Você está na página 1de 6

Português 10º Ano

Poesia Trovadoresca

Ai flores, ai flores do verde pinho


se sabedes novas do meu amigo,
Ai deus, e u é?

Ai flores, ai flores do verde ramo,


se sabedes novas do meu amado,
Ai deus, e u é?

Se sabedes novas do meu amigo,


aquele que mentiu do que pôs comigo,
Ai deus, e u é?

Se sabedes novas do meu amado,


aquele que mentiu do que me há jurado
Ai deus, e u é?

- Vós me perguntades polo voss' amigo,


E eu ben vos digo que é san e vivo.
Ai Deus, e u é?

- Vós me perguntades polo voss' amado,


E eu ben vos digo que é viv' e sano.
Ai Deus, e u é?

E eu ben vos digo que é san' e vivo


E seerá vosc' ant' o prazo saído.
Ai Deus, e u é?

E eu ben vos digo que é viv' e sano


E seerá voac' ant' o prazo passado.
Ai Deus, e u é?
D. Dinis (CV 171/CBN 568)

Questionário

1. O sujeito poético desta composição é...


A. a donzela. B. o amigo. C. as "flores do verde
pino".

2. Nesta cantiga a natureza está presente como...


A. cenário. B. testemunha do amor. C. confidente da donzela.

3. O sujeito poético revela um estado de espírito de...


A. alegria. B. ansiedade. C. religiosidade.
Português 10º Ano
Poesia Trovadoresca

4. As "flores do verde pino"...


A. tranquilizam o sujeito C. não respondem ao sujeito poético.
poético.
B. enganam o sujeito poético.

5. O refrão desta cantiga expressa...


A. uma oração a Deus. B. o desespero do sujeito. C. o eco da natureza.

6. Tendo em conta o "diálogo" que se estabelece, o recurso de estilo que se


verifica é...
A. a metáfora. B. a hipérbole. C. a personificação.

7. Os dois interlocutores deste diálogo são...


A. a donzela e o seu B. a donzela e Deus. C. a donzela e a
"amigo". natureza.

8. Quanto à estruturação interna ou temática, encontramos nesta cantiga...


A. duas partes. B. três partes. C. quatro partes.

9. Quanto à classificação estrófica, esta cantiga ...


A. é composta por oito B. é composta por oito dísticos com refrão
tercetos. monóstico.
C. é composta por oito monósticos, com
refrão dístico.

10. A métrica é regular nas coplas e o verso pode classificar-se como...


A. endecassílabo (11 sílabas métricas). C. redondilha maior (7 sílabas
B. decassílabo (10 sílabas métricas). métricas).

11. No refrão, a métrica é diferente e o verso é...


A. hexassilábico (6 sílabas métricas). C. redondilha menor (5 sílabas
B. redondilha maior. métricas).

12. Quanto à rima, constata-se a presença de rima...


A. emparelhada. B. interpolada. C. cruzada.

Apresente, de forma bem estruturada, as suas respostas aos itens.

1. Delimite as partes que compõem o texto, justificando a sua resposta.


Português 10º Ano
Poesia Trovadoresca

2. A questão da fidelidade do «amigo» percorre a cantiga.


Explicite o modo como é tratada por cada uma das vozes presentes no texto.
3. Analise o papel desempenhado pelas «flores do verde pino».
4. Indique três características temáticas do poema que contribuem para a sua
inserção no género das cantigas de amigo.
Cantiga de amigo.

Temática - saudade do amigo que se demora; a amiga interpela as flores que a


tranquilizam sobre o regresso do seu amigo.

Formalmente:
1 - dísticos monorrimos; refrão monóstico;
2 - rima AA / BB / A'A / B'B, emparelhada;
3 - paralelismo perfeito;
4 - leixa-prem;
5 - apóstrofe.

Esta é, seguramente, a mais conhecida cantiga de D. Dinis, e uma das mais


célebres da Lírica Galego-Portuguesa. Com inteira justiça, poderemos dizer, já
que se trata de uma composição que exemplifica, de forma notável, o modo
como a arte trovadoresca é, por vezes, capaz de alcançar uma extraordinária
profundidade de campo através da sábia conjugação dos recursos
(aparentemente) mais simples e elementares.
Não sendo este o espaço para uma análise aprofundada da riqueza e
complexidade da cantiga, apontam-se apenas algumas das linhas que poderão
eventualmente ajudar a esse entendimento:
- a cantiga pode dividir-se em dois momentos exatamente simétricos: a fala da
donzela e a resposta das "flores do verde pino"
- o diálogo da donzela com estas (inusitadas) "flores" é exemplo único (na
Lírica Galego-Portuguesa) de personificação da Natureza (apenas na "Pastorela
do Papagaio" (também de D. Dinis, encontramos um caso semelhante, mas aí
de uma ave a falar).
- o cenário (idílico mas isolado) onde a donzela se encontra decorre
implicitamente deste diálogo (como implícito é o motivo da sua presença ali:
decerto à espera do amigo)
- a técnica do paralelismo implica aqui, não uma repetição e amplificação do
que é dito nas estrofes iniciais (como acontece frequentemente neste género
de cantigas), mas uma verdadeira intensificação narrativa: o tempo passa, o
seu amigo não vem, a donzela inquieta-se. Na sua fala inicial, por exemplo, ela
passa rapidamente do simples pedido de notícias à hipótese de ele a ter
enganado (o mentiroso!).
- na sua resposta, as flores sossegam-na. Note-se, no entanto, que esta
Português 10º Ano
Poesia Trovadoresca

resposta, no seu segmento inicial (o seu amigo está vivo e de saúde) não
incide nas perguntas explícitas da donzela, mas antes na pergunta que ela não
ousa formular: teria o seu amigo morrido?
- finalmente, no segmento final da resposta (ele virá antes de passar a hora
combinada), percebemos que essa hora ainda não passou, ou seja, que a
donzela chegou muito antes e que toda a sua inquietação não passa disso
mesmo: inquietação de uma jovem apaixonada, sozinha num pinhal e insegura
(e note-se como o refrão, inalterado, para isso contribui).

Cenários de resposta:

1. A estrutura bipartida da cantiga relaciona-se com o carácter dialógico da


mesma, uma vez que, nas quatro primeiras estrofes (vv. 1-12), a donzela
interroga a Natureza sobre o paradeiro do «amigo», e, nas quatro restantes
estrofes (vv.13-24), «as flores do verde pino» respondem à sua interpelação.

2. O «amigo» é referido pela donzela como tendo mentido, faltando a um


juramento (v. 11), ou a um compromisso (v. 8). A essa infidelidade, que é
imaginada pela própria ânsia e saudade da donzela, é contraposta, pela voz
atribuída às «flores do verde pino», uma atitude de fidelidade, pois, segundo
essa voz afirma, ele voltará até mesmo antes do prazo combinado

3. A donzela sente temor pela sorte do «amigo», de quem não tem notícias, e
cria um interlocutor fictício para desabafar. A esse confidente imaginado –
símbolo do seu próprio amor – confessa a sua saudade e inquietação, e dele
ouve a seguir o que tanto deseja ouvir: que o amigo está bem e que voltará em
breve. Essa personificação benfazeja das «flores do verde pino» estabelece a
comunhão da donzela com a Natureza.

4. Na resposta, podem ser indicadas, entre outras, [as] seguintes


características:
– representação de um sujeito poético feminino, como falante e como ouvinte;
– lugar central dado à referência ao namorado («amigo», «amado»);
– expressão, por parte da donzela, do desejo de um encontro amoroso;
– interpelação da Natureza como confidente.

ANÁLISE DE UM POEMA MEDIEVAL


Elabore um comentário da composição, orientando-se pelos seguintes tópicos:
- Apresentação (identificação; género; presença nos cancioneiros; autor)
Português 10º Ano
Poesia Trovadoresca

- Estrutura externa/ versificação;


- Tema;
- Assunto;
- Estrutura interna;
- Análise interpretativa;
- Simbologia;
- Dimensão histórico-cultural (coordenadas espacial e/ou temporal);
- Conclusão.

Cenário de resposta:

«Ai flores, ai flores do verde pino» é uma cantiga de amigo da autoria de D.


Dinis, presente nos cancioneiros da Vaticana e da Biblioteca Nacional com os
números 171 e 568, respetivamente.
Do ponto de vista formal, esta cantiga paralelística perfeita, dialogada, é
constituída por oito coplas , cada copla tem um dístico de decassílabos graves
(1ª parte) e hendecassílabos graves (2ª parte) de rima monórrima e um refrão
monóstico pentassílabo agudo. O esquema rimático é: aaB.
Nesta composição é abordado o tema da saudade; quanto ao assunto, cheia de
saudade do seu amigo que se demora a menina interpela as flores, que a
tranquilizam.
Na primeira parte (coblas I a IV) a donzela traduz o seu estado de espírito e a
saudade pelo amigo. Aqui, ela entra em diálogo caracterizando-se
indiretamente como ansiosa («Se sabedes novas do meu amigo/amado», «Ai
Deus, e u é?») e indicando que o namorado está ausente; zangada («Aquel que
mentiu do que pôs comigo/mh’á jurado») e, ele, diretamente caracterizado,
mentiroso.
Na segunda parte (coblas V a VIII) a Natureza, personificada e humanizada,
tranquiliza a donzela. As flores respondem-lhe com a revelação de que o amigo
está de saúde («E eu bem vos digo que é viv’e sano/san’e vivo») e
comparecerá de acordo com o combinado («E será vosc’ant’o prazo
saído/passado»).
No entanto, acaba a cantiga e ela continua preocupada como confere a própria
estrutura paralelística cuja técnica do leixa-prém e a manutenção do refrão
adensam o clima tenso transmitido na cantiga.
Se quisermos fazer uma leitura do vocabulário utilizado e da simbologia para
que nos pode remeter, é possível descobrir os intervenientes da relação
amorosa. Assim: «as flores do verde pino» constituem uma invenção poética
Português 10º Ano
Poesia Trovadoresca

cujo referente será, sim, a flor do pinheiro, mas também e sobretudo a «flor del
bels pis» (da poesia provençal, occitânica), isto é, o símbolo do amor
invencível. Portanto, às flores se associa o campo lexical de beleza, delicadeza,
sensibilidade, feminilidade e aroma e a este campo lexical se liga a imagem
que existe na poesia trovadoresca da donzela. O pinheiro, pela força, apoio,
segurança, robustez, masculinidade, braços (ramos) simbolizará o amigo. A
relação entre os dois jovens, cheios de esperança, é transposta para a ideia de
verde, que significa imaturidade, juventude e esperança.
As coordenadas espácio-temporais que extraímos deste poema remetem-nos
para os primórdios da nacionalidade, época do estabelecimento das fronteiras
territoriais, quer pelo uso dos vocábulos «san’e vivo», quer pela autoria do
texto. O ambiente é rural.
A concluir, D. Dinis apanhou nesta composição de inspiração popular uma
característica tipicamente portuguesa, a saudade, podendo mesmo considerar-
se um tema eminentemente nacional, pois reflete condições em que se formou
o nosso país: a reconquista cristã.

José Carreiro, Ponta Delgada, 2002-01-07.

Você também pode gostar