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TÍTULO:
Resumo:
Este artigo procura relacionar as etapas de um processo de aprendizagem experimental com o
uso de simuladores de negócios no ensino de gestão. Inicialmente, se faz uma análise sobre as
mudanças de paradigma necessárias ao processo de aprendizagem para atender às expectativas dos
estudantes dos tempos atuais e se aponta como uma abordagem experimental pode atender a essas
necessidades. Posteriormente, são descritas as características dos simuladores de negócios,
particularmente os com foco estratégico, bem como as principais práticas pedagógicas associadas ao
seu uso. Na sequência se resgatam os fundamentos da aprendizagem experimental detalhando-se,
especificamente, o ciclo de Kolb. A partir dessa referência, se faz uma contraposição das etapas de
uso de um simulador estratégico com aquelas sugeridas por Kolb no processo de aprendizagem
experimental. Por fim, se traçam considerações sobre o processo de avaliação e de como esse pode
validar o aprendizado de base experimental.
Palavras-chave:
Simuladores de negócios; aprendizagem experimental; modelo de Kolb
Abstract:
This paper seeks to relate the steps of a process of experiential learning with the use of business
simulations in management education. Initially, an analysis is made about the paradigm shifts
necessary for the learning process to meet the expectations of the students of the present day and
shows how an experimental approach can meet these needs. Subsequently, we describe the
characteristics of business simulations, as well as main pedagogical practices associated with their
use. We review the main theoretical basis for experiential learning detailing, specifically, Kolb´s
learning cycle. With this reference, we compare the steps of using a strategic simulation with those
suggested by Kolb on experiential learning process. Finally, we outline considerations about
evaluation processes and how this can validate learning development within an experimental basis.
Keywords:
Business simulations; experimental learning; Kolb´s model
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1. Introdução
As últimas décadas têm presenciado uma significativa mudança no paradigma tradicional do
processo de ensino e aprendizagem, incluindo-se nesta o ensino de administração. Ensinar era
fundamentalmente pensado em termos de transferência de informação, conduzida por um professor
com conhecimentos tidos como relevantes para o meio no qual se inseria. Até poucos anos atrás, as
tecnologias instrucionais disponíveis ainda se resumiam a livros e palestras, com poucos recursos
extras para apoio à aprendizagem. Nesse contexto, se tudo transcorresse normalmente, se presumia
que a mensagem teria sido adequadamente transmitida do professor para o aluno e que, como
consequência, o processo de aprendizagem teria atingido seu objetivo. Em princípio, quanto mais
semelhante fosse o discurso do aluno quando comparado com o do professor, tanto mais efetiva e
completa teria sido sua educação.
Embora muitos ainda vivenciem processos de aprendizagem dessa forma, se sabe hoje das
limitações desse paradigma. Rubem (1999) formaliza alguns aspectos que contribuem para redução
da eficácia da aprendizagem quando se toma como referência um paradigma de transmissão da
informação, centrada no professor:
A estrutura do conceito pressupõe que ensino e aprendizagem são inseparáveis. Como
consequência, o ensinar é suposto como uma condição para aprender. Tal proposta cai por terra
na medida em que se percebe que aprendemos fora do contexto escolar formal, conversando
com outras pessoas, assistindo televisão ou interagindo através de diversas experiências do
cotidiano.
O verdadeiro teste de aquisição de conhecimentos e habilidades não está no saber em si, mas na
habilidade de utilizar tal conhecimento de modo a transformar comportamentos.
O paradigma também tende a reforçar o conceito de transmissão do conhecimento partindo de
um expert para um indivíduo isolado, e não de forma coletiva. Isto é, pressupõe que existam
poucas fontes de informações, representadas por indivíduos com conhecimento, o qual deverá
ser adquirido por um grande número de aprendizes passívos.
O detentor do conhecimento também define, além do conteúdo, a relevância do que é ensinado.
Assim, o que é ensinado é tido como relevante, independentemente de quem aprende, e
suficiente, independentemente do contexto de uso. Como consequência, o modelo não promove
o aprendizado ativo nem o espírito crítico sobre o que está sendo ensinado.
O modelo clássico de transferência do conhecimento tem uma baixa capacidade de lidar com
assuntos como emoção, com dificuldades para integrar os domínios cognitivo, afetivo e
comportamental.
A descrição desses aspectos limitantes da abordagem do aprendizado centrado na transmissão
de informações por parte do professor acaba por justificar a necessidade de buscar alternativas
pedagógicas que os superem e que levem a experiência do aprendizado para um novo patamar.
Surge, como uma das muitas alternativas, a possibilidade de se utilizar uma abordagem experimental
e vivencial como base para o processo de aprendizagem. Na verdade, os fundamentos teóricos para
o uso de simulações e de outras formas de aprendizado interativo, baseado na experimentação, são
muito antigos, havendo referências nos escritos de Aristóteles sobre essa forma de ensinar adotada
por Sócrates (Rubem, 1999).
Métodos de aprendizagem experimental (ou baseados na experiência) têm a possibilidade de
superar vários dos limitantes do paradigma convencional de ensino e aprendizagem. Eles permitem
acomodar abordagens bem mais elaboradas no que diz respeito ao processo e aos resultados da
aprendizagem, permitindo maior interação entre seus atores. A colaboração entre pares, a discussão
de aspectos cognitivos em conjunto com aspectos afetivos e, principalmente, um aprendizado ativo e
consciente estão entre as principais vantagens da abordagem experimental. É necessária,
entretanto, uma atenção especial sobre o papel do professor facilitador nesse processo, o qual muda
de fonte de informação para arquiteto de experiências construtivas.
A aplicação de métodos experimentais e vivenciais recebeu um significativo impulso nas últimas
décadas com o desenvolvimento das tecnologias de informação e comunicação (TICs). Estas
permitiram, através das simulações, criar uma versão moderna do método Socrático, em que se
propunham situações da vida real para reflexão dos alunos sobre o seu significado. A oferta em
massa de computadores pessoais de grande capacidade de processamento permitiu o uso regular de
simulações, tanto na forma de laboratórios virtuais como de simuladores de processos industriais ou
gerenciais. Softwares de simulação, que antes somente podiam rodar em grandes mainframes,
passaram a ser disponíveis também em computadores pessoais ou facilmente acessados via web
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2. Simuladores de negócios
Simulações (ou simuladores) são softwares destinados a modelar o comportamento de algum
objeto, máquina ou sistema, baseados na realidade, com a máxima fidelidade possível (TANG, 2007).
Uma característica dos simuladores é que estes possuem modelos matemáticos cujo desafio é tornar
a simulação o mais realística possível no que diz respeito ao comportamento do fenômeno simulado.
A simulação, portanto, procura reproduzir fenômenos físicos, sociais ou de negócios da forma mais
próxima possível da realidade. Para tal, vale destacar a definição de Tang (2009), o qual propõe que
"simuladores são sistemas de software que envolvem simulação de experiências da vida real,
destinadas ao desenvolvimento de habilidades onde os desafios apresentados reproduzem fielmente
um cenário do mundo real".
Um caso particular dos simuladores são aqueles destinados ao ensino de gestão,
particularmente utilizados em cursos de administração, onde o escopo se restringe a um ambiente de
competição entre empresas, cujos gestores são os alunos. Bernard (2006) explica que existem várias
formas de se referir a esse tipo de simulação, sendo algumas delas a de jogos de empresas, jogos de
negócios, jogos gerenciais, simulação empresarial, simulação de gestão, gestão simulada e
simulação gerencial. Bernard (2006) trata as simulações como um método de capacitação gerencial
em que participantes competem entre si, através de empresas simuladas, "...tomando decisões que,
processadas por um simulador, geram relatórios gerenciais para que um novo ciclo de análise e
tomada de decisões seja realizado".
O software de simulação é apenas um dos componentes do processo de ensino-
aprendizagem. Ele faz parte de uma arquitetura pedagógica, composta por vários atores (instrutor,
alunos, apoiadores) e recursos (equipamentos para processamento e comunicação, software,
manuais). A forma como as simulações têm sido usadas vem mudando muito nos últimos anos. De
acordo com Faria (2008), isso se deve, principalmente, à evolução dos recursos computacionais e de
comunicação que são utilizados nos ambientes digitais. Por exemplo, a forma de interação entre os
participantes ou entre estes e o instrutor está migrando dos tradicionais encontros presenciais para
reuniões virtuais, apoiadas por tecnologias de teleconferência. Da mesma forma, a disponibilidade de
maior capacidade computacional tem permitido o desenvolvimento de simuladores mais complexos,
os quais permitem, ao mesmo tempo, uma interatividade com o usuário de forma mais amigável,
porém com conteúdos mais elaborados, ensejando decisões cujo desdobramento requer análises
mais profundas.
Tipicamente, numa simulação empresarial, os alunos assumem o papel de gestores de
empresas que competem entre si em um mercado restrito a esses competidores. Pode haver
influências relacionadas ao microambiente, tais como inflação, restrição de acesso a matérias-primas,
mudanças nos custos de mão de obra, etc. (SAUAIA, 1995). As principais informações
disponibilizadas aos alunos referem-se à indústria onde deverão atuar, incluindo dados sobre o
mercado e os clientes, custos de produção e desenvolvimento de tecnologias, despesas de marketing
e eficiência das equipes comerciais. Na maioria dos casos, há um orçamento restrito, o qual deve ser
aplicado pelos gestores nas diferentes demandas de recursos. As decisões formalizadas pelas
equipes são, então, processadas pelo simulador, que compara as ofertas de mercado de acordo com
o composto de marketing criado individualmente pelas empresas. Após o processamento, novos
relatórios estão disponíveis aos gestores, repetindo-se o ciclo de decisão e análise.
As etapas de uso de uma simulação em um curso dividem-se em três grandes partes:
preparação, ciclos repetitivos e encerramento (TANABE, 1977 apud LACRUZ, 2004). Lacruz (2004)
propõe que a primeira etapa (preparação) contempla as fases de apresentação do cenário simulado,
esclarecimento das regras da simulação e planejamento das decisões a serem tomadas por parte das
equipes. A segunda etapa (ciclos repetitivos) seria composta pela simulação propriamente dita,
incluindo o registro das decisões, processamento e, ao final de todos os ciclos programados, a
definição da equipe vencedora. A terceira e última etapa (encerramento) seria, então, composta pelo
chamado debriefing ou aftermath, em que os alunos e o professor trocam impressões e
interpretações sobre cada rodada ou decisão relevante. Bernard (2006) complementa que também
faz parte da etapa inicial de preparação a divisão de responsabilidades entre os integrantes de cada
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equipe, definindo-se, em geral, cargos de direção ligados às principais áreas da empresa, tais como
marketing, vendas, produção, finanças ou recursos humanos.
Um destaque importante a ser dado na adoção de simulações em cursos de formação é o do
papel do professor ou instrutor nesse processo, em particular na segunda etapa, em que ocorrem os
ciclos repetitivos. Cadotte (1995) afirma que o papel do instrutor nas simulações difere muito da figura
tradicional do professor, uma vez que o centro do processo de análise e decisão está com o aluno. O
autor mostra que o papel do instrutor não é o de encontrar soluções para os problemas de cada time,
mas sim o de levantar questões e aspectos que ainda não tenham sido contemplados nas análises
prévias de cada grupo. Essa abordagem permite, normalmente, um atendimento personalizado
quando a discussão for direcionada a um aspecto em particular da gestão, cuja responsabilidade seja
de um dos integrantes do grupo em particular. Isso leva ao tratamento de cada estudante como sendo
um caso particular e único, o que, pedagogicamente, torna a abordagem muito eficiente.
Sobre o encerramento, cabe registrar que, cada vez mais, dedicam-se esforços para a
melhoria dessa etapa, uma vez que o processamento da simulação permite vários insights aos seus
participantes. No momento em que os participantes sentam lado a lado e começam a discutir o que
ocorreu ao longo da simulação, geralmente liderados pelo instrutor, podem surgir novos
questionamentos e interpretações sobre as decisões tomadas. Um bom processamento da simulação
permite aos gestores destacar os pontos importantes, assim como generalizar as lições aprendidas,
de modo que eles possam utilizá-las em outras situações (PRENSKY, 2001). Estudos comprovaram
(PETRANEK, 2000) que debriefings escritos geram ainda mais ganhos de aprendizagem por
forçarem os participantes a organizar a experiência da simulação sob uma ótica pessoal,
questionando e reestruturando conceitos prévios.
3. Aprendizagem experimental
As discussões epistemológicas relacionadas com a educação no século XX têm sido focadas
na interação do conhecimento que se quer trabalhar com a experiência do aprendiz (KREBER, 2001).
Esse conceito de que o conhecimento resulta de um acomodar de experiências dentro do conjunto de
estruturas cognitivas de quem aprende é a base da proposta piagetiana do processo de
aprendizagem e desenvolvimento. As tentativas de sistematizar o processo de interação entre
experiências objetivas e subjetivas acabaram por resultar numa modalidade de aprendizagem que
ficou conhecida como aprendizagem experimental (KREBER, 2001).
Para Kolb (1984), aprendizagem experimental é "o processo onde o conhecimento é criado
através da transformação da experiência. O conhecimento resulta da assimilação de uma
experiência transformadora". No seu modelo, Kolb (1984) detalha o processo pelo qual o aprendiz,
através de uma experiência concreta ou de uma conceituação abstrata, assimila uma experiência.
Esta compreensão, seja originária do reino concreto, sensorial, ou do reino abstrato, teórico, deve
sedimentar-se no reino abstrato para dar interpretação e significado à experiência, permitindo assim
que esta seja lembrada, recordada e comunicada.
O modelo de aprendizagem experimental (experiential learning model), proposto por Kolb
(1984) é representado na figura 1 a seguir, e envolve quatro estágios. O ciclo se caracteriza como a
vivência de uma experiência concreta em um evento, o qual resulta em reflexão sobre o observado.
As conclusões oriundas da reflexão são assimiladas de uma forma teórica e conceitual, a partir da
qual o indivíduo poderá deduzir novas implicações em ações futuras. Essas implicações também
poderão ser testadas, gerando novas experiências.
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Uma análise mais detalhada do modelo sugere que, para um aprendizado ser efetivo a partir
dessa abordagem, um aprendiz necessitará de quatro grupos distintos de habilidades:
Na Experiência Concreta (concrete experience-CE): a capacidade de se envolver integral e
abertamente, de maneira não tendenciosa em novas experiências;
Na Observação Reflexiva (reflexive observation-RO): a capacidade de observar e refletir sobre as
experiências vivenciadas a partir de diversas perspectivas de análise;
Na Conceituação Abstrata (abstract conceptualisation-AC): a habilidade de construir conceitos
que organizem as observações em estruturas teóricas lógicas;
Na Experimentação Ativa (active experimentation-AE): a habilidade de usar as teorias
desenvolvidas para solução de problemas e a tomada de decisão.
Dentro dessa proposta, um ciclo ideal de aprendizagem faz com que o aprendiz passe por
cada uma dessas etapas, experimentando, refletindo, pensando e agindo, em um processo contínuo
de interação com diferentes situações de aprendizado, contextos e conteúdos (KENWORTHY, 2005).
Um desdobramento da proposta de Kolb (1984) surge quando se considera as limitações
humanas de trabalhar simultaneamente com duas formas de pensamento que são, em essência,
antagônicas, como é o caso do concreto versus o abstrato e da ação versus a reflexão. Nesse
sentido, Kolb (1984) propôs que se passa a trabalhar de modo mais padronizado, elegendo o que ele
designou de "estilos de aprendizagem", os quais se caracterizariam por preferências pessoais na
forma de vivenciar e analisar uma experiência. Embora não esteja no escopo desse trabalho, vale
listar os quatro estilos de aprendizagem propostos por Kolb (1984), juntamente com a combinação
das habilidades predominantemente associadas a eles: estilo Convergente (AC+AE); estilo
Divergente (CE+RO); estilo Assimilador (AC+RO) e estilo Acomodador (CE+AE).
Apresenta-se, a seguir, uma leitura dos principais eventos de uma simulação, agrupados a
partir das etapas do ciclo de aprendizagem experimental proposto por Kolb (1984), com uma breve
descrição de como estes caracterizam cada etapa do ciclo:
pré-estabelecidos, quer na forma integrada destes (Balanced Scorecards e Indices por ação).
Uma análise dos resultados pós-rodada de simulação permite ao aluno desenvolver um modelo
que anteveja seu desempenho, desde que os movimentos estratégicos esperados dos
concorrentes venham a se realizar;
6. Conclusão
As simulações gerenciais se propõem a fazer a mudança de paradigma de aprendizagem,
necessária para atender às expectativas dos alunos dessa nova geração. Nas simulações, o foco do
processo de aprendizagem está no aluno e não no professor. Além disso, estas foram desenvolvidas
com o intuito de explorar o saber fazer, dando sentido e concretude aos conhecimentos
desenvolvidos ao longo de um curso de administração. Um desafio novo para muitos professores é o
fato de que nas simulações se trabalha também o aspecto afetivo dos alunos, estimulando-se
convívios, debates e tomadas de decisões coletivas, resultando em experiências que definirão a
atitude desses futuros gestores.
Ter como referência um modelo de construção do conhecimento, tal como o proposto no ciclo
de Kolb, permite ao facilitador compreender melhor se e como os objetivos de aprendizagem estão
sendo atingidos. Reconhecer os resultados esperados em cada etapa do ciclo de aprendizagem
pode auxiliar o professor a mostrar ao próprio aluno o seu progresso, fazendo com que essa
percepção de si o incentive ainda mais a continuar com o seu processo de aprendizagem.
Por fim, a construção de um sistema de avaliação formativa permite a tomada de consciência
por parte do aluno do que foi apreendido, dos modelos de conhecimento e das novas habilidades
desenvolvidas. Disso, se espera, resultará um administrador capaz de levar os conhecimentos
lapidados na academia para as organizações em que atuará como elemento transformador.
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