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ANA OLIVEIRA, DVM, DIP ECVD, PHD

DERMATOFITOSE CANINA E FELINA


FORMAÇÃO AVANÇADA 2021
OS AGENTES DA DERMATOFITOSE

 O Microsporum canis é o patogénio mais comum isolado em cães e gatos. Infecções por outros
dermatófitos zoofilicos também se encontram descritas: M. persicolor, M. gypseum e Trichophyton
mentagrophytes spp.
 A. vanbreuseghemii (forma sexuada) é um dermatofito zoofilico que pode afectar cães e gatos e que
pertence ao complexo Trichophyton mentagrophytes. Deve ser reportado como Trichophyton
mentagrophytes (forma assexuada). A taxonomia dos dermatófitos está em evolução contínua à
investigação com as novas técnicas moleculares de identificação genética.
 Na prática: mediante cultura, o laboratório deverá reportar os 3 géneros de dermatófitos e
eventualmente a espécie. As espécies importantes são: Microsporum spp., Trichophyton spp. e
Epidermophyton spp.
OS FUNGOS COMENSAIS DO CÃO E DO GATO

 Os dermatófitos não fazem parte da flora comensal e o seu isolamento indica presença de
infecção ou contaminação acidental da pelagem.

 As espécies Aspergillus, Alternaria, Penicillium e Cladosporium são consideradas flora comensal do


gato.

 Similar situação acontece com as espécies Alternaria e Cladosporium no caso do cão.


DERMATOFITOSE NO CÃO DE CAÇA
 Devido ao acesso ao meio rural e silvático o cão de caça está mais exposto à dermatofitose por
espécies geofílicas nomeadamente o M. gypseum. As espécies geofílicas proliferam e degradam a
queratina de pelos libertados no meio ambiente pelos animais silvestres. No geral, as espécies
geofílicas não são patogénicas.
 Os cães de caça que tenham contado com roedores ou respectivos ninhos estão mais
predispostos a contrair dermatofitose causada por Trychophyton metagrophytes.
 As lesãoes iniciais localizam-se na cabeça e/ou extremidades podais e tendem a demostrar o
local de contágio com o agente patogénico. As unhas podem estar afectadas.
 Raças de caça/trabalho: Braco Alemão, Fox Terrier, Labrador, Pastor Alemão, Jack Russel Terrier,
beagle e outras.
MODOS DE TRANSMISSÃO

 Directamente através do contato com o animal infectado – esta é a via mais importante de
transmissão do M. canis.

 A transmissão de Trycophyton mentagrophytes através do contato com roedores.

 A transmissão de M gypseum através de solo contaminado.

 A via indireta através do ambiente ou fómites contaminadas é menos frequente.

 O dermatófito produz endoproteases que digerem a queratina em aminoácidos.


COMO É A INFECÇÃO É CONTRAÍDA?

 A infecção por dermatófitos ocorre através de esporos (artrosporos) através de contacto


directo entre os animais ou através de fómites. As fómites incluem material de tosquia, camas,
mantas e eventualmente pulgas. Além dos esporos também é importante o microtrauma da
pele, pelo que, em condições experimentais é necessário a abrasão da epiderme e presença de
humidade para o desenvolvimento da infecção na pele. Por outro lado, o grooming é protector
em relação ao desenvolvimento da infecção. Em condições experimentais, o uso de colar
isabelino para evitar o grooming ajuda no estabelecimento da infecção em gatos. A infecção
estabelece-se inicialmente através da ligação do esporo com os queratinócitos seguida de
proliferação e invasão das estruturas pelas hifas.
QUAIS SÃO OS MECANISMOS DE DEFESA DO HOSPEDEIRO?

 A exposição aos esporos de dermatófitos não garante infeção, é necessário ultrapassar os


mecanismos de defesa do hospedeiro. Estes mecanismos incluem:
 remoção mecânica pelo grooming;
 microtrauma cutâneo (essencial para estabelecer infecção);
 antagonismo da flora bacteriana e fúngica comensal;
 exposição às propriedades fungistáticas dos lípidos (sebo) epidérmico;
 humidade reduzida da superfície cutânea;
 imunidade do hospedeiro.
QUAL É O PAPEL DO SISTEMA IMUNITÁRIO

 O estabelecimento de infecção por um dermatófito depende de vários fatores


nomeadamente a resposta imunitária. As espécies de dermatófitos mais bem adaptadas ao
hospedeiro induzem a uma resposta imunitária mais ligeira o que se traduz em menor
inflamação. O M. canis é o dermatófito mais bem adaptado ao cão e ao gato.

 A resposta imune é tipo celular Th1 e com produção de anticorpos. A imunidade celular é a
mais importante na cura e normalmente confere proteção (imunidade adquirida).
QUAIS OS FACTORES QUE INFLUENCIAM O QUADRO LESIONAL DA
DERMATOFITOSE?

 A prevalência é baixa em clinica.


 Variações na apresentação clínica e severidade estão relacionadas com o estado geral, idade,
raça e ambiente do animal.
 Os gatinhos e cachorros são mais predispostos, tal como, animais com acesso ao exterior e
que vivem em climas quentes.
 Na maioria dos animais imunocompetentes a dermatofitose pode resolver espontaneamente.
DERMATOFITOSE E COMORBILIDADES

 Infecções virais seropositivas FIV e FeLV não são factores de predisposição para o
desenvolvimento de dermatofitose. No entanto, o gato que esteja clinicamente sintomático
com retroviroses é mais susceptível ao desenvolvimento de dermatofitose.

 O tratamento com GC no gato não é um factor de predisposição para desenvolvimento de


dermatofitose.

 No caso do cão é importante descartar demodicose concomitante e doenças sistémicas (S.


Cushing, diabetes, leishmaniose e erlichiose entre outras).
HISTÓRIA PREGRESSA

 Na história pregressa existem alguns dados que podem levar o MV a suspeitar de


dermatofitose. A introdução de um gatinho no agregado familiar é a situação mais comum.
Idas à caça ou passeios em ambientes silváticos são outros dados que podem levar a
suspeitar desta doença. Finalmente, a administração de medicamentos que interfiram com a
imunidade ou de certas doenças como hiperadrenocorticismo devem considerados durante
a história pregressa.
EXISTEM 3 QUADROS CLÍNICOS:

 Quadro clinico clássico

 Quadro clínico atípico

 Portador assintomático
QUADRO CLÍNICO CLÁSSICO
 As lesões aparecem entre 1 a 3 semanas após infecção. O dermatófito invade tecidos
queratinizados: alopecia, descamação e “folicular plugging”. As unhas desenvolvem alterações da
parede e consequente fragilidade.

 Apresentação clínica: áreas circulares de alopécia com tracção facilitada da pelagem. A áreas de
alopecia podem estar associadas a seborreia ligeira, eritema e pápulas. O desenvolvimento das
pápulas e do eritema é uma consequência da resposta imunitária. A hiperpigmentação é uma
lesão secundária que surge posteriormente.

 Tipicamente o desenvolvimento das lesões é assimétrico. Nos gatos, comumente envolve a


cabeça e pavilhões auriculares e posteriormente progride para as extremidades podais e
outras áreas do corpo.
 O padrão generalizado e multifocal está associado a doenças sistémicas (ex: Yorkshire Terrier
com hiperarenocorticismo).
 Em regra, o prurido está ausente mas poderá manifestar em alguns casos.
EXISTEM 3 QUADROS CLÍNICOS:

Quadros clínicos atípicos:


 Quadro clinico clássico
 Kerion
 Pseudomycetoma
 Quadro clínico atípico  Dermatose simétrica pustulo-crostosa com envolvimento
facial
 Paronichia exsudativa
 Portador assintomático  Dermatose exfoliativa generalizada e outros quadros
lesionais em gatos.
PORQUE RAZÃO EXISTEM QUADROS CLÍNICOS ATÍPICOS?

 Nos quadro clínicos atípicos pode estar envolvido o M. canis ou outras espécies de
dermatófito: M. gypseum, M. persicolor e Trychophyton mentagrophytes.

 Em comparação com o M. canis estas espécies estão menos adaptadas ao hospedeiro levando
a uma interação diferenciada com o sistema imunitário. Desta interação resulta uma maior
diversidade de lesões e que podem oscilar entre um grau ligeiro a severo.
QUADRO CLÍNICO ATÍPICO: KERION

 Mais comum no cão.


 Nos kerions existe formação tipo nodular, circular, eritematosa e alopécica. Em alguns casos pode
haver exsudação e pequenas fistulas. A lesão pode ser única ou existirem várias no mesmo
paciente. Mais comumente aparece na cabeça e membros.
 L. Wood variável.
 Na biópsia verifica-se furunculose com presença de fragmentos de pelos com esporos em lesão
tipo furunculose.
 O kerion não é um pseudomicetoma.
 O kerion tem um bom prognóstico e responde bem ao tratamento tópico e oral e não tende a
recidivar.
QUADRO CLÍNICO ATÍPICO: PSEUDOMICETOMA
 O pseudomicetoma apresenta-se sob a forma de nódulos, eritematosos, alopécicos e fístulados. O exsudado
é purulento ou purulento-hemorrágico e pode conter grânulos. Existe infecção subcutânea e reacção
inflamatória muito exuberante. A maioria das vezes é causado por M. canis. Pode haver um ou mais nódulos
e a sua localização é variável. O pseudomicetoma é praticamente somente reportado em Persas e Yorkshires
Terries. Raramente também reportada em outras raças de gatos de pelos compridos.

 Nota: o pseudomicetoma é causado por um dermatófito; o micetoma é causado por um fungo não
dermatófito ou por uma bactéria (ex: Nocardia ou Actinomycetes). A apresentação clínica do micetoma e do
pseudomicetomas é similar com tumefecção, fistulação e exudação que pode conter grânulos. Existem vários
tipos de micetomas conforme o agente causal.
QUADRO CLÍNICO ATÍPICO: PSEUDOMICETOMA

 O diagnóstico é feito por biópsia ou citologia do exsudado (frequentemente positivo com


presença de hifas e esporos). As biopsias devem ser submetidas para histopatologia com
coloração especial para fungos e para cultura tecidular para permitir identificar a espécie de
dermatófito.

 A maioria das vezes a L Wood é negativa.

 O tratamento passa por medicação sistémica e excisão cirúrgica.

 Prognóstico: reservado. As recidivas frequentes podem levar à eutanásia.


QUADROS CLÍNICOS ATÍPICOS: DERMATOSE PUSTULAR SIMÉTRICA
E COM ENVOLVIMENTO FACIAL

 A presença de pústulas é rara na dermatofitose e pode ser confundida com pênfigo foliáceo.
A produção de proteases pelo dermatófito leva à libertação dos acantócitos que podem ser
visualizados nas citologias.

 A dermatofitose deve ser um diferencial em casos de suspeita de pênfigo foliáceo.

 Existe envolvimento da cabeça.

 Existe presença de pústulas e crostas. Além da pele também pode haver envolvimento do
plano nasal, almofadas plantares e unhas.
QUADROS CLÍNICOS ATÍPICOS: PARONICHIA EXSUDATIVA

 Em cães pode somente haver envolvimento de uma ou mais unhas com produção de
exsudado purulento e crostoso na base da unha. O envolvimento da unhas sugere zona de
contágio inicial com o dermatófito. Pode ser causado por M. canis outras espécies e pode
estar associada ao cão de caça/trabalho em meio rural.
QUADROS CLÍNICOS ATÍPICOS EM GATOS

 Em gatos, considerar sempre dermatofitose como diagnóstico diferencial em casos de


pododermatite ou dermatose exfoliativa generalizada. Considerar também em casos de
placa eosinofílica, dermatite miliar e seborreia generalizada.
EXISTEM 3 QUADROS CLÍNICOS:

Quadros clínicos atípicos:


 Quadro clinico clássico
 Kerion
 Pseudomycetoma
 Quadro clínico atípico  Dermatose simétrica pustulo-crostosa com envolvimento
facial
 Paronichia exsudativa
 Portador assintomático  Dermatose exfoliativa generalizada e outros quadros
lesionais em gatos.
PORTADOR ASSINTOMÁTICO

 A infeção pode não resultar em sinais clínicos, sendo que os gatos podem ser portadores por
longos períodos de tempo. A única espécie identificada em portadores é o M. canis.
 Os gatos mais frequentemente implicados como portadores são os gatos persas.
 O estado de portador demonstra um equilíbrio entre o hospedeiro e o sistema imunitário. No
entanto, o gato portador transmite a doença a outros animais e pessoas e é uma fonte
constante de contaminação ambiental.
 Normalmente, a suspeita inicial devido ao desenvolvimento de lesões em outros animais ou
pessoas após aquisição de um novo gato.
 No caso de suspeita de portador deve ser feito lâmpada de Wood e cultura fúngica devendo o
material ser recolhido pela técnica da escova dos dentes.
DEFINIR O TIPO DE INFEÇÃO AJUDA A DEFINIR O TRATAMENTO
 Infecção simples
 Animal saudável
 Quadro clinico tipo clássico ou kerion.
 Boa e rápida resposta ao tratamento ou remissão espontânea.

 Infecção complicada
 Existe(s) outra(s) patologia(s) concomitante (s) ou existir fatores intrisecos predisponentes (ex: raça Persa);
 A maioria dos quadros clínicos atípicos.
 Requerem tratamento mais prolongados e com maior probabilidade de recidiva.

 Portador
 Tratamento aconselhado devido ao potencial de transmissão da doença.
MEIOS AUXILIARES DE DIAGNÓSTICO

 Não existe um teste gold standard.

 Os únicos exames que garantem a confirmação de infeção de pelos e/ou


pele por dermatófitos é a observação direta de hifas ou artrosporos. A
observação direta pode ser feita através material recolhido por
raspagem superficial, tricograma ou biópsia.
PORQUE RAZÃO OS TESTES DE DIAGNOSTICO SÃO IMPORTANTES?

 Presença de infeção ativa versus contaminação da pelagem.


 Decidir sobre tratamento e/ou quarentena.
 Identificar portadores assintomáticos.
 Identificar o animal curado.
LÂMPADA DE WOOD
 Em caso de infeção por M. canis deve ser observada presença de fluorescência de cor esverdeada.
Fluorescência é detetada na larga maioria dos casos e resulta da presença de pteridina. Este metabolito
resulta de infeção ativa e localiza-se no córtex ou medula do pelo.

 O tratamento tópico com champo, lime sulfur ou enilconazole não retira a fluorescência.

 Alto valor preditivo positivo e negativo.

 Observação em sala escura. Mover a lâmpada lentamente perto da pelagem e examinar todo o animal,
embora se deve concentrar nas áreas que têm lesões e onde a infeção normalmente inicia (face, orelhas,
extremidades podais). Não é necessário aquecer a lâmpada antes da utilização. Os pelos infetados podem
ser observados 5-7 dias após exposição. No estadio inicial é mais fácil encontrar fluorescência em pelos
curtos.
LÂMPADA DE WOOD
 A “falsa fluorescência” tem cores distintas da fluorescência verde de M. canis.

 Para confirmação de infeção ativa é recomendada a remoção do pelo e observação da porção


intra-folicular.Também pode ser confirmada através do exame microscópio do pelo.

 Nem todos os pelos fluorescentes são positivos em cultura.

 À medida que a infecção é tratada no folículo piloso, perda da fluorescência é observada na


porção proximal do pelo permanecendo apenas na ponta. Tal pode ser observado em gatos
clinicamente curados. O pigmento permanece no pelo mas não significa que esteja presente que
a infecção esteja ativa.

 A L wood é um bom método de screenings para shelters.


EXAME DIRECTO AO MICROSCÓPIO

 Amostra pode ser recolhida por raspagem superficial e/ou arrancamento de pelos ou
descamação no local das lesões.

 Combinação de ambas as técnicas é positiva em 87,5% dos casos.

 Pode ser utilizado óleo mineral, clorfenolac, e hidróxido de potássio (KOH).


EXAME DIRECTO AO MICROSCÓPIO

 Óleo mineral
 Pode ser imediatamente visualizado;
 Fácil de encontrar;
 Não existe risco de lesão animal ou humano;
 Não danifica a lente do microscópio;
 Não causa perda da fluorescência;
 A falta de digestão da camada epidérmica não afecta a visualização de esporos e hifas.

 KOH
 É necessário 10-20 minutos para que ocorra digestão e necessita de exame directo para evitar artefactos
 Destrói a fluorescência de pelo infectados, tornando impossível utilizar a lâmpada de wood
MÉTODOS DE RECOLHA PARA CULTURA MICOLÓGICA
Técnica de Mackenzie com escova de dentes
1. Retirar da embalagem uma escova de dentes nova.
2. Escovar primariamente as áreas não afectadas por forma a não disseminar os esporos.
3. De seguida, escovar de forma suave a área afectada, incluindo a pele e margens da lesão com
pelagem ou descamação/crostas.
4. Colocar a escova de volta na embalagem, ou num envelope, identificado com o nome do paciente.

Colheita da pelagem com pinça


1. Remover, com uma pinça, pelos em torno das áreas de alopécia observadas.
2. Colocar os pelos tracionados num envelope, ou frasco estéril com tampa, identificado com o
nome do paciente.
DTM (DERMATOPHYTE TEST MEDIUM)

 Meio com Sabouraud dextrose agar e cicloheximida, gentamicina e clortetraciclina como antibióticos e
antifúngicos para inibição de crescimento de microrganismos contaminantes.
 Contém também o indicador de ph vermelho fenol.
 Os dermatófitos metabolizam a proteína no meio tornando a coloração amarela em vermelha quando as
colónias começam a surgir. Falsos positivos reportados em 20% dos casos. A alteração da coloração
ocorre até 14 dias.
 Preferir meios com maior superfície de contato. Incubar 25-30C. A luz não interfere com o crescimento
do dermatófito.
CULTURA MICOLÓGICA

 Os dermatófitos de cães e gatos, em cultura, aparecem com coloração branca, amarelo claro,
amarelo escuro ou castanho claro e com um aspecto de algodão ou poeirento.

 Nunca apresentam coloração preta, verde ou cinzenta.

 A avaliação das colónias em microscópio é também importante para garantir que se trata do
microorganismo correcto e não um contaminante que se assemelhe macroscopicamente.
 Em caso de infecção, o crescimento das colónias é confluente. No caso de apenas uma
colónia pode indicar que se trata de um caso em recuperação ou fómite. É importante que o
laboratório reporte o numero de colónias.
CITOLOGIA DE CULTURA MICOLÓGICA

1. Utilizando luvas, retirar um pedaço de fita-cola transparente e tocar suavemente na


superfície das colónias.
2. Colar a ponta numa lâmina e adicionar uma gota de azul-de-metileno, azul de
lactofenol ou de corante azul de Diff-Quick.
3. Observação em microscópio numa ampliação de 10-40x para visualização de
macroconídeas.
CULTURA MICOLÓGICA: RESULTADO

 Método muito sensível: “positive culture may offer a proof of infection and negative
cultures are less definitive” (Guidelines).

 Falsos positivos: contaminação ambiental da pelagem, erros de identificação.

 Falsos negativos: falta de amostra e após tratamento do animal com produtos tópicos
que inibam o crescimento em cultura. Por exemplo, aplicação de Betadine ou outros
anti-fúngicos.
PCR PARA DERMATÓFITOS

 É rápido e sensível e pode ser feito para Microsporum ou Trychophyton.


 Material a recolher: pelos arrancados ou crostas/descamação por raspagem. Não usar a
escova dos dentes.
 Excelente opção para pseudomicetomas em gatos em que a histopatologia é negativa.
Pode ser feito apartir de tecido fresco (preferível) ou formol.
 O resultado pode ser positivo no caso de animal infetado, fómite ou animal em
tratamento (deteta DNA não viável). O PCR não é afetado pelo tratamento.
 O resultado negativo pode acontecer em caso de recolha de amostra insuficiente ou em
caso de cura.
BIÓPSIA DE PELE

 É usada nos seguintes casos: lesões nodulares (kerion), lesões ulcerativas e exsudativas
(psedomicetoma), suspeita de pênfigo foliáceo e outras lesões atípicas.

 Pode ser negativo em HE. Pedir coloração especial (PAS ou GMS).

 Idealmente submeter tecido para histopatologia e tecido para cultura e/ou PCR. O tecido
para cultura ou PCR pode ser conservado em soro fisiológico. No caso de PCR a amostra
também pode ser conservada congelada.
NO PROCESSO DE DIAGNOSTICO PODERÁ SER NECESSÁRIO:

Hemograma
Bioquimica geral
Pesquisa de leishmaniose (cão)
FIV/FeLV (gato)
Eventualmente outros exames de acordo com historial e exame físico.
TRATAMENTO

 Em animais saudáveis a dermatofitose pode ser auto-limitante mas o tratamento permite reduzir
o tempo da doença e prevenir contaminação de outros animais e pessoas.

 O tratamento deve ser adequado a cada caso clínico. Dependendo de vários fatores pode incluir
medicação tópica, oral e limpeza ambiental.

 O tratamento tópico e oral são igualmente importantes. O tratamento tópico age sobre a haste
pilosa. O tratamento oral age no folículo piloso. A falta de tratamento tópico pode levar a falhas
de tratamento.

 Em média e em casos não complicados o tratamento dura um mês. Casos complicados


requerem tratamentos mais longos.
TRATAMENTO TÓPICO

 A escovagem da pelagem de ser feita depois do tratamento tópico para diminuir a


contaminação ambiental.

 O tratamento tópico serve para evitar contágio direto, contaminação ambiental e reduzir o
tempo de tratamento.

 No tratamento tópico deve-se usar um antifúngico que pode ser associado à clorhexidina. A
clorhexidina usada isoladamente é pouco eficaz.
TRATAMENTO TÓPICO

 Em geral, não é necessário tosquia de corpo inteiro. No entanto, a tosquia poderá ser necessária
em casos de pelagem comprida. A tosquia pode aumentar o numero de lesões em gatos que não
estejam a receber tratamento oral. Se o tratamento oral for instituído antes da tosquia evita-se
a propagação da infeção para outras zonas do corpo.

 Em caso de lesões localizadas considere o corte de pelagem em redor da lesão com tesoura ou
máquina de tosquiar.

 A eliminação do pelo contribui para a eficácia do tratamento tópico e para diminuir a


contaminação ambiental.
TRATAMENTO TÓPICO: BANHO

 Recomendado banho 2x semana.


 Banhos com champô de clorhexidina 2% associada ao miconazole a 2% são com tempo de
contato de 5 minutos.
 Os champôs têm menos acção residual que os “dips”.

 Este tratamento pode ser adotado em animais que foram expostos a animais infetados para
descontaminação da pelagem.
TRATAMENTO TÓPICO: LIME DIP

 Os “dips” são aplicados na pelagem e não são enxaguados. Deve ser aplicados 2x semana
com esponja ou mediante pulverização.

 Limeplus® (enxofre) – diluir de acordo com as instrucções (15 – 30ml de produto em 1 litro
de água). O enxofre é um bom anti-fúngico e pode ser usado em gatinhos. É seguro mas é
recomendado aplicação de colar isabelino enquanto a pelagem está a secar.
 O produto deve ser diluído antes da aplicação e tem cheiro típico do enxofre. Pode corar a
pelagem branca com tingimento amarelado e secar ligeiramente a pele e as almofadas
plantares. Evitar zona à volta dos olhos.
TRATAMENTO TÓPICO: ENILCONAZOLE

 Enilconazole 0,2% (Imaverol®)

 Diluir 20ml de produto em 1 litro de água. Fazer a diluição de fresco antes do tratamento.

 Aplicar com esponja ou com spray 2x semana.

 Pode causar aumento das enzimas hepáticas se o animal lamber a pelagem molhada.
TRATAMENTO TÓPICO LOCALIZADO

 O tratamento focal da lesão pode ser feito com um dip, creme ou mousse.

 Em lesões nas orelhas pode ser aplicada diariamente uma preparação cutânea que contenha
clotrimazole, cetoconazole ou miconazole.

 As mousses são fáceis de aplicar e estão licenciadas para uso no cão e no gato.

 Para lesões na face ou região periocular pode ser aplicado miconazole a 2% para uso ocular.
TRATAMENTOS ORAIS DE ELEIÇÃO

Cão: itraconazole ou terbinafina.

Gato: itraconazole.

A administração deve ser durante a refeição ou pós-prandial.

Atualmente as resistências aos antifúngicos são raras.


ITRACONAZOLE

 Tratamento eficaz no cão e gato. Eleição no caso do gato.

 Dose: 5mg/kg/SID em ambas as espécies.

 Cão: regime contínuo.

 Gato: continuo ou em regime pulsátil (1 semana on/ 1 semana off).

 Pode ser usado em gatinhos apartir das 10 semanas. Não usar em fêmeas prenhas ou lactantes.
ITRACONAZOLE

 Administrar com refeição. A absorção é favorecida pelo gordura presente nos alimentos e pelo
pH ácido do estômago. Não administrar medicamentos que reduzem o pH do estômago
(famotidina, omeoprazol, etc).

 Fortemente lipofílica com acumulação nas glândulas sebáceas e tecido subcutâneo. O sebo
permite o tratamento da haste folicular dentro do folículo. Acumula-se na pele durante 4
semanas (efeito prolongado no tempo).
ITRACONAZOLE

 Efeitos 2ºs: vómito, anorexia e aumento das enzimas hepáticas. Em caso de tratamento
prolongado, monitorizar enzimas hepáticas cada 3 semanas.

 Os efeitos secundários severos estão associados a doses mais altas (10mg/kg) e por períodos de
tempo mais prolongados (tratamento de micoses profundas). No cão, estão reportados casos de
vasculite e ulceração cutânea na dose alta.
TERBINAFINA

 Dose: 30-40 mg/kg/SID (cão e gato).

 É uma alilamina sintética comercializada em comprimidos grandes com 250mg.

 Acumula-se na pelagem do gato. O tratamento por ciclos também está reportado nesta espécie.

 No gato, a dose mais baixa (10-20mg/kg) está associada a um período de tempo mais prolongado
até à cura.
TERBINAFINA

 Raramente vómito ou diarreia e aumento da ALT e AST.

 No geral, segura e eficaz mas com poucos estudos (principalmente no gato).

 Existe um caso de reportado de dermatofitose felina por M. canis resistente à terbinafina mas
susceptível ao itraconazole (Hsiao, 2018).
OUTROS TRATAMENTOS
 O cetoconazole pode ser usado como alternativa no caso do cão mas é menos eficaz que as moléculas
de eleição e tem mais efeitos secundários. Não é recomendado no caso do gato devido à toxicidade.
Inibidor do citocromo P450. Dose: 5-10mg/kg (cão).

 O fluconazole tem uma eficácia baixa para dermatófitos.

 A griseofulvina está associada a baixa eficácia e pode ter efeitos secundários severos e é teratogénica.

 O lufenuron não é eficaz.


LIMPEZA DO AMBIENTE

 Os dermatófitos não se multiplicam no ambiente.

 Superfícies não porosas: aspirar, lavar com detergente que tenha acção desinfetante. Existem
inúmeros produtos comerciais com acção anti-fúngica.

 Superfícies porosas: aspirar e aplicar produtos próprios para a superfície a desinfectar.

 Lavar mantas, camas, pentes, brinquedos, etc…

 Em casos esporádicos pode ser necessário isolamento do paciente. No entanto, o isolamento


pode interferir com sociabilização dos animais jovens.
TRATAMENTO DE LESÕES NODULARES

 A lesão nodular mais frequente no cão é o kerion. Este tipo de lesão responde bem ao
tratamento.

 Em gatos, as lesões nodulares mais frequentes são os pseudomicetomas. O prognostico é


reservado e exige excisão cirúrgica com margens largas e tratamento oral prolongado. O
tratamento oral pode ser feito com itraconazole ou terbinafina. Em casos muito graves e
pouco responsivos ao tratamento oral pode-se considerar associar ambos os
medicamentos. Risco de recidiva.
MONITORIZAÇÃO DO TRATAMENTO

 A cura clínica antecede a cura micológica.

 Considerar interrupção do tratamento oral após resolução clínica.

 Considerar interrupção do tratamento tópico após a cura micológica.

 A monitorização micológica é feita através da cultura micológica. A monitorização


também pode incluir a lâmpada de Wood em casos que revelem flourescência.
Também podemos considerar o uso de PCR.
MONITORIZAÇÃO DO TRATAMENTO

 O tratamento eficaz está associado à diminuição do numero de colónias (CFU/plate).

 A cura é definida como ausência de sinais clínicos e 2 culturas fúngicas negativas com 2
semanas de intervalo.

 Em caso de infeção simples pode considerar uma cultura negativa única.


NUMERO DE COLÓNIAS EM CULTURA: GATOS

 Menos de 5 colónias: pode estar curado e trata-se somente de contaminação ambiental.

 Entre 5-10 colónias: zona “cinzenta”. Manter o tratamento oral e tópico e repetir cultura
passado 2 semanas.

 Mais de 10 colónias: infecção activa. Manter o tratamento e monitorizar cada 2 semanas.


PREVENÇÃO DA DERMATOFITOSE
 Evitar contato com animais infetados ou portadores. A inserção de novos gatos em colónias
pode ser precedido de quarentena. A quarentena deve ser acompanhada de culturas fúngicas
feitas no inicio e fim do período de quarentena. As culturas podem ser associadas a outros
meios auxiliares diagnóstico (lâmpada de Wood e/ou PCR).

 A vacinação não evita a infeção mas pode diminuir a intensidade dos sinais clínicos.
Eventualmente, pode ser usada como terapia complementar de tratamento. Neste momento,
ainda não está comercializada em Portugal. Em alguns países existe vacina composta por M.
canis e vacina mista com Microsporum e Trychophyton.
CONCLUSÃO

 A dermatofitose é uma doença curável.

 Os sinais clínicos resultam de vários fatores nomeadamente a idade, raça, estado imunitário e
espécie de dermatófito que está a causar a infeção.

 O tratamento passa pelo uso de produtos tópicos, medicação oral e limpeza do ambiente.

 A monitorização do tratamento é essencial para assegurar a cura do paciente.

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