Z T T Z
−st 1 −st s T −st
e cos(wt) dt = e sen (wt) + e sen (wt) dt
0 w 0 w 0
T
1 −st
= e sen (wt) +
w 0
" T Z T
#
s 1 −st s
+ − e cos(wt) − e −st cos(wt) dt
w w 0 w 0
T T
1 −st s −st

= e sen (wt) − 2 e cos(wt) −
w 0 w 0
Z T
s2
− 2 e −st cos(wt) dt,
w 0

isto é,
Z T Z T T T
s2 1 s
e −st cos(wt) dt + 2 e −st cos(wt) dt = e −st sen (wt) − 2 e −st cos(wt) ,
0 w 0 w 0 w 0

ou ainda,
1.3 Definição da transformada de Laplace 21

 Z T T
s2 T
−st 1 −st s −st

1+ 2 e cos(wt) dt = e sen (wt) − 2 e cos(wt) ,
w 0 w 0 w 0

que pode ser melhorada para


 2 Z T T T
s + w2 −st 1 −st
− s −st

,
e cos(wt) dt = e sen (wt) e cos(wt)
w2 0 w 0 w2 0

que, por fim, resulta em


Z T T T
−st w −st
s −st

e cos(wt) dt = 2 e sen (wt) − e cos(wt)
0 s + w2 s2 + w2
0 0
w  −sT 
= 2 e sen (wT ) − e0 sen 0 −
s + w2
s  −sT 0

− 2 e cos(wT ) − e cos 0
s + w2
w −sT s −sT s
(3.12) = 2 · e · sen (wT ) − · e · cos(wT ) + ·
s + w2 s2 + w2 s2 + w2

Figura 3.10: Gráfico de F(s) com w = 1.

Substituindo (3.12) em (3.11), obtém-se


Z T
L[ f (t)] = lim e −st cos(wt) dt
T →∞ 0

w
= lim · e −sT · sen (wT ) −
T →∞ s2 + w2

s −sT s
− 2 · e · cos(wT ) +
s + w2 s2 + w2
w  
= 2 2
· lim e −sT · sen (wT ) −
s + w T →∞
 
s  −sT  s
− 2 · lim e · cos(wT ) + lim 2
s + w2 T →∞ T →∞ s + w2
22 1 Transformada de Laplace

s ,
=
s2 + w2
pois, nos limites acima, as funções seno e cosseno são limitadas e lim e −sT = 0. Isso mostra o
T →∞
que foi afirmado.

Observação 3.2: Neste texto será usada a seguinte convenção para certas notações:

L[ f (t)] = F(s), L[g(t)] = G(s), L[x(t)] = X(s), L[y(t)] = Y (s), . . .

Em suma, usa-se uma letra minúscula para representar uma função na variável t e usa-se uma
letra maiúscula para representar a função transformada de Laplace na variável s.

1.4 Sobre a existência da inversa

Sejam f , g : [0, ∞) → R duas funções seccionalmente contínuas e admissíveis tais que f (t) =
g(t) para todo t ∈ [0, ∞). Então, existe k > 0 tal que F(s) = G(s) para todo s > k, ou seja, se
duas funções são iguais, também são iguais as suas funções transformadas de Laplace. Porém a
recíproca é falsa. Suponha que existe k > 0 tal que F(s) = G(s) para todo s > k. Então,
Z ∞ Z ∞ Z ∞
e −st f (t) dt = e −st g(t) dt ⇒ e −st [ f (t) − g(t)] dt = 0.
0 0 0

Se a recíproca fosse verdadeira, então f (t) − g(t) ≡ 0, mas isso é falso. Por exemplo, con-
sidere as seguintes funções:
( (
0, para 0 ≤ t < 2, 0, para 0 ≤ t ≤ 2,
f (t) = e g(t) =
1, para t ≥ 2, 1, para t > 2.

Agora calcula-se a transformada de Laplace para a função f . Tem-se:


Z ∞ Z 2 Z ∞
−st −st
F(s) = e f (t) dt = e · 0 dt + e −st · 1 dt
0 0 2
Z T
= lim e −st dt
T →∞ 2
 
1 −st T
= lim − ·e
T →∞ s 2
1.4 Sobre a existência da inversa 23


1  T
−st
= − · lim e
s T →∞ 2
1 
= − · lim e −sT − e −2s ,
s T →∞
e −2s ,
=
s
pois lim e −sT = 0.
T →∞
Analogamente calcula-se a transformada de Laplace para a função g. Tem-se:
Z ∞ Z 3 Z ∞
−st −st
G(s) = e g(t) dt = e · 0 dt + e −st · 1 dt
0 0 3
Z T  
−st 1 −st T
= lim e dt = lim − · e
T →∞ 2 T →∞ s 2
T
1  1 
= − · lim e −st = − · lim e −sT − e −2s ,
s T →∞ 2 s T →∞
e −2s ,
=
s
pois lim e −sT = 0.
T →∞
Portanto, conclui-se que F(s) = G(s) para todo s > 0. Agora, note que a função f (t) − g(t) é
dada por 

 0,
 para 0 ≤ t < 0,
f (t) − g(t) = 1, para t = 2,


 0, para t > 2,
ou seja, a função f (t) − g(t) não é a função identicamente nula, pois em t = 2 ela vale 1 e 0 nos
demais pontos do intervalo [0, ∞). Porém, a transformada de Laplace para a funções f (t) − g(t)
é igual a zero. De fato,
Z ∞ Z 2 Z ∞
−st −st
e · [ f (t) − g(t)] dt = e · [ f (t) − g(t)] dt + e −st · [ f (t) − g(t)] dt
0 0 2
Z 2 Z ∞
−st
= e · 0 dt + e −st · 0 dt
0 2

= 0 + 0 = 0.
Esse exemplo mostrou uma função, f (t) − g(t), que difere da função identicamente nula em
[0, ∞) e que tem transformada de Laplace igual a zero, pois as funções f e g são diferentes em
apenas um ponto. Porém, existem funções f e g tais que f (t) − g(t) diferem de zero em um
número grande de pontos e mesmo assim a sua transformada de Laplace também é igual a zero.
Assim, mostrou-se que G(s) = F(s), ou ainda, que duas funções f e g, diferindo apenas em
um ponto têm a mesma transformada de Laplace. O ponto escolhido foi t = 2, mas poderia
24 1 Transformada de Laplace

ser qualquer outro. Assim sendo, existe uma infinidade de funções formadas a partir de f ,
alterando-se o valor da mesma em um único ponto e que implicam em transformadas iguais a
da função f . Pode-se ir além, alterando dois pontos, depois três, etc. E todas as funções assim
construídas a partir de f terão transformadas de Laplace iguais. Sem entrar muito em detalhes,
é possível produzir uma infinidade de novas funções a partir da f e que diferem em um conjunto
de medida nula 6 e todas terão a mesma transformada de f .
Portanto, a inversa de uma função transformada de Laplace não é única. Logo, a transformada
inversa é um assunto delicado e precisa dar sentido a esta transformada inversa. Novamente,
sem entrar muito em detalhes técnicos, a ideia consiste em agrupar em um conjunto todas as
funções obtidas a partir de uma dada função f , mas diferindo de f em um conjunto de medida
nula. Este conjunto assim formado relaciona todas as funções com a função f e este conjunto é
tratado como classe de equivalência. Diz-se que duas funções são iguais quase sempre quando
elas diferem entre si em um conjunto de medida nula. Em suma, trata-se estas funções como
se fossem iguais, mas no sentido dado, de serem iguais quase sempre. Assim, ao inverter uma
função transformada o que se obtém é um representante desta classe de equivalência, que pode
ser qualquer uma das funções dessa classe, uma vez que elas são iguais quase sempre. (Veja a
seção C.8 do adendo C para mais detalhes.)
Dando continuidade, na seção 1.3 procurou-se condições para a existência da transformada
de Laplace e chegou-se a uma definição para a mesma. Nesta seção discutir-se-á a existência
da transformada inversa de Laplace. Para isso será preciso saber o seguinte: se a função trans-
formada de Laplace F(s) existe para uma função f (t), então f (t) será admissível? Em geral, a
resposta é não. O próximo exemplo exibe esta situação.

Exemplo 4.1: A proposição 3.1 deste capítulo apresenta condições suficientes para a existên-
cia da transformada de Laplace, entretanto estas condições não são necessárias: existem funções
que não são admissíveis, mas que possuem transformada de Laplace.  2
2
Um exemplo é considerar a função f : [0, ∞) → R definida por f (t) = 2 t · e t · cos e t . No
2
exemplo 3.4 mostrou-se que a função e t não é admissível. Como esta função é um dos fatores
de f (t), segue-se que f não é admissível. Mas esta função tem transformada de Laplace. De
fato, basta observar, pela regra da cadeia, que
h  2 i0 2
 2
sen e t = 2 t · e t · cos e t = f (t),

de modo que Z ∞ Z ∞ h  2 i0


e −st f (t) dt = e −st sen e t dt
0 0

Para continuar, basta fazer a seguinte integração por partes:

6 Diz-se que um conjunto X ⊂ R tem medida nula quando, para todo ε > 0, for possível obter uma coleção enumerável

[ ∞
de intervalos abertos I1 , I2 , . . . , In , . . . tais que X ⊂ In e ∑ | In | < ε .
n=1 n=1
1.4 Sobre a existência da inversa 25

 
 u = e −st  du = −s · e −st dt,
h  i0 e  2
 dv = sen e t 2 dt,  v = sen e t .

Portanto,
Z ∞ Z ∞ h  2 i0
e −st
f (t) dt = e −st sen e t dt
0 0
Z T h  2 i0
= lim e −st sen e t dt
T →∞ 0
" #
 T Z T   2
t2
−st
= lim e · sen e + s e −st · sen e t dt
T →∞ 0 0
  2 Z T   
−sT T −st t2
= lim e · sen e − sen 1 + s e · sen e dt
T →∞ 0
h    Z
i T  

−sT T2 −st t2
= lim e · sen e − sen 1 + lim s e · sen e dt
T →∞ T →∞ 0
Z ∞  2
(4.1) = − sen 1 + s e −st · sen e t dt.
0

Observe que h  2 i
lim e −sT
· sen e T = 0,
T →∞
pois a função seno é limitada e a funções exponencial, por ter expoente negativo, tende para
zero quando T → ∞.
Para demonstrar que a função f (x) dada tem uma transformada de Laplace será preciso fazer
uma estimativa na integral Z   ∞ 2
s e −st · sen e t dt
0
que aparece no segundo membro de (4.1). Observando que a função seno é limitada, segue-se
que Z ∞
 2  Z ∞  2 
t −st
s
0 e −st
· sen e dt
≤ s e · sen e t dt
0
Z ∞  
=s e −st sen e t 2 dt

0
Z ∞
≤s e −st dt
0
Z T
= s · lim e −st dt
T →∞ 0
!
1 −st T
= s · lim − ·e
T →∞ s 0
 
= lim −e −sT − (−1)
T →∞
26 1 Transformada de Laplace


= lim 1 − e −sT
T →∞

= 1,
−sT
pois lim e = 0 para todo s > 0.
T →∞
Usando esta estimativa e (4.1) conclui-se que
Z
∞ −st
e f (t) dt ≤ 1 − sen 1,
0

mostrando, assim, que a função f (t) dada no exemplo tem uma transformada de Laplace,
mesmo não sendo uma função admissível.

O exemplo 4.1 mostra a seguinte situação: a classe das funções que possuem transformadas
de Laplace é maior do que a classe das funções admissíveis. O quão maior é, é assunto delicado
e não será apresentado aqui.
Voltando à transformada inversa de Laplace, ainda é possível observar o seguinte: se f e g são
funções contínuas por partes e que diferem apenas nos pontos de descontinuidades, então tem-
se que L[ f (t)] = L[g(t)], apesar de f (t) 6= g(t). Dito de outra maneira: funções admissíveis que
diferem em certo conjunto de pontos (precisamente, quando diferem em um conjunto de pontos
de medida nula), têm sempre a mesma transformada de Laplace. Isto será feito no teorema 4.2
(Lerch).
Na demonstração do teorema de Lerch será necessário usar o teorema de aproximação de
Weierstrass E na demonstração do teorema de Weierstrass serão usados os chamados polinômio
de Bernstein.7 Na demonstração do teorema de Weierstrass será mostrado que os polinômios de
Bernstein da função f convergem para a própria função f . O n−ésimo polinômio de Bernstein
é definido por  
n k
Bn (t) = t (1 − t)n−k , para k = 0, 1, . . ., n.
k
Existe uma estreita relação dos polinômios Bn (t) com o binômio de Newton. De fato, da
fórmula binomial
n  
n n
(α + β ) = ∑ · α k · β n−k ,
k=0
k
tomando α = t e β = 1 − t, segue-se que

1 = [t + (1 − t)]n
n  
n
=∑ · t k · (1 − t)n−k
k=0
k
n
(4.2) = ∑ Bn (t).
k=0
7 Sergei Natanovich Bernstein (1880 – 1968) foi um matemático russo.
1.4 Sobre a existência da inversa 27

n
A propriedade obtida acima, que ∑ Bn (t) = 1, é conhecida como partição da unidade.
k=0
Agora divide-se o intervalo fechado [0, 1] em n subintervalos de mesmo comprimento,
[tk , tk+1], com k = 0, 1, . . ., n − 1, de modo que tk = k/n. Seja f : [0, 1] → R uma função con-
tínua. Então, calculando f (tk ) em cada ponto, com estas constantes é possível definir o n−ésimo
polinômio de Bernstein da seguinte maneira:
n n  
k
Bn ( f , t) = ∑ f (tk ) · Bn (t) = ∑ f · Bn(t)
k=0 k=0 n
n    
k n
=∑f · · t k · (1 − t)n−k .
k=0
n k

Observe que o n−ésimo polinômio depende apenas dos valores da função nos n + 1 pontos
0, 1/n, 2/n, . . ., (n−1)/n, 1, que são os pontos na forma tk = k/n.
Além disso, como
n
∑ Bn (t) = 1,
k=0
pode-se dizer que Bn (t) no ponto x é uma média ponderada dos valores de f nos n + 1 pontos
citados anteriormente, onde os pesos são dados por
 
n k
t (1 − t)n−k .
k
Além disso, observa-se que o conjunto dos polinômios de Bernstein, {Bn (t)}, Forma uma
base para o espaço vetorial dos polinômios de grau menor ou igual a n. E o polinômio de
Bernstein é uma combinação linear dos elementos desta base. A demonstração dessa afirmação
reside em mostrar que cada elemento da base canônica {1, x, x2, . . ., xn} pode ser escrito como
combinação linear dos Bn (t). Isso não será demonstrado neste texto.
Será necessário usar um lema na demonstração do teorema de Weierstrass; é o próximo re-
sultado.

Lema 4.1: Para qualquer n ∈ N, tem-se:


n    
1 k 2 n
· t · (1 − t) = ∑ t − · · t k · (1 − t)n−k .
n k=0 n k

D EMONSTRAÇÃO : Da definição
 
n n! ,
=
k k! (n − k)!
segue-se que
 
n−1 (n − 1)!
=
k−1 (k − 1)![(n − 1) − (k − 1)]!
28 1 Transformada de Laplace

(n − 1)!
=
(k − 1)![(n − k)]!
(n − 1)! k·n
= ·
(k − 1)![(n − k)]! k · n
n · (n − 1)! k
= ·
k · (k − 1)!(n − k)! n
n! k
= ·
k! · (n − k)! n
 
n k
(4.3) = · ·
k n
Além disso, viu-se a validade de (4.2), que é
n n  
n
∑ Bn (t) = ∑ k · t k · (1 − t)n−k = 1.
k=0 k=0

Substituindo n por n − 1 e k por k − 1 na expressão acima e a identidade (4.3), obtém-se


n−1  
n−1
nt = n t ∑ · t k−1 · (1 − t)(n−1)−(k−1)
k=1 k − 1
n−1  
n−1
= ∑ · n · t · t k−1 · (1 − t)n−k
k=1 k−1
n−1  
n−1
= ∑ · n · t k · (1 − t)n−k
k=1 k−1

= (por (4.3))
n  
n
(4.4) =∑ · k · t k · (1 − t)n−k .
k=0
k

Agora usa-se (4.4) com n − 1 e k − 1. Tem-se:


n−1  
n−1
(n − 1)t = ∑ · (k − 1) · t k−1 · (1 − t)(n−1)−(k−1)
k=1 k − 1

n−1  
n−1
(4.5) = ∑ · (k − 1) · t k−1 · (1 − t)n−k .
k=1
k−1

Assim,

n(n − 1) · t 2 = nt · [(n − 1)t]

= (por (4.5))
1.4 Sobre a existência da inversa 29

n−1  
n−1
= nt ∑ · (k − 1) · t k−1 · (1 − t)n−k
k=1
k−1
n−1  
n−1
= ∑ · n · (k − 1) · t · t k−1 · (1 − t)n−k
k=1 k−1
n−1  
n−1
= ∑ · n · (k − 1) · t k · (1 − t)n−k
k=1 k−1

= (por (4.3))
n  
n
=∑ · k · (k − 1) · t k · (1 − t)n−k
k=0
k
n  
n 
(4.6) =∑ · k2 − k · t k · (1 − t)n−k .
k=0 k

Para finalizar, (4.2), (4.4) e (4.6). Tem-se:


      
n
k 2 n k n
2 kt k2 n
∑ t − n k t (1 − t)n−k = ∑ t − 2 n + n2 k t k (1 − t)n−k
k=0 k=0
n  
2 n k
=t ∑ t (1 − t)n−k −
k=0 k
 
2t n n
− ∑ k kt k (1 − t)n−k +
n k=0
 
1 n n 2 k
+ 2∑ k t (1 − t)n−k ±
n k=0 k
 
1 n n
± 2∑ kt k (1 − t)n−k
n k=0 k
n  
2 n k
=t ∑ t (1 − t)n−k +
k=0 k
   
1 2t n n
+ 2−
n ∑ k kt k (1 − t)n−k +
n k=0
 
1 n n 
+ 2∑ k2 − k t k (1 − t)n−k
n k=0 k

= (usando (4.2), (4.4) e (4.6), obtém-se)


 
2 1 2t 1  
=t + 2 − nt + 2 n(n − 1)t 2
n n n
30 1 Transformada de Laplace

t t2 t t2
= t 2 + − 2t 2 + t 2 − = −
n n n n
1
= t (1 − t),
n
que é o resultado desejado.

Teorema 4.1 (Weierstrass): 8 Seja f : [0, 1] → R uma função contínua definida no intervalo
fechado [0, 1]. Então existe uma sequência {Bn } de funções polinomiais que converge uniforme-
mente para f em [0, 1], isto é, para todo ε > 0 tem-se que

| f (t) − Bn (t)| < ε , para todo 0 ≤ t ≤ 1.

D EMONSTRAÇÃO : Das expressões


n     n  
k n n
Bn (t) = ∑ f · · t k · (1 − t)n−k e ∑ k · t k · (1 − t)n−k = 1,
k=0
n k k=0
n
pois mostrou-se que ∑ Bn (t) = 1, segue-se que
k=0

n    
k n
f (t) − Bn (t) = f (t) · 1 − ∑ f · · t k · (1 − t)n−k
k=0 n k
n   n    
n k n−k k n
= f (t) ∑ · t · (1 − t) − ∑ f · · t k · (1 − t)n−k
k=0
k k=0
n k
n   n    
n k n
= ∑ f (t) · k · t · (1 − t) − ∑ f n · k · t k · (1 − t)n−k
k n−k
k=0 k=0
n     
k n
(4.7) = ∑ f (t) − f n · k · t k · (1 − t)n−k
k=0

Para obter uma estimativa para a última expressão (4.7), dividir-se-á o somatório em duas
partes. A primeira parte é para os valores de k tais que k/n esteja “perto” de x; nesse caso,
explora-se a continuidade de f . A segunda parte é para os demais valores de k; nesse caso,
usar-se-á o fato de que a soma dos pesos correspondentes a esses k é pequena.
Por hipótese, f é contínua. Então, dado ε > 0, existe δ > 0 tal que

(4.8) |x − y| < δ ⇒ | f (x) − f (y)| < ε ,

para x, y ∈ [0, 1]. Isso é a continuidade uniforme de f , pois a continuidade de f no intervalo


fechado e limitado [0, 1] implica em sua continuidade uniforme nesse mesmo intervalo.
8 Karl Wilhelm Theodor Weierstrass (1815 – 1897) foi um matemático alemão.
1.4 Sobre a existência da inversa 31

Seja M o máximo de f em [0, 1], ou seja, M = max | f (t)|. Seja n0 ∈ N tal que
t∈[0,1]
 
1 , M2
n0 > max ·
δ 4 ε2
Fixe t ∈ [0, 1]. Agora, para cada n ≥ n0 , divide-se o conjunto K = {0, 1, . . ., n} em duas partes:
a primeira parte, K1 , contém k tais que

t − k < 1

n n1/4
e a segunda parte, K2, contém os demais valores de k.
Desse modo, obtém-se a seguinte estivamativa para (4.7):
    
n k n
k n−k
| f (t) − Bn (t)| = ∑ f (t) − f · · t · (1 − t)
k=0 n k

n    
k n k n−k
≤ ∑ f (t) − f · k · t · |1 − t|
k=0 n

= (observando que t ∈ [0, 1])


n
   
k n k n−k
= ∑ f (t) − f · k · t · (1 − t)
k=0
n
   
k n k n−k
= ∑ f (t) − f · k · t · (1 − t) +
k∈K1 n
   
k n k n−k
(4.9)
+ ∑ f (t) − f
n · k · t · (1 − t) .
k∈K2

Agora estima-se a primeira parte em (4.9). A continuidade de f aplicada a números da forma


y = k/n, assegura que, dado ε > 0, existe δ > 1/n1/4 tal que
 
k 1
t − < <δ ⇒ f (t) − f k < ε .
n n 1/4 n
Além disso, pela propriedade de partição da unidade, conclui-se que
     
k n n
∑ f (t) − f n · k · t · (1 − t) < ∑ ε · k · t k · (1 − t)n−k
k n−k
k∈K1 k∈K1
 
n
=ε ∑ · t k · (1 − t)n−k
k∈K k
1

(4.10) = ε · 1 = ε.

Para fazer uma estimativa na segunda parte em (4.9), para k ∈ K2 , observa-se que
32 1 Transformada de Laplace

2

t − ≥ 1 ,
k
n n1/2
ou seja, que
 
√ k 2,
(4.11) 1≤ n t− k ∈ K2 .
n
Também usar-se-á o seguinte fato:
  n  
n k n
(4.12) ∑ k t (1 − t) ≤ ∑ k t k (1 − t)n−k = 1,
n−k
k∈L k=0

para qualquer L ⊂ {0, 1, 2, . . ., n}.


Lembrando que f é limitada em [0, 1], obtém-se
         
k n k n
∑ f (t) − f n · k · t · (1 − t) ≤ ∑ | f (t)| + f n · k · t k · (1 − t)n−k
k n−k
k∈K2 k∈K2
 
n
< ∑ (2M) · · t k · (1 − t)n−k
k∈K2 k
 
n
= 2M ∑ · t k · (1 − t)n−k
k∈K k
2

= (por (4.11))
   
√ k 2 n
≤ 2M ∑ n t − · · t k · (1 − t)n−k
k∈K n k
2

≤ (por (4.12))
   
√ n k 2 n
≤ 2M n ∑ t − · · t k · (1 − t)n−k
k=0 n k

= (pelo lema 4.1)


n  
√ 1 n
≤ 2M n ∑ · t · (1 − t) · · t k · (1 − t)n−k
k=0 n k

√ 1 n  
n
= 2M n · · t · (1 − t) ∑ · t k · (1 − t)n−k
n k=0 k

= (por (4.2))
√ 1
= 2M n · · t · (1 − t)
n
2M
= √ · [t(1 − t)]
n
1.4 Sobre a existência da inversa 33

2M 1 M
(4.13) ≤√ · = √ ,
n 4 2 n

pois t(1 − t) ≤ 1/4. De fato, tem-se que t(1 − t) = t − t 2 , que é uma parábola com convexidade
para baixo. Logo, todos os valores de y sobre esta parábola são menores ou iguais ao vértice
da mesma. Como yv = −(b2−4ac/4a, segue-se por substituição direta que yv = 1/4; segue-se daí a
justificativa da afirmação feita.
Para finalizar a demonstração: segue-se de (4.9) que
   
k n k n−k

| f (t) − Bn (t)| ≤ ∑ f (t) − f
n · k · t · (1 − t) +
k∈K1
   
k n k n−k
+ ∑ f (t) − f · k · t · (1 − t)
k∈K n
2

< (por (4.10) e (4.13))


M
<ε+ √ ·
2 n
A última desigualdade é válida para todo x ∈ [0, 1] e para todo n ≥ n0 , com n0 ∈ N dado
anteriormente. Com isso conclui-se a demonstração do teorema de aproximação de Weierstrass.

Observação 4.1: Seja f : [a, b] → R uma função contínua. A ideia consiste em aplicar o
teorema de Weierstrass a uma função cujo domínio é o intervalo fechado [a, b], ou seja, não
necessariamente o intervalo [0, 1]. Para mostrar isso, basta fazer t = (1 − x)a + bx, de modo que
1
x= · (t − a),
b−a
que implica dizer que t ∈ [a, b] se, e somente se, x ∈ [0, 1]. Nesse caso, considera-se uma função
f : [0, 1] → R definida por
f (x) = f [ (1 − x)a + bx] .
Essa função f passa a ser a função f usada no enunciado do teorema de Weierstrass, de modo
que tudo o que foi feito durante a sua demonstração vale para f e, consequente, para a função
f definida em [a, b]. Os detalhes são deixados como exercício.

A seguir apresenta-se o teorema de Lerch. Este resultado foi apresentado no artigo intitulado
Sur un point de la théorie des fonctions génératrices d’Abel, em 1903. Uma citação completa
sobre o mesmo pode ser encontrada na referência [73] da bibligrafia. A maneira em que se
demonstra este resultado neste texto não segue à risca as ideias originais de M. Lerch.
34 1 Transformada de Laplace

Teorema 4.2 (Lerch): 9 Sejam f e g funções admissíveis tais que

L[ f (t)] = L[g(t)], para s > s0 .

Então f (t) = g(t), exceto possivelmente nos pontos de descontinuidade.


D EMONSTRAÇÃO : Defina h(t) = f (t) − g(t). Assim,

L[h(t)] = 0, para s ≥ s0 .

Para simplificar a demonstração, mas sem perda de generalidade, continuar-se-á a demons-


tração supondo que h é contínua. Caso h tenha descontinuidades, as integrais a seguir devem
ser desmembradas em somas de integrais tomadas sobre intervalos onde h é contínua.
Agora faça Z t
v(t) = e −s0 x h(x) dx,
0
de modo que
v 0 (t) = e −s0 t h(t).
Assim, para n = 0, 1, 2, . . ., segue-se que
Z ∞
0 = L[h](s0 + n) = e −(s0+n)t h(t) dt
0
Z ∞  
= e −nt e −s0 t h(t) dt
0
Z ∞
= e −nt v 0 (t) dt
0
Z T
= lim e −nt v 0 (t) dt
T →∞ 0

= (integração por partes)


" T Z T
#

= lim e −nt v(t) + n e −nt v(t) dt
T →∞ 0 0

  Z ∞
−nT
= lim e v(T ) − v(0) + n e −nt v(t) dt
T →∞ 0
Z ∞
= −v(0) + n e −nt v(t) dt.
0

Observa-se que realizou-se integração por partes em um dos passos acima e usou-se o fato
que lim e −n T = 0. Portanto,
T →∞ Z ∞
n e −nt v(t) dt = v(0).
0
Mas da definição de v(x) segue-se imediatamente que v(0) = 0. Assim,

9 Matyáš Lerch (1860 – 1922) foi um matemático tcheco. O artigo original encontra-se em [73] da bibliografia.
1.4 Sobre a existência da inversa 35

Z ∞
(4.14) e −nt v(t) dt = 0, para n = 0, 1, 2, . . .
0

Nos pontos onde h é contínua, tem-se que v(t) é derivável e v 0 (t) = e −s0 t h(t). Logo, se for
demonstrado que v(t) = 0, seguir-se-á que h(t) = 0. Com intuito de mostrar que v(x) = 0, será
feita a seguinte mudança de variáveis em (4.14):

t = − lnx e u(x) = v (− lnx) .

Da primeira mudança de variáveis, segue-se que

−t = ln x ⇒ e −t = e ln x ⇒ x = e −t .

Os limites de integração, na variável t, na integral obtida em (4.14) são 0 e ∞. Assim, os


novos limites, na variável x, são, respectivamente,

x1 = e 0 = 1 e x2 = lim e −T = 0.
T →∞

Além disso, diferenciando x = e −t , obtém-se −dx = e −t dt. E ainda da primeira mudança de


variáveis, encontra-se
n t = −n(ln x) ⇒ − n t = ln (xn )
n)
e −nt = e ln(x ⇒ e −nt = x n.
Além disso, v(t) = v(− ln x) = u(x). Assim,
Z ∞
0= e −nt v(t) dt
0
Z 0
=− x n u(x) dx
1
Z 1
= x n u(x) dx,
0

isto é,
Z 1
(4.15) x n u(x) dx = 0, para n = 0, 1, 2, . . .
0

Agora considere a classe P de todas as funções polinomiais com coeficientes reais. Seja

p(x) = a0 + a1 x + a2 x2 + · · · + an xn

uma função polinomial em P.


Pela linearidade da integral e da relação obtida em (4.15), segue-se que
Z 1 Z 1 
p(x) f (x) dx = a0 + a1 x + a2 x2 + · · · + an xn u(x) dx
0 0
36 1 Transformada de Laplace

Z 1 Z 1 Z 1
= a0 f (x) dx + a1 x f (x) dx + a2 x2 f (x) dx + · · ·
0 0 0
Z 1
· · · + an xn f (x) dx
0

= a1 · 0 + a1 · 0 + a2 · 0 + · · ·+ an · 0 = 0,
por (4.15) e para toda função polinomial p ∈ P.
Então, pelo teorema de aproximação de Weierstrass, segue-se que existe uma sequência
de funções polinomiais pn (x) em P tal que pn(x) → u(x) uniformemente. Agora utiliza-se o
seguinte teorema: Se uma sequência de funções Riemann integráveis fn : [a, b] → R converge
uniformemente para f : [a, b] → R, então f é integrável e vale
Z b Z b
f (x) dx = lim fn (x) dx,
a n→∞ a

ou ainda, pode-se escrever


Z b Z b
lim fn (x) dx = lim fn (x) dx,
n→∞ a a n→∞

desde que a convergência seja uniforme. (Veja as referências [37] e [74], por exemplo, para uma
demonstração deste resultado.)
Dando continuidade, por hipótese, u é contínua em [0, 1]. Além disso, toda função polinomial
é contínua. Como o produto de funções contínuas é contínua„ segue-se daí que pn(x) u(x) é uma
função contínua. Então, por (4.15) e pelo teorema citado, conclui-se que
Z 1
0 = lim pn (x) u(x) dx
n→∞ 0
Z 1
= lim pn(x) u(x) dx
0 n→∞
Z 1 Z 1
= u(x) u(x) dx = [u(x)]2 dx.
0 0

Como [u(x)]2 é uma função contínua (por ser u contínua), por ser não negativa e por satisfazer
Z 1
[u(x)]2 dx = 0,
0

então afirma-se que u ≡ 0.


De fato, suponha que a afirmação seja falsa. Então existe x0 ∈ [0, 1] tal que [u(x0 )]2 = a > 0.
Por ser [u(x)]2 contínua, então existe δ > 0 tal que u2(x) > a/2 para todo x ∈ (x0 − δ , x0 + δ ).
Assim sendo,
Z 1 Z x0 +δ Z x0 +δ
2 2 a
[u(x)] dx ≥ [u(x)] dx > dx
0 x0 −δ x0 −δ 2
1.5 Propriedades básicas da transformada de Laplace 37


a x0+δ a
= ·x = [ (x0 + δ ) − (x0 − δ )]
2 x0 −δ 2
a
· (2δ ) = a δ > 0.
=
2
Mas isso contradiz o fato de que
Z 1
[u(x)]2 dx = 0,
0

portanto, u ≡ 0. Como v(− ln x) = u(x) ≡ 0 e t = − ln x, então segue-se que v ≡ 0. Como v0 (t) =


e −s0 t h(t) e v ≡ 0, então v0 ≡ 0, de modo que e −s0 t h(t) = 0 para todo t. Como a exponencial
nunca se anula, conclui-se que h ≡ 0. Segue-se daí que f (t) = g(t) nas partes contínuas.

Para o cálculo da transformada inversa de Laplace existe uma fórmula, chamada fórmula
complexa de inversão, que fornece a função admissível f (t) através de uma integral complexa
da transformada F(s). Entretanto, na prática, o cálculo dessa integral é evitado, pois, para os
casos mais comuns, existem métodos mais simples.

1.5 Propriedades básicas da transformada de Laplace

Nesta seção serão apresentadas propriedades resultantes da definição de transformada de


Laplace, bem como vários exemplos que daí decorrem. A partir desses exemplos, e dos anterio-
res, será construída uma tabela que permitirá o uso simplificado da transformada de Laplace
para solução de problemas práticos.
Uma importante propriedade da transformada de Laplace decorre da própria definição: a
linearidade.

Proposição 5.1 (linearidade): Sejam α , β ∈ R e f , g : [0, ∞) → R duas funções seccional-


mente contínuas e admissíveis. Denote por F(s) = L[ f (t)] e G(s) = L[g(t)] as respectivas trans-
formadas de Laplace para f e g. Então,

L[α f + β g](s) = α L[ f ](s) + β L[g](s),

ou ainda,
L[α f (t) + β g(t)] = α L[ f (t)] + β L[g(t)]

= α F(s) + β G(s).
D EMONSTRAÇÃO : Usando a definição de transformada de Laplace, obtém-se
38 1 Transformada de Laplace

Z ∞
L[α f (t) + β g(t)] = e −st [ α f (t) + β g(t)] dt
0
Z ∞ Z ∞
−st
= e [α f (t)] dt + e −st [β g(t)] dt
0 0
Z ∞ Z ∞
=α e −st f (t) dt + β e −st g(t) dt
0 0

= α F(s) + β G(s),
onde usou-se a propriedade de linearidade da integral nos passos acima.

No exemplo 3.5 mostrou-se que


1,
L(1) = para s > 0.
s
Resulta daí que  
−1 1
L = 1, para s > 0.
s
Analogamente, mostrou-se no exemplo 3.6 que
  1 ,
L e kt = para s > k,
s−k
donde se conclui que  
1
L −1
= e kt, para s > k.
s−k
Já o exemplo 3.7 mostrou que a transformada de Laplace da função de Heaviside é dada por
e −c s ,
L [u c(t)] = para s > 0,
s
o que leva a concluir que sua transformada inversa é dada por
 −c s 
−1 e
L = u c (t), para s > 0.
s
Este procedimento será adotado ao longo deste texto para calcular a transformada e a inversa
de Laplace para várias funções elementares. Em relação a inversa, na proposição 3.2 mostrou-se
que a transformada de Laplace satisfaz
M ,
| F(s)| ≤ para s > k,
s−k
onde | f (t)| ≤ M e k t com M > 0.
Isto diz que a transformada F(s) tem ordem O (1/s) quando s → ∞. Assim, considerar-se-á
funções F(s) com esta propriedade para o cálculo da inversa L−1[F(s)] = f (t).
1.5 Propriedades básicas da transformada de Laplace 39

Observação 5.1: A partir deste ponto será adotada uma convenção. Expressões do tipo as2 +
bs + c aparecerão quase que rotineiramente nos exemplos e exercícios. Em alguns casos será
necessário fatorar e em outros será necessário aplicar decomposição em frações parciais.
Considere ∆ = b2 − 4ac. A convenção será a seguinte:

(a) Se ∆ = b2 − 4ac < 0, então as raízes serão complexas, logo deve-se usar o procedimento
de completar quadrado. Com isso, evita-se o aparecimento de números complexos, ou seja, uma
maneira de continuar com números reais.

(b) Se ∆ = b2 − 4ac ≥ 0, então as raízes serão reais (iguais ou distintas). Então, neste caso,
determina-se as raízes e fatora o termo polinomial. Isso implica, como será visto, em decom-
posição em frações parciais.

Exemplo: caso se tenha duas raízes distintas α e β , então as2 + bs + c = (s − α )(s − β ). Caso
as raízes sejam iguais, então as2 + bs + c = (s − α )2 .

Em suma, a convenção fica assim: se ∆ < 0, completa-se o quadrado; se ∆ ≥ 0, decomposição


em frações parciais.
Motivo da convenção: evita-se o uso de funções hiperbólicas.

Exemplo 5.1: Encontre a transformada inversa para


s+3
F(s) = ·
s2 − 3s + 2
S OLUÇÃO : Observe que s2 − 3s + 2 tem ∆ = b2 − 4ac > 0, ou seja, duas raízes reais, s = 1 e
s = 2, de modo que o mesmo pode ser fatorado da seguinte maneira
s+3
F(s) = ·
(s − 1)(s − 2)
Para avançar na solução do exemplo será necessário decompor o segundo membro acima em
frações parciais. Tem-se:
s+3 A B
= +
(s − 1)(s − 2) s − 1 s − 2
A(s − 2) + B(s − 1)
=
(s − 1)(s − 2)
(A + B)s + (−2A − B) ,
=
(s − 1)(s − 2)
que implica em
s + 3 = (A + B)s + (−2A − B),
ou seja,
40 1 Transformada de Laplace

(
A + B = 1,
−2A − B = 3.
Multiplicando a primeira equação por 2 e somando com a segunda, encontra-se B = 5. Subs-
tituindo este valor em qualquer das equações acima encontra-se que A = −4. Portanto,
s−3 1 1
F(s) = = −4 · +5· ·
s2 − 3s + 2 s−1 s−2
Assim, usando a linearidade da inversa, obtém-se
f (t) = L−1[F(s)]
 
−1 1 1
=L −4 · +5·
s−1 s−2
   
−1 1 −1 1
= −4 · L +5·L ·
s−1 s−2
Para determinar as duas inversas no último membro acima, basta usar a fórmula da inversa
do exemplo 3.6, isto é,  
1
L −1
= e kt, para s > k,
s−k
tomando k = 1 no primeiro caso e k = 2 no segundo.
Logo,    
−1 1 −1 1
f (t) = −4 · L +5·L ·
s−1 s−2

= −4 e t + 5 e 2t ,
que é a resposta procurada.

O próximo resultado contém outra propriedade da transformada de Laplace e que é bastante


útil. Ele diz que a multiplicação de f (t) por e ct resulta na translação da transformada F(s) em
um distância c no sentido dos s positivos.

Proposição 5.2 (1a translação): Suponha que F(s) = L[ f (t)] existe para s > k ≥ 0. Se c é
uma constante, então
 
(5.1) L e ct f (t) = F(s − c), s > k + c.

Reciprocamente, se f (t) = L−1[F(s)], então

(5.2) e ct f (t) = L−1 [ F(s − c)] .

D EMONSTRAÇÃO : Como hipótese, assumiu-se a existência da transformada de Laplace para


a função f . Isso significa que f deverá ser admissível, isto é, que existem constantes M > 0 e k
1.5 Propriedades básicas da transformada de Laplace 41

tais que
| f (t)| ≤ M e kt .
Porém o enunciado da proposição considera um resultado envolvendo a transformada da
função e ct f (t), ou seja, é preciso mostrar que esta função também é admissível para que a
fórmula indicada faça sentido. Para tal, basta notar que a desigualdade acima implica dizer que

−M e kt ≤ f (t) ≤ M e kt ,

que tendo todos os membros multiplicado por e ct (por ser sempre positiva) resulta em

−M e kt e ct ≤ e ct f (t) ≤ M e ct e kt ,

que é o mesmo que


−M e (k+c)t ≤ f (t) ≤ M e (k+c)t .
e que pode ser reescrita na forma
ct
e f (t) ≤ M e (k+c)t .

Isto implica dizer que a função e ct f (t) é admissível e tem uma transformada de Laplace,
desde que a restrição s > k + c seja assumida.
Assim, pode-se aplicar a definição de transformada de Laplace na função e ct f (t) para obter
 ct
 Z ∞
L e f (t) = e −st e ct f (t) dt
0
Z ∞
= e −(s−c)t f (t) dt
0

= F(s − c), (s > k + c),


o que demonstra (5.1). Para mostrar (5.2), basta aplicar a transfornada inversa em (5.1).

Observe que a fórmula da proposição 5.2 é válida para qualquer constante c. Assim, se na
fórmula, trocar-se c por −c (aqui, c > 0), então fica assim:
 
L e −ct f (t) = F(s + c).

A fórmula acima pode ser chamada de propriedade de amortecimento: se a função f (t) for
“amortecida” pelo fator exponencial e −ct , então a transformada de Laplace será deslocada (para
a esquerda!) em relação à nova variável s.

Exemplo 5.2: Determine a transformada inversa de


1
F(s) = ·
s2 − 4s + 5
42 1 Transformada de Laplace

S OLUÇÃO : Observe que s2 − 4s + 5 tem ∆ = b2 − 4ac < 0, isto é, não tem raízes reais, logo
deve-se completar quadrado com o objetivo de usar alguma fórmula já obtida até este ponto.
Assim,

s2 − 4s + 5 = s2 − 4s + 4 + 1 = (s − 2)2 + 1,
de modo que
1
F(s) = ·
(s − 2)2 + 1
Para determinar a inversa f (t) pode-se usar a fórmula (5.2) da proposição 5.2. Para isso, basta
notar que
1
F(s) = = G(s − 2),
(s − 2)2 + 1
onde
1
G(s) = ·
s2 + 1
A fórmula (3.7) do exemplo 3.8 diz que
w ,
L[ sen(wt)] =
s2 + w2
de modo que sua inversa é dada por
 
−1 w
L = sen (wt).
s + w2
2

Assim, tomando w = 1 na fórmula acima, encontra-se


 
−1 −1 1
g(t) = L [G(s)] = L = sen t.
s2 + 1
Deste modo, usando fórmula (5.2) da proposição 5.2, com c = 2, obtém-se

f (t) = L−1[F(s)] = L−1[G(s − 2)]

= e 2t g(t) = e 2t sen t,
que é a resposta desejada.

Os exemplos a seguir apresentam algumas propriedades que ajudarão a determinar a trans-


formada de Laplace para outras funções e que permitirão resoluções simplificadas para certas
equações diferenciais.
Os cálculos envolvidos podem usar a propriedade da primeira translação, que foi visto na
proposição 5.2. Por outro lado, também é possível usar cálculos formais e aplicar a importante
fórmula de Euler:

(5.3) e i θ = cos θ + i · sen θ , onde i satisfaz i2 = −1.

Exemplo 5.3: Sejam f , g : [0, ∞) → R funções definidas por


1.5 Propriedades básicas da transformada de Laplace 43

f (t) = e k t cos(wt) e g(t) = e k t sen (wt).

Então suas transformadas de Laplace são dadas, respectivamente, por


s−k w ,
(5.4) F(s) = e G(s) =
(s − k)2 + w2 (s − k)2 + w2
para todo s > k, de modo que suas inversas são dadas por
   
s−k kt w
(5.5) L −1
= e cos(wt) e L −1
= e k t sen (wt).
(s − k)2 + w2 (s − k)2 + w2

S OLUÇÃO : O exemplo 3.3 mostrou que as funções f e g são admissíveis. Logo faz sentido
encontrar suas transformadas de Laplace.
Viu-se no exemplo 3.6 que
  1 ,
L e kt = para s > k.
s−k
Note que é possível substituir k por k + iw na fórmula acima. Assim,
h i 1 1
L e (k+iw)t = =
s − (k + iw) (s − k) − iw
1 (s − k) + iw
= ·
(s − k) − iw (s − k) + iw
(s − k) + iw (s − k) + iw
= =
(s − k)2 − (iw)2 (s − k)2 + w2
s−k w ,
(5.6) = 2 2
+i
(s − k) + w (s − k)2 + w2
onde realizou-se uma multiplicação e divisão pelo conjugado complexo e usou-se o fato que
i 2 = −1.
Por outro lado, segue-se da fórmula de Euler que

e (k+iw)t = e k t+iwt = e k t · e iwt

= e k t [cos(wt) + i sen (wt)]

(5.7) = e k t cos(wt) + i e k t sen (wt).

Usando (5.7) e a linearidade da transformada de Laplace (veja a proposição 5.1), tem-se que

h i h i
(k+iw)t kt kt
L e = L e cos(wt) + i e sen (wt)
h i h i
(5.8) = L e k t cos(wt) + i L e k t sen (wt) .
44 1 Transformada de Laplace

Observe-se, agora, que o primeiro membro de (5.6) é igual ao primeiro membro de (5.8), de
modo que seus segundos membros também são iguais, isto é,
h i h i s−k w
L e k t cos(wt) + i L e k t sen (wt) = + i ·
(s − k)2 + w2 (s − k)2 + w2
A expressão anterior é uma igualdade entre funções complexas, ou seja, a parte real de uma
deve ser igual a parte real da outra, da mesma forma que as partes imaginárias deverão ser
iguais, ou seja,
h i s−k h i w
kt
L e cos(wt) = e kt
L e sen (wt) = ,
2
(s − k) + w 2 (s − k)2 + w2
onde os dois segundos membros acima são, respectivamente, F(s) e G(s).
Segue-se imediatamente daí que as inversas são dadas por
   
s−k kt w
L −1
= e cos(wt) e L −1
= e k t sen (wt).
(s − k)2 + w2 (s − k)2 + w2
Isso mostra o que foi afirmado no enunciado do exemplo.

Observação 5.2: A fórmula de Euler que aparece na equação (5.3) será usada em várias
partes deste texto. Uma maneira formal de mostrar a validade da mesma é apresentada a seguir;
ela é baseada no desenvolvimento em série de Maclaurin.10
Inicia-se com o desenvolvimento da série de Maclaurin para a função f : R → R dada por
f (θ ) = cos θ .
Como f (0)(θ ) = f (θ ) = cos θ , tem-se:

f 0 (θ ) = − sen θ , f 00 (θ ) = − cos θ , f 000 (θ ) = sen θ ,

f (iv)(θ ) = cos θ f (v)(θ ) = − sen θ , f (vi)(θ ) = − cos θ ,

e assim por diante.


Fazendo θ = 0, encontra-se

f 0 (0) = − sen 0 = 0, f 00 (0) = − cos0 = −1, f 000 (0) = sen 0 = −0,

f (iv) (0) = cos 0 = 1 f (v) (0) = − sen 0 = 0, f (vi) (0) = − cos 0 = −1,

e assim por diante.


Agora observe que, para n = 2k, tem-se f (2k)(0) = (−1)k · cos 0 = (−1)k e que, para n =
2k + 1, se tem f (2k+1)(0) = (−1)k+1 · sen 0 = 0, para k = 0, 1, 2, . . .
Assim sendo, o desenvolvimento em série de Maclaurin para f (x) = cos x é dado por

10 Colin Maclaurin (1698 – 1746) foi um matemático e físico escocês.


1.5 Propriedades básicas da transformada de Laplace 45


f (n)(0) n f (n)(0) n f (n)(0) n
cos θ = ∑ θ =∑ θ + ∑ θ
n=0 n! n par n! n ímpar n!
∞ ∞
f (2k)(0) 2k f (2k+1)(0) 2k+1
= ∑ 2k!
θ + ∑ (2k + 1)!
θ
k=0 k=0

(−1)k 2k ∞
0 2k+1

(−1)k 2k
= ∑ 2k!
θ + ∑ (2k + 1)!
θ =∑
2k!
θ
k=0 k=0 k=0

(−1)0 2·0 (−1)1 2·1 (−1)2 2·2 (−1)3 2·3 (−1)4 2·4
= θ + θ + θ + θ + θ +···
(2 · 0)! (2 · 1)! (2 · 2)! (2 · 3)! (2 · 4)!
1 0 1 2 1 4 1 6
= θ − θ + θ − θ +···
0! 2! 4! 6!
θ2 θ4 θ6
(5.9) = 1− + − + · · ·,
2! 4! 6!
que é a representação em série de Maclaurin para f (x) = cos x.
O passo seguinte consiste em desenvolver a série de Maclaurin para a função f : R → R dada
por f (θ ) = sen θ .
Como f (0)(θ ) = f (θ ) = sen θ , tem-se:

f 0 (θ ) = cos θ , f 00 (θ ) = − sen θ , f 000 (θ ) = − cos θ ,

f (iv)(θ ) = sen θ f (v)(θ ) = cos θ , f (vi)(θ ) = − sen θ ,

e assim por diante.


Fazendo θ = 0, encontra-se

f 0 (0) = cos 0 = 1, f 00 (0) = − sen 0 = 0, f 000 (0) = − cos0 = −1,

f (iv)(0) = sen 0 = 0 f (v)(0) = cos 0 = 1, f (vi) (0) = − sen 0 = 0,

e assim por diante.


Agora observe que, para n = 2k, tem-se f (2k)(0) = (−1)k · sen 0 = 0 e que, para n = 2k + 1,
se tem f (2k+1)(0) = (−1)k · cos 0 = (−1)k , para k = 0, 1, 2, . . .
Assim sendo, o desenvolvimento em série de Maclaurin para f (x) = cos x é dado por

f (n)(0) n f (n)(0) n f (n)(0) n
cos θ = ∑ θ =∑ θ + ∑ θ
n=0 n! n par n! n ímpar n!
∞ ∞
f (2k)(0) 2k f (2k+1)(0) 2k+1
= ∑ 2k!
θ + ∑ (2k + 1)!
θ
k=0 k=0
46 1 Transformada de Laplace


0 2k ∞
(−1)k ∞
(−1)k
= ∑ θ + ∑ θ 2k+1 = ∑ θ 2k+1
k=0 2k! k=0 (2k + 1)! k=0 (2k + 1)!

(−1)0 (−1)1 (−1)2


= θ 2·0+1 + θ 2·1+1 + θ 2·2+1 +
(2 · 0 + 1)! (2 · 1 + 1)! (2 · 2 + 1)!
(−1)3 2·3+1 (−1)4
+ θ + θ 2·4+1 + · · ·
(2 · 3 + 1)! (2 · 4 + 1)!
1 1 1 3 1 5 1 7
= θ − θ + θ − θ +···
1! 3! 5! 7!
θ θ3 θ5 θ7
(5.10) = − + − + · · ·,
1! 3! 5! 7!
que é a representação em série de Maclaurin para f (x) = sen x.
Por fim, será feito a representação em série de Maclaurin para a função f : R → R uma
função definida por f (θ ) = e i θ
Um cálculo direto mostra que
d  iθ 
e = i · e iθ

  
d2  iθ  d d d  iθ 
2
e = e iθ
= i·e = i2 · e iθ = −e i θ
dθ dθ dθ dθ
 
d3  iθ  d d2  iθ  d  iθ 
3
e = 2
e = −e = −i · e i θ
dθ dθ dθ dθ
 
d4  iθ  d d3  iθ  d  
e = e = −i · e iθ
= −i2 · e i θ = e i θ
dθ 4 dθ dθ 3 dθ
 4  
d5  iθ  d d iθ d  iθ 
e = e = e = i · e iθ .
dθ 5 dθ dθ 4 dθ

Como o leitor deve ter notado, a n-ésima derivada de f (θ ) = e i θ é dada por


 (n)
f (n) (θ ) = e i θ = i n · e iθ , para n = 0, 1, 2, . . .

Isso mostra que f tem derivadas de todas as ordens, qualquer que seja θ ∈ R. Portanto é
possível formar a série de Taylor com θ0 = 0 (ou seja, a série de Maclaurin). Observando que,
para θ = 0, f n (0) = i n · e i·0 = i n, obtém-se

∞ 0 n
f (n)(0) n i
e iθ = ∑ θ =∑ θn
n=0 n! n=0 n!

in n in n
= ∑ n!
θ + ∑ θ
n par n ímpar n!
1.5 Propriedades básicas da transformada de Laplace 47


i 2k 2k ∞ i 2k+1
= ∑ θ +∑ θ 2k+1
k=0 2k! k=0 (2k + 1)!
 
i0 ·θ0 i2 ·θ2 i4 ·θ4 i6 ·θ6
= + + + +··· +
0! 2! 4! 6!
 
i·θ i3 ·θ3 i5 ·θ5 i7 ·θ7
+ + + + +···
1! 3! 5! 7!
" 2 3 #
1·1 i2 ·θ2 i2 ·θ4 i2 ·θ6
= + + + +··· +
1 2! 4! 6!
" 2 3 #
i·θ i·i2 ·θ3 i· i2 ·θ5 i· i2 ·θ7
+ + + + +···
1! 3! 5! 7!
 
(−1) · θ 2 (−1)2 · θ 4 (−1)3 · θ 6
= 1+ + + +··· +
2! 4! 6!
 
i · θ i · (−1) · θ 3 i · (−1)2 · θ 5 i · (−1)3 · θ 7
+ + + + +···
1! 3! 5! 7!
 
θ2 θ4 θ6
= 1− + − +··· +
2! 4! 6!
 
θ θ3 θ5 θ7
+ i· −i· +i· −i· +···
1! 3! 5! 7!
   
θ2 θ4 θ6 θ θ3 θ5 θ7
= 1− + − +··· +i· −· +· −· +···
2! 4! 6! 1! 3! 5! 7!

= (usando (5.9) e (5.10) nos dois casos anteriores)

= cos θ + i · sen θ ,
que é a fórmula de Euler.

Outra fórmula muito útil e que decorre daquelas duas do exemplo 5.3 é dada no exemplo a
seguir.

Exemplo 5.4: Sejam A, B, k, w constantes, com w 6= 0 (as demais constantes podem assumir
qualquer valor). Então,
  
kt Ak + B As + B ,
(5.11) L e A · cos(wt) + · sen (wt) = w 6= 0,
w (s − k)2 + w2
ou equivalentemente,
48 1 Transformada de Laplace

   
As + B Ak + B
(5.12) L −1 kt
= e A · cos(wt) + · sen (wt) , w 6= 0.
(s − k)2 + w2 w
S OLUÇÃO : Basta trabalhar com a segunda fórmula acima, pois a mesma é equivalente à
segunda. A ideia consiste em desenvolver o primeiro membro e usar as fórmulas obtidas no
exemplo 5.3, bem como a linearidade da transformada inversa. Tem-se:
   
−1 As + B −1 A(s − k) + (Ak + B)
L =L
(s − k)2 + w2 (s − k)2 + w2
   
−1 s−k −1 1
= AL + (Ak + B) L
(s − k)2 + w2 (s − k)2 + w2
   
−1 s−k Ak + B −1 w
= A·L + ·L
(s − k)2 + w2 w (s − k)2 + w2
h i Ak + B h i
= A · e k t cos(wt) + · e k t sen (wt)
w
 
Ak + B
kt
= e A · cos(wt) + · sen (wt) ,
w
que é o resultado desejado.
Cabe notar que em um dos passos acima somou-se e subtraiu-se Ak, bem como multiplicou-
se e dividiu-se por w. Neste último caso, para que as operações sejam válidas, faz-se necessário
assumir que w 6= 0.

Observação 5.3: As fórmulas obtidas no exemplo 5.4 podem ser usadas para quaisquer valo-
res de A, B e k, mas fica restrita para valores de w, que podem ser quaisquer, exceto w = 0.
Caso o leitor se depare com um problema em que w = 0, como observado, não poderá usar
as fórmulas do exemplo 5.4, porém poderá utilizar qualquer uma das fórmulas do exemplo 5.3,
que não têm restrição alguma para os valores de w.

Exemplo 5.5: Calcule a seguinte transformada inversa de Laplace


 
−1 1
L ·
s2 + 4s + 13
S OLUÇÃO : Observe-se que o denominador não pode ser fatorado em R, pois as raízes não
são reais. Assim, o passoo inicial consiste em completar quadrado na expressão acima, isto é,

s2 + 4s + 13 = s2 + 4s + 4 + 9 = (s + 2)2 + 32.

Com isto, será possível usar a fórmula (5.12) obtida no exemplo 5.4, ou seja,
1.5 Propriedades básicas da transformada de Laplace 49

   
−1 As + B kt Ak + B
L = e A cos(wt) + sen (wt) ,
(s − k)2 + w2 w
tomando os seguintes valores

A = 0, B = 1, k = −2 e w = 3.

Note-se que esta fórmula pôde ser usada porque w = 3 6= 0. Assim sendo, tem-se:
   
−1 1 −1 1
L =L
s2 + 4s + 13 (s + 2)2 + 32
 
−2t 0 · (−2) + 1
=e 0 · cos(3t) + sen (3t)
3
1 −2t
= e sen (3t),
3
que é o resultado desejado.

Proposição 5.3 (mudança de escala): Seja f : [0, ∞) → R uma função admissível. Então,
1 s,
(5.13) L[ f (ct)] = · F
c c
onde F(s) = L[ f (t)] e c 6= 0.
Reciprocamente, tem-se que
1 t 
(5.14) L−1[F(c s)] = ·f ·
c c
D EMONSTRAÇÃO : Usando a definição de transformada de Laplace e a mudança de variáveis
u = ct, de modo que du/c = dt, obtém-se
Z ∞ Z T
−st
L[ f (ct)] = e f (ct) dt = lim e −st f (ct) dt
0 T →∞ 0
Z cT
1 u
= · lim e −s ( /c) f (u) du
c T →∞ 0
Z cT
1 s
= · lim e −( /c)u f (u) du
c T →∞ 0
Z
1 ∞
e −( /c) u f (u) du
s
=
c 0
1 s
= ·F ·
c c
Para a fórmula (5.14), basta fazer c = 1/k na fórmula (5.13). Assim,
50 1 Transformada de Laplace

h  t i
L f = k · F (ks) ,
k
que tendo a inversa aplica em ambos os membros, resulta em
t 
f = k · L−1[F(ks)],
k
isto é,
1  t ,
L−1[F(ks)] = · f
k k
que é a fórmula (5.14).

Exemplo 5.6: Use a fórmula (5.13) (mudança de escala) para mostrar que
3
L[ sen(3t)] = ·
s2 + 9

S OLUÇÃO : Em exemplos anteriores viu-se que


1
L( sent) = ·
s2 + 1
Faça
1
f (t) = sen t, F(s) = e c = 3,
s2 + 1
então
1 s 1 s  1 1
f (ct) = f (3t) = sen (3t) e ·F = ·F = · ·
c c 3 3 3 (s/3)2 + 1
Assim, pela fórmula de mudança de escala, obtém-se
 
1 1 1  1 
L[ sen(3t)] = · = · 
3 (s/3) + 1 3  s2
2 
+1
9
 
1  1 
= · 
3  s2 + 9 
9
 
1 9 3
= · 2 = 2 ·
3 s +9 s +9
O leitor deve observar que este exemplo visa apenas e tão somente ilustrar o uso da pro-
priedade de mudança de escala, uma vez que transformada de sen (3t) pode ser obtida atráves
das fórmulas deduzida nesta seção e em seções anteriores.
1.5 Propriedades básicas da transformada de Laplace 51

Exemplo 5.7: Dado que  


 sen t  1 , 11
L = arc tg
t s
encontre  
sen (α t)
L ·
t

S OLUÇÃO : A proposição 5.3 mostra que


1 s
L[ f (ct)] = ·F ·
c c
Usando esta fórmula com c = α ,
 
sen t 1 ,
f (t) = e F(s) = arc tg
t s
segue-se que
s 1   α 
sen (α t) 1 1 1 ,
f (α t) = e ·F = · arc tg = · arc tg
αt α α α s/α α s
de modo que    
1 sen (α t) sen (α t)
·L =L
α t αt
1 s
= L[ f (α t)] = ·F
α α
1  α 
= · arc tg ,
α s
ou seja, mostrou-se que  
1 sen (α t) 1 α 
·L = · arc tg ·
α t α s
Multiplicando ambos os membros por α , obtém-se a solução do problema dado:
  α 
sen (α t)
L = arc tg ·
t s

Proposição 5.4: Seja f : [0, ∞) → R uma função admissível e periódica de período T , isto é,
f satisfaz f (t + T ) = f (t). Então,
Z T
e −st f (t) dt
0
(5.15) L[ f (t)] = ·
1 − e −sT
D EMONSTRAÇÃO : Tem-se:

11 Veja exemplo 8.4 da seção 1.8 para entender a validade desta fórmula.
52 1 Transformada de Laplace

Z ∞
L[ f (t)] = e −st f (t) dt
0
Z T Z 2T Z 3T
= e −st f (t) dt + e −st f (t) dt + e −st f (t) dt + · · ·
0 T 2T

Faça as seguintes mudanças de variáveis: t = x + T na segunda integral, t = x + 2T na terceira


integral e assim por diante. Observa-se que em todos estes casos tem-se dx = dt. Além disso,
por f ser periódica de período T , f (x + T ) = f (x). Mas se f é periódica de período T , então f
também é periódica de período kT , com k ∈ N, isto é, f (x + 2T ) = f (x), f (x + 3T ) = f (x) e
assim por diante (veja a seção 2.2 do capítulo 2 para detalhes).
Deste modo, segue-se que
Z T Z T
−s x
L[ f (t)] = e f (x) dx + e −s (x+T ) f (x + T ) dx +
0 0
Z T Z T
−s (x+2T)
+ e f (x + 2T ) dx + e −s (x+3T) f (x + 3T ) dx + · · ·
0 0
Z T Z T
−s x
= e f (x) dx + e −sT
e −s x f (x) dx +
0 0
Z T Z T
−2sT −s x −3sT
+e e f (x) dx + e e −sx f (x) dx + · · ·
0 0
Z T
= 1 + e −sT + e −2sT + e −3sT + · · · e −sx f (x) dx
0
Z T
e −sx f (x) dx
= 0 ,
1 − e −sT
onde usou-se o fato de que
1 ,
1 + r + r2 + r3 + · · · = | r | < 1,
1−r
tomando-se r = e −sT .

Exemplo 5.8: Seja


(
sen t, 0 < t < π,
f (t) =
0, π < t < 2π .
periódica de período T = 2π .
Use a fórmula Z
e α t [α sen (β t) − β cos(β t)]
e α t sen (β t) dt =
α2 + β 2
para determinar L[ f (t)].
1.6 Transformadas de funções descontínuas 53

S OLUÇÃO : Pela proposição 5.4, tem-se que


Z T
e −st f (t) dt
0
L[ f (t)] = ·
1 − e −sT
Assim,
Z 2π
1
L[ f (t)] = e −st f (t) dt
1 − e −2π s 0
Z π Z 2π
1 −st 1
= e f (t) dt + e −st f (t) dt
1 − e −2π s 0 1 − e −2π s π
Z π Z 2π
1 −st 1
= e sen t dt + e −st · 0 dt
1 − e −2π s 0 1 − e −2π s π
Z π
1
= e −st sen t dt
1 − e −2π s 0
 −st  π
1 e (−s sent − cost)
= ·
1 − e −2π s s2 + 1
0
 
1 e −π s(−s sen π − cos π ) e 0 (−s sen 0 − cos0)
= · −
1 − e −2π s s2 + 1 s2 + 1
1 1 + e −π s 1 1 + e −π s
= · = ·
1 − e −2π s s2 + 1 1 − (e −π s)2 s2 + 1
1 1 + e −π s
= ·
(1 − e −π s)(1 + e −π s) s2 + 1
1 1 1
= · 2 = ·
1−e −π s s + 1 (1 − e s) (s2 + 1)
−π

que é a solução do problema dado.

1.6 Transformadas de funções descontínuas

No exemplo 3.7 apresentou-se uma fórmula para a transformada de Laplace da função de


Heaviside e que também permite determinar a transformada inversa, isto é, de
(
0, se 0 ≤ t < c,
u c(t) =
1, se t ≥ c,
54 1 Transformada de Laplace

obtém-se  
e −cs −1 e −cs
L[u c(t)] = e L = u c(t),
s s
para s > 0.
O que se pretende fazer agora é escrever uma função degrau através de combinações funções
de Heaviside. Por exemplo, suponha que a função f : [0, ∞) → R seja dada na forma


 k1 , se 0 ≤ t < a,



k ,
2 se a ≤ t < b,
f (t) =

 k3 , se b ≤ t < c,



k ,
4 se t ≥ c.

Então, o procedimento consiste em reescrever f na seguinte forma

f (t) = k1[u0 (t) − ua (t)] + k2 [ua(t) − ub (t)] + k3 [ub(t) − uc (t)] + k4 uc (t).

O leitor poderá compreender essa ideia observando que u0 (t) − ua(t) representa a função
constante e igual a 1 no intervalo 0 ≤ t < a e igual a 0 para t ≥ a. Analogamente, a expressão
ua (t)− ub(t) é uma função igual a 1 no intervalo a ≤ t < b e 0 caso contrário. E assim por diante.
Portanto, basta multiplicar cada um destes fatores pelo valor da constante em cada intervalo e
somar todas as partes para que f seja reescrita como combinação de funções de Heaviside. Deste
modo, a transformada de Laplace de f é facilmente determinada e sem ter que usar a definição
de transformada. Isso decorre do fato de se trabalhar com a função definida por uma única
sentença e não várias sentenças. Este procedimento será melhor ilustrado através do próximo
exemplo.

Exemplo 6.1: Seja f : [0, ∞) → R uma função definida por




 1, se 0 ≤ t < 2,



 4, se 2 ≤ t < 5,
f (t) =

 2, se 5 ≤ t < 7,



 3, se t ≥ 7.

Pode-se reescrever f em termos de funções de Heaviside da seguinte maneira:


f (t) = 1[u0(t) − u2 (t)] + 4[u2 (t) − u5(t)] + 2[u5 (t) − u7 (t)] + 3u7(t)

= 1 − u2(t) + 4u2 (t) − 4u5 (t) + 2u5(t) − 2u7 (t) + 3u7 (t)

= 1 + 3u2(t) − 2u5 (t) + u7 (t).


Isso permite determinar a transformada de Laplace de f do seguinte modo:
F(s) = L [1 + 3u2(t) − 2u5 (t) + u7(t)]

= L(1) + 3 · L[u2(t)] − 2L · [u5(t)] + L · [u7(t)]


1.6 Transformadas de funções descontínuas 55

Figura 6.1: Gráfico de f .

1 e −2s e −5s e −7s ,


+3·
= −2· +
s s s s
onde usou-se a linearidade da transformada, a fórmula (1) da tabela com k = 1, bem como a
fórmula da transformada de Laplace para a função de Heaviside.

A próxima etapa consiste em analisar a situação de funções descontínuas mais gerais do


que aquelas do tipo escada. Por exemplo, uma função descontínua que seja obtida a partir da
translação de uma função usual. Especificamente, seja f : [0, ∞) → R uma função admissível e
considere g : [0, ∞) → R definida por
(
0, se 0 ≤ t < c,
g(t) =
f (t − c), se t ≥ c.

Deseja-se determinar a transformada de Laplace para a função g. O procedimento consiste


em reescrever g usando a função de Heaviside. Tem-se:
g(t) = 0 · [u0(t) − uc (t)] + f (t − c) · uc(t)

= uc (t) · f (t − c).
O próximo resultado diz qual é a transformada e a inversa para a função g acima.

Proposição 6.1 (2a translação): Suponha que F(s) = L[ f (t)] existe para s > k ≥ 0. Então,
se c é uma constante positiva, tem-se

(6.3) L[u c(t) · f (t − c)] = e −cs · F(s), s > k.

Reciprocamente, se f (t) = L−1[F(s)], então


56 1 Transformada de Laplace

 
(6.4) u c (t) · f (t − c) = L−1 e −cs · F(s) .

D EMONSTRAÇÃO : A demonstração consiste em usar a definição de transformada de Laplace


aplicada à função uc(t) f (t − c). Assim, fazendo a mudança de variáveis u = t − c, de modo que
du = dt nos passos adiante, obtém-se
Z ∞
L[uc(t) · f (t − c)] = e −st uc (t) · f (t − c) dt
0
Z c Z ∞
−st
= e · 0 · f (t − c) dt + e −st · 1 · f (t − c) dt
0 c
Z ∞ Z T
−st
= e · f (t − c) dt = lim e −st · f (t − c) dt
c T →∞ c
Z T −c
= lim e −s(u+c) · f (u) du
T →∞ 0
Z T −c
= lim e −cs e −su · f (u) du
T →∞ 0
Z T −c
= e −cs · lim e −su f (u) · du
T →∞ 0
Z ∞
−cs −s u
=e e · f (u) du
0

= e −cs · F(s), s > k.


Isso mostra (6.3). Para estabelecer (6.4), basta aplicar a transformada inversa em (6.3)

A proposição 6.1 diz que a translação de f (t) por uma distância c no sentido dos t positivos
corresponde à multiplicação de F(s) por e −c s.

Exemplo 6.2: Seja f : [0, ∞) → R uma função definida por f (t) = 1. Como já foi visto, esta
função é admissível e sua transformada de Laplace já foi calculada no exemplo 3.5, isto é, basta
tomar k = 1 naquele exemplo para obter
1,
L[ f (t)] = s > 0.
s
Agora considere a fórmula (6.3) da proposição 6.1, isto é,

L [uc(t) · f (t − c)] = e −cs · F(s), s > k.

Como f (t) = 1, tem-se que


1 e −cs ,
L [uc(t)] = L [uc (t) · 1] = e −cs · L(1) = e −cs · =
s s
1.6 Transformadas de funções descontínuas 57

confirmando a fórmula da transformada de Laplace para a função de Heaviside e que foi obtida
no exemplo 3.7.

Agora, considere uma função definida por



 se 0 ≤ t < a,
 u(t),

f (t) = v(t), se a ≤ t < b,


 w(t), se t ≥ b.

Então, seguindo as ideias anteriores, o que se busca é reescrever f , definida por várias sen-
tenças, em uma única sentença, como soma de funções de Heaviside convenientes, isto é,

f (t) = u(t) · [u0 (t) − ua (t)] + v(t) · [ua(t) − ub (t)] + w(t) · ub (t).

Exemplo 6.3: Seja


(
cos (t − 2π/3) , para t > 2π/3,
f (t) =
0, para 0 ≤ t < 2π/3.

Encontre L[ f (t)].

S OLUÇÃO : Observe que f pode ser reescrita através de funções de Heaviside da seguinte
forma:
 
f (t) = 0 · u0 (t) − u2π/3 (t) + cos (t − 2π/3) · u2π/3 (t) = u2π/3(t) · cos (t − 2π/3).

Lembre-se que
s
L(cost) = ·
s2 + 1
Assim, usando a fórmula da segunda translação, obtém-se
 
L[ f (t)] = L u2π/3(t) · cos (t − 2π/3)
−2π s/3
= e(
−2π/3)s
· L[F(s)] = e · L(cost)

−2π s/3 s s · e −2π s/3


=e · = ·
s2 + 1 s2 + 1

O próximo exemplo ilustra o emprego da fórmula (6.3) de uma maneira menos imediata do
que aquela dos exemplos anteriores.

Exemplo 6.4: Seja f [0, ∞) → R uma função definida por


58 1 Transformada de Laplace

(
sen t, para 0 ≤ t < π/4,
f (t) =
sen t + cos(t − π/4) , para t ≥ π/4.

Observa-se que f é escrita como soma de duas funções g, h : [0, ∞) → R, onde


(
0, para 0 ≤ t < π/4,
g(t) = sen t e h(t) =
cos (t − π/4) , para t ≥ π/4.

Assim, pela linearidade da transformada de Laplace, tem-se que a transformada de f será


igual a soma das transformadas de g e h. Logo, deve-se calcular estas duas transformadas. Para
g, basta usar a fórmula (5.2) obtida no exemplo 5.2, tomando k = 0 e w = 1 para encontrar
1
(6.5) L[g(t)] = L( sen t) = ·
s2 + 1

Figura 6.2: Gráfico de f (t).

Para a transformada de Laplace de h, deve-se reescrever esta função na forma


 
h(t) = 0 · u0 (t) − uπ/4(t) + cos (t − π/4) · uπ/4(t)

= uπ/4(t) · cos (t − π/4)


e usar a fórmula (6.3) da proposição 6.1, ou seja,
 
L[h(t)] = L uπ/4(t) · cos (t − π/4)
π t/4
= e− · L (cos t)
π t/4 s ,
(6.6) = e− ·
s2 + 1
1.6 Transformadas de funções descontínuas 59

onde usou-se a fórmula (5.2) do exercício 5.2 tomando k = 0 e w = 1 para determinar a trans-
formada de Laplace da função cos t.
Portanto, usando (6.5) e (6.6), tem-se a transformada de Laplace de f é dada por
L[ f (t)] = L[g(t) + h(t)] = L[g(t)] + L[h(t)]
1 −π s/4 s
= + e ·
s2 + 1 s2 + 1
1 + s e −π s/4 ,
=
s2 + 1
que é o resultado desejado.

Figura 6.3: Gráfico de F(s) do exemplo 6.4.

Exemplo 6.5: Determine a transformada inversa de Laplace para a seguinte função:

1 − e −2s
F(s) = ·
s2
S OLUÇÃO : O gráfico da função transformada dada encontra-se na figura 6.4.
Usar-se-á a linearidade da transformada inversa para obter
 −2s

−1 −1 1 − e
f (t) = L [F(s)] = L
s2
 
−1 1 −2s 1
=L −e · 2
s2 s
   
−1 1 −1 −2s 1
(6.7) =L −L e · 2 ·
s2 s
Agora usa-se as fórmulas da linha 2 da tabela (com n = 1); são elas:
60 1 Transformada de Laplace

Figura 6.4: Gráfico de F(s).

 
1 −1 1
L(t) = 2 e L = t.
s s2
Substituindo-as em (6.7) e usando a fórmula da segunda translação, encontra-se
   
−1 1 −1 −2s 1
f (t) = L −L e · 2
s2 s
 
= t − L−1 e −2s · L(t)

= t − u2(t) · (t − 2)

= t · u0(t) − t · u2 (t) + 2 · u2(t)

= t · [ u0 (t) − u2 (t)] + 2 · u2(t)


(
t, se 0 ≤ t < 2,
=
2, se t ≥ 2,

que é a resposta desejada.

1.7 Transformadas de Laplace da derivada e da integral

Para resolver problemas envolvendo equações diferenciais usando a transformada de Laplace


será necessário calcular transformadas de derivadas. O primeiro resultado, enunciado na forma
de lema, mostra que se f 0 (t) é admissível, então f (t) também é admissível. Em seguida
apresenta-se um teorema que permite calcular a transformada de Laplace da função derivada.
1.7 Transformadas de Laplace da derivada e da integral 61

Figura 6.5: Gráfico de f (t).

Lema 7.1: Seja f : [0, ∞) → R uma função seccionalmente diferenciável e admissível, isto é,
existem constantes M > 0 k > 0 tais que

| f (t)| ≤ M e k t , para 0 ≤ x < ∞.

Então, a integral de f (t), que é dada por


Z t
g(t) = f (x) dx,
0

também é uma função admissível com a mesma constante k.


Em particular, existe a transformada de Laplace de g para s > k.
D EMONSTRAÇÃO : Como, por hipótese, f é admissível, então | f (t)| ≤ M e k t para constantes
M > 0 e k > 0. Assim, Z Z
t t
| g(t)| = f (x) dx ≤
| f (x)| dx
0 0
Z t Z t
≤ M e k x dx = M e k x dx
0 0

M k x t M  kt 
= e = e −1
k 0 k
M kt
e = K e kt.

k
Observe-se que, como k > 0 e 0 ≤ x ≤ t, então e k t ≥ 1 (de fato, o expoente é não negativo,
de modo que a exponencial é uma função crescente, sendo que o menor valor que o expoente
pode assumir é 0). Assim, encerra-se a demonstração do lema.
62 1 Transformada de Laplace

Teorema 7.1 (transformada da derivada): Seja f : (0, ∞) → R uma função contínua com
f 0 (t)
seccionalmente contínua em qualquer intervalo 0 ≤ t ≤ T . Além disso, suponha que f (t)
e f (t) são funções admissíveis. Então, existe a transformada de Laplace de f 0 (t) e
0

 
(7.3) L f 0 (t) = s L[ f (t)] − f (0), s > k.

D EMONSTRAÇÃO : Considere a integral


Z T
e −st · f 0 (t) dt,
0

cujo limite para T → ∞, se existir, será a transformada de Laplace de f 0 .


Para calcular este limite será preciso escrever a integral de maneira adequada. Se f 0 tiver
pontos de descontinuidade no intervalo 0 ≤ t ≤ T , então eles serão denotados por t1, t2, . . ., tn.
Assim, a integral acima pode ser escrita na forma
Z T Z t1 Z t2 Z T
−st 0 −st 0 −st 0
e · f (t) dt = e · f (t) dt + e · f (t) dt + · · · + e −st · f 0 (t) dt.
0 0 t1 tn

Agora realiza-se integração por partes em cada termo do segundo membro acima, fazendo
( (
u = e −st , du = −s e −st dt,

dv = f 0 (t) dt, v = f (t).

Tem-se:

" t1 #
Z T Z t1

e −st · f 0 (t) dt = e −st · f (t) + s e −st · f (t) dt +
0 0
0
 t2 
Z t2

+ e −st · f (t) + s e −st · f (t) dt  + · · ·
t1
t1
 T 
Z T

· · · + e −st · f (t) + s e −st · f (t) dt 
tn
tn
 t1 t2 T 


= e −st · f (t) + e −st · f (t) + · · · + e −st · f (t) 

0 t1 tn
Z t1 Z t2 Z T 
−st −st −st
+s e · f (t) dt + e · f (t) dt + · · · + e · f (t) dt
0 t1 tn
h  
= e −st1 · f (t1 ) − f (0) + e −st2 · f (t2 ) − e −st1 · f (t1 ) + · · ·

i Z T
−sT −stn
···+ e · f (T ) − e · f (tn ) + s e −st · f (t) dt
0
1.7 Transformadas de Laplace da derivada e da integral 63

Z T
−sT
= − f (0) + e · f (T ) + s · e −st · f (t) dt
0
Z T
=s e −st · f (t) dt + e −sT · f (T ) − f (0).
0
Antes de prosseguir, observa-se que os termos e −sti · f (t1 ) se cancelam para todo i = 1, . . ., n,
restando apenas f (0) e e −sT . Já a soma das integrais evidenciadas representam a integral de 0
até T , quando se usa a propriedade de aditividade para integrais.
O próximo passo consiste em tomar limite para T → ∞ na última expressão obtida. Observe
que o limite para T → ∞ na integral do primeiro membro converge para L[ f 0 (t)] = F 0 (s). Assim,
Z T
0 0
F (s) = L[ f (t)] = lim e −st · f 0 (t) dt
T →∞ 0
 Z T

−st −sT
= lim s e · f (t) dt + e · f (T ) − f (0)
T →∞ 0
Z T
= s · lim e −st · f (t) dt + lim e −sT · f (T ) − lim f (0)
T →∞ 0 T →∞ T →∞

= s · F(s) − f (0),
pois
Z T
lim e −st f (t) dt = F(s), e lim f (0) = f (0).
T →∞ 0 T →∞
Além disso,
lim e −sT f (T ) = 0,
T →∞

mas é preciso justificar corretamente. É claro que f (T ) é uma constante e que a exponencial
acima tende para zero quando T → ∞. Porém o limite acima é tomado para qualquer T > 0, de
modo que, se f (T ) cresce rapidamente quando T aumenta, o limite poderia não ser igual a zero.
Por outro lado, assumiu-se como hipótese que f é uma função admissível. Isto significa que
existem constantes k, M > 0 tais que

| f (t)| ≤ M e kt , para todo t > 0.

Assim, para T ≥ M, tem-se que | f (T )| ≤ M e kT . Logo,


−sT
e · f (T ) = e −sT | f (T )| ≤ M · e −sT · e kT = M e −(s−k)T .

A última expressão tende a zero quando T → ∞, sempre que s > k. Portanto, pela desigual-
dade acima, e −sT · f (T ) → 0 quando T → ∞.

Corolário 7.1 (transformada da integral): Sejam f (0, ∞) → R uma função admissível e


64 1 Transformada de Laplace

Z t
g(t) = f (x) dx
0

a sua integral.
Então,
Z t

1 F(s)
(7.4) L f (x) dx = L[ f (t)] = ·
0 s s
Reciprocamente,
  Zt
−1 F(s)
(7.5) L = f (x) dx.
s 0

D EMONSTRAÇÃO : Como f é admissível, o lema 7.1 mostrou que g também é uma função
admissível. Além disso, segue do teorema fundamental do Cálculo, aplicado à expressão que
define g, que g0 = f . Assim, por ser f uma função admissível e igual a g0 , segue-se que esta
última também é uma função admissível. Logo faz sentido aplicar o teorema 7.1 à função g0 .
Deste modo, tem-se
 
L[ f (t)] = L g0 (t) = s · L[g(t)] − g (0) = s · L[g(t)],

pois, pela definição de g, g(0) = 0.


Portanto, Z 
t 1 F(s) ,
L f (x) dx = L[ f (t)]
0 s s
isto mostra (7.4).
Para demonstrar a recíproca, faça
Z t
g(t) = f (x) dx.
0

Logo g é derivável e g0 (t) = f (t) pelo teorema fundamental do Cálculo. Além disso, segue-se
da definição de g que g(0) = 0. Aplicando o teorema 7.1 à função g, encontra-se

F(s) = L[ f (t)] = L[g0(t)]

= s L[g(t)] − g(0) = s · L[g(t)].


Portanto,
F(s)
F(s) = s · L[ g(t)] = L[ g(t)].

s
Aplicando a inversa em ambos os membros na última igualdade, obtém-se
  Z t
−1 F(s)
L = g(t) = f (x) dx,
s 0

o que demonstra (7.5).


1.7 Transformadas de Laplace da derivada e da integral 65

Corolário 7.2: Seja f : [0, ∞) → R uma função definida por f (t) = t n e k t . Então,
  n!
(7.6) n kt
L t e = , s>k
(s − k)n+1
e
 
n!
(7.7) L −1
n+1
= tn · e k t.
(s − k)
D EMONSTRAÇÃO : Derivando f , obtém-se

f 0 (t) = n · t n−1 · e k t + k · t n · e k t .
Aplicando a transformada de Laplace em ambos os membros acima e usando a sua linea-
ridade, encontra-se
 0   
n−1 kt n kt
L f (t) = L n · t ·e +k·t ·e
   
(7.8) = n · L t n−1 · e k t + k · L t n · e k·t .

Por outro lado, aplicando o teorema 7.1 à função f 0 , obtém-se


  
L f 0 (t) = s · L[ f (t)] − f 0+
 
= s · L t n · e k t − 0n · e k·0
 
n kt
(7.9) = s·L t ·e .

Os primeiros membros de (5.6) e (5.7) são iguais, logo serão iguais seus segundos membros.
Assim,      
n kt n−1 kt n kt
s·L t ·e = n·L t ·e +k·L t ·e ,
ou ainda,    
(s − k) · L t n · e k t = n · L t n−1 · e k t ,
que resulta em    
n
L tn · e k t = · L t n−1 · e k t .
s−k
A última expressão obtida é uma fórmula de recorrência e que pode ser aplicada sucessiva-
mente para determinar a fórmula indicada no enunciado deste exemplo. Tem-se:
  n  
L tn · e k t = · L t n−1 · e k t
s−k
n n−1  
= · · L t n−2 · e k t
s−k s−k
n n−1 n−2  
n−3 kt
= · · ·L t ·e
s − k s − k (s − k)3
66 1 Transformada de Laplace

n n−1 n−2 2 1  
= · · ··· · · L t0 · e k t
s−k s−k s−k s−k s−k
n · (n − 1) · (n − 2) · · ·2 · 1  
= · L e kt
(s − k)n
n! 1 n! ,
= · = s>k
(s − k) s − k (s − k)n+1
n

onde usou-se o fato   1 ,


L e kt = s > k,
s−k
que foi obtido no exemplo 3.6.
A fórmula (7.7) é obtida ao aplicar-se a transformada inversa à fórmula (7.6).

Corolário 7.3 (transformada da derivada segunda): Seja f : (0, ∞) → R uma função duas
vezes derivável com f 00 (t) admissível. Então,
   
(7.10) L f 00 (t) = s2 · L[ f (t)] − s · f 0+ − f 0 0+ , s > k.

D EMONSTRAÇÃO : Com as hipóteses dadas, basta trocar f 0 por f 00 no teorema 7.1 duas vezes
para obter       
L f 00 (t) = L f 0 (t) = s L f 0 (t) − f 0+
  
= s · s · L[ f (t)] − f 0+ − f 0+
 
= s2 · L[ f (t)] − s · f 0+ − f 0 0+ ,
que é o resultado desejado.

Corolário 7.4: Seja f : (0, ∞) → R uma função k vezes derivável com f (k) admissível. Então,
h i    
L f (k)(t) = s k · L[ f (t)] − s k−1 · f 0+ − s k−1 · f 0 0+ − · · · − s · f (k−2) 0+ − f (k−1) 0+ ,

para s > k.
D EMONSTRAÇÃO : Basta usar os procedimentos adotados na demonstração do corolário 7.3
e usar indução em k.

Exemplo 7.1: Mostre que


1.7 Transformadas de Laplace da derivada e da integral 67

Z t

2
L sen (2x) dx = ·
0 s (s2 + 4)
S OLUÇÃO : Faça f (t) = sen (2t). Pela fórmula (3.7), com w = 2, do exemplo 3.8, tem-se que
2
L[ f (t)] = L[ sen (2t)] = ·
s2 + 4
Assim, usando a fórmula (7.4) do corolário 7.1, com f (t) = sen (2t), obtém-se
Z t 
F(s) 1
L f (x) dx = = · L[ f (t)]
0 s s
1 2
= · 2
s s +4
2 ,
=
s (s2 + 4)
que é o resultado desejado.

Exemplo 7.2: Determine a seguinte transformada inversa de Laplace


 
−1 s
L ·
(s − k)2
S OLUÇÃO : Novamente, não existe uma fórmula para uma aplicação direta. Será preciso de-
senvolver a expressão para a função que foi dada. Tem-se:
1 1 s−k s−k s k ,
= · = 2
= 2

s − k s − k s − k (s − k) (s − k) (s − k)2
isto é,
s 1 1
= + k ·
(s − k)2 s − k (s − k)2
As duas expressões no segundo membro acima têm fórmulas uso imediato: a inversa da
fórmula (3.6) do exemplo 3.7 e a fórmula (7.7) do corolário 7.2, respectivamente, sendo que
nesta última deve-se tomar n = 1. São elas:
   
1 kt n!
L −1
=e e L −1
= tn · e k t.
s−k (s − k)n+1
Deste modo, usando os procedimentos anteriores e a linearidade da inversa, encontra-se
   
−1 s −1 1 1
L =L +k
(s − k)2 s−k (s − k)2
   
−1 1 −1 1
=L +kL
s−k (s − k)2
68 1 Transformada de Laplace

= e kt + k · t · e kt

= e k t (kt + 1),
que é o resultado desejado.

Proposição 7.1 (valor inicial): Seja f : [0, ∞) → R uma função diferenciável com f 0 (t) ad-
missível. Se existirem os limites

lim f (t) e lim [ s · F(s)],


t→0+ s→∞

então

(7.11) lim f (t) = lim [ s · F(s)].


t→0+ s→∞

D EMONSTRAÇÃO : Pelo teorema 7.1, tem-se


   
(7.12) L f 0 (t) = s · L[ f (t)] − f 0+ = s · F(s) − f 0+ .

Como f 0 (t) é diferenciável e admissível, então


Z ∞
(7.13) lim e −st · f 0 (t) dt = 0.
s→∞ 0

Tomando-se limite para s → ∞ em (7.12), supondo que f (t) é contínua em t = 0, encontra-se


  
0 = lim s · F(s) − f 0+ ⇒ lim [ s · F(s)] = f 0+ = lim f (t).
s→∞ s→∞ t→0+

Se f (t) não for contínua em t = 0, o resultado ainda contínua verdadeiro, mas nesse caso
deve-se usar o teorema 7.1 em uma forma mais fraca: Seja f : (0, ∞) → R uma função derivável
com f 0 (t) admissível. Então

L[ f 0 (t)] = s · L[ f (t)] − f 0+ , s > k,

onde a f 0+ = lim f (t).
t→0+
A demonstração não será feita neste texto.

Proposição 7.2 (valor final): Seja f : [0, ∞) → R uma função diferenciável com f 0 (t) admis-
sível. Se existirem os limites

lim f (t) e lim [ s · F(s)] ,


t→∞ s→0

então
1.8 Derivada e integral da transformada de Laplace 69

(7.14) lim f (t) = lim [ s · F(s)] .


t→∞ s→0

D EMONSTRAÇÃO : Pelo teorema 7.1, tem-se que


  Z ∞
(7.15) L f 0 (t) = e −st · f 0 (t) dt = s · F(s) − f (0).
0

O limite no membro esquerdo de (7.15), quando s → 0, é


Z ∞ Z ∞
−st 0
lim e · f (t) dt = f 0 (t) dt
s→0 0 0
Z T
= lim f 0 (t) dt
T →∞ 0

= lim [ f (T ) − f (0)]
T →∞

= lim f (t) − f (0).


t→∞

O limite do lado direito de (7.15), quando s → 0, é

lim [ s · F(s)] − f (0).


s→0

Assim,
lim f (t) − f (0) = lim [ s · F(s)] − f (0),
t→∞ s→∞
ou, como requerido,
lim f (t) = lim [ s · F(s)] .
t→∞ s→0
Se f (t) não for contínua, o resultado ainda é verdadeiro, mas deve usar o teorema mencionado
na proposição 7.1 (valor inicial).

1.8 Derivada e integral da transformada de Laplace

Saber como derivar e integrar a função transformada de Laplace, além de importante, é muito
útil na prática. Este assunto será abordado na presente seção.

Proposição 8.1 (multiplicação por t n ): Seja f : [0, ∞) → R uma função admissível. Então,
dn
(8.3) L [t n · f (t)] = (−1)n · F(s) = (−1)n · F (n)(s).
ds n
70 1 Transformada de Laplace

Reciprocamente,
h i  n 
−1 d
(8.4) L −1
F (n)
(s) = L F(s) = (−1)n · t n · f (t).
ds n
D EMONSTRAÇÃO : Como f é admissível, sua transformada de Laplace está bem definida e é
dada por Z ∞
F(s) = e −st · f (t) dt.
0
Usando a regra de Leibniz (veja a proposição 12.1 no apêndice 1.12) para diferenciação sob
o sinal de integração, obtém-se
Z ∞
0 d d
F (s) = F(s) = e −st · f (t) dt
ds ds 0
Z ∞
∂  −st 
= e · f (t) dt
0 ∂s
Z ∞
= −t e −st · f (t) dt
0
Z ∞
=− e −st · [t · f (t)] dt
0

= −L [t · f (t)] .
Mostrou-se que
d
(8.5) L [t f (t)] = − F(s) = −F 0 (s),
ds
isto é, que o resultado é válido para n = 1.
Para o caso geral aplica-se indução matemática. Suponha que a fórmula (8.3) seja verdadeira
para n = k, isto é, assuma que
Z ∞ h i
(8.6) e −st · t ·k f (t) dt = (−1)k · F (k)(s).
0

Então, Z ∞ h i
d
e −st · t k · f (t) dt = (−1)k · F (k+1)(s),
ds 0
ou pela regra de Leibniz,
Z ∞ h i
k+1
− e −st
· t · f (t) dt = (−1)k · F (k+1)(s),
0

isto é,
Z ∞ h i
(8.7) e −st · t k+1 · f (t) dt = (−1)k+1 · F (k+1)(s).
0

Segue-se que, se (8.6) é verdadeiro, isto é, se a fórmula (8.3) se verifica para n = k, então
(8.7) é verdadeiro, ou seja, o resultado se verifica para n = k + 1. Mas por (8.5) a fórmula (8.3)
1.8 Derivada e integral da transformada de Laplace 71

é verdadeira para n = 1. Logo ela é verdadeira para n = 1 + 1 = 2, para n = 2 + 1 = 3, etc. E,


assim, ela é verdadeira para todos os valores de n natural.
A fórmula (8.5) é obtida ao aplicar-se a transformada inversa na fórmula (8.4).

Corolário 8.1 (divisão por t ): Seja f : [0, ∞) → R uma função admissível. Denote F(s) =
L[F(s)]. Então,
  Z ∞
f (t)
(8.8) L = F(u) du,
t s

desde que exista o limite


f (t)
lim ·
t→0 t
Reciprocamente,
Z 
−1
∞ f (t)
(8.9) L F(u) du = ·
s t
D EMONSTRAÇÃO : Seja g(t) = f (t)/t . Assim, f (t) = t g(t). Tomando a transformada de
Laplace em ambos os membros da última igualdade e usando a fórmula (8.4) da proposição
8.1, tomando n = 1, obtém-se
d
F(s) = L[ f (t)] = L[t · g(t)] = − L[g(t)] = −G0 (s),
ds
ou seja,
F(s) = −G0 (s) ⇒ G0 (s) = −F(s).
Assim, integrando ambos os membros na última igualdade, encontra-se
Z s Z ∞
(8.10) G(s) = − F(u) du = F(u) du,
∞ s

isto é, Z ∞   Z ∞
f (t)
L[G(s)] = F(u) du ⇒ L = F(u) du.
s t s
Observe-se que em (8.10) escolheu-se a “constante de integração” de tal modo que

lim G(s) = 0.
s→∞

Exemplo 8.1: Determine


 
L t · e 2t e L t 2 · e 2t
72 1 Transformada de Laplace

S OLUÇÃO : Recorde, primeiro, que


  1 ,
L e kt = s > k.
s−k
Assim, para k = 2, tem-se que
 1
L e 2t = ·
s−2
Usando a fórmula da proposição 8.1 (multiplicação por t n), obtém-se
 
2t
 d 1 1
L t ·e = − = ;
ds s − 2 (s − 2)2
 
2 2t
 d2 1 2
L t ·e = 2 = ·
ds s − 2 (s − 2)3

Exemplo 8.2: Mostre que


  2s3 − 6w2s
L t 2 · cos(wt) = 3
·
(s2 + w2 )

S OLUÇÃO : Pela fórmula (3.10) do exemplo 3.9, tem-se que


s ,
L[cos(wt)] = s > 0.
s2 + w2
Pela fórmula (8.4) da proposição 8.1, tomando n = 2, segue-se que
 
L t 2 · f (t) = F 00 (s),

que ao fazer f (t) = cos(wt), resulta em


 
 2
 d2 d2 s
L t · cos(wt) = 2 F(s) = 2 2
ds ds s + w2
"  #
d 1 · s2 + w2 − s (2s)
= 2
ds (s2 + w2)
" #
d −s2 + w2
=
ds (s2 + w2 )2
2  
−2s s2 + w2 − −s2 + w2 4s s2 + w2
= 4
(s2 + w2)
  
s2 + w2 −2s s2 + w2 − 4s −s2 + w2
= 4
(s2 + w2 )
1.8 Derivada e integral da transformada de Laplace 73

−2s3 − 2 w2s + 4s3 − 4w2s


= 3
(s2 + w2)
2s3 − 6 w2s ,
= 3
(s2 + w2 )
que é o resultado desejado.

Exemplo 8.3: Determine a seguinte transformada inversa de Laplace


!
3s + 6
L−1 2
·
(s2 + 4s + 13)
S OLUÇÃO : O leitor atento notará que não existe uma fórmula para aplicação imediata à
função dada. Neste caso, será necessário usar a fórmula (8.5), com n = 1, da proposição 8.1,
para a derivada de F(s). Observe, primeiro, que
  
d 1 0 · s2 + 4s + 13 − 1 · (2s + 4)
=
ds s2 + 4s + 13 (s2 + 4s + 13)
2

2(s + 2)
=− 2
·
(s2 + 4s + 13)
A expressão obtida ainda não é igual à função F(s) dada, porém ela difere por uma cons-
tante. O próximo passo consiste em multiplicar ambos os membros acima por uma constante
conveniente, no caso, multiplicar por −3/2. Tem-se:
   
3 d 1 3 2(s + 2) 3s + 6
− · = − − · = = F(s).
2 ds s2 + 4s + 13 2 (s2 + 4s + 13)2 (s2 + 4s + 13)2

A próxima etapa consiste em aplicar a fórmula (8.3) (que é a fórmula 25 da tabela) com n = 1,
isto é, h i
L−1 (−1)n F (n)(s) = t n · f (t) ⇒ −F 0 (s) = t · f (t),

onde f (t) = L−1[F(s)].


Antes, observe-se que f (t) já foi obtida no exemplo 5.4. Assim,
" #   
−1 3s + 6 3 d 1
L 2
= · −
(s2 + 4s + 13) 2 ds s2 + 4s + 13

= [fórmula (8.5) da proposição 8.1]


3
= · t · f (t)
2
= (resultado do exemplo 5.4)
74 1 Transformada de Laplace

 
3t 1 2t
= · e sen (3t) ,
2 3
t 2t
= · e · sen (3t),
2
que é o resultado desejado.

Exemplo 8.4: Mostre que  


 sen t  1
L = arc tg ·
t s

S OLUÇÃO : Recorde que


1 sen t
L( sent) = e lim = 1.
s2 + 1 t→0 t
Logo é possível aplicar o corolário 8.1 (divisão por t). Assim,
 sent  Z ∞  sen t 
L = L du
t s t
Z ∞  
du 1
= 2
= arc tg ·
s u +1 s

Exemplo 8.5: Encontre Z 


t sen u
L du .
0 u

S OLUÇÃO : Faça
sent
f (t) = e F(s) = L[ f (t)].
t
Pelo exemplo 8.4, tem-se que
 sen t   
1
F(s) = L = arc tg ·
t s
Além disso, pelo corolário 7.1 da seção anterior, tem-se que
Z t 
F(s) ,
L f (x) dx =
0 s
onde F(s) = L[ f (t)]. Assim, usando a fórmula acima do citado corolário, obtém-se
Z t   
sen x F(s) 1 1
L dx = = · arc tg ·
0 x s s s
1.8 Derivada e integral da transformada de Laplace 75

Exemplo 8.6: Mostre que Z ∞ Z ∞


f (t)
dt = F(u) du,
t 0 0
supondo que as duas integrais acima sejam convergentes. Em seguida, mostre que
Z ∞
sen t π
dt = ·
0 t 2

S OLUÇÃO : Pelo corolário 8.1 (divisão por t), tem-se


  Z ∞
f (t)
L = F(u) du.
t s

desde que exista o limite


f (t)
lim
·
t→0 t
Então tomando limite para s → 0+ , onde assume-se a hipótese de convergências das integrais,
segue-se imediatamente que Z ∞ Z ∞
f (t)
dt = F(u) du,
0 t 0
Agora faça f (t) = sen t. Pela fórmula 6 da tabela, segue-se que
1
F(s) = L( sent) = ·
s2 + 1
Portanto, pela fórmula que se demonstrou acima e pelo exemplo 8.4, obtém-se
Z ∞ Z ∞ Z ∞
sen t du
dt = F(u) du =
0 t 0 0 u2 + 1
Z T
du
= lim
T →∞ 0 u2 + 1
 T 

= lim arc tg u
T →∞ 0

= lim ( arc tg T − arc tg0)


T →∞

= lim arc tgT


T →∞
π
= ·
2
76 1 Transformada de Laplace

1.9 Problemas de valores iniciais

No final deste texto foi inserida uma tabela contendo os principais resultados obtidos e que
poderá ser utilizada pelo leitor para resolver problemas práticos. Assim, nesta seção serão apre-
sentados vários exemplos que mostram como resolver P.V.I. (Problemas de Valores Iniciais)
usando a transformada de Laplace.

Exemplo 9.1: Resolva o seguinte P.V.I.



 00
 y + y = t,

y(0) = 1,


 y0 (0) = −2.

S OLUÇÃO : Aplicando a transformada de Laplace em ambos os membros da equação diferen-


cial dada, obtém-se uma equação algébrica em Y (s) = L[y(t)]. Tem-se:

L y00 + y = L(t).

Usando a fórmula 2 da tabela com n = 1 no segundo membro e a linearidade da transformada,


obtém-se
 1
L y00 + L(y) = 2 ·
s
Agora aplica-se fórmula 24 para a transformada de Laplace da derivada segunda para obter
1
s2 Y (s) − s y(0) − y0 (0) + Y (s) = ·
s2
Com o uso das condições iniciais fornecidas no problema, encontra-se
1,
s2 Y (s) − s.1 − (−2) + Y (s) =
s2
ou seja,
 1
s2 + 1 Y (s) = s − 2 + 2 ,
s
que resolvida implica na seguinte solução
s−2 1
(9.3) Y (s) = 2
+ 2 2 ·
s + 1 s (s + 1)
A próxima etapa consiste em inverter a transformada para encontrar a solução y(t). O
primeiro quociente no segundo membro acima pode ser trabalhado diretamente com o uso da
fórmula 8 da tabela, mas o segundo quociente precisa ser desenvolvido antes para que se possa
aplicar fórmulas da tabela (pois não existe uma de aplicação direta).
Como o segundo quociente em um produto no denominador, então o desenvolvimento usará
o método de decomposição em frações parciais. Tem-se:
1.9 Problemas de valores iniciais 77

Figura 9.1: Gráfico de Y (s).

1 As + B Cs + D
(9.4) = + 2 ·
s2 (s2 + 1) s2 s +1
Assim, 
1 (As + B) s2 + 1 + s2 (Cs + D)
=
s2 (s2 + 1) s2 (s2 + 1)
(A + C) s3 + (B + D) s2 + A s + B ,
=
s2 (s2 + 1)
ou ainda,
0.s3 + 0.s2 + 0.s + 1 = (A + C) s3 + (B + D) s2 + A s + B.
Pela igualdade entre dois polinômios, segue-se que


 A+C = 0



B+D = 0

 A=0



B = 1

A solução deste sistema linear é simples, obtendo diretamente A = 0 e B = 1, que substituídos


nas duas primeiras equações resultam em C = 0 e D = −1. Agora substitui-se estes valores em
(9.4) para obter
78 1 Transformada de Laplace

1 1 1
(9.5) = − ·
s2 (s2 + 1) s2 s2 + 1
Com a substituição de (9.5) em (9.3), obtém-se
s−2 1
Y (s) = +
s2 + 1 s2 (s2 + 1)
s−2 1 1
= 2
+ 2− 2
s +1 s s +1
1 s−3
= + ·
s2 s2 + 12
Com Y (s) escrito na forma acima, basta aplicar a fórmula 2 da tabela com n = 1 e a fórmula
8 com A = 1, B = −3, k = 0 e w = 1, bem como a linearidade da transformada inversa, para
encontrar  
−1 −1 1 s−3
y(t) = L [Y (s)] = L +
s2 s2 + 12
   
−1 1 −1 s−3
=L +L
s2 s2 + 12
 
0.t 1.0 − 3
= t +e 1 · cos(1.t) + sen (1.t)
1

= t + cost − 3 sent,
que é a solução do problema proposto.

Exemplo 9.2: Resolva o seguinte problema de valores iniciais:



 00 0 −3t
 y + 4y + 5y = e
 · cost,
y(0) = 2,


 y0 (0) = 1.

S OLUÇÃO : O método é o mesmo que foi usado no exemplo anterior: aplicar a transformada
de Laplace em ambos os membros, sua linearidade, as condições iniciais e desenvolver o proble-
ma até obter uma solução para a equação algébrica. Tem-se:
 
L y00 + 4y0 + 5y = L e −3t cost ,

isto é,
  
L y00 + 4L y0 + 5L (y) = L e −3t cost .
Em seguida, aplica-se as fórmulas 23 e 24 da tabela no primeiro membro acima, bem como
a fórmula 7 no segundo membro, com k = −3 e w = 1, para escrever
1.9 Problemas de valores iniciais 79

Figura 9.2: Gráfico da solução y(t) = t + cost − 3 sent.

  s+3
s2Y (s) − s y(0) − y0 (0) + 4 [ sY (s) − y(0)] + 5Y (s) = ·
(s + 3)2 + 1
Usando as condições iniciais informadas, obtém-se
  s+3 ,
s2Y (s) − 2s − 1 + 4 [sY (s) − 2] + 5Y (s) =
(s + 3)2 + 1
ou ainda,
 s+3 ,
s2 + 4s + 5 Y (s) = 2s + 9 +
(s + 3)2 + 1
que resolvida implica em
2s + 9 s+3
Y (s) = + ·
s2 + 4s + 5 (s2 + 4s + 5)[(s + 3)2 + 1]

A expressão s2 + 4s + 5, por não possuir raízes reais, deve ser reescrita completando-se o
quadrado. Assim,

(9.6) s2 + 4s + 5 = s2 + 4s + 4 + 1 = (s + 2)2 + 12.
80 1 Transformada de Laplace

Deste modo,
2s + 9 s+3
(9.7) Y (s) = 2 2
+ ·
(s + 2) + 1 [(s + 2) + 12] [(s + 3)2 + 12 ]
2

Já o segundo termo no segundo membro de (9.7) deve ser desenvolvido através do método de
decomposição em frações parciais. Portanto,
s+3 s+3
=
[(s + 2)2 + 12 ] [(s + 3)2 + 12] (s2 + 4s + 5)(s2 + 6s + 10)

Figura 9.3: Gráfico de Y (s).

de modo que
s+3 As + B Cs + D
= +
(s2 + 4s + 5)(s2 + 6s + 10) s2 + 4s + 5 s2 + 6s + 10
 
(As + B) s2 + 6s + 10 + (Cs + D) s2 + 4s + 5
= ,
(s2 + 4s + 5) (s2 + 6s + 10)
donde segue que

s + 3 = (A + C) s3 + (6A + B + 4C + D)s2 + (10A + 6B + 5C + 4D) s + (10B + 5D) .

Assim, pela igualdade entre polinômios,




 A+C = 0



 6A + B + 4C + D = 0

 10A + 6B + 5C + 4D = 1



 10B + 5D = 3

é um sistema que deve ser resolvido.


Segue-se da primeira e quarta equações que
1.9 Problemas de valores iniciais 81

3 − 10B ,
(9.8) C = −A e D=
5
que substituídas nas segunda e terceira equações, resulta em
 3 − 10B

 6A + B − 4A + =0
5
 10A + 6B − 5A + 12 − 40B = 1,

5
ou ainda,  3 

 2A − B + = 0  10A − 5B + 3 = 0
5

 5A − 2B + 12 = 1,
  25A − 10B + 12 = 5,
5
Multiplicando a primeira equação do último sistema por −2 e somando com a segunda,
encontra-se
1
5A + 6 = 5 ⇒ A=− ·
5
Substituindo o valor de A que foi encontrado na primeira equação do último sistema, obtém-
se  
1 1
10 · − − 5B + 3 = 0 ⇒ B= ·
5 5
Agora substitui-se os valores de A e B em (9.8) para encontrar
1 1
C= e D= ·
5 5
Em seguida, aplica-se os valores para A, B, C e D nas frações parciais para escrever

s+3 − 51 s + 15 1 1
5 s+ 5
= +
[(s + 2)2 + 12 ] [(s + 3)2 + 12] s2 + 4s + 5 s2 + 6s + 10
− 15 s + 15 1
5 s+ 5
1
= +
(s + 2)2 + 12 (s + 3)2 + 12
1 s−1 1 s+1
(9.9) =− · + · ·
5 (s + 2)2 + 12 5 (s + 3)2 + 12
O próximo passo consiste em substituir (9.9) em (9.7) para escrever
2s + 9 s+3
Y (s) = +
(s + 2)2 + 12 [(s + 2)2 + 12] [(s + 3)2 + 12]
2s + 9 1 s−1 1 s+1
= 2 2
− · 2 2
+ ·
(s + 2) + 1 5 (s + 2) + 1 5 (s + 3)2 + 12
1 10s + 45 1 s−1 1 s+1
= · 2 2
− · 2 2
+ ·
5 (s + 2) + 1 5 (s + 2) + 1 5 (s + 3)2 + 12
1 9s + 46 1 s+1
(9.10) = · 2 2
+ · ·
5 (s + 2) + 1 5 (s + 3)2 + 12
82 1 Transformada de Laplace

Para finalizar, deve-se aplicar a linearidade da transformada inversa, bem como a fórmula 8
da tabela nos dois quocientes em (9.10), primeiro tomando naquela fórmula

A = 9, B = 46, k = −2 e w = 1,

depois tomando
A = 1, B = 1, k = −3 e w = 1,
ou seja, na ordem em que aparecem os dois quocientes no segundo membro em (9.10).
Portanto,
 
−1 −1 1 9s + 46 1 s+1
y(t) = L [Y (s)] = L · + ·
5 (s + 2)2 + 12 5 (s + 3)2 + 12
   
1 −1 9s + 46 1 −1 s+1
= ·L + ·L
5 (s + 2)2 + 12 5 (s + 3)2 + 12
 
1 −2t 9.(−2) + 46
= ·e 9. cos(1.t) + sen (1.t) +
5 1
 
1 −3t 1.(−3) + 1
+ ·e 1. cos(1.t) + sen (1.t)
5 1
1 −2t 1
= · e (9 cost + 28 sent) + e −3t (cost − 2 sent) ,
5 5
que é a solução do problema dado.

Exemplo 9.3: Resolva o seguinte P.V.I.


 (

 1, se 5 ≤ t < 20,

 2y00 + y0 + 2y =

 0, se 0 ≤ t < 5 e t ≥ 20,

 y(0) = 0,



 y0 (0) = 0.

S OLUÇÃO : Será necessário aplicar a transformada de Laplace em ambos os membros para


determinar a solução do problema proposto. Antes, é conveniente calcular a transformada da
função que aparece no segundo membro da equação, isto é,
(
1, se 5 ≤ t < 20,
f (t) =
0, se 0 ≤ t < 5 e t ≥ 20.

Para isso, escreve-se f através de combinações de funções de Heaviside do seguinte modo:


f (t) = 0 · [u0 (t) − u5 (t)] + 1 · [u5(t) − u20(t)] + 0 · u20(t)

= u5 (t) − u20(t).
1.9 Problemas de valores iniciais 83

Figura 9.4: Gráfico da solução y(t).

Portanto, a transformada para f é dada por


L[ f (t)] = L[u5(t) − u20(t)] = L[u5(t)] − L[u20(t)]

e −5s e −20s
= − ·
s s
Observe-se que a equação pode ser escrita na forma

2y00 + y0 + 2y = f (t).

Agora aplica-se a transformada de Laplace em ambos os membros, bem como todas as suas
propriedades associadas, para obter

L 2y00 + y0 + 2y = L[ f (t)],

que pela linearidade da transformada implica em


 
2 · L y00 + L y0 + 2 · L(y) = L[ f (t)],

ou ainda,
  e −5s e −20s
2 s2 Y (s) − s y(0) − y0 (0) + [sY (s) − y(0)] + 2Y(s) = − ·
s s
Em seguida, usa-se as condições iniciais fornecidas no enunciado do problema para obter
84 1 Transformada de Laplace

  e −5s e −20s ,
2 s2 Y (s) − s · 0 − 0 + [sY (s) − 0] + 2Y (s) = −
s s
que resulta em
e −5s e −20s ,
2s2 Y (s) + sY (s) + 2Y (s) = −
s s
ou seja
 e −5s e −20s
2s2 + s + 2 Y (s) = − ·
s s
Resolvendo a equação algébrica acima, encontra-se
1 1
(9.11) Y (s) = e −5s · − e −20s
· ·
s (2s2 + s + 2) s (2s2 + s + 2)
A próxima etapa é determinar a transformada inversa, mas antes será necessário usar decom-
posição em frações parciais no quociente que aparece em (9.11). Tem-se:
1 A Bs + C
= +
s (2s2 + s + 2) s 2s2 + s + 2

A 2s2 + s + 2 + (Bs + C) s
=
s (2s2 + s + 2)
(2A + B)s2 + (A + C)s + 2A ,
=
s (2s2 + s + 2)
donde segue-se que

0 · s2 + 0 · s + 1 = (2A + B)s2 + (A + C)s + 2A,

que pela igualdade entre polinômios se obtém o seguinte sistema




 2A + B = 0,

A + C = 0,


 2A = 1.

O sistema acima é simples de resolver e implica na seguinte solução:


1 1
A= , B = −1 e C=− ·
2 2
Portanto, tem-se que

1 A Bs + C
= + 2
s (2s2 + s + 2) s 2s + s + 2
1/2 −s − 1/2
= +
s 2s2 + s + 2
1 1 s + 1/2
= · − 2
2 s 2s + s + 2
1.9 Problemas de valores iniciais 85

1 1 s + 1/2
= · − h i
2 s 2 (s + 1/4)2 + √15/42
" #
1 1 s + 1/2 ,
(9.12) = · − √ 2
2 s (s + 1/4)2 + 15/4
onde completou-se o quadrado da seguinte maneira
 s 
2s2 + s + 2 = 2 s2 + + 1
2
  
2 s 1 15
=2 s + + +
2 16 16
 
 2 √ !2
1 15 
= 2 s+ + ·
4 4

Substituindo (9.12) em (9.11), obtém-se


1 1
Y (s) = e −5s · − e −20s ·
s (2s2 + s + 2) s (2s2 + s + 2)
" # " #
1 1 s + 1/2 1 1 s + 1/2
= e −5s · · − √  −e
−20s
· · − √ 
2 s (s + 1/4)2 + 15/4 2 2 s (s + 1/4)2 + 15/4 2

1 −5s 1 1 s + 1/2
= ·e · − · e −5s · √ 2 −
2 s 2 (s + 1/4)2 + 15/4
1 −20s 1 1 −20s s + 1/2
−·e · + ·e · √ 2
2 s 2 (s + 1/4)2 + 15/4
( " √ ! √ !#)
1 −5s 1 −5s t 15 1 15
= ·e · L(1) − · e · L e − /4 cos t + √ sen t −
2 2 4 15 4
( " √ ! √ !#)
1 −20s 1 −20s t 15 1 15
− ·e · L(1) + · e · L e − /4 cos t + √ sen t ·
2 2 4 15 4

onde usou-se a fórmula 8 da tabela em um dos passos acima, tomando A = 1, B = 1/2, k = −1/4

e w = 15/4.
Agora deve-se usar a seguinte fórmula para transformada de Laplace para funções des-
contínuas:
 
L−1 e −cs F(s) = uc (t) · f (t − c).
Assim, tomando a inversa em ambos os membros acima e usando a sua propriedade de linea-
ridade, obtém-se
86 1 Transformada de Laplace

1
y(t) = · u5(t) · 1 −
2
" √ ! √ !#
1 15 1 15
− · u5(t) · e − /4 cos
(t−5)
(t − 5) + √ sen (t − 5) −
2 4 15 4

1
− · u20(t) · 1 +
2
" √ ! √ !#
1 15 1 15
+ · u20(t) · e − /4
(t−20)
cos (t − 20) + √ sen (t − 20) ·
2 4 15 4

Fazendo " √ ! √ √ !#
1 1 t/4 15 15 15
g(t) = − · e cos t + sen t
2 2 4 15 4
a expressão para y(t) pode ser simplificada na seguinte forma

y(t) = u5(t) · g(t − 5) + u20 (t) · g(t − 20),

que é o resultado desejado.

Exemplo 9.4: Resolva o seguinte PVI:


 

 
 0, 0 ≤ t < 5,

 

 y00 + 4y = t − 5 ,

 5 ≤ t < 10,

 

 5
 1, t ≥ 10,





 y(0) = 0,


 0
y (0) = 0.

S OLUÇÃO : A função f dada por




 0, 0 ≤ t < 5,


t − 5,
f (t) = 5 ≤ t < 10,


 5
 1, t ≥ 10,

pode ser reescrita da seguinte forma:


t −5
f (t) = 0 · [u0 (t) − u5 (t)] + · [u5 (t) − u10 (t)] + 1 · u10(t)
5
t −5 t −5
(9.13) = · u5(t) − · u10(t) + u10 (t).
5 5
O objetivo é usar a fórmula 18 da tabela, que é
1.9 Problemas de valores iniciais 87

L [uc (t) f (t − c)] = e −cs F(s), s > k,

onde uc (t) é a função de Heaviside e F(s) = L[ f (t)]. Mas observe que o segundo termo no
último membro de (9.13) não se encontra em conformidade para o uso da fórmula citada; é
preciso manipular para que a mesma possa ser usada. Assim,
t −5 t −5
f (t) = · u5 (t) − · u10(t) + u10 (t)
5 5
1 1
= · (t − 5) · u5(t) − · (t − 5) · u10(t) + u10 (t)
5 5
1 1
= · (t − 5) · u5(t) − · [(t − 5 − 5) + 5] · u10(t) + u10 (t)
5 5
1 1
= · (t − 5) · u5(t) − · [(t − 10) + 5] · u10(t) + u10 (t)
5 5
1 1
= · (t − 5) · u5(t) − · (t − 10) · u10(t) − u10 (t) + u10(t)
5 5
1 1
= · (t − 5) · u5(t) − · (t − 10) · u10(t),
5 5
onde usou-se a técnica de somar e subtrair o mesmo número (± 5) em um dos passos acima,
bem como a operação distributiva para a função u10(t).
Agora aplica-se a transformada de Laplace em ambos os membros da última expressão
obtida, bem como a fórmula já indicada. Tem-se:
 
1 1
L[ f (t)] = L · (t − 5) · u5(t) − · (t − 10) · u10(t)
5 5
1 1
= · L [u5 (t) · (t − 5)] − · L [u10(t) · (t − 10)]
5 5
1 h i 1  
= · e −5s · L(t) − · e −10s · L(t)
5 5
1 e −5s 1 e −10s e −5s − e −10s ,
(9.14) = · − · 2 =
5 s2 5 s 5 s2
uma vez que L(t) = 1/s2 pela tabela.
Assim, a equação que deve ser resolvida pode ser reescrita na forma

y00 + 4y = f (t), y(0) = 0 e y0 (0),

que tendo a transformada aplicada em ambos os membros, resulta em



L y00 + 4y = L[ f (t)]

e −5s − e −10s ,
s2Y (s) − sy(0) − y0 (0) + 4Y (s) =
5 s2
de modo que
88 1 Transformada de Laplace

 e −5s − e −10s e −5s − e −10s 1


(9.15) s2 + 4 Y (s) = ⇒ Y (s) = · 2 2 ·
5 s2 5 s (s + 4)
O passo seguinte consiste em decompor o termo 1/[s2(s2+4)] em frações parciais. Tem-se:
1 As + B Cs + D
= + 2
s2 (s2 + 4) s2 s +4

(As + B) s2 + 4 + (Cs + D) s2
=
s2 (s2 + 4)
(A + C) s3 + (B + D) s2 + 4As + 4B ,
=
s2 (s2 + 4)
donde segue que

(A + C) s3 + (B + D) s2 + 4As + 4B = 1 = 0 · s3 + 0 · s2 + 0 · s + 1.

Assim, deve-se resolver o seguinte sistema:




 A + C = 0,



 B + D = 0,

 4A = 0,



 4B = 1,

que facilmente resulta em A = 0, B = 1/4, C = 0 e D = −1/4. Portanto,


 
1 1 1 1
= · − ·
s2 (s2 + 4) 4 s2 s2 + 4
Substituindo esta última expressão na última etapa de (9.15), obtém-se

e −5s − e −10s 1
Y (s) = · 2 2
5 s (s + 4)
 
e −5s − e −10s 1 1 1
= · · 2− 2
5 4 s s +4
    
1 −5s 1 1 −10s 1 1
= · e · 2− 2 −e · 2− 2 ·
20 s s +4 s s +4
Antes de aplicar a transformada inversa na última expressão obtida deve-se usar a tabela
(fórmula 2 com n = 1 e fórmula 4 com w = 2) para concluir que
     
−1 1 1 −1 1 1 −1 2 1
L 2
− 2 =L 2
− ·L 2
= t − · sen (2t).
s s +4 s 2 s +4 2
Portanto, pode-se reescrever a última expressão para Y (s) do seguinte modo:
1.9 Problemas de valores iniciais 89

   
1 −5s 1 1 −10s 1
(9.16) Y (s) = ·e · L t − · sen (2t) − · e L t − · sen (2t)
20 2 20 2
Para finalizar, usa-se a fórmula 18 da tabela, que é
 
L−1 e −cs F(s) = uc (t) f (t − c).

Aplicando a transformada inversa em (9.16) e usando a fórmula acima, encontra-se


 
1 1
y(t) = · u5 (t) · (t − 5) − · sen [2(t − 5)] −
20 2
 
1 1
− · u10(t) · (t − 10) − · sen [2(t − 10)]
20 2
 
1 1
= · u5 (t) · (t − 5) − · sen (2t − 10) −
20 2
 
1 1
− · u10(t) · (t − 10) − · sen (2t − 20)
20 2
1 1
= · u5 (t) · [2(t − 5) − sen (2t − 10)] − [2(t − 10) − sen (2t − 20)] ,
40 40
sendo a última expressão acima a solução do PVI dado.

Exemplo 9.5: Resolva o sistema de EDO


(
x0 = 2x − 3y,
y0 = y − 2x.

com as condições iniciais x(0) = 8 e y(0) = 3.

S OLUÇÃO : Aplica-se a transformada de Laplace em ambos os membros e em ambas as


equações, bem como as condições iniciais, para obter
( (
L(x0 ) = L(2x − 3y) sX(s) − x(0) = 2X(s) − 3Y (s)

L(y0) = L(y − 2x) sY (s) − y(0) = Y (s) − 2X(s)
( (
sX(s) − 8 = 2X(s) − 3Y (s) (s − 2)X(s) + 3Y (s) = 8

sY (s) − 3 = Y (s) − 2X(s) 2X(s) + (s − 1)Y (s) = 3

O último sistema acima deve ser resolvido para X(s) e Y (s). Para isto, multiplicar-se-á a
primeira equação por (s − 1) e a segunda por −3. Tem-se:
(
(s − 1)(s − 2)X(s) + 3(s − 1)Y (s) = 8(s − 1)
−6X(s) − 3(s − 1)Y (s) = −9
90 1 Transformada de Laplace

Somando-se as duas equações acima resulta em

[(s − 1)(s − 2) − 6] X(s) = 8(s − 1) − 9


 8s − 17
s2 − 3s − 4 X(s) = 8s − 17 ⇒ X(s) = ·
s2 − 3s − 4
O termo s2 − 3s − 4 tem b2 − 4ac = 9 + 16 > 0, logo deve-se determinar as raízes. Facilmente
verifica-se que as raízes são −1 e 4, de modo que s2 − 3s − 4 = (s + 1)(s − 4). Portanto,
8s − 17
X(s) = ·
(s + 1)(s − 4)
Antes de aplicar a transformada inversa em X(s), determinar-se-á a expressão para Y (s). Isso
pode ser feito com qualquer uma das equações dos sistemas acima. Aqui escolhe-se a equação
2X(s) + (s − 1)Y (s) = 3. Agora substitui-se a expressão encontrada para X(s). Tem-se:
8s − 17
2· + (s − 1)Y (s) = 3
(s + 1)(s − 4)
de modo que
16s − 34 ,
(s − 1)Y (s) = 3 −
(s + 1)(s − 4)
que implica em
3 16s − 34
(9.17) Y (s) = − ·
s − 1 (s + 1)(s − 1)(s − 4)
O próximo passo consiste em determinar x(t) a partir da expressão encontrada para X(s).
Antes, deve-se usar o método das frações parciais. Tem-se:
8s − 17 A B A(s − 4) + B(s + 1) ,
= + =
(s + 1)(s − 4) s + 1 s − 4 (s + 1)(s + 4)
ou seja,
(A + B)s + (−4A + B) = 8s − 17,
ou ainda, (
A + B = 8,
−4A + B = −17,
Multiplicando a segunda equação acima por −1 e somando o resultado obtido com a primeira
equação, obtém-se que A = 5. Substituindo o valor de A em qualquer uma das equações,
encontra-se B = 3. Assim,
5 3
X(s) = + .
s+1 s−4
Agora aplica-se a transformada inversa em ambos os membros e usa-se a fórmula 3 da tabela
para concluir que
x(t) = 5 e −t + 3 e 4t .
1.9 Problemas de valores iniciais 91

A etapa seguinte consiste em determinar y(t) a partir da expressão já obtida para Y (s). Antes
deve-se aplicar a decomposição em frações parciais em um de seus termos. Tem-se:
16s − 34 A B C
= + +
(s + 1)(s − 1)(s − 4) s + 1 s − 1 s − 4
A(s − 1)(s − 4) + B(s + 1)(s − 4) + C(s + 1)(s − 1)
=
(s + 1)(s − 1)(s − 4)
A(s2 − 5s + 4) + B(s2 − 3s − 4) + C(s2 − 1)
=
(s + 1)(s − 1)(s − 4)
(A + B + C)s2 + (−5A − 3B)s + (4A − 4B − C) ,
=
(s + 1)(s − 1)(s − 4)
donde segue-se que

(A + B + C)s2 + (−5A − 3B)s + (4A − 4B − C) = 0s2 + 16s − 34.

Portanto, deve-se resolver o seguinte sistema linear:



A+ B+C = 0


−5A − 3B = 16


 4A − 4B − C = −34

Este sistema será escalonado. Primeiro multiplica a primeira equação por 5 e que será somada
com a segunda, depois a primeira equação será multiplicada por −4 e o resultado somado com a
última equação. A etapa seguinte consiste em multiplicar a nova segunda equação, obtida após
o passo anterior, por 4 e somar com a nova terceira equação. Deste modo,
 
A+ B+C = 0 A+ B+C = 0

 

0 + 2B + 5C = 16 ⇒ 0 + 2B + 5C = 16

 

 0 − 8B − 5C = −34  0 + 0 + 15C = 30

O último passo mostra que C = 2, que substituído na segunda equação implica em B = 3,


resultando em A = −5 quando estes dois valores são substituídos na primeira equação do último
sistema. Portanto,
16s − 34 5 3 2
=− + + ·
(s + 1)(s − 1)(s − 4) s+1 s−1 s−4
Substituindo este último resultado em (9.17), obtém-se
 
3 5 3 2
Y (s) = − − + +
s−1 s+1 s−1 s−4
3 5 3 2
= + − −
s−1 s+1 s−1 s−4
92 1 Transformada de Laplace

5 2
− = ·
s+1 s−4
Agora aplica-se a transformada inversa em ambos os membros e usa-se a fórmula 3 da tabela
para concluir que
y(t) = L−1[Y (s)] = 5 e −t − 2 e 4t .
Portanto, a solução do sistema de EDO dado é
(
x(t) = 5 e −t + 3 e 4t ,
y(t) = 5 e −t − 2 e 4t .

1.10 Produto de transformadas e convolução

Em geral, a transformada de Laplace do produto de duas funções é diferente do produto das


transformadas destas funções. O mesmo vale em relação a transformada inversa. O exemplo a
seguir ilustra esta situação.

Exemplo 10.1: O objetivo deste exemplo é mostrar que, em geral, é falso que a transformada
do produto seja igual ao produto das transformadas. Em outras palavras, se f (t) e g(t) são duas
funções admissíveis, então

L [ f (t) · g(t)] 6= L[ f (t)] · L[g(t)].

Faça f (t) = 1 e g(t) = e t . Pelas fórmulas da tabela, 2 com n = 1 e 3 com k = 1, tem-se que
1  1 ,
L(1) = (s > 0) e L et = (s > 1).
s s−1
Note, agora, que
  1 ,
(10.3) L [ f (t) · g(t)] = L 1 · e t = L e t = (s > 1).
s−1
Por outro lado, tem-se que
 1 1 1
(10.4) L [ f (t)] · L [g(t)] = L(1) · L e t = · = ·
s s − 1 s(s − 1)
Portanto, segue-se de (10.3) e (10.4) que
1 1
L [ f (t) · g(t)) = 6= = L[ f (t)] · L[g(t)].
s − 1 s(s − 1)
1.10 Produto de transformadas e convolução 93

Sejam f , g : [0, ∞) → R duas funções para as quais existem as respectivas transformadas de


Laplace, L[ f (t)] e L[g(t)].
Deseja-se determinar uma função h tal que

(10.5) L[h(t)] = L[ f (t)] · L[g(t)].

Formalmente, aplicando a transformada de Laplace nas funções f e g, tem-se o seguinte:

L[h(t)] = L[ f (t)] · L[g(t)]


Z ∞  Z ∞

−sx −sy
= e f (x) dx e g(y) dy
0 0
ZZ
(10.6) = e −s (x+y) · f (x) · g(y) dx dy,
R 2+

onde

R 2+ = (x, y) ∈ R2 | x > 0 e y > 0
geometricamente R 2+ representa todo o primeiro quadrante do plano cartesiano.
Em seguida, realiza-se uma mudança de variáveis na última integral obtida do seguinte modo:

t = x+y e u = x.

A região de integração R 2+ é transformada em uma nova região e que será denotada por Ω.
Agora busca-se descrever esta região Ω. A partir da definição de R 2+, tem-se que x > 0 e que
y > 0. Logo, u = x > 0. Além disso,

t = x+y > x = u > 0 ⇒ t > u > 0.

Portanto, a nova região de integração é dada por



Ω = (t, u) ∈ R2 | t > u > 0 ,

que pode ser vista na figura 10.1.


Observe que a desigualdade t > u significa, geometricamente, que a região deve estar abaixo
da reta u = t. A desigualdade u > 0 signfica, geometricamente, que u não pode ser negativo na
nova região Ω (isto é, descarta-se os quadrantes segundo e terceiro). A desigualdade completa,
t > u > 0, significa, geometricamente, que a nova região tem que estar abaixo da reta u = t, que
nem u e nem t podem ser negativos (ou seja, o quarto quadrante também é descartado). Assim,
Ω é a região ilimitada no primeiro quadrante e abaixo da semi-reta u = t.
Antes de retornar a (10.4), é necessário determinar o jacobiano da mudança de variáveis.
Com as equações usadas para as novas variáveis é possível escrever x e y em função de t e de u,
ou seja,
( (
t = x + y, x = u,

u = x, y = t − u.
94 1 Transformada de Laplace

Figura 10.1: Gráfico da nova região de integração Ω.

Assim, o jacobiano da transformação, J, é dado por




xt xu 0 1

J= = = −1.

yt yu 1 −1

Observa-se que, ao usar a fórmula de mudanças de variáveis na integral dupla, deve-se usar
o valor absoluto do jacobiano, de modo que |J| = 1.
Retornando a expressão (10.6) e dando continuidade ao desenvolvimento, obtém-se
ZZ
L[h(t)] = e −s (x+y) · f (x) · g(y) dx dy,
R 2+
ZZ
= e −st · f (u) · g(t − u) · | J| dt du

ZZ
= e −st · f (u) · g(t − u) du dt

Z ∞Z t
= e −st · f (u) · g(t − u) du dt
0 0
Z ∞ Z t

−st
(10.7) = e · f (u) · g(t − u) du dt.
0 0

Comparando (10.5) com (10.7), conclui-se que


Z t
(10.8) h(t) = f (u) · g(t − u) du.
0

No caso da transformada de Laplace, as funções estão definidas apenas para valores positivos
de t, de modo que é possível estendê-las iguais a zero para valores negativos de t. Especifi-
camente, se f : [0, ∞) → R, então estenda esta função para todo R da seguinte maneira: seja
f : R → R definida por
1.10 Produto de transformadas e convolução 95

(
0, −∞ < t < 0,
f (t) =
f (t), 0 ≤ t < ∞.
Sem perda de generalidade, mantendo-se a mesma notação para f e g (isto é, o símbolo de
“barra”) para as funções estendidas, pode-se escrever a função h dada em (10.5) da seguinte
maneira Z ∞
h(t) = f (u) · g(t − u) du.
−∞
A integral acima é conhecida como o produto de convolução entre as funções f e g; ele é
denotado da seguinte forma
Z ∞
(10.9) ( f ∗ g)(t) = f (u) · g(t − u) du.
−∞

Portanto, o que mostrou-se, formalmente, nos procedimentos acima que vale a seguinte fór-
mula:

(10.10) L[( f ∗ g)(t)] = L[ f (t)] · L[g(t)] = F(s) · G(s),

que pode ser lido como “a transformada do produto de convolução entre duas funções é igual
ao produto das transformadas de cada uma delas”.
Naturalmente, vale a fórmula equivalente para a transformada inversa:

L−1 [F(s) · G(s)] = ( f ∗ g)(t).

Observação 10.1: na obtenção da fórmula (10.10), o ponto mais delicado é passar da integral
dupla para integrais iteradas, isto é, o uso do teorema de Fubini. Essa passagem é garantida pela
convergência absoluta da transformada de Laplace (veja o teorema 3.1 do Adendo A).

Observação 10.2: O produto de convolução é delicado. Por exemplo, o produto de duas


funções integráveis em R pode não ser integrável. Aqui será introduzido um espaço de funções,
dito L1 (R). Este espaço aparecerá diversas vezes neste texto. O leitor interessado em infor-
mações adicionais sobre este espaço poderá consultar o adendo B.

D EFINIÇÃO : Escrever-se-á L1(R) para representar a classe de funções f : R → R tais que f


e | f | são Riemann integráveis (R-integráveis), isto é,

L1(R) = { f : R → R | f e | f | R-integráveis} .

O que foi observado acima significa o seguinte: se f , g ∈ L1(R), então, em geral, não é
verdade que o produto f · g pertença ao espaço L1(R). O leitor interessado poderá consultar as
observações 1.2 e 1.3 do Adendo A, onde dois exemplos ilustram essa situação.
96 1 Transformada de Laplace

Como o produto de convolução para o espaço L1 (R) é um assunto delicado, então, para
garantir que ( f ∗ g) ∈ L1(R) é necessário usar hipóteses mais fortes:

Sejam f , g ∈ L1(R) com f contínua e limitada em R. Então a função y 7→ f (x − y) · g(y)


pertence ao espaço L1(R) para cada x ∈ R fixado.

Com as hipóteses acima é possível mostrar que f ∗ g é uma função contínua e limitada,
bem como dizer que ( f ∗ g) ∈ L1(R). Esse é um assunto delicado, mas será tratado aqui nesta
observação; seu estudo pode ser omitido em uma primeira leitura.

Sejam f , g ∈ L1(R), onde f é contínua e limitada em R. Então f ∗ g será uma função contínua
e limitada e tal que ( f ∗ g) ∈ L1(R). Além disso, vale a desigualdade:
Z ∞ Z ∞  Z ∞ 
| ( f ∗ g)(x)| dx ≤ | f (x)| dx |g(y)| dy .
−∞ −∞ −∞

De fato, Z ∞ Z ∞ Z ∞

| ( f ∗ g)(x)| dx = f (x − y) · g(y) dy dx
−∞ −∞
−∞
Z ∞ Z ∞ 
≤ | f (x − y) · g(y)| dy dx
−∞ −∞
Z ∞ Z ∞ 
= | f (x − y)| |g(y)| dy dx
−∞ −∞

= (teor. de Fubini)
Z ∞ Z ∞ 
= |g(y)| | f (x − y)| dx dy
−∞ −∞
Z ∞
 Z ∞

= | f (x)| dx |g(y)| dy .
−∞ −∞
Observa-se que em um dos passos acima foi usada a mudança de variáveis z = x − y, de modo
que dz = dx. Assim, Z Z
∞ ∞
| f (x − y)| dx = | f (z)| dz.
−∞ −∞
Como a variável de integração é “muda”, manteve-se x em vez de z, o que não muda o
resultado.
Por fim, observa-se o uso do teorema de Fubini, que é outro assunto delicado quando se trata
de funções integráveis no sentido de Riemann. O leitor interessado poderá consultar o Adendo
A para ver mais detalhes sobre este caso.

Proposição 10.1: Sejam f , g, h : R → R funções de L1 (R), sendo pelo menos uma delas
limi-tada. Então, o produto de convolução satisfaz as seguintes propriedades:
1.10 Produto de transformadas e convolução 97

(a) Comutatividade: ( f ∗ g)(t) = (g ∗ f )(t);

(b) Associatividade: [ f ∗ (g ∗ h)](t) = [( f ∗ g) ∗ h](t);

(c) Distributividade: [ f ∗ (g + h)](t) = ( f ∗ g)(t) + ( f ∗ h)(t).

D EMONSTRAÇÃO : Sem perda de generalidade, assume-se o produto de convolução entre f


e g do seguinte modo: Z ∞
( f ∗ g)(t) = f (t − u) g(u) du.
−∞
Para mostrar (a), faça a mudança de variáveis v = t − u (de modo que du = −dv) na integral
que define o produto de convolução. Assim,
Z ∞
( f ∗ g)(t) = f (t − u) · g(u) du
−∞
Z −∞
=− f (v) · g(t − v) dv

Z ∞
= f (v) · g(t − v) dv
−∞
Z ∞
= g(t − v) · f (v) dv
−∞

= (g ∗ f )(t).
O último termo na primeira linha acima deve ser olhado com atenção: na primeira integral,
quem varia de −∞ a +∞ é a variável u. Ao aplicar a mudança de variáveis, a nova variável v
passa variar de +∞ até −∞. Assim, o sinal de menos na segunda integral da primeira linha acima
deve-se ao sinal de “menos” da diferencial du = −dv. A passagem para a primeira integral da
segunda linha se deve a seguinte propriedade das integrais: ao trocar a ordem dos limites de
integração, a integral muda de sinal (de “mais” para “menos” e vice-versa). Já a última integral
acima foi obtida apenas mudando a ordem do produto entre as funções f e g.

Para (b), utilizar-se-á a definição do produto de convolução, uma mudança na ordem de inte-
gração (Fubini), a mudança de variáveis w = u − v (donde dw = du), bem como a parte (a) já
demonstrada. Tem-se:
  def. Z ∞
( f ∗ g) ∗ h (t) = [( f ∗ g)(t − u)] h(u) du
−∞
Z ∞
(a)
= h(t − u) · [( f ∗ g)(u)] du
−∞
Z ∞ Z ∞

def.
= h(t − u) · f (u − v) · g(v) dv du
−∞ −∞
Z Z 
(a) ∞ ∞
= h(t − u) · g(u − v) · f (v) dv du
−∞ −∞
98 1 Transformada de Laplace

Z ∞Z ∞
= g(u − v) · f (v) · h(t − u) dv du
−∞ −∞
Z ∞Z ∞
Fub.
= g(u − v) · f (v) · h(t − u) du dv
−∞ −∞
Z ∞ Z ∞

= f (v) · h(t − u) · g(u − v) du dv
−∞ −∞
Z ∞ Z ∞

= f (v) · h[t − (w + v)] · g(w) dw dv
−∞ −∞
Z ∞ Z ∞

= f (v) · h[(t − v) − w] · g(w) dw dv
−∞ −∞
Z Z 
(a) ∞ ∞
= f (v) · g[(t − v) − w] · h(w) dw dv
−∞ −∞
Z  
def. ∞
= f (v) · (g ∗ h)(t − v) dv
−∞
Z
(a) ∞  
= f (t − v) · (g ∗ h)(v) dv
−∞

def.  
= f ∗ (g ∗ h) (t).
Observa-se que, com as hipóteses fornecidas, o teorema de Fubini pôde ser usado correta-
mente.
A parte (c) decorre da propriedade de linearidade da integral. De fato, tem-se
  def. Z ∞
( f + g) ∗ h (t) = [( f + g)(t − u)] · h(u) du
−∞
Z ∞ 
= f (t − u) + g(t − u) · h(u) du
−∞
Z ∞ 
= f (t − u) · h(u) + g(t − u) · h(u) du
−∞
Z ∞ Z ∞
= f (t − u) · h(u) du + g(t − u) · h(u) du
−∞ −∞

def.
= ( f ∗ h)(t) + (g ∗ h)(t),
que demonstra a parte (c).

Observação 10.3: Observa-se que a multiplicação usual tem propriedades que o produto de
convolução não tem. Em geral, tem-se que ( f ∗ 1)(t) 6= f (t). De fato, por definição de con-
volução, tem-se
1.10 Produto de transformadas e convolução 99

Z t Z t
( f ∗ 1)(t) = f (t − u) · 1 du = f (t − u) du.
0 0
Agora faça f (t) = cost. Então,
Z t
( f ∗ 1)(t) = cos(t − u) du
0
t

= − sen (t − u) = − sen (t − t) − [− sen (t − 0]
0

= − sen 0 + sen t = sen t.


Segue-se daí que
( f ∗ 1)(t) = sen t 6= cost = f (t),
mostrando que ( f ∗ 1)(t) 6= f (t).

Observação 10.4: A observação anterior mostrou que, em geral, ( f ∗ 1)(t) 6= f (t). Agora será
mostrado que o produto de convolução f ∗ f nem sempre resulta em uma função não negativa.
Para ver isto, tomar-se-á a função f (t) = sen t como exemplo. Usando a definição de convolução
e a fórmula sen (a − b) = sen a · cos b − sen b · cosa, obtém-se
Z t Z t
( f ∗ f )(t) = f (t − u) · f (u) du = sen (t − u) · sen u du
0 0
Z t
= [ sen t · cos u − sen u · cost] · sen u du
0
Z t Zt
= sen t · sen u · cos u du − cost · sen 2u du
0 0
Z t Z t
= sen t sen u · cos u du − cost sen 2 u du
0 0
Z t Z t
1 − cos(2u)
= sen t sen u cos u du − cost du
0 0 2
Z t t Z t Z
1 1
= sen t sen u cos u du − · cost du + · cost cos(2u) du
0 2 0 2 0
Z sent t t
cost cost
= sen t x dx − ·u + sen (2u)
sen0=0 2 0 4 0
sent
x2 cost cost
= sen t · − · (t − 0) + [ sen (2t) − sen 0]
2 0 2 4
sen 2t − 02 t cost · sen (2t)
= sen t · − · cost +
2 2 4
sen 3t − t · cost cost · sen (2t)
= + ·
2 4
100 1 Transformada de Laplace

onde se fez a mudança de variáveis x = sen u (logo, dx = cost dt) em um dos passos acima.
Agora faça t = 2π . Tem-se:
( f ∗ f ) (2π ) = ( sen ∗ sen )(2π )

sen 3 (2π ) − (2π ) · cos(2π ) [cos(2π )] · sen (4π )


= +
2 4
[ sen (2π )]3 − (2π ) · cos(2π ) [cos(2π )] · sen (4π )
= +
2 4
03 − 2π · 1 1 · 0
= + = −π ,
2 4
mostrando que a função pode assumir valores negativos.

Exemplo 10.2: Use o método da convolução para determinar a transformada inversa de


Laplace para a seguinte função:
a
F(s) = 2 2 ·
s (s + a2)
S OLUÇÃO : A função dada pode ser reescrita na seguinte forma:

1 a
(10.11) F(s) = · 2 ·
s s + a2
2

Usando as fórmulas 2 (com n = 1) e 4 (com w = a) da tabela, tem-se:


1 a
= L(t) e = L[ sen(at)].
s2 t 2 + a2
Substituindo estas fórmulas em (10.11) e usando a fórmula (10.10) do teorema de convolução
(fórmula 21 da tabela), obtém-se
1 a
L[ f (t)] = F(s) = · 2
s s + a2
2

= L(t) · L[ sen(at)]

= L [t ∗ sen (at)] .
Por fim, aplica-se a transformada inversa em ambos os membros, ou seja,

L−1 L[ f (t)] = L−1 L[ t ∗ sen (at)] ⇒ f (t) = t ∗ sen (at),

que é a solução para o problema proposto. Caso seja de interesse obter uma expressão explícita
para a função f (t), então basta usar a definição de convolução e calcular a integral.
1.10 Produto de transformadas e convolução 101

Exemplo 10.3: Resolva o seguinte P.V.I.:



 00
 y + 4y = f (t),

y(0) = 3,



y0 (0) = −1.

S OLUÇÃO : A maneira inicial para resolver este P.V.I. é análoga ao que já foi visto, apenas em
etapa posterior aplica-se o método da convolução. Ou seja, inicia-se aplicando a transformada
direta em ambos os membros da equação, usando depois as condições iniciais. Tem-se:

L y00 + 4y = L[ f (t)]

s2Y (s) − sy(0) − y0 (0) + 4Y (s) = F(s)



s2Y (s) − 3s + 1 + 4Y (s) = F(s) ⇒ s2 + 4 Y (s) = 3s − 1 + F(s),
ou ainda,
3s − 1 F(s) 3s − 1 1
(10.12) Y (s) = 2
+ 2 = 2 + F(s) · 2 ·
s +4 s +4 s +4 s +4
Agora será usada a fórmula 8 da tabela, que é
  
As + B Ak + B
kt
= L e A cos(wt) + sen (wt) , w 6= 0 e s > k.
(s − k)2 + w2 w
com os valores A = 3, B = −1, k = 0 e w = 2.
A mesma fórmula pode ser usada para obter a inversa de 1/(s2+4), bastando tomar A = 0,
B = 1, k = 0 e w = 2.
Segue-se daí que
   
3s − 1 1 1 1
= L 3 cos(2t) − · sen (2t) e = L · sen (2t) .
s2 + 4 2 s2 + 4 2
Substituindo as duas últimas expressões em (10.12), bem como o teorema de produto de
convolução, obtém-se
3s − 1 1
Y (s) = 2
+ F(s) · 2
s +4 s +4
   
1 1
= L 3 cos(2t) − · sen (2t) + L[ f (t)] · L · sen (2t)
2 2
    
1 1
= L 3 cos(2t) − · sen (2t) + L f (t) ∗ · sen (2t)
2 2
  
1 1
= L 3 cos(2t) − · sen (2t) + f (t) ∗ · sen (2t) ·
2 2
Por fim, aplica-se a transformada inversa em ambos os membros para concluir que
102 1 Transformada de Laplace

 
1 1
y(t) = 3 cos(2t) − · sen (2t) + f (t) ∗ · sen (2t)
2 2
é a solução para o P.V.I. dado.

A seguir, resolve-se o mesmo problema apresentado no exemplo 9.2, porém usando o método
do produto de convolução.

Exemplo 10.4: Resolva o seguinte problema de valores iniciais usando o método do produto
de convolução: 
 00 0 −3t
 y + 4y + 5y = e
 cost,
y(0) = 2,


 y0 (0) = 1.

S OLUÇÃO : Este método inicia-se da mesma maneira que o procedimento anterior: aplicar
a transformada de Laplace em ambos os membros, sua linearidade, as condições de contorno
e desenvolver o problema até obter uma solução para a equação algébrica. Mas a partir desse
ponto há uma mudança nos procedimentos seguintes.
Assim sendo, tem-se:
 
L y00 + 4y0 + 5y = L e −3t cost ,
isto é,
  
L y00 + 4L y0 + 5L (y) = L e −3t cost .
Em seguida, aplica-se as fórmulas 23 e 24 da tabela no primeiro membro acima, bem como
a fórmula (7) no segundo membro, com k = −3 e w = 1, para escrever
  s+3
s2Y (s) − s y(0) − y0 (0) + 4 [ sY (s) − y(0)] + 5Y (s) = ·
(s + 3)2 + 1
Usando as condições iniciais informadas, obtém-se
  s+3 ,
s2Y (s) − 2s − 1 + 4 [sY (s) − 2] + 5Y (s) =
(s + 3)2 + 1
ou ainda,  s+3 ,
s2 + 4s + 5 Y (s) = 2s + 9 +
(s + 3)2 + 1
que resolvida implica em
2s + 9 s+3
Y (s) = + ·
s2 + 4s + 5 (s2 + 4s + 5)[(s + 3)2 + 1]

A expressão s2 + 4s + 5, por não possuir raízes reais, deve ser reescrita completando-se o
quadrado. Assim,

s2 + 4s + 5 = s2 + 4s + 4 + 1 = (s + 2)2 + 12.
1.10 Produto de transformadas e convolução 103

Deste modo,
2s + 9 s+3
Y (s) = + ·
(s + 2)2 + 12 [(s + 2)2 + 12] [(s + 3)2 + 12 ]
A partir desse ponto o procedimento para resolver o problema pelo método do produto de
convolução fica diferente. A ideia consiste em modificar sutilmente a expressão para Y (s) obtida
e escrever cada termo como a transformada de Laplace de funções presentes na tabela. Assim,
2s + 9 1 s+3
Y (s) = 2 2
+ · ·
(s + 2) + 1 [(s + 2) + 1 ] [(s + 3)2 + 12 ]
2 2

Usando a fórmula 8 da tabela, com valores convenientes para A, B, k e w de acordo com os


termos do segundo membro acima, pode-se escrever:
   
L[y(t)] = L e −2t (2 cost + 5 sent) + L e −2t sen t · L e −3t cost .

Em seguida, aplica-se a fórmula do produto das transformadas, escrevendo este como a trans-
formada do produto de convolução parar obter
    
L[y(t)] = L e −2t (2 cost + 5 sent) + L e −2t sen t ∗ e −3t cost .

Agora usa-se a linearidade da transformada para finalizar a solução do exemplo. Tem-se:


  
L[y(t)] = L e −2t (2 cost + 5 sent) + e −2t sen t ∗ e −3t cost ,

que tendo a inversa aplicada em ambos os membros resulta em


 
y(t) = e −2t (2 cost + 5 sent) + e −2t sen t ∗ e −3t cost ,

que é a solução do problema dado.

Observação 10.5: No exemplo 10.4, a solução y(t) contém um termo em sua expressão que
está escrito na forma do produto de convolução entre duas funções. Como o leitor já deve ter
notado, o produto de convolução entre duas funções descreve uma nova função, isto é, o produto
de convolução é uma maneira de representar funções. Assim, do ponto de vista da matemática,
a solução y(t) obtida no exemplo 10.4 faz sentido e está bem definida enquanto função.
Por outro lado, usando a definição de produto de convolução, pode-se escrever
  Z t
−2t −3t
e sen t ∗ e cost = e −2u · sen u · e −3(t−u) · cos(t − u) du.
0

Assim, o leitor poderá desenvolver a integral no segundo membro acima com a intenção de
expressar y(t) em termos de funções elementares. Para efeitos deste texto, a solução y(t) obtida
no exemplo 10.2 é considerada satisfatória.
104 1 Transformada de Laplace

Encerra-se esta seção com um breve comentário sobre o método da convolução para resolver
problemas de valores iniciais. Este método é muito mais simples, principalmente na parte fi-
nal da solução do problema. Porém a resposta sempre será dada através de uma ou mais in-
tegrais. Mas isto não significa problema, ao contrário, tais integrais podem ser facilmente re-
solvidas através de calculadora científica ou através de algum software que calcule integrais.
Mais: mesmo que a função no segundo membro da EDO seja arbitrária (sem ser representada
por funções elementares), ainda assim é possível dar a solução geral do P.V.I. em termos desta
função, o que não é possível quando se usa outros métodos com a transformada de Laplace.

1.11 Funções impulso

Em artigo de 1927, Dirac 12 (veja a referência [31] da bibliografia) introduziu um novo objeto
matemático da seguinte maneira: δ (t) é definida por
( Z ∞
+ ∞, se t = 0,
δ (t) = e δ (t) dt = 1.
0, se t 6= 0, −∞

Note que nenhuma função pode assumir o valor infinito, pois infinito não é número. Por
outro lado, é possível estender o domínio de δ e olhar para ele como uma função de fato:
δ : R ∪+ ∞ → R. Além disso, a exigência de que sua integral em R seja igual a 1 não faz sentido
Z ∞ Z 0
algum em qualquer teoria de integração conhecida atualmente, pois δ (t) dt = δ (t) dt +
Z ∞ −∞ −∞
δ (t) dt = 0 + 0 = 0.
0
Em seu artigo, Dirac escreve: “Se f (t) é qualquer função regular de t e c é qualquer número,
então Z ∞
f (t) δ (c − t) dt = f (c),
−∞
de modo que a operação de multiplicar por δ (c − t) e integrar em relação a t é equivalente
a operação de substituir t por c” [em f (t)]. Observa-se que a expressão no primeiro membro
acima parece com a fórmula do produto de convolução, mas o valor f (c) no segundo membro
é no mínimo curioso.
Matematicamente falando, o delta de Dirac não é tão simples como ele apresentou. Demorou
vários anos para dar um sentido rigoroso ao delta de Dirac, que foi apresentado pelo matemático
francês Schwartz,13 recebendo o nome de teoria das distribuições. Esta é uma teoria que gene-
raliza o conceito de função. Grosso modo, pode-se falar que toda função é uma distribuição,
mas a recíproca não é verdadeira, sendo o delta de Dirac um exemplo, pois não é função.
Não é objetivo deste texto entrar na teoria das distribuições, que é um assunto muito denso
e sofisticado, mas sim em usar o delta de Dirac em problemas práticos, de modo que será
12 Paul Adrien Maurice Dirac (1902 – 1984) foi um físico inglês.
13 Laurent Schwartz (1915 – 2002) foi um matemático francês.
1.11 Funções impulso 105

necessário saber qual é a sua transformada de Laplace. Mas antes disso, comentar-se-á sobre a
expressão usada por Dirac em seu artigo:
Z ∞
(11.3) f (x) δ (t − x) dx = f (t).
−∞

A condição Z ∞
δ (t) dt = 1
−∞
pode ser “justificada” olhando-se para a propriedade

(δ ∗ f )(t) = ( f ∗ δ )(t) = f (t),

ou ainda, Z ∞ Z ∞
f (x) δ (t − x) dx = f (t − x) δ (x) dx = f (t),
−∞ −∞
donde seria “natural” fazer f (t) = 1, de modo que a expressão acima implicaria em
Z ∞ Z ∞
δ (t − x) dx = δ (x) dx = 1.
−∞ −∞

Não tem rigor algum no que foi descrito acima, mas possivelmente a conclusão que a integral
em R do delta de Dirac tem valor 1 teve como motivação o produto de convolução entre duas
funções.
Não se pretende, aqui, introduzir o delta de Dirac, mas apenas dar uma ideia sobre com ele
pode ser pensado. Começa-se com uma sequência de funções, em particular, que satisfaz (11.3)
e que se aproxima do δ (t). Considere a sequência de funções definidas por

 n 1 1
 , se − ≤ t ≤ ,
un(t) = 2 n n


0, caso contrário.

O leitor é convidado a esboçar o gráfico das primeiras funções da sequência un(t); por exem-
plo, atribuindo valores para n = 1, 2, 3, 4. Se n = 1, então a função u1 (t) assume o valor cons-
tante e igual a 1/2 no intervalo fechado [−1, 1], ficando igual a zero fora deste intervalo. Para
n = 2 a função u2 (t) assume o valor constante e igual a 2 no intervalo fechado [−1/2, 1/2] e
restando igual a zero fora dele. E assim por diante.
À medida que o valor de n vai aumentando, os gráficos das funções assumem valores cons-
tantes cada vez maiores, enquanto os comprimentos dos intervalos em que as funções não se
anulam vão ficando cada vez menores. Fazendo n → ∞, tem-se que a sequência un(t) “tende”
para + ∞ e o comprimentos dos intervalos [−1/n, 1/n] “tende” para zero, ou seja, para a origem.
Além disso, também se tem
Z ∞ Z −1/n Z 1/n Z ∞
un (t) dt = un (t) dt + un (t) dt + un (t) dt
−∞ −∞ −1/n 1/n
106 1 Transformada de Laplace

Z Z 1/n Z ∞
−1/n
n
= 0 dt + dt + 0 dt
−∞ 2
−1/n 1/n

Z 1/n 1   
n n /n n 1 1
= dt = · x = · − −
2 −1/n 2 −1/2 2 n n
n 2
· = 1,
=
2 n
de modo que o valor da integral de cada função da sequência un(t) é sempre igual a 1.
Observe também que as funções un (t) são pares, isto é, un (−t) = un (t).14 Assim,
un(t − x) = un[−(−t + x)]

= un[−(x − t)]

= (paridade de un (x)) = un (x − t).


Além disso, observe que a sequência de funções un (x − t), obtida pela translação das funções
un (x), são dadas por

 n 1 1
 , se t − ≤ x ≤ t + ,
un(x − t) = 2 n n


0, caso contrário,

pois segue-se de −1/n ≤ x − t ≤ 1/n que t − 1/n ≤ x ≤ t + 1/n.


Agora avança-se um pouco mais, deseja-se investigar o que ocorre com a expressão dada em
(11.3). Seja f : R → R uma função seccionalmente contínua. Então,
Z ∞ Z ∞
f (x) un (t − x) dx = f (x) un (x − t) dx
−∞ −∞

= (pela observação anterior)


Z t−1/n Z t+1/n
= f (x) un (x − t) dx + f (x) un (x − t) dx +
−∞ t−1/n
Z ∞
+ f (x) un (x − t) dx
t+1/n
Z t−1/n Z t+1/n Z ∞
n
= f (x) · 0 dx + f (x) · dx + f (x) · 0 dx
−∞ t−1/n 2 t+1/n
Z t+1/n
n
(11.4) = f (x) dx.
2 t−1/n

Agora aplica-se o teorema do valor médio, que diz o seguinte: Se f : [a, b] → R é contínua,
Z b
então existe c ∈ (a, b) tal que f (t) dt = f (c) · (b − a). Assim sendo, com as hipóteses já
a

14 Veja a seção 2.5 e o exemplo 5.5, ambos do capítulo 2, para mais detalhes.
1.11 Funções impulso 107

dadas, segue-se que existe tn ∈ (t − 1/n, t + 1/n) tal que


Z t+1/n      
1 1 1 1 2
f (x) dx = f (tn ) · t + − t− = f (tn ) · + = f (tn ) · ·
t−1/n n n n n n
Aplicando este último resultado no último membro de (11.4), obtém-se
Z ∞
n 2
f (x) un (x − t) dx = · f (tn ) · = f (tn ).
−∞ 2 n
Agora observe que tn converge para t quando n → ∞. Isto segue de
   
1 1 1 1 ,
t − ≤ tn ≤ t + ⇒ lim t − ≤ lim tn ≤ lim t +
n n n→∞ n n→∞ n→∞ n
agora usa-se o teorema do sanduíche para concluir que lim tn = t.
n→∞
Portanto, Z ∞
lim f (x) un (x − t) dx = lim f (tn ) = f (t).
n→∞ −∞ n→∞

O que se fez aqui, através de um exemplo, é exibir uma sequência un (t) satisfazendo
(
∞, se t = 0,
lim un (t) =
n→∞ 0, caso contrário.

e que é tal que Z ∞


lim f (x) un (x − t) dx = f (t).
n→∞ −∞

Observação 11.1: Como foi dito, o que se fez anteriormente não tem rigor. Mas cabe obser-
var que a sequência tomada como exemplo depende apenas de n (e não de n e t). Assim, para
uma sequência arbitrária e dependendo n e t, a ideia de usar o teorema do valor médio também
deve ser ampliada, isto é, será necessário usar o segundo teorema do valor médio para integrais,
que diz: Sejam f , g : [a, b] → R, com f contínua, g integrável, g ≥ 0 e satisfazendo
Z b
g(t) dt > 0.
a

Então, existe c ∈ (a, b) tal que


Z b Z b
f (t) g(t) dt = f (c) g(t) dt.
a a

Uma adaptação para o caso geral ficaria assim: Seja f seccionalmente contínua. Seja ϕ :
R → R uma função com suporte compacto (ϕ é nula fora de um intervalo fechado e limitado)
satisfazendo:

a) ϕ (t) ≥ 0 para todo t ∈ R;

b) ϕ é uma função par, isto é, ϕ (−t) = ϕ (x) para todo t ∈ R.


108 1 Transformada de Laplace

Z ∞
c) ϕ (t) dt = 1.
−∞

Agora defina uma sequência {ϕn (t)} a partir de ϕ , fazendo ϕn (t) = n · ϕ (nt). A sequência
{ϕn (t)} tem as seguintes propriedades

lim ϕn (t) = 0, para t 6= 0,


n→∞

lim ϕn (t) = +∞, para t = 0.


n→∞
Seja an > 0, com an ≥ an+1 e tais que lim an = 0. Suponha que (−an, an ) sejam os intervalos
n→∞
onde ϕn (x) não se anula. Então, (t − an , t + an ) serão os intervalos onde ϕn (x−t) não se anulará.
Além disso, tem-se que Z t+an
ϕn (x − t) dx = 1.
t−an
Deste modo, seguindo os passos do exemplo inicial, obtém-se
Z ∞ Z t−an Z t+an
f (x) ϕn (x − t) dx = f (x) ϕn (x − t) dx + f (x) ϕn (x − t) dx+
−∞ −∞ t−an
Z ∞
+ f (x) ϕn (x − t) dx
t+an
Z t−an Z t+an Z ∞
= f (x) · 0 dx + f (x) ϕn (x − t) dx + f (x) · 0 dx
−∞ t−an t+an
Z t+an
= f (x) ϕn (x − t) dx.
t−an

É neste ponto que se usa o segundo teorema do valor médio para integrais, que deixa a última
expressão do seguinte jeito: para cada n ∈ N, existem tn ∈ (t − an , t + an) tais que
Z ∞ Z t+an
f (x) ϕn (x − t) dx = f (x) ϕn (x − t) dx
−∞ t−an
Z t+an
= f (tn ) ϕn (x − t) dx
t−an

= f (tn ),
pois o valor da integral de cada ϕn (x − t), no intervalo (t − an, t + an), é igual a 1.
Agora toma-se limite para n → ∞. Tem-se
Z ∞
lim f (x) ϕn (x − t) dx = lim f (tn ) = f (t).
n→∞ −∞ n→∞

Mais uma vez justifica-se que lim f (tn ) = f (t) usando o teorema do sanduíche, ou seja, que
n→∞

t − an ≤ t n ≤ t + an ⇒ lim (t − an ) ≤ lim tn ≤ lim (t + an) ,


n→∞ n→∞ n→∞

uma vez que lim an = 0.


n→∞
1.11 Funções impulso 109

Mesmo sem rigor, o que se viu foi que


Z ∞
lim f (x) ϕn (x − t) dx = f (t).
n→∞ −∞

Porém é preciso compreender que o limite no primeiro membro acima não pode ser passado
para dentro do sinal de integral. Se o limite for passado para dentro da integral, então acontece
o seguinte: Z h i Z
∞ ∞
f (x) lim ϕn (x − t) dx = f (x) · 0 dx = 0,
−∞ n→∞ −∞
pois a ϕn (t) satisfaz lim ϕn (t) = 0 para t 6= 0, de modo que lim ϕn (x − t) = 0 para x 6= t. Para
n→∞ n→∞
x = t, tem-se que lim ϕn (x) = + ∞; neste caso, a integral não faz sentido.
n→∞
Em resumo:
Z ∞ Z ∞ h i
lim f (x) ϕn (x − t) dx = f (t) e f (x) lim ϕn (x − t) dx = 0,
n→∞ −∞ −∞ n→∞

ou seja, Z ∞ Z ∞ h i
lim f (x) ϕn (x − t) dx 6= f (x) lim ϕn (x − t) dx.
n→∞ −∞ −∞ n→∞

Com isso, conclui-se que o delta de Dirac não é limite de uma sequência de funções. É
importante compreender esse ponto, pois o que se fez foi mostrar como é possível aproximar o
delta de Dirac por sequências de funções.
O leitor interessado em uma justificativa rigorosa para o que foi apresentado aqui poderá
consultar o apêndice 4 deste capítulo.

Agora retorna-se a fórmula (11.3), que será usada para deduzir outras fórmulas para a trans-
formada de Laplace. Tem-se que
Z ∞
f (t) δ (t − c) dt = f (c).
−∞

Como a transformada de Laplace está definida no intervalo (0, ∞), pode-se pensar, sem perda
de generalidade, que a função f da fórmula acima está definida da seguinte forma: vale 0 para
t ∈ (−∞, 0] e vale f (t) para t ∈ (0, ∞). Dessa forma, a integral acima fica assim:
Z ∞
f (t) δ (t − c) dt = f (c).
0

Por outro lado, aplicando a definição de transformada de Laplace no delta de Dirac, tem-se
Z ∞
L[δ (t − c)] = e −st δ (t − c) dt.
0

Comparando as duas últimas fórmulas, conclui-se que a função exponencial corresponde a


função f , ou seja, que f (t) = e −st . Segue-se daí que
Z ∞
L[δ (t − c)] = e −st δ (t − c) dt = e −cs
0
110 1 Transformada de Laplace

ou seja,

(11.5) L[δ (t − c)] = e −cs.

Outra fórmula útil ocorre quando o delta de Dirac atua sobre outra função, ou seja, quando o
delta de Dirac aparece multiplicando uma função: f (t) δ (t − c). Fazendo g(t) = f (t) δ (t − c) e
usando a definição de transformada de Laplace, obtém-se
Z ∞
L[ f (t) δ (t − c)] = e −st f (t) δ (t − c) dt
0
Z ∞
= g(t) δ (t − c) dt = g(c)
0


= e −st f (t) = e −sc f (c),
t=c

ou seja,

(11.6) L[ f (t) δ (t − c)] = f (c) · e −cs .

Exemplo 11.1: Resolva o seguinte P.V.I.:



00 0
 y + 2y + 2y = 2δ (t − π ),


y(0) = 0,


 y0 (0) = 0.

S OLUÇÃO : Pode-se interpretar este problema assim: ele representa um sistema sem excitação
até o instante t = π , neste instante o sistema recebe um impulso de intensidade 2. Agora deseja-
se analisar a influência deste impulso na solução do problema. Para ajudar mais um pouco:
pode-se pensar no problema acima como um sistema massa-mola que no instante t = π recebeu
uma carga externa muito forte, ou em um circuito LRC onde uma tensão inesperada (“pico de
energia”) surge quando t = π .
Como se sabe, a ordem de uma EDO é igual a ordem da derivada de maior ordem presente
na equação. No caso do problema dado, a EDO é de segunda ordem. Sabe-se também que
solução clássica é aquela que tem regularidade igual a ordem da equação. Assim, poder-se-ia
esperar que a solução do problema dado seja de classe C2 , isto é, duas vezes continuamente
diferenciável. Mas aqui não é o caso. Isto não pode ser esperado, uma vez que no segundo
membro aparece o delta de Dirac, que não é função.
Aliás, chama-se atenção do leitor para a natureza das derivadas no primeiro membro: se no
segundo membro aparece uma distribuição e que não é função, então as derivadas e funções que
aparececem no primeiro membro não podem ser entendidas no sentido clássico, não são como
as derivadas que aparecem em Cálculo. Elas precisam ser compreendidas também no sentido
das distribuições; grosso modo, estas derivadas “são diferentes e especiais”. Assim sendo, até
soluções descontínuas podem aparecer.
1.11 Funções impulso 111

Agora passa-se a resolução do problema pelo método de Laplace. Aplica-se a transformada


em ambos os membros, usa-se a fórmula (11.5) e outras fórmulas da tabela, bem como as
condições iniciais. Tem-se:

L y00 + 2y0 + 2y = L[2δ (t − π )]
2 
s Y (s) − sy(0) − y0 (0) + 2 [sY (s) − y(0)] + 2Y (s) = 2 e −π s
 1
s2 + 2s + 2 Y (s) = 2 e −π s ⇒ Y (s) = 2 e −π s · ·
s2 + 2s + 2
Como s2 + 2s + 2 tem b2 − 4ac < 0, então deve-se completar o quadrado. Tem-se:

s2 + 2s + 2 = (s2 + 2s + 1) + 1 = (s + 1)2 + 1.

Portanto a expressão para Y (s) fica assim


1
Y (s) = 2 e −π s · ·
(s + 1)2 + 1

Figura 11.1: Gráfico de Y (s).

A etapa seguinte consiste em aplicar a transformada inversa. Mas antes, observe-se que será
necessário usar a fórmula da segunda translação (fórmula 18 da tabela); a saber
 
L−1 e −cs F(s) = uc (t) f (t − c),
112 1 Transformada de Laplace

onde F(s) = L[ f (t)].


Fazendo
1 ,
F(s) =
(s + 1)2 + 1
segue-se da fórmula 8 da tabela, com A = 0, B = 1, k = −1 e w = 1, que

f (t) = e −t sen t,

onde esta função terá que ser transladada por c = π .


Assim,  
−1 −1 −π t 1
y(t) = L [Y (s)] = 2 · L e ·
(s + 1)2 + 1

= 2 · uπ (t) · f (t − π )
h i
= 2 · uπ (t) e −(t−π ) sen (t − π ) ,
ou ainda, 

 0, se t < π ,
y(t) = h i

 2 uπ (t) e −(t−π ) sen (t − π ) , se t ≥ π .
A solução acima pode ser assim interpretada: o sistema está em repouso até t = π , neste
instante o sistema recebeu um impulso de intensidade 2. A influência desse impulso faz com
que y(t) sofra uma oscilação (veja o papel da função seno na solução), mas fazendo com que
instantes depois y(t) volte a se estabilizar. Isso pode ser visto a partir da exponencial que aparece
na solução e que tem potência negativa, logo com decaimento ao longo do tempo. Veja o gráfico
da solução do P.V.I. dado na figura abaixo.

Figura 11.2: Gráfico da solução y(t).

Exemplo 11.2: Encontre a solução do seguinte P.V.I.:


1.11 Funções impulso 113


 00 0
 2y + y + 2y = δ (t − 5),

y(0) = 0,



y0 (0) = 0.

S OLUÇÃO : Para resolver o problema, aplica-se a transformada em ambos os membros e, depois,

as condições iniciais. Tem-se:



L y00 + y0 + 2y = L[δ (t − 5)]
 
2 2s2Y (s) − sy(0) − y(0) + [sY (s) − y(0)] + 2Y (s) = e −5s

2s2 + s + 2 Y (s) = e −5s,
ou ainda,
1
(11.7) Y (s) = e −5s · ·
2s2 + s + 2

Figura 11.3: Gráfico de Y (s).

Como 2s2 + s + 2 tem b2 − 4ac < 0, então completa-se o quadrado. Assim,


    
2 2 s 2 s 1 1
2s + s + 2 = 2 s + + 1 ⇒ 2 s + + − +1
2 2 16 16
"  #
1 2 15 h √ 2 i
2 s+ + ⇒ 2 (s + 1/4)2 + 15/4 ,
4 16

de modo que
114 1 Transformada de Laplace

1 1
= h √ 2 i ·
2s2 + s + 2 2 (s + 1/4)2 + 15/4

Substituindo esta última expressão em (11.7), obtém-se


1 1 −5s 1
Y (s) = e −5s · h √ 2 i = 2 · e · √ 2 ·
2 2
2 (s + 1/4) + 15/4 (s + 1/4) + 15/4

Observe-se que a última expressão tem a forma da fórmula 18 da tabela (2a translação), que
diz
 
L [uc (t) · f (t − c)] = e −cs · F(s) e L−1 e −cs · F(s) = uc(t) · f (t − c),
para s > k e onde F(s) = L[ f (t)].
Para continuar, é necessário determinar a função f (t). Para isto, usa-se a fórmula 8 da tabela,

fazendo A = 0, B = 1, k = −1/4 e w = 15/4. Tem-se:
" # √ ! √ !
1 1 15 4 15
L−1
−t/4
t = √ · e /4 · sen
−t
√ 2 = e · √15 · sen t
2
(s + 1/4) + 15/4 /4 4 15 4

Aplicando a transformada inversa em ambos os membros, bem como a segunda fórmula de


translação, com c = 5, obtém-se
√ !
1 1 4 −t/4 15
y(t) = u5 (t) f (t − 5) = · u5 (t) · √ · e · sen t
2 2 15 4
t−5
"√ #
2 15
(t − 5) ,
−(t−5)/4
= √ · u5(t) · e · sen
15 4

que é a solução desejada.

Figura 11.4: Gráfico da solução y(t)); note que os eixos estão fora de escala.

Exemplo 11.3: Encontre a solução do seguinte P.V.I.:


1.11 Funções impulso 115


 00 0
 y + 2y + 3y = sen t + δ (t − 3π ),

y(0) = 0,



y0 (0) = 0.

S OLUÇÃO : Aplica-se a transformada em ambos os membros, usando a sua linearidade, fórmu-

las da tabela. bem como as condições iniciais. Tem-se:



L y00 + 2y0 + 3y = L( sent) + L[δ (t − 3π ),
1
s2Y (s) − sy(0) − y0 (0) + 2[sY (s) − y(0)] + 3Y (s) = + e −3π s,
s2 + 1
1
(s2 + 2s + 3)Y (s) = 2
+ e −3π s,
s +1
ou seja,
1 −3π s 1
Y (s) = + e · ·
(s2 + 2s + 3)(s2 + 1) s2 + 2s + 3
O próximo passo consiste em decompor o primeiro termo do segundo membro acima em
frações parciais. Tem-se:
1 As + B Cs + D
= +
(s2 + 2s + 3)(s2 + 1) s2 + 2s + 3 s2 + 1
(As + B)(s2 + 1) + (Cs + D)(s2 + 2s + 3)
=
(s2 + 2s + 3)(s2 + 1)
(A + C)s3 + (B + 2C + D)s2 + (A + 3C + 2D)s + (B + 3D) ,
=
(s2 + 2s + 3)(s2 + 1)
de modo que

(A + C)s3 + (B + 2C + D)s2 + (A + 3C + 2D)s + (B + 3D) = 0s3 + 0s2 + 0s + 1.

Portanto, em virtude da igualdade acima, deve-se resolver o seguinte sistema:




 A + C = 0,



 B + 2C + D = 0,

 A + 3C + 2D = 0,



 B + 3D = 1.

Da primeira equação, segue-se que C = −A e da quarta equação, segue-se que B = 1 − 3D.


Substituindo C e B na segunda e na terceira equações, obtém-se
( (
1 − 3D − 2A + D = 0, 2A + 2D = 1,

A − 3A + 2D = 0. 2A − 2D = 0.
116 1 Transformada de Laplace

A soma das duas últimas equações implica em A = 1/4, que substituído em uma das equações
acima resulta em D = 1/4. Como C = −A e B = 1 − 3D, segue-se daí que C = −1/4 e B = 1/4.
Portanto,
1 1 s+1 1 s−1
2 2
= · 2 − · 2 ·
(s + 2s + 3)(s + 1) 4 s + 2s + 3 4 s + 1
Além disso,
s2 + 2s + 3 = (s2 + 2s + 1) + 2 = (s + 1)2 + 2.
Desse modo,
1 1 s+1 1 s−1
= · − · ·
(s2 + 2s + 3)(s2 + 1) 4 (s + 1) + 2 4 (s + 0)2 + 1
2

Portanto,
1 s+1 1 s−1 1
Y (s) = · 2
− · 2
+ e −3π s · ·
4 (s + 1) + 2 4 (s + 0) + 1 (s + 1)2 + 2
Para a determinação de y(t) deve-se aplicar a transformada inversa de Laplace em ambos os
membros acima e usar as fórmulas 8 e 18 da tabela. Para o primeiro, toma-se A = 1, B = 1,

k = −1 e w = 2. Para o segundo termo acima, toma-se A = 1, B = −1, k = 0 e w = 1. Para o

terceiro termo, toma-se A = 0, B = 1, k = −1 e w = 2.
Observe também que
 
−3π s 1 −3π s 1 −t √
e · =e · L √ e sen ( 2t)
(s + 1)2 + 2 2
√ √
sendo f (t) = (1/ 2) e −t sen ( 2t) a função que se usa na fórmula 18 da tabela e que deve ser
transladada com c = 3π .
Assim,
1 −t √ 1
y(t) = L−1[Y (s)] = · e cos( 2t) − · (cost − sen t) + u3π (t) f (t − 3π )
4 4
1 √ 1
= · e −t cos( 2t) − · (cost − sen t) + u3π (t) f (t − π )
4 4
 
1 −t √ 1 1 −(t−3π )

= · e cos( 2t) − · (cost + − sent) + u3π (t) · √ · e sen [ 2(t − 3π )]
4 4 2
1 1 1 √ 1 h √ i
= · sen t − · cost + · e −t cos( 2t) + √ · u3π (t) e −(t−3π ) sen [ 2(t − 3π )] ,
4 4 4 2
que é a solução do problema dado.

Exemplo 11.4: Encontre a solução do seguinte P.V.I.:


1.11 Funções impulso 117


 00
 y + y = δ (t − 2π ) cost,

y(0) = 0,



y0 (0) = 1.

S OLUÇÃO : Aplica-se a transformada de Laplace em ambos os membros, bem como as condições

iniciais e usa-se a fórmula 20 da tabela, com c = 2π , para obter



L y00 + y = L [δ (t − 2π ) cost]

s2Y (s) − sy(0) − y0 (0) + Y (s) = cos(2π ) e −2π s


1 1
(11.8) (s2 + 1)Y (s) = 1 + e −2π s ⇒ Y (s) = + e −2π s · ·
s2 + 1 s2 + 1
Pela fórmula 4 da tabela, tem-se que
 
−1 1
f (t) = L = sen t.
s2 + 1
Assim, aplicando a transformada inversa em ambos os membros de (11.8), bem como a já
citada fórmula de inversão da 2a translação (fórmula 18 da tabela), obtém-se

y(t) = L−1[Y (s)]


 
−1 1
=L + u2π (t) f (t − 2π )
s2 + 1

= sen t + u2π (t) sen (t − 2π ),


que é a solução do P.V.I. dado.
118 1 Transformada de Laplace

1.12 Exercícios propostos

Exercício 1: Encontre a transformada de Laplace para


(
1, se 0 ≤ t < π ,
f (t) =
0, se π ≤ t < ∞.

Exercício 2: Encontre a transformada de Laplace para a função



 se 0 ≤ t < 1,
 t,

f (t) = 2 − t, se 1 ≤ t < 2,


 0, se 2 ≤ t < ∞.

Exercício 3: Encontre a transformada inversa de Laplace para a função


3s
F(s) = ·
s2 − s − 6
Exercício 4: Use a transformada de Laplace para resolver o seguinte P.V.I.:

 y00 + 3y0 + 2y = 0,


y(0) = 1,



y0 (0) = 0.

Exercício 5: Use a transformada de Laplace para resolver o seguinte P.V.I.:



 00 0
 y − 2y + 2y = cost,

y(0) = 1,



y0 (0) = 0.

Exercício 6: Encontre a transformada de Laplace Y (s) = L[y(t)] do P.V.I. abaixo. Não é


preciso encontrar a transformada inversa.
 (

 1, se 0 ≤ t < π ,

 y00 + 4y =

 0, se π ≤ t < ∞,

 y(0) = 1,



 y0 (0) = 0.
1.12 Exercícios propostos 119

Exercício 7: Encontre a transformada de Laplace Y (s) = L[y(t)] do P.V.I. abaixo. Não é


preciso encontrar a transformada inversa.
 
  se 0 ≤ t < 1,



  t,


 y00 + y = 2 − t, se 1 ≤ t < 2,

 

 0, se 2 ≤ t < ∞,



 y(0) = 0,




 y0 (0) = 0.

Exercício 8: Expresse f (t) em termos da função de Heaviside uc(t), onde




 0, se 0 ≤ t < 3,



 −2, se 3 ≤ t < 5,
f (t) =

 2, se 5 ≤ t < 7,



 1, se t ≥ 7.

Exercício 9: Expresse f (t) em termos da função de Heaviside uc(t), onde


(
t 2, se 0 ≤ t < 2,
f (t) =
1, se t ≥ 2.

Exercício 10: Expresse f (t) em termos da função de Heaviside uc (t), onde




 t, se 0 ≤ t < 2,



 2, se 2 ≤ t < 5,
f (t) =

 7 − t, se 5 ≤ t < 7,



 0, se t ≥ 7.

Exercício 11: Encontre a transformada de Laplace para a função


(
0, se t < 2,
f (t) =
2
(t − 2) , se t ≥ 2.

Exercício 12: Encontre a transformada de Laplace para a função


(
0, se t < 1,
f (t) =
t 2 − 2t + 2, se t ≥ 1.

Exercício 13: Encontre a transformada de Laplace para a função


120 1 Transformada de Laplace



 0,
 se t < π ,
f (t) = t − π, se π ≤ t < 2π ,



0, se t ≥ 2π .

Exercício 14: Encontre a transformada inversa de Laplace para a seguinte função:


2 e −2s
F(s) = ·
s2 − 4

Exercício 15: Encontre a solução do seguinte P.V.I.:


 (

 1, se 0 ≤ t < 3π ,

 y00 + y =

 0, se 3π ≤ t < ∞.

 y(0) = 0,



 y0 (0) = 1.

Exercício 16: Encontre a solução do seguinte P.V.I.:


 (

 1, se π ≤ t < 2π ,

 y00 + 2y0 + 2y =

 0, se 0 ≤ t < π e t ≥ 2π .

 y(0) = 0,



 y0 (0) = 1.

Exercício 17: Encontre a solução do seguinte P.V.I.:



 00
 y + 4y = sent + uπ (t) sen (t − π ),

y(0) = 0,


 y0 (0) = 0.

Exercício 18: Encontre a solução do seguinte P.V.I.:



 00
 y + y = u3π (t),

y(0) = 1,


 y0 (0) = 0.

Exercício 19: Encontre a solução do seguinte P.V.I.:


1.12 Exercícios propostos 121

 (

 t/2, se 0 ≤ t < 6,

 y00 + y =

 3, se t ≥ 6.

 y(0) = 0,


 0
 y (0) = 1.

Exercício 20: Encontre a solução do seguinte P.V.I.:


 (

 5 sen t, se 0 ≤ t < π ,

 y00 + y0 + y =

 4 0, se t ≥ π .

 y(0) = 0,



 y0 (0) = 0.

Exercício 21: Encontre a solução do P.V.I. abaixo:



 00
 y + 4y = δ (t − π ) − δ (t − 2π ),

y(0) = 0,


 y0 (0) = 0.

Exercício 22: Encontre a solução do P.V.I. abaixo:



 00
 y − y = −20 δ (t − 3),

y(0) = 1,


 y0 (0) = 0.

Exercício 23: Encontre a solução do P.V.I. abaixo:



 00
 y + 4y = δ (t − 4π ),

y(0) = 1/2,


 y0 (0) = 0.

Exercício 24: Encontre a solução do P.V.I. abaixo:



00
 y + y = δ (t − 2π ) · cost,


y(0) = 0,


 y0 (0) = 1.

Exercício 25: Encontre a solução do P.V.I. a seguir:


122 1 Transformada de Laplace


 00
 y + y = uπ/2 (t) + 3 δ (t − /2) − u2π (t),
 3π

y(0) = 0,



y0 (0) = 0.

Exercício 26: Encontre a transformada inversa de Laplace para a seguinte função:


1
F(s) = ·
s4 (s2 + 1)

Exercício 27: Encontre a transformada inversa de Laplace para a seguinte função:


1
F(s) = ·
(s + 1)2 (s2 + 4)

Exercício 28: Use o método da convolução para resolver o seguinte P.V.I.:



 00 2
 y + ω y = g(t),

y(0) = 0,


 y0 (0) = 1.

Exercício 29: Use o método da convolução para resolver o seguinte P.V.I.:



 y00 + 4y0 + 4y = g(t),


y(0) = 2,



y0 (0) = −3.

Exercício 30: Use o método da convolução para resolver o seguinte P.V.I.:



 00 0
 y + 3y + 2y = cos(α t),

y(0) = 1,



y0 (0) = 0.
1.12 Exercícios propostos 123

Respostas dos exercícios

1 − e −π s
Exercício 1: F(s) = ·
s

1 − 2 e −s + e −2s
Exercício 2: F(s) = ·
s2
9 3t 6 −2t
Exercício 3: f (t) = e + e .
5 5

Exercício 4: y(t) = 2 e −t − e −2t .

1 
Exercício 5: y(t) = cost − 2 sent + 4 e t cost − 2 e t sen t .
5

s 1 − e −π s
Exercício 6: Y (s) = + ·
s2 + 4 s(s2 + 4)

1 − 2 e −s + e −2s
Exercício 7: Y (s) = ·
s2 (s2 + 1)

Exercício 8: f (t) = −2 u3(t) + 4 u5 (t) − u7 (t).



Exercício 9: f (t) = t 2 + u2 (t) 1 − t 2 .

Exercício 10: f (t) = t + u2 (t)(2 − t) + u5 (t)(5 − t) − u7 (t)(7 − t).

2 e −2s
Exercício 11: F(s) = ·
s3

e −s s2 + 2
Exercício 12: F(s) = ·
s3

e −π s e −2π s
Exercício 13: F(s) = − 2 (1 + π s).
s2 s

Exercício 14: f (t) = u2(t) · senh [2(t − 2)].


Observe que:
ex − e−x e2x − 1 1 − e−2x
senh x = = = ·
2 2 ex 2 e−x

Exercício 15: y(t) = 1 − cost + sent − u3π (t) · (1 + cost).


124 1 Transformada de Laplace

1 h i
Exercício 16: y(t) = e −t · sen t + · uπ (t) · 1 + e −(t−π ) · cost + e −(t−π ) · sen t −
h 2 i
1 −(t−2π ) −(t−2π )
− · u2π (t) 1 − e · cost − e · sen t .
2
1 1
Exercício 17: y(t) = · [2 sen t − sen (2t)] − · uπ (t) · [2 sent + sen (2t)] .
6 6

Exercício 18: y(t) = cost + u3π (t) · [1 − cos(t − 3π )] .

1 1 1
Exercício 19: · sent + · t − · u6(t) · [t − 6 − sen (t − 6)] .
2 2 2

Exercício 20: y(t) = h(t) + uπ (t) · h(t − π ), onde


4 h i
−4 cost + sen t + 4 · e /2 · cost + e /2 · sen t .
−t −t
h(t) =
17

1 1
Exercício 21: y(t) = · uπ (t) · sen [2(t − π )] − · u2π (t) · sen [2(t − 2π )].
2 2

Exercício 22: y(t) = cosh t − 20 · u3(t) · senh (t − 3).


Observe que:
ex − e−x e2x − 1 1 − e−2x
senh x = = =
2 2 ex 2 e−x
e
ex + e−x e2x + 1 1 + e−2x
cosh x = = = ·
2 2 ex 2 e−x

1 1
Exercício 23: y(t) = · cos(2t) + · u4π (t) · sen [2(t − 4π )].
2 2

Exercício 24: y(t) = sen t + u2π (t) · sen (t − 2π ).

Exercício 25: y(t) = uπ/2(t) [1 − cos(t − π/2)] + 3 · u3π/2(t) · sen (t − 3π/2)−


−u2π (t) [1 − cos(t − 2π )] .

1 3  1Z t
Exercício 26: f (t) = (t ) ∗ ( sen t) = (t − x)3 sen x dx.
6 6 0

1  −t   1Z t
Exercício 27: f (t) = t e ∗ ( sen (2t)) = (t − x) e −(t−x) sen (2x) dx.
2 2 0

1 1
Exercício 28: y(t) = sen (ω t) + {[ sen (ω t)] ∗ g(t)} =
Z ω ω
1 1 t
= sen (ω t) + sen [ω (t − x)] g(x) dx.
ω ω 0
1.12 Exercícios propostos 125

  
Exercício 29: y(t) = 2 e −2t + t e −2t + t e −2t ∗ g(t) =
Z t
= 2 e −2t + t e −2t + (t − x) e −2(t−x) g(x) dx.
0
  
Exercício 30: y(t) = 2 e−t − e −2t + e −t − e −2t ∗ cos(α t) =
Z th i
−t −2t −(t−x) −2(t−x)
= 2e −e + e −e cos(α x) dx.
0
126 1 Transformada de Laplace

N.o f (x) = L−1[F(s)] F(s) = L[ f (x)]

1. k k/s, s > 0, k = const.


n!
2. t n , n ∈ N s n+1
, s>0
1
3. e k t s−k , s>k
w
4. sen (wt) s 2 + w2
, s>0
s
5. cos(wt) s 2 + w2
, s>0
w
6. e k t · sen (wt) (s − k)2 + w2
, s>k
s−k
7. e k t · cos(wt) (s − k)2 + w2
, s>k
 Ak + B
 As + B
8. e k t A cos(wt) + w sen (wt) (s − k)2 + w2
, s > k e w 6= 0
w
9. senh (wt) s 2 − w2
, s > |w|
s
10. cosh(wt) s 2 − w2
, s > |w|
w
11. e k t · senh (wt) (s−k)2−w2
, s>k
s−k
12. e k t · cosh(wt) (s − k)2 − w2
, s>k
 Ak + B
 As + B
13. e k t A cosh(wt) + w senh (wt) (s − k)2 − w2
, s > k e w 6= 0
n!
14. t n · e k t , n ∈ N (s − k) n+1
, s>k

15. e k t · f (t) F(s − k)


1
16. f (ct) c F ( /c) ,
s c>0
e −cs
17. u c (t) s , s>0

18. u c (t) · f (t − c) e −cs F(s)

19. δ c(t) = δ (t − c) e −cs

20. δ (t − c) · f (t) e −cs · f (c)


Rt
21. f (t) ∗ g(t) = 0 f (t − x) g(x) dx F(s) · G(s)
Rt 1 1 Ra
22. a f (x) dx s F(s) − s 0 f (t) dt

23. f 0 (t) s F(s) − f (0+ )

24. f 00 (t) s2 F(s) − s f (0+ ) − f 0 (0+ )

25. t n · f (t) (−1)n F (n)(s)

26. (−t)n · f (t) F (n)(s)


R∞
27. f (t)/t
s F(x) dx, se existe lim [ f (t)/t ]
t→0+
1.12 Exercícios propostos 127

Apêndice 1: regras de Leibniz

Uma integral definida


Z b
f (t, s) dt
a
de uma função contínua f (t, s) tem um valor que depende da escolha de s. Portanto, pode-se
escrever Z b
ϕ (s) = f (t, s) dt.
a
A expressão acima é chamada de função definida por integral.

Observação 12.1: Quando uma função definida por integral puder ser representada em ter-
mos de funções elementares, ela se transforma em uma simples função dada explicitamente em
termos de uma variável. Um exemplo pode ser visto aqui:
Z π  
cos(ts) π cos(π s) cos 0
sen (ts) dt = − =− s − −
0 s 0 s
cos(π s) 1 1 cos(π s) ,
=− + = −
s s s s
para s 6= 0.
Por outro lado, em geral, nem sempre é possível representar uma função definida por integral
através de funções elementares. Um exemplo é a integral elíptica completa dada por
Z π/2
dt
√ ,
0 1 − k2 sen 2t
que é uma função definida por integral, onde se olha k e t como as duas variáveis.
Mesmo em tais casos (não poder ser representada por funções elementares), a função definida
por integrais, sob hipóteses adequadas, continua sendo bem definida. Logo, faz sentido ques-
tionar a diferenciabilidade de funções definidas por integrais. É só isso que trata as regras de
Leibniz.

Proposição 12.1 (1a regra de Leibniz): 15 Sejam R = [a, b] × [c, d] ⊂ R2 um retângulo


fechado e Ω uma região aberta contendo R. Considere f : Ω → R uma função contínua e que
possui uma derivada ∂ f/∂ s contínua em Ω. Então, para todo t ∈ (c, d), tem-se que
Z b Z b
d ∂f
(12.3) f (t, s) dt = (t, s) dt.
ds a a ∂s
D EMONSTRAÇÃO : Defina g : [c, d] → R por
15 Gottfried Wilhelm Leibniz (1646 – 1716) foi um filósofo e matemático alemão.
128 1 Transformada de Laplace

Z b
∂f
g(s) = (t, s) dt.
a ∂s
Usar-se-á o seguinte teorema (de Fubini):16 Seja R = [x1 , x2 ] × [y1 , y2] e u : R → R uma
função contínua. Então,
Z y2
v(s) = u(x, y) dy, α ≤ x ≤ β,
y1

será uma função contínua na variável x. Além disso, a integral de f sobre R pode ser determinada
através de integrais iteradas, ou seja,
ZZ Z x2 Z y2  Z y2 Z x2 
f (x, y) dx dy = f (x, y) dy dx = f (x, y) dx dy.
R x1 y1 y1 x1

Assim, como ∂ f/∂ s é contínua por hipótese, segue do teorema de Fubini que g(s) é uma
função contínua para c ≤ s ≤ d. E como g é contínua em [c, d], então ela é integrável neste
intervalo. Logo,
Z d Z d Z b 
∂f
g(s) ds = (t, s) dt ds.
c c a ∂s
Assim, usando novamente o teorema de Fubini, tem-se que é possível inverter a ordem dos
limites de integração. Portanto,
Z d Z d Z b 
∂f
g(s) ds = (t, s) dt ds = (teor. de Fubini)
c c a ∂s
Z b Z d 
∂f
= (t, s) ds dt
a c ∂s
Z b d

= [ f (t, s)] dt
a c
Z b
= [ f (t, d) − f (t, c)] dt
a
Z b Z b
= f (t, d) dt − f (t, c) dt
a a

= ϕ (d) − ϕ (c),
onde ϕ é definida por
Z b
ϕ (s) = f (t, s) dt.
a
Trocando d por s, de modo que c < s < d, pode-se escrever
Z s
ϕ (t) − ϕ (c) = g(x) dx.
c

16 Guido Fubini (1879 – 1879) foi um matemático italiano. O adendo A tem detalhes sobre este teorema.
1.12 Exercícios propostos 129

Agora é possível derivar ambos os membros em relação a s. Assim, pelo teorema fundamental
do Cálculo, tem-se que
Z b
0 ∂f
ϕ (t) = g(s) = (t, s) dt,
a ∂s
demonstrando, portanto, a regra de Leibniz.

O leitor interessado em demonstrações mais rigorosas da fórmula de Leibniz poderá consultar


o Adendo A, que contém vários outros casos e com resultados bem mais gerais.

Exemplo 12.1: Calcule a derivada da função ϕ : [0, π ] → R definida por


Z π
ϕ (s) = sen (ts) dt.
0

S OLUÇÃO : Pela primeira regra de Leibniz, tem-se que


Z π
dϕ d
ϕ 0 (s) = = sen (ts) dt
ds ds 0
Z π Z π

= [ sen (ts)] dt = t · sen (ts) dt
0 ∂s 0
 Zπ 
t · cos(ts) π cos(ts)
=− − − 0 dt
s 0 s
  Z
π · cos(π s) 0 · cos 0 1 π
=− − + cos(ts) dt
s s s 0

π · cos(π s) sen (ts) π
=− +
s s2 0
π · cos(π s) sen (π s) sen 0
=− + − 2
s s2 s
sen (π s) π · cos(π s) ,
= − (s 6= 0).
s2 s
onde se fez a seguinte integração por partes:
( 
u = t,  du = dt,

dv = sen (ts) dt,  v = − cos(ts) ·
s

Em algumas situações os limites de integração não são constantes, como aparece na primeira
regra de Leibniz, ou seja, situações nas quais os limites de integração são funções na variável s.
Por exemplo, a função definida por integral dada por
130 1 Transformada de Laplace

Z s3
2
ϕ (s) = e −t s dt.
s2
O próximo resultado, conhecido como segunda regra de Leibniz, é um método que per-
mite calcular a derivada de uma função definida por integral onde os limites de integração
são funções.

Proposição 12.2 (2a regra de Leibniz): Sejam R = [a, b] × [c, d] ⊂ R2 um retângulo fechado
e Ω uma região aberta contendo R. Considere f : Ω → R uma função contínua e que possui uma
derivada ∂ f/∂ s contínua em Ω. Além disso, sejam α , β : [s1 , s2] → R duas funções contínuas na
variável s, tendo derivadas contínuas. Então, para s ∈ (s1 , s2), tem-se que
Z β (s) Z β (s)
d 0 0 ∂f
(12.4) f (t, s) dt = f [β (s), s] · β (s) − f [α (s), s] · α (s) + (t, s) dt.
ds α (s) α (s) ∂s
D EMONSTRAÇÃO : Sejam u = α (s), v = β (s) e w = s. Assim, a integral ϕ (s) pode ser escrita
na forma
Z v
(12.5) ϕ (s) = f (t, w) dt = F(u, v, w),
u

onde todas as funções u, v e w dependem de s.


Pela regra da cadeia, segue-se que
dϕ ∂ F du ∂ F dv ∂ F dw
(12.6) = · + · + · ·
ds ∂ u ds ∂ v ds ∂ w ds
Mostrar-se-á que a soma dos três termos no segundo membro em (12.6) corresponde a soma
dos três termos do segundo membro de (12.4).
O teorema fundamental do Cálculo diz que
Z x
d
f (x) dx = f (x).
dx a

Assim, para o primeiro termo em (12.6), o teorema fundamental do Cálculo permite escrever
Z  Zu 
∂F ∂ v ∂
= f (t, w) dt = − f (t, w) dt = − f (u, w).
∂u ∂u u ∂u v

Como u = α (s), então


du ∂ F du
= α 0 (s) ⇒ · = − f (u, w) · α 0 (s),
ds ∂ u ds
de modo que
∂ F du
(12.7) · = − f [α (s), s] · α 0 (s),
∂ u ds
onde usou-se os fatos em que u = α (s) e w = s.
1.12 Exercícios propostos 131

Também no segundo termo em (12.6) pode-se aplicar o teorema fundamental do Cálculo.


Assim, Z
∂F ∂ v
= f (t, w) dt = f (v, w).
∂v ∂v u
Como v = β (t), então
dv ∂ F dv
= β 0 (t) ⇒ · = f (v, w) · β 0 (t),
ds ∂ v ds
de modo que
∂ F dv
(12.8) · = f [β (s), s] · β 0 (s),
∂ v ds
onde usou-se os fatos em v = β (s) e w = s.
Para o terceiro e último termo em (12.6), tem-se:
Z v
∂F ∂
= f (t, w) dt
∂w ∂w u

= (pela 1a regra de Leibniz)


Z v
∂f
= (t, w) dt.
u ∂w
Portanto, como w = s, segue-se que dw/ds = 1, de modo que
Z v 
∂ F dw ∂f dw
· = (t, w) dt ·
∂ w ds u ∂w ds
Z v
∂f
= (t, w) dt
u ∂w
Z β (s)
∂f
(12.9) = (t, s) dt,
α (s) ∂s
onde usou-se os fatos que u = α (s) e v = β (s) no último passo acima.
Substituindo (12.7), (12.8) e (12.9) em (12.6), obtém-se
∂ ϕ ∂ F du ∂ F dv ∂ F dw
= · + · + ·
∂s ∂ u ds ∂ v ds ∂ w ds
Z β (s)
0 0 ∂f
= − f [α (s), s] · α (t) + f [β (s), s] · β (s) + (t, s) dt
α (s) ∂s
Z β (s)
0 0 ∂f
(12.10) = f [β (s), s] · β (s) − f [α (s), s] · α (t) + (t, s) dt.
α (s) ∂s
Agora observe que o primeiro membro em (12.10), pela definição de ϕ (s) dada em (12.5), é
dado exatamente por
132 1 Transformada de Laplace

Z β (s)
dϕ d ∂f
(12.11) = (t, s) dt.
ds ds α (s) ∂s
Como os primeiros membros em (12.10) e (12.11), segue-se que os respectivos segundos
membros também são iguais, de modo que
Z β (s) Z β (s)
d 0 0 ∂f
f (t, s) dt = f [β (s), s] · β (s) − f [α (s), s] · α (t) + (t, s) dt,
ds α (s) α (s) ∂s
que a expressão dada em (12.4) no enunciado da proposição.

Exemplo 12.2: Calcule a derivada em relação à variável s da função definida por


Z s
ϕ (s) = t 2 dt.
1

S OLUÇÃO : Observe que α (s) = 1 e β (s) = s, de modo que α 0 (s) = 0 e β 0 (s) = 1. Além
disso, note que f (t, s) = t 2 . Assim sendo, pela segunda regra de Leibniz, segue-se que
Z s
dϕ d
ϕ 0 (s) = (s) = t 2 dt
ds ds 0
Z s
= f (s, s) · 1 − f (1, s) · 0 + 0 dt
1

= f (s, s) = s2 ,

pois a derivada parcial de f (t, s) = t 2 em relação a s é igual a 0.

Apêndice 2: funções gama e beta

Este apêndice aborda algumas funções especiais.


O exemplo 5.3 mostrou que a transformada de Laplace para a função f : [0, ∞) → R definida
por f (t) = t n e k t é dada por
  n!
L tn e k t = , s > k.
(s − k)n+1
Em particular, para k = 0, obtém-se a transformada para f (t) = t n , a qual é dada por
1.12 Exercícios propostos 133

n! ,
L (t n ) = s > 0.
s n+1
Particularizando mais uma vez, tomando s = 1 e usando a definição de transformada de
Laplace, decorre da expressão acima que
Z ∞
n! = e −t t n dt, n > 0.
0

A fórmula acima sugere uma maneira de generalizar o fatorial de um número real arbitrário.
Em geral, denota-se este fatorial generalizado por Γ(n + 1).

D EFINIÇÃO : A função gama Γ : [0, ∞) → R é definida por


Z ∞
Γ(x) = e−t t x−1 dt.
0

Note-se que a função gama é uma função definida por uma integral e que, no caso, é im-
própria. O leitor interessado em saber mais sobre funções definidas por integrais, convergência
e outras propriedades poderá consultar o adendo A. Aqui observa-se que o integrando tem uma
singularidade em t = 0 caso seja x < 1.
O próximo resultado dá uma importante propriedade satisfeita pela função gama.

Proposição 12.3: A função gama satisfaz

Γ(x + 1) = x · Γ(x).

D EMONSTRAÇÃO : Por integranção por partes, tem-se que


Z ∞ Z ∞ Z a
Γ(x + 1) = e−t t [(x+1)−1] dt = e−t t x dt = lim e−t t x dt
0 0 a→∞ 0
 a Z a
x −t
= lim −t e − lim x ex−1(−1)e−t dt
a→∞ 0 a→∞ 0
 Z a
x 0 x −a
= lim 0 e − a e + x lim e−t t x−1 dt
a→∞ a→∞ 0
Z ∞
=x e−t t x−1 dt = x · Γ(x),
0
como desejado.

Observação 12.2: Note-se que


Z ∞ Z a  a 
−t 0
Γ(1) = e t dt = lim e−t dt = lim −e−t = lim 1 − e−a = 1.
0 a→∞ 0 a→∞ 0 a→∞

Faça x = n, para n ∈ N, na fórmula Γ(x + 1) = x Γ(x). Então,


134 1 Transformada de Laplace

Γ(n + 1) = n · Γ(n).

Por recorrência, aplique-se novamente a mesma fórmula à Γ(n). Obtém-se

Γ(n + 1) = n · Γ(n) = n · Γ [(n − 1) + 1] = n.(n − 1) · Γ(n − 1).

Novamente recorrendo à fórmula e assim sucessivamente, obtém-se

Γ(n + 1) = n · (n − 1) · (n − 2) · · ·[n − (n − 1)]Γ(1) = n!,

isto é, a função gama é uma generalização natural do fatorial de um inteiro não negativo.

Para exibir outros valores importantes da função gama será necessário calcular o valor de
determinada integral que surgirá nos cálculos feitos a seguir. Isto será feito no próximo exemplo.
2
Lema 12.1: Seja f (−∞, ∞) → R uma função definida por f (x) = e −x . Então
Z ∞
2 √
e−x dx = π.
−∞

D EMONSTRAÇÃO : De fato, escrevendo


Z ∞
2
I= e−x dx,
−∞

então
Z ∞
 Z ∞

2 −x2 −y2
I = e dx e dy
−∞ −∞
Z −∞ Z −∞
2 +y2
= e−(x ) dx dy
−∞ −∞
Z aZ a
2 +y2
= lim e−(x ) dx dy
a→∞ −a −a

(12.3) = lim I 2(a),


a→∞

onde Z aZ a
2 +y2
2
I (a) = e−(x ) dx dy.
−a −a
Sejam R = [−a, a] × [−a, a],
 √ 2 

D1 = (x, y) ∈ R2 | x2 + y2 ≤ a2 e 2 2 2
D2 = (x, y) ∈ R | x + y ≤ 2a ,

isto é, D1 e D2 são os discos fechados de centro na origem que estão inscritos e circunscritos,
respectivamente, no retângulo R.
Note-se que a área de D1 , A(D1 ) = π a2 , é menor do que a área de R, A(R) = 4a2 . Tem-se
também que R tem área menor a área de D2 , A(D2 ) = 2π a2 . Isto é,
1.12 Exercícios propostos 135

(12.4) A(D1 ) < A(R) < A(D2 ).

Figura 12.1: Gráfico da nova região de integração.

Serão usadas as coordenadas polares, dadas por


(
x = r cos θ ,
y = r sen θ ,

cujo jacobiano dessa transformação é J = r, para calcular algumas integrais.


Faça ZZ ZZ
−(x2 +y2 ) 2 2
I = 1 e dx dy e I = e−(x +y ) dx dy. 2
D1 D2
Calculando estas integrais, obtém-se
ZZ Z a Z 2π
2 +y2 2
I1 = e−(x ) dx dy = e−r r d θ dr
D1 0 0
 
1 −r2 a
= 2π − e
2 0
 2

(12.5) = π 1 − e−a

e
ZZ Z √2 a Z 2π
−(x2 +y2 ) 2
I2 = e dx dy = e−r r d θ dr
D2 0 0
  √
1 −r2 2a  2

(12.6) = 2π − e = π 1 − e−2a .
2 0
136 1 Transformada de Laplace

2 2
Como o integrando e−(x +y ) é sempre positivo e as áreas de R, D1 e D2 obedecem a de-
sigualdade (12.4), segue-se que
Z aZ a
2 +y2
I1 ≤ e−(x ) dx dy ≤ I ,
2
−a −a

isto é, usando-se os valores obtidos em (12.5) e (12.6), segue-se que


  ZaZa  
−a2 −(x2 +y2 ) −2a2
π 1−e ≤ e du dv ≤ π 1 − e ,
−a −a

ou ainda,    
2 2
π 1 − e−a ≤ I 2(a) ≤ π 1 − e−2a .
Observa-se que existe limite para a → ∞ no primeiro e último membros na desigualdade
acima, de modo que existe limite para a → ∞ no membro do central. Assim,
h  2
i h  2
i
lim π 1 − e−a ≤ lim I 2(a) ≤ lim π 1 − e−2a .
a→∞ a→∞ a→∞

Mas, por (12.3), tem-se que I 2 = lim I 2(a). Portanto


a→∞

π ≤ I2 ≤ π ⇒ I2 = π ⇒ I= π,

como se queria mostrar.

Exemplo 12.3: Um valor importante da função gama é o valor Γ (1/2). Fazendo a mudança
de variá-veis t = u2 , de modo que dt = 2u du, obtém-se
Z ∞ Z ∞
1/2−1 −t 1
Γ (1/2) = t e = e−t t − /2 dt
0 0
Z ∞ −1/2 Z ∞
2 2
=2 u2 u e−u du = 2 u−1 u e −u du
0 0
Z ∞
2
=2 e−u du.
0

Agora usa-se o valor obtido para a integral dada no lema (12.1). Assim,
Z ∞ Z ∞ Z ∞
−u2 1 −u2 2 √
Γ (1/2) = 2 e dx = 2 e du = e−u du = π.
0 2 −∞ −∞

Outros valores da função gama podem ser obtidos a partir do valor Γ(1/2) = π . De fato,
segue-se da fórmula Γ(x + 1) = x Γ(x), dada pela proposição 12.3, que
  √   √
1 1 π 3 3 3 π
Γ(3/2) = Γ + 1 = Γ(1/2) = e Γ(5/2) = Γ + 1 = Γ(3/2) =
2 2 2 2 2 4
e assim por diante.
1.12 Exercícios propostos 137

Exemplo 12.4: Calcule Γ (−1/2) e Γ (−5/2).

S OLUÇÃO : Pela proposição 12.3, a função gama satisfaz


Γ(x + 1)
Γ(x + 1) = x · Γ(x) ⇒ Γ(x) = ·
x
A última expressão acima é usada para generalizar os valores negativos. Assim, fazendo
x = −1/2, obtém-se
Γ (−1/2 + 1) √
Γ (−1/2) = = −2 Γ(1/2) = −2 π ,
−1/2

onde usou-se o resultado Γ(1/2) = −2 π que foi obtido no exemplo 12.3.
Para calcular Γ (−5/2), toma-se x = −3/2 e aplica a fórmula anterior. Assim,

Γ (−3/2 + 1) 2 2 √  4 π
,
Γ (−5/2) = = − · Γ (−1/2) = − · −2 π =
−3/2 3 3 3
onde usou-se o valor de Γ (−1/2) que foi obtido no passo anterior.

Exemplo 12.5: Uma partícula com massa m é atraída para um ponto fixo O com uma força
inversamente proporcional à sua distância instantânea de O. Se a partícula for liberada do re-
pouso, encontre o tempo para que ela alcance O.

S OLUÇÃO : No instante de tempo t = 0 a partícula é colocada sobre o eixo x em x = L, onde


L > 0. Seja O a origem. Pela lei de Newton, segue-se que

d 2x k,
(12.7) m· = −
dt 2 x
onde m é a massa da partícula e k > 0 é uma constante de proporcionalidade.
Seja
dx
v=
dt
a velocidade da partícula. Então,

d 2 x dv dv dx dv
2
= = · = v· ·
dt dt dx dt dx
Assim, (12.7) pode ser escrito na forma
Z Z Z Z
dv k dv dx dx ,
m·v· =− ⇒ m v · dx = −k ⇒ m v dv = −k
dx x dx x x
ou seja,
138 1 Transformada de Laplace

m · v2
(12.8) = −k · ln x + c.
2
Como v = 0 em x = L, segue-se que
m · 02
= −k · ln(L) + c ⇒ c = k · ln(L).
2
Assim,  
m · v2 m · v2 L ,
= −k · ln x + k · ln(L) ⇒ = k · ln
2 2 x
ou ainda, s  
  r
2 2k L 2k L
v = · ln ⇒ v=± · ln ·
m x m x
Escolhe-se o sinal negativo na expressão acima, pois isto significa que x decrescente quando
t cresce, isto é,
r s  
2k L
(12.9) v=− · ln ·
m x

Agora determina-se o tempo T tomado pela partícula para ir de x = L até x = 0. Da relação


v(x) = dx/dt , segue-se que dt = dx/v(x). Assim,
Z 0
dx
T=
L v(x)
Z 0
dx
=− p p
L 2k/m · ln (L/x)
Z 0
dx
=− p p
L 2k/m · ln (L/x)
Z 0
1 dx
=− p ·p
L 2k/m ln (L/x)
r Z L
m dx
(12.10) = p ·
2k 0 ln (L/x)
Faça a seguinte mudança de variáveis:
 
L
ln =u ⇒ x = L · e −u,
x
donde segue que
dx = −L · e −u du,
de modo que os novos limites de integração são dados por
1.12 Exercícios propostos 139

   
L L
x=0 ⇒ u = ln = +∞ e x=L ⇒ u = ln = ln 1 = 0.
0 L
Substituindo-se em (12.10), resulta em
r Z
m L dx
T= p
2k 0 ln (L/x)
r Z
m 0 L · e −u
=− √ du
2k ∞ u
r Z
m ∞ L · e −u
= du
2k 0 u 1/2
r Z
m ∞ −u −1/2
= L· e ·u du
2k 0
r Z
m ∞ −u (1/2 − 1)
= L· e ·u du
2k 0
r
m
= L· · Γ(1/2)
2k
= (pelo resultado do exemplo 12.3)
r
m √ 
= L· · π
2k
r

= L· ·
2k

Proposição 12.4: Seja f : [0, ∞) → R uma função definida por f (t) = t k . Então a sua trans-
formada de Laplace é dada por
Γ(k + 1) ,
F(s) = (k > −1, s > 0).
sk+1
D EMONSTRAÇÃO : Por definição,
Z ∞ Z ∞
F(s) = e −st
f (t) dt = e −st · t k dt.
0 0

O passo seguinte consiste em fazer uma mudança de variáveis na última integral acima.
Fazendo u = st (de modo que dt = du/s), obtém-se
Z ∞
F(s) = e −st · t k dt
0
Z ∞  u k 1
= e −u · · du
0 s s
140 1 Transformada de Laplace

Z ∞
uk 1
= e −u · · du
0 sk s
Z ∞
1
= e −u · uk du
sk+1 0

Γ(k + 1)
= ·
sk+1
pois


Exemplo 12.6: Seja f : (0, ∞) → R uma função definida por f (t) = 1/ t . Então, apesar de
f não ser admissível, ela tem uma transformada de Laplace F e que pode ser calculada com a
fórmula da proposição 12.4

Calcula-se a transformada de Laplace da função f (t). Pela proposição 12.4 deste apêndice,
tem-se que
  Γ(k + 1)
L t k = k+1 , (k > −1, s > 0).
s

Fazendo k = −1/2 em g(t) = t k , obtém-se f (t) = t −1/2 = 1/t 1/2 = 1/ t . Logo, a transformada
de Laplace da função f é
  Γ (1/2 + 1) Γ (3/2)
1
L[ f (t)] = L t − /2 = = 3/2 ·
s 1/2+1 s

No exemplo 12.3 deste apêndice viu-se que Γ (3/2) = 2π . Assim,

√ π 1 ,
L[ f (t)] = L ( / t ) =
1 ·
2 s 3/2

que é a função transformada para a função f (t) = 1/ t .

D EFINIÇÃO : Define-se a função beta por


Z 1
B(x, y) = t x−1 · (1 − t) y−1 dt, (x, y > 0).
0

Proposição 12.5: A função beta satisfaz as seguintes propriedades:

(a) B(x, y) = B(y, x);


Z π/2
(b) B(x, y) = 2 ( sen θ )2x−1 · (cos θ )2y−1 d θ .
0
1.12 Exercícios propostos 141

D EMONSTRAÇÃO : Para a parte (a), faça a mudança de variáveis u = 1 − t, de modo que os


novos limites de integração são dados por

t=0 ⇒ u = 1−0 = 1 e t=1 ⇒ u = 1 − 1 = 0.

Assim, Z 1
B(x, y) = t x−1 · (1 − t) y−1 dt
0
Z 0
=− (1 − u) x−1 · u y−1 du
1
Z 1
= (1 − u) x−1 · u y−1 du
0
Z 1
= u y−1 · (1 − u) x−1 du
0

= B(y, x).
Para a parte (b), faz-se a mudança de variáveis t = sen 2θ , donde segue que dt = 2 sen θ ·
cos θ d θ . Segue-se daí que
√ √
sen θ = t ⇒ θ = arcsen t .

de modo que os novos limites de integração são dados por


π
t=0 ⇒ θ = arcsen 0 = 0 e t =1 ⇒ θ = arcsen 1 = ·
2
Portanto,
Z 1
B(x, y) = t x−1 · (1 − t) y−1 dt
0
Z π/2 x−1 y−1
= sen 2 θ · 1 − sen 2 θ · (2 sen θ · cos θ ) d θ
0
Z π/2 h ix−1 h iy−1
2 2
=2 (sen θ ) · (cos θ ) · ( sen θ · cos θ )d θ
0
Z π/2 h i h i
=2 (sen θ )2x−2 · sen θ · (cos θ )2y−2 · cos θ d θ
0
Z π/2
=2 ( sen θ )2x−1 · (cos θ )2y−1 d θ ,
0

como desejado.
142 1 Transformada de Laplace

Proposição 12.6: A função beta pode ser representada em termos da função gama da seguinte
maneira:
Γ(x) · Γ(y) ,
B(x, y) = (x, y > 0).
Γ(x + y)
D EMONSTRAÇÃO : Por definição, a função gama é dada por
Z ∞
Γ(x) = t x−1 e −t dt.
0

Introduzindo a mudança de variáveis t = u2 , de modo que dt = 2u du, obtém-se


Z ∞ Z ∞ x−1 2
Γ(x) = t x−1 · e −t dt = 2u · u2 · e −u du
0 0
Z ∞
2
=2 u · u2x−2 · e −u du
0
Z ∞
2
(12.11) =2 u 2x−1 · e −u du.
0

Analogamente, fazendo t = v2 , de modo que dt = 2v dv, obtém-se


Z ∞
Γ(y) = t y−1 · e −t dt
0
Z ∞ y−1 2
= 2v v2 · e −v dv
0
Z ∞
2
=2 v · v 2y−2 · e −v dv
0
Z ∞
2
(12.12) =2 v 2y−1 e −v dv.
0

O próximo passo consiste em realizar o produto entre Γ(x) e Γ(y) obtidos, respectivamente,
em (12.11) e (12.12). Assim,
 Z∞  Z ∞ 
2x−1 −u2 2y−1 −v2
Γ(x) · Γ(y) = 2 u ·e du 2 v ·e dv
0 0
Z ∞Z ∞  
2x−1 −u 2 2y−1 −v2
=4 u ·e v ·e du dv
0 0
Z ∞Z ∞
2 +v2
=4 u 2x−1 v 2y−1 e −(u ) du dv.
0 0

Usar-se-á coordenadas polares, cujas equações são dadas por


(
u = r cos θ ,
v = r sen θ .

onde 0 < r < +∞ e 0 < θ < π/2. O jacobiano dessa transformação, em valor absoluto, é dado
por | J| = r.
1.12 Exercícios propostos 143

Assim,
Z ∞ Z π/2
2 +v2
Γ(x) · Γ(y) = 4 u 2x−1 · v 2y−1 · e −(u ) du dv
0 0
Z ∞ Z π/2
2
=4 (r · cos θ ) 2x−1 · (r · sen θ ) 2y−1 · r · e −r d θ dr
0 0
Z ∞ Z π/2
2
=4 r 2x−1 · (cos θ ) 2x−1 · r 2y−1 · ( sen θ ) 2y−1 · r · e −r d θ dr
0 0
Z ∞ Z π/2
2
=4 (cos θ ) 2x−1 · ( sen θ ) 2y−1 · r 2x+2y−1 e −r d θ dr
0 0
 Z ∞
  Z π/2

−r 2 2x+2y−1 2y−1 2x−1
= 2 e ·r dr · 2 ( sen θ ) · (cos θ ) dθ
0 0
 Z ∞

−r 2 2x+2y−2
= 2 e ·r · r dr ·
0
 Z π/2

2y−2 2x−2
(12.13) · 2 ( sen θ ) · sen θ · (cos θ ) · cos θ d θ
0

Observe agora que a primeira integral no último membro de (12.13) pode ser escrita na forma
Z ∞ Z ∞
2 2
2 e −r · r 2x+2y−2 · r dr = e −r · r 2[(x+y)−1] · (2r) dr
0 0
Z ∞ (x+y)−1
2
= e −r · r2 · (2r) dr.
0

Fazendo t = r2 , de modo que dt = 2r dr, então os novos limites de integração são dados por

r=0 ⇒ t = 02 = 0 e r=∞ ⇒ t = ∞2 = ∞.

Portanto,
Z ∞ Z ∞ (x+y)−1
−r 2 2x+2y−2 2
2 e ·r · r dr = e −r · r2 · (2r) dr
0 0
Z ∞
(12.14) = e −t · t (x+y)−1 dt = Γ(x + y).
0

Além disso, a segunda integral no último membro de (12.13) pode ser escrita como
Z π/2
2 ( sen θ ) 2y−2 · sen θ · (cos θ ) 2x−2 · cos θ d θ =
0
Z π/2
= ( sen θ ) 2(y−1) · (cos θ ) 2(x−1) · (2 · sen θ cos θ ) d θ
0
Z π/2  y−1  x−1
= sen 2 θ · cos2 θ · (2 · sen θ cos θ ) d θ
0
144 1 Transformada de Laplace

Z π/2  y−1  x−1


= sen 2 θ · 1 − sen 2 θ · (2 · sen θ cos θ ) d θ .
0
Na última integral acima, fazendo t = sen 2 θ , segue-se que dt = 2 sen θ · cos θ d θ . E os novos
limites de integração são dados por
π
θ =0 ⇒ t=0 e θ= ⇒ t = 1.
2
Portanto,
Z π/2
2 ( sen θ ) 2y−2 · sen θ · (cos θ ) 2x−2 · cos θ d θ =
0
Z π/2  y−1  x−1
= sen 2θ · 1 − sen 2θ · (2 · sen θ cos θ ) d θ
0
Z 1
= t y−1 · (1 − t) x−1 dt
0

= B(y, x)

= (proposição 12.5, item (a))

(12.15) = B(x, y).

Substituindo (12.14) e (12.15) em (12.13), conclui-se que


Γ(x) · Γ(y) ,
Γ(x) · Γ(y) = Γ(x + y) · B(x, y) ⇒ B(x, y) =
Γ(x + y)
que é o resultado desejado.

Corolário 12.1: Tem-se que


Z π/2
1 Γ(x) · Γ(y) ,
( sen θ )2x−1 · (cos θ )2y−1 d θ = ·
0 2 Γ(x + y)
para x, y > 0.
D EMONSTRAÇÃO : Pelo item (b) da proposição 12.5, tem-se que
Z π/2
1
( sen θ )2x−1 · (cos θ )2y−1 d θ = · B(x, y).
0 2
Pela proposição 12.6, tem-se que
Γ(x) · Γ(y)
B(x, y) = ·
Γ(x + y)
Portanto,
1.12 Exercícios propostos 145

Z π/2
1 Γ(x) · Γ(y)
( sen θ )2x−1 · (cos θ )2y−1 d θ = · ·
0 2 Γ(x + y)

Exemplo 12.7: Mostre que:


    
1 1 3 1 √
(a) Γ k + = k− k− · · · · π;
2 2 2 2
     
3 1 1 1 √
(b) Γ k + = k+ · k− · · · · π.
2 2 2 2

S OLUÇÃO : Pela proposição 12.3, a função gama satisfaz a seguinte fórmula:

Γ(x + 1) = x · Γ(x).

A fórmula acima será usada em recorrência, isto é, será aplicada seguidas vezes. Assim,
parte-se do valor k até que k se torne nulo, ficando-se apenas com Γ (1/2).
Para a parte (a), tem-se
    
1 1
Γ k+ =Γ k− +1
2 2
   
fórm. 1 1
= k− ·Γ k−
2 2
    
1 3
= k− ·Γ k− +1
2 2
     
fórm. 1 3 3
= k− · k− ·Γ k−
2 2 2
      
1 3 5
= k− · k− ·Γ k− +1
2 2 2

= · · · (continuando o processo, chega-se a:)


     
1 3 1 1
= k− · k− ··· ·Γ
2 2 2 2
   
1 3 1 √
= k− · k− · · · · π,
2 2 2

onde usou-se o resultado obtido no exemplo 12.3, Γ(1/2) = π .
Para a parte (b), tem-se
146 1 Transformada de Laplace

    
3 1
Γ k+ =Γ k+ +1
2 2
   
fórm. 1 1
= k+ ·Γ k+
2 2
    
1 1
= k+ ·Γ k− +1
2 2
     
fórm. 1 1 1
= k+ · k− ·Γ k−
2 2 2
      
1 1 3
= k+ · k− ·Γ k− +1
2 2 2
       
fórm. 1 1 3 3
= k+ · k− · k− ·Γ k−
2 2 2 2
        
1 1 3 5
= k+ · k− · k− ·Γ k− +1
2 2 2 2

= · · · (continuando o processo, chega-se a:)


       
1 1 3 1 1
= k+ · k− · k− ··· ·Γ
2 2 2 2 2
     
1 1 3 1 √
= k+ · k− · k− · · · · π,
2 2 2 2

onde usou-se o resultado obtido no exemplo 12.3, Γ(1/2) = π .

Exemplo 12.8: Mostre que




 1 · 3 · 5 · · ·(n − 1) π ,
Z π/2 Z π/2  2 · 4 · 6 · · ·n · 2
 se n ∈ N é par,
n n
sen θ d θ = cos θ d θ =
0 0 
 2 · 4 · 6 · · ·(n − 1) ,


se n ∈ N é ímpar.
1 · 3 · 5 · · ·n

S OLUÇÃO : Pelo corolário 12.1, tem-se que


Z π/2
1 Γ(x) · Γ(y)
( sen θ )2x−1 · (cos θ )2y−1 d θ = · ·
0 2 Γ(x + y)
Faça 2x − 1 = n e 2y − 1 = 0. Assim, x = (n+1)/2 e y = 1/2. Tem-se:
Z π/2 Z π/2
sen n θ d θ = (sen θ )n · (cos θ )0 d θ
0 0
1.12 Exercícios propostos 147

h i 
1 Γ (n+1)
2 · Γ 12
= ·
2 Γ [(n+1)/2 + 1/2]
h i 
(n+1) 1
1 Γ 2 · Γ 2
(12.16) = · h i ·
2 Γ
(n+2)
2

Agora considere n ∈ N par, isto é, um número da forma n = 2k. Substituindo em (12.16),


obtém-se
h i 
Z π/2
1 Γ (n+1)
2 · Γ 12
sen n θ d θ = · h i
0 2 Γ
(n+2)
2
h i 
· Γ 12
(2k+1)
1 Γ 2
= · h i
2 Γ
(2k+2)
2
 
1 Γ k + 12 · Γ 1
2
= ·
2 Γ (k + 1)

= (pela observação 12.2 e parte (a) do exemplo 12.7)


    
1 k − 12 k − 23 · · · 21 · Γ 12 · Γ 12
= ·
2 k!
      
k − 12 k − 32 · · ·1 · 12 · Γ 21 · Γ 12
=
2k · (k − 1) · (k − 2) · · ·1

= (pelo exemplo 12.3)


    √ √ 
k − 21 k − 32 · · · 21 · π · π
=
2 [k · (k − 1) · (k − 2) · · ·1]
1 1  1
2 · (2k − 1) 2 · (2k − 3) · · · 2 π
= ·
k · (k − 1) · (k − 2) · · ·1 2
1 1  1
2 · (2k − 1) 2 · (2k − 3) · · · 2 · (1) π
= 1  1 1  1 ·
2 · (2k) · 2 · (2k − 2) 2 · (2k − 4) · · · 2 · (2)
2

(2k − 1)(2k − 3) · · ·1 π
= ·
2k · (2k − 2) · (4k − 4) · · ·2 2
1 · 3 · 5 · · ·(2k − 1) π ,
= ·
2 · 4 · 6 · · ·2k 2
que mostra a primeira parte.
Para a segunda parte, faça n = 2k + 1, isto é, um número ímpar. Substituindo em (12.16),
encontra-se
148 1 Transformada de Laplace

h i 
Z π/2 (n+1) 1
1 Γ ·
2 Γ 2
sen n θ d θ = · h i
0 2 Γ 2
(n+2)

h i 
(2k+1)+1 1
1 Γ 2 · Γ 2
= · h i
2 Γ
(2k+1)+2
2

1 Γ(k + 1) · Γ 21
= · 
2 Γ k + 23

= (pela observação 12.2)



1 k! · Γ 12
= · 
2 Γ k + 32
 
1 k · (k − 1) · (k − 2) · · ·1 1
= · 3
 ·Γ
2 Γ k+ 2 2

= (pelo exemplo 12.3)


1 k · (k − 1) · (k − 2) · · ·1 √
= ·  · π
2 Γ k + 32

= (pela parte (b) do exemplo 12.7)


1 k · (k − 1) · (k − 2) · · ·1 √
= ·   √ · π
2 k + 21 · k − 12 · · · 12 · π

1 k · (k − 1) · (k − 2) · · ·1 π
= · 1
 1
 1 ·√
2 k+ 2 · k− 2 ··· 2 π
1 k · (k − 1) · (k − 2) · · ·1
= ·  
2 k + 12 · k − 21 · · · 12

k · (k − 1) · (k − 2) · · ·1
=  
k + 21 · k − 12 · · ·1
1  1 1  1
· (2k) · (2k − 2) · (k − 2) · · · · (2)
= 2 1 2 1 2  1 2 
2 · (2k + 1) 2 · ·(2k − 1) · · · 2 · (1)

2k · (2k − 2) · (2k − 4) · · ·2
=
(2k + 1) · (2k − 1) · · ·1
2 · 4 · 6 · · ·2k ,
=
1 · 3 · 5 · · ·(2k + 1)
que mostra a segunda parte.
1.12 Exercícios propostos 149

Resta mostrar que os resultados acima valem para a integral de cosn θ . Fazendo a mudança
de variáveis θ = π/2 − α , segue-se que d θ = −d α , de modo que os novos limites de integração
são dados por
π π
θ =0 ⇒ α= e θ= ⇒ α = 0.
2 2
Portanto,
Z π/2 Z 0
n
sen θ d θ = − [ sen (π/2 − α )]n d α
0 π/2

Z 0
=− [ sen (π/2) · cos α + ( sen α ) · cos (π/2)]n d α
π/2

Z 0
=− [1 · cos α + ( sen α ) · 0]n d α
π/2

Z 0
=− (cos α )n d α
π/2

Z 0
=− cosn α d α ,
π/2

Z π/2
= cosn α d α .
0

Como a variável de integração é “muda”, isto é, não importa a letra usada que o valor da
integral não muda, segue-se que o valor da integral de cosn θ é igual ao valor da integral de
sen nθ . Portanto, mostrou-se que


 1 · 3 · 5 · · ·(n − 1) π ,
Z π/2 Z π/2  2 · 4 · 6 · · ·n · 2
 se n ∈ N é par,
sen n θ d θ = cosn θ d θ =
0 0 
 2 · 4 · 6 · · ·(n − 1) ,


se n ∈ N é ímpar.
1 · 3 · 5 · · ·n

Apêndice 3: interpretações físicas

Considere uma mola elástica, fixa por um dos extremos e que passa a oscilar na direção
vertical, como está indicado na figura 12.1.
Suponha que um peso de massa m esteja amarrado à mola e que todo o sistema fique em
equilíbrio com o peso no ponto y = 0 localizado a y0 unidades abaixo do comprimento natural
150 1 Transformada de Laplace

Figura 12.1:

da mola. Então, segundo a lei de Hooke, o peso experimenta uma força para cima, de módulo
ky0 , onde k > 0 é a constante elástica da mola.
Como o sistema está em equilíbrio, esta força acha-se neutralizada precisamente pela força
da gravidade que age sobre o peso. Assim, tem-se

(12.3) ky0 = mg.

Suponha que o sistema massa-mola esteja em equilíbrio e que o peso esteja agora submetido
a uma força vertical adicional f (t) que pode variar com o tempo. Então, no tempo t, com o
peso a uma distância y(t) da posição de equilíbrio e com a direção positiva orientada para
baixo, as forças que atuam sobre o peso são mg, devida à gravidade, −k(y − y0 ), devida à força
restauradora da mola e f (t). Assim, pela segunda lei de Newton, tem-se

m y00 (t) = mg − k(y − y0) + f (t),

de modo que ao aplicar (12.3), resulta em

m y00 + ky = f (t).

Além disso, como o sistema estava inicialmente em repouso, y(t) deve satisfazer as seguintes
condições iniciais:
y(0) = 0 e y0 (0) = 0.
Assim, obtém-se o movimento do peso (sistema massa-mola) como solução do seguinte
P.V.I.: 
 00
 m y + ky = f (t),

y(0) = 0,


 y0 (0) = 0.

Usando o método da transformada de Laplace, obtém-se


1.12 Exercícios propostos 151

m L(y00 ) + k L(y) = L[ f (t)],


 
m s2Y (s) − sy(0) − y0 (0) + kY (s) = F(s),
ou ainda,
(ms2 + k)Y (s) = F(s),
donde segue-se que
1
(12.4) Y (s) = · F(s).
ms2 + k
Assim,
p
1 1 k/m
Y (s) = 2
· F(s) ⇒ Y (s) = p · p 2 · F(s)
m (s + k/m) m· k/m
s2 + k/m

p p
1 k/m 1 k/m
Y (s) = p ·   · F(s) ⇒ Y (s) = √ · p 2 · F(s).
(m2 · k/m) s2 + pk/m 2 km s2 + k/m

Usando a fórmula 4 tabela de transformadas de Laplace vê-se que


   p
kt k/m
L sen = p 2 ·
m
s2 + k/m

Portanto,   
1 kt
L[y(t)] = Y (s) = L √ · sen · L[ f (t)]
km m
   
1 kt
= L √ · sen ∗ f (t) ,
km m
que ao aplicar a transformada inversa resulta em
 
1 kt
y(t) = √ · sen ∗ f (t).
km m
Deste modo, a equação do movimento para este sistema que se ache sob a ação de uma força
arbitrária f pode ser externa sob a forma integral, assim,
Z t hp i
1
(12.5) y(t) = √ sen k/m (t − x) f (x) dx.
km 0
Nas aplicações, a força f (t) comunicada é, em geral, da forma

(12.6) f (t) = A sen (ω t),

onde A e ω são constantes positivas, caso em que a equação do movimento se torna


152 1 Transformada de Laplace

Z t h√ i
A
y(t) = √ sen km (t − x) sen (ω x) dx.
km 0

Embora esta integral possa ser calculada por meio de técnicas elementares, é instrutivo re-
começar em (12.4) e resolver o problema diretamente. Assim,
1
Y (s) = · L[ sen(ω t)]
ms2 + k
1 Aω
= ·
ms2 + k s2 + ω 2

(12.7) = ·
(ms2 + k)(s2 + ω 2)
p
Considera-se agora dois casos, onde ω seja ou não igual a k/m.
p
C ASO 1: suponha que ω 6= k/m. Então,

(ms2 + k) (s2 + ω 2 )
pode ser desenvolvida em frações parciais. Tem-se:
Aω Bs + C Ds + E
= + 2
(ms2 + k)(s2 + ω 2 ) 2
ms + k s + ω 2
(Bs + C)(s2 + ω 2 ) + (Ds + E)(ms2 + k)
=
(ms2 + k)(s2 + ω 2 )
(B + D)s3 + (C + mE)s2 + (ω 2 B + kD)s + (ω 2C + kE)
= ·
(ms2 + k)(s2 + ω 2 )
Portanto,

(B + D)s3 + (C + mE)s2 + (ω 2 B + kD)s + (ω 2C + kE) = Aω .

Deve-se resolver o sistema dado a seguir:




 B+D = 0



 C + mE = 0


 ω 2 B + kD = 0


 ω 2C + kE = Aω

Escrevendo D = −B e C = −mE e substituindo nas duas equações restantes, obtém-se


( ( 
ω 2 B − kB = 0 ω 2 − k B = 0,
⇒ 
−mω 2 E + kE = Aω k − mω 2 E = Aω

Portanto, B = 0, que implica em D = 0. Além disso, segue-se que


1.12 Exercícios propostos 153

Aω Amω
E= ⇒ C=− ·
k − mω 2 k − mω 2
Assim,

Y (s) =
(ms2 + k) (s2 + ω 2 )
Amω 1 Aω 1
=− · + ·
k − mω 2 ms2 + k k − mω 2 s2 + ω 2
 
Aω 1 m
= − ·
k − mω 2 s2 + ω 2 ms2 + k
Usando a tabela de transformadas de Laplace e tomando as transformadas inversas, encontra-
se
" r r ! #
Aω 1 m k
(12.8) y(t) = · sen (ω t) − · sen t .
k − mω 2 ω k m

Esta função pode ser interpretada como a superposição de oscilações de duas frequências
diferentes: r
k
2π e 2πω .
m
A primeira delas é denominada frequência natural do sistema, enquanto que a segunda é a
frequência da força aplicada f (t) = A sen (ω t). Na figura 12.2 está esboçado o gráfico de y(t)
quando m = k = 1, A = 3 e ω = 2.
p
C ASO 2: para ω = k/m. Assim, de (12.7), vem que
p
Aω A k/m
Y (s) = =  p 2 
(ms2 + k)(s2 + ω 2 ) 2 2
(ms + k) s + k/m

p p
A k/m A k/m
= =  2 
(ms2 + k) [s2 + (k/m)] 2 ms + k
(ms + k)
m
r
p k √
Am k/m A m2 ·
m A km
= = =
(ms2 + k)2 ms2 + k)2 (ms2 + k)2

A km s
= · ·
s (ms2 + k)2
Como
    
−1 s −1 1 d 1
L =L − ·
(ms2 + k)2 2m ds ms2 + k
 
1 −1 1
= ·t · L
2m ms2 + k
154 1 Transformada de Laplace

Figura 12.2: Gráfico de y(t) = 2 sen (t) − sen (2t).

r !
t k
= √ · sen ·t ,
2m km m
pode-se usar a fórmula da convolução para obter
Z r !
A t k
y(t) = x · sen · x dx
2m 0 m
" r ! t Z t r !#
A x k 1 k

= − p · cos ·x + p cos ·x
2m k/m m k/m 0 m
0
" r !
A t k 0
= − p · cos · t + p · cos 0 +
2m k/m m k/m

r ! t #
1 1 k

+ p · p · sen ·x
k/m k/m m
0
" r ! # " r !#
A 1 k A t k
= · · sen · t − sen 0 − p · cos ·t
2m k/m m 2m k/m m
" r ! r r !#
A m k m k ,
= sen ·t − · t · cos ·t
2m k m k m

onde se fez uma integração por partes com


 
 u = x,  du = dx,
p  ⇒ p 
 dv = sen k/m · x dx,  v = − √1 · cos k/m · x .
k /m
1.12 Exercícios propostos 155

Logo,
r ! r !
A k A k
(12.9) y(t) = sen · x − √ · t · cos ·x .
2k m 2 km m

Portanto, quando a frequência aplicada é igual à frequência natural, a amplitude das os-
cilações cresce com o tempo e a mola se estende, enfim, além do seu limite elástico (veja a
figura 12.3, esboçada para A = k = m = 1). Este fenômeno é conhecido como ressonância e é
importante em vários problemas de Física.

Figura 12.3: Gráfico de y(t) = 1/2 · sen (t) − 1/2 · t · cos(t).

Situação bastante diferente surge ao se tentar achar a resposta deste sistema quando o peso
recebe um golpe brusco, na direção vertical, no tempo t = a, com a ≥ 0. Para obter a equação
do movimento, neste caso, introduz-se a função f definida por


 0,
 0 ≤ t ≤ a,
(12.10) f (t) = 1/c, a < t < a + c,


 0, a + c ≤ t,

onde c é uma constante positiva arbitrária.


156 1 Transformada de Laplace

Fisicamente, f representa uma força de módulo 1/c que age sobre o sistema durante um tempo
e, assim, f comunica ao sistema um impulso total de 1.17
Concorda-se agora que a descrição matemática da situação física descrita pelas palavras
“golpe brusco” se obtém aplicando-se uma força que age por intervalo de tempo arbitraria-
mente pequeno, mas comunica um impulso predeterminado, ou uma variação do momento, ao
sistema. Este problema vem a ser, então, o de determinar o comportamento da solução y(t) de
(12.5) quando f é como acima e c → 0.
A substituição de (12.10) em (12.5) resulta em



 0, 0 ≤ t ≤ a,



 Z
" r !#

 1 a+c 1 k

 √ sen (t − x) dx, a < t < a + c,
(12.11) f (t) = c a km m

 Z " r !#

 t


 1 1 k

 √ sen (t − x) dx, a + c ≤ t.
c a
 km m

Passando o limite para c → 0, obtém-se a solução




 0,

"r #
0 ≤ t ≤ a,
(12.12) y0 (t) = 1 k

 √ · sen

m
(t − a) , t > a.
km

Mas y0 (t) também é solução do P.V.I.



 00
 m y + ky = 0,

y(a) = 0,


 y0 (a) = 1/m,

e, como tal, pode ser interpretada como a resposta de uma mola pesada à qual se aplica um
momento unitário em t = a (isto é, m y0 (a) = 1) e se larga em seguida. Segue-se que, nesta
situação, y0(t) pode ser interpretada como que surgindo de um impulso unitário instantâneo,
comunicado ao sistema em t = a e o problema fica resolvido.
Para melhor compreensão sobre o que foi dito aqui, recomenda-se estudar as seções sobre a
transformada de Laplace do produto de convolução, bem como a seção sobre o delta de Dirac.

17
Diz-se que uma força constante de módulo F agindo sobre um objeto de massa m por t segundos comunica um
impulso I = F · t ao objeto. Como F = (d/dt)(mv), onde v é o módulo da velocidade do objeto (segunda lei de Newton),
segue-se que, quando F é constante, a variação total do momento mv do objeto é igual ao impulso. Neste estudo, admite-
se, por questão de comodidade, que I = 1.
1.12 Exercícios propostos 157

Sistema mecânico

Considere uma massa m suspensa por uma mola que está rigidamente presa em uma de suas
extremidades. A posição de equilíbrio é denotada por y = 0, o deslocamento para baixo é rep-
resentado por y > 0, enquanto o deslocamento para cima é representado por y < 0. Além disso,
sejam:

(i) k > 0 a constante elásticca da mola segundo a lei de Hooke;


(ii) ay0 (t) a força de amortecimento devido ao meio (por exemplo, o ar), onde a > 0, isto é, a
força de amortecimento é proporcional à velocidade y0 (t);
(iii) f (t) representa todas as forças externas atuando sobre m.

A segunda lei de Newton afirma que a soma das forças atuando sobre m é igual a my00 (t), ou
seja, que
my00 (t) = −ky(t) − ay0 (t) + f (t),
ou ainda, de forma mais simples,

(12.13) my00 + ay0 + ky = f (t).

A equação acima é chamada de equação do movimento. Se a = 0, o movimento é chamado


não amortecido. Se f (t) ≡ 0 (isto é, sem forças externas), o movimento é chamado de livre;
caso contrário é chamado de forçado.

O SCILADOR COM AMORTECIMENTO : Suponha que a massa m parta do repouso na posição


y0 . Então y(0) = y0 e y0 (0) = 0. Assim, o modelo matemático para o oscilador com amorteci-
mento partindo do repouso é dado pelo P.V.I. a seguir:

00 0
 my + ay + ky = 0,


y(0) = y0,


 y0 (0) = 0.

Aplicando a transformada de Laplace em ambos os membros, obtém-se


mL(y00 ) + aL(y0 ) + k L(y) = 0
 
m s2Y (s) − sy(0) − y0 (0) + a [sY (s) − y(0)] + kY (s) = 0

ms2 + as + k Y (s) − y0 ms − ay0 = 0

ms2 + as + k Y (s) = y0 (ms + a),
ou seja,
158 1 Transformada de Laplace

y0 (ms + a) y0 (ms + a)
Y (s) = =  ·
ms2 + as + k 2 a k
m s + ·s+
m m
A última expressão pode ser manipulada, completando-se o quadrado do denominador. As-
sim,    
2 a k 2 a a2 k a2
s + ·s+ = s + ·s+ 2 + −
m m m 4m m 4m2
  
2 a 2 k a2
= s + + − ·
2m m 4m2
Deste modo,  

y0 
 ms + a 

Y (s) = ·     2 ·
m  a 2 k a 
s2 + + − 2
2m m 4m
Agora usa-se a fórmula 8 da tabela,
   
−1 As + B kt Ak + B
L = e A · cos(wt) + · sen (wt) , (w 6= 0),
(s − k)2 + w2 w
com r
a k a2
A = m, B = a, k = − e w= − 2·
2m m 4m
Aqui é preciso ter um cuidado especial: com as hipóteses dadas, não é possível afirmar que
w 6= 0 e, assim, também não se sabe que o radicando que define w é positivo (caso contrário,
não existe a raiz quadrada). Mas observe que, se

a2 k
2
< ,
4m m
então o radicando é positivo, e assim w está bem definido e que será w 6= 0. Assim,
a2 k a2
2
< ⇒ <k ⇒ a2 < 4km.
4m m 4m
Assim, se o amortecimento for pequeno, então b2 < 4km. Além disso, fazendo

k a2
ω2 = − 2 ⇒ w = ω 6= 0,
m 4m
a expressão para Y (s) fica reescrita com
 
y0  ms + a ,
Y (s) = ·   
m 2 a 2
2
s + +ω
2m
e agora a fórmula 8 pode ser usada para concluir que
1.12 Exercícios propostos 159

 
y0 −(a/2m)·t m · (−a/2m) + a
y(t) = · e m cos(ω t) + · sen (ω t)
m ω
 
y0 −(a/2m)·t a/2
= ·e m cos(ω t) + · sen (ω t)
m ω
h a i
a
= y0 · e −( /2m)·t cos(ω t) + · sen (ω t) ·
2mω

Apêndice 4: núcleos de Dirac

Este apêndice é baseado nas referências [38] e [40] da bibliografia. Em particular, na referên-
cia [38], segue-se aquilo que está presente na seção 3.8 da mesma.
Como visto na seção 1.11, o delta de Dirac é definido por
(
+ ∞, se t = 0,
δ (t) =
0, se t 6= 0,
e Z ∞
δ (x) dx = 1.
−∞
Viu-se também que o delta de Dirac não pode ser uma função, pois uma função de fato
não pode assumir o valor infinito, pois infinito não é um número. Porém é possível estender o
domínio de δ e olhar para ele como uma função: δ : R ∪ {+ ∞} → R. Além disso, mostrou-se
nessa mesma seção que a integral do delta Dirac ser igual a 1 não faz sentido em qualquer teoria
de integração existente até hoje.
Na mesma seção 1.11 mostrou-se, informalmente, que uma importante propriedade satisfeita
pela delta de Dirac é a seguinte: se f : R → R é uma função contíua que se anula fora de um
intervalo limitado, então
Z ∞
(12.3) δ (t) f (t) dt = f (0).
−∞

Também existe problema com a expressão (12.3), pois o integrando não é uma função, de
modo que não pode ser integrado. Neste apêndice será dada uma justificativa da expressão
(12.3) de forma rigorosa. Não será dado, aqui, um sentido matemático preciso sobre o delta de
Dirac, que é feito na Teoria das Distribuições.
160 1 Transformada de Laplace

Seja un : R → R uma sequência de funções contínuas de suporte compacto (ou seja, as


funções un são nulas fora de um intervalo fechado e limitado) satisfazendo as seguintes pro-
priedades:

(1) un (t) ≥ 0;
Z ∞
(2) un(t) dt = 1;
−∞
Z
(3) Dados ε > 0 e η > 0, existe n0 ∈ N tal que un(t) dt < ε , para todo n ≥ n0.
| t |>η

Figura 12.1: Gráficos das funções un (t).

Como visto na seção 1.11, as funções un (x) podem ser entendidas, mas de modo intuitivo,
como uma aproximação do delta de Dirac. Na mesma seção viu-se que o primeiro membro de
(12.3) pode ser “definido” por
Z ∞ Z ∞
(12.4) δ (t) f (t) dt = lim un (t) f (t) dt.
−∞ n→∞ −∞

A seguir, mostrar-se-á que, com a definição em (12.4), a expressão (12.3) está correta.

D EFINIÇÃO : Uma sequência de funções un : R → R seccionalmente contínuas e que satisfaz


às propriedades (1), (2) e (3) acima é dita uma sequência de núcleos de Dirac.

Exemplo
Z 12.9: Seja u : R → R uma função seccionalmente contínua, não negativa e tal que

0< u(t) dt < ∞. Em particular, caso a função u(t) seja de suporte compacto, então a integral
−∞
anterior será sempre finita.
Seja Z ∞
k= u(t) dt.
−∞
Então as funções definidas por
n
un (t) = · u(nt)
k
1.12 Exercícios propostos 161

forma uma sequência de núcleos de Dirac.


Para mostrar (1), basta observar, pela hipótese u(t) ≥ 0, que k ≥ 0 (pois a integral de função
não negativa é um número não negativo). Além disso, por ser n > 0 e u(t) ≥ 0, segue-se daí que
u(nx) ≥ 0. Portanto,
n
un (t) = · u(nt) ≥ 0,
k
mostrando a propriedade (1).

Propriedade (2): observe que


Z ∞ Z ∞h i
n
un(t) dt = · u(nt) dt
−∞ −∞ k
Z
n ∞
= u(nt) dt
k −∞
Z ∞
n u(x)
= dx
k −∞ n
Z ∞
1
= u(x) dx
k −∞

k
= = 1,
k
onde se fez a mudança de variáveis x = nt, dx = n dt, de modo que para t = −∞, x = n · (−∞) =
−∞, e para t = ∞, x = n · (∞) = ∞. Observe que o valor da integral das funções un (x) em R é
igual a 1 porque o valor da integral no penúltimo passo acima é o valor da constante k.

Propriedade (3): sejam ε > 0 e η > 0 números dados. É preciso mostrar que existe n0 ∈ N
tal que Z
un (t) dt < ε , para todo n ≥ n0 .
| t |>η
Assim,
Z Z hn i
un (t) dt = · u(nt) dt
| t |>η | t |>η k
Z
n
= u(nt) dt
k | t |>η
Z
n u(x)
= dx
k |x |>n η n
Z
1
(12.5) = u(x) dx
k |x |>n η

onde se fez a mudança de variáveis x = nt, de modo que dx = n dt. Além disso, a desigualdade
| t | > η é equivalente a escrever que t ∈ [(−∞, −η ) ∪ (η , ∞)]. Então, x = nt ∈ [(−∞, −n η ) ∪
(n η , ∞)], ou seja, que | x | > n η sempre que | t | > η .
162 1 Transformada de Laplace

Z ∞
Por outro lado, a hipótese de que u(x) dx < ∞ implica na existência de um número α > 0
−∞
tal que
Z
(12.6) u(x) dx < k ε .
|x |>α

Tomando n0 > α/η e substituindo (12.6) em (12.5), obtém-se


Z Z
n
un (t) dt = u(x) dx
| t |>η k |x |>n η
Z
n
= u(x) dx
k |x |>α

1
< · (k ε ) = ε ,
k
mostrando que a propriedade (3) é satisfeita.

Teorema 12.1: Sejam {un} uma sequência de núcleos de Dirac e v : R → R uma função
seccionalmente contínua e limitada. Então:

(a) As funções Z ∞
vn (t) = (un ∗ v)(t) = un (t − x) v(x) dx
−∞
estão bem definidas;
(b) Suponha que un (t) seja uma função par, isto é, un(−t) = un (t) para todo t. Então, para
cada t, tem-se que
v(t + 0) + v(t − 0) ,
lim vn (t) =
n→∞ 2
onde v(t + 0) e v(t − 0) denotam, respectivamente, os limites laterais à direita e à esquerda de
cada ponto x ∈ R;
(c) A sequência {vn } converge uniformente para v em todo intervalo fechado em limitado I
que não contenha pontos de descontinuidade de v.
D EMONSTRAÇÃO : Parte (a): as funções vn (t) estão bem definidas. De fato, por hipótese, v é
limitada, ou seja, existe M ≥ 0 tal que | v(t)| ≤ M para todo t ∈ R. Assim,
Z ∞ Z ∞

u n (t − x) v(x) dx ≤ | un (t − x) v(x)| dx

−∞
−∞
Z ∞
= | un (t − x)| | v(x)| dx
−∞
Z ∞
≤ | un (t − x)| · M dx
−∞
1.12 Exercícios propostos 163

Z ∞
=M |un(t − x)| dx
−∞
Z ∞
=M un (t − x) dx,
−∞
pois, por hipótese, as funções un (t) são não negativas. Para finalizar, basta usar a hipótese que
as funções un (t) são seccionalmente contínuas, o que garante a existência da última integral
acima, mostrando assim que as funções vn (t) = (un ∗ v)(t) estão bem definidas.

Parte (b): Como (un ∗ u)(t) = (u ∗ un )(t), então pode-se escrever


Z ∞
vn (t) = un(x) v(t − x) dx.
−∞

Usando a expressão acima, bem como a propriedade (2) dos núcleos de Dirac, obtém-se
Z ∞
v(t + 0) + v(t − 0) v(t + 0) + v(t − 0)
vn (t) − = un (x) v(t − x) dx −
2 −∞ 2
= (pela propriedade (2))
Z ∞ Z ∞
v(t + 0) + v(t − 0)
= un (x) v(t − x) dx − un (t) dx
−∞ 2 −∞
Z ∞ Z ∞
v(t + 0) + v(t − 0)
= un (x) v(t − x) dx − un(t) · dx
−∞ −∞ 2
Z ∞
v(t + 0) + v(t − 0)
= un (x) v(t − x) − un(t) · dx
−∞ 2
Z ∞  
v(t + 0) + v(t − 0)
(12.7) = un (x) v(t − x) − dx.
−∞ 2
O próximo passo consiste em dividir a última integral acima em duas e depois fazer uma
estimativa. Para um δ > 0 que será escolhido logo adiante, obtém-se
Z ∞  
v(t + 0) + v(t − 0) v(t + 0) + v(t − 0)
vn (t) − = un (x) v(t − x) − dx
2 −∞ 2
Z  
v(t + 0) + v(t − 0)
= un (x) v(t − x) − dx +
|x |>δ 2
Z  
v(t + 0) + v(t − 0)
+ un (x) v(t − x) − dx
|x |≤δ 2

(12.8) = I1 + I2,

onde Z  
v(t + 0) + v(t − 0)
I1 = un (x) v(t − x) − dx
|x |>δ 2
e
164 1 Transformada de Laplace

Z  
v(t + 0) + v(t − 0)
I2 = un (x) v(t − x) − dx.
|x |≤δ 2
Por hipótese, as funções un(t) são pares; então tem-se que
Z  
v(t + 0) + v(t − 0)
I2 = un (x) v(t − x) − dx
|x |≤δ 2
Z δ  
v(t + 0) + v(t − 0)
= un (x) v(t − x) − dx
−δ 2
Z 0  
v(t + 0) + v(t − 0)
= un (x) v(t − x) − dx +
−δ 2
Z δ  
v(t + 0) + v(t − 0)
+ un (x) v(t − x) − dx
0 2
Z 0  
par. v(t + 0) + v(t − 0)
= un (−x) v(t − x) − dx +
−δ 2
Z δ  
v(t + 0) + v(t − 0)
+ un (x) v(t − x) − dx
0 2
Z 0  
v(t + 0) + v(t − 0)
= − un(y) v(t + y) − dy +
δ 2
Z δ  
v(t + 0) + v(t − 0)
+ un (x) v(t − x) − dx
0 2
Z δ  
v(t + 0) + v(t − 0)
= un (y) v(t + y) − dy +
0 2
Z δ  
v(t + 0) + v(t − 0)
+ un (x) v(t − x) − dx
0 2
Z δ Z δ
v(t + 0) + v(t − 0)
= un (y) v(t + y) dy − un(y) · dy +
0 0 2
Z δ Z δ
v(t + 0) + v(t − 0)
+ un (x) v(t − x) dx − un (x) · dx
0 0 2
= (como a variável de integração é “muda”, segue-se que)
Z δ Z δ
v(t + 0) + v(t − 0)
= un (x) v(t + x) dx − un (x) · dx +
0 0 2
Z δ Z δ
v(t + 0) + v(t − 0)
+ un (x) v(t − x) dx − un (x) · dx
0 0 2
Z δ Z δ
= un (x) v(t + x) dx + un (x) v(t − x) dx −
0 0
1.12 Exercícios propostos 165

Z δ Z δ
v(t + 0) + v(t − 0) v(t + 0) + v(t − 0)
− un (x) · dx − un (x) · dx
0 2 0 2
Z δ Z δ
v(t + 0) + v(t − 0)
= un (x) [ v(t + x) + v(t − x)] dx − 2 un (x) · dx
0 0 2
Z δ Z δ
= un (x) [ v(t + x) + v(t − x)] dx − un(x) [ v(t + 0) + v(t − 0)] dx
0 0
Z δ Z δ
= un (x) v(t + x) dx + un (x) v(t − x) dx −
0 0
Z δ Z δ
− un (x) v(t + 0) dx − un (x) v(t − 0) dx
0 0
Z δ Z δ
= un (x) [ v(t + x) − v(t + 0)] dx − un (x) [ v(t − x) − v(t − 0)] dx.
0 0
onde se fez a seguinte mudança de variáveis: y = −x e dx = −dy, de modo que, para x = − δ ,
y = δ , e para x = 0, y = 0.
Segue-se daí que
Z δ Z δ


| I2 | = un(x) [ v(t + x) − v(t + 0)] dx − un(x) [ v(t − x) − v(t − 0)] dx
0 0
Z Z
δ δ


un(x) [ v(t + x) − v(t + 0)] dx + un(x) [ v(t − x) − v(t − 0)] dx
0 0
Z δ Z δ
≤ |un (x) [ v(t + x) − v(t + 0)]| dx + |un (x) [ v(t − x) − v(t − 0)]| dx
0 0
Z δ Z δ
= |un (x)| | v(t + x) − v(t + 0)| dx + |un (x)| | v(t − x) − v(t − 0)| dx
0 0

= (as funções un (x) são não negativas; “saem” do módulo)


Z δ Z δ
= un (x) | v(t + x) − v(t + 0)| dx + un (x) | v(t − x) − v(t − 0)| dx.
0 0

Agora usa-se o fato de que v é, por hipótese, seccionalmente contínua: dado ε > 0, existe um
δ > 0 tal que

| v(t + x) − v(t + 0)| < ε e | v(t − s) − v(t − 0)| < ε

para 0 < x < δ . Portanto,


Z δ Z δ
| I2 | ≤ un (x) | v(t + x) − v(t + 0)| dx + un (x) | v(t − x) − v(t − 0)| dx
0 0
Z δ Z δ
< un (x) · ε dx + un (x) · ε dx
0 0
166 1 Transformada de Laplace

Z δ Z δ
=ε un (x) dx + ε un(x) dx
0 0
Z δ
= 2ε un (x) dx
0
Z ∞
≤ε un (x) dx
−∞

= ε · 1 = ε,
pois as funções un (t), que por Zhipótese são núcleos de Dirac, satisfazem a propriedade (2) dos

núcleos de Dirac, ou seja, que un (x) dx = 1.
−∞
O passo seguinte consiste em fazer uma estimativa para a integral I1 usando este mesmo δ
que foi agora determinado. Será usado o fato que v é limitada, isto é, existe M > 0 tal que
| v(t)| ≤ M para todo x ∈ R, em particular, para | x | > δ . Assim sendo, dado ε > 0, existe δ > 0
(o mesmo anterior), tal que
Z  

v(t + 0) + v(t − 0)
| I1| = un (x) v(t − x) − dx
|x |>δ 2
Z  
v(t + 0) + v(t − 0)
= un (x) v(t − x) dx − un(x) dx
|x |>δ 2
Z Z  
v(t + 0) + v(t − 0)
≤ un (x) v(t − x) dx + un (x) dx
|x |>δ |x |>δ 2
Z Z  

v(t + 0) + v(t − 0)
≤ | un(x) v(t − x)| dx + un (x) dx
|x |>δ |x |>δ 2
Z Z
v(t + 0) + v(t − 0)
= | un(x)| | v(t − x)| dx + | un(x)| dx

|x |>δ |x |>δ 2
Z Z
≤ | un(x)| · M dx + | un (x)| · M dx
|x |>δ |x |>δ
Z Z
≤M | un (x)| dx + M | un (x)| dx
|x |>δ |x |>δ
Z Z
≤ 2M | un (x)| dx = 2M un(x) dx.
|x |>δ |x |>δ

pois as un são não negativas.


Z Pela propriedade (3) dos núcleos de Dirac, dados ε > 0 e η > 0, existe n0 ∈ N tal que
un(t) dt < ε , para todo n ≥ n0. Segue-se da estimativa anterior,
| t |>η
Z
| I1 | ≤ 2M un (x) dx,
|x |>δ

e da propriedade (3) para os núcleos de Dirac, que existe n0 ∈ N tal que


1.12 Exercícios propostos 167

| I1 | ≤ 2M · ε , para todo n ≥ n0 .

Portanto, dado ε > 0, existe n0 ∈ N tal que




vn (t) − v(t + 0) + v(t − 0) = | I1 + I2 | ≤ | I1 | + | I2 |
2

= 2M · ε + ε

= (1 + 2M) · ε ,
para todo n ≥ n0 . Isso demonstra a parte (b).

Parte (c): Seja I = [a, b] que não contenha os pontos de descontinuidade de v. Dado η > 0,
seja J = [a − η , b + η ] um intervalo que também não contenha pontos de descontinuidade de v.
Como v é seccionalmente contínua e não tem descontinuidade em I e J, então ela é uma função
contínua nesses intervalos. E como estes intervalos são fechados e limitados (logo, conjuntos
compactos), então v é uma função uniforme contínua em I e J. Assim, dado ε > 0, existe δ > 0
tal que, se t1, t2 ∈ J e |t1 − t2| < δ , então |v(t1) − v(t2 )| < ε .
Retorna-se, agora, à expressão em (12.7):
Z ∞  
v(t + 0) + v(t − 0) v(t + 0) + v(t − 0)
(12.9) vn (t) − = un(x) v(t − x) − dx.
2 −∞ 2
Como v é contínua em J, então os limites laterais v(t + 0) e v(t − 0) são iguais e valem v(t).
Portanto,
v(t + 0) + v(t − 0) ,
v(t) =
2
que modo que a expressão em (12.9) pode ser reescrita na forma
Z ∞
vn (t) − v(t) = un (x) [v(t − x) − v(t)] dx.
−∞

A integral acima pode ser decomposta da seguinte forma:


Z Z
(12.10) vn (t) − v(t) = un(x) [v(t − x) − v(t)] dx + un (x) [v(t − x) − v(t)] dx.
|x |>δ |x |≤δ

Agora será feita uma estimativa em (12.10). Tem-se:


Z Z


vn (t) − v(t) = un (x) [v(t − x) − v(t)] dx + un (x) [v(t − x) − v(t)] dx
|x |>δ |x |≤δ
Z Z

≤ un (x) [v(t − x) − v(t)] dx + un(x) [v(t − x) − v(t)] dx
|x |>δ |x |≤δ
Z Z
≤ |un (x) [v(t − x) − v(t)]| dx + |un(x) [v(t − x) − v(t)]| dx
|x |>δ |x |≤δ
Z Z
= |un (x)| |v(t − x) − v(t)| dx + |un(x)| |v(t − x) − v(t)| dx
|x |>δ |x |≤δ
168 1 Transformada de Laplace

= (as funções un são não negativas)


Z Z
= un(x) |v(t − x) − v(t)| dx + un (x) |v(t − x) − v(t)| dx
|x |>δ |x |≤δ

(12.11) = I1 + I2,

onde
Z Z
I1 = un (x) |v(t − x) − v(t)| dx e I2 = un (x) |v(t − x) − v(t)| dx.
|x |>δ |x |≤δ

Na integral do último membro em (12.11) será usado o fato de que v é limitada, ou seja, que
existe M > 0 tal que |v(t)| ≤ M para todo x ∈ R, em particular, para | x | > δ . Assim,
Z
I1 = un (x) |v(t − x) − v(t)| dx
|x |>δ
Z
≤ un (x) [|v(t − x)| + |v(t)|] dx
|x |>δ
Z Z
= un (x) |v(t − x)| dx + |un (x)| |v(t)| dx
|x |>δ |x |>δ
Z Z
≤ un (x) · M dx + |un (x)| · M dx
|x |>δ |x |>δ
Z
= 2M un (x) dx.
|x |>δ

A propriedade
Z (3) dos núcleos de Dirac diz o seguinte: dados ε > 0 e η > 0, existe um n0 ∈ N
tal que un(t) dt < ε , para n ≥ n0. Logo, com esse ε > 0 dado e o correspondente δ > 0,
|t |>η
determina-se n0 ∈ N tal que a integral I1 fique menor do que ε , ou seja, que
Z Z ∞
un(x) dx ≤ un (x) dx < ε , para todo n ≥ n0 .
|x |>δ −∞

Portanto, segue-se que


Z
I1 ≤ 2M un(x) dx
|x |>δ
Z ∞
≤ 2M un (x) dx
−∞

(12.12) < 2M · ε .

para todo n ≥ n0
Para a integral I2 não é possível usar a limitação de v em virtude do termo v(t − x), ou seja,
é preciso ter cuidado com t − x em J. Para resolver esta questão, basta tomar δ < η , de modo
que t − x variará em J quando t percorrer I: pela continuidade de v nestes intervalos, tem-se que
|v(t − x) − v(t)| < ε . Logo, a integral I2 terá a seguinte estimativa:
1.12 Exercícios propostos 169

Z
I2 = un(x) |v(t − x) − v(t)| dx
|x |≤δ
Z
< un(x) · ε dx
|x |≤δ
Z
=ε un (x) dx
|x |≤δ
Z ∞
≤ε un (x) dx
−∞

(12.13) = ε · 1 = ε,

pois a integral de un em R é igual a 1 em virtude da propriedade (2) dos núcleos de Dirac.


Substituindo as estimativas para as integrais I1 e I2, que são, respectivamente, aquelas dadas
em (12.12) e (12.13), na expressão (12.11), conclui-se que
vn (t) − v(t) ≤ I1 + I2 < 2M · ε + ε

= (1 + 2M) ε ,
para todo x ∈ I e todo n ≥ n0 . isso demonstra a convergência uniforme da sequência {vn } em I.
E com isso, encerra-se a demonstração do teorema.

Observação 12.3: Retorna-se à explicação sobre a igualdade (12.3), isto é, que


Z ∞
δ (t) f (t) dt = f (0).
−∞

Sejam {un} uma sequência de núcleos de Dirac, onde un são funções pares, e f : R → R uma
função contínua e limitada. Com isso, as hipóteses do teorema 12.1 são satisfeitas. Este teorema
garante, em sua parte (a), que as funções
Z ∞
fn (t) = un(t − x) f (x) dx
−∞

estão bem definidas.


Além disso, o mesmo teorema, em sua parte (b), assegura, para cada x, que
f (t + 0) + f (t − 0)
lim fn (t) = ·
n→∞ 2
Mas, por hipótese, f é contínua, de modo que os limites laterais f (t + 0) e f (t − 0) são iguais
e valem ambos f (t). Portanto, conclui-se que

f (t) = lim fn (t).


n→∞
170 1 Transformada de Laplace

Além disso, a parte (c) do teorema 12.1 diz que a convergência anterior é uniforme em cada
intervalo fechado e limitado I que não contenha pontos de descontinuidade de f . Ora, a função f
é contínua em R, então se tem f (t) = lim fn (t) uniformemente em R. Agora usa-se a definição
n→∞
das fn (t) para concluir que
Z ∞
f (t) = lim un(t − x) f (x) dx.
n→∞ −∞

Em particular, para t = 0, segue-se daí que


Z ∞
f (0) = lim un (0 − x) f (x) dx
n→∞ −∞
Z ∞
= lim un (−x) f (x) dx.
n→∞ −∞

Mas por hipótese, as funções un (t) são pares, isto é, un (−t) = u(t) para todo t ∈ R. Portanto,
segue-se desta hipótese e da última igualdade acima que
Z ∞
f (0) = lim un(−x) f (x) dx
n→∞ −∞
Z ∞
par.
= lim un (x) f (x) dx.
n→∞ −∞

Como a variável de integração é “muda”, pode-se trocar a variável x por t na última integral
acima, de modo que se tem
Z ∞
(12.14) f (0) = lim un(t) f (t) dt
n→∞ −∞

Assumindo a igualdade em (12.3), ou seja,


Z ∞
f (0) = δ (t) f (t) dt,
−∞

e substituindo em (12.14), segue-se que


Z ∞ Z ∞
δ (t) f (t) dt = lim un (t) f (t) dt,
−∞ n→∞ −∞

que é a expressão dada em (12.4).


Em particular, quando f (t) = 1 para todo t ∈ R, obtém-se
Z ∞ Z ∞
δ (t) dt = lim un (t) dt
−∞ n→∞ −∞

= (pela propriedade (2) dos núcleos de Dirac)

= lim 1
n→∞

= 1,
pois a propriedade (2) dos núcleos de Dirac diz que
1.12 Exercícios propostos 171

Z ∞
un (t) dt = 1, para todo n ∈ N.
−∞

Z ∞É nesse sentido que se deve entender a integral do delta de Dirac ser igual a 1, ou seja, que
δ (t) dt = 1.
−∞
Capítulo 2
Séries de Fourier

2.1 Introdução

Estas séries surgiram quando Fourier 1 usou o método de separação de variáveis para resolver
a equação do calor. Neste capítulo estuda-se as séries de Fourier por si só. A questão central na
teoria das séries de Fourier é saber quando é possível representar uma dada função por meio de
uma série infinita envolvendo um conjunto prescrito de funções.
Quando se estuda certos problemas de valores de contorno é comum surgir a necessidade de
representar funções por séries. Por exemplo, alguns problemas da da física-matemática indicam
a necessidade de saber se uma função real f : [0, L] → R pode ser representada na forma abaixo:
∞ h  nπ x   nπ x i
a0
(1.1) f (x) = + ∑ an cos + bn sen ·
2 n=1 L L

A expressão
∞ h  nπ x   nπ x i
a0
+ ∑ an cos + bn sen
2 n=1 L L
é dita série trigonométrica.
A série de Fourier, objeto de estudo deste capítulo, é uma série trigonométrica, onde os coe-
ficientes guardam estreita relação com a função f dada a priori. Por outro lado, existem séries
trigonométricas que não são séries de Fourier. Isto será visto na seção 2.11, onde será apresen-
tada e estudada a identidade de Parseval e que demonstra, como aplicação de tal identidade, o
que foi afirmado.

2.2 Funções periódicas

D EFINIÇÃO : Uma função f : R → R diz-se periódica de período T se f (x + T ) = f (x) para


todo x ∈ R.
1 Jean-Baptiste Joseph Fourier (1768 – 1830) foi um matemático francês.

173
174 2 Séries de Fourier

Exemplo 2.1: As funções f , g : R → R, definidas por f (x) = sen x e g(x) = cos x, são per-
iódicas de período T = 2π .
De fato, tem-se que
f (x + 2π ) = sen (x + 2π ) = sen x · cos 2π + sen 2π · cosx

= sen x · 1 + 0 · cosx = sen x = f (x),


para todo x ∈ R.
Da mesma forma,
g(x + 2π ) = cos(x + 2π ) = cos x · cos 2π − sen x · sen 2π

= cos x · 1 + sen x · 0 = cos x = g(x),


para todo x ∈ R.

O leitor poderá verificar que o valor 4π também representa um período para as funções seno
e cosseno. De fato, se uma função é periódica, então ela possui vários períodos. Na verdade, não
há problema algum em funções periódicas possuírem vários períodos. Aliás, esta propriedade
das funções periódicas, além de útil, desempenha importante papel, em particular no estudo das
séries de Fourier.
Neste ponto será introduzido o conceito de período fundamental. Inicialmente, observa-se
que, se T é um período para a função f , então 2T também é um período para a mesma f . De
fato,
f (x + 2T ) = f [(x + T ) + T ] = f (x + T ) = f (x).
Outro caso também merece atenção: se f é periódica de período T , então −T também é
período para f . Com efeito,

f (x) = f [(x − T ) + T ] = f (x − T ) ⇒ f [ x + (−T )] = f (x),

mostrando que f também é periódica de período −T .


Estas duas situações mostram que uma mesma função pode ter vários períodos, positivos e
negativos. Mais ainda: de maneira mais geral tem-se que, se T é um período para a função f ,
então kT também é um período para f , onde k é um inteiro positivo, negativo ou nulo. Para ver
isso, basta usar indução em k. De fato, suponha que f é periódica de período T e que a mesma
seja periódica de período kT , isto é, que f (x + kT ) = f (x). Assim,
f [x + (k + 1)T ] = f [ x + (kT + T )] = f [(x + T ) + kT ]

= f (x + T ) = f (x),
onde usou-se a hipótese de indução no penúltimo passo acima e a peridiocidade de f no último.
Isso demonstra o que foi afirmado.
2.2 Funções periódicas 175

No caso acima, qualquer múltiplo inteiro do período T é também um período. O caso k = 0


equivale afirmar que 0 é um período de f . Mas, a rigor, o número 0 é um período para qualquer
função, pois é sempre verdade que f (x + 0) = f (x) qualquer que seja x e qualquer que seja
a função f . Deste modo não é interessante ter o valor 0 como período, devendo o mesmo ser
descartado. Portanto, ao falar sobre período de função deve-se levar em conta que T 6= 0.
Além disso, também é interessante não considerar períodos negativos, visto que seus simétri-
cos serão também períodos, bastando estes para trabalhar. Sendo conveniente considerar apenas
períodos positivos, deve-se, agora encontrar uma maneira de fixar apenas um entre eles de modo
que termine a aparente ambiguidade na definição de função periódica. Assim sendo, tem-se:

O menor período positivo é chamado de período fundamental, ou simplesmente período


quando não houver dúvida de que se trata do período fundamental.

Exemplo 2.2: Seja f : (0, 2) → R uma função definida por f (x) = x2 . Fazer uma extensão
periódica de f e de período T = 2.

S OLUÇÃO : O gráfico da função f encontra-se abaixo:

Figura 2.1: Gráfico da função f .

Inicialmente deve-se observar que uma extensão periódica implica dizer que a nova função
f esteja definida para todo x ∈ R. Tais valores de x devem ser divididos em dois grupos: (a)
x = 2k, com k ∈ Z e (b) os demais valores de x, ou seja, x ∈ (2k − 2, 2k), k ∈ Z.
Para os valores x ∈ (2k − 2, 2k) a função deve ser um “espelho” do gráfico de x2 , ou seja,
deve ser a translação desta função, para a esquerda e direita. Melhor dizendo, a função deve ser
(x − 2k)2 para x ∈ (2k − 2, 2k).
176 2 Séries de Fourier

Para os valores de f nos pontos x = 2k, com k ∈ Z, deve-se ter um cuidado adicional: a função
f dada não está definida em x = 0 e x = 2. Assim, antes de se fazer uma extensão direta para a
função f , deve-se fazer uma extensão de f , ainda não periódica, definindo-se um valor em um
dos pontos x = 0 e x = 2. Fixado um destes pontos, por exemplo, x = 0, escolhe-se qualquer
valor para a sua imagem. Aqui será assumido o valor zero, isto é, se fe denota a extensão de f
no ponto x = 0, então e f (0) = 0.
Observa-se que não é possível estender f simultaneamente nos dois valores x = 0 e x = 2,
pois a periodicidade esperada para f implicaria em duas imagens distintas para os pontos da
forma x = 2k e, consequentemente, deixaria de ser função.
Com estas considerações é possível escrever a extensão periódica da seguinte maneira:
(
(x − 2k)2 , se 2k − 2 < x < 2k, k ∈ Z,
f (x) =
0, se x = 2k.

O gráfico da extensão periódica f encontra-se na figura 2.2 abaixo.

Figura 2.2: Gráfico da função f .

Observação 2.1: Foi comentado acima que não é possível fazer uma extensão inicial de f
definindo valores simultaneamente para x = 0 e x = 2, pois a extensão periódica não seria
função. A maneira mais simples de ver isso é considerar a função g : [0, 2] → R definida por
g(x) = x2 . Com isso, nota-se facilmente que g(0) = 0 e g(2) = 4. Se uma nova extensão, agora
periódica, for feita, então o gráfico será como na figura 2.3.
Agora basta observar que em cada ponto da forma x = 2k, com k ∈ Z, existem duas imagens,
isto é, g(2k) assume os valores 0 e 4. Deste modo, a extensão periódica g não é uma função.
Em suma, não é possível fazer uma extensão periódica para a função g : [0, 2] → R definida por
g(x) = x2 .
2.2 Funções periódicas 177

Figura 2.3: Gráfico da extensão periódica de g, mostrando que não é função.

Exemplo 2.3: Seja f : R → R uma função definida por f (x) = sen (nπ x/L), onde n ∈ N é fixo,
porém arbitrário.
Deseja-se determinar o período fundamental T para a função dada. Assim, para que T seja
período, para todo x ∈ R, deve-se ter
h nπ i  nπ x 
sen (x + T ) = sen ,
L L
ou seja,     
 nπ x  nπ T nπ T nπ x   nπ x 
sen · cos + sen · cos = sen ·
L L L L L
A última equação acima é verdadeira para todos os valores de x real. Assim, em particular,
pode-se tomar x = L/2n para obter
π    π    π 
nπ T nπ T ,
sen · cos + cos · sen = sen
2 L 2 L 2
π    π 
nπ T ,
sen · cos = sen
2 L 2
que implica em
 
nπ T
(2.1) cos = 1.
L

Usando a identidade trigonométrica fundamental sen 2 θ + cos2 θ = 1, com θ = (nπ T)/L,

obtém-se
     
2 nπ T 2 nπ T 2 nπ T
sen + cos =1 ⇒ sen + 12 = 1,
L L L
178 2 Séries de Fourier

isto é,
 
nπ T
(2.2) sen = 0.
L
Agora deve-se procurar o menor valor positivo de T que satisfaça as equações (2.1) e (2.2)
simultaneamente. Logo, o argumento (nπ T)/L deve ser igual a 2π . Assim,
nπ T 2L
= 2π ⇒ T= ·
L n
Portanto, o período fundamental de sen (n π x/L) é T = 2L/n.

Exemplo 2.4: Analogamente, mostra-se que o período fundamental de cos (n π x/L) também é
T = 2L/n.

De fato, suponha que T é um período fundamental da função f : R → R definida por f (x) =


cos (nπ x/L), onde n ∈ N é fixo, porém arbitrário. Então, para todo x ∈ R, deve-se ter f (x + T ) =
f (x), isto é, h nπ i nπ x ,
cos (x + T ) = sen
L L
ou seja,    
 nπ x  nπ T  nπ x  nπ T  nπ x 
cos · cos − sen · sen = cos ·
L L L L L
Como a igualdade acima vale para todo x real, basta tomar, em particular, x = L/2n, para
escrever
π    π    π 
nπ T nπ T ,
cos · cos − sen · sen = cos
2 L 2 L 2
   
nπ T nπ T
0 · cos − 1 · sen = 0,
L L
 
nπ T
(2.3) sen = 0,
L
onde usou-se os fatos que cos(π/2) = 0 e sen (π/2) = 1.
Com a identidade trigonométrica fundamental sen 2 θ + cos2 θ = 1, com θ = (nπ T )/L, obtém-
se
     
2 nπ T 2 nπ T 2 2 nπ T
sen + cos =1 ⇒ 0 + cos = 1,
L L L
isto é,
 
nπ T
(2.4) cos = 1.
L
2.2 Funções periódicas 179

Assim, procura-se pelo menor valor positivo de T que satisfaça as equações (2.3) e (2.4)
simultaneamente. Logo, o argumento (nπ T)/L deve ser igual a 2π , isto é,
nπ T 2L
= 2π ⇒ T= ·
L n
Portanto, o período fundamental de cos(nπ x/L) é T = 2L/n.

O leitor deve ter em conta que o objetivo deste texto é estudar e analisar as séries de Fourier,
de modo que o estudo das funções periódicas que está sendo feito aqui se deve a periodicidade
das funções senos e cossenos que aparecem neste tipo de série e que foi mostrada através dos
exemplos 2.3 e 2.4. Assim, observando, mais uma vez, que se uma função pode ser representada
por sua série de Fourier, então é possível escrever
∞ h  nπ x   nπ x i
a0
f (x) = + ∑ an cos + bn sen ·
2 n=1 L L

Em virtude da periodicidade das funções senos e cossenos na série de Fourier, é possível


questionar se a função f , no primeiro membro, também deve ser periódica, ou seja, é preciso
saber se a periodicidade de f é uma exigência para que faça sentido falar em sua série de Fourier.
Antes de responder tal questionamento, é preciso observar que o segundo membro da última
igualdade acima, que é a série de Fourier, possui termos envolvendo senos e cossenos, multipli-
cação por escalar, bem como suas somas (e diferenças). Assim, é preciso garantir, primeiro, que
somas e diferenças de funções periódicas também é uma função periódica e que a multiplicação
de uma função periódica por um escalar é periódica.
Os próximos resultados e exemplos a seguir caminham nesta direção, têm como objetos exibir
as propriedades satisfeitas pelas funções periódicas, bem como certos cuidados que se deve ter.
Antes, define-se as seguintes operações algébricas entre funções. Sejam X ⊂ R, a ∈ R e
f , g : X → R duas funções. Então, por definição,
(a · f )(x) = a · f (x);

( f ± g)(x) = f (x) ± g(x);

( f · g)(x) = f (x) · g(x);


 
f f (x) ,
(x) = [ para g(x) 6= 0 ].
g g(x)

Proposição 2.1: Sejam f , g : X → R funções periódicas de período T . Então, também são


periódicas de período T as seguintes funções:
(a) f ± g;
(b) f · g;
(c) λ · f , onde λ ∈ R
180 2 Séries de Fourier

(d) f/g, desde que g(x) 6= 0.


D EMONSTRAÇÃO : Como f e g são periódicas de mesmo período T , para todo x ∈ R, tem-se

f (x + T ) = f (x) e g(x + T ) = g(x).

Logo,
( f + g)(x + T ) = f (x + T ) + g(x + T ) = f (x) + g(x) = ( f + g)(x),
o que mostra que f + g é periódica de período T .
Analogamente,

( f − g)(x + T ) = f (x + T ) − g(x + T ) = f (x) − g(x) = ( f − g)(x),

mostrando que f − g também é uma função periódica de período T .

(b) Para todo x ∈ R, tem-se

( f · g)(x + T ) = f (x + T ) · g(x + T ) = f (x) · g(x) = ( f · g)(x),

de modo que f · g também é periódica de período T .

(c) Para todo x ∈ R e λ ∈ R, tem-se

(λ · f )(x + T ) = λ · f (x + T ) = λ · f (x) = (λ · f )(x),

mostrando que λ · f é periódica de período T .

Seja f (x)/g(x), tal que g(x) 6= 0, para x ∈ R. Tem-se:


   
f f (x + T ) f (x) f
(x + T ) = = = (x),
g g(x + T ) g(x) g
o que demonstra que o quociente entre duas funções periódicas de período T também é periódica
de mesmo período, mas desde que o denominador não se anule.

Proposição 2.2: Seja f : X → R uma função periódica de período T . Então o período da


função f (ax), onde a 6= 0 é um número real, é T/a.
D EMONSTRAÇÃO : Seja g : R → R definida por g(x) = f (ax). Suponha que P ∈ R+ seja o
período de g. Então, g(x + P) = g(x), isto é,

f [a(x + P)] = f (ax) ⇒ f (ax + aP) = f (ax).

Agora faça t = ax para obter


f (t + aP) = f (t).
2.2 Funções periódicas 181

Deste modo, aP também é um período de f . Como T é o período de f , então nT , com n ∈ Z,


também é período. Assim, existe k ∈ Z tal que

aP = kT, k ∈ Z.

Portanto,
T
P=k ·
a
Considerando entre todos os valores de P aquele que é o menor positivo, tem-se que T/a é um
período para g. De fato,
    
T T
g x+ = f a x+ = f (ax + T ) = f (ax) = g(x).
a a

Observação 2.2: Na proposição 2.1, é importante notar que o período T assumido é qualquer,
isto é, não é necessariamente o período fundamental. Além disso, deve-se entender que aquelas
propriedades nos itens (a)–(d) são satisfeitas para algum período e não para todos os períodos.
Por exemplo, para o caso da diferença entre funções periódicas f e g, o que se pode dizer é que,
se existir certo período T comum a f e g, então este também será o período de f − g. Isso não
impede que exista outro período P, igualmente comum a f e g, que não seja período para f − g.
Em geral, isso pode acontecer quando se toma como período para f e g o período fundamental.
Os próximos exemplos ilustram esta situação.

Exemplo 2.5: O objetivo deste exemplo é mostrar que a diferença de duas funções periódicas
com o mesmo período fundamental é ainda periódica, porém com um período diferente do
fundamental.
Sejam f , g : R → R funções definidas por

f (x) = sen x e g(x) = 4 sen x · cos2 x.

Figura 2.4: Gráfico da função f (x) = sen x.


182 2 Séries de Fourier

Figura 2.5: Gráfico da função g(x) = 4 sen x · cos2 x.

O exemplo 2.1 mostrou que o período de f é igual 2π . Afirma-se que g tem o mesmo período
2π . De fato, basta observar que

g(x + 2π ) = 4 sen (x + 2π ) · cos2(x + 2π )

= 4 sen (x + 2π ) · cos(x + 2π ) · cos(x + 2π )

= 4 sen x · cos x · cosx (pois seno e cosseno têm período 2π )

= 4 sen x · cos2 x = g(x).


Agora considere a função h : R → R definida por

h(x) = g(x) − f (x) = 4 sen x · cos2 x − sen x.

Figura 2.6: Gráfico da função h(x) = sen 3x.

Observe-se que a função h pode ser reescrita na forma

h(x) = g(x) − f (x) = 4 sen x · cos2 x − sen x


  
= sen x · 4 cos2 x − 1 = sen x · 3 cos2 − 1 − cos2 x

= sen x · 3 cos2 x − sen 2 x = 3 sen x · cos2 x − sen 3 x

= 2 sen x · cos2 x + sen x · cos2 x − sen 3 x



= (2 sen x · cosx) · cos x + sen x · cos2 x − sen 2 x

= sen 2x · cos x + sen x · cos2 x − sen 2 x
2.2 Funções periódicas 183

= sen 2x · cos x + sen x · cos 2x

= sen (2x + x) = sen 3x.


Assim, para h(x) = sen 3x, basta usar o exemplo 2.2 e tomar L = π e n = 3 em T = 2L/n para
concluir que h tem como período T = 2π/3.

Exemplo 2.6: Este exemplo mostra que o produto entre duas funções periódicas com o
mesmo período fundamental é uma função periódica, mas tendo período distinto do funda-
mental.
Sejam f , g : R → R funções definidas por

f (x) = sen x e g(x) = cos x.

Considere h : R → R uma função dada por h(x) = f (x) · g(x). Assim,


h(x) = f (x) · g(x) = sen x · cos x
1
= ( sen x · cos x + sen x · cos x)
2
1 1
= · sen (x + x) = · sen 2x.
2 2
Tem-se que o período de f e g é igual a 2π , enquanto o período de h é π . Para confirmar
a afirmação para f e g, basta consultar o exemplo 2.1. Para a afirmação sobre o período de h,
basta consultar o exemplo 2.2, tomando T = 2L/n, L = π e n = 2.

Exemplo 2.7: Neste exemplo será mostrado que o quociente entre funções com o mesmo
período fundamental é ainda periódica, porém com período diferente do fundamental.
Sejam f , g : R → R funções definidas por

f (x) = sen x e g(x) = cos x.

Considere h : R → R uma função dada por


f (x) sen x
h(x) = = = tg x.
g(x) cos x
Como foi visto no exemplo 2.1, f e g têm período 2π , enquanto h tem período π . De fato,

sen (x + π )
h(x + π ) = tg (x + π ) =
cos(x + π )
sen x · cos π + sen π · cos x
=
cos x · cos π − sen x · sen π
184 2 Séries de Fourier

− sen x sen x
= =
− cosx cos x
= tg x = h(x).

Exemplo 2.8: Este exemplo mostra que existem funções periódicas de mesmo período e cuja
soma entre elas não possui um período fundamental.
Sejam f , g : R → R funções definidas por

f (x) = sen 2 x e g(x) = cos2 x.

Antes é preciso determinar o período fundamental para estas duas funções. Afirma-se que as
funções f e g acima têm período T = π .

Figura 2.7: Gráfico da função f (x) = sen 2 x.

Figura 2.8: Gráfico da função g(x) = cos2 x.

De fato, se T é um período fundamental para f (x) = sen x, então sen (x + T ) = sen x. Ele-
vando ambos os membros ao quadrado, segue-se que a equação a seguir deve ser satisfeita:

(2.5) sen 2 (x + T ) = sen 2x.

Mas da trigonometria tem-se que


2.2 Funções periódicas 185

1 − cos 2θ
sen 2 θ = ·
2
Fazendo θ = x + T no primeiro membro e θ = x no segundo membro de (2.5), obtém-se
1 − cos[2(x + T )] 1 − cos(2x)
= ⇒ cos(2x + 2T ) = cos(2x),
2 2
isto é,
cos(2x) · cos(2T ) − sen (2x) · sen (2T ) = cos(2x).
Em particular, tomando x = π , obtém-se

cos(2π ) · cos(2T ) − sen (2π ) · sen (2T ) = cos(2π ),

ou seja,

(2.6) cos(2T ) = 1.

Pela identidade trigonométrica fundamental, sen 2 θ + cos2 θ = 1, tomando θ = 2T e usando


(2.6), obtém-se

sen 2(2T ) + cos2 (2T ) = 1 ⇒ sen 2(2T ) + 12 = 1,

donde segue-se que

(2.7) sen (2T ) = 0.

Assim, deve-se procurar o menor período positivo T onde as equações (2.6) e (2.7) são satis-
feitas simultaneamente, isto é,

cos(2T ) = 1 e sen (2T ) = 0.

Portanto,
2T = 2π ⇒ T = π.
Isto mostra que a função f (x) = sen 2 x tem período π . Analogamente mostra-se que a função
g(x) = cos2 x tem o mesmo período π .

Figura 2.9: Gráficos das funções f (x) = sen 2 x e g(x) = cos2 x.


186 2 Séries de Fourier

Agora considere h : R → R uma função definida por

h(x) = f (x) + g(x) = sen 2 x + cos2 x = 1.

Deste modo, enquanto as funções f e g têm período igual a π , a função h, que é soma de f e
g, não tem um período fundamental (pois h é constante e igual a 1).

A proposição 2.1 deu uma resposta positiva sobre a periodicidade de somas, diferenças, mul-
tiplicação por escalar, etc. para funções periódicas. E através dos exemplos anteriores viu-se
que se deve tomar cuidado com os resultados afirmados na citada proposição.
Agora, interessa ao estudo das séries de Fourier saber se há exigência de periodicidade para a
função f dada. Para isso, deve-se observar que, na expressão para a série de Fourier, as funções
cossenos e senos que aparecem na mesma têm períodos diferentes, como pode ser comprovado
através dos exemplos 2.3 e 2.4, pois o valor do período T = 2L/n muda para cada valor de
n ∈ N. E na série de Fourier tais funções senos e cossenos aparecem somadas. Assim, é preciso
investigar quando é possível garantir que somas de funções periódicas de períodos distintos
é ainda uma função periódica. Note-se que esta situação é diferente de tudo aquilo que foi
estudado até este ponto.

Exemplo 2.9: Este exemplo mostra que a soma de duas funções periódicas de períodos dife-
rentes pode ser periódica.
Antes de exibir o exemplo propriamente dito, analisar-se-á a seguinte situação: considere
duas funções f , g : R → R definidas por f (x) = sen x e g(x) = cos x. O exemplo 2.1 mostrou que
as funções f e g são periódicas de período T = 2π , isto é, sen (x + 2π ) = sen x e cos(x + 2π ) =
cos x.
Agora defina h : R → R por

h(x) = f (x) + g(x) = sen x + cos x.

Assim,
h(x + 2π ) = sen (x + 2π ) + cos(x + 2π ) = sen x + cos x = h(x),
mostrando que a soma de duas funções periódicas também pode ser periódica. Este caso está,
portanto, em conformidade com o item (a) da prosição 2.1.
Por outro lado, existem casos em que as funções f e g possuem períodos diferentes e que a
sua soma ainda poderá ser periódica.
Para ver isso, considere, como exemplo, as seguintes funções u, v : R → R definidas por
u(x) = sen (π x) e v(x) = sen (2π x). A função u é periódica de período T1 = 2, pois

u(x + 2) = sen [π (x + 2)] = sen (π x + 2π )

= sen (π x) · cos(2π ) + sen (2π ) · cos(2x)


2.2 Funções periódicas 187

= sen (π x)

= u(x).
Observa-se também que v é periódica de período T2 = 1, pois
v(x + 1) = sen [2π (x + 1)] = sen (2π x + 2π )

= sen (2π x) · cos(2π ) + sen (2π ) · cos(2π x)

= sen (2π x) = v(x).

Figura 2.10: Gráfico da função u(x) = sen (π x).

Figura 2.11: Gráfico da função v(x) = sen (2π x).

Agora considera-se w : R → R definida por

w(x) = u(x) + v(x) = sen (π x) + sen (2π x).

Assim, para todo x ∈ R, tem-se


w(x + 2) = sen [π (x + 2)] + sen [2π (x + 2)]

= sen (π x + 2π ) + sen (2π x + 4π )


188 2 Séries de Fourier

Figura 2.12: Gráfico da função w(x) = sen (π x) + sen (2π x).

= sen (π x) · cos(2π ) + sen (2π ) · cos(π x) +

+ sen (2π x) · cos(4π ) + sen (4π ) · cos(2π x)

= sen (π x) + sen (2π x) = w(x),


mostrando que w é periódica de período T = 2.

Se f é periódica de período T1 e g é periódica de período T2 , com T1 6= T2 , então a função ( f +


g)(x) poder ser periódica (veja o exemplo 2.9). Por outro lado, existem situações em que ( f +
g)(x) não é periódica (veja o exemplo 2.10 mais adiante). O próximo resultado dá informações
sobre quando a soma ( f + g)(x) é periódica.

Proposição 2.3: Sejam f : R → R uma função periódica de período T1 e g : R → R uma


função periódica de período T2 . Suponha que existam inteiros m e n tais que mT1 = nT2 . Então
a função f + g é periódica de período T = mT1 .
D EMONSTRAÇÃO : Como T1 e T2 são os períodos, respectivamente, para as funções f e g,
pode-se escrever
f (x + T1 ) = f (x) e g(x + T2 ) = g(x).
Por hipótese, existem m, n ∈ Z tais que mT1 = nT2 . Faça T = mT1 . Agora deve ser lembrado
que, se T é período de uma função periódica, então kT também é um período, onde k ∈ Z, ou
seja, que se tem
f (x + mT1 ) = f (x) e g(x + nT2 ) = g(x).
Desse modo,

( f + g)(x + T ) = f (x + T ) + g(x + T ) = f (x + mT1 ) + g(x + mT1)

= f (x + mT1 ) + g(x + nT2)


2.2 Funções periódicas 189

= f (x) + g(x) = ( f + g)(x).

A proposição 2.3 exige que se tenha inteiros m e n tais que mT1 = nT2 para que a soma de
funções periódicas seja periódica. Mas
T1 n
mT1 = nT2 ⇒ = ,
T2 m
isto é, o quociente entre os períodos deve ser racional para que a soma de funções periódicas
também seja periódica.
Isso justifica o motivo de a função h(x) = sen (π x) + cos(2π x) do exemplo 2.9 ser periódica:
as funções f (x) = sen (π x) e g(x) = cos(2π x) são periódicas e cujos períodos são, respectiva-
mente, T1 = 2 e T2 = 1. Assim,
T1 2
= ⇒ 1 · T1 = 2 · T2 ,
T2 1
ou seja, m = 1 e n = 2 são os dois inteiros esperados.
O exemplo 2.9 mostrou que a soma de duas funções periódicas com períodos distintos pode
resultar em uma função ainda periódica. Por outro lado, nem sempre a soma de duas funções
periódicas de períodos diferentes será necessariamente periódica. O próximo exemplo exibe
esta situação.

Exemplo 2.10: O objetivo deste exemplo é mostrar que a soma de duas funções periódicas
de períodos diferentes pode não ser periódica.

De fato, basta considerar duas funções entre aquelas apresentadas no exemplo 2.9: sejam
f , g : R → R duas funções definidas por f (x) = sen x e g(x) = sen (π x). Como já foi visto no
citado exemplo, f (x) = sen x é periódica de período T1 = 2π e g(x) = sen (π x) é periódica de
período T2 = 2.
Agora observe que
T1 2π
= = π 6∈ Q.
T2 2
Definindo h : R → R por h(x) = f (x) + g(x) = sen x + sen (π x), segue-se que h não é perió-
dica, pois a mesma é soma de duas funções periódicas f e g cujo quociente de seus períodos
não é um racional.

A situação do exemplo 2.10 precisa ser melhor esclarecida, uma vez que se está diante de
uma situação embaraçosa: a soma de funções periódicas de períodos distintos pode, ou não, ser
periódica. Neste caso, para as séries de Fourier, cujas funções cossenos e senos não têm neces-
sariamente o mesmo período (veja exemplos 2.3 e 2.4), tal situação não permitiria conclusão
alguma sobre a periodicidade da função f dada a priori.
190 2 Séries de Fourier

O próximo resultado será usado na demonstração da proposição 2.5, dada a seguir, que per-
mitirar explicar o motivo de o exemplo 2.10 ter produzido uma soma não periódica de funções
periódicas (mas de períodos diferentes).

Proposição 2.4: Se f é uma função diferenciável e periódica de período T . Então a função


derivada, f 0 , também é periódica de período T .
D EMONSTRAÇÃO : Seja x = α + T para algum α ∈ [0, T ]. Note-se que para qualquer valor
de h, tem-se

f (x + h) − f (x) = f (α + T + h) − f (α + T )

= f [(α + h) + T ] − f (α + T )

(2.8) = f (α + h) − f (α ),

onde usou-se a periodicidade de f no penúltimo passo.


Tem-se também que f é diferenciável por hipótese. Assim, usando a definição de derivada e
(2.8), obtém-se
f (x + h) − f (x)
f 0 (x) = lim
h→0 h
f (α + h) − f (α )
= lim
h→0 h
(2.9) = f 0 (α ).

A igualdade obtida em (2.9) mostra que f 0 (x) = f 0 (α ). Mas x = α + T . Deste modo, f 0 (α +


T ) = f 0 (α ). Porém, como α é arbitrário, segue-se que o resultado é sempre verdadeiro para
qualquer α . Isto mostra que f 0 é periódica de período T .

O próximo resultado usa a proposição 2.4 para dar melhor entendimento sobre o que ocorreu
com a soma de funções periódicas (de períodos distintos) não ser periódica no exemplo 2.10.

Proposição 2.5: A função f : R → R, definida por f (x) = sen (ax) + sen (bx), é periódica se,
e somente se, a/b é racional.
D EMONSTRAÇÃO : Suponha que a/b seja racional. Então a, b ∈ Z. Deve-se mostrar que
f (x) = sen (ax) + sen (bx) é uma função periódica. Afirma-se que T1 = a · 2π é período para a
função sen (ax) e T2 = b · 2π é período para a função sen (bx). De fato,
sen (ax + T1 ) = sen (ax + 2aπ ) = sen (ax) · cos(2aπ ) + sen (2aπ ) · cos(ax) = sen (ax),

sen (bx + T2 ) = sen (bx + 2bπ ) = sen (bx) · cos(2bπ ) + sen (2bπ ) · cos(bx) = sen (bx),
2.2 Funções periódicas 191

pois sen (2aπ ) = sen (2bπ ) = 0 e cos(2aπ ) = cos(2bπ ) = 1 por serem múltiplos inteiros pares
de π . Além disso, tem-se que
T1 a · 2π a
= = ⇒ bT1 = aT2 .
T2 b · 2π b
Faça g(x) = sen (ax) e h(x) = sen (bx). Se a = b, então g(x) e h(x) tem o mesmo período,
de modo que item (a) da proposição 2.1 garante que a soma (g + h)(x) é periódica de mesmo
período. Caso a 6= b, então g(x) e h(x) terão períodos diferentes. Porém a condição bT1 =
aT2 , a, b ∈ Z, obtida acima permite usar a proposição 2.3 para concluir que f (x) = sen (ax) +
sen (bx) é uma função periódica. Isso mostra que a função f é periódica caso a/b seja racional.
Reciprocamente, suponha que a função f (x) = sen (ax) + sen (bx) seja periódica e que seu
período seja T . Agora deve-se demonstrar que a/b é racional.
Observe-se que f é uma função diferenciável (aliás, infinitamente diferenciável). Pela proposi-
ção 2.4, tem-se que
f 00 (x) = −a2 sen (ax) − b2 sen (bx)
também é periódica de mesmo período T .
Além disso,

f (0) = sen 0 + sen 0 = 0 e f 00 (0) = −a2 sen 0 − b2 sen 0 = 0.

Logo, pela periodicidade de f e f 00 , segue-se que

f (T ) = f (0 + T ) = f (0) = 0 e f 00 (T ) = f 00 (0 + T ) = f 00 (0) = 0.

Tem-se, portanto, o seguinte sistema:


(
sen (aT ) + sen (bT ) = 0,
a2 sen (aT ) + b2 sen (bT ) = 0.

Resolvendo o sistema acima, obtém-se



a2 sen (aT ) + b2 [− sen (aT )] = 0 ⇒ a2 − b2 sen (aT ) = 0,

implicando em sen (aT ) = 0, para a 6= b.


Substituindo na primeira equação, obtém-se também que sen (bT ) = 0 (a 6= b). Portanto,
tem-se que
sen (aT ) = sen (bT ) = 0, para a 6= b.
Daí segue-se que aT e bT são múltiplos inteiros de π , isto é,

aT = nπ e bT = mπ , m, n ∈ Z,

de modo que
a nπ/T nπ T n
= = · = ,
b mπ/T T mπ m
192 2 Séries de Fourier

mostrando que a/b é racional (pois é quociente de dois inteiros). Caso b = a 6= 0, então o resul-
tado é imediato, pois a/b = a/a = 1, mostrando que o quociente é racional.

No caso do exemplo 2.10, a função h(x) = sen x + sen (π x) tem a = 1 e b = π , de modo que
a 1
= ∈/ Q,
b π
mostrando que esta a função h não é periódica. Isto mostra que a questão não está relacionada
apenas aos períodos envolvidos, mas também com os argumentos das funções senos.
A partir deste ponto retorna-se às considerações sobre as séries de Fourier, onde será anali-
sada a periodicidade da função f que é dada a priori. A proposição 2.3 diz que a soma de duas
funções periódicas com períodos diferentes é também periódica, desde que o quociente entre os
períodos seja um racional. Sejam
2L 2L
Tn = e Tm = , (m 6= n),
n m
dois períodos distintos (para as funções cosseno e seno acima. Então,
Tn 2L/n 2L m m
= = · = ∈ Q,
Tm 2L/m n 2L n
pois m, n ∈ N.
Isso mostra que faz sentido procurar um período para a função f (x) dada a priori e que dá
origem a sua série de Fourier.
A ideia a ser perseguida consiste em procurar um período que seja comum a todas funções
cossenos e senos que aparecem na série de Fourier e depois analisar se tal período também é
um período para f . Os exemplos 2.3 e 2.4 mostraram que as funções
 nπ x   nπ x 
cos e sen
L L
têm período Tn = 2L/n, ou seja, para cada n ∈ N, estas funções possuem períodos distintos.

Exemplo 2.11: Os exemplos 2.3 e 2.4 mostraram que as funções


 nπ x   nπ x 
sen e cos
L L
têm o mesmo período Tn = 2L/n.
Mostrar-se-á que estas duas funções têm um período comum e igual a 2L. Note-se que a
afirmação feita diz apenas que estas funções têm, para cada n ∈ N, um período em comum, que
não necessariamente é o período fundamental para cada uma delas.
Com efeito, já foi comentado anteriormente que qualquer múltiplo inteiro do período funda-
mental também é um período. Assim, segue-se desta observação que n · Tn também é período,
de modo que
2.2 Funções periódicas 193

2L
= 2L
P = n · Tn = n ·
n
é um período comum para sen (nπ x/L) e para cos (nπ x/L).

Exemplo 2.12: Suponha que f : R → R é uma função que possa ser representada através de
sua série de Fourier, isto é, que se possa escrever
∞ h  nπ x   nπ x i
a0
f (x) = + ∑ an cos + bn sen ·
2 n=1 L L

Então, nestas condições, f é uma função periódica de período T = 2L.

De fato, como foi visto nos exemplos 2.3 e 2.4, as funções cos(nπ x/L) e sen (nπ x/L) têm como
período fundamental T = 2L/n para cada n ∈ N. Além disso, viu-se no exemplo 2.11 que P = 2L
é um período comum a todas estas funções. Assim,
∞ n h nπ i h nπ io
a0
f (x + 2L) = + ∑ an cos (x + 2L) + bn sen (x + 2L)
2 n=1 L L
∞ h  nπ x   nπ x i
a0
= + ∑ an cos + 2nπ + bn sen + 2nπ
2 n=1 L L
∞   nπ x   nπ x 
a0
= + ∑ an cos · cos(2nπ ) + an sen · sen (2nπ ) +
2 n=1 L L
 nπ x   nπ x  
+ bn sen · cos(2nπ ) + bn sen (2nπ ) · cos
L L
∞ h  nπ x   nπ x i
a0
= + ∑ an cos + bn sen
2 n=1 L L

= f (x),
onde usou-se os seguintes fatos

cos(2nπ ) = 1 e sen (2nπ ) = 0, n ∈ N.

Isto mostra que f (x + 2L) = f (x), ou seja, que toda função que pode ser escrita como sua
série de Fourier é periódica de período 2L.

Na seção 2.3 será apresentada uma maneira de determinar os coeficientes de Fourier. Para
isso, será necessário assumir um tipo de convergência que permita integrar a série termo a
termo, ou seja, passar o sinal de integração para depois do sinal de somatório. Em geral, isso
não é possível, mas se a convergência for uniforme, então sim. Além disso, a integração será
194 2 Séries de Fourier

feita em um intervalo muito particular: [−L, L]. A questão é justificar o motivo para a escolha
deste intervalo.
O próximo resultado mostrará que qualquer intervalo tendo o comprimento do período T da
função periódica f pode ser usado na integração termo a termo da série de Fourier (lembrando
que isto será feito na seção 2.3). Ou mais geralmente: que a integral de uma função periódica
de período T tem o mesmo valor em qualquer intervalo de comprimento T .

Proposição 2.6: Seja f : R → R uma função periódica de período T e integrável em qualquer


intervalo. Então, para qualquer a ∈ R, tem-se
Z a+T Z T
f (x) dx = f (x) dx.
a 0

D EMONSTRAÇÃO : Seja ϕ : R → R uma função definida por


Z x+T
ϕ (x) = f (t) dt.
x

Note-se que ϕ está bem definida, pois f é integrável em qualquer intervalo. Assim, pelo
teorema fundamental do cálculo, tem-se que
ϕ 0 (x) = f (x + T ) − f (x) ⇒ ϕ 0 (x) = 0,

pois f é periódica de período T , isto é, f (x + T ) = f (x).


Como ϕ 0 (x) = 0, segue-se que ϕ (x) é constante. Portanto, tem-se que ϕ (a) = ϕ (0), ou seja,
Z a+T Z T
f (t) dt = ϕ (a) = ϕ (0) = f (t) dt,
a 0

que é o resultado desejado.

Corolário 2.1: Seja f : R → R uma função periódica de período T = 2L e integrável em


qualquer intervalo. Então, para qualquer a ∈ R, tem-se
Z 2L Z a+L
f (t) dt = f (t) dt.
0 a−L

D EMONSTRAÇÃO : Viu-se na demonstração da proposição 2.6 que a função ϕ : R → R dada


por
Z x+2L
ϕ (x) = f (t) dt
x
é constante, pois f é periódica de período T = 2L.
Em particular, tem-se que ϕ (0) = ϕ (a − L). Assim,
Z 2L Z (a−L)+2L Z a+L
f (t) dt = ϕ (0) = ϕ (a − L) = f (t) dt = f (t) dt,
0 a−L a−L
2.2 Funções periódicas 195

que é o resultado desejado.

Corolário 2.2: Seja f : R → R uma função periódica de período T = 2L e integrável em


qualquer intervalo. Então, para qualquer a ∈ R, tem-se
Z a+L Z L
f (t) dt = f (t) dt.
a−L −L

D EMONSTRAÇÃO : Pela demonstração da proposição 2.6, a função ϕ : R → R dada por


Z x+2L
ϕ (x) = f (t) dt
x

é constante, pois f é periódica de período T = 2L.


Em particular, tem-se que ϕ (a − L) = ϕ (−L). Assim,
Z a+L Z −L+2L Z L
f (t) dt = ϕ (a − L) = ϕ (−L) = f (t) dt = f (t) dt,
a−L −L −L

que é o resultado desejado.

Usando a proposição 2.6 com T = 2L, bem como os corolários 2.1 e 2.2, obtém-se, por
transitividade, que
Z a+2L Z 2L Z a+L Z L
f (t) dt = f (t) dt = f (t) dt = f (t) dt,
a 0 a−L −L

isto é, Z a+2L Z L
f (t) dt = f (t) dt.
a −L
A última igualdade acima mostra que a integral de uma função f : R → R periódica de
período T = 2L também pode ser calculada no intervalor simétrico [−L, L] (e que também tem
comprimento 2L). Isto ainda não é suficiente para explicar o motivo da escolha de integrar
termo a termo a série de Fourier no intervalo [−L, L], apenas que uma integração pode feita
neste intervalo sem alterar valores e a convergência. O motivo será apresentado na seção 2.3,
mas será plenamente esclarecido na seção 2.5.
O próximo resultado analisa as relações sobre periodicidade entre a função f e a função ϕ
(que é nomeada de integral indefinida) introduzida na demonstração da proposição 2.6 e que
será útil em capítulos futuros.

Proposição 2.7: Seja f : R → R uma função periódica de período T e integrável. Então a


função ϕ : R → R, definida por Z x
ϕ (x) = f (t) dt,
0
196 2 Séries de Fourier

é periódica de período T se, e somente se,


Z T
f (t) dt = 0.
0

D EMONSTRAÇÃO : Suponha que


Z T
f (t) dt = 0.
0

Tem-se: Z x+T Z x
ϕ (x + T ) − ϕ (x) = f (t) dt − f (t) dt
0 0
Z 0 Z x+T
= f (t) dt + f (t) dt
x 0
Z x+T
= f (t) dt,
x
para qualquer x ∈ R.
Como f é periódica de período T, pela proposição 2.6, tem-se que
Z x+T Z T
f (t) dt = f (t) dt, ∀ x ∈ R.
x 0

Portanto, Z x+T Z T
ϕ (x + T ) − ϕ (x) = f (t) dt = f (t) dt = 0,
x 0
onde usou a hipótese assumida. Isto mostra que

ϕ (x + T ) − ϕ (x) = 0 ⇒ ϕ (x + T ) = ϕ (x),

ou seja, que ϕ é uma função periódica de período T .

Reciprocamente, suponha que ϕ é periódica de período T , isto é, que ϕ (x + T ) = ϕ (x) para


todo x ∈ R. Assim, em particular para x = 0, tem-se que

ϕ (T ) = ϕ (0 + T ) = ϕ (0),

ou ainda, Z T Z 0
f (t) dt = ϕ (T ) = ϕ (0) = f (t) dt = 0,
0 0
como desejado.

Observação 2.3: Seja f : R → R uma função periódica e integrável. Considere uma função
ϕ : R → R definida por Z x
ϕ (x) = f (t) dt.
0
2.2 Funções periódicas 197

Em geral, mesmo que f seja uma função periódica, nem sempre a função ϕ será periódica.
De fato, basta tomar, por exemplo, a função f definida por f (x) = 1 + cos x. O gráfico de f
encontra-se na figura 2.13.
A função f é periódica de período T = 2π , pois
f (x + 2π ) = 1 + cos(x + 2π )

= 1 + ( cosx) · [cos(2π )] − ( sen x) · [ sen (2π )]

= 1 + cosx

= f (x),
onde usou-se os fatos de que cos(2π ) = 1 e sen (2π ) = 0.

Figura 2.13: Gráfico da função f (x) = 1 + cosx.

Por outro lado, um cálculo direto de ϕ permite escrever


Z x Z x
ϕ (x) = f (t) dt = (1 + cost) dt
0 0
x

= (t + sen t) = (x + sen x) − (0 + sen 0)
0

= x + sen x.
A função ϕ (x) = x + sen x não é periódica, a menos que sua definição seja restrita a um
intervalo específico. Agora observe o motivo para que ϕ não seja periódica:
Z T Z 2π
f (t) dt = (1 + cost) dt
0 0


= (t + sen t)
0

= (2π + sen 2π ) − (0 − sen 0)

= 2π 6= 0.
Como a integral de f , de 0 até T = 2π , é diferente de zero, então a proposição 2.7 garante
que ϕ não é periódica.
198 2 Séries de Fourier

Figura 2.14: Gráfico da função ϕ (x) = x + sen x.

Proposição 2.8: Seja f : R → R uma função periódica de período T e integrável em qualquer


intervalo. Então, para que a função
Z x
ϕ (x) = f (t) dt − k x
0

seja periódica de período T deve-se ter


Z T
1
k= f (t) dt.
T 0

D EMONSTRAÇÃO : Para que ϕ seja periódica de período T deve-se ter ϕ (x + T ) = ϕ (x), isto
é, Z x+T Z x
f (t) dt − k(x + T ) = f (t) dt − k x,
0 0
ou ainda, Z x+T Z x
f (t) dt − k x − kT = f (t) dt − k x.
0 0
Cancelando o termo comum em ambos os membros e desenvolvendo a integral no primeiro
membro, encontra-se
2.3 Coeficientes de Fourier 199

Z x Z x+T Z x
f (t) dt + f (t) dt − kT = f (t) dt,
0 x 0

ou seja,
Z x+T Z x+T
1
(2.10) f (t) dt − kT = 0 ⇒ k= f (t) dt.
x T x

Como f é periódica de período T e integrável, então, pela proposição 2.6, tem-se


Z x+T Z T
(2.11) f (x) dx = f (x) dx, para qualquer x ∈ R.
x 0

Aplicando (2.11) em (2.10), conclui-se que


Z T
1
k= f (t) dt.
T 0

Observação 2.4: Note-se que, quando k = 0, então


Z x
ϕ (x) = f (t) dt.
0

Portanto, ϕ será periódica de período T se, e somente se,


Z T
f (t) dt = 0,
0

que está em conformidade com a proposição 2.7.

2.3 Coeficientes de Fourier

Inicia-se esta seção com resultados do Cálculo e que serão úteis naquilo que seguirá. Tais
resultados serão apresentados na forma de lema, para que possam ser citados oportunamente
quando necessário. Os quatro lemas dados a seguir são conhecidos como relações de ortogo-
nalidade.
Antes, apresentar-se-á alguns fatos simples de trigonometria que serão usados nos próximos
resultados, além de outros. Como os conceitos de paridade e imparidade de uma função ainda
não foram introduzidos, usar-se-á algebrismo para mostrar dois resultados e que serão usados
neste lema e em outros resultados. Tem-se:
200 2 Séries de Fourier

cos(−x) = cos x e sen (−x) = sen x.

Com efeito,
cos(−x) = cos(0 − x) = (cos 0) · (cos x) + ( sen 0) · ( sen x) = cos x,

sen (−x) = sen (0 − x) = ( sen 0) · (cos x) − ( sen x) · (cos 0) = − sen x,


onde usou-se os fatos elementares da trigonometria: sen 0 = 0 e cos 0 = 1.

Lema 3.1: Tem-se:


Z L  nπ x  Z L  nπ x 
(3.1) cos dx = 0 = sen dx.
−L L −L L
D EMONSTRAÇÃO : A demonstração consiste em calcular as duas integrais diretamente. Tem-
se:
Z L  nπ x  L  nπ x  L
cos dx = · sen
−L L nπ L −L

L
= [ sen (nπ ) − sen (−nπ )]

L
= [ sen (nπ ) + sen (nπ )]

2L
· sen (nπ ) = 0,
=

pois seno de múltiplo inteiro de π é sempre igual a zero.
Para a segunda integral, tem-se
Z L  nπ x  L  nπ x  L
sen dx = − · cos
−L L n π L
−L

L
=− [ cos(nπ ) − cos(−nπ )]

L
= − [ cos(nπ ) − cos(nπ )]

= 0.

Lema 3.2: Tem-se:


Z L  nπ x   mπ x 
(3.2) cos sen dx = 0, n, m ≥ 1.
−L L L
D EMONSTRAÇÃO : Deve-se mostrar o resultado separando em dois casos: m = n e m 6= 0.
Para m = n, tem-se
2.3 Coeficientes de Fourier 201

Z L  nπ x   mπ x  Z L  nπ x   nπ x 
cos sen dx = cos sen dx
−L L L −L L L
Z nπ
= sen u · cosu du
−nπ


= sen u = sen (nπ ) − sen (−nπ ) = 0,
−nπ

onde se fez duas mudanças de variáveis:


nπ x
u= e v = sen u.
L
Para o caso m 6= n é necessário usar a seguinte identidade trigonométrica:
sen (α − β ) + sen (α + β ) ,
sen α · cos β =
2
que pode ser obtida adicionando-se as fórmulas do seno da soma e do seno da diferença.
Assim,
Z L  nπ x   mπ x  Z  
1 L (n − m)π x (n + m)π x
cos sen dx = sen + sen dx
−L L L 2 −L L L
Z   Z  
1 L (n − m)π x 1 L (n + m)π x
= sen dx + sen dx
2 −L L 2 −L L
 
L (n − m)π x L
=− cos −
2(n − m)π L −L
  L
L (n + m)π x
− cos
2(n + m)π L −L

L
=− {cos[(n − m)π ] − cos[−(n − m)π ]} −
2(n − m)π
L
− {cos[(n + m)π ] − cos[−(n + m)π ]}
2(n + m)π
L
=− {cos[(n − m)π ] − cos[(n − m)π ]} −
2(n − m)π
L
− {cos[(n + m)π ] − cos[(n + m)π ]}
2(n + m)π
L L
=− ·0− · 0 = 0.
2(n − m)π 2(n + m)π
O leitor deve observar que este segundo procedimento de integração não pode ser aplicado
ao caso n = m, pois no segundo método o termo n − m aparece no denominador e que seria
anulado caso m = n.
202 2 Séries de Fourier

Lema 3.3: Tem-se:


Z L
(
 nπ x   mπ x  L, se n = m ≥ 1,
(3.3) cos cos dx =
−L L L 0, se n 6= m, n, m ≥ 1.

D EMONSTRAÇÃO : Deve-se dividir a demonstração em dois casos: m = n e m 6= n. Para o


caso m = n será necessário usar a seguinte identidade trigonométrica
1 + cos 2α ,
cos2 α =
2
que pode ser obtida adicionando-se a identidade trigonométrica fundamental à fórmula do
cosseno da soma, onde nesta última se toma os dois argumentos como α . Tem-se:
Z L  nπ x   mπ x  Z L  nπ x   nπ x 
cos cos dx = cos cos dx
−L L L −L L L
Z L  
2 nπ x
= cos dx
−L L
Z   
1 L 2nπ x
= 1 + cos dx
2 −L L
Z Z  
1 L 1 L 2nπ x
= dx + cos dx
2 −L 2 −L L
 
x L L 2nπ x L
= + sen
2 −L nπ L −L

1 L
= [L − (−L)] + [ sen (2nπ ) − sen (−2nπ )]
2 nπ
2L
= L+ · sen (2nπ ) = L.

Para o caso m 6= n, será necessário usar a identidade trigonométrica
cos(α − β ) + cos(α + β ) ,
cos α · cos β =
2
que pode ser determinada adicionando-se as fórmulas do cosseno da soma e do cosseno da
diferença. Tem-se:

Z L  nπ x   mπ x  Z L 
1 (n − m)π x (n + m)π x
cos cos dx = cos + cos dx
−L L L 2 −L L L
Z   Z  
1 L (n − m)π x 1 L (n + m)π x
= cos dx + cos dx
2 −L L 2 −L L
 
L (n − m)π x L
= sen +
2(n − m)π L −L
2.3 Coeficientes de Fourier 203

 
L (n + m)π x L
+ sen
2(n + m)π x L −L

L
= { sen [(n − m)π ] − sen [−(n − m)π ]} +
2(n − m)π
L
+ { sen [(n + m)π ] − sen [−(n + m)π ]}
2(n + m)π
L L
= · sen (n − m)π + · sen (n + m)π
(n − m)π (n + m)π
L L
= ·0+ · 0 = 0,
(n − m)π ) (n + m)π
onde usou-se novamente o fato de que seno de múltiplo inteiro de π é igual a zero.

Lema 3.4: Tem-se:


Z L
(
 nπ x   mπ x  L, se n = m ≥ 1,
(3.4) sen sen dx =
−L L L 0, se n 6= m, n, m ≥ 1.

D EMONSTRAÇÃO : Para o caso m = n usar-se-á a identidade trigonométrica


1 − cos2α ,
sen 2 α =
2
que pode ser determinada somando-se a identidade trigonométrica fundamental com a fórmula
do cosseno da diferença, onde nesta última se toma os dois argumentos como α . Assim, para
m = n, tem-se
Z L  nπ x   mπ x  Z L  nπ x   nπ x 
sen sen dx = sen sen dx
−L L L −L L L
Z L  nπ x 
= sen 2 dx
−L L
Z L 

1 2nπ x
= 1 − cos dx
2 −L L
Z Z  
1 L 1 L 2nπ x
= dx − cos dx
2 −L 2 −L L
 
x L L 2nπ x L
= − sen
2 −L nπ L −L

1 L
= [L − (−L)] − [ sen (2nπ ) − sen (−2nπ )]
2 nπ
204 2 Séries de Fourier

2L
= L− · sen (2nπ )

2L
= L− · 0 = L.

Para o caso m 6= n será necessário usar a identidade trigonométrica
cos(α − β ) − cos(α + β ) ,
sen α · sen β =
2
que pode ser obtida através da subtração entre as fórmulas do cosseno da soma e do cosseno da
diferença. Assim, para m 6= n, tem-se
Z L  nπ x   mπ x  Z  
1 L (n − m)π x (n + m)π x
sen sen dx = cos − cos dx
−L L L 2 −L L L
Z   Z  
1 L (n − m)π x 1 L (n + m)π x
= cos dx − cos dx
2 −L L 2 −L L
 
L (n − m)π x L
= sen −
2(n − m)π L −L
 
L (n + m)π x L
− sen
2(n + m)π x L −L

L
= { sen [(n − m)π ] − sen [−(n − m)π ]} −
2(n − m)π
L
− { sen [(n + m)π ] − sen [−(n + m)π ]}
2(n + m)π
L L
= · sen (n − m)π − · sen (n + m)π
(n − m)π (n + m)π
L L
= ·0− · 0 = 0,
(n − m)π ) (n + m)π
onde usou-se, mais uma vez, o fato de que seno de múltiplo inteiro de π é igual a zero.

Observação 3.1: Os quatro lemas, enunciados e demostrados anteriormente, são conhecidos


como relações de ortogonalidade. Os valores das integrais nestes lemas ou é 0 ou é L. Em
geral tal resultado é verdadeiro para qualquer outro intervalo tendo o mesmo comprimento
2L (o período comum das funções envolvidas), que pode ser justificado pela proposição 2.6
deste capítulo. Porém, para intervalos [a, b] de comprimentos diferentes de 2L, as relações de
ortogonalidade pode não existir.
Além disso, uma integração no intervalo [−L, L] é mais interessante na prática do que em
outro intervalo de comprimento 2L: ter a possibilidade de usar simetria de funções (seção 2.5).
2.3 Coeficientes de Fourier 205

Quando o intervalo de integração não é simétrico, então não faz sentido falar, por exemplo,
em funções pares e ímpares. É essa facilidade introduzida pela simetria de funções, que per-
mite interpretações geométricas, que justifica a escolha pelo intervalo simétrico [−L, L] para os
cálculos dos coeficientes de Fourier.

Com auxílio dos lemas enunciados e demonstrados, os coeficientes de Fourier serão deduzi-
dos a partir deste ponto. O procedimento adotado é formal, onde será admitido a convergência
uniforme da série para que os cálculos façam sentido.
Se uma função f (x) pode ser representada na forma

∞ h  nπ x   nπ x i
a0 ,
(3.5) f (x) = + ∑ an cos + bn sen
2 n=1 L L

é de se esperar que os coeficientes an e bn estejam intimamente ligados à função f . Objetiva-se


determinar as expressões que eles têm em termos da função f . Para isso, será admitido que
a igualdade em (3.5) se verifique e que a série dada no segundo membro de (3.5) convirja
uniformemente.

Proposição de Análise: Sejam un : [a, b] → R funções contínuas. Suponha que a série


∞ ∞
∑ un(x) convirja uniformemente. Então a sua soma u(x) = ∑ un (x) também é uma
n=1 n=1
função contínua. (Para uma demonstração, veja [66], por exemplo.)

Note-se que, pela proposição acima, a função f deve ser contínua (e, portanto, ela pode ser
integrada) e deve ser periódica de período 2L, pois o período fundamental de cos (π x/L) é 2L e
2L é o período comum para as demais funções seno e cosseno que aparecem na série. Reveja os
exemplos 2.2, 2.3, 2.4 e 2.5 deste capítulo para detalhamentos sobre as afirmações aqui feitas.

Sejam un [a, b] → R funções integráveis. Suponha que a série ∑ un(x) convirja uniformemen-
n=1
te para uma função u(x). Então,
Z
" #
b ∞ ∞ Z b

a
∑ un (x) dx = ∑ un (x) dx.
n=1 n=1 a

(Uma demonstração pode ser encontrada na mesma referência citada anteriormente.)

Em virtude da continuidade da função f pode-se usar a proposição acima para integrar ambos
os membros de (3.5) de −L até L para obter
Z L Z L Z L
( )
a0 ∞ h  nπ x   nπ x i
f (x) dx = dx + ∑ an cos + bn sen dx
−L L −L −L n=1 L L
206 2 Séries de Fourier

= (conv. uniforme)
Z ∞  Z L  nπ x  Z L  nπ x  
a0 L
(3.6) = dx + ∑ an cos dx + bn sen dx ·
2 −L n=1 −L L −L L

Pelas relações (3.1) do lema 3.1, tem-se que


Z L  nπ x  Z L  nπ x 
cos dx = 0 = sen dx,
−L L −L L
que aplicadas em (3.6) resulta em
Z L Z L
1
f (x) dx) = a0 · L ⇒ a0 = f (x) dx.
−L L −L

Para determinar os coeficientes an em (4.5), basta multiplicar ambos os membros por


cos (nπ x/L) e depois integrar de −L até L, isto é, para m ≥ 1 fixado, tem-se
 mπ x  ∞ h  nπ x   mπ x   nπ x   mπ x i
f (x) cos dx = ∑ n a cos cos + b n sen cos ,
L n=1 L L L L

de modo que uma integração de −L a L resulta em


Z L  mπ x  Z L  mπ x 
a0
f (x) cos dx = cos dx +
−L L L −L L
Z L ∞   nπ x   mπ x 
+ ∑ a n cos cos +
−L n=1 L L
 nπ x   mπ x  
+ bn sen cos dx
L L

= (conv. uniforme)
Z L  mπ x 
a0
= cos dx +
L −L L
∞  Z L  nπ x   mπ x 
+ ∑ an cos cos dx +
n=1 −L L L
Z L  nπ x   mπ x  
(3.7) + bn sen cos dx .
−L L L
Pelos lemas 3.1 e 3.2 tem-se, respectivamente, que para todo m, n ≥ 1
Z L  mπ x  Z L  nπ x   mπ x 
cos dx = 0 e sen cos dx = 0.
−L L −L L L
Já o lema 3.3 garante que
2.3 Coeficientes de Fourier 207

Z L
(
 nπ x   mπ x  L, se n = m ≥ 1,
cos cos dx =
−L L L 0, se n 6= m, n, m ≥ 1.

Tem em vista que m está fixo enquanto n varia sobre todos os naturais, segue das relações de
ortogonalidade (citadas acima) que o único termo não nulo à direita do sinal de igualdade em
(3.7) é o termo onde m = n no primeiro somatório. Assim,
Z L  nπ x  Z L  nπ x 
1
f (x) cos dx = an · L ⇒ an = f (x) cos dx.
−L L L −L L

Analogamente, uma expressão semelhante para bn pode ser obtida multiplicando-se (3.5) por
sen (mπ x/L), integrando de −L até L e usando as relações de ortogonalidade apresentadas através
dos lemas 3.1–3.4. Deste modo obtém-se
Z L  nπ x 
1
bn = f (x) sen dx.
L −L L

Observação 3.2: As fórmulas que definem os coeficientes de Fourier,


Z Z  nπ x  Z  nπ x 
1 L 1 L 1 L
a0 = f (x) dx, an = f (x) cos dx e bn = f (x) sen dx,
L −L L −L L L −L L
dependem apenas dos valores de f (x) no intervalo [−L, L]. Os exemplos 2.2 e 2.3 mostram
que as funções sen (nπ x/L) e cos (nπ x/L) são periódicas de período Pn = 2L/n. Já o exemplo 2.4
mostrou que estas funções têm T = 2L um período comum. Assim, como cada um dos termos
da série de Fourier (3.5) tem período comum e igual a 2L; então, se a série de Fourier convergir,
a sua soma f (x) também será uma função periódica de período 2L, como pode ser visto no
exemplo 2.5. Portanto, f (x) fica determinada para todo x através de seus valores no intervalo
[−L, L] (pois a periodicidade implica dizer que em cada intervalo de comprimento 2L a série de
Fourier se comportará como no intervalo [−L, L]).
A proposição 2.6 diz que as integrais de f em um intervalo de comprimento T têm o mesmo
valor. Portanto a integração sobre o intervalo [−L, L] na determinação dos coeficientes de
Fourier se justifica. Mas o leitor deve estar se perguntando: Por que neste intervalo especí-
fico e não em qualquer outro de comprimento 2L? A seção 2.5 dará mais detalhes (simetria das
funções é a justificativa). Caso o intervalo tenha comprimento diferente de 2L, a observação
3.1 mostra que as relações de ortogonalidade das funções cossenos e senos, em geral, não são
mantidas, fazendo com que os coeficientes de Fourier não tenham fórmulas simples.

D EFINIÇÃO : Seja f : R → R uma função periódica de período 2L, integrável e absolutamente


integrável em cada intervalo limitado. Os números an , para n ≥ 0, e bn , para n ≥ 1, dados por
208 2 Séries de Fourier

Z L
1
a0 = f (x) dx,
L −L
Z L  nπ x 
1
an = f (x) cos dx,
L −L L
Z L  nπ x 
1
bn = f (x) sen dx,
L −L L
são definidos como os coeficientes de Fourier da função f .

Observa-se que a exigência da integrabilidade e integrabilidade absoluta de f é necessária


para que as expressões que definem os coeficientes de Fourier façam sentido. Um estudo mais
detalhado será feito no próximo capítulo, por ora apenas chama-se atenção para o fato
Z L  nπ x  Z L


−L f (x) cos L dx ≤ −L | f (x)| dx;
e Z L  nπ x  Z L


−L f (x) sen L dx ≤ −L | f (x)| dx.

Observação 3.3: Na observação 3.1, comentou-se que as relações de ortogonalidade, em


geral, não são satisfeitas caso o intervalo de integração tenha um comprimento qualquer, pois,
quando o comprimento do intervalo é qualquer, as expressões dos coeficentes não seriam sim-
ples como aquelas vistas anteriormente. Apesar disso, ainda assim, é possível determinar os coe-
ficientes de Fourier em quaisquer intervalos de comprimento 2L (veja proposição 2.6). Além
disso, os coeficientes de Fourier nas formas aqui apresentadas permitem certas interpretações
em fenômenos físicos em que eles aparecem.

2.4 Série de Fourier

Dada uma função f : R → R periódica de período 2L, integrável e absolutamente integrável,


pode-se calcular os seus coeficientes de Fourier através das expressões apresentadas na seção
2.3. Deste modo, pode-se escrever
∞ h  nπ x   nπ x i
a0
(4.1) f (x) ∼ + ∑ a cos + bn sen ·
2 n=1 L L

O leitor não deve confundir o símbolo ∼ que aparece em (4.1) como “aproximadamente”.
Ele apenas indica que a expressão no lado direito em (4.1) representa a série de Fourier para
2.4 Série de Fourier 209

a função f . Dito isso, o leitor poderá questionar sobre a relação entre a função f e sua série
de Fourier. Não há garantias sobre a igualdade entre estes dois objetos, isto é, a função e sua
série de Fourier. Na verdade, a série de Fourier para uma função f pode divergir. Por exemplo,
é possível construir exemplos de funções contínuas cujas séries de Fourier divergem.
Por outro lado, existem funções cujas séries de Fourier convergem exatamente para elas, mas
também existem funções cujas séries de Fourier convergem para funções ligeiramente diferentes
das originalmente dadas (observa-se que “ligeiramente diferentes” significa ser diferente). As-
sim, é necessário dar um significado mais amplo para que dois objetos sejam iguais (para quem
já teve contato com o assunto, aqui se fala em relações de equivalência e classe de equivalência).
A seguir, apresenta-se condições suficientes para que a função f seja igual (em sentido amplo)
à sua série de Fourier.

D EFINIÇÃO : Diz-se que uma função f : R → R é seccionalmente contínua se ela tiver ape-
nas um número finito de descontinuidade (todas de primeira espécie2 ) em qualquer intervalo
limitado.

D EFINIÇÃO : Diz-se que uma função f : R → R é seccionalmente diferenciável se ela for


seccionalmente contínua e se a função f 0 (x) também for seccionalmente contínua.

Naturalmente, toda função contínua é seccionalmente contínua. A função f : R \ {0} definida


por f (x) = 1/x não é seccionalmente contínua, pois esta função tem uma descontinuidade em
x = 0 que é de segunda espécie (isto é, não existem os limites laterais à esquerda e à direita de
x = 0).

Exemplo 4.1: Seja f : R → R definida por




 1, se x ≥ 1,



1 1 1
f (x) = , se ≤x< , n ∈ N,

 n n+1 n



0, se x ≤ 0,

não é seccionalmente contínua.


Observe-se que todas as descontinuidades de f são de primeira espécie, isto é, existem os
limites laterais à esquerda e à direita em cada ponto de descontinuidade. Porém, no intervalo
(0, 1), existe um número infinito de descontinuidade. Mesmo que sejam de primeira espécie,
para ser seccionalmente contínua é necessário que apareçam em um número finito em todo
intervalo limitado e este não é o caso.

2 Diz-se que f : I → R tem descontinuidade de primeira espécie no ponto a ∈ I quando f é descontínua no ponto a e,
aém disso, existem os limites laterais lim f (x) e lim f (x). Se a for um ponto de acumulação de I apenas em um dos
x→a− x→a+
lados deste intervalo, exige-se somente que o limite lateral correspondente exista.
Diz que f : I → R tem uma descontinuidade de segunda espécie quando a é um ponto de acumulação à direita de I e
lim f (x) não existe ou quando a é um ponto de acumulação à esquerda de I, mas não existe o limite lateral lim f (x).
x→a+ x→a−
210 2 Séries de Fourier

Figura 4.1: Gráfico da função f do exemplo 4.1.

Note-se, também, que f não é seccionalmente diferenciável, pois para sê-lo f deveria ser
seccionalmente contínua, que não é o caso.

Exemplo 4.2: Seja f : R → R uma função definidas por


(
|x| para − 1 ≤ x < 1,
f (x) =
periódica de período T = 2,

O leitor poderá verificar que a função f é contínua, de modo que ela é seccionalmente con-
tínua. Tem-se também que f 0 (x) é seccionalmente contínua e, assim, f seccionalmente diferen-
ciável. Como exemplo do procedimento, será calculada as derivadas laterais de f e g em x = 0.
Tem-se

f (0 + h) − f (0) −(0 + h) − 0 −h
= = = −1.
h h h
2.4 Série de Fourier 211

Figura 4.2: Gráfico da função f do exemplo 4.2.

Como a expressão (constante e igual a 1) no último membro acima tem limite para h → 0− ,
então existe limite no primeiro membro. Assim,
f (0 + h) − f (0)
f 0 (0− ) = lim = lim (−1) = −1.
h→0− h h→0−

Agora observa-se que


f (0 + h) − f (0) (0 + h) − 0 h
= = = 1.
h h h
Deste modo, segue-se que existe limite para h → 0+ , pois existe limite no último membro
acima. Portanto,
f (0 + h) − f (0)
f 0 (0+ ) = lim = lim 1 = 1.
h→0+ h h→0+
Como as derivadas laterais são diferentes, não existe derivada na origem. Isto significa dizer
que a função derivada não está definida neste ponto. O leitor poderá adotar o mesmo proce-
dimento para os pontos x = ±1, ±2, ±3, . . . e verificar que a função derivada, f 0 (x), não está
definida nestes pontos.

Figura 4.3: Gráfico da função f 0 (x).


212 2 Séries de Fourier

Apesar de f 0 (x) não estar definida para x = 0, ±1, ±2, ±3, . . ., existem os limites laterais
nestes pontos, além de f 0 (x) existe em todos os demais pontos de R. Assim, f 0 pode ser es-
tendida de maneira conveniente nestes pontos. Sem perda de generalidade, pode-se denotar a
extensão ainda por f 0 , de modo que f 0 : R → R é uma função seccionalmente contínua, pois as
descontinuidades serão de primeira espécie e em número finito em todo intervalo limitado. E
isto implica em dizer que f é seccionamente diferenciável.

Exemplo 4.3: Seja f : R → R uma função definidas por




 0,
 se − π ≤ x < 0,
f (x) = 1, se 0 ≤ x < π,


 periódica de período T = 2π .

Figura 4.4: Gráfico da função f .

Facilmente o leitor poderá verificar que a função f tem apenas descontinuidades de primeira
espécie e que aparecem em um número finito em qualquer intervalo limitado. Assim, tem-se
que f é funções seccionalmente contínua.
Por outro lado, como f é descontínua nos pontos x = 0 ± π , ±2π , ±3π , . . ., tem-se que não
existe derivada em cada um destes pontos. Isto significa dizer que a função derivada, f 0 (x), não
está definida nestes pontos. Mas em todos os outros pontos, sim, sendo o valor da derivada igual
a zero, pois f é constante nos intervalos entre estes pontos. Seu gráfico encontra-se abaixo.

Figura 4.5: Gráfico da função f 0 (x).


2.4 Série de Fourier 213

Definindo f’(x) em x = 0, ±π , ±2π , ±3π , . . . de maneira conveniente, tem-se que a extensão,


ainda denotada por f 0 (x), será uma função f 0 : R → R seccionalmente contínua, pois as descon-
tinuidades serão de primeira espécie. Com isso, tem-se que f será uma função seccionalmente
diferenciável.

Exemplo 4.4: Seja f : R → R uma função definida por


(p
1 − x2 , se − 1 ≤ x ≤ 1,
f (x) =
periódica de período T = 2.

Figura 4.6: Gráfico da função f .

O leitor poderá verificar facilmente que f é seccionalmente contínua, pois existem os limites
laterais à esquerda e à direita dos pontos x = −1 e x = 1, bem como em seus múltiplos x =
±3, ±5, . . . Na verdade tem-se que f é contínua em todos estes pontos.
Por outro lado, f não tem derivada nos pontos x = ±1, ±3, ±5, . . . (são cúspides), pois
as derivadas laterais nestes pontos tende para −∞ e +∞. Isto significa dizer que as descon-
tinuidades da função derivada, f 0 (x), são de segunda espécie. Portanto, f 0 (x) não é seccional-
mente contínua e, consequentemente, f não é uma função seccionalmente diferenciável (apesar
de ser seccionalmente contínua).

O próximo resultado apresenta condições suficientes para a convergência da série de Fourier


de uma função f . A demonstração será omitida neste ponto; o leitor interessado poderá consultar
o capítulo 2.

Teorema 4.1 (Fourier): Seja f : R → R uma função seccionalmente diferenciável e periódica


de período T = 2L. Então, a série de Fourier da função f , dada por
∞ h  nπ x   nπ x i
a0 ,
f (x) ∼ + ∑ an cos + bn sen
2 n=1 L L
214 2 Séries de Fourier

Figura 4.7: Gráfico da função f 0 (x).

converge em cada ponto x para a média dos limites laterais, isto é, converge para
f (x + 0) + f (x − 0) ,
2
ou ainda,
∞ h  nπ x   nπ x i
f (x + 0) + f (x − 0) a0 ,
= + ∑ an cos + bn sen
2 2 n=1 L L
onde

f (x + 0) = lim f (t) e f (x − 0) = lim f (t).


t→x+ t→x−
O teorema de Fourier diz que, com as hipóteses assumidas, a série de Fourier converge para
a média dos limites laterais. Naturalmente, para as funções seccionalmente diferenciáveis que
são contínuas, a série de Fourier converge exatamente para o ponto, pois os limites laterais serão
iguais e coincidirá com o valor da função neste ponto. A demonstração está no adendo B.
2.4 Série de Fourier 215

Observação 4.1: No teorema de Fourier, a hipótese da periodicidade de f já foi justificada


na seção 2.2. Já a exigência de f ser seccionalmente contínua se dá por dois motivos:
(a) A necessidade da existência dos limites laterais, uma vez que a série de Fourier converge
para a média dos dois.
(b) A necessidade de f ser integrável e absolutamente integrável (no sentido de Riemann).

Por que pedir para que a função derivada também seja seccionalmente contínua (isto é, f ser
seccionalmente diferenciável)? Isto será visto na seção 2.9, onde serão feitas estimativas dos
coeficientes de Fourier. Com a integral de Riemann, usada neste texto, isto implica em fazer
integração por partes, de maneira que aparece a função derivada f 0 (x). Nesta mesma seção
também aparece de maneira clara a exigência da função f ser absolutamente integrável.

Exemplo 4.5: Seja f : R → R uma função definida por




 0,
 se − π ≤ x < 0,
f (x) = 1, se 0 ≤ x < π,



periódica de período T = 2π .

Determinar a série de Fourier para a função f .

S OLUÇÃO : O gráfico desta função pode ser visto na figura 4.4. Pelo exemplo 4.2, esta função
é periódica de período T = 2π e é seccionalmente diferenciável. Logo, pelo teorema de Fourier,
esta função admite uma série de Fourier. Inicialmente deve-se determinar os coeficientes da
série de Fourier. Observando que L = T/2 = π , tem-se:
Z L Z π
1 1
a0 = f (x) dx = f (x) dx
L −L π −π
Z 0 Z π
1 1
= f (x) dx + f (x) dx
π −π π 0
Z 0 Z π
1 1
= 0 dx + 1 dx
π −π π 0

x π 1
(4.2) = = (π − 0) = 1.
π 0 π
Para o cálculo de an , com n 6= 0, tem-se
Z L  nπ x 
1
an = f (x) cos dx
L −L L
Z 0 Z π
1 1
= 0 · cos(nx) dx + 1 · cos(nx) dx
π −π π 0
216 2 Séries de Fourier

Z π π
1 1
= cos(nx) dx = · sen (nx)
π 0 nπ 0
1 1
(4.3) = [ sen (nπ ) − sen 0] = · 0 = 0.
nπ nπ
Para o cálculo de bn , tem-se
Z  nπ x  Z Z
1 L 1 0 1 π
bn = f (x) sen dx = 0 · sen (nx) dx + 1 · sen (nx) dx
L −L L π −π π 0
Z π
1 π 1 1
= sen (nx) dx = − · cos(nx) = − [cos(nπ ) − cos 0]
π 0 nπ 0 nπ
1 1
= [1 − cos(nπ )] = [1 − (−1)n] ,
nπ nπ
ou ainda,
2
(4.4) b2k = 0 e b2k−1 = , k ∈ N.
(2k − 1)π
Assim, usando os valores para os coeficientes a0 , an e bn obtidos em (4.2), (4.3) e (4.4), a
série de Fourier para a função f é dada por

1 2
f (x) ∼ + ∑ · sen (2k − 1) x.
2 k=1 (2k − 1)π

Figura 4.8: Gráfico das somas parciais da série de Fourier.

A figura 4.8 exibe as quatro primeiras somas parciais da série de Fourier para a função f no
intervalo [−π , π ], isto é, o gráfico das funções

1 2
S1 (x) = + sen x,
2 π
2.4 Série de Fourier 217

1 2 2
S2 (x) = + sen x + sen (3x),
2 π 3π
1 2 2 2
S3 (x) = + sen x + sen (3x) + sen (5x),
2 π 3π 5π
1 2 2 2 2
+ sen x +
S4 (x) = sen (3x) + sen (5x) + sen (7x).
2 π 3π 5π 7π
O leitor poderá observar que cada termo adicionado faz com que a série se aproxime mais do
gráfico da função f . Também é interessante notar o que está acontecendo com os gráficos das
somas parciais no ponto (0, 1/2), que é o ponto médio entre os pontos (0, 0) e (0, 1), ou ainda,
que é o ponto obtido como a média dos limites laterais de f na origem.

Exemplo 4.6: A série de Fourier para a função f , que foi obtida no exemplo 4.5, pode ser
usada para obter uma representação para π através de uma série numérica.

De fato, basta tomar x = π/2. Note-se, naquele exemplo, que f (π/2) = 1 e que f é contínua
na vizinhança de x = π/2, de modo que a série de Fourier, ao convergir para a média dos limites
laterais, irá convergir exatamente para o valor de f (π/2) = 1. Assim, a função f pode ser escrita
através de uma igualdade nesta vizinhança, isto é,
1 2 ∞ 1
f (x) = + ∑ · sen (2k − 1) x.
2 π k=1 2k − 1

Fazendo x = π/2 na expressão acima, encontra-se


1 2 ∞ 1 h πi
1= + ∑ · sen (2k − 1) ,
2 π k=1 2k − 1 2

isto é,
1 2 ∞ 1 h πi
= ∑ · sen (2k − 1) ,
2 π k=1 2k − 1 2
ou ainda,
π ∞
1 h πi
=∑ · sen (2k − 1) ·
4 k=1 2k − 1 2
Portanto,
π  1      
π 1 3π 1 5π 1 7π
= · sen + · sen + · sen + · sen +···
4 1 2 3 2 5 2 7 2
1 1 1 ∞
(−1)k−1 ,
= 1− + − +··· = ∑
3 5 7 k=1 2k − 1
que é conhecida como a série de Leibniz.
Deste modo, é possível determinar um valor para π através da soma
218 2 Séries de Fourier


(−1)k−1 4 4 4
π =4∑ = 4 − + − + · · ·,
k=1 2k − 1 3 5 7

ou ainda com a aproximação desejada.

Exemplo 4.7: Seja f : R → R uma função definida por


(
| x |, se − 1 ≤ x < 1,
f (x) =
periódica de período T = 2.

Determinar a série de Fourier para f .

S OLUÇÃO : Note-se, primeiro, que f é uma função semelhante àquela apresentada no exem-
plo 4.2. Assim, analogamente aquele caso, mostra-se que f uma função seccionalmente dife-
renciável e periódica de período T = 2. Logo é possível determinar a sua série de Fourier. Para
isso é necessário encontrar os coeficientes de Fourier. Observando que L = 1, para a0 , tem-se
Z 1 Z 0 Z 1
1
a0 = f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx
1 −1 −1 0
Z 0 Z 1
x2 0 x2 1
= (−x) dx + x dx = − +
−1 0 2 −1 2 0
1 2  1 
=− 0 − (−1)2 + 12 − 02
2 2
1 1
(4.5) = + = 1.
2 2
Para os coeficientes an , tem-se
Z 1
1
an = f (x) cos(nπ x)dx
1 −1
Z 0 Z 1
= −x · cos(nπ x)dx + x · cos(nπ x)dx
−1 0
" 0 #  Z 0 
x 1
= − · sen (nπ x) − − sen (nπ x)dx +
nπ −1 nπ −1
" 1 #  Z 
x
1 1
+ · sen (nπ x) − sen (nπ x)dx
nπ 0 nπ 0
" 0 # " 0 #
x 1
= − · sen (nπ x) − cos(n π x)
+
nπ −1 (nπ )2 −1
2.4 Série de Fourier 219

" 1# " 1 #
x 1
+ · sen (nπ x) − − 2
cos(n π x)

nπ 0 (n π ) 0

  0
1 1
= − · x · sen (nπ x) − 2
· cos(nπ x) +
nπ (nπ )
−1
  1
1 1
+ · x · sen (nπ x) + 2
· cos(nπ x)
nπ (nπ )
0
 
1 1
= − · 0 · sen 0 − · cos 0 −
nπ (nπ )2
 
1 1
− − · (−1) · sen (−nπ ) − cos(−nπ ) +
nπ (nπ )2
 
1 1
+ · 1 · sen (nπ ) + · cos(nπ ) −
nπ (nπ )2
 
1 1
− · 0 · sen 0 + · cos0
nπ (nπ )2
 
1 1 1 1
= − + cos(nπ ) + cos(nπ ) −
(nπ )2 (nπ )2 (nπ )2 (nπ )2
2 2
(4.6) = [cos(n π ) − 1] = [(−1)n − 1] , n ∈ N,
(nπ )2 n2 π 2
onde realizou-se integração por partes nos passos acima da seguinte forma
( 
u = −x,  −du = dx,
e
dv = cos(nπ x)dx,  v = 1 · sen (nπ x),

( 
U = x,  dU = dx,
e
dV = cos(nπ x)dx.  V = 1 · sen (nπ x).

A expressão obtida em (4.6) pode ser melhorada, escrevendo-a para n par e n ímpar, isto é,
4 ,
(4.7) a 2k = 0, a 2k−1 = − k ∈ N.
(2k − 1)2π 2
Para o cálculo dos coeficientes bn , obtém-se
Z 1
1
bn = f (x) sen (nπ x)dx
1 −1
Z 0 Z 1
= −x · sen (nπ x)dx + x · sen (nπ x)dx
−1 0
220 2 Séries de Fourier

" 0 #  Z 0 
x 1
= · cos(nπ x) − cos(nπ x)dx +
nπ −1 nπ −1
" 1#  Z 
x
1 1
+ − · cos(nπ x) − − cos(nπ x)dx
nπ 0 nπ 0
" 0 # " 0 #
x 1
= · cos(nπ x) − 2
sen (n π x)
+
nπ −1 (n π ) −1
" 1# " 1#
x 1
+ − · cos(nπ x) − − 2
sen (n π x)

nπ 0 (n π ) 0

  0
1 1
= · x · cos(nπ x) − 2
· sen (nπ x) +
nπ (nπ )
−1
  1
1 1
+ − · x · cos(nπ x) + · sen (nπ x)
nπ (nπ )2
0
 
1 1
= · 0 · cos0 − · sen 0 −
nπ (nπ )2
 
1 1
− · (−1) · cos(−nπ ) − sen (−nπ ) +
nπ (nπ )2
 
1 1
+ − · 1 · cos(nπ ) + · sen (nπ ) −
nπ (nπ )2
 
1 1
− − · 0 · cos0 + · sen 0
nπ (nπ )2
 
1 1
= · cos(nπ ) − cos(nπ )
(nπ )2 (nπ )2

(4.8) = 0, n ∈ N,

onde realizou-se integração por partes nos passos acima da seguinte forma
( 
u = −x,  −du = dx,
e
dv = sen (nπ x)dx,  v = − 1 · cos(nπ x),

( 
U = x,  dU = dx,
e
dV = sen (nπ x)dx.  V = − 1 · cos(nπ x).

Assim, por (4.5), (4.7) e (4.8), tem-se que os coeficientes de Fourier são dados por
2.4 Série de Fourier 221

4
a0 = 1, ak = − e bk = 0.
(2k − 1)2 π 2
Assim, a série de Fourier para f é dada por

a0
f (x) ∼ + ∑ { ak cos[(2k − 1)π x] + bk sen [(2k − 1)π x]}
2 k=1
∞  
1 4
∼ +∑ − cos[(2k − 1)π x] + 0 · sen [(2k − 1)π x]
2 k=1 (2k − 1)2π 2

1 4 ∞ 1
∼ − 2 ∑ cos[(2k − 1)π x].
2 π k=1 (2k − 1)2

Figura 4.9: Gráfico das somas parciais.

Agora observe que a função f dada é contínua em todo x ∈ R, de modo que a média dos
limites laterais em um cada ponto coincide com o valor da função neste ponto. Em outras
palavras: é possível usar a igualdade entre f (x) e sua série de Fourier, isto é,
1 4 ∞ 1
f (x) = − 2 ∑ cos[(2k − 1)π x].
2 π k=1 (2k − 1)2

A figura 4.9 exibe o gráfico de f e das primeiras três somas parciais da série de Fourier, isto
é, das seguintes funções:
1 4
S1 (x) = − 2 · cos(π x),
2 π
1 4 4
S2 (x) = − 2 · cos(π x) − · cos(3π x),
2 π 3π
1 4 4 4
S3 (x) = − 2 · cos(π x) − · cos(3π x) − · cos(5π x).
2 π 3π 5π
Como f é contínua em R, então, em particular, ela está definida na origem. Fazendo x = 0 na
representação de f por sua série de Fourier, obtém-se
222 2 Séries de Fourier

1 4 ∞ 1
|0| = − 2∑ cos 0,
2 π k=1 (2k − 1)2

isto é,
1 4 ∞ 1 ,
= 2 ∑
2 π k=1 (2k − 1)2
ou ainda,
π2 ∞
1 1 1 1
=∑ 2
= 1+ + + +···
8 k=1 (2k − 1) 9 25 49

Exemplo 4.8: Seja f : R → R uma função definida por



 se − L < x < L,
 x,

f (x) = 0, se x = −L e x = L,


 periódica de período T = 2L.

Mostre que a série de Fourier para f é dada por

2L ∞ (−1)n+1  nπ x 
f (x) ∼ ∑ n sen ·
π n=1 L

S OLUÇÃO : O gráfico de f pode ser visto na figura 4.10.

Figura 4.10: Gráfico da função f .

Trata-se, portanto, de uma função periódica de período T = 2L e que é seccionalmente dife-


renciável, logo é possível usar o teorema de Fourier. O passo seguinte consiste em determinar
os coeficientes de Fourier.
Para a0 , tem-se:
Z L Z L
1 1 x2 L
a0 = f (x)dx = x dx =
L −L L −L 2L −L
2.4 Série de Fourier 223

(L)2 (−L)2
(4.9) = − = 0.
2L 2L
Para os coeficientes an , é preciso realizar uma integração por partes fazendo
 
 u = x,  du = dx,
 nπ x  ⇒  
 dv = cos ,  v = L · sen nπ x ·
L nπ L
Assim,
Z L  nπ x  Z  nπ x 
1 1 L
an = f (x) cos dx = x · cos dx
L −L L L −L L
" #
1 L  nπ x  L L
Z L  nπ x 
= · x · sen − sen dx
L nπ L −L nπ −L L

1 1 L2  nπ x  L
= [L · sen (nπ ) − (−L) · sen (−nπ )] + · 2 2 · cos
nπ L n π L −L
L L
= [ sen (nπ ) − sen (nπ )] + 2 2 [cos(nπ ) − cos(−nπ )]
nπ n π
L L
= [ sen (nπ ) − sen (nπ )] + 2 2 [cos(nπ ) − cos(nπ )]
nπ n π
(4.10) = 0,

onde usou os seguintes fatos

sen (−nπ ) = − sen (nπ ) e cos(−nπ ) = cos(nπ ).

Para os coeficientes bn , também é necessário realizar uma integração por partes fazendo
 
 u = x,  du = dx,
 nπ x  ⇒  
 dv = sen ,  v = − L · cos nπ x ·
L nπ L
Tem-se:
Z L  nπ x  Z  nπ x 
1 1 L
bn = f (x) sen dx = x · sen dx
L −L L L −L L
" #
1 L  nπ x  L L
Z L  nπ x 
= − · x · cos + cos dx
L nπ L −L nπ −L L

1 1 L2  nπ x  L
= − [L · cos(nπ ) − (−L) · cos(−nπ )] + · 2 2 · sen
nπ L n π L −L
L L
=− [cos(nπ ) + cos(nπ )] + 2 2 [ sen (nπ ) − sen (−nπ )]
nπ n π
224 2 Séries de Fourier

2L 2L
=− · cos(nπ ) + 2 2 · sen (nπ )
nπ n π
2L 2L
(4.11) = − · (−1)n = · (−1)n+1,
nπ nπ
onde usou-se os fatos

sen (−nπ ) = − sen (nπ ) = 0 e cos(−nπ ) = cos(nπ ) = (−1)n .

Assim, substituindo os coeficientes de Fourier obtidos em (4.9), (4.10) e (4.11) na série de


Fourier,
∞ h  nπ x   nπ x i
a0 ,
f (x) ∼ + ∑ an · cos + bn · sen
2 n=1 L L
obtém-se
2L ∞ (−1)n+1  nπ x 
f (x) ∼ ∑ n · sen , ∀ x ∈ R.
π n=1 L
Observe-se agora que a função f é descontínua nos pontos x = ±kL, com k ∈ N, mas que a
série de Fourier, que converge para a média dos limites laterais, satisfaz nestes pontos
 
2L ∞ (−1)n+1 nπ (kL) 2L ∞ (−1)n+1
∑ · sen = ∑ n · sen (knπ ) = 0 = f (±kL),
π n=1 n L π n=1

pois seno se anula em múltiplos inteiros de π .


Assim, tem-se que a série de Fourier para a função f converge exatamente para a função f ,
de modo que é possível escrever

2L ∞ (−1)n+1  nπ x 
f (x) = ∑ n · sen , ∀ x ∈ R.
π n=1 L

Figura 4.11: Gráfico das somas parciais.

A figura 4.11 mostra os gráficos de f e das seguintes quatro primeiras somas parciais da série
de Fourier:
2.4 Série de Fourier 225

2L  πx 
S1 = sen ,
π L
 πx  L  
2L 2π x ,
S2 = sen − sen
π L π L
 πx  L    
2L 2π x 2L 3π x ,
S3 = sen − sen + sen
π L π L 3π L
 πx  L      
2L 2π x 2L 3π x L 4π x
S4 = sen − sen + sen − sen ·
π L π L 3π L 2π L

Exemplo 4.9: Seja f : R → R uma função definida por


(
x2 , se − 1 < x ≤ 1,
periódica de período T = 2.

Para escrever a série de Fourier para f é preciso determinar os coeficientes de Fourier.


Observe-se que L = 1. Para o coeficiente a0, tem-se
Z L Z 1
1
a0 = f (x) dx = x2 dx
L −L −1

x3 1 13 (−1)3 2
(4.12) = = − = ·
3 −1 3 3 3
Para os coeficientes an , tem-se
Z 1 Z 1
an = f (x) cos(nπ x) dx = x2 cos(nπ x) dx
−1 −1
1 Z
1 2
2 1
= x sen (nπ x) − x sen (nπ x) dx
nπ −1 nπ −1
1  2 
= 1 sen (nπ ) − (−1)2 sen (−nπ ) −

" 1 Z 1
#
2 x 1
− − cos(nπ x) + cos(nπ x) dx
nπ nπ −1 nπ −1
 
2 1 (−1)
=− − cos(nπ ) + cos(−nπ ) −
nπ nπ nπ
1
2 1 1
− · · sen (nπ x)
nπ nπ nπ −1

4 2
= cos(n π ) − [ sen (nπ ) − sen (−nπ )]
n2 π 2 n3 π 3
226 2 Séries de Fourier

4 4
= cos(n π ) − sen (nπ )
n2 π 2 n3 π 3
4
(4.13) = 2 2 (−1)n ,
n π
onde usou-se os fatos que cos(−nπ ) = cos(nπ ) = (−1)n e sen (−nπ ) = − sen (nπ ) = 0. Além
disso, fez-se duas integrações por partes, primeiro fazendo
( 
u=x ,2  du = 2xdx,

dv = cos(nπ x),  v = 1 sen (nπ x),

e depois a seguinte
( 
U = x,  dU = dx,

dV = sen (nπ x),  v = − 1 cos(nπ x).

Para os coeficientes bn , obtém-se
Z 1 Z 1
bn = f (x) sen (nπ x) dx = x2 sen (nπ x) dx
−1 −1
1 Z
1 2 2 1
=− x cos(nπ x) + x cos(nπ x) dx
nπ −1 nπ −1
1  2 
=− 1 cos(nπ ) − (−1)2 cos(−nπ ) +

" 1 Z 1
#
2 1
+ x sen (nπ x) − sen (nπ x) dx
nπ −1 nπ −1

1 2
=− [ cos(nπ ) − cos(nπ )] + [1 · sen (nπ ) − (−1) · sen (−nπ )] +
nπ nπ
  1
2 1
+ · − · sen (nπ x)
nπ nπ −1

2 2
= [ sen (nπ ) − sen (nπ )] − 2 2 [ sen (nπ ) − sen (−nπ )]
nπ n π
4
=− sen (nπ )
n2 π 2
(4.14) = 0,

onde novamente usou-se os fatos que cos(−nπ ) = cos(nπ ) = (−1)n e sen (−nπ ) = − sen (nπ ) =
0.
Além disso, também se fez duas integrações por partes, primeiro fazendo
2.4 Série de Fourier 227

( 
u = x2 ,  du = 2xdx,

dv = sen (nπ x),  v = − 1 cos(nπ x),

e depois a seguinte
( 
U = x,  dU = dx,

dV = cos(nπ x),  v = 1 sen (nπ x).

Usando as expressões para os coeficientes de Fourier, obtidas em (4.12), (4.13) e (4.14),
pode-se escrever a série de Fourier para a função f . Tem-se:
∞  
2/3 4 n
f (x) ∼ + ∑ 2 2 (−1) cos(nπ x) + 0 · sen (nπ x) ,
2 n=1 n π

isto é,
1 4 ∞ (−1)n
f (x) ∼ + 2 ∑ cos(nπ x).
3 π n=1 n2
Como f é contínua, os limites laterais existem, são iguais e coincidem com o valor de f (x)
em todo x ∈ R. Logo, pode-se usar o sinal de igualdade para f e sua série de Fourier, ou seja,
1 4 ∞ (−1)n
f (x) = + 2 ∑ cos(nπ x).
3 π n=1 n2

Fazendo x = 1 na igualdade acima, tem-se que


1 4 ∞ (−1)n
f (1) = 12 = + 2 ∑ cos(nπ ),
3 π n=1 n2

isto é,
1 4 ∞ (−1)n
1− = 2 ∑ (−1)n ,
3 π n=1 n2
ou ainda,
2 4 ∞ (−1)2n ,
= ∑ n2
3 π 2 n=1
que implica em
π2 ∞
1 1 1 1
= ∑ 2 = 1+ + + +···
6 n=1 n 4 9 16

Os exemplos desta seção mostram que as séries de Fourier permitem calcular da soma de
séries numéricas convergentes. No estudo tradicional de séries numéricas são apresentados
testes de convergência que garantem a convergência ou divergência das séries, mas com aqueles
métodos não é possível apresentar, no caso de séries convergentes, para qual valor ela converge.
228 2 Séries de Fourier

Assim, é possível usar, em conjunto, os testes de convergência para decidir se uma dada série
numérica é convergente e as séries de Fourier para funções apropriadas, que permitem o cálculo
da soma destas séries numéricas.

2.5 Simetria de funções

D EFINIÇÃO : Diz-se que um conjunto X ⊂ R é simétrico em relação à origem se para todo


x ∈ X se tem −x ∈ X. Sejam X ⊂ R um conjunto simétrico e f : X → R uma função. Diz-se que
a função f : X → R é par se f (−x) = f (x) para todo x ∈ X. Diz-se que a função f : X → R é
ímpar se f (−x) = − f (x) para todo x ∈ X.
As definições de funções pares e ímpares permitem um interpretação geométrica: simetria
de seus gráficos. As funções pares são simétricas em relação ao eixo y: a distância do ponto
(x, f (x)) ao ponto (0, f (x)) é igual a distância do ponto (−x, f (−x)) = (−x, f (x)) ao ponto
(0, f (x)). As funções ímpares são simétricas em relação à origem: a distância do ponto (x, f (x))
até a origem é igual a distância do ponto (−x, f (−(x)) = (−x, − f (x)) ao ponto (0, 0).

(a) Gráfico de uma função par (b) Gráfico de uma função ímpar

Exemplo 5.1: A função f : R → R, definida por f (x) = xn , é par se n ∈ N é par e f é ímpar


se n ∈ N for um número natural ímpar.

Note-se que R é um conjunto simétrico (isto é, R = (−∞, +∞)), pois, para qualquer x ∈ R,
tem-se sempre que −x ∈ R. Seja n um número natural par, então n = 2k para k ∈ N. Assim,

f (−x) = (−x)n = (−1)2k x2k = x2k = xn = f (x),


2.5 Simetria de funções 229

mostrando que f , neste caso, é par.


Agora seja n um natural ímpar, de modo que se escreve n = 2k − 1, com k ∈ N. Tem-se:

f (−x) = (−x)n = (−1)2k−1 x 2k−1 = −x 2k−1 = −xn = − f (x),

donde se conclui que f é ímpar.

Exemplo 5.2: Sejam f , g : R → R duas funções definidas por


 nπ x   nπ x 
f (x) = cos e g(x) = sen ,
L L
onde L > 0 e n ∈ N. Então, f é par e g é ímpar para todo n ∈ N.

Com efeito, já foi visto que R é um intervalo simétrico. Além disso, da trigonometria tem-se
que
cos(−θ ) = cos(0 − θ ) = cos 0 · cos θ + sen 0 · sen θ = cos θ ,

sen (−θ ) = sen (0 − θ ) = sen 0 · cos θ − sen θ · cos0 = − sen θ .


Assim,
   nπ x   nπ x 
nπ (−x)
f (−x) = cos = cos − = cos = f (x),
L L L
   nπ x   nπ x 
nπ (−x)
g(−x) = sen = sen − = − sen = −g(x).
L L L

Exemplo 5.3: Seja f : [−1, 2] → R definida por f (x) = x3 + x. Esta função não é par e nem é
ímpar, pois o domínio de f , dom ( f ) = [−1, 2], não é simétrico em relação à origem. A função
g : [−π , π ] → R dada por
(
0, −π ≤ x < 0,
g(x) =
1, 0≤x≤π
não é par e nem é ímpar, mesmo que seu domínio, −π ≤ x ≤ π , seja simétrico. Basta observar
que para x ∈ [0, π ], se tem f (x) = 1, de modo que −x ∈ [−π , 0) e, assim, f (−x) = 0. Isto é, os
valores de f (x) e f (−x) não guardam ligação entre si.

Exemplo 5.4: Sejam X ⊂ R um conjunto simétrico em relação a origem e f : X → R uma


função definida por f (x) = 0 para todo x ∈ X (ou seja, f ≡ 0 é a função identicamente nula em
X). Observe-se que
f (−x) = 0 = f (x),
230 2 Séries de Fourier

mas também
f (−x) = 0 = −0 = − f (x),
isto é, a função identicamente nula é simultaneamente par e ímpar.

Agora suponha que existe uma função g : X → R que seja simultaneamente par e ímpar.
Então,
g(−x) = g(x) e g(−x) = −g(x),
ou ainda,
g(x) = g(−x) e g(x) = −g(−x).
Somando as duas últimas igualdades membro a membro, obtém-se

2g(x) = g(−x) − g(−x) = 0 ⇒ g(x) = 0, ∀ x ∈ X,

isto é, g é a função identicamente nula em X.


Isso mostra que a única função, tendo como domínio um conjunto simétrico, que é ao mesmo
tempo par e ímpar é a função identicamente nula.

Exemplo 5.5: As funções constantes, não identicamente nula, são funções pares.
De fato, sejam X ⊂ R um conjunto simétrico e f : X → R uma função dada por f (x) = c,
onde c ∈ R. Tem-se:
f (−x) = c = f (x),
mas
f (−x) = c 6= −c = − f (x),
isto é, as funções constantes não nulas são pares, mas não ímpares.

Proposição 5.1: Sejam X ⊂ R um conjunto simétrico e f , g : X → R funções dadas. Então,


(a) A soma (resp., diferença) de duas funções pares é uma função par.
(b) A soma (resp., diferença) de duas funções ímpares é uma função ímpar.
(c) O produto de duas funções pares é uma função par.
(d) O produto de duas funções ímpares é uma função par.
(e) O produto de uma função par por uma função ímpar é uma função ímpar.
(f) O quociente entre uma função par e uma ímpar é uma função ímpar.
(g) Se uma função for ímpar, então seu valor absoluto é par.
D EMONSTRAÇÃO : Seja X ⊂ R conjunto simétrico, isto é, x ∈ X se, e somente se, −x ∈ X,
podendo ser limitado ou não.
(a) Sejam f , g : X → R duas funções pares, isto é, f (−x) = f (x) e g(−x) = g(x) para todo
x ∈ R. Tem-se:
2.5 Simetria de funções 231

( f + g)(−x) = f (−x) + g(−x) = f (x) + g(x) = ( f + g)(x),

o que mostra que f + g é par.


Analogamente,

( f − g)(−x) = f (−x) − g(−x) = f (x) − g(x) = ( f − g)(x),

demonstrando que f − g também é par.


(b) Sejam f , g : X → R duas funções ímpares, isto é, f (−x) = − f (x) e g(−x) = −g(x).
Tem-se

( f + g)(−x) = f (−x) + g(−x) = − f (x) − g(x) = −[ f (x) + g(x)] = −( f + g)(x),

mostrando que f + g é ímpar.


Similarmente,

( f − g)(−x) = f (−x) − g(−x) = − f (x) − [−g(x)] = − [ f (x) − g(x)] = −( f − g)(x),

que demonstra que f − g também é ímpar.


(c) Sejam f , g : X → R duas funções pares. Então,

( f · g)(−x) = f (−x) · g(−x) = f (x) · g(x) = ( f · g)(x),

donde segue-se que f · g é par.


(d) Sejam f , g : X → R duas funções ímpares. Então,

( f · g)(−x) = f (−x) · g(−x) = [− f (x)] · [−g(x)] = f (x) · g(x) = ( f · g)(x),

mostrando que f · g é par.


(e) Sejam f : X → R uma função par e g : R → R uma função ímpar. Tem-se:

( f · g)(−x) = f (−x) · g(−x) = [ f (x)] · [−g(x)] = −[ f (x) · g(x)] = −( f · g)(x),

demonstrando que f · g é uma função ímpar.

(f) Sejam f : X → R uma função par e g : X → R uma função ímpar tal que g(x) 6= 0 para
x ∈ X. Então,    
f f (−x) f (x) f (x) f
(−x) = = =− =− (x),
g g(−x) −g(x) g(x) g
demonstrando que o quociente é ímpar.
Sejam f : X → R uma função ímpar e g : X → R uma função par tal que g(x) 6= 0 para x ∈ X.
Tem-se:    
f f (−x) − f (x) f (x) f
(−x) = = =− =− (x),
g g(−x) g(x) g(x) g
de modo que isto mostra que f/g é ímpar.
232 2 Séries de Fourier

(g) Seja f : X → R uma função ímpar, isto é, f (−x) = − f (x) para todo x ∈ R. Seja g(x) =
| f (x)|. Tem-se:

g(−x) = | f (−x)| = | − f (x)| = | − 1| · | f (x)| = | f (x)| = g(x),

demonstrando que g é par.

Exemplo 5.6: Considere as funções fn : R → R definidas por


 nπ x   nπ x 
fn (x) = cos · sen , n∈N
L L
onde L > 0. Tem-se que cada função fn é ímpar, pois cada fn se escreve como o produto de uma
função par (cosseno) por uma ímpar (seno).

Exemplo 5.7: Considere as funções fn , gn : R → R dadas por


 nπ x   nπ x   nπ x   nπ x 
fn (x) = cos · cos e gn (x) = sen · sen ,
L L L L
com L > 0 e n ∈ N.
Tem-se que fn e gn são funções pares. Cada função fn é par, pois é produto de duas funções
pares; e cada função gn é par, pois é produto de duas funções ímpares.

O próximo resultado mostra que qualquer função, definida em um conjunto simétrico, pode
ser escrita como soma de uma função par com uma função ímpar.

Proposição 5.2: Sejam X um conjunto simétrico em relação a origem e f : X → R uma função


qualquer. Então, existem funções g, h : X → R, onde g é par e h é ímpar, tal que f = g + h.
D EMONSTRAÇÃO : Como X é um conjunto simétrico, tem-se que para qualquer x ∈ X, sem-
pre se tem −x ∈ X, de modo que f estará bem definida para quaisquer x e −x em seu domínio.
Agora escreva f (x) da seguinte forma:
f (x) f (x) f (x) f (x) f (−x)
f (x) = + = + ±
2 2 2 2 2
   
f (x) f (−x) f (x) f (−x)
= + + −
2 2 2 2
f (x) + f (−x) f (x) − f (−x)
= + ·
2 2
Agora escreva
2.5 Simetria de funções 233

f (x) + f (−x) f (x) − f (−x)


g(x) = e h(x) = ·
2 2
Afirma-se que g é par e que h é ímpar. De fato,
f (−x) + f [−(−x)] f (−x) + f (x) f (x) + f (−x)
g(−x) = = = = g(x),
2 2 2
f (−x) − f [−(−x)] f (−x) − f (x) f (x) − f (−x)
h(−x) = = =− = −h(x).
2 2 2
Como f (x) = g(x) + h(x), onde g é par e h é ímpar, tem-se, portanto, que f se escreve como
soma de uma função par com uma função ímpar.

Em relação a proposição 5.2, a função g é dita componente par (ou parte par) de f e a função
h é dita componente ímpar (ou parte ímpar) de f .

Observação 5.1: Existe outro modo de demonstrar a proposição 5.2. De fato, suponha que f
possa ser escrita como a soma

(5.1) f (x) = u(x) + v(x),

onde u e v representam as partes par e ímpar de f , respectivamente.


Como u é par e v é ímpar, então por definição, tem-se que

u(−x) = u(x) e v(−x) = v(x).

Assim,

(5.2) f (−x) = u(−x) + v(−x) = u(x) − v(x).

Segue-se de (5.1) e (5.2) que


(
f (x) = u(x) + v(x),
f (−x) = u(x) − v(x).

Este sistema pode ser resolvido para determinar u(x) e v(x). Somando as duas expressões,
obtém-se u(x). Já v(x) pode ser obtida subtraindo-se a segunda equação da primeira. Assim,
obtém-se:

f (x) + f (−x) f (x) − f (−x)


u(x) = e v(x) = ·
2 2

Exemplo 5.8: Seja f : (−5, 5) → R uma função definida por f (x) = 2x3 − x2 − 3. Trata-se de
determinar funções g e f , par e ímpar, respectivamente, tais que f = g + h.
234 2 Séries de Fourier

Figura 5.2: Gráfico da função f (x) = 2x3 − x2 − 3.

Pela proposição 5.2, a função g dada a seguir é par:


f (x) + f (−x)
g(x) =
2
  
2x3 − x2 − 3 + 2(−x)3 − (−x)2 − 3
=
2
2x3 − x2 − 3 − 2x3 − x2 − 3
=
2
−2x2 − 6
= = −x2 − 3.
2
Observe-se que g realmente é uma função par, pois

g(−x) = −(−x)2 − 3 = −x2 − 3 = g(x).

Pela proposição 5.2, a função h dada abaixo é ímpar:


f (x) − f (−x)
h(x) =
2
  
2x3 − x2 − 3 − 2(−x)3 − (−x)2 − 3
=
2
2x3 − x2 − 3 + 2x3 + x2 + 3 4x3
= = = 2x3 .
2 2
Note-se que h realmente é uma função par, pois
2.5 Simetria de funções 235

h(−x) = 2(−x)3 = −2x3 = −h(x).

Figura 5.3: Gráfico das funções g(x) = −x2 − 3 e h(x) = 2x3 .

Por fim, observe que f se escreve como soma de g e h:

g(x) + h(x) = (−x2 − 3) + 2x3 = 2x3 − x2 − 3 = f (x).

Proposição 5.3: Sejam X ⊂ R um conjunto simétrico em relação a origem, f : X → R uma


função qualquer, g : X → R uma função par e h : X → R uma função ímpar tais que f = g + h.
Então, as funções g e h são únicas.
D EMONSTRAÇÃO : Suponha que f possa ser escrita como as seguintes somas f = g + h e
f = u + v, onde g e u são funções pares e h e v são funções ímpares.
Então, g + h = u + v. Ou ainda, que g − u = v − h. Como g e u são funções pares, pelo item
(a) da proposição 5.1 tem-se que g − u é par. Analogamente, como h e v são ímpares, pelo item
(b) da mesma proposição segue-se que v − h é ímpar.
Assim, de g − u = v − h, segue-se que o primeiro membro é par e o segundo membro é uma
função ímpar. Mas a igualdade implica dizer que as funções g − u e v − h são simultaneamente
par e ímpar. O exemplo 5.4 mostrou que a única função simultaneamente par e ímpar é a função
identicamente nula. Isto implica em g − u ≡ 0 e v − h ≡ 0, ou seja, que g = u e h = v. Portanto,
segue-se daí a decomposição em soma de funções par e ímpar é única.
236 2 Séries de Fourier

Exemplo 5.9: Seja f : [−1, 0) ∪ (0, 1] → R uma função definida por

2x3 − 1
f (x) = ·
x

Figura 5.4: Gráfico da função f .

Deseja-se determinar duas funções g e f , par e ímpar, respectivamente, tais que f = g + h.


Para g, tem-se:  
f (x) + f (−x) 1 2x3 − 1 2(−x)3 − 1
g(x) = = +
2 2 x (−x)
 3 
1 2x − 1 2x3 + 1
= +
2 x x
1 4x3
= · = 2x2 .
2 x
Para h, tem-se:

f (x) − f (−x)
h(x) =
2
2.5 Simetria de funções 237

 
1 2x3 − 1 2(−x)3 − 1
= −
2 x (−x)
 
1 2x3 − 1 2x3 + 1
= −
2 x x
 
1 2
= −
2 x
1
=− ·
x

Figura 5.5: Gráfico das funções g e h.

É fácil verificar que g(x) = 2x2 e h(x) = −1/x são, respectivamente, par e ímpar e que f (x) =
g(x) + h(x).
A decomposição em soma de função par e ímpar é única. Assim, outros procedimentos para
a determinação de funções par e ímpar podem ser usados, desde que as operações sejam viáveis
e corretas. Por exemplo,
 
2x3 − 1 2x3 1 2
 1
f (x) = = − = 2x + − = g(x) + h(x).
x x x x

Exemplo 5.10: Considere f : R → R definida por


238 2 Séries de Fourier

(
−2, −3 < x < 0,
f (x) =
2, 0 < x < 3,

e periódica de período T = 6.

Figura 5.6: Gráfico da função f do exemplo 5.10.

Note-se que o domínio X = (−3, 0)∪(0, 3) é simétrico e que f (−x) = − f (x) para todo x ∈ X.
Portanto f é uma função ímpar.

Exemplo 5.11: Seja f : R → R dada por


(
cos x, se 0 < x < π
f (x) =
0, se π < x < 2π ,

e periódica de período T = 2π . Esta função não é par e nem ímpar.

Exemplo 5.12: Seja f : R → R uma função definida por f (x) = x(10 − x) para 0 < x < 10 e
periódica de período T = 10. Um simples gráfico para f revela que ela é uma função par.
2.5 Simetria de funções 239

Figura 5.7: Gráfico da função f do exemplo 5.11.

Proposição 5.4: Sejam X ⊂ R um intervalo aberto e simétrico e f : X → R uma função


diferenciável. Tem-se:
(a) Se f for uma função par, então f 0 será uma função ímpar;

(b) Se f for uma função ímpar, então f 0 será uma função par.
D EMONSTRAÇÃO : Para mostrar (a), suponha que f seja par. Então, para qualquer x ∈ X,
tem-se
f (−x + h) − f (−x) = f [−(x − h)] − f (−x) = f (x − h) − f (x).
Segue-se, portanto, que
f (−x + h) − f (−x)
f 0 (−x) = lim
h→0 h
f (x − h) − f (x)
= lim
h→0 h
 
f (x − h) − f (x)
= − lim ·
h→0 −h
Agora faça h = −∆x. Tem-se:
 
0 f (x − h) − f (x)
f (−x) = − lim
h→0 −h
240 2 Séries de Fourier

 
f (x + ∆x) − f (x)
=− lim = − f 0 (x),
−∆x→0 ∆x
donde se conclui que
f 0 (−x) = − f 0 (x),
logo f 0 é uma função ímpar.

Para (b), suponha que f seja uma função ímpar. Assim, para todo x ∈ X, tem-se

f (−x + h) − f (−x) = f [−(x − h)] − f (−x) = − f (x − h) + f (x).

Assim,
f (−x + h) − f (−x)
f 0 (−x) = lim
h→0 h
− f (x − h) + f (x)
= lim
h→0 h
f (x − h) − f (x)
= lim ·
h→0 −h
Faça h = −∆x. Tem-se:
f (x − h) − f (x) f (x + ∆x) − f (x)
f 0 (−x) = lim = lim = f 0 (x),
h→0 −h −∆x→0 ∆x
donde se conclui que f 0 (−x) = f 0 (x), isto é, que f 0 é uma função par.

Proposição 5.5: Sejam X ⊂ R um intervalo simétrico e ϕ : X → R uma função definida por


Z x
ϕ (x) = f (t) dt.
0

Tem-se:
(a) Se f é uma função par, então ϕ é uma função ímpar.
(b) Se f é uma função ímpar, então ϕ é uma função par.
D EMONSTRAÇÃO : Note-se, primeiro, que
Z −x
ϕ (−x) = f (t) dt.
0

Fazendo u = −t, tem-se que −du = dt, de modo que


Z x Z x
(5.3) ϕ (−x) = − f (−u) du = − f (−u) du.
0 0

(a) Por hipótese, f é par, isto é, f (−u) = f (u). Usando este fato em (5.3), tem-se
2.5 Simetria de funções 241

Z x
ϕ (−x) = − f (u) du = −ϕ (x),
0

mostrando que ϕ é ímpar.

(b) Por hipótese, f é ímpar, isto é, f (−u) = − f (u). Assim, usando este fato em (5.3), obtém-
se Z x Z x Z x
ϕ (−x) = − f (−u) du = − − f (u) du = f (u) du = ϕ (x),
0 0 0
o que mostra que ϕ é uma função par.

Proposição 5.6: Seja f : [−L, L] → R uma função par e integrável. Então,


Z L Z L
f (x) dx = 2 f (x) dx.
−L 0

D EMONSTRAÇÃO : Observe-se, primeiro, que se pode escrever


Z L Z 0 Z L
f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx.
−L −L 0

Agora usa-se a hipótese de que f é uma função par, isto é, f (x) = f (−x) para todo x ∈ R, na
primeira integral do segundo membro acima. Tem-se:
Z L Z 0 Z L
f (x) dx = f (−x) dx + f (x) dx.
−L −L 0

Em seguida usa-se a mudança de variáveis y = −x, tal que −dy = dx, na primeira integral do
segundo membro da igualdade acima, mas mantendo a segunda integral. Note-se que os novos
limites de integração passam a ser y1 = −(−L) = L e y2 = −0 = 0, onde usou-se a própria
mudança de variáveis, y = −x, para obtê-los. Assim,
Z L Z 0 Z L
f (x) dx = − f (y) dy + f (x) dx
−L L 0
Z L Z L
= f (y) dy + f (x) dx
0 0
Z L
=2 f (x) dy,
0

onde inverteu-se o sinal de integração ao trocar a ordem dos limites de integração. Além disso,
somou-se as duas integrais em virtudes das variáveis de integração serem “mudas”.

Proposição 5.7: Seja f : [−L, L] → R uma função ímpar e integrável. Então,


242 2 Séries de Fourier

Z L
f (x) dx = 0.
−L

D EMONSTRAÇÃO : Note-se que


Z L Z 0 Z L
f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx.
−L −L 0

Em seguida usa-se a hipótese de que f é uma função ímpar, isto é, f (x) = − f (−x) para todo
x ∈ R, na primeira integral do segundo membro acima. Tem-se:
Z L Z 0 Z L
f (x) dx = − f (−x) dx + f (x) dx.
−L −L 0

Agora usa-se a mudança de variáveis y = −x, tal que −dy = dx, na primeira integral do
segundo membro da igualdade acima, mas mantendo a segunda integral. Os novos limites de
integração passam a ser y1 = −(−L) = L e y2 = −0 = 0, onde usou-se a própria mudança de
variáveis, y = −x, para obtê-los. Assim,
Z L Z 0 Z L
f (x) dx = − − f (y) dy + f (x) dx
−L L 0
Z 0 Z L
= f (y) dy + f (x) dx
L 0
Z L Z L
=− f (y) dy + f (x) dx = 0,
0 0

onde se inverteu o sinal da primeira integral do segundo membro em um dos passos acima ao
realizar a troca da ordem dos limites de integração. Além disso, somou-se as duas integrais em
virtudes das variáveis de integração serem “mudas”.

Os vários resultados obtidos nesta seção são muito úteis para simplificar os cálculos dos
coeficientes de Fourier. Os resultados a seguir são bem simples, porém se mostram úteis na
prática. Os mesmos serão enunciados na forma de proposições apenas para facilitar citações
nas seções seguintes.

Proposição 5.8: Seja f : R → R uma função par, periódica de período 2L, integrável e abso-
lutamente integrável. Então,
Z Z  nπ x 
2 L 2 L
a0 = f (x) dx, an = f (x) cos dx e bn = 0.
L 0 L 0 L
D EMONSTRAÇÃO : A expressão para o coeficiente a0 segue imediatamente da proposição 5.6,
pois, por hipótese, f é par. Para justificar a afirmação para os coeficientes an , basta observar
inicialmente que a função cos (nπ x/L) é par, como foi mostrado no exemplo 5.2. Além disso,
pelo item (c) da proposição 5.1, o produto entre duas funções pares resulta em uma função par.
2.5 Simetria de funções 243

Assim, o integrando na expressão para an , que é f (x) · cos (nπ x/L), é uma função par. Aplicando
a proposição 5.6, resulta que este coeficiente pode ser calculado multiplicando-se a integral por
2 e integrando no semi-intervalo [0, L]. Para justificar que os coeficientes bn são todos nulos
para uma função f par, basta observar que o exemplo 5.2 mostra que as funções sen (nπ x/L) são
ímpares. E pelo item (e) da proposição 5.1, o produto entre uma função par por outra ímpar
resulta em uma função ímpar. Assim, o integrando na expressão que define bn , que é f (x) ·
sen (nπ x/L), é uma função ímpar. Logo, pela proposição 5.7, a integral de uma função ímpar em
intervalo simétrico é sempre zero. Isto mostra que bn = 0 para todo n ∈ N.

Proposição 5.9: Seja f : R → R uma função ímpar, periódica de período 2L, integrável e
absolutamente integrável. Então,
Z  nπ x 
2 L
a0 = 0, an = 0 e bn = f (x) sen dx.
L 0 L
D EMONSTRAÇÃO : A expressão para o coeficiente a0 segue imediatamente da proposição
5.7, pois, por hipótese, f é ímpar. Para justificar a afirmação para os coeficientes an , basta
observar inicialmente que a função cos (nπ x/L) é par, como foi mostrado no exemplo 5.2. Além
disso, pelo item (e) da proposição 5.1, o produto entre uma função par por outra ímpar resulta
em uma função ímpar. Assim, o integrando na expressão para an, que é f (x) · cos (nπ x/L), é uma
função ímpar. Logo, pela proposição 5.7, a integral de uma função ímpar em intervalo simétrico
é sempre zero. Isto mostra que an = 0 para todo n ∈ N. Para justificar a expressão dada para os
coeficientes bn , basta observar que o exemplo 5.2 mostra que as funções sen (nπ x/L) são ímpares.
E pelo item (d) da proposição 5.1, o produto entre duas funções ímpares resulta em uma função
par. Assim, o integrando na expressão que define bn , que é f (x) · sen (nπ x/L), é uma função par.
Aplicando a proposição 5.6, resulta que este coeficiente pode ser calculado multiplicando-se a
integral por 2 e integrando no semi-intervalo [0, L].

Observação 5.2: Agora é possível dizer por qual motivo escolheu-se o intervalo [−L, L]
para realizar a integração para a determinação dos coeficientes de Fourier. É verdade, como
já foi dito, que as condições de ortogonalidades para as funções cosseno e seno são sempre ver-
dadeiras em qualquer intervalo de comprimento 2L. Porém as simetrias de paridade e impari-
dade só fazem sentido em intervalos simétricos: em qualquer outro intervalo não simétrico de
comprimento 2L não se pode usar estes conceitos de simetrias. Além disso, é muito útil, na
prática, determinar as séries de Fourier para funções pares, ímpares, ou mesmo as não pares e
nem ímpares, quando se pode usar todos os resultados sobre simetria obtidos nesta seção. Isso
ficará bastante evidente na próxima seção.
244 2 Séries de Fourier

Encerra-se esta seção com outros conceitos de simetria para funções periódicas.

D EFINIÇÃO : Seja f : R → R uma função periódica de período T > 0. Diz-se que f tem
simetria de meia onda quando a mesma satisfaz
 
T
f (x) = − f x + ·
2

Proposição 5.10: Seja f : R → R periódica com simetria de meia onda. Então,


 
T
f (x) = − f x − ·
2
D EMONSTRAÇÃO : Como f tem simetria de meia onda, então, por definição, tem-se que
 
T
f (x) = − x + ·
2
Como f é periódica de período T , segue-se que
    
T T
f x+ = f x+ T −
2 2
    
T T
=f x− +T = f x− ·
2 2
Portanto,    
T T
f (x) = − f x+ = −f x− ·
2 2

D EFINIÇÃO : Seja f : R → R uma função periódica de período T > 0 e com simetria de


meia onda. Se f for par ou ímpar, diz que f tem simetria de quarto de onda, par ou ímpar,
respectivamente.
Muitas vezes a simetria de uma função periódica é obscurecida por um termo constante. O
exemplo a seguir mostra este fato.

Exemplo 5.13: Seja f : R → R uma função definida por



 a − a x, para 0 ≤ x < T,
f (x) = T
 periódica de período T .

Então, é possível construir uma nova função, subtraindo uma constante a/2 de f , obtendo-se
uma função ímpar.
De fato, a função g : R → R, dada por
2.6 Séries de Fourier de funções pares e ímpares 245


 f (x) − a , para 0 ≤ x < T,
g(x) = 2
 periódica de período T ,

simplesmente desloca o gráfico de f para baixo de uma distância a/2.


Para se convencer que a função g é ímpar, sugere-se ao leitor esboçar o gráfico da mesma.

2.6 Séries de Fourier de funções pares e ímpares

Até este ponto as funções dadas nos exemplos sempre estavam definidas em intervalos do
tipo [−L, L], ou (−L, L], ou ainda [−L, L). A questão que agora se apresenta é: O que fazer caso
a função f esteja definida em um intervalo do tipo [0, L] e nada for dito sobre o período? Em
princípio, seria possível escolher um período T qualquer, tal que T > L, e estender a função de
maneira conveniente no intervalo (L, T ). Como consequência desta possibilidade, ter-se-ia uma
função f : [0, L] → R que pode ser representada por mais de uma série de Fourier.
Como exemplo, considere a função f : [0, π ] → R definida por f (x) = x. Os próximos exem-
plos mostram que esta função pode ser estendida de várias maneiras, sendo assim representadas
por séries distintas.

Exemplo 6.1: Seja f : [0, π ) → R definida por f (x) = x. Represente esta função como uma
série de senos.

S OLUÇÃO : Para obter uma série de senos é necessário fazer uma extensão da função f de
modo que resulte em uma função ímpar e periódica. Denotar-se-á a extensão por f . Assim,
(
x, se − π ≤ x < π ,
f (x) =
f (x + 2π ) = f (x).

O leitor poderá verificar facilmente que f é uma função ímpar e periódica, isto é, que f (−x) =
− f (x) e que f (x + 2π ) = f (x).
Para os coeficientes a0 e an , tem-se
Z π Z π
1 1
a0 = f (x) dx e an = f (x) cos (nx) dx.
π −π π −π

Como f é ímpar, pela proposição 5.7, tem-se que a0 = 0, pois se trata de uma integral em
intervalo simétrico de uma função ímpar. Para an , tem-se que o integrando é o produto de uma
função ímpar por uma par, isto é, o produto de f que é ímpar por cos(nx), que é uma função
par. Pelo item (e) da proposição 5.1, este integrando é uma função ímpar e pela proposição 5.7 a
246 2 Séries de Fourier

Figura 6.1: Gráfico da função f .

Figura 6.2: Gráfico da função estendida f .

integral em intervalo simétrico de uma função ímpar é sempre igual a zero. Assim, an = 0 para
todo n ∈ N.
Já os coeficientes bn precisam ser determinados pela definição. Porém, por ser f uma função
ímpar e sen (nx) também uma função ímpar, tem-se que o integrando em bn é uma função par.
Assim, pela proposição 5.6, basta multiplicar a integral por 2 e integrar no semi-intervalo [0, L].
Assim, realizando uma integração por partes, obtém-se
Z π Z π
1 2
bn = f (x) sen (nx) dx = x · sen (nx) dx
π −π π 0
2.6 Séries de Fourier de funções pares e ímpares 247

 π Z 
2 x
1 π
= − · cos(nx) + cos(nx) dx
π n 0 n 0
  π
2 x 1
= − · cos(nx) + 2 · sen (nx)
π n n 0
 
2 π 1
= − · cos(nπ ) + 2 sen (nπ ) −
π n n
 
2 0 1
− − · cos 0 + 2 sen 0
π n n
2 1
= − cos(nπ ) = −2 · (−1)n
n n
(−1)n+1
= 2· ·
n
A série de Fourier para f é dada por

a0
f (x) ∼ + ∑ [an cos(nx) + bn sen (nx)] ,
2 n=1

que após substituição dos valores dos coeficientes a0, an e bn , obtidos acima, resulta em

(−1)n+1
f (x) ∼ 2 ∑ · sen (nx), ∀ x ∈ R.
n=1 n

Figura 6.3: Gráfico das somas parciais até n = 4.

Para expressar a função f , dada originalmente, em termos de uma série de senos é necessário
restringir os valores de x para o domínio de f , isto é, para o intervalo 0 ≤ x < π . Assim,

(−1)n+1
f (x) = 2 ∑ · sen (nx), 0 ≤ x < π.
n=1 n
248 2 Séries de Fourier

Neste ponto chama-se atenção para o fato da série de Fourier não ser igual a f (x) = x para
x = π , pois neste ponto a função f é descontínua e, assim sua série de Fourier converge neste
ponto para a média dos limites laterais e que é diferente de f (π ) = π . Por isso tomou-se o
intervalo [0, π ) como domínio de f .

Figura 6.4: Gráfico da função f e das cinco primeiras somas parciais restritas ao intervalo [0, π ).

Exemplo 6.2: Seja f : [0, π ) → R definida por f (x) = x. Represente esta função como uma
série de cossenos.

S OLUÇÃO : Para determinar uma série de cossenos para representar f , é necessário fazer uma
extensão desta função de modo que resulte em uma nova função par e periódica. Denotando a
extensão por f , pode-se escrever
(
| x |, se − π ≤ x < π ,
f (x) =
periódica de período T = 2π .

Facilmente se verifica que f (−x) = f (x) e que f (x + 2π ) = f (x). Como f é par, pela
proposição 5.6, obtém-se
2.6 Séries de Fourier de funções pares e ímpares 249

Figura 6.5: Gráfico da função f .

Z π Z π
1 2
a0 = f (x) dx = x dx
π −π π 0
π
x2
= = π.
π 0
Como f é par, o integrando nos coeficientes an é par, pois se trata do produto entre duas
funções pares (veja proposição 5.1). Além disso, pela proposição 5.6, basta multiplicar a integral
por 2 e integrar no intervalo [0, L]. Assim, fazendo uma integração por partes, obtém-se
Z π Z π
1 2
an = f (x) cos(nx) dx = x · cos(nx) dx
π −π π 0
 π Z 
2 x
1 π
= sen (nx) − sen (nx) dx
π n 0 n 0
  π
2 x 1
= sen (nx) − 2 cos(nx)
π n n 0
   
2 π 1 2 0 1
= sen (nπ ) − 2 cos(nπ ) − sen 0 − 2 cos 0
π n n π n n
2 2 2
=− 2
cos(nπ ) + 2 = 2 [ (−1)n − 1],
πn πn πn
ou seja,
4 ,
a 2k = 0 e a 2k−1 = − k ∈ N.
(2k − 1)2 π
Para os coeficientes bn , basta notar que f é par e que sen (nx) é ímpar, de modo que o produto
entre estas duas funções, que é o integrando na integral que define bn , é ímpar. Assim, pela
proposição 5.7, tem-se que a integral de uma função ímpar em intervalo simétrico é igual a
zero, de modo que bn = 0 para todo n ∈ N.
O passo seguinte consiste em substituir os coeficientes de Fourier encontrados na série de
Fourier para f , isto é,

a0
f (x) ∼ + ∑ [ak cos(kx) + bn sen (kx)] ,
2 k=1
250 2 Séries de Fourier

Figura 6.6: Gráfico da função f e das três primeiras somas parciais.

ou ainda,
π 4 ∞ 1
f (x) ∼ − ∑ · cos(2k − 1)x, ∀ x ∈ R.
2 π k=1 (2k − 1)2
Por fim, para representar a função f , dada originalmente, através de uma série de cossenos,
é necessário restringir os valores de x na série para f (x) para aqueles x no domínio de f , isto é,
para o intervalo 0 ≤ x < π . Assim,
π 4 ∞ 1
f (x) = − ∑ · cos(2k − 1)x, 0 ≤ x < π.
2 π k=1 (2k − 1)2

Figura 6.7: Gráfico da função f e as três primeiras somas parciais.


2.6 Séries de Fourier de funções pares e ímpares 251

Exemplo 6.3: Seja f : [0, π ) → R definida por f (x) = x. Represente esta função como uma
série de senos e cossenos.

S OLUÇÃO : Para que se represente f por uma série envolvendo senos e cossenos é necessário
fazer uma extensão periódica de f , mas de tal modo que resulte em uma função que não seja par
e nem ímpar. A maneira de se estender f para −π < x < 0 não importa, mas desde que não seja
par ou ímpar (ou seja, não seja simétrica em relação ao eixo y e nem seja simétrica em relação
à origem). Assim, é natural escolher uma extensão mais simples, como 0 para π < x < 0, isto é,


 0,
 −π < x < 0,
f (x) = x, 0 ≤ x ≤ π,



periódica de período T = 2π .

Figura 6.8: Gráfico da função f .

Agora passa-se à determinação dos coeficientes de Fourier. Para a0, tem-se


Z π Z 0 Z π
1 1 1
a0 = f (x) dx = 0 dx + x dx
π −π π −π π 0

x2 π π
= = ·
2π 0 2
Para os coeficientes an , realizando uma integração por partes, obtém-se
Z π Z 0 Z π
1 1 1
an = f (x) cos(nx) dx = 0 · cos(nx) dx + x · cos(nx) dx
π −π π −π π 0
 π Z 
1 x
1 π
= · sen (nx) − sen (nx) dx
π n 0 n 0
  π
1 x 1
= · sen (nx) + 2 · cos(nx)
π n n 0
   
1 π 1 1 0 1
= · sen (nπ ) + 2 · cos(nπ ) − · sen 0 + 2 · cos0
π n n π n n
252 2 Séries de Fourier

1 1
= cos(n π ) −
n2 π n2 π
1
= [(−1)n − 1] ,
n2 π
ou ainda,
2 ,
a 2k = 0, e a 2k−1 = − k ∈ N.
(2k − 1)2 π
Para os coeficientes bn , onde será feita uma integração por partes, obtém-se
Z π
1
bn = f (x) sen (nx) dx
π −π
Z 0 Z
1 1 π
= 0 · sen (nx) dx + x · sen (nx) dx
π −π π 0
 π Z π 
1 x 1
= − · cos(nx) + cos(nx) dx
π n 0 n 0
  π
1 x 1
= − · cos(nx) + 2 · sen (nx)
π n n 0
   
1 π 1 1 0 1
= − · cos(nπ ) + 2 · sen (nπ ) − − cos 0 + 2 · sen 0
π n n π n n
1 1
= − · cos(nπ ) = − (−1)n
n n
(−1)n+1
= ·
n
Portanto, determinou-se os seguintes coeficientes de Fourier:

π 2 , (−1)k+1
a0 = , ak = − e bk = ·
2 (2k − 1)2π k

Deste modo, a série de Fourier para a função f é dada por



a0
f (x) ∼ + ∑ [ ak cos[(2k − 1)x] + bk sen (kx)]
2 k=1
∞  
π/2 2 (−1)k+1
∼ +∑ − · cos[(2k − 1)x] + · sen (kx)
2 k=1 (2k − 1)2π k

π 2 ∞ 1 ∞
(−1)k+1
∼ − ∑ · cos[(2k − 1)x] + ∑ k · sen (kx),
4 π k=1 (2k − 1)2 k=1

para todo x ∈ R.
Assim, para representar a função f , dada originalmente, basta retringir os valores de x na
série para f (x) para aqueles x no domínio de f , isto é,
2.6 Séries de Fourier de funções pares e ímpares 253

Figura 6.9: Gráfico das quatro primeiras somas parciais.

Figura 6.10: Gráfico da função f e das quatros primeiras somas parciais no intervalo [0, π ).

π 2 ∞ 1 ∞
(−1)k+1
f (x) = − ∑ · cos[(2k − 1)x] + ∑ k · sen (kx),
4 π k=1 (2k − 1)2 k=1

para todo 0 ≤ x < π .


Por fim, chama-se a atenção do leitor para que seja observado que a representação de f em
séries de senos e cossenos pode ser obtida pela soma das séries encontradas nos exemplos 6.1 e
6.2, mas dividindo o resultado por 2.
254 2 Séries de Fourier

Observação 6.1: Nos exemplos anteriores desta seção nada foi comentado sobre a maneira
de estender a função de maneira periódica. Na prática o que se viu foi uma extensão periódica
“dobrando-se” o comprimento do intervalo de definição da função, isto é, adotando-se como
período o menor possível. Não é necessário que seja assim, ou seja, é possível adotar como
período qualquer T > L.
Assim, a função do exemplo 6.1 pode ser estendida de maneira ímpar, mas usando como
período 4π e não necessariamente 2π como foi visto. Deste modo, uma extensão f : R → R
definida por 

 −2π − x, se − 2π < x < −π ,



 x, se − π ≤ x < π ,
f (x) =

 2π − x, se π ≤ x ≤ 2π ,



 periódica de período T = 4π .

também permite que se represente f : [0, π ) → R, dada por f (x) = x, em uma série de senos.
Como visto anteriormente, por ser f uma função ímpar, segue-se dos resultados da seção 2.5
que os coeficientes a0 = 0 = an para todo n ∈ N. Assim, basta calcular os coeficientes bn.
Lembrando que agora L = 2π e que o integrando em bn será par, por ser produto de f que é
impar por sen (nx/2) que também é ímpar, resultando em uma função par, obtém-se
Z 2π  nx  Z 2π  nx 
1 1
bn = f (x) sen dx = f (x) sen dx
2π −2π 2 π 0 2
Z π  nx  Z 2π  nx 
1 1
= x · sen dx + (2π − x) sen dx
π 0 2 π π 2
Z π  nx  Z 2π  nx  Z 2π  nx 
1 1
= x · sen dx + 2 sen dx − x · sen dx.
π 0 2 π 2 π π 2
A segunda integral no segundo membro acima pode ser resolvida através de uma substitu-
ição simples. Já a primeira e a última integrais no segundo membro podem ser resolvidas por
integração por partes do seguinte modo:
 
 u = x,  du = dx,
 nx  ⇒  
 dv = sen dx,  v = − 2 cos nx ·
2 n 2
Assim,
Z π  nx  Z 2π Z
 nx   nx 
1 1 2π
bn = x · sen dx + 2 sen dx − x · sen dx.
π 0 2 π 2 π π 2
" #
1

2x  nx  π 2 Z π  nx   2  nx  2π
= − · cos + cos dx + 2 − · cos −
π n 2 0 n 0 2 n 2 π
" #
1 2x  nx  2π 2 Z 2π  nx 
− − · cos + cos dx
π n 2 π n π 2
2.6 Séries de Fourier de funções pares e ímpares 255

1

2x  nx  4  nx  π 4  nx  2π
= − · cos + 2 · sen − · cos −
π n 2 n 2 n 2 π
0
  nx  4  nx  2π
1 2x
− − · cos + 2 · sen
π n 2 n 2 π
       
1 2π nπ 4 nπ 1 2.0 4
= − · cos + 2 · sen − − · cos 0 + 2 · sen 0 −
π n 2 n 2 π n n
4h  nπ i
− cos(nπ ) − cos −
n 2
    nπ  4  nπ  
1 4π 4 1 2π
− − · cos(nπ ) + 2 · sen (nπ ) + − · cos + 2 · sen
π n n π n 2 n 2
2  nπ  4  nπ  4 4  nπ 
= − · cos + 2 · sen − · cos(nπ ) + · cos +
n 2 n π 2 n n 2
4 2  nπ  4  nπ 
+ · cos(nπ ) − · cos + 2 · sen
n n 2 n π 2
8  nπ 
= 2 · sen ·
n π 2
Portanto, a série de Fourier para a função f é dada por

8 ∞ 1  nπ   nx 
f (x) ∼ ∑ n2 · sen · sen , ∀ x ∈ R.
π n=1 2 2
Agora basta restringir os valores de x para a série de Fourier de f para os valores de x no
domínio de f , isto é,
8 ∞ 1  nπ   nx 
f (x) = ∑ 2 · sen · sen , 0≤x<π
π n=1 n 2 2

e, assim, tem-se uma nova representação por meio de uma série de senos para a função f do
exemplo 6.1.
Note-se que o procedimento usado ao restrigir os valores de x ao domínio de f , isto é, para
0 ≤ x < 1, também poderia ser usado para x = π . Isto se deve ao fato que a extensão f adotada é
contínua em todos os pontos, de maneira que a série de Fourier converge para o valor da função
em cada ponto de seu domínio. De outro modo: a extensão da no exemplo 6.1 não é adequada
caso f esteja definida no intervalo [0, π ], mas a extensão feita nesta observação, sim.
256 2 Séries de Fourier

2.7 Diferenciação de séries de Fourier

As séries de Fourier constituem um importante modo de representar soluções de equações


diferenciais parciais (EDP), isto é, representar funções que são soluções de equações deste tipo.
Isto será visto em capítulo futuro. Além disso, também será visto que candidatos à soluções
de EDP, que são representadas através de séries de Fourier, precisam satisfazer não apenas a
equação como também condições de contorno e/ou condições iniciais. Com isso, será necessário
derivar o candidato à solução, isto é, a série de Fourier deverá ser derivada termo a termo.
As condições que permitem derivar termo a termo dadas através da seguinte proposição:

Sejam un : [a, b] → R funções de classe C1 [(a, b)]. Suponha que a série ∑ u0n(x) das
n=1
funções derivadas convirja uniformemente para uma função v(x) no intervalo [a, b]. Suponha

ainda que a série numérica ∑ un (x0 ) seja convergente para algum x0 ∈ [a, b]. Então, a série
n=1

de funções ∑ un (x) converge uniformemente em [a, b] para uma função u(x), onde u(x)
n=1
é derivável e u0 (x) = v(x), isto é,
" #
∞ ∞
d
∑ un(x) = ∑ u0n (x).
dx n=1 n=1

(Uma demonstração pode ser encontrada nas referências [37], [66] e [74].)

Porém esta proposição exige condições suficientes e não necessárias. Além disso, a derivação
termo a termo de uma série de Fourier também tem aspectos delicados, visto que as derivadas
das funções senos e cossenos que aparecem nesta série contêm a variável n, que em geral
aparece multiplicando tais funções e, com isso, atrapalhando a convergência da série. O teo-
rema dado a seguir possui exigências um pouco menores do que aquelas da proposição acima,
mas também deve ser usado com cuidado, isto é, nem sempre é possível derivar termo a termo
uma série de Fourier.

Teorema 7.1 (diferenciação da série de Fourier): Seja f : R → R uma função contínua,


periódica de período T = 2L e tal que f 0 é seccionalmente diferenciável. Então, a série de
Fourier para f 0 pode ser obtida derivando-se termo a termo a série de Fourier para a função f ,
isto é,
∞ h   nπ x   nπ   nπ x i

f 0 (x) ∼ ∑ · bn cos − · an sen ·
n=1 L L L L
D EMONSTRAÇÃO : Como f 00 é seccionalmente diferenciável e é periódica de período T = 2L,
pode-se aplicar o teorema de Fourier (teorema 4.1) para concluir que f 0 possui uma série de
Fourier que converge para f 0 , isto é,
2.7 Diferenciação de séries de Fourier 257

∞ h  nπ x   nπ x i
A0
(7.1) f 0 (x) ∼ + ∑ An · cos + B0 · sen ·
2 n=1 L L

Assim, a demonstração deste teorema se reduz a mostrar que


nπ nπ
A0 = 0, An = · bn e Bn = − · an .
L L
Para isto, usa-se as fórmulas dos coeficientes de Fourier, mas aplicados à função f 0 (e não a
f ). Para A0 , tem-se
Z L
1 L 0 1
A0 = f (x) dx = · f (x)
L −L L −L

1 1
(7.2) = [ f (L) − f (−L)] = · 0 = 0,
L L
onde usou-se o fato de f ser periódica de período T = 2L, isto é, fazendo-se x = −L em

f (x + 2L) = f (x) ⇒ f (L) = f (−L + 2L) = f (−L).

Como f 00 é seccionalmente contínua, tem-se que ela é integrável, de modo que faz sentido
integrar por partes os coeficientes An e Bn . Para An , fazendo
  nπ x   nπ  nπ x 
 u = cos ,  du = − sen ,
L ⇒ L L
 
dv = f 0 (x) dx, v = f (x).
tem-se
Z L  nπ x 
1 0
An = f (x) · cos dx
L −L L
" #
1  nπ x  L n π
Z L  nπ x 
= f (x) · cos + f (x) · sen dx
L L −L L −L L

1 nπ
= [ f (L) · cos(nπ ) − f (−L) · cos(−nπ )] + · bn
L L
(−1)n nπ
= [ f (L) − f (−L)] + · bn
L L
(−1)n nπ
= ·0+ · bn
L L

(7.3) = · bn ,
L
onde usou-se que cos(−nπ ) = cos(nπ ) = (−1)n (isto é, a paridade de cosseno), f (L)− f (−L) =
0 (isto é, a periodicidade de f , como foi visto anteriormente), bem como
Z  nπ x 
1 L
bn = f (x) sen dx.
L −L L
258 2 Séries de Fourier

Para Bn , fazendo
  nπ x   nπ  nπ x 
 u = sen ,  du = cos ,
L ⇒ L L
 
dv = f 0 (x) dx, v = f (x).
tem-se
Z L  nπ x 
1 0
Bn = f (x) · sen dx
L −L L
" #
1  nπ x  L n π
Z L  nπ x 
= f (x) · sen − f (x) · cos dx
L L −L L −L L
Z L  nπ x 
1 nπ
= [ f (L) · sen (nπ ) − f (−L) · sen (−nπ )] − f (x) · cos dx
L L −L L
sen (nπ ) nπ
= [ f (L) + f (−L)] − · an
L L

(7.4) = − · an ,
L
onde usou-se o fato que sen (−nπ ) = sen (nπ ) = (isto é, a imparidade de seno) e que
Z  nπ x 
1 L
an = f (x) cos dx.
L −L L
Substituindo (7.2), (7.3) e (7.4) em (7.1), obtém-se o resultado desejado, ou seja, substituindo
nπ nπ
A0 = 0, An = · bn e Bn = − · an .
L L
em ∞ h  nπ x   nπ x i
0 A0
f (x) ∼ + ∑ An · cos + B0 · sen ·
2 n=1 L L
encontra-se h nπ   nπ x   nπ   nπ x i

f 0 (x) ∼ ∑ · bn cos − · an sen ·
n=1 L L L L

Observação 7.1: A hipótese de continuidade de f , ao invés de seccionalmente contínua, é


natural e não deveria surpreender. De fato, se existe a derivada em um ponto, então a função f
é contínua neste ponto. Assim, se existe a derivada f 0 (x) em todos os pontos de seu domínio,
então a função f (x) deverá ser contínua em todos os pontos de seu domínio.
Por outro lado, é importante frisar a necessidade da continuidade de f : caso a função f no
teorema 7.1 seja descontínua, então a conclusão do mesmo, em geral, é falsa. Ou seja, mesmo
que f possua uma série de Fourier que converge para f em seus pontos de continuidade, não
2.7 Diferenciação de séries de Fourier 259

será possível derivar, termo a termo, a série de Fourier para f a fim de obter a série de Fourier
para f 0 .
Os dois próximos exemplos ilustram o caso de uma função f cuja derivada f 0 possui uma
série de Fourier, mas que não pode ser obtida derivando termo a termo a série de Fourier para
f.

Exemplo 7.1: Seja f : R → R uma função definida por




 x,
 se − L < x < L,
f (x) = 0, se x = −L e x = L,


 periódica de período T = 2L.

Mostre que f 0 (x) pode ser representada por uma série de Fourier e determine esta série.

S OLUÇÃO : Note-se, primeiro, que para os valores de x ∈ (−L, L), tem-se que f (x) = x e
isto implica em f 0 (x) = 1. Mas f é descontínua nos pontos x = ± kL, de modo que não existe
derivada neles, ou seja, f 0 (x) não está definida para estes valores de x. Porém, sem perda de
generalidade, é possível definir f 0 (± kL) = 1. Assim,


 1,
 se − L < x < L,
f 0 (x) = 1, se x = −L e x = L,



periódica de período T = 2L,

ou seja, f 0 (x) = 1 para todo x ∈ R.


Facilmente conclui-se que f 00 (x) = 0 para todo x ∈ R. Assim, tem-se que f 00 (x) é uma função
seccionalmente contínua (por ser contínua). Além disso, pela proposição 2.4, tem-se f 0 é uma
função periódica de período T = 2L, pois f é periódica e tem este período. Isto permite deter-
minar, segundo o teorema de Fourier, uma série de Fourier para a função f 0 (x).
Como f 0 (x) = 1 para todo x ∈ R, pode-se calcular os coeficientes de Fourier para f 0 através
de suas fórmulas. Para A0 , tem-se
Z Z
1 L 1 L
A0 = f (x) dx = 1.dx
L −L L −L

x L 1
= = · [L − (−L)] = 2.
L −L L
Para os coeficientes An , obtém-se
Z L  nπ x  Z L  nπ x 
1 1
An = f (x) cos dx = cos dx
L −L L L −L L
1 L  nπ x  L
= · · sen = 1 · [ sen (nπ ) − sen (−nπ )]
L nπ L −L nπ
260 2 Séries de Fourier

1
= · [ sen (nπ ) + sen (nπ )]

1
= · sen (nπ ) = 0.

Para os coeficientes Bn , obtém-se
Z L  nπ x  Z L  nπ x 
1 1
Bn = f (x) sen dx = sen dx
L −L L L −L L
1

L
  nπ x  L
= · − · cos
L nπ L −L
1
=− · [cos(nπ ) − cos(−nπ )]

1
= − · [cos(nπ ) − cos(nπ )] = 0.

Substituindo os coeficientes A0 , An e Bn na série de Fourier para f 0 , obtém-se
∞ h  nπ x   nπ x i
A0
f (x) = + ∑ An · cos + Bn · sen
2 n=1 L L
∞ h  nπ x   nπ x i
2
= + ∑ 0 · cos + 0 · sen = 1,
2 n=1 L L

isto é, a série de Fourier para a função f 0 é dada por

f 0 (x) = 1, ∀ x ∈ R.

Exemplo 7.2: Seja f : R → R uma função definida por



 se − L < x < L,
 x,

f (x) = 0, se x = −L e x = L,



periódica de período T = 2L.

Mostre que a série de Fourier para f 0 não pode ser obtida derivando termo a termo a série de
Fourier para a função f .

S OLUÇÃO : Como foi visto no exemplo 7.1, apesar de existir uma série de Fourier para f 0 (x),
a mesma não pode ser obtida derivando termo a termo a série de Fourier para f , pois tal série
assim obtida é divergente. De fato, foi visto no exemplo 4.7, a série de Fourier para f é dada
por
2L ∞ (−1)n+1  nπ x 
f (x) = ∑ n
π n=1
sen
L
·
2.7 Diferenciação de séries de Fourier 261

Derivando termo a termo o segundo membro da expressão acima, obtém-se

2L ∞ (−1)n+1 d h  nπ i 2L ∞ (−1)n+1 h nπ  nπ x i
∑ n · sen = ∑ n · cos
π n=1 dx L π n=1 L L
∞  nπ x 
(7.5) = 2 ∑ (−1)n+1 cos ·
n=1 L

A série no segundo membro de (7.5), resultante de derivação termo a termo, é divergente em


todos os pontos. Por exemplo, fazendo x = 0, a série em (7.5) se escrever como
∞  nπ x  ∞
n+1
2 ∑ (−1) cos
L
= 2 ∑ (−1)n+1 cos 0
n=1 x=0 n=1

= 2 ∑ (−1)n+1
n=1

= 2 (1 − 1 + 1 − 1 + · · ·).
A série numérica acima oscila entre os valores 2 e 0. Já para x = L em (7.5), obtém-se
∞  nπ x  ∞
n+1
2 ∑ (−1) cos
= 2 ∑ (−1)n+1 cos(nπ )
n=1 L x=L n=1

= 2 ∑ (−1)n+1 · (−1)n
n=1

= 2 ∑ (−1)n
n=1

= 2 (−1 + 1 − 1 + · · ·) ,
que oscila entre os valores −2 e 0.
Em geral, a série diverge em qualquer ponto, pois

lim cos(nx) 6= 0, ∀ x ∈ R.
n→∞

Para verificar tal afirmação, suponha por absurdo que lim cos(nx) = 0 para algum x ∈ R. Isto
n→∞
implica que
lim cos2 (nx) = lim [ cos(nx) · cos(nx)]
n→∞ x→∞
h ih i
= lim cos(nx) lim cos(nx)
n→∞ n→∞

= 0 · 0 = 0.
Como a sequência de funções {cos(nx)} é convergente para zero, segue-se que toda subse-
quência sua também é convergente e converge para o mesmo limite. Assim, em particular, a
subsequência {cos(2nx)} de {cos(nx)} converge para zero, isto é, lim cos(2nx) = 0.
n→∞
Por outro lado, considere a seguinte identidade trigonométrica
262 2 Séries de Fourier

1 + cos(2nx)
cos2 (nx) = ·
2
Tomando limite para n → ∞ em ambos os membros da identidade acima, obtém-se
 
2 1 + cos(2nx)
0 = lim cos (nx) = lim
n→∞ n→∞ 2
lim 1 + lim cos(2nx)
n→∞ n→∞
=
lim 2
n→∞

1 + 0 1,
= =
2 2
ou seja, um absurdo, pois 0 6= 1/2.
Isto mostra que
lim cos(nx) 6= 0, ∀x∈R
n→∞
e, portanto, que a série diverge em todos os pontos.

2.8 Integração de séries de Fourier

Se uma função f : R → R for igual à sua série de Fourier, isto é,


∞ h  nπ x   nπ x i
a0 ,
f (x) = + ∑ an cos + bn sen
2 n=1 L L

a qual se supõe convergir uniformemente, então é possível usar a proposição sobre integração
termo a termo para concluir que
Z b Z b ∞  Z b  nπ x  Z b  nπ x  
a0
f (x) dx) = dx + ∑ an cos dx + bn sen dx ·
a a 2 n=1 a L a L

Em comparação com a derivação termo a termo da série de Fourier, as hipóteses necessárias


para integração termo a termo de tal série para f são bem mais fracas. Mostrar-se-á nesta seção
que a integração termo a termo de uma série de Fourier é verdadeira mesmo que a série de
Fourier não convirja uniformente para f e mesmo que a série de Fourier não convirja pontual-
mente para f . Não para aí: mesmo quando a série de Fourier seja divergente ainda é possível
integrá-la termo a termo!
Isto, por si só, já sugere que a série de Fourier tem uma característica especial e rica em
propriedades interessantes.
2.8 Integração de séries de Fourier 263

Teorema 8.1 (integração da série de Fourier): Sejam f : R → R uma função periódica de


período T = 2L e seccionalmente contínua e
∞ h  nπ x   nπ x i
a0
+ ∑ an cos + bn sen
2 n=1 L L

a sua série de Fourier.


Tem-se:
(a) A série pode ser integrada termo a termo e o valor da série integrada é a integral de f ;
mais precisamente:
Z b Z b ∞  Z b  nπ x  Z b  nπ x  
a0
(8.1) f (x) dx = dx + ∑ an cos dx + bn sen dx ;
a a 2 n=1 a L a L

(b) A função Z xh
a0 i
ϕ (x) = f (t) −
dt
0 2
é periódica de período 2L, contínua, tem derivada ϕ 0 seccionalmente contínua e é representada
por sua série de Fourier
  nπ x  a  nπ x  
L ∞ bn L ∞ bn n
(8.2) ϕ (x) = ∑ + ∑ − · cos + · sen
π n=1 n π n=1 n L n L
e
Z L
L ∞ bn 1
(8.3) ∑
π n=1 n
=
2L −L
ϕ (x) dx.

D EMONSTRAÇÃO : Defina a função ϕ : R → R por


Z xh
a0 i
(8.4) ϕ (x) = f (t) − dt,
0 2
a qual é contínua.
Como consequência do teorema fundamental do cálculo, tem-se que ϕ 0 (x) existe em todos os
pontos x onde f é contínua. Além disso, ϕ 0 (x) = f (x) nesses pontos. Portanto, ϕ 0 (x) é seccio-
nalmente contínua.
Note-se que ϕ é periódica de período 2L, pois
Z x+2L h Z xh
a0 i a0 i
ϕ (x + 2L) − ϕ (x) = f (t) − dt − f (t) − dt
0 2 0 2
Z x+2L h Z Lh
a0 i a0 i
(8.5) = f (t) − dt = f (t) − dt,
x L −L 2
onde usou-se o fato de f (t) − a0/2 ser periódica de período 2L, bem como o corolário 2.1, que
diz Z a+L Z L
g(t) dt = g(t) dt,
a−L −L
264 2 Séries de Fourier

para todo função g periódica de período 2L e todo número a ∈ R fixado.


Agora observe que
Z Lh Z L Z
a0 i a0 L
f (t) − dt = f (t) dt − dt
−L 2 −L 2 −L
Z L
a0 t L
= f (t) dt −
−L 2 −L
a0
= a0 · L − [ L − (−L)] = 0.
2
Isso mostra que, em (8.5), o primeiro membro

ϕ (x + 2L) − ϕ (x) = 0,

isto é, que a função ϕ definida em (8.4) é contínua, tem derivada ϕ 0 contínua por partes e é
periódica de período 2L. Com isso, é possível usar o teorema de Fourier (teorema 4.1) para
escrever
∞ h  nπ x   nπ x i
A
(8.6) ϕ (x) = 0 + ∑ An cos + Bn sen ,
2 n=1 L L

onde os coeficientes de Fourier An e Bn são dados por


Z L  nπ x 
1
(8.7) An = ϕ (x) cos dx, n ≥ 0,
L −L L
Z L  nπ x 
1
(8.8) Bn = ϕ (x) sen dx, n ≥ 1.
L −L L
O próximo passo consiste em usar integração por partes para relacionar os coeficientes de
Fourier de ϕ com os coeficientes de Fourier da função f . Assim, fazendo,
 
 u = ϕ (x),  du = ϕ 0 (x) dx
 nπ x  ⇒  
 dv = cos dx,  v = L · sen nπ x ,
L nπ L
observando que ϕ 0 (x) = f (x) (em virtude do teorema fundamental do cálculo), para os coefi-
cientes An , obtém-se

Z L  nπ x 
1
An = ϕ (x) cos dx
L −L L
" #
1 L  nπ x  L L
Z L  nπ x 
= · ϕ (x) · sen − ϕ 0 (x) · sen dx
L nπ L −L nπ −L L
 Z  nπ x  
1 L L L L
= · ϕ (L) · sen (nπ ) − · ϕ (−L) · sen (−nπ ) − f (x) sen dx
L nπ nπ nπ −L L
2.8 Integração de séries de Fourier 265

Z L  nπ x 
1 L 1
=− · f (x) sen dx = − · (bn · L)
L nπ −L L nπ
L
(8.9) =− · bn , n ≥ 1,

onde usou o fato que seno é ímpar, isto é, sen (−nπ ) = − sen (nπ ), bem como o fato de ser
sen (nπ ) = 0.
Antes de relacionar os coeficientes Bn com os coeficientes da função f , observe-se primeiro
que, por ser ϕ periódica de período 2L, isto é, ϕ (x + 2L) = ϕ (x), tomando x = −L, tem-se que

ϕ (−L) = ϕ (−L + 2L) = ϕ (L).

Assim, fazendo,
 
 u = ϕ (x),  du = ϕ 0 (x) dx
 nπ x  ⇒  
 dv = sen dx,  v = − L · cos nπ x ,
L nπ L
observando que ϕ 0 (x) = f (x) (em virtude do teorema fundamental do Cálculo), para os coefi-
cientes Bn , obtém-se
Z  nπ x 
1 L
Bn = ϕ (x) sen dx
L −L L
" #
1 L  nπ x  L L
Z L  nπ x 
= − · ϕ (x) · cos + ϕ 0 (x) · cos dx
L nπ L −L nπ −L L
"
1 L L
= − · ϕ (L) · cos(nπ ) − · ϕ (−L) · cos(−nπ ) +
L nπ nπ
Z L
#
L  nπ x 
+ f (x) cos dx
nπ −L L
 Z  nπ x  
1 L L L
= − cos(nπ ) [ϕ (L) − ϕ (−L)] + f (x) cos dx
L nπ nπ −L L
Z  nπ x 
1 L L 1
= · f (x) cos dx = (an · L)
L nπ −L L nπ
L
(8.10) = · an , n ≥ 1,

onde usou-se os fato que cosseno é par, isto é, que cos(−nπ ) = cos(nπ ) e que ϕ (L) = ϕ (−L).
Já para o coeficiente A0 é preciso um tratamento à parte: deve-se fazer x = 0 em (8.6). Além
disso, deve ser observaddo que segue-se da definição de ϕ , dada em (8.4), que ϕ (0) = 0. Assim,
266 2 Séries de Fourier

∞     
A0 nπ .0 nπ .0
0 = ϕ (0) = + ∑ An cos + Bn sen
2 n=1 L L

A0
= + ∑ An (que por (8.9) resulta em)
2 n=1

A0 L ∞ 1
= − ∑ · bn ,
2 π n=1 n

donde
A0 L ∞ bn ,
= ∑
2 π n=1 n
ou seja,

2L ∞ bn
(8.11) A0 = ∑ n·
π n=1

Agora usa-se (8.4) para ϕ (x), a expressão para a série de Fourier de ϕ que é dada em (8.6),
bem como as relações dos coeficientes de Fourier obtidas em (8.9), (8.10) e (8.11) para escrever
∞ h  nπ x   nπ x i
A0 ,
ϕ (x) = + ∑ An cos + Bn sen
2 n=1 L L

ou seja,
Z xh ∞   nπ x  
a0 i L ∞ bn L  nπ x  L
f (t) − dt = ∑ + ∑ − · bn · cos + · an · sen
0 2 π n=1 n n=1 nπ L nπ L
  nπ x  a  nπ x  
L ∞ bn L ∞ bn n ,
= ∑ + ∑ − · cos + · sen
π n=1 n π n=1 n L n L

ou ainda,
Z xh   nπ x  
a0 i L ∞ bn L ∞ bn  nπ x  a
n ,
(8.12) f (t) dt − dt = ∑ + ∑ − · cos + · sen
0 2 π n=1 n π n=1 n L n L

que é (8.2) na parte (b) deste teorema.


A expressão (8.3) na parte (b) deste teorema é uma consequência imediata do coeficiente A0
da série de Fourier para a função ϕ (x). De fato, viu-se que
2L ∞ bn
A0 = ∑ n·
π n=1

Porém, por definição de A0 , tem-se que


Z L
1
A0 = ϕ (x) dx.
L −L

Combinando estas duas últimas expressões, obtém-se


2.8 Integração de séries de Fourier 267

Z L Z L
1 2L ∞ bn 1 L ∞ bn ,
L −L
ϕ (x) dx = ∑ n
π n=1

2L −L
ϕ (x) dx = ∑ n
π n=1

que é a expressão dada em (8.3).


Para mostrar a parte (a), basta notar que a expressão (8.12) pode ser reescrita como
Z x Z x ∞    nπ x    nπ x i
a0 L L h
(8.13) f (t) dt = dt + ∑ an · sen + bn · 1 − cos ·
0 0 2 n=1 nπ L nπ L

Por outro lado,


Z x  nπ t  L  nπ t  x
cos dt = · sen
0 L nπ L 0
L h  nπ x  i
= sen − sen 0
nπ L
L  nπ x 
(8.14) = · sen ·
nπ L
Também tem-se que
Z x  nπ t  L  nπ t  x
sen dt = − · cos
0 L nπ L 0
L h  nπ x  i
=− cos − cos 0
nπ L
L h  nπ x i
(8.15) = 1 − cos ·
nπ L
Substituindo (8.14) e (8.15) em (8.13), obtém-se
Z x Z x ∞  Z x  nπ t  Z x  nπ t  
a0
(8.16) f (t) dt = dt + ∑ an cos dt + bn sen dt ·
0 0 2 n=1 0 L 0 L

Por fim, faz-se x = a e x = b na expressão (8.16) e depois uma subtração entre os resultados
obtidos para chegar ao resultado desejado. Tem-se:
Z Z a ∞  Z a  nπ t  Z a  nπ t  
 a a0

 f (t) dt = dt + ∑ an cos dt + bn sen dt

 0 0 2 0 L 0 L
n=1
 Z b Z b ∞  Z b  nπ t  Z b  nπ t  

 a0

 f (t) dt = dt + ∑ an cos dt + bn sen dt
0 0 2 n=1 0 L 0 L

que multiplicando a primeira linha acima por −1, resulta em


 Z Z a ∞  Z a  nπ t  Z a  nπ t  
 a a0

 − f (t) dt = − dt + ∑ −an cos dt − bn sen dt

 0 0 2 0 L 0 L
n=1
 Z b Z b ∞  Z b  nπ t  Z b  nπ t  

 a0

 f (t) dt = dt + ∑ an cos dt + bn sen dt
0 0 2 n=1 0 L 0 L
268 2 Séries de Fourier

e invertendo a ordem os limites de integração, obtém-se


Z Z 0 ∞  Z 0  nπ t  Z 0  nπ t  
 0 a
 0

 f (t) dt = dt + ∑ an cos dt + bn sen dt
 a a 2 n=1 a L a L
 Z b Z b ∞  Z b  nπ t  Z b  nπ t  

 a 0

 f (t) dt = dt + ∑ an cos dt + bn sen dt
0 0 2 n=1 0 L 0 L

que somado membro a membro resulta em


Z b Z b ∞  Z b  nπ t  Z b  nπ t  
a0
f (t) dt = dt + ∑ an cos dt + bn sen dt ,
a a 2 n=1 a L a L

que é o resultado em (8.1) na parte (a) deste teorema.

Observação 8.1: Para as aplicações, o teorema 8.1 toma a forma prática seguinte: se
∞ h  nπ x   nπ x i
a0 ,
f (x) ∼ + ∑ an cos + bn sen
2 n=1 L L

então, Z xh
a0 i
ϕ (x) = f (t) − dt
0 2
Z L   nπ x  a  nπ x  
1 L ∞ bn n
= ϕ (x) dx + ∑ − · cos + · sen ·
2L −L π n=1 n L n L

Exemplo 8.1: Seja f : [−L, L] → R uma função definida por f (x) = x. Tem-se que a sua série
de Fourier é dada por
2L ∞ (−1)n+1  nπ x 
f (x) ∼ ∑ n · sen ·
π n=1 L
Note-se, primeiro, que
2L (−1)n+1
a0 = 0, an = 0 e bn = · ·
π n
Pela observação 8.1, será necessário determinar ϕ (x) e a sua integral. Tem-se
Z xh Z x 
a0 i 0
ϕ (x) = f (t) − dt = t − dt
0 2 0 2

t 2 x x2
= = ·
2 0 2
Além disso,
2.8 Integração de séries de Fourier 269

Z L Z L 2 L
1 1 x 1
3 1  3  L2
ϕ (x) dx = dx = ·x = L − (−L)3 = ·
2L −L 2L −L 2 12L −L 12L 6
Substituindo os resultados obtidos em
Z L   nπ x  a  nπ x 
1 L ∞ bn n ,
ϕ (x) = ϕ (x) dx + ∑ − · cos + · sen
2L −L π n=1 n L n L

obtém-se
  nπ x  0  nπ x  
x2 L2 L ∞ 2L (−1)n+1 1
= + ∑ − · · · cos + · sen
2 6 π n=1 π n n L n L

L2 2L2 ∞ (−1)n+2  nπ x 
= + 2 ∑ · cos
6 π n=1 n2 L

L2 2L2 ∞ (−1)n  nπ x 
= + 2 ∑ · cos , −L ≤ x ≤ L,
6 π n=1 n2 L

que é a série de Fourier para a função ϕ (x) = x2/2.

Exemplo 8.2: Considere a função f : [−L, L] → R dada por f (x) = x2/2. Determine a série de
Fourier para a função ϕ : [−L, L] → R definida por

x3 L2
ϕ (x) = − x.
6 6
S OLUÇÃO : O exemplo 8.1 mostrou que a série de Fourier para a função f dada neste exemplo
é
x2 L2 2L2 ∞ (−1)n  nπ x 
f (x) = = + 2 ∑ · cos ·
2 6 π n=1 n2 L
A ideia consiste em aplicar novamente o teorema 8.1 a esta série, tomando

L2 , 2L2 (−1)n
a0 = an = · e bn = 0.
3 π2 n2
Agora determina-se ϕ (x). Tem-se:
Z xh Z x 2 
a0 i t L2
ϕ (x) = f (t) − dt = − dt
0 2 0 2 6
 3 
t L2 t x x3 L2
= − = − x.
6 6 0 6 6
Agora determina-se a integral de ϕ (x):
Z L Z L 3 
1 1 x L2
ϕ (x) dx = − x dx
2L −L 2L −L 6 6
270 2 Séries de Fourier

 
1 x4 L2 x2 L
= −
2L 24 12 −L
 4   4 
1 L L4 L L4
= − − − = 0.
2L 24 12 24 12
Substituindo os resultados obtidos em
Z L   nπ x  a  nπ x 
1 L ∞ bn n ,
ϕ (x) = ϕ (x) dx + ∑ − · cos + · sen
2L −L π n=1 n L n L

obtém-se
  nπ x  2L2 (−1)n 1  nπ x  
x3 L2 L ∞ 0
− x = 0 + ∑ − · cos + 2 · · · sen
6 6 π n=1 n L π n2 n L

2L3 ∞ (−1)n  nπ x 
= ∑ n3 · sen , −L ≤ x ≤ L,
π 3 n=1 L

que é a série de Fourier para a função ϕ (x).

Exemplo 8.3: Seja f : [−L, L] → R uma função definida por

x3 L2
f (x) = − x.
6 6
Determine a série de Fourier para a função ϕ : [−L, L] → R dada por

x4 L2 2
ϕ (x) = − x
24 12
e, fazendo x = L, mostre que
π4 ∞
1
= ∑ 4·
90 n=1 n
S OLUÇÃO : Pelo exemplo 8.2, a série de Fourier para f é dada por

2L3 ∞ (−1)n  nπ x 
f (x) = 3 ∑ · sen , −L ≤ x ≤ L,
π n=1 n3 L

cujos coeficientes de Fourier são dados por


2L3 (−1)n
a0 = 0, an = 0 e bn = · ·
π3 n3
Novamente se usa o teorema 8.1. Porém, antes, confirmar-se-á a expressão para ϕ (x) e
determinar-se-á a sua integral. Tem-se:
Z xh
a0 i
ϕ (x) = f (t) − dt
0 2
2.8 Integração de séries de Fourier 271

Z x 3 
t L2
= − t dt
0 6 6
 4 
t L2 t 2 x
= −
24 12 0
x4 L2 x2
− = ·
24 12
Em seguida, determina-se a integral de ϕ (x):
Z Z  
1 L 1 L x4 L2 x2
ϕ (x) dx = − dx
2L −L 2L −L 24 12
 5 
1 x L2x3 L
= −
2L 120 36 −L
 5   
1 L L5 L5 L5
= − − − +
2L 120 36 120 36
L4 L4 3L4 − 10L4 7L4
= − = =− ·
120 36 360 360
Substituindo os resultados obtidos em
Z L   nπ x  a  nπ x 
1 L ∞ bn n ,
ϕ (x) = ϕ (x) dx + ∑ − · cos + · sen
2L −L π n=1 n L n L

obtém-se
x4 L2 x2
ϕ (x) = −
24 12
  nπ x  0  nπ x  
7L4 L ∞ 2L3 (−1)n 1
=− + ∑ − 3 · · cos + · sen
360 π n=1 π n3 n L n L

7L4 2L4 ∞ (−1)n+1  nπ x 


=− + 4 ∑ cos , −L ≤ x ≤ L.
360 π n=1 n4 L

Para finalizar, basta fazer x = L na série de Fourier para ϕ (x), isto é, em

x4 L2 x2 7L4 2L4 ∞ (−1)n+1  nπ x 


24

12
=− + ∑ n4 cos L ,
360 π 4 n=1

ou seja,
L4 L4 7L4 2L4 ∞ (−1)n+1

24 12
=− + ∑ n4 cos(nπ ).
360 π 4 n=1
Assim,
L4 7L4 2L4 ∞ (−1)n+1

24
=− + ∑ n4 · (−1)n ,
360 π 4 n=1
que implica em
272 2 Séries de Fourier

7L4 L4 2L4 ∞ (−1)2n+1 ,


− = 4 ∑
360 24 π n=1 n4
ou ainda,
7L4 − 15L4 2L4 ∞ 1
= − 4 ∑ 4·
360 π n=1 n
A última expressão pode ser simplicada para obter
8L4 2L4 ∞ 1 π4 ∞
1
= 4 ∑ 4 ⇒ = ∑ 4,
360 π n=1 n 90 n=1 n

que é a série numérica pedida.

2.9 Velocidade da convergência

Esta seção é dedicada à certas estimativas dos coeficientes de Fourier de uma dada função a
partir de hipóteses sobre a diferenciabilidade da mesma. Através destas estimativas será visto
que a rapidez da convergência da série de Fourier dependerá de seus coeficientes.

Proposição 9.1: Seja f : R → R uma função periódica de período T = 2L, integrável e abso-
lutamente integrável. Então, existe uma constante M ≥ 0 tal que

(9.1) | an | ≤ M e | bn | ≤ M.

D EMONSTRAÇÃO : A demonstração é muito simples, basta usar o fato de que as funções seno
e cosseno são limitadas, isto é,
 nπ x   nπ x 

sen ≤1 e cos ≤ 1.
L L
Para os coeficientes an , tem-se
Z L  nπ x 
1
| an | = f (x) sen dx
L −L L
Z
1 L  nπ x 

≤ f (x) sen dx
L −L L
Z  nπ x 
1 L
= | f (x)| sen dx
L −L L
Z L
1
≤ | f (x)| dx.
L −L
2.9 Velocidade da convergência 273

Como f é absolutamente integrável, fazendo


Z L
1
(9.2) M= | f (x) | dx,
L −L

obtém-se | an | ≤ M, que é a primeira desigualdade em (9.1).


Para os coeficientes bn , tem-se
Z  nπ x 
1 L

| bn | = f (x) cos dx
L −L L
Z Z
1 L  nπ x 
1 L  nπ x 

≤ f (x) cos dx = | f (x)| cos dx
L −L L L −L L
Z L
1
≤ | f (x)| dx.
L −L

Usando a mesma constante M ≥ 0 em (9.2) obtém-se que | bn | ≤ M, que é a segunda de-


sigualdade em (9.1).

Observação 9.1: A proposição 9.1 dá uma informação importante: basta a hipótese de in-
tegrabilidade de f e | f | para que os coeficientes de Fourier sejam limitados. Se isto não fosse
verdade, então certamente a série de Fourier seria divergente. Por outro lado, tomando como
hipótese apenas a integrabilidade de f e | f | o máximo que se obtém é limitação dos coefi-
cientes, não garantindo ainda que a série de Fourier será convergente, isto é, com estas hipóteses
a série poderá ser divergente.
A ideia de exigir que f e | f | sejam integráveis é natural: f deve ser integrável para que as
fórmulas que definem os coeficientes de Fourier façam sentido; já a integrabilidade de | f | é
necessária para que a estimativa faça sentido, isto é, ao tomar o valor absoluto dos coeficientes.
Assim, a integral resultante fica dependente de | f (x)| e que também deve fazer sentido, isto é,
ser integrável.

O próximo resultado melhora bastante o anterior: informações sobre a derivada de f dão


condições para a convergência da série de Fourier para f , isto é, com hipóteses adicionais sobre
f 0 os coeficientes de Fourier tendem a zero quando n tende para infinito.

Proposição 9.2: Seja f : R → R uma função periódica de período T = 2L, derivável e tal
que f 0 (x) seja uma função integrável e absolutamente integrável. Então, existe uma constante
M ≥ 0 tal que
M M,
(9.3) | an | ≤ e | bn | ≤
n n
274 2 Séries de Fourier

para todo n ∈ N.
D EMONSTRAÇÃO : A ideia consiste em integrar por partes os coeficientes de Fourier e depois
fazer as estimativas necessárias. Assim, para os coeficientes an , fazendo
 
 u = f (x), 
 du = f 0 (x) dx,
  ⇒  nπ x 
 dv = cos nπ x dx, 
v =
L
sen ·
L nπ L
obtém-se
Z L  nπ x 
1
an = f (x) cos dx
L −L L
" #
1 L  nπ x  L L
Z L  nπ x 
= · f (x) · sen − f 0 (x) · sen dx
L nπ L −L nπ −L L
Z L  nπ x 
1 1
= [ f (L) · sen (nπ ) − f (−L) · sen (−nπ )] − f 0 (x) · sen dx
nπ nπ −L L
Z  nπ x 
1 L 0
(9.4) =− f (x) · sen dx,
nπ −L L
onde usou-se o fato de a função seno ser ímpar e sen (nπ ) = 0. Note-se que a hipótese da
integrabilidade de f 0 foi usada para dar sentido aos procedimentos acima.
Agora se faz a estimativa para os coeficientes an tomando-se o valor absoluto da expressão
obtida em (9.4). Tem-se:
 nπ x 
1 ZL 0

| an | = − f (x) · sen dx
nπ −L L
Z L  nπ x 
1 0
≤ f (x) · sen dx
nπ −L L
Z
1 L 0  nπ x 

= f (x) sen dx
nπ −L L
Z
1 L 0
≤ f (x) dx.
nπ −L

Como, por hipótese, f 0 é absolutamente integrável, fazendo


Z L
1 f 0 (x) dx,
(9.5) M=
π −L

segue-se da estimativa acima que


M,
| an | ≤ ∀ n ∈ N,
n
que é a primeira desigualdade em (9.3).
De modo análogo se realiza os procedimentos para os coeficientes bn. Fazendo
2.9 Velocidade da convergência 275

 
 u = f (x), 
 du = f 0 (x) dx,
  ⇒  nπ x 
 dv = sen nπ x dx,  L
 v = − cos ,
L nπ L
obtém-se
Z L  nπ x 
1
bn = f (x) sen dx
L −L L
" #
1 L  nπ x  L L
Z L  nπ x 
= − · f (x) · cos + f 0 (x) · cos dx
L nπ L −L nπ −L L
Z  nπ x 
1 1 L 0
= − [ f (L) · cos(nπ ) − f (−L) · cos(−nπ )] + f (x) · cos dx
nπ nπ −L L
Z  nπ x 
cos(nπ ) 1 L 0
=− [ f (L) − f (−L)] + f (x) · cos dx
nπ nπ −L L
Z  nπ x 
1 L 0
(9.6) = f (x) · cos dx,
nπ −L L
onde usou-se o fato de a função cosseno ser par. Além disso, usou-se a periodicidade de f para
concluir que f (L) − f (−L) = 0, isto é, fazendo x = −L, tem-se

f (x + 2L) = f (x) ⇒ f (L) = f [(−L) + 2L] = f (−L).

Agora se faz a estimativa para os coeficientes bn tomando-se o valor absoluto da expressão


obtida em (9.6). Tem-se:
ZL  nπ x 
1 0
| bn | = f (x) · cos dx
nπ −L L
Z
1 L 0  nπ x 

≤ f (x) · cos dx
nπ −L L
Z
1 L 0  nπ x 
= f (x) cos dx
nπ −L L
Z L
1 f 0 (x) dx.

nπ −L

Usando a mesma constante M ≥ 0 obtida em (9.5), conclui-se que


M,
| bn | ≤ ∀ n ∈ N,
n
que é a segunda desigualdade em (9.3)
276 2 Séries de Fourier

A proposição 9.2, que considera hipóteses adicionais sobre f (isto é, existir f 0 e esta ser inte-
grável e absolutamente integrável) que implicaram na convergência para zero dos coeficientes
de Fourier. Porém isso ainda não assegura que a série de Fourier seja convergente.
Com hipóteses adicionais sobre f 0 e f 00 é possível melhorar ainda mais as estimativas obtidas
na proposição 9.2.

Proposição 9.3: Seja f : R → R uma função periódica de período T = 2L, com derivada
contínua e segunda derivada integrável e absolutamente integrável. Então, existe uma constante
M ≥ 0 tal que
M M,
(9.7) | an | ≤ e | bn | ≤
n2 n2
para todo n ∈ N.
D EMONSTRAÇÃO : Na demonstração da proposição 9.2 viu-se que nas igualdades (9.4) e
(9.6) que
Z  nπ x  Z  nπ x 
1 L 0 1 L 0
an = − f (x) · sen dx e bn = f (x) · cos dx.
nπ −L L nπ −L L
Como, por hipótese, f 00 é integrável, então faz sentido integrar por partes, cada uma das
expressões acima, novamente. Assim, para os coeficientes an, fazendo
 
0
 u = f (x), 
 du = f 00 (x) dx,
  ⇒  nπ x 
 dv = sen nπ x dx,  L
 v = − cos ·
L nπ L
obtém-se
Z L  nπ x 
1
an = − f 0 (x) · sen dx
nπ −L L
" #
1 L  nπ x  L L
Z L  nπ x 
=− − · f 0 (x) · cos + f 00 (x) · cos dx
nπ nπ L −L nπ −L L
Z L  nπ x 
L  0 0
 L 00
= f (L) · cos(n π ) − f (−L) cos(−n π ) − f (x) · cos dx
n2 π 2 n2 π 2 −L L
Z L  nπ x 
L · cos(nπ )  0 0
 L 00
= f (L) − f (−L) − 2 2 f (x) · cos dx
n2 π 2 n π −L L
Z L  nπ x 
L
(9.8) =− 2 2 f 00 (x) · cos dx,
n π −L L
onde usou-se a paridade das funções cosseno. Além disso, na proposição 2.4, mostrou-se que
se f é uma função periódica de período T , então f 0 também é periódica de mesmo período T .
Isto mostra que f 0 (L) − f 0 (−L) = 0 e que foi usado no desenvolvimento acima, pois fazendo
x = −L obtém-se
2.9 Velocidade da convergência 277

f 0 (x + 2L) = f 0 (x) ⇒ f 0 (L) = f 0 (−L + 2L) = f 0 (−L).

Em seguida se faz a estimativa para os coeficientes an tomando-se o valor absoluto na ex-


pressão obtida em (9.8). Tem-se:
Z L  nπ x 
L 00
| an | = − 2 2 f (x) · cos dx
n π −L L
Z L  nπ x 
L 00
≤ 2 2 f (x) · cos dx
n π −L L
Z L  
L f 00 (x) cos nπ x dx
= 2 2
n π −L L
Z L
L f 00 (x) dx.

n2 π 2 −L

Como, por hipótese, f 00 é absolutamente integrável, fazendo


Z L
M f 00 (x) dx,
(9.9) M= 2
π −L

segue-se da estimativa acima que


M,
| an | ≤ ∀ n ∈ N,
n2
que é a primeira desigualdade em (9.7).
De modo análogo se realiza os procedimentos para os coeficientes bn. Fazendo
 
 u = f 0 (x), 
 du = f 00 (x) dx,
  ⇒  nπ x 
 dv = cos nπ x dx, 
v =
L
sen ,
L nπ L
obtém-se
Z L  nπ x 
1
bn = f 0 (x) · cos dx
nπ −L L
" L Z L
#
1 L  
nπ x L  nπ x 
= · f 0 (x) · sen − f 00 (x) · sen dx
nπ nπ L −L nπ −L L
Z L  nπ x 
L  0 0
 L
= 2 2 f (L) · sen (nπ ) − f (−L) sen (−nπ ) − 2 2 f 00 (x) · sen dx
n π n π −L L
Z L  nπ x 
L · sen (nπ )  0 0
 L 00
= f (L) − f (−L) − f (x) · sen dx
n2 π 2 n2 π 2 −L L
Z L  nπ x 
L 00
(9.10) =− 2 2 f (x) · sen dx,
n π −L L
onde usou-se a imparidade das funções seno e o fato que sen (nπ ) = 0.
278 2 Séries de Fourier

Em seguida se faz a estimativa para os coeficientes bn tomando-se o valor absoluto na ex-


pressão obtida em (9.10). Tem-se:
Z L  nπ x 
L 00
| bn | = − 2 2 f (x) · sen dx
n π −L L
Z L  nπ x 
L 00
≤ 2 2 f (x) · sen dx
n π −L L
Z L  nπ x 
L 00
= 2 2 f (x) sen dx
n π −L L
Z L
L f 00 (x) dx.
≤ 2 2
n π −L

Usando a mesma constante M ≥ 0 obtida em (9.9), conclui-se que


M
| bn | ≤ , ∀ n ∈ N,
n2
que é a segunda desigualdade em (9.7).

A proposição 9.3 mostra que, sem fazer uso do teorema de Fourier (teorema 4.1), com o uso

1
do teste de comparação, a série de Fourier é convergente, pois a série ∑ 2 é convergente.
n=1 n
Cabe observar que a proposição 9.3 garante a convergência da série de Fourier, porém este
resultado não garante que a convergência da série de Fourier será exatamente para a própria
função f .

Observação 9.2: Com as hipóteses de integrabilidade e integrabilidade absoluta de f 00 , a


rapidez da convergência da série de Fourier é de ordem quadrática. Mais geralmente, usando-se
indução e os mesmos procedimentos usados nas demonstrações das proposições desta seção, é
possível mostrar que mais rapidamente os coeficientes de Fourier convergem para zero e, por-
tanto, com maior rapidez convergirá a série de Fourier. Seja f : R → R uma função periódica de
período T = 2L, k vezes diferenciável tal que f , f 0 , f 00 , . . ., f k−1 são contínuas em R e a derivada
f (k) é integrável e absolutamente integrável em R. Então é possível possível demonstrar que
M M,
|an | ≤ e |bn| ≤ ∀ n ∈ N.
nk nk
2.10 Forma complexa da série de Fourier 279

2.10 Forma complexa da série de Fourier

Usando a fórmula de Euler,

e i θ = cos θ + i sen θ , onde i satisfaz i2 = −1,

decorre, em virtude da paridade do cosseno e a imparidade do seno, que

e i θ = cos(−θ ) + i sen(−θ ) ⇒ e −i θ = cos θ − i sen θ .

Assim, o sistema abaixo (


e i θ = cos θ + i sen θ
e −i θ = cos θ − i sen θ
pode ser resolvido para obter

e i θ + e −i θ e i θ − e −i θ
cos θ = e sen θ = ·
2 2i
Assim, tomando θ = nπ x/L, tem-se que
 nπ x   nπ x  e inπ x/L + e −inπ x/L e inπ x/L − e −inπ x/L
an · cos + bn · sen = an + bn
L L 2 2i
   
an bn inπ x an bn inπ x
= + e /L + − e − /L
2 2i 2 2i
   
an bn inπ x/L an bn inπ x
= −i· e + +i· e − /L .
2 2 2 2
Faça
an bn an bn
cn =
−i· e dn = + i · ·
2 2 2 2
Então, usando as fórmulas dos coeficientes de Fourier,
Z  nπ x  Z  nπ x 
1 L 1 L
an = f (x) cos dx e bn = f (x) sen dx,
L −L L L −L L
em cn , obtém-se
an bn
cn = −i·
2 2
Z L  nπ x  Z  nπ x 
1 1 L
= f (x) cos dx − i · f (x) sen dx
2L −L L 2L −L L
Z h  nπ x   nπ x i
1 L
= f (x) cos − i · sen dx,
2L −L L L
que pela fórmula
280 2 Séries de Fourier

 nπ x   nπ x 
e
−inπ x/L
= cos − i · sen ,
L L
que é consequência da fórmula de Euler, permite escrever
Z L
1 −inπ x/L
cn = f (x) e dx, n = 1, 2, 3, . . .
2L −L

De maneira análoga, mostra-se que


Z L
1 inπ x/L
c−n = dn = f (x) e dx.
2L −L

Agora, para n = 0, define-se


Z L
a0 1
(10.1) c0 = = f (x) dx.
2 2L −L

Assim, vê-se que a série de Fourier


∞ h  nπ x   nπ x i
a0
f (x) ∼ + ∑ an cos + bn sen
2 n=1 L L

pode ser escrita na forma


∞   a ∞ ∞
a0 inπ x/L −inπ x/L 0 inπ x/L −inπ x/L
+ ∑ cn · e + c−n · e = + ∑ cn · e + ∑ c−n · e
2 n=1 2 n=1 n=1

= (reordenação dos termos)


∞ ∞
−inπ x/L inπ x/L
= ∑ c−n · e + c0 + ∑ cn · e
n=1 n=1

= (fazendo n 7→ −n no primeiro somatório)


n=−1 ∞
inπ x/L inπ x/L
= ∑ cn · e + ∑ cn · e
n=−∞ n=0

inπ x/L
(10.2) = ∑ cn · e ,
n=−∞

onde
a0 , an − ibn , an + ibn ,
(10.3) c0 = cn = c−n = n ∈ N.
2 2 2
Observa-se que o somatório de −∞ a ∞ é entendido como sendo uma soma de duas séries
∞ ∞ ∞
inπ x/L inπ x/L inπ x/L
∑ cn e = ∑ cn e + ∑ c−n e − , n ∈ Z.
n=−∞ n=0 n=1

Se as duas séries no segundo membro acima são convergentes, então o resultado é o mesmo
daquele na série no primeiro membro de (10.2).
2.10 Forma complexa da série de Fourier 281

A forma complexa da série de Fourier, dada em (10.2), apresenta várias vantagens. Por exem-
plo, todos os coeficientes cn podem ser definidos diretamente em termos de f (x):
Z L
1 −inπ x/L
cn = f (x) e dx, n ∈ Z,
2L −L

pois a integral no segundo membro acima é dada por


Z h  nπ x   nπ x i
1 L
f (x) cos − i · sen ·
2L −L L L
Quando n = 0, isso dá 12 a0 ; quando n > 0, a integral é igual a 12 (an − i bn) e quando n < 0,
vale 12 (a−n + i b−n). Tem-se, portanto, que
∞ Z L
inπ x/L 1 inπ x/L
f (x) ∼ ∑ cn e , cn = f (x) e − dx,
n=−∞ 2L −L

sempre que a série converge para f (x). A série acima para f é conhecida como série de Fourier
na forma complexa, onde seus coeficientes podem ser encontrados pela fórmula que define os
cn .

Observação 10.1: Aqui cabe um comentário importante: na prática, quando se determina


os coeficientes cn da série na forma complexa, pode ocorrer a presença de n no denominador
de uma dada expressão que representa cn . Neste caso, para a determinação do coeficiente c0 ,
não é possível fazer a substituição direta tomando-se n = 0, pois isto anularia o denominador.
Quando isto acontece, então é necessário determinar o coeficiente c0 diretamente a partir de sua
definição, que é dada por (10.1).

Observação 10.2: Segue-se de 10.3, isto é, de


an − ibn an + ibn ,
cn = e c−n = n∈N
2 2
que c−n = cn , ou seja, que c−n é igual ao conjugado complexo de cn , que é denotado por cn .
Além disso, tem-se também que
s r
 a 2  b 2 a2n b2n 1
q
n n
|cn | = + − = + = a2n + b2n.
2 2 4 4 2

Do fato que |z| = | z | para qualquer z ∈ C, conclui-se que | cn | = |cn |. E como c−n = cn , então
| c−n | = | cn | = |cn |, ou seja, |c−n | terá o mesmo valor de |cn| dado acima.
282 2 Séries de Fourier

Proposição 10.1: Seja f : [−L, L] → R uma função seccionalmente diferenciável e periódica


de período T = 2L. Tem-se:
(a) Se f for par, então todos os seus coeficientes de Fourier complexos são números reais.
(b) Se f for ímpar, então c0 = 0 e cn , para n 6= 0 inteiro, é um imaginário puro.
(c) Se f for uma função real, então c−n = cn , onde a barra indica a conjugação complexa.
D EMONSTRAÇÃO : Para a parte (a), deve-se mostrar que cn ∈ R para todo n ∈ Z e que cn =
c−n . Para n = 0, tem-se que
Z
1 L
c0 = f (x) dx,
2L −L
que é real, visto ser f uma função real.
Para n 6= 0 inteiro, usa-se a definição dos coeficientes cn , a fórmula de Euler, a paridade de f
e das funções cossenos, bem como a imparidade das funções senos, para obter
Z L
1 inπ x/L
cn = f (x) e − dx
2L −L
Z L h  nπ x   nπ x i
1
= f (x) cos − i sen dx
2L −L L L
Z L  nπ x  Z L  nπ x 
1 i
= f (x) cos dx − f (x) sen dx
2L −L L 2L −L L
Z L  nπ x 
1
(10.4) = f (x) cos dx,
L 0 L
onde no penúltimo passo acima usou-se a paridade da função f , a paridade da função cosseno
e a imparidade da função seno: produto de funções pares ( f e cosseno) é par, de modo que
se deve multiplicar a integral por 2 e integrar no semi-período; o produto de uma função par
( f ) por outra ímpar (seno) é ímpar, de modo que a integral de uma função ímpar em intervalo
simétrico é igual a zero.
Agora observe f é uma função real, de modo que a integral em (10.4) é um número real para
cada n ∈ Z. Resta, agora, mostrar que cn = c−n , com n ∈ Z. Usando a definição dos coeficientes
c−n , a fórmula de Euler, a paridades das funções f e cossenos, a imparidade das funções senos,
obtém-se
Z L
1 inπ x/L
c−n = f (x) e dx
2L −L
Z L h  nπ x   nπ x i
1
= f (x) cos + i sen dx
2L −L L L
Z  nπ x  Z L  nπ x 
1 L i
= f (x) cos dx + f (x) sen dx
2L −L L 2L −L L
Z  nπ x 
1 L
(10.5) = f (x) cos dx,
L 0 L
2.10 Forma complexa da série de Fourier 283

onde usou-se os mesmos argumentos anteriores para chegar na expressão (10.5).


Para encerrar a parte (a), basta observar que os segundos membros de (10.4) e de (10.5) são
iguais, de modo que cn = c−n para todo n ∈ Z.
Para demonstrar (b) deve-se mostrar que c0 = 0 e que, para n 6= 0, cn é um número da forma
cn = irn , onde rn é um número real. Para n = 0, tem-se que
Z L
1
cn = f (x) dx = 0,
2L −L

pois por hipótese f é ímpar e o intervalo de integração, acima, é simétrico, de modo que a
integral se anula.
Usando a expressão para os coeficientes cn , a fórmula de Euler, a paridade das funções
cossenos e a imparidade de f e das funções senos, obtém-se
Z L
1 inπ x/L
cn = f (x) e − dx
2L −L
Z L h  nπ x   nπ x i
1
= f (x) cos − i sen dx
2L −L L L
Z  nπ x  Z  nπ x 
1 L i L
= f (x) cos dx − f (x) sen dx
2L −L L 2L −L L
Z  nπ x 
i L
(10.6) =− f (x) sen dx,
L 0 L
onde no penúltimo passo acima usou-se a imparidade da função f , a paridade da função cosseno
e a imparidade da função seno, isto é, nesta ordem foram usados: o produto de uma função
ímpar ( f ) por uma função par (cosseno) é ímpar, de modo que a integral de uma função ímpar
em intervalo simétrico é igual a zero; produto de funções ímpares ( f e seno) é par, de modo que
se deve multiplicar a integral por 2 e integrar no semi-período.
Faça
Z  nπ x 
1 L
rn = − f (x) sen dx.
L 0 L
Por ser f uma função real, tem-se que rn é um número real para cada n 6= 0 inteiro. Segue-se
de (10.6) e de rn dado acima, que cn = i rn . Isto mostra que para funções ímpares, os coeficientes
cn são imaginários puros.

Para a parte (c), basta observar as fórmulas para os coeficientes cn e c−n , isto é,
Z L Z L
1 −inπ x/L 1 inπ x/L
cn = f (x) e dx e c−n = f (x) e dx.
2L −L 2L −L

Portanto, usando a fórmula de Euler e as fórmulas para os coeficientes cn e c−n , obtém-se


284 2 Séries de Fourier

Z L
1
cn = f (x) e −inπ x/L dx
2L −L
Z h  nπ x   nπ x i
1 L
= f (x) cos − i sen dx
2L −L L L
Z L  nπ x  Z L  nπ x 
1 i
= f (x) cos dx − f (x) sen dx
2L −L L 2L −L L
Z L  nπ x  Z L  nπ x 
1 i
= f (x) cos dx + f (x) sen dx
2L 0 L 2L −L L
Z L h  nπ x   nπ x i
1
= f (x) cos + i sen dx
2L −L L L
Z L
1 inπ x/L
= f (x) e dx
2L −L

= c−n ,
uma vez que as integrais
Z L  nπ x  Z L  nπ x 
1 i
f (x) cos dx e f (x) sen dx
2L 0 L 2L −L L
são reais, por ser f uma função real. Caso f não seja real, então a afirmação é falsa, pois cada
uma das integrais acima serão complexa, ou seja, tem parte real e parte imaginária.

Viu-se que a forma complexa da série de Fourier para uma função f (x) é dada por

inπ x/L
f (x) ∼ ∑ cn · e .
n=−∞

O próximo resultado mostra que as funções un (x) = e inπ x/L formam um conjunto ortogonal.

Proposição 10.2: Sejam un : R → C funções definidas por un(x) = e inπ x/L. Então,
Z L
(
0, para n 6= m,
un (x) · um (x) dx =
−L 2L, para n = m.

D EMONSTRAÇÃO : Observe primeiro, que da fórmula de Euler,

e iθ = cos θ + i · sen θ ,

segue-se que
e iθ = cos θ + i · sen θ = cos θ − i · sen θ

= cos(−θ ) + i · sen (−θ ) = e −iθ ,


2.10 Forma complexa da série de Fourier 285

pois, da paridade do cosseno e da imparidade do seno, tem-se que cos(−θ ) = cos θ e sen (−θ ) =
− sen θ .
−imπ x/L
Portanto, fazendo θ = mπ x/L, conclui-se que e imπ x/L = e .
Desse modo, para m 6= n, obtém-se
Z L Z L Z L
inπ x/L imπ x/L inπ x/L −imπ x/L
un (x) · um (x) dx = e ·e dx = e ·e dx
−L −L −L
Z L Z L
[(inπ x/L)−(imπ x/L)] (inπ x−imπ x)/L
= e dx = e
−L −L
Z L L
i(n−m)π x/L L
i(n−m)π x/L
= e dx = ·e
−L i(n − m)π −L

L h i
i(n−m)π L/L −i(n−m)π L/L
= · e −e
i(n − m)π
L h i
i(n−m)π −i(n−m)π
= · e −e
i(n − m)π

= (fórmula de Euler)
L nh i
= · cos[(n − m)π ] + i · sen [(n − m)π ] −
i(n − m)π
h io
− cos[(n − m)π ] − i · sen [(n − m)π ]

L
= · {i · sen [(n − m)π ] + i · sen [(n − m)π ]}
i(n − m)π
2i · L 2L
= · sen [(n − m)π ] = · 0 = 0,
i(n − m)π (n − m)π
pois sen [(n − m)π ] = 0, uma vez que n 6= m implica em seno de múltiplo inteiro de π , que é
sempre igual a zero.
Para a segunda parte, com m = n, obtém-se
Z L Z L Z L
inπ x/L
un (x) · um (x) dx = un (x) · un (x) dx = e · e inπ x/L dx
−L −L −L
Z L Z L
inπ x/L −inπ x/L (inπ x/L)−(inπ x/L)]
= e ·e dx = e[ dx
−L −L
Z L Z L Z L
e 0 dx
(inπ x−inπ x)/L 0/L
= e dx = e dx =
−L −L −L
Z L L

= dx = x = L − (−L) = 2L,
−L −L

como desejado.
286 2 Séries de Fourier

Exemplo 10.1: Seja f : R → R definida por


(
x, para − π < x ≤ π ,
f (x) =
periódica de período T = 2π .

Use a forma complexa para obter a série de Fourier para a função f .

S OLUÇÃO : Note-se que T = 2π , de modo que L = π . Agora deve-se determinar os coefi-


cientes cn para a série na forma complexa. Tem-se:
Z L Z π
1 −inπ x/L 1
cn = f (x) e dx = x e −inx dx
2L −L 2π −π
 Z 
1 1 −inx π 1 π −inx
= − xe + in −π e dx
2π in −π
 
1 1 −inπ inπ
 1 −inx π
= − π ·e +πe − 2 2e
2π in i n −π
  inπ  
1 2π e + e −inπ 1 −inπ inπ

= − + 2 e −e
2π in 2 n
    
1 2π i e inπ + e −inπ 2i e inπ − e −inπ
= − 2
2π n 2 n 2i
 
i 1
= π cos(nπ ) + sen (nπ )
nπ n
i
= (−1)n ,
n
onde nos passos acima realizou-se integração por partes, usou-se a fórmula de Euler, multiplicou-
se e dividiu-se por constantes convenientes, bem como usou-se os fatos

cos(nπ ) = (−1)n e sen (nπ ) = 0.

Os coeficientes c−n podem ser obtidos a partir dos coeficientes cn , substituindo n por −n na
expressão encontrada, ou seja,
i i
c−n = (−1)−n = − (−1)n .
−n n
Por outro lado, o coeficiente c0 não pode ser obtido pela substituição n = 0 em cn , pois n
aparece no denominador; logo deve ser obtido diretamente por sua fórmula. Assim,
Z L Z
1 1 π
c0 = f (x) dx = x dx
2L −L 2π −π

1 x2 π 1  2 
= · = π − (−π )2 = 0.
2π 2 −π 4π
2.10 Forma complexa da série de Fourier 287

Com as expressões dadas em (10.2), constitui-se um sistema que deve ser resolvido. Tem-se:

 an bn (

 − i = cn
2 2 an = cn + c−n

 an + i bn = c−n

 bn = i (cn − c−n)
2 2
Assim,
i i
an = cn + c−n = (−1)n − (−1)n = 0
n n
e
bn = i (cn − c−n )
 
i n i n
= i (−1) + (−1)
n n
2 2
= i 2 · (−1)n = − (−1)n
n n
(−1)n+1
=2 ·
n
Deste modo, foram determinados os seguintes coeficientes reais da série de Fourier:

(−1)n+1
a0 = 0, an = 0 e bn = 2 ·
n
Portanto, a série de Fourier para a função f é dada por

(−1)n+1
f (x) ∼ 2 ∑ sen (nx).
n=1 n

Observação 10.3: O leitor deve estar atento o bastante para não afirmar que a função f , dada
no exemplo 11.1, restrita ao intervalo (−π , π ], é ímpar. Isto se deve ao fato deste intervalo não
ser simétrico. Basta tomar x = π para verificar imediatamente que −x (que é igual a −π ) não
pertence a tal intervalo. Deve ser notado que a função está, na verdade, definida em todo R
através de uma extensão periódica.
Como a função f deste exemplo é uma extensão periódica ao conjunto R, ao se fazer isto, o
número −π passa a fazer parte do domínio da função, de modo que se tem de fato uma função
ímpar. Em suma, o domínio da função f é todo R, que é simétrico, de modo que a função é
ímpar.
Além disso, pela imparidade da função f do exemplo 10.1, já seria esperado que os coefi-
cientes a0 e an de sua série de Fourier fossem zeros. A resolução deste exemplo permitiu tal
confirmação. Mas observa-se que o valor zero para estes coeficientes foi uma decorrência do
método empregado, ou seja, a imparidade de f não foi usada em momento algum.
288 2 Séries de Fourier

Observação 10.4: O leitor também deve estar atento ao fato de que os coeficientes cn e c−n
da série na forma complexa são números complexos. Portanto tais coeficientes podem conter
a unidade imaginária i (com i 2 = −1). Por outro lado, os coeficientes a0 , an e bn da série de
Fourier são sempre números reais, isto é, não podem conter a unidade imaginária. Se a unidade
imaginária aparecer nestes coeficientes, então um erro foi introduzido durante a resolução.

Exemplo 10.2: Use a forma complexa da série de Fourier para determinar os coeficientes
(reais) a0 , an e bn da série (real) de Fourier para a função f : [−π , π ] → R dada por f (x) = | x |,
periódica de período T = 2π .
S OLUÇÃO : Deve-se determinar, inicialmente, os coeficientes da forma complexa e que são
dados por
Z Z
1 L 1 L inπ x
c0 = f (x) dx e cn = f (x) e − /L dx.
2L −L 2L −L
Observando que L = π e realizando integração por partes, com

u=x e dv = e − inx dx,


1 − inx
du = dx e v=− e ,
in
obtém-se
Z π Z 0 Z π
1 1 1
−x e − inx dx + x e − inx dx
i n π x/π
cn = | x |e − dx =
2π −π 2π −π 2π 0
Z Z
1 0 1 π
=− x e − inx dx + x e − inx dx

−π 2π 0
" Z
#
1  x − inx  0 1 0 − inx
= − − e + i n −π e dx +
2π in −π
 Z 
1  x − inx  π 1 π − inx
+ − e + in 0 e dx
2π in 0
!  
1 π inπ 1 − inx 0 1 π − inπ 1 − inx π
= − − e − 2 2e + − e − 2 2e
2π in i n −π 2π in i n 0
!  
1 π inπ 1 − inx 0 1 π − inπ 1 − inx π
= − − e + 2e + − e + 2e
2π in n −π 2π in n 0
   
1 π inπ 1 1 inπ 1 π − inπ 1 − inπ 1
= − − e + 2− 2e + − e + 2e − 2
2π in n n 2π in n n
1 inπ 1 1 1 − inπ 1 1
= e − 2
+ 2
e inπ − e + 2
e − inπ −
2in 2π n 2π n 2in 2π n 2π n2
2.10 Forma complexa da série de Fourier 289

1 inπ − inπ
 1 in π − inπ
 1
(10.7) = e + e + e − e − ·
2π n2 2i n π n2
Das fórmulas de Euler

e inπ = cos(nπ ) + i sen (nπ ) e e − inπ = cos(nπ ) − i sen (nπ ),

segue-se que
e in π + e −in π = 2 cos(nπ ) = 2(−1)n ,

e in π − e −in π = 2 sen (nπ ) = 0,


que substituídos em (10.7) resulta em
1 n 1 1
cn = · 2(−1) − · 0 −
2π n2 2in π n2
(−1)n 1
= 2
− 2
πn πn
1
(10.8) = [(−1)n − 1] .
π n2
Segue-se de (10.8), para n 6= 0, que
1  
c−n = 2
(−1)−n − 1
π (−n)
1
(10.9) = [(−1)n − 1] .
π n2
Observe-se que o coeficiente c0 não pode ser obtido fazendo n = 0 na expressão para cn , pois
surge um zero no denominador de (10.8). Para determinar c0 deve-se usar a definição. Assim,
Z π Z 0 Z π
1 1 1
c0 = f (x) dx = − x dx + x dx
2π −π 2π −π 2π 0

x2 0 x2 π
=− +
4π −π 4π 0
1  2  1 
=− 0 − (−π )2 + π 2 − 02
4π 4π
π π π
(10.10) = + = ·
4 4 2
Como a0 = 2 c0, então usando (10.10), obtém-se que
π
a0 = 2 · = π.
2
Para determinar os valores dos coeficientes an e bn deve-se usar as seguintes fórmulas

an = cn + c−n e bn = i (cn − c−n) ,

onde cn e c−n são dados por (10.8) e (10.9), respectivamente, isto é,


290 2 Séries de Fourier

1 1
cn = [(−1)n − 1] e c−n = [(−1)n − 1] .
π n2 π n2
Assim,
an = cn + c−n
1 1
= 2
[(−1)n − 1] + [(−1)n − 1]
πn π n2
2
= 2 [(−1)n − 1],
πn
que, para n = 2k − 1, resulta em
4 ,
ak = −
π (2k − 1)2
pois, para n par, tem-se que an = a2k = 0.
Para o cálculos dos coeficientes reais bn deve-se usar a seguinte fórmula:

bn = i (cn − c−n ) .

Deste modo,
bn = i (cn − c−n)
 
1 n 1 n
=i [(−1) − 1] − 2 [(−1) − 1]
π n2 πn
= i · 0 = 0.
Portanto, os coeficientes (reais) da série de Fourier, para a função f (x) dada, são
4
a0 = π , ak = − e bk = 0.
π (2k − 1)2

2.11 Identidade de Parseval

Dada uma função f : R → R periódica de período T = 2L, onde f , | f | e | f |2 são integráveis,


é possível demonstrar rigorosamente a identidade de Parseval, (veja, por exemplo, a referência
[38]) que é dada por
a20 ∞
2 2
 1Z L
+ ∑ an + bn = | f (x)|2 dx.
2 n=1 L −L

Com as hipóteses dadas, a demonstração é mais delicada e só será apresentada no próximo


capítulo. Um procedimento formal (isto é, sem rigor) e que permite mostrar tal identidade é
supor que a série de Fourier para a função f converge uniformemente para a própria função
2.11 Identidade de Parseval 291

e, então, realizar os cálculos formalmente, realizando trocas entre os sinais de integração e


somatório, etc.
Assim, nesse cenário, tem-se que a série de Fourier para f é escrita na forma

a0 ∞ h  nπ x   nπ x i
(11.1) f (x) = + ∑ n a cos + b n sen ,
2 n=1 L L

onde os coeficientes de Fourier são dados por


Z L Z L  nπ x  Z L  nπ x 
1 1 1
a0 = f (x) dx, an = f (x) cos dx e bn = f (x) sen dx.
L −L L −L L L −L L
Multiplicando ambos os membros de (11.1) por f (x) e integrando de −L até L, encontra-se
Z L Z L Z L
( )
∞ h  nπ x   nπ x i
a 0
[ f (x)]2 dx = f (x) dx + ∑ an f (x) cos L + bn f (x) L dx.
−L 2 −L −L n=1

Como se está supondo convergência uniforme da série, é possível trocar a ordem entre a
integração e o somatório no segundo membro da última expressão. Assim,
Z L Z L
2 a0
(11.2) [ f (x)] dx = f (x) dx +
−L 2 −L
 Z∞ L  nπ x  Z L  nπ x  
+ ∑ an f (x) cos dx + bn f (x) sen dx .
n=1 −L L −L L
Por outro lado, os coeficientes da série de Fourier são dados por
Z Z  nπ x  Z  nπ x 
1 L 1 L 1 L
a0 = f (x) dx, an = f (x) cos dx e bn = f (x) sen dx,
L −L L −L L L −L L
que substituídos em (11.2) resulta em
Z L ∞
2 a0
[ f (x)] dx = · (a0 L) + ∑ [ an · (an L) + bn · (bn L)] ,
−L 2 n=1

ou seja, " #
Z L
a2 ∞ 
[ f (x)]2 dx = L 0 + ∑ a2n + bn 2
,
−L 2 n=1
ou ainda,
Z L
1 2 a2 ∞ 
[ f (x)] dx = 0 + ∑ a2n + b2n ,
L −L 2 n=1
que é a identidade de Parseval.

Exemplo 11.1: Seja f : [−L, L] → R uma função definida por f (x) = x3 − L2 x e periódica de
período T = 2L.

(a) Determine os coeficientes da série de Fourier para a função f .


292 2 Séries de Fourier

(b) Use a identidade de Parseval para demonstrar que



1 π6
∑ n6 = 945 ·
n=1

S OLUÇÃO : Para a parte (a), determinar-se-á os coeficientes da série de Fourier para a função
dada. Note-se que f é uma função ímpar, pois

f (−x) = (−x)3 − L2(−x) = −x3 + L2x = − x3 − L2x = − f (x).

Assim, os coeficientes a0 = 0 e an = 0, de modo que basta calcular os coeficientes bn. Tem-se:


Z L  nπ x  Z L  nπ x 
1 1 
bn = f (x) sen x3 − L2x sen
dx = dx
L
−L L −L L L
Z  nπ x  Z L  nπ x 
1 L 3
(11.3) = x sen dx − L x sen dx.
L −L L −L L
As duas integrais em (11.3) devem ser calculadas por integração por partes. Isto será feito
separadamente.
Z L  nπ x  L  nπ x  L Z
L L  nπ x 
x sen dx = − x cos + cos dx
−L L nπ L −L nπ −L L

L L2  nπ x  L
= − [L · cos(nπ ) + L · cos(−nπ )] + 2 2 · sen
nπ n π L −L

2L2 L2
=− (−1)n + 2 2 [ sen (nπ ) − sen (−nπ )]
nπ n π
2L2
(11.4) = (−1)n+1 ,

onde usou-se a paridade da função cosseno, a imparidade da função seno e os fatos cos(nπ ) =
(−1)n e sen (nπ ) = 0.
Para o cálculo da outra integral no segundo membro de (11.3) deve-se integrar três vezes por
partes. Tem-se:

Z L  nπ x  L 3  nπ x  L Z
3L L 2  nπ x 
x3 sen dx = − x cos + x cos dx
−L L nπ L −L nπ −L L
L  3 3
 3L Z L 2  nπ x 
=− L cos(nπ ) + L cos(−nπ ) + x cos dx
nπ nπ −L L
Z  nπ x 
L4 n n 3L L 2
=− [(−1) + (−1) ] + x cos dx
nπ nπ −L L
Z  nπ x 
2L4 n+1 3L L 2
= (−1) + x cos dx
nπ nπ −L L
2.11 Identidade de Parseval 293

"
2L4 3L L  nπ x  L
= (−1)n+1 + x2 sen −
nπ nπ nπ L −L
Z
#
2L L  nπ x 
− x sen dx
nπ −L L

2L4 3L2  
= (−1)n+1 + 2 2 L2 sen (nπ ) − L2 sen (−nπ ) −
nπ n π
Z  nπ x 
6L2 L
− 2 2 x sen dx
n π −L L
Z  nπ x 
2L4 n+1 3L4 6L2 L
= (−1) + 2 2 [ 2 sen (nπ )] − 2 2 x sen dx
nπ n π n π −L L
Z  nπ x 
2L4 n+1 6L2 L
= (−1) − 2 2 x sen dx
nπ n π −L L
2L4 6L2 2L2
= (−1)n+1 − 2 2 · (−1)n+1
nπ n π nπ
 4 
2L 12L4
(11.5) = − (−1)n+1,
nπ n3 π 3
onde usou-se o valor encontrado em (11.4) para a última integral acima.
Agora substitui-se (11.4) e (11.5) em (11.3) para determinar os valores dos coeficientes bn.
Tem-se:
 
1 2L4 12L4 2L2
bn = − 3 3 (−1)n+1 − L · (−1)n+1
L nπ n π nπ
2n2 π 2 L3 n+1 12L3 n+1 2n2 π 2 L3
= (−1) − (−1) − (−1)n+1
n3 π 3 n3 π 3 n2 π 2
12L3 n+1 12L3
(11.6) =− (−1) = (−1)n .
n3 π 3 n3 π 3
Portanto, os coeficientes da série de Fourier para f são dados por

12L3
a0 = an = 0 e bn = (−1)n .
n3 π 3
(b) Para aplicar a identidade de Parseval deve-se, primeiro, determinar o valor da integral de
| f |2 de −L até L. Tem-se:
Z L Z L 2 Z L  
2 3 2
| f (x)| dx = x − L x dx = x6 − 2L2x4 + L4x2 dx
−L −L −L
  L
x7 2L2 L4
= − x5 + x3
7 5 3
−L
294 2 Séries de Fourier

   7 
L7 2L7 L7 L 2L7 L7
= − + − − + −
7 5 3 7 5 3
2L7 4L7 2L7 30L7 − 84L7 + 70L7
= − + =
7 5 3 105
16 7
(11.7) = L .
105
Como a0 = an = 0, basta usar o valor de bn, encontrado na parte (a), bem como o valor
da integral de | f |2 na identidade de Parseval. Assim, usando (11.6) e (11.7) na identidade de
Parseval,
a0 ∞
2 2
 1Z L
+ ∑ an + bn = | f (x)|2 dx,
2 n=1 L −L
obtém-se  2

12L3 1 16 7
∑ 3 3
(−1)n = · ·L ,
n=1 n π L 105
isto é,

144L6 16 144 6 ∞ 1 16 6
∑ n6 π 6 (−1)2n = 105 · L6 ⇒ 6
·L ∑ 6 =
105
·L ,
n=1 π n=1 n
ou seja,

1 π6 16 ∞
1 π6
∑ n6 = 144 · 105 ⇒ ∑ n6 = 9 · 105 ,
n=1 n=1
donde se conclui que

1 π6
∑ 6 = 945 ·
n=1 n

Exemplo 11.2: Seja f : R → R uma função definida por




 0,
 −π ≤ x < 0,
f (x) = 1, 0 ≤ x < π,


 periódica de período T = 2π .

(a) Determine os coeficientes de Fourier para a função f .


(b) Use a identidade de Parseval para mostrar que

1 π2
∑ (2n − 1)2
=
8
·
n=1

S OLUÇÃO : Para a parte (a), inicia-se determinando o coeficiente a0 para a função f dada.
Observe-se que T = 2π , de modo que L = π . Tem-se:
2.11 Identidade de Parseval 295

Z L Z π
1 1
a0 = f (x) dx = f (x) dx
L −L π −π
Z 0 Z π Z π
1 1 1
= f (x) dx + f (x) dx = dx
π π π 0 π 0

1 0 1
= x = (π − 0)
π −π π
(11.8) = 1.

Para o cálculo de an , tem-se


Z L  nπ x  Z π
1 1
an = f (x) cos dx = f (x) cos(nx) dx
L −L L π −π
Z 0 Z π
1 1
= 0 · cos(nx) dx + 1 · cos(nx) dx
π −π π 0
Z π π
1 1 1
= cos(nx) dx = · · sen (nx)
π 0 π n 0
1
(11.9) = [ sen (nπ ) − sen 0] = 0,

onde usou-se a imparidade do seno e o fato sen (nπ ) = 0.
Para o cálculo de bn , tem-se
Z  nπ x  Z
1 L 1 π
bn = f (x) sen dx = f (x) sen (nx) dx
L −L L π −π
Z 0 Z
1 1 π
= 0 · sen (nx) dx + 1 · sen (nx) dx
π −π π 0
Z   π
1 π 1 1
= sen (nx) dx = · − · cos(nx)
π 0 π n 0
1
=− [cos(nπ ) − cos 0]

1 1
= − [(−1)n − 1] = [1 − (−1)n ]
nπ nπ


 0, para n par,
= 2

 , para n ímpar,

Portanto, fazendo n = 2k − 1, para k ∈ N, tem-se que
2 ,
(11.10) bk = k ∈ N.
(2k − 1)π
296 2 Séries de Fourier

(b) Para usar a identidade de Parseval é necessário determinar o valor da integral | f |2 de −π


até π . Tem-se:
Z π Z 0 Z π
| f (x)|2 dx = | f (x)|2 dx + | f (x)|2 dx
−π −π 0
Z 0 Z π Z π
2 2
= |0| dx + |1| dx = dx
−π 0 0
π

(11.11) = x = π.
0

Substituindo os valores dos coeficientes de Fourier para f , obtidos em (11.8), (11.9) e (11.10),
bem como o valor da integral de | f |2 obtido em (11.11), na identidade de Parseval, obtém-se
Z π
a20 ∞  1
+ ∑ a2n + b2n = | f (x)|2 dx,
2 n=1 π π

isto é, "
∞  2 #
1 2 2 1
+∑ 0 + = · π,
2 n=1 (2n − 1)π π
ou ainda,
4 ∞ 1 1
2 ∑ 2
= 1− ,
π n=1 (2n − 1) 2
donde segue-se que

4 ∞ 1 1 ∞
1 π2 ,
∑ =
π 2 n=1 (2n − 1)2 2
⇒ ∑ 2
=
n=1 (2n − 1) 8

que é o resultado desejado.


Observa-se que este resultado permite determinar o valor de π 2 com a aproximação desejada,
bastando realizar a soma

2 1
π =8∑
n=1 (2n − 1)
 
1 1 1
= 8 1+ 2 + 2 + 2 +···
3 5 7
8 8 8
= 8+ + + +···
9 25 49

Neste ponto, o leitor poderá se perguntar se toda série trigonométrica, isto é, séries do tipo
∞ h  nπ x   nπ x i
a0
+ ∑ an cos + bn sen
2 n=1 L L

é uma série de Fourier.


2.11 Identidade de Parseval 297

A resposta é: em geral, não! Como foi visto, a identidade de Parseval mostra uma estreita
relação entre a função dada e os coeficientes da série. Ou seja, é justamente a identidade de
Parseval que dá uma caracterização para que séries trigonométricas sejam séries de Fourier. De
modo geral pode-se dizer que toda série de Fourier é uma série trigonométrica, mas a recíproca
é falsa. O próximo exemplo mostra isso.

Exemplo 11.3: Considere a seguinte série trigonométrica



sen (nx) ,
∑ nα
n=1

onde α > 0.
É possível mostrar que esta série converge para todo x ∈ R; na verdade é possível mostrar que
ela converge uniformemente em todo subintervalo fechado de (0, 2π ). Porém esta série conver-
gente não é absolutamente convergente se α < 1. Assim, o teste M de Weierstrass não pode ser
utilizado, precisando, neste caso, de outros tipos de testes de convergência condicionada, como
os testes de Abel e Dirichlet. A maneira mais conveniente de mostrar a convergência desta série
em particular é usando o teste de Abel:

T ESTE DE A BEL : Sejam {un(x)} e {vn (x)} sequência de funções definidas em um intervalo
I ⊂ R. Suponha que:
(a) A sequência {vn (x)} convirja uniformemente para 0 em I;

(b) A série ∑ |vn+1 (x) − vn (x)| convirja uniformemente;
n=1

n

(c) Exista uma constante K > 0 tal que ∑ uk (x) ≤ K para todo x ∈ I e todo n.
k=1

Então, a série ∑ un (x) vn (x) converge uniformemente.
n=1
Para demonstração deste teorema, bem como outros resultados correlatos, sugere-se o livro
[37] da bibliografia.

sen (nx)
Para mostrar a convergência da série ∑ , basta tomar un(x) = sen (nx) e vn (x) = 1/n α
n=1 n α

no teste de Abel. Assim, para a parte (a) do teste de Abel deve-se mostrar que lim vn (x) =
lim n−α = 0. Portanto, dado ε > 0, existe n0 ∈ N tal que
1 1
n0 > ⇒ < ε.
ε n0
Note que
1 1
n0 < n ⇒ < ·
n n0
Deste modo,
298 2 Séries de Fourier


1
− 0 = 1 < 1 < ε α < ε ,

nα nα para todo n > n0 ,
nα0

observando que ε α < ε por ser α < 1. Isto demonstra que lim vn (x) = lim n−α = 0.
n→∞ n→∞
Agora mostra-se a parte (b) no teste de Abel. Seja f : (0, ∞) uma função definida por f (x) =
1/xα . O teorema do valor médio afirma o seguinte: Seja f : [a, b] → R uma função diferenciável.

Então, existe c ∈ (a, b) tal que


f (b) − f (a)
= f 0 (c).
b−a
Agora observe que
 α
f 0 (x) = x−α = −α · x−α −1 = − 1+α , para x 6= 0.
x
Portanto, tomando a = xα e b = (x + 1)α (com x 6= 0), pelo teorema do valor médio, tem-se


1 1 0 α α
(x + 1)α − xα = f (c) = − x1+α ≤ x1+α ·

Fazendo x = n, conclui-se que




1 1
α
(n + 1)α − nα ≤ n1+α ·

Assim,
∞ ∞
1 1 α
∑ (n + 1)α nα ∑ n1+α ·
− ≤
n=1 n=1
Agora é necessário mostrar que a série

α
∑ n1+α
n=1

é convergente, pois, por comparação, a série






1 1
∑ |vn+1 (x) − vn (x)| = ∑ (n + 1)α − nα
n=1 n=1
também convergirá. E com isso a parte (b) do teste de Abel fica demonstrada.
Antes, observe que 1 + α > 1, pois 0 < α < 1. Assim, demonstrar-se-á que a série

1
∑ nr
n=1

convergirá para todo r > 1.


Note que os termos da última série são positivos, de modo que a sequência formada por
suas somas parciais é crescente. A ideia é mostrar que esta sequência é limitada e para isso
será mostrado que existe uma subsequência limitada. Considere as somas parciais de ordem
m = 2n − 1. Então,
2.11 Identidade de Parseval 299

   
1 1 1 1 1 1
Sm = 1 + r + r + r + r + r + r +
2 3 4 5 6 7
 
1 1 1 1 1 1 1 1 1
+ r + r + r + r + r + r + r + r + ···+ n
8 9 10 11 12 13 14 15 (2 − 1)r
   
1 1 1 1 1 1
= 1+ r + r + r + r + r + r +
2 3 4 5 6 7
 
1 1 1 1 1 1 1 1
+ r + r + r + r + r + r + r + r +···
8 9 10 11 12 13 14 15
 
 1 1 
 
· · · +  n−1 r + · · · + n r
 (2 ) (2 − 1) 
| {z }
n−1
   
1 1 1 1 1 1
≤ 1+ r + r + r + r + r + r +
2 2 4 4 4 4
 
1 1 1 1 1 1 1 1
+ r + r + r + r + r + r + r + r +···
8 8 8 8 8 8 8 8
 
 1 1 1 1 
 
· · · +  n−1 r + n−1 r + · · · + n−1 r + n−1 r 
 (2 ) (2 ) (2 ) (2 ) 
| {z }
n−1

2 4 8 2n−1
= 1 + r + r + r + · · · + n−1 r
2 4 8 (2 )
20 21 22 23 2n−1
= r + r + r + r + · · · + r
(20 ) (21) (22 ) (23 ) (2n−1)
20 21 22 23 2n−1
= + + + + · · · +
20r 21r 22r 23r 2(n−1)r
 0  1  2  3  n−1
2 2 2 2 2
= r
+ r + r + r + ···+ r
2 2 2 2 2
n−1  k
2
= ∑ r
·
k=0 2

Como r > 1, segue-se que


2
2 < 2r ⇒ < 1.
2r
300 2 Séries de Fourier

∞  n
2
Portanto, a série geométrica ∑ converge para uma soma S. Assim, Sm < S para todo
n=1 2r

1
m = 2n − 1. Segue-se daí que a série ∑ nr é convergente para r > 1. Observa-se, entretanto,
n=1
que esta série é divergente caso r ≤ 1.
Fazendo r = 1 + α > 1 (pois 0 < α < 1) e lembrando que
∞ ∞

1 1 α
∑ n+1
|v (x) − vn (x)| = ∑ (n + 1)α nα ∑ n1+α ,
− ≤
n=1 n=1 n=1

segue-se, por comparação, que ∑ |vn+1 (x) − vn (x)| é convergente, o que demonstra a parte (b)
n=1
do teste de Abel.
Para mostrar a parte (c), basta notar que as funções senos são limitadas. Assim,

n n n n

∑ k ∑
i=1
u (x) =
k=1
sen (kx) ∑

k=1
| sen (kx)| = ∑ 1k
k=1

= 1 + 1 + · · ·+ 1 = n.
| {z }
n vezes
Tomando K = n, conclui-se que a soma parcial das uk (x) é limitada. Isto mostra (c). Observe
que n tenderá para o infinito, mas a parte (c) trata-se de uma soma finita, de modo que o n
também é finito. Por isso se pôde tomar K = n. Caso a soma fosse infinita, tal afirmação seria
falsa.
Como as hipóteses (a), (b) e (c) do teste de Abel são satisfeitas, segue-se daí que a série

sen (nx)
∑ nα é convergente, ou seja, que esta série define uma função f (x).
n=1
Em suma, a série dada define uma função f (x), isto é,

sen (nx)
f (x) = ∑ nα
·
n=1

O interesse neste exemplo é mostrar que esta série trigonométrica não é uma série de Fourier.
Para isso será usada a identidade de Parseval. Primeiro, note-se que a expressão acima pode ser
escrita na forma

sen (nx)
f (x) = ∑
n=1 nα
∞  
0 1
= + ∑ 0 · cos(nx) + α · sen (nx) ,
2 n=1 n
isto é, a0 = 0, an = 0, bn = 1/n α e L = π .
Por outro lado, a identidade de Parseval é dada por
Z L
1 a20 ∞ 
| f (x)|2 dx = + ∑ a2n + b2n ,
L −L 2 n=1
2.11 Identidade de Parseval 301

isto é,
Z π
1 a20 ∞ 
| f (x)|2 dx = + ∑ a2n + b2n
π −π 2 n=1
"  2 #
02 ∞
1
= + ∑ 02 +
2 n=1 nα

1
(11.12) = ∑ n 2α
·
n=1

Assim, para α = 1/2, a expressão (11.12) é escrita como


Z π ∞ ∞
1 1 1
| f (x)|2 dx = ∑ = ∑
π −π n 2· 21 n
n=1 n=1

1 1 1 1
= 1 + + + + · · ·+ + · · ·,
2 3 4 n
que é a série harmônica, que é divergente.
A divergência da série para α = 1/2 implica na divergência da integral do primeiro membro,
ou seja, diz que f não é uma função quadrado integrável. Logo, a identidade de Parseval não
é satisfeita e isto demonstra que a série trigonométrica dada não é uma série de Fourier (pois
funções representadas por série de Fourier sempre satisfazem a identidade de Parseval).
302 2 Séries de Fourier

2.12 Exercícios propostos

Exercício 1: Para as funções dadas abaixo, determine se ela é periódica e se for, encontre o
seu período fundamental.

(a) f (x) = senh (2x),

(b) g(x) = tg (π x),


(
0, 2n − 1 ≤ x < 2n, n ∈ Z,
(c) u(x) =
1, 2n ≤ x < 2n + 1,
(
(−1)n , 2n − 1 ≤ x < 2n, n ∈ Z,
(d) v(x) =
1, 2n ≤ x < 2n + 1,

Exercício 2: Seja f : R → R uma função definida por


(
x + 1, −1 < x < 0,
f (x) =
x, 0 < x < 1,

e periódica de período T = 2. Determine uma fórmula para f (x) no intervalo 1 < x < 2 e no
intervalo 8 < x < 9.

Exercício 3: Considere uma função definida por



 0, se − 5 < x < 0,


f (x) = 3, se 0 < x < 5,


 periódica com T = 10.

(a) Encontre os coeficientes de Fourier.

(b) Escreva a correspondente série de Fourier.

(c) Como f (x) deverá ser definida nos pontos x = 0, ±5 para que a série de Fourier convirja
para f (x) no intervalo −5 ≤ x ≤ 5?

Exercício 4: Seja f : (0, L] → R uma função definida por f (x) = x2 .

(a) Faça uma extensão par e periódida de período T = 2L para f .

(b) Determine a sua série de Fourier.

(c) Use série de Fourier obtida em (b) para mostrar que


2.12 Exercícios propostos 303

π2 ∞
1 1 1 1 1
= ∑ 2 = 2 + 2 + 2 + 2 ···
6 n=1 n 1 2 3 4

Exercício 5: Encontre a série de Fourier para cada função abaixo:


(
−x, −L ≤ x < L,
(a) f (x) =
L, x = L.

(b) f (x) = sen 2 x, −π ≤ x ≤ π .


(
0, se − L ≤ x < 0 ou x = L,
(c) f (x) =
a, se 0 ≤ x < L; a ∈ R.

 −L ≤ x ≤ 0,
 L + x,

(d) f (x) = L − x, 0 ≤ x ≤ L,


 f (x + 2L) = f (x).


 0,
 −1 ≤ x ≤ 0,
(e) f (x) = x2 , 0 ≤ x < 1,


 f (x + 2) = f (x).

Exercício 6: Faça uma extensão ímpar, periódica de período com o período indicado e deter-
mine a série de senos para as seguintes funções:


 x,
 0 ≤ x < 1,
(a) f (x) = 1, 1 ≤ x < 2,


 periódica com T = 4.
(
1, 0 < x < π,
(b) f (x) =
periódica com T = 2π .


 0, 0 < x < π,



 1, π < x < 2π ,
(c) f (x) =

 2, 2π < x < 3π ,



 periódica com T = 6π .
(
−x, −π < x < 0,
(d) f (x) =
periódica com T = 2π .
(
2 − x2 , 0 < x < 2,
(e) f (x) =
periódica com T = 4.
304 2 Séries de Fourier

Exercício 7: Faça uma extensão par, periódica com o período indicado e determine a série de
cossenos para as seguintes funções:


 1,
 0 < x < 1,
(a) f (x) = 0, 1 < x < 2,


 periódica com T = 4.
(
1, 0 ≤ x ≤ π,
(b) f (x) =
periódica com T = 2π .
(
L − x, 0 ≤ x ≤ L,
(c) f (x) =
periódica com T = 2L.

 0 < x < π,
 x,

(d) f (x) = 0, π < x < 2π ,



periódica com T = 4π .
(
x2 − 2x, 0 < x < 4,
(e) f (x) =
periódica com T = 8.

Exercício 8: Use a forma complexa para obter as séries de Fourier (forma real) para cada
função do exercício 5.

Exercício 9: Se α não for um número inteiro, use a forma complexa para obter as séries de
Fourier para as funções abaixo:
(
cos(α x), se − π ≤ x < π ,
(a) f (x) =
periódica de período T = 2π .
(
sen (α x), se − π ≤ x < π ,
(b) f (x) =
periódica de período T = 2π .
(
e α x, se − π ≤ x < π ,
(c) f (x) =
periódica de período T = 2π .

Exercício 10: Seja f : (−π , π ) → R uma função definida por f (x) = x.

(a) Se f for par, mostre que todos os seus coeficientes de Fourier complexos são números
reais. Isto é, deve-se mostrar que cn ∈ R e cn = c−n para todo n ∈ Z.
(b) Se f for ímpar, mostre que c0 = 0 e que cn é um imaginário puro. Isto é, deve-se mostrar
que, para n 6= 0, que cn é um número da forma cn = i rn , onde rn é um número real.
2.12 Exercícios propostos 305

Exercício 11: Seja f : (−π , π ) → R uma função definida por f (x) = x.

(a) Faça uma expansão periódica conveniente e mostre que


 
sen x sen (2x) sen (3x)
x=2 − + −··· ·
1 2 3
(b) Integre o resultado em (a) e mostre que, para −π ≤ x ≤ π , se tem
 
2 π2 cos x cos(2x) cos(3x
x = −4 − + −··· ·
3 12 22 32
(c) Integre o resultado em (b) e mostre que, para −π ≤ x ≤ π , se tem
 
sen x sen (2x) sen (3x)
x(π − x)(π + x) = 12 − + −··· ·
13 23 33

Exercício 12: (a) Mostre que, para −π < x < π ,


 
1 2 3 4
x cosx = − sen x + 2 sen (2x) − sen (3x) + sen (4x) − · · · ·
2 1·3 2·4 3·5
(b) Use o resultado em (a) para mostrar que, para −π ≤ x ≤ π ,
 
1 cos(2x) cos(3x) cos(4x)
x sen x = 1 − cos x − 2 − + −··· ·
2 1·3 2·4 3·5
(c) Derive o resultado em (b) para mostrar que, para 0 ≤ x ≤ π , se tem
 
π 4 cos x cos(3x) cos(5x)
x= − + + +··· ·
2 π 12 32 52

Exercício 13: Considere a seguinte função f : (0, 2) → R definida por f (x) = x.

(a) Faça uma extensão ímpar e periódica com período T = 4 e mostre que sua série de senos
é dada por
4 ∞ cos(nπ )  nπ x  4   πx  1 
2π x

1

3π x
 
f (x) = − ∑ · sen = sen − sen + sen −···
π n=1 n 2 π 2 2 2 3 2

(b) Mostre que a diferenciação termo a termo na série da parte (a) não é válida.
S UGESTÃO : basta observar que na série derivada termo a termo o n−ésimo termo nesta série
não se aproxima de zero.

Exercício 14: (a) Encontre a série de Fourier para a função f : (0, 2) → R, dada por f (x) = x2 ,
integrando a série obtida na parte (a) do exercício 13.

(b) Use a parte (a) deste exercício para calcular a série numérica
306 2 Séries de Fourier


(−1)n−1
∑ n2 ·
n=1

Exercício 15: Mostre que as séries abaixo não são séries de Fourier de funções dife-
renciáveis:
∞ ∞
cos(nx) sen (nx)
∑ n e ∑ n ·
n=1 n=1

Exercício 16: Seja f : R → R uma função definida por



 se − 1 ≤ x < 0,
 −x,

f (x) = x, se 0 ≤ x < 1,



periódica de período T = 2.

(a) Determine os coeficientes de Fourier para a função f .


(b) Use a identidade de Parseval para mostrar que

1 π4
∑ 4
= ·
k=0 (2k + 1) 96

Exercício 17: Seja f (0, 2) → R definida por f (x) = x.

(a) Faça uma expansão par e periódica de período T = 4 e determine uma série de cossenos
para a função f .
(b) Use a identidade de Parseval para mostrar que

1 1 1 1 π4
∑ 4 = 14 + 24 + 34 + · · · = 90 ·
n=1 n

S UGESTÃO : A parte (a) é análoga à solução do exercício 14. Para a parte (b) é necessário um
pouco mais de atenção. A parte (a) permite escrever uma série numérica formada por termos
ímpares elevados a quarta potência (isto é, uma série como no exercício 14) e que também
convergirá para π 4/96. Mas a série da parte (b) deste exercício envolve todos os n (ou seja,

1
1, 2, 3, . . .). Assim, seja S = ∑ 4 . Agora escreva S como duas somas: uma para n ímpar e
n=1 n
outra para n par. Em seguida basta observar que
1 1 1 1 1
S= 4
+ 4 + 4 + 4 + 5 +···
1 2 3 4 5
   
1 1 1 1 1 1
= + + +··· + 4 + 4 + 4 +···
14 34 54 2 4 6
   
1 1 1 1 1 1
= + + +··· + + + +···
14 34 54 (2 · 1)4 (2 · 2)4 (2 · 3)4
2.12 Exercícios propostos 307

   
1 1 1 1 1 1 1
= + + +··· + 4 + + +···
14 34 54 2 14 24 34
π4 S
= + ·
96 16

Exercício 18: Considere a função f : [0, π ] → R dada por f (x) = π x − x2 .

(a) Faça uma extensão par e periódica de período T = 2π e mostre que a série de Fourier é
dada por
π2 ∞
cos(2kx)
f (x) ∼ −∑ ·
6 k=1 k2
(b) Use a identidade de Parseval para mostrar que

1 π4
∑ 4 90 ·
=
n=1 k

Exercício 19: Mostre que



1 π4
∑ 4
= ·
k=1 (2k − 1) 96
S UGESTÃO : Escreva a série obtida no item (b) do exercício 18 em duas partes, uma com k
ímpar e outra com k par. Assim

1 1 1 1 1 1 1
S= ∑ k 4 = 14 + 24 + 34 + 44 + 54 + 64 · · ·
k=1
   
1 1 1 1 1 1
= + + +··· + 4 + 4 + 4 ···
14 34 54 2 4 6
∞  
1 1 1 1
=∑ + + + +···
k=1
(2k − 1)4 (2 · 1)4 (2 · 2)4 2 · 3)4
∞  
1 1 1 1
=∑ 4
+ 4 4 + 4 4 + 4 4 +···
k=1 (2k − 1) 2 ·1 2 ·2 2 ·3
∞  
1 1 1 1 1
=∑ 4
+ 4 + + +···
k=1 (2k − 1) 2 14 24 34

1 S
= ∑ (2k − 1)4 + 16 ·
k=1

Agora basta substituir o valor da soma S encontrada no item (b) do exercício 18.

Exercício 20: Considere a função f : [0, π ] → R definida por f (x) = π x − x2 .

(a) Faça uma extensão ímpar e periódica de período T = 2π e mostre que a sua série de
Fourier é dada por
308 2 Séries de Fourier

8 ∞ sen [(2k − 1)x]


f (x) ∼ ∑ (2k − 1)3 ·
π k=1
(b) Use a identidade de Parseval para mostrar que

1 π6
∑ 6
= ·
n=1 (2k − 1) 960

Exercício 21: Mostre que



1 π6
∑ k6 = 945 ·
k=1

S UGESTÃO : Considere o resultado obtido no item (b) do exercício 19, isto é,



1 π6
∑ 6 960 ·
=
k=1 k

Agora escreva

1
S= ∑ k6 ,
k=1
onde S significa o valor do somatório.
Em seguida, observe que se pode escrever
1 1 1 1 1 1
S= 6
+ 6 + 6 + 6 + 6 + 6 +···
1 2 3 4 5 6
   
1 1 1 1 1 1
= + + +··· + 6 + 6 + 6 +···
16 36 56 2 4 6
   
1 1 1 1 1 1
= + + +··· + + + +···
16 36 56 (2 · 1)6 (2 · 2)6 (2 · 3)6
   
1 1 1 1 1 1 1
= + + +··· + 6 + + +···
16 36 56 2 16 26 36

1 1
= ∑ (2k − 1)6 + 26 · S
k=1

1 S
= ∑ (2k − 1)6 + 64 ·
k=1

Agora basta atribuir o valor do último somatório na igualdade obtida acima.

Exercício 22: Considere a seguinte função f (x) = sen x, com 0 < x < π .

(a) Faça uma expansão periódica par e determine uma série de cossenos para f .
(b) Use a identidade de Parseval para mostrar que
2.12 Exercícios propostos 309


1 1 1 1 π2 − 8
∑ 2 2
= + +
12 · 32 32 · 52 52 · 72
+ · · · = ·
n=1 (2k − 1) · (2k + 1) 16

S UGESTÃO : Monte a série numérica na identidade de Parseval para obter


∞  
a20 ∞
2 2
 16/π 2 −2[1 + cos(nπ )] 2
+ ∑ an + bn = +∑ 2 − 1)π
+ 02
2 n=1 2 n=2 (n

8 ∞
4[1 + 2 cos(nπ ) + cos2 (nπ )]
= + ∑
π 2 n=2 (n2 − 1)2 π 2
n o
n n 2
8 ∞ 4 1 + 2(−1) + [(−1) ]
= 2 ∑
π n=2 (n2 − 1)2 π 2

8 ∞
4 [2 + 2(−1)n]
= + ∑ (n2 − 1)2π 2
π 2 n=2

8 ∞
8 [1 + (−1)n]
= + ∑ (n2 − 1)2 π 2 ·
π 2 n=2

Observe que para n ímpar o termo 1 + (−1)n = 0 e que para n par se tem 1 + (−1)n = 2. Faça
isso e continue manipulando algebricamente as contas até obter
 
a20 ∞
2 2
 8 16 1 1 1
+ ∑ an + bn = 2 + 2 + + +··· .
2 n=1 π π 12 · 32 32 · 52 52 · 72

Agora basta substituir o que foi encontrado antes na última igualdade acima, manipular mais
um pouco até chegar no que foi pedido.

Exercício 23: Use a identidade de Parseval para mostrar que, se f : R → R for uma função
periódica de período T = 2L e tal que f 0 é contínua, então a série abaixo é convergente:
∞ q
∑ a2n + b2n,
n=1

onde an e bn são os coeficientes de Fourier.

Exercício 24: Mostre que a série trigonométrica



sen (nx)
∑ ln x
n=2

não é série de Fourier de uma função integrável e absolutamente integrável.


310 2 Séries de Fourier

Respostas dos exercícios

Exercício 1: (a) não é periódica; (b) T = 1; (c) T = 2; (d) T = 4.

Exercício 2: f (x) = x − 1 em 1 < x < 2 e f (x) = x − 8 em 8 < x < 9.

3(1 − cos(nπ )
Exercício 3: (a) a0 = 3, an = 0 e bn = ·
  nπ

3 3[1 − cos(nπ )] nπ x
(b) + ∑ · sen ·
2 n=1 nπ 5
(c) Nos pontos de descontinuidade −5, 0 e 5, a série converge para (3 + 0)/2 = 3/2. A série
convergirá para f (x) em −5 ≤ x ≤ 5 se f (x) for redefinida por


 3/2, se x = −5,





 0, se − 5 < x < 0,


 3/2, se x = 0,
f (x) =

 3, se 0 < x < 5,







3/2, se x = 5,


periódica de período T = 10.

Exercício 4: (b) os coeficientes são dados por


2L2 , 4L2
a0 = an = (−1)n e bn = 0.
3 n2 π 2
(c) Monte a série de Fourier na parte (b) e, em seguida, faça x = L para obter a série dada.

2L ∞ (−1)n  nπ x 
Exercício 5: (a) ∑ n · sen ·
π n=1 L

(b) sen 2 x = 1/2 − 1/2 · cos(2x). Para obter essa série de Fourier não é preciso se dar ao trabalho
de calcular os coeficientes.
 
a 2a ∞ 1 (2k + 1)π x
(c) + ∑ 2k + 1 · sen ·
2 π k=0 L
 
L 4L ∞ 1 (2k − 1)π x
(d) + 2 ∑ · cos ·
2 π k=1 (2k − 1)2 L
∞  
1 2 cos(nπ ) 2 − 2 cos(nπ ) + n2 π 2 cos(nπ )
(e) + ∑ · cos(nπ x) − · sen (nπ x) .
6 n=1 n2 π 2 n3 π 3
2.12 Exercícios propostos 311

∞   nπ    nπ x 
2 2
Exercício 6: (a) ∑ − cos(nπ ) + · sen sen .
n=1 nπ nπ 2 2

4 ∞ sen [(2n − 1)x


(b) ∑ 2n − 1 ·
π n=1
∞        nx 
2 nπ 2nπ
(c) ∑ cos + cos − 2 cos(nπ ) sen ·
n=1 nπ 3 3 3

(−1)n
(d) 2 ∑ · sen (nx).
n=1 n
∞  2 2   nπ x 
4n π [1 + cos(nπ )] 16[1 − cos(nπ )]
(e) ∑ + sen ·
n=1 n3 π 3 n3 π 3 2
 
1 2 ∞ (−1)n−1 (2n − 1)π x
Exercício 7: (a) + ∑ · cos ·
2 π n=1 2n − 1 2

(b) f (x) = 1.
 
L 4L ∞ 1 (2n − 1)π x
(c) + 2 ∑ · cos ·
2 π n=1 (2n − 1)2 L
  nπ  4 h  nπ  i  nx 
π 1 ∞ 2π
(d) + ∑ · sen + 2 cos − 1 cos ·
4 π n=1 n 2 n 2 2
   nπ x 
4 16 ∞ 1 + 3 cos(nπ )
(e) + 2 ∑ cos ·
3 π n=1 n2 4

Exercício 8: as respostas são as mesmas do exercício 5.

2 sen (απ ) 2α · sen (απ )


Exercício 9: (a) a0 = , an = 2 2
· (−1)n , bn = 0.
απ π (α − n )
2n · (−1)n · sen (απ )
(b) a0 = an = 0 e bn = ·
π (α 2 − n2)
( )
senh (πα ) 1 ∞
(−1)n
(c) +2 ∑ 2 2
[α · cos(nx) − n · sen (nx)] ·
π α n=1 α + n
       
16
2 πx 1 2π x 1 3π x
Exercício 14: (a) x = k − 2 cos − 2 cos + 2 cos − · · · , onde
 π 2 2 2 3 2
16 1 1 1
k = 2 1− 2 + 2 − 2 +··· ·
π 2 3 4
312 2 Séries de Fourier

a0 4
(b) É possível determinar a constante k de outro modo, fazendo k = = , que é obtido
2 3
integrando f (x) dada em (a). Agora faça x = 0 na série da parte (a), substitua este valor de k e
conclua que o valor da série numérica da parte (b) é igual a π 2/12.

(−1)n − 1 ,
Exercício 16: (a) a0 = 1, an = 2 · bn = 0.
n2 π 2

4[(−1)n − 1]
Exercício 17: (a) a0 = 2, an = , bn = 0.
n2 π 2

2 2 ∞ 1 + (−1)n
Exercício 22: (a) f (x) ∼ − ∑ · cos(nx).
π π n=2 n2 − 1
2.12 Exercícios propostos 313

Apêndice: interpretações físicas

Finaliza-se este capítulo com uma seção que pretende apresentar algumas interpretações físi-
cas associadas as séries de Fourier. Os resultados serão apresentados na forma de proposições.

Proposição 12.1: Seja u : R → R uma função seccionalmente diferenciável e periódica de


período T = 2L. Se
∞ h  nπ x   nπ x i
a0
u(x) ∼ + ∑ an cos + bn sen
2 n=1 L L

é a série de Fourier para u, então esta série também pode ser escrita na seguinte forma:
∞  nπ x 
(12.1) u(x) ∼ A0 + ∑ An cos − θn ,
n=1 L

onde q  
a0 bn
A0 = , An = a2n + b2n e θn = arc tg ·
2 an
D EMONSTRAÇÃO : Observe que se pode escrever
" #
 nπ x   nπ x  q a  nπ x  b  nπ x 
n n
an cos + bn sen = a2n + b2n p cos +p sen ·
L L 2 2
an + bn L an + b2n
2 L

Fazendo
an bn
(12.2) cos θn = p e sen θn = p ,
a2n + b2n a2n + b2n
a igualdade anterior pode ser escrita do seguinte modo:
(12.3)
 nπ x   nπ x  q h  nπ x   nπ x i
an cos + bn sen = a2n + b2n cos θn · cos + sen θn · sen ·
L L L L
Agora usa-se a identidade trigonométrica

cos(a − b) = cos a · cosb + sen a · sen b,

com
nπ x
a = θn e b= ,
L
que resulta em
 nπ x   nπ x   nπ x 
(12.4) cos − θn = cos θn · cos + sen θn · sen ·
L L L
Substituindo (12.4) em (12.3), obtém-se
314 2 Séries de Fourier

 nπ x   nπ x  q  nπ x 
an cos + bn sen = a2n + b2n cos − θn ·
L L L
Fazendo
q
(12.5) An = a2n + b2n,

pode-se escrever
 nπ x   nπ x   nπ x 
(12.6) an cos + bn sen = An cos − θn ·
L L L
Além disso, segue-se de (12.2) que
! p !
bn bn a2n + b2n sen θn
= p = = tg θn .
an a2n + b2n an cos θn

Logo,
 
bn bn
(12.7) tg θn = ⇒ θn = arc tg ·
an an
Agora faça
a0
(12.8) A0 = ·
2
Por fim, basta substituir (12.6) e (12.8) na série de Fourier para escrever
∞  nπ x 
u(x) ∼ A0 + ∑ An cos − θn ,
n=1 L

onde An e θn são dados, respectivamente, por (12.5) e (12.7), isto é,


q  
2 2
bn
An = an + bn e θn = arc tg ·
an

Naturalmente, existe uma representação similar para u, mas usando-se senos no lugar de
cossenos.

Proposição 12.2: Seja u : R → R uma função seccionalmente diferenciável e periódica de


período T = 2L. Se
∞ h  nπ x   nπ x i
a0
u(x) ∼ + ∑ an cos + bn sen
2 n=1 L L

é a série de Fourier para u, então esta série também pode ser escrita na seguinte forma:
2.12 Exercícios propostos 315

∞  nπ x 
(12.9) u(x) ∼ A0 + ∑ An sen + θn ,
n=1 L

onde q  
an
An = a2n + b2n e θn = arc tg ·
bn
D EMONSTRAÇÃO : Observe que se pode escrever
" #
 nπ x   nπ x  q a  nπ x  b  nπ x 
n n
an cos + bn sen = a2n + b2n p cos +p sen ·
L L a2n + b2n L a2n + b2n L

Fazendo
an bn
(12.10) sen θn = p e cos θn = p ,
a2n + b2n a2n + b2n
a igualdade anterior pode ser escrita do seguinte modo:
 nπ x   nπ x 
an cos + bn sen =
L L
q h  nπ x   nπ x i
(12.11) = a2n + b2n sen θn · cos + cos θn · sen ·
L L
Agora usa-se a identidade trigonométrica

sen (a + b) = sen a · cos b + sen b · cos a,

com
nπ x
a = θn e b= ,
L
que resulta em
 nπ x   nπ x   nπ x 
(12.12) sen θn + = sen θn · cos + sen · cos θn·
L L L
Substituindo (12.12) em (12.11), obtém-se
 nπ x   nπ x  q  nπ x 
an cos + bn sen 2 2
= an + bn sen + θn ·
L L L
Agora se faz
q
(12.13) An = a2n + b2n,

que permite escrever


 nπ x   nπ x   nπ x 
(12.14) an cos + bn sen = An sen + θn ·
L L L
Além disso, segue-se de (12.10) que
316 2 Séries de Fourier

! p !
an an a2n + b2n sen θn
= p = = tg θn .
bn a2n + b2n bn cos θn

Logo,
 
an an
(12.15) tg θn = ⇒ θn = arc tg ·
bn bn
Agora faça
a0
(12.16) A0 = ·
2
Por fim, basta substituir (12.14) e (12.16) na série de Fourier para escrever
∞  nπ x 
u(x) ∼ A0 + ∑ An sen + θn ,
n=1 L

onde An e θn são dados, respectivamente, por (12.13) e (12.15), isto é,


q  
an
An = a2n + b2n e θn = arc tg ·
bn

Observação 12.1: As expressões (12.1) e de (12.9) são chamadas de forma forma harmônica
da série de Fourier.. Assim, u representa tal função como soma de componentes cossenoidais
(ou senoidais) de frequências distintas.
Viu-se na primeira seção deste capítulo que os números Tn = 2L/n são os períodos para as
funções cossenos e senos da série de Fourier. Mas estes mesmos Tn também são os períodos
para as funções cossenos e senos das proposições 12.1 e 12.2, isto é,
 nπ x   nπ x 
cos − θn e sen + θn .
L L
A frequência f (não confundir com a função, que aqui é denotada por u) é definida como o
inverso do período, ou seja,
1 n
f= ⇒ fn = ·
T 2L
Já a frequência angular é definida pelos números
2nπ , 2nπ nπ
ωn = ou ainda, ωn = = ·
T 2L L
Grosso modo, a frequência angular representa uma taxa de variação de uma grandeza angular,
mas não necessariamente relacionada a uma rotação. Além disso, é possível encontrar uma
relação entre a frequência e a frequência angular:
nπ 2nπ n
ωn = = = 2π = 2π · f , ou seja, ωn = 2π · f .
L 2L 2L
2.12 Exercícios propostos 317

A componente cossenoidal, isto é, a função


 nπ x 
cos − θn = cos(ωn x − θn),
L
é chamada de n-ésimo harmônico da função periódica u.
Analogamente, também é chamado de n-ésimo harmônico da função periódica u a compo-
nente senoidal  nπ x 
sen + θn = sen (ωn x + θn ).
L
O primeiro harmônico, isto é, a função cos (π x/L − θ1), é chamado de harmônico fundamen-
tal, pois ele (isto é, a função cosseno acima com n = 1) tem o mesmo período T = 2L da
função u. Além disso, ω0 = π/L é chamada frequência angular fundamental. Analogamente
para sen (π x/L + θ1 ).
Já os coeficientes An e os ângulos θn são chamados de amplitudes harmônicas e deslocamen-
tos de fases (ou ângulos de fases), respectivamente.
Com esta linguagem, observado a série de Fourier para u periódica de período T = 2L,
∞ h  nπ x   nπ x i
a0 ,
u(x) ∼ + ∑ an cos + bn sen
2 n=1 L L

tem-se uma anologia com o caso com a teoria musical: o termo


a0
2
representa a posição neutra (isto é, sem vibrações); o termo
 πx   πx 
a1 cos + b1 sen
L L
é o harmônico fundamental (o tom fundamental); o segundo termo
   
2π x 2π x
a2 cos + b2 sen
L L
é primeiro harmônico (a oitava), e assim por diante. Deste modo, o som ouvido é uma combi-
nação (ou superposição) de vibrações harmônicas simples, isto é, os termos
 nπ x   nπ x 
an cos + bn ·
L L

O próximo resultado mostra que o valor médio quadrático de uma função periódica u(x) é
igual à soma dos valores médios quadráticos dos seus harmônicos.

Proposição 12.3: Seja u : R → R uma função seccionalmente diferenciável e periódica de


período T = 2L. Então,
318 2 Séries de Fourier

Z L
1 ∞ An 2
(12.17) 2
[ f (x)] dx = A20 + ∑ √ ,
2L −L
2
n=1

onde q
a0
A0 = e An = a2n + b2n.
2
D EMONSTRAÇÃO : Pela proposição 12.1, se
∞ h  nπ x   nπ x i
a0
u(x) ∼ + ∑ an cos + bn sen
2 n=1 L L

é a série de Fourier para a função u, então esta série também pode ser escrita na forma
∞  nπ x 
u(x) ∼ A0 + ∑ An cos − θn ,
n=1 L
q  
onde a0 bn
A0 = , 2
An = an + bn 2 e θ0 = arc tg ·
2 an

O valor da raiz da média quadrática 3 é An/ 2. Logo, o valor médio quadrático do n-ésimo

harmônico é (An/ 2)2.
Além disso, q
a0
An = a2n + b2n = 2| cn | e A0 = = | c0 |,
2
onde c0 e cn são os coeficientes complexos da série de Fourier.
Segue-se daí que
A2
(12.18) | cn |2 = n e | c0 |2 = A20 .
4
Agora usa-se a identidade de Parseval, isto é,
Z L
1 a20 ∞ 
[ f (x)] dx = + ∑ a2n + b2n ,
2
L −L 2 n=1

que multiplicada por 1/2, resulta em


Z L
1 a20 1 ∞ 2 
(12.19) [ f (x)]2 dx = + ∑ an + b2n .
2L −L 4 2 n=1

Substituindo (12.18) em (12.19), obtém-se


Z L ∞
1
[ f (x)] dx = | c0 | + 2 ∑ | cn |2
2 2
2L −L n=1


2
2 An
(12.20) = A0 + ∑ √ ·
n=1 2

3 Em inglês, root-mean-square, ou simplesmente RMS.


2.12 Exercícios propostos 319

A potência latente de uma função u : R → R periódica de período T = 2L é definida como o


valor médio quadrático
Z
1 L
[ f (x)]2 dx.
2L −L
Assim, se u(x) representa a forma de uma onda de tensão ou de corrente, então a expressão
acima representa a potência média liberada por u(x) em uma resistência de 1 Ω.
A equação (12.20) diz que o valor médio quadrático de uma função periódica u é igual à
soma dos valores médios quadráticos de seus harmônicos. Observa-se que a potência latente
(valor médio quadrático) de uma função periódica depende somente das amplitudes de seus
harmônicos e independe de suas fases.
Capítulo 3
Transformada de Fourier

3.1 Introdução

Nos capítulos anteriores mostrou-se que as séries de Fourier constituem um poderoso ins-
trumento para atacar problemas que envolvem funções periódicas. Por outro lado, em vários
problemas práticos que não envolvem funções periódicas, é desejável que o desenvolvimento
de um método de análise de Fourier inclua as funções não periódicas.

Exemplo 1.1: Seja f : R → R uma função periódica de período T = 2L definida por




 0, para − L < x < −α ,




 1, para − α < x < α ,
f (x) =

 0, para α < x < L,




 f (x + 2L) = f (x), L > α .

Agora se faz T → ∞, ou seja, L → ∞. Em particular, tomar-se-á L = 2nα , com n ∈ N. Assim,


tem-se que T, L → ∞ quando n → ∞. Além disso, tem-se que


 0, para − 2nα < x < −α ,




 1, para − α < x < α ,
f (x) =

 0, para α < x < 2nα ,




 f (x + 2nα ) = f (x).

Assim,

ϕ (x) = lim f (x)


T →∞

= lim f (x)
n→∞

321
322 3 Transformada de Fourier



 0, para − ∞ < x < −α ,


= 1, para − α < x < α ,



 0, para α < x < ∞,
(
1, se − α < x < α ,
=
0, caso contrário.
Note que, apesar de a função f ser periódica de período T , a função ϕ não é periódica. Dito
de outra maneira: quando se faz o período T tender para infinito, a função resultante pode não
ser periódica.

Figura 1.1: Gráfico com L = 2α .

Figura 1.2: Gráfico com L = 4α .

Figura 1.3: Gráfico com T → ∞.


3.1 Introdução 323

Na seção 2.10 do capítulo 2 viu-se que a forma complexa da série de Fourier é dada por

(i n π x)/L
f (x) = ∑ cn e ,
n=−∞

onde Z L
1 −(i n π x)/L
cn = f (x) e dx, n ∈ Z.
2L −L
Fazendo h = π/L, obtém-se
∞ Z L
in h x 1
f (x) = ∑ cn e e cn = f (x) e −in h x dx.
n=−∞ 2L −L

Agora faça ωn = nh, com n ∈ Z para escrever



(1.1) f (x) = ∑ cn e i ωn x ,
n=−∞
Z L
1
(1.2) cn = f (x) e − i ωn x dx.
2L −L

Por outro lado, de h = π/L, segue-se que


1 h 1 h 1 h
= ⇒ = =√ √ ,
L π 2L 2π 2π 2π
isto é,
1 h 1
(1.3) = √ ·√ ·
2L 2π 2π
O próximo passo consiste em escrever


(1.4) F(ωn ) = cn ,
h
e usar (1.3) juntamente com (1.2) para obter
√  Z 
2π 1 L −i ωn x
F(ωn ) = f (x) e dx
h 2L −L
√ Z L
2π h 1
= ·√ ·√ f (x) e −i ωn x dx,
h 2π 2π −L
isto é
Z L
1
(1.5) F(ωn ) = √ f (x) e −i ωn x dx.
2π −L

Além disso, segue de (1.4) que



2π h
F(ωn ) = cn ⇒ cn = √ F(ωn ),
h 2π
324 3 Transformada de Fourier

que substituído em (1.1) implica em


∞ ∞
h
f (x) = ∑ cn · e i ωn x = √ · F(ωn ) e i ωn x

n=−∞ n=−∞ 2π
∞ 
1 
(1.6) =√ ∑ F(ωn ) · e i ωn x · h.
2π n=−∞

Portanto, de (1.5) e (1.6) tem-se as seguintes expressões para F(ωn ) e f (x):


Z L ∞
1 1
F(ωn ) = √ f (x) e −i ωn x d x e f (x) = √ ∑ F(ωn ) e i ωn x h.
2π −L 2π n=−∞
Agora, formalmente (isto é, sem rigor), toma-se limite para L → ∞ e para h → 0 nas ex-
pressões acima. Observa-se que a série acima tem o aspecto formal de uma soma de Riemann
para a integral de F(ω ) e iωn x. Assim, obtém-se (formalmente!)
Z ∞ Z ∞
1 −i ω x 1
F(ω ) = √ f (x) e dx e f (x) = √ F(ω ) e i ω x d ω .
2π −∞ 2π −∞

A primeira expressão acima é conhecida como transformada de Fourier e a segunda ex-


pressão é a fórmula da transformada inversa de Fourier.
As condições para que as duas integrais acima existam são delicadas e não serão feitas em
detalhes neste texto. Neste capítulo abordar-se-á as questões operacionais das transformada de
Fourier e sua inversa, restringindo-se aos seus cálculos e algumas aplicações.

Recorda-se agora a definição de função seccionalmente contínua.

D EFINIÇÃO : Uma função f : R → R diz-se seccionalmente contínua se ela tiver apenas um


número finito de descontinuidade (todas de primeira espécie) em qualquer intervalo limitado.

Para que a transformada de Fourier esteja bem definida, considerando apenas as funções
Riemann integráveis, é preciso exibir uma classe de funções para as quais a integral que aparece
na transformada esteja bem definida. Tal classe de funções deve contemplar duas exigências:

(1) f : R → R deve ser seccionalmente contínua em cada intervalo [−a, b], com a, b > 0;
Z ∞
(2) | f (x)| dx < ∞.
−∞

Da definição de função seccionalmente contínua, tem-se que a condição (1) implica dizer que
a função e −iω x · f (x) (isto é, o integrando na transformada de Fourier) é limitada e integrável
em [−a, b]. Já a condição (2) exige que o limite em
Z ∞ Z b
−iω x
e · f (x) dx = lim e −iω x · f (x) dx
−∞ a,b→∞ −a

exista.
De fato, dado K > 0, pode-se escrever
3.1 Introdução 325

R = {x ∈ R | |x| ≤ K} ∪ {x ∈ R | |x| > k} .

Assim,
Z Z Z
−iω x
−iω x −iω x

e · f (x) dx = e · f (x) dx + e · f (x) dx
−∞ |x|≤K |x|>K

Z Z
−iω x
−iω x

≤ e · f (x) dx + e · f (x) dx
|x|≤K |x|>K
Z −iω x Z −iω x
≤ e · f (x) dx + e · f (x) dx
|x|≤K |x|>K
Z −iω x Z −iω x
=≤ e | f (x)| dx + e | f (x)| dx
|x|≤K |x|>K
Z Z
= | f (x)| dx + | f (x)| dx,
|x|≤K |x|>K

pois, pela fórmula de Euler,


−iω x p
e = cos2 x + sen 2 x = 1.

Como se está admitindo que f é uma função seccionalmente contínua, então a primeira in-
tegral no último membro da estimativa acima existe e é igual a um número real positivo (pois
f tem um número finito de descontinuidades, todas de primeira espécie, no intervalo fechado e
limitado −K ≤ x ≤ K, de modo que | f (x)| também).
Para que exista a integral do primeiro da estimativa, é preciso que a segunda integral do
último membro da mesma tenda para zero no infinito, isto é,
Z
| f (x)| dx → 0, para K suficientemente grande,
|x|>K

ou ainda, que dado ε > 0, exista K0 > 0 tal que


Z
| f (x)| dx < ε , ∀ K > K0.
|x|>k

Também deve ser observado, pelos passos realizados na estimativa, que a função f , além de
integrável, deve ser absolutamente integral (para que o limite exista).

Denota-se por L1(R) o espaço das funções f : R → R tais que as integrais impróprias de f e
| f | convergem. Isto significa que f e | f | sejam integráveis em cada intervalo [−a, b] e que os
limites abaixo existam:
Z b Z b
lim f (x) dx e lim | f (x) | dx.
a,b→∞ −a a,b→∞ −a

Se f : R → C, isto é, uma função definida em R com valores complexos, então ela pode ser
escrita na forma
f (x) = g(x) + ih(x),
326 3 Transformada de Fourier

onde g(x) e h(x) são funções reais representando suas partes real e imaginária, respectivamente.
Além disso, a integral de f é dada por
Z Z Z
f (x) dx = g(x) dx + i h(x) dx,
R
onde o símbolo denota, aqui, uma integral definida ou imprópria.

Diz-se que f : R → C é uma função de L1 (R, C) se as suas partes real e imaginária e | f |,


que são funções de R em R, pertencem ao espaço L1 (R) definido acima.

D EFINIÇÃO : Seja f : R → C uma função de L1 (R, C). Define-se a transformada de Fourier


de f pela expressão Z ∞
1
F [ f (x)] = F(ω ) = √ e −i ω x f (x) dx.
2π −∞
D EFINIÇÃO : Seja F : C → R uma função de L1(R, C). Define-se a transformada inversa de
Fourier de f pela expressão
Z ∞
1
F −1
[F(ω )] = f (x) = √ e i ω x F(ω ) d ω .
2π −∞

Observação 1.1: Na definição dos espaços L1 (R) e L1(R, C) pediu-se a convergência abso-
luta da integral. De fato, esta condição é suficiente. Suponha que a integral de | f | convirja, isto
é, Z ∞
| f (x) | dx < ∞.
−∞
Então, pela definição da transformada de Fourier, obtém-se

1 Z ∞ −iω x
| F(ω )| = √ e f (x) dx
2π −∞
Z ∞
1 e −iω x f (x) dx
≤√
2π −∞
Z ∞
1 e −iω x f (x) dx
=√
2π −∞
Z ∞
1 f (x) dx < ∞,
=√
2π ∞
uma vez que, pela fórmula de Euler,

e −iω x = cos(ω x) − i sen (ω x),

implica em
−iω x q
e = [cos(ω x)]2 + [− sen(ω x)]2 = 1.

Mostrar que | F(ω )| < ∞ significa dizer que a transformada é finita, ou seja, que ela existe.
Analogamente, para a transformada inversa de Fourier.
3.2 Interpretação física 327

Portanto, a condição de que a função seja absolutamente integrável é apenas suficiente para
garantir que a transformada de Fourier está bem definida. Porém esta condição não é necessária.
Uma consequência disso é a existência de funções Riemann integráveis, que não são abso-
lutamente integráveis, que possuem transformadas de Fourier (mas não necessariamente uma
inversa).

3.2 Interpretação física

Agora será feita uma breve revisão dos números complexos com intuito de apresentar inter-
pretações físicas para a função transformada de Fourier.
Um número complexo tem a forma z = a + ib, onde a, b ∈ R e i (onde i 2 = −1) é a unidade
imaginária. O número real a é chamado de parte real do número complexo z, enquanto o
número real b chamado de parte imaginária do complexo z. O conjunto de todos os números
complexos é denotado por C.
Sejam z = a+ib e w = c+id números complexos, onde a, b, c, d ∈ R e i (i 2 = −1) é a unidade
imaginária. As propriedades operatórias entre os números complexos são definidas por:

(a) Igualdade: z = w se, e somente se, a = c e b = d.


(b) Adição: z + w = (a + ib) + (c + id) = (a + c) + i(b + d).
(c) Multiplicação: z · w = (a + ib) · (c + id) = (ac − bd) + i(ad + bc).

Seja agora z = x + iy é um número complexo qualquer. p Define-se o conjugado complexo por


z = x + iy = x − iy. O módulo de z é definido por |z| = x2 + y2.
Seja z = x + iy. Um propriedade muito útil é

z · z = |z|2 ,

que é facilmente demonstrável, uma vez que


p 2
2 2
z · z = (x + iy) · (x − iy) = x + y = x2 + y2 = |z|2.

Um número complexo z = x + iy pode ser interpretado geometricamente como um par orde-


nado, isto é, z = x + iy se, e somente se, z = (x, y). Assim, o conjunto dos números complexos
C pode ser representado no plano que é conhecido de plano de Argand-Gauss.
Deste modo, se z = x + iy e observando a figura 2.1, obtém-se
x y,
cos θ = e sen θ =
|z| |z|
328 3 Transformada de Fourier

Figura 2.1: O plano de Argand-Gauss.

ou ainda,

(2.1) x = |z| · cos θ e y = |z| · sen θ .

Assim,
z = x + iy = |z| · cos θ + i · |z| · sen θ = |z| (cos θ + i · sen θ ).
A expressão
z = |z| (cos θ + i · sen θ )
é chamada de forma polar do número complexo z.
Também segue-se de (2.1) que
sen θ y y
tg θ = = ⇒ θ = arc tg ,
cos θ x x
onde θ é chamado de argumento do número complexo z.
Agora considere uma função f : R → C cuja transformada de Fourier é uma função F :
R → C, isto é, F(ω ) = F [ f (x)]. Assim sendo, a função transformada pode ser escrita na forma
F(ω ) = u(ω ) + i · v(ω ), onde

u(ω ) = Re[F(ω )] e v(ω ) = Im [F(ω )]

representam, respectivamente, as partes real e imaginária da função transformada F(ω ).


Suponha agora que a função transformada possa ser escrita na forma F(ω ) = u(ω ) + i · v(ω ).
Então o módulo |F(ω )| da função transformada é dado por
q
|F(ω )| = |u(ω ) + i · v(ω )| = [u(ω )]2 + [v(ω )]2 .

Além disso, o argumento de F(ω ) também será uma função que depende de ω , pois
 
u(ω )
Argumento[F(ω )] = arc tg = φ (ω ).
v(ω )
3.2 Interpretação física 329

Da fórmula de Euler e i·φ (ω ) = cos [φ (ω )] + i · sen [φ (ω )] segue-se que


F(ω ) = |F(ω )| · {cos [φ (ω )] + i · sen [φ (ω )]}

= |F(ω )| · e i·φ (ω ) ,
onde a última expressão é a forma polar para F(ω ).
Na forma polar de F(ω ),

(2.2) F(ω ) = |F(ω )| · e i·φ (ω ) ,

o módulo de F(ω ), q
|F(ω )| = [u(ω )]2 + [v(ω )]2 ,
é chamado de amplitude da transformada de Fourier ou de espectro de amplitudes do sinal f (x).
O argumento de F(ω ),  
u(ω ) ,
φ (ω ) = arc tg
v(ω )
é chamado ângulo de fase da transformada de Fourier ou de espectro de fases do sinal f (x).
Sejam f (x) uma função dada e F(ω ) = F [ f (x)] a sua função transformada de Fourier.
Define-se a densidade espectral de energia por

|F(ω )|2 = [u(ω )]2 + [v(ω )]2 .

Viu-se que a transformada de Fourier e transformada inversa são definidas, respectivamente,


por Z ∞ Z ∞
1 1
F(ω ) = √ e −iω x f (x) dx e f (x) = √ e iω x F(ω ) d ω .
2π −∞ 2π −∞
A natureza da representação da transformada inversa torna-se clara se a mesma for pen-
sada como uma superposição de oscilações senoidais de todas as frequências possíveis, que são
chamadas de representação espectral. Este nome é sugerido pela ótica, onde a luz é uma su-
perposição de cores (frequências). Na expressão que define a transformada inversa, a densidade
espectral F(ω ) mede a intensidade de f (x) no intervalo de frequência entre ω e ω + ∆ω (∆ω
pequeno e fixado). Afirma-se que, em conexão com vibrações, a integral
Z ∞
|F(ω )|2 d ω
−∞

pode ser interpretada como a energia total do sistema físico. Assim, a integral de |F(ω )|2 de a
até b dá a contribuição das frequências ω entre a e b à energia total.
Para tornar isto plausível, inicia-se com um sistema mecânico dando uma frequência única, a
saber, o oscilador harmônico (sistema massa-mola)

my00 + ky = 0.
330 3 Transformada de Fourier

Aqui está se denotando o tempo t por x. Multiplicando a última equação por y0 , obtém-se
my0 y00 + ky0 y = 0. Integrando esta equação em ambos os membros em relação a x, encontra-se
Z   Z
0 00 0
my (x) · y (x) + ky(x) · y (x) dx = 0 · dx = c1 .

ou ainda, Z Z
m y0 (x) · y00 (x) dx + k y(x) · y0 (x) dx = c1 ,

Fazendo U = y0 (x) na primeira integral, de modo que dU = y00 (x) dx e fazendo V = y(x) na
segunda integral, que implica em dV = y0 (x) dx, obtém-se
Z Z
U2 V2
m U dU + c2 + k V dV + c3 = c1 ⇒ m· +k· = c1 ,
2 2
mas U = y0 e V = y, de modo que
m 2 k
· y0 + · y2 = C,
2 2
onde se fez C = c1 − c2 − c3 .
Portanto,
m 2 k 2
· v + · y = E0 = constante,
2 2
onde v = y0 é a velocidade.
O primeiro termo é a energia cinética, o segundo é a energia potencial e E0 é a energia total
do sistema. A solução geral é dada por
y(x) = a1 · cos(ω0 x) + b1 · sen (ω0 x)
 
iω0 x −iω0 x 2 k
= c1 · e + c−1 · e , ω0 = ,
m
onde
a1 − i · b1 a1 + i · b1
c1 = e c−1 = c1 = ·
2 2
Fazendo
A = c1 · e iω0x e B = c−1 · e −iω0x ,
resulta que y = A + B. Por diferenciação, obtém-se

v = y0 = A0 + B0 = iω0 (A − B).

A substituição de v e y no segundo membro da equação para E0 resulta em


m 2 k 2
E0 = ·v + ·y
2 2
m k
= (iω0 )2 (A − B)2 + (A + B)2 .
2 2
Aqui, ω02 = k/m, como já foi dito. Assim, mω02 = k. Como i2 = −1, tem-se
3.3 Propriedades básicas 331

k 
E0 = −(A − B)2 + (A + B)2
2
= 2kAB

= 2kc1 · e iω0x · c−1 · e −iω0x

= 2 · k · c1 · c−1

= 2k · |c1|2.
Portanto, a energia é proporcional ao quadrado da amplitude |c1 |.
Como próximo passo, se um sistema mais complicado conduz à soluções periódicas y = f (x)
que pode ser representada por uma série de Fourier, então ao invés de um termo único de energia
|c1 |2, obtém-se uma série de quadrados |cn |2 dos coeficientes de Fourier cn. Neste caso, tem-se
um “espectro discreto” consistindo de frequências enumeráveis, com o correspondente |cn|2
sendo as contribuições para a energia total.
Finalmente, um sistema cuja solução pode ser representado pela integral da transformada in-
versa de Fourier conduz a integral acima para a energia, como é plausível dos caos já discutidos.

Daqui por diante objetiva-se seguir, grosso modo, os procedimentos adotados para a trans-
formada de Laplace, ou seja, deseja-se deduzir fórmulas para a transformada de Fourier para
algumas funções, assumindo-se que o procedimento inverso produz a transformada inversa de
Fourier. Com isso, será possível construir uma tabela com fórmulas que deverão ser usadas para
resolver vários exercícios.

3.3 Propriedades básicas

Nesta seção serão apresentadas as propriedades básicas sobre as transformadas de Fourier.

Proposição 3.1: Seja f : R → R uma função de L1(R). Então, as partes real e imaginária de
F(ω ) são dadas por
Z ∞ Z ∞
1 1
(3.1) u(ω ) = √ f (x) cos(ω x) dx e v(ω ) = − √ f (x) sen (ω x) dx.
2π −∞ 2π −∞

Além disso, as funções u(ω ) e v(ω ) são, respectivamente, funções par e ímpar de ω . Tem-se
também que
F(−ω ) = F(ω ),
onde a barra indica a conjugação complexa.
332 3 Transformada de Fourier

D EMONSTRAÇÃO : Observe-se inicialmente que, por hipótese, a função f é real, isto é, não
tem parte imaginária. Agora aplica-se a identidade de Euler, tem-se

e −iω x = cos(ω x) − i sen (ω x).

Aplicando a definição de transformada de Fourier e lembrando que f é real, obtém-se

Z ∞
1
F(ω ) = √ f (x) e −iω x dx
2π −∞
Z ∞
1  
=√ f (x) cos(ω x) − i sen (ω x) dx
2π −∞
Z ∞ Z
1 1 ∞
=√ f (x) cos(ω x) dx − i √ f (x) sen (ω x) dx
2π −∞ 2π ∞
Z ∞  Z ∞ 
1 1
(3.2) =√ f (x) cos(ω x) dx + i − √ f (x) sen (ω x) dx .
2π −∞ 2π ∞
Se F(ω ) = u(ω ) + i v(ω ) e se F(ω ) também é dada por (3.2), então, igualando-se as partes
real e imaginária de cada expressão, obtém-se
Z ∞ Z ∞
1 1
u(ω ) = √ f (x) cos(ω x) dx e v(ω ) = − √ f (x) sen (ω x) dx,
2π −∞ 2π −∞

que é (3.1).
Para mostrar a segunda parte, deve-se observar inicialmente que, por ser f uma função real,
Z ∞ Z ∞
1 1
u(−ω ) = √ f (x) cos(−ω x) dx = √ f (x) cos(ω x) dx = u(ω ),
2π −∞ 2π −∞
Z ∞ Z ∞
1 1
v(−ω ) = − √ f (x) sen (−ω x) dx = √ f (x) sen (ω x) dx = −v(ω ),
2π −∞ 2π −∞

onde usou-se a paridade da função cosseno e a imparidade da função seno nos passos acima.
Isto mostra que u é uma função par e que v é uma função ímpar da variável ω .
Por fim, de F(ω ) = u(ω ) + i v(ω ), da paridade de u e da imparidade de v, segue-se que
F(−ω ) = u(−ω ) + i v(−ω )

= u(ω ) − i v(ω )

= u(ω ) + i v(ω )

= F(ω ),
mostrando que a inversão do sinal de ω sob F equivale a conjugação complexa da função F.
3.3 Propriedades básicas 333

Corolário 3.1: A condição F(−ω ) = F(ω ) é uma condição necessária e suficiente para que
f seja uma função real.
D EMONSTRAÇÃO : Suponha que f (x) é uma função real. Então, mostrou-se na proposição
3.1 que F(−ω ) = F(ω ). Resta, portanto, demonstrar a recíproca, isto é, que a condição
F(−ω ) = F(ω ) implica em ser f uma função real.
Faça
f (x) = g(x) + i h(x) e F(ω ) = u(ω ) + i v(ω ).
Usando a definição da transformada inversa de Fourier para a função f acima, bem como a
fórmula de Euler, obtém-se
Z ∞
1
f (x) = √ F(ω ) e iω x dx
2π −∞
Z ∞
1  
=√ u(ω ) + i v(ω ) cos(ω x) + i sen (ω x) d ω
2π −∞
Z ∞h
1
=√ u(ω ) · cos(ω x) + iu(ω ) · sen (ω x) +
2π −∞
i
+ iv(ω ) · cos(ω x) − v(ω ) · sen (ω x) dx
Z ∞ Z ∞
1 1
=√ u(ω ) · cos(ω x) d ω + i √ u(ω ) · sen (ω x) d ω
2π −∞ 2π −∞
Z ∞ Z
1 1 ∞
+i √ v(ω ) · cos(ω x) d ω − √ v(ω ) · sen (ω x) d ω
2π −∞ 2π −∞
Z ∞
1  
=√ u(ω ) · cos(ω x) − v(ω ) · sen (ω x) d ω +
2π −∞
Z ∞
1 
(3.3) +i √ u(ω ) · sen (ω x) + v(ω ) · cos(ω x) d ω .
2π −∞

Como as expressões f (x) = g(x) + ih(x) e (3.3) representam a mesma função f (x), segue-se
que seus segundos membros são iguais, de modo que
Z ∞
1 
(3.4) g(x) = √ u(ω ) · cos(ω x) − v(ω ) · sen (ω x) d ω
2π −∞
e
Z ∞
1 
(3.5) h(x) = √ u(ω ) · sen (ω x) + v(ω ) · cos(ω x) d ω .
2π −∞

Mas, por hipótese, F(−ω ) = F(ω ), isto é,

u(−ω ) + i v(−ω ) = u(ω ) − i v(ω ),

donde se conclui que


334 3 Transformada de Fourier

u(−ω ) = u(ω ) e v(−ω ) = −v(ω ),

isto é, u(ω ) e v(ω ) são, respectivamente, funções par e ímpar na variável ω .


Portanto o produto u(ω ) · sen (ω x) é ímpar (u é par e seno é ímpar em ω ). Analogamente, o
produto v(ω ) · cos(ω x) também é ímpar (v é ímpar e cosseno é par em ω ). Assim, o integrando
em (3.5),
u(ω ) · sen (ω x) + v(ω ) · cos(ω x),
é soma de duas funções ímpares, logo é uma função ímpar. Segue-se daí que a integral em (3.5)
é nula, que implica em h(x) = 0. Isto mostra que f (x) é uma função real.

Corolário 3.2: Sejam f : R → R uma função de L1(R) e F(ω ) = F [ f (x)] a sua transformada
de Fourier. Então, o espectro de amplitudes | F(ω )| é uma função par de ω e o espectro de fases
φ (ω ) é uma função ímpar de ω .
D EMONSTRAÇÃO : Por hipótese, f é uma função real (isto é, não tem parte imaginária).
Logo, pela proposição 3.1, tem-se que F(−ω ) = F(ω ).
Por (2.2), a função F(ω ) pode ser escrita na forma

F(ω ) = u(ω ) + i v(ω ) = | F(ω )| e i φ (ω ) .

Segue-se daí que

(3.6) F(−ω ) = | F(−ω )| e i φ (−ω ).

Também por (2.2), segue-se que

F(ω ) = | F(ω )| e i φ (ω )

= | F(ω )| e i φ (ω )

(3.7) = | F(ω )| e −i φ (ω ) .

Como F(−ω ) = F(ω ), então os segundos membros em (3.6) e (3.7) devem-ser iguais, ou
seja,
| F(−ω )| e i φ (−ω ) = | F(ω )| e −i φ (ω ) .
Portanto,
| F(−ω )| = | F(ω )| e φ (−ω ) = −φ (ω ).
Isto mostra que os espectros de amplitudes e de fases são, respectivamente, funções pares e
ímpares de ω .
3.3 Propriedades básicas 335

Proposição 3.2: Sejam f : R → C uma função de L1(R, C) e F(ω ) a sua transformada de


Fourier. Tem-se:
(a) A transformada de Fourier F(ω ) será uma função real se, e somente se, f (x) for uma
função par;
(b) A transformada de Fourier F(ω ) será um imaginário puro se, e somente se, f (x) for uma
função ímpar.
D EMONSTRAÇÃO : Escreva F(ω ) = u(ω ) + i v(ω ). Pela proposição 3.1, tem-se

Z ∞ Z ∞
1 1
u(ω ) = √ f (x) cos(ω x) d ω e v(ω ) = − √ f (x) sen (ω x) dx.
2π −∞ 2π −∞

Parte (a): Suponha que a transformada de Fourier F(ω ) é real. Então, F(ω ) = u(ω ) e v(ω ) =
0. Como v(ω ) = 0, tem-se que o integrando, f (x) sen (ω x), para a integral que define v(ω ) deve
ser uma função ímpar em relação a variável x para que a integral se anule. Como sen (ω x) é uma
função ímpar na variável x, para que o integrando seja ímpar é necessário que f (x) seja uma
função par (“o produto de uma função par por outra ímpar é uma função ímpar”). Isto mostra
que f (x) é par.
Reciprocamente, suponha que f (x) seja uma função par. Por ser sen (ω x) uma função ímpar
na variável x, segue-se que o produto f (x) sen (ω x) é ímpar (na variável x). Logo, a integral
Z ∞
f (x) sen (ω x) dx = 0,
−∞

mostrando que v(ω ) = 0, de modo que F(ω ) = u(ω ), isto é, que F(ω ) é uma função real.
Parte (b): Suponha que a transformada de Fourier F(ω ) é um imaginário puro. Então, F(ω ) =
i v(ω ) e u(ω ) = 0. Como u(ω ) = 0, tem-se que o integrando, f (x) cos(ω x), para a integral que
define u(ω ) deve ser uma função ímpar em relação a variável x para que a integral se anule.
Como cos(ω x) é uma função par na variável x, para que o integrando seja ímpar é necessário
que f (x) seja uma função ímpar (“o produto de uma função ímpar por outra par é uma função
ímpar”). Isto mostra que f (x) é ímpar.
Reciprocamente, suponha que f (x) seja uma função ímpar. Por ser cos(ω x) uma função par
na variável x, segue-se que o produto f (x) cos(ω x) é ímpar (na variável x). Logo, a integral
Z ∞
f (x) cos(ω x) dx = 0,
−∞

mostrando que u(ω ) = 0, de modo que F(ω ) = i v(ω ), isto é, que F(ω ) é um imaginário puro.

Observação 3.1: Segue-se da proposição 3.2 que, se f (x) é uma função real e

F [ f (x)] = F(ω ) = u(ω ) + i v(ω ),


336 3 Transformada de Fourier

então
F [ f p(x)] = u(ω ) e F [ fi (x)] = i v(ω ).
onde f (x) = f p (x) + fi (x), sendo f p (x) e fi (x), respectivamente, as partes par e ímpar de f (x).

Proposição 3.3: Seja f : R → C uma função de L1 (R) cuja transformada de Fourier é


Z ∞
1
F(ω ) = √ e −iω x · f (x) dx.
2π −∞

Então,
lim F(ω ) = 0.
|ω |→∞

D EMONSTRAÇÃO : Tome ε > 0 e um intervalo [−K, K] tal que


Z √

| f (x)| dx > · ε.
|x|>K 2
Agora usa-se o teorema de Riemann-Lebesgue (veja a seção B.2 do adendo B para mais
detalhes), cujo enunciado é: se f : [a, b] → R é uma função de L1([a, b]), onde o intervalo [a, b]
é fechado e limitado, então Z b
lim f (x) · sen (ω x) dx = 0
ω →∞ a
e Z b
lim f (x) · cos(ω x) dx = 0.
ω →∞ a
Além disso, tem-se da fórmula de Euler que

e iθ = cos θ + i sen θ ⇒ e −iθ = cos θ − i sen θ .

Assim, fazendo θ = ω x, obtém-se


Z K Z K
−iω x
e · f (x) dx = [ cos(ω x) − i sen (ω x)] · f (x) dx
−K −K
Z K Z K
= f (x) · cos(ω x) dx − i f (x) · sen (ω x) dx.
−K −K

Pelo teorema de Riemann-Lebesgue, as duas integrais no último membro acima têm limite
para |ω | → ∞ e têm limite igual a 0, de modo que, pela igualdade, a integral do primeiro membro
também tem limite para |ω | → ∞. Logo,
Z K Z K Z K
lim e −iω x · f (x) dx = lim f (x) · cos(ω x) dx − i · lim f (x) · sen (ω x) dx = 0.
|x|→∞ −K |ω |→∞ −K |ω |→∞ −K

A expressão obtida, Z K
lim e −iω x · f (x) dx = 0,
|ω |→∞ −K
3.3 Propriedades básicas 337

significa dizer que, dado ε > 0, existe ω0 > 0 tal que, para todo |ω | ≥ ω0 , se tem
Z √
K −iω x
e · f (x) dx < 2π · ε .
−K 2
Porttanto, para |ω | > ω0 , tem-se

1 Z ∞ −iω x
|F(ω )| = √ e · f (x) dx
2π −∞

1 Z K −iω x 1
Z
−iω x


= √ e · f (x) dx + √ e · f (x) dx
2π −K 2π |x|>k
Z
1 K
−iω x
1 Z −iω x


= √ e
· f (x) dx + √ e · f (x) dx
2π −K 2π |x|>k
Z Z
1 K −iω x
1 −iω x
e

dx
≤ √ e · f (x) dx + √ · f (x)
2π −K 2π |x|>K
Z Z
1 K −iω x
1 −iω x
e | f (x)| dx
=√ e · f (x) dx + √
2π −K 2π |x|>K
Z Z
1 K −iω x
1
=√ e · f (x) dx + √ | f (x)| dx
2π −K 2π |x|>K
√ √ !
1 2π 2π ε ε
<√ ·ε + · ε = + = ε.
2π 2 2 2 2

Exemplo 3.1: Encontre a transformada de Fourier para a função f : R → R definida por



 1, se − α < x < α ,
f (x) =

0, caso contrário.

S OLUÇÃO : O gráfico da função f (x) encontra-se na figura 3.1.


Usar-se-á a definição de transformada de Fourier para determinar F(ω ). Para ω 6= 0, tem-se:
Z ∞
1
F(ω ) = √ f (x) e −iω x dx
2π −∞
Z −α Z α
1 1
=√ f (x) e −iω x dx + √ f (x) e −iω x dx +
2π −∞ 2π −α
Z ∞
1
+√ f (x) e −iω x dx
2π α
338 3 Transformada de Fourier

Figura 3.1: Gráfico da função f (x).

Z α α
1 −iω x 1 −iω x

=√ e dx = − √ e
2π −α i ω 2π −α

1  −iαω 
=− √ e − e iαω
i ω 2π
1  iαω 
(3.8) = √ e − e −iαω .
i ω 2π
Das fórmulas de Euler,

e i θ = cos θ + i sen θ e e −i θ = cos θ − i sen θ ,

segue-se facilmente que


e θ − e −θ
sen θ = ·
2i
Fazendo θ = αω , obtém-se

2i · sen (αω ) = e iαω − e −iαω

que substituído em (3.8) resulta em


1  
F(ω ) = √ e iαω − e −iαω
i ω 2π
1
= √ [2i sen (αω )]
i ω 2π
1 2
= √ · · sen (αω )
2π ω
 
2 sen (αω )
=√ · ·
2π ω
Agora deve-se calcular a transformada para o caso ω = 0. Tem-se:
Z ∞
1
F(0) = √ e i.0.x f (x) dx
2π −∞
3.3 Propriedades básicas 339

Z −α Z Z
1 1 α 1 ∞
=√ f (x) dx + √ f (x) dx + √ f (x) dx
2π −∞ 2π −α 2π α
Z α α
1 1 1
=√ dx = √ · x = √ [α − (−α )]
2π −α 2π −α 2π

=√ ·

Portanto, mostrou-se que
  
"( # 
 2 sen (αω )
 √ 2π ·
 , se ω 6= 0,
1, se | x | ≤ α ω
F(ω ) = F =
0, se | x | > α , 
 2α
√ ,
 se ω = 0.

Figura 3.2: Gráfico da função |F(ω )| com α = 1.

Observação 3.2: O leitor deve estar se perguntando se é verdade que


  √ (
sen (αω ) 2 π 1, se | x | ≤ α
f (x) = F −1 = ·
ω 2 0, se | x | > α .

Esse assunto merece cuidado e atenção, uma vez que a função F(ω ) = sen(αω )/ω , com ω 6= 0,
não é absolutamente integrável, como mostra o apêndice a este capítulo, de modo que F 6∈
L1(R). Por outro lado, já foi dito que a integrabilidade absoluta é uma condição suficiente, mas
não necessária. Ao longo deste capítulo este assunto voltará a aparecer outras vezes.

Recorde-se que a função de Heaviside é definida por


340 3 Transformada de Fourier

(
1, para x ≥ c,
uc(x) =
0, caso contrário.

Observe que decorre da definição da função de Heaviside que

uc (x) = u0(x − c) e uc (−x) = u−c (x).

Exemplo 3.2: Sejam α > 0 e f : R → R uma função definida por


(
e −α x, se x ≥ 0,
f (x) = e −α x · u0 (x) =
0, se x < 0,

onde α > 0.
Mostre que
  1 1
F(ω ) = F e −α x · u0 (x) = √ ·
2π α + i ω
e  
1 √
f (x) = F −1
= 2π · e −α x · u0 (x).
α + iω

S OLUÇÃO : A figura 3.3 exibe o gráfico da função f (x) quando α = 1.

Figura 3.3: Gráfico da função f (x) com α = 1.

Usando a definição de transformada de Fourier, obtém-se


Z ∞
1
F [ f (x)] = √ e −iω x f (x) dx
2π −∞
Z 0 Z ∞
1 −iω x 1
=√ e f (x) dx + √ e −iω x f (x) dx
2π −∞ 2π 0
Z 0 Z ∞
1 1
=√ e −iω x · 0 dx + √ e −iω x · e −ax dx
2π −∞ 2π 0
Z ∞ Z T
1 −(α +iω )x 1
=√ e dx = √ · lim e −(α +iω )x dx
2π 0 2π T →∞ 0
3.3 Propriedades básicas 341

1 1 h i T
−(α +iω )x
= −√ · · lim e
2π α + i ω T →∞ 0
1 1 h i
−( α +iω )T −( α +iω ).0
= −√ · · lim e −e
2π α + i ω T →∞
1 1  
= −√ · · lim e −iω T · e −α T − 1
2π α + iω T →∞
1 1
=√ · ·
2π α + i ω
Observe que usou-se o fato que

lim e −iω T · e −α T = 0.
T →∞

Isto se justifica, pois a função e −iω T é limitada, uma vez que


−iω T q
e = |cos(ω T ) − i sen (ω T )| = [cos(ω T )]2 + [− sen(ω T )]2 = 1.

Além disso, lim e −α T = 0, pois α > 0 por hipótese. Agora aplica-se o teorema que afirma
T →∞
que o limite do produto de duas funções, onde uma é limitada e a outra tende para zero com o
limite, é igual a zero.
Portanto, mostrou-se que
  1 1 ,
F(ω ) = F e −α x · u0 (x) = √ ·
2π α + i ω
ou equivalentemente,
 
1 √
f (x) = F −1
= 2π · e −α x · u0 (x).
α + iω

Exemplo 3.3: Sejam α > 0 e χ[0, α ] : R → R a função característica que é definida por
(
1, se 0 < x < α ,
χ[0, α ] (x) =
0, caso contrário.

Mostre que


 1 1 − e −iαω ,
 √
  2π · para ω 6= 0,

F χ[0, α ] (x) =
 α
√ ,
 para ω = 0,

e  
−1 1 − e −iαω √
F = 2π · χ[0, α ] (x), (ω 6= 0).

342 3 Transformada de Fourier

S OLUÇÃO : O gráfico da função f (x) = χ[0,α ] (x) se encontra na figura 3.4.

Figura 3.4: Gráfico da função f (x).

Para calcular a transformada de Fourier para χ[0, α ] deve-se dividir em dois casos: ω 6= 0 e
ω = 0. Para ω 6= 0, tem-se
Z ∞
  1
F χ[0, α ] (x) = √ e −iω x χ[0, α ] (x) dx
2π −∞
Z 0 Z α
1 −iω x 1
=√ e χ[0, α ] (x) dx + √ e −iω x χ[0, α ] (x) dx +
2π −∞ 2π 0
Z ∞
1
+√ e −iω x χ[0, α ] (x) dx
2π α
Z α   α
1 −iω x 1 1
−iω x
=√ e dx = √ − e
2π 0 2π iω 0

1 1 
= −√ · e −iαω − 1
2π i ω
1 1 − e −iαω
=√ · ·
2π iω
Para ω = 0, tem-se que
Z ∞
  1
F χ[0, α ] (0) = √ e −i.0.x χ[0, α ] (x) dx
2π −∞
Z 0 Z α Z ∞
1 1 1
=√ χ[0, α ] (x) dx + √ χ[0,a] (x) dx + √ χ[0, α ] (x) dx
2π −∞ 2π 0 2π α
Z α
1 1 α
=√ dx = √ x
2π 0 2π 0
α
=√ ·

Portanto, a transformada de Fourier para χ[0, α ] é dada por
3.3 Propriedades básicas 343



 1 1 − e −iαω ,
   √ · para ω 6= 0,
2 π iω
F χ[0, α ] (x) =
 α
√ ,
 para ω = 0,

ou, equivalentemente,
 
−1 1 − e −iαω √
F = 2π · χ[0, α ] (x), (ω 6= 0).

Exemplo 3.4: Considere a seguinte função:



 1 − | x |,
 se | x | ≤ α ,
f (x) = α

 0, se | x | > α .

Figura 3.5: Gráfico da função f (x) com α = 1.

Observe que está função tem suporte compacto, mas não pertence ao espaço C∞(R) (apesar
de ser contínua em x = 0, nesse ponto não existe derivada).
Agora, calcula-se (formalmente) sua transformada de Fourier. Para ω 6= 0, tem-se:
Z ∞
1
F(ω ) = √ e −i ω x f (x) dx
2π −∞
Z α Z
1 1
=√ e −i ω x f (x) dx + √ e −i ω x f (x) dx
2π −α 2π |x|>α
Z α   Z
1 −i ω x |x| 1
=√ e 1− dx + √ e −i ω x . 0 dx
2π −α α 2π |x |>α
Z α  
1 |x|
=√ e −i ω x 1 − dx
2π −α α
Z α Z α
1 −i ω x 1 1
=√ e dx − √ · e −i ω x | x | dx
2π −α 2π α −α
344 3 Transformada de Fourier

Z α 0 Z Z
1 −i ω x 1 1 α
=√ e dx − √ e −i ω x (−x)| dx − √ e −i ω x x dx
2π −α α 2π −α α 2π 0
  α   0
1 1 −i ω x 1 x −i ω x 1 −i ω x
=√ − e + √ − e + 2e −
2π iω α 2 π iω ω
−α −α
  α
1 x 1
− √ − e −i ω x + 2 e −i ω x
α 2π iω ω
0
 
1 1 iα ω −i α ω
 1 1 α iα ω 1 iα ω
=√ · e −e + √ − e − 2e −
2π i ω α 2π ω 2 i ω ω
 
1 α −i α ω 1 −i α ω 1
− √ − e + 2e − 2
α 2π iω ω ω
1 1  1 1 
=√ · e i α ω − e −i α ω − √ · e i α ω − e −i α ω +
2π i ω 2π i ω
1 1 iα ω −i α ω

+ √ · 2 − e − e
2π α ω 2
1 1 iα ω −i α ω

=√ · 2 − e − e ,
2π α ω 2
onde usou-se a técnica de integração por partes em uma das etapas acima.
Mas, como observado anteriormente,

e i α ω + e −i α ω = 2 cos (α ω ).

Assim,  
1 1 2 (1 − cos αω )
F(ω ) = √ (2 − 2 cos( α ω )) = √ ·
2π α ω 2 α 2π ω 2
Agora calcula-se a transformada de Fourier para f quando ω = 0. Tem-se:
Z ∞ Z α  
1 −i.0.x 1 |x|
F(0) = √ e f (x) dx = √ 1− dx
2π −∞ 2π −α α
Z α Z 
1 1 α
=√ dx − | x | dx
2π −α α −α
 α Z Z 
1
1 0 1 α
=√ x − −x dx − x dx
2π −α α −α α 0
 α Z 0 Z α 
1 1 1
=√ x + x dx − x dx
2π −α α −α α 0
!
1 x2 0 x2 α 1  α α α
=√ 2α + − = √ 2 α − − =√ ·
2π 2α −α 2α 0 2π 2 2 2π

Portanto, apesar de a função


3.4 Propriedades mais gerais 345


 1 − | x |,

se | x | < α ,
f (x) = α

 0, se | x | ≥ α .

ter suporte compacto (o intervalo [−α , α ]), a função transformada de Fourier para f ,

 2 1 − cos (α ω ) ,
 √ ·
 para ω 6= 0,
α 2π ω2
F(ω ) =

 α
√ , para ω = 0,

não tem suporte compacto.

Figura 3.6: Gráfico da função |F(ω )| com α = 1.

3.4 Propriedades mais gerais

Proposição 4.1 (linearidade): Sejam f1 , f2 : R → C funções de L1 (R, C) e α e β escalares


quaisquer. Então,

F [α f1 (x) + β f2 (x)] = α F [ f1 (x)] + β F [ f2 (x)], para ω ∈ R.

D EMONSTRAÇÃO : Basta usar a definição de transformada de Fourier e a linearidade da inte-


gral. De fato,
Z ∞
  1  
F α f1 (x) + β f2 (x) = √ e −iω x α f1 (x) + β f2 (x) dx
2π −∞
346 3 Transformada de Fourier

∞Z Z ∞
α β
=√ e −iω x f1 (x) dx + √ e −iω x f2 (x) dx
2π −∞ 2π −∞
   
= α F f1 (x) + β F f2 (x) .

Proposição 4.2 (escalonamento): Sejam α 6= 0 e f ∈ L1(R, C). Se F(ω ) = F [ f (x)], então,


1 ω 
F [ f (α t)] = ·F , ∀ ω ∈ R.
|α | α
D EMONSTRAÇÃO : A demonstração será feita em dois casos: α > 0 e α < 0.

C ASO 1: α > 0 Tem-se:


Z ∞ Z ∞
1 1
e −i ω x f (α x) dx =
(−i ω u)/α
F [ f (α x)] = √ √ e f (u) du
2π −∞ α 2π −∞
Z ∞ ω 
1 1 −i( ω 1 ,
= ·√ e α )u f (u) du = · F
α 2π −∞ α α
onde se fez a mudança de variáveis u = α x nas integrais acima.

C ASO 2: α < 0. Tem-se:


Z ∞ Z −∞
1 −i ω x 1 (−i ω u)/α
F [ f (α x)] = √ e f (α x) dx = √ e f (u) du
2π −∞ α 2π ∞
Z Z ∞
1 ∞ 1 1 ω
e −i( α )u f (u) du
(−i ω u)/α
=− √ e f (u) du = − · √
α 2π −∞ α 2π −∞

1  
ω ,
= − ·F
α α
onde também se fez a mudança de variáveis u = α x nas integrais acima.
Portanto, considerando-se os dois casos, tem-se que
1 ω 
F [ f (α x)] = ·F , ∀ ω ∈ R.
| α| α

Observação 4.1: A função f (α x) representa a função f (x) reduzida (respectivamente, am-


pliada) na escala dos tempos por um fator α . Analogamente, a função F (ω/α ) representa a
função ampliada (respectivamente, reduzida) na escala de frequências pelo mesmo fator α . As-
sim, a propriedade de escalonamento afirma que a redução no domínio do tempo é equivalente
3.4 Propriedades mais gerais 347

a ampliação no domínio da frequência e vice-versa. A propriedade do escalonamento também


é conhecida como propriedade de dilatação.

Corolário 4.1: Seja f ∈ L1 (R, C). Se F [ f (x)] = F(ω ) denota a transformada de Fourier para
f , então
F [ f (−x)] = F(−ω ).
D EMONSTRAÇÃO : Faça α = −1 na proposição 4.2. Assim,
 
1 ω
F [ f (−x)] = F = F(−ω ).
| − 1| −1
Observa-se que também é possível demonstrar este resultado usando a definição de transfor-
mada de Fourier.

Exemplo 4.1: Considere a função f : R → R definida por


(
e α x, se x < 0,
f (x) =
0, se x ≥ 0,

onde α > 0.
Mostre que
"( #
e α x, se x < 0, 1 1 ,
F(ω ) = F =√ ·
0, se x ≥ 0, 2π α − i ω
e (
 
1 √ e α x, se x < 0,
f (x) = F −1 = 2π ·
α − iω 0, se x ≥ 0,

S OLUÇÃO : Considere a função de Heaviside uc : R → R dada por


(
1, se x > c,
uc(x) =
0, caso contrário.

Note-se que f pode ser escrita na forma f (x) = e α x u0 (−x). Agora defina g : R → R por
g(x) = e −α x u0(x), onde u0 é a função de Heaviside com c = 0. Segue-se daí que f (x) = g(−x).
Pelo corolário 4.1, tem-se que F [g(−x)] = G(−ω ), onde G = F [g]. Além disso, pelo exemplo
3.2, tem-se que
1 1
G(ω ) = √ · ·
2π α + i ω
Portanto,
348 3 Transformada de Fourier

F [ f (x)] = F [g(−x)] = (cor. 4.1)

= G(−ω ) = (ex. 3.2)


1 1
=√ ·
2π α + i(−ω )
1 1 ,
=√ ·
2π α − i ω
que é a transformada de Fourier para f .
Mostrou-se, portanto, que
"( #
e α x, se x < 0, 1 1 ,
F(ω ) = F =√ ·
0, se x ≥ 0, 2π α − i ω

ou, equivalentemente,
  (
−1 1 √ e α x, se x < 0,
f (x) = F = 2π ·
α − iω 0, se x ≥ 0,

Exemplo 4.2: Considere a função f : R → R dada por


(
1, se − α < x < 0,
f (x) =
0, caso contrário,

onde α > 0.
Mostre que

"( # 
 1 e iαω − 1 ,
√ · para ω 6= 0,
1, se − α < x < 0, 2π iω
F(ω ) = F =
0, caso contrário,  α
√ ,
 para ω = 0,

e (
 
e iαω − 1 1, se − α < x < 0,
f (x) = F −1 =
iω 0, caso contrário,
para ω 6= 0 e α > 0.

S OLUÇÃO : Observe que f pode ser reescrita na forma f (x) = χ[−α ,0] . Deste modo, tem-se

f (x) = χ[−α ,0] (x) = χ[0,α ] (−x).

Para determinar a transformada de Fourier para f , basta usar o corolário 4.1 e o exemplo 3.3,
que mostram que
3.4 Propriedades mais gerais 349



 1 1 − e −iαω ,
   √ · para ω 6= 0,
2 π iω
F χ[0, α ] (x) =
 α
√ ,
 para ω = 0.

Tem-se:    
F(ω ) = F f (x) = F χ[−α ,0] (x) = (cor. 4.1)

= F [χ ](−ω ) = (ex. 3.3)




 1 1 − e −iα (−ω ) ,
 √ · para ω 6= 0,
2π i(−ω )
=

 α
√ , para ω = 0,



 1 1 − e iαω ,
−√ · para ω 6= 0,
2 π iω
=
 α
√ ,
 para ω = 0,



 1 e iαω − 1 ,
 √ · para ω 6= 0,
2π iω
=
 α
√ ,
 para ω = 0,

ou equivalentemente,
  (
e iαω − 1 1, se − α < x < 0,
f (x) = F −1 =
iω 0, caso contrário,

para ω 6= 0 e α > 0.

Exemplo 4.3: Considere a função característica χ[−α , α ] : R → R dada por


(
1, se − α < x < α ,
χ[−α , α ] (x) =
0, caso contrário,

onde α > 0.
Mostre que 
 2 sen (αω ) ,

 √ · se ω 6= 0,
  2π ω
F χ[−α , α ] (x) =

 2α
√ , se ω = 0.

S OLUÇÃO : Observe inicialmente que a função dada pode ser escrita na seguinte forma:
350 3 Transformada de Fourier

χ[−α , α ] (x) = χ[−α ,0] (x) + χ[0, α ] (x).

Assim, pela linearidade da transformada, basta somar as transformadas de Fourier das duas
funções do primeiro membro e que já foram determinadas nos exemplos 3.3 e 4.2, isto é,


 1 1 − e −iαω ,
 √
  2π · se ω 6= 0,

F χ[0, α ] (x) =
 α
√ ,
 se ω = 0,

e 

 1 e iαω − 1 ,
   √ · se ω 6= 0,
2 π iω
F χ[−α ,0] (x) =
 α
√ ,
 se ω = 0.

Além disso, será necessário usar a fórmula de Euler, do seguinte modo
(
e iαω = cos(aω ) + i sen (aω ), e iαω − e −iαω
⇒ sen (αω ) = ·
e −iαω = cos(aω ) − i sen (aω ), 2i

Agora é possível determinar a transformada de Fourier para a função dada. Para ω 6= 0, tem-
se    
F χ[−α , α ] (x) = F χ[−α ,0] (x) + χ[0, α ] (x)
   
= F χ[−α ,0] (x) + F χ[0, α ] (x) = (ex. 3.2 e 4.2)

1 e iαω − 1 1 1 − e −iαω
=√ · +√ ·
2π iω 2π iω
 iαω 
1 e − e −iαω
=√
2π iω
 iαω 
1 2 e − e −iαω
=√ ·
2π ω 2i
2 sen (αω )
=√ · ·
2π ω
Agora calcula-se a transformada para ω = 0. Tem-se:
   
F χ[−α , α ] (x) = F χ[−α ,0] (x) + χ[0, α ] (x)
   
= F χ[−α ,0] (x) + F χ[0, α ] (x) = (ex. 3.2 e 4.2)
α α 2α
= √ +√ =√ ·
2π 2π 2π
Portanto, a transformada de Fourier para a função dada no enunciado do exemplo é dada por
3.4 Propriedades mais gerais 351


 2 sen (αω ) ,
√ · se ω 6= 0,
   2π ω
F χ[−α , α ] (x) =
 √2α ,

 se ω = 0.

Observe que este exemplo está em concordância com a resposta do exemplo 3.1.

Exemplo 4.4: Considere a função f : R → R definida por f (x) = e −α |x | , com α > 0. Mostre
que
  2 α
F(ω ) = F e −α |x | = √ · 2
2π ω + α 2
e   √
α 2π −α |x |
f (x) = F −1 2 2
= ·e .
ω +α 2

S OLUÇÃO : O gráfico de f (x) = e −α |x| encontra-se na figura 4.1.

Figura 4.1: Gráfico da função f (x) com α = 1.

Observe, primeiro, que f pode ser reescrita na forma

(4.1) f (x) = e α x · u0(−x) + e −α x · u0 (x),

onde u0 (x) é a função de Heaviside com c = 0.


Pelo exemplo 4.1, tem-se que
  1 1
(4.2) F e α xu0 (−x) = √ · ·
2π α − i ω
Pelo exemplo 3.2, tem-se que
  1 1
(4.3) F e −α xu0 (x) = √ · ·
2π α + i ω
Aplicando a linearidade da transformada (proposição 4.1) em f dada em (4.1) e usando (4.2)
e (4.3), obtém-se
352 3 Transformada de Fourier

   
F(ω ) = F f (x) = F e α x · u0(−x) + e −α x · u0 (x)
 
= F [ e α xu0(−x)] + F e −α x · u0 (x)
   
1 1 1 1
= √ · + √ ·
2π α − i ω 2π α + i ω
 
1 1 1
=√ +
2π α − i ω α + i ω
 
1 (α + iω ) + (α − iω )
=√
2π (α − iω )(α + iω
2 α ,
=√ · 2
2π ω + α 2

Figura 4.2: Gráfico da função |F(ω )| com α = 1.

Segue-se daí que   √


α 2π −α |x |
f (x) = F −1 = ·e .
ω + α2
2 2

Proposição 4.3 (translação): Sejam ω0 e x0 escalares, f ∈ L1(R, C). Se F(ω ) = F [ f (x)],


então:

(a) F [ f (x − x0 )] = e −i ω x0 F(ω );
 
(b) F e iω0 x f (x) = F(ω − ω0).
D EMONSTRAÇÃO : Demonstrar-se-á o item (a). Fazendo a mudança de variáveis t = x − x0
em uma das integrais a seguir, obtém-se
Z ∞
1
F [ f (x − x0 ) ] = √ e −i ω x f (x − x0 ) dx
2π −∞
Z ∞
1
=√ e −i ω (t+x0) f (t) dt
2π −∞
Z ∞
1
=√ e −i ω t e −i ω x0 f (t) dt
2π −∞
3.4 Propriedades mais gerais 353

 Z ∞ 
−i ω x0 1 −i ω t
=e √ e f (t) dt
2π −∞

= e −i ω x0 F(ω ).
Item (b): Tem-se que:
Z ∞
 i ω0 x
 1  
F e f (x) = √ e −iω x e iω0 x f (x) dx
2π −∞
Z ∞
1
=√ e −i(ω −ω0)x f (x) dx
2π −∞

= F (ω − ω0 ) .
Com isto, completa-se a demonstração da proposição.

O item (a) da proposição 4.3 é conhecido como propriedade deslocamento no tempo e o


item (b) é conhecido como propriedade de variação de frequência, ambos da transformada
de Fourier. As propriedades de deslocamento e de variação foram aqui resumidas como pro-
priedade de translação.

Exemplo 4.5: Seja f : R → R uma função dada por


(
cos(ax), se − b < x < b,
f (x) =
0, caso contrário.

Mostre que
  

 1 sen [b(ω − a)] sen [b(ω + a)] ,
√ + se ω 6= ± a,
   2π ω −a ω +a
F(ω ) = F f (x) =  
 1
 sen (2ab) ,

√ b+ se ω = ± a.
2π 2a

S OLUÇÃO : Pela fórmula de Euler, e i θ = cos θ + i sen θ , fazendo primeiro θ = ax e depois


θ = −ax, obtém-se
e iax = cos(ax) + i sen (ax),

e −iax = cos(ax) − i sen (ax),


onde usou-se a paridade de cosseno e a imparidade de seno. Somando as duas últimas equações,
encontra-se
e iax + e −iax
cos(ax) = ·
2
Agora observa-se que f pode ser reescrita na seguinte forma:
354 3 Transformada de Fourier

 
e iax + e −iax
(4.4) f (x) = [cos(ax)] · χ[−b,b] (x) = · χ[−b,b] (x).
2
Além disso, pelo exemplo 4.4, tem-se que

 2 sen (bω ) ,
√ · se ω 6= 0,
   2π ω
(4.5) F χ[−b,b] (x) =

 2b
√ , se ω = 0.

Faça
χ[−b,b] (x)
g(x) =
2
Então, por (4.5), para ω 6= 0, tem-se que
1 sen (bω )
(4.6) G(ω ) = F [g(x)] = √ · ·
2π ω
Pela propriedade de translação (item (b) da proposição 4.3), tem-se que
 
(4.7) F e iω0x g(x) = G(ω − ω0 ).

Tomando ω0 = a em (4.7) e usando (4.6), obtém-se


  1 sen [b(ω − a)] ,
(4.8) F e iax g(x) = G(ω − a) = √ · se ω 6= a.
2π ω −a
Analogamente, ao tomar ω0 = −a em (4.7) e a mesma função g(x), obtém-se
 
F e −iax g(x) = G(ω + a).
1 sen [b(ω + a)] ,
(4.9) =√ · se ω 6= −a.
2π ω +a
Agora usa-se as propriedades de linearidade (proposição 4.1) para determinar a transformada
de Fourier para f . Assim, para ω 6= ± a, tem-se
 iax  
  e + e −iax
F f (x) = F · χ[−b,b] (x)
2
 
= F e iax g(x) + e −iax g(x) = (lin.)
   
= F e iax g(x) + F e −iax g(x) = (por (4.8) e (4.9))
1 sen [b(ω − a)] 1 sen [b(ω + a)]
=√ · +√ ·
2π ω −a 2π ω +a
 
1 sen [b(ω − a)] sen [b(ω + a)]
(4.10) =√ + ·
2π ω −a ω +a
3.4 Propriedades mais gerais 355

Para determinar a transformada de Fourier para ω = −a e ω = a, deve-se calcular o limite


 
para ω → a na expressão obtida em (4.10). A razão se deve ao fato de o valor de F χ[−b,b] (x)
ser constante para ω = 0, de modo que para ω = ± a este valor não pode ser transladado.
Assim, usa-se a propriedade de continuidade da transformada de Fourier para calcular seu valor
nos pontos ω = ± a. Para ω → a, tem-se
   
F f (a) = lim F(ω ) = lim F f (x)
ω →a ω →a
 
1 sen [b(ω − a)] sen [b(ω + a)]
= lim √ +
ω →a 2π ω −a ω +a
1 sen [b(ω − a)] 1 sen [b(ω + a)]
=√ lim +√ lim
2π ω →a ω −a 2π ω →a ω +a
1 sen (bx) 1 sen (2ab)
= √ lim +√
2π x→0 x 2π 2a
1 sen (bx) 1 sen (2ab)
= √ · b · lim +√
2π x→0 bx 2π 2a
 
1 sen (2ab) ,
=√ b+
2π 2a
onde se fez a mudança de variáveis x = ω − a.
Analogamente, para ω → −a, tem-se
   
F f (−a) = lim F(ω ) = lim F f (x)
ω →−a ω →−a
 
1 sen [b(ω − a)] sen [b(ω + a)]
= lim √ +
ω →−a 2π ω −a ω +a
1 sen [b(ω − a)] 1 sen [b(ω + a)]
=√ lim +√ lim
2π ω →−a ω −a 2π ω →−a ω +a
1 sen (−2ab) 1 sen (bx)
=√ +√ lim
2π −2a 2π x→0 x
1 − sen (2ab) 1 sen (bx)
=√ · + √ · b · lim
2π −2a 2π x→0 bx
1 sen (2ab) 1
=√ · + √ ·b
2π 2a 2π
 
1 sen (2ab) ,
=√ b+
2π 2a
onde se fez a mudança de variáveis x = ω + a e usou-se a imparidade do seno (lembrando que
a, b > 0).
Portanto, a transformada de Fourier para f é dada por
356 3 Transformada de Fourier

  

 1 sen [b(ω − a)] sen [b(ω + a)] ,
√ + se ω 6= ± a,
   2π ω −a ω +a
F(ω ) = F f (x) =  

 1 sen (2ab) ,

√ b+ se ω = ± a.
2π 2a

Proposição 4.4 (simetria): Seja f ∈ L1 (R, C). Se F(ω ) = F [ f (x)], então

F [F(x)] = f (−ω ).

D EMONSTRAÇÃO : A transformada inversa de F é dada por


Z ∞
1
f (x) = √ e iω x F(ω ) d ω .
2π −∞

Substituindo x por −x na expressão acima, obtém-se


Z ∞
1
f (−x) = √ e −iω x F(ω ) d ω .
2π −∞

Agora permuta-se x e ω para escrever


Z ∞
1
f (−ω ) = √ e −iω x F(x) dx,
2π −∞

ou ainda, Z ∞
1
√ e −iω x F(x) dx = f (−ω ),
2π −∞
isto é,
F [F(x)] = f (−ω ).

O exemplo a seguir calcula formalmente a transformada de Fourier da função apresentada na


observação 3.2.

Exemplo 4.6: Considere a seguinte função


sen (αω ) ,
F(ω ) = ω 6= 0.
ω
Mostre que
√

sen (α x)  2π ,

se |ω | < α .
F [F(x)] = F = 2
x 
0, se |ω | > α .
3.4 Propriedades mais gerais 357

S OLUÇÃO : No exemplo 3.1 viu-se que a transformada de Fourier da função


"( #  
1, se | x | < α , 2 sen (αω ) ,
F =√ · se ω 6= 0.
0, se | x | > α , 2π ω

Pela proposição 4.4 (propriedade de simetria), segue-se que

F [F(x)] = f (−ω ).

Assim,  
2 sen (α x)
F √ · = f (−ω ).
2π x
Mas f (x) é uma função par, pois é quociente entre duas funções ímpares, de modo que
f (−ω ) = f (ω ). Assim,  
2 sen (α x)
F √ · = f (ω ),
2π x
 
2 sen (α x)
√ ·F = f (ω ),
2π x
  √
sen (α x) 2π
F = · f (ω ).
x 2
Portanto,   √
sen (α x) 2π
F = · f (ω )
x 2
√ (
2π 1, se |ω | < α ,
= ·
2 0, se |ω | > α ,
√
 2π
, se |ω | < α ,
= 2

0, se |ω | > α .

Exemplo 4.7: Seja f : R → R uma função definida por


1
f (x) = ·
x2 + α 2
Mostre que √
2π −α |ω |
F(ω ) = F [ f (x)] = ·e

e   2 α
f (x) = F −1 e −α |ω | = √ · 2 ·
2π x + α 2
358 3 Transformada de Fourier

S OLUÇÃO : Pelo exemplo 4.4 tem-se que


  2 α
F e −α |x | = √ · 2 ·
2π ω + α 2
Agora faça √
2π −α |x |
g(x) = ·e .

Então pela fórmula acima (do exemplo 4.4), segue-se que
1
F [g(x)] = G(ω ) = = f (ω ),
ω2 + α2
onde fez a troca de x por ω na definição de f .
Observe que √
1 2π −α |ω |
G(x) = 2 2
e g(−ω ) = ·e .
x +α 2α
Pela proposição 4.4 (simetria), tem-se que F [G(x)] = g(−ω ). Assim,
 
1
F [ f (x)] = F 2
x + α2

= F [G(x)] = g(−ω )

2π −α |ω |
= ·e ,

ou, equivalentemente,
  2 α
f (x) = F −1 e −α |ω | = √ · 2 ·
2π x + α 2

Exemplo 4.8: Determine f : R → R cuja transformada de Fourier é


1
F(ω ) = ·
(2 + iω )(3 + iω )

S OLUÇÃO : Usando frações parciais, obtém-se


1 A B
= +
(2 + iω )(3 + iω ) 2 + iω 3 + iω
A(3 + iω ) + B(2 + iω )
=
(2 + iω )(3 + iω )
(3A + 2B) + i(A + B)ω ,
=
(2 + iω )(3 + iω )
ou seja, (3A + 2B) + i(A + B)ω = 1 + 0i, que implica em resolver o sistema
3.4 Propriedades mais gerais 359

(
3A + 2B = 1,
A + B = 0.

Multiplicando a segunda equação por −2 e somando com a primeira, obtém-se A = 1. Subs-


tituindo este valor na segunda linha, encontra-se B = −1. Assim,
1 1 1
= − ·
(2 + iω )(3 + iω ) 2 + iω 3 + iω
Aplicando a transformada inversa em ambos os membros acima e usando a sua linearidade,
obtém-se      
−1 1 −1 1 −1 1
F =F −F ·
(2 + iω )(3 + iω ) 2 + iω 3 + iω
Pelo exemplo 3.2, vale a fórmula
 
1 √
F −1
= 2π · e −α x · u0 (x).
α + iω
Aplica-se no segundo membro da identidade para a inversa, primeiro fazendo α = 2 e depois
α = 3. Assim,
     
−1 1 −1 1 −1 1
F =F −F
(2 + iω )(3 + iω ) 2 + iω 3 + iω
√ √
= 2π · e −2x · u0(x) − 2π · e −3x · u0(x)
√ 
= 2π · e −2x − e −3x u0 (x),
que é a resposta procurada.

Proposição 4.5: Sejam f integrável e absolutamente integrável e ω0 ∈ R. Então,


F (ω − ω0) + F (ω + ω0)
(4.11) F [ f (x) · cos(ω0 x)] = ·
2
D EMONSTRAÇÃO : Por definição de transformada de Fourier, tem-se
Z ∞
1
F [ f (x) · cos(ω0 x) = √ e −iω x · f (x) · cos(ω0 x) dx
2π −∞
Z ∞
1
=√ [cos(ω x) − i sen (ω x)] · f (x) · cos(ω0 x) dx
2π −∞
Z ∞n
1
=√ [cos(ω x) · cos(ω0 x)] · f (x) −
2π −∞
o
(4.12) − i[ sen (ω x) · cos(ω0 x)] · f (x) dx

Agora é preciso usar duas fórmulas da trigonometria. Tem-se:


360 3 Transformada de Fourier

(
cos(a + b) = (cos a)(cos b) − ( sen a)( sen b),
cos(a − b) = (cos a)(cos b) + ( sen a)( sen b),

Somando as duas identidades acima, encontra-se


cos(a − b) + cos(a + b)
(4.13) (cos a)(cos b) = ·
2
(
sen (a + b) = ( sen a)(cos b) + ( sen b)(cos a),
sen (a − b) = ( sen a)(cos b) − ( sen b)(cos a).
Além disso, ao somar as duas identidades acima, obtém-se
sen (a − b) + sen (a + b)
(4.14) ( sen a)(cos b) = ·
2
Substituindo (4.13) e (4.14) em (4.12), com a = ω x e b = ω0 x, obtém-se
Z ∞
1 cos[(ω − ω0)x] + cos[(ω + ω0 )x]
F [g(x)] = √ · f (x) −
2π −∞ 2

sen [(ω − ω0 )x] + sen [(ω + ω0)x]
− i· · f (x) dx
2
Z ∞
1 cos[(ω − ω0)x] − i sen [(ω − ω0 )x]
=√ · f (x) +
2π −∞ 2

cos[(ω + ω0)x] − i sen [(ω + ω0)x]
+ · f (x) dx
2
Z ∞n o
1
= √ cos[(ω − ω0 )x] − i sen [(ω − ω )x] · f (x) dx +
2 2π −∞
Z ∞n o
1
+ √ cos[(ω − ω0)x] − i sen [(ω − ω0)x] · f (x) dx
2 2π −∞
Z ∞ Z ∞ 
1 −i(ω −ω0)x 1 −i(ω +ω0)x
= √ e · f (x) dx + √ e · f (x) dx
2 2π −∞ 2 2π ∞
 Z ∞  Z ∞ 
1 1 −i(ω −ω0)x 1 −i(ω −ω0 )x
= · √ e f (x) dx + · e f (x) dx
2 2π −∞ 2 −∞

F (ω − ω0 ) + F (ω + ω0 ) ,
=
2
que é o resultado desejado.

Proposição 4.6: Sejam f integrável e absolutamente integrável e ω0 ∈ R. Então,


3.4 Propriedades mais gerais 361

F (ω − ω0 ) − F (ω + ω0 )
(4.15) F [ f (x) · sen (ω0 x)] = ·
2i
D EMONSTRAÇÃO : Por definição de transformada de Fourier, tem-se
Z ∞
1
F [ f (x) · sen (ω0 x) = √ e −iω x · f (x) · sen (ω0 x) dx
2π −∞
Z ∞
1
=√ [cos(ω x) − i sen (ω x)] · f (x) · sen (ω0 x) dx
2π −∞
Z ∞n
1
=√ [cos(ω x) · sen (ω0 x)] · f (x) −
2π −∞
o
(4.16) − i[ sen (ω x) · sen (ω0 x)] · f (x) dx

Agora é preciso usar duas fórmulas da trigonometria. Tem-se:


(
sen (a + b) = ( sen a)(cos b) + ( sen b)(cos a),
sen (a − b) = ( sen a)(cos b) − ( sen b)(cos a).

Multiplicando a segunda identidade por −1 e somando com a primeira, encontra-se


sen (a + b) − sen (a − b)
(4.17) (cos a)( sen b) = ·
2
Além disso, se (
cos(a + b) = (cos a)(cos b) − ( sen a)( sen b),
cos(a − b) = (cos a)(cos b) + ( sen a)( sen b),
então, multiplicando a primeira identidade por −1 e somando a segunda, encontra-se
cos(a − b) − cos(a + b)
(4.18) ( sen a)( sen b) = ·
2
Substituindo (4.17) e (4.18) em (4.16), com a = ω x e b = ω0 x, obtém-se

Z ∞
1 sen [(ω + ω0)x] − sen [(ω − ω0 )x]
F [ f (x) sen (ω0 x)] = √ · f (x) −
2π −∞ 2

cos[(ω − ω0 )x] − cos[(ω + ω0 )x]
− i· · f (x) dx
2
Z ∞
1 − sen [(ω − ω0)x] − i cos[(ω − ω0 )x]
=√ · f (x) +
2π −∞ 2

sen [(ω + ω0)x] + i cos[(ω + ω0 )x]
+ · f (x) dx
2
Z ∞
1 1 −i · sen [(ω − ω0)x − i2 cos[(ω − ω0 )x]
=√ · · f (x) +
2π −∞ i 2
362 3 Transformada de Fourier


1 −i · sen [(ω + ω0 )x] − i2 cos[(ω + ω0 )x]
+ · · f (x) dx
−i 2
Z ∞n h i
1 1
=√ cos[ω − ω0 )x] − i · sen (ω − ω0 )x] · f (x) −
2π −∞ 2i

1h i
− cos[(ω + ω0 )x] − i · sen [(ω + ω0 )x] · f (x) dx
2i
Z ∞ nh i
1
= √ cos[ω − ω0 )x] − i · sen (ω − ω0 )x] · f (x) −
2i 2π −∞
h i 
− cos[(ω + ω0)x] − i · sen [(ω + ω0 )x] · f (x) dx
Z ∞h i
1
= √ e −i(ω −ω0)x · f (x) − e −i(ω +ω0)x · f (x) dx
2i 2π −∞
 Z ∞  Z ∞ 
1 1 −i(ω −ω0 )x 1 −i(ω −ω0 )x
= · √ e f (x) dx − · e f (x) dx
2i 2π −∞ 2i −∞

F (ω − ω0 ) − F (ω + ω0 ) ,
=
2i
que é o resultado desejado.

Observação 4.2: Pelo item (b) da proposição 4.3 (translação), tem-se que
   
F(ω − ω0) = F e iω0 x · f (x) e F(ω + ω0 ) = F e −iω0x · f (x) ,

onde a segunda fórmula decorre da primeira ao fazer a mudança ω0 7→ −ω0 .


Lembrando que decorre da fórmula de Euler a identidade

e iω0x + e −iω0x
cos ω0 =
2
e usando as duas fórmulas de translação acima, obtém-se
   
F(ω − ω0) + F(ω + ω0 ) F e iω0x · f (x) + F e −iω0 x · f (x)
=
2 2
 iω x 
e 0 · f (x) + e −iω0 x · f (x)
=F
2
"  #
e iω0x + e −iω0x
=F · f (x)
2

= F [ f (x) · cos ω0 ] ,
3.5 Derivadas, integrais e transformada de Fourier 363

que está em concordância com a fórmula (4.11) da proposição 4.5.


Analogamente, também da fórmula de Euler decorre a seguinte identidade

e iω0x − e −iω0x
sen ω0 = ·
2i
Usando as duas fórmulas de translação citadas anteriormente, encontra-se
   
F(ω − ω0) − F(ω + ω0 ) F e iω0x · f (x) − F e −iω0 x · f (x)
=
2i 2i
 iω x 
e 0 · f (x) − e −iω0 x · f (x)
=F
2i
"  #
e iω0x − e −iω0x
=F · f (x)
2i

= F [ f (x) · sen ω0 ] ,
que está em concordância com a fórmula (4.15) da proposição 4.6.

3.5 Derivadas, integrais e transformada de Fourier

Proposição 5.1 (transformada das derivadas): Seja f : R → R uma função pertencente a


L1(R) e F(ω ) = F [ f (x)] a sua transformada de Fourier. Tem-se:

(a) Se f 0 (x) é seccionalmente contínua e lim | f (x)| = 0, então


x→± ∞

F [ f 0 (x)] = iω · F(ω ).

(b) Se f 0 (x) é contínua, f 00 (x) é seccionalmente contínua e lim | f 0 (x)| = 0, então


x→± ∞

F [ f 00 (x)] = −ω 2 · F(ω ).

D EMONSTRAÇÃO : Parte (a): como, por hipótese, f 0 (x) é seccionalmente contínua, então para
cada intervalo fechado [a, b] existem n pontos, x1 , x2 , . . ., xn , onde f 0 (x) é descontínua (com
todas as descontinuidade de primeira espécie). Assim, para a, b > 0, tem-se
Z ∞
1
0
F [ f (x)] = √ e −iω x f 0 (x) dx
2π −∞
Z b
1
= √ · lim e −iω x f 0 (x) dx+
2π a,b→∞ −a
364 3 Transformada de Fourier

"Z Z x2
1 x1
−iω x 0
= √ · lim e f (x) dx + e −iω x f 0 (x) dx
2π a,b→∞ −a x1

Z x3 Z b
#
+ e −iω x f 0 (x) dx + · · · + e −iω x f 0 (x) dx
x2 xn
" x1 Z x1
1 −iω x

= √ · lim e · f (x) + iω e −iω x f (x) dx +
2π a,b→∞ −a −a
x2 Z x2
−iω x

+e
· f (x) + iω e −iω x f (x) dx +
x1 x1
x3 Z x3
−iω x

+e
· f (x) + iω e −iω x f (x) dx + · · ·
x2 x2
b Z b
#

· · · + e −iω x · f (x) + iω e −iω x f (x) dx
xn xn
" x1 x2
1 −iω x
−iω x

= √ · lim e · f (x) + e · f (x) +
2π a,b→∞ −a x1
x3 b #

+ e −iω x · f (x) + · · · + e −iω x · f (x) +
x2 xn
"Z Z x2
iω x1
+ √ · lim e −iω x f (x) dx + e −iω x f (x) dx+
2π a,b→∞ −a x1

Z x3 Z b
#
−iω x −iω x
+ e f (x) dx + · · · + e f (x) dx
x2 xn
"
1
= √ · lim e −iω x1 · f (x1 ) − e iaω · f (−a) + e −iω x2 · f (x2 ) − e −iω x1 · f (x1 )+
2π a,b→∞
#
+ e −iω x3 · f (x3 ) − e −iω x2 · f (x2 ) + · · · + e −iω b · f (b) − e −iω xn · f (xn ) +

b Z

+ √ · lim e −iω x f (x) dx
2π a,b→∞ −a
h i Z b
1 −iω b iω a iω
= √ · lim e · f (b) − e · f (−a) + √ · lim e −iω x f (x) dx
2π a,b→∞ 2π a,b→∞ −a
Z ∞
1
= iω · √ e −iω x f (x) dx
2π −∞

= iω · F [ f (x)],
3.5 Derivadas, integrais e transformada de Fourier 365

onde realizou-se várias integrações por partes fazendo


( (
u = e −iω x, du = −iω · e −iω x dx,

dv = f 0 (x) dx, v = f (x).

O leitor deve notar que vários termos do tipo e −iω x · f (x) foram cancelados, pois aparecem
duas vezes com sinais opostos. Observe-se que usou-se estes fatos:
h i  
lim e −iω b · f (b) = 0 e lim e iω a · f (a) = 0.
b→∞ a→∞

Isto é equivalente a escrever


h i
lim e −iω b · f (b) = lim {[ cos(ω b) − i sen (ω b)] · f (b)}
b→∞ b→∞

= lim [ cos(ω b) · f (b)] − i · lim [ sen (ω b) · f (b)]


b→∞ b→∞

= 0 + 0 = 0,
pois as funções cos(ω b) e sen (ω b) são limitadas e f (b) → 0 quando b → ∞.
Analogamente,
 
lim e iω a · f (a) = lim {[ cos(ω b) + i sen (ω b)] · f (b)}
a→∞ b→∞

= lim [ cos(ω b) · f (b)] + i · lim [ sen (ω b) · f (b)]


b→∞ b→∞

= 0 + 0 = 0,
pois as funções cos(ω b) e sen (ω b) são limitadas e f (b) → 0 quando b → ∞.
Além disso, deve ser observado que
Z b Z x1 Z x2 Z b
−iω x −iω x −iω x
e f (x) dx = e f (x) dx + e f (x) dx + · · · + e −iω x f (x) dx.
−a −a x1 xn

O procedimento para demonstrar a parte (b) é análogo. Assim, para simplificar as contas,
opta-se pelo caso em que f 00 (x) é contínua. Se assim, não for, isto é, se for seccionalmente
contínua, então adota-se o procedimento de dividir em vários subintervalos, como na parte (a).
Assim, integrando por partes duas vezes, do modo indicado anteriormente, obtém-se
Z ∞
1
F [ f 00 (x)] = √ e −iω x f 00 (x) dx
2π −∞
Z b
1
= √ · lim e −iω x f 00 (x) dx
2π a,b→∞ −a
" b Z b #
1
= √ · lim e −iω x · f 0 (x) + iω e −iω x f 0 (x) dx
2π a,b→∞ −a −a
366 3 Transformada de Fourier

( b " b Z b
#)
1
= √ · lim e −iω x · f 0 (x) + iω e −iω x · f (x) + iω e −iω x f (x) dx
2π a,b→∞ −a −a −a
"
1
= √ · lim e −iω b · f 0 (b) − e iω a · f (−a) + iω · e −iω b · f (b) − iω · e iω a · f (−a) −
2π a,b→∞
Z
#
b
− ω2 e −iω x f (x) dx
−a
 Z b 
2 1 −iω x
= − ω · lim √ e f (x) dx
a,b→∞ 2π −a

= − ω 2 · F [ f (x)] = −ω 2 · F(ω ).
Justificam-se certos procedimento adotados acima como aqueles que foram feitos na parte
(a).

Observa-se que a proposição 5.1 mostra que a diferenciação no domínio do tempo corres-
ponde à multiplicação da transformada de Fourier por iω . A parte (b) mostra que derivar duas
vezes implica em multiplicar a transformada de Fourier por −ω 2. Em geral, derivar n vezes
significa multiplicar a transformadas por (iω )n .

Corolário 5.1 (transformada da integral): Sejam f : R → R uma função pertencente a


L1(R) e F(ω ) = F [ f (x)]. Se g é uma função definida por
Z x
g(x) = f (t) dt e tal que lim |g(x)| = 0,
0 x→± ∞

então
1
· F(ω ),
F [g(x)] = para ω 6= 0.

D EMONSTRAÇÃO : Pelo teorema fundamental do Cálculo, g0 (x) = f (x), donde resulta que
F [ f (x)] = F [g0(x)]. Além disso, com a hipótese adicional de lim |g(x)| = 0, pode-se aplicar
x→± ∞
o proposição 5.1 em g0 (x) para concluir que

F(ω ) = F [g0(x)] = iω · F [g(x)].

Segue-se daí que


1
F [g(x)] = · F(ω ).

3.5 Derivadas, integrais e transformada de Fourier 367

Proposição 5.2 (derivadas da transformada): Sejam f : R → R uma função pertencente a


L1(R) e F(ω ) = F [ f (x)] a transformada de Fourier para f . Tem-se:
(a) Se a função x · f (x) for absolutamente integrável em R, isto é,
Z ∞
| x · f (x) | dx < ∞,
−∞

então
dF  
(ω ) = −i · F x · f (x) .

2
(b) Se a função x · f (x) for absolutamente integrável em R, isto é,
Z ∞
x2 · f (x) dx < ∞,
−∞

então
d 2F  2 
(ω ) = − F x · f (x) .
dω2
D EMONSTRAÇÃO : Com as hipóteses de integrabilidade absolutamente para as funções f (x),
x f (x) e x2 f (x), pode-se demonstrar que a derivada pode ser calculada sob o sinal de integração.
Assim, para o item (a), tem-se
Z ∞
dF 1 d
(ω ) = √ e −iω x f (x) dx
dω 2π d ω −∞
Z ∞
1 d  −iω x 
=√ e f (x) dx
2π −∞ dω
Z ∞
1 
=√ −ix · e −iω x f (x) dx
2π −∞
Z ∞
1  
= −i · √ e −iω x x · f (x) dx
2π −∞
 
= −i · F x · f (x) ,
que demonstra (a).
Para a parte (b) usa-se o item (a), já demonstrado, para obter
 
d2 d dF d   
2
(ω ) = (ω ) = −i F x · f (x)
dω dω dω dω
 Z ∞ 
d 1 −iω x
 
= −i √ e x · f (x) dx
dω 2π −∞
Z ∞
1 d  −iω x 
= −i √ e · x · f (x) dx
2π −∞ dω
Z ∞
1
= −i √ −i · x · e −iω x · x · f (x) dx
2π −∞
368 3 Transformada de Fourier

Z ∞
1  
= (−i)2 √ e −iω x x2 · f (x) dx
2π −∞
Z ∞
1  
= −√ e −iω x x2 · f (x) dx
2π −∞
 2 
= −F x · f (x) ,
que demonstra (b).

Exemplo 5.1: Encontre a transformada de Fourier para a função f : R → R definida por


(
| x |, se − α < x < α ,
f (x) =
0, caso contrário,

onde α > 0.

S OLUÇÃO : Note-se, primeiro, que a função f pode ser escrita na forma

f (x) = | x | χ[−α , α ] (x) = −x · χ[−α ,0] (x) + x · χ[0, α ] (x).

Como já visto, tem-se que χ[−α ,0] (x) = χ[0, α ] (−x), de modo que

(5.1) f (x) = −x · χ[0, α ] (−x) + x · χ[0, α ] (x).

Faça g(x) = x · χ[0,α ] (x). Agora é possível usar o resultado obtido no exemplo 3.3, que diz

  1 1 − e iαω ,
F χ[0, α ] (x) = √ · ω 6= 0.
2π iω
e aplicar o teorema para derivada da transformada (proposição 5.2) para obter
 
F [ g(x)] = F x · χ[0, α ] (x) = (prop. 5.2)
d  
=i F χ[0, α ] (x) = (ex. 3.3 para ω 6= 0)

   
d 1 1 − e −iαω 1 d 1 − e −iαω
=i √ · =√
dω 2π iω 2π d ω ω
0
1 ω 1 − e −iαω − (1 − e −iαω )ω 0
=√
2π ω2
 
1 ω iα · e −iαω − 1 − e −iαω
=√
2π ω2
3.5 Derivadas, integrais e transformada de Fourier 369

1 iαω e −iαω + e −iαω − 1 ,


(5.2) =√ · ω 6= 0.
2π ω2
Agora observe-se que g(−x) = −x · χ[0, α ] (−x), de modo que é possível aplicar a propriedade
de escalonamento para o caso particular (isto é, o corolário 4.1), que diz
 
F g(−x) = G(−ω ).

Assim,
 
F [g(−x)] = F −x · χ[0,α ] (−x) = G(−ω )

1 iα (−ω ) · e −iα (−ω ) + e −iα (−ω ) − 1


=√ ·
2π (−ω )2
1 −iαω · e iαω + e iαω − 1 ,
(5.3) =√ · (ω 6= 0).
2π ω2
Desse modo,
 
F [ f (x)] = F −x · χ[0, α ] (−x) + x · χ[0, α ] (x)

= F [g(−x)] + F [g(x)]

= G(−ω ) + G(ω )

= [(5.2) + (5.3)]

1 iαω · e −iαω + e −iαω − 1 1 −iαω · e iαω + e iαω − 1


=√ · + √ ·
2π ω2 2π ω2
 
1 iαω · e −iαω + e −iαω − 1 −iαω · e iαω + e iαω − 1
=√ · +
2π ω2 ω2
 
1 iαω · e −iαω + e −iαω − 1 − iαω · e iαω + e iαω − 1
=√ ·
2π ω2
"   #
1 −iαω e iαω − e −iαω + e iαω + e −iαω − 2
=√ ·
2π ω2
 
1 −iαω (2i) · sen (αω ) + 2 cos(αω ) − 2
=√ ·
2π ω2
 
2 αω · sen (αω ) + cos(αω ) − 1 ,
=√ · (ω 6= 0).
2π ω2
Para ω = 0, se faz o seguinte:
Z ∞ Z ∞
1 i.0.x 1
F [ f (x)] = √ e f (x) dx = √ f (x) dx
2π −∞ 2π −∞
370 3 Transformada de Fourier

Z Z α Z ∞ 
1 −α
=√ f (x) dx + f (x) dx + f (x) dx
2π −∞ −α α
Z α
1
=√ | x | dx
2π −α
Z 0 Z α 
1
=√ (−x) dx + x dx
2π −α 0
 Z0 Z α 
1
=√ − x dx + x dx
2π −α 0

2
0 2
α !
1 x x
=√ − +
2π 2 −α 2 0
 
1 α2 α2
=√ +
2π 2 2
α2
=√ ·

Mostrou-se, portanto, que
  
 2 αω · sen (αω ) + cos(αω ) − 1 ,

 √2π ·
 se ω 6= 0,
ω2
F [ f (x)] =

 α2
√ ,
 se ω = 0.

2
Exemplo 5.2: Seja f : R → R uma função definida por f (x) = e −α x , onde α > 0. Mostre
que  2 
−ω 2
F e /2 = e /2.
−x

S OLUÇÃO : Graficamente, o exemplo 5.2 pede para mostrar a transformação dada pela figura
5.3 dada abaixo.
Serão usados cinco passos para resolver o problema.

PASSO 1: Será mostrado que f satisfaz a equação diferencial f 0 (x) + 2α x · f (x) = 0.


Derivando f e usando a regra da cadeia, obtém-se
2
f 0 (x) = −2α x · e −α x = −2α x · f (x) ⇒ f 0 (x) + 2α x · f (x) = 0.

PASSO 2: Agora deve-se demonstrar que

ω
F 0 (ω ) + · F(ω ) = 0.

3.5 Derivadas, integrais e transformada de Fourier 371

Figura 5.3: Gráficos das funções f (x) e |F(ω )|.

De fato, aplicando a transformada em ambos os membros da equação diferencial do passo 1


e usando a linearidade da transformada, encontra-se
 
F f 0 (x) + 2α x · f (x) = 0 ⇒ F [ f 0 (x)] + 2α · F [x · f (x)] = 0.

Em seguida, aplica-se parte (a) da proposição 5.1 (transformada das derivadas) no primeiro
membro acima e a parte (a) da proposição 5.2 (derivadas da transformada) no segundo termo
do primeiro membro para obter
ω
iω · F(ω ) + 2α i · F 0 (ω ) = 0 ⇒ F 0 (ω ) + · F(ω ) = 0,

como desejado.

PASSO 3: Agora deve-se resolver a EDO de primeira ordem obtida no passo 2 e mostrar que
sua solução é dada por
−ω 2
F(ω ) = F(0) · e /4α .
Para isso, multiplica-se ambos os membros da equação pelo seguinte fator de integração:
R
(ω/2α )d ω ω 2/4α
µ (ω ) = e =e .

Assim,
ω
µ (ω ) · F 0 (ω ) + µ (ω ) · · F(ω ) = 0,

de modo que
ω 2/4α ω 2/4α ω d h ω 2/4α i
e · F 0 (ω ) + e · · F(ω ) = 0 ⇒ e · F(ω ) = 0.
2α dω
Agora basta integrar a última equação em relação a ω para obter
ω 2/4α −ω 2/4α
e · F(ω ) = k ⇒ F(ω ) = k e .

Como F(0) = k.e0 = k, segue-se que


372 3 Transformada de Fourier

ω 2/4α
(5.4) F(ω ) = F(0) · e ,

como esperado.

PASSO 4: Agora deve-se determinar o valor de F(0). Para isso, será necessário o valor da
seguinte integral: Z ∞
2 √
e −x dx = π ,
−∞
que foi obtido explicitamente no apêndice 1 ao capítulo 1.
Um cálculo similar mostra que
Z ∞ √
−α x2 π
e dx = √ ,
−∞ α
que será o valor necessário para dar continuidade a passo 4.
Agora usa-se a definição de transformada de Fourier e o valor da última integral acima para
obter
Z ∞ Z ∞
1 1 2
F(0) = √ e −i.0.x
f (x) dx = √ e −α x dx
2π −∞ 2π −∞
√ √
1 π 1 π
= √ ·√ = √ √ ·√
2π α 2· π α
1
(5.5) =√ ·

PASSO 5: Nessa última etapa usa-se os passos 3 e 4 para finalizar a resolução. Assim, substi-
tuindo (5.5) em (5.4), obtém-se
  1
2 −ω 2
F e −α x = √ · e /4α .

Em particular, fazendo α = /2, obtém-se
1
 2 
−ω 2
F e /2 = e /2.
−x

Observação 5.1: O exemplo 5.2 mostrou que a transformada de Fourier para a função f (x) =
−x2/2
e é igual a ela mesma (a menos da variável). Essa função é chamada de gaussiana e é muito
importante nos estudos sobre transformadas de Fourier.

Exemplo 5.3: Mostre que


3.5 Derivadas, integrais e transformada de Fourier 373

Z ∞
sen ω
dω = π.
−∞ ω

S OLUÇÃO : As definições de transformada de Fourier e transformada inversas são


Z ∞ Z ∞
1 −iω x 1
F(ω ) = √ e f (x) dx e f (x) = √ e iω x F(ω ) d ω .
2π −∞ 2π −∞

No exemplo 5.1 mostrou-se que


  
"( 

# √ ·2 sen (αω )
 2π , se ω 6= 0,
1, se | x | ≤ α ω
F =
0, se | x | > α , 
 2α
√ ,
 se ω = 0.

Logo,
  Z ∞  
−1 sen (αω ) 1 iω x sen (αω )
F =√ e · dω
ω 2π −∞ ω
√ (
2π 1, se |x| ≤ α ,
= ·
2 0, se |x| > α ,
√
 2π
, se |x| ≤ α ,
(5.6) = 2

0, se |x| > α ,

Mas pela definição de transformada inversa e pela fórmula de Euler, obtém-se


  Z ∞  
−1 sen (αω ) 1 iω x sen (αω )
F =√ e · dω
ω 2π −∞ ω
Z ∞  
1 sen (αω )
=√ [cos(ω x) + i sen (ω x)] · dω
2π −∞ ω
Z ∞
1 sen (αω ) · cos(ω x)
=√ dω +
2π −∞ ω
Z ∞
1 sen (αω ) · sen (ω x)
(5.7) + i√ dω
2π −∞ ω
Na última integral em (5.7), as funções sen (αω ) e sen (ω x) são ímpares, logo seu produto é
par. Além disso, o denominador ω é uma função ímpar. Portanto, o quociente entre uma função
par e uma função ímpar, é ímpar. Como o intervalo de integração é simétrico e o integrando é
uma função ímpar, conclui-se que o valor da última integral é zero. Assim,
  Z ∞
−1 sen (αω ) 1 sen (αω ) · cos(ω x)
F =√ dω.
ω 2π −∞ ω
Usando o segundo membro acima em (5.6), obtém-se
374 3 Transformada de Fourier

√
1
Z ∞
sen (αω ) · cos(ω x)  2π
, se |x| ≤ α ,
√ dω = 2
2π −∞ ω 
0, se |x| > α ,

donde se conclui que


 √
Z ∞
sen (αω ) · cos(ω x) √ 2π
2π · , se |x| ≤ α ,
dω = 2
−∞ ω 
0, se |x| > α ,
(
π, se |x| ≤ α ,
=
0, se |x| > α .

Agora se faz x = 0 e α = 1 para concluir que


Z ∞
sen ω
dω = π.
−∞ ω
Observe que o integrando da integral acima é par (pois é o quociente entre as funções sen ω
e ω , que são ímpares). Portanto, tem-se também que
Z ∞
sen ω π
dω = ·
0 ω 2

A última proposição desta seção é sobre a transformada de Fourier das derivadas parciais de
uma função de duas variáveis. Esta proposição será muito usada no capítulo 4.

Proposição 5.3 (transformada das derivadas de funções de duas variáveis): Seja u =


u(x, t) uma função pertencente a L1 (R). Então:
  
∂u
(a) F (x, t) = iω · F [u(x, t)], se lim u(x, t) = 0;
∂x x→± ∞
 2  
∂ u ∂u
(b) F 2
(x, t) = −ω 2 F [u(x, t)], se lim u(x, t) = 0 e lim (x, t) = 0;
∂x x→± ∞ x→± ∞ ∂x
  
∂u ∂
(c) F (x, t) = F [u(x, t)].
∂t ∂t
 2  
∂ u ∂2
(d) F (x, t) = 2 F [u(x, t)].
∂ t2 ∂t

D EMONSTRAÇÃO : Para a parte (a), aplica-se a definição de transformada de Fourier para


obter
  Z ∞  
∂u 1 −iω x ∂u
F =√ e · (x, t) dx
∂x 2π −∞ ∂x
3.5 Derivadas, integrais e transformada de Fourier 375

Z b  
1 ∂u
−iω x
= √ · lim e · (x, t) dx
2π a,b→∞ −a ∂x
 b Z b 
1 −iω x −iω x
= √ · lim e · u(x, t) + iω e · u(x, t) dx
2π a,b→∞ −a −a

1 h i
−iω b iaω
= √ · lim e · u(b, t) − e · u(−a, t) +
2π a,b→∞
b Z
1
+ iω · √ · lim e −iω x · u(x, t) dx
2π a,b→∞ −a
 Z ∞ 
1 −iω x
= iω √ e · u(x, t) dx
2π −∞
= iω · F [u(x, t)].
onde se fez integração por partes como
 (
 v = e −iω x, dv = −iω · e −iω x dx,

 dw = ∂ u (x, t) dx, w = u(x, t)
∂x
No capítulo 2 apresentou-se a justificativa para que
h i
−iω b iaω
lim e · u(b, t) − e · u(−a, t) = 0,
a,b→∞

onde observa-se que as funções exponenciais são limitadas, bem como o uso da hipótese de que
lim u(x, t) = 0.
x→± ∞

Para a parte (b), basta fazer


∂u
v=
∂x
na parte (a) para concluir que
 2        
∂ u ∂ ∂u ∂v
F (x, t) = F (x, t) = F (x, t)
∂ x2 ∂x ∂x ∂x
  
(a) ∂u
= iω · F [v(x, t)] = iω · F (x, t)
∂x
(a)
= iω · [iω F [u(x, t)]] = −ω 2 · F [u(x, t)],
∂u
desde que lim (x, t) = 0;.
x→± ∞ ∂ x
Em geral, pode-se mostrar que
 n  
∂ u
F (x, t) = (iω )n , F [u(x, t)].
∂ xn
desde que
376 3 Transformada de Fourier

∂ u , , ∂ n−1
u, ··· → 0 quando x → ± ∞.
∂x ∂ xn−1

Para a parte (c), usa-se a definição de transformada para obter


   Z ∞   
∂u 1 −iω x ∂u
F (x, t) = √ e · (x, t) dx
∂t 2π −∞ ∂t
Z b   
1 −iω x ∂u
= √ · lim e · (x, t) dx
2π a,b→∞ −a ∂t
 Zb 
1 ∂ −iω x
= √ · lim e · u(x, t) dx
2π a,b→∞ ∂ t −a
 Z b 
∂ 1 −iω x
= √ · lim e · u(x, t) dx
∂t 2π a,b→∞ −a
 Z ∞ 
∂ 1 −iω x
= √ · e · u(x, t) dx
∂t 2π −∞

= F [u(x, t)],
∂t
onde usou-se a regra de Leibniz (proposição 12.1 do apêndice 1.12 do capítulo 1), que é dada
por
Z Z b
∂ b ∂v
v(x, t) dx = (x, t) dx.
∂ t −a −a ∂ t
Para a parte (d), fazendo
∂u
v=
∂t
na parte (c), tem-se
 2        
∂ u ∂ ∂u ∂v
F (x, t) = F (x, t) = F (x, t)
∂ t2 ∂t ∂x ∂t
  
(c) ∂ ∂ ∂u
= F [v(x, t)] = F (x, t)
∂t ∂t ∂t
 
(c) ∂ ∂ ∂2
= F [u(x, t)] = 2 F [u(x, t)],
∂t ∂t ∂t
como afirmado.
3.6 Produto de transformadas e convolução 377

3.6 Produto de transformadas e convolução

O produto de convolução foi estudado na seção 1.10 do capítulo 1. Aqui será recordada a
definição do produto de convolução entre duas funções. As propriedades comutativa, associativa
e distributiva foram apresentadas e demonstradas através da proposição 10.1 daquele capítulo
e não serão aqui repetidas. Esta seção será dedicada ao estudo do produto de transformadas de
Fourier.

D EFINIÇÃO : Sejam f , g : R → R funções integráveis, sendo pelo menos uma delas limitada.
A convolução entre as funções f e g é definida por
Z ∞
( f ∗ g)(x) = f (x − y) g(y) dy, para x ∈ R.
−∞

Teorema 6.1 (convolução no tempo): Sejam f , g : R → R funções pertencentes a L1(R),


sendo pelo menos uma delas limitada. Se F(ω ) = F [ f (x)] e G(s) = F [g(x)], então

F [( f ∗ g)(x)] = 2π · F(ω ) · G(ω ).

D EMONSTRAÇÃO : Usar-se-á as definições de transformada de Fourier e de produto de con-


volução. Será necessário usar o teorema de Fubini (as hipótese assumida assim permitem), bem
como uma mudança de variável, onde será feito x − y = z (e dx = dz). Tem-se:
Z ∞

F [( f ∗ g)(x)] = F f (x − y) g(y) dy
−∞

= (prop. comutativa)
Z ∞ 
=F f (y) g(x − y) dy
−∞
Z ∞ Z 
1 −iω x

=√ e f (y) g(x − y) dy dx
2π −∞ −∞

= (teor. Fubini)
Z ∞ Z 
1 ∞
−iω x
=√ f (y) e g(x − y) dx dy
2π −∞ −∞
Z ∞ Z 
1 ∞
−iω (y+z)
=√ f (y) e g(z) dz dy
2π −∞ −∞
Z ∞ Z 
1 ∞
−iω y −iω z
=√ f (y) e e g(z) dz dy
2π −∞ −∞
Z ∞ Z 
1 −iω y

−iω z
=√ e f (y) e g(z) dz dy
2π −∞ −∞
378 3 Transformada de Fourier

Z ∞  Z ∞ 
1 −iω y −iω z
=√ e f (y) dy e g(z) dz
2π −∞ −∞
 Z ∞ "√ Z ∞ #
1 2 π
= √ e −iω y f (y) dy √ e −iω z g(z) dz
2π −∞ 2π −∞
 Z ∞   Z ∞ 
√ 1 −iω y 1 −iω z
= 2π √ e f (y) dy √ e g(z) dz
2π −∞ 2π −∞

= 2π · F(ω ) · G(ω ).

Teorema 6.2 (convolução na frequência): Sejam F, G : R → R funções pertencentes a


L1(R), sendo pelo menos uma delas limitada. Se f (x) = F −1[F(ω )] e g(x) = F −1 [G(ω )],
então

F −1 [ (F ∗ G)(ω )] = 2π · f (x) · g(x),
ou equivalentemente,
1
F [ f (x) · g(x)] = √ · [F(ω ) ∗ G(ω )].

D EMONSTRAÇÃO : Recorde-se que, por definição, a transformada inversa de Fourier é dada
por Z ∞
1
f (x) = √ e iω x F(ω ) d ω .
2π −∞
Assim, Z 

F −1 [(F ∗ G)(ω )] = F −1 F(ω − β ) G(β ) d β
−∞

= (prop. comutativa)
Z ∞ 
−1
=F F(β ) G(ω − β ) d β
−∞
Z ∞ Z 
1 iω x

=√ e F(β ) G(ω − β ) d β d ω
2π −∞ −∞

= (teor. Fubini)
Z ∞ Z 
1 ∞
iω x
=√ F(β ) e G(ω − β ) d ω d β
2π −∞ −∞
Z ∞ Z 
1 ∞
i(α +β )x
=√ F(β ) e G(α ) d α d β
2π −∞ −∞
Z ∞ Z 
1 ∞
iα x i β x
=√ F(β ) e e G(α ) d α d β
2π −∞ −∞
3.6 Produto de transformadas e convolução 379

Z ∞ Z 
1 iβ x

iα x
=√ e F(β ) e G(α ) d α d β
2π −∞ −∞
Z ∞  Z ∞ 
1 iβ x iα x
=√ e F(β ) d β e G(α ) d α
2π −∞ −∞
 Z ∞ "√ Z ∞ #
1 iβ x 2π iα x
= √ e F(β ) d β √ e G(α ) d α
2π −∞ 2π −∞
 Z ∞  Z ∞ 
√ 1 iβ x 1 iα x
= 2π √ e F(β ) d β √ e G(α ) d α
2π −∞ 2π −∞

= 2π · F −1 [F(β )] · F −1 [G(α )]

= 2π · f (x) · g(x).
onde se aplicou Fubini e se fez a mudança de variáveis α = ω − β (e d α = d ω ).

Exemplo 6.1: Use o método da convolução para determinar


 
−1 1
f (x) = F ·
(1 + iω )2

S OLUÇÃO : A transformada de Fourier de f (x) é dada por


  
1 1 1
F(ω ) = = ·
(1 + iω )2 1 + iω 1 + iω
No exemplo 3.2 viu-se que
  1 1 ,
F e −α x · u0(x) = √ · (α > 0),
2π α + i ω
ou ainda,
1 √  
= 2π · F e −α x · u0(x) .
α + iω
Tomando α = 1, obtém-se
1 √  
= 2π · F e −x · u0(x) .
1 + iω
Portanto, a transformada de Fourier de f agora se reescreve na forma
  
1 1
F(ω ) =
1 + iω 1 + iω
n√  o n√  o
= 2π · F e −x · u0 (x) · 2π · F e −x · u0 (x)
380 3 Transformada de Fourier

√ n√  −x   −x o
= 2π · 2π · F e · u0(x) · F e · u0 (x)
√    
= 2π · F e −x · u0 (x) ∗ e −x · u0(x) .
Aplicando a transformada inversa em ambos os membros, conclui-se que
√    
f (x) 2π e −x · u0(x) ∗ e −x · u0 (x)

que é o resultado desejado.


Observa-se que a função f (x) pode ser apresentada de maneira explícita ao se calcular a
integral de convolução, mas isso é deixando como exercício proposto (exercício 4 item b deste
capítulo)

Exemplo 6.2: Determine o produto de convolução entre as duas funções dadas abaixo:
(
e −x , para x > 0,
f (x) = e −x · u0(x) =
0, caso contrário.
e (
e −2x, para x > 0,
g(x) = e −2x · u0(x) =
0, caso contrário.

S OLUÇÃO : Usando a definição de produto de convolução, obtém-se


Z ∞
( f ∗ g)(x) = f (y) g(x − y) dy
−∞
Z 0 Z ∞
= f (y) g(x − y) dy + f (y) g(x − y) dy
−∞ 0
Z ∞
= e −y · e −2(x−y) · u0(x − y) dy
0
Z ∞
= e −y · e −2x · e 2y · u0(x − y) dy
0
Z ∞
=e −2x
e y · u0(x − y) dy
0

Na última integral acima, se fez a mudança de variáveis z = x − y (de modo que −dz = dy),
sendo a nova integral calculada de x até −∞. Assim,
Z ∞
( f ∗ g)(x) = e −2x e y · u0 (x − y) dy
0
 Z −∞

−2x x−z
=e − e · u0(z) dz
x
3.6 Produto de transformadas e convolução 381

Z x
=e −2x
e x−z · u0 (z) dz
−∞
Z 0 Z x
= e −2x e x · e −z · u0(z) dz + e −2x e x · e −z · u0 (z) dz
−∞ 0
 x
= e −2x · 0 + e −2x · −e x · e −z
0

−2x −2x x
 0
−z
=e ·0+e · e ·e
x

= e −2x · 0 + e −2x · e x · 1 − e x · e −x

= e −2x · 0 + e −2x · (e x − 1)
(
0, se x < 0,
=
e −2x · (e x − 1) se x ≥ 0,

= e −2x · (e x − 1) · u0(x).

Exemplo 6.3: Use o método da convolução para encontrar a função f : R → C cuja transfor-
mada de Fourier é dada por
1
F(ω ) = ·
(2 + iω )(3 + iω )

S OLUÇÃO : Faça
1 1
G(ω ) = e H(ω ) = ·
2 + iω 3 + iω
Logo, F(ω ) = G(ω ) · H(ω ). O teorema da convolução (teorema 6.1) afirma que

F [(g ∗ h)(x)] = 2π · G(ω ) · H(ω ).

Segue-se daí que


1
f (x) = √ · (g ∗ h)(x).

Pela fórmula 4 da tabela,
 
1 √
F −1
= 2π · e −α x · u0 (x).
α + iω
Logo, α = 2 para G(ω ) e α = 3 para H(ω ), segue-se que
√ √
g(x) = 2π · e −2x · u0(x) e h(x) = 2π · e −3x · u0(x).
Deste modo, para determinar f , deve-se fazer o produto de convolução entre as duas funções

acima e dividir por 2π . Assim,
382 3 Transformada de Fourier

Z
1 1 ∞
f (x) = √ (g ∗ h)(x) = √ g(y) h(x − y) dy
2π 2π −∞
Z ∞ h√ i h√ i
1 −2y −3(x−y)
= √ 2π · e · u0(y) 2π · e · u0(x − y) dy
2π −∞
Z 0 h√ i h√ i
1
=√ 2π · e −2y · u0(y) 2π · e −3(x−y) · u0(x − y) dy +
2π −∞
Z ∞ h√ i h√ i
1
+ √ 2π · e −2y · u0 (y) 2π · e −3(x−y) · u0(x − y) dy
2π 0
Z 0 h√ ih√ i
1
=√ 2π · e −2y · 0 2π · e −3(x−y) · u0(x − y) dy +
2π −∞
Z ∞ h√ i h√ i
1
+ √ 2π · e −2y · 1(y) 2π · e −3(x−y) · u0 (x − y) dy
2π 0
√ −3x
√ Z ∞ −2y −3x 3y
= 2π · e · 0 + 2π e ·e · e · u0(x − y) dy
0
√ √ Z ∞
= 2π · e −3x
· 0 + 2π · e −3x
e y · u0 (x − y) dy
0

Na última integral acima, se faz a mudança de variáveis z = x − y (de modo que −dz = dy),
sendo a nova integral calculada de x até −∞. Assim,

 Z 
√ −3x
√ −3x
−∞
x−z
f (x) = 2π · e · 0 + 2π · e − e · u0(z) dz
x
Z 
√ −3x
√ −3x
x
x −z
= 2π · e · 0 + 2π · e e ·e · u0(z) dz
−∞
 Z 
√ √ x
= 2π · e −3x
· 0 + 2π · e −3x
ex e −z
· u0(z) dz
−∞
 Z Z x 
√ √ 0
= 2π · e −3x
· 0 + 2π · e −3x
ex e −z
· u0(z) dz + e x
e −z
· u0(z) dz
−∞ 0
 Z Z x 
√ √ 0
= 2π · e −3x
· 0 + 2π · e −3x
ex e −z
· 0 dz + e x
e −z
· 1 dz
−∞ 0
 Z x 
√ −3x
√ −3x x −z
= 2π · e · 0 + 2π · e e e dz
0
x !
√ √
−3x −3x x −z
= 2π · e · 0 + 2π · e −e · e

0
√ √  
= 2π · e −3x · 0 + 2π · e −3x −e x e −x − 1
√ √
= 2π · e −3x · 0 + 2π · e −3x (e x − 1)
3.6 Produto de transformadas e convolução 383

(
√ e x − 1, se x ≥ 0
= 2π · e −3x
0, se x < 0

= 2π · e −3x · (e x − 1) · u0(x)
√ 
= 2π · e −2x − e −3x · u0 (x).
O leitor poderá conferir que a resposta obtida acima está em conformidade com a resposta do
exemplo 4.8 e que foi obtida por outro método.

Exemplo 6.4: Resolva a seguinte equação integral:


Z ∞
2
f (y) · f (x − y) dy = e −x .
−∞

S OLUÇÃO : Observe que o primeiro membro é o produto de convolução da função f com ela
mesma. Agora aplica-se a transformada de Fourier em ambos os membros da equação:
Z ∞   2
F f (y) · f (x − y) dy = F e −x .
−∞

O teorema da convolução no tempo e a fórmula 7 da tabela dizem, respectivamente, que


√   1
2 −ω 2
F [( f ∗ g)(x)] = 2π · [ F(ω ) · G(ω )] e F e −α x = √ · e /4α .

Tomando-se g igual a f e α = 1, segue-se que
√ 1 −ω 2
2π · [F(ω ) · F(ω )] = √ · e /4
2
1 1 −ω 2 1 −ω 2
F 2(ω ) = √ · √ · e /4 = √ · e /4
2π 2 4π
 1/2
2 1 −ω 2
F (ω ) = · e /4

"  1 #1/2 " 1 #1/2
1 /2 −ω 2/4 1 /2  2 1/2
−ω
F(ω ) = ·e = · e /4
4π 4π
 1/4
1 −ω 2/8
F(ω ) = ·e .

Para determinar a solução f (x), aplica-se a transformada inversa em ambos os membros na
igualdade obtida acima, bem como a fórmula 7 da tabela, que diz que
 2  √ 2
−1
e /4α = 2α · e −α x ,
−ω
F (α > 0).
384 3 Transformada de Fourier

Portanto, tomando α = 2 na fórmula 7, obtém-se


" 1 #
/4
1 2
f (x) = F −1 [F(ω )] = F −1 · e /8
−ω


 1/4  
1 −1 −ω 2/(4·2)
= ·F e

= (fórmula 7 da tabela com α = 2)


 1/4    1 1/4  
1 −2x2 1 2
= · 2·e = · 4 /2 · e −2x
4π 4π
 1/4  1/2 
1 1/2 −2x2
= · 16 ·e

 1/4
1 1 2
= · 16 /4 · e −2x

 1/4
16 2
= · e −2x

 1/4
4 2
= · e −2x .
π
Portanto, a solução para a equação integral é dada por
 1/4
4 2
f (x) = · e −2x .
π

3.7 Teorema de Plancherel

Lema 7.1: Sejam f , g : R → C funções pertencentes a L1(R, C). Se F(ω ) = F [ f (x)] e


G(ω ) = F [g(x)], então
Z ∞ Z ∞
(7.1) f (x) g(x) dx = F(ω ) G(−ω ) d ω .
−∞ −∞

D EMONSTRAÇÃO : Segue-se do teorema 6.2 (convolução na frequência) que


Z ∞
1 1
F [ f (x) · g(x)] = √ · [F(α ) ∗ G(α )] = √ F(ω ) G(α − ω ) d ω ,
2π 2π −∞
3.7 Teorema de Plancherel 385

ou ainda, Z Z ∞
1 ∞ 1
√ e −iα x [ f (x) g(x)] dx = √ F(ω ) G(α − ω ) d ω .
2π −∞ 2π −∞
Simplificando e tomando α = 1, resulta
Z ∞ Z ∞
f (x) g(x) dx = F(ω ) G(−ω ) d ω .
−∞ −∞

Lema 7.2: Sejam f , g : R → C funções pertencentes a L1(R, C). Se F(ω ) = F [ f (x)] e


G(ω ) = F [g(x)], então
Z ∞ Z ∞
(7.2) f (x) g(x) dx = F(ω ) · G(ω ) d ω ,
−∞ −∞

onde G(ω ) designa o conjugado complexo de G(ω ).


D EMONSTRAÇÃO : O corolário 3.1 da seção 3.3 afirma: A condição F(−ω ) = F(ω ) é uma
condição necessária e suficiente para que f seja uma função real.
Por hipótese, f e g são funções reais; em particular, para a função g, tem-se que G(−ω ) =
G(ω ). Assim, usando a identidade (7.1) do lema 7.1, obtém-se
Z ∞ Z ∞
f (x) g(x) dx = F(ω ) G(−ω ) d ω
−∞ −∞
Z ∞
= F(ω ) G(ω ) d ω .
−∞

Lema 7.3: Sejam z = a + ib e w = c + id números complexos e f : R → C uma função dada


por f (x) = u(x) + i(v) e pertencente ao espaço L1(R, C). Então,

(a) z + w = z + w.
(b) z · w = z · w;
Z b Z b
(c) f (x) dx = f (x) dx;
a a
Z b Z b

(d) [e iω x f (x)] dx = e iω x f (x) dx
a a
D EMONSTRAÇÃO : Para a parte (a), tem-se

z + w = (a + ib) + (c + id) = (a − ib) + (c − id)

= (a + c) − i(b + d) = (a + c) + i(b + d)
386 3 Transformada de Fourier

= (a + ib) + (c + id) = z + w.
Parte (b): observe primeiro que

z · w = (a + ib)(c + id) = (ac − bd) + i(ad + bc),

de modo que z · w = (ac − bd) − i(ad + bc).


Além disso,
z · w = (a + ib) · (c + id) = (a − ib) · (c − id)

= (ac − bd) − i(ad + bc) = z · w.


Para a parte (c), tem-se
Z b Z b
f (x) dx = [u(x) + iv(x)] dx
a a
Z b
= [u(x) − iv(x)] dx
a
Z b Z b
= u(x) dx − i v(x) dx
a a
Z b Z b
= u(x) dx + i v(x) dx
a a
Z b
= [u(x) + iv(x)] dx
a
Z b
= f (x) dx.
a

Para a parte (d), tem-se


Z b Z b
[e iω x f (x)] dx = {e iω x [u(x) + iv(x)]} dx
a a
Z b
(b)
= e iω x · [u(x) + iv(x)] dx
a
Z b
= e −iω x[u(x) − iv(x)] dx
a
Z b Z b
= e −iω x u(x) dx − i e −iω x v(x) dx
a a
Z b Z b
= e iω x u(x) dx − i e iω x v(x) dx
a a
Z b
 Z b

(c)
= e iω x u(x) dx −i e iω x v(x) dx
a a
3.7 Teorema de Plancherel 387

Z b Z b
= e iω x u(x) dx + i e iω x v(x) dx
a a
Z b
= e iω x [u(x) + iv(x)] dx
a
Z b
= e iω x f (x) dx.
a

Teorema 7.1 (Plancherel): Seja f : R → C uma função pertencente a L1(R, C). Se F(ω ) =
F [ f (x)], então
Z ∞ Z ∞
2
(7.3) | f (x)| dx = |F(ω )|2 d ω .
−∞ −∞

D EMONSTRAÇÃO : Suponha que f : R → C. Se F(ω ) = F [ f (x)], então


h i Z ∞
1
F f (x) = √ e −iω x f (x) dx
2π −∞
Z ∞
1
=√ [e iω x f (x)] dx
2π −∞
Z 
1 ∞
=√ e iω x f (x) dx
2π −∞
Z 
1 ∞
=√ e −i(−ω )x f (x) dx
2π −∞

= F(−ω ).

Agora aplica-se o lema 7.1 fazendo f (x) = f (x) e g(x) = f (x), onde f é dada por f (x) =
u(x) + iv(x). Assim,
Z ∞
1
G(−ω ) = √ e −i(−ω )x g(x) dx
2π −∞
Z ∞
1
=√ e iω x f (x) dx
2π −∞
Z ∞
1
=√ e iω x [u(x) − iv(x)] dx
2π −∞
Z ∞
1
=√ e −iω x [u(x) + iv(x)] dx
2π −∞
Z ∞
1
=√ e −iω x f (x) dx
2π −∞
388 3 Transformada de Fourier

 Z ∞ 
1
= √ e −iω x f (x) dx = F(ω ).
2π −∞
Portanto,
Z ∞ Z ∞ Z ∞
(7.4) f (x) · f (x) dx = F(ω ) G(−ω ) d ω = F(ω )F (ω ) d ω .
−∞ −∞ −∞

Mas f (x) · f (x) = | f (x)|2 e F(ω ) · F(ω ) = |F(ω )|2 . Substituindo em (7.4), obtém-se
Z ∞ Z ∞
| f (x)|2 dx = |F(ω )|2 d ω ,
−∞ −∞

que é o resultado desejado.

Exemplo 7.1: A fórmula de Plancherel permite o cálculo de certas integrais. Por exemplo, se
(
1, se | x | ≤ 1
f (x) =
0, se | x | > 1,

então, pelo exemplo 3.1, tem-se que




 2  sen ω  ,

 2π ·
 se ω 6= 0,
ω
F(ω ) =

 2
√ ,
 se ω = 0,

onde se fez α = 1 naquele exemplo.
O teorema de Plancherel afirma que
Z ∞ Z ∞
2
| f (x)| dx = |F(ω )|2 d ω .
−∞ −∞

Observe agora que a integral no primeiro membro acima, em virtude da função f , ficará
restrita ao intervalo [−1, 1], pois f é igual a zero fora deste intervalo. Assim, substituindo as
expressões para f e F na fórmula de Plancherel, obtém-se
Z 1 Z ∞ 
2 sen ω 2
1 dx = √ · dω.
−1 −∞ 2π ω
Assim, 1
Z ∞
4 sen ω 2
d ω = x = 1 − (−1) = 2,
2π −∞ ω −1
ou ainda, Z ∞
2 sen ω 2
d ω = 2,
π −∞ ω
ou seja,
3.7 Teorema de Plancherel 389

Z ∞
sen ω 2
dω = π.
−∞ ω
390 3 Transformada de Fourier

3.8 Exercícios propostos

Exercício 3.1: Calcule as transformadas de Fourier das funções abaixo:

(a) f (x) = e −a |x | , a > 0.


(b) f (x) = e −a |x | cos(α x), a > 0, α ∈ R.
2
(c) f (x) = e −a x sen (α x), a > 0, α ∈ R.
(
1 − | x − 2| , se | x − 2| ≤ 1,
(d) f (x) =
0, se | x − 2| > 1.

2
Exercício 3.2: Seja f (x) = e ix = cos x2 + i sen x2 .

(a) Mostre que f satisfaz a equação diferencial f 0 (x) − 2 i x f (x) = 0.


(b) Aplique a transformada de Fourier na equação diferencial do item (a) para obter
ω
F [ f 0 ](ω ) − F [ f ](ω ) = 0.
2i
(c) Resolva a equação diferencial do item (b) e encontre que
−i ω 2/4
F(ω ) = F(0) e .

(d) Usando o fato


Z ∞ Z ∞
1 1 2 1 i,
F(0) = √ f (x) dx = √ e ix dx = +
2π −∞ 2π −∞ 2 2
mostre que   2   2 
1 ω −π ω +π
F(ω ) = √ cos + i cos ·
2 4 4
(e) Use o item (d) para mostrar que
 2 
2
 1 ω −π ,
F cos x (ω ) = √ cos
2 4
 2 
2 1  ω +π
F sen x (ω ) = √ cos ·
2 4
   
(f) Usando o item (e), encontre F cos(a x2 ) (ω ) e F sen (a x2 ) (ω ), para a > 0.

Exercício 3.3: Determine as funções f : R → C cujas transformadas de Fourier são dadas


por:
1
(a) F(ω ) = ;
(2 + i ω )(3 + i ω )
3.8 Exercícios propostos 391

1
(b) F(ω ) = ;
(1 + i ω )2

(c) F(ω ) = ;
1 + ω2
1
(d) F(ω ) = 2 ;
ω +ω +1
1 , onde a > 0 e b ∈ R;
(e) F(ω ) =
a + ib − iω
1
(f) F(ω ) = ·
4 + 2iω − ω 2

Exercício 3.4: Usando convolução, determine as funções f : R → C cujas transformadas de


Fourier são dadas por:
1
(a) F(ω ) = ;
(2 + i ω )(3 + iω )
1
(b) F(ω ) = ;
(1 + i ω )2
1
(c) F(ω ) = ·
4 + 2 i ω − ω2

Exercício 3.5: Resolva a equação


Z ∞
f (y) 1
2
dy = 2 ·
−∞ (x − y) + 4 x +9

Exercício 3.6: Resolva a equação integral abaixo:


Z ∞
y(x) = g(x) + y(u) r(x − u) du,
−∞

onde g(x) e r(x) são funções dadas.

Exercício 3.7: Resolva para y(x) a seguinte equação integral:


Z ∞
y(u) du 1 ,
2 2
= 2 (0 < a < b).
−∞ (x − u) + a x + b2

Exercício 3.8: Use a transformada de Fourier para resolver o seguinte problema:




 y00 − y = f (x), para − ∞ < x < ∞,

 lim y(x) = 0,
x→±∞

onde f é uma função integrável e absolutamente integrável em R.


392 3 Transformada de Fourier

Respostas dos exercícios

2 a
Exercício 3.1: (a) F(ω ) = √ · 2 ·
2π ω + a2
 
1 a a
(b) F(ω ) = √ + ·
2π a2 + (α + ω )2 a2 + (α − ω )2
i h −(ω −α )2/4a −(ω +α )2/4a
i
(c) F(ω ) = − √ e −e ·
2 2a
2 e −2iω (1 − cos ω )
(d) F(ω ) = √ · ·
2π ω2
 2   2 
 2
 1 ω π  2
 1 ω π
(f) F cos ax = √ · cos − e F sen ax = √ · cos + ·
2a 4a 4 2a 4a 4
√ 
Exercício 3.3: (a) f (x) = 2π e −2x − e −3x u0 (x).

(b) f (x) = 2π · x · e−x · u0(x).

2π x · e −|x| , d|x| |x|
(c) f (x) = − · pois = para x 6= 0.
2 |x| dx x

2π − √3|x|+ix)/2
(d) f (x) = √ · e ( .
3

(e) f (x) = 2π · e (a+ib)x · u0 (−x).

i 6π h −(1+i√3)x √
−(1−i 3)x
i
(f) f (x) = e −e u0(x).
6

√ 
Exercício 3.4: (a) f (x) = 2π e −2x − e −3x u0 (x).

(b) f (x) = 2π · x · e −x u0 (x).

i 6π h −(1+i√3)x √
−(1−i 3)x
i
(c) f (x) = e −e u0 (x).
6

2 1
Exercício 3.5: f (x) = · 2 ·
3π x + 1
Z ∞
1 G(ω )
Exercício 3.6: y(x) = √ e iω x · √ dω.
2π −∞ 1 − 2π · R(ω )

(b − a) · a
Exercício 3.7: y(x) = ·
bπ · [ x2 + (b − a)2]
3.8 Exercícios propostos 393

Z ∞
1
Exercício 3.8: y(x) = − f (y) · e −|x−y| dy.
2 −∞
394 3 Transformada de Fourier

Tabela de transformadas de Fourier

Transformadas de Fourier elementares

N.o f (x) = F−1 [F(ω )] F(ω ) = F[ f (x)]


Z ∞
1
Def. f (x) √ e−i ω x f (x) dx
2π −∞

 1, 0 ≤ x < α, 1 1 − e −i αω ,
1. χ[0,α ] (x) = √ · (ω 6= 0)
 0, caso contrário. 2π iω

 1, −α ≤ x < 0, 1 e i αω − 1 ,
2. χ[−α ,0] (x) = √ · (ω 6= 0)
 0, caso contrário. 2π iω

 1, −α ≤ x < α , 2 sen (αω ) ,
3. χ[−α ,α ] (x) = √ · (ω 6= 0)
 0, caso contrário. 2π ω

 e −α x, se x ≥ 0, 1 1
−α x
4. e · u0(x) = √ · , (α > 0)
 0, se x < 0. 2π α + i ω

 0, se x ≥ 0, 1 1
5. e α x · u0(−x) = √ · , (α > 0)
 e α x, se x < 0. 2π α − i ω

α , 2π −α | ω |
6. (α > 0) ·e
x2 + α 2 2
2 1 2
7. e −α x , (α > 0) √ · e − ω /4α

1 ω 
8. f (α x), (α 6= 0) ·F
| α| α

9. f (x − x0 ) e − i ω x0 · F(ω )

10. e i ω0 x · f (x) F (ω − ω0 )

11. F(x) f (−ω )

12. f 0 (x) i ω · F(ω )

13. f 00 (x) −ω 2 · F(ω )


3.8 Exercícios propostos 395

N.o f (x) = F−1 [F(ω )] F(ω ) = F[ f (x)]

14. x · f (x) i · F 0 (ω )

15. x2 · f (x) −F 00 (ω )
Z x
F(ω )
16. f (t) dt
0 iω
Z ∞ √
17. ( f ∗ g)(x) = f (x − y) g(y) dy 2π [F (ω ) · G (ω )]
−∞
Z
1 ∞
18. f (x) · g(x) √ [(F ∗ G) (ω )] = F(ω − β ) G(β ) d β
2π −∞

F(ω − ω0 ) + F(ω + ω0)


19. f (x) · cos(ω0 x)
2
F(ω − ω0 ) − F(ω + ω0)
20. f (x) · sen (ω0 x)
2i
 
∂u
21. (x, t) iω · F [u(x, t)]
∂x
 2 
∂ u
22. (x, t) −ω 2 · F [u(x, t)]
∂ x2
 
∂u ∂
23. (x, t) F [u(x, t)]
∂t ∂t
 2 
∂ u ∂2
24. (x, t) F [u(x, t)]
∂ t2 ∂ t2
Z ∞ Z ∞
2
25. | f (x)| dx = |F(ω )|2 d ω (Fórmula de Plancherel)
−∞ −∞

O BS .: na fórmula (11) acima, deve-se entender: a expressão F(x) é usada para denotar a
transformada de Fourier, F(ω ), onde se permuta a variável ω em sua fórmula pela variável x. Já
na segunda coluna, a expressão f (−ω ) significa que é a função original, f (x), onde é trocado
de papéis x por − ω . Isto segue-se da fórmula de inversão.
396 3 Transformada de Fourier

Apêndice: a integral de Dirichlet

Foi comentado ao longo deste texto que a integral imprópria


Z ∞
sen x
dx
−∞ x
é convergente, porém não absolutamente. Este apêndice abordará este assunto.
Observe-se que a integral acima pode ser escrita como
Z ∞ Z 0 Z ∞
sen x sen x sen x
dx = dx + dx.
−∞ x −∞ x 0 x
Assim, basta analisar apenas uma das integrais do segundo membro. A integral
Z ∞
sen x
dx
0 x
é conhecida como integral de Dirichlet.

Convergência da integral

D EFINIÇÃO : Seja f uma função definida em um intervalo [a, b]. Suponha que f é integrável
em [a, b] para todo c ∈ (a, b) e que f não seja limitada em toda vizinhança de b, ou seja, que
existe uma sequência {xn } de pontos que tende para b e para os quais | f (xn )| → +∞. Diz-se que
o ponto b é uma singularidade da função f .

Proposição 8.1: A integral imprópria


Z ∞
sen x
dx
0 x
é convergente.
D EMONSTRAÇÃO : Observa-se inicialmente que, do Cálculo, segue-se
sen x
lim = 1.
x→0 x
O resultado acima é conhecido com limite trigonométrico fundamental. Ele pode ser demons-
trado de várias maneiras; em particular é possível usar a regra de l’Hopital, visto que se trata de
uma indeterminação do tipo 0/0 (“zero sobre zero”).
Note-se que o integrando é não singular em x = 0; na verdade tem-se uma singularidade
removível na origem. Assim, a singularidade da integral se encontra, portanto, no limite superior
(ou seja, o domínio é ilimitado).

Para qualquer a > 0, pode-se escrever


3.8 Exercícios propostos 397

Z ∞ Z a
sen x sen x
dx = lim dx.
0 x a→∞ 0 x
Como a > 0 é qualquer, então existe um n ∈ N tal que a = nπ + rn, onde 0 ≤ rn ≤ π . Assim,
tem-se que n → ∞ quando a → ∞.
Pode-se escrever:
Z a Z nπ Z a
sen x sen x sen x
dx = dx + dx
0 x 0 x nπ x
Z nπ Z nπ +rn
sen x sen x
= dx + dx
0 x nπ x
= I1 + I2,
onde Z nπ Z nπ +rn
sen x sen x
I1 = dx e I2 = dx.
x 0 nπ x
A NÁLISE DE I 2 : inicialmente, observe que, para a integral I 2, se tem nπ ≤ x ≤ nπ + rn .
Assim, de nπ ≤ x, segue-se que
1 1 ,

x nπ
donde Z nπ +r Z nπ +r Z nπ +rn
n sen x n sen x 1

dx ≤ dx ≤ dx
nπ x nπ x nπ |x|
Z nπ +rn Z nπ +rn
1 1
= dx ≤ dx
nπ x nπ nπ
1 nπ +rn
= x
nπ n π
1
= [(nπ + rn) − nπ ]

rn π 1
= ≤ = ,
nπ nπ n
pois rn ≤ π .
Segue-se daí que I2 → 0 quando a → ∞. Portanto, é suficiente mostrar que I1 tem um limite
quando a → ∞.

A NÁLISE DE I1 : observe que se pode escrever


Z nπ
sen x
I1 = dx
0 x
Z π Z 2π Z nπ
sen x sen x sen x
= dx + dx + · · · + dx
0 x π x (n−1)π x
n Z kπ n
sen x
= ∑ x
dx = ∑ ak ,
k=1 (k−1)π k=1
398 3 Transformada de Fourier

onde Z kπ
sen x
ak = dx.
(k−1)π x
Note que as integrais
Z π Z 3π Z 5π
sen x sen x sen x
dx, dx, dx, . . .
0 x 2π x 4π x
estão definidas para valores de x nos primeiro e segundo quadrantes, de modo que seus valores
são positivos (pois o seno é não negativo nestes quadrantes). Além disso, as integrais
Z 2π Z 4π Z 6π
sen x sen x sen x
dx, dx, dx, . . .
π x 3π x 5π x
estão definidas para valores de x nos terceiro e quarto quadrantes, assim seus valores são nega-
tivos (pois o seno é não positivo nestes quadrantes). Segue-se desta observação que os sinais
dos coeficientes ak se alternam.
As figuras 8.1 e 8.2 exibem o gráfico da função ( senx)/x para 0 < x < ∞.

Figura 8.1: Gráfico da função senx/x.

Figura 8.2: Gráfico da função senx/x com eixo y ampliado.

Faça
3.8 Exercícios propostos 399

Z kπ sen x

bk = dx.
(k−1)π x
Ou seja, ak = (−1)k−1 bk para todo k ∈ N. Assim, fazendo u = x − (k − 1)π , obtém-se
sen x = sen [u + (k − 1)π ]

= sen u · cos(k − 1)π + sen (k − 1)π · cosu

= (−1)k−1 sen u,

pois cos(k − 1)π = (−1)k−1 e sen (k − 1)π = 0.


Como u = x − (k − 1)π , segue-se de (k − 1)π ≤ x ≤ kπ , que 0 ≤ u ≤ π . Assim,
Z kπ Z π
k−1 sen u Z π
sen x (−1) | sen u|
bk = dx = du = du,
(k−1)π x 0 u + (k − 1)π 0 u + (k − 1)π

para todo k ∈ N.
Como 0 ≤ u ≤ π , então, para todo k ∈ N, tem-se
1 1
u + (k − 1)π ≤ u + kπ ⇒ ≤ ·
u + kπ u + (k − 1)π
Portanto,
| sen u| | sen u| ,

u + kπ u + (k − 1)π
de modo que Z π Z π
| sen u| | sen u|
bk = du ≥ du = bk+1.
0 u + (k − 1)π 0 u + kπ
Isso mostra que bk ≥ bk+1 para todo k ∈ N, ou seja, tem-se uma sequência decrescente for-
mada por termos positivos. Logo, a sequência dos ak satisfaz
Z kπ
sen x
ak = dx
(k−1)π x
Z kπ sen x

= (−1)k−1 dx
(k−1)π x
Z π
k−1 | sen u|
= (−1) du
0 u + (k − 1)π

= (−1)k−1bk ,
de modo que também tem seus termos decrescendo em valores absolutos, mas alternada em
seus sinais (em relação aos bk ).
Assim,
Z nπ n
sen x
I1 =
0 x
dx = ∑ ak
k=1
400 3 Transformada de Fourier

n Z π
k−1 | sen u|
= ∑ (−1) 0 u + (k − 1)π
du
k=1
Z π Z π Z π Z π
| sen u| | sen u| | sen u| | sen u|
= du − du + du − du + · · ·
0 u 0 u+π 0 u + 2π 0 u + 3π
Z π Z π Z π Z π
sen u sen u sen u sen u
(8.1) = du − du + du − du + · · ·
0 u 0 u+π 0 u + 2π 0 u + 3π
pois sen u é não negativo para 0 < u ≤ π .
Antes de concluir, é interessante analisar a primeira integral em (8.1) acima:
Z π
sen u
du.
0 u
Seu integrando é análogo aquele que aparece na integral I1, mas isto não é um problema, pois
a função ( senu)/u é contínua para 0 < u ≤ π e, além disso,
sen u
lim = 1,
u→0 u
como já foi comentado. Logo esta integral converge.
O importante era compreender o que estava se passando com as demais integrais que for-
maram a série acima. Viu-se que I1 pode ser escrita como uma série alternada de termos decres-
centes e que ak → 0 (pela mesma razão que I2 → 0). Logo tal série é convergente.
Portanto I1 é a soma da integral Z π
sen u
du
0 u
com uma série alternada convergente; portanto I1 converge. Ou seja, demonstrou-se, assim, que
Z ∞ Z a
sen x sen x
dx = lim dx
0 x a→∞ 0 x
converge.

Observação 8.1: Como foi comentado anteriormente, tem-se que


Z ∞ Z 1 Z ∞
sen x sen x sen x
dx = dx + dx.
0 x 0 x 1 x
Além disso, por senx/x ser contínua, conclui-se que a primeira integral no segundo membro
acima existe, ou seja, que ela é convergente. Assim, a análise da convergência da integral do
primeiro membro se resume à análise da convergência da segunda integral do segundo membro.
Um método diferente daquele usado para demonstrar a proposição 8.1 feita anteriormente
também pode ser aplicado: integração por partes. Tem-se que
3.8 Exercícios propostos 401

Z a Z a
sen x 1
dx = · d(− cosx)
1 x 1 x
a  
Z a
cos x 1
=− + cos x · d
x 1 x
1
Z a
cos a cos x
=− + cos1 − dx.
a 1 x2
Assim,
Z ∞ Z a
sen x sen x
dx = lim dx
1 x a→∞ 1 x
 Z a 
cos a cos x
= lim − + cos 1 − dx
a→∞ a 1 x2
Z a
cos a cos x
= − lim + lim cos 1 − lim dx
a→∞ a a→∞ a→∞ 1 x2
Z ∞
cos x
(8.2) = cos 1 − dx,
1 x2
pois
cos a
lim
= 0.
a→∞ a
Observa-se que a integração por partes substituiu a integral imprópria original,
Z ∞
sen x
dx,
1 x
por outra integral imprópria: Z ∞
cos x
dx,
x2 1
que aparece em (8.2). Entretanto, esta última integral é absolutamente integrável.
Para ver isto, usa-se o teste da comparação para integrais impróprias. De fato, basta notar que
cos x 1

2 ≤ 2, para x ≥ 1.
x x
Assim,
Z ∞ Z a
dx dx
= lim
1 x2 a→∞ 1 x2
Z a
= lim x−2 dx
a→∞ 1
  a
1
= lim −
a→∞ x
1
  1
1
= lim
a→∞ x
a
402 3 Transformada de Fourier

 
1
= 1 − lim
a→∞ a

= 1.
Assim, pelo teste da comparação, tem-se que
Z ∞ Z ∞
cos x dx ,
dx ≤
1 x2 1 x2
mostrando que a integral do primeiro acima convergente, pois a integral do segundo membro é
convergente.
Portanto, o método de integração por partes, usado aqui, mostrou que a integral de senx/x,
com x variando de 1 a ∞, é convergente.

Divergência absoluta da integral

Proposição 8.2: A integral Z ∞


sen x
dx
0 x
não é convergente.
D EMONSTRAÇÃO : A ideia da demonstração consiste em escrever
Z ∞ Z nπ
sen x sen x
dx = lim dx, n ∈ N,
0 x n→∞ 0 x
e mostrar que o limite no segundo membro acima tende para infinito, donde concluir-se-á a
divergência da integral no primeiro membro.
Considere x ≥ 0 no intervalo
  
π 5π
kπ + ≤ x ≤ kπ + ·
6 6
Observe que da imediata desigualdade 6kπ + 5π ≤ 6kπ + 6π , obtém-se
1 1
(8.3) ≤ ·
6kπ + 6π 6kπ + 5π
Assim, segue-se de
5π 6kπ + 5π
x ≤ kπ + =
6 6
e de (8.2), que
1 6 6 1
(8.4) ≥ ≥ = ·
x 6kπ + 5π 6kπ + 6π (k + 1)π
3.8 Exercícios propostos 403

Observe agora que, para  


 π 5π ,
kπ + ≤ x ≤ kπ +
6 6
tem-se que | sen x| ≥ 1/2, pois nos extremos do intervalo acima tem-se que seno vale ±1/2. Veja
a figura 8.3 abaixo.

Figura 8.3: Intervalo kπ + π/6 ≤ x ≤ kπ + 5π/6.

Segue-se daí que


sen x 1 ,

≥ (x ≥ 0).
x 2x
Assim, usando-se (8.4), obtém-se
sen x 1 1

(8.5) ≥ ≥ ·
x 2x 2(k + 1)π
Note que
  
5π π  2π ,
(k + 1)π − kπ = π e kπ + − kπ + =
6 6 3
donde segue-se, devido a positividade do integrando, que
Z (k+1)π Z k π +5π/6
sen x sen x
(8.6) dx ≥ dx.
kπ x k π +π/6 x
Deste modo, usando (8.5) e (8.6), obtém-se
Z (k+1)π Z k π +5π/6
sen x sen x
dx ≥ dx
kπ x k π +π/6 x
Z k π +5π/6
1
≥ dx
2(k + 1)π k π +π/6
404 3 Transformada de Fourier

1 kπ +5π/6

= x
2(k + 1)π kπ +π/6
   
1 5π π
= kπ + − kπ +
2(k + 1)π 6 6
1 2π 1
(8.7) = · = ·
2π (k + 1) 3 3(k + 1)
Observe agora que
Z nπ Z π Z 2π Z nπ sen x
sen x sen x sen x
dx = dx + dx + · · · + dx
0 x 0 x π x (n−1)π x
n−1 Z (k+1)π
sen x

(8.8) = ∑ dx.
k=0 kπ x

Assim, usando (8.7) e (8.8), obtém-se


Z nπ n−1 Z (k+1)π
sen x sen x

0

x
dx = ∑ kπ

x
dx
k=0

1 n−1 1
≥ ∑ k+1
3 k=0

1 n 1
(8.9) = ∑ ·
3 k=1 k

Agora basta observar que, quando n → ∞, a soma no último membro de (8.9) transforma-se
na série

1
∑ k,
k=1
(a menos da constante multiplicativa 1/3) que é a série harmônica e, portanto, divergente.
Além disso, quando se toma n → ∞, a integral no primeiro membro de (8.9) se transforma
em Z ∞
sen x
dx,
0 x
que é divergente, pois é maior ou igual a série harmônica que é divergente.

Valor da integral de Dirichlet

Na proposição 8.1, mostrou-se que a integral imprópria


3.8 Exercícios propostos 405

Z ∞
sen x
dx
0 x
é convergente, mas o seu valor não foi explicitado. Porém isto pode ser feito e será objeto do
exemplo 8.1 que se encontra mais adiante.
A fim de determinar o valor da integral de Dirichlet, serão necessários usar dois outros resul-
tados, que é objeto dos dois primeiros exemplos.

Exemplo 8.1: Mostre que


Z ∞  
1 − cosx 1 α 
e −α x
· dx = arc tg − · ln α 2 + 1 , α > 0.
0 x2 α 2

S OLUÇÃO : Pela fórmula de integração


Z
e au
e au cos(bu) du = [a cos(bu) + b sen (bu)] + c,
a2 + b2
para α > 0, segue-se que
Z ∞ Z k
−α x
e cos(rx) dx = lim e −α x cos(rx) dx
0 k→∞ 0
 
e −α x [−α cos(rx) + r sen (rx)] k
= lim
k→∞ α 2 + r2 0
 −α x  k
e [r sen (rx) − α cos(rx)]
= lim
k→∞ α 2 + r2 0
 −α k 
e [r sen (rk) − α cos(rk)] e −α .0 [r sen (r.0) − α cos(r.0)]
= lim −
k→∞ α 2 + r2 α 2 + r2
 −α k   
e [r sen (rk) − α cos(rk)] α
= lim + lim
k→∞ α 2 + r2 k→∞ α 2 + r2

r h i α h i α
−α k −α k
= 2 2
lim e sen (rk) − 2 2
lim e cos(rk) + 2
α + r k→∞ α + r k→∞ α + r2
α ,
= 2
α + r2
pois h i h i
−α k −α k
lim e · sen (rk) = 0 e lim e · cos(rk) = 0,
k→∞ k→∞
por serem produtos de funções, sendo uma limitada e outra tendendo para zero no infinito.
Portanto,
Z ∞
α
(8.10) e −α x cos(rx) dx = ·
0 α 2 + r2
Além disso, pelo teorema de Fubini, tem-se que
406 3 Transformada de Fourier

Z r Z ∞  Z 
∞ Z r

−α x −α x
e · cos(tx) dx dt = e · cos(tx) dt dx
0 0 0 0
Z ∞ Z r 
−α x
= e cos(rx) dt dx
0 0
Z ∞ 
−α x sen (tx) r
= e · dx
0 x 0
Z ∞ 
−α x sen (rx) −α x sen (t.0)
= e · −e · dx
0 x x
Z ∞
sen (rx)
= e −α x · dx.
0 x
Logo,
Z ∞ Z r Z ∞ 
−α x sen (rx) −α x
(8.11) e · dx = e · cos(tx) dx dt.
0 x 0 0

Mas a integral entre parênteses no segundo membro de (8.11) foi encontrada e seu valor está
na igualdade (8.10). Assim, substituindo-se (8.10) em (8.11) e usando a fórmula
Z u
du 1
= arc tg +c
a2 + u2 a a
obtém-se Z ∞ Z r
−α x sen (rx) α
e · dx = dt
0 x 0 α2 + t2
Z r
1
=α dt
0 α2 + t2
 t  r
= arc tg
α 0
 
r
0
= arc tg − arc tg
α α
r
= arc tg ·
α
Assim, Z ∞
sen (rx) r
e −α x ·
dx = arc tg ·
0 x α
Agora integra-se novamente de 0 a r ambos os membros acima.
Z r Z ∞  Z r t 
−α x sen (tx)
(8.12) e · dx dt = arc tg dt.
0 0 x 0 α
No primeiro membro usar-se-á novamente o teorema de Fubini para inverter a ordem dos
limites de integração e, em seguida, uma integração por partes. Já a integral no segundo membro
será calculada diretamente, a partir da seguinte fórmula:
3.8 Exercícios propostos 407

Z
1 
arc tg u du = u arc tgu − ln 1 + u2 + c.
2
Assim, fazendo u = t/α , encontra-se α du = dt, de modo que
Z r Z ∞  Z r t Z r/α
−α x sen (tx)
e · dx dt = arc tg dt = α arc tg u du
0 0 x 0 α 0
 
1 2
 r/α
= α u arc tgu − ln 1 + u
2
0
 r 1  
r r2
=α arc tg − ln 1 + 2 −
α α 2 α
 
1 2

− α 0 · arc tg 0 − ln 1 + 0
2
  r  1  α 2 + r2 
r
=α arc tg − ln
α α 2 α2
 r  α  α 2 + r2 
= r arc tg − ln
α 2 α2
r α  α
= r arc tg − ln α 2 + r2 + ln α 2
α 2 2
r α 
= r arc tg − ln α 2 + r2 + α ln α
α 2
r α 
(8.13) = r arc tg − ln α 2 + r2 .
α 2
Para a integral no primeiro membro de (8.12), segue-se do teorema de Fubini, seguido de
uma integração por partes, que
Z r Z ∞  Z ∞ Z r 
−α x sen (tx) −α x sen (tx)
e · dx dt = e · dt dx
0 0 x 0 0 x
Z ∞ −α x Z r 
e
= sen (tx) dt dx
0 x 0
Z ∞ −α x  
e cos(tx) r
= − dx
0 x x 0
Z ∞ −α x  
e 1 cos(rx)
= − dx
0 x x x
Z ∞  
−α x 1 − cos(rx)
= e dx,
0 x2
ou seja, mostrou-se que
408 3 Transformada de Fourier

Z ∞ Z r Z ∞ 
−α x 1 − cos(rx) −α x sen (tx)
(8.14) e · dx = e · dx dt.
0 x2 0 0 x
Comparando (8.13) com (8.14), segue-se que
Z ∞ r α
1 − cos(rx) 
e −α x · 2
dx = r arc tg − ln α 2 + r2 .
0 x α 2
Por fim, basta tomar r = 1 na fórmula acima para obter-se o resultado desejado, isto é,
Z ∞  
−α x 1 − cosx 1 α 
e · 2
dx = arc tg − · ln α 2 + 1 , α > 0.
0 x α 2

Exemplo 8.2: Mostre que Z ∞


1 − cos x π
dx = ·
0 x2 2

S OLUÇÃO : Antes de determinar o valor da integral dada é preciso assegurar que tal integral
é convergente, visto que a mesma é imprópria. Tem-se:
Z ∞ Z π Z ∞
1 − cosx 1 − cosx 1 − cosx
(8.15) dx = dx + dx.
0 x2 0 x2 π x2
Observa-se que a primeira integral no segundo membro acima é convergente. Na verdade
trata-se de um integral própria, pois o seu domínio de integral é limitado e o integrando é
contínuo, como pode ser observado a seguir:
 
1 − cos x sen x 1 sen x 1
lim 2
= lim = lim = ,
x→0 + x x→0 + 2x 2 x→0 x
+ 2
onde usou-se a regra de l’Hospital no segundo passo acima, bem como o valor 1 para o limite
trigonométrico fundamental.
Agora analisa-se a convergência da segunda integral em (8.15). Para isso, usar-se-á o seguinte
teorema (não demonstrado aqui):

T EOREMA : Suponha que


lim x p · f (x) = L.
x→∞
Então,
Z ∞
(a) A integral imprópria f (x) dx converge se p > 1 e L é finito.
a
Z ∞
(b) A integral imprópria f (x) dx diverge se p ≤ 1 e L 6= 0 (L pode ser infinito).
a
Como   
3/2 1 − cos x
lim x = 0,
x→∞ x2
3.8 Exercícios propostos 409

então, tomando p = 3/2 > 1, a = π e L = 0 no citado teorema, tem-se que a integral


Z ∞
1 − cosx
(8.16) dx
π x2
é convergente.
Para dar continuidade ao trabalho, serão necessários dois teoremas, apenas citados aqui.

T ESTE M DE W EIERSTRASS : Se for possível encontrar uma função M(x) ≥ 0 tal que
(a) | f (x, α )| ≤ M(x) para α1 ≤ α ≤ α2 e a < x < ∞,
Z ∞
(b) M(x) dx converge, então a integral
a
Z ∞
f (x, α ) dx
a

é uniformemente e absolutamente convergente em α1 ≤ α ≤ α2 .

Dando continuidade, observe que


1 − cosx 1 − cosx ,
e −α x · ≤
x2 x2
para α ≥ 0 e x ≥ 0. Logo,
Z ∞ Z ∞
1 − cosx 1 − cos x
e −α x · dx ≤ dx,
0 x2 0 x2
para α ≥ 0 .
Assim, pelo teste M de Weierstrass, tem-se que a integral
Z ∞
1 − cosx
e −α x · dx
0 x2
converge uniformemente.
Agora usa-se o seguinte teorema:
Z ∞
T EOREMA : Se f (x, α ) é uma função contínua para a ≤ x < ∞ e α1 ≤ α ≤ α2 e se f (x, α ) dx
Z ∞ a
é uniformemente convergente para α1 ≤ α ≤ α2 , então ϕ (α ) = f (x, α ) dx é contínua em
a
α1 ≤ α ≤ α2 .
Em particular, se α0 é qualquer ponto de α ≤ α ≤ α2 , pode-se escrever
Z ∞ Z ∞
lim ϕ (α ) = lim f (x, α ) dx = lim f (x, α ) dx.
α →α0 α →α0 a a α →α0

Se α0 é um dos pontos extremos, então usa-se os limites laterais.

Assim, da continuidade da função


1 − cos x ,
f (x, α ) = e −α x ·
x2
410 3 Transformada de Fourier

segue-se do teorema acima que a função definida pela integral


Z ∞
1 − cos x
ϕ (α ) = e −α x · dx
0 x2
também é contínua.
Pelo mesmo teorema citado acima, é possível tomar limite para α → 0+ para obter
Z ∞ Z ∞
1 − cos x 1 − cosx
dx = lim e −α x dx
0 x2 α →0+
0 x2
   
1 α 2

= lim arc tg − · ln α + 1
α →0+ α 2
    
1 α 2

= lim arc tg − lim lim ln α + 1
α →0+ α α →0+ 2 α →0+
 
1 π
= lim arc tg − 0 · ln 1 = ,
α →0+ α 2
onde usou-se o resultado obtido no exemplo 1 para o valor da integral acima.

Exemplo 8.3: Mostre que


Z ∞ Z ∞
sen x π sen 2x
dx = = dx.
0 x 2 0 x2
S OLUÇÃO : Para mostrar que Z ∞
sen x
π,
dx =
0 x 2
a ideia consiste em integrar por partes a seguinte integral
Z ∞
1 − cosx
dx,
0 x2
onde se escreve Z b  Z b 
1 − cosx 1 − cos x
dx = lim lim dx .
a x2 a→0+ n→∞ a x2
Fazendo
1,
u = 1 − cos x e dv =
x2
segue-se que
1
du = sen x e v=− ,
x
de modo que
Z b   b Z
1 − cosx 1 b sen x
dx = − (1 − cosx) + dx
a x2 x a a x
3.8 Exercícios propostos 411

  Z b
1 − cosx a sen x
= + dx
x b a x
Z b
1 − cos a 1 − cos b sen x
= − + dx,
a b a x
isto é, Z b Z b
sen x
1 − cos b 1 − cos a 1 − cosx
dx = − + dx.
a x b a a x2
Tomando limites para a → 0 e para b → ∞, obtém-se
Z ∞ Z ∞
sen x 1 − cos b 1 − cos a 1 − cosx
dx = lim − lim + dx
0 x b→∞ b a→0 a 0 x2
Z ∞
1 − cosx π,
= dx =
0 x2 2
pois os dois limites acima existem e valem zero, além do fato que o valor da última integral é
π/2, como foi demonstrado no exemplo 8.2.

Agora será demonstrado que


Z ∞
π,sen 2x
dx =
0 x2 2
Observe que da fórmula da trigonometria dada abaixo

cos(α + β ) = cos α · cos β − sen α · sen β ,

segue-se, tomando α = β = θ , que

cos(2θ ) = cos2 θ − sen 2 θ .

Usando a última fórmula acima com a forma trigonométrica fundamental, cos2 θ + sen 2θ =
1, obtém-se (
cos2 θ + sen 2 θ = 1,
cos2 θ − sen 2 = cos(2θ ),
que conduz, ao ser resolvido, a outras duas fórmulas:
1 + cos(2θ ) 1 − cos(2θ )
cos2 θ = e sen 2 θ = ·
2 2
Fazendo θ = x/2 na última fórmula acima, obtém-se
1 − cos x
= sen 2 (x/2) ⇒ 1 − cos x = 2 sen 2 (x/2) ,
2
de modo que se tem
Z ∞ Z ∞
1 − cosx sen 2 (x/2)
dx = 2 dx.
x20 0 x2
Agora é feita a seguinte mudança de variáveis: u = x/2, que implica em 2du = dx. Logo,
412 3 Transformada de Fourier

Z ∞ Z ∞
1 − cosx sen 2 (x/2)
dx = 2 dx
0 x2 0 x2
Z ∞
sen 2u
=4 du
0 4u2
Z ∞
sen 2 u
= du.
0 u2
Em suma, mostrou-se que
Z ∞ Z ∞
sen 2u 1 − cosx π,
du = dx =
0 u2 0 x2 2
pois este valor π/2 foi encontrado no exemplo 8.2.

Exemplo 8.4: Outra maneira de mostrar que


Z ∞
sen y π
dy = ·
0 y 2
S OLUÇÃO : Considere a seguinte função definida por integral:
Z ∞
sen y
ϕ (x) = e −xy · dy.
0 y
Como se trata de uma integral imprópria, é necessário mostrar que a mesma converge uni-
formemente em x ≥ 0. Usar-se-á integração por partes. Fazendo
e −xy
u= e dv = sen y dy,
y
encontra-se
(1 + xy) e −xy
du = − e v = − cos y.
y2
Assim,
Z b Z b −xy
−xy sen y e
e · dy = · sen y dy
a y a y
Z b −xy
e
= · d(− cosy) dy
a y
b Z b
e −xy (1 + xy) e −xy
=− cos y − cos y dy
y a a y2
Z b
e −ax e −bx (1 + xy) e −xy
= cos a − cos b − cos y dy,
a b a y2
para a > 0.
3.8 Exercícios propostos 413

Tomando limite para para b → ∞, encontra-se


Z ∞ Z b
−xy sen y sen y
e · dy = lim e −xy ·
dy
a y b→∞a y
 −ax   −bx 
e e
= lim cos a − lim cos b −
b→∞ a b→∞ b
Z b
(1 + xy) e −xy
− lim ] · cosy dy
b→∞ a y2
Z ∞
e −ax (1 + xy) e −xy
(8.17) = cos a − · cosy dy.
a a y2
Observe agora que

(1 + xy) e −xy cos y = |1 + xy| e −xy |cos y|

≤ e xy e −xy |cos y| = |cos y| ≤ 1.


Usando a desigualdade acima em (8.17), obtém-se a seguinte estimativa:
Z ∞ −ax Z ∞ −xy


−xy sen y e
= (1 + xy) e

a e · dy a cos a − cos y dy
y a y2
−ax Z ∞ −xy

e (1 + xy) e
≤ cos a + cos y dy

a a y2
Z ∞
e −ax (1 + xy) e−xy
dy
≤ |cos a| + · cos y
a a y2
Z ∞
1 dy
≤ +
a a y2
Z b
1 dy
= + lim
a b→∞ y2 a
  b  
1 1 1 1 1
= + lim − = + lim −
a b→∞ y a a b→∞ a b
1 1 2
= + = ·
a a a
Sendo a desigualdade Z ∞
−xy sen y 2
dy ≤
a e ·
y a
válida para todo x ≥ 0, tem-se que dá a convergência uniforme desejada para a função ϕ (x).
Segue-se daí a continuidade da função ϕ (x).
A regra de Leibniz diz: Seja f (x, y) uma função contínua tendo uma derivada ∂ f/∂ x contínua
em um domínio do plano xy contendo o retângulo [a, b] × [c, d]. Então, para c < y < d, vale a
igualdade
414 3 Transformada de Fourier

Z b Z b
d ∂f
f (x, y) dy = (x, y) dy.
dx a a ∂x

Assim, usando a regra de Leibniz para derivar dentro do sinal de integração, obtém-se
Z ∞ −xy
d e
ϕ 0 (x) = · sen y dy
dx 0 y
Z ∞  
∂ e −xy
= · sen y dy
0 ∂x y
Z ∞
=− e −xy · sen y dy
0
Z ∞
(8.18) = e −xy · (− sen y) dy,
0

que é válida para todo x > 0. A integral acima converge uniformemente em cada intervalo da
forma [α , ∞), onde α > 0.
Note que a convergência não é uniforme em [0, ∞), pois, para x = 0, a integral em (8.18)
diverge. Basta observar que
Z ∞ Z ∞
0 0
ϕ (0) = − e · sen y dy = − sen y dy,
0 0

que é divergente.
A integral em (8.18) é a transformada de Laplace da função − sen y. Além disso, usando a
definição de transformada de Laplace é fácil ver que
1 1
L[− seny] = − ⇒ ϕ 0 (x) = − ·
1 + x2 1 + x2
Assim, com uma simples integração conclui-se que

ϕ (x) = c − arc tg x, x > 0.

Para calcular o valor da constante c, basta tomar limite para x → ∞. Assim,


π
(8.19) lim ϕ (x) = lim (c − arc tg x) = c − lim arc tg x = c − ·
x→∞ x→∞ x→∞ 2

A FIRMAÇÃO : lim ϕ (x) = 0.


x→∞

De fato, tem-se que


Z ∞ Z ∞
−xy sen y −xy sen y
|ϕ (x)| = e · dy ≤ e
· dy
0 y 0 y
Z ∞
−xy sen y

e
=
0
y dy
3.8 Exercícios propostos 415

Z ∞
−xy sen y

= e y dy
0
Z ∞
≤ e −xy dy
0
Z b  −xy  b
e
−xy

= lim e dy = lim −
b→∞ 0 b→∞ x
0
 
1 e −bx 1
= lim − = , x > 0.
b→∞ x x x
De |ϕ (x)| ≤ 1/x, segue-se que lim ϕ (x) = 0. Substituindo isto em (8.19), obtém-se
x→∞

π π π
lim ϕ (x) = c − ⇒ 0 = c− ⇒ c= ·
x→∞ 2 2 2
Fazendo x = 0 na integral original, isto é, em ϕ (x). Tem-se que
Z ∞ Z ∞
−0.y sen y sen y
ϕ (0) = e · dy = dy,
0 y 0 y
ou seja, Z ∞
sen y
dy = ϕ (0)
0 y
π
= − arc tg 0
2
π
= ,
2
que é o resultado desejado.
Capítulo 4
Aplicações às EDP

4.1 Problemas de valores de contorno

Nesta seção propõe-se o estudo de problemas do tipo abaixo:


 
 y00 + ay0 + by = f (x),  00 0

  y + ay + by = f (x),

y(α ) = y0, e y0 (α ) = y0 ,

 

 y(β ) = y ,  y0 (β ) = y ,
1 1

onde a, b, α , β ∈ R e f (x) é uma função real dada.


Observe que o valor da variável dependente, y(x) (também pode ser o valor de sua derivada
0
y (x)), é especificado em dois pontos distintos, α e β . As condições y(α ) = y0 e y(β ) = y1 (ou
y0 (α ) = y0 e y(β ) = y1 ) são chamadas de condições de contorno. Uma equação diferencial junto
com condições de contorno é denominado problema de valor de contorno.
Outros problemas de valores de contorno mais gerais podem ser estudados, mas neste texto
interessa-se apenas pelos dois casos apresentados.

Exemplo 1.1: Resolva o seguinte problema de valores de contorno:



00
 y + 2y = 0,


y(0) = 1,


 y(π ) = 0,

S OLUÇÃO : Fazendo y(x) = e α x e substituindo na equação, encontra-se

α2 · e αx + 2 · e αx = 0

α2 + 2 · e αx = 0

α2 + 2 = 0 ⇒ α 2 = −2.
√ √ √
Segue-se daí que α = ± 2 i, onde i satisfaz i 2 = −1. Logo, e −i 2 x e e i 2 x são soluções
para a equação dada, de modo que a solução geral é dada por

417
418 4 Aplicações às EDP

√ √
2x 2x
(1.1) y(x) = a1 · e i + a2 · e −i .

Agora considere a fórmula de Euler, e iθ = cos θ + i sen θ . Trocando θ por −θ na fórmula


anterior, obtém-se que e −iθ = cos θ −i sen θ , onde usou-se a paridade do cosseno e a imparidade
do seno.

O próximo passo consiste em fazer θ = 2 x e manipular (1.1) para reescrever y(t) em função
de cosseno e seno. Tem-se:
√ √
y(x) = a1 · e i 2 x + a2 · e −i 2 x
h √  √ i h √  √ i
= a1 · cos 2 x + i sen 2 x + a2 · cos 2 x − i sen 2x
√  √ 
= (a1 + a2) · cos 2 x + i (a1 − a2) · sen 2x
√  √ 
= c1 · cos 2 x + c2 · sen 2x ,

que é uma solução geral para a equação diferencial dada.


Usando a primeira condição de contorno, y(0) = 1, segue-se que

y(0) = c1 · cos 0 + c2 · sen 0 = 1 ⇒ c1 = 1.


√  √ 
Logo, y(x) = cos 2 x + c2 · cos 2 x . Agora usa-se a segunda condição de contorno,
y(π ) = 0, para concluir que
√  √ 
y(π ) = cos 2 π + c2 · sen 2π = 0
√  √ 
c2 · sen 2 π = − cos 2π
√ 
cos 2π √ 
c2 = −  √  = − cotg 2π .
sen 2π

Substituindo na última expressão para y(x), conclui-se que a solução para o problema de
valores iniciais dado é
√  √  √ 
y(x) = cos 2 x − cotg 2 π · sen 2x .

Este exemplo mostra um problema com condições de contorno não homogêneas e que tem
uma única solução.

Exemplo 1.2: Resolva o seguinte problema de valores de contorno:


4.1 Problemas de valores de contorno 419


 00
 y + y = 0,

y(0) = 1,



y(π ) = k.

S OLUÇÃO : Fazendo y(x) = e α x e substituindo na equação, encontra-se

α2 · e αx + e αx = 0

α2 + 1 · e αx = 0

α2 + 1 = 0 ⇒ α 2 = −1.
Segue-se daí que α = ± i. Assim, tem-se que e −ix e e ix são soluções para a equação dada, de
modo que a solução geral é dada por

y(x) = a1 · e ix + a2 · e −ix .

Usando a fórmula de Euler com θ = x e os mesmos procedimentos do exemplo anterior,


segue-se que
y(x) = a1 · e ix + a2 · e −ix

= a1 · (cos x + i sen x) + a2 · (cos x − i sen x)

= (a1 + a2 ) · cosx + i · (a1 − a2) · sen x

= c1 · cos x + c2 · sen x,
que é uma solução geral para a equação diferencial dada.
Usando a primeira condição de contorno, y(0) = 1, segue-se que

y(0) = c1 · cos 0 + c2 · sen 0 = 1 ⇒ c1 = 1.

Agora usa-se a segunda a segunda condição de contorno, y(π ) = 0 para concluir que
y(π ) = c1 cos π + c2 · sen π = k

− c1 + c2 · 0 = k ⇒ k = −c1 .
Assim, fica-se com duas condições sobre c1 : c1 = 1 e c1 = −k. Só que elas são incom-
patíveis se k 6= −1 e, neste caso, o problema não tem solução. Porém, se k = −1, então ambas
as condições são satisfeitas, desde que c1 = 1, independente do valor de c2 . Mas nesta situação
existe uma infinidade de soluções, todas na forma

y(x) = cos x + c2 · sen x,

pois c2 permanece arbitrário.


Este exemplo mostra que um problema com condições de contorno não homogêneas pode
não ter solução e que também pode ter uma infinidade de soluções.
420 4 Aplicações às EDP

Exemplo 1.3: Resolva o seguinte problema de valores de contorno:



 00
 y + 2y = 0,

y(0) = 0,


 y(π ) = 0.

S OLUÇÃO : Como foi visto no exemplo 1.1, a solução geral deste problema é
√  √ 
y(x) = c1 · cos 2 x + c2 · sen 2x .

Usando a primeira condição de contorno y(0) = 0, encontra-se

y(0) = c1 · cos 0 + c2 · sen 0 = 0 ⇒ c1 = 0.


√ 
Logo, y(x) = c2 · sen 2 x . Agora usa-se a segunda condição de contorno, y(π ) = 0, para
concluir que √ 
y(π ) = c2 · sen 2π = 0 ⇒ c2 = 0,
√ 
pois sen 2 x 6= 0.
Como c1 = c2 = 0, segue-se que y(x) = 0 para todo x, ou seja, y ≡ 0 (isto é, a solução
identicamente nula). Esse exemplo mostra que certos problemas com equação homogênea e
condições de contorno também homogêneas podem ter como solução apenas a solução trivial
(isto é, y ≡ 0).

Exemplo 1.4: Resolva o seguinte problema de valores de contorno:



 00
 y + y = 0,

y(0) = 0,


 y(π ) = 0.

S OLUÇÃO : Pelo exemplo 1.2, a solução geral da equação dada é

y(x) = c1 · cos x + c2 · sen x.

Usando a primeira condição de contorno, y(0) = 0, obtém-se

y(0) = c1 · cos 0 + c2 · sen 0 = 0 ⇒ c1 = 0.

Logo, y(x) = c2 · sen x. Usando a segunda condição de contorno, y(π ) = 0, encontra-se


4.1 Problemas de valores de contorno 421

y(π ) = c2 · sen π = 0 ⇒ c2 · 0 = 0,

portanto c2 pode ser qualquer, de modo que a solução do problema dado é y(x) = c2 · sen x.
Em virtude da arbitraridade de c2 , o problema dado tem uma infinidade de soluções. Assim,
este exemplo mostra que problemas com equação homogênea e condições de contorno também
homogêneas pode ter infinitas soluções.

Exemplo 1.5: Resolva o seguinte problema de valor de contorno:



 00
 y + λ y = 0,

y(0) = 0,


 y(L) = 0,

onde L > 0.

S OLUÇÃO : Observe que da forma em que o problema foi dado, é preciso analisar três casos:
λ = 0, λ < 0 e λ > 0.

C ASO 1: λ = 0. Neste caso, a equação fica reescrita como y00 = 0. Integrando uma vez em
relação a x, obtém-se y0 (x) = a; integrando mais uma vez, encontra-se y(x) = ax + b , que é a
solução geral. Agora usa-se as duas condições de contorno para determinar a e b. Tem-se:
y(0) = a · 0 + b = 0 ⇒ b = 0.

y(L) = a · L = 0 ⇒ a = 0.
De a = b = 0, segue-se que y(x) = 0 para todo x, ou seja, tem-se a solução trivial y ≡ 0.

C ASO 2: λ < 0. Para evitar aparecimento de raízes quadradas, faça λ = −µ 2. Assim, a


equação diferencial dada se reescreve como y00 − µ 2 y = 0. Fazendo y(x) = e α x e substituindo
na última equação, obtém-se

α2 · e αx − µ2 e αx = 0

α2 − µ2 · e αx = 0

α2 − µ2 = 0 ⇒ α 2 = µ 2.
Segue-se daí que α = ± µ , de modo que e −µ x e e µ x são soluções da equação, que tem como
solução geral
y(x) = a1 · e µ x + a2 · e −µ x.
Agora, observe que

y(x) = a1 · e µ x + a2 · e −µ x
422 4 Aplicações às EDP

a a1 − µ x   a2 µ x a2 µ x 
µx −µ x 1 −µ x
= a1 · e + a2 · e + ·e − ·e + ·e − ·e
2 2 2 2
a a1   a2 − µ x a2 − µ x 
1
= · e µx + · e µx + ·e + ·e +
2 2 2 2
a a1 − µ x   a2 µ x a2 µ x 
1 −µ x
+ ·e − ·e + ·e − ·e
2 2 2 2
 µx x
  µx x
  µx 
e +e − µ e −e − µ e + e −µ x
= a1 · + a1 · + a2 · −
2 2 2
 µx 
e − e −µ x
− a2
2
 µx   µx 
e + e −µ x e − e −µ x
= (a1 + a2) · + (a1 − a2) ·
2 2
 µx   
e + e −µ x e µ x − e −µ x
= c1 · + c2 ·
2 2

= c1 · cosh(µ x) + c2 · senh (µ x),


que é uma solução geral para a equação diferencial.
Usando a primeira condição de contorno, y(0) = 0, na solução geral acima, obtém-se

y(0) = c1 · cosh 0 + c2 senh 0 = 0 ⇒ c1 = 0,

pois pela definição de cosseno e seno hiperbólicos se vê facilmente que cosh 0 = 1 e senh 0 = 0.
Logo, y(x) = c2 · senh (µ x). Usando a segunda condição de contorno, y(L) = 0, resulta

y(L) = c2 · senh (µ L) = 0 ⇒ c2 · senh (µ L) = 0.

Como L > 0 e µ 6= 0, então senh (µ L) 6= 0. Deste modo, c2 = 0. E como c1 = c2 = 0, então


y(x) = 0 para todo x, ou seja, y ≡ 0.
Justificativa para senh (µ L) 6= 0: para que seja zero, deve-se ter e µ L = e −µ L, de modo que
µ L = −µ L, ou ainda, que 2 · µ · L = 0, que simplificado implica em µ · L = 0. Mas isso não é
possível, pois, por hipótese, µ 6= 0 e L > 0.

C ASO 3: Para evitar o aparecimento frequente de raízes quadradas, faça λ = µ 2 . Então a


equação diferencial fica reescrita na forma y00 + µ 2 y = 0.
Faça y(x) = e α x. Substituindo na última equação diferencial, obtém-se

α2 · e αx + µ2 · e αx = 0

α2 + µ2 · e αx = 0

α2 + µ2 = 0 ⇒ α 2 = −µ 2 .
Segue-se daí que α = ± iµ . Logo, a equação geral é

y(x) = a1 · e µ x + a2 · e µ x.
4.1 Problemas de valores de contorno 423

Substituindo-se as fórmulas de Euler já usadas, encontra-se


y(x) = a1 · [cos(µ x) + i sen (µ x)] + a2 · [cos(µ x) − i sen (µ x)]

= (a1 + a2 ) · cos(µ x) + i · (a1 − a2) · sen (µ x)

= c1 cos(µ x) + c2 sen (µ x),

que é também solução geral da equação diferencial.


Agora aplica-se a primeira condição de contorno, y(0) = 0, de modo que

y(0) = c1 · cos 0 + c2 · sen 0 = 0 ⇒ c1 = 0.

Logo, y(x) = c2 · sen (µ x). Usando a segunda condição de contorno, obtém-se

y(L) = c2 · sen (µ L) = 0 ⇒ c2 · sen (µ L) = 0,

ou seja, c2 = 0 ou sen (µ L) = 0. Se c2 = 0, então obtém-se y ≡ 0. Se sen (µ L) = 0, então µ L


tem que ser um múltiplo inteiro de π , isto é,
nπ n2 π 2 ,
µ L = nπ ⇒ µ= ⇒ λ= 2
L L
de modo que a solução do problema é
 nπ x 
yn(x) = c2 · sen , n ∈ N.
L

Exemplo 1.6: Resolva o seguinte problema de valor de contorno:



 00
 y + λ y = 0,

y0 (0) = 0,



y0 (L) = 0,

onde L > 0.

S OLUÇÃO : Como no exemplo 1.5, deve-se analisar os casos em que λ = 0, λ < 0 e λ > 0.

C ASO 1: λ = 0. Como a equação fica na forma y00 = 0, basta integrar duas vezes para concluir
que y(x) = ax + b . Observe que para usar as condições de contorno é preciso derivar a solução
geral, ou seja, y0 (x) = a. E neste caso, y0 (0) = y0 (L) = a = 0, de modo que y(x) = b.

C ASO 2: λ < 0. Novamente se faz λ = −µ 2 , de modo que a equação assume a forma y00 −
µ 2 y = 0. Foi mostrado no exemplo 1.5 que esta equação tem solução geral dada por

y(x) = c1 · cosh(µ x) + c2 · senh (µ x).


424 4 Aplicações às EDP

Lembrando que
d d
[cosh(µ x)] = µ · senh (µ x) e [ senh (µ x)] = µ · cosh(µ x),
dx dx
segue-se que a derivada da solução geral é dada por

y0 (x) = (c1 · µ ) · senh (µ x) + (c2 · µ ) · cosh(µ x).

Substituindo as condições de contorno, obtém-se

y0 (0) = c1 · µ · senh 0 + c2 · µ cosh 0 = 0 ⇒ c2 = 0,

(1.2) y0 (L) = c1 · µ · senh (µ L) = 0 ⇒ c1 = 0,

pois senh 0 = 0, cosh 0 = 1, µ , L 6= 0, de modo que senh (µ L) 6= 0. Portanto, para λ < 0 tem-se
que y ≡ 0.

C ASO 3: λ > 0. Faça λ = µ 2 . Pelo exemplo 1.5, tem-se que a solução geral para este caso é
dada por
y(x) = c1 · cos(µ x) + c2 · sen (µ x).
Agora deriva-se a solução acima para que seja possível usar as condições de contorno. Tem-
se:
y0 (x) = −(c1 · µ ) · sen (µ x) + (c2 · µ ) · cos(µ x).
Usando a primeira condição de contorno, y0 (0) = 0, encontra-se

y0 (0) = −c1 · µ · sen 0 + c2 · µ · cos0 = 0 ⇒ c2 = 0.

Logo, y0 (x) = −(c1 · µ ) sen (µ x). Agora aplica-se a segunda condição de contorno, y0 (L) = 0,
para obter

y0 (L) = −(c1 · µ ) · sen (µ L) = 0 ⇒ c1 · µ = 0 ou sen (µ L) = 0.

Como µ > 0, ou seja, diferente de zero, então caso c1 = 0, então y ≡ 0. Mas, se sen (µ L) = 0,
então
nπ n2 π 2
µ L = nπ ⇒ µ= e λ= 2 ·
L L
Observe que, com c2 = 0 e c1 6= 0, além dos valores acima, a solução geral para λ > 0 é
 nπ x 
yn (x) = c1 · cos .
L
Mas a solução acima não é a solução geral para o problema de valores de contornos que foi
dado. Não se pode esquecer que no caso 1 a solução foi y(x) = b. Assim, a solução geral para o
P.V.C. é a superposição (a soma) das soluções encontradas nos três casos, isto é,
 nπ x 
yn (x) = b + c1 · cos ·
L
4.2 Conceitos básicos para EDP 425

Observe-se que a constante b acima é arbitrária. Logo, a expressão acima é satisfeita pelo
P.V.C. para qualquer constante real b, de modo que se tem uma infinidade de soluções em
virtude do grau de liberdade da constante b. Isto é uma características de problemas de valores
de contorno do tipo Neumann.

4.2 Conceitos básicos para EDP

Uma equação diferencial é uma equação envolvendo uma ou mais variáveis independentes,
uma função desconhecida e suas derivadas com respeito a estas variáveis. Se existe apenas uma
variável independente x, diz-se que a equação é uma equação diferencial ordinária (EDO). Se
existe duas ou mais variáveis independentes x1 , x2, . . ., xn , diz-se que a equação é uma equação
diferencial parcial (EDP).
Assim, uma EDO é uma expressão da forma
 
(2.1) F x, u, u0, . . ., u(k) = 0,

onde u0 , . . ., u(k) denotam as derivadas de u(x) com respeito a x até a ordem k em algum sub-
conjunto aberto de R.
Já uma EDP tem a forma
 
∂ u , , ∂ u , ∂ 2u , ∂ 2u , , ∂ k u
(2.2) G t, x1 , . . ., xn , u, ··· ··· = 0,
∂ x1 ∂ xn ∂ x21 ∂ x1 ∂ x2 ∂ xkn
onde x = (x1 , . . ., xn ) pertence a algum conjunto aberto Ω ⊂ Rn, F e G são funções dadas, u é a
função a ser determinada e
∂ ju
, j = j1 + j2 + · · · + jn ,
∂ x1j1 ∂ x2j2 · · · ∂ xnjn
denota a j-ésima ordem da derivada parcial de u.

Os conceitos acima são muito gerais, não representam uma definição propriamente dita. Estes
conceitos permitem expressões sem sentido algum. Por exemplo,
0
e u (x) = 0 e e ux+uy = 0,

onde u = u(x) ou u = u(x, y), com ux = ∂ u/∂ x e uy = ∂ u/∂ y.


Observe que os dois primeiros casos não fazem sentido matemático algum, pois a função
exponencial nunca se anula. Segue-se daí que não existe uma definição satisfatória para uma
EDP. Portanto, é importante determinar quais equações têm significado e restringir atenção a
esta subclasse.
426 4 Aplicações às EDP

D EFINIÇÃO : A ordem de uma equação diferencial parcial é a ordem da derivada de maior


ordem que aparece na equação.

Se F e G não são constantes, quando consideradas como funções das derivadas de ordem k,
então ambas as equações (2.1) e (2.2) têm ordem k.

D EFINIÇÃO : Uma equação diferencial parcial é linear se ela é um polinômio do primeiro


grau em u e em suas derivadas. Caso contrário, a EDP é dita não linear.

A EDP de segunda ordem mais geral tem a seguinte forma


n n
∂ 2u ∂u
(2.3) ∑ a jk (x) + ∑ b j (x)
∂ x j ∂ xk j=1 ∂xj
+ c(x) u(x) + d(x) = 0,
j,k=1

onde pelo menos um dos coeficientes a jk (x) não é identicamente nulo.

Se d = 0, diz-se que a EDP (2.3) é homogênea; caso contrário, é dita não homogênea. A
parte principal de uma EDP é parte da equação que contém as derivadas de maior ordem. No
caso da equação (2.3), a parte principal é a soma dupla no lado esquerdo.
Equações não lineares com parte principal linear são chamadas de semilineares. A EDP semi-
linear de segunda ordem na forma geral é dada por
n  
∂ 2u ∂u , , ∂u
∑ a jk (x) ∂ x j ∂ xk = f x, u, . . ., ∂ x1 · · · ∂ xn ·
j,k=1

Uma EDP, quando modela algum sistema físico, usualmente tem infinitas soluções. Para
selecionar uma única função que representa a solução para o problema físico, deve-se impôr
certas condições auxiliares que mais caracterizam o sistema que está sendo modelado. Estas
recaem em duas categorias:

1) C ONDIÇÕES DE CONTORNO : estas são condições que devem ser satisfeitas nos pontos
sobre a fronteira ∂ Ω de uma região Ω na qual a EDP se verifica. Nomes especiais são dados às
três formas de condições de contorno:
(a) Condição de Dirichlet: u = g;
∂u
(b) Condição de Neumann: = g;
∂νν
∂u
(c) Condições de Robin: α u + β = g,
∂νν
∂u
nas quais g, α e β são funções prescritas sobre ∂ Ω. A notação denota a derivada normal,
∂νν
isto é, a derivada direcional na direção do vetor normal ν a ∂ Ω e que aponta para fora de Ω.
Caso a região possa ser escrita na forma Ω = Ω1 ∪ Ω2 , de modo que ∂ Ω = ∂ Ω1 ∪ ∂ Ω2 em ∂ Ω2,
∂u
então as duas condições de fronteira u = g em ∂ Ω1 e = h são conhecidas como condições
∂νν
mistas.
4.2 Conceitos básicos para EDP 427

2) C ONDIÇÕES INICIAIS : estas são condições que devem ser satisfeitas em todo Ω no ins-
tante quando as considerações do sistema físico se inicia. Uma típica condição inicial prescreve
alguma combinação de u e suas derivadas no tempo.

As funções prescritas nas condições inicial e de contorno, juntamente com as funções coefi-
cientes e qualquer termo não homogêneo na EDP, compõem os dados no problema modelado
pela EDP.

D EFINIÇÃO : Diz-se que a solução depende continuamente dos dados se uma pequena mu-
dança nos dados produz uma correspondente mudança pequena na solução.

D EFINIÇÃO : Um problema é dito bem posto se:


(i) A solução do problema existe e é única;
(ii) A solução depende continuamente dos dados.
Se qualquer destas condições não for satisfeita, então se diz que o problema é mal posto.

As condições auxiliares que, junto com uma EDP, formam um problema bem posto, não
devem ser muitas, ou o problema não terá solução. Elas não devem ser poucas também, ou a
solução não será única. Finalmente, as condições auxiliares devem ser do tipo correto, ou a
solução não dependerá continuamente dos dados.
Problema bem posto é importante em Física, Engenharia e outras áreas. Por exemplo, imagine
um experimento realizado em laboratório cujo modelo matemático é uma EDP. Se o problema
não tiver solução, então o experimento não terá uma explicação teórica. Se a EDP tiver mais
de uma solução, então haverá uma ambiguidade ao tentar-se explicar o experimento. E se não
tiver solução que depende continuamente dos dados, então qualquer imprecisão mínima dos
instrumentos poderá acarretar grandes distorções nos resultados.

O conceito de solução de uma EDP é muito vago, basicamente ele diz que é uma função
que satisfaz a equação e suas condições iniciais e/ou de contorno. O caso é análogo a ideia de
definir o que é uma EDP. Primeiro é preciso saber se uma dada equação realmente faz sentido
para que possa ser denominada EDP. Assim, o conceito de solução de uma EDP vai depender
fortemente da natureza da equação e de seus dados. Deste modo, neste texto o conceito de
solução aparecerá para cada tipo de problema a ser estudado, não como um conceito geral.
Um fato importante e que está fortemente relacionado aos estudos sobre EDP é que existem
espaços vetoriais de dimensão infinita. A demonstração geral é delicada, pois usa o conceito de
cardinalidade e não será feita aqui. Um exemplo será apresentado ao leitor.

Exemplo 2.1: Considere o espaço vetorial de todas as funções contínuas definidas no inter-
valo [0, 1], ou seja,
C([0, 1]) = { f : [0, 1] → R | f é contínua}.
Mostre que C ([0, 1]) tem dimensão infinita.
428 4 Aplicações às EDP

S OLUÇÃO : Suponha que o espaço C ([0, 1]) tenha dimensão finita e igual a n, ou seja, que
dim [C ([0, 1])] = n, onde n ∈ N. Agora considere o seguinte conjunto contendo as seguintes
n + 1 funções:

β = 1, x, x2 , . . ., xn .
Cada uma das funções do conjunto β é polinomial, logo cada uma delas é contínua no in-
tervalo [0, 1], portanto pertencem ao espaço C ([0, 1]). Isto mostra que β é um subconjunto de
C ([0, 1]).
O próximo passo consiste em fazer a combinação linear nula destas funções, isto é, escrever

a0 + a1 · x + a2 · x2 + · · · + an · xn = 0,

onde 0 representa, aqui, a função identicamente nula.


Como uma mesma função pode ser representada de várias maneiras, então tomar-se-á a
função polinomial identicamente nula como representante da função 0. Assim,

a0 + a1 · x + a2 · x2 + · · · + an · xn = 0 + 0 · x + 0 · x2 + · · · + 0 · xn.

A identidade acima fica reduzida, deste modo, a uma igualdade entre polinômios. Isso implica
dizer que os coeficientes dos monômios de mesmo grau são iguais, ou seja,

a0 = 0, a1 = 0, a2 = 0, . . ., an = 0.

Isso mostra que o conjunto β é L.I. (Linearmente Independente). Mas sabe-se da Álgebra
Linear que, em um espaço de dimensão finita e igual a n, qualquer conjunto com mais de
n vetores é necessariamente L.D. (Linearmente Dependente). Como o conjunto β tem n + 1
vetores e é L.I., então isto contradiz a hipótese de que o espaço C ([0, 1]) tem dimensão finita
n (se fosse o caso, β teria que L.D.). Logo, C ([0, 1]) não tem dimensão finita. Diz-se que um
espaço tem dimensão infinita quando ele não tem dimensão finita. Portanto o espaço C([0, 1])
tem dimensão infinita.

Uma situação importante sobre as EDP é saber que os espaços onde “moram” as soluções
têm dimensão infinita, diferentemente das EDO cujo espaço solução é de dimensão finita. Isto
será feito apenas na forma de um exemplo. E neste mesmo exemplo será possível constatar que
uma mesma EDP tem solução em vários espaços (logo, vários tipos de solução).

Exemplo 2.2: Considere a seguinte EDO: y00 (x) = 0. Como esta equação de segunda ordem
é muito simples, ela pode ser integrada duas vezes em relação a x para determinar a sua solução
geral. De fato, y(x) = ax + b, onde a e b são constantes. Observe que existem duas soluções
fundamentais, u(x) = x e v(x) = 1, de modo que a solução pode ser reescrita na forma y(x) =
a · u(x) + b · v(x). Então o espaço das soluções da EDO dado é aquele formados pelos pares
ordenados (a, b) (por exemplo, R2 e C2 ). Portanto, um espaço vetorial de dimensão finita.
4.2 Conceitos básicos para EDP 429

Agora considere uma função de duas variáveis u = u(x, y) e a EDP uxx = 0. Esta EDP pode
ser integrada em relação a x e que implica em ux(x, y) = f (y) e que novamente integrada em
relação a x resulta em u(x, y) = f (y) · x + g(y), que é a solução geral da EDP dada. Note que,
por dependerem apenas da variável independente y, as funções f (y) e g(y) se comportam como
“constantes” sob derivação em x. Observe também que a dimensão de um espaço está rela-
cionado com o espaço onde “moram” os coeficientes da solução geral da equação.
Agora considere como soluções fundamentais as funções v(x, y) = x e w(x, y) = 1, de modo
que a solução geral pode ser reescrita na seguinte forma:

(2.4) u(x, y) = f (y) · v(x, y) + g(y) · w(x, y).

Na solução geral acima para a EDP dada, as soluções fundamentais sempre são as mesma,
o que muda são as funções coeficientes na solução geral. Portanto, deve-se olhar para o espaço
onde “residem” estas funções coeficientes para saber a sua dimensão.
O espaço das soluções será aquele formados pelos pares ( f (y), g(y)), mas que são pares de
funções e não de escalares. E o exemplo 2.1 mostrou que espaços de funções tem dimensões
infinitas. Logo, o espaço das soluções de EDP sempre tem dimensão infinita.
Agora será considerado o tipo de solução para a EDP uxx = 0 dada. Como esta equação é
de segunda ordem, seria natural procurar por funções u(x, y) que satisfazem esta equação e que
sejam pertencentes ao espaço C2 . Por outro lado, como a derivação é realizada em x, as funções
f (y) e g(y) não precisam ser de classe C2 , porque elas atuam como “constantes”. Então o espaço
C1 também é um espaço de soluções para uxx.
Além disso, não há problema algum em tomar f , g ∈ C, ou seja, apenas contínuas, pois estas
funções, quando derivadas em relação a x, sempre se anulam e neste espaço a solução geral con-
tinua verdadeira. Na verdade, se as funções f e g tiverem um número finito de descontinuidade,
em nada alterará o fato de u(x, y) dada em (2.4) ser a solução geral de uxx. Pode mais, o espaço
de todas as funções descontínuas em um número infinito de pontos (ou até mesmo descontínua
em todos os pontos) atende as exigências da solução geral. No fundo, basta que f (y) e g(y)
sejam funções para que u(x, y) dada em (2.4) seja solução geral da EDP dada.
O comentário anterior mostra que uma mesma EDP pode ter vários espaços para suas
soluções e, consequentemente, soluções de naturezas diferentes. Mostra também que ao re-
solver uma EDP é necessário informar previamente em qual espaço se busca soluções, bem
como uma justificativa para esta escolha. E, por fim, revela que não existe uma definição de
solução para EDP, uma vez que as várias possibilidades de soluções para uma mesma equação
geram ambiguidades, e uma definição não pode ser ambígua.
430 4 Aplicações às EDP

4.3 Tipos de equações de segunda ordem

Considere uma EDP semi-linear de segunda ordem em duas variáveis:

(3.1) a(x, y) uxx + 2b(x, y) uxy + c(x, y) uyy + d(x, y) ux + e(x, y) uy + f (x, y) u = g(x, y).

Agora faça, formalmente, as seguintes substituições:

uxx 7→ α 2 , uxy 7→ αβ , uyy 7→ β 2 , ux 7→ α , uy 7→ β .

Assim, a equação (3.1) se associa a um polinômio de grau dois em α e β :

p(α , β ) = a(x, y) α 2 + 2b(x, y) αβ + c(x, y) β 2 + d(x, y) α + e(x, y) β + f (x, y).

As propriedades matemáticas das soluções de (3.1) são em grande parte determinadas pelas
propriedades algébricas do polinômio p(α , β ). O polinômio p(α , β ), e junto com ele, a EDP
(3.1), é classificado de acordo com o sinal de seu discriminante ∆(x, y) = b2 (x, y) − a(x, y) ·
c(x, y):
a) Hiperbólica em (x, y) ∈ Ω : se ∆(x, y) > 0;
b) Parabólica em (x, y) ∈ Ω : se ∆(x, y) = 0;
c) Elítica em (x, y) ∈ Ω : se ∆(x, y) < 0.

Observe que o tipo da equação (3.1) é determinado somente por sua parte principal (veja
a seção 4.2) e que o tipo poderá, em geral, mudar com a posição no plano xy, mesmo que
a(x, y), b(x, y) e c(x, y) sejam constantes.

Exemplo 3.1: (a) A EDP 3uxx + 2uxy + 5uyy + xuy = 0 é elítica. De fato,

∆(x, y) = b2 − ac = 12 − 3 · 5 = −14 < 0.

(b) A equação de Tricomi para fluxo transônico, yuxx + uyy = 0, tem

∆(x, y) = b2 − ac = 02 − y · 1 = −y.

Assim, a equação de Tricomi é elítica para y > 0, parabólica para y = 0 (ou seja, no eixo x) e
hiperbólica para y < 0. Logo a classificação desta EDP é do tipo misto.

Observa-se que uma propriedade importante sobre o tipo de uma EDP é que ele é invari-
ante sob mudanças de variáveis com certa regularidade, ou seja, o tipo da EDP não muda sob
mudanças de variáveis bem comportadas. A demonstração dessa afirmação não será feita neste
texto, mas o leitor poderá encontrá-la, por exemplo, na referência [62] da bibliografia.

Uma EDP linear de segunda ordem em n variáveis tem a seguinte forma geral
4.3 Tipos de equações de segunda ordem 431

n n
(3.2) ∑ ai j uxi x j + ∑ bi uxi + c u = d.
i, j=1 i=1

Se uxi x j = ux j xi , então a parte principal de (3.2) pode sempre ser rearranjado de modo que
 
ai j = a ji . Assim, a matriz A = ai j , n × n, pode ser assumida como simétrica.
Em Álgebra Linear mostra-se que cada matriz n × n real e simétrica tem n autovalores reais.
Estes autovalores são (possivelmente repetidos) os zeros de um polinômio de grau n em λ ,
det(A − λ I), onde I é a matriz identidade n × n.
Denote por P o número de autovalores positivos e N o número de autovalores iguais a zero
(isto é, a multiplicidade do autovalor zero) da matriz A. Então a equação (3.2) é:
• Hiperbólica: se N = 0 e P = 1, ou N = 0 e P = n − 1;
• Parabólica: se N > 0 (equivalentemente, se det A = 0);
• Elítica: se N = 0 e P = n, ou N = 0 e P = 0;
• Ultra-hiperbólica: se N = 0 e 1 < P < n − 1.

Se qualquer dos coeficientes ai j não for constante (isto é, se um deles for uma função), então
o tipo da equação (3.2) poderá variar de acordo com a posição.

Exemplo 3.2: Para a EDP 3uxx + uyy + 4uyz + 4uzz = 0, tem-se


   
3 0 0 3−λ 0 0 
   
A= 0 1 2
 e det  
 0 1 − λ 2  = (3 − λ )(λ )(λ − 5).
   
0 2 4 0 2 4−λ

Como λ = 0 é um autovalor, a EDP é parabólica (em todo o espaço xyz).

Exemplo 3.3: Classifique as seguintes equações quanto ao tipo:


a) uxx + 2y uxy + x uyy − ux + u = 0;
b) 2xy uxy + x uy + y ux = 0;
c) uxx + uxy + 5 uyx + uyy + 2 uyz + uzz = 0.

S OLUÇÃO : (a) Na notação (3.1), a = 1, b = y e c = x. Como b2 − ac = y2 − x, a equação é


hiperbólica na região y2 > x, parabólica sobre a curva y2 = x e elítica na região y2 < x.
(b) Aqui, a = 0, b = xy e c = 0. Como b2 − ac = x2 y2 , que é positiva, exceto sobre os eixos
coordenados, a equação é hiperbólica para todo x e y, exceto x = 0 ou y = 0. Ao longo dos eixos
coordenados a equação se degenera para primeira ordem e a categoria de segunda ordem não se
aplica.
432 4 Aplicações às EDP

(c) Reescreva a equação em forma simétrica

(3.3) ux 1 x 1 + 3 ux 1 x 2 + 3 ux 2 x 1 + ux 2 x 2 + ux 2 x 3 + ux 3 x 2 + ux 3 x 3 = 0

onde x1 = x, x2 = y e x3 = z.
A matriz correspondendo à parte principal de (3.3) é
 
1 3 0
 
A=  3 1 1 .

 
0 1 1

Como det (A − λ I) = (1 − λ )3 − 10(1 − λ ), os autovalores de A são 1 e 1 ± 10. Assim,
N = 0 e P = 3 − 1 = 2, tornando a EDP hiperbólica (em toda parte).

Exemplo 3.4: Classifique as seguintes EDP quanto à ordem e ao tipo:


a) Equação do calor: ut − a2 ux x = 0;
b) Equação de ondas: utt − a2 uxx = 0;
c) Equação de Laplace: ∆u = uxx + uyy = 0.

S OLUÇÃO : (a) A equação do calor é de segunda ordem, pois esta é a ordem da derivada
de maior ordem na equação. Para classificar quanto ao tipo é necessário determinar o discrimi-
nante. Como A = 0, B = 0 e C = −a2 , segue-se B2 − AC = 02 − 0 · (−a2) = 0. Portanto a equação
do calor é parabólica.
(b) A equação de ondas é de segunda ordem, pois esta é a ordem da derivada de maior ordem
na equação. Para esta equação, tem-se que A = 1, B = 0 e C = −a2, de modo que B2 − AC =
02 − 1 · (−a2) = a2 > 0. Logo, a equação de ondas é hiperbólica.
(c) A equação de Laplace é de segunda ordem, pois esta é a ordem da derivada de maior ordem
na equação. Para esta equação, tem-se A = 1, B = 0 e C = 1. Logo, B2 −AC = 02 −1·1 = −1 < 0.
Portanto, a equação de Laplace é elítica.

As equações do calor, de ondas e de Laplace representam modelos do tipo parabólico, hiper-


bólico e elítico, respectivamente. As soluções para problemas destes três tipos têm naturezas
distintas. Assim, estas três equações, em virtude de seus tipos, são as mais representativas em
um estudo inicial em EDP. As próximas seções serão destinadas aos estudos dessas equações,
onde cada uma será abordada separadamente.
4.4 Equação do calor 433

4.4 Equação do calor

Os problemas estudados nesta seção serão apresentados na forma de exemplos.

Exemplo 4.1: O problema de condução do calor em uma barra, com extremidades mantidas
a uma temperatura de 0◦ C e com uma distribuição inicial de temperatura dada por uma função
f (x), é modelado da seguinte maneira:



 ut − α 2 uxx = 0, 0 < x < L, t > 0,


 u(0, t) = 0, t > 0,
(4.1)

 u(L, t) = 0, t > 0,



 u(x, 0) = f (x), 0 ≤ x ≤ L.

Figura 4.1: Problema do calor com condições de Dirichlet homogêneas.

As seguintes notações adotadas acima significam:


∂u ∂ 2u
ut = e uxx = ·
∂t ∂ x2
A função u(x, t) é a temperatura da barra em cada ponto x ao longo do tempo t. A constante
α2 é chamada de difusividade térmica e é definida por
κ,
α2 =
ρs
onde κ é a condutividade térmica, ρ é a densidade e s é o calor específico do material da barra.
434 4 Aplicações às EDP

As condições de contorno u(0, t) = u(L, t) = 0 representam a temperatura nas extremidades


da barra, que neste caso é 0◦ . Na verdade, este modelo diz que a temperatura nas extremidades
da barra devem ter valores constantes, u(0, t) = T1 e u(L, t) = T2 . Porém, basta considerar o
caso homogêneo, já que o caso não homogêneo pode ser resolvido por mudança de variáveis
adequadas.
Quando as condições de contorno dão informações sobre a função u nas extremidades da
barra, u(0, t) e u(L, t), o problema de condução de calor é chamado de problema de Dirichlet.
Quando as condições de contorno dão informações sobre a derivada normal,1 ux(0, t) e ux (L, t),
o problema de condução de calor é chamado de problema de Neumann.
A condição inicial, u(x, 0) = f (x), com 0 ≤ x ≤ L, é uma distribuição inicial de temperatura,
ou seja, uma fonte de calor representada por f (x) em cada ponto x da barra.
A EDP (Equação Diferencial Parcial), ut − α 2 uxx = 0, descreve a evolução da temperatura no
intervalo 0 < x < L ao longo do tempo t > 0. Resolver o problema dado consiste em procurar
uma solução u(x, t) que satisfaz a EDP dada e submetida às condições de contorno e inicial.
O problema de condução de calor (4.1) é linear, pois as potências das derivadas de u são todas
iguais a um. As condições de contornos são homogêneas, iguais a zero. Então, a ideia é procurar
soluções que satisfazem a EDP e as condições de contorno e depois fazer uma superposição para
satisfazer a condição inicial.
Observe, primeiro, que u(x, t) ≡ 0 satisfaz a EDP do calor, bem como as condições de con-
torno, mas não satisfaz a condição inicial, exceto se f também for identicamente nula. Caso f
não seja identicamente nula, então u ≡ 0 não interessa, pois ela significa que a temperatura é
nula após a barra ter sido submetida a uma distribuição inicial de temperatura f (x) não nula;
fisicamente isto não faz sentido. Então, o objetivo é procurar outras soluções não nulas para o
problema de condução do calor.
O método que será usado recebe o nome de separação de variáveis. Este método consiste em
considerar, como hipótese, que a solução u(x, t) pode ser escrita como o produto de duas outras
funções, uma dependendo só de x e outra dependendo só de t. Assim,

(4.2) u(x, t) = X(x) · T (t).

O procedimento consiste em derivar u(x, t) acima e substituir estas derivadas na equação do


calor. Um cálculo direto mostra que

ut (x, t) = X(x) · T 0 (t) e uxx(x, t) = X 00 (x) · T (t).

Substituindo estas derivadas na equação ut − α 2 uxx = 0, resulta em


1
X(x) · T 0 (t) − α 2 X 00 (x) · T (t) = 0 ⇒ X 00 (x) · T (t) = · X(x) · T 0 (t),
α2
ou ainda,

1
Derivada normal é a derivada direcional na direção do vetor normal exterior, ou seja, o vetor normal apontando para
fora da região.
4.4 Equação do calor 435

X 00 (x) 1 T 0 (t)
(4.3) = 2· ·
X(x) α T (t)
A leitura que se deve fazer sobre a equação acima é que as variáveis estão separadas, uma
vez que o primeiro membro só tem funções na variável x e o segundo membro só tem funções
na variável t. Além disso, deve-se responder a seguinte pergunta: Em qual situação uma função
que depende de x é igual a outra função que depende t? A igualdade só pode existir quando a
equação (4.3) for igual a uma mesma constante. Se assim não fosse, ao manter uma variável
fixa (por exemplo, x) e deixar a outra (no caso, t) variando, um lado permaneceria constante e o
outro estaria variando, mas isto viola a igualdade.
Agora denota-se por −λ esta constante de separação. Este sinal de “menos” é para simpli-
ficar os cálculos, além do mais, nada é dito sobre o sinal de λ , de modo que é preciso com-
preender que não é correto dizer que −λ é uma constante negativa. Assim, a equação (4.3) fica
reescrita na forma
X 00 1 T0
(4.4) = 2 · = −λ ,
X α T
onde omitiu-se as variáveis x e t para simplificar as notações.
A expressão em (4.4) implica em duas EDO:

(4.5) X 00 + λ X = 0 e T 0 + α 2 λ T = 0.

A função u(x, t) = X(x) · T (t), para satisfazer a equação do calor, deve satisfazer as duas
EDO acima. Mas, além disso, também deve satisfazer as duas condições de contorno, isto é,
u(0, t) = u(L, t) = 0. Fazendo x = 0 em u(x, t), obtém-se

u(0, t) = X(0) · T (t) = 0 ⇒ X(0) · T (t) = 0,

isto significa que, ou X(0) = 0 ou T (t) = 0 para todo t > 0. Porém, se T (t) = 0 para todo t > 0,
então u(x, t) seria igual a zero para todo (x, t), ou seja, u ≡ 0. Este escolha implica na solução
trivial e que já foi descartada. Assim, assume-se que X(0) = 0, que é conhecida como condição
de compatibilidade, que, grosso modo, significa que esta escolha torna o problema fisicamente
compatível.
Fazendo o mesmo com a segunda condição de contorno, obtém-se

u(L, t) = X(L) · T (t) = 0 ⇒ X(L) · T (t) = 0,

ou seja, X(L) = 0 ou T (t) = 0 para todo t > 0. Como visto, a opção T (t) = 0 para todo t > 0 con-
duz à solução trivial, que está descartada. Então assume-se outra condição de compatibilidade,
que é X(L) = 0. Tem-se, portanto, que

(4.6) X(0) = 0 e X(L) = 0.

Segue-se da primeira equação em (4.5) e das duas condições em (4.6) que é necessário re-
solver o seguinte problema de valores de contorno:
436 4 Aplicações às EDP


 00
 X + λ X = 0,

(4.7) X(0) = 0,


 X(L) = 0.

O exemplo 1.5 mostrou que o problema (4.7) exige análise sobre três casos: λ = 0, λ < 0 e
λ > 0.

C ASO 1: para λ = 0. A equação fica reduzida a X 00 = 0, que integrada duas vezes seguidas
resulta em X(x) = ax + b. Agora usa-se as duas condições de compatibilidade. Para x = 0,
tem-se que
X(0) = a · 0 + b = 0 ⇒ b = 0.
Assim, resulta X(x) = ax. Agora se faz x = L, de modo que

X(L) = a · L = 0 ⇒ a = 0 ou L = 0.

Como L > 0 (isto é, é diferente de zero), então a = 0. Com isso X(x) = 0 para todo x. Mas se
X(x) = 0 para todo x, segue-se da separação de variáveis, u(x, t) = X(x) T (t) = 0 para todo x,
ou seja, que u ≡ 0.

C ASO 2: para λ < 0. Para evitar o aparecimento de raízes quadradas, faça λ = −µ 2. Assim,
a equação em (4.7) fica na forma X 00 − µ 2 X = 0. Pelo exemplo 1.5, a solução geral desta EDO
é dada por
X(x) = c1 · cosh(µ x) + c2 · senh (µ x).
Usando a primeira condição de contorno, X(0) = 0, obtém-se

X(0) = c1 · cosh 0 + c2 senh 0 = 0 ⇒ c1 = 0.

Logo a solução geral fica X(x) = c2 · senh (µ x). Usado a segunda condição de contorno,
X(L) = 0, obtém-se

X(L) = c2 · senh (µ L) = 0 ⇒ c2 = 0 ou senh (µ L) = 0.

Como L > 0 e µ 6= 0 (pois λ < 0), então µ L 6= 0, de modo que senh (µ L) 6= 0. Isto implica
que c2 = 0. Logo, X(x) = 0 para todo x e, portanto, u ≡ 0.

C ASO 3: para λ > 0. Fazendo λ = µ 2 , tem-se que a equação em (4.7) fica na forma X 00 +
µ 2 X = 0. Pelo exemplo 1.5, esta última equação tem solução geral

X(x) = c1 · cos(µ x) + c2 · sen (µ x).

Usando a primeira condição de contorno, X(0) = 0, obtém-se

X(0) = c1 · cos 0 + c2 · sen 0 = 0 ⇒ c1 = 0.


4.4 Equação do calor 437

Assim a equação fica na forma X(x) = c2 · sen (µ x). Agora aplica-se a segunda condição de
contorno, X(L) = 0, para concluir que

X(L) = c2 · sen (µ L) = 0 ⇒ c2 = 0 ou sen (µ L) = 0.


Se c2 = 0, então X(x) = 0 para todo x e, consequentemente, u ≡ 0, que após somar as
soluções dos três casos, resultaria na solução trivial u ≡ 0, que não interessa. Assim, tem-se
que sen (µ L) = 0, que implica em

nπ n2 π 2
µ L = nπ ⇒ µ= e λ= ·
L L2
Assim,  nπ x 
Xn (x) = c2 · sen ·
L
Sem perda de generalidade, pode-se fazer c2 = 1 (isto ficará claro mais adiante), de modo
que
 nπ x 
(4.8) Xn (x) = sen ·
L
Agora retorna-se a equação (4.5) em T , isto é, T 0 + α 2 λ T = 0. Observe, primeiro, que os
casos λ = 0 e λ < 0 ficam descartados também para esta equação, pois mesmo que tenha
solução, ela não interessará, uma vez que nestes dois casos sempre se tem u ≡ 0 como foi visto.
Então, resta apenas resolver esta equação para λ > 0. Assim, a equação fica

n2 π 2 α 2
T0 + T = 0.
L2
 
Mas esta EDO é simples de resolver, de modo que T (t) é proporcional exp (−n2 π 2 α 2 t)/L2 , ou
seja, a solução para a equação acima é
−n2 π 2 α 2 t
Tn(t) = k · e ( )/L2 .

Novamente, sem perda de generalidade, pode-se tomar k = 1, de modo que

−n2 π 2 α 2 t
(4.9) Tn (t) = e ( )/L2 .

De u(x, t) = X(x) · T (t) segue-se que un(x, t) = Xn (x) · Tn (t). Então, basta multiplicar (4.8) e
(4.9) para obter
 nπ x 
−n2 π 2 α 2 t )/L2
un (x, t) = e ( · sen , n = 1, 2, 3, . . .
L
Estas funções acima, para todo n ∈ N, satisfazem a EDP dada (4.1), bem como as condições
de contornos. Para confirmar, basta fazer as substituições diretamente; fica como exercício.
Resta apenas verificar se elas satisfazem a condição inicial

u(x, 0) = f (x), 0 ≤ x ≤ L.
438 4 Aplicações às EDP

Quando se trabalha com EDO e P.V.I., é comum formar combinações lineares de soluções
fundamentais e depois escolher os coeficientes desta combinação que satisfazem as condições
iniciais. O passo a ser adotado para a nossa EDP é similar, uma vez que existe uma infinidade
de soluções para o problema. A combinação linear geral é, na verdade, uma série infinita. O
procedimento de formar estas “combinações lineares infinitas” é chamado de superposição.
Assim, supõe-se que seja possível escrever
∞ ∞  
−n2 π 2 α 2 t )/L2 · sen nπ x ,
(4.10) u(x, t) = ∑ cn · un (x, t) = ∑ cn · e ( L
n=1 n=1

onde os coeficientes cn ainda estão indeterminado.


Deve-se supor que está série dada em (4.10) é convergente. Assim, para satisfazer a condição
inicial u(x, 0) = f (x), para 0 ≤ x ≤ L, deve-se fazer t = 0 em (4.10), de modo que
∞  nπ x 
u(x, 0) = ∑ cn · sen = f (x).
n=1 L

É a partir da expressão acima que se escolhe os coeficientes cn de modo que a série de senos
acima convirja para a distribuição inicial de temperatura f (x), com 0 ≤ x ≤ L. Mas observe que
a série  nπ x 

f (x) = ∑ cn · sen
n=1 L
é exatamente a série de Fourier para uma função ímpar no intervalo −L ≤ x ≤ L. Portanto, se
a função f (x) for estendida de modo ímpar no intervalo [−L, L] e depois estendida de forma
periódica de período T = 2L, nomeando tal extensão por f (x), então a série acima é tal que seus
coeficientes são dados por
Z  nπ x  Z  nπ x 
1 L 2 L
cn = f (x) · sen dx = f (x) · sen dx,
L −L L L 0 L
pois o integrando é uma função par (pois o integrando é produto de duas funções, f e seno, que
são ímpares). Além disso, f coincide com f no intervalo [0, L].
Portanto, a solução do problema (4.1) é dada por
∞  nπ x 
(−n2 π 2 α 2 t )/L2 ,
u(x, t) = ∑ cn · e · sen
n=1 L

onde os coeficientes cn são dados por


Z L  nπ x 
2
cn = f (x) · sen dx.
L 0 L
O que garante a convergência da solução acima é a natureza da função f . Para dar sentido,
inicialmente se fez uma extensão ímpar e periódica de período T = 2L. Mas como visto no
capítulo 2, para que a série de Fourier para f convirja, também é necessário supor que f seja
4.4 Equação do calor 439

seccionalmente diferenciável. Em todo este capítulo será assumido que as funções que aparecem
nos problemas satisfazem as hipóteses para convergências indicadas.
Apesar de a função f poder ser descontínua (afinal, por hipótese, f é seccionalmente diferen-
ciável), a solução u(x, t) é contínua para valores arbitrariamente pequenos de t > 0, na verdade
é possível mostrar que a solução é de classe C∞ . Isto mostra que a condução do calor é um
processo que suaviza, instantaneamente, quaisquer descontinuidades que possam estar presentes
na distribuição inicial de temperatura f (x).
Por fim, o leitor é convidado a observar atentamente a solução obtida e analisar seu compor-
tamento. Note que a exponencial que aparece no somatório tem potência negativa, isto faz com
que a solução tenda para zero quando t tende para infinito. E isto está coerente com o problema
proposto, uma vez que a barra está mantida a 0◦ nas extremidades, ou seja, quando o tempo
aumenta a temperatura da barra se aproxima de 0◦ .

Observação 4.1: Na resolução do problema (4.1), e nos demais que seguirão, foi usado o
seguinte fato: Se f (x) = g(t) para todos x, t ∈ R, então f (x) = g(t) = λ , onde λ é uma constante
real.
Uma maneira de mostrar essa afirmação é supor que ela é falsa e chegar a uma contradição.
Suponha que f (x) = g(t) para todos x, t ∈ R, mas que f (x) = g(t) 6= λ . Sejam x1 6= x2 e t1 6= t2
números reais tais que f (x1 ) = g(t1 ) = y1 e f (x2 ) = g(t2 ) = y2 . Como se supõe que f e g não
são constantes, então deve-se assumir que y1 6= y2 . Mas, por hipótese, deve-se ter f (x2 ) = g(t1 ),
pois f (x) = g(t) para todos x, t ∈ R. Portanto,

f (x2 ) = y2 6= y1 = g(t1 ) ⇒ f (x2 ) 6= g(t1 ),

que é uma contradição

Observação 4.2: Para saber se a solução obtida para o problema (4.1) está correta, é preciso
testar e justificar. Deve-se verificar que a solução satisfaz as condições de contono, bem como
a própria equação do calor. A solução obtida no exemplo anterior é
∞  nπ x 
(−n2 π 2 α 2 t )/L2
u(x, t) = ∑ cn · e · sen ·
n=1 L

Apenas dessa vez, neste texto, será mostrado que esta solução satisfaz a EDP dada e as
condições de contorno. Nos demais exemplos a verificação de que é solução será deixada para
o leitor. Inicia-se pelas condições de contorno. Tem-se:
∞   ∞
(−n2 π 2 α 2 t )/L2 nπ 0 −n2π 2 α 2 t )/L2
u(0, t) = ∑ cn · e · sen = ∑ cn · e ( · sen 0 = 0
n=1 L n=1
e
440 4 Aplicações às EDP

∞   ∞
−n2 π 2 α 2 t )/L2 nπ L −n2 π 2 α 2 t )/L2 · sen (nπ ) = 0,
u(L, t) = ∑ cn · e ( · sen = ∑ cn · e (
n=1 L n=1
pois sen 0 = 0 e seno de múltiplo inteiro de π também é zero.
Para mostrar que satisfaz a EDP em (4.1), deve-se derivar (4.10), “formalmente”, uma vez
em relação a t, duas vezes em relação a x e substituir na equação. Assim,

n2 π 2 α 2  
ut (x, t) = − ∑ · c · e (−n2π 2 α 2 t )/L2 · sen nπ x
n
n=1 L2 L
e  

nπ (−n2π 2 α 2 t )/L2 · cos nπ x ,
ux(x, t) = ∑ · cn · e
n=1 L L
de modo que
n2 π 2
∞  
uxx(x, t) = − ∑ · c · e (−n2π 2 α 2 t )/L2 · sen nπ x ·
2 n
n=1 L L
Substituindo as expressões para ut (x, t) e uxx(x, t) na EDP dada em (4.1), obtém-se

n2 π 2 α 2
∞  nπ x 
2 (−n2 π 2 α 2 t )/L2
ut − α uxx = − ∑ · cn · e · sen −
n=1 L2 L

n2 π 2  
− (−α 2 ) (−n2π 2 α 2 t )/L2 · sen nπ x
∑ 2 · cn · e
n=1 L L

n2 π 2 α 2  
(−n2π 2 α 2 t )/L2 · sen nπ x +
=− ∑ L2 · cn · e
L
n=1

n2 π 2 α 2  
(−n2π 2 α 2 t )/L2 · sen nπ x
+ ∑ L2 · cn · e
L
n=1

= 0,
o que demonstra o que foi afirmado.
Antes de continuar é preciso fazer uma observação: nos passos anteriores, para realizar as
derivações, passou-se a derivada para dentro do símbolo de somatório. Em geral isso não é
possível, somente é possível se a série assim formada converge uniformemente e nada garante
isso até agora. Sugere-se que o leitor retorne à seção 2.7 do capítulo 2 para ver as hipóteses
necessárias para que as operações acima sejam válidas.

Exemplo 4.2: Considere agora o seguinte problema:


4.4 Equação do calor 441




 ut − α 2 uxx = 0, 0 < x < L, t > 0,


 u(0, t) = T , t > 0,
1
(4.11)

 u(L, t) = T2 , t > 0,



 u(x, 0) = f (x), 0 ≤ x ≤ L.

Figura 4.2: Problema do calor com condições de Dirichlet não homogêneas.

No problema acima, as condições de contorno são não homogêneas: uma das extremidades
da barra é mantida a uma temperatura constante T1 e a outra é mantida com outra temperatura
constante T2 . A ideia para resolver este problema consiste em reduzi-lo a um problema com
condições de contorno homogêneas, que pode ser resolvido como no problema (4.1). Quando
uma EDP modela algum problema físico é comum observar o fenômeno envolvido e usar argu-
mentos físicos para resolver o problema.
No caso do problema (4.11) quando t → ∞ a barra alcançará uma temperatura estacionária
v(x), ou seja, independente do tempo t e das condições iniciais. Note que a derivada de v em
relação a t é nula, pois a função v só depende de x. Assim, ao substituir as derivadas de v(x) na
equação do calor, obtém-se vt = 0 e vxx = v00 . Além disso, usa-se as condições de contorno para
x = 0 e x = L. O problema em v fica assim:

00
 v (x) = 0, 0 < x < L,


v(0) = T1 ,


 v(L) = T .
2

O problema acima é uma EDO com condições de contorno. A solução geral da EDO é obtida
integrando-se duas vezes seguinda e é dada por v(x) = ax + b. Agora usa-se as duas condições
de contorno para encontrar as duas contantes a e b. Tem-se:
442 4 Aplicações às EDP

(
v(0) = a · 0 + b = T1, T2 − T1
⇒ b = T1 e a = ·
v(L) = a · L + b = T2 L

Portanto,
T2 − T1
(4.12) v(x) = x + T1.
L
O próximo passo consiste em escrever o problema (4.11) como soma de temperatura esta-
cionária v(x) com outra transiente w(x, t), ou seja,

u(x, t) = v(x) + w(x, t)

Derivando parcialmente a equação acima, primeiro em relação a t e depois duas vezes em


relação a x, obtém-se

ut (x, t) = wt (x, t) e uxx (x, t) = wxx(x, t),

pois vt (x) = 0 e vxx (x) = v00 (x) = 0.


Substituindo estas derivadas parciais na EDP do problema (4.11), resulta em

ut − α 2 uxx = wt − α 2 wxx = 0 ⇒ wt − α 2 wxx = 0.

Para as condições de contorno, encontra-se


( (
u(0, t) = v(0) + w(0, t) = T1, T1 + w(0, t) = T1 ,

u(L, t) = v(L) + w(L, t) = T2, T2 + w(L, t) = T2,

ou seja, w(0, t) = 0 e w(L, t) = 0. Para a condição inicial, tem-se que u(x, 0) = v(x) + w(x, 0) =
f (x), isto é,
T2 − T1
w(x, 0) = f (x) − v(x) ⇒ w(x, 0) = f (x) − x − T1 .
L
Portanto, o problema a ser resolvido para w fica assim resumindo:


 wt − α 2 wxx = 0, para 0 < x < L, t > 0,



 w(0, t) = 0, para t > 0,
(4.13)

 w(L, t) = 0, para t > 0,



 w(x, 0) = f (x) − T2 − T1
x − T1, para 0 ≤ x ≤ L.
L
Fazendo
T2 − T1
g(x) = f (x) − · x − T1,
L
o leitor notará que o problema (4.13) é idêntico ao problema (4.1), onde se troca f por g dada
acima e u por w. Como visto anteriormente, a solução do problema (4.1) é dada por
4.4 Equação do calor 443

∞  nπ x 
(−n2 π 2 α 2 t )/L2 ,
w(x, t) = ∑ cn · e · sen
n=1 L

onde
Z L  nπ x  Z L   nπ x 
2 2 T2 − T1
cn = g(x) · sen dx = f (x) − · x − T1 · sen dx.
L 0 L L 0 L L
Para finalizar, basta lembrar que a solução do problema (4.11) é u(x, t) = v(x) + w(x, t). Por-
tanto, tem-se que

T2 − T1 ∞  nπ x 
(−n2 π 2 α 2 t )/L2 ,
u(x, t) = x + T1 + ∑ cn · e · sen
L n=1 L

onde
Z L   nπ x 
2 T2 − T1
cn = f (x) − x − T1 · sen dx.
L 0 L L

Exemplo 4.3: Considere agora o seguinte problema:



2
 ut − α uxx = 0, para x ∈ R e t > 0,


(4.14) u(x, 0) = f (x), para x ∈ R,


 u limitada.

Figura 4.3: Problema da barra infinita.

O problema acima modela a temperatura u = u(x, t) em uma barra infinita, onde se conhece
apenas a distribuição inicial de temperatura. A condição de u ser uma função limitada é uma
condição de contorno no infinito e que garante a unicidade da solução do problema dado. Esta
condição também impoê a condição de compatibilidade f limitada.
Emprega-se o método de separação de variáveis, procurando soluções da forma

u(x, t) = X(x) T (t).


444 4 Aplicações às EDP

Derivando a expressão acima, encontram-se ut = X · T 0 e uxx = X 00 · T . Agora substitui-se na


EDP para obter
X 00 1 T0
= 2 · = −λ ,
X α T
onde λ é uma constante. Portanto,

X 00 + λ X = 0 e T 0 + λ α 2 T = 0.

A solução geral da EDO em X é dada por


√ √
−λ x −λ x
X(x) = a · e +b·e−
e a solução geral para a EDO em T é dada por

T (t) = k · e −λ t .

O leitor deve observar que a e b acima não são necessariamente constantes. Na verdade a e b
podem depender (ou seja, ser função) de λ , que não muda a solução geral. Para ver isso, escreva
√ √
−λ x −λ x
X(x) = a(λ ) · e + b(λ ) · e − .
Observe que a intenção é derivar duas vezes a expressão acima e verificar se ela satisfaz a
equação X 00 + λ X = 0. Note também que as funções a(λ ) e b(λ ), quando derivadas em relação
a x, atuam como “constantes”. Assim,
p √ p √
X 0 (x) = −λ · a(λ ) · e −λ x − −λ · b(λ ) · e − −λ x ,
p p √ p  p  √
X 00 (x) = −λ · −λ · a(λ ) · e −λ x − −λ · − −λ · b(λ ) · e − −λ x,
√ √
−λ x −λ x
X 00 (x) = −λ · a(λ ) · e − λ · b(λ ) · e − ,
Agora o resultado obtido será substituído na EDO para verificar se ela é satisfeita. Tem-se:
h √ √ i
X 00 + λ X = −λ · a(λ ) · e −λ x − λ · b(λ ) · e − −λ x +
h √ √ i
+ λ a(λ ) · e −λ x + b(λ ) · e − −λ x
√ √
−λ x −λ x
= − λ · a(λ ) · e − λ · b(λ ) · e − +
√ √
−λ x −λ x
+ λ · a(λ ) · e + λ · b(λ ) · e −

= 0.
Isto mostra que a(λ ) e b(λ ) não precisam ser constantes para que X(x) satisfaça a EDO
X 00 + λ X
= 0. Isto se deve ao fato de não existir qualquer condição adicional, como as condições
de contorno, que possa garantir que a(λ ) e b(λ ) sejam de fato constantes.
4.4 Equação do calor 445

Continuando, tem-se, portanto, que a solução geral para a equação do calor, u(x, t) = X(x) ·
T (t), é dada por h √ √ i
uλ (x, t) = a(λ ) · e −λ x + b(λ ) · e − −λ x · e −λ t .

Como se busca soluções limitadas, então −λ tem que ser um imaginário puro,2 de modo
que λ ∈ R e λ ≥ 0. Fazendo λ = ω 2 , obtém-se
h √ √ i 2
−ω 2 x − −ω 2 x
uω (x, t) = a(ω ) · e + b(ω ) · e · e −ω t .
√ √
Observando que −ω 2 = −1 · ω = iω , a solução geral fica na forma
  2
(4.15) uω (x, t) = a(ω ) · e iω x + b(ω ) · e −iω x · e −ω t .

A EDO X 00 − ω 2 X = 0 acrescida da condição de a solução ser limitada faz com que o conjunto
de autovalores dessa equação não seja enumerável, pois se tem um conjunto de números reais
ω . E como não se tem uma família enumerável de autovalores, então não é possível formar
uma série somando todas as soluções de (4.15). Se se interpretar uma série como uma “soma
discreta”, então a ideia de “somar continuamente” deve ser interpretada como uma integral.
Logo, é natural procurar soluções do problema (4.14) integrando as soluções em (4.15). Assim,
Z ∞
u(x, t) = uω (x, t) d ω
0
Z ∞  2
= a(ω ) · e iω x + b(ω ) · e −iω x · e −ω t d ω
0
Z ∞ Z ∞
iω x −ω 2t 2
= a(ω ) · e ·e dω + b(ω ) · e −iω x · e −ω t d ω
0 0
Z ∞ Z −∞
2 2
= a(ω ) · e iω x · e −ω t d ω − b(−α ) · e iα x · e −(−α ) t d α
0 0
Z ∞ Z 0
2 2
= a(ω ) · e iω x · e −ω t d ω + b(−α ) · e iα x · e −α t d α
0 −∞
Z ∞ Z 0
2 2
= a(ω ) · e iω x · e −ω t d ω + b(−ω ) · e iω x · e −ω t d ω ,
0 −∞

onde se fez a mudança de variáveis ω = −α (e d ω = −d α ). No último passo acima retornou-se


com a letra ω no lugar de α , pois a variável de integração é “muda” (isto é, não importa qual
letra é usada, pois o valor da integral será o mesmo).
Agora define-se

2 Em Variáveis Complexa tem um resultado, cujo nome é teorema de Liouville, cujo enunciado é: “Se uma função
f (z) for inteira e limitada no plano complexo, então f (z) é constante em todo o plano”. Uma função complexa é inteira
quando ela é diferenciável em todos os pontos do plano complexo. Esse é o caso da função f (z) = e z . Mas se essa função
fosse limitada, então pelo teorema ela teria que ser constante. Mas é fácil ver que f (z) = e z não é constante, logo ela é
ilimitada.
446 4 Aplicações às EDP

(
a(ω ), se − ∞ < ω < 0,
g(ω ) =
b(−ω ), se 0 ≤ ω < ∞.
Deste modo, obtém-se
Z ∞ Z 0
iω x −ω 2t 2
u(x, t) = a(ω ) · e ·e dω + b(−ω ) · e iω x · e −ω t d ω
0 −∞
Z ∞ Z 0
2 2
= g(ω ) · e iω x · e −ω t d ω + g(ω ) · e iω x · e −ω t d ω
0 −∞
Z ∞
2
= g(ω ) · e iω x · e −ω t d ω .
−∞

Para fazer com que certas fórmulas sejam simétricas, multiplica-se a integral acima por 1/ 2π ,
de modo que uma representação melhor para u(x, t) é
Z ∞
1 2
u(x, t) = √ g(ω ) · e iω x · e −ω t d ω .
2π −∞

Agora observe que a condição inicial dada, u(x, 0) = f (x), quando aplicada na expressão
acima para u(x, t) (isto é, fazendo t = 0 em u(x, t)), implica em
Z
1 ∞
f (x) = √ g(ω ) · e iω x d ω .
2π −∞
A expressão anterior, para f (x), é a transformada inversa de Fourier. O procedimento de
integrar as soluções uω (x, t) dadas em (4.15) sugere, para o problema da barra infinita, a corres-
pondente aplicação da transformada direta de Fourier em ambos os membros da EDP dada.

O próximo exemplo resolve o problema (4.14) através de transformadas de Fourier.

Exemplo 4.4: Resolva o seguinte problema da barra infinita:



 2
 ut − α uxx = 0,
 para x ∈ R e t > 0,
(4.16) u(x, 0) = f (x), para x ∈ R,



|u(x, t)| < M, onde M > 0.

S OLUÇÃO : Aplicando a transformada de Fourier em ambos os membros da equação, bem


como a sua linearidade, obtém-se

F ut − α 2 uxx = 0 ⇒ F (ut ) − α 2 · F (uxx) = 0.

Pelas fórmulas 23 e 22 da tabela (do capítulo 3), tem-se que



F [ut (x, t)] = F [u(x, t)] e F [uxx(x, t)] = −ω 2 · F [u(x, t)].
∂t
4.4 Equação do calor 447

Substituindo na última equação acima, encontra-se


∂ ∂
F [u(x, t)] + α 2ω 2 · F [u(x, t)] = 0 ⇒ · F [u(x, t)] = −α 2 ω 2 F [u(x, t)],
∂t ∂t
ou de forma mais simples:
d d
F (u) = −α 2 ω 2 · F (u) ⇒ F (u) + α 2 ω 2 · F (u) = .
dt dt
A expressão acima pode ser interpretada como uma EDO de primeira ordem, fazendo-se
U (ω , t) = F [u(x, t)], isto é, ela fica assim:

U 0 + α 2 ω 2 · U = 0.

A última equação acima pode ser resolvida multiplicando-se ambos os membros pelo fator
de integração Z 
 R 2 2 2 2
µ (t) = exp α ω dt = e (α ω )dt = e (α ω )t .
2 2

Assim,
e (α
2ω 2
)t U 0 + α 2 ω 2 · U  = e (α 2ω 2)t · 0
2ω 2
e (α )t · U 0 + α 2 ω 2 · e (α 2 ω 2)t · U = 0

2 2
h 2 2 i0
e (α ω )t · U 0 + e (α ω )t · U = 0

(pela regra de derivação do produto)


∂ h (α 2 ω 2)t i
e · U (ω , t) = 0.
∂t
A última expressão acima pode ser integrada diretamente em relação a t. Assim,
2ω 2
e (α )t · U (ω , t) = k(ω ),

de modo que
2ω 2
U (ω , t) = k(ω ) · e −(α )t .

Antes de continuar, é importante observar que se tem uma função k(ω ) após a integração
feita acima, ou seja, uma função de ômega e não apenas uma constante. O motivo é o fato de
que a derivada que aparece anteriormente em relação a t é parcial e não ordinária. Isso implica
em dizer que tudo aquilo que for derivado parcialmente em relação a t deve ser zero, de modo
que as funções que dependem apenas de ω cumprem essa exigência.
Em resumo, o que se mostrou é que a solução geral da equação em U (ω , t) é dada por
2ω 2
U (ω , t) = k(ω ) · e −(α )t .

Agora, suponha que exista a função transformada de Fourier para a função f (x), isto é, que
se possa escrever F(ω ) = F [ f (x)]. Assim, fazendo t = 0 na expressão acima e lembrando a
448 4 Aplicações às EDP

condição inicial u(x, 0) = f (x), obtém-se

F(ω ) = F [ f (x)] = U (ω , 0) = k(ω ) · e 0 = k(ω ).

Portanto, tem-se que


2ω 2 t
(4.17) U (ω , t) = F(ω ) · e −α .

Agora será usada a fórmula 7 da tabela de transformada de Fourier,


  1
2 ω2
F e −ax = √ · e − /4a,
2a
para encontrar a transformada inversa da exponencial no segundo membro de (4.17).
Fazendo
1 1
a= 2
ou = α 2 t,
4α t 4a
obtém-se h 2 2 i 1 2 2
F e /(4α t ) = p · e −α ω t ,
−x

2/(4α t )
2

ou ainda, h 2 2 i √ 2 2
F e /(4α t ) = α 2t · e −α ω t ,
−x

que implica em
 
1 −x2/ 4α 2 t
( ) = e −α 2ω 2t .
(4.18) F √ ·e
α 2t
Substituindo (4.18) em (4.17), obtém-se
 
1 −x2/ 4α 2 t
( ) .
U (ω , t) = F(ω ) · F √ ·e
α 2t
Agora faça
1 ( ). −x2/ 4α 2 t
g(x) = √ ·e
α 2t
Pelo teorema de convolução no tempo (fórmula 17 da tabela do capítulo 3), tem-se que
√ √
F [( f ∗ g)(x)] = 2π · F [ f (x)] · F [g(x)] = 2π · F(ω ) · G(ω ).

Portanto,
1
U (ω , t) = √ · F [ f (x) ∗ g(x)]

  
1 1 −x2/(4α 2 t )
= √ · F f (x) ∗ √ ·e
2π α 2t
  2 2 
1 1
= F √ · √ · f (x) ∗ e /(4α t )
−x

2π α 2t
  2 2 
1
√ · f (x) ∗ e /(4α t )
−x
=F
2α π t
4.5 Equação da onda 449

Aplicando a transformada inversa em ambos os membros, obtém-se


1 h 2 2 i
√ · f (x) ∗ e /(4α t )
−x
u(x, t) =
2α π t
Z ∞
1 −(x−y)2/ 4α 2 t
( ) dy.
= √ f (y) · e
2α π t −∞

A última expressão acima é a solução do problema (4.16). Além disso, é possível demonstrar
que, se f é uma função limitada, seccionalmente contínua e absolutamente integrável, então a
solução acima define uma função que satisfaz a equação do calor e lim u(x, t) = f (x), nos
t→0+
pontos em que f é contínua.

4.5 Equação da onda

Exemplo 5.1: Suponha que uma corda elástica de comprimento L esteja ligeiramente esticada
entre dois pontos colocados horizontalmente, de modo que o eixo x esteja ao logo da corda.
Pense em um elástico preso por dois pregos, ou as cordas de um violão, por exemplo. Suponha
que a corda seja colocada em movimento, oscilando em um plano vertical. Denote por u(x, t)
o deslocamento vertical da corda no ponto x e no instante t. Suponha também que os efeitos
de amortecimento (resistência oferecida pelo meio onde a corda se encontra) são desprezados e
que a amplitude do movimento não é muito grande.

Figura 5.1: A corda vibrante.

Nestas condições, o modelo matemático da corda vibrante é dado por




 utt − α 2 uxx = 0, se 0 < x < L e t > 0,




 u(0, t) = 0, se t ≥ 0,


(5.1) u(L, t) = 0, se t ≥ 0,



 u(x, 0) = f (x), se 0 ≤ x ≤ L,




 ut (x, 0) = 0, se 0 ≤ x ≤ L.
450 4 Aplicações às EDP

A constante α 2 que aparece na equação de onda é dada por


T,
α2 =
ρ
onde T é a tensão na corda e ρ é massa por unidade de comprimento.
As condições de contorno u(0, t) = 0 = u(L, t) significam que as extremidades da corda per-
manecem fixas. Já a condição inicial u(x, 0) = f (x), para 0 ≤ x ≤ L, significa a posição inicial da
corda e a condição inicial ut (x, 0) = 0 significa que a velocidade inicial da corda é zero, ou seja,
parte do repouso. Portanto, o modelo dado em (5.1) descreve a corda elástica com deslocamento
inicial não nulo.

Figura 5.2: O problema da corda com extremidades fixas partindo do repouso.

Este primeiro problema envolvendo a equação de onda será resolvido pelo método de sepa-
ração de variáveis. Suponha que a solução seja dada por

(5.2) u(x, t) = X(x) · T (t).

Então, como já visto,

utt (x, t) = X(x) · T 00 (t) e uxx(x, t) = X 00 (x) · T (t).

Substituindo estas expressões na equação de onda, obtém-se


1
X(x) · T 00 (t) − α 2 X 00 (x) · T (t) = 0 ⇒ X 00 (x) · T (t) = 2
· X(x) · T 00 (t),
α
ou ainda, que
X 00 (x) 1 T 00 (t)
= 2· = −λ .
X(x) α T (t)
4.5 Equação da onda 451

Como já foi visto, o primeiro membro só depende de x, enquanto o segundo membro só


depende de t, de modo que a igualdade só faz sentido se ambos os membros forem iguais a uma
mesma constante. Como já dito, o sinal de menos não significa que a constante é negativa, ele
é usado apenas para simplificar as contas que serão feitas a seguir. Segue-se imediatamente da
igualdade acima que
(
X 00 + λ X = 0,
(5.3)
T 00 + α 2 λ T = 0.

Agora deve-se substituir as condições de contorno em (5.2) para obter as condições de com-
patibilidade. Tem-se:

u(0, t) = X(0) · T (t) = 0 ⇒ X(0) = 0 ou T (t) = 0 para todo t.

Mas se T (t) = 0 para todo t, então por (5.2) se vê facilmente que u ≡ 0, ou seja, se tem a
solução trivial e que não é de interesse. Fisicamente, a solução trivial significa dizer que você
puxa a corda e ela imediatamente volta para a posição de equilíbrio; isso não faz sentido, já que
a corda é elástica. Segue-se daí, que X(0) = 0.
Com a outra condição de contorno se obtém

u(L, t) = X(L) · T (t) = 0 ⇒ X(L) = 0 ou T (t) = 0 para todo t.

Novamente, se T (t) = 0 para todo t, então por (5.2) segue-se que u ≡ 0. Portanto, escolhe-se
a condição X(L) = 0.
A condição inicial ut (x, 0) = 0 também é usada. Derivando (5.2) em relação a t, obtém-se que
ut (x, t) = X(x) · T 0 (t), de modo que

ut (x, 0) = X(x) · T 0 (0) = 0 ⇒ T 0 (0) = 0 ou X(x) = 0 para todo x.

Como visto, se X(x) = 0 para todo x, então u ≡ 0. Logo,

(5.4) T 0 (0) = 0.

Assim, deve-se resolver o seguinte problema de valores de contorno:



 00
 X + λ X = 0,

(5.5) X(0) = 0,



X(L) = 0.

Como λ pode ser igual a zero, negativo ou positivo, então é preciso dividir o problema em
três casos.

C ASO 1: para λ = 0 a equação fica reduzida a X 00 = 0, que integrada duas vezes em relação
a x resulta em X(x) = ax + b. Agora deve-se usar as condições de contorno para determinar as
constantes a e b. Tem-se:
452 4 Aplicações às EDP

X(0) = a · 0 + b = 0 ⇒ b = 0.

Resulta daí que X(x) = ax. Usando a segunda condição de contorno, encontra-se

X(L) = a · L = 0 ⇒ a=0 ou L = 0.
Mas L é o comprimento da corda, logo ele não pode ser igual a zero. Segue-se, portanto, que
a = 0, o que implica que X(x) = 0 para todo x. E por (5.2), segue-se que u ≡ 0.

C ASO 2: λ < 0. Fazendo λ = −µ 2, para evitar o aparecimento de raízes negativas, a equação


fica escrita na forma X 00 − µ 2 X = 0. Pelo exemplo 1.5, esta última equação tem a seguinte
solução geral:
X(x) = c1 · cosh(µ x) + c2 senh (µ x).
Pela primeira condição de contorno em (5.5), obtém-se

X(0) = c1 · cosh 0 + c2 senh 0 = 0 ⇒ c1 = 0.

Logo, X(x) = c2 · senh (µ x). Usando a segunda condição de contorno, encontra-se

X(L) = c2 · senh (µ L) = 0 ⇒ c2 = 0 ou senh (µ L) = 0.

Mas como visto, senh (µ L) 6= 0, pois µ 6= 0 e L 6= 0, de modo que µ · L 6= 0, e seno hiperbólico


de números diferentes de zero é diferente de zero (use a fórmula para se convencer disso). Logo,
c2 = 0, de modo que X(x) = 0 para todo x e isto implica em u ≡ 0 ao se usar (5.2).

C ASO 3: para λ > 0. Fazendo λ = µ 2 , a equação fica na forma X 00 + µ 2 X = 0. Pelo exemplo


1.5, segue-se que a solução geral da EDO é dada por

X(x) = c1 · cos(µ x) + c2 · sen (µ x).

Usando a primeira condição de contorno, obtém-se

X(0) = c1 · cos 0 + c2 sen 0 = 0 ⇒ c1 = 0.

Logo, a equação fica resumida em X(x) = c2 · sen (µ x). Agora aplica-se a segunda condição
de contorno para encontrar

X(L) = c2 · sen (µ L) = 0 ⇒ c2 = 0 ou sen (µ L) = 0.


Caso seja c2 = 0, então X(x) = 0 para todo x, de modo que se tem u ≡ 0. Então procura-se
casos em que sen (µ L) = 0, ou seja, o argumento deve ser igual a um múltiplo de π , isto é,

sen (µ L) = 0 ⇒ µ L = nπ ⇒ µ= ·
L
Além disso, por ser λ = µ 2 , segue-se que
4.5 Equação da onda 453

n2 π 2
λ= ·
L2
Portanto, o problema (5.5) tem as seguintes soluções
 nπ x 
Xn (x) = c2 · sen , n = 1, 2, 3, . . .
L
Sem perda de generalidade, pode-se tomar c2 = 1, como já foi explicado anteriormente (esta
constante será “absorvida” pelas constantes que aparecerão na superposição de soluções). As-
sim,
 nπ x 
(5.6) Xn (x) = sen , n = 1, 2, 3, . . .
L
Como os casos 1 e 2 levam sempre à solução trivial u ≡ 0, então não importa como será a
solução para a equação T 00 + α 2 µ 2 T = 0 nestes dois casos. Assim, a EDO em T (t) deve ser
analisada apenas na situação do caso 3. E pelo exemplo 1.5 a solução geral para esta equação é

T (t) = k1 · cos(αµ t) + k2 · sen (αµ t).

Por (5.4) tem-se que T 0 (0) = 0. Derivado a solução acima e usando esta condição, obtém-se

T 0 (t) = −k1 αµ · sen (αµ t) + k2 λ µ cos(αµ t),

de modo que

T 0 (0) = −k1 αµ · sen 0 + k2αµ cos 0 = 0 ⇒ k2 αµ = 0.

Mas como já visto, α , µ 6= 0, logo k2 = 0 e, portanto,

T (t) = k1 · cos(αµ t).

Sem perda de generalidade, toma-se k1 = 1 e introduz-se o valor de µ já obtido no caso 3


para escrever
 nπα t 
(5.7) Tn (t) = cos , n = 1, 2, 3, . . .
L
Segue-se de (5.2), (5.6) e (5.7) que

 nπ x   nπα t 
(5.8) un (x, t) = Xn (x) · Tn (t) = sen · cos , n = 1, 2, 3, . . .
L L
satisfazem a EDP e as condições de contorno do problema (5.1), bem como a segunda condição
inicial ut (x, 0) = 0 (deixa-se estas verificações como exercício para o leitor). As funções acima
são soluções fundamentais do problema dado.
A primeira condição inicial em (5.1), u(x, 0) = f (x), com 0 ≤ x ≤ L, será agora usada. Para
satisfazer esta condição inicial, considera-se uma superposição das soluções fundamentais (5.8)
com escolha adequada dos coeficientes. Assim, supõe-se que o candidato à solução tenha a
454 4 Aplicações às EDP

seguinte forma:

u(x, t) = ∑ cn · un(x, t)
n=1
∞  nπ x   nπα t 
= ∑ cn · sen L
· cos
L
·
n=1
Mas para que este candidato à solução seja de fato solução do problema (5.1) é preciso
informar com precisão quais são estas constantes cn , ou seja, uma maneira de obtê-las concre-
tamente. É neste ponto que se usa a primeira condição inicial, fazendo t = 0 no candidato à
solução. Tem-se:
∞  nπ x 
u(x, 0) = ∑ cn · sen · cos0 = f (x),
n=1 L
ou seja, que
∞  nπ x 
f (x) = ∑ cn · sen L
·
n=1
Mas a expressão acima é exatamente a série de Fourier para uma função ímpar. Assim,
estende-se a função f dada para uma função definida no intervalo simétrico −L ≤ x ≤ L,
tornando-a periódica de período T = 2L. Com isso, usando a notação f (x) para a extensão
feita, a última série será uma série de senos, onde os coeficientes cn são dados por
Z  nπ x  Z  nπ x 
1 L 2 L
cn = f (x) · sen dx = f (x) · sen dx,
L −L L L 0 L
onde, no último passo acima, usou-se o fato de que a extensão f (x) é ímpar e seno é uma função
também ímpar, de modo que o produto entre elas resulta em função par, resultando assim em
uma integral no semi-intervalo [0, L] multiplicada por 2. Além disso, f (x) coincide com f (x)
nesse último intervalo.
Portanto, a solução para o problema (5.1) é dada por
∞  nπ x   nπα t 
u(x, t) = ∑ cn · sen · cos ,
n=1 L L

onde os coeficientes cn são dados por


Z L  nπ x 
2
cn = f (x) · sen dx.
L 0 L
O leitor poderá fazer a justificativa da solução usando os mesmos procedimentos feitos para
a equação de calor.

Exemplo 5.2: Resolva o seguinte problema:


4.5 Equação da onda 455



 utt − α 2 uxx = 0, se 0 < x < L, t > 0,




 u(0, t) = 0, para t ≥ 0,


(5.9) u(L, t) = 0, para t ≥ 0,



 u(x, 0) = 0, para 0 ≤ x ≤ L,




 ut (x, 0) = g(x), para 0 ≤ x ≤ L.

S OLUÇÃO : Este problema estuda a corda elástica, ainda com extremidades fixas, com ve-
locidade inicial não nula. Este problema modela uma situação em que a corda é colocada em
movimento a partir de sua posição de equilíbrio com uma velocidade dada.

Figura 5.3: O problema da corda com extremidades fixas e partindo com velocidade dada.

Aplica-se o método de separação de variáveis supondo que

u(x, t) = X(x) · T (t).

Deriva-se u(x, t) duas vezes em relação a t e duas vezes em relação a x para obter

utt (x, t) = X(x) · T 00 (t) e uxx(x, t) = X 00 (x) · T (t).

Agora substitui-se as expressões acima na equação de onda utt − α 2 uxx = 0. Tem-se:


1
X(x) · T 00 (t) − α 2 X 00 (x) · T (t) = 0 ⇒ X 00 (x) · T (t) = · X(x) · T 00 (t),
α2
ou seja, que
X 00 (x) 1 T 00 (t)
= 2· = −λ .
X(x) α T (t)
456 4 Aplicações às EDP

A constante de separação, −λ , foi introduzida em virtude de o primeiro membro ser uma


função dependente apenas da variável x e o segundo membro ser uma função dependente ape-
nas da variável t, de modo que a igualdade só faz sentido quando ambos forem iguais a uma
constante.
Das igualdades acima resulta imediatamente que
(
X 00 + λ X = 0,
T 00 + α 2 λ T = 0.

A próxima etapa consiste em usar as duas condições de contorno e a primeira condição inicial
com o objetivo de obter as condições de compatibilidade. Assim,

u(0, t) = X(0) · T (t) = 0 ⇒ X(0) = 0 ou T (t) = 0 para todo t.

Ora, se T (t) = 0 para todo t, então segue-se imediatamente de u(x, t) = X(x) · T (t) que u ≡ 0.
Então opta-se pela condição de compatibilidade X(0) = 0.
Para a segunda condição de contorno, tem-se

u(L, t) = X(L) · T (t) = 0 X(L) = 0 ou T (t) = 0 para todo t.


Caso T (t) = 0 para todo t, então segue-se que u ≡ 0. Logo, admite-se a condição de compati-
bilidade X(L) = 0.
Ainda resta a primeira condição inicial, u(x, 0) = 0 para 0 ≤ x ≤ L, donde segue-se que

u(x, 0) = X(x) · T (0) = 0 ⇒ T (0) = 0 ou X(x) = 0 para todo x.

Mas caso seja X(x) = 0 para todo x, então segue de u(x, t) = X(x) · T (t) que u ≡ 0. Assim,
admite-se que T (0) = 0.
Assim, deve-se resolver o seguinte problema de valor de contorno:

 00
 X + λ X = 0,

(5.10) X(0) = 0,


 X(L) = 0.

Como a constante de separabilidade, λ , pode ser igual a zero, positiva ou negativa, o problema
acima deverá ser analisado em três casos.

C ASO 1: para λ = 0. Neste caso, a equação fica na forma X 00 (x) = 0, que integrada duas
vezes em relação a x resulta em X(x) = ax + b. Agora aplica-se as duas condições de contorno
com o intuito de determinar as constantes a e b. Para a primeira condição de contorno, tem-se

X(0) = a · 0 + b = 0 ⇒ b = 0,

de modo que X(x) = ax.


Usa-se agora a segunda condição de contorno para obter
4.5 Equação da onda 457

X(L) = a · L = 0 ⇒ a=0 ou L = 0.

Mas L > 0, pois L é o comprimento da corda. Logo, a = 0, de modo que X(x) = 0 para todo
x. Porém isto implica em u ≡ 0.

C ASO 2: para λ < 0. Para evitar o aparecimento de raízes se faz λ = −µ 2, de modo que a
EDO assume a forma X 00 − µ 2X = 0. Segundo o exemplo 1.5, a solução geral para uma equação
dessa forma é
X(x) = c1 · cosh(µ x) + c2 · senh (µ x).
Usando a condição de contorno X(0) = 0, obtém-se

X(0) = c1 · cosh 0 + c2 · senh 0 = 0 ⇒ c1 = 0,

de modo que X(x) = c2 · senh (µ x).


Com a condição de contorno X(L) = 0, encontra-se

X(L) = c2 · senh (µ L) = 0 ⇒ c2 = 0 ou senh (µ L) = 0.


Mas como −µ 2 = λ < 0, segue-se que µ 6= 0. E por ser L o comprimento da corda, segue-se
que L 6= 0, de modo que µ L 6= 0. Como µ L 6= 0, então, por definição, senh (µ L) 6= 0. Logo,
c1 = 0, que implica em X(x) = 0 para todo x, que resulta em u ≡ 0.

C ASO 3: para λ > 0. Neste caso, faça λ = µ 2 , de modo que a EDO assume a forma X 00 +
µ 2 X = 0. Segundo o exemplo 1.5 a solução geral desta equação é

X(x) = c1 · cos(µ x) + c2 · sen (µ x).

Aplicando a primeira condição de contorno, encontra-se

X(0) = c1 · cos 0 + c2 · sen 0 = 0 ⇒ c1 = 0,

logo X(x) = c2 · sen (µ x).


Com a segunda condição de contorno aplicada a X(x), obtém-se

X(L) = c2 · sen (µ L) = 0 ⇒ c2 = 0 ou sen (µ x) = 0.

Caso c2 = 0, então X(x) = 0 para todo x e isto resulta, como já visto, em u ≡ 0. Assim,
sen (µ L) = 0 e esta igualdade só faz sentido se o argumento for um múltiplo inteiro de π , isto
é,
nπ ,
µL = 0 ⇒ µ L = nπ ⇒ µ= n = 1, 2, 3, . . .
L
E como λ = µ 2 , segue-se que

n2 π 2 ,
λ= n = 1, 2, 3, . . .
L2
Portanto, obteve-se que
458 4 Aplicações às EDP

 nπ x 
X(x) = c2 · sen ,
L
que sem perda de generalidade, ao tomar c2 = 1, resulta em
 nπ x 
(5.11) Xn (x) = sen , n = 1, 2, 3, . . .
L
Agora basta considerar a equação T 00 + α 2 µ 2 T = 0 no terceiro caso, pois nos dois casos
anteriores sempre se é levado a u ≡ 0. E novamente pelo exemplo 1.5, a solução geral para esta
equação é dada por
T (t) = k1 · cos(αµ t) + k2 · sen (αµ t).
Mas seguiu-se da primeira condição inicial que T (0) = 0, de modo que

T (0) = k1 · cos 0 + k2 · sen 0 = 0 ⇒ k1 = 0,

que implica em T (t) = k2 · sen (αµ t).


Usando o valor de µ já obtido e tomando k2 = 1, sem perda de generalidade, obtém-se
 nπα t 
(5.12) Tn (t) = sen , n = 1, 2, 3, . . .
L
Assim, segue-se de (5.11) e (5.12), que
 nπ x   nπα t 
(5.13) un(x, t) = Xn (x) · Tn (t) = sen · sen , n = 1, 2, 3, . . .
L L
satisfazem a EDP dada, bem como as condições de contorno do problema 5.9 e também a
primeira condição inicial u(x, 0) = 0 (deixa-se as verificações como exercício).
A segunda condição inicial, ut (x, 0) = g(x) para 0 ≤ x ≤ L, será agora usada. Para satisfazer
esta condição inicial, considera-se uma superposição das soluções fundamentais (5.13) com
escolha adequada dos coeficientes. Assim, supõe-se que o candidato à solução do problema
(5.9) tenha a seguinte forma:

u(x, t) = ∑ cn · un (x, t)
n=1
∞  nπ x   nπα t 
(5.14) = ∑ cn · sen · sen ·
n=1 L L

Agora é preciso apresentar uma maneira de calcular os coeficientes cn na série acima. É neste
ponto que aplica-se a segunda condição inicial ut (x, 0) = g(x). Para isto, deriva-se formalmente
(5.14) para obter

∂ ∞  nπ x   nπα t 
ut (x, t) = ∑ n
∂ t n=1
c · sen
L
· sen
L

∂ h  nπ x   nπα t i
= ∑ cn · sen · sen
n=1 ∂t L L
4.5 Equação da onda 459


nπα  nπ x   nπα t 
(5.15) = ∑ · cn · sen · cos ·
n=1 L L L

Agora t = 0 em (5.15). Tem-se:



nπα  nπ x 
ut (x, 0) = ∑ · cn · sen · cos 0 = g(x),
n=1 L L

ou seja,

nπα  nπ x 
g(x) = ∑ L n · c · sen ,
n=1 L
que ao fazer
nπα
bn = · cn,
L
implica em
∞  nπ x 
g(x) = ∑ bn · sen ,
n=1 L
resultando em bn ser os coeficientes da série de Fourier para uma função ímpar. Então, deve-se
estender a função g dada para uma função definida no intervalo simétrico −L ≤ x ≤ L tornando-
a periódica de período T = 2L. Logo, denotando por g(x) a extensão feita, segue-se que a última
série será uma série de senos, onde os coeficientes bn são dados por
Z  nπ x  Z  nπ x 
1 L 2 L
bn = g(x) · sen dx = g(x) · sen dx,
L −L L L 0 L
pois o integrando é produto de duas funções ímpares, de modo que ele é par. Logo multiplica-se
a integral por 2 e integra no semi-intervalo indo de 0 até L. Além disso, g(x) coincide com g(x)
no intervalo [0, L].
Porém é preciso dizer quem é cn no candidato à solução do problema (5.9). Para isso, volta-se
com a definição de bn para reescrever a última igualdade na forma
Z  nπ x 
nπα 2 L
· cn = g(x) · sen dx,
L L 0 L
isto é, que
Z L  nπ x 
2
cn = g(x) · sen dx, n = 1, 2, 3, . . .
nπα 0 L
Portanto, a solução do problema (5.9) é dada por
∞  nπ x   nπα t 
u(x, t) = ∑ cn · sen · sen ,
n=1 L L

onde os coeficientes cn são dados por


Z L  nπ x 
2
cn = g(x) · sen dx, n = 1, 2, 3, . . .
nπα 0 L
460 4 Aplicações às EDP

As justificativas que u(x, t) satisfaz o problema dado serão deixadas como exercício para o
leitor.

O próximo problema estuda o caso geral para a corda elástica com condições de contorno
do tipo Dirichlet e com duas condições iniciais não homogêneas. A função f (x) representa a
posição inicial da corda e a função g(x) representa a velocidade inicial da mesma corda.

Exemplo 5.3: Resolva o seguinte problema geral da corda com extremidades fixas:

 2
 utt − α uxx = 0,


se 0 < x < L, t > 0,



 u(0, t) = 0,
 para t ≥ 0,
(5.16) u(L, t) = 0, para t ≥ 0,



 u(x, 0) = f (x), para 0 ≤ x ≤ L,




 ut (x, 0) = g(x), para 0 ≤ x ≤ L.

S OLUÇÃO : Este problema pode ser resolvido diretamente pelo método de separação de variá-
veis, mas como o leitor deve ter notado, seria mais um enorme trabalho a ser feito. Por outro
lado, o problema (5.16) pode ser visto como a soma dos problemas (5.1) e (5.9) já estudados e
resolvidos. Para deixar isso claro, escreve-se o problema (5.1) usando a função v(x, t) no lugar
de u(x, t) e escreve-se o problema (5.9) usando a função w(x, t) no lugar de u(x, t).

Figura 5.4: O problema geral da corda com extremidades fixas.

Tem-se, assim, os seguintes dois problemas:


4.5 Equação da onda 461



 vtt − α 2 vxx = 0, se 0 < x < L, t > 0,




 v(0, t) = 0, para t ≥ 0,


(5.17) v(L, t) = 0, para t ≥ 0,



 v(x, 0) = f (x), para 0 ≤ x ≤ L,




 vt (x, 0) = 0, para 0 ≤ x ≤ L.
e


 wtt − α 2 wxx = 0, se 0 < x < L, t > 0,





 w(0, t) = 0,
 para t ≥ 0,
(5.18) w(L, t) = 0, para t ≥ 0,





 w(x, 0) = 0, para 0 ≤ x ≤ L,


 wt (x, 0) = g(x), para 0 ≤ x ≤ L.

Agora se faz u(x, t) = v(x, t) + w(x, t), onde u(x, t) é a solução do problema em questão, ou
seja, o problema (5.16). A primeira etapa consiste em testar a EDP dada, isto é, a equação de
onda. O objetivo é mostrar que uma função u escrita desta forma satisfaz a equação de onda
quando as funções v(x, t) e w(x, t) a satisfaz. Tem-se:

utt − α 2 uxx = [ v(x, t) + w(x, t)]tt − α 2 [ v(x, t) + w(x, t)]xx

= [ vtt (x, t) + wtt (x, t)] − α 2 [ vxx (x, t) + wxx(x, t)]


   
= vtt (x, t) − α 2 vxx(x, t) + wtt (x, t) − α 2 wxx (x, t)

= 0 + 0 = 0,
mostrando que u satisfaz a equação de onda.
Agora verifica-se as duas condições de contorno. Tem-se

u(0, t) = v(0, t) + w(0, t) = 0 + 0 = 0 e u(L, t) = v(L, t) + w(L, t) = 0 + 0 = 0,

Tem-se também que u satisfaz a primeira condição inicial, pois

u(x, 0) = v(x, 0) + w(x, 0) = f (x) + 0 = f (x).

Por fim, basta verificar a segunda condição de contoro, que também é satisfeita, visto que

ut (x, 0) = vt (x, 0) + wt (x, 0) = 0 + g(x) = g(x).

O que foi mostrado acima é que u(x, t) é a soma das soluções do problema (5.17) e (5.18).
Portanto, basta resolver estes dois problemas citados e somar as suas soluções para obter ime-
diatamente a solução do problema (5.16) que foi dado, ou seja, somar as soluções para os
problemas (5.1) e (5.9) que já foram resolvido.
462 4 Aplicações às EDP

Este procedimento de somar soluções de problemas nem sempre é possível. Aqui foi possível
porque os problemas são lineares, de maneira que, se um problema é soma de dois outros, então
a sua solução é soma das soluções destes dois problemas. Em problemas não lineares não é
possível usar esta ideia.

O próximo exemplo é um problema envolvendo a equação de ondas em domínio ilimitado,


de modo que será necessário usar a transformada de Fourier.

Exemplo 5.4: Resolva o seguinte problema da corda infinita:





 utt − α 2 uxx = 0, para x ∈ R e t > 0,


 u(x, 0) = f (x), x ∈ R,
(5.19)

 ut (x, 0) = g(x),


x ∈ R,

 |u(x, t)| < M.

S OLUÇÃO : Este problema estuda a corda infinita, ou seja, em toda reta real. A partir de duas
condições iniciais, procura-se soluções limitadas para o problema.
Aplicando a transformada de Fourier em ambos os membros da EDP e usando a sua lineari-
dade, encontra-se

F utt − α 2uxx = F (0) = 0,
ou seja,
F (utt ) − α 2 · F (uxx ) = 0,
Pelas 24 e 22, respectivamente, da tabela do capítulo 3, tem-se que

∂2
F [ utt (x, t)] = F [u(x, t)] e F [ uxx (x, t)] = −ω 2 · F [u(x, t)].
∂ t2
Substituindo na última equação acima, encontra-se

∂2
2
F [u(x, t)] + α 2ω 2 · F [u(x, t)] = 0],
∂t
ou de forma mais simples,

d2
2
F (u) + α 2 ω 2 · F (u) = 0 ⇒ U 00 + α 2 ω 2 · U = 0,
dt
onde U (ω , t) = F [u(x, t)] é uma função das variáveis ω e t.
Fazendo U = e λ t e substituindo na equação, obtém-se

λ 2 · e λ t + α 2ω 2 · e λ t = 0 ⇒ λ 2 + α 2 ω 2 e λ t = 0,

que implica em λ 2 + α 2 ω 2 = 0, pois e λ t 6= 0. Assim,


4.5 Equação da onda 463

p 
λ 2 = −α 2 ω 2 ⇒ λ = ± −α 2 ω 2 ⇒ λ = ± αω i, i 2 = −1 .

Portanto a solução geral da equação é

U (ω , t) = a(ω ) · e −iαω t + b(ω ) · e iαω t .

Como observado no exemplo 4.3 deste capítulo, aqui deve-se ter a(ω ) e b(ω ) como funções
da variável ω e não apenas como constantes simplesmente.
Fazendo
F [ϕ (x)] = a(ω ) e F [ψ (x)] = b(ω ),

(5.20) U (ω , t) = F [ϕ (x)] · e −i αω t + F [ψ (x)] · e iαω t .

Aplicando a transformada inversa em ambos os membros e usando a sua linearidade, obtém-


se

u(x, t) = F −1[U (ω , t)] = F −1 F [ϕ (x)] · e −i αω t + F [ψ (x)] · e iαω t
 
= F −1 F [ϕ (x)] · e −i αω t + F −1 F [ψ (x)] · e iαω t
n o n o
= F −1 e −iω (α t) · F [ϕ (x)] + F −1 e −iω (−α t) · F [ψ (x)]

(5.21) = ϕ (x − α t) + ψ (x + α t),

onde aplicou a fórmula da translação (fórmula 9 da tabela do capítulo 3)


   
F −1 e −iω x0 · H(ω ) = F −1 e −iω x0 · F [h(x)] = h(x − x0 ),

onde se fez, primeiro, x0 = α t e depois x0 = −α t.


Dando sequência, agora aplica-se a transformada de Fourier nas duas condições iniciais,
u(x, 0) = f (x) e ut (x, 0) = g(x), para obter

U (ω , 0) = F(ω ) e Ut (ω , 0) = G(ω ),

onde U (ω , 0) = F [u(x, 0)], F(ω ) = F [ f (x)] e G(ω ) = F [g(x)].


Fazendo t = 0 em (5.20), obtém-se

U (ω , 0) = F [ϕ (x)] · e 0 + F [ψ (x)] · e 0 ⇒ U (ω , 0) = F [ϕ (x)] + F [ψ (x)],

ou seja,

(5.22) F(ω ) = F [ f (x)] = F [ϕ (x)] + F [ψ (x)].

Agora deriva-se (5.20) em relação a t. Tem-se:


464 4 Aplicações às EDP


Ut (ω , t) = U (ω , t)
∂t
∂ 
= F [ϕ (x)] · e −iαω t + F [ψ (x)] · e iω t
∂t
= −iαω · F [ϕ (x)] · e −iαω t + iαω · F [ψ (x)] · e iω t .
Fazendo t = 0 no último resultado obtido, encontra-se

G(ω ) = Ut (ω , 0)

= −iαω · F [ϕ (x)] · e 0 + iαω · F [ψ (x)] · e 0

= −iαω · F [ϕ (x)] + iαω · F [ψ (x)]

(5.23) = iαω {−F [ϕ (x)] + F [ψ (x)]} .

Segue-se de (5.22) e (5.23) que


(
F [ϕ (x)] + F [ψ (x)] = F(ω ),
−iαω · F [ϕ (x)] + iαω · F [ψ (x)] = G(ω ).

Multiplicando a primeira equação do sistema por iαω e somando com a segunda, obtém-se
 
1 G(ω )
2iαω · F [ψ (x)] = iαω · F(ω ) + G(ω ) ⇒ F [ψ (x)] = · F(ω ) + ·
2 iαω
Substituindo na primeira equação do sistema, encontra-se
 
1 G(ω )
F [ϕ (x)] + · F(ω ) + = F(ω ),
2 iαω
ou seja,  
F(ω ) G(ω ) 1 G(ω )
F [ϕ (x)] = F(ω ) − − = · F(ω ) − ·
2 2iαω 2 iαω
Agora substitui-se as expressões encontradas para F [ϕ (x)] e F [ψ (x)] em (5.20). Obtém-se:

U (ω , t) = F [ϕ (x)] · e −iαω t + F [ψ (x) · e iαω t


   
1 G(ω ) −iαω t 1 G(ω )
= · F(ω ) − ·e + · F(ω ) + · e iαω t
2 iαω 2 iαω
 
1  −iαω t iαω t
 1 iαω t G(ω ) −iαω t G(ω
(5.24) = e · F(ω ) + e · F(ω ) + e · −e · ·
2 2α iω iω
Pelas fórmulas 9 (translação) e 16 (transformada da integral), ambas na tabela do capítulo 3,
tem-se
  Z x
−1 H(ω )
−1
 −iω x 
F e 0 · H(ω ) = h(x − x0 ) e F = h(t) dt, (ω 6= 0).
iω 0
4.6 O método de d’Alembert 465

Aplicando a transformada inversa em (5.24) e sua linearidade, além das duas fórmulas acima,
obtém-se
u(x, t) = F −1[U (ω , t)]
  
−1 1 1 iαω t G(ω ) −iαω t G(ω
 −iαω t iαω t

=F e · F(ω ) + e · F(ω ) + e · −e ·
2 2α iω iω
1   1  
= · F −1 e −iαω t · F(ω ) + · F −1 e iαω t · F(ω ) +
2 2
   
1 −1 iαω t G(ω ) 1 −1 −iαω t G(ω )
+ ·F e · − ·F e ·
2α iω 2α iω
1 h i 1 h i
−1 −iω (α t) −1 −iω (−α t)
= ·F e · F(ω ) + · F e · F(ω ) +
2 2
   
1 −1 −iω (−α t) G(ω ) 1 −1 −iω (α t) G(ω )
+ ·F e · − ·F e ·
2α iω 2α iω
Z x+α t Z x−α t
1 1 1 1
= · f (x − α t) + · f (x + α t) + g(y) dy − g(y) dy
2 2 2α 0 2α 0
Z Z
1 1 1 x+α t 1 0
= · f (x − α t) + · f (x + α t) + g(y) dy + g(y) dy
2 2 2α 0 2α x−α t
Z 0 Z x+α t 
f (x − α t) + f (x + α t) 1
= + g(y) dy + g(y) dy
2 2α x−α t 0
Z x+α t
f (x − α t) + f (x + α t) 1
= + g(y) dy.
2 2α x−α t

A solução do problema anterior é a solução de d’Alembert para o problema de valor inicial


da corda infinita. Este assunto será objeto da próxima seção.

4.6 O método de d’Alembert

Considere a equação de onda em toda reta real, que é modelado através do problema abaixo:

2

 utt = α uxx,
 x ∈ R, t ≥ 0,
(6.1) u(x, 0) = f (x), x∈R


 u (x, 0) = g(x), x ∈ R.
t
466 4 Aplicações às EDP

Nesta seção será apresentada uma representação para a solução do problema (6.1), que é
conhecida como fórmula de d’Alembert.3 O desenvolvimento será feito através de vários resul-
tados que culminarão na representação desejada. Além disso, mostrar-se-á que há dependência
contínua nos dados iniciais.
Inicia-se com um resultado que permite introduzir uma mudança de variáveis que simplifica
a expressão da equação de onda.

Lema 6.1: Considere a equação de onda utt − α 2 uxx = 0. Suponha que exista uma função
u : R → R de classe C2 (R) que satisfaça a equação de onda. Então, existe uma mudança de
variáveis linear, (x, t) 7→ (ξ , η ) de R2 → R2, que permite que a equação de onda seja reescrita
na forma
∂ 2u
= 0.
∂ξ∂η
D EMONSTRAÇÃO : Seja (x, t) 7→ (ξ , η ) uma aplicação linear de R2 → R2 definida por
(
ξ = ax + bt,
η = cx + dt,

onde ad − bc 6= 0.
Pela regra da cadeia, aplicada a função u(ξ , η ) = u[ξ (x, t), η (x, t)], obtém-se

∂u ∂u ∂ξ ∂u ∂η
(6.2) = · + · ·
∂x ∂ξ ∂x ∂η ∂x
Agora usa-se novamente a regra da cadeia para obter a derivada segunda. Tem-se:
 
∂ 2u ∂ ∂u ∂ξ ∂u ∂η
= · + ·
∂ x2 ∂ x ∂ ξ ∂ x ∂ η ∂ x
     
∂ u ∂ 2ξ ∂ ∂u ∂ ξ ∂ u ∂ 2η ∂ ∂u ∂η
(6.3) = · 2+ · + · 2 + · ·
∂ξ ∂x ∂x ∂ξ ∂x ∂η ∂x ∂x ∂η ∂x
Mas
 
∂ ∂u ∂ 2u ∂ ξ ∂ 2u ∂ η
(6.4) = · + ·
∂x ∂ξ ∂ξ2 ∂x ∂η ∂ξ ∂x
e
 
∂ ∂u ∂ 2u ∂ ξ ∂ 2 u ∂ η
(6.5) = · + · ·
∂x ∂η ∂ ξ ∂ η ∂ x ∂ η2 ∂ x
Substituindo-se (6.4) e (6.5) em (6.3) e observando que as funções envolvidas aqui são de
classe C2(R), obtém-se

3 Jean le Rond d’Alembert (1717 – 1783) foi um matemático francês.


4.6 O método de d’Alembert 467

     
∂ 2 u ∂ u ∂ 2ξ ∂ ∂u ∂ ξ ∂ u ∂ 2η ∂ ∂u ∂η
2
= · 2+ · + · 2 + ·
∂x ∂ξ ∂x ∂x ∂ξ ∂x ∂η ∂x ∂x ∂η ∂x
 2 
∂ u ∂ 2ξ ∂ u ∂ξ ∂ 2u ∂ η ∂ ξ
= · + · + · · +
∂ ξ ∂ x2 ∂ξ2 ∂x ∂η ∂ξ ∂x ∂x
 2 
∂ u ∂ 2η ∂ u ∂ ξ ∂ 2u ∂ η ∂ η
+ · + · + · ·
∂ η ∂ x2 ∂ ξ ∂ η ∂ x ∂ η2 ∂ x ∂x
 
∂ u ∂ 2ξ ∂ 2u ∂ ξ 2 ∂ 2u ∂ η ∂ ξ
= · 2+ 2 + · · +
∂ξ ∂x ∂ξ ∂x ∂η ∂ξ ∂x ∂x
 
∂ u ∂ 2η ∂ 2u ∂ ξ ∂ η ∂ 2 u ∂ η 2
+ · + · · +
∂ η ∂ x2 ∂ ξ ∂ η ∂ x ∂ x ∂ η 2 ∂ x
   
∂ u ∂ 2ξ ∂ 2u ∂ ξ 2 ∂ 2 u ∂ ξ ∂ η ∂ 2 u ∂ η 2 ∂ u ∂ 2η ,
(6.6) = · + +2 · · + + ·
∂ ξ ∂ x2 ∂ ξ 2 ∂ x ∂ ξ ∂ η ∂ x ∂ x ∂ η2 ∂ x ∂ η ∂ x2

onde usou-se o fato de as funções serem de classe C2 (R) para afirmar que as derivadas parciais
mistas de segunda ordem são iguais, isto é,
∂ 2u ∂ 2u
= ·
∂ η∂ ξ ∂ξ∂η
Analogamente mostra-se que
 2  2
∂ 2 u ∂ u ∂ 2 ξ ∂ 2u ∂ξ ∂ 2u ∂ ξ ∂ η ∂ 2 u ∂η ∂ u ∂ 2η
(6.7) = · + +2 · · + + · ·
∂ t2 ∂ ξ ∂ t2 ∂ ξ 2 ∂t ∂ ξ ∂ η ∂ t ∂ t ∂ η2 ∂t ∂ η ∂ t2
Por outro lado, segue-se das equações que definem a mudança de variáveis, isto é,
(
ξ = ax + bt,
η = cx + dt,

que as mesmas podem ser diferenciadas diretamente para obter


∂ξ ∂ξ ∂η ∂η
(6.8) = a, = b, = c, = d.
∂x ∂t ∂x ∂t
Além disso, as derivadas segundas não mistas, também podem ser obtidas derivando mais
uma vez, de modo que se obtém

∂ 2ξ ∂ 2ξ ∂ 2 η ∂ 2η
(6.9) = = = 2 = 0.
∂ x2 ∂ t2 ∂ x2 ∂t
Substituindo (6.8) e (6.9) em (6.6) e (6.7), encontra-se
 
∂ 2u ∂ u ∂ 2u 2 ∂ 2u ∂ 2u 2 ∂ u
= ·0 + · a + 2 · a · c + ·c + ·0
∂ x2 ∂ ξ ∂ξ2 ∂ξ∂η ∂ η2 ∂η
468 4 Aplicações às EDP

∂ 2u ∂ 2u 2
2∂ u
(6.10) = a2 + 2ac + c
∂ξ2 ∂ξ∂η ∂ η2
e
 
∂ 2u ∂ u ∂ 2u 2 ∂ 2u ∂ 2u 2 ∂ u
= ·0 + · b + 2 · b · d + ·d + ·0
∂ t2 ∂ξ ∂ξ2 ∂ξ∂η ∂ η2 ∂η
∂ 2u ∂ 2u 2
2∂ u
(6.11) = b2 + 2bd + d ·
∂ξ2 ∂ξ∂η ∂ η2
Substituindo (6.10) e (6.11) na equação de ondas, segue-se que
2
 
2 2∂ u ∂ 2u 2
2∂ u 2
2
2∂ u ∂ 2u 2
2∂ u
utt − α uxx = b + 2bd +d −α a + 2ac +c
∂ξ2 ∂ξ∂η ∂ η2 ∂ξ2 ∂ξ∂η ∂ η2
 ∂ 2u  ∂ 2u  2
2 2 ∂ u
(6.12) = b2 − α 2 a2 + 2 bd − α 2
ac + d 2
− α c ·
∂ξ2 ∂ξ∂η ∂ η2
Observe-se que, se o primeiro e o último coeficientes no segundo membro de (6.12) se anu-
larem, isto é, b2 − α 2 a2 = 0 e d 2 − α 2 c2 = 0, então a equação nas variáveis ξ e η se simplifica
ainda mais, mas desde que bd − α 2 ac 6= 0.
Logo, para anular o primeiro e o último coeficientes, pode-se tomar

b=αa e d = −α c,

de modo que o segundo coeficiente no segundo membro de (6.12) satisfaz


 
2 bd − α 2 ac = 2 − α 2 ac − α 2 ac = −4α 2 ac 6= 0.

Justificativa da afirmação de que 2 bd − α 2 ac 6= 0: de fato, por hipótese, assumiu-se que
ad − bc 6= 0. Portanto,

0 6= ad − bc = a (−α c) − (α a) c = − α ac − α ac = −2 α ac.

Como −2α ac 6= 0, então isto implica em ac 6= 0, uma vez que α 6= 0. E por ser ac 6= 0, então

−4α 2 ac 6= 0. Isto mostra que 2 bd − α 2 ac = −4α 2 ac 6= 0.
Continuando, usando os fatos que b = α a e d − α c, obtém-se que
( (
ξ = ax + bt, ξ = ax + α at,

η = cx − dt, η = cx − α at,

de onde resulta, portanto, que uma boa mudança de variáveis é


(
ξ = a (x + α t) ,
η = c (x − α t) ,

onde a e c são números reais quaisquer e não nulos.


4.6 O método de d’Alembert 469

Fazendo a = c = 1, segue-se que 2(bd − α 2 ac) = −4α 2 , de modo que (6.12) pode ser escrita
como
∂ 2u
0 = utt − α 2 uxx = −4α 2 ·
∂ξ∂η
Assim, a equação de onda, nas variáveis ξ e η , pode ser escrita na seguinte forma:

∂ 2u ∂ 2u
−4α 2 =0 ⇒ = 0,
∂ξ∂η ∂ξ∂η
que é o resultado desejado.

Lema 6.2: Considere a equação de onda

utt − α 2 uxx = 0.

Suponha que exista uma função u : R → R de classe C2(R) que satisfaça a equação de onda.
Então, existem funções ϕ , ψ : R → R tais que u pode ser escrita na forma

(6.13) u(x, t) = ϕ (x + α t) + ψ (x − α t).

D EMONSTRAÇÃO : Pelo lema 6.1, segue-se que a equação de onda pode ser reescrita na forma

∂ 2u
= 0,
∂ξ∂η
que é o mesmo que  
∂ ∂u
= 0.
∂η ∂ξ
Integrando esta última EDP em relação a η , obtém-se que
∂u
= v(ξ ).
∂ξ
Fazendo nova integração na última expressão obtida, mas agora na variável ξ , se encontra
Z ξ
u(ξ , η ) = v(y) dy + w(η ).
0

Escrevendo Z ξ
ϕ (ξ ) = v(y) dy e ψ (η ) = w(η ),
0
segue-se que u pode ser escrita na forma u(ξ , η ) = ϕ (ξ ) + ψ (η ), onde ϕ e ψ são funções de
classe C2(R) arbitrárias.
Para finalizar, basta usar os fatos que ξ = x + α t e que η = x − α t, para reescrever a última
expressão na forma
470 4 Aplicações às EDP

u(x, t) = ϕ (x + α t) + ψ (x − α t),
que é o resultado desejado.

O resultado a seguir é conhecido como fórmula de d’Alembert. Ela apresenta uma solução
geral para a equação de onda em R, o problema (6.1).

Teorema 6.1 (fórmula de d’Alembert): Considere o seguinte problema de onda:



 2
 utt = α uxx,
 x ∈ R, t ≥ 0,
u(x, 0) = f (x), x ∈ R,


 u (x, 0) = g(x), x ∈ R,
t

onde u0 ∈ C2(R) e u1 ∈ C1 (R).


Então, a função dada por
Z x+α t
1 1
(6.14) u(x, t) = [ f (x + α t) + f (x − α t)] + g(y) dy
2 2α x−α t

conhecida como fórmula de d’Alembert, é uma solução de classe C2(R) para o problema de
onda em R.
D EMONSTRAÇÃO : Pelo lema 6.2, a solução geral para a equação de onda é dada por

u(x, t) = ϕ (x + α t) + ψ (x − α t).

Agora basta usar as condições iniciais para determinar as funções f e g, considerando as


hipóteses dadas de que u0 ∈ C2 (R) e u1 ∈ C1 (R). Tem-se
(
u(x, 0) = ϕ (x) + ψ (x) = f (x),
(6.15)
ut (x, 0) = α ϕ 0 (x) − α ψ 0 (x) = g(x).

A última equação no sistema anterior pode ser integrada em relação a x para ser reescrita na
forma Z x
0 0 1
ϕ (x) − ψ (x) = · f (x) ⇒ ϕ (x) − ψ (x) = g(y) dy + C.
α 0
Assim, escreve-se (6.15) na forma

 ϕ (x) + ψ (x) = f (x),

Z x
 ϕ (x) − ψ (x) = 1

g(y) dy + C.
α 0

Resolvendo este sistema, obtém-se


4.6 O método de d’Alembert 471

Z x
1 1 C
ϕ (x) = f (x) + g(y) dy + ,
2 2α 0 2
Z
1 1 x C
ψ (x) = f (x) − g(y) dy − ·
2 2α 0 2
Portanto, fazendo x 7→ x + α t em ϕ e x 7→ x − α t em ψ , obtém-se
Z x+α t
1 1 C
(6.16) ϕ (x + α t) = f (x + α t) + g(y) dy +
2 2α 0 2
e
Z x−α t
1 1 C
ψ (x − α t) = f (x − α t) − g(y) dy −
2 2α 0 2
Z 0
1 1 C
(6.17) = f (x − α t) + g(y) dy − ·
2 2α x−α t 2
Por fim, substitui-se (6.16) e (6.17) em

u(x, t) = ϕ (x + α t) + ψ (x − α t).
para concluir que
u(x, t) = ϕ (x + α t) + ψ (x − α t)
Z x+α t
1 1 C
= f (x + α t) + g(y) dy +
2 2α 0 2
Z 0
1 1 C
+ f (x − α t) + g(y) dy −
2 2α x−α t 2
1
= [ f (x + α t) + f (x − α t)] +
2
Z 0 Z x+α t 
1 C C
+ g(y) dy + g(y) dy + −
2α x−α t 0 2 2
Z x+α t
1 1
= [ f (x + α t) + f (x − α t)] + g(y) dy,
2 2α x−α t

que é o resultado desejado.

Observação 6.1: Uma questão interessante do método de d’Alembert é que a unicidade da


solução do problema de onda em R decorre da própria solução, isto é, não é necessário usar
outro tipo de demonstração para constatar esta afirmação.
De fato, pelo teorema 6.1, a solução do problema de onda em R é dado pela fórmula de
d’Alembert, isto é,
472 4 Aplicações às EDP

Z x+α t
1 1
u(x, t) = [ f (x + α t) + f (x − α t)] + g(y) dy.
2 2α x−α t

Caso exista outra solução v(x, t) obtida com as mesmas condições iniciais f (x) e g(x), então
v(x, t) será igual ao segundo membro da equação (6.14), isto é,
Z
1 1 x+α t
v(x, t) = [ f (x + α t) + f (x − α t)] + g(y) dy.
2 2α x−α t
Portanto, é imediato que v = u. Isto decorre do fato da solução depender apenas das condições
iniciais f e g.

Teorema 6.2 (Dependência contínua): Considere o seguinte problema de onda:



 2
 utt = α uxx,
 x ∈ R, t ≥ 0,
u(x, 0) = f (x), x∈R


 u (x, 0) = f (x), x ∈ R,
t

onde f ∈ C2 (R) e g ∈ C1 (R).


Então, a solução do problema de onda em R depende continuamente dos dados iniciais.
D EMONSTRAÇÃO : Considere os dois problemas

 2
 utt = α uxx,
 x ∈ R, t ≥ 0,
u(x, 0) = f (x), x ∈ R,


 u (x, 0) = g(x), x ∈ R,
t

e 
 2
 vtt = α vxx ,
 x ∈ R, t ≥ 0,
v(x, 0) = f (x), x ∈ R,



vt (x, 0) = g(x), x ∈ R,
onde f , f ∈ C2 (R) e g, g ∈ C1 (R), de modo que f , f e g, g são dois pares de dados iniciais
correspondendo, respectivamente, as soluções u(x, t) e v(x, t) dos problemas acima.
Da fórmula de d’Alembert, dada por (6.14) no teorema 6.1, segue-se que

1 Z
1 x+α t
|u(x, t) − v(x, t)| = [ f (x + α t) + f (x − α t)] + g(y) dy −
2 2α x−α t

Z
1  1 x+α t
− f (x + α t) + f (x − α t) − g(y) dy
2 2α x−α t

1   1 

= f (x + α t) − f (x + α t) + f (x − α t) − f (x − α t) +
2 2
4.6 O método de d’Alembert 473


Z
1 x+α t
+ [g(s) − g(y)] dy
2α x−α t

1   1 

≤ f (x + α t) − f (x + α t) + f (x − α t) − f (x − α t) +
2 2
Z
1 x+α t

+ [g(y) − g(y)] dy
2α x−α t

1 1
≤ f (x + α t) − f (x + α t) + f (x − α t) − f (x − α t) +
2 2
Z x+α t
1
+ |g(y) − g(y)| dy.
2α x−α t
Assim, dado ε > 0, tomando-se δ = ε/(1+T ),

f (x, t) − f (x, t) < δ e |g(x, t) − g(x, t)| < δ .

tem-se Z x+α t x+α t


δ δ δ δ
|u(x, t) − v(x, t)| < + + dy = δ + · y
2 2 2α x−α t 2α x−α t

δ
=δ + [(x + α t) − (x − α t)]

δ
=δ + · 2α t = δ + δ t

= δ (1 + t) ≤ δ · (1 + T )
ε
= · (1 + T ) = ε ,
1+T
para todo x ∈ R e 0 ≤ t ≤ T .
Isto mostra que a dependência dos dados iniciais é contínua.

Observação 6.2: Como visto na seção 4.2, diz-se que um problema que tem solução única
e dependência contínua nos dados iniciais (e/ou de contorno) é bem posto. Portanto, o que se
mostrou nesta seção, até este ponto, é que o problema (6.1) é bem posto.

Interpretação da solução de d’Alembert


474 4 Aplicações às EDP

Considerando a variável t como tempo, a transformação ξ = x + α t representa a translação


do sistema de coordenadas para a esquerda com “velocidade” α (na verdade α tem dimensão de
velocidade; abusar-se-á da linguagem). Analogamente, a transformação η = x − α t representa
a translação para a direita com velocidade α . A figura abaixo exibe os gráficos de sen (x + α t)
para t = 0, t = π/2α e t = π/4α .

Figura 6.1: Translação de sen (x + α t).

Analogamente, pode-se interpretar sen (x − α t) como a translação da senóide para a direita.


Assim, mais geralmente, interpreta-se ϕ (x + α t) e ψ (x − α t) como duas ondas se deslocando,
respectivamente, para a esquerda e para a direita, ambas com velocidade α . No caso da solução
de d’Alembert é preciso observar que se trata de uma superposição destes deslocamentos. Isto
será feito com um pouco mais de atenção.
A condição inicial f (x) = u(x, 0) tem o seu gráfico, no instante t = 0, representando o perfil
da onda, isto é, sua forma inicial. Para simplificar a interpretação geométrica, assumir-se-á que
a outra condição inicial é nula, isto é, g ≡ 0. No caso particular em que g(x) = 0 (velocidade
inicial nula), a solução de d’Alembert se reduz a
1
u(x, t) = [ f (x + α t) + f (x − α t)] .
2
O gráfico de u(x − α t) é obtido a partir de uma translação de α t do gráfico de f (x) no sentido
positivo do eixo x. Analogamente, o gráfico de f (x + α t) representa uma translação de f (x) no
sentido negativo do eixo x.
Como α tem dimensão de velocidade, f (x − α t) representa uma onda propagando-se com
velocidade α no sentido positivo do eixo x. Esta onda é chamada de onda progressiva ou onda
do futuro. Similarmente, f (x + α t) representa um sinal que se propaga na mesma velocidade α ,
mas em sentido oposto. Esta onda é chamada de onda regressiva ou onda do passado. Assim, a
solução u(x, t), neste caso particular, será a composição destes dois movimentos, isto é, a soma
das duas ondas obtidas por translação do sinal inicial.
O procedimento adotado para determinar a solução de d’Alembert levou em conta que a
mesma é uma função de classe C2 . Apesar de parecer estranho o modelo encontrado permite
dar algum sentido para funções com menos regularidade. Para simplificar a interpretação geo-
métrica do deslocamento das ondas, será assumido uma função apenas contínua no exemplo
dado a seguir.
4.6 O método de d’Alembert 475

Exemplo 6.1: Seja f : R → R uma função dada por




 x + 1,
 −1 ≤ x < 0,
f (x) = 1 − x, 0 ≤ x ≤ 1,


 0, caso contrário.
O gráfico de f (x) concide com o gráfico de f (x + α t) quando t = 0 e pode ser visto na figura
a seguir.

Figura 6.2: u(x, 0) = f (x).

Tomando α = 1, tem-se:

 (x + t) + 1,

 −1 − t ≤ x < −t,
f (x + t) = 1 − (x + t), −t ≤ x ≤ 1 − t,


 0, caso contrário.
e 

 (x − t) + 1,
 −1 + t ≤ x < t,
f (x − t) = 1 − (x − t), t ≤ x ≤ 1 + t,


 0, caso contrário.
A figura 6.3 mostra os gráficos das duas funções f (x + 1/2) e f (x − 1/2), isto é, para t = 1/2.

A figura 6.4 a superposição das funções f (x − 1/2) e f (x + 1/2), isto é, a soma das duas
dividido por 2.
A figura 6.5 exibe os gráficos das funções f (x + 1) e f (x − 1) separadamente, porém em um
mesmo sistema de coordenadas.
A figura 6.6 apresenta-se o gráfico da função u(x, 1). Observa-se que não se trata de dois
gráficos exibidos ao mesmo tempo, mas sim da superposição entre f (x − 1) e f (x + 1).
Na figura 6.7 exibe-se os gráficos de duas funções em um mesmo sistema de coordenadas:
f (x + 2) e f (x − 2).
476 4 Aplicações às EDP

Figura 6.3: f (x + 1/2) e f (x − 1/2).

Figura 6.4: gráfico de u (x, 1/2).

Figura 6.5: f (x + 1) e f (x − 1).

Na figura 6.8 é possível observar o distanciamento, em relação ao eixo y, das ondas do pas-
sado e do futuro.
4.6 O método de d’Alembert 477

Figura 6.6: gráfico de u(x, 1).

Figura 6.7: f (x + 2) e f (x − 2).

Figura 6.8: gráfico mostrando u(x, 2) em duas frentes de propagação.

Domínios de dependência e influência

Considere a fórmula de d’Alembert:


Z x+α t
1 1
u(x, t) = [ f (x + α t) + f (x − α t)] + g(y) dy,
2 2α x−α t

Observe que u(x0 , t0) depende dos valores de u0 nos dois argumentos x0 + α t0 e x0 − α t0 ,
bem como depende dos valores de g no intervalo (x0 − α t, x0 + α t) – o intervalo de integração.
Ou seja, a fórmula de d’Alembert mostra que o valor da solução u no ponto (x0 , t0) depende
apenas dos valores dos dados iniciais f e g no intervalo [x0 − α t0 , x0 + α t0]. Isto significa que
os dados iniciais podem ser alterados arbitrariamente fora desse intervalo sem mudar o valor
da solução no ponto (x0 , t0). Este intervalo é chamado de intervalo de dependência no ponto
(x0 , t0).
478 4 Aplicações às EDP

Cabe observar que, para cada (x0 , t0), o intervalo de dependência é limitado. Isto faz com
que o problema de valor inicial seja bem posto sem ter que especificar um comportamento no
infinito.
As retas inclinadas na figura 6.9 têm inclinações 1/α e −1/α e são chamadas de retas carac-
terísticas. As retas características são da forma x + α t = ξ0 e x − α t = η0.

Figura 6.9: intervalo de dependência.

A fórmula de d’Alembert também diz que os valores de f e g no ponto (x, 0) influenciam


os valores de u apenas no setor hachurado na figura 6.10 e determinado pelas semirretas que
partem de (x, 0) com inclinações 1/α e −1/α .

Figura 6.10: cone de dependência.

Essa região é chamada de cone de influência. Supondo-se que os dados iniciais u0 e u1 tenham
suporte no intervalo [a, b], isto é, que f e g se anulam fora de [a, b], segue-se que a solução u(x, t)
4.6 O método de d’Alembert 479

é necessariamente nula fora da região hachurada na figura 6.11, que é, então, chamada de região
de influência desses dados iniciais.

Figura 6.11: região de influência.

De outra maneira: dada um intervalo [a, b] ⊂ R, a maior região delimitada pelas retas carac-
terísticas passando pelos extremos do intervalo é a região
R = {(x, t) ∈ R[0, ∞) | a − α t ≤ x ≤ b + α t} ∪

∪ {(x, t) ∈ R(−∞, 0) | a + α t ≤ x ≤ b − α t} .
Este conjunto R é a região de influência do intervalo [a, b]. Note-se que, se (x0 , t0) ∈ R, então
o intervalo de dependência de (x0 , t0) intercepta [a, b]. Portanto, uma pertubação nos dados
iniciais no intervalo [a, b] modifica a solução na região R.
O problema (6.1) pode ser interpretado como a vibração de uma corda infinita provocada
pelo afastamento da posição de repouso através da condição inicial u(x, 0) = u0 (x) e por uma
velocidade inicial na corda dada por ut (x, 0) = u1 (x). Assim, caso as pertubações iniciais este-
jam concentradas em uma parte de [a, b] da corda, elas poderão afetar um ponto x0 > b apenas
depois de transcorrido um tempo t0 = (x0−b)/α . Isto significa dizer que as perturbações viajam
ao longo da corda com velocidade α .

Figura 6.12:
480 4 Aplicações às EDP

Durante a demonstração dos lemas que antecederam a fórmula de d’Alembert, bem cono na
demonstração desta mesma fórmula, usou-se fortemente as hipóteses de que f ∈ C2(R) e que
g ∈ C1 (R) para que u seja uma solução clássica para a equação de onda em R. Também já
foi comentado que há possibilidade de usar soluções não clássicas para este problema. Con-
siderando o que foi exposto até este ponto, questiona-se sobre o que aconteceria se a função
f , por exemplo, fosse descontínua. Para uma resposta, basta consultar novamente a fórmula de
d’Alembert para observar que u será descontínua ao longo das retas x + α t = ξ0 e x − α t = η0.
Ou seja, as descontinuidades se propagam ao longo das retas características. Naturalmente que
u dada pela fórmula de d’Alembert satisfaz a equação de onda fora das retas características que
passam por x0 .

Exemplo 6.2: Estude o seguinte problema de onda:




 utt − uxx = 0,
 x ∈ R, t ≥ 0,
u(x, 0) = sen x, x∈R


 u (x, 0) = 0, x ∈ R,
t

S OLUÇÃO : Considere a fórmula de d’Alembert


Z x+α t
1 1
u(x, t) = [ f (x + α t) + f (x − α t)] + g(y) dy.
2 2α x−α t

Neste caso, tem-se que α = 1, f (x) = sen x e g(x) = 0. Aplicando a fórmula de d’Alembert,
encontra-se Z
1 1 x+α t
u(x, t) = [ f (x + α t) + f (x − α t)] + g(y) dy.
2 2α x−α t
Z x+t
1 1
= [ sen (x + t) + sen (x − t)] + 0 dy
2 2 x−t

sen (x + t) + sen (x − t)
= ·
2
Da trigonometria, segue-se que
(
sen (a + b) = ( sen a)(cos b) + ( sen b)(cos a),
sen (a − b) = ( sen a)(cos b) − ( sen b)(cos a).

Somando estas duas identidades membro a membro, obtém-se

sen (a + b) + sen (a − b) = ( sen a)(cos b).

Fazendo a = x e b = t, resulta que a solução para o problema dado é

sen (x + t) + sen (x − t)
u(x, t) = = sen x · cost.
2
4.6 O método de d’Alembert 481

A solução u(x, t) = sen x · cos t é uma senóide de amplitude | cost|, de modo que é zero para
t = π/2 + kπ , onde k ∈ Z. Assim, quando 0 < t < π/2, a amplitude decresce de 1 até 0; quando
π/2 < t < π , a amplitude varia de 0 até 1, mas a oscilação é ao contrário da oscilação para

0 ≤ t ≤ π/2. No intervalo [π , 3π/2] a amplitude decresce e crescente novamente no intervalo


[3π/2, 2π ], quando atinge a posição inicial em t = 2π .
Como cos(t + 2kπ ) = cost, então u(x, t + 2kπ ) = u(x, t), para qualquer k ∈ Z. Portanto, o
movimento da corda em qualquer intervalo de tempo [2kπ , 2(k + 1)π ], com k ∈ Z, é precisa-
mente o mesmo que no intervalo [0, 2π ].

Exemplo 6.3: 

 utt − uxx = 0, x ∈ R, t ≥ 0,

 (

 2 − 2| x |, para | x | ≤ 1,
u(x, 0) =

 0, caso contrário.



 u (x, 0) = 0,
t x ∈ R,

S OLUÇÃO : Observe inicialmente que a função f (x) não é de classe C2 , mas é contínua.
Então a função u(x, t) dada pela fórmula de d’Alembert é contínua, pois f é contínua, mas não
é continuamente diferenciável no plano, uma vez que a derivada de f é descontínua em x = −1,
x = 0 e x = 1. Logo, as derivadas de u devem ser descontínuas ao longo das características no
plano (x, t) que passam pelos pontos (−1, 0), (0, 0) e (1, 0).
Considerando apenas as retas características que passam por (−1, 0) e (1, 0), elas dividem o
plano (x, t) em nove regiões. Faça o gráfico das regiões e encontre u(x, t) em cada caso.

Equação de ondas não homogênea

Agora será feito um estudo da equação de ondas não homogênea que está modelado no
problema abaixo:

 2 x ∈ R, t ≥ 0,
utt − α uxx = h(x, t),

(6.18) u(x, 0) = f (x), x ∈ R,



ut (x, 0) = g(x), x ∈ R.

Seja (x0 , t0) um ponto fixado, mas arbitrário, no plano xt no qual se deseja calcular a solução
do problema 6.18. Seja Ω o triângulo característico determinado por esse ponto, isto é, o triân-
gulo cujo vértices são os pontos (x0 − α t0, 0), (x0 , t0) e (x0 + α t0 , 0).
482 4 Aplicações às EDP

Figura 6.13: Triângulo característico.

A fronteira ∂ Ω de Ω considera-se orientada no sentido anti-horário, cuja escolha está em


coerência com a orientação do eixo x. Agora integra-se a equação do problema 6.18 na região
Ω. Tem-se:
ZZ   ZZ
2
(6.19) α uxx − utt dx dt = − h(x, t) dx dt.
Ω Ω

Faça
Q = α 2 ux e P = ut ,
de modo que o integrando acima (o primeiro membro da equação em si), pode ser reescrito na
forma
∂  ∂ ∂Q ∂P
α 2 uxx − utt = α 2 ux + (ut ) = − ·
∂x ∂t ∂x ∂t
Assim, a equação (6.19) fica escrita na forma
ZZ   ZZ
∂Q ∂P
− dx dt = − h(x, t) dx dt.
Ω ∂x ∂t Ω

Agora aplica-se o teorema de Green,


Z ZZ  
∂Q ∂P
P(x, t) dx + Q(x, t) dt = (x, t) − (x, t) dx dt,
∂Ω Ω ∂x ∂y
no primeiro membro acima, para obter
Z ZZ
P(x, t) dx + Q(x, t) dx = − h(x, t) dx dt.
∂Ω Ω
Retornando com P = ut e Q = α 2 ux no primeiro membro acima, obtém-se
Z ZZ
2
(6.20) ut dx + α ux dt = − h(x, t) dx dt.
∂Ω Ω
4.6 O método de d’Alembert 483

A integral do primeiro membro corresponde a integral de linha de um campo vetorial F (x, t)



dado por F (x, t) = ut (x, t), α 2 ux (x, t) . E seu cálculo é feito da seguinte maneira:
Z Z b
F (x, t) · dr = F [σ (s)] · σ 0 (s) ds,
∂Ω a

onde σ (s) é uma parametrização para a fronteira ∂ Ω.


Para calcular a integral no primeiro membro de (6.20) será necessário parametrizar ∂ Ω, ou
seja, o triângulo caraterístico que tem como vértices os pontos (x0 , t0), (x0 − α t0 , 0) e (x0 +
α t0 , 0). Começa-se determinando o segmento de reta do ponto (x0 , t0) até o ponto (x0 − α t0 , 0).
A ideia é usar a fórmula da Geometria Analítica, x − x0 = m(t − t0), onde m = ∆x/∆t . Para estes
dois pontos, tem-se:
x0 − α t0 − x0
m= = α.
0 − t0
Assim,

x − x0 = α (t − t0) ⇒ x − α t = x0 − α t0, (x0 − α t0 ≤ x ≤ x0 ).

Agora para o segmento de reta do ponto (x0 + α t0, 0) até o ponto (x0 , t0). Tem-se:
x0 − x0 − α t0
m= = −α .
t0 − 0
Assim,

x − (x0 + α t0 ) = −α (t − 0) ⇒ x + α t = x0 + α t0 , (x0 , x0 + α t0 ).

Para o segmento ligando (x0 − α t0 , 0) até o ponto (x0 + α t0 , 0) fica mais simples, pois não
há variação em t. Logo o mesmo pode ser parametrizado fazendo t = 0 enquanto x varia no
intervalo x0 − α t0 ≤ x ≤ x0 + α t0 .
Para simplificar, nomeia-se estas três parametrizações da seguinte forma:

(σ1 ) : x − α t = x0 − α t0 , x0 − α t0 ≤ x ≤ x0 ,

(σ2 ) : x + α t = x0 + α t0 , x0 ≤ x ≤ x0 + α t0 ,

(σ3 ) : t = 0, x0 − α t0 ≤ x ≤ x0 + α t0.

Observe que dx = α dt sobre σ1 , que dx = −α dt sobre σ2 e que dt = 0 sobre σ3 . Com estas


notações e observações, a integral no primeiro membro de (6.20) fica assim reescrita:
Z Z
ut (x, t) dx + α 2ux (x, t) dt = ut (x, t) dx + α 2ux (x, t) dt +
∂Ω σ1
Z
+ ut (x, t) dx + α 2ux (x, t) dt
σ2
Z
+ ut (x, t) dx + α 2ux (x, t) dt
σ3
484 4 Aplicações às EDP

Z
= ut (x, t) (α dt) + α ux (x, t) (α dt) +
σ1
Z
+ ut (x, t) (−α dt) − α ux(x, t) (−α dt) +
σ2
Z
+ ut (x, t) dx
σ3
Z
= α ut (x, t) dt + α ux (x, t) dx +
σ1
Z
+ −α ut (x, t) dt − α ux (x, t) dx +
σ2
Z
+ ut (x, 0) dx
σ3
Z Z
=α ut (x, t) dt + ux(x, t) dx − α ut (x, t) dt + ux (x, t) dx +
σ1 σ2
Z x0 +α t0
+ ut (x, 0) dx
x0 −α t0
Z Z Z x0 +α t0
=α d[u(x, t)] − α d[u(x, t)] + ut (x, 0) dx
σ1 σ2 x0 −α t0
Z x0 +α t0

= α u(x, t) − α u(x, t) + ut (x, 0) dx
σ1 σ2 x0 −α t0

= α [u(x0 − α t0 , 0) − u(x0, t0)] − α [u(x + 0, t0) − u(x0 + α t0, 0)] +


Z x0 +α t0
+ ut (x, 0) dx
x0 −α t0

= α [u(x0 + α t0 ), 0) + u(x0 − α t0 , 0)] − 2α u(x0 , t0) +


Z x0 +α t0
+ ut (x, 0) dx
x0 −α t0

= α [u0 (x0 + α t0)) + u0 (x0 − α t0 )] − 2α u(x0 , t0) +


Z x0 +α t0
(6.21) + u1 (x) dx.
x0 −α t0

Substituindo (6.21) em (6.20), obtém-se


Z x0 +α t0 ZZ
α [ f (x0 + α t0) + f (x0 − α t0)] − 2α u(x0 , t0) + g(x) dx = − h(x, t) dx dt,
x0 −α t0 Ω

donde segue-se que


Z x0 +α t0 ZZ
f (x0 + α t0) + f (x0 − α t0) 1 1
u(x0 , t0) = + g(x) dx + h(x, t) dx dt.
2 2α x0 −α t0 2α Ω
4.6 O método de d’Alembert 485

Em virtude da arbitrariedade de x0 e t0, sem perda de generalidade, é possível escrever


Z x+α t ZZ
f (x + α t) + f (x − α t) 1 1
(6.22) u(x, t) = + g(y) dy + h(x, t) dx dt.
2 2α x−α t 2α Ω

Os dois primeiros termos no segundo membro acima é a solução de d’Alembert para o proble-
ma homogêneo. O último termo no segundo membro acima,
ZZ
1
v(x, t) = h(x, t) dx dt,
2α Ω

(é possível demonstrar) é solução do problema



 vtt − α 2 vxx = h(x, t),

 x ∈ R, t ≥ 0,
v(x, 0) = 0, x ∈ R,



vt (x, 0) = 0, x ∈ R.
Portanto, a soma das duas soluções, u+v, é a solução do problema (6.18). De maneira análoga
ao que foi feito para o problema homogêneo, demonstra-se que o problema não homogêneo é
bem posto.

Exemplo 6.4: Determine a solução do problema




 utt − uxx = 1,
 para x ∈ R e t ≥ 0,
u(x, 0) = x2 , para x ∈ R,



ut (x, 0) = 1, para x ∈ R.

S OLUÇÃO : Deve-se usar (6.22),


Z x+α t ZZ
f (x + α t) + f (x − α t) 1 1
u(x, t) = + g(y) dy + h(x, t) dx dt,
2 2α x−α t 2α Ω

com α = 1, h(x, t) = 1, f (x) = x2 e g(x) = 1.


Agora será preciso determinar a região de integração Ω . Para fazer isso, pode-se usar o triân-
gulo característico da figura 6.13. A região Ω pode ser entendida como uma região do tipo II
como se vê em cursos de Cálculo. Segue-se daquela parte teórica que

x − α t = x0 − α t0 e x + α t = x0 + α t0,

com 0 ≤ t ≤ t0.
Fazendo x0 = x, x = y, t0 = t e t = s, obtém-se
y − α s = x − α t, 0 ≤ s ≤ t,

y + α s = x + α t, 0 ≤ s ≤ t,
486 4 Aplicações às EDP

ou ainda,
y = α s + x − α t, 0 ≤ s ≤ t,

y = −α s + x + α t, 0 ≤ s ≤ t,
Agora considere duas funções f1 , f2 : [0, t] → R definidas por

f1 (s) = α s + x − α t e f2 (s) = −α s + x + α t.

Portanto, segue-se daí que a regiâo de integração será dada por



Ω = (x, y) ∈ R2 | f1 (s) ≤ y ≤ f2 (s), 0 ≤ s ≤ t .

Como no exemplo α = 1, então em particular tem-se que

f1 (s) = s + x − t e f2 (s) = −s + x + t,

para 0 ≤ s ≤ t.
Assim,
Z x+t Z t Z −s+x+t
(x + t)2 + (x − t)2 1 1
u(x, t) = + 1 dy + 1 dyds
2 2 x−t 2 0 s+x−t
Z
x2 + 2xt + t 2 + x2 − 2xt + t 2 y x+t 1 t −s+x+t
= + + y ds
2 2 x−t 2 0 s+x−t
Z t
2x2 + 2t 2 (x + t) − (x − t) 1
= + + [(−s + x + t) − (s + x − t)] dt
2 2 2 0
Z t
1
= x2 + t 2 + t + (−2s + 2t) ds
2 0
t
2 2 s2 t
= x + t + t − + ts
2 0 0

t2
= x2 + t 2 + t − + t2
2
3t 2
= x2 + + t,
2
que é a solução para o problema dado.

Exemplo 6.5: Considere o seguinte problema da corda finita:


4.6 O método de d’Alembert 487



 utt − α 2 uxx = 0, 0 < x < L, t > 0,




 u(0, t) = 0, t > 0,


(6.23) u(L, t) = 0, t > 0,



 u(x, 0) = f (x), 0 ≤ x ≤ L,




 ut (x, 0) = 0, 0 ≤ x ≤ L.

A solução deste problema, pelo método de Fourier, foi apresentada na seção 4.4 e é dada por
∞  nπ x   nπα t 
u(x, t) = ∑ cn · sen · cos ,
n=1 L L

onde Z  nπ x 
2 L
cn = f (x) · sen dx.
L 0 L
Mostre que a solução acima pode ser representada na forma
h(x − α t) + h(x + α t)
u(x, t) = ·
2

S OLUÇÃO : Considere as seguintes fórmulas da trigonometria:


(
sen (a + b) = ( sen a) · (cos b) + ( sen b) · (cos a),
sen (a − b) = ( sen a) · (cos b) − ( sen b) · (cos a).

Somando estas duas identidades trigonométricas membro a membro, obtém-se


sen (a + b) + sen (a − b)
( sen a) · (cos b) = ·
2
nπ x nπα t
Agora faça a = e b= na última fórmula acima para escrever
L L
 nπ x   nπα t  1 h  nπ x nπα t   nπ x nπα t i
sen · cos = sen + + sen −
L L 2 L L L L
1 n h nπ i h nπ io
= sen (x − α t) + sen (x + α t) ·
2 L L
Portanto,
1 ∞ n h nπ i h nπ io
u(x, t) = ∑ cn sen (x − α t) + sen (x + α t) ·
2 n=1 L L
Supondo que a série acima pode ser dividida em duas somas, tem-se
1 ∞ h nπ i 1 ∞ h nπ i
u(x, t) = ∑ cn sen (x − α t) + ∑ cn · sen (x + α t) .
2 n=1 L 2 n=1 L

Fazendo agora
∞  nπ x 
h(x) = ∑ cn · sen ,
n=1 L
488 4 Aplicações às EDP

conclui-se que a última expressão acima satisfaz


h(x − α t) + h(x + α t) ,
u(x, t) =
2
como desejado.

4.7 Equação de Laplace

Uma importante equação diferencial parcial é a equação de Laplace, que em dimensão dois
é dada por
∆u = uxx + uyy = 0
e em dimensão três é dada por

∆u = uxx + uyy + uzz = 0.

Quando se considera campos eletrostáticos, a função potencial elétrico em um meio dielétrico


sem cargas elétricas tem que satisfazer ∆u = 0. Analogamente, a função potencial de uma
partícula livre no espaço sob ação apenas de forças gravitacionais também tem que satisfazer
∆u = 0. Por isso a equação de Laplace também é conhecida como a equação do potencial.

Observação 7.1: Considere o problema de Dirichlet não homogêneo:




 uxx + uyy = 0,
 0 < x < a, 0 < y < b,
(7.1) u(x, 0) = f (x), u(x, b) = g(x), 0 ≤ x ≤ a,



u(0, y) = h(y), u(a, y) = k(y), 0 < y < b.

Como no mostrado no exemplo 5.3, para equações de ondas, o problema de Dirichlet acima
pode ser resolvido mantendo-se uma condição de contorno não homogênea e as outras três
mantidas homogêneo. Assim, fica-se com quatro problemas e que podem ser resolvidos pelo
método de separação de variáveis. Como o problema dado é linear, então a sua solução pode ser
obtida como soma das soluções de cada um dos quatro problemas.
Suponha que existam funções u1 (x, y), u2 (x, y), u3(x, y) e u4(x, y), onde os números de 1 a 4
representam índices e não potências, que são, respectivamente, soluções para os problemas de
Dirichlet dados a seguir:

1 1
 uxx + uyy = 0, 0 < x < a, 0 < y < b,


(7.2) u1(x, 0) = f (x), u1(x, b) = 0, 0 ≤ x ≤ a,


 u1(0, y) = 0, u1(a, y) = 0, 0 < y < b.
4.7 Equação de Laplace 489

Figura 7.1: Problema de Dirichlet no retângulo.


 2 2
 uxx + uyy = 0,
 0 < x < a, 0 < y < b,
(7.3) u2(x, 0) = 0, u2 (x, b) = g(x), 0 ≤ x ≤ a,


 u2(0, y) = 0, u2 (a, y) = 0, 0 < y < b.

 3 3
 uxx + uyy = 0,
 0 < x < a, 0 < y < b,
(7.4) u3(x, 0) = 0, u3(x, b) = 0, 0 ≤ x ≤ a,



u3(0, y) = h(y), u3(a, y) = 0, 0 < y < b.

4 4
 uxx + uyy = 0, 0 < x < a, 0 < y < b,


(7.5) u4(x, 0) = 0, u4 (x, b) = 0, 0 ≤ x ≤ a,


 u4(0, y) = 0, u4 (a, y) = k(y), 0 < y < b.

Agora se faz
u(x, y) = u1 (x, y) + u2(x, y) + u3 (x, y) + u4 (x, y),
onde u(x, y) é a solução do problema (7.1).
O primeiro passo consiste em mostrar que u(x, y) dada acima satisfaz a equação de Laplace.
Tem-se:
∆u = uxx + uyy
 
= u1 (x, y) + u2 (x, y) + u3(x, y) + u4 (x, y) xx +
 
+ u1 (x, y) + u2 (x, y) + u3(x, y) + u4 (x, y) yy

= u1xx(x, y) + u2xx (x, y) + u3xx(x, y) + u4xx(x, y) +


+ u1yy(x, y) + u2yy(x, y) + u3yy(x, y) + u4yy(x, y)
   
= u1xx(x, y) + u1yy(x, y) + u2xx (x, y) + u2yy(x, y) +
490 4 Aplicações às EDP

   
+ u3xx (x, y) + u3yy(x, y) + u4xx (x, y) + u4yy(x, y)

= 0 + 0 + 0 + 0 = 0,
mostrando que u satisfaz a equação de Laplace.
O passo seguinte consiste em verificar cada uma das quatro condições de contorno. Tem-se:

u(x, 0) = u1 (x, 0) + u2(x, 0) + u3(x, 0) + u4 (x, 0)

= f (x) + 0 + 0 + 0 = f (x).

u(x, b) = u1 (x, b) + u2(x, b) + u3(x, b) + u4 (x, b)

= 0 + g(x) + 0 + 0 = g(x).

u(0, y) = u1 (0, y) + u2(0, y) + u3(0, y) + u4(0, y)

= 0 + 0 + h(y) + 0 = h(y).

u(a, y) = u1 (a, y) + u2(a, y) + u3(a, y) + u4(a, y)

= 0 + 0 + 0 + k(y) = k(y).
O que foi mostrado anteriormente é que u(x, y) é a soma das soluções dos problemas (7.2),
(7.3), (7.4) e (7.5). Portanto, para resolver o problema (7.1), basta resolver cada um dos quatro
problemas citados e somar as suas soluções para obter imediatamente a solução do problema
não homogêneo. Este procedimento é possível porque estes problemas são lineares.

Exemplo 7.1: Este exemplo é um estudo do problema de Dirichlet em um retângulo, que é


modelado da seguinte maneira:


 ∆u = uxx + uyy = 0,
 0 < x < a, 0 < y < b,
(7.6) u(x, 0) = 0, u(x, b) = 0, 0 < x < a,


 u(0, y) = 0, u(a, y) = k(y), 0 ≤ y ≤ b.

S OLUÇÃO : Aplica-se o método de separação de variáveis supondo que a solução do problema


é dada por
u(x, y) = X(x) · Y (y).
Derivadando u duas vezes em relação a x e duas vezes em relação a y, obtém-se

uxx (x, y) = X 00 (x) · Y (y) e uyy(x, y) = X(x) · Y 00 (y),


que levada à equação em (7.6) resulta em
X 00 Y 00
X 00 (x) · Y (y) + X(x) · Y 00 (y) = 0 ⇒ =− = λ,
X Y
4.7 Equação de Laplace 491

Figura 7.2: Problema de Dirichlet com uma condição não homogênea.

onde escolheu-se a constante de separalibilidade λ sem estar acompanhada do sinal de “menos”


(isto facilita a resolução deste problema).
No caso da região retangular, quando a condição não homogênea está em um dos lados na ver-
tical, opta-se por λ ; quando a parte não homogênea está na parte superior ou inferior, opta-se por
−λ . Isto ficará claro mais adiante: caso se inverta o sinal de λ , então aparecerá durante da res-
olução uma série em senos ou cossenos hiperbólicos, que parece com a série de Fourier, porém
não existe série de Fourier com senos e cossenos hiperbólicos, apenas com senos e cossenos
trigonométricos (e isto impediria a continuidade da resolução do problema).
Segue-se da última igualdade que
(
X 00 − λ X = 0,
Y 00 + λ Y = 0.

O próximo passo consiste em usar as três condições de contorno homogêneas para determinar
as condições de compatibilidade. Para a primeira condição de contorno, tem-se

u(x, 0) = X(x) · Y (0) = 0 ⇒ Y (0) = 0 ou X(x) = 0 para todo x.

Mas se X(x) = 0 para todo x, segue-se de u(x, y) = X(x) · Y (y) que u ≡ 0. Então, fica-se com
Y (0) = 0.
Para a segunda condição de contorno, tem-se

u(x, b) = X(x) · Y (b) = 0 ⇒ Y (b) = 0 ou X(x) = 0 para todo x.

Se X(x) = 0 para todo x, então como visto, u ≡ 0. Logo, Y (b) = 0.


E para a terceira condição de contorno, obtém-se

u(0, y) = X(0) · Y (y) = 0 ⇒ X(0) = 0 ou Y (y) = 0 para todo y.


492 4 Aplicações às EDP

Da mesma forma, u(x, y) = X(x) · Y (y) mostra que, se Y (y) = 0 para todo y, então u ≡ 0.
Então opta-se por X(0) = 0.
Portanto, deve-se resolver os seguintes problemas de valores de contorno:

 00
 Y + λ Y = 0,
( 
X 00 − λ X = 0,
⇒ Y (0) = 0,
X(0) = 0, 

 Y (b) = 0.

Observe que o primeiro problema só tem uma condição de contorno, enquanto o segundo
tem duas condições. Por isso inicia-se o estudo pelo segundo problema. É neste ponto que a
escolha da constante de separabilidade −λ daria problema na resolução. Se a escolha fosse
−λ o segundo problema teria como solução geral uma combinação linear de seno e cosseno
hiperbólico, como mostra o exemplo 1.5.
Divide-se o segundo problema acima em três casos: λ = 0, λ < 0 e λ > 0.

C ASO 1: para λ = 0 o problema se reduz a Y 00 = 0. Integrando duas vezes em relação a y,


encontra-se Y (y) = c1 · y + c2. Agora aplica-se as condições de contorno. Tem-se:

Y (0) = c1 · 0 + c2 = 0 ⇒ c2 = 0,

de modo que Y (y) = c1 · y.


Com a segunda condição de contorno, obtém-se

Y (b) = c1 · b = 0 ⇒ c1 = 0 ou b = 0.

Mas b é medida de um dos lados do retângulo, logo ele não pode ser zero. Assim, c1 = 0, de
modo que Y (y) = 0 para todo y. Mas isto implica em u ≡ 0.

C ASO 2: para λ < 0. Faça λ = −µ 2, isto evita o aparecimento de raízes. Dessa forma, a
equação se escreve na forma Y 00 − µ 2Y = 0. O exemplo 1.5 mostra que a solução geral para esta
equação é da forma
Y (y) = d1 · cosh(µ y) + d2 · senh (µ y).
Aplicando a primeira condição de contorno, encontra-se

Y (0) = d1 · cosh 0 + d2 senh 0 = 0 ⇒ d1 = 0,

de maneira que Y (y) = d2 · senh (µ y).


Usando a segunda condição de contorno, obtém-se

Y (b) = d2 · senh (µ b) = 0 ⇒ d2 = 0 ou senh (µ b) = 0.


Ora, como b, µ 6= 0 (b é a medida de um dos lados do retângulo e −µ 2 = λ > 0, de modo
que por ser λ 6= 0 também será µ 6= 0), tem-se assim, por definição, que senh (µ b) 6= 0. Isto faz
com que d2 = 0, de modo que u ≡ 0.
4.7 Equação de Laplace 493

C ASO 3: para λ > 0, faça λ = µ 2 (para evitar aparecimento de raízes). Assim, a equação em
Y fica na forma Y 00 + µ 2Y = 0. Pelo exemplo 1.5, a solução geral desta equação é dada por

Y (y) = e1 · cos(µ y) + e2 · sen (µ y).

Aplicando a primeira condição de contorno, conclui-se que

Y (0) = e1 cos 0 + e2 · sen 0 = 0 ⇒ e1 = 0,

de modo que Y (y) = e2 · sen (µ y).


Usando a segunda condição de contorno, resulta

Y (b) = e2 · sen (µ b) = 0 ⇒ e2 = 0 ou sen (µ b) = 0.

Caso fosse e2 = 0, então Y (y) = 0 para todo y e isto implicaria, como já explicado antes,
em u ≡ 0. Logo deve-se optar por sen (µ b) = 0. Isto faz com que o argumento seja igual a um
múltiplo inteiro de π , isto é,
nπ n2 π 2
µ b = nπ ⇒ µ= ⇒ λ= ·
b b2
Assim, a solução é dada por  nπ y 
Y (y) = e2 · sen,
b
que sem perda de generalidade, fazendo e2 = 1, resulta em
 nπ y 
(7.7) Yn(y) = sen , n = 1, 2, 3, . . .
b
Agora retorna-se ao problema
(
X 00 − λ X = 0,
X(0) = 0.
Não é necessário estudar este problema em relação aos casos 1 e 2, pois já foi mostrado que
estes dois casos, para o problema de Laplace que se estuda, conduzem semper a solução trivial
u ≡ 0. Logo, o problema acima deve ser analisado apenas no terceiro caso, isto é, para λ = µ 2.
Assim, segundo o exemplo 1.5 a solução geral para a equação X 00 − µ 2X = 0 é dada por

X(x) = d1 · cosh(µ x) + d2 · senh (µ x).

Usando a única condição de contorno para este problema, conclui-se que

X(0) = d1 · cosh 0 + d2 · senh 0 = 0 ⇒ d1 = 0,

de modo que X(x) = d2 senh (µ x).


Agora se usa o valor de µ já obtido anteriormente para escrever
 nπ x 
X(x) = d2 · senh ·
b
494 4 Aplicações às EDP

Sem perda de generalidade, pode-se tomar d2 = 1 e escrever


 nπ x 
(7.8) Xn (x) = senh ·
b
Usando (7.7) e (7.8), obtém-se
un (x, y) = Xn (x) · Yn(y)
 nπ x   nπ y 
= senh · sen , n = 1, 2, 3, . . .
b b
As funções un(x, y) satisfazem a equação de Laplace e as três condições de contorno ho-
mogêneas para cada n ∈ N. Para satisfazer a condição de contorno não homogênea, u(a, y) =
k(y), supõe-se que a solução u(x, y) possa ser representada como superposição das funções
un (x, y), ou seja, que

u(x, y) = ∑ cn · un(x, y)
n=1
∞  nπ x   nπ y 
= ∑ cn · senh b
· sen
b
·
n=1
Usando a condição de contorno não homogênea, u(a, y) = k(y), obtém-se
∞  nπ a   nπ y 
u(a, y) = ∑ cn · senh b
· sen
b
= k(y).
n=1

Agora se faz  nπ a 
bn = cn · senh ,
b
de modo que
∞  nπ y 
k(y) = ∑ bn · sen b
·
n=1
A expressão acima é a série de Fourier de uma função ímpar e periódica de período T = 2b.
Assim, chamando de k a extensão da função k no intervalo −b ≤ y ≤ b e periódica de período
T = 2b, tem-se que os coeficientes são dados por
Z  nπ y 
1 b
bn = k(y) · sen dy
b −b b
Z  nπ y 
2 b
= k(y) · sen dy,
b 0 b
pois o integrando é par (pois é produto de duas funções ímpares), de modo que se dobra o valor
da integral que é calculada no semi-intervalo [0, b] e onde k coincide com k.
Mas  nπ a 
bn = cn · senh ,
b
então  nπ a  2 Z b  nπ y 
cn · senh = k(y) · sen dy,
b b 0 b
4.7 Equação de Laplace 495

que resulta em
Z b  nπ y 
2
cn = k(y) · sen dy.
b · senh (nπ a/b) 0 b
Portanto, a solução do problema (7.1) é dada por
∞  nπ x   nπ y 
u(x, y) = ∑ cn · senh · sen ,
n=1 b b

onde
Z b  nπ y 
2
cn = k(y) · sen dy.
b · senh (nπ a/b) 0 b

Observação 7.2: O exercício 1.5 do capítulo 4 mostrou que

Y (y) = c1 · cosh(µ y) + c2 · senh (µ y)

é solução geral da EDO Y 00 − µ 2Y = 0, onde c1 e c2 são constantes.


Em alguns problemas, como o do próximo exemplo, a solução geral acima não é adequada
quando se tem como objetivo anular uma das constantes c1 e c2. Nesse caso, é melhor usar a
solução geral dada a seguir:

Y (y) = d1 · cosh[ µ (b − y)] + d2 · senh [ µ (b − y)],

onde d1 e d2 são constantes.


Por outro lado, é razoável mostrar que solução geral do tipo acima implica na solução geral
dada pelo exemplo 1.5 citado. Para ver isso, aplica-se as seguintes identidades hiperbólicas,
cosh(A − B) = (cosh A) · (cosh B) − ( senh A) · ( senh B),

senh (A − B) = ( senh A) · (cosh B) − ( senh B) · (cosh A),


fazendo A = µ b e B = µ y. Assim, obtém-se

Y (y) = d1 · cosh[ µ (b − y)] + d2 · senh [(µ (b − y)]

= d1 · {[cosh(µ b)] · [cosh(µ y)] − [ senh (µ b)] · [ senh (µ y)]} +

+ d2{[ senh (µ b)] · [cosh(µ y)] − [ senh (µ y)] · [cosh(µ b)]}

= d1 · [cosh(µ b)] · [cosh(µ y)] − d1 · [ senh (µ b)] · [ senh (µ y)] +

+ d2[ senh (µ b)] · [cosh(µ y)] − d2 · [ senh (µ y)] · [cosh(µ b)]

= [d1 · cosh(µ b) + d2 · senh (µ b)] · cosh(µ y) +

+ [−d1 · senh (µ b) − d2 · cosh(µ b)] · senh (µ y)


496 4 Aplicações às EDP

= c1 · cosh(µ y) + c2 · senh (µ y),


onde se fez

c1 = d1 · cosh(µ b) + d2 · senh (µ b) e c2 = −d1 · senh (µ b) − d2 · cosh(µ b),

uma vez que todos os termos envolvidos são constantes.


Também é possível mostrar que a solução geral,

Y (y) = d1 · cosh[ µ (b − y)] + d2 · senh [ µ (b − y)],

também é solução geral para a EDO Y 00 − µ 2Y = 0. Para isso, basta derivar a solução Y (y) duas
vezes e substituir na EDO. Tem-se:
Y 0 (y) = d1 · (−µ ) · senh [ µ (b − y)] + d2 · (−µ ) · cosh[ µ (b − y)]

Y 00 (y) = d1 · (−µ )2 · cosh[ µ (b − y)] + d2 · (−µ )2 · senh [ µ (b − y)]

Y 00 (y) = d1 · µ 2 · cosh[ µ (b − y)] + d2 · µ 2 · senh [ µ (b − y)].


Portanto,
Y 00 − µ 2Y = d1 · µ 2 · cosh[ µ (b − y)] + d2 · µ 2 · senh [ µ (b − y)]−
n o
− µ 2 d1 · cosh[ µ (b − y)] + d2 · senh [ µ (b − y)]

= d1 · µ 2 · cosh[ µ (b − y)] + d2 · µ 2 · senh [ µ (b − y)] −

− d1 · µ 2 · cosh[ µ (b − y)] − d2 · µ 2 · senh [ µ (b − y)]

= 0,
mostrando, assim, o que foi afirmado.

Exemplo 7.2: Resolva o seguinte problema de Laplace no retângulo R = (0, a) × (0, b) com
condições de contorno do tipo Dirichlet:


 ∆ u = uxx + uyy = 0,
 0 < x < a, 0 < y < b,
u(x, 0) = f (x), u(x, b) = 0, 0 < x < a,



u(0, y) = 0, u(a, y) = 0, 0 ≤ y ≤ b.

onde f : [0, a] → R é uma função dada.

S OLUÇÃO : Aplica-se o método de separação de variáveis supondo que a solução do problema


é dada por
u(x, y) = X(x) · Y (y).
Derivando u duas vezes em relação a x e duas vezes em relação a y, obtém-se
4.7 Equação de Laplace 497

Figura 7.3: Problema de Dirichlet com outra condição de contorno não homogênea.

uxx (x, y) = X 00 (x) · Y (y) e uyy(x, y) = X(x).Y 00 (y),

que levanda à EDP do problema dado resulta em

X 00 (x) · Y (y) + X(x) · Y 00 (y) = 0 ⇒ X 00 (x) · Y (y) = −X(x) · Y 00 (y),

ou ainda,
X 00 (x) Y 00 (y)
=− = −λ ,
X(x) Y (y)
onde −λ é a constante de separabilidade. Assim, tem-se

X 00 + λ X = 0 e Y 00 − λ Y = 0.

As condição de compatibilidade são obtidas da seguinte maneira:

u(x, b) = X(x) · Y (b) = 0 ⇒ Y (b) = 0 ou X(x) = 0, para todo x.

Caso seja X(x) = 0 para todo x, então encontra-se a solução trivial u ≡ 0. Nesse caso, adota-se
Y (b) = 0.
Além disso,
u(0, y) = X(0) · Y (y) = 0 ⇒ X(0) = 0 ou Y (y) = 0, para todo y,

u(a, y) = X(a) · Y (y) = 0 ⇒ X(a) = 0 ou Y (y) = 0, para todo y.


Nos dois casos acima, se Y (y) = 0 para todo y, então encontra-se a solução trivial u ≡ 0.
Então assume-se X(0) = 0 = X(a). Fica-se com os seguintes problemas:
( (
X 00 + λ X = 0, 0 < x < a, Y 00 − λ Y = 0, 0 < y < b,
e
X(0) = 0 = X(a), Y (b) = 0.

Separa-se em três casos: λ = 0, λ < 0 e λ > 0.


498 4 Aplicações às EDP

C ASO 1: para λ = 0, tem-se que X(x) = c1 · x + c2 . Usando a primeira condição de contorno,


obtém-se
X(0) = c1 · 0 + c2 = 0 ⇒ c2 = 0,
de modo que X(x) = c1 · x.
Para a segunda condição de contorno,

X(a) = c1 · a = 0 ⇒ c1 = 0,

pois a 6= 0, por ser a medida de um dos lados do retângulo.


Nesse caso, λ = 0 implica em X(x) = 0 para todo x, de modo que se tem a solução trivial
u ≡ 0.

C ASO 2: para λ < 0. Pode-se escrever λ = −µ 2 , pois assim evita-se o surgimento de raízes
negativas. Pelo exemplo 1.5 do capítulo 4 tem-se que a equação X 00 − λ µ 2 X = 0 tem como
solução geral
X(x) = d1 · cosh(µ x) + d2 · senh (µ x).
Usando a primeira condição de contorno, X(0) = 0, encontra-se

X(0) = d1 · cosh 0 + d2 · senh 0 = 0 ⇒ d1 = 0,

pois cosh 0 = 1 e senh 0 = 0. E, assim, X(x) = d2 · senh (µ x).


Para a segunda condição de contorno, X(a) = 0, tem-se

X(a) = d2 · senh (µ a) = 0 ⇒ d2 = 0 ou senh (µ a) = 0.

Mas µ a 6= 0, pois −µ 2 = λ < 0 e a é um dos lados do retângulo. Assim, por definição, tem-
se que senh (µ a) 6= 0 (na verdade o seno hiperbólico só se anula na origem). e isto implica em
d2 = 0. Assim, tem-se, para λ < 0, que X(x) = 0 para todo x, de modo que se encontra a solução
trivial u ≡ 0.

C ASO 3: para λ > 0. Pode-se escrever λ = µ 2 . A equação X 00 + µ 2 X = 0 tem solução geral


(veja exemplo 1.5 no capítulo 4)

X(x) = e1 · cos(µ x) + e2 · sen (µ x).

Pela primeira condição de contorno, X(0) = 0, encontra-se

X(0) = e1 · cos 0 + e2 · sen 0 = 0 ⇒ e1 = 0,

pois cos0 = 1 e sen 0 = 0, de modo que X(x) = e2 · sen (µ x).


Para a segunda condição de contorno, X(a) = 0, obtém-se

X(a) = e2 · sen (µ a) = 0 ⇒ e2 = 0 ou sen (µ a) = 0.

Se e2 = 0, então X ≡ 0 e, portanto, obtém-se a solução trivial u ≡ 0. Como a solução geral do


problema proposto é a soma das soluções obtidas em cada um dos três casos, então a solução
4.7 Equação de Laplace 499

geral seria a solução trivial u ≡ 0, que é indesejável. Por outro lado, há alguns valores de µ para
os quais se tem sen (µ a) = 0: o argumento deve satisfazer µ a = nπ , de modo que

nπ n2 π 2 ,
µ a = nπ ⇒ µ= e λ= n ∈ N.
a a2
Portanto,  nπ x 
Xn (x) = sen , n = 1, 2, 3, . . .,
a
onde, sem perda de generalidade, tomou-se e2 = 1.
A equação em Y (y) deve ser analisada apenas no caso 3, uma vez que nos demais casos
sempre se chega a u ≡ 0, não importando qual seja a solução em y. A equação Y 00 − λ Y =
Y 00 − µ 2Y = 0, pela exemplo 1.5 do capítulo 4, tem solução geral

Y (y) = f1 · cosh(µ y) + f2 · senh (µ y).

Entretanto, a solução geral acima deve satisfazer a condição de contorno Y (b) = 0 e a forma
acima não é vantajosa, pois com a expressão acima não é possível anular uma das constantes f1
e f2 . Nesse caso, é melhor usar a solução geral apresentada na observação 7.3:

Y (y) = k1 · cosh[µ (b − y)] + k2 · senh [(µ (b − y)].

Usando a condição de contorno Y (b) = 0 na solução acima, encontra-se


Y (b) = k1 · cosh[µ (b − b)] + k2 · senh [(µ (b − b)] = 0

k1 · cosh 0 + k2 · senh 0 = 0 ⇒ k1 = 0,
pois cosh 0 = 1 e senh 0 = 0. Portanto, Y (y) = k2 · senh [µ (b − y)].
Sem perda de generalidade, toma-se k2 = 1, o que permite concluir que
 
nπ (b − y)
Yn(y) = cosh[µ (b − y)] = senh .
a
Segue-se das expressões obtidas para Xn (x) e Yn(y) que
 nπ x   
nπ (b − y) ,
un (x, y) = Xn (x) · Yn(y) = sen · senh
a a
de modo que supõe-se que a solução u(x, y) para o problema proposto possa ser representado
como superposição das funções un (x, y), isto é,

u(x, y) = ∑ cn · un(x, y)
n=1
∞  nπ x   
nπ (b − y)
= ∑ cn · sen a
· senh
a
·
n=1

Agora aplica-se a condição de contorno nao homogênea, u(x, 0) = f (x):


500 4 Aplicações às EDP

∞  nπ x   
nπ b
u(x, 0) = ∑ cn · sen · senh = f (x).
n=1 a a

Agora se faz  
nπ b ,
an = cn · senh
a
de modo que
∞  nπ x 
f (x) = ∑ an · sen a
·
n=1
A expressão acima é a série de Fourier para uma função ímpar e periódica de período T = 2a.
Assim, chamando de f a extensão ímpar da função f no intervalo −a ≤ x ≤ a e periódica de
período T = 2a, tem-se que os coeficientes são dados por
Z  nπ x 
1 a
an = f (x) · sen dx
a −a a
Z  nπ x 
2 a
= f (x) · sen dx,
a 0 a
pois o integrando é par (por ser produto entre duas funções ímpares), de modo que se dobra o
valor da integral que é calculada no semi-intervalo [0, a] e onde f coincide com f .
Mas  
nπ b ,
an = cn · senh
a
então   Z a  nπ x 
nπ b 2
cn · senh = f (x) · sen dx,
a a 0 a
que resulta em Z a
2  nπ x 
cn = f (x) · sen dx.
a · senh (nπ b/a) 0 a
Portanto, a solução do problema proposto é dada por
∞  nπ x   
nπ (b − y) ,
u(x, y) = ∑ cn · sen a
· senh
a
n=1

onde Z a
2  nπ x 
cn = f (x) · sen dx.
a · senh (nπ b/a) 0 a

Exemplo 7.3: Resolva o seguinte problema de Laplace usando o método de separação de


variáveis:
4.7 Equação de Laplace 501



 uxx + uyy = 0,
 0 < x < a, 0 < y < b,
uy (x, 0) = 0, uy(x, b) = 0, 0 ≤ x ≤ a,



ux (0, y) = 0, ux (a, y) = k(y), 0 < y < b.

S OLUÇÃO : Procura-se por solução da forma

u(x, y) = X(x) · Y (y).

Derivando duas vezes em relação a x e y, após substituir na equação de Laplace, encontra-se


X 00 (x) Y 00 (y)
X 00 (x) · Y (y) + X(x) · Y 00 (y) ⇒ =− ·
X(x) Y (y)
A última expressão mostra que as variáveis estão separadas. Como o primeiro membro de-
pende apenas da variável x e o segundo membro depende apenas da variável y, então a igualdade
só se verifica se ambos os membros forem constantes, ou seja,
X 00 (x) Y 00 (y)
=− = λ,
X(x) Y (y)
isto é, (
X 00 − λ X = 0,
Y 00 + λ Y = 0.

Figura 7.4: Problema de Newmann com uma condição não homogênea.

Em seguida determina-se as condições de compatibilidade para resolver as EDOs acima.


Tem-se:

ux (0, y) = X 0 (0) · Y (y) = 0 ⇒ X 0 (0) = 0 ou Y (y) = 0 para todo y.

Caso Y (y) = 0 para todo y, então ter-se-ia u ≡ 0. Logo, assume-se que X 0 (0) = 0.
Para a condição de contorno uy (x, 0) = 0, obtém-se
502 4 Aplicações às EDP

uy (x, 0) = X(x) · Y 0 (0) = 0 ⇒ Y 0 (0) = 0 ou X(x) = 0 para todo x.

Assim, se X(x) = 0 para todo x, obter-se-ia u ≡ 0. Então adota-se a condição de compati-


bilidade Y 0 (0) = 0.
Para a condição de contorno uy (x, b) = 0, obtém-se

uy (x, b) = X(x) · Y 0 (b) = 0 ⇒ Y 0 (b) = 0 ou X(x) = 0 para todo x.

Caso X(x) = 0 para todo x, obter-se-ia u(x, y) ≡ 0. Então adota-se a condição de compatibili-
dade Y 0 (b) = 0.
Agora trata-se de resolver os seguintes problemas de valor de contorno:
( (
X 00 − λ X = 0, Y 00 + λ Y = 0,
e
X 0 (0) = 0, Y 0 (0) = 0 = Y 0 (b).

O primeiro problema acima só tem uma condição de contorno. Já o segundo problema, que
tem duas condições de contorno e que será estudado inicialmente, deve ser analisado em três
casos: λ = 0, λ < 0 e λ > 0.

C ASO 1: para λ = 0. Tem-se Y 00 = 0, que por duas integrações diretas tem como solução
Y (y) = c1 y+c2 . Derivando a última expressão uma vez e usando a condição de contorno Y 0 (0) =
0, encontra-se

Y 0 (y) = c1 ⇒ Y 0 (0) = c1 = 0 ⇒ c1 = 0,

donde resulta Y (y) = c2 .


Agora usa-se a segunda condição de contorno, Y 0 (b) = 0, em Y 0 (y) = 0, que implica em
Y 0 (b) = 0. Ou seja, com a segunda condição de contorno a solução Y (y) = c2 permance a
mesma, que implicará em u(x, t) = c = constante, a ser adicionada no final. Mais adiante será
visto que esta constante c2 não poderá ser determinada. Isto é uma característica de problemas
de Neumann.

C ASO 2: para λ < 0. Neste caso, para evitar expressões contendo raízes opta-se por escrever
λ = −µ 2 . Assim, o exemplo 1.5 mostra que a solução geral para Y 00 − µ 2Y = 0 é dada por

Y (y) = d1 · cosh(µ y) + d2 · senh (µ y).

Derivando a expressão acima e usando a condição de contorno Y 0 (0) = 0, obtém-se


Y 0 (y) = d1 · µ · senh (µ y) + d2 · µ · cosh(µ y)

Y 0 (0) = d1 · µ · senh 0 + d2 · µ · cosh 0 = 0 ⇒ d1 · µ · 0 + d2 · µ · 1 = 0,


ou seja, d2 · µ = 0, que implica em d2 = 0, pois cosh 0 = 1, senh 0 = 0 e µ 6= 0. Resulta, portanto,
que Y (y) = d1 · cosh(µ y).
Usando a condição de contorno Y 0 (b) = 0 em Y 0 (y) = d1 µ senh (µ y), encontra-se
4.7 Equação de Laplace 503

Y 0 (b) = d1 · µ · senh (µ b) = 0 ⇒ d1 · µ = 0 ou senh (µ b) = 0.

Mas µ 6= 0 e b > 0, de modo que µ b 6= 0. Além disso, senh (µ b) 6= 0, pois o seno hiper-
bólico de número diferente de zero é não nulo. De fato, basta observar a sua definição:
ex − e−x
senh x = . Segue-se daí que d1 = 0 (pois µ 6= 0). E isto implica que Y (y) = 0 para
2
todo y, de modo que u ≡ 0.

C ASO 3: para λ > 0. Neste caso, escreve-se λ = µ 2 . Pelo exemplo 1.5 a solução geral de
Y 00 + µ 2Y = 0 é dada por

Y (y) = e1 · cos(µ y) + e2 · sen (µ y).

Derivando a última expressão uma vez e usando a condição de contorno Y 0 (0) = 0 na solução
acima, obtém-se
Y 0 (y) = −e1 · µ · sen (µ y) + e2 · µ · cos(µ y)

Y 0 (0) = −e1 · µ · sen 0 + e2 · µ · cos 0 = 0 ⇒ e1 · µ · 0 + e2 · µ · 1 = 0,


que dá e2 = 0 (pois µ 6= 0). Assim, tem-se que Y (y) = e1 · cos(µ x).
Com a condição de contorno Y 0 (b) = 0 aplicada em Y 0 (y) = − e1 · µ · sen (µ y), encontra-se

Y 0 (b) = − e1 · µ sen (µ b) ⇒ − e1 · µ = 0 ou sen (µ b) = 0.

No primeiro caso, se e1 = 0 (pois µ 6= 0), então u ≡ 0. Logo, sen (µ b) = 0, de modo que

sen (µ b) = 0 ⇒ µ b = nπ ,

que implica em
nπ n2 π 2
µ= e λ=
·
b b2
Portanto,  nπ y 
Y (y) = e1 cos ·
b
Sem perda de generalidade é possível tomar e1 = 1, de modo que se encontra
 nπ y 
Yn(y) = cos ,
b
para todo n ∈ N.
Para a outra equação diferencial, isto é, para X 00 − λ X = 0, com λ = n2π 2/b2, obtém-se como
solução geral a expressão
 nπ x   nπ x 
X(x) = k1 · cosh + k2 · senh ·
b b
A condição de contorno X 0 (0) = 0 implica em

nπ  nπ x  nπ  nπ x 
X 0 (x) = k1 · · senh + k2 · · cosh
b b b b
504 4 Aplicações às EDP

   
0 nπ nπ · 0 nπ nπ · 0
X (0) = k1 · · senh + k2 · · cosh =0
b b b b
nπ nπ
k1 · · senh 0 + k2 · · cosh 0 = 0,
b b
nπ nπ
k1 · · 0 + k2 · · 1 = 0,
b b
e isto implica em k2 = 0 (pois cosh 0 = 1, senh 0 = 0 e nπ/b 6= 0).
Logo,  nπ x 
Xn (x) = cosh ,
b
onde, sem perda de generalidade, tomou-se k1 = 1.
Portanto, fazendo un (x, y) = Xn (x) · Yn(y), obtém-se
 nπ x   nπ y 
un (x, y) = cosh cos , n ∈ N.
b b
Assim, o candidato à solução do problema de Laplace é dado por

u(x, y) = c + ∑ cn un (x, y)
n=1
∞  nπ x   nπ y 
(7.9) = c + ∑ cn cosh cos ·
n=1 b b

Para encerrar a solução deste problema é necessário informar como são dados os coeficientes
da série (acima) que representa a solução. Para isso, usa-se a condição de contorno ux (a, y) =
k(y) dada no problema, mas antes é preciso derivar uma vez o candidato à solução do problema
de Laplace. Tem-se:

nπ  nπ x   nπ y 
ux (x, y) = ∑ cn senh cos ,
n=1 b b b

nπ  nπ a   nπ y 
k(y) = ux(a, y) = ∑ cn senh cos ·
n=1 b b b

Fazendo  nπ a 
nπ ,
an = cn · · senh
b b
obtém-se  nπ y 

k(y) = ∑ an cos b
·
n=1
Mas a última expressão acima representa a série de Fourier para funções pares (uma série de
cossenos). Assim, fazendo uma extensão par de k no intervalo (−b, b] e periódica de período
T = 2b, denotando tal extensão por k, segue-se que os coeficientes an são dados por
Z b  nπ y  Z b  nπ y 
1 2
an = k(y) · cos dy = k(y) · cos dy,
b −b b b 0 b
4.7 Equação de Laplace 505

pois o integrando é par, por ser produto de duas funções pares, e por k coincidir com k no
intervalo [0, b].
Portanto, os coeficientes cn são dados por
Z b  nπ y 
2
cn = k(y) cos dy.
nπ · senh (nπ a/b) 0 b
Portanto, segue-se de (7.9) que a solução do problema é dada por
∞  nπ x   nπ y 
u(x, y) = c + ∑ cn · cosh · cos ,
n=1 b b

onde os coeficientes da série acima são dados por


Z b  nπ y 
2
cn = k(y) cos dy.
nπ · senh (nπ a/b) 0 b

Agora é importante observar que o termo constante c que aparece na solução u(x, y) não pode
ser determinado, isto é, não existe nenhuma condição dada que permita determinar o valor de c.
Com isso problemas deste tipo não tem solução única. Como foi dito, isso é uma característica
de problemas de Neumann.
Por fim, observa-se que o problema dado só terá solução se a0 = 0, ou seja, se
Z b
k(y) dy = 0.
0

Isso se justifica pelo fato de


∞  nπ y 
k(y) = ∑ an cos , n = 1, 2, 3, . . .,
n=1 b

ou seja, uma série de cossenos em que o termo constante não aparece. Isto significa que a0 = 0
nesta série, ou ainda, que
Z b Z b Z b
2 2
a0 = k(y) · cos(0) dy k(y) dy = 0 ⇒ k(y) dy = 0.
b 0 b 0 0

Exemplo 7.4: Resolva o seguinte problema de Dirichlet:


 
 ∆u = u + u = 0, em Ω = (x, y) ∈ R 2 | x2 + y2 < a2 ,

 xx yy

(7.10) u ∂ Ω = g(x, y), em (x, y) ∈ ∂ Ω = (x, y) ∈ R2 | x2 + y2 = a2 ,


 |u(x, y)| < M.
506 4 Aplicações às EDP

S OLUÇÃO : Observe, primeiro, que não é possível aplicar diretamente o método de separação
de variáveis. Isso se deve a fato de que este método só se aplica a regiões retangulares e o
domínio dado, Ω, é um disco, ou região circular. Assim, este problema deve ser reescrito em
coordenadas polares para que a aplicação do método de separação de variáveis seja possível.
Usando coordenadas polares, isto é,

x = r cos θ e y = r sen θ ,

a região Ω e sua fronteira ∂ Ω se transformam em


D = {(r, θ ) | r < a e 0 ≤ θ < 2π } ,

∂ D = {(r, θ ) | r = a e 0 ≤ θ < 2π } .

Figura 7.5: Equação de Laplace no disco.

A dedução do laplaciano em coordenadas polares pode ser encontrada na proposição 8.3 no


apêndice 2 deste capítulo. Já a restrição de u(x, y) = f (x, y) à fronteira fica assim:

u(a, θ ) = u(a cos θ , a sen θ ) = g(a cos θ , a sen θ ) = f (θ ).

pois em ∂ D se tem r = a.
A equação de Laplace e a condição de contorno são dadas por:

 u + 1 · u + 1 · u = 0, em D,
rr r θθ
(7.11) r r2
 u(a, θ ) = f (θ ), em ∂ D.

Para que u(r, θ ) esteja bem definida, acrescenta-se a hipótese de que u seja periódica de
período T = 2π na variável θ . Além disso, exige-se que a função u(r, θ ) seja limitada para
r ≤ a.

Usar-se-á o método de separação de variáveis para resolver este problema. Suponha que

(7.12) u(r, θ ) = R(r) · Θ (θ ).


4.7 Equação de Laplace 507

Derivando u, obtém-se

ur (r, θ ) = R0 (r) · Θ (θ ), urr (r, θ ) = R00 (r) · Θ (θ ) e uθθ (r, θ ) = R(r) · Θ 00 (θ ).

A substituição das derivadas acima na equação de Laplace em coordenadas polares resulta


em
1 1
R00 (t) · Θ (θ ) + · R0 (r) · Θ (θ ) + 2 · R(r) · Θ 00 (θ ) = 0,
r r
ou ainda,  
1 0 1
R (t) + · R (r) · Θ (θ ) = − 2 · R(r) · Θ 00 (θ ),
00
r r
que implica em
R00 (r) R0 (r) Θ 00 (θ )
r2 · +r· =− = λ,
R(r) R(r) Θ (θ )
onde λ é a constante de separação, uma vez que o primeiro membro é uma função da variável r
e o segundo membro é uma função apenas da variável θ , de modo que a igualdade só é possível
se ambos os membros forem uma constante.
Igualando o primeiro membro a λ , obtém-se
R00 (r) R0 (r)
r2 · +r· =λ ⇒ r2 · R00 (t) + r · R0 − λ · R = 0.
R(r) R(r)
Analogamente, encontra-se
Θ 00 (θ )
− =λ ⇒ Θ 00 + λΘ = 0.
Θ (θ )
Assim, obtém-se duas EDO:
(
r2 · R00 + r · R0 − λ R = 0,
(7.13)
Θ 00 + λΘ = 0.

Esse problema não tem condições de contorno homogêneas. Por outro lado, as soluções têm
que ser limitadas na variável r e periódicas de período T = 2π na variável θ . Considere a
equação Θ 00 (θ ) + λΘ (θ ) = 0. Olhando λ como autovalor dessa equação, então a função Θ
pode ser complexa. Assim, tomando o produto entre Θ e seu conjugado Θ (θ ), integrando de 0
a 2π e usando a EDO anterior, obtém-se
Z 2π Z 2π
2
λ | Θ (θ )| d θ = λ Θ (θ ) · Θ (θ ) d θ
0 0
Z 2π
= [λΘ (θ )] · Θ (θ ) d θ
0
Z 2π
eq.
=− Θ 00(θ ) · Θ (θ ) d θ
0
508 4 Aplicações às EDP

2π Z 2π
0

= −Θ (θ ) · Θ (θ ) + Θ 0 (θ ) · [Θ 0 (θ )] d θ
0 0
Z 2π
= −Θ 0(2π ) · Θ (2π ) + Θ 0(0) · Θ (0) + Θ 0 (θ ) 2 d θ
0
Z 2π
0
= −Θ (0 + 2π ) · Θ (0 + 2π ) + Θ (0) · Θ (0) +0 Θ 0 (θ ) 2 d θ
0
Z 2π
= −Θ 0(0) · Θ (0) + Θ 0 (0) · Θ (0) + Θ 0(θ ) 2 d θ
0
Z 2π
(7.14) = Θ 0 (θ ) 2 d θ .
0

onde usou-se a periodicidade de Θ em um passo acima. Também se fez uma integração por
partes, fazendo
(  h i
u = Θ (θ ),  du = Θ (θ ) 0 = [Θ 0 (θ )],

dv = Θ 00 (θ ) d θ ,  v = Θ 0(θ ).

Observe que a integral no primeiro e no último membros são positivas, pois os integrandos
são funções positivas (estão elevados ao quadrado). Isso faz com que λ ≥ 0, isto é, λ é um
número real não negativo. Então serão considerados dois casos: λ = 0 e λ > 0.

C ASO 1: para λ = 0. Substituindo este valor em (7.14), obtém-se


Z 2π
Θ 0(θ ) 2 d θ = 0 ⇒ Θ 0(θ ) = 0 ⇒ Θ (θ ) = constante
0

é solução para a equação Θ 00 + λΘ = 0.


Além disso, para λ = 0, a outra equação em R(r) fica na forma

r2 · R00 + r · R0 = 0.

Esta equação acima é do tipo de Euler, que tem solução geral

R(r) = k1 ln r + k2 .4

O termo logarítmico não é aceitável, pois o termo ln r → −∞ quando r → 0, fazendo com


que a solução seja ilimitada. Portanto, k1 = 0. Isto implica que R(r) = k2 . Como u(r, θ ) =
R(r) · Θ (θ ), então R(r) · Θ (θ ) = a2 · k2. Ou seja, tem-se que para λ = 0 a solução u(r, θ ) é
constante, de modo que ela é proporcional à solução u0 (r, θ ) = 1.

C ASO 2: para λ > 0, onde se faz λ = µ 2 , em que basta considerar µ > 0. Assim, as equações
em (7.8) ficam na forma

4 Veja as observações 7.3 e 7.4 para mais detalhes.


4.7 Equação de Laplace 509

(
r2 · R00 + r · R0 − µ 2R = 0,
Θ 00 + µ 2Θ = 0.
Pelo exemplo 1.5 a solução geral da equação Θ 00 + µ 2Θ = 0 é dada por

(7.15) Θ (θ ) = d1 · cos(µθ ) + d2 · sen (µθ ).

Como Θ (θ ) tem que ser periódica de período 2π , então


d1 · cos(µθ ) + d2 · sen (µθ ) = d1 · cos[µ (θ + 2π )] + d2 · sen [µ (θ + 2π )]

= d1 · cos(µθ + 2πµ ) + d2 · sen (µθ + 2πµ )


de modo que se deve ter

cos(µθ + 2πµ ) = cos(µθ ) e sen (µθ + 2πµ ) = sen (µθ ).

Desenvolve-se a primeira dessas identidades acima. Tem-se:

cos(µθ ) · cos(2πµ ) − sen (µθ ) · sen (2πµ ) = cos(µθ ).

Como a igualdade acima vale para todo θ , então basta tomar, em particular, θ = π/2µ . Assim,
     
π π π ,
cos µ · · cos(2πµ ) − sen µ · · sen (2πµ ) = cos µ ·
2µ 2µ 2µ
ou seja, π  π  π 
cos · cos(2πµ ) − sen · sen (2πµ ) = cos ,
2 2 2
ou ainda,
0 · cos(2πµ ) − sen (2πµ ) = 0 ⇒ sen (2πµ ) = 0.
Isto significa que o argumento 2πµ tem que ser múltiplo inteiro (positivo, pois basta tomar
µ > 0) de 2π . Logo, 2πµ = 2nπ , implica em µ = n, onde n = 0, 1, 2, 3, . . .
Analogamente, desenvolve-se a identidade sen (µθ + 2πµ ) = sen (µθ ). Tem-se:

sen (µθ ) · cos(2πµ ) + sen (2πµ ) · cos(µθ ) = sen (µθ ).

Como a equação anterior vale para qualquer θ , então basta tomar, em particular, θ = π/2µ
para obter
     
π π π ,
sen µ · · cos(2πµ ) + sen (2πµ ) · cos µ · = sen µ ·
2µ 2µ 2µ
ou seja, π  π  π 
sen cos(2πµ ) + sen (2πµ ) cos = sen ,
2 2 2
ou ainda,

1 · cos(2πµ ) + sen (2πµ ) · 0 = 1 ⇒ cos(2πµ ) = 1.


510 4 Aplicações às EDP

Mas, para que seja cos(2πµ ) = 1, o argumento 2πµ deve ser múltiplo inteiro (positivo) de
2π . Assim, 2πµ = 2nπ , de modo que µ = n. Assim, nos dois casos obte-se que µ = n. Portanto,
mostrou-se que, para que θ seja periódica de período 2π , é necessário que µ seja um inteiro
positivo n.
A primeira equação, r2 · R00 + r · R0 − µ 2 R = 0, é uma equação de Euler, que tem solução geral

R(r) = c1 · r µ + c2 r −µ . 5

Como µ = n, a solução r −µ que aparece na solução R(r) acima tem que ser descartada, pois
ela se torna ilimitada quando r → 0 (lembre-se que µ > 0). Portanto, segue-se que c2 = 0. Logo,

(7.16) R(r) = c1 · r n .

Fazendo λ = µ 2 = n2 , segue-se de (7.15) e (7.16), quando aplicadas a (7.12), que


un (r, θ ) = Rn (r) · Θn (θ )

= r n · [cos(nθ ) + sen (nθ )]

= r n · cos(nθ ) + r n · sen (nθ ), n = 1, 2, 3, . . .,


onde se fez, sem perda de generalidade, as constantes finais iguais a 1.
Essas funções, juntamente com u0(r, θ ) = 1, formam um conjunto fundamental de soluções
para o problema em questão.

Agora, suponha que u pode ser representada pela superposição das soluções fundamentais,
isto é,

u(r, θ ) = ∑ cn · un (r, θ )
n=1

c0
= + ∑ r n [cn · cos(nθ ) + dn · sen (nθ )] .
2 n=1
Agora aplica-se a condição de contorno, u(a, θ ) = f (θ ), tomando r = a na última expressão
acima. Note que o termo c0/2 atua aqui como o múltiplo da solução u0 (r, θ ) = 1. Tem-se:

c0
f (θ ) = u(a, θ ) = + ∑ a n [cn · cos(nθ ) + dn · sen (nθ )]
2 n=1

c0
= + ∑ [(a n cn ) · cos(nθ ) + (an dn ) · sen (nθ )]
2 n=1

A0
(7.17) = + ∑ [An · cos(nθ ) + Bn · sen (nθ )] , (0 < θ < 2π ),
2 n=1

onde se fez
c0 = A0 , An = an cn e Bn = an dn .

5 Veja as observações 7.3 e 7.4 para mais detalhes.


4.7 Equação de Laplace 511

Seja f : R → R a extensão de f (x), periódica de período T = 2π . Então, a série dada em


(7.17) é a série de Fourier para a função f . Como a função estendida tem período 2π , pode-se
calcular seus coeficientes de Fourier integrando em qualquer período da função (como foi visto
na proposição 2.6 do capítulo 2). Em particular, é conveniente usar o intervalo original (0, 2π ),
pois, em virtude da generalidade da extensão, não se sabe exatamente qual é a função em outros
intervalos, mas se sabe que f coincide com f no intervalo (0, 2π ). Então, os coeficentes desta
série são dados por
Z 2π Z 2π
1 1
c0 = A0 = f (θ ) d θ = f (θ ) d θ ,
π 0 π 0
Z 2π Z 2π
n 1 1
a · cn = An = f (θ ) · cos(nθ ) d θ = f (θ ) · cos(nθ ) d θ ,
π 0 π 0
Z 2π Z 2π
n 1 1
a · dn = Bn = f (θ ) · sen (nθ ) d θ = f (θ ) · sen (nθ ) d θ ,
π 0 π 0

pois f coincide com f no intervalo (0, 2π ).


Assim, Z
1 2π
c0 = f (θ ) d θ ,
π 0
Z 2π
1
cn = An = n f (θ ) · cos(nθ ) d θ ,
a π 0
Z 2π
1
dn = Bn = n f (θ ) · sen (nθ ) d θ ,
a π 0
para n = 1, 2, 3, . . .
Portanto, a solução do problema (7.10) é dada por

c0
u(r, θ ) = + ∑ r n [cn · cos(nθ ) + dn · sen (nθ )] ,
2 n=1

onde os coeficientes acima são dados por


Z 2π
1
c0 = f (θ ) d θ ,
π 0
2π Z
1
cn = An = n f (θ ) · cos(nθ ) d θ ,
a ·π 0
Z 2π
1
dn = Bn = n f (θ ) · sen (nθ ) d θ ,
a ·π 0
para n = 1, 2, 3, . . .
Observa-se que esse problema precisa dos termos em senos e cossenos na solução. Isso se
deve ao fato da condição de contorno ser dada no intervalo 0 ≤ θ < 2π e a extensão periódica
ter sido feita para uma função qualquer, ou seja, não par e não ímpar. No capítulo 2 mostrou-se
512 4 Aplicações às EDP

que uma função qualquer é soma de uma função par com outra ímpar. Consequentemente, a
série de Fourier precisa ser completa, em vez da série só em senos ou só em cossenos.
Assim, a solução final pode ser reescrita da seguinte forma:
∞  
c0 rn rn
u(r, θ ) = + ∑ cn · n · cos(nθ ) + dn · n · sen (nθ )
2 n=1 a a
∞  n
c0 r
= +∑ · [cn · cos(nθ ) + dn · sen (nθ )] ,
2 n=1 a

onde os coeficientes acima são dados por


Z 2π
1
c0 = f (θ ) d θ ,
π 0
Z 2π
1
cn = An = f (θ ) · cos(nθ ) d θ ,
π 0
Z 2π
1
dn = Bn = f (θ ) · sen (nθ ) d θ ,
π 0

para n = 1, 2, 3, . . .

Observação 7.3: A equação diferencial ordinária

d 2y dy
(7.18) x2 · 2
+ ax · + by = 0,
dx dx
onde a e b são constantes, é chamada de equação de Euler.
Será feita a mudança de variáveis x = e t para transformar a equação acima em uma EDO com
coeficientes constantes, que permitirá ser resolvida com técnicas conhecidas. Antes, observe que
agora y(t) = y[x(t)] = y (e t ), de modo que
dy dy dx dy
= · = et ·
dt dx dt dx
e  2
d 2y d 2y dx dy d 2x 2
t 2 d y
 dy
2
= 2
· + · 2
= e · 2
+ et · ·
dt dx dt dx dt dx dx
Assim,
d 2y dy
x2 · 2
+ ax · + by = 0,
dx dx
2 d 2 y dy
et · 2 + a · e t · + by = 0,
dx dx
   
 2
t 2d y t dy t dy
e +e · + (a − 1) e · + by = 0,
dx2 dx dx
4.7 Equação de Laplace 513

d 2y dy
(7.19) 2
+ (a − 1) · + by = 0.
dt dt
Mas para resolver a equação (7.19) é preciso conhecer explicitamente os coeficientes a e b e,
assim, só dá para resolver caso a caso. Porém existe uma maneira de obter uma solução geral
para a equação de Euler dada em (7.18): procurar por solução da forma y(x) = x λ , para cada λ
possível. Assim, observando que

dy d 2y
= λ · x λ −1 e = λ (λ − 1) · x λ −2,
dx dx2
obtém-se
d 2y dy h i  
x2 · 2
+ ax · + by = 0 ⇒ x2 λ (λ − 1) · x λ −2 + ax λ · x λ −1 + b · x λ = 0,
dx dx
λ (λ − 1) · x λ + aλ · x λ + b · x λ = 0 ⇒ x λ [ λ (λ − 1) + aλ + b] = 0.
Como se busca soluções L.I. (Linearmente Independentes), então deve-se ter

λ (λ − 1) + aλ + b = 0 ⇒ λ 2 + (a − 1)λ + b = 0.

Como está equação é do segundo grau, então existem três possibilidades: duas raízes reais e
diferentes, duas raízes reais e iguais e duas raízes complexas conjugadas.

C ASO 1: duas raízes reais e diferentes. Neste caso, tem-se y1 (x) = x α e y2 (x) = x β , de modo
que a solução geral será
y(x) = a1 · x α + a2 · x β .
C ASO 2: duas raízes reais e iguais. Neste caso, tem-se que y1 (x) = x α e y2 (x) = x α · ln x, de
modo que a solução geral será

y(x) = b1 · x α + b2 · x α · ln x.

C ASO 3: duas raízes complexas conjungadas. Neste caso, se λ = a + ib, tem-se

y(x) = xa+ib = xa · xib = xa · e ib ln x


n h  i h  io
= xa cos ln xb + i sen ln xb
n h  io n h  io
= xa · cos ln xb + i xa · sen ln xb

As partes real e imaginária da função acima são reais. Assim, toma-se


h  i h  i
y1 (x) = xa · cos ln xb e y2 (x) = xa · sen ln xb
514 4 Aplicações às EDP

Observação 7.4: Agora usa-se as informações passadas na observação 7.3 para justificar as
soluções gerais de duas equações de Euler que apareceram na resolução do exemplo 7.4. A
primeira equação foi
r2 · R00 + r · R = 0.
Fazendo R(r) = r λ e substituindo na equação acima e observando que

R0 = λ · r λ −1 e R00 = λ (λ − 1) · r λ −2,

obtém-se h i  
2 λ −2 λ −1
r · λ (λ − 1) · r +r· λ ·r = 0,

λ (λ − 1) · r λ + λ · r λ = 0,
 
r λ λ 2 − λ + λ = 0,

rλ = 0 ou λ 2 = 0.
Se r λ = 0, então R ≡ 0. Logo, tem-se que λ 2 = 0, que implica em λ = 0. Pela observação
7.3 tem-se duas raízes reais e iguais e a solução geral é da forma

R(r) = b1 · r λ + b2 · r λ · ln r ⇒ R(r) = b1 + b2 · ln r,

como na aparece na resolução do exemplo citado.

A segunda equação que apareceu na resolução do exemplo 7.4 é

r2 · R00 + r · R − µ 2R = 0.

Novamente se faz R(r) = r λ e substitui na equação acima para obter


h i  
r2 · λ (λ − 1) · r λ −2 + r · λ · r λ −1 − µ 2 · r λ = 0,

λ (λ − 1) · r λ + λ · r λ − µ 2 · r λ = 0,

r λ · λ 2 − λ + λ − µ 2 = 0,

rλ = 0 ou λ 2 − µ 2 = 0.

Caso seja r λ = 0, então R ≡ 0. Logo, tem-se que λ 2 − µ 2 = 0, ou seja, que λ 2 = µ 2, que


implica em λ = ± µ . Tem-se, portanto, duas raízes reais e diferentes. Pela observação 7.3, a
solução geral é dada por
R(r) = a1 · r −µ + a2 · r µ ,
como aparece na resolução do exemplo 7.4.

Exemplo 7.5: Considera o seguinte problema de Laplace no semiplano


4.7 Equação de Laplace 515



 ∆u = uxx + uyy = 0,
 x ∈ R e y > 0,
(7.20) u(x, 0) = f (x), x ∈ R,


 |u(x, y)| < M.

S OLUÇÃO : Suponha que exista a transformada de Fourier da solução u(x, y), bem como as
transformadas de Fourier de suas derivadas parciais primeiras e segundas e que a função f (x)
seja absolutamente integrável. Suponha também que

lim |u(x, y)| = 0 e lim |ux(x, y)| = 0.


x→± ∞ x→± ∞

Nestas condições, é possível aplicar a transformada de Fourier em ambos os membros da


equação de Laplace.

Figura 7.6: Equação de Laplace no semiplano

Serão usadas as fórmulas 22 e 24, respectivamente, da tabela do capítulo 3, trocando-se t por


y:
     
∂ 2u ∂ 2u ∂2
F (x, y) = −ω 2 · F [u(x, y)] e F (x, y) = F [u(x, y)],
∂ x2 ∂ y2 ∂ y2
ou ainda,
F [uxx(x, y)] = −ω 2 · U (ω , y) e F [uyy(x, y)] = U 00 (ω , y),
onde deve-se entender U 00 como sendo a derivada segunda de U (ω , y) em relação a variável y.
Assim, aplicando a transformada de Fourier em ambos os membros da equação de Laplace,
usando sua linearidade e as fórmulas acima, obtém-se
F (uxx + uyy) = 0 ⇒ F [uxx(x, y)] + F [uyy(x, y)] = 0

− ω 2 · U (ω , y) + U 00(ω , y) = 0 ⇒ U 00 (ω , y) − ω 2 · U (ω , y) = 0.
Observe que a última equação é uma EDO, mas não é do tipo estudado no exemplo 1.5. A
solução geral da equação U 00 − ω 2 · U = 0 é

U (ω , y) = a(ω ) · e −ω y + b(ω ) · e ω y.

Como já observado anteriormente, deve-se ter a compreensão de que os coeficientes das


exponenciais acima são funções de ω e não meras constantes.
516 4 Aplicações às EDP

Deve-se analisar os três casos: ω > 0, ω = 0 e ω < 0. Para o caso ω = 0 a equação se reduz a
U 00 = 0, de modo que sua solução é dada por U (ω , y) = a(ω )+ b(ω )· y, após integrar duas vezes
em relação a y. Mas aqui ω = 0, de modo que esta solução fica na forma U (0, y) = a(0)+b(0)·y.
Assim, 
 −ω y + b(ω ) · e ω y , se ω > 0,
 a(ω ) · e

U (ω , y) = a(0) + b(0) · y, se ω = 0,


 a(ω ) · e ω y + b(ω ) · e −ω y, se ω < 0
Agora usa-se o seguinte teorema sobre transformadas de Fourier: Seja f : R → R uma função
seccionamente diferenciável e absolutamente integrável (ou seja, f ∈ L1), então lim F(ω ) =
ω →± ∞
0. Este teorema diz que a função transformada de Fourier tende para zero no infinito. Assim,
 
lim U (ω , y) = lim a(ω ) · e −ω y + b(ω ) · e ω y = 0,
ω →∞ ω →∞
 
lim U (ω , y) = lim a(ω ) · e ω y + b(ω ) · e −ω y = 0.
ω →−∞ ω →−∞

Mas para que seja


 
lim [b(ω ) · e ω y] = 0 e lim b(ω ) · e −ω y = 0,
ω →∞ ω →−∞

b(ω ) = 0, pois na situação acima as exponenciais tenderiam para +∞ e, portanto, não existiria
a função transformada U (ω , y).
Deste modo, tem-se

 −ω y , se ω > 0,
 a(ω ) · e

U (ω , y) = a(0) + b(0) · y, se ω = 0,


 a(ω ) · e ω y , se ω < 0,

que pode ser resumida na forma

(7.21) U (ω , y) = a(ω ) · e −|ω |y .

Fazendo y = 0 na função U acima, obtém-se U (ω , 0) = a(ω ). Mas a condição de contorno


no infinito, u(x, 0) = f (x), implica em F(ω ) = F [ f (x)] = F [u(x, 0)] = U (ω , 0). Então, tem-se
que F(ω ) = a(ω ). Substituindo esta última expressão em (7.21), obtém-se

(7.22) U (ω , y) = F(ω ) · e −|ω |y .

A fórmula 6 da tabela de transformada de Fourier mostra que


  √
α 2π −α |ω |
F 2 2
= ·e , (α > 0).
x +α 2
Fazendo α = y na fórmula acima, conclui-se
4.7 Equação de Laplace 517

  √  
y 2π −α |ω | −|ω |y 2 y
F = ·e ⇒ e =F √ · 2 ·
x + y2
2 2 2π x + y2
Agora, a expressão em (7.22) pode ser escrita na forma
 
2 y
U (ω , y) = F [ f (x)] · F √ · 2 ·
2π x + y2
Agora aplica-se o teorema da convolução para transformada de Fourier (fórmula 17 da
tabela), que é
√ 1
2π [ F(ω ) · G(ω )] = F [( f ∗ g)(x)] ⇒ F −1 [F(ω ) · G(ω )] = √ · ( f ∗ g)(x).

Aplicando a transformada inversa em ambos os membro acima, obtém-se

u(x, y) = F −1 [U (ω , y)]
  
−1 2 y
=F F [ f (x)] · F √ · 2 2
2π x + y
  
1 2 y
=√ f (x) ∗ √ · 2
2π 2π x + y2
  
1 2 y
= √ ·√ f (x) ∗ 2
2π 2π x + y2
Z ∞
1 y
= · f (t) · dt
π −∞ (x − t)2 + y2
Z
y ∞ f (t)
= dt.
π −∞ (x − t)2 + y2
A última expressão obtida acima é a solução do problema (7.20).

A equação de Laplace, ∆u = 0, também aparece em estudos sobre fluidos estacionários (isto


é, independentes do tempo) e incompressíveis em meio poroso e que pode ser compreendido a
partir da lei de Darcy, que é dada por
 
p ,
V = −k · grad y +
γ
onde V = V (x, y) é a velocidade do fluido, p = p(x, y) é a pressão na área ocupada pelo fluido,
γ é o peso específico do fluido (isto é, γ = ρ g, onde ρ representa a sua massa específica e g o
módulo da aceleração da gravidade) e k é o coeficiente de permeabilidade do meio poroso em
relação ao fluido.
Considerando um fluido ideal, ou seja, escoamento permanente, o meio poroso é homogêneo
com coeficiente de permeabilidade constante k = 1. Assim, fazendo
518 4 Aplicações às EDP

p(x, y)
u(x, y) = y +
γ
na lei de Darcy, resulta que
V = − grad u = ∇u,
logo u é um potencial de velocidade.
Agora considera-se a equação da continuidade, que é dada por

V = 0.
+ ρ divV
dt
Matematicamente, afirmar que um movimento é estacionário equivale a escrever que d ρ/dt =
V = 0,
0 na equação da continuidade. Com isto, a equação da continuidade fica reduzida a divV
ou seja, o fluido é incompressível (pois o divergente do campo é igual a zero).
Aplicando o divergente em ambos os membros da equação de Darcy e considerando que
V = 0, obtém-se
divV
0 = divV V = − div (∇u) = ∆u,
ou seja, ∆u = 0, de modo que esta equação modela o problema de escoamento de um fluido
estacionário em meio pororo. Observe também que, por definição, sempre se tem ∆u = div (∇u)
(a demonstração desta afirmação é deixada como exercício).

Exemplo 7.6: Resolva o seguinte problema de Laplace:




 ∆u = uxx + uyy = 0,
 0 < x < a, 0 < y < b,
(7.23) uy (x, 0) = 0, u(x, b) = α x + b, 0 ≤ x ≤ a,


 u (0, y) = 0, ux (a, y) = 0, 0 ≤ y ≤ b.
x

Este problema modela o fluxo de água em um meio poroso em um aquífero. O fluxo é


bombeado por uma cabeça hidráulica, um medida da energia potencial da água acima do
aquífero. Considera-se o retângulo R = (0, a) × (0, b) como uma seção vertical do aquífero.

Figura 7.7: O problema do aquífero.


4.7 Equação de Laplace 519

Como já comentado, a partir da equação de Darcy é possível mostrar que a solução do proble-
ma de fluxo em meio poroso satisfaz a equação de Laplace, isto é, a equação ∆u = 0 representa
o escoamento. Já as condições de contorno uy(x, 0) = 0, uy (x, b) = 0 e ux(0, y) = 0 diz que não
pode existir fluxo de água em três lados do retângulo R, isto é, não entra e nem sai água nestes
lados.
Observa-se que u representa a pressão do fluído e as derivadas ux e uy no bordo ∂ R de R
representam o fluxo. Estas derivadas, na verdade, são derivadas normais, isto é, derivadas dire-
cionais na direção do vetor normal (a cada lado do retângulo R) apontando para fora da região.
No lado 0 ≤ x ≤ a e y = 0 (isto é, a “base” de R) o vetor normal apontando para fora de R é
paralelo ao eixo y e, como ele aponta “para baixo” de R, pode ser tomado como ν = (0, −1).
Assim, neste caso, a derivada normal é dada por
∂u
= ∇u · ν = (ux (x, 0), uy (x, 0) · (0, −1) = −uy(x, 0).
∂νν
Pedir que não tenha fluxo na “base” de R significa que −uy(x, 0) = 0, isto é, uy(x, 0) para 0 ≤
x ≤ a. Esta é uma das condições de contorno para o problema (7.23). As outras duas condições
de contorno homogêneas podem ser obtidas com este mesmo procedimento. Já a condição de
contorno não homogênea, u(x, y) = α x + b, para 0 ≤ x ≤ a, informa a pressão do fluido “parte
superior” do retângulo R.

S OLUÇÃO : Aplicar-se-á o método de separação de variáveis fazendo

u(x, y) = X(x) · Y (y).

A suas derivadas parciais segundas são dadas por

uxx (x, y) = X 00 (x) · Y (y) e uyy(x, y) = X(x) · Y 00 (y),

que substituídas na equação de Laplace resulta em

X 00 (x) · Y (y) + X(x) · Y 00 (y) = 0 ⇒ X 00 (x) · Y (y) = −X(x) · Y 00 (y),

ou ainda,
X 00 (x) Y 00 (y)
=− = −λ ,
X(x) Y (y)
onde λ é a constante de separação. Tem-se, portanto, que

X 00 + λ X = 0 e Y 00 − λ Y = 0.

As condições de compatibilidade são assim obtidas:

ux (0, y) = X 0 (0) · Y (y) = ⇒ X 0 (0) = 0 ou Y (y) = 0 para todo y.

Mas Y (y) = 0 para todo y implica em u ≡ 0. Logo, opta-se por X 0 (0) = 0.


Para a condição de contorno ux (a, y) = 0, obtém-se
520 4 Aplicações às EDP

ux(a, y) = X 0 (a) · Y (y) = 0 ⇒ X 0 (a) = 0 ou Y (y) = 0 para todo y.

Novamente, se Y (y) = 0 para todo y, então resulta u ≡ 0. Então, tem-se que X 0 (a) = 0.
E por fim, para uy (x, 0) = 0, encontra-se

uy (x, 0) = X(x) · Y 0 (0) = 0 ⇒ Y 0 (0) = 0 ou X(x) = 0 para todo x.

Caso fosse X(x) = 0 para todo x, então obter-se-ia u ≡ 0. Logo, escolhe-se Y 0 (0) = 0.
Portanto, trata-se de resolver os seguintes problemas de Neumann:

 00
 X + λ X = 0,
 (
Y 00 − λ Y = 0,
(7.24) 0
X (0) = 0, e

 Y 0 (0) = 0.
 X 0 (a) = 0,

Para resolver o primeiro problema em (7.19), deve-se considerar três casos: λ = 0, λ < 0 e
λ > 0.

C ASO 1: para λ = 0 a equação fica reduzida a X 00 = 0, que integrada duas vezes em relação
a x implica em X(x) = c1 · x + c2 . Para usar a primeira condição de contorno, deve-se, antes,
derivar X(x). Assim, X 0 (x) = c1 e, desse modo, tem-se que

X(0) = c1 = 0 ⇒ c1 = 0,

de modo que X(x) = c2 .


Para a segunda condição de contorno,

X 0 (a) = c1 = 0 ⇒ c1 = 0,

ou ainda, que X(x) = c2 .


Em qualquer caso, tem-se que X(x) = c = constante. Isto se deve ao fato do problema ser de
Neumann, como já visto antes.

C ASO 2: para λ < 0. Faz-se λ = −µ 2 para evitar o aparecimento de raízes. Assim, a equação
fica na forma X 00 − µ 2X = 0 e que, pelo exemplo 1.5, tem como solução geral

X(x) = d1 · cosh(µ x) + d2 · senh (µ x).

Para aplicar as condições de contorno é preciso, antes, derivar a solução acima. Tem-se:

X 0 (x) = d1 µ · senh (µ x) + d2 µ · cosh(µ x).

Para a condição X 0 (0) = 0, obtém-se

X 0 (0) = d1 µ · senh 0 + d2 µ · cosh 0 = 0 ⇒ d2 · µ = 0.

Como µ 6= 0 (pois λ < 0), então d2 = 0, de modo que X(x) = d1 · cosh(µ x). Para aplicar a
condição X 0 (a) = 0, deriva-se X(x) para encontrar X 0 (x) = d1 µ senh (µ x). Assim,
4.7 Equação de Laplace 521

X 0 (a) = d1 µ · senh (µ a) = 0 ⇒ d1 µ = 0 ou senh (µ a) = 0.

Como µ 6= 0 e a 6= 0 (pois é lado do retângulo), tem-se que µ a 6= 0, de modo que senh (µ a) 6=


0, pois seno hiperbólico não se anula para valores diferentes de zero. Logo, d1 µ = 0. Como
µ 6= 0, segue-se que d1 = 0. Logo, X(x) = 0 para todo x e isto implica em u ≡ 0.

C ASO 3: para λ > 0. Fazendo λ = µ 2 , para evitar aparecimento de raízes, conclui-se que a
equação ficará na forma X + µ 2X = 0. Pelo exemplo 1.5 a solução geral desta EDO é dada por

X(x) = e1 · cos(µ x) + e2 · sen (µ x),

que derivada em relação a x resulta em

X(x) = −e1 µ · sen (µ x) + e2 µ · cos(µ x).

Usando a primeira condição de contorno, obtém-se

X 0 (0) = e1 µ · sen 0 + e2 µ cos 0 = 0 ⇒ e2 = 0,

de modo que X(x) = e1 · cos(µ x). Derivando em relação a x, obtém-se X 0 (x) = −e1 · µ cos(µ x).
Agora aplica-se a segunda condição de contorno para encontrar

X 0 (a) = −e1 · µ · sen (µ a) = 0 ⇒ e1 · µ = 0 ou sen (µ a) = 0.

Caso fosse e1 · µ = 0, então e1 = 0 (uma vez que µ 6= 0), que implicaria em X(x) = 0 para
todo x e, consequentemente, em u ≡ 0. Logo, sen (µ a) = 0. Então o argumento deve ser múltiplo
inteiro de π , isto é,
nπ n2 π 2
µ a = nπ ⇒ µ= ⇒ λ= ·
a a2
Portanto, a solução para o primeiro problema em (7.24) é
 nπ x 
(7.25) Xn (x) = cos , n = 1, 2, 3, . . .,
a
onde se fez e1 = 1, sem perda de generalidade.

Agora retorna-se ao segundo problema em (7.24), que deve ser tratado apenas no caso 3.
Assim, a EDO fica na forma Y 00 − µ 2Y = 0. O exemplo 1.5 mostra que a solução geral para esta
equação é
Y (y) = k1 · cosh(µ y) + k2 · senh (µ y),
isto é,  nπ y   nπ y 
Y (y) = k1 · cosh + k2 · sen
·
a a
Agora deriva-se a expressão acima em relação a y,
nπ  nπ y  nπ  nπ y 
0
Y (y) = k1 · · senh + k2 · · cosh ,
a a a a
522 4 Aplicações às EDP

e aplica-se a condição de contorno Y 0 (0) = 0 para encontrar


nπ nπ nπ
Y 0 (0) = k1 · · senh 0 + k2 · · cosh 0 = 0 ⇒ k2 · = 0.
a a a
Ora, nπ/a 6= 0, logo k2 = 0. Assim,
 nπ y 
Y (y) = k1 · cosh ·
a
Portanto, a solução para o segundo problema em (7.24) é
 nπ y 
(7.26) Yn(y) = cosh , n = 1, 2, 3, . . .,
a
onde se fez k1 = 1, sem perda de generalidade.
Fazendo un (x, y) = Xn (x) · Yn(y), segue-se de (7.25) e (7.26) que
 nπ x   nπ y 
un(x, y) = cos · cosh , n = 1, 2, 3, . . .
a a
Assim, tem-se como candidato à solução do problema (7.23) é a superposição das funções
acima:

u(x, y) = ∑ cn · un(x, y)
n=1
∞  nπ x   nπ y 
(7.27) = c + ∑ cn · cos · cosh , n = 1, 2, 3, . . .,
n=1 a a

onde c é a constante obtida no caso 1.


Para determinar os coeficientes cn , usa-se a condição de contorno u(x, b) = α x + b tomando
y = b no candidato à solução acima. Assim,
∞  nπ x   
nπ b
α x + b = u(x, b) = c + ∑ cn · cos · cosh ·
n=1 a a

Ao fazer 
a0 nπ b ,
=c e an = cn · cosh
2 a
a série acima ganha a seguinte forma:

a0 ∞  nπ x 
α x + b = + ∑ an cos ·
2 n=1 a
A última expressão acima é a série de cossenos, portanto a série de Fourier de uma função par
e periódica de período T = 2a. Assim, basta estender a função g(x) = α x + b para o intervalo
(−a, a], que será denotada por g(x), e torná-la periódica de período T = 2a para escrever
Z a Z a
a0 1 1
= g(x) dx = g(x) dx
2 2a −a a 0
4.7 Equação de Laplace 523

Z a   a
1 1 x2
= (α x + b) dx = α · + bx
a 0 a 2 0
  
1 a2
= α · + ab − (α · 0 + b · 0)
a 2
a·α
(7.28) = b+ ·
2
Além disso,
Z a  nπ x  Z  nπ x 
1 2 a
an = g(x) · cos dx = g(x) · cos dx
a −1 a a 0 a
Z  nπ x 
2 a
= (α x + b) · cos dx
a 0 a
Z  nπ x  Z  nπ x 
2α a 2b a
= x · cos dx + cos dx
a 0 a a 0 a

2α ax  nπ x  a a a
Z  nπ x  
= · sen − sen dx +
a nπ a 0 nπ 0 a
2b a  nπ x  a
+ · · sen
a nπ a 0
  Z  nπ x 
2α a2 a·0 2aα a
= · sen (nπ ) + · sen 0 − sen dx +
a nπ nπ anπ 0 a
2b
[ sen (nπ ) − sen 0]
+

2α  a   nπ x  a
=− · − · cos
nπ nπ a 0
2aα 2aα
= 2 2
[cos(nπ ) − cos 0] = 2 2 [(−1)n − 1]
n π n π

− 4aα , para n ímpar,
= (2k − 1)2π 2

0, para n par.
4aα ,
(7.29) =− k = 1, 2, 3, . . .
(2k − 1)2 π 2
onde se usou sen (nπ ) = 0 e sen 0 = 0.
Também se fez, em um dos passos acima, uma integração por partes tomando
 
 U = x,  dU = dx,
 nπ x  ⇒ a  nπ x 
 dV = cos , V = · sen ·
a nπ a
Como
524 4 Aplicações às EDP

 
nπ b ,
an = cn · cosh
a
segue-se de (7.29) que
1
cn = nπ b
 · an
cosh a
 
1 4aα
= h i· −
cosh
(2k−1)π b (2k − 1)2 π 2
a

4a · α
(7.30) =− h i·
πb
π 2 · (2k − 1)2 · cosh (2k−1)
a

Substituindo (7.28) e (7.30) em (7.27), obtém-se


∞  nπ x   nπ y 
u(x, y) = c + ∑ cn · cos · cosh
n=1 a a
a·α
= b+ +
2
 
∞      
4a · α (2k − 1)π x (2k − 1)π y
+ ∑ − h i · cos · cosh
k=1
 π 2 · (2k − 1)2 · cosh (2k−1)π b  a a
a

a·α
= b+ −
2
   
4a · α ∞ 1 (2k − 1)π x (2k − 1)π y
− ∑
π 2 n=1 2
h
(2k−1)π b
i · cos
a
· cosh
a
(2k − 1) · cosh a
h i h i
(2k−1)π x (2k−1)π y
a · α 4a · α ∞ cos · cosh
a a
,
= b+ − 2 ∑ h i
2 π n=1 (2k − 1)2 · cosh (2k−1)π b
a

que é a solução do problema (7.23).


4.8 Exercícios propostos 525

4.8 Exercícios propostos

Exercício 1: Classifique as equações abaixo de acordo com o tipo:

(a) 4uxx + 12uxy + 5uyy − 6ux + uy = 0;


(b) uxx − 4uxy + 4uyy − 2uy − u − 2uy = 0;
(c) 2uxx + 6uxy + 9uyy − xyu = 0;
(d) (1 + x2 )2 uxx − (1 + y2)2 uyy = 0;
(e) (1 + x2)2 uxx − 2(1 + x2)(1 + y2 )uxy + (1 + y2)2 uyy − xu2 = 0.
(f) uxx + (1 + x2 )2 uyy = 0.

Exercício 2: Classifique as equações abaixo de acordo com o tipo:

(a) 2uxx − 4uxy − 6uyy + ux = 0;


(b) 4uxx + 12uxy + 9uyy − 2ux + u = 0;
(c) uxx − x2 y uyy = 0, para y > 0;
(d) e 2x uxx + 2e x+yuxy + e 2yuyy = 0;
(e) uxx − uxy − 2uyy = 0;
(f) uxx + 2uxy + uyy = 0;
(g) 2uxx + 4uxy + 3uyy − 5u = 0;
(h) uxx + 2x uxy + uyy + (cos xy)ux − u = 0;
(i) y uxx − 2uxy + e x uyy + u − 3 = 0;
(j) e xy uxx + ( senh x)uyy + u = 0;
(k) x uxx + 2xy uxy − y uyy = 0;
(l) x uxx + 2xy uxy + y uyy = 0.

Exercício 3: Resolva o problema do calor em uma barra com extremidades isoladas termica-
mente: 


 ut − α 2 uxx = 0, 0 < x < L, t > 0,


 u (0, t) = 0, t > 0,
x

 ux(L, t) = 0, t > 0,



 u(x, 0) = f (x), 0 ≤ x ≤ L.

Exercício 4: Resolva o seguinte problema de condução de calor:


526 4 Aplicações às EDP




 ut − α 2 uxx = 0, 0 < x < L, t > 0,


 u(0, t) = 0, t > 0,

 ux(L, t) = 0, t > 0,



 u(x, 0) = f (x), 0 ≤ x ≤ L.

O BSERVAÇÃO : este problema é resolvido pelo método de separação de variáveis. Porém cabe
resaltar que a extensão da função inicial f para o intervalo [−L, L] e periódica de período T = 2L
é ligeiramente diferente das extensões consideradas nos exemplos. Basta ficar atento para isso.

Exercício 5: Considere o seguinte problema:





 ut − α 2 uxx = 0, 0 < x < L, t > 0,


 u(0, t) = 0, t > 0,

 ux (L, t) + γ u(L, t) = 0, t > 0,



 u(x, 0) = f (x), 0 ≤ x ≤ L.

(a) Faça u(x, t) = X(x) · T (t) e mostre que

(8.25) X 00 + λ X = 0, X(0) = 0 e X 0 (L) + γ X(L) = 0.

Mostre também que T 0 + λ α 2 T = 0, onde λ é a constante de separação.


(b) Suponha que λ seja real e mostre que o problema (8.25) não tem soluções não triviais se
λ ≤ 0.
(c) Seja λ > 0. Faça λ = µ 2 , com µ > 0. Mostre que o problema (8.25) só tem soluções não
triviais se µ for solução da equação

(8.26) µ · cos(µ L) + γ · sen (µ L) = 0.

(d) Reescreva a equação (8.26) como


µ
tg (µ L) = − ·
γ
Esboce os gráficos de
µL
y = tg (µ L) e y=−
γL
para µ > 0 no mesmo conjunto de eixos. Mostre que a equação (8.26) é satisfeita por uma
infinidade de valores positivos de µ . Denote esses valores por µ1 , µ2 , . . ., µn, . . ., ordenados em
ordem crescente.
(e) Determine o conjunto das soluções fundamentais un (x, t) correspondentes aos valores µn
encontrados na parte (d).
4.8 Exercícios propostos 527

Exercício 6: Considere o seguinte problema de condução de calor em uma barra em contato


térmico com uma fonte de calor externa:

 ut − α 2 uxx = g(x),

 0 < x < L, t > 0,


 u(0, t) = T , t > 0,
1
(8.27)

 u(L, t) = T2, t > 0,



 u(x, 0) = f (x), 0 ≤ x ≤ L.

Faça u(x, t) = v(x) + w(x, t), onde v e w são as partes estacionária e transiente, respectiva-
mente, da solução u.
(a) Mostre que v(x) é solução do seguinte problema de valores de contorno:

 2 00
 α v = −h(x),

v(0) = T1 ,


 v(L) = T .
2

(b) Mostre que w(x, t) satisfaz ao seguinte problema de valores de contorno homogêneo:



 wt − α 2 wxx = 0, 0 < x < L, t > 0


 w(0, t) = 0, t > 0,

 w(L, t) = 0, t > 0,



 w(x, 0) = f (x) − v(x), 0 ≤ x ≤ L.

(c) Conclua que u(x, t) = v(x) + w(x, t) é solução do problema (8.27).

Exercício 7: Use o método da transformada de Fourier para resolver o seguinte problema de


valor inicial em domínio ilimitado:
(
ut + 2 ux = h(x), x ∈ R, t > 0
u(x, 0) = f (x), x ∈ R.

Encontre a solução do problema acima para f (x) = cos x e h(x) = 0.

Exercício 8: Resolva o seguinte problema da corda elástica solta em uma extremidade e


partindo do repouso:


 utt − α 2 uxx = 0, 0 < x < L, t > 0,



 u(0, t) = 0,


 t > 0,
ux(L, t) = 0, t > 0,



 u(x, 0) = f (x), 0 ≤ x ≤ L,




 ut (x, 0) = 0, 0 ≤ x ≤ L.
528 4 Aplicações às EDP

Exercício 9: Resolva o seguinte problema da corda elástica com uma extremidade solta e
com deslocamente inicial nulo:


 utt − α 2 uxx = 0, 0 < x < L, t > 0,





 u(0, t) = 0,
 t > 0,
ux(L, t) = 0, t > 0,



 u(x, 0) = 0, 0 ≤ x ≤ L,




 ut (x, 0) = g(x), 0 ≤ x ≤ L.

Exercício 10: Use o método da transformada de Fourier para obter a solução geral da equação
de ondas em domínio ilimitado:

utt − α 2 uxx = −2k · ut − k2 · u, x ∈ R, t > 0,

onde k > 0.

Exercício 11: Considere o seguinte problema da corda elástica infinita:



2
 utt − α uxx = 0, x ∈ R, t > 0,


u(x, 0) = f (x), 0 ≤ x ≤ L,


 u (x, 0) = g(x), 0 ≤ x ≤ L.
t

(a) Use a solução de d’Alembert para encontrar a solução do problema acima quando f (x) =
e −xe g(x) = 0;
(b) Faça o mesmo, porém, agora, com f (x) = A · sen (ω x) e g(x) = B · cos(µ x), onde A e B
são constantes.

Exercício 12: Considere o problema do exercício 9 onde a EDP é dada por utt − α 2 uxx =
F(x, t), mas mantendo-se as condições iniciais. Use a fórmula de d’Alembert para a equação
não homogênea e determine a solução do problema com as seguintes condições iniciais:
(a) f (x) = sen (ω x), g(x) = 0 e F(x, t) = 1;
(b) f (x) = 0, g(x) = cosh(bx) e F(x, t) = 4x + t.

Exercício 13: Resolva o seguinte problema de Laplace para um retângulo:




 uxx + uyy = 0,
 0 < x < a, 0 < y < b,
u(x, 0) = 0, u(x, b) = g(x), 0 ≤ x ≤ a,


 u(0, y) = 0, u(a, y) = 0, 0 < y < b,

onde g : [0, a] → R é uma função dada.


4.8 Exercícios propostos 529

Exercício 14: Resolva o seguinte problema de Laplace no retângulo R = (0, a) × (0, b) com
condições de contorno do tipo Neumann:

 ∆u = uxx + uyy = 0, 0 < x < a, 0 < y < b,


uy (x, 0) = 0, uy (x, b) = 0, 0 ≤ x ≤ a,


 u (0, y) = h(y), ux (a, y) = 0, 0 < y < b.
x

Exercício 15: Resolva o seguinte problema de Laplace no retângulo R = (0, a) × (0, b) com
condições de contorno do tipo misto:


 ∆u = uxx + uyy = 0,
 0 < x < a, 0 < y < b,
uy (x, 0) = 0, u(x, b) = g(x), 0 ≤ x ≤ a,


 u(0, y) = 0, u(a, y) = 0, 0 < y < b.

Exercício 16: (a) Encontre a solução u(r, θ ) da equação de Laplace na região semicircular
0 < r < a e 0 < θ < π satisfazendo o seguinte problema de contorno:
 1 1

 urr + · ur + 2 · uθθ = 0, 0 < r < a e 0 < θ < π,

 r r


u(r, 0) = 0, 0 < r < a,

 u(r, π ) = 0, 0 < r < a,




u(a, θ ) = f (θ ), 0 < θ < π.

Suponha que u(x, y) está bem definida e é limitada na região dada.


(b) Encontre a solução para f (θ ) = θ (π − θ ).

Exercício 17: Use o método da transformada de Fourier para determinar a solução da equação
de Laplace no semiplano:
(
∆u = uxx + uyy = 0, x ∈ R, y > 0
u(x, 0) = f (x), x ∈ R.

Respostas dos exercícios

Exercício 1: (a) hiperbólica em R2; (b) parabólica em R2; (c) elítica em R2; (d) hiperbólica
em R2 ; (e) parabólica em R2; (f) elítica em R2 .

Exercício 2: (a) hiperbólica; (b) parabólica; (c) hiperbólica; (d) parabólica; (e) hiperbólica;
(f) parabólica; (g) elítica; (h) hiperbólica para |x| > 1, parabólica para |x| = 1 e elítica para |x| <
530 4 Aplicações às EDP

1; (i) hiperbólica para y < e −x, parabólica para y = e −x e elítica para y > e −x; (j) hiperbólica
para x < 0, parabólica para x = 0 e elítica para x > 0; (k) hiperbólica para xy(xy + 1) > 0,
parabólica para xy(xy + 1) = 0 e elítica para xy(xy + 1) < 0; (l) hiperbólica para xy(xy − 1) > 0,
parabólica para xy(xy − 1) = 0 e elítica para xy(xy − 1) < 0.
∞  
Exercício 3: u(x, t) = k + ∑ cn · e −(
n2 π 2 α 2 t )/L2 · cos nπ x , onde
n=1 L
Z L  nπ x 
2
cn = f (x) · cos dx, n = 0, 1, 2, 3, . . .
L 0 L

∞  
−[(2n+1)2 π 2 α 2 t ]/4L2 (2n + 1)π x ,
Exercício 4: u(x, t) = ∑ c 2n+1 · e · sen onde
n=0 2L
Z L  
4 (2n + 1)π x
c 2n+1 = f (x) · sen dx.
2L 0 2L

2 2
Exercício 5: Parte (e): un (x, t) = e −µn α t · sen (µn x).
Z 2t
1
Exercício 7: u(x, t) = f (x − 2t) + (k ∗ h)(x, t) = f (x − 2t) + h(x − y) dy, onde k(x, t) =
√ 2 0

· χ [0,2t] (x).
2
Para f (x) = cos x e h(x) = 0: apesar de não ser possível aplicar a transformada de Fourier
diretamente neste problema, pois não existe a transforma de Fourier para a função cos x, ela
satisfaz a equação do calor dada (encontre as derivadas e as substitua na EDP do calor). Assim,
pela solução anterior, basta concluir que u(x, t) = cos(x − 2t).
∞    
(2n + 1)π x (2n + 1)πα t ,
Exercício 8: u(x, t) = ∑ c 2n+1 · sen · cos onde
n=0 2L 2L
Z  
2 L (2n + 1)π x
c 2n+1 = f (x) · sen dx, n = 0, 1, 2, 3, . . .
L 0 2L

∞    
(2n + 1)π x (2n + 1)πα t ,
Exercício 9: u(x, t) = ∑ c 2n+1 · sen · sen onde
n=0 2L 2L
Z L  
4 (2n + 1)π x
c 2n+1 = g(x) · sen dx.
(2n + 1)πα 0 2L

Exercício 10: u(x, t) = e −kt · [ϕ (x − α t) + ψ (x + α t)].

Exercício 11: Parte (a): u(x, t) = e −x · cosh(α t)


4.8 Exercícios propostos 531

B
Parte (b): u(x, t) = A · [ sen (ω x)] · [cos(ω α t)] + · [ sen (µ α t)] · [cos(µ x)]
µα

t2
Exercício 12: (a) u(x, t) = sen (ω x) · cos(ωα t) − ·

cosh (bx) + senh (bα t) 2 t3
(b) u(x, t) = + 2 xt + ·
bα 6
∞  nπ x   nπ y 
Exercício 13: u(x, y) = ∑ cn sen · senh , onde
n=1 a a
Z a  nπ x 
2 1
cn = · g(x) sen dx, n = 1, 2, 3, . . .
a senh (nπ b/a) 0 a

∞  nπ y   
nπ (x − a) ,
Exercício 14: u(x, y) = k + ∑ cn · cos · cosh onde
n=1 b b
Z b  nπ y 
2
cn =  nπ a  k(y) · cos dy, n = 1, 2, 3, . . .
nπ · senh 0 b
b
∞  nπ x   nπ y 
Exercício 15: u(x, y) = ∑ cn · sen · cosh , onde
n=1 a a
Z a  nπ x 
2
cn =   g(x) · sen dx.
nπ b 0 a
a · cosh
a
∞ Z π
n 2
Exercício 16: (a) u(r, θ ) = ∑ cn · r · sen (nθ ), onde cn = n f (θ ) · sen (nθ ) d θ .
n=1 πa 0

4 1 − cos(nπ )
(b) cn = · ·
π an n3
Z ∞
1 y f (t)
Exercício 17: u(x, y) = √ ( f ∗ k)(x, y) = 2 2
dt, onde
2π π −∞ (x − t) + y

2 y
k(x, y) = √ · 2 ·
2π x + y2
532 4 Aplicações às EDP

Apêndice 1: derivadas superiores de funções compostas

Enunciar-se-á, mas sem demonstrar, o teorema do valor médio para funções de uma variável
e que será usado na demonstração do próximo resultado. A demonstração deste teorema pode
ser encontrada em livros de Cálculo ou de Análise.

Teorema 8.1 (do valor médio): Seja f : [a, b] → R uma função contínua e derivável no
intervalo aberto (a, b). Então, existe c ∈ (a, b) tal que
f (b) − f (a)
f 0 (c) = ·
b−a

Teorema 8.2 (Schwarz): Sejam Ω ⊂ R2 um conjunto aberto e f : Ω → R uma função de


classe C2 (Ω) dada por z = f (x, y). Então, as suas derivadas parciais mistas de segunda ordem
são iguais, isto é,
∂2 f ∂2 f
(x, y) = (x, y), (x, y) ∈ Ω.
∂x∂y ∂y∂x
D EMONSTRAÇÃO : Seja (x0 , y0 ) ∈ Ω. Como Ω é aberto, existe ε > 0 tal que o retângulo
R = (x0 − ε , x0 + ε ) × (y0 − ε , y0 + ε ) está contido em Ω. Agora defina ϕ : (−ε , ε ) → R por

ϕ (t) = f (x0 + t, y0 + t) − f (x0 + t, y0 ) − f (x0 , y0 + t) + f (x0 , y0 ).

Observe que se pode escrever

ϕ (t) = f (x0 + t, y0 + t) − f (x0 + t, y0 ) − f (x0 , y0 + t) + f (x0 , y0 )

(8.0) = [ f (x0 + t, y0 + t) − f (x0 , y0 + t)] − [ f (x0 + t, y0 ) − f (x0 , y0 )] .

O próximo passo consiste em aplicar o teorema do valor médio (veja o teorema 8.1), sepa-
radamente, em cada parte entre colchetes no segundo membro de (8.0). Assim, fazendo a = x0
e b = x0 + h, existe θ ∈ (0, 1) tal que
∂f
f (x0 + t, y0 + t) − f (x0 , y0 + t) = (x0 + θ t, y0 + t) [(x0 + t) − x0]
∂x
 
∂f
(8.1) = (x0 + θ t, y0 + t) · t
∂x
e
∂f
f (x0 + t, y0 ) − f (x0 , y0) = (x0 + θ t, y0 )[(x0 + t) − x0 , ]
∂x
 
∂f
(8.2) = (x0 + θ t, y0 ) · t.
∂x
Substituindo (8.1) e (8.2) em (8.0), obtém-se
4.8 Exercícios propostos 533

   
∂f ∂f
ϕ (t) = (x0 + θ t, y0 + t) · t − (x0 + θ t, y0 ) · t
∂x ∂x
 
∂f ∂f
(8.3) = (x0 + θ t, y0 + t) − (x0 + θ t, y0 ) · t.
∂x ∂x
Observe-se, agora, que a derivada parcial de f em relação a x que aparece no segundo membro
de (8.3) é diferenciável (pois f ∈ C2(Ω), por hipótese) e que a primeira coordenada é constante,
mas com a segunda variando de y0 até y0 + t. Isto permite usar novamente o teorema do valor
médio, porém agora na segunda coordenada. Fazendo a = y0 e b = y0 + t no teorema do valor
médio, tem-se que existe θ ∈ (0, 1) tal que

∂f ∂f ∂2 f
(x0 + θ t, y0 + t) − (x0 + θ t, y0 ) = (x0 + θ t, y0 + θ t) [(y0 + t) − y0]
∂x ∂x ∂y∂x
 2 
∂ f
(8.4) = (x0 + θ t, y0 + θ t) · t.
∂y∂x
Substituindo (8.4) em (8.3), obtém-se
 2 
∂ f
ϕ (t) = (x0 + θ t, y0 + θ t) · t 2 ,
∂y∂x
donde segue-se que
ϕ (t) ∂2 f
= (x0 + θ t, y0 + θ t).
t2 ∂y∂x
Como f é de classe C2 (Ω), então a derivada parcial de segunda ordem e mista que aparece
acima é contínua em (x0 , y0 ). Logo, existe limite para t → 0 no segundo membro e, pela igual-
dade, também existe limite para t → 0 no primeiro membro. Portanto,
 2 
ϕ (t) ∂ f
lim = lim (x0 + θ t, y0 + θ t)
t→0 t 2 t→0 ∂ y ∂ x

∂2 f
(8.5) = (x0 , y0 ) .
∂y∂x
A ideia inicial da demonstração foi definir uma função ϕ , reescrevê-la em uma forma con-
veniente para aplicar o teorema do valor médio (veja a expressão (8.0) dada anteriormente)
e chegar a expressão em (8.5). Para mostrar a igualdade entre as duas derivadas parciais de
segunda ordem e mistas, é preciso reescrever em outra forma, igualmente conveniente, para
chegar-se a outra derivada parcial segunda mista. Todo o procedimento a seguir é análogo ao
anterior.
Assim, deve-se reescrever ϕ do seguinte modo:

ϕ (t) = f (x0 + t, y0 + t) − f (x0 + t, y0 ) − f (x0 , y0 + t) + f (x0 , y0 )

(8.6) = [ f (x0 + t, y0 + t) − f (x0 + t, y0 )] − [ f (x0 , y0 + t) − f (x0 , y0 )] .


534 4 Aplicações às EDP

A próxima etapa consiste em aplicar o teorema do valor médio (veja o teorema 8.1), sepa-
radamente, em cada parte entre colchetes no segundo membro de (8.6). Assim, fazendo a = y0
e b = y0 + h naquele teorema, tem-se que existe θ ∈ (0, 1) tal que
∂f
f (x0 + t, y0 + t) − f (x0 + t, y0 ) = (x0 + t, y0 + θ t)[(y0 + t) − y0]
∂y
 
∂f
(8.7) = (x0 + t, y0 + θ t) · t
∂y
e
∂f
f (x0 , y0 + t) − f (x0 , y0 ) = (x0 , y0 + θ t)[(y0 + t) − y0]
∂y
 
∂f
(8.8) = (x0 , y0 + θ t) · t.
∂y
Substituindo (8.7) e (8.8) em (8.6), obtém-se
   
∂f ∂f
ϕ (t) = (x0 + t, y0 + θ t) · t − (x0t, y0 + θ t) · t
∂y ∂y
 
∂f ∂f
(8.9) = (x0 + t, y0 + θ t) − (x0 , y0 + θ t) · t.
∂y ∂y
Observe-se, agora, que a derivada parcial de f em relação a y que aparece no segundo membro
de (8.9) é diferenciável (pois f ∈ C2 (Ω), por hipótese) e que a segunda coordenada é constante,
mas com a primeira variando de x0 até x0 + t. Isto permite usar novamente o teorema do valor
médio, porém agora na segunda coordenada. Fazendo a = x0 e b = x0 + t no teorema do valor
médio, tem-se que existe θ ∈ (0, 1) tal que

∂f ∂f ∂2 f
(x0 + t, y0 + θ t) − (x0 , y0 + θ t) = (x0 + θ t, y0 + θ t)[(x0 + t) − x0]
∂y ∂y ∂x∂y
 2 
∂ f
(8.10) = (x0 + θ t, y0 + θ t) · t.
∂x∂y
Substituindo (8.10) em (8.9), obtém-se
 2 
∂ f
ϕ (t) = (x0 + θ t, y0 + θ t) · t 2 ,
∂x∂y
donde segue-se que
ϕ (t) ∂2 f
= (x0 + θ t, y0 + θ t).
t2 ∂x∂y
Como f é de classe C2 (Ω), então a derivada parcial de segunda ordem e mista que aparece
acima é contínua em (x0 , y0 ). Logo, existe limite para t → 0 no segundo membro e, pela igual-
dade, também existe limite para t → 0 no primeiro membro. Portanto,
4.8 Exercícios propostos 535

 2 
ϕ (t) ∂ f
lim = lim (x0 + θ t, y0 + θ t)
t→0 t 2 t→0 ∂ x ∂ y

∂2 f
(8.11) = (x0 , y0 ) .
∂x∂y
Para finalizar, basta notar que os primeiros membros nas expressões obtidas em (8.5) e (8.11)
são iguais, de modo que devem ser iguais os respectivos segundos membros, isto é,
∂2 f ∂2 f
(x0 , y0 ) = (x0 , y0 ),
∂y∂x ∂x∂y
o que demonstra este teorema.

É importante ressaltar a hipótese de a função ser de classe C2 para poder afirmar que as duas
derivadas parciais mistas são iguais. Caso isto não seja observado, a igualdade poderá deixar de
existir. O próximo exemplo ilustra esta situação.

Exemplo 8.1: Seja f : R2 → R uma função definida por



 x y3 ,

2 2
se (x, y) 6= (0, 0),
f (x) = x + y


0, se (x, y) = (0, 0).

É fácil constatar que nos pontos de R2 \ {(0, 0)}, f possui derivadas parciais de todas as
ordens. O problema que pode surgir reside na origem. Para determinar as derivadas parciais
segundas será necessário encontrar as derivadas parciais primeiras.
Para a derivada parcial de f em relação a x em (0, y), com y 6= 0, tem-se
 
f (0 + h, y) − f (0, y) 1 hy3 0.y3
= −
h h h2 + y2 02 + y2
hy3 y3
= = ·
h (h2 + y2) h2 + y2
O último membro acima tem limite para h → 0, de modo que existe limite para h → 0 no
primeiro membro. Assim,
∂f f (0 + h, y) − f (0, y)
(0, y) = lim
∂x h→0 h
 
y3
= lim
h→0 h2 + y2

y3 y3
= = = y.
h2 + y2 y2
536 4 Aplicações às EDP

Agora determina-se a derivada parcial segunda mista, primeiro em relação a x e depois em


relação a y. Tem-se:
  
∂2 f ∂ ∂f
(0, 0) = (0, 0)
∂y∂x ∂y ∂x
∂f ∂f
(0, k) − (0, 0)
= lim ∂ x ∂x
k→0 k
 
k−0
= lim
k→0 k

(8.12) = lim 1 = 1.
k→0

Analogamente, para a derivada parcial de f em relação a y em (x, 0), com x 6= 0, tem-se


 
f (x, 0 + k) − f (x, 0) 1 x k3 x.03
= −
h k x2 + k2 x2 + 02
k3 x
=
k (x2 + k2)
k2 x
= ·
x2 + k2
O último membro acima tem limite para k → 0, de modo que existe limite para k → 0 no
primeiro membro. Assim,
∂f f (x, 0 + k) − f (x, 0)
(x, 0) = lim
∂y k→0 k
 2 
k x 0
= lim 2 2
= 2 = 0.
k→0 x + k x
Em seguida, determina-se a derivada parcial segunda mista, primeiro em relação a y e depois
em relação a x. Tem-se:
  
∂2 f ∂ ∂f
(0, 0) = (0, 0)
∂x∂y ∂x ∂y
∂f ∂f
(h, 0) − (0, 0)
∂y ∂y
= lim
h→0 h
 
0−0
(8.13) = lim = lim 0 = 0.
h→0 h h→0

Segue-se de (8.12) e (8.13) que as derivadas parciais segundas mistas, na origem, são diferen-
tes, isto é,
4.8 Exercícios propostos 537

∂2 f ∂2 f
(0, 0) = 1 6= 0 = (0, 0).
∂y∂x ∂x∂y

Os próximos resultados apresentam regrais gerais para o cálculo de derivadas de funções


compostas de duas variáveis. Este procedimento é muito comum e útil no estudos de equações
diferenciais parciais (EDP). Por outro lado, observa-se que resultados gerais sempre exigem
hipóteses mais fortes, que implicam em uso mais restrito.

Proposição 8.1 (regra da cadeia – 1o caso): Sejam I ⊂ R um intervalo, Ω ⊂ R2 um con-


junto aberto, f : Ω → R uma função de classe C2 (Ω) e σ : I → Ω um caminho duas vezes
diferenciável. Então, z(t) = f [σ (t)] é duas vezes diferenciável e vale a fórmula geral
 2  
d 2z ∂ z d 2x ∂ 2z dx ∂ 2 z dx dy ∂ z d 2y ∂ 2 z dy 2
(8.14) = · + · +2 · · + · + · ·
dt 2 ∂ x dt 2 ∂ x2 dt ∂ x ∂ y dt dt ∂ y dt 2 ∂ y2 dt

D EMONSTRAÇÃO : Sendo σ : I → Ω denotado por σ (t) = (x(t), y(t)), pode-se escrever a


composição de f com σ na seguinte forma: z(t) = f (x(t), y(t)). Logo faz sentido desejar derivar
z(t) em relação a t. Isso pode ser feito através da regra da cadeia, o que é possível, visto que as
funções envolvidas são duas vezes diferenciáveis. Tem-se:
dz ∂ z dx ∂ z dy
(8.15) = · + · ·
dt ∂ x dt ∂ y dt
Agora aplica-se a regra do produto em (8.15) para obter a seguinte expressão para a derivada
segunda de z em relação a t:
   
d 2z d dz d ∂ z dx ∂ z dy
= = · + ·
dx2 dt dt dt ∂ x dt ∂ y dt
     
d ∂z dx ∂ z d dx
= · + · +
dt ∂ x dt ∂ x dt dt
     
d ∂z dy ∂ z d dy
+ · + ·
dt ∂ y dt ∂ y dt dt
     
d ∂z dx ∂ z d 2 x d ∂z dy ∂ z d 2 y
(8.16) = · + · 2 + · + · ·
dt ∂ x dt ∂ x dt dt ∂ y dt ∂ y dt 2
Para continuar é preciso determinar as seguintes derivadas
   
d ∂z d ∂z
e
dt ∂ x dt ∂ y
e depois retornar em (8.16) substituindo-as.
Para calcular as duas derivadas acima é necessário recorrer à expressão (8.15) novamente,
mas com tal expressão aplicada a ∂ z/∂ x e ∂ z/∂ y e não a z. Explica-se: as derivadas ∂ z/∂ x e ∂ z/∂ y
538 4 Aplicações às EDP

são funções de x e y e estas são funções de t. Ou seja,


∂z ∂z
(x(t), y(t)) e (x(t), y(t)) ·
∂x ∂y
Isto obriga a observar que a necessidade de derivar, parcialmente em relação a x e y, cada
uma das expressões anteriores, para só então derivar em relação a t. De modo explícito:
   
d ∂z d ∂z
= (x(t), y(t))
dt ∂ x dt ∂ x
     
∂ ∂z dx ∂ ∂z dy
= · + ·
∂x ∂x dt ∂y ∂x dtx
∂ 2z dx ∂ 2 z dy
(8.17) = · + ·
∂ x2 dt ∂ y ∂ x dt
e
   
d ∂z d ∂z
= (x(t), y(t))
dt ∂y dt ∂ y
     
∂ ∂z dx ∂ ∂z dy
= · + ·
∂x ∂y dt ∂y ∂y dt
∂ 2 z dx ∂ 2z dy
(8.18) = · + · ·
∂ x ∂ y dt ∂ y2 dt
Assim sendo, substitui-se (8.17) e (8.18) em (8.16) para obter
     
d 2z d ∂z dx ∂ z d 2 x d ∂z dy ∂ z d 2 y
= · + · + · + ·
dt 2 dt ∂ x dt ∂ x dt 2 dt ∂ y dt ∂ y dt 2
 2 
∂ z dx ∂ 2z dy dx ∂ z d 2 x
= · + · · + · +
∂ x2 dt ∂ y ∂ x dt dt ∂ x dt 2
 2 
∂ z dx ∂ 2z dy dy ∂ z d 2y
+ · + · · + ·
∂ x ∂ y dt ∂ y2 dt dt ∂ y dt 2
 
∂ 2 z dx 2 ∂ 2z dx dy ∂ z d 2 x
= 2· + · · + · +
∂x dt ∂ y ∂ x dt dt ∂ x dt 2
 
∂ 2 z dx dy ∂ 2 z dy 2 ∂ z d 2y
+ · · + · + ·
∂ x ∂ y dt dt ∂ y2 dt ∂ y dt 2
 
∂ z d 2x ∂ 2z dx 2 ∂ 2 z dx dy
= · 2+ 2· + · · +
∂ x dt ∂x dt ∂ y ∂ x dt dt
 
∂ z d 2y ∂ 2z dy 2 ∂ 2 z dx dy
(8.19) + · 2+ 2· + · · ·
∂ y dt ∂y dt ∂ x ∂ y dt dt
4.8 Exercícios propostos 539

Como a função é de classe C2 , então as derivadas parciais mistas que aparecem em (8.19)
serão iguais. Com isso, obtém-se a seguinte regra, também dita da cadeia:
 2  
d 2z ∂ z d 2x ∂ 2z dx ∂ 2 z dx dy ∂ z d 2y ∂ 2 z dy 2
(8.20) = · + · +2 · · + · + · ·
dt 2 ∂ x dt 2 ∂ x2 dt ∂ x ∂ y dt dt ∂ y dt 2 ∂ y2 dt
Com isso, encerra-se a demonstração da proposição.

Proposição 8.2 (regra da cadeia – 2a caso): Sejam X ⊂ R2 e Ω ⊂ R2 conjuntos abertos e


g : X → R2 função de classe C2 (X) tal que g(X) ⊂ Ω. Seja ainda f : Ω → R uma função de
classe C2(Ω). Então, z(u, v) = f [g(u, v)] é duas vezes diferenciável e vale a fórmula geral
 2  2
∂ 2z ∂ 2z ∂x ∂ z ∂ 2x ∂ 2z ∂ x ∂ y ∂ 2z ∂y ∂ z ∂ 2y
(8.21) = · + · +2 · · + · + ·
∂ u2 ∂ x2 ∂u ∂ x ∂ u2 ∂ x ∂ y ∂ u ∂ u ∂ y2 ∂u ∂ y ∂ u2
e
   
∂ 2z ∂ 2 z ∂ x 2 ∂ z ∂ 2 x ∂ 2 z ∂ x ∂ y ∂ 2z ∂ y 2 ∂ z ∂ 2y
(8.22) = · + · +2 · · + · + · ·
∂ v2 ∂ x2 ∂v ∂ x ∂ v2 ∂ x ∂ y ∂ v ∂ v ∂ y2 ∂v ∂ y ∂ v2

D EMONSTRAÇÃO : Denotando z = f (x, y) e g(u, v) = (x(u, v), y(u, v), a composição de f


com g pode ser escrita como
z(u, v) = f [ x(u, v), y(u, v)] ,
isto é, é possível interpretar z como uma função de duas variáveis u e v.
Assim, em virtude das hipóteses de serem f e g funções de classe C2 , faz sentido derivar duas
vezes a função composta acima.
O próximo passo consiste em estabelecer expressões análogas a (8.20) para as derivadas
parciais de z em relação a u e v e, em seguida, as derivadas parciais segundas. Os procedimentos
são semelhantes ao caso anterior, porém deve-se observar, agora, que x e y são funções de duas
derivadas, de modo que a regra do produto deve levar em consideração as derivadas parciais
destas duas últimas funções. Assim, para a derivada parcial de z em relação a u, tem-se:
∂z ∂z ∂x ∂z ∂y
= · + · ·
∂u ∂x ∂u ∂y ∂u
Agora determina-se a derivada parcial segunda de z em relação a u. Tem-se:
 
∂ 2z ∂ ∂z ∂x ∂z ∂y
= · + ·
∂ u2 ∂ u ∂ x ∂ u ∂ y ∂ u
     
∂ ∂z ∂x ∂z ∂ ∂x
= · + · +
∂u ∂x ∂u ∂x ∂u ∂u
540 4 Aplicações às EDP

 
   
∂ ∂z ∂y ∂z ∂ ∂y
+ · + ·
∂u ∂y ∂u ∂y ∂u ∂u
     
∂ ∂z ∂ x ∂ z ∂ 2x ∂ ∂z ∂ y ∂ z ∂ 2y
(8.23) = · + · 2+ · + · ·
∂u ∂x ∂u ∂x ∂u ∂u ∂y ∂ u ∂ y ∂ u2
A etapa seguinte consiste em determinar expressões para as seguintes derivadas:
   
∂ ∂z ∂ ∂z
e ·
∂u ∂x ∂u ∂y
Para isso é importante observar que
       
∂ ∂z ∂ ∂z ∂ ∂z ∂ ∂z
= (x(u, v), y(u, v)) e = (x(u, v), y(u, v)) ,
∂u ∂x ∂u ∂x ∂u ∂y ∂u ∂y
isto é, que as derivadas parciais são funções compostas.
Assim, tem-se
       
∂ ∂z ∂ ∂z ∂x ∂ ∂z ∂y
= · + ·
∂u ∂x ∂x ∂x ∂u ∂y ∂x ∂u
∂ 2z ∂ x ∂ 2z ∂ y
(8.24) = · + · ·
∂ x2 ∂ u ∂ y ∂ x ∂ u
e
       
∂ ∂z ∂ ∂z ∂x ∂ ∂z ∂y
= · + ·
∂u ∂y ∂x ∂y ∂u ∂y ∂y ∂u
∂ 2z ∂ x ∂ 2z ∂ y
(8.25) = · + · ·
∂ x ∂ y ∂ u ∂ y2 ∂ u
Substituindo (8.24) e (8.25) em (8.23), encontra-se
     
∂ 2z ∂ ∂z ∂ x ∂ z ∂ 2x ∂ ∂z ∂ y ∂ z ∂ 2y
= · + · + · + ·
∂ u2 ∂u ∂x ∂ u ∂ x ∂ u2 ∂u ∂y ∂ u ∂ y ∂ u2
 2 
∂ z ∂x ∂ 2 z ∂ y ∂ x ∂ z ∂ 2x
= · + · · + · +
∂ x2 ∂ u ∂ y ∂ x ∂ u ∂ u ∂ x ∂ u2
 2 
∂ z ∂ x ∂ 2 z ∂ y ∂ y ∂ z ∂ 2y
+ · + · · + ·
∂ x ∂ y ∂ u ∂ y2 ∂ u ∂ u ∂ y ∂ u2
∂ 2z ∂ x ∂ x ∂ 2z ∂ y ∂ x ∂ z ∂ 2 x
= · · + · · + · +
∂ x2 ∂ u ∂ u ∂ y ∂ x ∂ u ∂ u ∂ x ∂ u2
∂ 2z ∂ x ∂ y ∂ 2 z ∂ y ∂ y ∂ z ∂ 2 y
+ · · + · · + ·
∂ x ∂ y ∂ u ∂ u ∂ y2 ∂ u ∂ u ∂ y ∂ u2
 2
∂ 2z ∂x ∂ z ∂ 2x ∂ 2z ∂ y ∂ x
= 2· + · 2+ · · +
∂x ∂u ∂x ∂u ∂y∂x ∂u ∂u
4.8 Exercícios propostos 541

 2
∂ 2 z ∂ x ∂ y ∂ 2z ∂y ∂ z ∂ 2y
(8.26) + · · + · + · ·
∂ x ∂ y ∂ u ∂ u ∂ y2 ∂u ∂ y ∂ u2

Considerando funções de classe C2, então as derivadas parciais mixtas serão iguais, isto é,

∂ 2z ∂ 2z
= ·
∂x∂y ∂y∂x
Portanto, usando este fato em (8.26), obtém-se
 2  2
∂ 2 z ∂ 2z ∂x ∂ z ∂ 2x ∂ 2z ∂ x ∂ y ∂ 2z ∂y ∂ z ∂ 2y ,
= · + · + 2 · · + · + ·
∂ u2 ∂ x2 ∂u ∂ x ∂ u2 ∂ x ∂ y ∂ u ∂ u ∂ y2 ∂u ∂ y ∂ u2
que é a expressão indicada em (8.21).
Para obter a derivada parcial segunda de z em relação a v, dada em (8.22), o procedimento é
análogo. Inicia-se determinando a derivada parcial de z em relação a v:
∂z ∂z ∂x ∂z ∂y
= · + · ·
∂v ∂x ∂v ∂y ∂v
Em seguida, deriva-se a expressão anterior usando a regra do produto para determinar a
derivada segunda de z em relação a v:
 
∂ 2z ∂ ∂z ∂x ∂z ∂y
= · + ·
∂ v2 ∂ v ∂ x ∂ v ∂ y ∂ v
     
∂ ∂z ∂x ∂z ∂ ∂x
= · + · +
∂v ∂x ∂v ∂x ∂v ∂v
     
∂ ∂z ∂y ∂z ∂ ∂y
+ · + ·
∂v ∂y ∂v ∂y ∂v ∂v
     
∂ ∂z ∂ x ∂ z ∂ 2x ∂ ∂z ∂ y ∂ z ∂ 2y
(8.27) = · + · 2+ · + · ·
∂v ∂x ∂v ∂x ∂v ∂v ∂y ∂ v ∂ y ∂ v2
O próximo passo consiste em determinar expressões para as derivadas
   
∂ ∂z ∂ ∂z ,
e
∂v ∂x ∂v ∂y
não se esquecendo que em tais derivadas x e y dependem de u e v.
Deste modo,
       
∂ ∂z ∂ ∂z ∂x ∂ ∂z ∂y
= · + ·
∂v ∂x ∂x ∂x ∂v ∂y ∂x ∂v
∂ 2z ∂ x ∂ 2z ∂ y
(8.28) = · + ·
∂ x2 ∂ v ∂ y ∂ x ∂ v
e
542 4 Aplicações às EDP

       
∂ ∂z ∂ ∂z ∂x ∂ ∂z ∂y
= · + ·
∂v ∂y ∂x ∂y ∂v ∂y ∂y ∂v
∂ 2z ∂ x ∂ 2z ∂ y
(8.29) = · + · ·
∂ x ∂ y ∂ v ∂ y2 ∂ v
Substituindo (8.28) e (8.29) em (8.27), encontra-se
     
∂ 2z ∂ ∂z ∂ x ∂ z ∂ 2x ∂ ∂z ∂ y ∂ z ∂ 2y
= · + · + · + ·
∂ v2 ∂v ∂x ∂ v ∂ x ∂ v2 ∂v ∂y ∂ v ∂ y ∂ v2
 2 
∂ z ∂x ∂ 2z ∂ y ∂ x ∂ z ∂ 2 x
= · + · · + · +
∂ x2 ∂ v ∂ y ∂ x ∂ v ∂ v ∂ x ∂ v2
 2 
∂ z ∂ x ∂ 2 z ∂ y ∂ y ∂ z ∂ 2y
+ · + · · + ·
∂ x ∂ y ∂ v ∂ y2 ∂ v ∂ v ∂ y ∂ v2
∂ 2z ∂ x ∂ x ∂ 2 z ∂ y ∂ x ∂ z ∂ 2x
= · · + · · + · +
∂ x2 ∂ v ∂ v ∂ y ∂ x ∂ v ∂ v ∂ x ∂ v2
∂ 2 z ∂ x ∂ y ∂ 2z ∂ y ∂ y ∂ z ∂ 2y
+ · · + · · + ·
∂ x ∂ y ∂ v ∂ v ∂ y2 ∂ v ∂ v ∂ y ∂ v2
 
∂ 2z ∂ x 2 ∂ z ∂ 2x ∂ 2z ∂ y ∂ x
= 2· + · 2+ · · +
∂x ∂v ∂x ∂v ∂y∂x ∂v ∂v
 
∂ 2 z ∂ x ∂ y ∂ 2z ∂ y 2 ∂ z ∂ 2 y
(8.30) + · · + · + · ·
∂ x ∂ y ∂ v ∂ v ∂ y2 ∂v ∂ y ∂ v2

Considerando funções de classe C2, então as derivadas parciais mixtas serão iguais, isto é,

∂ 2z ∂ 2z
= ·
∂x∂y ∂y∂x
Portanto, usando este fato em (8.30), obtém-se
   
∂ 2 z ∂ 2z ∂ x 2 ∂ z ∂ 2x ∂ 2z ∂ x ∂ y ∂ 2z ∂ y 2 ∂ z ∂ 2y ,
= · + · +2 · · + · + ·
∂ v2 ∂ x2 ∂v ∂ x ∂ v2 ∂ x ∂ y ∂ v ∂ v ∂ y2 ∂v ∂ y ∂ v2
que é a expressão dada em (8.22).

Observação 8.1: O leitor poderá revisitar a expressão obtida em (8.5) (regra de derivação
para uma variável) e observar que ela é um caso particular das expressões determinadas em
(8.21) e (8.22): basta tratar v como constante nestas duas últimas fórmulas para encontrar a
primeira.
4.8 Exercícios propostos 543

Apêndice 2: o laplaciano em outras coordenadas

O laplaciano em duas dimensões e em coordenadas retangulares é dado por

∂ 2u ∂ 2u
∆u = + ·
∂ x2 ∂ y2
A proposição abaixo exibe o laplaciano em coordenadas polares.

Proposição 8.3 (laplaciano em coordenadas polares): Sejam Ω ⊂ R2 e u : Ω → R uma


função de classe C2 (Ω). Então, o laplaciano em coordenadas polares é dado por

∂ 2u 1 ∂ 2u 1 ∂u
(8.0) ∆u = + · + · ·
∂ r2 r2 ∂ θ 2 r ∂r
D EMONSTRAÇÃO : Considere um sistema de coordenadas polares dado pelas seguintes equações:

x = r cos θ e y = r sen θ .

O passo seguinte consiste em compor a função u = u(x, y) com as funções x = r cos θ e


y = r sen θ para, em seguida, expressar ∆u em termos de r e θ . Assim, de

u = u(r cos θ , r sen θ ),

obtém-se as seguinte derivadas parciais pelas regras de derivação


∂u ∂u ∂r ∂u ∂θ ,
(8.1) = · + ·
∂x ∂r ∂x ∂θ ∂x
∂u ∂u ∂r ∂u ∂θ
(8.2) = · + · ·
∂y ∂r ∂y ∂θ ∂y
Agora é preciso determinar as seguintes derivadas parciais:
∂r , ∂θ , ∂r ∂θ
e ·
∂x ∂x ∂y ∂y
Para isso, usa-se as diferenciais de

x = r cos θ e y = r sen θ ,

isto é
(
dx = cos θ dr − r sen θ d θ ,
(8.3)
dy = sen θ dr + r cos θ d θ .

Multiplicando a primeira equação em (8.3) por cos θ e multiplicando a segunda equação por
sen θ , obtém-se
544 4 Aplicações às EDP

(
cos θ dx = cos2 θ dr − r sen θ cos θ d θ ,
sen θ dy = sen 2 θ dr + r sen θ cos θ d θ ,
que somadas as equações resulta em

dr = cos θ dx + sen θ dy.

Agora multiplica-se a primeira equação em (8.3) por − sen θ e a segunda equação por cos θ ,
obtém-se (
− sen θ dx = − sen θ cos θ dr + r sen 2 θ d θ ,
cos θ dy = sen θ cos θ dr + r sen 2 θ d θ ,
que somadas as equações resulta em
sen θ cos θ
r d θ = − sen θ dx + cos θ dy ⇒ dθ = − dx + dy.
r r
Logo, tem-se um sistema em termos de dx e dy:


 dr = cos θ dx + sen θ dy,
(8.4)
 d θ = − sen θ dx + cos θ dy.

r r
Por outro lado, tem-se que

 ∂r ∂r


 dr = dx + dy,
∂x ∂y
(8.5)

 ∂θ ∂θ

 dθ = dx + dy.
∂x ∂y
Comparando os sistemas (8.4) e (8.5), conclui-se que
∂r ∂r ∂θ sen θ , ∂θ cos θ
(8.6) = cos θ , = sen θ , =− = ·
∂x ∂y ∂x r ∂y r
Substituindo (8.6) nas equações (8.1) e (8.2), obtém-se

∂u ∂u sen θ ∂ u ,
(8.7) = cos θ · − ·
∂x ∂r r ∂θ

∂u ∂u cos θ ∂ u
(8.8) = sen θ · + · ·
∂y ∂r r ∂θ
Com isso, consegue-se estabelecer expressões para as derivadas parciais primeiras para u e
que permitirão regras gerais para representar as derivadas parciais segundas em termos de r e θ .
Assim, para determinar uma regra geral para a derivada parcial de segunda ordem para u duas
vezes em relação a x, basta usar a equação (8.7), a regra do produto e observar que
4.8 Exercícios propostos 545

 
∂ 2u ∂ ∂u
2
=
∂x ∂x ∂x
     
(8.7) ∂ ∂u sen θ ∂ ∂ u
= cos θ −
∂r ∂x r ∂θ ∂x
  
(8.7) ∂ ∂ u sen θ ∂ u
= cos θ cos θ · − · −
∂r ∂r r ∂θ
  
sen θ ∂ ∂ u sen θ ∂ u
− cos θ · − ·
r ∂θ ∂r r ∂θ
    
∂ ∂u ∂ sen θ ∂ u
= cos θ cos θ · − · −
∂r ∂r ∂r r ∂θ
    
sen θ ∂u ∂ ∂u ∂ sen θ ∂ u
− − sen θ · + cos θ · − ·
r ∂r ∂θ ∂r ∂θ r ∂θ
 
d.p. ∂ 2 u sen θ ∂ u sen θ ∂ 2 u
= cos θ cos θ · 2 + 2 · − · −
∂r r ∂θ r ∂ r∂ θ
 
sen θ ∂u ∂ 2u cos θ ∂ u sen θ ∂ 2 u
− − sen θ · + cos θ · − · − ·
r ∂r ∂θ∂r r ∂θ r ∂θ2
∂ 2u sen θ · cos θ ∂ u sen θ · cos θ ∂ 2 u
= cos2 θ · + · − · +
∂ r2 r2 ∂θ r ∂ r∂ θ
sen 2 θ ∂ u sen θ · cos θ ∂ 2 u sen θ · cos θ ∂ u sen 2 θ ∂ 2u
+ · − · + · + ·
r ∂r r ∂θ∂r r2 ∂θ r2 ∂θ2
∂ 2u sen θ · cos θ ∂ 2u sen 2θ ∂ 2 u
= cos2 θ · − 2 + · +
∂ r2 r ∂ r∂ θ r2 ∂θ2
sen 2 θ ∂ u sen θ · cos θ ∂ u
(8.9) + · +2 · ·
r r r2 ∂θ
onde usou (8.7) mais de uma vez e, em seguida, a regra de derivação do produto (d.p.). Além
disso, por hipótese u ∈ C2 , de modo que
∂ 2u ∂ 2u
= ·
∂ θ ∂ r ∂ r∂ θ
Agora determina-se a derivada parcial de segunda ordem em relação a y da função u(x, y). O
procedimento é análogo. Tem-se:
 
∂ 2u ∂ ∂u
2
=
∂y ∂y ∂y
     
(8.8) ∂ ∂u cos θ ∂ ∂ u
= sen θ +
∂r ∂y r ∂θ ∂y
546 4 Aplicações às EDP

 
(8.8) ∂ ∂ u cos θ ∂ u
= sen θ sen θ · + · +
∂r ∂r r ∂θ
  
cos θ ∂ ∂ u cos θ ∂ u
+ sen θ · + ·
r ∂θ ∂r r ∂θ
    
∂ ∂u ∂ cos θ ∂ u
= sen θ sen θ · + · +
∂r ∂r ∂r r ∂θ
    
cos θ ∂u ∂ ∂u ∂ cos θ ∂ u
+ cos θ · + sen θ · + ·
r ∂r ∂θ ∂r ∂θ r ∂θ
 
d.p. ∂ 2 u cos θ ∂ u cos θ ∂ 2 u
= sen θ sen θ · 2 − 2 · + · +
∂r r ∂θ r ∂ r∂ θ
 
cos θ ∂u ∂ 2u sen θ ∂ u cos θ ∂ 2 u
+ cos θ · + sen θ · − · + ·
r ∂r ∂θ∂r r ∂θ r ∂θ2
∂ 2u sen θ · cos θ ∂ u sen θ · cos θ ∂ 2u
= sen 2 θ · − · + · +
∂ r2 r2 ∂θ r ∂ r∂ θ
cos2 θ ∂ u sen θ · cos θ ∂ 2u sen θ · cos θ ∂ u cos2 θ ∂ 2u
+ · + · − · + 2 · 2
r ∂r r ∂θ∂r r2 ∂θ r ∂θ
∂ 2u
2 sen θ cos θ ∂ 2 u cos2 θ ∂ 2 u
= sen θ · 2 + 2 · + 2 · +
∂r r ∂ r∂ θ r ∂θ2
cos2 θ ∂ u sen θ · cos θ ∂ u ,
(8.10) + · −2 ·
r ∂r r2 ∂θ
onde as passagens acima se justificam como antes.
Agora soma-se (8.9) e (8.10) para encontrar o laplaciano em coordenadas polares. Assim,

∂ 2u ∂ 2u
∆u = +
∂ x2 ∂ y2

∂ 2u sen θ · cos θ ∂ 2u sen 2θ ∂ 2 u


= cos2 θ · − 2 + · +
∂ r2 r ∂ r∂ θ r2 ∂θ2
!
sen 2 θ ∂ u sen θ · cos θ ∂ u
+ · +2 · +
r r r2 ∂θ

∂ 2u sen θ cos θ ∂ 2u cos2 θ ∂ 2u


+ sen 2 θ ·+ 2 · + · 2+
∂ r2 r ∂ r∂ θ r2 ∂θ
!
cos2 θ ∂ u sen θ · cos θ ∂ u
+ · −2 ·
r ∂r r2 ∂θ

 ∂ 2u sen 2θ + cos2 θ ∂ 2 u sen 2 θ + cos2 θ ∂ u


= cos2 θ + sen 2 θ + · + ·
∂ r2 r2 ∂θ2 r ∂r
4.8 Exercícios propostos 547

∂ 2u 1 ∂ u 1 ∂u
= 2
+ 2· 2
+ · ,
∂r r ∂θ r ∂r
como desejado.

O laplaciano em três dimensões e em coordenadas retangulares é dado por


∂ 2 u ∂ 2u ∂ 2u
∆u = + + ·
∂ x2 ∂ y2 ∂ z2
A próxima proposição apresenta o laplaciano em coordenadas cilíndricas. Apesar do lapla-
ciano em coordenadas cilíndricas seguir de forma quase imediata ao laplaciano em coordenadas
polares, as contas serão refeitas e apresentadas a seguir.

Proposição 8.4 (laplaciano em coordenadas cilíndricas): Sejam Ω ⊂ R3 e u : Ω → R uma


função de classe C2 (Ω). Então, o laplaciano em coordenadas cilíndricas é dado por

∂ 2u 1 ∂ 2u 1 ∂u ∂ 2u
(8.11) ∆u = 2 + 2 · + · + ·
∂r r ∂θ2 r ∂r ∂ z2
D EMONSTRAÇÃO : Seja u = u(x, y, z), onde (x, y, z) ∈ Ω ⊂ R3 . Considere um sistema de co-
ordenadas polares dado pelas seguintes equações:

x = r cos θ , y = r sen θ e z = z.

O passo seguinte consiste em compor a função u = u(x, y, z) com as funções x = r cos θ ,


y = r sen θ e z para, em seguida, expressar ∆u em termos de r, θ e z. Assim, de

u = u(r cos θ , r sen θ , z),

obtém-se as seguinte derivadas parciais pelas regras de derivação

∂u ∂u ∂r ∂u ∂θ ,
(8.12) = · + ·
∂x ∂r ∂x ∂θ ∂x
∂u ∂u ∂r ∂u ∂θ ,
(8.13) = · + ·
∂y ∂r ∂y ∂θ ∂y

∂u ∂u
(8.14) = ·
∂z ∂z
Agora é preciso determinar as seguintes derivadas parciais:

∂r , ∂θ , ∂r ∂θ
e ·
∂x ∂x ∂y ∂y
548 4 Aplicações às EDP

Note que não é preciso calcular a derivada parcial de u em relação a z, pois ela é imediata.
Para isso, usa-se as diferenciais de

x = r cos θ e y = r sen θ ,

isto é
(
dx = cos θ dr − r sen θ d θ ,
(8.15)
dy = sen θ dr + r cos θ d θ .

Multiplicando a primeira equação em (8.15) por cos θ e multiplicando a segunda equação por
sen θ , obtém-se (
cos θ dx = cos2 θ dr − r sen θ cos θ d θ ,
sen θ dy = sen 2 θ dr + r sen θ cos θ d θ ,
que somadas as equações resulta em

dr = cos θ dx + sen θ dy.

Agora multiplica-se a primeira equação em (8.15) por − sen θ e a segunda equação por cos θ ,
obtém-se (
− sen θ dx = − sen θ cos θ dr + r sen 2 θ d θ ,
cos θ dy = sen θ cos θ dr + r sen 2 θ d θ ,
que somadas as equações resulta em
sen θ cos θ
r d θ = − sen θ dx + cos θ dy ⇒ dθ = − dx + dy.
r r
Logo, tem-se um sistema em termos de dx e dy:


 dr = cos θ dx + sen θ dy,
(8.16)
 d θ = − sen θ dx + cos θ dy.

r r
Por outro lado, tem-se que

 ∂r ∂r
 dr = ∂ x dx + ∂ y dy,


(8.17)

 ∂θ ∂θ

 dθ = dx + dy.
∂x ∂y
Comparando os sistemas (8.16) e (8.17), conclui-se que
∂r ∂r ∂θ sen θ , ∂θ cos θ
(8.18) = cos θ , = sen θ , =− = ·
∂x ∂y ∂x r ∂y r
Substituindo (8.18) nas equações (8.12) e (8.13), obtém-se
4.8 Exercícios propostos 549

∂u ∂u sen θ ∂ u ,
(8.19) = cos θ · − ·
∂x ∂r r ∂θ
∂u ∂u cos θ ∂ u
(8.20) = sen θ · + · ·
∂y ∂r r ∂θ
Com isso, consegue-se estabelecer expressões para as derivadas parciais primeiras para u e
que permitirão regras gerais para representar as derivadas parciais segundas em termos de r e θ .
Assim, para determinar uma regra geral para a derivada parcial de segunda ordem para u duas
vezes em relação a x, basta usar a equação (8.19), a regra do produto e observar que
 
∂ 2u ∂ ∂u
=
∂ x2 ∂ x ∂ x
     
(8.19) ∂ ∂u sen θ ∂ ∂ u
= cos θ −
∂r ∂x r ∂θ ∂x
  
(8.19) ∂ ∂ u sen θ ∂ u
= cos θ cos θ · − · −
∂r ∂r r ∂θ
  
sen θ ∂ ∂ u sen θ ∂ u
− cos θ · − ·
r ∂θ ∂r r ∂θ
    
∂ ∂u ∂ sen θ ∂ u
= cos θ cos θ · − · −
∂r ∂r ∂r r ∂θ
    
sen θ ∂u ∂ ∂u ∂ sen θ ∂ u
− − sen θ · + cos θ · − ·
r ∂r ∂θ ∂r ∂θ r ∂θ
 
d.p. ∂ 2 u sen θ ∂ u sen θ ∂ 2 u
= cos θ cos θ · 2 + 2 · − · −
∂r r ∂θ r ∂ r∂ θ
 
sen θ ∂u ∂ 2u cos θ ∂ u sen θ ∂ 2 u
− − sen θ · + cos θ · − · − ·
r ∂r ∂θ∂r r ∂θ r ∂θ2
∂ 2u sen θ · cos θ ∂ u sen θ · cos θ ∂ 2 u
= cos2 θ · + · − · +
∂ r2 r2 ∂θ r ∂ r∂ θ
sen 2 θ ∂ u sen θ · cos θ ∂ 2 u sen θ · cos θ ∂ u sen 2 θ ∂ 2u
+ · − · + · + ·
r ∂r r ∂θ∂r r2 ∂θ r2 ∂θ2
∂ 2u sen θ · cos θ ∂ 2u sen 2θ ∂ 2 u
= cos2 θ · − 2 + · +
∂ r2 r ∂ r∂ θ r2 ∂θ2
sen 2 θ ∂ u sen θ · cos θ ∂ u
(8.21) + · +2 · ·
r r r2 ∂θ
onde usou (8.19) mais de uma vez e, em seguida, a regra de derivação do produto (d.p.). Além
disso, por hipótese u ∈ C2 , de modo que

∂ 2u ∂ 2u
= ·
∂ θ ∂ r ∂ r∂ θ
550 4 Aplicações às EDP

Agora determina-se a derivada parcial de segunda ordem em relação a y da função u(x, y). O
procedimento é análogo. Tem-se:
 
∂ 2u ∂ ∂u
=
∂ y2 ∂ y ∂ y
     
(8.20) ∂ ∂u cos θ ∂ ∂ u
= sen θ +
∂r ∂y r ∂θ ∂y
  
(8.20) ∂ ∂ u cos θ ∂ u
= sen θ sen θ · + · +
∂r ∂r r ∂θ
  
cos θ ∂ ∂ u cos θ ∂ u
+ sen θ · + ·
r ∂θ ∂r r ∂θ
    
∂ ∂u ∂ cos θ ∂ u
= sen θ sen θ · + · +
∂r ∂r ∂r r ∂θ
    
cos θ ∂u ∂ ∂u ∂ cos θ ∂ u
+ cos θ · + sen θ · + ·
r ∂r ∂θ ∂r ∂θ r ∂θ
 
d.p. ∂ 2 u cos θ ∂ u cos θ ∂ 2 u
= sen θ sen θ · 2 − 2 · + · +
∂r r ∂θ r ∂ r∂ θ
 
cos θ ∂u ∂ 2u sen θ ∂ u cos θ ∂ 2 u
+ cos θ · + sen θ · − · + ·
r ∂r ∂θ∂r r ∂θ r ∂θ2
∂ 2 u sen θ · cos θ ∂ u sen θ · cos θ ∂ 2u
= sen 2 θ · − · + · +
∂ r2 r2 ∂θ r ∂ r∂ θ
cos2 θ ∂ u sen θ · cos θ ∂ 2 u sen θ · cos θ ∂ u cos2 θ ∂ 2 u
+ · + · − · + 2 ·
r ∂r r ∂θ∂r r2 ∂θ r ∂θ2
∂ 2u sen θ cos θ ∂ 2u cos2 θ ∂ 2u
= sen 2 θ · + 2 · + · +
∂ r2 r ∂ r∂ θ r2 ∂θ2
cos2 θ ∂ u sen θ · cos θ ∂ u
(8.22) + · −2 · ·
r ∂r r2 ∂θ
onde as passagens acima se justificam como antes.
Além disso, segue imediatamente de (8.14) que

∂ 2u ∂ 2u
(8.23) = 2·
∂ z2 ∂z
Agora soma-se (8.21), (8.22) e (8.23) para encontrar o laplaciano em coordenadas cilíndricas.
Assim,

∂ 2u ∂ 2u ∂ 2u
∆u = 2 + 2 + 2
∂x ∂y ∂z
4.8 Exercícios propostos 551

∂ 2u
2 sen θ · cos θ ∂ 2 u sen 2 θ ∂ 2u
= cos θ · 2 − 2 + · 2+
∂r r ∂ r∂ θ r2 ∂θ
!
sen 2θ ∂ u sen θ · cos θ ∂ u
+ · +2 · +
r r r2 ∂θ

∂ 2u sen θ cos θ ∂ 2 u cos2 θ ∂ 2 u


+ sen 2 θ · + 2 · + · +
∂ r2 r ∂ r∂ θ r2 ∂θ2
!
cos2 θ ∂ u sen θ · cos θ ∂ u ∂ 2u
+ · −2 · +
r ∂r r2 ∂θ ∂ z2

 ∂ 2u sen 2 θ + cos2 θ ∂ 2u sen 2θ + cos2 θ ∂ u ∂ 2u


= cos2 θ + sen 2 θ + · 2+ · +
∂ r2 r2 ∂θ r ∂ r ∂ z2
∂ 2u 1 ∂ u 1 ∂ u ∂ 2u ,
= + · + · +
∂ r2 r2 ∂ θ 2 r ∂ r ∂ z2
como desejado.

O laplaciano em coordenadas esféricas é apresentado na próxima proposição. Porém será


preciso usar o teorema da aplicação inversa. Aqui será feito de maneira informal, pois visa-se
apenas o cálculo que será usado na proposição 8.5
Quando o número de variáveis dependentes é igual ao número de variáveis independentes as
equações simultâneas podem ser vistas como uma mudança de coordenadas. Por exemplo, em
dimensão três, as funções


 x = x(u, v, w),

(8.24) y = y(u, v, w),



z = z(u, v, w).

podem ser interpretadas como uma associação entre pontos do espaço xyz e do espaço uvw.
Neste caso, as curvas u = constante, v = constante e w = constante determinam um sistema de
coordenadas curvilíneas no espaço xyz.
Agora se escreve (8.24) da seguinte forma:

 x(u, v, w) − x = 0,


y(u, v, w) − y = 0,


 z(u, v, w) − z = 0.

Assim, as diferenciais são dadas por


552 4 Aplicações às EDP



 ∂x ∂x ∂x

 du + dv + dw = 0,
 ∂u


∂v ∂w

∂y ∂y ∂y
du + dv + dw = 0,


 ∂u ∂v ∂w


 ∂ z du + ∂ z dv + ∂ z dw = 0.


∂u ∂v ∂w
Se o jacobiano J da transformação é dado por

∂x ∂x ∂ x

∂u ∂v ∂ w

∂ (x, y, z) ∂ y ∂y ∂y ,

J= =
∂ (u, v, w) ∂ u ∂v ∂ w

∂z ∂z ∂ z


∂u ∂v ∂w
então é possível mostrar (veja, por exemplo, a referência [65] na bibliografia) que

 ∂ (y, z) ∂ (z, x) ∂ (x, y)





∂u ∂ (v, w) , ∂u ∂ (v, w) , ∂ u ∂ (v, w) ,

 = = =

 ∂x J ∂y J ∂z J



 ∂ (y, z) ∂ (z, x) ∂ (x, y)

(8.25) ∂v ∂ (w, u) , ∂v ∂ (w, u) , ∂ v ∂ (w, u) ,

 = = =


 ∂ x J ∂ y J ∂ z J



 ∂ (y, z) ∂ (z, x) ∂ (x, y)



 ∂ w = ∂ (u, v) , ∂w ∂ (u, v) , ∂ w ∂ (u, v)


= = ·
∂x J ∂y J ∂z J

Proposição 8.5 (laplaciano em coordenadas esféricas): Sejam Ω ⊂ R3 e u : Ω → R uma


função de classe C2 (Ω). Então, o laplaciano em coordenadas esféricas é dado por

∂ 2u 1 ∂ 2u 1 ∂ 2u 2 ∂u cotg ϕ ∂ u
(8.26) ∆u = 2
+ 2· 2
+ 2 2
· 2 + · + · ·
∂ρ ρ ∂ϕ ρ sen ϕ ∂ θ ρ ∂ρ ρ2 ∂ϕ
D EMONSTRAÇÃO : Para facilitar a demonstração, deduzir-se-á as expressões para coorde-
nadas esféricas e outros resultados auxiliares. Na figura 8.1, segue-se do triângulo retângulo
OxQ que
x y
cos θ = e sen θ = ,
r r
de modo que

(8.27) x = r cos θ e y = r sen θ .

Além disso, pelo triângulo retângulo OzP, segue-se que


z r,
cos ϕ = e sen ϕ =
ρ ρ
4.8 Exercícios propostos 553

de modo que

(8.28) z = ρ cos ϕ e r = ρ sen ϕ .

Figura 8.1: Coordenadas esféricas.

A primeira expressão em (8.28) dá o z em coordenadas polares. Para determinar x e y neste


sistema, basta substituir a segunda expressão em (8.28) nas duas expressões em (8.27) para
concluir que
x = ρ sen ϕ cos θ e y = ρ sen ϕ sen θ .
O passo seguinte consiste em compor a função a função u = u(x, y, z) com as funções acima
para, em seguida, expressar o laplaciano ∆u em termos de ρ , ϕ e θ . Assim, de

u = u(ρ sen ϕ cos θ , ρ sen ϕ sen θ , ρ cos ϕ )

tem-se as seguintes derivadas parciais pelas regras de derivação:


∂u ∂u ∂ρ ∂u ∂ϕ ∂u ∂θ ,
(8.29) = · + · + ·
∂x ∂ρ ∂x ∂ϕ ∂x ∂θ ∂x
∂u ∂u ∂ρ ∂u ∂ϕ ∂u ∂θ ,
(8.30) = · + · + ·
∂y ∂ρ ∂y ∂ϕ ∂y ∂θ ∂y
∂u ∂u ∂ρ ∂u ∂ϕ ∂u ∂θ
(8.31) = · + · + · ·
∂z ∂ρ ∂z ∂ϕ ∂z ∂θ ∂z
Das coordenadas esféricas,
x = ρ sen ϕ cos θ ,

y = ρ sen ϕ sen θ ,

z = ρ cos ϕ .
segue-se que
554 4 Aplicações às EDP



 ∂x ∂y ∂z

 = sen ϕ cos θ , = sen ϕ sen θ , = cos ϕ ,

 ∂ ρ ∂ρ ∂ρ



∂x ∂y ∂z
(8.32) = ρ cos ϕ cos θ , = ρ cos ϕ sen θ , = −ρ sen ϕ ,

 ∂ ϕ ∂ϕ ∂ϕ





 ∂x ∂y ∂z
 = −ρ sen ϕ sen θ , = ρ sen ϕ cos θ , = 0.
∂θ ∂θ ∂θ
Com as relações em (8.32), é possível determinar o jacobiano da transformação. Tem-se:

∂x ∂x ∂x

∂ρ ∂ϕ ∂θ


∂y ∂y ∂y
J =

∂ρ ∂ϕ ∂θ

∂z ∂z ∂θ

∂ρ ∂ϕ ∂w


sen ϕ cos θ ρ cos ϕ cos θ −ρ sen ϕ sen θ



= sen ϕ sen θ ρ cos ϕ sen θ ρ sen ϕ cos θ



cos ϕ −ρ sen ϕ 0

= ρ 2 sen 3ϕ sen 2 θ + ρ 2 sen ϕ cos2 ϕ cos2 θ +

+ ρ 2 sen ϕ cos2 ϕ sen 2 θ + ρ 2 sen 3 ϕ cos2 θ


 
= ρ 2 sen 3ϕ sen 2 θ + cos2 θ + ρ 2 sen ϕ cos2 ϕ cos2 θ + sen 2 θ

= ρ 2 sen 3ϕ + ρ 2 sen ϕ cos2 ϕ



= ρ 2 sen ϕ sen 2ϕ + cos2 ϕ

= ρ 2 sen ϕ .

Agora encontra-se as derivadas parciais do seguinte modo:



 ∂ (y, z) ∂ (z, x) ∂ (x, y)



 ∂ρ ∂ (ϕ , θ ) , ∂ρ ∂ (ϕ , θ ) , ∂ρ ∂ (ϕ , θ ) ,

 = = =

 ∂x J ∂y J ∂z J





 ∂ (y, z) ∂ (z, x) ∂ (x, y)
∂ϕ ∂ (θ , ρ ) , ∂ϕ ∂ (θ , ρ ) , ∂ϕ ∂ (θ , ρ ) ,

 = = =
 ∂x
 J ∂y J ∂z J





 ∂ (y, z) ∂ (z, x) ∂ (x, y)



 ∂ θ = ∂ (ρ ϕ ) ,
 ∂θ
=
∂ (ρ , ϕ ) , ∂θ
=
∂ (ρ , ϕ )
·
∂x J ∂y J ∂z J
4.8 Exercícios propostos 555

Assim, usando (8.32), obtém-se



∂y ∂ y

∂ϕ ∂ θ


∂ (y, z) ∂ z ∂ z

∂ρ ∂ (ϕ , θ ) ∂ ϕ ∂θ
= =
∂x J J


ρ cos ϕ sen θ ρ sen ϕ cos θ



−ρ sen ϕ 0
=
ρ 2 sen ϕ
ρ 2 sen 2 ϕ cos θ
=
ρ 2 sen ϕ
(8.33) = sen ϕ cos θ .

∂y ∂ y

∂θ ∂ ρ
ρ sen ϕ cos θ sen ϕ cos θ

∂ (y, z) ∂z ∂ z

∂ϕ ∂ (θ , ρ ) ∂θ ∂ρ 0 cos ϕ
= = =
∂x J J ρ 2 sen ϕ
ρ sen ϕ cos ϕ cos θ cos ϕ cos θ
(8.34) = 2
= ·
ρ sen ϕ ρ


∂y ∂ y

∂ρ ∂ ϕ
sen ϕ sen θ ρ cos ϕ sen θ

∂ (y, z) ∂z ∂ z

∂θ ∂ (ρ , ϕ ) ∂ρ ∂ϕ cos ϕ −ρ sen ϕ
= = =
∂x J J ρ 2 sen ϕ

−ρ sen 2 ϕ sen θ − ρ cos2 ϕ sen θ −ρ sen θ sen 2ϕ + cos2 ϕ
= =
ρ 2 sen ϕ ρ 2 sen ϕ
sen θ
(8.35) =− ·
ρ sen ϕ

∂z ∂z

∂ϕ ∂θ
−ρ sen ϕ 0

∂ (z, x) ∂x ∂ x

∂ρ ∂ (ϕ , θ ) ∂ϕ ∂θ ρ cos ϕ cos θ −ρ sen ϕ sen θ
= = =
∂y J J ρ 2 sen ϕ
556 4 Aplicações às EDP

ρ 2 sen 2 ϕ sen θ
=
ρ 2 sen ϕ
(8.36) = sen ϕ sen θ .


∂z ∂z

∂θ ∂ρ
0 cos ϕ

∂ (z, x) ∂x ∂ x

∂ϕ ∂ (θ , ρ ) ∂θ ∂ρ −ρ sen ϕ sen θ sen ϕ cos θ
= = =
∂y J J ρ 2 sen ϕ
ρ sen ϕ cos ϕ sen θ
=
ρ 2 sen ϕ
cos ϕ sen θ
(8.37) = ·
ρ


∂z ∂ z

∂ρ ∂ ϕ
cos ϕ −ρ sen ϕ

∂ (z, x) ∂x ∂ x

∂θ ∂ (ρ , ϕ ) ∂ρ ∂ϕ sen ϕ cos θ ρ cos ϕ cos θ
= = =
∂y J J ρ 2 sen ϕ

ρ cos2 ϕ cos θ + ρ sen 2ϕ cos θ ρ cos θ cos2 ϕ + sen 2 ϕ
= =
ρ 2 sen ϕ ρ 2 sen ϕ
cos θ
(8.38) = ·
ρ sen ϕ


∂x ∂x

∂ϕ ∂θ
ρ cos ϕ cos θ −ρ sen ϕ sen θ

∂ (x, y) ∂y ∂ y

∂ρ ∂ (ϕ , θ ) ∂ϕ ∂θ ρ cos ϕ sen θ ρ sen ϕ cos θ
= = =
∂z J J ρ 2 sen ϕ
ρ 2 sen ϕ cos ϕ cos2 θ + ρ 2 sen ϕ cos ϕ sen 2 θ
=
ρ 2 sen ϕ

ρ 2 sen ϕ cos ϕ cos2 θ + sen 2θ
=
ρ 2 sen ϕ
(8.39) = cos ϕ .
4.8 Exercícios propostos 557


∂x ∂ x

∂θ ∂ ρ
−ρ sen ϕ sen θ sen ϕ cos θ

∂ (x, y) ∂y ∂ y

∂ϕ ∂ (θ , ρ ) ∂θ ∂ρ ρ sen ϕ cos θ sen ϕ sen θ
= = =
∂z J J ρ 2 sen ϕ

−ρ sen 2 ϕ sen 2 θ − ρ sen 2 ϕ cos2 θ −ρ sen 2ϕ sen 2 ϕ + cos2 ϕ
= =
ρ 2 sen ϕ ρ 2 sen ϕ
sen ϕ
(8.40) =− ·
ρ


∂x ∂ x

∂ρ ∂ ϕ
sen ϕ cos θ ρ cos ϕ cos θ

∂ (x, y) ∂y ∂ y

∂θ ∂ (ρ , ϕ ) ∂ρ ∂ϕ sen ϕ sen θ ρ cos ϕ sen θ
= = =
∂z J J ρ 2 sen ϕ
ρ sen ϕ cos ϕ sen θ cos θ − ρ sen ϕ cos ϕ sen θ cos θ
=
ρ 2 sen ϕ
0
(8.41) = = 0.
ρ 2 sen ϕ
O resumo dos cálculos encontrados em (8.33)-(8.41) está apresentado no quadro abaixo:


 ∂ρ ∂ρ ∂ρ

 = sen ϕ cos θ , = sen ϕ sen θ , = cos ϕ ,

 ∂x ∂y ∂z


 ∂ϕ cos ϕ cos θ , ∂ ϕ cos ϕ sen θ , ∂ϕ sen ϕ ,
(8.42) = = =−

 ∂x ρ ∂y ρ ∂z ρ





 ∂θ sen θ , ∂θ cos θ , ∂θ
 =− = = 0.
∂x ρ sen ϕ ∂y ρ sen ϕ ∂z

Agora substitui-se as derivadas parciais em (8.42) nas diferenciais dadas em (8.29)-(8.31).


Assim,


 ∂u ∂ u cos ϕ cos θ ∂ u sen θ ∂ u ,

 = sen ϕ cos θ · + · − ·

 ∂x ∂ρ ρ ∂ ϕ ρ sen ϕ ∂ θ


 ∂u ∂ u cos ϕ sen θ ∂ u cos θ ∂ u ,
(8.43) = sen ϕ sen θ · + · + ·

 ∂y ∂ρ ρ ∂ ϕ ρ sen ϕ ∂ θ



 ∂u

 ∂ u sen ϕ ∂ u
 = cos ϕ · − · ·
∂z ∂ρ ρ ∂ϕ
Com as expressões para as derivadas parciais primeiras para u será possível estabelecer regras
gerais para representar as derivadas parciais segundas em termos de ρ , ϕ e θ . Assim, para
558 4 Aplicações às EDP

determinar uma regra geral para a derivada parcial de segunda ordem para u duas vezes em
relação a x, basta usar a primeira equação em (8.43), a regra do produto e observar que

 
∂ 2u ∂ ∂u
=
∂ x2 ∂ x ∂x

    
(8.43) ∂ ∂u cos ϕ cos θ ∂ ∂u
= sen ϕ cos θ + −
∂ρ ∂x ρ ∂ϕ ∂x
  
sen θ ∂ ∂u

ρ sen ϕ ∂ θ ∂ x
  
(8.43) ∂ ∂ u cos ϕ cos θ ∂ u sen θ ∂ u
= sen ϕ cos θ sen ϕ cos θ · + · − · +
∂ρ ∂ρ ρ ∂ ϕ ρ sen ϕ ∂ θ
  
cos ϕ cos θ ∂ ∂ u cos ϕ cos θ ∂ u sen θ ∂ u
+ sen ϕ cos θ · + · − · −
ρ ∂ϕ ∂ρ ρ ∂ ϕ ρ sen ϕ ∂ θ
  
sen θ ∂ ∂ u cos ϕ cos θ ∂ u sen θ ∂ u
− sen ϕ cos θ · + · − ·
ρ sen ϕ ∂ θ ∂ρ ρ ∂ ϕ ρ sen ϕ ∂ θ
d.p. ∂ 2 u sen ϕ cos ϕ cos2 θ ∂ u
= sen 2ϕ cos2 θ · − · +
∂ ρ2 ρ2 ∂ϕ
sen ϕ cos ϕ cos2 θ ∂ 2 u sen θ cos θ ∂ u sen θ cos θ ∂ 2 u
+ · + · − · +
ρ ∂ ρ∂ ϕ ρ2 ∂θ ρ ∂ ρ∂ θ
cos2 ϕ cos2 θ ∂ u sen ϕ cos ϕ cos2 θ ∂ 2 u sen ϕ cos ϕ cos2 θ ∂ u
+ · + · − · +
ρ ∂ρ ρ ∂ ϕ∂ ρ ρ2 ∂ϕ
cos2 ϕ cos2 θ ∂ 2u cos2 ϕ sen θ cos θ ∂ u cos ϕ sen θ cos θ ∂ 2u
+ · + · − · +
ρ2 ∂ ϕ2 ρ 2 sen 2 ϕ ∂θ ρ 2 sen ϕ ∂ ϕ∂ θ
sen 2 θ ∂ u sen θ cos θ ∂ 2 u cos ϕ sen 2 θ ∂ u
+ · − · + · −
ρ ∂ρ ρ ∂θ∂ρ ρ 2 sen ϕ ∂ϕ
cos ϕ sen θ cos θ ∂ 2 u sen θ cos θ ∂ u sen 2 θ ∂ 2 u
− · + · + ·
ρ 2 sen ϕ ∂θ∂ϕ ρ 2 sen 2 ϕ ∂ θ ρ 2 sen 2 ϕ ∂ θ 2
∂ 2 u cos2 ϕ cos2 θ ∂ 2u sen 2 θ ∂ 2u
= sen 2ϕ cos2 θ · + · + · +
∂ ρ2 ρ2 ∂ ϕ 2 ρ 2 sen 2 ϕ ∂ θ 2
 2 
cos ϕ cos2 θ sen 2 θ ∂u
+ + ·
ρ ρ ∂ρ
 
sen ϕ cos ϕ cos2 θ sen ϕ cos ϕ cos2 θ cos ϕ sen 2 θ ∂ u
+ − − + +
ρ2 ρ2 ρ 2 sen ϕ ∂ϕ
 
sen θ cos θ cos2 ϕ sen θ cos θ sen θ cos θ ∂ u
+ + + 2 +
ρ2 ρ 2 sen 2 ϕ ρ sen 2 ϕ ∂ θ
4.8 Exercícios propostos 559

  2
sen ϕ cos ϕ cos2 θ sen ϕ cos ϕ cos2 θ ∂ u
+ + −
ρ ρ ∂ ρ∂ ϕ
  2
sen θ cos θ sen θ cos θ ∂ u
− + −
ρ ρ ∂ ρ∂ θ
  2
cos ϕ sen θ cos θ cos ϕ sen θ cos θ ∂ u
− 2
+ 2
ρ sen ϕ ρ sen ϕ ∂ ϕ∂ θ

∂ 2 u cos2 ϕ cos2 θ ∂ 2 sen 2 θ ∂ 2u
= sen 2 ϕ cos2 θ · 2 + · + · +
∂ρ ρ2 ∂ ϕ 2 ρ 2 sen 2ϕ ∂ θ 2
 2 
cos ϕ cos2 θ sen 2θ ∂u
+ + ·
ρ ρ ∂ρ
 
cos ϕ sen 2 θ sen ϕ cos ϕ cos2 θ ∂ u
+ −2 +
ρ 2 sen ϕ ρ2 ∂ϕ
 
sen θ cos θ cos2 ϕ sen θ cos θ sen θ cos θ ∂ u
+ + + 2 +
ρ2 ρ 2 sen 2ϕ ρ sen 2 ϕ ∂ θ
sen ϕ cos ϕ cos2 θ ∂ 2 u sen θ cos θ ∂ 2 u
+2 · −2 · −
ρ ∂ ρ∂ ϕ ρ ∂ ρ∂ θ

cos ϕ sen θ cos θ ∂ 2u
(8.44) −2 · ·
ρ 2 sen ϕ ∂ ϕ∂ θ
onde usou-se a primeira equação em (8.43) mais de uma vez e a regra de derivação do produto.
Além disso, por hipótese, u ∈ C2, de modo que as derivadas parciais mistas são iguais.
Usa-se o mesmo procedimento para encontrar a derivada parcial segunda de u em relação a
y. Tem-se:

 
∂ 2u ∂ ∂u
=
∂ y2 ∂ y ∂y
     
(8.43) ∂ ∂u cos ϕ sen θ ∂ ∂u
= sen ϕ sen θ · + · +
∂ρ ∂y ρ ∂ϕ ∂y
  
cos θ ∂ ∂u
+ ·
ρ sen ϕ ∂ θ ∂ y
  
(8.43) ∂ ∂ u cos ϕ sen θ ∂ u cos θ ∂ u
= sen ϕ sen θ · sen ϕ sen θ · + · + · +
∂ρ ∂ρ ρ ∂ ϕ ρ sen ϕ ∂ θ
  
cos ϕ sen θ ∂ ∂ u cos ϕ sen θ ∂ u cos θ ∂ u
+ · sen ϕ sen θ · + · + · +
ρ ∂ϕ ∂ρ ρ ∂ ϕ ρ sen ϕ ∂ θ
  
cos θ ∂ ∂ u cos ϕ sen θ ∂ u cos θ ∂ u
+ · sen ϕ sen θ · + · + ·
ρ sen ϕ ∂ θ ∂ρ ρ ∂ ϕ ρ sen ϕ ∂ θ
560 4 Aplicações às EDP

d.p. ∂ 2 u sen ϕ cos ϕ sen 2 θ ∂ u


= sen 2 ϕ sen 2 θ · − · +
∂ ρ2 ρ2 ∂ϕ
sen ϕ cos ϕ sen 2θ ∂ 2 u sen θ cos θ ∂ u sen θ cos θ ∂ 2 u
+ · − · + · +
ρ ∂ ρ∂ ϕ ρ2 ∂θ ρ ∂ ρ∂ θ
cos2 ϕ sen 2 θ ∂ u sen ϕ cos ϕ sen 2θ ∂ 2 u sen ϕ cos ϕ sen 2 θ ∂ u
+ · + · − · +
ρ ∂ρ ρ ∂ ϕ∂ ρ ρ2 ∂ϕ
cos2 ϕ sen 2 θ ∂ 2u cos2 ϕ sen θ cos θ ∂ u cos ϕ sen θ cos θ ∂ 2u
+ · − · + · +
ρ2 ∂ ϕ2 ρ 2 sen 2 ϕ ∂θ ρ 2 sen ϕ ∂ ϕ∂ θ
cos2 θ ∂ u sen θ cos θ ∂ 2u cos ϕ cos2 θ ∂ u
+ · + · + · +
ρ ∂ρ ρ ∂θ∂ρ ρ 2 sen ϕ ∂ϕ
cos ϕ sen θ cos θ ∂ 2 u sen θ cos θ ∂ u cos2 θ ∂ 2u
+ · − · + ·
ρ 2 sen ϕ ∂θ∂ϕ ρ 2 sen 2 ϕ ∂ θ ρ 2 sen 2 ϕ ∂ θ 2

2 2∂ 2 u cos2 ϕ sen 2 θ ∂ 2u cos2 θ ∂ 2u


= sen ϕ sen θ · 2 + · + · +
∂ρ ρ2 ∂ ϕ 2 ρ 2 sen 2 ϕ ∂ θ 2
 2 
cos ϕ sen 2 θ cos2 θ ∂ u
+ + +
ρ ρ ∂ρ
 
sen ϕ cos ϕ sen 2 θ sen ϕ cos ϕ sen 2θ cos ϕ cos2 θ ∂ u
+ − − + −
ρ2 ρ2 ρ 2 sen ϕ ∂ϕ
 
sen θ cos θ cos2 ϕ sen θ cos θ sen θ cos θ ∂ u
− + + 2 +
ρ2 ρ 2 sen 2 ϕ ρ sen 2 ϕ ∂ θ
  2
sen ϕ cos ϕ sen 2 θ sen ϕ cos ϕ sen 2 θ ∂ u
+ + +
ρ ρ ∂ ρ∂ ϕ
  2
sen θ cos θ sen θ cos θ ∂ u
+ + +
ρ ρ ∂ ρ∂ θ
  2
cos ϕ sen θ cos θ cos ϕ sen θ cos θ ∂ u
+ 2
+ 2
ρ sen ϕ ρ sen ϕ ∂ ϕ∂ θ

∂ 2u cos2 ϕ sen 2 θ ∂ 2 u cos2 θ ∂ 2u
= sen 2 ϕ sen 2θ · 2 + · + · +
∂ρ ρ2 ∂ ϕ 2 ρ 2 sen 2 ϕ ∂ θ 2
 2 
cos ϕ sen 2 θ cos2 θ ∂ u
+ + +
ρ ρ ∂ρ
 
cos ϕ cos2 θ sen ϕ cos ϕ sen 2θ ∂ u
+ −2 −
ρ 2 sen ϕ ρ2 ∂ϕ
 
sen θ cos θ cos2 ϕ sen θ cos θ sen θ cos θ ∂ u
− + + 2 +
ρ2 ρ 2 sen 2 ϕ ρ sen 2 ϕ ∂ θ
4.8 Exercícios propostos 561

sen ϕ cos ϕ sen 2 θ ∂ 2 u sen θ cos θ ∂ 2u


+2 · +2 · +
ρ ∂ ρ∂ ϕ ρ ∂ ρ∂ θ

cos ϕ sen θ cos θ ∂ 2u ,
(8.45) +2 ·
ρ 2 sen ϕ ∂ ϕ∂ θ
onde usou-se a primeira equação em (8.43) mais de uma vez e a regra de derivação do produto.
Além disso, por hipótese, u ∈ C2, de modo que as derivadas parciais mistas são iguais.
Novamente será usado o mesmo procedimento para encontrar a derivada parcial segunda de
u em relação a z. Tem-se:
 
∂ 2u ∂ ∂u
=
∂ z2 ∂ z ∂ z
     
(8.43) ∂ ∂u sen ϕ ∂ ∂u
= cos ϕ −
∂ρ ∂z ρ ∂ϕ ∂z
  
(8.43) ∂ ∂ u sen ϕ ∂ u
= cos ϕ cos ϕ · − · −
∂ρ ∂ρ ρ ∂ϕ
  
sen ϕ ∂ ∂ u sen ϕ ∂ u
− cos ϕ · − ·
ρ ∂ϕ ∂ρ ρ ∂ϕ
d.p. ∂ 2u sen ϕ cos ϕ ∂ u sen ϕ cos ϕ ∂ 2 u
= cos2 ϕ + · − +
∂ ρ2 ρ2 ∂ϕ ρ ∂ ρ∂ ϕ
sen 2 ϕ ∂ u sen ϕ cos ϕ ∂ 2 u sen ϕ cos ϕ ∂ u
+ · − + · +
ρ ∂ρ ρ ∂ ϕ∂ ρ ρ2 ∂ϕ
sen 2 ϕ ∂ 2 u
+ ·
ρ2 ∂ ϕ2

∂ 2 u sen 2 ϕ ∂ 2 u sen 2 ϕ ∂ u
= cos2 ϕ + · + · +
∂ ρ2 ρ2 ∂ ϕ2 ρ ∂ρ

sen ϕ cos ϕ ∂ u sen ϕ cos ϕ ∂ 2 u ,
(8.46) +2 · −2 ·
ρ2 ∂ϕ ρ ∂ ρ∂ ϕ
onde usou-se a primeira equação em (8.43) mais de uma vez e a regra de derivação do produto.
Além disso, por hipótese, u ∈ C2, de modo que as derivadas parciais mistas são iguais.
O passo seguinte consiste em somar os resultados obtidos em (8.44), (8.45) e (8.46). Assim,

∂ 2u ∂ 2u ∂ 2u
∆u = + +
∂ x2 ∂ y2 ∂ z2

∂ 2u cos2 ϕ cos2 θ ∂ 2 sen 2θ ∂ 2 u
= sen 2 ϕ cos2 θ · 2 + · + · +
∂ρ ρ2 ∂ ϕ 2 ρ 2 sen 2 ϕ ∂ θ 2
 2 
cos ϕ cos2 θ sen 2 θ ∂u
+ + ·
ρ ρ ∂ρ
562 4 Aplicações às EDP

 
cos ϕ sen 2 θ sen ϕ cos ϕ cos2 θ ∂ u
+ −2 +
ρ 2 sen ϕ ρ2 ∂ϕ
 
sen θ cos θ cos2 ϕ sen θ cos θ sen θ cos θ ∂ u
+ + + 2 +
ρ2 ρ 2 sen 2ϕ ρ sen 2 ϕ ∂ θ
sen ϕ cos ϕ cos2 θ ∂ 2 u sen θ cos θ ∂ 2 u
+2 · −2 · −
ρ ∂ ρ∂ ϕ ρ ∂ ρ∂ θ

cos ϕ sen θ cos θ ∂ 2 u
−2 · +
ρ 2 sen ϕ ∂ ϕ∂ θ

∂ 2u cos2 ϕ sen 2 θ ∂ 2u cos2 θ ∂ 2u
+ sen 2 ϕ sen 2 θ · 2 + · + · +
∂ρ ρ2 ∂ ϕ 2 ρ 2 sen 2 ϕ ∂ θ 2
 2 
cos ϕ sen 2 θ cos2 θ ∂ u
+ + +
ρ ρ ∂ρ
 
cos ϕ cos2 θ sen ϕ cos ϕ sen 2 θ ∂ u
+ −2 −
ρ 2 sen ϕ ρ2 ∂ϕ
 
sen θ cos θ cos2 ϕ sen θ cos θ sen θ cos θ ∂ u
− + + 2 +
ρ2 ρ 2 sen 2ϕ ρ sen 2 ϕ ∂ θ
sen ϕ cos ϕ sen 2θ ∂ 2 u sen θ cos θ ∂ 2 u
+2 · +2 · +
ρ ∂ ρ∂ ϕ ρ ∂ ρ∂ θ

cos ϕ sen θ cos θ ∂ 2 u
+2 · +
ρ 2 sen ϕ ∂ ϕ∂ θ

∂ 2 u sen 2 ϕ ∂ 2 u sen 2 ϕ ∂ u
+ cos2 ϕ 2 + · + · +
∂ρ ρ2 ∂ ϕ2 ρ ∂ρ

sen ϕ cos ϕ ∂ u sen ϕ cos ϕ ∂ 2u
+2 · −2 ·
ρ2 ∂ϕ ρ ∂ ρ∂ ϕ
 ∂ 2u
= sen 2 ϕ cos2 θ + sen 2 ϕ sen 2θ + cos2 ϕ +
∂ ρ2
 2 
cos ϕ cos2 θ cos2 ϕ sen 2 θ sen 2 ϕ ∂ 2 u
+ + + +
ρ2 ρ2 ρ2 ∂ ϕ2
  2
sen 2θ cos2 θ ∂ u
+ + 2 +
ρ sen ϕ ρ sen ϕ ∂ θ 2
2 2 2

 2 
cos ϕ cos2 θ sen 2 θ cos2 ϕ sen 2 θ cos2 θ sen 2 ϕ ∂ u
+ + + + + +
ρ ρ ρ ρ ρ ∂ρ

cos ϕ sen 2 θ sen ϕ cos ϕ cos2 θ cos ϕ cos2 θ sen ϕ cos ϕ sen 2 θ
+ − 2 + − 2 +
ρ 2 sen ϕ ρ2 ρ 2 sen ϕ ρ2
4.8 Exercícios propostos 563

 
sen ϕ cos ϕ ∂u sen θ cos θ cos2 ϕ sen θ cos θ sen θ cos θ
+2 + + + 2 −
ρ2 ∂ϕ ρ2 ρ 2 sen 2 ϕ ρ sen 2 ϕ

sen θ cos θ cos2 ϕ sen θ cos θ sen θ cos θ ∂ u
− − − 2 +
ρ2 ρ 2 sen 2 ϕ ρ sen 2 ϕ ∂ θ
  2
sen ϕ cos ϕ cos2 θ sen ϕ cos ϕ sen 2 θ sen ϕ cos ϕ ∂ u
+ 2 +2 −2 +
ρ ρ ρ ∂ ρ∂ ϕ
  2
sen θ cos θ sen θ cos θ ∂ u
+ −2 +2 +
ρ ρ ∂ ρ∂ θ
  2
cos ϕ sen θ cos θ cos ϕ sen θ cos θ ∂ u
+ −2 + 2
ρ 2 sen ϕ ρ 2 sen ϕ ∂ ϕ∂ θ
   ∂ 2u
= sen 2 ϕ cos2 θ + sen 2 θ + cos2 ϕ +
∂ ρ2
 2 
cos ϕ 2 2
 sen 2 ϕ ∂ 2u
+ · cos θ + sen θ + +
ρ2 ρ2 ∂ ϕ2
 
sen 2 θ + cos2 θ ∂ 2 u
+ +
ρ 2 sen 2ϕ ∂θ2
 2 
cos ϕ 2 2
 sen 2 θ + cos2 θ sen 2ϕ ∂ u
+ · cos θ + sen θ + + +
ρ ρ ρ ∂ρ
 
cos ϕ 2 2
 sen ϕ cos ϕ 2 2
 sen ϕ cos ϕ ∂ u
+ 2 sen θ + cos θ − 2 cos θ + sen θ + 2 +
ρ sen ϕ ρ2 ρ2 ∂ϕ
 
∂u sen ϕ cos ϕ 2 2
 sen ϕ cos ϕ ∂ 2u
+0· + 2 cos θ + sen θ − 2 +
∂θ ρ ρ ∂ ρ∂ ϕ
∂ 2u ∂ 2u
+0· +0·
∂ ρ∂ θ ∂ ϕ∂ θ
∂ 2u 1 ∂ 2u 1 ∂ 2u 2 ∂ u cos ϕ ∂u
= 2
+ 2
· 2
+ 2 2
· 2
+ · + 2 ·
∂ρ ρ ∂ϕ ρ sen ϕ ∂ θ ρ ∂ ρ ρ sen ϕ ∂ ϕ
∂ 2u 1 ∂ 2u 1 ∂ 2u 2 ∂ u cotg ϕ ∂ u ,
= + · + · + · + ·
∂ ρ 2 ρ 2 ∂ ϕ 2 ρ 2 sen 2 ϕ ∂ θ 2 ρ ∂ ρ ρ2 ∂ϕ
que é a expressão em (8.26).
564 4 Aplicações às EDP

Apêndice 3: condução do calor em uma barra

Considere uma barra uniforme isolada termicamente nas laterais, de modo que a condução
do calor só se dê na direção do eixo, porém admite-se transferência de calor nas extremidades
da barra. Sejam L o comprimento dessa barra e A a área de sua seção transversal.

Figura 8.1: Condução do calor em uma barra.

As hipóteses de uniformidade do material que é feito a barra e o isolamento térmico nas


laterais faz com que a condução do calor se dê na direção longitudinal, que pode ser pensado
como na direção do eixo x.
Considerar-se-á a lei de Fourier que afirma: Considere duas placas P1 e P2 com áreas transver-
sais iguais a A mantidas com temperaturas constantes T1 e T2 , respectivamente. Se estas duas
placas forem colocadas a uma pequena distância d, haverá transferência de calor da seção mais
quente para a seção mais fria. Essa quantidade de calor é diretamente proporcional à área A e à
diferença de temperatura |T2 − T1|, e inversamente proporcional à distância entre elas, ou seja,
κ A|T2 − T1 | ,
(8.0) Q=
d
onde a constante de proporcionalidade κ é chamada de condutividade térmica e que depende
do material que é feito a barra.
Denote por u(x, t) a temperatura de um ponto de abcissa x no tempo t. Tome duas seções
transversais da barra localizadas em x e x + d. A lei de Fourier exige que as temperaturas em
cada seção seja constante, mas as temperaturas nessas duas seções variam com o tempo t. A
ideia é introduzir o fluxo de calor em cada seção x0 em um instante t: fazendo T2 = u(x0 + d, t)
e T1 = u(x0 , t), onde se fixou o tempo t, e depois passar ao limite quando d → 0. Daqui por
diante, até o final do apêndice, assume-se que a função u(x, t) é de classe C2 .
Assim,

κ A |T2 − T1|
Q(x0 , t) = lim
d→0 d
u(x0 + d, t) − u(x0, t)
= κ A · lim
d→0 d
= κ A ux (x0 , t).
4.8 Exercícios propostos 565

Observa-se que o módulo foi retirado intencionalmente: o sinal da última expressão pode
variar, neste caso. O importante é dar um sentido físico para −κ A ux (x, t) e para κ A u(x, t).
Define-se o fluxo de calor na direção positiva do eixo x por

(8.1) q(x, t) = −κ A ux (x, t).

O sinal de “menos” significa o seguinte: se a temperatura u(x, t) crescesse com x, então


ux (x, t) seria positivo, mas como o calor fluiria para a esquerda, então q(x, t) deveria ser nega-
tivo. Por outro lado, se u(x, t) decrescesse com x, então ux (x, t) seria negativo, mas q deveria ser
positivo, uma vez que o calor fluiria para a direita.

Figura 8.2: Condução do calor em uma parte barra.

Agora fixa-se um elemento da barra entre x0 e x0 + ∆x e analisa-se qual é a quantidade de


calor q que entra aí no período de tempo t0 e t0 + ∆t. Usando o fluxo de calor q(x, t), obtém-se
Z t0 +∆t Z t0 +∆t
q= q(x0 , t) dt − q(x0 + ∆x, t) dt
t0 t0
Z t0 +∆t Z t0 +∆t
= [−κ A ux (x0 , t)] dt − [−κ A u(x0 + ∆x, t)] dt
t0 t0
Z t0 +∆t
= [−κ A ux (x0 , t) + κ A ux (x0 + ∆x, t)] dt
t0
Z t0 +∆t
(8.2) = κ A [ux (x0 + ∆x, t) − ux(x0 , t)] dt.
t0

O calor específico c de uma substância é a quantidade de calor necessária para elevar em 1◦


C a temperatura de um grama dessa substância e que pode ser escrito na forma
Z t0 +∆t Z x0 +∆x
(8.3) q= c ρ A ut (x, t) dx dt,
t0 x0

onde ρ é a densidade da substância.


Pelo teorema fundamental do Cálculo em (8.2), tem-se que
566 4 Aplicações às EDP

Z t0 +∆t
q= κ A [ux (x0 + ∆x, t) − ux (x0 , t)] dt
t0
Z t0 +∆t Z x0 +∆x

= κA uxx(x, t) dx dt
t0 x0
Z t0 +∆t Z x0 +∆x
(8.4) = κ A uxx(x, t) dx dt.
t0 x0

Como os primeiros membros em (8.3) e (8.4) são iguais, então seus segundos membros tam-
bém serão iguais. Assim,
Z t0 +∆t Z x0 +∆x Z t0 +∆t Z x0 +∆x
κ A uxx(x, t) dx dt = c ρ A ut (x, t) dx dt,
t0 x0 t0 x0
Z t0 +∆t Z x0 +∆x Z t0 +∆t Z x0 +∆x
κ uxx(x, t) dx dt = c ρ ut (x, t) dx dt,
t0 x0 t0 x0
Z t0 +∆t Z x0 +∆x Z t0 +∆t Z x0 +∆x
κ uxx(x, t) dx dt − c ρ ut (x, t) dx dt = 0,
t0 x0 t0 x0
Z t0 +∆t Z x0 +∆x
(8.5) [κ uxx (x, t) − c ρ ut (x, t)] dx dt = 0.
t0 x0

A expressão em (8.5) é válida para todo t0 > 0, todo 0 < x0 < L e todos ∆t > 0 e ∆x > 0.
Segue-se daí que

κ uxx(x, t) − c ρ ut (x, t) = 0 ⇒ c ρ ut (x, t) − κ uxx(x, t) = 0,

ou seja,
κ
ut (x, t) − uxx(x, t) = 0 ⇒ ut − α 2 uxx = 0,

onde α 2 = κ/cρ é a difusividade térmica, que depende apenas do material de que é feita a barra.
A última equação é chamada de equação do calor e que representa a variação da temperatura
u(x, t) em uma barra uniforme com superfície lateral isolada termicamente.
A temperatura u(x, t) da barra satisfaz a equação do calor, mas, por outro lado, esta equação
tem várias soluções. Por exemplo, se a função u(x, t) for constante ou u(x, t) = cx, onde c é
constante, então u satisfaz a equação do calor. Assim, deve-se impor outras condições. Uma
condição inicial é essencial para determinar a solução u(x, t). Assim, escrever u(x, 0) = f (x),
com f : [0, L] → R dada, significa dizer que f descreve a temperatura nos vários pontos da barra
quando t = 0.
Além disso, é importante informar se as extremidades da barra estão isoladas termicamente,
se entra ou não calor, etc. Estas informações nas extremidades da barra são chamadas de
condições de fronteira e podem ser de vários tipos.
Por exemplo, se

u(0, t) = T1 e u(0, t) = T2 ,
4.8 Exercícios propostos 567

então isto significa que as extremidades da barra estão sendo mantidas a temperaturas contantes,
mas com temperatura diferente em cada extremidade.
Caso seja
u(0, t) = T1(t) e u(L, t) = T2 (t),
então as condições de fronteiras descrevem a variação da temperatura nas extremidades da barra.
Outra possilidade é analisar o fluxo de calor nas extremidades. Neste caso, o fluxo de calor
é dado pelas derivadas normais, ou seja, derivadas direcionais na direção do vetor normal ν e
que aponta para fora das extremidades da barra. Para a extremidade esquerda e direita da barra,
tem-se, respectivamente que
∂u ∂u
(0, t) e (L, t)·
∂νν 1 ∂νν 2
Como estas derivadas normais são paralelas ao eixo x, então pode-se tomar como vetores
normais ν 1 = (−1, 0) e ν 2 = (1, 0), respectivamente, nas derivadas acima. Assim, em dimensão
1, tem-se que
∂u
(0, t) = ∇u(0, t) · ν1 = (ux (0, t), ut (0, t)) · (−1, 0) = −ux(0, t),
∂νν 1
∂u
(0, t) = ∇u(L, t) · ν2 = (ux (L, t), ut (L, t)) · (1, 0) = ux (L, t).
∂νν 2
Caso seja
ux(0, t) = ux (L, t) = 0,
então está se afirmando que o fluxo de calor nas extremidades é zero, ou seja, que não entra e
nem sai calor nas extremidades da barra. Isto é o mesmo que dizer que as extremidades estão
isoladas termicamente.
Também é possivel ter condições de fronteira que informam a temperatura em uma extremi-
dade e o fluxo de calor na outra. Por exemplo,

u(0, t) = 0 e ux (L, t) = 0.

Existem outras possibilidades, mas essas são suficientes para os objetivos deste texto.

Apêndice 4: vibrações em uma corda elástica

Neste apêndice ao capítulo 4 estudar-se-á o problema de pequenas vibrações em uma corda


elástica. Idealiza-se o modelo no plano xOu onde a corda vibre em torno de sua posição de
568 4 Aplicações às EDP

equilíbrio ao longo do eixo x. Além disso, supõe-se que os pontos sobre a corda se desloquem
apenas na direção do eixo u, ou seja, considera-se as vibrações transversais. Além disso, supõe-
se que a corda tem comprimento L e tem as extremidades fixas em x = 0 e x = L, mas com uma
tensão τ constante ao longo da corda. Essa situação inicial é chamada de posição de equilíbrio
da corda.
Suponha que a corda seja perturbada de sua posição de equilíbrio e que comece a vibrar
livremente no plano xOu, onde cada ponto sobre a corda se desloque perpendicularmente ao
eixo x. Aqui é necessário supor que a amplitude da corda seja muito pequena, a fim de que
a inclinação relativa ao eixo x seja pequena em comparação com a posição de equilíbrio. Isto
significa dizer que um segmento dx da corda em posição de equilíbrio deforma-se em um arco
de curva ds no instante t, de modo que ds ≈ dx (ou seja, ds é aproximadamente igual a dx). Isto
não seria verdade caso a amplitude fosse grande.
A função u(x, t) representará o deslocamento transversal de um ponto x da posição inicial
no instante t. Com ux(x, t) representa-se a inclinação da corda no ponto x e no instante t. Já a
derivada ut (x, t) representa a velocidade com que o ponto x se desloca verticamente.
Observa-se que as grandezas envolvidas na lei de Newton são vetoriais, de modo que se deve
ter cuidado com a direção e a orientação de forças, velocidades, acelerações, etc.
Sejam x = a e x = b dois pontos arbitrários da corda, de modo estes dois pontos determinando
uma parte da corda. Seja ρ (x, t) a densidade da corda, ou seja, o quociente da massa pelo
comprimento. Como foi comentado anteriormente, supõe-se que os pontos sobre a corda se
deslocam verticalmente em relação a x. Assim sendo, a densidade ρ não vai depender de t, mas
apenas de x; ela será denotada por ρ (x).
A quantidade de movimento é definida como o produto entre a massa de um corpo e a veloci-
dade instantânea. Por definição de densidade, segue-se que dm = ρ (x) dx representa a massa
infinitesimal de uma pequena porção da corda. Além disso, como já comentado, ut (x, t) repre-
senta a velocidade no movimento. Assim, dM = ρ ut (x, t) dx representa a quantidade de movi-
mento infinitesimal, de uma pequena porção da corda, de modo que a sua integral representa
a quantidade de movimento entre dois pontos. Portanto, a quantidade de movimento da corda
entre os pontos x = a e x = b é dada por
Z b
(8.1) M(t) = ρ (x) ut (x, t) dx.
a

Lei de Newton: “A derivada com relação ao tempo da quantidade de movimento do corpo é


igual à soma das forças aplicadas”.
Como dito anteriormente, está se considerando vibrações transversais, de modo que a corda
se desloca apenas na direção do eixo u, logo não há componente de velocidade na direção do
eixo x, somente da direção de u.
Existem dois tipos de forças a serem considerados:
(a) A ação no restante da corda sobre a porção entre x = a e x = b;
(b) As tensões na direção das tangentes.
4.8 Exercícios propostos 569

Denota-se por Ta = T (a, t) e Tb = T (b, t) as tensões, respectivamente, nos pontos x = a e


x = b. Sejam, respectiamente, θa e θb os ângulos das tangentes a corda com o eixo x nos pontos
x = a e x = b.

Figura 8.1: Porção da corda sob tensão.

Figura 8.2: Tensões horizontais e verticais.

A lei de Newton dada anteriormente é equivalente a seguinte versão: “A força externa to-
tal, devido à tensão nas extremidades do elemento, é igual ao produto da massa da porção
considerada pela aceleração de seu centro de massa”. Como não há aceleração horizontal, as
componentes horizontais devem satisfazer

T (b, t) · cos θb − T (a, t) · cos θa = 0.

A expressão anterior mostra componente horizontal da tensão independe do ponto x e que é


função apenas do tempo t. Denote por τ (t) = T · cos θ a componente horizontal da tensão. Além
disso, observe que
sen θ
τ (t) · tg θ = [ T · cos θ ] · tg θ = T · sen θ · = T sen θ .
cos θ
Esta última expressão diz que τ (t) · tg θ é igual a componente vertical da tensão.
570 4 Aplicações às EDP

Analisa-se agora a resultante das tensões verticais. Observando que tg θ = ux (x, t) e usando
o teorema fundamental do Cálculo, obtém-se
cos θb cos θa
T (b, t) · sen θb − T (a, t) · sen θa = T (b, t) · · sen θb − T (a, t) · · sen θa
cos θb cos θa
= [ T (b, t) · cos θb ] · tg θb − [T (a, t) · cos θa ] · tg θa

= τ (t) · tg θb − τ (t) · tg θa

= τ (t) · [ tg θb − tg θa]

= τ (t) · [ ux(b, t) − ux (a, t)]


b

= τ (t) · ux (x, t)
a
Z b
= τ (t) · uxx (x, t) dx
a
Z b
= τ (t) · uxx (x, t) dx,
a

ou seja, que a resultante vertical das tensões, Tres. , atuando sobre a porção da corda entre x = a
e x = b é dada por
Z b
(8.2) Tres. = τ (t) · tg (θb ) − τ (t) · tg (θa) = τ (t) · uxx(x, t) dx.
a

Além das forças de tensão, o sistema pode estar sujeito à ação de forças externas, como
gravidade, resistência ao movimento oposta pelo meio onde está a corda, ou forças tendentes
a restaurar a posição de equilíbrio da corda. Seja h(x, t, u) a densidade linear dessas forças ao
longo da corda. Então, a sua integral representa o conjunto de forças externas, Fext , atuando no
sistema, ou seja, tem-se que
Z b
(8.3) Fext = h(x, t, u) dx
a

representa as forças externas.


Recorde-se a lei de Newton, que diz: “A derivada com relação ao tempo da quantidade de
movimento do corpo é igual à soma das forças aplicadas”. Então deve-se derivar a expressão
que define a quantidade de movimento, que é
Z b
M(t) = ρ (x) ut (x, t) dx,
a

e igualar a soma das forças atuantes no sistema. A derivada da quantidade de movimento


é obtida aplicando-se a regra de Leibniz, que é apresentada através do proposição 12.1 do
apêndice 1.12 do capítulo 1, pois aqui supõe-se que u ∈ C2 . Assim, tem-se que
4.8 Exercícios propostos 571

Z b
dM d
(t) = ρ (x) ut (x, t) dx
dt dt a

= (Regra de Leibniz)
Z b

= [ ρ (x) ut (x, t)] dx
a ∂t
Z b
(8.4) = ρ (x) utt (x, t) dx
a

Assim, pela lei de Newton, segue-se que


dM
= Tres. + Fext ,
dt
de modo que, pelas expressões em (8.2), (8.3) e (8.4), resulta em
Z b Z b Z b
(8.5) ρ (x) · utt (x, t) dx = τ (t) · uxx(x, t) dx + h(x, t, u) dx.
a a a

Assim, Z b Z b Z b
ρ (x) · utt (x, t) dx = τ (t) · uxx (x, t) dx + h(x, t, u) dx,
a a a
Z b Z b
ρ (x) · utt (x, t) dx = [τ (t) · uxx (x, t) + h(x, t, u)]dx,
a a
Z b Z b
ρ (x) · utt (x, t) dx − [τ (t) · uxx(x, t) + h(x, t, u)] dx = 0,
a a
Z b
[ρ (x) · utt (x, t) − τ (t) · uxx(x, t) − h(x, t, u)] dx = 0,
a
Segue-se daí que ρ (x) · utt (x, t) − τ (t) · uxx (x, t) − h(x, t, u) = 0, ou que

ρ (x) · utt (x, t) − τ (t) · uxx(x, t) = h(x, t, u).

Como ρ (x) > 0, da expressão acima resulta


τ (t) h(x, t, u) ,
utt (x, t) − · uxx (x, t) =
ρ (x) ρ (x)
ou ainda, que

(8.6) utt − α 2 uxx = f (x, t, u),

onde se fez
τ (t) h(x, t, u)
α 2 = [α (x, t)]2 =e f (x, t, u) = ·
ρ (x) ρ (x)
A expressão em (8.6) é chamada de equação de onda, que é o modelo matemático para
pequenas vibrações da corda elástica.
572 4 Aplicações às EDP

A NÁLISE DIMENSIONAL : considere as três grandezas massa, comprimento e tempo, as quais


serão presentadas pelas letras M, L e T, respectivamente. Como τ (t) é a componente horizontal
da tensão (produto da massa pela aceleração) e ρ (x) é a densidade (quociente entre a massa e o
comprimento), segue-se, então, que suas dimensões são dadas por
L ML M
dim[τ (t)] = M · = e dim[ρ (x)] = ·
T2 T2 L
Daí segue-se que
ML
 dim[τ (t)] 2 ML L L2 L,
dim α 2
= = T = 2 · = 2 ⇒ dim (α ) =
dim[ρ (x)] M T M T T
L
ou seja, α tem dimensão de velocidade.
A equação de onda, utt − α 2 uxx = f (x, t, u), também está dimensionalmente correta. De fato,
como ut (x, t) tem dimensão de velocidade, então utt (x, t) tem dimensão de aceleração. Como
ux (x, t) representa a inclinação da corda, então uxx(x, t) representa a curvatura da corda. Segue-
se daí que
L 1
dim[utt (x, t)] = 2 e dim[uxx(x, t)] = ·
T L
Assim, 
dim[ f (x, t, u)] = dim[utt (x, t)] + dim α 2 · dim[uxx(x, t)]

L L2 1 L L
=
2
+ 2
· = 2+ 2
T T L T T
L
= 2 2·
T
Como o valor 2 não altera a dimensionalidade, segue-se, portanto, que
L
dim[ f (x, t, u)] = ·
T2
E como h(x, t, u) = ρ (x) · f (x, t, u), segue-se daí que
M L M
dim[h(x, t, u)] = dim[ρ (x)] · dim[ f (x, t, u)] = · 2 = 2·
L T T
4.8 Exercícios propostos 573

Apêndice 5: classificação de equações de segunda ordem

Uma EDP semi-linear de segunda ordem com duas variáveis independentes é uma equação
da forma

(8.1) a(x, y) uxx + 2b(x, y) uxy + c(x, y) uyy = f (x, y, u, ux , uy).

Chama-se parte principal ao operador diferencial

(8.2) Pu = a(x, y) uxx + 2b(x, y) uxy + c(x, y) uyy.

Sejam Ω ⊂ R2 uma região aberta e a, b, c : Ω → R funções contínuas que não se anulam


simultaneamente. A função ∆ : Ω → R dada por

(8.3) ∆(x, y) = [b(x, y)]2 − a(x, y) · c(x, y)

é dita o discriminante da EDP (8.1).

D EFINIÇÃO : A EDP semi-linear dada em (8.1) é dita


(a) Parabólica no ponto (x, y) ∈ Ω se ∆(x, y) = 0;
(b) Hiperbólica no ponto (x, y) ∈ Ω se ∆(x, y) > 0;
(c) Elítica no ponto (x, y) ∈ Ω se ∆(x, y) < 0.

O leitor deve observar que a EDP (8.1) pode mudar de tipo no domínio de definição de seus
coeficientes. Quando isso ocorre, diz-se que a EDP (8.1) é uma equação de tipo misto.

Exemplo 8.2: A equação de Tricomi,

y uxx + uyy = 0,

é uma equação de tipo misto.

De fato, observando que a(x, y) = y, b(x, y) = 0 e c(x, y) = 1, conclui-se que

∆(x, y) = [b(x, y)]2 − a(x, y) · c(x, y) = 02 − y · 1 = y.

Logo, no semi-plano y > 0 a equação de Tricomi será elítica, no semi-plano y < 0 ela será
hiperbólica e será parabólica no eixo x.

Proposição 8.6: Sejam Ω ⊂ R2 e T (x, y) = (ξ (x, y), η (x, y)) uma mudança de variáveis de
classe C2(Ω). Suponha também que o jacobiano
574 4 Aplicações às EDP



∂ (ξ , η ) ξx (x0 , y0) ξy(x0 , y0)
J(x0, y0 ) = = 6= 0
∂ (x, y)
ηx (x0 , y0 ) ηy (x0 , y0)

em um ponto (x0 , y0) ∈ Ω. Então, a EDP semi-linear dada em (8.1) é invariante sob esta mudança
de variáveis.

D EMONSTRAÇÃO : Como as funções ξ = ξ (x, y) e η = η (x, y) são funções com derivadas


segundas contínuas em uma vizinhança de (x0 , y0) ∈ Ω e J(x0 , y0) 6= 0, então, por continuidade,
o jacobiano não se anula em uma vizinhança de (x0 , y0) ∈ Ω. Com isso, é possível usar o teorema
da aplicação inversa e resolver localmente x = x(ξ , η ) e y = y(ξ , η ) em uma vizinhança de
(ξ0 , η0) = (ξ (x0 , y0 ), η (x0 , y0)). Além disso, as funções x = x(ξ , η ) e y = y(ξ , η ) também serão
de classe C2 nessa vizinhança.
Agora defina v(ξ , η ) = u(x, y). Pela regra da cadeia (veja o apêndice 1 deste capítulo para
mais detalhes), obtém-se
ux = vξ · ξx + vη · ηx,

uy = vξ · ξy + vη · ηy,

uxx = vξ ξ · (ξx )2 + 2vξ η · ξx · ηx + vηη · (ηx )2 + vξ · ξxx + vη · ηxx,

uxy = vξ ξ · ξx · ξy + vξ η (ξx · ηy + ξy · ηx) + vηη · ηx · ηy + vξ · ξxy + vη · ηxy ,

uyy = vξ ξ · (ξy)2 + 2vξ η · ξy · ηy + vηη (ηy )2 + vξ · ξyy + vη · ηyy.

Fazendo a = a(x, y), b = b(x, y) e c = c(x, y) e substituindo-se as derivadas parciais acima na


parte principal da equação (8.1), encontra-se

h i
a uxx + 2b uxy + c uyy = a · vξ ξ · ξx2 + 2vξ η · ξx · ηx + vηη · ηx2 + vξ · ξxx + vη · ηxx +
h
+ 2b · vξ ξ · ξx · ξy + vξ η (ξx · ηy + ξy · ηx ) +
i
+ vηη · ηx · ηy + vξ · ξxy + vη · ηxy +
h i
2 2
+ c · vξ ξ · ξy + 2vξ η · ξy · ηy + vηη ηy + vξ · ξyy + vη · ηyy
 
= a · ξx2 + 2b · ξx · ξy + c · ξy2 · vξ ξ +

+ [2a · ξx · ηx + 2b · (ξx · ηy + ξy · ηx) + 2c · ξy · ηy] · vξ η +


 
+ a · ηx2 + 2b · ηx · ηy + c · ηy2 · vηη +
h
+ a · vξ · ξxx + a · vη · ηxx + 2b · vξ · ξxy + 2b · vη · ηxy + c · vξ · ξyy+
i
+ c · vη · ηyy
4.8 Exercícios propostos 575

 
= a · ξx2 + 2b · ξx · ξy + c · ξy2 · vξ ξ +

+ 2 [a · ξx · ηx + b · (ξx · ηy + ξy · ηx ) + c · ξy · ηy ] · vξ η +
 
+ a · ηx2 + 2b · ηx · ηy + c · ηy2 · vηη +
n o
(8.4) + [a · ξxx + 2b · ξxy + c · ξyy] · vξ + [a · ηxx + 2b · ηxy + c · ηyy] · vη .

Fazendo em (8.4)

A(ξ , η ) = a(x, y) · ξx2 + 2b(x, y) · ξx · ξy + c(x, y) · ξy2,

B(ξ , η ) = a(x, y) · ξx · ηx + b(x, y) · (ξx · ηy + ξy · ηx ) + c(x, y) · ξy · ηy,

C(ξ , η ) = a(x, y) · ηx2 + 2b(x, y) · ηx · ηy + c(x, y) · ηy2 ,

R = [a(x, y) · ξxx + 2b(x, y) · ξxy + c(x, y) · ξyy] · vξ +

+ [a(x, y) · ηxx + 2b(x, y) · ηxy + c(x, y) · ηyy] · vη ,


conclui-se que

(8.5) a(x, y) uxx + 2b(x, y) uxy + c(x, y) uyy = A(ξ , η ) vξ ξ + 2B(ξ , η ) vξ η + C(ξ , η ) vηη + R.

O leitor deve observar que a expressão para R envolvem derivadas parciais de primeira ordem
apenas, ou seja, R = R(ξ , η , v, vξ , vη ). Por outro lado, a parte principal no segundo membro de
(8.5) tem os coeficientes A, B e C multiplicando derivadas parciais de segunda ordem. Portanto,
se u(x, y) uma solução clássica da equação

a(x, y) uxx + 2b(x, y) uxy + c(x, y) uyy = f (x, y, u, ux , uy),

então v(x, y) será uma solução clássica da EDP

(8.6) A(ξ , η ) vξ ξ + 2B(ξ , η ) vξ η + C(ξ , η ) vηη = F(ξ , η , v, vξ , vη ),

Para continuar, em um cálculo que realizado a seguir usará a fórmula do quadrado da soma
entre três termos, que é dada por

(a + b + c)2 = a2 + b2 + c2 + 2ab + 2ac + 2bc.

Também será necessário encontrar o quadrado do jacobiano, J 2. Como




∂ (ξ , η ) ξx ξy

J= = = ξx · ηy − ξy · ηx,
∂ (x, y)
η
x η y

segue-se que

J 2 = (ξx · ηy − ξy · ηx)2 = ξx2 · ηy2 − 2ξx · ξy · ηx · ηy + ξy2 · ηx2 .


576 4 Aplicações às EDP

Assim, calculando o discriminante da equação (8.6), encontra-se

∆(ξ , η ) = [B(ξ , η )]2 − A(ξ , η ) · C(ξ , η )

= [a · ξx · ηx + b · (ξx · ηy + ξy · ηx) + c · ξy · ηy]2 −


   
− a · ξx2 + 2b · ξx · ξy + c · ξy2 · a · ηx2 + 2b · ηx · ηy + c · ηy2

= (Pela fórmula acima)

= a2 · ξx2 · ηx2 + b2 · (ξx · ηy + ξy · ηx )2 + c2 · ξy2 · ηy2 +

+ 2 [a · b · ξx · ηx (ξx · ηy + ξy · ηx )] + 2 [a · c · ξx · ξy · ηx · ηy ] +

+ 2 [b · c · ξy · ηy · (ξx · ηy + ξy · ηx )] −

− a2 · ξx2 · ηx2 − 2a · b · ξx2 · ηx · ηy − a · c · ξx2 · ηy2 −

− 2a · b · ξx · ξy · ηx2 − 4b2 · ξx · ξy · ηx · ηy − 2b · c · ξx · ξy · ηy2 −

− a · c · ξy2 · ηx2 − 2b · c · ξy2 · ηx · ηy − c2 · ξy2 · ηy2

= a2 · ξx2 · ηx2 + b2 · ξx2 · ηy2 + 2b2 · ξx · ξy · ηx · ηy + b2 · ξy2 · ηx2 + c2 · ξy2 · ηy2+

+ 2a · b · ξx2 · ηx · ηy + 2a · b · ξx · ξy · ηx2 + 2a · c · ξx · ξy · ηx · ηy+

+ 2b · c · ξx · ξy · ηy2 + 2b · c · ξy2 · ηx · ηy−

− a2 · ξx2 · ηx2 − 2a · b · ξx2 · ηx · ηy − a · c · ξx2 · ηy2 −

− 2a · b · ξx · ξy · ηx2 − 4b2 · ξxξyηx · ηy − 2b · c · ξx · ξy · ηy2 −

− a · c · ξy2 · ηx2 − 2b · c · ξy2 · ηx · ηy − c2 · ξy2 · ηy2



= b2 ξx2 · ηy2 − 2ξx · ξy · ηx · ηy + ξy2 · ηx2 −

− a · c ξx2 · ηy2 − 2ξx · ξyηx ηy + ξy2 · ηy2 +
h
+ a2 · ξx2 · ηx2 − a2 · ξx2 · ηx2 + c2 · ξy2 · ηy2 − c2 · ξy2 · ηy2 +
 
+ 2a · b · ξx2 · ηx · ηy + ξx · ξy · ηx2 − 2a · b · ξx2 · ηx · ηy + ξx · ξy · ηx2
 i
+ 2b · c · ξx · ξy · ηy2 + ξy2 · ηx · ηy − 2b · c · ξx · ξy · ηy2 + ξy2 · ηx · ηy

= b2 ξx2 · ηy2 − 2ξx · ξy · ηx · ηy + ξy2 · ηx2 −

− a · c ξx2 · ηy2 − 2ξx · ξyηx ηy + ξy2 · ηy2 +

= b2 · J 2 − a · c · J 2 = b2 − a · c · J 2 ,

que ao fazer δ (x, y) = b2 (x, y) − a(x, y) · b(x, y) implica em


4.8 Exercícios propostos 577

∆(ξ , η ) = δ (x, y) · J 2(x, y).

Como, por hipótese, o jacobiano não se anula em uma vizinhança do ponto (x0 , y0), então o
sinal de ∆(ξ , η ) será sempre igual ao sinal de δ (x0 , y0). Isso mostra que a classificação de uma
EDP semi-linear é invariante sob mudança de variáveis.
Adendo A
Funções representadas por integrais

Este adendo é dedicado ao estudo de funções representadas por integrais. Serão discutidas as
propriedades de continuidade, diferenciabilidade e integrabilidade de funções ϕ representadas
por integrais dos seguintes tipos:
Z b Z ∞
ϕ (x) = f (x, y) dy, ϕ (x) = f (x, y) dy,
a a
Z b Z ∞
ϕ (x) = f (x, y) dy, ϕ (x) = f (x, y) dy,
−∞ −∞

onde f : I ×J → R é uma função dada, satisfazendo certas condições e onde I ⊂ R é um intervalo


(limitado ou não) e J ⊂ R.
Observa-se que as duas integrais,
Z ∞ Z b
f (x, y) dy e f (x, y) dy,
a −∞

são reduzidas a um único caso, pois fazendo a mudança de variáveis z = −y (de modo que
−dz = dy), permite-se escrever
Z b Z −b Z ∞ Z ∞
f (x, y) dy = − f (x, −z) dz = f (x, −z) dz = f (x, −z) dz,
−∞ ∞ −b a

onde se fez a = −b.


Assim sendo, serão abordados os três casos distintos:
Z b Z ∞ Z ∞
f (x, y) dy, f (x, y) dy e f (x, y) dy.
a a −∞

A.1 Primeiro caso

Começa-se com o caso de função definida por integral do tipo


Z b
(1.1) ϕ (x) = f (x, y) dy,
a

579
580 A Funções representadas por integrais

onde I ⊂ R é um intervalo (limitado ou não) e f : I × [a, b] → R é uma função dada e cuja



restrição, f [a,b] – isto é, a função y 7→ f (x, y) – é integrável.
Z b
Tem-se que ϕ (x) é de fato uma função no intervalo I: para x fixado, se a integral f (x, y) dy
a
existir, ou seja, se esta integral for um número finito, então ela terá ϕ (x) como seu valor. Como
o valor de x está fixado, então o valor ϕ (x) da integral, além de exisitir, será único. Isso mostra
que para cada x existe um único ϕ (x) associado a ele; logo ϕ é função.
Naturalmente, existem funções f (x, y), que integradas em relação a y, não definem uma
função. Tipicamente, isso decorre do fato de f ser ilimitada em um ou mais pontos y em seu
domínio. Nesse caso, trata-se de uma integral imprópria. Esse assunto será tratado mais adiante.
O próximo lema será usado em vários resultados presentes neste adendo.

Lema 1.1: Sejam f : I × [a, b] → R uma função contínua x0 ∈ I um ponto fixado. Então, para
todo ε > 0, existe δ > 0 tal que, para x ∈ I, se tem

|x − x0 | < δ ⇒ | f (x, y) − f (x0 , y)| < ε ,

qualquer que seja y ∈ [a, b].


D EMONSTRAÇÃO : Suponha que a afirmação do lema seja falsa. Então existem sequências
de pontos xn ∈ I e yn ∈ [a, b] tais que
1
|xn − x0 | < ⇒ | f (xn , yn) − f (x0 , yn)| ≥ ε .
n
Como a sequência {yn } ⊂ [a, b] e este intervalo, além de fechado, é limitado, tem-se, em
virtude do teorema de Bolzano-Weierstrass, que ela possui subsequência convergente. Passando
uma subsequência, se necessário, pode-se supor que lim yn = y ∈ [a, b]. Além disso, a parte
n→∞
|xn − x0 | < 1/n significa dizer que lim xn = x0 . Assim sendo, a continuidade da função f implica
n→∞
em
ε ≤ lim | f (xn , yn ) − f (x0 , yn)| = | f (x0 , y) − f (x0 , y)| = 0,
n→∞
ou seja, que ε ≤ 0. Mas isso contradiz a hipótese de que ε > 0.

O resultado a seguir será usado em vários resultados ao longo deste texto.

Teorema 1.1 (teorema valor médio para integrais): Parte (a): Sejam f : [a, b] → R uma
Z b
função contínua e g : [a, b] → R uma função não negativa e integrável tal que g(x) dx > 0.
a
Então, existe c ∈ [a, b] tal que
Z b Z b
f (x) · g(x) dx = f (c) g(x) dx.
a a
A.1 Primeiro caso 581

D EMONSTRAÇÃO : Como f é contínua em [a, b], então m ≤ f (x) ≤ M, onde m = min f (x) e
M = max f (x) em [a, b]. Suponha que g(x) ≥ 0. Então,

m · g(x) ≤ f (x) · g(x) ≤ M · g(x),

para todo x ∈ [a, b].


Em virtude a integrabilidade de f (por ser contínua) e de g (integrável por hipótese), segue-se
daí que
Z b Z b Z b
m g(x) dx ≤ f (x) · g(x) dx ≤ M g(x) dx.
a a a
Portanto, existe d ∈ [m, M] tal que
Z b Z b
d g(x) dx = f (x) · g(x) dx.
a a

Como f é contínua, então pelo teorema do valor intermediário, existe algum c ∈ [a, b] tal que
f (c) = d. Portanto,
Z b Z b
f (x) · g(x) dx = f (c) g(x) dx.
a a

Z b
Observa-se que o teorema 1.1 continua verdadeiro para funções g(x) ≤ 0 tais que g(x) dx <
a
0. Neste caso, basta aplicar o teorema com − f e −g.
O exemplo a seguir mostra que é preciso ter certos cuidados ao trabalhar com funções
definidas por integrais.

Exemplo 1.1: Seja f : (0, 1] × [0, 1] → R definida por


y −y2/x2
f (x, y) = ·e .
x2
Afirma-se que existe o limite
lim f (x, y) = ψ (y),
x→0
mas que
Z 1 Z 1
ψ (y) dy 6= lim f (x, y) dy.
0 x→0 0
De fato, tem-se que
0 −0/x2
f (x, 0) = ·e = 0 · e = 0.
x2
Fixado y ∈ (0, 1] e fazendo

y2 y y2 1 t ,
t= ⇒ = · =
x2 x2 x2 y y
obtém-se
582 A Funções representadas por integrais

y   
−y2/x2 y 1
lim f (x, y) = lim ·e = lim · 2
x→0+ x→0+ x2 x→0+ x2 e y /x2
   
t 1 t
= lim · = lim = (por l’Hospital)
t→∞ y e t t→∞ y · e t
 
1
= lim = 0.
t→∞ y · e t

Isso permite concluir que

lim f (x, y) = 0 = ψ (y), para todo y ∈ [0, 1]


x→0+

e, consequentemente, que
Z 1 Z 1
ψ (y) dy = 0 dy = 0.
0 0
Além disso, a função f (x, y) é contínua em y ∈ [0, 1]. Portanto, ela é Riemann integrável na
variável y. Assim, para qualquer x ∈ (0, 1], obtém-se
Z 1 Z 1 Z  
y −y2/x2  1 1 −2y −y2/x2
f (x, y) dy = ·e dy = − ·e dy
0 0 x2 2 0 x2

= (fazendo u = −y2/x2 , de modo que du = (−2y/x2) dy)


Z −1/x2 −1/x2
1 1
=− e u dy = − · e u
2 0 2 0

1  −1 2  1 
−1 2

= − · e /x − e 0 = · −e /x + 1
2 2
1  
−1 2
= · 1 − e /x .
2
Por outro lado,
Z 1  
1  −1/x2
lim f (x, y) dy = lim · 1−e
x→0+ 0 x→0+ 2

1 1  
−1 2
= lim − · lim e /x
x→0+ 2 2 x→0+
 
1 1 1
= lim − · lim
x→0+ 2 2 x→0+ e 1/x2

= (fazendo t = 1/x2 , de modo que t → ∞ quando x → 0+ )


 
1 1 1 1 1
= − · lim = − ·0
2 2 t→∞ e t 2 2
Z 1
1
= 6= 0 = lim f (x, y) dy.
2 0 x→0+

Com isso conclui-se que


A.1 Primeiro caso 583

Z 1 Z 1
1
ψ (y) dy = 0 6= = lim f (x, y) dy.
0 2 x→0 0

Por fim, observa-se que a convergência não é uniforme em [0, 1]: escolhendo yx = x ∈ [0, 1]
para todo x ∈ (0, 1], obtém-se
x
−x2 2
| f (x, yx ) − ψ (yx )| = | f (x, x) − ψ (x)| = 2 · e /x − 0
x
1
= · e −1 → +∞, quando x → 0+ .
x

O próximo resultado garante a continuidade de ϕ .

Proposição 1.1 (continuidade): Seja f : I × [a, b] → R uma função contínua. Então, a função
ϕ : I → R definida por
Z b
ϕ (x) = f (x, y) dy
a
é uma função contínua.
D EMONSTRAÇÃO : Seja x0 ∈ I. Então,
Z Z b
b
|ϕ (x) − ϕ (x0 )| = f (x, y) dy − f (x0 , y) dy
a a
Z
b
= [ f (x, y) − f (x0 , y)] dy
a
Z b
(1.2) ≤ | f (x, y) − f (x0 , y)| dy.
a

Como f é contínua, por hipótese, então é possível usar o lema 1.1 para concluir que, dado
ε > 0, existe δ > 0 tal que, para x ∈ I, se tem
ε ,
|x − x0| < δ ⇒ | f (x, y) − f (x0 , y)| <
b−a
qualquer que seja y ∈ [a, b].
Retornando a (1.2), encontra-se
Z b
|ϕ (x) − ϕ (x0 )| ≤ | f (x, y) − f (x0 , y)| dy
a
Z b b Z
ε ε
< dy = dy
a b−a b−a a
ε b ε

= ·y = · (b − a) = ε .
b−a a b−a
Mostrou-se, portanto, que, dado ε > 0, existe δ > 0 tal que, para x ∈ I, se tem
584 A Funções representadas por integrais

|x − x0 | < δ ⇒ |ϕ (x) − ϕ (x0 )| < ε ,

ou seja, que a função ϕ é contínua.

Observação 1.1: A proposição 1.1 mostrou que a função representada por integral,
Z b
ϕ (x) = f (x, y) dy,
a

é contínua quando f é contínua. A consequência disso é a possibilidade da troca da ordem entre


o limite e a integral. Especificamente: seja x ∈ I. Então, da continuidade de ϕ em x0 , segue-se
que
lim ϕ (x) = ϕ (x0 ).
x→x0

A expressão acima é equivalente a escrever


Z b Z b
lim f (x, y) dy = f (x0 , y) dy.
x→x0 a a

Como f também é contínua em x0 ∈ I, ou seja, que lim f (x, y) = f (x0 , y), então a última
x→x0
expressão é equivalente
Z b Z b
lim f (x, y) dy = lim f (x, y) dy,
x→x0 a a x→x0

mostrando a troca na ordem entre a integral e o limite.

O exemplo dado a seguir ilustra o fato de uma função f (x, y) descontínua em um único ponto
que faz com que a função ϕ (x) definida na proposição 1.1 seja também descontínua.

Exemplo 1.2: Seja f : R2 \ {(0, 0)} → R uma função definida por



x y2 + 1
f (x, y) = 2 ·
x + y2
Não é difícil concluir que f (x, y) é ilimitada e não tem limite na origem: ao longo do eixo y
tem-se que
lim f (0, y) = lim 0 = 0,
y→0 y→0

enquanto que ao longo do eixo x se tem


x
lim f (x, 0) = lim = ∞.
x→0 x→0 x2
A função
A.1 Primeiro caso 585

Z 1
ϕ (x) = f (x, y) dy
0
é determinada da seguinte maneira: para x = 0, então
Z 1
ϕ (0) = 0 dy = 0.
0

Para x 6= 0, tem-se
Z 1  Z 1 2 Z 1 2  
x y2 + 1 y +1 x + y2 + 1 − x2
ϕ (x) = dy = x dy = x dy
0 x2 + y2 0 x2 + y2 0 x2 + y2
Z 
1 x2 + y2
2
Z 1 dy
= x· dy + 1 − x
0 x2 + y2 0 x + y2
2

1
 1  y  1  
= x + 1 − x · arc tg 1 ·
2 2

= x · y + x · 1 − x · · arc tg
x x 0 x
0

Assim,   
2
 1
lim ϕ (x) = lim x + 1 − x · arc tg
x→0 x→0 x
    
2
 1
= lim x + lim 1 − x · lim arc tg
x→0 x→0 x→0 x
π
6= 0 = ϕ (0),
=
2
donde segue-se que ϕ (x) não é contínua em x = 0.

O próximo exemplo mostra que se uma função f (x, y) é contínua na variável x para qualquer
y fixado e também é contínua em y para qualquer x fixado, então a função ϕ (x) da proposição
1.1, em geral, é descontínua.

Exemplo 1.3: Considere f : R2 → R uma função definida por



2
 x · e −x2/y2 ,

para y 6= 0,
f (x, y) = y3

 0, para y = 0.

Fixado y0 6= 0, tem-se que a função f (x, y0 ) é contínua, pois, para qualquer x0 ∈ R, se tem
 2 
x −x2/y2 x20 −x20/y2
lim · e 0 = ·e 0·
x→x0 y3 y 3
0 0

Além disso, para y0 = 0 a função f (x, y) = f (x, 0) = 0 para qualquer que seja x ∈ R, de modo
que f é uma função contínua. Analogamente, para x = 0, a função
586 A Funções representadas por integrais

02 −02/y2
f (x, y) = f (0, y) = ·e = 0 · e 0 = 0,
y3
que é contínua.
Por fim, para x0 6= 0, a função f (x0 , y) é contínua em cada y 6= 0. De fato,
 2 
x0 −x20/y2
lim f (x0 , y) = lim 3 · e = (fazendo y = 1/t )
y→0 y→0 y
( )  
x20 −x2 3
0/[( /t ) ]
1 −x20 x20/(1/t 3)
= lim ·e = lim ·e
t→∞ (1/t )3 t→∞ (1/t 3 )

 3   
2 t
3
−x20 · t1 2 3
= lim x0 · · e = lim x20 · t 3 · e −x0·t
t→∞ 1 t→∞
 2 3
x0 · t
= lim = (por l’Hospital)
t→∞ e x20 ·t 2
!  
3x20 · t 2 3 t2
= lim = · lim
t→∞ 2x2 · t · e x20·t 2 2 t→∞ t · e x20·t 2
0

= (por l’Hospital novamente)


!
3 2t
= · lim 2 2 2 2
2 t→∞ e x0·t + 2x20 · t 2 · e x0·t

= (mais uma vez por l’Hospital)


!
3 2
= · lim 2 2 2 2 2 2
2 t→∞ 2 · t · e x0·t + 4x20 · t · e x0·t + 4x40 · t 3 · e x0·t
3
= · 0 = 0 = f (x0 , 0),
2
mostrando o que foi afirmado.
Observe, entretanto, que a função f (x, y) é descontínua na origem. Para ver isso, considere
um caminho σ (t) = (t, t) que tende para a origem. Tem-se que
 2
 t · e −t 2/t 2 , para t 6= 0,
f [σ (t)] = f (t, t) = t 3

0, para t = 0,

 1 · e −1, para t 6= 0,
= t
 0, para t = 0,

 1 , para t 6= 0,
= t ·e
 0, para t = 0.
A.1 Primeiro caso 587

de modo que  
1
lim f [σ (t)] = lim = +∞.
t→0 t→0 t · e

Isso faz com que a função ϕ (x) seja descontínua em x = 0. De fato, para x = 0, tem-se que
Z 1 Z 1
ϕ (0) = f (0, y) dy = 0 dy = 0.
0 0

Além disso, para x 6= 0, segue-se que


Z 1 2 Z 1  
x −x2/y2 ∂ 1 −x2/y2
ϕ (x) = ·e dy = ·e dy
0 y3 ∂y 2 0
   
1 −x2/y2 1 1 −x2/y2 1
= ·e lim
= A→0 ·e
2 0
+ 2 A
 
1 −x2/12 1 −x2/A2
= lim ·e − ·e
A→0 + 2 2
   
1 −x2 1 −x2/A2
= lim ·e − lim ·e
A→0+ 2 A→0+ 2
 
1 −x2 1 −x2/A2
= ·e − lim ·e
2 A→0+ 2

= (fazendo t = 1/A, de modo que t → +∞ quando A → 0)


 
1 −x2 1 −x2·t 2
= ·e − lim ·e
2 t→+∞ 2
 
1 −x2 1 1 2
= ·e − lim 2·t 2 = · e −x − 0
2 t→+∞ 2 e x 2
1 −x2
= ·e .
2
Assim,    
1 −x2 1 1
lim ϕ (x) = lim ·e = lim 2 = 6= 0 = ϕ (0),
x→0 x→0 2 x→0 2ex 2
o que mostra a descontinuidade de ϕ (x) em x = 0.

Os dois exemplos anteriores mostram que a hipótese de continuidade da função f (x, y) na


proposição 1.1 é importante para garantir a continuidade da função ϕ (x). Ao mesmo tempo,
essa condição é apenas suficiente, de modo que ϕ (x) ainda pode ser contínua quando f (x, y) é
descontínua, como mostra o próximo exemplo.

Exemplo 1.4: Seja f : R × [0, 1] → R uma função definida por


588 A Funções representadas por integrais

 7/3
 x ·y ,

para x2 + y2 6= 0,
4 4
f (x, y) = x + y


0, para x2 + y2 = 0.

A função f (x, y) é ilimitada em x = 0. De fato, considerando o caminho dado por σ (t) = (t, t),
obtém-se
t · t 7/3 t 10/3 1 1
f [σ (t)] = f [(t, t)] = 4 4 = 4 = 4 −10/3 = 2/3 ·
t +t 2t 2t ·t 2t
Logo,  
1
lim f [σ (t)] = lim = +∞,
t→0 t→0 2 t 2/3

mostrando que f é ilimitada, embora f (x, y) seja contínua em R2 \ {(0, 0)}.


Por outro lado, Z 1
ϕ (0) = 0 dy = 0
0
e, para x 6= 0, encontra-se
Z 1 7/3 Z 1
x ·y 7/3 y
ϕ (x) = dy = x 2 2
dy
0 x4 + y4 0 (x2 ) + (y2 )

Z 1 Z 1
x7/3 2y dy x7/3 (y2 )0 dy
= 2 2
= 2 2
2 (x2 ) + (y2 )
0 0 (x2 ) + (y2 ) 2
 2  1
x7/3 1 y
= · 2 · arc tg 2
2 x x 0
    
x7/3 1 0
= 2 · arc tg 2 − arc tg 2
2x x x
     
x7/3 · x−2 1 x1/3 1
= · arc tg 2 − 0 = · arc tg 2 ·
2 x 2 x
Afirma-se que ϕ (x) é contínua em x 6= 0. De fato,
"  #
x1/3 1
lim ϕ (x) = lim · arc tg 2 = 0 = ϕ (0),
x→0 x→0 2 x

pois a função arco tangente é limitada e a função x1/3 = 3
x tende para zero quando x → 0.

N OTAÇÃO : será denotado por L1 ([a, b]) o espaço das funções integráveis e absolutamente
integráveis no sentido de Riemann, isto é,

L1 ([a, b]) = { f : [a, b] → R | f e | f | são Riemann-integráveis} .

Para mais detalhes sobre o espaço L1([a, b]), veja a seção B.1 do adendo B.
A.1 Primeiro caso 589

Na proposição 1.1, a continuidade exigida para f pode ser enfraquecida. Esse é o objetivo do
próximo resultado.

Proposição 1.2 (continuidade): Sejam g : I × [a, b] → R uma função contínua e h : [a, b] → R


uma função pertencente ao espaço L1([a, b]). Então, a função ϕ : I → R, definida por
Z b
ϕ (x) = g(x, y) h(y) dy,
a

é uma função contínua.


D EMONSTRAÇÃO : Seja x0 ∈ I. Então,
Z b Z b

|ϕ (x) − ϕ (x0 )| = g(x, y) h(y) dy − g(x0 , y) h(y) dy
a a
Z
b
= [ g(x, y) h(y) − g(x0 , y) h(y)] dy

a
Z
b
= [g(x, y) − g(x0 , y)] h(y) dy
a
Z b
≤ |[g(x, y) − g(x0 , y)] h(y)| dy
a
Z b
(1.3) = |g(x, y) − g(x0 , y)| |h(y)| dy.
a

Como g é contínua, por hipótese, então é possível usar o lema 1.1 para concluir que, dado
ε > 0, existe δ > 0 tal que, para x ∈ I, se tem
ε ,
|x − x0| < δ ⇒ |g(x, y) − g(x0 , y)| < Z b
|h(y)| dy
a

qualquer que seja y ∈ [a, b]. Isso é sempre verdade, pois, por hipótese, a função h ∈ L1([a, b]),
ou seja, por ser deste espaço segue-se que |h(y)| é integrável e o valor resultante dessa integral
acima é um número finito.
Retornando a (1.3), encontra-se
Z b
|ϕ (x) − ϕ (x0 )| ≤ | g(x, y) − g(x0 , y)| |h(y)| dy
a
Z b
ε
< Z b |h(y)| dy
a
|h(y)| dy
a
Z b
ε
=Z b
|h(y)| dy = ε .
a
|h(y)| dy
a
590 A Funções representadas por integrais

Mostrou-se, portanto, que, dado ε > 0, existe δ > 0 tal que, para x ∈ I, se tem

|x − x0 | < δ ⇒ |ϕ (x) − ϕ (x0 )| < ε ,

ou seja, que a função ϕ é contínua.

O próximo resultado garante a diferenciabilidade de ϕ . Ele mostra que pode-se derivar sob o
sinal de integral, desde que o integrando resultante seja uma função contínua.

Proposição 1.3 (Leibniz): Seja I ⊂ R um intervalo aberto. Considere f : I × [a, b] → R uma


função satisfazendo:

(i) f em contínua em I × [a, b];


∂f
(ii) Para todo (x, y) ∈ I × [a, b] a função : I × [a, b] → R existe e é contínua.
∂x
Então, ϕ : I → R definida por
Z b
ϕ (x) = f (x, y) dy
a

é diferenciável e é tal que


Z b
0 ∂f
ϕ (x) = (x, y) dy.
∂x a
D EMONSTRAÇÃO : Seja x0 ∈ I. Por hipótese, (∂ f/∂ x)(x, y) é contínua, logo pode-se usar o
lema 1.1 para concluir que, para todo ε > 0, existe δ > 0 tal que, para x ∈ I, se tem

∂ f ∂ f
|x − x0 | < δ ⇒ (x, y) − (x0 , y) < ε ,
∂x ∂x b−a

qualquer que seja y ∈ [a, b].


Em particular, o resultado acima é verdadeiro para x = x0 + θ k, para |k| < δ e θ ∈ (0, 1) (pois
I é um intervalo aberto). Assim,

∂ f ∂ f
(1.4) |x − x0| < δ ⇒ (x0 + θ k, y) − (x0 , y) < ε ·
∂x ∂x b−a

Observe que, para |k| < δ , se tem


Z b Z b 
ϕ (x0 + k) − ϕ (x0 ) 1
= f (x0 + k, y) dy − f (x0 , y) dy
k k a a
Z
1 b
= [ f (x0 + k, y) − f (x0, y)] dy.
k a
Z b
f (x0 + k, y) − f (x0 , y)
= dy.
a k
A.1 Primeiro caso 591

Assim,
Z b
ϕ (x0 + k) − ϕ (x0 ) Z b ∂ f f (x0 + k, y) − f (x0 , y)
Z b
∂ f
− (x0 , y) dy = dy − (x0 , y) dy .
k a ∂x a k a ∂x

Será necessário usar o teorema do valor médio que diz o seguinte: com as hipóteses para f
no enunciado da proposição, segue-se que existe θ ∈ (0, 1) tal que
∂f
f (x0 + k, y) − f (x0 , y) = (x0 + θ k, y) · k.
∂x
Assim sendo, obtém-se
Z
ϕ (x0 + k) − ϕ (x0 ) Z b ∂ f b f (x0 + k, y) − f (x0 , y) Z b
∂ f
− (x0 , y) dy = dy − (x0 , y) dy
k a ∂x a k a ∂x

= (pelo teor. do valor médio)



∂f
Z b (x0 + θ k, y) · k Z b ∂ f
=
∂ x − (x0 , y) dy

a k a ∂x

Z b Z b
∂f ∂f
= (x0 + θ k, y) dy − (x0 , y) dy
a ∂x a ∂x
Z b  
∂ f ∂ f
= (x0 + θ k, y) − (x0 , y) dy
a ∂x ∂x
Z b
∂ f ∂ f
≤ (x0 + θ k, y) − (x0 , y) dy
a
∂x ∂x
= (por (1.4))
Z b b Z
ε ε
< dy = dy
a b−a b−a a
ε b ε

= ·y = · (b − a) = ε .
b−a a b−a
Portanto, isso mostra que
Z b
0 ∂f
ϕ (x0 ) = (x0 , y) dy.
∂x a
Como x0 é fixo, mas arbitrário, segue-se que o resultado é verdadeiro para todo x ∈ I.

Agora, um resultado um pouco mais geral do que a proposição 1.3.

Proposição 1.4 (diferenciabilidade): Sejam g : I × [a, b] → R uma função contínua cuja


∂g
derivada parcial : I × [a, b] → R existe e é contínua e h : [a, b] → R uma função tal que
∂x
592 A Funções representadas por integrais

h ∈ L1 . Então, a função ϕ : I → R, definida por


Z b
ϕ (x) = g(x, y) h(y) dy,
a

é diferenciável e, além disso,


Z b
∂g
ϕ 0 (x) = (x, y) h(y) dy.
a ∂x
D EMONSTRAÇÃO : Seja x0 ∈ I. Por hipótese, (∂ g/∂ x)(x, y) é contínua, logo pode-se usar o
lema 1.1 para concluir que, para todo ε > 0, existe δ > 0 tal que, para x ∈ I, se tem

∂g ∂ g ε
|x − x0 | < δ ⇒ (x, y) − (x0 , y) < Z ,
∂x ∂x b
|h(y)| dy
a
qualquer que seja y ∈ [a, b]. Isso é sempre verdade, pois, por hipótese, a função h ∈ L1([a, b]),
ou seja, por ser deste espaço segue-se que |h(y)| é integrável e o valor resultante dessa integral
acima é um número finito.
Em particular, o resultado acima é verdadeiro para x = x0 + θ k, para |k| < δ e θ ∈ (0, 1) (pois
I é um intervalo aberto). Assim,

∂g ∂ g ε
(1.5) |x − x0 | < δ ⇒ (x0 + θ k, y) − (x0 , y) < Z ·
∂x ∂x b
|h(y)| dy
a

Observe que, para |k| < δ , se tem


Z b Z b 
ϕ (x0 + k) − ϕ (x0 ) 1
= g(x0 + k, y) h(y) dy − g(x0 , y) h(y) dy
k k a a
Z b

1
= [ g(x0 + k, y) h(y) − g(x0 , y) h(y)] dy
k a
Z b

1
= [ g(x0 k, y) − g(x0, y)] h(y) dy
k a
Z b
g(x0 + k, y) − g(x0, y)
= h(y) dy.
a k
Assim,
Z b
ϕ (x0 + k) − ϕ (x0 ) Z b ∂ g g(x0 + k, y) − g(x0, y)
− (x, y) h(y) dy = h(y) dy −
k a ∂x
a k
Z b
∂g
− (x, y) h(y) dy .
a ∂x

Será necessário usar o teorema do valor médio que diz o seguinte: com as hipóteses para g
no enunciado da proposição, segue-se que existe θ ∈ (0, 1) tal que
A.1 Primeiro caso 593

∂g
g(x0 + k, y) − g(x0, y) = (x0 + θ k, y) · k.
∂x
Assim sendo, obtém-se
Z b
ϕ (x0 + k) − ϕ (x0 ) Z b ∂ g g(x0 + k, y) − g(x0, y)
− (x0 , y) h(y) dy = h(y) dy −
k a ∂x
a k
Z b
∂g
− (x0 , y) h(y) dy
a ∂x

= (pelo teor. do valor médio)

Z b ∂ g (x + θ k, y) · k
0
= ∂x h(y) dy −
a k
Z b
∂g
− (x0 , y) h(y) dy
a ∂x
Z b
∂g
= (x0 + θ k, y) h(y) dy −
a ∂x
Z b
∂g
− (x0 , y) h(y) dy
a ∂x
Z b  
∂ g ∂ g
= (x0 + θ k, y) − (x0 , y) h(y) dy
a ∂x ∂x
Z b  
∂ g ∂ g
≤ (x0 + θ k, y) − (x0 , y) h(y) dy
a
∂x ∂x
Z b

∂g ∂g | h(y)| dy
= (x 0 + θ k, y) − (x0 , y)
a ∂x ∂x
= (por (1.5))
Z b
ε
< Z b |h(y)| dy
a
|h(y)| dy
a
Z b
ε
=Z b
|h(y)| dy = ε .
a
|h(y)| dy
a

Portanto, isso mostra que


Z b
0 ∂g
ϕ (x0 ) = (x0 ) h(y) dy.
∂x
a
Como x0 é fixo, mas arbitrário, segue-se que o resultado é verdadeiro para todo x ∈ I.
594 A Funções representadas por integrais

Exemplo 1.5: Este exemplo mostra uma situação em que


Z b Z b
d ∂f
f (x, y) dy 6= (x, y) dy.
dx a a ∂x
Considere uma função definida por
 3
 x 2
 · e −x /y , para y > 0,
2
f (x, y) = y


0, para y = 0,

com domínio no semiplano superior y ≥ 0.


Essa função é contínua na variável x para cada valor fixado de y e é uma função contínua na
variável y para cada valor fixado de x, embora f (x, y), nas duas variáveis x e y, seja uma função
descontínua em (0, 0). De fato, basta fazer y = x2 , de modo que

 1
 · e −1, para y > 0,
f (x, x2 ) = x

 0, para y = 0,

mostrando que não existe limite quando x → 0 (o limite lateral à esquerda de 0 tende para −∞
e o limite lateral à direita de 0 tende para +∞.
Para calcular a integral de f (x, y), observe primeiro que

∂  −x2
 ∂ h  −x2·y−1 i  2 −1
 x3
−x2
x · e /y = x· e = x · x2 · y−2 · e −x ·y = 2 · e /y.
∂y ∂y y
Assim,
Z 1 Z 1 3
x −x2/y
ϕ (x) = lim f (x, y) dy = lim ·e dy
a→∞ a a→∞ a y2
Z 1
∂     1
−x2/y −x2/y
= lim x·e dy = lim x · e
a→∞ a ∂y a→∞
a
  x
2 −x2 2
= lim x · e −x − x · e /a
= x · e −x − lim
a→∞ a→∞ e x2/a

2 2
= x · e −x − 0 = x · e −x ,
para qualquer x ∈ R (incluindo x = 0).
Portanto, segue-se daí que
 0 
−x2 2 2 2
0
ϕ (x) = x · e = e −x + x · e −x · (−2x) = e −x 1 − 2x2 ,

para qualquer x ∈ R (incluindo x = 0).


Agora calcula-se a derivada parcial em relação à x da função f (x, y) antes de calcular a sua
integral. Para x 6= 0, tem-se
A.1 Primeiro caso 595

 
∂f ∂ x3 −x2/y
(x, y) = ·e
∂x ∂x y2
   3   
∂ x3  −x2/y  x ∂ −x2/y
= · e + 2 · e
∂ x y2 y ∂x
 
3x2 −x2/y x3 2x −x2/y
= 2 ·e + 2 · − ·e
y y y
 2 
−x2/y 3x 2x4
=e − 3 ·
y2 y
Observe que
 2    2    
∂ x −x2/y ∂ x −x2/y x2 ∂ −x2/y
− ·e =− ·e − · e
∂y y ∂y y y ∂y
    
∂ 2 −1  −x2/y x2 ∂ −x2 ·y−1
=− x ·y ·e − · e
∂y y ∂y
 2   2 
x −x2/y x2 x −x2/y
= − − 2 ·e − · 2 ·e
y y y
x2 −x2/y x4 −x2/y
= ·e − 3 ·e .
y2 y
 2 
−x2/y x x4
=e · 2− 3 ·
y y
Assim sendo, para x 6= 0, tem-se
Z 1 Z 1  
∂f −x2/y 3x2 2x4
(x, y) dy = e − 3 dy
0 ∂x 0 y2 y
Z 1 2 Z 1 4
x −x2/y x −x2/y
=3 ·e dy − 2 ·e dy
0 y2 0 y3
Z 1 2 Z 1 2 Z 1 4
x −x2/y x −x2/y x −x2
= ·e dy + 2
·e dy − 2 · e /y dy
0 y2 0 y
2
0 y
3

Z 1 2 Z 1 2 
x −x2/y x −x2/y x4 −x2/y
= 2
·e dy + 2 ·e − 3 ·e dy
0 y 0 y2 y
Z 1 2 Z 1  2 
x −x2/y −x2/y 3x 2x4
= 2
·e dy + 2 e − 3 dy
0 y 0 y2 y
Z 1  Z 1  2 
∂  −x2/y  ∂ x −x2/y
= e dy + 2 − ·e dy
0 ∂y 0 ∂y y
Z 1  Z 1  2 
∂  −x2/y  ∂ x −x2/y
= lim e dy + 2 · lim − ·e dy
a→0 a ∂y a→0 a ∂y y
596 A Funções representadas por integrais

  1  2
x
 1

−x2/y + 2 · lim − · e −x 2
/y
= lim e
a→0 a a→0 y a
   
−x2 1 2 −x2 x2 1
= lim e − 2 + 2 · lim −x · e + · 2
a→0 e x /a a→0 a e x /a
2 2 2 
= e −x − 2x2 · e −x = e −x 1 − 2x2 .
Fazendo b = 1/a, obtém-se que b → ∞ quando a → 0. Assim, pela regra de l’Hospital, obtém-
se    
x2 1 b · x2
lim · = lim = (por l’Hospital)
a→0 a e x2/a b→∞ e b·x
2

 
x2
= lim 2 =0
b→∞ x2 · e b·x

Por outro lado, para x = 0, tem-se que f (0, y) = 0, de modo que a sua integral resulta em
Z 1 Z 1
f (0, y) dy = 0 dy = 0.
0 0
2 
Assim, segue-se do fato de que ϕ 0 (x) = e −x 1 − 2x2 que ϕ 0 (0) = 1. Portanto,
Z 1
0
ϕ (0) = 1 6= f (0, y) dy = 0.
0

A próxima proposição trata da mudança na ordem de integração, ou ainda, a maneira de


integrar a função ϕ .

Proposição 1.5 (mudança na ordem de integração): Seja f : [a, b] × [c, d] → R uma função
contínua. Então tem-se que
Z b Z d  Z d Z b 
f (x, y) dy dx = f (x, y) dx dy.
a c c a

D EMONSTRAÇÃO : Defina ϕ : [a, b] → R por


Z d Z x 
ϕ (x) = f (t, y) dt dy.
c a

Tem-se que
Z d Z b 
(1.6) ϕ (a) = 0 e ϕ (b) = f (x, y) dx dy.
c a

Pela regra de Leibniz (proposição 1.3), segue-se que


Z d Z x  Z d Z x 
0 d d
ϕ (x) = f (t, y) dt dy = f (t, y) dt dy
dx c a c dx a
A.1 Primeiro caso 597

Z d Z x  Z d
∂f
(1.7) = (t, y) dt dy = f (x, y) dy,
c a ∂t c

pois o integrando f (x, y) é uma função contínua.


Pelo teorema fundamental do Cálculo (T.F.C.), segue-se que
Z b
ϕ 0 (x) dx = ϕ (b) − ϕ (a),
a

ou seja, que
Z d Z b 
f (x, y) dx dy = ϕ (b)
c a

= (por (1.6))
Z b
= ϕ (a) + ϕ 0 (x) dx
a

= (pelo T.F.C.)
Z b Z d 
= 0+ f (x, y) dy dx
a c

= (por (1.6) e (1.7))


Z b Z d 
= f (x, y) dy dx,
a c
demonstrando, assim, o que foi afirmado na proposição.

Agora, um resultado um pouco mais geral do que a proposição 1.5.

Proposição 1.6 (mudança na ordem de integração): Sejam g : [c, d] × [a, b] → R uma


função contínua e h : [a, b] → R uma função tal que h ∈ L1 ([a, b]). Então, tem-se que
Z b Z d  Z d Z b 
g(x, y) h(y) dy dx = g(x, y) h(y) dx dy.
a c c a

D EMONSTRAÇÃO : Defina uma função G : [c, d] × [a, b] → R por


Z x
G(x, y) = g(t, y) dt
c

e uma função ϕ : [c, d] → R por


Z b
ϕ (x) = G(x, y) h(y) dy.
a

Observe que G e ϕ estão bem definidas.


598 A Funções representadas por integrais

Como g é contínua, a proposição 1.1 garante que G também é contínua. Pelo teorema fun-
∂G ∂G
damental do cálculo, tem-se que (x, y) = g(x, y); e como g é contínua, então também é
∂x ∂x
contínua.
Assim, pela proposição 1.4, tem-se que ϕ é diferenciável e, além disso,
Z b Z b
∂G
ϕ 0 (x) = (x, y) h(y) dy = g(x, y) h(y) dy.
a ∂x a

Agora pode-se integrar de c até d para obter


Z d Z dZ b
0
(1.8) ϕ (d) − ϕ (c) = ϕ (x) dx = g(x, y) h(y) dy dx.
c c a

Mas
Z b Z b
ϕ (d) − ϕ (c) = G(d, y) h(y) dy − G(c, y) h(y) dy
a a
Z b
= [G(d, y) − G(c, y)]h(y) dy
a
Z b Z d Z c 
= g(x, y) dx − g(x, y) dx dy
a c c
Z bZ d
(1.9) = g(x, y) h(y) dx dy.
a c

Segue-se de (1.8) e (1.9) que


Z bZ d Z dZ b
g(x, y) h(y) dx dy = g(x, y) h(y) dy dx.
a c c a

Observação 1.2: A mudança na ordem de integração em integrais iteradas é uma questão


delicada, só sendo possível mediante restrições como aquelas presentes, por exemplo, nas
proposições 1.5 e 1.6.
Um exemplo que comprova isso é dado pela função f : [0, 1] × [0, 1] → R definida por
x−y
f (x, y) = ·
(x + y)3
Observe que f é contínua e, portanto, as integrais
Z 1Z 1 Z 1Z 1
f (x, y) dx dy e f (x, y) dy dx
0 0 0 0

estão bem definidas, ou seja, elas existem.


A.1 Primeiro caso 599

Por outro lado, calculando cada uma das integrais, fazendo a mudança de variáveis u = x + y,
obtém-se:
Z 1Z 1 Z 1Z 1
x−y
f (x, y) dx dy = dx dy
0 0 0 0 (x + y)3
Z 1 Z 1+y  Z 1  1+y
u − 2y 1 y
= du dy = − + 2 dy
0 y u3 0 u u
y

Z 1  1+y Z 1
y − u 1
= dy = − dy
0 u2 0 (1 + y)2
y
Z 2
1 1 2
=− dv =
1 v2 v 1
1 1
(1.10) = −1 = − ,
2 2
onde v = 1 + y.
Agora calcula-se a integral com a ordem inversa:
Z 1Z 1 Z 1Z 1
x−y
f (x, y) dy dx = dy dx
0 0 0 0 (x + y)3
Z 1 Z 1+x  Z 1  1+x
2x − u 1 x
= du dx = − 2 dx
0 x u3 0 u u
x

Z 1  1+x Z 1
u − x 1
= 2 dx = 2
dx
0 u 0 (1 + x)
x
Z 2
1 1 2
= 2
dx = −
1 v v 1
 
1 1
(1.11) =− −1 = ,
2 2
onde v = 1 + x.
Segue-se de (1.10) e (1.11), para a função dada, que
Z 1Z 1 Z 1Z 1
f (x, y) dx dy 6= f (x, y) dy dx.
0 0 0 0

Exemplo 1.6: Seja f : (0, 1) × (0, 1) → R uma função definida por

x2 − y2
f (x, y) = ·
(x2 + y2 )2
600 A Funções representadas por integrais

Serão calculadas duas integrais, mas trocando-se a ordem de integração. Fazendo


y ,
g(x, y) =
x2 + y2
obtém-se
∂g (x2 + y2) · 1 − y · (2y)
(x, y) =
∂y (x2 + y2)2
x2 + y2 − 2y2 x2 − y2
= = 2
(x2 + y2 )2 (x + y2 )2

= f (x, y).
Assim,
Z 1Z 1 Z 1 Z 1 2 
x − y2
f (x, y) dy dx = dy dx
0 0 0 (x2 + y2)2
0
Z 1 Z 1   
∂ y
= 2 2
dy dx
0 0 ∂y x +y
Z 1 1
y
= dx
2
0 x +y 0
2
Z 1
1
= dx
0 x2 + 1
1 π

(1.12) = arc tg x = ·
0 4
Por outro lado, fazendo
x ,
h(x, y) = −
x2 + y2
obtém-se
∂h (x2 + y2) · (−1) + x · (2x)
(x, y) =
∂x (x2 + y2 )2
−x2 − y2 + 2x2 x2 − y2
= =
(x2 + y2 )2 (x2 + y2)2

= f (x, y).
Assim,
Z 1Z 1 Z 1 Z 1 2 
x − y2
f (x, y) dx dy = dx dy
0 0 0 (x2 + y2)2
0
Z 1 Z 1   
∂ x
= − 2 dx dy
0 0 ∂x x + y2
Z 1  1
x
= − 2 dy
0 x + y2
0
A.1 Primeiro caso 601

Z 1
1
=− 2
dy
0 1+y
1 π

(1.13) = − arc tg y = − ·
0 4
Os resultados obtidos em (1.12) e (1.13) mostram que
Z 1Z 1 Z 1Z 1
f (x, y) dy dx 6= f (x, y) dx dy.
0 0 0 0

Mostra mais: pelo teorema de Fubini (o autêntico, para integrais de Lebesgue) a função
f (x, y) não é integrável no sentido de Lebesgue no quadrado (0, 1) × (0, 1). Quando as duas
integrais (iteradas) existem, mas são diferentes, ocorre que uma delas não é absolutamente inte-
grável. Esta afirmação será argumentada apenas através da função dada neste exemplo. Tem-se:
Z x Z x 2
x − y2
f (x, t) dt = dt
0 0(x2 + y2)2
Z x  
∂ t
= 2 2
dt
0 ∂t x +t
x
t x
= 2 2 = 2
x + t 0 x + x2
1
= ·
2x
Segue-se daí que
Z 1 Z x Z x
1,
| f (x, y)| dy ≥ | f (x, y)| dy ≥ f (x, y) dy =
0 0 0 2x
uma vez que

| f (x, y)| = f + (x, y) + f − (x, y) ≥ f + (x, y) − f − (x, y) = f (x, y).

Portanto, fazendo
Z 1 Z 1  Z 1 Z 1
1 1 dx
| f (x, y)| dy dx ≥ dx =
0 0 0 2x 2 0 x
1
= · ln |x| = ∞,
2
pois o logarítmo diverge quando |x| → 0.
Outra coisa que o leitor pode observar é fato de que f (y, x) = − f (x, y). Realmente,

y2 − x2 −(x2 − y2 ) x2 − y2
f (y, x) = = = − = − f (x, y).
(y2 + x2)2 (x2 + y2 )2 (x2 + y2)2
602 A Funções representadas por integrais

Esse exemplo mostra que a existência das integrais iteradas não assegura a existência da
integral. Além disso, mesmo que as duas integrais iteradas sejam iguais o problema ainda pode
persistir; este é caso do próximo exemplo.

Exemplo 1.7: Seja f : [(−1, 1) × (−1, 1)] \ (0, 0) → R uma função definida por
xy
f (x, y) = ·
(x2 + y2 )2
Considere a função g : [(−1, 1) × (−1, 1)] \ (0, 0) → R dada por
1 x
g(x, y) = − · 2 ·
2 x + y2
Então,
∂g 1 (x2 + y2 ) · 0 − x · (2y)
(x, y) = − ·
∂y 2 (x2 + y2 )2
xy
= 2 = f (x, y).
(x + y2 )2

Assim,
Z 1Z 1 Z 1 Z 1 
xy
f (x, y) dy dx = 2 2 2
dy dx
−1 −1 −1 −1 (x + y )
Z 1 Z 1   
∂ 1 x
= − · 2 dy dx
−1 −1 ∂ y 2 x + y2
Z
1 1 x 1
=− dx
2 −1 x2 + y2 −1
Z  
1 1 x x
=− − dx
2 −1 x2 + 12 x2 + (−1)2
Z  
1 1 x x 1
(1.14) =− 2
− 2 dx = − · 0 = 0.
2 −1 x + 1 x + 1 2
Por outro lado, ao considerar a função a função h : [(−1, 1) × (−1, 1)] \ (0, 0) → R dada por
1 y
h(x, y) = − · 2 ·
2 x + y2
obtém-se
∂h 1 (x2 + y2 ) · 0 − y · (2x)
(x, y) = − ·
∂x 2 (x2 + y2 )2
xy
= 2 = h(x, y).
(x + y2 )2
Assim,
A.1 Primeiro caso 603

Z 1Z 1 Z 1 Z 1 
xy
f (x, y) dx dy = 2 2 2
dx dy
−1 −1 −1 −1 (x + y )
Z 1 Z 1   
∂ 1 y
= − · 2 dx dy
−1 −1 ∂ x 2 x + y2
Z 1
1 1 y
dy
=−
2 −1 x2 + y2 −1
Z  
1 1 y y
=− − dy
2 −1 12 + y2 (−1)2 + y2
Z  
1 1 y y 1
(1.15) =− − dy = − · 0 = 0.
2 −1 1 + y2 1 + y2 2
De (1.14) e (1.15) que
Z 1Z 1 Z 1Z 1
f (x, y) dy dx = 0 = f (x, y) dx dy,
−1 −1 −1 −1

ou seja, as duas integrais iteradas existem e são iguais.


No entanto, a função f (x, y) não é integrável no quadrado (−1, 1) × (−1, 1). De fato, con-
sidere o subquadrado (0, 1) × (0, 1). Então,
Z 1Z 1 Z 1Z 1 Z 1Z 1
f (x, y) dx dy ≤ | f (x, y)| dx dy ≤ | f (x, y)| dx dy.
0 0 0 0 −1 −1

Porém a função f (x, y) não é integrável no subquadrado (0, 1) × (0, 1). Para ver isso, usa-se
coordenadas polares fazendo

x = r · cos θ e y = r · sen θ ,

com 0 < r ≤ 1 e 0 ≤ θ ≤ 2π .
Assim, com o módulo do jacobiano sendo |J| = r, obtém-se
Z 1Z 1 Z 1 Z 1 
xy
f (x, y) dx dy = 2 2 2
dx dy
0 0 0 0 (x + y )
Z 1 Z 2π 
(r · cos θ )(r · sen θ )
= · |J| d θ dr
0 0 [(r · cos θ )2 + (r · sen θ )2 ]2
"
Z 1 Z 2π
#
r3 · cos θ · sen θ
= 2
d θ dr
0 0 [r2 · (cos2 θ + sen 2 θ )]

Z 1 Z 2π 3 
r · cos θ · sen θ
= d θ dr
0 0 r4
Z 1 Z 2π 
cos θ · sen θ
= d θ dr.
0 0 r
Porém a integral
604 A Funções representadas por integrais

Z 1 Z 2π 
cos θ · sen θ
d θ dr
0 0 r
é divergente. De fato, isso pode ser visto através da seguinte estimativa:
Z 1 Z 2π Z 1 Z 2π

cos θ · sen θ

cos θ · sen θ
d θ dr
0 0 d θ dr ≤
r 0 0 r
Z 1 Z 2π
| cos θ · sen θ |
= d θ dr
0 0 |r|
Z 1 Z 2π
| cos θ | · | sen θ |
= dθ
0 0 r
Z 2π Z 1 Z 2π 
1·1 1
≤ d θ dr = d θ dr
r
0 0 0 r
Z 1 2π Z 1
θ dr
= dr = 2π
0 r 0 0 r
1

= 2π · ln |r| = ∞,
0

pois ln |r| → ∞ quando |r| → 0. Isso mostra que a integral da função f (x, y) é divergente.

A observação 1.2 e os exemplos anteriores apresentaram situações sobre os cuidados que se


deve ter ao tratar integrais de funções ilimitadas. Assim sendo, será necessário definir um novo
critério de convergência: a convergência uniforme para a integral
Z b
f (x, y) dy,
a

onde f : (a, b] → R é ilimitada.


A convergência uniforme para este tipo de integral é delicada: a função f pode ser ilimitada
em pontos isolados ou ao longo de retas. Na verdade, pode existir situações mais delicadas
ainda, mas aqui fica-se limitado a dois casos. Por exemplo, a integral
Z b
dy ,

0 x+y
para 0 ≤ x ≤ b tem uma única singularidade, que está na origem. Já a integral
Z 1
dy ,
0 y 1−x · e y
para 0 ≤ x < 1, tem singularidade ao longo da reta y = 0, mas não incluindo x = 1.
Dada f : I × (a, b] → R, ilimitada em x = a, considere a integral convergente
Z b
f (x, y) dy.
a
A.1 Primeiro caso 605

Observe que f deve ser limitada em I × (a + δ , b], para 0 < δ < b − a, pois, caso contrário,
a integral divergiria. Para este caso, tem-se a seguinte definição de convergência uniforme:
D EFINIÇÃO : Seja f : I × (a, b] → R uma função ilimitada em x = a. Diz-se que a integral
Z b
f (x, y) dy converge uniformemente para ϕ : I → R se, dado ε > 0, existe B = B(ε ) > 0 tal
a
que Z b


a+δ f (x, y) dy − ϕ (x) < ε ,
quando 0 < δ ≤ B.

A definição acima é um modo rigoroso para descrever o seguinte:


Z b
ϕ (x) = lim+ f (x, y) dy,
δ →0 a+δ

onde o limite deve ser entendido como sendo uniforme.


A partir de última definição, segue-se alguns testes de convergência uniforme.

Teorema 1.2 (critério de Cauchy): Sejam I ⊂ R um intervalo e f : I × [a, b] → R uma


função ilimitada em x = a. Uma condição necessária e suficiente para a convergência uniforme
Z b
da integral ϕ (x) = f (x, y) dy em I é que, dado ε > 0, exista B = B(ε ) > 0 tal que
a
Z a+δ
2

a+δ f (x, y) dy < ε ,
1

para 0 < δ1 < δ2 ≤ B.


D EMONSTRAÇÃO : Suponha que a integral convirja uniformemente. Então, dado ε > 0, existe
B = B(ε ) > 0 tal que, para todo x ∈ I, se tem
Z b Z b
ε ε
f (x, y) dy − ϕ (x) < e f (x, y) dy − ϕ (x) < ,
a+δ 2 a+δ 2
1 2

para 0 < δ1 < δ2 ≤ B.


Portanto, para 0 < δ1 < δ2 ≤ B, tem-se que
Z Z Z b
a+δ2 b
f (x, y) dy = f (x, y) dy − f (x, y) dy
a+δ a+δ a+δ2

1 1
Z   Z b 
b
= f (x, y) dy − ϕ (x) + ϕ (x) − f (x, y) dy
a+δ1 a+δ2
Z Z
b b

f (x, y) dy − ϕ (x) + ϕ (x) − f (x, y) dy
a+δ1 a+δ2
ε ε
< + = ε.
2 2
606 A Funções representadas por integrais

Reciprocamente, suponha que a condição de Cauchy se verifique. Assim, fazendo δ1 = 1/n e


δ2 = 1/m, com m, n ∈ N, tem-se, para ε > 0, que
Z a+1/m
ε
f (x, y) dy < ·
a+1/n 2

Considere a sequência definida por


Z b
ϕn(x) = f (x, y) dy, n ∈ N.
a+1/n

Assim, por hipótese, dado ε > 0, existe B = B(ε ) > 0 tal que
Z b Z b

| ϕn (x) − ϕm (x)| = f (x, y) dy − f (x, y) dy
a+1/n a+1/m
Z Z a+1/m
b

= f (x, y) dy + f (x, y) dy
a+1/n b
Z a+1/m
ε

= f (x, y) dy < ,
a+1/n 2
para 0 < 1/n < 1/m ≤ B.
Mas uma sequência de funções ϕn : I → R é uniformemente convergente se, e somente se,
é uma sequência de Cauchy. Assim, tem-se que existe uma função ϕ : I → R tal que ϕn (x) →
ϕ (x). Assim, dado ε > 0, escolha B de modo que
ε, 1
| ϕn(x) − ϕ (x)| < quando 0 < a + ≤ B.
2 n
Agora escolha n0 ∈ N tal que a + 1/n < B, isto é, que 1/n0 < B − a. Então, se b > a + 1/n0,
tem-se que
Z b Z a+1/m Z b

f (x, y) dy − ϕ (x) = f (x, y) dy + f (x, y) dy − ϕ (x)
a+1/n
a+1/n a+1/m

Z  Z a+1/m
b
= f (x, y) dy − ϕ (x) + f (x, y) dy
a+1/m a+1/n
Z a+1/m
ε ε
≤ | ϕn (x) − ϕ (x)| + f (x, y) dy < + = ε ·
a+1/n 2 2
Segue-se daí que
Z b
lim f (x, y) dy = ϕ (x).
n→∞ a+1/n
A.1 Primeiro caso 607

Proposição 1.7: Seja f : I × (a, b] → R uma função ilimitada em x = a. Se a integral


Z b
ϕ (x) = f (x, y) dy convergir uniformemente em I, então, para todo ε > 0 dado, existe um
a
correspondente B = B(ε ) > 0 tal que
Z a+δ

f (x, y) dy < ε, para 0 < δ ≤ B.
a
D EMONSTRAÇÃO : Como, por hipótese, a integral converge uniformemente em I, então, dado
ε > 0, existe B = B(ε ) > 0 tal que, para todo x ∈ I, se tem
Z b

f (x, y) dy − ϕ (x) < ε, para 0 < δ < B.
a+δ

Portanto, para 0 < δ < B, tem-se que


Z a+δ Z b Z b

f (x, y) dy = f (x, y) dy − f (x, y) dy
a a a+δ
Z b



= ϕ (x) − f (x, y) dy < ε ,
a+δ

que demonstra o resultado desejado.

Z b
D EFINIÇÃO : Diz que a integral f (x, y) dy é absolutamente convergente quando
a
Z b
| f (x, y)| dy
a

converge e se diz que a integral é condicionalmente convergente quando a integral


Z b
| f (x, y)| dy
a

diverge.

Dada uma função f : I × (a, b] → R, define-se a sua parte positiva e a sua parte negativa,
fazendo, para x ∈ (a, b], por
(
f (x, y), se f (x, y) ≥ 0,
f + (x, y) =
0, se f (x, y) < 0,
e (
0, se f (x, y) ≥ 0,
f − (x, y) =
− f (x, y), se f (x, y) < 0.

Proposição 1.8: Se f : I × (a, b] → R é absolutamente convergente, então f também é con-


vergente.
608 A Funções representadas por integrais

D EMONSTRAÇÃO : Observe que segue-se das definições de partes positiva e negativa de uma
função que
| f (x, y)| + f (x, y) | f (x, y)| − f (x, y) ,
f + (x, y) = e f − (x, y) =
2 2
de modo que f + e f − são contínuas. Além disso, tem-se também que f + (x, y) ≥ 0 e f − (x, y) ≥
0. Tem-se também que
| f (x, y)| + f (x, y) | f (x, y)| − f (x, y)
f + (x, y) − f − (x, y) = −
2 2
| f (x, y)| f (x, y) | f (x, y)| f (x, y)
= + − +
2 2 2 2
(1.16) = f (x, y)
e
| f (x, y)| + f (x, y) | f (x, y)| − f (x, y)
f + (x, y) + f − (x, y) = +
2 2
| f (x, y)| f (x, y) | f (x, y)| f (x, y)
= + + −
2 2 2 2
(1.17) = | f (x, y)|.

Assim,

+ +
| f (x, y)| + f (x)
f (x, y) = | f (x, y)| =

2
| | f (x, y)| + f (x)| | f (x, y)| + | f (x, y)|
(1.18) ≤ = = | f (x, y)|
|2| 2
e

− −
| f (x, y)| − f (x)

f (x, y) = | f (x, y)| =
2

| | f (x, y)| − f (x)| | f (x, y)| + | − f (x, y)|


(1.19) ≤ = = | f (x, y)|
|2| 2
Por hipótese, f é absolutamente convergente, então das desigualdades (1.18) e (1.19) segue-
se que as partes positiva e negativa de f também são convergentes, isto é,
Z b Z b
+
f (x, y) dy < +∞ e f − (x, y) dy.
a a

Por (1.16), segue-se que


Z b Z b 
f (x, y) dy = f + (x, y) − f − (x, y) dy
a a
A.1 Primeiro caso 609

Z b Z b
+
= f (x, y) dy − f − (x, y) dy,
a a
é convergente.

Observação 1.3: Em geral, a recíproca da proposição 1.8 é falsa. De fato, considere a função
f : I × (0, 1] → R definida por
1 1
f (x, y) = (−1)n · n, para x ∈ I e <y≤ ,
n+1 n
para n ∈ N.
Assim, Z 1  

1 n 1
f (x, y) dy = ∑ (−1) · n · −
0 n=1 n n+1

n+1−n
= ∑ (−1)n · n · n(n + 1)
n=1

1 ∞
(−1)n
= ∑ (−1)n · n · n(n + 1) = ∑
n=1 n=1 n + 1

1 1 1
= − + − + · · ·,
2 3 4
que é uma série alternada cujo termo geral, em módulo, converge para zero quando n → ∞.
Logo, essa série é convergente, de modo que a integral também é convergente.
Por outro lado, Z 1  

n 1 1
| f (x, y)| dy = ∑ |(−1) · n| · −
0 n=1 n n+1

n+1−n
= ∑ n · n(n + 1)
n=1
∞ ∞
1 1
= ∑ n· =∑
n(n + 1) n=1 n + 1
n=1

1 1 1
+ + + · · ·,
=
2 3 4
que é uma série harmônica, que sabidamente é divergente. Isso mostra que a integral não é
absolutamente convergente.

Teorema 1.3 (Dirichlet): Sejam f , g : [a, b]×[c, d] → R duas funções satisfazendo as seguintes
hipóteses:
610 A Funções representadas por integrais

(1) A função f é contínua na variável y e tem primitiva F limitada para c ≤ y ≤ d;


(2) A função g contínua na variável y, tem função derivada ∂ g/∂ y contínua na variável y e
decrescente para c ≤ y ≤ d;
(3) A função g satisfaz lim g(x, y) = 0 uniformemente.
y→d

Então a integral
Z d
f (x, y) · g(x, y) dy
c
converge em a ≤ x ≤ b
D EMONSTRAÇÃO : Observa-se inicialmente que, com as hipóteses de continuidade das fun-
ções f e g, a função produto f (x, y) · g(x, y) também é contínua, de modo que é integrável no
intervalo limitado [c, d]. Logo, faz sentido falar sobre a integral imprópria desse produto.
Seja Z y
F(x, y) = f (x, t) dt
c
a primitiva da função f (x, y), isto é, (∂ F/∂ x) (x, y) = f (x, y) para todo (x, y) ∈ [a, b] × [c, d].
Observe que é imediato concluir que F(x, c) = 0.
Integrando por partes sobre o intervalo [c, y0] para y0 ≤ d, obtém-se
Z y0 Z y0
∂F
f (x, y) · g(x, y) dy = (x, y) · g(x, y) dy
c c ∂y
y0 Z y0
∂g
= F(x, y) · g(x, y) − F(x, y) · (x, y) dy
c c ∂y
Z y0
0 0 ∂g
= F(x, y ) · g(x, y ) − F(x, c) · g(x, c) − F(x, y) · (x, y) dy
c ∂y
Z y0
∂g
= F(x, y0 ) · g(x, y0 ) − F(x, y) · (x, y) dy
c ∂y
pois F(x, c) = 0.
Por hipótese, a primitiva F é limitada na variável y. Logo, existe M = sup |F(x, y)| > 0 tal
que |F(x, y)| ≤ M para todo y ∈ [c, d], de modo que

|F(x, d) · g(x, y0 )| = |F(x, y0 )| |g(x, y0 )| ≤ M · |g(x, y0)|.

Mas pela hipótese (3),

lim g(x, y) = 0 ⇒ lim |g(x, y0 )| = 0 ⇒ lim |F(c, d) · |g(x, d)| = 0.


y→d y0→d y→d

Também, por hipótese, tem-se que a função g é decrescente, de modo que (∂ g/∂ y) (x, y) ≤ 0
para c ≤ y ≤ d. Portanto,
A.1 Primeiro caso 611

Z y0
Z y0
∂g

Z y0

F(x, y) · ∂ g (x, y) dy = |F(x, y)| (x, y) dy ≤ M ∂g
(x, y) dy
c
∂y c
∂y c
∂y

= (usando o fato que ∂ g/∂ y(x, y) ≤ 0)


Z y0 Z c
∂g ∂g
= −M (x, y) dy = M (x, y) dy
∂yc y0 ∂ y
c

= M · g(x, y) 0 = M[g(x, c) − g(x, y0 )]
y

≤ M · g(x, c),
pois g(x, y0 ) ≤ g(x, c) (uma vez que g é decrescente na variável y). Além disso, as hipóteses (2)
e (3) permitem concluir que g(x, y) ≥ 0 e que, em particular, g(x, y0 ) ≥ 0. De fato, como g é
decrescente e tende para zero quando y → d, então ela não pode ficar negativa.
Assim, dizer que
Z y0

∂ g
F(x, y) · (x, y) dy ≤ M · g(x, c)
c
∂y
significa afirmar que as integrais acima estão limitadas no conjunto para todos os y0 > c. Por-
tanto, a integral
Z y0

F(x) · ∂ g (x, y) dy
c
∂y
converge absolutamente. Pela proposição 1.8, segue-se que a integral
Z y0
∂g
F(x, y) · (x, y) dy
c ∂y
converge pontualmente, ou seja, existe e é finito o limite
Z y0
∂g
lim F(x, y) · (x, y) dy.
0
y →d c ∂y
Para finalizar, basta observar que, em
Z y0 Z y0
0 0 ∂g
f (x, y) · g(x, y) dx = F(x, y ) · g(x, y ) − F(x, y) · (x, y) dy,
c c ∂y
o primeiro membro tem limite para y0 → d, pois, como mostrado, cada termo no segundo mem-
bro tem limite para y0 → d, uma vez que estes limites são finitos. Isso significa dizer que a
integral
Z d
f (x, y) · g(x, y) dy
c
é convergente.
612 A Funções representadas por integrais

A.2 Segundo caso

Agora estuda-se funções representadas por integrais impróprias da forma


Z ∞
(2.1) ϕ (x) = f (x, y) dy,
a

onde f : I × [a, ∞) → R, sendo I ⊂ R um intervalo limitado ou não.


Mas antes de analisar a continuidade, a diferenciabilidade e a integrabilidade de funções
representadas por integrais do tipo acima, é necessário investigar sob quais condições a integral
é convergente, isto é, quando ela define de fato uma função ϕ (x). Isso precisa ser esclarecido,
pois a integral é de natureza imprópria (seu domínio é ilimitado, é a semirreta [a, +∞)). Para
isso, é necessário definir uma forma de convergência para integrais deste tipo.
A ideia inicial consiste em escrever
Z ∞ Z n
ϕ (x) = f (x, y) dy = lim f (x, y) dy = lim ϕn (x),
0 n→∞ 0 n→∞

onde Z n
ϕn (x) = f (x, y) dy,
0
ou seja, olhar para a função ϕ como limite de uma sequência de funções {ϕn }, onde cada função
é definida por integral. Mas deve ser observado que nem sempre é possível representar ϕ como
limite de uma sequência (de fato). Caso n ∈ N seja substituído por b ∈ R, então não se tem uma
sequência (que é uma função definida em N). Logo, é preciso ter mais cuidado e olhar esta ideia
como uma espécie de motivação.

D EFINIÇÃO : Seja f : I × [a, ∞) → R uma função integrável em cada intervalo [a, b] ⊂ [a, ∞).
Suponha que, para cada x ∈ I fixado, a integral imprópria
Z ∞
f (x, y) dy
a

seja convergente. Se ϕ denota a função definida por


Z ∞
ϕ (x) = f (x, y) dy, para x ∈ I,
a

diz-se que a integral converge pontualmente (ou diz que converge simplesmente) para ϕ : J → R,
com J ⊂ I.

Observe que a hipótese de convergência da integral imprópria, para cada x ∈ I, é importante.


Caso a integral imprópria divirja em um dado valor de x, então o objeto resultante, ϕ (x), não
será uma função de fato.

Exemplo 2.1: Seja f : [0, ∞) × (0, ∞) → R uma função definida por f (x, y) = x · e −xy.
Mostre que a integral
A.2 Segundo caso 613

Z ∞ Z ∞
f (x, y) dy = x · e −xy dy
0 0
converge pontualmente para uma função ϕ : [0, ∞) → R. Mostre também que a função ϕ não é
contínua.

S OLUÇÃO : Seja x ∈ [0, ∞) um número fixado. Então, para x = 0, tem-se que


Z ∞ Z ∞ Z ∞ Z ∞
−xy −0y
f (x, y) dy = x·e dy = 0·e dy = 0 dy = 0.
0 0 0 0

Agora observe que


0 
−e −xy = − −x · e −xy = x · e −xy.
Assim, para x > 0, tem-se
Z ∞ Z A Z A 0
−xy −xy
x·e dy = lim x·e dy = lim −e −xy dy
0 A→∞ 0 A→∞ 0

 A
−xy
 0
−xy
= lim −e = lim e
A→∞ 0 A→∞ A
 
= lim 1 − e −Ax = lim 1 − lim e −Ax = 1,
A→∞ A→∞ A→∞

pois A > 0 implica em lim e −Ax = 0, uma vez que x ≤ 0.


A→∞
Fixado x ∈ [0, ∞), mostrou-se que a integral imprópria,
Z ∞
x · e −xy dy,
0

é convergente. Em virtude da arbitrariedade de x ∈ [0, ∞), tem-se que cada integral imprópria é
convergente. Pela definição, segue-se daí que
Z ∞ Z ∞
ϕ (x) = f (x, y) dy = x · e −xy dy
0 0

convergente pontualmente e define, portanto, uma função ϕ (x).


Além disso, mostrou-se, também, que
(
1, para 0 < x < ∞,
ϕ (x) =
0, para x = 0.

Agora basta observar que lim ϕ (x) 6= ϕ (0). Isso mostra que ϕ não é contínua em x = 0, de
x→0+
modo que ela é descontínua.
2
Exemplo 2.2: Seja f : R × [0, ∞) → R uma função definida por f (x, y) = sen 2x · e −y·sen x.
Mostre que a integral imprópria
Z ∞ Z ∞
2
f (x, y) dy = sen 2 x · e −y·sen x dy
0 0
614 A Funções representadas por integrais

converge pontualmente para uma função ϕ : R → R. Mostre também que a função ϕ não é
contínua.
2
S OLUÇÃO : Antes, note que f (nπ , y) = sen 2(nπ ) · e −y·sen (nπ ) = 0, com n ∈ Z, pois seno de
múltiplo inteiro de π é igual a zero. Porém, para os demais pontos x > 0 e tais que x 6= nπ , a
função f (x, y) é diferente de zero. Então tem-se duas situações: o valor ϕ (nπ ) = 0 e o valor de
ϕ (x) para x 6= nπ .
Agora observe que   2x 0 2
−e −y·sen = sen 2 x · e −y·sen x ,
Assim, para x 6= nπ , com n ∈ Z, obtém-se
Z ∞ Z ∞
2
f (x, y) dy = sen 2x · e −y·sen x dy
0 0
Z ∞ 0 Z A 0
2x 2x
= −e −y·sen dy = lim −e −y·sen dy
0 A→∞ 0
  A   0
−y·sen 2 x −y·sen 2 x
= lim −e = lim e
A→∞ 0 A→∞ A
 2

= lim e 0 − e −A·sen x = 1,
A→∞

pois a exponencial tem expoente negativo, pois A > 0 e sen 2x é uma função limitada.
Para x = nπ , com n ∈ Z, tem-se que
Z ∞ Z ∞
2 (nπ )
f (nπ , y) dy = sen 2 (nπ ) · e −y·sen dy = 0,
0 0

pois sen 2 (nπ ) = [ sen (nπ )]2 = 0, pois sen (nπ ) = 0 para todo n ∈ Z.
Assim, fixado x ∈ R, mostrou-se que a integral imprópria,
Z ∞
2
sen 2 x · e −y·sen x dy,
0

é convergente. Em virtude da arbitrariedade de x ∈ R, tem-se que cada integral imprópria é


convergente. Pela definição, segue-se daí que
Z ∞ Z ∞
2
ϕ (x) = f (x, y) dy = sen 2 x · e −y·sen x dy
0 0

converge pontualmente e define, portanto, uma função ϕ (x).


Além disso, mostrou-se, também, que a função ϕ : [0, ∞) → R é dada por
(
0, para x = nπ , (n ∈ Z),
ϕ (x) =
1, caso contrário,
A.2 Segundo caso 615

A expressão para ϕ também mostra que ela não é uma função contínua, pois os limites laterais
em x = nπ , com n ∈ Z, existe e são iguais a 1, mas diferem do valor da função nestes pontos,
que é igual a 0.

Os dois exemplos anteriores mostraram que a convergência pontual da integral assegura a


existência de uma função. Porém eles mostram mais: mesmo que o integrando f (x, y) seja uma
função contínua, a função ϕ pode ser descontínua. Assim, retornando àquela ideia de olhar ϕ
como limite de uma sequência de funções {ϕ (x)}, é razoável entender que limite pontual de
sequência de funções contínuas pode não resultar em uma função contínua. Mas certamente
resultaria em uma função contínua caso a convergência fosse uniforme. Na verdade, o que se
gostaria de fazer é escrever
Z ∞ Z n
ϕ (x) = f (x, y) dy = lim f (x, y) dy = lim ϕn (x),
a n→∞ a n→∞

de modo que a continuidade da função ϕ (x) estaria garantida se ϕ (x) = lim ϕn (x) uniforme-
n→∞
mente. Então, para seguir esta “lógica”, será preciso restringir um pouco mais as funções f (x, y)
e introduzir o conceito de convergência uniforme para integrais.

D EFINIÇÃO : Seja f : I × [a, ∞) → R limitada e integrável em cada intervalo [a, b]. Diz-se que
a integral Z ∞
f (x, y) dy
a
converge uniformemente para ϕ : J → R, onde J ⊂ I, se, dado ε > 0, existir B = B(ε ) > a tal
que, para todo x ∈ J, se tenha
Z b

f (x, y) dy − ϕ (x) < ε , para b > B.
a

Note que, na definição de convergência pontual para integrais, é exigido que a convergência
para cada x ∈ I fixado, mas na convergência uniforme para integrais é para todo x ∈ I.
O teorema a seguir dá uma condição necessária e suficiente para que as integrais do tipos
estudados nesta seção convirjam uniformemente.

Teorema 2.1 (Cauchy): Uma condição necessária e suficiente para que a integral
Z ∞
f (x, y) dy
a

convirja uniformemente em um intervalo J ⊂ I é que, dado ε > 0, exista B = B(ε ) > a tal que,
para todo x ∈ J, se tenha
Z b
2
f (x, y) dy < ε , para todos b2 > b1 ≥ B.
b1
616 A Funções representadas por integrais

D EMONSTRAÇÃO : Suponha que a integral convirja uniformemente. Então, dado ε > 0, existe
B = B(ε ) > a tal que, para todo x ∈ J,
Z b
ε
f (x, y) dy − ϕ (x) < , para b > B.
a 2

Sejam b1 e b2 dois números tais que b2 > b1 ≥ B. Então,


Z b Z b Z b1
2 2
f (x, y) dy = f (x, y) dy − f (x, y) dy
b1 a a
Z b   Z b1 
2
= f (x, y) dy − ϕ (x) + ϕ (x) − f (x, y) dy
a a
Z Z b1
b2
≤ f (x, y) dy − ϕ (x) + ϕ (x) − f (x, y) dy
a a
ε ε
< + = ε,
2 2
mostrando que a validade do critério de Cauchy.
Reciprocamente, suponha que valha o critério de Cauchy, isto é, que dado ε > 0, exista
B = B(ε ) > a tal que, para todo x ∈ J, se tenha
Z
b2 ε
, para b2 > b1 ≥ B.
b f (x, y) dy < 2
1

Considere a sequência definida por


Z n
ϕn (x) = f (x, y) dy, para n > a.
a

Para n, m ∈ N tais que n > m ≥ B, tem-se que


Z n Z m



| ϕn (x) − ϕm (x)| = f (x, y) dy − f (x, y) dy
a a
Z Z n
a
= f (x, y) dy + f (x, y) dy
m a
Z
n ε
= f (x, y) dy < ·
m 2
Portanto, para n, m ∈ N tais que n > m ≥ B, tem-se que
ε
| ϕn (x) − ϕm (x)| < ·
2
Mas uma sequência de funções ϕn : J → R é uniformemente convergente se, e somente se, é
uma sequência de Cauchy. Assim, existe uma função ϕ : J → R tal que ϕn (x) → ϕ (x) quando
n → ∞.
Agora seja ε > 0 dado e B um número correspondente escolhido como no enunciado do
teorema. Sejam n0 ∈ N tal que n0 > B e tal que
A.2 Segundo caso 617

ε,
| ϕn (x) − ϕ (x)| < ∀ n ≥ n0 ,
2
isto é Z n
ε
,
a f (x, y) dy − ϕ (x) < 2 ∀ n ≥ n0 .

Assim, para b > n0 , tem-se que


Z b Z n0 Z b

f (x, y) dy − ϕ (x) = f (x, y) dy + f (x, y) dy − ϕ (x)
a
a n0
Z n  Z b
0
= f (x, y) dy − ϕ (x) + f (x, y) dy
a n0
Z Z
n0 n0
≤ f (x, y) dy − ϕ (x) + f (x, y) dy
a a
ε ε
= + = ε,
2 2
que mostra que a convergência da integral é uniforme.

Z ∞
D EFINIÇÃO : Diz que a integral f (x, y) dy é absolutamente convergente quando
a
Z ∞
| f (x, y)| dy
a

converge e se diz que a integral é condicionalmente convergente quando a integral


Z ∞
| f (x, y)| dy
a

diverge.

Dada uma função f : I × [a, ∞) → R, define-se a sua parte positiva e a sua parte negativa,
fazendo, para x ∈ [a, ∞), por
(
f (x, y), se f (x, y) ≥ 0,
f + (x, y) =
0, se f (x, y) < 0,
e (
0, se f (x, y) ≥ 0,
f − (x, y) =
− f (x, y), se f (x, y) < 0.

Proposição 2.1: Se f : I × [a, ∞) → R é absolutamente convergente, então f também é con-


vergente.
D EMONSTRAÇÃO : Observe que segue-se das definições de partes positiva e negativa de uma
função que
618 A Funções representadas por integrais

| f (x, y)| + f (x, y) | f (x, y)| − f (x, y) ,


f + (x, y) = e f − (x, y) =
2 2
de modo que f + e f − . Além disso, tem-se também que f + (x, y) ≥ 0 e f − (x, y) ≥ 0. Tem-se
também que
| f (x, y)| + f (x, y) | f (x, y)| − f (x, y)
f + (x, y) − f − (x, y) = −
2 2
| f (x, y)| f (x, y) | f (x, y)| f (x, y)
= + − +
2 2 2 2
(2.2) = f (x, y)
e
| f (x, y)| + f (x, y) | f (x, y)| − f (x, y)
f + (x, y) + f − (x, y) = +
2 2
| f (x, y)| f (x, y) | f (x, y)| f (x, y)
= + + −
2 2 2 2
(2.3) = | f (x, y)|.

Assim, das definições de partes positiva e negativa de uma função, segue-se que

+ +
| f (x, y)| + f (x)
f (x, y) = | f (x, y)| =

2
| | f (x, y)| + f (x)| | f (x, y)| + | f (x, y)|
≤ =
|2| 2

(2.4) = | f (x, y)|


e

− −
| f (x, y)| − f (x)

f (x, y) = | f (x, y)| =
2

| | f (x, y)| − f (x)| | f (x, y)| + | − f (x, y)|


≤ =
|2| 2

(2.5) = | f (x, y)|

Por hipótese, f é absolutamente convergente, então das desigualdades (2.4) e (2.5) segue-se
que as partes positiva e negativa de f também são convergentes, isto é,
Z ∞ Z ∞
+
f (x, y) dy < +∞ e f − (x, y) dy.
a a

Por (2.2), segue-se que


Z ∞ Z ∞ 
f (x, y) dy = f + (x, y) − f − (x, y) dy
a a
A.2 Segundo caso 619

Z ∞ Z ∞
+
= f (x, y) dy − f − (x, y) dy,
a a
é convergente.

Como já observado, em geral, a recíproca da proposição 2.1 é falsa.

Teorema 2.2 (teste M de Weierstrass): Suponha que, para cada x fixado, a função y 7→
f (x, y) pertença ao espaço L1 ([a, ∞)). Suponha também que exista uma função M : [a, ∞) → R
não negativa e integrável tal que

| f (x, y)| ≤ M(y), ∀ x ∈ J.

Então, a integral Z ∞
f (x, y) dy
a
converge absoluta e uniformente em J, isto é, as integrais
Z ∞ Z ∞
f (x, y) dy e | f (x, y)| dy
a a

são uniformemente convergentes em J.


D EMONSTRAÇÃO : Por hipótese, a função M é integrável. Logo,
Z ∞
M(y) dy < ∞ ,
a

ou seja, a integral é convergente.


Assim, Z ∞ Z∞ Z ∞

f (x, y) dy ≤ | f (x, y)| dy ≤ M(y) dy < ∞ ·
a a a
Isso mostra que a integral Z ∞
f (x, y) dy
a
é absolutamente convergente.
Resta mostrar a convergência uniforme. Tem-se:
Z Z Z b2
b2 b2
(2.6)
f (x, y) dy ≤ | f (x, y)| dy ≤ M(y) dy, para b2 > b1 ≥ B.
b1 b1 b1

Mas, por hipótese, M é integrável, isto é, a integral


Z ∞
M(y) dy
a

é convergente.
Assim, dado ε > 0, existe B = B(ε ) > a tal que b1 > B, para todo x ∈ J,
620 A Funções representadas por integrais

Z Z ∞
b1 ε
(2.7) M(y) dy − M(y) dy < ·
a a
2

Também, para b2 > b1 ≥ B, tem-se que


Z b Z
2 ∞ ε
(2.8) M(y) dy − M(y) dy < ·
a a 2
Assim, usando (2.7) e (2.8), obtém-se
Z b Z b Z b1

2 2

M(y) dy = M(y) dy − M(y) dy
b1 a a
Z b Z ∞  Z ∞ Z b1 
2
= M(y) dy − M(y) dy + M(y) dy − M(y) dy
a a a a
Z b Z ∞
2 Z b1 Z ∞
≤ M(y) dy − M(y) dy + M(y) dy − M(y) dy
a a a a
ε ε
< + = ε.
2 2
Usando esse resultado em (2.6), tem-se que
Z b
2
f (x, y) dy < ε, para b2 > b1 ≥ B,
b1

para todo y ∈ J.
Assim, o critério de Cauchy (teorema 2.1) é atendido e, portanto, a integral
Z ∞
f (x, y) dy
a

converge uniformemente em J.

Exemplo 2.3: Considere a seguinte integral:


Z ∞
e −xy · sen y dy.
0

Observe que
−xy
e · sen y ≤ e −xy ,
pois | sen y| ≤ 1.
Além disso, tem-se que
e −xy ≤ e −by para b ≤ x.
Fazendo M(x) = e −by, obtém-se
A.2 Segundo caso 621

Z ∞ Z ∞ Z A
−by
M(y) dy = e dy = lim e −by dy
0 0 A→∞ 0
   −by  0
1 −by A e

= lim − · e = lim
A→∞ b 0 A→∞ b A
 
1 e −Ab 1
= lim − = ·
A→∞ b b b
Assim, pelo teste M de Weierstrass, a integral
Z ∞
e −xy · sen y dy
0

converge uniformemente em [b, ∞) para todo b > 0.

Observação 2.1: O teste M de Weierstrass é um critério que diz quando a integral


Z ∞
ϕ (x) = f (x, y) dy
a

converge uniformemente, mas apenas no caso em que a integral de | f (x, y)| também convirja
uniformemente. Há casos em que a integral acima converge, mas a integral imprópria do valor
absoluto diverge. Por exemplo, Z ∞
sen (xy)
dy.
0 y
O caso acima será estudado nos exemplos seguintes. Nessas situações, diz-se que há convergên-
cia condicional e há critérios para cuidar desses casos. Dois critérios importantes para testar a
convergência condição são os de Abel e de Dirichlet. Neste texto, estudar-se-á apenas o critério
de Dirichlet.

Teorema 2.3 (2o teorema do valor médio para integrais): Sejam f : [a, b] → R uma função
decrescente, positiva, com derivada integrável e g : [a, b] → R uma função contínua. Então,
existe c ∈ [a, b] tal que. Então, existe c ∈ [a, b] tal que
Z b Z c Z b
f (x) · g(x) dx = f (a) g(x) dx + f (b) g(x) dx.
a a c

D EMONSTRAÇÃO : Como g é contínua, então ela é integrável. Defina G : [a, b] → R por


Z x
G(x) = g(t) dt.
a
Então, pelo teorema fundamental do Cálculo, segue-se que G0 (x) = g(x) para todo x ∈ [a, b].
Além disso, é imediato ver que G(a) = 0. Fazendo uma integração por partes, obtém-se
622 A Funções representadas por integrais

Z b Z b Z b
f (x) · g(x) dx = f (x) · g(x) dx = f (x) · G0 (x) dx
a a a
b Z b

= f (x) · G(x) − f 0 (x) · G(x) dx
a a
Z b
= f (b) · G(b) − f (a) · G(a) − f 0 (x) · G(x) dx
a

= (teorema 1.1, valor médio para integrais)


Z b
= f (b) · G(b) − G(c) f 0 (x) dx
a

= f (b) · G(b) − G(c) [ f (b) − f (a)]

= f (a) · G(c) + f (b) [ G(b) − G(c)] ,


pois G(a) = 0.
Mas, por definição de G, tem-se que
Z c Z b
G(c) = g(x) dx e G(b) = G(x) dx.
a a

Portanto,
Z b
f (x) · g(x) dx = f (a) · G(c) + f (b) [ G(b) − G(c)] .
a
Z c Z b Z c 
= f (a) g(x) dx + f (b) g(x) dx − g(x) dx
a a a
Z c Z b Z a 
= f (a) g(x) dx + f (b) g(x) dx + g(x) dx
a a c
Z c Z a Z b 
= f (a) g(x) dx + f (b) g(x) dx + g(x) dx
a c a
Z c Z b
= f (a) g(x) dx + f (b) g(x) dx,
a c
demonstrando assim o teorema.

Teorema 2.4 (Dirichlet): Sejam f : I × [a, ∞) → R e g : [a, ∞) → R duas funções que satis-
fazem as seguintes hipóteses:
∂f
(1) A função f tem derivada parcial contínua na variável y, monótona na variável y (isto
∂y
é, f (x, y) ≤ f (x, y0 ) para y0 < y, com x fixado) e tal que f (x, y) → 0 uniformemente quando
y → ∞.
A.2 Segundo caso 623

Z b
(2) A função g é contínua na variável y e é tal que a integral g(y) dy é limitada para todo
a
intervalo [a, b] ⊂ [a, ∞).
Então a integral Z ∞
f (x, y) · g(y) dy
a
converge uniformente em J.
D EMONSTRAÇÃO : Pelo segundo teorema do valor médio para integrais, para quaisquer b2 >
b1 ≥ B > a, na existência de um b ∈ [b1, b2] tal que
Z b2 Z b Z b2
(2.9) f (x, y) · g(y) dy = f (x, b1 ) g(y) dy + f (x, b2 ) g(y) dy.
b1 b1 b
Z y
Como, por hipótese, g(t) dt é limitada, então existe M > 0 tal que
a
Z
y
g(y) dy ≤ M.
a

Assim,
Z b Z b Z b1

g(y) dy = g(y) dy − g(y) dy
b a a
1
Z b Z b
1
≤ g(y) dy + g(y) dy
a a

(2.10) ≤ M + M = 2M.

Analogamente, também se tem que


Z b Z b2 Z b
1
g(y) dy = g(y) dy − g(y) dy

b a a
Z b Z b
2
≤ g(y) dy + g(y) dy
a a

(2.11) ≤ M + M = 2M.

Como f (x, y) → 0 uniformemente quando y → ∞, então, dado ε > 0, existe B = B(ε ) > a,
quaisquer que sejam y > B e x ∈ I, se tem
ε
(2.12) | f (x, y)| < ·
4M
Aplicando as desigualdades obtidas em (2.10), (2.11) e (2.12) em (2.9), obtém-se
Z b Z b Z b2
2
f (x, y) · g(y) dy = f (x, b 1 ) g(y) dy + f (x, b 2 ) g(y) dy
b b b

1 1
624 A Funções representadas por integrais

Z b Z b2

≤ f (x, b1 ) g(y) dy + f (x, b2 ) g(y) dy
b1 b
Z Z
b b2
= | f (x, b1 )| g(y) dy + | f (x, b2 )| g(y) dy
b1 b
ε ε
< · (2M) + · (2M)
4M 4M
ε ε
= + = ε.
2 2
Mostrou-se, portanto, que Z
b2

b f (x, y) · g(y) dy < ε ,
1

ou seja, que o critério de Cauchy foi atendido. Segue-se do teorema 1.1 que
Z ∞
f (x, y) · g(y) dy
a

converge uniformemente.

Z ∞
Observação 2.2: A integral f (x, y)· g(y) dy poderia ser estimada sem recorrer ao segundo
a
teorema do valor médio, procedendo-se de maneira análoga à usada na demonstração do critério
de Dirichlet feito na proposição 1.3, ou seja, integrando por partes. Isso, no entanto, tornaria a
demonstração mais complicada sem essencialmente evitar raciocínios repetidos, próprios da
demonstração do segundo teorema do valor médio.
O fato de a função f (x, y) ter uma derivada contínua em relação a x não é essencial e se deve
apenas ao segundo teorema do valor médio (teorema 2.3) que foi demonstrado sob as condições
de tal hipótese. Basta observar que não apareceu essa derivada na demonstração.

Exemplo 2.4: Considere a seguinte integral:


Z ∞
sen y
e −xy · dy.
0 y
Faça f (x, y) = e −xy/y e g(y) = sen y, para x ≥ 0 e y > 0. Assim, fixado x e fazendo y0 < y,
0
tem-se que 1/y < 1/y0. Além disso, e −xy ≤ e −xy para y0 < y e x fixado. Logo,
0
e −xy e −xy
f (x, y) = ≤ 0 = f (x, y0 ), para y0 < y.
y y
Tem-se também que
e −xy 1
lim = lim = 0,
y→∞ y y→∞ y · e xy
A.2 Segundo caso 625

pois x ≥ 0 e y > 0.
A segunda hipótese do teste de Dirichlet também é satisfeita, pois sen y é contínua na variável
ye Z b Z b
Z b
g(b) db ≤ | sen y| dt ≤ dy = b − a.
a a a
Isso mostra que as hipóteses do teorema 2.4 (Dirichlet) são satisfeitas, de modo que a integral
Z ∞
sen y
e −xy · dy
0 y
converge uniformemente.

Exemplo 2.5: Considere a seguinte integral:


Z ∞
sen (xy)
dy
0 y
Será usada a técnica de integração por partes para mostrar a convergência dessa integral.
Primeiro, observe que
Z ∞ Z 1 Z ∞
sen (xy) sen (xy) sen (xy)
dy = dy + dy.
0 y 0 y 1 y
Como
sen y
lim = 1,
y→0 y
segue-se que
   
sen (xy) sen (xy) sen (xy)
lim = lim x · = x · lim = x · 1 = x.
y→0 y y→0 xy y→0 xy
Assim, o integrando é contínuo sobre a semirreta y ≥ 0 e, portanto, é Riemann integrável
sobre qualquer intervalo limitado. Em particular, assim o é sobre o intervalo [0, 1]. Dessa forma,
a questão sobre a convergência recai apenas sobre a integral
Z ∞
sen (xy)
dy.
0 y
O fator 1/y do integrando é uma função monótona e tal que
1
lim = 0.
y→0 y
Além disso, Z ∞
y
sen (xt) dt = − cos(xt) = | − cos(xy) + cos x|
1 1

≤ | cos(xy)| + | − cos x| < 2.


Isso mostra que a integral
626 A Funções representadas por integrais

Z y
sen (xt) dt
1
é limitada para cada b ≥ 1.
Assim, pelo critério de Dirichlet, a integral
Z ∞
sen (xy)
dy
1 y
é convergente.
Portanto, a integral Z ∞
sen (xy)
dy,
y 0
que é soma de duas integrais impróprias convergentes, é convergente

Exemplo 2.6: Este exemplo mostrará que a integral


Z ∞
sen (xy)
dy
0 y
não é absolutamente convergente.
Inicialmente será demonstrado que a integral
Z ∞
sen u
du
0 u
não converge absolutamente.
De fato, considere a integral
Z kπ
| sen u|
du, k ∈ N.
0 u
(Observe que não é preciso considerar |u|, pois u ≥ 0.)
Assim,
Z kπ k Z nπ
| sen u| | sen u|
(2.13)
0 u
du = ∑ (n−1)π u
du.
n=1

Faça u = (n − 1)π + t e observe que (n − 1)π ≤ u ≤ nπ implica em

(n − 1)π ≤ (n − 1)π + t ≤ nπ ⇒ 0 ≤ t ≤ π.

Assim,
| sen u| = | sen [(n − 1)π + t]|

= sen [(n − 1)π ] · cost + sen t · cos[(n − 1)π ]



= (−1)n−1 sen t = sen t,
A.2 Segundo caso 627

pois seno de múltiplo de π é igual a zero e cos[(n − 1)π ] = (−1)n−1 . E como 0 ≤ t ≤ π , então
sen t ≥ 0 e por isso pôde ser retirado do módulo.
Além disso, para y = (n − 1)π , tem-se t = 0; para y = nπ , tem-se t = π . Então,
Z nπ Z π
| sen u| sen t
du = dt.
(n−1)π u 0 (n − 1)π + t
Como t ≥ 0 e nπ ≥ (n − 1)π , então
1 1
nπ + t ≥ (n − 1)π + t ⇒ ≥ ·
(n − 1)π + t nπ + t
Observe também que
1 1 ,
nπ + t ≥ nπ ⇒ ≥
nπ nπ + t
pois t ≥ 0.
Portanto,
Z nπ Z π
| sen u| sen t
du = dt
(n−1)π u 0 (n − 1)π + t
Z π Z π
sen t sen t
≥ dt ≥ dt
0 nπ + t 0 nπ
π
1 1
= · (− cost) = · (− cos π + cos 0)
nπ 0 nπ
2
(2.14) = ·

Substituindo (2.14) em (2.13), obtém-se
Z kπ k Z nπ k
| sen u| | sen u| 2
(2.15) du = ∑ du ≥ ∑ ·
0 u n=1 (n−1)π u n=1 kπ

Como Z ∞ Z kπ
| sen u| | sen u|
du = lim du,
0 u k→∞ 0 u
segue-se de (2.15) que
Z ∞ ∞
| sen u| 2 2 ∞ 1
u
du ≥ ∑ = ∑n
0 n=1 nπ π n=1
 
2 1 1 1
= 1+ + + +··· ,
π 2 3 4
onde a soma entre parênteses é a série harmônica, que sabidamente é diverge.
Como a integral no primeiro membro é maior do que uma quantidade divergente, então, por
comparação, a integral do primeiro membro é divergente.
628 A Funções representadas por integrais

Para mostrar que a integral Z ∞


| sen (xy)|
dy
0y
também é divergente, basta observar que se pode fazer u = xy na integral
Z ∞
| sen u|
du
0 u
e observar que u = xy e du = x dy, de modo que x será cancelado, que implica dizer que
 Z∞
 | sen u|
Z ∞ 
 − du, para x < 0,
| sen (xy)| 0 u
dy = Z ∞
0 y 
 | sen u|
+ du, para x > 0.
0 u
Como cada uma das integrais no segundo membro é divergente, então a integral do segundo
membro também será divergente.

Os exemplos 2.1 e 2.2 mostraram que a continuidade de f (x, y) não garante a continuidade da
função ϕ (x). Então foi preciso restringir a função f para que os resultados fossem alcançados,
quando se usou o conceito de convergência uniforme como visto anteriormente.
O próximo resultado trata da continuidade da função ϕ .

Proposição 2.2 (continuidade): Sejam I ⊂ R um intervalo e f : I × [a, ∞) → R uma função


contínua. Se a integral Z ∞
ϕ (x) = f (x, y) dy
a
convergir uniformemente em I, então a função ϕ : I → R é contínua.
D EMONSTRAÇÃO : Sejam x0 ∈ J ⊂ I e b > a. Então,
Z ∞ Z ∞

| ϕ (x) − ϕ (x0 )| = f (x, y) dy − f (x0 , y) dy
a a
Z b Z ∞ 

= f (x, y) dy + f (x, y) dy −
a b
Z b Z ∞ 

− f (x0 , y) dy + f (x0 , y) dy
a b
Z b Z b 

= f (x, y) dy − f (x0 , y) dy +
a a
Z ∞ Z ∞

+ f (x, y) dy − f (x0 , y) dy
b b
Z b Z ∞ Z


= [ f (x, y) − f (x0 , y)] dy + f (x, y) dy − f (x0 , y) dy
a b b
A.2 Segundo caso 629

Z Z Z
b ∞ ∞
(2.16)
≤ [ f (x, y) − f (x0 , y)] dy +
f (x, y) dy + f (x0 , y) dy .
a b b

Por hipótese, f é contínua. Então, pelo lema 1.1, dado ε > 0, existe δ > 0 tal que, para x ∈ I,
se tem
ε ,
|x − x0| < δ ⇒ | f (x, y) − f (x0 , y)| <
3(b − a)
qualquer que seja y ∈ [a, b].
Portanto, a primeira integral no último membro de (2.16) pode ser estimada da seguinte
maneira: para x ∈ [x0 − δ , x0 + δ ],
Z Z
b b
[ f (x, y) − f (x0 , y)] dy ≤ | f (x, y) − f (x0 , y)| dy
a
a
Z b b Z
ε ε
< dy = dy
a 3(b − a) 3(b − a) a
b
ε ε ε
(2.17) = · y = · (b − a) = ·
3(b − a) a 3(b − a) 3
Por hipótese, a integral Z ∞
ϕ (x) = f (x, y) dy
a
converge uniformemente, diga-se, em um intervalo J ⊂ I. Então, dado ε > 0, existe B = B(ε ) > a
tal que, para todo x ∈ J, se tem
Z
b ε
f (x, y) dy − ϕ (x) < , para b > B.
a 3

Agora observe que


Z ∞ Z b Z ∞
ϕ (x) = f (x, y) dy = f (x, y) dy + f (x, y) dy,
a a b

de modo que
Z Z Z
b ∞ ∞

a f (x, y) dy − ϕ (x) = − b f (x, y) dy = b f (x, y) dy .

Segue-se daí e da hipótese da convergência ser uniforme que


Z ∞ Z b
ε
f (x, y) dy = f (x, y) dy − ϕ (x) < ·
b a 3

Em particular, segue-se daí que


Z ∞ Z ∞
ε ε
(2.18) e ,
b f (x, y) dy < 3 b f (x0 , y) dy < 3

para b > B.
Substituindo (2.17) e (2.18) em (2.16), encontra-se
630 A Funções representadas por integrais

Z Z Z
b ∞ ∞
| ϕ (x) − ϕ (x0 )| ≤ [ f (x, y) − f (x0 , y)] dy + f (x, y) dy + f (x0 , y) dy
a b b
ε ε ε
< + + = ε,
3 3 3
mostrando, assim, a continuidade da função ϕ .

O próximo resultado melhora o resultado da proposição anterior.

Proposição 2.3 (continuidade): Sejam g : I × [a, ∞) → R uma função contínua e limitada


(isto é, |g(x, y)| ≤ K(y) para x fixado) e h : [a, ∞) → R uma função de L1([a, ∞)). Então a
função definida por Z ∞
ϕ (x) = g(x, y) h(y) dy
a
é contínua em I.
D EMONSTRAÇÃO : Sejam x0 ∈ J ⊂ I e b > a. Então,
Z Z ∞

| ϕ (x) − ϕ (x0 )| = g(x, y) h(x) dy − g(x0 , y) h(y) dy
a a
Z b Z ∞ 

= g(x, y) h(y) dy + g(x, y) h(y) dy −
a b
Z b Z ∞ 

− g(x0 , y) h(y) dy + g(x0 , y) h(y) dy
a b
Z b Z g 

= g(x, y) h(y) dy − (x0 , y) h(y) dy +
a a
Z ∞ Z ∞

+ g(x, y) h(y) dy − g(x0 , y) h(y) dy
b b
Z Z ∞
b
= [ g(x, y) h(y) − g(x0, y) h(y)] dy + g(x, y) h(y) dy −
a b
Z ∞

− g(x0 , y) h(y) dy
b
Z b Z ∞


= [ g(x, y) − g(x0, y)] h(y) dy + g(x, y) h(y) dy −
a b
Z ∞

− g(x0 , y) h(y) dy ,
b
Z b Z ∞


≤ [ g(x, y) − g(x0, y)] h(y) dy + g(x, y) h(y) dy +
a b
Z ∞

(2.19) + g(x0 , y) h(y) dy .
b
A.2 Segundo caso 631

Por hipótese, g é contínua. Então, pelo lema 1.1, dado ε > 0 existe δ > 0 tal que, para x ∈ I,
se tem
ε ,
|x − x0| < δ ⇒ |g(x, y) − g(x0, y)| < Z ∞
3 |h(y)| dy
a
qualquer que seja y ∈ [a, b]. Observe que a integral no último denominador faz sentido, pois,
por hipótese, h ∈ L1([a, ∞)).
Portanto, a primeira integral no último membro de (2.19) pode ser estimada da seguinte
maneira: para x ∈ [x0 − δ , x0 + δ ],
Z b Z b

[g(x, y) − g(x0, y)] h(y) dy ≤ |[g(x, y) − g(x0, y)] h(y)| dy
a
a
Z b
= | g(x, y) − g(x0 , y)| | h(y)| dy
a
Z b
ε
< Z ∞ | h(y)| dy
a 3 | h(y)| dy
a
Z b
ε
= Z ∞ | h(y)| dy
3 | h(y)| dy a
a
Z ∞
ε
≤ Z ∞ | h(y)| dy
3 | h(y)| dy a
a
ε
(2.20) = ·
3
Além disso, por hipótese, tem-se que |g(x, y)| ≤ K(y), para x fixado, e h ∈ L1 ([a, ∞)). Então
é possível fazer a seguinte estimativa:
Z ∞ Z ∞

g(x, y) h(y) dy ≤ | g(x, y) h(y)| dy
a a
Z ∞
= | g(x, y)| | h(y)| dy
a
Z ∞
≤ K(y) |h(y)| dy = M(y),
a

onde se fez Z ∞
M(y) = K(y) | h(y)| dy,
a
uma vez que a integral acima é constante e finita por ser h ∈ L1([a, ∞)).
Com isso, é possível usar o teste M de Weierstrass para concluir que a integral
Z ∞
g(x, y) h(y) dy
a
632 A Funções representadas por integrais

converge uniformente, por exemplo, em um intervalo J ⊂ I.


Assim, dado ε > 0, existe B = B(ε ) > a tal que, para todo x ∈ J, se tem
Z b

g(x, y) h(y) dy − ϕ (x) < ε , para b > B.
a 3

Agora observe que


Z ∞ Z b Z ∞
ϕ (x) = g(x, y) h(y) dy = g(x, y) h(y) dy + g(x, y) h(y) dy
a a b

de modo que
Z Z Z
b ∞ ∞
g(x, y) h(y) dy − ϕ (x) = −
a b g(x, y) h(y) dy = b g(x, y) h(y) dy .

Segue-se daí e do fato de a integral convergir uniformemente que


Z Z
∞ b
g(x, y) h(y) dy = g(x, y) h(y) dy − ϕ (x) < ε ·
a a 3

Em particular, segue-se daí que


Z ∞ Z ∞
ε ε
(2.21) e ,
a g(x, y) h(y) dy < 3 a g(x0 , y) h(y) dy < 3

para b > B e x ∈ [x0 − δ , x0 + δ ].


Substituindo (2.20) e (2.21) em (2.19), encontra-se
Z Z
b ∞
| ϕ (x) − ϕ (x0 )| = [g(x, y) − g(x0 , y)] h(y) dy +
g(x, y) h(y) dy +
a b
Z ∞

+ g(x0 , y) h(y) dy
b
ε ε ε
+ + = ε,
<
3 3 3
mostrando, assim, a continuidade da função ϕ .

Nas demonstrações feitas nas proposições 2.2 e 2.3 mostrou-se a continuidade da função ϕ
em um ponto x0 supondo a convergência uniforme da integral em uma vizinhança de x0 . Isso é
importante, pois no caso de um intervalo I ilimitado a integral pode convergir uniformemente
na vizinhança de cada ponto, mas divergir em todo I. Isso se deve ao fato de que a continuidade
(bem como a diferenciabilidade) é um conceito local.

Proposição 2.4 (diferenciabilidade): Seja f : I × [a, ∞) → R uma função contínua, pos-


suíndo derivada parcial ∂ f/∂ x : I × [a, ∞) → R também contínua. Suponha que a integral
A.2 Segundo caso 633

Z ∞
ϕ (x) = f (x, y) dy
a

convirja (não é necessário ser uniformemente) e que


Z ∞
∂f
ψ (x) = (x, y) dy
a ∂x
convirja uniformemente em I.
Então, ϕ é derivável em todo ponto de I e
Z ∞
0 ∂f
ϕ (x) = dy.
a ∂x
D EMONSTRAÇÃO : Deseja-se mostrar que, dado ε > 0, existe δ > 0 tal que, para x0 ∈ I, se
tem
ϕ (x0 + k) − ϕ (x0 ) Z ∞ ∂ f
− (x0 , y) dy < ε,
k a ∂x

para |k| < δ .
Sejam x0 ∈ J ⊂ I e b > a. Então, para |k| < δ , tem-se
Z ∞ 
ϕ (x0 + k) − ϕ (x0 ) Z ∞ ∂ f 1 Z ∞
− (x0 , y) dy = f (x0 + k, y) dy − f (x0 , y) dy −
k a ∂x k a a
Z ∞
∂f
− (x0 , y) dy
a ∂x
Z ∞
1
= [ f (x0 + k, y) − f (x0 , k)] dy −
k a
Z ∞
∂f
− (x0 , y) dy ,
a ∂x
Z Z ∞
∞ f (x0 + k, y) − f (x0 , y) ∂f
= dy − (x0 , y) dy
a k a ∂x
 Z
b f (x + k, y) − f (x , y)
0 0
= dy +
a k
Z ∞ 
f (x0 + k), y) − f (x0 , y)
+ dy −
b k
Z b Z ∞ 
∂f ∂f
− (x0 , y) dy + (x0 , y) dy
a ∂x a ∂x
 Z Z b 
b f (x + k, y) − f (x , y) ∂ f
0 0
= dy − (x0 , y) dy +
a k a ∂x
 Z ∞ Z ∞ 
f (x0 + k, y) − f (x0 , y) ∂f
+ dy − (x0 , y) dy
b k b ∂x
634 A Funções representadas por integrais

Z  
b f (x0 + k, y) − f (x0 , y) ∂f

= dy − (x0 , y) dy +
a k ∂x
Z ∞ Z ∞
f (x0 + k, y) − f (x0, y) ∂f
+ dy − (x0 , y)
b k b ∂x

= (pelo teorema do valor médio para integrais)


 
∂f
Z b (x + θ k, y) · k ∂ f
 ∂x 0 
=  − (x0 , y) dy +
a k ∂x

∂f
Z ∞ (x0 + θ k, y) · k Z ∞
∂ f
+ ∂x dy −

(x0 , y) dy
b k b ∂ x

Z b ∂ f ∂f
 Z ∞
∂f
Z ∞
∂f

= (x0 + θ k, y) − (x0 , y) dy + (x0 + θ k, y) dy − (x0 , y)dy
a ∂x ∂x b ∂x b ∂x
 Z ∞
Z b ∂ f ∂f ∂f

≤ (x0 + θ k, y) − (x0 , y) dy + (x0 + θ k, y) dy +
a ∂x ∂x b ∂x

Z ∞ ∂ f

(2.22) + (x0 , y)dy .
b ∂x

Por hipótese ∂ f/∂ x é contínua. Então, é possível usar o lema 1.1 para concluir que, para todo
ε > 0, existe δ > 0 tal que, para x ∈ I, se tem

∂ f ∂ f ε
|x − x0 | < δ ⇒ (x, y) − (x0 , y) < ,
∂x ∂x 3(b − a)
qualquer que seja y ∈ [a, ∞).
Em particular, o resultado acima é verdadeiro para x = x0 + θ k, para |k| < δ e θ ∈ (0, 1) (pois
I é um intervalo aberto). Assim,

∂ f ∂ f ε
(2.23) |x − x0 | < δ ⇒ (x0 + θ k, y) − (x0 , y) < ·
∂x ∂x 3(b − a)
Também por hipótese, a integral
Z ∞
∂f
ψ (x) = (x, y) dy
a ∂x
converge uniformemente, diga-se, em um intervalo J ⊂ I. Então, dado ε > 0, existe B = B(ε ) > a
tal que, para todo x ∈ J, se tem
Z b
∂f ε
, para todo b > B.
a ∂ x (x, y) dy − ψ (x) < 3
A.2 Segundo caso 635

Agora observe que


Z ∞ Z b Z ∞
∂f ∂f ∂f
ψ (x) = (x, y) dy = (x, y) dy + (x, y) dy,
a ∂x a ∂x b ∂x
de modo que
Z Z Z
b∂f ∞∂f ∞∂f
(x, y) dy − ψ (x) = − (x, y) dy = (x, y) dy .
a ∂x b ∂x b ∂x

Segue-se daí e da hipótese de a convergência ser uniforme que


Z ∞ Z b
∂f ∂f ε
(x, y) dy = (x, y) dy − ψ (x) < ·
b ∂x a ∂x 3

Em particular, segue-se também que


Z ∞ Z ∞
∂ f ε ∂ f ε
(2.24) (x0 + θ k, y) dy < e (x0 , y) dy < ,
b ∂x 3 b ∂x 3

para todo b > B.


Substuindo (2.23) e (2.24) em (2.22), encontra-se
Z  
ϕ (x0 + k) − ϕ (x0 ) Z ∞ ∂ f b ∂f ∂ f
− (x0 , y) dy ≤ (x0 + θ k, y) − (x0 , y) dy +
k a ∂x a ∂x ∂x

Z ∞ ∂ f

+ (x0 + θ k, y) dy +
b ∂x

Z ∞ ∂ f

+ (x , y)dy
b ∂x 0
Z b

∂f ∂f
≤ (x0 + θ k, y) − (x0 , y) dy +
a ∂x ∂x
Z Z
∞∂f ∞∂f

+ (x0 + θ k, y) dy + (x0 , y)dy
b ∂x b ∂x
Z b
ε ε ε
< dy + +
3(b − a) a 3 3
ε 2ε
= · (b − a) +
3(b − a) 3
ε 2ε
= + = ε,
3 3
o que demonstra o resultado desejado.
636 A Funções representadas por integrais

Observação 2.3: Caso a integral


Z ∞
∂f
ϕ (x) = (x, y) dy
a ∂x
convirja uniformemente apenas em uma vizinhança de um ponto x0 ∈ I, então a função ϕ (x)
resulta derivável neste ponto x0 . Como x0 é arbitrário, então o resultado é verdadeiro para todo
x ∈ I.

Agora apresenta-se um resultado um poucomais geral do que aquele contido na proposição


anterior.

Proposição 2.5 (diferenciabilidade): Sejam g, ∂ g/∂ x : I × [a, ∞) → R funções contínuas e


limitadas na variável y (isto é, |g(x, y)| ≤ K(y) e |∂ g/∂ x(x, y)| ≤ K(y) para x fixado) e h : [a, ∞) →
R uma função de L1 ([a, ∞)). Seja f : I × [a, ∞) → R uma função definida por f (x, y) = g(x, y) ·
h(y). Então, a função definida por
Z ∞
ϕ (x) = g(x, y) · h(y) dy
a

é derivável em todo ponto de I e


Z ∞
∂g
ϕ 0 (x) = (x, y) · h(y) dy.
a ∂x
D EMONSTRAÇÃO : Deseja-se mostrar que, dado ε > 0, existe δ > 0 tal que, para x0 ∈ I„ se
tem
ϕ (x0 + k) − ϕ (x0 ) Z ∞ ∂ g
− (x0 , y) · h(y) dy < ε ,
k a ∂x
para |k| < δ .
Sejam x0 ∈ J ⊂ I e b > a. Então, para |k| < δ , tem-se
Z ∞
ϕ (x0 + k) − ϕ (x0 ) Z ∞ ∂ g g(x0 + k, y) · h(y)
− (x0 , y) · h(y) dy = dy −
k a ∂x a k
Z ∞
g(x0 , y) · h(y)
− dy −
a k
Z ∞
∂g
− (x0 , y) · h(y) dy
a ∂x
Z ∞
[g(x0 + k, y) − g(x0, y)] · h(y)
= dy −
a k
Z ∞
∂g
− (x0 , y) · h(y) dy
a ∂x
Z
b [g(x0 + k, y) − g(x0, y)] · h(y)
+ dy +
a k
A.2 Segundo caso 637

Z ∞
[g(x0 + k, y) − g(x0, y)] · h(y)
+ dy −
b k
Z b Z ∞
∂g ∂g
− (x0 , y) · h(y) dy − (x0 , y) · h(y) dy
a ∂x b ∂x
Z Z b
b [g(x0 + k, y) − g(x0, y)] · h(y) ∂g

= dy − (x0 , y) · h(y) dy +
a k a ∂x
Z ∞ Z ∞
[g(x0 + k, y) − g(x0, y)] · h(y) ∂g
+ dy − (x0 , y) · h(y) dy
b k b ∂x
Z  
b g(x0 + k, y) − g(x0, y) ∂ g

= − (x0 , y) · h(y) dy +
a k ∂x
Z ∞ Z ∞
[g(x0 + k, y) − g(x0, y)] · h(y) ∂g
+ dy − (x0 , y) · h(y) dy
b k b ∂x
= (pelo teorema do valor médio para integrais)
 
∂g
Z b (x + θ k, y) · k ∂ g
 ∂x 0 
=  − (x0 , y) · h(y) dy +
a k ∂x

∂g
Z ∞ (x0 + θ k, y) · k Z ∞
∂ g
+ ∂x · h(y) dy −

(x0 , y) · h(y) dy
b k b ∂ x
Z  
b ∂g ∂g

= (x + θ k, y) − (x0 , y) · h(y) dy +
a ∂x 0 ∂x

Z ∞ Z ∞
∂g ∂g
+ (x0 + θ k, y) · h(y) dy − (x0 , y) · h(y) dy
b ∂x b ∂x

Z b ∂ g ∂ g


≤ (x0 + θ k, y) − (x0 , y) · h(y) dy +
a ∂x ∂x
Z Z
∞ ∂g ∞ ∂g

(2.25) + (x0 + θ k, y) · h(y) dy + (x0 , y) · h(y) dy .
b ∂x b ∂x

Por hipótese, ∂ g/∂ x é contínua. Então é possível usar o lema 1.1 para concluir que, para todo
ε > 0, existe δ > 0 tal que, para x ∈ I, se tem

∂g g
|x − x0 | < δ ⇒ (x, y) − (x0 , y) < Z ε
∂ ,
∂x ∂x b
3 |h(y)| dy
a
638 A Funções representadas por integrais

qualquer que seja y ∈ [a, b]. Isso é sempre verdade, pois, por hipótese, a função h ∈ L1([a, b]),
ou seja, por ser deste espaço, segue-se que |h(y)| é integrável e o valor resultante desta integral
acima é um número finito.
Em particular, o resultado acima é verdadeiro para x = x0 + θ k, para |k| < δ e θ ∈ (0, 1) (pois
I é um intervalo aberto. Assim,

∂ g ∂g
|x − x0| < δ ⇒ (x0 + θ k, y) − (x0 , y) < Z ∞ ε ,
∂x ∂x
3 |h(y)| dy
a

Portanto, a primeira integral no último membro de (2.25) pode ser estimada da seguinte
maneira:para x ∈ [x0 − δ , x0 + δ ], tem-se

Z b ∂ g ∂ g
 Z b ∂ g ∂ g


(x0 + θ k, y) −
(x0 + θ k, y) − (x0 , y) · h(y) dy ≤ (x0 , y) · h(y) dy
a ∂x ∂x a ∂x ∂x
Z b

∂g ∂g |h(y)| dy
= (x0 + θ k, y) − (x 0 , y)
a ∂x ∂x
Z b
ε
< Zb |h(y)| dy
a
3 |h(y)| dy
a
Z ∞
ε
< Z ∞ |h(y)| dy
3 |h(y)| dy a
a

ε
(2.26) < ·
3
Além disso, por hipótese, tem-se que |∂ g/∂ x(x, y)| ≤ K(y), para x fixado, e h ∈ L1 ([a, ∞)).
Então, Z Z
∞ ∂g ∞ ∂g

a ∂ x (x, y) · h(y) dy ≤ a ∂ x (x, y) · h(y) dy
Z ∞

∂g · |h(y)| dy
= ∂x (x, y)
a
Z ∞
≤ K(y) |h(y)| dy = M(y),
a
onde se fez Z ∞
M(y) = K(y) |h(y)| dy,
a
uma vez que a integral acima é constante e finita por ser h ∈ L1([a, ∞)).
Com isso, é possível usar o teste M de Weierstrass para concluir que a integral
Z ∞
∂g
(x, y) · h(y) dy
a ∂x
converge uniformemente, por exemplo, em um intervalo J ⊂ I.
A.2 Segundo caso 639

Fazendo Z ∞
∂g
ψ (x) = (x, y) · h(y) dy
∂x a
então pela convergência uniforme da integral acima, tem-se que, dado ε > 0, existe B = B(ε ) > a
tal que, para todo x ∈ J,
Z
b ∂g ε
(x, y) · h(y) dy − ψ (x) < , para todo b > B.
a ∂x 3

Agora observe que


Z ∞ Z b Z ∞
∂g ∂g ∂g
ψ (x) = (x, y) · h(y) dy = (x, y) · h(y) dy + (x, y) · h(y) dy,
a ∂x a ∂x b ∂x
de modo que
Z Z Z
b ∂g ∞ ∂g ∞ ∂g
(x, y) · h(y) dy − ψ (x) = − (x, y) · h(y) dy = (x, y) · h(y) dy .
a ∂x b ∂x b ∂x

Segue-se daí e de a convergência ser uniforme que


Z ∞ Z b
∂ g ∂ g ε

b ∂ x (x, y) · h(y) dy = a ∂ x (x, y) · h(y) dy − ψ (x) < 3 ·

Em particular, segue-se também que


Z ∞ Z ∞
∂g ε ∂g ε
(2.27) (x0 + θ k, y) · h(y) dy < e (x0 + θ k, y) · h(y) dy < ,
b ∂x 3 b ∂x 3

para todo b > B.


Substituindo (2.26) e (2.27) em (2.25), encontra-se
Z  
ϕ (x0 + k) − ϕ (x0) Z ∞ ∂ g b ∂g ∂ g

− (x0 , y) · h(y) dy ≤ (x0 + θ k, y) − (x0 , y) · h(y) dy +
k a ∂ x a ∂ x ∂ x

Z ∞ ∂g

+ (x0 + θ k, y) · h(y) dy +
b ∂x

Z ∞ ∂g

+ (x0 , y) · h(y) dy
b ∂x

Z b

∂ g ∂ g
(x0 + θ k, y) − (x0 , y) · |h(y)| dy +

a ∂x ∂x

Z ∞ ∂g

+ (x0 + θ k, y) · h(y) dy +
b ∂x

Z ∞ ∂g

+ (x0 , y) · h(y) dy
b ∂x
640 A Funções representadas por integrais

ε ε ε
< + + = ε,
3 3 3
o que demonstra o resultado desejado.

Proposição 2.6 (mudança na ordem de integração): Seja f : I × [a, ∞) → R uma função


contínua. Suponha que a integral
Z ∞
ϕ (x) = f (x, y) dy
a

converge uniformemente. Então, para qualquer intervalo limitado [x1, x2] ⊂ I, vale que
Z x2 Z ∞ Z ∞ Z x2
(2.28) f (x, y) dy dx = f (x, y) dx dy.
x1 a a x1

D EMONSTRAÇÃO : Como f é contínua, então, pela proposição 2.2, a função ϕ também será
contínua. Assim, a integral no primeiro membro,
Z x2 Z ∞ Z x2
f (x, y) dy dx = ϕ (x) dx,
x1 a x1

ou seja, é igual a integral de x1 até x2 da função ϕ (x).


Como o intervalo [x1, x2 ] é limitado e ϕ é contínua, então a integral no segundo membro
acima existe, de modo que, pela igualdade, existe a integral no primeiro membro. Portanto,
tem-se que (2.28) pode ser escrito como
Z ∞ Z x2 Z x2
f (x, y) dx dy = ϕ (x) dx,
a x1 x1

ou ainda, Z b Z x2 Z x2
lim f (x, y) dx dy = ϕ (x) dx
b→∞ a x1 x1
Como a integral dupla no primeiro membro acima é dada em dois intervalos limitados e o
integrando f (x, y) é uma função contínua, então pode-se usar a proposição 1.6 que trata sobre a
mudança na ordem de integração para integrais deste tipo. Assim, segue-se daí que
Z x2 Z b Z x2
lim f (x, y) dy dx = ϕ (x) dx.
b→∞ x1 a x1

Agora observe que

Z x2 Z b Z x2 Z ∞ Z x2 Z ∞
(2.29) f (x, y) dy dx = f (x, y) dy dx − f (x, y) dy dx.
x1 a x1 a x1 b

Agora será demonstrado que


A.2 Segundo caso 641

Z x2 Z ∞
(2.30) lim f (x, y) dy dx = 0.
b→∞ x1 b

Observa-se que não é possível passar o limite acima para dentro da primeira integral, pois não
é possível saber se issso implicará em mudança do resultado. Assim, a ideia consiste em usar a
hipótese da convergência uniforme da integral de ϕ (x). De fato, dado ε > 0, existe B = B(ε ) > a,
tal que Z

f (x, y) dy < ε ·
b x2 − x1
Segue-se daí e de (2.30) que
Z x Z ∞ Z
x2 Z ∞

2
f (x, y) dy dx ≤ f (x, y) dy dx
x1 b
x1
b
Z x2 x2
ε ε
< dx = · x
x2 − x1 x1 x2 − x1 x1
ε
= · (x2 − x1 ) = ε ,
x2 − x1
mostrando que Z x2 Z ∞
lim f (x, y) dy dx = 0.
b→∞ x1 b
Por (2.29) e (2.30), segue-se que
Z x2 Z ∞ Z x2 Z b
f (x, y) dy dx = lim f (x, y) dy dx
x1 a b→∞ x1 a
Z x2 Z ∞ Z x2 Z ∞
= lim f (x, y) dy dx − lim f (x, y) dy dx
b→∞ x1 a b→∞ x1 b
Z x2 Z ∞
= f (x, y) dy dx.
x1 a

Portanto, Z x2 Z ∞ Z ∞ Z x2
f (x, y) dy dx = f (x, y) dx dy,
x1 a a x1
ficando demonstrada a proposição.

Na proposição 2.6, a substituição do intervalo limitado [x1 , x2] pelo intervalo ilimitado (a, ∞)
é um assunto bem delicado e complicado. A convergência uniforme da integral
Z ∞
ϕ (x) = f (x, y) dy
a

não é suficiente para a mudança na ordem de integração. Assim sendo, dois exemplos nessa
direção serão apresentados a seguir, mostrando a dificuldade desse caso específico.
642 A Funções representadas por integrais

Exemplo 2.7: Este exemplo mostrará que a mudança na ordem de integração também pode
ter problemas com as integrais em domínios ilimitados. De fato, considere a função f : (1, ∞) ×
(1, ∞) → R definida por
x−y
f (x, y) = ·
(x + y)3
Agora considere a função g : (1, ∞) × (1, ∞) → R definida por
x
g(x, y) = − ·
(x + y)2
Observe que
 
∂g ∂ x (x + y)2 · (−1) + x · [2(x + y)]
(x, y) = − =
∂x ∂x (x + y)2 (x + y)4
−x2 − 2xy − y2 + 2x2 + 2xy x2 − y2
= =
(x + y)4 (x + y)4
(x + y)(x − y) x−y
= 4
= = f (x, y).
(x + y) (x + y)3
Assim,
Z ∞ Z b Z b  
x−y x∂
f (x, y) dx = lim dx = lim − dx
1 b→∞ 1 (x + y)3 b→∞ 0 ∂ x (x + y)2
  b   1
x x
= lim − = lim
b→∞ (x + y)2 1 b→∞ (x + y)2 b
 
1 b
= lim −
b→∞ (1 + y)2 (b + y)2
1 b
= lim 2
− lim 2
b→∞ (1 + y) b→∞ b + 2by + y2

1 1
= 2
−0 = ·
(1 + y) (1 + y)2
Portanto,
Z ∞Z ∞ Z ∞ Z b
1 1
f (x, y) dx dy = dy = lim dy
1 1 1 (1 + y)2 1 (1 + y)
b→∞ 2

Z 1+b   1+b
1 1
= lim du = lim −
b→∞ 2 u 2 b→∞ u 2
  2  
1 1 1
= lim = lim −
b→∞ u 1+b b→∞ 2 1+b
1 1
= lim − lim
b→∞ 2 b→∞ 1 + b
A.2 Segundo caso 643

1 1
(2.31) = −0 = ·
2 2
onde se fez a seguinte mudança de variáveis: u = 1 + y (de modo que du = dy).
Similarmente, define-se uma função h : (1, ∞) × (1, ∞) → R por
y
h(x, y) = ·
(x + y)2
Agora observe que
 
∂h ∂ y (x + y)2 · 1 − y · [2(x + y)]
(x, y) = =
∂y ∂ y (x + y)2 (x + y)4
x2 + 2xy + y2 − 2xy − 2y2 x2 − y2
= =
(x + y)4 (x + y)4
(x + y)(x − y) x−y
= 4
= = f (x, y).
(x + y) (x + y)3
Assim, Z ∞ Z b  
x−y ∂ y
f (x, y) dy = lim dy = lim dy
1 b→∞ (x + y)3 b→∞ 0 ∂ y (x + y)2
  b  
y b 1
= lim = lim −
b→∞ (x + y)2 1 b→∞ (x + b)2 (x + 1)2
b 1
= lim − lim
b→∞ x2 + 2bx + b2 b→∞ (x + 1)2
1 1
= 0− 2
=− ·
(x + 1) (x + 1)2
Portanto,
Z ∞Z ∞ Z ∞ Z b
1 1
f (x, y) dy dx = − dx = − lim dx
1 1 1 (x + 1)2 1 (x + 1)
b→∞ 2

Z b+1   b+1
1 1
= − lim dx = − lim −
b→∞ 2 u 2 b→∞ u 2
  b+1  
1 1 1
= lim = lim −
b→∞ u 2 b→∞ b + 1 2
1 1
= lim − lim
b→∞ b + 1 b→∞ 2
1 1
(2.32) = 0− =− ·
2 2
onde se fez a seguinte mudança de variáveis: u = x + 1 (de modo que du = dy).
Segue-se de (2.31) e (2.32) que
644 A Funções representadas por integrais

Z ∞Z ∞ Z ∞Z ∞
f (x, y) dx dy 6= f (x, y) dy dx.
1 1 1 1

O exemplo 2.7 mostrou a impossibilidade de fazer uma mudança na ordem de integração,


pois cada integral dupla possui valores distintos. O próximo exemplo mostra que se tem a con-
vergência uniforme da integral, mas que não é suficiente para garantir a mudança na ordem de
integração.

Exemplo 2.8: Considere a função f : (1, ∞) × (1, ∞) → R definida por


x−y
f (x, y) = ·
(x + y)3
Como x, y > 1, então
1 1
(y)2 < (x + y)2 ⇒ 2
≤ 2·
(x + y) y

Assim, observando que (x + y)3 = (x + y)3 , tem-se a seguinte estimativa:

x−y

| f (x, y)| = = |x − y| = |x − y|
(x + y) |(x + y)3 | (x + y)3
3

|x + y| x+y 1 1,
≤ = = ≤
(x + y)3 (x + y)3 (x + y)2 y2
onde usou-se a desigualdade anterior.
Considere agora a função M : (1, ∞) → R dada por
1
M(y) = ·
y2
Observe que M é uma função não negativa. Agora mostra-se que M é integrável. Basta cal-
cular diretamente a sua integral em seu domínio de definição. Tem-se:
Z ∞ Z b   b
1 1 1
dy = lim dy = lim −
1 y
2 b→∞ 1 y2 b→∞ y 1
  1  
1 1
= lim = lim 1 −
b→∞ y b b→∞ b
1
= lim 1 − lim = 1.
b→∞ b→∞ b
Como M é uma função não negativa e integrável, então é possível aplicar o teste M de Weier-
strass para concluir que a integral
Z ∞ Z ∞
x−y
f (x, y) dy = dy
1 1 (x + y)3
A.2 Segundo caso 645

converge uniformemente. Mas a convergência não é absoluta, pois a função f (x, y) não pertence
ao espaço L1((1, ∞)). Essa afirmação equivale a dizer que a função f (x, y) não é absolutamente
integrável.
De fato, observe que
 
∂ y ∂  
2
= y(x + y)−2
∂ y (x + y) ∂y
= (x + y)−2 + (−2) · y · (1)(x + y)−3
1 2y x+y 2y
= 2
− 3
= 3

(x + y) (x + y) (x + y) (x + y)3
x + y − 2y x−y
(2.33) = 3
=
(x + y) (x + y)3
e que
 
∂ y ∂  
− 2
= −y(x + y)−2
∂y (x + y) ∂y

= −(x + y)−2 − (−2) · y · (1)(x + y)−3


1 2y x+y 2y
=− 2
+ 3
=− 3
+
(x + y) (x + y) (x + y) (x + y)3
−x − y + 2y y−x
(2.34) = 3
= ·
(x + y) (x + y)3
Além disso, observe que
(
x − y, para x − y ≥ 0,
|x − y| =
−(x − y), para x − y < 0,
(
x − y, para y ≤ x,
=
y − x, para y > x.
Usando (2.33) e (2.34), obtém-se
Z ∞ Z ∞ Z x Z ∞
|x − y| x−y y−x
| f (x, y)| dy = dy = dy + dy
1 1 (x + y)3 1 (x + y)3 x (x + y)3
Z x Z b
x−y y−x
= dy + lim dy
1 (x + y)3 b→∞ x (x + y)3

= (por (2.33) e (2.34))


Z x   Z b  
∂ y ∂ y
= dy + lim − dy
1 ∂ y (x + y)2 b→∞ x ∂y (x + y)2
646 A Funções representadas por integrais

  x   b
y y
= − lim
(x + y)2 1 b→∞ (x + y)2 x
x 1 b x
= 2
− 2
− lim 2
+ lim
(2x) (x + 1) b→∞ (x + b) b→∞ (2x)2

1 1 1
= − 2
−0+
4x (x + 1) 4x
1 1
(2.35) = − ·
2x (x + 1)2
Portanto, por (2.35), encontra-se
Z ∞Z ∞ Z ∞Z ∞
|x − y|
| f (x, y)| dy dx = dy dx
1 1 1 1 (x + y)3
Z ∞ 
1 1
= − dx
1 2x (x + 1)2
Z ∞ Z ∞
1 1
= dx − dx.
1 2x 1 (x + 1)2
A segunda integral no último membro acima converge, mas a primeira integral não converge,
pois um cálculo simples mostra que aparecerá o termo ln x que diverge quando x → ∞. Isso im-
plica na divergência de toda a integral no primeiro membro, mostrando, portanto, que a função
f (x, y) não é absolutamente integrável.
Para calcular a outra integral, com ordem de integração invertida em relação a integral calcu-
lada, observe primeiro que
 
∂ x ∂  −2

= x(x + y)
∂ x (x + y)2 ∂x
= (x + y)−2 + (−2) · x · (1)(x + y)−3
1 2x x+y 2x
= 2
− 3
= 3

(x + y) (x + y) (x + y) (x + y)3
x + y − 2x y−x
(2.36) = 3
=
(x + y) (x + y)3
e que
 
∂ x ∂  −2

− = −y(x + y)
∂x (x + y)2 ∂y
= −(x + y)−2 − (−2) · x · (1)(x + y)−3
1 2x x+y 2x
=− 2
+ 3
=− 3
+
(x + y) (x + y) (x + y) (x + y)3
A.2 Segundo caso 647

−x − y + 2x x−y
(2.37) = = ·
(x + y)3 (x + y)3
Observe também que
(
x − y, para x − y ≥ 0,
|x − y| =
−(x − y), para x − y < 0,
(
x − y, para x ≥ y,
=
y − x, para x < y.

Usando (2.36) e (2.37), obtém-se


Z ∞ Z ∞ Z y Z ∞
|x − y| y−x x−y
| f (x, y)| dx = dx = dx + dx
1 1 (x + y)3 1 (x + y)3 y (x + y)3
Z y Z b
y−x x−y
= dx + lim dx
1 (x + y)3 b→∞ y (x + y)3

= (por (2.36) e (2.37))


Z y   Z b  
∂ x ∂ x
= dx + lim − dx
1 ∂ x (x + y)2 b→∞ y ∂x (x + y)2
  y   b
x x
= + lim −
2
(x + y) 1 b→∞ (x + y) y
2

 
y 1 b y
= − + lim − +
(2y)2 (y + 1)2 b→∞ (y + b)2 (2y)2
1 1 b 1
= − 2
− lim 2
+ lim
4y (y + 1) b→∞ (y + b) b→∞ 4y

1 1 1
= − 2
−0+
4y (y + 1) 4y
1 1
(2.38) = − ·
2y (y + 1)2
Portanto, por (2.38), encontra-se
Z ∞Z ∞ Z ∞Z ∞
|x − y|
| f (x, y)| dx dy = dx dy
1 1 1 1 (x + y)3
Z ∞ 
1 1
= − dy
1 2y (y + 1)2
Z ∞ Z ∞
1 1
= dy − dy.
1 2y 1 (y + 1)2
648 A Funções representadas por integrais

A segunda integral no último membro acima converge, mas a primeira integral não converge,
pois um cálculo simples mostra que aparecerá o termo ln y que diverge quando x → ∞. Isso im-
plica na divergência de toda a integral no primeiro membro, mostrando, portanto, que a função
f (x, y) não é absolutamente integrável.

O exemplo 2.7 mostrou que uma situação em que a troca da ordem de integração não resul-
tou em integrais duplas iguais. O exemplo 2.8 mostrou o motivo do problema apresentado no
exemplo 2.7: que a hipótese convergência uniforme não é o bastante para que se possa mudar a
ordem de integração quando se trata de domínio de integração ilimitado, pois as duas integrais
duplas não eram absolutamente convergentes.
O próximo resultado não é exatamente o clássico teorema de Fubini, mas sim uma versão
bastante particularizada para o mesmo. Porém, por outro lado, neste texto o teorema de Fubini
foi citado diversas vezes e em diversos lugares. A versão a seguir foi usada, por exemplo, na
demonstração do teorema da convolução para transformada de Laplace. Assim sendo, esclarece-
se que o teorema de Fubini citado em partes deste texto tem como uma de suas versões o sentido
do teorema a seguir.

Teorema 2.5 (Fubini): Seja f : R2 → R uma função contínua tal que as integrais iteradas
abaixo convirjam
Z ∞Z ∞ Z ∞Z ∞
| f (x, y)| dy dx e | f (x, y)| dx dy.
a b b a

Então, as integrais iteradas de f convergem e vale


Z ∞Z ∞ Z ∞Z ∞
f (x, y) dy dx = f (x, y) dx dy.
a b b a

D EMONSTRAÇÃO : Considere as partes positivas e negativa para a função f :


(
f (x, y), se f (x, y) ≥ 0,
f + (x, y) =
0, se f (x, y) < 0,
e (
0, se f (x, y) ≥ 0,
f − (x, y) =
− f (x, y), se f (x, y) < 0.
Observe que segue-se das definições de partes positiva e negativa de uma função que
| f (x, y)| + f (x, y) | f (x, y)| − f (x, y) ,
f + (x, y) = e f − (x, y) =
2 2
de modo que f + e f − são contínuas. Além disso, tem-se que f + (x, y) ≥ 0 e f − (x, y) ≥ 0. Tem-se
também que
A.2 Segundo caso 649

| f (x, y)| + f (x, y) | f (x, y)| − f (x, y)


f + (x, y) − f − (x, y) = −
2 2
| f (x, y)| f (x, y) | f (x, y)| f (x, y)
= + − +
2 2 2 2
= f (x, y)
e
| f (x, y)| + f (x, y) | f (x, y)| − f (x, y)
f + (x, y) + f − (x, y) = +
2 2
| f (x, y)| f (x, y) | f (x, y)| f (x, y)
= + + −
2 2 2 2
= | f (x, y)|,
ou seja, mostrou-se que

f (x, y) = f + (x, y) − f − (x, y) e | f (x, y)| = f + (x, y) + f − (x, y).

Isso mostra que basta demonstrar a proposição para o caso em que f (x, y) ≥ 0. Seja
Z ∞
ϕ (x) = f (x, y) dy,
b

onde Z d
ϕ (x) = lim f (x, y) dy,
d→∞ b
qualquer que seja d > b. Note que ϕ (x) ≥ 0, pois f (x, y) ≥ 0.
Portanto, para qualquer d > b, tem-se que
Z ∞ Z d
ϕ (x) = f (x, y) dy ≥ f (x, y) dy,
b b

pois assume-se que f ≥ 0, de modo que o valor da integral aumenta quando se aumenta o
comprimento do intervalo.
Seja c > a quaisquer. Como, por hipótese, f é contínua, então pela proposição 2.2, tem-se que
ϕ também é contínua. Com isso, tem-se que ϕ (x) é integrável em qualquer intervalo limitado
[a, c]. Assim,  
Z c Z c Z d
ϕ (x) dx ≥ f (x, y) dy dx
a a b
Z cZ d
= f (x, y) dy dx
a b

= (pela proposição 1.5)


Z dZ c
= f (x, y) dx dy.
b a
Segue-se daí que
650 A Funções representadas por integrais

Z ∞ Z c Z dZ c
(2.39) ϕ (x) dx ≥ ϕ (x) dx ≥ f (x, y) dx dy,
a a b a

pois ϕ ≥ 0 e o valor da integral aumenta quando se aumenta o comprimento do intervalo.


Em virtude da arbitrariedade de c, segue-se de (2.39) que
Z ∞ Z c
ϕ (x) dx = lim f (x, y) dx.
a c→∞ a

Como se está supondo que f (x, y) ≥ 0, então segue-se de (2.39) e da última expressão que
Z ∞ Z dZ ∞
ϕ (x) dx ≥ f (x, y) dx dy.
a b a

Daí segue-se que


Z ∞ Z ∞Z ∞
(2.40) ϕ (x) dx ≥ f (x, y) dx dy.
a b a

Faça Z ∞Z ∞ Z ∞Z ∞
I1 = f (x, y) dy dx e I2 = f (x, y) dx dy.
a b b a
A desigualdade obtida em (2.40) significa dizer que I1 ≥ I2 .
O próximo passo é mostrar que I2 ≤ I1 . Novamente, basta demonstrar para o caso em que
f (x, y) ≥ 0. Seja Z ∞
ψ (y) = f (x, y) dx,
a
onde Z c
ψ (y) = lim f (x, y) dx.
c→∞ a

para qualquer c > a. Note que ψ (y) ≥ 0, pois f (x, y) ≥ 0.


Portanto, para qualquer c > a, tem-se que
Z ∞ Z c
ψ (y) = f (x, y) dx ≥ f (x, y) dx,
a a

pois assume-se que f ≥ 0, de modo que o valor da integral aumenta quando se aumenta o
comprimento do intervalo.
Sejam d > b quaisquer. Como, por hipótese, f é contínua, então pela proposição 2.2, tem-
se que ψ também é contínua. Com isso, tem-se que ψ (y) é integrável em qualquer intervalo
limitado [a, c]. Assim,  
Z d Z d Z c
ψ (y) dy ≥ f (x, y) dx dy
b b a
Z dZ c
= f (x, y) dx dy
b a

= (pela proposição 1.5)


Z cZ d
= f (x, y) dy dx.
a b
A.3 Terceiro caso 651

Segue-se daí que


Z ∞ Z d Z cZ d
(2.41) ψ (y) dy ≥ ψ (y) dy ≥ f (x, y) dy dx,
b b a b

pois ϕ ≥ 0 e o valor da integral aumenta quando se aumenta o comprimento do intervalo.


Em virtude da arbitrariedade de d, segue-se de (2.41) que
Z ∞ Z d
ψ (y) dy = lim f (x, y) dy.
a d→∞ b

Como se está supondo que f (x, y) ≥ 0, então segue-se de (2.41) e da última expressão que
Z ∞ Z cZ ∞
ψ (y) dy ≥ f (x, y) dy dx.
b a b

Daí segue-se que


Z ∞ Z ∞Z ∞
(2.42) ψ (y) dy ≥ f (x, y) dy dx.
a a b

Como foi feito


Z ∞Z ∞ Z ∞Z ∞
I1 = f (x, y) dy dx e I2 = f (x, y) dx dy,
a b b a

então a desigualdade obtida em (2.42) significa dizer que I2 ≥ I1 . Como já foi demonstrado que
I1 ≥ I2 , então conclui-se que I1 = I2 , ou seja, que
Z ∞Z ∞ Z ∞Z ∞
f (x, y) dy dx = f (x, y) dx dy,
a b b a

demonstrando o que foi afirmado.

A.3 Terceiro caso

Nesta seção analisar-se-a a função ϕ representada por


Z ∞
ϕ (x) = f (x, y) dy.
−∞

Agora, observe que sempre é possível escrever


Z ∞ Z 0 Z ∞
f (x, y) dy = f (x, y) dy + f (x, y) dy.
−∞ −∞ 0
Na primeira integral do segundo membro acima, faça a mudança de variáveis z = −y. Com
isso, tem-se que −dz = dy e que nos novos limites de integração serão: z = ∞ (para y = −∞) e
652 A Funções representadas por integrais

z = 0 (para y = 0). Assim,


Z 0 Z 0 Z 0 Z ∞
f (x, y) dy = f (x, −z) (−dz) = − f (x, −z) dz = f (x, −x) dz,
−∞ ∞ ∞ 0

mostrando, portanto, que a integral do primeiro membroa acima também é uma integral do tipo
Z ∞
u(x, y) dy.
a

Assim sendo, a função ϕ (x) pode ser escrita como soma de duas integrais do tipo acima.
Portanto, a teoria de funções representadas por integrais de −∞ até ∞ fica resumida ao estudo
das integrais da seção A.2). Mas antes é preciso dar significado ao conceito de convergência
uniforme para integrais do tipo estudado nesta seção.
Como Z Z Z
∞ 0 ∞
f (x, y) dy = f (x, y) dy + f (x, y) dy,
−∞ −∞ 0
então se diz que a integral converge uniformemente se, dado ε > 0, existir um B = B(ε ) > 0 tal
que
Z B Z ∞

(3.1) f (x, y) dy + f (x, y) dy < ε .
−∞ B

O que será mostrado a seguir será usado nas demonstrações das proposições que estão logo
adiante. Afirmação: as integrais no segundo membro de (3.1) também convergem uniforme-
mente.
De fato, Z B Z B Z ∞


−∞ f (x, y) dy ≤ −∞ f (x, y) dy + B f (x, y) dy < ε
e Z ∞ Z B Z ∞

f (x, y) dy ≤ f (x, y) dy + f (x, y) dy < ε.
B −∞ B

As duas desigualdades acima mostram que as integrais
Z 0 Z ∞
f (x, y) dy e f (x, y) dy
−∞ 0

também convergem uniformemente, com o mesmo ε > 0 e o mesmo B = B(ε ) > 0. Este fato
será usado nas demonstrações das proposições a seguir, mas não serão novamente mostrado.

Proposição 3.1 (continuidade): Sejam I ⊂ R um intervalo e f : I × R uma função contínua.


Suponha que a integral Z ∞
f (x, y) dy
−∞
convirja uniformemente para x ∈ I. Então a função ϕ : I → R, definida por
Z ∞
ϕ (x) = f (x, y) dy,
−∞
A.3 Terceiro caso 653

é contínua.
Z ∞
D EMONSTRAÇÃO : Por hipótese, a integral f (x, y) dy converge uniformente. Então, como
−∞
demonstrado anteriormente, tem-se que as integrais
Z 0 Z ∞
f (x, y) dy e f (x, y) dy
−∞ 0

também convergem uniformemente.


Portanto, como f é contínua e cada uma das integrais acima converge uniformente, então
é possível usar a proposição 2.2 para concluir que cada integral acima representa uma função
contínua, isto é, existem duas funções contínuas ϕ1 e ϕ2 tais que
Z 0 Z ∞
ϕ1(x) = f (x, y) dy e ϕ2(x) = f (x, y) dy.
−∞ 0

Como claramente se tem ϕ (x) = ϕ1 (x) + ϕ2(x), sendo ϕ1 e ϕ2 contínuas, em virtude da


proposição 2.2, segue-se daí que ϕ também é contínua, pois se escreve como soma de duas
funções contínuas.

Proposição 3.2 (continuidade): Sejam I ⊂ R um intervalo, g : I × R uma função contínua e


limitada na variável y (isto é, |g(x, y)| ≤ K(y) para x fixado) e h : R → R uma função de L1(R).
Suponha que a integral Z ∞
g(x, y) · h(y) dy
−∞
convirja uniformemente para x ∈ I. Então a função ϕ : I → R, definida por
Z ∞
ϕ (x) = g(x, y) · h(y) dy,
−∞

é contínua.
D EMONSTRAÇÃO : A hipótese de convergência uniforme para a integral do enunciado não
está presente, mas ela decorre das demais hipóteses. Com isso, será necessário concluir a con-
vergência uniforme antes de avançar. Tem-se:
Z ∞
ϕ (x) = g(x, y) · h(y) dy
−∞
Z 0 Z ∞
(3.2) = g(x, y) · h(y) dy + g(x, y) · h(y) dy.
−∞ 0

Por hipótese, tem-se que |g(x, y)| ≤ K(y), para x fixado, e h ∈ L1(R). Então é possível fazer
a seguinte estimativa:
Z Z
∞ ∞
g(x, y) · h(y) dy ≤ | g(x, y) · h(y)| dy
−∞
−∞
654 A Funções representadas por integrais

Z ∞
= | g(x, y)) · |h(y)| dy
−∞
Z ∞
≤ K(y) |h(y)| dy = M(y),
−∞
Z ∞
onde se fez M(y) = K(y) |h(y)| dy, uma vez que a integral acima é constante e finita por ser
−∞
h ∈ L1 (R).
Com isso, é possível usar o teste M de Weierstrass para concluir que a integral
Z ∞
g(x, y) · h(y) dy
−∞

converge uniformemente, por exemplo, em um intervalo J ⊂ I.


Então, por definição, dado ε > 0, existe um B = B(ε ) > 0 tal que
Z B Z ∞

g(x, y) · h(y) dy + g(x, y) · h(y) dy < ε.
−∞ B

Além disso,
Z B Z B Z ∞

g(x, y) · h(y) dy ≤ g(x, y) · h(y) dy + g(x, y) · h(y) dy <ε
−∞ −∞ B

e Z Z Z ∞
∞ B
g(x, y) · h(y) dy ≤ g(x, y) · h(y) dy + g(x, y) · h(y) dy < ε.
B −∞ B

As duas desigualdades acima mostram que as integrais
Z 0 Z ∞
g(x, y) · h(y) dy e g(x, y) · h(y) dy
−∞ 0

também convergem uniformemente.


Assim sendo, é possível usar a proposição 2.3 para concluir que cada integral no último
membro de (3.2) representa uma função contínua, isto é, existem duas funções contínuas ϕ1 (x)
e ϕ2(x) tais que
Z 0 Z ∞
ϕ1 (x) = g(x, y) · h(y) dy e ϕ2(x) = g(x, y) · h(y) dy.
−∞ 0

Como claramente se tem ϕ (x) = ϕ1 (x) + ϕ2 (x), sendo ϕ1 (x) e ϕ2 (x) contínuas, em virtude
da proposição 2.3, segue-se daí que ϕ também é contínua, pois se escreve como soma de duas
funções contínuas.

Proposição 3.3 (diferenciabilidade): Seja f : I × R → R uma função contínua, possuindo


derivada parcial ∂ f/∂ x : I × R → R também contínua. Suponha que a integral
A.3 Terceiro caso 655

Z ∞
ϕ (x) = f (x, y) dy.
−∞

convirja e que a integral Z ∞


∂f
(x, y) dy
∂x −∞
convirja uniformemente em R. Então, ϕ é derivável em R e vale
Z ∞
0 ∂f
ϕ (x) = (x, y) dy.
−∞ ∂x
D EMONSTRAÇÃO : Pode-se escrever
Z ∞ Z 0 Z ∞
f (x, y) dy = f (x, y) dy + f (x, y) dy
−∞ −∞ 0

Analogamente, tem-se
Z ∞ Z 0 Z ∞
∂f ∂f ∂f
(3.3) (x, y) dy = (x, y) dy + (x, y) dy.
−∞ ∂x −∞ ∂x 0 ∂x
Como, por hipótese, a integral do primeiro membro acima converge uniformemente, então,
por definição, dado ε > 0, existe um B = B(ε ) > 0 tal que
Z B Z ∞
∂f ∂f
(x, y) dy + (x, y) dy < ε.
−∞ ∂ x B ∂x

Além disso,
Z B Z B Z ∞
∂f ∂f ∂f

−∞ ∂ x (x, y) dy ≤ −∞ ∂ x (x, y) dy + B ∂ x (x, y) dy < ε
e Z ∞ Z B Z ∞
∂ f ∂ f ∂ f
(x, y) dy ≤ (x, y) dy + (x, y) dy < ε.
B ∂x −∞ ∂ x B ∂x

As duas desigualdades acima mostram que as integrais
Z 0 Z ∞
∂f ∂f
(x, y) dy e (x, y) dy
−∞ ∂x 0 ∂x
também convergem uniformemente.
Portanto, como f é contínua e cada uma das integrais acima converge uniformemente, então
é possível usar a proposição 2.4 para concluir que cada integral no último membro de (3.3)
representa uma função diferenciável, isto é, existem duas funções diferenciáveis ϕ1 (x) e ϕ2 (x)
tais que
Z 0 Z ∞
∂f ∂f
ϕ10 (x) = (x, y) dy e = ϕ20 (x)
(x, y) dy.
∂x −∞ 0 ∂x
Fazendo ϕ (x) = ϕ1 (x) + ϕ2 (x), segue-se que ϕ é uma função diferenciável, por ser soma de
duas funções diferenciáveis. Além disso, segue-se que
656 A Funções representadas por integrais

ϕ 0 (x) = ϕ10 (x) + ϕ20 (x)


Z 0 Z ∞
∂f ∂f
= (x, y) dy + (x, y) dy
−∞ ∂x 0 ∂x
Z ∞
∂f
= (x, y) dy,
−∞ ∂x
como desejado.

Proposição 3.4 (diferenciabilidade): Sejam g, ∂ g/∂ x : I × R → R funções contínuas e limi-


tadas na variável y (isto é, |g(x, y)| ≤ K(y) e |∂ g/∂ x(x, y)| ≤ K(y), para x fixado) e h : R → R uma
função de L1(R). Seja f : I × R → R uma função definida por f (x, y) = g(x, y) · h(y). Então, a
função definida por Z ∞
ϕ (x) = g(x, y) · h(y) dy
−∞
é derivável em todo ponto de J e
Z ∞
0 ∂g
ϕ (x) = (x, y) · h(y) dy.
−∞ ∂x
D EMONSTRAÇÃO : Como a integral de ϕ (x) converge, então pode-se escrever
Z ∞ Z 0 Z ∞
g(x, y) · h(y) dy = g(x, y) · h(y) dy + g(x, y) · h(y) dy.
−∞ −∞ 0

Analogamente,
Z ∞ Z 0 Z ∞
∂g ∂g ∂g
(3.4) (x, y) · h(y) dy = (x, y) · h(y) dy + (x, y) · h(y) dy.
−∞ ∂x −∞ ∂x 0 ∂x
Por hipótese, tem-se que |∂ f/∂ x| ≤ K(y), para x fixado, e h ∈ L1(R). Então é possível fazer a
seguinte estimativa:
Z ∞ Z ∞
∂g ∂ g

−∞ ∂ x (x, y) · h(y) dy ≤ −∞ ∂ x (x, y) · h(y) , dy
Z ∞

∂ g
(x, y) · |h(y)| dy
=
−∞ ∂ x
Z ∞
≤ K(y) |h(y)| dy = M(y),
−∞

onde se fez Z ∞
M(y) = K(y) |h(y)| dy,
−∞

uma vez que a integral acima é constante e finita por ser h ∈ L1(R).
Com isso, é possível usar o teste M de Weierstrass para concluir que a integral
A.3 Terceiro caso 657

Z ∞
∂g
(x, y) · |h(y)| dy
−∞ ∂x
converge uniformemente, por exemplo, em um intervalo J ⊂ I.
Então, por definição, dado ε > 0, existe um B = B(ε ) > 0 tal que
Z Z ∞
B ∂g ∂ g
(x, y) · h(y) dy + (x, y) · h(y) dy < ε.
−∞ ∂ x B ∂x

Além disso,
Z Z Z ∞
B ∂g B ∂g ∂g
(x, y) · h(y) dy ≤ (x, y) · h(y) dy + (x, y) · h(y) dy <ε
−∞ ∂ x −∞ ∂ x B ∂x

e Z ∞ Z ∞ Z ∞
∂ g ∂ g ∂ g
(x, y) · h(y) dy ≤ (x, y) · h(y) dy + (x, y) · h(y) dy < ε.
B ∂x −∞ ∂ x B ∂x

As duas desigualdades acima mostram que as integrais
Z 0 Z ∞
∂g ∂g
(x, y) · h(y) dy e (x, y) · h(y) dy
−∞ ∂x 0 ∂x
também convergem uniformemente.
Assim sendo, é possível usar a proposição 2.5 para concluir que cada integral no último mem-
bro de (3.4) representa uma função diferenciável, isto é, existem duas funções diferenciáveis
ϕ1 (x) e ϕ2 (x) tais que
Z 0 Z ∞
∂g ∂g
ϕ10 (x) = (x, y) · h(y) dy e ϕ20 (x) = (x, y) · h(y) dy.
−∞ ∂x 0 ∂x
Fazendo ϕ (x) = ϕ1 (x) + ϕ2 (x), segue-se que ϕ é uma função diferenciável, por ser soma de
duas funções diferenciáveis. Além disso, segue-se que
ϕ 0 (x) = ϕ10 (x) + ϕ20 (x)
Z 0 Z ∞
∂g ∂g
= (x, y) · h(y) dy + (x, y) · h(y) dy
−∞ ∂x 0 ∂x
Z ∞
∂g
= (x, y) · h(y) dy,
−∞ ∂x
como desejado.

Proposição 3.5 (mudança na ordem de integração): Seja f : I × R → R uma função con-


tínua. Suponha que a integral Z ∞
ϕ (x) = f (x, y) dy
−∞
convergir uniformente. Então, para qualquer intervalo limitado [x1 , x2] ⊂ I, vale que
658 A Funções representadas por integrais

Z x2 Z ∞ Z ∞ Z x2
f (x, y) dy dx = f (x, y) dx dy.
x1 −∞ −∞ x1

D EMONSTRAÇÃO : Como antes, pode-se escrever


Z ∞ Z 0 Z ∞
f (x, y) dy = f (x, y) dy + f (x, y) dy.
−∞ −∞ 0

Por hipótese, a integral Z ∞


f (x, y) dy
−∞
converge uniformemente. A igualdade acima nas integrais implica dizer que cada integral no
segundo membro também converge uniformemente, como foi visto anteriormente.
Além disso, por hipótese, f é contínua, então pela proposição 3.1, a função ϕ também será
contínua. Portanto, ela é integrável em qualquer intervalo da forma [x1 , x2]. Assim, a integral no
primeiro membro pode ser escrita na forma
Z x2 Z x2 Z ∞
ϕ (x) dx = f (x, y) dy dx
x1 x1 −∞
Z x2 Z 0 Z ∞ 
= f (x, y) dy + f (x, y) dy dx
x1 −∞ 0
Z x2 Z 0 Z x2 Z ∞
(3.5) = f (x, y) dy dx + f (x, y) dy dx.
x1 −∞ x1 0

Cada integral no último membro de (3.5) é do tipo da integral da proposição 2.6 e que pode
ser usada neste ponto. Assim,
Z x2 Z ∞ Z x2 Z 0 Z x2 Z ∞
f (x, y) dy dx = f (x, y) dy dx + f (x, y) dy dx
x1 −∞ x1 −∞ x1 0

= (pela proposição 2.6)


Z 0 Z x2 Z ∞ Z x2
= f (x, y) dx dy + f (x, y) dx dy
−∞ x1 0 x1
Z ∞ Z x2
= f (x, y) dx dy,
−∞ x1

demonstrando assim o resultado.

Na proposição 3.4, a substituição do intervalo limitado [x1 , x2] pelo intervalo ilimitado
(−∞, ∞) é um assunto bem delicado e complicado. A convergência uniforme da integral
Z ∞
ϕ (x) = f (x, y) dy
−∞
A.3 Terceiro caso 659

não é suficiente para a mudança na ordem de integração. O mesmo caso se aplica em integrais
duplas, ambas com limites de integração de a até ∞. Ocorre aqui a mesma situação descrita na
seção A.2, onde os exemplos 2.7 e 2.8 podem ser usados como referências.
O próximo resultado não é exatamente o clássico teorema de Fubini, mas sim uma versão
bastante particularizada para o mesmo. Porém, por outro lado, neste texto o teorema de Fubini
foi citado diversas vezes e em diversos lugares. A versão a seguir foi usada, por exemplo, na
demonstração do teorema da convolução para transformada de Fourier. Assim sendo, esclarece-
se que o teorema de Fubini citado em partes deste texto tem como uma de suas versões o sentido
do teorema a seguir.

Teorema 3.1 (Fubini): Seja f : R2 → R uma função contínua tal que as integrais iteradas
abaixo convirjam
Z ∞Z ∞ Z ∞Z ∞
| f (x, y)| dx dy e | f (x, y)| dy dx.
−∞ −∞ −∞ −∞

Então, as integrais iteradas de f convergem e vale


Z ∞Z ∞ Z ∞Z ∞
f (x, y) dx dy = f (x, y) dy dx.
−∞ −∞ −∞ −∞

D EMONSTRAÇÃO : Considere as partes positivas e negativa para a função f :


(
f (x, y), se f (x, y) ≥ 0,
f + (x, y) =
0, se f (x, y) < 0,
e (
0, se f (x, y) ≥ 0,
f − (x, y) =
− f (x, y), se f (x, y) < 0.
Observe que segue-se das definições de partes positiva e negativa de uma função que
| f (x, y)| + f (x, y) | f (x, y)| − f (x, y) ,
f + (x, y) = e f − (x, y) =
2 2
de modo que f + e f − são contínuas. Além disso, tem-se que f + (x, y) ≥ 0 e f − (x, y) ≥ 0. Tem-se
também que
| f (x, y)| + f (x, y) | f (x, y)| − f (x, y)
f + (x, y) − f − (x, y) = −
2 2
| f (x, y)| f (x, y) | f (x, y)| f (x, y)
= + − + = f (x, y)
2 2 2 2
e
| f (x, y)| + f (x, y) | f (x, y)| − f (x, y)
f + (x, y) + f − (x, y) = +
2 2
| f (x, y)| f (x, y) | f (x, y)| f (x, y)
= + + − = | f (x, y)|,
2 2 2 2
660 A Funções representadas por integrais

ou seja, mostrou-se que

f (x, y) = f + (x, y) − f − (x, y) e | f (x, y)| = f + (x, y) + f − (x, y).

Isso mostra que basta demonstrar a proposição para o caso em que f (x, y) ≥ 0. Seja
Z ∞
ϕ (x) = f (x, y) dy,
−∞

onde Z d
ϕ (x) = lim f (x, y) dy,
c,d→∞ −c
quaisquer que sejam c, d > 0. Note que ϕ (x) ≥ 0, pois f (x, y) ≥ 0.
Portanto, para quaisquer c, d > 0, tem-se que
Z ∞ Z d
ϕ (x) = f (x, y) dy ≥ f (x, y) dy,
−∞ −c

pois assume-se que f ≥ 0, de modo que o valor da integral aumenta quando se aumenta o
comprimento do intervalo.
Sejam a, b > 0 quaisquer. Como, por hipótese, f é contínua, então pela proposição 3.1, tem-
se que ϕ também é contínua. Com isso, tem-se que ϕ (x) é integrável em qualquer intervalo
limitado [−a, b]. Assim,
Z b Z b Z d 
ϕ (x) dx ≥ f (x, y) dy dx
−a −a −c
Z bZ d
= f (x, y) dy dx
−a −c

= (pela proposição 1.5)


Z dZ b
= f (x, y) dx dy.
−c −a

Segue-se daí que


Z ∞ Z b Z dZ b
(3.6) ϕ (x) dx ≥ ϕ (x) dx ≥ f (x, y) dx dy,
−∞ −a −c −a

pois ϕ ≥ 0 e o valor da integral aumenta quando se aumenta o comprimento do intervalo.


Em virtude da arbitrariedade de a e b, segue-se de (3.6) que
Z ∞ Z b
ϕ (x) dx = lim f (x, y) dx.
−∞ a,b→∞ −a

Como se está supondo que f (x, y) ≥ 0, então segue-se de (3.6) e da última expressão que
Z ∞ Z dZ ∞
ϕ (x) dx ≥ f (x, y) dx dy.
−∞ −c −∞
A.3 Terceiro caso 661

Daí segue-se que


Z ∞ Z ∞Z ∞
(3.7) ϕ (x) dx ≥ f (x, y) dx dy.
−∞ −∞ −∞

Faça Z ∞Z ∞ Z ∞Z ∞
I1 = f (x, y) dy dx e I2 = f (x, y) dx dy.
−∞ −∞ −∞ −∞
A desigualdade obtida em (3.7) significa dizer que I1 ≥ I2 .
O próximo passo é mostrar que I2 ≤ I1 . Novamente, basta demonstrar para o caso em que
f (x, y) ≥ 0. Seja Z ∞
ψ (y) = f (x, y) dx,
−∞
onde Z b
ψ (y) = lim f (x, y) dx
a,b→∞ −a

quaisquer que forem a, b > 0. Note que ψ (y) ≥ 0, pois f (x, y) ≥ 0.


Portanto, para quaisquer a, b > 0, tem-se que
Z ∞ Z b
ψ (y) = f (x, y) dx ≥ f (x, y) dx,
−∞ −a

pois assume-se que f ≥ 0, de modo que o valor da integral aumenta quando se aumenta o
comprimento do intervalo.
Sejam c, d > 0 quaisquer. Como, por hipótese, f é contínua, então pela proposição 3.1, tem-
se que ψ também é contínua. Com isso, tem-se que ψ (y) é integrável em qualquer intervalo
limitado [−c, d]. Assim,
Z d Z d Z b 
ψ (y) dy ≥ f (x, y) dx dy
−c −c −a
Z dZ b
= f (x, y) dx dy
−c −a

= (pela proposição 1.5)


Z bZ d
= f (x, y) dy dx.
−a −c

Segue-se daí que


Z ∞ Z d Z bZ d
(3.8) ψ (y) dy ≥ ψ (y) dy ≥ f (x, y) dy dx,
−∞ −c −a −c

pois ϕ ≥ 0 e o valor da integral aumenta quando se aumenta o comprimento do intervalo.


Em virtude da arbitrariedade de c e d, segue-se de (3.8) que
Z ∞ Z d
ψ (y) dy = lim f (x, y) dy.
−∞ c,d→∞ −c
662 A Funções representadas por integrais

Como se está supondo que f (x, y) ≥ 0, então segue-se de (3.8) e da última expressão que
Z ∞ Z bZ ∞
ψ (y) dy ≥ f (x, y) dy dx.
−∞ −a −∞

Daí segue-se que


Z ∞ Z ∞Z ∞
(3.9) ψ (y) dy ≥ f (x, y) dy dx.
−∞ −∞ −∞

Como foi feito


Z ∞Z ∞ Z ∞Z ∞
I1 = f (x, y) dy dx e I2 = f (x, y) dx dy,
−∞ −∞ −∞ −∞

então a desigualdade obtida em (3.9) significa dizer que I2 ≥ I1 . Como já foi demonstrado que
I1 ≥ I2 , então conclui-se que I1 = I2 , ou seja, que
Z ∞Z ∞ Z ∞Z ∞
f (x, y) dy dx = f (x, y) dx dy,
−∞ −∞ −∞ −∞

demonstrando o que foi afirmado.

No caso da integral de Lebesgue, o teorema 3.1 é chamado, de fato, de teorema de Fubini e


basta supor que apenas uma das integrais convirja, de tal modo que segue-se daí a convergência
da outra integral.
Adendo B
O teorema de Fourier

O objetivo deste adendo é enunciar o teorema de Fourier. As ideias aqui apresentadas foram
baseadas na referência [38] da bibliografia. Uma demonstração diferente dessa aqui adotada
pode ser encontrada na referência [62] também da bibliografia.

B.1 O espaço L1

Neste texto a integral adotada será a de Riemann. As funções f : [a, b] → R, com domínio
limitado, que são Riemann integrável podem ser limitadas ou ilimitadas. Assim, em relação
a integrabilidade de f , quando f for limitada diz-se que a integral é própria e quando f for
ilimitada diz-se que a integral é imprópria. Quando o domínio de f é ilimitado, seja a função
limitada ou ilimitada, também se diz que a integral é imprópria.
Para funções f : [a, b] → R, com domínio limitado, tem-se o seguinte:

(i) Se f for limitada, então ela é integrável (propriamente) se o supremo das somas inferiores
for igual ao ínfimo das somas superiores.
(ii) Se f for ilimitada, então ela é integrável (impropriamente) se o intervlo [a, b] puder ser
decomposto em um número finito de intervalos I1, . . ., In, com Ii = [ai , bi ], tais que, para todos
δ1 > 0 e δ2 > 0, a função f é limitada e integrável [ai + δ1, bi − δ2] e os limites abaixo existirem
Z bi Z bi −δ2
f (x) dx = lim f (x) dx.
ai δ1 →0 ai +δ1
δ2 →0

Neste caso, a integral (imprópria) de f é definida por


Z b n Z bi
f (x) dx = ∑ f (x) dx.
a i=1 ai

D EFINIÇÃO : Diz-se que f é absolutamente integrável se o valor absoluto | f (x)| for integrável
no sentido (i) ou (ii) acima.

663
664 B O teorema de Fourier

Uma das principais restrições da integral de Riemann (própria ou imprópria) é essa, de não
ser um reticulado vetorial. Os problemas são vários. Escrever-se-á “R-integrável” para dizer que
uma função é Riemann integrável.

S ITUAÇÃO 1: demonstra-se em curso de Análise que, se f for R-integrável e limitada, então


f é absolutamente integrável. A recíproca deste resultado, em geral, é falsa, como mostra o
exemplo a seguir.

Exemplo 1.1: A função de Dirichlet f : [0, 1] → R, dada por


(
1, se x ∈ [0, 1] for racional,
f (x) =
−1, se x ∈ [0, 1] for irracional,

é absolutamente integrável, mas não é R-integrável.

Esta função não é R-integrável, o que pode ser verificado observando-se que a soma inferior
dá −1 e a soma superior dá 1. Por outro lado, f é absolutamente R-integrável, pois | f (x)| = 1
para 0 ≤ x ≤ 1, tendo a integral o valor 1.

S ITUAÇÃO 2: quando f não é limitada, em geral, a integrabilidade de f não implica na


integrabilidade de | f |. O próximo exemplo exibe esta situação.

Exemplo 1.2: Considere a função (definida por várias sentenças) f : (0, 1] → R dada por
1 1
f (x) = (−1)n n, se <x≤ ·
n+1 n
Esta função é R-integrável. De fato, tem-se que
Z ∞ ∞   ∞
n 1 1 1
f (x) dx = ∑ (−1) n − = ∑ (−1)n n
−∞ n=1 n n+1 n=1 n(n + 1)

(−1)n 1 1 1
= ∑ n + 1 = − 2 + 3 − 4 + · · ·,
n=1

que é uma série alternada com termo geral tendendo para zero e que, portanto, é convergente.
Isto mostra que a integral de f existe.
Por outro lado, a função dada não é absolutamente integrável. De fato, tem-se que

| f (x)| = |(−1)n n| = n,

Assim, a integral de | f (x)| é


Z ∞ ∞  
1 1
−∞
| f (x)| dx = ∑n −
n n+1
n=1
B.1 O espaço L1 665


1
= ∑ n · n(n + 1)
n=1

1 1 1 1
= ∑ n + 1 = 2 + 3 + 4 + · · ·,
n=1
que é uma série harmônica e, portanto, divergente. Isto mostra que | f | não é R-integrável.

y
4

1
x

1
−1

−2

−3

−4

Figura 1.1: Gráfico da função f (x).

Figura 1.2: Gráfico da função | f (x)|.


666 B O teorema de Fourier

C ONCLUSÃO : há funções f que são Riemann integráveis, mas tais que | f | não é R-integrável,
bem como há funções f não integráveis a Riemann tais que | f | é R-integrável. Aqui considera-
se integrais próprias e impróprias (isto é, no caso, funções ilimitadas).

Feita estas observações iniciais, introduz-se agora uma classe de funções que permitem
definir a transformada de Fourier.

N OTAÇÃO : Escrever-se-á L1 ([a, b]) para representar a classe de funções f : [a, b] → R tais
que f e | f | são R-integráveis, isto é,

L1 ([a, b]) = { f : [a, b] → R | f e | f | R-integráveis} .

Para funções f : R → R denota-se por L1(R) a seguinte classe de funções

L1 (R) = { f : R → R | f e | f | R-integráveis} .

Observa-se que as funções contínuas e, mais geralmente, as funções seccionalmente con-


tínuas no intervalo [a, b] são limitadas e integráveis no primeiro sentido dado acima.
Note-se, também, que afirmar que f ∈ L1 (R) significa que f e | f | são R-integráveis em cada
intervalo [−a, b] e que os limites
Z b Z b
(1.1) lim f (x) dx e lim | f (x)| dx
a,b→∞ −a a,b→∞ −a

existem.
Note que, se f for seccionalmente contínua em cada intervalo [−a, b] e se o segundo limite
em (1.1) existir, então f ∈ L1 (R).

A seguir serão feitas várias observações sobre certos cuidados que se deve ter sobre as funções
pertencentes ao espaço L1(R).

Observação 1.1: Em cursos de Cálculo aprende-se que, se f , g : [a, b] → R são funções R-


integráveis, então f + g é uma função R-integrável. Porém, se f , g :→ R forem funções abso-
lutamente integráveis no sentido de Riemann, então, em geral, não é verdade que f + g seja
absolutamente integrável no sentido de Riemann.
Para ver isso, considere o seguinte exemplo. Sejam f , g : [0, 1] → R funções definidas por
(
1, se x ∈ [0, 1] for racional,
f (x) = e g(x) = 2.
−1, se x ∈ [0, 1] for irracional.

Ambas as funções f e g são absolutamente integráveis. De fato, viu-se anteriormente que


a função de Dirichlet é tal que | f (x)| = 1, logo é R-integrável em [0, 1]. Por ser constante no
B.1 O espaço L1 667

intervalo [0, 1], segue-se que |g(x)| = 2 também é R-integrável. Porém a soma | f + g| não é
integrável. Veja:
(
3, se x ∈ [0, 1] for racional,
f (x) + g(x) =
1, se x ∈ [0, 1] for irracional,
de modo que seu valor absoluto fica igual, isto é,
(
3, se x ∈ [0, 1] for racional,
| f (x) + g(x)| =
1, se x ∈ [0, 1] for irracional.

A função |( f + g)(x)| = | f (x) + g(x)| é descontínua em todos os pontos do intervalo [0, 1],
portanto ela não é integrável no sentido de Riemann.

Observação 1.2: Existem funções de L1(R) tais que o produto destas função por elas mes-
mas (ou seja, seu quadrado) não pertencem a L1(R).
Seja f : R → R uma função dada por

1
√ ,
 0 < x < 1,
f (x) = x


0, caso contrário.

x
1

Figura 1.3: Gráfico da função f (x).

Mostrar-se-á que f ∈ L1 (R). Tem-se:


668 B O teorema de Fourier

Z ∞ Z 0 Z 1 Z ∞
f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx + f (x) dx
−∞ −∞ 0 1
Z 1 Z 1 Z 1
dx −1/2 1
= √ = x dx = lim x− /2 dx
0 x 0 a→0+ a

√ 1 √ √ 
= 2 lim x = 2 lim 1− a
a→0 + a + a→0
√ √ 
=2 1 − 0 = 2,

o que mostra que f é integrável em R.


Observe-se que a função f é não negativa em todo R, de modo que seu valor absoluto coincide
com a própria f ; portanto tem-se que | f | também é integrável. Isto mostra que f ∈ L1 (R).
Por outro lado, tem-se que
Z ∞ Z ∞
f (x) · f (x) dx = [ f (x)]2 dx
−∞ −∞
Z 0 Z 1 Z ∞
2 2
= [ f (x)] dx + [ f (x)] dx + [ f (x)]2 dx
−∞ 0 1
Z 1  Z 1 Z 1
1 2 dx dx
= √ dx = = lim
0 x 0 x a→0+ a x
 1 

= lim ln x = lim (ln 1 − ln a)
a→0+ a + a→0

= − lim (ln a) = +∞.


a→0+

x
1

−1

−2

−3

−4

Figura 1.4: Gráfico da função ln a para −∞ < a ≤ 1.


B.1 O espaço L1 669

Isto mostra que a integral de f 2 é divergente, isto é, que f 2 não é integrável em R. Portanto,
tem-se que f é uma função de L1(R), mas que o produto dela consigo mesma, f 2 , não pertence
a L1(R).

Observação 1.3: Também é preciso tomar cuidado com o produto de funções R-integráveis,
que poderá não resultar em uma função R-integrável se uma delas não for limitada. Para ver
isto, considere as duas funções f , g : (0, 1] → R dadas abaixo:
1 1
f (x) = (−1)n n, <x≤ ,
n+1 n
1 1
g(x) = (−1)n , <x≤ ·
n+1 n

−1

Figura 1.5: Gráfico da função g(x).

Observe-se que f é uma função não limitada em (0, 1], mas que g é limitada neste mesmo
intervalo (pois seu valor apenas alterna entre −1 e 1). O gráfico da função f (x) está exibido na
figura 1.1, já o gráfico da função g(x) é mostrado na figura 1.5 a seguir.
Mostrou-se anteriormente que a função f é R-integrável. Tem-se também que g é R-integrável
no intervalo (0, 1]. De fato,
Z 1 ∞   ∞
n 1 1 1
g(x) dx = ∑ (−1) − = ∑ (−1)n · ·
0 n=1 n n+1 n=1 n(n + 1)

Agora faça
670 B O teorema de Fourier

1
an = ·
n(n + 1)
Tem-se que
Z 1 ∞

0
g(x) dx = ∑ (−1)n an .
n=1
Note-se que an > 0 para todo n ∈ N. Tem-se também que an+1 < an . De fato,

n(n + 1) = n2 + n < (n2 + n) + (n + 2) = n2 + 3n + 2 = (n + 1)(n + 2),

ou seja, segue-se que


1 1
n(n + 1) < (n + 1)(n + 2) ⇒ an+1 = < = an ,
(n + 1)(n + 2) n(n + 1)
para todo n ∈ N.
Agora usa-se o seguinte teorema para séries infinitas:

“Considere a série alternada ∑ (−1)n an , onde an > 0 e an+1 < an para todo n ∈ N. Se
n=1
lim an = 0, então a série alternada converge.”
n→∞

A demonstração pode ser encontrada em livros de Cálculo, como, por exemplo, o livro [72]
citado na bibliografia.
Usando este teorema, segue-se que g é R-integrável em (0, 1], pois a sua integral pode ser
escrita como uma série que, como visto acima, é convergente.
Agora se faz o produto de f e g. Tem-se:
( f · g)(x) = f (x) · g(x) = [ (−1)n n ] · (−1)n

= (−1)n+n n = (−1)2n n = n.
De modo análogo ao que se fez anteriormente nesta seção, tem-se que a integral de f + g é
dada pela seguinte soma:
Z 1 Z 1
( f · g)(x) dx = [ f (x) · g(x)] dx
0 0
Z 1 ∞  
1 1
= n dx = ∑ n −
0 n=1 n n+1
∞ ∞
1 1
= ∑ n· =∑
n(n + 1) n=1 n + 1
n=1

1 1 1
= + + + · · ·,
2 3 4
que é uma série do tipo harmônica e, portanto, divergente. Isto mostra que o produto f g não é
R-integrável.
B.1 O espaço L1 671

Figura 1.6: Gráfico da função ( f · g)(x) = n para x ∈ (1/n+1, 1/n].

Teorema 1.1: Seja f : [a, b] → R uma função de L1([a, b]). Então, dado ε > 0, existe uma
função contínua ϕ : [a, b] → R tal que
Z b
| f (x) − ϕ (x)| dx < ε e ϕ (a) = 0 = ϕ (b).
a

D EMONSTRAÇÃO : Observe-se, primeiro, que f pode ser limitada ou ilimitada. Assim, a


demonstração será dividida em dois casos.

C ASO 1: Suponha, inicialmente, que f seja limitada e integrável. Isto significa que, dado
ε > 0, existe uma partição do intervalo [a, b], isto é,

a = x0 < x1 < · · · < xk = b,

tal que
Z b k
ε
(1.2) f (x) dx − ∑ mi (xi − xi−1 ) < ,
a i=1 2

onde
mi = inf { f (x) | xi−1 ≤ x ≤ xi } .
Agora denote por χ (x) a função característica que é definida por

(1.3) χ (x) = mi para xi−1 ≤ x < xi .


672 B O teorema de Fourier

Observe que
Z b k
χ (x) dx = ∑ mi (xi − xi−1 ) ,
a i=1
de modo que (1.2) pode ser reescrito como
Z b Z b Z b
ε
(1.4) [ f (x) − χ (x)] dx = f (x) dx − χ (x) dx < ·
a a a 2

Figura 1.7: Gráfico de χ (x).

A figura 1.7 dará uma ideia sobre os procedimentos adotados a seguir na demonstração do
teorema. Suponha que a partição tenha quatro pontos e o gráfico de χ (x) seja como na figura
1.7. Suponha também que, para cada n, a função ϕn é obtida por substituição dos “retângulos”
da figura 1.7 por trapézios, cujos lados inclinados têm inclinação igual a n (veja a figura 1.8).

Figura 1.8: Gráfico de χ (x).


B.1 O espaço L1 673

O próximo passo consiste em escrever as funções ϕn(x). Para isso, considerando os casos das
Z b
figuras 1.7 e 1.8, observe que o valor da integral [χ (x) − ϕ (x)] dx coincide com a soma da
a
área de certos retângulos que aparecem em virtude da diferença entre as duas funções. Veja a
figura 1.9.

Figura 1.9: Integral de a até b de χ (x) − ϕn (x).

Agora analisa-se um dos triângulos, que é retângulo. Veja a figura 1.10.

Figura 1.10: Área de um retângulo.

A mencionada integral será igual a soma de triângulos do tipo acima. Lembrando que a
inclinação é igual a n, então este é o ângulo entre os lados de medidas a e b. Então,
b
cos n = ⇒ b = a · cosn,
a
mi mi
sen n = ⇒ a= ·
a sen n
Assim, a área A do triângulo da figura 1.10 será dada por:

b · mi a · cosn · m1
A= =
2 2
674 B O teorema de Fourier

1 mi
= · · cos n · m1
2 sen n
1 cos n
= · mi · = m2i · cotg n
2 sen n
1 m2i
·= ·
2 tg n
Mas para cada trapézio deve-se contar o mesmo triângulo duas vezes, pois tem um de cada
lado do mesmo. E por fim, deve-se somar a área de todos os triângulos. Mas para o que vem a
seguir, o que interessa é a integral de |χ (x) − ϕn (x)|: na prática os triângulos abaixo do eixo x,
ao tomar o módulo, passam para a parte de cima, deixando a integral não negativa.
Usando esta ideia para uma função χ (x) qualquer, como a definida em (1.4), tem-se
Z b k
m2i
(1.5) | χ (x) − ϕn (x)| dx = ∑ ·
a i=1 tg n

Por hipótese, f é limitada: seja M > 0 tal que | f (x)| ≤ M, para todo x ∈ [a, b]. Além disso,
tem-se que mi = inf { f (x) | xi−1 ≤ x ≤ xi }. Logo, mi ≤ M para cada i = 1, 2, . . ., k. Segue-se
daí que
k
m2i m21 m22 m2k
∑ = + + · · · +
i=1 tg n tg n tgn tg n

M2 M2 M2
≤ + + ···+
tg n tgn tg n
| {z }
k vezes

k · M2
· =
tg n
Logo, da observação acima e de (1.5), segue-se que
Z b
k · M2
(1.6) |χ (x) − ϕn (x)| dx ≤ ·
a tg n
Portanto, como k está fixado, existe n, tal que
Z b
ε
(1.7) |χ (x) − ϕn (x)| dx < ·
a 2
De (1.4) e (1.7) obtém-se que, dado ε > 0, existe uma função contínua ϕn : [a, b] → R, com
ϕn (a) = 0 = ϕn (b) tal que
Z b Z b
| f (x) − ϕn (x)| dx = |[ f (x) − χ (x)] + [χ (x) − ϕn (x)]| dx
a a
Z b Z b
≤ | f (x) − χ (x)| dx + |χ (x) − ϕn (x)| dx
a a
B.1 O espaço L1 675

ε ε
< +
2 2
= ε.
Essa função ϕn é a função ϕ anunciada no teorema.

C ASO 2: Suponha, agora, que f não seja limitada, mas seja integrável e absolutamente in-
tegrável no sentido das integrais impróprias. Para facilitar, suponha que f se torne ilimitada
apenas nas vizinhanças de a e b. Portanto, dado ε > 0, existe δ > 0 tal que
Z b Z b−δ
ε
(1.8) | f (x)| dx − | f (x)| dx < ·
a a+δ
2

Como f é limitada e integrável em [a + δ , b − δ ], pela primeira parte já demonstrada, existe


uma função contínua ϕ : [a + δ , b − δ ] → R, com ϕ (a + δ ) = 0 = ϕ (b − δ ) tal que
Z b−δ
ε
(1.9) | f (x) − ϕ (x)| dx < ·
a+δ 2
Considere a função ϕ : [a, b] → R definida por
(
ϕ (x), se a + δ ≤ x ≤ b − δ ,
ϕ (x) =
0, se a ≤ x ≤ a + δ e b − δ ≤ x ≤ b.

Tem-se:
Z b Z a+δ Z b−δ
| f (x) − ϕ (x)| dx = | f (x) − ϕ (x)| dx + | f (x) − ϕ (x)| dx +
a a a+δ
Z b
+ | f (x) − ϕ (x)| dx
b−δ
Z a+δ Z b−δ Z b
= | f (x)| dx + | f (x) − ϕ (x)| dx + | f (x)| dx.
a a+δ b−δ

Observe que [a, b] = [a, a + δ ] ∪ (a + δ , b − δ ) ∪ [b − δ , b]. Veja a figura 1.11.

Figura 1.11:

Segue-se daí que


Z b Z a+δ Z b−δ Z b
| f (x)| dx = | f (x)| dx + | f (x)| dx + | f (x)| dx.
a a a+δ b−δ

Portanto,
676 B O teorema de Fourier

Z a+δ Z b Z b Z b−δ
| f (x)| dx + | f (x)| dx = | f (x)| dx − | f (x)| dx.
a b−δ a a+δ

Usando a observação acima, bem como as desigualdades (1.8) e (1.9), obtém-se


Z b Z a+δ Z b−δ Z b
| f (x) − ϕ (x)| dx = | f (x)| dx + | f (x) − ϕ (x)| dx + | f (x)| dx
a a a+δ b−δ
Z a+δ Z b  Z b−δ
= | f (x)| dx + | f (x)| dx + | f (x) − ϕ (x)| dx
a b−δ a+δ
Z b Z b−δ Z b−δ

= | f (x)| dx − | f (x)| dx + | f (x) − ϕ (x)| dx
a a+δ a+δ
ε ε
< + = ε,
2 2
o que completa a demonstração do teorema.

Observação 1.4: O teorema 1.1 afirma que, dada f : [a, b] → R pertencente a L1([a, b]),
existe uma sequência de funções contínuas ϕn : [a, b] → R, com ϕn(a) = 0 = ϕn (b), tal que
Z b
lim | f (x) − ϕn (x)| dx = 0.
n→∞ a

Observação 1.5: Suponha que f : R → R seja uma função periódica de período T = 2L e tal
que f ∈ L1 ([−L, L]). Então, existe uma sequência de funções contínuas ϕn : R → R, periódicas
de período T = 2L tal que
Z L
lim | f (x) − ϕn (x)| dx = 0.
n→∞ −L

De fato, pode-se tomar ϕn (−L) = 0 = ϕn (L), para todo n ∈ N.

Observação 1.6: Dada uma sequência de funções contínuas ϕn : [a, b] → R, diz-se que ela
converge no sentido do L1 se
Z b
lim |ϕn (x) − ϕm (x)| dx = 0.
n→∞ a

Pode, nesse caso, existir uma função f : [a, b] → R integrável e absolutamente integrável, no
sentido aqui estudado, tal que
B.2 O teorema de Riemann-Lebesgue 677

Z b
(1.10) lim | f (x) − ϕn (x)| dx = 0.
n→∞ a

Neste caso, diz-se que f é o limite de ϕn no sentido do L1.


Em geral, tal f não existe. Se, no entanto, usar-se o conceito mais geral de integral de
Lebesgue, então existe uma função f integrável a Lebesgue tal que (1.10) seja verdade, en-
tendendo a integral como integral de Lebesgue. E aí ter-se-ia o fato seguinte: as funções inte-
gráveis a Lebesgue em [a, b] são os limites no sentido do L1 de sequências de funções contínuas
em [a, b].
O espaço das funções Lebesgue integráveis em [a, b] é designado por L1([a, b]). Trata-se de
um espaço vetorial. A expressão
Z b
k f kL1 = | f (x) | dx
a

define uma norma no espaço L1 ([a, b]).


Portanto, L1 ([a, b]) é um espaço vetorial normado e as observações feitas até agora podem
ser sintetizadas dizendo-se que as funções contínuas formam um conjunto denso nele.

B.2 O teorema de Riemann-Lebesgue

O teorema de Riemann-Lebesgue é um resultado essencial para demonstração de resulta-


dos envolvendo convergência de séries e transformadas de Fourier. Ele vale em situações bem
gerais. Neste texto, por se trabalhar com a integral de Riemann, o caso mais geral possível se
reduz ao L1([a, b]). Por outro lado, optou-se neste texto pela versão do teorema de Fourier
que toma por hipótese as funções seccionalmente diferenciáveis. Neste caso, o teorema de
Riemann-Lebesgue possui uma demonstração mais simples e que é suficiente para ser usado
na demonstração do teorema de Fourier.
Nesta seção serão apresentadas duas versões do teorema de Riemann-Lebesgue: com a
hipótese de funções seccionalmente contínuas (resultado suficiente para demonstrar o teorema
de Fourier) e um caso mais geral, onde se toma funções pertencentes a L1([a, b]). Inicia-se com
a versão para funções seccionalmente contínuas, deixando a versão mais geral para o final da
seção.

Proposição 2.1 (Riemann-Lebesgue): Seja f : [a, b] → R uma função seccionalmente con-


tínua. Então,
Z b
(2.1) lim f (x) · sen (tx) dx = 0,
t→∞ a
678 B O teorema de Fourier

e
Z b
(2.2) lim f (x) · cos(tx) dx = 0.
t→∞ a

D EMONSTRAÇÃO : Por hipótese, a função é seccionalmente contínua. Logo, o intervalo [a, b]


pode ser dividido em um número finito de subintervalos tais que f é contínua em cada um deles,
exceto possível nas extremidades. Como o limite da integral no intervalo [a, b] é a soma finita
dos limites da integral em cada subintervalo, basta mostrar que o limite é zero em cada um destes
subintervalos. Assim, sem perda de generalidade, é possível supor que f é contínua em [a, b],
mas redefinindo-se esta função nos extremos do intervalo se for necessário (isto é, redefinir
f (a) = f (a + 0) e f (b) = f (b − 0)), pois o valor da função nas extremidades do intervalo não
afeta o valor da integral.
Considere uma partição P para o intervalo [a, b] tal que todos os subintervalos tenham com-
primentos iguais, isto é,

a = x0 < x1 < x2 < · · · < xn−1 < xn = b.

Escreva
Z b n−1 Z xi+1

a
f (x) · sen (tx) dx = ∑ f (x) · sen (tx) dx
i=0 xi

n−1 Z xi+1 
= ∑ f (xi ) + [ f (x) − f (xi )] sen (tx) dx
i=0 xi

n−1 Z xi+1
= ∑ f (xi ) · sen (tx) dx +
i=0 xi

n−1 Z xi+1
+ ∑ [ f (x) − f (xi )] sen (tx) dx
i=0 xi

n−1  Z xi+1 
= ∑ f (xi ) sen (tx) dx +
i=0 xi

n−1 Z xi+1
(2.3) + ∑ [ f (x) − f (xi )] sen (tx) dx.
i=0 xi

Como f é contínua no intervalo fechado e limitado [a, b], tem-se que o seu máximo é atingido.
Seja M = max{ f (x) | x ∈ [a, b]}. Então, usando este fato e (2.3), obtém-se a seguinte estimativa:
Z b n−1  Z xi+1 


a f (x) · sen (tx) dx = ∑ f (xi ) x sen (tx) dx +
i=0 i

n−1 Z xi+1 

+ ∑ [ f (x) − f (xi )] sen (tx) dx
i=0 xi
B.2 O teorema de Riemann-Lebesgue 679

 
n−1 Z xi+1

≤ ∑ f (xi ) sen (tx) dx +
i=0 xi

n−1 Z xi+1

+ ∑ [ f (x) − f (xi )] sen (tx) dx
i=0 xi

n−1 Z xi+1

≤ ∑ f (xi ) sen (tx) dx +
i=0 x i


n−1 Z xi+1


+ ∑ [ f (x) − f (xi )] sen (tx) dx
i=0 xi

n−1 
Z x 
i+1
= ∑
| f (xi )| sen (tx) dx +
i=0 x i


n−1 Z xi+1


+ ∑ [ f (x) − f (xi )] sen (tx) dx
x
i=0 i

n−1
Z x
i+1
≤ ∑ | f (xi )| sen (tx) dx +
i=0 x i

n−1 Z xi+1

+ ∑ [ f (x) − f (xi )] sen (tx) dx
i=0 xi

n−1
Z
xi+1
= ∑ | f (xi )| sen (tx) dx +
i=0 x i

n−1 Z xi+1
+ ∑ f (x) − f (xi ) · sen (tx) dx
i=0 xi

n−1
Z x n−1 Z x
i+1 i+1
(2.4)
≤ ∑ | f (xi )| sen (tx) dx + ∑ f (x) − f (xi ) dx,
i=0 x i x i=0 i

onde usou-se o fato que | sen (tx)| ≤ 1.


Agora realiza-se um integração por partes na primeira integral do último membro de (2.4)
para obter outra estimativa. Tem-se:
Z x
i+1 1 Z xi+1 d
sen (tx) dx = − [ cos(tx)]dx
x t xi dx
i

cos(tx) xi+1

= −
t xi
 
cos(t xi+1 ) cos(t xi )
= − −

t t
680 B O teorema de Fourier

1 2
= cos(t xi+1 ) − cos(t xi ) ≤ ·
t t
Portanto, usando a última desigualdade encontrada, obtém-se a seguinte estimativa para a
primeira soma no último membro de (2.4):
n−1
Z x
i+1 2 n−1
∑ | f (xi )| sen (tx) dx ≤ ∑ | f (xi )|
x t
i=0 i i=0

2
≤ ( M + M + ···+ M )
t | {z }
n vezes

2nM
(2.5) = ·
t
Da mesma forma, busca-se uma estimativa para a segunda soma em (2.4). Para isso, sejam

mi = min{ f (x) | x ∈ [xi , xi+1]} e Mi = max{ f (x) | x ∈ [xi , xi+1 ]}.

Assim, observando que

| f (x) − f (xi )| ≤ Mi − mi , para xi−1 ≤ x ≤ xi ,

obtém-se
n−1 Z xi+1 n−1 Z xi+1 n−1
xi+1

∑ | f (x) − f (xi )| dx ≤ ∑ (Mi − mi) dx = ∑ (Mi − mi ) x
i=0 xi i=0 xi i=0 xi

n−1
= ∑ (Mi − mi) (xi+1 − xi)
i=0

n−1 n−1
(2.6) = ∑ Mi (xi+1 − xi) + ∑ mi (xi+1 − xi ).
i=0 i=0

A desigualdade (2.6) afirma que o primeiro membro fica menor ou igual do que a diferença
entre a soma superior e a soma inferior (de Riemann) na partição [ a = x0 , x1, x2, . . ., xn−1, xn = b].
Assim, como f é integrável (pois assumiu-se que f é contínua em [a, b]), tanto a soma supe-
rior quanto a soma inferior convergem para o valor da integral de f em [a, b] quando se refina
a partição do intervalo (isto é, quando se toma partições do intervalo [a, b] com subintervalos
de comprimento cada vez menor, que é conseguido ao aumentar no número n de pontos da
partição).
Deste modo, dado ε > 0 arbitrariamente, pode-se sempre encontrar n suficientemente grande
tal que
n−1 Z xi+1
ε
(2.7) ∑ | f (x) − f (xi )| dx ≤ ·
i=0 xi 2

Além disso, com esse n fixado, tome em (2.5) um t0 tal que


B.2 O teorema de Riemann-Lebesgue 681

2nM ε
(2.8) < ·
t0 2
Usando (2.7) e (2.8) em (2.4), obtém-se

Z n−1 Z n−1 Z
b xi+1 xi+1
f (x) · sen (tx) dx ≤ ∑ | f (xi )| sen (tx) dx + ∑ | f (x) − f (xi )| dx
a x x
i=0 i i=0 i

ε ε
< + = ε,
2 2
completando a demonstração.

Para o caso mais geral, onde assume-se uma função f R-integrável e absolutamente R-
integrável, tem-se o seguinte resultado:

Teorema 2.1 (Riemann-Lebesgue): Seja f : [a, b] → R uma função pertencente ao espaço


L1([a, b]).
Então,
Z b
(2.9) lim f (x) · sen (tx) dx = 0,
t→∞ a
Z b
(2.10) lim f (x) · cos(tx) dx = 0.
t→∞ a

D EMONSTRAÇÃO : A demonstração será dividida em dois casos: para f limitada e f ∈


L1([a, b])qualquer.

C ASO 1: Suponha, inicialmente, que f seja limitada, isto é, que exista M > 0 tal que | f (x)| ≤
M para todo x ∈ [a, b]. Recorde-se o significado de uma função limitada f ser integrável: dado
ε > 0, existe uma partição P do intervalo [a, b],

P : a = x0 < x1 < · · · < xn = b,

tal que
S( f , P) − s( f , P) < ε ,
onde
n
S( f , P) = ∑ Mi (xi − xi−1 ) , Mi = sup { f (x) | xi−1 ≤ x ≤ xi } ,
i=1
e
n
s( f , P) = ∑ mi (xi − xi−1 ) , mi = inf { f (x) | xi−1 ≤ x ≤ xi } ,
i=1
são as somas superior e inferior (no sentido de Darboux) associadas à partição P.
Demonstrar-se-á a validade de (2.9). Considere a partição do intervalo [a, b] determinada
pelos pontos
682 B O teorema de Fourier

i ,
xi = a + para i = 0, 1, . . ., n.
n(b − a)
Então,
Z b n Z xi n Z xi
(2.11) f (x) · sen (tx) dx = ∑ f (xi ) sen (tx) dx + ∑ [ f (x) − f (xi )] sen (tx) dx.
a i=1 xi−1 i=1 xi−1

Agora observe que


Z x
i 1 Z xi d cos(tx) xi

x sen (tx) dx = − t x dx cos(tx) dx = − t
i−1 i−1 xi−1

cos(t xi ) cos(t xi−1 )
= − +

t t

cos(t xi ) cos(t xi−1 )
≤ − +



t t
|cos(t xi )| | |cos(t xi−1 )|
= +
|t| |t|
1 1 2
(2.12) ≤ + = ·
t t t
Observe também que

(2.13) | f (x) − f (xi )| ≤ Mi − mi , para xi−1 ≤ x ≤ xi .

Usando as estimativas (2.12) e (2.13) em (2.11), obtém-se

Z b n Z xi n Z xi




a f (x) · sen (tx) dx = ∑ f (xi ) x sen (tx) dx + ∑ x [ f (x) − f (xi )] sen (tx) dx
i=1 i−1 i=1 i−1

n Z xi n Z xi

≤ ∑ f (xi ) sen (tx) dx + ∑ [ f (x) − f (xi )] sen (tx) dx
i=1 xi−1 i=1 xi−1

n Z xi n Z
xi
≤ ∑ f (xi ) sen (tx) dx + ∑ [ f (x) − f (xi )] sen (tx) dx
i=1 xi−1 i=1 xi−1

n
Z x n Zx
i i

≤ ∑ | f (xi )| sen (tx) dx + ∑ |[ f (x) − f (xi )] sen (tx)| dx
i=1 x i−1 x i=1 i−1

n
Z x n Zx
i i

= ∑ | f (xi )| sen (tx) dx + ∑ | f (x) − f (xi )| | sen (tx)| dx
i=1 x i−1 x i=1 i−1

n
Z n Z
xi xi
= ∑ | f (xi )| sen (tx) dx + ∑ | f (x) − f (xi )| dx
i=1 xi−1 x i=1 i−1
B.2 O teorema de Riemann-Lebesgue 683

Z xi
2 n n
≤ ∑ [| f (x1 )| + | f (x2)| + · · · + | f (xn )|] + ∑ (Mi − mi ) dx
t i=1 i=1 xi−1

n Z xi
2
≤ ( M + M + · · · + M ) + ∑ (Mi − mi ) dx
t | {z }
i=1 xi−1
n vezes

n
2nM
(2.14) = + ∑ (Mi − mi ) (xi − xi−1 ).
t i=1

Agora observe-se que o somatório em (2.14) é a diferença S( f , P)−s( f , P). Logo, dado ε > 0,
tome n tal que essa diferença seja menor do que ε/2. Em seguida, com este n fixado, tome t0 tal
que
2nM ε
< ·
t0 2
Portanto, dado ε > 0, tem-se
Z b n
2nM
f (x) · sen (tx) dx ≤ + ∑ (Mi − mi)(xi − xi−1 )
a t i=1

2nM
= + [S( f , π ) − s( f , π )]
t
ε ε
= + = ε, ∀ t ≥ t0 .
2 2
Isto completa a demonstração de (2.9). A demonstração de (2.10) é análoga e será deixada
para o leitor.

C ASO 2: Suponha agora que f seja uma função qualquer de L1([a, b]). Dado ε > 0, tome
uma função contínua ϕ : [a, b] → R tal que
Z b
ε
(2.15) | f (x) − ϕ (x)| dx < ,
a 2
que é possível em virtude do teorema 1.1.
Como toda função contínua em um intervalo fechado e limitado é limitada e integrável, então
pode-se aplicar o resultado obtido no CASO 1 da demonstração e concluir que existe t0 tal que,
para t > t0, se tem
Z b
ε
(2.16) ϕ (x) · sen (tx) dx < ·
a 2

Agora observe que é possível escrever


Z b Z b
f (x) · sen (tx) dx = {ϕ (x) + [ f (x) − ϕ (x)]} sen (tx) dx
a a
Z b Z b
= ϕ (x) · sen (tx) dx + [ f (x) − ϕ (x)] sen (tx) dx,
a a
684 B O teorema de Fourier

de modo que se obtém


Z Z Z b
b b
f (x) · sen (tx) dx = ϕ (x) · sen (tx) dx + [ f (x) − ϕ (x)] sen (tx) dx
a
a a

Z Z
b b
≤ ϕ (x) · sen (tx) dx + [ f (x) − ϕ (x)] sen (tx) dx
a a
Z Z
b b
≤ ϕ (x) · sen (tx) dx + |[ f (x) − ϕ (x)] · sen (tx)| dx
a a
Z b Z b

= ϕ (x) · sen (tx) dx + | f (x) − ϕ (x)| | sen (tx)| dx
a a
Z b Z b

= ϕ (x) · sen (tx) dx + | f (x) − ϕ (x)| dx
a a
ε ε
= + = ε,
2 2
onde usou-se as estimativas (2.15) e (2.16) nos último passo acima.
Portanto, dado ε > 0, existe t0 tal que, para t ≥ t0 , se tem
Z b

f (x) · sen (tx) dx < ε,
a

o que completa a demonstração do teorema de Riemann-Lebesgue.

B.3 Convergência pontual da série de Fourier

O objetivo desta seção é demonstrar o teorema de Fourier, isto é, a convergência pontual da


série de Fourier. Para isso, será necessário fazer estimativas para
f (x + 0) + f (x − 0) ,
En (x) = Sn (x) −
2
onde
n     
a0 kπ x kπ x
Sn (x) = + ∑ ak · cos + bk · sen
2 k=1 L L
representa a sequência das somas parciais da série de Fourier para uma função f .
A etapa seguinte consiste em representar a soma parcial Sn (x) de um modo mais conveniente
com o propósito de obter majorações para En (x). O primeiro lema apresenta uma nova represen-
tação para Sn (x) e o lema seguinte trata de certas propriedades decorrentes de tal representação.
B.3 Convergência pontual da série de Fourier 685

Lema 3.1: Seja f : R → R uma função seccionalmente contínua e periódica de período T =


2L. Considere a soma parcial
n     
a0 kπ x kπ x ,
(3.1) Sn (x) = + ∑ ak · cos + bk · sen
2 k=1 L L

onde a0 , ak e bk são os coeficientes de Fourier para a função f . Então,


Z L
( "  #)
n
1 1 kπ (x − y)
(3.2) Sn (x) = f (y) + ∑ cos dy.
−L L 2 k=1 L

D EMONSTRAÇÃO : Inicialmente usa-se as fórmulas para os coeficientes de Fourier para


serem substituídas em (3.1). Assim, para a0 , tem-se
Z L
a0 1
= f (y) dy.
2 2L −L

Para a soma envolvendo senos e cossenos no somatório no segundo membro de (3.1), usa-se
as fórmulas para os coeficientes de Fourier
Z   Z  
1 L kπ y 1 L kπ y
ak = f (y) cos dy e bk = f (y) sen dy,
L −L L L −L L
bem como a identidade trigonométrica
kπ x kπ y ,
cos(a − b) = cos a · cos b + sen a · sen b, com a = e b=
L L
para obter
     Z L     
kπ x kπ x 1 kπ y kπ x
ak · cos + bk · sen = f (y) cos dy cos +
L L L −L L L
 ZL     
1 kπ y kπ x
+ f (y) sen dy sen
L −L L L
Z L     
1 kπ x kπ y
= f (y) cos · cos +
L −L L L
   
kπ x kπ y
+ sen · sen dy
L L
Z  
1 L kπ x kπ y
= f (y) cos − dy
L −L L L
Z  
1 L kπ (x − y)
= f (y) cos dy.
L −L L
Portanto,
n     
a0 kπ x kπ x
Sn(x) = + ∑ an · cos + bn · sen
2 k=1 L L
686 B O teorema de Fourier

Z L Z L   
1 1 n kπ (x − y)
= f (y) dy + ∑ f (y) cos du
2L −L L k=1 −L L
Z L
( "  #)
n
1 1 kπ (x − y)
= f (y) + ∑ cos dy,
−L L 2 k=1 L
que é (3.2), o resultado desejado.

Observação 3.1: O lema 3.1 permitiu uma nova representação para Sn(x), que é dada através
da expressão (3.2), isto é,
Z L
( "  #)
n
1 1 kπ (x − y)
Sn (x) = f (y) + ∑ cos dy.
−L L 2 k=1 L

A expressão abaixo, que é uma das componentes do integrando acima,


"  #
n
1 1 kπ x
Dn (x) = + ∑ cos
L 2 k=1 L

é conhecida como o núcleo de Dirichlet.


A proposição 3.1 apresentará várias propriedades satisfeitas pelo núcleo de Dirichlet e que
são importantes para o desenvolvimento que seguirá.

O próximo lema é, na verdade, uma identidade trigonométrica e que será usada durante a
demonstração da próxima proposição e que trata sobre as propriedades do núcleo de Dirichlet.

Lema 3.2: A seguinte identidade trigonométrica é verdadeira:


h i
n   sen (n + 1/2) π x
1 kπ x
(3.3) + ∑ cos =  π x L ,
2 k=1 L 2 sen
2L
D EMONSTRAÇÃO : Para demonstrar que
h πx i
 πx     nπ x  sen (n + 1/2)
1 2π x
+ cos + cos + · · · + cos =  π x L ,
2 L L L 2 sen
2L
usar-se-á da trigonometria as seguintes duas identidades:
(
sen (a + b) = sen a · cosb + sen b · cos a,
sen (a − b) = sen a · cosb − sen b · cos a.
B.3 Convergência pontual da série de Fourier 687

Multiplicando a segunda equação por −1 e somando com a primeira, obtém-se


sen (a + b) − sen (a − b)
(3.4) sen b · cosa = ·
2
Fazendo
nπ x πx ,
a= e b=
L 2L
conclui-se que
πx πx
a + b = (n + 1/2) e a − b = (n − 1/2) ·
L L
Substituindo a + b e a − b acima em (3.4), encontra-se
 πx   nπ x  sen (n + 1/2) π x  − sen (n − 1/2) π x 
L L
(3.5) sen · cos = ·
2L L 2
O próximo passo consiste em somar os termos acima de 1 até n e usar (3.5). Tem-se:
 πx  n    πx   πx     nπ x 
kπ x 2π x
sen ∑ cos L = sen 2L cos L + cos L + · · · + cos L
2L k=1
 πx   πx 
= sen · cos +
2L L
 πx     πx   nπ x 
2π x
+ sen · cos + · · · + sen · cos
2L L 2L L
   
sen (1 + 1/2) πLx − sen (1 − 1/2) πLx
= +
2
   
sen (2 + 1/2) πLx − sen (2 − 1/2) πLx
+ +···
2
   
sen (n + 1/2) πLx − sen (n − 1/2) πLx
···+
2
   
sen 32Lπx
− sen π2Lx sen 52L πx
− sen 32L πx
= + +···
2 2
   
sen (n + 1/2) πLx − sen (n − 1/2) πLx
···+
2
1  π x  sen 3π x  − sen 3π x 
2L 2L
= − · sen + +
2 2L 2
 
sen 52L πx
− sen 52L πx
+ +···
2
   
sen ((n − 1) − 1/2) πLx − sen ((n − 1) − 1/2) πLx
···+ +
2
1 h πx i
+ · sen (n + 1/2)
2 L
688 B O teorema de Fourier

1 h πx i 1 πx 
= · sen (n + 1/2) − · sen
2 L 2 2L
 π x
 π x

sen (n + 1/2) L − sen 2L
(3.6) = ·
2
Assim, a expressão (3.6) pode ser escrita como
πx  n     
kπ x sen (n + 1/2) πLx − sen πx
sen ∑ cos L = 2L ,
2L k=1 2

ou ainda,  
 πx  n
kπ x h πx i  πx 
2 sen ∑ cos = sen (n + 1/2) − sen ·
2L k=1 L L 2L
Agora divide-se ambos os membros acima por 2 sen (π x/2L) para obter
   
n
kπ x sen (n + 1/2) πLx 1
∑ cos L = 2 sen π x  − 2 ,
k=1 2L

que após somar −1/2 em ambos os membros resulta em


   
1 n
kπ x sen (n + 1/2) πLx
+ ∑ cos =  ,
2 k=1 L 2 sen π2Lx

que é a expressão afirmada em (3.3).

Proposição 3.1: Considere o núcleo de Dirichlet Dn : R → R definido por


"  #
n
1 1 kπ x
Dn (x) = + ∑ cos ·
L 2 k=1 L

Então Dn satisfaz, para cada n ∈ N, as seguintes propriedades:


(a) Dn(x) é uma função par.
(b) O núcleo de Dirichlet satisfaz
Z L
Dn (x) dx = 1.
−L

(c) Dn(x) é uma função contínua.


(d) Dn (x) é uma função periódica de período 2L.
(e) Para x = 0, Dn satisfaz
n + 1/2
Dn (0) = ·
L
(f) Dn (x) pode ser escrito na forma compacta
B.3 Convergência pontual da série de Fourier 689

h πx i
1 sen (n + 1/2)
Dn (x) = ·  πx  L ·
2L sen
2L
D EMONSTRAÇÃO : Para a parte (a), tem-se que
"  #
n
1 1 kπ (−x)
Dn(−x) = + ∑ cos
L 2 k=1 L
"  #
n
1 1 kπ x
= + ∑ cos −
L 2 k=1 L
"  #
n
1 1 kπ x
= + ∑ cos = Dn (x),
L 2 k=1 L

onde usou-se a paridade das funções cossenos.


(b) Tem-se:  
Z L Z L Z L n
1 kπ x
−L
Dn (x) dx =
2L −L
dx + ∑ cos L dx
−L k=1
L n Z L  
1 k π x
= ·x + ∑ cos dx
2L −L k=1 −L L
1
= [L − (−L)] = 1,
2L
onde usou-se o fato que  
Z L
kπ x
cos dx = 0,
−L L
para todo k ∈ N e que foi demonstrado no lema 3.1 do capítulo 2.
(c) A demonstração é imediata, visto que as funções Dn podem ser escritas como
      nπ x  
1 1 πx 2π x
Dn (x) = + cos + cos + · · · + cos ·
2L L L L L
Como cada uma das funções cos (kπ x/L), com k = 1, 2, . . ., n é contínua, como o produto entre
uma constante e uma função contínua é contínua e como a soma (finita) de funções contínuas é
contínua, resulta que Dn (x) é uma função contínua.
(d) Com efeito, usando a identidade trigonométrica

cos(a + b) = cos a · cosb − sen a · sen b,

com
kπ x
a= e b = 2kπ
L
nos passos a seguir, obtém-se
690 B O teorema de Fourier

"  #
n
1 1 kπ (x + 2L)
Dn (x + 2L) = + ∑ cos
L 2 k=1 L
"  #
n
1 1 kπ x
= + ∑ cos + 2kπ
L 2 k=1 L
( )
n     
1 1 kπ kπ x
= + ∑ cos · cos (2kπ ) − sen · sen (2kπ )
L 2 k=1 L L
(  )
n    
1 1 kπ kπ x
= + ∑ cos · 1 − sen ·0
L 2 k=1 L L
"  #
n
1 1 kπ
= + ∑ cos
L 2 k=1 L

= Dn (x),
mostrando que Dn é periódica de período 2L.
(e) Fazendo x = 0 na expressão que define Dn(x), encontra-se
" #
n
1 1
Dn (0) = + ∑ cos 0
L 2 k=1

1 1
= + ( 1 + 1 + · · ·+ 1 )
2L L | {z }
n vezes

1 n (n + 1/2) ,
= + =
2L L L
como afirmado.
(f) Por definição, tem-se
"  #
n
1 1 kπ x
Dn (x) = + ∑ cos ·
L 2 k=1 L

Substituindo a expressão (3.3),


h πx i
n   sen (n + 1/2)
1 kπ x
+ ∑ cos =  π x L ,
2 k=1 L 2 sen
2L
obtida no lema 3.2, na expressão original para Dn (x), encontra-se
"  #
n
1 1 kπ x
Dn (x) = + ∑ cos
L 2 k=1 L
B.3 Convergência pontual da série de Fourier 691

 h πx i 
1  sen (n + 1/2) 
=  π x L
L  2 sen 
2L
h πx i
1 sen (n + 1/2)
= · πx  L ,
2L sen
2L
como desejado.

Lema 3.3: Seja f : [−L, L] → R uma função seccionalmente contínua e periódica de período
T = 2L. Considere a soma parcial
n     
a0 kπ x kπ x
Sn(x) = + ∑ ak · cos + bk · sen ·
2 k=1 L L

Então, Sn (x) pode ser reescrita na forma


Z L
(3.7) Sn (x) = Dn (t) · f (x − t) dt.
−L

D EMONSTRAÇÃO : O lema 3.1 mostrou que Sn (x) pode ser reescrita em uma nova expressão,
que é dada por ( "
Z L n  #)
1 1 kπ (x − y)
Sn (x) = f (y) + ∑ cos dy,
−L L 2 k=1 L
onde "  #
n
1 1 kπ (x − y)
Dn (x − y) = + ∑ cos
L 2 k=1 L
é o núcleo de Dirichlet.
Portanto, Sn(x) pode ser reescrita na forma
Z L
Sn (x) = f (y) · Dn (x − y) dy.
−L

Fazendo a mudança de variável independente y = x − t na expressão acima, então dy = −dt


e novos limites de integração serão t1 = x − (−L) = x + L e t2 = x − L. Assim, obtém-se
Z L
Sn(x) = f (y) · Dn (x − y) dy
−L
Z x−L
=− f (x − t) · Dn (t) dt
x+L
Z x+L
(3.8) = f (x − t) · Dn (t) dt,
x−L
692 B O teorema de Fourier

onde inverteu-se a ordem dos limites de integração.


Por hipótese, f é periódica de período T = 2L. Além disso, pelo item (d) da proposição 3.1,
o núcleo de Dirichlet é uma função periódica de período T = 2L. Pelo item (b) da proposição
2.1 do capítulo 2, o produto entre duas funções periódicas de período T também tem período T .
Logo, o integrando em (3.8), que é f (x − t) · Dn (x) é uma função periódica de período T = 2L.
Tem-se também, pelo corolário 2.2 do capítulo 2, tem-se que
Z a+L Z L
g(t) dt = g(t) dt,
a−L −L

para toda função g : R → R periódica de período T = 2L e para qualquer a ∈ R.


Assim, é possível reescrever a integral no segundo membro de (3.8) na forma
Z x+L Z L
f (x − t) · Dn (t) dt = f (x − t) · Dn (t) dt,
x−L −L

de modo que se tem Z L


Sn (x) = Dn (t) · f (x − t) dt,
−L
que é (3.7).

Lema 3.4: Seja f : R → R uma função periódica de período T = 2L e seccionalmente con-


tínua. Então a expressão
f (x + 0) + f (x − 0)
En (x) = Sn(x) −
2
pode ser reescrita na forma
Z L 
(3.9) En (x) = Dn (t) · [ f (x + t) − f (x + 0)] + [ f (x − t) − f (x − 0)] dt.
0

D EMONSTRAÇÃO : Desenvolvendo a expressão (3.7) obtida no lema 3.3, obtém-se


Z L
Sn (x) = Dn (t) · f (x − t) dt
−L
Z 0 Z L
= Dn (t) · f (x − t) dt + Dn (t) · f (x − t) dt
−L 0
Z 0 Z L
= Dn (−t) · f (x − t) dt + Dn(t) · f (x − t) dt
−L 0
Z 0 Z L
=− Dn (u) · f (x + u) du + Dn(t) · f (x − t) dt
L 0
Z L Z L
= Dn (u) · f (x + u) du + Dn(t) · f (x − t) dt
0 0
B.3 Convergência pontual da série de Fourier 693

Z L
(3.10) = Dn (t) · [ f (x + t) + f (x − t)] dt,
0

onde usou-se a paridade das funções Dn(x) vista item (a) da proposição 3.1, se fez a mudança
de variáveis u = −t e, por fim, inverteu-se a ordem dos limites de integração.
Pelo item (b) da proposição 3.1, tem-se que
Z L
Dn (t) dt = 1.
−L

Pelo item (a) da proposição 3.1, Dn (t) é par. Então, pela proposição 5.6 do capítulo 2, tem-se
que
Z L Z L
1= Dn (t) dt = 2 Dn (t) dt,
−L 0
de modo que
Z L
1
Dn(t) dt = ·
0 2
O próximo passo consiste em mostrar uma nova representação para as funções En (x). Antes,
observe-se que estas funções estão bem definidas, pois f é seccionalmente contínuas, de modo
que os limites laterais f (x + 0) e f (x − 0) existem, para cada x, fazendo sentido a expressão
f (x + 0) + f (x − 0)
En (x) = Sn(x) − ·
2
Portanto, usando (3.10) na expressão que define En (x) e o último fato acima, obtém-se
f (x + 0) + f (x − 0)
En (x) = Sn (x) −
2
Z L
f (x + 0) + f (x − 0)
= Dn (t) · [ f (x + t) + f (x − t)] dt −
0 2
Z L
1 1
= Dn (t) · [ f (x + t) + f (x − t)] dt − · f (x + 0) − · f (x − 0)
0 2 2
Z L
= Dn (t) · [ f (x + t) + f (x − t)] dt −
0
Z L
 Z L

− f (x + 0) Dn (t) dt − f (x − 0) Dn (t) dt
0 0
Z L
= Dn (t) · [ f (x + t) + f (x − t)] dt −
0
Z L Z L
− Dn (t) · f (x + 0) dt − Dn (t) · f (x − 0) dt
0 0
Z L Z L
= Dn (t) · [ f (x + t) + f (x − t)] dt − Dn(t) · [ f (x + 0) + f (x − 0)] dt
0 0
Z L 
= Dn (t) · [ f (x + t) − f (x + 0)] + [ f (x − t) − f (x − 0)] dt,
0
694 B O teorema de Fourier

que é 3.9.

Proposição 3.2 (teste de Dini): Seja f : R → R uma função períodica de período T = 2L e


pertencente ao espaço L1([−L, L]). Considere a função g : R × R → R definida por

g(x, t) = [ f (x + t) − f (x + 0)] + [ f (x − t) − f (x − 0)] .

Fixado x ∈ [−L, L], suponha que f (x + 0) e f (x − 0) existam e que exista η > 0 tal que
Z η

g(x, t)
(3.11) t dt < ∞.
0

Então,
lim En (x) = 0,
n→∞
ou seja,
f (x + 0) + f (x − 0)
lim Sn(x) = ·
n→∞ 2
D EMONSTRAÇÃO : Como f ∈ L1([a, b]) e existem os limites laterais f (x + 0) + f (x − 0),
então as funções dadas por
f (x + 0) + f (x − 0)
En (x) = Sn(x) −
2
estão bem definidas.
Pelo lema 3.4, as funções En (x) pode ser reescritas na forma
Z L 
En (x) = Dn (t) · [ f (x + t) − f (x + 0)] + [ f (x − t) − f (x − 0)] dt,
0

ou ainda,
Z L
(3.12) En (x) = Dn(t) · g(x, t) dt,
0

onde
g(x, t) = [ f (x + t) − f (x + 0)] + [ f (x − t) − f (x − 0)] .
O passo seguinte consiste em reescrever En (x) em duas partes, usando resultados já enuncia-
dos e demonstrados anteriormente. Assim, pelo item (f) da proposição 3.1, tem-se que
h πt i
1 sen (n + 1/2)
(3.13) Dn (t) = ·  πt  L ·
2L sen
2L
Substituindo (3.13) em (3.12), obtém-se
B.3 Convergência pontual da série de Fourier 695

Z L
En (x) = Dn (t) · g(x, t) dt
0
Z δ Z L
= Dn (t) · g(x, t) dt + Dn (t) · g(x, t) dt
0 δ
h πt i
Z δ   sen (n + /2)
Z L 1
g(x, t) 1
= t · Dn (t) dt + ·  π t  L · g(x, t) dt
0 t δ 2L sen
2L
 
Z δ   Z L   
g(x, t) 1 π t  g(x, t) 
(3.14) = t · Dn (t) dt + sen n + ·  π t   dt.
0 t δ 2 L 2L sen
2L
A primeira integral em (3.14) será feita pequena tomando-se δ convenientemente pequeno e
usando a hipótese (3.11). Já na segunda integral em (3.14) será usado o teorema de Riemann-
Lebesgue (veja a proposição 2.1 ou o teorema 2.1).
Assim, segue-se de (3.13) que
h
πt i
1 sen (n + 1/2)

|t · Dn(t)| = t · ·  πt  L
2L sen

2L


t h π t i

=   · sen (n + 1/2)
2L sen π t L

2L


t |t |

≤  πt  =  
2L sen sen π t
2L
2L 2L
t
(3.15) =  πt  ,
2L sen
2L
onde foi possível retirar o módulo em virtude de 0 < t ≤ L e de a função seno variar de 0 até 1
neste intervalo (isto é, com argumento variando de 0 até π/2, onde seno é positivo).
Observe-se que a função no segundo membro de (3.15),
t
h(t) =  πt  ,
2L · sen
2L
é contínua e crescente em [0, L].
Logo, o máximo de h ocorrerá quando t = L, isto é,
696 B O teorema de Fourier

L 1 1
h(L) =  = π  = ·
πL 2 sen 2
2L sen 2
2L
Isto faz com que h(t) ≤ 1/2 para todo t ∈ [0, L). Assim, usando este fato em (3.15), obtém-se
a seguinte estimativa
1
|t · Dn(t)| ≤ h(t) ≤ , para t ∈ [0, L].
2
Portanto, dado ε > 0, tome δ < min{L, η }, tal que
Z δ Z δ
g(x, t) g(x, t)
t · Dn(t) dt ≤ t · Dn (t) · dt
0 t 0
t
Z δ
g(x, t)
= |t · Dn (t)| dt
0 t
Z δ Z
1 g(x, t) 1 δ g(x, t)

0 2
t dt = 2 0 t dt
ε
(3.16) < ,
2
em virtude da hipótese (3.11).
A próxima etapa consiste em manter o δ obtido acima fixado e aplicar o teorema de Riemann-
Lebesgue à segunda integral em (3.14), isto é,
 
Z L   
1 π t  g(x, t) 
sen n + ·  π t   dt.
δ 2 L 2L sen
2L
Para usar o teorema de Riemann-Lebesgue, basta verificar que a função
g(x, t)
ϕ (t) =  πt  , δ ≤ t ≤ L,
2L sen
2L
é integrável. Mas isso é imediato, visto que o denominador nunca se anula no intervalo [δ , L] e
que g, por hipótese, é integrável.
Logo, para n suficientemente grande, tem-se que
 
  
Z L 1 π t  g(x, t)  ε

(3.17) sen n+ ·  π t   dt < ·
δ 2 L 2L sen 2

2L
Assim, segue-se de (3.14) e de (3.16) e (3.17) que
 
    
Z δ g(x, t)
Z L
1 π t g(x, t)
 
| En (t)| = t · Dn(t) dt + sen n + ·  π t   dt
0 t δ 2 L 2L sen

2L
B.3 Convergência pontual da série de Fourier 697

 
Z δ   Z L   

g(x, t) 1 π t  g(x, t) 
≤ t · Dn (t) dt + sen n+ ·  π t   dt
0 t δ 2 L 2L sen

2L
ε ε
< + = ε,
2 2
o que demonstra o teste de Dini.

O teste de Dini pode ser utilizado para obter condições suficientes para a convergência da
série de Fourier, condições que sejam mais facilmente verificáveis.

Corolário 3.1: Seja f : R → R uma função periódica de período T = 2L e Hölder contínua


na vizinhança do ponto x, isto é, que existam constantes α > 0, δ > 0 e K > 0 tais que

(3.18) | f (t) − f (s)| ≤ K | t − s|α , para t, x ∈ [ x − δ , x + δ ].

Considere a função g : R → R definida por

g(x, t) = [ f (x + t) − f (x + 0)] + [ f (x − t) − f (x − 0)].

Então, lim En (x) = 0.


n→∞
D EMONSTRAÇÃO : A desigualdade (3.18) implica que f seja contínua em x. Portanto, exis-
tem os limites laterais no ponto x e estes são tais que

f (x + 0) = f (x − 0) = f (x).

Usando este fato, bem como (3.18), é possível fazer a seguinte estimativa:
|g(x, t)| = |[ f (x + t) − f (x + 0)] + [ f (x − t) − f (x − 0)]|

≤ | f (x + t) − f (x + 0)| + | f (x − t) − f (x − 0)|

= | f (x + t) − f (x)| + | f (x − t) − f (x)|

≤ K|(x + t) − x|α + K|(x − t) − x|α

= K t α + K t α = 2K t α .
Logo,
Z δ Z δ Z δ
g(x, t)
dt = | g(x, t)| 2K t α
dt ≤ dt
0 t 0 |t | 0 t
Z δ Z a
α −1
= 2K t dt = 2K · lim t α −1 dt
0 a→δ 0
 t  a 
a 0

= 2K · lim = 2K · lim −
a→δ α 0 a→δ α α
698 B O teorema de Fourier

2K δ
(3.19) = < ∞.
α
Portanto, a condição (3.11) no teste de Dini (proposição 3.2) é verificada e o mesmo pode ser
aplicado para concluir que
lim En (x) = 0.
n→∞

Corolário 3.2: Seja f : R → R uma função periódica de período T = 2L e diferenciável no


ponto x. Considere a função g : R → R definida por

g(x, t) = [ f (x + t) − f (x + 0)] + [ f (x − t) − f (x − 0)].

Então, lim En (x) = 0.


n→∞

D EMONSTRAÇÃO : A ideia consiste em mostrar que a função é lipschitziana usando, para


isso, o teorema do valor médio (de Lagrange). Eis o teorema do valor médio:
Seja f : [a, b] → R uma função contínua. Se f é derivável em (a, b), então existe c ∈ (a, b)
tal que
f (b) − f (a)
f 0 (c) = ·
b−a
Deseja demonstrar a seguinte afirmação: Seja f : I → R derivável no intervalo aberto I. Se
existe k ∈ R tal que | f 0 (x)| ≤ k para todo x ∈ I, então quaisquer que sejam x, y ∈ I, se tem

| f (x) − f (y)| ≤ k|x − y|.

De fato, dados xy ∈ I, f é contínua no intervalo fechado cujas extremidades são x e y, bem


como é derivável no intervalo aberto correspondente. Logo, pelo teorema do valor médio, existe
z ∈ (x, y) tal que
f (x) − f (y) = f 0 (z)(x − y).
Como, por hipótese, | f 0 (z)| ≤ k, vem que

| f (x) − f (y)| = | f 0 (z)| | x − y| ≤ k | x − y|,

mostrando que f é lipschitziana.


Agora basta observar que f ser lipschitziana é um caso particular de ser Hölder contínua,
bastando notar que, nesse caso, toma-se α = 1. Como o corolário 3.1 vale para as funções
Hölder contínuas, então também vale para as funções lipschitzianas e, portanto, sua conclusão
continua ainda válida, isto é,
lim En (x) = 0.
n→∞
B.3 Convergência pontual da série de Fourier 699

Teorema 3.1 (Fourier): Seja f : R → R uma função seccionalmente diferenciável e periódica


de período T = 2L. Então, a série de Fourier da função f , dada por
∞ h  nπ x   nπ x i
a0 ,
f (x) ∼ + ∑ an cos + bn sen
2 n=1 L L

converge em cada ponto x para a média dos limites laterais, isto é, converge para
f (x + 0) + f (x − 0) ,
2
ou ainda,
∞ h  nπ x   nπ x i
f (x + 0) + f (x − 0) a0 ,
= + ∑ an cos + bn sen
2 2 n=1 L L
onde
f (x + 0) = lim f (t) e f (x − 0) = lim f (t).
t→x+ t→x−
D EMONSTRAÇÃO : Como f é, por hipótese, seccionalmente diferenciável, então ela é, por
definição, seccionalmente contínua. Deseja-se que as razões incrementais
f (x + t) − f (x + 0) f (x − t) − f (x − 0)
e
t t
sejam limitadas para t > 0 suficientemente pequeno.
Em particular, isso é verdade se as derivadas laterais em x existem, isto é, se existem
f (x + t) − f (x + 0) ,
f+0 (x) = lim
t→0+ t
f (x − t) − f (x − 0) ,
f−0 (x) = lim
t→0+ t
e isto é verdade, pois f é seccionalmente diferenciável (visto que suas descontinuidades são
todas de primeira espécie).
Assim, existem constantes K1, K2 > 0 tais que

f (x + t) − f (x + 0) f (x − t) − f (x − 0)
≤ K1 e ≤ K2 .
t t

Considere a função g : R → R definida por

g(x, t) = [ f (x + t) − f (x + 0)] + [ f (x − t) − f (x − 0)].

Então,
g(x, t) f (x + t) − f (x + 0) f (x − t) − f (x − 0)
= + ·
t t t
Portanto, tomando K = max{K1 , K2 }, obtém-se

g(x, t) f (x + t) − f (x + 0) f (x − t) − f (x − 0)
= +
t t t
700 B O teorema de Fourier


f (x + t) − f (x + 0) f (x − t) − f (x − 0)


t + t

(3.20) ≤ K1 + K2 ≤ 2K.

Assim, Z η Z η
g(x, t) η
dt ≤ 2K
dt = 2K · t = 2K η < ∞.
0 t 0 0

Logo é possível usar o teste de Dini e concluir que

lim En (x) = 0.
n→∞

Com isso, encerra-se a demonstração do teorema de Fourier.


Adendo C
Série de Fourier generalizada

C.1 Espaço com produto interno

Este adendo tem como objetivo mostrar que a série de Fourier tem características algébricas
que podem ser generalizadas através da Álgebra Linear. Inicia-se revisando as definições de
dependência e independência linear, bem como a definição de base.

D EFINIÇÃO : Um conjunto finito de vetores, {u1, . . ., un}, diz-se linearmente dependente se


existe um correspondente conjunto de escalares, {a1, . . ., an}, não todos nulos, tal que
n
∑ a1 u1 + · · · + anun = 0.
k=1
n
Por outro lado, caso ∑ ak uk = 0 implique em ak = 0 para todo k = 1, . . ., n, diz-se, então,
k=1
que o conjunto {u1, . . ., un} é linearmente independente.

Observa-se que dependência e independência linear são propriedades de conjuntos de vetores


e não propriedades dos vetores em si. Além disso, também é conveniente falar de dependência
e independência linear de conjuntos de vetores que não são necessariamente finitos.

D EFINIÇÃO : Seja β um conjunto de vetores, não necessariamente finito, em um espaço ve-


torial V . Diz-se que β é linearmente independente (L.I.) se todo subconjunto finito de β é L.I.;
caso contrário, diz-se que β é linearmente dependente (L.D.).

D EFINIÇÃO : Uma base em um espaço vetorial V é um conjunto de vetores β L.I. tal que
cada vetor em V é uma combinação de elementos de β . Um espaço vetorial de dimensão finita
tem uma base finita.

Exemplo 1.1: Seja P o conjunto de todos os polinômios com coeficientes complexos na


variável t. É fácil ver que P é um espaço vetorial. O conjunto β = {1, t, t 2 , . . ., t n, . . .} é uma
base para P. Para ver isso, primeiro deve-se mostrar que β é L.I., isto é, deve-se mostrar que
todo subconjunto finito de β é L.I. Seja α = {1, t, t 2, . . ., t n }. Então,

701
702 C Série de Fourier generalizada

a0 + a1 · t + a2 · t 2 + · · · + an · t n = 0.

Como P é um espaço vetorial, o vetor nulo no segundo membro acima é o polinômio iden-
ticamente nulo. Assim,

a0 + a1 · t + a2 · t 2 + · · · + an · t n = 0 + 0 · t + 0 · t 2 + · · · + 0 · t n ,

de modo que a igualdade acima reduz-se a igualdade entre polinômios, isto é,

a0 = 0, a1 = 0, a2 = 0, . . ., an = 0.

Isto mostra que o subconjunto α de β é L.I. Como α é arbitrário, segue-se que todo subcon-
junto finito de β é L.I. Portanto, por definição, tem-se que β é L.I.
Além disso, todo polinômio é, por definição, uma combinação linear de um número finito de
monômios t n , isto é, se p ∈ P, então p(t) = a0 + a1 t + a2 t 2 + · · · + an t n .
Mostrou-se que β é um conjunto L.I., bem como, que cada vetor de P pode ser escrito como
combinação linear de elementos de β . Logo, por definição, tem-se que β é uma base para P.
Por outro lado, P não tem uma base finita. De fato, dado qualquer conjunto finito de
polinômios, é possível encontrar um polinômio de grau maior do que qualquer polinômio deste
conjunto. Este último polinômio, obviamente, não é uma combinação linear dos anteriores.

A partir deste ponto passa-se a tratar dos espaços vetoriais com produto interno, bem como
de resultados importantes que decorrem desta característica em particular de espaços vetoriais.

D EFINIÇÃO : Sejam K o corpo dos números reais ou o corpo dos números complexos e V
um espaço vetorial sobre K. Um produto interno sobre V é uma função que associa a cada par
ordenado de vetores u, v ∈ V um escalar (u, v) em K da seguinte maneira:

(a) (u + v, w) = (u, w) + (v, w), para todos u, v, w ∈ V ;


(b) (ku, v) = k(u, v), para todos u ∈ V e k ∈ K;
(c) (u, v) = (v, u), onde a barra indica a conjugação complexa;
(d) (u, v) ≥ 0, para todo u ∈ V ; e (u, u) = 0 se, e somente se, u = 0.
Dito de outra maneira, um produto interno (u, v) é uma forma bilinear de V × V em R,
simétrica, definida positiva (isto é, (u, v) ≥ 0 para todo u ∈ V e (u, u) > 0 se u 6= 0).

D EFINIÇÃO : Um espaço com produto interno é um espaço vetorial real ou complexo, munido
de um produto especificado sobre aquele espaço.

Sejam V espaço vetorial e u, v ∈ V . Então,

(u, v) = Re (u, v) + i · Im(u, v),

onde Re (u, v) e Im (u, v) são as partes real e imaginária do número complexo (u, v).
C.1 Espaço com produto interno 703

Observação 1.1: O número i é definido por i 2 = −1. Alguns autores definem a unidade

imaginária por i = −1, mas não é adequado entrar na polêmica de “raiz quadrada de números
negativos”. A questão relacionada ao “valor” de i encontra algum problema pelo fato de C não
ter uma relação de ordem. Caso i tenha algum valor, então ele deveria ser negativo, nulo ou
positivo. E isso não faz sentido.

De fato, se i ≥ 0, então é possível multiplicar a desigualdade sem alterar o sinal. Assim,

i≥0 ⇒ i·i ≥ 0·i ⇒ i2 ≥ 0 ⇒ −1 ≥ 0,

que é um absurdo
Se i < 0, então −i > 0, de modo que é possível multiplicar a última desigualdade por −i sem
alterar o sinal. Assim,

−i > 0 ⇒ (−i) > (−i) ≥ 0 · (−i) ⇒ i2 > 0 ⇒ −1 > 0,

que novamente implica em um absurdo.


Portanto, o leitor não deve se preocupar com o valor da unidade imaginária i, mas sim com o
fato de que ela satisfaz i 2 = −1 e que ela é representada pelo número i = 0 + i · 1 ou pelo par
ordenado (0, 1) no plano complexo .

Se z = a + ib é um número complexo, então −iz = −i(a + ib) = b − ia, de modo que

Im (z) = Re (−iz).

Decorre daí que

(1.1) Im(u, v) = Re [−i(u, v)] = Re (u, iv).

Assim, o produto interno é completamente determinado por sua parte real, isto é

(1.2) (u, v) = Re (u, v) + i · Re(u, iv).

Às vezes é muito útil saber que um produto interno sobre um espaço vetorial, real ou com-
plexo, é determinado por outra função, a chamada forma quadrática determinada pelo produto
interno. Para defini-la, indica-se a raiz quadrada positiva de (u, u) pelo símbolo kuk, que é de-
nominada a norma de u em relação ao produto interno. A forma quadrática determinada pelo
produto interno é a função que associa a cada vetor u o escalar kuk2.

Lema 1.1: Seja V um espaço com produto interno, real ou complexo. Então, para quaisquer
u, v ∈ V , tem-se

(1.3) ku ± vk2 = kuk2 ± 2 Re(u, v) + kvk2.


704 C Série de Fourier generalizada

D EMONSTRAÇÃO : Primeiro, observe que, se z ∈ C, então pode-se escrever z = a + ib. Assim,

z + z = (a + ib) + (a − ib) = 2a = 2 Rez.

Agora usa-se a observação acima para determinar o quadrado da norma da soma e da difer-
ença entre vetores. Para o quadrado da norma da soma, tem-se

ku + vk2 = (u + v, u + v) = (u + v, u) + (u + v, v)
= (u, u) + (v, u) + (u, v) + (v, v)
= (u, u) + (u, v) + (u, v) + (v, v)
= kuk2 + 2 Re(u, v) + kvk2.
Para o quadrado da norma da diferença, tem-se

ku − vk2 = (u − v, u − v) = (u − v, u) + (u − v, −v)
= (u, u) − (v, u) − (u, v) + (v, v)
= (u, u) − (u, v) − (u, v) + (v, v)
= kuk2 − 2 Re(u, v) + kvk2.
Portanto, em qualquer situação, a expressão para o quadrado da norma da soma e da diferença
pode ser escrita na forma

ku ± vk2 = kuk2 ± 2 Re(u, v) + kvk2.

Lema 1.2: Seja V um espaço com produto interno sobre os complexos. Então, para quaisquer
u, v ∈ V , tem-se

(1.4) ku ± ivk2 = kuk2 ± 2 Re(u, iv) + kvk2.

D EMONSTRAÇÃO : Observe que

z − z = (a − ib) − (a + ib) = a − ib − a − ib = −2ib = −2i Im(z).

Assim, com a observação anterior, para o quadrado da norma da soma, tem-se

ku + ivk2 = (u + iv, u + iv) = (u + iv, u) + (u + iv, iv)


= (u, u) + (iv, u) + (u, iv) + (iv, iv)
= (u, u) + i(v, u) + (i)(u, v) + i · (i)(v, v)
= (u, u) + i(u, v) − i(u, v) + (v, v)
C.1 Espaço com produto interno 705

h i
= (u, v) + i (u, v) − (u, v) + (v, v)

= kuk2 + i [−2i Im(u, v)] + kvk2 ,


= kuk2 + 2 Im(u, v) + kvk2,
que ao usar (1.1) resulta em

ku + ivk2 = kuk2 + 2 Re(u, iv) + kvk2.

Para o quadrado da norma da diferença, tem-se

ku − ivk2 = (u − iv, u − iv) = (u − iv, u) + (u − iv, −iv)


= (u, u) + (−iv, u) + (u, −iv) + (−iv, −iv)
= (u, u) − i(v, u) + (−i)(u, v) + (−i) · (−i)(v, v)
= (u, u) − i(u, v) + i(u, v) − i2(v, v)
h i
= (u, v) − i (u, v) − (u, v) + (v, v)

= (u, v) − i [−2i Im(u, v)] + (v, v)


= kuk2 − 2 Im(u, v) + kvk2,
que junto com (1.1) resulta em

ku − ivk2 = kuk2 − 2 Re(u, iv) + kvk2.

Portanto, em qualquer situação, a expressão para o quadrado da norma da soma e da diferença


pode ser escrita na forma

ku ± ivk2 = kuk2 ± 2 Re(u, iv) + kvk2.

As duas próximas proposições tratam da identidade de polarização, a primeira no caso real


e a segunda no caso complexo.

Proposição 1.1: Seja V um espaço com produto interno sobre os reais. Então, para quaisquer
u, v ∈ V , tem-se
1 1
(1.5) (u, v) = ku + vk2 − ku − vk2.
4 4
D EMONSTRAÇÃO : Pelo lema 1.2, tem-se que

ku ± vk2 = kuk2 ± 2 Re(u, v) + kvk2.

Esta expressão, para o caso real, pode ser simplificada e escrita na forma
706 C Série de Fourier generalizada

ku ± vk2 = kuk2 ± 2(u, v) + kvk2.

Segue-se daí que (


ku + vk2 = kuk2 + 2(u, v) + kvk2,
ku − vk2 = kuk2 − 2(u, v) + kvk2.
Subtraindo a segunda equação acima da primeira, obtém-se

ku + vk2 − ku − vk2 = 4(u, v),

ou ainda, 1 1
(u, v) = ku + vk2 − ku − vk2.
4 4

Proposição 1.2: Seja V um espaço com produto interno sobre os complexos. Então, para
quaisquer u, v ∈ V , tem-se
1 1 i i
(1.6) (u, v) = ku + vk2 − ku − vk2 + ku + ivk2 − ku − ivk2.
4 4 4 4
D EMONSTRAÇÃO : Pelos lemas 1.1 e 1.2, tem-se as seguintes identidades:

ku ± vk2 = kuk2 ± 2 Re(u, v) + kvk2,


ku ± ivk2 = kuk2 ± 2 Re(u, iv) + kvk2.
Com estas identidades pode-se escrever:
 
ku + vk2 − ku − vk2 + iku + ivk2 − iku − ivk2 = kuk2 + 2 Re(u, v) + kvk2 −
 
− kuk2 − 2 Re(u, v) + kvk2 +
 
+ i kuk2 + 2 Re(u, iv) + kvk2 −
 
− i kuk2 − 2 Re(u, iv) + kvk2
= 4 Re(u, v) + 4i Re(u, iv)
= 4 [Re (u, v) + i Re(u, iv)]
= 4(u, v),
onde usou-se (1.2) no último passo acima.
Portanto, tem-se que
1 1 i i
(u, v) = ku + vk2 − ku − vk2 + ku + ivk2 − ku − ivk2.
4 4 4 4
C.1 Espaço com produto interno 707

A identidade de polarização, na forma real ou complexa, permite obter o produto interno a


partir de uma norma e vice-versa. É preciso notar que não se está afirmando que uma norma
sempre provém de um produto interno. Na verdade existem normas que não provém de produto
interno. A próxima proposição trata de uma identidade que é conhecida como identidade do
paralelogramo. Se esta identidade for satisfeita, então a norma provém de um produto interno.

Proposição 1.3: Seja V um espaço vetorial, real ou complexo, com produto interno. Então,
para quaisquer u, v ∈ V , tem-se

u + v 2 u − v 2 1 
(1.7) + = kuk2 + kvk2 ,
2 2 2
para todo u, v ∈ V .
D EMONSTRAÇÃO : Pelo lema 1.1, tem-se que
(
ku + vk2 = kuk2 + 2 Re(u, v) + kvk2,
ku − vk2 = kuk2 − 2 Re(u, v) + kvk2.

Somando as duas equações acima membro a membro, obtém-se

ku + vk2 + ku − vk2 = 2kuk2 + 2kvk2.

Multiplicando ambos os membros da última igualdade por 1/4, resulta em

ku + vk2 ku − vk2 1 
+ = kuk2 + kvk2 ,
4 4 2
ou ainda,
u + v u − v 1 2 2

+
2 2 = 2 kuk + kvk ,
que é o resultado desejado.

Observação 1.2: A expressão identidade do paralelogramo é sugerida pela geometria ele-


mentar, quando se lembra que a norma generaliza o conceito elementar de comprimento de
um vetor. Veja a figura 1.1. A ideia básica, do ponto de vista geométrico, é que a soma dos
quadrados dos comprimentos das diagonais do paralelogramo deve ser igual ao dobro da soma
dos quadrados dos comprimentos de dois de seus lados.
Observa-se ainda que, se uma norma não satisfaz a identidade do paralelogramo, dada em
p
(1.7), então esta norma não pode ser obtidade de um produto interno pelo uso de kuk = (u, u).
É claro que existem normas que não provêm de produto interno e exemplos podem ser exibidos.
Grosso modo, pode-se afirmar que nem todos espaços normados são espaços com produto in-
terno.
708 C Série de Fourier generalizada

u+v
v
u-v

Figura 1.1: Gráfico da função f .

Este adendo aborda espaços com produto interno, mas observou-se que existem normas que
não provêm de produto interno algum. Assim, é necessário definir norma de maneira geral, isto
é, apresentar uma definição que seja independente do produto interno. Tem-se:

D EFINIÇÃO : Seja V um espaço vetorial, real ou complexo. Uma norma é uma função k · k :
V → R que satisfaz as seguintes propriedades:

(a) kuk ≥ 0 para todo u ∈ V ;


(b) kuk = 0 ⇔ u = 0;
(c) kk uk = |k| kuk, para todo u ∈ V e k escalar;
(d) ku + vk ≤ kuk + kvk para todos u, v ∈ V .

A propridade (d) acima é conhecida como desigualdade triangular.

Exemplo 1.2: Considere o espaço l 1, onde cada elemento deste espaço é uma sequência de
números x = {xn } = {x1, x2 , . . .} tal que |x1 | + |x2| + · · · converge. Defina

kxk1 = ∑ |xn | < ∞.
n=1

Mostra-se que k · k1 define uma norma em l 1, porém não será feito neste momento. Apenas
será demonstrado que k · k1 é uma norma que não provém de produto interno. Considere duas
sequências em l 1:

x = {1, 1, 0, 0 . . .} e y = {1, −1, 0, 0, . . .}.

Tem-se:
kxk1 = k{1, 1, 0, 0, . . .}k1 = |1| + |1| + |0| + |0| + · · · = 2,
kyk1 = k{1, −1, 0, 0, . . .}k1 = |1| + | − 1| + |0| + |0| + · · · = 2,
kx + yk1 = k{2, 0, 0, 0, . . .}k1 = |2| + |0| + |0| + |0| + · · · = 2,
C.1 Espaço com produto interno 709

kx − yk1 = k{0, 2, 0, 0, . . .}k1 = |0| + |2| + |0| + |0| + · · · = 2.


Segue-se daí que

x + y x − y
kx + yk1 kx − yk1 2 2
(1.8) 2 + 2 = + = + = 2.
1 1 2 2 2 2
Além disso,
1  1 
(1.9) kxk21 + kyk2k1 = 22 + 22 = 4.
2 2
Portanto, conclui-se de (1.8) e (1.9) que

x + y x − y 1 2 2

+
2 2 6= 2 kxk1 + kyk1 ,
1 1

isto é, a identidade do paralelogramo não é satisfeita. Isto mostra que a norma k · k1 de l 1 não
provém de um produto interno.

Viu-se anteriormente a definição geral de norma. Agora mostra-se que, em um espaço de


p
produto interno V , a função k · k : V → R dada por kuk = (u, u) define, de fato, uma norma
neste espaço.

Teorema 1.1: Seja V um espaço com produto interno. Então, para quaisquer u, v ∈ V e todo
escalar k, tem-se:

(a) kkuk = |k| kuk;


(b) kuk > 0 para todo u 6= 0;
(c) |(u, v)| ≤ kuk kvk (desigualdade de Cauchy-Schwarz);
(d) ku + vk ≤ kuk + kvk (desigualdade triangular ou de Minkowski).
D EMONSTRAÇÃO : Para demonstrar (a) usa-se a definição de norma e de produto interno.
Antes, observe-se que para k = a + ib, tem-se

k · k = (a + ib)(a − ib) = a2 − iab + iab − i2b2 = a2 + b2 = |k|2.

Assim,
kkuk2 = (ku, ku) = k · k (u, u) = |k|2(u, u) = |k|2 kuk2 ,
ou seja,
kkuk2 = |k|2 kuk2 ⇒ kkuk = |k| kuk.
(b) Seja u 6= 0. Então,
kuk2 = (u, u) > 0,
pelo item (d) na definição de produto interno. Portanto, segue-se daí que kuk > 0.
710 C Série de Fourier generalizada

(c) Agora demonstra-se a desigualdade de Cauchy-Schwarz. Se u = 0, então Cauchy-Schwarz


é evidente, em particular vale a igualdade. Caso u 6= 0, então defina
(v, u)
w = v− u.
kuk2
Então,  
(v, u)
(w, u) = v − u, u
kuk2
 
(v, u)
= (v, u) + − u, u
kuk2
(v, u)
= (v, u) − (u, u)
kuk2
(v, u)
= (v, u) − 2
· kuk2
kuk
= (v, u) − (v, u) = 0.
Além disso, usando a parte já demonstrada em (b), segue-se que
 
2 (v, u) (v, u)
0 ≤ kwk = v − u, v − u
kuk2 kuk2
     
(v, u) (v, u) (v, u) (v, u)
= (v, v) + v, − u + − u, v + − u, − u
kuk2 kuk2 kuk2 kuk2
 " #
(v, u) (v, u) (v, u) (v, u)
= (v, v) − (v, u) − (u, v) + − − (u, u)
kuk2 kuk2 kuk2 kuk2
" # 
(u, v) (u, v) (u, v) (u, v)
= (v, v) − (u, v) − (u, v) + − − (u, u)
kuk2 kuk2 kuk2 kuk2

(u, v)(u, v) (u, v)(u, v) (u, v)(u, v)


= (v, v) − − + (u, u)
kuk2 kuk2 kuk4
|(u, v)|2 |(u, v)|2 |(u, v)|2
= kvk2 − − + kuk2
kuk2 kuk2 kuk4
|(u, v)|2 |(u, v)|2
= kvk2 − 2 +
kuk2 kuk2
|(u, v)|2 ,
= kvk2 −
kuk2

onde usou-se o fato que (u, v)(u, v) = (u, v)(u, v) = |(u, v)|2, que pode ser verificado como no
início da demonstração da parte (a), como foi feito para o complexo k.
Portanto,
|(u, v)|2 kuk2 kvk2 − |(u, v)|2
0 ≤ kvk2 − ⇒ 0≤ ⇒ 0 ≤ kuk2 kvk2 − |(u, v)|2,
kuk2 kuk2
C.1 Espaço com produto interno 711

donde segue-se a desigualdade de Cauchy-Schwarz

|(u, v)| ≤ kuk kvk.

Note-se que para estabelecer a desigualdade de Cauchy-Schwarz não se utilizou a hipótese


(u, v) > 0 se u 6= 0.
(d) Para demonstrar a desigualdade Minkowski usa-se a desigualdade de Cauchy-Schwarz e
o lema 1.1. Além disso, por (1.2), tem-se que

(u, v) = Re (u, v) + i · Re (u, iv) ⇒ | Re (u, v)| ≤ | Re (u, v) + i · Re (u, iv)| = |(u, v)|.

Assim,
ku + vk2 = (lema 1.1) = kuk2 + 2 Re(u, v) + kvk2
≤ kuk2 + 2 | Re (u, v)| + kvk2
≤ kuk2 + 2|(u, v)| + kvk2 ≤ (Cauchy-Schwarz)
≤ kuk2 + 2 (kuk kvk) + kvk2
= (kuk + kvk)2 .
Portanto, segue-se daí que
ku + vk ≤ kuk + kvk,
que é a desigualdade triangular (ou de Minkowski).

Naturalmente, o teorema 1.1 possui mais propriedades do que as necessárias para justificar
p
que kuk = (u, u) é uma norma. É o caso da desigualdade de Cauchy-Schwarz, porém a mesma
foi usada para demonstrar a desigualdade triangular.
Um conceito básico em toda esta teoria que aqui está sendo desenvolvida é o de ortogonali-
dade. Da Geometria Analítica, sabe-se que, se o produto escalar entre dois vetores em R3 é
zero, então os vetores são ortogonais, isto é, eles são perpendiculares ou pelo menos um deles é
o vetor nulo. Isto sugere e motiva a próxima definição.

D EFINIÇÃO : Sejam u e v vetores em um espaço V com produto interno. Diz-se que u e v


são ortogonais se (u, v) = 0. Se β é um conjunto de vetores em V , diz-se que β é um conjunto
ortogonal se quaisquer dois vetores distintos em β são ortogonais. Um conjunto ortonormal é
um conjunto ortogonal β com a propriedade adicional de que kuk = 1 para todo u ∈ β .

A base canônica em Rn é exemplo de um conjunto ortonormal em um espaço de dimensão


finita. Como visto no capítulo 2, conjunto {cos (nπ x)/L, sen (nπ x)/L} é um conjunto ortogonal em
um espaço de dimensão infinita.

Teorema 1.2: Seja β = {u1, u2, . . ., un} um conjunto ortogonal de vetores não nulos em um
espaço com produto interno V . Então β é um conjunto L.I.
712 C Série de Fourier generalizada

D EMONSTRAÇÃO : Suponha que

u = a1 u1 + a2 u2 + · · · + an un .

Então, para 1 ≤ k ≤ n, tem-se


(u, uk) = (a1 u1 + a2u2 + · · · + anun , uk )
= a1(u1 , uk ) + a2(u2 , uk ) + · · · + an(un , uk )
= ak (uk , uk ) = ak kuk k2 ,
pois (ui , u j ) = 0 para todo i 6= j, em virtude dos vetores de β serem dois a dois ortogonais e não
nulos. Como todos os vetores de β são não nulos, então (uk , uk ) 6= 0. Assim, decorre daí e da
última igualdade que
(u, uk ) ,
ak = 1 ≤ k ≤ n.
kuk k2
Caso u = 0, então cada ak = 0, pois o produto interno no numerador da última igualdade será
necessariamente igual a zero. Ou seja, quando u = 0 pode-se escrever

a1u1 + a2u2 + · · · + ak uk = 0,

que é a combinação linear nula. E como observado, todos os coeficientes desta combinação são
nulos. Isto mostra que o conjunto β é L.I.

Corolário 1.1: Sejam β = {u1 , u2, . . ., un} um conjunto ortogonal de vetores não nulos e u
um vetor que é combinação destes vetores, isto é,

u = a1 u1 + a2 u2 + · · · + an un .

Então, u é exatamente a combinação linear


n
(u, uk ) (u, u1) (u, u2 ) (u, un)
u= ∑ 2
uk = 2
u1 + 2
u2 + · · · +
kun k2
un .
k=1 kuk k ku1k ku2 k

D EMONSTRAÇÃO : Seja u = a1 u1 + a2u2 + · · · + an un. A demonstração do teorema 1.1


mostrou que, ao tomar-se o produto interno entre u e cada uk ∈ β , a seguinte expressão para
ak é obtida:
(u, uk )
ak = , 1 ≤ k ≤ n.
kuk k2
Portanto, substituindo na combinação linear para u a expressão obtida para cada ak , obtém-se
n
(u, uk ) (u, u1) (u, u2 ) (u, un)
u= ∑ 2
uk = 2
u1 + 2
u2 + · · · +
kun k2
un ,
k=1 kuk k ku1k ku2 k

como foi afirmado.


C.1 Espaço com produto interno 713

Observação 1.3: As ideias desenvolvidas aqui são generalizações sobre aquilo que é estu-
dado em geometria analítica: projeção ortogonal de vetores. Sejam u e v dois vetores não nulos
e θ o ângulo entre eles. Deseja-se decompor u da seguinte forma:

u = u1 + u2 , onde u1 // v e u2 ⊥ v.

A figura 1.2 ilustra duas situações possíveis: ângulos agudo e obtuso.

Figura 1.2: Projeções ortogonais de vetores.

O vetor u1 é chamado de projeção ortogonal de u sobre v e é denotado por u1 = proj v(u).


Deseja-se encontrar uma expressão para proj v (u) envolvendo apenas os vetores u e v. Por
hipótese, u1 // v, de modo que u1 = av. Como u2 = u − u1 = u − av é ortogonal a v, segue-se que

(u − av, v) = 0 ⇒ (u, v) − a(v, v) = 0,

ou ainda,
(u, v) (u, v)
a= = ·
(v, v) kvk2
Como proj v (u) = u1 e u1 = av, segue-se, portanto, que
(u, v)
proj v(u) = v.
kvk2
Agora deseja-se dar uma interpretação geométrica para o módulo do produto interno. Para
isso será necessário supor que v seja unitário, isto é, kvk = 1. Então,
(u, v)
proj v (u) = v = (u, v) v.
kvk2
Logo,
k proj v(u)k = k(u, v) vk = |(u, v)| kvk = |(u, v)|,
onde usou-se o fato, mais uma vez, que o vetor v é unitário.
Portanto, a última igualdade diz que, sendo v um vetor unitário, então o módulo do produto
interno (u, v) é igual ao comprimento do vetor projeção proj v (u).
714 C Série de Fourier generalizada

C.2 A desigualdade de Bessel

Teorema 2.1 (desigualdade de Bessel): Seja β = {u1, . . ., un} um conjunto ortogonal de


vetores não nulos em um espaço com produto interno V . Se u é um vetor qualquer e se ak =
(u, uk ), então
n
|(u, uk )|2
(2.1) ∑ 2
≤ kuk2.
k=1
kuk k

Além disso, a igualdade vale se, e somente se,


n
(u, uk)
u= ∑ u .
2 k
k=1 kuk k

D EMONSTRAÇÃO : Considere o seguinte vetor


n
(u, uk )
v = u− ∑ 2 k
u.
k=1 kuk k

Assim,

!
n n
(u, u k ) (u, u k )
0 ≤ kvk2 = (v, v) = u − ∑ 2 k
u , u− ∑ 2 k
u
k=1
ku k k k=1
ku k k
! !
n n
(u, uk ) (u, uk )
= (u, u) − u, ∑ 2 k
u − ∑ 2 k
u ,u +
k=1 kuk k k=1 kuk k
!
n n
(u, uk) (u, uk )
+ ∑ 2 k ∑ ku k2 k
u, u
k=1 kuk k k=1 k
   
(u, u1) (u, un) (u, u1) (u, un)
= (u, u) − u, u1 + · · · + un − u1 + · · · + un , u +
ku1 k2 kunk2 ku1 k2 kunk2
 
(u, u1 ) (u, un) (u, u1) (u, un)
+ u1 + · · · + un , u1 + · · · + un
ku1 k2 kun k2 ku1 k2 kun k2
" #
(u, u1) (u, un)
= (u, u) − (u, u1) + · · · (u, un) −
ku1k2 kun k2
 
(u, u1) (u, un)
− (u1 , u) + · · ·+ (un , u) +
ku1 k2 kunk2
" #
(u, u1) (u, u1 ) (u, u1) (u, un)
+ (u1 , u1) + · · · + (u1 , un) + · · ·
ku1 k2 ku1 k2 ku1k2 kun k2
" #
(u, un) (u, u1 ) (u, un) (u, un)
···+ (un , u1) + · · · + (un , un)
kun k2 ku1 k2 kunk2 kun k2
C.2 A desigualdade de Bessel 715

" #
(u, u1 )(u, u1) (u, un)(u, un)
= (u, u) − 2
+ ···+ −
ku1k kun k2
" #
(u, u1)(u, u1) (u, un)(u, un )
− + ···+ +
ku1 k2 kunk2
" #
(u, u1)(u, u1) (u, un)(u, un)
+ (u1 , u1) + · · · + (un , un)
ku1 k4 kun k4
   
|(u, u1)|2 |(u, un)|2 |(u, u1)|2 |(u, un)|2
= (u, u) − + ···+ − + ···+ +
ku1k2 kun k2 ku1 k2 kunk2
 
|(u, u1)|2 2 |(u, un)|2 2
+ ku1k + · · · + kun k
ku1 k4 kunk4
n n n
|(u, uk )|2 |(u, uk )|2 (u, uk )|2
= (u, u) − ∑ 2
− ∑ kuk k2 ∑ kuk k2
+
i=1 kuk k k=1 k=1
n
|(u, uk )|2 ,
= kuk2 − ∑
k=1
kuk k2
ou seja, segue daí que
n
|(u, uk )|2
∑ 2
≤ kuk2.
k=1 ku k k
Observa-se que, nos passos acima, usou-se o fato que (ui , u j ) = 0, para i 6= j, pois o conjunto
é ortogonal. Além disso, também usou-se o seguinte fato
(u, uk )(u, uk ) = (u, uk )(u, uk ) = |(u, uk )|2 ,

em virtude de z · z = z · z = |z|, como já foi justificado anteriormente.


Para demonstrar a segunda afirmação deve-se observar que, no início da demonstração da
desigualdade, usou-se o seguinte vetor
n
(u, uk )
v = u− ∑ 2 k
u.
k=1 kuk k

Ao longo daquela demonstração, a única desigualdade usada foi que 0 ≤ kvk2 . Assim, a
igualdade só ocorrerá quando 0 = kvk2 , isto é, a igualdade só é verificada se, e somente se,
v = 0. Logo, n n
(u, uk ) (u, uk)
0 = u− ∑ 2
uk ⇒ u= ∑ u.
2 k
k=1 kuk k k=1 kuk k
Portanto, tem-se que
n n
2 |(u, uk )|2 (u, uk )
kuk = ∑ se, e somente se, u= ∑ uk .
k=1
kuk k2 k=1
kuk k2
716 C Série de Fourier generalizada

Corolário 2.1 (desigualdade de Bessel): Seja β = {u1, . . ., un} um conjunto ortonormal de


vetores não nulos em um espaço com produto interno V . Então,
n
(2.2) ∑ |(u, uk )|2 ≤ kuk2.
k=1

D EMONSTRAÇÃO : Como, por hipótese, β é um conjunto ortonormal, seus vetores são or-
togonais e unitários. Assim, kuk k = 1, para todo k = 1, . . ., k. Usando este fato na desigualdade
(2.1) no teorema 2.1
n
|(u, uk )|2
∑ kuk k2 ≤ kuk2,
k=1
segue-se que n
∑ |(u, uk )|2 ≤ kuk2,
k=1
que é o resultado desejado.

Corolário 2.2: Sejam V um espaço com produto interno e β = {u1, . . ., un} um conjunto
ortogonal de vetores de V . Então, para qualquer vetor u ∈ V , tem-se que o vetor
n
(u, uk )
v = u− ∑ uk
k=1
kuk k2

é ortogonal a cada um dos uk e, consequentemente, ao subespaço gerado por β .


D EMONSTRAÇÃO : Para demonstrar o que foi afirmado deve-se tomar o produto interno de v
com cada uk , mostrando que o mesmo é igual a zero. Tem-se:
!
n
(u, uk )
(v, uk ) = v − ∑ u ,u
2 k k
k=1 kuk k
 
(u, u1 ) (u, u2) (u, un)
= u− u1 − u2 − · · · − un , uk
ku1 k2 ku2 k2 kun k2
(u, u1) (u, u2) (u, un)
= (u, uk ) − 2
(u1 , uk ) − 2
(u2 , uk ) − · · · − (un , uk )
ku1 k ku2 k kunk2
(u, uk )
= (u, uk ) − (uk , uk ) = (u, uk ) − (u, uk ) = 0.
kuk k2
No procedimento acima deve-se observar que o conjunto é ortogonal, de modo que (ui , u j ) =
0 para todo i 6= j e que, para i = j se tem (ui , u j ) 6= 0. A primeira afirmação se deve ao fato de
os vetores serem dois a dois ortogonais e a segunda se deve à hipótese de os vetores serem não
nulos.
C.3 Conjunto completo e identidade de Parseval 717

C.3 Conjunto completo e identidade de Parseval

D EFINIÇÃO : Diz-se que um conjunto ortonormal é completo se ele não estiver contido em
nenhum conjunto ortonormal maior.

Teorema 3.1 (completude): Seja β qualquer conjunto finito ortonormal em um espaço com
produto interno V . As seguintes condições sobre β são equivalentes.

(a) O conjunto ortonormal β é completo.


(b) Se u ∈ V é tal que (u, uk ) = 0 para k = 1, . . ., n, então u = 0.
(c) O subespaço gerado por β é todo o espaço V .
n
(d) Se u ∈ V , então u = ∑ (u, uk )uk .
k=1
(e) Se u, v ∈ V , então vale a identidade de Parseval
n
(u, v) = ∑ (u, uk)(uk , v).
k=1

(f) Se u ∈ V , então
n
kuk2 = ∑ |(u, uk)|2 .
k=1
D EMONSTRAÇÃO : A demonstração será feita através das implicações

(a) ⇒ (b) ⇒ (c) ⇒ (d) ⇒ (e) ⇒ (f) ⇒ (a).

(a) ⇒ (b): suponha que (u, uk ) = 0, para todo k = 1, . . ., n, e que u 6= 0. Então, o vetor v = u/kuk
é unitário e ortogonal a cada um dos vetores uk de β . Portanto, o conjunto

α = β ∪ {v} = {u1, . . ., uk, v}

é um ortonormal tal que β ⊂ α . Mas isto contradiz a hipótese (a) de ser β um conjunto completo
(pois ele não seria o maior conjunto ortonormal de V ). Logo, tem-se que u = 0.
(b) ⇒ (c): suponha que o subespaço gerado por β não seja igual a V . Então, existe um vetor
u ∈ V que não pode ser escrito como combinação linear dos vetores uk de β . Pelo corolário 2.2,
o vetor dado por
n
v = u − ∑ (u, uk )uk
k=1
é ortonormal a cada um dos vetores uk ∈ β e tal que v 6= 0. Isto é, (v, uk ) = 0 para todo k = 1, . . ., n
e v = 0. Mas isto contradiz a hipótese (b), onde afirma que vetor v que satisfaz a condição
(v, uk ) = 0 para todo k = 1, . . ., n deve ser o vetor nulo, ou seja, v = 0. Portanto, o subespaço
gerado por β deve ser todo V .
718 C Série de Fourier generalizada

(c) ⇒ (d): tomando (c) como hipótese, então cada vetor u ∈ V pode ser escrito como combi-
nação linear dos vetores de β , isto é,
n
u = a1 u1 + · · · + an un = ∑ ak uk .
k=1

Para finalizar, basta mostrar que ak = (u, uk ) para todo k = 1, . . ., n. Com efeito,
(u, uk ) = (a1 u1 + · · · + anun , uk )
= a1 (u1 , uk ) + · · · + an(un , uk )
= ak (uk , uk )
= ak ,
onde-se usou-se, acima, os fatos de que (ui , u j ) = 0 para i 6= j (pois são ortogonais) e que
(uk , uk) = kuk k2 = 1 (pois uk são vetores unitários).
Portanto, tem-se que
n
u = (u, u1 )u1 + · · · + (u, un)un = ∑ (u, uk )uk .
k=1

(d) ⇒ (e): Sejam u, v ∈ V vetores quaisquer. Então, por (d), tem-se que
n n
u= ∑ (u, uk)uk e v= ∑ (v, uk )uk .
k=1 k=1

Então, !
n n
(u, v) = ∑ (u, uk )uk , ∑ (v, uk )uk
k=1 k=1

= ((u, u1)u1 + · · · + (u, un)un , (v, u1 )u1 + · · · + (v, un)un )


h i
= (u, u1 )(v, u1 )(u1 , u1) + · · · + (u, u1)(v, un )(u1 , un) + · · ·
h i
· · · + (u, un )(v, u1 )(un , u1) + · · · + (u, un)(v, un )(un , un)

= (u, u1 )(u1 , v)(u1 , u1) + · · · + (u, un)(un , v)(un , un)


= (u, u1 )(u1 , v)ku1k2 + · · ·(u, un )(un , v)kunk2
= (u, u1 )(u1 , v) + · · · + (u, un)(un , v)
n
= ∑ (u, uk )(uk , v),
k=1

onde usou-se os fatos que (ui , u j ) = 0 para i 6= j, kuk k = 1 para todo k = 1, . . ., n e que (v, uk ) =
(uk , v).
(e) ⇒ (f): basta tomar v = u em (e). De fato,
C.4 O espaço l 2 719

n
kuk2 = (u, u) = ∑ (u, uk )(uk , u)
k=1

= (u, u1)(u, u1 ) + · · · + (u, un)(u, un )


= |(u, u1)|2 + · · · + |(u, un)|2
n
= ∑ |(u, uk)|2 ,
k=1

onde usou-se o fato que (uk , u) = (u, uk ) e que (u, uk)(u, uk ) = |(u, uk)|2 para todo k = 1, . . ., n.
(f) ⇒ (a): suponha que β não seja completo. Isto significa dizer que existe um conjunto
ortonormal α que é maior do que β , isto é, β ⊂ α . Seja v ∈ α tal que v 6∈ β . Então, v deverá
ser ortogonal a cada uk , ou seja, (v, uk ) = 0 para todo k = 1, . . ., n. Pelo item (f), tem-se que v
satisfaz
n
2
kvk = ∑ |(v, uk )|2 = 0.
k=1

Como kvk2 = 0, segue-se que v = 0. Isto mostra que qualquer vetor do conjunto α , diferente
dos uk , k = 1, . . ., n, é o vetor nulo. Logo α não é maior do que β . Portanto, β é completo.

C.4 O espaço l 2

D EFINIÇÃO : Denomina-se l 2 o espaço vetorial cujos vetores são sequências de números,


reais ou complexos, da forma x = {xn}n∈N = {x1, x2 , . . ., xn, . . .} tais que |x1|2 + |x2 |2 + · · · +
|xn |2 + · · · converge, isto é,

∑ |xn |2 < ∞.
n=1
A adição e a multiplicação por escalar são definidas componente a componente, isto é, são
definidas por
{x1 , x2, . . .} + {y1, y2, . . .} = {x1 + y1 , x2 + y2, . . .},
k{x1 , x2, . . .} = {kx1 , kx2, . . .}.

Lema 4.1: Sejam x = {x1 , x2, . . ., xn, . . .} e y = {y1 , y2, . . ., yn , . . .} duas sequências em l 2.
Então,

(x, y) = ∑ xn · yn
n=1

é um produto interno em l 2.
720 C Série de Fourier generalizada

D EMONSTRAÇÃO : Veja a definição de produto interno no início da seção C.1 deste adendo.
Axioma (a): sejam x = {x1 , x2, . . ., xn , . . .}, y = {y1 , y2, . . ., yn , . . .} e z = {z1 , z2, . . ., zn, . . .} três
sequências em l 2. Então,

(x + y, z) = ∑ (xn + yn ) · zn
n=1

= (x1 + y1) · z1 + (x2 + y2 ) · z2 + · · · + (xn + yn ) · zn + · · ·


= [(x1 · z1) + (y1 · z1 )] + [(x2 · z2 ) + (y2 · z2 )] + · · · + [(xn · zn ) + (yn · zn )] + · · ·
= [(x1 · z1) + (x2 · z2 ) + · · · + (xn · zn ) + · · ·] +
+ [(y1 · z1 ) + (y2 · z2) + · · · + (yn · zn ) + · · ·]
∞ ∞
= ∑ xn · zn + ∑ yn · zn = (x, z) + (y, z).
n=1 n=1

Axioma (b): sejam x, y ∈ l 2 e k ∈ R. Então,



(k · x, y) = ∑ (k · xn ) · yn
n=1

= (k · x1 ) · y1 + (k · x2) · y2 + · · · + (k · xn) · yn + · · ·
= k · (x1 · y1) + k · (x2 · y2 ) + · · · + k · (xn · yn ) + · · ·
= k · (x1 · y1 + x2 · y2 + · · · + xn · yn + · · ·)

= k · ∑ xn · yn = k · (x, y).
n=1

Axioma (c): sejam x, y ∈ l 2. Então,



(x, y) = ∑ xn · yn = x1 · y1 + x2 · y2 + · · · + xn · yn + · · ·
n=1

= y1 · x1 + y2 · x2 + · · · + yn · · ·xn + · · ·

= ∑ yn · xn = (y, x).
n=1

Axioma (d): seja x ∈ l 2. Então,



(x, x) = ∑ xn · xn
n=1

= x1 · x1 + x2 · x2 + · · · + xn · · ·xn + · · ·
= x21 + x22 + · · ·x2n + · · · ≥ 0,
pois soma de números não negativos é não negativo.
Agora suponha que x = 0, ou seja, x = (0, 0, . . ., 0, . . .). Então,
C.4 O espaço l 2 721


(x, x) = ∑ xn · xn
n=1

= x1 · x1 + x2 · x2 + · · ·xn · xn + · · ·
= 0 · 0 + 0 · 0 + · · ·+ 0 · · ·0 + · · ·
= 0 + 0 + · · ·0 + · · · = 0.
Reciprocamente, suponha que (x, x) = 0. Então,

0 = (x, x) = ∑ xn · xn
n=1

= x1 · x1 + x2 · x2 + · · ·xn · xn + · · ·
= x21 + x22 + · · ·x2n + · · ·

= ∑ x2n .
n=1

Em virtude da potência par, a soma ∑ x2n só pode ser igual a zero se cada um dos termos for
n=1
zero, isto é, se xn = 0 para todo n ∈ N. Mas se xn = 0 para todo n ∈ N, então x = (0, 0, . . ., 0 . . .),
ou seja, x = 0.

A partir deste ponto serão apresentados alguns resultados referentes ao conjunto l 2.

Proposição 4.1 (Cauchy-Schwarz): Sejam

x = {xn} e y = {yn }

duas sequências em l 2 . Então,


s ! s !
∞ ∞ ∞
2 2
(4.1) ∑ | xn yn | ≤ ∑ | xn | ∑ | yn | ·
n=1 n=1 n=1

D EMONSTRAÇÃO : Observe-se, primeiro, que para quaisquer reais α , β ≥ 0, é verdadeiro que

α2 β 2 ,
(4.2) α ·β ≤ +
2 2
pois

(α − β )2 ≥ 0 ⇒ α 2 − 2α β + β 2 ≥ 0 ⇒ α 2 + β ≥ 2α β .

Seja { xn } e { yn } duas sequências tais que


∞ ∞
(4.3) ∑ | x n |2 = 1 e ∑ | yn |2 = 1.
n=1 n=1
722 C Série de Fourier generalizada

Fazendo α = | xn | e β = | yn| em (4.2), obtém-se

| xn |2 | yn|2
(4.4) | xn yn | ≤ + ·
2 2
Tomando a soma com n = 1 a ∞ na desigualdade acima e usando (4.3), obtém-se
!
∞ ∞
| xn|2 | yn |2 1 1
(4.5) ∑ | xn yn | ≤ ∑ 2 + 2 ≤ 2 + 2 = 1.
n=1 n=1

Agora toma-se duas sequências não nulas, x = {xn } e y = {yn} em l 2 e define-se


xn yn
(4.6) xn = !1/2 e yn = !1/2 ·
∞ ∞
∑ | xn |2 ∑ | yn |2
n=1 n=1

Note-se que as condições (4.3) são satisfeitas. Logo, é possível aplicar a desigualdade obtida
em (4.5). Assim, substituindo (4.6) em (4.5), obtém-se




∞ ∞
| xn yn| xn yn
∑ ∞ !1/2

!1/2 ∑
=

!1/2 ·

!1/2
n=1 n=1
∑ | xn |2 ∑ | yn|2 ∑ | xn |2
∑ | yn|2

n=1 n=1 n=1 n=1

= ∑ | xn yn| ≤ 1,
n=1

ou seja,

| xn yn |
∑ !1/2 !1/2 ≤ 1,
n=1 ∞ ∞
∑ | xn |2 ∑ | yn|2
n=1 n=1
que após multiplicar ambos os membros da desigualdade acima pelos fatores presentes no de-
nominador, obtém-se
!1/2 !1/2
∞ ∞ ∞
2
∑ | xn yn| ≤ ∑ | xn | ∑ | yn |2 ,
n=1 n=1 n=1

que é o resultado desejado.

Corolário 4.1: Sejam {xn} e {yn } duas sequências em l 2. Então,

({x1 , x2, . . .}, {y1, y2 , . . .}) = x1y1 + x2 y2 + · · ·


C.4 O espaço l 2 723

define um produto interno sobre l 2(R).


D EMONSTRAÇÃO : Deve-se demonstrar que a soma

∑ xn yn = x1 y1 + x2y2 + · · ·
n=1

converge absolutamente. Assim, o produto interno estará bem definido.


Pela desigualdade de Cauchy-Schawarz (proposição 4.1), tem-se que
v v s s
u u
u k u k ∞ ∞
t 2 t
|x1 y1 | + · · · + |xkyk | ≤ ∑ |xn | · ∑ |yn | ≤ ∑ |xn | · ∑ |yn|2 ,
2 2
n=1 n=1 n=1 n=1

que vale para todo n.


Assim, a sequência monótona de somas

Sn = |x1 y1 | + · · ·+ |xn yn |

é limitada e, por isso, é convergente. Portanto, a soma infinita converge absolutamente.


A verificação dos axiomas para o produto interno será deixado como exercício para o leitor.

Uma consequência imediata do corolário 4.1 é que este produto interno define uma norma
em l 2 : se x = {x1, x2 , . . .} é uma sequência em l 2, então

kxk22 = (x, x) = x1 · x1 + x2 · x2 + · · · = ∑ |xn |2 ,
n=1

ou ainda, que
!1/2

kxk2 = ∑ |xn|2
n=1

é uma norma em l 2.

Proposição 4.2 (Minkowski): Sejam

x = {xn} e y = {yn }

duas sequências em l 2 (R). Então,


!1/2 !1/2 !1/2
∞ ∞ ∞
(4.7) ∑ | xn + yn|2 ≤ ∑ | xn |2 + ∑ | yn |2 .
n=1 n=1 n=1

D EMONSTRAÇÃO : Observe-se, primeiro, que para números reais vale a desigualdade trian-
gular. Assim, tem-se que

| xn + yn| ≤ | xn | + | yn | , ∀ n ∈ N.
724 C Série de Fourier generalizada

Agora usa-se este fato no fator quadrático para encontrar

| xn + yn|2 = | xn + yn| · | xn + yn|


≤ (| xn | + | yn |)| xn + yn| .
Fazendo a soma com n de 1 até um valor fixado k, obtém-se
k k
2
∑ | xn + yn| ≤ ∑ (| xn | + | yn|) | xn + yn |
n=1 n=1
k k
(4.8) = ∑ | xn | · | xn + yn | + ∑ | yn | · | xn + yn| .
n=1 n=1

Agora aplica-se a desigualdade de Cauchy-Schwarz em cada uma das somas no último mem-
bro de (4.8) para obter, respectivamente,
!1/2 !1/2
k k k
2 2
(4.9) ∑ | xn | · | xn + yn | ≤ ∑ | xn | ∑ | xn + yn |
n=1 n=1 n=1

e
!1/2 !1/2
k k k
2 2
(4.10) ∑ | yn | · | xn + yn | ≤ ∑ | yn | ∑ | xn + yn| .
n=1 n=1 n=1

Substituindo (4.9) e (4.10) em (4.8) e atentando-se o sinal de desigualdade na soma (isto é,


≤), encontra-se
k k k
∑ | xn + yn|2 ≤ ∑ | xn | · | xn + yn| + ∑ | yn | · | xn + yn |
n=1 n=1 n=1
!1/2 !1/2
k k
≤ ∑ | xn|2 ∑ | xn + yn|2 +
n=1 n=1
!1/2 !1/2
k k
+ ∑ | yn |2 ∑ | xn + yn |2
n=1 n=1
 !1/2 !1/2 !1/2
k k k
(4.11) = ∑ | xn |2 + ∑ | yn |2  ∑ | xn + yn|2 .
n=1 n=1 n=1

Agora multiplica-se ambos os membros da desigualdade (4.11) por


!−1/2
k
∑ | xn + yn|2
n=1

para obter
C.4 O espaço l 2 725

! !−1/2 !1/2 !1/2


k k k k
∑ | xn + yn|2 ∑ | xn + yn |2 ≤ ∑ | xn |2 + ∑ | yn|2 ,
n=1 n=1 n=1 n=1

ou seja,
!1/2 !1/2 !1/2
k k k
2 2 2
∑ | xn + yn| ≤ ∑ | xn | + ∑ | yn | .
n=1 n=1 n=1
A última desigualdade obtida é a desigualdade de Minkowski no caso de somas finitas. Para
o caso infinito, basta observar que é possível tomar limite para k → ∞ para cada um dos termos,
pois {xn } e {yn} são, por hipóteses, sequências de l 2 (R), logo convergentes. Logo, existe limite
para k → ∞ para o fator do primeiro membro. Isto permite tomar limite para k → ∞ em ambos
os membros para obter
!1/2 !1/2 !1/2
∞ ∞ ∞
∑ | xn + yn|2 ≤ ∑ | xn |2 + ∑ | yn |2 ,
n=1 n=1 n=1

que é o resultado desejado.

Lema 4.2: Seja x = (x1 , x2, . . ., xn, . . .) uma sequência em l 2. Então, a função k · k2 : l 2 → R
definida por s

kxk2 = ∑ |xn |2
n=1
2
é uma norma em l .
D EMONSTRAÇÃO : Sejam x = (x1 , x2, . . ., xn, . . .) e y = (y1 , y2, . . ., yn , . . .) em l 2 e k ∈ R.

Axioma (a): Para toda sequência x ∈ l 2, tem-se que


s

kxk2 = ∑ |xn|2 ≥ 0,
n=1

pois o somatório de números não negativos resulta e um número não negativo. Além disso, a
raiz quadrada de números não negativos é também um número não negativo.

Axioma (b): Suponha que x = 0. Então, x = (0, 0, . . ., 0, . . .). Assim,


s
∞ √
kxk2 = ∑ |0|2 = 0 = 0.
n=1

Reciprocamente, suponha agora que kxk2 = 0. Então,


s
∞ ∞
0= ∑ |xn |2 ⇒ 0 = 02 = ∑ |xn |2 .
n=1 n=1
726 C Série de Fourier generalizada


Em virtude da potência par (os termos ficam positivos), o somatório ∑ |xn |2 só pode ser
n=1
igual a zero se cada um dos termos xn for igual a zero, ou seja, se xn = 0 para todo n ∈ N. Mas
isso significa que x = (0, 0, . . ., 0, . . .), isto é, que x = 0.

Axioma (c): para x ∈ l 2 e k ∈ R, tem-se



kk · xk22 = ∑ |k · xn|2 = |k · x1 |2 + |k · x2|2 + · · · + |k · · ·xn |2 + · · ·
n=1

= |k|2 · |x1|2 + |x2|2 + · · · + |xn|2 + · · ·

= |k|2 · ∑ |xn|2 .
n=1

Como o primeiro e último membro são não negativos, então é possível extrair a raiz quadrada
em ambos os membros, obtendo-se
s
∞ ∞
kk · xk22 = |k|2 · ∑ |xn|2 ⇒ kkxk2 = |k| · ∑ |xn |2,
n=1 n=1

ou seja, isso mostra que kk · xk2 = |k| · kxk2 .

Axioma (d): sejam x, y ∈ l 2. Então, pode-se aplicar a desigualdade de Minkowski, que diz
!1/2 !1/2 !1/2
∞ ∞ ∞
∑ | xn + yn|2 ≤ ∑ | xn |2 + ∑ | yn |2 ,
n=1 n=1 n=1

que por definição da função k · k2, implica em

kx + yk2 ≤ kxk2 + kyk2 .

Com isso finaliza-se a demonstração.

Sejam x = (x1 , x2 , . . ., xn, . . .) e y = (y1 , y1, . . ., yn, . . .) duas sequências em l 2. Então, a de-
sigualdade de Cauchy-Schwarz, em termos de norma, pode ser escrita na forma

|(x, y)| ≤ kxk2 kyk2

e desigualdade de Minkowski pode ser escrita na forma

kx + yk2 ≤ kxk2 + kyk2 .

Na desigualdade de Minkowski, o segundo membro acima representa a soma de duas séries


convergentes, de modo que é convergente. Portanto, o primeiro membro, por representar uma
série de quadrado de uma soma, e por ser menor ou igual, também é convergente. Isto mostra
que l 2 é um espaço vetorial.
C.4 O espaço l 2 727

Em geral, nem toda norma provém de um produto interno, mas a norma do l 2 sim, ela provém
de um produto interno. A maneira de verificar isso é usar a identidade do paralelogramo, que
foi vista na proposição 1.3 da seção C.1. Ela diz o seguinte: Seja V um espaço vetorial com
produto interno. Então, para quaisquer u, v ∈ V , tem-se

u + v 2 u − v 2 1 
+ = kuk2 + kvk2 .
2 2 2

O próximo resultado mostra que a norma do l 2 provém de um produto interno.

Lema 4.3: Sejam x = (x1 , x2, . . ., xn, . . .) e y = (y1 , y2 , . . ., yn, . . .) duas sequências em l 2. En-
tão a norma s

kxk2 = ∑ |xn |2
n=1
satisfaz a identidade do paralelogramo.
D EMONSTRAÇÃO : Observe, primeiro, que
 
x + y (x1 + y1 , x2 + y2, . . ., xn + yn, . . .) x1 + y1 , x2 + y2 , xn + yn ,
= = ··· ···
2 2 2 2 2
e  
x − y (x1 − y1 , x2 − y2 , . . ., xn − yn, . . .) x1 − y1 , x2 − y2 , xn − yn ,
= = ··· ··· ·
2 2 2 2 2
Desse modo, tem-se que

x + y 2 x − y 2 ∞ xn + yn 2 ∞ xn − yn 2
∑ 2 + ∑ 2
2 + 2 =
1 2 n=1 n=1
∞  2

|xn | |xn | · |yn| |yn |2
= ∑ + + 2 +
n=1 22 2 2
∞  
|xn|2 |xn | · |yn| |yn |2
+ ∑ − + 2
n=1 22 2 2

|xn |2 ∞
|yn|2
= ∑ 2· 22
+ ∑ 2 ·
22
n=1 n=1

|xn|2
∞ ∞
|yn |2
= ∑ +∑
n=1 2 n=1 2
!
∞ ∞
=2 ∑ |xn |2 + ∑ |yn|2
n=1 n=1

= 2 kxk22 + kyk22

mostrando, assim, que a norma do l 2 satisfaz a identidade do paralelogramo.


728 C Série de Fourier generalizada

Em um espaço normado X, diz-se que uma sequência é de Cauchy se para todo ε > 0 existe
um n0 ∈ N tal que kxn − xmk < ε para todos m, n > n0 .
Diz-se que um espaço métrico X é completo se toda sequência de Cauchy de pontos de X é
convergente em X.

Proposição 4.3: O espaço l 2 é completo.


D EMONSTRAÇÃO : Seja {xn} = (x1, x2, . . ., xn , . . .) uma sequência de Cauchy em l 2, onde
xn = (x1n , x2n, . . ., xnn, . . .). Então, para cada ε > 0, existe um n0 ∈ N tal que
s

(4.12) kxn − xm k2 = ∑ | xin − xim|2 < ε .
i=1

para todos m, n > n0.


Para cada i = 1, 2, . . ., segue-se daí que
i
(4.13) xn − xim < ε , para todos m, n > n0.

Agora escolhe-se e fixa-se um i. De (4.13), segue-se que xi1, x22 , . . ., xin, . . . é uma sequência
numérica de Cauchy. Como toda sequência de Cauchy de números reais é convergente, segue-se

daí que a sequência xi1 , x22 , . . ., xin, . . . é convergente, ou seja, que existe um xi tal que lim xin =
n→∞
i
x . E existe limite existe para cada i = 1, 2, . . . quando se usa o mesmo argumento.
Então,  
lim xn = lim x1n , lim x2n , . . ., lim xnn , . . .
n→∞ n→∞ n→∞ n→∞
1 2

= x , x , . . ., xn, . . . .
Agora defina x = (x1 , x2 , . . ., xn, . . .). A ideia agora é mostrar que x ∈ l 2 e que lim xn = x.
n→∞
Esses serão os próximos passos.
De (4.12), segue-se, para todos m, n > n0 , que
vu 2
u k k 2
t ∑ | xin − xim|2  < ε 2 ⇒ ∑ xin − xim < ε 2, para k = 1, 2, . . ..
i=1 i=1

Tomando limite para m → ∞, obtém-se, para n > n0


k
i
i 2

∑ nx − x ≤ ε 2, para k = 1, 2, . . ..
i=1

Agora pode-se tomar limite para k → ∞. Assim, para n > n0 , tem-se



i
i 2

∑ nx − x ≤ ε 2.
i=1

Segue-se da desigualdade acima que


C.5 O espaço L2 729

s

(4.14) kxn − xk2 = ∑ | xin − xi|2 ≤ ε .
i=1

A última desigualdade mostra que xn − x = xin − xi ∈ l 2. Por hipótese, xn ∈ l 2. É preciso
mostrar que x ∈ l 2. Faça agora x = xn + (x − xn ). Assim sendo, segue-se da desigualdade de
Minkowski (proposição 4.2 desta seção) que

kxk2 = kxn + (x − xn )k2 ≤ kxn k2 + kx − xnk2 .

As duas normas no último membro existem, pois xn e x − xn pertecem ao espaço l 2. Em


virtude da desigualdade, segue-se que x também pertence ao l 2.
Além disso, a desigualdade em (4.14), isto é, kxn − xk2 ≤ ε mostra que a sequência {xn }
converge para x, ou seja, que lim xn = x. E por fim, como a sequência {xn} é uma sequência
n→∞
de Cauchy arbitrária em l 2, segue-se, portanto, que l 2 é um espaço completo.

Um espaço de Hilbert é um espaço vetorial H munido de um produto interno (u, v) e que é


p
completo para a norma kuk = (u, u).
Viu-se que l 2 é um espaço vetorial normado. O lema 4.3 mostrou que a norma do l 2 provém de
um produto interno. A proposição 4.3 mostrou que o espaço l 2 é completo. Portanto, conclui-se
que l 2 é um espaço de Hilbert.

C.5 O espaço L2

D EFINIÇÃO : Uma função f : [a, b] → R é chamada de quadrado integrável se f e | f |2 forem


Riemann integráveis (R-integráveis).
N OTAÇÃO : Usar-se-á as seguintes notações para representar a classe de funções quadrado
integráveis em intervalos e todo R:

L2 ([a, b]) = { f : [a, b] → R | f e | f |2 são R-integráveis},

e
L2 (R) = { f : R → R | f e | f |2 são R-integráveis}.
Note que dizer que f ∈ L2 ([a, b]) é o mesmo que afirmar que | f |2 ∈ L1([a, b]). Um estudo mais
detalhado dos espaços L1 ([a, b]) e L1 (R) pode ser feito através da primeira seção do adendo B.

Proposição 5.1: Seja f : [a, b] → R uma função limitada tal que f ∈ L1 ([a, b]). Então f ∈
L2([a, b]).
730 C Série de Fourier generalizada

D EMONSTRAÇÃO : De fato, se f é limitada, então existe uma constante M > 0 tal que
| f (x)| ≤ M para todo x ∈ [a, b]. E como f é R-integrável, então
Z b Z b
2
| f (x)| dx = | f (x)| · | f (x)| dx
a a
Z b Z b
≤ M · M dx = M 2 dx
a a
2
= M ( b − a) < ∞,
onde M = sup {| f (x)| | x ∈ [a, b]}.

A hipótese de limitação da função f na proposição 5.1 é importante: caso f : [a, b] → R não


seja limitada, então pode-se ter f ∈ L1([a, b]), mas tal que f 6∈ L2 ([a, b]). O exemplo a seguir
exibe uma situação deste tipo.

Exemplo 5.1: Considere a função f : (0, 1) → R definida por


1
f (x) = √ ·
x

Afirma-se: f ∈ L1 (0, 1), mas f 6∈ L2(0, 1).


De fato, para ver que f ∈ L1 (0, 1), deve-se mostrar que f e | f | são R-integráveis. Como se
tem
1
f (x) = | f (x)| = √ ,
x
basta calcular uma das integrais. Tem-se:
Z 1 Z 1 Z 1 Z 1
dx 1dx
f (x) dx = √ = lim √ = lim x − /2 dx
0 0 x a→0+ a x a→0+ a
1 √

1/2 √ 
= 2 · lim x = 2 · lim 1− a
a→0+ a a→0+

= 2(1 − 0) = 2.

Isto mostra que f ∈ L1(0, 1). Para ver que f 6∈ L2(0, 1), basta tomar seu quadrado e integrar
de 0 até 1. Tem-se:
Z 1 Z 1 Z 1
2 dx dx
| f (x)| dx = = lim
0 0 x a→0+ a x
1

= lim ln x = lim (ln 1 − ln a)
a→0+ a→0+
a

= − lim (ln a) = +∞,


a→0+
C.5 O espaço L2 731

onde usou-se o fato de que ln 1 = 0 e que não existe limite para a → 0+ de ln a, pois este diverge
para −∞. Isto mostra que f 6∈ L2(0, 1).

Lema 5.1: Para todos a, b ≥ 0, vale a seguinte desigualdade:



(a + b)2 ≤ 2 a2 + b2 .

D EMONSTRAÇÃO : Considere a função f : [0, ∞) → R definida por f (x) = x2 . Esta função é


convexa, pois a sua derivada,
f 0 (x) = 2x ≥ 0,
é monótona não decrescente.
Assim, para quaisquer a, b ∈ [0, ∞), tem-se que
f (b) − f (a)
f (x) ≤ f (a) + (x − a),
b−a
ou seja, o gráfico de f está abaixo do segmento de reta ligando os pontos (a, f (a)) = (a, a2) e
(b, f (b)) = (b, b2), pertencentes ao gráfico de f .
Tomando x = (a+b)/2 em f (x) = x2 na última desigualdade acima, obtém-se
   
a+b f (b) − f (a) a + b
f ≤ f (a) + −a ,
2 b−a 2
ou seja,
 2  
a+b 2 b2 − a2 a+b
≤a + −a
2 b−a 2
 
2 b2 − a2 a + b − 2a
=a +
b−a 2
 
2 b2 − a2 b − a
=a +
b−a 2
b2 − a2
= a2 +
2
2a + b − a2
2 2
=
2
a + b2
2
= ·
2
Da desigualdade obtida,
 2
a+b a2 + b2 ,

2 2
segue-se que
(a + b)2 a2 + b2 
≤ ⇒ (a + b)2 ≤ 2 a2 + b2 ,
4 2
732 C Série de Fourier generalizada

como antes se afirmou.

Proposição 5.2: A classe L2 ([a, b]) é um espaço vetorial.


D EMONSTRAÇÃO : Sejam f , g ∈ L2([a, b]) quaisquer e α ∈ R. Deve-se mostrar que

α · f ∈ L2 ([a, b]) e f + g ∈ L2([a, b]).

Para mostrar a primeira parte, tome α ∈ R e f ∈ L2([a, b]). Por definição de L2 ([a, b]), as
funções f e | f |2 são R-integráveis. Como f é R-integrável, segue-se da definição da integral de
Riemann que α · f também é R-integrável para qualquer escalar α ∈ R. Ainda resta demonstrar
que |α · f |2 = α 2 · | f |2 é R-integrável. Da definição de multiplicação de função por escalar,
(α · f )(x) = α · f (x), segue-se que

|(α · f )(x)|2 = |α · f (x)|2 = α 2 | f (x)|2 .

Como f ∈ L2 ([a, b]), tem-se que | f |2 é R-integrável e, consequentemente, α 2 | f |2 também o


é. Portanto, segue-se da igualdade acima que |α · f |2 é R-integrável. Com isso, conclui-se que
α · f ∈ L2 ([a, b]).
Para demonstrar a segunda parte, considere duas funções f , g ∈ L2 ([a, b]). Usar-se-á o lema
5.1 tomando a = | f (x)| e b = | g(x)|. Por definição de soma de funções, tem-se

( f + g)(x) = f (x) + g(x).

Assim,

|( f + g)(x)|2 = | f (x) + g(x)|2 ≤ 2 | f (x)|2 + | g(x)|2 .
Por serem f , g ∈ L2([a, b]), segue-se que f , g, | f |2 e | g|2 são R-integráveis. Deste modo,
a expressão no segundo membro da última desigualdade acima é R-integrável (pois soma de
funções integráveis é integrável e multiplicação de função integrável por escalar também é inte-
grável). Portanto, o primeiro membro da última desigualdade, por ser menor ou igual, também
é uma função R-integrável, isto é, | f + g|2 é R-integrável, ou ainda, que ( f + g) ∈ L2([a, b]).

As desigualdades de Cauchy-Schwarz e de Minkowski para sequências, vistas na seção ante-


rior, também possuem versões para integrais. Elas são objetos das duas próximas proposições.

Proposição 5.3 (Cauchy-Schwarz): Sejam f , g ∈ L2([a, b]). Então, f · g é absolutamente


integrável e vale a desigualdade
Z b Z b
1/2 Z b 1/2
2 2
(5.1) | f (x) · g(x)| dx ≤ | f (x)| dx | g(x)| dx .
a a a
C.5 O espaço L2 733

D EMONSTRAÇÃO : Se f e g forem nulas, ou exceto em um número finito de pontos, então


a desigualdade de Cauchy-Schwarz é imediata. Agora considere duas funções f , g ∈ L2([a, b])
tais que

Z b Z b
(5.2) f (x) 2 dx = 1 e | g(x)|2 dx = 1.
a a

Observe que é sempre verdade que (a − b)2 ≥ 0 para todos a, b ∈ R. Segue-se daí que a2 −
2a · b + b2 ≥ 0, de modo que 2a · b ≤ a2 + b2. Portanto é verdadeira a desigualdade

a2 b2
a·b ≤ + ·
2 2

Fazendo a = f (x) e b = | g(x)| e substituindo na última desigualdade, obtém-se

f (x) 2 | g(x)|2
(5.3) f (x) · g(x) = f (x) · | g(x)| ≤ + ·
2 2
2
Como f , g ∈ L2 ([a, b]), então, por definição, tem-se que f (x) e | g(x)|2 são R-integráveis.
Como o segundo membro de (5.3) é soma de funções R-integráveis, segue-se, portanto, que

o primeiro membro, f (x) · g(x) é R-integrável. Logo, pode-se fazer a integração de a até b.
Assim,
Z b Z b 2 Z b

f (x) · g(x) dx ≤ f (x) | g(x)|2
dx + dx
a a 2 a 2
Z Z
1 b 2 1 b
=
f (x) dx + | g(x)|2 dx
2 a 2 a
1 1
(5.4) ≤ + = 1,
2 2
pois, por (5.2), cada integral tem valor igual a 1.
Agora, tome duas funções f , g ∈ L2 ([a, b]) e defina
f (x) g(x)
(5.5) f (x) = Z 1/2 e g(x) = Z 1/2 ·
b b
2
| f (x)| dx | g(x)|2 dx
a a

Por (5.4), tem-se que


Z b
f (x) · g(x) dx ≤ 1,
a
de modo que segue-se, usando-se (5.5), que

Z b
Z b

| f (x) · g(x)| f (x) g(x)

Z b 1/2 Z b 1/2 dx = · dx
1/2
Z b 1/2 Z b
a a
| f (x)|2 dx | g(x)|2 dx | f (x)|2 dx | g(x)|2 dx
a a a a
734 C Série de Fourier generalizada

Z b
= f (x) · g(x) dx ≤ 1,
a
ou seja,
Z b
1
Z b 1/2 Z b 1/2 | f (x) · g(x)| dx ≤ 1.
a
2 2
| f (x)| dx | g(x)| dx
a a
Multiplicando ambos os membros da desigualdade acima pelos fatores presentes no denomi-
nador no primeiro membro, obtém-se
Z b Z b 1/2 Z b 1/2
2 2
| f (x) · g(x)| dx ≤ | f (x)| dx | g(x)| dx ,
a a a

que é o resultado desejado.

Corolário 5.1: Seja f : [a, b] → R uma função de L2([a, b]). Então f ∈ L1 ([a, b]).
D EMONSTRAÇÃO : Sejam f , g ∈ L2([a, b]), então pode usar a desigualdade de Cauchy-
Schwarz, isto é,
Z b Z b 1/2 Z b 1/2
2 2
| f (x) · g(x)| dx ≤ | f (x)| dx | g(x)| dx .
a a a

Agora faça g(x) ≡ 1 (que obviamente é uma função de L2([a, b])) na desigualdade acima
para escrever
Z b Z b 1/2 Z b 1/2
2 2
| f (x)| dx ≤ | f (x)| dx |1| dx
a a a
Z b
1/2 Z b 1/2
2
= dx | f (x)| dx
a a
 1/2 Z b 1/2
b 2
= x | f (x)| dx
a a
Z b
1/2
1/2 2
= (b − a) | f (x)| dx .
a

Como f ∈ L2([a, b]), então, por definição, f é R-integrável e, além disso, a integral no se-
gundo membro acima existe (isto é, a integral é convergente). Logo existe a integral no primeiro
membro, portanto | f | também é R-integrável. Isto mostra que que f e | f | são simultaneamente
R-integráveis, que é o mesmo que afirmar que f ∈ L1([a, b]).
C.5 O espaço L2 735

No corolário 5.1, é importante observar a hipótese da limitação do domínio X das funções


de L2 (X). Em geral, em conjuntos ilimitados, pode acontecer de f ∈ L2 (X), mas tal que f 6∈
L1(X). Veja o próximo exemplo.

Exemplo 5.2: Seja f : R → R uma função definida por



 1
 , para x ≥ 1,
f (x) = x

 0, caso contrário.

Afirma-se: f ∈ L2(R), mas f 6∈ L1 (R). Para ver que f ∈ L2 (R), basta elevar f ao quadrado
e integrar. Tem-se:
Z ∞ Z 1 Z ∞
2 2
| f (x)| dx = | f (x)| dx + | f (x)|2 dx
−∞ −∞ 1
Z 1 Z ∞ Z a
1 1
= 0 dx + 2
dx = lim dx
−∞ 1 x a→∞ 1 x2
 
1 a 1
= − lim = lim 1 − 2
a→∞ x a→∞ a
1

= 1 − 0 = 1.
Isso mostra que f ∈ L2(R). Para ver que f 6∈ L1 (R), basta integrar a função ou seu módulo
(pois f é positiva). Tem-se:
Z ∞ Z 1 Z ∞
| f (x)| dx = | f (x)| dx + | f (x)| dx
−∞ −∞ 1
Z 1 Z ∞ Z a
1 1
= 0 dx + dx = lim dx
−∞ 1 x a→∞ 1 x
a

= lim ln x = lim ( ln 1 − ln a)
a→∞ 1 a→∞

(5.6) = 0 − lim ln a = +∞,


a→∞

onde usou-se fatos que ln 1 = 0 e que lim ln a = −∞. Isto mostra que a integral diverge e que,
a→∞
consequetemente, f 6∈ L1(R).

Proposição 5.4 (Minkowski): Sejam f , g ∈ L2 ([a, b]). Então,

Z b
1/2 Z b 1/2 Z b 1/2
2 2 2
(5.7) | f (x) + g(x)| dx ≤ | f (x)| dx + | g(x)| dx .
a a a
736 C Série de Fourier generalizada

D EMONSTRAÇÃO : Por hipótese, f , g ∈ L2([a, b]). Isto significa que f e g são R-integráveis e
que | f |2 e |g|2 também são R-integráveis. Pela proposição 5.2, tem-se que L2 ([a, b]) é um espaço
vetorial e que, portanto, ( f + g) ∈ L2 ([a, b]), isto é, que f + g e | f + g|2 são R-integráveis.
Por outro lado,
| f (x) + g(x)| 2 = [ f (x) + g(x)] 2
= [ f (x)]2 + 2 f (x) · g(x) + [g(x)]2
= | f (x)|2 + 2 f (x) · g(x) + | g(x)|2 .
Segue-se daí, bem como da desigualdade de Cauchy-Schwarz, que
Z b Z bh i
| f (x) + g(x)| 2 dx = | f (x)|2 + 2 f (x) · g(x) + | g(x)|2 dx
a a
Z b Z b Z b
2 2
= | f (x)| dx + | g(x)| dx + 2 f (x) · g(x) dx
a a a
Z b Z b Z b
≤ | f (x)| 2 dx + | g(x)|2 dx + 2 f (x) · g(x) dx ±
a a a
Z b
1/2 Z b 1/2
2 2
±2 | f (x)| dx | g(x)| dx
a a
(Z 1/2 Z b 1/2 )2
b
= | f (x)|2 dx + | g(x)|2 dx +
a a

Z b Z b
1/2 Z b 1/2
2 2
+2 f (x) · g(x) dx − 2 | f (x)| dx | g(x)| dx
a a a

≤ (por Cauchy-Schwarz)
(Z 1/2 Z b 1/2 )2
b
≤ | f (x)|2 dx + | g(x)|2 dx +
a a
Z b
Z b 
2 2
+2 | f (x)| dx | g(x)| dx
a a
Z b
1/2 Z b 1/2
2 2
−2 | f (x)| dx | g(x)| dx
a a
(Z 1/2 Z b 1/2 )2
b
= | f (x)|2 dx + | g(x)|2 dx ·
a a

Mostrou-se, portanto, que


Z b
(Z 1/2 Z b 1/2)2
b
| f (x) + g(x)| 2 dx ≤ | f (x)| 2 dx + | g(x)|2 dx ·
a a a

Elevando ambos os membros acima à potência 1/2, obtém-se


C.5 O espaço L2 737

Z b
1/2 Z b 1/2 Z b 1/2
2 2 2
| f (x) + g(x)| dx ≤ | f (x)| dx + | g(x)| dx ,
a a a

que é o resultado desejado.

Sejam f , g ∈ L2 ([a, b]). Então, decorre da desigualdade de Cauchy-Schwarz que


Z b
( f , g) = f (x) g(x) dx
a

define um produto interno em L2([a, b]). Deixa-se a verificação da validade das propriedades
de produto interno como exercício para o leitor.
Neste ponto, deseja-se definir a função k · k2 : L2 → R por
Z b
1/2
2
k f k2 = | f (x)| dx
a

e saber se ela define uma norma em L2 ([a, b]).


A resposta é, em geral, não. De fato, a função k f k2 satisfaz todas as propriedades para norma,
exceto uma: não é verdade que k f k2 = 0 implica em f ≡ 0, pois a integral usada aqui é de
Riemann (mas isso é verdade caso se adote a integral de Lebesgue). Por isso se diz que k f k2 é
uma semi-norma. Veja o próximo exemplo.

Exemplo 5.3: Sejam a > 0 e f : [−a, a] → R uma função definida por


(
1, se x = 0,
f (x) =
0, caso contrário.

Agora basta calcular a integral de f 2 . Tem-se:


Z a
k f k22 = | f (x)|2 dx
−a
Z 0 Z a
2
= | f (x)| dx + | f (x)|2 dx
−a 0
Z 0 Z a
= 02 dx + 02 dx = 0.
−a 0

O simples cálculo acima mostrou que k f k2 = 0, mas f 6≡ 0. De fato, f é diferente de zero


para x = 0, logo não é a função identicamente nula.

É fácil demonstrar as demais propriedades de norma. É simples verificar que k f k2 ≥ 0, pois


a definição de k f k2 tem como integrando uma função não negativa (o integrando é elevado a
uma potência par), resultando em uma integral igualmente não negativa. Também é imediato
738 C Série de Fourier generalizada

constatar que, se f ≡ 0, então k f k2 = 0: com um integrando identicamente nulo, implica-se em


uma integral igual a zero.
Para verificar o axioma (b), basta observar que, para todo α ∈ R e f ∈ L2 ([a, b]), se tem
Z b
1/2 Z b 1/2
2 2 2
kα f k2 = | α f (x)| dx = | α | | f (x)| dx
a a
 Z b 1/2  1/2
2 2  2 1/2 Z b 2
= | α| | f (x)| dx = |α | | f (x)| dx
a a

= | α | k f k2 .

Para verificar o axioma (c) usa-se a desigualdade de Minkowski. Sejam f , g ∈ L2([a, b]).
Tem-se: Z b 1/2
2
k f + gk2 = | f (x) + g(x)| dx
a

≤ (desigualdade de Minkowski)
Z b 1/2 Z b 1/2
2 2
≤ | f (x)| dx + | g(x)| dx
a a

= k f k2 + k gk2.
Apesar de k f k2 não ser uma norma de fato e, consequentemente, o L2 ([a, b]) não ser efe-
tivamente um espaço normado, ainda assim é possível falar de distância entre duas funções
f , g ∈ L2([a, b]), escrevendo k f − gk2.

D EFINIÇÃO : Seja X um conjunto não vazio. Uma função d : X × X → R é chamada de


métrica ou função distância sobre X se ela satisfaz, para cada x, y, z ∈ X, os seguintes axiomas:
(a) d(x, x) = 0 para todo x ∈ X;
(b) Se x 6= y, então d(x, y) > 0;
(c) d(x, y) = d(y, x) para todo x, y ∈ X;
(d) d(x, y) ≤ d(x, z) + d(z, y).
O número real d(x, y) é chamado de distância de x a y.

Observação 5.1: Sejam f , g ∈ L2([a, b]). Então d( f , g) = k f − gk2 define uma métrica neste
espaço.
Axioma (a): tem-se que
Z b 1/2
d( f , f ) = k f − f k2 = [ f (x) − f (x)] dx
a
Z b
1/2
= 0 dx = 0.
a
C.6 Generalizando a série de Fourier 739

para toda f ∈ L2 ([a, b]).

Axioma (b): Se f 6= g, então


Z b
1/2
2
d( f , g) = k f − gk2 = [ f (x) − g(x)] dx > 0,
a

pois a condição f 6= g garante que o integrando nunca será nulo, além de não ser negativo, em
virtude do expoente do mesmo ser par.

Axioma (c): Sejam f , g ∈ L2([a, b]). Então,


Z b
1/2
2
d( f , g) = k f − gk2 = [ f (x) − g(x)] dx
a
Z b
1/2
2
= [g(x) − f (x)] dx = kg − f k2
a

= d(g, f ),
onde justifica-se a troca de ordem da subtração entre as funções pelo fato de o integrando está
elevado ao quadrado.

Axioma (d): Sejam f , g, h funções quaisquer em L2([a, b]). Então,

d( f , g) = k f − gk2 = k( f − g) ± hk
= k( f − h) + (h − g)k2
≤ (desigualdade de Minkowski)
≤ k f − hk2 + kh − gk2
= d( f , h) + d(h, g).

C.6 Generalizando a série de Fourier

Seja {un (x)} um conjunto ortogonal. Define-se a série de Fourier generalizada para uma
função u(x) por

(u, un)
u(x) ∼ ∑ cn un (x), onde cn = ·
n=1 kun k22
Caso o conjunto {un(x)} seja ortonormal, então os coeficientes da série acima são dados por
cn = (u, un).
740 C Série de Fourier generalizada

Observe que a soma acima é infinita, logo é uma série, de modo que podem surgir complica-
ções devido a questões de convergência.

Proposição 6.1: Seja {un (x)} um conjunto ortogonal de funções contínuas no intervalo [a, b].

Se a série ∑ cn un(x) converge uniformemente para u(x) em [a, b], então
n=1

(u, un ) ,
cn =
kun k22
de modo que a série dada é série de Fourier generalizada para u(x) com relação a {un(x)}. Em
particular, se o conjunto {un (x)} é ortonormal, então cn = (u, un).
D EMONSTRAÇÃO : Como cada un (x) é contínua e a convergência da série é, por hipótese,
uniforme, então segue-se daí que u(x) é uma função contínua. Assim,
(u, un ) = (c1 u1 + · · · + cn un + · · · , um )
= c1 (u1 , um) + · · · + cn (un , um) + · · ·
= cm (um , um )
= cm kumk22 ,

uma vez que (ui , u j ) = 0 para i 6= j, (ui , ui ) = kui k22 e kui k2 = 1, pois o conjunto é ortogonal.
Assim,
(u, um)
(u, um ) = cm kum k22 ⇒ cm = ·
kum k22
Isto mostra que a expressão obtida para cn é verdadeira. Além disso, as operações com a
série são justificadas pela convergência uniforme. Caso seja {un (x)} um conjunto ortonormal,
decorre imediatamente que cn = (u, un), uma vez que o denominador vale um.

Corolário 6.1: Seja {un(x)} um conjunto ortogonal de funções contínuas no intervalo [a, b].
Suponha que as séries
∞ ∞
∑ cn un(x) e ∑ dn un (x)
n=1 n=1
convirjam uniformemente em [a, b] para uma mesma função u(x). Se
∞ ∞
∑ cn un(x) ≡ ∑ dn un (x)
n=1 n=1

para todo x ∈ [a, b], então cn = dn para todo n ∈ N.


D EMONSTRAÇÃO : Basta observar que pela proposição 1.4
C.6 Generalizando a série de Fourier 741

(u, un ) (u, un)


cn = e dn = ·
kun k22 kun k22
Como nas duas expressões acima os segundos membros são iguais, decorre daí que cn = dn
para todo n ∈ N. E caso u ≡ 0, então todos os coeficientes são iguais a zero.

Sejam u : [a, b] → R uma função seccionalmente diferenciável e {un(x)} um conjunto orto-


normal em [a, b]. Suponha que a soma finita
k
Sk (x) = ∑ an un (x)
n=1

seja uma aproximação para u(x), onde an , para n ∈ N, são constantes desconhecidas.
O erro médio quadrático dessa aproximação é definido por
Z b
1
Ek = [ u(x) − Sk (x)]2 dx
b−a a

e a raiz do erro médio quadrático é dado pela raiz quadrada da expressão anterior, isto é,
 Z b 1/2
1 2
E RMS = [ u(x) − Sk (x)] dx ,
b−a a
onde o subscrito RMS é uma sigla em inglês que significa “Root Mean Square”, ou a raiz da
média quadrática.
Observa-se que é comum, na literatura, dizer que Sk (x) com coeficientes cn é uma aproxi-
mação para u(x) no sentido dos mínimos quadrados ou aproximação dos mínimos quadrados
para u(x).
A ideia consiste em determinar as constantes an que farão com que a raiz do erro médio
quadrático tenha valor mínimo. Isso será feito na proposição 6.2 a seguir; antes, alguns lemas.

Lema 6.1: Sejam {un(x)} um conjunto ortonormal em funções de L2 ([a, b]), u : [a, b] → R
uma função de L2([a, b]) e
k
Sk (x) = ∑ an un (x)
n=1
o erro médio quadrático.
Então,
Z b Z b k k
[u(x) − Sk (x)]2 dx = [u(x)]2 dx − 2 ∑ an cn + ∑ a2n ,
a a n=1 n=1
onde Z b
cn = u(x) · un (x) dx
a
são os coeficientes generalizados de Fourier correspondentes a u(x).
742 C Série de Fourier generalizada

D EMONSTRAÇÃO : Tem-se:
k
u(x) − Sk (x) = u(x) − ∑ an un(x).
n=1

Tomando o quadrado, obtém-se


" #2
k
[u(x) − Sk (x)]2 = u(x) − ∑ an un (x)
n=1
" #2
k k
= [u(x)]2 − 2 ∑ an u(x) · un (x) + ∑ an un (x)
n=1 n=1
" #" #
k k k
= [u(x)]2 − 2 ∑ an u(x) · un (x) + ∑ an un (x) ∑ an un (x)
n=1 n=1 n=1
k
= [u(x)]2 − 2 ∑ an u(x) · un (x)+
n=1

+ [a1 u1(x) + · · · + ak uk (x)] · [a1 u1 (x) + · · · + ak uk (x)]


k
= [u(x)]2 − 2 ∑ an u(x) · un (x)+
n=1
 
+ a21 u21(x) + a1 a2 u1 (x) · u2 (x) + · · · + a1 ak u1 (x) · uk (x) + · · ·
 
· · · + ak a1 uk (x) · u1 (x) + ak a2 uk (x) · u2 (x) + · · · + a2k u2k (x)
k k k
2
= [u(x)] − 2 ∑ an u(x) · un (x) + ∑ ∑ ai a j ui(x) · u j (x).
n=1 i=1 j=1

A etapa final consiste em integrar ambos os membros acima de a até b e usar


Z b Z b
(
0, se i 6= j,
cn = u(x) · un (x) dx e ui (x) · u j (x) dx =
a a 1, se i = j.

Portanto,
Z b Z b
" #
k k k
[u(x) − Sk (x)]2 dx = [u(x)]2 − 2 ∑ an u(x) · un (x) + ∑ ∑ ai a j ui (x) · u j (x) dx
a a n=1 i=1 j=1
Z b k Z b
2
= [u(x)] dx − 2 ∑ an u(x) · un (x) dx+
a n=1 a

k k Z b
+∑ ∑ ai a j ui (x) · u j (x) dx
i=1 j=1 a

Z b k k
= [u(x)]2 dx − 2 ∑ an cn + ∑ a2n,
a n=1 n=1
C.6 Generalizando a série de Fourier 743

que é o resultado desejado.

Lema 6.2: Sejam {un(x)} um conjunto ortonormal em funções de L2 ([a, b]), u : [a, b] → R
uma função de L2([a, b]) e
k
Sk (x) = ∑ an un (x).
n=1
Então,
Z b Z b k k
[u(x) − Sk (x)]2 dx = [u(x)]2 dx + ∑ (an − cn)2 − ∑ c2n ,
a a n=1 n=1
onde Z b
cn = u(x) · un (x) dx.
a
D EMONSTRAÇÃO : Pelo lema 6.1, segue-se que
Z b Z b k k
2
[u(x) − Sk (x)] dx = [u(x)]2 dx − 2 ∑ an cn + ∑ a2n
a a n=1 n=1
Z b k 
= [u(x)]2 dx + ∑ a2n − 2an cn
a n=1
Z b k   
= [u(x)]2 dx + ∑ a2n − 2an cn + c2n − c2n
a n=1
Z b k  
= [u(x)]2 dx + ∑ (an − cn )]2 − c2n
a n=1
Z b k k
= [u(x)]2 dx + ∑ (an − cn )2 − ∑ c2n .
a n=1 n=1

Proposição 6.2: Sejam {un (x)} um conjunto ortonormal em L2 ([a, b]), u ∈ L2 ([a, b]) e
k
Sk (x) = ∑ an un (x).
n=1

Então, a raiz do erro médio quadrático é mínima quando os coeficientes an da soma Sk (x)
forem iguais aos coeficientes generalizados de Fourier, isto é, quando an = cn .
D EMONSTRAÇÃO : Pelo lema 6.2, tem-se
744 C Série de Fourier generalizada

Z b Z b k k
[u(x) − Sk (x)]2 dx = [u(x)]2 dx + ∑ (an − cn)2 − ∑ c2n .
a a n=1 n=1

Observe que a raiz erro médio quadrático terá um mínimo quando a expressão acima tiver
um mínimo. Entretanto, é claro que o membro direito tem um mínimo quando
k
∑ (an − cn )2 = 0,
n=1

isto é, quando an = cn para todo n = 1, . . ., k.


Logo,
Z b Z b k
[u(x) − Sk (x)]2 dx = [u(x)]2 dx − ∑ c2n .
a a n=1
Isso mostra que o erro médio quadrático é mínimo. Mas, em particular, tem-se que a raiz do
erro médio quadrático também será mínima, uma vez que
 Z b 1/2
1 2
E RMS = [u(x) − Sk (x)] dx
b−a a
" Z b
#1/2
k
1
= [u(x)]2 dx − ∑ c2n
b−a a n=1
"Z #1/2
b k
1
=√ [u(x)]2 − ∑ c2n ,
b−a a n=1

sendo o último membro o valor mínimo da raiz do erro médio quadrático.

Corolário 6.2 (desigualdade de Bessel): Considere {un(x)} um conjunto ortonormal em


[a, b] e u ∈ L2([a, b]). Sejam cn , com n ∈ N, os coeficientes generalizados de Fourier para a

função u(x). Então, a série ∑ c2n converge e vale a seguinte desigualdade:
n=1
∞ Z b
∑ c2n ≤ a
|u(x)|2 dx.
n=1

D EMONSTRAÇÃO : Com as hipóteses dada é possível aplicar a proposição 6.2. Tem-se que
"Z #1/2
b k
1
E RMS = √ [u(x)]2 − ∑ c2n .
b−a a n=1

Como a raiz do erro médio quadrático deve ser não negativo, segue-se que
C.6 Generalizando a série de Fourier 745

Z b k
0≤ [u(x)]2 − ∑ c2n,
a n=1

que resulta em
k Z b
(6.1) ∑ c2n ≤ a
|u(x)|2 dx.
n=1

Observe que o membro direito acima não depende de k. Logo, é possível tomar limite para
k → ∞, de modo que
∞ Z b
(6.2) ∑ c2n ≤ |u(x)|2 dx.
n=1 a

Como consequência, vê-se que, se o membro direito de (6.2) existe, então a série no membro
esquerdo deve convergir. No caso especial onde a igualdade se verifica em (6.2) é obtida a
identidade de Parseval.

Corolário 6.3 (Riemann-Lebesgue): Sejam {un (x)} é um conjunto ortonormal de funções



em [a, b] e u ∈ L2 ([a, b]). Suponha que a série de Fourier generalizada, ∑ cn un (x) converge
n=1
para a função u(x). Então,
Z b
lim u(x) · un (x) dx = 0.
n→∞ a

D EMONSTRAÇÃO : Como o conjunto {un (x)} é ortonormal e a série de Fourier generalizada,



∑ cn un (x), converge para a função u(x) em [a, b], então a proposição 6.1 mostra que os coefi-
n=1
cientes de Fourier são dados por cn = (u, un), isto é,
Z b
cn = u(x) · un (x) dx.
a

A desigualdade de Bessel (corolário 6.2) diz que


∞ Z b
∑ c2n ≤ |u(x)|2 dx.
n=1 a

Como a função u(x) pertence a L1([a, b]), então a integral no segundo membro existe, de

modo que a desigualdade de Bessel mostra que a série numérica ∑ c2n é convergente. Logo,
n=1
o n-ésimo termo c2n deve tender para zero quando n → ∞.. Mas, se lim c2n = 0, então tem-se
n→∞
também que lim cn = 0. Portanto,
n→∞
746 C Série de Fourier generalizada

Z b
lim u(x) · un (x) dx = lim cn = 0.
n→∞ a n→∞

Uma importante questão reside em saber se é possível afirmar que Ek converge para zero
quando k → ∞. Isso é equivalente a questionar se a função u(x) pode ser aproximada, no sentido
do erro médio quadrático, tanto quanto se queira, por uma combinação linear finita de funções
un (x). Como visto no teorema 3.1 da seção C.3, se ocorrer essa situação, então o conjunto
{un (x)} deve ser completo.

D EFINIÇÃO : Um conjunto ortonormal {un(x)} de funções em L2([a, b]) chama-se completo


se, para toda função u(x) pertencente ao espaço L2([a, b]), o erro médio quadrático

lim Ek = lim ku(x) − Sk (x)k22 = 0.


k→∞ k→∞

Proposição 6.3 (Parseval): Seja {un (x)} um conjunto completo em L2 ([a, b]) e u ∈ L2 ([a, b]).
Então,

ku(x)k22 = ∑ c2n , onde cn = (u, un ).
n=1
k
D EMONSTRAÇÃO : Foi demonstrado na proposição 6.2 que, para Sk (x) = ∑ an un (x), vale
n=1
Z b Z b k
2
|u(x) − Sk (x)| dx = |u(x)|2 dx − ∑ c2n .
a a n=1

Por hipótese, o conjunto {un(x)} é completo, ou seja, tem-se que

lim Ek = lim ku(x) − Sk (x)k22 = 0.


k→∞ k→∞

Desse modo, obtém-se


0 = lim Ek = lim ku(x) − Sk (x)k22
k→∞ k→∞
Z b
= lim |u(x) − Sk (x)|2 dx
k→∞ a
"Z #
b k
= lim |u(x)|2 dx − ∑ c2n
k→∞ a n=1
Z b ∞
= |u(x)|2 dx − ∑ c2n .
a n=1
Portanto, segue-se daí que
Z b ∞ Z b ∞ ∞
2
|u(x)| dx − ∑ c2n =0 ⇒ |u(x)|2 dx = ∑ c2n ⇒ kuk22 = ∑ c2n ,
a n=1 a n=1 n=1
C.6 Generalizando a série de Fourier 747

que é o resultado desejado.

Proposição 6.4: A validade da identidade de Parseval é equivalente à completude.


D EMONSTRAÇÃO : Seja {un(x)} um conjunto ortonormal em L2([a, b]). Suponha que a iden-
tidade de Parseval valha para toda função u(x) de L2([a, b]), ou seja, que

kuk22 = ∑ c2n , onde cn = (u, un ).
n=1

Então,

kuk22 − ∑ c2n = 0,
n=1
de modo que
!
k
lim Ek = lim kuk22 − ∑ c2n
k→∞ k→∞ n=1

(6.3) = kuk22 − ∑ c2n = 0,
n=1

mostrando, assim, que o conjunto {un (x)} é completo.


Reciprocamente, suponha que {un (x)} seja um conjunto completo. Seja u : [a, b] → R uma
função de L2([a, b]). Por definição, um conjunto é completo se o erro médio quadrático satisfaz
lim Ek = 0. Pela proposição 6.2, o valor mínimo do erro médio quadrático é dado por
n→∞

k
Ek = k u(x) − Sk (x)k22 = kuk22 − ∑ c2n .
n=1

Portanto, !
k ∞
0 = lim Ek = lim kuk22 − ∑ c2n = kuk22 − ∑ c2n ,
k→∞ k→∞ n=1 n=1
ou seja,
∞ ∞
kuk22 − ∑ c2n = 0 ⇒ kuk22 = ∑ c2n,
n=1 n=1
que é a identidade de Parseval.

Alguns autores definem um conjunto completo da seguinte maneira: Um conjunto {un (x)}
em L2([a, b]) é completo se, para uma função u ∈ L2([a, b]) ser tal que cn = (u, un ), para todo
n ∈ N, implicar em u = 0. Na verdade, essa definição é equivalente a anterior. Isso é o que
mostra a próxima proposição.
748 C Série de Fourier generalizada

Proposição 6.5: Sejam {un (x)} um conjunto ortonormal de funções de L2([a, b]). São equi-
valentes:

(a) O conjunto {un(x)} é completo;


(b) Se u ∈ L2([a, b]), então vale a identidade de Parseval

kuk22 = ∑ c2n ;
n=1

(c) Se u ∈ L2([a, b]) é tal que


Z b
cn = (u, un) = u(x) · un (x) dx = 0, para todo n ∈ N,
a

então u = 0.
D EMONSTRAÇÃO : A demonstração será feita através das implicações: (a) ⇒ (b) ⇒ (c)
⇒ (a).

(a) ⇒ (b): Suponha que {un(x)} seja um conjunto completo. Seja u : [a, b] → R uma função
de L2([a, b]). Por definição, um conjunto é completo se lim Ek = 0. Pela proposição 6.2, o
n→∞
valor mínimo do erro médio quadrático é dado por
k
Ek = k u(x) − Sk (x)k22 = kuk22 − ∑ c2n .
n=1

Portanto, !
k ∞
0 = lim Ek = lim kuk22 − ∑ c2n = kuk22 − ∑ c2n ,
k→∞ k→∞ n=1 n=1
ou seja,
∞ ∞
kuk22 − ∑ c2n = 0 ⇒ kuk22 = ∑ c2n,
n=1 n=1
que é a identidade de Parseval.

(b) ⇒ (c): Suponha que valha a identidade de Parseval,



kuk22 = ∑ c2n .
n=1

A hipótese em (c) diz que u ∈ L2 ([a, b]) uma função tal que cn = (u, un) = 0 para todo n ∈ N.
Agora deve-se mostrar que u = 0. Substituindo cn = 0 na identidade de Parseval, conclui-se que
kuk22 = 0. Mas isto implica que u = 0.
De fato, suponha que não se tenha u = 0. Então, se x0 for um ponto de continuidade de u tal
que u(x0 ) 6= 0, então existirá um intervalo I = [x0 − δ , x0 + δ ] onde u(x) 6= 0. Logo,
Z Z b
2
0< |u(x)| dx ≤ |u(x)|2 dx = 0,
I a
C.7 Convergência em média quadrática 749

que é um absurdo.

(c) ⇒ (a): Suponha que u ∈ L2([a, b]) satisfaça cn = (u, un ) = 0, para todo n ∈ N e que isto
implique em u = 0. Pela proposição 6.2, tem-se que
k
Ek = kuk22 − ∑ c2n .
n=1

Portanto, !
k ∞
lim Ek = lim kuk22 − ∑ = kuk22 − ∑ c2n .
k→∞ k→∞ n=1 n=1

Mas por hipótese, a função u ∈ L2 ([a, b]) tal que cn = 0, para todo n ∈ N, implica em u = 0.
Substituindo na expressão acima, obtém-se que

lim Ek = kuk22 − ∑ c2n = k0k22 + ∑ 02 = 0.
k→∞ n=1 n→∞

Isso mostra que o conjunto {un (x)} é completo.

C.7 Convergência em média quadrática

D EFINIÇÃO : Diz-se que uma sequência de funções {un(x)} pertencentes a L2 ([a, b]) con-
verge em média quadrática para uma função u ∈ L2([a, b]) se
Z b
lim | u(x) − un (x)|2 dx = 0.
n→∞ a

Como visto anteriormente, a expressão


Z b
| u(x) − un (x)|2 dx
a

é chamada de erro médio quadrático na aproximação de u(x) por un(x).

Teorema 7.1: Seja u : [a, b] → R uma função pertencente a L2([a, b]). Então, existe uma
sequência de funções contínuas ϕn : [a, b] → R, com ϕn (a) = 0 = ϕn (b), tal que
Z b
lim | u(x) − ϕn (x)|2 dx = 0.
n→∞ a

D EMONSTRAÇÃO : A demonstração será dividida em dois casos: quando u é limitada e


quando u é ilimitada.
750 C Série de Fourier generalizada

C ASO 1: Suponha que u seja limitada. Como u ∈ L2 ([a, b]), segue-se do corolário 5.1 da
seção C.5 que u ∈ L1([a, b]). Logo é possível aplicar o teorema 1.1 do adendo B, que diz o
seguinte: Seja u : [a, b] → R uma função de L1([a, b]). Então, dado ε > 0, existe uma função
contínua ϕ : [a, b] → R tal que
Z b
|u(x) − ϕ (x)| dx < ε e ϕ (a) = 0 = ϕ (b).
a

Portanto, dado ε > 0, existe uma função contínua ϕ : [a, b] → R, com ϕ (a) = 0 = ϕ (b), tal
que
Z b
| u(x) − ϕ (x)| dx < ε .
a
Tem-se que |ϕ (x)| ≤ M, onde M > 0 é uma constante tal que | u(x)| ≤ M, para todo x ∈ [a, b].
Para se convencer disso, o leitor poderá voltar à demonstração do teorema 1.1 (adendo B).
Lá será visto que a função ϕ é uma poligonal em forma de trapézios formados a partir das
funções características dos subintervalos da partição. As funções características são definidas
por χ (x) = mi , para x ∈ [xi−1 , xi ], onde mi = inf{u(x) | xi−1 ≤ x ≤ xi }. Ora, como ϕ (x) está
entre o menor e o maior dos números mi , para algum i = 0, 1, . . ., k e mi ≤ M (a limitação de u),
então |ϕ (x)| ≤ M.
Com estas majorações de ϕ e f , obtém-se
Z b Z b
2
| u(x) − ϕ (x)| dx = | u(x) − ϕ (x)| · | u(x) − ϕ (x)| dx
a a
Z b
= | u(x) + [−ϕ (x)] | · | u(x) − ϕ (x)| dx
a
Z b
≤ [ | u(x)| + | ϕ (x)| ] · | u(x) − ϕ (x)| dx
a
Z b
≤ [ M + M ] · | u(x) − ϕ (x)| dx
a
Z b
= 2M | u(x) − ϕ (x)| dx < 2M ε .
a

Segue-se, daí, a conclusão do caso em que u é limitada.

C ASO 2: Suponha que u seja ilimitada. A ideia da demonstração aparece completamente no


caso particular em que u se torna ilimitada apenas nas vizinhanças dos pontos extremos a e b
do intervalo [a, b]. O caso geral seria demonstrado de modo análogo.
Dado ε > 0, escolha δ > 0 tal que
Z a+δ Z b
2 ε ε
| u(x)| dx < e | u(x)|2 dx < ·
a 3 b−δ 3
Agora usa-se o CASO 1, já demonstrado, para determinar uma função ϕ : [a + δ , b − δ ] → R
contínua, com ϕ (a + δ ) = 0 = ϕ (b − δ ) tal que
C.7 Convergência em média quadrática 751

Z b−δ
ε
| u(x) − ϕ (x)| 2 dx < ·
a+δ 3
Portanto, definindo ϕ : [a, b] → R por


 0,
 se a ≤ x ≤ a + δ ,
ϕ (x) = ϕ (x), se a + δ ≤ x ≤ b − δ ,



0, se b − δ ≤ x ≤ b,

obtém-se
Z b Z a+δ Z b−δ
2 2
| u(x) − ϕ (x)| dx = | u(x) − ϕ (x)| dx + | u(x) − ϕ (x)|2 dx +
a a a+δ
Z b
+ | u(x) − ϕ (x)|2 dx
b−δ
ε ε ε
< + + = ε,
3 3 3
concluindo a demonstração do teorema.

Observação 7.1: Seja u : R → R uma função periódica de período T = 2L e pertencente a


L2([−L, L]).Então, existe uma sequência {ϕn } de funções contínuas ϕn : R → R periódicas de
período T = 2L (de fato, pode-se tomar ϕn (−L) = 0 = ϕn (L), para todo n) e tal que
Z L
lim | u(x) − ϕn (x)|2 dx = 0.
n→∞ −L

Observação 7.2: Se for usada a integral de Lebesgue, segue-se da desigualdade de Cauchy-


Schwarz, de maneira similar ao que foi feito no corolário 5.1, que toda função quadrado inte-
grável (no sentido de Lebesgue) é do espaço L1([a, b]). Denotando por L2 ([a, b]) o espaço das
funções quadrado integráveis no sentido de Lebesgue, tem-se que L2([a, b]) ⊂ L1 ([a, b]).
Ressalta-se, entretanto, que a limitação do domínio é fundamental para esta inclusão. Caso o
domínio X seja ilimitado, então, em geral, não é verdadeira a inclusão L2 (X) ⊂ L1 (X) (mesmo
para integrais de Lebesgue). O leitor poderá verificar o exemplo 5.2 novamente; ele é igualmente
adequado como contra-exemplo para integrais no sentido de Lebesgue.

Como visto anteriormente, se o conjunto {un(x)} é completo (veja a seção C.6), então o erro
médio quadrático Ek converge para zero quando k → ∞, mas isso não implica na convergência da
752 C Série de Fourier generalizada


série de Fourier ∑ cn un (x) para u(x). Porém a sequência das somas parciais se aproximam de
n=1
u(x) no sentido do erro médio quadrático. Essa situação é descrita dizendo que a série converge
em média para u(x) e denota-se por
" #
k
l.i.m.
k→∞
∑ cn un (x) = u(x),
n=1

onde a expressão “l.i.m.”, em inglês, significa “limit in (the) mean” (limite em média).
Sejam X ⊂ R e função u : X → R uma função de L2(X). Define-se a norma da média
quadrática por
Z b 1/2
2
kuk2 = [u(x)] dx .
a

Em geral, se o conjunto de funções {un (x)} e a função u(x) pertencem ao espaço L2([a, b]),
então escreve-se
l.i.m. un (x) = u(x)
n→∞
se
lim kun(x) − u(x)k2 = 0,
n→∞
ou seja, se
Z b
lim [un(x) − u(x)]2 dx = 0.
n→∞ a
Considere agora X ⊂ R um conjunto e u : X → R. Define-se a norma uniforme por

kukX = sup | f (x)|, para todo x ∈ X.

Se X for um conjunto fechado e limitado e f for uma função contínua, então kukX =
max |u(x)| para todo x ∈ X. Além disso, se ku − vkX < ε , então |u(x) − v(x)| < ε para todo
x ∈ X, de modo que u se aproxima de v uniformemente em X.

Uma sequência de funções {un} é converge uniformemente para uma função u em um con-
junto X se, se somente se, lim kun − ukX = 0.
n→∞

A definição anterior é equivalente a: Uma sequência {un} converge uniformemente para u em


X se, e somente se, dado ε > 0, existe um n0 ∈ N tal que |un(x) − u(x)| < ε , para todo n ≥ n0 e
todo x ∈ X.

Observação 7.3: Em geral, as norma da convergência em média, k · k2 , e da convergência


uniforme, k; · kX , são diferentes. Por exemplo, considere as funções u, v : [0, 1] → R definidas
por u(x) = x2 e v(x) = x3 . Lembrando que o intervalo é fechado e limitado e que as funções u e
v são contínuas, então ku − vk[0,1] = max |u(x) − v(x)| para todo x ∈ [0, 1].
Agora faça w(x) = u(x) − v(x) = x2 − x3 . Para determinar a norma uniforme de w, deve-
se procurar o valor de x ∈ [0, 1] que maximiza w. Derivando essa função e igualando a zero,
obtém-se
C.7 Convergência em média quadrática 753

w0 (x) = 2x − 3x2 ⇒ 2x − 3x2 = 0 ⇒ x(2 − 3x) = 0,

de modo que x = 0 e x = 2/3 são pontos críticos. Tem-se que w(0) = 0 (no extremo x = 1 tem-se
que w(1) = 0). Além disso,
 2  3
2 2 4 8 4
w(2/3) = − = − = ,
3 3 9 27 27
que mostra que w(2/3) é o valor máximo de w(x) em [0, 1], que resulta em
4
ku − vkX = max |u(x) − v(x)| = max |w(x)| = |w(2/3)| = ·
27
Por outro lado, para a média quadrática, tem-se
Z 1 1/2
2
ku − vk2 = [u(x) − v(x)] dx
0
Z 1
1/2
2

3 2
= x −x dx
0
Z 1   1/2
4 5 6
= x − 2x + x dx
0
"  #1/2
x5 x6 x7 1
= − +
5 3 7 0
 1  1
1 1 1 /2 21 − 35 + 15 /2
= − + =
5 3 7 105
 1/2
1 1
= =√ ·
105 105
Isso mostra que a norma uniforme e a norma da média quadrática são diferentes. Apesar
disso, existe uma desigualdade entre essas duas normas que é sempre verdadeira, como mostra
o próximo resultado.

Proposição 7.1: Sejam u, v : [a, b] → R duas funções pertencentes ao espaço L2([a, b]). En-
tão,

ku − vk2 ≤ b − a · ku − vk[a,b].
D EMONSTRAÇÃO : Com as hipóteses dadas, tem-se:
Z b
ku − vk22 = |u(x) − v(x)|2 dx
a
Z b
≤ [sup |u(x) − v(x)|]2 dx
a
754 C Série de Fourier generalizada

Z b
2
= [sup |u(x) − v(x)] dx
a
b

= [sup |u(x) − v(x)|]2 · x
a

= (b − a) · [sup |u(x) − v(x)]2


= (b − a) · ku − vk2[a,b].
Elevando ambos os membros da desigualdade obtida a potência 1/2, obtém-se
1/2 h i1/2
ku − vk22 ≤ (b − a) · ku − vk2[a,b] ,
1/2  1/2
ku − vk22 ≤ (b − a) /2 · ku − vk2[a,b]
1
,

donde segue-se que



ku − vk2 ≤ b − a · ku − vk[a,b],
que demonstra o resultado afirmado.

Corolário 7.1: Sejam un : [a, b] → R e u ∈ L2 ([a, b]). Se a sequência de funções un(x) con-
verge uniformemente para u(x), então un(x) também converge em média para u(x).
D EMONSTRAÇÃO : Por hipótese, tem-se que lim un(x) = u(x) uniformemente. Isso é equiva-
n→∞
lente a lim kun (x) − u(x)k[a,b] = 0. Pela proposição 7.1, obtém que
n→∞

lim kun − uk2 ≤ b − a · lim kun(x) − u(x)k[a,b] = 0,
n→∞ n→∞

que mostra que lim kun − uk2 = 0, ou seja, que a sequência {un(x)} converge em média
n→∞
quadrática para u(x).

Em geral, a recíproca da proposição 7.1 é falsa. O exemplo 7.1 mostra que, se un (x) converge
em média quadrática para u(x), então un(x) pode não convergir uniformemente para u(x).
n √ 2
o
Exemplo 7.1: A sequência n x · e −n x converge em média para 0 em [0, 1], mas não con-
verge uniformemente.
√ 2
S OLUÇÃO : Faça un(x) = n x · e −n x e u(x) = 0 para x ∈ [0, 1]. Assim,
Z 1
kun(x) − u(x)k22 = kun (x)k22 = [un(x)]2 dx
0
Z 1 2
√ −n2x
= n x·e dx
0
C.7 Convergência em média quadrática 755

Z 1
2
= n2 · x · e −2n x dx
0
Z n2
1
= 2 v · e −2v dv
n 0
2 Z 2
!
1 v · e −2v n 1 n −2v
= 2 − + e dv
n 2 0 2 0
" 2
! n2 #
1 n2 · e −2n 0·e0 1 −2v
= − + − ·e
n2 2 2 4 0
" #
1  −2n2 
2
1 n2 · e −2n 0
= − − e −e
n2 2 4
2
!
1 n2 · e −2n 1 1 −2n2
= − + − ·e
n2 2 4 4
1  2 −2n2 −2n2

= 1 − 2n · e − e
4n2
2 2
1 e −2n e −2n
= 2− −
4n 2 4n2
1 1 1
= 2 − 2n2 − 2 2n2 ,
4n 2e 4n · e
onde foi feita, primeiro, uma mudança de variáveis v = n2 x, com dv/n2 = dx, com os novos
limites de integração indo de v = 0 até v = 2n2. Em seguida, usou-se integração por parte
fazendo por w = v e dz = e −2v dv (dw = dv e z = −e −2v/2).
Segue-se daí que
 
2 1 1 1
lim kun (x) − u(x)k2 = lim − 2 −
n→∞ n→∞ 4n2 2 e 2n 4n2 · e 2n
2

1 1 1
= lim 2
− lim 2 − lim
n→∞ 4n n→∞ 2 e 2n n→∞ 4n · e 2n2
2

= 0 − 0 − 0 = 0,
donde segue-se que lim kun(x) − u(x)k2 = 0, mostrando, assim, que un(x) converge em média
n→∞
quadrática para u(x).
Por outro lado, {un (x)} não converge uniformemente para u(x). De fato, observe primeiro
√ 2
que, de un (x) = n x · e −n x , usando a regra do produto, obtém-se
n 2 √ 2
u0n(x) = √ · e −n x − n3 x · e −n x,
2 x
cujos pontos críticos são obtidos fazendo
n 2 √ 2 n 2 √ 2
√ · e −n x − n3 x · e −n x = 0 ⇒ √ · e −n x = n3 x · e −n x ,
2 x 2 x
756 C Série de Fourier generalizada

1 √ 1 1 ,
√ = n2 x ⇒ = 2n2 ⇒ x=
2 x x 2n2
que são os pontos críticos para as funções un (x).
Lembrando que as funções são contínuas e o intervalo é fechado e limitado, obtém-se
kun (x) − u(x)k[0,1] = kun (x) − 0k[0,1]
= kun (x)k[0,1] = max |un (x)|
 
1
= un
2n2
r
1 2 1

−n · 2
= n · e 2n
2n2
1
= √ · e /2
−1

2
1 1
= √ ·√
2 e
1
=√ ,
2e
para todo n ∈ N. Os extremos do intervalo, x = 0 e x = 1, também devem ser testados. Para
2
x = 0, tem-se que un(0) = 0 e un (1) = n · e −n . Como isso, kun(0) − u(0)k[0,1] = 0 e kun(1) −
2
u(1)k[0,1] = n · e −n .
Portanto, em quaisquer casos tem-se que o limite uniforme

lim kun(x) − u(x)k[0,1] 6= 0,


n→∞

ou seja, un(x) não tende para 0, quando n → ∞, para todo x ∈ [0, 1].

O próximo exemplo mostra que uma sequência pode convergir pontualmente em um intervalo
[a, b], mas sem convergir em média quadrática e nem uniformemente.
n√ √ √ o
−nx2/2
Exemplo 7.2: Considere a seguinte sequência: 2· n· x·e para x ∈ [0, 1]. Ela
converge pontualmente para a função u ≡ 0, mas não converge em média quadrática e nem
uniformemente.
√ √ √ 2
S OLUÇÃO : Faça un(x) = 2 · n · x · e −nx /2 e u(x) = 0 para x ∈ [0, 1].
Para ver que ela converge pontualmente, basta tomar limite para n → ∞, fixando-se x. Tem-se:
h√ √ √ i
−nx2
lim un(x) = lim 2 · n · x · e /2
n→∞ n→∞

√ √ n
= 2 · x · lim nx2
n→∞ e /2
C.7 Convergência em média quadrática 757

= (l’Hospital em n)
√ √ 1/(2√n)
= 2 · x · lim  2
n→∞ x2/2 · e nx /2
√ √ 2 1
= 2 · x · 2 · lim √
x n→∞ 2 n · e nx2/2

2 1 ,
= √ · lim √
3 n→∞ nx2/2
x n·e
onde é claro que o último limite acima tende para 0. Isso mostra a convergência pontual da
sequência kun(x)}.
Agora mostra-se que a sequência não converge em média para a função u ≡ 0. Tem-se:
Z 1
kun (x) − u(x)k22 = kun(x)k22 = [un (x)]2 dx
0
Z 1 √ 2
√ √ −nx2/2
= 2· n· x·e dx
0
Z 1 
2
= 2 · n · x · e −nx dx
0
Z 1 0
−nx2
= −e dx
0
1
nx2

= −e = −e −n + e 0

0
−n
= 1−e .
Segue-se daí que 
lim kun (x) − u(x)k22 = lim 1 − e−n
n→∞ n→∞

= lim 1 − lim e −n
n→∞ n→∞
1
= 1 − lim = 1−0
n→∞ e nx
= 1,
donde se conclui lim kun (x) − u(x)k2 = 0, mostrando, assim, que un (x) não converge em média
n→∞
quadrática para u(x).

Agora demonstra-se que a sequência {un (x)} também não converge uniformemente. Como
√ √ √ 2
un (x) = 2 · n · x · e −nx /2, então, derivando pela regra do produto em relação a x, obtém-se
 
0
√ √ 1 −nx2/2
√ √ √ 2nx −nx2
u (x) = 2 · n · √ · e + 2· n· x· − · e /2
2 x 2

2 √ 1 −nx2
√ √ √ −nx2
= · n · √ · e /2 − 2 · n n · x x · e /2,
2 x
758 C Série de Fourier generalizada

cujos pontos críticos são obtidos fazendo



2 √ 1 −nx2
√ √ √ −nx2
· n · √ · e /2 − 2 · n n · x x · e /2 = 0
2 x

2 √ 1 −nx2
√ √ √ −nx2
· n · √ · e /2 = 2 · n n · x x · e /2
2 x
1 1 √ 1 1
· √ = n·x x ⇒ x2 = ⇒ x= √ ·
2 x 2n 2n
Lembrando que as funções são contínuas e o intervalo é fechado e limitado, obtém-se

kun(x) − u(x)k2[0,1] = kun(x) − 0k2[0,1] = kun (x)k2[0,1]


  2
2
1
= [max |un(x)|] = un √
2n
 
−nx2
= 2n · x · e √
x=1/ 2n

1 2 e −1/2 √
= 2n · √ · e /2 = √ · n
−1

2n 2
2 √
= √ · n.
2e
Claramente se vê que lim kun (x) − u(x)k2[0,1] = +∞. Consequentemente, tem-se também que
n→∞
lim kun (x) − u(x)k[0,1] = +∞. Nos extremos do intervalo, x = 0 e x = 1, tem-se, respectiva-
n→∞
mente:
√ √
un(1) − u(1) = 2 · n · e /2,
−n
un (0) − u(0) = 0 − 0 = 0 e
que não são pontos de máximo. Com isso, mostra-se que a convergência não é uniforme.

Observação 7.4: A convergência em média quadrática não garante a convergência pontual e


nem a convergência pontual implica na convergência em média quadrática.

De fato, considere a sequência de funções un : [0, 1] → R definidas por


(
1, para 0 ≤ x ≤ 1/n,
un (x) =
0, caso contrário.

Então,
Z 1 Z 1/n
kux (x)k22 = 2
|un (x)| dx = dx
0 0
1/n 1

(7.4) =x = ·
0 n
C.8 Propriedade da unicidade 759

Isso mostra que


1
lim kun (x) − 0k22 = lim
= 0,
n→∞ n→∞ n
ou seja, que a sequência {un(x)} converge em média quadrática para a função nula.
Por outro lado, a sequência {un (x)} não converge pontualmente.. De fato, un(0) = 1 para
todo n ∈ N, de modo que a sequência numérica un (0) não converge pontualmente para zero.
Conclui-se, portanto, a primeira afirmação.
Para a segunda afirmação, considere a sequência de funções vn : [0, 1] → R definida por
(
n, para 0 < x < 1/n,
vn (x) =
0, caso contrário.

Afirma-se que esta sequência converge pontualmente para zero, mas não converge em média
quadrática. De fato, vn (0) = 0 para todo n. Para qualquer x > 0 tem-se que vn (x) = 0 para
n > |x|−1, pois, para x > 1/n, tem-se que
1 1
x> ⇒ n> = |x|−1.
n x
Por outro lado,
Z 1 Z 1/n
kvn (x)k22 = 2
|vn (x)| dx = n2 dx
0 0
1/n 1

(7.5) = n2 x = n2 · = n,
0 n
de modo que
lim kvn (x) − 0k22 = lim n = +∞,
n→∞ n→∞
mostrando que a sequência {vn(x)} não converge em média quadrática.

C.8 Propriedade da unicidade

Suponha que {un (x)} é um conjunto ortonormal arbitrário, não necessariamente um conjunto
completo. Deseja-se estudar a relação entre a função u(x) e sua série de Fourier generalizada.
Alguns questionamentos devem ser feitos. Se cn são os coeficientes de Fourier para uma função
u(x), questiona-se se a sequência {cn}, formada pelos coeficientes de Fourier para u(x), carac-
teriza de maneira única a função u(x) entre todas as funções do espaço. Questiona-se também
sobre quais propriedades de u(x) estão refletidas em {cn}.
760 C Série de Fourier generalizada

Se u e v têm a mesma sequência de Fourier, então (u, un) = (v, un ) para todo n. Se w = u − v,
então (w, un ) = 0 para todo n. Como u = v se, e somente se, w = 0, então questiona-se se 0
é a única função que é ortogonal a todas as funções un . Assim, a questão da unicidade para
um dado conjunto ortonormal {un(x)} é, portanto, o mesmo que perguntar se o conjunto é
completo, no sentido de que nenhuma função adicional pode ser encontrada no espaço e que
seja orthogonal a todas as funções un(x) já escolhidas e que não seja identicamente nula. Se
um conjunto ortonormal {un (x)} é completo, então cada função u é caracterizada de maneira
única pelos coeficientes de Fourier. Observa-se que um conjunto pode ser completo em um dado
espaço, mas poderá deixar de ser completo em um espaço de funções maior.
Assim, uma vez em que se determina os coeficientes de Fourier {cn} para u(x), pode-se

formar a série de Fourier generalizada ∑ cn un (x). Mesmo assim resta saber como a série de
n=1
Fourier generalizada para u(x) converge para u(x). Por exemplo, se a convergência se dá em
média, ou pontualmente, ou uniformemente.

D EFINIÇÃO : Diz-se que um conjunto ortogonal {un (x)}, com x ∈ [a, b], tem a propriedade da
unicidade se toda função u ∈ L1([a, b]) está determinada de maneira única por seus coeficientes
de Fourier em relação a {un (x)}.

De modo equivalente, a definição acima diz que, se duas funções u e v, definidas em [a, b],
são tais que (u, un ) = (v, un ) para todo n, então u(x) − v(x) = 0∗. Ou ainda, que w(x) = 0∗ é a
única função em L1([a, b]) que é ortogonal a todas as funções un (x). Uma consequência é que
um conjunto de funções ortogonais não pode ser ampliado. Observa-se que a função 0∗ não é a
função identicamente nula, mas sim uma função que é igual a 0, exceto em um número finito
de pontos. Para o caso em número infinito de pontos, veja a próxima observação.
O comentário do último parágrafo é delicado: é preciso dar um entendimento preciso sobre o
significado da expressão “determinada de maneira única”. A explicação técnica sobre este fato
será apresentada na próxima observação. Esse assunto contido na observação a seguir pode ser
omitido em uma primeira leitura.

Observação 8.1: Inicia-se recordando algumas definições de Fundamentos de Matemática.

D EFINIÇÃO : Uma relação de um conjunto X em um conjunto Y é um subconjunto R ⊂


X × Y . Se (x, y) ∈ R, escreve-se x R y e se diz que x mantém relação R com y.

D EFINIÇÃO : A relação R ⊂ X × Y chama-se reflexiva se, para cada x ∈ X, (x, y) ∈ R . Isto é,


a relação é reflexiva se cada elemento do conjunto relaciona-se consigo mesmo. Significa que a
relação R contém a diagonal D do produto cartesiano X × Y .

D EFINIÇÃO : A relação R ⊂ X × Y chama-se simétrica se (x, y) ∈ R implica em (y, x) ∈


R. Isto é, a relação é simétrica quando x relaciona-se com y e y também relaciona-se com x.
Significa que a relação R é simétrica em relação a diagonal D do produto cartesiano X × Y .
C.8 Propriedade da unicidade 761

D EFINIÇÃO : A relação R ⊂ X × Y chama-se transitiva se (x, y) ∈ R e (x, y) ∈ R implicar


em (x, z) ∈ R . Isto é, a relação é transitiva quando x relacionando com y e y relacionando com
z implicar em x relacionando com z.

D EFINIÇÃO : Uma relação de equivalência em um conjunto X é uma relação R que satisfaz


as propriedades de ser reflexiva, simétrica e transitiva.

D EFINIÇÃO : Chama-se classe de equivalência, segundo a relação R de um elemento x0 ∈ X,


ao conjunto de todos os elementos x ∈ X que são equivalentes a x0 segundo R . Representa-se a
classe de equivalência de x0 por

x0 = {x ∈ X | x R x0 }.

Observe que x0 é um subconjunto de X. Portanto, x0 ∈ P (X), o conjunto formado por todos


os subconjuntos de X. Em símbolos: x0 ⊂ X e x0 ∈ P (X). Além disso, para todo x ∈ X, tem-se
que x ∈ x, pois pela propriedade reflexiva de R tem-se que x R x. Isto mostra que a classe de
equivalência x nunca é vazia.

D EFINIÇÃO : Chama-se conjunto quociente de X pela relação de equivalência R o conjunto


formado por todas as classe de equivalência segundo R. O conjunto quociente é denotado por

X/ R = {x | x ∈ X}.

Observe que o conjunto quociente X/ R é um subconjunto de P (X). Portanto, X/ R ∈


P [P (X)]. Em símbolos: X/ R ⊂ P (x) e X/ R ∈ P [P (X)].

D EFINIÇÃO : Diz-se que um conjunto X ⊂ R tem medida nula, que será denotado por µ (X) =
0, quando, para todo ε > 0, for possível obter uma coleção enumerável de intervalos abertos
I1, I2 , . . ., In , . . . tais que

X ⊂ I1 ∪ I2 ∪ · · · ∪ In ∪ · · · e ∑ | In | < ε .
n=1

D EFINIÇÃO : Diz que duas funções u, v : X → R são iguais “quase sempre”, e denota-se por
u(x) = v(x) q.s. em X, quando elas diferem entre si em um conjunto de medida nula.

• A igualdade “quase sempre” entre duas funções é uma relação de equivalência.


Denote por u Rv a relação dada por: u = v se, e somente se, u(x) = v(x) q.s. A relação R é
reflexiva: tem-se que u = u se, e somente se, u(x) = u(x) q.s. Mas a função u(x) não difere dela
mesma em nenhum ponto, ou seja, o conjunto dos pontos em que u(x) difere dela mesma é vazio
e, portanto, tem medida nula. Assim, u R u. Ela também é simétrica: se u Rv, então u = v se, e
somente se, u(x) = v(x) q.s. Logo, v(x) = u(x) q.s., que mostra que v = u, ou seja, que v Ru.
Por fim, a relação é transitiva: se u R v e v Rw, então u = v e v = w se, e somente se, u(x) = v(x)
q.s. e v(x) = w(x) q.s. Segue-se daí que u(x) = w(x) q.s. Mas isto significa que u = w, ou seja,
que u R w. 
762 C Série de Fourier generalizada

• Seja X um espaço normado com norma k · k. Escreve-se ku − vk = 0 para dizer que u(x) =
v(x) q.s. Então, uma relação dada dessa forma também é uma relação de equivalência.
Seja u Rv a relação dada por: ku − vk = 0 se, e somente se, u(x) = v(x) q.s. A relação R é
reflexiva: tem-se que ku − uk = 0 se, e somente se, u(x) = u(x) q.s. Como o conjunto de pontos
em que u(x) difere dela mesma é vazio, tem-se que a relação é sempre verdadeira, pois este
conjunto tem medida nula. Assim, u Ru. Além disso, R é simétrica: se u Rv, então ku − vk = 0
se, e somente se, u(x) = v(x) q.s. Mas isto é o mesmo que escrever v(x) = u(x) q.s., que implica
em kv − uk = 0, ou seja, que v Ru. A relação é transitiva: se u R v e v R w, então ku − vk = 0 e
kv − wk = 0 se, e somente se, u(x) = v(x) q.s. e v(x) = w(x) q.s. Segue-se daí que u(x) = w(x)
q.s. Mas isto é o mesmo que escrever ku − wk = 0, ou seja, que u Rw. 

Fixando u ∈ X, porém de modo arbitrário, indica-se por

u = {v ∈ X | ku − vk = 0}

a classe de equivalência da função u ∈ X, isto é, o conjunto de todos os elementos de v ∈ X que


são equivalentes a u segundo a relação ku − vk = 0.
Por definição, tem-se que u é um subconjunto de X. Portanto, u ∈ P (X). Além disso, para
todo elemento u ∈ X tem-se que u ∈ u, pois, pela propriedade reflexiva (da relação de equiv-
alência) tem-se que ku − uk = 0. Isto mostra que u nunca é uma classe vazia, isto é, u 6= ∅.
Seja R a relação de equivalência dada por ku − vk = 0. Denote por X o conjunto quociente
X/ R, ou seja, o conjunto de todas as classes de equivalência u, quando u percorre todo X. Em
símbolos:
X = X/ R = {u | u ∈ X}.
Observe que X = X/ R é subconjunto de P (X). Portanto, segue-se daí que X é um elemento
de P [P (X)].

• Tem-se que u = v se, e somente se, ku − vk = 0.


De fato, como foi observado, tem-se que u ∈ u e v ∈ v. Se u = v, então v ∈ u e u ∈ v. Em
particular, dizer que v ∈ u significa que ku − vk = 0.
Para demonstrar a recíproca, considere as classes de equivalência

u = { f ∈ X | ku − f k = 0} e v = {g ∈ X | kv − gk = 0}.

Por hipótese tem-se que ku − vk = 0. Isto significa que v é um elemento de u, isto é, v ∈ u. Isto
mostra que v ⊂ u. Além disso, como a relação ku − vk = 0 é simétrica, então tem-se também
que kv − uk = 0. Isto significa que u ∈ v, que mostra que u ⊂ v. Assim, das inclusões v ⊂ u e
u ⊂ v, conclui-se que u = v, como afirmado. 

• Sejam u, v ∈ X . Escreva ku − vk = ku − vk. Tem-se que ku − vk está bem definido.


Com efeito, se u = f e v = g, então
C.8 Propriedade da unicidade 763

ku − vk = ku − vk = k(u − v) ± f ± gk
= k(u − f ) + ( f − g) + (g − v)k (desig. triang.)
≤ ku − f k + k f − gk + kg − vk

= ku − f k + k f − gk + kg − vk

(8.1) = k f − gk,

pois ku − f k = 0 = kg − vk, uma vez que por hipótese se tem u = f e v = g.


Analogamente, obtém-se

k f − gk = k f − gk = k( f − g) ± u ± vk
= k( f − u) + (u − v) + (v − g)k
≤ (desig. triang.)
≤ k f − uk + ku − vk + kv − gk

= k f − uk + ku − vk + kv − gk
(8.2) = ku − vk,

pois k f − uk = 0 = kv − gk, uma vez que por hipótese se tem u = f e v = g.


Portanto, segue-se de (8.1) e (8.2) que ku − vk = k f − gk. Isto mostra que a definição de
ku − vk não é ambígua, ou seja, que de fato este objeto está bem definido. 

• Tem-se que d (u, v) = ku − vk é uma métrica em X.


Primeiro deve-se mostrar que d (u, u) = 0. De fato, tem-se que u ∈ u, de modo que, por
definição, d (u, u) = ku − uk = ku − uk = 0.
Agora deve-se mostrar que d (u, v) > 0 para u 6= v. Como visto, tem-se que u = v se, e somente
se, ku − vk = 0. Como, por hipótese, u 6= v, então ku − vk =
6 0. Mas isto significa que ku − vk > 0.
Assim, d (u, v) = ku − vk = ku − vk > 0.
Em seguida mostra-se que d (u, v) = d (v, u). Como foi demonstrado, tem-se que a relação
ku − vk é simétrica, isto é, que ku − vk = kv − uk. Portanto, por definição, tem-se que

d (u, v) = ku − vk = ku − vk = kv − uk = kv − uk = d (v, u) .

Por fim, resta mostrar que vale a desigualdade triangular, isto é, que

d (u, w) ≤ d (u, v) + d (v, w) .

Com efeito, tem-se que


d (u, w) = ku − wk = ku − wk
= k(u − v) + (v − w)k
≤ ku − vk + kv − wk
764 C Série de Fourier generalizada

= ku − vk + kv − wk,
= d (u, v) + d (v, w) ,
como desejado. 

É no contexto da observação 8.1 que se deve entender significado de que, “se (u, un) = (v, un ),
para todo n, então u(x) − v(x) = 0”. Aqui este 0 não é necessariamente a função identicamente
nula, mas sim funções que diferenciam da função identicamente nula em um conjunto de medida
nula. Assim, a unicidade é obtida ao escolher o representante da classe de equivalência, que
pode ser qualquer elemento desta classe. Porém é preciso considerar a integral de Lebesgue que
funciona bem com a igualdade quase sempre, uma vez que a integral de Riemann falha com a
igualdade quase sempre entre funções.

Teorema 8.1: Um conjunto completo {un (x)}, com x ∈ [a, b], tem a propriedade da unicidade.
D EMONSTRAÇÃO : Sejam u(x) e v(x) duas funções definidas em [a, b] e seccionalmente con-
tínuas que satisfazem
(u(x), un (x)) = (v(x), un (x)).
Então,
(u(x), un (x)) − (v(x), un (x)) = 0 ⇒ (u(x) − v(x), un (x)) = 0.
Faça w(x) = u(x) − v(x). Desse modo, (w(x), un (x)) = 0 para todo n ∈ N. Seja

w(x) = ∑ cn un (x),
n=1

a série de Fourier generalizada para a função w(x), onde cn são os coeficientes de Fourier.
Por ser {un(x)} um conjunto ortogonal de funções seccionalmente contínuas no intervalo
[a, b], a proposição 6.1 diz que os coeficientes de Fourier são dados por

(w, un )
(8.3) cn = ·
kunk2
Pela proposição 6.3, a completude de um conjunto é equivalente a validade da identidade de
Parseval. A identidade de Parseval para w é dada por

(8.4) kwk2 = ∑ c2n .
n=1

Substituindo (8.3) em (8.4), obtém-se



kwk2 = ∑ c2n
n=1
∞  2
(w, un )
= ∑ kunk2
n=1
C.8 Propriedade da unicidade 765

∞  2
0
= ∑ kunk2
n=1

= 0.
Isto mostra que kwk2 = 0, de modo que também se tem que kwk = 0. Segue-se daí que w(x) =
0, ou seja, que u(x) − v(x) = 0. Portanto, o conjunto completo {un (x)} satisfaz a propriedade da
unicidade.

Observa-se que a recíproca do teorema 8.1 é conhecida como teorema de Riesz-Fischer, que é
verdadeira quando se considera o espaço L2 ([a, b]) das funções quadrado integráveis no sentido
de Lebesgue. Porém, a recíproca do teorema 8.1 não é verdadeira no espaço L2 ([a, b]), pois
este espaço não é completo (veja o exemplo 8.1) – não confundir com o conceito de conjunto
completo. Para conseguir condições suficientes para a completude é preciso exigir hipóteses
fortes; para isso, veja o teorema 9.1 da próxima seção.

Exemplo 8.1: Considere a sequência de funções un : [0, 1] → R dadas por



 1
x , para x > ,
−1/4

n
un (x) =


 0, 1
para x ≤ ·
n
Se m > n, então

 1 1
 x −1/4, para <x≤ ,
um (x) − un (x) = m n

 0, caso contrário.

Assim,
Z 1  2 Z 1/n
kum (x) − un (x)k22 =
−1/4 −1/2
x dx = x dx
0 1/m
1/n  
1/2
= 2 · x = 2 n /2 − m /2
−1 −1

1/m
 
1 1
=2 √ −√ ,
n m
que permite concluir que
 
1 1
lim kum (x) − un (x)k22 = lim 2 √ − √ = 0,
m,n→∞ m,n→∞ n m
mostrando que a sequência {un(x)} é de Cauchy.
Por outro lado, o limite pontual (ou em média quadrática) é claramente a função
766 C Série de Fourier generalizada

(
x −1/4, para 0 < x ≤ 1,
u(x) =
0, para x = 0,

porém esta função não pertence ao espaço L2([0, 1]), pois ela se torna ilimitada quando x → 0+ :
de fato,
1
lim u(x) = lim x /4 = lim 1/4
−1

x→0+ x→0+ x→0+ x


1
= lim √ = + ∞,
x→0 + 4
x
ou seja, u(x) não é uma função seccionalmente contínua, pois a descontinuidade em x = 0 é de
2a espécie.

Teorema 8.2: Seja {un (x)} um conjunto ortogonal de funções contínuas no intervalo [a, b].
Suponha que o conjunto {un (x)} tem a propriedade da unicidade. Seja u : [a, b] → R uma função
contínua. Suponha que a série de Fourier generalizada para u(x) em relação a {un (x)} convirja
uniformemente para x ∈ [a, b]. Então a série de Fourier generalizada converge para u(x).
D EMONSTRAÇÃO : Denote por v(x) a soma da série de Fourier generalizada para a função
u(x), isto é,

v(x) = ∑ cn un (x).
n=1
Como, por hipótese, as funções un (x) são contínuas e a convergência é uniforme, segue daí
que v(x) é contínua em [a, b] e que cn são os coeficientes generalizados de Fourier. Mas a série
foi dada como a série de Fourier generalizada para u(x). Logo, u(x) e v(x) têm os mesmos
coeficientes generalizados de Fourier. Portanto, tem-se que u(x) = v(x). Isto mostra que a série
de Fourier generalizada para u(x) converge para u(x).

C.9 Condições suficientes para completude

O próximo resultado apresenta as condições suficientes para que um conjunto seja completo.

Teorema 9.1: Seja {un(x)} um conjunto ortogonal de funções contínuas definidas no inter-
valo [a, b]. Suponha que as duas propriedades a seguir são satisfeitas:
(a) O conjunto {un(x)} tem a propriedade da unicidade;
C.9 Condições suficientes para completude 767

(b) Para algum k ∈ N, a série de Fourier generalizada para v(x) em relação a {un(x)} é
uniformemente converge para toda v(x) de classe Ck em [a, b] e tal que

v(a) = v0 (a) = · · · = v(k)(a) = 0 e v(b) = v0 (b) = · · · = v(k)(b) = 0.

Então, o conjunto {un (x)} é completo.


D EMONSTRAÇÃO : Seja u : [a, b] → R uma função seccionalmente contínua. Deve-se mostrar
que, dado ε > 0, existe uma combinação linear w(x) = c1 u1 (x)+ · · ·+ cn un (x) tal que ku − wk <
ε . Sem perda de generalidade, supõem-se que k = 2 na hipótese (b). A construção da função
w(x) será feita em vários passos.

PASSO 1: Será determinada uma função contínua U (x) tal que kU − uk < ε/4 e U (x) = 0 se
x ∈ [a, a + δ ] ou x ∈ [b − δ , b] com uma escolha conveniente de δ . O gráfico da figura 9.3 dá
uma ideia sobre o que está sendo feito.

Figura 9.3: Aproximação da função u(x) seccionalmente contínua por uma função contínua
U (x) e uma função V (x) de classe C1 .

Defina u1 : [a, b] → R por


(
u(x), para x ∈ (a + 2δ , b − 2δ ),
u1(x) =
0, para x ∈ [a, a + 2δ ] ∪ [b − 2δ , b].

Agora, serão traçados segmentos formando pontes sobre os saltos de u1 (x). Em cada salto, o
segmento une o ponto [x0 − δ , u1(x0 − δ )] com o ponto [x + 0 + δ , u1(x0 + δ )]. A função U (x)
coincide com u1 (x), exceto entre x0 − δ e x0 + δ , onde o seu gráfico é um segmento. Então,
U (x) é contínua e kU − uk2 é soma de um número finito K de integrais da forma
Z x0 +δ
[U (x) − u(x)]2 dx
x0 −δ

mais duas integrais,


Z a+δ Z b
2
[u(x)] dx e [u(x)]2 dx,
a b−δ
pois nestes dois intervalos de integração tem-se que U ≡ 0. Ou seja, tem-se que
768 C Série de Fourier generalizada

Z x0 +δ Z a+δ Z b
2 2 2
kU − uk = K [U (x) − u(x)] dx + [u(x)] dx + [u(x)]2 dx.
x0 −δ a b−δ

Como u(x) é seccionalmente contínua, então ela é limitada, ou seja, existe M > 0 tal que
|u(x)| ≤ M. Pela maneira em que U (x) foi construída, tem-se também que |U (x)| ≤ M. Portanto,
segue-se da desigualdade triangular que

|U (x) − u(x)| = |U (x) + [u(x)]| ≤ |U (x)| + |−u(x)| = M + M = 2M,

para todo x. Assim,


Z x0 +δ Z
2
[U (x) − u(x)] dx ≤ x0 + δ (2M)2 dx
x0 −δ x0 −δ
x0 +δ

2
= 4M = 4M 2 [(x0 + δ ) − (x0 − δ )]
x0 −δ

= 4M · (2δ ) = 8M 2 · δ .
2

Lembrando que
Z x0 +δ Z a+δ Z b
2 2 2
kU − uk = K [U (x) − u(x)] dx + [u(x)] dx + [u(x)]2 dx,
x0 −δ a b−δ

obtém-se Z a+δ Z b
kU − uk2 ≤ K · (8M 2 · δ ) + [u(x)]2 dx + [u(x)]2 dx
a b−δ
Z a+δ Z b
≤ 8KM 2 · δ + M 2 dx + M 2 dx
a b−δ
Z a+δ Z b
2 2 2
≤ 8KM · δ + M dx + M dx
a b−δ

= 8KM 2 · δ + M 2 [(a + δ ) − a] + M 2[b − (b − δ )]


= 8KM 2 · δ + M 2 · δ + M 2 · δ
= 8KM 2 · δ + 2M 2 · δ .
Fazendo δ → 0 na última expressão acima, conclui-se que kU − uk2 → 0. Portanto, para δ
suficientemente pequeno, tem-se que kU − uk < ε/4.
Em seguida, escolhe-se uma função V (x) de classe C1 ([a, b]) tal que kV −U k < ε/4 e V (x) ≡ 0
para x ∈ [a, a + δ/2] ∪ [b − δ/2, b]. Para isso, define-se U (x) como sendo identicamente nula fora
do intervalo [a, b] e se faz
Z x1 +h
1
V (x1 ) = U (x) dx, 0 < h < δ/2.
2h x1 −h

A constante h será fixada mais adiante. A função V (x) está definida, portanto, para todo x e
V (x) ≡ 0 para x ∈ [a, a + δ/2] ∪ [b − δ/2, b] como desejado. Assim, pelo teorema fundamental
do Cálculo, segue-se que
C.9 Condições suficientes para completude 769

x1 +h
0 1 1
V (x1 ) = · U (x) = [U (x1 + h) − U (x1 − h)] .
2h x1 −h 2h

Portanto, segue-se daí que V (x) tem uma derivada contínua para todo x. Além disso, tem-se
que
Z x1 +h
1
V (x1 ) − U (x1) = U (x) dx − U (x1)
2h x1 −h
Z x1 +h
1 1
= U (x) dx − · U (x1) · (2h)
2h x1 −h 2h
Z
1 x1+h 1
= U (x) dx − · U (x1) · [(x1 + h) − (x1 − h)]
2h x1 −h 2h
Z Z x1 +h
1 x1+h 1
= U (x) dx − · U (x1) dx
2h x1 −h 2h x1 −h
Z x1 +h Z x1 +h
1 1
= U (x) dx − U (x1 ) dx
2h x1 −h 2h x1 −h
Z x1 +h
1
(9.1) = [U (x) − U (x1)] dx.
2h x1 −h

Portanto, segue-se da igualdade obtida em (9.1) que


Z  2
2 1 x1+h
[V (x1 ) − U (x1)] = [U (x) − U (x1)] dx
2h x1−h
Z x +h 2
1 1
(9.2) = 2 [U (x) − U (x1)] dx .
4h x1 −h

Agora aplica-se a desigualdade de Cauchy-Schwarz (proposição 4.1), que é dada por


Z b 2 Z b  Z b 
2 2
f (x) · g(x) dx ≤ [ f (x)] dx [g(x)] dx ,
a a a

na integral do último membro em (9.2). Assim, fazendo f (x) = U (x)−U (x1) e g(x) = 1, obtém-
se
Z x1 +h
2
2 1
[V (x1 ) − U (x1)] = 2 [U (x) − U (x1)] dx
4h x1 −h
Z x1 +h
2
1
= 2 [U (x) − U (x1)] · 1 dx
4h x1 −h
Z x1 +h
Z x1 +h

1 2 2
≤ 2 [U (x) − U (x1)] dx 1 dx
4h x1 −h x1 −h
Z x1 +h
 x1+h
1 2

= [U (x) − U (x1)] dx · x
4h2 x1 −h x1 −h
770 C Série de Fourier generalizada

Z x1 +h

1 2
= 2 [U (x) − U (x1)] dx · [(x1 + h) − (x1 − h)]
4h x1 −h
Z
2h x1+h
= [U (x) − U (x1)]2 dx
4h2 x1 −h
Z
1 x1+h
= [U (x) − U (x1)]2 dx.
2h x1 −h
Portanto,
Z b
2
kV − U k = [V (x1 ) − U (x1 )]2 dx1
a
Z b  Z x1 +h 
1 2
≤ [U (x) − U (x1)] dx dx1
a 2h x1−h
Z b Z x1 +h
1
(9.3) = [U (x) − U (x1)]2 dx dx1.
2h a x1 −h

Agora faça a seguinte mudança de variáveis: x1 = α e x = α − β . O jacobiano da transfor-


mação é dado por
∂ x1 ∂ x1

∂α
∂β 1 0

J = = = −1.
∂x ∂ x
1 −1
∂α ∂β
Observa-se que na fórmula de mudanças de variáveis em integrais duplas o jacobiano é con-
siderado em módulo, ou seja, |J| = | − 1| = 1. Além disso, o domínio de integração na integral
no último membro de (9.3) é dado por

D = (x, x1) ∈ R2 | x1 − h ≤ x ≤ x1 + h e a ≤ x1 ≤ b .

Agora deve-se determinar o novo domínio de integração. Como x1 = α e a ≤ x1 ≤ b, então


a ≤ α ≤ b. Como x = α − β e x1 − h ≤ x ≤ x1 + h, então α − h ≤ α − β ≤ α + h, pois x1 = α .
Somando −α em todos os membros da última desigualdade, conclui-se que −h ≤ −β ≤ h.
Multiplicando por −1, obtém-se h ≥ β ≥ h, que é o mesmo que escrever −h ≤ β ≤ h. Portanto,
o novo domínio de integração é

W = (α , β ) ∈ R2 | a ≤ α ≤ b e − h ≤ β ≤ h .

Portanto, segue-se de (9.3) e o teorema da mudança de variáveis para integrais duplas que
Z b Z x1 +h
1
kV − U k ≤ 2
[U (x) − U (x1)]2 dx dx1
2h a x1 −h
Z hZ b
1
= [U (α − β ) − U (α )]2 · | J | d α d β
2h −h a
Z hZ b
1
= [U (α − β ) − U (α )]2 d α d β .
2h −h a
C.9 Condições suficientes para completude 771

Agora faça
Z b
H(β ) = [U (α − β ) − U (α )]2 d α .
a
Observe que
Z b
H(0) = [U (α − 0) − U (α )]2 d α
a
Z b
= 0 d α = 0.
a
Além disso, H(β ) é uma função contínua, pois a função U é contínua. O teorema do valor
médio para integrais afirma que: Se f : [c, d] → R é contínua, então existe x∗ ∈ (c, d) tal que
Z d
f (x) dx = f (x∗ ) · (d − c). Usando este teorema, conclui-se que
c
Z h Z b 
1
2 2
kV − U k ≤ [U (α − β ) − U (α )] d α d β
2h −h a
Z h
1
= H(β ) d β
2h −h

= (teorema do valor médio para integrais)


1
= · H(β ∗ ) · [h − (−h)]
2h
1
= · H(β ∗ ) · (2h)
2h
= H(β ∗ ).
Agora note que, quando h → 0, tem-se que H(β ∗ ) → 0, de modo que kV − U k < ε/4 se h for
suficientemente pequeno.
Em seguida, constrói-se uma função v(x) tal que kv − Vk < ε/4, onde v(x) é uma função de
classe C2 e v(x) ≡ 0 para a ≤ x ≤ a + δ/4 e b − δ/4 ≤ x ≤ b. Para isso, basta repetir o processo
de tomar médias acima e escrever
Z
1 x1+k δ
v(x1 ) = V (x) dx, 0<k< ·
2k x1−k 4
Outros passos podem ser repetidos e a desigualdade desejada é obtida com uma escolha
conveniente de k. Como
1
v0 (x1 ) = [V (x1 + k) − G(x1 − k)]
2k
e V tem derivada contínua, então v(x) tem derivadas primeiras e segundas contínuas para todo
x, ou seja, v ∈ C2.
Finalmente, construiu-se uma combinação linear w(x) = c1 u1 (x) + · · · + cn un (x) tal que
kv − wk < ε/4. Como v(x) satisfaz a todas as condições da hipótese (b) do teorema, a série
de Fourier de v(x) é uniformemente convergente. Por (a) e pelo teorema 8.2, a série converge
para v(x). Pelo corolário 7.1, se uma sequência {un(x)} de funções ortonormais e seccional-
mente contínuas converge uniformemente para u(x), então esta sequência também converge em
772 C Série de Fourier generalizada

média para u(x). Portanto, as somas parciais dessa série de Fourier também converge em média
para v(x). Assim, uma soma parcial Sn(x) = w(x) pode ser escolhida de modo que kv− wk < ε/4.
A função w(x) é precisamente a combinação linear procurada, pois, pela desigualdade trian-
gular (k f + gk ≤ k f k + kgk), conclui-se que

ku − wk = k(u − U ) + (U − V ) + (V − v) + (v − w)k
≤ ku − U k + kU − V k + kV − vk + kv − wk
ε ε ε ε
< + + + = ε.
4 4 4 4

Observa-se que a demonstração do teorema 9.1 mostra que a hipótese (a) pode ser omitida se
na hipótese (b) for substituída a expressão “uniformemente convergente” por “convergente em
média para v(x)”.

C.10 Integração e diferenciação

Teorema 10.1: Sejam u, v : [a, b] → R seccionalmente contínuas. Um conjunto ortogonal


{un (x)}, para x ∈ [a, b], é completo se, e somente se,
Z b ∞
(u, v) =
a
u(x) · v(x) dx = ∑ cn · c0n kun k2,
n=1

onde cn e c0n são os coeficientes de Fourier para as funções u(x) e v(x), respectivamente, em
relação ao conjunto {un(x)}.
D EMONSTRAÇÃO : Suponha que
Z b ∞
(u, v) =
a
u(x) · v(x) dx = ∑ cn · c0n kun k2,
n=1

seja verdadeiro.
Fazendo v(x) = u(x), obtém-se

kuk2 = (u, u) = ∑ cn · cn kunk2
n=1

= ∑ c2n kunk2 ,
n=1

que é a identidade de Parseval para u(x). Pela proposição 6.3, a validade da identidade de
Parseval é equivalente à completude. Isso mostra que o conjunto {un (x)} é completo.
C.10 Integração e diferenciação 773

Reciprocamente, suponha que o conjunto {un(x)} é completo. A identidade de polarização


(proposição 1.1) diz que
1 1
(u, v) = ku + vk2 − ku − vk2 .
4 4
Observando que
Z b Z b
(u, v) = u(x) · v(x) dx e kuk2 = [u(x)]2 dx
a a

segue-se daí e da identidade de polarização que

1 1
(u, v) = ku + vk2 − ku − vk2
4 4
Z b Z b
1 1
= [u(x) + v(x)]2 dx − [u(x) − v(x)] dx.
4 a 4 a
Como, por hipótese, o conjunto {un(x)} é completo, segue-se da proposição 6.3 que vale a
identidade de Parseval. Assim, aplica-se a identidade de Parseval para as funções u(x) + v(x) e
u(x) − v(x) na última expressão obtida acima. Tem-se:
Z b Z b
1 1
2
(u, v) = [u(x) + v(x)] dx − [u(x) − v(x)] dx
4 a 4 a
∞ ∞
1 2 1 2
=
4 ∑ cn + c0n kun k2 − 4 ∑ cn − c0n kun k2
n=1 n=1

1  
= ∑ c2n + 2cn · c0n + (c0n )2 kunk2 −
4 n=1

1  2 
− ∑ cn − 2cn · c0n + (c0n )2 kun k2
4 n=1

1
=
4 ∑ 4cn · c0n kun k2
n=1

= ∑ cn · c0n kunk2 ,
n=1

que é o resultado desejado.

A expressão que aparece no enunciado do teorema 10.1 é chamada de segunda forma da


identidade de Parseval. Quando o conjunto é ortonormal a segunda forma da identidade de
Parseval fica escrita do seguinte modo:

(u, v) = c1 · c01 + c2 · c02 + · · · + cn · c0n + · · · ,

onde cn = (u, un) e c0n = (v, un ).


Observe que a expressão acima é similar à equação
774 C Série de Fourier generalizada

(a, b) = a1 · b1 + a2 · b2 + · + an · · ·bn

para vetores a = (a1 , a2, . . ., an) e b = (b1 , b2, . . ., bn).

Teorema 10.2: Seja {un(x)} um conjunto ortonormal completo, com x ∈ [a, b]. Sejam u :
[a, b] → R uma função seccionalmente contínua e v : [x1, x2 ] → R uma função seccionalmente

contínua, onde a ≤ x1 < x2 ≤ b. Seja ∑ cn · un(x) a série de Fourier generalizada de u(x) em
n=1
relação ao conjunto {un(x)}. Então,
Z x2 ∞ Z x2

x1
u(x) · v(x) dx = ∑ cn x1
v(x) · un (x) dx.
n=1

D EMONSTRAÇÃO : Inicia-se fazendo uma extensão da função v(x) a todo o intervalo [a, b].
Seja v : [a, b] → R a extensão de v, que é definida por
(
v(x), para x ∈ (x1 , x2),
v(x) =
0, para x ∈ [a, x1] ∪ [x2, b].

Deste modo é possível aplicar o resultado do teorema 10.2, que é a segunda forma da identi-
dade de Parseval, isto é,
∞ Z b
∑ cn · c0n kunk2 = u(x) · v(x) dx
n=1 a
Z x1 Z x2 Z b
= u(x) · v(x) dx + u(x) · v(x) dx + u(x) · v(x) dx
a x1 x2
Z x2
(10.4) = u(x) · v(x) dx.
x1

Por outro lado, como o conjunto {un (x)} é ortonormal, tem-se que os coeficientes c0n são
dados por
(v, un) ,
c0n =
kunk2
de modo que
(v, un)
c0n kun k2 = · kunk2 = (v, un)
kun k2
Z b
= v(x) · un (x) dx
a
Z x1 Z x2 Z b
= v(x) · un (x) dx + v(x) · un (x) dx + v(x) · un (x) dx
a x1 x2
Z x2
(10.5) = v(x) · un (x) dx.
x1

Substituindo (10.5) em (10.4), obtém-se


C.10 Integração e diferenciação 775

Z x2 ∞

x1
u(x) · v(x) dx = ∑ cn · c0n kunk2
n=1
∞ Z x2

= ∑ cn x1
v(x) · un (x) dx ,
n=1

que é o resultado desejado.

O teorema 10.2 afirma que a integral no primeiro membro pode ser calculada por integração

termo a termo na série ∑ cn · v(x) · un (x). Isto é surpreendente, uma vez que não há hipótese
n=1
alguma sobre convergência da série antes da integração. Muito menos é exigido que se tenha
convergência uniforme, que é uma noção de convergência muito forte e restritiva.

Corolário 10.1: Seja {un (x)} um conjunto ortonormal completo, com x ∈ [a, b]. Sejam u :
[a, b] → R uma função seccionalmente contínua e v : [x1, x2 ] → R uma função seccionalmente

contínua, onde a ≤ x1 < x2 ≤ b. Seja ∑ cn · un(x) a série de Fourier generalizada de u(x) em
n=1
relação ao conjunto {un(x)}. Então,
Z x2 ∞ Z x2

x1
u(x) dx = ∑ cn x1
un(x) dx,
n=1

ou seja, é permitido integrar termo a termo toda a série de Fourier generalizada em relação a um
sistema ortogonal completo {un (x)}.
D EMONSTRAÇÃO : O teorema 10.2 assegura que
Z x2 ∞ Z x2

x1
u(x) · v(x) dx = ∑ cn x1
v(x) · un (x) dx.
n=1

Fazendo v(x) = 1, para x ∈ [x1, x2 ], obtém-se


Z x2 ∞ Z x2

x1
u(x) dx = ∑ cn x1
un(x) dx,
n=1

que é o resultado desejado.

Observa-se que a derivação termo a termo na série de Fourier exige muita atenção e cuidado,
nem sempre ela pode ser aplicada. Como exemplo, considere a série dada por

sen (nx) sen (2x) sen (nx)
∑ = sen x + + ···+ +···
n=1 n 2 n

Note que os coeficientes desta série são dados por


776 C Série de Fourier generalizada

1
a0 = 0, an = 0 e bn = ·
n
Pela identidade de Parseval,
a20 ∞  ∞ ∞
1
+ ∑ a2n + b2n = ∑ b2n = ∑ 2
2 n=1 n=1 n=1 n
1 1 1
= 1 + + + ···+ 2 + ···
4 9 n
que é uma série convergente.
Como a série dos quadrados dos coeficientes é convergente, então esta série é de Fourier.
Porém, observe o que ocorre ao derivar a série termo a termo:
 
d ∞ sen (nx) ∞
d sen (nx)
∑ n = ∑ dx
dx n=1 n
n=1
∞ ∞
cos(nx)
= ∑ n· = ∑ cos(nx)
n=1 n n=1

= cos x + cos(2x) + · · · + cos(nx) + · · ·


Os coeficientes da série acima são dados por

a0 = 0, an = 1 e bn = 0.

Portanto, pela identidade de Parseval, obtém-se

a20 ∞  ∞
+ ∑ a2n + b2n = ∑ a2n
2 n=1 n=1

= a21 + a22 + · · · + a2n + · · ·


= 12 + 12 + · · · + 12 + · · ·
= 1 + 1 + · · ·+ 1 + · · ·
que claramente mostra que é uma série divergente.

Se a série dos quadrados dos coeficientes é divergente, então a série ∑ cos(nx) não é uma
n=1
série de Fourier. Além disso, esta série é divergente, isto é, não define nenhuma função.
C.11 Convergência uniforme da série de Fourier 777

C.11 Convergência uniforme da série de Fourier

No adendo B foi apresentado o teorema de Fourier, que trata da convergência pontual da série
de Fourier. Com as ferramentas apresentadas neste adendo C é possível apresentar condições
suficientes sobre uma função f , periódica de período T = 2L, que garantam a convergência
uniforme de sua série de Fourier. A ideia consiste em aplicar o teste M de Weierstrass.
Como  nπ x   nπ x 

an cos = |an | cos ≤ |an|
L L
e  nπ x   nπ x 

bn sen = |bn| sen ≤ |bn |,
L L
então deve-se ver em quais condições a série numérica

(11.1) ∑ (|an | + |bn|)
n=1
converge.
A proposição 9.3 do capítulo 2 diz o seguinte: Se f é uma função periódica de período T = 2L
com derivada primeira contínua e derivada segunda integrável e absolutamente integrável, então
existe uma constante M ≥ 0 tal que
M M
|an| ≤ e |bn| ≤ ·
n2 n2
Aplicando este resultado em (11.1), obtém-se
∞ ∞   ∞
M M 1
∑ (|a n | + |b n |) ≤ ∑ n2 n2
+ = 2M ∑ n2 ,
n=1 n=1 n=1

cuja última série é convergente (veja o exemplo a seguir). Portanto, por comparação, a série
numérica em (11.1) também é convergente.
Porém é possível mostrar que a série em (11.1) ainda converge quando se adota condições
menos restritivas em f .

Exemplo 11.1: A série numérica



1 1 1 1
∑ 2
= 1 + 2 + 2 + ···+ 2 + ···
n=1 n 2 3 n

é convergente.

A série acima é conhecida como série p, para p = 2. Todos os termos desta série são positivos,
de modo que os termos podem ser agrupados sem compromenter a convergência da mesma.
Assim,

1 1 1 1
∑ n2 = 1 + 22 + 32 + · · · + n2 + · · ·
n=1
778 C Série de Fourier generalizada

   
1 1 1 1 1 1 1
= 2+ 2+ 2 + 2+ 2+ 2+ 2 +
1 2 3 4 5 6 7
 
1 1 1
+ + + · · · + +···
82 92 152
   
1 1 1 1 1 1 1
< 2+ 2+ 2 + 2+ 2+ 2+ 2 +
1 2 2 4 4 4 4
 
1 1 1
+ 2
+ 2 + ···+ 2 + ···
8 8 8
2 4 8 2n−1
= 1+ + + + · · · + +···
22 42 82 (2n−1)
2

1 1 1 1
= 1 + + + + · · · + n−1 + · · ·
2 4 8 2

1
= ∑ n−1 ·
n=1 2
A última série acima é uma série geométrica cuja razão é 1/2. Portanto, a última série é
∞ ∞
1 1
convergente. Como ∑ 2 < ∑ n−1 , onde a última série é convergente, então pelo teste da
n=1 n n=1 2

1
comparação segue-se que a ∑ 2 é convergente.
n=1 n

Teorema 11.1 (convergência uniforme 1): Seja f : R → R uma função periódica de período
T = 2L contínua tal que f 0 ∈ L2(R). Então, a série de Fourier de f converge uniformemente
para f .
D EMONSTRAÇÃO : O passo inicial é análogo aquele adotado no início da demonstração da
proposição 9.2 do capítulo 2: integrar por partes os coeficientes de Fourier. Assim, fazendo
 
 u = f (x),  du = f 0 (x) dx,
 nπ x  ⇒  
 dv = cos ,  v = L sen nπ x ,
L nπ L
obtém-se
Z L  nπ x 
1
an = f (x) cos dx,
L −L L
" #
1 L  nπ x  L L
Z L  nπ x 
= · f (x) · sen − f 0 (x) · sen dx
L nπ L −L nπ −L L
Z  nπ x 
1 1 L 0
= [ f (L) · sen (nπ ) − f (−L) · sen (−nπ )] − f (x) · sen dx
nπ nπ −L L
Z  nπ x   Z  nπ x  
1 L 0 L 1 L 0
=− f (x) · sen dx = − f (x) · sen dx
nπ −L L nπ L −L L
C.11 Convergência uniforme da série de Fourier 779

L 0
(11.2) =− b ,
nπ n
onde usou-se o fato de a função seno ser ímpar e sen (nπ ) = 0.
Analogamente, faz-se o mesmo para os coeficientes bn . Fazendo
 
 u = f (x),  du = f 0 (x) dx,
 nπ x  ⇒  
 dv = sen ,  v = − L cos nπ x ,
L nπ L
obtém-se
Z L  nπ x 
1
bn = f (x) sen dx,
L −L L
" #
1 L  nπ x  L L
Z L  nπ x 
+ 0
= − · f (x) · cos f (x) · cos dx
L nπ L −L nπ −L L
Z  nπ x 
1 1 L 0
= − [ f (L) · cos(nπ ) − f (−L) · cos(−nπ )] + f (x) · cos dx
nπ nπ −L L
Z  nπ x 
cos(nπ ) 1 L 0
= [ f (L) − f (−L)] + f (x) · cos dx
nπ nπ −L L
 Z  nπ x  
L 1 L 0
= f (x) · cos dx
nπ L −L L
L
(11.3) = − a0n ,

onde usou-se o fato de a função cosseno ser par. Além disso, usou-se a periodicidade de f para
concluir que f (L) − f (−L) = 0, isto é, fazendo x = −L, tem-se

f (x + 2L) = f (x) ⇒ f (L) = f [(−L) + 2L] = f (−L).

Portanto, mostrou-se em (11.2) e (11.3) que


L 0 L 0
(11.4) an = − b e bn = a ,
nπ n nπ n
onde a0n e b0n designam os coeficientes de Fourier da função f 0 (x).
Portanto, a soma parcial da série numérica

∑ (|an | + |bn|)
n=1

pode ser escrita como


n  n

L 0 L 0
∑ (|ak | + |bk |) = ∑ − nπ bk + nπ an

k=1 k=1
n 

L 0 L 0
= ∑ − |bk | + |ak |
k=1 kπ kπ
780 C Série de Fourier generalizada

n  
L 1 0 L 1
= ∑ · · |bk | + · · |a0n|
k=1 π k π k
L n 1 0 
(11.5) = ∑ |ak | + |b0k| .
π k=1 k

Agora será usada a desigualdade de Cauchy-Schwarzna seguinte forma:


!1/2 !1/2
n n n

(11.6) ∑ uk vk ≤ ∑ u2k ∑ v2k .
k=1 k=1 k=1

O próximo passo consiste em aplicar a desigualdade de Cauchy-Schwarz acima em (11.5)


fazendo uk = 1/k e vk = |a0k | + |b0k|. Tem-se:
"  2 #1/2 " n #1/2
n n
1 0 0
 (11.6) 1 2
∑ |a k | + |b k | ≤ ∑ k ∑ |a0k | + |b0k |
k=1 k k=1 k=1
!1/2 " #1/2
n n
1 0 0 2

(11.7) = ∑ 2 ∑ |ak | + |bk | ·
k=1 k k=1

Aplicando (11.7) em (11.5), obtém-se


n
L n 1 0 
∑ (|ak | + |bk|) = ∑ |ak | + |b0k |
k=1
π k=1 k
!1/2 " #1/2
n n
(11.7) L 1  2
(11.8) ≤ ∑ 2 ∑ |a0k | + |b0k| .
π k=1 k k=1

Agora usa-se o lema 5.1 deste adendo C:



(a + b)2 ≤ 2 a2 + b2 , para todos a, b ≥ 0.

Fazendo a = |a0k | e b = |b0k | na desigualdade acima e substituindo em (11.8), obtém-se


!1/2 " #1/2
n n n
L 1 2
∑ (|ak | + |bk |) ≤ π ∑ k2 ∑ |a0k | + |b0k|
k=1 k=1 k=1
!1/2 " #1/2
n n
L 1 
≤ ∑ k2 ∑2 |a0k |2 + |b0k | 2
π k=1 k=1
!1/2 " #1/2
n n
L 1 
= ∑ k2 2 ∑ |a0k |2 + |b0k | 2
π k=1 k=1
!1/2 " #1/2
n √ n
L 1 
= ∑ k2 · 2· ∑ |a0k |2 + |b0k| 2
π k=1 k=1
C.11 Convergência uniforme da série de Fourier 781

√ !1/2 " #1/2


n n
2L 1 
(11.9) = ∑ k2 ∑ |a0k |2 + |b0k | 2
.
π k=1 k=1

Como a desigualdade obtida em (11.9) é válida para todo n ∈ N, segue-se daí que
√ !1/2 " #1/2
∞ ∞ ∞
2L 1 
(11.10) ∑ (|an| + |bn|) ≤ ∑ n2 ∑ |a0n|2 + |b0n| 2
.
n=1 π n=1 n=1

O exemplo 11.1 mostra que a série



1
∑ n2
n=1
é convergente.
Aplicando a desigualdade de Bessel à função f , que, por hipótese, é periódica de período
T = 2L e pertencente ao espaço L2 (R), segue-se
∞ Z L
  1
∑ (a0n )2 + (b0n)2 ≤ | f 0 (x)|2 dx,
n=1 L −L

isto é, a desigualdade de Bessel mostra que a série


∞ 
∑ |a0n|2 + |b0n|2
n=1

é convergente.
Portanto, a série no primeiro membro de (11.10),

∑ (|an| + |bn|) ,
n=1

é majorada pelo produto de duas séries convergentes. Logo ela é convergente.


Para finalizar, basta observar o seguinte: a série de Fourier para f é dada por
∞ h  nπ x   nπ x i
a0
+ ∑ an cos + bn sen ·
2 n=1 L L

Escrevendo  nπ x   nπ x 
un (x) = an cos + bn sen ,
L L
obtém-se  nπ x   nπ x 

|un(x)| = an cos + bn sen
L L
 nπ x   nπ x 

≤ an cos + bn sen
L L
 nπ x   nπ x 

= |an| cos + |bn| sen
L L
= |an| + |bn| = Mn ,
onde Mn = |an | + |bn|.
782 C Série de Fourier generalizada

Isso mostra |un (x)| ≤ Mn para todo n ∈ N. Além disso, Mn ≥ 0 para todo n ∈ N. A de-

sigualdade em (11.10) mostra que a série ∑ α n é convergente. Portanto, tem-se que a série de
n=1

funções ∑ un (x) converge normalmente.1
n=1
O passo seguinte consiste em aplicar o teste M de Weierstrass. Ele diz o seguinte: Seja

∑ un (x) uma série de funções un : I → R definidas em um subconjunto I ⊂ R que converge
n=1

normalmente. Então, a série de funções ∑ un(x) converge uniforme e absolutamente em I.
n=1

Pelo teste M de Weierstrass, a série de funções ∑ un (x) converge uniformemente. Então a
n=1
série de Fourier, pelo o que foi exposto acima, também converge uniformente. Isto demonstra o
teorema.

Observação 11.1: Note que o teorema 11.1 toma como hipótese uma função f contínua em
R, mas permitindo que a função derivada primeira, f 0 (x), possa ser descontínua, mesmo que se
torne ilimitada nas vizinhanças de alguns pontos isolados. Se f for descontínua em um ponto
x0 , então a série de Fourier não poderá convergir uniformemente para f em nenhum intervalo
que contenha x0 . Isto se deve ao seguinte fato: o limite uniforme de uma sequência de funções
contínuas é uma função contínua. E aqui se fala sobre a sequência de somas parciais {Sn (x)}.
Portanto, para que se tenha a convergência uniforme da série de Fourier em todo R, a função f
deve ser necessariamente contínua.
Se f for contínua em um intervalo fechado e limitado [a, b], a série de Fourier da função f
convergiria uniformemente para f neste intervalo? A resposta é sim e está presente no próximo
teorema. Antes, serão apresentado alguns lemas, que serão usados em sua demonstração.

O lema a seguir mostra que uma determinada função, descontínua em vários pontos, converge
uniformemente em certos intervalos. Na verdade este lema é um caso particular do próximo
teorema.

Lema 11.1: Seja ϕ : R → R uma função periódica de período T = 2L definida por


1 Sejam un : I → R funções definidas em um subconjunto I ⊂ R. Diz-se que a série de funções un (x) converge

n=1

normalmente se existir uma sequência de constantes a0 ≥ 0 tais que a série numérica ∑ an converge e |un (x)| ≤ an para
n=1
todo n ∈ N e todo x ∈ I.
C.11 Convergência uniforme da série de Fourier 783


 1 x ,


 − 1+ −L ≤ x < 0,
 2
 L
(11.11) ϕ (x) = 0, para x = 0,


  
 1 1− x ,


0 < x ≤ L.
2 L
Então, a série de Fourier para ϕ é

1 ∞  nπ x 
ϕ (x) ∼ ∑ sen ·
π n=1 L
D EMONSTRAÇÃO : Inicia-se observando que esta série nunca convergirá uniformente em R,
pois sua soma é uma função descontínua ϕ (x). Por outro lado, mostrar-se-á que a série de
Fourier para ϕ converge uniformemente em todo intervalo (−a, a) tal que 0 < a < L.
Em seguida, determinar-se-á a série de Fourier para a função ϕ . Observando que ϕ é uma
função ímpar, então os coeficientes a0 = an = 0, de modo que basta calcular os coeficintes bn.
Assim, fazendo
 
 u = x,  du = dx,
 nπ x  ⇒  
 dv = sen dx,  v = − L cos nπ x ,
L nπ L
obtém-se Z  nπ x  Z  nπ x 
1 L 2 L
bn = ϕ (x) sen dx = ϕ (x) sen dx
L −L L L 0 L
Z
2 L1 x  nπ x 
= 1− · sen dx
L 0 2 L L
Z  nπ x  Z  nπ x 
1 L 1 L
= sen dx − 2 x · sen dx
L 0 L L 0 L
1  nπ x  L
=− cos −
nπ L 0
" #
1 L  nπ x  L L Z L  nπ x 
− 2 − · x · cos + cos dx
L nπ L 0 nπ 0 L
1 1
=− [cos(nπ ) − cos 0] + [L · cos(nπ ) − 0 · cos 0] −
nπ nπ L
1 L L  nπ x  L
− 2· · · sen
L nπ nπ L 0
1 1 1
=− [(−1)n − 1] + (−1)n − 2 2 [ sen (nπ ) − sen 0]
nπ nπ n π
1 1 1 1 ,
= − (−1)n + + (−1)n =
nπ nπ nπ nπ
n
onde usou-se os fatos que cos(nπ ) = (−1) e sen (nπ ) = sen 0 = 0.
Portanto, a série de Fourier para ϕ é
784 C Série de Fourier generalizada

1 ∞ 1  nπ x 
ϕ (x) ∼ ∑ sen ·
π n=1 n L

O próximo lema é conhecido como fórmula de Abel de adição por partes, uma vez que ela
corresponde a fórmula para integração por partes.
n
Lema 11.2 (Abel): Sejam {an } e {bn} duas sequências e Bn = ∑ bk a soma parcial. Se
k=1
n > m, então,
n n−1
(11.12) ∑ ak bk = (an Bn − am+1Bm ) + ∑ (ak − ak+1)Bk .
k=m+1 k=m+1

D EMONSTRAÇÃO : Observe primeiro que


k k−1
bk = ∑ bi − ∑ bi = Bk − Bk−1 .
i=1 i=1

para k = 1, 2, . . .
Então, o primeiro membro de (11.12) pode ser escrito na seguinte forma:
n n
(11.13) ∑ ak bk = ∑ ak (Bk − Bk−1).
k=m+1 k=m+1

Agora escreva
n
∑ ak (Bk − Bk−1) = am+1(Bm+1 − Bm ) + am+2 (Bm+2 − Bm+1 ) +
k=m+1

+ am+3 (Bm+3 − Bm+2) + · · ·


· · · + an−1 (Bn−1 − Bn−2) + an (Bn − Bn−1 ).
= − am+1Bm + (am+1 − am+2)Bm+1 +
+ (am+2 − am+3 )Bm+2 + · · · + (an−1 − an )Bn−1 + anBn

= anBn − am+1Bm + (am+1 − am+2)Bm+1 +

+ (am+2 − am+3 )Bm+2 + · · · + (an−1 − an )Bn−1
n−1
(11.14) = (anBn − am+1 Bm ) + ∑ (ak − ak+1)Bk .
k=m+1

Como o segundo membro de (11.13) é igual ao primeiro membro de (11.14), segue-se que
n n−1
∑ ak (Bk − Bk−1) = (an Bn − am+1 Bm ) + ∑ (ak − ak+1)Bk ,
k=m+1 k=m+1
C.11 Convergência uniforme da série de Fourier 785

que é o resultado desejado.

Lema 11.3: A série


∞ nπ x

sen L
(11.15) ∑
n=1 n

converge uniformemente em cada intervalo que não contenha pontos da forma x = 2nL, com
n ∈ Z.
D EMONSTRAÇÃO : Considere a seguinte série de funções complexas:

e inθ ,
(11.16) ∑
n=1 n

onde θ = π x/L.
Usando a fórmula de Euler, e inθ = cos(nθ ) + i sen (nθ ), com θ = π x/L, obtém-se

e inθ 1  nπ x  1  nπ x 
= cos + i sen ,
n n L n L
donde

e inθ ∞
1  nπ x  ∞
1  nπ x 
∑ = ∑ cos + i ∑ sen ·
n=1 n n=1 n L n=1 n L
Assim, se for demonstrado que a série complexa em (11.12) converge, então estará demon-
strado que as séries que representam suas partes real e imaginária, isto é,

1  nπ x  ∞
1  nπ x 
∑ cos e ∑n sen ,
n=1 n L n=1 L

também convergem. Assim, basta observar que se tem


" #
1 ∞ 1  nπ x  1 ∞ e inθ
∑ n sen L = Im π ∑ n ·
π n=1 n=1

Deste modo, o lema estará demonstrado se for mostrado que, para qualquer δ > 0, a série em
(11.12) converge uniformente para 0 < δ ≤ | x | ≤ L. Para isso, será demonstrado que a série

e inθ ,

n=1 n

converge uniformemente para θ ∈ [ε , π ], com ε > 0 arbitrário.


Seja
n
En (θ ) = ∑ e ikθ .
k=1
Observe que
786 C Série de Fourier generalizada

   
ik θ iθ 2iθ i(k−1)θ ik θ iθ 2iθ i(k−1)θ
e = e +e + ···+ e +e − e +e + ···+ e
k k−1
= ∑ e i jθ − ∑ e i jθ = Ek (θ ) − Ek−1(θ ),
j=1 j=1

donde segue que


n n
e ikθ Ek (θ ) − Ek−1(θ )
(11.17) ∑ k = ∑ ·
k=m+1 k=m+1 k

Pelo lema 11.2, tem-se que


n n−1
∑ ak (Bk − Bk−1) = (an Bn − am+1 Bm ) + ∑ (ak − ak+1)Bk .
k=m+1 k=m+1

Fazendo
1
ak = e Bk = Ek (θ ),
k
segue-se que
n n
e ikθ 1
∑ = ∑ [Ek (θ ) − Ek−1(θ )]
k=m+1 k k=m+1 k

= (lema 11.2)
  n−1  
En (θ ) Em (θ ) 1 1
(11.18) = − + ∑ − Ek (θ ).
n m+1 k=m+1 k k + 1

Por outro lado, tem-se


1 − zn+1 ,
1 + z + z2 + · · · + zn = z 6= 1.
1−z
Fazendo z = e iθ , para 0 < θ < 2π , obtém-se
n
1 − e i(n+1)θ ,
∑ e ikθ = 1 + e iθ + e 2iθ + · · · + e inθ = 1 − e iθ
k=1

isto é,

e iθ − e i(n+1)θ
(11.19) En (θ ) = ·
1 − e iθ
Além disso, da fórmula de Euler e da identidade trigonométrica, respectivamente,
 
iθ 2 θ 1 − cos θ ,
e = cos θ + i sen θ e sen =
2 2
segue-se que

1 − e = |1 − (cos θ + i sen θ )| = |(1 − cos θ ) + i sen θ |
C.11 Convergência uniforme da série de Fourier 787

q
= (1 − cos θ )2 + ( sen θ )2
p
= 1 − 2 cos θ + cos2 θ + sen 2 θ
p q
= 2(1 − cos θ ) = 2 · 2 sen 2 (θ/2)
q
= 4 · sen 2 (θ/2) = 2 | sen (θ/2)| .
Porém, como 0 < θ < 2π , tem-se que 0 < θ/2 < π , de modo que o valor do seno no último
membro acima é sempre não negativo, ou seja, o seu valor absoluto é igual a ele mesmo. Logo,


(11.20) 1 − e iθ = 2 sen (θ/2) .


Usando (11.20) e o fato e i(n+1)θ = 1 em (11.19), obtém-se a seguinte estimativa:


i(n+1)θ i(n+1)θ
1 − e i(n+1)θ 1 − e 1 + e

|En (θ )| = i =
1−e θ 1 − e iθ 1 − e iθ
2 (11.19) 2
= =
1 − e iθ 2 sen (θ/2)
1
(11.21) = ·
sen (θ/2)
Assim, aplicando (11.21) em (11.18), obtém-se


n e ikθ n−1  1 1
 
En (θ ) Em (θ )

∑ = ∑ − Ek (θ ) + −
k=m+1 k k=m+1 k k + 1 n m+1

n−1  1 1

E (θ ) E (θ )
n + m
= ∑ − Ek (θ ) +
k=m+1 k k + 1 n m+1

n−1  
1 1
|Ek (θ )| + |En (θ )| + |Em (θ )|
≤ ∑ −
k=m+1
k k+1 n m+1
 
(11.21) n−1 1 1 1 1 1 1 1
≤ ∑ k − k + 1 sen (θ/2) + sen (θ/2) · n + sen (θ/2) · m + 1
k=m+1
" #
n−1   
1 1 1 1 1
= ∑ k − k+1 + n + m+1
sen (θ/2) k=m+1
"   
1 1 1 1 1
= − + − +···
sen (θ/2) m+1 m+2 m+2 m+3
     #
1 1 1 1 1 1
···+ − + − + +
n−2 n−1 n−1 n n m+1
788 C Série de Fourier generalizada

 
1 1 1 1 1
= − + +
sen (θ/2) m + 1 n n m + 1
2
(11.22) = ·
(m + 1) sen (θ/2)
Logo, para 0 < ε ≤ θ ≤ π , segue-se que

n e ikθ 2

∑ ≤ ·
k=m+1 k (m + 1) sen (ε/2)

Portanto, pelo critério de Cauchy, segue-se a convergência uniforme de (11.16) e, conse-


quentemente, a convergência uniforme de (11.15).

Teorema 11.2 (convergência uniforme 2): Seja f : R → R uma função periódica de período
T = 2L, seccionalmente contínua e tal que f 0 ∈ L2(R). Então, a série de Fourier de f con-
verge uniformemente para f em todo intervalo fechado e limitado que não contenha pontos de
descontinuidade de f .
D EMONSTRAÇÃO : Sejam x1 , . . ., xk os pontos do intervalo [−L, L) onde f é descontínua e
sejam ω1 , . . ., ωk os saltos da função f nestes pontos de descontinuidade, isto é,

ωi = f (xi + 0) − f (xi − 0).

Agora considere a função ϕ do lema 11.1, isto é,



 1 x ,


 − 1+ −L ≤ x < 0,
 2
 L
ϕ (x) = 0, para x = 0,


  
 1 1− x ,


0 < x ≤ L.
2 L
Com a notação anterior, tem-se que a função ωi ϕ (x − xi ) é descontínua nos pontos da forma
xi ± 2Ln, onde n = 0, 1, 2, . . .. Além disso, o salto dessa função nesses pontos é ωi . Então a
função f (x) − ωi ϕ (x − xi ) é contínua nesses pontos e em todos os pontos onde f já é contínua.
Desse modo, produziu-se uma função com menos continuidade do que a função original f . Para
eliminar todas as descontinuidades, repete-se este processo k vezes e, assim, ter-se-á a função
k
g(x) = f (x) − ∑ ωi ϕ (x − xi ),
i=1

que é contínua para todo x.


C.11 Convergência uniforme da série de Fourier 789

Portanto, pode-se aplicar o primeiro teorema sobre a convergência uniforme da série de


Fourier (teorema 11.1) à função g, que satisfaz suas hipóteses. Com isso, conclui-se que a série
de Fourier para a função g converge uniformemente para f em todos os pontos de R.
Além disso, pelo lema 11.3, a série de Fourier para a função ϕ (x − xi ) converge uniforme-
mente em qualquer intervalo fechado que não contenha pontos da forma xi ± 2Ln Como a
série de Fourier da função f é a soma das séries de Fourier das funções g e ωi ϕ (x − ß), para
j = 1, . . ., k, segue-se que ela converge uniformemente em qualquer intervalo fechado que não
contenha pontos da forma xi ± 2Ln, para i = 1, . . ., k e n = 0, 1, 2, . . ., que são justamente os
pontos de descontinuidade da função f . Isso completa a demonstração do teorema.

Observação 11.2: Será comentado aqui as ideias usadas nas demonstrações dos lemas ante-
riores. Na verdade, os três lemas poderiam ser unificado em um único resultado: que a função
ϕ (do lema 11.1) tem uma série de Fourier (lema 11.3) que converge uniformemente nos in-
tervalos que não contém seus pontos de descontinuidade. Ou seja, é um caso particular e um
resultado mais geral e que será objeto do próximo teorema.
Seja u : R → R uma função periódica de período T = 2L definida por

 L x x2
 − − ,
 −L ≤ x ≤ 0,
(11.23) u(x) = 2 2 4L
 2
L+x− x ,

0 < x < L.
2 2 4L
A função u é contínua. Os pontos que merecem atenção especial são x = ±L e x = 0, pois
nos demais pontos do intervalo [−L, L) a função é polinomial e, portanto, contínua. Tem-se:
 
L x x2 L L L 3L
lim u(x) = lim − − = + − = ,
x→−L+ x→−L+ 2 2 4L 2 2 4 4
 
L x x2 L L L 3L
lim u(x) = lim + − = + − = ,
x→L− x→L− 2 2 4L 2 2 4 4
 
L x x2 L
lim u(x) = lim − − = ,
x→0 − x→0 − 2 2 4L 2
 
L x x2 L
lim u(x) = lim + − = ·
x→0 + x→0 + 2 2 4L 2
Isto mostra que u é contínua no intervalo [−L, L). Mas como u é periódica de período T = 2L,
segue-se que u é contínua em todos os pontos de R.
Tem-se também que u0 ∈ L2(R). Novamente, basta considerar os pontos x = ±L e x = 0
calcular as derivadas laterais. Para x = −L, tem-se

u(−L + h) − u(−L)
u0+ (−L) = lim
h→0+ h
790 C Série de Fourier generalizada

 
1 L −L + h (−L + h)2 L −L (−L)2
= lim − − − + +
h→0+ h 2 2 4L 2 2 4L
   
1 h h h2 h
(11.24) = lim − + + = lim = 0.
h→0+ h 2 2 4L h→0+ 4L

Para x = L, tem-se
u(L + h) − u(L)
u0− (L) = lim
h→0− h
 
1 L L + h (L + h)2 L L (L)2
= lim + − − − +
h→0− h 2 2 4L 2 2 4L
 
1 h h h2
= lim − −
h→0− h 2 2 4L
 
h
(11.25) = lim − = 0.
h→0− 4L
Para x = 0 deve-se calcular as duas derivadas laterais: u0− (0) e u0− (0). Tem-se:

u(0 + h) − u(0)
u0− (0) = lim
h→0− h
 
1 L h h2 L 0 02
= lim − − − + +
h→0− h 2 2 4L 2 2 4L
   
1 h h2 1 h 1
(11.26) = lim − − lim − − =− ·
h→0− h 2 4L h→0− 2 4L 2
e
u(0 + h) − u(0)
u0+ (0) = lim
h→0+ h
 
1 L h h2 L 0 02
= lim + − − − +
h→0+ h 2 2 4L 2 2 4L
   
1 h h2 1 h 1
(11.27) = lim − lim − = ·
h→0 h 2
+ 4L h→0 2 4L
+ 2
Nos demais pontos do intervalo [−L, L) a derivada pode ser calculada diretamente. Assim,
para x ∈ (−L, 0), tem-se
1 x 1 x ,
(11.28) u0 (x) = − − = − 1+
2 2L 2 2
e para x ∈ (0, L)

0 1 x 1 x
(11.29) u (x) = − − = 1− .
2 2L 2 2
Reunindo os resultados obtidos nas equações de (11.24)–(11.29) pode-se escrever uma rep-
resentação para u0 (x):
C.11 Convergência uniforme da série de Fourier 791


 1 x,


 − 1 + −L ≤ x < 0,
 2
 2
u0 (x) = 0, x = 0,


  
 1 1− x ,


0<x<L
2 2
onde se definiu a derivada de u em x = 0 como sendo u0 (0) = 0, uma vez que u0 (x) é descontínua
neste ponto.
Fazendo uma extensão periódica de período T = 2L na função u0 (x), segue-se que a mesma
será exatamente a função ϕ (x) do lema 11.1 e que também foi usada na demonstração do teo-
rema 11.2.
Como u é contínua, então ela é integrável no intervalo [−L, L). Além disso, é fácil calcular
a integral de |u(x)|2 . Isto mostra que u ∈ L2([−L, L)). E, consequentemente, a sua extensão
periódica de período T = 2L também.
Agora avança-se mais um pouco e determina-se a série de Fourier para a função u definida
em 11.23) e que é periódica de período T = 2L. Usando a própria definição da função u, é fácil
verificar que a mesma é uma função par, de modo que basta calcular os coeficientes a0 e an,
uma vez que todos os bn serão nulos. Tem-se:
Z Z  
2 L 2 L L x x2
a0 = u(x) dx = + − dx
L 0 L 0 2 2 4L
 
2 Lx x2 x3 L
= + −
L 2 4 12L 0
   
2 L2 L2 L3 2 6L2 3L2 L2
= + − = + −
L 2 4 12L L 12 12 12
4L
(11.30) = ·
3
Em seguida calcula-se os coeficienets an , onde será necessário fazer integração por partes.
Tem-se:
Z L  nπ x  Z L   nπ x 
2 2 L x x2
an = u(x) cos dx = + − cos dx
L 0 L L
0 2 2 4L L
Z L  nπ x  Z  nπ x  Z L  nπ x 
1 L 1
= cos dx + x · cos dx − 2 x2 · cos dx
0 L L 0 L 2L 0 L
" #
L  nπ x  L 1 L  nπ x  L L Z L  nπ x 
= · sen + · x · sen − sen dx −
nπ L 0 L nπ L 0 nπ 0 L
" #
1 L 2  nπ x  L 2L Z L  nπ x 
− · x · sen − x · sen dx
2L2 nπ L 0 nπ 0 L

L 1 L  nπ x  L
= [ sen (nπ ) − sen 0] + [L · sen (nπ ) − 0 · sen 0] + 2 2 cos −
nπ nπ n π L 0
792 C Série de Fourier generalizada

Z L  nπ x 
1  2 2
 1
− L · sen (nπ ) − 0 · sen 0 + x · sen dx
2nπ L nπ L 0 L
" #
L 1 L  nπ x  L L Z L  nπ x 
= 2 2 [cos(nπ ) − cos 0] + − · x · cos + cos dx
n π nπ L nπ L 0 nπ 0 L

L 1 L  nπ x  L
n
= 2 2 [(−1) − 1] − 2 2 [L · cos(nπ ) − 0 · cos 0] + 3 3 sen
n π n π n π L 0
L L L L
= (−1)n − − (−1)n + [ sen (nπ ) − sen 0]
n2 π 2 n2 π 2 n2 π 2 n3 π 3
L
(11.31) =− ·
n2 π 2
Usando (11.30) e (11.31), segue-se que a série de Fourier para u,
∞ h  nπ x   nπ x i
a0 ,
u(x) ∼ + ∑ an cos + bn sen
2 n=1 L L

é dada por

2L L ∞ cos nπL x
(11.32) u(x) ∼ − 2 ∑ ·
3 π n=1 n2

Agora observe o seguinte



L L 1 M
|an| = − 2 2 = 2 · 2 = 2 ,

n π π n n
onde M = L/π 2. Já os coeficientes bn são todos nulos. Assim, o teorema 11.1 garante que a série
de Fourier para u converge uniformemente para a função u(x) em R.
Viu-se anteriormente que a derivada da função u(x) é igual a função ϕ (x) do lema 11.1 e que
foi usada no teorema 11.2. Surge a seguinte questão: É possível derivar termo a termo a série
de Fourier para u(x) e ser a mesma igual a série de Fourier para a função ϕ (x)? Note-se que a
série de Fourier para ϕ (x) foi calculada na demonstração do lema 11.1.
Agora será usado o seguinte resultado de Análise: Sejam un : [a, b] → R funções de classe

C1 ([a, b]). Suponha que a série ∑ u0n(x) das funções derivadas convirja uniformemente para
n=1

uma função v(x) no intervalo [a, b]. Suponha ainda que a série numérica ∑ un(x0 ) seja con-
n=1

vergente para certo x0 ∈ [a, b]. Então, a série de funções ∑ un(x) converge uniformemente em
n=1
[a, b] para uma função u(x), u(x) é derivável e u0 (x) = v(x), isto é,
" #
d ∞ ∞

dx n=1
u n (x) = ∑ u0 (x).
n=1
C.11 Convergência uniforme da série de Fourier 793

Assim, esta proposição responde afirmativa à questão posta, caso x esteja em um intervalo
em que a série das derivadas converge uniformemente. Deste modo, passa-se a derivação termo
a termo da série em (11.32), mas derivando em intervalos que não contenha os pontos na forma
x = ±2Ln, n = 0, 1, 2, . . . Tem-se:
" #
d 2L L ∞ cos nπL x L ∞ 1 d  nπ x 
− 2 ∑ = − 2 ∑ 2 · cos
dx 3 π n=1 n2 π n=1 n dx L
L ∞ 1  nπ   nπ x 
= 2 ∑ 2· − sen
π n=1 n L L

1 ∞ sen nπL x
= ∑ ·
π n=1 n

Observe-se que a série acima, obtida por derivação termo a termo da série de Fourier para a
função u(x), é examente a série de Fourier para a função ϕ (x) que foi obtida no lema 11.1.
Também deve ser notado que em pontos da forma x = ±2Ln, n = 0, 1, 2, . . ., a série acima
não converge uniformemente, como já comentado anteriormente. Por outro lado, nestes pontos
a série, que passa a ser numérica, converge para zero, pois os senos se anulam. E, neste caso,
é notável que, mesmo tendo ϕ (x) = u0 (x) um salto de −1/2 até 1/2 nestes pontos, ainda assim a
série converge para a média destes limites laterais, no caso para o valor zero. Como exemplo,
observe tal salto em x = 0, a periodicidade de ϕ = u0 justifica os saltos nos demais pontos.
Adendo D
Equação de Laplace: estudo mais geral

D.1 Revisão dos teorema de Green e Gauss

Um teorema fundamental para o estudo de EDP é o teorema de Gauss, também conhecido


como teorema da divergência. Em R2, o teorema de Gauss é um corolário do teorema de Green.

Lema 1.1: Seja Ω ⊂ R2 uma região do tipo 1, isto é, uma região fechada e limitada que é
descrita simultaneamente nas seguintes formas:

(1.1) Ω = (x, y) ∈ R2 | a ≤ x ≤ b, e f1 (x) ≤ y ≤ f2 (x) ,

e

(1.2) Ω = (x, y) ∈ R2 | c ≤ x ≤ d, e g1 (y) ≤ y ≤ g2 (y) ,

onde f1 (x) e f2 (x) são funções de classe C1 no intervalo [a, b] que satisfazem f1 (x) ≤ f2 (x) e
onde g1(y) e g2(y) são funções de classe C1 no intervalo [c, d] que satisfazem g1(y) ≤ g2 (y). A
fronteira ∂ Ω de Ω está orientada positivamente (no caso, no sentido anti-horário) e é percorrida
apenas uma vez.
Se F (x, y) = (F1 (x, y), F2 (x, y)) é um campo vetorial de classe C1 em um subconjunto aberto
que contém Ω, então
Z ZZ  
∂ F2 ∂ F1
F1 (x, y) dx + F2(x, y)dy = − dx, dy.
∂Ω Ω ∂x ∂y
D EMONSTRAÇÃO : Um exemplo de região simples pode ser vista através da figura 1.1. A
fronteira ∂ Ω de Ω formada por dois caminhos que são gráficos de duas funções.
Para a região dada em (1.1), a fronteira ∂ Ω de onda pode ser descrita pela união de duas
curvas que podem ser parametrizadas por

C1 : σ 1(x) = (x, f1 (x)), para x variando de a até b,

C2 : σ 2(x) = (x, f2 (x)), para x variando de b até a.

795
796 D Equação de Laplace: estudo mais geral

Figura 1.1: Região Ω do tipo simples.

Assim, a integral de linha de F1 (x, y) sobre ∂ Ω, fronteira de Ω dado em (1.1), é dada por
Z Z Z Z
F1 (x, y) dx = F1 (x, y) dx = F1 (x, y) dx + F1 (x, y) dx
∂Ω C1 ∪C2 C1 C2
Z b Z a
= (F1 [σ 1 (x)], 0) · σ 01 (x) dx + (F1 [σ 2(y)], 0) · σ 02 (y) dy
a b
Z b Z b
= (F1 [σ 1 (x)], 0) · σ 01 (x) dx − (F1 [σ 2(y)], 0) · σ 02 (y) dy +
a a
Z b
= (F1 (x, f1 (x)), 0) · (1, f10 (x)) dx −
a
Z b
− (F1 (x, f2 (x)), 0) · (1, f20 (x)) dx
a
Z b Z b
= F1 (x, f1 (x)) dx − F1 (x, f2 (x)) dx
a a
Z b
(1.3) =− [F1 (x, f2 (x)) − F1 (x, f1 (x))] dx.
a

Para a região dada em (1.2), a fronteira ∂ Ω de onda pode ser descrita pela união de quatro
curvas que podem ser parametrizadas por

C2 : σ 3 (y) = (g1 (y), y), para y variando de d até c,

C4 : σ 4 (y) = (g2 (y), y), para y variando de c até d.

Assim, a integral de linha de F2 (x, y) sobre ∂ Ω, fronteira de Ω dado em (1.2), é dada por
Z Z
F2 (x, y) dx = F2 (x, y) dy
∂Ω C1 ∪C2
Z Z
= F2 (x, y) dy + F2 (x, y) dy
C1 C2
D.1 Revisão dos teorema de Green e Gauss 797

Z c Z d
= (F2 [σ 1 (x)], 0) · σ 01 (y) dy + (F2 [σ 2 (x)], 0) · σ 02 (x) dx
d c
Z d Z d
=− (0, F2 [σ 1 (y)]) · σ 01 (y) dy + (F2 [σ 2(x)], 0) · σ 02 (x) dx +
c c
Z d
=− (0, F2 (g1 (y), y)) · (g01(y), 1) dy +
c
Z d
+ (0, F2(g2 (y), y)) · (g02(y), 1) dy −
c
Z d Z d
=− F2 (g1 (y), y) dy + F2 (g2 (y), y) dy
c c
Z d
(1.4) = [F2 (g2 (y), y) − F2 (g1 (y), y)] dy.
c

Por outro lado, observe agora que a integral dupla pode ser escrita na seguinte forma:
ZZ   ZZ ZZ
∂ F2 ∂ F1 ∂ F2 ∂ F1
− dx dy = dx dy + − dx dy.
Ω ∂x ∂y Ω ∂x Ω ∂y
Agora é possível calcular cada integral do segundo membro acima separadamente. Usando
Ω descrito em (1.1), obtém-se
ZZ Z b Z f2 (x)
∂ F1 ∂ F1
− (x, y) dx dy = (x, y) dy dx

Ω ∂y a f1 (x) ∂y
Z b f2 (x)
TFC
= −F1 (x, y) dx
a f1 (x)
Z b
= − [F1 (x, f2 (x)) − F1 (x, f1 (x))] dx
a
Z b
=− [F1 (x, f2 (x)) − F1 (x, f1 (x))] dx
a
Z
(1.3)
(1.5) = F1 (x, y) dx.
∂Ω

onde TFC significa teorema fundamental do Cálculo.


Para a outra integral, encontra-se
ZZ Z d Z g2 (y)
∂ F2 ∂ F2
(x, y) dx dy = (x, y) dx dy
Ω ∂x c ∂x g1 (y)
Z d g2(y)
TFC
= F2 (x, y) dy
c g1 (y)
Z d
= [ F2 (g2 (y), y) − F2 (g1 (y), y)] dy
c
Z
(1.4)
(1.6) = F2 (x, y) dy.
∂Ω
798 D Equação de Laplace: estudo mais geral

Somando (1.5) e (1.6) membro a membro, obtém-se


ZZ   ZZ ZZ
∂ F2 ∂ F1 ∂ F2 ∂ F1
− dx dy = (x, y) + − (x, y) dx dy
Ω ∂x ∂y Ω ∂x Ω ∂y
Z Z
= F2 (x, y) dy + F1 (x, y)dx
∂Ω ∂Ω
Z Z
= F1 (x, y) dx + F2 (x, y)dy
∂Ω ∂Ω
Z
= F1 (x, y) dx + F2 (x, y) dy,
∂Ω

que é o teorema de Green restrito a regiões simples.

Teorema 1.1 (Green): Sejam Ω ⊂ R2 uma região fechada e limitada, cuja fronteira ∂ Ω é
uma curva fechada simples (isto é, sem auto-interseção), orientada positivamente e parametri-
zada por uma função de classe C1 por partes, de modo que ∂ Ω seja percorrida apenas uma vez.
Se F (x, y) = (F1 (x, y), F2 (x, y)) é um campo vetorial de classe C1 1 em um subconjunto aberto
que contém Ω, então
Z Z ZZ  
∂ F2 ∂ F1
F · drr = F1 dx + F2 dy = − dx dy.
∂Ω ∂Ω Ω ∂x ∂y

Demonstração: Para regiões mais gerais a ideia consiste em decompor tais regiões como
união de regiões simples e aplicar o resultado particular obtido no lema 1.1. Suponha que Ω
seja uma região não simples e que possa ser descrita na forma Ω = Ω1 ∪ Ω2 ∪ · · · ∪ Ωn , onde
cada região Ωk , com k = 1, 2, . . ., n, é do tipo simples e que tem fronteira ∂ Ωk C1 por partes.
Deste modo, é possível aplicar o teorema de Green para regiões simples em cada Ωk , permitindo
escrever ZZ   Z
∂ F2 ∂ F1
− dx dy = F1 dx + F2 dy, k = 1, 2, . . ., n.
Ωk ∂x ∂y ∂ Ωk
Portanto,
ZZ   ZZ  
∂ F2 ∂ F1 ∂ F2 ∂ F1
− dx dy = − dx dy
Ω ∂x ∂y Ω1 ∪Ω2 ∪···∪Ωn ∂x ∂y
ZZ  
∂ F2 ∂ F1
= − dx dy +
Ω1 ∂x ∂y
ZZ  
∂ F2 ∂ F1
+ − dx dy + · · ·
Ω2 ∂x ∂y

1
Seja X ⊂ R2 aberto. Diz-se que F : X → R2 é um campo vetorial de classe C1 (X) quando todas as derivadas parciais
∂ Fi
das funções coordenadas de F são contínuas em X.
∂xj
D.1 Revisão dos teorema de Green e Gauss 799

ZZ  
∂ F2 ∂ F1
···+ − dx dy
Ωn ∂x ∂y
Z
= F1 dx + F2 dy +
∂ Ω1
Z
+ F1 dx + F2 dy + · · ·
∂ Ω2
Z
···+ Fn dx + F2 dy
∂ Ω1
ZZ
= F1 dx + F2 dy,
∂Ω
que é a versão do teorema de Green para regiões mais gerais.

Figura 1.2: Decomposição da região Ω em regiões simples Ωk .

A fronteira ∂ Ω da região Ω é formada por partes das curvas ∂ Ωk , com k = 1, 2, . . ., n. As


partes de ∂ Ωk que não constituem a fronteira de Ω agem como fronteira comum a duas regiões
simples. Uma parte de ∂ Ωk que é fronteira comum a duas regiões simples será percorrida duas
vezes em sentidos opostos, de modo que a soma de duas integrais de linha nesta parte será igual
a zero. Ou seja, enquanto
Z as partes das curvas ∂ Ωk que formam a fronteira de Ω contribuem
para a integral de linha F1 dx + F2 dy, as outras partes se cancelam, de forma que se tem
∂Ω
ZZ   Z
∂ F2 ∂ F1
− dx dy = F1 dx + F2 dy.
Ω ∂x ∂y ∂Ω

O próximo passo consiste em apresentar o teorema de Gauss em R2 . Para isso, seja Ω um


domínio limitado com fronteira ∂ Ω dada por uma curva suave, isto é, uma curva que pode ser
parametrizada por σ (t) de classe C1 tal que o vetor velocidade σ 0 (t) nunca se anule. A aplicação
dada por (x, y) 7→ (x, y, 0) identifica a região Ω ⊂ R2 em uma região contida Ω0 no plano xy do
espaço R3. Aqui é preciso um cuidado adicional: os pontos de Ω são pares ordenados (x, y) e os
800 D Equação de Laplace: estudo mais geral

pontos de Ω0 são triplas ordenadas (x, y, 0). Assim sendo, a rigor, as duas regiões não são iguais,
mas a identificação permite que elas sejam observadas como se fosse uma só. Deste modo, por
abuso de notação, continuar-se-á usando a notação Ω no lugar de Ω0 .
Agora defina
σ 0 (t) × k ,
(1.7) n (t) =
|σ 0 (t) × k |

onde k = (0, 0, 1) e o símbolo “×” denota o produto vetorial em R3 .


Considere a parametrização σ com orientação positiva para a fronteira ∂ Ω. Então n definida
a expressão (1.7) é o vetor normal exterior (unitário). Veja a figura 1.3. Observe também que o
vetor k é vertical ao plano xy em R3.

Figura 1.3: n (t) é normal exterior unitário no ponto σ (t), mas pertencente ao plano xy.

Faça σ (t) = (x(t), y(t)), de modo que σ 0 (t) = (x0 (t), y0 (t)). Calculando explicitamente o pro-
duto vetorial em (1.7), obtém-se


i j k

 
0 0 0
σ (t) × k = x (t) y (t) 0 = y (t), −x (t), 0 .
0 0



0 0 1

A identificação (x, y) 7→ (x, y, 0) tem como inversa a aplicação (x, y, 0) 7→ (x, y) que permite
escrever o vetor n (t) em R2 a partir da fórmula (1.7), ou seja, em R2 tem-se que n (t) é escrito
na forma
1 
n (t) = p y0 (t), −x0 (t)
[x0 (t)]2 + [y0 (t)]2
!
y0 (t) −x0 (t)
(1.8) = p , p ·
[x0 (t)]2 + [y0 (t)]2 [x0 (t)]2 + [y0 (t)]2
D.1 Revisão dos teorema de Green e Gauss 801

Convenciona-se, neste texto, que falar em normal exterior se refere ao vetor n definido pela
fórmula (1.8) acima.
Uma curva suave pode ser sempre parametrizada pelo comprimento de arco, pois
ds 0
= σ (t) > 0.
dt
Sejam Ω ⊂ R3, f : Ω → R uma função contínua por partes e C uma curva parametrizada por
σ : [a, b] → Ω de classe C1 . Então a integral de f ao longo de σ em relação ao comprimento de
arco é Z Z b Z L
0
f (x, y)dx =
f [σ (t)] σ (t) dt = f [γ (s)] ds,
C a 0
onde L é o comprimento de σ e γ : [0, L] → Ω dada por γ (s) = σ [t(s)] é a representação de σ
pelo comprimento de arco.
A versão do teorema de Gauss (teorema da divergência) para R2 é dada no resultado abaixo.

Teorema 1.2 (Gauss): Sejam Ω ⊂ R2 uma região fechada e limitada, cuja fronteira ∂ Ω é uma
curva fechada simples (isto é, sem auto-interseção), orientada positivamente e parametrizada
por uma função de classe C1 por partes, de modo que ∂ Ω seja percorrida apenas uma vez. Seja
F : Ω → R2 um campo vetorial dado por F(x, y) = (F1 (x, y), F2 (x, y)) e de classe C1 em um
subconjunto aberto que contém Ω. Então,
Z ZZ
(1.9) F · n ds = F dx dy,
divF
∂Ω Ω

onde n é a normal exterior unitária.


D EMONSTRAÇÃO : Sejam σ 1 , . . ., σ n as curvas que formam a fronteira ∂ Ω, onde σ i : [ai , bi] →
Ω são dadas por σ i (t) = (xi (t), yi (t)), i = 1, . . ., n, e que dão uma orientação positiva para ∂ Ω.
Com as hipóteses dadas é possível aplicar o teorema de Green. Lembrando que, por definição,
o divergente do campo F , é dado por
∂ F1 ∂ F2
F (x, y) =
divF (x, y) + (x, y).
∂x ∂y
de modo que se tem
ZZ ZZ   ZZ   
∂ F1 ∂ F2 ∂ F1 ∂ F2
F dx dy =
divF + dx dy = − − dx dy
Ω Ω ∂x ∂y Ω ∂x ∂y
= (pelo teorema de Green)
Z
= (−F2 (x, y) dx + F1 (x, y) dy)
∂ Ω+
n Z
= ∑ (−F2 (x, y) dx + F1 (x, y) dy)
i=1 σ i
n Z bi  
= ∑ −F2 (xi (t), yi (t)) x0i (t) + F1 (xi (t), yi (t)) y0i (t) dt
i=1 ai
802 D Equação de Laplace: estudo mais geral

n Z bi 
=∑ (F1 (xi (t), yi (t)) , F2 (xi (t), yi (t))) · y0i (t), −x0i (t) dt
i=1 ai
n Z bi
=∑ (F1 [σ i (t)] , F2 [σ i (t)]) · σ 0i (t) dt
i=1 ai
!
n Z bi
1 0
=∑ (F1 [σ i (t)] , F2 [σ i (t)]) · σ 0i (t)
σ 0 (t) σ i (t) dt

i=1 a i i
" #
n Z bi
σ 0 (t)
=∑ (F1 [σ i (t)] , F2 [σ i (t)]) · i0 σ 0i (t) dt
i=1 ai σ i (t)
n Z bi
=∑ [(F1 [σ i (t)] , F2 [σ i (t)]) · ni (t)] σ 0i (t) dt
i=1 ai
n Z L(σ i ) Z
=∑ F · n i ds = F · n ds,
i=1 0 ∂Ω

onde a notação ∂ Ω+ indica que a fronteira está orientada positivamente.

A seguir, a versão em R3 para o teorema de Gauss (ou teorema da divergência).

Teorema 1.3 (Gauss): Seja Ω uma região fechada e limitada em R3, cuja fronteira ∂ Ω é uma
superfície orientada positivamente. Se F = (F1 , F2 , F3) é um campo vetorial de classe C1 em um
subconjunto aberto de R3 que contém Ω, então
ZZ ZZZ
(1.10) F · dSS = F dx dy dz.
divF
∂Ω Ω

D EMONSTRAÇÃO : Suponha que Ω seja uma região simples, ou seja, Ω é uma região dos
tipos 1, 2 e 3 simultaneamente em R3 . Assim sendo, a integral tripla no segundo membro de
(1.10) pode ser escrito na forma
ZZZ ZZZ  
∂ F1 ∂ F2 ∂ F3
F dx dy dz =
divF + + dx dy dz
Ω Ω ∂x ∂y ∂z
ZZZ ZZZ ZZZ
∂ F1 ∂ F2 ∂ F3
(1.11) = dx dy dz + dx dy dz + dx dy dz.
Ω ∂x Ω ∂y Ω ∂z

Por outro lado, a integral de superfície no primeiro membro de (1.10) é dada por
ZZ ZZ ZZ
F · dSS = F · n ) ds =
(F [(F1 , F2 , F3) · n ] ds
∂Ω ∂Ω ∂Ω
ZZ
= {[(F1 , 0, 0) + (0, F2, 0) + (0, 0, F3)] · n } ds
∂Ω
ZZ
= [(F1 , 0, 0) · n + (0, F2 , 0) · n + (0, 0, F3) · n] ds
∂Ω
D.1 Revisão dos teorema de Green e Gauss 803

ZZ ZZ ZZ
(1.12) = [(F1 , 0, 0) · n] ds + [(0, F2 , 0) · n] ds + [(0, 0, F3) · n ] ds.
∂Ω ∂Ω ∂Ω

Segue-se de (1.11) e (1.12) que a demonstração estará concluída se for demonstrado a vali-
dade das seguintes identidades:
ZZZ ZZ
∂ F1
(1.13) dx dy dz = [(F1 , 0, 0) · n] ds,
Ω ∂x ∂Ω
ZZZ ZZ
∂ F2
(1.14) dx dy dz = [(0, F2 , 0) · n] ds,
Ω ∂y ∂Ω
ZZZ ZZ
∂ F3
(1.15) dx dy dz = [(0, 0, F3) · n ] ds,
Ω ∂z ∂Ω

Inicia-se demonstrando a identidade (1.15). Para isso, a região Ω será descrita como uma
região do tipo 1, ou seja,

Ω = (x, y, z) ∈ R3 | f1 (x, y) ≤ z ≤ f2 (x, y), (x, y) ∈ D ,

onde D é uma região no plano xy em R3 .


Essa região é limitada inferiormente por uma superfície S1 de equação z = f1 (x, y), com
(x, y ∈ D, limitada superiormente por uma superfície S2 de equação z = f2 (x, y), (x, y) ∈ D e
possivelmente por uma superfície S3 que é uma porção de cilindo gerada por uma reta paralela
ao eixo z ao longo da fronteira de D. Veja a figura 1.4.
Assim sendo, tem-se
ZZZ ZZ Z f2 (x,y) 
∂ F3 ∂ F3
dx dy dz = dx, dy
Ω ∂z D f1 (x,y) ∂ z
ZZ f2(x,y)
TFC
= F3 (x, y, z) dx dy
D f1 (x,y)
ZZ
(1.16) = [F3 (x, y, f2 (x, y)) − F3 (x, y, f1 (x, y))] dx dy.
D

Por outro lado, tem-se que


ZZ ZZ
[(0, 0, F3) · n] ds = [(0, 0, F3) · n ] ds
∂Ω S1 ∪S2 ∪S3
ZZ
= [(0, 0, F3) · n 1 ] ds
S1
ZZ
+ [(0, 0, F3) · n 2 ] ds +
S2
ZZ
(1.17) + [(0, 0, F3) · n 3 ] ds,
S3

onde n 1 , n 2 e n 3 denotam os vetores normais unitários às superfícies S1 , S2 e S3, respectivamente.


Em S3 , o campo de vetores normais unitários é paralelo ao plano xy, de modo que (0, 0, F3) ·
n 3 = 0. Portanto,
804 D Equação de Laplace: estudo mais geral

Figura 1.4: Região simples, isto é, uma região dos tipos 1, 2 e 3 simultaneamente.

ZZ
(1.18) [(0, 0, F3) · n 3 ] ds = 0.
S3

A superfície S2 é o gráfico da função z = f2 (x, y), com (x, y) ∈ D, de modo que a mesma pode
ser paramentrizada por

ϕ (x, y) = (x, y, f2 (x, y)), (x, y) ∈ D.

Os vetores a abaixo são tangentes à superfície S2 :


   
∂ϕ ∂ f2 ∂ϕ ∂ f2
(x, y) = 1, 0, (x, y) e (x, y) = 0, 1, (x, y) .
∂x ∂x ∂y ∂y
Assim, o campo de vetores normais de Ω é dado por
 
∂ϕ ∂ϕ
n2 = × (x, y)
∂x ∂y


i j k


∂ f
2
= 1 0 (x, y)
∂x

∂ f 2

0 1 (x, y)

∂y
 
∂ f2 ∂ f2
= − (x, y), − (x, y), 1 .
∂x ∂y
Portanto,
D.1 Revisão dos teorema de Green e Gauss 805

ZZ ZZ   
∂ f2 ∂ f2
[(0, 0, F3) · n 2 ] ds = (0, 0, f2(x, y)) · − ,− ,1 dx dy
S2 D ∂x ∂y
ZZ
(1.19) = F3 (x, y, f2 (x, y) dx dy.
D

A superfície S1 é o gráfico da função z = f1 (x, y), com (x, y) ∈ D, de modo que a mesma pode
ser paramentrizada por

ϕ (x, y) = (x, y, f1 (x, y)), (x, y) ∈ D.

Os vetores a abaixo são tangentes à superfície S1 :


   
∂ϕ ∂ f1 ∂ϕ ∂ f1
(x, y) = 1, 0, (x, y) e (x, y) = 0, 1, (x, y) .
∂x ∂x ∂y ∂y
Assim, o campo de vetores normais que aponta para fora de Ω é dado por


i j k

   
∂ϕ ∂ϕ ∂ f ∂ f1 ∂ f1
1
N= × (x, y) = 1 0 (x, y) = − (x, y), − (x, y), 1 .
∂x ∂y ∂x ∂x ∂y

∂ f 1

0 1 (x, y)

∂y
N para
Mas este vetor normal N aponta para dentro da região. Assim, basta tomar n 2 = −N
obter um vetor normal apontando para fora da região, ou seja,
 
∂ f1 ∂ f1
n2 = (x, y), (x, y), −1 .
∂x ∂y
Portanto,
ZZ ZZ   
∂ f1 ∂ f1
[(0, 0, F3) · n 2 ] ds = (0, 0, f1(x, y)) · , , −1 dx dy
S1 D ∂x ∂y
ZZ
(1.20) = −F3 (x, y, f1 (x, y) dx dy.
D

Substituindo (1.18), (1.19) e (1.20) em (1.17), obtém-se


ZZ ZZ ZZ
[(0, 0, F3) · n ] ds = [(0, 0, F3) · n 1] ds + [(0, 0, F3) · n 2 ] ds +
∂Ω S1 S2
ZZ
+ [(0, 0, F3) · n 3] ds,
S3
ZZ ZZ
= −F3 (x, y, f1 (x, y)) dx dy + F(x, y, f2 (x, y)) dx dy + 0
D D
ZZ
(1.21) = [F3 (x, y, f2 (x, y)) − F3 (x, y, f1 (x, y))] dx dy.
D
806 D Equação de Laplace: estudo mais geral

As igualdades obtidas em (1.16) e (1.21) têm seus segundos membros expressões iguais, de
modo que seus primeiros membros devem também ser iguais, ou seja, que
ZZZ ZZ
∂ F3
dx dy dz = [(0, 0, F3)] ds,
Ω ∂z ∂Ω

o que mostra a identidade (1.15). As demonstrações das identidades (1.13) e (1.14) são feitas
de maneira análoga. Não será feita aqui para evitar que a demonstração fique muito longa; fica
como exercício para o leitor.
Quando Ω não é uma região simples, então pode-se decompô-la como uma unição finita
de regiões simples, isto é, Ω = Ω1 ∪ Ω2 ∪ · · · ∪ Ωn , de maneira análoga ao que foi feito na
demonstração do teorema de Green. Sejam ∂ Ωk , com k = 1, 2, . . ., n, as fronteiras das regiões
simples Ωk . Então, tem-se que a fronteira de Ω é dada por ∂ Ω = ∂ Ω1 ∪ ∂ Ω2 ∪ · · · ∪ Ωn .
Usando a fórmula (1.10) do teorema de Gauss em cada região simples, obtém-se:
ZZZ ZZZ ZZZ
F dx dy dz =
divF F dx dy dz +
divF F dx dy dz + · · ·
divF
Ω Ω1 Ω2
ZZZ
···+ F dx dy dz
divF
Ωn
ZZ ZZ ZZ
= F · dSS + F · dSS + · · · + F · dSS
∂ Ω1 ∂ Ω2 ∂ Ωn
ZZ
= F · dSS
∂ Ω1 ∪Ω2 ∪···∪Ωn
ZZ
= F · dSS,
∂Ω

que é o resultado desejado.


Deve ser observado que nas passagens acima foi usado o seguinte fato: os vetores normais
exteriores à fronteira comum de duas regiões simples são opostos, de modo que as integrais de
superfície correspondentes iguais em módulo, mas com sinais opostos; ou seja, a soma destas
duas integrais se anulam. Para efeito de simplificação, omitiu-se este detalhamento.

D.2 Identidades de Green

Lema 2.1: Sejam Ω ⊂ R3 uma região aberta, u : Ω → R uma função de classe C2 (Ω) e
F : Ω → R3 um campo vetorial de classe C1 (Ω). Então,

F + F · ∇u.
div ( f F ) = u divF
D.2 Identidades de Green 807

Em particular, se u, v : Ω → R3 são funções de classe C2 (Ω), então

div (v ∇u) = ∇v · ∇u + v ∆u.

D EMONSTRAÇÃO : Faça F = (F1 , F2 , F3), onde F1 , F2 e F3 são funções escalares definidas em


Ω. Pela definição de divergente, tem-se que
F ) = div [u (F1 , F2, F3 )] = div (u F1 , u F2, u F3)
div (uF
∂ ∂ ∂
= (u F1 ) + (u F2 ) + (u F3 )
∂x ∂y ∂z
     
∂u ∂ F1 ∂u ∂ F2 ∂u ∂ F3
= F1 + u + F2 + u + F3 + u
∂x ∂x ∂y ∂y ∂z ∂z
   
∂ F1 ∂ F2 ∂ F3 ∂u ∂u ∂u
= u +u +u + F1 + F2 + F3
∂x ∂y ∂z ∂x ∂y ∂z
   
∂ F1 ∂ F2 ∂ F3 ∂u ∂u ∂u
=u + + + F1 + F2 + F3 F + F · ∇u,
= u divF
∂x ∂y ∂z ∂x ∂y ∂z
que é o caso geral.
Agora demonstra-se o caso particular. Antes, demonstrar-se-á que div (∇u) = ∆u. De fato,
 
∂u ∂u ∂u
div (∇u) = div , ,
∂x ∂y ∂z
     
∂ ∂u ∂ ∂u ∂ ∂u
= + +
∂x ∂x ∂y ∂y ∂z ∂z
∂ 2u ∂ 2u ∂ 2u
= + +
∂ x2 ∂ y2 ∂ z2
= ∆u.
Agora basta tomar F = ∇u. Desse modo, tem-se

div (v ∇u) = v div (∇u) + ∇u · ∇v = ∇v · ∇u + v ∆u,

que demonstra o caso particular.

Proposição 2.1 (identidades de Green): Seja Ω ⊂ R3 uma região aberta cuja fronteira ∂ Ω é

de classe C1 por partes. Sejam u, v : Ω 2 → R funções de classe C2 Ω . Então valem as seguintes
identidades:

2 A notação Ω indica o fecho do conjunto Ω em R3 . Um ponto a ∈ R3 diz-se aderente a um conjunto Ω ⊂ R3 quando


é limite de uma sequência de pontos desse conjunto. O conjunto dos pontos aderentes a Ω chama-se o fecho de Ω e é
indicado com a notação Ω.
808 D Equação de Laplace: estudo mais geral

ZZZ ZZ
∂u
(2.1) (v∆u + ∇v · ∇u)dxdy = v ds;
Ω ∂Ω ∂n

ZZZ ZZ  
∂u ∂v
(2.2) (v∆u − u∆v) dx dy = v −u ds,
Ω ∂Ω ∂n ∂n

onde denota a derivada exterior, isto é, é a derivada direcional na direção do vetor normal
∂n
n que aponta para o exterior de Ω. As integrais dos primeiros membros são triplas e as dos
segundos membros são integrais de superfície.

D EMONSTRAÇÃO : Para mostrar (2.1), faça F = v∇u. Como u, v ∈ C2 Ω , então F é um

campo vetorial de classe C1 Ω . Assim, pelo lema 2.1, segue-se que

F = div (v∇u) = ∇v · ∇u + v∆u.


divF

Pelo teorema de Gauss (teorema 1.3), tem-se


ZZZ ZZZ
(v∆u + ∇v · ∇u)dx dy dz = div (v ∇u) dx dy dz
Ω Ω
ZZZ ZZ
(Gauss)
= F dx dy dz
divF = F · n ds
Ω ∂Ω
ZZ ZZ
= (v ∇u) · n ds = v (∇u · n) ds
∂Ω ∂Ω
ZZ
∂u
= v ds,
∂Ω ∂n
pois tem-se que ∇u · n = ∂ u/∂ n , pois u é diferenciável (por ser u ∈ C2 (Ω))
Agora demonstra-se a segunda identidade de Green. Antes, observe que a aplicação do lema
2.1 permite escrever
div (v ∇u) = ∇v · ∇u + v ∆u
e
div (u ∇v) = ∇u · ∇v + u∆v.
Usando as duas identidades acima e a primeira identidade de Green (2.1), já demonstrada,
obtém-se

ZZZ ZZZ
(v ∆u − u ∆v)dx dy dz = [(∇v · ∇u + v ∆u)− (∇u · ∇v + u ∆v)] dx dy dz
Ω Ω
ZZZ
= (v ∆u + ∇v · ∇u)dx dy dz −

ZZZ
− (u ∆v + ∇u · ∇v)dx dy dz

ZZ ZZ
(2.1) ∂u ∂v
= v ds − u ds
∂Ω ∂n ∂Ω ∂n
D.2 Identidades de Green 809

ZZ  
∂u ∂v
= v −u ds,
∂Ω ∂n ∂n
que demonstra a segunda identidade de Green.

Observação 2.1: A versão para R2 das identidades de Green pode assim ser enunciada: Seja
Ω ⊂ R2 uma região aberta cuja fronteira ∂ Ω é de classe C1 por partes. Sejam u, v : Ω → R

funções de classe C2 Ω . Então valem as seguintes identidades:
ZZ Z
∂u
(v∆u + ∇v · ∇u)dxdy = v ds
Ω ∂Ω ∂n
e ZZ Z  
∂u ∂v
(v∆u − u∆v) dx dy = v −u ds,
Ω ∂Ω ∂n ∂n

onde denota a derivada exterior, isto é, é a derivada direcional na direção do vetor normal n
∂n
que aponta para o exterior de Ω. Observa-se que as integrais nos primeiros membros são duplas
e as dos segundo membros são integrais de linha.
A demonstração no caso R2 é semelhante àquela feita na demonstração da proposição 2.1,
porém deve-se usar o teorema 1.2, ou seja, o teorema de Gauss na versão R2.

Corolário 2.1: Sejam Ω, subconjunto de R3 uma região aberta cuja fronteira ∂ Ω é de classe

C1 por partes e u : Ω → R uma função de classe C2 Ω tal que ∆u = 0 em Ω. Então valem as
seguintes identidades:
ZZZ ZZ
2 ∂u
(2.3) |∇u| dx dy = u ds
Ω ∂Ω ∂n
e
ZZ
∂u
(2.4) ds = 0.
∂Ω ∂n

D EMONSTRAÇÃO : Para mostrar (2.3), basta tomar u = v em (2.1). De fato, tem-se que
ZZZ ZZZ
| ∇u|2 dx dy = ∇u · ∇u dx dy
Ω Ω
ZZ ZZZ
(2.1) ∂u
= u ds − u ∆u dx dy dz
∂Ω ∂n Ω
ZZ
∂u
= u ds,
∂Ω ∂n

uma vez que, por hipótese, ∆u = 0.


810 D Equação de Laplace: estudo mais geral

Para mostrar (2.4), basta tomar v ≡ 1 em (2.2). Segue-se daí que ∂ v/∂ n = 0 e ∆v = 0. Assim,
de ZZZ ZZ  
(2.2) ∂u ∂v
(v ∆u − u ∆v) dx dy dz = v −u ds,
Ω ∂Ω ∂n ∂n
segue-se que  
ZZZ ZZ
∂u
(1.∆u − u.0)dx, dy dz = 1· − u.0 ds,
Ω ∂Ω ∂n
ou ainda, que ZZZ ZZ
∂u
∆u dx dy dz = ds.
Ω ∂Ω ∂n
Mas, por hipótese, tem-se que ∆u = 0. Portanto,
ZZ
∂u
ds = 0.
∂Ω ∂n

Corolário 2.2: Sejam Ω, subconjunto de R3 (ou de R2), uma região aberta cuja fronteira ∂ Ω
é de classe C1 por partes, f ∈ C(∂ Ω) e g ∈ C2 (∂ Ω). Então o problema
 
 2

 u ∈ C Ω ,
(2.5) ∆u = f , em Ω,



u = g, em ∂ Ω,

tem no máximo uma solução.


D EMONSTRAÇÃO : Suponha que u e v sejam duas soluções para o problema (2.5). Faça w =

u − v. Então, como w é diferença de duas funções de classe C2 Ω , tem-se que ela própria é
uma função deste espaço. Além disso, pela linearidade do laplaciano, tem-se que

∆w = ∆(u − v) = ∆u − ∆v = f − f = 0, em Ω,

pois u e v são soluções da equação de Poisson.



Similarmente, tem-se que w ∂ Ω satisfaz

w ∂ Ω = u ∂ Ω − ∂ Ω = g − g = 0.

Segue-se, portanto, que w é solução do problema


 
2
w ∈ C Ω ,


∆w = 0, em Ω,


 w = 0, em ∂ Ω,

isto é, w satisfaz a equação de Laplace com condição de contorno homogênea.



Como w ∂ Ω = 0, pela identidade (2.3) do corolário 2.1, segue-se que
D.3 A área da esfera Sn−1 811

ZZ Z Z
2 ∂w
|∇w| dx dy = w ds = w.0 ds = 0,
Ω ∂Ω ∂n ∂Ω

pois, como w ≡ 0 em ∂ Ω, segue-se que a sua derivada exterior, ∂ u/∂ n , é nula em toda a fronteira.

Como w ∈ C2 Ω , segue-se que ∇w ≡ 0 em Ω, pois o integrando |∇w|2, acima, é uma função
contínua e não negativa. Logo, w é constante em Ω, pois Ω é conexo. Portanto, w ≡ 0, pois w = 0
em ∂ Ω. Segue-se daí que u − v = 0, isto é, u = v em Ω, mostrando que a solução do problema
(2.5), se existir, é única.

O resultado obtido no corolário 2.2, apesar de interessante, é relativamente fraco. Esperar


unicidade para problema do tipo abaixo é mais interessante:
 
2


 u ∈ C (Ω) ∩ C Ω ,
∆u = f , em Ω,


 u = g, em ∂ Ω,

onde f ∈ C(Ω) e g ∈ C (∂ Ω) são funções dadas. Mostrar que este problema tem solução única
será feito mais adiante.

D.3 A área da esfera Sn−1

O objetivo desta seção é determinar uma expressão geral para a área da esfera S n−1, que será
usada nas próximas seções.
A função gama, é definida por
Z ∞
Γ(x) = e−t t x−1 dt.
0

Note-se que a função gama é uma função definida por uma integral e que, no caso, é im-
própria. Não adentrar-se-á, neste texto, no mérito de que a Γ está bem definida e nem sobre os
critérios de convergência de integrais impróprias.
O primeiro resultado dá uma importante propriedade satisfeita pela função gama.

Proposição 3.1: A função gama satisfaz

Γ(x + 1) = x · Γ(x).

D EMONSTRAÇÃO : Tem-se, por integranção por partes, que


812 D Equação de Laplace: estudo mais geral

Z ∞
Γ(x + 1) = e−t t [(x+1)−1] dt
0
Z ∞ Z a
−t x
= e t dt = lim e−t t x dt
0 a→∞ 0

 a Z a
x −t
= lim −t e − lim x ex−1(−1)e−t dt
a→∞ 0 a→∞ 0
 Z a
x 0 x −a
= lim 0 e − a e + x lim e−t t x−1 dt
a→∞ a→∞ 0
Z ∞
=x e−t t x−1 dt = x · Γ(x),
0

como desejado.

Observação 3.1: Observe que


Z ∞
Γ(1) = e−t t 0 dt
0
Z a
= lim e−t dt
a→∞ 0
 a
= lim −e−t
a→∞ 0

= lim 1 − e−a
a→∞

= 1.
Faça x = n, para n ∈ N, na fórmula Γ(x + 1) = x · Γ(x). Então,

Γ(n + 1) = n · Γ(n).

Por recorrência, aplique-se novamente a mesma fórmula à Γ(n). Obtém-se

Γ(n + 1) = n · Γ(n) = n · Γ [(n − 1) + 1] = n.(n − 1).Γ(n − 1).

Novamente recorrendo à fórmula e assim sucessivamente, obtém-se

Γ(n + 1) = n.(n − 1).(n − 2) . . .[n − (n − 1)].Γ(1) = n!,

isto é, a função gama é uma generalização natural do fatorial.

Para exibir outros valores importantes da função gama será necessário calcular o valor de
determinada integral que surgirá nos cálculos feitos a seguir. Isto será feito no próximo exemplo.

Exemplo 3.1: Afirma-se que


D.3 A área da esfera Sn−1 813

Z ∞ √
2
e−x dx = π.
−∞
De fato, escrevendo Z ∞
2
I= e−x dx,
−∞
então
Z ∞
 Z ∞

2 −x2 −y2
I = e dx e dy
−∞ −∞
Z −∞ Z −∞
2 +y2
= e−(x ) dx dy
−∞ −∞
Z aZ a
2 +y2
(3.1) = lim e−(x ) dx dy = lim I 2(a),
a→∞ −a −a a→∞

onde Z aZ a
2 +y2
2
I (a) = e−(x ) dx dy.
−a −a
Sejam R = [−a, a] × [−a, a],
 n √ o
D1 = (x, y) ∈ R2 x2 + y2 ≤ a e D2 = (x, y) ∈ R2 | x2 + y2 ≤ 2 a ,

isto é, D1 e D2 são os discos fechados de centro na origem que estão inscritos e circunscritos,
respectivamente, no retângulo R.
Note-se que a área de D1 , A(D1 ) = π a2 , é menor do que a área de R, A(R) = 4a2 . Tem-se
também que R tem área menor a área de D2 , A(D2 ) = 2π a2 . Isto é,

(3.2) A(D1 ) < A(R) < A(D2 ).

Serão usadas as coordenadas polares, dadas por


(
x = r cos θ ,
y = r sen θ ,

cujo jacobiano dessa transformação é J = r, para calcular algumas integrais.


Faça ZZ ZZ
−(x2 +y2 ) 2 2
I = 1 e dx dy e I = e−(x +y ) dx dy. 2
D1 D2
Calculando estas integrais, obtém-se
ZZ Z a Z 2π
−(x2 +y2 ) 2
I1 = e dx dy = e−r r d θ dr
D1 0 0
 
1 −r2 a 
−a2

(3.3) = 2π − e = π 1−e .
2 0

e
814 D Equação de Laplace: estudo mais geral

ZZ Z √2 a Z 2π
−(x2 +y2 ) 2
I2 = e dx dy = e−r r d θ dr
D2 0 0

  √
1 −r2 2a 
−2a2

(3.4) = 2π − e = π 1−e .
2 0

2 2
Como o integrando e−(x +y ) é sempre positivo e as áreas de R, D1 e D2 obedecem a de-
sigualdade (3.2), segue-se que
Z aZ a
2 +y2
I1 ≤ e−(x ) dx dy ≤ I ,
2
−a −a

isto é, usando-se os valores obtidos em (3.3) e (3.4), segue-se que


  ZaZa  
−a2 −(x2 +y2 ) −2a2
π 1−e ≤ e du dv ≤ π 1 − e ,
−a −a

ou ainda,    
2 2
π 1 − e−a ≤ I 2(a) ≤ π 1 − e−2a .
Observe-se que existe limite para a → ∞ no primeiro e último membros na desigualdade
acima, de modo que existe limite para a → ∞ no membro do central. Assim,
h  2
i h  2
i
lim π 1 − e−a ≤ lim I 2(a) ≤ lim π 1 − e−2a .
a→∞ a→∞ a→∞

Mas, por (3.1), tem-se que I 2 = lim I 2(a). Portanto


a→∞

π ≤ I2 ≤ π ⇒ I2 = π ⇒ I= π,

como se queria mostrar.

Exemplo 3.2: Um valor importante da função gama é Γ (1/2). O mesmo pode ser encontrado
fazendo a mudança de variáveis t = u2 :
Z ∞ Z ∞ −1/2 Z ∞
2 2
e−x x2
1
(3.5) Γ (1/2) = e−t t − /2 dt = 2 x dx = 2 e−x dx.
0 0 0

Agora usa-se o valor obtido para a integral dada no exemplo 3.1. Assim,
Z ∞ Z ∞ Z ∞
−x2 1 −x2 2 √
Γ (1/2) = 2 e dx = 2 e dx = e−x dx = π.
0 2 −∞ −∞

Outros valores da função gama podem ser obtidos a partir do valor Γ(1/2) = π . De fato,
segue-se da fórmula Γ(x + 1) = x Γ(x), dada pela proposição 3.1, que

  √   √
1 1 π 3 3 3 π,
Γ(3/2) = Γ + 1 = Γ(1/2) = e Γ(5/2) = Γ + 1 = Γ(3/2) =
2 2 2 2 2 4
D.3 A área da esfera Sn−1 815

e assim por diante.

O próximo resultado dá o valor do volume da esfera Sn (r) de raio r e centro na origem.

Proposição 3.2: Sejam x = (x1 , . . ., xn) ∈ Rn ,

S n (r) = {x ∈ Rn | kxk ≤ r}
 q 
n 2 2
= (x1 , . . ., xn) ∈ R | x1 + · · · + xn ≤ r

a esfera n-dimensional com centro na origem de Rn e raio r e


Z
Vn (r) = dx1 · · ·dxn
S n (r)

o volume de S n(r). Então

π n/2
(3.6) Vn(r) = rn ,
Γ (n/2 + 1)
onde Γ é a função gama.
D EMONSTRAÇÃO : Observe-se inicialmente que, para n = 1, o exemplo 3.1 mostrou que

Γ (3/2) = 1/2 π , de modo que a fórmula (3.6) dá

π 1/2 1 π
V1(r) = r = √ r = 2r,
3
Γ( /2) π/2
que é o comprimento do intervalo [−r, r].
Da observação 3.1 segue-se que

Γ(2) = Γ(1 + 1) = 1.Γ(1) = 1.

Assim, para n = 2, a fórmula (3.6) dá

π1 2 π 2
V2 (r) = r = r = π r2 ,
Γ(2) 1
que é a área do círculo de raio r.
Assim, demonstrar-se-á a fórmula (3.6) para o caso n ≥ 3. Mostra-se inicialmente que, para
todo r > 0, se tem

(3.7) Vn(r) = r n Vn (1),

isto é, o volume da esfera de raio r é igual a r n multiplicado pelo volume da esfera de raio 1.
Para mostrar (3.7), se faz a seguinte mudança de variáveis linear: considera-se ϕ : Sn (1) →
Sn (r) definida por ϕ (u) = x = r u, isto é,
816 D Equação de Laplace: estudo mais geral

ϕ (u1 , . . ., un) = (x1 (u1 , . . ., un ), . . ., xn(u1 , . . ., un))

= (r u1 , . . ., r un),

ou ainda, 

 x1 = x1 (u1 , . . ., un ) = r u1 ,



 x = x (u , . . ., u ) = r u ,
2 2 1 n 2
 .
.. .
.. .
..




 x = x (u , . . ., u ) = r u ,
n n 1 n n

Note-se que o jacobiano da aplicação é J = r n . De fato,




r 0 0 ... 0 0



0 r 0 ... 0 0


∂ (x1 , . . ., xn ) 0 0 r . . . 0 0

J= = = r n.
∂ (u1 , . . ., un ) ... ... ... .. ..
. .




0 0 0 ... r 0



0 0 0 ... 0 r
Assim, Z
Vn(r) = dx1 . . . dxn
Sn (r)
Z
= r n du1 . . . dun
Sn (1)
Z
n
=r du1 . . . dun
Sn (1)

= r n Vn(1),
o que mostra (3.7).
Consequentemente, para demonstrar a validade da fórmula (3.6), basta mostrar que

π n/2
(3.8) Vn(1) = ·
Γ (n/2 + 1)

Observa-se que x21 + · · · + x2n ≤ 1 se, e somente se,

x21 + · · · + x2n−2 ≤ 1 − x2n−1 − x2n e x2n−1 + x2n ≤ 1.

Isto permite escrever a integral múltipla que dá o valor de Vn(1) como a iteração de uma
integral (n − 2)-múltipla com uma integral dupla. De fato,
D.3 A área da esfera Sn−1 817

Z Z
Vn(1) = dx1 . . . dxn = dx1 . . . dxn
Sn (1) x21 +···+x2n ≤1
ZZ Z
!
(3.9) = dx1 . . . dxn−2 dxn−1 dxn.
x2n−1+ x2n ≤1 x21 +···+x2n−2 ≤1−x2n−1−x2n

A integral que aparece entre parênteses


q na expressão (3.9) acima está estendida à esfera
n−2
(n − 2)-dimensional S (R), onde R = 1 − x2n−1 − x2n. Assim, usando (3.7), tem-se
Z
Vn−2(R) = dx1 . . . dxn−2
x21 +···+x2n−2 ≤1−x2n−1−x2n
Z
n−2
=R dx1 . . . dxn−2
x21 +···+x2n−2≤1
h 1/2in−2
= Rn−2 Vn−2(1) = 1 − x2n−1 − x2n Vn−2(1)
n/2−1
(3.10) = 1 − x2n−1 − x2n Vn−2(1).

Agora escreve-se x em lugar de xn−1 e y em lugar de xn . Então, usando-se (3.10) em (3.9), a


expressão (3.9) toma a seguinte forma
ZZ h n/2−1 i
Vn(1) = 1 − x2 − y2 Vn−2(1) dx dy
x2 +y2 ≤1
ZZ n/2−1
(3.11) = Vn−2(1) 1 − x2 − y2 dx dy.
x2 +y2 ≤1

A integral dupla é calculada por coordenadas polares. De fato, fazendo


(
x = r cos θ ,
y = r sen θ ,

com 0 < r < 1 e 0 ≤ θ < 2π , lembrando que o jacobiano em coordenadas polares é J = r,


tem-se ZZ Z 1 Z 2π
2

2 n/2−1
(1 − r2 ) /2−1 r d θ dr
n
1−x −y dx dy =
x2 +y2 ≤1 0 0
Z 1
(1 − r2 ) /2−1 r dr
n
= 2π
0

= (fazendo u = 1 − r2 )
Z 0
n/2−1
= −π u
1
2π n/2 1 2π
= u = ·
n 0 n
Assim, substituindo este último valor encontrado em (3.11), obtém-se
Z 2π Z 1 n/2−1 2π
Vn(1) = Vn−2(1) 1 − r2 r dr d θ = Vn−2(1) ·
0 0 n
818 D Equação de Laplace: estudo mais geral

Ou seja, os números Vn (1) satisfazem à fórmula de recorrência



Vn (1) = Vn−2(1), para n ≥ 3.
n
Porém a sequência de números { f (n)}, definida por

π n/2 ,
f (n) =
Γ (n/2 + 1)
satisfaz a mesma fórmula de recorrência devido a fórmula Γ(x + 1) = x Γ(x). De fato,

π n/2 π n/2 2 π n/2


f (n) = = =
Γ (n/2 + 1) n/2 Γ (n/2) n Γ (n/2)
2π π n/2−1 2π π (n−2)/2
= =
n Γ (n/2) n Γ [(n−2)/2 + 1]

= · f (n − 2).
n
√ √
Assim, Γ(1/2) = π , do qual segue-se que Γ(3/2) = 1/2 π (como foi visto no exemplo 3.2)
e f (1) = V1(1) = 2. Tem-se também que f (2) = V2(1) = π . Portanto, aplicando a fórmula de
recorrência, conclui-se que f (n) = Vn(1) para todo n ≥ 1. Isto demonstra a fórmula (3.8).

Corolário 3.1: A área da esfera S n−1 (r) = {x ∈ Rn | kxk = r} é dada por


 n−1
 2 π n/2 n−1
ωn (r) = A S (r) = ·r .
Γ (n/2)
D EMONSTRAÇÃO : Demonstrou-se na proposição 3.1 que

Vn(r) = r n · Vn(1),

que implica em
d
Vn (r) = n · r n−1 · Vn(1).
dr
Agora, note-se que Z r
Vn(r) = ωn (r) dr.
0
Segue-se do teorema fundamental do Cálculo que
d
(3.12) ωn (r) = Vn(r) = n · r n−1 · Vn(1).
dr
Também foi demonstrado na proposição 3.1 a validade da equação (3.8), isto é,

π n/2 ,
(3.13) Vn(1) =
Γ (n/2 + 1)
D.4 Solução fundamental 819

Portanto, substituindo (3.13) em (3.12) segue-se que

π n/2
(3.14) ωn (r) = n · r n−1 · Vn(1) = n · r n−1 · ·
Γ (n/2 + 1)
Mas a função gama satisfaz
n  n n
(3.15) Γ +1 = ·Γ ·
2 2 2
Substituindo (3.15) em (3.14), obtém-se

2 π n/2 2 π n/2 n−1


ωn (r) = n · r n−1 · · = ·r ,
n Γ (n/2) Γ (n/2)
que é o resultado desejado.

Observação 3.2: Segue-se imediatamente do corolário 3.1, fazendo r = 1, que

2 π n/2
ωn (1) = ,
Γ (n/2)

dá a área da esfera unitária Sn−1 (1).


Tem-se, também, que o volume e a área da esfera independem das coordenadas tomadas.

D.4 Solução fundamental


Sejam Ω ⊂ Rn e x0 = x01 , . . ., x0n um vetor fixo em Ω. Objetiva-se determinar as soluções de
∆u = 0 que dependam somente de r = kx − x0 k, distância de x = (x1 , . . ., xn ) ao ponto x0 (isto
é, procura-se soluções radiais).

A norma usada é a euclidiana, isto é, fazendo x = (x1 , . . ., xn) e x0 = x01 , . . ., x01 , escreve-se
q
2 2
kx − x0 k = x1 − x01 + · · · + (xn − x0n ) .

Os resultados serão enunciados na forma de proposições, porém é importante que o leitor


note que certas expressões carecem de rigor; em tese algumas delas nem sentido fazem. Alguns
detalhes serão dados através de notas de rodapé.
820 D Equação de Laplace: estudo mais geral

Proposição 4.1: Sejam Ω ⊂ R2 aberto e u : Ω → R uma função de classe C2 tal que ∆u = 0.


Faça r = kx − x0k, onde x = (x, y) e x0 = (x0 , y0) são pontos de Ω. A mudança de variáveis
v(r) = u(x) = u(x, y) transforma a equação de Laplace ∆u = 0 na equação diferencial ordinária

d 2v 1 dv
(4.1) + = 0,
dr2 r dr
cuja solução geral é dada por

(4.2) v(r) = k1 ln r + k2 = k1 ln kx − x0 k + k2.

D EMONSTRAÇÃO : De fato, seja v = v(r) = u(x) a solução procurada. Antes de prosseguir, é


preciso explicar esta notação.
Na igualdade u(x) = v(r) é preciso observar que u não depende apenas de uma variável,
ou seja, de r. Dando um sentido: considera-se uma função f : R2 → R dada por f (x, y) =
p
kx − x0 k = (x − x0 )2 + (y − y0)2 = r. Agora toma-se uma função v : R → R dada por v = v(r)
e, em seguida, define-se u = (v ◦ f ) : R2 → R. Note-se, também, que há abuso de notação ao
escrever v = v(r), isto é, usa-se a mesma letra para representar a função e sua imagem.
Como Ω é aberto, mostra-se facilmente que f (Ω) é aberto em [0, ∞). Assim, a função v, sob
as hipóteses dadas, está definida em f (Ω), e a validade da equação diferencial ordinária em
(4.1) ocorre em f (Ω)\{x0 }. Além disso, como u ∈ C2 (Ω), é possível mostrar facilmente que v
é de classe C2 ( f (Ω)\{x 0}). Portanto a equação (4.1) tem sentido.
Para evitar notação “carregad”, optar-se-á pelo abuso habitual de notação e não se fará a
demonstração usando-se a função composta. Os cálculos serão feitos formalmente.
Sendo r = kx − x0 k =6 0, tem-se
∂r 1 1
= p [2(x − x0 )]
∂ x 2 (x − x0 )2 + (y − y0 )2
x − x0 x − x0
= = ·
kx − x0 k r
De maneira similar encontra-se a derivada parcial de r em relação a y, de modo que se tem
∂ r x − x0 ∂ r y − y0
= e = ·
∂x r ∂y r
Assim, pela regra da cadeia, obtém-se as derivadas parciais primeiras:
  
∂ u ∂ v dv ∂ r dv x − x0 ,
= = =
∂ x ∂ x dr ∂ x dr r
  
∂ u ∂ v dv ∂ r dv y − y0 ,
= = =
∂ y ∂ y dr ∂ y dr r
onde as expressões entre parênteses nos últimos membros indicam o produto entre dois termos.
Observe-se que a derivada de r em relação a x já foi calculada explicitamente, assim, a mesma
será usada logo a seguir. Para a primeira expressão acima, tem-se a seguinte derivada parcial
D.4 Solução fundamental 821

segunda:
 
∂ 2 u ∂ 2 v d 2v ∂ r x − x0 dv ∂ x − x0
= 2= 2· · + ·
∂ x2 ∂x dr ∂ x r dr ∂ x r
!
d 2v x − x0 x − x0 dv ∂ x − x0
= 2· · + · p
dr r r dr ∂ x (x − x0 )2 + (y − y0 )2 + (z − z0 )2
 
(x − x0 )2 d 2v dv 1.r − (x − x0 ).(1/2).2(x − x0 ).r−1
= · 2+ ·
r2 dr dr r2
(x − x0 )2 d 2v 1 dv (x − x0 )2 dv ,
= · 2+ − ·
r2 dr r dr r3 dr
para x ∈ Ω\{x0 }.
Procedendo de maneira análoga para a derivada parcial segunda em relação a y, pode-se
escrever
∂ 2 u ∂ 2 v (x − x0 )2 d 2v 1 dv (x − x0 )2 dv ,
= = · 2+ − ·
∂ x2 ∂ x2 r2 dr r dr r3 dr
∂ 2 u ∂ 2 v (y − y0 )2 d 2 v 1 dv (y − y0 )2 dv
= = · 2+ − · ·
∂ y2 ∂ y2 r2 dr r dr r3 dr
Somando as três expressões acima, a equação ∆u = 0 se transforma em

∂ 2u ∂ 2u
∆u = +
∂ x2 ∂ y2
   
(x − x0 )2 + (y − y0)2 d 2v 2 dv (x − x0 )2 + (y − y0)2 dv
= + −
r2 dr2 r dr r3 dr
r2 d 2 v 2 dv r2 dv d 2v 2 dv 1 dv
= + − = + −
r2 dr2 r dr r3 dx dr2 r dr r dr
d 2v 1 dv
= + = 0.
dr2 r dr
Agora deve-se resolver a equação diferencial ordinária.

d 2v 1 dv
+ = 0.
dr2 r dr
Isto será feito por redução de ordem, fazendo-se
dv d 2v d p
=p e = ·
dr dr2 dr
Assim, a equação (4.1) pode ser reescrita através do seguinte sistema:

 dp 1

 + p = 0,
dr r
(4.3)
 dv = p.


dr
822 D Equação de Laplace: estudo mais geral

A primeira equação em (4.3) é de primeira ordem e linear, cuja solução geral é dada por
 Z  Z Z  
−1 −1
p = exp − r dr 0 · exp r dr dr + c
 Z 
= c · exp − r dr = c0 · exp (− ln |r|)
0 −1

−1
= c0 · e − ln |r| = c0 · e ln r = c0 · r−1 .
Portanto,
dv
= p = c0 · r−1 ,
dr
que após integração resulta em
Z
v(r) = c0 r−1 dr + k = c0 ln |r| + k = k1 ln r + k2 ,

onde k1 e k2 são constantes.


Assim, a solução geral de (4.1), para o caso n = 2, é dada por

v(r) = k1 ln r + k2 = k1 ln kx − x0 k + k2,

como desejado.

Proposição 4.2: Sejam Ω ⊂ Rn aberto e u : Ω → R uma função de classe C2 tal que ∆u = 0.


Faça r = kx − x0k, onde x = (x1 , . . ., xn) e x0 = (x01 , . . ., x0n). A mudança de variáveis v(r) =
u(x) = u(x1 , . . ., xn) transforma a equação de Laplace ∆u = 0 na equação diferencial ordinária

d 2v n − 1 dv
(4.4) + = 0,
dr2 r dr
cuja solução geral é dada por

(4.5) v(r) = c1 · r2−n + c2 = c1 · kx − x0 k2−n + c2 .

D EMONSTRAÇÃO : De fato, seja v = v(r) = u(x) a solução procurada. Antes de prosseguir, é


preciso explicar esta notação.
Na igualdade u(x) = v(r) é preciso observar que u não depende apenas de uma variável, ou
seja, de r. Dando um sentido: considera-se uma função f : Rn → R dada por
q
2 2
f (x1 , . . ., xn) = kx − x0k = x1 − x01 + · · · + (xn − x0n) = r.

Agora toma-se uma função v : R → R dada por v = v(r) e, em seguida, define-se u = (v ◦ f ) :


Rn → R. Note-se, também, que há abuso de notação ao escrever v = v(r), isto é, usa-se a mesma
letra para representar a função e sua imagem.
D.4 Solução fundamental 823

Como Ω é aberto, mostra-se facilmente que f (Ω) é aberto em [0, ∞). Assim, a função v, sob
as hipóteses dadas, está definida em f (Ω), e a validade da equação diferencial ordinária em
(4.1) ocorre em f (Ω)\{x0 }. Além disso, como u ∈ C2 (Ω), é possível mostrar facilmente que v
é de classe C2 ( f (Ω)\{x 0}). Portanto a equação (4.4) tem sentido.
Para evitar notação “carregada”, optar-se-á pelo abuso habitual de notação e não se fará a
demonstração usando-se a função composta. Os cálculos serão feitos formalmente.
Sendo r = kx − x0 k =6 0, tem-se
∂r 1 1  
= q 2 2 x1 − x01
∂ x1 2 2
x1 − x01 + · · · + (xn − x0n)

x1 − x01 x1 − x01
= = ·
kx − x0 k r
De maneira similar, conclui-se que

∂r x1 − x01 , ∂ r x2 − x02 , ∂r xn − x0n


= = ···, = ·
∂ x1 r ∂ x2 r ∂ xn r
Assim, pela regra da cadeia, obtém-se
  
∂u ∂ v dv ∂ r dv x1 − x01 ,
= = =
∂ x1 ∂ x dr ∂ x1 dr r
..
.
  
∂u ∂ v dv ∂ r dv xn − x0n ,
= = =
∂ xn ∂ z dr ∂ xn dr r
onde as expressões entre parênteses nos últimos membros indicam o produto entre dois termos.
Observe-se que a derivada de r em relação a x1 já foi calculada explicitamente, assim, a
mesma será usada logo a seguir. Para a primeira expressão acima, tem-se a seguinte derivada
parcial segunda:
 
∂ 2u ∂ 2 v d 2v ∂ r x1 − x01 dv ∂ x1 − x01
= = · · + ·
∂ x21 ∂ x21 dr2 ∂ x1 r dr ∂ x1 r
 
2 0 0
d v x1 − x1 x − x0 dv ∂  x1 − x1 
= 2· · + · q 
dr r r dr ∂ x1 0 2 0 2
x1 − x1 + · · · + (xn − xn)
2 "   #
x1 − x01 d 2v dv 1.r − x1 − x01 .(1/2).2 x1 − x01 .r−1
= · 2+ ·
r2 dr dr r2
2 2
x1 − x01 d 2v 1 dv x1 − x01 dv
= · 2+ − · ·
r2 dr r dr r3 dr
Procedendo de maneira análoga, pode-se escrever
824 D Equação de Laplace: estudo mais geral

2 2
∂ 2u ∂ 2 v x1 − x01 d 2v 1 dv x1 − x01 dv ,
= = · 2+ − ·
∂ x21 ∂ x21 r2 dr r dr r3 dr
2 2
∂ 2u ∂ 2 v x2 − x02 d 2v 1 dv x2 − x02 dv ,
= = · 2+ − ·
∂ x22 ∂ x22 r2 dr r dr r3 dr
..
.
2 2
∂ 2 u ∂ 2v xn − x0n d 2 v 1 dv xn − x0n dv
= = · 2+ − · ·
∂ x2n ∂ x2n r2 dr r dr r3 dr
Somando as três expressões acima, a equação ∆u = 0 se transforma em

∂ 2u ∂ 2u
∆u = + · · · +
∂ x21 ∂ x2n
" 2 2 #
x1 − x01 + · · · + x1 − x01 d 2v n dv
= + −
r2 dr2 r dr
" 2 2 #
x1 − x01 + · · · + xn − x0n dv
− 3
r dr

r2 d 2 v n dv r2 dv d 2v n dv 1 dv
= + − = + −
r2 dr2 r dr r3 dx dr2 r dr r dr
d 2v n − 1 dv
= 2+ = 0.
dr r dr
Agora deve-se resolver a equação diferencial ordinária
d 2v n − 1 dv
+ = 0.
dr2 r dr
O procedimento também será por redução de ordem, fazendo-se

dv d 2v d p
=p e = ·
dr dr2 dr
Assim, a equação (4.4) pode ser reescrita através do seguinte sistema:

 dp n−1

 + p = 0,
dr r
(4.6)
 dv = p.


dr
A primeira equação em (4.6) é de primeira ordem e linear, cuja solução geral é dada por
 Z  Z Z  
−1 −1
p = exp − (n − 1)r dr · 0 · exp (n − 1)r dr dr + c
 Z 
 
= c · exp − (n − 1)r dr = c0 · exp −(n − 1) r−1
0 −1
D.4 Solução fundamental 825

−(n−1)
= c0 · e −(n−1) ln|r| = c0 · e ln[ r ] = c0 · r 1−n.
Portanto,
dv
= p = c0 · r 1−n,
dr
que após integração resulta em
Z
1−n c0
v(r) = c0
r dr + k = · r 2−n + k = c1 · r 2−n + c2,
2−n
onde c1 e c2 são constantes.
Assim, a solução geral de (4.4), para o caso em que n ≥ 3, é

v(r) = c1 · r 2−n + c2 = c1 · kx − x0 k2−n + c2,

como desejado.

Agora se introduz a função singularidade.


Como visto até este ponto, nas condições assumidas, a equação de Laplace ∆u = 0 possui as
soluções 

 k1 · ln kx − x0 k + k2, se n = 2
v(r) =

 c1 · kx − x0 k2−n + c2, se n ≥ 3.
Observa-se que, nos dois casos acima, as soluções possuem uma singularidade no ponto
x = x0 . Agora define-se uma função s, chamada de função singularidade, do seguinte modo:
sejam Ω x0 = Ω\ {x0 } e
sx0 : Ωx0 → R
dada por 
 1
 2π · ln kx − x0k ,
 se n = 2
sx0 (x) =
 1

 kx − x0 k2−n , se n > 2,
(2 − n) ωn
onde 2π é o comprimento do círculo unitário em R2 e ωn é a área da esfera

S n−1 = {x ∈ Rn | kx − x0k = 1} ,

isto é, onde
Z ∞
2 π n/2
ωn = e Γ(x) = e−t t x−1 dt.
Γ (n/2) 0

Proposição 4.3: A função s, para cada x0 ∈ Ω ⊂ R2 fixo tal que x 6= x0, é infinitamente
diferenciável e satisfaz ∆s = 0.
826 D Equação de Laplace: estudo mais geral

D EMONSTRAÇÃO : De fato, para o caso n = 2, tem-se


    q 
∂ sx0 1 ∂ 1 ∂
= (ln kx − x0 k) = ln (x − x0 )2 + (y − y0)2
∂x 2π ∂ x 2π ∂ x
1 1 x − x0
= p ·p
2π (x − x0 )2 + (y − y0)2 (x − x0 )2 + (y − y0)2
1 x − x0
=
2π (x − x0 )2 + (y − y0 )2
1 x − x0
= ·
2π kx − x0 k2
A derivada segunda fica assim:
 
∂ 2sx0 1 ∂ x − x0
=
∂ x2 2π ∂ x (x − x0 )2 + (y − y0)2
1 (y − y0 )2 − (x − x0)2
=
2π [(x − x0 )2 + (y − y0)2 ]2
1 (y − y0 )2 − (x − x0)2
= ·
2π kx − x0 k4
Analogamente, mostra-se que
∂ sx0 1 y − y0 ∂ 2sx0 1 (x − x0 )2 − (y − y0)2
= · e = · ·
∂y 2π kx − x0 k2 ∂ y2 2π kx − x0 k4
Portanto, segue-se daí que

∂ 2 sx0 ∂ 2sx0
∆sx0 = +
∂ x2 ∂ y2
1 (y − y0 )2 − (x − x0)2 1 (x − x0 )2 − (y − y0)2
= · + ·
2π kx − x0k4 2π kx − x0k4
1 (x − x0 )2 − (y − y0)2 1 (x − x0 )2 − (y − y0)2
=− · + · = 0,
2π kx − x0 k4 2π kx − x0 k4
mostrando que sx0 é harmônica para x 6= x0 .

Proposição 4.4: A função s, para o caso geral n ≥ 3, também é harmônica para x 6= x0 .


D EMONSTRAÇÃO : De fato, tem-se que

∂ sx0 1 ∂  2−n

= · kx − x0 k
∂ x1 (2 − n)ωn ∂ x1
D.4 Solução fundamental 827

q 2−n
1 ∂ 2 2
= · x1 − x01 + · · · + (xn − x0n )
(2 − n)ωn ∂ x1
 
1 ∂ h 
0 2
 i1/2 2−n
0 2
= · x1 − x1 + · · · + xn − xn
(2 − n)ωn ∂ x1
1 ∂ h 
0 2
 i1−n/2
0 2
= · x1 − x1 + · · · + xn − xn
(2 − n)ωn ∂ x1
1 h  n i h 2 2 i−n/2
= · 2 1− x1 − x01 x1 − x01 + · · · + xn − x0n
(2 − n)ωn 2

(2 − n) x1 − x01 x1 − x01
= −n
· kx − x0 k = · kx − x0 k−n .
(2 − n)ωn ωn
Já a derivada parcial segunda em relação a x1 fica assim:
∂ 2 sx0 1 ∂   
2
= · x1 − x01 kx − x0 k−n
∂ x1 ωn ∂ x1
( q −n )
1 ∂   2 2
= · x1 − x01 x1 − x01 + · · · + (xn − x0n )
ωn ∂ x1
 
1 ∂ 0
h 
0 2
 i−n/2
0 2
= · x1 − x1 x1 − x1 + · · · + xn − xn
ωn ∂ x1
 
1 ∂  h 2 2 i−n/2
= · x1 − x1 · x1 − x01 + · · · + xn − x0n
0
+
ωn ∂ x1
 
0
 ∂ h 
0 2
 i−n/2
0 2
+ x1 − x1 x1 − x1 + · · · + xn − xn
∂ x1
1 h 
0 2
 i−n/2
0 2
= · x1 − x1 + · · · + xn − xn −
ωn
n h 2 i h 2 2 i(−n−2)/2
− · n x1 − x01 x1 − x01 + · · · + xn − x0n
ωn
1 n 2
= · kx − x0 k−n − x1 − x01 kx − x0 k−n−2 .
ωn ωn
Analogamente, mostra-se que, para todo i = 1, . . ., n, vale

∂ sx0 xi − x0i
= kx − x0 k−n
∂ xi ωn
e
∂ 2 sx0 1 n 2
2
= kx − x0 k−n − xi − x0i kx − x0 k−n−2 .
∂ xi ωn ωn
Portanto,

∂ 2 sx0 ∂ 2sx0
∆sx0 = + · · · +
∂ x21 ∂ x2n
828 D Equação de Laplace: estudo mais geral

 
1 −n n 
0 2 −n−2
= kx − x0 k − x1 − x1 kx − x0 k +···
ωn ωn
 
1 −n n 
0 2 −n−2
···+ kx − x0 k − xn − xn kx − x0 k
ωn ωn
 
1 −n 1 −n
= kx − x0 k + · · · + kx − x0 k −
ωn ωn
 
n 
0 2 −n−2 n 
0 2 −n−2
− x1 − x1 kx − x0 k + ···+ xn − xn kx − x0 k
ωn ωn
n n
= kx − x0 k−n − kx − x0 k2 kx − x0 k−n−2
ωn ωn
n n
= kx − x0 k−n − kx − x0 k−n = 0,
ωn ωn
confirmando que sx0 é harmônica para x 6= x0 .

Por fim, introduz-se a solução fundamental para a equação de Laplace.


Sejam agora Ω ⊂ Rn e ϕ : Ω → R uma função satisfazendo as duas condições seguintes:
( 
ϕ ∈ C1 Ω ∩ C2(Ω),
∆ϕ = 0, em Ω.

Com a ϕ assim definida, chamar-se-á solução fundamental da equação de Laplace ∆u = 0,


relativa ao domínio Ω, a função Fx0 : Ω x0 → R dada por

(4.7) Fx0 (x) = sx0 (x) + ϕ (x).

A solução fundamental possui domínio Ωx0 = Ω\ {x0 }, sendo Ω ⊂ Rn, e do mesmo modo
que a função s, possui uma singularidade em Ω no ponto x = x0 . Assim,

 1
 2π ln kx − x0 k + ϕ (x),
 se n = 2
(4.8) Fx0 (x) =
 1

 kx − x0 k2−n + ϕ (x), se n > 2,
(2 − n) ωn
onde
2π n/2 ,
ωn = ωn (1) =
Γ (n/2)
que representa a área da esfera unitária S n−1(1).
D.5 Terceira identidade de Green 829

D.5 Terceira identidade de Green

Com as definições e resultados obtidos até aqui, pode-se agora enunciar e demonstrar o
principal resultado que se busca: o da representação integral para uma função real de classe

C1 Ω ∩ C2 (Ω), sendo Ω um conjunto aberto, conexo e limitado em Rn. Este resultado é con-
hecido como terceira identidade de Green.
A terceira identidade de Green exige demonstração diferenciada para o caso n = 2 e n ≥ 3,
apesar de a representação integral ser a mesma. Assim, opta-se por enunciar e demonstrar dois
teoremas, um no caso n = 2 e outro no caso n ≥ 3.
Antes de enunciar e demonstrar a terceira identidade de Green para n = 2, enunciar-se-á um
lema de análise com resultado clássico e que será usado na demonstração do próximo teorema.

Lema 5.1: Para x ∈ R+, tem-se


log x
(a) lim = 0.
x→+∞ x
(b) lim (x log x) = 0.
x→0
D EMONSTRAÇÃO : Demonstrar-se-á a afirmação (a). A função f (x) = log x é derivável para
x > 0, logo pode-se aplicar o teorema do valor médio. Então, para todo x > 1, existe 1 < c < x
tal que
f (x) − f (1) 1 log x − log 1 ,
f 0 (c) = ⇒ =
x−1 c x−1
isto é,
1
log x = log x − log 1 = (x − 1).
c
Como 1 < c, segue-se que 1/c < 1. Além disso, para todo x > 1 é imediato que (x − 1) < x.
Assim,
1
log x = (x − 1) < 1.x = x,
c
para todo x > 1.
Em particular, para x > 1 vem que
 
1 1
0 < log x /2 < x /2.

Como   1
1
log x /2 = log x,
2
pode-se elevar ao quadrado a última desigualdade para obter
 2  
1 1
2 (log x)2
0< log x < x /2 ⇒ 0< < x.
2 4
Assim,
830 D Equação de Laplace: estudo mais geral

log x log x 4 ,
0 < log x · <x ⇒ 0< <
4 x log x
para todo x > 1.
Observando que lim (1/log x) = 0, tem-se que
x→+∞
 
log x 1 log x
lim 0 < lim <4 lim ⇒ lim = 0,
x→+∞ x→+∞ x x→+∞ log x x→+∞ x

como desejado.

Para mostrar (b), faça-se x = 1/t . Assim,


log (1/t ) log 1 − log t 0 − log t log t
x log x = = = =− ·
t t t t
Observe-se que existe limite para t → +∞ no último membro acima e que este limite é igual a
zero pela parte (a). Além disso, como x = 1/t , então quando t → +∞ tem-se que x → 0. Portanto,
pode-se tomar limite na expressão acima e escrever
 
log t
lim (x log x) = − lim = 0,
x→0 t→+∞ t

que demonstra o item (b).

Teorema 5.1 (3a identidade de Green – caso n = 2): Sejam Ω ⊂ R2 um conjunto aberto,

conexo e limitado e u ∈ C1 Ω ∩ C2(Ω) uma solução para a equação ∆u = f em Ω, onde

f ∈ C Ω . Então, para todo x0 ∈ Ω, tem-se
Z   ZZ
∂ Fx0 ∂u
(5.1) u(x0 ) = u(x) (x) − Fx0 (x) (x) dS + Fx0 (x) f (x) dx,
∂Ω ∂n ∂n Ω

onde n denota o vetor normal exterior a ∂ Ω.


D EMONSTRAÇÃO : Inicialmente, atenta-se para a primeira dificuldade que surge na demons-
tração: dar sentido a segunda integral (em Ω) que aparece na equação (5.1). De fato, para n = 2,
tem-se que
1
Fx0 (x) = ln kx − x0 k + ϕ (x).

Note-se que Fx0 (x) diverge quando x → x0 . Portanto, deve-se definir a integral sobre Ω como
uma integral imprópria – isto será feito no final da demonstração. Observa-se também que a
outra integral em (5.1), sobre ∂ Ω, não apresenta problema: de fato, se x0 ∈ Ω e x ∈ ∂ Ω, então
Fx0 (x) está bem definida, além de ser uma função continuamente diferenciável em x ∈ ∂ Ω.
O objetivo é usar a segunda identidade de Green substituindo-se uma das funções neste re-
sultado pela solução fundamental Fx0 . Porém esta função não é de classe C2 (Ω), logo não é
D.5 Terceira identidade de Green 831

possível a substituição direta. A ideia básica consiste em retirar uma vizinhança do ponto de
singularidade x = x0 de Fx0 , em relação a todo Ω original, de modo que no novo domínio,
assim construído, seja possível usar a segunda identidade de Green.
Feitas estas observações, considere-se um ponto arbitrário x0 ∈ Ω e um número real ε > 0
tais que o disco aberto Bε (x0 ), de raio ε e centro em x0 , esteja contido em Ω. Como Ω é aberto,
por hipótese, então é sempre possível encontrar um ε > 0 para que isto ocorra.
Agora escreva Ωε = Ω\Bε (x0 ). Note-se que a solução fundamental Fx0 (x), dada por (4.7)
e (4.8) para n = 2, está definida em todo ponto x ∈ Ωε (veja-se figura 5.5).

Figura 5.5:

Nessas condições pode-se aplicar a segunda identidade de Green (equação (2.2) da proposição
2.1), isto é, ZZ Z  
∂u ∂v
(v∆u − u∆v) dx dy = v −u ds.
Ω ∂Ω ∂n ∂n
A fronteira do novo domínio Ωε é dada por

∂ Ωε = ∂ (Ω\Bε (x0)) = ∂ Ω ∪ ∂ Bε (x0 ).

Observe que a orientação positiva de ∂ Ωε coincide com a orientação positiva de ∂ Ω e com a


orientação negativa de ∂ Bε (x0), isto é, a normal exterior a ∂ Ω aponta para fora de Ω, enquanto
a normal exterior de ∂ Bε (x0 ) aponta para dentro da bola.
Usando a segunda identidade de Green com estas novas condições, substituindo-se u por Fx0
e v por u nesta identidade, obtém-se a expressão

ZZ Z  
∂ Fx0 ∂u
(u ∆Fx0 − Fx0 ∆u) dx dy = u − Fx0 ds
Ωε ∂ Ω ∪ ∂ Bε (x0 ) ∂n ∂n
Z  
∂ Fx0 ∂u
= u − Fx0 ds −
∂Ω ∂n ∂n
Z  
∂ Fx0 ∂u
(5.2) − u − Fx0 ds.
∂ Bε (x0 ) ∂n ∂n
832 D Equação de Laplace: estudo mais geral

onde o sinal negativo na segunda integral do segundo membro de (5.2) se deve a inversão do
sinal da normal exterior na bola (isto é, em virtude da orientação positiva da normal à bola).
Note-se que a primeira integral do segundo membro de (5.2) não depende de ε , isto é, do raio
da bola Bε (x0 ).
O procedimento de demonstração será realizado em várias etapas.
Assim, lembrando-se que Fx0 = sx0 + ϕ , o integrando da segunda integral no segundo membro
de (5.2) pode ser escrito na seguinte forma:
 
∂ Fx0 ∂u ∂ sx0 ∂ ϕ ∂u
u − Fx0 =u + − (sx0 + ϕ )
∂n ∂n ∂n ∂n ∂n
   
∂ sx0 ∂u ∂ϕ ∂u ,
= u − sx0 + u −ϕ
∂n ∂n ∂n ∂n
resultando, para a última integral do segundo membro de (5.2), a expressão
Z   Z  
∂ Fx0 ∂u ∂ Fx0 ∂u
u − Fx0 ds = u − Fx0 ds
∂ Bε (x0 ) ∂n ∂n kx−x0 k=ε ∂n ∂n
Z  
∂ sx0 ∂u
= u − sx0 ds +
kx−x0 k=ε ∂n ∂n
Z  
∂ϕ ∂u
(5.3) + u −ϕ ds.
kx−x0 k=ε ∂n ∂n
Substituindo (5.3) em (5.2), obtém-se
ZZ Z  
∂ Fx0 ∂u
(u∆Fx0 − Fx0 ∆u) dxdy = u − Fx0 ds−
Ωε ∂Ω ∂n ∂n
Z   Z   
∂ sx0 ∂u ∂ϕ ∂u
− u − sx0 ds + u −ϕ ds
∂ Bε (x0 ) ∂n ∂n ∂ Bε (x0 ) ∂n ∂n
Z   Z
∂ Fx0 ∂u ∂ sx0
= u − Fx0 ds − u ds +
∂Ω ∂n ∂n ∂ Bε (x0 ) ∂ n

Z Z  
∂u ∂ϕ ∂u
(5.4) + sx0 ds − u −ϕ ds.
∂ Bε (x0 ) ∂n ∂ Bε (x0 ) ∂n ∂n
Agora faça
Z Z
∂ sx0 ∂u
I1 (ε ) = u ds, I2 (ε ) = sx0 ds
∂ Bε (x0 ) ∂n ∂ Bε (x0 ) ∂n
e Z  
∂ϕ ∂u
I3 (ε ) = u −ϕ ds.
∂ Bε (x0 ) ∂n ∂n

Note-se que (5.4) agora se escreve como


D.5 Terceira identidade de Green 833

ZZ Z  
∂ Fx0 ∂u
(5.5) (u∆Fx0 − Fx0 ∆u) dxdy = u − Fx0 ds − I1(ε ) + I2 (ε ) − I3(ε ).
Ωε ∂Ω ∂n ∂n
Com esta notação, mostrar-se-á que

lim I1 (ε ) = u(x0 ), lim I2 (ε ) = 0 e lim I3 (ε ) = 0.


ε →0 ε →0 ε →0

1a E TAPA : Demonstrar-se-á que lim I3(ε ) = 0, onde


ε →0
Z  
∂ϕ ∂u
I3 (ε ) = u −ϕ ds.
∂ Bε (x0 ) ∂n ∂n

Por hipótese, tem-se u, ϕ ∈ C1 Ω ∩ C2 (Ω), sendo que ∆ϕ = 0. Assim, a função
 
∂ϕ ∂u
x 7→ u(x) (x) − ϕ (x) (x)
∂n ∂n

é contínua em Ω, logo é limitada. Então, existe M > 0 tal que



∂ϕ ∂ u
u − ϕ ≤M
∂n ∂n

para todo x ∈ Bε (x0) e para todo ε 0 ≤ ε .


Observe que, para x = (x, y) e x0 = (x0 , y0), tem-se

∂ Bε (x0 ) = x ∈ R2 | kx − x0k = ε
 q 
2
= (x, y) ∈ R (x − x0 )2 + (y − y0)2 = ε ·

Assim, resulta para I3(ε ) a seguinte desigualdade:


Z Z
∂ϕ ∂ u
|I3(ε )| ≤ u − ϕ ds ≤ M ds = 2π M ε ,
kx−x0 k=ε
∂n ∂n kx−x0 k=ε

pois a última integral acima é uma integral de linha de uma função identicamente igual a 1 sobre
p
a circunferência (x − x0 )2 + (y − y0 )2 = ε , que dá o comprimento da mesma, que no caso é
igual a 2π ε .
Esta última desigualdade implica que lim I3(ε ) = 0.
ε →0

2a E TAPA : Mostrar-se-á que lim I2(ε ) = 0, onde


ε →0
Z
∂u
I2(ε ) = sx0 ds.
kx−x0 k=ε ∂n

De fato, sendo u ∈ C1 Ω ∩C2(Ω), por hipótese, segue-se que as derivadas parciais primeiras
de u são funções contínuas em Ω, portanto limitadas, isto é, existe N > 0 tal que
834 D Equação de Laplace: estudo mais geral


∂ u ∂u
, ≤N
∂x ∂y

em Ω e, portanto, em Bε (x0), ε 0 ≤ ε .
∂u
Fazendo n = (η1 , η2), daí resulta a seguinte estimativa para:
∂n

∂ u ∂u ∂ u ∂ u ∂ u
= |∇u · n| = η1 + η2
≤ + ,
∂n ∂x ∂y ∂x ∂y
donde
∂ u
≤ 2N = N1 .
∂n
Além disso, se x ∈ ∂ Bε (x0), isto é, kx − x0 k = ε , então a função sx0 (x) é dada por
1 1
sx0 (x) = ln kx − x0 k = ln ε .
2π 2π
e x pode ser escrito na forma
x = x0 + ε n ,
onde n é, agora, a normal unitária exterior a Bε (x0 ).
Dessas considerações segue-se que
Z
∂u
I2(ε ) = sx0 (x) (x) dsε =
kx−x0 k=ε ∂n
Z
∂u
= sx0 (x0 + ε n )
(x0 + ε n ) dsε
kx−x0 k=ε ∂n
Z  
1 ∂u
= · ln ε · (x0 + ε n).ε ds1
kx−x0 k=1 2π ∂n
Z  
ε ln ε ∂u
= (x0 + ε n ) ds1 ,
2π kx−x0k=1 ∂ n
sendo dsε e ds1 , respectivamente, os elementos de comprimento de arco dos círculos r = ε e
r = 1.
Portanto, tem-se Z
ε |ln ε | ∂ u
| I2(ε )| ≤ (x0 + ε n ) ds1

kx−x0 k=1 ∂ n

Z
N1 ε | ln ε |
≤ ds1 = N1 ε | ln ε | ,
2π kx−x0 k=1
pois a última integral dá o comprimento do círculo de raio 1, ou seja, 2π .
Mostrar-se-á agora que lim ε | ln ε | = 0.
ε →0

O procedimento é o mesmo usado na parte (b) da demonstração do lema 5.1. Fazendo ε = 1/t ,
para t > 1, obtém-se
D.5 Terceira identidade de Green 835

| ln (1/t )| | ln 1 − ln t| | 0 − ln t| | ln t|
ε | ln ε | = = = = ·
t t t t
Note-se que, para t > 1, tem-se que | ln t| = ln t, isto é,
ln t ,
ε | ln ε | =
t
para todo t > 1.
Assim, pode-se usar a parte (a) do lema 5.1. Além disso, observa-se que existe limite para
t → +∞ no segundo membro acima e que este limite é igual a zero pela parte (a) do lema 5.1.
E como ε = 1/t , então quando t → +∞ tem-se que ε → 0. Portanto, pode-se tomar limite na
expressão acima e escrever
ln t
lim (ε | ln ε |) = lim = 0,
ε →0 t→+∞ t

Segue-se daí que lim I2 (ε ) = 0.


ε →0

E TAPA 3: Mostra-se agora que lim I1 (ε ) = u(x0 ), onde


ε →0
Z
∂ sx0
I1(ε ) = u ds.
kx−x0 k=ε ∂n
Antes de se tomar o limite, com ε → 0, deve-se calcular

sx0
(x)
∂n kx−x0 k=ε

Como, para n = 2 a função sx0 é dada por


1
sx0 (x) = ln kx − x0 k,

segue-se que
1 1
sx0 (x) = ln kx − x0k = ln ε ,
2π 2π
se kx − x0 k = ε .
Portanto,
∂ sx0 1 ∂ 1
(x) = (ln ε ) = [∇ (ln ε ) · n ]
∂n kx−x0 k=ε 2π ∂ n 2π
1
= [∇ (ln kx − x0k) · n] ,

com
x − x0
n= ,
ε
ou seja, para n = (η1 , η2), tem-se
x − x0 y − y0
η1 = e η2 = .
ε ε
Antes, note que
836 D Equação de Laplace: estudo mais geral

 q 
∂ ∂ ∂
(ln ε ) = (ln kx − x0 k) = ln (x − x0 )2 + (y − y0)2
∂x ∂x ∂x
x − x0 1
=p ·p
(x − x0 )2 + (y − y0)2 (x − x0 )2 + (y − y0)2
x − x0 x − x0
= 2
= ·
kx − x0 k ε2
Similarmente encontra-se a derivada parcial em relação a y, de modo que se tem a seguinte
expressão para o gradiente:
 
x − x0 , y − y0 x − x0
∇ (ln ε ) = = ·
ε2 ε2 ε2
Assim,
∂ ∂
∇ (ln ε ) · n = (ln ε ) · η1 + (ln ε ) · η2
∂x ∂y
x − x0 x − x0 y − y0 y − y0
= · + 2 ·
ε2 ε ε ε
2
(x − x0 ) + (y − y0 ) 2 ε 2 1
= 3
= 3= ·
ε ε ε
sx0
Portanto, tem-se, para (x), quando x é um ponto de ∂ Bε (x0 ), a expressão
∂n

sx0 sx 1 1 1,
(x) = 0 (x0 + ε n ) = [∇ (ε ) · n ] = ·
∂n kx−x0 k=ε ∂n 4π 2π ε

que substituída na integral I1(ε ) resulta em


Z Z
∂ sx0 1 1
I1 (ε ) = u(x) (x) ds = u(x0 + ε n) ds
kx−x0 k=ε ∂n 2π kx−x0 k=ε ε
Z
1
= u(x0 + ε n ) ds.
2πε kx−x0 k=ε

Para mostrar que I1(ε ) converge para o valor u no ponto x0 , mostrar-se-á que, dado um
número real positivo qualquer δ > 0, pode-se sempre encontrar outro real τ > 0 tal que

| I1 (ρ ) − u(x0 )| < δ sempre que ρ < τ,

onde 0 < ρ ≤ ε , o que equivale, evidentemente, a afirmar que lim I1(ρ ) = u(x0 ).
ρ →0
Pode-se escrever a seguinte expressão para u(x0 ):
Z
2πρ u(x0 ) 1
u(x0 ) = = u(x0 ) ds.
2πρ 2πρ kx−x0 k=ρ

Então,
Z Z
1 1
I1(ρ ) − u(x0 ) = u(x0 + ρ n ) ds − u(x0 ) ds
2πρ kx−x0 k=ρ 2πρ kx−x0 k=ρ
D.5 Terceira identidade de Green 837

Z
1
= [u(x0 + ρ n ) − u(x0 )] ds.
2πρ kx−x0 k=ρ

Como u é contínua em Ω, fixado qualquer x0 ∈ Ω e dado δ > 0, existe τ > 0 tal que

|u(x0 + ρ n ) − u(x0 )| < δ se ρ < τ.

Sejam, então, δ e τ nessas condições. Segue-se que



1 Z

| I1 (ρ ) − u(x0 )| = [u(x0 + ρ n ) − u(x0 )] ds
2πρ kx−x0 k=ρ
Z
1
≤ |u(x0 + ρ n ) − u(x0 )| ds
2πρ kx−x0 k=ρ
Z
δ δ
≤ ds = · (2πρ ) = δ ,
2πρ kx−x0 k=ρ 2πρ
se ρ < τ .
Concluindo, se 0 < ρ ≤ ε e é dado δ > 0, então existe τ > 0 de modo que

ρ <τ ⇒ | I1 (ρ ) − u(x0 )| < δ .

Isto mostra que lim I1 (ε ) = u(x0).


ε →0

E TAPA 4: Agora é preciso dar um sentido a integral em Ω que aparece no segundo membro
de (5.1). Observe, inicialmente, que ∆Fx0 = 0 em Ωε = Ω\Bε (x0), de modo que se pode escrever
ZZ ZZ
(u ∆Fx0 − Fx0 ∆u) dx dy = − Fx0 ∆u dx dy.
Ωε Ωε

Além disso, como Ω\Ωε = Bε (x0), tem-se que


ZZ ZZ ZZ
(5.6) Fx0 ∆u dx dy − Fx0 ∆u dx dy = Fx0 ∆u dx dy.
Ω Ωε Bε (x0 )

Agora faça ZZ
I4(ε ) = Fx0 ∆u dx dy.
Bε (x0 )
Lembrando que Fx0 = sx0 + ϕ , segue-se que
ZZ
I4(ε ) = Fx0 ∆u dx dy
Bε (x0 )
ZZ
= (sx0 + ϕ )∆u dx dy
Bε (x0 )
ZZ ZZ
= sx0 ∆u dx dy + ϕ ∆u dx dy.
Bε (x0 ) Bε (x0 )

Como u, ϕ ∈ C1 Ω ∩C2 (Ω), então ϕ e ∆u são funções contínuas em Bε (x0 ), logo limitadas
no fecho da bola. Portanto, existem constantes M1 , M2 > 0 tais que
838 D Equação de Laplace: estudo mais geral

|ϕ | ≤ M1 e |∆u| ≤ M2 .

Além disso, para n = 2, tem-se que


1
sx0 (x) = ln kx − x0 k .

Assim,
ZZ ZZ

| I4 (ε )| = sx0 ∆u dx dy + ϕ ∆u dx dy
Bε (x0 ) Bε (x0 )
ZZ ZZ
1
= ln kx − x0 k ∆u dx dy + ϕ ∆u dx dy
2π Bε (x0) Bε (x0 )
ZZ ZZ
1
≤ | ln kx − x0k ·| |∆u| dx dy + |ϕ | · |∆u| dx dy
2π Bε (x0 ) Bε (x0 )
ZZ ZZ
M2
≤ |ln kx − x0 k| dx dy + M1 M2 dx dy
2π Bε (x0 ) Bε (x0 )
ZZ
M2
(5.7) = |ln kx − x0 k| dx dy + M1 M2 π ε 2 ,
2π Bε (x0 )

onde se usou o fato que


ZZ
dx dy = Área(Bε (x0 )) = π ε 2 .
Bε (x0 )

Para a integral no segundo membro de (5.7), introduz-se um sistema de coordenadas polares


centrado em x0 fazendo-se

x − x0 = (x − x0 , y − y0) = (r cost, r sen t) ,

com 0 < r0 < r < ε e 0 ≤ t ≤ 2π . Deve ser lembrado também que o jacobiano para este sistema
de coordenadas é dado por J = r.
Assim,
ZZ
M2
| I4 (ε )| ≤ |ln kx − x0 k| dx dy + M1 M2 π ε 2
2π Bε (x0 )
Z Z 2π 
M2 ε
= r | ln r | dt dr + M1 M2 π ε 2
2π r0 0
Z ε
2
(5.8) = M1 M2 π ε + M2 r | ln r | dr.
r0

Por outro lado, pela parte (b) do lema 5.1 tem-se que lim (r ln r) = 0. Logo, a função r 7→
r→0
r ln r é limitada perto da origem, isto é, existe M3 > 0 tal que

0<r<1 ⇒ 0 < r | ln r | < M3 .

Portanto, usando este fato em (5.8), segue-se que


D.5 Terceira identidade de Green 839

Z ε
| I4(ε )| ≤ M1 M2 π ε 2 + M2 M3 dr
r0

= M1 M2 π ε 2 + M2 M3 ε − r 0 .

Como 0 < r0 < ε , segue-se que 0 < (ε − r 0 ) < ε . Assim,

| I4 (ε )| ≤ M1 M2 π ε 2 + M2 M3 ε .

Usando esta última desigualdade e (5.6), obtém-se


ZZ ZZ ZZ

Fx0 ∆u dx dy = | I4 (ε )|
Ω Fx0 ∆u dx dy − Ω Fx0 ∆u dx dy = B
ε ε (x0 )

≤ M1 M2 π ε 2 + M2 M3 ε .
Isto mostra que o primeiro membro acima converge para zero quando ε → 0. Portanto,
interpreta-se a integral imprópria em (5.1) como sendo
ZZ ZZ
(5.9) Fx0 ∆u dx dy = lim Fx0 ∆u dx dy.
Ω ε →0 Ωε

Viu-se que no início da etapa 4 que se pode escrever


ZZ ZZ
(u ∆Fx0 − Fx0 ∆u) dx dy = − Fx0 ∆u dx dy.
Ωε Ωε

Tomando limite para ε → 0 na igualdade acima e usando (5.9), obtém-se


ZZ ZZ
lim (u ∆Fx0 − Fx0 ∆u) dx dy = − lim Fx0 ∆u dx dy
ε →0 Ωε ε →0 Ωε
ZZ
=− Fx0 ∆u dx dy.

Agora finaliza-se a demonstração do teorema. Verificou-se em (5.5) que se pode escrever


ZZ Z  
∂ Fx0 ∂u
(u∆Fx0 − Fx0 ∆u) dxdy = u − Fx0 ds − I1 (ε ) + I2 (ε ) − I3 (ε ).
Ωε ∂Ω ∂n ∂n
Cada uma das quatro etapas mostrou que cada uma das parcelas acima tem limite para ε → 0
e forneceu seu valor. Assim, tomando-se limite para ε → 0 na última igualdade, e observando
que a integral no segundo membro acima não depende de ε , obtém-se
ZZ ZZ
− Fx0 ∆u dx dy = lim (u ∆Fx0 − Fx0 ∆u) dx dy
Ω ε →0 Ωε
 Z 
∂ Fx0 ∂u
= lim u − Fx0 ds −
ε →0 ∂ Ω ∂n ∂n
− lim I1 (ε ) + lim I2(ε ) − lim I3 (ε )
ε →0 ε →0 ε →0
Z  
∂ Fx0 ∂u
= u − Fx0 ds − 0 + 0 − u(x0 ),
∂Ω ∂n ∂n
840 D Equação de Laplace: estudo mais geral

isto é, ZZ Z  
∂ Fx0 ∂u
− Fx0 ∆u dx dy = u − Fx0 ds − u(x0 ),
Ω ∂Ω ∂n ∂n
donde Z   ZZ
∂ Fx0 ∂u
u(x0 ) = u − Fx0 ds + Fx0 ∆u dx dy,
∂Ω ∂n ∂n Ω
que é o resultado desejado.

Teorema 5.2 (3a identidade de Green – caso n ≥ 3): Sejam Ω ⊂ Rn um conjunto aberto,

conexo e limitado e u ∈ C1 Ω ∩ C2(Ω) uma solução para a equação ∆u = f em Ω, onde

f ∈ C Ω . Então, para todo x0 ∈ Ω, tem-se
Z   Z
∂ Fx0 ∂u
(5.10) u(x0 ) = u(x) (x) − Fx0 (x) (x) dS + Fx0 (x) f (x) dx,
∂Ω ∂n ∂n Ω

onde n denota o vetor normal exterior a ∂ Ω.


D EMONSTRAÇÃO : Como no caso n = 2, observa-se que é preciso dar sentido a segunda
integral que aparece na equação (5.10), isto é, tratá-la como uma integral imprópria. Em linhas
gerais a demonstração segue a mesma lógica daquela usada na demonstração do teorema 5.1.
Considere-se um ponto qualquer x0 ∈ Ω e ε > 0 tais que a bola Bε (x0 ), de raio ε e centro
em x0 , esteja contida em Ω. Como visto, isto é sempre possível, pois Ω é aberto. Escreva Ωε =
Ω\Bε (x0 ). Note-se que a solução fundamental Fx0 (x), dada por (4.7) - (4.8) para n ≥ 3, está
definida em todo ponto x ∈ Ωε .
Nessas condições, vale a segunda identidade de Green (equação (2.2) na proposição 2.1),
Z Z  
∂u ∂v
(v∆u − u∆v) dx = v −u ds.
Ω ∂Ω ∂n ∂n
A fronteira do domínio Ωε é dada por

∂ Ωε = ∂ (Ω\Bε (x0)) = ∂ Ω ∪ ∂ Bε (x0 ).

Usando-se a segunda identidade de Green com estas novas condições, substituindo u por Fx0
e v por u, obtém-se a expressão
Z Z  
∂ Fx0 ∂u
(u∆Fx0 − Fx0 ∆u) dx = u − Fx0 ds
Ωε ∂ Ω ∪ ∂ Bε (x0 ) ∂n ∂n
Z   Z  
∂ Fx0 ∂u ∂ Fx0 ∂u
(5.11) = u − Fx0 ds − u − Fx0 ds,
∂Ω ∂n ∂u ∂ Bε (x0 ) ∂n ∂n
onde o sinal negativo na segunda integral do segundo membro deve-se a inversão do sinal da
normal exterior na bola.
D.5 Terceira identidade de Green 841

Do mesmo modo que no caso n = 2, a primeira integral do segundo membro não depende do
raio ε da bola de centro x0 .
Assim, lembrando-se que Fx0 = sx0 + ϕ , o integrando da segunda integral no segundo membro
pode ser escrito na seguinte forma:
 
∂ Fx0 ∂u ∂ sx0 ∂ ϕ ∂u
u − Fx0 =u + − (sx0 + ϕ )
∂n ∂n ∂n ∂n ∂n
   
∂ sx0 ∂u ∂ϕ ∂u ,
= u − sx0 + u −ϕ
∂n ∂n ∂n ∂n
resultando, para a última integral do segundo membro, a expressão
Z   Z  
∂ Fx0 ∂u ∂ Fx0 ∂u
u − Fx0 ds = u − Fx0 ds
∂ Bε (x0 ) ∂n ∂n ∂ Bε (x0) ∂n ∂n
Z  
∂ sx0 ∂u
= u − sx0 ds +
∂ Bε x0 ) ∂n ∂n
Z  
∂ϕ ∂u
(5.12) + u −ϕ ds.
∂ Bε (x0 ) ∂n ∂n
Substituindo (5.12) em (5.11), obtém-se
Z Z  
∂ Fx0 ∂u
(u ∆Fx0 − Fx0 ∆u) dx = u − Fx0 ds−
Ωε ∂Ω ∂n ∂n
"Z  
∂ sx0 ∂u
− u − sx0 ds
∂ Bε (x0 ) ∂n ∂n
Z   #
∂ϕ ∂u
+ u −ϕ ds
∂ Bε (x0 ) ∂n ∂n
Z   Z
∂ Fx0 ∂u ∂ sx0
= u − Fx0 ds − u ds +
∂Ω ∂n ∂n ∂ Bε (x0 ) ∂ n
Z Z  
∂u ∂ϕ ∂u
(5.13) + sx0 ds − u −ϕ ds.
∂ Bε (x0 ) ∂n ∂ Bε (x0 ) ∂n ∂n
Agora faça
Z Z
∂ sx0 ∂u
I1 (ε ) = u ds, I2 (ε ) = sx0 ds
∂ Bε (x0 ) ∂n ∂ Bε (x0 ) ∂n
e Z  
∂ϕ ∂u
I3 (ε ) = u −ϕ ds.
∂ Bε (x0 ) ∂n ∂n
Note que (5.13) agora se escreve como

Z Z  
∂ Fx0 ∂u
(5.14) (u ∆Fx0 − Fx0 ∆u) dx = u − Fx0 ds − I1 (ε ) + I2 (ε ) − I3(ε ).
Ωε ∂Ω ∂n ∂n
842 D Equação de Laplace: estudo mais geral

Com esta notação, mostrar-se-á que

lim I1 (ε ) = u(x0 ), lim I2 (ε ) = 0 e lim I3 (ε ) = 0.


ε →0 ε →0 ε →0

1a E TAPA : Demonstrar-se-á que lim I3(ε ) = 0, onde


ε →0
Z  
∂ϕ ∂u
I3 (ε ) = u −ϕ ds.
∂ Bε (x0 ) ∂n ∂n

Por hipótese, u, ϕ ∈ C1 Ω ∩ C2 (Ω), sendo que ∆ϕ = 0. Assim, a função
 
∂ϕ ∂u
x 7→ u(x) (x) − ϕ (x) (x)
∂n ∂n

é contínua em Ω, logo é limitada. Então, existe M > 0 tal que



∂ϕ ∂ u
u − ϕ ≤ M,
∂n ∂n

para todo x ∈ Bε (x0) e para todo ε 0 ≤ ε .


Observe-se que
∂ Bε (x0 ) = {x ∈ Rn | kx − x0k = ε } .
Assim, resulta para I3 (ε ) a seguinte desigualdade:
Z Z
∂ϕ ∂ u
| I3(ε )| ≤
kx−x0 k=ε
u ∂ n − ϕ ∂ n ds ≤ M kx−x k=ε ds
0

= M · ωn (ε ) = M · ωn(1) · ε n−1 ,
onde a última igualdade foi obtida a partir do corolário 3.1. De fato, o lema assegura que

2π n/2 n−1
ωn (ε ) = ·ε ,
Γ(n/2)
de modo que (fazendo ε = 1 na fórmula acima) se obtém

2π n/2
ωn (1) = ⇒ ωn (ε ) = ωn(1) · ε n−1 .
Γ(n/2)
Como M e a área da esfera unitária ωn (1) são constantes, tem-se que a desigualdade acima
implica que lim I3 (ε ) = 0.
ε →0

2a E TAPA : Mostrar-se-á que lim I2 (ε ) = 0, onde


ε →0
Z
∂u
I2 (ε ) = sx0 ds.
∂ Bε (x0 ) ∂n
D.5 Terceira identidade de Green 843


De fato, sendo u ∈ C1 Ω ∩C2(Ω), por hipótese, segue-se que as derivadas parciais primeiras
de u são funções contínuas em Ω, portanto limitadas, isto é, existe N > 0 tal que

∂u
, . . ., ∂ u ≤ N
∂x ∂ xn
1

em Ω e, portanto, em Bε (x0), ε 0 ≤ ε .
∂u
Fazendo n = (η1 , . . ., ηn), daí resulta a seguinte estimativa para :
∂n

∂ u ∂ u ∂ u ∂u ∂u
= ,
∂ n ∂ x η1 + · · · + ∂ xn η3 ≤ ∂ x + · · · + ∂ xn
1 1

donde
∂ u
≤ n N.
∂n
Além disso, se x ∈ ∂ Bε (x0), isto é, kx − x0 k = ε , então a função sx0 (x) é dada por
1 1
sx0 (x) = kx − x0 k2−n = ε 2−n.
(2 − n)ωn (2 − n)ωn
Tem-se que x pode ser escrito na forma

x = x0 + ε n,

onde n é, agora, o normal unitário exterior a Bε (x0 ).


Dessas considerações segue-se que
Z
∂u
I2 (ε ) = sx0 (x) (x) dsε
kx−x0 k=ε ∂n
Z
∂u
= sx0 (x0 + ε n ) (x0 + ε n ) dsε
kx−x0 k=ε ∂n
Z
1 ∂u
= ε 2−n (x0 + ε n ) ε n−1 ds1
kx−x0 k=1 (2 − n)ωn ∂n
Z
ε ∂u
= (x0 + ε n) ds1,
(2 − n)ωn kx−x0 k=1 ∂ n

sendo dsε e ds1 , respectivamente, os elementos de superfície das esferas de raio r = ε e r = 1.


Portanto, tem-se
Z
ε ∂ u
| I2(ε )| ≤ (x 0 + ε n ) ds1
|2 − n| ωn kx−x0 k=1 ∂ n
Z
nNε nNε
≤ ds1 = ωn
(n − 2) ωn kx−x0 k=1 (n − 2) ωn
= N0 · ε ,
onde se fez
844 D Equação de Laplace: estudo mais geral

n·N
N0 = ·
(n − 2)
Daí segue-se que lim I2(ε ) = 0.
ε →0

E TAPA 3: Mostra-se agora que lim I1 (ε ) = u(x0 ), onde


ε →0
Z
∂ sx0
I1(ε ) = u ds.
kx−x0 k=ε ∂n
Antes de se tomar o limite, com ε → 0, deve-se calcular

sx0
(x)
∂n kx−x0 k=ε

Como, para n ≥ 3, a função sx0 é dada por


1
sx0 (x) = kx − x0 k2−n ,
(2 − n) ωn
segue-se que
1
sx0 (x) = ε 2−n,
(2 − n) ωn
se kx − x0 k = ε .
Portanto,
∂ sx0 1 ∂  1   
(x) = ε 2−n = ∇ ε 2−n · n ,
∂n kx−x0 k=ε (2 − n) ωn ∂ n (2 − n) ωn
com
x − x0 ,
n=
ε
ou seja, para n = (η1 , . . ., ηn), tem-se

x1 − x01 , xn − x0n
η1 = · · · , ηn = ·
ε ε
Antes, note que

∂ 2−n
 ∂  2−n

ε = kx − x0 k
∂ x1 ∂ x1
∂ h 2 2 i(2−n)/2
= x1 − x01 + · · · + xn − x0n
∂ x1

(2 − n) x1 − x01
=h in
2 2 /2
x1 − x01 + · · · + (xn − x0n)

(2 − n) x1 − x01
= ·
εn
D.5 Terceira identidade de Green 845

Similarmente encontram-se as demais derivadas parciais, de modo que se tem a seguinte


expressão para o gradiente:
0
 0
!
 (2 − n) x 1 − x1 , (2 − n) x n − xn
∇ ε 2−n = n
···, n
·
ε ε

Assim,
   
2−n
 ∂ 2−n
 ∂ 2−n

∇ ε ·n = ε η1 + · · · + ε ηn
∂ x1 ∂ xn
   
(2 − n) x1 − x01 x1 − x01 (2 − n) xn − x0n xn − x0n
= + ··· +
εn ε εn ε
 2 2
x1 − x01 + · · · + xn − x0n
= (2 − n)
ε n+1
ε2 2−n
= (2 − n) n+1 = n−1 ·
ε ε
sx
Portanto, tem-se, para 0 (x), quando x é um ponto de ∂ Bε (x0 ), a expressão
∂n

sx0
(x) = sx0 (x0 + ε n )
∂n kx−x0 k=ε
1   
= ∇ ε 2−n · n
(2 − n) ωn
1 (2 − n) 1
= n−1
= ·
(2 − n) ωn ε ωn ε n−1
que substituída na integral I1(ε ) resulta em
Z
∂ sx0
I1 (ε ) = u(x) (x) ds
kx−x0 k=ε ∂n
Z
1 1
= u(x0 + ε n ) ds
ωn kx−x0 k=ε ε n−1
Z
1
= u(x0 + ε n ) ds.
ωn ε n−1 kx−x0 k=ε

Para demonstrar que I1(ε ) converge para o valor u(x0), mostrar-se-á que, dado um número
real positivo qualquer δ > 0, pode-se sempre encontrar outro real τ > 0 tal que

| I1 (ρ ) − u(x0 )| < δ sempre que ρ < τ,

onde 0 < ρ ≤ ε , o que equivale, evidentemente, a afirmar que lim I1(ρ ) = u(x0 ).
ρ →0
Pode-se escrever a seguinte expressão para u(x0 ):

ωn ρ n−1
u(x0) = u(x0 )
ωn ρ n−1
846 D Equação de Laplace: estudo mais geral

Z
u(x0 )
= ds
ωn ρ n−1 kx−x0 k=ρ
Z
1
= u(x0 ) ds.
ωn ρ n−1 kx−x0 k=ρ
Então,
Z Z
1 1
I1 (ρ ) − u(x0) = u(x0 + ρ n ) ds − u(x0 ) ds
ωn ρ n−1 kx−x0 k=ρ ωn ρ n−1 kx−x0 k=ρ
Z
1
= [u(x0 + ρ n ) − u(x0)] ds.
ωnρ n−1 kx−x0 k=ρ

Como u é contínua em Ω, fixado qualquer x0 ∈ Ω e dado δ > 0, existe τ > 0 tal que

|u(x0 + ρ n ) − u(x0 )| < δ , se ρ < τ.

Sejam, então, δ e τ nessas condições. Segue-se que


Z
1
| I1 (ρ ) − u(x0 )| = [u(x 0 + ρ n ) − u(x 0 )] ds

ωn ρ n−1 kx−x0 k=ρ
Z
1
≤ |u(x0 + ρ n ) − u(x0 )| ds
ωn ρ n−1 kx−x0 k=ρ
Z 
δ δ
< ds = · ωn ρ n−1
ωn ρ n−1 kx−x0 k=ρ ωn ρ n−1

= δ,
se ρ < τ .
Concluindo, se 0 < ρ ≤ ε e é dado δ > 0, então existe τ > 0 de modo que

ρ <τ ⇒ | I1 (ρ ) − u(x0 )| < δ .

Isto mostra que lim I1 (ε ) = u(x0).


ε →0

E TAPA 4: Agora é preciso dar um sentido a integral sobre Ω que aparece no segundo mem-
bro de (5.10). Observe, inicialmente, que ∆Fx0 = 0 em Ωε = Ω\Bε (x0 ), de modo que se pode
escrever Z Z
(u ∆Fx0 − Fx0 ∆u) dx = − Fx0 ∆u dx.
Ωε Ωε
Além disso, como Ω\Ωε = Bε (x0), tem-se que
Z Z Z
(5.15) Fx0 ∆u dx − Fx0 ∆u dx = Fx0 ∆u dx.
Ω Ωε Bε (x0 )

Agora faça Z
I4 (ε ) = Fx0 ∆u dx.
Bε (x0 )
Lembrando que Fx0 = sx0 + ϕ , segue-se que
D.5 Terceira identidade de Green 847

Z Z
I4 (ε ) = Fx0 ∆u dx = (sx0 + ϕ )∆u dx
Bε (x0 ) Bε (x0 )
Z Z
= sx0 ∆u dx + ϕ ∆u dx.
Bε (x0 ) Bε (x0 )

Como u, ϕ ∈ C1 Ω ∩C2 (Ω), então ϕ e ∆u são funções contínuas em Bε (x0 ), logo limitadas
no fecho da bola. Portanto, existem constantes M1 , M2 > 0 tais que

|ϕ | ≤ M1 e |∆u| ≤ M2 .

Além disso, para n ≥ 3, tem-se que


1
sx0 (x) = kx − x0 k2−n .
(2 − n) ωn
Assim, fazendo kx − x0 k = r, obtém-se
Z Z

| I4(ε )| = sx0 ∆u dx + ϕ ∆u dx
Bε (x0 ) Bε (x0 )
Z Z

≤ sx0 ∆u dx + ϕ ∆u dx
Bε (x0 ) Bε (x0 )
Z Z
1 2−n

= r ∆u dx + ϕ ∆u dx
(2 − n) ωn Bε (x0 ) Bε (x0 )
Z Z
1 2−n
≤ r |∆u| dx + |ϕ | |∆u| dx
|2 − n| ωn Bε (x0 ) Bε (x0 )
Z Z
M2 2−n
≤ r dx + M1 M2 dx
(n − 2) ωn Bε (x0 ) Bε (x0 )
Z Z
M2 ε ε
= r 2−n ωn (r) dr + M1 M2 ωn (r) dr
(n − 2) ωn 0 0
Z ε Z ε
M2 2−n n−1
 
= r nr ωn dr + M1 M2 n r n−1 ωn dr
(n − 2) ωn 0 0
Z ε Z ε
n M2
= r dr + M1 M2 ωn r n−1 dr
n−2 0 0
n M2 ε M M ω
1 2 n n ε
= r2 + r
2(n − 2) 0 n 0
n M2 M1 M2 ωn n
(5.16) = ε2 + ε .
2(n − 2) n
Agora escreva
n M2 M1 M2 ωn
M10 = e M20 = ·
2(n − 2) n
Assim, a desigualdade (5.16) pode ser reescrita como

| I4(ε )| ≤ M10 ε 2 + M20 ε n.


848 D Equação de Laplace: estudo mais geral

Fazendo M = max {M10 , M20 } e observando que para n ≥ 3 e ε > 0 suficientemente pequeno,
tem-se que ε n < ε 2, é possível melhorar a estimativa anterior e obter | I4 (ε )| < M ε 2 ; insiste-se,
para ε suficientemente pequeno.
Usando este fato e (5.15), obtém-se
Z Z Z

Fx ∆u dx − F ∆u dx = − F ∆u dx
Ω 0 Ωε
x 0 B (x ) 0 x
ε 0

= | I4 (ε )| ≤ M ε 2 .
Isto mostra que o primeiro membro acima converge para zero quando ε → 0. Portanto,
interpreta-se a integral imprópria em (5.10) como sendo
Z Z
(5.17) Fx0 ∆u dx = lim Fx0 ∆u dx.
Ω ε →0 Ωε

Viu-se no início da etapa 4 que


Z Z
(u ∆Fx0 − Fx0 ∆u) dx = − Fx0 ∆u dx.
Ωε Ωε

Tomando limite para ε → 0 na igualdade acima e usando (5.17), obtém-se


Z Z
lim (u ∆Fx0 − Fx0 ∆u) dx = − lim Fx0 ∆u dx
ε →0 Ωε ε →0 Ωε
Z
(5.18) =− Fx0 ∆u dx.

Com isto se encerra a etapa 4.

Agora finaliza-se a demonstração do teorema. Viu-se em (5.14) que se pode escrever


Z Z  
∂ Fx0 ∂u
(u ∆Fx0 − Fx0 ∆u) dx = u − Fx0 ds − I1 (ε ) + I2 (ε ) − I3(ε ).
Ωε ∂Ω ∂n ∂n
Cada uma das quatro etapas mostrou que cada uma das parcelas acima tem limite para ε → 0
e forneceu seu valor. Assim, tomando-se limite para ε → 0 na última igualdade, e observando
que a integral no segundo membro acima não depende de ε , obtém-se
ZZ ZZ
− Fx0 ∆u dx dy = lim (u ∆Fx0 − Fx0 ∆u) dx dy
Ω ε →0 Ωε
Z  
∂ Fx0 ∂u
= lim u − Fx0 ds −
ε →0 ∂ Ω ∂n ∂n
− lim I1 (ε ) + lim I2(ε ) − lim I3 (ε )
ε →0 ε →0 ε →0
Z  
∂ Fx0 ∂u
= u − Fx0 ds − 0 + 0 − u(x0 ),
∂Ω ∂n ∂n
isto é,
D.6 Função de Green 849

ZZ Z  
∂ Fx0 ∂u
− Fx0 ∆u dx dy = u − Fx0 ds − u(x0 ),
Ω ∂Ω ∂n ∂n
donde Z   ZZ
∂ Fx0 ∂u
u(x0 ) = u − Fx0 ds + Fx0 ∆u dx dy,
∂Ω ∂n ∂n Ω
que é o resultado desejado.

Pode-se concluir, recordando-se as hipóteses do teorema 5.1 - 5.2, que, se existe uma solução

u do problema ∆u = f em Ω, com f ∈ C Ω , então u, em cada ponto x0 ∈ Ω, é dada pela
expressão
Z   Z
∂ Fx0 ∂u
(5.19) u(x0 ) = u(x) (x) − Fx0 (x) (x) ds + Fx0 (x) f (x) dx.
∂Ω ∂n ∂n Ω

Todavia, note-se que essa representação de u não é conveniente no caso do problema de


Dirichlet, pois, neste caso, é dado apenas o valor de u(x) quando x ∈ ∂ Ω, e observa-se que,
∂u
para se usar a representação (5.19), é preciso conhecer também os valores de (x) quando x é
∂n
tomado sobre ∂ Ω.
Essa pequena dificuldade desaparecerá, como se verá, ao se estudar a função de Green, que é
o assunto da próxima seção.

D.6 Função de Green

Na seção anterior foi encontrada uma representação integral da solução do problema ∆u = f ,



com f ∈ C Ω , caso exista solução. Além disso, foi observado que, para se ter u explicitamente,
as seguintes funções deveriam ser dadas:

∂ u
u(x) = a(x) e (x) = b(x).
x ∈∂ Ω ∂n x∈∂ Ω

Observa-se não ser razoável dar informações sobre a função u e sua derivada exterior, si-
multaneamente, em cada ponto da fronteira de Ω. A ideia, aqui, consiste em obter uma função,
conhecida como função de Green, que permita determinar uma representação integral para a
equação de Poisson sem que precise conhecer a função u e sua derivada exterior ao mesmo
tempo. Em seguida será apresentado um estudo que considera uma representação integral da
∂ u
solução u, mas sem que seja preciso conhecer a função (x) = b(x).
∂n x∈∂ Ω
850 D Equação de Laplace: estudo mais geral

Como motivação inicial, considere-se um caso particular com Ω ⊂ Rn . Os cálculos serão


realizados formalmente.
Sejam x0 ∈ Ω, r = kx − x0k e
1 1
sx0 (x) = kx − x0 k2−n = r2−n .
(2 − n) ωn (2 − n) ωn
Considere a fórmula dada em (4.8), isto é,
1
Fx0 (x) = kx − x0 k2−n + ϕ (x), se n ≥ 3.
(2 − n) ωn
Tomando ϕ (x) = 0 em Ω, então
1
Fx0 (x) = sx0 (x) + ϕ (x) = r2−n
(2 − n) ωn
é uma solução fundamental do laplaciano relativo do domínio Ω, como foi demonstrado na
proposição 4.4.
A terceira identidade de Green para n ≥ 3 é dada pela fórmula (5.10), que é reproduzida aqui:
Z   Z
∂ Fx0 ∂u
u(x0) = u(x) (x) − Fx0 (x) (x) ds + Fx0 (x) f (x) dx.
∂Ω ∂n ∂n Ω

Substituindo Fx0 (x) obtida da maneira acima na terceira identidade de Green, obtém-se
Z    
∂ 1 2−n 1 2−n ∂ u
u(x0) = u(x) r − r ds +
∂Ω ∂ n (2 − n)ωn (2 − n)ωn ∂n
Z
1
+ r2−n f (x) dx
Ω (2 − n) ωn
Z   Z
1 ∂ 2−n  2−n ∂ u 1
(6.1) = u(x) r −r ds + f (x) r2−n dx.
(2 − n) ωn ∂ Ω ∂n ∂n (2 − n) ωn Ω
Suponha agora que seja conhecida uma função Hx0 (x) satisfazendo o seguinte problema:
(
∆Hx0 = 0 em Ω,
Hx0 (x) = −r2−n, se x ∈ ∂ Ω.

Considere a segunda identidade de Green:


Z Z  
∂v ∂u
(u ∆v − v ∆u)dx = u −v ds.
Ω ∂Ω ∂n ∂n
Faça v = Hx0 na segunda identidade de Green. Lembrando que ∆u = f e ∆Hx0 = 0 (pois
satisfaz o problema acima), obtém-se
Z Z  
∂ Hx0 ∂u
(u ∆Hx0 − Hx0 ∆u) dx = u − Hx0 ds,
Ω ∂Ω ∂n ∂n
que implica em
D.6 Função de Green 851

Z Z  
∂ Hx0 ∂u
[u.0 − Hx0 (x) f (x)] dx = u − Hx0 ds,
Ω ∂Ω ∂n ∂n
ou seja,  
Z Z
∂ Hx0 ∂u
− Hx0 f (x) dx = u − Hx0 ds.
Ω ∂Ω ∂n ∂n
Dividindo ambos os membros acima por (2 − n) ωn , obtém-se
Z Z  
1 1 ∂ Hx0 ∂u
(6.2) − Hx (x) f (x) dx = u(x) − Hx0 (x) ds.
(2 − n) ωn Ω 0 (2 − n) ωn ∂ Ω ∂n ∂n
Somando-se membro a membro (6.1) e (6.2), resulta que
Z Z  
1 1 ∂ 2−n  2−n ∂ u
u(x0 ) − Hx (x) f (x) dx = u(x) r −r ds +
(2 − n) ωn Ω 0 (2 − n) ωn ∂ Ω ∂n ∂n
Z
1
+ f (x) r2−n dx +
(2 − n) ωn Ω
Z  
1 ∂ Hx0 ∂u
+ u(x) − Hx0 (x) ds,
(2 − n) ωn ∂Ω ∂n ∂n
donde segue-se que
Z Z
1 1
u(x0 ) = Hx0 (x) f (x) dx + f (x) r2−n dx +
(2 − n) ωn Ω (2 − n) ωn Ω
Z  
1 ∂ Hx0 ∂u
+ u(x) − Hx0 (x) ds,
(2 − n) ωn ∂ Ω ∂n ∂n
Z  
1 ∂ 2−n  2−n ∂ u
+ u(x) r −r ds
(2 − n) ωn ∂ Ω ∂n ∂n
Z 
1 
= Hx0 (x) + r2−n f (x) dx +
(2 − n) ωn Ω
Z  
1 ∂ Hx0 ∂ 2−n 
+ + r u(x) ds −
(2 − n) ωn ∂ Ω ∂ n ∂n
Z 
1  ∂u
− Hx0 (x) + r2−n ds
(2 − n) ωn ∂ Ω ∂n
Z 
1 
= Hx0 (x) + r2−n f (x) dx +
(2 − n) ωn Ω
Z  
1 ∂ 2−n

+ Hx0 + r u(x) ds −
(2 − n) ωn ∂ Ω ∂ n
Z 
1  ∂u
− Hx0 (x) + r2−n ds.
(2 − n) ωn ∂ Ω ∂n

Mas, por hipótese, tem-se que Hx0 ∂ Ω = −r2−n , de modo que a parte entre colchetes do
integrando na última integral acima se anula, anulando também toda esta última integral. Assim,
852 D Equação de Laplace: estudo mais geral

Z 
1 
u(x0 ) = Hx0 (x) + r2−n f (x) dx +
(2 − n) ωn Ω
Z  
1 ∂ 2−n

+ Hx0 + r u(x) ds,
(2 − n) ωn ∂Ω ∂n
ou ainda,
Z  
Hx0 (x) r2−n
u(x0 ) = + f (x) dx +
Ω (2 − n) ωn (2 − n) ωn
Z   
∂ Hx0 r2−n
+ + u(x) ds,
∂ Ω ∂ n (2 − n) ωn (2 − n) ωn
Fazendo
Hx0 (x) r2−n ,
Gx0 (x) = +
(2 − n) ωn (2 − n) ωn
a expressão acima fica escrita como
Z Z
∂ Gx 0
(6.3) u(x0 ) = Gx0 (x) f (x) dx + (x) u(x) ds.
Ω ∂Ω ∂n

Portanto, se as funções Gx0 (x) e u(x) ∂ Ω = a(x) são conhecidas, a solução do problema de
Dirichlet (
∆u = f , em Ω,

u = a(x) ∂Ω
será dada, em cada ponto x0 ∈ Ω, pela expressão (6.3).

Dois fatos importantes relativos à função Gx0 (x) acima:

(1o) Gx0 (x) = 0, se x ∈ ∂ Ω.


De fato, pela definição de Gx0 (x), tem-se
Hx0 (x) r2−n r2−n r2−n

Gx0 (x) = + =− + = 0,
∂Ω (2 − n) ωn (2 − n) ωn (2 − n) ωn (2 − n) ωn

pois Hx0 (x) = −r2−n para todo x ∈ ∂ Ω.


(2o) A função Gx0 (x) é a soma de uma função dada por
Hx0 (x) ,
(2 − n) ωn
com a solução fundamental do laplaciano, que é

r2−n
·
(2 − n) ωn
Além disso, Gx0 (x) satisfaz as seguintes condições:
 
Hx0 (x) 1 r2−n
∆ =0 e Hx0 (x) = = sx0 (x).
(2 − n) ωn (2 − n) ωn ∂Ω (2 − n) ωn
D.6 Função de Green 853

Essas observações e a motivação anterior leva à seguinte definição:

D EFINIÇÃO : Diz-se que uma região Ω ⊂ Rn tem uma função de Green G(x, x0) se, para cada
x0 ∈ Ω, o problema de Dirichlet

 ∆H(x, x0) = 0, em Ω,
1
 H(x, x0) = − kx − x0 k2−n , x ∈ ∂Ω
(2 − n) ωn
tem solução H(x, x0 ). Neste caso, a função de Green é dada por

kx − x0k2−n
G(x, x0 ) = + H(x, x0 ) n ≥ 3.
(2 − n) ωn
Para o caso n = 2, o procedimento feito anteriormente é análogo e será deixado como exer-
cício. Nesse caso, a função de Green é dada por
ln kx − x0 k
G(x, x0) = + H(x, x0 ).

Lema 6.1: n
 Sejam Bε (x) ⊂ R uma bola de centro x e raio ε e u : Bε (x) → R uma função de
classe C1 Bε (x) ∩ C2 (Bε (x)). Faça

1
Γ(z, x) = kz − xk2−n, z ∈ ∂ Bε (x).
(2 − n)ωn
Então,
∂Γ 1 zi − xi 1 zi − xi ,
(a) (z, x) = =
∂ zi ωn kz − xkn ωn ε n
∂Γ 1 1 1 1 ,
(b) (z, x) = [∇ Γ(z, x)] · n = n−1
=
∂n ωn kz − xk ωn ε n−1
Z
∂Γ
(c) lim u(z) (z, x) dz S = u(x).
ε →0 ∂ Bε (x) ∂n
D EMONSTRAÇÃO : Sejam

z = (z1 , z2 , . . ., zn ) e x = (x1 , x2, . . ., xn).

Para mostrar o item (a), tem-se:

∂Γ 1 ∂
(z, x) = · kz − xk2−n
∂ zi (2 − n)ωn ∂ zi
1 ∂ h 2 2
i(2−n)/2
= · (z1 − x1 ) + · · · + (zn − xn)
(2 − n)ωn ∂ zi
 h i−n/2
1 (2 − n) 2 2
= · · [2(zi − xi )] (z1 − x1) + · · · + (zn − xn )
(2 − n)ωn 2
854 D Equação de Laplace: estudo mais geral

1 h i−n/2
2 2
= · (zi − xi ) (z1 − x1) + · · · + (zn − xn )
ωn
1 zi − xi
= ·
ωn [(z1 − x1)2 + · · · + (zn − xn )2 ]n/2
1 zi − xi 1 zi − xi ,
= n
=
ωn kz − xk ωn ε n
demonstrando a parte (a).
Agora demonstra-se o item (b). Pela primeira parte, já demonstrada, segue-se que
 
1 z1 − x1 , , 1 zn − xn
∇ Γ(z, x) = ···
ωn kz − xkn ωn kz − xkn
 
1 z1 − x1 , , zn − xn
= ··· ·
ωn kz − xkn kz − xkn
Portanto,
∂Γ
(z, x) = [∇ Γ(z, x)] · n
∂n
    
1 z1 − x1 , , zn − xn z−x
= ··· ·
ωn kz − xkn kz − xkn kz − xk
  !
1 z1 − x1 , , zn − xn z1 − x1 , , zn − xn
= ··· · ···
ωn kz − xkn kz − xkn kz − xk kz − xk
 
1 (z1 − x1 )2 (zn − xn)2
= + ···+
ωn kz − xkn+1 kz − xkn+1
1 kz − xk2
=
ωn kz − xkn+1
1 1 1 1 ,
= n−1
=
ωn kz − xk ωn ε n−1
como foi afirmado.
Por fim, mostra-se a parte (c), isto é, será demonstrado que
Z
∂Γ
lim u(z) (z, x) dzS = u(x).
ε →0 ∂ Bε (x) ∂n
Tem-se: Z Z
∂Γ ∂Γ
u(z) (z, x) dz S = u(z) (z, x) dz S
∂ Bε (x) ∂n kz−xk=ε ∂n
= (pela parte (b))
Z
1 1
= u(x + ε n ) dz S
kz−xk=ε ωn ε n−1
Z
1
= u(x + ε n) dzS.
ωn ε n−1 kz−xk=ε
D.6 Função de Green 855

Para mostrar que a integral converge para o valor u(x), mostrar-se-á que, dado um real δ > 0,
pode-se sempre encontrar outro real τ > 0 tal que
Z
∂ Γ
u(z) (z, x) d z S − u(x) < δ, sempre que ρ < τ ,
∂ B (x) ∂n
ε

onde 0 < ρ ≤ ε , o que equivale, evidentemente, a afirmar que


Z
∂Γ
lim u(z) (z, x) dz S = u(x).
ρ →0 ∂ Bε (x) ∂n
Agora observe que se pode escrever u(x) da seguinte forma:

ωn ρ n−1
u(x) = u(x)
ωn ρ n−1
Z
u(x)
= dz S
ωn ρ n−1 kz−xk=ρ
Z
1
= u(x) dzS
ωn ρ n−1 kz−xk=ρ

Assim,
Z Z
∂Γ 1
u(z) (z, x) dz S − u(x) = u(x + ε n ) dzS −
∂ Bρ (x) ∂n ωn ε n−1 kz−xk=ρ
Z
1
− u(x) dzS
ωn ρ n−1 kz−xk=ρ
Z
1
= [u(x + ρ n ) − u(x)] dzS.
ωn ρ n−1 kz−xk=ρ

Como u é contínua, fixado qualquer x e dado δ > 0, existe τ tal que

|u(x + ρ n ) − u(x)| < δ , se ρ < τ .

Sejam, então, δ e τ nessas condições. Segue-se que


Z Z
∂ Γ 1
u(z) (z, x) d z S − u(x) = [u(x + ρ n ) − u(x)] d z S
∂ B (x) ∂n ωn ρ n−1 kz−xk=ρ
ρ
Z
1
≤ |u(x + ρ n ) − u(x)| dz S
ωn ρ n−1 kz−xk=ρ
Z 
δ δ n−1
< dz S = ωn ρ
ωn ρ n−1 kz−xk=ρ ωn ρ n−1
= δ,
se ρ < τ .
Concluindo, se 0 < ρ ≤ ε e é dado δ > 0, então existe τ > 0 de modo que, para ρ < τ , tem-se
856 D Equação de Laplace: estudo mais geral

Z
∂Γ
u(z) (z, x) dzS − u(x) < δ .
∂B ∂n
ρ (x)

Isto mostra que Z


∂Γ
lim u(z) (z, x) dz S = u(x).
ρ →0 ∂ Bε (x) ∂n

Proposição 6.1: Seja Ω ⊂ Rn uma região que tem uma função de Green G. Então, a função
de Green é simétrica, isto é, G(x, y) = G(y, x) para todos x, y ∈ Ω, com x 6= y.
D EMONSTRAÇÃO : Fixe x, y ∈ Ω. Sejam u, v : W → R duas funções dadas, respectivamente,
por u(z) = G(z, x) e v(z) = G(z, y). Por construção, a função de Green,

kx − yk2−n
G(x, y) = + H(x, y),
(2 − n) ωn
satisfaz ∆x G(x, y) = 0, ou seja, a função de Green satisfaz a equação de Laplace na primeira
variável (o laplaciano deve ser tomando em relação a x). Segue-se daí que
∆u(z) = ∆z G(z, x) = 0, z 6= x,
∆v(z) = ∆z G(z, y) = 0, z 6= y.
Além disso, para todos x, z ∈ ∂ W, tem-se
kz − xk2−n
u(z) = G(z, x) = + H(z, x)
(2 − n) ωn
kz − xk2−n 1
= − kz − xk2−n
(2 − n) ωn (2 − n) ωn
= 0.
Analogamente mostra-se que v(z) = 0 para todos y, z ∈ ∂ W .
Mostrar-se-á que u(z) = v(z) aplicando a segunda identidade de Green na região W = Ω \
[Bε (x) ∪ Bε (y)], onde ε > 0 é suficientemente pequeno. Assim,
Z   Z
∂v ∂u
u −v dzS = (u ∆v − v ∆u) dz Ω = 0,
∂W ∂n ∂n W

pois em W tem-se que ∆u = ∆v = 0. Observa-se que a notação dzS diz que a integral de super-
fície é feita z e que dz Ω denota uma integração em Ω, mas na variável z.
Portanto, Z  
∂v ∂u
0= u −v dz S
∂W ∂n ∂n
Z  
∂v ∂u
= u −v dz S
∂ (Ω\[Bε (x)∪Bε (y)]) ∂n ∂n
D.6 Função de Green 857

Z   Z  
∂v ∂u ∂v ∂u
= u −v dz S + u −v dz S
∂Ω ∂n ∂n ∂ [Bε (x)∪Bε (y)] ∂n ∂n
Z   Z  
∂v ∂u ∂v ∂u
= u −v dz S + u −v dz S +
∂Ω ∂n ∂n ∂ Bε (x) ∂n ∂n
Z  
∂v ∂u
+ u −v dzS.
∂ Bε (y) ∂n ∂n
Deve-se observar que a integral sobre ∂ Ω o vetor normal n aponta para fora de Ω, enquanto
as integrais sobre ∂ Bε (x) e ∂ Bε (y) o vetor normal n aponta para o interior de cada uma dessas
bolas.
Além disso, tem-se que u = v = 0 em ∂ Ω, anulando a primeira integral no último membro
acima. Deste modo, obtém-se
Z   Z  
∂v ∂u ∂v ∂u
u −v dz S + u −v dzS = 0,
∂ Bε (x) ∂n ∂n ∂ Bε ( y ) ∂n ∂n
ou ainda, que    
Z Z
∂v ∂u ∂u ∂v
u −v dz S = v −u dzS,
∂ Bε (x) ∂n ∂n ∂ Bε ( y ) ∂n ∂n
lembrando mais uma vez que o vetor normal n aponta para o interior de Bε (x) ∪ Bε (y).
Agora será analisada as integrais em cada membro. A demonstração será dividida em três
passos: as duas integrais no primeiro membro, as duas integrais no segundo membro e, por fim,
a demonstração final da afirmação da proposição.

PASSO 1: Serão analisadas as duas integrais do primeiro membro. Será demonstrado que
Z Z
∂v ∂u
lim u dz S = 0 e lim v dz S = v(x).
ε →0 ∂ Bε (x) ∂ n ε →0 ∂ Bε (x) ∂n
∂v
Como u é contínua na vizinhança de x, então ela é limitada. Logo, existe M > 0 tal que
∂n

∂v
u ≤ M,
∂n

para todo z ∈ Bε (x) e para todo ε 0 ≤ ε .


Observe que
∂ Bε (x) = {x ∈ Rn | kz − xk = ε }.
Assim, tem-se que
Z Z Z
∂v ∂v

u dz S ≤
∂B u ∂ n dz S ≤ M ∂ B (x) dz S
ε ( x) ∂ n ∂ Bε (x) ε

= M · ωn (ε ) = M.ωn (1).ε n−1 = C · ε n−1,


onde usou-se o corolário 3.1 e a observação 3.2.
Isto mostra que
858 D Equação de Laplace: estudo mais geral

Z
∂v
lim u dzS = 0.
ε →0 ∂ Bε (x) ∂n
Para mostrar a segunda parte, serão usados o item (c) do lema 6.1, que diz
Z
∂Γ
lim v(z) (z, x) dz S = v(x),
ρ →0 ∂ Bε (x) ∂n
e o fato que Z
∂H
lim v (z, x) dzS = 0.
ε →0 ∂ Bε (x) ∂n
Para mostrar a última afirmação acima, basta observar que v é contínua e ∂ H/∂ n é de classe
C2 , de modo que são limitadas no fecho da bola, ou seja, que |v.(∂ H/∂ n)| < M para alguma
constante M > 0. Deste modo,
Z Z Z
∂ H ∂H
v (z, x) d S
z ≤ v (z, x) d S < M dz S
∂ B (x) ∂ n ∂ Bε (x)
∂n z ∂ Bε (x)
ε

= M.ωn (ε ) = M.ωn (1).ε n−1 = C.ε n−1.


O último membro acima tem limite e este tende a zero quando ε → 0. Isto mostra a afirmação
feita.
Continuando, tem-se
Z Z  
∂u ∂ kz − xk2−n ∂ H
v dz S = v + (z, x) dzS
∂ Bε (x) ∂ n ∂ Bε (x) ∂ n (2 − n) ωn ∂n
Z   Z
∂ kz − xk2−n ∂H
= v dz S + v (z, x) dzS
∂ Bε (x) ∂ n (2 − n) ωn ∂ Bε (x) ∂ n

= (pelo item (b) do lema 6.1)


Z Z
∂Γ ∂H
= v dz S + v (z, x) dz S.
∂ Bε (x) ∂n ∂ Bε (x) ∂n
Para concluir, usa-se os dois fatos abaixo:
Z Z
∂Γ ∂H
lim v(z) (z, x) dz S = v(x) e lim v (z, x) dzS = 0.
ρ →0 ∂ Bε (x) ∂n ε →0 ∂ Bε (x) ∂n
Portanto,
Z Z Z
∂u ∂Γ ∂H
lim v dzS = lim v dzS + lim v (z, x) dz S
ε →0 ∂ Bε (x) ∂n ε →0 ∂ Bε (x) ∂n ε →0 ∂ Bε (x) ∂n
= v(x) + 0 = v(x),
que demonstra a afirmação feita anteriormente.

PASSO 2: Serão analisadas as duas integrais do segundo membro. Será demonstrado que
Z Z
∂u ∂v
lim v dz S = 0 e lim u dzS = u(y).
ε →0 ∂ Bε (y) ∂n ε →0 ∂ Bε (y) ∂n
D.6 Função de Green 859

∂v
Como v é contínua na vizinhança de y, então ela é limitada. Logo, existe M > 0 tal que
∂n

∂u
v ≤ M,
∂n

para todo z ∈ Bε (y) e para todo ε 0 ≤ ε .


Assim, tem-se que
Z Z Z
∂ u ∂u

∂ B (y) v ∂ n dz S ≤ ∂ B (y) v ∂ n dzS ≤ M ∂ B (y) dzS
ε ε ε

= M · ωn (ε ) = M.ωn (1).ε n−1 = C · ε n−1,


onde usou-se o corolário 3.1 e a observação 3.2.
Isto mostra que Z
∂u
lim v dz S = 0.
ε →0 ∂ Bε (y) ∂ n

Para mostrar a segunda parte, será usado o item (c) do lema 6.1, que diz
Z
∂Γ
lim u(z) (z, y) dz S = u(y),
ρ →0 ∂ Bε (y) ∂n
e o fato que Z
∂H
lim u (z, y) dz S = 0.
ε →0 ∂ Bε (y) ∂n
Para mostrar a última afirmação acima, basta observar que u é contínua e ∂ H/∂ n é de classe
2
C , de modo que são limitadas no fecho da bola, ou seja, que |u.(∂ H/∂ n )| < M para alguma
constante M > 0. Deste modo,
Z Z Z
∂H ∂H

∂ B (y) u ∂ n (z, x) dzS ≤ ∂ B (y) u ∂ n (z, x) dzS < M ∂ B (y) dzS
ε ε ε

= M.ωn (ε ) = M.ωn (1).ε n−1 = C.ε n−1.


O último membro acima tem limite e este tende a zero quando ε → 0. Isto mostra a afirmação
feita.
Continuando, tem-se
Z Z  
∂v ∂ kz − yk2−n ∂ H
u dz S = u + (z, y) dz S
∂ Bε ( y ) ∂ n ∂ Bε (y) ∂ n (2 − n) ωn ∂n
Z   Z
∂ kz − yk2−n ∂H
= u dz S + u (z, y) dzS
∂ Bε (y) ∂ n (2 − n) ωn ∂ Bε (y) ∂ n

= (pelo item (b) do lema 6.1)


Z Z
∂Γ ∂H
= u dz S + u (z, y) dzS.
∂ Bε (y) ∂ n ∂ Bε ( y ) ∂n
Para concluir, usa-se os dois fatos abaixo:
860 D Equação de Laplace: estudo mais geral

Z Z
∂Γ ∂H
lim u(z) (z, y) dzS = u(y) e lim u(z) (z, y) dzS = 0.
ρ →0 ∂ Bε (y) ∂n ε →0 ∂ Bε (y) ∂n
Portanto,
Z Z Z
∂u ∂Γ ∂H
lim u dz S = lim u dz S + lim u (z, y) dz S
ε →0 ∂ Bε (y) ∂ n ε →0 ∂ Bε ( y ) ∂ n ε →0 ∂ Bε ( y ) ∂n
= u(y) + 0 = u(y),
que demonstra a afirmação feita anteriormente.

PASSO 3: segue-se dos resultados obtidos nos passos 1 e 2 que


Z   Z  
∂v ∂u ∂u ∂v
u −v dz S = v −u dzS,
∂ Bε (x) ∂n ∂n ∂ Bε ( y ) ∂n ∂n
de modo que
Z   Z  
∂v ∂u ∂u ∂v
lim u −v dz S = lim v −u dz S
ε →0 ∂ Bε (x) ∂n ∂n ε →0 ∂ Bε (y) ∂n ∂n
Z Z
∂v ∂u
lim u dzS − lim v dz S =
ε →0 ∂ Bε (x) ∂ n ε →0 ∂ Bε (x) ∂n
Z Z
∂u ∂v
= lim v dz S − lim u dz S
ε →0 ∂ Bε (y) ∂ n ε →0 ∂ Bε (y) ∂n
0 − v(x) = 0 − u(y).
ou seja, que u(y) = v(x).
Como u(y) = G(y, x) e v(x) = G(x, y), então decorre da igualdade u(y) = v(x) que G(y, x) =
G(x, y), mostrando que a função de Green é simétrica.

Agora supõem-se que a função de Green do laplaciano, relativamente a Ω, seja conhecida.


Então, a expressão (5.1) - (5.10) do teorema 5.1 - 5.2 pode ser escrita na forma
Z   Z
∂G ∂u
u(x) = u(y) (x, y) − G(x, y) (y) dSy + G(x, y) f (x) dx.
∂Ω ∂n ∂n Ω

Por definição, tem-se que G = −F + H e em ∂ Ω se tem G = F. Assim, G = −F + H =


−F + F ≡ 0, em Ω. Portanto,
Z Z
∂G
(6.4) u(x) = u(y) (x, y) dSy + G(x, y) f (y) dy,
∂Ω ∂n Ω

onde, na primeira integral, por dSy, está-se indicando que a integração é em relação a y.
Dados Ω ⊂ Rn e dadas as funções f e u0 , se existirem a função de Green relativamente a Ω
e a solução u do problema de Dirichlet, então ela será dada por (6.4).
D.6 Função de Green 861

Os cálculos realizados acima foram feitos formalmente, sem rigor. Observa-se que é impor-
∂G
tante garantir que a derivada normal existe e, portanto, que faça sentido a integral em que a
∂n
mesma aparece. Este é um problema delicado e não será feito neste texto. O leitor interessado
poderá consultar o capítulo 21 do livro Partial Differential Equations of Mathematical Physics
de S. L. Sobolev. Em linhas gerais, deve-se interpretar tal derivada normal como certo limite
uniforme, isto é,
∂G
(x, y) = lim ∇G (x, y + t n y ) · n y ,
∂n t→0
existe uniformemente em y, onde o gradiente é calculado em relação à segunda variável.

Para finalizar esta seção, chamar-se-á a atenção do leitor para algumas propriedades impor-
tantes da função de Green que não são demonstradas devido ao caráter elementar deste texto.
Inicialmente, observar-se-á que, dado Ω ⊂ R3 , se existir a função de Green, relativamente a

Ω, será a função G definida no conjunto Ω × Ω \D, onde D = {(x, y) ∈ Ω × Ω | x = y} é a
diagonal de Ω × Ω,

G : Ω × Ω \D → R.
Além disso, a função de Green, como foi definida anteriormente, possui as seguintes pro-
priedades:

(a) G(x, y) = 0 para todo x ∈ Ω e y ∈ ∂ Ω.


(b) Para todo x fixo em Ω, a função gx (y) = G(x, y) é infinitamente diferenciável na variável
y em Ω\ {x}.
(c) G(x, y) = G(y, x), isto é, G é simétrica para todo x, y ∈ Ω, com x 6= y.

Observação 6.1: Até este ponto tem-se usado as expressões “se existir a função de Green”
e “se existir a solução do problema de Dirichlet” porque não foi demonstrado ainda nenhum
resultado sobre existência. Além disso, é possível perceber que a construção da função de Green
G depende do domínio Ω, além do fato de a solução do problema de Dirichlet depender da
função f dada. Em seção futura volta-se a estes temas.
Para concluir esta parte, observa-se que decorre das definições de G e F que

G(x, y) = F(x, y) = s(x, y) + ϕ (x, y),

G(x, y) = 0 se y ∈ ∂ Ω.
Assim, conhecida a função singular s(x, y), para se determinar a função de Green G basta
resolver o problema
(
∆ϕ (x, y) = 0, se y ∈ Ω,
(6.5)
ϕ (x, y) = −s(x, y), se y ∈ ∂ Ω.
862 D Equação de Laplace: estudo mais geral

Aparentemente, está-se em um círculo vicioso, pois, para se resolver o problema de Dirichlet,


dever-se-á determinar a função de Green G e, para se calcular G, será preciso resolver o proble-
ma (6.5), semelhante ao problema de Dirichlet. Dependendo do domínio Ω, existem métodos
diretos para determinação de G, por exemplo, o método de separação de variáveis, no caso do
disco, e o método das imagens.
Determinar-se-á aqui a função de Green para a bola BR (0) ⊂ R3, de raio R e centro na origem,
resolvendo-se o problema (6.5).

Exemplo 6.1: Neste exemplo determinar-se-á a função de Green na bola BR (0) ⊂ R3. Neste
caso,
1 1
s(x, y) =
4π kx − yk
e deve-se determinar ϕ (x, y) tal que

(6.6a)  ∆ϕ (x, y) = 0,
 se kyk ≤ R,
1 1 ,
(6.6b) 
 ϕ (x, y) = − se kyk = R.
4π kx − yk
Seja
k 1 ,
ϕ (x, y) = −
4π kλ x − yk
com λ x 6= y, onde k e λ são números a serem determinados de modo que ϕ satisfaça as
condições impostas.
Evidentemente, tem-se que ∆ϕ = 0 em BR (0). Verificar-se-á a condição de fronteira. Suponha-
se y ∈ ∂ BR (0), isto é, que se tenha kyk = R. Então,
k 1 1 1 ,
− =−
4π kλ x − yk 4π kx − yk
donde
k2 kx − yk2 = kλ x − yk2 ,
que equivale a
k2 hx − y, x − yi = hλ x − y, λ x − yi.
Desenvolvendo-se os produtos escalres, segue-se que
  
k2 − 1 kyk2 = λ 2 − k2 kxk2 + 2 k2 − λ hx, yi.

Como λ e k são arbitrários, por enquanto se pode escolher λ = k2 . Resulta que



(λ − 1)kyk2 = λ 2 − λ kxk2 = λ (λ − 1)kxk2 .

Se λ = 1, ter-se-á k = ±1 e, no caso de ser k = −1, ocorreria que


1 1
=− ⇒ kx − yk = 0,
kx − yk kx − yk
D.6 Função de Green 863

donde λ x = x = y.
Escolha-se, então, λ 6= 1. Como kyk = R, obtém-se

R2
(λ − 1) R2 = λ (λ − 1) kxk2 ou λ= = k2 .
kxk
Tomando-se k = R/kxk e substituindo-se na expressão de ϕ , resulta que
1 R 1
ϕ (x, y) = − 2 ·
4π kxk R
x − y
kxk2

A função de Green será dada por


 

1 
 1 R 1 

G(x, y) =  − ·
4π  kx − yk kxk R 2 

kxk2 x − y

Quando x = 0, tem-se, para ϕ , a expressão


k 1
ϕ (0, y) = −
4π kyk
e, se kxk = R, conclui-se que k = 1, donde
1
ϕ (0, y) = −
4π R
e  
1 1 1 1 1 1 1
G(0, y) = − = − ·
4π kyk 4π R 4π kyk R
Mostrou-se, assim, que a função de Green para a bola BR (0) é dada por
  





 1  1 R 1 


 G(x, y) = 4π 
 − 2 , se x 6= 0,
 kx − yk kxk R 

 kxk2 x − y



  

 1 1 1 ,

 G(0, y) = − se x = 0.
4π kyk R
864 D Equação de Laplace: estudo mais geral

D.7 Fórmula e teorema de Poisson

Na seção anterior viu-se que, se existe a função de Green, relativamente a Ω ⊂ R3, a solução
do problema
∆u = f em Ω
será representada pela equação (6.3),
Z Z
∂G
u(x) = (x, y) dSy − G(x, y) f (y) dy,
∂Ω ∂n Ω

devendo ser dada, também, a função u(y) y∈∂ Ω .
Mas para se usar a fórmula acima, é preciso conhecer, para cada x fixo em Ω, o valor de
∂G
(x, y) para todo y ∈ Ω.
∂n
Far-se-á, a seguir, esse cálculo para o caso em que Ω = BR (0) ⊂ R3 , ficando o caso do disco
Ω = BR (0) ⊂ R2 como exercício.

Seja então Ω = BR (0) = y ∈ R3 | kyk ≤ R . Sejam x, y ∈ Ω, sendo

x = (x1 , x2 , x3), y = (y1 , y2, y3) e r = kx − yk.

Como
∂G
(x, y) = h∇G(x, y), n i,
∂n
deve-se, inicialmente, calcular ∇G(x, y), sendo as derivadas em relação à variável y. Calcula-se
a primeira componente do ∇G, sendo as outras duas calculadas de modo análogo. A função de
Green para a bola BR (0), calculada na seção anterior, é
 

1 
 1 R 1 

G(x, y) =  − 2  , R = kx − yk.
4π  kx − yk kxk R 

kxk2 x − y

Segue-se daí que


" 2 −1 !#
∂G 1 ∂  R ∂ R
(∇G)y1 = = kx − yk−1 − x − y
∂ y1 4π ∂ y1 kxk ∂ y1 kxk2

1 ∂
=− kx − yk−2 (kx − yk)−
4π ∂ y1
" −2  2 # )

R R 2
∂ R
− x − y x − y ,
kxk kxk2 ∂ y kxk2
1

donde
D.7 Fórmula e teorema de Poisson 865

"
1 (x1 − y1)
(∇G)y1 = kx − yk−2 −
4π kx − yk
 
R2
2 −2 x − y1  #
R  R kxk 2 1 
(7.1) −  2
x − y
2  ,
kxk  kxk R 

kxk2 x − y

pois
∂ x1 − y1
(kx − y) = − .
∂ y1 kx − yk
Considere-se, agora, y ∈ ∂ BR (0), isto é, kyk = R. Neste caso, viu-se que G(x, y) = 0. Logo,
da expressão de G ressulta que
 

1 
 1 R 1 
,
0 = G(x − y) =  −  y ∈ ∂ BR (0),
4π  kx − yk kxk R2 

kxk2 x − y

ou
2
kxk
R
,
(7.2) kx − yk = x − y
R kxk2
para todo y ∈ ∂ BR (0).
Substituindo-se a equação (7.2) na equação (7.1), obter-se-á o seguinte resultado:
 
R2
 x − y1 
2 1
∂G 1  R 3 kxk 
= 3 (x1 − y1 ) − kx − yk 3 
∂ y1 4π kx − yk  kxk R 2 

kxk2 x − y
 
R2
kxk2 x1 − y1 
 2 3
1  R kxk3 R 
= 3 (x1 − y1 ) − 3 2
x − y 2 3 
4π kx − yk  kxk R kxk R 
x − y
kxk2
  2 
1 kxk2 R
= (x1 − y1) − 2 x1 − y1
4π kx − yk3 R kxk2
 
1 kxk2
= − 1 y1
4π kx − yk3 R2
1 kxk2 − R2
= y1
4π kx − yk3 R2
1 1 2 2 y1

= kxk − R ·
4π kx − yk3 R2
866 D Equação de Laplace: estudo mais geral

Do mesmo modo se obtém as expressões para as demais derivadas parciais de G, ficando


assim:
∂G 1 1 2 2 y1 ,

= kxk − R
∂ y1 4π kx − yk3 R2
∂G 1 1 2 2 y2 ,

= kxk − R
∂ y2 4π kx − yk3 R2
∂G 1 1  y3
= 3
kxk2 − R2 2 ·
∂ y3 4π kx − yk R
As componentes da normal exterior unitária n são
y1 , y2 y3
e ·
R R R
Daí se tem
∂G ∂ G y1 ∂ G y2 ∂ G y3
(x, y) = + +
∂n ∂ y1 R ∂ y2 R ∂ y3 R
1 1 kxk2 − R2  2 2 2

= (y1 ) + (y2 ) + (y3 )
4π kx − yk3 R3
1 1 kxk2 − R2
= ·
4π kx − yk3 R
Agora a equação (6.3) se escreve como
Z Z
R2 − kxk2 u(y)
(7.3) u(x) = dSy − G(x, y) f (y) dy.
4π R kyk≤R kx − yk3 kyk≤R

A fórmula (7.3), obtida acima, chama-se fórmula de Poisson.


A seguir enunciar-se-á e demonstrar-se-á o teorema de Poisson, que juntamente com resulta-
dos a serem obtidos na seção seguinte, permitirá mostrar que o problema de Dirichlet homogê-
neo para o domínio Ω = BR (0) ⊂ R3 é bem posto.

Teorema 7.1 (Poisson): Seja u0 ∈ C (∂ BR (0)). Então, a função u(x), definida como
 2 Z

 R − kxk2 u0(y)
 3
dSy, se kxk < R,
u(x) = 4 π R k yk=R kx − yk


 u (x), se kxk = R,
0
 
pertence a classe C BR (0) ∩ C2 (BR (0)) e é solução do problema
(
∆u = 0, em BR (0),
u(x) = u0 (x), em ∂ BR (0).

D EMONSTRAÇÃO : Inicialmente, mostrar-se-á que ∆u = 0 em BR (0) e depois que a função u


se prolonga de forma contínua a BR (0), fecho da bola BR (0).
D.7 Fórmula e teorema de Poisson 867

Mostrar-se-á que a função u, como foi definida, satisfaz a ∆u = 0 em BR (0). Em BR (0) a


função u é dada por
Z
R2 − kxk2 u0(y)
u(x) = dSy, se kxk < R.
4π R kyk=R kx − yk3
Como kxk < R e kyk = R, segue-se que

ky − xk ≥ |kyk − xk| ≥ ky − kxk = R − kxk > 0,

isto é,
kxk < R ⇒ kx − yk > 0.
Logo, a função
R2 − kxk2
H(x) =
kx − yk3
está definida para todo x ∈ BR (0) e é aí infinitamente diferenciável.
Como a integração é em relação a y, pode-se derivar sob o sinal de integral. Assim,
Z  2 
1 R − kxk2
∆u(x) = u0 (y) ∆ dSy.
4π R kyk=R x − yk3
Sendo
∂2 ∂2 ∂2
x = (x1 , x2, x3) e ∆= + + ,
∂ x21 ∂ x22 ∂ x23
para se calcular o laplaciano em questão, faça-se

α (x) = R2 − kxk e β (x) = kx − yk−3 .

Assim, obter-se-á
∂H ∂ ∂α ∂β
(x) = [α (x) β (x)] = β (x) (x) + α (x) (x)
∂ x1 ∂ x1 ∂ x1 ∂ x1
e
∂ 2H ∂ 2α ∂ 2β ∂α ∂β
2
(x) = β (x) 2
(x) + α (x) 2
(x) + 2 (x) (x).
∂ x1 ∂ x1 ∂ x1 ∂ x1 ∂ x1
Do mesmo modo se obtém
∂ 2H ∂ 2α ∂ 2β ∂α ∂β
2
(x) = β (x) 2
(x) + α (x) 2
(x) + 2 (x) (x),
∂ x2 ∂ x2 ∂ x2 ∂ x2 ∂ x2
e
∂ 2H ∂ 2α ∂ 2β ∂α ∂β
2
(x) = β (x) 2
(x) + α (x) 2
(x) + 2 (x) (x),
∂ x3 ∂ x3 ∂ x3 ∂ x3 ∂ x3
donde  
∂α ∂β ∂α ∂β ∂α ∂β
∆H = β (x) ∆α + α (x) ∆β + 2 + + ·
∂ x1 ∂ x1 ∂ x1 ∂ x2 ∂ x3 ∂ x3
Calculando-se as derivadas de α e β , vem
868 D Equação de Laplace: estudo mais geral

∂α ∂α ∂α
= −2 x1, = −2 x2 e = −2 x3,
∂ x1 ∂ x2 ∂ x3
o que implica em ∆α = −6.
∂β x1 − y1 , ∂β x2 − y2 ∂β x3 − y3 ,
= −3 = −3 e = −3
∂ x1 kx − yk5 ∂ x2 kx − yk5 ∂ x3 kx − yk5
que implica em
6
∆β = ·
kx − yk5
Substituindo-se essas expressões em ∆H e também α e β por suas expressões, segue-se que
 6
∆H = − 6kx − yk−3 + R2 − kxk2 +
kx − yk5
6
+ [x1(x1 − y1) + x2 (x2 − y2) + x3 (x3 − y3 )]
kx − yk5
6  2 2
 2 2

= R − kxk − kx − yk + 2kxk − 2hx, yi .
kx − yk5
Efetuando-se os cálculos na expressão entre os colchetes, encontra-se

R2 − kxk2 − kx − yk2 + 2kxk2 − 2hx, yi = R2 − kxk2 − kxk2 − kyk2 +
+ 2hx, yi + 2kxk2 − 2hx, yi
= R2 − kyk2 = R2 − R2 = 0,
o que implica ser ∆H = 0. Logo, se kxk < R e kyk = R, tem-se ∆u = 0, que é o que se desejava
mostrar.
Já se havia observado que a função u, como foi definida, é infinitamente diferenciável em

BR (0) = x ∈ R3 | kxk < R . Logo, satisfaz a condição de ser u ∈ C2 (BR (0)). Para se mostrar
que u ∈ C BR (0) , mostre-se que a função u pode ser estendida continuamente a ∂ BR (0) tal
que u ≡ u0 se x ∈ ∂ BR (0).
Na demonstração, usar-se-ão dois resultados, um deles decorrendo diretamente das hipóteses
do teorema, que são os seguintes:

(1) A função u(x) ≡ 1 em BR (0) é solução do problema


(
∆u = 0, em BR (0),
u ∈ C2 (BR (0)) .

Decorre daí e da fórmula de Poisson (7.3), com f ≡ 0, que


Z Z
R2 − kxk2 1 R2 − kxk2
1= dSy = dSy.
4π R kyk=R kx − yk3 kyk=R 4π R kx − yk3
D.7 Fórmula e teorema de Poisson 869

(2) A função u0 (x) é contínua em ∂ BR (0), logo, se y, x0 ∈ ∂ BR (0) e dado ε > 0, é possível
encontrar δ > 0 tal que

ky − x0 k < δ ⇒ |u0(y) − u0 (x0 )| < ε .

Além disso, u0 , sendo contínua em um compacto, é limitada. Existe, portanto, M > 0 tal que

|u0(y) − u0(x0 )| ≤ |u0 (y)| + |u0 (x0 )| ≤ 2M, x0 , y ∈ ∂ BR (0).

Tome-se um ponto x0 qualquer em ∂ BR (0) e, dado ε > 0, considere-se uma vizinhança


Bδ (x0 ) tal que|u0 (y) − u0 (x0 )| < ε/2 para todo ponto y ∈ Bδ (x0) ∩ ∂ BR (0). Sempre existe
Bδ (x0 ) nessas condições, pois u0 é contínua em ∂ BR (0).

Figura 7.6:

Chame-se SR à fronteira ∂ BR (0) e σ ao conjunto SR ∩ Bδ (x0 ), como na figura 7.6.


Se x ∈ BR (0) ∩ Bδ (x)0 ), então a fórmula de Poisson dá u no ponto x por
Z
R2 − kxk2 u0(y)
u(x) = dSy.
4π R kyk=R kx − yk3
Da parte (1) se pode escrever u0(x0 ) como
Z
R2 − kxk2 u0 (x0 )
u0 (x0 ) = dSy.
4π R kyk=R kx − yk3
Segue-se daí que
Z Z
R2 − kxk2 u0 (y) R2 − kxk2 u0(x0)
u(x) − u0 (x0 ) = · dSy − · dSy
kyk=R 4π R kx − yk3 kyk=R 4π R kx − yk3
Z
R2 − kxk2
= [u0 (y) − u0 (x0)] · dSy.
kyk=R 4π Rkx − yk3
A última integral pode ser escrita como soma de duas integrais, uma sobre σ e a outra sobre
SR − σ . A expressão anterior se transforma em
870 D Equação de Laplace: estudo mais geral

Z Z
u(x) − u0 (x0 ) = [u(x) − u0 (x0 )] h(x, y) dSy + [u(x) − u0(x0)] h(x, y) dSy.
SR −σ σ

onde se fez
R2 − kxk2
h(x, y) = ·
4π Rkx − yk3
Considere-se a última integral em primeiro lugar. Como y ∈ σ = Bδ (x0 )∩ ∂ BR (0), então vale
a desigualdade |u0 (y) − u0(x0)| < ε/2, como já foi visto.
Logo, a última integral satisfaz a seguinte desigualdade:
Z Z
[u0 (y) − u0(x0)] h(x, y) dSy ≤ |u0(y) − u0 ((x0)| h(x, y) dSy
σ σ
Z
ε
< h(x, y) dSy
σ 2
Z
ε
= h(x, y) dSy
2 σ
ε
= ·
2
Decorre daí que
Z
ε
(7.4) u(x) − u0(x0 ) < + [u0 (y − u0(x0 )] h(x, y) dSy.
2 SR −σ

Sendo u0 limitada sobre ∂ BR (0), tem-se que |u0 (y − u0(x0 )| ≤ 2M, como foi visto.
Pode-se supor agora que o ponto x seja um ponto de BR (0)∩ Bδ/2 (x0 ). Todas as desigualdades
anteriores continuam válidas, pois tem-se que Bδ/2(x0 ) ⊂ Bδ (x0 ). O ponto x assim escolhido é
tal que
δ
kx − x0 k <
2
e essa relação implica a seguinte:
δ
ky − xk = k(y − x0 ) + (x0 − x)k ≥ ky − x0 k − kx − x0 k > δ − = δ1 ,
2
donde
1 1
< ·
kx − yk3 δ13
Mas, então, h(x, y) satisfaz a relação

R2 − kxk2 (R + kxk) (R − kxk) 2 (R − kxk)


h(x, y) = 3
= < ·
4π Rkx − yk 4π Rkx − yk3 4πδ13
Resulta que a expressão (7.4) se transforma em
Z
ε 2M.2 (R − kxk)
|u(x) − u0 (x0 )| = + dSy
2 SR −σ 4πδ13
Z
ε 2M.2 (R − kxk)
= + dSy
2 4πδ13 SR −σ
D.8 Funções harmônicas, propriedades da média e do máximo 871

ε 4M (R − kxk)
< + 3
· 4π R2
2 4πδ1
ε 4MR2 (R − kxk)
= + ·
2 δ13
Seja agora ρ1 um número real positivo suficientemente pequeno tal que se tenha

4MR2 ρ1 ε
< ·
δ13 2

Seja ρ = min {ρ1 , δ1 }. Se kx − x0 k < ρ , segue-se que

R − kxk = kx0k − kxk ≤ kx0 − xk < ρ .

Então, se kx − x0 k < ρ , decorre que


ε ε
|u(x − u0(x0)| < + = ε,
2 2
o que quer dizer que lim u(x) = u0 (x0 ).
x→x0
Como x0 é um ponto qualquer de ∂ BR (0), o resultado vale, qualquer que seja x0 ∈ ∂ BR (0).
Pode-se,
 então,
 definir a função u0 (x) = u(x) para todo ponto x ∈ ∂ BR (0) e, nessas condições,
u ∈ C BR (0) .

O teorema de Poisson, que se acabou de demonstrar, diz que a solução do problema de Dirich-
let homogêneo para a bola BR (0) existe. Que é um problema bem posto, isto é, que a solução é
única e depende continuamente dos dados será visto na próxima seção, ao se estudar o chamado
“princípio do máximo” para funções harmônicas.

D.8 Funções harmônicas, propriedades da média e do


máximo

Como se disse no final da última seção, ver-se-ão, agora, algumas propriedades de um sub-
conjunto do conjunto das soluções da equação de Laplace, chamadas funções harmônicas. Essas
propriedades permitirão mostrar que o problema de Dirichlet é bem posto. Comerçar-se-á com
uma definição.

D EFINIÇÃO : Sejam Ω ⊂ R3 um conjunto aberto, conexo e limitado, e u : Ω → R uma função



de classe C Ω . Se, para cada bola Br (x) ⊂ Ω, valer a relação
872 D Equação de Laplace: estudo mais geral

Z
1
(8.1) u(x) = u(y) ds,
4π r 2 ky−xk=r

então se dirá que u satisfaz a primeira propriedade da média em Ω.


Se, nas mesmas condições anteriores sobre u, valer
Z
3
(8.2) u(x) = u(y) dy,
4π r 3 ky−xk≤r

então se dirá que u satisfaz a segunda propriedade da média.

Na definição acima, em particular para Ω ⊂ R2 , ter-se-ão, respectivamente,


Z
1
(8.3) u(x) = u(y) ds,
2π r ky−xk=r

e
Z
1
(8.4) u(x) = 2 u(y) dy,
πr ky−xk=≤r

Como o nome está indicando, a equação (8.1) diz que o valor de u no ponto x é dado pela
média dos valores de u sobre a superfície da bola de centro x.
Na demonstração da proposição dada a seguir, usar-se-á um resultado de Cálculo que será
enunciado e demonstrado na forma de lema.

Lema 8.1: Seja u : R3 → R integrável em qualquer bola contida em R3 . Seja ainda


Z
I(ρ ) = u(x, y, z) ds, 0 ≤ ρ ≤ R.
∂ Bρ (0)

Então, tem-se
Z Z R Z R Z 
u(x, y, z) dx dy dz = I(ρ ) d ρ = u(x, y, z) ds d ρ .
BR (0) 0 0 ∂ Bρ (0)

D EMONSTRAÇÃO : A bola Bρ (0) é definida por



Bρ (0) = (x, y, z) ∈ R3 | x2 + y2 + z3 = ρ 2 .

Seja D = {(u, v) ∈ R2 | 0 ≤ u ≤ π e 0 ≤ v < 2π } ⊂ R2 . Esta bola pode ser parametrizada


por ϕ : D → R3 definida por

ϕ (u, v) = ( ρ · sen u · cosv, ρ · sen u · sen v, ρ · cos u) .

Além disso, tem-se que


∂ϕ
= (ρ · cos u · cosv, ρ · cos u · sen v, −ρ · sen u)
∂u
e
∂ϕ
= (−ρ · sen u · sen v, ρ · sen u · cos v, 0).
∂v
D.8 Funções harmônicas, propriedades da média e do máximo 873

Assim, o vetor normal à bola Bρ (0) é dado por:





i j k

∂ϕ ∂ϕ
× = ρ · cos u · cosv ρ · cos u · sen v −ρ · sen u
∂u ∂v

−ρ · sen u · sen v ρ · sen u · cos v 0

= ρ 2 · sen 2 u · cos v, ρ 2 · sen 2 u · sen v, . . .

. . . ρ 2 · sen u · cos u · cos2 v + ρ 2 · sen u · cosu · sen 2 v

= ρ 2 · sen 2 u · cos v, ρ 2 · sen 2 u · sen v, . . .
2 2 2

. . . ρ · sen u · cos u cos v + sen v
 
2 2 2 2 2
= ρ · sen u · cos v, ρ · sen u · sen v, ρ · sen u · cosu

Portanto, o quadrado da norma do vetor obtido acima é dado por



∂ ϕ ∂ ϕ 2  
× = ρ 2 · sen 2 u · cosv 2 + ρ 2 · sen 2 u · sen v 2 +
∂u ∂v
2
+ ρ 2 · sen u · cos u
= ρ 4 · sen 4 u · cos2 v + ρ 4 · sen 4 u · sen 2v + ρ 4 · sen 2 u · cos2 u

= ρ 4 · sen 4 u cos2 v + sen 2v + ρ 4 · sen 2 · cos2 u
= ρ 4 · sen 4 u + ρ 4 · sen 2 u · cos2 u

= ρ 4 · sen 2 u sen 2 u + cos2 u
= ρ 4 · sen 2 u,
de modo que
∂ ϕ ∂ ϕ 2

∂ u × ∂ v = ρ · sen u.
Recorde-se a definição de integral de superfície para campos escalares:
ZZ ZZ
∂ ϕ ∂ ϕ
f (x, y, z) ds = f [ϕ (u, v)]
∂ u × ∂ v du dv,
S D

onde ϕ (u, v), com (u, v) ∈ D, é uma parametrização para a superfície S.


Segue-se da definição de integral de superfície para campo escalar, da definição de I(ρ ) e da
norma do vetor normal obtido acima, que
Z
I(ρ ) = u(x, y, z) ds
∂ Bρ (0)
874 D Equação de Laplace: estudo mais geral

ZZ
∂ ϕ ∂ ϕ
=
u[ϕ (u, v)] × du dv
D ∂u ∂v
Z π Z 2π
(8.5) = u(ρ · sen u · cosv, ρ · sen u · sen v, ρ · cos v) · ρ 2 sen u du dv.
0 0

Agora analisa-se a integral tripla sobre a bola BR (0):


ZZZ
u(x, y, z) dx dy dz.
BR (0)

Usar-se-á a mudança de coordenadas esféricas que é dada por


x = ρ · sen u · cosv,
y = ρ · sen u · sen v,
z = ρ · cosu,
onde 0 ≤ ρ ≤ R, 0 ≤ u ≤ π e 0 ≤ v < 2π .
O jacobiano dessa mudança de variáveis é dado por

∂x ∂ x ∂ x

∂ρ ∂u ∂ v


∂ (x, y, z) ∂ y ∂y ∂ y
J= =
∂ (ρ , u, v) ∂ ρ ∂u ∂ v

∂z ∂ z ∂ z

∂ρ ∂u ∂v


sen u · cosv ρ · cosu · cos v − ρ · sen u · sen v


= sen u · sen v ρ · cos u · sen v ρ · sen u · cosv


cos u −ρ · sen u 0

= 0 + ρ 2 · sen 3 u · cos2 v +

+ ρ 2 · sen u · cos2 u · cos2 v − 0

+ ρ 2 · sen 3 u · sen 2v + ρ 2 · sen u · cos2 u · sen 2v
= ρ 2 · sen 3 u · cos2 v + ρ 2 · sen 3 u · sen 2 v +
+ ρ 2 · sen u · cos2 u · cos2 v + ρ 2 · sen u · cos2 u · sen 2 v
 
= ρ 2 · sen 3 u · cos2 v + sen 2 v + ρ 2 · sen u · cos2 u · cos2 v + sen 2 v
= ρ 2 · sen 3 u + ρ 2 · sen u · cos2 u

= ρ 2 · sen u · ( sen 2u + cos2 u
= ρ 2 · sen u.
D.8 Funções harmônicas, propriedades da média e do máximo 875

Como sen u ≥ 0 para 0 ≤ u ≤ π , então | J| = ρ 2 · sen u. Escrevendo a mudança de coordenadas


esféricas na forma

F(ρ , u, v) = (ρ · sen u · cosv, ρ · sen u · sen v, ρ · cosu),

onde 0 ≤ ρ ≤ R, 0 ≤ u ≤ π e 0 ≤ v < 2π , segue-se, portanto, que


ZZZ Z R Z π Z 2π
u(x, y, z) dx dy dz = u[F(ρ , u, v)] · ρ 2 sen u dr du dv,
BR (0) 0 0 0

Z R Z π Z 2π
(8.6) = u(ρ · sen u · cos v, ρ · sen u · sen v, ρ · cos u) · ρ 2 · sen u d ρ du dv.
0 0 0

Segue-se de (8.5) e (8.6) que


ZZZ Z R Z π Z 2π
(8.6)
u(x, y, z) dx dy dz = u[F(ρ , u, v)] ρ 2 · sen u du dv d ρ
BR (0) 0 0 0
ZZZ Z R  Z π Z 2π 
2
u(x, y, z) dx dy dz = u[F(ρ , u, v)] ρ · sen u du dv d ρ
BR (0) 0 0 0
Z Z 
(8.5) R
= u(x, y, z) ds d ρ
0 ∂ Bρ (0)
Z R
= I(ρ ) d ρ ,
0

que é o resultado desejado.

Proposição 8.1: As duas propriedades da média são equivalentes.


D EMONSTRAÇÃO : (1) A primeira propriedade da média implica a segunda.
De fato, se a equação (8.1) vale, então para a bola Bρ (x), tem-se
Z
12
u(x)ρ = u(y) ds.
4π kx−yk=ρ

Integrando-se em relação a ρ de 0 a r e usando-se o lema 8.1, obtém-se


Z r Z r Z  Z Z 
2 1 1 r
u(x)ρ d ρ = u(y) ds d ρ = u(y) ds d ρ ,
0 0 4π ky−xk=ρ 4π 0 ky−xk=r

donde Z
3
u(x) = u(y) dy.
4π r 3 ky−xk≤r
(2) A segunda propriedade implica a primeira.
Se vale a equação (8.2), então
876 D Equação de Laplace: estudo mais geral

Z Z r Z 
r3 u(x) 1 1
= u(y) dy = u(y) ds d ρ .
3 4π ky−xk≤r 4π 0 ky−xk=ρ

Fazendo-se Z
ϕ (ρ ) = u(y) dy,
ky−xk=ρ
que é contínua em 0 ≤ ρ ≤ r e Z r
ψ (r) = ϕ (ρ ) d ρ ,
0
com 0 ≤ r ≤ k, tal que Br (x) ⊂ Ω, segue-se que
Z

= ϕ (r) = u(y) ds.
dr ky−xk=r

Notando que
r3 u(x) 1
= ψ (r),
3 4π
resulta que Z
1
u(x) = u(y) ds.
4π ky−xk=r

Pode-se agora demonstrar o resultado central desta seção afirmando-se que, se u satisfaz a
propriedade da média em Ω, então os pontos de máximo e mínimo de u são pontos da fronteira
de Ω. Mais precisamente, tem-se o segunte:

Teorema 8.1 (princípio do máximo e mínimo): Se u : Ω → R satisfaz a propriedade da


média em Ω, então os valores máximos e mínimos de u ocorrem em pontos da fronteira ∂ Ω,
sendo Ω conexo.

D EMONSTRAÇÃO : De fato, se u satisfaz a propriedade da média em Ω, então u ∈ C Ω .
Logo, existem pontos x ∈ Ω = Ω ∪ ∂ Ω onde u atinge valores máximos e mínimos.
Seja x0 ∈ Ω um ponto de máximo. O caso de ser ponto de mínimo é inteiramente análogo.
Faça-se u(x0) = M. Se u for constante em Ω, u(x) = M para todo x ∈ Ω, então valerá o teorema.
Suponha-se, portanto, que u não seja constante em Ω e que x0 , o ponto onde u assume o
valor máximo, seja um ponto interior de Ω, isto é, x0 6∈ ∂ Ω. Mostrar-se-á que essa suposição
vai implicar uma contradição, o que implica, por sua vez, ser falsa a hipótese feita. Poder-se-á
concluir, então, que, se u não é constante em Ω, os pontos x0 tais que u(x0 ) = M não podem ser
pontos interiores. Como existe pelo menos um ponto x0 onde u(x0 ) = M, por ser u contínua em
um compacto, então x0 ∈ ∂ Ω.
Para se mostrar a contradição acima, usar-se-á um resultado de topologia que afirma que, se
A ⊂ B, sendo A 6= ∅ e B um conjunto conexo, sendo A fechado e aberto em B, então A = B.
Sejam, então, x0 ∈ Ω (isto é, x0 6∈ ∂ Ω) tal que u(x0 ) = M, o valor máximo de u, e A o conjunto
definido por
D.8 Funções harmônicas, propriedades da média e do máximo 877

A = {x ∈ Ω | u(x) = M} .
Nessas condições, A 6= ∅, pois x0 ∈ A e A ⊂ Ω, sendo Ω um conjunto conexo por hipótese.
Resta mostrar que A é fechdo e aberto em Ω.

(1) A é fechado em Ω.

Deve-se mostrar que, se uma sequência de pontos xn ∈ A, n ∈ N, converge para um ponto


x ∈ Ω, então x ∈ A.
Seja então {xn }, com xn ∈ A, tal que lim xn = x. Sendo xn ∈ A, para cada n ∈ N, então
n→∞
u(xn ) = M. Como u é contínua, vale
 
lim u(xn) = u lim xn .
n→∞ n→∞

Daí segue-se que  


u(x) = u lim xn = lim u(xn ) = M,
n→∞ n→∞
ou seja, x ∈ A. Logo A é fechado em Ω.

(2) A é aberto em Ω.

Ter-se-á de mostrar agora que, se x0 ∈ A e ρ > 0 é tal que Bρ (x0 ) ⊂ Ω, então Bρ (x0 ) ⊂ A, isto
é, u(x) = M para todo ponto x ∈ Bρ (x0 ).
Suponha-se que isso não fosse verdade. Então existiria x1 Bρ (x0 ) tal que u(x1 ) < M. Sendo u
contínua em Ω, existe Bδ (x1 ) ⊂ Bρ (x0 ) com u(x) < M para todo x ∈ Bδ (x1 ). Veja-se figura 8.7.

Figura 8.7:

Da propriedade da média decorre que

Z Z
3 3
M= u(x) dx = u(x) dx +
4πρ 3 Bρ (x0 ) 4πρ 3 Bρ (x0 )\B(δ (x1 )
Z Z Z
3 3 3
+ u(x) dx < u(x) dx + M dx
4πρ 3 Bδ (x1 ) 4πρ 3 Bρ (x1 )\Bδ (x1 ) 4πρ 3 Bδ (x1 )
878 D Equação de Laplace: estudo mais geral

Z
3 3M 4π 3
= u(x) dx + · ·δ
4πρ 3Bρ (x0 )\Bδ (x1 ) 4πρ 3 3
   3
3M 4 3 4 3 δ
= 3
πρ − πδ + M
4πρ 3 3 ρ
 3  3
δ δ
=M− M+ M = M,
ρ ρ
isto é,
M = u(x0 ) < M,
o que é uma contradição.
Logo, não pode existir x1 ∈ Bρ (x0 ) com u(x1 ) < M. Daí, u(x) = M para todo x ∈ Bρ (x0 ) e
Bρ (x0 ) ⊂ A. Isto mostra que A é aberto em Ω, do que resulta A = Ω. Portanto, u = M em Ω, o
que contraria a hipótese de ser u não constante em Ω. Essa contradição é consequência de se
haver suposto o ponto de máximo como um ponto interior.

Uma consequência imediata desse resultado é que, se u possui a propriedade da média em Ω


e u ≡ 0 em ∂ Ω, então u ≡ 0 em Ω. De fato, tem-se

min u(x) ≤ u(x) ≤ max u(x), x∈Ω

e, como u possui a propriedade da média, min u(x) e max u(x) ocorrem em ∂ Ω.

A seguir dar-se-á a definição de função harmônica e posteriormente se caracterizará essa


classe de funções através da propriedade da média.

D EFINIÇÃO : Diz-se que uma função u : Ω → R é harmônica quando u ∈ C Ω ∩ C2 (Ω) e
∆u = 0 em Ω.

Exemplo 8.1: u(ξ ) = aξ + b, onde a e b são constantes, é harmônica em Ω = (0, 1).


Exemplo 8.2: u(ξ , η ) = ξ 2 − η 2 é harmônica em Ω = (ξ , η ) ∈ R2 | ξ 2 + η 2 < r2 , r > 0 .

Exemplo 8.3: u(ξ , η ) = ξ 2 + η 2 não é harmônica em qualquer domínio Ω ⊂ R2 .

A seguir mostrar-se-á que as asserções “u é harmônica em Ω” e “u possui a propriedade da


média em Ω” são equivalentes.
D.8 Funções harmônicas, propriedades da média e do máximo 879

Teorema 8.2: Uma função u : Ω → R é harmônica em Ω se, e somente se, u possui a pro-
priedade da média em Ω.
D EMONSTRAÇÃO : (⇒) Suponha que u é harmônica; mostrar-se-á que u possui a propriedade
da média.
De fato, seja u harmônica em Ω. Logo, ∆u = 0 em Ω e u ∈ C(Ω) ∩ C 2 (Ω). Seja x um ponto
qualquer em Ω e r > 0 tal que Br (x) ⊂ Ω. Pelo teorema 5.1 (ou pelo teorema 5.2), u no ponto x
é dada por  
Z
∂u ∂F
u(x) = F(x − y) (y) − u(y) (x − y) dSy,
ky−xk=r ∂n ∂n
onde lembramos que F(x − y) = s(x, y) + ϕ (x, y), sendo ∆ϕ = 0 em relação a y. Decorre daí,
usando-se a segunda identidade de Green, que
Z   
∂u ∂s ∂ϕ
u(x) = (s + ϕ ) −u + dSy
ky−xk=r ∂n ∂n ∂n
Z   Z  
∂u ∂s ∂u ∂ϕ
= s −u dSy + ϕ −u dSy
ky−xk=r ∂n ∂n ky−xk=r ∂n ∂n
Z   Z
∂u ∂s
= s −u dSy + (ϕ ∆u − u ∆ϕ ) dy
ky−xk=r ∂n ∂n ky−xk=r
Z  
∂u ∂s
= s −u dSy,
ky−xk=r ∂n ∂n
pois ∆u = 0 em Ω e u é harmônica e ∆ϕ = 0 em relação a y.
Sendo
1
s(x, y) = kx − yk−1 ,

obtém-se, para ky − xk = r, que
∂s 1 1
= − · 2,
∂n 4π r
como já foi visto. Logo,
Z  
1 1 ∂u 1 1
u(x) = · · +u· · dSy
ky−xk=r 4π r ∂ n 4π r 2
Z Z
1 ∂u 1
= (y) dSy + u(y) dSy
4π r ky−xk=r ∂ n 4π r 2 ky−xk=r
Z
1
= u(y) dSy.
4π r 2 ky−xk=r

Então u ∈ C Ω e
Z
1
u(x) = u(y) dSy,
4π r 2 kx−yk=r
onde x é um ponto qualquer em Ω.
Portanto, u possui a propriedade da média em Ω.
880 D Equação de Laplace: estudo mais geral

(⇐) Suponha agora que u possui a propriedade da média; mostrar-se-á que u é harmônica. Se

u possui a propriedade da média em Ω, então u ∈ C Ω . Seja x ∈ Ω e Br (x) ⊂ Ω. O problema
(
∆v = −0, em Br (x),
v = u, em ∂ Br (x),

possui solução,
 que
 é dada pelo teorema de Poisson, como já foi demonstrado anteriormente,
com v ∈ C Br (x) ∩ C2 (Br (x)), o que implica ser v uma função harmônica em Br (x).
Mas se v é harmônica em Br (x), segue-se que v possui a propriedade da média em Br (x) e
o mesmo ocorre com a função w = u − v. Se w possui a propriedade da média em Br (x), pelo
teorema 8.1, o máximo e o mínimo de w ocorrerm em pontos de ∂ Br (x). Mas w = 0 em ∂ Br (x),
o que implica ser w ≡ 0 em Br (x), ou seja, v ≡ u em Br (x).
Resulta daí que u é uma função harmônica em Br (x) ⊂ Ω. Como x ∈ Ω foi um ponto esco-
lhido arbitrariamente, conclui-se que u é harmônica em Ω, o que demonstra o teorema.

Assim, o teorema 8.2 se aplica igualmente às funções harmônicas; poder-se-ia ter enunciado
em primeiro lugar o seguinte teorema: “Se u é harmônica em Ω, então o máximo e o mínimo
de u ocorrem em pontos de ∂ Ω”.

D.9 Problema de Dirichlet e o teorema de Harnack

Pode-se agora mostrar que o problema de Dirichlet para Ω = Br (0) é bem posto, isto é, a
solução existe, é única e depende continuamente das condições de contorno.
Convém lembrar que o problema de Dirichlet consiste em, dados um aberto limitado e conexo

Ω ⊂ R3 e uma função u0 : ∂ Ω → R contínua, determinar uma u ∈ C Ω ∩C2(Ω) tal que ∆u = 0
em Ω e a restrição de u a ∂ Ω seja igual a u0.
Em outras palavras: o problema de Dirichlet consiste em encontrar uma solução para a
equação de Laplace satisfazendo uma condição de fronteira dada.
A existência da solução do problema de Dirichlet quando Ω = Br (0) é garantida pelo teorema
de Poisson. A unicidade e dependência contínua são consequências do princípio do máximo e
mínimo expresso no teorema 8.1.
De fato, sejam u1 e u2 duas soluções distintas do problema
(
∆u = 0, em Ω = Br (0),
u = u0 , em ∂ Ω = ∂ Br (0).
D.9 Problema de Dirichlet e o teorema de Harnack 881

 
Então, u1 , u2 ∈ C Br (0) ∩ C2 (Br (0)) e a função w = u1 − u2 é solução do problema
(
∆w = 0, em Ω = Br (0),
w = 0, em ∂ Ω = ∂ Br (0).

Sendo w = 0 em ∂ Br (0), decorre do teorema 8.1 que w ≡ 0 em Br (0), ou seja, u1 = u1 em


Br (0).
Suponha-se, agora, v1 e v2 soluções dos dois problemas seguintes:
( (
∆u = 0, em Br (0), ∆u = 0, em Br (0),
u = ϕ1, em ∂ Br (0), u = ϕ2 , em ∂ Br (0),

e que max |ϕ1 (x) − ϕ2 (x)| < ε , para ε > 0.


O teorema 8.1, princípio do máximo e do mínimo, garante que

|v1 (x) − v2 (x)| ≤ max |ϕ1 (x) − ϕ2 (x)| < ε , x ∈ Br (0).

Essa desigualdade quer dizer que pequenas modificações nas condições de contorno provo-
cam pequenas modificações na solução. Assim, mostra-se que o problema de Dirichlet é bem
posto para Ω = Br (0). Mostra-se analogamente que, dado Ω ⊂ R3, se existir a solução do prob-
lema de Dirichlet, ela será única e dependerá continuamente da condição de fronteira.
O aberto Ω, nessas condições, chama-se aberto de Dirichlet. A bola Br (0) é um exemplo
simples de tal aberto.
Pode-se formular para a equação de Poisson ∆u = f uma problema análogo ao problema de
Diricchlet. Dados um aberto limitado e conexo Ω ⊂ R3 e funções u0 : ∂ Ω → R e f : Ω → R

com u0 contínua, determinar u ∈ C Ω ∩ C2 (Ω) tal que
(
∆u = f , em Ω,
u = u0 , em ∂ Ω.

O estudo deste problema de Dirichlet é bem mais delicado que o feito quando f = 0 e Ω =
Br (0). Todavia, o leitor pode obter alguma indicação livro de G. Hellwig, Partial Differential
Equations.
Finalizando esta seção, demonstrar-se-á um resultado sobre convergência de funções harmôni-
cas, conhecido como teorema de harnack. Sabe-se que, devido à linearidade do operador de
Laplace, uma combinação linear qualquer de funções harmônicas será uma função harmônica.
A pergunta que ocorreria é se uma série convergente de funções harmônicas define uma função
harmônica. Esta questão é respondida pelo

Teorema 9.1 (Harnack): Sejam Ω um aberto limitado de R3 e {un} uma sequência de



funções harmônicas em Ω. Seja, ainda, ϕn = un Ω . Se a sequência {ϕn} converge uniforme-
mente para uma função ϕ em ∂ Ω, então existe uma função u : Ω → R tal que un → u uniforme-

mente em Ω, u é harmônica em Ω e u Ω = ϕ .
882 D Equação de Laplace: estudo mais geral


D EMONSTRAÇÃO : Poe definição, se un é harmônica em Ω, para n ∈ N, então un ∈ C Ω e
satisfaz a propriedade da média. Além disso, os valores máximos e mínimos de un, para cada
n ∈ N, ocorrem em ∂ Ω.
Por hipótese, {ϕn} converge uniformemente para uma ϕ em ∂ Ω. Logo, dado ε > 0, existe
n0 ∈ N tal que
|ϕn (x) − ϕm (x)| < ε , para todo m, n, ≥ n0
e qualquer que seja x ∈ ∂ Ω.
O princípio do máximo e mínimo permite escrever que, para todo m, n ∈≥ n0 ,

max |un (x) − um (x)| ≤ max |ϕn (x) − ϕm (x)| < ε ,

o que implica ser {un } unaiformemente convergente em Ω. Então existe u : Ω → R tal que

u∈C Ω e u Ω = ϕ .

Mostrar-se que u é harmônica em Ω. Como un , para n ∈ N, é harmônica em Ω, tem-se, pela


propriedade da média, que Z
1
un(x) = un(y) dS.
4π r2 ∂ Br (x)
Como un → u uniformemente em Ω, pode-se permutar a operação limite com integração e
tem-se
u(x) = lim un (x)
n→∞
Z 
= lim un (y) dS
n→∞ ∂ Br (x)
Z h i
= lim un(y) , dS
∂ Br (x) n→∞
Z
= u(y) dS.
∂ Br (x)
Portanto, u é harmônica em Ω.

Observação 9.1: Observa-se que, na demonstração do teorema anterior, pode-se mostrar


ainda que, se Ω0 é tal que (Ω0 ) ⊂ Ω, então as derivadas de qualquer ordem de un, para n ∈ N,
convergem uniformemente para as derivadas correspondentes de u em Ω0 ⊂ Ω. Não se fará
a demonstração desse resultado aqui, mas o leitor poderá consultar o livro de S. G. Mikhlin,
Mathematical Physics.
D.10 Problema de Dirichlet e fórmula de Poisson para o círculo 883

D.10 Problema de Dirichlet e fórmula de Poisson para o


círculo

Obtiveram-se, nas seções D.5 e D.6, a função de Green e a fórmula de Poisson para Ω =
Br (0) ⊂ R3, ficando a determinação no caso Ω = Br (0) ⊂ R2, usando-se o método ali estudado,
como exercício. Resolver-se-á, agora, o problema de Dirichlet para o círculo utilizando-se o
método de separação de variáveis.
Como os aspectos essenciais do método, tais como convergência de séries de Fourier, cál-
culo de coeficientes dos termos da série, etc., espera-se conhecidos. Limitar-se-á aqui a dar os
resultados principais, utilizando-se, evidentemente, os fatos já conhecidos.
Devido à simetria circular do problema, é conveniente usar coordenadas polares.
Sejam, então, x e y as coordenadas cartesianas de um ponto do plano e r e θ as coordenadas
polares do mesmo ponto. Tem-se

(  ∂x ∂x

 = cos θ , = −r sen θ ,
x = r cos θ , ∂r ∂θ


y = r sen θ ,  ∂ y = sen θ ,
 ∂y
= r cos θ .
∂r ∂θ
Escrevendo-se
u = u(x, y) = u(r cos θ , r sen θ ),
usando a regra da cadeia, obtém-se as relações
∂u ∂u ∂x ∂u ∂y ∂u ∂u
(10.1) = + = cos θ + sen θ
∂r ∂x ∂r ∂y ∂r ∂x ∂y
∂u ∂u ∂x ∂u ∂y ∂u ∂u
(10.2) = + = −r sen θ + r cos θ ·
∂θ ∂x ∂θ ∂y ∂r ∂x ∂y
Agora determina-se as derivadas segundas em relação a r e θ . Tem-se:
   
∂ 2u ∂ ∂u ∂ ∂u
= cos θ + sen θ
∂ r2 ∂r ∂x ∂r ∂y
     
∂ ∂u ∂x ∂ ∂u ∂y
= cos θ + +
∂x ∂x ∂r ∂y ∂x ∂r
     
∂ ∂u ∂x ∂ ∂u ∂y
+ sen θ +
∂x ∂y ∂r ∂y ∂y ∂r
 2   2 
∂ u ∂ 2u ∂ u ∂ 2u
= cos θ cos θ + sen θ + sen θ cos θ + 2 sen θ
∂ x2 ∂ y∂ x ∂ x∂ y ∂y
∂ 2u 2 ∂ u
2 ∂ 2u ,
(10.3) = cos2 θ + sen θ + 2 cos θ sen θ
∂ x2 ∂ y2 ∂ x∂ y
onde usou-se o fato de u ∈ C2 para considerar a igualdade das derivadas parciais mistas.
884 D Equação de Laplace: estudo mais geral

Analogamente, encontra-se que


   
∂ 2u ∂u ∂ ∂u ∂u ∂ ∂u
2
= − r cos θ − r sen θ − r sen θ + r cos θ
∂θ ∂x ∂θ ∂x ∂u ∂θ ∂y
     
∂u ∂ ∂u ∂x ∂ ∂u ∂y
= − r cos θ − r sen θ + −
∂x ∂x ∂x ∂θ ∂y ∂x ∂θ
     
∂u ∂ ∂u ∂x ∂ ∂u ∂y
− r sen θ + r cos θ +
∂y ∂x ∂y ∂θ ∂y ∂y ∂θ
 2 
∂u ∂ u ∂ 2u
= − r cos θ − r sen θ (−r sen θ ) + (r cos θ ) −
∂x ∂ x2 ∂ y∂ x
 2 
∂u ∂ u ∂ 2u
− r sen θ + r cos θ (−r sen θ ) + 2 (r cos θ )
∂y ∂ x∂ y ∂y
 
∂u ∂u
= − r cos θ + sen θ +
∂x ∂y
 2 2

2 2 ∂ u 2 ∂ u ∂ 2u
(10.4) + r sen θ 2 + cos θ 2 − 2 cos θ sen θ ·
∂x ∂y ∂ x∂ y

Divide-se, agora, ambos os membros de (10.4) por r2 e em seguida use (10.1) na mesma
expressão para obter

1 ∂ 2u 1 ∂u 2 ∂ u
2
2 ∂ u
2 ∂ 2u
(10.5) = − + sen θ + cos θ − 2 cos θ sen θ ·
r2 ∂ θ 2 r ∂r ∂ x2 ∂ y2 ∂ x∂ y

Por fim, adiciona-se (10.3) e (10.5) para encontrar

∂ 2u 1 ∂ 2 u 2 ∂ u
2
2 ∂ u
2 ∂ 2u
+ = cos θ + sen θ + 2 cos θ sen θ −
∂ r2 r2 ∂ θ 2 ∂ x2 ∂ y2 ∂ x∂ y
1 ∂u ∂ 2u ∂ 2u ∂ 2u
− + sen 2 θ 2 + cos2 θ 2 − 2 cos θ sen θ
r ∂r ∂x ∂y ∂ x∂ y
1 ∂u  ∂ 2u  ∂ 2u
=− + cos2 θ + sen 2 θ + sen 2
θ + cos2
θ
r ∂r ∂ x2 ∂ y2
1 ∂ u ∂ 2u ∂ 2u
(10.6) − + + ·
r ∂ r ∂ x2 ∂ y2
Segue-se de (10.6) que
∂ 2u ∂ 2u ∂ 2 u 1 ∂ u 1 ∂ 2u ,
∆u = + = 2+ +
∂ x2 ∂ y2 ∂r r ∂ r r2 ∂ θ 2
que é o laplaciano em coordenadas polares.
A equação de Laplace ∆u = 0 em coordenadas polares planas se escreve, então, como
D.10 Problema de Dirichlet e fórmula de Poisson para o círculo 885

∂ 2u 1 ∂ u 1 ∂ 2u
+ + = 0.
∂ r2 r ∂ r r2 ∂ θ 2
Suponha, agora, que a solução u possa ser representada na forma

u(r, θ ) = R(r) T (θ ).

Então, segue-se que


r2 R00 T + rR0 T + RT 00 = 0,
onde
dR dT
R0 = e T0 = ·
dr dθ
Assim, tem-se que
r2 R00 + rR0 T 00
=− ·
R T
O primeiro membro da igualdade acima é função apenas de r, enquanto que o segundo mem-
bro é função apenas de θ . Para que a igualdade seja válida é preciso que sejam iguais a uma
constante, que será chamada de λ 2 , isto é,
r2 R00 + rR0 T 00
=− = λ 2,
R T
de onde obtém-se, daí, duas equações diferenciais ordinárias, uma na variável independente r e
a outra em θ : 
 r2 R00 + rR0 − λ 2 R = 0,
 T 00 + λ 2 T = 0.

Se λ = 0, têm-se as soluções

 R(r) = c0 log r + d0 ,
 T (θ ) = a + b θ .
0 0

No caso λ 6= 0, a equação em R é a chamada equação de Euler. Supondo-se a solução R(r) =


rα , com α a determinar, resulta que
α 2 − λ 2 = 0,
donde
α1 = λ e α2 = −λ
e
R(r) = c1rλ + d1r−λ .
A outra equação é de solução imediata, que é

T (θ ) = a1 cos(λ θ ) + b1 sen (λ θ ).

Resumindo:
886 D Equação de Laplace: estudo mais geral


 R(r) = c0 log r + d0 ,
λ =0:
 T (θ ) = a + b θ .
0 0

 R(r) = c1 r λ + d1 r−λ ,
λ 6= 0 :
 T (θ ) = a cos(λ θ ) + b sen (λ θ ).
1 1

A solução geral da equação se escreve, então, como

u(r, θ ) = (c0 log r + d0 ) (a0 + b0θ ) +


 
λ −λ
(10.7) + c1 r + d1r [a1 cos(λ θ ) + b1 sen (λ θ )] ,

ficando as constantes a0 , b0 , c0, a1, b1, c1 e d1 para serem determinadas com as condições dadas
em cada problema.
Passa-se, então, à resolução do problema de Dirichlet para o círculo.
Sejam R > 0 e Ω o círculo de centro na origem e raio igual a R:

Ω = (ξ , η ) ∈ R2 | ξ 2 + η 2 < R2 ,

∂ Ω = (ξ , η ) ∈ R2 | ξ 2 + η 2 = R2 .

O problema de Dirichlet consiste, neste caso, em achar uma função u, definida no disco, que
seja contínua na união do disco com sua circunferência, Ω ∪ ∂ Ω, duas vezes continuamente
diferenciável em Ω e cuja restrição à circunferência ∂ Ω seja uma função dada u0 As condições
sobre u0 serão impostas durante a solução do problema. Resumindo:
( 
∆u = 0, em Ω, u ∈ C Ω ∩ C2 (Ω) ,
u = u0 , em ∂ Ω, u0 : ∂ Ω → R.

Em coordenadas polares:
 2 2
 ∂ u 1 ∂u 1 ∂ u
+ + = 0, 0 < r < R, −∞ < θ < ∞,
∂ r2 r ∂ r r2 ∂ θ

u = u0 , r = R.

Pelo método de separação de variáveis, fazendo u(r, θ ) = U (r)T (θ ), obtém-se o par de


equações:
(
r2U 00 + rU 0 − λ 2U = 0,
T 00 + λ 2 T = 0.
Para que u(r, θ ) seja bem definida, é necessário que u(r, θ ) = u(r, θ + 2π ), 0 ≤ r ≤ R, isto
é, u deve ser periódica de período 2π . Pela forma de u, conclui-se que T deve ser periódica de
período 2π . Resultam as seguintes condições:
D.10 Problema de Dirichlet e fórmula de Poisson para o círculo 887

T (θ + 2π ) = T (θ ) ⇒ T (π ) = T (−π ),

T 0 (θ + 2π ) = T 0 (θ ) ⇒ T 0 (π ) = T 0 (−π ).

O parâmetro λ pode agora ser determinado resolvendo-se o seguinte problema de contorno:





 T 00 + λ 2 T = 0,

T (π ) = T (−π ),



 T 0 (π ) = T 0 (−π ).

Resolvendo esse problema, encontra-se que λ = n, com n = 0, 1, 2, . . ., e ainda, no caso λ = 0,


que b0 , na equação (10.7) é igual a zero. Como a origem é um ponto de Ω e se quer que a solução

u seja C Ω , portanto, limitada em Ω, devem se fazer as constantes c0 e d1 na equação (10.7)
também iguais a zero.
Após essas considerações, a solução geral de (10.7) toma a forma
un (r, θ ) = d0 .a0 + cn rn (an cosnθ + bn sen nθ ),
a0
= + rn (an cos nθ + bn sen nθ ),
2
e

(10.8) u(r, θ ) = ∑ rn (an cos nπ + bn sen nπ )
n=0

será uma solução se a série convergir de forma conveniente e se se tiver ainda



(10.9) u(R, θ ) = u0 (θ ) = ∑ Rn (an cos nθ + bn sen nθ ) ,
n=0

com 0 ≤ θ ≤ 2π .
Se u0 (θ ) for uma função periódica de período 2π , contínua com derivada primeira contínua
por partes em (−π , π ) e u0(−π ) = u0(π ), então a série de Fourier de u0 , (10.9), convergirá
uniformemente para u0 em R, considerando-se agora sua extensão periódica. Então, tem-se que
de

u0(θ ) = ∑ (Rn an cosnθ + Rn bn sen nθ )
n=0
decorre que
Z 2π
n 1
An = R an = u0 (θ ) cosnθ d θ ,
π 0
Z 2π
n 1
Bn = R bn = u0 (θ ) sen nθ d θ ,
π 0
para n = 0, 1, 2, . . .
Substituindo-se os valores de an e bn na série para u, segue-se que
888 D Equação de Laplace: estudo mais geral

∞  
a0 n An n Bn
u(r, θ ) = + ∑ r n cos nθ + r n sen nθ
2 n=1 R R
∞  n
a0 r
= +∑ (An cos nθ + Bn sen nθ ) .
2 n=1 R
Faça uma pequena pausa para uma análise rápida dos resultados que foram conseguidos:

(a) Obteve-se uma sequência de funções {u(r, θ )}, onde un (r, θ ) é harmônica em Ω para cada
n ∈ N. A verificação desse fato fica como exercício. Logo, {vn (r, θ )}, com
∞  n
a0 r
vn (r, θ ) = + ∑ (An cos nθ + Bn cos nθ ),
2 n=1 R

é uma sequência de funções harmônicas em Ω.


(b) Se r = R, então {vn } é tal que

a0
vn (R, θ ) = + ∑ (An cos nθ + Bn sen nθ )
2 n=1

e é uma sequência de funções harmônicas convergindo uniformemente para u0 (θ ) em ∂ Ω


Pelo teorema de Harnack, existe u = u(r, θ ) harmônica em Ω tal que

lim vn (r, θ ) = u(r, θ ),


n→∞

sendo a convergência uniforme.


Em vista dessas observações, pode-se fazer
∞  n
a0 r
u(r, θ ) = +∑ (An cos nθ ) + Bn sen nθ )
2 n=1 R
" #
∞  n
a0 r
= + lim ∑ (An cos nπ + Bn sen nπ )
2 n→∞
n=1 R
" #
∞  n
a0 r
= lim +∑ (An cos nπ + Bn sen nπ )
n→∞ 2
n=1 R

= lim vn (r, θ ).
n→∞

Então, a função u(r, θ ) definida por


∞  n
a0 r
u(r, θ ) = + ∑ (An cos nπ + Bn sen nπ ) ,
2 n=1 R

onde Z Z
1 2π 1 2π
An = u0 (θ ) cosnπ d θ e Bn = u0 (θ ) sen nπ d θ ,
π 0 π 0
para n = 0, 1, 2, . . . é a solução do problema de Dirichlet para o círculo de raio R e centro na
origem.
D.10 Problema de Dirichlet e fórmula de Poisson para o círculo 889

Observe-se que, se r = 0, então


Z 2π
a0 1
u(0, θ ) = = u0 (θ ) d θ ,
2 2π 0

pois u possui a propriedade da média em Ω.


A solução u obtida por ser interpretada como sendo a distribuição de temperatura estacionária
em um disco de raio R, centro na origem, construído com um material condutor, com fronteira
∂ Ω isolada termicamente, sendo conhecida a distribuição de temperatura u0 (θ ) em ∂ Ω.
Utilizando-se a solução u(r, θ ) assim obtida, encontrar-se-á a fórmula de Poisson para o cír-
culo da seguinte maneira: substituindo-se as expressões de An e Bn na série de u(r, θ ), segue-se
que "Z
Z
1 2π 1 ∞  r n 2π
u(r, θ ) = u0 (ϕ ) d ϕ + ∑ u0 (ϕ ) cos nϕ cos nθ d ϕ +
2π 0 π n=1 R 0

Z
#

+ u0 (ϕ ) sen nϕ sen nθ d ϕ
0

Z 2π
"Z
1 1 ∞  r n 2π 
= u0 (ϕ ) d ϕ + ∑ u0 (ϕ ) cos nϕ cos nθ +
2π 0 π n=1 R 0
#

+ u0 (ϕ ) sen nϕ sen nθ d ϕ d ϕ

Z 2π Z 
1 1 ∞  r n ∞
= u0 (ϕ ) d ϕ + ∑ u0(ϕ ) cos n (ϕ − θ ) d ϕ .
2π 0 π n=1 R 0

Lembrando-se que a convergência da série é uniforme, podem-se permutar soma e inte-


grando, donde
Z Z
" #
∞  n
1 2π 1 2π r
u(r, θ ) = u0 (ϕ ) d ϕ + u0(ϕ ) ∑ cos n(ϕ − θ ) d ϕ
2π 0 π 0 n=1 R
Z
" #
∞  n
1 2π r
= u0 (ϕ ) 1 + 2 ∑ cos n(ϕ − θ ) d ϕ .
2π 0 n=1 R

Para se obter a fórmula de Poisson, ter-se-á de calcular


∞  n
r
1+2 ∑ cos n(ϕ − θ ).
n=1 R

Comece-se por observar que a  r n


cos n(ϕ − θ )
R
é a parte real do número complexo
 r n
n
z = [cos n (ϕ − θ ) + i sen n (ϕ − θ )]
R
890 D Equação de Laplace: estudo mais geral

h r  in
= [cos (ϕ − θ ) + i sen (ϕ − θ )] ,
R
sendo r r
z= [cos(ϕ − θ ) + i sen(ϕ − θ )] = e i(ϕ −θ ) ,
R R
donde r r

|z| = e i(ϕ −θ ) = < 1,
R R
pois 0 ≤ r < R.
Pode-se, pois, escrever que
!
∞  r n ∞ r
n
1+2 ∑ cos n(ϕ − θ ) = Re 1+2 ∑ z , onde z = e i(ϕ −θ ) .
n=1 R n=1 R

Se |z| < 1, então é válida a seguinte expansão:


  !

1+z 1
1−z
= −1 + 2
1−z
= −1 + 2 ∑ zn
n=1
!
∞ ∞
= −1 + 2 1 + ∑ zn = −1 + 2 + 2 ∑ zn
n=1 n=1

= 1 + 2 ∑ zn .
n=1

Calculando-se a parte real, tem-se


!  

n 1+z 1 − |z|2
Re 1+2 ∑ z = Re =
n=1 1−z 1 − 2 Re(z) + |z|2
 r 2
1−
= R
r   r 2
1−2 cos(ϕ − θ ) +
R R
2
R −r 2
= 2 ·
R − 2rR cos(ϕ − θ ) + r2
Conclui-se, portanto, que a soma da série é dada por
!  
∞  r 2 ∞
1+z
n
1+2 ∑ cos n(ϕ − θ ) = Re 1+2 ∑ z = Re
n=1 R n=1 1−z

R2 − r2
= ·
R2 − 2rR cos(ϕ − θ ) + r2
A fórmula de Poisson, que dá a representação integral da solução do problema de Dirichlet
para o círculo, é, então,
D.10 Problema de Dirichlet e fórmula de Poisson para o círculo 891

Z 2π
R2 − r2 1
u(r, θ ) = u0 (ϕ ) d ϕ .
2π 0 R2 − 2rR cos(ϕ − θ ) + r2
Embora se tenha resolvido, explicitamente, o problema de Dirichlet apenas para o círculo
de raio R e centro na origem, a solução existe para uma grande classe de domínios no plano,
denominados domínios simplesmente conexos. Para se ter uma ideia do que seja um domínio
simplesmente conexo, dir-se-á o seguinte: imagine-se um conjunto aberto e limitdo Ω ⊂ R2 e Γ
uma curva simples, fechada, inteiramente contida em Ω. Podem existir duas situações: ou todos
os pontos interiores a Γ são pontos de Ω ou existe um ou mais pontos interiores à curva que não
são pontos de Ω. Assim, Ω será simplesmenete conexo se todos os pontos interiores a Γ forem
pontos de Ω, qualquer que seja a curva Γ simples e fechada contida em Ω.
Se Ω ⊂ R2 é simplesmente conexo, então o teorema de representação de Riemann afirma que
existe uma transformação conforme de Ω em um círculo de raio R e centro na origem. O leitor
interessado poderá consultar o livro de S. Lang, Complex Analysis.
O teorema de Riemann transforma o problema de Dirichlet para um Ω simplesmente conexo
no problema de Dirichlet para o círculo, com centro na origem, o qual se sabe resolver. Não se
deterá aqui nesse tipo de problema.
Bibliografia

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Equações Diferenciais B da UFMG, 2017. Disponível em novembro de 2021 no site
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Índice Remissivo

Ângulo de fase, 329 de Dirichlet, 426


de Neumann, 426
Amplitude, 329 de Robin, 426
harmônica, 317 mista, 426
Aproximação Condição inicial, 566
dos mínimos quadrados, 735 Condições
Base, 695 de contorno, 417
iniciais, 426, 427
Classe Condições de fronteira, 566
de equivalência, 24 Condutividade térmica, 564
representante, 24 Cone de influência, 478
Classe de equivalência, 755 Conjunto
Coeficiente de permeabilidade completo, 740, 741
do meio poroso, 517 de medida nula, 24, 755
Coeficientes de Fourier, 199, 205, 208, 242 fecho de um, 801
estimativas, 272 linearmente dependente, 695
Complexo linearmente independente, 695
argumento, 328 ortogonal de vetores, 705
conjugado, 327 ortonormal completo, 711
forma polar, 328 ortonormal de vetores, 705
módulo, 327 quociente, 755
parte imaginária, 327 simétrico, 228
parte real, 327 Constante de separação, 435
unidade imaginária, 327 Convergência
Complexos em média, 746
plano de Argand-Gauss, 327 normal, 776
Condição uniforme, 746
de compatibilidade, 435 Coordenadas

899
900 ÍNDICE REMISSIVO

curvilíneas, 551 total, 329


Corda infinita, 465 Equação
da continuidade, 518
Delta de Dirac, 104
de Euler, 512, 879
Densidade espectral, 329
de Laplace, 432, 488
Densidade espectral de energia, 329
de onda, 571
Dependência contínua dos dados, 427
diferencial, 425
Derivação
diferencial ordinária, 425
da transformada de Fourier, 366
diferencial parcial, 425
Derivada
do calor, 432, 566
normal, 426
do movimento, 157
Descontinuidade
do potencial, 488
de primeira espécie, 209
Equação de Laplace
de segunda espécie, 209
problema de Dirichlet no retângulo, 490
Desigualdade
Equação de ondas, 432
de Bessel, 708, 710, 738
não homogênea, 481
de Cauchy-Schwarz, 703, 715, 726
Erro médio quadrático, 735, 743
de Minkowski, 703, 717, 729
raiz do, 735
triangular, 702
Espaço
Deslocamento
completo, 722
de fase, 317
das frequências, 11
Difusividade térmica, 433, 566
de dimensão infinita, 427
Dimensão infinita, 428
de Hilbert, 723
EDP dos tempos, 11
elítica, 430, 431 Espaço L1 ([a, b]), 660
hiperbólica, 430, 431 Espaço L1 (R), 660
homogênea, 426 Espaço L2 ([a, b]), 745
linear, 426 Espaço L1 ([a, b]), 670
linear de 2a ordem, 430 Espaço l 2, 713
não homogênea, 426 Espaço com produto interno, 696
não linear, 426 Espectro de amplitudes, 329
ordem, 426 Espectro de fases, 329
parabólica, 430, 431 Espectro discreto, 331
parte principal, 426 Extensão periódica, 175
semi-linear de 2a ordem, 430
Fórmula
semilineares, 426
de Abel, 778
solução, 427
de d’Alembert, 466, 470
ultra-hiperbólica, 431
de Euler, 42, 279
Energia
de Poisson, 860
cinética, 330
Fluido
potencial, 330
ÍNDICE REMISSIVO 901

ideal, 517 Gaussiana, 372


incompressível, 518 Green
massa específica, 517 terceira identidade, 823
peso específico, 517
Harmônico
pressão, 517
n-ésimo, 317
velocidade, 517
fundamental, 317
Forças externas, 570
primeiro, 317
Forma quadrática, 697
Frequência, 316 Identidade
angular, 316 de Parseval, 290, 711
angular fundamental, 317 de polarização, 699
natural, 153 do paralelogramo, 701
Função, i Identidade de Parseval
ímpar, 228 segunda forma, 767
absolutamente integrável, 657 Identidades
admissível, 6 de Green, 801
beta, 140 Impulso, 156
característica, 341 Integral
componente ímpar, 233 convergência condicional, 615
componente par, 233 critério de Dirichlet, 616
de Dirichlet, 658 imprópria, 657
de Green, 847 indefinida, 195
de Heaviside, 15 própria, 657
definida por integral, 127 tipo 1, continuidade, 577, 583
gama, 133, 805 tipo 1, convergência absoluta, 601
Hölder contínua, 691 tipo 1, convergência condicional, 601
harmônica, 872 tipo 1, convergência uniforme, 599
lipschitziana, 692 tipo 1, critério de Cauchy, 599
par, 228 tipo 1, diferenciabilidade, 585
parte negativa, 601, 611 tipo 1, Leibniz, 584
parte positiva, 601, 611 tipo 1, mudança na ordem de integração,
periódica, 173 590, 591
quadrado integrável, 723 tipo 2, convergência absoluta, 611
representação, iii tipo 2, convergência condicional, 611
seccionalmente contínua, 4, 209, 324 tipo 2, convergência pontual, 606
seccionalmente diferenciável, 209 tipo 2, convergência uniforme, 609
singularidade, 396, 819 tipo 2, critério de Cauchy, 609
Funções tipo 2, Teste
iguais quase sempre, 24, 755 M de Weierstrass, 613
representadas por integrais, 573 Integral de Dirichlet, 396
convergência, 396, 400
902 ÍNDICE REMISSIVO

divergência absoluta, 402 Perfil de onda, 474


valor da, 410, 412 Polinômio de Bernstein, 26
Integral, convergência uniforme, tipo 3, 646 Posição de equilíbrio da corda, 568
Interpretação da solução de d’Alembert, 473 Potência
Intervalo de dependência, 477 latente, 319
Potencial de velocidade, 518
Laplaciano
Problema
coordenadas cilíndricas, 547
da barra infinita, 443
coordenadas esféricas, 552
de Dirichlet, 434
coordenadas polares, 543
de Neumann, 434
Lebesgue
de valor de contorno, 417
integral de, 595, 656, 731, 745, 758, 759
Problema bem posto, 427
Lei
Problema da corda
de Fourier, 564
corda infinita, 462
Lei de Darcy, 517
dependência contínua, 472
Lema de Riemann-Lebesgue, 739
extremidade fixa, caso geral, 460
Limite trigonométrico fundamental, 396
extremidades fixas e com posição inicial nula,
Média quadrática, 743 454
Métrica, 732 extremidades fixas e partindo do repouso,
Movimento 449
estacionário, 518 unicidade, 471
forçado, 157 Problema de Dirichlet
livre, 157 não homogêneo, 488
não amortecido, 157 Problema de Laplace
Mudança no disco, 505
de coordenadas, 551 Problema do calor
condição de Dirichlet homogênea, 433
Núcleo condição de Dirichlet não homogênea, 440
de Dirichlet, 680, 682, 685 em domínio ilimitado, 446
Norma, 697, 702 em domíno ilimitado, 443
da média quadrática, 746 Problema mal-posto, 427
uniforme, 746 Produto
de convolução, 95, 377
Onda
Produto interno, 696
do futuro, 474
Projeção ortogonal, 707
do passado, 474
Proposição
progressiva, 474
do valor final (Laplace), 68
regressiva, 474
do valor inicial (Laplace), 68
Partição da unidade, 27 Propriedade
Período, 173, 175, 316 1a translação (Laplace), 40
Período fundamental, 174, 175 2a translação (Laplace), 55
ÍNDICE REMISSIVO 903

da unicidade, 754 trigonométrica, 173, 296


de deslocamento no tempo, 353 Série de Fourier, 173, 179, 186, 189, 194
de dilatação, 347 convergência pontual, 678
de linearidade (Fourier), 345 convergência uniforme 1, 772
de linearidade (Laplace), 37 convergência uniforme 2, 782
de simetria (Fourier), 356 forma complexa, 279
de translação, 352 forma harmônica, 316
de variação de frequência, 353 generalizada, 695, 733
divisão por t (Laplace), 71 Série de funções
do amortecimento, 41 convergência, 2
do escalonamento, 346 divergência, 3
mudança de escala (Laplace), 49 soma, 3
multiplicação por t n (Laplace), 69 somas parciais, 2
Série numérica
Quantidade de movimento, 568
convergência, 1
Raiz n-ésima, ii divergência, 2
Região de influência, 479 soma, 2
Regra da cadeia Semi-norma, 731
1a caso, 537 Separação de variáveis, 434
2o caso, 539 Sequência
Regra de Leibniz, 413, 570 de núcleos de Dirac, 160
Regra de Leibniz, primeira, 127 de Cauchy, 722
Regra de Leibniz, segunda, 130 de números reais, 1
Relação, 754 de somas parciais, 1
de equivalência, 755 Sequência de funções
reflexiva, 754 convergência pontual, 2
simétrica, 754 Sequência numérica, 1
transitiva, 755 convergência, 1
Relação funcional, i divergência, 1
Relações de ortogonalidade, 199, 204 Simetria
Representação espectral, 329 de meia onda, 244
Ressonância, 155 de quarto de onda, 244
Retas características, 478 Solução
RMS, 318 fundamental, 822
Superposição, 438
Série
alternada, 658, 664 Tensão, 568
de Fourier, 173, 208 Teorema
de Fourier na forma complexa, 281 do valor médio; segundo, 107
de Leibniz, 217 convolução na frequência, 378
harmônica, 301, 659, 664 convolução no tempo, 377
904 ÍNDICE REMISSIVO

de Fourier, 213, 657, 693


de Gauss em R2, 795
de Gauss em R3, 796
de Green, 792
de Riemann-Lebesgue, 671, 689
de Riemann-Lebesgue, caso 1, 671
de Riemann-Lebesgue, caso 2, 675
de Schwarz, 532
de Weierstrass, 30
diferenciação da série de Fourier, 256
do valor médio, 532
do valor médio para integrais, 106
integração da série de Fourier, 262
Plancherel, 387
valor médio de Lagrange, 692
Teste
de Abel, 297
de Cauchy, 609
de Dini, 688
Transformada
da derivada (Laplace), 61
da derivada segunda (Laplace), 66
da integral (Fourier), 366
da integral (Laplace), 63
das derivadas (Fourier), 363
das derivadas de funções de duas variáveis,
374
de Fourier, 324, 326
de Laplace, 4, 5
de Laplace (existência), 9
do delta de Dirac, 110
do produto de convolução (Laplace), 95
inversa de Fourier, 324, 326
Transformada de Laplace, 414

Vetores ortogonais, 705


Vibrações transversais, 568

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