Você está na página 1de 52

WBA0518_V2.

BIOCOMBUSTÍVEIS E BIOMASSA
2

João Vitor Rodrigues de Souza

BIOCOMBUSTÍVEIS E BIOMASSA
1ª edição

São Paulo
Platos Soluções Educacionais S.A
2022
3

© 2022 por Platos Soluções Educacionais S.A.

Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida ou
transmitida de qualquer modo ou por qualquer outro meio, eletrônico ou mecânico, incluindo
fotocópia, gravação ou qualquer outro tipo de sistema de armazenamento e transmissão de
informação, sem prévia autorização, por escrito, da Platos Soluções Educacionais S.A.

Head de Platos Soluções Educacionais S.A


Silvia Rodrigues Cima Bizatto

Conselho Acadêmico
Alessandra Cristina Fahl
Camila Braga de Oliveira Higa
Camila Turchetti Bacan Gabiatti
Giani Vendramel de Oliveira
Gislaine Denisale Ferreira
Henrique Salustiano Silva
Mariana Gerardi Mello
Nirse Ruscheinsky Breternitz
Priscila Pereira Silva
Tayra Carolina Nascimento Aleixo

Coordenador
Nirse Ruscheinsky Breternitz

Revisor
Douglas Vieira Barboza

Editorial
Beatriz Meloni Montefusco
Carolina Yaly
Márcia Regina Silva
Paola Andressa Machado Leal

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


_____________________________________________________________________________
Souza, João Vitor Rodrigues de
S729b Biocombustíveis e biomassa / João Vitor Rodrigues de
Souza. – São Paulo: Platos Soluções Educacionais S.A., 2022.
32 p.

ISBN 978-65-5356-113-7

1. Balanço energético. 2. Matriz energética. 3. Fontes


renováveis. I. Título.
CDD 662.88
_____________________________________________________________________________
Evelyn Moraes – CRB: 010289/O

2022
Platos Soluções Educacionais S.A
Alameda Santos, n° 960 – Cerqueira César
CEP: 01418-002— São Paulo — SP
Homepage: https://www.platosedu.com.br/
4

BIOCOMBUSTÍVEIS E BIOMASSA

SUMÁRIO

Apresentação da disciplina ___________________________________ 05

Introdução a Bioenergia ______________________________________ 06

Bioenergias líquidas e suas aplicações________________________ 17

Bioenergia sólida/gasosa e suas aplicações___________________ 30

Sustentabilidade socioeconômica e ambiental da bioenergia____ 40


5

Apresentação da disciplina

A disciplina Biocombustíveis e biomassa estabelecerá o entendimento


fundamental sobre as características dos recursos de biomassa, tão
como o projeto e operações dos sistemas de energia desta fonte.

Os principais tópicos a serem abordados incluem: os fundamentos


da produção, disponibilidade e sustentabilidade dos recursos;
características da biomassa como combustível; aspectos de projeto
sobre os processos de pré-tratamento, conversão termoquímica e
conversão bioquímica. Em particular, serão enfatizados os aspectos
ambientais da energia de biomassa, economia e a sustentabilidade
sobre a produção de energia de biomassa.

Ao final deste curso, você será capaz de descrever a natureza e o


princípio dos diferentes sistemas de extração de energia de biomassa e
saber escolher os combustíveis de biomassa adequados para diferentes
aplicações bioenergéticas. Além disso, será possível distinguir as
características desejáveis dessas fontes de energia de biomassa e suas
vantagens em relação aos combustíveis tradicionais, como carvão e
petróleo. E, também, de identificar o escopo limitado em termos de
locais adequados, dependência dos elementos, custos de capital e custo-
benefício em comparação com fontes tradicionais.

O curso será de particular interesse para profissionais da área de


engenharia, de projeto e consultores envolvidos nas indústrias de
bioenergia, petroquímica e química. Será benéfico, também, para
pesquisadores que precisam entender os antecedentes de suas
pesquisas e gestores que desejam entender questões técnicas para
auxiliar a tomada de decisões no setor de biocombustíveis, visando
fomentar a sustentabilidade de suas atividades.
6

Introdução a Bioenergia
Autoria: João Vitor Rodrigues de Souza
Leitura crítica: Douglas Vieira Barboza

Objetivos
• Compreender os conceitos fundamentais a respeito
de bioenergia.

• Estabelecer critérios para a classificação de


bioenergia.

• Identificar as principais políticas públicas e aspectos


socioambientais envolvidos na produção de
bioenergia.
7

1. Conhecendo o que é a bioenergia

O interesse em energia renovável está aumentando globalmente em


resposta à crescente demanda por energia e proteção ambiental. As
concessionárias e empresas energéticas estão, portanto, buscando
novas tecnologias e novos recursos para atender a essas necessidades.

O rejeito de material biológico vivo – comumente chamado de biomassa


–tem sido usado desde
​​ o início da história para cozinhar e aquecer
espaços onde os humanos vivem e trabalham. Hoje, a biomassa tem um
papel expandido no consumo de energia global.

A bioenergia produzida a partir da biomassa é uma solução promissora


para os desafios ambientais e um impulsionador do desenvolvimento
econômico de níveis globais a locais (GOLDEMBERG; COELHO, 2004).

Para atender à demanda de bioenergia, os fornecedores de energia


devem garantir continuamente um suprimento suficiente e confiável
de biomassa a preços que lhes permitam operar de forma lucrativa. No
Brasil, de acordo com o Balanço Energético Nacional de 2021 (BRASIL,
2021), estima-se que quase 10% da oferta interna de energia elétrica
seja oriunda de biomassa (Gráfico 1)

Gráfico 1 – Matriz de energia elétrica do Brasil

Fonte: elaborado pelo autor.


8

À medida que a atenção se concentra na sustentabilidade do uso de


recursos, os produtores de biomassa (por exemplo, agricultores) devem
equilibrar as pressões do mercado para o fornecimento cada vez maior
por preços baixos com as demandas por valores fora do mercado, como
conservação do solo, proteção da qualidade da água e aumento da
biodiversidade.

Portanto, são necessárias soluções que irão reduzir os trade-offs


potenciais entre desenvolvimento econômico e conservação de recursos,
bem como a competição por recursos terrestres.

Figura 1 – Exemplo de uso de biomassa por meio da combustão de


toras de madeira para aquecimento

Fonte: Rawf8/iStock.com.

A bioenergia é uma energia renovável derivada de material biológico


recentemente vivo, ou biomassa. Fontes de fóssil carbono de energia,
como carvão e petróleo, não são fontes de bioenergia porque esses
materiais são o resultado de processos geológicos que transformaram
plantas que viveram milhares de anos atrás.

A bioenergia é uma forma de energia renovável porque a energia


contida na biomassa é a energia do sol capturada por meio de processos
9

naturais de fotossíntese. Desde que a quantidade de biomassa usada


seja igual ou menor que a quantidade que pode ser regenerada, ela é
potencialmente renovável indefinidamente. As formas de bioenergia
incluem energia, calor e combustíveis sólidos, líquidos e gasosos.

2. Produtos bioenergéticos

Os usos das várias formas de bioenergia incluem aplicações industriais,


residenciais e comerciais.

A bioeletricidade é a eletricidade gerada a partir da combustão de


biomassa, sozinha ou em combinação com carvão, gás natural ou outro
combustível (denominado co-combustão). A maioria das usinas de
energia biológica são sistemas de queima direta em que as matérias-
primas de biomassa são queimadas em uma caldeira para produzir
vapor de alta pressão, que aciona turbinas conectadas a geradores
elétricos. A eletricidade produzida pode ser distribuída para uso
industrial, residencial ou comercial (Figura 2).

O calor gerado pela combustão da biomassa também pode ser usado


para impulsionar diretamente os processos mecânicos em ambientes
industriais (Figura 2). Desafios técnicos na geração de energia biológica
envolvem qualidade da matéria-prima, química da caldeira, deposição e
descarte de cinzas. No entanto, esses desafios estão sendo resolvidos à
medida que a tecnologia avança. Segundo Hinrichs (2009), a eficiência da
caldeira de co-combustão pode ser reduzida levemente em comparação
com a eficiência da queima de 100% de matéria-prima de combustível
fóssil devido ao teor de umidade da biomassa.

Já os biocombustíveis, referem-se a combustíveis sólidos, líquidos


e gasosos. Combustíveis sólidos são normalmente usados para ​​
aquecimento ambiente por combustão. Combustíveis líquidos e gasosos
são usados para
​​ transporte e processos industriais (Figura 2).
10

Biocombustíveis líquidos e gasosos são produzidos por fermentação,


gaseificação, pirólise e torrefação, descritas a seguir. Bioetanol e biodiesel
são as principais formas de biocombustível. Os biocombustíveis produzidos
a partir de óleos, açúcares e amidos originários de safras alimentícias,
como descreve Hinrichs (2009), são conhecidos como biocombustíveis de
primeira geração. Os biocombustíveis de primeira geração são produzidos
por meio de tecnologias relativamente simples e estabelecidas. As
tecnologias de conversão ainda em desenvolvimento permitem a criação
de biocombustíveis de segunda geração, também conhecidos como
biocombustíveis avançados, que são produzidos a partir de culturas não
alimentares, como gramíneas perenes e materiais lenhosos, e as porções
não alimentares de culturas alimentares. Hinrichs (2009) afirma que
biocombustíveis de terceira geração são produzidos a partir de algas.

Figura 2 – Produtos energéticos e seus tipos de uso

Fonte: elaborada pelo autor.

A produção e o uso da bioenergia ocorrem em um contínuo de escala.


Em uma extremidade do espectro está o uso doméstico de biomassa
para aquecimento e cozimento.
11

Na seção intermediária do espectro estão vários arranjos de produção e


distribuição e tipos de organização, incluindo operações de escala mista,
cooperativas e projetos de energia distribuída de base comunitária ou
em pequena escala.

Na outra ponta do espectro de produção/uso de bioenergia estão


grandes empresas de energia que possuem os meios de produção e
conversão de biomassa, bem como os meios de distribuição de produtos
de bioenergia. Nesta extremidade da utilidade do espectro, as empresas
aproveitam as economias de escala para adquirir grandes quantidades
de biomassa, seja de suas próprias terras ou terras que alugam, ou
de fornecedores em grande escala, e então convertem a biomassa em
bioenergia para torná-la disponível para milhares de consumidores.

Existem vantagens e desvantagens associadas a diferentes escalas


de produção e uso de bioenergia. Os tomadores de decisão devem
considerar as compensações entre esses benefícios e desvantagens,
particularmente em relação aos custos e benefícios públicos.

3. Políticas públicas

Muito do interesse atual em bioenergia gira em torno de questões


de segurança energética, independência energética e oportunidades
percebidas de crescimento econômico e desenvolvimento. A segurança
energética é o acesso confiável à energia acessível. A independência
energética é a autossuficiência estadual/nacional para a produção/
fornecimento de energia.

O Brasil foi um dos pioneiros na adoção de práticas voltadas ao


uso de biocombustíveis em seus segmentos comerciais industriais.
O primeiro grande marco legal foi em 1975, com o lançamento do
Programa Nacional do Álcool (Proálcool) (BRASIL, 1975). O programa,
12

lançado como resultado dos impactos da crise do petróleo de 1973,


tinha como objetivo tornar o país menos dependente de importação de
petróleo, reduzindo a vulnerabilidade da economia brasileira a eventos
externos. O Proálcool pode ser considerado um programa pioneiro de
biocombustíveis para a produção de um combustível alternativo (etanol
hidratado), que poderia ser usado em veículos dedicados.

Outra importante política pública, lançado em 2005, foi o Programa


Brasileiro de Produção e Uso de Biodiesel (PNPB). O programa federal
foi concebido com intuito favorecer a implementação sustentável
da produção e uso de biodiesel, com foco na inclusão social e no
desenvolvimento regional, por meio da geração de emprego e renda.

O óleo diesel vendido no varejo contém um percentual de biodiesel que


compõe uma mistura de 13%, imposta pela Lei nº 11.097 / 2005 (BRASIL,
2005) e alterada pela Resolução 16, de 2018, do Conselho Nacional de
Política Energética (CNPE, 2018), que apresenta uma definição ampla
para o biodiesel, como qualquer combustível derivado de biomassa
renovável para uso em motores de ciclo Diesel.

A Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP)


especificou o diesel verde e obrigações quanto ao controle de qualidade
conforme Resolução nº 842/2021. Com isso, a regulamentação
dos biocombustíveis no ciclo Diesel passa a incorporar os avanços
tecnológicos atuais e permite a utilização de outros biocombustíveis
além do biodiesel FAME (BRASIL, 2021).

Em 2017, o Brasil instituiu a Política Brasileira de Biocombustíveis


(RENOVABIO), que criou um marco regulatório para revitalizar o setor
de biocombustíveis, estimulando ganhos de eficiência energética na
produção e uso de biocombustíveis (BRASIL, 2017). A política visa reduzir
a intensidade de carbono da matriz de combustível de transporte em
10% e evitar 620 milhões de toneladas de emissões de CO2eq de 2018
até 2030.
13

Em 2020, o Crédito de Descarbonização (CBIO), que corresponde a 1


tonelada de CO2eq evitada na atmosfera, iniciou sua comercialização
na bolsa de valores brasileira (B3). Mesmo com advento da Covid-19,
as distribuidoras de combustível atingiram 97,6% da meta estabelecida
(14,9 milhões de CBIOs), incrementando de forma inciativa suas receitas
(BRASIL, 2021).

4. Uso da terra e mudanças climáticas

As decisões sobre o uso da terra são afetadas por muitos fatores,


incluindo políticas públicas e preços de commodities agrícolas e
florestais e petróleo. A lucratividade de usos específicos da terra, os
benefícios não econômicos do uso alternativo da terra e os custos
de oportunidade associados a usos competitivos da terra também
influenciam a tomada de decisões.

Os tomadores de decisão que optam por produzir matérias-primas para


bioenergia devem considerar o uso da terra e as mudanças no uso da
terra. O uso da terra é a gestão dos recursos da terra para o benefício
econômico e inclui atividades de cultivo, manutenção e colheita,
bem como práticas de conservação. Mudança de uso da terra inclui
a conversão de ecossistemas nativos em uso agrícola (ou seja, troca
de terra), bem como a mudança de um tipo de cultura para outro (ou
mudança de um tipo de floresta para outro (GOLDEMBERG; COELHO,
2004). O uso da terra e a mudança da terra associados à produção
de matéria-prima de bioenergia podem aumentar ou diminuir os
benefícios diretos, indiretos e não financeiros dos ecossistemas nativos
e gerenciados.

Os ecossistemas nativos e os ecossistemas gerenciados fornecem


muitos benefícios que afetam indiretamente o bem-estar humano e
os meios de subsistência. A ciclagem de água e nutrientes são dois
14

exemplos dos benefícios que os ecossistemas fornecem, mas para os


quais não há valor de mercado atualmente

Gases do efeito estufa (GEEs) são gases na atmosfera que absorvem


e emitem radiação térmica em um processo conhecido como efeito
estufa, o mecanismo pelo qual a radiação solar é capturada e a terra
é aquecida na medida necessária para sustentar a vida. Os principais
GEEs são vapor d’água, dióxido de carbono, metano, óxido nitroso e
ozônio. Esses gases diferem em sua abundância na atmosfera, bem
como em seu poder de aquecimento. A ciência da mudança climática
global indica uma tendência de aquecimento geral para a Terra como
um todo em associação com os níveis crescentes de GEE. De acordo
com pesquisadores da mudança climática, as usinas, os processos
industriais e os setores de transporte são os maiores contribuintes para
as emissões anuais de GEE.

Essas contribuições são resultado do uso de combustíveis fósseis


(principalmente carvão mineral, gás natural e petróleo), que liberam o
carbono anteriormente armazenado nas moléculas dessas fontes de
energia não renováveis na
​​ atmosfera como dióxido ou monóxido de
carbono, enriquecendo, assim, o efeito estufa.

A bioenergia tem o potencial de ser neutra em carbono ao equilibrar a


quantidade de carbono liberada no uso de produtos de bioenergia com
uma quantidade equivalente colocada e armazenada em solos, tecidos
vegetais e animais ou outro material como o fundo do oceano. Ou seja,
a bioenergia é parte de um ciclo global do carbono, em que as plantas
absorvem dióxido de carbono atmosférico e o convertem em tecido
vegetal (ou seja, sequestram carbono). O carbono é liberado de volta
para a atmosfera quando a biomassa da planta é queimada diretamente
ou depois de ter sido convertida em um combustível e usada (ou seja,
emissões de carbono), e a partir daí está disponível novamente para
absorção pela planta (ou seja, sequestro). No entanto, ao adotar uma
abordagem de avaliação do ciclo de vida, a bioenergia pode ou não
15

ser neutra em carbono. A neutralidade da bioenergia em relação a


outros GEEs, como metano e óxido nitroso, também é questionável. De
importância na avaliação da neutralidade de carbono de uma safra de
bioenergia são as mudanças no uso da terra e os sistemas de produção
de matéria-prima.

A bioenergia é energia renovável derivada de material biológico


recentemente vivo, ou biomassa. As formas de bioenergia incluem
energia, calor e biocombustíveis sólidos, líquidos e gasosos. O interesse
pela bioenergia está aumentando em resposta às preocupações sobre
segurança energética, independência energética e impactos ambientais
e climáticos associados ao uso de recursos energéticos não renováveis.

Políticas, programas governamentais e pesquisas patrocinadas são os


principais motores do desenvolvimento da bioenergia. Os materiais de
biomassa, após o pré-processamento em formas adequadas para várias
tecnologias de conversão, fornecem matéria-prima para uma variedade
de produtos de bioenergia e usos finais.

A maior parte da biomassa para bioenergia vem de florestas, agricultura


e resíduos. Terras de preservação de algas e não florestais são
importantes fontes emergentes de matérias-primas para bioenergia. Os
principais tipos de matéria-prima incluem açúcares e amidos de safras e
materiais celulósicos/lignocelulósicos de florestas, agricultura, sistemas
agroflorestais e resíduos industriais e de construção.

Referências
BRASIL. Presidência da República. Decreto nº 76.593, de 14 de novembro de 1975.
Institui o Programa Nacional do Álcool e dá outras Providências. Brasília: D.O.U.,
1975. Disponível em: https://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1970-1979/
decreto-76593-14-novembro-1975-425253-publicacaooriginal-1-pe.html. Acesso em:
11 abr. 2022.
16

BRASIL. Presidência da República. Lei nº 11.097, de 13 de janeiro de 2005. Dispõe


sobre a introdução do biodiesel na matriz energética brasileira [...]. Brasília: D.O.U.,
2005. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/
l11097.htm. Acesso em: 11 abr. 2022.
BRASIL. Presidência da República. Lei nº 13.576, de 26 de dezembro de 2017.
Dispõe sobre a Política Nacional de Biocombustíveis (RenovaBio) e dá outras
providências. Brasília: D.O.U., 2017. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/
ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11097.htm. Acesso em: 11 abr. 2022.
BRASIL. CNPE. Conselho Nacional de Política Energética. Resolução nº 16, de 29 de
outubro de 2018. Dispõe sobre a elevação do percentual de mistura obrigatória no
Brasil. 2018. Disponível em: http://antigo.mme.gov.br/documents/36074/265770/
Resolucao_16_CNPE_29-10-18.pdf/03661cf7-007d-eb99-10b4-61ee59c30941. Acesso
em: 11 abr. 2022.
BRASIL. EPE. Empresa de Pesquisa Energética. Balanço Energético Nacional
2021. 2021. Disponível em: https://www.epe.gov.br/pt/publicacoes-dados-abertos/
publicacoes/balanco-energetico-nacional-2021. Acesso em: 2 jan. 2022.
GOLDEMBERG, J.; COELHO, S. T. Renewable energy – traditional biomass vs. modern
biomass. Energy Policy, v. 32, 6. ed., abr./2004.
HINRICHS, R. Energia e meio ambiente. 3. ed. São Paulo: Cengage Learning, 2009.
17

Bioenergias líquidas e suas


aplicações
Autoria: João Vitor Rodrigues de Souza
Leitura crítica: Douglas Vieira Barboza

Objetivos
• Compreender os conceitos fundamentais básicos de
bioenergia líquida.

• Identificar os principais processos de produção de


bioenergia líquida.

• Analisar os principais impactos positivos e negativos


na produção de bioenergia líquida.
18

1. Introdução a bioenergia líquida e processo


de produção

Os biocombustíveis líquidos oferecem um combustível alternativo para


todos os tipos de motores de combustão interna movidos a gasolina, diesel
ou querosene, inclusive para uso em veículos de passeio, caminhões, navios
e aviões. De acordo com dados do Balanço Energético Nacional (BRASIL,
2021), os biocombustíveis líquidos, incluindo as formas convencionais e
avançadas de etanol e biodiesel, podem representar 10% do uso de energia
do setor de transporte até 2030, mais que o triplo da participação em 2017.

Os biocombustíveis líquidos serão fundamentais para que os


sistemas de transporte, incluindo terrestre, marítimo e aéreo, sejam
mais sustentáveis (REIS; FADIGAS; CARVALHO, 2005). Esses modos
de transporte representam 20% da demanda total de energia do
transporte e são os segmentos de crescimento mais rápido do setor
de transporte. Portanto, soluções – em particular para biocombustíveis
avançados – precisarão ser desenvolvidas.

Dentre as vantagens do uso dos biocombustíveis líquidos frente


aos derivados de petróleo, destacam-se as reduções de emissões
significativas em comparação com a gasolina ou o diesel. Conforme
Andersen (2001), as reduções de emissões podem chegar a 80% em
comparação com os motores movidos a combustível fóssil.

A produção de biocombustíveis líquidos – como etanol, biodiesel e


afins –, normalmente envolve processo de várias etapas. Incialmente,
é necessário compreender que o organismo vivo (planta) apresenta
uma estrutura rígida e resistente, chamada de parede celular (que
inclui as moléculas biológicas celulose, hemicelulósica e lignina unidas
firmemente) que devem ser quebradas (SOUZA et al., 2015). Isso pode
ser feito de duas maneiras: desconstrução em alta temperatura ou
desconstrução de baixa temperatura.
19

1.1 Desconstrução em alta temperatura

A desconstrução em alta temperatura utiliza calor e pressão extremos


para decompor a biomassa sólida em intermediários líquidos ou
gasosos. Existem três rotas primárias usadas nesta via (GOLDEMBERG;
COELHO, 2004):

• Pirólise.

• Gaseificação.

• Liquefação hidrotermal.

Durante a pirólise, a biomassa é aquecida rapidamente em altas


temperaturas (500 °C – 700 °C) em um ambiente livre de oxigênio
(GOLDEMBERG; COELHO, 2004). O calor decompõe a biomassa em vapor
de pirólise, gás e carvão. Uma vez que o carvão é removido, os vapores
são resfriados e condensados em​​ um óleo líquido “bio-crude” – material
oleoso semelhante ao petróleo.

Figura 1 – Biocrude de algas pós hidrotratamento com catalisadores


metálicos

Fonte: Wang et al., (2016)

A gaseificação segue um processo ligeiramente semelhante; no entanto,


a biomassa é exposta a uma faixa de temperatura mais alta (> 700 °C)
com algum oxigênio presente para produzir gás de síntese) – uma mistura
que consiste principalmente de monóxido de carbono e hidrogênio (REIS;
FADIGAS; CARVALHO, 2005).
20

Ao trabalhar com matérias-primas úmidas, como algas, a liquefação


hidrotérmica é o processo térmico preferido. Este processo usa água
sob temperaturas moderadas (200 °C – 350 °C) e pressões elevadas para
converter biomassa em bio-petróleo líquido.

1.2 Desconstrução em baixa temperatura

A desconstrução em baixa temperatura normalmente faz uso de


catalisadores biológicos chamados enzimas ou produtos químicos para
decompor as matérias-primas em intermediários.

Primeiro, a biomassa passa por uma etapa de pré-tratamento que abre a


estrutura física das paredes celulares de plantas e algas, tornando mais
acessíveis polímeros de açúcar como celulose e hemicelulose. Esses
polímeros são, então, decompostos enzimaticamente ou quimicamente
em blocos de construção simples de açúcar durante um processo
conhecido como hidrólise (Figura 2).

Figura 2 – Representação esquemática do processo de hidrolise


sobre celulose na geração de glicose

Fonte: adaptada de Ogeda e Petrri (2010)


21

Após a desconstrução, intermediários como bio-óleos brutos, gás


de síntese, açúcares e outros blocos de construção químicos devem
ser atualizados para produzir um produto acabado. Esta etapa pode
envolver processamento biológico ou químico.

Microrganismos, como bactérias, leveduras e cianobactérias, podem


fermentar açúcar ou intermediários gasosos em misturas de combustível
e produtos químicos. Alternativamente, açúcares e outras correntes
intermediárias, como bio-óleo e gás de síntese, podem ser processados ​​
usando um catalisador para remover quaisquer compostos indesejados
ou reativos, a fim de melhorar as propriedades de armazenamento e
manuseio (HINRICHS; KLEINBACH, 2014).

Os produtos acabados da modernização podem ser combustíveis


ou bioprodutos prontos para venda no mercado comercial ou
intermediários estabilizados adequados para acabamento em uma
refinaria de petróleo ou fábrica de produtos químicos (Figura 3)

Figura 3 – Vias potenciais para produção de biocombustíveis

Fonte: adaptada de Goldenberg (2009, [s.p.]).


22

2. Processos e exemplos de biocombustíveis


líquidos

Os atuais processos de produção de biocombustíveis líquidos dependem


de caminhos de conversão de primeira geração e compreendem dois
produtos distintos: etanol e biodiesel. As políticas em todo o mundo
estimularam a demanda de biocombustíveis ao estabelecer metas e
cotas de mistura e auxiliaram seu desenvolvimento ao estabelecer
mecanismos de apoio (como subsídios e isenções fiscais no início dos
programas) (HINRICHS; KLEINBACH, 2014). 

No Brasil, os dois principais tipos de biocombustível produzido e


comercialmente utilizados são o etanol, obtido por meio de culturas
como cana-de-açúcar, e o biodiesel, produzido a partir de óleos vegetais
e/ou gorduras de animais. Nos próximos tópicos, apresentaremos uma
descrição dessas tipologias de biocombustíveis, o processo de produção
e as vantagens e desvantagens no uso de cada um.

2.1 Etanol

A produção de biocombustíveis está crescendo vigorosamente no século


21 e os Estados Unidos, juntamente com o Brasil, juntos respondem por
cerca de 70% da produção mundial, geralmente relatada como Mtep
(milhões de toneladas de teor de óleo) (BRASIL, 2022). Pensando em
uma biomassa rica em carboidratos, o etanol é a principal aplicação
atual devido à sua aplicação mundial, ou seja, é o biocombustível mais
produzido. De fato, a produção global de etanol é de 45 a 50 Mtep (mais
de 100 milhões de m³ a 25 bilhões de galões por ano). Os Estados Unidos
e o Brasil detêm a hegemonia na produção de etanol, respondendo por
quase 85% (produção mundial), utilizando milho e cana-de-açúcar como
matéria-prima, respectivamente.
23

A produção de etanol é dividida em quatro gerações diferentes: os


biocombustíveis de 1ª geração são produzidos a partir de sacarina e
amido (cana, beterraba e milho); os biocombustíveis de 2ª geração
a partir de biomassa lignocelulósica; os de 3ª geração do uso de
biomassa de micro/macroalgas; e, por fim, o 4ª geração, que produz
biocombustível a partir de cianobactérias geneticamente modificadas
por meio de um processo denominado “fotofermentação” (conversão
direta de luz e dióxido de carbono em etanol).

Figura 4 – Classificação das matérias-primas do etanol

Fonte: elaborada pelo autor.

A produção de etanol de segunda geração tem algumas vantagens


definitivas sobre a produção de etanol de primeira geração. Por
exemplo, matérias-primas de segunda geração podem crescer em terras
marginais de baixa qualidade com menos água e fertilizantes e sem
competição direta com culturas alimentares (HINRICHS; KLEINBACH,
2014).

No entanto, pode-se observar pela Figura 4 que as matérias-primas


de primeira geração possuem maior concentração de açúcar para
24

a produção de etanol em comparação com as matérias-primas de


segunda geração.

Embora as matérias-primas de etanol de segunda geração tenham


abordado alguns dos problemas associados às matérias-primas de
primeira geração, elas ainda apresentam algumas desvantagens. Por
exemplo, a produção de etanol de segunda geração requer mais custo
de capital devido ao sofisticado equipamento de processamento e
menor densidade de energia em comparação com o etanol de primeira
geração (HINRICHS; KLEINBACH, 2014). No entanto, o etanol de segunda
geração apresenta menor emissão de gases de efeito estufa (CO2 2,8 kg/
kg) em comparação com as demais matérias-primas.

No caso do Brasil, a cana-de-açúcar é a principal matéria-prima utilizada,


devido ao seu menor custo de produção em nível internacional
(GOLDEMBERG; COELHO, 2004) quando comparado às outras duas
principais culturas alternativas: milho (Estados Unidos) e beterraba
(Europa).

Dado o aumento da produtividade de açúcar e etanol por unidade de


área, ambos produzem um volume significativo de biomassa residual,
composta por bagaço, palha e espigas, que podem ser utilizadas
como combustível na geração de vapor e energia elétrica, tornando as
unidades energeticamente autossuficientes e, até mesmo, exportadores
de energia.

Um diagrama de fluxo de processo simples de produção de etanol a


partir de açúcar, amido e celulose é mostrado na Figura 5. Embora
as rotas de conversão de produção de etanol variam de acordo com
a fonte de matéria-prima, as etapas listadas são consideradas as
principais.
25

Figura 5 – Principais etapas envolvidas no processo de produção de


etanol de 1ª e 2ª Geração

Fonte: Carpio, Giordano e Secchi (2018, [s.p.]).

2.2 Biodiesel

O biodiesel é um combustível renovável, descrito como uma mistura


de ésteres monoalquílicos, principalmente ésteres metílicos, produzido
pelo processo de transesterificação, que é a reação de óleo vegetal (ou
gordura animal) com um álcool (metanol ou etanol) na presença de
um catalisador (geralmente alcalino, devido aos melhores resultados),
produzindo biodiesel e glicerol (GOLDEMBERG; COELHO, 2004). A Figura
6 ilustra o fluxo genérico da produção de biodiesel.
26

Figura 6 – Principais etapas envolvidas no processo de produção de


etanol de biodiesel

Fonte: Gonçalves, Perez e Ângelo (2009, [s.p.]).

Em 2004, o Governo Federal criou o Programa Nacional de Produção


e Uso de Biodiesel (PNPB). O objetivo do PNPB foi implementar, de
forma sustentável, em aspectos técnicos e econômicos, a produção e
uso de biodiesel e permitir inicialmente a mistura de 2% de biodiesel
(em volume) com diesel (B2) de forma voluntária. A lei federal nº
11.097 (BRASIL, 2005) foi aprovada em 2005 para estabelecer uma
meta obrigatória de 2% e 5% de adição de biodiesel ao óleo diesel em
2008 e 2013, respectivamente. Em julho de 2008, o Conselho Nacional
de Política Energética (CNPE) adotou 3% de biodiesel como mistura
obrigatória, que foi elevada para 13% (B5) em 2018 (CNPE, 2018).

Embora o PNPB vise a diversificação de oleaginosas, dados recentes


da Agência Nacional do Petróleo (ANP, 2021) mostraram que os
mecanismos utilizados tiveram pouco impacto na diversificação
27

da matéria-prima do biodiesel, com predominância da produção


de biodiesel a partir do óleo de soja. A Figura 7 ilustra as principais
matérias-primas utilizadas no Brasil para produção de biodiesel.

Figura 7 – Matérias-primas utilizadas para produção de biodiesel no


Brasil

Fonte: ANP (2021, [s.p.]).

1
Inclui óleo de palma, óleo de amendoim, óleo de nabo-forrageiro, óleo de
girassol, óleo de canola, óleo de milho, óleo de palmiste, óleo de fritura usado
e outros materiais graxos.
2
Inclui gordura bovina, gordura de frango e gordura de porco.

Por outro lado, o aumento do consumo de biodiesel de 2,7 para mais


de mais de 6 milhões de litros ao final de 2020, colocando o Brasil como
segundo produtor mundial de biodiesel, pode nos permitir considerar o
PNPB como uma conquista desse programa energético (ANP, 2021).

É importante ressaltar que a eficiência da indústria de biodiesel depende


significativamente das conquistas da extração de óleo da biomassa bruta
e da tecnologia de produção de biodiesel. As tecnologias de extração e
transesterificação enzimática e supercrítica são capazes de substituir
os métodos químicos convencionais e facilitar a produção de biodiesel
ecologicamente correta, segura e sustentável.
28

A abordagem de análise do ciclo de vida (ACV) permitirá selecionar


as condições mais adequadas com base em uma variedade de tipos
de matéria-prima, métodos de produção de biodiesel, localização
geográfica, situação social e outras características. Portanto, a produção
de biodiesel se apresenta como uma promissora oportunidade para a
humanidade obter uma fonte de energia estável, segura e renovável.

Referências
ANDERSEN, A D. Innovation systems and natural resources: The case of
sugarcane in Brazil. Copenhagen: Aalborg University, 2011.
ANP. Ministério de Minas e Energia. Agência Nacional do Petróleo. Anuário
estatístico Brasileiro do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis. 2021.
Disponível em: https://www.gov.br/anp/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/
anuario-estatistico/anuario-estatistico-2021. Acesso em: 11 abr. 2022.
BRASIL. Presidência da República. Lei nº 11.097, de 13 de janeiro de 2005. Dispõe
sobre a introdução do biodiesel na matriz energética brasileira [...]. Brasília: D.O.U.,
2005. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/
l11097.htm. Acesso em: 11 abr. 2022.
BRASIL. CNPE. Conselho Nacional de Política Energética. Resolução nº 16, de
29 de outubro de 2018. Dispõe sobre a elevação do percentual de mistura
obrigatória no Brasil. Brasília: D.O.U., 2018Disponível em: http://antigo.mme.gov.br/
documents/36074/265770/Resolucao_16_CNPE_29-10-18.pdf/03661cf7-007d-eb99-
10b4-61ee59c30941. Acesso em: 11 abr. 2022.
BRASIL. EPE. Empresa de Pesquisa Energética. Balanço Energético Nacional.
Disponível em: https://www.epe.gov.br/pt/publicacoes-dados-abertos/publicacoes/
balanco-energetico-nacional-2021. Acesso em: 2 jan. 2022.
CARPIO, R. R.; GIORDANO, R. C.; SECCHI, A. R. Modelagem, simulação e otimização
de uma biorrefinaria integrada para a produção de etanol de primeira e segunda
geração. XXII Congresso Brasileiro de Engenharia Química, v. 1 nº. 5, 4 p., 2018.
Disponível em: https://www.proceedings.blucher.com.br/article-details/modelagem-
simulao-e-otimizao-de-uma-biorrefinaria-integrada-para-a-produo-de-etanol-de-
primeira-e-segunda-gerao-29452. Acesso em: 11 abr. 2022.
GOLDEMBERG, J.; COELHO, S. T. Renewable energy—traditional biomass vs. modern
biomass. Energy Policy, v. 32, 6. ed., abr./2004.
29

GOLDEMBERG, José. Biomassa e energia. Química Nova, São Paulo, v.


32, n. 3, p. 582-587, 2009. Disponível em: https://www.scielo.br/j/qn/a/
L6Pd3ZKdPqc4pZ4TQn5RyQy/?lang=pt. Acesso em: 11 abr. 2022.
GONÇALVES, B. R. L.; PEREZ, L; ÂNGELO, A. C. D. Glicerol: uma inovadora fonte de
energia proveniente da produção de biodiesel. 2nd International Workshop |
Advances in Cleaner Production. Key Elements for a Sustainable World: Energy,
Water And Climate Change. São Paulo, 2009.
HINRICHS, R. A.; KLEINBACH, M. Energia e meio ambiente. 5. ed. São Paulo:
Cengage Learning, 2014.
OGEDA, T. L.; PETRI, D. F. S. Hidrólise Enzimática de Biomassa. Química Nova, São
Paulo, v. 33, n. 7, p. 1549-1558, 2010. Disponível em: https://www.scielo.br/j/qn/a/9n
4nqyhZ3dVtZrpHQy5thDh/?lang=pt. Acesso em: 11 abr. 2022.
REIS, L. B.; FADIGAS, E. A. A.; CARVALHO, C. E. Energia, recursos naturais e a
prática do desenvolvimento sustentável. Barueri: Manole, 2005.
SOUZA, G. M. et al. Bioenergy & Sustainability: bridging the gaps. Paris: Scope,
2015. 779p.
WANG, Z. et al. Upgrading of hydrothermal liquefaction biocrude from algae
grown in municipal wastewater. Fuel Processing Technology, v. 142, 2016,
p. 147-156. Disponível em: https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/
S0378382015302022?via%3Dihub. Acesso em: 11 abr. 2022.
30

Bioenergia sólida/gasosa e suas


aplicações
Autoria: João Vitor Rodrigues de Souza
Leitura crítica: Douglas Vieira Barboza

Objetivos
• Compreender os conceitos fundamentais básicos de
bioenergia sólida e gasosa.

• Identificar as etapas de produção de bioenergia


sólida.

• Analisar as principais fases necessárias para a


geração de bioenergia gasosa.
31

1. Introdução a bioenergia sólida

Os biocombustíveis sólidos abrangem material orgânico sólido não


fóssil de origem biológica (também conhecido como biomassa)
que pode ser usado como combustível para produção de calor ou
geração de eletricidade. Nas estatísticas de energia, biocombustíveis
sólidos é um agregado de produtos igual à soma de carvão vegetal,
lenha, resíduos e subprodutos de madeira, licor negro, bagaço de
cana, dejetos animais, outros materiais e resíduos vegetais e fração
renovável de resíduos industriais.

O fornecimento de biocombustíveis sólidos que atendam à alta


qualidade padrões está se tornando cada vez mais importante para
atender às crescentes exigências técnicas e ambientais requisitadas
para a sua utilização. O processo de conversão termoquímica é
amplamente influenciado pelas propriedades do biocombustível. Assim,
as características específicas dos respectivos combustíveis têm de ser
devidamente consideradas. Isto é: também essencial compreender o seu
impacto no processo de conversão, a fim de avaliar a sua importância e
avaliar as chances de melhorias.

A prevenção das características que tornam o uso do​​ biocombustível


desfavoráveis só será considerada se estas condições forem, de fato,
investigadas. Por isso, é importante analisar a produção (cadeia) e
identificar os principais impactos para a qualidade do biocombustível.

No geral, os fatores determinantes da qualidade do biocombustível


sólido podem ser atribuídos a duas fases principais da vida ciclo: a
fase de crescimento, na qual são desenvolvidas principalmente as
características composicionais; e a fase de abastecimento, na qual são
determinados principalmente os parâmetros físico-mecânicos (Figura 1).
Apenas parte dos fatores de influência identificados durante essas fases
podem ser quantificados (GOLDEMBERG; COELHO, 2004).
32

Tendo em vista as influências e a história do biocombustível, conforme


descrita na Figura 1, a seleção e especificação do combustível adequado
para um determinado processo é uma parte essencial da estratégia
de otimização de um conceito de uso de energia para biomassa. Tanto
a determinação direta dos parâmetros críticos de qualidade quanto a
avaliação de combustível, conhecendo as espécies e as influências ao
longo da cadeia de abastecimento, pode levar a uma boa avaliação da
aplicabilidade dos biocombustíveis.

Figura 1 – Fatores que influenciam a qualidade dos


biocombustíveis sólidos

Fonte: Manandhar et al. (2022, [s.p.]).

A especificação do biocombustível pode ser feita diretamente,


determinando os parâmetros relevantes do biocombustível, ou
indiretamente, refazendo o caminho do biocombustível até a origem e/
ou até o local/espécie que permite a avaliação. Ambas as abordagens
são discutidas a seguir.
Para o uso energético, três grupos de características são decisivos: a
composição elementar; a técnica; propriedades de combustão; e as
33

propriedades físico-mecânicas (Quadro 1). Às vezes, os dois últimos


grupos também são compilados como “parâmetros físicos”.

O máximo de parâmetros atribuídos aos três grupos são parâmetros


relevantes para a qualidade, pois, podem influenciar os termoquímicos e os
processos de formação de poluentes. Ou, ainda, eles estão determinando a
usabilidade do produto produzido, resíduos de cinzas ou escórias.

Quadro 1 – Características relevantes para a qualidade dos


biocombustíveis sólidos e seu impacto na cadeia de utilização
Parâmetro qualitativo Principal impacto.
Elemento concentrado
Carbono (C) Valor calórico, demanda de oxigênio, emissões de partículas.
Hidrogênio (H) Valor calórico, demanda de oxigênio.
Oxigênio (O) Valor calórico, demanda de oxigênio.
Potássio (k) Comportamento de amolecimento de cinzas, corrosão
em alta temperatura, emissão de partículas.
Cloro (Cl) Emissões de HCl e compostos orgânicos de halogênio.
Metais pesados Utilização de cinzas, emissões de metais
pesados, impactos catalíticos.
Propriedades de combustão
Teor de umidade Valor calórico, capacidade de armazenamento
(perdas por biodegradação, autoignição), peso do
combustível, temperatura de combustão.
Valor calorífico Conteúdo energético do combustível,
dimensionamento da instalação de combustão.
Conteúdo de cinzas Emissão de partículas, gestão e utilização de resíduos.
Propriedades físico-mecânicas
Formas e dimensões Alocação a sistemas mecânicos e tipos de fornos, propriedades
de ponte, inflamabilidade, velocidade de secagem.
Densidade aparente Esforços de armazenamento e transporte,
necessidade de energia dos motores do
transportador, volume de armazenamento.
Densidade da partícula Densidade aparente, propriedades de transporte
pneumático, propriedades de combustão
(calor específico condutividade etc.).

Fonte: Manandhar et al. (2022, [s.p.]).


34

2. Bioenergia gasosa

Os biocombustíveis utilizados na forma gasosa são comumente


chamados de biogás.

O biogás é originário de material biogênico e é um tipo de


biocombustível, normalmente referido a um gás produzido por
bactérias fermentação de material orgânico em condições anaeróbicas
(na ausência de oxigênio). Pode ser produzido a partir de uma ampla
variedade de materiais e resíduos orgânicos disponíveis, incluindo lodo
de esgoto, esterco animal e lixo orgânico municipal.

Os materiais como lixo biodegradável, palha, esterco, cana-de-açúcar


e subprodutos da agricultura e da indústria, processos e culturas
energéticas especialmente cultivadas, também podem ser usados para a
produção de energia.

A digestão anaeróbica é uma tecnologia simples amplamente utilizada


para o processamento de resíduos orgânicos biodegradáveis para
​​
a produção de biogás. O estrume animal (esterco de vaca) é usado
como inóculo, pré-tratamento do substrato. As condições termofílicas
melhoraram o rendimento do biogás, em termos de produção (volume)
em aproximadamente 92% (SOUZA et al., 2015).

A fermentação de resíduos orgânicos envolve processos biológicos e


químicos, e o processo é igualmente benéfico na gestão de resíduos.
Durante o processo, grandes polímeros orgânicos que compõem
a biomassa são divididos em moléculas por produtos químicos e
microrganismos. Sobre conclusão do processo de digestão anaeróbica,
a biomassa é convertida em biogás, (metano, dióxido de carbono e
vestígios de outros gases contaminantes), bem como digerido líquido
(fertilizante rico em nutrientes).
35

A digestão anaeróbica é um processo complexo que ocorre em


quatro etapas bioquímicas: hidrólise: acidogênese; acetogênese; e
metanogênese. Esses estágios são ilustrados na Figura 2. As etapas
de degradação individual são realizadas por diferentes consórcios de
microrganismos, que estão parcialmente em inter-relação e colocar
exigências diferentes sobre o ambiente.

Os microrganismos fermentativos e hidrolíticos são responsáveis pelo ​​


ataque inicial aos polímeros e monômeros e produzem principalmente
acetato, hidrogênio e quantidades variadas de ácidos graxos voláteis,
como o propionato. Microrganismos hidrolíticos excretam enzimas
hidrolíticas, por exemplo, celulase, celobiase, xilanase, amilase, lipase
e protease. Um complexo consórcio de microrganismos participa da
hidrólise e fermentação de matéria orgânica.

A maioria das bactérias são anaeróbios estritos, como Bacteriocidas,


Clostridia e Bifidobactérias. Além disso, alguns anaeróbios facultativos
como Enterobacteriaceae e Streptococcus também participam.

Os ácidos graxos mais voláteis são convertidos em acetato e hidrogênio


por obrigar a produção de bactérias hidrogênio-acetogênicas. O acúmulo
de hidrogênio pode inibir o metabolismo das bactérias acetogênicas. A
manutenção de uma pressão parcial extremamente baixa de hidrogênio
é essencial para as bactérias acetogênicas e produtoras de H2.

Embora muitos detalhes microbianos de redes metabólicas em um


consórcio não são claros, o conhecimento atual sugere que o hidrogênio
pode ser um substrato limitante para metanogênios (HINRICHS;
KLEINBACH, 2014).

No final da cadeia de degradação, dois grupos de bactérias


metanogênicas produzem metano a partir de acetato ou hidrogênio e
dióxido de carbono.
36

Figura 2 – Sequências metabólicas e grupos microbianos envolvidos


na digestão anaeróbia (A – Bactérias hidrolíticas e fermentativas;
B – Bactérias acetogênicas; C – Bactérias homoacetogênicas;
D – Arqueias metanogênicas hidrogenotróficas; E – Arqueias
metanogênicas acetoclásticas)

Fonte: Fuess e Garcia (2012, [s.p.])

Os quatro estágios da fermentação anaeróbica para realizar o processo


de produção de metano são discutidos a seguir.

• Hidrólise: a biomassa é normalmente composta por grandes


polímeros orgânicos proteínas, gorduras e carboidratos. Estes
são divididos em moléculas menores, como aminoácidos, ácidos
graxos e açúcares simples. É o primeiro passo essencial na
fermentação anaeróbio; bactérias fermentativas hidrolisam o
complexo matéria orgânica em moléculas solúveis. Alguns dos
37

produtos de hidrólise, incluindo hidrogênio e acetato podem ser


usados por metanógenos mais tarde no processo de digestão
anaeróbica. A maioria das moléculas, que ainda são relativamente
grandes, deve ser decomposta no processo de acidogênese para
que possam ser usados para
​​ criar metano.

• Acidogênese: é o próximo passo da digestão anaeróbica


quando microrganismos acidogênicos decompõem ainda mais
a biomassa e produtos orgânicos após hidrólise. Essas bactérias
fermentadoras produzem um ambiente ácido no tanque digestivo
enquanto cria amônia, H2, CO2, H2S, gorduras voláteis mais
curtas ácidos e ácidos orgânicos, bem como vestígios de outros
subprodutos. Os principais ácidos produzidos são o ácido acético,
ácido propiônico, ácido butírico etc.

• Acetogênese: em geral, a acetogênese é a criação de acetato, um


derivado do ácido acético, a partir de fontes de carbono e energia
por acetogênios. Esses microrganismos catabolizam muitos dos
produtos criados na acidogênese em ácido acético, CO2 e H2.
Os acetogênios decompõem a biomassa até um ponto em que
metanogênicos podem utilizar grande parte do material restante
para criar metano.

• Metanogênese: constitui o estágio final do processo de digestão


anaeróbio, na qual metanogênicos criam o gás metano a partir dos
produtos finais da acetogênese, bem como de alguns dos produtos
intermediários da hidrólise e da acidogênese. Existem duas vias
gerais envolvendo o uso de ácido acético e dióxido de carbono,
para criar metano em metanogênese:

CO2 + 4H2 → CH4 + 2H2O

CH3COOH → CH4 + CO2


38

Enquanto o CO2 pode ser convertido em metano e água a partir da


reação, o principal mecanismo para criar metano na metanogênese é a
via que envolve o ácido acético. Isto leva à geração de metano e CO2, os
dois principais produtos da digestão anaeróbica.

Com a decomposição de materiais orgânicos ou biológicos vários gases


são liberados. A decomposição orgânica pode ocorrer em duas vias
básicas: aeróbica (na presença de oxigênio), e decomposição anaeróbica
(na ausência de oxigênio).

No entanto, os produtos de decomposição são bastante diferentes


em cada caso. Decomposição aeróbica (fermentação) produz dióxido
de carbono, amônia e alguns outros gases em pequenas quantidades,
quantidade significativa de calor e um produto que pode ser usado
como fertilizante. anaeróbico.

A decomposição produz metano, dióxido de carbono e vestígios de


outros gases, muito pouco calor e um produto final com maior teor de
nitrogênio do que é produzido pela fermentação aeróbica.

A decomposição anaeróbica é um processo que envolvem um consórcio


microbiano específico, que se alimentam de certos materiais orgânicos.
Na primeira etapa, bactérias ácidas desmantelam as moléculas
orgânicas complexas em peptídeos, glicerol, álcool e os açúcares mais
simples. Quando estes compostos são produzidos em quantidades
suficientes, um segundo tipo de bactéria começa a converter estes mais
simples compostos em metano.

Essas bactérias produtoras de metano são particularmente influenciadas


pelas condições ambientais, que podem retardar ou encerrar o processo
se não estiverem dentro de uma banda bastante estreita. O Quadro 2
apresenta uma síntese dos principais compostos obtidos ao longo do
processo de produção de biogás.
39

Quadro 2 – Composição média do biogás


Composto Porcentagem por volume
Metano (CH4) 50 – 60
Dióxido de Carbono (CO2) 15 – 50
Nitrogênio (N2) 0 – 10
Hidrogênio (H) 0–1
Sulfato de
0 – 0,5
Hidrogênio (H2S)
Oxigênio (O2) 0–3

Fonte: Souza et al. (2015).

A digestão anaeróbica é mais comumente usada para converter material


orgânico em biogás a partir de alto teor de umidade resíduos orgânicos
como estrume (animal e humano) e culturas resíduos.

O tempo médio de retenção de dejetos animais é 20 a 40 dias e para


resíduos orgânicos é de 60 a 90 dias (SOUZA et al., 2015). O biogás
resultante contém de 55 a 80% de metano, dependendo do tipo de
resíduo. A quantidade dos compostos pode variar significativamente,
como apresentado no Quadro 2.

Referências
FUESS, L. T; GARCIA, M, L. Qual o valor da vinhaça? Mitigação de impacto
ambiental e recuperação de energia por meio da digestão anaeróbia – São Paulo:
Cultura Acadêmica: Universidade Estadual Paulista, 2012.
GOLDEMBERG, J.; COELHO, S. T. Renewable energy—traditional biomass vs. modern
biomass. Energy Policy, v. 32, 6. ed., abr./2004.
HINRICHS, R. A.; KLEINBACH, M. Energia e meio ambiente. São Paulo: Cengage
Learning, 2014.
MANANDHAR, A. et al. Solid biofuels. In: Biomass, Biofuels, Biochemicals Green-
Economy: Systems Analysis for Sustainability. 2022. p. 343-370.
SOUZA, G. M. et al. Bioenergy & Sustainability: bridging the gaps. Paris: Scope,
2015.
40

Sustentabilidade socioeconômica
e ambiental da bioenergia
Autoria: João Vitor Rodrigues de Souza
Leitura crítica: Douglas Vieira Barboza

Objetivos
• Compreender os conceitos fundamentais de
sustentabilidade energética.

• Identificar os aspectos sociais, econômicos e


ambientais envoltos a bioenergia

• Identificar a importância e aplicação da


sustentabilidade energética por meio da bioenergia.
41

1. Conceito de sustentabilidade energia

O mundo tem ao todo 193 países. Cada um deles têm diferentes


necessidades de energia devido a variações nas restrições
ambientais, econômicas, sociais e políticas, que influenciam os perfis
de demanda e as capacidades de geração. Assim, essas restrições
determinam as prioridades de desenvolvimento e implementação de
políticas para consumo, geração e distribuição de energia sustentável.

De acordo com Andersen (2011), um futuro energético sustentável


prevê a disseminação de serviços de energia para atingir populações
desfavorecidas, a prática de estratégia de precificação racional
e ações de reforma estrutural para garantir a facilitação e o
financiamento da transferência de tecnologia. O componente
social da energia sustentável pode ser expandido para abranger o
envolvimento da comunidade, acessibilidade, aceitação social, estilos
de vida e estética.

A sustentabilidade requer que as quatro vertentes – econômica,


política, social cultural e ambiental – sejam consideradas igualmente
importantes. Portanto, os recursos energéticos sustentáveis devem
​​
ser economicamente viáveis, politicamente apoiados, socialmente
equitativos, culturalmente identificado e ambientalmente aceitáveis
(Figura 1). 

Neste sentido, pode-se admitir que o conceito de energia sustentável


envolve qualquer recurso energético economicamente viável
(não apenas eletricidade) que não seja, em seu ciclo de vida, um
contribuinte líquido para as mudanças climáticas e que não tenha
um impacto ambiental ou social substancialmente negativo (real ou
potencial) (GOLDEMBERG; COELHO, 2004).
42

Figura 1 – Dimensões da sustentabilidade energética

Fonte: elaborada pelo autor.

A energia sustentável requer uma composição equilibrada entre


segurança energética, desenvolvimento econômico e proteção
ambiental. De acordo com Hinrichs (2009), abrange os sistemas de
energia, que se baseiam em três dimensões centrais: segurança
energética: equidade social; e mitigação do impacto ambiental. Um
grande componente disso seria a incorporação de energia renovável na
matriz energética existente, mas não elimina o uso eficiente de fontes
convencionais para garantir a segurança energética sustentável. O
termo também leva em conta as questões de criação de um mercado
interno de energia e coordenação da colaboração internacional, que por
si só constitui os esforços de gestão eficiente do consumo de energia e
distribuição de energia.

Enquanto isso, a política é descrita como um conjunto de decisões para


uma abordagem a longo prazo para um determinado problema, que em
âmbitos governamentais geralmente são incorporados em legislação
43

e ações reais e direcionadas para atingir seus objetivos. Portanto, para


os propósitos desta revisão, a política energética sustentável pode ser
entendida como um conjunto de decisões, que incentivam investimentos
do setor privado, apresentam casos de negócios claros para suas
estratégias e são desenvolvidas de forma participativa, transparente
e responsável, para alcançar práticas de uso, geração e distribuição
de energia que sejam economicamente viáveis, ambientalmente
responsáveis ​​e socialmente aceitáveis ​​a longo prazo.

O futuro da gestão da energia é, dessa forma, uma evidente necessidade


de abrandar a exploração dos recursos não renováveis, de utilizar a
energia de forma eficiente e de sensibilizar todos os utilizadores de
energia para a necessidade de se adaptarem à nova forma de fazer
negócios e pensamento.

2. Aspectos socioeconômicos e ambientais da


bioenergia

A importância das energias renováveis é


​​ reconhecida como uma
alternativa ao estoque limitado de combustíveis fósseis. Como uma das
principais energias renováveis em
​​ potencial, a demanda por bioenergia
está aumentando globalmente. Assim como outras energias renováveis,
a bioenergia também tem impactos socioeconômicos e ambientais.

As questões e impactos críticos da produção de bioenergia de


aspectos socioeconômicos e ambientais incluem o uso da terra para
a bioenergia e a competição desta com a produção de alimentos,
impacto na segurança alimentar, geração de empregos, comércio de
biocombustíveis, emissão de gases de efeito estufa e impactos na
água e na biodiversidade. Esses e outros tópicos serão discutidos a
seguir.
44

2.1 Aspectos socioeconômicos

Embora a bioenergia seja considerada um tipo versátil de energia


renovável, a produção em larga escala a partir de biomassa é sempre
alvo de críticas, pois requer grandes faixas de terras agricultáveis para
​​
o plantio de bioenergia. Portanto, há um conflito de interesses direto
entre a produção de alimentos e de biocombustíveis nas sociedades em
questão.

As considerações socioeconômicas são influenciadas principalmente


pelas estruturas locais e regionais (sociais e econômicas) das nações
envolvidas, incluindo o nível educacional, aspectos culturais e políticas,
incluindo metas ambientais e sociais.

O primeiro passo em qualquer projeto sempre diz respeito à avaliação


dos custos e das receitas esperadas. Os projetos de bioenergia sempre
precisam produzir energia de maneira econômica em comparação com
outros métodos convencionais de produção de energia. Em alguns
casos, a bioenergia pode ser realizada apesar do fato de que outras
opções parecem, em curto prazo, ser mais lucrativas, devido ao declínio
das matérias-primas ou por causa de maiores benefícios sociais ou
ambientais que levarão a maiores contribuições governamentais.

Os projetos de bioenergia afetam as comunidades em que são


implementados de várias maneiras. Isso pode ir desde a melhoria
da qualidade da água até a criação de novos empregos em regiões
economicamente deprimidas.

Alguns usos da bioenergia requerem uma matéria-prima baseada na


produção de campo dedicada (como culturas energéticas) ou resíduos da
produção agrícola. Alguns campos agrícolas são marginais para a produção
de alimentos e a produção de bioenergia poderia melhorar essas terras
marginais. No entanto, em alguns casos, a produção de culturas energéticas
pode ter um efeito prejudicial na segurança alimentar.
45

Um bom exemplo dos impactos sociais da bioenergia diz respeito ao


etanol de milho e ao aumento do preço do petróleo. Como o milho
é uma cultura intensiva em energia e requer o uso de combustíveis
fósseis, um aumento no custo do barril de petróleo também aumenta
os custos de produção relacionados à produção de milho. Ao mesmo
tempo, esse aumento nos preços do petróleo aumenta os lucros que um
agricultor pode obter com a produção de etanol de milho. Em condições
competitivas de mercado, o aumento do preço do petróleo limita a
oferta de insumos agrícolas e favorece a transformação da oferta de
milho em etanol de milho. Essas consequências limitam a oferta de
milho para consumo animal e humano e podem afetar os preços globais
do milho, tornando-o um produto menos acessível.

2.2 Aspectos ambientais

Embora a bioenergia seja projetada para ser de grande importância para


a segurança energética, a expansão da produção de matérias-primas
bioenergéticas pode causar algumas alterações ambientais adversas.

Os aspectos ambientais envolvidos na produção da bioenergia envolvem


impactos relacionados a diferentes variáveis, incluindo recursos hídricos,
emissões de gases de efeito estufa, processos erosivos e biodiversidade.
A seguir, cada um deles será detalhado.

2.2.1 Recursos hídricos

Os efeitos da produção de bioenergia na quantidade de água podem


se dar, principalmente, por meio do consumo potencial de água das
culturas bioenergéticas e da conversão do uso da terra. Por exemplo,
a ampla expansão da produção de etanol de milho (biocombustível
de primeira geração) nos Estados Unidos, foi projetada para gerar
potencial estresse hídrico em escala regional e local (HOEKMAN; BROCH;
46

LIU, 2018). O Gráfico 1 apresenta a pegada hídrica para determinadas


culturas utilizadas para a produção do etanol.

Outra preocupação significativa ocorre, também, com a qualidade da


água em relação ao aumento do cultivo de culturas bioenergéticas é
a poluição por nutrientes resultante do escoamento superficial e da
infiltração nas águas subterrâneas. A fonte poluente mais importante
da poluição por nutrientes é o nitrato. O milho, por exemplo, tem o
maior uso de fertilizantes e baixa eficiência no uso de nutrientes em
comparação com outras culturas bioenergéticas. Portanto, aumentar a
frequência de plantio de milho no sistema de rotação de milho e soja ou
substituí-lo por milho contínuo levaria significativamente a mais nitrato
para os cursos d’água e diminuiria o teor de nitrogênio do solo.

Gráfico 1 – Média da pegada hídrica média global total para culturas


que fornecem eletricidade a partir do etanol (m³/GJ)

Fonte: Gerbens-Leenes, Hoekstra e van der Meer (2009, [s.p.]).

Outro potencial impacto relacionado é o aumento da carga de nutrientes


aportados nos recursos hídricos. Dado a necessidade de cultivo em larga
escala, os nutrientes são essenciais no cultivo das espécies produtoras
de biodiesel. Por outro lado, o uso desenfreado pode contribuir de
47

forma significativa para o carreamento desses nutrientes até os recursos


hídricos, gerando fenômenos como a eutrofização.

A eutrofização é a perturbação dos ecossistemas aquáticos com excesso


de nutrientes ou um ecossistema prejudicado, levando à proliferação
de algas e eventos anóxicos. Grandes mudanças ecológicas nos lagos
podem afetar o abastecimento de água, a pesca, a produtividade das
pastagens, bem como outros serviços ecossistêmicos (SOUZA et al.,
2015).

2.2.2 Emissões de gases de efeito estufa

A redução das emissões de GEE é um dos termos mais importantes


considerados na produção de bioenergia. Entre os GEE’s, o dióxido de
carbono (CO2) e o óxido nitroso (N2O) são dois componentes primários
devido à sua grande quantidade e múltiplas abordagens de produção.

Teoricamente, as emissões líquidas de CO2 resultantes do uso direto de


biocombustíveis são muito menores do que a utilização de combustível
fóssil, o que foi comprovado por muitos estudos (SOUZA et al., 2015).

No entanto, os efeitos indiretos da produção de bioenergia nas emissões


de CO2 também são preocupações importantes, como a perturbação das
emissões de CO2 devido às transições de uso da terra (GOLDEMBERG;
COELHO, 2004). Estudos recentes envolvendo avaliação dos impactos
potenciais dos biocombustíveis afirmaram que as transições de terras de
culturas arvenses para bioenergia de segunda geração podem resultar
em ligeira redução das emissões de CO2 e a conversão de terras de
pastagens nativas para culturas bioenergéticas de primeira geração
(SOUZA et al., 2015). Portanto, é necessário e significativo considerar os
tipos de cultivos bioenergéticos apropriados e as práticas de manejo ao
considerar a mitigação das emissões de CO2.
48

Comparado ao CO2, o N2O é outro importante gás de efeito estufa


devido ao seu grande potencial de aquecimento global (298 vezes
maior que o CO2), sendo a agricultura a maior produtora desse gás.
Semelhantemente à emissão de CO2, as transições terrestres são os
principais fatores que influenciam as emissões de N2O.

A expansão do milho, impulsionada pela demanda por etanol, por


exemplo, pode estimular a emissão de N2O. A cultura do milho
necessita de muito mais fertilizante em comparação a outras culturas
(como a cana-de-açúcar, principal matéria-prima do etanol brasileiro)
principalmente o fertilizante nitrogenado, que é o substrato para o
processo de desnitrificação do solo, agravando diretamente a emissão
de N2O. Portanto, a escolha razoável do tipo de usina de bioenergia
e dos locais de plantio também é muito importante no controle da
emissão de N2O.

2.2.3 Processos erosivos

A erosão do solo, um problema muito comum, mas grave, também é um


grande ponto de preocupação na produção de bioenergia, pois reduz a
qualidade do solo e, portanto, reduz a produtividade dos ecossistemas
naturais e agrícolas. A erosão do solo também é desencadeada em três
vias principais – a expansão da área plantada, remoção de resíduos e
mudança no uso da terra.

A expansão da área plantada se dá devido à crescente demanda por


etanol pode ter sérias consequências adversas na retenção do solo
devido ao seu espaço de plantio relativamente mais solto. Estima-se que
os benefícios das medidas de conservação na retenção do solo seriam
diminuídos ainda mais se o cultivo aumentasse nessas terras.

O resíduo de cultura deixado na superfície do solo pode amortecer


as forças erosivas do vento e da água. Assim, a colheita de resíduos
de cultura pode aumentar o risco de erosão devido à menor proteção
49

física da superfície do solo levando a perdas de nutrientes, o que pode


corroborar para o fenômeno conhecido como Dust Bowl.

Figura 2 – Tempestade de areia – fenômeno Dust Bowl

Fonte: Susan Vineyard/iStock.com.br.

O Dust Bowl foi um período de severas tempestades de poeira que


prejudicaram muito a ecologia e a agricultura das pradarias americanas
e canadenses durante a década de 1930. A seca severa e a falta de
aplicação de métodos agrícolas de sequeiro para evitar os processos
eólicos (erosão eólica) causaram o fenômeno. Apesar de datado de
um período recente, registros semelhantes deste evento têm sido
observados em outras partes do mundo, incluindo o Brasil.

2.2.4 Biodiversidade

A biodiversidade é um indicador-chave relacionado à produção de


alimentos e serviços ecossistêmicos (QIN et al., 2018). O impacto da
produção de biocombustíveis na biodiversidade depende da condição
inicial de uso da terra, do tipo de sistema de produção de bioenergia e
da configuração da paisagem (SOUZA et al., 2015).
50

A conversão do uso da terra é o fator mais importante que afeta a


abundância biológica a partir da mudança direta das condições de uso
da terra e do sistema de produção, que também depende do tipo de
planta e dos locais de plantio. 

Gráfico 2 – Evolução da produção de cana-de-açúcar e de outras


culturas em Ribeirão Preto (SP)

Fonte: Vicente, Zullo e Aidar (2013, [s.p.]).

Em comparação com o combustível fóssil convencional, a bioenergia


apresenta vantagens óbvias devido à sua capacidade de renovação e
grande quantidade, desempenhando, assim, um papel crucial na defesa
da segurança energética. No entanto, o desenvolvimento da bioenergia
pode potencialmente causar sérias alterações ambientais, que ainda não
estão claras.

Neste contexto, cada vez mais atenção está sendo dada e deverá
continuar sendo dada à proteção ambiental como o desenvolvimento da
bioenergia, e entre os termos que influenciam a produção de bioenergia.

Embora possa-se reconhecer que a produção de bioenergia pode, de


fato, exercer efeitos negativos sobre o meio ambiente, sociedade e
economia, os impactos adversos variaram muito dependendo dos tipos
de biomassa, localizações do solo, e práticas de gestão. A identificação
de locais de cultivo razoáveis, tipos de cultivos bioenergéticos
51

apropriados e práticas de manejo ideais podem ser benéficas para o


meio ambiente e o desenvolvimento sustentável da bioenergia.

Referências
ANDERSEN, A. D. Innovation systems and natural resources: The case of
sugarcane in Brazil. Copenhagen: Aalborg University, 2011.
GERBENS-LEENES, W.; HOEKSTRA, A, Y.; VAN DER MEER, T, H. The water footprint
of bioenergy. Proceedings [...], v. 106, n. 25, p. 10219-10223. 2009. Disponível em:
https://www.pnas.org/doi/full/10.1073/pnas.0812619106. Acesso em: 12 abr. 2022.
GOLDEMBERG, J.; COELHO, S. T. Renewable energy – traditional biomass vs. modern
biomass. Energy Policy, v. 32, 6. ed., abr./2004.
HINRICHS, R. Energia e meio ambiente. 3. ed. São Paulo: Cengage Learning, 2009.
HOEKMAN, S. K.; BROCH, A.; LIU, X. Environmental implications of higher ethanol
production and use in the US: a literature review. Part I—impacts on water, soil, and
air quality. Renew Sustain Energy, Rev 81, p. 3140–3158, 2018.
QIN, Z. et al. Influence of spatially dependent, modeled soil carbon emission
factors on life-cycle greenhouse gas emissions of corn and cellulosic ethanol. GCB
Bioenergy, 8(6), p. 1136–1149, 2016.
SOUZA, G. M. et al. Bioenergy & Sustainability: bridging the gaps. Paris: Scope,
2015.
52

Você também pode gostar