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Nacional de Combate à Discriminação / SEDH eSecretário de Direitos Humanos da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e
Travestis (ABGLT).Ivair Augusto Alves dos Santos - Secretário-Executivo do Conselho Nacional de Combate
àDiscriminação /SEDH – Presidência da República
No Brasil realiza-se a maior parada gay do mundo, e isso há 3 anos consecutivos. São Paulo reuniu, no último
dia 17 de junho, mais de 2 milhões e meio de pessoas em uma festa linda, marcada pelas cores do arco-íris:
símbolo universal da diversidade. Depois do Carnaval, é nossa maior festa em número de participantes.
Em todos os mais de 5.000 Municípios, há alguma entidade em defesa dos direitos humanos atenta ao tema da
livre orientação sexual. Entre os movimentos sociais existentes são estes os de maior número. A ABGLBT –
Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Transexuais e Travestis - congrega mais de 200 entidades.
Mas há mais. O programa nacional intitulado “Brasil sem Homofobia” visa a combater a violência e a
discriminação contra os homossexuais e a promover a cidadania, atentando à diversidade de gênero. Este é o
maior plano de ações governamentais já implantado e envolve todos os setores do governo em todos os níveis:
federal, estadual e municipal. O próprio governo federal, inclusive, criou um observatório - do qual tenho o
Em nível federal, há o Conselho Nacional de Combate à Discriminação, ligado à Secretaria Especial de Diretos
Humanos, e, na maioria dos 26 Estados, existem conselhos visando à implantação de políticas públicas em prol
dos direitos à identidade homossexual. O Programa Nacional DST/AIDS destaca-se como exemplo no panorama
Tudo isso leva a crer que o Brasil é o melhor dos mundos: não existe discriminação, reina o primado dos
direitos humanos, e é absoluto o respeito às diferenças. No entanto, infelizmente esta não é a realidade do
nosso País. Talvez o dado mais chocante seja o fato de não existir nenhuma lei que reconheça direito aos
parceiros do mesmo sexo. A omissão é total, mesmo sendo o Código Civil bastante recente, do ano de 2003.
Projeto de lei buscando o reconhecimento da parceria civil, do ano de 1995, nunca chegou a ser votado. As
reações são violentas. Apesar de o Brasil ser considerado um país católico, a maioria do Congresso Nacional é
formada por integrantes de igrejas evangélicas, segmento religioso que tem crescido muito, dispõe de grande
poder econômico e vem dominando até os meios de comunicação. Assim, somam-se as forças conservadoras
que impedem a aprovação de qualquer lei que busque reconhecer algum benefício à parcela da população alvo
Este obstáculo, que vem sendo visto quase como instransponível, tem levado à aprovação de algumas leis, de
alcance estadual e municipal, com medidas de repressão a atitudes homofóbicas. Porém, os avanços mais
significativos vêm sendo alcançados no âmbito do Poder Judiciário. É por intermédio das decisões judiciais que
alguns direitos são reconhecidos. No entanto, o número dessas decisões ainda é escasso.
https://mp-pe.jusbrasil.com.br/noticias/100154828/mppe-cria-
comissao-de-direitos-homoafetivos
Para o chefe do MPPE, é preciso seguir em frente e não se deixar abater pelas
adversidades. “Acredito que essa luta é grande e a sua causa, justa. Assim,
todas as vezes que a luta é grande e a causa é justa, o Universo conspira a
nosso favor. Eu me sinto honrado por ter criado a Comissão de Direito
Homoafetivo, que é integrada por pessoas honradas e comprometidas com as
causas em defesa dos direitos humanos. Quero dizer a todos e a cada um de
vocês que tenham no MPPE um parceiro importante e uma ferramenta de luta
em defesa de seus direitos”, declarou.
Entre os diversos dados apresentados, Toni Reis destacou que o Brasil foi o
quinto país no mundo a tirar o homossexualidade da lista de doenças mentais e
o ano de 1979 marca o início do Movimento LGBT brasileiro. Outras questões
como homofobia nas instituições, nas escolas, bullying e uso dos veículos de
comunicação pelo fundamentalismo religioso, também foi destacado. O
palestrante resumiu a luta do movimento em apenas uma frase: “Buscamos
simplesmente o respeito”, disse taxativo.
O vereador do Recife Jaime Asfora falou sobre a sua atuação com operador do
Direito e na Câmara de Vereadores, como um dos poucos políticos que luta pelo
respeito aos direitos dos homossexuais.
POR UM BRASIL SEM HOMOFOBIA1 Francisca de Paula de Oliveira2 RESUMO O presente artigo
tem como objetivo anal
POR UM BRASIL SEM HOMOFOBIA1 Francisca de Paula de Oliveira2 RESUMO O presente artigo
tem como objetivo analisar os processos através dos quais se estabelece relações de poder
entre o Estado e o movimento LGBT brasileiro 2004 a 2012. Procurouse compreender o
conjunto de ações que resultou na criação de um Programa de Governo intitulado “Brasil sem
Homofobia” PBSH. Desse modo, será apresentado um breve histórico do referido programa
com intuito de analisar sua inserção no campo das políticas públicas. Todavia, na interpretação
dessas ações, o delineamento das políticas LGBT será focado com considerável destaque. O
reconhecimento foi analisado com base, principalmente no referencial teórico de Fraser
(2001); assim como a dimensão da política pública foi analisada com base na contribuição
teórica e conceitual de Frey (2000). A metodologia incluiu análises de documentos oficiais,
pesquisa bibliográfica e entrevistas livres com os atores significativos sobre a temática
proposta. PALAVRAS!CHAVE Movimento LGBT; Reconhecimento; Políticas Públicas; Brasil sem
Homofobia. 1. Introdução No presente artigo analisase um conjunto de ações, focalizando o
processo de construção das demandas de reconhecimento dos direitos da população brasileira
de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais LGBT, que culminou na criação de um
Programa de Governo intitulado “Brasil sem Homofobia” PBSH. Inicialmente, expõese uma
breve contextualização histórica acerca da origem do referido programa na busca de investigar
sua inserção no âmbito das Políticas Públicas. A abordagem metodológica foi subsidiada por
meio de pesquisa bibliográfica e documental, e ainda, através de entrevistas com ativistas do
movimento LGBT brasileiro. O “Brasil sem Homofobia” – BSH é um Programa de Governo
criado em 2004, no âmbito da Secretaria Especial de Direitos Humanos, durante a primeira
gestão do governo Lula, que tinha como premissas básicas: a) Implantar em todo o território
nacional Centros de Referência em Direitos Humanos e combate à Homofobia; b) Financiar
Núcleos de Pesquisa e promoção da cidadania LGBT3 ; c) Capacitar grupos e líderes na
temática dos Direitos Humanos para o combate à Homofobia. Esse Programa de Governo, em
seu conjunto de proposições, entra na história da população LGBT como um marco simbólico
das políticas públicas, apesar da aparente instabi1 Trabalho apresentado no GT “Políticas
públicas de gênero e agenciamento: da disciplina dos corpos à inclusão e às garantias de
direitos” do V Congresso Internacional em Estudos Culturais: Gêneros, Direitos Humanos e
Ativismos. 2 Doutora em Ciências Sociais com habilitação em Sociologia; Coordenadora
Adjunta do Programa Universidade Aberta do Brasil, portaria nº. 896/2015 UNIFAP;
professora do Colegiado de Ciências Sociais – UNIFAP; Pesquisadora do grupo de estudos:
Direitos Sociais, Cultura e Cidadania; Sócia fundadora do Núcleo Interdisciplinar de Estudos em
Diversidade Sexual, Gêneros e Direitos Humanos – UFRN. 3 Lésbicas, Gays, Bissexuais,
Travestis, Transexuais. 400 lidade na consolidação da cidadania LGBT. Todavia, embora o
“Brasil Sem Homofobia” tenha sido construído numa perspectiva de política pública, percebese
que, do ponto de vista funcional, tal programa não incorporou o conjunto de instrumentos
pertinentes a ideia. O autor Klaus Frey (2000) subsidia esse debate ao disponibilizar um
aparato teórico metodológico acerca da política pública, considerando o contexto em que esta
foi gerada. Com esse propósito, Frey observa contradições inerentes às políticas públicas no
Brasil ao analisar sua aplicabilidade. Neste sentido, este autor descreve os mecanismos
constitutivos da policy cycle na medida em que dimensiona o processo de formulação,
implementação e avaliação dos impactos. Na discussão que se segue, será estabelecida uma
breve consideração sobre Direitos Humanos, visto que gestores brasileiros atribuem a tais
direitos um sentido de política pública. Essa ideia constituiu um elemento primordial, em 1996,
na primeira versão do Plano Nacional de Direitos Humanos – PNDH. Entretanto, ficou evidente
a não referência aos direitos humanos da população LGBT. Há implicitamente, em 2002, com a
segunda versão do Plano Nacional de Direitos Humanos – PNDHII, a inclusão da população
LGBT. Porém, dentre quinhentas e dezoito ações propostas, somente cinco contemplavam tal
demanda. Outro fator que antecede a criação do “Brasil Sem Homofobia” remete a
consolidação da democracia brasileira na década de 1980. Ao longo desta década, o Estado
Brasileiro propunha assegurar e proteger os direitos dos Cidadãos. Assim, em virtude da
possibilidade do exercício pleno da cidadania, ecoaram, no Congresso Federal, vozes em favor
do reconhecimento dos direitos dessa população. Sobre essa questão, vale ressaltar a
tentativa de incluir, no texto constitucional de 1988, os termos, “orientação sexual” e
“identidade de gênero” (CARRARA, 2010, p. 134), que também foi frustrada. Entretanto, do
ponto de vista convencional, a materialização de diálogo entre movimento LGBT e governo
brasileiro se deu mediante a instalação de Conselhos. Através destes, foram firmadas
prioridades para compor a agenda de governo. Mas, somente em dezembro de 2010 ocorreu a
criação do Conselho Nacional de Combate a Discriminação e Promoção dos Direitos de
Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais – CNCD/LGBT (Decreto nº 7.388). Assim,
ficou assegurada a essa população a participação política. 2. Análise do “Brasil Sem
Homofobia” na perspectiva da teoria do reconhecimento Focalizando o “Brasil Sem
Homofobia”, que culminou no reconhecimento dos direitos LGBT, esta análise pode ser
embasada na contribuição de Nancy Fraser (2001), haja vista que a noção de reconhecimento
assume relevância a partir das análises desenvolvidas por esta autora, na medida em que
pontua as diferenças no intuito de considerar, especificamente as políticas de
reconhecimento. Nessa perspectiva, a abordagem sobre reconhecimento assume uma postura
crítica no contexto contemporâneo, no qual a proliferação das diferenças reivindica o direito
de ser diferente. Portanto, como elemento central dessa abordagem, a política de
reconhecimento, tornase o objeto de estudo de Nancy Fraser. Seguidamente, pensando na
transversalidade da política exposta, enfatizase o processo que culminou no reconhecimento
político do movimento LGBT. Outra maneira de compreenGÉNERO, DIREITOS HUMANOS E
ATIVISMOS " ATAS DO V CONGRESSO INTERNACIONAL EM ESTUDOS CULTURAIS 401 der tal
transversalidade seria explicitar as múltiplas dimensões das ações sinalizadas no “Brasil Sem
Homofobia”, pois percebese que esse Programa de Governo condensou um amontoado de
ações sem uma estrutura de monitoramento e financiamento. Ainda nesse viés, é óbvio que
esse Programa de Governo disponibiliza um conjunto de ações que tangenciam, de forma
periférica, as políticas públicas. Sua abrangência incide precariamente no interior da própria
política. Além disso, não superou o foco de atuação no âmbito da homofobia, sendo este
apenas um dos inúmeros problemas enfrentados por essa população. Nesse contexto, o
Programa “Brasil Sem homofobia”, funcionou como instrumento político de monitoramento
das demandas LGBT, logo, sua importância se deve ao fato de introduzir na agenda
governamental as demandas dessa população, além de agendar e pautar tais demandas, até
então pouco visíveis ao Estado. Entendese, portanto, que esse programa promoveu o
reconhecimento político do movimento LGBT, em nível governamental. A partir do momento
que o governo Lula se compromete em combater a violência e a discriminação contras os
atores sociais autodeclarados LGBT, essa mudança de atitude política desencadeou grande
agitação, dentro e fora do movimento LGBT nacional. Ou seja, Lula ao enfatizar no PBSH o
reconhecimento das identidades LGBT no nível de governo, impactou vários setores da
sociedade brasileira. 2.1. Análise das contradições inerentes ao processo de formulação do
BSH No campo do ativismo LGBT, predominam divergências na interpretação do Programa
Brasil Sem Homofobia. Se para uns ativistas o referido Programa significa um marco
regulatório das políticas públicas LGBT, para outros tal programa não somente intimidou as
ações do movimento em questão, como também as limitou. Vale ressaltar que Julian
Rodrigues reconhece que a criação do PBSH acatou a participação cidadã da população LGBT.
Segundo este ativista, a construção do programa de governo representou uma aliança política
entre essa população e o governo do Partido do Trabalhador. Partindo dessas considerações
sobre o “Brasil Sem Homofobia”, observase uma maneira distinta de adentrar nos espaços de
participação política e assegurar os direitos que foram negados aos sujeitos LGBT. Nessa
vertente, Julian Rodrigues afirma: O grande marco foi o Brasil Sem Homofobia, porque abriu os
canais de participação e abriu as portas nos Ministérios. O problema é que o BSH não foi
institucionalizado por meio de decreto, portaria, etc. Não constou no PPA, não estava explícito
nas ações orçamentárias. Andou por boa vontade dos gestores e muita sintonia política com o
movimento LGBT, sobretudo ABGLT. A I Conferência, no entanto teve OUTRO processo de
construção. Entrou outro ator de peso no cenário – o setorial LGBT do PT. Em 2006, eu
organizei a elaboração (como coordenador do setorial) do programa LGBT de Lula (construindo
um Brasil sem Homofobia). (Julian Rodrigues, entrevista concedida, via email, em 11 de
dezembro de 2012) Analisando as contradições que foram identificadas ao longo do processo
de formulação do BSH, dois aspectos são particularmente relevantes. Em primeiro lugar, o
posicionamento contraditório do Movimento LGBT com o governo. Em segundo lugar, ao abrir
espaço para POR UM BRASIL SEM HOMOFOBIA 402 negociação, traz para o centro da
discussão o conflito de interesses. Todavia, as relações de poder são permeadas de
preconceito, o que desencadeia novos conflitos. Nesse sentido, conforme indica o ativista Lula
Ramires, o Brasil Sem Homofobia não possui status de lei. Em razão disso, não pode ser visto
como o marco regulatório das políticas públicas reivindicadas pelo movimento LGBT. Dito de
outra forma, este ativista argumenta: Na minha modestíssima opinião, não vejo marco
regulatório no Brasil Sem Homofobia nem na 1ª Conferência (considerando que esta produziu
dois anos mais tarde o Plano Nacional de Combate à Homofobia), pois constituem na verdade
cartas de intenção e não possuem força legal que possa compelir o Executivo a agir
solidamente naquela direção. Fica, portanto, a critério da “sensibilidade” do gestor de plantão
dar seguimento às ações indicadas (ou “deliberadas”) ou não. Como você mesma diz, é um
pacto ou uma aliança, se quiser, mas ainda muito frágil. A meu ver, isso tem relação direta com
a enorme resistência que ainda nos deparamos no Legislativo, sobretudo nas bancadas
conservadoras e religiosas (fundamentalistas) tanto católica quanto evangélica. (Lula Ramires,
entrevista concedida em 05 de novembro de 2012) Para Justo Favaretto4 , ativista do
movimento LGBT, a união das lideranças LGBT com o governo Lula prejudicou e enfraqueceu
as reivindicações da população LGBT. Embora considere legítima a aproximação do movimento
com o governo, afirma que as propostas das políticas públicas LGBT, “na verdade ficaram no
papel”, com o agravante de que é difundida a impressão de que muita coisa foi resolvida, o
que teria influência sobre os níveis gerais de mobilização do movimento. Em sua avaliação
sobre os resultados dessa aproximação, este ativista emite o seguinte: O Projeto de Lei 122
nestes oito anos de governo Lula, “patinando”, e ele não disse uma só palavra em prol. Mas,
ele era mais simpático a causa, esteve na primeira Conferência LGBT, levantou a nossa
bandeira, o que é emblemático positivamente, assim como os feitos da Dilma o são
negativamente. (Justo Favaretto, entrevista concedida em 30 de dezembro de 2012, via
Facebook) Quando ques"onado sobre os resultados gerados pelo PBSH, o a"vista se mostrou
pessimista: Quais os resultados? Os assassinatos homofóbicos aumentam em escala
geométrica, somos campeões mundiais neste quesito! Não há resultado prático, somos
expulsos da escola pelo bullyng homofóbico. As travestis são jogadas na marginalidade devido
a isso também. Muitos jovens são expulsos de casa! E tudo para nos manter calados com uma
maquiagem sem efeito prático. (Justo Favaretto, entrevista concedida em 30 de dezembro de
2012, via Facebook). “Maquiagem sem efeito prático” é o resumo da percepção deste ativista
da relação entre o movimento LGBT e o governo Lula, mas, sobretudo, do Programa de
Governo o qual propunha combater a violência e a discriminação contra a referida população.
Porém, considerado 4 “[...] sou primeiro secretário da Organização não Governamental
Primavera de Sertãozinho (interior de SP), sou membro da comissão da diversidade sexual da
OAB, subseção sertãozinho, mas meu maior trabalho é individual, independente, sou melhor
assim” (Entrevista concedida em 30 de dezembro de 2012, via Facebook). GÉNERO, DIREITOS
HUMANOS E ATIVISMOS # ATAS DO V CONGRESSO INTERNACIONAL EM ESTUDOS CULTURAIS
403 ou não como marco regulatório, é importante deixar claro que o BSH resultou de uma
articulação efetiva entre o governo e o movimento LGBT. Os desdobramentos dessas
articulações culminaram no apoio desse movimento à campanha do então candidato a
Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva. Assim, foi selado um compromisso de
campanha, momento este em que Lula se compromete em promover a realização de
Conferências Nacionais sobre a temática das identidades de gênero e sexualidades
alternativas. Neste contexto, o papel político do movimento LGBT foi fundamental na
sensibilização do governo brasileiro para o reconhecimento da cidadania LGBT. Julian
Rodrigues comenta esse processo: Foi um compromisso público do candidato com algumas
metas importantes, entre elas a realização da I conferência LGBT. Assim, a partir do segundo
semestre de 2007, eu abri um diálogo enquanto setorial LGBT com o então Ministro Paulo
Vannuchi. Diálogo de petistas, que discutiam como avançar na execução do programa
acordado na campanha. Foi fundamental a atuação do Paulo, um aliado, um grande ministro,
sensível e competente. Depois desse diálogo inicial com o setorial, chamamos a ABGLT, ANTRA
e outras entidades para dialogar sobre a construção da Conferência. Ou seja, houve a
MEDIAÇÃO DO PARTIDO antes do diálogo direto com o movimento social. E tudo fluiu
razoavelmente bem porque a maioria dos quadros dirigentes do movimento eram afiliados ou
simpatizantes do Partido dos Trabalhadores (PT) e/ou partidos da base aliada. Assim, aos
trancos e barrancos, gestamos a histórica I Conferência Nacional, em junho de 2008, com a
presença de LULA. (Julian Rodrigues, entrevista concedida, via email em 11 de dezembro de
2012) Posteriormente, tendo situado os avanços e as limitações do BSH no conjunto de suas
de ações, que se debruçam sobre a construção da agenda governamental, o que resta é
caracterizar como se estabeleceu a relação do movimento LGBT com os gestores das políticas
públicas. De modo geral, como aponta Ivair Augusto Alves dos Santos5 , o processo que
desencadeou a construção do Programa BSH, envolveu 14 Ministérios que se comprometeram
em somar propostas. As estratégias de negociação que demandaram o protagonismo de
outros agentes da política pública podem ser entendidas de acordo com o relato de Santos:
Comecei a conversar com cada Ministério e consegui o apoio de 14. Cada um colocou no papel
o que podia e pretendia realizar e o Programa foi a soma das propostas de cada ministério.
Algumas propostas estavam muito aquém daquilo que era necessário – mas isso não era
importante no momento. Era importante estabelecer uma proposta política e governamental
com relação ao tema, e que se ampliasse para além da saúde e dos direitos humanos,
envolvendo as outras áreas. Esse trabalho conjunto provocou o primeiro documento do
governo com relação a esse tema. (Ivair Augusto Alves dos Santos, entrevista cedida ao Grupo
Dignidade. In: Uma história de Dignidade. Curitiba: Grupo Dignidade, 2008 p. 79) 5 Um dos
gestores públicos atuou como Assessor Especial da Secretaria Especial de Direitos Humanos e
como SecretárioExecutivo do Conselho Nacional de Combate à Discriminação. POR UM BRASIL
SEM HOMOFOBIA 404 Ainda segundo Ivair Santos, foi muito importante na construção do BHS
e seus desdobramentos, as experiências de entidades que compõem o movimento LGBT
nacional. É nesses termos que este gestor faz referência ao papel exercido por uma dessas
entidades: O grupo Dignidade tem essa experiência. Outro ponto foi: o governo não conhece a
temática LGBT. E nesse sentido o Dignidade foi fundamental: conciliou a competência na
abordagem e no saber conversar com o governo de forma que pudesse realizar o que
interessasse as duas partes, com tremenda objetividade. (Ivair Augusto Alves dos Santos,
entrevista cedida ao Grupo Dignidade. In: Uma história de Dignidade. Curitiba: Grupo
Dignidade, 2008 p. 79) Admirado com a base sólida sobre a qual operaram os arranjos políticos
que modelaram o PBSH, Ivair Santos ainda argumenta: Eu não vi nenhum movimento com
ação de advogacy6 como eles fizeram desse movimento. Eles conseguiram recursos para um
programa de governo. Essas emendas conseguiram implementar mudanças substanciais para a
política acontecer. E o Dignidade esteve a frente. Eu fiquei surpreso, e com a rapidez. O que
eles fizeram ninguém mais fez. Com a qualidade do que foi feita foi impressionante. (Ivair
Augusto Alves dos Santos, entrevista cedida ao Grupo Dignidade. In: Uma história de
Dignidade. Curitiba: Grupo Dignidade, 2008 p. 79) 3. Considerações sobre os desafios para
pensar a política pública LGBT Considerando o cenário político atual, no qual se instala a
letargia dos três poderes Legislativo, Judiciário, Executivo7 , o Movimento LGBT procura
superar o retrocesso das negociações firmadas na gestão de Lula. As relações desiguais de
poder, nesta perspectiva, emergem como mais um desafio que tem potencial para balançar as
bases desse movimento social. Retomando ainda as articulações que antecedem a origem do
BSH, o governo Lula criou o Conselho Nacional de Combate a Discriminação. Neste, reuniu
representantes da comunidade LBGT e representantes da gestão pública. Esse modelo de
gestão participativa é, concomitantemente, um campo político estruturado que tem em vista a
construção do Programa Brasil Sem Homofobia. Este programa de governo objetivou agir em
diferentes frentes, tanto em relação ao combate à violência como também na promoção de
direitos humanos em diversas áreas, tais como: saúde, educação, trabalho, cultura, juventude
e mulheres8 . Portanto, a característica da flexibilidade é que diferencia a gestão de Lula com a
gestão seguinte. Ao longo da segunda gestão do governo do presidente Luiz Inácio Lula da
Silva, foi 6 ADVOGACY: “Argumentar em defesa de uma causa ou de alguém”. (The Advanced
Learner’s Dictionary of Current English: London, Oxford University Press, 1970) In: Uma
História de Dignidade. – Curitiba: Grupo Dignidade, 2008, p. 69. 7 Gestão da Presidente Dilma
Rousseff 8 Através da Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República, o
referido programa foi lançado em 2004. Neste mesmo ano, o Ministério da Saúde publicou
uma portaria, convocando comitês técnicos para debater questões relacionadas às
necessidades dos grupos minoritários, excluídos das políticas públicas de saúde, a exemplo da
população LGBT. Assim, em agosto de 2004 institucionalizase o Comitê Técnico de Saúde LGBT,
através da Portaria 2.227, que estabelecia o compromisso de: 1º) sistematizar propostas com
vistas à política pública de saúde LGBT; 2º) promover políticas públicas de saúde para essa
população; 3º) incorporar subsídios dos movimentos sociais e das pesquisas na elaboração
dessas políticas; 4º) participar de ações com vista à saúde LGBT. GÉNERO, DIREITOS HUMANOS
E ATIVISMOS " ATAS DO V CONGRESSO INTERNACIONAL EM ESTUDOS CULTURAIS 405 notória
a participação de entidades que compõem o movimento LGBT, em várias disputas de espaços
de poder. Na dinâmica da construção de alianças entre esse movimento social e o governo,
Lula foi pioneiro no que se refere à participação dessa população como prioridade na agenda
governamental. Entretanto, é paradoxal, o recente processo de participação da cidadania na
atual gestão da Presidente Dilma, pois novas formas de representação social se revelam como
expressão permanente da diversidade e da contradição. Dito de outra forma, como pode ser
visualizado, a entrada dos sujeitos LGBT nos privilegiados espaços de disputas políticas tem
encontrado resistências por parte de grupos sociais e setores da política. Estes, por sua vez,
dificultam a abertura de espaços plurais de participação política. No entanto, é cabível
enfatizar também a coexistência de permanência dos sujeitos nos espaços de participação
política é assegurada pela Constituição Federal de 1988, muito embora esta não contemple em
seu texto, a orientação sexual entre as formas de discriminação das diferenças. Mas, mesmo
enfrentando resistência do Legislativo Federal em aprovar leis antihomofóbicas, o movimento
consegue avançar no campo de atuação das políticas de saúde, atendendo a demanda LGBT.
Sequencialmente, em 2007, ocorre o lançamento do Plano Integrado de Enfrentamento da
Feminização da Epidemia de AIDS e das DST. Este plano objetivava atender o contingente
lésbico e bissexual. Neste mesmo ano, com a realização do Seminário Nacional de Saúde da
População LGBT, foi debatida a necessidade da criação de Políticas de Saúde para abranger
todo contingente LGBT, visto que o Plano de Ação (criado em 20042007) não beneficiava esta
população. Posto isso, em se tratando de estabelecer uma síntese dos desafios enfrentados
por esse movimento social, destacase as ações do Poder Judiciário, que ao contrário de Poder
Legislativo, sai em defesa dos direitos civis e sociais das pessoas autodeclaradas homossexuais.
Dessa maneira, o Poder Judiciário devolveu a população LGBT o direito de construir uma vida
em comum, além de outros benefícios. Foram também geradas várias jurisprudências voltadas
ao reconhecimento do direito de guarda dos filhos por casais homossexuais. A atual
representante do Executivo Federal prometeu, durante a campanha eleitoral, dar continuidade
às ações de combate a homofobia. Em seu governo, as principais medidas de aproximação
dessa temática, se deram com a criação do Conselho Nacional LGBT e a realização da II
Conferência. O fortalecimento desse Conselho expressa a mobilização social que define a
relação entre as diferenças, levando em consideração a orientação sexual. Por fim, o mérito do
PBSH se deve ao fato de promover visibilidade das identidades LGBT e das batalhas travadas
em prol do reconhecimento dos direitos, dando visibilidade as contradições heteronormativas.
O Programa também conduziu e subsidiou a criação e manutenção, em todo o território
nacional, de Centros de Referências em Direitos Humanos de Combate a Homofobia. Contudo,
os múltiplos desafios postos a esse segmento social lhe são intrínsecas, com contradições e
paradoxos. Somente o esforço conjunto e a mobilização das organizações governamentais e
não governamentais poderão superar os desafios, fazendo com que as políticas sociais
atendam efetivamente a população LGBT. POR UM BRASIL SEM HOMOFOBIA 406 Referências
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